Vous êtes sur la page 1sur 195

Plantaram" Xicão:

"
os xukuru do ororubá e a
criminalização do direito ao território
Planta
"
os xukuru do
criminalizaç
Plantaram" Xicão:
"
os xukuru do ororubá e a
criminalização do direito ao território

Vânia Fialho
Rita de Cássia Maria Neves
Mariana Carneiro Leão Figueiroa
(Organizadores)

Manaus, 2011
© Vânia Fialho, 2011
S umário

7 PREFÁCIO
Vânia Fialho

Projeto Gráfico e Diagramação
12 DOSSIÊ CHICÃO
Émerson Carlos Pereira da Silva
Ivson J. Ferreira
Sheila Brasileiro
Vânia Fialho
A32 "Plantaram" Xicão: Os Xukuru do Ororubá e a Criminalização
do direito ao território / Vânia Fialho, Rita de Cássia Maria Neves,
48 PARECER ANTRO
Mariana Carneiro Leão Figueiroa (Organizadoras). Manaus: PNCSA-
Faccionalismo Xu
-UEA/UEA Edições, 2011.
Vânia Fialho
195 p. : il. ; 22 cm.
ISBN: 978-85-7883-175-2
93 OS XUKURU E A
1. Conflitos sociais - Direito - Xucuru.. Luiz Couto
CDU 299.6 Luciano Mariz M
Ficha elaborada por Rosenira Izabel de Oliveira, bibliotecária Manoel Morais
Vânia Fialho
PROJETO NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL DA AMAZÔNIA
NCSA/CESTU/UEA – PPGAS/UFAM – FUND. FORD
142 A PRODUÇÃO D
PROJETO NOVAS CARTOGRAFIAS ANTROPOLÓGICAS DA AMAZÔNIA As possibilidades d
PROJETO TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-ECONÔMICAS NO RIO
MADEIRA: ANALISES PARA FINS DE MONITORAMENTO DE Rita de Cássia M
POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS – NCSA/CESTU/UEA – IEB – CNPq
Vânia Fialho
NÚCLEO DE PESQUISAS EM TERRITORIALIZAÇÃO, IDENTIDADE E
MOVIMENTOS SOCIAIS – CNPq/UEA
158 UM OLHAR AN
Núcleo de Diversidade e Identidades Sociais - NDIS/UPE
PROCESSO CRIM
O CACIQUE XIC
Endereços: E-mails: Mariana Carnei
UFAM UEA - Edifício Professor Samuel pncaa.uea@gmail.com
Rua José Paranaguá, 200 Rua Leonardo Malcher, 1728 pncsa.ufam@yahoo.com.br
Centro. Centro www.novacartografiasocial.com
Cep.: 69.005-130 Cep.: 69.010-170 Fone: (92) 3232-8423
Manaus, AM Benchimol. Manaus, AM
S umário

7 PREFÁCIO
Vânia Fialho

12 DOSSIÊ CHICÃO XUKRU
Ivson J. Ferreira
Sheila Brasileiro
Vânia Fialho
ubá e a Criminalização
a de Cássia Maria Neves,
48 PARECER ANTROPOLÓGICO:
doras). Manaus: PNCSA-
Faccionalismo Xukuru
Vânia Fialho

93 OS XUKURU E A VIOLÊNCIA
Luiz Couto
CDU 299.6 Luciano Mariz Maia
bibliotecária Manoel Morais
Vânia Fialho

142 A PRODUÇÃO DE UM CONFLITO:


AZÔNIA As possibilidades de compreensão da dissidência xukuru
Rita de Cássia Maria Neves
NPq
Vânia Fialho
ADE E

158 UM OLHAR ANTROPOLÓGICO ACERCA DO


E
PROCESSO CRIMINAL QUE TEVE COMO VÍTIMA
O CACIQUE XICÃO XUKURU
E-mails: Mariana Carneiro Leão Figueiroa
pncaa.uea@gmail.com
pncsa.ufam@yahoo.com.br
www.novacartografiasocial.com
Fone: (92) 3232-8423
P REFÁCIO

O livro "Plantaram"
ção do direito ao território fo
trabalhos realizados em d
das também diferentes, m
do povo indígena Xukuru
mais veemência, seus últim
Não é à toa que com
livro também enfatiza o e
de uma seqüência de fatos
Em 20 de maio de
cacique Xicão Xukuru, líd
tino. Polêmico, de fala fo
do agreste de Pernambuc
viviam os índios, principa
garantidos e efetivados. S
terrado e, sim, “plantado”
Contam-nos os teór
resultado do constante ex
o que queremos contar de
crita só por conflitos, a Ser
tais dos últimos doze ano
de outra memória: a inst
Processo que não se limi
partir dele, provocar um
história por esse viés, para
triste e desconcertante.

1. A adoção da forma escrita de


vro, acatando a escolha que os Xuk
este livro é composto por docume
possível encontrar também a grafi
“Plantaram” Xicão

P REFÁCIO

Vânia Fialho

O livro "Plantaram" Xicão: Os Xukurú do Ororubá e a Criminaliza-


ção do direito ao território foi organizado com a intenção de reunir alguns
trabalhos realizados em diferentes momentos com objetivos e deman-
das também diferentes, mas que têm uma marca em comum: a história
do povo indígena Xukuru contada por episódios que caracterizam, com
mais veemência, seus últimos 12 anos.
Não é à toa que começamos com o “Dossiê Xicão1”. O título do
livro também enfatiza o evento que é a referência temporal para o início
de uma seqüência de fatos que serão aqui tratados.
Em 20 de maio de 1998, é assassinado na cidade de Pesqueira o
cacique Xicão Xukuru, líder que despontava no cenário indígena nordes-
tino. Polêmico, de fala forte e incisiva, enfrentava a estrutura fundiária
do agreste de Pernambuco, dando visibilidade à difícil situação em que
viviam os índios, principalmente por não terem seus direitos territoriais
garantidos e efetivados. Segundo os Xukuru, Xicão não foi morto e en-
terrado e, sim, “plantado”.
Contam-nos os teóricos da memória, da história, que memória é o
resultado do constante exercício do acionar, a partir de um filtro seletivo,
o que queremos contar depois. A história dos Xukuru não pode ser des-
crita só por conflitos, a Serra do Ororubá nos traz muito mais. Porém, nos
tais dos últimos doze anos, temos sido forçados a enfrentar a construção
de outra memória: a institucionalização da criminalização dos Xukuru.
Processo que não se limita a este povo indígena, mas que podemos, a
partir dele, provocar uma reflexão. Trata-se, assim, de querer contar a
história por esse viés, para que ela não seja mesmo esquecida, mesmo que
triste e desconcertante.

1. A adoção da forma escrita de “Xicão” com “x” foi uma opção feita pelas organizadoras do li-
vro, acatando a escolha que os Xukuru fizeram pela grafia do nome de seu líder. No entanto, como
este livro é composto por documentos escritos em momentos diferentes e por vários autores, é
possível encontrar também a grafia de Chicão com “ch”.

7
XUKURU DO ORORUBÁ

O que nos possibilitou o exercício dessa rememoração foi a leitura O Projeto Nova Car
de alguns trabalhos produzidos por antropólogos ou em parceria com os cação deste livro, ao se de
mesmos, por demandas específicas em relação a vários episódios em que tivas objetivadas em movi
de vítimas, os índios foram colocados no lugar de réus. jurídicas intrínsecas a pov
Em todos os documentos constantes nesse trabalho está presente, principais dificuldades na
de alguma forma, o processo de criminalização ao qual os Xukuru vêm tre as várias iniciativas do
sendo submetidos. São todos documentos mediados pelo fazer antropoló- balhos que permite eviden
gico; um tipo de intervenção que se diferencia da atuação acadêmica e se dos povos tradicionais, co
propõe a operar com problemas postos pela sociedade. Neles, o discurso nesse contexto. Organizad
antropológico assume um status importante na definição dos problemas, rado o fascículo Xukuru2
dos princípios para se lidar com as populações indígenas e das garantias entre o PNCS e o Núcleo
da Constituição brasileira de 1988. Universidade de Pernamb
perspectivas de transform
São trabalhos já inseridos em um campo de disputas judiciais, por-
tanto, constituem instrumentos importantes numa arena institucionali- O primeiro capítulo
zada de contendas. É nesse contexto que a noção de “criminalização” pas- após o assassinato de Xicã
sa a ser importante. Ela será trabalhada aqui, conforme o entendimento ciavam a tensão entre xuk
do jurista argentino Zaffaroni (2003) de “criminalização secundária”. de forma extremamente
Para este autor, existem dois níveis de criminalização; a criminalização morte de Xicão, a sua viúv
primária, que é “o ato e o efeito de sancionar uma lei penal material que ta. O trabalho tem caráter
incrimina ou permite a punição de certas pessoas” e a criminalização secun- notícias veiculadas antes e
dária que é “a ação punitiva sobre pessoas concretas”. Dentre os meca- interinstitucional; os auto
nismos adotados na criminalização secundária se encontraria a ação seletiva Procuradoria Geral da Rep
pelos meios de comunicação, das agências policiais, judiciário. compilaram as informaçõ
a possibilidade de uma in
É possível perceber com os trabalhos apresentados neste livro que o
regularização do território
período que seguiu a morte de Xicão veio marcado por tentativas cons-
tantes de deslegitimação das reivindicações e da mobilização política dos O segundo texto co
Xukuru. No período em que Xicão protagonizava a intensa articula- cionalismo” xukuru. Resu
ção indígena, os argumentos para fragilizá-lo se baseavam na negação Nacional do Índio, e do
de uma “autêntica” identidade indígena, por conseguinte, na negação
de qualquer direito constitucional específico, como a regularização do
seu território como Terra Indígena. No momento posterior a sua morte, 2. Os fascículos correspondem
siste em “mapear esforços mobiliz
quando já era possível visualizar os avanços alcançados pelo movimento que é considerado relevante pela
indígena em Pernambuco, a principal estratégia antiindígena passou a treinamento e a capacitação dos m
cipais responsáveis pela seleção e
ser a criminalização do movimento e de lideranças. Os trabalhos são re- duzidos. As oficinas de mapas rea
sultantes desse embate que tem sido constantes. composição definida pelos repres
informações obtidas por meio da o
para dotar suas reivindicações de

8
“Plantaram” Xicão

ememoração foi a leitura O Projeto Nova Cartografia Social (PNCS), responsável pela publi-
os ou em parceria com os cação deste livro, ao se debruçar sobre a emergência de identidades cole-
a vários episódios em que tivas objetivadas em movimento sociais, tem dado visibilidade às práticas
de réus. jurídicas intrínsecas a povos e/ou comunidades tradicionais e mostrado as
se trabalho está presente, principais dificuldades na interlocução destes com o poder político. Den-
o ao qual os Xukuru vêm tre as várias iniciativas do PNCS, está a publicação de uma série de tra-
ados pelo fazer antropoló- balhos que permite evidenciar os antagonismos na efetivação dos direitos
da atuação acadêmica e se dos povos tradicionais, como o caso dos indígenas. Este livro se insere
ciedade. Neles, o discurso nesse contexto. Organizado no mesmo período em que está sendo elabo-
definição dos problemas, rado o fascículo Xukuru2, constitui também a consolidação da parceria
indígenas e das garantias entre o PNCS e o Núcleo de Diversidade e Identidades Sociais (NDIS) da
Universidade de Pernambuco (UPE) no que versa sobre a sinalização de
perspectivas de transformação social.
de disputas judiciais, por-
uma arena institucionali- O primeiro capítulo do livro, Dossiê Xicão, produzido em 1998 logo
o de “criminalização” pas- após o assassinato de Xicão, mostra como os próprios jornais locais noti-
onforme o entendimento ciavam a tensão entre xukurus, ocupantes não índios e políticos locais. E,
minalização secundária”. de forma extremamente arbitrária, foram indiciados como suspeitos da
alização; a criminalização morte de Xicão, a sua viúva, Zenilda Araújo, e o vice-cacique, Zé de San-
ma lei penal material que ta. O trabalho tem caráter descritivo e de maneira esquemática mostra as
as” e a criminalização secun- notícias veiculadas antes e depois do evento. Tratou-se de uma iniciativa
cretas”. Dentre os meca- interinstitucional; os autores, motivados pelo empenho da 6ª Câmara da
encontraria a ação seletiva Procuradoria Geral da República no acompanhamento das investigações,
iais, judiciário. compilaram as informações que se encontravam dispersas, propiciando
a possibilidade de uma interessante leitura sobre os conflitos nos quais a
sentados neste livro que o
regularização do território xukuru estava envolta.
cado por tentativas cons-
a mobilização política dos O segundo texto constitui um parecer antropológico sobre o “fac-
nizava a intensa articula- cionalismo” xukuru. Resultou de um demanda da FUNAI, Fundação
se baseavam na negação Nacional do Índio, e do Ministério Público Federal em Pernambuco,
conseguinte, na negação
como a regularização do
nto posterior a sua morte, 2. Os fascículos correspondem aos trabalhos resultantes de oficinas, cujo objetivo geral con-
siste em “mapear esforços mobilizatórios, descrevendo-os e georreferenciando-os, com base no
ançados pelo movimento que é considerado relevante pelas próprias comunidades mapeadas. Tal trabalho pressupõe o
gia antiindígena passou a treinamento e a capacitação dos membros dessas próprias comunidades, que constituem os prin-
cipais responsáveis pela seleção e escolha do que deverá constar do fascículo e dos mapas pro-
nças. Os trabalhos são re- duzidos. As oficinas de mapas realizadas nas próprias aldeias e/ou comunidades, consoante uma
s. composição definida pelos representantes delas mesmas, delimitam perímetrose consolidam as
informações obtidas por meio da observação direta e de diferentes tipos de relatos, contribuindo
para dotar suas reivindicações de uma descrição etnográfica precisa” (ALMEIDA, 2009: p. 14)

9
XUKURU DO ORORUBÁ

diante dos recorrentes eventos que apresentavam a possibilidade de um Referências


desmembramento do território xukuru e das solicitações de reconheci-
mento por parte das instituições de outro grupo indígena, derivado de ALMEIDA, A. W. B. Pre
uma dissidência dessa mesma etnia. nas cidades. Manaus: UEA
O terceiro capítulo apresenta o relatório de uma Comissão Especial, SHIRAISHI NETO, J. “P
instituída através de Resolução do Conselho de Defesa dos Direitos da cionais de acesso e uso da t
Pessoa Humana de 20 de março de 2003. Esta foi também composta de Babaçu Livre: práticas juríd
maneira interdisciplinar e objetivava acompanhar as investigações sobre correlatas. Manaus: PPGS
a tentativa de assassinato do cacique Xukuru Marcos Luidson de Araújo, e fatos
conexos, mas como os próprios autores afirmam, a questão seria mais ZAFFARONI, E. R.; BAT
bem tratada sob a temática de os Xukuru e a violência, como foi, então, Penal Brasileiro. v.1 Rio de
intitulado o relatório.
Em seguida, o quarto capítulo toma como referência o relatório
técnico sobre o conflito instalado em 2003 e já relatado no terceiro ca-
pítulo. As autoras, que integraram a Comissão Técnica interinstitucio-
nal responsável pela elaboração do relatório, objetivaram favorecer uma
compreensão do conflito que não o apresente apenas como um problema
de divisão faccional, mas que envolve um conjunto de sujeitos, de atores
sociais, que não podem ser percebidos como agentes externos ou alheios
ao quadro apresentado. Trata-se de uma reflexão sobre a produção do
conflito e sobre os seus desdobramentos para as ações e empreendimentos
na condução do problema.
Por último, Mariana Carneiro Leão Figueiroa apresenta um estudo
de caso sobre o processo criminal que tramitou na 16ª Vara Criminal da
Justiça Federal do Estado de Pernambuco e teve como escopo a apuração
das circunstâncias e a autoria da morte do cacique Xicão Xukuru. Seu
objetivo é compreender como a máquina judiciária estatal opera diante
da diversidade cultural existente na nossa sociedade.
Cabe ressaltar que com este livro, o PNCS objetiva compartilhar
documentos que contribuem para a compreensão do conflito a partir de
um olhar diversificado e necessário para o reconhecimento de direitos,
indicando, como o fez Shiraishi Neto (2006, p. 14) “que as tentativas de
adequar as situações vivenciadas aos modelos jurídicos preexistentes são
totalmente incompatíveis” e prejudiciais à autonomia e à audeterminação
dos povos tradicionais, como os Xukuru do Ororubá.

10
“Plantaram” Xicão

am a possibilidade de um Referências
solicitações de reconheci-
po indígena, derivado de ALMEIDA, A. W. B. Prefácio. In: FARIAS JR, E. A. F.. Terras indígenas
nas cidades. Manaus: UEA Edições, 2009.
e uma Comissão Especial, SHIRAISHI NETO, J. “Práticas Jurídicas” diferenciadas: formas tradi-
de Defesa dos Direitos da cionais de acesso e uso da terra e dos recursos naturais. In: ______. Leis do
foi também composta de Babaçu Livre: práticas jurídicas das quebradeiras de coco babaçu e normas
har as investigações sobre correlatas. Manaus: PPGSCA-UFAM/Fundação Ford, 2006.
s Luidson de Araújo, e fatos
am, a questão seria mais ZAFFARONI, E. R.; BATISTA, N.; ALAGIA, A.; SLOKAR, A. Direito
violência, como foi, então, Penal Brasileiro. v.1 Rio de Janeiro: Revan, 2003.

mo referência o relatório
á relatado no terceiro ca-
o Técnica interinstitucio-
bjetivaram favorecer uma
penas como um problema
unto de sujeitos, de atores
gentes externos ou alheios
exão sobre a produção do
ações e empreendimentos

iroa apresenta um estudo


u na 16ª Vara Criminal da
e como escopo a apuração
cique Xicão Xukuru. Seu
ciária estatal opera diante
dade.
CS objetiva compartilhar
são do conflito a partir de
onhecimento de direitos,
14) “que as tentativas de
urídicos preexistentes são
nomia e à audeterminação
orubá.

11
XUKURU DO ORORUBÁ

D OSSIÊ CHICÃO XUKURU julgamentos realizados em


sob alegação de que teria
TERRA INDÍGENA XUKURU/PE (1988-1998): Também no caso de
BREVE HISTÓRICO DE UM CONFLITO PERMANENTE ter sido perpetrado fora d
bairro da cidade de Pesque
Ivson j. Ferreira gestivamente denominad
Sheila brasileiro cia poderá ser repassada à
Vânia fialho pelas polícias Federal e Ci
Commércio, de Pernambu
versões de motivação pass
O presente documento foi produzido no intuito de organizar in-
formações que possam vir a subsidiar ações que visem não só o esclareci- Líderes Xukuru con
mento do recente assassinato do cacique Chicão, mas também de ilustrar sido “encomendado” por
a situação da Terra Indígena Xukuru, elencando fatos acontecidos prin- ventiva”, posto que recen
cipalmente nesses últimos 10 anos, período que coincide tanto com o maram a Fazenda Tionant
início do processo de regularização fundiária desta terra e também com a tos limítrofes a áreas hoje o
escolha/atuação de Chicão como cacique do povo Xukuru. alvos privilegiados de poss
Francisco de Assis Araújo, também conhecido por Chicão, nasci- A Terra Indígena Xu
do em 20.03.1950, eleito cacique Xukuru desde 1988, um dos princi- pulação estimada em 700
pais líderes indígenas do Nordeste, foi assassinado no dia 20.05.1998, Nordeste). Localiza-se no
por volta das 9:30 horas da manhã, quando estacionava o veículo Niva co, a 216 km da cidade d
KHM-2269, da FUNAI, em frente à residência de uma sua irmã, Marli, da mesma foi iniciado pela
localizada no bairro “Xukurus”, na cidade de Pesqueira, Pernambuco. e Delimitação. Em 1992 fo
Ele foi alvejado no interior do veículo, por seis tiros à queima-roupa, por mediante Portaria Minist
um indvíduo desconhecido que, segundo informações de moradores das cação física realizada com
imediações, rondava o local há algumas horas. dos próprios índios, os Xu
estando o restante da áre
Este é o terceiro crime praticado no bojo do processo de regulariza-
que dentre os ocupantes
ção fundiária da Terra Indígena Xukuru. No dia 3 de setembro de 1992,
região de reduto político-e
foi assassinado com 4 tiros, numa emboscada, o índio José Everaldo Ro-
sr. Marco Maciel, encontr
drigues Bispo, filho do pajé Xukuru Pedro Rodrigues Bispo. Em 14 de
tradicionalmente influent
maio de 1995, o procurador da FUNAI, Geraldo Rolim Mota Filho, foi
também assassinado a tiros, na cidade de São Sebastião do Umbuzeiro, Com base no decre
Paraíba. Representante da OAB em Pesqueira, onde era presidente do Xukuru teve 272 contes
PSB local, Rolim notabilizou-se pela assessoria prestada em prol da regu- de Pesqueira; Câmara Mun
larização fundiária da Terra Indígena Xukuru. Ambos assassinatos, ainda Estado de Pernambuco; do S
que claramente remetidos à problemática fundiária Xukuru, foram im- tos do Cacau e Balas e Doces
putados a disputas pessoais e averiguados no âmbito da Justiça Comum. Sindicato Rural de Pesqueira
No caso do procurador da FUNAI, o seu assassino foi “absolvido”, em No âmbito administrativ

12
“Plantaram” Xicão

julgamentos realizados em 1996 e 1997, na Comarca de Monteiro/PB,


sob alegação de que teria agido “em legítima defesa”.
88-1998): Também no caso de Chicão, que apresenta o “agravante” do crime
TO PERMANENTE ter sido perpetrado fora dos limites da Terra Indígena (ainda que num
bairro da cidade de Pesqueira, majoritariamente habitado por índios e su-
Ivson j. Ferreira gestivamente denominado “Xukurus”), ao que tudo indica, a competên-
Sheila brasileiro cia poderá ser repassada à Justiça Estadual. Inquéritos foram instaurados
Vânia fialho pelas polícias Federal e Civil (conforme informação contida no Jornal do
Commércio, de Pernambuco, de 22.05.98, ambos inquéritos analisavam
versões de motivação passional e de vingança).
o intuito de organizar in-
e visem não só o esclareci- Líderes Xukuru consideram a hipótese do assassinato de Chicão ter
o, mas também de ilustrar sido “encomendado” por fazendeiros da região, enquanto medida “pre-
do fatos acontecidos prin- ventiva”, posto que recentemente, em março passado, os Xukuru reto-
que coincide tanto com o maram a Fazenda Tionante, que juntamente com outras situadas em pon-
sta terra e também com a tos limítrofes a áreas hoje ocupadas efetivamente pelos índios, constituem
vo Xukuru. alvos privilegiados de possíveis novas ações de retomada pelo grupo.
hecido por Chicão, nasci- A Terra Indígena Xukuru, com 23 “aldeias” ou núcleos, possui po-
sde 1988, um dos princi- pulação estimada em 7000 índios (sendo a maior população indígena no
nado no dia 20.05.1998, Nordeste). Localiza-se no município de Pesqueira, agreste de Pernambu-
stacionava o veículo Niva co, a 216 km da cidade de Recife. O processo de regularização fundiária
a de uma sua irmã, Marli, da mesma foi iniciado pela FUNAI em 1989, com a etapa da Identificação
Pesqueira, Pernambuco. e Delimitação. Em 1992 foi declarada de posse permanente dos índios Xukuru,
tiros à queima-roupa, por mediante Portaria Ministerial, e, finalmente, em 1995, teve sua demar-
mações de moradores das cação física realizada com dimensão de 27.555 ha. Segundo estimativas
dos próprios índios, os Xukuru ocupam pouco mais de 10% desse total,
estando o restante da área intrusado por cerca de 300 posses. Note-se
do processo de regulariza-
que dentre os ocupantes não indígenas da Terra Xukuru, inserida em
a 3 de setembro de 1992,
região de reduto político-eleitoral do atual Vice-Presidente da República,
o índio José Everaldo Ro-
sr. Marco Maciel, encontram-se vários fazendeiros membros de famílias
drigues Bispo. Em 14 de
tradicionalmente influentes em Pernambuco.
ldo Rolim Mota Filho, foi
Sebastião do Umbuzeiro, Com base no decreto 1775/96, a demarcação da Terra Indígena
a, onde era presidente do Xukuru teve 272 contestações, dentre as quais da Prefeitura Municipal
prestada em prol da regu- de Pesqueira; Câmara Municipal de Pesqueira; Federação da Agricultura do
Ambos assassinatos, ainda Estado de Pernambuco; do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Produ-
diária Xukuru, foram im- tos do Cacau e Balas e Doces e Consumos Alimentícios no Estado de Pernambuco;
mbito da Justiça Comum. Sindicato Rural de Pesqueira e Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pesqueira.
assino foi “absolvido”, em No âmbito administrativo, essas contestações foram julgadas improce-

13
XUKURU DO ORORUBÁ

dentes. Recorrendo a esfera judicial, um grupo de fazendeiros impetrou centemente, no final da d


Mandado de Segurança e no final de 96, o STJ, através do ministro relator dos anos, que o territó
Adhemar Maciel, concedeu liminar assegurando a posse de não índios na áreas de ocupação de índios e
Terra Xukuru. Em maio de 1997 o Mandado de Segurança foi julgado e manente na disputa pela poss
concedido. Embora a demarcação física desta Terra Indígena tenha sido Para facilitar sua co
realizada em 1995, a partir de então o processo de regularização fundiária do em fases/etapas que po
não teve prosseguimento. sim sendo, constituem: a
jurídicos recentes, que tra
TERRA INDÍGENA XUKURU: SINOPSE HISTÓRICA Terra Indígena Xukuru. (
existentes que ratificam e
Xukuru sobre suas terr
Referências históricas sobre os Xukuru remontam ao século XVI.
que demandaria muito te
Hohenthal (1958: 99), por exemplo, citou que a menção mais antiga
citar apenas os atos mais
sobre a tribo Shucurú, na versão Xacuru, se dá por volta de 1599, de
zação de reportagens dos
acordo com o autor de Desagravos do Brasil e Glórias de Pernambuco,
Pernambuco, com notícia
escrito em 1757 no Recife.
terra em Pesqueira, bem
As terras habitadas pelos índios Xukuru, segundo tradição oral do rios, Pareceres, Ofícios, Decl
grupo e das diversas fontes históricas existentes, abrangeria a Serra do Feli- res ocupantes não índios d
pe, Serra da Aldeia Velha, Serra do Aió, Serra do Mají (Pedra Furada), Poço resumida, relação de não
do Mulungu, Serra Isabel Dias, Serra da Gangorra, Serra da Ventania ou diversos documentos cons
do Vento, e atrás da Serra do Felipe, em perímetro de aproximadamente 40 terra entre índios e não ín
léguas. Em termos atuais, este território compreenderia, no sentido leste-
-oeste, do Brejo da Madre de Deus (PE) à proximidade de Arcoverde (PE),
e no sentido norte-sul, da região limítrofe aos estados da Paraíba e Pernam- REFERÊNCIAS
buco, até a Pedra Serrana, no município de Pedra/PE. (ATLAS, 1993, 66)
Outras informações encontram-se nas referências sobre a congrega- ATLAS das TERRAS IN
ção do Oratório da Madre de Deus que, em terras doadas pelo governo, Museu Nacional/UFRJ. 1
era responsável pela Missão Ararobá, de catequese aos índios. Documentos HOHENTHAL, W. Note
oficiais do Governo de Pernambuco, em meados do século XVIII, aponta- Pernambuco, Brazil. Revi
vam que a colonização da região, aonde se localizam os Xukuru, foi iniciada
a partir da Vila de Cimbres, local anteriormente denominado Aldeia Ara- SOUZA, Vânia R. Fialho
robá, que serviu como ponto de catequese de vários grupos indígenas locais Área Indígena Xukuru - M
por aproximadamente dois séculos. Em 1836, a sede da Vila de Cimbres
foi transferida para a povoação de Pesqueira que, segundo história oral dos
Xukuru, tratava-se de local tradicional de pescaria daqueles índios.
3. Referências mais antigas sobre
Apesar de insistentemente reivindicada pelos Xukuru, as primeiras Indígena Xukuru (FUNAI/ 1989) e
providências sobre a demarcação das terras desses índios só ocorreram re- me, 1992. - Dissertação de Mestrad

14
“Plantaram” Xicão

o de fazendeiros impetrou centemente, no final da década de 80. Essa situação ocasionou, ao longo
através do ministro relator dos anos, que o território Xukuru se tornasse um mosaico onde interagem
o a posse de não índios na áreas de ocupação de índios e não índios, caracterizando situação de conflito per-
de Segurança foi julgado e manente na disputa pela posse da terra na região. (ATLAS, 1993, 66)
Terra Indígena tenha sido Para facilitar sua compreensão, o presente levantamento foi dividi-
de regularização fundiária do em fases/etapas que possam dinamizar sua leitura e/ou utilização, as-
sim sendo, constituem: a) sinopses histórica e dos atos administrativos/
jurídicos recentes, que tratam do processo de regularização fundiária da
PSE HISTÓRICA Terra Indígena Xukuru. (Pela diversidade de documentos e informações
existentes que ratificam e reconhecem historicamente o direito dos
Xukuru sobre suas terras, consistiria tarefa extremamente exaustiva e
emontam ao século XVI.
que demandaria muito tempo relacioná-los na sua totalidade, optamos
ue a menção mais antiga
citar apenas os atos mais importantes dos últimos 10 anos3); b) organi-
dá por volta de 1599, de
zação de reportagens dos principais jornais em circulação no estado de
Glórias de Pernambuco,
Pernambuco, com notícias principalmente sobre a disputa pela posse da
terra em Pesqueira, bem como de outros documentos tais como Relató-
segundo tradição oral do rios, Pareceres, Ofícios, Declarações, etc; c) Alguns Quadros contendo maio-
abrangeria a Serra do Feli- res ocupantes não índios da Terra Indígena Xukuru (e ainda de maneira
Mají (Pedra Furada), Poço resumida, relação de não índios citados tanto nas reportagens, como nos
orra, Serra da Ventania ou diversos documentos consultados que se referem a disputa pela posse da
o de aproximadamente 40 terra entre índios e não índios em Pesqueira).
eenderia, no sentido leste-
midade de Arcoverde (PE),
ados da Paraíba e Pernam- REFERÊNCIAS
ra/PE. (ATLAS, 1993, 66)
erências sobre a congrega- ATLAS das TERRAS INDÍGENAS do NORDESTE. PETI/PPGAS/
rras doadas pelo governo, Museu Nacional/UFRJ. 1993
se aos índios. Documentos HOHENTHAL, W. Notes on the Shucurú Indians of Serra de ARAROBÁ,
s do século XVIII, aponta- Pernambuco, Brazil. Revista do Museu Paulista. N. S. São Paulo, 8. 1958
am os Xukuru, foi iniciada
e denominado Aldeia Ara- SOUZA, Vânia R. Fialho P. e. Relatório de Identificação e Delimitação da
ios grupos indígenas locais Área Indígena Xukuru - Município de Pesqueira/PE, FUNAI. 1989
a sede da Vila de Cimbres
, segundo história oral dos
ria daqueles índios.
3. Referências mais antigas sobre os Xukuru ver Relatório de Identificação e Delimitação da Área
elos Xukuru, as primeiras Indígena Xukuru (FUNAI/ 1989) e FIALHO, Vânia. As Fronteiras do Ser Xukuru. Reafe: Massanga-
ses índios só ocorreram re- me, 1992. - Dissertação de Mestrado em Antropologia/UFPE/1992.

15
XUKURU DO ORORUBÁ

TERRA INDÍGENA XUKURU (Pesqueira /PE) indígena Xuku


26.980 ha., be
(Atos administrativos/jurídicos do o trabalho de I
Processo de Regularização Fundiária) Decreto 22/91
ministrativos/j
• Em 1954 foi criado o Posto Indígena Xukuru, sob adminis- regularização f
tração do Serviço de Proteção aos Índios-SPI, que três anos • Através da Res
depois (1957), adquiriu através de compra, área com dimen- são Especial de
são de 6,75 ha. para instalação do Posto. Escritura e registro NAI, de 26.04
no cartório do I ofício da Comarca de Pesqueira indica como deliberava sob
sendo 14 ha. a sua extensão, embora na realidade, a área tenha Xukuru.
aproximadamente 6,75 ha. (Info. 207/DID/DGPI/FUNAI, • Despacho Nº 3
em 06.08.81 - Relatório de Identificação da Área Indígena Xuku- FUNAI, aprov
ru/FUNAI/1989) Nº 67 como p
• No ano de 1989, considerando o que estabelecia os decretos adequações à d
94.945/87 e 94.946/87, através da Portaria PP Nº 218/89 de perfície de 26.
14.03.89, foi designado Grupo de Trabalho (GT) para reali- marcação da r
zar a Identificação/Delimitação da Terra Indígena Xukuru, panhado de M
com proposta de demarcação de área com extensão de 26.980 • No dia 29 de
ha. O Levantamento Fundiário na época, uma das fases des- ria/MJ Nº 259
sa etapa do trabalho, identificou um total de 281 ocupações Xukuru, a ár
não indígenas incidentes no perímetro da área proposta para 26.980 ha., de
demarcação. Desse total, 266 tiveram suas benfeitorias vis- sua demarcaçã
toriadas e 15 ocupantes não permitiram que o levantamento da República,
fosse realizado. O número de famílias de não índios declaradas Decreto 22/91
como residentes nas posses vistoriadas somava 233, totalizan-
• Embora na tra
do 960 pessoas.
larização Fund
• Em fevereiro de 1991 os Xukuru ocuparam em caráter defi- área para dem
nitivo a área da Pedra D’Água, com 110 ha., que estava sob fases, em Par
domínio do Ministério da Agricultura. Essa área foi cedida em Brogiolo Tafur
1989 para a FUNAI, por um prazo de 10 anos, através de limitação da FU
Termo de Comodato. Embora os índios mantenham ocupação à FUNAI atrav
permanente nessa área, até o presente não há notícias sobre a sindicatos de p
formalização jurídica entre os órgãos envolvidos e/ou de trans- do deputado f
ferência definitiva para os Xukuru. mentava pela n
• Parecer Nº 67 de 29 de novembro de 1991, da relatora Wil- área para dema
ma Marques Leitão, é favorável à demarcação física da área a ingerência p

16
“Plantaram” Xicão

esqueira /PE) indígena Xukuru, proposta pela Identificação de 1989 com


26.980 ha., bem como da sua desintrusão, argumentando que
o trabalho de Identificação contém todas as peças exigidas no
Decreto 22/91 que estabelecia na época, os procedimentos ad-
ministrativos/jurídicos a serem considerados nos processos de
na Xukuru, sob adminis- regularização fundiária de Terras Indígenas.
Índios-SPI, que três anos • Através da Resolução Nº 44, de 23 de março de 1992, a Comis-
compra, área com dimen- são Especial de Análise-CEA, instituída pela Portaria 398/FU-
Posto. Escritura e registro NAI, de 26.04.91, ratificou o Parecer Nº 67 de 29.11.91, que
de Pesqueira indica como deliberava sobre o processo de demarcação da Terra Indígena
na realidade, a área tenha Xukuru.
207/DID/DGPI/FUNAI, • Despacho Nº 3, de 23 de março de 1992, do Presidente da
ão da Área Indígena Xuku- FUNAI, aprovou as conclusões ratificadas tanto pelo Parecer
Nº 67 como pela Resolução Nº 44, reconhecendo os estudos e
ue estabelecia os decretos adequações à delimitação da Terra Indígena Xukuru com su-
Portaria PP Nº 218/89 de perfície de 26.980 ha. Encaminhou ainda o processo de de-
Trabalho (GT) para reali- marcação da respectiva área, ao Ministério da Justiça, acom-
Terra Indígena Xukuru, panhado de Minuta de Portaria Declaratória, para aprovação.
a com extensão de 26.980 • No dia 29 de maio de 1992 é publicada no DOU, a Porta-
época, uma das fases des- ria/MJ Nº 259 que declara de posse permanente dos índios
m total de 281 ocupações Xukuru, a área Identificada/Delimitada com superfície de
tro da área proposta para 26.980 ha., determinando ainda que a FUNAI promova a
ram suas benfeitorias vis- sua demarcação para posterior homologação pelo Presidente
iram que o levantamento da República, nos termos do estabelecido na Lei 6001/73 e no
s de não índios declaradas Decreto 22/91.
as somava 233, totalizan-
• Embora na tramitação do Processo administrativo de Regu-
larização Fundiária da Terra Indígena Xukuru, a proposta de
cuparam em caráter defi- área para demarcação tenha sido ratificada em todas as suas
m 110 ha., que estava sob fases, em Parecer (20.10.94) elaborado por Sílvia Regina
ra. Essa área foi cedida em Brogiolo Tafuri, então chefe da Coordenação de Análise e De-
o de 10 anos, através de limitação da FUNAI, em Brasília, atendendo pleitos enviados
ios mantenham ocupação à FUNAI através de entidades representativas de classes como
te não há notícias sobre a sindicatos de produtores rurais de Pesqueira e Fax (24.08.94)
envolvidos e/ou de trans- do deputado federal (PFL/PE) Roberto Magalhães, argu-
mentava pela necessidade da FUNAI reelaborar a proposta de
de 1991, da relatora Wil- área para demarcação. Neste Parecer é ressaltada e “elogiada”
demarcação física da área a ingerência política local Em especial, à consideração pela

17
XUKURU DO ORORUBÁ

escolha do deputado federal Roberto Magalhães (PFL/PE), nambuco; Sind


como emissário dos mencionados sindicatos... Sendo reco- lhadores Rurai
mendado a necessidade de reestudo dos limites definidos pela vam-se na: ...
Portaria MJ/259/92, para a AI XUKURU DE PESQUEI- inobservância
RA... é necessário que a DID) tome a iniciativa de rever a da ampla defe
proposta de limites apresentada para a AI XUKURU DE regular, sobre
PESQUEIRA ... Foi proposto ainda a suspensão das provi- como indígena
dências referentes à demarcação... bem como elaboração de § 1º , da Con
exposição de limites, justificando para o MJ, a necessidade julgados impro
de reestudo dos limites. Essas argumentações foram refutadas obedeceu as no
em Pareceres elaborados tanto pela antropóloga que elaborou ca de sua real
o Laudo da Identificação, como por outros técnicos do setor defesa foi alca
fundiário da própria FUNAI, em Brasília, tendo em vista o termos do art.
caráter parcial das argumentações apresentadas em favor dos miniais aprese
pleitos de ocupantes não índios da Terra Indígena Xukuru. 1938, e a aleg
• Através de convênio nº 014/94, firmado entre a FUNAI e não tem força
ITERAL-Instituto de Terras de Alagoas, publicado no DOU gena das terra
em 05.01.95, foi realizada conjuntamente por esses órgãos 231, § 6º, da C
a demarcação física da Terra Indígena Xukuru, totalizando em relação às
superfície de 27.555,0583 ha. Segundo consta de Relatório à Carta de 19
(22.08.95) elaborado por técnico da FUNAI designado para delimitação da
fiscalizar a demarcação física (ITE Nº 016/DAF/FUNAI-Bra- jurídicos, dem
sília, de 08.08.95), durante os trabalhos de campo, a equipe ção dos seus fu
técnica foi procurada pelo fazendeiro Otávio Carneiro Leão, 231, § 1º, da
que propôs alteração em limites da área, especificamente matéria de fat
aqueles que cruzam a Faz. Quixaba que tinha como detentora idônea a elidir
do imóvel, a sua esposa. nº 32/MJ, pub
• No ano de 1996, em janeiro, o Governo Federal sancionou o • Ainda em 199
Decreto 1775, permitindo que ocupantes não índios de Terras Xukuru, impe
Indígenas contestassem o processo demarcatório das mesmas em 21.11.96,
e os seus limites. No caso Xukuru, 272 recursos de ocupantes Ministro relato
não índios contestando os limites propostos para demarcação rando a posse d
foram encaminhados à FUNAI, dentre os quais da Prefeitura que ... Não hou
Municipal de Pesqueira; Câmara Municipal de Pesqueira; Fe- seus títulos domi
deração da Agricultura do Estado de Pernambuco; do Sindi- tos, o que acarr
cato dos Trabalhadores nas Indústrias de Produtos do Cacau O Mandado d
e Balas e Doces e Consumos Alimentícios no Estado de Per- guinte (28.05.

