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Biogeografia

Prof.a Ângela da Veiga Beltrame


Prof. Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado

2012
Copyright © UNIASSELVI 2012

Elaboração:
Prof.ª Ângela da Veiga Beltrame
Prof. Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

910
B546p Beltrame , Ângela da Veiga.
Biogeografia/ Ângela da Veiga Beltrame [e]
Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado. Centro
Universitário Leonardo da Vinci –: Indaial, Grupo
UNIASSELVI, 2012.x ; 308.p.: il

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7830-334-1

1. Geografia 2. Geografia Política 3. Biogeografia


I. Centro Universitário Leonardo da Vinci
II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título
Apresentação
Prezado(a) acadêmico(a)!

A ideia da elaboração deste caderno por nós, autores, derivou


da necessidade de uma melhor organização e sistematização de sínteses
elaboradas sobre os temas das três grandes unidades que compõem o estudo
desta disciplina:

- a primeira compreende a introdução à Biogeografia, seus conceitos, objeto


de estudo e objetivo, a biosfera, a atmosfera e o solo, onde há condições
para o desenvolvimento da vida;

- a segunda aborda a história evolutiva da vida sobre a Terra, denominada


aqui de Paleobiogeografia, e também as razões da distribuição e adaptação
dos organismos na biosfera;

- a terceira e última unidade abrange os territórios biogeográficos, os grandes


biomas e a ação do homem sobre eles, de forma a se poder “viajar” através
dos textos.

Há o cuidado, na orientação deste estudo, no sentido de sempre se


considerar a integração dos diferentes aspectos biogeográficos. Com isso,
queremos enfatizar que a vida pode se desenvolver ou se adaptar ou se
extinguir por um conjunto de fatores bióticos e abióticos, que agem sobre uma
população ou comunidade de forma correlacionada, nunca isoladamente.

Não temos intenção de esgotarmos os assuntos aqui colocados.


Pretendemos que o conteúdo deste caderno seja uma boa introdução aos
seus estudos em Biogeografia e que, a partir dele, possa desenvolver outras
leituras sobre esta fascinante disciplina.

Este caderno é dedicado a todos os estudiosos iniciantes em


Biogeografia e a todos os interessados pela temática.

Desejamos uma boa leitura.

Prof.ª Ângela da Veiga Beltrame


Prof. Ricardo Wagner Ad-Víncula Veado

III
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO
E OS SERES VIVOS...................................................................................................... 1

TÓPICO 1 – OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA.................................. 3


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 OBJETO E OBJETIVOS........................................................................................................................ 3
RESUMO DO TÓPICO 1 ....................................................................................................................... 11
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 13

TÓPICO 2 – A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA........................ 15


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 15
2 ECOSSISTEMA E GEOSSISTEMA................................................................................................... 15
3 O ENFOQUE SISTÊMICO................................................................................................................... 16
3.1 O GEOSSISTEMA: A ORGANIZAÇÃO ESPACIAL .................................................................. 18
RESUMO DO TÓPICO 2 ....................................................................................................................... 20
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 21

TÓPICO 3 – A BIOSFERA....................................................................................................................... 23
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 23
2 CONCEITO E LIMITES DA BIOSFERA........................................................................................... 23
3 AS FONTES DE ENERGIA DA BIOSFERA..................................................................................... 24
4 OS FLUXOS DE ENERGIA E NUTRIENTES NA BIOSFERA:
OS CICLOS BIOGEOQUÍMICOS..................................................................................................... 25
RESUMO DO TÓPICO 3 ....................................................................................................................... 31
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 33

TÓPICO 4 – A ATMOSFERA.................................................................................................................. 35
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 35
2 O SIGNIFICADO DO CLIMA............................................................................................................ 35
3 OS PADRÕES CLIMÁTICOS E AS PLANTAS............................................................................... 36
4 OS EFEITOS DO CLIMA SOBRE OS SERES VIVOS................................................................... 38
RESUMO DO TÓPICO 4 ....................................................................................................................... 40
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 41

TÓPICO 5 – O SOLO E OS SERES VIVOS......................................................................................... 43


1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 43
2 FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO............................................................................................ 44
3 MECANISMOS E PROCESSOS PEDOGENÉTICOS.................................................................... 45
4 O PERFIL DE SOLO.............................................................................................................................. 47
5 DESCRIÇÕES DO PERFIL EM CAMPO.......................................................................................... 49
5.1 DESCRIÇÕES GERAIS..................................................................................................................... 49
5.2 DESCRIÇÕES ESPECÍFICAS DO PERFIL.................................................................................... 50
5.3 OUTROS ATRIBUTOS DOS HORIZONTES, ANALISADOS EM LABORATÓRIO.............. 53
6 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE SOLOS.................................................................................... 54

VII
6.1 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS DO MUNDO............................................................................. 54
6.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS DO BRASIL .............................................................................. 56
6.2.1 Horizontes diagnósticos......................................................................................................... 57
6.2.2 Tipos de Solos do Brasil ......................................................................................................... 59
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 62
RESUMO DO TÓPICO 5 ....................................................................................................................... 64
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 66

UNIDADE 2 – A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO


DOS SERES VIVOS...................................................................................................... 67

TÓPICO 1 – A PALEOBIOGEOGRAFIA............................................................................................. 69
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 69
2 O ESTUDO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A SUA IMPLICAÇÃO
NA BIOGEOGRAFIA........................................................................................................................... 69
3 ELEMENTOS DE APOIO PARA A RECONSTITUIÇÃO DE ÉPOCAS PASSADAS.............. 71
3.1 PALEOSSOLOS E SEDIMENTOS.................................................................................................. 72
3.2 ANÁLISE POLÍNICA OU PALINOLOGIA.................................................................................. 72
3.3 DATAÇÃO RADIOMÉTRICA ....................................................................................................... 73
3.4 PALEONTOLOGIA.......................................................................................................................... 73
3.5 DENDROCRONOLOGIA............................................................................................................... 74
3.6 VARVES EM VARVITOS ................................................................................................................ 74
3.7 REFÚGIOS FLORESTAIS................................................................................................................. 74
3.8 PALEOMAGNETISMO .................................................................................................................. 74
3.9 FÓSSEIS VIVOS ............................................................................................................................... 74
4 A DERIVA CONTINENTAL E O SEU SIGNIFICADO BIOGEOGRÁFICO............................ 75
5 BREVE DESCRIÇÃO DA EVOLUÇÃOBIOGEOGRÁFICA NAS ERAS GEOLÓGICAS..... 76
5.1 O ARQUENO.................................................................................................................................... 76
5.2 PROTEROZOICO OU PRÉ-CAMBRIANO................................................................................. 77
5.3 A ERA PALEOZOICA...................................................................................................................... 79
5.3.1 Cambriano................................................................................................................................ 79
5.3.2 Ordoviciano ............................................................................................................................. 80
5.3.3 Siluriano ................................................................................................................................... 81
5.3.4 Devoniano . .............................................................................................................................. 82
5.3.5 Carbonífero . ............................................................................................................................ 85
5.3.6 Permiano .................................................................................................................................. 87
5.4 A ERA MESOZOICA........................................................................................................................ 89
5.4.1 Triássico ................................................................................................................................... 90
5.4.2 Jurássico.................................................................................................................................... 92
5.4.3 Cretáceo . .................................................................................................................................. 94
5.5 A ERA CENOZOICA....................................................................................................................... 98
5.5.1 Terciário . .................................................................................................................................. 98
5.5.2 Paleoceno ................................................................................................................................. 98
5.5.3 Eoceno ...................................................................................................................................... 98
5.5.4 Oligoceno ................................................................................................................................. 99
5.5.5 Mioceno . ................................................................................................................................ 100
5.5.6 Plioceno .................................................................................................................................. 100
5.5.7 Pleistoceno ............................................................................................................................. 101
5.5.8 Holoceno ............................................................................................................................... 103
RESUMO DO TÓPICO 1 ..................................................................................................................... 104
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 107

VIII
TÓPICO 2 – ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS ........................................................ 109
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 109
2 AS PRIMEIRAS IDEIAS SOBRE O APARECIMENTO DA VIDA.......................................... 109
3 A QUIMIOSSÍNTESE: UMA TEORIA MODERNA SOBRE A ORIGEM DA VIDA............ 114
3.1 A ATMOSFERA PRIMITIVA......................................................................................................... 114
3.2 O AMBIENTE NA TERRA PRIMITIVA...................................................................................... 115
3.3 SURGE A FOTOSSÍNTESE............................................................................................................ 116
3.4 A TEORIA DA EVOLUÇÃO: O DARWINISMO E O NEODARWINISMO -
A SELEÇÃO NATURAL E A ORIGEM DAS ESPÉCIES........................................................... 117
3.5 O DARWINISMO, O NEODARWINISMO E AS IDEIAS MODERNAS
DA EVOLUÇÃO............................................................................................................................. 118
3.6 A ADAPTAÇÃO............................................................................................................................. 120
3.7 O ISOLAMENTO GENÉTICO E GEOGRÁFICO...................................................................... 123
RESUMO DO TÓPICO 2 ..................................................................................................................... 126
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 129

TÓPICO 3 – A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS.................................................................... 131


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 131
2 PADRÕES DE DISTRIBUIÇÃO DAS ESPÉCIES......................................................................... 131
3 AS FORMAS DE DISPERSÃO DAS ESPÉCIES............................................................................ 134
4 ESPÉCIES EXÓTICAS OU ESTRANGEIRAS.............................................................................. 138
5 OS MOVIMENTOS DOS SERES VIVOS...................................................................................... 140
6 AS INTERAÇÕES ENTRE OS SERES VIVOS.............................................................................. 141
7 O RELEVO COMO BARREIRA OU PONTE BIOGEOGRÁFICA............................................ 145
8 POPULAÇÕES ISOLADAS: A TEORIA DA BIOGEOGRAFIA DE ILHAS........................... 146
9 A TEORIA DOS REFÚGIOS ............................................................................................................ 148
10 CICLOS CLIMÁTICOS, PALEOCLIMAS E OS REFÚGIOS.................................................... 151
11 A TEORIA DOS REFÚGIOS E A ESPECIAÇÃO. OS CENTROS DE ORIGEM,
DE DISPERSÃO E DE DIVERSIFICAÇÃO................................................................................. 153
12 REFÚGIOS BRASILEIROS ATUAIS............................................................................................. 155
13 IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DOS REFÚGIOS ATUAIS......................................... 157
RESUMO DO TÓPICO 3 ..................................................................................................................... 160
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 162

UNIDADE 3 – TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM.... 163

TÓPICO 1 – OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS................................................... 165


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 165
2 TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS ............................................................................................. 165
2.1 REINO HOLÁRTICO..................................................................................................................... 170
2.2 REINO PALEOTROPICAL............................................................................................................ 170
2.3 REINO AUSTRALIANO................................................................................................................ 171
2.4 REINO ARQUINÓTICO ............................................................................................................... 176
2.5 REINO NEOTROPICAL................................................................................................................ 182
3 OS BIOMAS.......................................................................................................................................... 185
3.1 BIOMA DE TUNDRA ................................................................................................................... 185
3.2 BIOMA DE TAIGA - FLORESTA BOREAL DE CONÍFERAS . .............................................. 189
3.3 FLORESTA TEMPERADA SEMIDECÍDUA OU MISTA.......................................................... 195
3.4 BIOMA DE ESTEPES, PRADARIAS OU CAMPOS.................................................................. 198
3.5 BIOMA DE DESERTOS E SEMIDESERTOS .............................................................................. 201
3.6 VEGETAÇÃO MEDITERRÂNEA .............................................................................................. 208
3.7 BIOMA DE SAVANAS................................................................................................................... 211

IX
3.8 BIOMA DE FLORESTAS PLUVIAIS EQUATORIAIS .............................................................. 215
RESUMO DO TÓPICO 1 ..................................................................................................................... 221
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 224

TÓPICO 2 – AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL................ 227


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 227
2 DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS BRASILEIROS.................................................................. 227
2.1 DOMÍNIO DOS CHAPADÕES TROPICAIS COM DUAS ESTAÇÕES,
RECOBERTOS POR CERRADOS E COM FLORESTAS-GALERIA........................................ 228
2.2 DOMÍNIO DAS REGIÕES SERRANAS TROPICAIS ÚMIDAS OU DOS
"MARES DE MORROS", RECOBERTOS POR FLORESTAS PLUVIAIS................................. 231
2.3 DOMÍNIO DAS DEPRESSÕES INTERMONTANAS SEMIÁRIDAS, COM INSELBERGS
E DRENAGEM INTERMITENTE E RECOBERTAS POR CAATINGAS................................ 235
2.4 DOMÍNIO DAS TERRAS BAIXAS EQUATORIAIS, EXTENSIVAMENTE
FLORESTADAS DA AMAZÔNIA............................................................................................... 237
2.5 DOMÍNIO DOS PLANALTOS DAS ARAUCÁRIAS ............................................................... 240
2.6 DOMÍNIO DAS PRADARIAS MISTAS DO SUDESTE DO RIO GRANDE DO SUL.......... 243
RESUMO DO TÓPICO 2 ..................................................................................................................... 247
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 250

TÓPICO 3 – DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX....................................... 253


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 253
2 A COMUNIDADE VEGETAL E COMUNIDADES VEGETAIS .............................................. 254
3 ESTRUTURA DAS COMUNIDADES ............................................................................................ 258
4 O DESENVOLVIMENTO DA COMUNIDADE. SUCESSÃO, CLÍMAX
E HIERARQUIA DAS COMUNIDADES ...................................................................................... 261
RESUMO DO TÓPICO 3 ..................................................................................................................... 270
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 272

TÓPICO 4 – A SOCIEDADE HUMANA........................................................................................... 275


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 275
2 O IMPACTO DA SOCIEDADE NOS SISTEMAS NATURAIS................................................. 276
3 MODIFICAÇÕES NOS ECOSSISTEMAS E NOS GEOSSISTEMAS...................................... 280
4 A GEOGRAFIA MÉDICA.................................................................................................................. 286
LEITURA COMPLEMENTAR.............................................................................................................. 290
RESUMO DO TÓPICO 4 ..................................................................................................................... 292
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................ 294

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................................... 295

X
UNIDADE 1

A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O
CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Ao final desta unidade você será capaz de:

• compreender os fundamentos históricos, conceituais e metodológicos da


Biogeografia;

• identificar a posição da Biogeografia na ciência geográfica, bem como o


funcionamento dos ecossistemas e geossistemas;

• entender o funcionamento da biosfera e sua dinâmica de sustentação da vida;

• compreender os padrões climáticos e sua relação com as plantas, bem


como os efeitos do clima sobre os seres vivos;

• conhecer os diferentes tipos de solos, os processos que o originaram e sua


importância na sustentação da vida.

PLANO DE ESTUDOS
Esta Unidade está organizada em cinco tópicos, sendo que em cada
um deles você encontrará atividades para uma maior compreensão das
informações apresentadas.

TÓPICO 1 – OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA

TÓPICO 2 – A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA

TÓPICO 3 – A BIOSFERA

TÓPICO 4 – A ATMOSFERA

TÓPICO 5 – O SOLO E OS SERES VIVOS

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA

1 INTRODUÇÃO
A Biogeografia ocupou, durante certo tempo, um lugar secundário
na Geografia. As primeiras abordagens biogeográficas, desde o século XIX até
meados do século XX, apoiavam-se na Biologia e na Ecologia.

No entanto, em meados do século XX a Biogeografia firmou-se como


uma ciência geográfica, porque, ao contrário da Ecologia, que não considera
o espaço, mas apenas o hábitat, desenvolveu-se uma visão espacial, que
a integrava definitivamente no seio da Geografia. Com o uso do modelo
sistêmico, os estudos biogeográficos foram ampliados e pôde-se determinar
com maior exatidão o campo de estudo biogeográfico dentro de uma
perspectiva espacial integrada.

A Biogeografia explica a distribuição dos seres vivos no espaço


organizado. O dinamismo da expansão e distribuição das espécies na biosfera é
muito complexo e envolve conceitos da Geografia, da Ecologia, da Biologia, da
Climatologia, da Hidrologia e muitas outras disciplinas, inclusive as ligadas à
Geografia Humana.

2 OBJETO E OBJETIVOS
O termo Biogeografia causa alguma confusão ainda hoje – é muito
comum confundir-se Biogeografia com Ecologia – e vice-versa. Camargo (1988,
p.98) aponta que “[...] muitos trabalhos, apesar de se referirem ou terem por
tema “Biogeografia”, apresentam uma abordagem completamente diferente
da dos geógrafos, em função da formação profissional destes cientistas e,
principalmente, por causa dos objetivos diferentes”.

3
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Dansereau (1957, p. 323 e 1999, p.128) definiu a Ecologia como “o estudo das
reações das plantas e animais ao seu ambiente imediato, o seu hábitat (e não à sua
localização geográfica)”. Em 1966, com base nesta mesma definição, argumentou
que, “de acordo com este enunciado, a ecologia não chega a abranger o estudo do
ambiente como um todo, assumindo em suas dimensões últimas o que constituiria
o domínio da Biogeografia. Esta última integra neste sentido a geografia das plantas
e animais históricos + bioclimatologia + autoecologia + sinecologia + uso do solo [...].
Mas valorizo a distinção entre Ecologia e Biogeografia, e mantenho pelo menos que
necessitamos desta sólida estrutura conceitual para fazer avançar a ciência ambiental.
Vejo-me também compelido a enfatizar que a ecologia forma o seu pivô [...]”.

A Biogeografia considera o espaço geográfico organizado para explicar


as causas e as consequências da distribuição das espécies. Para isso, tem que
considerar o passado e, com ele, explicar o presente.

O homem é um elemento primordial na distribuição das espécies, papel


que é, muitas vezes, ignorado por muitos biogeógrafos, que se preocupam
apenas com os fatores naturais. Não podemos esquecer que o homem sempre
exerceu participação fundamental na repartição das espécies. Causas naturais e
antropogênicas se misturam no decorrer do tempo.

Os processos evolutivos são importantes: “[...] o geógrafo precisa saber


como apareceram e porque se extinguiram as espécies. A distribuição geográfica
das espécies, assim como a respectiva fisionomia, dependem das condições das
épocas passadas [...]”.

O número de indivíduos por espécie também era preocupação de De


Martone, que afirmava que “[...] Os processos de multiplicação e de dispersão
[...] são fatores primordiais da distribuição geográfica [...]”. A competição e a
adaptação ao meio também eram objeto de preocupação de De Martone, porque
contribuem para a fisionomia das regiões geográficas. De Martone escreveu
também um capítulo sobre as modificações que o homem impunha à natureza.

As definições modernas da Biogeografia são semelhantes e seguem, em


geral, a linha de De Martone.

Dansereau (1959) define a Biogeografia como “a ciência que estuda a


distribuição, a adaptação, a expansão e a associação das plantas e dos animais”.
Lemée (1967, apud KUHLMANN, 1977) a define como “a ciência da repartição
dos seres vivos, de suas causas e de suas modificações”. (FURON apud
KUHLMANN) afirma que a Biogeografia “é a ciência que estuda a repartição
dos seres vivos na superfície dos continentes e no seio dos oceanos e as causas
dessa repartição no espaço e no tempo”. Elhai (1968, apud QUINTANILLA, 1981)
destaca a inter-relação da natureza com o homem e sintetiza o objeto e o objetivo
da Biogeografia: “A Biogeografia estuda os organismos vivos, as plantas e os
animais na superfície do globo, na sua repartição, em seu agrupamento e em suas
relações com outros elementos do mundo físico e humano.”

4
TÓPICO 1 | OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA

Para Mielke (1988, p.1), a Biogeografia “é o estudo científico dos


padrões globais dos animais e das plantas”. Margalef (1989, p. 238) compara a
Biogeografia com a Ecologia e sua definição mostra que ele se preocupa com o
espaço geográfico, um conceito importante na Geografia, mas que a Ecologia não
leva em conta: a Biogeografia é “[...] o estudo dos fenômenos biológicos em sua
manifestação espacial [...]”.

Troppmair (1989, p.1) defende a Biogeografia como parte integrante da


Geografia e, pois, “estuda as interações, a organização e os processos espaciais”
nos quais os seres vivos, inclusive o homem, têm participação fundamental. Por
isso, ele diz (2006, p.1) que a Biogeografia estuda “as interações, a organização e
os processos espaciais do presente e do passado, dando ênfase aos seres vivos –
biocenoses – que habitam determinado local: o biótopo”.

Cox & Moore (1994, p.1) definem a Biogeografia como “o estudo das
coisas vivas num contexto espacial e temporal”.

A ocupação de um biótopo é gradual, segundo a capacidade de adaptação


e de dispersão das espécies. O tempo é importante, porque muitos fatos e fatores
mudarão e evoluirão, enquanto as espécies organizam o espaço em que vão viver.
Margalef (1989, p.235) reconhece que o tempo tem influência nas distribuições
dos seres vivos do passado, com reflexos nos ecossistemas atuais.

Müeller (1976, apud TROPPMAIR, 2006, p.1) delimita os objetivos e o campo


de atuação da Biogeografia e dá importância ao espaço ocupado pelas espécies:

Biogeografia pesquisa as razões da distribuição dos organismos, das


comunidades vivas (biocenoses) e dos ecossistemas nas paisagens, países e
continentes do mundo. A estrutura, a função, a história e os fatos indicadores
sobre espaços são o objetivo dos estudos biogeográficos.

Cox & Moore (1994, p.1) enumeram várias questões básicas que os
biogeógrafos procuram responder: por que há tantos seres vivos? Por que eles se
encontram distribuídos segundo os padrões atuais? Ocuparam eles, no passado,
os mesmos padrões de distribuição de hoje? As atividades humanas alteram esses
padrões e, se os alteram, o que acontecerá no futuro?

A tarefa do biogeógrafo é buscar respostas para essas indagações e


procurar regras gerais que as expliquem e, dessa forma, construir uma rede de
conhecimentos que possa ser usada em predições para o futuro das espécies,
incluindo a humana.

A Geografia é antropocêntrica. O homem pode desequilibrar algumas


variáveis do meio físico e acelerar e desequilibrar esses mecanismos e, pois,
transformar a organização espacial. Por esta razão, Cox & Moore (1994, p. 1)
afirmam que “[...] seria irreal fazer uma síntese da Biogeografia sem considerar o
impacto causado pela espécie humana”. E Quintanilla (1981) confere fundamental
importância à atuação do homem como modificador do meio natural.

5
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Dansereau (1999, p. 37), comentou seu livro de 1957 (ver bibliografia) e


disse que “Na verdade, meu esforço só chegaria a ser superado muito tempo
depois, na medida em que ‘Biogeography’ permaneceu como sendo o único tratado
geral de ecologia onde a dimensão humana era colocada em destaque” (p. 37).
Ele foi um dos primeiros ecólogos a tentar construir uma ponte entre Ecologia e
Biogeografia, ao enfocar a participação humana no meio natural.

Dansereau mostrou que a Biogeografia busca auxílio em muitas outras


ciências, tal qual faz a própria Geografia. Ele chamou essas disciplinas auxiliares
de níveis de integração: “Os planos da Biogeografia representam, então, as várias
limitações que o meio impõe sucessivamente aos seres vivos no tempo e no
espaço”. (1999, p. 70).

Contudo, o pilar principal da Biogeografia é a Geografia, onde se tem a


base do estudo representada pela noção de espaço, de organização espacial. A
distribuição dos seres vivos se faz no espaço geográfico e altera, com a dinâmica,
a organização espacial.

As disciplinas auxiliares da Biogeografia – Climatologia, Geologia,


Pedologia, Fisiologia, Etologia, Sociologia, Antropologia, Filosofia, Ecologia,
Biologia, Química, Física, Botânica, Zoologia, Paleontologia, Matemática,
Estatística, Bioquímica e tantas outras – são integradas sob um único ponto de
vista – o geossistema, que, de acordo com Monteiro (1994), é o “elemento de
integração da síntese geográfica”.

Os estudos geográficos e biogeográficos integram-se nos pontos de vista do


geossistema e do ecossistema, embora sejam conceitos diferentes, que não devem
ser confundidos. Orellana (1985, p.130) explica: “[...] no ecossistema a ênfase é
toda para o componente vivo (biocenose) e o físico é acessório e muito variável
[...]. No geossistema o elemento básico para a classificação é o espaço e tudo o que
nele está contido em integração funcional”. O geossistema é a integração do meio
físico, que constitui a sua base, com o meio biótico, que vive nele.

O tempo é importante na Biogeografia. Ele tem duas escalas diferentes


– a escala do homem e a escala dos tempos geológicos. Gould (1991) chama esta
última de tempo profundo, para definir um tempo difícil de ser assimilado na
escala cronológica.

Conhecer a distribuição atual das espécies implica no estudo da sua evolução.


Não apenas situar as espécies em uma determinada época geológica, mas, sobretudo,
compreender o papel delas nos biótopos pretéritos. Da mesma forma, entender como
as espécies atuais derivaram das suas ancestrais e que participações elas têm, hoje,
nos biótopos. Então, a noção de tempo volta-se para outro ponto de vista – quanto
tempo ainda viverão as espécies atuais que se encontram em estado de extinção?
Quanto tempo levará para que essas espécies, ao invés de se extinguirem, se adaptem
às transformações dos biótopos? São perguntas feitas por Cox & Moore (1994, p. 2)
para as quais os biogeógrafos precisam encontrar a resposta.

6
TÓPICO 1 | OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA

As populações e comunidades são outro rico campo de estudo da


Biogeografia. A complexa rede de inter-relacionamento dos seres vivos nas
comunidades pode permitir a coexistência de espécies diferentes no mesmo
biótopo, selecionando as bem adaptadas, mas também pode eliminar populações
pouco adaptadas.

A espécie humana tem muita flexibilidade de se adaptar às mudanças


ambientais, tanto por sua própria capacidade fisiológica, quanto por dispor
de técnicas.

O meio abiótico exerce enorme influência nas espécies, inclusive a humana.


Os fatores físicos possuem uma dinâmica complexa, mas previsível, que se dá em
ciclos – os ciclos biogeoquímicos.

A noção de ecossistema é capital para a Geografia. Entretanto, o


ecossistema não tem escala. Mas isto não impede que possa ser abordado
convenientemente pelos estudos geográficos. No entanto, deve-se tomar o devido
cuidado, exatamente pela falta da escala.

As diferenças entre o ecossistema e o geossistema começam aqui – a


escala. O ecossistema não é um lugar físico na natureza, mas, sim, um conjunto de
relações ecológicas, que não pode ser mapeado, porque não tem dimensão espacial,
muito embora essas relações de deem no espaço geográfico. O geossistema tem
dimensão e pode ser representado cartograficamente.

As relações dos organismos com o meio em que vivem e com os outros seres
vivos se dão no campo sociológico e biológico, daí, a dificuldade de mapeá-las.
Consideremos, por exemplo, a polinização das flores por pássaros, insetos ou pelo
vento. O mecanismo da polinização é biológico, mas também implica num aspecto
geográfico – graças a ele, a planta pode se expandir e ocupar o espaço geográfico. A
polinização não pode ser mapeada, mas seus resultados podem ser colocados em
tabelas e gráficos. A expansão da vegetação, por seu lado, pode ser mapeada. Este
fato evidencia a interligação da Ecologia com a Biogeografia e com a Geografia, o
que mostra que as noções de ecossistema e de geossistema se completam.

A Biogeografia não estuda apenas a distribuição das espécies, mas,


também, as interações dos seres vivos entre si e com o meio em que vivem, tal
como se faz na Ecologia. Contudo, com a diferença de que o espaço organizado
tem que ser levado em conta, o que representa o estudo da organização do espaço,
em que interagem elementos bióticos e abióticos, incluindo o homem.

Quando uma população se estabelece num biótopo provocará alterações,


que alterarão a organização espacial do geossistema. É o caso dos cupins (insetos
da ordem Isoptera), que mudam a paisagem natural do cerrado brasileiro quando
erigem seus ninhos. O número elevado de cupinzeiros dificulta o uso para
pastagem e para a agricultura. Na África, os elefantes devastam as florestas de
acácias, das quais usam apenas a casca para se alimentar.

7
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

O homem é o principal transformador das paisagens. Além das modificações


que ele introduz nos biótopos e nos ecossistemas, um fato que não desperta muita
atenção, a proliferação de doenças, é um dos mais importantes efeitos do mau
planejamento regional. Muitas epidemias, que se julgavam controladas ou até
erradicadas, voltaram com muita força desde o final do século passado.

A dengue e a febre amarela transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti,


a malária protagonizada pelo mosquito Anopheles darlingi, que introduz o
protozoário do gênero Plasmodium, o cólera, trazido pelo bacilo Vibrio comma,
que vive em águas contaminadas por esgotos, são exemplos mais recentes de
endemias típicas do século XIX e anteriores. A geografia médica presta ao homem
um inestimável serviço no conhecimento e localização de focos de epidemias.

O estudo das enfermidades tem um vasto campo de pesquisa na Biogeografia.


Conhecer os hábitos de vetores transmissores de moléstias, saber quais são os seus
predadores, por exemplo, é um decisivo passo para combatê-los.

A organização do espaço não se refere apenas à estrutura visível


da paisagem do geossistema. As microformas, quase invisíveis e pouco
observadas, são um importante componente da organização do espaço. Restos
de comida, simples farelos de pão, por exemplo, esquecidos no canto da sala
e que nos passam despercebidos, são excelentes fontes de alimentos para uma
população inteira de baratas. As simpáticas lagartixas, que habitam os cantos
invisíveis das casas, são um grande e útil predador de baratas e mosquitos.
A organização do espaço doméstico é fortemente influenciada pelos insetos e
outros animais, como os ratos.

A organização do espaço tem uma vertente natural – não é só o homem


que cria a paisagem. Há fatores físicos que interferem na distribuição das
espécies e na organização do espaço. Por exemplo, nas altas montanhas, a
distribuição das plantas está diretamente ligada às faixas de temperatura.
Podemos observar isso nas serras de Santa Catarina, que não são tão altas, mas
que mostram essa distribuição claramente. Outro exemplo é a distribuição das
temperaturas segundo as latitudes.

Em Santa Catarina, podemos ver uma clara distribuição natural da


vegetação – a floresta ombrófila densa no litoral e nos morros e serras litorâneas,
a floresta de araucária e os campos no planalto, com as suas respectivas
particularidades. O homem não intervém nessa repartição.

Há incontáveis maneiras de estudar a Biogeografia, tanto em excursões


programadas nos cursos de Geografia e Ecologia, como um simples passeio num
jardim e em um quintal. Os jardins e os quintais apresentam uma organização
social e espacial muitíssimo variada e, por isto, são excelentes locais para se
observar pequenos animais e insetos nas relações que travam entre si e com o
ambiente. As comunidades dos jardins e quintais dependem integralmente do
arranjo dos elementos componentes.

8
TÓPICO 1 | OBJETO, OBJETIVOS E CONCEITO DA BIOGEOGRAFIA

A sombra de um arbusto, por exemplo, abriga seres vivos que preferem


locais frescos e com alguma umidade, desde pequenos insetos, como aranhas, e
animais, como minhocas, lesmas e centopeias, e plantas, como os musgos. Durrel
(1989, p. 31) explora o ambiente doméstico numa observação criteriosa e assinala:
“um quintal é um bom lugar para se estudar a história das plantas, uma vez
que estamos, por assim dizer, ‘in situ’ e podemos observar as suas condições
de crescimento, a forma como florescem e dão sementes e quais os animais que
as ajudam ou prejudicam”. Quanto menos perturbação sofreu esse quintal ou
jardim, maior será a diversidade de seres vivos nele abrigada.

As populações em um quintal mudam com as horas do dia, porque


cada ser vivo tem o seu próprio relógio biológico, que interfere no seu
comportamento. Há espécies que preferem as horas mais frescas da manhã e
da tarde, outras aparecem no final da tarde e outras, ainda, só vêm à noite. Nas
horas mais quentes, os indivíduos, normalmente, permanecem em repouso a
fim de resguardar a energia. Nisso inclui-se o homem, com a sua tradicional
sesta após o almoço. No interior das residências também podemos encontrar
padrões biogeográficos bem distintos.

A busca do conhecimento em Biogeografia passa indubitavelmente


pela observação in situ das inter-relações entre os seres vivos e destes com o
ambiente: “a observação do ambiente natural faz parte do cotidiano do ser
humano, de forma mais ou menos consciente. Todavia, no contexto acadêmico,
esta operação deve ser cada vez melhor registrada, organizada e sistematizada”
(BELTRAME, 1999, p. 519).

A Biogeografia é dividida em dois ramos: a Fitogeografia, que estuda


a distribuição espacial e as formas de dispersão das plantas na biosfera; e a
Zoogeografia, que analisa as formas de distribuição e dispersão dos animais.

Esse estudo deveria ser integrado, mas a complexidade dos dois campos
e a preferência do biogeógrafo por um ou outro direcionam as pesquisas, o que
não invalida o outro campo.

No Brasil, de um modo geral, tem-se dispensado mais atenção à


Fitogeografia.

Camargo (1993) aponta várias dificuldades por que a Zoogeografia é


menos estudada: a mobilidade constante dos animais à procura de comida e de
abrigo, a competição entre as populações e dentro delas, os hábitos específicos
de cada espécie, como a vida noturna, o pequeno porte dos animais brasileiros
– com a única exceção da onça. Também podemos juntar aí o pequeno número
de indivíduos por espécie, o que torna uma floresta, por exemplo, quase vazia,
sobretudo de mamíferos.

9
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Não é constante a aproximação do homem de um animal – ou ele foge ou


está bem escondido. O pesquisador tem que acompanhar durante vários dias as
pegadas, as fezes e todos os traços deixados pelo animal no hábitat até encontrá-
lo. Há lugares específicos frequentados pelos animais, como locais em que vão
dessedentar-se em rios. E eles têm períodos próprios para ir a esses lugares,
geralmente, ao cair da noite.

Por esta razão é importante conhecer pessoas que vivam nas proximidades
desses biótopos. Elas, de modo geral, têm algum conhecimento dos hábitos dos
animais. Os lugares mais indicados para se encontrar um animal ou ave são os
ecótonos, uma faixa de transição entre ecossistemas diferentes – que não deve ser
confundido com zonas de conflito ou de tensão ecológica, quando uma ou mais
espécies tentam se impor sobre outras, em clara competição pelo espaço.

O estudo da vegetação é facilitado, porque as plantas são fixas e permitem


melhor observação, que consiste, principalmente, nas suas relações com o clima,
o relevo e o solo. (CAMARGO, 1993).

A Fitogeografia estuda as relações das plantas com os fatores físicos e


bióticos dos biótopos. A flora é um tema da Botânica, mas não pode ser esquecido
pela Fitogeografia. O enfoque biogeográfico não é biológico, mas procura
relacionar as espécies de plantas – e de animais – com o meio em que se encontram.

Finalmente, o objetivo da Biogeografia é estudar a repartição dos seres


vivos na face da Terra e criar as bases conceituais para que a sua compreensão
possa conduzir ao conhecimento dos hábitos e do comportamento das espécies,
permitindo que as pesquisas se estendam até o âmbito da qualidade de vida para
as outras espécies e, por extensão, para o próprio homem.

10
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico você estudou que:

• A Biogeografia explica a distribuição dos seres vivos no espaço organizado. O


dinamismo da expansão e distribuição das espécies na biosfera é muito complexo
e envolve conceitos da Geografia, da Ecologia, da Biologia, da Climatologia, da
Hidrologia e muitas outras disciplinas, inclusive as ligadas à Geografia Humana.

• A Biogeografia considera o espaço geográfico organizado para explicar as causas


e as consequências da distribuição das espécies. Para isso, tem que considerar o
passado e, com ele, explicar o presente.

• Para Mielke (1988, p. 1), a Biogeografia “é o estudo científico dos padrões globais
dos animais e das plantas”.

• A Biogeografia estuda “as interações, a organização e os processos espaciais do


presente e do passado, dando ênfase aos seres vivos – biocenoses – que habitam
determinado local: o biótopo”.

• A Biogeografia pesquisa as razões da distribuição dos organismos, das


comunidades vivas (biocenoses) e dos ecossistemas nas paisagens, países e
continentes do mundo. A estrutura, a função, a história e os fatos indicadores
sobre espaços são o objetivo dos estudos biogeográficos.

• A tarefa do biogeógrafo é buscar respostas para essas indagações e procurar regras


gerais que as expliquem e, dessa forma, construir uma rede de conhecimentos que
possa ser usada em predições para o futuro das espécies, incluindo a humana.

• O tempo é importante na Biogeografia. Ele tem duas escalas diferentes – a escala


do homem e a escala dos tempos geológicos

• Conhecer a distribuição atual das espécies implica no estudo da sua evolução.


Não apenas situar as espécies em uma determinada época geológica, mas,
sobretudo, compreender o papel delas nos biótopos pretéritos.

• As diferenças entre o ecossistema e o geossistema começam aqui – a escala. O


ecossistema não é um lugar físico na natureza, mas, sim, um conjunto de relações
ecológicas, que não pode ser mapeada, porque não tem dimensão espacial,
muito embora essas relações se deem no espaço geográfico. O geossistema tem
dimensão e pode ser representado cartograficamente.

11
• A Biogeografia é dividida em dois ramos: a Fitogeografia, que estuda a distribuição
espacial e as formas de dispersão das plantas na biosfera; e a Zoogeografia, que
analisa as formas de distribuição e dispersão dos animais.

• O enfoque biogeográfico não é biológico, mas procura relacionar as espécies de


plantas – e de animais – com o meio em que se encontram.

12
AUTOATIVIDADE

1 O que estuda a biogeografia e quais os dois principais ramos em que ela


se divide?

2 Acerca do objeto, objetivo e conceito da Biogeografia, coloque V para as


afirmativas verdadeiras e F para as falsas e em seguida assinale a alternativa
que apresenta a sequência correta.

( ) As primeiras abordagens biogeográficas, desde o século XIX até cerca de


meados do século XX, apoiavam-se na Biologia e na Ecologia.
( ) A Biogeografia considera o espaço geográfico organizado para explicar as
causas e as consequências da distribuição das espécies. Para isso, tem que
considerar o passado e, com ele, explicar o presente.
( ) A Biogeografia pesquisa as razões da distribuição dos organismos, das
comunidades vivas (biocenoses) e dos ecossistemas nas paisagens, países
e continentes do mundo. A estrutura, a função, a história e os fatos
indicadores sobre espaços são o objetivo dos estudos biogeográficos.
( ) A Biogeografia não estuda apenas a distribuição das espécies, mas,
também, as interações dos seres vivos entre si e com o meio em que vivem,
tal como se faz na Ecologia.
( ) A Biogeografia é dividida em dois ramos: a Fitogeografia, que estuda a
distribuição espacial e as formas de dispersão das plantas na biosfera; e a
Zoogeografia, que analisa as formas de distribuição e dispersão dos animais.

A sequência CORRETA é:

a) ( ) V – V – V – V – V.
b) ( ) F – V – F – V – V.
c) ( ) V – F – V – V – F.
d) ( ) V – V – V – F – V.

13
14
UNIDADE 1
TÓPICO 2

A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico estudaremos assuntos relacionados ao ecossistema e ao
geossistema.

2 ECOSSISTEMA E GEOSSISTEMA
A unidade funcional da biosfera na visão da Ecologia é o ecossistema.
Na visão geográfica, o espaço acha-se integrado à biosfera e é constituído por
geossistemas (DUVIGNEAUD, 1980, p. 99; TROPPMAIR, 2002, p.100), formados
por um mosaico de ecossistemas.

O termo geobiocenose foi proposto pelo pedólogo russo Soukatchev em


1947 e é semelhante ao conceito de ecossistema. Subentende uma visão espacial
do ecossistema, a partir do conceito de paisagem ecológica, expressão criada
por Berg, em 1931, na Rússia. Berg definiu a paisagem ecológica como “[...] uma
combinação ou agrupamento de objetos e de fenômenos, em que o relevo, o clima,
a água, o solo, a cobertura vegetal, a vida animal e, ainda, a atividade humana, se
combinam num todo harmonioso, repetindo-se de forma típica ao longo de uma
área territorial”. (DUVIGNEAUD, p. 102).

Troppmair (2002) assevera que as geobiocenoses têm uma componente


orgânica – os seres vivos – e uma inorgânica – o biótopo, “[...) o elemento espacial,
suporte da geobiocenose [...]”.

A Ecologia estuda a transferência de matéria e energia no âmbito dos


ecossistemas e esse movimento cria uma complexa rede de inter-relações.

A Geografia estuda, por sua vez, a distribuição espacial dos ecossistemas


no sistema geográfico, ou geossistema. Na verdade, não se pode falar de
distribuição espacial dos ecossistemas, unicamente, porque eles não têm escala,
dimensão. Um ecossistema não ocupa lugar no espaço, porque é uma rede de
inter-relações e não um elemento concreto.

15
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

O homem é um componente da cadeia alimentar do ecossistema. Logo, é


visto, pela Ecologia, como um produtor e consumidor de energia. Mas sociedade
humana também é a paisagem geográfica organizada e cria paisagens diferentes.

A cultura é um elemento do desenvolvimento cultural, transmitida


coletivamente e própria da sociedade humana. É ela que diferencia o homem dos
demais animais. Para Drew (1994, p.1), “a tradição cultural tem desempenhado
o seu papel na determinação do comportamento das pessoas em relação ao
ambiente”. Sem dúvida, é um elemento indispensável na análise da dimensão
antropocêntrica de um geossistema.

É o homem um componente biótico da cadeia alimentar ou é um


componente à parte, situado fora do geossistema, mas que o altera? Ou poderá
ser os dois, simultaneamente? Essas dúvidas foram levantadas na década de 1950
e, até agora, a Geografia não encontrou uma resposta.

Inicialmente, os estudos biogeográficos foram realizados por biólogos


– e muitos ainda o são. Mas a Ecologia não estuda a distribuição das espécies,
mas, apenas, a sua localização, situando-as nos diversos biomas. A Geografia tem
outra concepção – ela considera a constituição do espaço geográfico, uma vez que
introduz um componente espacial, que foge aos conceitos ecológicos. (SCHÄFER,
1984 p. 37; CAMARGO, 1993).

O ecossistema é a componente biológica do geossistema – que é físico.


Troppmair (1984, apud CAMARGO, 1993) justifica o estudo dos ecossistemas na
Geografia "[...] estudando a distribuição, a estrutura e a organização espacial dos
compoentes bióticos e abióticos. Desse ponto de vista, o ecossistema passa a ser
um subsistema do geossistema, pois a distribuição e a organização espacial dos
diferentes ecossistemas, seja na forma, função e estrutura, compõem um mosaico
que é a própria ‘paisagem’, objeto de pesquisa geográfica”.

3 O ENFOQUE SISTÊMICO
O objetivo deste tópico é servir como um ponto de partida e apoio para
a compreensão dos processos e mecanismos integrados, que se verificam na
biosfera e que nortearão a linha filosófica do Caderno de Estudos.

A organização espacial dos sistemas naturais e humanos depende


fundamentalmente da importação e da exportação da energia e da matéria. A
organização espacial dos geossistemas é fruto dessa importação e exportação de
energia e matéria. Ela compõe a paisagem geográfica organizada, integrada.

16
TÓPICO 2 | A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA

Os estudos da paisagem não são recentes na Geografia. Alexandre von


Humboldt (1769-1859) e Karl Ritter (1779-1859) afirmavam que o homem e a natureza
se completavam. Vidal de La Blache (1845-1918) mostrou a interdependência dos
fatores físicos e do homem na natureza, cujo fundamento está em Humboldt e Ritter
(BROECK, 1981 p. 37; CHRISTOFOLETTI, org., 1982, p. 43; Moraes, 1986 p. 61; Müller
Filho, 1988). Para De La Blache, a influência mútua homem-natureza constitui “[...]
um todo integrado, interagente e interdependente [...], (MÜLLER FILHO, 1988, p.
1-21). Dessa forma, de La Blache criou as bases do possibilismo geográfico.

Contudo, na concepção de La Blache, os fatores físicos sobressaíam-se aos


humanos e deveriam ser tratados em primeiro lugar. Só depois de analisados fatores
físicos, os humanos seriam incluídos, porque entravam para alterar o quadro físico.
Por isto, ele separava os aspectos naturais e humanos em dois blocos distintos e
fechados, que não se comunicavam. Mas, na sua visão, o papel da geografia não era
estático. A ideia de La Blache era uma sobreposição de fatos e não de integração.

O final da Segunda Guerra Mundial foi um novo renascimento para


a humanidade. As relações da sociedade com a natureza tornaram-se mais
complexas e se davam com extrema rapidez. A Geografia Regional de La Blache
não conseguia acompanhar as mudanças.

As pesquisas integradas na Geografia foram primeiramente elaboradas


pelo geógrafo alemão Carl Troll (1899-1975). Firmando-se nos conceitos de troca de
energia entre sistemas – a sinergia – que a Ecologia já usava desde a década de 30 –
e que a Geografia só descobriu em fins dos anos 40 e início dos 50, graças aos seus
trabalhos, ele mostrou como os elementos se interligavam para obter um resultado.

Ele observara, perto de Munique, Alemanha, que, em algumas pequenas áreas,


havia apenas uma cobertura vegetal de caráter xerófito, que se destacava por completo
da vegetação de floresta de clima temperado úmido (Troppmair, 2001). Troll constatou
que a vegetação xerófita nascera num solo pedregoso de origem glacial trazido pelo
escoamento da água do degelo na primavera. Levados pelo escoamento e rios, os
sedimentos foram depositados no sopé dos morros nos arredores de Munique.

O solo formado era pobre em nutrientes e em água e a vegetação era


um reflexo dessas condições. Levantou ele, então, a hipótese de que quadros
semelhantes deveriam ocorrer em outras partes do mundo. Suas viagens pelos
Andes, África e Ásia confirmaram a sua hipótese.

Em 1939, Troll concluiu de suas pesquisas que:


"Toda biocenose está vinculada a condições ambientais e tem
características que dão origem a um tipo de paisagem [...]" e que "[...] toda
biocenose bem característica e marcante é um sistema ecológico onde clima, solo,
água, plantas e animais são funcionalmente interligados, formando um sistema
maravilhosamente integrado" (in Troppmair, Id.).

17
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

O trabalho de Troll, em Munique, foi feito com observações de campo e


com fotografias aéreas, em 1928/29 – ele foi pioneiro no uso da fotointerpretação
(Troppmair). Em 1937 ele apresentou as suas conclusões na Associação de Ciências
da Terra, na Alemanha, que tiveram enorme repercussão entre os geógrafos,
geólogos e outros pesquisadores das geociências. Um ano mais tarde ele publicou
um trabalho intitulado Fotointerpretação e Pesquisa Ecológica, defendendo o uso
de fotografias aéreas nos trabalhos ecológicos. Nesse trabalho, Troll utilizou pela
primeira vez o termo Landschaftsoekologie, ou ecologia da paisagem ou, ainda,
geoecologia (CHRISTOFOLETTI, 1981; KLINK, 1981, TROPPMAIR, 1985).

3.1 O GEOSSISTEMA: A ORGANIZAÇÃO ESPACIAL


Os elementos constitutivos da paisagem integrada agrupam-se em
unidades homogêneas em si mesmas, contudo, heterogêneas em relação ao
conjunto. Essas unidades recebem inúmeras denominações: geossistemas
geocomplexos, sistemas geográficos, sistemas naturais territoriais, dentre outras.

Viktor Sochava (1905-1978) empregou o método sistêmico, desenvolvido pelo


biólogo austríaco Ludwig von Bartalanffy (1901-1972), para desenvolver o conceito
de geossistema (Monteiro, 1996). O conceito de geossistema é fundamentalmente
físico (SOCHAVA,1977; ORELLANA, 1985). A análise de sistemas investiga um
todo unificado, formado por partes integradas, que se completam. Desta forma, é
um excelente método para o estudo da paisagem geográfica.

O geossistema é estruturado por processos dinâmicos que lhe conferem


um estado momentâneo e característico. Os processos que dinamizam os
geossistemas são de ordem biótica e abiótica e sua ação origina arranjos espaciais
que “[...] formam um mosaico que é a própria organização do espaço geográfico”.
(TROPPMAIR, 1989, p. 125).

Troppmair (2002, p. 99) define o geossistema como “[...] um espaço que


se caracteriza pela homogeneidade dos seus componentes, suas estruturas,
fluxos e relações que, integrados, formam o sistema do ambiente físico e onde há
exploração biológica.”

Sochava define como “[...] sistemas naturais, de nível local, regional ou


global, nos quais o substrato mineral, o solo, as comunidades de seres vivos, a
água e as massas de ar, particulares às diversas subdivisões da superfície terrestre,
acham-se interconectadas por trocas de matéria e energia, em um só conjunto”.
(ROUGERIE; BEROUTCHACHVILI, 1991, p. 59).

18
TÓPICO 2 | A POSIÇÃO DA BIOGEOGRAFIA NA CIÊNCIA GEOGRÁFICA

Para Monteiro (1994), o geossistema é uma organização espacial geográfica,


que forma um conjunto só entre o homem e o meio biótico e abiótico. Por esta razão,
Monteiro “[...] evita a consideração das relações entre a natureza e sociedade em
termos de antagonismo entre sistemas oponentes [...] (1994), pois, na sua opinião, o
geossistema é um “[...] sistema singular, do tipo complexo, evolutivo e cibernético.
O homem - parte integrante da natureza – [...] deve ser capaz de ser um elemento
catalisador do jogo de relações e capaz de introduzir circuitos positivos de ‘feed-
back’ regeneradores e autorreguladores do sistema”. (1994).

O conceito de geossistema não está fechado – ainda se discutem as suas


implicações na evolução da paisagem e o seu relacionamento com o homem e
demais variáveis bióticas. Ao considerá-lo um paradigma da Geografia Física,
Monteiro (1994) afirma que “[...] mais de três decênios (35 anos de 1960 a 1995)
são passados e a ideia dos ‘geossistemas’ continua em progressão”.

A estrutura, a hierarquia e o funcionamento do geossistema dependem da


quantidade e da qualidade da energia importada. Os fluxos de energia organizam
a distribuição das espécies e, desta forma, a expansão dos seres vivos não se dá ao
acaso. Há fatores muito complexos (que estudaremos mais tarde) que a governam.

O estudo da organização espacial é um diagnóstico do estado atual do


geossistema enfocado. A representação cartográfica é essencial na síntese da
análise geossistêmica, ao integrar dados obtidos nas diversas fontes utilizadas na
pesquisa. As técnicas de geoprocessamento são essenciais hoje em dia para dar
suporte à pesquisa.

A aplicação do modelo geossistêmico, embora fundamental nos estudos


geográficos e biogeográficos, especialmente, ainda é um grande desafio na
sua concepção como na sua aplicação. Monteiro (1994) aponta três grandes
dificuldades nesta abordagem, mas que devemos vê-las como desafios da
Geografia atual. São elas:

• incorporação das ações antropogênicas, sugerindo o levantamento de medidas


de precaução e a apresentação de medidas preventivas das aptidões do
geossistema em estudo;
• a prática da interdisciplinaridade, “isto é, quando várias disciplinas interagem
de modo convergente para um propósito superior a todas elas” (p. 90);
● a comunicação visual dos resultados obtidos, que, em geral, requer mais do que
a representação cartográfica.

Monteiro (1994) salienta ainda que os componentes naturais podem, muitas


vezes, ser superados pela “antropização” do geossistema, especialmente em áreas
urbanizadas e industrializadas, o que representa outro desafio para o geógrafo.

19
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você estudou que:

• Na visão geográfica, o espaço acha-se integrado à biosfera e é constituído por


geossistemas.

• Inicialmente, os estudos biogeográficos foram realizados por biólogos – e


muitos ainda o são. Mas a Ecologia não estuda a distribuição das espécies,
apenas a sua localização, situando-as nos diversos biomas.

• A Geografia tem outra concepção – ela considera a constituição do espaço


geográfico, uma vez que introduz uma componente espacial, que foge aos
conceitos ecológicos.

• O ecossistema é a componente biológica do geossistema – que é físico.

• O objetivo do enfoque sistêmico é servir como um ponto de partida e apoio


para a compreensão dos processos e mecanismos integrados, que se verificam
na biosfera e que nortearão a linha filosófica do Caderno de Estudos.

• Os elementos constitutivos da paisagem integrada agrupam-se em unidades


homogêneas em si mesmas, contudo, heterogêneas em relação ao conjunto.
Essas unidades recebem inúmeras denominações: geossistemas geocomplexos,
sistemas geográficos, sistemas naturais territoriais, dentre outras.

• O geossistema é estrutura por processos dinâmicos que lhe conferem um estado


momentâneo e característico. Os processos que dinamizam os geossistemas são
de ordem biótica e abiótica e sua ação origina arranjos espaciais que “[...] formam
um mosaico que é a própria organização do espaço geográfico” (TROPPMAIR,
1989, p. 125).

• O geossistema é uma organização espacial geográfica, que forma um conjunto


só entre o homem e o meio biótico e abiótico.

20
AUTOATIVIDADE

1 Caracterize três grandes desafios em estudos geográficos através da


abordagem geossistêmica.

2 A unidade funcional da biosfera na visão da Ecologia é o ecossistema. Na


visão geográfica, o espaço acha-se integrado à biosfera e é constituído por
geossistemas formados por um mosaico de ecossistemas. Diante do exposto
e com base no estudo realizado neste tópico, analise as afirmativas a seguir.

I. O termo geobiocenose foi proposto pelo pedólogo russo Soukatchev em 1947


e é semelhante ao conceito de ecossistema.
II. A Ecologia estuda a transferência de matéria e energia no âmbito dos
ecossistemas e esse movimento cria uma complexa rede de inter-relações.
III. A Geografia estuda, por sua vez, a distribuição espacial dos ecossistemas
no sistema geográfico ou geossistema.
IV. Um ecossistema não ocupa lugar no espaço, porque é uma rede de inter-
relações e não um elemento concreto.
V. O homem é um componente da cadeia alimentar do ecossistema. Logo, é
visto, pela Ecologia, como um produtor e consumidor de energia.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, II, III e IV.


b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, III e V.
c) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas III e IV.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

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UNIDADE 1
TÓPICO 3

A BIOSFERA

1 INTRODUÇÃO
Caro(a) acadêmico(a), neste tópico abordaremos temas referentes à
Biosfera, como: conceito, limites, fontes de energia, fluxos de energia e nutrientes
(ciclos biogeoquímicos).

2 CONCEITO E LIMITES DA BIOSFERA


A biosfera é a camada do planeta capaz de ser habitada por organismos. Divide-
se em hidrosfera, troposfera (camada mais inferior da atmosfera) e a parte superior da
litosfera, compreendendo uma faixa ou camada do globo terrestre que não ultrapassa
os 20 quilômetros de espessura.

O termo biosfera foi introduzido na ciência em 1875, pelo geólogo


austríaco Eduard Suess. O russo Vladimir Ivanovitch Vernadsky usou o termo
numa conferência em 1929 e, desta forma, o conceito de biosfera chegou ao
Ocidente (Hutchinson, in Scientific American, 1972, p. 3).

É quase impossível demarcar os limites da biosfera – traçar esses limites é


desenhar a própria fronteira da vida.

É muito difícil demarcar os limites da biosfera. Formas simples de vida, como


esporos e bactérias, vivem a 8 ou 9 quilômetros de altura, camada em que o oxigênio
é mínimo e a temperatura está por volta de 60º C abaixo de zero. Nos oceanos, a luz
alcança cerca de 200 metros de profundidade, o que é o limite para as plantas que fazem
a fotossíntese. Nas fossas submarinas, a mais de 10 quilômetros de profundidade,
pequenos organismos vivem no limite da sobrevivência. Na superfície dos continentes,
os desertos quentes e frios, as crateras de vulcões, as fontes termais, onde a água atinge
temperaturas de 80º C, são lugares em que a vida está no seu limite. Dentre estes
lugares, estão os picos de montanhas com "neves perpétuas" e lugares muito quentes
e áridos. O limite do oxigênio é cerca de 6.000 metros de altitude, o que obriga aos
alpinistas o uso de equipamento especial. Hutchinson (in Scientific American, 1972, p.
4) chama essas zonas de parabiosféricas.

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UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

3 AS FONTES DE ENERGIA DA BIOSFERA


A principal fonte de energia para a Terra é o Sol. Sua energia calorífica
e luminosa espalha-se de forma desigual pela superfície, unicamente devido à
forma globular do planeta. As latitudes e as altitudes criam variações diárias de
luz e calor e os distribuem de forma irregular na superfície, e isto é uma das
condições para a expansão das espécies.

As leis da Termodinâmica dirigem o papel da energia na biosfera. A


energia não pode ser criada nem destruída, apenas pode ser convertida para outra
forma – postula a primeira lei, a Lei da Conservação da Energia. Quando uma
dada quantidade de energia muda de forma, ocorre uma perda da quantidade
total de energia usada antes, que se dissipa na forma de calor. A segunda lei, a Lei
da Dissipação da Energia, explica essa perda.

FIGURA 1 – A BIOSFERA E OS SEUS SUBSISTEMAS

Atmosfera
Atmosfera Hidrosfera

Litosfera Hidrosfera

Plantas Animais Plantas Animais

FONTE: Os autores

A luz emitida do Sol compõe-se de vários comprimentos de onda, que


originam o espectro eletromagnético da luz. Isaac Newton (1643-1727) foi o
primeiro cientista a observar a luz solar decomposta nas suas diversas faixas de
luz diferentes. Ele chamou as faixas de espectro. Newton mostrou que a luz não
era formada apenas por luz branca, como se supunha até então.

Ao atravessar a atmosfera, a radiação solar sofre modificações e perde


considerável parte da quantidade total com que chega ao topo da atmosfera. As
moléculas e os íons dos gases, as partículas de poeira, o vapor d'água, as nuvens
são agentes que modificam a energia incidente.

Eis alguns dados sobre a energia solar (TUBELIS & NASCIMENTO, 1984,
p. 31; AYOADE, 1994, p. 23):

- 56 x 1026 calorias são irradiadas pelo Sol por minuto nas formas seguintes:
- radiação ultravioleta (comprimento de onda menor que 0,4 µm) - total de 9%
recebido pela Terra;

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TÓPICO 3 | A BIOSFERA

- radiação visível (de 0,4 a 0,7 µm) - total de 41%;


- radiação infravermelha (maior que 0,7 µm) - total de 50%;
- a Terra intercepta 2,55 x 1018 cal - meio milionésimo do total, mas cerca de 30 mil
vezes mais energia do que o total anual que a humanidade produz e consome;
- constante solar: total de energia que incide numa superfície de 1 cm2 do topo da
atmosfera por minuto. Equivale, aproximadamente, a 2cal/cm2/min. A energia solar
gasta 9,5 minutos para percorrer os 150 milhões de quilômetros entre a Terra e o Sol.

Cerca de 98% da energia incidente se perdem e a biosfera absorve apenas


2% deste total, conforme explica a Lei da Conservação da Energia.

A energia radiante que chega à superfície da Terra é formada, num


dia claro, por 45% de luz visível, 45% de infravermelho e 10% de ultravioleta.
(ODUM, 1985).

4 OS FLUXOS DE ENERGIA E NUTRIENTES NA BIOSFERA: OS


CICLOS BIOGEOQUÍMICOS
As formas da matéria na biosfera são pouco variadas – gasosa, sólida ou
líquida. A matéria transita na biosfera em círculos, ao contrário da energia, que tem
apenas uma direção. O intemperismo é uma das formas de movimento dos materiais.

O escoamento superficial transporta grandes quantidades de detritos,


provenientes do desgaste do solo e das rochas, que são depositadas nos vales e
nos leitos dos rios. É um processo contínuo de exportação e importação de matéria
pelos geossistemas. A decomposição orgânica gera uma enorme quantidade
de elementos e compostos químicos, como nitratos, fosfatos, sulfatos, ácidos
orgânicos e elementos livres, como o enxofre, o carbono etc., que são prontamente
absorvidos pelas plantas.

Tudo começa com a absorção da energia solar pelas plantas clorofiladas.


Esse início determina como a energia solar entra na biosfera e sofre modificações
na sua forma, qualidade e quantidade. Esse trajeto é denominado cadeia trófica e
tem várias etapas.

Na fotossíntese, as plantas verdes produzem carboidratos, que, mais


tarde, são usados como fonte de energia para o metabolismo da planta. As plantas
verdes são chamadas de produtores primários. São autótrofas, porque produzem
sua própria fonte de energia.

Os herbívoros alimentam-se das plantas – são os consumidores de primeira


ordem. Os carnívoros alimentam-se dos herbívoros e são os consumidores de
segunda ordem. Há também os decompositores, micro e macro-organismos,
que degradam ou mineralizam os restos orgânicos e compõem um importante
papel na reciclagem dos nutrientes. Todos esses são heterótrofos, isto é, a fonte
de energia é externa a eles.
25
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Na fotossíntese, a energia solar ou energia dispersa é transformada em


matéria ou energia concentrada. A primeira lei da Termodinâmica explica essa
transformação. É chamada de Lei da Conservação da Energia. Esse processo
constitui a primeira etapa da fabricação de matéria na biosfera. Por isto é
denominada de produção primária. Representa a quantidade de tecidos orgânicos
produzida pelas plantas.

Apenas 2% da energia solar são absorvidos pela biosfera – 98% se perdem.


O total absorvido, nada mais que 0,1%, é usado na fotossíntese. Não obstante esse
valor tão baixo, as plantas produzem de 150 bilhões a 200 bilhões de toneladas de
matéria orgânica seca por ano.

Esse mecanismo complexo representa a única forma de manter a energia


nos ecossistemas. A transformação de uma forma de energia – energia solar – para
outra – a matéria ou energia concentrada – implica numa perda ou dissipação da
energia, que supera 90% do total. Portanto, apenas 10% da matéria produzida
num nível trófico são usados no nível trófico seguinte.

Os nutrientes minerais têm outro processo. A energia tem um fluxo


contínuo numa direção apenas – ele não volta sobre si mesmo. Mas os minerais
circulam livremente na biosfera. Esse movimento circular permite que os
nutrientes sejam usados várias vezes pelos seres vivos, antes de se dispersarem
nos sedimentos, na água ou na atmosfera.

Os nutrientes deixam os ecossistemas na forma de biomassa. A dispersão


da biomassa é feita por três caminhos:

- como matéria orgânica morta, que vai ser degradada pelos decompositores,
na forma de restos vegetais, e na forma de outros produtos exportados (pólen,
sementes, gases, líquidos etc.);
- serapilheira, restos vegetais decompostos, que serão transformados em húmus
pelos saprófagos – isto constitui o ciclo curto;
- transformação dessa matéria orgânica em nutrientes por fungos e bactérias.

As plantas reabsorvem os nutrientes e o ciclo é fechado, para recomeçar


em seguida.

O ciclo longo inclui todos os consumidores (parasitas, herbívoros,


onívoros e carnívoros). Embora este ciclo seja menos representativo em termos
de quantidade de matéria orgânica reciclada, os consumidores são considerados
os reguladores de todo o sistema: “A sobreposição dos circuitos reguladores
forma as cadeias alimentares. O ciclo longo é formado por uma sucessão dessas
cadeias, que garantem, apesar das flutuações, o alto grau de estabilidade média
do ecossistema”.

O fluxo de gás carbônico proveniente dos processos de decomposição da


serapilheira e do húmus é conhecido como respiração do solo.

26
TÓPICO 3 | A BIOSFERA

Os ciclos são relativamente estáveis, mas estão sujeitos a flutuações,


provocadas pela quantidade de matéria que entra no sistema, por pragas,
moléstias, queimadas, escoamento superficial, nevascas, vendavais etc. Walter
(1986, p. 9) cita, por exemplo, que o pastoreio moderado em pradarias “[...]
também estimula o crescimento vegetativo das gramíneas, a ponto de aumentar
a produção anual total” de biomassa vegetal (fitomassa), incluindo a quantidade
consumida pelos animais.

A ciclagem dos elementos é a essência do funcionamento do ecossistema.


Nos ecossistemas terrestres, elementos essenciais circulam nos detritos que
recobrem o solo. No meio aquático, as fontes de nutrientes são os sedimentos.

Odum (1985, p. 27) ilustra bem a importância desta reciclagem, ao


afirmar que:
“(...) a degradação da matéria orgânica é um processo longo e
complexo, controlando várias funções importantes no ecossistema.
Por exemplo: (1) recicla os nutrientes através da mineralização da
matéria orgânica morta; (2) (ligação entre íons metálicos e moléculas
orgânicas) e complexa (ligação metal-carbono) nutrientes minerais;
(3) recupera nutrientes e energia por ação microbiana; (4) produz
alimento para uma sequência de organismos na cadeia alimentar de
detritos; (5) produz metabólitos secundários que podem ser inibidores
ou estimuladores e que são, muitas vezes, reguladores; (6) modifica os
materiais inertes da superfície terrestre, produzindo, e.g., o complexo
característico da terra que é o ‘solo’; e (7) mantém uma atmosfera que
permita a vida de aeróbios de grande biomassa, como nós.”

A ciclagem dos nutrientes é mais conhecida como ciclos biogeoquímicos,


porque deles fazem parte tanto componentes bióticos quanto abióticos. Os ciclos
biogeoquímicos são de dois tipos: ciclos gasosos, cujo reservatório é a atmosfera,
e ciclos sedimentares, em que a crosta terrestre é o reservatório.

Os nutrientes variam em quantidades usadas pelos seres vivos. Por


esta razão, foram classificados em duas categorias: os macronutrientes e os
micronutrientes.

Os macronutrientes existem em maior quantidade, porque as plantas os


usam em grande quantidade. Os micronutrientes são elementos de que as plantas
têm menor necessidade – embora, igualmente, sejam imprescindíveis – e, por
isto, ocorrem em menor quantidade na natureza.

Esses elementos são de origem natural. Contudo, o homem tem


introduzido nos ciclos elementos artificiais ou não, que não fazem parte da
matéria orgânica, que Odum denomina elementos não essenciais (1985, p.132).
Esses elementos provêm de indústrias, da mineração, da agricultura e contêm
concentrações mais ou menos elevadas de metais e compostos orgânicos tóxicos
e, sobretudo, elementos radioativos.

27
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Por não fazerem parte da matéria orgânica, os elementos não essenciais


não são eliminados pelos mamíferos e acabam por se concentrar neles em órgãos
como o fígado, rins, pulmões, coração, no cérebro e nas gorduras e nos músculos.

Na crosta terrestre ocorrem 90 elementos químicos. Deste total, 30 são


fundamentais para os organismos – são os macronutrientes. Carbono – que aparece
no dióxido de carbono, CO2, e é a base da matéria orgânica – hidrogênio, oxigênio
e nitrogênio são essenciais para a vida na Terra. Os demais macronutrientes são:
potássio, cálcio, magnésio, fósforo, enxofre, ferro e manganês, que fazem parte
dos ciclos sedimentares. O dióxido de carbono, o hidrogênio, o oxigênio e o
nitrogênio são elementos gasosos e ocorrem na atmosfera da Terra.

Os macronutrientes ou oligonutrientes são: boro, magnésio, zinco, cobre,


molibdênio, ferro (que também pode ser macro) e cloro.

Homeostase em ecossistemas e geossistemas

A energia flui nos ecossistemas e nos geossistemas de maneiras diferentes.


Esse movimento da energia está estreitamente vinculado às estruturas funcionais
dos ecossistemas e dos geossistemas – ou melhor, da Ecologia e da Geografia.
A Ecologia tem um fluxo no sentido vertical – os ciclos biogeoquímicos, a
cadeia trófica, as relações sociológicas, a decomposição orgânica, são alguns dos
processos ecológicos. A Geografia tem um fluxo horizontal, que se dá no espaço
geográfico organizado.

A paisagem geográfica é representada pelos geossistemas, uma unidade


natural, física. Os geossistemas são formados pela união de elementos bióticos
e elementos abióticos. Os ecossistemas constituem os elementos bióticos do
geossistema. A integração dos elementos físicos do geossistema e dos elementos
bióticos do ecossistema origina a organização espacial dos geossistemas. Em
outras palavras, a paisagem geográfica organizada.

Conforme Margalef (1989, p. 739), todas as interações da biosfera se dão no


interior dos geossistemas e dos ecossistemas. Na Ecologia, as interações
acontecem num único ponto, pois que os ecossistemas não têm escala.
Por outro lado, as inter-relações ecossistêmicas, no geossistema, ocorrem,
pois, no espaço geográfico. Logo, essas inter-relações se distribuem pelo
espaço geográfico. Segundo Walter (1986, p. 8), juntando-se aos fatores
físicos do geossistema, criam a paisagem geográfica. É um mecanismo
muito complexo, contínuo, em que o ambiente age sobre os organismos e
os organismos agem sobre o ambiente.

A sucessão vegetal é um dos componentes da organização espacial dos


geossistemas. As relações das plantas com o meio e com outros seres vivos são
de ordem ecológica. A expansão espacial é um ponto de vista geográfico. As
relações sociológicas são outro meio de expansão das plantas. Por exemplo, a
polinização das flores.

28
TÓPICO 3 | A BIOSFERA

Logo, existe um fluxo de energia e matéria no sentido horizontal no


interior dos geossistemas e um fluxo no interior dos ecossistemas no sentido
vertical. Cada um deles com um resultado diferente, que, entretanto, converge
para a organização espacial.

O ecossistema não é espacial. É, na verdade, um conjunto de relações


ecológicas que se manifestam no interior dos geossistemas. Não é espacial, porque
não tem escala – aspecto fundamental nas diferenças entre a Geografia e a Ecologia.

Os geossistemas e os ecossistemas importam energia e também a


exportam, como todo sistema aberto. O calor é a principal forma de energia
dissipada por ambos. A transpiração das plantas e dos animais é uma das formas
de dissipação da energia. A lixiviação dos elementos e compostos solúveis é outra
forma. Por outro lado, também há um ganho de energia quando os nutrientes são
incorporados ao solo ou são absorvidos pelas raízes. A captação da luz para a
fotossíntese das plantas é outra forma de importação de energia.

As quantidades de energia importadas e exportadas pelos sistemas


são relativamente semelhantes. Esse mecanismo mantém os sistemas, como o
geossistema e o ecossistema, em equilíbrio dinâmico. Por esta razão, os sistemas
abertos funcionam em estado estacionário.

O funcionamento do geossistema e do ecossistema está na dependência


da quantidade e da qualidade da energia importada. Quando a importação
muda, ocorre um desequilíbrio no sistema. – o equilíbrio dinâmico é rompido e o
sistema altera o seu funcionamento. Nesse momento entram em cena mecanismos
de reajuste ou de retroalimentação, que procuram reequilibrar o sistema.

O sistema equilibrado tem um dado grau de homeostase, isto é, sua


estrutura ajusta-se às mudanças. Neste caso, as transformações podem ser de dois
tipos – uma vez instaladas, elas podem prosseguir até alterar totalmente o sistema,
criando, então, outro sistema; por outro lado, o mecanismo de desequilíbrio
pode ser interrompido, a mudança não avança e o sistema readquire o estado –
fisionomia – anterior. No primeiro caso, temos a retroalimentação positiva – ela
muda por completo o sistema. No segundo caso, predominará a retroalimentação
negativa, que interrompe a mudança e o sistema se reequilibra e volta a ser o
sistema antigo.

A Ecologia também utiliza o termo resiliência, que expressa a capacidade


do sistema em resistir às perturbações, retornando às suas condições originais.
Todo sistema tem um limite de resiliência, de resistência às mudanças. Na
natureza, predomina a retroalimentação negativa. Neste caso, a resiliência do
sistema impede que ele mude totalmente. Para que ocorra a retroalimentação
positiva é necessário que a força introduzida no sistema seja muito poderosa, a
ponto de romper a sua resiliência e mudar a estrutura.

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UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Quando o sistema se reequilibra, dizemos, pois, que é homeostático. Um


exemplo de homeostase pode ser visto no cerrado após a ação do fogo: “[...] são
numerosas as plantas que possuem adaptações ou dispositivos aparentemente
correlacionados ao fogo [...]”. (RIZZINI, 1976, p. 89).

O reequilíbrio dos sistemas naturais depende muito da sua complexidade.


Quanto mais complexo um sistema, maior a sua capacidade de homeostasia. A
complexidade do sistema está intimamente ligada a dois fatores – o número de
elementos e o grau de resistência desses elementos às mudanças.

O intemperismo das rochas e a fertilização artificial são dois exemplos


de reequilíbrio das perdas do solo e fazem com que ele readquira o estado
anterior. O homem é um agente de introdução de energia nos ecossistemas e nos
geossistemas, tanto quanto é também um agente de desequilíbrio. Neste caso,
o homem sempre introduziu atividades que ultrapassam o grau de homeostase
da natureza, o que leva muita gente a tecer prognósticos sombrios quanto ao
futuro da humanidade. Drew (1994 p. 194) já alertava que “É inevitável que, em
data futura, as provisões serão inferiores à demanda, enquanto se vai tomando
consciência de que o crescimento infinito é impossível num mundo finito”. É o
fantasma de Malthus voltando para assombrar a humanidade.

As perspectivas de um desequilíbrio que leve à fome generalizada


no planeta são visíveis, no dizer de muitos pesquisadores. A National Wildlife
Foundation (WWF) estudou a pressão que cada habitante exerce sobre o
planeta quanto ao consumo de alimento, materiais e energia em relação à área
biologicamente produtiva, e não chegou a números otimistas. Foram excluídas
da pesquisa as necessidades de água e a área ocupada por poluição e produtos
tóxicos, por falta de dados globais disponíveis.

Segundo os cálculos da pesquisa, a Terra dispunha de 12,6 bilhões de


hectares de terras produtivas em 1996. São necessários 2,85 hectares/habitante
para satisfazer as demandas individuais. Atualmente somamos mais de 6
bilhões de habitantes no planeta. Multiplicando esse dado pela demanda,
verificamos que já estamos em débito com a biosfera. Seremos 8,9 bilhões no ano
2050 (ÂNGELO, 2000). Quanta terra a mais precisaremos para satisfazer esta
necessidade? Será que as novas tecnologias serão suficientemente adequadas no
sentido de equacionarmos este débito? Esse fato é uma representação da segunda
lei da Termodinâmica. Terá a humanidade, no futuro, meios de introduzir
mecanismos retrorreguladores? Poderá a tecnologia existente compensar essas
perdas e procurar novamente o estado homeostático da natureza, como assegura
a primeira lei da Termodinâmica?

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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você estudou que:

• A biosfera é a camada do planeta capaz de ser habitada por organismos. Divide-


se em hidrosfera, troposfera (camada mais inferior da atmosfera) e a parte
superior da litosfera, compreendendo uma faixa ou camada do globo terrestre
que não ultrapassa os 20 quilômetros de espessura.

• O termo biosfera foi introduzido na ciência em 1875, pelo geólogo austríaco


Eduard Suess.

• A principal fonte de energia para a Terra é o Sol. Sua energia calorífica e


luminosa espalha-se de forma desigual pela superfície, unicamente devido à
forma globular do planeta. As latitudes e as altitudes criam variações diárias
de luz e calor e os distribuem de forma irregular na superfície, e isto é uma das
condições para a expansão das espécies.

• As formas da matéria na biosfera são pouco variadas – gasosa, sólida ou líquida. A


matéria transita na biosfera em círculos, ao contrário da energia, que tem apenas
uma direção. O intemperismo é uma das formas de movimento dos materiais.

• Os ciclos Biogeoquímicos começam com a absorção da energia solar pelas


plantas clorofiladas. Esse início determina como a energia solar entra na
biosfera e sofre modificações na sua forma, qualidade e quantidade. Esse trajeto
é denominado cadeia trófica e tem várias etapas.

• Na fotossíntese, a energia solar ou energia dispersa é transformada em


matéria ou energia concentrada. A primeira lei da Termodinâmica explica essa
transformação. É chamada de Lei da Conservação da Energia. Esse processo
constitui a primeira etapa da fabricação de matéria na biosfera. Por isto, é
denominada de produção primária. Representa a quantidade de tecidos
orgânicos produzida pelas plantas.

• Apenas 2% da energia solar são absorvidos pela biosfera – 98% se perdem. O


total absorvido nada mais que 0,1% é usado na fotossíntese. Não obstante esse
valor tão baixo, as plantas produzem de 150 bilhões a 200 bilhões de toneladas
de matéria orgânica seca por ano.

• O fluxo de gás carbônico proveniente dos processos de decomposição da


serapilheira e do húmus é conhecido como respiração do solo.

31
• A ciclagem dos nutrientes é mais conhecida como ciclos biogeoquímicos,
porque neles fazem parte tanto componentes bióticos quanto abióticos. Os
ciclos biogeoquímicos são de dois tipos: ciclos gasosos, cujo reservatório é a
atmosfera, e ciclos sedimentares, em que a crosta terrestre é o reservatório.

• Os nutrientes variam em quantidades usadas pelos seres vivos. Por esta


razão, foram classificados em duas categorias: os macronutrientes e os
micronutrientes.

• Os macronutrientes existem em maior quantidade, porque as plantas os usam


em grande quantidade. Os micronutrientes são elementos de que as plantas
têm menor necessidade – embora, igualmente, sejam imprescindíveis – e, por
isto, ocorrem em menor quantidade na natureza.

• Na crosta terrestre ocorrem 90 elementos químicos. Deste total, 30 são


fundamentais para os organismos – são os macronutrientes. Carbono –
que aparece no dióxido de carbono, CO2, e é a base da matéria orgânica
–, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio são essenciais para a vida na Terra. Os
demais macronutrientes são potássio, cálcio, magnésio, fósforo, enxofre, ferro,
cobre, manganês, zinco, molibdênio, boro e cloro, que fazem parte dos ciclos
sedimentares. O dióxido de carbono, o hidrogênio, o oxigênio e o nitrogênio
são elementos gasosos e ocorrem na atmosfera da Terra.

• A energia flui nos ecossistemas e nos geossistemas de maneiras diferentes. Esse


movimento da energia está estreitamente vinculado às estruturas funcionais
dos ecossistemas e dos geossistemas – ou melhor, da Ecologia e da Geografia.

• A paisagem geográfica é representada pelos geossistemas, uma unidade


natural, física. Os geossistemas são formados pela união de elementos bióticos
e elementos abióticos. Os ecossistemas constituem os elementos bióticos do
geossistema. A integração dos elementos físicos do geossistema e dos elementos
bióticos do ecossistema origina a organização espacial dos geossistemas. Em
outras palavras, a paisagem geográfica organizada. Portanto, todas as interações
da biosfera se dão no interior dos geossistemas e dos ecossistemas.

• Os geossistemas e os ecossistemas importam energia e também a exportam,


como todo sistema aberto.

• A Ecologia também utiliza o termo resiliência, que expressa a capacidade do


sistema em resistir às perturbações, retornando às suas condições originais.

32
AUTOATIVIDADE

1 Por que a capacidade de reequilíbrio dos sistemas naturais depende da sua


complexidade?
Exemplifique.

2 Sobre a BIOSFERA é correto afirmar:

I - A biosfera é a camada do planeta capaz de ser habitada por organismos.


II - O termo biosfera foi introduzido na ciência em 1875 pelo geólogo austríaco
Eduard Suess.
III - As leis da Termodinâmica dirigem o papel da energia na biosfera.
IV - As formas da matéria na biosfera são pouco variadas: gasosa, sólida ou
líquida.
V - Todas as interações da biosfera se dão no interior dos geossistemas e dos
ecossistemas.
VI - Apenas 2% da energia solar são absorvidos pela biosfera – 98% se perdem.
O total absorvido, nada mais que 0,1%, é usado na fotossíntese.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas II, III, IV e V.


b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, II e V.
c) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas IV e V.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

3 Acerca dos ciclos biogeoquímicos, coloque V para as afirmativas verdadeiras


e F para as falsas e em seguida assinale a alternativa que apresenta a
sequência CORRETA:

( ) Na fotossíntese, a energia solar ou energia dispersa é transformada em


matéria ou energia concentrada.
( ) A ciclagem dos nutrientes é mais conhecida como ciclos biogeoquímicos,
porque deles fazem parte tanto componentes bióticos quanto abióticos.
( ) Os ciclos Biogeoquímicos começam com a absorção da energia solar pelas
plantas clorofiladas.
( ) Os macronutrientes existem em maior quantidade porque as plantas os usam
em grande quantidade. Os micronutrientes são elementos de que as plantas
têm menor necessidade e, por isto, ocorrem em menor quantidade na natureza.
( ) Na crosta terrestre ocorrem 90 elementos químicos. Deste total, 30 são
fundamentais para os organismos – são os macronutrientes.

a) ( ) V – V – V – F – V.
b) ( ) V – V – V – V – V.
c) ( ) F – V – F – V – V.
d) ( ) V – F – V – V – F.

33
34
UNIDADE 1
TÓPICO 4

A ATMOSFERA

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico trataremos sobre o significado do clima, os padrões climáticos
e as plantas, e os efeitos do clima sobre os seres vivos.

2 O SIGNIFICADO DO CLIMA
O clima é o mais ativo fator da natureza. Ele influencia o bem-estar do
homem, desde efeitos diretos do tempo meteorológico às mudanças climáticas.
Todos os seres vivos dependem diretamente do clima.

O clima é um conjunto de estados habituais da atmosfera sobre um lugar


na sua sucessão normal, na definição de Max Sorre, citada por Monteiro (1958).
A Climatologia, a ciência que estuda o clima – e não a Meteorologia, que estuda
os estados do tempo – é um ramo da Geografia Física. O estudo do clima e as
suas influências na biosfera é tema de pesquisa do geógrafo. Conhecer o clima é
fundamental para a Biogeografia. Há uma constante inter-relação da atmosfera
com os oceanos – e com as massas de água em geral – e com a superfície sólida do
planeta. Basicamente, é uma troca de calor entre o ar circundante e a superfície.

A atmosfera é uma fina camada de ar composta por mais de 20 gases


diferentes, dentre os quais o oxigênio é o mais importante. O oxigênio é usado na
respiração aeróbica dos seres vivos e, além disso, combina com outros elementos
químicos e origina compostos fundamentais para a vida orgânica. O gás mais
abundante na atmosfera é o nitrogênio, que aparece com 78% do total, o oxigênio
com 21% e os demais gases – argônio, vapor de água, dióxido de carbono, metano,
etc. – com menos de 1%.

As radiações letais provindas do Sol, como as ultravioletas, X, gama, que


atingem a Terra constantemente, são filtradas pela capa protetora da atmosfera.
Então, elas chegam aqui em quantidades não prejudiciais aos seres vivos. A capa
de gases tem outro papel importante – impede a perda de calor pela superfície e
mantém a temperatura média em cerca de 16º C em todo o planeta. É óbvio que a
temperatura média de 16º C não é verdadeira em toda a extensão do planeta, mas
considera-se que seja esta a média de temperatura que mantém os seres vivos.

35
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Esse mecanismo é denominado de efeito estufa. Deve-se a ele a manutenção


da vida na Terra. Entretanto, desde o final do século passado, os físicos começaram
a duvidar da real eficiência e, sobretudo, da existência do efeito estufa. De acordo
com eles, a atmosfera não segura na superfície a radiação emitida pela Terra. O
que mantém o calor na superfície da Terra é a pressão atmosférica exercida pela
massa de gases. Cerca de 97% dos gases concentram-se nos primeiros 30 km de
altura da atmosfera.

O peso da atmosfera sobre a superfície facilita o atrito entre as moléculas,


os átomos dos gases e todos os corpos que existem na atmosfera, os aerossóis.
O atrito gera calor e, como a maior massa da atmosfera encontra-se sobre a
superfície, esta se mantém aquecida. A radiação infravermelha emitida pela
superfície do planeta – ou a maior parte dela – atravessa a camada de gases e se
perde no espaço.

Por esta razão, os físicos propõem que os termos efeito estufa e gases do
efeito estufa sejam trocados para efeito da atmosfera. Além disso, consideram
injustificado supor que o homem pode proteger o clima controlando quantidades-
traço de dióxido de carbono e outros gases na atmosfera. Essa teoria moderna ainda
não está incluída nos anais da ciência atual, porque a contesta flagrantemente.
Mas é vista com atenção pelos cientistas.

NOTA

Prezado (a) Acadêmico (a), para aprofundar os seus estudos, acesse o site:
<http://freenet-homepage.de/klima/indexe.htm, 2003
Thieme, Heinz – Greenhouse Gás Hypothesis Violates Fundamentals of Physics. Disponível
em: <http://freenet-homepage.de/klima/indexe.htm, 2003>. Acesso em: 13 jul. 2010.

Nas partes superiores da atmosfera, onde há menor densidade,


logicamente, o atrito será reduzido e o calor será proporcionalmente menor. É
uma das razões porque as altas montanhas têm cumes gelados, mesmo sob a
linha do Equador.

3 OS PADRÕES CLIMÁTICOS E AS PLANTAS


O clima determina as espécies de plantas e de animais e as formas de
vida que podem viver numa área. A forma da Terra intervém no clima e o altera
segundo as latitudes.

36
TÓPICO 4 | A ATMOSFERA

A circulação atmosférica e as correntes marítimas transportam grandes


quantidades de energia calorífica entre os polos e o Equador. Esse transporte
mantém o equilíbrio térmico no planeta.

A circulação marinha é fundamental na distribuição dos climas, não só no


litoral, mas, também, no interior, próximo às zonas costeiras.

A água superficial das regiões equatoriais, no Atlântico Norte, ruma


para a Islândia e a Noruega, o que faz com que o clima nas regiões ocidentais
europeias seja mais ameno. Ao aproximar-se do Polo Norte, a água vai, aos
poucos, resfriando-se e afunda. Em seguida, ela volta-se para o Equador e vai até
o extremo sul do Oceano Atlântico e então ruma para os oceanos Índico e Pacífico,
onde se aquece novamente e retoma o processo, que prossegue.

Essa circulação recebe o nome de circulação termo-halina, cria padrões


climáticos no globo, que respondem pelas formas de vida litorâneas. Por
exemplo, no hemisfério Norte as condições amenas do litoral ocidental da Europa
favorecem o aparecimento da floresta boreal de coníferas – a taiga –, que atinge
latitudes maiores na Escandinávia e bem menores no Alasca, cujo oceano é frio.

A altitude afeta os climas. A temperatura do ar, como vimos, cai 0,6º


C para cada 100 metros de ascensão. As condições da encosta, como o grau de
inclinação – que interfere na distribuição do calor nela –, a elevada insolação e
a exposição aos ventos alteram este quadro. Contudo, nas regiões montanhosas
situadas nos trópicos e nos subtrópicos, como o Himalaia e os Andes, a fauna e a
flora diferem muito em relação às regiões mais quentes.

O clima determina a chamada forma biológica ou forma de vida das plantas


(COX & MOORE, 2009 p. 121). O botânico dinamarquês Christian Raunkier, em
1934, estudou as plantas em seus ambientes e definiu as formas de vida, que
variam segundo as condições climáticas e edáficas locais. Ele observou que as
plantas dominantes numa dada região climática possuíam formas específicas bem
adaptadas às condições da região. As plantas possuem brotos de crescimento que
são sensíveis às estações pouco favoráveis – inverno, verão. A posição dos brotos
depende das condições adversas do local onde estão elas.

Raunkier (1934, apud DAJOZ, 2006) classificou as plantas segundo a altura


dos brotos vegetativos em relação ao solo – acima ou abaixo. Nos trópicos, onde
as plantas crescem sem pressão do clima, os brotos estão nos pontos mais altos da
planta. Nos casos de estiagem ou no inverno brando das regiões subtropicais, as
espécies caducifólias se defendem perdendo as folhas para manter a água no seu
interior. A planta, então, entra numa fase de dormência.

37
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Nas regiões de climas severos – polos, desertos e altas montanhas – os


brotos encontram-se mais próximos do solo. Nas regiões áridas, os brotos, em
geral, são subterrâneos. A posição dos brotos está na dependência da quantidade
de calor que a planta recebe. Nos trópicos o calor é constante, por isso os brotos
afastam-se do solo. Nos climas polares e das montanhas elevadas o broto fica
próximo ao solo, porque o calor liberado por ele é importante para a planta e,
ademais, as folhas ficam protegidas do efeito abrasivo de partículas de gelo ou de
areia empurradas pelo vento.

Nos climas desérticos e semidesérticos os brotos são subterrâneos,


porque, em geral, as plantas são anuais e perdem a parte exposta nas estações
desfavoráveis. Permanecem vivas, porque possuem rizomas subterrâneos, que
armazenam água e nutrientes usados nessas estações. Na época favorável, os
brotos subterrâneos germinam. Muitas espécies liberam sementes, que ficam em
estado de dormência nas estações desfavoráveis – inverno, estiagem sazonal.

Também os animais apresentam diversas defesas às estações desfavoráveis.


Nos climas frios, têm pelagem espessa e os pelos possuem uma camada de óleo que
impede o contato da pele com a água fria, como os ursos polares. Nos climas quentes,
a pelagem é escassa ou muito fina, para facilitar a troca de calor com a superfície.

A distribuição da biota na Terra está na sujeição do clima global. O


número de espécies é elevado na zona tropical e cai gradativamente à medida
que se afasta dela em direção à zona temperada e aos polos. Os biomas terrestres
resultam da interação do clima com o relevo, o solo, a vegetação e a fauna.

4 OS EFEITOS DO CLIMA SOBRE OS SERES VIVOS


As zonas climáticas da Terra mantêm condições de temperatura e de chuvas
diferenciadas, que regulam a distribuição dos seres vivos, incluindo o homem.

