Abordagens didático-metodológicas da Matemática na Escola
Básica e na EJA: tendências e problematizações
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é entendida por Fonseca (2002)
não como uma modalidade de oferta de educação básica, mas como uma ação pedagógica que atende a um público específico que não teve a oportunidade de iniciar e/ou concluir escolarização básica, mais caracterizada por questões de exclusão social e cultural que por faixa etária. Fonseca (2002) elenca algumas problematizações relacionadas ao ensino de Matemática para esse público, mas que, conforme o próprio autor destaca, se estendem para as diversas práticas e cenários escolares da Educação Básica, a saber: i) a linearidade de apresentação dos conteúdos da Matemática, cuja fragmentação não possibilita a compreensão de relações entre conceitos de diferentes áreas dessa disciplina como, por exemplo, entre aritmética, álgebra e geometria; ii) a necessidade de vencer completamente uma etapa escolar e de cumprir obrigatoriamente o programa, em que esta geralmente é desvinculado de contextualização e interdisciplinaridade, bem como de reflexões com base na realidade e perspectivas dos estudantes, enquanto aquela é resultado de provas estereotipadas que quantificam o saber do estudante tomando como parâmetro o distanciamento entre suas reproduções com as apresentadas pelo professor e deixa de avaliar as compreensões do estudante a partir da perspectiva do que ele sabe; e iii) a falta de clareza sobre o que é certo e o que é errado em matemática, em que o erro é encarado apenas em caráter punitivo e não como fonte de informações que possam indicar possibilidades que contribuam com a aprendizagem. Entraves relacionados à estrutura e aos propósitos escolares, caracterizados como resistências às investidas de superação de práticas escolares tradicionais, circunstanciam os diversos níveis e modalidades da Educação Básica, inclusive a EJA. Dentre essas investidas encontram-se as pesquisas em Educação Matemática que têm apontado diversas tendências pedagógicas e metodológicas para a abordagem de conteúdos matemáticos que contribuam para a aprendizagem significativa por parte do estudante e para minimizar dificuldades que apresentam em compreender conceitos matemáticas nesse direcionamento de aprendizagem. Respeitando processos cognitivos que caracterizam diferentes idades de estudantes da Educação Básica, desde a infância até a vida adulta, podemos considerar como tendências e alternativas às práticas escolares de Matemática: a Resolução de Problemas, a Investigação Matemática, a Modelagem Matemática, a História da Matemática, a utilização de Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), a Etnomatemática, entre outros. Vale enfatizar que, além dos processos cognitivos relativo a cada idade, ao propor qualquer uma das tendências da Educação Matemática é preciso considerar a relação de cada sujeito em aprendizagem como o conhecimento matemático. No caso da EJA, essa relação é adulta e voltada para a questão utilitária desse conhecimento. Portanto, os conteúdos precisam ser confrontados com situações extraescolares para a solução de problemas cotidianos. Além disso, para esse público, apesar de também apreciarem e requererem a dimensão formativa, essa perspectiva é divergente da assumida pelas crianças e adolescentes, que tem como referência o futuro, aquilo que virão a ser e a enfrentar. Na EJA, a preocupação é com o vir a ser, com a realização no presente e, portanto, os aspectos formativos almejados têm caráter de atualidade. Apesar de suas especificidades, em linhas gerais evidenciamos a relevância de que o conhecimento matemático em todas as etapas e modalidades de ensino, incluindo a EJA, contemple situações que permitam ao aprendiz vivenciar experiências de significação que, além de vivenciadas, sejam apreciadas por ele. Tais experiências precisam ser contextualizadas com problemas reais, interdisciplinares e destacar relações entre conceitos da própria matemática para que o estudante possa ter a oportunidade de compreender o que a ele é ensinado, a partir da atribuição que atribui a esse conhecimento matemático. Sem limitar a conteúdos, mas discutindo em linhas gerais, passamos a apresentar caracterizações de algumas das tendências metodológicas da Educação Matemática e discutir brevemente suas possibilidades segundo problematizações elencadas por Fonseca (2002). A respeito da utilização de computadores no ensino de Matemática, Borba e Penteado (2007) defendem que, para além de servir como recurso motivacional ao estudante, a informática deve ser entendida como um direito do estudante devido o momento atual, o qual exige uma “alfabetização tecnológica” no sentido de aprender a ler essa mídia. De maneira mais ampla, os autores sugerem que a informática na escola precisa ser vista como parte de projeto coletivo de democratização de