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Vol. 02 N.

02 v jul/dez 2004

Ana Maria de Mattos Guimarães


anamaria@mercurio.unisinos.br

Desenvolvimento de narrativas e o processo


de construção social da escrita

RESUMO – Este artigo apresenta resultados parciais de pes- ABSTRACT – This work presents partial results of an
quisa que investiga a relação entre o discurso narrativo oral e investigation concerning the relationship between oral narrative
a construção do discurso escrito, pelo acompanhamento lon- discourse and the construction of written discourse in child
gitudinal de dois grupos de 15 alunos cada, da 3ª até a 5ª séries development. Two groups of 15 children are observed longitudinally
do Ensino Fundamental, sendo que é desenvolvido um traba- throughout their 3rd to 5th year of elementary schooling (Ensino
lho de intervenção formativa com um desses grupos. Seu Fundamental, in Brazil). In one of the school classes our research
objetivo principal é analisar o processo de textualização do team develops a work of educational intervention. The focus of
gênero narrativo sob dois ângulos: o do produto texto e o da the investigation is to analyze the textualization process in the
interferência da escola neste processo, para o que é utilizada a development of narrative genres under two perspectives: from the
teoria interacionista sociodiscursiva (Bronckart, 1999; point of view of the text as a product, and from the point of view
Schneuwly e Dolz, 1999; Vygotski, 1988). of the school’s interference in the process. The theoretical
framework assumed is that of the socio-discursive interactionism
(Bronckart, 1997; Schneuwly & Dolz, 1999; Vygotsky, 1988).

Palavras-chave: narrativas orais e escritas, desenvolvimen- Key words: written and oral narratives; written language
to da linguagem escrita, intervenções formativas, transposi- development; formative intervention; didactic transposition;
ção didática, interacionismo sociodiscursivo. socio-discursive interactionism

Um pouco da história da pesquisa mo, de classe média baixa. Trata-se de uma escola
pequena, em que funciona apenas uma turma por sé-
O projeto “Construção de narrativas e desen- rie, do pré até a 5ª série.
volvimento social da escrita” representa, sob a forma O principal objetivo do projeto é analisar o
de um envolvimento com a realidade escolar, a conti- processo de textualização da narrativa sob dois ân-
nuidade de pesquisas em torno de questões sobre gulos: o do produto texto e o da interferência da esco-
desenvolvimento da linguagem da criança na fase de la no processo de apropriação do escrito pela criança.
letramento, com ênfase em narrativas orais e escritas. Este projeto encontra-se em sua fase inicial, uma vez
Nesse sentido, objetiva aproximar as pesquisas pen- que começou em setembro de 2003.
sadas sob o prisma de aquisição e desenvolvimento É preciso referir também que o projeto foi con-
da linguagem do contexto escolar, transpondo-as para cebido sem que a escola onde seria desenvolvido
uma reflexão pedagógica, a partir do acompanhamen- estivesse escolhida. Essa tarefa não foi fácil, em parte
to longitudinal de dois grupos de alunos, da 3ª até a pela falta de interesse das escolas em desenvolver
5ª séries. Em um dos grupos é desenvolvido o traba- projetos de parceria, mas, sobretudo, pela falta de
lho de intervenções formativas; o outro é o grupo estímulo do professor da turma escolhida, uma vez
controle. A escola onde se desenvolve a pesquisa é que a maioria parece não medir os benefícios que possa
municipal, na periferia de uma cidade da região metro- vir a ter com a quebra de seu paradigma docente. Fi-
politana de Porto Alegre, e a maioria dos alunos que a nalmente, quando se chegou a uma escola receptiva,
freqüenta é de classes menos favorecidas, no máxi- foi bastante difícil convencer o professor da turma

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Calidoscópio

escolhida para a intervenção pedagógica. Seu princi- A: Eu escrevo # eu gosto, as coisas que eu
pal argumento - “as crianças são um problema” - era mais gosto de escrever é as coisas que a
justificado pelo de fato de os alunos serem turbulen- (profes)sora escreve no quadro: os textos, es-
tos, de idades diferentes (na 3ª série, as idades oscila- sas coisas.
vam entre oito e 13 anos), de forma que vislumbrava P: E o que tu escreves?
ser impossível realizar um trabalho com eles. Nesse A: O que eu escrevo?
ínterim, o papel do pesquisador ia se desenvolvendo: P: O que é que tu gostas mais?
observação da turma, envolvimento de seus A: Fazer texto.
mestrandos, entrevista individualizada com as crian- P: Que tipo de texto que tu fazes?
ças, recolhimento dos poucos textos por elas escritos A: # Sobre os bichos, essas coisas, sobre, como
durante o ano de 2003. Era outubro, o ano ameaçava vou dizer?...
findar, quando... (Cassiandro, 13 anos)

