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ANÁLISE CRÍTICA DAS POLÍTICAS EXTERNAS BRASILEIRAS, COM

DESTAQUE PARA OS ANOS LULA.

Romênia Oliveira de Souza1

Resumo: a política externa de um país é o conjunto de decisões, políticas e ações do governo que
instituem um princípio específico, coerente e até permanente que se projeta no meio internacional,
para atender às necessidades do Estado, das grandes empresas e da sociedade como um todo. No
presente estudo, analisam-se as políticas externas brasileiras, dando um destaque àquela dos governos
Lula. Poucos entendem a importância que a política exterior de um país tem para os cidadãos que nele
vivem. E é este o principal objetivo desta pesquisa: apresentar os princípios de política externa e de
forma clara e objetiva, as políticas implantadas no Brasil, e seus reflexos para a economia e para a vida
dos residentes. No caso da política mais recentemente implantada, onde se despendeu maior atenção,
fica evidente o alinhamento à dinâmica do mercado e aos interesses dos grandes conglomerados e do
Estado. Utilizou-se de metodologia qualitativa, tratando-se de pesquisa descritivo-analítica.
Palavras-chave: política externa, Brasil, Estado, conglomerados.

1. INTRODUÇÃO

As transformações mundiais e as políticas implantadas pelo Brasil para definir sua


inserção no cenário internacional geram um enorme impacto sobre a população brasileira e
envolve aspectos econômicos e geopolíticos. A definição do espaço internacional do país
influencia na possibilidade de implantação e implementação de um projeto nacional de
desenvolvimento com justiça social, e vice-versa (VIZENTINI, 2008). Por esta razão, o
presente estudo aborda as políticas externas brasileiras, enfatizando a política dos governos de
Luiz Inácio Lula da Silva.
Na primeira seção, apresentam-se os princípios de política externa. Isto é, seus
conceitos, os tipos de objetivos e os meios de ação, e a composição da agenda do Estado. O
conceito de agenda internacional comporta os interesses nacionais e novos temas de crescente
importância econômica, comercial, financeira, tecnológica, ambiental, a criminalidade e o
terrorismo, entre outros (DIAS, 2010).
Na segunda seção, apresentam-se, de modo sintético, as políticas externas brasileiras
desde sua formação social-nacional até o último governo de Fernando Henrique Cardozo. O
objetivo é mostrar o comportamento do Estado no que se refere à inserção internacional do

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Pós-graduada em Administração Financeira pela URCA e Docente do Departamento de Economia da URCA.
E-mail: romenia@bol.com.br
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país e suas implicações internas. É perceptível a alternância, ao longo dos anos, de iniciativas
promissoras e de retrocessos em relação à inserção, às parcerias firmadas e aos resultados
obtidos. Essa descontinuidade de ações é um empecilho considerável para um país em
processo de desenvolvimento.
Na terceira seção analisa-se a política externa do Brasil durante os governos Lula e
seus reflexos, principalmente, sobre a economia. Fica evidente a compatibilização dos
interesses do governo e dos grandes conglomerados empresariais na implantação dessa
política. Alguns resultados são apresentados em termos da balança comercial, principalmente
das exportações, e dos investimentos diretos brasileiros no exterior. E logo após essa seção,
apresentam-se as principais conclusões do estudo.

2. ALGUNS PRINCÍPIOS DE POLÍTICA EXTERNA

Entende-se por política externa de um país o conjunto de decisões, políticas e ações de


um governo que instituem um princípio específico, coerente, e de certa forma permanente,
que se projeta no meio internacional, para atender às necessidades do Estado, refletindo a
força e a estabilidade deste último. É o modo através do qual o Estado conduz suas relações
mútuas como parte integrante do sistema internacional, interagindo de diversas maneiras,
através da cooperação ou do conflito. É influenciada pelo regime político do país,
particularmente em termos de alinhamento de propostas com outros Estados, e por fatores
externos conjunturais.
Em termos de política exterior, os objetivos (permanentes, de curto e de médio prazo)
e os meios de ação constituem elementos fundamentais. Os objetivos permanentes constituem
o que se deseja alcançar no longo prazo. Seus fins básicos são: a segurança nacional
(manutenção da independência política e da soberania nacional) e internacional; a proteção
das condições de vida de seus habitantes; conservação dos valores e princípios próprios dessa
sociedade e que a identificam como nação. Além da proteção e respeito aos direitos humanos;
resolução pacífica de controvérsias; cumprimento de obrigações jurídicas internacionais;
promoção do progresso social e do nível de vida dos povos.

