Vous êtes sur la page 1sur 40

I - INTRODUÇÃO

O presente trabalho propõe-se a tecer considerações sobre (i) a


Ação Direta de Inconstitucionalidade (“ADI”) nº 2238, (ii) as Ações Diretas de
Inconstitucionalidade nº 2250, nº 2261, nº 2256, nº 2324, nº 2241 enº 2365; e
(iii) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (“ADPF”) nº 24
(em conjunto, “Ações”). Tais Ações questionam a constitucionalidade de
dispositivos da Lei Complementar nº 101/2000 (“Lei de Responsabilidade
Fiscal” ou “LFR”) eda Medida Provisória nº 1.980-20/2000 (“MP nº 1.980-
20/2000”).

Na análise das Ações, a constitucionalidade dos dispositivos


impugnados também será examinada considerando a posição do Supremo
Tribunal Federal – STF em sede do julgamento da medida cautelar da ADI nº
2238, realizado em agosto de 2007.

II – DA INCONSTITUCIONALIDADE DOS §§ 2º E 3º DO ARTIGO 7º DA LEI


DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 7º, §§ 2º e 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 7º O resultado do Banco Central do Brasil, apurado após a


constituição ou reversão de reservas, constitui receita do Tesouro
Nacional, e será transferido até o décimo dia útil subseqüente à
aprovação dos balanços semestrais.

(...)

§ 2º O impacto e o custo fiscal das operações realizadas pelo Banco


Central do Brasil serão demonstrados trimestralmente, nos termos em
que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias da União.

§ 3º Os balanços trimestrais do Banco Central do Brasil conterão


notas explicativas sobre os custos da remuneração das
disponibilidades do Tesouro Nacional e da manutenção das reservas
cambiais e a rentabilidade de sua carteira de títulos, destacando os
de emissão da União.

A constitucionalidade do dispositivo em comento é questionada


em razão da antinomia existente entre o disposto nos §§ 2º e 3º do artigo 7º da
LRF, que prevê a trimestralidade dos balanços do Banco Central do Brasil –
BACEN, e o disposto no artigo 4º da MP nº 1980-20/2000, que determina a
observação do período considerado entre 1º de janeiro e 31 de dezembro para
a elaboração dos balanços do BACEN.

No julgamento da medida cautelar, O STF não conheceu da


impugnação aos §§ 2º e 3º do artigo 7º da LRF, uma vez que o conflito com o
artigo 4º da MP nº 1980-20/200 distancia-se do escopo do controle de
constitucionalidade de leis e atos normativos. A Suprema Corte ainda salientou
que a antinomia em questão deve ser solucionada mediante os princípios
gerais de hermenêutica e aplicação do direito.

De fato, a referida impugnação não deve ser conhecida,haja vista


a existência de antinomia apenas entre normas infraconstitucionais, hipótese
que foge do escopo do controle de constitucionalidade. A propósito, o
parâmetro de controle da ação direta de inconstitucionalidade deve ser a
própria Constituição Federal e não norma infraconstitucional, conforme
sustenta a doutrina:

A expressão “controle de constitucionalidade” designa um fenômeno


composto de dois elementos essenciais nos Estados
contemporâneos. Em primeiro lugar, o controle pressupõe a
existência de uma Constituição que seja considerada superior em
relação aos demais atos e normas no âmbito de um Estado. E isso
porque, “constitucionalidade” é uma noção relacional: algo – uma lei,
um ato administrativo, um contrato – será comparado com a
Constituição e será considerado constitucional ou inconstitucional,
sendo certo que esse juízo apenas faz sentido se a segunda for
considerada superior, servindo assim como um parâmetro de
controle1.

Nesse sentido, em consonância com a posição do STF no


julgamento da medida cautelar da ADI nº 2238, não deve ser conhecido o
pedido de declaração da inconstitucionalidade dos §§ 2º e 3º do artigo 7º da Lei
de Responsabilidade Fiscal.

III – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 30, INCISO I, DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 30, inciso I, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

1BARCELLOS, Ana Paula de. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 2018,
p. 507-508.
Art. 30. No prazo de noventa dias após a publicação desta Lei
Complementar, o Presidente da República submeterá ao:

I - Senado Federal: proposta de limites globais para o montante da


dívida consolidada da União, Estados e Municípios, cumprindo o
que estabelece o inciso VI do art. 52 da Constituição, bem como de
limites e condições relativos aos incisos VII, VIII e IX do mesmo
artigo;

Evidentemente, o dispositivo legal impugnado constitui norma de


caráter temporário, cujo prazo para cumprimento já havido sido expirado na
data de julgamento da medida cautelar. Dessa forma, o STF declarou
prejudicado o pedido autoral, no que se referia à impugnação do artigo 30,
inciso I, da Lei de Responsabilidade Fiscal, considerando a expiração do prazo
de vigência da norma.

A esse respeito, a doutrina afirma:

O objeto da ação direta é a declaração de inconstitucionalidade de lei


ou ato normativo em tese, produzindo, em última análise, o efeito
prático de torná-los inaplicáveis com caráter geral, erga omnes.
Assim, a revogação ou exaurimento dos efeitos da lei impugnada
fazem com que a ação perca seu objeto ou, mais tecnicamente,
levam à perda superveniente do interesse processual, haja vista que
a medida deixou de ser útil e necessária. Eventuais direitos subjetivos
que tenham sido afetados pela lei inconstitucional deverão ser
demandados em ação própria2.

Nessa perspectiva, considerando que o controle de


constitucionalidade concentrado exercido por meio de ação direta de
inconstitucionalidade exige que a norma impugnada esteja em plena produção
de seus efeitos para que exista interesse processual na demanda, deve ser
entendido que o pedido formulado, no que tange ao inciso I do artigo 30 da
LRF, resta prejudicado.

IV – DA INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL POR VIOLAÇÃO AO ARTIGO 65 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL

2 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro: exposição


sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6. ed. rev. e atual., São Paulo:
Saraiva, 2012, p. 209.
A constitucionalidade formal da Lei de Responsabilidade Fiscal é
questionada, em razão de suposta violação ao parágrafo único do artigo 65 da
Constituição da República.

Vale transcrever o trecho normativo:

Art. 65. O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela
outra, em um só turno de discussão e votação, e enviado à sanção ou
promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou arquivado, se o
rejeitar.

Parágrafo único. Sendo o projeto emendado, voltará à Casa


iniciadora. (grifamos)

A doutrina constitucional costuma distinguir a


inconstitucionalidade material e a inconstitucionalidade formal de acordo coma
natureza do vício que macula o ato impugnado, conforme transcrito abaixo:

Costuma-se proceder à distinção entre inconstitucionalidade material


e formal, tendo em vista a origem do defeito que macula o ato
questionado. Os vícios formais afetam o ato normativo singularmente
considerado, independentemente de seu conteúdo, referindo-se,
fundamentalmente, aos pressupostos e procedimentos relativos à sua
formação. Os vícios materiais dizem respeito ao próprio conteúdo do
ato, originando-se de um conflito com princípios estabelecidos na
Constituição. E, evidentemente, a inconstitucionalidade material
envolve não só o contraste direto do ato legislativo com o parâmetro
constitucional, mas também a aferição do desvio de poder ou do
excesso de poder legislativo3.

Portanto, considera-se formalmente inconstitucional o ato


normativo cujo vício se refere aos pressupostos e procedimentos relativos à
sua formação, como a competência e o devido processo legislativo.

Na hipótese, o suposto vício formal teria decorrido da


inobservância do procedimento previsto no artigo 65, parágrafo único, da
Constituição da República. Isso porque os artigos 3º, 5º, 20 e 63do Projeto de
Lei de Responsabilidade Fiscal sofreram ajustes de redação pelo Senado, sem
que o Projeto retornasse à Câmara dos Deputados para reapreciação.

Ocorre que, no julgamento da medida cautelar da ADI nº 2238, o


STF entendeu que o argumento da inconstitucionalidade formal da Lei de
Responsabilidade Fiscal deveria ser afastado, porque o parágrafo único do

3MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de Constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos.


São Paulo: Saraiva, 1990, p. 28.
artigo 65 da Constituição Federal só determina o retorno do projeto de lei à
Casa iniciadora se a emenda parlamentar introduzida acarretar modificação no
sentido da proposição jurídica.

As emendas ao projeto de lei podem ser de natureza supressiva,


aditiva, aglutinativa, modificativa, substitutiva e de redação. Alexandre de
Moraes define as emendas de redação como aquelas que se apresentam “para
sanar vício de linguagem, incorreção de técnica legislativa ou lapso
manifesto”4e também afirma que “...em face do princípio do bicameralismo,
qualquer emenda ao projeto aprovado por uma das Casas haverá,
obrigatoriamente, que retornar à outra...”5.

Contudo, a interpretação do procedimento previsto no artigo 65,


parágrafo único, da Constituição Federal não deve ser restrita à literalidade.
Em verdade, a referida norma constitucional visa a preservar a
integridadesubstancialda prescrição normativa que se pretende veicular
mediante a lei em elaboração. Assim, se a emenda ao projeto de lei for
meramente redacional e não alterar a proposição jurídica, de fato, inexiste
inconstitucionalidade formal.