18
“Plantaram” Xicão

to Magalhães (PFL/PE), nambuco; Sindicato Rural de Pesqueira e Sindicato dos Traba-


indicatos... Sendo reco- lhadores Rurais de Pesqueira. Em síntese, as alegações pauta-
dos limites definidos pela vam-se na: ... nulidade do procedimento administrativo por
XUKURU DE PESQUEI- inobservância do devido processo legal e afronta à garantia
me a iniciativa de rever a da ampla defesa; domínio e posse, de sua parte, com titulação
ara a AI XUKURU DE regular, sobre parcela da área; não caracterização das terras
da a suspensão das provi- como indígenas, à luz dos requisitos constantes do art. 231,
bem como elaboração de § 1º , da Constituição Federal. Esses recursos foram todos
para o MJ, a necessidade julgados improcedentes pois o procedimento administrativo
mentações foram refutadas obedeceu as normas legais e regulamentares, vigentes à épo-
antropóloga que elaborou ca de sua realização e ao princípio constitucional da ampla
r outros técnicos do setor defesa foi alcançado pela oportunização das contestações, nos
Brasília, tendo em vista o termos do art. 9º do citado Decreto nº 1.775/96.; os títulos do-
presentadas em favor dos miniais apresentados pelos contestantes, de origem posterior a
Terra Indígena Xukuru. 1938, e a alegada posse “longi temporis” sobre parte da área
rmado entre a FUNAI e não tem força jurídica para descaracterizar a natureza indí-
goas, publicado no DOU gena das terras porque, consoante disposição expressa do art.
tamente por esses órgãos 231, § 6º, da Constituição Federal, tais títulos são ineficazes
ena Xukuru, totalizando em relação às comunidades indígenas, situação que remonta
undo consta de Relatório à Carta de 1934; o laudo antropológico de identificação e
a FUNAI designado para delimitação da área em tela, no que pertine a seus aspectos
º 016/DAF/FUNAI-Bra- jurídicos, demonstra, em seu conjunto, substancial adequa-
alhos de campo, a equipe ção dos seus fundamentos aos pressupostos elencados no art.
o Otávio Carneiro Leão, 231, § 1º, da Carta Republicana vigente e, no que tange a
da área, especificamente matéria de fato, os contestantes não fizeram qualquer prova,
que tinha como detentora idônea a elidir a veracidade desses fundamentos. (Despacho
nº 32/MJ, publicado no DOU; 10.07.96).
verno Federal sancionou o • Ainda em 1996, um grupo de ocupantes não índios da Terra
antes não índios de Terras Xukuru, impetrou Mandado de Segurança (Nº 4.802-DF) e,
demarcatório das mesmas em 21.11.96, o Superior Tribunal de Justiça - STJ, através do
272 recursos de ocupantes Ministro relator Adhemar Maciel, concedeu liminar assegu-
ropostos para demarcação rando a posse desses não índios na Terra Indígena, deliberando
ntre os quais da Prefeitura que ... Não houve, in casu, oportunidade aos interessados de terem
unicipal de Pesqueira; Fe- seus títulos dominiais examinados e suas provas depositadas nos au-
de Pernambuco; do Sindi- tos, o que acarreta a nulidade do ato administrativo questionado.
ias de Produtos do Cacau O Mandado de Segurança foi julgado e concedido no ano se-
ntícios no Estado de Per- guinte (28.05.97).

19
XUKURU DO ORORUBÁ

• O processo administrativo para regularização fundiária da formava que o


Terra Indígena Xukuru teve prosseguimento através do Ofício serão suficientes
nº 35/PRESI, DE 06.10.97, do presidente da FUNAI que o mês de julho, i
encaminhou ao Ministro da Justiça, os autos do Processo FU- regularização
NAI/BSB/ nº 08620.0449/96, que tratava da demarcação da res...
Terra indígena Xukuru, e minuta de decreto homologatório • Através do ME
da demarcação. Departamento F
• Através da Exposição de Motivos nº 511-MJ, de 22.10.97, o formou atend
Ministro da Justiça encaminhou ao presidente da República estava impossi
para apreciação, projeto de Decreto que tratava da homolo- fundiária da te
gação da demarcação da Terra Indígena Xukuru. Ainda nesse crédito requerido
mês de outubro/97, no dia 27, o processo foi devolvido ao Mi- caminhado no
nistério da Justiça pelo Gabinete da Presidência da República do Planejamento
tendo em vista a decisão proferida nos autos do Mandado de descontingenciam
Segurança nº 4802-DF. No entanto, Parecer elaborado pela • Memorando nº
Procuradoria Geral da FUNAI, em dezembro desse mesmo da Diretoria d
ano, recomendava o prosseguimento do processo de homolo- Brasília, inform
gação demarcatória da Terra Indígena Xukuru,... por con- daquele órgão
siderar que enquanto não for publicado o Acórdão da deci- qualquer solicita
são judicial proferida nos autos do Mandado de Segurança implantadas por
nº 4802-DF, e consequentemente, tomado conhecimento o não for aprovada
Exmo. Sr. Ministro da Justiça, nada poderá sobrestar o pro- da Justiça.
cedimento administrativo em questão. (grifo nosso). Após
essa fase, caberá ainda, Recurso junto ao Supremo Tribunal Federal,
matéria restrita a Procuradoria-Geral da República. A partir de
então não se observa quisquer providências do Governo no
sentido de concluir o processo de regularização fundiária da
Terra Xukuru.
• O estado atual da questão: O Ministério Público Federal, através de
seu sub procurador, Dr. Miguel Guskov, impetrou agravo de instru-
mento no STJ nos autos do Mandado de Segurança nº 4802-DF. Esse
agravo foi denegado. A Advocacia Geral da União apresentou então
um recurso extraordinário para fazer subir o processo ao Supremo Tri-
bunal Federal, também negado pelo STJ sob alegação de que teria que
haver um pré questionamento vinculado com o direito constitucional.
• Aviso nº 0249/98, de 04.03.98, do Ministério da Justiça, en-
caminhado ao Ministério do Planejamento e Orçamento, in-

20
“Plantaram” Xicão

egularização fundiária da formava que os recursos alocados à FUNAI, neste exercício, só


uimento através do Ofício serão suficientes para manter as atividades básicas e operacionais até
residente da FUNAI que o mês de julho, inviabilizando todo o processo de demarcação e
os autos do Processo FU- regularização de terras, de fiscalização e retirada de invaso-
tratava da demarcação da res...
de decreto homologatório • Através do MEMO/Nº 251/DEF/98 de 02.06.98, o chefe do
Departamento Fundiário (DEF) da FUNAI, em Brasília, in-
º 511-MJ, de 22.10.97, o formou atendendo solicitação da FUNAI/AER-Recife, que
presidente da República estava impossibilitado de dar prosseguimento a regularização
o que tratava da homolo- fundiária da terra indígena Xukuru, até aprovação e liberação do
ena Xukuru. Ainda nesse crédito requerido, junto ao Ministério da Justiça, que havia en-
cesso foi devolvido ao Mi- caminhado no dia 4 de março, o Aviso nº 0249/98, ao Ministério
Presidência da República do Planejamento e Orçamento, solicitando “em caráter de urgência, o
nos autos do Mandado de descontingenciamento das dotações da FUNAI...”
to, Parecer elaborado pela • Memorando nº 564/DAF-CIRCULAR, de 17.06.98, o diretor
m dezembro desse mesmo da Diretoria de Assuntos Fundiários (DAF) da FUNAI, em
to do processo de homolo- Brasília, informava às Administrações Executivas Regionais
gena Xukuru,... por con- daquele órgão, que não dispunha de mais recursos para atender
icado o Acórdão da deci- qualquer solicitação que seja, ressaltando indenização de benfeitorias
Mandado de Segurança implantadas por ocupantes não índios em terras indígenas, enquanto
tomado conhecimento o não for aprovada a liberação do crédito requerido junto ao Ministério
a poderá sobrestar o pro- da Justiça.
estão. (grifo nosso). Após
o Supremo Tribunal Federal,
da República. A partir de
vidências do Governo no
egularização fundiária da

o Público Federal, através de


, impetrou agravo de instru-
Segurança nº 4802-DF. Esse
l da União apresentou então
bir o processo ao Supremo Tri-
sob alegação de que teria que
com o direito constitucional.
Ministério da Justiça, en-
amento e Orçamento, in-

21
XUKURU DO ORORUBÁ

Cronologia do Conflito
23/10/88 Índios Xukuru r
bre medidas qu
Cronologia de uma luta por território e terras, a serem
a demarcação d
de um assassinato ço de projetos
dos dispositivo
índios teve iníci
DATA NOTÍCIA/FATO/ACONTECIMENTO/ FONTE
liberativo da SU
DESCRIÇÃO SUMÁRIA de duas cartas
para empresas
ária Vale do Ip
22/10/88 Ameaça dos Xukuru de retomarem suas terras que FOLHA DE
área de 2.000 h
fazendeiros estavam se apossando para desenvol- PERNAMBUCO
e da Indústria A
ver atividades de pecuária; denúncia da aprovação
aldeia era de t
e liberação de verbas para implantação de proje-
de terra, como
to da Empresa Agropecuária Vale do Ipojuca S/A,
tima empresa
em 2.000 ha. das terras tradicionalmente ocupa-
era permitida
das pelos índios Xukuru; protesto do vice-cacique
Chicão que responsabilizou a FUNAI pelo que viesse
a ocorrer em virtude da situação; referência a inci- FEV/1989 Índios Xukuru
dente que envolveu o índio Xukuru Ademar Marco- Pesqueira de c
lino, da aldeia Canabrava, e o filho do fazendeiro bros da comun
Pio Amaral. Após discussão, este último teria decla-
rado: Tô vendo que vai morrer muito índio por aqui.
02/02/89 Xukurus denun
Índios Xukuru, sob tensão, exigiam da FUNAI a de- JORNAL DO legado de pol
marcação das suas terras; a contenção do avanço COMMÉRCIO cisco de Assis
de projetos agropecuários na região e a aplicação gado prendeu
dos dispositivos da Constituição Brasileira; fazendei- Cícero Serafim
ros ameaçavam soltar o gado sobre as plantações
dos índios. Na área, os índios estavam temerosos Índios Xukuru
pela ação dos fazendeiros. O índio Luiz Caetano, da rança Pública
aldeia Brejinho declarou que: Se o índio for enfren- cumento, contr
tar (o fazendeiro) apanha. Para isso eles têm dinhei- Leite pelo dele
ro. Para contratar jagunço. Relembrou o caso que mando do fazen
tinha ocorrido há dois meses atrás, quando capan- bido a dança do
gas do fazendeiro Justo Farias deram uma “sova”
em Gentil Severiano, da aldeia “Pé de Serra”. Afir- Líderes Xukuru
mou ainda que De nada adiantou ter dado parte à gurança Públic
polícia. O fato também foi comunicado à FUNAI que de Pesqueira P
até então, não tinha tomado qualquer providência. estava prende
morte índios Xu
Líderes indígenas temiam confronto com fazen- plos, o caso do
deiros devido ao clima de insegurança que tinha se foi preso e esp
estabelecido na região após a promulgação da nova zembro passad
Constituição. Fazendeiros apressavam-se em plantar Xukuru, as pe
capim e soltar o gado no pasto para ocupar de vez aumentaram q
a terra, enquanto os índios, respaldados por seus rante o segund
novos direitos constitucionais, resolveram reaver que Eles (os faz
o que lhes pertencia, estabelecendo-se daí um cli- sabendo de tod
ma de animosidade e desconfiança entre as partes. tuição, daí o a

22
“Plantaram” Xicão

23/10/88 Índios Xukuru realizaram assembléia para decidir so- JORNAL DO


bre medidas que iriam adotar, pela garantia das suas COMMÉRCIO
e terras, a serem encaminhadas à FUNAI. Eles exigiam
a demarcação das suas terras, a contenção do avan-
ço de projetos de pecuária na região e a aplicação
dos dispositivos da nova Constituição. A revolta dos
índios teve início com a aprovação pelo Conselho De-
O/ FONTE
liberativo da SUDENE, no último dia 30 de setembro,
de duas cartas consultas, para liberação de recursos
para empresas da região. Tratava-se da Agropecu-
ária Vale do Ipojuca, que implantaria projeto numa
rras que FOLHA DE
área de 2.000 ha, incidentes em terras dos Xukuru;
esenvol- PERNAMBUCO
e da Indústria Alimentícia Carlos de Brito. O clima na
provação
aldeia era de tensão e revolta, tanto por questões
de proje-
de terra, como também pela proibição daquela úl-
uca S/A,
tima empresa em relação a um açude, aonde não
e ocupa-
era permitida sequer a aproximação dos índios.
-cacique
ue viesse
ia a inci- FEV/1989 Índios Xukuru acusaram o delegado municipal de TRIBUNA DE
r Marco- Pesqueira de cometer arbitrariedades contra mem- PESQUEIRA
zendeiro bros da comunidade e exigiam o seu afastamento.
ia decla-
por aqui.
02/02/89 Xukurus denunciaram torturas praticadas por de- FOLHA DE
NAI a de- JORNAL DO legado de polícia de Pesqueira. O cacique Fran- PERNAMBUCO
o avanço COMMÉRCIO cisco de Assis Araújo afirmou que o referido dele-
plicação gado prendeu arbitrariamente e torturou o índio
azendei- Cícero Serafim dos Santos, de apenas 17 anos.
antações
merosos Índios Xukuru protestaram ao Secretário de Segu- DIÁRIO DE
tano, da rança Pública de Pernambuco, encaminhando do- PERNAMBUCO
r enfren- cumento, contra a prisão arbitrária do índio Edilson
m dinhei- Leite pelo delegado de Pesqueira, que teria agido a
aso que mando do fazendeiro Eudim Bezerra, além de ter proi-
o capan- bido a dança do “toré”.
a “sova”
ra”. Afir- Líderes Xukuru denunciaram ao secretário de Se- JORNAL DO
parte à gurança Pública de Pernambuco, que o delegado COMMÉRCIO
NAI que de Pesqueira Petrônio Góes, conhecido por Jesus,
vidência. estava prendendo, torturando e ameaçando de
morte índios Xukuru. Foi citado como um dos exem-
m fazen- plos, o caso do índio Adelmo Ferreira Messias, que
tinha se foi preso e espancado durante quatro dias, em de-
da nova zembro passado (1988). Para o cacique Francisco
m plantar Xukuru, as perseguições policiais em Pesqueira
r de vez aumentaram quando os índios foram a Brasília du-
por seus rante o segundo turno da Constituinte, afirmando
m reaver que Eles (os fazendeiros) perceberam que estávamos
í um cli- sabendo de todos os nossos direitos na nova Consti-
s partes. tuição, daí o aumento da violência contra a gente.

23
XUKURU DO ORORUBÁ

O Juiz da Comarca de Pesqueira, Pedro Coutinho PORTARIA Nº Xukurus denun


de Almeida, em virtude dos conflitos em Pesquei- 001/89 - e intimidações
ra e pela reivindicação dos Xukuru pela devolução ASSISTÊNCIA com muito med
das suas terras, que encontravam-se em poder de JUDICIÁRIA DO nhos. Até a ida à
proprietários poderosos; pelos riscos que vêm cor- ESTADO pediam ainda o
rendo os sílvicolas, em face de agir o sr. Delegado de região. Agravam
Pesqueira, de modo a que atende às pretensões dos ameaças de mo
proprietários..., designou o advogado Geraldo Rolim ferson Borges,
Mota Filho, da Assistência Judiciária do Estado, para (Chicão) - o mi
acompanhar o caso dos índios Xukuru, na qualida- por um homem
de de representante do Governo de Pernambuco. que lhe avisou: “
O vice-cacique
cercada por p
03.02.89 Secretário de Segurança Pública, Almeida Filho, DIÁRIO DE
mandou apurar denúncias contra o delegado de PERNAMBUCO
Pesqueira, José Petrônio Góes, acusado de estar 23.02.89 Índios Xukuru d
torturando índios Xukuru naquela cidade, a pedido açados de mor
de um fazendeiro, por causa de problemas relacio- vação da instal
nados a disputa pela posse da terra. Segundo o ca- do Ipojuca - em
cique Chicão, para pressionar os índios, o fazendeiro
Eudim Bezerra prestou queixa à delegacia municipal,
alegando que os índios estavam se reunindo, dan- 06.03.89 Em depoiment
çando o “Toré”, para invadir a propriedade dele. Humanos da P
de Pernambuco
pela posse da t
20.02.89 Declaração assinada pelos líderes Xukuru Francisco tensificaram em
de Assis Araújo, José Pereira de Araújo, Antonio índios em faze
Severiano de Santana, Antonio Rosa de Lima, de- que não mais p
nunciava ameaças de fazendeiros e delegado de índios pelos br
Pesqueira que ocorriam na área, inclusive com têm tomado um
a proibição da dança do toré. Pediam que as au- índios a dança d
toridades tomam providências para desarmar os José Petrônio G
fazendeiros, porque eles dizem que estão prepara- tes envolvendo
dos para enfrentar-nos. Estamos com medo e não do o índio ADE
estamos mais seguro para andar sozinhos e até a parte de policia
ida à feira estamos obrigados a andar em grupos... fatos de agressã
parte de policia
para que os ín
22.02.89 Índios Xukuru denunciaram atitudes arbitrárias FOLHA DE
de delegado de Polícia de Pesqueira e ameaças PERNAMBUCO
dos fazendeiros Eudim Bezerra e “Zé de Riva”. 08.04.89 Em Nota dis
dades e à Im
Índios Xukuru denunciaram antigas ameaças de fa- DIÁRIO DE Manoel Palme
zendeiros acobertados pela própria Polícia. PERNAMBUCO pastorais, leigo
nifestou solida
ru e missionár
e ameaças po

24
“Plantaram” Xicão

Coutinho PORTARIA Nº Xukurus denunciaram dificuldades por eles vividas JORNAL DO


Pesquei- 001/89 - e intimidações feitas por fazendeiros. Diziam estar COMMÉRCIO
evolução ASSISTÊNCIA com muito medo e sem segurança para andar sozi-
poder de JUDICIÁRIA DO nhos. Até a ida à feira tem que ser em grupo; os índios
vêm cor- ESTADO pediam ainda o desarmamento dos fazendeiros da
egado de região. Agravamento de tensão em Pesqueira com
sões dos ameaças de morte feitas ao missionário do CIMI, Ge-
do Rolim ferson Borges, e ao vice-cacique Francisco de Assis
do, para (Chicão) - o missionário teve seu carro interceptado
qualida- por um homem “de chapéu de couro e barba rala”
ambuco. que lhe avisou: “Se não quiser morrer, deixe a área...”.
O vice-cacique (Chicão), por sua vez, teve a sua casa
cercada por pistoleiros durante algumas noites.
a Filho, DIÁRIO DE
gado de PERNAMBUCO
de estar 23.02.89 Índios Xukuru denunciaram que estavam sendo ame- FOLHA DE
a pedido açados de morte por fazendeiros da região e apro- PERNAMBUCO
s relacio- vação da instalação de Projeto Agropecuário – Vale
do o ca- do Ipojuca - em dois mil hectares da Terra Indígena.
zendeiro
unicipal,
do, dan- 06.03.89 Em depoimento no Gabinete do Setor de Direitos TERMO DE
de dele. Humanos da Procuradoria da República no Estado DECLARAÇÕES
de Pernambuco, Chicão afirmou que os conflitos PRESTADAS POR
pela posse da terra entre índios e não índios se in- FRANCISCO DE
rancisco tensificaram em Pesqueira, em virtude da luta dos ASSIS ARAÚJO
Antonio índios em fazer constar na Constituição princípios (PROCURADORIA
ima, de- que não mais permitisse a violação dos direitos dos DA REPÚBLICA EM
gado de índios pelos brancos; que ultimamente os conflitos PE) - INQUÉRITO
e com têm tomado uma dimensão maior sendo proibido aos CIVIL PÚBLICO Nº
e as au- índios a dança do TORÉ, pelo delegado de polícia, Dr. 01/89
rmar os José Petrônio Góis...; que tem havido vários inciden-
prepara- tes envolvendo os índios e o delegado de polícia, ten-
o e não do o índio ADELMO FERREIRA sofrido violências por
e até a parte de policiais civis e militares; que houve outros
grupos... fatos de agressão física envolvendo outros índios por
parte de policiais, sendo uma maneira de pressionar
para que os índios não reivindiquem suas terras...
bitrárias FOLHA DE
ameaças PERNAMBUCO
e Riva”. 08.04.89 Em Nota distribuída recentemente às autori-
dades e à Imprensa, assinada pelo bispo Dom
as de fa- DIÁRIO DE Manoel Palmeira da Rocha, sacerdotes, agentes
PERNAMBUCO pastorais, leigos, etc., a Diocese de Pesqueira ma-
nifestou solidariedade para com os índios Xuku-
ru e missionários do CIMI, vítimas de agressões
e ameaças por parte de fazendeiros da região.

25
XUKURU DO ORORUBÁ

No documento são feitas denúncias sobre o desca- 13.01.91 Reportagem so


so e a omissão da FUNAI em relação a estes fatos buco apontava
ocorridos recentemente em Pesqueira, pela trans- tensão entre ín
ferência do delegado de polícia daquela cidade, va também que
José Petrônio Góes (acusado de arbitrariedades sem a proteçã
contra os índios), e exigia o cumprimento da Cons- devido a const
tituição no que concerne às terras dos Xukuru. intensificadas n
coincidia com o
fundiária da TI
14.11.90 Representação proposta pela Comunidade Indíge- cacique. Este,
na Xukuru, através de seu cacique Francisco de e a Brasília, no
Assis Araújo (Chicão), ao Ministério Público Federal lhe foi realmen
no Estado de Pernambuco, requeria a abertura de de de índios”
INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO apuratório das respon- absolutamente
sabilidades dos citados entes da administração ças está relacio
pública federal (FUNAI, Ministério da Agricultu- do cacique em
ra), referente a situação da área Pedra D’Água. no início do an
por parte do de
09.12.90 Índios Xukuru em Pesqueira em “pé-de-guerra”, de- JORNAL DO posteriormente
ram ultimato aos posseiros que ocupavam terras dos COMMÉRCIO Justiça do esta
seus antepassados na Pedra D’Água. Os Xukuru pre- da da área Pedr
tendiam ocupar a área até o dia 17, aonde estão hoje ha. - local onde
cerca de 70 posseiros que teriam sido assentados ali - promovida há
através de convênio firmado em 1981, entre o Mi- as últimas ame
nistério da Agricultura e a Cooperativa Agropecuária tensão, atualm
de Pesqueira. A área da Pedra D’Água foi repassada
para o Ministério da Agricultura pela prefeitura do 24.05.91 O cacique Xuku
município, na gestão do prefeito Ésio Araújo. O atual de ofício, encam
prefeito, João Araújo Leite (PFL), afirmou que o ter- NAI em Recife, c
reno é do Ministério da Agricultura, e não dos índios, plantado na áre
por uma doação pessoal da prefeitura (em 16.05.89). pela unanimida
malsinado além
18.12.90 Índios e posseiros selaram acordo em relação a Pe- JORNAL DO atenderia uma
dra D’Água. Chicão denunciou estar sendo ameaçado COMMERCIO não passa de um
de morte. Fui jurado por por “Jorge Bigodão”. Ele já técnico da FUN
fez até emboscadas. Os fazendeiros dizem que têm pa- pela área onde s
pel provando ter comprado a terra. De que jeito? Tro-
cando por uma garrafa de cachaça e ¼ de bode, como
fez Adalberto Caracciolo de Freitas, avô do deputado? set./91 Com base no
O fazendeiro Moacir Brito (ex-proprietário do gru- promotor de
po Mansur/Peixe), sobre o processo demarcatório Valdeci Alves d
da Terra Xukuru, declarou que Vamos ver no que Estado de Per
dá. Pessoalmente não creio que isso vá pra frente... tra Francisco
acusados de t
truição de ben
na, bem como
pliada no Sítio

26
“Plantaram” Xicão

o desca- 13.01.91 Reportagem sobre as Terras Indígenas em Pernam- JORNAL DO


es fatos buco apontava Pesqueira como o maior ponto de COMMÉRCIO
la trans- tensão entre índios e não índios no estado. Informa-
cidade, va também que o cacique Xukuru Chicão não andava
riedades sem a proteção de “uma legião” de outros índios
da Cons- devido a constantes ameaças de morte contra ele,
Xukuru. intensificadas nos últimos dois anos, período que
coincidia com o início do processo de regularização
fundiária da TI Xukuru e a escolha de Chicão como
e Indíge- cacique. Este, teria solicitado proteção a SSP-PE
cisco de e a Brasília, no entanto, nenhuma garantia de vida
o Federal lhe foi realmente prestada e, a não ser pela “pare-
rtura de de de índios” que o acompanhava, Chicão estava
respon- absolutamente desprotegido. O motivo das amea-
nistração ças está relacionado a questão da terra. A atuação
gricultu- do cacique em defesa das terras Xukuru, acarretou
D’Água. no início do ano, registro de violência contra índios
por parte do delegado de polícia civil de Pesqueira,
rra”, de- JORNAL DO posteriormente afastado pelo então Secretário de
erras dos COMMÉRCIO Justiça do estado, Almeida Filho. Mas foi a retoma-
kuru pre- da da área Pedra D’Água, com aproximadamente 110
tão hoje ha. - local onde os Xukuru realizam rituais sagrados
tados ali - promovida há cerca de dois meses, que ocasionou
re o Mi- as últimas ameaças e o crescimento do clima de
pecuária tensão, atualmente pronto a se traduzir em mortes .
passada
eitura do 24.05.91 O cacique Xukuru Francisco de Assis Araújo, através OFÍCIO 001/91 -
. O atual de ofício, encaminhado ao Superintendente da FU- FRANCISCO DE
ue o ter- NAI em Recife, comunicou que o projeto que seria im- ASSIS ARAÚJO
os índios, plantado na área indígena cuja intenção foi reprovada CACIQUE E
6.05.89). pela unanimidade dos índios Xukurus, uma vez que o PRESIDENTE DA
malsinado além de ter viabilidade duvidosa somente ASSOCIAÇÃO DA
ção a Pe- JORNAL DO atenderia uma meia dúzia de famílias... Esse projeto COMUNIDADE
meaçado COMMERCIO não passa de um engodo. É político... que o irmão do INDÍGENA XUKURU
o”. Ele já técnico da FUNAI que elaborou o projeto é Vereador
e têm pa- pela área onde seria implantado o malogrado projeto.
eito? Tro-
de, como
eputado? set./91 Com base no Inquérito Policial nº 063/91 DPF, o PEÇAS DA AÇÃO
do gru- promotor de Justiça da Comarca de Pesqueira, PENAL 928427-3 - 2ª
arcatório Valdeci Alves dos Passos, do Ministério Público do VARA DA JUSTIÇA
no que Estado de Pernambuco, ofereceu denúncia con- FEDERAL/PE (ainda
frente... tra Francisco de Assis Araújo, Chicão, e outros, em tramitação)
acusados de terem promovido desordem e des-
truição de benfeitorias existentes na área indíge-
na, bem como na barragem que estava sendo am-
pliada no Sítio Canivete, na Aldeia “Pé de Serra”...

27
XUKURU DO ORORUBÁ

O Processo Crime contra Chicão, segundo os advoga- 19.03.92 Em Carta env


dos que atuaram em sua defesa, entre eles Geraldo Pernambuco, Jo
Rolim, tinha conotações de manobra política que de Pesqueira, r
envolviam índios e não índios interessados em en- desse município
fraquecer a liderança do cacique Francisco de Assis recentes invest
Araújo... Com base no Inquérito Policial nº 063/91 produtores, por
DPF, o promotor de Justiça da Comarca de Pesquei- dono por se con
ra, Valdeci Alves dos Passos, do Ministério Público fos nossos), soli
do Estado de Pernambuco, ofereceu denúncia contra de, do bem esta
Francisco de Assis Araújo, Chicão, e outros, acusados cípio e que nun
de terem promovido desordem e destruição de benfei- indígena desde
torias existentes na área indígena, bem como na barra- as propriedades
gem que estava sendo ampliada no Sítio Canivete, na a área em confli
Aldeia “Pé de Serra”... O Processo Crime contra Chi- vam a Carta des
cão, segundo os advogados que atuaram em sua de- dente do Sindic
fesa, entre eles Geraldo Rolim, tinha conotações de Sobrinho (pres
manobra política que envolviam índios e não índios de Pesqueira);
interessados em enfraquecer a liderança do cacique da Associação
Francisco de Assis Araújo... Tal argumentação funda- do Ipojuca); Cos
mentava-se no fato de que foi um projeto elaborado Maçônica de Pe
por técnico da FUNAI, que gerou o clima de insatisfa- Edson Vieira de
ção entre os Xukuru. Além dos seus principais líderes readores); João
não terem sido consultados sobre o referido proje-
to, o autor do mesmo (funcionário da FUNAI), era
irmão do vereador de Pesqueira Vilberto Antonio 14.04.92 Índios Xukuru
de Araújo (Beto Zacarias), que tinha como objetivo, do Estado, qu
além de favorecer alguns índios, que na época eram dios. Os Xukur
oponentes de Chicão, fortalecer sua base eleitoral cesso de regu
na região aonde seria implantado. O próprio Chicão
tinha denunciado tal manobra, encaminhando ofício
29.04.92 Reportagem s
ao Superintendente da FUNAI, em Recife, em 24 de
pe pelos Xuku
maio de 1991. Chicão e os outros acusados foram
conflitos vivido
absolvidos das acusações imputadas a eles, em maio
terra e apontav
de 1995, em sentença proferida pelo Juiz Francisco
ra indígena, qu
Alves dos Santos Júnior, 2ª Vara da Justiça Federal/PE.
dos Xukuru, d
perdas são ger
25.02.92 Liderados pelo cacique Chicão, índios Xukuru ocu- JORNAL DO Carta enviada à
param a fazenda Caípe de Baixo, então sob domínio COMMÉRCIO Pernambuco, M
do vereador do PFL de Pesqueira, Hamilton Didier, CIMI-Conselho
inserida na sua totalidade na Terra Indígena Xukuru. moradores das
os Xukuru ocup
26.02.92 Índios Xukuru começaram a plantar na área retoma- JORNAL DO Hamilton Didier
da por eles, da fazenda do vereador Hamilton Didier. COMMÉRCIO estranhas na re
alojados num g
sr. André Didier
06.03.92 Notícia sobre suposto atentado a tiros con- JORNAL DO para averiguar o
tra o fazendeiro José Jorge de Medeiros, co- COMMÉRCIO Xukuru, entre el
nhecido por “Jorge Bigodão”. No local da
emboscada foram encontrados além de cartu-
chos de armas de fogo, um “cocar indígena”.

28
“Plantaram” Xicão

advoga- 19.03.92 Em Carta enviada ao governador do estado de


Geraldo Pernambuco, Joaquim Francisco, diversas entidades
tica que de Pesqueira, relatavam que proprietários de terra
s em en- desse município estavam sendo constrangidos pelas
de Assis recentes investidas contra o patrimônio de pacatos
º 063/91 produtores, por parte de grupo que se diz primitivo
Pesquei- dono por se considerar descendentes de índios... (gri-
o Público fos nossos), solicitando em nome da paz e prosperida-
a contra de, do bem estar que sempre nortearam nosso muni-
cusados cípio e que nunca se atritou com qualquer civilização
e benfei- indígena desde seus primórdios... que sejam mantidas
na barra- as propriedades como se encontram... e que não seja
ivete, na a área em conflito demarcada... dentre os que assina-
ntra Chi- vam a Carta destacamos: Paudjo F. A. Queiroz (presi-
m sua de- dente do Sindicato Rural de Pesqueira; Afonso Freire
ações de Sobrinho (presidente da Cooperativa Agropecuária
ão índios de Pesqueira); Jonas Celso Maia Brito (presidente
cacique da Associação dos Produtores de Tomates do Vale
o funda- do Ipojuca); Cosmo Joaquim da Silva (Venerável-Loja
aborado Maçônica de Pesqueira); Clube de Diretores Lojistas;
nsatisfa- Edson Vieira de Melo (presidente da Câmara de Ve-
is líderes readores); João Araújo Leite (Prefeito de Pesqueira)
do proje-
NAI), era
Antonio 14.04.92 Índios Xukuru ocuparam Assembléia Legislativa JORNAL DO
objetivo, do Estado, que dedicou Sessão Especial aos ín- COMMÉRCIO
oca eram dios. Os Xukuru reivindicavam agilização no pro-
eleitoral cesso de regularização fundiária das suas terras.
o Chicão
do ofício
29.04.92 Reportagem sobre reconquista da fazenda Caí- DIÁRIO DE
m 24 de
pe pelos Xukuru, contextualizava historicamente PERNAMBUCO
os foram
conflitos vividos por estes índios pela posse da
em maio
terra e apontava a provocação de posseiros da ter-
rancisco
ra indígena, que soltavam o gado em plantações
deral/PE.
dos Xukuru, destruindo suas lavouras, “onde as
perdas são gerais”, denunciava o cacique Chicão.
uru ocu- JORNAL DO Carta enviada à Procuradora Geral da República em CARTA - CIMI,
domínio COMMÉRCIO Pernambuco, Maria do Socorro Leite de Paiva, pelo 29.04.92
n Didier, CIMI-Conselho Indigenista Missionário, relatava que
Xukuru. moradores das localidade de Caípe de Baixo, aonde
os Xukuru ocuparam a Fazenda sob domínio do sr.
retoma- JORNAL DO Hamilton Didier, observaram a presença de pessoas
n Didier. COMMÉRCIO estranhas na região, alguns armados, que estariam
alojados num galpão na Fazenda Massaranduba, do
sr. André Didier. Solicitava o envio da Polícia Federal
os con- JORNAL DO para averiguar os fatos e garantias de vida a lideranças
ros, co- COMMÉRCIO Xukuru, entre elas o cacique Francisco de Assis Araújo.
ocal da
e cartu-
dígena”.