Alexander von Humboldt (1769-1859) foi o primeiro cientista a se


preocupar com as relações das plantas com o seu ambiente. Humboldt comparou
plantas de montanhas com as de terras baixas, desde os polos até os trópicos.
Ele observou que, em alguns lugares, semelhantes condições abióticas e bióticas
condicionavam um dado grupo de plantas a colonizá-los. Ele denominou esse
grupo de plantas, que vivia na dependência dos fatores locais, de associação,
termo ainda empregado hoje.

O botânico suíço Augustin Pyrame de Candolle (1778-1841) estudou a


influência do clima sobre as plantas. De Candolle viu que a temperatura exercia
influência sobre as plantas, que se viam obrigadas a se adaptar ao clima de um
lugar. Com base nos seus estudos, ele estabeleceu categorias de plantas segundo
a temperatura da região.

38
TÓPICO 4 | A ATMOSFERA

De Candolle criou os seguintes grupos de plantas, de acordo com a


temperatura:

- megatérmicas, plantas tropicais, que vivem em temperaturas médias acima


de 20º C;
- mesotérmicas, preferem médias entre 15º C e 19º C;
- microtérmicas, plantas de climas temperados, com verões quentes e invernos
frios, com médias abaixo de 15º C;
- hequistotérmicas, espécies herbáceas e arbustivas, que vivem além do limite
das árvores, no norte e no sul;
- xerófitas, plantas que nascem em lugares onde a escassez de água é fator limitante.

Muitos cientistas, nos séculos XVIII e XIX, realizaram importantes


descobertas sobre as plantas. Eis alguns exemplos dessas pesquisas.

O botânico e médico alemão August Heinrich Rudolf Grisebach (1814-


1879), em 1866, notou que floras separadas por grandes distâncias guardavam
muitos pontos em comum. Ele partiu do princípio de que plantas e animais, que
viviam em comunidades separadas, não podiam ser estudados em separado
dos seus respectivos hábitats. Grisebach descobriu, então, similaridades em
floras distantes ocasionadas pelos tipos climáticos. Então, ele agrupou numa
mesma categoria as floras do Chile, da Califórnia, do Mediterrâneo e da África
do Sul, todas elas pertencentes ao tipo climático mediterrâneo. Em outro grupo
ele colocou as floras das estepes asiáticas, das pradarias norte-americanas, dos
pampas argentinos e dos campos do Kalahari. Foi uma importante forma de
classificação das plantas.

Andreas Franz Wilhelm Schimper (1856-1901), botânico alemão, em 1898


esteve no Brasil (1880-1883) e nas Antilhas (1883). Ele considerou o clima como
o principal fator de influência na distribuição das plantas. Centrando nas zonas
latitudinais, ele elaborou grupos de plantas. Para as zonas tropicais e temperadas
ele criou as categorias de floresta úmida, florestas, bosques e campos. Para o
deserto tropical, criou a categoria xerófita para as plantas que viviam em um
ambiente com deficiência de água. Para ele, a tundra era vegetação exclusiva dos
polos e o deserto alpino era a cobertura das altas montanhas. Schimper criou o
termo formações climáticas para distribuir a vegetação no planeta e formações
locais ou edáficas para os grupos de áreas menores.

Em 1870, o climatologista russo Wladmir Köppen (1846-1940), sogro de


Alfred Wegener (1880-1930), meteorologista alemão nascido na Groenlândia e
criador da teoria da Deriva Continental, elaborou um mapa climático para todo o
planeta deduzido das relações da vegetação com o clima. O mapa só foi publicado em
1900, quando ele se sentiu seguro da sua classificação dos climas. Köppen combinou
as ideias de Candolle acerca das respostas fisiológicas das plantas às diferentes
temperaturas com as similaridades entre as plantas estudadas por Grisebach.

39
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico você estudou que:

● O clima é o mais ativo fator da natureza. Ele influencia o bem-estar do homem,


desde efeitos diretos do tempo meteorológico às mudanças climáticas. Todos
os seres vivos dependem diretamente do clima.

● A atmosfera é uma fina camada de ar composta por mais de 20 gases diferentes,


dentre os quais oxigênio é o mais importante.

● O clima determina as espécies de plantas e de animais e as formas de vida


que podem viver numa área. A forma da Terra intervém no clima e o altera
segundo as latitudes.

● A circulação marinha é fundamental na distribuição dos climas, não só no


litoral, mas, também, no interior, próximo às zonas costeiras.

● A altitude afeta os climas. A temperatura do ar, como vimos, cai 0,6º C para
cada 100 metros de ascensão.

● A posição dos brotos está na dependência da quantidade de calor que a planta


recebe. Nos trópicos, o calor é constante, por isso os brotos afastam-se do solo.
Nos climas polares, o broto fica próximo ao solo, porque o calor liberado por
ele é importante para a planta e as folhas ficam protegidas do efeito abrasivo de
partículas de gelo ou de areia empurradas pelo vento.

• As zonas climáticas da Terra mantêm condições de temperatura e de chuvas


diferenciadas, que regulam a distribuição dos seres vivos, incluindo o homem.

40
AUTOATIVIDADE

1 O clima é o mais ativo fator da natureza. Ele influencia o bem-estar do homem


desde efeitos diretos do tempo meteorológico às mudanças climáticas. Todos
os seres vivos dependem diretamente do clima. Diante do exposto e com
base no estudo realizado sobre a atmosfera, analise as afirmativas a seguir:

I - A Climatologia, a ciência que estuda o clima, é um ramo da Geografia Física.


II - O clima determina as espécies de plantas e de animais e as formas de vida
que podem viver numa área. A forma da Terra intervém no clima e o altera
segundo as latitudes.
III - Os biomas terrestres resultam da interação do clima com o relevo, o solo, a
vegetação e a fauna.
IV - As zonas climáticas da Terra mantêm condições de temperatura e de chuvas
diferenciadas, que regulam a distribuição dos seres vivos, incluindo o homem.
V - O clima determina a chamada forma biológica ou forma de vida das plantas.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas II, IV e V.


b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, III e V.
c) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas III, IV e V.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

2 Qual a relação entre a altura do broto vegetativo e o clima?


Comente este aspecto para plantas de clima tropical e plantas de clima desértico.

3 Por que razão os físicos têm proposto que os termos efeito estufa e gases do
efeito estufa sejam trocados por efeito da atmosfera?

41
42
UNIDADE 1
TÓPICO 5

O SOLO E OS SERES VIVOS

1 INTRODUÇÃO
O solo é o substrato que sustenta grande parte da vida na Terra.
Corresponde à parte superficial não consolidada do manto de intemperismo.

O estudo da origem e formação dos solos teve início na escola russa, onde
se destacou o geólogo V. V. Dokuchaiev (1846-1903), com estudos realizados
entre 1882 e 1900 sobre os cinco fatores de formação do solo (clima, vegetação,
material de origem, topografia e tempo). Seus estudos foram estendidos por
outro pesquisador russo, K. D. Glinka (1867-1927), no início do séc. XX, quando
conceituou os distintos horizontes do perfil de solo (STRAHLER & STRAHLER,
1994; GUERRA, 1989, p. 399; WALTER, 1986, p. 227).

A importância de se conhecer as características físicas e químicas dos solos


se dá em função da necessidade de se planejar adequadamente o seu uso e manejo.

O estudo do solo se faz pela Pedologia, ciência que enfoca os materiais


existentes a partir da superfície até a rocha intemperizada, a alterita. Compreende
o estudo dos fatores e processos de formação, ou pedogênese, das características
físicas e químicas, bem como a classificação dos diversos tipos de solos.

A partir de levantamentos pedológicos é possível a determinação dos


potenciais e limitações de determinado tipo de solo, constituindo-se como “[...]
fonte de dados para estudos de viabilidade técnica e econômica de projetos de
estudo, manejo e conservação de solos” (IBGE, 1995, p.13). É nossa intenção, aqui,
apresentar uma base teórica, que subsidie a caracterização dos biomas mundiais
e brasileiros e, eventualmente, os trabalhos de campo em biogeografia.

43
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

2 FATORES DE FORMAÇÃO DO SOLO


De acordo com Jenny (1941, apud PALMIERI & LARACH, 1996, p. 70),
a formação do solo se dá em função de cinco fatores:

SOLO = ƒ (relevo, clima, geologia, organismos, tempo)

Os cinco fatores agem de forma simultânea, gerando combinações


diferentes e, consequentemente, uma grande diversidade de tipos diferentes
de solos:

Clima: promove o intemperismo das rochas e age na dinâmica interna do


perfil de solo, transformando e distribuindo materiais através da precipitação,
da temperatura, da umidade e do vento. O clima é um dos principais fatores
que afetam a velocidade na formação do solo, podendo agir como uma espécie
de catalisador, acelerando as reações químicas e o intemperismo.

Geologia: fornece a matéria-prima para a pedogênese, conferindo


ao solo muitas de suas qualidades e limitações, tanto químicas como físicas
(VIEIRA et al., 1988, p. 9). Oliveira (1972a, p. 276) ressalta três principais
características da rocha ou do material de origem, cujos efeitos são fundamentais
nas características dos diferentes tipos de solo:

a) composição química e mineralógica: afetará o teor de nutrientes, a textura


e a cor do solo;
b) estrutura: afetará a organização entre sólidos e vazios do solo e sua
permeabilidade;
c) resistência química e mecânica: influi na velocidade de intemperismo.

Relevo: ao influenciar a dinâmica da água nos processos erosivos, no


microclima, no clima regional e na distribuição dos tipos de vegetação, afeta
diretamente a formação dos tipos de solo. O relevo condiciona a formação
de solos eluviais (desenvolvidos in situ), de solos coluviais (resultantes de
transporte gravitacional em uma encosta) e de solos aluviais (resultantes de
materiais transportados pelo rio) (VIEIRA et al., 1988, p. 10). Em geral, nas
partes mais altas e planas de uma encosta, os solos são bem drenados; na parte
média os solos são excessivamente bem drenados ou secos (embora possam
sofrer influência de lençol temporário em épocas chuvosas); na base da encosta
e áreas de várzea e/ou depressões os solos são mais úmidos e mal drenados,
apresentando-se às vezes saturados quanto mais próximos ao lençol freático
permanente. Embora não seja o único fator, o relevo é um condicionante
importante nos caminhos de distribuição da água no interior do perfil de solo.
As características físicas dos horizontes pedológicos, que serão vistas em
seguida, também são de extrema importância na distribuição da dinâmica da
água no interior do perfil.

44
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

a) organismos e matéria orgânica: influenciam na síntese e translocação de


materiais e gases, na mineralização de substâncias, na estruturação física e
na proteção do solo frente aos processos erosivos. Conforme Oliveira (1972ª,
p. 283), pode-se agrupar os organismos conforme a sua forma de ação:
b) cobertura vegetal: ação protetora contra a erosão e reguladora dos efeitos
do clima e da radiação solar; adiciona matéria e ácidos orgânicos;
c) fauna: age como agentes de revolvimento, alterando a porosidade, agindo
na decomposição e mineralização da matéria orgânica;
d) homem: altera drasticamente o solo, impermeabilizando-o com
pavimentações e edificações, com obras de drenagem e irrigação, com a
introdução de plantas exóticas e produtos químicos etc.

Tempo (idade): a intensidade na formação do solo se dá em função do


dinamismo da ação dos demais fatores. Um solo será tanto mais antigo ou maduro
quanto mais espesso e diferenciado estiverem os horizontes (OLIVEIRA, 1972, p.
286; VIEIRA et al., 1988, p.12; PALMIERI & LARACH, 1996, p. 71).

Como já dissemos, todos os fatores combinam-se simultaneamente,


embora a intensidade de ação seja distinta entre eles. Assim, é comum um ou
mais fatores se sobressaírem em relação a outros.

3 MECANISMOS E PROCESSOS PEDOGENÉTICOS


Embora existam vários processos de formação dos solos, com base em
Oliveira (1972b, p. 326) sintetizamos, no quadro 2, os mais importantes, agrupados
em cinco conjuntos, a partir do principal mecanismo que rege cada um deles.

QUARO 1 – MECANISMOS E PROCESSOS PEDOGENÉTICOS PRINCIPAIS

MECANISMO AGENTE OU TIPO DE


RESULTADO
DE FORMAÇÃO PROCESSO
Adição de poeiras, sais, cinzas vulcânicas
Adições Vento (adição eólica)
e de queimadas
Adição de minerais dissolvidos, cinzas,
Precipitação
poeiras e sais
Umidade do ar nos poros do Adição de oxigênio, nitrogênio e gás
solo carbônico
Água do lençol freático e
Adição de material coloidal
capilares do solo
Rios Adição de depósitos aluviais e deltáicos
Gravidade Adição de material coluvial

45
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Adição de matéria mineral, matéria


Seres vivos
orgânica e água
Transformações Cristalização
Transformação da matéria orgânica em
Ação mecânica das raízes
húmus; de minerais
Primários em secundários e destes em
Dissolução
coloides
Oxidação
Hidrólise
Soluções livres na porosidade Transporte de argila, água, coloides e
Transportes
do solo íons
Soluções vasculares dos
para o interior Transporte de íons e água
vegetais (raízes)
Seres vivos (fauna do solo) Transporte de matéria orgânica e mineral
Movimentos Dissolução do calcário Abatimentos (regiões cársticas)
mecânicos Expansão e retração de argilas Modificação da porosidade
Desidratação da matéria
Abatimentos
orgânica
Seres vivos Abatimentos, remanejamentos, aterros
Perdas Colheitas
Perdas de matéria orgânica, matéria
Fogo
mineral e água
Enxurradas
Vento

FONTE: Sintese elaborada pelos autores

A partir desses mecanismos, desenvolvem-se fenômenos específicos de


formação do solo, denominados processos pedogenéticos. Os principais são:

a) Latolização ou laterização: perda de sílica e bases e pela concentração de


óxidos e hidróxidos de ferro e de hidróxido de alumínio. Ocorre em regiões
intertropicais onde ocorre clima úmido ou com estação seca e chuvosa
alternadas. Ao completar-se o processo, forma-se o laterito ou canga, quando o
solo transforma-se em rocha ferruginosa. No Brasil, por exemplo, ocorre laterito
na região Centro-Oeste, na Amazônia, no litoral da Paraíba, na Chapada do
Araripe (região Nordeste) (Guerra, 1989, p. 260).
b) Podolização: caracteriza-se pela lixiviação ou transporte de material coloidal
em solução no solo, como argilas, matéria orgânica e/ou óxidos de ferro e
alumínio, do horizonte A (eluvial, que perde), tornando-se mais descorado,
para o horizonte B (iluvial, que recebe), que se torna mais marrom ou bruno.
Desenvolve-se sob florestas temperadas ou subtropicais.

46
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

c) Calcificação: transporte e deposição de carbonato de cálcio de um horizonte


para outro. Pode ocorrer em certas áreas de clima árido ou semiárido. O
íon bicarbonato, em concentrações acima de 8 meq/l, pode inibir a absorção
de nutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio em muitas plantas, sendo
considerado fator limitante ao uso do solo.
d) Salinização: é o transporte e deposição de sais solúveis do tipo cloretos e
sulfatos de cálcio, magnésio, sódio e potássio, de um horizonte para outro.
Geralmente acumula-se na camada superficial, por ser consequência de fluxo
água capilar ascendente, sendo proporcional ao índice de aridez do clima, como
no semiárido do Nordeste brasileiro. Ocorre geralmente em áreas deprimidas
do terreno, que recebe água com sal de áreas vizinhas nas épocas de enxurradas.
Constitui-se em fator limitante ao uso do solo, pois é impedimento ao bom
desenvolvimento de grande parte das plantas cultivadas.
e) Gleização: transformação por redução anaeróbia, em condição de saturação
em água, dos minerais que contêm ferro, e consequente falta de oxigênio
(falta de arejamento). Típico de condições de má drenagem. É indicado pela
cor cinza (glei), em forma de manchas ou de modo contínuo, caracterizando
a hidromorfia e/ou solos hidromórficos. Dependendo da intensidade da
saturação, este solo pode ter grande limitação de utilização.

4 O PERFIL DE SOLO
À medida que os fatores de formação do solo interagem e a pedogênese
se desenvolve, o material de origem vai sofrendo diferenciações, mais ou menos
paralelas à superfície. Definem-se camadas ou horizontes pedológicos. O conjunto
destes, compreendidos numa sequência vertical desde a superfície até o material
de origem, denomina-se perfil de solo.

O perfil hipotético ou perfil modelo é um esquema onde se representa


todos os horizontes possíveis de serem observados em campo. Ressalta-se,
entretanto, que geralmente nem todos estarão presentes.

QUADRO 2 - PERFIL DE SOLO HIPOTÉTICO

HORIZONTE DESCRIÇÃO
Camada de húmus superficial; matéria orgânica
pouco fragmentada, na qual as estruturas
Oi
vegetais originais são diferenciáveis.

Camada de fermentação; matéria orgânica


O Oe Horizontes de
parcialmente decomposta.
atividade
Camada úmida; matéria orgânica bem
biológica e eluviação
transformada, sem vestígios vegetais
Oh máximas.
macroscópicos discerníveis.
Horizonte de coloração escura, com alto teor
A A
orgânico misturado com minerais.

47
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

Horizonte de cor clara, com baixo teor orgânico


E
E devido à alta eluviação.
EB Camada de transição.
Horizontes de
BE Camada de transição.
eluviação;
acumulação de argila,
Camada escura de acumulação de argila, óxidos
húmus ou óxidos de
de ferro, com máxima expressão da estrutura
B B ferro transportados
maciça e/ou prismática.
das
BC Camada de transição camadas superiores
Material intemperizado pouco afetado pela
pedogênese, com relíquias da rocha alterada,
C C
podendo apresentar evidências de gleização.
R R Rocha alterada

FONTE: LEPSCH et al. (1986)

As descrições em campo podem ser realizadas abrindo-se trincheiras, em


voçorocas, em barrancos à margem de rios ou de estradas, desde que se proceda a
limpeza cuidadosa do mesmo e com tradagens, que é a retirada de amostras com
uma sonda manual, o trado. Salientamos que as amostras retiradas com trados
têm a estrutura deformada, pela compressão causada pelo mesmo.

É de grande importância o detalhamento das descrições de campo, pois


estas são fundamentais na interpretação das análises de laboratório.

Os métodos tradicionais de levantamento do meio físico, enquanto


trabalham com medidas estáticas de um momento do perfil do solo, não
permitem uma visão de sua dinâmica integral, que leve em consideração tanto o
funcionamento vertical como o lateral.

Não pretendemos aqui detalhar os procedimentos da análise estrutural


dos solos, mas enfatizamos que esta metodologia subdivide-se em duas etapas. A
primeira compreende a definição de um transecto, do topo à base de uma vertente
de relevo representativo da região. Com a topografia, tradagens e a abertura
de trincheiras é possível desenhar-se o transecto em duas dimensões. Num
segundo momento, sondagens e trincheiras observadas no entorno do transecto
possibilitam o reconhecimento da distribuição espacial dos horizontes, que serão
delimitados, no papel, por curvas de isovalores (ou curvas de isodiferenciação),
dando o caráter tridimensional à representação cartográfica.

A análise estrutural prioriza o reconhecimento e cartografia detalhada


dos horizontes pedológicos, seus limites, transições e as modificações das
características, compatibilizando as distintas escalas, do maior ao menor detalhe,
tratando de observar o solo como um continuum pedológico.

48
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

5 DESCRIÇÕES DO PERFIL EM CAMPO

5.1 DESCRIÇÕES GERAIS


Em campo é possível descrever-se a aparência macroscópica do solo, ou seja,
a sua morfologia. Através desta descrição é possível deduzir-se comportamentos
dos horizontes em relação à drenagem, à permeabilidade, à compactação, à
suscetibilidade à erosão, subsídio essencial na determinação do tipo de solo, dentre
outros. Com isso é possível separar-se em campo e posteriormente, sobre cartas
topográficas e temáticas, unidades pedológicas homogêneas com determinadas
características. Os resultados laboratoriais auxiliam também nesta caracterização.

Ao se iniciar a descrição do perfil, devem ser registradas algumas


características gerais sobre o local (IBGE, 1995, p. 50). É importante ter-se em mãos
cartas topográficas locais e regionais e fotos aéreas, em escala mais detalhada
possível, para associar-se aos seguintes aspectos a serem observados no campo:

a) Relevo regional: observar formas de topos das elevações, forma e largura dos
vales, forma e extensão das vertentes, amplitude de variação dos declives e,
quando houver, descrever microrrelevos.
b) Declividade média do local onde se insere o perfil, que pode ser retirada com
clinômetro e trena.
c) Litologia e material originário: observando-se possíveis afloramentos,
pedregosidade (tipo de proporção), presença de cascalhos e matacões.
d) Sinais de erosão: descrever, se ocorrer, erosão superficial e subsuperficial,
se laminar e/ou em sulcos e/ou em voçorocas, caracterizar suas frequências e
profundidades.
e) Drenagem: caracterizar a drenagem interna do perfil e, se possível, a
profundidade do lençol freático.
f) Vegetação original: de que tipo e se foi retirada, há quantos anos se deu etc.
g) Uso atual: informar se há quantos anos está sob aquele uso e que perturbações
sofre (queimadas, pastoreio, mecanização etc.).
h) Tipo de perfil em análise: corte de estrada, barranco, trincheira, tradagens, etc.

Todas estas informações serão úteis ao serem correlacionadas com as


descrições do perfil e com os resultados laboratoriais. Quanto mais detalhadas
forem as descrições de campo, mais “chaves” teremos para o desenvolvimento de
interpretações sobre a influência do solo sobre os seres vivos, e vice-versa.

49
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

5.2 DESCRIÇÕES ESPECÍFICAS DO PERFIL


a) Separação dos horizontes: observando-se as diferenças de cor, estrutura e
consistência, traça-se linhas de separação entre eles. Coloca-se uma trena em
posição vertical (sendo que o zero deve coincidir com a superfície) e mede-se
a espessura de cada horizonte e a profundidade total do perfil, se possível até
a rocha alterada. De acordo com EMBRAPA (1999), o perfil é considerado:

- raso: menor que 50 cm;


- pouco profundo: entre 50 e 100 cm;
- profundo: entre 100 e 200 cm;
- muito profundo: maior que 200 cm.

Esta característica está diretamente relacionada à possibilidade de


desenvolvimento das raízes.

b) Transição entre horizontes: refere-se ao contraste ou nitidez na separação


de dois horizontes. É uma característica importante como indicadora do
desenvolvimento de processos pedogenéticos. Conforme IBGE (1995, p. 25),
dependendo da espessura da faixa de separação, a classificação pode ser:

- abrupta: menor que 2,5 cm;


- gradual: entre 2,5 e 7,5 cm;
- difusa: maior que 12,5 cm

Dependendo da tortuosidade da faixa, esta pode ser classificada como


horizontal ou plana; ondulada ou sinuosa; irregular e descontínua.

c) Cor: é importante indicadora do teor de matéria orgânica, da aeração e da


capacidade de drenagem do horizonte. Os corantes principais do solo são o
ferro, que dá a cor vermelha quando oxidado (indica horizonte aerado); a cor
amarela clara ou branca ou cinza, quando o ferro está na forma reduzida (indica
hidratação e má drenagem); a matéria orgânica dá a cor escura até o negro; a sílica
dá a cor branca (solos muito arenosos). A determinação da cor deve ser feita com
a amostra úmida e comparada à Tabela de Munsell, que é o padrão internacional.
Cada página da tabela corresponde a um conjunto de matiz que varia entre o
amarelo (Y), vermelho (R) e alaranjado (YR). O matiz é definido por números e
letras e é precedido por uma fração que define valor/croma. Estas letras e números
também podem ser acompanhados pelo nome correspondente. Exemplos: 5 YR
5/8 (vermelho amarelado); 7.5 YR 4/4 (bruno ou marrom); 10YR 7/8 (amarelo).
d) Textura: quanto mais grosseira a textura dos materiais, mais eficiente é a
drenagem e a lixiviação de nutrientes. A textura pode ser observada no tato e
deve ser conferida em laboratório. De acordo com a EMBRAPA (1999, p. 294),
“classifica-se como:

- argiloso: entre 35 e 60% de argila;


- siltoso: menos de 15% de areia e mais de 35% de argila;

50
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

- média: menos de 35% de argila e mais de 15% de areia (excluídas as classes


areia e areia franca);
- arenoso: compreende apenas areia e areia franca.

Pode-se incluir, quando necessário, a qualificação sobre a presença de


cascalho fino (2 mm a 20 mm), sendo

- pouco cascalhento: entre 8 e 15%;


- cascalhento: entre 15 e 50%;
- muito cascalhento: mais que 50%”.

E também, a presença de cascalho grosso (20 a 200 mm) e matacão (maior


que 200 mm).

Através da análise granulométrica realizada em laboratório, com o apoio


das observações de campo, classifica-se a textura dos horizontes, com base no
gráfico triangular e na escala de texturas. Esta é uma classificação americana,
desenvolvida pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e utilizada
pela EMBRAPA (1999).

e) Estrutura: indica a organização entre poros preenchidos com ar ou água e a


parte sólida do solo. Varia com a umidade, com a disposição das partículas
(mais ou menos compactadas) e com o estado de floculação dos coloides
(partículas amorfas minúsculas, maiores que moléculas). É importante na
avaliação da capacidade de retenção e movimento da água e gases no solo.

f) Porosidade: a funcionalidade dos poros está diretamente relacionada ao


seu tamanho e ao tamanho das frações granulométricas presentes. Indica
a permeabilidade do horizonte. A água retida no solo pela força dos poros
capilares disponíveis às plantas ocupa porosidade entre 0,2 e 10 micra. A
umidade retida nesta porosidade, excluída a água gravitacional (água de
saturação), denomina-se capacidade de campo. Exaurida esta reserva hídrica,
a vegetação pode alcançar o ponto de murcha permanente, embora ainda
exista a água de ligação entre as moléculas (coeficiente higroscópico), mas que
não está disponível para as plantas.

A macroporosidade é possível de ser observada em campo com auxílio de


lupa de 10 ou 20 vezes de aumento. Conforme IBGE (1995, p.26), os tamanhos dos
poros em campo podem ser assim classificados: muito pequenos – menor que 1
mm; pequenos – entre 1 e 2 mm; médios – entre 2 e 5 mm; grandes – entre 5 a 10
mm; muito grandes – maiores que 10 mm. Pode-se avaliar a microporosidade em
laboratório, através de diversos métodos, como a porosidade total, a porosimetria
a mercúrio e a micromorfologia dos solos. (BELTRAME, 1997).

51
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

g) Cerosidade: caracteriza-se por uma película de material coloidal


(minerais de argila, óxidos, matéria orgânica etc.), revestindo
poros ou superfícies da estrutura. Em campo, pode ser observada
com lupa. É grande indicadora de lixiviação de materiais para o
interior do perfil (geralmente ocorre no horizonte B ou C). Pode
ser caracterizada quanto à nitidez, como fraca, comum ou forte.
Quanto à quantidade, pode ser pouca, comum ou abundante
(LEPSCH, 1972 b, p.346).

h) Consistência: está relacionada às forças de coesão e adesão entre


as partículas do solo em função do teor de umidade presente.
Assim, deve ser observada mediante diferentes teores de umidade.
Pode orientar o tipo de manejo mais adequado. Por exemplo,
solos muito plásticos ou pegajosos só devem ser trabalhados em
uma estreita faixa de umidade. O manejo inadequado pode levar
ao desenvolvimento de uma camada subsuperficial muito dura,
denominada empacotamento, que dificulta a expansão das raízes
e da mecanização (VIEIRA et al., 1988, p. 40). A consistência úmida
é observada ao se umedecer um torrão. É considerado pegajoso se
aderir a um objeto e plástica ao se deixar moldar. A consistência
levemente úmida é observada esboroando-se o torrão na mão.
Pode ser considerado solto, friável ou firme. A consistência seca
é observada ao esboroar-se um torrão seco na mão, podendo ser
solto, macio, duro ou muito duro.

i) Cimentação: dependendo da consistência, certos horizontes podem


desenvolver crostas superficiais endurecidas, caracterizando a cimentação,
que se desenvolve a partir das forças de coesão de carbonato de cálcio, da sílica
e de óxidos ou sais de ferro e alumínio. A cimentação é capaz de caracterizar o
tipo de horizonte. O horizonte será chamado de Fragipã, quando a cimentação
é dura, quando seca, podendo quebrar-se quando úmida. Geralmente é muito
denso, pouco permeável, dificultando a penetração das raízes. A textura pode
ser média a arenosa, com muito baixo teor de matéria orgânica. O horizonte
será chamado de Duripã quando a cimentação for muito dura, mesmo quando
seca (EMBRAPA, 1999, p. 56) (LEPSCH, 1972, p. 367).

j) Nódulos e concreções: são concentrações endurecidas de certos compostos


químicos, identificados quanto à quantidade, tamanho, dureza, forma, cor
e natureza. Os mais comuns são de óxidos de ferro ou ferro e alumínio. A
Petroplintita, que se origina da Plintita (manchas vermelhas resultantes da
segregação do ferro), são concreções ferruginosas que originam o laterito ou a
canga (já citadas).

k) Raízes: é indicada pela quantidade visualizada no perfil, sendo utilizados os


termos: muito comuns, poucas ou raras. Geralmente não mencionadas quando
ausentes (IBGE, 1995, p. 51).

l) Atividade biológica: refere-se à presença de cupins, formigas, minhocas etc.,


em cada horizonte.

52
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

5.3 Outros atributos dos horizontes, analisados em


laboratório
Além das características morfológicas observadas em campo, outros
atributos são fundamentais para a classificação do tipo de solo e suas propriedades.

a) Atividade da fração argila (valor T): refere-se à capacidade de troca de cátions


do horizonte. Indica a capacidade do solo em manter alguns nutrientes por
tempo suficiente para ser aproveitado pelos vegetais. A matéria orgânica e
certos tipos de argila têm alta capacidade de troca de cátions, ao contrário
das areias, cujo valor é baixo. As argilas de atividade alta (Ta) possuem valor
T igual ou superior a 27 cmolc/kg de argila. As argilas de atividade baixa (Tb)
possuem valores inferiores ao citado (EMBRAPA, 1999).

b) Saturação por bases (valor V%): “indica o percentual de locais de troca


química que são ocupados por cátions básicos trocáveis, importantes para a
manutenção da planta. O cálcio e o magnésio, por exemplo, são importantes
cátions trocáveis. São considerados altos os valores de V acima de 50% e baixo
quando inferior a este valor” (VIEIRA et al., 1988, p. 27).

c) Material orgânico: é considerado material orgânico aquele cujos constituintes


orgânicos predominam sobre os minerais. Os limites desses constituintes são
definidos por EMBRAPA (1999, p. 9) e IBGE (1995, p. 34).

d) Caráter álico: corresponde às concentrações de alumínio trocável na camada


subsuperficial. Valores elevados são tóxicos para a maioria das plantas
cultivadas e indica pobreza de nutrientes. Está relacionado ao valor do pH
e da saturação por bases. O caráter álico é identificado quando a análise do
solo indicar saturação em alumínio superior a 50%, o que ocorre geralmente
quando o pH em água é inferior a 5,0 e a saturação por bases é inferior a
10%. Pode ser corrigido com a aplicação de calcário, denominada calagem
(LEPSCH, 1983, p. 81).

e) Caráter distrófico: é identificado quando a saturação por bases (V%) for inferior
a 50% ou quando a saturação em alumínio estiver entre 10% e 50% (quando
maior que 50% será denominado distrófico e álico). É difícil de ser corrigido com
adubação e calagem se abaixo do horizonte superficial (LEPSCH, 1983, p. 80).

f) pH ácido e alcalino: como vimos, a acidez afeta o caráter álico e


consequentemente o grau de saturação por bases. De acordo com EMBRAPA
(1999, p. 299), “é considerado pH ácido quando inferior a 5,6; pH neutro entre
5,6 e 7,4 e alcalino quando acima de 7,4”.

Outras características dos solos também são consideradas para a classificação


do tipo de solo e podem ser consultadas em IBGE (1995) e EMBRAPA (1999).

53
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

6 CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE SOLOS


A classificação dos solos não é tarefa fácil. Requer muito conhecimento teórico
interdisciplinar e prática de campo, já que o solo é produto da combinação de cinco
fatores, em diversas intensidades. A classificação será tanto mais generalista quanto
menos detalhada for a escala de estudos. Conforme Guerra (1989, p. 400), “[...] as
cartas zonais, isto é, estudos zonais dos solos, não têm grande valor científico [...]”.
Para estudos mais precisos, faz-se necessário o uso de cartas detalhadas ou até mesmo
o estudo in loco. Salientamos que a caracterização física e química dos horizontes
e, a partir disso, a identificação de suas aptidões e limitações, pode ser suficiente
para dar o suporte necessário em muitos estudos de biogeografia, não requerendo
necessariamente a identificação do tipo (nome) do solo. Por outro lado, em trabalhos
espacialmente mais abrangentes, a classificação do tipo de solo pode ser essencial.

6.1 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS DO MUNDO


Durante as décadas de 1920 e 1930, nos Estados Unidos, o estudo dos
solos recebeu grande atenção, em função da preocupação frente à intensa erosão,
que estava ocorrendo em terras agrícolas americanas (ODUM, 1985, p. 173). Nesta
época formou-se a Divisão do Serviço de Solo do Departamento de Agricultura
dos Estados Unidos, que elaborou um sistema de classificação dos solos em nível
mundial, ainda bastante utilizado atualmente. (ODUM, 1985, p. 173)

Inicialmente, a grande diversidade de solos pode ser agrupada em três


grandes conjuntos:

I) Solos Zonais: o clima e os organismos (principalmente vegetação) são os


fatores de maior influência na definição das características, que são bem
desenvolvidas. São solos bem drenados.
II) Solos Intrazonais: o relevo dominante ou o material de origem são os fatores
de maior influência na definição das características. Podem ter drenagem
insuficiente em ambientes alagáveis (várzeas e pântanos) ou sob climas úmidos.
Podem se desenvolver em superfícies elevadas e ricas em carbonato de cálcio
ou sob altas concentrações de sais solúveis (desertos e bacias costeiras).
III) Solos Azonais: não possuem características bem definidas, pois são muito jovens.
Podem se localizar em terrenos íngremes que não permite ainda sobre dunas.

De modo similar à taxonomia dos animais e vegetais (já apresentada),


os solos também possuem um sistema de classificação baseado em categorias
hierarquizadas nos seguintes níveis de agrupamentos:

Ordens
Subordens
Grandes Grupos
Subgrupos
Famílias
Séries
54
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

Caracterizando-se resumidamente as ordens de solos, tem-se que:

a) Alfissolos (alf/alfafa): são solos com acúmulo de argilas no horizonte B, com


suprimento médio a alto de bases, com horizonte sobrejacente permeável,
comumente bruno-amarelado e um horizonte subjacente bruno-avermelhado,
devido à maior concentração de óxidos de ferro e alumínio. São moderadamente
intemperizados. Formam-se geralmente sob cobertura florestal, em climas
subúmidos ou úmidos durante pelo menos 90 dias consecutivos. Predominam
na parte central da América do Norte, Europa, Sibéria Central, Norte da
China, Norte e Sul da Austrália, Brasil oriental, Leste e Sul da África, Oeste de
Madagascar, Leste da Índia e Indochina.

b) Aridissolos (arid/árido): são solos com acúmulo de gibsita (mineral de


hidróxido de alumínio), escassa matéria orgânica (horizonte superficial claro),
concentrações de sais de cálcio, magnésio e potássio, típico de clima árido.
Geralmente seco em pelo menos 90 dias consecutivos. Forma-se sob vegetação
dispersa, ervas efêmeras, cactáceas e arbustos, todos xerófitos. Com irrigação
podem ser muito produtivos. Presentes nos grandes desertos das Américas,
do Saara, da Arábia, da Austrália e da Ásia.

c) Entissolos (enti/recente): são solos formados por depósitos recentes de


materiais, como cinzas vulcânicas, depósitos fluviais, areias quartzosas, sem
a definição de horizontes. Desenvolvidos sob qualquer tipo de clima e sob
qualquer tipo de cobertura vegetal.

d) Histossolos (histo/histologia, tecidos): são solos com grande concentração de


matéria orgânica (20% a 30%) nos primeiros 80 cm. Geralmente são originados
de formações pantanosas e turfeiras. Podem se desenvolver diretamente sobre
a rocha, sob clima úmido e temperado. Concentram-se no Canadá.

e) Molissolos (moll/mole, macio): são solos com horizontes bem definidos, alta
concentração de carbonato de cálcio (portanto, são básicos), parte superior
escura com concentração média a alta de matéria orgânica. Desenvolvem-se
geralmente sob cobertura de campos ou pastagens de latitudes médias, em
condições semiáridas ou subúmidas. Predominam nas áreas das pradarias
norte-americanas, dos pampas sul-americanos e das estepes da Europa e Ásia.

f) Oxissolos (oxi/óxidos): são solos muito antigos e, portanto, intemperizados,


com minerais primários menos resistentes ao intemperismo ausentes e,
elevada concentração de argila de baixa atividade (Tb), quartzo, óxidos de
ferro e alumínio. Com horizontes espessos, pouco definidos e bem drenados.
Muitas vezes forma-se horizonte óxico (laterito) em subsuperfície (abaixo de
2 m) ou plintita. Desenvolvem-se em condições de clima equatorial, tropical
e subtropical, sobre superfícies geologicamente antigas (do Pleistoceno ou
anteriores). Ocorrem em extensas regiões da África e parte tropical e equatorial
da América do Sul.

55
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

g) Ultissolos (ulti/últimos): são solos com horizonte subsuperficial bastante


intemperizado, argiloso, ácido e pobre em bases (menos de 35%), requerendo
adição de fertilizante para cultivo. Desenvolvem-se em regiões de floresta, sob
clima com leve a pronunciado déficit hídrico sazonal, sob clima subtropical
úmido e clima tropical seco e úmido. As chuvas sazonais provocam forte
lixiviação do perfil, sendo o horizonte B bem drenado. Ocorrem em porções
representativas no Sudeste do EUA e da China, Bolívia, Sul do Brasil, África
central e ocidental, Nordeste da Índia e da Austrália.

h) Vertissolos (verti/inverter): são solos que se expandem e se contraem,


respectivamente, com o aumento e diminuição da umidade, formando
rachaduras profundas e largas, em função da alta concentração de argilas
expansíveis. Desenvolvem-se sob climas tropicais e subtropicais. Ocorrem na
Índia, Centro-Oeste da África (Sudão) e na Austrália Oriental.

i) Inceptissolos (incep/incipiente, incompleto): são solos jovens, com horizontes


pouco desenvolvidos, mas sem acúmulo de materiais transportados que não
sejam carbonatos ou sílica, com minerais primários e argilas de atividade alta
(Ta). Desenvolvem-se sob condição úmida, com pelo menos 90 dias úmidos
consecutivos, sob clima de tundra latitudinal e altitudinal, geralmente
associados a relevos jovens ou sobre sedimentos. Ocorrem da zona equatorial
às latitudes médias. São exemplos os terrenos de várzea de rios como do
Amazonas, do Mississipi, do Congo, do Nilo, do Ganges, dentre outros.

j) Espodossolos (espodo/horizonte espódico): solos que sofreram eluviação de


coloides do horizonte superficial, que é, portanto, mais claro e bem drenado,
com iluviação do horizonte inferior (processo de podolização). Geralmente são
ácidos, pobres em nutrientes e húmus. Desenvolve-se em ambientes úmidos a
superúmidos, sob coberturas florestais de latitudes médias, correspondendo à
área de abrangência das florestas de coníferas do Hemisfério Norte.

k) Solos de altitude: o aumento da altitude implica em consideráveis mudanças


climáticas, de vegetação e de relevo, como já mencionado em capítulo anterior.
Mesmo que o material de origem e o tempo cronológico sejam os mesmos,
a combinação dos fatores citados desenvolverá solos de tipos diferentes,
especialmente em função das variações altitudinais Cartograficamente, serão
representados como uma associação de solos, cuja denominação muitas vezes
é do tipo predominante, ou podem ser denominados simplesmente como
solos de altitude.

6.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SOLOS DO BRASIL


Os solos brasileiros são classificados pelo Centro Nacional de Pesquisas
de Solos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), com
base na presença ou ausência de certos atributos reconhecidos nos horizontes
diagnósticos, responsáveis na definição do tipo de solo.

56
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

6.2.1 Horizontes diagnósticos


Como os horizontes diagnósticos são essenciais na classificação dos solos,
apresentaremos, antes da classificação dos solos propriamente dita, a descrição
sucinta dos Horizontes Diagnósticos Principais. Salientamos que a descrição
detalhada dos mesmos encontra-se em EMBRAPA (1999):

UNI

Caro(a) acadêmico(a)!
Para auxiliar nos seus estudos, acesse o site. <http://www.iac.sp.gov.br/
OAgronomico/531/53108-10_it_solos.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2010.

a) Horizonte hístico: resulta da acumulação superficial de restos vegetais em


camada de 20 cm ou mais de espessura. Recoberto por horizonte ou depósitos
minerais e/ou orgânicos mais recentes. Possui coloração escura e elevado
teor de matéria orgânica. Além destes, este horizonte deve atender a outros
requisitos apresentados em EMBRAPA (1999, p.31).

b) Horizonte A chernozêmico: relativamente espesso, de cor escura (bruno-


escuro), com alta saturação por base (predomínio de cálcio ou magnésio).

c) Horizonte A proeminente: difere do anterior por apresentar saturação por


base inferior a 65%.

d) Horizonte A húmico: de cor escura (com valor e croma 4 ou menor – bruno),


saturação por base menor que 65%.

e) Horizonte A fraco: pouco desenvolvido, com baixo teor de coloides minerais ou


orgânicos, sob restrições de clima e vegetação, como, por exemplo, na Caatinga.

f) Horizonte A antrópico: formado ou modificado pelo uso prolongado do solo


pelo homem, como locais de residência ou de cultivo, com adição de material
orgânico e mineral, sendo indicativos a presença de restos de cerâmica,
conchas e ossos.

g) Horizonte B textural: com textura franco-argilosa ou mais fina que no A, pela


acumulação de argila ou argila+silte. Este acúmulo pode ser resultante de
iluviação (que pode ser observada pela cerosidade) e/ou de formação “in situ”
e/ou herança do material de origem. A transição de A para B pode ser abrupta,
clara ou gradual.

57
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

h) Horizonte B plânico: é um tipo de horizonte B textural, precedido por mudança


textural abrupta, apresentando permeabilidade lenta, cores acinzentadas, com
elevados teores de argila dispersa (adensado).

i) Horizonte B latossólico: seus constituintes encontram-se em estágio avançado


de intemperização, apresentando perda de sílica, lixiviação de bases e
concentração residual de óxidos de ferro e alumínio, argila de baixa atividade
e minerais primários resistentes aos intemperismos (ex. quartzo). A espessura
mínima para ser considerado diagnóstico é de 50 cm.

j) Horizonte B incipiente: desenvolvimento físico e químico em estágio pouco


avançado, sem cor e estrutura características. A espessura mínima para ser
considerado diagnóstico deve ser de 10 cm.

k) Horizonte B espódico: apresenta iluviação de matéria orgânica e compostos


de alumínio, com presença ou não de ferro iluvial. A espessura mínima para
ser considerado diagnóstico é de 2,5 cm.

l) Horizonte cálcico: caracteriza-se pela acumulação de carbonato de cálcio, que


normalmente ocorre no horizonte C, mas pode ocorrer no A ou no B. Para ser
considerado diagnóstico deve possuir 15 cm ou mais de espessura.

m) Horizonte plíntico: apresenta 15% ou mais de plintita e possui uma espessura


mínima de 15 cm. Apresenta mosqueamentos (pintas) vermelhas, acinzentadas
ou brancas. Com textura franco-argilosa ou mais fina. Este horizonte pode
se desenvolver em áreas baixas, depressões, terços inferiores de encostas ou
áreas de nascentes, com saturação hídrica. Chama-se horizonte litoplíntico,
quando há uma camada consolidada de óxidos de ferro ou de alumínio e ferro.

n) Fragipã e Duripã: já mencionados antes, no item Cimentação, das


características morfológicas.

o) Horizonte glei: caracteriza-se pela saturação em água do lençol freático,


durante todo o ano ou sazonalmente. Esta saturação torna o ferro quimicamente
reduzido, derivando cores cinzentas (ao contrário da cor vermelha do ferro
oxidado). Possui menos de 15% de plintita. Para ser considerado diagnóstico,
deve ter 15 cm ou mais de espessura.

p) Horizonte sulfúrico: compõe-se de material orgânico com pH 3,5 ou menor,


com presença de ácido sulfúrico. Origina-se muitas vezes da drenagem artificial
(como na construção de estradas, mineração, dragagens etc.) e consequente
oxidação de matéria orgânica e mineral. É tóxico para a maioria da plantas.
Para ser diagnóstico, deve possuir 15 cm ou mais de espessura.

58
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

q) Horizonte vértico: é superficial e argiloso ou muito argiloso. Devido à


expansão das argilas, apresenta feições típicas, como fendas (com no mínimo
1 cm), no período mais seco do ano. Deve apresentar no mínimo 20 cm de
espessura para ser considerado diagnóstico.

r) Horizonte B nítico: caracteriza-se pela textura argilosa ou muito argilosa,


pode ser subsuperficial ou superficial se houve erosão, e é não hidromórfico,
com pouco ou nenhum incremento de argila de A para B, mas não o suficiente
para ser caracterizado como B textural. Pode apresentar cerosidade.

s) Horizonte A moderado: suas características não se enquadram na dos demais


horizontes superficiais.

6.2.2 Tipos de Solos do Brasil


Em 2001, a EMBRAPA, através do Serviço Nacional de Levantamento e
Conservação do Solo, em conjunto com a Diretoria de Geociências do IBGE, com o
apoio dos levantamentos produzidos pelo Projeto RADAMBRASIL, produziram
o Mapa de Solos do Brasil em escala 1:5.000.000 (IBGE, 2001).

Apresentaremos, resumidamente, as características gerais das quatorze


ordens ao nível de solos brasileiros, definidos pela classificação da EMBRAPA
(1999). Com exceção dos Organossolos, todas as demais ordens são basicamente
constituídas por material mineral. Aqui também apresentamos palavras
mnemotécnicas, para facilitar a identificação dos nomes. Após cada descrição,
apresentamos a denominação antiga (anterior a 1999) dos tipos de solos incluídos
em cada uma das ordens.

a) ALISSOLOS (ali/alto teor de alumínio): possuem horizonte B textural ou B


nítico, com argila de atividade igual ou superior a 20 cmolc/kg, baixa saturação
por bases, alto teor de alumínio e alta saturação por alumínio. O horizonte A
pode ser moderado ou proeminente ou húmico, com ou sem horizonte eluvial
sobrejacente ao B textural. Corresponde aos anteriormente chamados: Rubrozem,
Podzólicos bruno-acinzentado distróficos álicos; Podzólicos vermelho-amarelos
distróficos ou álicos Ta e alguns Podzólicos vermelho-amarelos distróficos ou
álicos Tb (com limite mínimo do valor T de 20 cmolc/kg.

b) ARGISSOLOS (argi/Bt.Tb): apresentam horizonte B textural e argilas


de atividade baixa. Encontram-se abaixo do A ou de E. Corresponde aos
anteriormente chamados: Podzólicos vermelho-amarelos Tb; Podzólicos
vermelho-escuros Tb; Podzólicos amarelos; parte de Terra Roxa Estruturada,
de Terra Roxa Estruturada Similar, de Terra Bruna Estruturada e de Terra
Bruna Estruturada Similar.

59
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

c) CAMBISSOLOS (cambi/cambiar, trocar): possuem horizonte B incipiente


subjacente a qualquer tipo de horizonte superficial. Corresponde aos
anteriormente chamados: Cambissolos eutróficos, distróficos e álicos Ta e Tb,
exceto os com horizonte A chernozêmico e B incipiente eutróficos Ta.

d) CHERNOSSOLOS (cherno/preto, rico em bases): apresentam alta saturação


por bases, argilas de atividade alta, horizonte A chernozêmico sobrejacente
a um horizonte B textural ou nítico ou incipiente ou ainda a horizonte C
cálcico ou carbonático. Corresponde aos anteriormente chamados: Brunizem,
Brunizem avermelhado, Brunizem hidromórfico e Rendzina.

e) ESPODOSSOLOS (espodo/com horizonte B espódico): com horizonte B


espódico subjacente a horizonte E ou qualquer tipo de horizonte A ou ainda
sob horizonte hístico. Corresponde aos anteriormente chamados: Podzol,
inclusive Podzol hidromórfico.

f) GLEISSOLOS (glei/com horizonte glei): com horizonte glei subjacente


ao horizonte A ou hístico, com menos de 40 cm de espessura. Não há outro
horizonte diagnóstico acima do glei. Corresponde aos anteriormente chamados:
Glei pouco húmico, Glei húmico, parte do Hidromórfico cinzento (sem mudança
textural abrupta), Glei tiomórfico e Solonchak com horizonte glei.

g) LATOSSOLOS (lato/com horizonte B latossólico): apresenta horizonte B


latossólico subjacente a qualquer tipo de horizonte A, dentro de 200 cm da
superfície ou 300 cm se o horizonte A for mais espesso que 150 cm. Corresponde
aos anteriormente chamados: Latossolos em geral com algumas exceções.

h) LUVISSOLOS (luvi/saturado, acumulação de argila Ta): possui alta concentração


de argila de atividade alta, alta saturação por bases e horizonte B textural ou B nítico
subjacente ao horizonte A fraco ou moderado ou proeminente ou ao horizonte
E. Corresponde aos anteriormente chamados: Brunos não cálcicos; Podzólicos
vermelho-amarelos eutróficos Ta, Podzólicos bruno-acinzentados eutróficos e ao
Podzólicos vermelho-escuros eutróficos Ta.

i) NEOSSOLO (neo/novo, pouco desenvolvido): são pouco evoluídos, sem


horizonte B. Corresponde aos anteriormente chamados: Litossolos; Solos
litólicos; Regossolo; Solos aluviais e Areias Quartzosas.

j) NITOSSOLO (nito/nítido, com horizonte B nítico): com horizonte B nítico, com


argilas de atividade baixa adjacente ao horizonte A ou até 50 cm do horizonte
B. Corresponde aos anteriormente chamados Terra Roxa Estruturada; Terra
Roxa Estruturada Similar, Terra Bruna Estruturada, Terra Bruna Estruturada
Similar; Podzólicos vermelho-escuros Tb e Podzólicos vermelho-amarelos Tb.

60
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

k) ORGANOSSOLO (organo/orgânico, com horizonte A úmico ou hístico):


constituído por material orgânico, com horizonte O ou A hístico, com teor de
matéria orgânica igual ou superior a 20% e espessura mínima de 30 cm quando
sobrejacente à rocha matriz. Corresponde aos anteriormente chamados: Solos
Orgânicos; Solos Semiorgânicos; Solos Tiomórficos Turfosos e parte dos Solos
Litólicos Turfosos.

l) PLANOSSOLO (plano/com horizonte B plânico): constitui-se do horizonte


A ou E seguido pelo horizonte B plânico. Corresponde aos anteriormente
chamados: Planossolos, Solonetz-solodizados e Hidromórficos cinzentos que
apresentam mudança textural abrupta.

m) PLINTOSSOLO (plinto/plintita, com horizonte plíntico): apresentam


horizonte plíntico ou litoplíntico. É bastante compacto e bastante característico,
por ser multicolorido.

n) VERTISSOLO (verti/com horizonte vértico): possui horizonte vértico entre


25 e 100 cm de profundidade e relação textural com o horizonte sobrejacente
insuficiente para ser caracterizado como B textural. Corresponde aos
anteriormente chamados: Vertissolos, inclusive os hidromórficos.

61
UNIDADE 1 | A BIOGEOGRAFIA, A BIOSFERA, O CLIMA, O SOLO E OS SERES VIVOS

LEITURA COMPLEMENTAR

EROSÃO DO SOLO

Antes dos colonizadores estabelecerem suas fazendas nas pradarias dos


Estados Unidos e do Canadá, no século XIX, os solos eram moderadamente
espessos. Eles se formam de modo relativamente rápido nessa área, porque a
glaciação que terminou há cerca de 10 mil anos favoreceu a abundante deposição
de material fragmentado e facilmente alterável do substrato. Mas os solos formam-
se muito lentamente; mesmo em regiões de rápido intemperismo, podem avançar
em taxas baixas de até 2 mm por ano.

Como a formação dos solos envolve um longo tempo, eles não podem
ser renovados rapidamente depois de terem sido erodidos. Há certo equilíbrio
entre a erosão natural moderada dos solos, feita pelo escoamento da água e
pelos ventos, e a lenta formação de novos solos. Se o solo se forma e erode em
taxas aproximadamente semelhantes, sua espessura permanece constante. Se ele
erode mais lentamente do que se forma, sua espessura aumenta. Se erode muito
mais rapidamente do que se forma, o novo solo não tem oportunidade de se
desenvolver e o solo existente é rapidamente perdido.

Como regra geral, são necessários 30 anos para se formarem 2,54 cm da


camada de topo. Contudo, esse intervalo pode ser perdido em menos de uma
década, como resultado de práticas agrícolas equivocadas e pastagem excessiva.
A agricultura acelera a erosão porque a aradura desagrega o solo e elimina a
cobertura natural de vegetais resistentes à erosão. A erosão do solo tem sido
particularmente intensa em muitas regiões do mundo. Uma delas é a das pradarias
norte-americanas, onde a lavra do solo tem sido muito profunda e as práticas
de conservação vêm sendo ignoradas há bastante tempo. Os solos desagregados
foram adelgaçados e carregados pelos rios da região. As pradarias são, agora,
vulneráveis ao incremento da erosão quando tempestades de pó têm lugar nos
longos períodos de seca.

O plantio em curvas de contorno pode diminuir o dano causado pela


agricultura. Essa prática cobre o terreno com uma sulcagem sinuosa que procura
seguir o contorno das curvas de nível das encostas naturais, ao invés de fazê-la
paralela aos limites da propriedade, que podem cruzar a encosta em qualquer
direção. O plantio em curvas de contorno inibe a erosão, porque boa parte da
água da chuva é conduzida ao longo do sulco de contorno, ao invés de escorrer
diretamente encosta abaixo.

62
TÓPICO 5 | O SOLO E OS SERES VIVOS

Apesar da grande difusão de técnicas agrícolas como essa, os solos


continuam a ser erodidos muito mais rapidamente do que a sua reposição. Em
algumas regiões dos Estados Unidos e do Canadá, mais de 24,7 toneladas de solo
arável em cada hectare de terra cultivada são perdidas anualmente. Somente
nos Estados Unidos, 2 bilhões de toneladas da camada arável são perdidas pela
erosão a cada ano – duas vezes a quantidade do solo formado no mesmo período.
Uma perda nessa escala é equivalente à destruição de 1.927.353,6 hectares de terra
agricultável. Perdas comparáveis estão ocorrendo em outras regiões agrícolas
do mundo, incluindo as estepes da Rússia, partes da África e a dizimação de
florestas tropicais em Madagascar e no Brasil. Os custos diretos e indiretos da
erosão do solo são estimados como sendo de US$ 44 bilhões nos Estados Unidos
e US$ 400 bilhões no mundo inteiro. Se tais perdas persistirem neste novo século,
a agricultura em solos delgados terá redução do rendimento, com o inevitável
abandono dessa atividade nas regiões mais seriamente afetadas. E, uma vez
perdido, o solo leva milhares de anos para se formar novamente. A estimativa
e a previsão da erosão do solo são a base das decisões políticas para o uso de
métodos agrícolas adequadas para manter a agricultura em níveis sustentáveis,
como também para preservar a cobertura da Terra.

Fonte: PRESS, F., et al. Para Entender a Terra.Trad. Rualdo Menegat et al. 4.ed. Porto Alegre:
Bookman, 2006, p. 187.

63
RESUMO DO TÓPICO 5
Neste tópico você estudou que:

● A importância de se conhecer as características físicas e químicas dos solos se dá


em função da necessidade de se planejar adequadamente o seu uso e manejo.

● Os cinco fatores responsáveis pela formação do solo, ou seja, relevo, clima, geologia,
organismos, tempo, agem de forma simultânea, gerando combinações diferentes e,
consequentemente, uma grande diversidade de tipos diferentes de solos.

● À medida que os fatores de formação do solo interagem e a pedogênese se


desenvolve, o material de origem vai sofrendo diferenciações, mais ou menos
paralelas à superfície. Definem-se camadas ou horizontes pedológicos. O
conjunto destes, compreendidos numa sequência vertical desde a superfície até
o material de origem, denomina-se perfil de solo.

● É de grande importância o detalhamento das descrições de campo, pois estas


são fundamentais na interpretação das análises de laboratório.

● Ao se iniciar a descrição do perfil do solo, devem ser registradas algumas


características gerais sobre o local (IBGE, 1995, p. 50). É importante ter-se em mãos
cartas topográficas locais e regionais e fotos aéreas, em escala mais detalhada
possível, para associar-se aos seguintes aspectos a serem observados no campo.

● A classificação dos solos não é tarefa fácil. Requer muito conhecimento teórico
interdisciplinar e prática de campo, já que o solo é produto da combinação
de cinco fatores, em diversas intensidades. A classificação será tanto mais
generalista quanto menos detalhada for a escala de estudos.

● Inicialmente, a grande diversidade de solos pode ser agrupada em três grandes


conjuntos:

I ) Solos Zonais: o clima e os organismos (principalmente vegetação) são os


fatores de maior influência na definição das características, que são bem
desenvolvidas. São solos bem drenados.

II) Solos Intrazonais: o relevo dominante ou o material de origem são os


fatores de maior influência na definição das características. Podem ter
drenagem insuficiente em ambientes alagáveis (várzeas e pântanos) ou sob
climas úmidos. Podem se desenvolver em superfícies elevadas e ricas em
carbonato de cálcio ou sob altas concentrações de sais solúveis (desertos e
bacias costeiras).

64
III) Solos Azonais: não possuem características bem definidas, pois são muito
jovens. Podem se localizar em terrenos íngremes.

● Os solos brasileiros são classificados pelo Centro Nacional de Pesquisas de


Solos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), com
base na presença ou ausência de certos atributos reconhecidos nos horizontes
diagnósticos, responsáveis na definição do tipo de solo.

● Existem quatorze ordens ao nível de solos brasileiros, definidos pela


classificação da EMBRAPA (1999). Com exceção dos Organossolos, todas
as demais ordens são basicamente constituídas por material mineral. Aqui
também apresentamos palavras mnemotécnicas para facilitar a identificação
dos nomes. Após cada descrição, apresentamos a denominação antiga (anterior
a 1999), dos tipos de solos incluídos em cada uma das ordens.

65
AUTOATIVIDADE

1 Quais são e como agem os cinco fatores de formação do solo?

2 Os argissolos, latossolos, cambissolos e gleissolos são tipos de solo comuns


no Brasil. Como se caracteriza o horizonte-diagnóstico de cada um deles?

3 O solo é o substrato que sustenta grande parte da vida na Terra. Corresponde


à parte superficial não consolidada do manto de intemperismo. Diante do
exposto e com base no estudo realizado sobre o solo, analise as afirmativas
a seguir:

I - O estudo da origem e formação dos solos teve início na escola russa, onde se
destacou o geólogo V. V. Dokuchaiev (1846-1903), com estudos realizados
entre 1882 e 1900 sobre os cinco fatores de formação do solo.
II - O estudo do solo se faz pela Pedologia, ciência que enfoca os materiais
existentes a partir da superfície até a rocha intemperizada, a alterita.
III - A formação do solo se dá em função de cinco fatores: relevo, clima,
geologia, organismos, tempo.
IV- À medida que os fatores de formação do solo interagem e a pedogênese
se desenvolve, o material de origem vai sofrendo diferenciações, mais ou
menos paralelas à superfície.
V - A partir dos mecanismos de formação (adições; transformações; transportes
para o interior; movimentos mecânicos e perdas) desenvolvem-se fenômenos
específicos de formação do solo, denominados processos pedogenéticos.

Agora, assinale a alternativa que apresenta as afirmativas CORRETAS:

a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, III, IV e V.


b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, II e V.
c) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas III e V.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

66
UNIDADE 2

A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO
E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Ao final desta unidade você será capaz de:

• compreender de que forma ocorreu a evolução da vida sobre a Terra, de-


nominada aqui de Paleobiogeografia;

• entender de que forma as mudanças climáticas e a deriva dos continentes


influenciaram na evolução da vida em nosso planeta;

• identificar as causas da distribuição e adaptação dos organismos na biosfera.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está organizada em três tópicos, sendo que em cada um de-
les você encontrará atividades para uma maior compreensão das informa-
ções apresentadas.

TÓPICO 1 – A PALEOBIOGEOGRAFIA

TÓPICO 2 – ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

TÓPICO 3 – A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

67
68
UNIDADE 2
TÓPICO 1

A PALEOBIOGEOGRAFIA

1 INTRODUÇÃO
As causas da presente distribuição dos seres vivos não estão apenas
nos fatores atuais, mas também são encontradas na evolução da Terra ao
longo das eras geológicas. Devemos considerar dois aspectos no estudo da
evolução dos seres vivos:

a) as características do meio físico atual e as modificações que sofreu durantes as


eras geológicas;
b) a variabilidade genética dos seres vivos, refletindo o seu potencial em preservar
ou desenvolver adaptações para a manutenção das espécies, submetidas às
pressões do meio.

As populações, quando se deslocam, diferenciam-se umas das outras por


causa das influências dos ambientes em que vivem, e dos processos genéticos.

Procurar as causas da distribuição atual dos organismos nos conduz


também a entender os padrões passados e atuais do clima, que pressionaram a
evolução das espécies, os deslocamentos de animais e plantas, as relações entre
eles e as necessidades de adaptação a um novo ambiente.

2 O ESTUDO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS E A SUA


IMPLICAÇÃO NA BIOGEOGRAFIA
Estudar os climas do passado depende diretamente da obtenção de dados,
que são inferidos de indicadores climáticos naturais. Os vestígios mais estudados
são: os fósseis de plantas, de animais e depósitos sedimentares. Eles indicam a
duração e a extinção das condições de temperatura e umidade desde o começo
do período Cambriano, há 600 m.a., quando o conteúdo de oxigênio da atmosfera
cresceu o bastante para permitir o surgimento de formas de vida, que, então,
expandiram-se rapidamente.

69
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

O estudo dos climas do passado tem que ser feito tomando como base
as condições ambientais atuais, para permitir comparações. Uma espécie atual
exige condições ambientais que lhe sejam adequadas. Desta forma, projetando-
se para o passado, os cientistas concordam que uma espécie ancestral também
exigia condições adequadas para sobreviver. Este princípio, chamado de
uniformitarismo, regula vasta variedade de estudos geológicos e climáticos que
envolvam os fósseis do passado.

Também evidências inorgânicas são úteis para estudar os climas


passados. Depósitos de origens eólicas, aluviais, glaciais ou vulcânicas,
formas de relevo que mostrem sinais de inundações, glaciações ou
ações dos ventos, linhas de praia que indiquem avanços e recuos do
nível de lagos ou mares, também são evidências de processos climáticos
passados. Nos Alpes, estudos de glaciologia descobriram que uma
combinação de verões frios e invernos muito frios e com nevascas
violentas favorece a expansão das geleiras. (PARRY, 1978, p. 39).

Um claro retrato dos climas pretéritos está impresso nos anéis de


crescimento de algumas espécies de árvores de climas temperados. Neles, o
desenrolar das estações do ano pode ser acompanhado ano a ano. O estudo dos
anéis de crescimento das árvores é chamado dendrocronologia. No norte da Europa
e da América do Norte e em regiões semiáridas descobriu-se que os anéis de
algumas espécies têm estreita relação com o clima. Nas coníferas, temperaturas
altas no verão exercem forte controle e favorecem o crescimento das árvores. Nos
climas áridos, a baixa umidade é fator limitante ao crescimento.

Cada ano de vida de uma árvore é indicado nos anéis. O anel mais externo
aponta a idade atual do espécime. Os anéis refletem as condições climáticas de
uma determinada época. Temperatura e umidade adequadas indicam uma longa
estação de crescimento, o que resulta em anéis largos. Períodos de seca e de frio
indicam anéis estreitos e um curto período de crescimento.

O crescimento das árvores está ligado diretamente a um tecido chamado


câmbio, que regula este crescimento. Nos climas temperados e frios, o câmbio
funciona na primavera e no verão, quando a árvore retorna da dormência do
inverno. No fim da primavera ou do verão, o câmbio produz um anel. No outono,
o câmbio entra em repouso e só volta a funcionar na primavera. Portanto, cada
anel indica o início da primavera e o fim do verão.

Nas espécies tropicais e subtropicais não há separação muito nítida entre as


estações do ano, de modo que o câmbio funciona durante todo o ano. Logo, não há
produção de anéis de crescimento na árvore, o que torna difícil calcular a sua idade.

Entretanto, em alguns casos, em épocas secas e chuvosas, nas regiões


tropicais e subtropicais, pode ocorrer a produção de anéis de crescimento. Neste caso,
na ausência de estações nítidas, a quantidade de água disponível para as plantas
é que determina as atividades do câmbio – épocas secas mostram anéis apertados,
indicando um crescimento lento ou ausente, e épocas úmidas são indicadas por anéis
mais largos, que mostram estação favorável ao crescimento. (FERRI, 1972, p. 80).

70
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

Por outro lado, sabemos que épocas secas estão, em geral, relacionadas
com climas frios, e épocas úmidas, com climas quentes.

Um jatobá (Hymenaea spp, família Leguminosae) com 600 anos de idade,


encontrado perto de Manaus, mostrou um estreitamento dos anéis e um aumento
da densidade da madeira, o que sugere um dessecamento e resfriamento do clima
amazônico (MOLION, 1995).

Os anéis de crescimento ilustram até períodos de 3 mil anos nas árvores


atuais, e mais de 5 mil anos em fósseis de plantas. Cientistas americanos, no sul
dos EUA (CHRITCHFIELD, 1983 p. 230), mostraram estreita relação entre as
flutuações das chuvas anuais e o crescimento de anéis em árvores atuais. Outros
estudos apontam correlação entre temperatura, pressão e circulação atmosférica,
o que torna possível inferir flutuações climáticas.

O uso de isótopos instáveis, radioativos é comum nos estudos de


geocronologia. Paleossolos, turfeiras, resíduos de evaporação da água (evaporitos),
blocos de gelo retirados do interior de geleiras e depósitos de carbonato de
cálcio em cavernas podem ser datados por radiometria. Isótopos radioativos de
potássio, rubídio, tório e urânio têm sido empregados com êxito para estabelecer
a idade de rochas.

Restos orgânicos são datados pelo Carbono-14, embora o espectro de


tempo alcançado por este método seja de apenas 50 mil anos. Outro método para
datar restos orgânicos é pela medição de aminoácidos. Alguns aminoácidos são
estáveis, porém, alguns são pouco estáveis e a taxa de sua perda – ou decaimento
– se deve à temperatura. Conhecendo-se a taxa de decaimento de aminoácidos e
as temperaturas relacionadas, pode-se estabelecer as variações das temperaturas
ambientais por milhões de anos.

3 ELEMENTOS DE APOIO PARA A RECONSTITUIÇÃO DE


ÉPOCAS PASSADAS
Não podemos estudar a Biogeografia de hoje sem compreender o passado
geológico da Terra. Entender o passado nos leva a conhecer os fatores físicos e
os grupos taxonômicos (principalmente classe, ordem, família, gênero e espécie)
que constituíam as paleoformas de vida.

As técnicas mais usadas atualmente são as seguintes.

71
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Formas de relevo. O relevo é um espelho preciso das condições climáticas,


porque preserva as modificações ocorridas no clima de uma dada época, como
flutuações de clima úmido para seco ou de frio para quente (TROPPMAIR,
1989, p. 168). O relevo do Parque Estadual de Vila Velha, em Ponta Grossa
(Paraná), tem idade paleozoica e toda a sua evolução se deu numa sucessão
de climas glaciais e interglaciais, desde o Carbonífero. O estudo cuidadoso da
geomorfologia local mostra todas essas variações, que ficam impressas nos
sedimentos. (BIGARELLA et al., 1985).

A orogênese e as alterações das linhas de costa podem se tornar fatores


limitantes, que obrigam as espécies a desenvolver complexos mecanismos
de adaptação (PEREIRA & ALMEIDA, 1996 p. 207). Na Praia da Pinheira, no
Município de Paulo Lopes (Santa Catarina), há testemunhos de regressão do mar
holocênico, representados por cordões litorâneos em região de Laguna, Santa
Catarina - Brasil (CARUSO JÚNIOR, 1992).

3.1 PALEOSSOLOS E SEDIMENTOS


A granulometria das partículas do solo e dos sedimentos é um
testemunho de paleoclimas. Na costa brasileira pode-se ver estágios do
alargamento do Oceano Atlântico, registrados nos sedimentos marinhos.
(SALGADO-LABOURIAU, 2001).

3.2 ANÁLISE POLÍNICA OU PALINOLOGIA


Grãos de pólen e esporos, encontrados em sedimentos, informam sobre
espécies vegetais e sobre os climas ocorridos à época em que foram produzidos.
Conhecendo-se como se deu a velocidade e a espessura da sedimentação, pode-
se inferir a época da deposição e as plantas que liberaram o pólen. Sabendo-se
as características do grupo taxonômico, é possível reconstituir o ambiente de
determinada época. A análise de pólens obtidos em sedimentos de lagos e turfa
em Carajás (Pará) indica que grande parte da área atualmente ocupada pela
floresta amazônica já foi colonizada por vegetação de cerrado em certos períodos
mais secos do Pleistoceno. (ABSY et al., 1993).

No Parque dos Aparados da Serra, Roth & Lorscheitter (1991) mostraram


as características paleoambientais da região nos últimos 10.000 anos, estudando
as turfeiras e o pólen encontrados nos sedimentos: há 11.000 anos, o clima era
quente, com elevada pluviosidade, e a vegetação era de florestas em toda a
região estudada. Cerca de 600 anos mais tarde (10.480 anos), o clima passou para
semiárido e a cobertura vegetal mudou, em sua maioria, para gramíneas, que
substituíram as árvores das florestas.

72
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

3.3 DATAÇÃO RADIOMÉTRICA


Analisa a velocidade de desintegração de elementos radioativos
(isótopos radioativos) presentes nas rochas. Os elementos radioativos perdem
metade da sua massa atômica em períodos de tempo, denominados de meia-
vida, que variam segundo o elemento. À medida que perdem massa, ganham
uma nova estrutura atômica e transformam-se em outro elemento de massa
menor (quadro a seguir).

QUADRO 3 – DESINTEGRAÇÃO DE ELEMENTOS RADIOATIVOS

Isótopo radiativo Produto final – Estável Meia-vida (Em anos)


Urânio, U-235 Chumbo, Pb-207 713 milhões
Tório, Th232 Chumbo, Pb-208 14.000 milhões
Tório, Th-230 Protactínio, Pa-231 75.200 mil
Potássio, K-40 Argônio, Ar-40 1.300 milhão
Carbono, C-14 Nitrogênio, N-14 5.730±40

FONTE: O autor

Produto final e meia-vida de alguns isótopos usados para datações.


Baseado em Salgado-Labouriau (2001, p. 38).

A meia-vida é o período em que o elemento perde 50% da sua massa.


Gastará outro tanto para perder mais 50%, e assim por diante. Por
exemplo, o carbono, C-14, tem uma meia-vida de 5.730 anos, período
no qual perderá metade da sua massa. O mesmo tempo ele gastará
para perder outros 50%. Conhecendo-se esse intervalo de tempo e a
quantidade restante do carbono, pode-se deduzir a idade de fósseis.
(TROPPMAIR, 1989, p. 168; 2002, p. 127).

O método do Carbono-14 data idades entre 25.000 e 30.000 anos. Datações


de idades mais avançadas exigem outros métodos. Por exemplo, o método
potássio-argônio e o rubídio-estrôncio mostraram que as idades do Escudo
Oriental Africano são idênticas às do Escudo Brasileiro. (EICHER, 1969, p. 112).

3.4 PALEONTOLOGIA
O estudo dos fósseis desvenda muita coisa do passado da Terra. Por
exemplo, pode-se identificar o clima da época em que vivia o fóssil, desde que
se conheçam as suas características. No Estado do Acre, estudando fósseis de
animais pastadores dos gêneros Tapirus (anta), Tayassu (cateto ou queixada),
Glyptodon (gliptodonte, um ancestral do atual tatu), Toxodon (preguiça) e Dasypus
(tatu), Ranzi (2000) identificou um ambiente de savana de idade pleistocênica
onde hoje cresce a floresta amazônica.

73
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

3.5 DENDROCRONOLOGIA
O estudo dos anéis de crescimento de árvores permite conhecer a sua
idade e as condições climáticas a que estiveram elas submetidas durante o
período de crescimento. As sequoias são as mais longevas espécies de plantas
da Terra – a sua idade pode ultrapassar 5 mil anos. A Sequoia sempervirens é uma
dessas decanas da natureza (SALGADO-LABOURIAU, 2001, p. 50). Molion
(1995), mostrou um jacarandá amazonense de 600 anos, cujos anéis indicavam
todas as variações climáticas ocorridas nesse período.

3.6 VARVES EM VARVITOS


Depósitos de argila, organizados em camadas no fundo de lagos glaciais
e submetidos ao congelamento em períodos frios, originam uma rocha chamada
varvito. Os estratos sedimentares são chamados de varves e indicam as condições
ambientais em que se formaram (DANSEREAU, 1957, p. 117). Em Santa Catarina,
no Município de Trombudo Central, existem camadas de varvitos que indicam a
idade e em que tipos de ambiente elas se formaram.

3.7 REFÚGIOS FLORESTAIS


São ilhas de vegetação que não combinam com o clima atual. Por exemplo,
na Serra da Mantiqueira e na Serra da Bocaina, a existência de refúgios de Araucaria
angustifolia, em altitudes acima de 1.500 metros, numa região tropical, sugere um
clima relativamente mais frio que o atual no passado, que fez com que a araucária
emigrasse para o norte.

3.8 PALEOMAGNETISMO
Quando as rochas magmáticas se resfriam, deixam marcados nelas
vestígios da direção do campo magnético terrestre. Rochas magmáticas com mais
de 1 bilhão de anos permitiram indicar a posição do território brasileiro no Pré-
Cambriano. (BICUDOI, 2002).

3.9 FÓSSEIS VIVOS


Alguns animais e plantas atuais originaram-se em eras passadas, mas
continuam vivos. A árvore Gingko biloba, encontrada no Japão e na China,
tem idade triássica e é a única espécie viva do gênero Gingko. O ornitorrinco
(Ornithorhynchus anatinus) é um mamífero primitivo e estranho: ele põe ovos, tem
bico de pato, amamenta os filhotes e não existem outros espécimes do seu gênero.
Vive apenas na Austrália e na Tasmânia.

74
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

As técnicas de estudo do passado são inúmeras e não atuam sozinhas,


uma dando suporte à outra, como peças de um quebra-cabeça, demonstrando
que elas se correlacionam umas com as outras.

4 A DERIVA CONTINENTAL E O SEU SIGNIFICADO


BIOGEOGRÁFICO
O deslocamento dos continentes teve reflexos em todo o planeta e mudou
a sua face, ao originar oceanos e mares, alterar o clima mundial e levar a uma
incomensurável mudança nas formas de vida em todo o mundo.

Em 1915, o astrônomo e climatologista alemão Alfred Wegener (1880-


1930), desenvolveu a teoria da deriva continental. Era um tema amplamente
discutido desde o século XIX, na Europa.

Wegener sustentava que os continentes formavam apenas um único bloco,


que ele denominou de Pangea, cercado por um único oceano, a que chamou de
Panthalassa. Ele apoiou-se em alguns fatos:

• tilitos da mesma idade ocorriam na Índia, Austrália, África do Sul e Brasil;


• grande semelhança entre a flora da Europa e da América do Norte;
• o réptil fóssil Mesossaurus, do Permiano, era encontrado na África e na América
do Sul;
• a flora de Glossopteris, do Devoniano, também era encontrada na África, na
Austrália, na Ásia e na América do Sul.

Ele não elaborou, contudo, uma boa explicação para o deslocamento dos
continentes, o que lhe valeu muitas críticas e a sua teoria foi quase que esquecida.
Entretanto, a moderna teoria da tectônica de placas, surgida nos anos 60, a reviveu.

Eicher (1969, p. 109) afirmava:


Muitas evidências geológicas sugerem que a deriva ocorreu, mas não
a provam. Durante décadas recentes esta evidência, por si só, não
conseguiu influenciar os adeptos da permanência continental, que
continuaram céticos a respeito do que consideravam uma hipótese
radical e desnecessária.

As ideias de Wegener foram aceitas a partir da década de 1970, depois que


os métodos de datação e de paleomagnetismo foram aperfeiçoados no final dos
anos 60. A tectônica de placas sustenta que os blocos continentais são empurrados
por fortes correntes de magma e deslizam sobre as placas oceânicas. A América
do Sul afasta-se da África cerca de 5 centímetros por ano (LEONARDI, 1984, p.
51). A Califórnia desloca-se para noroeste numa velocidade de 3 a 5 centímetros
por ano. (EICHER, 1969, p. 112).

75
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A separação dos continentes encerra um importantíssimo significado


biogeográfico. Graças ao deslocamento, as populações de animais e de plantas
se separaram e com o passar do tempo, foram constituir novas famílias, gêneros
e espécies. O deslocamento explica, por exemplo, por que a araucária existe no
Brasil, na Argentina, no Chile e na longínqua Austrália. Explica também por que
macacos existem na América tropical e na África. E também revela por que a
fauna da Austrália difere tanto das demais.

5 BREVE DESCRIÇÃO DA EVOLUÇÃOBIOGEOGRÁFICA NAS


ERAS GEOLÓGICAS

5.1 O ARQUENO
A era mais antiga da Terra é o Pré-Cambriano. Foi dividida em dois
períodos: Arqueano, que começou há 4,6 bilhões de anos e terminou há 2,5 bilhões
de anos, e o Proterozoico, que se estendeu de 2,5 bilhões a 540 milhões de anos. O
Arqueano corresponde a 45,66% do tempo geológico total.

A crosta ainda era muito fina, com predomínio de rochas vulcânicas


basáltico-andesíticas, envolvidas pelo oceano de magma fumegante. A gravidade
já prendia uma tênue atmosfera, mortal para os seres vivos atuais, formada
apenas por elementos livres – hidrogênio, nitrogênio e oxigênio.

Há 3,5 bilhões de anos, reações entre os elementos resultaram no dióxido


de carbono (CO2), na amônia (NH3), no metano (CH4), no vapor de água, e, pouco
mais tarde, apareceram o ácido clorídrico (HCN), o gás sulfídrico (H2S) e o dióxido
de enxofre (SO2). Desta forma, a atmosfera tornou-se redutora.

Tormentas violentas levaram para os mares esses compostos. Os


oceanos começavam a se formar. Ainda eram de água aquecida e, no seu
interior, o calor atuou como catalisador e os compostos recém-chegados da
atmosfera formaram os primeiros aminoácidos e polímeros e, mais tarde, os
ácidos nucleicos, RNA e DNA.

Bolsões de oxigênio apareciam nos mares rasos e as primeiras algas


azuis, as cianofícias, primeiros organismos autotróficos, começaram a fazer
fotossíntese e liberar mais oxigênio na água. Na atmosfera, o oxigênio do vapor
de água expelido pelos vulcões e pela evaporação dos oceanos aquecidos formou
a primeira capa de ozônio, momento fundamental para a vida, que iniciava seus
primeiros e tímidos passos na proteção dos oceanos.

76
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

Junto com as cianofícias, que cresciam em número e oxigenavam cada vez


mais os mares, apareceram os primeiros organismos heterótrofos aeróbicos. A
partir dessa época, a concentração de oxigênio não parou mais de crescer. A vida
surgia, pouco a pouco, na Terra.

Os organismos mais antigos foram os estromatólicos, depósitos de


bactérias cianofícias, que se agregavam em rochas próximas às costas. Os fósseis
de estromatólitos foram encontrados na África do Sul e na Austrália. No Brasil,
apareceram em Itapeva (SP), Corumbá (MT) e nas proximidades de Curitiba (PR)
(MCALESTER, 1971; SALGADO-LABOURIAU, 1994).

5.2 PROTEROZOICO OU PRÉ-CAMBRIANO


Iniciou-se há 2,5 bilhões de anos. É formado pelo Proterozoico Inferior
(2,5 bilhões a 1,6 bilhão de anos), Proterozoico Médio (1,6 bilhão a 900 milhões de
anos) e Proterozoico Superior (900 milhões a 540 milhões de anos).

A crosta ainda era inconsolidada e o teor de oxigênio na atmosfera e


na água, muito pequeno. A velocidade da Terra, ainda muito próxima do Sol,
era de 13.500 km/h. Os dias tinham 14 horas e 50 minutos e o ano, 880 dias. No
Cambriano (600 ma), com o afastamento cada vez maior do Sol, a velocidade da
Terra reduziu-se para 1.800 km/h, o dia tinha 21 horas e 19 minutos e o ano ficou
mais curto, 424 dias. A velocidade atual da Terra no equador é de 1.600 km/h.

Glaciações sucessivas, vulcanismos, terremotos e colisões constante dos


blocos continentais eram comuns nesse período. O primeiro grande continente,
Rodínia – terra-mãe, em russo – estendia-se pelos dois hemisférios.

Três ciclos orogenéticos ocorreram nesse período. Há 1 bilhão de anos,


a orogênese Laurenciana afetou a parte sententrional da América do Norte. Há
800 milhões de anos foi a vez da orogenia Huroniana atingir os Grandes Lagos,
na América do Norte, a Escócia e chegou até a Finlândia. Finalmente, no fim
deste período, a orogenia Animiquiniana não teve muita expressão. (FONT-
ALTABA & ARRIBAS, 1964).

No Pré-Cambriano Inferior, uma grande glaciação envolveu toda a Terra,


excetuando-se a faixa equatorial, que se manteve aquecida.

Os primeiros testemunhos de vida na Terra têm a idade de 3,7 bilhões de


anos – eram os estromatólitos, estruturas de carbonato de cálcio, ramificadas ou
laminadas, que formavam bancos com a espessura média de 1 metro, podendo,
em raros casos, chegar a algumas dezenas de metros (McAllester, 1971: 30). A
flora do Silex Flint (EUA e Canadá) e a fauna de Ediacara (Austrália) são dois
dos mais importantes depósitos de estromatócitos de idade pré-cambriana
superior (650 ma).

77
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A flora do Sílex Gunflint era formada por filamentos delgados


microscópicos e corpos esféricos, muito semelhantes às atuais bactérias
(MCALLESTER, 1971, p. 32). Nas montanhas de Ediacara, no sul da Austrália,
em 1947, decobriram-se impressões macroscópicas de animais de corpo mole
gravadas no arenito, que lembram as atuais medusas, pólipos e vermes. A
fauna de Ediacara inclui-se em dois filos atuais: os Celenterados (organismos
multicelulares, como os corais, as anêmonas e as medusas) e os Anelídeos
(vermes segmentados, como a minhoca).

A fauna de Ediacara, para alguns autores, assinala a passagem do


Proterozoico para o Paleozoico (Cambriano), quando novas formas de vida
apareceram para substituí-la.

Embora tenha sido o período mais longo da história da Terra, o Pré-


Cambriano é pobre em registros fósseis, embora os mares já contivessem uma
população apreciável. Os estromatólitos, de idade pré-cambriana, aparecem
no Brasil, encontradas em calcário, em Itapeva (SP), Corumbá (MT) e nas
proximidades de Curitiba. (Id. p. 30).

A Plataforma Sul-Americana, de idade arqueana, é formada de rochas


metamórficas (anfibolitos, granulitos, granitoides, de idade arqueana),
associadas a dobramentos, sedimentos e rochas vulcânicas de idade
proterozoica. A Plataforma consolidou-se no Proterozoico Superior e
início do Paleozoico, no fim do Ciclo Brasiliano. As rochas mais antigas
da América do Sul encontram-se no Brasil Central, nas proximidades
das Guianas (MIOTO; HASUI, 1987, p. 45).

No final do Proterozoico Superior, a Terra foi assolada pela mais duradoura


glaciação em toda a sua história, que se estendeu de 1 bilhão a 600 milhões de
anos e atingiu todos os continentes.

A maior glaciação da história da Terra deu-se no final do Proterozoico


Superior, entre 1 bilhão e 600 milhões de anos e deixou marcas em quase todos
os continentes. Os tilitos, rochas originadas da consolidação de fragmentos
transportados por geleiras (conglomerado glaciário), são registros das glaciações
deste tempo. No final do período, em consequência dessa glaciação, uma
transgressão marinha atingiu todo o mundo.

A essa época, Rodínia rompeu-se em dois grandes blocos continentais, que,


mais tarde, também se partiram em blocos menores. Abriu-se um novo oceano –
Lapetus – que separava os dois grandes blocos. Nasciam, então, os continentes de
Laurásia (hoje, ocupado pela América do Norte, Sibéria e China), que se postava
na linha do equador, Báltica (o atual norte da Europa), nas latitudes médias, e
Gondwana, o mais extenso, que englobava das latitudes baixas do hemisfério
Norte até o polo Sul.

78
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

5.3 A ERA PALEOZOICA


Seis períodos compõem a era Paleozoica: Cambriano, Ordoviciano,
Siluriano, Devoniano, Carbonífero e Permiano. Estende-se de 600-540 milhões a
270 milhões de anos.

5.3.1 Cambriano
A transgressão marinha do período anterior indica o começo deste período
há cerca de 570 MA, o que corresponde a 1.3% do tempo geológico total. A fauna
marinha invadiu as plataformas rasas inundadas na transgressão e, daí, bem mais
tarde, deixaria os oceanos para colonizar as terras baixas.

Na transição com o Pré-Cambriano, época de elevado número de animais


e multicelulares heterótrofos – artrópodos, equinodermos e moluscos – com a
vida bem consolidada, convivia com algas e outras plantas marinhas (SALGADO
LABOURIAU, 1996). Com exceção do filo Bryozoa, todos os filos invertebrados
atuais dotados de partes duras surgiram no período de transição (MCALLESTER,
1971). Atualmente, são conhecidas mais de 900 espécies que surgiram neste período.

Três províncias faunísticas ocorriam nos oceanos. A primeira aparecia ao


largo de Laurásia, na faixa equatorial. Outra província ficava ao longo da costa
de Báltica, nas latitudes médias e altas, de águas frias e com camadas de folhelhos
e arenitos de 250 metros de espessura. A terceira e mais importante província
apareceu ao largo de Gondwana.

No final do Cambriano Inferior, o mar recuou e tornou a transgredir no


Médio. Na nova subida do oceano ocorreu a radiação adaptativa e apareceram
classes de trilobitas e artrópodos rastejadores e nadadores, porque seus hábitats
foram ampliados com o avanço do mar. A fauna de Ediacara e a do Folhelho de
Burgess (Colúmbia Britânica, Canadá) tiveram rápido desenvolvimento.

Importante acontecimento começou a se desenvolver nessa época: o


teor de oxigênio na água já permitia o surgimento de seres aeróbicos simples.
Invertebrados de corpo mole expandiram-se simultaneamente e constituíram as
faunas de Ediacara e do Folhelho de Burgess (Colúmbia Britânica, Canadá). O
folhelho de Burgess tem mais de 35 mil espécimes de celenterados e anelídeos de
corpo mole. Artrópodos – trilobitas – predominam nele (MCALLESTER, 1971, p.
74). No Brasil, o folhelho de Ponta Grossa (PR) é rico em artrópodos dessa época
(Paes Leme, 1943, cit. por BIGARELLA et al., 1997, p. 21). Os trilobitas foram um
dos mais longevos animais que existiram na Terra – dominaram os mares por 400
milhões de anos. Entraram em decadência até se extinguir apenas no Permiano
(270 MA). No Cambriano, compunham mais de 60% da fauna marinha. Eram
predadores vorazes, que não davam moleza para as presas. Eram cobertos por
uma grossa carapaça de quitina com carbonato de cálcio e fosfato de cálcio. Seu
tamanho variava entre 2 e 70 cm, sendo mais comuns em torno dos 10 cm.

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UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Onze filos animais desenvolveram-se durante o Cambriano – Annelida,


Arthropoda, Brachiopoda, Chordata, Ctenophora, Echinodermata, Hemichordata,
Mollusca, Onychophora, Porifera e Priapulida. A flora fotossintética era unicelular e
incluía bactérias e algas dos reinos Protista e Monera.

A fauna do Cambriano era muito rica e era composta de 60% de artrópodos,


em que se inserem mais de mil espécies de trilobitas, 30% de braquiópodos e 10%
de esponjas, cnidários, moluscos e anelídeos. Algas azuis, fotossintetizantes, não
formaram fósseis. No Cambriano Médio, algas verdes, Chlorophyta, eram comuns.

As extinções neste período se deram em momentos de regressão marinha


– os organismos eram expostos à radiação solar e ao ambiente fora d'água, a que
não se achavam ainda preparados para enfrentar.

5.3.2 Ordoviciano
Segundo período da era Paleozoica, durou de 505 milhões a 438 milhões
de anos (1,57% do tempo geológico).

O Ordoviciano presenciou uma significativa expansão dos seres


marinhos – as 200 famílias existentes no Cambriano passaram para 500 famílias
neste período. Lado a lado com os trilobitas, grupos germiformes (artrópodos
sem carapaça, celenterados, anelídeos) ocuparam os nichos marinhos por
irradiação adaptativa.

As plantas também evoluíram e as primeiras espécies, que migrariam para


as terras emersas bem mais tarde, apareceram nos mares tropicais de águas rasas.