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Os objetivos de curto e médio prazo expressam resultados buscados em um período de
tempo menor e sua determinação corresponde ao Executivo, independentemente do regime
político interno. Quanto aos meios de ação, atualmente se consideram como mais importantes:
a diplomacia, a propaganda, medidas econômicas (ofertas, concessão de vantagens, imposição
de sanções), a subversão, a ameaça e a guerra (DIAS, 2010).
O comportamento de política exterior está diretamente relacionado às decisões
tomadas pelos Estados entre si e se apresentam na forma de: alianças, área de atuação e modus
operandi – multilateralismo e ativismo (PEARSON e ROCHESTER, 2004 apud DIAS,
2010). As agendas dos Estados estão condicionadas por diversos fatores que podem ser
agrupados em três grandes grupos: fatores sistêmicos, atributos nacionais e a personalidade de
seus governantes.
Dentre os fatores sistêmicos estão: a geografia (localização, número e extensão das
fronteiras a defender, grau de acesso a diferentes partes do planeta); vínculos internacionais
(semelhanças ou diferenças políticas, ideológicas, culturais); e estrutura do sistema
internacional (uni polaridade, bipolaridade e multipolaridade). Quanto aos atributos nacionais,
os mais significativos são: os demográficos (tamanho, motivação, habilidades e
homogeneidade da população); econômicos (tamanho e taxa de crescimento da economia,
nível de riqueza nacional, natureza do sistema econômico); militares; e a organização política.
Já a personalidade dos governantes pode criar situações que prejudicam ou não as
relações internacionais de seus respectivos Estados, isolando ou ampliando-as (DIAS, 2010).
O modo como o presidente atua internacionalmente caracteriza um determinado tipo de
diplomacia (reflexa; ativa; afirmativa). A diplomacia reflexa funciona apenas como reação
aos estímulos externos. A diplomacia presidencial ativa alude à utilização da imagem e da
transmissão de ideias, demonstrando maior participação aos olhos da opinião pública. E a
diplomacia afirmativa, além das características ativas, inclui maior iniciativa presidencial na
condução da política externa, valendo-se de sua sensibilidade e senso de oportunidade para
obter uma melhor projeção e inserção do país em âmbito internacional (FIGUEIRA, 2011).

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3. SÍNTESE DAS POLÍTICAS EXTERNAS BRASILEIRAS DESDE SUA
FORMAÇÃO SOCIAL E NACIONAL ATÉ OS GOVERNOS FHC

A formação social e nacional brasileira se originou com a expansão europeia dos


séculos XV-XVI, por meio da ‘descoberta’ e da colonização portuguesas. A dupla
problemática da subordinação unilateral ao capitalismo mediterrâneo e norte-atlântico e da
construção do espaço nacional constituiu a primeira fase das relações exteriores brasileiras, a
qual se estendeu por quatro séculos (VIZENTINI, 2008). Neste período, o Brasil adotou uma
política ‘entreguista’, estabelecendo acordos comerciais com as grandes potências
(principalmente a Inglaterra) extremamente desvantajosos para o país.
De 1888 até 1930, pode-se caracterizar a diplomacia como reflexa, com efeitos
meramente simbólicos (FIGUEIRA, 2011). No início do século XX estendendo-se até a
década de 1950, o eixo da diplomacia política e econômica do Brasil voltou-se para os
Estados Unidos em busca do status de aliado privilegiado. A unilateralidade durante a
hegemonia norte-americana representou um novo período: foi concluído o traçado das
fronteiras do país, que se voltou para um processo de inserção hemisférica e vinculou sua
política externa ao desenvolvimento econômico. Entretanto, tal relação se mostrava
insuficiente como base para a industrialização implementada desde os anos 1930, e até
obstaculizava-a.
No início dos anos 1960, na esteira do desenvolvimento industrial, a política exterior
brasileira buscou novos espaços por meio da mundialização e da multilateralização. Iniciou-se
um terceiro grande período das relações exteriores (VIZENTINI, 2008). Com a Política
Externa Independente2 (PEI), durante o governo de Jânio Quadros, objetivou-se: afastar o
Brasil do confronto bipolar da época e dar-lhe autonomia; exaltar a ONU como veículo para
solução de problemas internacionais; solidarizar-se com países subdesenvolvidos, tentando
deslocar as preocupações mundiais do campo ideológico para questões econômicas
(FIGUEIRA, 2011).

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Princípios da PEI: 1º- exportações brasileiras para todos os países, inclusive socialistas; 2º- defesa do direito internacional,
da autodeterminação e da não intervenção nos assuntos internos de outros países; 3º- política de paz, desarmamento e
coexistência pacífica nas relações internacionais; 4º- apoio à descolonização completa de todos os territórios; 5º- formulação
autônoma de planos nacionais de desenvolvimento e de encaminhamento da ajuda externa (VIZENTINI, 2008).
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Apesar da manutenção do eixo vertical Norte-Sul, a diplomacia brasileira passou a
atuar em um eixo horizontal Sul-Sul e em um diagonal Sul-Leste (Terceiro Mundo e países
socialistas, respectivamente). Isso se tornou possível pelas necessidades de desenvolvimento
do país e pelo advento de um sistema mundial de hegemonias em crescente desgaste
(VIZENTINI, 2008). Com o golpe militar, precisamente de 1964-1974, retomou-se o
alinhamento preferencial com os EUA e com outros países ocidentais capitalistas,
abandonando as premissas fundamentais de inserção internacional do país e rompendo
relações diplomáticas com países comunistas.
De 1974-1979, o governo Geisel adotou algumas diretrizes e um projeto de inserção
internacional associado à PEI, e que ficou conhecido como Pragmatismo Ecumênico e
Responsável: sem teor ideológico; com mudanças realizadas de forma lenta e gradual, assim
como o processo de transição do regime ditatorial para o democrático. Buscou-se diversificar
parcerias internacionais (China, Estados africanos, árabes e a União Soviética) e reduzir a
dependência aos EUA. Figueiredo (de 1979-1985) continuou as ações de Geisel, visitou vinte
e cinco países e estreitou relações com os latino-americanos. Tancredo Neves e Sarney
também buscaram a inserção internacional do país, defendendo os direitos humanos, o meio
ambiente, se comprometendo com o desenvolvimento de tecnologia e energia nuclear para
fins pacíficos e a noção de integração regional (FIGUEIRA, 2011).
As vigorosas alterações do cenário mundial, na passagem dos anos 80 aos 90, e a
implantação de um modelo inspirado no neoliberalismo com o governo Collor,
entretanto, configuraram uma crise no processo de multilateralização, ainda não
superada. Depois de um interregno, durante o governo Itamar Franco, que resgatou
certas dimensões de soberania e interesse nacional, os dois governos Fernando
Henrique Cardoso aprofundaram ainda mais uma vinculação subordinada à
globalização (VIZENTINI, 2008, p. 12).