A propósito, a doutrina constitucional contemporânea reconhece,


sem críticas, a tese do STF formulada no julgamento da medida cautelar da
ADI nº 2238:

Ou seja: os projetos de lei, em geral, devem contar com a


concordância simultânea de ambas as Casas, por manifestação de
seus Plenários de acordo com o quórum exigido pela Constituição, e
a violação a essa regra conduz à inconstitucionalidade formal, como
acontece com o descumprimento de qualquer norma constitucional
que cuide da elaboração de normas. Assim, por exemplo, se o
Senado Federal altera projeto oriundo da Câmara e o encaminha
diretamente para sanção ou veto presidencial, sem devolvê-lo para
que a Câmara aprecie as alterações, haverá inconstitucionalidade. O
STF entende, porém, que modificações puramente redacionais
ou de estilo, que não alterem o sentido do projeto, dispensam o
retorno para reapreciação6. (grifamos)

4 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São


Paulo: Atlas, 2002, p. 1151.
5Ibid., p. 1150.
6 BARCELLOS, op. cit., p. 326.
Diante disso, o argumento suscitado pelos autores das Ações de
que a Lei de Responsabilidade Fiscal deve ser declarada inconstitucional
integralmente, em razão do suposto vício formal por violação ao artigo 65,
parágrafo único, da Constituição Federal, não merece prosperar.

V – DA INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA LEI DE


RESPONSABILDIADE FISCAL POR VIOLAÇÃO AO ARTIGO 163 DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL

As Ações deduzem o pedido de declaração da


inconstitucionalidade formal in totum da Lei de Responsabilidade Fiscal, em
razão da regulamentação apenas parcial do artigo 163 da Constituição da
República7. De acordo com os demandantes, a LRF teria regulado apenas as
matérias dispostas nos incisos I a IV do artigo em questão, excluídos os incisos
V – vigente à época, VI e VII.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que, por


abranger assuntos de natureza diversa, é constitucional a regulamentação do
artigo 163 da Constituição por meio de mais de uma lei complementar,
inexistindo, portanto, vício formal de inconstitucionalidade na Lei de
Responsabilidade Fiscal.

Nesse sentido, a doutrina afirma que as matérias elencadas nos


incisos do artigo 163 da Constituição podem ser reguladas por diferentes leis
complementares, conforme transcrito abaixo:

7 À época do ajuizamento da ADI nº 2238, o artigo 163 da Constituição Federal apresentava a


seguinte redação:
Art. 163. Lei complementar disporá sobre:
I - finanças públicas;
II - dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades
controladas pelo Poder Público;
III - concessão de garantias pelas entidades públicas;
IV - emissão e resgate de títulos da dívida pública;
V - fiscalização das instituições financeiras;
V - fiscalização financeira da administração pública direta e indireta; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 40, de 2003)
VI - operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios;
VII - compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas
as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional.
Um debate que sempre surge é sobre se a expressão “lei
complementar disporá” restringe apenas uma ou mais de uma lei
dessa estirpe. Ou seja, se uma única lei complementar for editada
sobre certos aspectos do rol de matérias tratadas nos incisos ela
deverá ser considerada excludente de outras, única? Ou poderá
haver outra lei complementar que disponha sobre aspectos não
tratados na anterior? Entende-se que podem existir tantas leis
complementares quantas sejam necessárias. Não há no comando
normativo nenhuma ordem que determine que apenas uma lei
complementar disponha sobre todos os aspectos tratados nos
incisos. Bem como entende-se ser plenamente possível a existência
concomitante de várias Leis Complementares que tratem de matérias
referentes a cada qual dos incisos, tal como existe para o item I,
“finanças públicas”8.

Inexiste, portanto, inconstitucionalidade formal na Lei de


Responsabilidade Fiscal por regulamentação incompleta do artigo 163 da
Constituição da República. Em verdade, é admissível que, por dispor sobre
matérias diferentes,o artigo constitucional em questão seja interpretado no
sentido de que é constitucional a edição de mais de uma lei complementar
sobre as matérias nele elencadas.

VI – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO II DO § 2º DO ARTIGO 4º


DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 4º, § 2º, inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal


dispõe que o Anexo de Metas Fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias –
LDO deverá evidenciar a consistência das metas anuais com as premissas e
os objetivos da política econômica nacional.

Para os autores, tal disposição viola o princípio federativo,


estampado com o status de cláusula pétrea no artigo 60, § 4º, inciso I, da
Constituição Federal, porque o artigo 2º da LRF estende as obrigações legais
deduzidas no mesmo diploma legal não apenas à União, mas também aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

Dessa forma, sendo a política econômica nacional definida única


e exclusivamente pela União, ao atrelar os demais entes federativos a uma
decisão exarada pela União, a LRF estaria reduzindo a autonomia desses

8Comentários à Constituição Federal de 1988. Paulo Bonavides, Jorge Miranda, Walber de


Moura Agra (coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 1915.
entes, em virtude da mitigação da capacidade de autogoverno e
autoadministração dos Estados, Distrito Federal e Municípios.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o inciso


II, do § 2º, do artigo 4º da Lei de Responsabilidade Fiscal apenas obriga
Estados e Municípios a demonstrarem a viabilidade das metas programadas,
em face das diretrizes traçadas pela política econômica do Governo Federal
(políticas creditícias e de juros, previsões sobre inflação, etc.), o que não
encontra óbice na Constituição.

De fato, ao exigir que os entes locais demonstrem apenas a


viabilidade de suas metas anuais à política econômica nacional, não há
violação ao princípio federativo. Vale dizer, o princípio federativo consiste em
cláusula pétrea que visa a preservar a autonomia dos entes federativos, a qual
não é atingida na hipótese em deslinde.

A exigência de que a política econômica nacional seja observada,


em verdade, pretende reforçar a autonomia dos entes federativos, de modo
que as metas orçamentárias anuais por eles definidas no Anexo de Metas
Fiscais sejam praticáveisperantea conjuntura econômica do País.

Assim, deve ser entendido que não houve violação ao artigo 60, §
4º, inciso I, da Constituição Federal, não sendo admissível o argumento da
inconstitucionalidade do artigo 4º, § 2º, inciso II, da Lei de Responsabilidade
Fiscal.

VII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 4º, § 4º DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

Os autores das Ações alegam que o artigo 4º, § 4º, da Lei de


Responsabilidade Fiscal é materialmente inconstitucional por violação ao artigo
165, § 2º, da Constituição Federal. O artigo impugnado determina que matéria
que deveria constar na Lei de Diretrizes Orçamentárias conste em ato
administrativo (“mensagem”) enviado ao Congresso Nacional pelo Presidente
da República.
No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que a
circunstância de certos elementos informativos deverem constar de
determinado documento (Lei de Diretrizes Orçamentárias) não impede que
venham eles a ser reproduzidos em outro, principalmente quando destinado à
apresentação do primeiro, como simples reiteração dos argumentos nele
contidos.

É certoque o artigo 165, § 2º, da Constituição Federal estipula que


a matéria pertinente aos “objetivos das políticas monetária, creditícia e cambial,
bem como os parâmetros e as projeções para seus principais agregados e
variáveis, e ainda as metas de inflação, para o exercício subsequente” devem
constar da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Contudo, não há impedimento à reiteração da previsão de tal


matéria em atos administrativos prévios à elaboração da LDO. A mensagem a
que se refere o artigo 4º, § 4º, da LRF não visa a substituir a LDO como meio
de veiculação da matéria em questão, mas atua como instrumento de reforço
ao conteúdo que deverá constar do Projeto de LDO enviado ao Congresso
Nacional pelo Presidente da República.

VIII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 7º, CAPUT, DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 7º, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 7º O resultado do Banco Central do Brasil, apurado após a


constituição ou reversão de reservas, constitui receita do Tesouro
Nacional, e será transferido até o décimo dia útil subseqüente à
aprovação dos balanços semestrais.

Na hipótese, os autores das Ações suscitam a


inconstitucionalidade do artigo 7º, caput, da LRF, por afronta ao artigo 192,
caput, da Constituição Federal.

À época da edição da LRF, o artigo 192, caput, da Carta Magna


dispunha que o Sistema Financeiro Nacional – SFN seria regulado por lei
complementar específica9. Assim, ao regular a destinação do resultado do
BACEN, a Lei de Responsabilidade Fiscal estaria usurpando a competência da
referida lei complementar específica sobre o SFN.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o exame


da constitucionalidade do artigo 7º, caput, da LRF prescinde da sua adequação
ao artigo 192 da Constituição Federal, porque o dispositivo impugnado veicula
norma de natureza fiscal, disciplinadora da realização da receita, e não norma
vinculada ao Sistema Financeiro Nacional – SFN.

A esse respeito, vale destacar que a constituição subdivide as


finanças públicas e privadas em dois sistemas distintos: (i) o sistema de
finanças públicas; e (ii) o sistema de finanças nacionais – ou Sistema
Financeiro Nacional.