29
XUKURU DO ORORUBÁ

05.05.92 Índios Xukuru pediram ajuda à Polícia Federal contra JORNAL DO 05.09.92 Clima de tensã
jagunços armados no município de Pesqueira. Situa- COMMÉRCIO rupção a tiros p
ção era tensa na área após a ocupação pelos índios seata pró-impe
de fazenda sob domínio de Hamilton Didier, localiza- assassinato no d
da dentro da Terra Indígena. Os Xukuru denunciaram José Everaldo R
presença de jagunços armados nas proximidades da
ocupação, os quais estariam alojados na fazenda de-
nominada Massaranduba, de domínio de André Didier. 09.09.92 Declaração ass
Pereira de Ara
nunciava que E
22.06.92 Carta do Sindicato Rural de Pesqueira, então presi- Bispo (filho do p
dido por Paudijo Fernando Araújo Queiroz relatava com o fazendeir
que a FUNAI pincelou um mapa na qual inseriu várias do pelo nome d
aldeias, como se Pesqueira fosse a Amazônia e que ros da Terra Ind
toda aquela área fosse na realidade utilizada pelos jurou arrancar a
“pseudos índios...” Recentemente um grupo que (Chicão). Os índ
se diz indígena, chefiado pelo pseudo “cacique Chi- sença da família
cão”, invadiu 147 ha. de terras da propriedade Pedra na área, para ev
D’Água.... Tentou o grupo contra a vida do pacato pe-
cuarista José Jorge Medeiros... Em nome dos proprie-
tários de Pesqueira, finalizava afirmando que Não
podemos simplesmente renunciar nossos direitos, 09.09.92 Os índios Xuku
porque já em cima desses, organizamos o município, sa dos Santos
não podemos, não devemos e não deixaremos que se lícia Federal e
promova o seu desmoronamento. Cópias enviadas o fazendeiro
para a FUNAI/Brasília; os senadores pernambucanos da Terra Indíge
Marco Maciel e Ney Maranhão; para os deputados ru José Everal
federais Roberto Magalhães e José Moura (ambos Um grupo de ín
do PFL); Governo do Estado e Ministro da Justiça. sinato do filho d
deiro acusado
foragido. Ante
encontraram um
07.08.92 Um grupo de supostos índios Xukuru, denunciou DIÁRIO DE Xukuru, dentre
que recebeu ameaças de morte de índios lidera- PERNAMBUCO Rodrigues Bisp
dos por Chicão. Uma das denunciantes, chama- Francisco de A
da Jussara Rodrigues do Nascimento, se dizia Joaquim de Far
sobrinha de Antonio Farias, a quem os Xukuru sentar o filho à
apontavam como um dos invasores das suas terras. relacionado a c

28.08.92 Delegado de Polícia de Pesqueira iniciou apura- JORNAL DO 10.10.92 Em virtude do


ção de queixa prestada pelo candidato a verea- COMMÉRCIO Everaldo Rodr
dor Geraldo Rolim, contra o prefeito do municí- daquela comu
pio, João Araújo Leite, acusado de interromper zendeiro Egiva
a tiros, no dia 26.08, passeata em favor do im- crime. Everald
peachment do então Presidente da República, gues Bispo e
Collor de Mello. Índios Xukuru prestaram solida- zenda de Egiv
riedade a Geraldo Rolim, um dos líderes desse
movimento pelo impeachment em Pesqueira.

30
“Plantaram” Xicão

al contra JORNAL DO 05.09.92 Clima de tensão em Pesqueira em virtude da inter- JORNAL DO


ra. Situa- COMMÉRCIO rupção a tiros pelo prefeito João Leite, de uma pas- COMMÉRCIO
os índios seata pró-impeachment do Presidente Collor e pelo
localiza- assassinato no dia 04.09, no sítio Canabrava, do índio
unciaram José Everaldo Rodrigues Bispo (filho do pajé Xukuru).
dades da
enda de-
ré Didier. 09.09.92 Declaração assinada pelos índios Xukuru Antonio DECLARAÇÃO
Pereira de Araújo e José Barbosa dos Santos, de- (dos índios XUKURU
nunciava que Egivaldo Farias, assassino de Everaldo JOSÉ BARBOSA
ão presi- Bispo (filho do pajé Xukuru), mantinha ligações direta DOS SANTOS E
relatava com o fazendeiro José Cordeiro de Santana, conheci- ANTONIO PEREIRA
iu várias do pelo nome de Zé de Riva, um dos maiores possei- DE ARAÚJO)
ia e que ros da Terra Indígena e ainda que o mesmo Egivlado
da pelos jurou arrancar a cabeça do cacique Francisco de Assis
upo que (Chicão). Os índios solicitavam que fosse evitada a pre-
que Chi- sença da família Farias (a qual pertencia o assassino)
de Pedra na área, para evitar novos derramamentos de sangue...
acato pe-
proprie-
que Não
direitos, 09.09.92 Os índios Xukuru Antonio Pereira e José Barbo- JORNAL DO
unicípio, sa dos Santos (Zé de Santa), denunciaram à Po- COMMÉRCIO
os que se lícia Federal e à Procuradoria da República, que
enviadas o fazendeiro Egivaldo Farias da Silva, posseiro
bucanos da Terra Indígena, era o assassino do índio Xuku-
putados ru José Everaldo Rodrigues Bispo (filho do pajé).
(ambos Um grupo de índios Xukuru revoltados com o assas-
Justiça. sinato do filho do pajé, ateou fogo na casa do fazen-
deiro acusado do assassinato, que encontrava-se
foragido. Antes porém, após vasculharem o local,
encontraram uma lista contendo 21 nomes de índios
enunciou DIÁRIO DE Xukuru, dentre os quais o do próprio José Everaldo
s lidera- PERNAMBUCO Rodrigues Bispo, o do pajé Pedro Bispo e do cacique
chama- Francisco de Assis, o Chicão. O fazendeiro Antonio
se dizia Joaquim de Farias, pai do acusado, prometeu apre-
Xukuru sentar o filho à polícia para depor. O crime estava
s terras. relacionado a conflitos pela posse da terra na região.

u apura- JORNAL DO 10.10.92 Em virtude do assassinato do índio Xukuru José JORNAL DO BRASIL
a verea- COMMÉRCIO Everaldo Rodrigues Bispo, um grupo de índios
municí- daquela comunidade incendiou a casa do fa-
rromper zendeiro Egivaldo Farias da Silva, acusado do
do im- crime. Everaldo era filho do pajé Pedro Rodri-
epública, gues Bispo e foi morto quando passava pela fa-
m solida- zenda de Egivaldo, que encontrava-se foragido.
s desse
esqueira.

31
XUKURU DO ORORUBÁ

25.01.93 Defesa Prévia apresentada na Ação Penal 928427- DEFESA PRÉVIA 11.03.94 O cacique Fran
3 em que figuravam como réus Francisco de Assis (FUNAI/1993) documento ao
Araújo e outros, os advogados da FUNAI, represen- em Recife, co
tando os índios, apresentaram argumentações refu- raldo Rolim M
tando todas as acusações arguindo que os acusados no Processo C
foram vítimas de uma manobra política orquestrada tiça Federal-PE
por índios e não índios, interessados em enfraquecer
a liderança do cacique Francisco de Assis Araújo...
07.06.94 Alegações Fina
raldo Rolim, qu
21.04.93 Índios Xukuru fizeram manifestação na Casa da Cul- JORNAL DO Processo Crime
tura, em Recife, promovendo coleta de assinaturas COMMÉRCIO -PE, argumenta
em documento a ser enviado ao Presidente Itamar os réus; as acus
Franco, reivindicando a demarcação de suas terras. bra para enfraq
Xukuru. Sobre
reu, na verdade
03.05.93 O prefeito de Pesqueira Evandro Mauro Maciel Cha- DECRETO da Funai, em co
con, declarou, através de Decreto Municipal nº 019/93, MUNICIPAL fins eleitoreiros
uma área da Terra Indígena Xukuru, de utilidade pú- Nº 019/93 em detrimento
blica, para fins de desapropriação destinado a TELPE do projeto, ser
(Empresa de Telecomunicações de Pernambuco). Vilberto Antoni
Pesqueira, que q
15.09.93 O Procurador Geral da República-PR/PE, Francisco PARECER Nº 504/93 - xoso, Ivo Pereir
Rodrigues dos Santos Sobrinho, em Parecer elabora- PROCURADORIA nunciado (no ca
do para a Ação de Reintegração de Posse proposta DA REPÚBLICA
por Milton do Rego Barros Didier e outros, contra os NO ESTADO DE 11.05.95 Deputados da
índios Xukuru, por ocupação do imóvel rural deno- PERNAMBUCO-MPF co, juntament
minado Caípe, manifestou-se favoravelmente a con- Evandro Chaco
cessão de liminar de reintegração de posse para os Federal, a rev
autores, embora o imóvel rural em questão estivesse
totalmente inserido no perímetro da área já reconhe-
cida formalmente como Indígena desde 1989, com 12.05.95 Em reunião com
a Identificaçãoe Delimitação e já declarada de pos- o prefeito de P
se permanente dos índios Xukuru pela Portaria 259/ deputado fede
MJ/92. No seu Parecer, o referido Procurador argu- Magalhães, sol
mentou que as terras em tela não estavam sendo ocu- Xukuru.
padas pelos índios, tanto é que eles invadiram a área
em questão. Ninguém invade aquilo que já ocupa....
ante a existência na região de aldeamentos Xucurus, e 15.05.95 Notícia sobre
havendo notícia da presença dos ditos índios naquelas raldo Rolim M
plagas desde 1599, iniciou-se o procedimento de de- dade de São
marcação, tendo havido, por enquanto, tão-só, as eta- culado ao tra
pas de identificação e delimitação... A área questiona- referido procu
da, portanto, nem de fato (ocupação indígena), nem queira e ao p
de direito, pode ser considerada, ainda, como área indí- Indígena Xuku
gena... Isto posto, OPINO no sentido de ser CONCEDIDA suspeito, o faz
A LIMINAR. pleiteada, de REINTEGRAÇÃO DE POSSE...

32
“Plantaram” Xicão

928427- DEFESA PRÉVIA 11.03.94 O cacique Francisco de Assis Araújo, encaminhou


de Assis (FUNAI/1993) documento ao administrador regional da FUNAI
epresen- em Recife, comunicando que o advogado Ge-
ões refu- raldo Rolim Mota Filho, faria as alegações finais
acusados no Processo Crime nº 928427-3, 3ª Vara da Jus-
uestrada tiça Federal-PE, em que Chicão figura como réu.
raquecer
Araújo...
07.06.94 Alegações Finais apresentadas pelo advogado Ge- ALEGAÇÕES FINAIS
raldo Rolim, que representava Chicão e outros, em (PROCESSO Nº
a da Cul- JORNAL DO Processo Crime 928427-3, 3ª Vara da Justiça Federal- 92.0008427-3 -
sinaturas COMMÉRCIO -PE, argumentava que improcedia a denúncia contra ADVOGADO
e Itamar os réus; as acusações fundamentavam-se em mano- GERALDO ROLIM
s terras. bra para enfraquecer a liderança de Chicão entre os MOTA FILHO
Xukuru. Sobre o fato, argumentou que o que ocor-
reu, na verdade, foi a tentativa, por parte de servidor
ciel Cha- DECRETO da Funai, em colocar em prática projeto hídrico com
nº 019/93, MUNICIPAL fins eleitoreiros, para beneficiar apenas uma pessoa,
dade pú- Nº 019/93 em detrimento de uma comunidade toda. - O autor
a TELPE do projeto, servidor da Funai, é irmão do vereador
mbuco). Vilberto Antonio de Araújo (Beto Zacarias), ambos de
Pesqueira, que queriam a todo custo, favorecer o quei-
Francisco PARECER Nº 504/93 - xoso, Ivo Pereira de Araújo, que é adversário do 1º de-
elabora- PROCURADORIA nunciado (no caso, Francisco de Assis Araújo - Chicão)
proposta DA REPÚBLICA
ontra os NO ESTADO DE 11.05.95 Deputados da bancada federal de Pernambu- DIÁRIO DE
al deno- PERNAMBUCO-MPF co, juntamente com o prefeito de Pesqueira PERNAMBUCO
te a con- Evandro Chacon Maciel, solicitaram ao Governo
para os Federal, a revisão dos limites da Terra Xukuru.
estivesse
reconhe-
89, com 12.05.95 Em reunião com o Ministro da Justiça, Nelson Jobim, DIÁRIO DE
de pos- o prefeito de Pesqueira, Evandro Chacon Maciel, e o PERNAMBUCO
aria 259/ deputado federal do PFL pernambucano, Roberto
dor argu- Magalhães, solicitaram a revisão dos limites da Terra
ndo ocu- Xukuru.
m a área
ocupa....
ucurus, e 15.05.95 Notícia sobre o assassinato do procurador Ge- JORNAL DO
naquelas raldo Rolim Mota Filho, no dia 14.05.95, na ci- COMMMÉRCIO
o de de- dade de São Sebastião do Umbuzeiro-PB, vin-
ó, as eta- culado ao trabalho de assessoramento que o
uestiona- referido procurador prestava aos índios em Pes-
na), nem queira e ao processo de demarcação da Terra
área indí- Indígena Xukuru. Foi apontado como principal
NCEDIDA suspeito, o fazendeiro conhecido por Teopompo.
POSSE...

33
XUKURU DO ORORUBÁ

A Comissão d
16.05.95 Clima de revolta e preocupação entre os Xukuru JORNAL DO bléia Legislativ
em Pesqueira, com o assassinato do procurador da COMMMÉRCIO por três rep
FUNAI Geraldo Rolim. O cacique Chicão esperava para reivindic
que fosse reforçada a segurança na região e pediu Geraldo Rolim
garantia de vida. Dizia ele: Não podemos continu- ças Xukuru, e
ar sendo vítimas desses exploradores que fazem um
movimento em Pesqueira para tentar impedir nos-
so direito, estamos evitando ir à cidade para evitar 18.05.95 Índios Xukuru,
provocações. De acordo com o cacique Chicão, o da Polícia Fed
procurador vinha sendo seguido tendo lhe reve- continuação do
lado na semana anterior ao seu assassinato, que terras e garan
um pistoleiro teria sido contratado para matá-lo. “Continuamos
nimas e estamo
O fazendeiro Teopompo Siqueira é o princi- DIÁRIO DE não ficarmos ex
pal suspeito do assassinato do procurador PERNAMBUCO
Geraldo Rolim. As primeiras apurações indi-
cavam que Teopompo Siqueira teria se sentido pre- 19.05.95 Testemunhas r
judicado com a demarcação das terras dos Xukuru. po Siqueira de
dor Geraldo Ro
Através dos ofícios 09/95 e 10/95, enviados respec- OFÍCIOS Nº 09/95 E terras indígena
tivamente ao Ministro da Justiça e ao Procurador 10/95 - assassinato.
Geral da República, o deputado federal Fernando DEPUTADO
Ferro, do PT pernambucano, relatou clima de tensão FEDERAL Testemunhas r
entre índios e fazendeiros em Pesqueira, solicitando FERNANDO FERRO po Siqueira de
medidas urgentes para esclarecer assassinato do ad- procurador Ger
vogado Geraldo Rolim e garantias de vida para o ca-
cique Chicão, que também sofria ameaças de morte.
20.05.95 No inquérito qu
curador Gerald
17.05.95 Comissão de índios Xukuru e membros do CIMI- JORNAL DO de que o procur
-Conselho Indigenista Missionário, pediram COMMÉRCIO das últimas pre
segurança de vida ao Procurador Geral da As-
sistência Judiciária, Roberto Moraes, que res-
21.05.95 Chicão será te
pondia internamente pela Secretaria de Justi-
de Geraldo Rol
ça do estado de Pernambuco. O líder indígena
ameaçado por
Antonio Pereira, solicitou a nomeação de um dele-
de terras em
gado especial para acompanhar a apuração do as-
caram há pouc
sassinato do procurador e a ajuda da Polícia Federal.
trabalhos de de
As ameaças en
Deputado Federal do PT (PE), Fernando Ferro, DIÁRIO DE
“cabeça” de Ch
solicitou ao Ministro da Justiça, Nelson Jobim e PERNAMBUCO
ser assassinado
ao Procurador Geral da República, Aristides Jun-
selhou o caciqu
queira, a interferência da Polícia Federal para
-Conselho Indig
apurar o assassinato do advogado Geraldo Ro-
referiam-se a i
lim. O parlamentar solicitou ainda a designação
determinação
de policiais federais para a segurança do cacique
em Pesqueira
Chicão, que também estava ameaçado de morte.
reações violent
O CIMI-Conselho Indigenista Missionário, divulgou
deiros, execut
documento informando que os amigos de Geraldo
ranças Xukuru,
Rolim sofreram dois atentados quando procuravam
socorrê-lo.

34
“Plantaram” Xicão

A Comissão de Defesa da Cidadania da Assem-


Xukuru JORNAL DO bléia Legislativa foi procurada ontem (16.05),
rador da COMMMÉRCIO por três representantes dos índios Xukuru,
esperava para reivindicar a apuração do crime contra
e pediu Geraldo Rolim, e segurança de vida às lideran-
continu- ças Xukuru, especialmente ao cacique Chicão.
azem um
edir nos-
ra evitar 18.05.95 Índios Xukuru, em reunião com o Superintendente DIÁRIO DE
hicão, o da Polícia Federal em Pernambuco, solicitaram a PERNAMBUCO
he reve- continuação do processo de demarcação das suas
ato, que terras e garantia de vida para o cacique Chicão:
matá-lo. “Continuamos recebendo ameaças de morte anô-
nimas e estamos evitando até deixar as aldeias para
princi- DIÁRIO DE não ficarmos expostos a conflitos com fazendeiros”
ocurador PERNAMBUCO
es indi-
tido pre- 19.05.95 Testemunhas reconheceram o fazendeiro Teopom- DIÁRIO DE
Xukuru. po Siqueira de Brito como o assassino do procura- PERNAMBUCO
dor Geraldo Rolim e apontaram a demarcação das
s respec- OFÍCIOS Nº 09/95 E terras indígenas em Pesqueira, como motivação do
ocurador 10/95 - assassinato.
ernando DEPUTADO
e tensão FEDERAL Testemunhas reconheceram o fazendeiro Teopom- JORNAL DO
licitando FERNANDO FERRO po Siqueira de Brito como autor do assassinato do COMMÉRCIO
to do ad- procurador Geraldo Rolim.
ara o ca-
e morte.
20.05.95 No inquérito que apurava os motivos da morte do pro- JORNAL DO
curador Geraldo Rolim, foram colhidas informações COMMÉRCIO
do CIMI- JORNAL DO de que o procurador sofria ameaças freqüentes. Uma
pediram COMMÉRCIO das últimas premeditava que ele não viveria 15 dias.
da As-
que res-
21.05.95 Chicão será testemunha no caso do assassinato DIÁRIO DE
e Justi-
de Geraldo Rolim. O cacique disse que também foi PERNAMBUCO
indígena
ameaçado por fazendeiros devido à demarcação
um dele-
de terras em Pesqueira. As ameaças se intensifi-
o do as-
caram há poucos dias, quando foram iniciados os
Federal.
trabalhos de demarcação física da área dos Xukuru.
As ameaças enfatizavam que com a demarcação, a
o Ferro, DIÁRIO DE
“cabeça” de Chicão iria também “voar”. Antes de
Jobim e PERNAMBUCO
ser assassinado, o procurador Geraldo Rolim acon-
des Jun-
selhou o cacique a se precaver. Membros do CIMI-
ral para
-Conselho Indigenista Missionário em Pernambuco,
aldo Ro-
referiam-se a insatisfação dos fazendeiros com a
signação
determinação da demarcação da Terra Indígena
cacique
em Pesqueira e a preocupação dos índios com as
e morte.
reações violentas que poderiam advir desses fazen-
divulgou
deiros, executando antigas ameaças contra lide-
Geraldo
ranças Xukuru, principalmente ao cacique Chicão.
curavam

35
XUKURU DO ORORUBÁ

22.05.95 O governador de Pernambuco, Miguel Ar- JORNAL DO 02.04.96 Familiares do


raes declarou que queria a Polícia Federal COMMÉRCIO taram os no
também investigando o assassinato de Ge- E ra João Leit
raldo Rolim. O cacique Chicão revelou que o pro- DIÁRIO DE nho de João
curador teria lhe confidenciado o nome de três fa- PERNAMBUCO Rivas, como int
zendeiros que estariam interessados na sua morte.
Parentes do p
que Theopomp
25.05.95 Ameaças de morte ao procurador Geraldo Rolim fo- DIÁRIO DE leiro e teria ag
ram confirmadas por testemunhas. PERNAMBUCO Riva”, Jorge “B

Em depoimento prestado ao delegado Aristeu JORNAL DO


Chaves, responsável pelo inquérito que apura- COMMÉRCIO 14.04.96 Em virtude do
va o assassinato do procurador, o cacique Fran- Xukuru teve 271
cisco de Assis Araújo, reafirmou que Geraldo por posseiros
Rolim estava sendo ameaçado de morte. Chi- Chicão afirmou
cão revelou ainda o nome de três fazendeiros recebendo ame
e de um vereador de Pesqueira que teriam con- deiros temeros
tratado um pistoleiro para assassinar Rolim.
Um grupo de
29.05.95 A família do procurador Geraldo Rolim revelou JORNAL DO levado por pr
que ele estava sendo “jurado” de morte por fa- COMMÉRCIO Rural de Pesqu
zendeiros da região e foi obrigado a interromper roz, a contesta
um programa que apresentava na Rádio Jor- do Decreto 17
nal, “O povo e a lei”, por causa dessas ameaças. ironizando sob
gião, afirmou q

06.06.95 O fazendeiro Theopompo Siqueira Brito foi indiciado JORNAL DO Prefeito de Pes
por homicídio qualificado no caso da morte do advo- COMMÉRCIO tou acusações d
gado Geraldo Rolim. República Marc
deiros nas con
16.06.95 O cacique Chicão, denunciou na Procuradoria da DIÁRIO DE
República em Brasília, a difícil situação vivida na PERNAMBUCO
terra Xukuru e confirmou o estado de tensão em 16.04.96 O cacique Fran
Pesqueira após o assassinato do advogado Ge- uma das testem
raldo Rolim. Pediu garantia de vida em função assassinou o p
de também estar sendo ameaçado de morte.

01.04.96 Polícia Federal prendeu o acusado de assassinar o JORNAL DO 30.04.96 O cacique Fr


advogado Geraldo Rolim. COMMÉRCIO declarou em
Higino, que o
Polícia Federal prendeu Theopompo de Siqueira DIÁRIO DE tava ligado a
Brito Sobrinho, assassino do procurador Geral- PERNAMBUCO cão afirmou q
do Rolim. O fazendeiro pertence a família Bri- ameaças de
to, uma das mais tradicionais de Arcoverde-PE.
O acusado teria agido a mando de um vereador 16.05.96 Familiares do p
e dois fazendeiros de Pesqueira, insatisfeitos que foi assassin
com a demarcação da Terra Indígena Xukuru. do processo qu

36
“Plantaram” Xicão

uel Ar- JORNAL DO 02.04.96 Familiares do procurador Geraldo Rolim ci- JORNAL DO
Federal COMMÉRCIO taram os nomes do ex-prefeito de Pesquei- COMMÉRCIO
de Ge- E ra João Leite, do vereador Leitinho (sobri-
e o pro- DIÁRIO DE nho de João Leite) e do fazendeiro José de
e três fa- PERNAMBUCO Rivas, como interessados na morte do procurador.
a morte.
Parentes do procurador assassinado denunciaram DIÁRIO DE
que Theopompo (acusado do assassinato) era pisto- PERNAMBUCO
Rolim fo- DIÁRIO DE leiro e teria agido a mando dos fazendeiros “Zé de
PERNAMBUCO Riva”, Jorge “Bigodão” e do vereador “Leitinho”.

Aristeu JORNAL DO
e apura- COMMÉRCIO 14.04.96 Em virtude do Decreto 1775/96, a Terra Indígena DIÁRIO DE
ue Fran- Xukuru teve 271 contestações apresentadas à FUNAI PERNAMBUCO
Geraldo por posseiros e fazendeiros da região. O cacique
te. Chi- Chicão afirmou que não emplacaria em 96, por estar
endeiros recebendo ameaças de morte por parte de fazen-
am con- deiros temerosos de perderem terras em Pesqueira.
Rolim.
Um grupo de índios Xukuru denunciou que foi
revelou JORNAL DO levado por propaganda enganosa do Sindicato
por fa- COMMÉRCIO Rural de Pesqueira, presidido por Fernando Quei-
rromper roz, a contestar suas próprias terras, em virtude
dio Jor- do Decreto 1775/96. Fazendeiro Hamilton Didier
meaças. ironizando sobre a presença dos Xukuru na re-
gião, afirmou que não existem índios em Pesqueira.

ndiciado JORNAL DO Prefeito de Pesqueira, Evandro Chacon Maciel, refu-


do advo- COMMÉRCIO tou acusações de que seu primo, o vice-presidente da
República Marco Maciel, estaria favorecendo fazen-
deiros nas contestações da Terra Indígena Xukuru.
doria da DIÁRIO DE
ivida na PERNAMBUCO
nsão em 16.04.96 O cacique Francisco de Assis Araújo - Chicão, será DIÁRIO DE
ado Ge- uma das testemunhas de acusação do fazendeiro que PERNAMBUCO
função assassinou o procurador da FUNAI, Geraldo Rolim.
morte.

assinar o JORNAL DO 30.04.96 O cacique Francisco de Assis Araújo, Chicão, JORNAL DO


COMMÉRCIO declarou em depoimento no Fórum Dr. Sérgio COMMÉRCIO
Higino, que o assassinato de Geraldo Rolim es-
Siqueira DIÁRIO DE tava ligado a demarcação da Terra Xukuru. Chi-
r Geral- PERNAMBUCO cão afirmou que o procurador vinha recebendo
mília Bri- ameaças de morte de fazendeiros da região.
erde-PE.
vereador 16.05.96 Familiares do procurador da FUNAI Geraldo Rolim, DIÁRIO DE
atisfeitos que foi assassinado, denunciaram que o andamento PERNAMBUCO
Xukuru. do processo que apurava o caso, estava muito lento.

37
XUKURU DO ORORUBÁ

08.10.96 O índio Xukuru Antonio Pereira, foi eleito vereador JORNAL DO 08.09.97 Compareceram
em Pesqueira. Na eleição anterior, os índios tinham COMMÉRCIO formada por re
apoiado o candidato Geraldo Rolim (procurador as- Conselho de Art
sassinado em 1995), que na época não conseguiu se dígenas do Bras
eleger. Indígenas do No
dentre os quais
Os Xukuru, tendo a frente o cacique Chicão, lidera- e outros líderes
ram movimento que destituiu o administrador da referia-se ao Ma
Administração Regional da FUNAI, localizada na cida- petrado por um
de de Arcoverde-PE. Terra Indígena
o cacique Franc
Chicão. As ame
19.12.96 No julgamento de Theopompo Sobrinho, as- JORNAL DO fato de Chicão
sassino do procurador Geraldo Rolim, não es- COMMÉRCIO assassinato do
tarão presentes duas testemunhas importan-
tes que presenciaram o assassinato. Teriam se
mudado para São Paulo após sofrerem ameaças. 12.09.97 O novo julgam
ocorrerá na ci
julgamento qu
20.12.96 Juiz da Comarca de Monteiro/PB, adiou o julga- DIÁRIO DE naquela cidade
mento do assassino de Geraldo Rolim porque PERNAMBUCO vido sob alegaç
duas testemunhas de acusação não comparece-
ram. Uma delas ainda encontrava-se refugiada em
São Paulo, após ter recebido ameaças de morte. 02.10.97 O assassino do
vido em novo j
05.04.97 Cerca de 300 Xukurus receberam no dia 03.04, em JORNAL DO
Pesqueira, o Governador de Pernambuco, Miguel COMMÉRCIO 28.11.97 Cerca de 400
Arraes. Os índios reivindicavam o apoio do governo ção em desagr
do estado no sentido de agilizar junto a FUNAI, as de carta anôni
indenizações dos 280 ocupantes não índios da Terra contendo acus
Indígena Xukuru. po de líderes
como autores
09.04.97 O índio Xukuru Reginaldo Ferreira da Silva foi as- JORNAL DO instalados na T
sassinado. Foi acusado pelo crime um outro índio, COMMÉRCIO lardo Maciel (
também Xukuru, identificado por Everaldo Araújo pública, Marco
Neto. Segundo testemunhas, o crime foi motivado Chicão afirmou
por questões de terra. com fogo como
rem me queim

17.06.97 Fazendeiros comemoraram em Pesqueira decisão JORNAL DO


favorável do STJ, sobre contestação impetrada por COMMÉRCIO 18.03.98 Cerca de 500 ín
eles, ao processo de regularização fundiária da Terra te a Fazenda T
Indígena Xukuru, que poderá ser reiniciado. Os fazen- dentro do perím
deiros locais estão eufóricos. Eles dizem que foi o pró- disseram que s
prio Governo Federal que deu o direito de contestação, Governo Federa
através do decreto 1775/96. O cacique Chicão afirmou
que essa decisão prova o descaso que o Governo Fe-
deral vem dando à questão indígena, principalmente
a demarcatória. Representante de Sindicato Patronal
de Pesqueira, o advogado Sebastião Martiniano, que
também é fazendeiro na área, trouxe a notícia para o
município, pois está sempre em contato com Brasília...

38
“Plantaram” Xicão

vereador JORNAL DO 08.09.97 Compareceram a 6ª Câmara, em Brasília, comissão ATA DA 79ª


s tinham COMMÉRCIO formada por representantes indígenas da CAPOIB - REUNIÃO DA 6ª
rador as- Conselho de Articulação dos Povos e Organizações In- CÂMARA DE
eguiu se dígenas do Brasil; da APOINME - Articulação dos Povos COORDENAÇÃO E
Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo, REVISÃO
dentre os quais o cacique Xukuru, Francisco de Assis, (MINISTÉRIO
o, lidera- e outros líderes indígenas. Um dos assuntos tratados PÚBLICO FEDERAL)
ador da referia-se ao Mandado de Segurança nº 4.802-DF, im-
na cida- petrado por um grupo de ocupantes não índios da
Terra Indígena Xukuru; e, ameaças anônimas contra
o cacique Francisco de Assis Araújo, conhecido por
Chicão. As ameaças estariam vinculadas também ao
ho, as- JORNAL DO fato de Chicão ser uma das testemunhas no caso do
não es- COMMÉRCIO assassinato do procurador da FUNAI, Geraldo Rolim.
mportan-
riam se
meaças. 12.09.97 O novo julgamento do assassino de Geraldo Rolim JORNAL DO
ocorrerá na cidade de Monteiro/PB. No primeiro COMMÉRCIO
julgamento que ocorreu no dia 19.12.96, também
o julga- DIÁRIO DE naquela cidade, o assassino do procurador foi absol-
porque PERNAMBUCO vido sob alegação que teria agido em legítima defesa.
mparece-
iada em
e morte. 02.10.97 O assassino do procurador Geraldo Rolim foi absol- JORNAL DO
vido em novo julgamento ocorrido no dia 01.10.97. COMMÉRCIO
3.04, em JORNAL DO
Miguel COMMÉRCIO 28.11.97 Cerca de 400 índios Xukuru realizaram manifesta- DIÁRIO DE
governo ção em desagravo ao cacique Chicão, em virtude PERNAMBUCO
UNAI, as de carta anônima enviada ao Ministro da Justiça,
da Terra contendo acusações graves contra ele e a um gru-
po de líderes políticos Xukuru. Chicão apontou
como autores das falsas denúncias, fazendeiros
a foi as- JORNAL DO instalados na Terra Indígena, dentre os quais Abe-
ro índio, COMMÉRCIO lardo Maciel (parente do vice-presidente da Re-
o Araújo pública, Marco Maciel) e políticos do município.
motivado Chicão afirmou que não conseguiram me queimar
com fogo como fizeram com o irmão Galdino, e que-
rem me queimar através de calúnias e mentiras.

decisão JORNAL DO
rada por COMMÉRCIO 18.03.98 Cerca de 500 índios Xukuru ocuparam recentemen- JORNAL DO
da Terra te a Fazenda Tionante, localizada na sua totalidade COMMÉRCIO
Os fazen- dentro do perímetro da Terra Indígena demarcada, e
foi o pró- disseram que só deixarão a área após acordo com o
testação, Governo Federal.
afirmou
verno Fe-
palmente
Patronal
ano, que
ia para o
Brasília...

39
XUKURU DO ORORUBÁ

abril/98 Foi realizada reunião em Pesqueira, no dia 17.03.98, RELATÓRIO: 23.05.98 Atualmente exi
para tratar da retomada pelos índios Xukuru da OCUPAÇÃO DA pando a fazen
fazenda Tionante (ou fazenda Sítio do Meio). Esta- FAZENDA SÍTIO DO 16.03.98. Houve
vam presentes o cacique Xukuru Francisco de Assis MEIO POR ÍNDIOS volvendo FUNA
Araújo e demais lideranças indígenas; Procurador XUKURU, representantes
Geral da República em Pernambuco, Francisco Ro- MUNICÍPIO DE dades de apoio
drigues; administrador da FUNAI-Recife e represen- PESQUEIRA/PE advogados do s
tantes do sr. Leonardo Gomes da Silva, que era na (FUNAI/98) detentor daque
ocasião da retomada, o detentor do imóvel. Os índios socupação do im
solicitaram que se promovesse a retirada imediata do
gado para que pudessem iniciar o plantio de roças.
Os representantes do sr. Leonardo Gomes alerta- 26.05.98 Hipótese de cri
ram que iriam mover Ação de Reintegração de Posse. de Chicão. Fam
Os Xukuru declararam que o motivo da retomada que essa versão
da fazenda Tionante é pela morosidade do Gover- afirmaram aind
no Federal no processo de regularização fundi- ros e latifundiár
ária da sua Terra e também pela insuficiência de Crime passional
terras para que pudessem desenvolver ativida- assassinato.
des de subsistência, pois a maior parte da Terra
Indígena encontra-se intrusada por não índios.
27.05.98 A irmã de Chicã
costumava rec
21.05.98 O cacique Chicão foi assassinado no dia 20.05.98, DIÁRIO DE ras ao cacique a
com 6 tiros a queima-roupa, em frente a residên- PERNAMBUCO como na Câma
cia da sua irmã, em Pesqueira. O crime tem liga- trabalha. As am
ção com a demarcação das terras Xukuru. O índio vereador índio,
Antonio Severino de Santana, que estava com
Chicão no momento do seu assassinato, apontou
28.05.98 Polícia civil pre
o fazendeiro Sebastião Salustiano como possível
cacique Xukuru
mandante. Afirmou que poucos dias atrás, um capa-
convocou 4 te
taz do referido fazendeiro havia ameaçado Chicão.
nheceram o sus
O índio Antonio Pereira de Araújo (vereador em
O delegado adm
Pesqueira pelo PSB) declarou que Chicão morreu
confirmar a hip
porque lutava por nossas terras, pelos nossos di-
de terra. A viúva
reitos. Disse ainda que o assassinato de Chicão era
ao prestar dep
esperado e que também está ameaçado de morte.
do, três cartas a
cacique nas últ
Em 1996, representantes dos Xukuru tiveram audiên- JORNAL DO
continuasse a lu
cia com a Comissão de Direitos Humanos da Assem- COMMÉRCIO
bléia Legislativa, denunciando ameaças a Chicão.
Município de Pesqueira é reduto do PFL pernambu- 03.06.98 Polícia civil real
cano e a família Maciel é apontada como aquela que trato falado do
domina politicamente a região. do em municíp
transportando
Pesqueira no d
22.05.98 Polícia Civil instaurou inquérito que envolve também JORNAL DO índios tinham e
versões de crime por motivação passional e de vin- COMMÉRCIO Justiça. Reivind
gança no assassinato de Chicão. Alguns índios acusa- ha. demarcado
ram a enfermeira Ana Dárcia Mendonça, com quem do assassinato
Chicão mantinha um caso há dois meses, de ter liga-
ções com fazendeiros da região, interessados na mor-
te do cacique. Outra versão estaria vinculada a um
recente caso de roubo de madeira na Terra Indígena.

40
“Plantaram” Xicão

a 17.03.98, RELATÓRIO: 23.05.98 Atualmente existem cerca de 300 índios Xukuru ocu- JORNAL DO
Xukuru da OCUPAÇÃO DA pando a fazenda Tionante, retomada por eles em COMMÉRCIO
Meio). Esta- FAZENDA SÍTIO DO 16.03.98. Houve reunião em Pesqueira, na época, en-
co de Assis MEIO POR ÍNDIOS volvendo FUNAI, Ministério Público Federal, índios,
Procurador XUKURU, representantes do fazendeiro, políticos locais e enti-
ncisco Ro- MUNICÍPIO DE dades de apoio, mas não se chegou a um acordo. Os
e represen- PESQUEIRA/PE advogados do sr. Leonardo Gomes da Silva, que era o
que era na (FUNAI/98) detentor daquele imóvel, teriam exigido imediata de-
l. Os índios socupação do imóvel, o que foi refutado pelos índios.
mediata do
o de roças.
mes alerta- 26.05.98 Hipótese de crime passional foi refutada pela família JORNAL DO
o de Posse. de Chicão. Familiares do cacique assassinado temem COMMÉRCIO
retomada que essa versão impeça o esclarecimento do crime,
do Gover- afirmaram ainda que existe gente graúda, fazendei-
ção fundi- ros e latifundiários interessados na morte de Chicão.
ciência de Crime passional é apenas uma forma de acobertar o
er ativida- assassinato.
e da Terra
ão índios.
27.05.98 A irmã de Chicão, Maria das Montanhas, afirmou que JORNAL DO
costumava receber ligações telefônicas ameaçado- COMMÉRCIO
a 20.05.98, DIÁRIO DE ras ao cacique assassinado, tanto em sua residência,
a residên- PERNAMBUCO como na Câmara de Vereadores de Pesqueira, onde
e tem liga- trabalha. As ameaças também eram direcionadas ao
ru. O índio vereador índio, Antonio Pereira.
stava com
o, apontou
28.05.98 Polícia civil prendeu suspeito pelo assassinato do JORNAL DO
o possível
cacique Xukuru. O delegado Antonio Carlos Gomes COMMÉRCIO
s, um capa-
convocou 4 testemunhas do crime, que não reco-
do Chicão.
nheceram o suspeito, que foi solto logo em seguida.
reador em
O delegado admitiu que as investigações tendiam a
ão morreu
confirmar a hipótese de crime motivado por questões
nossos di-
de terra. A viúva do cacique, Zenilda Maria de Araújo,
Chicão era
ao prestar depoimento, entregou ao citado delega-
de morte.
do, três cartas anônimas datilografadas, enviadas ao
cacique nas últimas semanas, que diziam se Chicão
am audiên- JORNAL DO
continuasse a luta pela demarcação, seria assassinado.
da Assem- COMMÉRCIO
a Chicão.
pernambu- 03.06.98 Polícia civil realizou a reconstiuição do crime e o re- JORNAL DO
aquela que trato falado do assassino de Chicão para ser divulga- COMMÉRCIO
do em municípios vizinhos de Pesqueira. Um ônibus
transportando cerca de 45 índios Xukuru, partiu de
Pesqueira no dia 01.06, com destino a Brasília. Os
ve também JORNAL DO índios tinham encontro marcado com o ministro da
al e de vin- COMMÉRCIO Justiça. Reivindicavam a homologação dos 27.555
dios acusa- ha. demarcados em 1995 e cobravam a elucidação
com quem do assassinato do cacique Chicão.
de ter liga-
dos na mor-
ulada a um
a Indígena.