NOTA

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para conhecer mais sobre as primeiras espécies, acesse o site:
<http://freenet-homepage.de/klima/indexe.htm, 2003>. Acesso em: 13 jul. 2010.

Havia mesmo um esboço de vida terrestre – fósseis de insetos assinalam, em


rochas continentais do Ordoviciano Superior, que já existiam tentativas de emigração.

Animais de corpo mole desenvolveram carapaças e conchas para


proteção contra a predação empreendida pelos trilobitas e cefalópodes
(semelhantes ao atual náutico).

80
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

Os trilobitas experimentaram um primeiro declínio quando as águas


dos mares tropicais, mais quentes e menos oxigenadas, os obrigaram a emigrar
para águas mais frias. Perduraram então, por mais 300 milhões de anos, até o
fim do Paleozoico.

A emigração dos trilobitas foi benéfica para suas presas – nautiloides e


moluscos bivalves –, cujas populações expandiram nos mares mais rasos. Um
novo personagem surgiu nessa época: peixes ostracodermos, com escamas
ósseas (FERNANDES, 1982), carapaça óssea e sem mandíbula. Seus fósseis são
encontrados em calcários do Ordoviciano Inferior na Austrália e nos EUA.

Todos os filos de animais modernos já estavam formados no final do


Ordoviciano.

Existiam quatro continentes, no Ordoviciano: Laurásia (América do


Norte), Báltica (Europa meridional), Sibéria e Gondwana.

Uma potente glaciação, originada no sul de Gondwana, no Ordoviciano


Inferior, atingiu todo o planeta e extirpou mais de 60% da fauna e da flora dos
mares. Durou entre 300 mil e 500 mil anos. Desconhece-se a causa dessa glaciação,
mas os indícios dirigem-se para uma modificação na atmosfera, quando houve
uma drástica redução no teor de dióxido de carbono, cuja causa também é
ignorada. A atmosfera não possuía ainda uma boa quantidade de umidade, que
se juntasse aos demais gases para formar o efeito estufa. Desprovida de um de
seus gases mais importantes, o dióxido de carbono, o efeito estufa reduziu-se ao
mínimo e fez cair violentamente a temperatura. O clima só voltou a se aquecer
no final do período.

5.3.3 Siluriano
O Siluriano iniciou-se há 438 milhões de anos e terminou há 410 milhões de
anos, tempo equivalente a 0,6% do tempo geológico. Cerca de 400 milhões antes deste
período, os continentes de Laurência, Sibéria e Báltica iniciaram um movimento que
os levou a coalescer e, no final do Siluriano, dar origem à Laurásia. Esse mecanismo
foi chamado de orogênese caledoniana (FONT-ALTABA & ARRIBA, 1964) e
resultou nas montanhas Caledonianas, na Escandinávia, as terras altas escocesas, a
Groenlândia e os Apalaches. O movimento orogenético prosseguiu até o Devoniano.

Com o ocaso da glaciação ordoviciana, o clima voltou a ser quente e


úmido. Em algumas regiões, a 40º graus de latitude norte e sul, imperava um
clima árido. A transgressão marinha subsequente originou mares continentais
rasos e bem oxigenados, logo invadidos pelas plantas e por invertebrados, que
encontraram uma infinidade de nichos vazios.

81
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Os trilobitas prosseguiram a sua via crucis em direção ao


desaparecimento inexorável. Os mares eram agora dominados por
braquiópodos de idade cambriana, que perfaziam mais de 80% do total
da fauna. Suas conchas são utilizadas para a datação dos depósitos.
Mais de 30 mil espécies de fósseis de braquiópodos foram descritas.
Conhecem-se, hoje, 68 gêneros e 260 espécies vivas, todos marinhos,
solitários e, quase sempre, presos ao fundo do mar por um pedúnculo.
(STORER et al., 1991, p. 399).

Contudo, quem dava as ordens nos mares eram os euripterídeos,


uma subclasse de artrópodos extinta – Eurypterida. Um dos gêneros
existentes então, Ptegygotus, semelhante ao atual escorpião, mas com
três metros de comprimento, o maior artrópodo que já existiu na
Terra. Os euripterídeos nadavam ou rastejavam no fundo do mar e
eram perigosos predadores de vermes e peixes pequenos. (S T O R E R
et al., 1991, p. 476).

NOTA

Prezado(a) Acadêmico(a)!
Para aprofundar seus estudos, acesse o site: <http://freenet-homepage.de/klima/indexe.htm,
2003>. Acesso em: 13 jul. 2010.

Tentativas ainda tímidas, mas bem-sucedidas, de ocupar as terras baixas


foram dadas pelas pterifófitas – plantas vascularizadas, que não produzem
sementes, mas apenas esporos, como as samambaias. São os mais antigos fósseis
de vegetais conhecidos.

O final do período foi marcado por uma crescente aridez, que substituiu
a umidade até então reinante.

5.3.4 Devoniano
Durou de 410 mihões até 350 milhões de anos. Foi, talvez, o mais
importante período do ponto de vista biogeográfico – plantas vasculares e animais
invertebrados deixaram em definitivo a proteção dos oceanos e ganharam as
terras baixas litorâneas. O Devoniano é chamado de a idade dos peixes, porque,
nele, os peixes tiveram importante desenvolvimento.

Os oceanos proporcionavam aos organismos uma quantidade de


facilidades – evitavam mudanças bruscas de temperatura, o ambiente era
relativamente estável, a comida era abundante e a proteção era fácil. A mudança
para o ambiente subaéreo ou para os lagos e pântanos de água doce litorâneos
obrigou-os a importantes adaptações fisiológicas e morfológicas.

82
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

As plantas enfrentaram falta de água nas rochas secas, sob intensa luz
solar, enorme perda de água pela transpiração excessiva, acelerada pelo vento
constante. (MCALLESTER, 1871, p. 81). Os animais se viram obrigados a
desenvolver estruturas para respirar o oxigênio do ar. A reprodução assexuada
viu-se em perigo – na água os gametas podiam ser liberados sem muitos
problemas, mas nas rochas nuas e quentes eles corriam perigo de dessecação.

Mas nem tudo era fator limitante nas zonas litorâneas – havia luz em
abundância, oxigênio e comida existiam em quantidades suficientes, desde que
as plantas se adaptaram muito bem às condições subaéreas.

As algas verdes, do gênero Chlorophyta, foram atraídas pelas


desembocaduras de águas cristalinas e rasas dos rios e córregos. Foram eles os
primeiros seres vivos a colonizar as terras e podem ter sido os ancestrais de todas
as plantas vasculares terrestres atuais, que constituem o filo Tracheophyta.

Dos charcos à beira-mar, as clorófitas retiravam o dióxido de carbono do


ar e liberavam o oxigênio. Desta forma, conseguiram, pouco a pouco, iniciar a
invasão do interior dos continentes. Contudo, apenas no final do período elas
atingiram porte arbóreo.

As primeiras plantas semelhantes a árvores constituíram a Flora de


Archaeopteris (literalmente, fetos antigos) – pequenos fetos com troncos de um
metro de diâmetro e altura entre 9 e 12 metros, que recobriam solos úmidos de
territórios onde hoje se acham a Rússia, a Irlanda, o Canadá e os Estados Unidos
(SALGADO-LABOURIAU, 1994, p. 105). As classes Psilophytopsida, Lycopsida,
Psilotopsida, Articulatae e Filices – todas do filo Pteridophyta – são fósseis (Siluriano
e Devoniano), mas têm descendentes atuais. (JOLY, 1991, p. 134).

As plantas tinham anéis de crescimento que indicavam um clima sazonal


e colonizaram cursos d’água, onde formavam florestas de galeria. Em solos bem
drenados, os fetos eram substituídos por cobertura herbáceo-arbustiva. No Devoniano
Inferior, os fetos predominavam em toda a Terra. Produziam esporos e não sementes.
As gimnospermas primitivas apareceram no final dos Devonianos. Tinham raízes
bem desenvolvidas e colonizaram as proximidades dos pântanos costeiros e de áreas
baixas e muito úmidas, onde os esporos adaptaram-se bem por causa da umidade. O
auge das gimnospermas, entretanto, deu-se no Jurássico e no Cretáceo.

Muitas espécies foram comuns aos períodos Siluriano e Devoniano. O


grupo mais antigo das plantas terrestres, a ordem Psilophytales, teve seu ápice no
Devoniano Médio e desapareceu no Superior. A ordem Lepidondendrales é toda
ela fóssil – mais de 100 espécies fósseis conhecidas (ib.). Nasceu no Devoniano,
alcançou o seu clímax no Carbonífero e desapareceu no Permiano. A ordem
Equisetales tem uma família, Equisetaceae, com espécies fósseis e atuais, como a
cavalinha (Equisetum giganteum). Sua idade é do Carbonífero.

83
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Ao passo que as plantas vasculares invadiam as terras emersas, nos


mares vazios, esponjas e corais – de idade cambriana e ordoviciana
–, junto com os braquiópodos, ocupavam os nichos vazios. Os
braquiópodos chegaram ao seu clímax no Devoniano, e no Mesozoico
entraram em declínio. Das 30 mil espécies devonianas existentes,
restam apenas 285 espécies fósseis. (STORER et al., 1991, p. 242).

Hoje, existem 63 gêneros e 260 espécies de braquiópodos (Storer et al.,


1991 p. 242).

Os invertebrados que se arriscaram fora do mar eram lamelibrânquios


(moluscos bivalves), gastrópodos (moluscos com concha espiralada) e crustáceos.
Ocuparam os gigantescos charcos e mares rasos, que salpicavam ao longo dos
litorais. A paisagem àquela época era relativamente simples – nas planícies
litorâneas, o avanço do mar, devido à fase úmida de então, originou um incontável
número de pequenos mares, lagoas e pântanos. Poucos além deles, para o interior,
as rochas nuas ainda dominavam, pois a vegetação ainda não adquirira condições
de se afastar da umidade litorânea. A vegetação era formada por densas florestas
de fetos, ainda pouco ocupadas por animais terrestres, exceto alguns insetos, que
se preservaram no âmbar – a resina fossilizada da conífera Pinus succinifer. Nas
águas rasas das lagoas e mares costeiros, os invertebrados – sem esqueletos –
deixaram poucas marcas.

A origem dos vertebrados, que derivaram dos invertebrados, é pouco


conhecida (Storer et al., 1991, p. 243). Os primeiros vertebrados foram os peixes.
Infelizmente, ainda faltam fósseis para mostrar a transição dos invertebrados para
os vertebrados. Mas, sabe-se que, vivendo em rios, lagos e charcos rasos, alguns
peixes desenvolveram pulmões para sobreviver nas estiagens, sem a necessidade
de retornar ao mar. (RODRIGUES, 1989 p. 17).

O Ichthyostega era um anfíbio, que pode ser um ancestral dos anfíbios.


Seus fósseis foram descobertos em Vitória, Austrália. Em Tibagi, Paraná, foram
encontradas pegadas de um anfíbio mais antigo (LEONARDI, 1984, p. 50).

A locomoção era um problema para os primeiros peixes anfíbios,


que morriam asfixiados nos charcos durante as estiagens, pois não
conseguiam alcançar a água a tempo. Além disso, eram presas fáceis
para os predadores. Por mutação, as nadadeiras transformaram-se
num acanhado par de patas, que lhes permitia arrastar-se pela lama e
mudar de um pântano para outro. (MCALLESTER, 1991, p. 96).

Mas os primeiros animais terrestres de respiração aérea podem ter sido os


escorpiões da classe Eurypterida (Storer, et al., 1991, p. 242). Predadores vorazes,
que, embora raramente, atingiam três metros de comprimento, locomoviam-
se com grande facilidade pelos pântanos. Normalmente, os escorpiões não
ultrapassavam os 20 cm de comprimento e os gigantes de três metros eram raros
e, obviamente, muito mais perigosos. (STORER, p. 476).

84
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

No Devoniano Inferior, a paisagem de Gondwana era formada,


principalmente, por grandes planícies de origem sedimentar, constantemente
varridas pelo vento. No interior do continente, uma extensa cadeia de montanhas
cristalinas, já muito desgastada pela erosão, sobressaía-se sobre as desoladas
planícies. Tectônica, ocorria uma calma em Gondwana. (MONTEIRO, 1968, p. 20).

Gondwana formava o maior continente do planeta e se estendia ao sul de


Laurência e Báltica, que eram grandes ilhas situadas ao longo da linha equatorial.

Em Gondwana, desertos subtropicais estendiam-se até 35º de latitude sul.


Em latitudes maiores, em ambos os hemisférios, uma zona de clima sazonal ia em
direção aos polos.

No Devoniano Inferior, uma glaciação, iniciada no sul de Gondwana,


começava a marchar para a zona temperada.

Um novo acontecimento se aproximava. Laurência e Báltica, ao norte,


e Gondwana, ao sul, iniciavam um movimento que os levaria a se chocar no
Devoniano Superior para formar o supercontinentre de Pangea.

O nascimento de Pangea alterou todo o clima no planeta. A mudança de


direção dos ventos úmidos favoreceu a expansão da vegetação, que evoluiu dos
fetos para florestas gigantescas. O consumo de dióxido de carbono aumentou,
assim como o de oxigênio. Em um clima úmido, a decomposição química das
rochas e a decomposição da matéria orgânica tornaram os solos mais ricos em
nutrientes, o que foi ótimo para as nascentes florestas.

No início do Devoniano, o albedo dos continentes era elevado e o calor


transferido para a atmosfera, por causa das rochas nuas dos continentes, que
refletiam a radiação solar sem interferência da camada de ar. O crescimento e
a expansão da cobertura vegetal nas terras emersas fizeram decrescer o albedo.
Paralelamente, com o aumento do porte das florestas, o consumo de dióxido
de carbono aumentou, ao passo que menos calor na atmosfera conduziu
inevitavelmente para a queda da temperatura, que levou para a glaciação,
chamada de permo-carbonífera, pois avançou e invadiu os períodos seguintes – o
Carbonífero e o Permiano.

5.3.5 Carbonífero
Iniciou-se há 355 milhões de anos e prevaleceu até 270 milhões de anos. No
Carbonífero Inferior, a glaciação, iniciada no período anterior, atingiu as latitudes
médias de todo o globo terrestre. No Carbonífero Superior, Gondwana chocou-se
com Laurásia (ou Laurência) e Báltica, e se uniram para formar o supercontinente
de Pangea (SALGADO-LABOURIAU, 1994, p. 102). Disso resultaram os montes
Apalaches, na América do Norte, e os Urais, na Rússia.

85
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A região equatorial tinha clima úmido e quente, momento em que as


florestas atingiram o seu apogeu – as árvores ultrapassavam 30 ou 40 metros de
altura. A gênese dos futuros depósitos de carvão e petróleo estava se desenhando.
(BIGARELLA et. al., 1997, p. 31).

O inlandsis chegou a "[...] algumas centenas de metros de espessura e cerca


de 2.500 quilômetros de largura [...]” (BIGARELLA, et. al., 1997) e estendeu-se
da Argentina até Ubatuba, em São Paulo. Ambientes de sedimentação fluviais,
palustres e lacustres sucederam-se ao longo do período. (MONTEIRO, 1968, p. 20).

Com a glaciação, os mares recuaram e deixaram muitas lagunas rodeadas


por bosques de lepidondendros (fetos arborescentes) em Laurásia. Depósitos
de hulha, encontrados, hoje, na Inglaterra, França, Holanda e em outros lugares
da Europa, datam dessa época. (FONT-ALTABA; ARRIBAS, 1964). Em Santa
Catarina, as camadas de carvão são do Permiano Médio e Superior e também se
desenvolveram em antigas lagunas e pântanos costeiros. (SCHEIBE, 1986, p. 25).

Biogeograficamente, o Carbonífero foi riquíssimo em espécies de animais


e plantas. Apareceram os primeiros répteis vertebrados, que punham ovos – a
casca rígida evitava o dessecamento do embrião (FERNANDES, 1982) – e insetos
de grandes proporções. A fauna e a flora ganharam em definitivo os continentes e
novos gêneros e espécies surgiram à medida que a expansão se dava por irradiação.
Os mares eram dominados pelos corais, braquiópodos, equinodermos, amonites,
briozoários etc., todos invertebrados. Os trilobitas entraram, finalmente, em
declínio sem volta, no Carbonífero Inferior, mas só terminaram a sua longa vida
no final do Permiano. (STORER et al., 1991, p. 231).

Peixes da classe Placodermi dominavam os mares. Eram recobertos por


escamas ou placas ósseas. Os peixes cartilaginosos, como tubarões e raias da
classe Chondrichthyes, surgiram no Carbonífero Inferior (STORER et al., 199, p.
231). Nos rios, lagos e pântanos costeiros, crocodilos, salamandras e enguias eram
as populações mais importantes.

Em Gondwana, durante a glaciação, cresciam plantas apenas de médio e


pequeno portes. No sul do continente a flora de Glossopteris recobria as planícies.
Eram plantas de alguns centímetros de altura, muito semelhantes às atuais
samambaias. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 150).

As florestas de Laurásia – antes do nascimento de Pangea – eram


dominadas por árvores dos gêneros Lepidondendron, Sigillaria, Calamites, com 20
metros de altura, e Cordaites, com mais de 45 metros. Seus hábitats preferidos eram
os grandes pântanos litorâneos. No interior, em terrenos mais bem drenados, a
cobertura era esparsa, de menor porte.

86
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

Insetos diversos, aracnídeos e artrópodos habitavam as florestas


úmidas costeiras, onde o alimento era abundante. Muitos insetos
cresceram desmesuradamente, como a libélula do gênero Meganeura,
ordem Protodonnata, que atingia mais de 75 centímetros de
envergadura. Tinha o corpo estreito, enormes olhos arregalados,
poderosas mandíbulas e pernas compridas, com as quais agarrava as
presas. Suas larvas eram aquáticas, carnívoras e predavam pequenos
vertebrados, como peixes e anfíbios. Quando adulta, a libélula devia
ser o predador mais temido pelos pequenos animais. Provavelmente,
devido à grande mobilidade de voo, a libélula aventurou-se pelas
terras do interior. (STORER et al., 1991, p. 522).

5.3.6 Permiano
O Permiano transcorreu entre 270 milhões até 220 milhões de anos,
correspondendo a 0,87% do tempo geológico. O fato que marcou o período foi a
grande extinção ocorrida ao seu fim.

Uma extensa cordilheira – chamada de Cordilheira Hercianiana –


emergiu onde hoje é a Europa Central, rodeada por uma grande superfície de
aplainamento muito antiga.

O surgimento de Pangea alterou o clima em todo o planeta, o que pode


ter sido a causa principal das extinções no final do período. Recuos e avanços do
mar foram comuns e, nas regressões, a flora marinha, exposta à radiação solar, foi
exterminada. Sem as plantas, muitas espécies de animais se extinguiram.

A glaciação permocarbonífera originou um clima seco, sazonal, com


chuvas concentradas, que erodiram a cordilheira. Maack (MONTEIRO, 1968)
descreve assim a paisagem no final do Permiano brasileiro: “[...] grandes lagunas
de água salobra estendendo-se em continuação à região litorânea dos rasos
mares da plataforma continental, enquanto vastos lagos de água doce e pântanos
preencheram as planícies do interior”.

O Permiano Médio foi dominado por um clima seco, quando muitos


pântanos costeiros secaram. Muitas espécies de plantas pereceram nessa época,
assim como muitas espécies de animais, que dependiam da umidade e do alimento
que os pântanos lhes proporcionavam. Os anfíbios resistiam, porque habitavam
dois ambientes distintos, o que lhes aumentava a possibilidade de sobreviver. No
sul de Pangea, em Gondwana, a flora Glossopteris foi substituída por Dicroidium,
típica de climas semiáridos do Permiano Superior.

Nas terras emersas, os répteis dominavam, em lugar dos anfíbios.


Destacava-se a classe Synapsida, ancestral dos mamíferos, que dava os seus
primeiros passos no final do período, quando climas secos e frios e climas úmidos
e quentes se alternavam constantemente.

87
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

O réptil Mesosaurus brasiliensis, ordem Mesossaurídeos, destacava-se


em Gondwana. Seus fósseis foram encontrados na América do Sul e
na África. Media entre 50-60 cm, tinha cauda comprida, que lhe servia
para se impulsionar na água, dentes finos e alongados. A garganta
pequena e o formato dos dentes sugerem que a sua dieta compunha-
se de pequenos crustáceos, cujos restos foram encontrados ao lado dos
fósseis. No Brasil, os folhelhos da Formação Irati, na bacia do Paraná,
exibem fósseis do mesossauro. A Formação Irati é rica em fósseis de
peixes, crustáceos, asas de insetos, espículas de esponjas, esporos e
madeiras fósseis. (PETRI & FÚLFARO, 1983, p. 129).

O Mesosaurus e o crustáceo Liocaris aparecem em calcários, enquanto o


crustáceo Pygaspis, nos folhelhos pirobetumisos.

O período atravessava uma fase tectônica relativamente calma, que


perdurou por mais de 100 milhões de anos. Os mares permianos eram povoados
por crinoides (equinodermos primitivos), amonites (molusco cefalópode), corais
e uma grande variedade de peixes. Nas águas rasas, próximas à costa, novas
espécies de anfíbios e répteis adaptaram-se aos ambientes dos pântanos e charcos.

Barreiras biogeográficas distribuíam a fauna em Laurásia e em


Gondwana. No sudeste de Laurásia, uma extensa cadeia de montanhas e, em
Gondwana, um deserto longitudinal entre a América do Sul e a África, impediam
que vertebrados nortistas emigrassem para o sul. Desta forma, até o Permiano
Superior, vertebrados terrestres não existiam em Gondwana.

O período que antecedeu ao extermínio, no final do Permiano, foi muito


rico em formas de vida.

Os pelicossauros (Ordem Pelycosauria, incluída na Subclasse Synapsida,


Storer et al., 199, p. 660) eram o grupo dominante. Dele fazia parte o réptil
carnívoro Dimetrodon, um dos ancestrais dos dinossauros. Carnívoro de origem
carbonífera, habitava os pântanos costeiros e teve o seu apogeu no Mesozoico.
Media 3,5 metros de comprimento e pesava 250 kg. Nas costas, portava uma
estrutura semelhante a uma vela de barco, que pode ter sido um aparelho
termoregulador, por meio do qual absorvia e emitia calor.

Lado a lado com o Dimetrodon, Secodontosaurus – carnívoros – Diadectes


e Edaphosaurus – herbívoros – eram os principais répteis, que alcançavam, em
média, três metros de comprimento. Viviam nos pântanos costeiros, onde tinham
alimento e proteção. O interior era esparsamente ocupado por pequenos animais
insetívoros e carnívoros, como Tetraceratops.

O final do Permiano foi marcado pela maior extinção já ocorrida na Terra.


Cerca de 95% dos vertebrados extinguiram-se. Dentre as inúmeras hipóteses, que
tentam explicar a extinção, quatro são as mais aceitas.

A primeira sustenta que a grande glaciação em Gondwana seria uma causa,


ao provocar resfriamento em todo o mundo e rebaixamento do nível do mar.

88
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

A segunda teoria afirma que a colisão de Laurásia e Gondwana fez com


que as terras excedessem os oceanos em área. Isso teria forçado uma intensa
competição pelo espaço entre as espécies marinhas, o que resultaria no extermínio.

A terceira teoria apela para flutuações climáticas nas zonas temperadas,


causadas por glaciações nos polos Norte e Sul. Essas flutuações são comprovadas
por sequências de dunas e evaporitos, encontradas nas camadas sedimentares das
regiões temperadas atuais. Nos polos há evidências de grandes glaciações permianas.

A quarta teoria apoia-se em violentos eventos de vulcanismos basálticos


ocorridos na Sibéria. As erupções foram explosivas e lançaram enormes
quantidades de sulfatos na atmosfera. Nuvens de cinzas e de sulfatos provenientes
dos vulcões envolveram todo o planeta, o que o privou da luz solar e o resfriou.
As idades das lavas siberianas coincidem com a época das extinções do Permiano.

UNI

Para você conhecer mais sobre os animais, sugiro que você, acadêmico(a),
acesse os sites: <http://www.palaeos.com/Paleozoic/Permian/Permian.htm> e <http://
hannover.park.org/Canada/Museum/extinction/permass.html>. Acesso em: 13 jul. 2010.

5.4 A ERA MESOZOICA


A era Mesozoica assinala uma divisão na história da Terra – podemos
dizer antes e depois do Mesozoico. Ordens e famílias modernas tiveram a sua
gênese no Mesozoico.

Pangea estilhaçou-se em blocos distintos, que desenharam os contornos dos


continentes atuais. Mas o que distinguiu o Mesozoico foram os dinossauros. Os
grandes répteis viraram heróis – são representados de todas as formas no cinema,
nas histórias em quadrinhos, na literatura, na televisão. Incontáveis de eletrizantes
histórias já foram escritas sobre os dinossauros, todas elas irreais, claro.

Nos continentes os dinossauros ditaram as leis. Nos oceanos, enormes


répteis marinhos dominavam, enquanto os Pterossaurus voejavam nos ares,
levando o terror aos pequenos mamíferos, que começavam a surgir.

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UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

5.4.1 Triássico
O primeiro período dessa era durou de 220 milhões de anos a 180 milhões
de anos. Foram 60 milhões de anos de constantes inovações. As mais importantes
dessas novidades foram o desmantelamento de Pangea e o reflorescimento da
vida no planeta, depois da extinção do Permiano. No Triássico Inferior o clima
era seco e frio, os oceanos estavam recuados e os continentes ainda eram áridos.

A fragmentaçao de Pangea iniciou-se no fim do Permiano e avançou no


Triássico Inferior (250 milhões de anos.). O movimento intensificou-se no jurácico
(135 milhões de anos) e durou até o Cretáceo (205 milhões de anos).

Laurásia deu o pontapé inicial ao separar-se de Gondwana, o que fez surgir,


no Triássico Médio, o mar de Thetys (SALGADO-LABOURIAU, 1994, p. 138). No
final do Triássico, a Europa separou-se, em definitivo, de Gondwana. Grande
destaque em Gondwana, o intenso vulcanismo durou até o final do Cretáceo.
Atingiu o máximo no Jurássico e no Cretáceo e, no Brasil, resultou no Planalto
Meridional. Os derrames ultrapassaram 1 milhão de quilômetros quadrados em
extensão. (SALGADO-LABOURIAU, 1994).

Um clima sazonal no interior de Gondwana e da Laurásia favoreceu o


aparecimento de savanas e desertos. No sul do Brasil, o vasto deserto de Botucatu
distinguia a paisagem.

A erosão das terras emersas permianas formou bacias fechadas, de clima


desértico, com acumulação de sedimentos avermelhados. Esses sedimentos,
trabalhados pelos processos erosivos, originaram um arenito vermelho, chamado
de arenito Botucatu, contemporâneo ao início do vulcanismo.

No início do Triássico, o movimento das placas, durante a separação de


Gondwana, era muito lento e isso facilitou a eclosão de novas formas de vida,
favorecidas por um clima que se tornava sazonal e quente. A aridez ainda
prevalecia, como o provam depósitos eólicos e de evaporitos (depósitos de sal),
típicos de ambientes áridos.

No entanto, as grandes extensões de terras com climas sazonais sugerem


que ventos formados em anticiclones marítimos transportavam umidade e calor
do mar para o interior de Gondwana e Laurásia nas latitudes médias e baixas e,
em altas latitudes, climas frios eram comuns. Logo, pode-se inferir que o clima no
início do Triássico era bem diversificado.

O surgimento do mar de Thetys, no leste de Gondwana e sul de Laurásia,


colaborou para o transporte de umidade e para elevar as temperaturas nas regiões
de baixas latitudes.

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TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

O aquecimento do clima e o aumento da umidade permitiram o


aparecimento de novas formas de vida, que foram ocupar os nichos vazios do
período anterior. Grupos de invertebrados modernos tiveram a sua gênese no
Triássico. Nos continentes, os insetos experimentaram um grande impulso.

Pequenos répteis, como o Protorosaurus, que media de 50 centímetros a dois


metros de comprimento, evoluíram para os Thecodontia, ancestrais dos dinossauros

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para auxiliar seus estudos, acesse os sites: <http://www.ace.mmu.ac.uk/resources/gcc/5-2-
2-2.html> e <http://www.palaeos.com/Vertebrates/Units/270Archosauromorpha/270.000.
html>. Acesso em: 13 jul. 2010.

(Storer et al., 199, p. 666) e para os Archosauriforme. Os arcossauros


eram carnívoros couraçados, que lembravam os modernos crocodilos. Tinham
organismos semiaquáticos e viveram no Triássico Inferior e Médio. Deles
derivaram os dinossauros, os crocodilos e os répteis alados pterossauros. E, bem
mais tarde, deles surgiram os atuais pássaros.

No Triássico inferior, os dinossauros mostraram a cara pela primeira vez


e, no Jurássico, atingiram o apogeu. Os primeiros dinossauros eram pequenos,
se comparados aos seus descendentes. Alguns chegavam a nove metros de
comprimento, como os herbívoros plateossauros e melanossauros. Nos mares, os
répteis ictiossauros Shastosaurus e Parvipelvia tinham tamanho avantajado.

Muitos fósseis foram desenterrados no Brasil: Endotiodonte, com 235


milhões de anos de idade, foi encontrado em Apucarana (PR); Labirintodonte
(220-240 milhões de anos) foi achado em Pouso Redondo (SC).

A cobertura vegetal no Triássico teve profundas mudanças com a chegada


do clima sazonal. Gimnospermas, como as coníferas, povoaram o interior dos
continentes. Animais herbívoros acompanharam a sua expansão e foram seguidos
por predadores. Desta forma, o interior se povoava.

A flora Glossopteris foi substituída pelo feto Dicrodium, que invadiu


todas as formações vegetais, desde as florestas úmidas quanto os
campos e as florestas sazonais. Podocarpos, fetos arborescentes,
cícadas e gingkos, endêmicos de Laurásia, avançaram para Gondwana.
Cicadáceas e as ormundas substituíram as pteridófitas arbóreas e as
lepidodendrales, no final do período. (COX; MOORE, 1994, p. 182).

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UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

No sul do Brasil, no final do período, vulcanismo basáltico intercalou suas


lavas com os arenitos vermelhos do deserto de Botucatu (MONTEIRO, 1968). Na
Europa, geossinclinais assinalaram a gênese dos grandes dobramentos terciários.

A chegada dos répteis gigantes pode ter sido uma das causas de uma
grande extinção da fauna de pequeno e médio portes, característica do Triássico,
no final do período. Os grandes dinossauros começavam a dominar a Terra.

Carnívoros, como o réptil Cynognathus, de idade permiana, considerado


um ancestral dos mamíferos (STORER et al., 1991, p. 660), junto com Garjainia e
Erythrosuchus, eram os maiores predadores de então.

Pequenos animais, ágeis, dotados de grande inteligência, espalharam-


se pelos desertos triássicos. Eram os proto-mamíferos. Refugiavam-se em tocas
escavadas no solo duro e árido, abrigavam-se em cavernas ou afloramentos
rochosos. O Cynognathus não ultrapassava 1,5 metro de comprimento. Ágil
predador, como se supõe, de acordo com os seus fósseis, predava principalmente
filhotes dos dinossauros ou dos próprios protomamíferos. Por seu lado, era presa
dos dinossauros carnívoros. A Terra assistia, agora, a uma luta competitiva feroz
de antagonistas que se equiparavam.

5.4.2 Jurássico
Durou 180 mihões a 135 milhões de anos. Na entrada do Jurássico, o clima
umedeceu e aqueceu e o planeta tomou uma feição tropicalizada. O clima era
quente e úmido, o que favoreceu rápida expansão da fauna e da flora. Os pequenos
mamíferos adaptaram-se com grande facilidade às alterações ambientais. Não
podiam enfrentar os grandes répteis e, por isto, agiam nas sombras – tinham
hábitos noturnos, em sua maioria.

Pangea prosseguiu despedaçando-se. A América do Norte separou-se de


Laurásia e, ao mover-se para oeste, formou um braço de mar, que se tornaria
o Golfo do México. No continente, as Montanhas Rochosas e a Sierra Nevada
começaram a surgir, graças ao deslocamento para oeste do bloco continental.

Em Gondwana, uma grande fenda abriu-se e o futuro Oceano Atlântico


meteu-se por ela, iniciando a separação da América do Sul e da África. No
litoral ocidental, o deslocamento de Gondwana para oeste, para baixo da placa
oceânica, provocou grandes dobramentos nos sedimentos marinhos. No final
do período, o mar recuou e esboçou os atuais contornos da Europa (FONT-
ALTABA; ARRIBAS, 1964).

O desdobramento de Pangea foi fundamental para a Biogeografia, porque


separou a biota gonduânica e forçou o aparecimento de linhagens diferentes na
América do Sul, África, Antártida e Austrália.

92
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

As gimnospermas continuaram dominando a flora. Cícadas (do gênero


Cycca) eram de tal ordem comuns, que o Jurássico é chamado de idade das cícadas.
As cícadas atuais pertencem à ordem Cycadales, com duas famílias – Zamiaceae e
Cycadaceae (JOLY, 1991, p. 193). As cicadales mais antigas datam do Devoniano,
mas o seu ápice se deu no Triássico e, sobretudo, no Jurássico. Junto com as
Cycadales, as Bennettitales, que se extinguiram no final do Cretáceo, compunham
mais de 40% da flora jurássica (Ib., p. 196).

As famílias atuais de coníferas – Araucariaceae, Cephalotaxaceae, Pinaceae,


Podocarpaceae, Taxaceae e Taxodiaceae – fazem parte da ordem Coniferae.

As coníferas (ordem Coniferae) dominaram o Jurássico. As famílias


atuais Araucariaceae, Cephalotaxaceae, Pinaceae, Podocarpaceae, Taxaceae e
Taxodiaceae estão incluídas na ordem. Da classe Cycadopsida faz parte a
ordem Ginkgoales, com uma única espécie viva, Gingko biloba, nascida
no Jurássico. Os xaxins pertencem à família Dicksoniaceae e abundaram
no Jurássico. (JOLY, 1991, p. 173).

As samambaias arborescentes ou samambaiuçus (família Cyatheaceae),


com folhas que podem ultrapassar três metros de comprimento, atingiam mais
de 20 metros no Jurássico (JOLY, 1991, p. 170). Os sub-bosques das coníferas
eram cobertos por um tapete de osmundáceas (família Osmundaceae). A classe
Sphenopsida, representada apenas pela família Equisetaceae (ordem Equisetales),
tem um membro sobrevivente, de idade carbonífera – a popular cavalinha, do
gênero Equisetum. (JOLY, p. 152).

A família Araucariaceae é a mais antiga dentre as coníferas. Seus ancestrais


estão no Paleozoico e no Mesozoico. A família consolidou-se no Mesozoico – as
espécies do gênero Araucaria têm idade jurássica e cretácea e vivem na América
do Sul, na Austrália e Nova Zelândia. O gênero tem 18 espécies. A araucária tem,
pois, cerca de 250 milhões de anos de idade.

Os oceanos atingiram uma enorme diversidade, com novas famílias que


surgiram no início do Triássico e encontravam nichos desocupados. Esponjas,
corais, briozoários, gastrópodos, bivalves e amonoides, todos invertebrados,
povoavam os oceanos. Nos continentes, lesmas, milípedes, escorpiões, aranhas
espalhavam-se por entre a vegetação luxuriante. Os insetos eram representados
pelas ordens Orthopera, Hemoptera, Psylloidea, Pentamoidea, Cimicoidea, Thysanoptera,
Coleoptera e Hymenoptera.

Os dinossauros, ainda pequenos e com boa locomoção, deixavam os


hábitats próximos ao litoral e se aventuravam em biótopos interioranos, mais
secos (Storer et al., 1991, p. 656). Eles mostravam uma excelente adaptação ao
ambiente. A pele grossa e seca reduzia a transpiração e os ovos, agora, passaram a
ser postos em terra firme e não mais na água, o que reduzia o perigo de predação
dos filhotes. Os dinossauros se preparavam para dominar a Terra nos próximos
100 milhões de anos.

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UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Se em terra os dinossauros já ditavam as regras, no ar, dois indivíduos


levavam o terror aos mamíferos que se aventuravam fora das tocas
durante o dia – os pterodáctilos, com uma envergadura de 7,5
metros, grandes voadores, e os Archeopterix, nascidos no início do
Jurássico. Com o tamanho semelhante ao pombo atual, eram os
primeiros dinossauros com penas, ancestrais dos atuais pássaros.
Eram carnívoros e os dentes, como mostram os fósseis, indicavam
grande voracidade. Os Archeopterix não voavam, apenas planavam.
(STORER et al., 1991, p. 687).

Com essa estupenda capacidade de adaptação, os dinossauros foram as


formas de vida superior mais duradouras que apareceram no planeta. No entanto,
no fim do Cretáceo, desapareceram numa velocidade inversamente proporcional
à sua existência.

5.4.3 Cretáceo
Durou de 135 milhões a 70 milhões de anos. Período de intensas mudanças
geológicas e biogeográficas na Terra. A separação da América do Sul e da África
interrompeu a dispersão da flora e da fauna no sentido longitudinal. Com o
movimento da África para o norte, o mar de Thetys desapareceu.

As angiospermas surgiram nesse período nas regiões tropicais. A expansão


teve início pouco antes da divisão definitiva dos continentes, o que favoreceu
plantas com flores e frutos. As flores atraíram insetos polinizadores – desta forma,
ambos, flores e insetos, se beneficiavam uns dos outros. Esse processo chama-
se coevolução. Entretanto, as gimnospermas, como as cicadáceas, os fetos e as
coníferas, que dependiam de mecanismos mais complicados para se expandir,
como o vento, tiveram uma redução correspondente ao avanço das angiospermas.
Mais bem-dotadas, as angiospermas contavam com uma grande capacidade de
adaptação e espalharam-se por todo o planeta.

No Cretáceo Médio (120 ma), as floras de Gondwana e de Laurásia


mostravam diferenciações longitudinais. No norte de Laurásia, o clima
temperado-úmido desempenhou importante papel no desenvolvimento das
pináceas (família Pinaceae) e dos fetos. No norte de Gondwana, cícadas e poucos
fetos eram as dominantes. No sul, de clima úmido e temperado, coníferas do
gênero Podocarpus e muitas espécies de fetos predominavam, lado a lado com
árvores perenifólias, arbustos e ervas.

94
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

Ao passo que as angiospermas se expandiam, no Cretáceo Médio


(120 milhões de anos) as floras de Gondwana e de Laurásia mostravam
diferenciações longitudinais. No norte de Laurásia, de clima temperado-
úmido, dominavam coníferas endêmicas, da família das Pináceas (Pinaceae),
junto com alguns fetos. No sul de Laurásia, as espécies dominantes eram os
fetos e outros gêneros de coníferas. No norte de Gondwana apareciam as
cícadas e poucos fetos. No sul de Gondwana, úmido e temperado, coníferas
do gênero Podocarpus e muitos fetos eram as plantas dominantes. No sul de
Gondwana apareceram árvores perenifólias, arbustos e ervas, que conviveram
junto com os podocarpos e fetos.

FONTE: Cox; Moore (1994, p. 192)

A espécie arbórea africana Napoleona deixou fósseis nos arenitos cretácicos


nos Estados do Piauí e Acre (IBGE, 1991, p. 52). Há 110 milhões de anos, o sul do
Ceará era pontilhado de lagos habitados por uma fauna variada de peixes, anfíbios
e répteis. Santana placidus, ancestral do Tyranossaurus rex, era um dinossauro
carnívoro de 2,5 metros de comprimento, que dominava a região.

Medidas do isótopo de oxigênio de fósseis de conchas marinhas mostram


que o clima era quente, e os oceanos eram cerca de 15º C mais aquecidos que os
atuais (COX; MOORE, 1994, p.193). No final do Cretáceo (Cretáceo Superior),
o clima esfriou, provavelmente devido ao elevado número de oceanos – como o
Atlântico – e de mares continentais rasos, cuja água absorve mais calor que a terra
e o libera gradualmente. No interior dos continentes, longe dos oceanos, o clima
tornou-se sazonal, com verões muito quentes e secos e invernos frios e úmidos
(COX; MOORE, 1994, p.193).

As correntes marinhas afetam enormemente o clima das regiões costeiras.


Entre a Antártica e a Austrália, tão logo ambas se separavam, uma corrente circumpolar
fria impediu que a água quente do sul do Pacífico alcançasse à região sub-polar. A
aridez no interior da Austrália aumentou e a calota polar teve grande incentivo.
(COX; MOORE, 1994, p. 194). A Corrente do Golfo encontrou caminho para o norte
graças à abertura do mar da Noruega, entre a Groenlândia e a Escandinávia, no fim
do Eoceno (53 ma), e chegou até às altas latitudes do Atlântico Norte.

A evolução dos mamíferos primitivos em placentários e marsupiais foi


muito rápida no Cretáceo, e passaram a competir com os senhores da biosfera – os
dinossauros. O pterossauro, do gênero Ornithocherius, com uma envegadura de 12
metros, usava com inteligência as correntes ascendentes e descendentes e voava
quilômetros sem a necessidade de bater asas. Seus fósseis foram encontrados em
todo o mundo, inclusive no Brasil, o que atesta a sua enorme capacidade de voar.

95
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Os pássaros ganharam grande impulso. Os pequenos dinossauros


terapsidas (gênero Therapsida) foram, provavelmente, seus ancestrais, pois sua
estrutura óssea é muito semelhante a das aves atuais. A maioria dos pássaros
cretácicos era dotada de dentes, como o Archeopterix. O arqueoptérix nasceu no
Jurássico e chegou até o Cretáceo com o status de ancestral de todos os pássaros
atuais. Seus restos encontram-se, principalmente, na Alemanha.

O Cretáceo assistiu ao apogeu do vulcanismo triássico. Em Santa Catarina


e no Rio Grande do Sul, os derrames ácidos deram origem aos campos de altitude,
que constituem os lugares mais elevados desses Estados. Em Presidente Epitácio,
São Paulo, derrames sucessivos chegaram a 1.500 metros de espessura. (PETRI;
FÚLFARO, 1983, p. 235).

No final do Cretáceo, ilhas de origem vulcânica pontilharam o oceano


entre Gondwana e Laurásia. O tráfego de plantas e animais, que havia sido
interrompido com a separação, retomou, ainda que timidamente. (SALGADO-
LABOURIAU, 1994, p. 135).

A separação dos continentes teve um enorme significado biogeográfico.


As biotas, antes convivendo juntas e compatilhando cargas genéticas mútuas,
separaram-se e cada uma tomou um rumo diferente na evolução.

O número de famílias de animais terrestres e marinhos diversificou-


se: no Carbonífero, no Permiano e no início do Mesozoico, havia 20
ordens de répteis. No Mesozoico e no Cenozoico existiam 33 ordens de
mamíferos. Nos oceanos e nos mares rasos do interior dos continentes
– chamados mares epicontinentais – as famílias de vertebrados
aumentaram de 270, no Mesozoico, para as mais de 400 atuais.
(MIELKE, 1989, p. 65).

O final do Cretáceo coincidiu com o fim dos dinossauros. Muitas teorias


tentam explicar o súbito desaparecimento dos répteis gigantes. A mais aceita
defende a ideia de um meteorito de 10 km de diâmetro que caiu na Península
de Yucatã, no México, há 65 milhões de anos e abriu uma cratera com 180 km de
diâmetro. Essa teoria foi elaborada por Luiz e Walter Alvarez, em 1980.

Alvarez & Alvarez notaram um grande aumento, irregular, do mineral


irídio nas camadas geológicas da zona da queda. O irídio é um metal raro na
crosta e aparece em quantidades diminutas. Por exemplo, no granito o teor de
irídio é de 0,00001 ppm. Contudo, teores mais elevados foram encontrados em
meteoritos. Logo, concluíram eles, o aumento do irídio na região só poderia ter
vindo do espaço, porque, reforçavam, na Terra esse aumento súbito é impossível.
Observaram também traços de fuligem e cristais de quartzo alterados. O quartzo
só é alterado em temperaturas e pressões muito elevadas e a fuligem atesta que
houve alta combustão no local.

96
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

O súbito aumento da temperatura poderia ter sido a principal causa da


extinção. Na queda, o meteorito incendiou a atmosfera pelo atrito, em todo o
planeta, e o impacto levantou uma enorme quantidade de poeira. A radiação solar
foi dispersada, as plantas não faziam mais a fotossíntese e, ao se extinguirem,
levaram consigo os animais herbívoros e carnívoros. Não só os dinossauros foram
extintos. Mais de 80% das formas de vida pereceram à época.

Em 1990, o pesquisador Alan Hildebrand encontrou uma cratera com 180


km de diâmetro na Península de Yucatán, cuja idade, calculada pelo argônio 40, é
de 65,5 milhões de anos, que coincide com a data da extinção.

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para aprofundar seus estudos, sugiro que você acesse os sites: <http://web.ukonline.co.uk/a.
buckley/dino.htm> e <http://www.solarnavigator.net/archaeology/dinosaurs.htm> e <http://
www.solarnavigator.net/archaeology/dinosaurs.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010.

A teoria de Alvarez & Alvarez, embora sofra críticas, é a mais aceita para
explicar o súbito desaparecimento dos dinossauros.

As tentativas de explicar as extinções são inúmeras. Uma das mais


estudadas é o campo magnético da Terra. Muitas rotas de migrações de animais
e aves são governadas pelas linhas magnéticas, que orientam o movimento e
até a comunicação – o tordo europeu, as salamandras, as abelhas, os pombos e
algumas espécies de golfinhos utilizam o campo magnético. Mudanças no campo
magnético afetam o comportamento dos animais.

Nos primeiros 55 milhões de anos do Cenozoico houve pelo menos 171


inversões do campo magnético. As mudanças se deram numa média de tempo
que variava em torno de 1 milhão de anos. Nos últimos 170 milhões de anos – no
Mesozóico – houve mais de 300 inversões magnéticas. (ERICKSON, 1992).

No Carbonífero Superior, o campo magnético permaneceu estável até


o Permiano – foram cerca de 50 milhões de anos de calma. A grande extinção
permiana coincide com o fim da estabilidade magnética.

Os impactos de meteoritos na Terra podem provocar inversões do campo


magnético. A última inversão se deu há 700.000 anos e parece estar associada
a fragmentos de meteoritos, que caíram na Terra. As idades dos fragmentos
coincidem com a época da inversão. (MIELKE, 1989, p. 67).

97
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

5.5 A ERA CENOZOICA


O Cenozoico é a era atual. Iniciado entre 70 milhões e 65 milhões de
anos, é a era dos mamíferos. A vida evoluiu de maneira definitiva. A evolução
se deu num ritmo mais ou menos acelerado e os insetos, os pássaros e os peixes
ganharam grande impulso.

Dois períodos constituem o Cenozoico – o Terciário, entre 65 milhões e 2


milhões de anos, e o Quaternário, nos últimos 2 milhões de anos.

5.5.1 Terciário
O Terciário é formado por cinco épocas: Paleoceno (70-54 milhões de anos),
Eoceno (54-34 mihões de anos), Oligoceno (34-22 milhões de anos), Mioceno (22-
11 milhões de anos) e Plioceno (11-2 milhões de anos). O Quaternário tem duas
épocas: Pleistoceno (2-1 milhão de anos) e o Holoceno (1 milhão de anos).

5.5.2 Paleoceno
Iniciou-se há 70-65 milhões de anos até 54 milhões de anos. Os nichos
vazios por causa da extinção do Cretáceo foram preenchidos, graças ao clima de
temperaturas e umidade elevadas. Grandes cadeias de montanhas surgiram nessa
época – os Andes, as Rochosas, os Alpes, os Cárpatos, os Pirineus e o Himalaia. A
Antártica e a Austrália ainda se achavam ligadas à América do Sul. No hemisfério
Norte, o Atlântico Norte começava a avançar sobre Laurásia, o que resultaria na
separação da América do Norte e da Europa.

5.5.3 Eoceno
Durou de 54 milhões a 34 milhões de anos. O surgimento da América do
Norte e da Europa obrigou ao Atlântico Norte dirigir-se para o sul, levando água
fria para o sul. O clima ainda era quente e úmido. A separação da América do Sul
e da Antártica abriu o Atlântico Sul e água quente tropical movimentou-se para o
sul e provocou um aumento da temperatura do ar entre 10º C e 18º C. Esse clima
quente perdurou por 2 mil anos (COX; MOORE, 1994, p. 198). Por causa desse
aumento da temperatura, cerca de 150 gêneros de plantas tropicais expandiram
para o norte e alcançaram a região de Londres – fósseis de plantas tropicais foram
encontrados junto ao rio Tâmisa.

98
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

A Índia separou-se da África no final do Cretáceo e levou de 20 milhões


a 30 milhões de anos para chocar-se com o sudeste da Eurásia, 5 mil quilômetros
ao norte. (SALGADO-LABOURIAU, 1994, p. 165). O choque originou o Himalaia,
que passou a funcionar como uma importante barreira biogeográfica entre a
Eurásia e o Sudeste Asiático. O deslocamento da Índia para o norte, devido ao
longo tempo, forçou sucessivos tipos de climas no bloco, desde o equatorial ao
temperado, à medida que se movimentava para o norte. O clima atual da Índia é
sazonal, com invernos secos e frios e verões quentes e úmidos.

Em Laurásia, a orogenia alpina formou os Pirineus e os Alpes. No norte


da África apareceram os montes Atlas (FONT-ALTABA & ARRIBA, 1964). O mar
de Thetys deu origem ao atual Mediterrâneo. A ligação entre a América do Norte
e a Eurásia ainda prosseguia, como palco de trocas de genes entre as duas regiões.

Os mamíferos abriram-se em diversas ordens e famílias. Cervídeos,


bovinos, cavalos, rinocerontes e hipopótamos evoluíram para as formas atuais.
As baleias e os morcegos descendem de mamíferos, que retornaram ao mar ou se
desenvolveram sem deixar de ser alados. A maioria dos mamíferos atuais surgiu
no início do Eoceno – morcegos, proboscídeos, primatas, roedores, ungulados e
marsupiais surgiram nesse período.

No Eoceno Médio o clima iniciou uma fase de resfriamento, que


avançou para Oligoceno e deu origem a uma forte glaciação. As
florestas recuaram e campos abertos com gramíneas duras em solos
litólicos as substituíram. O pequeno cavalo primitivo, que habitava as
florestas de solos macios, perdeu as patas aveludadas e ganhou cascos,
que lhe permitiam melhor locomoção no solo duro. Na Antártica, que
se resfriava, a flora tropical foi definitivamente extinta e substituída
por uma flora de clima frio e seco. (COX; MOORE, 1994, p. 199).

Nas baías e enseadas de águas calmas e rasas, sedimentos foram se


depositando para servir de hábitat pelos embriões dos manguezais de hoje, como
Rhyzophora e outros gêneros

Desertos proliferaram no final do Eoceno, com um largo esfriamento do


clima. Campos cobriam grandes extensões e animais de cascos puderam evoluir.

Separadas da África desde o Paleoceno (65 milhões de anos), a flora e a


fauna sul-americanas procuraram outros rumos na trilha da evolução.

5.5.4 Oligoceno
Durou de 34 milhões a 22 milhões de anos. Marcou essa época a
orogenia dos Andes, que desenhou novas paisagens no oeste da América do Sul
e alterou todo o clima do hemisfério Sul. A Austrália libertou-se da Antártica e
navegou para sudoeste e abriu caminho para que águas frias polares chegassem
ao extremo sul da América do Sul, o que ampliou a queda da temperatura e
originou uma forte glaciação.
99
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A Austrália e a América do Sul isolaram-se dos demais continentes e


desenvolveram uma fauna típica. Muitas famílias tornaram-se endêmicas ou
eram relictos de antigas espécies gonduânicas.

O resfriamento exterminou parte da fauna eocênica de pequeno porte,


substituída nessa época por animais de porte maior, ancestrais dos atuais elefantes,
rinocerontes e hipopótamos – um corpo maior retém o calor com mais facilidade.
Alguns grupos antigos conseguiram escapar, como o gambá, o porco-espinho,
a toupeira e o mussaranho. Castores, esquilos, ratos, camundongos e coelhos
surgiram entre os roedores. Canídeos e felídeos eram os predadores e, dentre
eles, Hoplophoneus era o maior predador. Seus dentes poderosos, compridos, que
saíam da boca, valeram-lhe o nome de tigre-dentes-de-sabre.

No final do período, o clima umedeceu, como mostram grãos de pólen


encontrados em sedimentos. (SALGADO-LABOURIAU, 1994, p. 171). Florestas
temperadas na Europa e na América do Norte expulsaram as gimnospermas para
locais mais frios e altos.

5.5.5 Mioceno
Iniciado há 22 milhões de anos, terminou há 5,3 milhões de anos. O clima
atravessava um período de extremo dinamismo. Ao separar-se da Antártica, a
Austrália barrou as águas quentes do Pacífico, o que resfriou mais ainda o clima
antártico, até então, subtropical. Correntes frias invadiram os oceanos Atlântico,
Pacífico e Índico até o hemisfério Norte.

Os campos, que se expandiam por causa do clima frio, eram povoados por
grandes herbívoros. O estreito de Bhering tornou-se importante rota de trânsito
entre a América do Norte e a Eurásia. Os mamutes, vindos da África, cruzaram
a Sibéria e estabeleceram-se na América do Norte. O Caribe era salpicado de
incontáveis pequenas ilhas, que foram povoadas por animais e por pássaros.

5.5.6 Plioceno
Última época da era Cenozoica, o Plioceno durou de 5 milhões até 2 milhões
de anos. O clima continuou esfriando, o que culminaria na grande glaciação do
Pleistoceno. Finalmente, com o recuo do mar, o istmo centro-americano surgiu
das águas e ligou as duas Américas.

100
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

Isolada desde o Cretáceo (65 ma), a América do Sul desenvolveu


espécies endêmicas na flora e na fauna. O istmo permitiu que a fauna
da América do Norte e da América do Sul entrasse em forte competição.
O isolamento sul-americano acabou por originar uma fauna mais
fraca, com pouco poder de competição, em relação à fauna do norte,
acostumada a ter contato por competição com as espécies da Eurásia.
Isto a tornou extremamente agressiva. Os mamíferos do norte tiveram
mais sucesso na competição com os do sul e invadiam a América do Sul
com frequência. (SALGADO-LABOURIAU, 1994, p. 175).

No entanto, a flora sul-americana teve mais sucesso ao invadir o norte


e estabeleceu-se sobretudo no istmo até o México. Planícies litorâneas e as
montanhas foram invadidas e ocupadas pela flora.

5.5.7 Pleistoceno
Primeira época da era Cenozoica, o Pleistoceno iniciou-se há 1,6 milhão
de anos e durou até 12 mil-10 mil anos, no fim da última glaciação. A fauna e a
flora da Terra eram muito semelhantes às atuais, exceto pelo porte. O Pleistoceno
teve uma sucessão de glaciações intercaladas com interglaciais. Quatro grandes
glaciações sucederam-se durante essa época e foram denominadas de Gunz,
Mindel, Riss e Würm.

Na América do Sul, as ordens Marsupialia, Notoungulata, Litopterna e


Edentada, em geral de grande porte, eram endêmicas. O clima frio lhes
era apropriado – os megatérios (Megatherium), preguiças com mais
de cinco metros de altura, os gliptodontes (Glyptodon), enormes tatus,
povoavam os campos. Na Argentina, o Doedicurus, um gliptodonte,
media mais de 4 metros de comprimento. (MENDES, 1970, p. 31).

Entre os predadores, o tigre-de-dentes-de-sabre (Smilodon populator)


era o mais importante. Esqueletos do Smilodon foram encontrados nas grutas
de Maquiné (em Cordisburgo, MG) e Lapinha (em Lagoa Santa, MG) pelo
paleontólogo e naturalista dinamarquês Pedro Guilherme Lund (1801-1880), no
século XIX. Foi Lund quem criou o nome tigre-de-dentes-de-sabre. Lund chegou
ao Rio de Janeiro em 1825 e viajou por São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Minas
Gerais. Em Minas Gerais, estabeleceu-se na cidade de Lagoa Santa, onde visitou
e explorou as cavernas da região e encontrou fósseis de animais. Descreveu 115
espécies de animais pré-históricos. Em 1843, em Lagoa Santa, encontrou vestígios
de homens pré-históricos. Seus estudos e descrições iniciaram os estudos do
que ficou conhecido como O Homem de Lagoa Santa. Lund estabeleceu-se
definitivamente em Lagoa Santa, onde morreu em 1880.

Muitas ordens vieram da América do Norte e colonizaram a América do Sul,


como os cavalos (Equus), cervídeos, camelídeos (que evoluíram para os lhamas e
alpacas dos Andes) e os carnívoros, como o tigre-de-dentes-de-sabre. Mendes e Paula
Couto (1975) fazem um relato muito detalhado da fauna pleistocênica brasileira.

101
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A alternância glacial/interglacial tornou-se fundamental mecanismo


de movimentação e distribuição da fauna e da flora em todo o mundo. Nas
glaciações, o gelo recobriu mais de 2 milhões de km2 na América do Sul. (PAULA
COUTO, 1975, p. 130).

Uma vasta fauna de savanas sub-xerófitas povoava o centro do continente,


entre o Nordeste brasileiro e o sul da Argentina – as ordens Marsupialia, Rodentia
(porcos-espinhos), Primatas, Notoungulados (similares aos hipopótomos atuais),

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Informações importantes sobre Peter Wilhelm Lund.
Acesse o site: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Peter_Wilhelm_Lund>. Acesso em: 13 jul. 2010.

Edentada (tatus, preguiças e tamanduás), Chiroptera (morcegos) etc. eram


comuns e tinham alimento abundante.

Entre 28 mil e 14 mil anos, a floresta equatorial foi, em grande parte,


substituída por campos e savanas (MERCER; PALACIOS, 1977.; apud Ranzi, 2000;
KRONBERG & BENCHMOL, 1993.; Absy et al., 1993, VIADANA, 2002). Fósseis
de animais pastadores, com idade de 12 mil anos, dos gêneros Tayassu (cateto
ou queixada), Glyptodon (tatus gigantes), Toxodon (preguiças), Dasypus (tatus,
de menor porte), Eyra (iraras) e os camelídeos importados do norte, Paleolama
(lhama), Vicugna (vicunha), comprovam a existência de campos na Amazônia.

Ao longo dos leitos dos rios amazônicos, florestas-de-galeria substituíram


a floresta densa, enquanto nas serras litorâneas a floresta úmida se manteve em
refúgios úmidos por chuvas orográficas. Em outro capítulo discutiremos com
mais detalhes os refúgios florestais no Brasil durante o final do Pleistoceno.

A chegada do Homo sapiens, que atravessou Bhering durante as glaciações,


e marchou até a América do Sul, provavelmente foi a principal causa da extinção
dos grandes herbívoros, como o mastodonte – embora essa ideia seja, por
enquanto, mera especulação.

102
TÓPICO 1 | A PALEOBIOGEOGRAFIA

5.5.8 Holoceno
É a época atual, que começou no fim da glaciação, há 12.000-10.000 anos.
A temperatura continua em ascensão e as florestas úmidas podem expandir-se
em latitudes maiores. Não há, por enquanto, o período de extinção de seres vivos
e as que ocorrem hoje devem-se, em sua maior parte, ao homem.

Novas linhas de costas surgiram na atual época e o mar deixou


planícies litorâneas, lagoas, cordões arenosos e depósitos de conchas,
como ocorre em Tubarão e Laguna, em Santa Catarina. Cordões
litorâneos na praia da Pinheira (Paulo Lopes, SC) foram depositados
há 5.100 anos pela última elevação do mar. (CARUSO JÚNIOR, 1992).

A principal marca desta época é a evolução da civilização humana, desde


que os primeiros homens, que se estabeleceram no Oriente Médio. O avanço da
ciência é uma das características do Holoceno. Incontáveis espécies de animais e
plantas foram extintas pelo homem primitivo e pelo homem moderno. Por outro
lado, a imprensa informa com alguma frequência descobertas de novas espécies
em lugares remotos, que o homem ainda não tinha pisado.

103
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico você estudou que:

● O estudo dos climas do passado tem que ser feito tomando como base as
condições ambientais atuais, para permitir comparações. Uma espécie atual
exige condições ambientais que lhe sejam adequadas.

● Procurar as causas da distribuição atual dos organismos nos conduz também a


entender os padrões passados e atuais do clima, que pressionaram a evolução
das espécies, os deslocamentos de animais e plantas, as relações entre eles, as
necessidades de adaptação a um novo ambiente.

● O estudo dos climas do passado tem que ser feito tomando como base as
condições ambientais atuais, para permitir comparações. Uma espécie atual
exige condições ambientais que lhe sejam adequadas.

● Um claro retrato dos climas pretéritos está impresso nos anéis de crescimento
de algumas espécies de árvores de climas temperados. Neles, o desenrolar das
estações do ano pode ser acompanhado ano a ano.

● Os anéis de crescimento ilustram até períodos de 3 mil anos nas árvores atuais
e mais de 5 mil anos em fósseis de plantas.

● Não podemos estudar a Biogeografia de hoje sem compreender o passado


geológico da Terra. Entender o passado nos leva a conhecer os fatores físicos e
os grupos taxonômicos (principalmente classe, ordem, família, gênero e espécie),
que constituíam as paleoformas de vida.

● Paleossolos e sedimentos: a granulometria das partículas do solo e dos


sedimentos é um testemunho de paleoclimas. Na costa brasileira é possível
ver estágios do alargamento do Oceano Atlântico, registrados nos sedimentos
marinhos.

● Análise polínica ou palinologia: grãos de pólen e esporos, encontrados em


sedimentos, informam sobre espécies vegetais e sobre os climas ocorridos à
época em que foram produzidos.

● Datação radiométrica: analisa a velocidade de desintegração de elementos


radioativos (isótopos radioativos) presentes nas rochas.

● As técnicas de estudo do passado são inúmeras e não atuam sozinhas, uma


dando suporte a outra, como peças de um quebra-cabeça, demonstrando que
elas se correlacionam umas com as outras.

104
● O deslocamento dos continentes teve reflexos em todo o planeta e mudou a
sua face, ao originar oceanos e mares, alterar o clima mundial e levar a uma
incomensurável mudança nas formas de vida em todo o mundo.

● A separação dos continentes encerra um importantíssimo significado


biogeográfico. Graças ao deslocamento, as populações de animais e de plantas
se separaram e, com o passar do tempo, foram constituir novas famílias,
gêneros e espécies.

● A era mais antiga da Terra é o Pré-Cambriano. Foi dividida em dois períodos:


Arqueano, que começou há 4,6 bilhões de anos e terminou há 2,5 bilhões de
anos, e o Proterozoico, que se estendeu de 2,5 bilhões a 540 milhões de anos. O
Arqueano corresponde a 45,66% do tempo geológico total.

● Proterozoico ou Pré-Cambriano: Iniciou-se há 2,5 bilhões de anos. É formado


pelo Proterozoico Inferior (2,5 bilhões a 1,6 bilhões de anos), Proterozoico Médio
(1,6 bilhão a 900 milhões de anos) e Proterozoico Superior (900 milhões a 540
milhões de anos).

● No final do Proterozoico Superior, a Terra foi assolada pela mais duradoura


glaciação em toda a sua história, que se estendeu de 1 bilhão a 600 milhões
de anos.

● Os primeiros testemunhos de vida na Terra têm a idade de 3,7 bilhões de anos


– eram os estromatólitos, estruturas de carbonato de cálcio, ramificadas ou
laminadas, que formavam bancos com a espessura média de 1 metro, podendo,
em raros casos, chegar a algumas dezenas de metros.

● São seis os períodos que compõem a era Paleozoica: Cambriano, Ordoviciano,


Siluriano, Devoniano, Carbonífero e Permiano. Estende-se de 600-540 milhões a 270
milhões de anos.

● A fauna do Cambriano era muito rica e era composta de 60% de artrópodos, em


que se inserem mais de mil espécies de trilobitas, 30% de braquiópodos e 10%
de esponjas, cnidários, moluscos e anelídeos. Algas azuis, fotossintetizantes, não
formaram fósseis. No Cambriano Médio, algas verdes, Chlorophyta, eram comuns.

● O Ordoviciano presenciou uma significativa expansão dos seres marinhos – as


200 famílias existentes no Cambriano passaram para 500 famílias neste período.

● Com o ocaso da glaciação ordoviciana, o clima voltou a ser quente e úmido.

● O final do período siluriano foi marcado por uma crescente aridez, que substituiu
a umidade até então reinante.

105
● Ao passo que as plantas vasculares invadiam as terras emersas, nos mares
vazios esponjas e corais – de idade cambriana e ordoviciana –, junto com os
braquiópodos, ocupavam os nichos vazios.

● Os primeiros animais terrestres de respiração aérea podem ter sido os escorpiões


da classe Eurypterida.

● Biogeograficamente, o Carbonífero foi riquíssimo em espécies de animais e


plantas. Apareceram os primeiros répteis vertebrados, que punham ovos – a casca
rígida evitava o dessecamento do embrião – e insetos de grandes proporções. A
fauna e a flora ganharam em definitivo os continentes e novos gêneros e espécies
surgiram à medida que a expansão se dava por irradiação. Os mares eram
dominados pelos corais, braquiópodos, equinodermos, amonites, briozoários.

● O surgimento de Pangea alterou o clima em todo o planeta, o que pode ter sido
a causa principal das extinções no final do período. Recuos e avanços do mar
foram comuns e, nas regressões, a flora marinha, exposta à radiação solar, foi
exterminada. Sem as plantas, muitas espécies de animais se extinguiram.

● O Permiano Médio foi dominado por um clima seco, quando muitos pântanos
costeiros secaram.

● A era Mesozoica assinala uma divisão na história da Terra – podemos dizer


antes e depois do Mesozoico. Ordens e famílias modernas tiveram a sua gênese
no Mesozoico. Pangea estilhaçou-se em blocos distintos, que desenharam os
contornos dos continentes atuais. Mas o que distinguiu o Mesozoico foram
os dinossauros.

● A fragmentação de Pangea iniciou-se no fim do Permiano e avançou no Triássico


Inferior (250 milhões de anos.). O movimento intensificou-se no Cretáceo (205
milhões de anos) e durou até o Jurássico (135 milhões de anos).

● Pequenos animais, ágeis, dotados de grande inteligência espalharam-se pelos


desertos triássicos. Eram os proto-mamíferos. Refugiavam-se em tocas escavadas
no solo duro e árido, abrigavam-se em cavernas ou afloramentos rochosos. O
Cynognathus não ultrapassava 1,5 metro de comprimento.

● Com estupenda capacidade de adaptação, os dinossauros foram as formas de


vida superior mais duradouras que apareceram no planeta. No entanto, no fim
do Cretáceo, desapareceram numa velocidade inversamente proporcional à sua
existência.

● A principal marca da época atual ou holoceno é a evolução da civilização humana,


desde que os primeiros homens se estabeleceram no Oriente Médio. O avanço da
ciência é uma das características do Holoceno. Incontáveis espécies de animais
e plantas foram extintas pelo homem primitivo e pelo homem moderno.

106
AUTOATIVIDADE

1 O final do Permiano foi marcado pela maior extinção já ocorrida na Terra.


Cerca de 95% dos vertebrados extinguiram-se. Dentre as inúmeras hipóteses
que tentam explicar a extinção, quatro são as mais aceitas. Quais são estas
hipóteses e o que defendiam?

2 De que elementos da natureza e de que técnicas o biogeógrafo se utiliza


como subsídio para interpretação de épocas passadas?

3 Sobre o estudo da Paleobiogeografia, coloque V para as afirmativas


verdadeiras e F para as falsas e em seguida assinale a alternativa que
apresenta a sequência correta.

( ) O deslocamento dos continentes teve reflexos em todo o planeta e mudou


a sua face, ao originar oceanos e mares, alterar o clima mundial e levar a
uma incomensurável mudança nas formas de vida em todo o mundo.
( ) Não podemos estudar a Biogeografia de hoje sem compreender o passado
geológico da Terra.
( ) Nas espécies tropicais e subtropicais não há separação muito nítida entre
as estações do ano, de modo que o câmbio funciona durante todo o ano.
Logo, não há produção de anéis de crescimento na árvore, o que torna
difícil calcular a sua idade.
( ) Estudar os climas do passado depende diretamente da obtenção de dados,
que são inferidos de indicadores climáticos naturais.
( ) As causas da presente distribuição dos seres vivos não estão apenas nos
fatores atuais, mas também são encontradas na evolução das eras geológicas.

Agora, assinale a alternativa que abarca a sequência CORRETA.

a) ( ) V – F – V – V – F.
b) ( ) F – V – F – V – V.
c) ( ) V – V – V – F – V.
d) ( ) V – V – V – V – V.

107
108
UNIDADE 2 TÓPICO 2

ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico abordaremos temas relacionados à origem e evolução dos
seres vivos; o aparecimento da vida, a quimiossíntese, a atmosfera primitiva, o
ambiente na Terra primitiva e a fotossíntese. Estudaremos também a teoria da
Evolução (Darwinismo e o Neodarwinismo), as ideias modernas da evolução, a
adaptação e o isolamento genético e geográfico.

2 AS PRIMEIRAS IDEIAS SOBRE O APARECIMENTO DA VIDA


A origem da vida sempre foi objeto de preocupação do homem, desde
os filósofos da Antiguidade até os pesquisadores modernos, passando pelos
religiosos das diversas seitas do mundo.

Quatro linhas de pensamento buscam explicar como a vida surgiu na


Terra. A criação especial é a ideia defendida pela religião cristã. Nesse ponto
de vista, a vida foi criada por um ser sobrenatural, não houve qualquer tipo de
evolução e os animais de hoje são exatamente como eram no momento da criação.
Essa ideia não tem qualquer fundamento científico e não se apoia na ciência.
Seus adeptos não permitem que ela seja testada em bases científicas, pois não
resistiria aos testes mais simples. Para aceitar seus dogmas é preciso, antes de
mais nada, crer na existência de um ser divino. Aí reside a primeira dificuldade.
Como comprovar cientificamente que esse ser divino – seja ele qual for – existe de
fato? A ciência não pode provar e nem se interessa pelo tema. A existência do ser
divino encontra-se apoiada unicamente na fé pessoal de cada um.

Não obstante, existe uma corrente muito forte de cientistas que apoia
essa ideia. O brasileiro Freire-Maia (1988, p. 66) dizia que “[...] Não há evidências
da ação direta de forças transcendentes [...] nos vários passos da evolução, mas,
pode-se aceitar que a matéria tenha sido criada como um ‘impulso evolutivo’ de
Deus, há talvez 20 bilhões de anos. Isto significa que a matéria tem propriedades
que [...] a levaram a produzir vida [...]”.

Freire-Maia (1988, p. 61) menciona o padre jesuíta Pierre Teilhard de


Chardin (1881-1955), duramente combatido pelo Vaticano, porque sustentava a
evolução biológica, sem perder, contudo, a conexão com os dogmas cristãos.

109
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Freire-Maia (1988), aceita que a matéria contenha um impulso evolutivo


(sic), que a permitiu organizar-se e evoluir sem interferência divina até chegar ao
momento da eclosão da vida. É uma postura que busca conciliar a eterna disputa
entre a ciência e a religião. Tem o mérito de procurar dar um sentido científico à
ideia da criação especial sem, contudo, negar a existência da evolução biológica.

Na Austrália, nos anos 80, o biólogo Michael Denton, diretor do Centro de


Pesquisa em Genética Humana, de Sidney, escreveu um livro intitulado “Evolução:
uma teoria em crise”, no qual defende o criacionismo e refuta inteiramente a
evolução. Outros cientistas são mais condescendentes e o paleontólogo americano
Stephen J. Gould (1941-2002), grande divulgador da ciência, não concorda com
a linha neodarwinista, também chamada de teoria sintética da evolução, que
substituiu as ideias de Darwin por conceitos modernos apoiados na Biologia
Molecular, e diz que essa linha é incompleta e insatisfatória. No entanto, ele
defende com unhas e dentes a evolução. (BLANC, 1994, p. 12).

O Vaticano tem sido mais aberto à teoria da evolução e, em 1950, o papa


Pio XII, na encíclica Humani generis, um papa reconhecidamente conservador,
admitiu a possibilidade da evolução biológica das espécies. (BLANC, 1994, p. 10).

No entanto, nos EUA, nos anos 80, grupos protestantes, autodenominados


fundamentalistas ou criacionistas, exigiram que o relato do Gênesis tivesse, nas
escolas americanas, o mesmo peso que a teoria científica.

Salzano (2005) faz um oportuno comentário sobre a interferência da


religião na ciência, comparando o confronto do idealismo e da razão, ressaltando
o papel da intolerância. Salzano (2005), é contra a inclusão do conceito de criação
nos currículos escolares. Barros (2005), sustenta que os textos religiosos devem
ser cultivados, pelo seu significado para a cultura do homem, mas não devem
ser tomados do ponto de vista científico, porque não é ciência e dificultam a
compreensão dos conceitos científicos.

Outra linha de pensamento da criação da vida vem da hipótese da panspermia.


Essa hipótese foi criada pelo químico sueco Svante August Arrhenius (1959-1927), na
qual sustenta que bactérias e outros organismos unicelulares chegaram à Terra trazidos
por poeira interestelar. Aqui, encontradas condições propícias, desenvolveram-se
nas espécies de organismos, que evoluíram para as atuais.

No entanto, o problema da origem da vida não é resolvido pela teoria,


afirma Orgel (1988, p.15). Segundo ele, o problema é apenas transferido para
outro planeta, o que não explica como a vida surgiu. Porém, Arrhenius e seus
seguidores refutaram esse argumento dizendo que a vida era eterna e, pois, não
teria início. Para eles, quem criou a vida eterna? – um ser sobrenatural, claro.

Orgel volta ao ataque e diz que as radiações – raios cósmicos, raios X,


ultravioletas, gama etc. – que percorrem o cosmo, destruiriam “[...] qualquer
material organizado com base no carbono, hidrogênio, nitrogênio e oxigênio”.

110
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

Mas, compostos orgânicos foram descobertos num meteorito caído na


Austrália – os cientistas detectaram vários compostos orgânicos e aminoácidos
– glicina, alanina, ácido glutâmico, valina e prolina. Caso a matéria orgânica
fique protegida das radiações – no interior do meteorito, por exemplo, – poderia
se preservar. E caso encontre condições favoráveis aqui na superfície da Terra,
poderia desenvolver-se, sustenta a hipótese de Arrhenius.

Mas, aqui também, muitos argumentos contestam a hipótese. O


principal é que, se uma única célula viva, desenvolvida em outro
planeta e com um código genético já elaborado, caísse na Terra, no
momento em que o planeta ainda estivesse desprovido de seres vivos,
seus descendentes teriam que ter, forçosamente, o mesmo código
genético. O resultado é que todos os seres vivos da Terra, desde os
unicelulares ao homem, comporiam uma única família. Por outro lado,
se células com códigos genéticos diversos caíssem aqui, a diversidade
seria bem maior. No entanto, não há como comprovar essa hipótese.
(ORGEL, 1988, p. 82).

O mais correto, por conseguinte, é aceitar que a vida evoluiu aqui mesmo.
As provas, que apoiam essa ideia, são inúmeras, como veremos.

A terceira linha de pensamento é a geração espontânea, uma ideia que


durou por quase dois mil anos. A geração espontânea garantia que a vida podia
surgir da matéria inanimada. Ela apoiava-se apenas na observação e tirava
conclusões apressadas, conjugadas com uma fertilíssima imaginação, movida,
sobretudo, pela superstição e pela pressão da Inquisição.

Aristóteles (384-322), talvez tenha sido o primeiro pensador a dar peso


para a ideia. Para ele, a matéria continha uma força sobrenatural, uma capacidade
inerente a ela, que Aristóteles chamou de princípio ativo. Essa força podia criar
a vida, sob certas condições. Por exemplo, o princípio ativo explicava porque um
ovo de galinha só gerava um pintinho e não um peixe. Do ovo da galinha não
podia, de forma alguma, nascer um peixe – e vice-versa.

No obscurantismo da Idade Média surgiram crenças curiosas nascidas na


imaginação das pessoas, alicerçadas e incentivadas pelos dogmas religiosos. Eis
algumas: gansos nasciam em árvores que só cresciam no litoral; certas árvores
davam frutos semelhantes a melões, no interior dos quais existiam carneiros.
Paracelso, no século XVI, médico e alquimista respeitado no seu tempo, afirmou
que ratos, enguias e tartarugas podiam nascer a partir de água, palha e madeira
podre. O médico belga Jean Baptiste van Helmont, no século XVII, cientista
renomado que, mais tarde, realizou excelentes experiências em fisiologia vegetal,
escreveu uma receita para a produção de ratos em exatamente 21 dias a partir de
uma camisa suja, na qual o princípio ativo era o suor humano em contato com
trigo ou farelo de pão. Os fósseis, que começavam a ser descobertos no século
XVIII, existiam graças a vapores úmidos, que continham sementes e sopravam
dos mares para dentro das fendas da Terra, onde eles, então, se desenvolviam.

111
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Apenas no Renascimento começaram a surgir ideias mais arejadas e a


pesquisa científica pôde se desenvolver sem interferência do Vaticano. Mas,
nem tudo era esclarecido na Renascença. No século XVIII, um século depois de
Helmont e sua receita, na Inglaterra, o arcebispo de Armagh jurou que vira em
sonho um anjo descer dos céus e lhe revelar que a Terra havia sido criada no ano
4004 a.C. e que sua idade não ultrapassava os 6.000 anos. Foi o que bastou para
que ele tivesse adeptos em toda a Europa.

Mesmo assim, enfrentando esses percalços, a ciência avançava. Robert


Hooke (1635-1703), no início do século XVIII, propôs uma relação entre os fósseis
e as camadas geológicas. No meio científico, suas ideias foram bem recebidas,
principalmente, porque começava a se aceitar que a Terra tinha muito mais que
6 mil anos.

Em 1788, o médico escocês James Hutton (1726-1797), publicou um ensaio


intitulado Uma teoria sobre a Terra, em que explica processos erosivos nas rochas
e nos solos. Para ele, por causa desses processos, os continentes teriam levado
milhões de anos para se formar. Sua teoria foi chamada uniformitarismo.

O zoólogo francês Georges Cuvier (1796-1832), professor de Zoologia


na Universidade de Paris e profundo conhecedor de anatomia comparada,
deu um enorme impulso no estudo dos fósseis. Usando apenas ossos esparsos
ou marcas deixadas em sedimentos, ele conseguia reconstruir esqueletos de
animais pré-históricos.

Apesar de todo o seu saber, Cuvier foi o principal responsável por uma não
muito breve estagnação da ciência no século XVIII. Ele explicava a existência dos
fósseis graças a catástrofes, como o dilúvio, que exterminaram todos os animais.
Findo o período da catástrofe, a criação divina repovoava a Terra. Sua ideia foi
chamada de catastrofismo e também teve muitos adeptos. Cientistas renomados
seguiam as pegadas de Cuvier, como o biólogo suíço-americano Louis Agassiz
(1797-1873), o paleontólogo francês Alcide d’Orbigny (1802-1857), o zoólogo
inglês Richard Owen (1804-1892) e muitos outros.

Outros pesquisadores, de mente aberta, testavam a geração espontânea


e concluíram que era impossível a vida surgir como defendiam seus adeptos.
O médico italiano Francesco Redi (1626-1698), em Florença, afirmou, depois de
realizar inúmeras experiências, que os vermes observados na matéria orgânica em
decomposição eram fruto de ovos depositados por outros vermes ou por moscas.

Paradoxalmente, um dos maiores inventos usados pela ciência reforçou


a ideia da geração espontânea: o microscópio, inventado em 1672 pelo holandês
Anton van Leeuwenhoek (1632–1723), permitiu ao seu inventor observar as
primeiras bactérias, cuja existência foi logo associada à geração espontânea.

112
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

Mais um impulso à geração espontânea partiu de John Needham (1713-


1781), em Londres, em 1745. Ele aqueceu e vedou tubos de ensaio, que continham
um caldo orgânico, e constatou que, neles, havia vermes. Lazzaro Spallanzani
(1729-1799), padre italiano, discordou do inglês e declarou que ele não havia
aquecido bem os tubos. Mas Needham contra-atacou e disse, definitivamente,
que se aquecesse em demasia os frascos, o princípio ativo seria destruído. A
glória ficou com o inglês e Spallanzani foi esquecido.

A luz só brilhou no final do século XIX, quando as experiências do


bacteriologista francês Louis Pasteur (1802-1895), pingaram um ponto final à
eterna discussão. Dizia ele: se um líquido orgânico ficar em contato com o ar,
cedo conterá um exército de seres vivos, unicamente porque o ar está repleto de
sementes, esporos e microrganismos. E completava: fora do contato com o ar, o
caldo não se deteriorará.

Pasteur provou o que dizia. Preparou um caldo orgânico e, com ele,


encheu vários frascos e não os vedou. Ao contrário, com uma chama, entortou
os gargalos em forma de um alongado S. Outros frascos foram deixados com o
gargalo normal. Os frascos foram postos em repouso por alguns dias. Em seguida,
observou os frascos e notou que nos frascos de gargalos curvos, depositaram-se,
no colo do gargalo, as impurezas contidas no ar. Nesses frascos, o líquido não se
deteriorou. Mas nos frascos normais, houve deterioração.

Pasteur, então, pôde comprovar dois fatos: a geração espontânea,


definitivamente, não existia e, mais importante, o ar era carregado de impurezas,
que provocavam a decomposição da matéria orgânica, com o aparecimento de
bactérias, fungos, vermes e outros organismos, onde, antes, não existiam.

Os frascos com gargalo entortado são mantidos intactos no Instituto


Pasteur, em Paris. Foram apenas tapados para evitar a evaporação.

A experiência de Pasteur foi tão conclusiva que, durante todo o final do


século XIX e princípio do século XX, as investigações sobre a origem da vida
foram relegadas ao esquecimento.

Mas, como a ciência não para, no século XX surgiram hipóteses modernas


baseadas em fatos puramente científicos comprovados. A principal delas é
a hipótese da quimiossíntese e traz à tona os primeiros estudos sérios sobre o
surgimento da vida.

Ela se apoia em experiências realizadas em laboratórios, em evidências da


observação cuidadosa, em testemunhos geológicos, nos estudos modernos dos
fósseis e nas observações obtidas em outros planetas.

113
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

3 A QUIMIOSSÍNTESE: UMA TEORIA MODERNA SOBRE A


ORIGEM DA VIDA
No início do século XX, poucos cientistas deram prosseguimento às
pesquisas sobre a origem da vida. Mesmo no século XIX, cientistas como Thomas
Huxley, grande defensor das ideias de Darwin (1825-1895), e James Tyndall,
outro cientista inglês, em 1874, chegaram à mesma ideia de que a vida poderia ter
surgido na combinação de substâncias inorgânicas. Suas deduções não tiveram
eco, unicamente devido a Pasteur e seu experimento.

Na década de 1920, o russo Aleksander Ivanovich Oparin (1894-1980) e o


inglês John Burdon Sanderson Haldane (1892-1964 - mais conhecido como J.B.S.
Haldane), trabalhando em separado, disseram que a vida teria surgido a partir de
moléculas orgânicas existentes numa atmosfera rica em hidrogênio e substâncias
orgânicas. Levadas pelas chuvas para os oceanos, que Haldane definia como uma
sopa fina e quente, as moléculas originaram compostos orgânicos.

A matéria viva é formada por hidrogênio, oxigênio, carbono, nitrogênio,


fósforo e enxofre. Esses elementos combinam-se de diversas maneiras e originam
os principais compostos, que constituem a matéria orgânica: água, carboidratos,
lipídios (graxas ou gorduras), proteínas, enzimas e os ácidos nucleicos.

Para que entendamos como esses elementos se combinaram para gerar


a matéria orgânica, devemos recuar no tempo até a formação da Terra e sua
atmosfera primitiva.

3.1 A ATMOSFERA PRIMITIVA


A primeira atmosfera da Terra era formada por amônia (NH3), metano
(CH4), dióxido de carbono (CO2), ácido clorídrico (HCl), gás sulfídrico (H2S),
dióxido de enxofre (SO2) e vapor d'água. A volatilização dos compostos, antes
retidos nos interstícios dos planetesimais, foi chamada de desgaseificação.

O teor de dióxido de carbono era 600 vezes maior que o atual (Krauskopf,
1972, p. 215), o que tornava a atmosfera primitiva redutora. Provavelmente,
os oceanos também se formaram a essa época, pelo mesmo processo e pelas
atividades vulcânicas.

114
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

3.2 O AMBIENTE NA TERRA PRIMITIVA


O vento solar, erupções na superfície do Sol, as radiações solares, as
atividades vulcânicas ativaram as moléculas gasosas leves, como o hidrogênio e
o hélio, que se perderam no espaço. As atmosferas de Júpiter, Saturno, Urano e
Netuno – planetas gasosos – são formadas principalmente por esses gases e por
elevadas concentrações de dióxido e monóxido de carbono, metano e amônia,
mas a distância do Sol não as afeta.

Em 1953, Stanley Miller (1930-2007), então estudante da Universidade


de Chicago, elaborou um aparelho, no qual conseguiu representar as condições
ambientais da Terra primitiva, como era há 3,5 bilhões de anos. No seu aparelho
ele mostrou que as reações entre compostos inorgânicos geravam compostos
orgânicos. Miller recebeu o Prêmio Nobel de Química pela sua experiência.

Miller comprovou que, sob uma descarga elétrica, compostos como o


dióxido e monóxido de carbono, amônia, vapor de água, metano e elementos
simples como hidrogênio, hélio, nitrogênio e oxigênio, reagiam entre si e
originavam aminoácidos, carboidratos, ácidos nucleicos, glicose, frutose e,
mais tarde, proteínas. Na sua experiência original, Miller obteve aminoácidos.
Nas experiências que se seguiram, realizadas por ele e por outros cientistas,
conseguiram os compostos mais complexos, como os ácidos nucleicos.

Miller sugeriu então que, sob certas condições e contando com uma fonte
de energia permanente, esses gases, na Terra primitiva, reagiam e formavam
moléculas mais complexas. As chuvas encarregavam-se de levar para os oceanos
as moléculas formadas na atmosfera.

O passo seguinte deu-se nos oceanos aquecidos e representou a formação


de macromoléculas, os polímeros, que são protegidos por uma membrana de
substâncias gordurosas. Oparin, em 1938, chamou os polímeros de coacervados.
A membrana de gordura era fundamental para os coacervados primitivos – ela
mantinha os componentes orgânicos fora do contato com a água do mar e, desta
forma, eles puderam se organizar e realizar reações químicas mais complexas.
Surgiram daí mecanismos essenciais, como a síntese dos ácidos nucleicos. Os
ácidos nucleicos, por seu lado, passaram a comandar todas as funções internas
dos coacervados, que, a partir dessa época, podiam se multiplicar e, pois,
aumentar sua população.

115
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

3.3 SURGE A FOTOSSÍNTESE


Enquanto esses acontecimentos se davam nos oceanos, na atmosfera,
também, as coisas iam se alterando lentamente – a camada de ozônio começava
a se formar. As reações químicas formadoras dos compostos orgânicos, como os
carboidratos, dependiam fundamentalmente das radiações ultravioletas do Sol.
Os coacervados primitivos eram heterótrofos e os carboidratos, importantes na
sua fisiologia. Sem o ultravioleta, a produção de compostos orgânicos reduziu-se
e começou a faltar comida para os coacervados, cuja população já era numerosa.

Isso aconteceu há 2,7 bilhões de anos. A formação da camada de ozônio


mostrava, entretanto, que a concentração de oxigênio na atmosfera aumentava.
As primeiras moléculas de oxigênio podem ter surgido na desgaseificação das
rochas, quando vapor de água foi liberado. O hidrogênio, por ser leve, localizou-
se nas camadas superiores da atmosfera e o oxigênio, mais pesado, permaneceu
ao nível da superfície, o que facilitava o seu contato com a água do oceano. Desta
forma, apareceram pequenos bolsões de água mais oxigenada. Nesses bolsões
desenvolveram-se moléculas orgânicas que podiam usar o oxigênio – as algas
cianofícias. As algas azuis conseguiam processar compostos como o dióxido de
carbono e água, que sob a ação da luz solar, nos mares rasos, liberavam oxigênio
para a água na fotossíntese. A oxigenação da água dos mares rasos foi o trampolim
para o surgimento de outro processo de obtenção de energia – a respiração.

Havia dois tipos de organismos nos oceanos primitivos – os autótrofos,


como as cianofícias, e os heterótrofos, subdivididos em dois grupos – os
anaeróbicos, que obtinham sua energia por meio da fermentação, e os aeróbicos,
que a conseguiam pela respiração.

A oxigenação da água dos mares foi um passo fundamental para a vida


na Terra. Desde o surgimento da fotossíntese em diante – há cerca de 2 bilhões
de anos – até a transição do período Pré-Cambriano para o Paleozoico, o planeta
presenciou uma significativa expansão de seres aeróbicos. Nessa época, a
concentração de oxigênio equivalia a 1 centésimo da atual, mas foi o bastante
para a explosão populacional que ocorreu naquele período.

No Siluriano (430 ma), a concentração de oxigênio na atmosfera subiu para


1 décimo da atual e as primeiras plantas puderam deixar o oceano e colonizar as
regiões costeiras. No Devoniano(400 ma), a quantidade de oxigênio e de ozônio
atingiu teores próximos aos atuais e a vida terrestre ganhou grande impulso.

No quadro a seguir, baseado em Soares (1992, p. 26), podemos ver,


resumidamente, os passos que levaram à evolução das células primitivas.