Vale transcrever trecho doutrinário a respeito:

A CF disciplina o sistema financeiro nacional, assim entendido o


sistema de finanças privadas e do seu controle pelo governo. É
novidade do nosso constitucionalismo. O termo finanças sempre foi
utilizado no sentido de finanças públicas (vide p. 7), como o faz a
própria CF no art. 163. Mas tem, modernamente, a acepção de
finanças privadas, consistindo na utilização, pelo povo, do dinheiro e
outros instrumentos criados pelo Governo, o que permite ao Estado
legislar sobre tais ativos, como aconteceu no Plano Collor (1990). A
CF separa claramente o sistema das finanças públicas, que abrange
os subsistemas tributário, orçamentário, dos gastos públicos e
monetário (arts. 145 – 169), do sistema das finanças nacionais, a
compreender as instituições privadas, inclusive os bancos
pertencentes aos poderes Públicos que operem sob a forma de
pessoa jurídica de direito privado10.

Osistema de finanças públicas é regulado por meio de lei


complementar financeira, nos termos do artigo 163 da Carta Magna, ao passo
que oSFNregula as finanças privadas por meio de lei complementar referida no
artigo 192 da Lei Maior, conforme sustenta a doutrina:

A CF conhece ainda a lei complementar financeira, que tem por


objetivo estabelecer normas gerais de finanças públicas, entendidas

9 Ainda que não afete o exame da constitucionalidade do artigo 7º, caput, da LRF, tendo em
vista que o parâmetro de validade constitucional deve ser o vigente à época de edição da
norma, a Emenda Constitucional nº 40/2003 alterou o artigo 192 da Constituição Federal, para
determinar que mais de uma lei complementar possa regular o Sistema Financeiro Nacional.
10 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 19ª ed., rev. e atual., Rio de

Janeiro: Renovar, 2013, p. 228.


no sentido que excede as questões orçamentárias e tributárias,
compreendendo, segundo o artigo 163: dívida pública externa e
interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades
controladas pelo Poder Público; concessão de garantias pelas
entidades públicas; emissão e resgate de títulos da dívida pública;
fiscalização financeira da administração pública direta e indireta;
operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; compatibilização
das funções das instituições oficiais de crédito da União,
resguardadas as características e condições operacionais plenas
voltadas ao desenvolvimento regional.

A lei complementar relativa às finanças públicas não se confunde


com as leis complementares que regulam o sistema financeiro
nacional, que congrega as instituições privadas sob o controle do
Banco Central (art. 192 CF, na redação da EC 40/03)l 11.

O artigo 7º, caput, da LRF trata da hipótese de realização de


receita do Tesouro Nacional decorrente do resultado do Banco Central do
Brasil. Nessa perspectiva, ao tratar de receita pública, o dispositivo impugnado
é de matéria pertinente ao direito financeiro e, consequentemente, às finanças
públicas, conforme sustenta a doutrina:

O Direito Financeiro, como sistema objetivo, é o conjunto de normas


e princípios que regulam a atividade financeira. Incumbe-lhe
disciplinar a constituição e a gestão da Fazenda Pública,
estabelecendo as regras e procedimentos para a obtenção da receita
pública e a realização dos gastos necessários à consecução dos
objetivos do Estado12.

Assim, inexiste inconstitucionalidade por violação ao artigo 192,


caput, da Constituição Federal, tendo em vista que o artigo 7º, caput, da LRF
dispõe sobre matéria de competência de lei complementar financeira, nos
termos do artigo 163 da Constituição da República.

IX – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 7º, § 1º, DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 7º, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 7º (omissis)

§ 1º O resultado negativo constituirá obrigação do Tesouro para com


o Banco Central do Brasil e será consignado em dotação específica
no orçamento.

11 TORRES, op. cit., p. 46.


12 Ibid., p. 12.
De acordo com os autores das Ações, o dispositivo viola o artigo
167, inciso VII, da Constituição Federal, que veda “a concessão ou utilização
de créditos ilimitados”. Isso porque o § 1º do artigo 7º da LRF permite que,
independentemente do vulto e sem qualquer limitação, o resultado negativo do
BACEN constitua em obrigação do Tesouro Nacional, sendo consignado em
dotação específica no Orçamento.

Para os autores, essa medida constituiu a consagração de uma


prática governamental supostamente ilegítima, realizada desde a instituição do
Plano Real, que pretendia absorver os constantes resultados negativos anuais
do BACEN por meio do Tesouro Nacional.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que a


obrigação do Tesouro Nacional de cobrir o resultado negativo do BACEN não
constitui utilização de créditos ilimitados pelo Poder Público, inexistindo,
portanto, inconstitucionalidade.

Os créditos orçamentários são definidos pela doutrina como


“dotação incluída no orçamento para atender às diversas despesas do
Estado”13. Sendo insuficientes os créditos, a Constituição autoriza a abertura
de créditos adicionais, que compreendem os créditos suplementares, os
especiais e os extraordinários, sendo vedada a concessão ou utilização de
créditos ilimitados.

Tal vedação reflete a necessidade de observação do princípio da


legalidade orçamentária, bem como do princípio do equilíbrio orçamentário,
segundo o qual as receitas e as despesas devem ser equalizadas, com vistas a
combater o déficit público, por meio da contenção de despesas.

Ocorre que, no caso em tela, o resultado do BACEN, ainda que


negativo, há de possuir um limite aferível para a devida dotação no Orçamento,
constituindo um valor determinado a ser absorvido pelo Tesouro Nacional,
desprovido de caráter ilimitado. Sendo assim, inexiste inconstitucionalidade no
§ 1º do artigo 7º da Lei de Responsabilidade Fiscal.

13 TORRES, op. cit., p. 196.


X – DA INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 9º, § 5º, 26, § 1º, 29, § 2º
E 39, TODOS DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL

Os artigos 9º, § 5º, 26, § 1º, 29, § 2º e 39 da Lei de


Responsabilidade Fiscal são impugnados por veicularem matérias que
supostamente deveriam ser tratadas pela lei complementar específica sobre o
Sistema Financeiro Nacional a que se referia o artigo 192 da Constituição
Federal, à época da edição da LRF.

Conforme aludido, as matérias pertinentes às finanças públicas


não competem à lei complementar específica referida no artigo 192 da
Constituição da República, uma vez que artigo 163 da Constituição Federal
estipula que tais matérias devem ser veiculadas por meio de lei complementar
financeira.

Considerando que o artigo 9º, § 5º, da LRF dispõe sobre o Banco


Central do Brasil como executor da política econômica e não como órgão
central do SFN, não há inconstitucionalidade por violação ao artigo 192 da
Constituição Federal, haja vista tratar-se de matéria pertinente às finanças
públicas. Corrobora com esse entendimento a própria decisão do STF no
julgamento da medida cautelar.

O artigo 26, § 1º e o artigo 29, § 2º, da Lei de Responsabilidade


Fiscal dispõem sobre assuntos pertinentes às finanças públicas, não ao
sistema financeiro nacional, tendo emvista tratarem, respectivamente, da
destinação de recursos públicos para o setor privado e da dívida e do
endividamento público. Tais matérias são precipuamente de finanças públicas,
devendo ser reguladas por lei complementar, conforme o artigo 163, da
Constituição da República.

O artigo 39 da Lei de Responsabilidade Fiscal também não


corresponde à matéria pertinente ao Sistema Financeiro Nacional. Vale dizer,
as operações vedadas pelo artigo 39 da LRF não se incluem no escopo da lei
complementar específica referida no artigo 192 da Constituição Federal, que se
destina a regular as finanças privadas.
Portanto, considerando que o artigo 39 da LRF contém norma
pertinente às finanças públicas, inexiste contrariedade ao artigo 192 da
Constituição Federal.

Dessa forma, não há de se falar em inconstitucionalidade por


violação ao artigo 192 da Constituição Federal, tendo em vista que os artigos
impugnados não correspondem ao escopo ou à função da lei complementar
que se destina a regular o Sistema Financeiro Nacional. Assim, deve ser
indeferido o pleito autoral no que concerne aos artigos 9º, § 5º, 26, § 1º, 29, §
2º e 39 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

XI – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 11, PARÁGRAFO ÚNICO,


DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 11, parágrafo único, da Lei de Responsabilidade Fiscal


dispõe:

Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na


gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os
tributos da competência constitucional do ente da Federação.

Parágrafo único. É vedada a realização de transferências voluntárias


para o ente que não observe o disposto no caput, no que se refere
aos impostos.

Os autores das Ações sustentam que o referido dispositivo viola o


artigo 160 da Constituição Federal, que veda a “retenção ou qualquer restrição
à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos”, na seção da repartição
receitas tributárias, “aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles
compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos”.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que, por se


tratar de transferências voluntárias, as restrições impostas aos entes
beneficiários que se revelem negligentes na instituição, previsão e arrecadação
de seus próprios tributos não são incompatíveis com o artigo 160 da
Constituição Federal.

De fato, o artigo 11, parágrafo único, da LRF dispõe sobre as


transferências de natureza voluntária. Restringir tais transferências não
encontra óbice na Constituição, tendo em vista que não são impostasrestrições
àrepartição tributária, constitucionalmente prevista, como expressão do
federalismo cooperativo vigente no País.

As restrições repousam única e exclusivamente sobre as


transferências voluntárias, hipótese plenamente constitucional nos termos da
ordem constitucional vigente. Diante disso, inexiste inconstitucionalidade a ser
declarada no que tange ao artigo 11, parágrafo único, da Constituição Federal.