Paradoxos do pesquisador Por menos dogmático que pareça, conversa


com a supervisora educacional da escola em conjun-
Outubro, dois textos escritos ao longo do ano to com a professora indicou a única saída. Cabia-me
pelos alunos e professora renitente, enfatizando só as sair do papel de observadora e encarar o de docente,
dificuldades do trabalho. Procurou-se discutir com a com o objetivo de demonstrar que, mesmo crianças
docente princípios do interacionismo sociodiscursivo, tidas como difíceis, são capazes.
de concepções de linguagem que estão por trás do
trabalho com a língua materna e perspectivas de reali- O desenvolvimento do trabalho
zação de um trabalho centrado na produção textual do
aluno. Nesse sentido, foram analisadas também as difi- Foi escolhido como tipo de discurso
culdades que os poucos textos das crianças deixaram constitutivo das atividades de linguagem a que nos
entrever, mas a professora persistiu na alegação de di- dedicaríamos a narração. Um dos aspectos envolvi-
ficuldades pessoais para dar início a um trabalho dife- dos diz respeito a como se estruturam as narrativas, o
renciado. No papel de observadora participante, pude que significa ter em mente um esquema narrativo, como
constatar que as interações da professora com a turma apresentado por Adam (1985) e Labov (2001). Esse
eram repletas de autoritarismo, evidenciado pelo tom último conceitua narrativa mínima como aquela que
de voz muito elevado da docente e pela proposta de tem uma complicação e uma resolução.
trabalhos sempre individuais e absolutamente previsí- A análise dos textos anteriormente produzi-
veis. Ainda que transparecesse afetividade nas rela- dos pela turma apontou que, mesmo sob o rótulo de
ções, a docente não permitia que as crianças fossem narrativa e a partir de título sugestivo - “um passeio
interlocutoras do processo pedagógico. Eram absolu- inesquecível”, faltava a todos a característica mais
tamente passivas, expostas a longos trabalhos de có- marcante da ação complicadora. Também grande parte
pias. O trabalho com língua materna focalizava sobre- das narrativas orais produzidas durante as entrevistas
tudo aspectos gramaticais e ortográficos, faz um relato de ações, sem uma ação complicadora,
desvinculados do contexto de produção. Eram feitas como é possível depreender pela transcrição a seguir
leituras compreensivas de textos curtos, muitas vezes de entrevista realizada com uma das crianças:
copiados do quadro, e sempre seguidos por questio-
nário com perguntas de respostas fechadas e previsí- ANA: E aí então me conta uma historinha que
veis. Quando perguntadas sobre o que escreviam, tu te lembras.
mesmo nas entrevistas individuais, as crianças respon- SUY: ### Essa porta aí é meia maluca...
diam, invariavelmente “TEXTOS”, sem conseguir Deixa eu me lembrar ### ah @ i a do Patinho
explicitar finalidade: Feio é a única que eu me lembro.
ANA: Então me conta.
P: Hmmm! E me conta uma coisa, tu gostas de SUY: Ah, é a do Puff que eu me lembro, a
escrever? do Patinho Feio não é tão boa assim. Ah @ i,
A: Gosto. o Puff no livrinho dizia que ele era um ursi-
P: Ah, é? Bah@d, isso é muito legal. Que é que nho que era muito feliz, que ele pulava de um
tu gostas de escrever? lado pro outro com seus amigos que era o

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Tigrão, o Porco, se eu não me engano é o O gênero “conto de fadas” é considerado um