41
XUKURU DO ORORUBÁ

RELAÇÃO DAS MAIORES OCUPAÇÕES Entre 300 E 499 H


NÃO INDÍGENAS NA TERRA INDÍGENA XUKURU/PE
(Grandes e médias ocupações): • Felipe Sabino d
• Milton do Reg
Os dados abaixo são do Levantamento Fundiário da TI Xukuru, dado de Segur
realizado pela FUNAI em 1989, na etapa da Identificação/Delimitação. recurso admin
Alguns ocupantes não índios detém domínio sobre mais de uma área, no decreto 1.7
dessa maneira são relacionados como ocupações distintas e muitas vezes • Moacir Brito d
descontínuas. Há casos em que os respectivos ocupantes sonegam infor- Segurança Nº
mações, declarado dimensão inferior ao total da área ocupada. É possível ministrativo co
que posteriormente ao Levantamento Fundiário, alguns imóveis rurais 1.775/96 - Pro
incidentes na TI Xukuru tenham sido objeto de transações, como é o caso • Abelardo Alve
da Tionante, imóvel rural recentemente retomado pelos índios Xukuru Segurança Nº
(no mês de março/98, aproximadamente dois meses antes do assassinato ministrativo co
do cacique Chicão). 1.775/96 - Pro
• Raimundo Na
Acima de 1.000 Hectares:
Entre 100 E 299 H
• Otávio Carneiro Leão (impetrante de recurso administrativo
contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96 - • Miguel Cavalc
Processo 08620.1098/96) dado de Segur
• Agropecuária Brito Irmãos S/A recurso admin
no decreto 1.7
• Abelardo Alve
Entre 500 e 999 hectares:
Segurança Nº
ministrativo co
• Agropecuária Brito Irmãos S/A-BRISA 1.775/96 - Pro
• Ivan Nunes da Silva (um dos impetrantes do Mandado de Se- • Miguel Ernest
gurança Nº 4802-DF - (96.0069057-0 STJ e de recurso ad- de Segurança N
ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto administrativo
1.775/96 - Processo 08620.0913/96) to 1.775/96 - P
• Paulo Pessoa Cavalcante de Petribu (um dos impetrantes do • José Jorge Me
Mandado de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e (um dos impet
de recurso administrativo contestando a TI Xukuru, com base - 96.0069057-
no decreto 1.775/96 - Processo 08620.0881/96) do a TI Xuku
• José Cordeiro de Santana (também conhecido por Zé de Rivas) 08620.1009/9

42
“Plantaram” Xicão

ES Entre 300 E 499 Hectares:


GENA XUKURU/PE
• Felipe Sabino da Silva
• Milton do Rego Barros Didier (um dos impetrantes do Man-
Fundiário da TI Xukuru, dado de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de
dentificação/Delimitação. recurso administrativo contestando a TI Xukuru, com base
sobre mais de uma área, no decreto 1.775/96 - Processo 08620.0959/96)
es distintas e muitas vezes • Moacir Brito de Freitas (um dos impetrantes do Mandado de
ocupantes sonegam infor- Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso ad-
a área ocupada. É possível ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto
rio, alguns imóveis rurais 1.775/96 - Processo 08620.0927/96)
transações, como é o caso • Abelardo Alves Maciel (um dos impetrantes do Mandado de
mado pelos índios Xukuru Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso ad-
meses antes do assassinato ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto
1.775/96 - Processo 08620.0865/96)
• Raimundo Nato

Entre 100 E 299 Hectares:


de recurso administrativo
se no decreto 1.775/96 - • Miguel Cavalcanti de Petribu (um dos impetrantes do Man-
dado de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de
recurso administrativo contestando a TI Xukuru, com base
no decreto 1.775/96 - Processo 08620.0933/96)
• Abelardo Alves Maciel (um dos impetrantes do Mandado de
Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso ad-
ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto
ISA 1.775/96 - Processo 08620.0865/96)
rantes do Mandado de Se- • Miguel Ernesto dos Santos (um dos impetrantes do Mandado
7-0 STJ e de recurso ad- de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso
uru, com base no decreto administrativo contestando a TI Xukuru, com base no decre-
6) to 1.775/96 - Processo 08620.0849/96
(um dos impetrantes do • José Jorge Medeiros (também conhecido por Jorge Bigodão)
DF - 96.0069057-0 STJ e (um dos impetrantes do Mandado de Segurança Nº 4802-DF
do a TI Xukuru, com base - 96.0069057-0 STJ e de recurso administrativo contestan-
20.0881/96) do a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96 - Processo
onhecido por Zé de Rivas) 08620.1009/96)

43
XUKURU DO ORORUBÁ

• Waldemar de Brito Cavalcanti (um dos impetrantes do Man- • Joaquim Rodr


dado de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de re- • Rodrigo Gome
curso administrativo contestando a TI Xukuru, com base no contestando a
decreto 1.775/96 - Processos 08620.0845 e 08620.0851/96) Processo 0862
• Fernando Didier Pita
• Roberto Eudes Araújo Bezerra Entre 70 E 99 Hect
• Antonio Farias
• Moacir Brito de Freitas (um dos impetrantes do Mandado de • José Fernando
Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso ad- tivo contestand
ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto - Processo 086
1.775/96 - Processos 08620.7775/96 e 08620.0927/96)
• Felix Feitosa M
• André Bezerra do Rego de Barros (um dos impetrantes do
• Aluízio Neto
Mandado de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e
de recurso administrativo contestando a TI Xukuru, com base • Walter Mende
no decreto 1.775/96 - Processo 08620.0860/96) ministrativo co
1.775/96 - Pro
• José Maria Cavalcanti (impetrante de recurso administrativo
contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96 - • Ivan Nunes da
Processo 08620.1138/96) gurança Nº 48
ministrativo co
• Paulo Pessoa Cavalcanti Petribu Filho (um dos impetrantes do
1.775/96 - Pro
Mandado de Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e
de recurso administrativo contestando a TI Xukuru, com base • CIA Agrícola V
no decreto 1.775/96 - Processo 08620.0881/96) • Anizio Queiro
• Antonio Júlio dos Santos (impetrante de recurso administra- rança Nº 4802
tivo contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96 nistrativo cont
- Processo 08620.1114/96) 1.775/96 - Pro
• Ivo Izidoro de Assis • Geraldo Bezer
• José Paulino Filho • Daniel Bezerra
• Luiz Alves de Almeida • Antonio Júlio
• Francisco Alves de Araújo tivo contestand
• Elias Alves Feitosa - Processo 086
• João Eudes Machado Tenório (impetrante de recurso admi- • Hamilton Mot
nistrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto contestando a
1.775/96 - Processo 08620.0953/96) Processo 0862
• Vilberto Antonio de Araújo (também conhecido por Beto • Antonio de So
Zacarias) Segurança Nº

44
“Plantaram” Xicão

dos impetrantes do Man- • Joaquim Rodrigues da Silva


6.0069057-0 STJ e de re- • Rodrigo Gomes Meira (impetrante de recurso administrativo
TI Xukuru, com base no contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96 -
.0845 e 08620.0851/96) Processo 08620.

Entre 70 E 99 Hectares:

petrantes do Mandado de • José Fernando Silva Santos (impetrante de recurso administra-


57-0 STJ e de recurso ad- tivo contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96
uru, com base no decreto - Processo 08620.1034/96)
6 e 08620.0927/96)
• Felix Feitosa Maciel
(um dos impetrantes do
• Aluízio Neto
DF - 96.0069057-0 STJ e
do a TI Xukuru, com base • Walter Mendes do Rego Barros (impetrante de recurso ad-
20.0860/96) ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto
1.775/96 - Processo 08620.0910/96)
de recurso administrativo
se no decreto 1.775/96 - • Ivan Nunes da Silva (um dos impetrantes do Mandado de Se-
gurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso ad-
ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto
o (um dos impetrantes do
1.775/96 - Processo 08620.0913/96)
DF - 96.0069057-0 STJ e
do a TI Xukuru, com base • CIA Agrícola Vale do Ipanema
20.0881/96) • Anizio Queiroz (um dos impetrantes do Mandado de Segu-
te de recurso administra- rança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso admi-
base no decreto 1.775/96 nistrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto
1.775/96 - Processo 08620.0980/96)
• Geraldo Bezerra de Menezes
• Daniel Bezerra da Silva
• Antonio Júlio dos Santos (impetrante de recurso administra-
tivo contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96
- Processo 08620.1114/96)
etrante de recurso admi- • Hamilton Mota Didier (impetrante de recurso administrativo
ru, com base no decreto contestando a TI Xukuru, com base no decreto 1.775/96 -
6) Processo 08620.0918/96)
bém conhecido por Beto • Antonio de Souza Lima (um dos impetrantes do Mandado de
Segurança Nº 4802-DF - 96.0069057-0 STJ e de recurso ad-

45
XUKURU DO ORORUBÁ

ministrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto • JAILSON GUEN


1.775/96 - Processo 08620.0947/96) • IVAN NUNES D
• Valter Mendes Rego Barros (impetrante de recurso admi- • JOÃO BATISTA
nistrativo contestando a TI Xukuru, com base no decreto • JORGE MACIE
1.775/96 - Processo 08620.0910/96) • JOSÉ CARLOS R
• JOSÉ EMÍDIO D
RELAÇÃO DOS IMPETRANTES DO • JOSÉ CORDEIR
MANDADO DE SEGURANÇA • JOSÉ JORGE M
Nº 4802-DF-(96.0069057-0) STJ • JOSELITON GU
• LEONARDO G
• GILENO DE CARLI • LEONIO BERN
• ABELARDO ALVES MACIEL • MANUEL LOPE
• MILTON BARBOSA VIANA DE ARAÚJO MACIEL • ANIZIO CORR
• MARIA NICE REGO BARROS DIDIER MACIEL • PAUDIJO FERN
• PAULO FERNANDO DIDIER MACIEL
• LÚCIA HELENA DIDIER MACIEL INDÚSTRIAS ALIM
• DOLORES DIDIER MACIEL FÁBRICA PEIXE
• MARIA NICE DIDIER MACIEL
• SEBASTIÃO GALVÃO MARTINIANO LINS • MARCELO JOS
• JULIANA LINS MATOS • MILTON DIDIE
• ANNA CLOTILDE COUTINHO MARTINIANO LINS • NIEL BORBA D
• PEDRO LUÍS COUTINHO MARTINIANO LINS • VALDEMAR DE
• BRUNO COUTINHO MARTINIANO LINS • JÂNIO JOSÉ D
• MILTON DO REGO BARROS DIDIER • AGGEU GUAR
• ANDRÉ BEZERRA DO REGO BARROS JÚNIOR • ALEXANDRE D
• MOACYR BRITTO DE FREITAS • ROSEANE GON
• ANTÔNIO CARLOS PINTO VASCONCELOS • RAMONA TER
• ANTÔNIO DE SOUZA LIMA • MIGUEL CAVA
• ANTÔNIO JOSÉ MOTA DO REGO BARROS JÚNIOR • PAULO PESSOA
• AURÉLIO JORGE DO AMARAL FRANCA • PAULO PESSOA
• CREUZA GENU DE ARAÚJO • JORGE CAVALC
• ERIBERTO DE QUEIROZ MARQUES
• ESTELITA DE QUEIROZ MARQUES
• GERALDO DE MAGELLA MOTA DO REGO BARROS

46
“Plantaram” Xicão

uru, com base no decreto • JAILSON GUENES DE SANTANA


6) • IVAN NUNES DA SILVA
etrante de recurso admi- • JOÃO BATISTA RAPOSO DE ARAÚJO
ru, com base no decreto • JORGE MACIEL ALMEIDA
6) • JOSÉ CARLOS RIBEIRO DO REGO BARROS
• JOSÉ EMÍDIO DA COSTA
• JOSÉ CORDEIRO DE SANTANA
• JOSÉ JORGE MEDEIROS
• JOSELITON GUENES DE SANTANA
• LEONARDO GOMES DA SILVA
• LEONIO BERNARDO SILVA
• MANUEL LOPES VENTURA
ÚJO MACIEL • ANIZIO CORREIA DE QUEIROZ
R MACIEL • PAUDIJO FERNANDO ARAÚJO QUEIROZ
L
INDÚSTRIAS ALIMENTÍCIAS CARLOS DE BRITTO S/A -
FÁBRICA PEIXE

O LINS • MARCELO JOSÉ OLIVEIRA DIDIER


• MILTON DIDIER LYRA
TINIANO LINS • NIEL BORBA DE CARVALHO
ANO LINS • VALDEMAR DE BRITO CAVALCANTI
LINS • JÂNIO JOSÉ DE BRITO CAVALCANTI
R • AGGEU GUARANÁ TABOSA
OS JÚNIOR • ALEXANDRE DE OLIVEIRA MEDEIROS
• ROSEANE GONÇALVES MONTEIRO SANTOS
NCELOS • RAMONA TERESA ECKER BEZERRA
• MIGUEL CAVALCANTI DE PETRIBU
ARROS JÚNIOR • PAULO PESSOA CAVALCANTI DE PETRIBU
NCA • PAULO PESSOA CAVALCANTI DE PETRIBU FILHO
• JORGE CAVALCANTI DE PETRIBU

Recife, agosto de 1998.


REGO BARROS

47
XUKURU DO ORORUBÁ

P ARECER ANTROPOLÓGICO:
FACCIONALISMO XUKURU
locadas como “isoladas”e
tomado como desintegrad
a apontar que no fim do s
Vânia Fialho Dentro da literatur
tre categorias sociais e gru
O presente relatório tem por objetivo contextualizar a situação desestruturantes foram ta
apresentada atualmente na TI (Terra Indígena) Xukuru no que concerne ralmente necessários para
às divergências políticas internas que têm levantado o problema da legi- importante é percebermo
timidade de lideranças indígenas e da possibilidade de um processo de condizente com os valores
faccionalismo interno. que produzem o conhecim
Para realização do mesmo, utilizamo-nos de pesquisa bibliográfica e Assim, como entend
documental, entrevistas e dados de outros períodos de trabalho de campo Nordeste Brasileiro? A pa
junto ao grupo indígena Xukuru e, por último, os dados que coletamos basar adequadamente a d
no período de 05 a 14 de novembro de 2001, quando fomos à área in- esta reflexão subsidiará aç
dígena focalizando a problemática da divergência interna. Nesta última públicas?
etapa, fomos acompanhados de duas técnicas da FUNAI (Fundação Na- Nos itens a seguir,
cional do Índio) – Recife que realizavam o levantamento dos projetos im- zação sócio-cultural e qu
plantados na TI Xukuru e que estavam sendo alvo de críticas por estarem apresenta na TI Xukuru.
contemplando apenas algumas aldeias xukurus.
OS XUKURU DO
DA HARMONIA AO FACCIONALISMO
Falamos acima na pr
Está presente no imaginário social e na perspectiva de algumas ru. Ao nos referirmos dess
instituições, até mesmo especializadas, a percepção das sociedades in- da Terra Indígena –TI) em
dígenas como unidades sociais homogêneas, livres de contradições. Ge- das suas próprias fronteira
ralmente, as sociedades indígenas são postas, inclusive, como ideais do entendemos que a questã
ponto de vista da igualdade e das relações equilibradas entre seus com- ver com o seu processo de
ponentes, o que também caracterizaria sua relação com o meio-ambien- bilização do grupo pela s
te. Nesta maneira de pensar, os conflitos que emergem das relações so- processo bastante comple
ciais são negligenciados, o que endossa a pretensa existência harmônica dades que não podem ser
das sociedades indígenas. Enfatizamos que ao
A produção literária sobre os indígenas vem também a colaborar mister atentar para aspect
para uma visão estereotipada que atende à percepção dessas sociedades do pressuposto que é prec
como distantes da realidade brasileira como um todo; seja do ponto de apresentam para, aí sim, d
vista biológico ou cultural, as sociedades indígenas “verdadeiras” são co- No universo das pop
rus constituem um grupo

48
“Plantaram” Xicão

locadas como “isoladas”e o contato com outras culturas e sociedades é


tomado como desintegrador das mesmas. Darcy Ribeiro (1970) chegou
a apontar que no fim do século XX não existiriam mais índios no Brasil.
Vânia Fialho Dentro da literatura antropológica clássica, os antagonismos en-
tre categorias sociais e grupos foram tratados de diferentes maneiras; de
contextualizar a situação desestruturantes foram também percebidos como funcionais ou estrutu-
Xukuru no que concerne ralmente necessários para a sociedade. De uma maneira ou de outra, o
ntado o problema da legi- importante é percebermos que a visão construída das situações sociais é
idade de um processo de condizente com os valores, as concepções filosóficas e religiosas daqueles
que produzem o conhecimento acerca do assunto.
de pesquisa bibliográfica e Assim, como entender o fenômeno do faccionalismo indígena no
dos de trabalho de campo Nordeste Brasileiro? A partir de que perspectiva? Ou melhor, como em-
o, os dados que coletamos basar adequadamente a discussão a esse respeito, tendo em mente que
quando fomos à área in- esta reflexão subsidiará ações de agências e agentes executores de políticas
cia interna. Nesta última públicas?
a FUNAI (Fundação Na- Nos itens a seguir, vamos abordar questões específicas da organi-
ntamento dos projetos im- zação sócio-cultural e que estão no cerne da problemática que hoje se
lvo de críticas por estarem apresenta na TI Xukuru.
.
OS XUKURU DO ORORUBÁ
MO
Falamos acima na problemática existente na Terra Indígena Xuku-
perspectiva de algumas ru. Ao nos referirmos dessa forma ao grupo indígena (enfatizando a figura
epção das sociedades in- da Terra Indígena –TI) em questão, não queremos limitá-lo às definições
vres de contradições. Ge- das suas próprias fronteiras territoriais, mas assim nos referirmos porque
inclusive, como ideais do entendemos que a questão que motivou este parecer em muito tem a
ilibradas entre seus com- ver com o seu processo de reconquista territorial, assim como com a mo-
ação com o meio-ambien- bilização do grupo pela sua reafirmação étnica, o que nos remete a um
emergem das relações so- processo bastante complexo, em que são acionadas categorias e subjetivi-
nsa existência harmônica dades que não podem ser percebidas de maneira simplista.
Enfatizamos que ao lidar com situações sociais, como esta, faz-se
vem também a colaborar mister atentar para aspectos muitas vezes negligenciados. Partimos então
rcepção dessas sociedades do pressuposto que é preciso se render aos preceitos que as ciências sociais
m todo; seja do ponto de apresentam para, aí sim, dar conta de aspectos práticos decorrentes.
enas “verdadeiras” são co- No universo das populações indígenas nordestinas, os índios xuku-
rus constituem um grupo cujo reconhecimento oficial se deu na década de

49
XUKURU DO ORORUBÁ

50 passada com o processo de garantia de seu território iniciado no final Outras informações
da década de 80. Juntamente com os Pankararu e os Fulni-ô, os Xuku- gação do Oratório da Mad
ru representam um dos grupos indígenas nordestinos com significativa era responsável pela cateq
quantidade de documentos apresentados pela historiografia oficial. tos oficiais do Governo d
Mesmo assim, foi a mobilização de sua população pelo seu reco- apontavam que a coloniza
nhecimento étnico e territorial nas últimas década que fez com que esse iniciada a partir da Vila
grupo viesse a ter maior destaque. Aldeia Ararobá, que serv
indígenas locais por aprox
De índios esquecidos e até folclorizados, quando tinham visibilidade
Vila de Cimbres foi transfe
apenas nas festas do município de Pesqueira, agreste do estado de Per-
do história oral dos Xuku
nambuco, os Xukuru passam a assumir uma nova postura, agora, voltada
daqueles índios (Relatório
para a conquista de seus direitos constitucionais; tanto assim que já foram
objeto de quatro dissertações de mestrado (duas em antropologia, uma A Terra Indígena Xu
em educação na UFPE e uma em associativismo rural na UFRPE), de nais, possui população es
algumas monografias de conclusão de curso de graduação e estão sendo do a maior população ind
estudados em duas teses de doutorado; foram também realizados dois de Pesqueira, agreste de P
vídeos sobre o grupo, o que nos disponibiliza uma quantidade bastante processo de regularização
significativa de informações que podem subsidiar nosso parecer. – Fundação Nacional do
Delimitação. Em 1992 foi
mediante Portaria Ministe
UM POUCO DA HISTÓRIA zada com dimensão de 27
teve publicado o seu decre
Referências históricas sobre os Xukuru remontam ao século XVI. O número de aldeia
Num dos textos clássicos sobre alguns povos indígenas no Nordeste, Ho- trovertido. Consideramos
henthal (1958: 99) citou que a menção mais antiga sobre a tribo Shucu- concentrações de habitaçõ
rú, na versão Xacuru, se dá por volta de 1599, de acordo com o autor de ganização social e política
Desagravos do Brasil e Glórias de Pernambuco, escrito em 1757 no Recife. algumas localidades apre
As terras habitadas pelos índios Xukuru, segundo a tradição oral como por exemplo, a alde
do grupo e das diversas fontes históricas existentes, abrangiam a Serra e Caldeirão “de Baixo”; ou
do Felipe, Serra da Aldeia Velha, Serra do Aió, Serra do Mají (Pedra Fu- dos Nogueiras” e Pé de Se
rada), Poço do Mulungu, Serra Isabel Dias, Serra da Gangorra, Serra da
Ventania ou do Vento e atrás da Serra do Felipe, em perímetro de aproxi-
DIVERGÊNCIA EN
madamente 40 léguas. Em termos atuais, este território compreenderia,
no sentido leste-oeste, do Brejo da Madre de Deus (PE) à proximidade
de Arcoverde (PE), e no sentido norte-sul, da região limítrofe aos estados De acordo com que
da Paraíba e Pernambuco até a Pedra Serrana no município de Pedra/PE recer, foi deflagrada com
(ATLAS, 1993: 66). lado de “desenvolviment
- Fundação de Desenvolvi

50
“Plantaram” Xicão

território iniciado no final Outras informações encontram-se nas referências sobre a Congre-
ru e os Fulni-ô, os Xuku- gação do Oratório da Madre de Deus que, em terras doadas pelo governo,
destinos com significativa era responsável pela catequese dos índios na Missão Ararobá. Documen-
historiografia oficial. tos oficiais do Governo de Pernambuco, em meados do século XVIII,
população pelo seu reco- apontavam que a colonização da região onde se localizam os Xukuru foi
ada que fez com que esse iniciada a partir da Vila de Cimbres, local anteriormente denominado
Aldeia Ararobá, que serviu como ponto de catequese de vários grupos
indígenas locais por aproximadamente dois séculos. Em 1836, a sede da
uando tinham visibilidade
Vila de Cimbres foi transferida para a povoação de Pesqueira que, segun-
agreste do estado de Per-
do história oral dos Xukuru, tratava-se de local tradicional de pescaria
va postura, agora, voltada
daqueles índios (Relatório de Identificação da TI Xukuru, 1989).
; tanto assim que já foram
as em antropologia, uma A Terra Indígena Xukuru, com 23 “aldeias” ou núcleos habita-cio-
mo rural na UFRPE), de nais, possui população estimada em 7000 índios (FUNAI/2001), sen-
e graduação e estão sendo do a maior população indígena no Nordeste. Localiza-se no município
m também realizados dois de Pesqueira, agreste de Pernambuco, a 216 km da cidade de Recife. O
uma quantidade bastante processo de regularização fundiária da mesma foi iniciado pela FUNAI
ar nosso parecer. – Fundação Nacional do Índio - em 1989, com a etapa da Identificação e
Delimitação. Em 1992 foi declarada de posse permanente dos índios Xukuru,
mediante Portaria Ministerial; em 1995, teve sua demarcação física reali-
zada com dimensão de 27.555 ha (Brasileiro et alii, 1998) e, finalmente,
teve publicado o seu decreto de homologação em 2001.
emontam ao século XVI. O número de aldeias, apresentado aqui como 23, é um dado con-
dígenas no Nordeste, Ho- trovertido. Consideramos como aldeias os núcleos populacionais, ou seja,
tiga sobre a tribo Shucu- concentrações de habitações que possuem representatividade junto à or-
de acordo com o autor de ganização social e política do grupo. As divergências existem por conta de
escrito em 1757 no Recife. algumas localidades apresentarem designações para trechos específicos,
, segundo a tradição oral como por exemplo, a aldeia Caldeirão que aglutina Caldeirão “de Cima”
entes, abrangiam a Serra e Caldeirão “de Baixo”; ou a aldeia Pé de Serra que congrega “Pé de Serra
Serra do Mají (Pedra Fu- dos Nogueiras” e Pé de Serra “de São Sebastião”.
rra da Gangorra, Serra da
, em perímetro de aproxi-
DIVERGÊNCIA ENTRE OS XUKURU
território compreenderia,
Deus (PE) à proximidade
egião limítrofe aos estados De acordo com que nos foi relatado, a divergência, objeto deste pa-
no município de Pedra/PE recer, foi deflagrada com o início da implantação de um projeto intitu-
lado de “desenvolvimento” da Vila Cimbres, coordenada pela FIDEM
- Fundação de Desenvolvimento Municipal - e que previa a construção de

51
XUKURU DO ORORUBÁ

uma estrada da Vila até a aldeia Guarda, visando a melhoria do acesso ao Sem dúvidas, Cimbr
Santuário de Nossa Senhora das Graças. Xukuru, assim também
Este santuário já vem sendo motivo para divergências desde que que funda a existência do
passou a ser a razão para a implantação de projetos que,- desconsideram o Como o conflito que tem
fato de que o mesmo está encravado no território tradicional dos Xukuru, tro da disputa, sua dimen
já demarcado e homologado pelo Presidente da República - mais do que financeiros para implanta
desconsiderar os limites da TI Xukuru, esses projetos vêm ignorando a apresentaremos um pouco
existência dos problemas que os índios têm enfrentado, assim como a cia para os Xukuru.
autonomia dos mesmo para definir o destino de seu território.
Desde o nosso primeiro trabalho junto aos Xukuru, em 1989, já CIMBRES E ARARO
havíamos identificado alguns problemas na região da Vila de Cimbres de-
vido ao Santuário de Nossa Senhora das Graças e às pessoas que estavam A Aldeia do Ararob
envolvidas na sua manutenção. conhecida por Nossa Senh
gundo Valle (1992, 30), e
Alguns problemas: bitado por moradores estr
dância d’água, tornou-se p
1. Preterição dos costumes indígenas
bispo D. Matias de Figue
2. Aumento do fluxo de pessoas (romeiros e visitantes) na terra Montanhas foi ali instala
indígena agreste de Pernambuco.
3. Atração de não índios para se instalar em localidades que ser- A aldeia do Ararobá
vem de apoio à visita ao santuário, como Cajueiro Monte Alegre e ao ser cr
4. A população indígena da aldeia Guarda foi ignorada pelas ini- permanece, segundo uns
ciativas do santuário; sendo inclusive considerada um empeci- em Portugal, segundo ou
lho por afastar, com sua pobreza, os turistas e peregrinos ensino” (MACIEL, 1977,
5. Mobilização de algumas instituições como FIDEM, Prefeitura de ensino ministrado pelo
Municipal de Pesqueira no intuito de efetivar a implantação culos. No início, era a cate
da reforma do santuário. Néri ou do Oratório da M
de instalação de um estab
dos índios de Urubá”.
Em trabalho anterior (Fialho, 1998), abordamos as aldeias localiza-
A observação do “E
das nas proximidades de Cimbres como um capítulo específico, por en-
26.03.1762 4 da autoria d
tendermos a necessidade de se visualizar a relação de Cimbres, como local
leva a se fazer algumas con
que fundou o processo de aldeamento dos índios daquela região, com as
de Cimbres:
aldeias mais distantes, também percebidas como fazendo parte de um
mesmo território, como Canabrava e Pedra D’Água. Estas, mesmo estan-
do situadas na porção leste da TI, juntamente com Cimbres, representam
4. FIAM/CEHM/Prefeitura Munici
as aldeias que concentram as decisões políticas e religiosas dos Xukuru.

52
“Plantaram” Xicão

do a melhoria do acesso ao Sem dúvidas, Cimbres tem um papel fundamental na história dos
Xukuru, assim também como para o arcabouço mitológico religioso
a divergências desde que que funda a existência dos Xukuru como identidade étnica diferenciada.
tos que,- desconsideram o Como o conflito que tem emergido recentemente tem Cimbres no cen-
o tradicional dos Xukuru, tro da disputa, sua dimensão vai muito além de apropriação de recursos
a República - mais do que financeiros para implantação de projetos e benefícios. Por isso, a seguir,
projetos vêm ignorando a apresentaremos um pouco da história desta localidade e de sua importân-
nfrentado, assim como a cia para os Xukuru.
e seu território.
aos Xukuru, em 1989, já CIMBRES E ARAROBÁ
ião da Vila de Cimbres de-
s e às pessoas que estavam A Aldeia do Ararobá, que deu origem à Vila de Cimbres, também
conhecida por Nossa Senhora das Montanhas, foi fundada em 1669. Se-
gundo Valle (1992, 30), este aldeamento também é posteriormente ha-
bitado por moradores estranhos. Devido ao seu clima favorável e a abun-
dância d’água, tornou-se próspero e foi elevado à paróquia em 1692 pelo
bispo D. Matias de Figueiredo e Melo. A igreja de Nossa Senhora das
eiros e visitantes) na terra Montanhas foi ali instalada em 1692 e tornou-se a primeira matriz do
agreste de Pernambuco.
ar em localidades que ser- A aldeia do Ararobá também teve o nome dado pelos jesuítas, de
omo Cajueiro Monte Alegre e ao ser criada a vila em 1761, o de Cimbres que ainda
rda foi ignorada pelas ini- permanece, segundo uns, recordando uma povoação de nome idêntico
e considerada um empeci- em Portugal, segundo outros, significando na língua indígena “lugar de
turistas e peregrinos ensino” (MACIEL, 1977, 309-10). Na realidade, Cimbres foi um lugar
como FIDEM, Prefeitura de ensino ministrado pelos brancos aos índios, por mais ou menos dois sé-
de efetivar a implantação culos. No início, era a catequese dos índios pela Congregação de S. Felipe
Néri ou do Oratório da Madre de Deus; no século XIX, havia um projeto
de instalação de um estabelecimento de ensino profissional, o “Colégio
dos índios de Urubá”.
damos as aldeias localiza-
A observação do “Edital para a feitura da vila de Cimbres” de
apítulo específico, por en-
26.03.1762 4 da autoria do Desembargador Manuel de Gouveia Avares
ão de Cimbres, como local
leva a se fazer algumas considerações a respeito da escolha do local da vila
os daquela região, com as
de Cimbres:
mo fazendo parte de um
Água. Estas, mesmo estan-
om Cimbres, representam
4. FIAM/CEHM/Prefeitura Municipal de Pesqueira, 1985, pag. 40.
e religiosas dos Xukuru.

53
XUKURU DO ORORUBÁ

1º- que a finalidade da criação da vila foi, sem dúvida índio; sua Com a promulgação
atração para fins de lhes ser prestada assistência religiosa e lições de civili- tar a administração das te
dade, era real motivo das bulas pontificias, leis e ordem régias; mente os casos conflituoso
2º- que, além dos índios, outros moradores brancos, religiosos ou não, tivo primordial desta lei “
havia na antiga aldeia de Ararobá, depois povoação de Monte Alegre”. ocupação das terras ainda
titulação de terras, para re
va vulneráveis aquelas ocu
Juntamente com a instituição da vila e termo de Cimbres, começa a ressaltado, tais medidas n
funcionar sua Câmara Municipal. O termo de Cimbres, durante grande finição de domínio da terr
parte do século XIX, pertenceu jurisdicionalmente à Comarca da Madre
A extinção de inúm
de Deus.
Provincial em relação aos
Em 1813 há referência da existência de 245 índios “Shucurú” na- necessidade de recorrer à
quele local. Este documento representa uma petição do governo provin- pressionar para a garantia
cial de Pernambuco, declarando que a Vila de Cimbres é muito pobre em nome de fazendeiros.
para alimentar os índios supracitados e requer que a tutela governamen- Em 1873, dos sete al
tal dos aborígenes seja encerrada porque são capazes de viver por si pró- missão constituída pelo Pr
prios (HOHENTAL, 1958,101). de Cimbres e o de Assunç
Sarah Valle (1992, 34) acrescenta que, com o advento da Indepen- sião, foi cogitada, inclusive
dência do Brasil, os Oratorianos foram desprestigiados pelos brasileiros deamentos extintos, para a
pela sua fidelidade à Coroa Portuguesa. Com a ausência do poder da me- to governamental de cons
trópole na colônia, os congregados estavam dispersos, constando por vol- foi declarada a extinção de
ta de 1825, apenas quatro padres e alguns leigos (COSTA, 1983, vol. 9, ra de Regência de Cimbre
p.378). Logo após este momento, discussões a respeito da responsabilida- à pessoas estranhas; só qu
de de administrar os bens da Congregação e da posse dos rendimentos da seu direito à terra. Porém
mesma, indicam a extinção da congregação de São Filipe Néri na Provín- assim interpretou, aguçan
cia de Pernambuco (Costa, 1983, v. 9, 312), oficializada através da Carta a extinção das aldeias sign
de Lei de 9 de dezembro de 1830. índios tinha acabado, não
Em 13 de maio de 1836, a lei provincial nº20, mudou a sede desta Apesar da extinção
ter se efetuado em 1879,
vila para a Povoação de Pesqueira, que passou à categoria de vila e cabeça
e a sociedade envolvente j
do termo, dando outro rumo à história daquela região. Segundo a tradi-
de Cimbres a extinguir o
ção oral dos Xukuru, o próprio nome “Pesqueira” é oriundo do local de dios reverteram para o pat
pescaria dos índios, este, situado atualmente nas proximidades da Fábrica em 1824 é formada uma
Rosa no centro da cidade de Pesqueira. guerrilha da Vila e uma co
Muitos outros documentos informam sobre a administração do al- ter os índios, alegando rou
deamento de Cimbres. Um deles, datado de 1879, trata da denúncia feita Porém, em 25 de m
pela representação daqueles índios, de que o diretor local estava arrendan- pério ordena o envio de u
do terras da aldeia quando eles haviam se retirado em conseqüência da seca. Aldeamento de Cimbres c

54
“Plantaram” Xicão

i, sem dúvida índio; sua Com a promulgação da Lei 601 de 1850, que procurava regulamen-
religiosa e lições de civili- tar a administração das terras devolutas do Império, aumentava vultosa-
e ordem régias; mente os casos conflituosos pela ocupação das terras nas aldeias. O obje-
brancos, religiosos ou não, tivo primordial desta lei “era o de modernizar a agricultura e promover a
ção de Monte Alegre”. ocupação das terras ainda incultas”. Porém, a exigência de demarcação e
titulação de terras, para reconhecimento do direito de propriedade, torna-
va vulneráveis aquelas ocupadas pelos grupos indígenas, pois, como já foi
mo de Cimbres, começa a ressaltado, tais medidas não eram compatíveis com os parâmetros de de-
Cimbres, durante grande finição de domínio da terra destes mesmos grupos (PARAISO, 1987, 57).
ente à Comarca da Madre
A extinção de inúmeras aldeias se deu pelo desrespeito ao governo
Provincial em relação aos direitos dos índios. Estes, sem atentar para a
245 índios “Shucurú” na- necessidade de recorrer às medidas legais exigidas e sem condições de
etição do governo provin- pressionar para a garantia de seus direitos, viram suas terras registradas
e Cimbres é muito pobre em nome de fazendeiros.
que a tutela governamen- Em 1873, dos sete aldeamentos em Pernambuco estudados pela Co-
apazes de viver por si pró- missão constituída pelo Presidente da Província de Pernambuco, apenas o
de Cimbres e o de Assunção não foram considerados extintos. Nesta oca-
m o advento da Indepen- sião, foi cogitada, inclusive, a possibilidade de transferência de índios de al-
stigiados pelos brasileiros deamentos extintos, para ali se fixarem. No entanto, foi efêmero o propósi-
ausência do poder da me- to governamental de conservar os dois aldeamentos, pois em 25.01.1879,
persos, constando por vol- foi declarada a extinção de Cimbres e suas terras foram entregues a Câma-
os (COSTA, 1983, vol. 9, ra de Regência de Cimbres, para redistribuição a título de venda ou cessão
espeito da responsabilida- à pessoas estranhas; só que isto não implicava que os Xukuru perderiam
posse dos rendimentos da seu direito à terra. Porém, a população não-índia de Cimbres e Pesqueira
São Filipe Néri na Provín- assim interpretou, aguçando o esbulho das terras indígenas. Na realidade,
cializada através da Carta a extinção das aldeias significava apenas que a tutela governamental dos
índios tinha acabado, não os destituindo de seu direito às terras.
nº20, mudou a sede desta Apesar da extinção do Aldeamento de Cimbres pela Província só
ter se efetuado em 1879, o conflito existente entre os índios do Ararobá
categoria de vila e cabeça
e a sociedade envolvente já havia provocado a Câmara Municipal da Vila
a região. Segundo a tradi-
de Cimbres a extinguir o aldeamento em 1822 e todas as terras dos ín-
ira” é oriundo do local de dios reverteram para o patrimônio da Câmara. Como se isso não bastasse,
s proximidades da Fábrica em 1824 é formada uma força autorizada pelo governo, oriunda de uma
guerrilha da Vila e uma companhia de ordenanças de Moxotó, para aba-
bre a administração do al- ter os índios, alegando roubos e assassinatos por parte dos nativos.
79, trata da denúncia feita Porém, em 25 de março de 1825, um aviso do Ministério do Im-
etor local estava arrendan- pério ordena o envio de um padre para servir de Diretor dos índios do
o em conseqüência da seca. Aldeamento de Cimbres com o fim de sua catequese.