XII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 14, INCISO II, DA LEI DE


RESPONABILIDADE FISCAL

O artigo 14, inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de


natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar
acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no
exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes,
atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos
uma das seguintes condições:

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período


mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente
da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração
ou criação de tributo ou contribuição.

Os autores das Ações sustentam que o referido dispositivo legal é


inconstitucional em razão da violação ao artigo 167, inciso III, da Constituição
Federal. O artigo constitucional vedaa realização de operações de crédito que
ultrapassem “o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas
mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa,
aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta”.

No STF, o julgamento foi suspenso, projetando para posterior


exame, o pedido de concessão de liminar alusivamente ao artigo 14, inciso II,
da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Em verdade, o artigo 14, inciso II, da LRF não dispõe sobre


concessão de créditos suplementares ou especiais, mas sobre renúncia de
receita, o que afasta a avaliação de sua constitucionalidade segundo o
parâmetro do artigo 167, inciso III, da Constituição da República.
Nos termos do artigo 14, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal,
a renúncia de receita pode ser realizada mediante anistia, remissão, subsídio,
crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de
alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada
de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a
tratamento diferenciado.

Tais modalidades de renúncia devem ser pautadas nos princípios


da capacidade contributiva e do desenvolvimento econômico, vedando-se os
privilégios e discriminações odiosas (artigo 150, inciso II, da Constituição
Federal), conforme sustenta a doutrina:

Por evidente que o limite entre o privilégio odioso e o não-odioso é


muitas vezes fluídico, dependendo da razoabilidade da distinção. Já
dissemos que a tendência atual do direito constitucional tributário é
no sentido de considerar odiosas as isenções, a não ser que ser que
se comprove robustamente a sua necessidade frente aos princípios
da capacidade contributiva e do desenvolvimento econômico14.

Os privilégios odiosos são aquelas isenções e quaisquer outros


benefíciossem base jurídica razoável para distinguir entre cidadãos. Por sua
vez, as discriminações odiosas são aquelas isenções que excluem certas
pessoas ou bens do gozo da exoneração fiscal, ou impõem condições
inconstitucionais para que certas pessoas ou bens não tomem parte da
isenção.

Na hipótese, o artigo 14, inciso II, da Constituição Federal não


impede que as renúncias não odiosas sejam realizadas, mas estipula restrições
decorrentes de valores constitucionais que devem irradiar no sistema de
finanças públicas brasileiro, especialmente, a norma-princípio do equilíbrio
orçamentário, que visa a evitar o déficit público por meio da equalização das
receitas e despesas públicas.

Nessa perspectiva, o artigo 14, inciso II, da Constituição Federal


apresenta-se como instrumento de reforço do princípio do equilíbrio
orçamentário, por viabilizar uma gestão orçamentária responsável, que autoriza

14 TORRES, op. cit., p. 314.


as renúncias de receita não odiosas, sem o comprometimento do equilíbrio
fiscal por meio do endividamento público.

A esse respeito, afirma a doutrina que uma das funções da Lei de


Responsabilidade Fiscal é justamente permitir o equilíbrio entre as receitas e
as despesas públicas:

Também é função da lei de responsabilidade fiscal fixar regras que


importem na compatibilização do orçamento público, permitindo o
equilíbrio entre receitas e despesas, visando a coibir o endividamento
desordenado do setor público. Não se podendo negar que a medida é
proveitosa, espera-se que ela não seja meta longe de ser atingida 15.

Diante disso, o dispositivo impugnado não deve ser considerado


inconstitucional, por inibir a concessão de benefícios fiscais por entes com
competência tributária. Em verdade, a limitação à faculdade atribuída a tais
entes de renunciar receita encontra fundamento no princípio constitucional-
financeiro do equilíbrio orçamentário, regulado infraconstitucionalmente pelo
artigo 14, inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal.

XIII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 15 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 15 da Lei de Responsabilidade Fiscal considera “não


autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa
ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17”.

Por sua vez, o artigo 16 determina que a ação governamental que


implique em aumento de despesa seja acompanhada de “I – estimativa do
impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e
nos dois subsequentes”; e de “II – declaração do ordenador de despesa de que
o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária
anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes
orçamentárias”.

E o artigo 17 considera “obrigatória de caráter continuado a


despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo

15Comentários à Lei de responsabilidade fiscal. Ives Gandra da Silva Martins, Carlos Valder
Nascimento (org.). 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2009, p. 45.
normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um
período superior a dois exercícios”.

Para os autores das Ações, o artigo 15 da LRF afronta o inciso II


do artigo 167 da Constituição Federal, na medida em que exige que os créditos
adicionais estejam aprovados originariamente na lei orçamentária,
estabelecendo requisito além do fixado no dispositivo constitucional.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o


dispositivo apenas torna efetivo o cumprimento do plano plurianual, das
diretrizes orçamentárias e dos orçamentos anuais, não inibindo a abertura de
créditos adicionais previstos no artigo 166 da Carta Política.

Com efeito, não há inibição à abertura de créditos adicionais, nos


termos do artigo 166. Vale dizer, o artigo 15 da Lei de Responsabilidade Fiscal
se traduz em regra de uma gestão orçamentária racional e eficiente, condizente
com a Constituição e com os fins públicos, que demandam responsabilidade na
geração de despesas públicas.

A esse respeito, sustenta a doutrina:

O artigo de que trata cuida da regularidade e eficiência na geração da


despesa pública, isto é, do emprego de recursos financeiros na
persecução de fins públicos, o que difere de outros procedimentos
que não têm a mesma natureza, como assinala Aliomar Baleeiro: “se
o objetivo público é alcançado sem aplicação de dinheiro, não há
despesa pública, mas outro processo financeiro e administrativo”.

A geração de despesa ou assunção de obrigação deve ter em mira o


impacto financeiro e a sincronia com os instrumentos de
planejamento orçamentário previstos na Constituição. Sem a
observância desses postulados, será considerada não autorizada,
posto que irregular e lesiva ao patrimônio público 16.

No que tange à compatibilidade com as leis orçamentárias, quais


sejam, a lei do plano plurianual (LPP), a lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e
a lei orçamentária anual (LOA), a exigência do artigo 15 constitui premissa que
visa a compatibilizar a geração de despesas com a política orçamentária
traçada pelo governo, de modo que não sejam despesas inócuas e
desarmonizadas com o plano orçamentário elaborado.

16Comentários à Lei de responsabilidade fiscal, 2009, p. 121-122.


Nesse sentido, a doutrina afirma:

A declaração do ordenador de despesas de que o aumento do gasto


público guarda compatibilidade com as normas financeiras insere-se
no contexto da coexistência dos objetivos que se pretendia atingir, de
modo harmonizável. Será compatível com a finalidade orçamentário-
financeira a iniciativa de evidenciar pelo aumento da despesa a
conciliação entre elas, na observância da regra que assim dispõe.

(...)

A compatibilidade entre a despesa e as normas financeiras referidas


pressupõe o entendimento de vários atributos, dentre eles: diretrizes,
objetivos, prioridades e metas. Sem a conciliação desses elementos
não se pode alcançar a filosofia preconizada pelo preceito sob
análise. Disse depende a harmonização perseguida pela gestão
fiscal17.

Dessa forma, não deve ser declarada a inconstitucionalidade do


artigo 15 da Lei de Responsabilidade Fiscal, visto que o referido dispositivo
visa a cumprir com os objetivos constitucionais de eficiência e racionalidade na
gestão orçamentária.

XIV – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 17 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa


corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo
normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução
por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o


caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do
art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de


comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as
metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art.
4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser
compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução
permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita


o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de
cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente,


conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem

17Comentários à Lei de responsabilidade fiscal, 2009, p. 126-127.


prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais
normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da


implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o
instrumento que a criar ou aumentar.

§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao


serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal
de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.

§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada


por prazo determinado.

Os autores das ações sustentam a inconstitucionalidade do


referido dispositivo legal em razão de violação ao princípio da separação de
poderes, ao princípio federativo e aos artigos 51, inciso IV, 52, inciso XIII, 99 e
127, § 1º, da Constituição Federal.

Em síntese, sustentam os autores que as exigências deduzidas


no artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal, no que se refere às despesas
obrigatórias de caráter continuado, englobam as despesas com admissão de
novos servidores e, considerando que o dispositivo não prevê qualquer
mecanismo de aumento de receita, as exigências do artigo 17 poderiam causar
o engessamento daAdministração Pública.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o


aumento de despesa de caráter continuado estar condicionado à redução de
despesa ou aumento de receita, também em caráter continuado, é proposição
que, por achar-se em sintonia com a lógica, não pode ser obviamente
considerada responsável pelo engessamento de quaisquer dos Poderes de
Estado ou órgãos da Administração e, portanto, ofensiva ao princípio da
separação dos poderes e ao princípio da autonomia dos entes federados.

Para o STF, o incremento da arrecadação pelas formas indicadas


no § 3º do art. 17 da LRF se reveste de previsibilidade e se presta, por isso,
para um cálculo de compensação, que há de ser, tanto quanto possível, exato.