acessos a tecnologias. Em específico ao ensino de matemática, computadores podem ser utilizados por exemplo para auxiliar no processo de ensino e de aprendizagem de geometria, pois permite, por meio de “softwares”, visualizar propriedades e de maneira dinâmica diversas figuras e entes geométricos, além de contribuir para a evidenciação de relações entre geometria e álgebra, por exemplo. No caso do público da EJA, também podemos enfatizar a aprendizagem desses alunos no manuseio de planilhas eletrônicas, em que, além de contribuir para a aprendizagem de operações matemáticas, noções de estatísticas, entre outros, o esse manuseio tem sido exigido em diversas áreas no mercado de trabalho. Pensando no conhecimento matemático em associação à realidade, a Etnomatemática pode ser entendida, enquanto dimensão educacional, como de caráter holística e transdisciplinar, que objetiva compreender o saber e o fazer matemático da realidade social e cultural que está próxima do educando, com a pretensão de propor ações pedagógicas mais próximas e naturais possíveis de sua realidade social e cultural (D’AMBRÓSIO, 2000). Um exemplo é propor a simulação de uma compra fictícia de uma estante de livros para analisar como um marceneiro desenvolveria o projeto, sabendo que a estante deve ter 1,8 m de altura e duas portas. A partir dessa situação, os alunos investigaram saberes matemáticos presentes nas estratégias laborais de um marceneiro com baixa escolarização. Para comparar a “matemática do marceneiro” com a matemática acadêmica, os alunos podem fazer uso da Modelagem Matemática, que segundo Biembengut e Hein (2005), corresponde à arte de expressar por intermédio de linguagem matemática situações-problema de nosso meio. Na perspectiva desses autores, dependendo do nível e modalidade de ensino, o professor pode optar pela Modelagem Matemática, que parte de uma situação/tema e sobre ela desenvolve questões para serem respondidas mediante de pesquisas sobre esse tema e formulações matemáticas (constituição de modelos matemáticos), ou pela Modelação Matemática, na qual o professor escolhe determinados modelos que serão recriados em sala de aula. Além das tendências metodológicas citadas, há muitas outras que podem ser consideradas no ensino e na aprendizagem de conceitos matemáticos nas diversas etapas e modalidades da Educação Básica. Vale ressaltar que todas elas apresentam algumas características muito próximas de outras duas tendências, a Resolução de Problemas e a Investigação Matemática. Segundo Onuchic (2011), problema é tudo aquilo que não se sabe fazer, mas que se está interessado em fazer, ou seja, são atividades ou situações em que a resolução do problema não é conhecida ou memorizada pelos estudantes de antemão. Na Investigação Matemática, investigar corresponde “descobrir relações entre objetos matemáticos conhecidos ou desconhecidos, procurando identificar as respectivas propriedades” (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2006, p. 13) e envolve quatro momentos principais: exploração e formulação de questões, formulação de conjecturas, testes e reformulações das conjecturas e, por fim, argumentação, justificação e avaliação. Uma investigação matemática pode se desenvolver em torno de um ou mais problemas. Inclusive, o primeiro passo é identificar que problemas resolver. Contudo, vai além de resolver um problema proposto, mas envolve a realização de outras descobertas, tão ou mais importantes que a resolução do próprio problema. Portanto, há uma relação muito próxima entre investigação matemática e resolução de problemas, mas eles não podem ser confundidos. Problemas são questões para os quais o aluno não dispõe de um método que permita a sua resolução imediata, mas seu enunciado indica claramente o que é dado e o que é pretendido. Assim, a resposta do aluno estará certa ou errada, ainda que a avaliação adequada do professor se paute no processo e não no produto. Já na investigação, as situações são mais abertas, de forma que a questão não está bem definida a princípio, de modo que os pontos de partida não são os mesmos e, consequentemente, os pontos de chegada também não. Para Ponte (2005), resolver um problema é um processo associado ao raciocínio e à comunicação, ao desafio das capacidades matemáticas do aluno e ao gosto pela descoberta, podendo levá-lo a ter uma visão mais ampla da Matemática e a desenvolver o gosto por esta disciplina. Estas características também estão presentes nas investigações e explorações que, segundo este autor, assumem um carácter mais aberto e requerem que o aluno participe na formulação das próprias questões a resolver. Apesar das diferentes tendências exemplificadas, vale ressaltar que o professor não deve se limitar a uma ou algumas delas, mas articular e equilibrar todas elas de maneira a promover o desenvolvimento matemático dos alunos com diferentes níveis de desempenho.