Ou seja, a política externa se adequou ao processo de globalização incorporando


princípios do neoliberalismo econômico; de proteção ambiental; desarmamento; proteção aos
direitos humanos; luta contra o terrorismo, o crime organizado e outras atividades ilícitas
(FIGUEIRA, 2011). “As quase soberanias, as divisões territoriais e a segregação de
identidades promovidas e transformadas num must pela globalização dos mercados e da
informação não refletem uma diversidade de parceiros iguais” (BAUMAN, 1999, p.78). É a
globalização um processo de concentração de capitais, das finanças e de outros recursos de
escolha e ação efetiva, e, sobretudo de concentração da liberdade de mover e agir (idem).
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4. A POLÍTICA EXTERNA DOS GOVERNOS LULA

Lula, ainda como candidato, defendia a intenção de garantir por meio da política
externa, a presença soberana do Brasil no mundo. A forte diplomacia presidencial beneficiou-
se da imagem positiva que o presidente adquiriu internacionalmente. Sua presença afirmou o
compromisso brasileiro com o desenvolvimento, a justiça e equidade social a nível global
(SOUZA NETO, 2011). Ainda sob os efeitos da globalização, no final do século XX, o país
passou a valorizar principalmente, o espaço regional latino-americano via MERCOSUL. As
relações internacionais dos governos Lula foram dotadas de três dimensões diplomáticas:
econômica, política e social.
A primeira dimensão se referiu a necessidade de manter abertos os canais de
negociação com os países mais desenvolvidos, obtendo investimentos e tecnologias,
negociando a dívida externa e sinalizando o desejo do governo em cumprir os compromissos
internacionais, sem nenhuma ruptura brusca ou quebra do modelo macroeconômico
(VIZENTINI, 2008). Significou que, para conquistar a credibilidade e garantir a
governabilidade do país, Lula: honrou o acordo com o FMI e sua renovação; preservou a
diretoria do Banco Central, intimamente relacionada ao sistema financeiro globalizado;
escolheu uma equipe econômica comprometida com a estabilidade econômica e com o ajuste
fiscal (GREMAUD et al, 2011).
A promoção dos negócios e o aprofundamento das relações comerciais entre as
distintas economias, com a manutenção do grau de abertura comercial e da reestruturação
produtiva ulterior promoveu ao longo dos governos Lula a elevação da dependência do
mercado externo como centro dinâmico da economia brasileira. Isso acentuou o processo de
reprimarização das exportações e elevou a vulnerabilidade externa estrutural3 da economia
brasileira (CARCANHOLO, 2010).