55
XUKURU DO ORORUBÁ

A luta pela apropriação das terras do aldeamento de Cimbres, lide- envolvente; por outro, isto
rada pela Câmara Municipal local, foi amplamente documentada. Sabe- mentos que compõem a id
-se que esta Câmara tinha patrimônio territorial justamente no espaço e geograficamente está re
que separava os dois territórios próprios do aldeamento e que mesmo coletiva do grupo e constr
com tentativas para um acordo de ocupação das terras, este não foi res- determinada por múltiplo
peitado pelos edis. primária, individual, mas
A demarcação das terras do aldeamento era constantemente requi- tivas aos quais vem a se ac
sitada pelos índios, na oportunidade das denúncias de posseiros e arren- Destacamos aqui, o
damento da área. Pelo visto, porém, a demarcação do território Xukuru que, a partir dele, vamos
não foi realizada, até que na década de 80 do século XX, estes índios dos para as lideranças xuk
voltassem a se mobilizar para sua efetivação. sua relação com a tradição
Pode-se perceber que a colonização da região esteve intimamente O livro “Filhos da M
relacionada à ocupação primeira dos índios, que alimentou a necessidade genas durante a realização
de sua “pacificação” e “catequização” e as relações ali construídas a partir nação do Centro de Cultu
das disputas pelas terras. técnicos de universidades
No entanto, para a realidade dos Xukuru, a importância de Cim- de Educação do Estado, a
bres tem um outro sentido: foi o espaço fundamental para a construção rio Xukuru que os profess
da alteridade; se o processo a eles imposto era o de homogeneização, isto com diversos integrantes
se dava pelo reconhecimento das diferenças entre os índios e a sociedade Os limites e os critér
envolvente; é fundamentalmente a partir do OUTRO que se dá a cons- TI Xukuru podem ser per
trução da identidade. Tanto assim que a região de Cimbres está repleta
de signos dessa identidade indígena, sobre os quais vamos tecer a seguir.

IDENTIDADE XUKURU

Nos trabalhos que já desenvolvemos sobre os Xukuru, sempre res-


saltamos que a sua identidade está fundada na percepção do território5
dos mesmos. Por um lado, com a mobilização pela garantia de suas terras
houve a ênfase aos aspectos diacríticos que os diferenciam da sociedade

5. É importante ressaltar que a afirmação da identidade indígena xukuru “ não é apenas o ato de
outorga de território, de ‘etnificação’ puramente administrativa, de submissões, mandatos políti-
cos e imposições culturais, é também aquele da comunhão de sentidos e valores, do batismo de
cada um de seus membros, da obediência a uma autoridade simultaneamente religiosa e política.
Só a elaboração de utopias (religiosas/morais/políticas) permite a superação da contradição entre
os objetivos históricos e o sentimento de lealdade às origens, transformando a identidade étnica
em uma prática social efetiva, culminada pelo processo de territorialização.” (OLIVEIRA, 1999, 32).

56
“Plantaram” Xicão

amento de Cimbres, lide- envolvente; por outro, isto se dá porque o seu território está eivado de ele-
ente documentada. Sabe- mentos que compõem a identidade xukuru. Esse espaço demarcado física
rial justamente no espaço e geograficamente está repleto de uma simbologia que nutre a memória
ldeamento e que mesmo coletiva do grupo e constrói, no dia a dia, “uma trajetória (que é histórica e
as terras, este não foi res- determinada por múltiplos fatores) e uma origem (que é uma experiência
primária, individual, mas que também está traduzida em saberes e narra-
ra constantemente requi- tivas aos quais vem a se acoplar)” (OLIVEIRA, 1999, 30).
ncias de posseiros e arren- Destacamos aqui, o caráter sagrado atribuído ao seu território, por-
ação do território Xukuru que, a partir dele, vamos também abordar a questão dos aspectos volta-
o século XX, estes índios dos para as lideranças xukurus; como são escolhidas, qual o seu papel e
sua relação com a tradição do grupo.
egião esteve intimamente O livro “Filhos da Mãe Natureza”, elaborado pelos professores indí-
e alimentou a necessidade genas durante a realização do Projeto de Educação Xukuru sob a coorde-
ões ali construídas a partir nação do Centro de Cultura Luiz Freire e assessorado por pesquisadores e
técnicos de universidades, Conselho Indigenista Missionário e Secretaria
u, a importância de Cim- de Educação do Estado, apresenta graficamente a concepção do territó-
mental para a construção rio Xukuru que os professores coletaram durantes as pesquisas realizadas
o de homogeneização, isto com diversos integrantes desta sociedade indígena.
tre os índios e a sociedade Os limites e os critérios escolhidos para estabelecer as fronteiras da
OUTRO que se dá a cons- TI Xukuru podem ser percebidos nos desenhos abaixo:
o de Cimbres está repleta
uais vamos tecer a seguir.

e os Xukuru, sempre res-


a percepção do território5
ela garantia de suas terras
diferenciam da sociedade

ena xukuru “ não é apenas o ato de


a, de submissões, mandatos políti-
sentidos e valores, do batismo de
multaneamente religiosa e política.
e a superação da contradição entre
ransformando a identidade étnica
torialização.” (OLIVEIRA, 1999, 32).

57
XUKURU DO ORORUBÁ

Xukuru e por ter constitu


cia e de articulação para a

OS DOIS PÓLOS R

Localizada no ponto
é uma montanha em que
grada, (b) a Pedra do Rei
Pedra do Reino, onde se d
que fica exposta no meio
túmulo do cacique Chicão
agosto passado.
Sobre esta Pedra, seu

Pedra
no [an
A religiosidade é um dos aspectos mais importantes para a coesão todo m
das aldeias xukurus. O fluxo que permite com que identifiquemos o con- que diz
junto de sua sociedade se dá através das relações de parentesco e compa- vam. M
drio e dos eventos que envolvem a religião. (Gerci
De uma maneira geral, podemos afirmar que seu universo religioso
está envolto de elementos do catolicismo popular, com a devoção a santos
É nessa área que oco
católicos, da crença nos “encantados”, que são espíritos de seus antepas-
eventos mais importantes
sados (dos “antigos”) e ainda aspectos de cultos afro-brasileiros. São devo-
São João (24/06) e de Nos
tos, principalmente, de Nossa Senhora das Montanhas, a quem chamam
estas duas última acontec
de “Tamain”, de São João e se referem à uma divindade maior, nos moldes
do cristianismo, como “Tupã”.
CEMITÉRIOS
Além das duas festas tradicionais na vila de Cimbres, São João
(24/06) e Nossa Senhora das Montanhas (02/07), quando também se
misturam elementos da religiosidade indígena, como o toré e outros ritu- Existem, na região,
ais, os Xukuru realizam os rituais regularmente na mata e nos terreiros. Pão de Açúcar e o de Cim
Dentre esses locais, os mais representativos estão: o terreiro do Caboclo quer dos três, no entanto
João Jorge, na aldeia Sucupira e o terreiro da Pedra D’Água, próxima da para os Xukuru, onde ger
Pedra do Rei (ou Reino).
6. Bacurau é o indivíduo que se
Este último tem assumido um certo destaque por nele estar se “puxar as linhas”, os cânticos que
concentrando a mobilização política para a regularização das terras dos espirituais.

58
“Plantaram” Xicão

Xukuru e por ter constituído, no início do processo, um foco de resistên-


cia e de articulação para as etapas seguintes.

OS DOIS PÓLOS RELIGIOSOS: Cimbres e Pedra D’Água

Localizada no ponto mais alto da Serra do Ararobá, a Pedra D’Água


é uma montanha em que estão presentes: (a) uma mata considerada sa-
grada, (b) a Pedra do Rei, ou do Reino, (c) uma clareira no caminho da
Pedra do Reino, onde se dança o Toré, ao redor da jurema, bebida sagrada
que fica exposta no meio do círculo e, desde de 1998 fica também (d) o
túmulo do cacique Chicão e do líder Chico Quelé, assassinado no mês de
agosto passado.
Sobre esta Pedra, seu Gercino,“bacurau”6 antigo dos xukuru, afirmou:

Pedra do Reino (de Reis)[é] ritual antigo; Antero, Jardinili-


no [antigos caciques] foram chamados pela natureza; não era
mportantes para a coesão todo mundo que sabia que existia isso ali; (...) tinha aqueles
que identifiquemos o con- que diziam que iam, pois ouviam as conversas, mas não acha-
es de parentesco e compa- vam. Meu pais já conheciam a Pedra de Reis, é coisa antiga.
(Gercino, 11/11/01)
que seu universo religioso
ar, com a devoção a santos
É nessa área que ocorre no dia 06 de janeiro, a festa de Reis, um dos
espíritos de seus antepas-
eventos mais importantes do calendário xukuru, assim como a festa de
afro-brasileiros. São devo-
São João (24/06) e de Nossa Senhora das Montanhas ( 02/07), sendo que
ntanhas, a quem chamam
estas duas última acontecem na Vila de Cimbres.
vindade maior, nos moldes
CEMITÉRIOS
la de Cimbres, São João
/07), quando também se
como o toré e outros ritu- Existem, na região, três cemitérios: o da cidade de Pesqueira, o de
e na mata e nos terreiros. Pão de Açúcar e o de Cimbres. Os índios podem ser enterrados em qual-
tão: o terreiro do Caboclo quer dos três, no entanto, os dois últimos possuem um caráter especial
edra D’Água, próxima da para os Xukuru, onde geralmente eram enterrados os seus antepassados.

6. Bacurau é o indivíduo que se posiciona na frente da fila que, em círculos, dança o toré para
staque por nele estar se “puxar as linhas”, os cânticos que marcam o ritmo e cujas letras evocam diferentes entidades
gularização das terras dos espirituais.

59
XUKURU DO ORORUBÁ

Exatamente por a Vila de Cimbres ter se originado de um antigo aldea- TERRITÓRIO SAG
mento indígena, este ainda tem um papel preponderante. Ainda hoje,
muitos dos Xukuru são enterrados na Vila; é um pedido principalmente A TI Xukuru coincid
dos mais velhos, a “Vila” é mãe deles. ra do Ororubá e a Pedra
Dona Marcionila, 86 anos, índia moradora da aldeia Caldeirão, en- pontos de convergência d
fatizando o papel da Vila de Cimbres para o universo religioso xukuru, são capazes de reforçar as
chegou a nos dizer que além do toré ter sempre acontecido na Vila de dá ao mesmo o caráter de
Cimbres, os índios sempre manifestaram o desejo se serem enterrados no A relação e a ênfase
cemitério daquela localidade. Segundo ela, “o pessoal saía das aldeias para se orientem numa suposta
ser enterrado na Vila dessa “serra dos índios. [...] O pessoal pensa que só em que vivem; determina
se salva se for para a ‘Vila’”. criado de novo, consagrad
Dona Maria de Romão, 78 anos, viúva de Romão da Hora, que foi Através da religião,
uma liderança da Vila de Cimbres, referência histórica e tradicional para deixa de ser homogêneo,
os Xukuru, também afirmou que “mesmo o pessoal de Caetano (aldeia diferentes das outras e, e
localizada no outro extremo da TI) era enterrado em Cimbres; nós nasce- concebem como identidad
mos lá, mas somo todos daqui”.
Rita Neves (1999),
É interessante notar que tanto o cacique Chicão como a líder Chico grama de Pós-Graduação
Quelé, antes de serem enterrados na Pedra D’Água, tiveram seus corpos damente esses espaços sag
levados até a Vila de Cimbres, onde ocorreu uma missa na Igreja de Nossa ra, destacamos algumas la
Senhora das Montanhas.
O circuito que envolve os rituais de morte dos Xukuru respeita as
1.Pedra do Dinheiro
duas principais localidades relacionadas ao aspecto sagrado desses índios:
Cimbres e Pedra D’Água e a partir deles podemos ter uma percepção
bem mais apurada do que representa o território Xukuru para a identida- Esta pe
de dos mesmos, assim como para sua organização social e política. também
Seu Medalha, o gaiteiro, ou seja, o tocacor da flauta (mibim) nos sui 5 o
rituais da Vila de Cimbres fornece uma idéia sobre como se dá esse fluxo de que
religioso no seu território: Seu for
pessoas
alguns
Nós temos o nosso terreiro na Sucupira; dançamos aqui
mitá-la
e na Sucupira, lá no sábado à tarde; lá na Pedra D’Água
Por iss
também tem o nosso terreiro, eles vêm para cá e a gente
da mat
vai para lá. Todos os torés são fortes; o toré tem que ser
ximida
assim, que é uma dança de fé; não é uma dança qualquer,
perman
[é] pensando nos antepassados, pensando em Tamain,
pensando em nosso pai Tupã e o toré dá força pra gente; As pess
toré é uma religião indígena [...]. colocad

60
“Plantaram” Xicão

nado de um antigo aldea- TERRITÓRIO SAGRADO


eponderante. Ainda hoje,
m pedido principalmente A TI Xukuru coincide com a cadeia de montanhas chamada de Ser-
ra do Ororubá e a Pedra D’Água e a Vila de Cimbres constituem dois
a da aldeia Caldeirão, en- pontos de convergência das aldeias xukurus e as situações que lá ocorrem
universo religioso xukuru, são capazes de reforçar as fronteiras territoriais e identitárias do grupo e
pre acontecido na Vila de dá ao mesmo o caráter de unidade.
ejo se serem enterrados no A relação e a ênfase desse espaço sagrado permitem que os Xukuru
essoal saía das aldeias para se orientem numa suposta homogeneidade e, assim, “fundam o mundo”
..] O pessoal pensa que só em que vivem; determinando o “nosso mundo”; o “nosso território” foi
criado de novo, consagrado.
e Romão da Hora, que foi Através da religião, o espaço, conforme já salientou Eliade (1996),
istórica e tradicional para deixa de ser homogêneo, indicando porções de espaço qualitativamente
essoal de Caetano (aldeia diferentes das outras e, em torno deste circuito sagrado, os Xukuru se
o em Cimbres; nós nasce- concebem como identidade étnica diferenciada.
Rita Neves (1999), em dissertação de mestrado defendida no Pro-
Chicão como a líder Chico grama de Pós-Graduação em Antropologia da UFPE, descreve detalha-
Água, tiveram seus corpos damente esses espaços sagrados dos Xukuru. Dentre os citados pela auto-
a missa na Igreja de Nossa ra, destacamos algumas lajes (pedras) consideradas sagradas:

te dos Xukuru respeita as


1.Pedra do Dinheiro
cto sagrado desses índios:
demos ter uma percepção
o Xukuru para a identida- Esta pedra está localizada em Cajueiro – um bairro da Vila que
ão social e política. também é uma aldeia xukuru – e fica em cima de um morro. Pos-
or da flauta (mibim) nos sui 5 ou 6 metros de altura e olhando de baixo, dá a impressão
obre como se dá esse fluxo de que está solta em cima de três pedrinhas minúsculas.
Seu formato original era o deu um cálice. Conta-se que algumas
pessoas da própria Vila e também de outros lugares, inclusive
alguns alemães conhecidos do padre da região, tentaram dina-
Sucupira; dançamos aqui
mitá-la para ver se deslizava, mas nunca conseguiram movê-la.
arde; lá na Pedra D’Água
Por isso dizem estar ali “segura por mãos divinas, por espíritos
eles vêm para cá e a gente
da mata” (Joana – 20/06/98). Ainda hoje se vê em suas pro-
fortes; o toré tem que ser
ximidades, as lascas da pedra dinamitada. Ela, no entanto,
não é uma dança qualquer,
permanece em pé.
s, pensando em Tamain,
o toré dá força pra gente; As pessoas dizem que esta pedra não pode ser destruída porque foi
.]. colocada no local por “Nosso Senhor Jesus Cristo, no tempo em que

61
XUKURU DO ORORUBÁ

ele andava por lá com Nossa Senhora” (Maria – 20/06/98). 4.Laje do Crajéu
É também uma pedra sonora pois quando se bate nela com um
objeto metálico, o tinido é tão forte como se fosse oca. É por isso que
Vindo
ela é chamada de Pedra do Dinheiro, porque acreditam que den-
Cimbre
tro dela tem ‘ouro, prata e inteligência’ (Maria – 20/06/98).
a serra
eles par
2.Pedra do Conselho
Além d
era o m
Essa pedra é também chamada de Laje do Conselho. O seu ziam a
formato é liso e achatado. Durante a madrugada da festa de São O mort
João é nela que acontece um dos momentos mais importantes onde Xukur
os Xukuru e os não-índios fazem seus rituais sagrados. cipó. A
Fala-se também que todos os antepassados que algum dia, quan- guir em
do vivos, ‘dançaram na palha’ [ segundo Rita Neves, a expres-
são “dançar na palha”significa usar a vestimenta ou apenas a
Além dessas pedras,
barretina e participar do ritual na Pedra do Conselho à meia-
tras quatro referenciadas p
-noite], se encontram presentes na hora desse ritual. Algumas
que a vila possuía. Como
pessoas da vila dizem que nesse momento vêem os seus ancestrais.
não serem mais usadas, o
É o momento também em que alguns Xukuru mais experientes
porém não mais realizam
recebem os “Encantados”através de incorporação. São eles que
dão conselhos sobre a conduta de todo o povo Xukuru.p. 39-40 Outras pedras consid
outras localidades, como
3.Laje do Patreká do Vento e a do Acauã, já
riormente.
Como antigo bacura
Considerada sagrada, nela também se realizavam rituais. Atu-
comentou:
almete, no entanto, com a expansão da Vila, uma parte dessa
laje foi tomada pelas casas, caindo em desuso.
Segundo os Xukuru, antigamente essa era a primeira laje que [Antig
abrigava os rituais da noite de São João. Depois que os Xukuru dra do
dan;cavam na porta da Igreja, ao redor da vila e em frente à nós faz
casa paraquial, se dirigiam para a laje do Patreká e a partir que ia
daí seguiam para outras lajes. va, ass
Mesmo nàp sendo mais usada, ainda é considerada sagrada
Pé de
porque dizem nela encontrar-se ‘as pegadas de Nossa Senhora,
todo pa
do Menino Jesus e do burrico que andava com eles por Cimbres’ Tinha
(Maria – 20/06/98) nós rec

62
“Plantaram” Xicão

ora” (Maria – 20/06/98). 4.Laje do Crajéu


quando se bate nela com um
omo se fosse oca. É por isso que
Vindo de Pesqueira, essa laje encontra-se na entrada da vila de
o, porque acreditam que den-
Cimbres. Conta-se que antigamente, quando os Xukuru subiam
ncia’ (Maria – 20/06/98).
a serra a pé, para as festas da vila, antes de entrar em Cimbres,
eles paravam nessa laje para descansar e iniciar os rituais do Toré.
Além de servir como marco inicial dos rituais, essa laje também
era o momento de parada e decanso, quando os Xukuru tra-
e Laje do Conselho. O seu ziam algum morto para ser enterrado no cemitério de Cimbres.
a madrugada da festa de São O morto vinha em uma rede, e quando chegava no Crajéu, os
mentos mais importantes onde Xukuru colocavam-no sobre a laje e depois o surravam com um
us rituais sagrados. cipó. Assim, espantavam os maus espíritos, ajudando este a se-
ssados que algum dia, quan- guir em paz. p.41
gundo Rita Neves, a expres-
ar a vestimenta ou apenas a
Além dessas pedras, localizadas exatamente em Cimbres, existem ou-
a Pedra do Conselho à meia-
tras quatro referenciadas pelos índios como relacionadas às sete entradas
hora desse ritual. Algumas
que a vila possuía. Como já ressaltou Neves (1999), apesar das entradas
mento vêem os seus ancestrais.
não serem mais usadas, os Xukuru ainda consideram as lajes sagradas,
ns Xukuru mais experientes
porém não mais realizam rituais sobre elas.
e incorporação. São eles que
do o povo Xukuru.p. 39-40 Outras pedras consideradas com este significado estão presentes em
outras localidades, como a Pedra do Rei (ou Reino) do Ororubá, a Pedra
do Vento e a do Acauã, já tendo sido a primeiras delas referenciada ante-
riormente.
Como antigo bacurau, seu Gercino, um dos mais velhos xukurus,
m se realizavam rituais. Atu-
comentou:
ão da Vila, uma parte dessa
em desuso.
essa era a primeira laje que [Antigamente] tinha que ter a flauta; tinha que ir na Pe-
João. Depois que os Xukuru dra do Conselho, Pedra do Crajéu, que foi a primeira que
o redor da vila e em frente à nós fazia a nossa devoção, quando a gente partia daqui
a laje do Patreká e a partir que ia para Vila de Cimbres, era onde a gente se acampa-
va, assim umas 9, 10, 11 horas. O pessoal de Canabrava,
inda é considerada sagrada
Pé de Serra , Oiti, Brejinho, Boa Vista, esse povo aqui ia
s pegadas de Nossa Senhora,
todo para Vila a pés.
andava com eles por Cimbres’ Tinha que ir para as Pedras em Cimbres, porque lá é que
nós recebia as ordens para nós fazer o que tinha que fa-

63
XUKURU DO ORORUBÁ

zer; recebia ordem dos antigos, doas antepassados que já acionada e sua cultura ress
tinham ido se embora. Ali tinha Luiz Romão, Zé Romão, legitimação das mesmas se
Miguel e outro, que lês eram uns homens sabidos, entendi- políticas se articularam co
dos, sabiam onde tinham as ventas; eles se concentrava e A questão à qual at
[...] os antepassados falavam através dessas pessoa [...].Se conflito interno na socied
acabar aquele conselho ali a vaca vai pro brejo, porque só lítica, composta por mora
faz ali o que mais velhos faziam; aquilo ali é um negócio jueiro. Tal fato não teria t
sério, não é brincadeira. (Gercino, 11/11/2001) como se denominam os in
reação à liderança tradicio
CONTEXTUALIZANDO AS DIVERGÊNCIAS divisão dos Xukuru; ora i
tiva”, em que o gerencia
Consideramos a pertinência dos itens até então apresentados para região oeste da terra indíg
que a partir deles possamos tecer algumas considerações sobre a orga- liderança, ora propondo o
nização social e política xukuru, sejam as relações até então construídas ritório em duas partes e q
e que dão o aspecto de unidade do grupo, sejam os critérios presentes entre as duas parcelas.
nessas relações responsáveis pela concessão das diversas formas de poder Logo, está em jogo
dentro grupo. cuja semântica está associ
O processo de territorialização é abordado por Oliveira (1993 e senta, principalmente na
1999) de maneira bastante abrangente e que nos auxilia na visualização como unificada e o contro
da forma organizativa desse grupo. A partir da percepção de um qua- ços que vêm sendo admin
dro colonial, ou de fatos históricos específicos, o autor argumenta que “a tuído pelas lideranças trad
atribuição a uma sociedade de uma base territorial fixa se constitui em Especificamente ao f
um ponto-chave para apreensão das mudanças por que ela passa, isso ção de representantes e lid
afetando profundamente o funcionamento das suas instituições e a signi- culação à qual nos referim
ficação de suas manifestações culturais”. Para tanto, Oliveira propõe que Antropologicament
a “territorialização” seja compreendida como um processo de reorgani- discutido e reinterpretado
zação social que implica: i) a criação de uma nova unidade sóciocultural de cultura como algo crist
mediante o estabelecimento de uma identidade étnica diferenciadora; ii) templar a toda a complex
a constituição de mecanismos políticos especializados; iii) a redefinição do É importante ressalt
controle social sobre os recursos ambientais; iv) a reelaboração da cultura nada pelas próprias socied
e da relação com o passado ( Oliveira, 1999, 20). eles identificados como tra
É nesse processo que nos baseamos para descrever os Xukuru, por inclusão e exclusão do seu
percebermos que a concepção que eles têm de si, a formulação da sua pró- contornos étnicos e constr
pria identidade e a instituição de seus mecanismos de tomada de decisão e
de representação estão diretamente vinculadas à trajetória dessa sociedade
indígena na regularização de seu território, em que a memória coletiva foi 7. Esta área engloba as aldeias de
Courodanta

64
“Plantaram” Xicão

doas antepassados que já acionada e sua cultura ressemantizada . O fortalecimento de lideranças e a


a Luiz Romão, Zé Romão, legitimação das mesmas se deu nesse processo, quando as novas demandas
s homens sabidos, entendi- políticas se articularam com elementos tradicionais da cultura xukuru.
ntas; eles se concentrava e A questão à qual atenta este parecer, diz respeito à eclosão de um
través dessas pessoa [...].Se conflito interno na sociedade xukuru e a estruturação de uma facção po-
ca vai pro brejo, porque só lítica, composta por moradores da Vila de Cimbres e do povoado de Ca-
m; aquilo ali é um negócio jueiro. Tal fato não teria tamanha ressonância se os Xukuru de Cimbres,
no, 11/11/2001) como se denominam os integrantes do grupo que vêm promovendo uma
reação à liderança tradicional dos Xukuru, não estivessem propondo uma
ÊNCIAS divisão dos Xukuru; ora identificando-a como uma divisão “administra-
tiva”, em que o gerenciamento dos recursos e projetos voltados para a
então apresentados para região oeste da terra indígena7 ficaria sob a responsabilidade dessa nova
nsiderações sobre a orga- liderança, ora propondo o estabelecimento de uma divisão física do ter-
ões até então construídas ritório em duas partes e que impossibilitaria o livre trânsito dos Xukuru
jam os critérios presentes entre as duas parcelas.
diversas formas de poder Logo, está em jogo a percepção do território como área contínua e
cuja semântica está associada a uma sociedade que se entende e se apre-
do por Oliveira (1993 e senta, principalmente nas relações com instituições externas ao grupo,
nos auxilia na visualização como unificada e o controle e gerenciamento dos recursos e bens de servi-
da percepção de um qua- ços que vêm sendo administrados pelo grupo hegemônico, aquele consti-
o autor argumenta que “a tuído pelas lideranças tradicionais e suas alianças.
torial fixa se constitui em Especificamente ao falarmos sobre a hegemonia e sobre a legitima-
as por que ela passa, isso ção de representantes e lideranças estaremos buscando elementos da arti-
suas instituições e a signi- culação à qual nos referimos acima: tradição e mobilização política.
anto, Oliveira propõe que Antropologicamente, o termo tradição tem sido freqüentemente
um processo de reorgani- discutido e reinterpretado no sentido de que não venha a substituir a idéia
ova unidade sóciocultural de cultura como algo cristalizado no tempo e no espaço, deixando de con-
e étnica diferenciadora; ii) templar a toda a complexidade e dinamicidade dos processos culturais.
zados; iii) a redefinição do É importante ressaltar como a idéia de “tradição” vem sendo acio-
a reelaboração da cultura nada pelas próprias sociedades em questão e o papel dos elementos por
). eles identificados como tradicionais e que acabam por nortear as idéias de
descrever os Xukuru, por inclusão e exclusão do seu grupo, assim como vão dando plasticidade aos
, a formulação da sua pró- contornos étnicos e construindo as relações sociais dentro do grupo.
mos de tomada de decisão e
à trajetória dessa sociedade
que a memória coletiva foi 7. Esta área engloba as aldeias de Cimbres, Guarda, Cajueiro, podendo ainda envolver a aldeia de
Courodanta

65
XUKURU DO ORORUBÁ

Na tentativa de perceber quais os elementos que a tradição xukuru Antes do conflito in


elenca na conformação de sua organização social e política, utilizamos as realizamos uma reunião
entrevistas realizadas com pessoas mais velhas da comunidade, indicadas dos indivíduos que estão l
pelos dois grupos divergentes, assim também como os dados já levanta- com os integrantes da par
dos em períodos anteriores. projeto de divisão da TI,
Procuramos visitar várias aldeias, inclusive aquelas em que existem Cimbres e um dos princip
os projetos objetos das queixas por parte do grupo liderado por Expedito Senhora das Graças, na al
Alves Cabral, o Biá, que está atuando como conselheiro de seu irmão, estivemos também com o
Francisco de Assis Cabral, que se identifica como cacique dos Xukuru de quinhos, e Dona Zenilda,
Cimbres. um importante papel den
anterior à morte de seu m
O contato com algumas instituições, como a EBAPE (Empresa de
Abastecimento e Extensão Rural do Estado de Pernambuco), foi de extre- Nos momentos que
ma importância para percebermos como as instituições oficiais também Pedra D’água, São José, C
estão presentes nas decisões acerca da implantação dos projetos. gueiras, Pé de Serra de S
Sucupira e Afeto.
Os depoimentos for
O Contexto
informações que vínhamo
nhamos a questão Xukur
Faz-se necessário relatar um pouco o que foi o período de coleta de
personagens da história d
dados mais recentes, pelo fato deste ter se dado em meio aos conflitos já
trajetória é capaz de dize
anunciados.
região.
O trabalho na região de Pesqueira aconteceu no momento em que
O grupo de Cimbres
uma das fazendas já reavaliadas, em 2000, pelo grupo técnico coordenado
timar através do reconhec
pela FUNAI (trata-se da maior fazenda encravada na terra tradicional dos
Xukuru, a São Severino, titulada no nome de Otávio Carneiro Leão) esta-
va sendo indenizada e, por conseguinte, liberada para ocupação dos índios. Cacique – Francisco
A tensão na região era bastante visível, principalmente ao chegar- Vice-cacique – Agna
mos na Vila de Cimbres. Na frente de cada de Expedito Cabral (Biá) es- Pajé – José Ferreira L
tava exposta uma faixa com os seguintes dizeres: “Xukurus de Cimbres
querem paz”. Conselho:
A nossa presença na área indígena se deu, como já foi dito anterior- Expedito Alves Cabr
mente, no mesmo momento em que as duas técnicas da FUNAI, incum- José Ailton Barbosa
bidas de levantar as denúncias sobre os projetos implantados na área,
estavam realizando seu levantamento. De certa forma, isto possibilitou Francisca Romão de
que entrássemos em contato com as pessoas diretamente envolvidas nos Eraldo Alves Cabral
projetos, ou pelo menos, que são habitantes da região em que os referidos
projetos estão sendo desenvolvidos.

66
“Plantaram” Xicão

tos que a tradição xukuru Antes do conflito instaurado em relação à Fazenda São Severino,
al e política, utilizamos as realizamos uma reunião na casa de Expedito Cabral, o Biá, com parte
da comunidade, indicadas dos indivíduos que estão lhe dando apoio e também, pudemos nos reunir
como os dados já levanta- com os integrantes da parcela da comunidade que se opõe à Biá e ao seu
projeto de divisão da TI, alojada na casa em que o Frei José, pároco de
e aquelas em que existem Cimbres e um dos principais mentores do projeto do Santuário de Nossa
upo liderado por Expedito Senhora das Graças, na aldeia Guarda. Após esses contatos preliminares,
conselheiro de seu irmão, estivemos também com o atual cacique xukuru Marcos Luidson, o Mar-
mo cacique dos Xukuru de quinhos, e Dona Zenilda, sua mãe e viúva do cacique Chicão, que possui
um importante papel dentro da mobilização xukuru mesmo no período
anterior à morte de seu marido.
mo a EBAPE (Empresa de
Pernambuco), foi de extre- Nos momentos que se seguiram, estivemos nas seguintes aldeias:
tituições oficiais também Pedra D’água, São José, Canabrava, Caípe, Lagoa, Pé de Serra dos No-
ção dos projetos. gueiras, Pé de Serra de São Sebastião, Curral Velho, Guarda, Cimbres,
Sucupira e Afeto.
Os depoimentos foram de máxima valia no sentido de atua-lizar as
informações que vínhamos coletando no decorrer dos anos que acompa-
nhamos a questão Xukuru, assim como no sentido de rever importantes
foi o período de coleta de
personagens da história deste grupo, lideranças tradicionais, cuja longa
o em meio aos conflitos já
trajetória é capaz de dizer muito acerca dos últimos acontecimentos na
região.
ceu no momento em que
O grupo de Cimbres vem, desde julho de 2000, procurando se legi-
grupo técnico coordenado
timar através do reconhecimento das seguintes lideranças:
da na terra tradicional dos
távio Carneiro Leão) esta-
para ocupação dos índios. Cacique – Francisco de Assis Cabral
principalmente ao chegar- Vice-cacique – Agnaldo Bezerra Sobrinho
Expedito Cabral (Biá) es- Pajé – José Ferreira Leite
es: “Xukurus de Cimbres
Conselho:
como já foi dito anterior- Expedito Alves Cabral (Biá)
cnicas da FUNAI, incum- José Ailton Barbosa
tos implantados na área,
ta forma, isto possibilitou Francisca Romão de Siqueira
retamente envolvidas nos Eraldo Alves Cabral
região em que os referidos

67
XUKURU DO ORORUBÁ

Os principais argumentos deste grupo estão voltados para as de- (1967). Na sua perspecti
núncias de que os projetos e recursos que têm entrado na área indígena para cada tipo de autorida
têm beneficiado as aldeias articuladas com a liderança hegemônica. Esta A autoridade legal s
última, que vem representando a sociedade xukuru, é composta por: básica, as leis podem ser p
procedimentos formais. A
te, mas a regras e regulam
Cacique – Marcos Luidson, (Marquinhos)
regra se deve obedecer.
Vice-cacique: Zé de Santa
A segunda, a autorid
Pajé – Pedro Rodrigues Bispo ( Zequinha) de da ordem social e de su
Os Representantes das 23 aldeias sados; o conjunto político
Uma Comissão Interna - formada por 12 membros indicados pelo no comando é o “senhor”,
cacique e pelo pajé, que atua como um conselho. tes. Todos obedecem dire
seja consagrada pela trad
são controladas pela leald
Estas lideranças não aceitam a possibilidade de que seja criada uma gação funcional em relaçã
outra forma de representatividade dos Xukuru, pois alegam que esta se-
Já a autoridade caris
ria uma manobra para promover a entrada de grupos econômicos e polí-
voção afetiva e pessoal do
ticos na terra indígena, que estariam oferecendo vantagens particulares
graça (carisma). Compree
aos membros opositores (um dos exemplos por eles citados é de que a em-
de heroísmo, poder ment
preiteira responsável pela construção da estrada Cimbres-Guarda seria de
aqui tomado dentro das
uma das principais lideranças da facção de Cimbres e de que o mesmo se
mento que este carisma te
utiliza de recursos da Prefeitura de Pesqueira para estabelecer relações de
apoio aos seus projetos) e negligenciando o caráter daquelas terras tradi- Em relação a esta ú
cionalmente ocupadas pelos Xukuru, que correspondem a uma categoria “o costume tradicional d
jurídica que não permite que sejam exploradas à revelia do próprio grupo na legalidade formal, a q
indígena e da União Federal. Além disso, estariam indo de encontro às hábito”(1967, 25). No cas
formas tradicionais dos Xukuru se organizarem ao menos quando for eli
estrutura de autoridade te
Partimos, no entanto, do pressuposto que os argumentos que po-
o carisma não é extinto de
dem esclarecer sobre a legitimidade das lideranças xukurus se encontram
forma, transferida para os
numa discussão que vai além das acusações bilaterais e estão presentes na
na é verificada através dos
análise sócio-organizativa do grupo que vem sendo construída historica-
mente.
1. Inc
dos pr
TRADIÇÃO E LIDERANÇA
carism
Estes
A referência sociológica para a temática da liderança tem sido o tra-
atribu
balho de Max Weber intitulado “Os três aspectos da autoridade legítima”

68
“Plantaram” Xicão

stão voltados para as de- (1967). Na sua perspectiva, Weber apresenta características diferentes
entrado na área indígena para cada tipo de autoridade: (a) legal, (b) tradicional e (c) carismática.
derança hegemônica. Esta A autoridade legal seria baseada na promulgação; segundo a idéia
kuru, é composta por: básica, as leis podem ser promulgadas e regulamentadas livremente por
procedimentos formais. A obediência não é devida a alguém pessoalmen-
te, mas a regras e regulamentos legais, que preceituam a quem e a que
regra se deve obedecer.
A segunda, a autoridade tradicional, baseia-se na crença da santida-
de da ordem social e de suas prerrogativas, existentes desde tempos pas-
sados; o conjunto político baseia-se em relações comunais e o indivíduo
membros indicados pelo no comando é o “senhor”, que exerce domínio sobre os “súditos” obedien-
o. tes. Todos obedecem diretamente ao “senhor” desde que sua dignidade
seja consagrada pela tradição. As relações entre o “staff ” administrativo
são controladas pela lealdade pessoal do serventuário fiel e não pela obri-
de de que seja criada uma gação funcional em relação ao cargo ou à disciplina.
, pois alegam que esta se-
Já a autoridade carismática, ainda segundo Weber, baseia-se na de-
grupos econômicos e polí-
voção afetiva e pessoal dos seguidores do “senhor” e nas dádivas de sua
do vantagens particulares
graça (carisma). Compreendem habilidades mágicas especiais, revelações
eles citados é de que a em-
de heroísmo, poder mental e de locução.Vale ressaltar que o carisma é
Cimbres-Guarda seria de
aqui tomado dentro das ciências sociais e está vinculado ao reconheci-
bres e de que o mesmo se
mento que este carisma tem.
ara estabelecer relações de
áter daquelas terras tradi- Em relação a esta última categoria, o autor ainda acrescenta que
spondem a uma categoria “o costume tradicional do “prestígio” (carisma) funde-se com a crença
à revelia do próprio grupo na legalidade formal, a qual, em última análise, também constitui um
riam indo de encontro às hábito”(1967, 25). No caso de sua existência continuada, adverte Weber,
m ao menos quando for eliminado o representante pessoal do carisma, a
estrutura de autoridade tende a entrar na rotina, e isto acontece quando
e os argumentos que po-
o carisma não é extinto de uma só vez, mas continua a existir de alguma
ças xukurus se encontram
forma, transferida para os sucessores a autoridade do “senhor”. Essa roti-
terais e estão presentes na
na é verificada através dos seguintes processos:
endo construída historica-