116
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

QUADRO 4 – EVOLUÇÃO DAS CÉLULAS PRIMITIVAS


CO + CO2 + N2 H2 H20

⇓ Altas temperaturas, centelhas elétricas + raios ultravioletas


Aminoácidos da atmosfera
⇓ Chuvas
Aminoácidos nos oceanos aquecidos
⇓ Aquecimento prolongado
Formação de proteínas

“Sopa” de proteínas nos mares

Formação de coloides

Formação de coacervados

Nucleoproteínas com envoltório (membrana)

Formação da célula primitiva heterótrofa

Formação da Célula autótrofa quimiossintetizante aparecimento da clorofila

Formação da célula autótrofa fotossintetizante
FONTE: Soares (1992, p. 26)

3.4 A TEORIA DA EVOLUÇÃO: O DARWINISMO E O


NEODARWINISMO - A SELEÇÃO NATURAL E A ORIGEM
DAS ESPÉCIES
A distribuição atual dos seres vivos resulta de uma sequência de
mudanças ocorridas nos ambientes e na evolução das espécies no
decorrer do tempo. Em todos os períodos ocorreu uma relação
recíproca entre o ambiente físico e os organismos que o habitavam.
Se o ambiente influencia o processo evolutivo, é de se esperar que
a velocidade e o tipo de processo dependam das características das
áreas de distribuição. (MARGALEF, 1989, p. 265).

TUROS
ESTUDOS FU

Prezado(a) acadêmico(a)!
No estudo da evolução é preciso considerar os aspectos genéticos e as transformações
que se sucederam nos ambientes antigos, porque estes são uma das causas das mudanças
ocorridas nos organismos, como veremos à frente.

117
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A distribuição atual das espécies se sustenta no processo conjunto da


evolução e das mudanças ambientais no decorrer dos tempos geológicos. O termo
evolução refere-se à biosfera como um todo e não apenas às espécies.

O ambiente tem forte participação na evolução dos organismos, embora


não seja determinista. Se o ambiente muda, a espécie responderá a essa alteração
com uma adaptação às novas propriedades. Se a espécie se adapta, passará para a
sua prole a sua capacidade de se amoldar a um novo ambiente. Desta forma, cria-
se uma linhagem de organismos preparados para viver em ambientes diversos. Se
a espécie não consegue transmitir as variações genéticas, não manterá a linhagem
futura e extinguir-se-á.

É esse o conceito de seleção natural, que Charles Darwin (1809-1882),


introduziu no seu livro “A Origem das Espécies”, em 1859. A evolução darwinista
apoia-se inteiramente no mecanismo da seleção natural. Contudo, a própria
evolução da teoria da evolução alterou o conceito darwinista e, hoje, é muito
diferente do conceito inicial. Outras linhas de pensamento sustentam que existem
outros mecanismos, além da seleção natural – que muitas dessas linhas também
aceitam – que atuam no desenvolvimento dos seres vivos. E, em alguns casos,
afirmam seus defensores, a seleção não tem qualquer influência. De qualquer
maneira, a evolução darwinista é aceita pela maioria dos biólogos. Darwin deu
o pontapé inicial e, involuntariamente, preparou o campo para que estudos
posteriores aprimorassem a teoria.

3.5 O DARWINISMO, O NEODARWINISMO E AS IDEIAS


MODERNAS DA EVOLUÇÃO
A discussão sobre a evolução caminhou junto com o século XX e ganhou
muito impulso na década de 1940. Digladiavam, de um lado, os neodarwinistas,
adeptos da teoria de Darwin adaptada à Biologia moderna, e, de outro, os
adversários, que não aceitavam totalmente, mas que concordavam que a evolução
era um fato incontestável.

Atualmente, dois temas resumem a discussão (BLANC, 1994, p. 14). No


primeiro, duas perguntas esperam respostas: a seleção natural, como a imaginou
Darwin, de fato se dá? O acaso intervém na seleção natural? No segundo tema
a dúvida gira em torno de uma indagação: como uma espécie origina outra?
Se há descendência e sendo uma espécie ancestral de outra mais recente, como
surgiu a espécie ancestral?

A teoria darwinista não explica como uma nova espécie surge, tampouco
a neodarwinista clareia os fatos. Para Gould (1992, p.13), devem existir outros
fatos além da explicação neodarwinista para solucionar os mistérios da evolução.

118
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

As discussões filosóficas sobre a evolução darwinista, a neodarwinista


e outras teorias modernas não fazem parte deste texto, mas não podem deixar
de ser acompanhadas, mesmo à distância. É necessário que se forme uma visão,
ainda que superficial, do atual quadro da discussão do tema.

A teoria darwinista apoia-se no conceito de seleção natural – alguns


indivíduos estão mais bem preparados que outros para enfrentar fatores
limitantes. Quando a espécie se ajusta ao ambiente, diz-se que está adaptada. A
adaptação é, pois, resultado da seleção natural. A evolução é consequência da
adaptação – quando uma espécie se adapta, simultaneamente, evolui.

Entretanto, o darwinismo não oferece exemplos de seleção natural que


possam ser observados na natureza. As observações de Darwin foram feitas na
seleção artificial, realizadas por criadores de pombos. Os criadores escolhiam
pombos que lhes pareciam bem preparados para transmitir seus caracteres aos
filhos. Esperava-se que os pombos da geração seguinte tivessem características
que os tornassem superiores aos seus pais. Darwin, ao entrar em contato com os
criadores e vendo a aplicação de um método simples, perguntou-se se na natureza
não poderia ocorrer o mesmo. É bom termos em mente que a genética só seria
desenvolvida no final do século XIX, pelo padre Gregório Mendel (1822-1884).
Portanto, as dúvidas de Darwin eram todas empíricas, não apoiadas na ciência.

Além disso, Darwin não observou esses mecanismos na natureza, mas


apenas deduziu que se davam como ele imaginava, repousando suas ideias
nas suposições de outros cientistas, como o inglês H. W. Bates, que estudou o
mimetismo de borboletas na Amazônia, no século XIX.

Portanto, as ideias de Darwin não tinham qualquer base científica. Mas tal
era a sua coerência, que serviu de modelo para o desenvolvimento da Biologia.

O neodarwinismo apoia-se na genética e atua em conjunto com a seleção


natural (BLANC, 1994, p. 97), e o mecanismo da mutação é essencial. Duas
proposições sustentam o neodarwinismo (BLANC, 1994, p. 88):

- “[...] a evolução consiste no surgimento de novas variantes de genes por


mutação ao acaso nas populações, seguida da substituição gradual, sob a ação da
seleção natural, das variantes menos apropriadas pelas mais apropriadas [...]”;

- “[...] o mesmo mecanismo de modificação da composição genética das


populações permite explicar como uma espécie gradualmente dá origem a outra,
como resultado da diferenciação genética acrescida de uma de suas subespécies”.

Portanto, o neodarwinismo explica como surgem novas espécies. Como


a genética ainda não havia surgido, Darwin não pôde explicar esse mecanismo.
Muitas teorias biológicas são o ponto de apoio para o neodarwismo formular
o seu conceito – genética, mutações gênicas, paleontologia, taxonomia etc. Por
isso, Julian Huxley, em 1942, neto de T.H. Huxley, o grande defensor de Darwin,
propôs o nome de teoria sintética da evolução. (BLANC, p. 88).

119
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Na década de 1960, os neodarwinistas acrescentaram uma nova corrente


na teoria, que afirmava que o acaso era mais importante que a seleção natural no
aparecimento de espécies novas (BLANC, 1994, p. 93). Na década de 60, uma
nova corrente surgiu entre os neodarwinistas e afirmava que o acaso tinha uma
participação maior que a seleção natural. (BLANC, 1994, p. 93). A teoria passou
a ser denominada de teoria neutralista da evolução e seu defensor era o japonês
Motoo Kimura, em 1968.

Até então, os geneticistas aceitavam que os alelos governavam o processo


adaptativo da espécie. Nas espécies novas, os alelos antigos, pouco eficazes
na adaptação, seriam substituídos por novos alelos e a seleção natural tinha
participação fundamental nessa substituição. (BLANC, 1994, p. 119).

Mas Kimura sustentava que a substituição dos alelos era neutra e que a
seleção natural não tinha uma participação tão importante. Para ele, os alelos
flutuavam numa população de forma aleatória, isto é, ao acaso. Desta forma, a
seleção natural não tinha fundamento. Ademais, todos os alelos tinham o mesmo
peso e nenhum era mais eficaz que o outro.

Uma outra teoria discordava dos neodarwinistas – a teoria dos equilíbrios


pontuados, de Stephen J. Gould (1941-2002) e Niles Eldredge (1943-), elaborada
em 1972. Dela nos ocuparemos resumidamente mais adiante.

Afinal, havia outras alternativas para explicar a origem de novas espécies e


os pesquisadores e os curiosos podiam, desde então, escolher entre muitas teorias.

3.6 A ADAPTAÇÃO
A adaptação é a resposta de uma população às condições ambientais em
que vive, graças à pressão exercida pela seleção natural, de acordo com o que
sustenta o neodarwinismo.

O mecanismo de adaptação é muito complexo. Um ambiente em constante


transformação, em que os fatores limitantes sejam constantes, como numa restinga
ou num deserto, obriga a espécie a adaptar-se. A seleção natural presenteia a
espécie com meios de ajustar-se ao ambiente e ela transmite essas características
aos descendentes. A espécie, certamente, extinguir-se-á se não ocorrer adaptação
ou se a seleção natural não atuar a contento.

Caso o ambiente seja estável e as mudanças sejam raras, as espécies não


terão dificuldade em se adaptar. As sequoias são as mesmas há cerca de 5 mil anos.
Portanto, o ambiente em que elas se encontram não mudou muito nesse período.

A variável mais importante na transformação do biótopo é o clima. As


plantas são muito sensíveis às alterações do tempo e do clima.

120
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

Para os neodarwinistas, o acaso na mutação genética e não a seleção natural


é que permite a adaptação (BLANC, 1994, p. 121). A adaptação e a evolução são
lentas, defendem os neodarwinistas, e passam-se gerações até que surja uma
espécie bem adaptada ao seu ambiente. Contudo, teorias modernas contestam
essa ideia e insistem que a evolução é um processo muito rápido. A rapidez da
evolução explica a falta de fósseis intermediários em algumas camadas geológicas.

A teoria dos equilíbrios pontuados, de Stephen Gould e Niles Eldredge


(GOULD, 1992, p. 259; BLANC, 1994, p. 159), procura explicar a quebra na
sequência de fósseis quando uma espécie salta para outra repentinamente na
camada superior, sem que apareçam entre elas espécies intermediárias. É como
se a evolução se desse em saltos.

Gould e Eldredge basearam-se no fato de que trilobitas do Devoniano


Médio (370 ma) permaneceram imutáveis por cerca de 4 milhões de anos e,
subitamente, foram substituídos por espécies muito diferentes, sem que houvesse
uma transição gradual entre a espécie ancestral e a mais nova. Para ambos, esse
fato mostrava “[...] mudanças espasmódicas ou episódicas, preferencialmente a
um ritmo suave e gradual”. (GOULD, 1992). Períodos de evolução lenta e gradual
eram substituídos por especiação rápida (a que eles chamaram de pontuações).

Parece, no entanto, que a evolução obedece tanto a um ritmo rápido,


quanto a um processo lento. Os grupos antagônicos aceitam os aspectos de uma
ou de outra teoria.

Voltando à adaptação, notamos que uma espécie muito bem ajustada


ao seu ambiente tem pouca flexibilidade de se adaptar caso houver mudanças
bruscas no seu ambiente. Em outras palavras, uma especialização excessiva é
prejudicial e a espécie não terá tempo para se ajustar e perecerá.

Toda espécie deve ser flexível às mudanças ambientais. Transformações


muito rápidas, como um terremoto ou vulcanismo, exigem respostas rápidas das
espécies, o que vem reforçar a ideia de que a evolução é rápida.

Em contrapartida, a flexibilidade de adaptação é a capacidade que uma


espécie tem de se amoldar às mudanças do ambiente. Em princípio, as probabilidades
de sobrevivência serão maiores quanto mais flexível for a espécie – uma fonte variada
de alimento, por exemplo, evitará que uma espécie se extinga. Contudo, excesso de
flexibilidade também pode ser fatal, porque a espécie não suportará a competição
com outras populações bem adaptadas e isso pode levá-la à extinção. Por exemplo,
se ela mudar de nicho, entrará em choque com outra espécie já ocupando esse nicho.

O equilíbrio entre a especialização e a flexibilidade é muito frágil.


Mecanismos de retroalimentação positiva aceleram o desequilíbrio. Porém, as
espécies têm uma capacidade de regeneração e a tendência não é o extermínio
puro e simples, mas a procura de um novo estado de equilíbrio, como explica a
teoria de sistemas. Prevalecerá, neste caso, a retroalimentação negativa.

121
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

O extermínio de espécies acontece antes que a retroalimentação negativa


possa agir. As mutações genéticas são a base da especiação e são manifestações
da retroalimentação positiva. (CHRISTOFOLETTI, 1980, p. 26).

ATENCAO

Cuidado para não confundir especiação e especialização.


Especiação é a criação, por evolução, de uma nova espécie. Especialização é o ato dessa
espécie distinguir-se em alguma particularidade.

O papel do ambiente é importante, mas não determinante. Mudanças


ambientais podem influir nas variações e nas alterações na carga genética de uma
espécie, o que pode levar a uma mutação.

Mas as mutações genéticas podem se dar sem que haja influência ambiental.
A adaptação do organismo a novas condições tem tanto origem genética quanto
comportamental. Muitas vezes, a velocidade e a capacidade de adaptação salvam
a espécie. Muitas plantas, por exemplo, nascem em solos estéreis de zonas de
mineração. Se a adaptação é lenta, a espécie pode se ajustar ao novo ambiente.

As formas de muitos mamíferos resultam de uma adaptação forçada por


condições climáticas ou ambientais. Mamíferos de pequeno porte, normalmente,
não vivem em climas muito frios – embora haja exceções, como os lemingues –,
porque corpos pequenos perdem calor rapidamente.

A variação genética é chamada de cline. O bagre Catostomus clarki tem


uma distribuição no rio Colorado (EUA), que depende de uma enzima (proteína)
produzida em suas células. A ação da enzima varia com a temperatura da água.
Dessa forma, os bagres do rio Colorado possuem enzimas diferentes segundo a
temperatura da água. A variação é gradual, pois a temperatura da água muda
lentamente com a latitude. Esse é um exemplo de cline.

Em uma mesma espécie podem ocorrer diferenças genéticas muito


notáveis – é o que se chama de polimorfismo (do grego, poli, muito; morfo, forma).
Estudaram-se duas populações de caracóis terrestres da espécie Cepaea nemoralis,
na Inglaterra. Uma população apresentava listras nas conchas e a outra possuía
conchas lisas (sem listras). A adaptação dos caracóis dependia da sua forma e do
ambiente em que vivia. Em superfícies uniformes, os caracóis sem listras podiam
ocultar-se do predador, o tordo. Mas os listrados tornavam-se visíveis a ele. Nas
florestas, de ambiente escuro, o caracol listrado sofria menor predação.

122
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

O caso de adaptação mais bem estudado, com todos os detalhes e que


se tornou clássico, é o da mariposa Biston betularia, na Inglaterra. O melanismo
industrial, como se denomina o caso, sugere que a evolução não é tão lenta quanto
a julgavam Darwin e os seus seguidores, mas pode se dar com certa rapidez. Leia
sobre o melanismo industrial nos livros de Biologia.

3.7 O ISOLAMENTO GENÉTICO E GEOGRÁFICO


Populações que vivam no mesmo hábitat trocam informações genéticas
e as características da espécie são resguardadas. O isolamento interrompe essa
troca. É o primeiro passo para o aparecimento de uma nova espécie. Ilhas exercem
importante participação no processo da especiação. É esse o caso dos fringilídeos
(os tentilhões) das Galápagos, estudados por Darwin.

Supõe-se que os tentilhões das Galápagos originaram de pássaros


transportados da América do Sul por ventos e tempestades. Os ventos sopram
no sentido continente-oceano – anti-horário – e é possível que tenham apanhado
os pássaros no litoral da América do Sul e os transportado para as Galápagos.
Caídos – ou pousados – numa das ilhas, os pássaros adaptaram-se logo, porque
os nichos deviam estar vazios.

A fauna das ilhas Galápagos contém várias espécies de aves, uma de rato
– possivelmente levada pelos primeiros navios que lá aportaram, no início da
colonização –, uma espécie de morcego, uma de tartaruga gigante – em espanhol,
galápago, que deu nome ao arquipélago –, várias espécies de insetos e lesmas. Não
existem anfíbios.

Foi a partir das observações acerca dos fringilídeos que Darwin


desenvolveu sua teoria sobre evolução. Existem 13 espécies de fringilídeos no
arquipélago, todas descendentes dos ancestrais, que ocuparam gradativamente
as ilhas e, isolando-se, constituíram patrimônio genético próprio, isto é, um
novo genótipo.

Quando uma espécie é isolada de outras por uma barreira e origina


novas espécies, diz-se que houve uma especiação alopátrica (pátria diferente). É
o caso dos fringilídeos das Galápagos, que se formaram longe do seu centro de
dispersão, a América do Sul.

Um exemplo brasileiro de especiação alopátrica foi observado por


Vanzolini (1970, apud MIZUGUCHI, ALMEIDA & PEREIRA, 1982, p. 111), que
estudou a dispersão do lagarto do gênero Liolaemus (família Iguanidae) na América
do Sul e mostrou que ele tem duas áreas de distribuição – uma, desde o Peru até
a Terra do Fogo, no oeste do continente, a outra, no leste, no norte da Argentina,
Uruguai e na costa do Rio Grande do Sul. Nessa faixa de distribuição contínua
reside o Liolaemus occiptalis.

123
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Ocorre que, no litoral do Rio de Janeiro, existe outra espécie do mesmo


gênero – o Liolaemus lutzae. Essa espécie originou-se a partir da L. occiptalis, mas,
devido às transformações ocorridas no litoral da América do Sul, isolou-se dela
para formar uma variedade nova, ou espécie disjunta. O L. occiptalis expandiu-
se, desde o oeste do continente, até o litoral do Atlântico. No Holoceno (há
exatamente 2.680 anos, segundo Mizoguchi, Almeida & Pereira, 198, p. 113), uma
transgressão marinha isolou a população do L. occiptalis em dois grupos, que,
com o decorrer do tempo, evoluíram por caminhos diferentes. Derivou dela, pois,
a espécie L. lutzae, típica da restinga do Estado do Rio de Janeiro.

A formação do L. lutze se deu com alguma rapidez, o que vem comprovar


a ideia de que a evolução não é tão lenta. A seleção natural pode ter atuado com
alguma intensidade, porque o ambiente era fruto de mudanças muito grandes,
com uma transgressão marinha, que isolou a atual restinga de Marambaia, hábitat
do lagarto, do restante do litoral ao sul. Muitas mudanças devem ter ocorrido na
área, porque o avanço do mar ocupou uma vasta área e, com certeza, interferiu
nos ecossistemas, alterando-os e os obrigando a se amoldar à nova situação. As
cadeias alimentares devem ter sofrido mudanças, o que pode ter provocado grande
desequilíbrio no ambiente, como a destruição de populações e o surgimento de
outras, como o L.lutzae. Os microclimas e o clima local (topoclima), com certeza,
também mudaram, talvez tornando-se mais úmido em alguns lugares. Cursos
de água mudaram de curso quando a antiga restinga foi inundada. A deposição
de sedimentos feita pelo mar e, agora, os rios abrindo outros cursos, alteraram a
dinâmica do litoral. Nova restinga surgiu com o recuo do mar, mas o lagarto já
havia se transformado em nova espécie, que dura até hoje.

Outro exemplo de dispersão alopátrica foi a dispersão da mosca de frutas,


Drosophila, no Havaí. No mundo existem mais de 1.500 espécies de drosófila, das
quais mais de 400 espécies vivem no Havaí. Supõe-se que as moscas deixaram
o Japão e chegaram ao Havaí há 5 milhões de anos. Ao ocupar as diversas
ilhas, isolaram-se e constituíram as espécies havaianas. As ilhas havaianas não
são de grande extensão e o meio físico é relativamente homogêneo, o que pode
ter reduzido a pressão do ambiente sobre as espécies. Desta forma, os fatores
genéticos devem ter tido maior participação na evolução da drosófila havaiana
do que a seleção natural.

O isolamento de uma população não se deve unicamente a barreiras


geográficas. Uma única espécie pode ocupar dois nichos diferentes dentro do
mesmo hábitat e não ocorrer nenhum cruzamento entre as duas populações.
Desta forma, não ocorrerá especiação, porque ocorreu um isolamento simpátrico.
A espécie é chamada de simpátrica, isto é, pátria comum.

Vários fatores podem se dar para um isolamento simpátrico. No caso


de híbridos, não há cruzamento, embora vivam no mesmo hábitat. Plantas com
épocas distintas de reprodução ou de floração podem isolar-se geneticamente e
originar grupos de uma mesma espécie.

124
TÓPICO 2 | ORIGEM E EVOLUÇÃO DOS SERES VIVOS

Numa experiência de laboratório, duas linhagens de milho da mesma


espécie foram selecionadas. Colheram-se sementes híbridas que foram replantadas
nas seis gerações seguintes. A época de floração das variedades era a mesma nas
cinco primeiras gerações. No entanto, na última geração, a floração apresentou
uma diferença de 10 dias entre uma população e outra, o que dificultava o
cruzamento entre as populações. Desta forma, as populações estavam se tornando
geneticamente isoladas e estavam prestes a originar espécies simpátricas.

125
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você estudou que:

Quatro linhas de pensamento buscam explicar como a vida surgiu na


Terra.

● A criação especial é a ideia defendida pela religião cristã. Nesse ponto de vista,
a vida foi criada por um ser sobrenatural, não houve qualquer tipo de evolução
e os animais de hoje são exatamente como eram no momento da criação. Essa
ideia não tem qualquer fundamento científico e não se apoia na ciência.

● Nos EUA, nos anos 80, grupos protestantes, autodenominados fundamentalistas


ou criacionistas, exigiram que o relato do Gênesis tivesse, nas escolas americanas,
o mesmo peso que a teoria científica.

● Outra linha de pensamento da criação da vida vem da hipótese da panspermia.


Essa hipótese foi criada pelo químico sueco Svante August Arrhenius (1959-
1927), na qual sustenta que bactérias e outros organismos unicelulares chegaram
à Terra trazidos por poeira interestelar. Aqui, encontradas condições propícias,
desenvolveram-se nas espécies de organismos, que evoluíram para as atuais.

● A terceira linha de pensamento é a geração espontânea, uma ideia que durou


por quase dois mil anos. A geração espontânea garantia que a vida podia surgir
da matéria inanimada. Ela apoiava-se apenas na observação e tirava conclusões
apressadas, conjugadas com uma fertilíssima imaginação, movida, sobretudo,
pela superstição e pela pressão da Inquisição.

● Em 1788, o médico escocês James Hutton (1726-1797), publicou um ensaio


intitulado Uma teoria sobre a Terra, em que explica processos erosivos nas
rochas e nos solos. Para ele, por causa desses processos, os continentes teriam
levado milhões de anos para se formar. Sua teoria foi chamada uniformitarismo.

● A luz só brilhou no final do século XIX, quando as experiências do bacteriologista


francês Louis Pasteur (1802-1895), pingaram um ponto final à eterna discussão.
Dizia ele: se um líquido orgânico ficar em contato com o ar, cedo conterá um
exército de seres vivos, unicamente porque o ar está repleto de sementes,
esporos e micro-organismos. E completava: fora do contato com o ar, o caldo
não se deteriorará.

● Na década de 1920, o russo Aleksander Ivanovich Oparin (1894-1980) e o


inglês John Burdon Sanderson Haldane (1892-1964 - mais conhecido como
J.B.S. Haldane), trabalhando em separado, disseram que a vida teria surgido a
partir de moléculas orgânicas existentes numa atmosfera rica em hidrogênio e
substâncias orgânicas.

126
● A primeira atmosfera da Terra era formada por amônia (NH3), metano (CH4),
dióxido de carbono (CO2), ácido clorídrico (HCl), gás sulfídrico (H2S), dióxido
de enxofre (SO2) e vapor d'água. A volatilização dos compostos, antes retidos
nos interstícios dos planetesimais, foi chamada de desgaseificação.

● Havia dois tipos de organismos nos oceanos primitivos – os autótrofos, como


as cianofícias, e os heterótrofos, subdivididos em dois grupos – os anaeróbicos,
que obtinham sua energia por meio da fermentação, e os aeróbicos, que a
conseguiam pela respiração.

● A oxigenação da água dos mares foi um passo fundamental para a vida na


Terra. Desde o surgimento da fotossíntese em diante – há cerca de 2 bilhões de
anos – até a transição do período Pré-Cambriano para o Paleozoico, o planeta
presenciou uma significativa expansão de seres aeróbicos. Nessa época, a
concentração de oxigênio equivalia a 1 centésimo da atual, mas foi o bastante
para a explosão populacional que ocorreu naquele período.

● A distribuição atual dos seres vivos resulta de uma sequência de mudanças


ocorridas nos ambientes e na evolução das espécies no decorrer do tempo.

● É esse o conceito de seleção natural, que Charles Darwin (1809-1882) introduziu


no seu livro “A Origem das Espécies”, em 1859. A evolução darwinista apoia-se
inteiramente no mecanismo da seleção natural. Contudo, a própria evolução da
teoria da evolução alterou o conceito darwinista e, hoje, é muito diferente do
conceito inicial.

● A discussão sobre a evolução caminhou junto com o século XX e ganhou muito


impulso na década de 1940. Digladiavam, de um lado, os neodarwinistas,
adeptos da teoria de Darwin adaptada à Biologia moderna, e, de outro, os
adversários, que não aceitavam totalmente, mas que concordavam que a
evolução era um fato incontestável.

● Portanto, o neodarwinismo explica como surgem novas espécies. Como a


genética ainda não havia surgido, Darwin não pôde explicar esse mecanismo.
Muitas teorias biológicas são o ponto de apoio para o neodarwismo formular o
seu conceito – genética, mutações gênicas, paleontologia, taxonomia.

● A adaptação é a resposta de uma população às condições ambientais em que


vive, graças à pressão exercida pela seleção natural, de acordo com o que
sustenta o neodarwinismo.

● A variável mais importante na transformação do biótopo é o clima. As plantas


são muito sensíveis às alterações do tempo e do clima.
● Parece que a evolução obedece tanto a um ritmo rápido, quanto a um processo
lento. Os grupos antagônicos aceitam os aspectos de uma ou de outra teoria.

127
● Populações que vivam no mesmo hábitat trocam informações genéticas e as
características da espécie são resguardadas. O isolamento interrompe essa
troca. É o primeiro passo para o aparecimento de uma nova espécie. Ilhas
exercem importante participação no processo da especiação. É esse o caso dos
fringilídeos (os tentilhões) das Galápagos, estudados por Darwin.

128
AUTOATIVIDADE

1 Qual a relação entre seleção natural, mutação genética, isolamento genético


na evolução e adaptação de seres vivos?

2 Explique com suas palavras como ocorreu a experiência em que o bacteriologista


francês Louis Pasteur (1802-1895), provou que, definitivamente, a geração
espontânea não existia, mas que o ar estava carregado de impurezas que
provocavam a decomposição da matéria orgânica,

3 A origem da vida sempre foi objeto de preocupação do homem, desde os


filósofos da Antiguidade até os pesquisadores modernos, passando pelos
religiosos das diversas seitas do mundo. Neste contexto e com base no
estudo realizado sobre as primeiras ideias no que tange ao aparecimento da
vida, analise as afirmativas a seguir:

I - Quatro linhas de pensamento buscam explicar como a vida surgiu na


Terra: A criação especial; hipótese da panspermia; geração espontânea e
hipótese da quimiossíntese.

II - No início do século XX, poucos cientistas deram prosseguimento às


pesquisas sobre a origem da vida.

III - Geração espontânea, uma ideia que durou por quase dois mil anos,
garantia que a vida podia surgir da matéria inanimada. Essa ideia apoiava-
se apenas na observação e tirava conclusões apressadas, conjugadas com
uma fertilíssima imaginação, movida, sobretudo, pela superstição e pela
pressão da Inquisição.

IV - No século XX surgiram hipóteses modernas, baseadas em fatos puramente


científicos comprovados. A principal delas é a hipótese da quimiossíntese
e traz à tona os primeiros estudos sérios sobre o surgimento da vida.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, III e IV.


b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas II e III.
c) ( ) Está correta apenas a afirmativa IV.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

129
130
UNIDADE 2 TÓPICO 3

A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

1 INTRODUÇÃO
Neste tópico estudaremos a distribuição dos seres vivos, as espécies e
suas formas de dispersão, as espécies exóticas, as interações entre os seres vivos,o
relevo, as teorias, os ciclos climáticos e os refúgios brasileiros atuais ( importância
da preservação).

2 PADRÕES DE DISTRIBUIÇÃO DAS ESPÉCIES


A distribuição atual de animais e plantas é fruto de processos físicos e
biológicos passados e atuais. A evolução das espécies, as migrações, mudanças
ambientais e climáticas, extinções em larga escala, adaptação aos hábitats e a
ocupação de nichos vazios foram alguns dos processos que convergiram para a
distribuição atual.

Existe uma significativa quantidade de fatores que intervêm na especiação


e na repartição atual. Podemos destacar:

- fatores físicos – altitude, longitude, latitude, temperatura, umidade do ar, luz,


pressão atmosférica, radiação solar;
- fatores geográficos – relevo (cadeias montanhosas, vales), corpos hídricos (mares,
rios e lagos);
- fatores químicos – acidez, alcalinidade, salinidade, concentração de gases no ar
ou em solução, presença ou ausência de minerais importantes como o cálcio e
fosfatos;
- fatores biológicos – relações biocenóticas inter e intraespecíficas, mobilidade,
recursos alimentares, presença de água etc.

Há também fatores que dificultam ou impedem o estabelecimento das


espécies, como os enumera Furley (1986, p. 165):

131
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

1 – quando a dispersão é interrompida, seja pela presença de barreiras ou pela


inabilidade da população em se dispersar ou, ainda, pelo tempo, que pode
ser insuficiente para que ela se dissemine segundo o seu próprio potencial
de dispersão;
2 – quando, ao atingir a nova área, a população não a coloniza por incapacidade
de adaptação, de competição ou de reprodução;
3 – no caso da colonização ser bem-sucedida, podem existir adaptações
fisiológicas, morfológicas ou comportamentais que conduzem à evolução
de uma nova espécie.

Alternativamente, a extinção pode reduzir a dispersão de uma espécie


desde o seu ponto inicial.

O ponto que dá início à dispersão de uma espécie é chamado de área de


dispersão. A origem das áreas de dispersão gera muitas discussões atualmente
entre os biogeógrafos: as espécies deixaram as altas latitudes para colonizar a zona
tropical ou migraram dos trópicos em direção às altas latitudes?. (MARGALEF,
1989, p. 295).

A área de distribuição geográfica de uma espécie animal compreende, em


princípio, a sua área de reprodução. (MÜLLER, 1979, p. 27).

As áreas de migração ou corredores são rotas que apresentam


ambientes favoráveis às espécies em deslocamento. Os corredores
são estreitas faixas contínuas de vegetação, que diferem do restante
da paisagem que os circunda, denominada matriz. (FORMAN &
GODRON, 1986, p. 123).

Alguns exemplos de corredores são as matas ciliares, cercas de arbustos


para delimitar pastos e propriedades, faixas de vegetação para diminuir a perda
de nutrientes pelo solo e para evitar a erosão, vale de rios, curso de água, estradas
etc. (FORMAN & GODRON, 1986, p. 121). As sebes ou cercas vivas, em geral,
estão conectadas a capões ou bosques. Os corredores também podem ser barreiras
para algumas espécies, que não se adaptem às suas condições ambientais.

Condição fundamental para o estabelecimento das áreas de distribuição é


o potencial biótico (MARTINS, 1992, p. 13), “valência ecológica” “(DAJOZ, 1973,
p. 30) ou limite de tolerância”. (ODUM, 1985, p. 142).

Ao deixar o seu centro de origem ou centro de dispersão, a espécie


ocupará, sucessivamente, nichos e hábitats novos. Se não tiver contato com
outras populações da sua espécie, a especiação poderá se dar e novas espécies
divergirão daquela espécie ancestral. Esse, em resumo, é o mecanismo da radiação
adaptativa, que pode ter se dado com alguma frequência no passado. As espécies,
obrigatoriamente, têm que estar bem preparadas, com um genótipo adequado,
que lhes permita capacidade de adaptação.

132
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Uma espécie dotada dessa habilidade poderá ocupar vastas áreas, porque
seu genótipo lhe permite. É chamada de cosmopolita.

São poucos os casos de cosmopolitismo ao nível de espécie. Existem


apenas 25 espécies de plantas superiores que se distribuem por mais de 50% da
superfície terrestre, sendo a maioria de plantas aquáticas.

Uma área cosmopolita é ocupada por um táxon que apareça em todos os


continentes – exceto a Antártica – e que não seja menor que um 1/3 da superfície
terrestre (VALDÉS, 1985, p. 123). Eis alguns exemplos – a coruja-da-igreja (Tyto
alba), Musca doméstica (mosca), Canis familiaris (cachorro), Rattus novegicus
(ratazana) e o Homo sapiens, a espécie mais cosmopolita de todas. No reino vegetal,
temos Pteridium caudatum (samambaia invasora de terrenos depois de derrubada
a vegetação), Urtiga dioica (urtiga), Taraxacum officinale (chicória) etc.

Entretanto, as espécies cosmopolitas exigem certas condições favoráveis


para a sua sobrevivência. A barata (Periplaneta americana), por exemplo, precisa
de ambientes propícios, como o lixo acumulado em locais tranquilos e escuros.

Outros organismos dividem-se entre limites latitudinais precisos e


definem áreas circunterrestres – a lebre-do-Ártico (Lepus timidus), os pinguins
(Família dos Esfenisídeos) etc.

Dentre as plantas que ocupam a zona intertropical ou circuntropical,


estão a erva-sensitiva (Mimosa pudica) e a família das Palmáceas. Exemplos
de plantas da zona temperada do hemisfério Norte (circuntemperada) são os
carvalhos (gênero Quercus), as faias (gênero Fagus) e a erva produtora da
bebida groselha (gênero Ribes).

As espécies endêmicas resumem-se a poucas áreas ou mesmo em


apenas uma área. São espécies com um baixo nível de tolerância. Por isto, sua
área é determinada pelas condições ambientais.

FONTE: Furley (1986, p. 165)

O endemismo está estreitamente ligado a barreiras biogeográficas, que isolam


grupos de organismos. Esses grupos são aqueles que poderão originar especiações.

Alguns exemplos de espécies endêmicas: a ordem dos monotremos


(équidna e ornitorrinco) é endêmica da Austrália e Nova Guiné; o
gênero Sequoia, que já ocupou amplas áreas do globo, atualmente está
restrito às montanhas da Califórnia; 80% da flora da Nova Zelândia
são endêmicos. (LACOSTE; SALANON, 1973, p. 22).

133
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Segundo Szymhiewcz (1938, apud DANSEREAU, 1957, p.29), a ilha de


Córsega (França) possui 58% de espécies endêmicas, a ilha de Madagascar, 66%;
Nova Zelândia 79%; Havaí (EUA) 82% e a ilha Santa Helena (Reino Unido), 85%.

Um exemplo brasileiro de área de endemismo são as dunas do rio São


Francisco, ao norte da Bahia. Ao final do último período glacial, há 12 mil
anos, este rio desaguava num grande lago interior, em cujas margens diversas
populações de lagartos se entrecruvazam. Com o aquecimento posterior, o rio
transpôs as serras do norte da Bahia e atingiu o Oceano Atlântico, passando a
isolar geneticamente as populações de cada margem.

Klein (1990), cita diversos exemplos da flora catarinense: a orquídea Laelia


purpurata, usada como símbolo do Estado, endêmica do sul do Brasil, atualmente
quase extinta; bromélias como a Aechmea kleinii Reitz, endêmica da borda oriental
do planalto da Serra Geral, e a A. lindenii (E. Morren) Baker, variedade makoyana
Mez, endêmica da Ilha de Santa Catarina; árvores da família das Mirtáceas, como
o guaramirim-ferro (Nomitrnthes gemballae (Legr. Legr.), endêmica do alto vale do
rio Itajaí, e o araçazeiro (Eugenia pseudomalactha Legr.), endêmica do Estado.

Muitas espécies endêmicas estão a caminho da extinção, ressalta Klein,


por causa do seu valor econômico, farmacológico ou alimentar – o pinheiro-
do-Paraná (Araucaria angustifolia), a canela-preta (Ocotea catharinensis), a imbuia
(Ocotea porosa), o palmiteiro (Euterpe edulis), a erva-mate (Ilex paraguariensis), além
de muitas outras.

Os níveis taxonômicos que possuem um ancestral comum, mas que pelo


surgimento de barreiras biogeográficas se separaram, evoluindo distintamente,
são chamados de vicariantes. Por exemplo, os gêneros Camelus e Llama são
vicariantes, ou seja, tiveram a mesma origem evolutiva, pois ambos são da família
Camelidae. A distribuição desta família atualmente encontra-se em territórios
descontínuos, chamados de áreas disjuntas.

É preciso tomar o cuidado de não confundir o centro de origem ou de


dispersão de uma espécie com a sua atual área de distribuição. Centros de
origem ou de dispersão são áreas que, antes, eram refúgios, e se tornam áreas
irradiadoras das espécies. Áreas de distribuição são aquelas em que as espécies se
localizam hoje. Elas resultam de processos – como a irradiação adaptativa – que
se superpõem e interagem no tempo e no espaço.

3 AS FORMAS DE DISPERSÃO DAS ESPÉCIES


Dispersão é o mecanismo em que uma população, ou parte dela, abandona
seu hábitat e procura outro para sobreviver. No decorrer do tempo, ocupa nichos
vagos e, eventualmente, poderá entrar em competição com outras espécies.

134
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A migração é um dos mecanismos da dispersão. Ela pode ser temporária,


como as migrações sazonais, ou definitivas. Existem vários fatores que levam
uma população a emigrar – escassez de alimento, superpopulação, competição
com outras espécies etc. Por outro lado, também podem ser controladas pelas
estações do ano e mesmo as fases da lua – são os movimentos sazonais.

As migrações sazonais são comuns em animais de montanha, de savana,


da tundra. Muitas espécies de peixes deixam o mar para desovar nas cabeceiras
dos rios – é o caso dos salmões. A piracema nos rios brasileiros é outro exemplo
de movimento regulado pela estação da desova dos peixes.

Explosões populacionais também são uma potente mola de migrações.


Os lemingues (Lemmus lemmus), na tundra ártica, e o pássaro
siberiano quebra-nozes (Nucifraga cariocatactes), que invade e Europa
Central quando a densidade da sua população ultrapassa certo limite.
Mas o movimento depende da abundância de nozes nas coníferas das
regiões invadidas. Caso a produção de nozes seja reduzida, não há
crescimento da população e nem migração. (MÜLLER 1979, p. 41).

Quando a espécie imigrante se adapta bem ao novo hábitat, a população


atingirá um grau de segurança, que encorajará novos nascimentos e a
espécie se estabelece em definitivo. Caso contrário, a espécie tornará a
emigrar ou poderá ser extinta. Para as plantas é necessária a existência
de um agente dispersor, como insetos e aves polinizadores. Água
corrente e vento são importantes dispersores do pólen, de sementes
e esporos. Uma espécie de planta pode ocupar um hábitat favorável,
mas se não houver agentes polinizadores, ela não se desenvolverá e,
desta forma, ao permanecer estéril, não constituirá uma população.
Orquídeas centro-americanas enfrentam essa dificuldade, quando o
vento leva suas sementes para a Flórida, onde elas formam grupos e não
populações. Essas regiões estéreis são chamadas de áreas de expatriação.
(MARGALEF, 1989, p. 241).

É o caso da Flórida, para essas orquídeas.

Os agentes de transporte são muitos e variados: a gravidade, a água da


chuva, rios e córregos, as correntes marinhas, o vento, os animais, o homem, as
geleiras etc.

A anemocoria é o processo em que o ser vivo é levado por correntes aéreas.


Organismos empurrados pelos ventos são chamados de diásporas (DANSEREAU,
1957, p. 227). Normalmente, têm menos de 0,1 mm de comprimento – são
sementes, esporos, fungos, fetos, algas etc. e vivem em suspensão numa vida
latente na atmosfera, até cair ao solo. Diásporas maiores precisam ser levadas por
ventos mais fortes, como vendavais, furacões ou ciclones, tornados etc.

135
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Conforme Margalef (1989, p. 250):

uma coluna de ar com 4.200 metros de altura e 1 km2 de seção


pode conter 10 milhões de animais, mesmo alguns com cerca de 10
centímetros de tamanho, como camundongos, e até peixes podem
ser levados por furacões. Aves levadas por furacões colonizam ilhas
marítimas situadas a milhares de quilômetros da sua área de origem.
Insetos podem percorrer 30 ou 50 quilômetros e teias de aranha servem
de proteção à sua inquilina.

O transporte pela água chama-se hidrocoria. Animais planctônicos –


que se locomovem ao sabor das correntes – são transportados pela água. Os
bentônicos – peixes, crustáceos etc. - podem se locomover por meios próprios
e, quando são apanhados pelas correntes marinhas, dispersam-se com grande
facilidade, podendo se espalhar por todo o planeta.

Conhecem-se 24 espécies do Mar Vermelho, que atravessaram os


162 quilômetros do canal de Suez, construído em 1869, e estabeleceram-se no
Mediterrâneo. O estreito de Gibraltar é também um corredor entre o Mediterrâneo
e o Oceano Atlântico.

As correntes marinhas são agentes colonizadores de ilhas, porque levam


frutos e plantas em geral a grandes distâncias. Frutos, como o coco, que tem
proteção, podem flutuar e, ao chegar a uma praia, podem brotar novamente. O
leite é uma reserva de água e nutrientes.

A ilha de Krakatoa, entre Java e Sumatra, foi praticamente destruída


por um vulcão, em 1883. Toda a fauna e flora e 30 mil pessoas que a habitavam
pereceram. A ilha mais próxima está a 40 quilômetros de distância.

Apenas três anos depois, cerca de 30 espécies de plantas haviam se


estabelecido na ilha. Dez anos mais tarde, uma savana recobria a ilha. Vinte
anos à frente, uma floresta de pequeno porte substituiu a savana. A fauna já
era muito semelhante às das ilhas vizinhas. Vinte e cinco anos mais tarde, 200
espécies de insetos, 16 espécies de aves, duas espécies de répteis e duas espécies
de caracóis terrestres encontraram condições para colonizar a ilha. (VAN DER
MOLEN, 1981).

A ilha reunia ótimas condições para recolonização – calor e umidade e


um solo vulcânico muito rico. Mottershead (1984, p. 16), mostra a evolução das
populações da ilha:

Plantas com flores 1921 1933


Criptógramas 142 219
Musgos 42 52
Total de espécies da fauna 19 -
(Seg. Mottershead, 1984, p. 16) 618 795

136
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Cerca de 60% das espécies haviam sido transportados pelo mar, 32% por
correntes aéreas e 8% por pássaros. (MOTTERSHEAD, 1984, p. 16).

Outro exemplo ocorreu na ilha de Surtsey (Islândia), uma ilha de 2,5 km2
e com 172 metros na parte mais alta, surgida na erupção de um vulcão submarino
em 14 de novembro de 1963. Cinco anos mais tarde, 1968, a população de animais
e plantas já era considerável.

Quando o transporte se faz simultaneamente pela água e pelo vento,


recebe o nome de anemohidrocoria. O vento empurra os organismos na superfície
da água até a margem oposta. Na Finlândia, mais de 4 mil insetos por metro
quadrado foram estudados numa praia do Mar Báltico, depois de cruzar mais de
100 quilômetros de mar.

Biocoria ou zoocoria é o processo de transporte feito por animais ou


pelo homem. Organismos que possuam garras, espinhos ou pelos prendem-se à
pelagem, às patas, unhas, cascos de animais e às roupas do homem e mudam de
hábitat com muita frequência. Aves transportam sementes nas penas, nas fezes
ou no bico. Uma das formas de dispersão da araucária (Araucaria angustifolia),
na floresta ombrófila mista, é feita por animais e aves. Destacam-se a gralha-azul
(Cyanocorax caeruleus) e a gralha-amarela (C. chrysops). Animais, como o ouriço
(família Erethizontidae), a paca (Cuniculidae), a cotia (Dasyproctidae), o esquilo
(caxinguelê) (Sciuridae) e camundongos de diversos gêneros (família Cricetidae)
também dispersam a araucária (MÜLLER, 1986).

Os hábitos alimentares dos organismos dispersores da araucária são


muito variados (MÜLLER, 1986, p. 42). A gralha-azul apanha o pinhão na
pinha ainda presa à árvore e se afasta para devorá-lo, com ele preso no bico.
Por vezes, pode percorrer mais de 300 metros. Se o pinhão cair ao solo, durante
o voo ou quando ela o arranca da pinha, a gralha procura outra pinha. Dessa
forma, o pinhão pode germinar e originar outra árvore. A gralha-amarela
prefere os pontos médios da árvore ou pode descer ao solo para apanhar
um pinhão que lhe escapou do bico. A gralha-azul não desce até ao solo.
(MÜLLER, p. 43).

Quando as sementes são dispersadas pelas fezes de animais ou aves, são


chamadas de endozoócoras.

137
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

4 ESPÉCIES EXÓTICAS OU ESTRANGEIRAS


Dansereau (1957, p. 266):

enumera categorias de organismos que surgiram naturalmente através


da dispersão natural e principalmente os que foram introduzidos
pelo homem. A dispersão feita pelo homem sempre foi importante.
Em todos os lugares para onde foi ele levou consigo não só espécies
domesticadas – cão, aves, gato, gado etc. – e plantas diversas, mas
também espécies selvagens, como o pardal, ou comensais (que
convivem com ele), como o rato e a barata.

Espécies indígenas – ou espécies nativas (art, 1998, p. 295): Não precisam


do homem para expandir-se. Muitas são endêmicas. Exemplos – a quaresmeira
(Tibouchina spp), no Brasil, o coelho europeu (Lepus europaeus), que invadiu a Europa
Ocidental, e o coelho-de-rabo-de-algodão, que emigrou dos EUA para o Canadá.

Muitas espécies indígenas, sobretudo os vegetais, foram domesticadas


pelos povos primitivos, nos últimos 20 mil ou 10 mil anos. Cerca de 400 novas
subespécies surgiram disso.

Espécies estrangeiras esporádicas – ou estrangeiras, que nunca se


estabelecem, porque não conseguem se adaptar a outro hábitat. Pinguins levados
pela corrente das Malvinas vão parar nas costas do Estado de Santa Catarina, mas
não sobrevivem.

Espécies estrangeiras conservadas (não naturalizadas) – exigem a


intervenção do homem. É o caso do Eucalyptus spp. Introduzido no Brasil em
meados do século XX, se dispersa graças ao homem, mas sua dispersão natural
é um fato consumado. O café (Coffea arabica) e as frutas cítricas – laranjas, limas,
limões, tangerinas – originárias da Ásia, também vieram na bagagem do homem.

Espécies estrangeiras naturalizadas – instalam-se com a ajuda do homem


e se dispersam sem a sua ajuda, o que causa desequilíbrios. No Brasil, os
portugueses introduziram o pardal (Passer domesticus), o bico-de-lacre (Estrilda
cinerea), o capim-gordura (Melinis minutiflora), o capim-colonião (Panicum
maximum), vindos com os navios de escravos. Os problemas ambientais que essas
espécies podem causar são graves. Na Nova Zelândia e na Austrália, os ingleses
introduziram o gato doméstico e o coelho, este na Austrália. O gato tornou-se uma
praga tão séria, porque não tem predadores, que o governo da Nova Zelândia
liberou sua caça a tiros.

A introdução de epidemias é outro exemplo deste grupo. A peste bubônica,


transmitida pela pulga do rato, chegou à Europa por navios. Marinheiros ingleses
levaram doenças venéreas, como a sífilis, para as ilhas do Pacífico. A febre
amarela, a dengue e outras doenças foram introduzidas no Brasil pelos navios
que traziam escravos. Também chegou com os navios o mosquito Anopheles
gambiae, transmissor da malária.

138
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A propagação da abelha africana Apis mellifera adansonii no Brasil deveu-


se a um acidente. Em 1956, 70 rainhas africanas foram levadas para a cidade de
Rio Claro (SP), com a finalidade de melhorar a produção de mel, que é alta na
espécie. No ano seguinte, um funcionário deixou cair ao chão uma colmeia e as
abelhas se dispersaram. Em poucos anos, cruzaram fronteiras e invadiram todos
os países das Américas do Sul e Central. No início dos anos 80, haviam invadido
os EUA, onde se encontram até hoje.

Um exemplo bem atual da dispersão de espécies estrangeiras naturalizadas


e seus impactos negativos sobre os ambientes nativos dá-se com o gênero Pinus,
no sul do Brasil. O centro de dispersão da familia Pinaceae localiza-se na América
do Norte. Chegado ao Brasil nos anos 60, com finalidade comercial, como o
eucalipto, dispersou-se com extrema facilidade. Por ser um gênero altamente
invasor, entrou em competição com as espécies endêmicas.

Segundo Zalba (2002) (Bond, p. 1991; HUGHES, 1994; RICHARDSON;


HIGGINS, p.1998), os ambientes mais suscetíveis à invasão desse gênero são,
em primeiro lugar, áreas de solo exposto, seguido das dunas, de comunidades
vegetais campestres e savanícolas, e posteriormente de comunidades florestais.

A bacia da Lagoa da Conceição, ponto turístico de Florianópolis, é outro


exemplo de área que sofre esta contaminação biológica. Seus biótopos são
favoráveis à dispersão do pinheiro e um reflorestamento – monocultura – desde
os anos 60, com centenas de hectares, ganhou o status de parque – Parque Florestal
do Rio Vermelho.

Beltrame & Viggiano (2000), realizaram mapeamento da referida bacia,


enfocando as áreas ocupadas por este gênero, e concluíram que 8,6% (5 km2) da
área da bacia estavam ocupados por reflorestamentos e 10,4% (6 km2) estavam
ocupados por Pinus dispersos aleatoriamente.

Reitz (1961), refere-se a esse tipo de monocultura como floresta artificial


homogênea, e alertava que "As florestas desta espécie são de um estrato único
e suas folhas resinosas, de difícil decomposição, impedem, pela ação dessas
mesmas resinas, o crescimento de ervas que cobrem o solo, diminuindo-lhe a
absorção das águas pluviais que, ao rolarem pela superfície, erodem o solo. [...]
(e também) a ausência nela de frutos para a alimentação dos animais de pêlo
e de pena, que exercem importante papel ecológico na floresta, inclusive o de
fertilização”. (REITZ, 1975, p. 15).

Strahler; Strahler (1996), acentuam a característica dos pinheiros de ser


plantas pioneiras, que invadem áreas desmatadas e acabam por expulsar espécies
endêmicas. Muitas áreas da antiga floresta temperada subcaducifólia foram
desmatadas para a implantação de agricultura, mas, quando abandonadas, foram
invadidas pelos pinheiros.

139
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Espécies estrangeiras aclimatadas a habitações e cidades – são aqueles


insetos que infernizam a vida do homem e com quem competem – a mosca
doméstica (Musca domestica), o rato (Rattus rattus, R. norvegicus) e a resistente
barata (Periplaneta americana, Blatta germanica e B. americana). Também plantas
em grandes quantidades foram trazidas do meio natural e aclimataram-se com
facilidade à vida doméstica. O pardal (Passer domesticus) está completamente
adaptado à América do Norte (e ao Brasil também).

Espécies estrangeiras de áreas abandonadas – o cactus figo-da-índia


(Opuntia ficus-indica), natural da América Central, foi introduzido no Mediterrâneo.
O agave (Agave spp) também levado das Américas para outros países.

Espécies estrangeiras de áreas cultivadas – são plantas de jardins, agricultura


e pastos. O mangusto-da-Índia (Herpeste edwardsii) foi introduzido na Jamaica e, como
seu alimento principal são as cobras venenosas, adaptou-se rapidamente. O coelho
(Lepus europaeus), introduzido na Austrália, é outro caso conhecido. O caramujo
Achatina fulica, natural das Ilhas Maurício, foi introduzido no Havaí e em Guam em
meados do século XIX. Daí expandiu-se naturalmente por todo o Pacífico, agarrado
aos cascos dos navios. Foi introduzido no Brasil com vistas à produção comercial, em
Curitiba (PR). No entanto, a produção foi abandonada e o caramujo expandiu-se, pois
não houve cuidado em interromper a sua proliferação. Os caramujos foram jogados
irresponsavelmente em córregos e, sem predador, proliferaram – como acontece em
todos os lugares por onde passou. Em pouco tempo ele chegou ao norte da Ilha de
Santa Catarina, onde se instalou e se tornou uma praga de difícil erradicação.

A distribuição dos seres vivos é governada por algumas ideias básicas,


que nos permitem entendê-la. A principal delas é que toda espécie tem
uma área de distribuição geográfica definida, embora os seus limites
sejam difíceis de precisar. Fatores ligados às mudanças ambientais no
decorrer dos tempos geológicos, a evolução, a especiação, as extinções,
as intervenções humanas, devem ser igualmente examinados.
(FURLEY, et al., 1986, p. 164).

5 OS MOVIMENTOS DOS SERES VIVOS


Forman & Godron (1986, p. 357), enquadram os movimentos dos seres
vivos em dois grupos: movimentos contínuos e movimentos descontínuos.

O movimento contínuo é visto em paisagens homogêneas, sem barreiras


que possam interromper o movimento.

O movimento descontínuo é feito por partes, interrompido e retomado


em seguida. Quando o ser vivo interrompe seu deslocamento pode haver
uma integração dele com o ambiente, e isto é importante na colonização
de territórios. Criam-se, então, interações do organismo com o ambiente,
porque, quando a população para de se deslocar, integrar-se-á ao hábitat
e viverá nele um certo tempo. A parada pode ser para descansar, por
exemplo, após uma refeição, ou pode significar a colonização de um
território. (FORMAN; GODRON, 1986, p. 360).

140
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Os movimentos descontínuos podem ser de três tipos: dentro do hábitat,


dispersão e migração (Formam & Godron, 1986, p.361). No primeiro caso, o
animal fica apenas nas proximidades da sua moradia (ninhos, cavernas, tocas
etc.), em geral, à procura de alimento. A área onde se desloca uma espécie é o seu
território, que ela defende com unhas e dentes. O confronto torna-se competição
quando o intruso é da mesma espécie, porque haverá luta pelas fêmeas, pelo
alimento, pela hierarquia dos grupos etc. Os intrusos são expulsos com violência.
As lutas, normalmente, não causam a morte do intruso. Elas resumem-se a sons
emitidos para intimidação ou a encontrões, marradas, coices etc. No caso de
carnívoros, como os lobos, as lutas são violentas e os contendores saem muito
feridos. A delimitação do território dá-se também no âmbito doméstico – num
galinheiro, o galo mais forte não vê com bons olhos a chegada de um rival, com o
qual acabará, um dia, disputando as fêmeas. O galo mais forte, o chefe do terreiro,
ocupa o posto mais alto nas grades construídas para a noite.

A dispersão é um movimento ligado ao estabelecimento de territórios,


contíguos ou não (Forman & Godron, 1986, p. 361). A dispersão é um processo
em que o indivíduo deixa o território natal, paterno, e estabelece os seus próprios
domínios. Todos os animais fazem isto.

6 AS INTERAÇÕES ENTRE OS SERES VIVOS


Walter (1986, p. 28) tem uma hipótese sobre a extensão da área de
distribuição de uma espécie. Para ele, “O limite natural de distribuição de uma
espécie particular é atingido quando, em consequência de mudança nos fatores
físico-ambientais, sua habilidade em competir – ou seu poder competitivo – está
tão enfraquecida que ela pode ser expulsa pelas outras espécies”. Esse fator
subentende, como ele próprio expõe, a presença de competidores, cuja existência
também age na delimitação do território.

As interações biológicas são influências mútuas entre os seres vivos,


que interferem substancialmente (positivamente ou negativamente) em sua
sobrevivência. São também chamadas de associações ou de relações biocenóticas.
Contribuem substancialmente no equilíbrio do ecossistema, permitindo o controle
populacional, tornando possível a sobrevivência de diversos seres vivos, muitas
vezes em detrimento de outros.

As interações ocorrem dentro da população e entre indivíduos de espécies


diferentes. Quando se dão dentro de uma mesma espécie, chamam-se intraespecíficas.
E quando se dão fora da espécie, são denominadas de intraespecíficas.

Pode ser benéfica para ambos associados ou benéfica para um e neutra


para outro, conhecida como associação harmônica (simbolizada com +/+
ou +/0, respectivamente). Pode ser benéfica para um e prejudicial para
o outro (+/-). Pode ser neutra para um e negativa para outro (0/-), ou,
ainda, ser prejudicial para ambos (-/-), sendo estas últimas denominadas
associações desarmônicas. (MONTEIRO & PINHEIRO, 1992, p. 21).

141
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Competição (-/-) – Pode ser tanto intraespecífica como interespecífica, em


que, num sentido mais amplo, “[...] dois organismos procuram a mesma coisa [...]
provoca muitas adaptações seletivas que facilitam a coexistência de uma diversidade
de organismos numa dada área ou comunidade. [...]. A interação competitiva muitas
vezes envolve o espaço, o alimento ou nutrientes, a luz, dejetos, suscetibilidade a
carnívoros, doenças etc.”. (ODUM, 1985, p. 235). É considerada um dos principais
mecanismos da seleção natural. Um exemplo de competição intraespecífica ocorre
nas florestas de araucária (Araucaria angustifolia), onde os pinheiros guardam
certa distância entre si, pois as folhas que caem contêm hormônios que inibem a
germinação das sementes onde se depositam. Isto permite que cada indivíduo garanta
o seu suprimento de água e sais minerais, necessários ao seu desenvolvimento. Nos
desertos e nas savanas, as plantas tendem a guardar uma distância considerável entre
si, porque, assim, reduzem a competição pela água e pelos nutrientes.

Outro exemplo de competição interespecífica ocorre com o Paramecium


caudatum e o Paramecium aurélia. Experimentos indicaram que, num primeiro
momento, as populações cresceram separadas e, num segundo momento, quando
foram colocadas juntas, houve o desaparecimento do P. caudatum (GAUSE, apud
MARCONDES, 1992, p. 104).

Muitas vezes, a competição intra e interespecífica ocorre


simultaneamente. Quando o primeiro tipo é mais acentuado, há
tendência da população se espalhar pelo território. Por outro lado,
quando a competição interespecífica domina, a espécie tende a se
restringir em uma área menor. Isto é observado em populações
de ilhas, como é o caso do rato-do-prado, do gênero Microtus, que
ocupa também hábitats florestais, quando o seu competidor natural,
o rato-de-dorso-vermelho (do gênero Clethrionomys), está ausente.
(CROWELL, 1962 apud ODUM, 1985, p. 240).

Portanto, “[...] espécies estreitamente aparentadas ou espécies que possuem


necessidades muito semelhantes, de modo geral ocupam áreas geográficas
diferentes ou hábitats diferentes na mesma área, ou evitam a competição por
diferenças na atividade diária ou sazonal e na alimentação (ODUM, 1985, p. 239).
A competição depende da densidade de indivíduos e é considerada uma das
interações mais importantes da natureza (MARCONDES, 1992; MONTEIRO &
PINHEIRO, 1992).

Amensalismo (0/-) Relação interespecífica, onde uma espécie chamada


inibidora dificulta o crescimento da outra, chamada amensal. O fitoplâncton marinho
do gênero Gonyaulase, por exemplo, provoca a conhecida maré vermelha ao lançar
substâncias tóxicas, provocando a morte de outras espécies. Outros exemplos são
as plantas que produzem substâncias tóxicas, que inibem o crescimento de outras
plantas, interação também denominada de alelopatia (MARCONDES, 1992).

Comensalismo (+/0) Relação interespecífica em que uma espécie, chamada


comensal, aproveita-se dos restos alimentares da outra. Um exemplo tradicional é
o da rêmora e do tubarão (Marcondes, 1992, p. 129), onde a primeira se alimenta
dos restos deixados pelo tubarão. Insetos como baratas são comensais do homem.

142
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Forésia (+/0) Relação interespecífica em que um organismo é transportado


pelo outro. Alguns autores consideram uma forma de comensalismo (DAJOZ,
1983, p. 190). Os coleópteros da família dos Escarabeídeos transportam ácaros do
gênero Geotrupes.

Mutualismo (+/+) Relação interespecífica obrigatória para a sobrevivência


de ambos os indivíduos. Também chamada de simbiose (Dajoz, 1983, p.190),
embora este termo possa ter significado mais abrangente (Art, 1998; PINHEIRO
& MONTEIRO, 1992, p. 23; MARCONDES, 1992, p. 125). São exemplos os liquens
(uma associação entre algas e fungos), micorriza (uma leguminosa e a bactéria
Rhyzobium, fixadora de nitrogênio) (MARCONDES, 1992, p.126), cupins e o
protozoário Tryconinpha, que produz uma enzima usada na digestão da celulose,
herbívoros e protozoários digestivos.

Protocooperação ou cooperação (+/+) Semelhante ao mutualismo, porém


não obrigatória. Ocorre entre o jacaré e o pássaro-palito, que lhe retira parasitas
(MARCONDES, 1992, p. 128), e entre o paguro-eremita (crustáceo marinho) e a
anêmona-do-mar (o eremita transporta a anêmona, que, com os ferrões, o protege
de predadores). (MARCONDES, 1992, p. 128).

Inquilinismo (animais) ou epifitismo (vegetais)(+/0) Relação


interespecífica em que um indivíduo procura no outro abrigo ou melhores
condições de vida. Por exemplo, o peixe-agulha (gênero Fierasfer) penetra no
corpo do pepino-do-mar (holotúria), saindo apenas para se alimentar; orquídeas
e bromélias desenvolvem-se sobre troncos de árvores, buscando suporte e a
quantidade de luz de que necessitam.

Predatismo (+/-) Quando uma espécie mata e se alimenta de outra, a presa.


É uma interação importante para o equilíbrio populacional de presas, mas se o
efeito é muito intenso, pode levar populações de presas à extinção. Perturbações
provocadas pelo homem podem gerar consequências desastrosas.

Canibalismo (+/-) Semelhante ao predatismo, porém ambos são da


mesma espécie. A aranha viúva-negra (Latrodectus mactans) mata e
devora o macho após a cópula. Ocorre também quando certas espécies
sofrem pressões ambientais, que alteram o seu comportamento, como
observado em populações de camundongos restritas a uma área
insuficiente (PINHEIRO; MONTEIRO, 1992, p. 25).

Parasitismo (+/-) Nesta categoria, uma espécie “hospeda-se” na outra,


retirando dele seu alimento. Uma espécie pode se instalar dentro do
organismo do hospedeiro (endoparasitas), como Ascaris lumbricoides,
que habita o intestino do homem, ou pode localizar-se externamente
ao hospedeiro (ectoparasitas), como a pulga nos animais. Ocorre
também entre vegetais, como, por exemplo, o cipó-chumbo, com suas
raízes sugadoras (haustórios) em diversas fanerógamas. As parasitoses
são motivos de preocupações e de pesquisas, principalmente quando
relacionadas a produtos da agropecuária e às enfermidades humanas.
A doença-de-Chagas (esquistossomose) e a malária são consideradas
parasitoses endêmicas no Brasil. (MARCONDES, 1992, p.133).

143
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Escravagismo (+/-) Ocorre quando uma espécie captura a outra para


utilizar-se de seu trabalho e/ou alimento. Pássaros, como o cuco, colocam seus
ovos em ninhos de outras espécies de pássaros, utilizando-os como chocadeiras
(Pinheiro & Monteiro, 1992:28). Von Ihering (2002, p. 175) assim descreve o trabalho
de aproveitador do chupim (Gnorimopsar chopi): ele "[...] não constrói ninho
próprio; aproveita-se do trabalho já feito por outros pássaros, principalmente
pelo tico-tico, mas também vai ao ninho da pombinha-das-almas, dos sanhaços,
dos papa-capins e dos canários-da-terra. Clandestinamente aí põe seus ovos
[...]. Sua maldade ou astúcia vai a ponto de eliminar os ovos legítimos ou, pelo
menos, inutilizá-los por meio de bicadas. E o pobre do tico-tico, sem dar pela
coisa, consagra todo o seu carinho a esses ovos alheios e, mais tarde, ao saírem
os filhotinhos, dispensa-lhes os mesmos desvelos como aos próprios filhos".
Sabiamente, diz Von Ihering (2002), o povo do interior apelidou de chupim os
maridos que vivem às custas da mulher.

Herbivoria ou fitofagia (+/-) Ocorre entre animais que se alimentam de


plantas mais ou menos específicas. Os ungulados, por exemplo, alimentam-se de
diversos tipos de folhas. Por conta da herbivoria dá-se a principal conexão entre
plantas e animais (AMABIS & MARTHO, 1985).

Saprofitismo (+/0) Ocorre entre animais e vegetais que se alimentam


da matéria orgânica em decomposição. Ex. fungos, certos anelídeos e certas
pteridófitas usam a matéria orgânica em decomposição como fonte de energia.

Colônia (+/+) Os indivíduos vivem ligados fisicamente. Pode ocorrer entre


organismos morfologicamente iguais (ex. corais e cracas), onde não há divisão de
trabalho, ou entre indivíduos morfologicamente diferentes (ex. as caravelas – Physalia
caravela), que exercem funções distintas (PINHEIRO & MONTEIRO, 1992, p. 22).

Sociedade (+/+) Semelhante à colônia, porém, os organismos não estão


ligados anatomicamente. Mantêm-se unidos por causa de estímulos,
que se refletem no comportamento social da população. Podem
apresentar divisão de funções, onde os indivíduos agrupam-se em
categorias de trabalho. Ocorre, por exemplo, entre cupins, abelhas e
formigas. Pode ocorrer sem a divisão de trabalho, onde todos podem
realizar qualquer função dentro do grupo, ou ainda as relações de
trabalho podem se desfazer quando não houver mais motivação. É o
que ocorre, por exemplo, na alcateia entre os lobos, no cardume entre
os peixes e na sociedade humana. (MARCONDES, 1992, p.121).

Efeito de grupo (+/+): Certas populações, para se reproduzir e


sobreviver, precisam da existência de um número mínimo de
indivíduos na população. Por exemplo, a população de renas exige um
grupamento de 300 a 400 indivíduos para se manter. Entre os elefantes,
25 indivíduos são o número mínimo. Nas populações de cormorões, o
mínimo são 10 mil indivíduos. (DAJOZ, 1983, p. 182).

Esse fato é muito importante entre os animais, porque explica a dificuldade


que têm eles para ter filhotes nos zoológicos.

144
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Efeito de massa (-/-) Há consequências negativas devido à superpopulação,


como o canibalismo e perturbações na reprodução e fecundidade. Por exemplo,
no gorgulho-do-trigo (Sitophilus oryzae), a postura diminui quando todos os grãos
estão ocupados por ovos ou larvas (DAJOZ, 1983, p. 186).

A ausência de interação intraespecífica ou entre espécies diferentes


denomina-se neutralismo (ODUM, 1985: 234; art, 1998, p. 368).

7 O RELEVO COMO BARREIRA OU PONTE BIOGEOGRÁFICA


Quando os fatores físicos interferem na distribuição das espécies, temos
uma barreira biogeográfica. Contudo, a barreira pode funcionar com um corredor
ou como uma ponte biogeográfica para umas espécies e não para outras.

A Serra do Tabuleiro, no sul de Santa Catarina, com cerca de 900


metros de altitude máxima, é uma barreira fitogeográfica, que
divide formações fitogeográficas ao norte e ao sul. No sul da serra
predominam plantas que suportam temperaturas médias abaixo de
15º C. Ao norte, aparecem plantas que se dão bem em temperaturas
médias acima desse valor. (TEIXEIRA, COURA NETO, PASTORE &
RANGEL FILHO, in IBGE/RADAMBRASIL, 1986, p. 565).

Muitas espécies conseguem sobreviver nos dois ambientes,


independentemente da temperatura. Klein (1960), denominou as florestas
ao norte da serra de tropicais e ao sul de subtropicais, porque, nestas, faltam
espécies tipicamente tropicais, como lianas e orquídeas. As bromeliáceas são mais
tolerantes e aparecem nos dois lados da serra.

O clima é uma barreira geográfica. No caso da Serra do Tabuleiro, as


temperaturas governam a distribuição. No sul da serra, massas úmidas e frias
vindas do Polo Sul são o principal fator limitante para as espécies do norte. Mas,
no norte, as massas tropicais úmidas e quentes barram a expansão das espécies
sulistas. A serra separa duas formações fitogeográficas.

As altitudes selecionam as espécies de plantas por causa da sensível


queda da temperatura à medida que se sobem as montanhas e serras. Na floresta
ombrófila densa, ao longo das vertentes dos morros cristalinos de Santa Catarina,
o palmiteiro Euterpe edulis não ultrapassa os 200 ou 300 metros de altitude.

Em vales muito encaixados, onde prevalecem áreas muito sombreadas e


a circulação do ar é difícil, as massas de ar originadas neles podem ser mais frias
que aquelas das encostas batidas pelo sol, até numa altitude em que a temperatura
comece a cair. No fundo do vale é comum o aparecimento de nevoeiros no fim do
dia e no início da manhã. Isso torna o ambiente muito úmido, o que é acentuado
pelas sombras. Na Serra do Tabuleiro, os vales encaixados, nas partes mais altas
essas temperaturas mais baixas e o excesso de umidade podem funcionar como
barreira para plantas e animais, mesmo que estejam eles acostumados à maior
umidade ao norte da serra – neste caso, a temperatura contrabalançará a umidade.

145
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Oceanos, mares, rios e ilhas separam e distribuem muitas espécies de


animais e vegetais, servindo como barreiras para alguns e de pontes para outros.
Um simples lago num jardim, por exemplo, pode ser uma barreira intransponível
para caracóis. A água salgada dos mares, outro exemplo, age contra espécies de
água doce, assim como a temperatura da água de rios. O mosquito conhecido
como borrachudo (Simulium spp.), da família Simulidae, só põe seus ovos em riachos
de águas límpidas, frias e correntes. Se alguma dessas variáveis faltar, ele emigra.

A inclinação das encostas também influencia na distribuição do calor do


sol e da umidade do solo e do ar. Em vertentes íngremes, o escoamento superficial
é maior e a pedogênese reduzida. Num relevo suave ondulado, a pedogênese é
mais rápida, porque a água infiltra no solo mais facilmente. A cobertura vegetal
nesses biótopos será governada pela declividade e pela espessura do solo, assim
como a fauna que a acompanha.

8 POPULAÇÕES ISOLADAS: A TEORIA DA BIOGEOGRAFIA


DE ILHAS
A teoria da biogeografia de ilhas foi desenvolvida por Robert McArthur e
Edward Wilson, dois ecólogos americanos, em 1963/67. Embora ecólogos, biólogos
e biogeógrafos tenham feito muitas críticas à teoria (KENT, 1987; FOWLER;
ROMAGNANO; AGUIAR, 1991), os seus conceitos são ainda utilizados. Hoje
em dia a teoria está em desuso, substituída pela teoria dos refúgios ecológicos,
que veremos à frente. Não vamos abordá-la aqui.

O termo ilha biogeográfica não se refere apenas a uma porção de terra


cercada por água por todos os lados, como na antiga definição de ilha. Ele se refere
a qualquer biótopo isolado, dentro do qual se desenvolve uma ou mais populações,
isoladas de outras. Esse conceito também foi substituído pelo de refúgio.

A teoria da biogeografia de ilhas tem recebido muitas críticas, porque não


considera as comunidades dinamicamente e parte do princípio de que o número
de espécies é afetado somente pelas características físicas da ilha e não pelas
relações biológicas entre elas, que são complexas e fundamentais (COX; MOORE,
1994, p. 147). A biota das ilhas não é um conjunto de comunidades individuais,
que vivam isoladas umas das outras, mas um sistema dinâmico, integrado,
complexo, no qual novas comunidades surgem, afastando as antigas.

No campo da Geografia, uma das principais críticas que se fazem à


teoria é que, por ter origem na Ecologia e Biologia, ela não considera os aspectos
espaciais, fundamentais na análise geográfica e, por extensão, na biogeográfica
também, quando vista nessa perspectiva (KENT, 1987).

146
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A teoria tem sido aplicada, muitas vezes livremente, em projetos de


reservas ecológicas (KENT, 1987; FOWLER; ROMAGNANO; AGUIAR, 1991),
como é o caso do Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais, de
Manaus, mesmo sem ter passado por testes na natureza que comprovassem a sua
validade (FOWLER; ROMAGNANO; AGUIAR, 1991), e porque os seus conceitos
ainda são prematuros, o que faz com que muitos ecólogos e geógrafos relutem em
aceitá-la, assevera Kent (1983).

Mais importante do que as considerações sobre populações ilhadas, como


na teoria da biogeografia de ilhas, são as condições físicas das ilhas.

O estudo das ilhas pode fornecer informações sobre o mecanismo da


seleção natural. Arquipélagos, ilhas isoladas, lagos, cavernas, são propícios para
a diferenciação taxonômica (MARGALEF, 1989, p. 266). Populações de ilhas
contíguas – da mesma espécie – podem apresentar cargas genéticas diferentes,
por causa do isolamento, o que pode levar à especiação.

As populações de ilhas não levam boa vida. As ilhas contêm


proporcionalmente maior quantidade de fatores limitantes, do que o continente, por
causa de sua menor dimensão. Alterações ambientais numa ilha podem afetar as
populações, que não têm para onde correr. Furacões, terremotos e vulcões causam
enormes problemas nas ilhas. Terremotos submarinos podem originar maremotos
– tsunamis. Ilhas e regiões costeiras com poucas altitudes são vítimas frequentes de
ondas gigantes ou de tufões, como Bangladesh, Sri Lanka, o litoral da Índia. Nesses
locais, as planícies litorâneas não têm barreiras para a penetração das ondas.

Cavernas são outro tipo de refúgio biogeográfico ou ilha biogeográfica.


A fauna é diminuta e especializada e, como expõe Margalef (1989, p. 267), sua
diferenciação taxonômica em todos os grupos sistemáticos é muito maior do que
as mesmas espécies que habitam a superfície. Isso se deve ao isolamento a que
foram submetidas. A especiação será tanto mais acentuada quanto mais antiga
for a colonização da região. A seleção e o isolamento genético podem ser as molas
propulsoras dessas modificações.

Os animais cavernícolas são cegos e desprovidos de pigmentos e de asas.


Não estão, de forma alguma, preparados para a vida fora das cavernas.

O lago é outro local de intenso processo de especiação. A maioria


dos grandes lagos é atual de origem glacial, portanto, bem recente.
A pequena diversidade biológica que contêm provém da sua idade.
Lagos mais antigos, como o Baikal, na Sibéria, o Ocrida, na Iugoslávia,
o Tanganica e o Malawi, na África, são mais ricos em espécies. Por
exemplo, o lago Baikal tem 2.113 espécies catalogadas e, destas, 90%
são endêmicas – o Baikal tem 70 milhões de anos de idade e a sua
profundidade máxima é de 1.620 metros. (MARGALEF, 1989, p. 268).

147
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Os cumes de montanhas originam áreas descontínuas com alta


diversidade de ambientes e de hábitat, que também são ilhas biogeográficas.
Nesses locais existem muitas espécies do Terciário, que, hoje, são consideradas
relictos. Müller (1979, p. 29), cita vários exemplos de animais e plantas que
sobreviveram de alguma forma às glaciações quaternárias, como a Planaria
alpina, um verme carnívoro, de vida livre ou parasita, cujo hábitat eram as
bacias superiores dos rios alpinos.

Alguns lugares nos cumes das montanhas ficaram livres do gelo durante as
eras glaciais e tornaram-se refúgios para animais e plantas. São chamados de nunataks
(MIELKE, 1989, p. 185) e mantêm espécies de animais e plantas que se diferenciaram
de outras áreas. Muitos invertebrados e coleópteros sobreviveram nos nunataks.

Essas considerações, muito resumidas, mostram que a noção de ilha


biogeográfica, no seu sentido mais amplo, não é necessariamente uma porção
de terra cercada por água, mas, na verdade, uma porção de território que
se isole de outras devido ao aparecimento de uma barreira natural. Vimos,
anteriormente, o surgimento do lagarto Liolaemus, estudado por Vanzolini (1970,
apud MIZUGUICHI, ALMEIRA e PEREIRA, 1981, p. 111). O isolamento de certas
áreas de restinga proporcionou a evolução do lagarto.

9 A TEORIA DOS REFÚGIOS


A teoria dos refúgios é um dos temas principais na Biogeografia atual.
No entanto, apenas a partir da década de 1930 é que ela passou a ser considerada
com mais profundidade, quando se realizaram estudos na África, na Austrália, na
Malásia, na Nova Guiné e na América do Sul.

Na Geografia, Ab'Sáber (1977, 1977, 1988), deu impulso à teoria com


trabalhos sobre a evolução geomorfológica e paleoclimática da América do Sul e
do Brasil. Viadana (2002), fez uma detalhada revisão da literatura acerca do tema
no Brasil e aplicou a teoria dos refúgios florestais para o Estado de São Paulo.

Ab´Sáber (1966), ao fazer uma retrospectiva dos estudos sobre paleoclimas


da Amazônia, salientou que, até 1950, não se observava a presença de “ilhas” ou
manchas de floresta como “redutos de tropicalidade vegetacional biótica” e enfatizou
que se “não houvesse redutos de vegetação florestal biodiversa, não existiriam
condições para a reexpansão de biotas, quando do retorno da tropicalidade nos
últimos 12,7 mil anos A.P. Do nada não se criam estoques de diversidade vegetal e
animal suficientes para a reexpansão de grandes contínuos de biodiversidade, tal
como aconteceu na Amazônia e na fachada Atlântica do Brasil ”.

Como toda teoria, esta também recebe críticas, pela não aceitação de
indicadores de interpretações de dados e modelos por parte de alguns autores,
conforme exposto por Haffer e Prance (2002, p. 205) e Viadana (2002, p. 46).
Entretanto, este último salienta que nenhuma crítica apresenta sustentação teórica
e científica convincente.
148
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

O estudo dos refúgios envolve uma grande quantidade de temas ligados à


biogeografia, à ecologia, à geomorfolgia e à paleoclimatologia. A ideia do refúgio
surgiu da observação de paisagens que diferem da paisagem geral, da qual
fazem parte, como os enclaves de cerrado na Amazônica, de araucária na floresta
Atlântica etc. São facilmente destacados na paisagem circundante.

Como surgiram esses núcleos – também chamados de disjunções – no seio


de paisagens tão diferentes? As flutuações climáticas são o pilar principal em que
se apoia a ideia do aparecimento de uma disjunção.

Nessa ótica, o refúgio florestal nos trópicos é conceituado como resultado


de flutuações climáticas ocorridas no final do Pleistoceno (entre 18.000 e 12.000
anos), quando o clima se tornou mais seco e frio e forçou às florestas tropicais
retraírem para pequenas áreas em que a umidade se manteve. Nessas áreas, elas se
mantiveram protegidas do frio e puderam sofrer diferenciações, que originaram
novas espécies de plantas. O modelo dos refúgios não se restringe apenas ao
Quaternário, mas pode ser aplicada ao Terciário ou a períodos mais antigos.

A teoria dos refúgios florestais no Brasil foi esboçada por Ab'Sáber a


partir de observações iniciadas em 1957, junto com o geomorfólogo francês Jean
Tricart. Ab'Sáber mostrou que, nos trópicos úmidos, regiões em que linhas de
pedras apareciam espacialmente muito próximas umas das outras, tinham tido
solos litólicos, semelhantes aos atuais solos do Nordeste. Portanto, aventou a
presença de “linhas de pedra” sugere climas áridos e semiáridos do passado,
pois a existência de solos pedregosos significa uma impossibilidade para o
aparecimento de florestas e o consequente estabelecimento de uma vegetação
aberta. E, em condições normais, a mata só recua se o clima tornar-se mais seco.

Em 1970, Damuth & Fairbridge estudaram a costa brasileira e constataram


a presença de depósitos sedimentares, de idade quaternária, que sugerem um
clima passado bem mais seco que o atual na América do Sul. Contudo, Ab'Sáber
já sugeria um clima com tendências à semiaridez desde que iniciou os estudos
sobre as linhas- de-pedra.

As primeiras observações de Ab'Sáber sobre as linhas-de-pedra se deram no


Estado de São Paulo, assessorando uma excursão com Tricart (1957) (Viadana, 2002).

Ab'Sáber, então, fazendo comparações com o Nordeste, levantou a


hipótese de que, nas regiões com solos pedregosos predominara a caatinga e
que as florestas teriam recuado para ambientes mais úmidos, semelhantes aos
brejos do Nordeste, que ele chamou inicialmente de redutos. O nome refúgio foi
adotado por outros pesquisadores.

Aos estudos de Ab'Sáber seguiram-se outros, que realizaram pesquisas


sobre animais e plantas nas regiões tropicais e concluíram acerca da existência
de antigos refúgios florestais em regiões próximas ao equador como resultado de
um dessecamento do clima no final do Pleistoceno.

149
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

As linhas-de-pedra resultam de um clima seco ou semiárido, em que as


chuvas são torrenciais e sazonais. Bigarella (1964, apud VIADANA, 2002, p. 2)
afirma que o estudo das cascalheiras permite deduzir sobre a derradeira invasão
das matas atuais sobre a vegetação aberta, o que atesta ser a cobertura atual muito
jovem, e que, ainda, climas semiáridos são simultâneos às glaciações, ficando os
períodos interglaciais com as épocas mais chuvosas. Bigarella (1971) mostrou
que, durante o Quaternário, houve uma variedade de climas, desde glaciais, com
regressão marinha, em que as regiões tropicais e sub-tropicais, no Brasil, ficaram
sob clima semiárido, até climas tropicais em que a umidade voltou.

Bigarella, Andrade-Lima & Riehs (1975) sugerem a criação de refúgios


na Amazônia ao afirmarem que, durante épocas secas, houve uma notável "[...]
variação do recobrimento vegetal [...]", que forçou a fauna e a flora quaternárias
a deslocamentos e a diferenciações genéticas. Eles citam várias pesquisas sobre
o aparecimento de pássaros e mamíferos na África e na Austrália, ocorrido nos
deslocamentos da vegetação durante a glaciação Würm (Pleistoceno Superior)
e na subsequente era pós-glacial. No sul do Brasil, Klein (1975) mostrou que, no
Quaternário, o clima úmido atual ainda não conseguiu erradicar a vegetação
de campos, típica de climas semiáridos, nem a floresta de araucária, própria de
climas temperados. Ele sustenta que a vegetação atual na Região Sul está em clara
discordância com o clima atual.

A hipótese de Klein (1975) sobre a variação da vegetação com as oscilações


climáticas é apoiada por trabalhos de Ab'Sáber (1980, apud Viadana, 2002, p.
28). Entre 18.000 e 13.000 anos, no final do Pleistoceno, houve um período de
dessecamento do clima no Brasil. Nessa época, as formações abertas, como
campos e savanas, predominaram e as matas recolheram-se nas áreas de maior
umidade, principalmente nas encostas e vertentes sujeitas a chuvas orográficas.
A semiaridez era acentuada pela expansão da corrente fria das Malvinas para o
norte, até cerca do Espírito Santo. Nas serras cristalinas litorâneas, a mata pluvial
refugiou-se nos vales estreitos e nas encostas, varridas por chuvas orográficas,
constituindo núcleos, semelhantes aos atuais brejos nordestinos rodeados por
campos e savanas.

Ao regredir por dezenas de quilômetros em relação à linha costeira atual, o


mar expôs afloramentos cristalinos, que, intemperizados, serviram de fonte de areia
para a formação de restingas e dunas, quando o oceano voltou a subir (Viadana).

No interior, estepes emigraram da Patagônia e avançaram para o norte


para entrar em contato com o cerrado e a caatinga, que predominavam no centro
do continente. A caatinga, partindo do Nordeste, de onde se expandia, era a mais
extensa formação vegetal do interior, envolvendo o cerrado, que formava um
núcleo no Planalto Central. Para o oeste, estendia-se até o sopé dos Andes, e,
para o norte, até a Amazônia, onde ocupou toda a região, sendo barrado pelas
florestas-de-galeria. Refúgios de florestas espalhavam-se pelas áreas mais úmidas
na Amazônia, rodeados pelo cerrado, com enclaves de caatinga.

150
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A floresta de araucária, graças ao clima mais frio, expandiu-se para o norte,


acompanhando as serras mais altas, junto com os campos, que prevaleceram nas
áreas mais elevadas da Região Sul e chegaram até as serras do Planalto Central
(Espinhaço, etc.), onde ocuparam os topos.

Entre 3.000 e 2.000, a umidade voltou e as florestas puderam deixar os


refúgios, revigoradas, com novas espécies, pois eles funcionam, principalmente,
como bancos genéticos para a especiação, o que sustenta as teorias expostas por
Bigarella, Andrade-Lima e Riehs (1975).

Uma vez mudado o clima, os refúgios passaram a atuar como centros de


dispersão, com as florestas e suas faunas dispersando-se em radiação adaptativa.

Podemos, agora, definir o refúgio, segundo Müller (1977, apud


TROPPMAIR, 2002, p. 138), como:

[...] áreas florestais ou não, onde espécies da flora e fauna permanecem


isoladas em espaços relativamente restritos, enquanto em grandes
áreas circunvizinhas ocorrem condições ambientais adversas à sua
expansão. Esses refúgios somente podem ser considerados como tais
se as condições ambientais neles reinantes permitirem a preservação
integral dos ecossistemas que encerram.

Um refúgio é uma ilha, não no sentido usual de ilha, mas no ponto de vista
biogeográfico – uma ilha biogeográfica, porque, neles, as espécies estão isoladas,
ilhadas, sujeitas a condições ambientais específicas.

10 CICLOS CLIMÁTICOS, PALEOCLIMAS E OS REFÚGIOS


As oscilações climáticas a que se refere a teoria dos refúgios fundamentam-
se nos ciclos astronômicos de Milankovic. Para compreender como os refúgios se
formaram e que causas os levaram a se estabelecer, é preciso entender as causas
das glaciações.

Antes, é necessário ficar bem claro que as condições climáticas normais


na Terra são os períodos glaciais e que as épocas interglaciais – como a atual, que
mostra indícios de estar caminhando para o ocaso –, além de curtas, são apenas a
transição para outra glaciação.

A teoria de Milankovic é um método muito seguro para calcular a


incidência de idades glaciais, que afetaram o clima durante a maior parte da
história da Terra.

No Brasil, o efeito dos ciclos na última glaciação fez reduzir a radiação


solar e, consequentemente, a temperatura do mar, o que afetou a evaporação e
baixou a precipitação. As áreas com florestas reduziram em favor de vegetação
mais aberta (BIGARELLA et all., 1975, p. 456).

151
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Haffer (1992, p.30), lembra também que, simultaneamente às alterações


climáticas, outras alterações não cíclicas – regressão e transgressão marinhas, que
alteraram a distribuição das terras e do mar, mudanças climáticas locais devido à
ação do relevo, deriva continental, processos morfogenéticos – atuaram durante
a história geológica da Terra, formando barreiras ou pontes e promovendo a
especiação de forma mais ou menos intensa.

Damuth; Fairbridge (1970), citados por Leite; Klein (1990, p. 114), indicam
alguns fatores decorrentes de um dessecamento e resfriamento do clima na
América do Sul, embora acentuem não se tratar de um fato generalizado, mas,
talvez localizado, devido ao relevo local.

São eles:

- laterização, típica de clima sazonal;


- existência de xilopódios (órgão subterrâneo para o armazenamento de água e
nutrientes), em plantas do gênero Baccharis, Croton, Psidium, Mimosa;
- presença de vegetação distinta da paisagem local, como a existência de cerrado
no meio da mata tropical (ou da equatorial, no caso da Amazônia), os campos no
Planalto Meridional, junto com a araucária, e desta última na mata subtropical,
como acontece na serra do Tabuleiro, em Santa Catarina, ou da mata tropical,
como em Campos do Jordão e no sul de Minas Gerais, e nas serras mais elevadas
do Espírito Santo e Rio de Janeiro;
- existência de espécies arbóreas com flores coloridas na floresta estacional do
rio Uruguai (canafístula, Cassia spp, ipês). Flores muito coloridas são típicas de
climas sazonais, como o cerrado, e as cores vivas servem para atrair pássaros e
insetos polinizadores;
- plantas como a peroba (Aspidosperma spp), o cedro (Cedrela spp), o ipê (Tabebuia
spp), têm lenho espesso e quando aparecem na mata tropical úmida podem
indicar um paleoclima semiárido;
- ocupação dos campos pela araucária (Araucaria angustifolia) e as espécies
companheiras, indicando que o clima úmido atual favorece a expansão das
florestas;
- invasão da mata de araucária, de caráter temperado, pela floresta subtropical
subestacional do rio Uruguai, de caráter subtropical, que indica uma alteração
do clima para o tipo úmido atual;
- disjunções da araucária no meio da floresta ombrófila densa no sul do país.