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A vulnerabilidade externa é a probabilidade de resistência a pressões, fatores desestabilizadores e choques externos. Pode
ser conjuntural e estrutural. É conjuntural quando determinada pelas opções e custos do processo de ajuste externo. Depende
diretamente das opções disponíveis e inversamente dos custos do ajuste. Essencialmente, é um fenômeno de curto prazo. A
vulnerabilidade externa é estrutural quando decorre de mudanças relativas ao padrão comercial, da eficiência do aparelho
produtivo, da dinâmica tecnológica e do vigor do sistema financeiro nacional. Determinada pelos processos de desregulação e
liberalização econômica nas relações internacionais do país, sendo um fenômeno de longo prazo (FILGUEIRAS et al., 2007).
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A segunda dimensão diplomática – a política – representou a reafirmação dos
interesses nacionais e um verdadeiro protagonismo nas relações internacionais, com a
intenção real de desenvolver uma diplomacia ativa e afirmativa. Foi promovida a adoção de
políticas afirmativas sem quotas, acréscimo do número de diplomatas, abertura de embaixadas
na África e na Ásia e maior abertura da diplomacia à sociedade civil e acadêmica.
A terceira dimensão diplomática envolve o projeto social interno do governo Lula
(com impactos internacionais), que foi ao encontro da agenda que busca corrigir as distorções
criadas pela globalização centrada apenas em comércio e investimentos livres. A campanha de
combate à fome foi o elemento simbólico da construção de um suposto modelo
socioeconômico alternativo, respondendo a crise da globalização neoliberal4.
O governo brasileiro superou a passividade do anterior e buscou alianças fora do
hemisfério para ampliar seu poder de influência no âmbito internacional a partir da
mencionada postura ativa e pragmática. Analisando a integração sul-americana e do
MERCOSUL, esta é uma parceria necessária para o crescimento da economia, e
consequentemente para que a integração deixe de ser virtual. Como também a possibilidade
de reversão da marginalização crescente da região (VIZENTINI, 2008).
A integração sul-americana se realiza em três níveis: 1º- o comercial e de
investimentos, relativamente consolidado com o MERCOSUL; 2º- o operacional de
construção de infraestrutura de transportes, comunicações e energia, através da Iniciativa de
Integração Regional Sul-Americana (IIRSA); e 3º- o nível político, através da União das
Nações Sul-Americanas (Casa/UNASUL), um fórum para desenvolver a consciência política
da integração que inclui também a Guiana e o Suriname (VIZENTINI, 2008). O Brasil
também liderou o MERCOSUL contra a tentativa de o governo estadunidense impor uma
agenda unilateral para a Área de Livre Comércio das Américas (SOUZA, 2008);
As relações Norte-Sul ganharam um novo enfoque: ao contrariar alguns desígnios da
potência hegemônica – recusando-se em respaldar ações contra o Iraque sem que os
inspetores da ONU concluíssem seu trabalho e aprovassem uma invasão – e ao ressaltar sua

4
Esse projeto social interno do governo é uma das evidências de manutenção do modelo liberal periférico iniciado durante o
segundo mandato de FHC, e sustentado em três pilares: 1º- liberalização, privatização e desregulação; 2º- subordinação e
vulnerabilidade externa estrutural; 3º- dominância do capital financeiro. E evidencia a atualização da dependência
tecnológica e financeira do país, agravando a vulnerabilidade externa da economia brasileira e sua fragilidade financeira
(FILGUEIRAS et al, 2007).
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autonomia, a diplomacia brasileira criou uma razoável margem de manobra. Chamou atenção
para suas reinvindicações socioeconômicas e para obras de infraestrutura com os vizinhos
(VIZENTINI, 2008). O presidente Lula também reivindicou a queda das barreiras
alfandegárias5 e dos subsídios agrícolas6 (RODRIGUES et al., 2009).
As estratégias de cooperação Sul-Sul tiveram ações focadas em pontos comuns sem a
criação de uma frente anti-hegemônica ou anti OCDE. O primeiro passo foi a constituição do
IBAS ou G-3 (Fórum de cooperação entre Índia, Brasil e África do Sul), procurando gerar a
cooperação trilateral, a liberalização comercial recíproca e a unificação e fortalecimento de
posições nos foros multilaterais. Uma contribuição à construção de um sistema mundial
multipolar, sem hegemonias e regido por organizações multilaterais. Outras iniciativas
importantes foram as visitas de Lula aos países árabes do Oriente Médio e a aproximação com
a África para aproveitar lacunas existentes no sistema internacional, ocupando espaços
extremamente importantes para ampliar exportações de bens e serviços e expandir a ação de
empresas brasileiras e a influência internacional do país (VIZENTINI, 2008).
Uma das iniciativas da diplomacia brasileira que mais suscitou repercussão,
tanto a nível doméstico quanto internacional, foi a aproximação com o Irã, refletida
na troca de visitas presidenciais ao longo de 2009 e 2010, e na postura brasileira
favorável ao desenvolvimento de tecnologia nuclear por parte daquele país. A
diplomacia brasileira procurou explicitar que defendia o direito do governo iraniano
de possuir um programa nuclear para fins pacíficos e condenava o discurso
antissemita e de negação do Holocausto por parte do presidente iraniano. No
entanto, a proximidade entre Brasília e Teerã atraiu críticas de alguns membros da
comunidade internacional, como Estados Unidos e Israel, e também de alguns
setores domésticos. A aprovação da resolução 1929 pelo Conselho de Segurança da
ONU em junho de 2010, estabelecendo sanções comerciais ao Irã nas áreas de
material militar e tecnologia nuclear, comprometeu o esforço brasileiro de buscar
uma aproximação comercial com o país e também os esforços de mediação de Brasil
e Turquia. Apesar do fracasso nas negociações, o envolvimento brasileiro revelou
uma disposição do país em estabelecer canais de diálogo sul-sul, demonstrando
também que defende o direito dos países em desenvolvimento de estabelecer
programas nucleares para fins pacíficos, como previsto no Tratado de Não-
Proliferação Nuclear (SOUZA NETO, 2011, p. 103).