Coelho e eu não sei os outros que tem. Ah gênero simples (Canvat, 2003, p. 173-174), no qual
@ i que ele era muito feliz, que ele pulava, no pode operar uma relação de conformidade, isto é, de
anoitecer ele ia pra casa, ele tomava banho, duplicação, entre o texto e seu gênero, por se tratar de
fazia seus dever(es) de casa, e no outro dia, um gênero fortemente restringido por fórmulas pré-
ele alevantava de manhã, tomava banho, se determinadas pela tradição. O uso de recursos
arrumava e ia pro colégio e aí depois que ele lingüísticos é simples e direto. Os nomes de seus per-
chegava do colégio ele ia brincar de novo e sonagens representam as suas características (Bruxa
aí depois de noite ele www # só me lembro Onilda). As palavras formam uma imagem visual, prin-
essa parte cipalmente na descrição de elementos fantásticos e
(Suyse – 10 anos) mágicos. A metamorfose das personagens, a magia, o
encanto, o uso de talismãs e a força do destino são
Planejei, em conjunto com a professora, uma também constantes neste gênero (Jolles, 1993). Os
proposta de trabalho com gêneros textuais em seqüên- contos de fada clássicos apresentam o mesmo esque-
cias didáticas, com base em Schneuwly e Dolz (1996, ma narrativo, no qual as dificuldades materiais do
1999), Schneuwly (2002), Bronckardt (1999), Cordeiro personagem são apresentadas na situação inicial. A
et al. (2004) e Machado (2000). O ponto a ser afirmado partir do desenvolvimento da ação, esse cotidiano é
foi a hipótese de que “é através dos gêneros que as alterado pela interferência do elemento mágico, o que
práticas de linguagem encarnam-se nas atividades dos permite a emancipação do herói e o clássico final feliz
aprendizes” (Schneuwly e Dolz, 1999, p. 6). na resolução e na situação final. As personagens são
Foram, então, consideradas as regularidades planas, geralmente poucas e sem complexidade psi-
do uso desse gênero em diferentes atividades de lin- cológica. São, na maioria, jovens em idade de casar.
guagem, sob um triplo ponto de vista: (a) dos conteú- As qualidades físicas ou morais são nítidas em cada
dos e conhecimentos veiculados pelo texto; (b) das personagem. O tempo e o espaço são indeterminados,
estruturas comunicativas comuns aos textos vistos por isso, são comuns expressões genéricas do tipo:
como pertencentes ao gênero escolhido; (c) das con- “era uma vez”, “há muito tempo”, “num certo dia” e
figurações específicas das unidades lingüísticas que “num lugar distante”. (Zilberman, 1982) Observe-se
compõem o texto (Schneuwly e Dolz, 1999, p. 7). que se optou pelo uso de contos de fadas ditos reno-
O gênero escolhido foi o de contos de fadas, vados, em lugar dos tradicionais, para permitir uma
pelo interesse que as crianças, na entrevista, revela- melhor inserção do mágico na realidade atual.
ram ter na leitura de títulos desse gênero. Partiu-se, A seqüência didática sobre o gênero conto de
então, para a organização da seqüência didática que fadas foi organizada em sete oficinas, a partir de uma
orientou a intervenção pedagógica feita. ordem determinada para dar conta da dificuldade que
Inicialmente, caracterizou-se o gênero de refe- se pretendeu vencer (a ausência de complicação no
rência, para estudar como transformá-lo em objeto de texto narrativo). Foi explicado aos alunos que eles
aprendizagem. Fica sempre marcante a necessidade teriam “oficinas de ESCREVER” por dois meses. Ne-
de ultrapassar o que Schneuwly (2002, p. 238-239) las estudariam os contos de fada, sendo desenvolvi-
caracteriza como gênero escolar, marcado pelo fato das atividades para que refletissem sobre suas carac-
de pertencer, simultaneamente, a dois lugares sociais, terísticas e pudessem produzir eles mesmos contos
o da situação de referência que tenta reproduzir o de fadas, com acontecimentos mágicos.
tema proposto e o da situação escolar da escrita, O primeiro texto produzido por eles não teve
orientação específica, a não ser que deveriam apre-
“definida notadamente pelo fato de que o aluno
deve escrever para mostrar que ele sabe escrever e sentar um personagem inventado que se encontraria
por aprender a escrever, de que escreve a mesma com uma bruxa. Na análise desse primeiro texto, foi
coisa e, ao mesmo tempo, que numerosos outros de possível verificar que a maioria mostrou conhecimen-
seus co-discípulos, de que ele sabe que seu texto to sobre a magia como componente básico dos con-
corresponde a uma ficção de situação à qual ele
pode se identificar mais ou menos”, tos de fada, mas, em grande parte não foi possível
caracterizar a mudança de uma situação inicial, que se
sem que se efetive uma troca comunicacional. Para dá, sobretudo, por uma ação complicadora. Nas pro-
tal fim, procurou-se, inicialmente, refletir sobre a duções finais, foi possível checar a reversão desta
“escolarização” do gênero de referência. análise inicial.