Esses fatores mostram que, na última fase do Pleistoceno, o clima era


frio e seco, o que favorecia o avanço de formações como a estepe, a savana e
a caatinga. As matas tropicais recuaram e ocuparam locais em que a umidade
ainda se preservava, como vales encaixados, que serviam de refúgios florestais. O
solo, desprovido de vegetação, era lavado nas chuvas torrenciais, que arrastavam
detritos como areia e cascalho para os interflúvios. Esses detritos deram origem às
linhas-de-pedra, muitas vezes associadas ao clima glacial do final do Pleistoceno
(AB´SÁBER, 1979; VIADANA, 2002).

152
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

No Brasil, durante o final do Pleistoceno, o clima semiárido predominou


nas regiões tropicais e subtropicais (BIGARELLA, 1971, apud VIADANA, 2002,
p. 29). Num clima semiárido as vertentes não têm proteção, porque são recobertas
por formações abertas de cerrado ou de caatinga. A dissecação do relevo é mais
intensa, pois as chuvas, embora sazonais, são aguaceiros poderosos, que lavam
as vertentes. Nos períodos interglaciais, o clima volta a ser quente e úmido, com
chuvas regularmente distribuídas.

Segundo Livingstone (1980, apud HAFFER, 1992, p. 17), a redução da


biomassa de árvores durante períodos mais frios e secos do Pleistoceno pode
ter sido da ordem de 50%. Remanescentes de formações tropicais durante os
períodos cíclicos mais adversos refugiaram-se em condições mais favoráveis. O
patrimônio genético foi resguardado e, quando o clima umedeceu novamente, as
florestas puderam se expandir.

11 A TEORIA DOS REFÚGIOS E A ESPECIAÇÃO. OS CENTROS


DE ORIGEM, DE DISPERSÃO E DE DIVERSIFICAÇÃO
As mudanças paleoclimáticas cíclicas originaram continuidades e
descontinuidades de hábitats, e promoveram a especiação. A diversificação
de hábitats, permitida em ambientes tropicais, estimulou a biodiversidade.
A teoria considera a multiplicação, a dispersão e a migração de espécies em
“alterações por pulsação, como efeito dos ciclos paleoclimáticos e vegetacionais”
(HA F F E R , 1992, p. 20). E, ainda, “[...] ciclos paleoclimáticos funcionaram como
eficiente ‘máquina de especiação’ ou ‘bomba de espécies’ durante o curso da
história geológica”. Uma vez isoladas no refúgio, as espécies passam a sofrer
diferenciações genéticas que, uma vez transmitidas às gerações seguintes,
podem originar espécies e subespécies novas.

As populações, que deixam o refúgio num processo de radiação adaptativa,


entram em contato com outras populações. No processo de expansão podem se
dar novas transformações genotípicas e fenotípicas até que novas espécies sejam
criadas, diferindo, pois, das ancestrais. Vanzolini (1970, apud TROPPMAIR,
1989, p. 187), enumera algumas transformações nesse contato e as divide em dois
grupos: com incompatibilidade total entre as novas espécies e no caso de haver
compatibilidade entre elas.

No caso da incompatibilidade total, o contato pressupõe os seguintes


fatos:

- não há cruzamento entre as espécies, devido às divergências genéticas


desenvolvidas durante o isolamento: neste caso, trata-se de espécies distintas;

153
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

- se há especialização no âmbito das espécies, pode não haver competição entre


elas e, deste modo, elas podem conviver, porque ocupam nichos diferentes. São
espécies ditas simpátricas, isto é, coexistem na mesma área, mas ocupam nichos
diferentes. Foi rara em áreas consideradas centro de origem de espécies. Para
estimular este tipo de especiação seria necessário que as espécies se separassem
geograficamente, em virtude do surgimento de barreiras biogeográficas. Na
Amazônia, por exemplo, as barreiras poderiam ser a erosão, a mudança dos
leitos de rios de planície e a formação de clareiras na vegetação densa, levando à
fragmentação da floresta adulta e ao desenvolvimento de um mosaico (clareiras
e manchas de floresta), desta forma, promovendo o aumento da diversidade;
- no caso de competição, uma das espécies, ou mais de uma, pode ser extinta;
- se houver competição, as espécies podem, contudo, ocupar nichos semelhantes
ou diferentes em territórios diferentes, mas contíguos. As espécies, neste caso, são
chamadas de alopátricas – i. e., vivem em áreas distintas - e podem se desenvolver
em separado até a criação de novas espécies, como mencionado abaixo.

Se houver compatibilidade genética entre as espécies, temos:

- cruzamentos entre as espécies;


- populações (da mesma espécie) ocupam áreas distintas, que apresentam
diferenciações entre si, mas numa área de transição elas podem manter
contato genético e cria-se uma faixa de hibridização, que pode originar
subespécies ou raças.

Embora o processo de especiação ocorra de maneira idêntica tanto nas


faunas tropicais como nas extratropicais do mundo, é na região equatorial que
a disponibilidade de hábitats para manter a especiação é maior e pode ter,
segundo Terborgh (1973, 1972, apud HAFFER, 1992, p. 32), mais de 10 vezes a
disponibilidade das latitudes médias.

De acordo com Müller (1971, citado por Bigarella et all., 1975, p. 450), os
centros de dispersão são tipos especiais de refúgios onde, ao cessar as pressões
que levaram ao isolamento, ocorre a expansão territorial das espécies vegetais e
animais antes retraídas. Assim, um refúgio não é necessariamente um centro de
dispersão, embora o contrário seja verdadeiro. Por conta da existência dos centros
de dispersão, certos biomas se conservam durante períodos que lhe são adversos.

Müller (1979, p. 175), reforça essa ideia ao dizer que uma área só terá
importância como centro de dispersão se as condições ambientais em seu interior
não provocarem a extinção das comunidades que a habitam. E completa: “[...] as
áreas de dispersão são zonas de refúgio em sua origem”.

Outro conceito importante são os centros de diversidade. Para que uma


determinada área seja considerada atualmente como um centro de diversidade é
necessário que atenda a alguns pré-requisitos, como:

154
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

a) A existência de diversas raças primitivas, especialmente se estas forem


endêmicas. Um exemplo ocorre com a área de abrangência das raças de pupunha
(Bactris gasipaes), palmácea da Amazônia, domesticada pelos ameríndios e que
tem sido motivo de pesquisa no Brasil, pois com a farinha obtida do seu fruto
é possível a produção de pães e bolos em substituição ao trigo e ao milho.

b) A existência de dados arqueológicos, históricos, linguísticos, sobre as espécies.

c) A presença de parasitas especializados na espécie. Estes, além de indicarem a


evolução em direção à resistência, indicam também a coevolução parasita-espécie.

12 REFÚGIOS BRASILEIROS ATUAIS


No Holoceno, há 11.000 anos, outra flutuação climática trouxe a umidade
de volta e, com ela, a expansão das florestas, que ocuparam as áreas de cerrado e
caatingas, reduzindo-as praticamente à localização atual.

A regressão do mar, em dezenas de metros, formou uma planície


litorânea com dezenas de quilômetros de extensão, cujo relevo cristalino, exposto
à intempérie, tem sido fonte de areia para a formação de dunas e restingas.

Refúgios atuais podem ser observados em vários lugares do mundo. Na


Amazônia e no Pantanal, por exemplo, existem comunidades ilhadas de cerrados
e de caatinga. A floresta de araucária, de caráter temperado, deixou enclaves
na mata Atlântica, tropical e subtropical. No Nordeste, o clima semiárido
isolou pequenas áreas úmidas, recobertas por florestas, cercadas por caatingas,
denominadas brejos. No cerrado do Planalto Central, as veredas são outro tipo de
refúgio, semelhantes aos brejos – áreas alagadas com vegetação muito diferente
daquela do cerrado, que as circunda, geralmente, palmeiras e árvores da mata
tropical sazonal, cujo hábitat foi invadido pela exudação do lençol aquífero,
quando da formação da vereda.

Os refúgios são áreas de distribuição descontínua ou disjunta, também


denominadas enclaves. Essas áreas permanecem por um certo tempo isoladas de
outras por barreiras biogeográficas. Como diz Vanzolini (1992, p. 52), “refúgios
estão por toda a parte, apenas chamamo-los de enclaves”.

Na Amazônia, áreas de endemismos de espécies animais e vegetais atuais


coincidem com áreas onde se aplica o modelo dos refúgios ecológicos.

O Pantanal mato-grossense apresenta componentes da flora do cerrado,


do Chaco e da Amazônia. Apresenta também relictos florísticos provenientes de
áreas mais secas, como espécies arbóreas da caatinga e cactáceas, relacionados à
expansão das caatingas no final do Pleistoceno (entre 23.000 e 13.000 anos A.P.),
quando estas ocuparam territórios inter e subtropicais no Brasil. Segundo Ab'Sáber
(1988), é possível identificar áreas diferenciadas no contato entre os domínios

155
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

morfoclimáticos e fitogeográficos brasileiros, que se apresentam em forma de


composições e mosaicos e, por isso, propõe o desuso do termo “complexo do
Pantanal”, uma vez que “[...] a região possui um mosaico integrado de paisagens
e espaços geoecológicos perfeitamente visualizáveis e cartografáveis”. Em razão
da sua situação geográfica atual, entre três grandes domínios fitogeográficos, ele
caracteriza o Pantanal mato-grossense como “[...] uma imensa depressão-aluvial-
tampão e ao mesmo tempo, como um receptáculo de componentes bióticos
provenientes das áreas circunvizinhas”, comportando-se como “[...] um delicado
espaço de tensão ecológica, em termos fitogeográficos” (Ab´Sáber, 1988, p. 40).

Com o dessecamento do clima, as florestas tropicais, no interior,


ocuparam bolsões de umidade, como vales encaixados, e serras,
onde chuvas orográficas cuidavam da sua manutenção. Mesmo no
litoral, porque a corrente fria das Malvinas chegou até a altura do
atual Estado do Espírito Santo, as chuvas escassearam e os topos e
os grotões úmidos da Serra do Mar viram-se invadidos pela floresta
ombrófila à procura de proteção contra a semiaridez. Eram situações
que permitem fazer analogia com os brejos nordestinos cercados pela
semiaridez da caatinga. Portanto, os brejos são refúgios de uma flora
de floresta no meio de uma flora diferente. O clima de altitude, mais
frio, mais úmido, a orientação das vertentes, voltadas para os ventos
mais úmidos vindos do mar, que induzem chuvas orográficas, são
fatores que mantêm os brejos intactos. (AB´SÁBER, 1979, p. 9).

Na Região Sudeste, nos terrenos elevados do sul de Minas Gerais, de São


Paulo (Campos do Jordão), do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, a araucária (Araucaria
angustifolia) deixou disjunções, que se destacam claramente nas paisagens tropicais.

Klein (1975) relacionou a vegetação do Sul do Brasil a flutuações climáticas


ocorridas no Quaternário. Nesse estudo, ele mostrou que a distribuição da
mata e dos campos está intimamente ligada às mudanças do clima na América
do Sul e enunciou a hipótese de que a flora atual na Região Sul encontra-se em
discordância com o clima de hoje. Maack, no Paraná (1947, apud BIGARELLA
et al., 1975), sugeriu que climas mais rigorosos haviam existido no decorrer do
Quaternário no Brasil e que os campos atuais são relictos desses climas frios e
secos do passado. Klein concorda com esta opinião.

Pelo menos três flutuações climáticas quaternárias influenciaram a


composição e a estrutura da vegetação no Sul do país. O clima úmido de hoje
favorece a expansão da mata tropical e a tendência é o desaparecimento dos
campos e da mata de araucária. Na realidade, durante o Quaternário ocorreram
nove épocas de glaciações.

Klein (1975, 1978) observou discordâncias na composição da floresta


Atlântica e o clima atual, como a existência de espécies decíduas. Ele cita inúmeras
espécies de árvores encontradas no vale do rio Itajaí-Açu (SC) remanescentes de
climas menos úmidos. Embora produzam sementes férteis, não deixam mais
descendentes dentro da floresta, estando, pois, a caminho da extinção. É o caso
da Alchornea triplinervia, o tanheiro ou tapiá-guaçu, árvore com mais de 25 metros
de altura, caducifólia, muito comum na floresta Atlântica catarinense, porém:
156
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

[...] apresenta melhor vitalidade nas matas abertas e esparsas, onde se


podem encontrar plantas em todos os estágios de desenvolvimento.
Na mata densa, alta e sombria, quase só é encontrada como árvore
plenamente desenvolvida, possivelmente porque suas sementes não
encontram luz suficiente ou condições edáficas adequadas para o seu
desenvolvimento (REITZ et al., 1961, p. 266).

Essa espécie enfrenta, pois, dificuldades em manter a sua descendência


no interior da floresta, indicando que pertencia originalmente a outra condição
climática mais seca, anterior à atual.

Gêneros de origem andina também podem ser encontrados nas matas de


araucária do Sul do Brasil, como Gunnera, Drimys, Podocarpus, Weinmannia, Berberis,
dentre outros (KLEIN, 1975, apud BIGARELLA et al. 1975, p. 425), sendo “...
uma representação diluída e empobrecida da flora da região sulina dos Andes”.
Outro exemplo apontado por Klein é a presença de espécies arbóreas das florestas
interiores da bacia Paraná-Uruguai também encontradas na floresta Atlântica do
vale do Itajaí-Açú. São relictos de uma expansão da mata tropical do interior durante
uma época mais seca que a atual. Quando o clima umedeceu, a floresta ombrófila
retomou o seu lugar e empurrou para a posição atual as formações interiores.

13 IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DOS REFÚGIOS ATUAIS


Tem sido bastante discutido nas últimas décadas o risco de extinção de
diversas espécies devido às ações impensadas – ou não – do homem, muito antes
de tomarmos conhecimento da sua importância para os mais diversos fins, tanto
no aspecto ecológico e geográfico quanto como fator econômico, como plantas
comestíveis e medicinais.

Neste sentido, Troppmair (2002, p. 142) adverte que, devido às atividades


humanas, os sistemas naturais são inteiramente modificados. Os limites dos refúgios
atuais são extremamente móveis, tanto quanto frágeis: “[...] enquanto alguns se
expandem, outros se retraem ou mesmo desaparecem.” Por esta razão, continua
ele, os atuais enclaves de cerrados, brejos e matas, “[...] desempenharão talvez por
pouco tempo o papel de ‘refúgios’, [...] pelo espaço reduzido que ocupam [...]”.
Desta forma, esses enclaves não conseguiriam preservar as espécies em seu interior
e então, “[...] não podem ser cientificamente classificados como ‘refúgios’.”

Os animais e as plantas exigem um espaço mínimo para se estabelecer


e esse espaço tem que lhes oferecer recursos compatíveis com o número de
indivíduos que as populações possuem num dado momento. Se o espaço da
vegetação diminuir, a consequência será clara – a fauna também mostrará uma
retração. Por outro lado, animais que vivem em grupos precisam de um número
mínimo de indivíduos nos grupos, aquém do qual, a tendência é a extinção da
população – é o que se chama de efeito de grupo (DAJOZ, 1973, p. 183). Conclui-
se, facilmente, que a extinção da cobertura vegetal poderá levar também a uma
drástica redução da fauna.

157
UNIDADE 2 | A PALEOBIOGEOGRAFIA, EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

A imprensa mundial e brasileira tem alertado quase diariamente sobre


a extinção. Recentemente, publicou-se que o desmatamento da Amazônia está
levando consigo um número imenso de animais. Entre 2003 e 2004, desmataram
26.000 km2 da Amazônia, o que representou 1,3 bilhão de árvores cortadas,
equivalentes a 0,7% da floresta. Isso representou a perda de 32,6 milhões de aves
(0,5% do total da região), 1,1 milhão de macacos (0,5% do total) e 3,1 milhões de
outros animais (0,9% do total).

O desmatamento do cerrado em Minas Gerais, transformado em carvão


para as siderúrgicas, modificou toda a paisagem quando o substituiu pela
monocultura do eucalipto. Percorrem-se dezenas de quilômetros no norte de
Minas Gerais sem ver o cerrado, onde há poucos anos ele existia. Agora, o que se
vê é um imenso reflorestamento.

Wilson (Wilson, 1997) cita o caso de uma reserva biológica no Equador, de


apenas 0,8 km2, que contém 1.033 espécies de plantas, das quais cerca de 25% só
existiam nas costas daquele país.

Felizmente ainda é possível encontrar-se raças de frutíferas e outras


espécies alimentícias indígenas da Amazônia com distribuições provavelmente
similares às da época pré-colombiana ou em suas situações onde é possível
decifrar a direção das migrações dos povos ainda dependentes delas. No entanto,
a acelerada devastação da floresta amazônica – e sobretudo de seus povos nativos
– está pondo em risco o futuro dessa riqueza.

Comentando sobre a intensidade dos desmatamentos antrópicos da floresta


amazônica, Haffer (1992, p. 33) alerta para a “[...] fragmentação desastrosa da
paisagem inteira [...] sem dar nenhuma chance para o solo e a paisagem ajustarem-
se”. O autor salienta algumas prioridades que devem ser levadas em conta na
preservação de áreas da floresta, como aquelas com máxima riqueza de espécies,
áreas com grupos endêmicos e áreas que apresentem espécies e subespécies.

Neste sentido, Vanzolini (1980, p. 10) salienta como prioritárias as áreas


onde ocorreu diferenciação genética de plantas e animais em manchas isoladas
de florestas. Ressalta que “[...] nas áreas de refúgio poderíamos encontrar
faunas coadaptadas, evoluídas durante o isolamento, enquanto que nas suturas
de coalescência deveríamos encontrar intensos processos de coadaptação em
progresso. Assim, uma reserva cobrindo porções adjacentes adequadas de dois
refúgios coalescidos seria a ótima escolha”.

Nesta mesma direção, Bigarella et al. (1975, p. 460) adverte sobre a ocupação
de grandes áreas na Amazônia, sendo que a sua fragilidade, conhecida nos meios
científicos, é “[...] praticamente ignorada por parte dos responsáveis pelos programas
pseudodesenvolvimentistas não assessorados e não controlados cientificamente”.

158
TÓPICO 3 | A DISTRIBUIÇÃO DOS SERES VIVOS

Vanzolini (1980, p. 18) conclui:

“O planejamento de uma política conservacionista depende de uma


definição firme de objetivos nacionais e da aquisição de informação científica
básica. Ambas as coisas estão faltando no Brasil”.

159
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você estudou que:

• A evolução das espécies, as migrações, mudanças ambientais e climáticas,


extinções em larga escala, adaptação aos hábitats e a ocupação de nichos vazios
foram alguns dos processos que convergiram para a distribuição atual.

● Muitas espécies endêmicas estão a caminho da extinção, ressalta Klein, por


causa do seu valor econômico, farmacológico ou alimentar – o pinheiro-do-
Paraná (Araucaria angustifolia), a canela-preta (Ocotea catharinensis), a imbuia
(Ocotea porosa), o palmiteiro (Euterpe edulis), a erva-mate (Ilex paraguariensis),
além de muitas outras.

● É preciso tomar o cuidado de não confundir o centro de origem ou de dispersão


de uma espécie com a sua atual área de distribuição. Centros de origem ou de
dispersão são áreas que, antes, eram refúgios, e se tornam áreas irradiadoras
das espécies. Áreas de distribuição são aquelas em que as espécies se localizam
hoje. Elas resultam de processos – como a irradiação adaptativa – que se
superpõem e interagem no tempo e no espaço.

● Dispersão é o mecanismo em que uma população, ou parte dela, abandona seu


hábitat e procura outro para sobreviver. No decorrer do tempo, ocupa nichos
vagos e, eventualmente, poderá entrar em competição com outras espécies.

● A migração é um dos mecanismos da dispersão. Ela pode ser temporária, como


as migrações sazonais, ou definitiva.

● Transporte pela água chama-se hidrocoria. Animais planctônicos – que se


locomovem ao sabor das correntes – são transportados pela água. Os bentônicos
– peixes, crustáceos etc. - podem se locomover por meios próprios e, quando
são apanhados pelas correntes marinhas, dispersam-se com grande facilidade,
podendo se espalhar por todo o planeta

● As correntes marinhas são agentes colonizadores de ilhas, porque levam frutos


e plantas em geral a grandes distâncias. Frutos, como o coco, que tem proteção,
podem flutuar e, ao chegar a uma praia, podem brotar novamente. A água de
coco é uma reserva de nutrientes.

● A dispersão feita pelo homem sempre foi importante. Em todos os lugares para
onde foi ele levou consigo não só espécies domesticadas – cão, aves, gato, gado
etc. – e plantas diversas, mas também espécies selvagens, como o pardal, ou
comensais (que convivem com ele), como o rato e a barata.

160
● A propagação da abelha africana Apis mellifera adansonii no Brasil deveu-se a
um acidente. Em 1956, 70 rainhas africanas foram levadas para a cidade de
Rio Claro (SP), com a finalidade de melhorar a produção de mel, que é alta na
espécie. No ano seguinte, um funcionário deixou cair ao chão uma colmeia e
as abelhas se dispersaram. Em poucos anos, cruzaram fronteiras e invadiram
todos os países das Américas do Sul e Central. No início dos anos 80, haviam
invadido os EUA, onde se encontram até hoje.

● Um exemplo bem atual da dispersão de espécies estrangeiras naturalizadas e


seus impactos negativos sobre os ambientes nativos dá-se com o gênero Pinus,
no sul do Brasil.

● As interações biológicas são influências mútuas entre os seres vivos,


que interferem substancialmente (positivamente ou negativamente) em
sua sobrevivência. São também chamadas de associações ou de relações
biocenóticas. Contribuem substancialmente no equilíbrio do ecossistema,
permitindo o controle populacional, tornando possível a sobrevivência de
diversos seres vivos, muitas vezes em detrimento de outros.

● As interações ocorrem dentro da população e entre indivíduos de espécies


diferentes.

● A Teoria dos Refúgios foi desenvolvida por Edward Forbe, em 1846. É este
um dos temas principais na Biogeografia atual. No entanto, apenas a partir da
década de 1930 é que ela passou a ser considerada com mais profundidade,
quando se realizaram estudos na África, na Austrália, na Malásia, na Nova
Guiné e na América do Sul.

● Na Geografia, Ab'Sáber deu impulso à teoria com trabalhos sobre a evolução


geomorfológica e paleoclimática da América do Sul e do Brasil.

● As mudanças paleoclimáticas cíclicas originaram continuidades e


descontinuidades de hábitats, e promoveram a especiação. A diversificação de
hábitats, permitida em ambientes tropicais, estimulou a biodiversidade.

● Refúgios atuais podem ser observados em vários lugares do mundo. Na


Amazônia e no Pantanal, por exemplo, existem comunidades ilhadas de
cerrados e de caatinga. A floresta de araucária, de caráter temperado, deixou
enclaves na mata Atlântica, tropical e subtropical. No Nordeste, o clima
semiárido isolou pequenas áreas úmidas, recobertas por florestas, cercadas por
caatingas, denominadas brejos.

● Os animais e as plantas exigem um espaço mínimo para se estabelecer e esse


espaço tem que lhes oferecer recursos compatíveis com o número de indivíduos
que as populações possuem num dado momento. Se o espaço da vegetação
diminuir, a consequência será clara – a fauna também mostrará uma retração.

161
AUTOATIVIDADE

1 A distribuição atual de animais e plantas é fruto de processos físicos e


biológicos passados e atuais. Que fatores intervêm na especiação e na
repartição atual das espécies?

2 Caracterize e explique espécies endêmicas, cosmopolitas e os diversos tipos


de espécies estrangeiras no enfoque biogeográfico.

3 Competição, amensalismo, comensalismo, epifitismo, saprofitismo e


efeito de massa são relações biocenóticas importantes em populações e
comunidades. Caracterize e exemplifique cada uma delas.

4 Em síntese, no que se constitui a Teoria dos Refúgios e qual a importância


biogeográfica da preservação de áreas consideradas refúgios da vida silvestre?

5 Sobre a Teoria dos Refúgios é correto afirmar:

I - A Teoria dos Refúgios foi desenvolvida por Ab’Saber em 1846 e é


considerada um dos principais temas na Biogeografia atual.

II - Na Geografia, Ab'Sáber deu impulso à Teoria dos Refúgios com


trabalhos sobre a evolução geomorfológica e paleoclimática da América
do Sul e do Brasil.

III - Como toda teoria, a Teoria dos Refúgios também recebeu críticas, pela não
aceitação de indicadores de interpretações de dados e modelos por parte
de alguns autores.

IV - O estudo dos refúgios envolve uma grande quantidade de temas ligados à


biogeografia, à ecologia, à geomorfologia e à paleoclimatologia.

V - A teoria dos refúgios florestais no Brasil foi esboçada por Ab'Sáber a partir de
observações iniciadas em 1957, junto com o geomorfólogo francês Jean Tricart.

VI - A ideia do refúgio surgiu da observação de paisagens que diferem da


paisagem geral, da qual fazem parte, como os enclaves de cerrado na
Amazônia, de araucária na floresta Atlântica etc.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, II, III e VI.


b) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas I, IV, V e VI.
c) ( ) Estão corretas apenas as afirmativas II, III, IV, V e VI.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

162
UNIDADE 3

TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS,
BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
Ao final desta unidade você será capaz de:

• compreender o que são territórios ou reinos biogeográficos;

• conhecer e aprender a localizar os diferentes tipos de biomas existentes


no planeta;

• entender o que são paisagens fitogeográficas do reino neotropical e os do-


mínios morfoclimáticos brasileiros;

• compreender a dinâmica da vegetação e como ocorre a sucessão e o clímax


no reino dos vegetais;

• estudar os impactos da sociedade humana sobre os biomas da Terra.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está organizada em quatro tópicos e em cada um deles você encon-
trará atividades para uma maior compreensão das informações apresentadas.

TÓPICO 1 – OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

TÓPICO 2 – AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTRO-


PICAL

TÓPICO 3 – DINÂMICA DA VEGETAÇÃO – SUCESSÃO E CLÍMAX

TÓPICO 4 – A SOCIEDADE HUMANA

163
164
UNIDADE 3
TÓPICO 1

OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

1 INTRODUÇÃO
Os seres vivos se movimentam e se distribuem na biosfera. Os padrões de
distribuição não são aleatórios, mas dependem de vários fatores abióticos e bióticos,
que interagem atualmente ou que interagiram no passado, para constituir conjuntos
de hábitats. Por causa dessas interações, esses conjuntos podem apresentar certas
correspondências nos limites territoriais de distribuição dos seres vivos. Em outras
palavras, podemos dizer que pode existir coincidência no limite de distribuição dos
hábitats, o que é indicado pelo nível de endemicidade dos seres vivos, que se dá em
diversas categorias ou nívies taxonômicos: ordem, família, gênero e espécie.

Isso permite a identificação de territórios de distribuição exclusiva de


determinados grupos da flora e da fauna, denominados territórios biogeográficos
ou biorreinos. Eles se distribuem hierarquicamente, conforme o nível de
endemicidade que está relacionado ao nível taxonômico.

2 TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS
Os territórios biogeográficos possuem extensões continentais e se distinguem
pelo número elevado de endemismos, geralmente em nível de ordens e de famílias.
Os reinos subdividem-se em Regiões Biogeográficas, com endemismos ao nível
de subfamílias e de gêneros. Por sua vez, as regiões biogeográficas subdividem-
se em Domínios ou Províncias Biogeográficas, compreendendo áreas com elevado
número de endemismo ao nível de gêneros e espécies. Os domínios subdividem-
se em Setores ou Distritos Biogeográficos, que correspondem a territórios restritos
com elevado número de endemismos ao de espécies ou de gêneros, se estes últimos
possuírem poucas espécies (LACOSTE; SALANON, 1973; VALDÉS, 1985).

Os limites dos reinos biogeográficos, muitas vezes, se confundem e se


interpenetram, principalmente quando as barreiras biogeográficas não
são bem definidas. Essas divisões variam muito, principalmente quando
o nível taxonômico é mais restrito. Por isso, existem as faixas de transição,
que ligam reinos contíguos e indicam uma passagem gradual de um
reino para o outro. Nessas faixas encontram-se espécies de um reino e
de outro em convívio e ocupando hábitats diferentes. Por exemplo, na
estreita faixa de terras da América Central coexistem espécies tropicais
na planície costeira e nas baixas encostas cobertas pela mata tropical
úmida e quente, mas nas serras, de clima frio e seco, aparecem espécies
próprias de regiões frias. (TROPPMAIR, 1989, p. 176).

165
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Inúmeros pesquisadores estabeleceram divisões fito e zoogeográficas para


a biota. Destacam-se, dentre tantos, De Candolle (1855), Sclater (1857), Wallace
(1876), que criaram as bases das classificações modernas. Entre os autores atuais,
destacam-se Schmithuesen (1961), que criou seis reinos, Lemée (1967) com sete
reinos, Müller (1973) com cinco e Udvardy (1975) com oito reinos biogeográficos.
Hoje, uma das classificações mais usadas é a de Müller (1979, 1980), subdividida
em várias sub-regiões.

Na sua classificação, Müller (1979, p. 54) estabeleceu os reinos


biogeográficos (Figura 02), resumidos no Quadro 5.

QUADRO 5 – REINOS BIOGEOGRÁFICOS DE MÜLLER (1979)

Reino Região Localização


Holártico Neártica América do Norte, Ártico e Groenlândia
Eurásia (incluídas Islândia, Canárias, Coreia e
Paleártica
Japão) e norte da África
Paleotropical Etiópica África, ao sul do Saara.
Malgache Madagascar e ilhas oceânicas
Oriental Índia Indochina, até a linha de Wallace
Australiana
Austrália, Nova Guiné e ilhas vizinhas,
Oceânica
Australiano Oceania, parte da Nova Zelândia, Havaí e
Neozelandesa
demais ilhas do Pacífico.
Havaiana
Neotropical - Américas do Sul e Central e Antilhas
Antártida, sudoeste da América do Sul e
Arquinótico -
sudoeste da Nova Zelândia.

FONTE: Müller (1979)

A divisão entre os reinos Neotropical e Paleotropical e o reino Holártico


tem suscitado discussões. Alguns pesquisadores consideram a América Central
não uma zona de transição entre os reinos Holártico e Neotropical, mas uma
região do reino Neotropical, porque nela predomina a fauna sul-americana e o
clima é tropical. Também é difícil traçar os limites entre os reinos Paleotropical
e Holártico. Os animais migram com facilidade entre as duas regiões, sobretudo
na zona de transição representada pela Península Arábica e pelo norte da África.

A linha de Wallace é uma zona de transição que separa a região Oriental


(reino Paleotropical) da região Australiana (reino Australiano) e nela encontra-
se uma fauna mista de origem australiana e oriental. Possui também espécies
endêmicas, como o macaco de Célebes (Cynopthecus niger).

166
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Na América Central, a variabilidade da capacidade de dispersão dos


grupos de animais foi o ponto principal que levou a essa diversidade de opiniões.
Para os mamíferos e aves, grupos com alta capacidade de dispersão, as condições
climáticas e de relevo da América Central não influíram muito, mas, para os
anfíbios, répteis e outros, as dificuldades de dispersão foram maiores. O número
de espécies sul-americanas é muito maior que as norte-americanas. Ao se traçarem
os limites setentrionais das espécies sul-americanas e os limites meridionais dos
grupos norte-americanos, podem-se observar dois fatos (MÜLLER, 1979):

1 – as famílias sul-americanas aparecem em maior número;


2 – existe uma barreira natural que marca o limite setentrional das espécies sul-
americanas, representada, ao norte da América Central, pela floresta tropical
das terras baixas e pelas altitudes de 1.500 metros da Sierra Madre, no México.
Acima dessa cota altimétrica, espécies norte-americanas predominam e
migram para a América do Sul pelos Andes.

O deserto do Saara é outra região de transição cujos limites são incertos


(Figura. 02). Nela transitam espécies de animais e de plantas dos reinos Holártico
(região Paleártica) e Paleotropical (principalmente da região Etiópica). A região
central do Saara é mais seca, porém, possui montanhas de clima mais ameno,
que atuam como se fossem ilhas ou corredores biogeográficos, por onde migram
espécies holárticas em direção ao sul. É também usada pelas espécies etiópicas,
que a cruzam no seu movimento para o norte.

No período Quaternário, quatro flutuações climáticas marcaram as


zonas centrais do Saara: um período úmido, entre 22.000 e 8.500 a.p.,
seguido por uma fase de aridez que se estendeu de 8.500 a 5.000 a.p.
Nova fase de umidade predominou de 5.000 a 2.500 a.p. e, finalmente,
o período seco atual, desde 2.500 a.p. O atual lago Tchad é um resíduo
dos diversos lagos quaternários que se sucederam nas flutuações
climáticas. (MÜLLER, 1979, p. 61).

Essa sucessão de condições climáticas criou refúgios, que isolaram


as populações de animais e estabeleceram uma fauna particular, típica de
desertos. No entanto, essa fauna aparece em zonas áridas da Índia, o que mostra
a existência de corredores antigos entre as duas regiões, ativos possivelmente
durante a existência do continente de Gondwana. Esse fato justifica a união das
regiões Oriental e Etiópica no reino Paleotropical. Aparecem, nas duas regiões,
inúmeras espécies de animais, como o elefante, o camelo, o rinoceronte, aves
diversas, anfíbios.

Por outro lado, é pequeno o número de famílias de aves endêmicas em


cada região. Das 67 famílias de aves existentes nas duas regiões, apenas quatro
são endêmicas da região Etiópica e uma da Oriental. Dos 267 gêneros de aves que
habitam as regiões, 69 espécies são etiópicas e se estendem até a Índia, ao passo que,
destas, 63 aparecem na Europa (MÜLLER, 1979).

167
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Outra região de transição entre os reinos Holártico e Paleotropical aparece


na China, bastante modificada pela ocupação humana, especialmente depois
da chegada dos europeus. As matas subtropicais originais foram totalmente
erradicadas e a fauna florestal substituída por espécies adaptadas ao campo aberto.

A última zona de transição acha-se nas regiões meridionais da América


do Sul e da Nova Zelândia e as separa do reino Arquinótico. Muitas famílias de
plantas e de invertebrados atuais mostram estreita relação nessas regiões, cujas
origens estão no período Terciário.

Na atualidade, grupos imigrantes antigos e modernos nos diversos


reinos se superpõem uns aos outros. Origina-se aí uma confusa complexidade,
que tende a se acentuar simultaneamente ao avanço da intervenção humana nos
geossistemas. Contudo, cada reino ainda conserva as suas peculiaridades.

FIGURA 2 – OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS

1 - Holártico 3 - Australiano
1a - Região Paleártica 3a - Região Australiana
2b - Região Neártica 3b - Região Oceânica Os reinos biogeográficos,
3c - Região Neozelandesa segundo MÜLLER (1979).
2 - Paleotropical 3d - Região Havaiana Sem escala
2a - Região Etiópica
2b - Região Malgache 4 - Netropical
2c - Região Oriental 5 - Arquinótico

Faixas de transição

FONTE: Müller (1979)

168
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Como foi dito antes, o problema dos limites suscita muitas discussões, eles
são bem definidos apenas quando existem acidentes geográficos como montanhas,
desertos e oceanos, que também atuam como barreiras (TROPPMAIR, 2002, p. 131).

Resumimos no Quadro 6 alguns exemplos de grupos da flora e da fauna


de cada reino biogeográfico, para ilustrar importantes endemismos que serviram
de indicação da delimitação desses territórios.

QUADRO 6 – FAUNA E FLORA MAIS COMUNS DOS REINOS BIOGEOGRÁFICOS

Reino Fauna Flora


Mamíferos: Ursidae (ursos), Canidae (cães, lobos,
coiotes), Cervidae (cervos e alces), Bovidae (búfalo,
bisão), Castoridae (castores), Erinaceídae* (ouriço),
Betulaceae (arbustos
Didelphidae** (gambás), Procionedae** (quatis).
e árvores como
Aves: Regularidae (saracura), Tetraonidae (urogalo),
as avelanzeiras);
Alcidae (papagaio-do-mar), Ciconidae* (cegonha),
Holártico Salicaceae (choupo,
Cuculidae* (cucos), Turdidae* (rouxinóis), Vulturidae**
álamo), Ranunculaceae
(abutres).
(ranúnculos), Moráceas
Peixes: Acipenseridae (esturjão), Percidae (perca),
(amoreiras)
Salmonídae (salmão e truta).
*
Exclusiva da Região Paleártica
*
Exclusiva da Região Neártica
Mamíferos: Giraffidae (girafa), Hippopotamidae
(hipopótamos), Hyaenidae (hiena), Pongidae (gorila, Gêneros Pelargonium
chimpancé), Felidae (leão), Elephantidae (elefante), (gerânios), Khaia (ébano),
Paleotropical
Equidae (zebras). Cola (árvore produtora de
Aves: Struthioniformes (avestruz), Galliformes alcaloide).
(galinhola).
Ordem Monotremata (équidna, ornitorrinco),
Macropodidae (canguru), Phascolarctos cinereus
Australiano Gênero Eucalyptus.
(coala), Casuarius casuarius (casuar), Dromaius
novaehollandiae (emu).
Mamíferos: Cebidae (macacos), Callithricidae
Cactaceae (cactos),
(saguis), Myrmecophagidae (tamanduás), gênero
Bromeliaceae (bromélias),
Neotropical Lama (lhama, vicuña, guanaco).
gênero Hevea
Aves: Trochilidae (beija-flores), Tinamiformes
(seringueira).
(perdizes), gênero Rhamphastos (tucanos).
Deschampsia
Aptenodytes forsteri (pinguim-imperador), Pycoscelis
Arquinótico antarctica
adeliae (pinguim-de-adélia)
Colobanthus crassifolius

FONTE: Lacoste; Salanon (1973); Pereira; Almeida (1996)

169
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

2.1 REINO HOLÁRTICO


O reino Holártico é restrito ao Hemisfério Norte. Compreende a Europa,
incluindo a Islândia, a Sibéria, os países asiáticos, incluindo a Coreia e o Japão, o
norte da África e a América do Norte, exceto o México. O reino Holártico tem uma
fauna e uma vegetação bem diversificadas. À época da Pangea, o reino foi parte
dos continentes de Gondwana e Laurásia. No início do Paleoceno, a América do
Norte e a Eurásia constituíram um bloco ligado à África por um estreito istmo,
que separava o Atlântico Norte, recém-aberto, do Mar de Thetis, entre a Eurásia
e a África. No Mioceno, a América do Norte separou-se da Eurásia, iniciando um
movimento para o sul. Posteriormente, por meio de um conjunto de ilhas, que
veio a constituir o istmo da América Central, ligou-se à América do Sul. A ligação
da América do Norte com a Eurásia explica a semelhança verificada atualmente
entre a fauna e a flora de ambos continentes.

No reino Holártico aparecem os biomas da tundra, taiga, floresta temperada


decídua, estepes e pradarias, desertos e vegetação mediterrânea, que abrigam uma
fauna muito variada. “A riqueza de biomas no reino se deve a uma complexa rede de
interações, cujo centro está nas condições climáticas, que levou ao desenvolvimento
de paisagens variadas e antigas”. Strahler (1984, p. 244) e Strahler; Strahler (1996, p.
184) classificaram o clima do reino Holártico no grupo climas de médias latitudes
e no de altas altitudes, que variam desde o clima de tundras, no norte do Canadá
e Alaska e no norte da Sibéria, até um clima subtropical úmido, no sul dos EUA,
passando por clima mediterrâneo, desértico e de montanhas.

O reino Holártico subdivide-se em duas regiões: a região Paleártica, que


engloba a Eurásia e o norte da África, excluindo-se a zona de transição com o
reino Paleotropical, e a região Neártica, representada pela América do Norte
e a Groenlândia. O bloco continental Europa-Ásia-África é contínuo e permite
um trânsito relativamente constante de animais e plantas em todos os sentidos,
respeitando-se as barreiras montanhosas, que se interpõem às rotas (Montes
Urais, Stanovoi e Verkhianski, Cárpatos, Cáucaso, Bálcãs, Alpes etc.) e, acima de
tudo, a presença do homem.

2.2 REINO PALEOTROPICAL


O reino Paleotropical aparece na África e no Oceano Índico, onde se limita
com o reino Australiano. Três regiões biogeográficas o compõem: região Etiópica,
região Malgache e região Oriental. Nele aparecem biomas de deserto, estepe,
savana e a floresta tropical úmida.

No reino Paleotropical predominam climas tropicais e subtropicais, que dão


características um pouco diferentes aos desertos e estepes, embora as semelhanças
com seus homônimos do reino Holártico sejam maiores que as diferenças.

170
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Os climas encontrados no reino Paleotropical são todos tropicais, exceto


os de altas montanhas. De acordo com a classificação de Straher (1984, p. 247) e de
Strahler; Strahler (1996, p. 185), os climas que aparecem neste reino são o tropical
árido, o subtropical árido, o mediterrâneo, o tropical com duas estações (seco-
úmido) e o equatorial.

2.3 REINO AUSTRALIANO


O que mais chama a atenção no reino Australiano é a sua fauna endêmica,
consequência do isolamento desde o Mesozoico Inferior. O reino inclui a
Austrália, Nova Caledônia, Tasmânia, o centro-norte da Nova Zelândia, Nova
Guiné, Polinésia e Havaí. O reino Australiano é um dos mais ricos em formações
fitogeográficas, abrangendo quase todas as formações do planeta – desertos,
estepes e pradarias, savanas, floresta temperada decídua, floresta tropical úmida
e o chaparral. Da mesma forma, apresenta uma variedade climática significativa.

De um modo geral, as faixas climáticas do reino Australiano são estreitas


na Austrália, mas as incontáveis ilhas da região resumem-se a apenas um tipo de
clima, com algumas poucas exceções.

Segundo Strahler; Strahler (1996, p. 185):

aparecem os seguintes tipos climáticos na região: nas ilhas que


circundam a Austrália, o clima equatorial úmido predomina na Nova
Guiné, Nova Caledônia, Fiji e Havaí; no centro da Nova Guiné, uma
alta cadeia de montanhas, com altitudes acima de 4.000 metros,
constantemente batida pelos alísios de nordeste, com clima tropical
seco; na Nova Zelândia e na Tasmânia predomina o clima marítimo
da costa ocidental. Na Austrália, o clima no litoral é úmido e o interior
apresenta climas sucessivamente mais sazonais até chegar ao deserto,
no centro do país.

No litoral oriental australiano, o domínio é do clima subtropical úmido,


verão quente e úmido, invernos suaves e chuvas bem distribuídas ao longo do ano,
trazidas pelos alísios de sudeste, com predomínio no verão. O excesso de umidade
facilitou o crescimento da floresta subtropical úmida, que se estende apenas por
duas pequenas regiões. No litoral sudeste, ventos frios de oeste originaram um
clima com verões quentes e invernos frios e chuvosos. Em direção ao interior,
uma extensa e estreita faixa de clima tropical seco margeia o deserto, desde o
norte até o sul, com temperaturas elevadas durante todo o ano. No litoral norte
aparecem duas pequenas faixas, separadas pelo mar, do clima tropical sazonal,
com chuvas no verão (dezembro/março) e seca no inverno (junho/agosto). No
litoral sudoeste ocorre uma estreita porção de clima mediterrâneo com inverno
úmido e verão seco. Finalmente, no interior, predomina o clima desértico, com
massas continentais secas e quentes. (STRAHLER; STRAHLER, 1996).

171
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A chamada linha de Wallace separa o reino Australiano do reino Paleotropical.


A linha de Wallace passa entre a Nova Guiné e a Indonésia e separa as faunas asiática
e australiana. Entre os anos de 1854 e 1862, o naturalista inglês Alfred Russel Wallace
(1823-1913), ao explorar a região, sugeriu que o estreito de Makassar, que separa a ilhas
de Borneo e Sulawesi (ou Célebes), na Indonésia, divide nitidamente as faunas dos
dois reinos em duas porções – a oeste, a fauna asiática, e a leste a fauna australiana. Em
homenagem a Wallace, a linha foi batizada com o seu nome. O estreito de Makassar é
profundo – ele fica sobre a placa Indo-Australiana – e é improvável, que, no passado,
houvesse existido uma ponte de terra entre os reinos, mesmo nas maiores regressões
do mar. Muitas espécies de pássaros não cruzam o estreito, que não é largo - embora
muitas transitem normalmente pelas ilhas. Os trabalhos de Wallace o levaram a ser
considerado um dos precursores da Biogeografia.

Para entender as atuais flora e fauna australianas devemos recorrer à


paleobiogeografia. No Cretáceo médio, a Austrália e as ilhas faziam parte de
Gondwana. Com a separação dos continentes, a Austrália moveu-se para o norte
até meados do Eoceno (há 54 MA), quando se isolou por completo do restante
dos continentes. Em latitudes mais baixas, o clima mudou de temperado frio
para uma variedade de climas à medida que o continente se assentava na sua
posição atual – climas mediterrâneo, desértico, temperado, tropical e subtropical.
(FURLEY; NEWEY, 1986).

No Pleistoceno, a Austrália teve uma fase úmida seguida de um período


seco, este, entre os anos 18.000 e 16.000. A alternância entre o dois períodos levou
a uma redução do nível do mar e originou uma ligação entre a Austrália e a Nova
Guiné, que emergiu e submergiu várias vezes. Essa ponte só se interrompeu
em definitivo entre os anos 8.000 e 6.500. “A floresta tropical úmida da Nova
Guiné pôde, então, colonizar o litoral nordeste da Austrália, juntamente com a
fauna típica” (MÜLLER, 1979, p. 72). Savanas e estepes (campos) predominam
na paisagem australiana. As florestas equatoriais formam duas estreitas faixas
no litoral nordeste. “As maiores florestas encontram-se no litoral norte – são as
florestas de monções, sempre verdes, com palmeiras, atingida por ventos alísios,
que se mistura a savanas arbóreas e estepes” (STRAHLER; STRAHLER, 1996, p.
548). “No interior, quando as precipitações escasseiam, a savana e os bosques de
árvores esparsas passam a ter o domínio”. (WALTER, 1986, p. 176).

No litoral ocidental, com clima mediterrâneo, destacam-se grandes florestas


de Eucalyptus spp. As chuvas caem no inverno e o verão é seco. As chuvas são
trazidas pelas frentes polares, que predominam no inverno – 650 a 1.250 mm/ano.
No verão, o domínio pertence às massas tropicais continentais, quentes e secas.

Os solos em que estão as florestas de eucaliptos são arenosos e bem


drenados, o que os torna secos e limitantes para uma floresta mais densa. As
florestas de eucaliptos são abertas, o que permite um sub-bosque esparso. Apesar
disso, há cerca de 6.000 espécies de plantas vasculares, das quais aproximadamente
3.500 são endêmicas na região (WALTER, 1986). No sul, a espécie dominante
Eucalyptus diversicolor pode alcançar 85 metros de altura, enquanto no sub-bosque,
samambaias têm mais de 1,5 metro de altura.

172
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

O gênero Eucalyptus, da família Myrtaceae, forma um arco em todo


o litoral e penetra para o interior, onde escasseia nas proximidades da zona
árida central. São xerófitos e perenefólios, com folhas coriáceas e duras, mas as
raízes podem extrair muita água do solo, mesmo nos locais em que a maioria
das mesófitas tem dificuldade em obtê-la (FURLEY & NEWEY, 1986). Pouco
exigente, o eucalipto pode se desenvolver em solos com deficiência de nutrientes
e água. Sua ocorrência depende das chuvas no litoral, da topografia, dos solos,
da rede de drenagem, de incêndios e do uso da terra. Nas regiões com chuvas
de inverno do sul, as florestas de eucaliptos são densas e bem desenvolvidas. No
interior, aonde as chuvas vão, pouco a pouco, escasseando, a floresta é aberta,
com o solo recoberto por gramíneas. Nas regiões ao norte e ao leste, com 250 mm/
ano de chuva, o eucalipto não se desenvolveu, formando apenas moitas de uma
variedade raquítica chamada localmente mallee, expressão aborígene (FURLEY;
NEWEY, 1986; WALTER, 1986). Nas regiões em que a estiagem chega a sete
meses, as savanas substituem as florestas de eucaliptos.

“Os incêndios naturais são comuns nas florestas mistas com eucaliptos e
nas savanas. Muitas espécies só florescem após um incêndio WALTER” (1986, p.
179) relaciona vários gêneros pirófilos nas savanas.

Segundo Furley e Newey (1986, p. 262):

As savanas se distribuem, na Austrália, de acordo com as chuvas.


Quanto maior o índice pluviométrico, maiores são as espécies de gramíneas
que as recobrem. Nas regiões litorâneas, onde o índice é superior a 1.500 mm/
ano, medra uma savana com gramíneas altas. No interior, em solos férteis, em
que grandes propriedades usam métodos modernos para a agricultura e para o
pastoreio de ovelhas, com índices menores, aparece uma savana de gramíneas
baixas. Finalmente, nas zonas semiáridas do interior, a savana xerófita ocupou
solos pobres e com pouca água.

NOTA

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para conhecer mais sobre espécies de plantas vasculares, acesse o site: <http://en.wikipedia.
org/wiki/Australasia_ecozone>. Acesso em: 13 jul. 2010.

A floresta tropical úmida sempre verde aparece em todas as ilhas que


rodeiam a Austrália, embora, nela própria, não seja comum. Nas ilhas Célebes, o
arquipélago das Molucas tem o maior endemismo de aves em todo o mundo. O
gênero Agathis da família Araucariaceae é encontrado nesse arquipélago.

173
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Na Nova Guiné, a maior ilha do reino Australiano, na floresta tropical


é encontrada a maior borboleta do mundo, a chamada borboleta da rainha
Alexandra (Ornithoptera alexandrae), e a ave do paraíso (Paradiseae rudolphi), que
é endêmica. A floresta baixa guineana comporta 1.200 espécies de árvores. Nas
ilhas Salomão convivem 148 espécies de pássaros, das quais 60 são endêmicas. Na
Nova Caledônia existem 2.900 espécies de plantas vasculares (80% endêmicas),
duas espécies de Araucaria, 15% de gêneros endêmicos e 5% de famílias endêmicas.
(FURLEY; NEWEY, 1986).

A ilha da Tasmânia tem clima marítimo das costas ocidentais, com


verões quentes e invernos frios e chuvosos. Nas montanhas, acima de 1.500
metros, com menos chuvas, predomina a savana com árvores esclerfófilas e
gramíneas curtas. No litoral úmido, batido pelas frentes polares, predominam
árvores do gênero Nothofagus, típico de clima temperado do hemisfério Norte,
e a samambaia arborescente Dicksonia, com três metros de altura. No interior, a
floresta temperada, com mais de 800 espécies, depende dos incêndios naturais.
“O eucalipto predomina e pode ultrapassar os 100 metros de altura” (WALTER,
1986, p. 187). É o hábitat do marsupial diabo-da-Tasmânia (Sarchophilus harrisii),
do équidna (Tachyglosus aculeatus), do ornitorrinco (Ornithrhyncus anatinus), do
lobo-da-Tasmânia (Thylacinus cynocephalus) etc.

Na Nova Zelândia, nas florestas subtropicais, aparecem as coníferas


gimnospermas Podocarpaceae, Cupressaceae e Araucariaceae. Dentre as angiospermas,
faias do gênero Nothofagus são as espécies dominantes. Lianas e epífitas recobrem
os galhos e os troncos das árvores. Em toda a floresta subtropical, a espécie
dominante é a Araucariaceae Agathis australis.

No quadro a seguir vê-se uma lista dos desertos australianos:

QUADRO 7 – DESERTOS AUSTRALIANOS

Estado/Território Nome Extensão (km2) Austrália ( % )


WA, SA Great Victoria 348 750 4.5
WA Great Sandy 267 250 3.5
WA, NT Tanami 184 500 2.4
NT, QLD, SA Simpson 176 500 2.3
WA Gibson 156 000 2.0
WA Little Sandy 111 500 1.5
SA, QLD, NSW Strzelecki 80 250 1.0
SA, QLD, NSW Sturt Stony 29 750 0.3
SA Tirari 15 250 0.2
SA Pedirka 1 250 less than 0.1
- Total 1 371 000 18

Fonte: Auslig Deserts database (1994). Disponível em: <http://www.ga.gov.au/education/facts/


landforms/geogarea.htm>. Acesso em: 24 jul. 2010.

174
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Diversos animais domésticos como cavalos, gado, cabras, porcos,


jumentos, camelos, búfalos, cães, gatos, coelhos e também raposas foram
introduzidos no reino Australiano pelos europeus. O dingo (Canis lupus familiaris
dingo), provavelmente criado na Índia e tendo chegado à Austrália entre 4.000
e 3.500 anos, talvez levado pelos antigos maoris, espalhou-se pelo continente e
pela Nova Zelândia. Raposas, cabras, gatos e coelhos batem todos os recordes
populacionais na Austrália. Os gatos têm uma densidade de um indivíduo por
quilômetro quadrado, mas os coelhos (Lepus europaeus) ultrapassam o bom senso:
somam entre 200 milhões e 300 milhões de indivíduos, para uma população de
20.345.802 pessoas.

Na Nova Zelândia, os animais europeus promoveram uma devastação


sem paralelo. O cervo vermelho escocês ou cervo europeu (Cervus elephas),
aportado à ilha no século XIX, alimenta-se sobretudo de Nothofagus, uma das
espécies dominantes na floresta neozelandesa. “De crescimento lento, a vegetação
foi praticamente destruída pelo cervo, o que acelerou a erosão do solo em vastas
áreas” (WALTER, 1986, p. 189). “Desde a década de 80, os cervos são caçados
e levados para fazendas, onde são criados como animais de corte e couro”.
(FURLEY; NEWEY, 1986, p. 271).

O isolamento da Austrália e das ilhas fez com que a evolução de animais e


plantas trilhasse outros caminhos, bem pecualiares, porque não ocorreu a troca de
genes com outras populações. Semelhante processo também se deu na América
do Sul, embora com menos intensidade. Na Austrália, depois da separação de
Gondwana, o único contato se deu com a Nova Guiné, já mencionado antes.

UNI

Para conhecer mais sobre os animais, sugiro que você, acadêmico(a), acesse
os sites:
<http://www.animalliberation.org.au/feralint.html.>
<http://www.wwwins.net.au/dingofarm/02.htm l> e
<http://www.abs.gov.au>. Acesso em: 13 jul. 2010.

A Austrália é a terra por excelência dos marsupiais. Apenas duas famílias de


marsupiais aparecem em outros continentes – Didelphidae (gambás) e Caenolestidae
(semelhante ao mussaranho). As famílias de marsupiais endêmicas à Austrália
são Dasyuridae (gêneros Thylacinus, lobo-da-Tasmânia) Sarcophilus (diabo-da-
Tasmânia), Phalangeridae (Phascolarctus, coala), Phascolamidae (Vombatus, vombate),
Macropodidae (Megaleia e Macropus, cangurus, Petrogale, wallaby-das-rochas,
Lagorchestes, wallaby-lebre, Dendrolagus, canguru-das-árvores) (STORER et al.,
1991, p. 715) etc. Totalizam, na Austrália, 16 famílias e 152 espécies de marsupiais.

175
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

“No século XVII, a Austrália foi denominada Terra psittacorum, por causa
do grande número de periquitos” (MÜLLER, 1979, p. 72). Dentre as famílias
endêmicas de aves citam-se Dromiceidae (Dromaeus, emu, na Nova Guiné e ilhas),
Casuaridae (Casuarius, casuar), Dinornitidae (moas, na Nova Guiné), Apterygydeae
(Apteryx, quivis), Psittacidae (muitas famílias, pagagaios e periquitos), Cacatuidae
(cacatuas) etc. Existem 91 famílias com 826 espécies de aves na Austrália. “Na
Nova Caledônia existem 68 espécies de aves, das quais uma é endêmica. Partindo
da Austrália, 18 espécies invadiram a Nova Caledônia e evoluíram pela radiação
adaptativa”. (MÜLLER, 1979, p. 73).

Os répteis endêmicos pertencem às famílias Carettochelyidae (tartaruga-de-


água-doce, existente no norte da Austrália e sul da Nova Guiné) e Pygopodidae
(Pygopus, lagarto, na Austrália, Tasmânia e Nova Guiné, com 30 espécies). Calcula-
se que na Austrália existam 17 famílias de répteis, com 633 espécies estudadas.

“Na Nova Zelândia, muitas famílias têm afinidades com as famílias das
ilhas do Pacífico e com a América do Sul” (MÜLLER, 1979, p. 74). A Nova Zelândia
separou-se de Gondwana e ficou isolada por 80 milhões de anos, o que permitiu
que 90% dos insetos e moluscos marinhos, 80% das árvores, fetos e angiospermas,
25% das espécies de pássaros, todas as 60 espécies de répteis, quatro espécies de
sapos e duas espécies de morcegos sejam endêmicas.

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para auxiliar seus estudos, acesse os sites:< http://www.deh.gov.au/biodiversity/abrs/online-
resources/abif/fauna/afd/stats-est.html - Australian Faunal Directory. Estimated Numbers of
Australian Fauna>
< http://www.deh.gov.au/biodiversity/abrs/publications/fauna-of-australia/pubs/volume2a/
ar22ind.pdf> e
<http://www.deh.gov.au/biodiversity/abrs/online-resources/abif/fauna/afd/stats-est.html -
Australian Faunal Directory. Estimated Numbers of Australian Fauna>. Acesso em: 13 jul. 2010.

2.4 REINO ARQUINÓTICO


O termo Arquinótico significa oposto ao Ártico e engloba o extremo sul da
América do Sul, Antártica e o sudeste da Nova Zelândia. As condições adversas à
vida dificultam o estabelecimento de animais e plantas, de modo que as espécies
que lograram se adaptar às condições reinantes são altamente especializadas e de
pequeno número de espécies.

176
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para conhecer mais sobre o termo Arquinótico, acesse o site: <http://www.inach.cl/portal_
educa/antartica/antartica.html>. Acesso em: 13 jul. 2010.

São 13,5 milhões de quilômetros quadrados de gelo, apenas no Continente


Antártico. O gelo tem uma espessura média de cerca de 2.000 metros e o Monte
Vinson, na cadeia Ellsworth, é o ponto culminante, com 4.897 metros. Cerca de
90% do gelo da Terra estão na Antártica, que correspondem a 70% da água doce
do planeta.

Juntamente com a América do Sul, África, Austrália e Índia, a Antártica


fazia parte do continente de Gondwana. Portanto, a geologia da Antártica é muito
semelhante à daqueles continentes.

O Continente Antártico foi dividido em duas partes para efeito de estudos:


a Antártica Oriental e a Antártica Ocidental. A Antártica Oriental localiza-se ao
sul da Austrália e da África. A Antártica Ocidental situa-se ao sul da América
do Sul. A cordilheira Transantártica divide as duas regiões (CUNHA, 1973). “A
geologia da parte oriental é constituída pelo embasamento granítico, de idade pré-
cambriana. A porção ocidental tem a mesma sequência de rochas sedimentares
e ígneas da América do Sul. Os sedimentos estão associados ao sistema andino e
têm idade jurássica e terciária”. (MÜLLER, 1979, p. 79).

Fósseis antigos encontrados na Antártica comprovam a antiga ligação


ao continente de Gondwana. São fósseis de idades cambrianas, ordoviciana
e siluriana. Depósitos glaciais de tilito carbonífero recobertos por sedimentos
permianos e triássicos encerram fósseis de vertebrados terrestres, camadas de
carvão e presença da flora Glossopteris. Essa variedade de fósseis e as evidências
geológicas mostram que o clima antártico já foi mais quente do que o atual. As
camadas de carvão indicam um clima úmido e quente. A flora de Glossopteris
é de idade carbonífera e é contemporânea à do réptil carnívoro Lystrosaurus.
(CUNHA, 1973).

Da mesma forma que no Polo Norte, a Antártica não tem um ciclo diário
dividido em 24 horas. De setembro a março, o Sol paira sobre o horizonte, o
que corresponde ao verão austral – o dia no Polo Sul. De março a setembro ele
desaparece lentamente, à medida que o outono avança e o inverno o sucede.
Quando a primavera retorna, ele ascende no horizonte para clarear nos próximos
seis meses. O Sol nunca fica no zênite nos polos e nunca sobe muito além do
horizonte. Por essa razão, os polos recebem muito pouca radiação solar e este é
um dos fatores das baixas temperaturas.

177
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A massa de gelo se desloca lentamente do centro do continente em direção


à periferia. No Oceano Antártico, a plataforma continental tem uma extensão
média de 30 quilômetros e, devido ao peso do gelo, é mais profunda do que dos
demais continentes.
O continente gelado é a fonte da massa de ar antártica (mP), que
se forma no anticiclone fixo polar e se deloca sob a forma de fortes
ventos, que alcançam velocidades superiores a 100 km/h no litoral. O
anticiclone permanente tem inversão térmica muito baixa, fazendo
com que o deslocamento das massas quentes superiores para a
superfície seja lento. Por esta razão, o contato das massas de ar com a
superfície gelada é longo. Dessa forma, elas perdem totalmente o calor
adquirido na descida. (NIMER, 1979, p. 11).

O vento, chamado de catabático, diverge do anticiclone em direção ao


litoral com um desvio constante para a esquerda, devido ao efeito de Coriolis, e
atinge velocidades superiores a 100 km/h em razão do forte gradiente de pressão
existente entre o interior do continente e o mar.

Em alguns lugares do litoral, como no Mar de Weddel, onde há um centro


de baixa pressão, para os quais migram as massas antárticas, as tempestades
são violentas e podem durar semanas. No interior, as precipitações são de neve,
raramente de água líquida. No litoral, o total pluviométrico não ultrapassa os 250
mm/ano. Em todo o continente, o índice médio é inferior a 100 mm de precipitação.

A Antártica tem temperaturas bem menores que o Ártico. As razões são


as seguintes:

1) no Ártico há maior quantidade de água, que retém melhor o calor. Na Antártica,


com muito mais gelo, apenas uma pequena porcentagem do calor é mantida
pela água;
2) o oceano reflete cerca de 5% da radiação solar incidente (de ondas curtas) e
absorve o restante, liberando-o lentamente. A superfície exposta à radiação
reflete entre 15% e 35% da radiação de ondas curtas. O restante é liberado com
maior velocidade, o que resfria a superfície. A capa de gelo antártica reflete
cerca de 80% da radiação incidente – por isto, existe mais gelo na Antártica que
no Ártico;
3) no inverno, o Oceano Glacial Antártico se congela e praticamente dobra o
tamanho do continente, impedindo ou dificultando, pois, que a água do mar
funcione como um mecanismo moderador das temperaturas.

178
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

E
IMPORTANT

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para auxiliar nos estudos e conhecer mais sobre as baixas temperaturas na Antártica, acesse o
site: <http://www.iespana.es/natureduca/ant_indice.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010.

A temperatura média anual no interior do continente é de 54o C negativos.


Todos os meses têm média inferior a 0o C. Mas no verão no litoral, a temperatura
máxima do verão raramente chega a 15o C, registrada na Península Antártica
Norte, a região mais aquecida do continente. Em outras regiões litorâneas, a
temperatura raramente chega a 5º C. A mínima absoluta da Terra registrou-se
na estação russa de Vostok, que está a uma altitude de 3.505 metros e na latitude
de 78º28’: -89,2o C, em julho de 1983. O recorde anterior havia sido da mesma
estação, em agosto de 1960: -88,3o C. A média anual na estação Vostok é de -56º C,
a média no mês mais quente (janeiro) é de -33º C e a máxima absoluta, -21º C. No
inverno, no litoral, a média é inferior a -40o C.

No Polo Sul, a amplitude térmica varia antre -25º C e -62º C. Altitudes


elevadas, o anticiclone polar, que mantém a atmosfera quase sempre límpida, e a
baixa umidade atmosférica contribuem para as temperaturas tão baixas, a que se
junta a posição do sol sempre no horizonte.

A vida no reino Arquinótico enfrenta fatores limitantes severos,


representados, sobretudo, pelo clima. Os seres vivos se viram obrigados a um
complexo processo de adaptação, muito próximo do limite vital.

“O limite meridional das plantas superiores encontra-se a 68o de latitude sul,


e, na Antártica, aparecem apenas duas espécies: a gramínea Deschampsia antarctica
e a vascular com flores Colobanthus crassifolius” (MÜLLER, 1979, p. 78; WALTER,
1986, p. 294). O restante é representado por musgos, algas terrestres e líquens, que
ocuparam esparsamente apenas a costa. A erva C. crassifolius cresce em lugares
protegidos do vento, que contenham alguma umidade, especialmente depois do
degelo da primavera. Suas flores são brancas e têm menos de 0,5 centímetro de
comprimento. D. antarctica e C. crassifolius crescem apenas na Península Antártica e
nas ilhas mais setentrionais, que têm temperaturas mais amenas.

Segundo Walter, 1986, p. 294:

Nas ilhas próximas, as temperaturas são superiores a 0o C no verão,


mas o solo litólico e o frio extremo impedem o crescimento de árvores.
As baixas temperaturas dificultam a pedogênese e a superfície é
coberta por calhaus de pedras. Chuva e neblina ocorrem durante todo
o ano e o vento polar varre as ilhas sem parar. A cobertura vegetal das
ilhas é representada por musgos, samambaias e líquens. (WALTER,
1986, p. 294).

179
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Líquens e musgos são as vegetações mais comuns e melhor adaptadas


em todo o Continente Antártico, podendo ser encontrados a até 400 quilômetros
do Polo Sul. Existem mais de 400 espécies de líquens, 75 espécies de musgos,
oito gêneros de hepáticas e 75 espécies de fungos (apenas oito macroscópicas) na
Antártica. Nas rochas, onde as aves fazem os seus ninhos, a alga verde terrestre
Prasiola crispa é comum. Algas azuis, as cianofícias, são frequentes também.

Quanto à fauna, a Antártica tem cerca de 200 espécies endêmicas de peixes,


em geral, de tamanho pequeno, com menos de 25 cm de comprimento, raramente
chegando a 50 cm. A maioria tem crescimento lento e grande longevidade. O
krill (Euphausia superba) é a principal fonte de alimentação da maioria dos peixes
antárticos. É um crustáceo muito semelhante ao camarão, que não ultrapassa 6
cm de comprimento e pesa, no máximo, 1,5 g.

Existem 85 espécies de krills, que vivem em grupos de milhares e contituem


uma biomassa de cerca de 5 bilhões de toneladas. Baleias, aves e pinguins também
usam o krill como fonte de energia. As baleias ingerem cerca de 1 tonelada de krill
num único almoço. O krill integra uma complexa rede alimentar, que começa com
os fitoplânctons, o seu alimento. Barcos pesqueiros japoneses e noruegueses o
pescam intensamente.

As aves antárticas compõem sete famílias: Spheniscidae (pinguins, 18


espécies); Stercorariidae (skuas, duas espécies); Laridae (gaivotas, três espécies);
Phalacrocoracidae (cormorão, uma espécie); Procelariidae (petréis, três espécies, e
a pomba-antártica, uma espécie); Diomedidae (albatroz, três espécies); Oceanitidae
(andorinhas-do-mar, uma espécie).

Os pínguins são os representantes mais comuns do reino Arquinótipo.


O pinguim-imperador (Aptenodytes forsterii), que pode ter mais de um metro
de altura e pesar 40 quilos, e o pinguim-de-Adélia (Pygoscelis adeliae) formam
grandes colônias de milhares de indivíduos e são os únicos que vivem ao longo do
litoral durante todo o ano. O pinguim-imperador forma colônias de mais de 300
mil indivíduos. O krill é o principal alimento dos pinguins e os seus predadores
são a foca-leopardo (Hydrurga leptonyx), a gaivota (Larus dominicanus) e as skuas
(Chataracta spp).

O estercorário (família Sterchoranïdae), ou skuas, são os maiores predadores


do polo Sul. Alimentam-se de aves, filhotes e ovos de pinguins, filhotes de focas,
restos de placentas das focas, animais mortos, em adiantado estado de putrefação.

180
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

DICAS

Prezado(a) acadêmico(a)!
Quanto às espécies, acesse o site: <http://www.inach.cl/portal_educa/antartica/antartica.
html> e <http://www.inach.cl/portal_educa/antartica/antartica.html>.Acesso em: 13 jul. 2010.

Na Antártica ocorrem três espécies de gaivotas: Larus dominicanus, a


gaivota-dominicana, Sterna paradisaea, a gaivota-do-Ártico (que nos respectivos
invernos voa para o polo oposto no verão) e Sterna vitatta, a gaivota da Antártica.
A família Laridae tem 90 espécies de gaivotas, das quais 20 vivem no Brasil.
O hábitat preferido são as ilhas Shetland do Sul, que dividem com as focas e
pinguins. Alimentam-se de peixes, ovos, roedores pequenos e restos de animais
mortos e de plantas. O seu predador mais contumaz é o estercorário.

Outras aves na Antártica são o cormorão-da-Antártica (Phalacrocorax


bransfieldensis), que pesca a 30 metros de profundidade e prende a respiração por
um minuto. No Brasil, o biguá, P. olivaceus, representa a espécie. O cormorão
é uma ave cosmopolita e, no reino Paleotropical, estende os seus domínios da
Europa Ocidental até a Ásia e a Austrália. Outros procelários (família Procelariidae)
na Antártica são Daption capense, o petrel, Macronecte giganteus, o petrel-gigante,
Pagoroma nivea, o petrel-das-neves, Chionis alba, a pomba-antártica.

O simpático albatroz (família Diomedeidae) é uma das aves mais


cosmopolitas, mas a principal concentração se dá no Hemisfério Sul, nas
ilhas Shetland do Sul e na Península Antártica. Há três espécies: Diomedea
melanophris, o pelicano-negro, D. chrysostoma, pelicano-de-cabeça-cinza, e D.
exulans, albatroz comum.

Os invertebrados têm poucos representantes – tardígrafos (invertebrados


com 1 mm de comprimento), ácaros (parasitas de aves e mamíferos, com menos
de 1 mm), colêmbolos (insetos ápteros com 5 mm de comprimento), que vivem
sob o musgo (STORER et al., 1991).

Dentre os mamíferos marinhos, duas ordens fazem parte da fauna antártica:


Carnivora e Cetacea. Dentre os carnívoros estão a foca (família Phocidae) e o lobo-
marinho (família Othariidae). As focas estão representadas por diversos gêneros:
a foca-elefante ou elefante-marinho (Mirounga leonina), a foca-branca (Lobodon
carcinophagus), a foca-leopardo ou leopardo-marinho (Hydrurga leptonyx), a foca
de Weddell (Leptonychotes weddelli) e a foca-de-Ross (Ommatohoca rossi).

181
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As baleias são os maiores animais da Terra. Na ordem Cetacea incluem-se


também os golfinhos. “As baleias são classificadas em duas subordens – Odontoceti,
baleias-com-dentes, e Mysticeti, sem dentes” (STORER et al., 199, p. 721). Na
Antártica encontram-se a baleia-azul (Balaenoptera musculus), o maior animal do
planeta, com 32 m de comprimento, e filhotes que nascem com 7 m de comprimento,
a mink (Balaenoptera acutorostrata), a baleia-de-corcova ou corcunda (Megaptera
novaeangliae) e a baleia fin (Balaenoptera physalus), dentre as baleias sem dentes. As
únicas baleias com dentes são a orca (Orcinus orca), erroneamente chamada de
baleia-assassina, e o cachalote (Physeter catodon) ou baleia-de-espermacete, com 18
m de comprimento. O espermacete é um óleo lubrificante produzido pela baleia,
armazenado num reservatório localizado na cabeça. No estômago, ela produz o
âmbar-cinzento, muito usado em perfumaria (STORER).

DICAS

Prezado(a) acadêmico(a)!
Quanto às espécies de baleias, acesse o site: <http://www.antarcticconnection.com/antarctic/
wildlife/whales/index.shtml> Acesso em: 13 jul. 2010.

2.5 REINO NEOTROPICAL


O reino Neotropical inclui a América do Sul, as Antilhas e grandes
extensões da parte oriental da América Central. As condições paleogeográficas e
paleoecológicas favoreceram o desenvolvimento e a manutenção de uma fauna e
uma flora riquíssima em espécies.

O reino Neotropical possui os seguintes biomas: floresta equatorial,


floresta tropical, savanas ou cerrados, campos, manguezais e restingas tropicais.
As relações existentes no reino Neotropical são muito semelhantes às relações
já vistas anteriormente em outros biomas tropicais e equatoriais, mas em razão
da localização, da complexidade e da atuação da população humana, os biomas
neotropicais apresentam peculiaridades. Por exemplo, a floresta Amazônica, que
se estende sob o equador, e a floresta tropical da encosta da Serra do Mar - a
floresta Atlântica - exibem características que as diferem uma da outra. A floresta
tropical da América Central tem características próprias. O cerrado, que é a savana
neotropical, é muito diferente da savana africana ou da australiana, embora as
suas relações dinâmicas tenham muitas semelhanças com as outras.

Há uma grande e complexa variedade de climas no reino Neotropical, o


que levou ao desenvolvimento de hábitats diferentes – desde os superúmidos,
como o clima equatorial, até o semiárido da caatinga e o clima de deserto, nas
partes mais elevadas dos Andes e nas planícies do centro e do sul da Argentina.

182
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Strahler (1984) e Strahler e Strahler (1996) enquadram os climas neotropicais


em dois tipos principais: climas de baixas latitudes e climas de latitudes médias.
São climas governados por movimentos de massas de ar e por zonas frontais.

As massas de ar que atuam nos climas das baixas latitudes têm regiões-
fonte variadas: podem ser continentais tropicais, tropicais marítimas e equatoriais
marítimas e continentais. As regiões-fonte encontram-se tanto nas zonas tropicais
quanto nas subtropicais e incluem a zona de convergência intertropical, o cinturão
dos ventos alísios e partes das células subtropicais de alta pressão.

Na faixa de baixas latitudes, os climas predominantes são o equatorial


úmido, o clima de monção das costas atingidas pelos ventos alísios, o tropical
seco-úmido e o tropical árido (STRAHLER 1984; STRAHLER; STRAHLER,
1996). Os tipos climáticos vão desde o extremamente úmido e quente, como o
equatorial, ao extremamente quente e árido, como o desértico. Nas montanhas,
como os Andes, as altitudes criam tipos climáticos com características muito
especiais e contrastantes, como vertentes a barlaventos com chuvas torrenciais
e vertentes, a sotavento, semiáridas (sombra de chuva). A insolação é elevada
nas altas latitudes, devido à rarefação do ar, e a radiação solar incide sobre a
superfície quase sem encontrar barreira imposta pela umidade, que é baixa, e
pelos aerossóis. A concentração de radiação ultravioleta é alta e pode causar
danos ao homem e aos animais.

As latitudes médias situam-se na zona de confronto de massas de ar


tropicais e polares, as zonas de descontinuidades. Nas descontinuidades, a frente
polar origina ondas ciclônicas, que se movem, ora na direção do equador, ou
retrocedem para o Polo Sul, trazendo chuvas constantes, muitas vezes violentas
tempestades. As frentes predominam a partir de meados do outono até meados
da primavera seguinte, com uma ligeira queda no inverno, que é dominado,
no Hemisfério Sul, pela massa polar atlântica. Na América Central, a atividade
frontal é menor, mas ciclones e furacões são comuns. As células ciclonais podem
aparecer em qualquer época do ano, sobretudo no verão.

Essa variedade de climas com características e propriedades diferentes


mantém os biomas no reino Neotropical, mas a presente distribuição da fauna
e da flora se deve, sobretudo, à sucessão de fatores paleoambientais e genéticos,
paralelamente a flutuações climáticas, que marcaram o Pleistoceno e o Holoceno.
As variações dos ecossistemas ocorridas no Quaternário podem ser acompanhadas
nos estudos de fósseis vegetais e animais, o que permite formar um quadro
preciso dos paleoambientes para entender a paisagem atual.

Ao relacionar fatores geomorfológicos, climáticos, fitogeográficos,


hidrológicos e ecológicos, Ab'Sáber (1977) agrupou a paisagem sul-americana em três
grandes domínios paisagísticos: planaltos intertropicais do Brasil, das Guianas e de
parte da Venezuela, que ele chamou de áreas nucleares; domínios transicionais das
planuras e baixos platôs meridionais do sul do continente; e domínios de montanhas
e altiplanos da Cordilheira dos Andes, controlados pelo clima de altitude.

183
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A essas paisagens integradas, Ab'Sáber (1967, p. 1977) denominou domínios


morfoclimáticos e fitogeográficos e as definiu como "[...] um conjunto espacial de
certa ordem de grandeza territorial – de centenas de milhares a milhões de km2 de
área – onde haja um esquema coerente de feições de relevo, tipos de solos, formas de
vegetação e condições climático-hidrológicas". Essas paisagens integradas ocorrem
sempre numa área típica, que Ab'Sáber chama de área core ou área nuclear. A área
nuclear apresenta as características típicas, que são reflexo dos seus fatores naturais,
mas que, à medida que se afasta do centro, vão se alterando gradativamente, para, mais
adiante, dar lugar a outra paisagem. Essas áreas de transição compõem corredores
que interligam e envolvem as áreas nucleares. Elas resultam de processos diferentes,
que originaram vegetação, solos e formas de relevo particulares. (AB'SÁBER, 1977).

As áreas de transição são extremamente complexas e podem apresentar


fisionomias em mosaico de duas ou várias áreas nucleares, ou mesmo combinações
totalmente diversas, que Ab'Sáber (1977) chamou de áreas-tampão – que não têm
nenhuma relação direta com as áreas nucleares adjacentes. As paisagens-tampão
podem se localizar no centro das faixas de transição e se destacam da paisagem
envolvente. Essas paisagens-tampão são formações fitogeográficas que se adaptaram
às condições climáticas, edáficas e de relevo das zonas de transição. Ab'Sáber (1977)
cita a zona dos cocais, as matas-de-cipó e as matas-secas como representantes mais
típicos das áreas-tampão. Na verdade, são refúgios ou enclaves, que se estabeleceram
numa época de clima e condições ecológicas diferentes das de hoje.

Todas essas variações ambientais estão sujeitas diretamente ao comando


de mudanças e flutuações climáticas. As condições climáticas, principalmente as
regionais, são, em parte, responsáveis pelas formas de relevo, pelos tipos de solos,
pela hidrografia e pela cobertura vegetal (BIGARELA, 2003; ANDRADE-LIMA;
RIEHS, 1975). Segundo o tipo de clima, ocorria a degradação lateral ou a dissecação
vertical, que moldavam a paisagem e lhe conferiam tipos específicos de formações
geográficas, acompanhadas das respectivas faunas. Bigarella & Mousinho (1965, p.
17) “mostraram, estudando os sedimentos da região de Pariquera-Açu (Estado de
São Paulo), que a degradação lateral é típica de um clima semiárido”. Naquela região,
a morfogênese mecânica formou superfícies aplainadas e sedimentos grosseiros e
finos. A dissecação vertical, característica da decomposição química de climas úmidos
e quentes, produziu espessos regolitos, recobertos por densas florestas úmidas.

Nas épocas semiáridas, as florestas recuam para os biótopos em que a


umidade possa ser mantida e, então, constituem refúgios para a fauna e para a
flora. Viadana (2002: 26) cita Bigarella (1964), que estudou depósitos sedimentares
em vários lugares do Brasil e mostrou que a ciclicidade do clima fica revelada
nos sedimentos, o que permite calcular a idade das formações vegetais atuais.
Bigarella (apud Viadana) mostrou, estudando sedimentos quaternários em
diversas regões do país, que as glaciações causam a semiaridez, enquanto os
períodos interglaciais umedecem o clima. Em 1970, Damuth e Fairbridge (apud
1990, p. 114; VIADANA, 2002, p. 34) “confirmaram a afirmação de Bigarella (1964,
apud VIADANA) e de Leite e Klein, de que nos períodos glaciais o clima é frio e
seco e nos períodos interglaciais é úmido e quente”.

184
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Essas mudanças atingem diretamente os seres vivos e os obrigam a adaptar-


se a elas – ou perecer. Inúmeros refúgios formaram-se no Brasil e na América do
Sul, devido a modificações do clima no Quaternário. Os refúgios acabam por se
tornar centros de dispersão, de onde espécies de animais e de plantas migram tão
logo as condições ambientais externas lhes permitam expandir.

3 OS BIOMAS
Os reinos biogeográficos compreendem os biomas, embora os critérios de
delimitação estejam baseados mais na forma das plantas submetidas a um tipo
climático existente atualmente do que propriamente no nível de endemismo, na
sua evolução e nas áreas de dispersão dos seres vivos.

Os biomas estão reunidos em quatro grupos principais, também chamados


biócoros. São eles: florestas, savanas, estepes (pradarias, campos) e desertos.

Os reinos biogeográficos abrigam os seguintes biomas:

Reino Holártico – tundra, taiga, floresta temperada decídua, estepes e


pradarias, deserto, vegetação mediterrânea.

Reino Paleotropical – deserto, estepe, savana, floresta tropical úmida.

Reino Australiano – deserto, estepes e pradarias, savana, floresta


temperada decídua, floresta tropical úmida, vegetação mediterrânea.

Reino Neotropical – floresta tropical úmida, savana, estepe e pradaria,


floresta temperada decídua, vegetação de montanhas.

A seguir, a descrição dos biomas, independentemente de reino ou região


biogeográfica em que se encontram.

3.1 BIOMA DE TUNDRA


Nos limites do Polo Norte, entre 50o e 70o de lat. norte, está a tundra – vegetação
de porte rasteiro, que enfrenta um clima cujo verão é de 6 a 10 semanas, com apenas
quatro meses do ano ultrapassando 10o C, e invernos longos de temperaturas abaixo
de zero grau. O nome tundra significa terra nua e deriva do finlandês tunturia. O
ecossistema da tundra é muito recente e formou-se no fim da última glaciação, há
cerca de 10 mil anos, quando o gelo começou a recuar e a expor a superfície nua das
rochas. É o maior ecossistema da Terra, recobrindo cerca de 20% do planeta.

No Hemisfério Sul, a tundra aparece apenas em pequenas ilhas ao largo


da Antártida e Península Antártica. Nas altas montanhas, como nos Andes, ocorre
uma cobertura vegetal fisionomicamente muito semelhante à tundra ártica,
embora com flora diferente. É considerada tundra altitudinal.
185
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A tundra distingue-se por quatro fatores: um período de crescimento


vegetativo de menos de 50 dias entre a primavera e o outono seguinte; existência
do permafrost, denominação do subsolo sempre gelado; precipitações inferiores a
250 mm/ano concentradas no verão; baixa produtividade das plantas (inferior a
1g de matéria seca por m2/dia), ou seja, a vegetação cresce muito lentamente.

As temperaturas são extremas e no mês de julho, o mais quente, elas não


chegam a 10º C. No inverno, as temperaturas podem chegar a 50º C abaixo de
zero ou menos. As chuvas anuais não alcançam 250 mm.

O clima da tundra do Hemisfério Norte é controlado por massas de ar


polares e árticas. Além da temperatura, a evaporação também é baixa. As massas
árticas dominam no extremo norte da tundra, com os seus centros de alta pressão
localizados no Oceano Ártico e na Groenlândia. “No interior dos continentes
aparecem massas de ar polares continentais e polares marítimas” (STRAHLER,
1984, p. 307). A frente polar ártica atua durante todo ano com tempestades
violentas, que se movem para leste.

Embora a tundra ártica cubra uma larga extensão espacial, a composição


florística é muito pobre, resumindo-se a musgos, liquens, gramíneas, arbustos e
ervas diversas. Não existem árvores na tundra. As baixas temperaturas e os solos
litólicos, em sua maioria, determinam faixas de vegetação, que se estendem a partir
da taiga (floresta de coníferas, a última linha de árvores). Furley e Newey (1986, p.
225) apontam três faixas: “tundra alta, tundra média e tundra baixa”. As designações
não se referem ao porte da vegetação, mas à latitude em que se acham elas.

A tundra alta envolve o Polo Norte, aparecendo no litoral setentrional


dos continentes e em ilhas ao norte do Canadá. Nas ilhas, a vegetação é muito
esparsa, formada por diminutas manchas de líquens, musgos e ervas. Em algumas
depressões aparece o salgueiro-anão, a única espécie lenhosa.

A tundra média aparece mais ao sul, onde as condições climáticas e


edáficas permitem uma cobertura de maior porte, como as urzes sobre solos
pobres (charnecas). Predominam juncos e turfas, espécies de áreas pantanosas.

No extremo sul da região estende-se a tundra baixa, que recobre o norte


do Canadá, o Alaska, o sul da Groenlândia e vastas áreas da Sibéria. São espécies
lenhosas, como moitas de salgueiros e bétulas, ericáceas, musgos, líquens e ervas.
“A família Saxifragaceae, plantas herbáceas ou arbustivas lenhosas, pouco comum
no Brasil, inclui, dentre outras, o gênero Ribes, de onde se extrai a popular bebida
groselha”. (JOLY, 1991, p. 362).

A tundra baixa limita-se com a taiga. Entre ambas aparece um ecótono


(faixa de transição entre ecossistemas), com espécies de ambas as formações,
chamada de floresta da tundra, com manchas de pinheiros, abetos e larícios.

186
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Walter (1986, p. 292) tem outra taxonomia para a tundra do Hemisfério


Norte: “tundra de arbustos anões, equivalente à tundra baixa (ao sul); a tundra
verdadeira de líquens e musgos, semelhante à tundra média; e o deserto frio,
com vegetação esparsa entremeada de blocos rochosos soltos e afloramentos
correspondendo à tundra alta (no extremo norte)”.

O permafrost, camada permanentemente congelada do subsolo, pode


atingir, no norte do Hemisfério Norte, centenas de metros de profundidade,
reduzindo-se para o sul, chegando até cerca de 25 cm de espessura. O permafrost
dificulta o crescimento das plantas superiores, porque as raízes são impedidas
de se aprofundar, e reduz a atividade de bactérias e fungos na decomposição
da matéria orgânica. A matéria orgânica morta mal decomposta acumula-se
na superfície, originando uma espessa camada de turfa. O permafrost impede a
infiltração da água do degelo, que também se acumula à superfície e origina outro
traço marcante da tundra: milhares de lagos pontilham a paisagem no verão, e se
constituem habitats povoados por uma enorme multidão de aves e mamíferos.

E
IMPORTANT

Urzes são plantas da família Ericaceae, típicas de solos pobres, ácidos e mal
drenados. As Ericáceas têm 82 gêneros com mais de 2.500 espécies, que aparecem nas
regiões temperadas e subtropicais dos dois hemisférios. São plantas lenhosas, arbustivas,
com folhas esclerófilas e flores muito vistosas. No Brasil, é muito comum nos jardins o
Rhododendron spp, a azaleia, que floresce no inverno, e a Erica spp. Na Europa, cachimbos
de boa qualidade são feitos de madeira de Erica spp. O nome urze foi introduzido pelos
portugueses (Joly, 1991, p. 535).

A umidade do solo regula a distribuição das plantas. Em solos bem


drenados, como os litossolos, liquens e musgos predominam. Nos solos não
encharcados, como nas encostas suaves de solos castanhos, gramíneas e arbustos
anões de Vaccinium spp aparecem ao lado de ervas do gênero Dryas spp. Nos
solos alagados dos brejos são comuns ciperáceas como Carex spp, e musgos como
Hypnum spp, Sphagnum spp e Aulocomnium spp.

As plantas desenvolveram artifícios para enfrentar os fatores limitantes.


Como o período favorável é curto, elas têm que aproveitar ao máximo o calor. “A
alta latitude reduz a radiação solar e as plantas procuram no calor emitido pelo
solo outra fonte de energia para compensar. Por esta razão, não são maiores que
8 ou 10 cm” (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 232). Os talos e folhas do salgueiro-anão
(Salix herbacea), por exemplo, alastram-se sobre o solo e formam um emaranhado
intrincado, que dificulta caminhar sobre ele.

187
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

O metabolismo das plantas é lento devido ao frio, por isto, elas


atingem idades avançadas: o salgueiro-do-Ártico (Salix arctica) vive 150
anos, e o zimbro (Juniperus communis) ultrapassa os 300 anos. Liquens, como
Rhizocarpon geographicum, podem viver por milhares de anos. “Os liquens usam
convenientemente o calor do solo ou da superfície das rochas e a água do degelo,
o que lhes faculta uma fotossíntese eficiente”. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 234)

Na curta estação de crescimento (primavera e verão), as plantas


adaptaram-se a se desenvolver, reproduzir e em seguida, entrar em dormência
para se preparar para o inverno seguinte. As plantas fazem fotossíntese em baixas
temperaturas e muitas espécies usam reservas de carboidrato estocadas nas
raízes, talos e rizomas.

Do mesmo modo que as plantas, os animais da tundra também se adaptaram


ao frio e também aos predadores. São representantes da fauna do Hemisfério
Norte o boi almiscarado (Ovibus muschatus), a raposa-do-Ártico (Alopex lagopus),
a ptármiga (Lagopus hyperboreus), dentre outros e que possuem adaptações como
grossa camada de pele, impermeável ao frio e à umidade. A raposa pode suportar
temperaturas abaixo de 50º C negativos sem interromper as suas atividades. A
camuflagem é importante para escapar aos predadores. A raposa e o arminho
(Mustela erminea) são marrons no verão e brancos no inverno. A pelagem branca é
valiosa no mercado de peles e, por isso, sofrem ambos intensa caça.

E
IMPORTANT

Vaccinium é um dos 82 gêneros da família Ericaceae. Plantas lenhosas, típicas de


solos ácidos, algadiços (Joly, 1991, p. 534).