5
Alguns produtos brasileiros estão sujeitos a quotas de exportações. Aqueles que ultrapassarem tais limites pagam tarifas
exorbitantes. Nos EUA: suco de laranja, etanol, açúcar, carne de frango, suína e bovina, fumo, frutas tropicais, vegetais e
produtos siderúrgicos. Na União Europeia: carne suína e bovina, frango, milho, açúcar e suco de laranja. No Japão:
amendoim descascado e frutas tropicais. E no Canadá: aves, particularmente o frango (MAIA, 2011).
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Em 2003, a União Europeia estabeleceu subsídios para a produção do setor bovino (100%) e de aves e caprinos (50%). Em
2007, os EUA aprovaram uma lei que proporcionará até 2012 subsídios agrícolas no valor de US$ 284 bilhões (MAIA,
2011).
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A solidariedade ativa também foi importante, com os projetos na área social e de
saúde, além da atuação conjunta nos organismos internacionais, como o G-207. Portanto, o
protagonismo brasileiro junto ao Terceiro Mundo e a diversificação dos vínculos com o
Primeiro, intensifica sua campanha para obtenção de um assento permanente no Conselho de
Segurança da ONU8 (VIZENTINI, 2008), onde o Brasil assumiu a posição de líder na missão
de paz no Haiti.
Sobre a reforma do Conselho de Segurança, uma ampliação do órgão, isto é, do
número de membros pode tornar a sua composição mais democrática, ao mesmo tempo em
que não irá diretamente torná-lo mais rápido e eficiente para tratar dos desafios relacionados à
manutenção da paz e da segurança internacional. Para o Brasil, a obtenção de um assento
permanente poderá torna-lo alvo de pressão por parte dos demais atores, e não
necessariamente um ator mais poderoso e influente em relação aos temas internacionais.
Poderá ainda comprometer os objetivos de longo prazo de fortalecimento e consolidação da
unidade política da própria América do Sul, haja vista não existir um consenso regional em
prol da candidatura brasileira, principalmente na Argentina.
Quanto ao Haiti, apesar da liderança na missão não qualificar automaticamente o país
para assumir um assento permanente, o seu envolvimento permite maior participação nas
discussões sobre planejamento e formulação das missões de paz, desempenhando funções
como proteção de civis, ajuda humanitária e reforma das instituições estatais. Por meio dessa
missão, o Brasil promove internacionalmente uma atuação em prol da resolução de conflitos e
de situações de fragilidade internacional a partir das raízes da subversão e na afirmação de
que a via militar e de segurança devem ser combinadas com a promoção da justiça social e do

7
Criado no final dos anos 1990 como uma reação às crises financeiras na Ásia, Brasil e Rússia, objetivando proteger
interesses agrícolas dos países em desenvolvimento diante da liberalização comercial da Rodada Doha (FIGUEIRA, 2011).
Seus membros são: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul,
EUA, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia. Além disso, participa a União Europeia
(através de sua presidência rotativa), e o Banco Central Europeu, bem como o Banco Mundial e o FMI. Teve um papel de
destaque no enfrentamento da crise financeira de 2008, colocando em evidência as possibilidades de formação de um novo
sistema de distribuição de poder, baseado no multilateralismo (DIAS, 2010).
8
Constituído por quinze países, cinco são membros permanentes (China, Rússia, França, Reino Unido e EUA) e os outros
dez são nomeados pela Assembleia-Geral e permanecem no conselho por dois anos. A polarização atualmente existente no
mundo está diferente daquela expressa pelos membros permanentes do conselho (representantes da polarização emergente no
pós Segunda Guerra). Hoje, países que àquela época foram derrotados (Alemanha e Japão), polos dinâmicos globais (como o
Brasil) e Estados representativos de importantes culturas globais (por exemplo, os países árabes), encontram-se excluídos
desse importante organismo. Uma das principais responsabilidades do Conselho é a manutenção da paz e da segurança
internacionais (DIAS, 2010).
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desenvolvimento econômico, na qual os atores locais opinem e definam estratégias de
reconstrução de suas próprias sociedades (SOUZA NETO, 2011).
Ações de diversificação de parcerias fizeram também parte da aposta central na
potencialização do comércio exterior brasileiro com vistas à produção de saldos comerciais
superavitários que evitassem o aprofundamento da dependência do país a capitais estrangeiros
de curto prazo. Ou seja, objetivou-se acabar com a dívida externa e com a vulnerabilidade
externa do país herdada9 do governo FHC (FIGUEIRA, 2011).
Entretanto, as reformas estruturais pró-mercado (incluindo liberalização comercial,
financeira e produtiva), do governo anterior, não apenas são mantidas como aprofundadas em
seu governo. No que se refere à liberalização financeira, foram aprovadas a unificação do
mercado cambial permitindo a não discriminação entre exportadores e importadores; e a
extinção da conta de não residentes visando não limitar pessoas físicas e jurídicas na
conversão de Reais em dólares, facilitando a saída de recursos.
A expansão dos prazos para a cobertura cambial das exportações significava a
manutenção de 30% de receitas em dólares no exterior, apontando para o fim da obrigação de
convertê-las para moeda nacional, ao mesmo tempo em que lhes permite atuar no mercado
especulativo de câmbio no interim entre o recebimento dos dólares e sua eventual
transformação em Reais. O governo também criou uma medida provisória concedendo
incentivos fiscais aos investidores estrangeiros para aquisição de títulos da dívida pública
interna (CARCANHOLO, 2010).
Portanto, a questão central do governo Lula foi ampliar os superávits no comércio
exterior e acumular saldos e reservas internacionais que protegeriam o país dos movimentos
de capitais em direção ao exterior. Implicava uma espécie de dualidade da estrutura
exportadora brasileira: manufaturas para o continente americano e produtos intensivos em
recursos ambientais (agrícolas e minerais) para a Europa e a Ásia. Como no interior do
complexo industrial brasileiro também se importa muito, a possibilidade de ampliar
rapidamente os saldos comerciais se apoiava na perspectiva do incremento das exportações
agrícolas e minerais no curto prazo. Deve-se considerar ainda a transnacionalização de