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Calidoscópio

As oficinas: Oficina 3. Um conto de fadas apresenta vários acon-


tecimentos (modificação da situação inicial e ações
Oficina 1. O que é um conto de fadas? que respondem à nova situação)
Apresentação da personagem que acompa- Análise da história A guerra, sob o ponto de
nhará o trabalho, a partir da distribuição do livro As vista de seu enredo. Escrita no quadro dos “grandes
memórias da Bruxa Onilda (Larreuta e Capdevilla, acontecimentos”. Em grupos de quatro, elaboração
2002). Leitura comentada da história. Exploração das de uma história coletiva com grandes acontecimen-
principais características do gênero: a presença da tos, que envolvam o personagem da capa de seus
magia e do encanto; os personagens típicos, as ca- cadernos (personagens galácticos, que determinaram
racterísticas de tempo e espaço indeterminados; os a separação dos grupos) e a Bruxa Onilda. Leitura e
nomes típicos dos personagens; os momentos de avaliação dessas histórias realizadas pelo conjunto
apresentação dos personagens e suas dificuldades da turma, a partir do critério de apresentarem vários
na situação inicial; a presença de uma complicação acontecimentos, terem um enredo, um conflito. A lei-
que atua sobre a situação inicial, a interferência do tura foi feita por mim, para que não houvesse interfe-
elemento mágico para resolução deste problema; o rência de quem lia o texto e a conseqüente relação
final feliz. texto=aluno. Li com ênfase os textos, sempre pergun-
Escolha pelas crianças de um personagem para tando: Há vários acontecimentos? A história monta
os seus contos de fada, que os acompanhará em to- um enredo?
das as oficinas. Escrita de texto com a descrição deste Observação: foi possível detectar que todos
personagem e apresentação à classe. Distribuição da os textos cumpriram esses quesitos
história : No zoológico , com novas aventuras da Bruxa
Onilda, para leitura em casa e escrita de um conto Oficina 4. É preciso reescrever o texto para que ele se
semelhante com seu personagem. aperfeiçoe
Introdução do procedimento de reescrita dos
Oficina 2. Nós podemos escrever um conto de fadas textos. Foi escolhido, aleatoriamente, um dos textos
A partir do sorteio de um dos personagens de cada grupo já analisado tematicamente na aula
inventados, composição coletiva de uma narrativa anterior, que foi copiado tal e qual em folha especial.
Cada aluno leu individualmente o texto recebido e
em que a Mulher Gata se encontra com a Bruxa
assinalou o que imaginava ser um erro, escrevendo a
Onilda, mediante proposta oral de segmentos, se-
forma certa ao lado. Após, em conjunto, foram assi-
guida de escrita no quadro. O objetivo da Oficina foi
nalados os erros, devendo reescrevê-lo corretamente
cumprido, uma vez que as crianças entenderam o
no quadro quem o descobrisse. Vencidos os proble-
que é escrever um conto de fadas (presença do má-
mas ortográficos (letra maiúscula e trocas), passou-
gico) e sua característica de complexidade (vários
se a outros questionamentos. Nenhuma criança apon-
acontecimentos) e a obrigatoriedade de conflito (mar-
tou problemas de pontuação (blocos de oração esta-
ca do enredo).
vam presentes em todos os textos), mas foram capa-
Observação: nesta oficina, evidenciaram-se
zes de identificar os casos de discurso direto e corri-
problemas de ortografia, de diferentes ordens, o que
giram essas marcas. Mesmo a necessidade de ponto
exigiu um trabalho paralelo sobre a questão. De pron- de interrogação não foi percebida e teve que ser assi-
to, foi tratado o problema da grafia m antes de p e b, nalada por mim, a partir de dramatização de leitura.
tendo ficado evidente que essa regra era sabida pe- Resolvi deixar de lado os problemas dos blocos de
las crianças, mas não havia sido apropriada. Cada oração, por entender que mereciam um estudo à par-
criança foi convidada a escrever uma palavra com te, uma vez que nenhum leitor se ocupou disso.
essa dificuldade no quadro. As palavras não podi- Observação: a seqüência didática atualmente
am ser iguais, o que trouxe dificuldades para os últi- em desenvolvimento na turma tem como um dos obje-
mos, mas mostrou um vocabulário ampliado, pelo tivos ultrapassar a questão dos blocos de oração, ten-
uso de “emborrachado”, “bombachudo”, por exem- do sido escolhido o gênero ‘peça de teatro infantil’.
plo. Como se trata de problema muito grave para a
maior parte da turma, desenvolve-se, atualmente, Oficina 5. Colocando palavras, melhora...
oficina específica, sob forma de laboratório, em ho- A partir de duas histórias mudas em seqüên-
rário especial. cia (Furnari, 2002), leitura oral dos quadrinhos e