1. Incorporação das ordens na tradição. A autoridade


dos precedentes ocupa o lugar da criatividade do líder
carismático ou de seu pessoal na lei e na administração.
Estes precedentes protegem os sucessores ou são a eles
a liderança tem sido o tra-
atribuídos.
os da autoridade legítima”

69
XUKURU DO ORORUBÁ

2. O pessoal administrativo ou os discípulos caris-máti- da no


cos transformam-se em um “staff ” legal ou estatal, assu- futura
mindo prerrogativas internas ou as que são apro-priadas aldeia
ou atribuídas através dos privilégios. sentir
3. O significado do próprio carisma poderá sofrer uma objetiv
modificação. Decisivo, neste caso, é o modo por que se re- O cac
solver o problema da sucessão, que representa uma ques- repres
tão crítica por meios ideológicos e, com muita freqüência, orgulh
por motivos materiais. No resolvê-la, pode ocorrer a ex- lhor p
pectativa passiva de um novo mestre, “autenticado pelo nosso
carisma’ ou qualificado, a qual resultará na ativa pesquisa temos
de um sucessor, especialmente se não aparece prontamen- lideran
te um elenco capaz, e quando haja interesse acentuado todos.
pela continuidade da estrutura de autoridade. (1967, 26).
Ao perguntarmos p
Tais colocações são bastante úteis para pensarmos como tem se dado lideranças, obtivemos as s
o processo de constituição a liderança Xukuru.
No livro “Filhos da Mãe Natureza” (1997) de autoria dos professo- O prim
res xukurus e instrumento no qual se baseia o currículo diferenciado da mão d
escola xukuru, encontramos sobre o papel do cacique para eles: que; e
també
O cacique é o chefe dos povos indígenas de várias aldeias. uma li
Uma pessoa índia, de boa procedência, escolhida pelo Pajé faz po
e pela comunidade. O cacique é quem procura os recur- botam
sos para as comunidades indígenas, ele tem que ser uma Pereira
pessoa de muita coragem para lutar pelos direitos do povo
e se acaso ele errar, o Pajé pode corrigi-lo. Todos os índios Sobre como se dá a e
do nosso povo respeitam o cacique como se fosse um pai.
O cacique representa todas as comunidades e conduz a
Não é
luta pelos nossos direitos. É uma autoridade muito im-
caciqu
portante, não só para nós índios, mas também para os
aqui d
brancos.
por ou
O cacique é um líder responsável pela organização da é a na
comunidade indígena Xukuru. Para o nosso povo, ele é nião p
considerado nosso pai, porque é o mesmo quem coman- não é,

70
“Plantaram” Xicão

u os discípulos caris-máti- da nossa área, buscando recursos, para que tenhamos,


aff ” legal ou estatal, assu- futuramente, melhores condições de vida em nossas
u as que são apro-priadas aldeias. Sua força de lutar pelos nossos direitos nos faz
égios. sentir protegidos, porque o mesmo luta com um único
arisma poderá sofrer uma objetivo, que é a nossa subsistência.
so, é o modo por que se re- O cacique para nós índios, representa tudo. Além de
que representa uma ques- representar o povo Xukuru, representa um motivo de
s e, com muita freqüência, orgulho para nós, porque ele resolve tudo o que é de me-
olvê-la, pode ocorrer a ex- lhor para a nossa comunidade. O cacique tem total apoio
mestre, “autenticado pelo nosso em sua luta, até porque todo poder de decisão, nós
resultará na ativa pesquisa temos oportunidade de compartilhar, juntamnete com as
e não aparece prontamen- lideranças. Então além de representar tudo, representa
haja interesse acentuado todos.p. 63
de autoridade. (1967, 26).
Ao perguntarmos para alguns índios mais velhos sobre as antigas
sarmos como tem se dado lideranças, obtivemos as seguintes informações:

7) de autoria dos professo- O primeiro cabeção daqui, cacique, irmão do finado Ro-
currículo diferenciado da mão da Hora, do Brejinho; era chamado mesmo de caci-
acique para eles: que; era cacique na região toda, do começo ao fim, mas
também tinha as lideranças das Aldeias, todo trecho tem
ndígenas de várias aldeias. uma liderança [...] Depois foi Jardilino Pereira de Araújo;
dência, escolhida pelo Pajé faz poucos anos.[...] Jardelino morreu e ficou Antero e aí
é quem procura os recur- botamo Zé Pereira, sobrinho de Antero (primo de Toinho
enas, ele tem que ser uma Pereira.” (Gercino Balbino da Silva, 07/11/01)
utar pelos direitos do povo
corrigi-lo. Todos os índios Sobre como se dá a escolha do cacique, respondeu:
que como se fosse um pai.
comunidades e conduz a
Não é nós quem escolhe o cacique é a natureza; nossos
ma autoridade muito im-
caciques que têm entrado aqui, que tem permanecido
ios, mas também para os
aqui dentro não é nós que tira; quer dizer por uma parte,
por outra é nós e não é. Quem bota o cacique e coloca ele
ável pela organização da é a natureza. Nós tem a nossa separação, fazemos a reu-
. Para o nosso povo, ele é nião para cacique, então, a natureza fala quem é quem
é o mesmo quem coman- não é, às vezes porque nós também temos nossa experi-

71
XUKURU DO ORORUBÁ

ência e nossa ciência, nós mais ou menos já sabe quem é. Mesmo considerand
E quando no dia de apresentar o cacique, nós já está sa- nas categorias apresentad
bendo. Precisa de que nós faz a reunião e vamo colocando a toda sociedade, suas pre
e vamo representando e vamo levando ele, levando ele os valores que estão na ba
até quando ele chega ao ponto de cacique. O material até então
cique Francisco de Assis A
A participação nesse processo de escolha do cacique, se dá através - tem um papel marcante
dos índios mais velhos, especificamente, aqueles que têm a “ciência”. So- à liderança dos Xukuru fo
bre quem seriam essas pessoas, foi esclarecido: anteriores. Os critérios pre
da “ciência” da natureza,
índios mais velhos, mais
Aqui tem muito pouco, quer dizer tem pouco porque capacidade de entremear
os mais velhos morreram. Tem o pajé, Zequinha; o pajé tados, os espíritos dos ant
aponta [o novo cacique] e nós faz carreira com ele, des- de sua “formação até qua
viando, apontando, explicando, dando as explicações, ou seja, à maturidade ne
como faz, como não faz, explicando a ele direitinho [o como representante, mas
indicado] até ele chegar ao normal; chegou ao normal, aí comunidade.
tem uma festa, dia da representação dele.[...]
Destacamos a figura
Foi assim que Marquinhos foi eleito. O finado Chicão di-
morte, fica claro que a au
zia: ‘eu sei que eu vou um dia, não sei qual o dia que eu
muito próxima ao modelo
vou, mas eu sei que vou, mas quando eu me for que vocês
a se fundir com aquela de
me aplantarem, eu vou nascer e quando eu nascer, quan-
do eu nascer, eu entrego para vocês’; a gente já entendia Os caciques anterior
mais ou menos quem era que queria ser que ele ficasse morreram de “morte nat
como cacique. comunidade.
Exceção é o caso de Z
posto por não correspond
E continua: das reivindicações pela reg
A definição do suce
O cacique de dentro da aldeia, ele não é botado co como mente conturbado para o
a gente pega uma pedra daqui e bota ali não, é não. A Marquinhos, atual caciqu
gente tem que fazer a escolha pra ver e pedir licença a da nova liderança contem
rainha da natureza, se dá ou não dá ou se pode conseguir os riscos diante da socied
ou não pode, se ela liberar, ela [...] nosso antepassados, por Weber, a qual nos ref
nós bota ele; Também, se não der licença, ninguém bota, foi extinto de uma só vez,
porque não pode, tem que fazer o que a natureza manda. cão tornou-se uma figura
simbólico xukuru.

72
“Plantaram” Xicão

ou menos já sabe quem é. Mesmo considerando a dificuldade em se identificar as lideranças


o cacique, nós já está sa- nas categorias apresentadas por Weber, devido à dinâmica social inerente
reunião e vamo colocando a toda sociedade, suas premissas são importantes para compreendermos
levando ele, levando ele os valores que estão na base da constituição da autoridade xukuru.
de cacique. O material até então coletado demonstra que, primeiramente, o ca-
cique Francisco de Assis Araújo – o Chicão, assassinado em 20/05/1988
do cacique, se dá através - tem um papel marcante na história do grupo; o processo que o conduziu
s que têm a “ciência”. So- à liderança dos Xukuru foi semelhante àqueles ocorridos com os caciques
anteriores. Os critérios preponderantes estão associados ao conhecimento
da “ciência” da natureza, atribuição dada a alguns índios, e também aos
índios mais velhos, mais experientes, que acabam por desenvolver esta
dizer tem pouco porque capacidade de entremear a experiência com os ensinamentos dos encan-
m o pajé, Zequinha; o pajé tados, os espíritos dos antepassados e acompanhar o cacique no período
faz carreira com ele, des- de sua “formação até quando se considera que ele chegou ao “normal”,
o, dando as explicações, ou seja, à maturidade necessária para desempenhar seu papel político,
cando a ele direitinho [o como representante, mas também como um conselheiro dentro de sua
mal; chegou ao normal, aí comunidade.
tação dele.[...]
Destacamos a figura do cacique Chicão pelo fato de que com a sua
leito. O finado Chicão di-
morte, fica claro que a autoridade até então constituída pelos Xukuru,
não sei qual o dia que eu
muito próxima ao modelo de “autoridade tradicional” de Weber, começa
uando eu me for que vocês
a se fundir com aquela denominada de “autoridade carismática”.
e quando eu nascer, quan-
vocês’; a gente já entendia Os caciques anteriores haviam saído de cena no momento em que
queria ser que ele ficasse morreram de “morte natural”, que se deram de forma já esperada pela
comunidade.
Exceção é o caso de Zé Pereira, que antecedeu o Chicão, que foi de-
posto por não corresponder ao perfil exigido naquele momento do início
das reivindicações pela regularização do território xukuru.
A definição do sucessor de Chicão se deu num período extre-ma-
ele não é botado co como mente conturbado para os Xukuru e demorou mais de um ano para que
i e bota ali não, é não. A Marquinhos, atual cacique e filho de Chicão fosse apresentado. A escolha
pra ver e pedir licença a da nova liderança contemplava mais do que nunca a responsabilidade e
o dá ou se pode conseguir os riscos diante da sociedade envolvente e assume a “rotina” destacada
a [...] nosso antepassados, por Weber, a qual nos referimos anteriormente. Ou seja, o carisma não
er licença, ninguém bota, foi extinto de uma só vez, mas continuou a existir de alguma forma. Chi-
r o que a natureza manda. cão tornou-se uma figura mítica de extrema importância para o universo
simbólico xukuru.

73
XUKURU DO ORORUBÁ

Dona Marcionila, que, devido a sua idade avançada, não sai muito A cren
de sua residência na aldeia Caldeirão expressa bem esse sentimento dos funda
Xukuru ao afirmar que um dos seus desejos antes de morrer é “espiar o ticular
túmulo do Chicão”. Como
Seu túmulo, na Pedra d’Água, veio a reforçar o caráter sagrado aquele
daquela localidade, assim como veio a enfatizar o que poderíamos até no ‘ha
chamar do “encantamento” do seu líder assassinado; processo pelo qual virtud
passou a constituir uma entidade espiritual que veio a compor o conjunto uma c
dos ancestrais que tinham “ciência” e que continuam, mesmo num outro que est
plano de existência, a orientar, ditar e aconselhar a vida dos encarnados. comun
nidad
Mesmo antes de sua morte, ele mesmo colocava que quando che-
gasse o seu dia , ele seria “plantado” e quando estivesse na hora certa,
transmitiria as direções necessárias na conformação do seu sucessor. OS PONTOS DE T
Desta forma, seu filho, o Marquinhos, foi escolhido como liderança
tendo como base o arcabouço do simbolismo da tradição xukuru, através 1. Liderança: legiti
do qual, se tenta assegurar o caráter tradicional-carismático da autorida-
de instaurada por Chicão, transmitida simbolicamente a ele pelo cocar Obviamente, as tens
que passou a usar a partir do dia 06 de janeiro de 2000, quando , durante ranças não podem ser ne
a festa de Reis na Pedra D’Água, foi apresentado como cacique Xukuru. grande preocupação dos í
Este cocar foi um presente recebido por Chicão em uma de suas viagens de antigas práticas religio
visando articulações com os movimentos indígenas nacionais e passou a o uso de alguns adereços r
ser um emblema de sua autoridade austera. sígnias da identidade xuk
Conforme várias passagens deste trabalho, argumentamos que a a flauta (o mibim) como o
constituição do campo intersocietário se dá no processo de (re)elaboração durante o toré.
e (re)reconstrução histórica dos grupos sociais. Assim, ao lidarmos com Segundo alguns rela
a categoria de liderança tradicional-carismática estamos entendendo a e com muita facilidade in
mesma como diretamente vinculada aos processos políticos vivenciados penas, hoje já amplament
e, portanto, longe de ser percebida como atributo primordial8. bém apresentam a preocu
Tal perspectiva já fica explícita quando Weber apresenta a possibi- ais, que consideram estar
lidade de alteração que o significado do “carisma” pode sofrer e é ainda namoros durante a sua pr
reforçada quando ele articula, em sua obra, as idéia de comunidades polí- Tais situações de con
ticas e comunidades étnicas, conforme apresentamos abaixo: um grupo indígena tem s
os Xukuru, por um proc
cujos desdobramentos se d
8. Em item a seguir, utilizamos a abordagem do italiano Alberto Melucci que associa a constitui-
ção de lideranças às ‘ações coletivas’, no sentido de nos distanciarmos do caráter naturalizado e No caso Kambiwá/P
primordialista das autoridades. por Barbosa (2001), tal d

74
“Plantaram” Xicão

e avançada, não sai muito A crença na afinidade de origem – seja esta objetivamente
bem esse sentimento dos fundada ou não – pode ter conseqüências importantes, par-
ntes de morrer é “espiar o ticularmente para a formação de comunidades políticas.
Como não se trata de clãs, chamaremos de ‘grupos étnicos’
eforçar o caráter sagrado aqueles grupos humanos que, em virtude de semelhanças
ar o que poderíamos até no ‘habitus externo ou nos costumes, ou em ambos, ou em
inado; processo pelo qual virtude de lembranças de colonização e migração, nutrem
veio a compor o conjunto uma crença subjetiva na procedência comum, de tal modo
nuam, mesmo num outro que esta se torna importante para a propagação de relações
ar a vida dos encarnados. comunitárias, sendo indiferente se existe ou não uma comu-
nidade de sangue efetiva. (2000: 270)
olocava que quando che-
o estivesse na hora certa,
ação do seu sucessor. OS PONTOS DE TENSÃO
escolhido como liderança
a tradição xukuru, através 1. Liderança: legitimidade e faccionalismo
l-carismático da autorida-
icamente a ele pelo cocar Obviamente, as tensões latentes no campo da legitimação das lide-
e 2000, quando , durante ranças não podem ser negligenciadas, principalmente, porque há uma
do como cacique Xukuru. grande preocupação dos índios mais velhos em garantir a sobrevivência
o em uma de suas viagens de antigas práticas religiosas, como a prática do toré nas pedras sagradas,
genas nacionais e passou a o uso de alguns adereços ritualísticos que também exercem o papel de in-
sígnias da identidade xukuru, como a “barretina”, a “farda” ( ver foto ), e
ho, argumentamos que a a flauta (o mibim) como o principal instrumento para “puxar”os toantes
processo de (re)elaboração durante o toré.
Assim, ao lidarmos com Segundo alguns relatos, “os mais jovens” não têm essa preo-cupação
ca estamos entendendo a e com muita facilidade incorporam elementos externos, como cocares de
ssos políticos vivenciados penas, hoje já amplamente em uso entre os Xukuru. Os mais velhos tam-
uto primordial8. bém apresentam a preocupação em garantir o clima de respeito dos ritu-
Weber apresenta a possibi- ais, que consideram estar sendo banalizados ao permitir “brincadeiras” e
ma” pode sofrer e é ainda namoros durante a sua prática.
déia de comunidades polí- Tais situações de confronto entre concepções de cultura dentro de
tamos abaixo: um grupo indígena tem se dado em outras sociedades que passam, como
os Xukuru, por um processo de reafirmação de suas fronteiras étnicas,
cujos desdobramentos se dão das mais diferentes formas.
to Melucci que associa a constitui-
ciarmos do caráter naturalizado e No caso Kambiwá/Pipipã, por exemplo, detalhadamente descrito
por Barbosa (2001), tal desdobramento se deu no sentido de uma cisão

75
XUKURU DO ORORUBÁ

entre duas partes do referido grupo que aconteceu depois de uma série de Comissão Interna, esta úl
eventos incluindo a participação da própria FUNAI. Neste caso, além do cique e pelo pajé), assim t
reconhecimento por uma identidade diferenciada, está também presente posto pelo seu vice-caciqu
o pleito pela regularização de uma área, a Serra Negra, onde realizam na sede da FUNAI em Re
seus rituais religiosos e que não foi incorporada no território. A cisão, no suas terras.
entanto, mesmo considerando todos os discursos que problematizam esse Porém, afirma que “
desfecho para os Kambiwá/Pipipã, assegurou por parte dos dois segmen- tro mesmo, não tem divi
tos o reconhecimento mútuo de suas lideranças; a cisão significou a ins- continua:
tauração não apenas de uma nova ordem política e de poder, mas de um
“embate de culturas” em que a disputa se dá por diferentes concepções do
que seria cada “cultura”. “[...]
divisão
No caso dos Xukuru, o que se pode perceber é que a discussão so-
disso n
bre o problema da sua cultura “tradicional”- que se dá entre diferentes
toré lá
gerações dos índios e não entre áreas geográficas da TI-, problemática
divisão
esta já identificada em períodos de pesquisa anteriores com os Xukuru,
está sendo utilizada, em parte, por indivíduos que pleiteiam o reconhe-
cimento dos “Xukuru de Cimbres” como um grupo à parte, no sentido Seu Severino Joaqui
de se tentar legitimar uma possível divisão; porém, os outros argumentos afirma que lá “É um povo
apresentam uma disputa de poder interno que também indicam as ar- não tem como haver conc
ticulação e interesses presentes nessa situação, que são de outra ordem. Outra questão intere
Nas entrevistas realizadas em várias localidades, pudemos muitas da com a forma que receb
vezes identificar pontos de preocupação, seja porque o cacique xukuru já apontamos anteriorme
atual ainda está passando pelo processo de amadurecimento de sua au- agências, como vimos trat
toridade, porém já previsto pela forma como tem se dado a escolha dessa FUNAI, Igreja, etc se dá n
liderança, seja pelo anúncio da “nomeação” de um outro cacique xukuru. rio em questão (OLIVEIR
O interessante é notar que mesmo no discurso das duas partes em e sobrinho de seu sucessor
conflito está presente a idéia de unidade do grupo. pelo chefe de posto daqu
1974 e 1983), para ir a um
O cacique que antecedeu a Chicão, José Pereira (58 anos), mora-
partir deste momento assu
dor da aldeia Canabrava9, localizada no lado oposto à Vila de Cimbres,
apresentou suas queixas em relação à falta de destinação de recursos para Seu Gercino, sobre o
a sua aldeia, alegando que outras núcleos populacionais estavam sendo
priorizados de acordo com a indicação das lideranças atuais (cacique e a Hoje,
deia n
9. A aldeia Canabrava é um importante foco da identidade xukuru. Além de ser uma das aldeias o negó
mais populosas,antes da reapropriação da Pedra D’Água, as decisões políticas se concentravam um oc
ali. Até nos dia atuais mora em Canabrava o pai de Chicão, Cícero Pereira, e o pajé xukuru, seu
Zequinha. pode s

76
“Plantaram” Xicão

ceu depois de uma série de Comissão Interna, esta última formada por 12 índios indicados pelo ca-
NAI. Neste caso, além do cique e pelo pajé), assim também como em relação à maneira que foi de-
da, está também presente posto pelo seu vice-cacique, o Chicão, depois de ter feito várias incursões
rra Negra, onde realizam na sede da FUNAI em Recife e em Brasília para exigir a regularização de
a no território. A cisão, no suas terras.
os que problematizam esse Porém, afirma que “dividir a aldeia, é índio com índio daqui de den-
or parte dos dois segmen- tro mesmo, não tem divisão não, a gente anda de uma para outra”. E
s; a cisão significou a ins- continua:
ca e de poder, mas de um
r diferentes concepções do
“[...] eles [o grupo que propõe a divisão] falaram dessa
divisão de Courodantas para lá, mas nunca me lembrei
eber é que a discussão so-
disso não, meus avô nunca contou isso não e dançava o
que se dá entre diferentes
toré lá na Vila de Cimbres os daqui e nunca teve essa
cas da TI-, problemática
divisão não, tá falando nisso agora”.
nteriores com os Xukuru,
que pleiteiam o reconhe-
grupo à parte, no sentido Seu Severino Joaquim Neto, morador da Vila de Cimbres também
ém, os outros argumentos afirma que lá “É um povo só, foi tudo criado junto”, apesar de achar que
e também indicam as ar- não tem como haver conciliação entre os grupos divergentes.
que são de outra ordem. Outra questão interessante apresentada por Zé Pereira é a relaciona-
lidades, pudemos muitas da com a forma que recebeu o cargo de cacique e que vem reforçar o que
porque o cacique xukuru já apontamos anteriormente, que a presença e a ação de instituições, ou
madurecimento de sua au- agências, como vimos tratando dentro da literatura antropológica, como
m se dado a escolha dessa FUNAI, Igreja, etc se dá nas mais diversas esferas do campo intersocietá-
um outro cacique xukuru. rio em questão (OLIVEIRA, 1988). Como neto.do antigo cacique Antero
curso das duas partes em e sobrinho de seu sucessor, o Jardelino, foi convidado (após a morte do tio)
po. pelo chefe de posto daquela ocasião, Geraldo Vieira (que lá atuou entre
1974 e 1983), para ir a uma reunião indígena em Palmeiras dos Índios e a
Pereira (58 anos), mora-
partir deste momento assumiu o papel de cacique dos Xukuru .
oposto à Vila de Cimbres,
estinação de recursos para Seu Gercino, sobre o assunto afirmou:
ulacionais estavam sendo
ranças atuais (cacique e a Hoje, já estou velho, mas nunca vi dois caciques em al-
deia nenhuma... O petrificado é o cacique é o verdadeiro;
ukuru. Além de ser uma das aldeias o negócio de vice-cacique é que às vezes o cacique está
ecisões políticas se concentravam um ocupado muito grande, aí tem o outro.O cacique não
cero Pereira, e o pajé xukuru, seu
pode sair no dia que ele quer. [...] Não existia divisão en-

77
XUKURU DO ORORUBÁ

tre Cimbres e Canabrava.[...] Ouvia os mais velhos con- A questão em si não


tarem: uma aldeia pode ser da aldeia que for, mas não agências “de contato”10 o
pode ter dois caciques, só pode ser uma cacique só. mente delas para conduzi
As decorrências des
Existe uma grande preocupação principalmente no que tange às dimensão que o faccionali
instituições voltadas para a intervenção direta nos grupo indígenas, com promovido pela FUNAI e
a temática do faccionalismo, como se a existência de divergências inter- importantes abordagens.
nas fosse de encontro a uma idéia de pretensa unidade, o que coincidiria Adolfo Neves, por e
com o que está presente no imaginário popular: comunidades indígenas está presente nessa coletân
seriam livres de contradições e tensões internas, se aproximando do “bom
selvagem” de Rousseau.
O term
Sobre este aspecto, ao abordar o termo “comunidade”, Hans públic
Joas (2001) afirma que e difer
des de
no discurso moral e político americano, ‘comunidade’ que o c
ainda é – como foi observado por Robert Bellah e seu entend
grupo em entrevistas – ‘um tipo de palavra muito espe- própri
cial que sempre significa algo de bom.’Termos como ‘fac- – ou a
ção’, ‘agregado’ou ‘enclave de estilo de vida’são usados nificad
na literatura sociológica se os autores tendem a negar os cacife
aspectos positivos de ‘comunidade’... p. 95 de bar
suas re
nista,
Diferente dessa perspectiva, consideramos que o que parece à pri- possibi
meira vista como desassociação, como Simmel já ressaltou, é, na verda-
de, uma de suas formas elementares de socialização (1983, 128). Pre-
tendemos, como em trabalho anterior (FIALHO, 1998), dar ao campo Consideramos que e
intersocietário em questão a dinamicidade que lhe cabe, reconhecendo principais problemas dec
as potencialidades do grupo, suas elaborações e sua capacidade de inter- Xukuru dizem respeito à
ferir e reinterpretar situações e definir suas necessidades. Nesses campos, as esferas de poder regiona
os “conflitos fazem parte da estrutura social, cujo equilíbrio atual está vos adotados pelo próprio
marcado por aquilo que costumamos normalmente chamar de desajusta- Devido às práticas tu
mentos” (GLUCKMAN, 1987, 261). grupos indígenas, docum

10. Por agências de contato ente


intersocietário e, por conseguinte

78
“Plantaram” Xicão

Ouvia os mais velhos con- A questão em si não é a existência das divergências, mas como as
a aldeia que for, mas não agências “de contato”10 oficiais e não-oficiais se utilizam conveniente-
ser uma cacique só. mente delas para conduzir suas ações.
As decorrências dessa prática no Nordeste já atingiram tamanha
palmente no que tange às dimensão que o faccionalismo já foi objeto de discussão de um workshop
nos grupo indígenas, com promovido pela FUNAI em 1988, cuja publicação resultante nos fornece
ncia de divergências inter- importantes abordagens.
unidade, o que coincidiria Adolfo Neves, por exemplo, cujo trabalho sobre os Xukuru-Kariri
r: comunidades indígenas está presente nessa coletânea, afirma que:
se aproximando do “bom
O termo faccionalismo, tal como tem sido usado pelos órgãos
mo “comunidade”, Hans públicos afetos à questão indígena no país, engloba várias
e diferentes práticas, sendo o delineamento das especificida-
des de cada uma necessário ao trato da questão. Acredito
americano, ‘comunidade’ que o caráter faccional do faccionalismo indígena, tal como
por Robert Bellah e seu entendido pela FUNAI, é construído muitas vezes com seu
po de palavra muito espe- próprio concurso, dotando os grupos envolvidos no mesmo
e bom.’Termos como ‘fac- – ou alguns deles – de possibilidades de atuação e de sig-
estilo de vida’são usados nificados que são passíveis de apropriação e conversão em
utores tendem a negar os cacife político por parte destes grupos, alterando seu poder
ade’... p. 95 de barganha e persuasão tanto em nível da dinâmica de
suas relações internas quanto ante o próprio órgão indige-
nista, que contribuiu originalmente para a geração de tais
os que o que parece à pri- possibilidades e significados. (2000: 99)
já ressaltou, é, na verda-
lização (1983, 128). Pre-
HO, 1998), dar ao campo Consideramos que este é o ponto mais delicado da questão, pois os
e lhe cabe, reconhecendo principais problemas decorrentes que tomamos conhecimento do caso
e sua capacidade de inter- Xukuru dizem respeito à atuação do poder local, e suas articulações com
essidades. Nesses campos, as esferas de poder regional e nacional, e dos procedimentos administrati-
cujo equilíbrio atual está vos adotados pelo próprio órgão indigenista.
ente chamar de desajusta- Devido às práticas tutelares desenvolvidas historicamente junto aos
grupos indígenas, documentos emitidos pelos representantes do órgão

10. Por agências de contato entendemos todas as instituições que estão presentes no campo
intersocietário e, por conseguinte, interagindo com os Xukuru.

79
XUKURU DO ORORUBÁ

indigenista e de seus técnicos são rapidamente ressemantizados, adqui- Esta percepção de a


rindo o que o sociólogo francês Pierre Bourdieu (1989) denominou de mos entrevista na Vila de
poder do “REX”, ou seja, o efeito simbólico exercido por um discurso sidente.
especializado (seja esta “especialização” uma atribuição legitimada pelas Seu Severino Joaquim
instâncias burocráticas) ao consagrar um estado das divisões e da visão apóia a divisão dos Xukur
das divisões. Os critérios objetivos, notadamente aqueles reconhecidos to, desde que atualmente
pelas instâncias oficiais, são utilizados como armas nas lutas simbólicas Vila, que antes, segundo
pelo conhecimento e pelo reconhecimento. qual, o Chicão assumiu o
Nos momentos em que estivemos em Pesqueira acompanhando Dizendo-se “escante
de perto o campo das divergências e mesmo em reunião em Recife, na reivindicações pela regula
sede da Procuradoria Geral da República em Pernambuco, observamos teve mais espaço, afirma:
que os documentos produzidos pela FUNAI nos momentos críticos do
conflito, estavam sendo acionados e estrategicamente interpretados para
legitimar uma das facções. Como exemplo, podemos citar o documento Fui eu
emitido pelo Administrador Regional que autorizava o chefe de posto a o filho
cumprir um dia de serviço na Vila de Cimbres, o fato do índio que lidera sentan
o grupos dissidente, o Expedito Cabral ter sido nomeado pela Prefeitura manip
de Pesqueira como pessoa responsável por uma “secretaria especial para era um
assuntos indígenas”. O que pode parecer, inicialmente, uma medida ad- as cois
ministrativa para dirimir o clima de tensão na região, acaba constituindo
um artifício para alimentá-lo. A referência ao primeiro documento foi Seu Severino também
utilizada como elemento legitimador de uma da facção que tenta se fir- des não aceitas por ele, co
mar como autoridade na Vila de Cimbres. do pároco de Cimbres dur
Outra estratégia nesse sentido tem sido a discussão em torno da Prefeitura de Pesqueira em
legitimidade da liderança que, junto ao INSS, vai atestar a identidade manda o padre; índio nun
indígena de indivíduos com o propósito de se conceder a “aposentado- de autoridade legal que ch
ria especial”. Qualquer documento emitido, no momento, sem a análise cita, quando este entrevis
prévia dos possíveis desdobramentos, poderá ter um fim além daquele estar necessariamente rela
explicitamente proposto no seu texto. ticas apresentadas anterio
Nessas situações, percebemos que se aciona a possibilidade de asse-
gurar uma autoridade com as características que Weber, como já colocado 2. Projetos
anteriormente , designava como “autoridade legal”, aquela regulamenta-
da por procedimentos formais, dando-se a obediência não à alguém pes- Como já colocado n
soalmente, mas a regras e regulamentos legais, que preceituam a quem e do com a possibilidade de
a que regra se deve obedecer. aldeias Cimbres e Guarda
diversas fontes estavam se
vizinhança do local de mo

80
“Plantaram” Xicão

e ressemantizados, adqui- Esta percepção de autoridade foi também emitida quando realiza-
eu (1989) denominou de mos entrevista na Vila de Cimbres com um dos membros do grupo dis-
exercido por um discurso sidente.
ribuição legitimada pelas Seu Severino Joaquim Neto, também conhecido como “Boião”, que
do das divisões e da visão apóia a divisão dos Xukuru, faz muitas queixas em relação ao grupo opos-
nte aqueles reconhecidos to, desde que atualmente se vê linhas de xangô e maracá nas festas da
rmas nas lutas simbólicas Vila, que antes, segundo ele, não existia, assim como a forma através da
qual, o Chicão assumiu o papel de cacique.
Pesqueira acompanhando Dizendo-se “escanteado”, pois afirma ter acompanhado o início das
em reunião em Recife, na reivindicações pela regularização fundiária e após a posse de Chicão não
Pernambuco, observamos teve mais espaço, afirma:
nos momentos críticos do
mente interpretados para
demos citar o documento Fui eu que arrumei a demarcação junto com eles; com
orizava o chefe de posto a o filho, não é tão mal, só que ele colocou muito repre-
o fato do índio que lidera sentante. [...] Não tenho o que dizer dele, ele está sendo
nomeado pela Prefeitura manipulado pelos representantes todinhos [...] Chicão
a “secretaria especial para era uma pessoa boa, os representantes é que vão dizer
almente, uma medida ad- as coisas.
egião, acaba constituindo
primeiro documento foi Seu Severino também afirmou que o “outro grupo” tem tido atitu-
da facção que tenta se fir- des não aceitas por ele, como, por exemplo, ir de encontro às orientações
do pároco de Cimbres durante as realizações da missa e criticar a ação da
a discussão em torno da Prefeitura de Pesqueira em Cimbres. Sobre isso ele acrescenta: “Na Igreja
, vai atestar a identidade manda o padre; índio nunca se meteu contra prefeito aqui”. Esse caráter
conceder a “aposentado- de autoridade legal que chamamos atenção no momento, fica bem explí-
o momento, sem a análise cita, quando este entrevistado se refere ao cacique como “federal”, sem
ter um fim além daquele estar necessariamente relacionado às características tradicional-carismá-
ticas apresentadas anteriormente.
na a possibilidade de asse-
e Weber, como já colocado 2. Projetos
gal”, aquela regulamenta-
diência não à alguém pes- Como já colocado no início desse relatório, o conflito foi deflagra-
que preceituam a quem e do com a possibilidade de estabelecimento de um projeto na região das
aldeias Cimbres e Guarda e na acusação de que os recursos advindos de
diversas fontes estavam sendo desviados para priorizar as áreas da circun-
vizinhança do local de moradia do cacique até então legitimado.