9
A chamada herança maldita se refere de modo mais amplo, à exposição da economia brasileira a ataques externos
(fragilidade externa) e internos (condições de prazo, rentabilidade e liquidez da dívida pública) legada do governo anterior
(MINEIRO, 2010).
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algumas empresas brasileiras, e sua expansão para espaços regionais e para a África
(MINEIRO, 2010).
O gráfico 1 mostra que a balança comercial brasileira no período 2002-2010 se
manteve superavitária, apresentando os maiores saldos em 2006 e 2005, respectivamente US$
46.456.628.726,00 e US$ 44.928.809.227,00. Embora o intercâmbio comercial tenha crescido
continuamente desde o início do período, o diferencial entre exportações e importações foi
diminuindo e pode ser explicado, entre outros fatores, pelas apreciações do câmbio R$/US$.

Gráfico 1 – Balança comercial brasileira em US$ a preços FOB


Fonte: Intercâmbio comercial brasileiro, totais gerais, Brasil. Secex/MDIC (2011).

O gráfico 2 mostra a composição das exportações brasileiras totais no período 2002-


2010. É nítida a importância relativa dos produtos industrializados manufaturados na pauta de
exportações brasileira. Os produtos básicos vêm em seguida. O fato relevante é a reversão de
posições dos produtos básicos e manufaturados no ano 2010, onde os primeiros respondem
por 44,6% das exportações totais e os manufaturados por 39,4%. Em 2009, os manufaturados
respondiam por 44%, enquanto os básicos 40,5%.

Gráfico 2 – Composição das exportações brasileiras totais no período 2002-2010


Fonte: Exportações brasileiras totais por fator agregado. Secex/MDIC (2011).
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Quanto aos investimentos diretos no exterior, o Brasil tem aplicado capitais para criar
empresas filiais de exportadoras e de bancos brasileiros. O total dos investimentos brasileiros
no exterior cresceu de 2005 a 2009, e deveu-se à maior presença das empresas que
aproveitaram a apreciação do Real, particularmente com relação ao dólar, para comprar ativos
externos. Em julho de 2010 o total de investimentos atingiu US$ 514 bilhões. O que
contribuiu bastante para essa elevação foi o aumento dos ativos de reservas externas do Banco
Central brasileiro (O ESTADO DE SÃO PAULO, 2010 apud MAIA, 2011). O gráfico 3
mostra a evolução dos investimentos diretos brasileiros no exterior entre 2002-2010 em
milhões de dólares americanos.

Gráfico 3 – Investimentos diretos brasileiros no exterior entre 2002-2010.


Fontes: Declarações do CBE do Banco Central do Brasil (2006; 2010).

Os principais motivos da expansão de empresas brasileiras no exterior foram: medidas


contra o protecionismo externo (a exemplo de indústrias siderúrgicas implantadas nos EUA
para vencer a política americana de proteção às ultrapassadas produtoras daquele país); o
custo Brasil (apreciação do Real, elevadas taxa de juros e pesada carga tributária); sistema de
transportes deficiente e caro; burocracia brasileira. Como consequência, foram gerados
empregos e impostos no exterior. Também a maior proximidade do comprador dá à empresa
brasileira condições de fornecimento mais rápido ao cliente. Assim como ganhos de escala,
decorrentes do aumento da produção, onde a empresa não fica dependente de um só mercado
(MAIA, 2011).
Os grupos brasileiros que atuavam tradicionalmente nos setores de bens de capital,
eletrônica profissional, entretenimento e construção civil pesada, ou que compunham
conglomerados financeiros, foram os que passaram por redefinições mais drásticas de suas
estratégias, devido à nova inserção internacional do Brasil ou aos processos de privatizações e
concessão de serviços das estatais (MIRANDA et al., 1999).