Os lemingues (o lemingue marrom, Lemmus lemmus, e o lemingue de coleira,


Dicrostonyx torquatus) não hibernam e nem armazenam reservas de alimentos para
o inverno. No período frio, metem-se sob a neve, formando enormes colônias.
Alimentam-se de raízes, sementes e musgos. Estes animais ocupam uma posição
fundamental na cadeia alimentar da tundra. Fertilíssimos, procriam em todas as
estações do ano, quando nascem de 8 a 10 filhotes. A fêmea pode procriar a partir
da terceira semana de idade. O tamanho não passa dos 15 cm e pesam apenas 50 g.
Contudo, com um metabolismo intenso, têm que consumir de 40 a 50 kg de plantas
por ano. “Uma colônia que ocupe uma área de 1 a 1,5 ha arrasa mais de 95% da
vegetação” (WALTER, 1986, p. 291). Nos túneis cavados na neve, a temperatura é
de 10º C, enquanto na superfície pode estar 50º C abaixo de zero. Ao fim do inverno,
emigram para outra área, deixando para trás um terreno arrasado. Na primavera,
no entanto, gramíneas e ciperáves rebrotam rapidamente.

188
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

A lenda popular diz que os lemingues se suicidam no verão. Na verdade, a


cada quatro ou cinco anos há uma explosão populacional, se a comida é farta. Após
devastar a região, partem à procura de outras áreas e o processo de devastação
prossegue. A redução do alimento leva a uma drástica redução populacional e
a colônia emigra. Nesse período de escassez, os lemingues constituem massas
compactas de animais, que vagam pela tundra. Ao encontrar um braço de mar, rio
ou lago, não hesitam em pular na água, pois são exímios nadadores. No entanto,
muitos perecem afogados, devido ao cansaço da marcha. Gaivotas, peixes
carnívoros, raposas, lobos e corujas fartam-se com tanta comida. São predadores
do lemingue a skua (Catharacta skua), a raposa do Ártico, a doninha e a coruja. Por
isso, a variação cíclica da população de lemingues atinge em cheio as populações
dos predadores. Quando a população dos lemingues reduz-se, os predadores
partem para outras presas, como a ptármiga e os esquilos, ou emigram para o sul.

3.2 BIOMA DE TAIGA - FLORESTA BOREAL DE CONÍFERAS


Localizada ao sul da tundra, entre as latitudes de 45o e 75o graus, a taiga
forma um cinturão contínuo entre a América do Norte (Canadá e Alaska, uma
estreita faixa no extremo oeste americano e pequenas manchas no norte dos EUA),
o norte da Europa (norte da Escócia e Escandinávia), atravessava toda a Sibéria,
e chega até o Japão. Na Sibéria, a taiga alcança a sua maior extensão norte-sul,
estendendo-se por 1.600 quilômetros de território. O bioma de taiga no Hemisfério
Sul é pouco expressivo em território. Na latitude correspondente à localização
da taiga predomina oceano. Aparece pontualmente no sul do Chile, no extremo
sul-ocidental da Austrália, na Nova Zelândia e na Tasmânia - apresentam uma
cobertura semelhante na fisionomia, mas com flora muito diferente.

A floresta tem uma fisionomia característica – árvores, muitas vezes com


mais de 40 metros de altura, de copa com forma cônica quando jovem, com troncos
retos, galhos curtos e folhas pequenas, estreitas, em forma de agulha (acícula), de
onde advém o nome da floresta – aciculifólia.

“A tundra e a taiga têm origem pós-glacial, quando o gelo começou a


recuar, há cerca de 10 mil anos” (WALTER, 1986, p. 276). A taiga ocupava, então,
pequenos refúgios, e, graças ao clima mais úmido do Holoceno, pôde, então,
avançar para colonizar as terras atuais, paralelamente à tundra, ao norte.

A floresta boreal estende-se nas áreas dominadas pelas massas polares


continentais, frias, secas e estáveis – isto é, a região fonte do anticiclone continental.
Além disso, é sempre invadida por massas árticas continentais, extremamente frias.
As poucas chuvas concentram-se no verão, trazidas por ciclones móveis marítimos.

189
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As condições climáticas são extremas. O gradiente de temperatura entre


verão e inverno cresce com as latitudes. Por exemplo, na cidade de Fort Vermilion,
Província de Alberta, no Canadá, na latidude de 58o norte, a temperatura máxima
absoluta do verão é de 14o C, a mínima absoluta no inverno, -27o C. São sete meses
consecutivos de temperaturas abaixo de zero. “Em Yakutsk, na Sibéria, a 62o de
latitude norte, a máxima absoluta é de 17o C, e a mínima, -43o C” (STRAHLER;
STRAHLER, 1996, p. 214).

As precipitações não chegam, em muitos casos, a 300 mm anuais e se


concentram sempre no verão. Em Fort Vermilion, o máximo se dá em julho,
com 50 mm. O total anual é de 310 mm. No verão, o sol brilha durante 16 horas
consecutivas em julho, mas no inverno o sol só aparece por cinco horas diárias
(janeiro) (STRAHLER; STRAHLER, 1996, p. 214).

A maioria das coníferas é perenifólia. As copas são muito densas e o


sub-bosque, por esta razão, é ralo. A umidade no interior da mata é elevada e o
solo é recoberto por um denso tapete de musgos. A comunidade vegetal é pobre
em espécies, predominando, em geral, uma ou duas espécies em vastas áreas.
Entretanto, as populações são numerosas. Nos lugares mais bem drenados, mas
ainda com alguma umidade, líquens e certas espécies de musgos são as espécies
dominantes, e nos trechos onde o solo é mais úmido, arbustos baixos (Vaccinium
spp, Empetrum spp) são os dominantes. O musgo Sphagnum spp. aparece apenas
nas baixadas muito encharcadas.

A forma cônica das árvores impede que a neve se acumule nos galhos.
Isso evita que quebrem com seu peso. Se houver água suficiente, a fotossíntese
se faz sempre, exceto no inverno, quando a água congela. A forma acicular das
folhas diminui a superfície de contato com o ar, o que reduz a evapotranspiração
no verão e na primavera preserva a água nas células. (SIMMONS, 1982, p. 130).

“A variação de latitude tem forte influência da composição florística da


taiga”. Furley & Newey (1986, p. 242) dividem a floresta em três zonas: a floresta
da tundra, a última linha de árvores, ao norte; a subzona de bosques, uma zona de
transição, ao sul da floresta da tundra; e a floresta boreal. Esta última designação
engloba toda a floresta da taiga.

A floresta da tundra é uma formação aberta de transição com árvores raquíticas,


como lariços e abetos, lado a lado com arbustos, ervas e outras espécies da tundra. Na
subzona de bosques, ao sul, a formação é mais densa, com um sub-bosque muito denso.
Aparecem abetos brancos (Picea glauca) e abetos negros (P. mariana).

A taiga típica, a floresta boreal, é densamente povoada por coníferas


de grande porte, bem desenvolvidas (abetos branco e negro e o bálsamo, Abies
balsamea, são as espécies mais comuns). Pântanos e atoleiros nas depressões são
rodeados por formações de abeto negro. Os bálsamos e o abeto branco preferem
solos bem drenados e férteis.

190
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Na América do Norte, quatro gêneros de coníferas predominam: o abeto


vermelho (Picea), os pinheiros (Pinus), o abeto (Abies) e o lariço (Larix), este, o único
gênero com espécies caducifólias. (WALTER, 1986, p. 267). Na costa do Pacífico,
Picea glauca (abeto vermelho) é a espécie dominante, que se estende numa faixa
contínua até a Terra Nova, no Atlântico.

Na Europa, a dominância está a cargo de apenas duas espécies, o abeto


vermelho (P. abies) e o pinheiro bravo (Pinus sylvestris). Na Sibéria, a flora é mais
rica: os abetos Picea obovata, Abies sibirica, o lariço Larix sibirica e o pinheiro Pinus
sibirica. Nas áreas de clima seco da Sibéria Oriental, em terrenos acidentados,
longe da influência do Pacífico, a grande floresta de lariço dahuriano (Larix
dahurica) recobria mais de 2,5 milhões de quilômetros quadrados (WALTER, 1986,
p. 266). “Era uma formação aberta, com um sub-bosque denso de arbustos, ervas
e briófitas” (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 243), “hoje é praticamente inexistente
devido ao desmatamento. A ação combinada do clima, solo, topografia, ação do
fogo e a exploração humana são fatores atuais que interferem na distribuição e na
variação florísticas” (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 243)

Uma das características da floresta boreal é a competição entre as plantas,


que determina a sua distribuição espacial. As coníferas consomem com grande
rapidez os nutrientes do solo, restando poucos elementos úteis para o sub-
bosque, que, por isto, é formado por plantas pouco exigentes e raquíticas. Mesmo
coníferas jovens, sobretudo os pinheiros, têm dificuldade em competir com as
plantas adultas: têm que aguardar a morte de uma árvore velha para que possam
se desenvolver convenientemente, livres da competição (WALTER, 1986, p. 268).
A concentração de nutrientes é mais importante que a luminosidade para a
composição florística do estrato herbáceo. Outro fator importante na distribuição
das plantas é a resistência ao frio, que chega na Sibéria Oriental a -60º C. O lariço
(Larix), que perde as acículas no inverno, é uma das poucas árvores que podem
suportar temperaturas desta ordem.

Também a fauna tem participação na distribuição da floresta. Furley e


Newey (1986, p. 245) agrupam os animais em categorias segundo os efeitos que
causam na cobertura: dominantes, maiores influentes e menores influentes. Os
dominantes agem sobre outros animais e plantas diretamente e, pois, controlam
as comunidades. São o alce (Alces alces), que pisoteia o solo e muda a composição
florística, erradicando muitas espécies, e também prejudicando outros animais.
Entre os maiores influentes, agrupam-se os predadores de grande porte
(os carnívoros) e mesmo o homem. Na última categoria estão os carnívoros
invertebrados e os parasitas.

191
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Na costa ocidental da América do Norte, da Califórnia até o sul do


Alaska, e também no sul da Austrália e no sul do Chile, aparece uma formação
que pertence à floresta boreal, mas com características próprias, a floresta úmida
das costas ocidentais. Na costa ocidental da América do Norte, a formação inclui
a floresta de sequoias, coníferas sempre verdes, que podem alcançar mais de
100 metros de altura e estão entre as espécies mais longevas conhecidas – a
idade das árvores ultrapassa, muitas vezes, os dois mil anos. Localizam-se onde
predomina o clima oceânico das costas ocidentais. As chuvas são distribuídas
no decorrer do ano graças à ação conjunta de tempestades ciclônicas e do efeito
orográfico produzido pela proximidade das Montanhas Rochosas. No entanto,
o máximo de chuvas se dá no inverno. No verão, o anticiclone subtropical do
Pacífico invade a região, fazendo reduzirem as chuvas, porque desvia as massas
polares e a frente polar para leste e sudeste. No inverno, as massas polares são
desviadas para leste pelo efeito de Coriolis, impedindo que as temperaturas
desçam a valores negativos na floresta e permanecem entre 1º e 2º C positivos
em janeiro (STRAHLER; STRAHLER, 1996, p. 291). No entanto, a incidência das
frentes polares aumenta com o recuo do anticiclone para o oceano durante os
meses frios. No verão, em julho, a temperatura não ultrapassa os 17º C.

FONTE: Strahler e Strahler (1996, p. 291)

O podzol é o solo predominante. É um solo ácido e muito lixiviado. Há


pouca atividade bacteriana, o que resulta numa espessa camada de húmus, que
comporta razoáveis concentrações de cálcio, sódio e potássio. O teor de nutrientes,
as chuvas abundantes, o inverno suave, são fatores primordiais para a floresta,
que, então, abriga as maiores árvores do mundo.

“A sequoia vermelha (Sequoia sempervirens), a sequoia gigante (S.


giganteum) e o abeto de Douglas (Psudotsuga taxifolia) são as espécies dominantes”
(STRAHLER, 1986, p. 379). A sequoia vermelha e a gigante podem ultrapassar
100 metros de altura e 20 metros de perímetro de tronco.

O bioma de taiga no Hemisfério Sul não apresenta a mesma expressividade


territorial e de diversidade. O Chile é influenciado predominantemente pela
presença do Oceano Pacífico, de águas frias, devido à corrente de Humboldt, o
que empurra as temperaturas para baixo. No sul do Chile a dominância é de
espécies do gênero Nothofagus. Este gênero pertence à família Fagaceae, com 600
espécies distribuídas em seis gêneros (JOLY, 1991, p. 228). “São árvores, em
geral, caducifólias, como N. obliqua, que forma extensas florestas”. (WALTHER,
1986, p. 174). Mais para o sul, o clima torna-se superúmido, com as chuvas
atingindo índices entre 2.000-3.000 mm anuais, e a floresta perenefólia é formada
por N. dombeyia, com os gêneros de coníferas Austrocedrus e Podocarpus e a
espécie Araucaria araucana. No extremo sul aparecem florestas de menor porte,
denominadas localmente de florestas de Magalhães, com uma flora empobrecida
pelas baixas temperaturas e árvores de porte reduzido, com 6-8 metros de altura.
Aparecem também pântanos bem desenvolvidos.
192
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

A vida animal na taiga é muito semelhante à da tundra. A fauna é mais


diversificada, porque o período de frio é menor. Entretanto, muitas espécies
emigram no inverno. No Hemisfério Norte, muitos mamíferos hibernam, como
os ursos. Outros, como os veados e os alces, não hibernam, mas desenvolveram
pêlos longos contra o frio, a neve e a chuva. Mussaranhos e ratos silvestres vivem
sob a neve, que os mantém aquecidos e alimentados com uma boa provisão de
comida estocada durante os meses quentes. Os ursos preparam-se para o inverno
alimentando-se fartamente de frutas, peixes e pequenos mamíferos. Veados e
alces, que não hibernam, alimentam-se, no inverno, de líquens, musgos e cascas
de árvores e de arbustos.

Pica-paus, chapim, quebra-nozes, corujas, gaviões e a tetraz são as únicas


aves residentes fixas, inclusive no inverno holártico. Alimentam-se das agulhas
das coníferas (o galo silvestre europeu, na família da tetraz, e o pardal do pinheiro,
um tentilhão), líquens e musgos, que atraem insetos, caramujos, estes, dieta dos
pássaros pequenos. Na primavera, uma vasta população de insetos é alimento
de pássaros, que estão chegando das regiões mais quentes e têm, pois, comida
farta. São vespas, abelhas, mosquitos, que passam o inverno na forma de pupas,
encerrados no solo ou nas árvores, onde são procurados pelos pica-paus.

Na primavera, insetos e vertebrados, que sugam a seiva das árvores,


animais pastadores e os que comem folhas e raízes prejudicam intensamente a
floresta. Apenas na estação seguinte as plantas se recompõem. Esse excesso de
atividade dos herbívoros traz problemas para as plantas. Furley e Newey (1986)
enumeram: redução da fotossíntese, com diminuição consequente da produção
de carboidratos e do transporte da seiva, e menor potencial reprodutivo devido
ao consumo de frutos e flores.

O alce tem participação intensa na modificação da paisagem: o pisoteio


compacta o solo e dificulta o crescimento da vegetação herbácea, e a intensidade
com que consome as plantas pode reduzir algumas populações. “No verão,
alimenta-se de plantas aquáticas e, no inverno, quando os lagos congelam, procura
ramos de bétulas, salgueiros e faias” (FURLEY & NEWEY, 1986, p. 246). Outro
herbívoro que altera a paisagem é o caribu, que se alimenta em todos os estágios
de desenvolvimento da sucessão vegetal. Os caribus estendem o seu hábitat até
a tundra. No estágio pioneiro, os líquens são a sua dieta predileta. No inverno,
manadas de milhares de caribus deslocam-se para o sul e invadem a taiga. Os
galhos de abetos e lariços recobertos de líquens são arrancados e, com a língua,
eles retiram os líquens. Em poucos dias, a paisagem da taiga fica profundamente
modificada, com árvores mutiladas.

Para os carnívoros, não falta comida. O lobo (Canis lupus) caça animais
grandes, como o alce e o boi almiscarado. O lince (Lynx spp), a doninha (Mustela
nivalis) e a marta (Martes martes) atacam pequenos mamíferos e aves.

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UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A madeira é explorada desde o século XIX, principalmente para a produção


de papel. Por isto, a floresta boreal está bastante reduzida, retringindo-se a
pequenas manchas. Raios causam incêndios no verão, quando a vegetação está
muito ressecada. “As clareiras abertas são logo colonizadas por ervas, arbustos,
que são alimento de arganazes, veados e aves, e, principalmente, pinheiros (Pinus
spp), que são plantas invasoras de rápido crescimento” (Walter, 1986, p. 264). Nas
zonas de transição da floresta boreal com a floresta decídua ao sul, os pinheiros, no
processo de regeneração da mata, podem ser substituídos por plantas decíduas,
que acabam por constituir florestas decíduas puras. Monoculturas de abeto-
vermelho (Picea abies), decíduas, têm substituído as florestas decíduas e as de
pinheiros. Acampamentos itinerantes formam a base da indústria madeireira na
Sibéria. “Plantas medicinais, como o teixo (Taxus brevifolia), de cuja casca se produz
remédios contra o câncer, são muito procuradas”. (COX; MOORE, 1994, p. 92).

O comércio de peles é outra atividade que tem contribuído para a


devastação da floresta, graças ao desequilíbrio das relações ecológicas. O castor,
o lince, o arminho, a raposa, a zibelina, dentre outros, são espécies intensamente
caçadas. Os movimentos de grupos ecologistas reduziram em muito a caça, mas,
eventualmente, ela retorna com força. Muitos animais são criados em cativeiro,
como é o caso do arminho, unicamente para o abate.

A poluição do ar pelas indústrias é outro fator limitante para a floresta


boreal. Óxidos de enxofre e de nitrogênio, ao reagir com a água da atmosfera,
originam ácido sulfúrico e nítrico, que retornam à superfície como chuva ácida.
A resistência da floresta boreal à poluição é baixa, porque a diversidade florística
não é grande. “A homogeneidade dos ecossistemas facilita o ataque de insetos e
larvas, que se alimentam das cascas ou das raízes” (COX; MOORE, 1994, p. 92).

A chuva ácida diminui a capacidade dos solos alcalinos, típicos da


floresta, em neutralizar os ácidos trazidos por ela. O degelo, por sua vez, leva
água acidificada para os rios e lagos. A água ácida, uma vez infiltrada no solo,
lixiviando os minerais solúveis, é absorvida pelas raízes e isto acelera a redução
da resistência da planta. O teor de alumínio no solo também é aumentado com
a acidez e, como não é eliminado, acumula-se nos vasos da planta, afetando seu
desenvolvimento.

Sem a mata, os pássaros emigram, em sua maioria, e deixam o campo livre


para insetos, principalmente da ordem Diptera, como moscas e mosquitos, que têm
causado muitos problemas de saúde não só para o homem no norte do Canadá,
mas também para aves e animais domésticos. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 246).

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TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

3.3 FLORESTA TEMPERADA SEMIDECÍDUA OU MISTA


Ao sul da floresta boreal, a floresta semidecídua ocupa uma área menor que
a Taiga. Situada entre 50º e 30º de latitude norte, na zona temperada da América
do Norte, do leste da Ásia, da Europa Ocidental e Central. No Hemisfério Sul ela
aparece no litoral do Chile, na Patagônia, numa estreita faixa no litoral sudeste da
Austrália, na Nova Zelândia e no extremo sul da África do Sul.

Strahler (1986) inclui o clima da floresta no grupo clima das latitudes


médias e o divide em duas categorias: clima marítimo da costa ocidental,
localizado no noroeste da América do Norte, no oeste da Europa, e no centro-
sul e no extremo sul do Chile; clima continental úmido, no centro e nordeste
da América do Norte e na Eurásia, estendendo-se da Europa Central até o sul
dos Montes Urais. Interrompido pelas estepes e pelo Himalaia, volta a aparecer
somente a leste desta cordilheira, de onde se estende até o litoral.

O clima marítimo das costas ocidentais tem influências do mar e as


temperaturas não descem abaixo de zero grau. As chuvas se concentram no
inverno, trazidas por massas polares úmidas que, na verdade, dominam na maior
parte do ano. No verão, a massa subtropical invade o continente, porque as massas
polares recuam e mantêm o ar estável, reduzindo as chuvas. Clima continental
úmido, que fica na zona da frente polar ártica, tem verões quentes e invernos de
três meses com temperaturas abaixo de zero. Chuvas convectivas concentram-se
no verão, trazidas pela massa tropical marítima, que faz subir a temperatura a
índices muito altos. No inverno, a frente polar traz chuvas ciclônicas. A estação
de crescimento das plantas é de quatro a seis meses, o que lhes assegura um bom
desenvolvimento.

Cox e Moore (1994, p. 93) agrupam a Floresta Semidecídua Temperada em


quatro categorias:

1) Floresta mista de coníferas e árvores decíduas de folhas largas, que constitui


a vegetação clímax da maior parte da floresta.

2) Floresta mista de coníferas e árvores perenefólias de folhas largas, típica da


região mediterrânea, rara atualmente, mas ainda observável no Chile, na
Nova Zelândia, Tasmânia e África do Sul.

3) Floresta de folhas largas composta quase inteiramente de árvores decíduas,


que, antigamente, recobria a Europa, norte da Ásia e leste da América do
Norte, e, hoje, existe somente na Patagônia.

4) Floresta de árvores perenefólias de folhas largas, encontrada na Flórida,


nordeste do México e no Japão.

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UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

No outono, a floresta ganha um colorido que varia em tons de amarelo e


laranja, pois ao cessar a fotossíntese, deixa de produzir clorofila e passa a mostrar
outros pigmentos, até o momento da queda das folhas. As folhas caem no outono,
porque os dias tornam-se gradativamente mais curtos e a radiação do sol diminui,
indo compor a serapilheira, que forma um espesso tapete no chão da mata. Ao se
decompor, recobre o solo com uma camada de matéria orgânica ou húmus, que traz
muita fertilidade. Na primavera a vegetação apressa-se em reproduzir. A floresta
toma o colorido de incontáveis árvores e do estrato herbáceo. O adensamento
das copas provocado pelas novas folhas que vão brotando aos poucos acaba por
impedir a penetração da luz no chão. Com o sombreamento, o tapete de ervas que,
neste curto momento já brotou, floresceu, produziu frutos e sementes, perece.

Os solos predominantes são o podzol, caracterizados pela presença de


óxidos de ferro e de alumínio lixiviados e que se acumulam no horizonte B,
caracterizando o horizonte Bt (B textural), e o solo chernozem (negro), muito fértil
pela quantidade de matéria orgânica, o que o tornou excessivamente procurado
para a agricultura. Troppmair (2002, p. 59) enumera as suas qualidades:
concentração adequada de carbonatos de cálcio e de magnésio, camada de
húmus, que pode chegar a 80 cm, teores diferentes de carbonatos e horizontes
de matéria orgânica em diferentes estados de decomposição. Os solos pardos são
uma transição entre o podzol e os solos podzólicos vermelho-amarelos, de origem
cristalina e pobres em carbonatos. (TROPPMAIR, 2002, p. 59).

Floristicamente, a formação norte-americana é mais rica que a euroasiática,


por causa do clima, da topografia e dos solos. Essas propriedades originavam
vários tipos de clímax. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 251). Mas, na Eurásia, desde
a Idade Média e acentuando-se nos séculos XIX e XX, a fase final e mais madura
da sucessão vegetal não é mais encontrada. No seu lugar, predominam hoje
formações secundárias, terras ocupadas pela agricultura e cidades.

A distribuição da fauna e da flora no reino Holártico depende fortemente


do relevo. Cadeias montanhosas, que se estendem no sentido latitudinal, como
os Alpes e os Pirineus, na Europa, funcionaram como uma barreira para os
deslocamentos no sentido do sul, durante as glaciações, o que levou muitas
espécies à extinção. O Himalaia constitui uma barreira difícil de ser transposta
pela maioria das espécies de plantas e de animais. Outras cadeias atuam como
corredores de dispersão, como as Montanhas Rochosas e os Apalaches, na
América do Norte, e os Urais, na Sibéria, que se dispõem no sentido longitudinal
e facilitam, por isto, os deslocamentos no sentido dos meridianos.

O carvalho (Quercus spp), a faia (Fagus spp), a bétula (Betula spp), o


bordo (Acer spp), a tília (Tilia spp), o olmo (Ulmus spp), o fresno (Fraxinus spp),
o tulípero (Lidiondendron spp), a castanha (Castanea spp), dentre outros, são
árvores decíduas ou caducifólias de folhas largas, comuns na América do Norte,
no sudeste da Europa e na Ásia oriental (STRAHLER, 1984, p. 378). Na Nova
Zelândia, na Tasmânia, no sul do Chile e na Colúmbia Britânica aparecem outras
coníferas e espécies perenes de folhas largas.

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TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

A cobertura atual, na sua maior parte, é secundária, formada por arbustos


anões, principalmente Callunis vulgaris, da família Ericaceae. O sub-bosque
primário, em muitas regiões, era formado por espécies da charneca ou urze.
“Com o desmatamento, os arbustos da charneca expandiram-se nos terrenos
desocupados pela agricultura. Cerca de ¼ à metade da Escócia encontra-se
coberto pela charneca (Calluna vulgaris)”. (WALTER, 1986, p. 193). Na Escócia,
queima-se regularmente a charneca para a formação de pastos, onde se criam
ovelhas. Exceto nas florestas, as charnecas e urzes são vegetação de solos pobres,
ácidos, bem drenados e arenosos.

Na estação de crescimento, a primavera, inicia-se uma intensa atividade


orgânica no solo da floresta, com um exército de macro e micro-organismos, que
atacam a matéria orgânica – lesmas, besouros, aranhas, larvas, caracóis, minhocas
etc. O resultado é a espessa camada de húmus. Pássaros insetívoros têm comida
farta a partir da primavera. Na Europa, o chapim (Parus spp), e, na América do
Norte, o chickadee, comem indistintamente insetos e plantas. O pássaro abelheiro
(P. caeruleus), o chapim grande (P. major), a andorinha (Hirundo rustica), o
papa-moscas (Empidonax flaviventris) e muitos outros pássaros ocupam nichos
diferentes, de maneira que a competição entre eles é reduzida.

Herbívoros variados, como os veados, na América do Norte, o bisão, na


Europa, roedores, como os arganazes, ratos e esquilos, ocupam o segundo nível da
cadeia alimentar e são predados por uma grande quantidade de carnívoros, como
a coruja amarela (Strix aluco), na Eurásia, cuja dieta inclui arganazes e ratos, e na
sua falta, pequenos pássaros, peixes, sapos e insetos. O gavião (Accipiter nisus),
na Eurásia e África do Norte, o lobo (Canis lupus), hoje extinto na Europa, mas
ainda sobrevivendo a duras penas na América do Norte, são outros predadores
importantes. O guaxinim (Porcyou lotor), o urso negro (Ursus americanus), o
gambá (Mephitis mephitis) são onívoros. A rede alimentar é complexa e longa.
As relações das cadeias alimentares envolvem os ciclos minerais, a biomassa e a
produtividade da floresta e também transferência de elementos e nutrientes da
serapilheira para o solo pela lixiviação, a acumulação dos nutrientes no solo e a
retenção nos galhos e nas copas das árvores.

FONTE: Furley; Newey (1986, p.253)

Túneis cavados por pequenos roedores e pelas minhocas melhoram a


circulação da água e a aeração do solo. Estes animais revolvem o solo e incorporam
matéria orgânica. Numa floresta de carvalhos da Sibéria, em um hectare havia
3.350 entradas para os túneis de roedores, que perfaziam um comprimento total
de 7,9 km de subterrâneos (WALTER, 1986, p. 207).

Sapos, rãs, salamandras e tritões vivem nos alagadiços, nos rios e nos lagos.
As salamandras alimentam-se de minhocas, caracóis e artrópodos. De coloração
berrante, algumas espécies excretam uma toxina que bloqueia o sistema nervoso
e pode matar animais grandes. Por isso não são predadas, ocupando o topo da
cadeia alimentar (STORER et al., 1991, p. 639).

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UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Plantas ciófitas (adaptadas à sombra) e heliófitas (adaptadas ao sol)


travam uma violenta batalha pela luz, que sempre acaba com a morte de alguém.
As ciófitas, por aproveitarem melhor a pouca luz, formam um sub-bosque
muito denso, que impede o crescimento das heliófitas, que ficam com o porte de
arbustos. Quando uma clareira se abre na floresta e espécies heliófitas começam
a se regenerar, o dossel das ciófitas dificulta o seu crescimento, fazendo sombra
sobre elas e, então, a predominância será das ciófitas. Esse processo complexo e
altamente seletivo pode ser visto na floresta de araucária (Araucaria angustifolia),
no sul do Brasil. Na realidade, ele se dá em toda floresta muito fechada.

Quando as árvores da mata semidecídua temperada estão desfolhadas,


a quantidade de luz incidente sobre a superfície é total. A luminosidade do solo
varia com as estações. No final do inverno e início da primavera, quando as árvores
estão desfolhadas, a luz atinge o chão da mata, o que é capital para a vegetação
herbácea e arbustiva. Com o avanço da primavera, as copas das árvores vão se
adensando e a quantidade de luz reduz-se proporcionalmente. Walter (1986,
p. 201) acentua que as plantas geófitas (com brotos abaixo da superfície, como
os tubérculos), se beneficiam desse curto período – elas florescem, frutificam
e armazenam reservas nos bulbos e rizomas, preparando-se para o inverno
seguinte. Quando as copas se fecham, as geófitas entram em dormência.

A competição entre as raízes também é grande. As árvores têm uma


capacidade de sucção da água do solo e de absorver nutrientes, muito maior
que a dos arbustos e ervas (Walter, 1986: 206). Este é um fator limitante contra o
qual os arbustos e ervas se veem na contingência de lutar – as plantas menores
ficam com as sobras que as árvores não conseguem absorver. Entretanto, Walter
faz uma constatação importante: se as árvores forem cortadas, arbustos e ervas
desenvolver-se-ão com alguma rapidez, porque sobrará mais nutriente e água para
eles. Portanto, o fator limitante na floresta geralmente é a água e não a luz solar.

3.4 BIOMA DE ESTEPES, PRADARIAS OU CAMPOS


No reino Holártico, estepes e pradarias correspondem a uma zona de
transição entre a floresta decídua e a savana e o deserto. A vegetação constitui-
se de gramíneas e ervas perenes. As árvores são muito raras, como também o
são os arbustos, e só podem ser vistas em pequenos capões nas depressões ou
em vales úmidos. Para buscar água no profundo lençol aquífero, as gramíneas
desenvolveram raízes longas. A paisagem da estepe e da pradaria é um mar
contínuo de ervas, que se perde no horizonte.

Walter (1986, p. 233) “divide este bioma em duas zonas principais,


determinadas pela denominação: as estepes euroasiáticas, que se estendem no
sentido leste-oeste, e as pradarias norte-americanas, no sentido norte-sul”.

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TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Strahler e Strahler (1996, p. 563) demarcam as regiões de coberturas


herbáceas em duas formações: as pradarias, que têm gramíneas altas, chuvas
mais abundantes, quando aparecem sob o clima continental úmido, e as estepes,
formadas por gramíneas baixas e pouco exigentes em água e nutrientes, com menor
índice pluviométrico. Entre elas há uma zona de transição com gramíneas mistas.

Strahler e Strahler (235) classificam o clima das estepes e pradarias como


seco das latitudes médias, situado nas sombras de chuva das grandes montanhas.
“As chuvas concentram-se no verão, em geral convectivas, e variam entre 600 e
800 mm/ano”. (TROPPMAIR, 2002, p. 92). “As temperaturas sempre acima de 25º
C no verão, e descem a índices negativos no inverno” (STRAHLER,1986, p. 294).
No verão, os tornados são comuns. No inverno, os ventos podem ultrapassar 10
quilômetros/hora.

Os solos predominantes nas estepes e pradarias são os chernozem,


considerados os mais férteis do mundo devido à considerável camada de húmus
devido à incorporação de grande quantidade de biomassa resultante da renovação
anual das folhas de gramíneas e outras ervas. Três horizontes constituem esses solos:
o horizonte A, superficial, de cor negra pela matéria orgânica ou marrom-escura,
com estrutura granular, abriga vermes, insetos e outros animais da fauna edáfica;
abaixo deste horizonte alinha-se o horizonte A2, de cor clara, muitas vezes com
intensa comunidade de roedores, que cavam túneis; finalmente, o horizonte B de
acumulação, para o qual convergem carbonatos de cálcio (FURLEY; NEWEY, 1986,
p. 255; WALTER, 1986, p. 228). O podzol aparece nas áreas mais úmidas e lixiviadas.

O degelo e as chuvas de primavera e verão suprem o lençol freático nas


zonas do clima continental úmido. O calor do verão faz a água do solo ascender
por capilaridade e conduz para cima compostos calcários, que concentram os
nutrientes ao nível das raízes (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 255). Nas áreas com
menor índice pluviométrico, a água dos poros superficiais evapora no alto verão,
originando um déficit hídrico.
FONTE: Furley; Newey (1986, p. 255)

A decomposição orgânica é lenta, porque o calor excessivo do verão e


o frio do inverno reduzem os micro-organismos. Como a lixiviação também é
reduzida nos meses de inverno, a perda de compostos orgânicos é insignificante.
Forma-se um horizonte rico em matéria orgânica e carbonatos, povoado por
minhocas, roedores e insetos, fertilíssimo, intensamente usado na agricultura.

Predominam as gramíneas e as árvores aparecem em geral nas depressões


úmidas, onde formam capões. O pisoteio de animais pastadores (bisões) e de
animais domésticos, as queimadas feitas por agricultores e os incêndios causados
por descargas elétricas nas tempestades de verão facilitam a expansão das
gramíneas, em detrimento das árvores (WALTER, 1986, p. 234). As gramíneas e
arbustos têm caules flexíveis e raízes profundas, com o que se protegem dos ventos
fortes. Andropogon gerardi e A. scoparius são as gramíneas mais comuns nos EUA.

199
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Com a chegada das chuvas de primavera e do degelo, a pradaria de ervas


altas americana é tomada por um infindável tapete de flores coloridas.

Onde as chuvas começam a se escassear, a pradaria caracteriza-se por


gramíneas baixas, denominada estepe propriamente dita. O tapete de ervas é
esparso e o solo nu, muitas vezes, é visível, mas árvores e arbustos, sempre de
pequeno porte, podem aparecer onde haja concentração maior de umidade.

A fauna, originalmente muito rica, praticamente não existe mais, por causa
das atividades humanas, em que se inclui caça predatória desmedida realizada
nos séculos XIX e XX. Reservas biológicas foram criadas na América do Norte e
Eurásia com o fim de proteger o que restou da fauna e da flora.

Dentre as espécies que mantêm estreitas relações com as pradarias na


América do Norte, o bisão (Bison bison) e o cão-da-pradaria (Citellus spp), que não
é um canídeo, mas um roedor, ajudam, com o seu pastoreio, na manutenção da
vegetação. O bisão (que não deve ser confundido com o búfalo) formava imensas
manadas e movia-se das pradarias, na primavera e no verão, para as florestas,
no inverno, à procura de abrigo e comida. Os índios das planícies – Apaches,
Comanches, Navajos etc. – tinham nos bisões a sua principal fonte de energia.
As manadas foram quase exterminadas, sobretudo por caçadores brancos. O
mais famoso deles, William Cody, conhecido com Buffalo Bill, vendia a sua carne
para os trabalhadores das ferrovias, que começavam a se alastrar pelo centro-
oeste americano. No fim do século XIX, leis protetoras preservaram os bisões
remanescentes e as manadas voltaram a crescer.

O cão-da-pradaria cava extensos túneis e a sua população chega a milhões


de indivíduos, que se protegem do frio e de predadores nos labirintos, que são
divididos em territórios. O cão-da-pradaria alimenta-se das gramíneas e impede
que as pradarias sejam invadidas por árvores e arbustos. Situado no segundo nível
da cadeia trófica, o cão-da-pradaria sustenta um enorme número de predadores,
como gaviões, corujas, águias, cascavéis, raposas, coiotes e lobos. Os agricultores,
desde o século XIX, empreenderam uma intensa caça ao cão-da-pradaria, porque,
com a chegada de novas fontes de energia, as populações invadiram as fazendas e
plantações. Na impossibilidade de matar a tiros, os fazendeiros jogavam veneno
nas tocas. Quase exterminada, a população de cães-da-pradaria sobrevive hoje
em diminutas manchas das pradarias, mas continuam mantendo a sua função de
preservá-las (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 259).

O uso intensivo e mal planejado do solo nas pradarias foi a origem de muitos
desastres ambientais, como na estepe siberiana e, sobretudo, na destruição de
milhares de hectares de terras no centro-oeste americano na década de 30, quando
a região ficou conhecida como Dust Bowl (Bacia da Poeira). John Steinbeck, em
1930, escreveu um soberbo relato, As Vinhas da Ira, sobre as vicissitudes enfrentadas
pela população sem terras durante a escassez de trabalho, agravadas ainda mais
pela depressão econômica. A Dust Bowl é uma vasta região no centro dos EUA,
intensamente arada pelos fazendeiros, numa época de grandes chuvas, durante a

200
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

década de 1920, o que lhes rendeu ótimas safras de trigo. No entanto, a década de
1930 começou com um período de seca, que se alastrou por todo o centro-oeste. Os
fazendeiros continuaram arando e plantando. As colheitas foram enfraquecendo
até chegar a zero. Removido pela aração, o solo arenoso era varrido por ventos que
alcançavam 100 quilômetros/hora. Gigantescas nuvens de poeira cobriam tudo e
chegavam a soterrar as fazendas. Empobrecida, a população emigrou, formando
nas estradas, conforme narra Steinbeck, intermináveis filas de calhambeques, que
transportavam a mudança, ao lado de milhares de pessoas que levavam às costas
os seus bens, esfomeadas, doentes, sem esperança. “O aumento da aridez atraiu
plantas típicas dos desertos, que invadiram a região, como os cactos e a acácia”
(Prosopis spp) (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 260). “Em 1934, um único tornado
transportou 300 milhões de toneladas de solo”. (HARE, 1995, p. 73).

3.5 BIOMA DE DESERTOS E SEMIDESERTOS


A principal característica das regiões áridas de latitudes médias
subtropicais é que a evapotranspiração potencial é maior que a precipitação anual.
Uma segunda característica, que resulta da anterior, é que o fator limitante nos
desertos é a falta de água na superfície: a precipitação é inferior 250 mm/ano. A
escassez de água superficial tem como resposta uma vegetação de baixo porte e as
adaptações que animais e plantas desenvolveram para viver num ambiente seco.
Os desertos não são uma região destituída de vida. Na verdade, eles possuem
fauna e flora bastante diversificadas. Uma terceira característica é que os desertos
têm chuvas irregulares, umidade muito baixa e intensa insolação.

“Os desertos aparecem em diferentes geossistemas, cujas variáveis físicas são


responsáveis pela sua origem. Neste caso, as condições climáticas e topográficas locais
têm um peso importante. Existem quatro tipos principais”. (FURLEY; NEWEY,1986,
p. 310; SIMMONS, 1982, p. 119):

- desertos subtropicais, influenciados pelas células de alta pressão, como o Saara;


- desertos costeiros frios, com baixa precipitação devido a massas de ar que
passam por correntes frias e que também recebem influência das células de
alta pressão. Estão neste caso os desertos da Namíbia, no sudoeste da África,
de Atacama, nos Andes peruano-chilenos e da Baixa Califórnia, no México;
- desertos de sombras de chuva. São também desertos frios, muito secos, que se
localizam a sotavento de grandes massas montanhosas, como Gobi, ao norte do
Himalaia, a Grande Bacia, no sudoeste dos EUA, e Chihuahua, no norte do México,
a sotavento das serras Nevada, San Gabriel e Madre Ocidental, no México;
- desertos continentais, afastados da influência marítima e com extremos de
temperatura e chuvas. É o caso do deserto de Gobi e os desertos no interior da
Califórnia (como o Vale da Morte) e do México.

201
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Normalmente, os desertos verdadeiros são circundados por uma faixa de


transição semiárida, chamada de semideserto, considerado por alguns autores como
um bioma. Os semidesertos aparecem nas zonas tropicais e nas latitudes médias. No
reino Paleotropical, os semidesertos aparecem na parte meridional do Saara, na zona
do Sahel, contornam a Etiópia, avançam para leste, sempre seguindo a fímbria do
deserto, e infletem para sudoeste e para o interior do Quênia, quando o litoral toma a
direção sudoeste-nordeste, no chamado Chifre da África.

Existem muitos tipos diferentes de desertos, cujas características atendem às


condições físicas do solo e do relevo locais. Walter (1986, p. 117) relaciona seis tipos de
desertos. As designações foram tiradas dos dialetos dos povos do deserto do Saara.
Nesta lista estão não só os desertos das latitudes médias, mas, também, os desertos
tropicais. Foram mantidos juntos, independentemente da sua localização, para tornar
mais fácil a comparação de um tipo com o outro.

Deserto rochoso ou hamada – Aparece nos topos e escarpas de


planaltos onde o vento removeu a areia e expôs a rocha subjacente, que forma
uma superfície com blocos de rochas espalhados por uma extensão variável.
Óxidos de manganês e de ferro dão às rochas uma cor escura, conhecida como
verniz do deserto. Depósitos de sal sob as rochas impedem o crescimento da
vegetação. Apenas espécies xero-halófitas resistem às adversidades ambientais
da hamada e colonizam as fendas das rochas.

Desertos de cascalho (reg ou serir) – A rocha-mãe, do tipo


conglomerado, libera blocos de pedregulhos, que se espalham pela superfície,
formando uma paisagem de relevo ondulado, com vertentes pedregosas
longas e vales pouco profundos, nos quais se acumula a areia levada pelo
vento. Nessas depressões a umidade é maior, o que favorece o aparecimento
de plantas, principalmente halófitas. “A hamada e o reg compõem a maior parte
dos desertos: o Saara tem 1,8 milhão de km2 de areias e 7,3 milhões de km2 de
rochas nuas (LEINZ; AMARAL, 1972, p. 169).

Deserto arenoso (erg ou areg) – São formações arenosas, de cor


avermelhada, devido ao óxido de ferro, existentes nas áreas de bacias, nas quais
a areia, transportada pelo vento, se deposita. Quando o vento apresenta uma
direção predominante, formam-se dunas do tipo barcana. Os erg ocupam uma
área pouco extensa. No Saara, os erg ocupam apenas 30% de sua superfície.
As dunas são boas armazenadoras de água, que infiltra até o lençol, que é
formado de água doce. As dunas móveis não têm vegetação sobre elas e se
movimentam ao sabor dos ventos. As fixas são colonizadas por gramíneas do
gênero Ziziphus spp, que, juntamente com alguns arbustos, seguram a areia e
originam pequenas dunas, chamadas de nebka.

202
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Vales secos (wadi ou oued) – Em períodos mais úmidos do Pleistoceno


formaram-se rios estreitos, que secaram e deram origem a uma rede de vales
pelos quais escoa a água das chuvas muito fortes. Nos vales mais largos a
vegetação não cresce, porque as enchentes eventuais são muito fortes e
arrancam as plantas do solo, levando-as para jusante. Mas nas margens cresce
uma cobertura vegetal, halofítica ou não. O tamarindo (Tamarix spp), uma
halófita, encontra, aí, boas condições de crescimento. Nos locais em que se dá
alguma lixiviação nas chuvas, o sal é removido ou reduzido a um mínimo, e
espécies não halófitas, como Retama spp e Caligonum spp, podem crescer. Rios
subterrâneos não são raros nas regiões cársticas e, então, há umidade bastante
para o crescimento de densos bosques de espécies não halófitas.

Depressões (playas, sebka ou schott) – Nessas depressões depositam-se


grandes quantidades de argila e silte, podendo haver também concentração de
sais. Quando há um rio subterrâneo, a água acumulada na superfície não será
salobra. O solo é argiloso e muito seco, porque a água das enchentes forma grandes
poças, que evaporam rapidamente, deixando um hábitat pouco adequado para
as plantas. A água penetra apenas nas camadas superficiais do solo e quando a
poça evapora, a água de infiltração ascende por capilaridade e evapora, formando
espessas camadas de sal (sebka ou schott). As depressões são bordejadas por
pequenos arbustos não halofíticos, porque, nas margens, o teor de sal é menor.
As plantas atuam como fixadoras da areia e, em sua volta, formam-se pequenos
montes de areia, os nebka, que originam uma paisagem típica.

Oásis – São áreas em que a água doce do lençol aflora em quantidade


suficiente para permitir uma densa vegetação, muitas vezes, de espécies
hidrófitas. Normalmente, são circundadas por depressões que contêm grandes
concentrações de sal, para as quais o excesso de água escoa, torna-se salobra
e evapora, aumentando, pois, a quantidade de sal na superfície que rodeia os
oásis. São os lugares mais densamente povoados dos desertos, unicamente
porque têm água. Por isto, a vegetação primária tem diminuído e dado lugar
para plantas cultivadas.

FONTE: (WALTER 1986, p. 117)

Furley e Newey (1986, p. 312) “classificam a vegetação dos desertos


tropicais em dois grupos: espécies que constituem uma resposta direta ao
ambiente e espécies que usam água captada em outras fontes, externas ao hábitat,
como as chuvas.

As plantas que dependem das chuvas são anuais e perenes. As anuais


têm raízes superficiais, que absorvem a água das primeiras chuvas, quando,
então, crescem rapidamente. As espécies perenes têm raízes profundas e dois
mecanismos lhes permitem usar a água disponível: estocando a água, como as
suculentas, ou usando-a economicamente, como fazem as xerófitas.

203
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As depressões (sebka), os vales secos (wadi) e os oásis são locais em que


as plantas podem germinar, porque a água subterrânea mantém a umidade
necessária. Nos oásis, devido à densidade de população humana, muitas espécies
endêmicas cederam espaço para variedades cultivadas, como as tâmaras (Phoenix
dactylifera) e outras frutíferas.

As adaptações das plantas contra os fatores limitantes nem sempre são de ordem
fisiológica. Entre elas, citam-se as seguintes: plantas esparsas reduzem a competição entre
si; produção de substâncias químicas para afastar herbívoros e impedir o crescimento
de outras espécies no hábitat, o que também reduz a competição; o creosoto (Larrea
spp) libera um odor característico, que espanta os pastadores; a espirradeira (Nerium
olander, que também aparece na floresta Atlântica) é venenosa; algumas substâncias
dão paladar estranho à planta, como o látex de algumas Euphorbiaceae, ou o tanino
e as resinas secretadas pelas folhas, pela casca da Cassia e outras espécies (FURLEY;
NEWEY, 1986, p. 315). “O gênero Euphorbia, o maior da família Euphorbiaceae, tem 2.300
espécies, das quais muitas são xerófilas, afilas (sem folhas), cactáceas, típicas das regiões
áridas da África”. (JOLY, 1991, p. 404).

A evolução da flora dos desertos holárticos e paleotropicais remonta aos


continentes de Laurásia e Gondwana – por esta razão, ambas as floras diferem
muito. “No sul do Saara, no Sahel, aparecem gramíneas como Aristida, Eragrostis e
Paniwia, e arbustos dos gêneros Acacia, Commiphora, Maerua e Grewia”. (WALTER,
1986, p. 130). Na África do Sul, o deserto de Karroo tem muitas suculentas, como
Euphorbia, Portulacaria e Cotyledon, e arbustos anões da família Compositae. Dentre
as lenhosas, Acacia, Rhus, Euclea, Olea e Diospyro colonizaram o fundo de vales
áridos, locais em que a umidade se concentra.

A zona de transição entre os reinos Paleotropical e Holártico é uma região


montanhosa no centro do Saara (as montanhas Tibetsi têm 3.415 metros). “É uma
das regiões mais secas do planeta”. (WALTER, 1986, p. 143). No sudoeste da África,
o anticiclone subtropical do Atlântico Sul, somando-se à água fria da corrente de
Benguela (12º a 16º C), origina o deserto da Namíbia. A camada inferior da massa
é úmida e forma densos nevoeiros no litoral, que são a marca da região. “O vento
de oeste empurra a neblina para o interior do deserto e, durante mais de 200 dias
por ano, uma pesada neblina acompanhada de temperaturas baixas paira sobre o
deserto”. (WALTER, 1986, p. 143).

O uso da terra nas regiões vizinhas aos desertos tem trazido inúmeros
problemas ambientais. Na África, as populações saarianas praticaram, ao longo
dos séculos, agricultura e pecuária primitivos, cujos reflexos transformaram-
se, hoje, em processos de desertificação. Uma das regiões mais atingidas pelo
avanço do deserto é o Sahel. A pecuária pode estar na base da desertificação desta
porção do Saara. O uso intensivo do pastoreio pelas populações nômades levou
à destruição da vegetação, que era de savanas. As grandes secas das décadas de
1970 e 1980 aceleraram o processo de desertificação. Problemas político-tribais e
a agricultura ao sul impediam a criação de gado nas suas áreas. “Desprovido de
vegetação, o albedo do solo aumentou e a temperatura aumentou, promovendo o
processo de desertificação”. (HARE, 1995, p. 120).

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TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

“Os solos mais comuns nos desertos são regossolos, rendzinas e vertissolos,
além das dunas” (TROPPMAIR, 2002, p. 89), é solo mais rocha fragmentada
na fração areia. Os regossolos são pouco desenvolvidos, possuem excesso de
areia, são pobres em bases, muito drenados devido à areia, ácidos, têm perfil
pouco desenvolvido e são muito susceptíveis à erosão. “Os vertissolos são solos
com elevado teor de argila” (VIEIRA, 1975, p. 362). Os solos do tipo rendzinas
são típicos de pradarias, provenientes da decomposição de rochas calcárias.
(BUCKMAN; BRADY, 1976, p. 362).

Devido à forte insolação diária, na superfície os desertos podem ter


temperaturas acima de 60º C, enquanto a temperatura do ar não chega a 40º C. À
noite, a perda de calor pela superfície é considerável, porque a escassez de umidade
no ar facilita esta perda. Portanto, a amplitude térmica diária é muito grande em
ambientes desérticos, pode ser superior a 90º C. No inverno, durante a madrugada,
a temperatura, que era positiva durante o dia, pode cair para 40º C abaixo de zero.
As chuvas podem faltar por anos, mesmo por décadas e, quando caem, são, em
geral, muito violentas. A pouca umidade do ar não impede a formação de orvalho,
que é, muitas vezes, a única fonte de água para sustentar a vida.

“Nas regiões semiáridas, a quantidade de chuvas anuais varia entre 380


mm e 760 mm e vão reduzindo-se em direção às regiões áridas, que recebem entre
125 e 380 mm por ano”. (BUCKMAN; BRADY, 1976, p. 311).

A infiltração da água das chuvas na areia ou nos solos argilosos desérticos


é fundamental para as plantas e animais. A infiltração depende da quantidade de
chuva. Se chover pouco, a infiltração se dá apenas na camada superficial e logo
evapora. Nas chuvas fortes, a água dirige-se para o lençol subterrâneo, que pode se
localizar a mais de 100 metros de profundidade. (LEINZ & AMARAL, 1972, p. 165).

“Nos solos arenosos, a infiltração é facilitada pela quantidade de poros,


mas nos solos argilosos ela quase não se infiltra. Nos solos litólicos, os poros são
grandes e armazenam mais água” (WALTER, 1986, p. 115). “No semideserto do
Sudão, com pluviosidade entre 50 mm e 250 mm, Acacia tortilis cresce sobre um
solo arenoso, mas só aparece em solos argilosos quando os índices pluviométricos
são superiores a 400 mm” (WALTER, 1986, p. 116).

“O movimento capilar ascendente da água concentra na superfície compostos


salinos – carbonato de cálcio, CaCO3. Ao evaporar, deixa crostas muitas vezes com
espessura de um a quatro metros” (LEINZ; AMARAL, 1972, p. 165). Óxidos de ferro
e de manganês emprestam ao deserto uma cor avermelhada ou escura.

A abrasão da areia levada pelos ventos esculpe o relevo e pode originar


uma superfície pedregosa, quando material fino é levado pelas chuvas. Quando
a areia em movimento encontra um obstáculo, origina-se um sistema de dunas.
O material levado pelas águas das chuvas acumula-se em depressões e forma
camadas de sedimentos, que podem ter quantidades variadas de sais, como
sulfatos e carbonatos de sódio e potássio.

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UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As plantas desenvolveram um complexo mecanismo contra a perda de água


por transpiração. Mas essa perda varia muito com as espécies. “A Larrea divaricata
(creosoto), por exemplo, transpira quase toda a água das células e vive com o
mínimo necessário até a próxima chuva, que pode tardar anos” (SIMMONS, 1982,
p. 122). Nos desertos arenosos, as raízes são longas, às vezes com mais de 50 metros,
para buscar água no lençol subterrâneo. Plantas suculentas armazenam água nas
raízes, nos caules e nas folhas. O recobrimento de cera sobre as folhas, em muitas
espécies, reflete a luz e reduz a absorção do calor. Pelos sobre as folhas formam uma
micrométrica camada de ar, que dificulta a perda de água pela transpiração. Folhas
carnudas são boas armazenadoras de água, folhas pequenas têm poucos estômatos,
folhas enroladas protegem os estômatos da luz. Os cactos transformaram as folhas
em espinhos que fazem as trocas gasosas e protegem contra herbívoros predadores, o
caule verde e recoberto de cera é responsável pela fotossíntese e pelo armazenamento
de água. Algumas espécies param de crescer até que a água volte a ser suficiente.
Espécies anuais permanecem em forma de sementes, que só brotam na chuva
seguinte. Os mecanismos de proteção não se resumem a modificações fisiológicas e
morfológicas, apenas. A quantidade de água disponível regula a competição entre as
plantas e, portanto, a densidade entre elas. “Uma estiagem prolongada pode ser fatal
para certas populações vegetais”. (WALTER, 1986, p. 120).

Em desertos onde o índice de chuvas é inferior a 100 mm/ano, a umidade se


concentra em ravinas e depressões, porque a água escoa para eles. As plantas têm um
sistema radicular avantajado. “Portanto, a quantidade de água nos desertos secos
não é tão pequena como se pensa. Onde há plantas, há obrigatoriamente água”.
Segundo Walter (1986, p. 123), as plantas dos desertos podem ser agrupadas em três
categorias: xerófitas, suculentas e halófitas. “Ele define os xerófitos como plantas que
vivem com mínima quantidade de água e não a armazenam. Para Rizzini” (1976, p.
258), xerófito é uma planta que vive num hábitat seco e desenvolveu mecanismos
para resistir à seca. Se o solo mantém a água nas estações secas, como ocorre com o
cerrado brasileiro, as plantas não são xerófitos. Só serão xerófitos se o ambiente for
seco, como se dá nos solos argilosos dos desertos – que são secos.

Walter (1986) e Rizzini (1976) concordam que a maioria das plantas dos
desertos é mesófita e não xerófita. Há plantas que evitam a seca e as que resistem à
seca, com menor ou maior capacidade (WALTER, 1986). “O que distingue o xerófito
do mesófito é a capacidade que ele tem de utilizar a água, diz Rizzini” (1976, p. 262).

Os mesófitos só fecham os estômatos quando há o deficit de água, mas eles


continuam transpirando através da cutícula e, se a água não for reposta, podem
murchar e morrer. O xerófito não transpira pela cutícula e, desta forma, mantém
a água no seu interior. Portanto, ele tem maior capacidade de reduzir a perda de
água a um mínimo suportável, e é esta faculdade que distingue os xerófitos.

As suculentas armazenam água nas folhas, no caule e nos rizomas e


tubérculos subterrâneos. “As raízes das suculentas são, em geral, superficiais, e,
na primeira chuva, absorvem a água com muita eficiência” (RIZZINI, 1976, p.
263). Elas aparecem nos desertos e estepes, nas restingas, sobre as rochas, em

206
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

solos salinos, nos troncos e galhos de árvores, nas montanhas, nos polos etc. As
halófitas são suculentas e são típicas de ambientes salinos. Dependem mais do solo
do que do clima local. São, pois, de caráter edáfico. Plantas efêmeras germinam
quando há água e sobrevivem nas estiagens na forma de sementes ou frutos.

A vida nos desertos é particularmente difícil para os animais: a falta de


água e o calor excessivo são os fatores limitantes também para eles. Animais de pele
macia, úmida e porosa e sem pelos têm hábitos noturnos. Durante o dia, escondem-
se em tocas ou em afloramentos. A procura de comida se dá, às vezes, no início da
manhã ou no fim da noite. As adaptações fisiológicas nos animais foram criadas por
processos evolutivos relacionados à genética, pressionado pelo ambiente. Inúmeras
aves, insetos e roedores obtêm água apenas a partir do seu alimento. O asno selvagem
africano e o asiático (Equus asinus e E. hemmionus) bebem até a quarta parte do seu
peso em água. “O camelo pode beber 120 litros de água de uma só vez” (SIMMONS,
1982, p. 123). Grande parte dos animais tem hábitos exclusivamente noturnos,
porque são muito sensíveis ao calor e à desidratação. No momento em que o sol
nasce, retornam às tocas, em geral muito profundas. Lagartos, a maioria dos pássaros
e alguns mamíferos enfrentam o calor do dia, mas, quando à temperatura ultrapassa
os 50º C, eles procuram abrigo. A dormência e o enquistamento são defesas contra o
calor. A dormência é própria de animais grandes, mas os micro-organismos (ameba,
ciliados e outros protozoários) enquistam. Em ambos os processos, a respiração,
metabolismo e o crescimento reduzem-se a um mínimo e o indivíduo gasta pouca
energia. Alguns caramujos podem permanecer em dormência por mais de cinco anos.
“Nas chuvas torrenciais e rápidas, que formam pequenas poças d'água, o camarão
Triops eclode e tem um ciclo de vida de duas semanas, quando se reproduz e entra
em dormência, quando as poças secam. Novo ciclo de vida, só na próxima e incerta
chuva”. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 316).

O deserto australiano é um dos mais áridos do mundo – as chuvas são


inferiores a 250 mm/ano. O arbusto-do-sal (Atriplex vesicaria) e o arbusto-azul (Kochia
sedifolia) são as espécies dominantes. A. vesicaria, halófita, pode ser um subarbusto
ou erva e tem folhas suculentas e raízes superficiais. “Os indivíduos guardam uma
boa distância entre si, o que reduz a competição pela água” (WALTER, 1986, p. 133).
Nas regiões com dunas, os arbustos Acacia, Casuarina e Eremophila são dominantes.
Acacia aneura, conhecida como mulga na Austrália Central, forma árvores, em média,
com seis metros de altura e raízes que alcançam dois metros de profundidade. A
formação das flores e frutos só se dá após uma chuva forte. “Nos lugares mais secos
ela se distancia das vizinhas, mas quando há água suficiente no solo, forma densas
moitas” (1986 p. 134). A mulga adaptou-se plenamente às condições limitantes e
quando estas se tornam mais severas, ela interrompe ou reduz o seu crescimento a
um mínimo. A mulga desenvolveu adaptações para driblar a falta de água – ela tem
uma forma pontuda, que conduz a água das chuvas ao longo do tronco para a base
da árvore, de onde penetra no solo até as. Uma forma de sobrevivência no deserto.

Muitas espécies de pequenos herbívoros não bebem água, mas a retiram


do alimento. Outras têm hábitos noturnos e só saem para caçar à noite. Longas
patas, orelhas e caudas são mecanismos eficientes na perda de calor corporal. O

207
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

rato marsupial cego (Notoryctes typhlops) nada sob a areia como se estivesse na
água e raramente sai à superfície. Os gekos (Nephrurus spp) e os escorpiões são
noctívagos. Os ratos saltadores mantêm a toca úmida por meio da transpiração.
Bebem a urina dos filhotes e retiram água das fezes, espremendo-as entre as
patas. À noite, eles caçam insetos e se alimentam de brotos de plantas.

DICAS

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para conhecer mais sobre o desenvolvimento e adaptação das plantas, acesse o site: <
http://farrer.riv.csu.edu.au/ASGAP/APOL16/dec99-5.html - Australian plants on line>. Acesso
em: 13 jul. 2010.

3.6 VEGETAÇÃO MEDITERRÂNEA


Nas costas ocidentais dos continentes, nas latitudes de 30o e 45o, entre a
floresta temperada decídua e os desertos quentes, a vegetação de certas regiões é
dita mediterrânea não necessariamente por estar à margem do Mar Mediterrâneo,
mas porque guardam entre si uma similaridade acentuada quanto à topografia,
clima e elementos biogeográficos. São apenas cinco regiões em todo o mundo,
que apresentam características tão marcantes que constituem uma transição entre
aqueles dois biomas. Com um clima semiárido de verões quentes e secos e invernos
suaves e úmidos, as regiões mediterrâneas foram colonizadas pelo homem desde a
Antiguidade. As regiões mediterrâneas aparecem no litoral do Mar Mediterrâneo, na
Califórnia, no sul do Chile e nos extremos meridionais da África do Sul e da Austrália.

O clima é muito seco no verão, mas os invernos são relativamente frios,


com raras quedas de neve, e muito chuvosos. No verão, o anticiclone subtropical
traz um aumento da temperatura, porque é atraído pelas baixas pressões polares.
Ao passar sobre regiões desérticas e subdesérticas continentais, no seu trajeto
para os polos, perde a pouca umidade e torna-se massa tropical continental seca
e quente. As temperaturas no verão podem ser altas e não é raro chegar aos 40º C,
em verões particularmente quentes, na Europa. Mas a média anual fica por volta
dos 20º C. As altas temperaturas e a secura do ar no verão são causas de incêndios
espontâneos na floresta mediterrânea.

No inverno, ciclones subtropicais, formados no encontro das massas


subtropicais marítimas com as massas polares, invadem as costas ocidentais e
a região mediterrânea europeia, com muita chuva e queda da temperatura. As
chuvas, em média, variam entre 300 mm e 500 mm no inverno.

208
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

“As folhas são coriáceas (grossas), têm pelos e poucos estômatos. Estão
preparadas para suportar meses secos reduzindo a transpiração ao mínimo, ou
fechando os estômatos (almécega, Pistacia lentiscus) ou adotando a microfilia
(junco bravo, Adenostoma fasciculatum)”. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 265).

Algumas plantas têm raízes superficiais e outras profundas, como a


amendoeira (Prunus amygdallus). Alguns vegetais são terófitos (a maior parte do ano
em forma de sementes), outros são geófitos (com raízes e brotos abaixo da superfície
– ex. tubérculos), entram em dormência no verão e florescem apenas no inverno.
Animais e insetos herbívoros atacam as plantas, que sobrevivem no verão, obrigando-
as a criar mecanismos de defesa, como folhas duras e espinhos. “O junco bravo exala
substâncias odoríferas, que espantam seus predadores”.(HARE, 1995, p. 122).

Não obstante a escassez de água, a flora e a fauna mediterrâneas são


consideráveis.

No litoral mediterrâneo, florestas de carvalho (Quercus spp) predominavam


na paisagem, com destaque para o Q. ilex, árvore perenefólia, clímax nas terras
baixas, hoje reduzido a manchas e substituído no litoral pelo sombreiro (Q.
suber), de maior valor econômico. A oliveira (Olea europaea), também importante
atividade econômica, substituiu os carvalhos em quase todo o Mediterrâneo.
“Nas montanhas pode-se ver carvalhos decíduos, faias e as florestas de coníferas,
de abetos e pinheiros”. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 266).

A vegetação é esclerófila e xerófita e tem porte médio e baixo, com árvores


pouco desenvolvidas e arbustos espinhosos, principalmente onde o solo serviu de
pasto para o gado doméstico. O aspecto da vegetação é muito parecido em todos
aqueles lugares, mas recebe nome específico e com certas diferenças: mallee na
Austrália, chaparral na Califórnia, fynbos (ou fynbosch) na África do Sul, matorral no
Chile (HARE, 1995, p.122), maquis ou macchia no Mediterrâneo e garrigue, no sul
da França. Estes nomes designam arbustos esclerófilos com um metro de altura,
e batha refere-se a arbustos anões, com menos de 0,5 metro de altura. O maquis
ou macchia é um matagal denso e impenetrável, com arbustos de mais de dois
metros de altura, espalha-se, favorecido pelos desmatamentos. Quando o maquis
é substituído por pastos ou é destruído por incêndios ou por cortes, o garrigue o
substitui. O garrigue é uma vegetação de ervas e arbustos duros, acostumada a
solos estéreis e com pouca água, que forma touceiras espalhadas, deixando o solo
praticamente descoberto entre eles. As fortes chuvas de inverno atacam o solo
desnudo e aceleram a erosão e retiram do solo os penúltimos elementos nutrientes,
o que favorece a chegada do batha, arbustos esparsos, muito resistentes, um estágio
que antecede a invasão de plantas do deserto, onde, outrora, havia uma floresta
de carvalho. O maquis resulta das atividades milenares dos povos europeus. Ele
forma a primeira etapa da sucessão ecológica e, caso evoluísse normalmente, sem
interferência do homem, regenerar-se-ia num bosque de folhas perenes. O pastoreio
com cabras e ovelhas, por séculos sucessivos, mudou a organização espacial da
vegetação do Mediterrâneo. As ovelhas alimentam-se apenas dos brotos macios
dos arbustos anões, mas as cabras são extremamente vorazes e comem plantas de

209
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

textura grossa e até espinhos. Ágeis, sobem em árvores e se equilibram na beira de


barrancos altos, com grande indiferença ao perigo, para comer as folhas, onde quer
que elas existam. Um rebanho de cabras faz um estrago considerável no maqui e,
em poucos meses, ele se transforma num garrigue.

No verão, a vegetação ressecada pelo calor e pela escassez de água é um


excelente combustível para o alastramento do fogo. O fogo faz parte da ecologia
da vegetação Mediterrânea, como também de outros biomas como da Taiga,
da Floresta Mista, da Savana e do Campo. Em todos, o fogo seleciona espécies
chamadas tipos do fogo, ao impedir, por exemplo, a expansão de árvores e arbustos,
que, ao se propagarem, fariam sombra sobre as pradarias. Favorece o rápido
desenvolvimento de espécies resistentes, como gramíneas de raízes extensas,
cujos brotos germinam quando as chuvas retornam e destrói substâncias químicas
tóxicas formadas por alguns arbustos, e, desta forma, libera nutrientes para o
solo. Quando vêm as chuvas do inverno seguinte, a rápida lixiviação faz infiltrar
os nutrientes, ajudando no crescimento de ervas e gramíneas, que se alastram
rapidamente, pois os solos são, em geral, ricos em bases. “Incêndios pequenos
causados naturalmente (por raios ou por superaquecimento de minerais como
quartzo), consomem o combustível constituído pela serapilheira e assim previnem
grandes incêndios naturais”. (RICKLEFS, 1996, p. 360).

No chaparral da Califórnia a paisagem é muito semelhante à europeia.


Existem duas formações: floresta de carvalhos e o chaparral propriamente dito,
uma formação de arbustos espinhosos. Entre os carvalhos, a dominância é das
fagáceas Quercus agrifolia e Q. lobata, com árvores espalhadas, formando bosques
abertos, que recobrem de 25% a 60% do solo, lado a lado com os arbustos do
chaparral. “A floresta de carvalho aparece em solos profundos com precipitações
entre 380 e 1.000 mm/ano”. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 267). Nas cadeias costeiras,
mais áridas e com solos pobres, o chaparral é a vegetação clímax. As espécies mais
comuns no chaparral são a lilás silvestre (Caenothus spp), um arbusto da família das
Oleáceas, a maçã (Arctostaphylos spp), o mogno de montanha (Cercocarpus spp), o
carvalho venenoso (Rhus diversiloba) (Strahler, 1986, p. 381). A artemísia (Artemísia
tridentata), comum no chaparral americano e mexicano, onde recebe o nome de
sagebrush, é um arbusto perene, que pode atingir mais de três metros de altura. Tem
dois sistemas de raízes – profundas, para a falta de chuvas, quando vai buscar água
no lençol - superficial, que usa nas chuvas. Nas grandes estiagens, perde as folhas e
libera sementes, que são espalhadas pelo vento. Pode também libertar-se das raízes
e é empurrada pelo vento, liberando sementes por onde passa, rolando sobre a
areia. Essa visão da artemísia levada pelo vento ficou popularizada nos filmes de
faroeste. Os índios do deserto queimam a artemísia para liberar um odor forte e
espantar insetos e animais. Também é fervida e usada contra urticária. O sagebrush é
alimento de muitos animais, tais como o gado doméstico, ovelhas, cavalos, cabritos
monteses, alces, veados, pássaros terrestres e aquáticos.

210
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

3.7 BIOMA DE SAVANAS


As savanas são tipicamente tropicais – elas aparecem entre a floresta
equatorial e os desertos e estepes das latitudes médias. A paisagem é uma
cobertura de árvores, gramíneas e arbustos espaçados. Constitui-se por um
balanço entre ervas, arbustos e árvores, podendo caracterizar-se como mais
herbácea ou mais arbustiva-arbórea. “As savanas variam muito de um lugar para
outro, o que vai depender das condições do hábitat, mas, de um modo geral,
estrutural e funcionalmente, elas se assemelham”. (COLE, 1987, p. 334-356).

Walter (1986, p. 76) define a savana como uma "[...] comunidade vegetal
homogênea, do ponto de vista ecológico, caracterizada pela presença de vegetais
lenhosos esparsos, em meio a prados relativamente secos". É bom frisar que o
termo seco não se aplica ao cerrado brasileiro.

Müller (1979, p. 108) e Troppmair (2002, p. 80) relacionam três tipos de


savanas, segundo as condições climáticas: savana úmida, com três a quatro meses
de estiagem; savana árida, com 6-7 meses sem chuvas; savana espinhosa, com
8-9 meses sem chuvas. O cerrado brasileiro inclui-se no primeiro tipo e a caatinga
neste último tipo de savana.

O clima das savanas tem dois períodos bem marcados – chuvas de verão e
estiagem no inverno. No reino Paleotropical, a savana aparece nos dois hemisférios.
Portanto, tem dois regimes de chuvas – no verão do Hemisfério Norte (junho, julho
e agosto/setembro), com as chuvas concentradas em agosto (360 mm); o inverno
(dezembro, janeiro e fevereiro/março) é seco. A estação das chuvas começa em
março e avoluma-se na direção do meio do ano. No Hemisfério Sul o verão é
chuvoso – dezembro, janeiro e fevereiro/março – e o inverno é seco – junho, julho e
agosto/setembro. O período das chuvas inicia-se em setembro/outubro.

No inverno predominam massas tropicais continentais secas trazidas pelo


anticiclone marítimo, e, por isto, sempre estável. Cerca de meados do outono
seguinte, a pressão principia a cair, devido ao aquecimento do hemisfério, e
massas tropicais e equatoriais começam a se movimentar na direção dos trópicos,
trazendo chuvas de convecção abundantes. A massa tropical marítima é a mesma
que atua no inverno, mas agora, com uma diferença – como o hemisfério está
aquecido, ela forma chuvas de convecção, típicas do verão, que caem no final da
tarde. Simultaneamente, as temperaturas também sobem.

As savanas são um ecossistema extremamente sensível. Para se manter,


precisam de uma complexa rede de interações de animais, plantas e variáveis
físicas – dentre estas, a água, os nutrientes do solo e o fogo são fundamentais para
a fisionomia, para a flora e, sobretudo, para a distribuição espacial da vegetação
e da fauna. (COLE, 1987).

211
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Na estação chuvosa, a lixiviação é elevada e, por isto, há deficiência de


cálcio, magnésio, fósforo, potássio e sódio no solo. Contudo, altos teores de ferro e
alumínio permanecem nos solos. A laterização é comum nas savanas e tem papel
destacado na fisionomia da paisagem e na estrutura (WALTER, 1986, p. 84).

A distribuição e a fisionomia das savanas se devem, sobretudo, às


condições do solo e à geomorfologia, em detrimento do clima. No Brasil, aparecem
no Planalto Central, onde as superfícies de aplainamento se preservaram e
os solos têm uma uniformidade geral. Na África, os solos são mais variados,
porque têm origens diversas, o que reflete na sua distribuição. (COLE, 1987). De
um modo geral, a fisionomia da savana africana é muito homogênea.

A competição entre as plantas é intensa. Walter (1986, p. 79) agrupa


as plantas das savanas em duas categorias: espécies herbáceas, com raízes
desenvolvidas e ramificadas, e espécies lenhosas, com raízes grossas horizontais
e verticais. As plantas estão em permanente competição entre si: “[...] são dois
tipos vegetais antagônicos; via de regra, um exclui o outro” As gramíneas são
grandes consumidoras de água, porque a sua transpiração é intensa, enquanto
as lenhosas sabem preservá-la, por exemplo, perdendo as folhas na estação
seca. Na estiagem, as gramíneas tendem a consumir toda a água do lençol e as
lenhosas não conseguem sobreviver – nesse local, a savana será exclusivamente
de gramíneas. Só haverá água para as lenhosas se as chuvas forem superiores
a 300 mm/ano. Nesse caso, a savana terá arbustos lado a lado com gramíneas,
sempre em competição. Para as árvores, a precipitação tem que ser superior
a 400 mm/ano. A cobertura de árvores mantém o sombreamento e impede o
crescimento das gramíneas – é o único caso em que as árvores prevalecem em
relação às ervas .

FONTE: WALTER (1986, p. 82)

A fisionomia das savanas é típica e inconfundível – árvores espaçadas,


raramente ultrapassando os 15 metros de altura, troncos de cascas grossas, com
poucos galhos e ramos, sempre tortuosos, em geral micrófilas, raramente xerófitas.
Essa paisagem é comum nas savanas africanas e no cerrado brasileiro. “Em
algumas ocasiões pode predominar uma espécie única, como o baobá (Adansonia
digitata), que se estende do Senegal até a Tanzânia, ou as palmeiras (Borassus spp),
no Sudão e na Costa do Marfim” (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 296). O baobá é uma
árvore mítica para o nativo africano. O tronco chega a ter 20 metros de diâmetro
e pode armazenar até 120.000 litros de água. (MÜLLER, 1986, p. 78).

Furley e Newey (1986, p. 296) classificaram a savana africana em três


zonas principais: a zona da Guiné, mais úmida, com árvores entre 15 e 20 metros,
e que, segundo eles, pode representar os restos de antigas floresta tropicais; a
zona do Sudão, formada por uma associação de espécies lenhosas (Acacia sp) com

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TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

palmeiras (Hyphaene sp) e gramíneas de um a 1,5 metro de altura; finalmente, a


zona do Sahel, ao norte, mais seca, com árvores espaçadas de folhas espinhentas.
Walter (1986, p. 86), por seu lado, distinguiu quatro tipos de savanas
africanas, segundo a origem:

● savanas fósseis, formadas em épocas geológicas passadas (embora ele não


determine a época geológica);

● savanas climáticas, em regiões com precipitações inferiores a 500 mm/ano;

● savanas edáficas, reguladas pelas condições dos solos:

a – solos que contenham camadas impermeáveis, como lateritas e argilas, que


influenciem o balanço hídrico local;
b – solos pobres em nutrientes;
c – solos encharcados, em que palmeiras são comuns – no cerrado brasileiro este
tipo é denominado de vereda;

savanas secundárias, cuja existência deve-se ao fogo, à pastagem pelos


grandes herbívoros e ao homem.

Os grandes herbívoros são um fator importante na expansão das savanas,


e Walter faz considerações interessantes: “O elefante é um inimigo especial das
florestas, arrancando árvores ou descascando os seus troncos. As trilhas dos elefantes
rarefazem a mata, abrindo caminho por onde os incêndios dos capinzais penetram
na floresta. Um só elefante destrói em média quatro árvores por dia”. Os elefantes
são grandes apreciadores da casca das acácias, que derrubam e as arrancam com as
presas. Nas reservas, onde os elefantes são protegidos dos caçadores, o pisoteio feito
pelas manadas, que usam sempre o mesmo trajeto, acelera a erosão em sulcos. Walter
(apud, p. 86) também atribui aos hipopótamos a erosão nas margens dos rios.

A água, o solo e o fogo são elementos que influenciam a estrutura e a


fisionomia das savanas. Cole (1987) considera o fogo tão importante quanto a água
e os nutrientes, mas para Furley; Newey (1986, p. 297), “as labaredas reduzem a
quantidade de matéria orgânica, afetam o microclima e a fauna”. Supunha-se que
queimadas praticadas por povos antigos eram responsáveis não só pela origem
como pela fisionomina da savana, porque raízes jovens e brotos apicais eram
destruídos pelo calor.

Rawitscher, Ferri e Rachid (1943, apud FERRI, 1973; TROPPMAIR, 2002, p.


82), ARENS (1958 e 1963) e GOODLAND (1979) mostraram que não falta água no
cerrado e que altas concentrações de alumínio em solos pobres em bases trocáveis
são os responsáveis pela forma retorcida das árvores.

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UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A savana africana é a mais rica em espécies animais. Na Austrália aparecem


os marsupiais e as aves, como os papagaios, e o emú (que não voa), equivalente ao
avestruz africano. Na América do Sul destacam-se o guará (Chrysocyon brachyurus,
chamado popularmente de lobo-guará, mas que não pertence ao gênero Canis),
o cervo dos pampas e do Pantanal e felinos, como a onça pintada, a parda ou
suçuarana, dentre outros.

As térmitas (cupins) revolvem e arejam o solo e, pois, melhoram


as condições de trocas entre ele e a vegetação e acabam por desenhar uma
paisagem típica, que Müller (1979, p. 111) e Walter (1986, p. 87) “chamam de
savana de termiteiros”. No cerrado brasileiro, os cupinzeiros são uma das marcas
características. Térmitas e formigas estão na base de muitas cadeias alimentares
na África – o aardvark e o pangolim, pássaros, cobras e lagartos têm nelas a sua
principal dieta. No Brasil, o tamanduá (Myrmecophaga spp) é grande apreciador
de formigas e cupins. Destacam-se no Brasil o tamanduá-bandeira (M. tridactyla)
e o tamanduá-mirim (M. tetradacctyla).

As térmitas e as formigas atacam a vegetação de duas maneiras (FURLEY;


NEWEY, 1986, p. 300): pelo consumo direto e decomposição da matéria orgânica
e ao modificar as propriedades do solo. Muitas espécies cortam as folhas das
árvores, como o gênero Atta, a saúva da savana sul-americana, o que prejudica
a fotossíntese. As saúvas são comuns no interior do Brasil. No século XIX, o
naturalista francês Saint-Hilaire (1779-1853), quando percorreu o Brasil, disse,
alarmado e, obviamente, exagerado, que "ou o Brasil acaba com a saúva ou a
saúva acaba com o Brasil". Saint-Hilaire não desconfiava que ao acabar com uma
praga, criam-se outras, às vezes muito piores. O Brasil não acabou com a saúva e
nem a recíproca aconteceu.

Os cupins edificam monturos, que alteram a paisagem e impedem o


seu uso pela agricultura ou por pastos. Eles podem movimentar mais
de 1.500 m3 de terra. Outras espécies cavam extensos túneis e galerias
subterrâneos e acumulam matéria orgânica com que alimentam as
larvas. Quando o fogo devasta a superfície da savana, as formigas
escapam ao calor refugiando-se nas galerias mais profundas. (FURLEY;
NEWEY, 1986, p. 298).

Os pássaros são variados na savana africana e têm grande habilidade de


se adaptar às condições sazonais, o que lhes permite ocupar nichos ecológicos
diferentes. Aves predatórias deste bioma são a águia, o falcão e o abutre, enquanto
outras não podem voar, como o avestruz. Aves migratórias viajam sazonalmente
entre os reinos Paleártico e Paleotropical – há, pelo menos, 135 espécies de aves
europeias na Nigéria. Os pássaros granívoros e frugívoros predominam e o seu
papel na dispersão da vegetação é fundamental. Os insetívoros têm uma relação
com os mamíferos e carnívoros muito próxima, porque alimentam-se de insetos
e larvas, que infernizam a sua vida. Geralmente essas aves acompanham os
deslocamentos dos animais.

214
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

O fogo extermina a fauna de pequeno porte que vive no solo, principalmente


os invertebrados, que têm menor capacidade de deslocamento. Quando
o fogo elimina a vegetação e expõe o solo nu, o microclima é totalmente
alterado, o que conduz a uma profunda alteração nos nichos ecológicos
e nas cadeias tróficas. A sucessão ecológica, que sobrevém ao fogo, logo
que as primeiras chuvas caem, repõe 60% da micro e macrofauna do solo.
(FURLEY; NEWEY, 1986, p. 300).

3.8 BIOMA DE FLORESTAS PLUVIAIS EQUATORIAIS


A floresta equatorial do reino Paleotropical aparece na bacia do Congo e
no sudeste asiático, onde atinge as maiores extensões. A região equatorial recebe
calor durante todo o ano, porque a obliquidade dos raios solares é zero, e, por isto,
a pressão atmosférica é baixa, o que origina a Zona de Convergência Intertropical,
CIT ou ZCIT. A baixa equatorial, como também é chamada a CIT, atrai massas
oceânicas e, no interior, produz massas equatoriais continentais, sempre úmidas
e quentes, que provocam chuvas fortes à sua passagem. No Sudeste Asiático são
comuns as chuvas de monções, sazonais: chuvas de verão e estiagens no inverno.

“A precipitação média nas florestas tropicais pluviais varia entre 2.000 e 3.000
mm/ano. Contudo, no sudoeste de Camarões ou nas montanhas de Khasi, na Índia,
as chuvas ultrapassam os 10.000 mm/ano”. (FURLEY; NEWEY 1986, p. 275). As
médias de temperatura ficam por volta dos 20º C e raramente são superiores a 30º C.

As árvores são sempre altas, de troncos lisos, sem galhos, que só aparecem
no topo para formar as copas, sempre largas. As raízes, normalmente, são
tabulares e servem para a sustentação da árvore e para absorver prontamente
os nutrientes provindos da reciclagem da matéria orgânica. As folhas são largas,
com uma nervura central bem definida, que ajuda no escoamento da água.

O ciclo de vida na floresta tropical é muito rápido e as árvores raramente


ultrapassam os 300 anos de idade. Na floresta temperada, o metabolismo é mais
lento e as árvores podem superar os 1.000 anos de idade, como as sequoias. Na
floresta tropical, uma clareira aberta pela queda de uma árvore é logo repovoada
por pequenas árvores, que antes eram impedidas de crescer por causa do
sombreamento feito pelas maiores e, por isto, tinham porte arbustivo. Com a luz
abundante, as árvores disparam para cima numa ferrenha luta pela luz. Em cinco
anos podem atingir 25 metros de altura, com meio metro de circunferência. Em
poucos anos, a floresta fecha a clareira.

A floresta tropical tem de quatro a cinco estratos de árvores – ou sinúsias. No


primeiro estrato estão as árvores emergentes, que formam um conjunto disperso,
com mais de 40 metros de altura. O segundo estrato é contínuo e as árvores têm
de 15 a 30-40 metros de altura. É ele que forma o dossel característico da floresta
tropical. No terceiro estrato estão as arvoretas, de hábitos ciófitos, dispersas no meio
da mata, atingindo entre cinco e 15 metros de altura. O quarto estrato é constituído
por arbustos, geralmente árvores pequenas, que não conseguem crescer devido à

215
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

competição pela luz e pela sombra feita pelas árvores maiores. O quinto estrato
é o herbáceo, e a sombra impede o seu desenvolvimento pleno – são ervas, fetos,
gramíneas e rebentos de árvores, que aparecem aonde alguma claridade chega até
a superfície do solo, e que ficam à espera da eventual abertura da clareira.

A distribuição da temperatura no sentido horizontal é muito uniforme.


Contudo, no sentido vertical a sua distribuição origina microclimas específicos e
complexos. As populações de animais e insetos que vivem nas árvores dependem
diretamente dos microclimas, porque a luz e a sombra fazem variar o teor de
umidade e a temperatura ao longo do dia e cria habitats especializados nos troncos.

“A distribuição da luz depende das copas. As emergentes recebem luz


diretamente e o vento varre as folhas livremente. Esses dois fatores aumentam
a transpiração da árvore, levando o primeiro estrato a experimentar um déficit
hídrico, como revelaram estudos na Costa do Marfim”. (CACHAN; DUVAL, 1963,
apud FURLEY; NEWEY, 1986, p.: 275; DAJOZ, 1973, p. 73). As folhas externas são
heliófitas e apresentam os mesmos mecanismos para a retenção de água vistos
nas regiões quentes e secas.

A luz diminui à medida que se desce para a superfície. Isto cria uma inversão
térmica: a temperatura era de 32º C na copa das emergentes e, no solo, caiu para 27º C,
na floresta do Banco, na Costa do Marfim (CACHAN; DUVAL, 1963, apud DAJOZ,
1973, p. 73). A umidade relativa passou de 30% nas copas para 80% na superfície.
A iluminação era de 100.000 luxes no topo e caiu para 100 luxes no solo. O vento
tinha uma velocidade de 7 m/min. no topo e desapareceu no solo. A temperatura
no solo variava entre 25º C e 27º C nos dias quentes e, como as trocas de nitrogênio
entre a planta e o solo se fazem melhor à temperatura de 25º C “[...] compreende-se
assim, a razão pela qual a floresta pode conservar-se em um solo pobre, que, quando
desembaraçado das árvores, só dará fracas colheitas”. (DAJOZ, 1973, p. 73).

Epífitas heliófitas das famílias Orchidaceae e Bromeliaceae crescem


profusamente nos galhos expostos ao sol, lado a lado com fetos, musgos, líquens
e hepáticas. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 275).

As copas reduzem a velocidade das gotas de chuva, que perdem a energia


à medida que descem em direção ao solo. No solo, o tapete de folhas mortas e em
decomposição reduz ainda mais o impacto da gota, o que torna a erosão pluvial
mínima na floresta. Mas nas clareiras, sem a proteção das copas, como o solo fica
exposto, a insolação e a erosão são maiores.

Em um hectar de mata pluvial equatorial pode-se contar de 40 a 100


espécies de árvores de inúmeras famílias. Na floresta temperada, sob outras
condições climáticas, há de cinco a 20 espécies de árvores em um hectare.

216
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

As raízes são, em geral, superficiais, penetrando muito pouco no solo, no


máximo até 2,5 metros de profundidade, contudo, mantendo uma média de 10
cm até 30 cm de profundidade. Algumas espécies de Bombaceae, Leguminoseae,
Sapotaceae e Meliaceae são dotadas de raízes escora, que podem chegar a nove
metros de altura. (FURLEY; NEWEY, 1986, p. 279) e se estender horizontalmente
por mais de cinco metros.

A floração e a frutificação se dão continuamente ao longo do ano (WALTER,


1986, p. 52), porque, como o clima é uniforme, não há uma estação própria para
crescimento das plantas, nem estação que o retarde. As folhas só caem devido à
sua idade e são logo substituídas por outras novas – não há espécies decíduas.
Quando houver, seguramente, é uma espécie sobrevivente de climas mais secos
do passado, que ainda se mantém. Isto pode ser visto na Floresta Ombrófila Densa
(Mata Atlântica) de Santa Catarina, Brasil, onde algumas espécies de árvores são
de uma época passada em que o clima era mais seco e frio e perdem as folhas no
inverno. (KLEIN, 1975).

A dispersão dos frutos é complexa e vai desde aquele que explode ao cair
no chão e espalha suas sementes, aos que podem flutuar, como as cabaças, e atingir
longas distâncias. A participação de animais e aves na dispersão é considerável. A
dispersão horizontal depende dos tipos de solo, do relevo, da presença ou escassez
de água no solo, das relações com animais, insetos e aves polinizadores, das
relações entre as plantas entre si em associações vegetais. Essas últimas organizam
os indivíduos segundo as características sociológicas e fisiológicas de cada um. As
clareiras interrompem bruscamente um contínuo e criam outros tipos de dinâmica.

O caráter importante da floresta pluvial é dado pelas lianas ou


trepadeiras e epífitas. As trepadeiras agarram-se aos troncos e galhos das árvores,
principalmente das emergentes, porque são heliófitas e buscam muita luz. Nas
árvores secundárias das clareiras elas travam verdadeiras batalhas pela luz.
As lianas possuem muitos artifícios para se agarrar às hospedeiras: espinhos,
gavinhas (órgãos de fixação), raízes adventícias, que se introduzem nas fendas
ou enlaçam os troncos, como fazem as Aráceas (Araceae).

As epífitas usam troncos, arbustos, galhos ou rochas para se fixar. Não


são parasitas, usam os hospedeiros apenas como suporte. São plantas de clima
úmido, escasseando nas matas de clima sazonal ou nas savanas. “A maior parte
das epífitas é heliófita, sobretudo as bromeliáceas” (RIZZINI, 1976, p. 280). A
água armazenada num reservatório é hábitat importante para uma infinidade
de insetos e animais, como larvas de insetos, planárias, caramujos, centopeias,
formigas, escorpiões, aranhas, rãs, lagartos e até pequenas cobras.

217
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Furley & Newey (1986, p. 281) “agrupam as epífitas em macroepífitas –


orquídeas, bromélias, cactos – e microepífitas – musgos, líquens e algas. Dentro
desses tipos, elas podem ser classificadas segundo três fatores: morfologia, relações
com a água e nutrição e posição ecológica na floresta” (1986, p. 281). Rizzini (1986,
p. 279) “as classifica pela estrutura: podem ser suculentas ou esclerófilas. Cain &
Oliveira Castro (1959, apud FURLEY; NEWEY, p. 281) dividem as epífitas em
quatro grupos: holoepífitas, hemiepífitas, pseudoepífitas e semiparasitas”.

As holoepífitas (holo-, gr. holos, exprime a ideia de totalidade) nunca se


ligam ao solo, como as Orchidaceae, Bromeliaceae e Piperaceae. A bromeliácea
Tillandsia (como T. usneoides), conhecida no Brasil como barba-de-velho ou barba-
de-bode (JOLY, 1991, p. 686), faz parte desse grupo.