Com efeito, não deve ser declarado inconstitucional o artigo 17 da


Lei de Responsabilidade Fiscal, porque pautado em valores constitucionais
como o equilíbrio orçamentário e a eficiência da Administração Pública, visa a
instituir um regime de gestão orçamentária racional consciente de que os
recursos públicos não são inesgotáveis.

Assim salienta a doutrina a respeito do artigo 17 da LRF:

Toda despesa, nas condições aqui estabelecidas, há de ser


examinada quanto à conveniência e ao interesse de sua realização,
especialmente se consulta ao interesse público. Mesmo que
autorizada dentro deste permissivo legal, torna-se necessária a
demonstração de onde deverão sair os recursos financeiros que
possam suprir a dotação orçamentária dela decorrente.

Para criação e aumento de despesa obrigatória de duração


continuada, exige-se que o impacto orçamentário decorrente desse
ato de sua formalização seja devidamente estimado. O estudo em
questão deve compreender o exercício em que terá curso sua
vigência e os dois anos civis subsequentes 18.

Portanto, inexiste inconstitucionalidade a ser atribuída ao artigo 17


da Lei de Responsabilidade Fiscal, visto que o objetivo do dispositivo constitui
a efetivação de uma gestão fiscal condizente com a ordem constitucional, sem
qualquer afronta ao princípio da separação de poderes, ao princípio federativo
e aos artigos 51, inciso IV, 52, inciso XIII, 99 e 127, § 1º, da Constituição
Federal.

XV – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 18, § 1º, DA LEI DE


RESPONABILIDADE FISCAL

O artigo 18, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende-se como


despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da
Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a
mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de
membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais
como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios,
proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive
adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de
qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições
recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

§ 1º Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se


referem à substituição de servidores e empregados públicos serão
contabilizados como "Outras Despesas de Pessoal".

Os autores das Ações aduzem a inconstitucionalidade do


dispositivo por afronta ao artigo 37, incisos II e XXI, da Constituição Federal,

18Comentários à Lei de responsabilidade fiscal, 2009, p. 139.


uma vez que a terceirização de mão-de-obra celebrada pela Administração
Pública é ilícita, razão pela qual não deveria ser referida pelo artigo 18, § 1º, da
Lei de Responsabilidade Fiscal.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o artigo


18, § 1º, da LRF visa a evitar que a terceirização de mão-de-obra venha a ser
utilizada com o fim de ladear o limite de gasto com pessoal. Tem, ainda, o
mérito de erguer um dique à contratação indiscriminada de prestadores de
serviço, valorizando o servidor público e o concurso.

A terceirização é definida, no direito do trabalho, como “a


contratação, por determinada empresa (o tomador de serviço), do trabalho de
terceiros para o desempenho de atividade meio”19, podendo assumir diferentes
formas, como empreitada, locação de serviços, fornecimento etc.

Para a Administração Pública, a definição é a mesma, visto que


esta é autorizada a celebrar contratos de empreitada (de obra e de serviço) e
de fornecimento, com fulcro no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal,
observadas as normas da Lei nº 8.666/1993.

Por sua vez, a terceirização de mão-de-obra – ou contratação de


mão-de-obra por interposta pessoa – é vedada pela ordem jurídica brasileira. A
esse respeito, o Enunciado nº 331 da Súmula do Tribunal Superior do Trabalho
– TST preceitua que “a contratação de trabalhadores por empresa interposta é
ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no
caso de trabalho temporário”.

Especialmente em relação ao Poder Público, o referido enunciado


sumular afirma que “a contratação irregular de trabalhador, mediante empresa
interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração
Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).”

Cumpre destacar que aterceirização de mão-de-obra celebrada


pela Administração Pública também constitui ilicitudena hipótese de trabalho

19DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26. ed., São Paulo: Atlas, 2013, p.
357.
temporário. Em verdade, o artigo 37, inciso IX, da Constituição da República
permite que a Administração contrate pessoal temporariamente, porém em
observância à Lei nº 8.745/1993, que proíbe a contratação temporária por
interposta pessoa.

Com efeito, o artigo 18, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal


apresenta redação confusa, por determinar que as despesas com contratação
de mão-de-obra por interposta pessoa devam ser contabilizadas como “Outras
Despesas de Pessoal” e, consequentemente, passem a obedecer aos limites
das despesas com pessoal definidos no artigo 19 da LRF.

Contudo, o legislador não pretendeu reconhecer a licitude da


contratação de mão-de-obra por interposta pessoa pela Administração Pública
ao atribuir tal redação ao § 1º do artigo 18 da LRF. Em verdade, o objetivo foi
evitar que, independentemente da licitude ou ilicitude da contratação de mão-
de-obra, as despesas de pessoal excedam os limites estabelecidos.

De forma análoga ao que ocorre no direito tributário, por meio do


princípio non olet, o legislador buscou não privilegiar ilicitudes, inserindo as
despesas ilícitas com pessoal, praticadas pela Administração, no escopo da
gestão financeira responsável pautada nos valores de racionalidade e
eficiência que a ordem constitucional consagra.

A respeito da interpretação do artigo 18, § 1º, da Lei de


Responsabilidade Fiscal, sustenta a doutrina:

Sendo inadmissível o contrato de fornecimento de mão-de-obra, o


dispositivo deve ser entendido no sentido de que, se celebrado, a
despesa correspondente será levada em consideração para fins de
cálculo das despesas com pessoal. O legislador não estava
preocupado com a licitude ou ilicitude desse tipo de contrato diante
de outros dispositivos legais e constitucionais, mas apenas e tão-
somente com os fins da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mais uma
vez, exige-se do intérprete o bom-senso que faltou ao legislador 20.

Nesse sentido, não há inconstitucionalidade a ser declarada em


relação ao artigo 18, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal. A terceirização
de mão-de-obra continua ilícita, configurando ato de improbidade administrativa
se celebrada, porém as despesas que tal prática acarretar devem ser objeto de
20Comentários à Lei de responsabilidade fiscal, 2009, p. 152.
uma gestão responsável na execução orçamentária, haja vista a função da Lei
de Responsabilidade Fiscal.

XVI – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 20 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal estipula uma


repartição dos limites globais de despesa total com pessoal entre os Poderes,
nas esferas federal, estadual e municipal.

Para os autores, tais limites deveriam constar da lei de diretrizes


orçamentárias e não de lei complementar. Isso porque a lei complementar a
que se refere o artigo 169 da Constituição Federal abrange apenas os limites
globais de despesa total com pessoal por esfera de governo, não por Poder,
tendo em vista o disposto no artigo 99, § 1º, da Carta Política, que dispõe sobre
os limites de gastos por Poder a serem fixados conjuntamente na LDO.

Também é sustentado que o artigo 20, inciso I, alínea “d”, da LRF


viola a autonomia financeira do Ministério Público da União (artigo 127, § 2º, da
Constituição Federal), porque estipula o limite de 0,6% para as suas despesas
com pessoalsem considerar um de seus órgãos, o Ministério Público do Distrito
Federal e Territórios, fixando-lhe limite diferente.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o artigo


169 da Carta Magna não veda que se faça uma distribuição entre os Poderes
dos limites de despesa com pessoal; ao contrário, para tornar eficaz o limite, há
de se dividir internamente as responsabilidades.

De fato, o artigo 99, § 1º, da Constituição Federal deve ser


interpretado no sentido de que os limites de despesa a serem definidos
conjuntamente pelos Poderes na lei de diretrizes orçamentárias referem-se às
despesas globais, envolvendo as despesas de investimento. Por sua vez, o
artigo 169, § 1º, da Lei Maior autoriza que os limites das despesas com pessoal
sejam fixados por meio de lei complementar, inclusive os limites de tais
despesas relativos aos Poderes.
Nesse sentido, o artigo 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal não
deve ser questionado quanto a sua constitucionalidade mediante o parâmetro
do artigo 99, § 1º, da Constituição Federal, tendo em vista que o artigo 169 da
Carta Magna permite que os limites das despesas com pessoal dos Poderes
sejam fixados por lei complementar,inexistindo inconstitucionalidade.

XVII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 24 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 24 da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 24. Nenhum benefício ou serviço relativo à seguridade social


poderá ser criado, majorado ou estendido sem a indicação da fonte
de custeio total, nos termos do § 5º do art. 195 da Constituição,
atendidas ainda as exigências do art. 17.

§ 1º É dispensada da compensação referida no art. 17 o aumento de


despesa decorrente de:

I - concessão de benefício a quem satisfaça as condições de


habilitação prevista na legislação pertinente;

II - expansão quantitativa do atendimento e dos serviços prestados;

III - reajustamento de valor do benefício ou serviço, a fim de preservar


o seu valor real.

§ 2º O disposto neste artigo aplica-se a benefício ou serviço de


saúde, previdência e assistência social, inclusive os destinados aos
servidores públicos e militares, ativos e inativos, e aos pensionistas.

Os autores das Ações sustentam que o dispositivo legal


impugnado é inconstitucional por determinar que a criação, majoração ou
extensão de benefício ou serviço relativo à seguridade social atenda às
exigências do artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que as


exigências do artigo 17 da LRF são constitucionais, daí não sofrer de nenhuma
mácula o dispositivo que determina sejam atendidas essas exigências para a
criação, majoração ou extensão de benefício ou serviço relativo à seguridade
social.