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escrita posterior, sempre reafirmando os elementos Outros personagens mágicos (Vampiro, ou-
necessários para um conto de fadas. A história tras bruxas, Frankenstein, Homem Ara-
maior apresentou dificuldades na recontagem oral, nha,...): 41,2%
o que não permaneceu na escrita. Avaliadas algu- Antagonistas: 47,1%
mas das histórias escritas sob o ponto de vista de Protagonistas: 100%
terem (ou não) reproduzido os acontecimentos dos Seqüência narrativa (Adam, 1985)
quadrinhos e de apresentarem os elementos neces- Situação inicial
sários para gênero. A história mais complexa foi • Momento: 88,2% (um dia, era uma vez, no dia
dramatizada, como forma de avaliar sua compreen- das bruxas...)
são, o que mostrou não ter havido problemas de • Lugar: 65% (castelo, praia, rua, floresta, casa
entendimento. da bruxa...)
• Personagens : 100% (de 2 a 6 personagens)
Oficina 7. Produção final • Dificuldades do personagem= 65%
Produção de um conto de fadas, que trouxes-
se novas aventuras da Bruxa Onilda e apresentasse Complicação
todas as características estudadas. Esse texto foi lido • Evento modificador da situação inicial: 100%
também por duas outras professoras: a supervisora • Metamorfose dos personagens: 53%
educacional e a professora da classe. Deles foram
escolhidos três contos que foram publicados como Ações variadas
um livro infantil e distribuídos na festa de encerra- Diversidade de ações: 70,6%
mento das oficinas. Interferência do elemento mágico no cotidia-
no: 65%
Primeiros resultados
Resolução
A avaliação das produções finais dos alu- Resolução da complicação: 94,1%
nos demonstra que o objetivo de construção de
um texto inserido no gênero de escolha foi atingi- Situação final
do. Apresenta-se, a seguir, uma análise preliminar • Final feliz: 88,2%
dessas produções, a partir da proposta de • Novo estado de equilíbrio: 88,2% (na maior
Bronckart (1999). Essa análise preliminar tratou do parte, ligada à resolução, do tipo “viveram fe-
que chama de “infra-estrutura geral”, ou seja, o lizes para sempre”).
nível mais profundo do texto, de acordo com o
gênero de texto escolhido, a pertinência do con- Esses resultados dão-nos alento para a conti-
teúdo temático desenvolvido no texto e as seqüên- nuidade do projeto, ainda mais que, na primeira pro-
cias que o organizam. Foram investigadas as se- dução analisada, não havia mostras de que os alunos
guintes características (apresentadas junto ao conheciam os elementos da seqüência narrativa, mui-
percentual de ocorrências): to certamente, em função de que não era tratada ade-
Léxico típico: quadamente a questão de produção de qualquer
Marcas temporais indefinidas (era uma vez, um tipo de texto. Nesse sentido, a presença da seqüência
dia...): 70,6% narrativa se mostra muito evidente, pelos percentuais
Nome de personagem como representativo de elevados em todos os seus elementos. A escolha de
suas características (Bruxa Onilda, fada xx,): um gênero considerado simples, como é o caso dos
100% contos de fada, certamente contribuiu para este de-
Nomes que remetam diretamente ao conto de sempenho.
fadas (castelo, vassoura de bruxa): 88,2% Por outro lado, problemas de língua, como or-
Situações típicas: tografia e pontuação, se mantiveram e precisarão ser
Presença de encantamento, magia: 100% corrigidos com a evolução do trabalho. Para isso, es-
Interferência do elemento mágico no cotidia- tão sendo planejadas novas seqüências didáticas de
no: 70,6% forma a refletir sobre uma aprendizagem da escrita
Personagens típicos (excluindo-se a Bruxa, que permita ir além do fato de que “escrever se apren-
presente na proposta do texto): de escrevendo”.