As hemiepífitas (hemi-, gr., hemi, exprime a ideia de meio) começam como


epífitas verdadeiras, cuja semente, trazida por pássaros ou morcegos, germina
no galho de uma árvore, e mudam para lianas, parasitas, quando crescem e
atingem o solo, formando raízes aéreas, que se abastecem de água e de nutrientes,
permitindo que ela cresça, agora para cima, para formar um caule que se espessa
e envolve a hospedeira. A liana, então, abraça a árvore e a estrangula e acaba
por matá-la. À medida que cresce, ela vai, aos poucos, substituindo o tronco da
hospedeira, que impossibilitada de fazer correr livremente a seiva nos vasos, cede
o lugar para a liana, agora enorme e com uma copa vasta. O cipó tem gavinhas
que sugam a seiva da hospedeira. Em pouco tempo, a hospedeira deixa de existir
e é substituída pela liana, que se transforma numa árbore como a figueira (Ficus
spp). No interior do Brasil, esta liana é conhecida com figueira-mata-pau.

As pseudoepífitas germinam no solo e procuram uma planta hospedeira


para subir por ela, livrando-se, em seguida, das raízes do solo, tão logo se fixem
no tronco, onde, então, passam a viver como epífitas.

As semiparasitas se apoiam em árvores das quais retiram nutrientes,


mas possuem folhas e são clorofiladas, podendo fazer a fotossíntese. Os
haustórios (órgãos sugadores) da planta penetram na hospedeira até
os vasos lenhosos e retiram deles o material necessário para sintetizar
o seu alimento. Ao crescer, a planta se adere à hospedeira por meio de
órgãos viscosos e, então, introduz no caule e nos galhos da hospedeira
os haustórios. No Brasil, a popular erva-de-passarinho, da família
Loranthaceae, é uma praga que recobre árvores inteiras, chegando a
matá-las. Esta família tem 40 gêneros e cerca de 1.400 espécies, todas
parasitas (JOLY, 1991, p. 246).

Parasitas verdadeiras são plantas que obtêm o seu alimento diretamente


de outra, como os fungos, que são saprófitos. É exemplo a Rafflesia arnoldii, da
família Rafflesiaceae, em Sumatra, que produz flores enormes, com mais de um
metro de diâmetro.

218
TÓPICO 1 | OS REINOS BIOGEOGRÁFICOS E OS BIOMAS

Os solos tropicais, em geral, são pobres em nutrientes. A lixiviação retira


os minerais úteis e permanecem no solo óxidos de ferro e alumínio (Fe2O3 e
Al2O3) de pouca ou nenhuma utilidade para as plantas. O pH varia entre 4,5 e 5,5
(WALTER, 1986, p. 49).

A floresta tropical se mantém unicamente, pode-se dizer, graças à


sua própria reciclagem de nutrientes. O clima úmido e quente é a base para a
manutenção de uma população de micro e macro-organismos decompositores da
matéria orgânica. A decomposição libera para o solo os elementos químicos, que
são, então, lixiviados pelas chuvas. As raízes são dotadas de micorrizas, que as
ligam diretamente com a serapilheira, o que lhes permite absorver os elementos e
compostos químicos formados na decomposição orgânica.

A dinâmica da floresta tropical é muito veloz, porque ela depende da sua


própria capacidade de reciclar os nutrientes. A exploração da mata desequilibra
os ecossistemas e os nutrientes podem se perder, empobrecendo o solo, o que
transforma a paisagem e lhe confere outra dinâmica. A recuperação completa
da mata e dos seus ecossistemas será, então, muito lenta e, de acordo com Hare
(1995, p. 96), pode levar até 700 anos.

As florestas tropicais não se resumem apenas às planícies. Também


em áreas montanhosas, como as atingidas pelos ventos alísios, as vertentes
montanhosas revestem-se de florestas densas, como na costa oriental da América
do Sul (Mata Atlântica), em Madagascar e no nordeste da Austrália, todas regiões
atingidas pelos alísios.

A presença das montanhas nas costas orientais leva à formação de densas


nuvens, que envolvem quase permanentemente os cumes. Por isto, a floresta é
conhecida como floresta de neblina. No Brasil, as serras do Mar e Geral, acima de 1.200
metros de altitude, são envolvidas por nuvens formadas pela ascensão das massas
oceânicas. Klein (1978, p. 8), usando a denominação de Rambo, chama de mata nebular
as formações florestais de ambas as serras. Walter (1986, p. 64) situa as florestas de
neblina entre 1.000 e 2.500 metros de altura, altitude em que as chuvas orográficas são
mais fortes e constantes. O ar saturado de umidade favorece o desenvolvimento das
epífitas e, em maiores altitudes, dos fetos, licopódios, musgos e hepáticas (WALTER,
1986, p. 64; FURLEY; NEWEY, 1986, p. 288). A vegetação recobre vertentes de alta
declividade, sob solos delgados quando há, mas é uma cobertura densa, de árvores
baixas, pouco desenvolvidas, repletas de epífita, revestidas de musgos e tortuosas.
Nos países de língua inglesa, a mata é conhecida como floresta de duendes (elfin forest)
(WALTER, 1986, p. 64; FURLEY; NEWEY, 1986,p. 288), porque transmite uma
sensação de floresta mágica, encantada, com as árvores sempre envolvidas por uma
neblina densa, que lhes dá um aspecto leitoso, misterioso. Os galhos e troncos, finos
e tortos, não raro estão completamente tomados por espessos tapetes de musgos e
epífitas, que pendem deles, como a Tillandsia spp (barba-de-velho), cujos filamentos
formam densas cortinas, que chegam até o solo, reforçando essa impressão.

219
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A fauna das florestas tropicais é muito rica e é um reflexo também da sua


complexidade. A atividade dos animais está intimamente ligada à estrutura da
vegetação, da biomassa e da flora. Eis alguns poucos exemplos da fauna: o bongo
(Boocerus euryceros) habita a África Ocidental, a bacia do Congo até o Sudão; o
bonobo (Pan panisous), uma espécie muito pacífica de chimpanzé, muito relacionada
ao homem, vive somente nas florestas do Zaire, numa área de 350.000 km2, na bacia
do Congo; o elefante indiano (Elephas maximus) ocorre na Índia até Mianmar (antigo
Ceilão), Sumatra e Bornéu, domesticável, é muito usado em tarefas pesadas, como
transporte; o elefante pigmeu (Loxodonta cyclotis) vive no interior das florestas da
África Central e Ocidental; o chimpanzé (Pan troglodytes), no Zaire, Guiné, Uganda
e Tanzânia, ocupa desde as florestas à savana; o tigre-de-Bengala (Leo tigris) habita
as selvas da Índia, Bangladesh, Burma, Sumatra, Java, Bali, China e Sibéria; o búfalo
(Syncerus caffer) tem duas raças na África, mas apenas uma espécie: o búfalo das
savanas, no Quênia e Tanzânia, e o búfalo das florestas, também chamado de búfalo
anão, na África Ocidental; o leopardo (Panthera pardus), o mais ardiloso e inteligente
dos carnívoros e o mais forte dos felinos; o pacífico gorila-das-montanhas (Gorilla
berengei berengei), nas montanhas de Uganda e levado quase à extinção.

TUROS
ESTUDOS FU

As florestas pluviais equatoriais do Reino Neotropical, mais especificamente a


Floresta Amazônica, pela sua exuberância e diversidade de características, será tratada mais
detalhadamente no TÓPICO 2, que trata das paisagens fitogeográficas do reino Neotropical.

220
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico você estudou que:

● Os territórios biogeográficos possuem extensões continentais e se distinguem


pelo número elevado de endemismos, geralmente em nível de ordens e de
famílias. Os reinos subdividem-se em Regiões Biogeográficas, com endemismos
ao nível de subfamílias e de gêneros. Por sua vez, as regiões biogeográficas
subdividem-se em Domínios ou Províncias Biogeográficas, compreendendo
áreas com elevado número de endemismo ao nível de gêneros e espécies.

● Ao se traçarem os limites setentrionais das espécies sul-americanas e os limites


meridionais dos grupos norte-americanos, podem-se observar dois fatos:

1 – as famílias sul-americanas aparecem em maior número;


2 – existe uma barreira natural, que marca o limite setentrional das espécies sul-
americanas, representada, ao norte da América Central, pela floresta tropical
das terras baixas e pelas altitudes de 1.500 metros da Sierra Madre, no México.
Acima dessa cota altimétrica, espécies norte-americanas predominam e
migram para a América do Sul pelos Andes.

● O deserto do Saara é outra região de transição cujos limites são incertos.


Nela, transitam espécies de animais e de plantas dos reinos Holártico (região
Paleártica) e Paleotropical (principalmente da região Etiópica). A região central
do Saara é mais seca, porém, possui montanhas de clima mais ameno, que
atuam como se fossem ilhas ou corredores biogeográficos, por onde migram
espécies holárticas em direção ao sul. É também usada pelas espécies etiópicas,
que a cruzam no seu movimento para o norte.

● Outra região de transição entre os reinos Holártico e Paleotropical aparece na China,


bastante modificada pela ocupação humana, especialmente depois da chegada dos
europeus. As matas subtropicais originais foram totalmente erradicadas e a fauna
florestal substituída por espécies adaptadas ao campo aberto.

● A última zona de transição acha-se nas regiões meridionais da América do Sul e


da Nova Zelândia e as separa do reino Arquinótico. Muitas famílias de plantas
e de invertebrados atuais mostram estreita relação nessas regiões, cujas origens
estão no período Terciário.

● O reino Holártico é restrito ao Hemisfério Norte. Compreende a Europa,


incluindo a Islândia, a Sibéria, os países asiáticos, incluindo a Coreia e o Japão,
o norte da África e a América do Norte, exceto o México. O reino Holártico tem
uma fauna e uma vegetação bem diversificadas.

221
● O que mais chama a atenção no reino Australiano é a sua fauna endêmica,
consequência do isolamento desde o Mesozoico Inferior. O reino inclui a
Austrália, Nova Caledônia, Tasmânia, o centro-norte da Nova Zelândia,
Nova Guiné, Polinésia e Havaí. O reino Australiano é um dos mais ricos em
formações fitogeográficas, abrangendo quase todas as formações do planeta
– desertos, estepes e pradarias, savanas, floresta temperada decídua, floresta
tropical úmida e o chaparral.

● O termo Arquinótico significa oposto ao Ártico e engloba o extremo sul


da América do Sul, Antártica e o sudeste da Nova Zelândia. As condições
adversas à vida dificultam o estabelecimento de animais e plantas, de modo
que as espécies que lograram se adaptar às condições reinantes são altamente
especializadas e de pequeno número de espécies.

● O nome tundra significa terra nua e deriva do finlandês tunturia. O ecossistema


da tundra é muito recente e formou-se no fim da última glaciação, há cerca de
10 mil anos, quando o gelo começou a recuar e a expor a superfície nua das
rochas. É o maior ecossistema da Terra, recobrindo cerca de 20% do planeta.

● Localizada ao sul da tundra, entre as latitudes de 45o e 75o graus, a taiga forma
um cinturão contínuo entre a América do Norte (Canadá e Alaska, uma estreita
faixa no extremo oeste americano e pequenas manchas no norte dos EUA), o
norte da Europa (norte da Escócia e Escandinávia), atravessava toda a Sibéria,
e chega até o Japão. Na Sibéria, a taiga alcança a sua maior extensão norte-sul,
estendendo-se por 1.600 quilômetros de território.

● Ao sul da floresta boreal, a floresta semidecídua ocupa uma área menor que a
Taiga. Situada entre 50º e 30º de latitude norte, na zona temperada da América
do Norte, do leste da Ásia, da Europa Ocidental e Central. No Hemisfério Sul
ela aparece no litoral do Chile, na Patagônia, numa estreita faixa no litoral
sudeste da Austrália, na Nova Zelândia e no extremo sul da África do Sul.

● A principal característica das regiões áridas de latitudes médias subtropicais é que


a evapotranspiração potencial é maior que a precipitação anual. Uma segunda
característica, que resulta da anterior, é que o fator limitante nos desertos é a falta
de água na superfície: a precipitação é inferior a 250 mm/ano. A escassez de água
superficial tem como resposta uma vegetação de baixo porte e as adaptações que
animais e plantas desenvolveram para viver num ambiente seco. Os desertos
não são uma região destituída de vida. Na verdade, eles possuem fauna e flora
bastante diversificadas. Uma terceira característica é que os desertos têm chuvas
irregulares, umidade muito baixa e intensa insolação.

222
● Nas costas ocidentais dos continentes, nas latitudes de 30o e 45o, entre a floresta
temperada decídua e os desertos quentes, a vegetação de certas regiões é dita
mediterrânea não necessariamente por estar à margem do Mar Mediterrâneo,
mas porque guardam entre si uma similaridade acentuada quanto à topografia,
clima e elementos biogeográficos. São apenas cinco regiões em todo o mundo,
que apresentam características tão marcantes que constituem uma transição
entre aqueles dois biomas... As regiões mediterrâneas aparecem no litoral do
Mar Mediterrâneo, na Califórnia, no sul do Chile e nos extremos meridionais
da África do Sul e da Austrália.

● As savanas são tipicamente tropicais – elas aparecem entre a floresta equatorial


e os desertos e estepes das latitudes médias. A paisagem é uma cobertura de
árvores, gramíneas e arbustos espaçados. Constitui-se por um balanço entre
ervas, arbustos e árvores, podendo caracterizar-se como mais herbácea ou mais
arbustiva-arbórea. As savanas variam muito de um lugar para outro, o que
vai depender das condições do hábitat, mas, de um modo geral, estrutural e
funcionalmente, elas se assemelham.

● A floresta equatorial do reino Paleotropical aparece na bacia do Congo e no


sudeste asiático, onde atinge as maiores extensões. A região equatorial recebe
calor durante todo o ano, porque a obliquidade dos raios solares é zero, e,
por isto, a pressão atmosférica é baixa, o que origina a Zona de Convergência
Intertropical, CIT ou ZCIT.

223
AUTOATIVIDADE

1 Qual a relação entre o nível de endemicidade e os territórios biogeográficos?

2 Qual a localização dos cinco reinos biogeográficos conforme a classificação


de Müller (1979)?

3 Os territórios biogeográficos possuem extensões continentais e se distinguem


pelo número elevado de endemismos, geralmente em nível de ordens e de
famílias. Acerca do estudo realizado sobre os territórios biogeográficos,
analise as afirmativas a seguir:

I - As regiões biogeográficas subdividem-se em Domínios ou Províncias


Biogeográficas, compreendendo áreas com elevado número de endemismo
ao nível de gêneros e espécies.
II - Os domínios subdividem-se em Setores ou Distritos Biogeográficos, que
correspondem a territórios restritos com elevado número de endemismos
ao de espécies ou de gêneros, se estes últimos possuírem poucas espécies.
III - Os limites dos reinos biogeográficos, muitas vezes, se confundem e se
interpenetram, principalmente quando as barreiras biogeográficas não
são bem definidas. Essas divisões variam muito, principalmente quando o
nível taxonômico é mais restrito.
IV - A divisão entre os reinos Neotropical e Paleotropical e o reino Holártico
tem suscitado discussões. Alguns pesquisadores consideram a América
Central não uma zona de transição entre os reinos Holártico e Neotropical,
mas uma região do reino Neotropical, porque nela predomina a fauna sul-
americana e o clima é tropical.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas as afirmativas I, III e IV.


b) ( ) Estão corretas as afirmativas II e IV.
c) ( ) Apenas a afirmativa III está correta.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

4 Relacione cada reino biogeográfico com seus respectivos grupos da flora


e da fauna.

1 Reino Holártico.
2 Reino Paleotropical.
3 Reino Australiano.
4 Reino Neotropical.
5 Reino Arquinótico.

224
( ) Pinguim-imperador; pinguim-de-adélia; Deschampsia Antactica;
Colobanthus crassifolius.
( ) Macacos; saguis; tamanduás; lhama; vicuña; guanaco; beija-flores; perdizes;
tucanos; cactos; bromélias; seringueira.
( ) Ornitorrinco; canguru; coala; casuar; Gênero Eucalyptus.
( ) Girafa; hipopótamos; hiena; gorila; chimpanzé; leão; elefante; zebras;
avestruz; gerânios; ébano; árvore produtora de alcaloide; galinhola.
( ) Ursos; cães; lobos; coiotes; cervos e alces; búfalo; bisão; castores; ouriço;
gambás; quatis; saracura; urogalo; papagaio-do-mar; cegonha; cucos;
rouxinóis; abutres; esturjão; perca; salmão e truta; arbustos e árvores como
as avelanzeiras; choupo; álamo; ranúnculos; amoreiras.

Agora, assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) 1 – 2 – 3 – 4 – 5.
b) ( ) 5 – 4 – 3 – 2 – 1.
c) ( ) 3 – 4 – 5 – 2 – 1.
d) ( ) 4 – 5 – 3 – 2 – 1.

225
226
UNIDADE 3
TÓPICO 2

AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO


NEOTROPICAL

1 INTRODUÇÃO
Todo o complexo mecanismo climático, edáfico e geomorfológico
anteriormente descrito foi a mola que empurrou e manteve a evolução das
paisagens nos trópicos. A paisagem geográfica integrada resulta de um jogo de
fatores interconectados, que estendem a sua influência por uma área de tamanho
variado ao longo de um tempo determinado. A evolução da paisagem depende
tanto de fatores locais, quanto de fatores externos a ela.

2 DOMÍNIOS MORFOCLIMÁTICOS BRASILEIROS


Apoiado no princípio de que tanto fatores locais quanto externos
influenciam na evolução da paisagem, Ab'sáber (1967), delimitou os domínios
morfoclimáticos e as províncias fitogeográficas brasileiras:

1 – Domínio dos chapadões tropicais a duas estações, recobertos por cerrados e


com florestas-galeria.
2 – Domínio das regiões serranas tropicais úmidas ou dos "mares de morros",
recobertos por florestas pluviais.
3 – Domínio das depressões intermontanas semiáridas, com inselbergs e
drenagens intermitentes e recobertas por caatingas.
4 – Domínio de planaltos subtropicais com florestas de araucária e pradarias
de altitude.
5 – Domínio das coxilhas subtropicais uruguaio-sul-rio-grandense, com
pradarias mistas.
6 – Domínio das terras baixas equatoriais florestadas da Amazônia brasileira.

Os domínios são separados por faixas contínuas de paisagens de transição,


em que padrões inteiramente podem se destacar, como vimos antes.

A descrição das paisagens neotropicais será apoiada nas ideias de


Ab'Sáber, mas, nela, introduziremos conceitos de outros autores recentes.

227
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

São pesquisas realizadas em outros campos que não apenas da Geografia,


mas também da Ecologia, da Geologia, da Geomorfologia, da Botânica, e outros,
que nos auxiliarão a ter uma visão detalhada das paisagens atuais deste reino.

2.1 DOMÍNIO DOS CHAPADÕES TROPICAIS COM DUAS


ESTAÇÕES, RECOBERTOS POR CERRADOS E COM
FLORESTAS-GALERIA
“Recobrindo uma superfície de cerca de 18 milhões de km2 (TROPPMAIR,
2002, p. 82), no Planalto Central brasileiro, este domínio tem clima sazonal, com
chuvas de verão, que mantêm uma drenagem perene”. “A estiagem dura de
quatro a cinco meses, predominantemente no inverno. As chuvas variam entre
1.100 e 1.600 mm/ano”. (EINTEN, IN PINTO, 1994, p. 20).

“A região é formada por planaltos de estrutura complexa e planaltos


sedimentares compartimentados”. (AB'SÁBER, 1967, p. 5). “Os interflúvios têm
rampas suaves e os vales são espaçados e pouco ramificados”. (BIGARELLA,
ANDRADE-LIMA & RIEHS, 1975, p. 429). “São comuns níveis de pediplanos e
terraços embutidos nos vários compartimentos, o que revela a ação de flutuações
climáticas pleistocênicas”. (BIGARELLA, ANDRADE-LIMA & RIEHS, p. 428). “Os
solos são pobres e predominam os latossolos vermelho-escuros e vermelho-amarelos,
com textura argilosa. Nos relevos acidentados aparecem lateritas, e nas veredas, solos
orgânicos e gley húmicos”. (BIGARELLA, ANDRADE-LIMA & RIEHS, p. 430).

A paisagem do cerrado é formada por um tapete descontínuo e esparso


de gramíneas, entremeado de ervas, arbustos e árvores. Arbustos e
árvores têm troncos tortuosos, casca espessa, folhas coriáceas, duras
e revestidas por uma camada de cera ou pêlos. As folhas têm cor clara
ou acinzentada, são grandes e pontudas, o que facilita o gotejamento
e evita a acumulação da água na folha, reduzindo a incidência de
infecções por fungos. (EINTEN, in PINTO, 1994, p. 22).

“Ideias antigas consideravam o cerrado um campo seco”. (FERRI, 1973, p.


288). No entanto, quando Rawitscher, Ferri e Rachid (1943, apud FERRI, 1973, p.
289) realizaram as primeiras pesquisas sobre o cerrado, tendo o cerrado de Emas
(Estado de São Paulo) como área de estudo, novas concepções vieram à tona e
mudaram os conceitos antigos. Em Emas aqueles pesquisadores mostraram que
(FERRI, 1973, p. 289):

1 – o solo é profundo, tem água disponível e permanente para as plantas, exceto


na camada superficial (2 m de profundidade), que é seca na estiagem. O lençol
flutua segundo as duas estações;
2 – a água gravitacional move-se para baixo durante todo o ano. Acima do lençol
a quantidade de água armazenada nos poros equivale às precipitações de três
anos. Segundo Arens (FERRI, 1971, p. 254), a água pode levar até seis meses
para alcançar o lençol, o que mostra que o movimento descendente avança
estação seca adentro;
228
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

3 – a maioria das espécies alcança o lençol, enquanto outras não o atingem, mas suas
raízes descem além de 10 metros, onde há água abundante nos poros do solo;
4 – os estômatos da maior parte das plantas permanecem abertos durante o dia,
mesmo na estiagem, e elas transpiram livremente.

“O cerrado exibe uma fisionomia xerófita muito acentuada, maior que


a da caatinga. Mas como não falta água, a vegetação é mesófita e não xerófita.
O aspecto xerófito se deve não à falta de água, mas à deficiência de nutrientes
no solo”. (FERRI, 1973; 1980, p. 134). As plantas do cerrado fazem a fotossíntese
durante todo o dia – há luz em excesso no cerrado. A produção de carboidratos,
pois, é alta. Eles se acumulam nas folhas e nos caules e galhos e, desta forma, lhes
emprestam um aspecto xeromorfo.

O principal fator limitante no cerrado é a deficiência de nutrientes,


como mostrou Arens”. (apud FERRI, 1971, p. 252). Cálcio, fósforo,
enxofre, nitrogênio, zinco, boro e molibdênio existem em quantidades
inferiores à necessidade das plantas e vários processos fisiológicos são
atingidos, como a síntese das proteínas. Nitrogênio, fósforo e enxofre
são elementos importantes na síntese e a sua escassez afeta todo o
processo, e o resultado são plantas pouco desenvolvidas. (ARENS,
apud FERRI, 1971, p. 255).

As plantas do cerrado são, por definição, escleromorfas oligotróficas.


A escleromorfia produz tecidos grossos e duros, o que dificulta o crescimento
normal da planta, tornando-a raquítica. Oligotrofismo é um termo que se refere
à deficiência de absorção – oligo, do grego, significa pouco, escasso, e trofismo
vem de trophein, grego, alimentar-se. Portanto, plantas que dispõem de poucos
nutrientes são oligotróficas e escleromorfas. O limite do cerrado pode ser marcado
pela deficiência de minerais no solo. Nos lugares em que os nutrientes existem
em quantidades mais elevadas, aparecem o cerradão e a mata mesófita.

Por outro lado, “o alumínio aparece em teores muito elevados, o que


agrava o problema do escleromorfismo”, como demonstrou Goodland (1971,
apud FERRI, 1973, p. 321), porque ele é tóxico para as plantas, mas não para os
animais.

A fisionomia do cerrado está na dependência da quantidade de nutrientes


e de alumínio nos solos. Goodland (1971, apud FERRI, 1973, p. 337), mostrou que
na região do cerrado há uma variedade de formações dependentes das condições
do solo. Goodland estabeleceu um gradiente de formações:

1 – campo sujo, com árvores de até três metros de altura;


2 – campo cerrado, com árvores até quatro metros;
3 – cerrado (sensu strictu), com árvores até seis metros;
4 – cerradão, com árvores até nove metros.

Em algumas classificações, refere-se ao campo limpo, uma formação de


ervas e subarbustos esparsos. Matas-galerias são muito comuns nas margens dos
rios e córregos. (EINTEN, 1972, apud GARCIA; PIEDADE, 1980).

229
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

O porte da vegetação cresce no sentido do cerradão, o que significa que


o teor de nutrientes aumenta, ao passo que o pH e a concentração de alumínio
descem na direção do campo sujo. Portanto, o xeromorfismo aumenta do cerradão
(35% de alumínio no solo) para o campo sujo (58% de alumínio no solo), de acordo
com Goodland.

Goodland também descobriu que as plantas podem armazenar alumínio


em maior ou menor proporção. Ele as classificou, pois, em acumuladoras
obrigatórias ou facultativas, e não acumuladoras tolerantes ou sensitivas. As não
acumuladoras sensitivas armazenam entre 10 e 20 ppm de alumínio. As plantas
da família das Voquisiáceas acumulam mais de 10.000 ppm – são acumuladoras
obrigatórias. As famílias acumuladoras obrigatórias dominam no cerrado e
apresentam as características conhecidas.

No reino Neotropical, as savanas aparecem no Brasil (cerrado e caatinga),


na Venezuela, onde constitui os lhanos, no Chaco e em pequenas porções da
América Central.

O cerrado brasileiro está caminhando em ritmo acelerado para a sua


extinção. Em Minas Gerais, o cerrado foi praticamente todo cortado para
alimentar os fornos siderúrgicos. O uso do cerrado como fornecedor de carvão
vegetal é antigo. Com a expansão de fornos de ferro-gusa naquele Estado, o corte
do cerrado acelerou-se, e, praticamente, não existe mais em vastas áreas do norte
de Minas Gerais. Em seu lugar veem-se extensas monoculturas de eucaliptos.
Fornos de carvão são uma visão comum no meio das áreas sem vegetação. Nos
pátios das siderúrgicas, dezenas de caminhões aguardam o descarregamento. Nas
estradas da região, os caminhões andam praticamente em fila, tal o seu número.
Contudo, agora, transportam carvão de eucalipto, pois quase não há mais cerrado
para ser cortado. O que restou está, finalmente, protegido. Por seu turno, grandes
propriedades do norte do Estado também transformaram o cerrado, retirando
a vegetação para formar pastos. Extensas áreas, antes cobertas pela vegetação,
agora são ocupadas pelo gado de corte.

As atividades agrícolas no cerrado aceleraram-se a partir da década de


70, quando técnicas modernas de cultivo e de criação foram introduzidas, com o
objetivo de estimular o crescimento econômico do Planalto Central, especialmente
depois da fundação de Brasília. Cerca de 70% da produção de carne bovina vêm
do Planalto Central. Feijão, soja, milho e arroz são outros produtos largamente
cultivados, graças às técnicas de correção do solo. Plantações de eucaliptos
(Eucalyptus spp) e de pinheiros (Pinus spp) atendem à fabricação de polpa de
celulose para a indústria de papel. A ocupação do cerrado, como toda ocupação
mal planejada, tem levado a uma deterioração dos hábitats, com redução da
flora e da fauna, embora unidades de conservação tenham sido criadas, mas em
número insuficiente.

230
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

2.2 DOMÍNIO DAS REGIÕES SERRANAS TROPICAIS


ÚMIDAS OU DOS "MARES DE MORROS", RECOBERTOS
POR FLORESTAS PLUVIAIS
Este domínio corresponde à região dos mares de morros de origem ígnea e
metamórfica, forma uma faixa que se estende ao longo do litoral oriental do reino
Neotropical e ocupa uma área de mais de 1 milhão de quilômetros quadrados.
O clima superúmido, com temperaturas elevadas durante todo o ano, originou
uma forte decomposição das rochas, o que resultou num manto de alteração
muito espesso, graças a um processo de mamelonização, que se alternou com a
pedimentação e compôs uma paisagem típica de morros gnáissicos e granítico-
gnáissicos de vertentes arredondadas, que Ab'Sáber (1993, 1966, apud AB'SÁBER,
1973, p. 15) chamou de “mares de morros e Libault denominou de colinas
policonvexas” (Ab'Sáber).

Ab'Sáber (1973, p. 14), define mamelonização como "[...] um conjunto


de processos fisiográficos, suficientemente capaz de arredondar as vertentes de
rochas cristalinas decompostas até o nível de uma feição geométrica policonvexa
[...]". Simultaneamente, a pedogênes tropical sob floresta úmida aprofundava o
manto de intemperismo, enquanto a drenagem ganhava desenho dendrítico e
caráter perene. A pedimentação é a aplainação lateral das vertentes, vinculada
a uma transição de clima úmido para clima semiárido, um processo oposto à
mamelonização, que forma rampas de erosão. Ab'Sáber explica que em toda zona
costeira do Brasil tropical úmido as condições de pedimentação e mamelonização
ocorreram durante todo o Quaternário.

A mamelonização se deu em climas úmidos sob florestas tropicais úmidas


e, na mudança para climas semiáridos, de curta duração, houve a retração da
cobertura florestal, a erosão mecânica se instalou e atacou as colinas policonvexas,
agora sem vegetação, e transportou os detritos para os vales por pedimentação,
formando pavimentos detríticos. Uma umidificação posterior do clima retomou
o intemperismo químico, que prevalece atualmente. As linhas-de-pedra (stone
lines) são um testemunho da última fase seca, que se deu na transição entre o
Pleistoceno e o Holoceno. (AB'SÁBER, 1973; VIADANA, 2002).

A floresta ombrófila densa, a mata Atlântica, recobre a cadeia costeira, a


Serra do Mar, estende-se até os mares-de-morros e a Serra da Mantiqueira, cujo
ambiente já apresenta algumas diferenças em relação ao litoral. Muitos autores
ampliam os domínios da floresta Atlântica até o interior do Brasil (RIZZINI, 1979,
Fundação SOS Mata Atlântica, 1992, 1993), o que não corresponde à realidade. A
Fundação SOS Mata Atlântica inclui os Estados de Goiás e Mato Grosso do Sul como
áreas ocupadas pela floresta Atlântica. Rizzini vai mais longe: “a mata Atlântica
avança até a Argentina. Rizzini” (1979, p. 67). considera a floresta de araucária uma
continuação da floresta ombrófila densa e, por isto, a inclui nesta, ao dizer que "[...]
teremos que lidar com as seguintes formações dentro da floresta Atlântica: floresta
pluvial montana, floresta pluvial baixo-montana, floresta de Araucária e floresta
pluvial ripária e em manchas".
231
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As condições ecológicas e biogeográficas da floresta ombrófila densa, que


se encontra no litoral, e a floresta tropical do interior, são inteiramente diferentes
e ambas as formações não podem ser tomadas como uma comunidade única.

Fisionomicamente, as matas do interior se assemelham à floresta litorânea


e as floras apresentam muitas espécies e gêneros comuns. No entanto, as
características ambientais numa e noutra região são completamente diferentes. Não
são apenas a flora e a fisionomia que particularizam uma formação fitogeográfica.
Muitos outros fatores intervêm e se completam para produzir uma rede complexa
de interações, que caracterizará as diversas formações fitogeográficas. As
florestas Atlântica e Amazônica são muito semelhantes, se observarmos apenas
a fisionomia. Mas são inteiramente diferentes geograficamente e ecologicamente
falando. A floresta ombrófila mista, a mata de araucária, apresenta espécies da
floresta Atlântica, como se pode ver na divisa entre os Estados de Santa Catarina e
Paraná, em plena Serra do Mar. Essa região é um ecótono entre as duas formações,
que se misturam e interpenetram, mas cada uma guarda a sua individualidade.

As condições ambientais mudam do litoral para o interior – o clima úmido


do litoral, sem estação de estiagem, torna-se mais seco, sazonal, com duas estações
bem marcadas. A influência do oceano reduz-se gradativamente para o interior.
As frentes polares raramente entram no interior de Minas Gerais, vindas do
litoral, pois o seu avanço é dificultado pelas serras do sul do Estado e, sobretudo,
pela Serra do Mar e, mais no interior, pela Mantiqueira. As invasões da frente
polar pelo interior se dão por outro padrão de dinâmica. As chuvas (orográficas,
frontais e de convecção) nas serras litorâneas chegam a 4.000 mm/ano, na Serra
do Mar em São Paulo, mas caem paulatinamente no interior até atingir a marca
de 1.000 mm/ano no norte de Minas Gerais.

O clima está diretamente vinculado à variedade de relevo e de rochas.


As condições de umidade do litoral e do interior proporcionam processos
morfogenéticos diferentes, que condicionam formações vegetais diversas. No
litoral superúmido, o relevo é típico de regiões tropicais cristalinas florestadas.
(MOREIRA; CAMELIER, 1977, p. 25). Os processos morfogenéticos úmidos
“[...] são interrompidos pela passagem do domínio cristalino para a depressão
Paleozoica em São Paulo, e em Minas Gerais pelas altas superfícies do Espinhaço”.
(MOREIRA; CAMELIER, 1977, p. 25).
Desse modo, a umidade reduz-se do litoral para o interior, permitindo
o desenvolvimento de formações fitogeográficas típicas de clima
sazonal. De acordo com os fatores morfogenéticos, as formações
vegetais podem ser subdivididas em dois setores: as florestas
perenefólias costeiras e as florestas subcaducifólias tropicais do
interior. (MOREIRA; CAMELIER, 1977, p. 25).

Essas duas formações desenvolveram-se graças a condições ambientais


específicas.

Essas condições ambientais facultam às florestas litorâneas o caráter


perene. No interior, a menor umidade, o período de estiagem e outros fatores,
como os solos, dão à floresta o caráter subcaducifólio – não se incluem aqui os
232
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

cerrados e a caatinga. A deciduidade se torna mais conspícua à medida que se


caminha para o interior da Região Sudeste.

Alonso (1977, p. 91), enfatiza que “nas encostas voltadas para leste e
sul das serras do Mar e Mantiqueira, a floresta é pluvial, mas nos seus reversos
(sombra de chuva, a sotavento), a floresta é subcaducifólia”.

A floresta ombrófila densa costeira desenvolveu-se onde impera a


meteorização química, favorecida pelas elevadas temperaturas e índices
pluviométricos. Colonizando as escarpas íngremes da Serra do Mar, a floresta
recebe influências muito marcadas das faixas de altitude, o que levou Veloso
(IBGE, 1992), a descrevê-la segundo os níveis de altitude: “floresta ombrófila
densa aluvial, floresta ombrófila densa das terras baixas, floresta ombrófila densa
submontana e floresta ombrófila densa montana”.

“A floresta Atlântica típica situa-se entre 800 e 1.500-1.700 metros de


altitude” (RIZZINI, 1979, p. 67), recobrindo a paisagem de morros mamelonares,
entre os quais aparece um relevo acidentado, com vertentes de alta declividade
e vales encaixados e muito profundos. É denominada por Veloso (1992), de
formação montana – com altitudes entre 600 e 2.000 metros, na região tropical, e
diminuindo a cota de altitude simultaneamente ao aumento da latitude. Chuvas
copiosas, que podem ultrapassar os 4.000 mm/ano na Serra do Mar, no norte
de São Paulo, mantêm a floresta sempre verde e intemperizam as rochas para
formar mantos de alteração profundos – não raro, com profundidade de 40-60
metros. (AB'SÁBER, 1963, apud RIZZINI). Nos trechos muito íngremes, o solo é
superficial, comportando apenas uma cobertura herbácea com poucos arbustos.

Entre as altitudes de 300 e 800 metros, a floresta dos mares-de-morros


distribui-se no interior dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo e Rio de
Janeiro, até o litoral. A floresta tropical do interior não pode mais ser chamada
de floresta Atlântica ou floresta ombrófila densa, primeiro, porque não é mais
ombrófila – há uma nítida estação seca - e, depois, porque a flora, em razão disso,
muda sensivelmente. Veloso (1992, p. 17), “a rotula de formação submontana,
com altitudes entre 100 e 600 metros”.

Em Angra dos Reis (RJ) chove 2.150 mm/ano e há quatro meses de


estiagem, mas em Caxambu (MG), com 1.530 mm/ano, e Passa Quatro (MG) 1.500
mm/ano, há de cinco a seis meses de estiagem (RIZZINI, 1979, p. 71). No entanto,
como Rizzini (1979), mostra o topoclima de Angra dos Reis não se mostra seco,
porque não há precipitações abaixo de 60 mm/ano. O que há é uma redução das
chuvas no inverno, com o mês de julho comportando 83 mm – logo, não há uma
estiagem típica e a floresta Atlântica de Angra dos Reis pode ser considerada
ombrófila. Nas duas cidades mineiras ocorre uma seca ecológica de quatro meses,
em que falta água no solo para as plantas. Além disso, as elevadas temperaturas
no interior fazem crescer a evapotranspiração, o que agrava a seca ecológica – sem
a reposição das chuvas, o lençol aquífero baixa e fica fora do alcance de muitas
espécies. As plantas recorrem, então, ao orvalho, que, no inverno, é copioso.

233
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A floresta tropical do interior, que recobre as colinas policonvexas


interioranas, é diferente da floresta tropical do litoral, a floresta ombrófila densa,
tanto na composição florística, quanto na fisionomia. Rizzini (1979, p. 72) aponta
as diferenças:

1 – na floresta do interior, as árvores são menores (15-25 m de altura);


2 – menor densidade e maior espaçamento entre as árvores, para evitar ao
máximo a competição pela água e nutrientes;
3 – há poucas lianas, epífitos, plantas macrofilas, palmeiras, fetos
arborescentes, líquens arbustivos e musgos, que, no entanto, são comuns
nos vales encaixados, onde a umidade é maior;
4 – poucas raízes de escora (sapopemas).

“O maior espaçamento entre as árvores permite o desenvolvimento de um


sub-bosque com árvores menores e maior densidade de arbustos” (RIZZINI, 1979,
p. 72). RIZZINI (1979) diz que a "[...] impressão geral é de secura. A própria terra
parece seca em julho." Algumas espécies típicas da mata: Piptadenia macrocarpa
(angico), Persea cordata (maçaranduba), Ocotea rigida (canela-amarela), Belangera
tomentosa (salgueiro), Machaerium villosum (jacarandá-pardo), Copaifera lansgdorfii
(copaíba), Cedrela fissilis (cedro), Platypodium elegans (jacarandá-branco) etc.

Quando se aproxima do litoral, onde a umidade é maior, a floresta dos


mares de morros adquire outra fisionomia. As árvores atingem 20-25
metros e algumas podem ter mais de um metro de diâmetro, como o
vinhático (Plathymenia), o guarabu (Peltogyne) e o jequitibá (Cariniana).
O sub-bosque tem árvores menores e um estrato arbustivo. Lianas,
palmeiras e epífitos podem se mostrar. (RIZZINI, 1979, p. 72).

Rizzini (1979), enumera algumas espécies típicas: Apuleia leiocarpa (garapa),


Cariniana estrellensis (jequitibá-rosa), Melanoxylon braunia (braúna), Peltogyne
discolor e P. mattosiana (guarabu), Schizolobium parahyba (garapuvu), Plathymenia
foliolosa (vinhático) etc.

Segundo Rizzini (1979, p. 73), “muitas espécies são comuns à floresta dos
níveis mais altos – floresta ombrófila densa montana – e à floresta dos níveis mais
baixos – floresta ombrófila densa baixo-montana”.

A floresta ombrófila densa dos mares-de-morros e das encostas da


Serra do Mar varia em composição florística, segundo a latitude.
As condições climáticas mudam com as latitudes, principalmente
as temperaturas. As temperaturas médias (médias anuais, médias
das máximas e das mínimas) mudam no sul. As temperaturas caem
sensivelmente no litoral do Paraná, de Santa Catarina e Rio Grande do
Sul, o que afeta o desenvolvimento da floresta e as árvores têm porte
menor. Mesmo assim, podem-se encontrar gigantes com 30-35 metros
de altura. (KLEIN, 1978, p. 3).

234
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

Não apenas o porte é afetado, mas a composição florística também muda com
a latitude. A quantidade de espécies reduz-se, ao passo que o número de indivíduos
por espécie cresce. As famílias das Lauraceae e Myrtaceae predominam no sul
(KLEIN, 1978, p. 4). As epífitas aparecem em grande densidade, representadas pelas
familias Bromeliáceas, Orquidáceas, Aráceas, Piperáceas, Gesneriáceas, samambaias
(Pteridófitas), as lianas lenhosas Bignoniáceas, Hipocrateáceas e Sapindáceas.

2.3 DOMÍNIO DAS DEPRESSÕES INTERMONTANAS


SEMIÁRIDAS, COM INSELBERGS E DRENAGEM INTERMITENTE
E RECOBERTAS POR CAATINGAS
O domínio das depressões intermontanas semiáridas, com inselbergs
e drenagem intermitente e recobertas por caatingas, é considerada uma região
de contrastes. O Nordeste brasileiro começa a mostrar a sua complexidade no
clima, que é "[...] o que mais se destaca, não só por conferir individualidade à
região, como também, por ser o principal elemento do qual decorrem as demais
características do relevo, da vegetação e da rede fluvial" (Silva, 1972, p. 215). A
tudo isso soma-se os aspectos humanos, estreitamente ligados e praticamente
dependentes do clima semiárido. A circulação atmosférica deriva da conexão
de sistemas diferentes, o que origina regimes pluviométricos de características
locais. Se as chuvas diferem de um lugar para outro, o regime de temperaturas,
no entanto, é um fator que unifica a Região Nordeste. Nimer (1977, p. 315) a
considera "[...] uma das regiões mais complexas do mundo".

A umidade chegada do mar concentra-se no litoral – o que favorece o


aparecimento da floresta ombrófila densa, hoje completamente devastada pelos
canaviais, que aproveitaram e esgotaram, praticamente, solos extremamente
férteis. No litoral, as chuvas variam entre 1.500 e 2.000 mm/ano.

A semiaridez do Nordeste deve-se à presença, no interior, de um


ramo destacado do anticiclone marítimo, cuja subsidência impede
a ascensão de massas de ar e, pois, a condensação, permanecendo a
região sob um regime de chuvas escassas, que não chegam a 600 mm/
ano. O anticiclone do interior provavelmente é um extenso braço do
anticiclone dos Açores, que se estende para o sul, ultrapassa a linha do
equador e se instala no interior do Nordeste (CONTI; FURLAN, apud
ROSS, 1995, p. 105). Dessa forma, a célula anticiclônica, ao divergir
ventos, impede a entrada na região da massa equatorial continental
(mEc) e da frente polar. Outro fator que pode também estar na origem
da semiaridez é a temperatura baixa da água do oceano. A corrente de
Benguela, que margeia o litoral ocidental da África, é empurrada para
oeste pelo movimento anti-horário do anticiclone do Atlântico e, no
litoral dos Estados do Ceará e Rio Grande do Norte, a água mais fria
tem menores evaporação e condensação. Com isto, caem os índices
pluviométricos. Em Cabeceiras, na Paraíba, foi registrado o menor
índice de chuvas no Brasil – 278,1 mm/ano. (SILVA, 1972, p. 217).

235
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

“O período seco varia muito de um lugar para outro. No Raso da Catarina,


na Bahia, há de nove a 10 meses secos, e, a sotavento da Borborema, entre os
Estados de Pernambuco e Rio Grande do Norte, a estiagem dura 11 meses”.
(FERRI, 1980, p. 40).

No interior, o sertão, zona da caatinga, a umidade desce a valores mínimos.


É uma região de depressões interplanálticas, que constituem superfícies de erosão,
com altitudes inferiores a 500 metros, situada entre serras – Borborema, Araripe,
Ibiapaba, com 800 metros de altitude, e a Diamantina, com 1.200 metros. Perdidos
no meio dessa planura semiárida, destacam-se morros isolados, talhados em
rochas mais resistentes, os inselbergs, testemunhos de ciclos de erosão em climas
áridos no passado. Os solos são rasos, litólicos.

“O regime de chuvas no Nordeste é muito variado, segundo as regiões.


No litoral, o período chuvoso dá-se no outono-inverno e a estiagem na primavera-
verão. No interior, as chuvas caem no verão-outono, e o inverno é a época da
estiagem” (SILVA, 1972, p. 217). As chuvas e as secas estão na dependência da
posição da Zona de Convergência Intertropical (CIT) e das invasões das ondas
de leste. Quando o Hemisfério Norte está no inverno, a CIT é empurrada para
o sul, ultrapassa a linha do equador e traz chuvas para o Nordeste de janeiro a
abril. De maio em diante, a pressão começa a subir e atinge o máximo em julho,
o que mantém a CIT fora da região. De agosto em diante, a pressão começa a
cair e atinge o mínimo em janeiro. Estimulada pela baixa regional e pela baixa
equatorial, a CIT desloca-se para o sul.

“A estiagem se dá nos meses de alta pressão, quando o anciticlone dos


Açores avança até a região e predomina sobre ela. Em junho, julho e agosto,
as ondas de leste levam chuvas para o litoral, mas, no interior, a célula de alta
pressão traz a seca”. (NIMER, 1977, p. 36).

No inverno do Hemisfério Sul, a CIT emigra para o norte, e a alta pressão


prevalece. As chuvas nordestinas têm características únicas: são escassas, e, no
entanto, podem ser torrenciais e costumam faltar durante anos a fio.

Esse complexo regime de chuvas e de temperaturas elevadas mantém uma


região semiárida em que a maioria das plantas é xerófita. Os solos são férteis, mas
são litólicos ou arenosos, permeáveis e bem arejados. A vegetação da caatinga é
muito rica em espécies.

As árvores são baixas (10-12 m de altura), espalham-se esparsamente,


deixando um bom espaço descoberto entre elas, de modo a reduzir ao máximo
a competição pela água. As árvores são cobertas por espinhos ou acúleos e as
cactáceas e bromeliáceas são comuns. Epífitos e lianas não existem na caatinga.

236
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

As plantas da caatinga são xeromorfas, mas não escleromorfas (veja o


cerrado). Xeromorfas, porque a água é um fator limitante no sertão. Entretanto,
não são escleromorfas, porque não predomina nela a esclerofilia, como nas
espécies do cerrado, que são escleromorfas oligotróficas, mas não são xerófitos.
Na caatinga, como há falta de água, as plantas têm que economizá-la. Por isto,
os estômatos se fecham durante as horas quentes do dia, reduzindo, pois, a
fotossíntese. Dessa forma, não há produção excessiva de carboidratos – como
se dá no cerrado – e as plantas, por conseguinte, não os acumulando, não são
esclerófitas. Não obstante serem xerófitos, as plantas da caatinga não apresentam
fisionomia de xeromorfismo, como as do cerrado – que não são xerófitos, mas
apresentam essas características, porque são esclerófilas.

A flora da caatinga, apesar da severidade do ambiente, é muito rica. Eis


algumas espécies (JOLY, 1970, p. 28): baraúna ou braúna (Schinopsis brasiliensis),
aroeira (Astronium urundeuva), umbuzeiro (Spondias tuberosa), que produz, em
dezembro, o umbu, um fruto muito apreciado, juazeiro (Ziziphus joazeiro),
de copa muito densa, sempre verde, mesmo na seca mais aguda, sempre nas
partes mais baixas das vertentes onde há acúmulo de umidade. O seu fruto
amarelo, que nasce em janeiro e fevereiro, o joá, é também muito apreciado.
A oiticica (Licania rigida) também prefere as baixadas dos rios secos – ainda há
alguma umidade no solo – e igualmente permanece verde por muito tempo
na seca, mas acaba por perder parte das folhas. Os ipês amarelo e roxo, no
Nordeste são chamados, respectivamente, de caraibeira (Tabebuia caraiba) e
pau-d'arco (T. avellanedae). Estas são apenas algumas das muitas espécies de
árvores da caatinga. Com exceção do juazeiro e da oiticica, todas as espécies
do cerrado são caducifólias.

As plantas suculentas, como as cactáceas, armazenam água no caule,


e são sempre verdes. Os cactos fazem parte da paisagem da caatinga. O
mandacaru (Cereus jamacaru), que dá frutos saborosos, o facheiro (C. squomosus)
e o xique-xique (Pilocereus gounellei) são dos mais comuns.

2.4 DOMÍNIO DAS TERRAS BAIXAS EQUATORIAIS,


EXTENSIVAMENTE FLORESTADAS DA AMAZÔNIA
O domínio das terras baixas equatoriais, extensivamente florestadas da
Amazônia, estende-se na região equatorial e subequatorial, ocupando
uma superfície de mais de 2,5 milhões de km2. São planícies de
inundação labirínticas e meândricas, tabuleiros de vertentes convexas
e morros mamelonares baixos, que aparecem nos relevos cristalinos,
juntamente com relevo residuais de pães-de-açúcar, inselbergs no
Quaternário. (AB'SÁBER, 1973, p. 3).

Testemunhos de pediplanação e pedimentação sugerem climas mais secos


no passado (BIGARELLA; ANDRADE-LIMA; RIEHS, 1975).

237
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A floresta deve a sua existência ao regime de chuvas e às temperaturas


elevadas, que provêm os ecossistemas com uma população de organismos, macro
e micro, decompositores da matéria orgânica, que promovem uma intensa e vital
reciclagem da matéria e mantêm a floresta.

Ab'Sáber (2002), expõe que a complexidade da região leva a muitas


distorções no estudo dos ecossistemas locais, porque, numa primeira vista,
a floresta amazônica constituiu uma enorme massa vegetal aparentemente
homogênea, mas que esconde uma infinidade de ecossistemas individualizados
e inteiramente diferentes uns dos outros, ou, em outros casos, tão semelhantes
que apenas sutilezas permitem diferenciá-los.

Essa dinâmica complexa origina três tipos de paisagens principais: a


floresta de terra firme, a floresta de várzea e a floresta de igapó.

Floresta de terra firme – É a formação de grande porte, que caracteriza a


região. Colonizou terrenos acima da faixa de inundação – entre 60 e 200 metros de
altitude. No seu interior encontram-se as florestas de várzea, de igapós e os campos.
As copas das árvores emergentes, muitas vezes acima de 60 metros de altura,
formam um dossel tão compacto que, no interior da mata, chegam tão somente de
5% a 10% da luz incidente. A umidade, pois, cresce em direção à superfície do solo.

Rizzini (1979, p. 56) destaca quatro estratos de árvores na floresta:


o andar emergente, acima de 60 metros, comumente, entre 40-50 metros. O
segundo estrato tem árvores com altura entre cinco e 20 metros. O terceiro
estrato é arbóreo-arbustivo, entre dois e cinco metros. O estrato herbáceo,
formado por ervas e árvores jovens, fica sob a sombra permanente e só se
desenvolve se houver a abertura de uma clareira. Cipós e trepadeiras não
chegam a formar um emaranhado.

Rizzini (1979, p. 58), cita um relatório da FAO que assinala um inventariado


feito em 200 milhões de hectares, nos quais encontraram-se cerca de 400 espécies
de árvores, de 47 famílias, com diâmetro superior a 25 cm. A maior parte das
árvores tem tronco fino, devido à competição pela luz, que as obriga a crescer,
e poucas ultrapassam 1 m de diâmetro. Há exceções: a sumaúma (Ceiba), a
castanheira (Bertholletia excelsa), o angelim-pedra (Dinizia excelsa) e jutaí (Apuleia)
ultrapassam os 3,5 metros de diâmetro.

“Existem dois mata-paus, Clusia (Guttiferae) e Ficus”, (Moraceae) (FERRI,


1980, p. 23). Triplaris e Tococa são gêneros de plantas mirmecófilas e Rizzini (1980,
p. 54), menciona mais de 20 gêneros de plantas que vivem em associações com
formigas. Predominam as Leguminosas, as Moráceas e as Sapotáceas (FERRI).

238
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

Florestas de várzeas – Colonizam terrenos baixos, recentes, sujeitos a


inundações períodicas. A faixa de terras inundáveis pode chegar a 100 km terra
adentro (FERRI). Ferri (FERRI, p. 25), “refere-se a uma várzea baixa, em que a cobertura
é muito semelhante à dos igapós, porque permanece inundada por muito tempo, e a
uma várzea alta, em que a inundação é curta e a vegetação é muito parecida com a da
terra firme”. Rizzini (1979, p. 55), “distingue a flora das matas de várzea dos rios de
água branca, que transportam muitos sedimentos erodidos das margens, da flora das
matas de várzea dos rios de água preta, que não transportam sedimentos”.

As várzeas são menos desenvolvidas a partir da foz do rio Negro, em


direção ao mar. Em muitos lugares aparecem campos com canarana, uma
gramínea alta, quase sempre inundados, e nos quais a população planta a juta
(CORCHORUS, JOLY, 1991, p. 456) (RIZZINI).

“As árvores da mata de várzea têm, em média, de 10 e 20 metros, embora


o andar emergente possa variar entre 20 e 30 metros. O sub-bosque é rico em
arbustos, lianas, palmeiras e epífitos” (RIZZINI, p. 56). São comuns nas várzeas
o pau-mulato (Calycophyllum spruceannum), o cumaru (Coumarona odorata), a
seringueira (Hevea brasiliensis), etc.. “O angelim-pedra (Dinizia excelsa), uma
leguminosa, chega a 60 metros” (FERRI, 1979, p. 26).

“Floresta de igapó – Nas margens sempre inundadas dos rios e córregos,


a mata de igapó assemelha-se a um grande pântano” (Rizzini, 1979, p 59).
A água é escura, porque contém grandes quantidades de restos orgânicos em
decomposição e, por isto, o substrato é mal arejado.

Os igapós são mais comuns no baixo Amazonas, devido à maior deposição


de sedimentos pelos rios. As raízes sapopemas com dois ou três metros de altura são
frequentes. Para suprir a deficiência de aeração da água empoçada, as raízes retiram
oxigênio do ar por meio de lenticelas, orifícios existentes nas raízes, e o passam
para a árvore. As matas de igapós são pobres em espécies, quando comparadas
às outras duas. As árvores são cobertas de musgos, hepáticas, orquídeas, aráceas,
piperáceas, bromeliáceas, gesneriáceas e pteridófitos. As árvores mais típicas são o
taxi ou tachizeiro (Triplaris surinamensis), a mamorana (Bombax aquaticum), o arapari
(Macrolobium acaciaefolium) e a sumaúma (Ceiba pentandra), dentre as mais comuns.
Junto dos rios, a planta mais característica, no Baixo Amazonas, é a
aninga (Montrichardia arborescens), que tem caule ereto de 3-4 cm de
diâmetro, e dois a três metros de altura. O caule é cheio de cicatrizes de
folhas que caíram e as folhas remanescentes formam um tufo no ápice.
No Alto Amazonas, a aninga desaparece e é substituída pela Victoria
regia ou Victoria amazonica, como é conhecida atualmente, da família
Ninfeácea (Nymphaeaceae), da qual fazem parte os nenúfares. (JOLY,
1970, p. 16; FERRI, 1980, p 25).

A Victoria amazonica, a planta mais conhecida da Amazônia, tem folhas com


1,50 a dois metros e flores brancas ou rosadas, com 40 centímetros de diâmetro.
O caule permanece enterrado no substrato no fundo do rio e o longo pecíolo sobe
em direção à superfície da água, onde se abre nas folhas cujo limbo pode suportar
um adulto deitado.

239
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

2.5 DOMÍNIO DOS PLANALTOS DAS ARAUCÁRIAS


O domínio dos planaltos das Araucárias é recoberto pela conífera Araucaria
angustifolia, com altitudes entre 500 e 1.300 metros, clima subtropical úmido,
verões brandos e invernos suaves, com neve eventual e rara. A amplitude térmica
anual é acentuada. As temperaturas são fortemente influenciadas pelas altitudes.
A floresta de araucária – floresta ombrófila mista – recobria uma superfície de
177.600 km2, mas hoje não passa de 20.000 km2 (LEITE, 1995).

A paisagem do geofácies Planalto Central é distinguida por áreas


aplainadas recobertas por vegetação campestre, cercadas por vertentes em
degraus, nas quais a floresta ombrófila mista avança sobre os campos, migrando
desde os vales recobertos pelas matas de galeria.

A floresta mista deixa a impressão de homogeneidade, mas, na verdade,


é muito heterogênea, e Klein (1978, p. 10) estabelece duas formações: a floresta
dos pinhais ou de araucária e a floresta dos faxinais. A floresta de pinhais ou
de araucária "[...] é formada por pinheiros em geral de grande porte e submatas
igualmente bem desenvolvidas e densas, onde predominam as Lauráceas [...]"
(KLEIN, 1978). A floresta de faxinal, entre 700 e 1.200 metros de altitude,

[...] apresenta pinheiros de menor porte e esparsos, com submata baixa,


pouco densa, onde predominam os representantes das Mirtáceas e
Aquifoliáceas, entremeadas por densos taquarais e carazais". Os faxinais
são uma transição da floresta ombrófila densa do litoral para a floresta
ombrófila mista. (KLEIN, p. 14).

Klein (1978) agrupa a floresta de araucária em quatro núcleos principais:


bacia dos rios Iguaçu e Negro e do alto vale dos afluentes do rio Uruguai; bacia
dos rios Pelotas e Canoas; do extremo oeste; e núcleos da floresta na zona da mata
pluvial atlântica.

Floresta de araucária dos rios Iguaçu e Negro e do alto vale dos afluentes
do rio Uruguai – Compunha uma formação uniforme com imbuia (Ocotea porosa),
sapopema (Sloanea lasiocoma) e a erva-mate (Ilex paraguariensis) como principais
espécies da submata. Muitas famílias de árvores grandes compunham o restante
da flora – Lauráceas (em que se destacam as canelas Ocotea e Nectandra, e a
citada imbuia), Mirtáceas, Sapindáceas, Compostas, Leguminosas, Meliáceas,
Cunoniáceas, Verbenáceas, Rosáceas, Aquifoláceas e Caneláceas. O estrato das
arvoretas não é denso e o número de espécies é diminuto, com destaque para
a erva-mate (Ilex paraguariensis), pelo seu valor econômico – e, por isso mesmo,
quase inexistente em sua forma nativa, predominando as monoculturas de
caráter comercial. Taquaras (Merostachys multiranea, taquara-mansa) formam um
emaranhado de touceiras muito densas, que recobre o solo.

Floresta de araucária na bacia dos rios Pelotas e Canoas – Eram grupamentos


muito densos, que recobriam as encostas dos vales e, nos topos de relevo
ondulado, eram substituídos pelos campos. O sub-bosque era menos denso que o

240
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

da formação anterior. Em Lages, a Laurácea canela-lageana (Ocotea pulchella) era


a principal espécie do sub-bosque. Outras Lauráceas também apareciam na mata
desse domínio e também eram vistas no agrupamento anterior. No entanto, neste
grupo, apresentavam maior densidade e abundância: canela-amarela (Nectandra
lanceolata), canela-guáica (Ocotea puberula), canela-fedida (Nectandra grandiflora) e
a canela-fogo (Cryptocarya aschersoniana). Klein (1978, p. 12), cita várias espécies
de árvores que apresentavam afinidade com a canela-lageana e compunham o
sub-bosque da floresta com ela. Dentre elas, destacam-se camboatá (Matayba
elaeagnoides), guamirim (Myrcia obtecta), o araçazeiro (Myrcianthes gigantea), a
congonha (Ilex theezans) etc.

Floresta de araucária do extremo oeste – Nos divisores dos rios Peperi-


Guaçu, das Antas, Chapecó e Irani aparece uma floresta de araucária pouco
densa, com pinheiros idosos. À medida que se desce para os vales, a floresta
subtropical subcaducifólia do rio Uruguai se encorpa e substitui os pinheiros,
que, então, apenas alcançam as vertentes médias. A floresta é uma continuação
da formação dos rios Negro e Iguaçu e das cabeceiras dos afluentes do rio
Uruguai. A imbuia (Ocotea porosa) vai, aos poucos, cedendo lugar para outra
composição florística, onde se destaca a sapopema (Sloanea lasiocoma). A
imbuia é representada por indivíduos velhos, o que mostra que estão sendo
substituídos por outras espécies, típicas da floresta subtropical das bacias dos
rios Paraná e Uruguai, como as canelas Ocotea e Nectandra.

FONTE: Klein (1960, p. 37)

As espécies mais comuns que aparecem nos pinhais do extremo-oeste são


o angico--vermelho (Parapiptadenia rigida), a guajuvira (Patagonula americana), a
grápia (Apuleia leiocarpa) etc.

Esta fase da sucessão da araucária mostra que ela está, aos poucos, sendo
substituída pela floresta pluvial subtropical. Klein (1978, p. 13) enfatizava que "Na
submata destes pinhais, o pinheiro não apresenta possibilidades de regeneração.
Tudo indica que estamos assistindo a uma lenta, mas segura expansão da floresta
subtropical em detrimento dos pinhais, que, paulatinamente, vêm perdendo
terreno". Em 1960, Klein (Klein, 1960, p. 38) já chamava a atenção para esse fato
ao observar que "[...] em grandes extensões as associações da mata pluvial vêm
subindo pelos vales dos rios, substituindo todas as espécies características do
pinheiro [...] (que) cairá também, vítima da invasão da mata pluvial".

Isso significa que a floresta de araucária, independente da ação do homem,


tende a se autoextinguir no clima atual, porque, por ser uma conífera, típica de
clima com temperaturas baixas, a araucária não suporta temperaturas muito
altas. O clima atual favorece a expansão das florestas tropicais úmidas, razão pela
qual as espécies da floresta ombrófila mista estão sendo substituídas pela flora
subtropical do rio Uruguai, que avança para o norte.

241
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Núcleos de pinhais na zona da mata pluvial atlântica – São disjunções


da araucária na planície quaternária, no meio da floresta ombrófila densa,
formadas por pinheiros adultos e velhos. A submata tinha espécies tanto do
planalto quanto da mata pluvial. Há muito essas disjunções deixaram de
existir, substituídas por agricultura e pastos e outras atividades humanas. A
importância paleofitogeográfica delas era muito grande, porque eram os últimos
representantes de uma época do Quaternário em que, devido ao período glacial,
a araucária desceu as encostas das serras e chegou até as proximidades do mar.

A migração do pinheiro sobre os campos, a formação dos capões e


das matas de galeria são consequência de uma perfeita interação da Araucaria
angustifolia com a fauna. No início da brotação, o pinhão prefere a sombra, mas
passada essa fase inicial, a luz solar é capital para o seu desenvolvimento.

O principal veículo de dispersão do pinheiro são animais roedores e aves.


Müller (1986: 36) identificou várias espécies de animais e de aves que se alimentam
dos pinhões e estudou os seus hábitos alimentares na dispersão do pinhão: ouriço
(Coendu insidiosus), paca (Cuniculus paca), cotia (Dasyprocta azarae), caxinguelê
(Sciurius ingrami), camundongos diversos (família Cricetidae), gralha-azul
(Cyanocorax caeruleus, Corvidae) e a gralha-amarela (Cyanocorax chrysops, Corvidae).

A gralha-azul é, popularmente, considerada o mais importante vetor


de dispersão do pinheiro. A gralha-azul apanha o pinhão na própria pinha e o
transporta para um lugar que julga seguro para comê-lo. No entanto, se, no voo,
o pinhão cair, ela voltará à árvore à cata de outro. Uma vez no solo, o pinhão
poderá germinar. A gralha-amarela pega o pinhão no chão, que caiu da árvore,
não da pinha. Muitas vezes, um pinhão que a gralha-azul deixou cair no momento
em que bicava a pinha. A gralha-azul jamais desce até o solo. Portanto, ocupam
nichos diferentes e não competem entre si.

Os demais animais e aves pegam o pinhão no chão. Os roedores o levam


para a sua toca, onde podem se alimentar em segurança.

Para Reitz & Klein (1966, p. 24), “o vento e a queda do pinhão têm pouca
participação na germinação”. No entanto, Mattos (1994, p. 130), afirma que o vento
é importante na fecundação: caso os pinheiros masculinos e femininos estejam bem
localizados, uns em relação aos outros, os grãos de pólen terão boas probabilidades
de cair sobre os estróbilos femininos, desde que a velocidade do vento seja de 7
km/h. Acima e abaixo dessa velocidade, dificilmente haverá fecundação.

242
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

2.6 DOMÍNIO DAS PRADARIAS MISTAS DO SUDESTE DO


RIO GRANDE DO SUL
O domínio das pradarias mistas do Sudeste do Rio Grande do Sul constitui
uma paisagem temperada úmida, que se estende do Rio Grande do Sul para o
Uruguai e para a Argentina, compondo o limite das pradarias pampeanas (sic) e,
ao mesmo tempo, uma paisagem individualizada. (AB'SÁBER, 1973, p. 6).

A paisagem é aplainada, com encostas suaves e longas, tendo, nos


vales, florestas galerias subtropicais. Os solos são variados: paleossolos claros
desenvolvidos em climas frios e paleossolos vermelhos evoluídos em climas
quentes, o que gerou uma grande quantidade de tipos de solos, destacando-se
as classes brunizem, grumossolo e planossolo. (BIGARELLA; ANDRADE-LIMA;
RIEHS, 1975).

Os campos não se limitam apenas ao Rio Grande do Sul, mas invadem os


Estados de Santa Catarina e Paraná, trazendo características específicas em cada
um deles. Na Região Sudeste eles aparecem no topo das serras da Mantiqueira,
do Mar e do Espinhaço. Embora este tópico tenha a designação do domínio
morfoclimático de Ab'Sáber, ele será estendido para outras áreas do Brasil em
que as formações campestres preedominam.

Rizzini (1979, p. 192) mostra uma afinidade entre o cerrado e os campos,


ao estabelecer uma hierarquia nítida, que se inicia com o cerradão, passa pelo
cerrado e continua no campo cerrado, campo sujo e campo limpo – com o solo
cada vez mais escasso em nutrientes e mais rico em alumínio e, consequentemente,
a vegetação empobrecendo nesta direção – isto é, desde a fisionomia de mata
fechada no cerradão às ervas do campo limpo, que, contudo, pode ter árvores
baixas e muito espaçadas.

Na Região Sul, onde os campos aparecem no interior da floresta de


araucária, Leite (1995, p. 129), extrapolando a limitação sugerida por Ab'Sáber,
explica que a aplicação do termo estepe para os campos sulinos deve-se à influência
das altitudes sobre os campos, o que se acentua no inverno. Existe um nítido
período frio de três a oito meses, em que a média térmica é igual ou inferior a 15º
C, e um período quente de zero a três meses, com médias de temperatura maior
ou igual a 20º C.

“As estepes mencionadas por Ab'Sáber aparecem no extremo sul do


Estado do Rio Grande do Sul, ocupando o Planalto da Campanha e a Depressão
do Rio Ibicuí e do Rio Negro”. (LEITE; KLEIN, 1990, p. 138).

Observando os aspectos fisionômicos e estruturais, Leite (1995: 130) agrupa


os campos nas seguintes categorias: Formação Parque, Formação Gramíneo-
Lenhosa, Contato Estepe Ombrófila e Floresta Ombrófila Mista.

243
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Formação parque – Aparece nas superfícies onduladas e forte-onduladas


dos derrames ácidos mesozoicos, em altitudes superiores a 1.000 metros na forma
de estepe. A formação parque tem dois estratos: um arbóreo-arbustivo, com
plantas perenefoliadas esparsas, em que Araucaria angustifolia formava florestas-
galerias e capões de onde se irradiava com as suas espécies companheiras para os
campos, e o outro, gramíneo-lenhoso, com hemicriptófitas, caméfitas e geófitas,
com predominância de Andropogon lateralis (campim-caninha). Aparece nas
regiões de São Joaquim e Bom Jardim da Serra, em Santa Catarina, e no Planalto
Sul-Rio-Grandense, em terrenos forte-ondulados e montanhosos pré-cambrianos
com acentuada erosão e em altitudes menores que 1.000 metros. “Nos locais
protegidos do vento pode-se ver formações florestais mais bem desenvolvidas”.
(LEITE; KLEIN, 1990, p 133). Klein (1978, p. 19) “inclui a Formação Parque nos
campos de altitude, que aparecem nos topos das serra Geral e do Mar, em Santa
Catarina, na forma de manchas no meio da floresta nebular”.

Na Serra Geral, o capim-caninha é comum nas áreas mais enxutas, e onde a


umidade se acentua, as tiriricas (Rhynchospora e Scleria) e os botões-de-ouro (Xyris)
desenham a paisagem mais característica. As turfeiras, com o musgo Sphagnum
spp, são comuns, ao lado da samambaia-dos-gramados (Blechunm imperiale).

Formação gramíneo-lenhosa – A paisagem campestre mais típica


encontra-se espalhada no meio das florestas de araucárias, que formam capões
e florestas-de-galeria. Os campos formam a paisagem mais característica do
Planalto Meridional, de tal forma que são conhecidos pelo nome local, muitas
vezes associado ao Município: Campos Gerais, do Segundo Planalto Paranaense,
Campos de Curitiba, Campos de Lages etc. – cada um deles associado a fatores
geológicos e pedológicos específicos, que lhes dão características próprias. Mas
advertem Leite (1995, p. 131) e Leite e Klein (1990, p. 134), essas características
não os dotam, necessariamente, de flora ou de fisionomia notáveis.

Em Santa Catarina, Klein (1978, p. 17) inclui esta formação na sua


classificação de campos com capões, florestas ciliares e pequenos bosques de pinhais.
Predominam espécies das famílias das Gramíneas, Ciperáceas, Compostas,
Leguminosas e Verbenáceas. Klein os denomina de campos limpos, em contraste com
os campos sujos, em que aparecem carqueja-do-campo (Baccharis gaudichaudiana),
a vassoura-lageana (Baccharis uncinella), os caraguatás (Bromeliácea) (Eryngium
spp), e a samambaia-das-taperas (Pteridium aquilinum). Nos campos sujos acham-
se os capões e as matas ciliares, que se expandem e ocupam os campos e, desta
forma, exercem um papel fundamental na dispersão da araucária.

Por ser a paisagem mais comum no Planalto Meridional, é, por isto mesmo,
a mais ocupada e descaracterizada pelas atividades do homem. Queimadas,
pecuária intensiva e extensiva, agricultura, reflorestamentos, desmatamentos,
esgotamento dos solos pelo excesso de uso, deterioração da águas dos rios,
como o Peixe, em Santa Catarina, uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos são
algumas das incontáveis atividades exercidas pelo homem na região.

244
TÓPICO 2 | AS PAISAGENS FITOGEOGRÁFICAS DO REINO NEOTROPICAL

Contato estepe ombrófila/floresta ombrófila mista – A facilidade que as


espécies têm para ocupar o espaço depende diretamente da sua capacidade de
expansão. A temperatura no Planalto Meridional é uma barreira para espécies
tropicais, mas não o é para as subtropicais e temperadas. A temperatura está
vinculada diretamente à latitude e à altitude. O contato entre as duas formações
mostra claramente essa característica. Os campos sulinos originaram-se em
climas frios e mais secos que o atual (KLEIN, 1975). Portanto, as espécies
atuais que os recobrem descendem de um ambiente diferente do de hoje. Por
outro lado, a flora da floresta mista congrega tanto espécies temperadas, como
a araucária, e tropicais ou subtropicais, como a canela. Portanto, a floresta mista
"[...] não dispõe, no momento post glacial atual, de elementos florísticos arbóreos
adaptados a colonizar todos os espaços ombrófilos do planalto, principalmente
os mais frios [...]", porque a flora tropical não suporta temperaturas muito baixas
(LEITE, 1995, p. 133).

Klein afirma que a flora dos campos e a temperada estão em desacordo com
o atual período interglacial, úmido e quente. A sucessão vegetal se faz, por isso, do
litoral, mais quente, para o interior, mais frio. Entretanto, há espécies da floresta
ombrófila densa que não suportam temperaturas demasiado baixas, ao passo que
outras conseguem galgar as escarpas das serras Geral e do Mar (LEITE).

Para Leite, a expansão da flora tropical para o planalto mostra uma


importante qualidade sua, que é a agressividade. Em contrapartida, a flora
ombrófila mista – subtropical e temperada – é pouco agressiva, pois que se deixa
invadir "[...] por todos os lados por contingentes florísticos diversos, a ponto de
espécies como a araucária serem suplantadas em muitos lugares".

Todavia, a agressividade das espécies tropicais é menor nos pontos mais


altos, onde as temperaturas são baixas. Desse modo, os campos estão livres da
sua expansão. As condições ambientais em que se encontram os campos mostram
que eles atingiram o clímax climático nas suas áreas de ocorrência, porque o seu
hábitat não pode ser ocupado por outra vegetação por causa dos solos rasos e das
temperaturas baixas. Nas áreas de solos pouco espessos, litólicos, bem drenados,
que não podem suportar árvores nem espécies tropicais, os campos de solos
espessos são invadidos e ocupados pela araucária, o que mostra que, neste caso,
o clímax é florestal e não campestre.

As serras quartzíticas de Minas Gerais e Goiás são o centro de dispersão


dos campos no Brasil, diz Rizzini (1979, p. 195) – “todos os campos derivam
desses. Nas serras, os solos são rasos e secos e há uma estação seca ecológica. O
campo aí também atingiu o clímax climático, pois não cede o lugar para qualquer
outro tipo de vegetação”. (p. 202).

Nesses biótopos, a flora campestre é muito rica, mas à medida que se


irradia vai empobrecendo e diferenciando. Em direção ao sul, a flora tem menos
representantes, mas é composta de um maior número de indivíduos, o que é
favorecido pelo clima de temperaturas menores e chuvas constantes (1979, p. 196).

245
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Rizzini (1979, p. 204) agrupa os campos limpos do Brasil Central da


seguinte maneira:

a) Campos ferruginosos – campos com cobertura de canga.


b) Campos quartzíticos – com gramíneas e subarbustos e os campos dos
afloramentos.
c) Campos "gerais".
d) Campos planálticos.
e) Campo arbustivo.
f) Campo altimontano.

246
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico você estudou que:

● Recobrindo uma superfície de cerca de 18 milhões de km2 (TROPPMAIR, 2002,


p. 82), no Planalto Central brasileiro, há o domínio dos chapadões tropicais
com duas estações, recobertos por cerrados e com florestas-galeria. O clima é
sazonal, com chuvas de verão, que mantêm uma drenagem perene. A estiagem
dura de quatro a cinco meses, predominantemente no inverno. As chuvas
variam entre 1.100 e 1.600 mm/ano.

● A paisagem do cerrado é formada por um tapete descontínuo e esparso de


gramíneas, entremeado de ervas, arbustos e árvores. Arbustos e árvores têm
troncos tortuosos, casca espessa, folhas coriáceas, duras e revestidas por uma
camada de cera ou pêlos. As folhas têm cor clara ou acinzentada, são grandes e
pontudas, o que facilita o gotejamento e evita a acumulação da água na folha,
reduzindo a incidência de infecções por fungos.

● A fisionomia do cerrado está na dependência da quantidade de nutrientes e de


alumínio nos solos.

● As atividades agrícolas no cerrado aceleraram-se a partir da década de


70, quando técnicas modernas de cultivo e de criação foram introduzidas,
com o objetivo de estimular o crescimento econômico do Planalto Central,
especialmente depois da fundação de Brasília. Cerca de 70% da produção de
carne bovina vêm do Planalto Central. Feijão, soja, milho e arroz são outros
produtos largamente cultivados, graças às técnicas de correção do solo.

● O domínio das regiões serranas tropicais úmidas ou dos "mares de morros",


recobertos por florestas pluviais, corresponde à região dos mares de morros
de origem ígnea e metamórfica, forma uma faixa que se estende ao longo do
litoral oriental do reino Neotropical e ocupa uma área de mais de 1 milhão de
quilômetros quadrados. O clima superúmido, com temperaturas elevadas
durante todo o ano, originou uma forte decomposição das rochas, o que resultou
num manto de alteração muito espesso, graças a um processo de mamelonização,
que se alternou com a pedimentação e compôs uma paisagem típica de morros
gnáissicos e granítico-gnáissicos de vertentes arredondadas, que Ab'Sáber (1993,
1966, apud AB'SÁBER, 1973, p. 15) chamou de mares de morros.

● A floresta ombrófila densa, a mata Atlântica, recobre a cadeia costeira, a Serra


do Mar, estende-se até os mares-de-morros e a Serra da Mantiqueira, cujo
ambiente já apresenta algumas diferenças em relação ao litoral.

247
● As condições ecológicas e biogeográficas da floresta ombrófila densa, que se
encontra no litoral, e a floresta tropical do interior, são inteiramente diferentes
e ambas as formações não podem ser tomadas como uma comunidade única.

● As condições ambientais mudam do litoral para o interior – o clima úmido


do litoral, sem estação de estiagem, torna-se mais seco, sazonal, com duas
estações bem marcadas. A influência do oceano reduz-se gradativamente para
o interior. As frentes polares raramente entram no interior de Minas Gerais,
vindas do litoral, pois o seu avanço é dificultado pelas serras do sul do Estado
e, sobretudo, pela Serra do Mar e, mais no interior, pela Mantiqueira.

● O domínio das depressões intermontanas semiáridas, com inselbergs e


drenagem intermitente e recoberta por caatingas, é considerada uma região
de contrastes. O Nordeste brasileiro começa a mostrar a sua complexidade
no clima, que é o que mais se destaca, não só por conferir individualidade à
região, como também, por ser o principal elemento do qual decorrem as demais
características do relevo, da vegetação e da rede fluvial.

● Na caatinga, como há falta de água, as plantas têm que economizá-la. Por


isto, os estômatos se fecham durante as horas quentes do dia, reduzindo,
pois, a fotossíntese. Dessa forma, não há produção excessiva de carboidratos
– como se dá no cerrado – e as plantas, por conseguinte, não os acumulando,
não são esclerófitas. Não obstante serem xerófitos, as plantas da caatinga não
apresentam fisionomia de xeromorfismo, como as do cerrado – que não são
xerófitos, mas apresentam essas características, porque são esclerófilas.

● O domínio das terras baixas equatoriais, extensivamente florestadas da


Amazônia, estende-se na região equatorial e subequatorial, ocupando uma
superfície de mais de 2,5 milhões de km2. São planícies de inundação labirínticas
e meândricas, tabuleiros de vertentes convexas e morros mamelonares baixos,
que aparecem nos relevos cristalinos, juntamente com relevos residuais de
pães-de-açúcar, inselbergs no Quaternário.

● A floresta deve a sua existência ao regime de chuvas e às temperaturas elevadas


que provêm os ecossistemas com uma população de organismos, macro e
micro, decompositores da matéria orgânica, que promovem uma intensa e vital
reciclagem da matéria e mantêm a floresta.

● Essa dinâmica complexa origina três tipos de paisagens principais: a floresta de


terra firme, a floresta de várzea e a floresta de igapó.

● O domínio dos planaltos das Araucárias é recoberto pela conífera Araucaria


angustifolia, em altitudes entre 500 e 1.300 metros, clima subtropical úmido,
verões brandos e invernos suaves, com neve eventual e rara. A amplitude
térmica anual é acentuada. As temperaturas são fortemente influenciadas pelas
altitudes. A floresta de araucária – floresta ombrófila mista – recobria uma
superfície de 177.600 km2, mas hoje não passa de 20.000 km2 (Leite, 1995).

248
● A paisagem do geofácies Planalto Central é distinguida por áreas aplainadas
recobertas por vegetação campestre, cercadas por vertentes em degraus, nas
quais a floresta ombrófila mista avança sobre os campos, migrando desde os
vales recobertos pelas matas de galeria.

● A migração do pinheiro sobre os campos, a formação dos capões e das matas de


galeria são consequência de uma perfeita interação da Araucaria angustifolia
com a fauna. No início da brotação, o pinhão prefere a sombra, mas passada
essa fase inicial, a luz solar é capital para o seu desenvolvimento.

249
AUTOATIVIDADE
1 Quais são os Domínios Morfoclimáticos Brasileiros, conforme Ab’Sáber (1976)?

2 Recobrindo uma superfície de cerca de 18 milhões de km2 no Planalto Central


brasileiro, o Domínio dos chapadões tropicais tem um clima sazonal, com
chuvas de verão, que mantêm uma drenagem perene. Acerca deste domínio
morfoclimático, coloque V para as afirmativas verdadeiras e F para as falsas.

( ) A estiagem dura de 4 a 5 meses, predominantemente no inverno. As chuvas


variam entre 1.100 e 1.600 mm/ano.
( ) A paisagem do cerrado é formada por um tapete descontínuo e esparso de
gramíneas, entremeado de ervas, arbustos e árvores.
( ) O cerrado exibe uma fisionomia xerófita muito acentuada, maior que a da
caatinga. Mas como não falta água, a vegetação é mesófita e não xerófita.
( ) O cerrado brasileiro está caminhando em ritmo acelerado para a sua
extinção. Em Minas Gerais, por exemplo, o cerrado foi praticamente todo
cortado para alimentar os fornos siderúrgicos.
( ) Os solos são pobres e predominam os latossolos vermelho-escuros e
vermelho-amarelos, com textura argilosa. Nos relevos acidentados
aparecem lateritas, e nas veredas, solos orgânicos e gley húmicos.

Agora, assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – V – F – F.
b) ( ) V – V – V – V – V.
c) ( ) F – F – V – V – V.
d) ( ) F – F – V – F – V.

3 Relacione os domínios morfoclimáticos brasileiros com suas respectivas


características:

1 Domínio dos chapadões tropicais.


2 Domínio das regiões serranas tropicais úmidas.
3 Domínio das depressões intermontanhas semiáridas.
4 Domínio de planaltos subtropicais.
5 Domínio das coxilhas subtropicais uruguaio-sul-rio-grandense.
6 Domínio das terras baixas equatoriais.

( ) Tem clima sazonal, com chuvas de verão, que mantêm uma drenagem
perene. A estiagem dura de quatro a cinco meses, predominantemente no
inverno. As chuvas variam entre 1.100 e 1.600 mm/ano.
( ) Estende-se na região equatorial e subequatorial, ocupando uma superfície
de mais de 2,5 milhões de km2. São planícies de inundação labirínticas e
meândricas, tabuleiros de vertentes convexas e morros mamelonares baixos,
que aparecem nos relevos cristalinos, juntamente com relevos residuais de
pães-de-açúcar, inselbergs no Quaternário.
250
( ) São recobertos pela conífera Araucaria angustifolia, com altitudes entre
500 e 1.300 metros, clima subtropical úmido, verões brandos e invernos
suaves, com neve eventual e rara. A amplitude térmica anual é acentuada.
As temperaturas são fortemente influenciadas pelas altitudes.
( ) A paisagem é aplainada, com encostas suaves e longas, tendo nos vales
florestas-galerias subtropicais. Os solos são variados: paleossolos claros
desenvolvidos em climas frios e paleossolos vermelhos evoluídos em
climas quentes, o que gerou uma grande quantidade de tipos de solos,
destacando-se as classes brunizem, grumossolo e planossolo.
( ) Este domínio corresponde à região dos mares de morros de origem
ígnea e metamórfica, forma uma faixa que se estende ao longo do litoral
oriental do reino Neotropical e ocupa uma área de mais de 1 milhão de
quilômetros quadrados.
( ) É considerada uma região de contrastes. O Nordeste brasileiro começa a
mostrar a sua complexidade no clima, que é "[...] o que mais se destaca,
não só por conferir individualidade à região, como também, por ser o
principal elemento do qual decorrem as demais características do relevo,
da vegetação e da rede fluvial" (SILVA, 1972, p. 215). A tudo isso somam-
se os aspectos humanos, estreitamente ligados e praticamente dependentes
do clima semiárido.

Agora, assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) 1 – 2 – 3 – 4 – 5 – 6.
b) ( ) 1 – 4 – 5 – 6 – 2 – 3.
c) ( ) 2 – 3 – 4 – 1 – 5 – 6.
d) ( ) 6 – 1 – 5 – 3 – 4 – 2.

251
252
UNIDADE 3
TÓPICO 3

DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

1 INTRODUÇÃO
Os fatores físicos e bióticos interferem na vida dos organismos e estes
também intervêm nas variáveis naturais. Para Margalef (1989, p. 738), duas forças
atuam simultaneamente nesse sistema natural-antrópico. Uma força age fora das
relações ecossistêmicas e, sobre ela, os seres vivos não têm qualquer controle. Mas,
no interior do ecossistema, outra força intefere diretamente nas suas atividades
e, consequentemente, nos seres vivos. Graças à ação conjunta dessas forças, o
ecossistema evolui e é palco de mudanças dirigidas por elas.

Uma das mais importantes mudanças que se dão nos ecossistemas e nos
geossistemas é a sucessão vegetal ou ecológica. Do ponto de vista biogeográfico,
a sucessão ecológica dirige a expansão espacial das plantas e da fauna que as
acompanha. É, na verdade, um processo muito complexo, que procura levar os
ecossistemas e os geossistemas a um equilíbrio final. Temos duas forças atuando
na sucessão – uma, de origem biológica, alicerçada nas relações ecossistêmicas,
e outra, de origem geográfica, que leva as plantas a ocupar o espaço geográfico e
dar-lhe uma forma.

À medida que a sucessão prossegue, os biótopos e hábitats são ocupados


e podem, pois, ser mapeados e descritos biogeograficamente. A complexidade do
mecanismo da sucessão aparece quando se considera todos os seus aspectos físicos e
biológicos. Solos, clima, bioquímica e fisiologia do solo, sociologia vegetal, as atividades
do homem etc. têm que ser analisados detidamente. Conceitos de Botânica, Zoologia,
Geografia, Biologia, Ecologia, Química, Física, econômicos e sociais são a base para
a compreensão da sucessão. Portanto, a sucessão vegetal, dentro da perspectiva da
Biogeografia, não congrega apenas os aspectos biológicos e ecológicos.

Quando as plantas encontram condições físicas – solos, clima, relevo –


adequadas, estabelecem-se em grupos denominados comunidades vegetais. No
interior das comunidades formam grupos sociais de espécies diferentes. Os grupos
sociais refletem as condições ecológicas e geográficas de cada hábitat particular.

253
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

2 A COMUNIDADE VEGETAL E COMUNIDADES VEGETAIS


Apesar da forte competição entre as plantas, as que chegam mais tarde
conseguem se estabelecer e todas crescem juntas. As plantas ocupam diferentes
hábitats e é neles que a competição é alta. As plantas constituem agrupamentos
variados, com estrutura e composição florística próprias. Esses grupos são as
comunidades vegetais.

As biocenoses são formadas por uma variedade de populações e


comunidades. A formação fitogeográfica que predomina numa biocenose é
chamada de matriz. (FORMAN; GODRON, 1986).

Quando a matriz é alterada, instala-se um mecanismo complexo de


recomposição da vegetação. Esse mecanismo deriva da retroalimentação negativa
e é conhecido como sucessão vegetal ou ecológica. Nela, uma variedade de formas
vegetais se sucederá, usando o mesmo habitat e repartindo entre si as mesmas
condições ambientais, desde o clima aos minerais e a água do solo.

A cobertura vegetal varia entre o topo das montanhas, as vertentes e


os vales. A flora em cada caso desses também é diferente. Os vales, uma vez
ocupados, comporão um mosaico relativamente homogêneo de vegetação.
Por serem unidades ou subsistemas menores, os vales apresentam, em geral,
condições físicas muito homogêneas, o que congrega uma flora mais ou menos
específica – isto não é uma regra geral, contudo. Dentro de um mesmo hábitat
pode haver muitas diferenciações florísticas.

Logo, o mosaico de vegetação resulta das condições físicas locais, do


topoclima, isto é, o clima local, o microclima, solos, relevo, água, altitude etc.
Portanto, a noção de hábitat alicerça-se nos componentes físicos.

A planície costeira em Santa Catarina é um biótopo ocupado pela floresta


ombrófila densa. Nela, o clima tem menor participação na manutenção da vegetação
do que as propriedades do solo. O biótopo da planície quaternária costeira tem
hábitats colonizados por plantas típicas. Por exemplo, os banhados, as áreas de
solos úmidos, mas não encharcados, as áreas de solos secos etc. A vegetação desses
biótopos e hábitats é denominada de edáfica, porque o solo prevalece sobre o clima.

O hábitat também pode ser o galho de uma árvore, sobre o qual vive uma
comunidade de plantas, como epífitas, lianas, parasitas e variados animais. O
hábitat é composto por lugares específicos com propriedades específicas. Rizzini
(1977, p. 8) os chama de substrato – substratro rochoso, arenoso etc. Em cada um
deles desenvolve-se uma sucessão diferente.

254
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

A comunidade é, pois, um conjunto de seres vivos – animais e plantas -


que habita um território. Os conjuntos diferentes de seres vivos que compõem
a comunidade são as populações e cada população é integrada por uma única
espécie animal ou vegetal.

Na comunidade, os organismos cumprem, cada um, uma função própria,


um papel específico. Essa posição é seu nicho ecológico. Por exemplo, os herbívoros
têm o seu próprio nicho – comem vegetais. Mas cada herbívoro específico – o boi,
o coelho, o elefante, a girafa etc. – ocupa seu nicho próprio – a girafa alimenta-se
das folhas mais altas da árvore; o coelho come as ervas etc. Portanto, a noção de
nicho ecológico está ligada ao tipo de alimento.

As comunidades de seres vivos vivem na biosfera, a zona favorável à vida,


que se estende desde o subsolo até a troposfera. Por ocupar área tão extensa, as
comunidades especializaram-se em três grandes ambientes, ou biociclos – águas
salgadas, águas doces e terras.

O biociclo terrestre compreende quatro grandes biomas – florestas,


savanas, pradarias (ou campos ou ainda estepes) e desertos (veja o quadro na
próxima página). Os biomas são subdivididos em unidades menores.