Conforme aludido, o artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal


objetiva a efetivação de uma gestão fiscal condizente com a ordem
constitucional, eficiente e racional, sem qualquer afronta ao princípio da
separação de poderes, ao princípio federativo e aos artigos 51, inciso IV, 52,
inciso XIII, 99 e 127, § 1º, da Constituição Federal.

Sendo assim, considerando os argumentos já abordados na


discussão quanto à constitucionalidade do artigo 17, conclui-se, em
consonância com o entendimento do STF, que não há inconstitucionalidade a
ser declarada no que tange ao artigo 24 da LRF, por atrelar a validade de
benefícios ou serviços relacionados à seguridade social às exigências do artigo
17 do mesmo diploma legal.

XVIII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 29, INCISO I, DA LEI


DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 29, inciso I, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as


seguintes definições:

I - dívida pública consolidada ou fundada: montante total, apurado


sem duplicidade, das obrigações financeiras do ente da Federação,
assumidas em virtude de leis, contratos, convênios ou tratados e da
realização de operações de crédito, para amortização em prazo
superior a doze meses;

Para os autores, o referido dispositivo legal viola o princípio da


publicidade, consagrado no artigo 37, caput, da Constituição Federal, por não
demonstrar com clareza a distinção entre dívida pública consolidada ou
fundada e por excluir do conceito de dívida consolidada a parcela referente à
dívida flutuante.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que não se


demonstrou qual dispositivo da Constituição resultou malferido.

De fato, a definição de conceitos pelo Legislador não fere o


princípio da publicidade, mas constitui modalidade de interpretação autêntica,
comum na prática legislativa. Dessa forma, não havendo a indicação de outro
dispositivo constitucional como parâmetro para a aferição da
constitucionalidade do artigo 29, inciso I, da Constituição Federal, não há
inconstitucionalidade a ser declarada.
XIX – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 59, § 1º, INCISO IV, DA
LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 59, § 1º, inciso IV, da Lei de Responsabilidade Fiscal


dispõe:

Art. 59. O Poder Legislativo, diretamente ou com o auxílio dos


Tribunais de Contas, e o sistema de controle interno de cada Poder e
do Ministério Público, fiscalizarão o cumprimento das normas desta
Lei Complementar, com ênfase no que se refere a:

§ 1º Os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou órgãos referidos


no art. 20 quando constatarem:

IV - que os gastos com inativos e pensionistas se encontram acima


do limite definido em lei;

Os autores das Ações sustentam que o dispositivo legal


impugnado viola o artigo 194, § 1º, inciso I, da Constituição Federal, por insistir
na possibilidade de impor limites legais aos gastos com inativos e pensionistas,
como se fosse possível restringir o direito subjetivo adquirido destes aos
proventos integrais, ou existisse mecanismo semelhante ao da demissão,
utilizado para manter os gastos com os servidores da ativa dentro dos limites
legalmente estabelecidos.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o artigo


59, § 1º, inciso IV, da Lei de Responsabilidade Fiscal trata de dispositivo que
prevê mera advertência, sem maiores conseqüências.

Dessa forma, inexiste inconstitucionalidade no artigo 59, § 1º,


inciso IV, da Lei de Responsabilidade Fiscal, seja por tratar-se de mera
advertência, seja por não haver inconstitucionalidade na fixação de limites
legais aos gastos com inativos e pensionistas, nos termos do artigo 21, inciso
II, da Lei de Responsabilidade Fiscal.

XX – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 60 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 60 da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 60. Lei estadual ou municipal poderá fixar limites inferiores


àqueles previstos nesta Lei Complementar para as dívidas
consolidada e mobiliária, operações de crédito e concessão de
garantias.

Para os autores, o referido artigo é inconstitucional por violar


competência exclusiva do Senado Federal para fixar os limites globais para as
operações de crédito externo e interno e para o montante da dívida mobiliária
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme os incisos VII e IX
do artigo 52 da Constituição Federal.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que ao


Senado Federal incumbe, por força dos incisos VII e IX do art. 52 da
Constituição Federal, fixar limites máximos, norma que não é violada enquanto
os valores se situarem dentro desse âmbito.

Com efeito, os dispositivos constitucionais referem-se aos limites


máximos, conforme sustenta a doutrina:

Esse limite é fixado em percentual da receita corrente líquida para


cada esfera de governo e aplicado igualmente a todos os entes da
Federação que a integrem, constituindo, para cada um deles, limites
máximos (...)21.

Nesse sentido, não há inconstitucionalidade a ser declarada no


que tange ao artigo 60 da Lei de Responsabilidade Fiscal, tendo em vista que a
lei estadual ou municipal poderá fixar limite inferior ao limite máximo estipulado
pelo Senado Federal.

XXI – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 68, CAPUT, DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 68, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 68. Na forma do art. 250 da Constituição, é criado o Fundo do


Regime Geral de Previdência Social, vinculado ao Ministério da
Previdência e Assistência Social, com a finalidade de prover recursos
para o pagamento dos benefícios do regime geral da previdência
social.

Os autores das Ações questionam a constitucionalidade do


referido dispositivo por (i) destinar as contribuições arrecadadas para o custeio
do Regime Geral de Previdência Social – RGPS ao fundo referidono artigo 250
21SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. 7. ed., atual., São Paulo:
Malheiros, 2010, p. 421.
da Constituição Federal; e (ii) versarsobre matéria de competência de lei
ordinária em lei complementar, tendo em vista que, nos termos do artigo 250
da Constituição Federal, o Fundo do RGPS deveria ter sido criado por lei
ordinária.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o artigo


250 da Carta-Cidadã, ao prever a instituição de fundo integrado por bens,
direitos e ativos de qualquer natureza, não excluiu a hipótese de os demais
recursos pertencentes à previdência social, até mesmo os provenientes da
arrecadação de contribuições, virem a compor o referido fundo. Ademais, para
o STF, nada impede que a providência legislativa de caráter ordinário seja
veiculada em lei complementar.

De fato, no que concerne à primeira questão suscitada, o artigo


250 da Constituição Federal, ao referir-se aos ativos de qualquer natureza, não
exclui os valores decorrentes das contribuições para o custeio do RGPS.
Portanto, carece de legitimidade o pleito autoral, não havendo
inconstitucionalidade a ser declarada nesse sentido.

Da mesma forma, no que tange à veiculação de matéria de lei


ordinária em lei complementar, não há inconstitucionalidade a ser declarada.
Nessa situação, a matéria pertinente à lei ordinária continua com o status de lei
ordinária, mesmo que veiculada em lei complementar, podendo ser alterada
por lei ordinária superveniente, conforme sustenta a doutrina:

De outra parte, se uma lei é processada e aprovada como lei


complementar, mas trata, em determinados artigos, de matéria
própria de lei ordinária, nem por isso transforma tais temas em
próprios de lei complementar: só a Constituição pode fazê-lo, na
verdade. Nesse caso, a lei complementar aprovada terá, em relação
a esses artigos, natureza de lei ordinária, de tal modo que lei
ordinária posterior poderá vir a alterá-los22.

Assim, não há de se falar em inconstitucionalidade por veiculação


de matéria pertinente à lei ordinária em lei complementar, devendo ser julgado
improcedente o pedido autoral concernente ao artigo 60, caput, da Lei de
Responsabilidade Fiscal.

22 BARCELLOS, op. cit., p. 340.


XXII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 12, § 2º, DA LEI DE
RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 12, § 2º, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe

Art. 12. As previsões de receita observarão as normas técnicas e


legais, considerarão os efeitos das alterações na legislação, da
variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de
qualquer outro fator relevante e serão acompanhadas de
demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da projeção
para os dois seguintes àquele a que se referirem, e da metodologia
de cálculo e premissas utilizadas.

§ 2º O montante previsto para as receitas de operações de crédito


não poderá ser superior ao das despesas de capital constantes do
projeto de lei orçamentária.

Sustentam os autores que o referido dispositivo é inconstitucional


por violaçãoao artigo 167, inciso III, da Constituição Federal, segundo o qual as
operações de crédito autorizadas mediante créditos suplementares e especiais
com finalidade precisa e aprovadas pelo Poder Legislativo possam exceder o
montante das despesas de capital.

No julgamento da medida cautelar, o STF conferiu ao dispositivo


impugnado interpretação conforme ao inciso III do artigo 167 da Constituição
Federal, em ordem a explicitar que a proibição não abrange operações de
crédito autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com
finalidade precisa, aprovadas pelo Poder Legislativo.

De fato, na insuficiência dos créditos orçamentários, a


Constituição autoriza a abertura de créditos adicionais, dentre os quais os
créditos suplementares e os créditos especiais, definidos pela doutrina nos
seguintes termos:

Os créditos suplementares destinam-se ao reforço das dotações


orçamentárias. São autorizados pelo Legislativo e abertos por ato do
Executivo, com a indicação dos recursos correspondentes (art. 167,
V, CF). Mas o próprio orçamento pode autorizá-los (art. 165, § 8º,
CF).