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Ou seja, as grandes corporações nacionais tentaram se inserir em nichos de mercados
nos quais conseguiam ser mais competitivas, e se voltaram para os produtos intensivos em
recursos naturais, de baixo conteúdo tecnológico e de menor valor agregado. O
estabelecimento de subsidiárias brasileiras no exterior complementa suas respectivas
atividades de exportações. Muitas vezes o investimento direto ocorre por meio de compras ou
associações com grupos locais (SILVA, 2003).
Dados da UNCTAD relativos a 2004 revelaram as maiores multinacionais brasileiras
nos setores não financeiros e de manufaturados segundo a quantidade de países onde estão
presentes, conforme apresentado no quadro a seguir. Os escassos dados disponíveis sobre as
empresas brasileiras que investiram no exterior mostram que se trata de um número reduzido
de empresas cujas atividades ainda estão atreladas ao comércio de exportação (SILVA, 2003).
Companhias Quantia./países
Odebrecht 14
Tomra Latasa 7
Petrobras 6
WEG 5
Vale 4
Tupy Fundições, Andrade Gutierrez, AmBev, Altus. 3 cada uma
CSN, Gerdau, Tigre, São Paulo Alpargatas. 2 cada uma
Embraer, Marcopolo, Politec, Teka, IBF, Forjas Taurus, Renner Hermann, Sisalana,
Seisa Clerman Empreendimentos, Embratel. 1 cada uma
Quadro 1 – Companhias brasileiras com maior quantidade de filiais em outros países em 2004
Fonte: O Estado de São Paulo, 2006 apud Maia, 2011.

O governo Lula promoveu o retorno do Estado interventor para reforçar o capital


financeiro bancário e produtivo e fortalecer os grandes grupos econômicos nacionais
(privados ou não). Na crise mundial recente, a intervenção se deu diretamente no processo de
associação da Sadia e Perdigão através do BNDES, e na compra de parte do Banco
Votorantim através do Banco do Brasil. Na área de infraestrutura e petroquímica, grupos
nacionais associados ao Estado implementam megaempreendimentos para exploração futura
dos serviços que daí derivará (FILGUEIRAS et al, 2010).
Entretanto e contraditoriamente, o crescimento das multinacionais brasileiras no
exterior já está criando problemas para algumas delas. Em 2006, a Petrobras e o Grupo
Brasileiro EBX tiveram suas instalações tomadas pelas tropas do exército boliviano. Em
2008, o presidente do Paraguai questionou, de forma preocupante, o sistema de remuneração
da energia elétrica da Usina de Itaipu, fornecida pelo Paraguai ao Brasil. Neste mesmo ano, o
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presidente do Equador expulsou a Construtora Odebrecht de seu país e ameaçou tomar
medida idêntica com relação à Petrobras (MAIA, 2011).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS: O PAPEL DO ESTADO (CONSOLIDADO EM SUA


POLÍTICA EXTERNA), SEU ALINHAMENTO À DINÂMICA E ÀS DEMANDAS
DAS GRANDES EMPRESAS, E SEUS REFLEXOS NA ECONOMIA NACIONAL.

O modelo liberal-periférico brasileiro se estruturou a partir de profundas mudanças,


iniciadas nos anos 1990, em pelo menos cinco dimensões da organização econômica, social e
política do país: a relação capital/trabalho; a relação entre as distintas frações do capital; as
formas de representação política; a inserção internacional do país; a estrutura e o
funcionamento do Estado. Para o presente trabalho, interessou as duas últimas dimensões,
embora todas estejam inter-relacionadas.
Com a abertura e desregulamentação dos mercados financeiros e com as privatizações,
assistiu-se ao aprofundamento da financeirização da economia e a um movimento de
centralização de capitais, através de fusões, aquisições e incorporações. Ao mesmo tempo, em
que ocorria uma maior desnacionalização e internacionalização da economia (FILGUEIRAS
et al, 2010). Para Carneiro (2002 apud FILGUEIRAS et al, 2010, p.43), em decorrência desse
processo, assistiu-se também “a um processo de desindustrialização, com redução da
participação relativa da indústria na economia nacional e especialização regressiva”. Com a
quebra de monopólios estatais em vários setores e com as privatizações de empresas públicas,
o Estado reduziu sua participação nas atividades diretamente produtivas fortalecendo grupos
privados nacionais ou não (FILGUEIRAS et al, 2010).
Ou seja, os papéis de Estado condutor, regulamentador e produtor foram modificados.
Enquanto que o de Estado financiador, captador e repassador de poupanças, ainda não foi
desmantelado. Essas mudanças estão intrinsecamente relacionadas à dinâmica de acumulação
e de concentração de capital pelas quais passou o Brasil (GREMAUD et al, 2011). O padrão
de acumulação capitalista brasileiro, inaugurado com as privatizações (uma tentativa de
formar grandes conglomerados pela associação de grupos) e a liberalização comercial dos
anos 1990 está baseado na formação de conglomerados privados nacionais e estrangeiros,
fomentados pelos fundos públicos (TAUTZ et al, 2010).