A base dos biomas é a resposta que as associações vegetais dão aos grandes
regimes climáticos – precipitação, luz, temperatura e ventos. Já estudamos os biomas.

“As comunidades vegetais constituem uma hierarquia complexa,


interligada, que resulta da interação de variáveis físicas e bióticas. O homem
intervém constantemente e altera algumas de suas propriedades. Mas o
homem não muda o geossistema, apenas transforma a organização espacial”.
(TROPPMAIR, 2002, p. 5). Algumas variáveis físicas são ligeiramente
modificadas. Por exemplo, horas de insolação, maritimidade e continentalidade,
embasamento geológico, tipos de solos, relevo, climas etc., não mudam quando o
homem ocupa um território. Podem ocorrer alterações em algumas propriedades
dessas variáveis, como no solo – ele pode tornar-se fértil ou infértil, mais ácido,
mais seco etc. O homem pode rebaixar um morro ou mesmo uma serra, mas não
alterará o relevo regional. Pode alterar as condições climáticas de um lugar, mas
não mudará o clima regional, muito menos o global etc.

O Quadro 8 mostra uma hierarquia das comunidades vegetais, baseada


em Dansereau (1957) e Strahler (1986 e 1998).

255
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As plantas têm a sua extensão horizontal mais ou menos limitada a cada


um dos níveis do Quadro 8. Entretanto, uma determinada planta pode, de acordo
com as características do meio e as suas próprias, como a valência ecológica,
aparecer em mais de uma unidade. À medida que se for descendo na classificação
em direção ao hábitat, mais e mais restrita será a espécie. Logo, um hábitat pode
ser designado pela espécie ou espécies dominantes que ocorrem no seu interior.
Há, no interior do hábitat, uma biocenose específica, que pode caracterizá-lo.

Porém, a mata ciliar pode ser considerada um hábitat e, nela, a variedade


de espécies é elevada, não se restringindo a uma ou outra apenas, mas a todo
um conjunto – uma biocenose –, muito rico em espécies, individualizado por um
ambiente físico específico, que são as margens dos rios. Também uma diáclase,
em que haja uma nascente com uma biocenose específica de locais úmidos pode
ser um hábitat. Portanto, a noção de hábitat é muito ampla e é o pesquisador
quem vai determinar os seus limites. Algumas espécies não são confinadas a um
dado hábitat. Por exemplo, o capim melado (Melinis minutiflora) pode aparecer no
cerrado e nos morros desmatados da floresta Atlântica.

Por outro lado, liquens e musgos geralmente ocorrem em hábitats muito


específicos, como cascas de árvores, base de um muro na sombra, rochas etc.
Os liquens podem aparecer em biótopos ensolarados, mas os musgos, de modo
geral, crescem apenas em hábitats úmidos e sombrios.

O estudo dos biótopos é de grande importância para o planejamento


territorial. Troppmair (1984) define o biótopo como “[...] o espaço ocupado por
determinada biocenose, com seus diferentes tipos de vida (biotipo); [...] o biótopo
é uma expressão espacial que abrange os aspectos estruturais abióticos e bióticos
em equilíbrio”. Para aquele autor, os biótopos têm uma vasta amplitude, que vai
desde as nascentes, passa pela vegetação ciliar, que são paisagens de valor estético,
até antigas zonas de mineração, em que crateras foram abandonadas e depósitos de
rejeitos são biótopos que podem ser transformados em áreas de refúgio da flora e
da fauna. São chamadas de Áreas de Preservação Ambiental ou APA.

256
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

QUADRO 8 – HIERARQUIA DAS COMUNIDADES VEGETAIS. BASEADA EM DANSEREAU (1957),


STRAHLER (1984) E STRAHLER E STRAHLER (1998)
Unidade Controle Superfície Tipo de Tipos de Tipos de Formação
Vegetação
ambiental principal coberta resposta biociclos biomas fitogeográfica
Águas
salgadas
Biociclo Vários
Físico Planetária Ecológica Águas Várias
tipos
doces
Terrestres
Úmida
Florestas
equatorial
Úmida
tropical
Monçônica
Temperada
Decídua
Aciculifólia
(pinheiros)
Perenefólia

Úmida
Savanas
Espinhosa
Climático tropical
Biomas Continental Estrutural Classes -
Savana
Semideserto
Manguezais e
Alagados
Tundra

Pradaria
Pradarias
(campos)
Estepe
Tundra
herbácea

Deserto seco
Desertos
Tundra ártica
Ecológico e
Formações
geográfico Regional Estrutural Várias - - Várias
fitogeográficas
(espacial)
Micros-
Microclimá-
-sociedade
Biótopos tico e Nichos Microedáfico - - -
ou
biológico
agregação
Microtopo-
Comunidades
gráfico e Local Sociológico Associação - - -
vegetais
microedáfico
Microclimá- Camadas
Sinúsias Sociológico Várias - - -
tico verticais
Topográfico
Hábitats Local Sociológico Associação - - -
e edáfico

FONTE: O autor

257
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

3 ESTRUTURA DAS COMUNIDADES


As plantas podem ser agrupadas segundo as formas de vida e segundo
as espécies. Os dois conceitos são importantes na descrição e classificação das
comunidades. Normalmente, enfatiza-se o agrupamento de espécies, que destaca
as relações fitossociológicas entre as plantas. Em áreas de amostragem analisam-
se aspectos qualitativos e quantitativos de todas as espécies presentes.

O agrupamento de espécies obedece à fitossociologia vegetal. O estudo da


fitossociologia vegetal implica em conhecer padrões qualitativos e quantitativos
de todas as espécies numa área-teste da comunidade. Os caracteres quantitativos
incluem o número de indivíduos (abundância) e a sua densidade (número
de espécies por área, em metro ou quilômetro quadrado), a aglomeração
(formação de grupos com dominância de uma espécie), a cobertura espacial e
extensão (distribuição) e frequência (quantas vezes uma espécie aparece numa
comunidade). Os caracteres qualitativos implicam na estratificação (composição
vertical), na vitalidade (fatores que levam a espécie a aparecer em diversos
lugares) e na periodicidade (épocas de floração, de formação do fruto, etc).
Simultaneamente, o hábitat é descrito, por exemplo, quanto aos tipos de solos, de
relevo, à altitude, etc. (KLEIN, 1974).

Os fatores quantitativos e qualitativos são analíticos e a eles se juntam


os fatores sintéticos, obtidos pela comparação da lista de espécies de outras
amostras. De posse dessas informações, pode-se definir, finalmente, a unidade
fitossociológica básica de vegetação, a associação. Os fatores sintéticos incluem a
constância, a frequência e a fidelidade.

Constância compreende a porcentagem de ocorrência dos indivíduos


de uma mesma espécie numa comunidade. Esse grupo de indivíduos, que é a
população, indica a ocorrência da espécie naquela comunidade. Frequência é o
número de vezes que uma espécie aparece numa única área. Fidelidade indica o
grau com que uma espécie é restrita a um tipo particular de comunidade. O grau
de fidelidade varia de espécies exclusivas, limitadas a associações específicas, até
espécies indiferentes, que não têm preferência por uma associação particular, isto
é, podem aparecer em vários habitats diferentes. Espécies de alta fidelidade são
um indicador confiável de certas condições ambientais.

Braun-blanquet (1932, apud DANSEREAU, 1957, p. 198), estabeleceu


os graus de sociabilidade das plantas dentro de um critério sintético (de análise
integrada). Os graus são os seguintes:

258
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

Grau de fidelidade 5 – espécies exclusivas: limitadas a associações


específicas.
Grau de fidelidade 4 – espécies seletivas: mais frequentes em algumas
associações que em outras.
Grau de fidelidade 3 – espécies preferenciais: aparecem em várias
associações com maior ou menor abundância, mas terão maior vitalidade
numa associação específica que em outra.
Grau de fidelidade 2 – espécies indiferentes: não têm preferência por
qualquer associação, aparecendo indistintamente em qualquer uma. Também
chamadas de espécies companheiras.
Grau de fidelidade 1 - espécies acidentais: raras ou acidentais, relictos
ou pioneiras.

Klein (1974) analisou a fidelidade das lauráceas nas florestas de araucária


em Santa Catarina. Adotando o método criado por Braun-blanquet (1932), Klein
classificou as lauráceas das florestas de araucária nos três graus mais elevados e
classificou as espécies companheiras, que acompanham a araucária, como fidelidade
2. Klein (1974) não incluiu espécies com fidelidade 1 na mata de araucárias.

A floresta de araucária (Araucaria angustifolia) tem quatro andares ou


sinúsias (KLEIN, 1974), segundo as formas de vida:

Megafanerófitas, com a araucária dominando e podendo atingir de 30


a 45 metros;

Macrofanerófitas, com árvores de 15 a 30 metros, com destaque para


as lauráceas;

Mesofanerófitas, arvoretas de cinco a 12 metros, predominando as


aquifoliáceas (família com três gêneros, de caráter temperado, comum nos dois
hemisférios. Plantas arbustivas ou arbóreas (das quais se destaca, no sul do
Brasil, o gênero ilex, a erva-mate); as sapindáceas (família com 140 gêneros,
principalmente trepadeiras, arbustos e algumas árvores comuns nos trópicos
e subtrópicos de todo o mundo). São, geralmente, plantas venenosas, como
algumas espécies dos gêneros serjania e paullinia, trepadeiras comuns nas matas.
O timbó é uma raiz venenosa usada pelos índios em pescarias, que as mergulham
na água. Uma espécie de paullinia tem sementes usadas no preparo do guaraná,
na Amazônia); as mirtáceas (família com 100 gêneros e mais de 3.000 espécies,

259
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

que têm as Américas e a Austrália como centros principais de dispersão. São


plantas lenhosas, arbustivas ou arbóreas. No Brasil, são comuns a goiaba, o araçá,
a jabuticaba, a pitanga, o jambo etc. O gênero eucalipthus é originário da Austrália
e aparece em todo o mundo como planta cultivada. As mirtáceas têm tronco liso
e florescem no início da primavera (JOLY, 1991);

Nanofanerófitas, arbustos e ervas entre um a três metros de altura.

Existem 22 espécies de lauráceas na floresta de araucária em Santa Catarina,


das quais apenas três são exclusivas da formação das araucárias. (KLEIN, 1974).

Empregando o método de Braun-blanquet, Klein (1974) estabeleceu os


graus de fidelidade na floresta de araucária, como segue:

Fidelidade 5 – existem três espécies exclusivas e confinadas apenas


às comunidades da submata de pinheiros: Ocotea porosa (imbuia), Nectandra
reticulata (canela), Cinnamomum sellowianum (garuva). O porosa é a espécie mais
característica dos pinheirais, aparecendo em todos os ambientes da mata – desde
os vales até os topos e encostas –, principalmente no norte do Estado, onde
aparece com uma abundância entre 50% e 80% da composição florística do sub-
bosque. A árvore alcança de 15 a 20 metros de altura, podendo o tronco chegar a
1,5 metro de diâmetro. A principal área da imbúia estende-se de Campo Alegre,
Mafra e Porto União até o Oeste do Estado, numa extensão de 400 quilômetros,
passando por Concórdia, de onde avança para o sudoeste. A oeste da cidade de
Ponte Serrada, a imbuia começa a ter os seus valores de abundância reduzidos,
até desaparecer no contato com a mata pluvial subtropical do Rio Uruguai. Para
o sul, aparece apenas até Curitibanos.

Fidelidade 4 – são espécies seletivas, que podem ser vistas numa comunidade,
mas também aparecem em outras, embora com alguma raridade. Na floresta de
araucária ocorrem quatro espécies: Ocotea pulchella (canela lageana), O. Puberula
(canela guáica ou canela sebo), Nectandra grandiflora (canela fedida ou canela amarela)
e o Acutifolia (canela branca). O. pulchella é a espécie mais típica neste grupo, e, depois
da imbuia, é a que caracteriza mais fortemente a mata de araucária.

Ela aparece indistintamente na mata de araucária adulta, quanto junto


a pinheiros jovens, nos morros cristalinos da encosta atlântica. Sua distribuição
é ampla no sudeste do planalto de Santa Catarina (São Joaquim, Lages, dentre
outras) e no extremo oeste (Xanxerê, São Lourenço, etc.). Aparece ainda em Minas
Gerais, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul. Um espécime pode alcançar de
20 a 30 metros de altura.

260
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

Fidelidade 3 – espécies preferenciais, que podem aparecer em várias


comunidades do sul do país, mas que apresentam melhor vitalidade nas florestas
de araucária.

Klein (1974), destaca três espécies desta categoria: Cryptocarya aschersoniana


(canela fogo, que aparece nas baixas encostas, nas margens de rios pequenos e
em solos úmidos não encharcados da mata de araucária e da mata da encosta
atlântica), Ocotea pretiosa (canela sassafrás, distribui-se na encosta atlântica, na
mata de araucária e na floresta subtropical do Rio Uruguai, principalmente nos
topos em que as matas sejam bem desenvolvidas, sempre em solos bem drenados.
É muito comum na zona de transição da araucária com a mata pluvial) e Nectandra
lanceolata (canela amarela, em toda a mata de araucária e em solos úmidos da
encosta atlântica. Muito comum na zona dominada pela canela lageana).

Fidelidade 2 – representada por espécies indiferentes, isto é, aquelas


que não são fixas nos pinheirais. Duas espécies são importantes: Nectandra
megapotâmica (canela preta, cresce nos pinheirais, onde aparece nas áreas
dominadas pela imbuia, e nos estágios pioneiros da mata subtropical do Oeste
de Santa Catarina. Na encosta atlântica é pouco comum, mas a sua frequência
cresce para oeste, sobretudo a partir do Médio Vale do Itajaí-açu), e Cinnamomum
glaziovii (garuva, de ampla difusão na araucária e na mata pluvial atlântica, onde
aparece em terrenos levemente ondulados e nos solos quaternários fluviais. Na
floresta ombrófila densa a sua abundância cresce para oeste, sendo pouco comum
nas proximidades do litoral.

As unidades fitossociológicas são agrupadas segundo uma dada série


de espécies, representada pelo gênero dominante acrescido do sufixo-etum. Esse
conjunto origina a associação, a unidade básica da comunidade. As associações
dominadas pela Ocotea são denominadas ocotietum, as dominadas pela Araucaria
formam a associação araucarietum etc.

4 O DESENVOLVIMENTO DA COMUNIDADE. SUCESSÃO,


CLÍMAX E HIERARQUIA DAS COMUNIDADES
O desenvolvimento das comunidades de plantas é um processo gradual,
que representa o estágio final de uma longa série sucessiva de diferentes
comunidades que colonizaram o hábitat.

261
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A substituição de uma comunidade por outra é chamada de sucessão


vegetal ou sucessão ecológica e a sequência de mudanças pelas quais as
comunidades passaram é conhecida por sere. Uma sere é considerada completa
somente quando a comunidade alcançou uma forma estável, que apresenta a mais
alta forma de vida vegetal que o hábitat pode conter a comunidade clímax. Nesse
momento, a comunidade atingiu o seu ponto de equilíbrio com o meio natural e
não ocorrem mais mudanças. Alguns ecossistemas podem levar milhares de anos
para atingir o clímax. Mas em alguns casos, a sucessão completa pode levar cerca
de um século ou menos para atingir o estágio de equilíbrio dinâmico, um estado
estável ou estado estacionário.

Os seres têm participação ativa na pedogênese – as raízes aprofundam


o solo, as plantas mortas e decompostas enriquecem o solo e mantêm a teor de
umidade. Essas propriedades favorecem a comunidade seguinte, que será mais
exigente que a anterior.

A sucessão vegetal ocorre em três tipos de habitats – numa rocha exposta, num
solo recém-desenvolvido ou recém-exposto às intempéries ou numa área desmatada.

Existem dois tipos de sucessão – a sucessão primária e a sucessão secundária.

A sucessão primária dá-se em um lugar nunca antes colonizado por


vegetação, como uma rocha, lava resfriada ou o leito seco de um rio ou lago.
O exemplo mais notável são as ilhas Krakatoa, em Java, e Surtsey, na Islândia.
Nessas ilhas, pouco tempo depois das erupções, formou-se um solo rico em
nutrientes, provindos do magma e, num tempo relativamente curto, as ilhas
foram recolonizadas por plantas e animais.

A sucessão secundária ocorre num lugar em que a cobertura anterior foi


retirada, como um terreno cuja vegetação foi queimada ou uma área cultivada
e, em seguida, abandonada. Na sucessão secundária, o hábitat não é totalmente
estéril, porque alguns espécimes das comunidades anteriores permanecem nele.
Mas, devido à exposição do solo às intempéries – erosão laminar, em sulcos –
ventos, neve, chuvas, radiação solar etc. – ele, forçosamente, empobrecerá e a
sucessão será menos rica que a primária. Com o tempo, contudo, as comunidades
tenderão a se tornar mais complexas, com a introdução de novas espécies. A flora
não será idêntica à primária.

A sucessão é governada por fatores internos ou externos à comunidade.


No primeiro caso, a sucessão é autogênica, isto é, os fatores originam-se na própria
área, como modificações no solo – não na classe do solo, mas nas suas propriedades,
por exemplo, quando ele se torna mais salinizado ou mais ácido ou mais rico ou
pobre em nutrientes. A sucessão é alogênica quando os fatores são externos, como
uma mudança climática ou um processo de erosão (cuja origem é externa).

262
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

A sucessão primária começa com a chegada de plantas pioneiras sobre uma


rocha nua. Esta etapa inicial é chamada de fase de colonização. Participam dela
poucas espécies vegetais, sempre bem adaptadas às condições locais, resistentes aos
fatores limitantes e, pois, pouco exigentes – drenagem rápida da água, pouca oferta
de água e de nutrientes, exposição à luz e ao vento e variação de temperaturas.
As plantas pioneiras são algas microscópicas e líquens, que aderem firmemente
à rocha e se encontram aptos para suportar condições extremas de calor, frio,
vento. A morte dos líquens libera ácidos orgânicos, ao serem decompostos por
micro-organismos, que dissolvem minerais do substrato e dão início à formação
do solo (pedogênese). À medida que aumenta a carga de matéria orgânica, cresce
também a população de micro-organismos, logo seguida por uma fauna de macro-
organismos, como formigas, aranhas, ácaros, lesmas, caracóis e outros.

A comunidade pioneira gradualmente é substituída pela comunidade


seguinte, representada pelos musgos, que dão ao solo recém-formado estabilidade e
profundidade, fato que ajuda a manter a sua coesão e adiciona matéria orgânica a ele
e, desta forma, retém a umidade. O solo só é considerado formado quando, à matéria
mineral proveniente das rochas decompostas, é adicionada a matéria orgânica.

Seguem-se aos musgos, quando morrem, arbustos perenes ou anuais, cujas


raízes encontraram profundidade bastante para se fixar. As plantas modificam
o microclima, porque criam sombra e, desta forma, alteram a temperatura e a
luz solar. Além disso, reduzem a velocidade do vento e, portanto, diminuem a
evapotranspiração.

Os musgos e as pequenas ervas preparam o solo e o ambiente para o


estabelecimento de plantas maiores e mais exigentes: são espécies de arbustos
lenhosos, que expulsam as ervas e os musgos e, eventualmente, podem formar
uma densa comunidade arbustiva. Pequenas árvores heliófitas começam a chegar
ainda esparsas, retorcidas, e logo se tornam cobertas por líquens, musgos e
pequenas epífitas. O adensamento das árvores expulsa os arbustos, por causa do
sombreamento. A continuação da sucessão vai depender do tipo de relevo, do clima
e do solo. Num relevo (topografia) plano, a floresta pode dominar, finalmente, mas
numa vertente com alta declividade, a sucessão pode se interromper nos arbustos.

A evolução da cobertura vegetal prosseguirá até o clímax dominante.

Há, pois, uma progressão da cobertura mais simples até a mais complexa,
de uma camada de plantas a várias camadas e de uma comunidade instável a
uma mais estável. O número de espécies de animais e de plantas aumenta ao
passo que a sucessão prossegue. A produtividade da comunidade também cresce
no mesmo sentido.

263
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A sucessão leva mudanças aos fatores físicos do ambiente, como o


microclima de uma floresta, cuja evolução está na dependência do crescimento da
vegetação. Numa escala maior, a atmosfera local também se encontra relacionada
ao resultado da sucessão.

À medida que a sucessão avança, a intensidade do seu ritmo tende a


reduzir-se gradativamente. Nas etapas iniciais ela é rápida e intensa, mas nas
finais, com a vegetação mais densa bem evoluída, o ritmo diminui até atingir um
estado estacionário no clímax. As etapas ou fases se sucedem e nunca se repetem –
a sucessão só se dá numa direção. As fases podem ser consideradas sistemas menos
maduros, ou menos instáveis – no começo da sucessão – e sistemas mais maduros,
ou mais estáveis – no fim da sucessão. No entanto, há um certo retorno a uma
etapa imediatamente anterior, representado pela vegetação que começa a crescer e
substituir a anterior e vai representar aquela fase. Em outras palavras, há uma zona
intermediária em que as formações vegetais são simultâneas a duas fases sucessivas.
Por isso, Margalef (1989, p. 738) representa a sucessão por uma estrutura helicoidal.
A amplitude da hélice muda com o passar do tempo e das etapas. Ocorrem sempre
sobreposições, que representam uma rápida volta à etapa anterior.

Na realidade, o que há é a sobreposição da etapa seguinte na precedente,


até que esta última seja, finalmente, substituída. No início, a hélice tem amplitudes
largas, porque a quantidade de novidades que chegam é muito grande. Em outras
palavras, as etapas iniciais são abertas a vários gêneros de plantas.

Mas nas etapas finais, a amplitude da hélice diminui proporcionalmente


à maturidade do sistema, porque ele se torna, paulatinamente, exclusivo,
mais complexo e mais estável. Quanto mais maduro o ecossistema, maiores
as possibilidades de vida para os organismos e, pois, mais intensa é a taxa de
renovação dos seres vivos. A tendência da sucessão é alcançar um estado mais
provável, ou o estado estacionário, no clímax.

Há dois tipos de sucessão: aquela que cria uma organização com os


elementos de que dispõe (sucessão primária ou secundária) e a que admite
inovações na forma de novos elementos, que se juntam à estrutura inicial graças
à dispersão natural ou quando introduzidos pelo homem.

As primeiras fases da sucessão têm pouca organização, porque recebem


o impacto direto do ambiente físico. Mas à medida que o ecossistema se torna
maduro e uma ordem se estabelece, as trocas com o meio externo se reduzem,
mas não cessam, porque ele, pouco a pouco, se estabiliza. Por exemplo, uma
estiagem prolongada – fator externo ao ecossistema - afetará pouco a vegetação de

264
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

maior porte das etapas finais, porque o lençol aquífero a abastece relativamente
bem de água até que as chuvas retornem ao seu ritmo normal. A vegetação de
maior porte está bem assentada no hábitat e convive relativamente bem com
as condições naturais que lhe são oferecidas. É claro que ela tem um limite de
resistência. Quando o limite for ultrapassado – e ele é frágil, por mais complexo
que seja o ecossistema –, toda a comunidade poderá ser destruída e substituída
por outra. Essa substituição inclui a vegetação plantada pelo homem.

QUADRO 9 – VARIAÇÕES DO ECOSSISTEMA


Características do ecossistema

Sucessão Tempo Na variação do


ecossistema, podem-se
distinguir duas
componentes: uma
cíclica, que
representa um retorno
a situações passadas,
e uma componente
com direção definida,
cujo sentido é
irreversível.

(Seg. Margalef, 1989)

Flutuações e ritmos
FONTE: Margalef (1989)

À medida que a comunidade caminha no sentido da formação mais


estável, torna-se mais fechada – não um sistema fechado –, mais exclusiva, e,
pois, restringe o aparecimento de novas espécies, porque o grau de liberdade é,
gradativamente, menor. Isto se explica pela especialização cada vez mais intensa
da formação, isto é, as espécies que colonizaram o hábitat estão mais e mais
próximas do clímax regional.

A sucessão é uma acumulação de informações do ambiente em que a


associação consegue, com o desenvolvimento cronológico da sucessão, ajuntá-las
e usá-las de imediato para dificultar cada vez mais a entrada de novas informações
vindas de fora, o que mostra que a organização surgida pode ser indiferente nas
fases iniciais e resistente a mudanças nas fases mais adiantadas.

265
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

No início da sucessão há um desequilíbrio entre a produção de matéria bruta


(produção primária), ou fotossíntese total, e a respiração da comunidade. Enquanto a
sucessão prossegue, a tendência é estabelecer um equilíbrio entre produção primária
e respiração da comunidade. O equilíbrio ocorre quando a comunidade atinge um
nível de desenvolvimento em que possa ser mantida pelo fluxo disponível de energia
e matéria, isto é, quando atinge um estado estacionário ou clímax.

Na sucessão num ambiente inorgânico, por exemplo, sobre uma rocha, a


taxa de fotossíntese total ou de produção primária bruta é sempre maior que a
da respiração da comunidade, mas num ambiente orgânico, como nos esgotos, a
respiração é mais intensa do que a produção primária, porque, nesse ambiente, a
sucessão é feita por organismos heterotróficos (ODUM, 1985).

Em qualquer estágio da sucessão haverá uma comunidade vegetal interligada


a animal, que será substituída pela comunidade seguinte, até o clímax final.

A vegetação evolui para um estágio mais complexo e permanece, então,


estável. Em teoria, ela está em equilíbrio com as condições físicas locais, isto é, num
estado estacionário: as entradas de energia e nutrientes estão em equilíbrio com as
saídas, e a composição da população é estável, com as taxas de natalidade e de morte
em equilíbrio. Na prática, entretanto, as condições ambientais são pouco estáveis por
longos períodos e o equilíbrio é precário, podendo ser rompido com relativa facilidade
– mesmo na fase de clímax, em que o ecossistema está maduro e bem estruturado. A
retirada de uma única árvore poderá refletir-se em todo o sistema.

O período de tempo necessário para alcançar o clímax varia muito e


depende das condições locais e da capacidade de dispersão das plantas e dos
animais. Em algumas ocasiões, a vegetação não evolui para o seu clímax, embora
as condições do hábitat o permitam, porque um fator externo, como vertentes
com alta declividade, excesso de umidade no solo ou falta de nutrientes impede
o clímax. Esse estágio é chamado de subclímax. Se o fator externo for retirado, o
mecanismo da sucessão prosseguirá em direção ao clímax.

A fase de clímax corresponde, pois, ao final da sucessão, a um ecossistema


maduro – estável – quando a vegetação dominante encontra-se em
equilíbrio com o meio (clima, relevo, litologia, solo e água do solo e os
fatores bióticos), um estado estacionário, em que a energia é importada
apenas para manter o ecossistema e não mais para promover o seu
desenvolvimento. Por essa razão, a produção líquida do ecossistema é
pequena. Nesse caso, diz-se que o ecossistema está em equilíbrio com
o ambiente, sobretudo o clima, e não ocorrem mudanças posteriores
– esta situação é chamada de monoclímax e é explicada pela teoria
monoclimácica. (CLEMENTS, 1916, in FURLEY; NEWEY, 1986, p. 109).

266
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

É o que se chama de clímax-climácico. A teoria monoclimática


foi desenvolvida por Frederick Clements (1874-1945), que supunha ser o
clima o único elemento que controlava o desenvolvimento das plantas.
(MOTTERSHEAD, 1984, p. 25).

“Por outro lado, se a comunidade de plantas não estiver em equilíbrio


com o clima, o clímax será determinado pelo solo, pelo relevo, pelo fogo ou
pela ação do homem. Portanto, há um policlímax, explicado pela teoria
policlimácica”. (CLEMENTS, 1916, in FURLEY; NEWEY, 1986, p. 109). “O
solo tem papel preponderante na sucessão policlimácica – o clímax edáfico.
A teoria policlimática substituiu a teoria monoclimácica, pois o clímax não é
determinado apenas pelo clima regional, mas pela interação de todos os fatores
locais”. (MOTTERSHEAD, 1984, p. 25).

A vegetação do cerrado brasileiro atingiu o clímax regional. O cerrado


não deve o seu desenvolvimento unicamente ao clima, porque o solo tem ação
capital no seu estabelecimento e manutenção. Há, pois, um clímax edáfico, que
governa as diversas formas de cerrado – campo cerrado, cerrado, cerradão –, que
depende do teor de nutrientes nos solos – que cresce do campo cerrado para o
cerradão, e de alumínio, que reduz na mesma direção.

A hierarquia das comunidades está relacionada ao porte da planta.


A maior comunidade é chamada de bioma. Os biomas são constituídos por
formações fitogeográficas, que são reconhecidas pela planta predominante – por
ex.: a formação da araucária. A floresta subtropical semidecídua do Rio Uruguai
é dominada pela presença de espécies decíduas. As florestas tropicais úmidas –
florestas ombrófilas densas – das Américas do Sul e Central, as florestas sempre
verdes de coníferas (taiga) ou os campos temperados da eurásia (Sibéria), são
outros exemplos de formações fitogeográficas. Em cada uma dessas áreas, as
espécies de plantas (floras) são diferentes, mas a resposta do tipo dominante de
vegetação a um regime climático similar é igualmente similar, desde que essas
espécies tenham, durante o curso de sua evolução, desenvolvido estruturas
adaptadas ao ambiente. Por exemplo, as estepes russas são fisionomicamente
muito semelhantes às pradarias americanas, embora cada região esteja situada
a uma grande distância uma da outra e tenham climas diferentes. Em cada uma
delas há espécies tipicamente predominantes.

A sucessão das plantas também varia segundo os diferentes ambientes.


Caso o ambiente seja desprovido de água, temos uma xerossera; se for úmido,
hidrossera. As xerosseras podem ser litosseras (em rochas nuas), ou psamosseras (em
ambientes arenosos, como nas restingas). Se a sucessão se dá em água doce, temos
a hidrossera. Se em água salgada, a halossera.

267
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As áreas modificadas pelo homem são extensas e a vegetação original,


praticamente, não mais regenera em muitos desses lugares. A cobertura poderá
ser de ervas raquíticas, muitas vezes, xerófitas, esparsas, com largas extensões do
solo descoberta. A retirada da vegetação leva à sucessão secundária, com as etapas
diferentes que se superpõem – etapa das pioneiras, etapa de campos (com ervas,
gramíneas), etapa arbustiva, etapa arbustivo-arbórea (quando arbustos e árvores se
misturam), etapa arbóreo-arbustiva (com predomínio das árvores sobre os arbustos)
e etapa arbórea. A etapa arbórea pode ser de dois tipos – a etapa arbórea da sucessão
primária e a etapa arbórea da sucessão secundária, que antecede a floresta secundária.

Na floresta ombrófila densa do litoral do sul do Brasil, essas etapas têm


os seguintes nomes populares, durante a recuperação da vegetação: campo ou
pasto, capoeirinha (arbustos), capoeira (arbustos e árvores), capoeirão (árvores) e
floresta secundária (árvores de grande porte).

As formações secundárias jamais serão semelhantes às primárias, porque,


quando a cobertura é retirada, as propriedades ambientais dos solos e dos topoclimas
e microclimas mudam muito e com certa rapidez. Até que a cobertura vegetal se
recomponha, o solo será lavado pelo escoamento superficial e a perda de nutrientes
será considerável. Quando a vegetação começa a se recompor, nas etapas iniciais da
sucessão, o solo recebe quantidades crescentes de nutrientes à medida que a sucessão
prossegue. Mas a sua recomposição é muito lenta, o que influi no porte e no tipo
(espécie) de planta. Nas primeiras etapas prevalecem plantas pouco exigentes em
nutrientes e água e tolerantes ao excesso de luz e calor. O solo é oligotrófico (isto é,
pobre em nutrientes), as espécies são, em geral, esclerófitas e xerófitas. À medida que
o sombreamento se expande, a umidade é mantida no solo e começam a aparecer
espécies ciófitas, que não são esclerófilas nem xerófitas, mas mesófitas.

Muitos fatores afetam a distribuição das plantas e a sua ação é mais ou


menos simultânea. Em algumas situações pode agir somente um fator, ou um
grupo deles interfere. Mottershead (1984, p. 25) enumera esses fatores:

268
TÓPICO 3 | DINÂMICA DA VEGETAÇÃO: SUCESSÃO E CLÍMAX

● Fatores físicos - luz, temperatura, umidade, condições do solo, nutrientes


minerais, co2 (atmosfera).

● Fatores bióticos - graus de tolerância das plantas às condições físicas,


dispersão e migração das plantas, competição com outras plantas por luz,
água e nutrientes, ação de animais, insetos desfolhadores, organismos
patogênicos (como certos fungos), homem (pastos, fogo, plantações,
desmatamentos, emissão de gases e compostos tóxicos).

Esses fatores interferem de um modo ou de outro nas plantas e aceleram


ou desaceleram o seu crescimento. Por isso, há plantas com maior ou menor
desenvolvimento, mesmo sendo da mesma espécie e que cresceram em solos
semelhantes, mas que apresentam leves variações.

269
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico você estudou que:

● Uma das mais importantes mudanças que se dão nos ecossistemas e nos
geossistemas é a sucessão vegetal ou ecológica. Do ponto de vista biogeográfico,
a sucessão ecológica dirige a expansão espacial das plantas e da fauna que as
acompanha. É, na verdade, um processo muito complexo, que procura levar os
ecossistemas e os geossistemas a um equilíbrio final. Temos duas forças atuando
na sucessão – uma, de origem biológica, alicerçada nas relações ecossistêmicas,
e outra, de origem geográfica, que leva as plantas a ocupar o espaço geográfico
e dar-lhe uma forma.

● Quando as plantas encontram condições físicas – solos, clima, relevo –


adequadas, estabelecem-se em grupos denominados comunidades vegetais.
No interior das comunidades formam grupos sociais de espécies diferentes.
Os grupos sociais refletem as condições ecológicas e geográficas de cada
hábitat particular.

● A comunidade é, pois, um conjunto de seres vivos – animais e plantas - que


habita um território. Os conjuntos diferentes de seres vivos que compõem a
comunidade são as populações e cada população é integrada por uma única
espécie animal ou vegetal.

● O biociclo terrestre compreende quatro grandes biomas – florestas, savanas,


pradarias (ou campos ou ainda estepes) e desertos. Os biomas são subdivididos
em unidades menores.

● As plantas podem ser agrupadas segundo as formas de vida e segundo as


espécies. Os dois conceitos são importantes na descrição e classificação das
comunidades. Normalmente, enfatiza-se o agrupamento de espécies, que
destaca as relações fitossociológicas entre as plantas. Em áreas de amostragem,
analisam-se aspectos qualitativos e quantitativos de todas as espécies presentes.

● O agrupamento de espécies obedece à fitossociologia vegetal. O estudo da


fitossociologia vegetal implica em conhecer padrões qualitativos e quantitativos
de todas as espécies numa área-teste da comunidade.

● O desenvolvimento das comunidades de plantas é um processo gradual,


que representa o estágio final de uma longa série sucessiva de diferentes
comunidades que colonizaram o hábitat.

270
● A substituição de uma comunidade por outra é chamada de sucessão vegetal
ou sucessão ecológica e a sequência de mudanças pelas quais as comunidades
passaram é conhecida por sere. Uma sere é considerada completa somente
quando a comunidade alcançou uma forma estável, que apresenta a mais alta
forma de vida vegetal que o hábitat pode conter. A comunidade clímax. Nesse
momento, a comunidade atingiu o seu ponto de equilíbrio com o meio natural
e não ocorrem mais mudanças. Alguns ecossistemas podem levar milhares de
anos para atingir o clímax. Mas em alguns casos, a sucessão completa pode levar
cerca de um século ou menos para atingir o estágio de equilíbrio dinâmico, um
estado estável ou estado estacionário.

● A sucessão vegetal ocorre em três tipos de hábitats – numa rocha exposta,


num solo recém-desenvolvido ou recém-exposto às intempéries ou numa
área desmatada.

● Existem dois tipos de sucessão – a sucessão primária e a sucessão secundária.

● A sucessão é governada por fatores internos ou externos à comunidade.


No primeiro caso, a sucessão é autogênica, isto é, os fatores originam-se na
própria área, como modificações no solo – não na classe do solo, mas nas suas
propriedades, por exemplo, quando ele se torna mais salinizado ou mais ácido
ou mais rico ou pobre em nutrientes. A sucessão é alogênica quando os fatores
são externos, como uma mudança climática ou um processo de erosão (cuja
origem é externa).

● A sucessão leva mudanças aos fatores físicos do ambiente, como o microclima de


uma floresta, cuja evolução está na dependência do crescimento da vegetação.
Numa escala maior, a atmosfera local também se encontra relacionada ao
resultado da sucessão.

● Em qualquer estágio da sucessão haverá uma comunidade vegetal interligada


a animal, que será substituída pela comunidade seguinte, até o clímax final.

A fase de clímax corresponde, pois, ao final da sucessão, a um ecossistema


maduro – estável –, quando a vegetação dominante encontra-se em equilíbrio
com o meio (clima, relevo, litologia, solo e água do solo e os fatores bióticos),
um estado estacionário, em que a energia é importada apenas para manter o
ecossistema e não mais para promover o seu desenvolvimento.

● A hierarquia das comunidades está relacionada ao porte da planta. A maior


comunidade é chamada de bioma. Os biomas são constitiuídos por formações
fitogeográficas, que são reconhecidas pela planta predominante – por ex.: a
formação da araucária.

271
AUTOATIVIDADE

1 Caracterize os dois tipos de sucessão vegetal.

2 As plantas podem ser agrupadas segundo as formas de vida e segundo as


espécies. Os dois conceitos são importantes na descrição e classificação das
comunidades. Diante do exposto e com base no estudo realizado sobre a
estrutura das comunidades, analise as afirmativas a seguir:

I - O agrupamento de espécies obedece à fitossociologia vegetal. O estudo


da fitossociologia vegetal implica em conhecer padrões qualitativos e
quantitativos de todas as espécies numa área-teste da comunidade.
II - Simultaneamente, o hábitat é descrito, por exemplo, quanto aos tipos de
solos, de relevo, à altitude etc.
III - Constância compreende a porcentagem de ocorrência dos indivíduos de
uma mesma espécie numa comunidade. Esse grupo de indivíduos, que é
a população, indica a ocorrência da espécie naquela comunidade.
IV - Frequência é o número de vezes que uma espécie aparece numa única
área. Fidelidade indica o grau com que uma espécie é restrita a um tipo
particular de comunidade.
V - O grau de fidelidade varia de espécies exclusivas, limitadas a associações
específicas, até espécies indiferentes, que não têm preferência por uma
associação particular, isto é, podem aparecer em vários habitats diferentes.
VI - Espécies de alta fidelidade são um indicador confiável de certas condições
ambientais.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas as afirmativas III, IV e V.


b) ( ) Estão corretas as afirmativas I, III e IV.
c) ( ) Apenas a afirmativa II está correta.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

3 Sobre o desenvolvimento, sucessão, clímax e hierarquia das comunidades é


CORRETO afirmar:

I - O desenvolvimento das comunidades de plantas é um processo gradual,


que representa o estágio final de uma longa série sucessiva de diferentes
comunidades que colonizaram o hábitat.
II - A substituição de uma comunidade por outra é chamada de sucessão
vegetal ou sucessão ecológica, e a sequência de mudanças pelas quais as
comunidades passaram é conhecida por sere.
III - A sucessão vegetal ocorre em três tipos de hábitats – numa rocha exposta,
num solo recém-desenvolvido ou recém exposto às intempéries ou numa
área desmatada.

272
IV - A evolução da cobertura vegetal prosseguirá até o clímax dominante.
V - A tendência da sucessão é alcançar um estado mais provável, ou o estado
estacionário, no clímax.
VI - Se a comunidade de plantas não estiver em equilíbrio com o clima, o
clímax será determinado pelo solo, pelo relevo, pelo fogo ou pela ação do
homem. Portanto, há um policlímax, explicado pela teoria policlimácica.
VII - A hierarquia das comunidades está relacionada ao porte da planta. A
maior comunidade é chamada de bioma.

Agora, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Estão corretas as afirmativas I, II, IV e VII.


b) ( ) Estão corretas as afirmativas I, III e VI.
c) ( ) Estão corretas as afirmativas III, V, VI e VII.
d) ( ) Todas as afirmativas estão corretas.

273
274
UNIDADE 3
TÓPICO 4

A SOCIEDADE HUMANA

1 INTRODUÇÃO
A população humana é muito menor que a população da maior parte dos
seres vivos, mas a sua capacidade de modificação na dinâmica ambiental é tão
grande que atinge toda a biosfera. Sua importância hoje é de tal magnitude que,
para entender o funcionamento dos ecossistemas e geossistemas, é necessário
atentar para o papel do homem na natureza e avaliar os seus resultados.

Há, pelo menos, duas maneiras com que se pode enfocar o estudo
ecológico do homem na natureza (MARGALEF 1989, p. 789): “considerar a espécie
humana como um componente das cadeias tróficas ou supor o homem como um
subsistema da natureza, por um lado, e o restante da natureza de outro, como
outro subsistema, mas interagindo ambos”.

O primeiro ponto de vista permite usar o exemplo do homem para completar


e entender a teoria ecológica da sucessão, enquanto a segunda abordagem considera
o homem e a natureza como dois subsistemas que se completam: ele explora os
recursos naturais e determina um desequilíbrio maior ou menor nos ecossistemas.

O desequilíbrio dos geossistemas e ecossistemas provoca diminuição


da diversidade biológica e traz atreladas espécies oportunistas, em geral pouco
exigentes em nutrientes e em água.

A atividade humana corre no sentido oposto ao da sucessão ecológica, pois


promove o empobrecimento do biótopo. Cria-se uma outra organização espacial.

O homem não atua em todos os sistemas da biosfera. Alguns sistemas têm


pequena capacidade de regeneração, por serem muito simples e por causa da fragilidade
de seus elementos. Quanto mais simples os sistemas naturais, mais frágeis serão.

275
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

2 O IMPACTO DA SOCIEDADE NOS SISTEMAS NATURAIS


A Revolução Industrial pode ser considerada uma fase de transição da
humanidade. Um período cujas ramificações transformaram profundamente o
modo de pensar e agir da sociedade e a levaram a uma encruzilhada sem volta,
em que o desenvolvimento se transformou numa necessidade e, em seu nome,
muitos desmandos foram feitos, a ponto de mudar e rearranjar muitos sistemas
naturais e a sua organização espacial, destruindo uns e criando outros.

Ao inventar a máquina a vapor, o escocês James Watt (1736-1819) jamais


podia imaginar a reviravolta que causaria nas atividades econômicas da Inglaterra
e, muito menos, no mundo – houve, de fato, uma revolução da ordem até então
estabelecida. Ainda menos tinha ele noção das transformações que a natureza
sofreria desde então. James Watt está na origem dos problemas ambientais
modernos, com todo o respeito que a sua invenção, sem dúvida, mereça.

A invenção de Watt consistiu em modificar uma bomba a vapor, já


existente desde 1720, e usada para drenar a água de minas de carvão. Ao
introduzir aperfeiçoamentos na antiga máquina, Watt aumentou a sua eficiência
e a transformou numa verdadeira máquina a vapor. Em 1800, a máquina a vapor
de Watt era usada em 30 minas de carvão, 22 minas de cobre, 28 fundições, 17
cervejarias e oito fábricas de algodão. (HUBERMAN, 1971).

Por volta de 1840-50, delineava-se na Europa, especialmente na Inglaterra,


o que comumente se denomina de sociedade industrial. Na Inglaterra, o processo,
iniciado em fins do século XVIII, com a generalização do uso da máquina de Watt,
desencadeou uma rápida e profunda transformação econômica, com a expansão
urbana e das indústrias e a implantação de uma rede ferroviária nacional.

A expansão econômica resultou no aumento da população das cidades,


que recebiam milhares de pessoas vindas dos campos, no maior consumo de
produtos manufaturados, e no crescimento consequente do comércio.

A cultura e a educação difundiam-se – ao menos para os nobres e para


aqueles que podiam pagar –, nasciam movimentos de opinião pública, organizações
de trabalhadores da indústria e ligas de operários, preocupadas com as condições
de vida sub-humans nas indústrias e nas minas de carvão – crianças eram usadas,
muitas vezes, para empurrar vagões nos apertados túneis em que um adulto não
poderia se locomover e, não raro, trabalhavam mais de 16 horas por dia.

A promiscuidade, a total falta de higiene, inclusive pessoal, que facilitava


a proliferação de epidemias, também era motivo de preocupação de pessoas de
cabeça mais arejada.

Nas zonas industriais das grandes cidades, como Manchester, a qualidade


de vida era próxima do zero, como Fracchi (1970, p. 137) descreve: “nos grandes

276
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

bairros superpovoados das cidades industriais vivia-se em casas construídas às


pressas, pouco sólidas, e situadas em filas ao longo de ruas, que eram ao mesmo
tempo esgotos mal-cheirosos”.

A inexistência de condições sanitárias desencadeou uma epidemia de


cólera em Londres, em 1831-32. Contudo, somente em 1855, quando a cidade
já contava com uma população superior a um milhão de habitantes, é que
se construiu uma rede de esgotos coberta (FRACCHI). Mais da metade da
população não tinha água em casa e tinha que usar poços rasos, frequentemente
contaminados por coliformes fecais.

O uso dos recursos naturais aumentou simultaneamente ao crescimento


da população europeia e à expansão urbano-industrial, principalmente na
Inglaterra. Contudo, as condições sociais continuavam sub-humanas para mais
da metade da população das grandes cidades industriais, como Liverpool e
Manchester. No continente, os países europeus viram na industrialização uma
necessidade premente para a sua expansão econômica – não se cogitava, nem de
leve, do lado social e, muito menos, o ecológico.

O crescimento da exploração de minas, principalmente as de carvão, a


grande fonte de energia de então, deu início à deterioração dos recursos ambientais,
como os rios, cuja água era usada pela população para consumo doméstico.

As alterações nos ecossistemas tiveram a sua origem, ou, pelo menos, o


seu crescimento, efetivamente, nessa época. Não apenas a exploração dos recursos
minerais desfigurava a paisagem nos campos, introduzindo novas variáveis, que
substituíam as primárias e que, mais tarde, eram substituídas por outras, porém,
igualmente nas cidades, a deterioração ganhava impulso e começava a mostrar os
primeiros sinais. O célebre caso da mariposa Biston betularia, na Inglaterra, ilustra
bem as modificações de que os ecossistemas começavam a ser palco.

No restante da Europa, a industrialização cresceu, sobretudo, na segunda


metade do século XIX, notadamente a partir de 1870, quando a economia agrícola
passou à mista, com acentuada predominância do desenvolvimento industrial.
(FRACCHI, 1970).

A industrialização alemã data dessa época, quase um século depois da


inglesa. A expansão industrial alemã valeu-se da experiência e da técnica de
países já industrializados, como a França e a Inglaterra. A anexação dos territórios
franceses da Alsácia, com suas indústrias têxteis, e da Lorena, rica em ferro, depois
da guerra de 1870, e a indenização de guerra imposta aos franceses, foram fatores
fundamentais, que impulsionaram o desenvolvimento do país e constituíram-se
na mola propulsora da exploração dos recursos naturais para suprir as fábricas
que se expandiam pelo país. Juntando-se a isso, modernas ferrovias e canais
navegáveis ligavam as regiões industriais do interior aos portos marítimos por
onde passavam os seus produtos e chegavam matérias-primas e combustíveis
para as indústrias. Na metade da primeira década do século XX, a Alemanha já
era uma das maiores potências industriais do mundo.

277
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

O crescimento das atividades industriais, como a siderurgia, a indústria


química, a metalurgia, foi o ponto de partida para a expansão dos problemas
ambientais e para a modificação dos sistemas naturais. A agricultura, que
também se expandia, embora em ritmo mais lento, e a mineração, eram
atividades altamente transformadoras da organização espacial, porque se faziam
sem qualquer planejamento. Um dos problemas trazidos pela agricultura era a
aração, que revolve o solo e o torna facilmente erodível. Não existia qualquer
preocupação com a deterioração da natureza, com a disposição de resíduos, com
a localização das zonas industriais. Aliás, os rios tornaram-se o local mais óbvio
para o lançamento dos dejetos industriais e urbanos – e, ainda, em muitos casos,
são. Paralelamente ao desenvolvimento industrial e urbano e ao crescimento da
população, a qualidade de vida decrescia em todos os países industrializados.

As consequências para os sistemas naturais são conhecidas. Sabemos que a


biosfera é um sistema aberto, interligado, formado pela união de três subsistemas
– a hidrosfera, a litosfera e a atmosfera. Uma vez na biosfera, elementos estranhos
percorrem incontáveis caminhos, desde as cadeias alimentares aos ciclos
biogeoquímicos.

Dejetos industriais lançados nos corpos d’água disseminam-se


sistemicamente pela biosfera e atingem o homem e demais mamíferos. Por exemplo,
a produção de fertilizantes nitrogenados, NPK, é acusada de desequilibrar a
quantidade total de nitrogênio de origem natural. Os ciclos biogeoquímicos são
sistemas fechados, porque reciclam sempre a mesma quantidade de elementos. Se
um ciclo, como o do nitrogênio, receber maior quantidade do que pode reciclar, uma
sobra será devolvida para a biosfera. Todas as etapas do ciclo serão desequilibradas.

De acordo com dados estatísticos, a quantidade de nitrogênio industrial


lançada no ciclo duplica a cada seis anos e, juntando-se a ela, o nitrogênio de
fertilizantes, poderemos ter um aumento de 10% do gás na natureza. As bactérias
não conseguiriam processar tal quantidade e sobraria na biosfera um excesso de
matéria orgânica não decomposta. Além disso, o excesso de nitrogênio nas águas
forma nitratos, que provocam a eutrofização.

Fato semelhante ocorre com o ciclo do fósforo, componente fundamental


dos ácidos nucleicos e, portanto, relacionado à transmissão da hereditariedade. O
ciclo do fósforo é parte do ciclo da erosão. O escoamento superficial leva o fósforo,
na forma de fosfato, para o oceano e ele decanta nos sedimentos. Só poderá ser
usado novamente no caso do soerguimento do fundo do oceano ou no caso de
um recuo do mar numa época fria. A quantidade de fósforo no seu ciclo tem
aumentado devido ao uso de fertilizantes e de detergentes. Na água, os fosfatos
exercem o mesmo papel que os nitratos.

Os elementos tóxicos têm curso livre na biosfera e penetram com facilidade


na cadeia alimentar. Mercúrio, chumbo, cádmio e outros metais chamados de
pesados ou tóxicos, são considerados não essenciais por Odum (1985). Nenhum
desses metais tem importância para a matéria orgânica, porque não participam
dos ciclos biológicos.

278
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

O mercúrio, embora apareça em concentrações pequenas na biosfera,


tem crescido em quantidade graças à utilização industrial. Nos organismos, o
mercúrio acumula-se nos tecidos e, na cadeia alimentar, por não tomar parte da
fisiologia dos seres vivos, galga rapidamente os níveis superiores.

O mercúrio metálico não é tóxico para os animais, mas bactérias


especializadas podem convertê-lo em variedades orgânicas, que são altamente
tóxicas. O metilmercúrio e o alquimercúrio são variedades de elevada toxidez.

O caso de Minamata, uma pequena cidade de pescadores no Japão, ilustra


os efeitos do mercúrio ingerido por seres humanos. É um caso que ficou clássico
na literatura científica do século XX. Em 1953, uma indústria química lançava
os seus efluentes num rio que desaguava na baía de Minamata. Depositados
nos sedimentos do fundo da baía, os efluentes, cujo principal componente era
o metilmercúrio, foram absorvidos pelas plantas marinhas e o metilmercúrio
entrou na cadeia alimentar. As algas eram alimento de peixes herbívoros e, dessa
forma, o mercúrio passou para a fauna.

“Pescados, os peixes foram servir de alimento para a população da baía.


Houve mais de 100 casos constatados de intoxicação e 46 mortes” (BATALHA;
PARLATORE, 1997), mas, provavelmente, o número de pessoas infectadas tenha
sido superior a 10.000. O acidente ficou conhecido como a doença de Minamata
e apresentava um quadro então desconhecido pela medicina: parestesia (doença
nervosa marcada por sensações de formigamento e dormência no corpo), perda
de coordenação motora progressiva, perda da visão, da audição e deterioração
intelectual. Os sintomas eram náuseas, vômitos, cólicas abdominais, diarreia
sanguínea, danos nos rins. O quadro culminava com a morte em menos de 10
dias. A toxidez crônica mostrava inflamação na boca e nas gengivas, dilatação
das glândulas salivares, salivação excessiva, perda dos dentes, problemas renais
e alterações psicológicas e psicomotoras. Todas as mulheres infectadas, as que
sobreviveram, geraram filhos defeituosos. No caso das mulheres grávidas à época
dos derrames de efluentes na baía, o metilmercúrio concentrou-se nos fetos. As
mães escaparam dos efeitos, porque os fetos removeram todo mercúrio ingerido
por elas. As crianças nasceram, todas elas, defeituosas. O ecossistema da baía de
Minamata foi recuperado com a eliminação dos efluentes lançados pela indústria
e as águas estão limpas. Mas as sequelas permaneceram, na forma de pessoas
defeituosas, hoje adultas, como para sempre lembrar o que ocorreu.

Não existe cura para os problemas do mercúrio, uma vez ele instalado
no organismo. Durante a ocorrência da intoxicação em Minamata se tentou
uma grande variedade de terapias para apressar a eliminação do mercúrio do
organismo, todas em vão.

279
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

O processo dos ciclos sedimentares sob intervenção humana cresce de forma


geométrica. A concentração de elementos e compostos provenientes das atividades
humanas nas cadeias alimentares é a sua principal consequência. Supõe-se que
a aceleração dos ciclos e a acumulação de elementos poderão forçar aos sistemas
naturais a busca de um novo equilíbrio. No entanto, é preciso atentar para que o
limiar de resistência dos ecossistemas não seja ultrapassado, o que tornará o processo
irreversível, isto é, a transformação dos sistemas naturais, uma vez rompido o seu
limite de resiliência, poderá criar outros sistemas diferentes dos atuais.

Os sistemas naturais possuem um limite de tolerância e de resistência,


dentro do qual podem absorver os excessos. Contudo, os teores de radioatividade
derivados de isótopos, como Estrôncio-90 e o Césio-137, já causam problemas
sérios antes mesmo do limite ser transposto.

Elementos radioativos, metais tóxicos, não fazem parte da matéria


orgânica. Portanto, são estranhos a ela. Quando entram na cadeia alimentar,
vão se acumulando nos níveis sucessivos e não são eliminados. Nos mamíferos,
acumulam-se nos tecidos, nas gorduras, em órgãos como o fígado, no cérebro
etc., e podem levar à morte ou à invalidez do organismo.

3 MODIFICAÇÕES NOS ECOSSISTEMAS E NOS


GEOSSISTEMAS
As transformações que os ecossistemas e os geossistemas sofrem podem
ser estudadas sob muitos pontos de vista. No entanto, um aspecto importante,
fundamental, é o que trata do transporte de energia e da matéria no interior
dos sistemas naturais. As modificações nos fluxos de energia e matéria têm a
propriedade de alterá-los profundamente, desde transformações biológicas – por
exemplo, as cadeias alimentares – até a organização espacial dos geossistemas.
As alterações se dão em cadeia e tendem a se avolumar a partir do ponto inicial
e, no trajeto, danificam toda a dinâmica dos sistemas, até romper a sua estrutura.
As reações em sequência explicam-se pelas conexões que mantêm os sistemas
unidos e interdependentes e originam ciclos. Dessa maneira, uma alteração num
sistema propagar-se-á pelos sistemas vizinhos.

A natureza é formada por uma extensa teia de relações interdependentes,


na qual as espécies estão adaptadas a um ambiente climático, geográfico e biológico.
A adaptação de uma população é problemática e vários fatores congregam-
se para tornar essa adaptação um processo delicado. São os fatores limitantes
que, segundo Dajoz (1973), atuam para condicionar “[...] as possibilidades de
sucesso de um organismo, embora este possa efetivamente subsistir no meio”.
Os seres vivos, portanto, apresentam maior ou menor adaptabilidade aos fatores
limitantes. As condições naturais nunca são as ideais para os organismos e, por
isso, eles veem-se obrigados a criar uma série de adaptações a essas condições.
Dajoz (1973), adverte que “[...] é preciso ter o cuidado para não cair no erro
finalista, que consiste em crer que tudo é perfeito na natureza e que, em todos

280
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

os casos, os seres vivos se encontram nas condições de meio que lhes são mais
favoráveis. É oportuno lembrar aqui a observação de Bodenheime (1932): ‘não é
certo acreditar que cada animal é sempre conduzido por seus órgãos dos sentidos
à procura das condições ótimas”. Condições perfeitas só são encontradas nos
laboratórios, criadas pelos cientistas.

A natureza não é perfeita. Se fosse, os seres vivos não precisariam procurar


meios de se defender dos fatores limitantes, mesmo porque eles não existiriam. E,
pois, os organismos não evoluiriam.

Os sistemas naturais encontram-se bem próximos dos limites de tolerância


a mudanças bruscas, embora seus componentes se achem em equilíbrio. Entretanto,
esse equilíbrio é extremamente tênue, porque é sujeito a transformações impostas
pelo próprio dinamismo do sistema. Daí ser denominado de equilíbrio dinâmico.

As modificações lentas, muitas vezes, em ritmo geológico, ou no decurso de


séculos, permitem que os sistemas se adaptem a elas. As transformações rápidas,
como terremotos, maremotos, vulcanismos, mudam a paisagem em pouco tempo.
A essas transformações os seres vivos têm muita dificuldade de adaptação.

As transformações antropogênicas tendem a ser muito rápidas, porque,


com o desequilíbrio do ecossistema e do geossistema, desencadeiam-se forças
que aceleram os mecanismos de deterioração. Vejamos o caso do desmatamento
numa vertente.

A exposição do solo ao intemperismo origina a erosão em lençol, que


lava o solo e alarga os sulcos existentes. A infiltração da água no solo reduz-se
e o lençol aquífero ficará mais profundo. Plantas, na encosta, de raízes curtas,
morrerão. O abaixamento do lençol terá como consequência menor densidade
na rede fluvial.

A retirada da floresta implicará também no desaparecimento da camada


de umidade proveniente da evapotranspiração das árvores. O clima local, o
topoclima, ficará mais seco. Espécies xerófitas começarão a assentar-se na vertente.

A erosão acelerada levará para os rios os sedimentos retirados da


encosta e o assoreamento reduzirá a lâmina de água e a turbidez aumentará.
O soterramento da vegetação aquática reduzirá o teor de oxigênio dissolvido
na água. A turbidez da água impedirá que as plantas aquáticas façam a
fotossíntese e também ajudará na diminuição do oxigênio. Espécies da fauna
aeróbica emigrarão à procura de águas límpidas. As cadeias alimentares do rio
e terrestres sofrerão profundas modificações.

A retirada da floresta levará consigo aves e animais predadores de insetos


e outros animais nocivos ao homem, como cobras, aranhas etc. A população
das presas, sem os predadores, crescerá, e, sem a proteção da floresta, invadirá
jardins, quintais e as casas próximas.

281
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Se a vegetação se recompuser na vertente, no decorrer dos anos, e formar,


mais tarde, uma floresta, a fauna alada retornará e novos ciclos vitais e novas
cadeias alimentares formar-se-ão. No entanto, o novo sistema não terá as mesmas
características do anterior. Muitas espécies de plantas, que podem ter importância
econômica, desaparecerão e serão substituídas por outras, que, por sua vez,
poderão não ter a mesma importância da flora anterior. A diversidade biológica
será muito menor que antes.

O lançamento de dejetos industriais nos sistemas naturais traz


consequências mais graves. Compostos e elementos químicos tóxicos sempre
carregam resultados mais danosos aos ecossistemas. A inclusão desses materiais
nos níveis das cadeias e redes tróficas rompe-lhes o equilíbrio, naturalmente
tênue. Além disso, a concentração de elementos estranhos aos ciclos aumenta
consideravelmente. Nesse caso, os isótopos radioativos e os metais tóxicos são
um problema de difícil solução. Os metais não são solúveis na água, de modo que,
durante a lixiviação, não são solubilizados e, pois, não acompanham o movimento
descendente da água. Os isótopos, mesmo que sejam solúveis, transportam a
desintegração radioativa por onde passam. No caso de elementos necessários aos
ciclos de materiais, a sua concentração em excesso é prejudicial, porque os teores
elevados acabam não sendo processados e eles passam a sobrar nas cadeias.

Odum (1985) classifica os ecossistemas em quatro categorias, segundo as


formas de energia que os percorrem, e o seu gasto:

Ecossistemas naturais, dependentes unicamente da energia solar como


fonte. São eles que sustentam a vida no planeta e movimentam de 1.000 a 10.000
kcal/cm2/ano de energia, que importam e emitem ou devolvem;

Ecossistemas naturais, dependentes da energia do sol e de outras fontes


naturais. Têm grande capacidade de sustentação da vida, por produzirem
excedentes de matéria orgânica, que podem ser exportados para outros sistemas
ou armazenados. Movimentam entre 10.000 e 40.000 kcal/cm2/ano de energia.
São, por exemplo, os oceanos, os rios etc.

Ecossistemas de origem antrópica, mas que dependem da energia solar,


como a agricultura e a aquacultura. São sustentados por formas de energia
fornecidas pelo homem, por exemplo, os fertilizantes. Movimentam entre 10.000
e 40.000 kcal/cm2/ano de energia.

Ecossistemas urbano-industriais, cuja fonte de energia são os combustíveis


fornecidos pelo homem – combustíveis fósseis, termonucleares – que podem
substituir o sol. Dependem inteiramente da primeira e da terceira categorias para
se manter e para obter alimentos e combustíveis. Para Odum, funcionam como
parasitas daquelas duas categorias. A quantidade de energia que movimentam é
muito grande, variando de 100.000 a 3.000.000 kcal/cm2/ano.

282
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

O grande trunfo dos ecossistemas na luta para se autopreservarem é a sua


complexidade. Quando mais complexos, quanto maior o número de elementos
que interligam os diversos setores, tanto maior será a quantidade de ligações de
interdependência com os sistemas vizinhos. Isso lhes faculta maior capacidade de
absorção das mudanças que lhes são impostas e, desta forma, mantêm a integridade.
Num ecossistema complexo, os elementos estranhos terão sua mobilidade reduzida,
porque atuarão em elementos com níveis de resistência diferentes.

A comparação entre uma monocultura e uma floresta tropical mostra uma


grande quantidade de diferenças entre ambas. A fragilidade da monocultura, por
exemplo, um reflorestamento ou um cafezal, é muito maior do que a complexidade
da mata, mesmo secundária. Na monocultura existe uma única espécie, ao
contrário da mata. No caso da expansão de pragas, a monocultura está muito
mais sujeita do que a floresta, porque, nesta, a variedade de espécies dificulta a
propagação. O mesmo se dá com o fogo – no reflorestamento ele se alastra mais
facilmente, porque as árvores têm, em geral, o mesmo índice de resistência, de
modo que as labaredas não encontram dificuldades em se propagar.

A intervenção constante na mata – primária ou secundária – pode levar


a um ponto sem volta. O continuado desmatamento de uma região ou o uso
exagerado do solo pode esgotar o teor de nutrientes e empobrecer o solo a um
ponto extremo, em que a vegetação terá dificuldade em recolonizar o terreno,
limitando-se a indivíduos de pequeno porte, pouco exigentes em nutrientes e em
água. O desaparecimento dos nutrientes concentra o teor de alumínio e de íons
ácidos, pouco solúveis na água, e o solo torna-se progressivamente mais ácido e
mais pobre em bases trocáveis. A presença de samambaias, que recobrem uma
vertente, é claro sinal de solo pobre em nutrientes e rico em compostos ácidos.

Situações como essa são comuns em sistemas urbano-industriais. Os


fluxos de energia e matéria e as redes de intercomunicação dos ecossistemas e
geossistemas tratam de passar os problemas à frente, num processo em cadeia ou
em cascata. Os mecanismos de controle do ecossistema são internos e fazem parte
das interligações, e não são externos a ele.

Portanto, mesmo num ecossistema complexo, por mais difícil que seja
a propagação de elementos estranhos às redes alimentares, sempre haverá um
transporte “para cima” desses elementos. Não obstante a sua complexidade,
os ecossistemas e, pois, as cadeias alimentares, são dotadas de um equilíbrio
muito delicado.

As entradas de energia e matéria nos ciclos naturais são o clima


(temperatura e precipitações), o transporte dos materiais intemperizados e os
fertilizantes artificiais adicionados ao solo (DREW, 1986). Junto com essas entradas
vêm também resíduos industriais e urbanos, que se incorporarão ao solo.

283
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

As saídas de energia e matéria são representadas pela lixiviação, pelo


escoamento superficial e pelas colheitas (DREW, 1986). Entretanto, os componentes
inúteis aos processos vitais não são retirados, porque dificilmente são solúveis na
água. Portanto, permanecem e, como se encontram incorporados à solução do
solo, retornam às plantas para recompor os ciclos.

Uma vez no ciclo, os componentes tóxicos passam para os níveis superiores.


A passagem de um nível trófico para o seguinte acarreta numa degradação de
energia, sob a forma de calor.

Ao dissipar-se a energia, de acordo com a segunda lei da termodinâmica,


o elemento tóxico tem o seu teor aumentado, e, pois, em todos os níveis ele terá
sempre concentração gradativamente maior, até o último nível da cadeia. Ehrlich
e Erlich (1974) mostram que se observou um significativo aumento nos teores de
DDT na cadeia alimentar aquático-terrestre num estuário em Long Island (EUA).

Outro exemplo extremo – e, porque não dizer, ridículo – de aplicação de


DDT foi narrado por Curtis (1977, p. 900). Nos anos 50, a Organização Mundial
de Saúde criou um programa de combate ao mosquito com o uso de DDT em
Bornéu. O DDT exterminou os mosquitos, mas também matou uma espécie de
vespas que predava lagartas. As lagartas, no entanto, que não tinham a ver com
a história, alimentavam-se da madeira das armações dos tetos das casas. Sem as
vespas, sua predadora, as lagartas aumentaram em população e o dano causado
pelas lagartas nos tetos cresceu proporcionalmente. O resultado do combate aos
mosquitos foi que os tetos começaram a despencar dentro das casas.

Mas a série de fatos insólitos e descabidos não parou por aí. A segunda
etapa do combate aos mosquitos, patrocinado pela OMS, foi a destruição da
mosca doméstica, que era predada por lagartixas, que viviam nas casas. O DDT
passou das moscas para as lagartixas, que entraram a morrer envenenadas e
caíam dos tetos e paredes. Uma vez no chão, mortas ou agonizando, as lagartixas
eram devoradas pelos gatos das casas. Os gatos começaram a morrer.

Com a morte dos gatos, as populações de ratos aumentaram, invadiram


as casas e passaram a competir com os moradores pelo alimento. Pior que isso,
começaram a propagar doenças na população humana. Sem nenhuma ideia para
solucionar o caso dos ratos, a OMS resolveu jogar gatos por paraquedas nas
regiões mais afastadas e de difícil acesso, numa tentativa infrutífera de recompor
o equilíbrio ecológico, rompido por um programa feito sem planejamento e sem
qualquer previsão de acontecimentos futuros. Um programa que começou com
o combate aos mosquitos acabou atingindo os gatos e a população humana. Os
resultados obtidos pelos gatos paraquedistas foram pífios.

284
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

Madeira dos
DDT Mosquitos Vespas Lagartas
tetos das
casas

Aumento da
população
Moscas domésticas Lagartixas Gatos
de ratos
domésticos
e do campo

Competição
com a
população
humana

As alterações nos ecossistemas dão-se, cada vez mais, em escala maior,


resultado da necessidade do homem de ampliar as suas atividades econômicas,
vitais para a humanidade.

Um dos grandes responsáveis pelas modificações são as práticas mal


executadas de agricultura e pastoreio, a que se pode juntar a mineração. Quando
feitas sem planejamento, como o são, na maioria das vezes, tornam-se predatórias.
Nesse ponto, podemos incluir também a urbanização. Praticamente, não se conhece
algum tipo de planejamento urbano que mostre resultados apenas aceitáveis. A
expansão urbana de Florianópolis é um exemplo de falta de planejamento ordenado,
sustentado num plano diretor. Cidades turísticas crescem segundo o interesse de
grupos econômicos que detêm as atividades. Florianópolis não é diferente. Juntem-
se a ela cidades como o Rio de Janeiro, Santos, Salvador – só para citar essas – e tem-
se um quadro urbano pouco animador. O crescimento é caótico e incontrolável.

Cidades planejadas, como Belo Horizonte, Goiânia e Brasília, têm


problemas graves de todos os tipos, porque a sua construção preocupou-se
apenas com o momento presente e não com o futuro e as consequências que
o seu crescimento traria. O Lago Paranoá, em Brasília, é um exemplo de mal
planejamento. O mesmo se dá com a Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte,
poluída, suja, cheia de lixo nas margens, mal-cheirosa e, antes, usada – da
mesma forma que o lago Paranoá – como recanto de lazer. Em Florianópolis –
Santa Catarina - Brasil, a Lagoa da Conceição, um local de inigualável beleza
cênica, outrora lugar de lazer da população da cidade e dos turistas, tornou-se
impraticável, porque grande parte dos esgotos domésticos e de restaurantes é
lançada nela in natura. Uma pequena estação de tratamento de esgoto, erguida no
meio das dunas, não dá conta de processar todas as águas cloacais canalizadas
para ela. A maioria das residências, dos restaurantes e bares nas margens e nas
imediações da lagoa não tem ligação com a estação.
285
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

A base, portanto, em que se apoiam as alterações nos ecossistemas e nos


geossistemas é, sem dúvida, a falta de um planejamento racional que estabeleça
normas – que sejam obedecidas – de ação. Sem planejamento, as interferências
nos fluxos de energia e matéria dos sistemas naturais prosseguirão até atingir
um limite além do qual os mecanismos de retroalimentação positiva impedirão
qualquer retorno. Uma situação dessas, que acontece com frequência em escala
mundial, significará o surgimento de uma nova organização espacial.

4 A GEOGRAFIA MÉDICA
A difusão de epidemias e doenças tem um componente biogeográfico
muito forte. O contato do homem com animais e insetos pode ser vetor da
transmissão e expansão de muitas epidemias. O ar está repleto de micro-
organismos que podem transmitir doenças diversas – Pasteur comprovou isto
na sua famosa experiência. A poluição do ar por gases e particulados é causa
de doenças respiratórias e muitas atividades praticadas pelo homem tornam-lhe
prejudiciais, devido à falta de cuidados e de profilaxia adequados.

A ligação do homem com o seu ambiente é muito estreita e qualquer


perturbação causada num refletirá no outro, de uma forma ou de outra. Essa ligação,
já íntima desde os tempos das cavernas, quando o homem primitivo dependia
essencialmente da natureza para sobreviver, tornou-se extremamente forte nos dias
modernos, porque o homem introduz meios cada vez mais eficientes de explorar os
recursos naturais, sem perceber que desorganiza o meio natural e, por extensão, o seu
próprio meio. Na ânsia de retirar o máximo da natureza, o homem desestruturou os
ecossistemas, destruiu um sem número deles e criou ecossistemas artificiais.

A destruição de ecossistemas ou apenas modificações leves neles liberam


forças de retroalimentação, que tratam de encontrar novamente o reequilíbrio.
Porém, ao modificar os elementos do ecossistema, ao mudar a sua localização, muitas
cadeias tróficas podem ser alteradas ou destruídas, fazendo com que os componentes
de um dado nível alimentar emigrem para outro ecossistema à procura de comida.
Um exemplo simples é a erradicação de florestas. Os pássaros emigram, porque os
seus habitats foram destruídos, e o resultado é que as suas presas, que são os insetos,
sem o controle populacional então mantido pelas aves, proliferam. As nuvens de
gafanhotos, tão comuns na África e no interior do Brasil, resultam disso.

“Há incontáveis casos de intervenção do homem nos ecossistemas que


levaram a resultados catastróficos. O caso de Yamata, no Japão, tão conhecido, é
um deles. Outro ocorreu nos EUA, na cidade de Lyme, Estado de Connecticut, em
1975-76”. (GARRET, 1995, p. 525). CDC, Centers for Disease Control and Prevention,
2005) e ficou conhecido com a doença de Lyme, que acometia adultos e crianças com
uma espécie de artrite. A doença é transmitida pela bactéria Borrelia burgdorferi e,
em 2003, já havia mais de 23 mil casos no país. A bactéria vive nas glândulas
salivares de carrapatos da espécie Ixodes scapullaris e é transmitida cerca de 40
horas depois da picada pelo carrapato.

286
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

Como surgiu a doença de Lyme? Lyme é uma pequena cidade no nordeste


dos EUA, à beira-mar, cercada por florestas temperadas secundárias. As florestas
são habitadas por animais, como cervos, esquilos, guaxinins e outras espécies
típicas da floresta temperada. Sem predadores como lobos e pumas, as populações
dos herbívoros cresceram a ponto de entrar na cidade para fuçar latas de lixo,
jardins e quintais. Certo dia, começaram a aparecer pessoas que se queixavam de
dores musculares e nas articulações, sintomas de artrite e apresentavam manchas
vermelhas na pele, que acabavam em lesões. A evolução dos sintomas podia
levar, mais tarde, a problemas neurológicos e cardíacos, amnésia, dores mais
fortes ainda e deficiência na respiração.

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para conhecer mais sobre a doença de Lyme, acesse o site: <http://www.cdc.gov/ncidod/
dvbid/lyme//>. Acesso em: 10 jul. 2010.

Pesquisas mostraram todo o trajeto da doença. O reservatório natural do


carrapato I. Scapullaris é um camundongo, Peromyscus leucopus. O camundongo é
o hábitat do carrapato I. Scapullaris, que, infectado, pula para o cervo, quando as
duas populações entram em contato, no início da primavera, tão logo os cervos
voltam para a região – no inverno, eles emigram para outras plagas para fugir
do frio. Transportando os carrapatos, os cervos, cuja população aumenta no final
do inverno, invadem quintais e jardins da cidade. Em contato direto com cães
e gatos domésticos, passam para eles o carrapato. Daí, para os donos dos gatos
e dos cães, é um pulo. Levados pelos novos vetores – o homem - os carrapatos
espalharam-se até a Califórnia. A maior incidência da doença é na região original,
reduzindo-se gradativamente para oeste.

A gênese da doença, contudo, não está no caso narrado. Têm causas muito
mais antigas e começa com a chegada dos colonos ingleses à América do Norte, no
século XVII. Muitas áreas florestais foram derrubadas para a implantação de culturas,
pastos, indústrias caseiras etc. Jazidas de minério de ferro induziram à instalação
de pequenas fundições, que precisavam de lenha para os fornos. As florestas foram
devastadas totalmente para abastecer os fornos, a tal ponto que, no final do século
XIX, não havia mais florestas na região e a madeira tinha que ser importada. A fauna
fugiu com quantas pernas tinha para outras regiões e para o Canadá.

Sem árvores para alimentar as fundições, que interromperam em definitivo


suas atividades, a natureza foi deixada em paz, pois as culturas não ocupavam todos
os lugares. Desenvolveu-se, então, uma vegetação secundária, com plantas baixas e,
à medida que a sucessão se adiantava, a fauna retornava. Entretanto, os carnívoros
predadores não retornaram, não se sabe por que, e os herbívoros, como os cervos e os
roedores, como o camundongo, puderam se expandir sem problemas de predação.
287
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

Esse caso mostra como um problema ambiental, ocorrido há três séculos,


teve repercussões tão longo tempo mais tarde. Também revela a fragilidade do
homem em contato com animais silvestres, que são hospedeiros de vetores de
doenças para as quais o homem não desenvolveu proteção. Epidemias, como a
AIDS, a doença transmitida pelo vírus Ébola e tantas outras, podem ter a sua
gênese nesse contato. Afinal, em Lyme, todo o cenário da doença foi aos poucos
se formando para que ela eclodisse no século XX.

O caso da doença de Lyme expõe a importância dos estudos biogeográficos


na determinação de vetores transmissores de doenças para os homens e para os
animais domésticos. Conhecendo-se o vetor e as suas características principais –
tipos de hábitat que prefere hábitos alimentares e comportamentais, seus predadores
naturais e suas presas, condições ambientais, naturais ou antropogênicas, para a
sua proliferação e muitos outros fatores – pode-se combatê-lo e a doença erradicada
sem o uso de meios perigosos para os seres vivos, como os pesticidas.

Aspectos ligados à saúde humana acham-se intimamente associados ao


desequilíbrio do meio físico e às condições sociais e econômicas. A preocupação
com o ambiente físico não é recente na geografia e na ecologia. Os filósofos gregos
já enrugavam a testa à procura das causas de doenças e, dentre outros, Hipócrates
(460 a.c.-355 a.c.), considerado o patrono da medicina, destacou-se nesse mister.
Ele considerava a doença um resultado da ação do ambiente sobre a pessoa e
dizia que o homem está ligado diretamente à natureza e depende dela: “o homem
é uma parte integral do cosmos e só a natureza pode preservar e curar os seus
males”, escreveu ele, no livro A doença sagrada. Dizia ele, ainda, que todas as
doenças nascem em todas as estações, mas algumas se tornam mais evidentes
em certas estações (COELHO; FURTADO; SILVA, 2010). Antes de Hipócrates,
supunha-se que as doenças eram criadas pelos deuses para punir os pecadores.

O estudo da Geografia médica envolve as relações mútuas do agente


transmissor – ou vetor – com o seu meio, ou autoecologia, e com o meio da vítima
ou hospedeiro e desta com o seu próprio ambiente, ou sinecologia.

Compreendendo essas relações, pode-se deduzir o comportamento de


vetores e parasitas de doenças infecciosas, por exemplo. Os hábitos alimentares, as
relações sociais, como as de predação, a competição, o comensalismo ou qualquer
relação que signifique contato entre populações são alguns dos aspectos relevantes
no estudo da geografia médica. Acima de tudo, a área de distribuição dos vetores,
que se exprime a partir do estabelecimento das relações ecológicas. Ávila-Pires
(2000, p. 31) mostra que o estudo das relações, para a ecologia médica, é mais
importante do que os sintomas e terapêuticas. A profilaxia é uma etapa posterior.

288
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

UNI

Prezado(a) acadêmico(a)!
Para conhecer mais sobre A doença sagrada, acesse o site: <http://www.medicina.ufmg.
br/90anos/hipocrates.htm >. Acesso em: 10 jul. 2010.

As relações dos vetores com o seu ambiente são importantes, não só


porque revelarão muitos aspectos sobre ele, que não serão notados se o estudo
for apenas tópico, mas também, porque é a própria essência da Geografia.

289
UNIDADE 3 | TERRITÓRIOS BIOGEOGRÁFICOS, BIOMAS E A AÇÃO DO HOMEM

LEITURA COMPLEMENTAR

BIODIVERSIDADE E BIOGEOGRAFIA

Denis Richter 

Ao observarmos a natureza, muitas vezes, não percebemos a complexa


estrutura que a envolve e a faz continuar existindo. Esse grande bioma (conjunto
de seres vivos de uma área), que é o planeta Terra, possui muitas características
e processos bem definidos, onde todas as formas de vida existentes no globo se
inter-relacionem  para formar uma biodiversidade.

As diferenças regionais em cada local do mundo criam ambientes (hábitats)


diferenciados. Nesses espaços, as relações bióticas (relativo às formas de vida) e
abióticas (ausência de vida) demonstram suas diversas funções para interagir
no mesmo espaço. Como resultado disso, forma-se o que os ecólogos (cientistas
que estudam a ecologia) chamam de “padrões geográficos em diversidades de
espécies”. Assim podemos compreender a existência de determinadas espécies
em várias regiões do globo.

As estruturas ambientais demonstram características próprias onde cada


uma se distingue de outra, criando, assim, um ambiente rico em diversidade. Cada
nicho (porção restrita de um hábitat) possui  uma grande diversidade de condições
físicas, em que os animais e plantas, ali localizados, estão aptos a viver nessa “aldeia”.
Suas características variam de acordo com diversos fatores, sendo, por exemplo:
climático, da altitude, da temperatura, da luz solar etc. Dentro desses nichos, os
animais predadores podem ser usados como base na compreensão da existência
de outros seres vivos. Pode-se exemplificar dizendo que num determinado nicho
ecológico, uma onça, com sua presa (dente) de 5 mm, busca animais que servirão
de comida para ela possuindo características para serem mortos por suas próprias
presas. Isso evidencia a existência de uma diversidade muito grande, pois basta
fazer uma relação entre a cadeia alimentar (estrutura alimentar entre os animais de
uma determinada região) e forma-se uma grande quantidade de espécies variadas,
constituindo um determinado nicho ecológico. Uma característica importante na
diversidade de um nicho é a variedade de papéis ecológicos que cada ser vivo
possui nesse ambiente. O resultado disso será uma grande diversidade localizada
no nicho (fato que é abordado por muitos ecólogos).

Outro fator a ser considerado é o espaço que o nicho possui, esse fator
demonstra que a diversidade pode ser maior quando o espaço local aumenta.
Entende-se isso de maneira simples, onde esse espaço irá permitir uma maior
quantidade de espécies e assim resultando numa cadeia alimentar diversa, o que
constitui a diversidade do ambiente.

290
TÓPICO 4 | A SOCIEDADE HUMANA

Os espaços de fuga serão as possibilidades que as espécies possuem para


evitar a mortalidade. Essa função irá depender de vários fatores, onde a percepção
auditiva, visual ou a coloração idêntica à mata local poderão ser características
fundamentais para a fuga. Alguns estudos revelam que a capacidade de fuga
depende do espaço local existente, a própria evolução ou adaptação de uma
espécie a um ambiente pode significar uma vantagem na fuga. Exercendo, assim,
uma função natural entre as espécies, a busca pela sobrevivência.

Essas características demonstram que a fuga pode ser, em vários momentos,


uma solução para a existência da diversidade, pois, como se sabe, existe uma
cadeia alimentar que é respeitada naturalmente e onde o ambiente a torna fator
determinante para a sua existência. Conforme Darwin (cientista inglês que criou a
Teoria da Evolução), cada espécie irá adaptar-se ao seu hábitat e à sua diversidade,
demonstrando suas funções ecológicas na cadeia alimentar, evidenciando,
assim, um equilíbrio no ambiente, pois cada ser vivo coexiste localmente através
da intensidade da competição. Dentro dessas observações, nos cabe analisar que
o número de espécies num determinado hábitat vai depender de suas relações
internas, originando a “teoria do equilíbrio da biogeografia insular”. Essa quantidade
de espécies irá se estruturar no espaço local e constituir um pequeno bioma, onde
a competição, a cadeia trófica (cadeia alimentar), os espaços de fuga, entre outros,
serão fatores importantes na formação dessa “ilha”.

Nesses espaços de biodiversidade podemos observar a competição pela


existência de cada espécie. Num mesmo hábitat, a coexistência demonstra-se como
fator de equilíbrio natural sendo definido por diversos fatores, como: dimensão do
nicho, poder de adaptação e espaços de fuga. Assim, as espécies irão controlar as
populações de determinados seres igualmente. Podemos compreender também
que os espaços influem na quantidade de espécies, tomemos como exemplo um
rio. Em sua montante (nascente) o número de espécies será menor do que em
sua jusante (foz),  pois o espaço para a existência de uma cadeia trófica grande e
diversa vai necessitar de um local amplo para coexistirem.

Portanto, tendo em vista que as relações ecológicas estruturam-se de


forma igualitária, percebemos que para haver a continuidade desse equilíbrio
é necessário que a  biodiversidade ocorra em todas as regiões do globo. Pois
devemos ter em mente que nós, homens, somos parte da natureza e buscamos ser
menos impactante em nosso meio.

FONTE: Disponível em: <http://www.algosobre.com.br/geografia/biodiversidade-e-biogeografia.


html> Acesso em: 10 jul. 2010.

291
RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico você estudou que:

● A população humana é muito menor que a população da maior parte dos


seres vivos, mas a sua capacidade de modificação na dinâmica ambiental é tão
grande que atinge toda a biosfera. Sua importância hoje é de tal magnitude que,
para entender o funcionamento dos ecossistemas e geossistemas, é necessário
atentar para o papel do homem na natureza e avaliar os seus resultados.

● A atividade humana corre no sentido oposto à sucessão ecológica, pois promove


o empobrecimento do biótopo. Cria-se outra organização espacial.

● O homem não atua em todos os sistemas da biosfera. Alguns sistemas têm pequena
capacidade de regeneração, por serem muito simples e por causa da fragilidade de
seus elementos. Quanto mais simples os sistemas naturais, mais frágeis serão.

● A Revolução Industrial pode ser considerada uma fase de transição da


humanidade. Um período cujas ramificações transformaram profundamente o
modo de pensar e agir da sociedade e a levaram a uma encruzilhada sem volta,
em que o desenvolvimento se transformou numa necessidade e, em seu nome,
muitas desmandas foram feitas, a ponto de mudar e rearranjar muitos sistemas
naturais e a sua organização espacial, destruindo uns e criando outros.

● A inexistência de condições sanitárias desencadeou uma epidemia de cólera em


Londres, em 1831-32. Contudo, somente em 1855, quando a cidade já contava
com uma população superior a um milhão de habitantes, é que se construiu
uma rede de esgotos coberta.

● O crescimento da exploração de minas, principalmente as de carvão, a grande


fonte de energia da Inglaterra da Revolução Industrial, deu início à deterioração
dos recursos ambientais, como os rios, cuja água era usada pela população para
consumo doméstico.

● O crescimento das atividades industriais, como a siderurgia, a indústria


química, a metalurgia, foi o ponto de partida para a expansão dos problemas
ambientais e para a modificação dos sistemas naturais. A agricultura, que
também se expandia, embora em ritmo mais lento, e a mineração, eram
atividades altamente transformadoras da organização espacial, porque se
faziam sem qualquer planejamento.

● As consequências para os sistemas naturais são conhecidas. Sabemos que a


biosfera é um sistema aberto, interligado, formado pela união de três subsistemas
– a hidrosfera, a litosfera e a atmosfera. Uma vez na biosfera, elementos
estranhos percorrem incontáveis caminhos, desde as cadeias alimentares aos
ciclos biogeoquímicos.
292
● As transformações que os ecossistemas e os geossistemas sofrem podem ser
estudadas sob muitos pontos de vista. No entanto, um aspecto importante,
fundamental, é o que trata do transporte de energia e da matéria no interior
dos sistemas naturais. As modificações nos fluxos de energia e matéria têm a
propriedade de alterá-los profundamente, desde transformações biológicas – por
exemplo, as cadeias alimentares – até a organização espacial dos geossistemas.

● A natureza é formada por uma extensa teia de relações interdependentes, na qual


as espécies estão adaptadas a um ambiente climático, geográfico e biológico.

● Os sistemas naturais encontram-se bem próximos dos limites de tolerância


a mudanças bruscas, embora seus componentes se achem em equilíbrio.
Entretanto, esse equilíbrio é extremamente tênue, porque é sujeito a
transformações impostas pelo próprio dinamismo do sistema. Daí ser
denominado de equilíbrio dinâmico.

● As alterações nos ecossistemas dão-se, cada vez mais, em escala maior,


resultado da necessidade do homem de ampliar as suas atividades econômicas,
vitais para a humanidade. A base, portanto, em que se apoiam as alterações
nos ecossistemas e nos geossistemas é, sem dúvida, a falta de um planejamento
racional que estabeleça normas – que sejam obedecidas – de ação. Sem
planejamento, as interferências nos fluxos de energia e matéria dos sistemas
naturais prosseguirão até atingir um limite, além do qual os mecanismos de
retroalimentação positiva impedirão qualquer retorno.

● A difusão de epidemias e doenças tem um componente biogeográfico muito


forte. O contato do homem com animais e insetos pode ser vetor da transmissão
e expansão de muitas epidemias.

293
AUTOATIVIDADE

1 Como se dá o impacto da sociedade humana sobre os sistemas naturais?

2 No que tange ao estudo realizado sobre as modificações nos ecossistemas e


nos geossistemas, coloque V para as afirmativas verdadeiras e F para as falsas.

( ) As transformações que os ecossistemas e os geossistemas sofrem podem ser


estudadas sob muitos pontos de vista. Contudo, um aspecto fundamental
que deve ser considerado é o de transporte de energia e da matéria no
interior dos sistemas naturais.
( ) Os seres vivos, portanto, apresentam maior ou menor adaptabilidade
aos fatores limitantes. As condições naturais nunca são as ideais para
os organismos e, por isso, eles veem-se obrigados a criar uma série de
adaptações a essas condições.
( ) Os sistemas naturais encontram-se bem próximos dos limites de tolerância
a mudanças bruscas, embora seus componentes se achem em equilíbrio.
( ) O grande trunfo dos ecossistemas na luta para se autopreservarem é a
sua complexidade. Quando mais complexos, quanto maior o número
de elementos que interligam os diversos setores, tanto maior será a
quantidade de ligações de interdependência com os sistemas vizinhos.
( ) As alterações nos ecossistemas dão-se, cada vez mais, em escala maior,
resultado da necessidade do homem de ampliar as suas atividades
econômicas, vitais para a humanidade.
( ) A base em que se apoiam as alterações nos ecossistemas e nos geossistemas
é, sem dúvida, a falta de um planejamento racional que estabeleça normas
– que sejam obedecidas – de ação.

Agora, assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – V – V – V – V.
b) ( ) V – F – V – F – F – V.
c) ( ) F – F – V – V – V – F.
d) ( ) F – F – V – F – V – V.

294
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