Os créditos especiais se destinam às despesas para as quais não


haja dotação orçamentária específica. Estremam-se perfeitamente
dos créditos suplementares porque estes reforçam a dotação
existente, enquanto os créditos especiais autorizam despesas não
computadas no orçamento. Exigem prévia autorização do Legislativo
e são abertos por ato do Executivo23.

Sendo assim, o artigo 12, § 2º, da Lei de Responsabilidade Fiscal


viola o artigo 167, inciso III, da Constituição Federal, por submeter todas as
operações de crédito ao limite do montante das despesas de capital, ignorando
as operações autorizadas por créditos suplementares e especiais, nos termos
do texto constitucional.

Em razão disso, em consonância com o entendimento do STF,


deve ser dada interpretação conforme ao referido dispositivo, evitando a sua
total inconstitucionalidade, para ressalvar as operações de crédito decorrentes
de créditos suplementares e especiais, conforme o artigo 167, inciso III, da
Constituição Federal, do limite do montante das despesas de capital.

Em verdade, o que o legislador objetivou com a edição da norma


deduzida no artigo 12, § 2º, da LRF foi submeter as despesas não fixadas no
orçamento e que não são autorizadas a título de crédito adicional suplementar
ou especial ao limite do montante das despesas de capital. Assim, nesse
aspecto, a norma é plenamente constitucional.

XXIII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 21, INCISO II, DA LEI


DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 21, inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 21. É nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da


despesa com pessoal e não atenda:

II - o limite legal de comprometimento aplicado às despesas com


pessoal inativo.

Os autores questionam a constitucionalidade do referido


dispositivo porque se refere ao limite legal aplicado às despesas com pessoal
inativo, quando não deveria haver distinção entre despesas com pessoal
inativo e pessoal ativo, nos termos do artigo 169 da Constituição Federal.

Com base no mesmo dispositivo constitucional, os autores ainda


alegam que a fixação do limite de despesas com pessoal deve ser fixada

23 TORRES, op. cit., p. 196-197.


somente por meio da lei complementar a que se refere o artigo 169 da
Constituição Federal.

No julgamento da medida cautelar, o STF conferiu ao artigo 21,


inciso II, da Lei de Responsabilidade Fiscal, interpretação conforme à
Constituição, para que se entenda como limite legal o previsto em lei
complementar.

Desde então, não houve a edição da lei complementar para fixar o


limite legal previsto no artigo 21, inciso II, da LRF, restando tal dispositivo
ineficaz, conforme sustenta a doutrina:

Esse limite era estabelecido pelo art. 2º e §§ 1º e 2º da Lei n. 9.717,


de 27 de novembro de 1998, que “dispõe sobre regras gerais para a
organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência
social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito
Federal e dá outras providências”; esse limite era fixado em doze por
cento da receita corrente líquida em cada exercício financeiro; no
entanto, com as alterações introduzidas pela Lei n. 10.887, de 18 de
junho de 2004, esse limite não foi mais previsto.

Justifica-se essa alteração, tendo em vista que o STF, na ADIn 2.238-


5 (DOU de 19-2-2003), conferiu ao inciso II do art. 21 da Lei de
Responsabilidade Fiscal interpretação conforme à Constituição
Federal, “para que se entenda como limite legal o previsto em Lei
Complementar”. Dessa forma, a exigência contida nesse dispositivo
legal não tem como ser cumprida enquanto não for definido o limite
nele referido, por meio de lei complementar24.

De fato, não deve haver distinção entre ativos e inativos na


fixação do limite legal de despesas com pessoal, bem como tal fixação deve
ser veiculada por meio de lei complementar, conforme dispõe o artigo 169 da
Constituição da República. Nesse sentido, assiste razão à decisão do STF de
conferir interpretação conforme à Constituição ao artigo 21, inciso II, da Lei de
Responsabilidade Fiscal.

É certo que a Emenda Constitucional nº 41/2003 encerrou o


regime de integralidade e paridade entre ativos e inativos para os servidores
que, após a sua edição, ingressarem na Administração Pública. Contudo, isso
não influencia o debate, ainda mais considerando que o parâmetro para o

24Comentários à Lei de responsabilidade fiscal, 2009, p. 169.


exame da constitucionalidade do dispositivo legal impugnado deve ser o texto
constitucional vigente à época da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal.

XXIV – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 72 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 72 da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 72. A despesa com serviços de terceiros dos Poderes e órgãos


referidos no art. 20 não poderá exceder, em percentual da receita
corrente líquida, a do exercício anterior à entrada em vigor desta Lei
Complementar, até o término do terceiro exercício seguinte.

Os autores sustentam que o referido dispositivo deve ser


declarado inconstitucional por violação ao princípio federativo, haja vista o
prejuízo à autonomia dos demais entes da federação para a fixação da
despesa com serviços de terceiros. Aduzem, ainda, que nem mesmo a
Emenda Constitucional nº 19/1998, que alterou o artigo 169 da Constituição
Federal, estipulou restrições à despesa com serviços de terceiros.

No julgamento da medida cautelar, o STF conferiu interpretação


conforme à Constituição da República, para considerar a proibição contida no
dispositivo legal restrita aos contratos de prestação de serviços permanentes.

Não pode ser considerada inconstitucional norma que estipula


limite de despesa com serviços de terceiros somente porque a Constituição
não dispõe sobre tais limites, ainda mais sob o argumento de violação ao
princípio federativo. Em verdade, o artigo 169, § 9º, da Constituição Federal
previu que lei complementar estabeleceria normas de gestão financeira, sendo
esta Lei de Responsabilidade Fiscal.

A Administração Pública deve gerir o patrimônio e as finanças


públicas com responsabilidade, obedecendo aos imperativos de eficiência,
economicidade, transparência e equilíbrio das contas públicas. E isso não deve
excluir a gestão financeira das despesas com serviços de terceiros.

Conforme aludido, o Poder Público está autorizado a celebrar


contratos de terceirização de serviços ou de empreitada, sendo vedada a
contratação de mão-de-obra por interposta pessoa. Não obstante, mesmo a
terceirização de mão-de-obra deve ser objeto de gestão financeira responsável,
conforme o artigo 18, § 1º, da LRF, quanto mais as modalidades de
terceirização lícitas que a Administração Pública pode celebrar.

A respeito da gestão orçamentária responsável, a doutrina afirma:

A gestão orçamentária deve se fazer de acordo com os princípios da


descentralização, da eficiência e da responsabilidade (accountability)
e dos seus subprincípios da prudência e da transparência.

A Lei de Responsabilidade Fiscal constitui importante passo para o


aperfeiçoamento da gestão orçamentária25.

Diante disso, não deve ser declarada a inconstitucionalidade do


artigo 72 da Lei de Responsabilidade Fiscal, por violação ao princípio
federativo. Em verdade, tal dispositivo é veiculado pela lei complementar a que
se refere a Constituição no artigo 169, § 9º, devendo ser observado por todos
os entes da federação, como expressão de uma gestão orçamentária
responsável.

XXV – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 9º, § 3º, DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 9º, § 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 9º Se verificado, ao final de um bimestre, que a realização da


receita poderá não comportar o cumprimento das metas de resultado
primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, os
Poderes e o Ministério Público promoverão, por ato próprio e nos
montantes necessários, nos trinta dias subseqüentes, limitação de
empenho e movimentação financeira, segundo os critérios fixados
pela lei de diretrizes orçamentárias.
§ 3º No caso de os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério
Público não promoverem a limitação no prazo estabelecido no caput,
é o Poder Executivo autorizado a limitar os valores financeiros
segundo os critérios fixados pela lei de diretrizes orçamentárias.

Para os autores, o dispositivo legal impugnado viola o princípio da


separação de poderes, consagrado como cláusula pétrea no artigo 60, § 4º,
inciso III, da Constituição da República. Isso porque autorizar a ingerência do
Executivo na promoção da limitação de empenho no âmbito do Legislativo, do
Judiciário e do Ministério Público, seria constituir um superpoder.

25 TORRES, op. cit., p. 181.


No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que o artigo
9º, § 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal consiste em hipótese de
interferência indevida do Poder Executivo nos demais Poderes e no Ministério
Público.

Com efeito, o princípio da separação de poderes constitui cláusula


pétrea, nos termos do artigo 60, § 4º, inciso III, da Carta Magna, e um princípio
fundamental, conforme o artigo 2º da Constituição Federal. Sendo um princípio,
estruturalmente, a separação de poderes possui um núcleo de sentido
insuscetível de alteração e contornos para além desse núcleo que admitem
soluções diversas pela maioria política.

A respeito do núcleo de sentido da separação de poderes, a


doutrina afirma:

A ideia, já registrada pela doutrina e pelo STF, é a de que a cláusula


pétrea em questão protege o núcleo de sentido da separação de
Poderes, mas não inviabiliza quaisquer mudanças no assunto. O que
o núcleo do princípio determina, em síntese, é uma divisão das
funções legislativas, executiva e jurisdicional entre órgãos diversos.
Em regra, não se cuida de divisão absoluta, mas sim de ma
especialização funcional, sem prejuízo da existência de espaços de
interseção, que atendem a duas finalidades: i) garantir a autonomia
de cada um dos Poderes, evitando que a atividade de um fique na
dependência da atuação dos demais; ii) funcionar como mecanismo
de controle recíproco, incrementado. Para além desse núcleo, há um
certo espaço de indefinição, que admite soluções diversas 26.