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Entre 1989-1995, os grupos nacionais ampliaram-se e concentraram-se nos setores de
siderurgia e petroquímica, em que a participação estatal foi contraída pelo capital nacional
(MIRANDA et al., 1999). No período 1995-2002, surgiram redes de proprietários baseadas
em relações societárias conectadas entre si, configurando oligopólios. Empresas tradicionais
(Gerdau, Andrade Gutierrez, Camargo Correa, Odebrecht, Votorantim, Bradesco/Vale)
valeram-se das liberalizações e privatizações e assumiram posições nos referidos setores, bem
como na telefonia. Também passaram a integrar essas redes as estatais, o BNDESPar e a
Eletrobrás, além dos fundos de pensões (Previ, Petros, Funcef) de funcionários de empresas
públicas.
O BNDES, em especial, tem atuado na internacionalização de empresas destes setores
na América do Sul e na África, reproduzindo nessas regiões o modelo de especialização
produtiva e de desapropriação das populações e territórios. A perspectiva de integração
regional adotada está voltada para a liberalização do comércio e dos investimentos,
aprofundando o modelo de inserção competitiva. A diferença do governo Lula em relação ao
período anterior está na suposta defesa de grupos nacionais, pelo Estado, bem como da
escolha dos ‘eleitos’ (TAUTZ et al, 2010). De modo geral, não houve alterações na correlação
de forças entre capital e trabalho. Entretanto, recuperou-se o emprego, reduziu-se o
desemprego e houve melhoras no salário real e no salário mínimo, resultantes do crescimento
econômico ocorrido a partir de 2006 (FILGUEIRAS et al, 2010).
Mesmo a política internacional do país (proativa para muitos), responde à demanda de
multinacionais brasileiras em termos da criação de ambientes externos favoráveis para seus
investimentos. Embora se privilegie empresas de capital nacional, não há qualquer garantia de
que essas mesmas não venham a ser controladas por empresas de capital estrangeiro. Também
a política industrial que apresenta projeções de maiores investimentos em inovação e
tecnologia, capazes de favorecer a exportação de produtos de maior valor agregado, na
realidade despeja recursos no setor de commodities (TAUTZ et al, 2010).
As contas externas melhoraram no período 2002-2006 devido: a alta no ciclo de
liquidez internacional (em razão da redução das taxas internacionais de juros, proporcionando
o crescimento da economia mundial e reduzindo o risco-país); intenso crescimento da
economia chinesa (importadora de produtos brasileiros); crescimento dos preços das

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commodities. A conjuntura externa favorável proporcionou o crescimento das exportações, a
reversão do déficit comercial e de transações correntes e o acúmulo de reservas internacionais
que permitiram o pagamento antecipado de um montante da dívida externa com organismos
internacionais (CARCANHOLO, 2010).
A partir de 2007/2008, a reversão da conjuntura internacional significou a volta dos
problemas no balanço de pagamentos por duas razões: desaceleração do crescimento das
exportações, em função da recessão mundial; e redução dos preços das commodities, tanto
pela recessão como pela desvalorização do capital fictício aplicado na especulação dentro do
mercado futuro de commodities. “Isso significa que a vulnerabilidade externa estrutural tende
a se manifestar novamente na piora das contas externas” (Idem, p.126). O impacto da crise
mundial sobre as contas externas foi agravado pela dinâmica da atração de investimentos
externos de curto prazo e de natureza especulativa, necessários para o fechamento do balanço
de pagamentos.
Muitos economistas chamam a atenção para o fato de que as políticas adotadas foram
importantes para reduzir a vulnerabilidade conjuntural da economia, principalmente por suas
manifestações e suas soluções serem sentidas no curto prazo, tendo um maior apelo político.
Entretanto, houve um agravamento da vulnerabilidade estrutural. Para Souza (2008), a
política externa brasileira esteve a serviço do desenvolvimento nacional. Se for considerada a
diversificação de parceiros comerciais do Brasil, pode-se concluir que além de reduzir a
dependência por um pequeno número de mercados consumidores e produtores, aumentando
as possibilidades, essa diversificação incluiu países latino-americanos, africanos e árabes, cujo
intercâmbio envolve produtos diferentes daqueles comercializados com os parceiros mais
tradicionais.
Em um mundo com constantes conflitos socioeconômicos e políticos, essa estratégia
de contemplar e harmonizar as diferenças é um elemento crucial no sistema internacional.
Assim como representou a conciliação dos interesses do governo brasileiro com os dos
grandes conglomerados nacionais que investiram montantes elevados no exterior, por razões
já explicadas. A postura brasileira, chamada por alguns de ‘em cima do muro’, não gera
conflitos diretos de interesses, exprime simpatia e conciliação política.

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Quanto às estratégias do governo brasileiro que refletem o pretendido papel a
desempenhar no sistema internacional, seus impactos poderão ser sentidos no aumento da
cooperação militar e de defesa na América do Sul e nos países de língua portuguesa, assim
como no interesse em um maior envolvimento do país em missões de assistência humanitária
e operações de manutenção da paz. O interesse em um maior protagonismo internacional,
fruto da crença das elites de que o país está destinado a ocupar um enfático lugar nesse
cenário, demanda uma reavaliação do seu posicionamento quanto ao princípio da não
intervenção e da participação em missões que contemplam o uso da força para fins do
cumprimento do mandato estabelecido pelas Nações Unidas. Também a não indiferença e a
atuação por meio de uma diplomacia solidária pode ser entendida como motivada pela tra-
jetória pessoal do Presidente e seus esforços a favor do combate à fome, que levaram a uma
ênfase em prol das causas sociais também na política externa (SOUZA NETO, 2011).

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