81
XUKURU DO ORORUBÁ

É mister se esclarecer alguns pontos: a) os projetos, então alvo das lecion


denúncias, se deram em áreas em que havia disponibilidade de terras; b) a índios
restrição da área em que os projetos estavam sendo aplicados se dava ba- que fa
seada na metodologia dos próprios projetos. Aquele, por exemplo, sob a A adm
responsabilidade da EBAPE, teve, inclusive, a participação de técnicos de dade i
outras instituições e da própria FUNAI no estabelecimento dos critérios as qua
para a escolha das aldeia em que se dariam sua efetivação. Nesse sentido, dos pr
podemos citar os seguintes trechos do referido projeto: As ava
visand
Na elaboração deste projeto foi utilizada a metodologia equipe
participativa, onde uma equipe composta por técnicos PE e F
da EMATER-PE, da sede e da regional, da UFPE e da senso
FUNAI, deslocaram-se até o município de Pesqueira dos re
com a finalidade de iniciar os primeiros contatos com a
Prefeitura Municipal e com o Cacique Francisco de Assis Nosso objetivo ao ap
Araújo. A partir disto foi relaizado um estudo de levan- peito à necessidade de ind
tamento na área indígena, seguindo-se uma reunião com não pode ser analisado at
os representantes das aldeias e, posteriormente, partiu-se naturalizado em percepçõ
para a elaboração do projeto técnico. fato de projetos, como o r
por profissionais de vários
Os trabalhos a serem executados durante o horizonte tem- do Estado etc, não os ise
poral de três anos, serão coordenados, no Estado, pela execução de seus propósit
Secretaria de Agricultura de Pernambuco e a execução decorrentes de sua prática
será realizada, em parceria, pela EMATER-PE, IPA, Temos, antes de tud
UFPE, como órgão prestadores de assistência técnica , a lou, para o fato de que a
FUNAI e a Prefeitura Municipal de Pesqueira como ór- mente integrada” (ARCE
gãos de apoio administrativo e logístico.[...]. (Projeto de faccional é decorrente de
apoio às atividades produtivas agropecuárias para a tribo permeiam as relações as q
Xukuru, 1997). po situacional sócio-políti
A organização socia
No decorrer do texto, o projeto vai sendo explicitado, indicando que que se articulam com as r
seriam implantadas seis “Unidades Demonstrativas” (pinha, coco, mara- as formas hierárquicas de
cujá, café, minhocultura e confecção de renda de renascença) e continua: belecidas.
Ao tentar entender
Estas Unidades Demonstrativas serão utilizadas no pro- mos que visualizar as dem
cesso de capacitação dos indígenas das cinco aldeias se-

82
“Plantaram” Xicão

s projetos, então alvo das lecionadas e, posteriormente, para capacitar os demais


ponibilidade de terras; b) a índios agricultores e familiares das outras dezoito aldeias
ndo aplicados se dava ba- que fazem parte da tribo Xukuru.[...]
quele, por exemplo, sob a A administração do projeto será realizada pela comuni-
participação de técnicos de dade indígena através de suas vinte e três representações,
abelecimento dos critérios as quais reunem-se mensalmente para análises e soluções
efetivação. Nesse sentido, dos problemas.
projeto: As avaliações acorrerão [sic] em todas as fases do Projeto,
visando seu aperfeiçoamento, e ficarão a cargo de uma
oi utilizada a metodologia equipe técnica composta pela EMATER-PE, IPA, UFR-
pe composta por técnicos PE e FUNAI, a qual tomará as decisões através de con-
a regional, da UFPE e da senso de acordo com o processo participativo após análise
município de Pesqueira dos resultados alcançados durante cada trimestre.
primeiros contatos com a
Cacique Francisco de Assis Nosso objetivo ao apresentar as considerações supracitadas diz res-
zado um estudo de levan- peito à necessidade de indicar que o problema do faccionalismo Xukuru
uindo-se uma reunião com não pode ser analisado através de um viés substancializado, como algo
posteriormente, partiu-se naturalizado em percepções idiossincráticas dos grupos em oposição. O
cnico. fato de projetos, como o referido acima, ter sua equipe técnica composta
por profissionais de vários órgãos, como Universidade, FUNAI, Governo
s durante o horizonte tem- do Estado etc, não os isenta das articulações políticas que viabilizam a
denados, no Estado, pela execução de seus propósitos e das responsabilidades dos desdobramentos
Pernambuco e a execução decorrentes de sua prática.
ela EMATER-PE, IPA, Temos, antes de tudo, que estar atentos como Wetheim já assina-
de assistência técnica , a lou, para o fato de que a “sociedade nunca é uma entidade completa-
ipal de Pesqueira como ór- mente integrada” (ARCE & LONGMAN, 2000) e de que “o processo
logístico.[...]. (Projeto de faccional é decorrente de estratégias e de flexibilização de barganha que
agropecuárias para a tribo permeiam as relações as quais envolvem atores sociais presentes no cam-
po situacional sócio-político” (Secundino, 2000: 106).
A organização social é, pois, um jogo de confluências e demandas
explicitado, indicando que que se articulam com as relações de parentesco, vizinhança, compadrio e
tivas” (pinha, coco, mara- as formas hierárquicas de prestígio e posições socioeconomicamente esta-
e renascença) e continua: belecidas.
Ao tentar entender o processo que hoje se dá com os Xukuru, te-
as serão utilizadas no pro- mos que visualizar as demandas políticas presentes num espaço físico de
enas das cinco aldeias se-

83
XUKURU DO ORORUBÁ

disputas, em que a domínio territorial dos índios significa um obstáculo Cimbres à atividade turís
para as relações de poder político e econômico presentes no município centivos à adaptação das
de Pesqueira e a atuação das agências nesse complexo vem a destacar a hospedagem de natureza
complexidade da questão. No texto dessa prop
A análise realizada por Secundino para o caso Fulni-ô, é muito per- tão que merece cuidados
tinente para a questão aqui tratada ao afirmar que mos para a instalação do
do projeto e a necessidad
sociais e culturais daquela
o campo instaurado pelo processo de faccionalismo é gerado
por conflitos e disputas que produzem lideranças as quais É muito importante
vão desempenhar o papel de mediadores com diversos agen- síveis benefícios para a po
tes e pólos institucionais e intermediação de bens e serviços, Guarda, localizada muito
bem como de forças políticas através de arremate de votos. genciada. A situação dos
(2000, 106) um quadro de saúde basta
baixa visão e doenças men
para tratar a questão.
No caso Xukuru, tem ficado muito explícita a disputa pelo poder
Essa afirmação se dá
de “administrar” os recursos que chegam na área, assim também como
autoria e intitulado “As Fr
indicam a preocupação com a manutenção das relações que defendem
resultante de dissertação
posições, no mínimo, problemáticas para os Xukuru, como é o caso da
que, já naquele momento
ampliação do Santuário de Nossa Senhora das Graças.
implantação do projeto de
No próprio projeto apresentado pela Agência de Desenvolvimento Graças. Um de seus trech
Econômico de Pernambuco S.A., datado de junho de 1998, para a conso- José, pároco de Cimbres n
lidação do município de Pesqueira como pólo turístico através da estru- da referida ampliação, den
turação do Santuário, está presente a necessidade de adoção das seguintes da Área e da Infra-estrutu
providências: propostas para garantir o
colhimento” do santuário
[...] obtenção de consenso sobre interesses existentes na outro local. Segundo ele:
região, relativos à questão fundiária na área e à sua explo-
ração; definição das providências necessárias à legislação [...]no
da área, com propriedade e posse definidas; realização lizada
de um projeto amplo e detalhado para a implantação do tempos
Santuário, que considere os aspectos físicos, sociais, am- ra são
bientais e culturais ( grifos nossos). verdad
viciad
do esm
O documento ainda apresenta a necessidade de definir medidas Eles p
emergentes voltadas para, entre outras coisas, “adequação da Vila de para e

84
“Plantaram” Xicão

os significa um obstáculo Cimbres à atividade turística; o desenvolvimento de uma política de in-


o presentes no município centivos à adaptação das propriedades rurais existentes, como meios de
mplexo vem a destacar a hospedagem de natureza rural...”.
No texto dessa proposta pode-se perceber que se trata de uma ques-
caso Fulni-ô, é muito per- tão que merece cuidados especiais no que tange à legalidade e formalis-
que mos para a instalação do projeto, a falta de consenso sobre a viabilidade
do projeto e a necessidade de se atentar para as especificidades também
sociais e culturais daquela área.
o de faccionalismo é gerado
duzem lideranças as quais É muito importante destacar que pouco se apresenta sobre os pos-
iadores com diversos agen- síveis benefícios para a população indígena, principalmente para a aldeia
mediação de bens e serviços, Guarda, localizada muito próxima ao santuário e que vem sendo negli-
avés de arremate de votos. genciada. A situação dos índios da aldeia Guarda é crítica, apresentando
um quadro de saúde bastante grave com um elevado número de cegueira,
baixa visão e doenças mentais, sem que tenha havido qualquer iniciativa
para tratar a questão.
ícita a disputa pelo poder
Essa afirmação se dá baseada nos dados presentes no livro de nossa
rea, assim também como
autoria e intitulado “As Fronteiras do Ser Xukuru” (Massangana, 1998),
as relações que defendem
resultante de dissertação de mestrado defendida em 1992. Têm desta-
Xukuru, como é o caso da
que, já naquele momento, os problemas decorrentes da possibilidade de
Graças.
implantação do projeto de ampliação do Santuário de Nossa Senhora das
ncia de Desenvolvimento Graças. Um de seus trechos é baseado em documento emitido por Frei
ho de 1998, para a conso- José, pároco de Cimbres naquele período e um dos principais defensores
turístico através da estru- da referida ampliação, denominado “Plano de Ampliação e Organização
de de adoção das seguintes da Área e da Infra-estrutura so Santuário Nossa Senhora”. Uma de suas
propostas para garantir o “devido clima do culto, oração, silêncio e re-
colhimento” do santuário seria a de transferir os índios do Guarda para
re interesses existentes na outro local. Segundo ele:
iária na área e à sua explo-
as necessárias à legislação [...]no vale do Santuário que desce à planície estão loca-
osse definidas; realização lizadas dezenas de famílias dos índios Xukuru que em
do para a implantação do tempos passados viviam em terras das redondezas, que ago-
pectos físicos, sociais, am- ra são grandes fazendas. Eles acabaram relegados numa
os). verdadeira grota. Não têm outra terra, são paupérrimos,
viciados na cachaça; as mulheres e os meninos vivem pedin-
do esmolas aos peregrinos criando transtorno ao Santuário.
dade de definir medidas Eles precisam de terra, trabalho e assistência; será bom
s, “adequação da Vila de para eles e para todos. ( Fialho, 1998, 107)

85
XUKURU DO ORORUBÁ

Nos dias atuais, a interferência deste pároco na Vila de Cimbres é era peq
assim percebida pelos índios: gente d
ferente
contra
O que acabou com tradição porque chegou um padre aqui e ele é
em Cim
muito abusado; o pessoal ia para a igreja rezar o terço e ele não
conta
queria (...); festa, ele não queria que fizesse festa, só a procissão
opiniõ
de Nossa Senhora, no São João só fazia uma fogueirinha e pron-
to, não podia dançar o toré, num podia fazer nada, nada mesmo Aqui n
e começou a ficar tudo embatucado, desgostou o pessoal daqui. consid
(Maria de Romão, 12/11/2001) dar as
de idéi
acredi
Não é nosso objetivo constatar ou não as denúncias levantadas pelo índios
grupo dos Xukuru que estiveram presentes na sede do Ministério Público [...] Te
em outubro de 2001 solicitando providências e se apresentando como (18/04
outras lideranças dos Xukuru, até mesmo porque foi constituída uma
equipe técnica com essa finalidade. Porém, ressaltamos que o primeiro
passo para se lidar com a questão dessa disputa é não polarizá-la e sim Ainda segundo Exp
inserir no contexto a responsabilidade das diversas agências envolvidas. ao santuário e ao turismo
também aconteceu, consi
atitude no sentido de regu
3. Ocupação territorial
A problemática sobr
identificação e delimitaçã
A localidade denominada Cajueiro sempre foi objeto de preocu- tava os problemas decorre
pação, por ter sempre ficado claro que parte de sua população não se famílias já haviam estabe
considera indígena, apesar de muitas famílias da aldeia Guarda terem se de parentesco com os Xu
transferido para lá. Atualmente, sua população está bastante misturada e com mais calma as ações
sabemos que o processo de afirmação da identidade indígena está direta- que negam sua identidade
mente relacionada à mobilização do grupo pa atingir algum fim político
e ou de garantia de bens. A proposta para “sep
está, segundo pudemos p
No ano de 2000, enquanto acompanhávamos o GT de atua-lização bros de Cimbres e Cajueiro
da benfeitorias da área emergencial, conversarmos com Expedito Cabral, no, localizada na Vila de C
Biá, considerando que foi um projeto dele, enquanto vereador em Pes- xukuru.
queira que transformou Cajueiro num povoado em 1982.
De acordo com ou
Segundo o levantamento feito por Biá em 2000, no Cajueiro exis- 2000 – por exemplo), é c
tiam cerca de 170 famílias e relatou que quando conheceu Cajueiro já de regularização fundiária
havia a casa da Fábrica Peixe; ocupação dos índios, que
ções divergentes.

86
“Plantaram” Xicão

oco na Vila de Cimbres é era pequeno e foi crescendo; tem uma família diferente da
gente daqui, aparece que vieram famílias de fora, são di-
ferentes não só da questão da pele, como de opiniões; são do
contra, eles se consideram assim; tudo que a gente faz aqui
chegou um padre aqui e ele é
em Cimbres, não é possível fazer com eles, porque ali a gente
igreja rezar o terço e ele não
conta com a minoria de 10%, o resto fica toda contra as
ue fizesse festa, só a procissão
opiniões dos índios.
azia uma fogueirinha e pron-
odia fazer nada, nada mesmo Aqui na Vila a gente tem a grande maioria, 90% índio,
o, desgostou o pessoal daqui. considerados e assumidos; nem por isso a agente deixa de
) dar assistência lá” [...]; é meio complicado; ou eles mudam
de idéia ou tem que se tomar outra medida; o que eu não
acredito que vai ficar é uma grupinho europeu no meio dos
denúncias levantadas pelo índios.[...] Ali era um ponto de apoio da Fábrica Peixe.
ede do Ministério Público [...] Tem famílias Xukuru lá, assumidos, e que moram lá.
e se apresentando como (18/04/2000)
rque foi constituída uma
ssaltamos que o primeiro
ta é não polarizá-la e sim Ainda segundo Expedito, o crescimento de Cajueiro se deu devido
sas agências envolvidas. ao santuário e ao turismo religioso, principalmente nos últimos dez anos;
também aconteceu, considerando que o Governo Federal não tomou um
atitude no sentido de regularizar as terras.
A problemática sobre Cajueiro não é recente, durante o trabalho de
identificação e delimitação em 1989, Chicão, que era o cacique, já levan-
pre foi objeto de preocu- tava os problemas decorrentes daquela localidade e afirmava que muitas
de sua população não se famílias já haviam estabelecido, ou eram mesmo originárias de relações
da aldeia Guarda terem se de parentesco com os Xukuru e que, portanto, deveriam ser estudado
está bastante misturada e com mais calma as ações para que fossem retiradas somente as famílias
dade indígena está direta- que negam sua identidade indígena e não são reconhecidas como tal.
atingir algum fim político
A proposta para “separação” dos Xukuru que motivou este parecer,
está, segundo pudemos perceber, baseada numa articulação entre mem-
mos o GT de atua-lização bros de Cimbres e Cajueiro objetivando a ocupação da fazenda São Severi-
mos com Expedito Cabral, no, localizada na Vila de Cimbres e onde está também o antigo cemitério
quanto vereador em Pes- xukuru.
em 1982.
De acordo com outras referências bibliográficas (BRASILEIRO,
m 2000, no Cajueiro exis- 2000 – por exemplo), é comum, em momentos como esse do processo
ndo conheceu Cajueiro já de regularização fundiária quando as terras começam a ser liberadas para
ocupação dos índios, que partes de um mesmo grupo apresentem posi-
ções divergentes.

87
XUKURU DO ORORUBÁ

4. Mobilização Política A ênfase aos aspect


xukuru se dá pela importâ
Afastando-se um pouco da noção psicologizante de autoridade pro- regularização de suas terra
posta por Max Weber, encontramos uma perspectiva bastante interes- Tal mobilização foi i
sante para associarmos no caso em questão. Trata-se da idéia de Alberto profundas repercussões in
Melucci (1996) que analisa a constituição de liderança num contexto de um dos critérios utilizado
movimento social, o que resgataria a o papel dos agentes como atores exclusão de seus compone
ativos neste processo.
Foi através desta mo
A partir da idéia de ação coletiva, Melucci aborda a questão da for- gulho de sua identidade e
mação da liderança e as relações entre a liderança e sua base de suporte, os no plano físico como simb
componentes da ação da liderança e seus papéis integrativos e inovadores
A projeção dos xuku
(1996, 332).
nacional também se seu p
Para ele, o líder deve satisfazer as expectativas dos membros ao faci- movimento indígena no N
litar a busca de seus objetivos, representando o grupo nas relações com o
Assim, a compreens
mundo externo e coordenando e integrando as atividades internas, assim
construída, relacionada c
como deve impor sanções aos membros quando sua conduta não se dá de
de garantir a ocupação d
acordo com as normas de sua organização.
tradicional-carismáticas.
As principais incumbências de uma liderança, segundo Melucci se-
Baseando-nos em B
riam:
concorrencial da relação e
parece vir se configurando
1. Definir objetivos, que implica a habilidade não somente de âmbito mais propriament
formular objetivos para o movimento, mas também estabele- ráter efêmero ou não.
cer um sistema de prioridades e adaptá-las a novas condições;
2. Prover os meios de ação, ou seja, organizar os recursos e dire- CONSIDERAÇÕES
ciona-los a fim de realizar os objetivos do movimento;
3. Manter a estrutura do movimento, garantindo a interação en- Diante das informaç
tre os membros e para isso deve agir no sentido de neutralizar seguintes considerações:
a influência de adversários, internos ou externos;
Os Xukuru estão v
4. Mobilizar a população que o apóia a continuar na busca de internas que está culmina
alcançar seus objetivos; e sidente em Cimbres que
5. Manter e fortalecer a identidade do grupo, incentivando a so- ticas baseadas apenas nas
lidariedade, projetando uma imagem do grupo em que seus zando-se de procediment
participantes podem se identificar e de onde eles podem ex- FUNASA, INSS) para sua
trair sentimentos afetivos. Tais divergências nã
de uma cisão da sociedad

88
“Plantaram” Xicão

A ênfase aos aspectos da liderança no que tange ao movimento


xukuru se dá pela importância que a sua ação coletiva teve no processo de
gizante de autoridade pro- regularização de suas terras e na reafirmação de sua identidade.
spectiva bastante interes- Tal mobilização foi iniciada no final da década de 80 passada e teve
ata-se da idéia de Alberto profundas repercussões internas e externas ao grupo, tanto assim, que
derança num contexto de um dos critérios utilizados pelos Xukuru como mecanismo de inclusão e
dos agentes como atores exclusão de seus componente é a participação no “movimento pela terra”.
Foi através desta mobilização que os Xukuru restabeleceram o or-
i aborda a questão da for- gulho de sua identidade e demarcaram os espaços de sua existência, tanto
a e sua base de suporte, os no plano físico como simbólico.
integrativos e inovadores
A projeção dos xukuru e de suas lideranças no movimento indígena
nacional também se seu pelo papel que exerceram no fortalecimento do
ivas dos membros ao faci- movimento indígena no Nordeste.
grupo nas relações com o
Assim, a compreensão da autoridade xukuru como politicamente
atividades internas, assim
construída, relacionada com a ação coletiva do grupo com o propósito
o sua conduta não se dá de
de garantir a ocupação de suas terras se mistura com as características
tradicional-carismáticas.
ança, segundo Melucci se-
Baseando-nos em Brasileiro (1999), podemos dizer que o aspecto
concorrencial da relação entre os segmentos faccionais entre os Xukuru
parece vir se configurando mais em um plano situacional do que em um
bilidade não somente de âmbito mais propriamente estrutural, tendo as facções existentes um ca-
to, mas também estabele- ráter efêmero ou não.
ptá-las a novas condições;
ganizar os recursos e dire- CONSIDERAÇÕES FINAIS
os do movimento;
garantindo a interação en- Diante das informações expostas até o momento, podemos fazer as
no sentido de neutralizar seguintes considerações:
ou externos;
Os Xukuru estão vivenciando um claro processo de divergências
a continuar na busca de internas que está culminando com o estabelecimento de um grupo dis-
sidente em Cimbres que vem indicando representantes com caracterís-
grupo, incentivando a so- ticas baseadas apenas nas formas burocráticas do estado nacional, utili-
m do grupo em que seus zando-se de procedimentos administrativos dos órgãos oficiais (FUNAI,
e de onde eles podem ex- FUNASA, INSS) para sua legitimação;
Tais divergências não apresentam, até o momento, a constituição
de uma cisão da sociedade Xukuru capaz de sustentar a divisão de seu

89
XUKURU DO ORORUBÁ

território, devido, principalmente, ao significado que sua terra tem como ogy, development and modern
um todo, no plano religioso e organizativo do grupo e ao intenso fluxo lence. London, Routledge,
dos índios entre as 23 aldeias existentes.
ATLAS das Terras Indígen
Considerando a dinamicidade dos processos sociais e a inten-sidade UFRJ, 1993.
dos fluxos no campo intersocietário em questão, não há como se afirmar
ou como delimitar o que seriam características originalmente xukurus BARBOSA, Wallace. Os
e aquelas estabelecidas externamente pelas agências presentes; tal afir- Étnica”. Dissertação de M
mação constituiria um equívoco teórico e metodológico ao se tratar esta Belas Artes da Universida
problemática. Mas é possível perceber que as autoridades social e histori-
camente constituídas pelos xukuru têm correspondido ao seu caráter tra- BRASILEIRO, Sheila. “P
dicional-carismático e que vem assumindo o estatuto de autoridade legal. quista territorial e faccion
gem da volta: etnicidade, po
Rio de Janeiro, Contra Ca
SUGESTÕES DE ENCAMINHAMENTOS:
BRASILEIRO, Sheila; FE
Propor a constituição de uma comissão xukuru formada por inte- Xukuru. Recife, ANAI, 19
grantes de todas as aldeias no sentido de formular um planejamento de COSTA, F. Pereira da.Ana
ocupação das áreas (imóveis) a serem liberados; trimônio Histórico e Artís
Realização de uma conferência sobre o desenvolvimento na Terra
Indígena Xukuru, em que possam ser apresentados e discutidos (entre ín- ELIADE, Mircea . O sagra
dios e representantes das diversas organizações – governamentais e não- 1996.
-governamentais – envolvidas) todos os projetos que estão sendo imple- FIALHO, Vânia. As fronte
mentados junto a esse grupo e as agências responsáveis por eles. Através
desse evento, poderia se explicitar os objetivos dos projetos, seus critérios GLUCKMAN, Max. Aná
e metodologias, os recursos alocados, as formas de gerenciamento dos derna. In: FELDMAN-B
mesmos e a participação e a responsabilidade das instituições envolvidas. temporâneas. São Paulo, Gl
HOHENTAL, N.D. Not
Recife, 15 de março de 2002 Pernambuco, Brasil. Revist
Vânia R. Fialho de Paiva e Souza
UPE/ANAI JOAS, Hans. “O comunit
Jessé (org.).Democracia hoj
rânea. Brasília, Editora da
REFERÊNCIAS
MACIEL, José de Almeid
ARCE, Alberto & LONG, Norman. Reconfiguring modernity and de- Companhia Editora de Pe
velopment from anthropological perspective. In: ________.Anthropol-
MELUCCI, Alberto. Chal
Cambridge, UK, Cambri

90
“Plantaram” Xicão

do que sua terra tem como ogy, development and modernities: explory discourses, counter-tendencies abd vio-
grupo e ao intenso fluxo lence. London, Routledge, 2000.
ATLAS das Terras Indígenas do Nordeste. PETI/PPGAS/Museu Nacional/
os sociais e a inten-sidade UFRJ, 1993.
o, não há como se afirmar
as originalmente xukurus BARBOSA, Wallace. Os Índios Kambiwá de Pernambuco: Arte e Identidade
ências presentes; tal afir- Étnica”. Dissertação de Mestrado em Antropologia da Arte, Escola de
odológico ao se tratar esta Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1991.
utoridades social e histori-
ondido ao seu caráter tra- BRASILEIRO, Sheila. “Povo Indígena Kiriri: emergência étnica, con-
atuto de autoridade legal. quista territorial e faccionalismo”. In: OLIVEIRA, João Pacheco. A via-
gem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no nordeste indígena.
Rio de Janeiro, Contra Capa, 1999.
TOS:
BRASILEIRO, Sheila; FERREIRA, Ivson; FIALHO, Vânia. Dossiê Chicão
xukuru formada por inte- Xukuru. Recife, ANAI, 1998.
ular um planejamento de COSTA, F. Pereira da.Anais Pernambucanos. v.10 Recife, Fundação do Pa-
trimônio Histórico e Artístico de Pernambuco.
desenvolvimento na Terra
ados e discutidos (entre ín- ELIADE, Mircea . O sagrado e o profano. 3 ed. São Paulo, Martins Fontes,
– governamentais e não- 1996.
os que estão sendo imple- FIALHO, Vânia. As fronteiras do ser Xukuru. Recife, Massanga, 1998.
onsáveis por eles. Através
dos projetos, seus critérios GLUCKMAN, Max. Análise de uma situação social na Zuluândia mo-
as de gerenciamento dos derna. In: FELDMAN-Bianco, Bela (org). Antropologia das sociedades con-
as instituições envolvidas. temporâneas. São Paulo, Globo, 1987.
HOHENTAL, N.D. Notes of the Shucurú indians of Serra de Ararobá,
cife, 15 de março de 2002 Pernambuco, Brasil. Revista do Museu Paulista, 8: 91-166, 1958.
R. Fialho de Paiva e Souza
UPE/ANAI JOAS, Hans. “O comunitarismo: uma perspectiva alemã”. In: SOUZA,
Jessé (org.).Democracia hoje: novos desafios para a teoria democrática contempo-
rânea. Brasília, Editora da UNB, 2001.
MACIEL, José de Almeida. Pesqueira e o antigo termo de Cimbres. Recife,
uring modernity and de- Companhia Editora de Pernambuco, 1980.
In: ________.Anthropol-
MELUCCI, Alberto. Challenging codes: collective action in the information age.
Cambridge, UK, Cambridge University Press, 1996.

91
XUKURU DO ORORUBÁ

NEVES, Rita de Cássia. Festas e Mitos: identidades na Vila de Cimbres –PE.


Dissertação de Mestrado. PPGA/UFPE, 1999. O S XUKURU E A V

OLIVEIRA FILHO, João Pacheco (Org). Os Poderes e as Terras dos Índios.


Rio de Janeiro, PPGAS/MN/UFRJ, Comunicação 14, 1989.
_______. “A VIAGEM DE VOLTA”: Reelaboração Cultural e Horizon-
tes Políticos dos Povos Indígenas do Nordeste In ATLAS das Terras Indí-
genas do Nordeste. PETI/PPGAS/Museu Nacional/UFRJ, 1993.
_______.(org.),A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural
no Nordeste indígena. Rio de janeiro, Contra Capa, 1999.
OLIVEIRA JR, Adolfo Neves. “Faccionalismo Xukuru-kiriri e a atuação
da FUNAI. In: ESPÍRITO SANTO, Marco Antônio (org.). Política indi-
genista: leste e nordeste brasileiros. Brasília, FUNAI/DEDOC, 2000.
PARAÍSO, Maria Hilda B. Identidade étnica dos Xakriabá – Laudo Antro-
plógico. Salvador, UFBA, 1987.
PROFESSORES XUKURU. Xukuru: filhos da mãe natureza – uma his-
tória de resistência e luta. Olinda, Centro de Cultura Luiz Freire, 1997.
RIBEIRO, Darcy. Os índios e a civilização. Rio de Janeiro, Editora Civiliza-
ção Brasileira, 1970. Iª Parte. INFORM
SECUNDINO, Marcondes de Araújo. Tramas e conexões no campo político
intersocietário Fulni-ô. Dissertação de Mestrado PPGS/UFPE. Constituída através
2003, com a finalidade de
SIMMEL, George. A natureza sociológica do conflito. In:MORAES, Eva- Xukuru Marcos Luidson de
risto de (org).George Simmel: sociologia. São Paulo, UFSC, 1983. composta por Luciano M
VALLE, Sarah Maranhão. A perpetuação da conquista: a destruição das aldeias Severino Morais de Almei
indígenas em Pernambuco no século XIX. Dissertação de Mestrado em His- tratada sob a temática de
tória.Recife, UFPE, 1992. Igualmente entend
acompanhamento de inve
WEBER, Max. Os três aspectos de autoridade legítima. In: ETIZIONI, termina sendo identificar
Amital. Organizações complexas. São Paulo, Atlas. p.17-25, 1967. violações a direitos humanos,
ser dado no sentido de en
WEBER, Max. Economia e sociedade. v.1. Brasília, Editora da UNB, 2000.
ficar caminhos de sua trans
volvido pelo consagrado p
pacíficos (peace by peacefu

92
“Plantaram” Xicão

des na Vila de Cimbres –PE.


O S XUKURU E A VIOLÊNCIA

Luiz Couto
oderes e as Terras dos Índios. Luciano Mariz Maia
ção 14, 1989. Manoel Morais
ração Cultural e Horizon- Vânia Fialho
n ATLAS das Terras Indí-
al/UFRJ, 1993. “Quando não houver saída
Quando não houver mais solução
lítica e reelaboração cultural Ainda há de haver saída
a, 1999. Nenhuma idéia vale uma vida”.
Titãs. Enquanto houver sol.
Xukuru-kiriri e a atuação
ntônio (org.). Política indi- “Uma vida não vale nada,
I/DEDOC, 2000. mas nada vale uma vida”.
Xakriabá – Laudo Antro- André Malraux

“Amicus platus sed magis amica veritas”.


a mãe natureza – uma his- Aristóteles.
ultura Luiz Freire, 1997.
Janeiro, Editora Civiliza-
Iª Parte. INFORMAÇÕES GERAIS
e conexões no campo político
PPGS/UFPE. Constituída através de Resolução do CDDPH de 20 de março de
2003, com a finalidade de acompanhar a tentativa de assassinato do cacique
nflito. In:MORAES, Eva- Xukuru Marcos Luidson de Araújo, e fatos conexos, a Comissão Especial,
o, UFSC, 1983. composta por Luciano Mariz Maia, Luiz Couto, Vânia Fialho e Manoel
ista: a destruição das aldeias Severino Morais de Almeida, entendeu que a questão devesse ser melhor
ção de Mestrado em His- tratada sob a temática de os Xukuru e a violência.
Igualmente entendeu que, embora sendo comissão especial de
acompanhamento de investigação, instituída pelo CDDPH, cuja função
legítima. In: ETIZIONI, termina sendo identificar situações em que possam ter ocorrido graves
. p.17-25, 1967. violações a direitos humanos, no contexto da sua atuação melhor foco deveria
ser dado no sentido de entender os conflitos, e envidar esforços para identi-
a, Editora da UNB, 2000.
ficar caminhos de sua transformação, segundo método de trabalho desen-
volvido pelo consagrado professor Johan Galtung de paz através de meios
pacíficos (peace by peaceful means).

93
XUKURU DO ORORUBÁ

Por que a Comissão Especial Os índios, então, ate


para depredar e atear fog
A Comissão Especial foi constituída em março de 2003, na esteira por Biá –, tido como líde
dos desdobramentos decorrentes de fatos ocorridos no dia 7 de fevereiro pessoa a quem os agressor
de 2003, na fazenda Curral de Boi e na Aldeia Cimbres, situados no terri- bral e vários seus familiare
tório dos índios Xukuru, nas proximidades do município de Pesqueira PE. e suas casas destruídas.
Àquele momento, órgãos federais11 em Brasília foram comu-nica- Muitas outras famíli
dos que, na manhã do dia 7 de fevereiro de 2003, um índio chamado José expulsas da Vila do Cimbr
Lourival Frazão, conhecido por “Louro Frazão”, na companhia de outras ra, ou em Recife.
pessoas - índios e não índios -, na localidade chamada Fazenda Curral de Os Xukuru ligados a
Boi, atentou contra a vida do cacique Xukuru Marcos Luidson de Araújo, ças tradicionais, auxiliado
de cujo incidente resultaram mortos os índios Jozenílson José dos Santos rio, exigem a designação d
e José Ademílson Barbosa da Silva. tado. E também exigem u
Subseqüente a esse incidente fatal, índios Xukuru, informados dos Público, acompanhar as in
acontecimentos, dirigiram-se à Fazenda Curral de Boi e destruíram a casa Foi designado o DPF
de Louro Frazão, bem assim um veículo pertencente a um amigo deste, Assim, a explosão d
tido como participante nos fatos do início da manhã. instituições públicas e pr
À medida em que a notícia se espalhava, índios ligados ao cacique de ataques e agressões – a
Marcos Luidson se dirigiram para a Aldeia Cimbres (ou Vila do Cimbres), que fez parecer ao CDDP
para aguardar a chegada do corpo de um dos índios mortos, e prestar-lhe Pelo fato de a Comis
as últimas homenagens. nistério Público Federal (
É nesse ambiente que tomam conhecimento de que o cidadão José especiais designadas pelo
Luiz Almeida de Carvalho, conhecido por “Zé Luiz”, participara do in- Pernambuco se sentiram
cidente da manhã, e estava escondido em sua residência, ali mesmo, na funcional, afirmando que
Aldeia Cimbres. natural. E formularam re
Esses índios saem marchando em direção à casa de Zé Luiz, e a cer- ato de indicação13. O Proc
cam, querendo que ele se entregue. Zé Luiz responde com tiros, ferindo a membro da instituição i
alguns dos circunstantes. As polícias12 civil e militar tardam a intervir. E critérios para tais designaç
só vão resgatar Zé Luiz mais tarde, levando-o preso. signação do membro da C
sente caso não se amoldas
respeitada a apresentação

11. Secretaria Especial de Direitos Humanos e CDDPH; Ministério da Justiça; Funai; Departamento
de Polícia Federal e Procuradoria Geral da República (6a Câmara de Coordenação e Revisão – Câmara
dos Índios e Minorias, e PFDC Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão).
12. A Polícia Federal relutou a ingressar na área, só o fazendo por insistência de entidades de 13. Esse pedido é reforçado em v
direitos humanos. cho aberto, opta por manter a des

94
“Plantaram” Xicão

Os índios, então, ateiam fogo à casa e ao carro de Zé Luiz, e partem


para depredar e atear fogo à casa de Expedito Alves Cabral – conhecido
março de 2003, na esteira por Biá –, tido como líder da dissidência ao cacique Marcos Luidson, e
idos no dia 7 de fevereiro pessoa a quem os agressores daquele são ligados. Expedito Alves Biá Ca-
Cimbres, situados no terri- bral e vários seus familiares são expulsos de imediato da Vila do Cimbres,
município de Pesqueira PE. e suas casas destruídas.
Brasília foram comu-nica- Muitas outras famílias de pessoas apontadas como ligadas a Biá são
3, um índio chamado José expulsas da Vila do Cimbres. Vão se abrigar provisoriamente em Pesquei-
, na companhia de outras ra, ou em Recife.
amada Fazenda Curral de Os Xukuru ligados ao cacique Marcos Luidson e às demais lideran-
Marcos Luidson de Araújo, ças tradicionais, auxiliados pelo CIMI – Conselho Indigenista Missioná-
ozenílson José dos Santos rio, exigem a designação de um delegado especial para investigar o aten-
tado. E também exigem um procurador especial, para, como Ministério
Xukuru, informados dos Público, acompanhar as investigações.
de Boi e destruíram a casa Foi designado o DPF Servílio Paiva para investigar o caso.
ncente a um amigo deste, Assim, a explosão de atos de violência, a quebra do diálogo entre
anhã. instituições públicas e privadas, e uma crise de credibilidade resultante
índios ligados ao cacique de ataques e agressões – algumas recíprocas – formaram o caldo de cultura
bres (ou Vila do Cimbres), que fez parecer ao CDDPH a necessidade de constituição da comissão.
dios mortos, e prestar-lhe Pelo fato de a Comissão Especial ser integrada por membro do Mi-
nistério Público Federal (como, aliás, quase todas as demais comissões
nto de que o cidadão José especiais designadas pelo CDDPH), os procuradores da República em
Luiz”, participara do in- Pernambuco se sentiram agredidos em sua autonomia e independência
residência, ali mesmo, na funcional, afirmando que tal procedimento fere o princípio do promotor
natural. E formularam representação ao PGR, exigindo a revogação do
à casa de Zé Luiz, e a cer- ato de indicação13. O Procurador Geral da República entendeu ser próprio
sponde com tiros, ferindo a membro da instituição integrar comissão temática do CDDPH, e fixou
militar tardam a intervir. E critérios para tais designações. Segundo o Procurador Geral, embora a de-
reso. signação do membro da Comissão Especial para acompanhamento do pre-
sente caso não se amoldasse aos critérios que acabara de fixar, deveria ser
respeitada a apresentação do Relatório, quando se encerraria sua atuação.

io da Justiça; Funai; Departamento


e Coordenação e Revisão – Câmara
do Cidadão).
o por insistência de entidades de 13. Esse pedido é reforçado em visita do PGR à PR/PE, em fevereiro de 2004. O PGR, em despa-
cho aberto, opta por manter a designação, e aguardar a conclusão do Relatório.

95
XUKURU DO ORORUBÁ

O que pode/é foi-lhe possível comunica


e o que não pode/não é a CDDPH horizontal e não hierarquiz

Desde o princípio os membros da Comissão Especial compreende- Método de trabalho


ram que sua atuação não se revestia de índole processual ou judiciária,
mas seria modo de realização das prerrogativas apontadas pelo art. 4º da
A Comissão realizou
Lei 4.319/64, segundo o qual compete ao Conselho de Defesa dos Direi-
contrado com lideranças
tos da Pessoa Humana promover inquéritos, investigações e estudos acer-
Cimbres. Visitou as instal
ca da eficácia das normas asseguradoras dos direitos da pessoa humana,
familiares e seguidores est
inscritos na Constituição Federal, na Declaração Americana dos Direitos
to com lideranças dissiden
e Deveres Fundamentais do Homem (1948) e na Declaração Universal
blica na 5a Região, local on
dos Direitos Humanos (1948); e promover, nas áreas que apresentem
maiores índices de violação dos direitos humanos, a realização de inquéri- Foram feitas visitas à
tos para investigar as suas causas e sugerir medidas tendentes a assegurar à Justiça Federal. Foram f
a plenitude do gozo daqueles direitos. e com o CIMI.
Não sendo órgão judicial, nem pretendendo produzir informes para Desses contatos pre
uso perante o Judiciário (não se confundindo, portanto, nem de longe, (presunções) assumidas p
com as funções próprias de polícia judiciária, ou de ministério público), a tamentos (e, portanto, su
comissão pretende, no presente Relatório, sugerir medidas tendentes a asse- sível) a razão de surgimen
gurar a plenitude do gozo dos direitos humanos. interesses e pretensões con
O esforço seguinte d
os eventos que explodiram
Escopo do trabalho
compreensão e transform
Sendo Comissão de acompanhamento de investigação policial, e sua
eventual conversão em ação judicial (como foi o caso), comporta examinar Base documental
se houve violação ao direito à vida, ao direito a um julgamento justo, ao direito
à vida e à convivência comunitária, ao direito ao etnodesenvolvimento, à liberdade Embora tenha produ
contra interferência indevida no modo de organização social, ao direito à liberdade de ção in loco, entrevistas, reu
locomoção, ao direito à intimidade e à vida privada (incluindo honra e imagem), ao trabalhou a CE consistiu e
direito às terras de ocupação tradicional, e ao direito à segurança de suas pessoas e bens.
Autos processuais de
No entanto, para além de identificar reais ou potenciais violações Autos de um inquér
a direitos humanos fundamentais, a Comissão Especial considera mais
Relatórios antropoló
próprio desenvolver esforços no sentido de identificar caminhos para trans-
formar os conflitos em processos de solução de problemas e satisfação das necessidades Relatório antropológ
básicas dos membros da comunidade Xukuru.
A Comissão Especial observa que, realizada a quebra de diálogo en- 14. Por especial atenção da chefi
de procurador regional puderam f
tre as partes e instituições com a prisão do índio João Campos da Silva,

96
“Plantaram” Xicão

foi-lhe possível comunicação direta com todos os envolvidos, em relação


PH horizontal e não hierarquizada.

são Especial compreende- Método de trabalho da Comissão


e processual ou judiciária,
apontadas pelo art. 4º da
A Comissão realizou visitas à Terra Indígena Xukuru, tendo se en-
selho de Defesa dos Direi-
contrado com lideranças tradicionais na Aldeia Pedra d’Água e Vila de
vestigações e estudos acer-
Cimbres. Visitou as instalações em que Expedito Alves Biá Cabral, seus
reitos da pessoa humana,
familiares e seguidores estiveram hospedados em Recife, e o recebeu, jun-
o Americana dos Direitos
to com lideranças dissidentes, na sede da Procuradoria Regional da Repú-
na Declaração Universal
blica na 5a Região, local onde funcionou a secretaria ad-hoc da comissão14.
nas áreas que apresentem
os, a realização de inquéri- Foram feitas visitas à Polícia Federal, ao Ministério Público Federal e
idas tendentes a assegurar à Justiça Federal. Foram feitas visitas e realizadas reuniões com a FUNAI
e com o CIMI.
do produzir informes para Desses contatos preliminares foi possível perceber que as atitudes
portanto, nem de longe, (presunções) assumidas pelos vários atores condicionavam seus compor-
u de ministério público), a tamentos (e, portanto, suas ações), tornando compreensível (e até previ-
rir medidas tendentes a asse- sível) a razão de surgimento dos conflitos, tendo em vista a existência de
interesses e pretensões contraditórios.
O esforço seguinte da CE foi identificar que fatores fizeram surgir
os eventos que explodiram em atos de violência, de modo a permitir sua
compreensão e transformação.
nvestigação policial, e sua
caso), comporta examinar Base documental de exame
m julgamento justo, ao direito
odesenvolvimento, à liberdade Embora tenha produzido informação própria, decorrente da inspe-
ocial, ao direito à liberdade de ção in loco, entrevistas, reuniões, etc., o material mais denso sobre o qual
ncluindo honra e imagem), ao trabalhou a CE consistiu em exame de
gurança de suas pessoas e bens.
Autos processuais de 3 ações penais
is ou potenciais violações Autos de um inquérito policial (em fase de conclusão)
o Especial considera mais
Relatórios antropológicos sobre dissidências entre os Xukuru
tificar caminhos para trans-
s e satisfação das necessidades Relatório antropológico sobre situação dos banidos de Cimbres

da a quebra de diálogo en- 14. Por especial atenção da chefia da PRR 5a, os serviços de secretaria e assessoria do gabinete
de procurador regional puderam funcionar como secretaria ad-hoc da comissão.
io João Campos da Silva,

97
XUKURU DO ORORUBÁ

Despacho do MPF sobre arquivamento de procedimento adminis- os Xukuru desde 1987, p


trativo, referente ao surgimento das dissidências, denúncias de desvio de que esta sociedade vem so
recursos, discriminação na aplicação de investimentos públicos na terra constituição de grupos dis
dos índios, etc.
Relatório de Visita de membros da Comissão de Direitos Humanos Situação Fundiária
da Câmara dos Deputados.
Dossiê Xukuru (CIMI).