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Calidoscópio

Primeiras conclusões Bruxa Onilda não poderá nos ajudar, infelizmente): a


interação que propomos que ocorra como central no
Reconhece-se a dificuldade permanente de processo de sala de aula também acaba sendo
transposições didáticas, desde a distância entre o que determinante na nossa relação com o professor.
acabamos de escrever sobre o gênero em questão,
baseado em teorias de referência (saber ‘savant’), até Referências
chegar ao saber ensinado (Perrenoud, 1998). Pensa-
se nas relações que ficam entre eles, relativas aos ADAM, J.M. 1985. Le texte narratif. Paris, Nathan.
BRONCKART, J-P. 1999. Atividade de linguagem, textos e
saberes escolhidos para ensinar e os efetivamente discurso: por um interacionismo sócio-discursivo. São
ensinados e, finalmente, entre os saberes ensinados Paulo, Educ.
e aqueles integrados pelos alunos, nosso objetivo CANVAT, K. 2003. L’écriture et son apprentisage: une question
de genres? Etat des lieux et perspectives. Pratiques, 117/
final (Garcia Debanc, 1998). 118 :171-180.
Com relação aos alunos, o trabalho até agora CORDEIRO, G.S.; AZEVEDO, I.C.M. e MATTOS, V.L.P.
desenvolvido comprova a afirmação de Schneuwly 2004. Trabalhando com seqüências didáticas: uma pro-
posta de ensino e de análise de narrativas de aventuras de
(2002, p. 241) de que se aprende a escrever a partir da viagens. Calidoscópio, 2(1):29-37.
apropriação dos utensílios da escrita, no sentido GARCIA-DEBANC, C. 1998. Transposition didactique et
vygotskiano de que essa apropriação permite trans- chaïne de reformulations des savoirs: le cas de connecteurs.
Pratiques, 97-98:133-152.
formar a relação com o próprio processo psíquico da JOLLES, A. 1993. Formas simples. São Paulo, Cultrix.
produção de linguagem. “As pesquisas em didática FURNARI, E. 2002. A Bruxinha e o Gregório. São Paulo,
mostram que o cacife da aprendizagem da escrita – e, Ática.
LABOV. W. 2001. Uncovering the event structure of
conseqüentemente, de sua aprendizagem – é a trans- narrative. Georgetown University Round Table 2001.
formação do sistema pela construção de um novo sis- Georgetown, Georgetown University Press.
tema que reorganize de outra forma os diferentes com- LARREULA, E. e CAPDEVILLA, R. 2002. As memórias da
Bruxa Onilda.10ª ed., São Paulo, Scipione.
ponentes que intervêm na produção de um texto” MACHADO, A.R. 2000. Uma expeirência de assessoria do-
(Schneuwly, 2002, p. 242). cente e de elaboração de material diático para o ensino de
A maior dificuldade constatada é na mediação produção de textos na universidade. DELTA,16(1):1-26.
PERRENOUD, P. 1998. La transposition didactique à partir
do professor de classe. Como fazê-lo se apropriar de de pratiques : des savoirs aux compétences. Revue des
conceitos com os quais trabalhamos e acreditamos? sciences de l’éducation, 24(3):487-514.
Como desempenhar o papel que entendemos ser do SCHNEUWLY, B. 2002. L’écriture et son apprentissage: le
point de vue de la didactique. Éléments de synthèse. Pra-
professor de Língua Portuguesa: o de leitor profici- tiques, 115/116:237-253.
ente do texto de seu aluno, de forma a interagir com SCHNEUWLY, B e DOLZ, J. 1996. Genres et progression
ele e qualificá-lo, para que possa atuar na vida real, orale et écrite : élements de réflexions à propos d’une
expérience romande. Enjeux, 37/38:49-75.
tendo se apropriado do sistema lingüístico, na medi- SCHNEUWLY, B e DOLZ, J. 1999. Os gêneros escolares : das
da em que constitui a si próprio como locutor e aos práticas de linguagem aos objetos de ensino. Revista Bra-
outros como interlocutores? sileira de Educação,11:5-16.
ZILBERMAN, R. 1982. Literatura infantil: autoritarismo e
Diante de um professor de escola fundamental emancipação. São Paulo, Ática.
pública, com formação de ensino médio, perto da apo-
sentadoria e com remuneração escassa, essas dificul- Recebido em jul/2004
dades aumentam. Enfim, não há soluções mágicas (a Aceito em set/2004

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