No caso em tela, o dispositivo impugnado não apresenta hipótese


de controle entre Poderes admissível, por não violar o núcleo de sentido do
princípio. Em verdade, há a transformação do Executivo num superpoder, com
ingerência na autoadministração dos demais Poderes e do Ministério Público.
Nesse sentido, deve ser declarada inconstitucional a norma contida no artigo
9º, § 3º, da Constituição Federal, por violação à separação de poderes.

XXVI – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 23, §§ 1º E 2º, DA LEI


DE RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 23, §§ 1º e 2º, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

26 BARCELLOS, op. cit., p. 278.


Art. 23. Se a despesa total com pessoal, do Poder ou órgão referido
no art. 20, ultrapassar os limites definidos no mesmo artigo, sem
prejuízo das medidas previstas no art. 22, o percentual excedente
terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes, sendo pelo
menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras, as
providências previstas nos §§ 3º e 4º do art. 169 da Constituição.

§ 1º No caso do inciso I do § 3º do art. 169 da Constituição, o objetivo


poderá ser alcançado tanto pela extinção de cargos e funções quanto
pela redução dos valores a eles atribuídos.

§ 2º É facultada a redução temporária da jornada de trabalho com


adequação dos vencimentos à nova carga horária.

Os autores das Ações sustentam que o artigo 23, §§ 1º e 2º, da


Lei de Responsabilidade Fiscal deve ser declarado inconstitucional, por violar a
regra da irredutibilidade dos vencimentos/subsídios dos ocupantes de cargos e
empregos públicos consagrada no artigo 37, inciso XV, da Constituição
Federal.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que a


competência cometida à lei complementar pelo § 3º do art. 169 da Constituição
Federal está limitada às providências nele indicadas, o que não foi observado,
ocorrendo, inclusive, ofensa ao princípio da irredutibilidade de vencimentos.

Assim, o STF concluiu por suspender, no § 1º do art. 23, a


expressão “quanto pela redução dos valores a eles atribuídos”, e,
integralmente, a eficácia do § 2º do referido artigo.

O artigo 169, § 3º, incisos I e II, da Constituição Federal define


providências a serem tomadas pelos entes federativos com vistas ao
atendimento do limite legal de despesa com pessoal ativo e inativo. Dentre tais
providências estão a redução em pelo menos 20% (vinte por cento) das
despesas com cargos em comissão e funções de confiança e a exoneração de
servidores não estáveis.

A Constituição Federal não admite, contudo, a redução dos


vencimentos/subsídios de funcionários públicos como providência para a
adequação ao limite legal de despesa com pessoal, principalmente, em razão
do artigo 7º, inciso VI, do artigo 37, inciso XV, e do artigo 39, § 3º, da Carta
Magna. A propósito, a irredutibilidade dos vencimentos/subsídios constitui
prerrogativa essencial para o exercício independente da função pública,
conforme assevera a doutrina:

Nesse sentido, sendo inadmissível que o legislador inove na


ordem jurídica em desconformidade com as normas constitucionais, devem ser
declarados inconstitucionais os §§ 1º e 2º do artigo 23 da Lei de
Responsabilidade Fiscal, por violação à regra da irredutibilidade dos
vencimentos/subsídios dos ocupantes de cargos e empregos públicos.

XXVII – DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 56, CAPUT, DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 56, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 56. As contas prestadas pelos Chefes do Poder Executivo


incluirão, além das suas próprias, as dos Presidentes dos órgãos dos
Poderes Legislativo e Judiciário e do Chefe do Ministério Público,
referidos no art. 20, as quais receberão parecer prévio,
separadamente, do respectivo Tribunal de Contas.

De acordo com os autores das Ações, o dispositivo impugnado


viola a separação de poderes e a sistemática de prestação de contas dos
Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público, definida nos termos do
artigo 71, incisos I e II, da Constituição da República.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que a norma


contraria o inciso II do art. 71 da Carta Magna, tendo em vista que apenas as
contas do Presidente da República deverão ser apreciadas pelo Congresso
Nacional.

O artigo 71 da Constituição Federal estipula hipótese de controle


externo das finanças públicas, definindo as competências do Tribunal de
Contas da União – TCU. Essas atribuições se estendem aos Tribunais de
Contas dos Estados, do Distrito Federal e dos Tribunais ou Conselhos de
Contas dos Municípios, quando houver, nos termos do artigo 75 da
Constituição Federal.
O inciso I do artigo 71 dispõe que o TCU deverá elaborar parecer
não vinculativo sobre as contas do Presidente da República, para que o
Congresso Nacional proceda pelo julgamento de tais contas, nos termos dos
artigos 49, inciso IX e 84, inciso XXIV, da Constituição Federal, conforme o
entendimento do STF exarado no julgado abaixo ementado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO - ACÓRDÃO DO TRIBUNAL


SUPERIOR ELEITORAL - FUNDAMENTO LEGAL E
CONSTITUCIONAL. (...) INELEGIBILIDADE - PREFEITO -
REJEIÇÃO DE CONTAS - COMPETÊNCIA. Ao Poder Legislativo
compete o julgamento das contas do Chefe do Executivo,
considerados os três níveis - federal, estadual e municipal. O Tribunal
de Contas exsurge como simples órgão auxiliar, atuando na esfera
opinativa - inteligência dos artigos 11 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, 25, 31, 49, inciso IX, 71 e 75, todos do
corpo permanente da Carta de 1988 (...)27.

Por sua vez, o artigo 71, inciso II, da Constituição da República


trata de hipótese em que o próprio TCU julga as contas apresentadas pelos
demais administradores, envolvendo as contas dos Presidentes dos demais
Poderes e do Chefe do Ministério Público. Isso porque a Constituição exige que
apenas as contas do Chefe do Poder Executivo sejam julgadas pelo Poder
Legislativo.

Dessa forma, deve ser declarada inconstitucional a disposição


contida no artigo 56, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal, haja vista que
as contas dos Presidentes do Judiciário e do Legislativo e do Chefe do
Ministério Público não devem julgadas pelo Congresso Nacional, mas pelo
Tribunal de Contas.

XXVIII– DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 57 DA LEI DE


RESPONSABILIDADE FISCAL

O artigo 57 da Lei de Responsabilidade Fiscal dispõe:

Art. 57. Os Tribunais de Contas emitirão parecer prévio conclusivo


sobre as contas no prazo de sessenta dias do recebimento, se outro
não estiver estabelecido nas constituições estaduais ou nas leis
orgânicas municipais.

27STF, Tribunal Pleno, Recurso Extraordinário nº 132.747, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em
17.06,1992, DJ 07.12.1995.
§ 1º No caso de Municípios que não sejam capitais e que tenham
menos de duzentos mil habitantes o prazo será de cento e oitenta
dias.

§ 2º Os Tribunais de Contas não entrarão em recesso enquanto


existirem contas de Poder, ou órgão referido no art. 20, pendentes de
parecer prévio.

Os autores sustentam que, conforme aludido, excluindo as contas


do chefe do Executivo, os Tribunais de Contas estão autorizados a apreciar e
julgar as contas dos demais administradores, não apenas emitir parecer prévio
não vinculativo, nos termos do artigo 71, inciso II, da Constituição Federal.

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que a


referência a “contas de Poder”, no § 2º do art. 57, evidencia a abrangência, no
termo “contas” constante do caput do artigo, daqueles cálculos decorrentes da
atividade financeira dos administradores e demais responsáveis por dinheiros,
bens e valores públicos, que somente poderão ser objeto de julgamento pelo
Tribunal de Contas competente (inciso II do art. 71 da Constituição).

Com efeito, considerando os argumentos abordados na discussão


relativa à constitucionalidade do artigo 56, caput, da LRF, também deve
declarada a inconstitucionalidade do artigo 57 da Lei de Responsabilidade
Fiscal, por violação ao artigo 71, inciso II, da Constituição Federal.

XXIX – DA PREJUDICIALIDADE DA AÇÃO EM RELAÇÃO À IMPUGNÇÃO A


ARTIGOS DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1980-20/2000

No julgamento da medida cautelar, o STF entendeu que às


impugnações aos artigos 3º, inciso I e 4º da MP nº 1980-20/200 estão
prejudicadas, tendo em vista que o diploma normativo foi reeditado, sem que
houvesse pedido de aditamento da petição inicial.

Conforme aludido nos comentários à constitucionalidade do artigo


30, inciso I, da Lei de Responsabilidade Fiscal, o objeto do controle de
constitucionalidade mediante ação direta de inconstitucionalidade deve ser lei
ou ato normativo federal ou estadual não revogado, para que haja interesse
processual existente na demanda.
Dessa forma, considerando que o ato impugnado foi revogado por
atos posteriores, inexiste interesse processual no prosseguimento da demanda
constitucional, devendo ser prejudicada a ação, conforme entendeu o STF no
julgamento da medida cautelar.

XXX – BIBLIOGRAFIA

Vous aimerez peut-être aussi