IIª Parte.

Antecedentes do Conflito.
contextualizando as situações de Violência

O evento ocorrido no dia 07 de fevereiro de 2003 foi atribuído ao


conflito que vem se configurando na TI indígena Xukuru desde, princi-
palmente, o ano de 2001.
Julgamos então pertinente fazermos algumas considerações sobre
o acirramento desses conflitos que se encontram relacionados às disputas
pela posse de terras na região de Pesqueira, quando é iniciado o processo O processo de recon
de regularização fundiária do território tradicional dos Xukuru. entrecortado por fortes re
gais, o que é perfeitamen
A composição e os elementos que conformam a base de cada facção
até o extremo das mais div
envolvida foi devidamente discutido no parecer antropológico realizado
no ano de 2002 (Fialho, 2002). Dentre os argumentos que são aciona- Em região do Nord
dos pelas partes em confronto, encontram-se as disputas pelos recursos fúndios e no controle dess
destinados às aldeias, as alianças que as duas facções estabeleceram com leceram e conduziram as p
agentes externos no curso de suas histórias, a falta de metodologia do relações ali existentes, gar
órgão indigenista oficial para proceder intervenções junto às sociedades processo extremamente co
indígenas, e os princípios que vêm norteando sua prática. O caso Xukuru é u
No nosso entendimento, o acompanhamento desse caso se dá pela desde a dificuldade da so
via de uma contextualização mais ampla e do destaque a aspectos do pro- do Estado, responsáveis p
cesso por eles vivenciado, que ainda se encontra em curso. Desta forma, rem a identidade étnica d
optamos por evidenciar aqueles que podem ser alterados no sentido de correspondem à idéia de í
viabilizar negociações e evitar novos conflitos. a sociedade brasileira tem
cipalmente em suas práti
Considerando os objetivos dessa Comissão, destacamos os seguintes
diversidade étnico-cultura
aspectos: a situação fundiária e o clima de tensão e conflito em que vivem

98
“Plantaram” Xicão

e procedimento adminis- os Xukuru desde 1987, principalmente; o nível e as formas de violência


as, denúncias de desvio de que esta sociedade vem sofrendo, do ponto de vista físico e simbólico; a
mentos públicos na terra constituição de grupos dissidentes

são de Direitos Humanos Situação Fundiária e Tensão


situações de Violência

de 2003 foi atribuído ao


na Xukuru desde, princi-

umas considerações sobre


m relacionados às disputas
ando é iniciado o processo O processo de reconhecimento de um território indígena é sempre
nal dos Xukuru. entrecortado por fortes resistências que envolvem desde as disputas le-
gais, o que é perfeitamente legítimo dentro de um estado democrático,
mam a base de cada facção
até o extremo das mais diversas formas de violências.
r antropológico realizado
umentos que são aciona- Em região do Nordeste, cuja ocupação foi feita com base nos lati-
as disputas pelos recursos fúndios e no controle dessas terras a partir das oligarquias que se estabe-
acções estabeleceram com leceram e conduziram as práticas políticas que ainda hoje caracterizam as
falta de metodologia do relações ali existentes, garantir a posse da terra a grupos indígenas é um
nções junto às sociedades processo extremamente complexo.
ua prática. O caso Xukuru é um desses exemplos. Os problemas são postos
ento desse caso se dá pela desde a dificuldade da sociedade envolvente e dos próprios mecanismos
estaque a aspectos do pro- do Estado, responsáveis pela execução de políticas públicas, reconhece-
a em curso. Desta forma, rem a identidade étnica de tais sociedades, considerando que estas não
r alterados no sentido de correspondem à idéia de índio presente do imaginário social. Além disso,
a sociedade brasileira tem mostrado sua dificuldade em se assumir, prin-
cipalmente em suas práticas, como uma sociedade pluriétnica, atenta à
o, destacamos os seguintes
diversidade étnico-cultural.
o e conflito em que vivem

99
XUKURU DO ORORUBÁ

Os índios Xukuru representam um caso paradigmático em relação acompanhamento sistemá


aos povos indígenas no Nordeste brasileiro. Seu reconhecimento oficial e jurídicos também apon
se deu na década de 50 do século passado, quando é instalado um Posto ameaças feitas aos índios.
Indígena do SPI — Serviço de Proteção ao Índio — na Serra do Ororubá, A organização dos X
na aldeia denominada São José, com o objetivo de prestar assistência a repercussões nacionais e
essa população. regional e nacionalmente
Amplamente registrada nos documentos historiográficos, a história sora: dentro da própria F
dos Xukuru é contada através da descrição de suas práticas religiosas (fes- tramitação do processo de
ta de Nossa Senhora da Montanhas, Busca da lenha na festa de São João) to de cinco índios - um de
(NEVES, 1999), como através os feitos heróicos, quando um contingente Rolim, este último tamb
de índios integra o grupo daqueles que vão lutar na Guerra do Paraguai. Xukuru. A homologação
No entanto, é na questão do conflito pela posse da terra que se pode com a maioria das etapas n
ter uma dimensão mais ampla de como tem sido a trajetória desses índios. cretizadas desde 1998.
Documentos do século XIX tornam bastante claro como tem sido O processo de regula
a relação dos índios com a população vizinha, assim como com o poder pela FUNAI — Fundaçã
público no âmbito local. É possível se perceber desde documentos que da Identificação e Delimi
atestam o arrendamento das terras indígenas por fazendeiros da região, nente dos índios Xukuru,
explicitando tanto o direito dos índios sobre seu território, como o inte- sua demarcação física real
resse de outros pelas mesmas, além de apontarem como se deu a apro- alii, 1998) e, finalmente,
priação das terras indígenas pelo poder municipal e fazendeiros da região. em 2001.
Desde muito cedo (1762) o poder público local esteve presente no Apesar de já ter sid
território Xukuru, quando foi criada oficialmente a Vila de Cimbres na fundiária, o problema da
alto da Serra do Ororubá e começa a funcionar sua Câmara Municipal. principais obstáculos; não
O interessante é que o a principal finalidade da criação da vila foi, exa- denizações são liberados p
tamente, o índio e a atração do mesmo para que lhe fosse “prestada as- mento do território começ
sistência religiosa e lições de civilidade”, como aponta o “Edital para a gônicos entre os índios qu
feitura da Vila de Cimbres” de 26.03.176215 tentativa de legitimação
àquela conhecida como “l
As relações mais recentes entre os índios e sua vizinhança estão tam-
bém marcadas pela disputa pela posse da terra, agora de maneira mais Um dos principais co
explícita, pelo fato do território indígena ter sido objeto desde de 1989 de para se passar de uma etap
um processo jurídico-administrativo para o seu reconhecimento formal fundiária. Outro fator dec
como “terra indígena”. aquele apresentado em do
de um período limitado e
É a partir deste período que se estabelece com nitidez o conflito
com os fazendeiros locais, considerando que tais embates passam a ter O intervalo entre o i
dígena Xukuru consiste e
no seu primeiro levantam
15. FIAM/CEHM/Prefeitura Municipal de Pesqueira, 1985, p.40. morosidade de ação do ór

100
“Plantaram” Xicão

paradigmático em relação acompanhamento sistemático da imprensa e os recursos administrativos


eu reconhecimento oficial e jurídicos também apontam para os iminentes conflitos na região e as
ndo é instalado um Posto ameaças feitas aos índios.
o — na Serra do Ororubá, A organização dos Xukuru e a sua forma de mobilização tiveram
vo de prestar assistência a repercussões nacionais e o cacique Chicão teve sua liderança projetada
regional e nacionalmente, tornando-os alvo de todo tipo de ação repres-
historiográficos, a história sora: dentro da própria FUNAI houve procedimentos que impediram a
uas práticas religiosas (fes- tramitação do processo de garantia territorial com agilidade e o assassina-
enha na festa de São João) to de cinco índios - um deles o cacique Chicão - e do procurador Geraldo
s, quando um contingente Rolim, este último também empenhado na regularização do território
ar na Guerra do Paraguai. Xukuru. A homologação só veio acontecer em abril de 2001, mesmo
posse da terra que se pode com a maioria das etapas necessárias para a homologação tendo sido con-
o a trajetória desses índios. cretizadas desde 1998.
ante claro como tem sido O processo de regularização fundiária da Terra Indígena foi iniciado
assim como com o poder pela FUNAI — Fundação Nacional do Índio — em 1989, com a etapa
er desde documentos que da Identificação e Delimitação. Em 1992 foi declarada de posse perma-
por fazendeiros da região, nente dos índios Xukuru, mediante Portaria Ministerial; em 1995, teve
u território, como o inte- sua demarcação física realizada com dimensão de 27.555 ha (Brasileiro et
rem como se deu a apro- alii, 1998) e, finalmente, teve publicado o seu decreto de homologação
pal e fazendeiros da região. em 2001.
o local esteve presente no Apesar de já ter sido alcançada adiantada etapa da regularização
nte a Vila de Cimbres na fundiária, o problema da desintrusão da TI passou a constituir um dos
r sua Câmara Municipal. principais obstáculos; não só os recursos necessários para efetivar as in-
da criação da vila foi, exa- denizações são liberados por etapas, como o próprio controle e gerencia-
ue lhe fosse “prestada as- mento do território começam a ser objeto de contenda de interesses anta-
o aponta o “Edital para a gônicos entre os índios que refletem uma clara disputa pelo poder e pela
tentativa de legitimação de outras formas de lideranças que se opõem
àquela conhecida como “liderança tradicional”.
sua vizinhança estão tam-
a, agora de maneira mais Um dos principais complicadores no processo é o tempo que decorre
o objeto desde de 1989 de para se passar de uma etapa para outra do procedimento de regularização
u reconhecimento formal fundiária. Outro fator decorrente do citado, é que o processo burocrático,
aquele apresentado em documentos, apresenta a situação relatada dentro
de um período limitado e que a torna aparentemente estanque.
ce com nitidez o conflito
ais embates passam a ter O intervalo entre o início do processo e a homologação da terra In-
dígena Xukuru consiste em 12 anos e, obviamente, o quadro identificado
no seu primeiro levantamento fundiário foi muito modificado. Diante da
. morosidade de ação do órgão indigenista oficial, os Xukuru utilizaram a

101
XUKURU DO ORORUBÁ

estratégia de retomar imóveis que consideravam importantes, seja para de tensão, índios e fazend
garantir o controle do seu território, seja para chamar a atenção do poder sentantes do Ministério P
público para dar prosseguimento à regularização fundiária. Diante do question
Em fevereiro de 1991, os Xukuru ocuparam em caráter definitivo a à defasagem dos valores
área da Pedra D’Água, com 110 ha, que estava sob domínio do Ministé- to fundiário de 1989, um
rio da Agricultura. Em 1992, os Xukuru retomaram a Fazenda Caípe e atualização dos mesmos,
em março de 1998, dois meses antes do assassinato de Chicão, ocuparam do Grupo Técnico 193/P
a Fazenda Tionante. Os Xukuru consideram a hipótese do assassinato Indígena Xukuru/PE.
de seu líder ter sido “encomendado” por fazendeiros da região enquanto Inicialmente, os índi
medida “preventiva”, pois a Fazenda Tionante, juntamente com outras
indígena cujos imóveis ele
situadas em pontos limítrofes às áreas hoje ocupadas efetivamente pelos
índios, constituíam alvos privilegiados de possíveis novas ações de reto- Alguns deles devido à pr
mada pelo grupo. o que garantiria a continu
guardar a segurança do g
Nesta mesma época, a rodovia estadual que corta a terra indígena disponíveis para organiza
foi também bloqueada pelos índios que tentavam chamar a atenção das pantes que representavam
autoridades para a morosidade do processo de garantia de seu território,
estagnado já há algum tempo. A continuidade do l
mento das referidas inden
A medida de ocupar algumas áreas prioritárias, como aquela conhe-
cida como da Fábrica Peixe (Fazenda Pitanga) que os Xukuru retomaram não houve nenhuma discu
no início de 2000, estava relacionada ao fato de os fazendeiros continu- diada pela FUNAI, para
arem negociando essas terras com a aprovação do cartório de registro de do seu território. Da mesm
imóveis de Pesqueira que ignora o fato de incidirem em terras indígenas. pequenos ocupantes não í
sendo assistidos pelos prog
Diante dos impasses que vinham se dando na região, foi realizada
em 22/02/2000 uma reunião na Câmara Municipal de Pesqueira, em que Em suma, ao eviden
o Sr. Presidente da FUNAI, Carlos Frederico Marés, juntamente com o alguns anos, que havia um
Ministério Público, estabeleceu o procedimento de indenização dos ocu- região.
pantes não índios da Terra Xukuru, inclusive determinado datas para a
liberação da verba destinada para a extrusão, assim como também como O Nível e as Formas
o valor estimado para cada parcela.
Com o não cumprimento do acordo, as negociações seguintes —
A ocupação de um t
envolvendo os índios, o Ministério Público Federal, FUNAI e Conselho
Indigenista Missionário, que ainda dialogavam — se deram no sentido de um espaço demarcado fisi
discutir o estabelecimento de critérios para as indenizações, considerando à possibilidade de sua exp
que os Xukuru apresentavam uma lista com o nome de sete ocupantes garante a existência e a co
de suas terras, escolhidos a partir da localização dos imóveis e da relação e afins que dão sustentaçã
de belicosidade mantida entre índios e não-índios, independentemente uma sociedade.
do tamanho do imóvel. Os ocupantes não-índios da TI Xukuru também A história dos Xuku
tiveram representantes nos encontros de negociação, mas devido ao clima mesmos em garantir a sua

102
“Plantaram” Xicão

m importantes, seja para de tensão, índios e fazendeiros se reuniam separadamente com os repre-
hamar a atenção do poder sentantes do Ministério Público Federal.
ão fundiária. Diante do questionamento dos ocupantes não-índios em relação
am em caráter definitivo a à defasagem dos valores das benfeitorias apresentados no levantamen-
a sob domínio do Ministé- to fundiário de 1989, uma das necessidades por eles apontadas foi a de
maram a Fazenda Caípe e atualização dos mesmos, pleito que foi contemplado com a instituição
nato de Chicão, ocuparam do Grupo Técnico 193/PRES/2000 de “Avaliação de Imóveis na Terra
a hipótese do assassinato Indígena Xukuru/PE.
deiros da região enquanto
Inicialmente, os índios indicaram sete nomes de ocupantes da terra
e, juntamente com outras
indígena cujos imóveis eles consideravam prioritários para desocupação.
upadas efetivamente pelos
íveis novas ações de reto- Alguns deles devido à proximidade de glebas já ocupadas pelos índios,
o que garantiria a continuidade das áreas, aspecto importante para res-
guardar a segurança do grupo, assim como para a ampliação das terras
que corta a terra indígena disponíveis para organizarem seus roçados. Indicaram também os ocu-
am chamar a atenção das pantes que representavam algum tipo de ameaça para a comunidade.
garantia de seu território,
A continuidade do levantamento dos imóveis incidentes e o paga-
mento das referidas indenizações vêm ocorrendo em fases sucessivas, mas
árias, como aquela conhe-
ue os Xukuru retomaram não houve nenhuma discussão com os Xukuru, que deveria ter sido me-
de os fazendeiros continu- diada pela FUNAI, para constituir um plano de ocupação e de manejo
do cartório de registro de do seu território. Da mesma forma, tem sido negligenciada a presença de
irem em terras indígenas. pequenos ocupantes não índios no território Xukuru, que deveriam estar
sendo assistidos pelos programas de reassentamento do INCRA.
do na região, foi realizada
cipal de Pesqueira, em que Em suma, ao evidenciar esse contexto, já era possível visualizar, há
Marés, juntamente com o alguns anos, que havia uma tendência da violência se intensificar naquela
o de indenização dos ocu- região.
determinado datas para a
ssim como também como O Nível e as Formas de Violência
negociações seguintes —
A ocupação de um território não significa apenas a apropriação de
deral, FUNAI e Conselho
— se deram no sentido de um espaço demarcado fisicamente, relacionado de maneira generalizante
ndenizações, considerando à possibilidade de sua exploração econômica. Trata-se de um espaço que
o nome de sete ocupantes garante a existência e a continuidade de redes de relações consangüíneas
o dos imóveis e da relação e afins que dão sustentação à organização social e produção simbólica de
dios, independentemente uma sociedade.
os da TI Xukuru também A história dos Xukuru é marcada pela expropriação do direito dos
ação, mas devido ao clima mesmos em garantir a sua sobrevivência física e cultural, o que caracteriza-

103
XUKURU DO ORORUBÁ

ria a violência estrutural, ou seja, as estruturas básicas de organização social, Tais questões comple
tal como estabelecidas historicamente no Brasil, não permitiam a garantia locam em evidência que u
de condições mínimas para assegurar a sobrevivência física e cultural das so- desde 1988, ou seja, a supe
ciedades indígenas. De maneira mais incisiva, a violência contra os Xukuru tada na prática das interve
se deu com o assassinato de seus membros e de pessoas a eles relacionadas De maneira mais pon
e teve seu ápice com a morte do cacique Chicão, fato que propiciou uma reiro, é necessário também
fragilização dos mecanismos internos de controle social dos Xukuru. os Xukuru tem vivencian
Durante quase dois anos, a indicação de um novo cacique ficou em Ao falarmos de violê
suspenso. Somente em 2000, quase dois anos após o assassinato de Chi- jetivos da cultura Xukuru
cão, seu filho, Marcos Luidson, assume o cacicado. A partir desse momen- sentimento de inseguranç
to, houve necessidade de uma reestruturação da sociedade Xukuru que
A assassinato do cac
envolvia desde o restabelecimento de alianças internas para a tentativa
morte de seu representant
de consolidação de um poder hegemônico até o aprendizado para lidar
dos Xukuru e de seus dir
com elementos tradicionais da cultura Xukuru, articulação que era bem
carismático que carregava
trabalhada pelo cacique Chicão e produzia a unidade entre as diversas
aldeias e diferentes gerações. O referido período de fragilidade vivido por Nesse contexto, dur
esses indígenas foi particularmente sensível aos efeitos do que denomina- licitada a exumação do seu
mos de violência institucional. se apresentavam como inc
A falta de preparação das várias agências para lidar com a plurali- O período anterior,
dade étnica — o que corresponde afirmar a necessidade de contemplar para a realização da exuma
diferentes lógicas — e a falta de elaboração de uma política indigenista e o evento em si deve ser a
proporcionaram intervenções extremamente danosas no seio das socieda- como um segundo mome
des indígenas. Se por um lado, os representantes das sociedades indígenas vido e atualizados os senti
não são chamados a participar de maneira equânime das negociações e Os registros da exum
decisões que dizem respeito aos seus interesses e destinos, por outro, há parte da comunidade (ad
um completo descompasso entre instâncias diferentes do indigenismo tirada do corpo, mas todo
oficial na condução de ações junto às sociedades indígenas. de seu túmulo na Pedra D
Há necessidade de se voltar para a discussão sobre a constituição religioso para os Xukuru.
e legitimidade de lideranças a partir da discussão das questões expostas a lona cedida por um padr
seguir, considerando que estamos diante de uma situação extremamente com uma “faca peixeira” e
complexa que acarreta o reconhecimento de direitos estabelecidos pelo
Estado brasileiro (ou a negação dos mesmos): a) como se estabelece o
poder na organização dos Xukuru? b) Como o Estado tem lidado com
códigos morais e tipos de sanções que diferem daqueles estabelecidos pe- 16. Basicamente tentar localizar
para verificar se teria sido expelido
los padrões hegemônicos da sociedade dita brasileira? c) Como o Estado tencente a “Ricardo” – João Libór
Brasileiro tem lidado com a superação do instituto da tutela a partir da
17. A exumação é precedida por
Constituição de 1988? Bispo.

104
“Plantaram” Xicão

sicas de organização social, Tais questões complementam a idéia da violência institucional e co-
não permitiam a garantia locam em evidência que um dos maiores avanços da política indigenista
ncia física e cultural das so- desde 1988, ou seja, a superação da tutela, ainda não está sendo implemen-
violência contra os Xukuru tada na prática das intervenções institucionais.
pessoas a eles relacionadas De maneira mais pontual, no que refere ao evento do dia 07 de feve-
o, fato que propiciou uma reiro, é necessário também discorrer sobre outras formas de violência que
e social dos Xukuru. os Xukuru tem vivenciando.
um novo cacique ficou em Ao falarmos de violência simbólica, ressaltamos que aspectos sub-
após o assassinato de Chi- jetivos da cultura Xukuru vêm sendo desconsiderados, ocasionando um
do. A partir desse momen- sentimento de insegurança e promovendo seqüelas incomensuráveis.
da sociedade Xukuru que
A assassinato do cacique Chicão representou muito mais do que a
internas para a tentativa
morte de seu representante e do que ele significou para o reconhecimento
o aprendizado para lidar
dos Xukuru e de seus direitos. Significou o aniquilamento de um líder
, articulação que era bem
carismático que carregava em si toda uma representação do sagrado.
unidade entre as diversas
o de fragilidade vivido por Nesse contexto, durante o inquérito que apurava sua morte, foi so-
efeitos do que denomina- licitada a exumação do seu corpo, a fim de evidenciar algumas provas que
se apresentavam como inconclusas.16
para lidar com a plurali- O período anterior, quando se negociava com os familiares a data
ecessidade de contemplar para a realização da exumação, foi já caracterizado por uma grande tensão
e uma política indigenista e o evento em si deve ser analisado, a despeito da sua necessidade ou não,
anosas no seio das socieda- como um segundo momento em que o luto pela morte de Chicão foi revi-
s das sociedades indígenas vido e atualizados os sentimentos de perda e revolta.
uânime das negociações e Os registros da exumação mostram o clima de comoção17 em que
e destinos, por outro, há parte da comunidade (adultos e crianças) acompanhou não apenas a re-
iferentes do indigenismo tirada do corpo, mas todo o processo de perícia, que foi realizada ao lado
s indígenas. de seu túmulo na Pedra D´Água, local que possui importante significado
ussão sobre a constituição religioso para os Xukuru. Os restos mortais foram ali expostos sobre uma
ão das questões expostas a lona cedida por um padre que acompanhava a exumação e explorados
ma situação extremamente com uma “faca peixeira” emprestada por um índio.
direitos estabelecidos pelo
: a) como se estabelece o
o Estado tem lidado com
daqueles estabelecidos pe- 16. Basicamente tentar localizar algum projétil em seu corpo, e submeter a exame de balística,
sileira? c) Como o Estado para verificar se teria sido expelido ou não do cano do revólver apreendido posteriormente, per-
tencente a “Ricardo” – João Libório Galindo. Não foi encontrado projétil, quando da exumação.
tuto da tutela a partir da
17. A exumação é precedida por um ritual religioso, acompanhado pelo Pajé Pedro Rodrigues
Bispo.

105
XUKURU DO ORORUBÁ

A violação do corpo de Chicão, que havia sido “plantado” e não como uma divisão “admin
enterrado, conforme o depoimento de vários índios18, atualizou os senti- sos e projetos voltados pa
mentos já citados e foi nesse contexto que atentam contra a vida de seu a responsabilidade dessa n
filho Marcos, cacique desde 2000, e matam dois “parentes” que o acom- de uma divisão física do te
panhavam. livre trânsito dos Xukuru
As lideranças tradic
A Constituição de Grupos Dissidentes bilidade de que seja criad
Xukuru, pois alegam que
trada de grupos econômi
Os Xukuru estão vivenciando, principalmente desde 2001, um cla-
oferecendo vantagens par
ro processo de divergências internas que culminou com o estabelecimento
de um grupo dissidente em Cimbres. Este é composto por representantes A questão em si não
com características baseadas nas formas burocráticas do estado nacional, agências “de contato”20 o
utilizando-se de procedimentos administrativos dos órgãos oficiais (FU- mente delas para conduzir
NAI, FUNASA, INSS) para sua legitimação. a ruptura no diálogo entre
ído em demasia para o aci
A maioria dos Xukuru é representada pelo que os próprios índios
denominam de “lideranças tradicionais”, são essas as autoridades social Destacamos ainda q
e historicamente constituídas pelos xukuru que têm correspondido ao bida de forma simplista e
caráter tradicional-carismático (Weber, 1967) e que vêm assumindo o Técnica instituída para ide
estatuto de autoridade legal. das da Terra Indígena, exi
mesma condição21.
Apesar dos conflitos já instaurados, tais divergências não apresen-
tam, até o momento, a constituição de uma cisão da sociedade Xukuru
capaz de sustentar a divisão de seu território; Tanto assim que os que se
colocaram contrários às lideranças tradicionais, ao serem envolvidos na
morte dos dois índios e no atentado à vida do cacique Marcos, foram
banidos da Terra Indígena, a fim de que o controle do território como um
19. Esta área engloba as aldeias d
todo fosse efetivado, considerando sua importância no plano religioso e de Courodanta
organizativo do grupo indígena. 20. Por agências de contato ente
A questão da dissidência entre os Xukuru foi iniciada com a estru- intersocietário e, por conseguinte
turação de uma facção política, composta por moradores da Vila de Cim- 21. “A primeira dificuldade enco
viam a saída das famílias da terra
bres e do povoado de Cajueiro. Tal fato não teria tamanha ressonância se flito do dia 07/02, mas envolvia ta
os Xukuru de Cimbres, como se denominam os integrantes do grupo que conflitos anteriores.
vêm promovendo uma reação à liderança tradicional dos Xukuru, não Optamos, dessa forma, por identi
dem elucidar cada situação observ
estivessem propondo uma divisão do grupo indígena; ora identificando-a Situação 1: Vila de Cimbres e Curra
Situação 2: Aldeias Cajueiro e Guar
Situação 3: Aldeia Lagoa e São Brá
Situação 4: Santa Rita” (Relatóri
18. Segundo os Xukuru, Chicão foi plantado e a partir dele nascerão novos guerreiros. Xukuru — 07.02.2003 — Pesqueira

106
“Plantaram” Xicão

via sido “plantado” e não como uma divisão “administrativa”, em que o gerenciamento dos recur-
ndios18, atualizou os senti- sos e projetos voltados para a região oeste da terra indígena19 ficaria sob
ntam contra a vida de seu a responsabilidade dessa nova liderança, ora propondo o estabelecimento
is “parentes” que o acom- de uma divisão física do território em duas partes e que impossibilitaria o
livre trânsito dos Xukuru entre as duas parcelas.
As lideranças tradicionais e seus seguidores não aceitam a possi-
bilidade de que seja criada uma outra forma de representatividade dos
Xukuru, pois alegam que esta seria uma manobra para promover a en-
trada de grupos econômicos e políticos na terra indígena, que estariam
mente desde 2001, um cla-
oferecendo vantagens particulares aos membros opositores.
ou com o estabelecimento
mposto por representantes A questão em si não é a existência das divergências, mas como as
áticas do estado nacional, agências “de contato”20 oficiais e não-oficiais se utilizam conveniente-
s dos órgãos oficiais (FU- mente delas para conduzir suas ações. Nesse sentido, podemos inferir que
a ruptura no diálogo entre as várias instituições envolvidas tem contribu-
ído em demasia para o acirramento dos conflitos.
elo que os próprios índios
ssas as autoridades social Destacamos ainda que a questão da dissidência não deve ser perce-
ue têm correspondido ao bida de forma simplista e polarizada. Conforme o Relatório da Comissão
e que vêm assumindo o Técnica instituída para identificar a situação das famílias que foram bani-
das da Terra Indígena, existem situações diferentes sendo colocadas num
mesma condição21.
divergências não apresen-
são da sociedade Xukuru
Tanto assim que os que se
, ao serem envolvidos na
o cacique Marcos, foram
ole do território como um
19. Esta área engloba as aldeias de Cimbres, Guarda, Cajueiro, podendo ainda envolver a aldeia
ância no plano religioso e de Courodanta
20. Por agências de contato entendemos todas as instituições que estão presentes no campo
u foi iniciada com a estru- intersocietário e, por conseguinte, interagindo com os Xukuru.
moradores da Vila de Cim- 21. “A primeira dificuldade encontrada pela Comissão foi a variedade de situações que envol-
viam a saída das famílias da terra indígena. Tratava-se não apenas da saída provocada pelo con-
ia tamanha ressonância se flito do dia 07/02, mas envolvia também outras problemáticas, como atritos entre familiares e
integrantes do grupo que conflitos anteriores.
dicional dos Xukuru, não Optamos, dessa forma, por identificar todas as famílias egressas e situá-las em quadros que po-
dem elucidar cada situação observada, a saber:
ígena; ora identificando-a Situação 1: Vila de Cimbres e Curral de Boi
Situação 2: Aldeias Cajueiro e Guarda
Situação 3: Aldeia Lagoa e São Brás
Situação 4: Santa Rita” (Relatório da Comissão Técnica PP 365/PRES/03 de 07.05.03 - Conflito
cerão novos guerreiros. Xukuru — 07.02.2003 — Pesqueira/PE; p.06)

107
XUKURU DO ORORUBÁ

Polarização Isto fez com que um


contestação, fosse formad
Focando o presente estudo sobre os Xukuru e a violência, é evidente por suas lideranças.
que o centro das atenções é o grupo indígena Xukuru de Ororubá, que Outro pólo de aglut
engloba todos os índios dessa etnia, espalhados em 23 aldeias em torno da tuído pelos fazendeiros e p
serra de Ororubá, na circunscrição política do que hoje é conhecido como Xukuru.
município de Pesqueira, na região agreste de Pernambuco. A violência física e i
Como já foi mencionado, os Xukuru são uma minoria22 étnica23, e a molde de polarização inte
reconstrução dessa etnicidade indígena passou pela luta pela reconquista principais agressores dos í
do espaço territorial24, e fortalecimento das formas tradicionais de orga- dores. É na esteira dessa p
nização social. Everaldo Rodrigues Bisp
Nesses esforços e nessas lutas para ressurgimento dos vínculos étnicos, rador da FUNAI Geraldo
e reconstrução do modo de ser e viver Xukuru, os índios tiveram de enfrentar Theopombo; em 1998 Fr
fazendeiros e posseiros, que estavam na posse de seus territórios, a FUNAI to pelo fazendeiro José Co
e todo o aparato administrativo da União Federal, para transformar em Francisco de Assis Santan
reconhecimento jurídico sua reivindicação sobre a terra, tendo ainda que A primeira fase do
enfrentar ações judiciais longas, difíceis e incertas. Xukuru; o apuratório do
Santos, conhecido como
cídio dos índios Jozenílson
22. Afirmando não haver uma definição de minoria universalmente aceita, a organização não-go- Silva; e da destruição de c
vernamental Minority Rights Group International, que realiza a defesa e a promoção de minorias,
em trabalho conduzido por Gudmundur Alfredsson e Erika Ferrer admitiu que “auto-identificação mato de violência, não m
com o grupo ou o elemento subjetivo; características objetivas, tais como elemento nacional, mente visível, mas uma in
racial, étnico, lingüístico e religioso, que distinga a minoria de outros grupos da população em
um país; aspecto numérico, isto é a exigência de o grupo compreender menos da metade da po- Isto fará surgir uma
pulação do Estado e o estabelecimento do grupo em um território em um considerável período dicionais Xukuru e as org
de tempo provavelmente constituem os principais elementos da definição”. Os autores também
reconheceram que as minorias não são sempre homogêneas, nem constituem sempre menor (CIMI, Centro Luiz Freire
número da população, acrescentando que os membros das minorias estão entre os mais pobres o Ministério Público Fede
e marginalizados da população.
23. Para Fredrik Barth, “O termo grupo étnico é utilizado geralmente na literatura antropológi-
ca para designar uma comunidade que: a) em grande medida se autoperpetua biologicamente;
2) compartilha valores culturais fundamentais realizados com unidade manifestada em formas
culturais; 3) integra um campo de comunicação e interação; 4) conta com membros que se iden-
tificam a si mesmos e são identificados pelos outros e que constituem uma categoria distinguível
de outras categorias da mesma ordem”.
24. Poutignat e Streiff-Fenart fazem importante observação, ao afirmarem que a adoção do con-
ceito nos termos étnico e etnicidade é correlata ao aparecimento de um tipo de conflito e de reivin-
dicações definidos como “étnicos” no final da década de 60, surgindo não apenas nas sociedades
desenvolvidas, mas igualmente nas sociedades do Terceiro Mundo. E tal conceito se impõe “para
abranger o que têm em comum todos esses fenômenos de competição e de conflito nos quais os 25. Embora dois índios estejam r
grupos se opõem em nome de sua pertença étnica”, concluindo que a emergência de uma pertença próprio afirmou, na 6a Câmara, s
étnica tornou-se uma categoria pertinente para a ação social, “e a crescente tendência de fazer agressões por parte dos fazendeir
derivar dela lealdades e direitos coletivos”.

108
“Plantaram” Xicão

Isto fez com que um pólo de aglutinação, e, ao mesmo tempo, de


contestação, fosse formado pelos Xukuru como um todo, representados
ru e a violência, é evidente por suas lideranças.
Xukuru de Ororubá, que Outro pólo de aglutinação, e, igualmente, de contestação, é consti-
em 23 aldeias em torno da tuído pelos fazendeiros e posseiros, os quais resistem às reivindicações dos
ue hoje é conhecido como Xukuru.
ernambuco. A violência física e interpessoal contra os Xukuru se enquadra no
uma minoria22 étnica23, e a molde de polarização intensa pela luta da terra, e terá nos fazendeiros os
pela luta pela reconquista principais agressores dos índios Xukuru, alcançando seus líderes, e apoia-
mas tradicionais de orga- dores. É na esteira dessa polarização que são assassinados em 1992 José
Everaldo Rodrigues Bispo, filho do pajé Zequinha; em 1995 o Procu-
mento dos vínculos étnicos, rador da FUNAI Geraldo Rolim da Mota Filho, morto pelo fazendeiro
ndios tiveram de enfrentar Theopombo; em 1998 Francisco de Assis Araújo Chicão Xukuru, mor-
seus territórios, a FUNAI to pelo fazendeiro José Cordeiro, conhecido como Zé de Riva; em 2002
eral, para transformar em Francisco de Assis Santana, Chico Quelé25.
e a terra, tendo ainda que A primeira fase do apuratório do assassinato do cacique Chicão
as. Xukuru; o apuratório do assassinato do cacique Francisco Barbosa dos
Santos, conhecido como Chico Quelé; as investigações do duplo homi-
cídio dos índios Jozenílson José dos Santos e José Ademílson Barbosa da
ente aceita, a organização não-go- Silva; e da destruição de casas no Cimbres, farão evidenciar um novo for-
defesa e a promoção de minorias,
er admitiu que “auto-identificação mato de violência, não mais aquela violência física e interpessoal, facil-
as, tais como elemento nacional, mente visível, mas uma invisível, institucional.
e outros grupos da população em
preender menos da metade da po- Isto fará surgir uma nova forma de polarização: as lideranças tra-
tório em um considerável período dicionais Xukuru e as organizações não governamentais que as apóiam
da definição”. Os autores também
, nem constituem sempre menor (CIMI, Centro Luiz Freire, MNDH, etc.) de um lado, e a Polícia Federal e
norias estão entre os mais pobres o Ministério Público Federal, no outro pólo.
almente na literatura antropológi-
se autoperpetua biologicamente;
unidade manifestada em formas
conta com membros que se iden-
stituem uma categoria distinguível

o afirmarem que a adoção do con-


o de um tipo de conflito e de reivin-
rgindo não apenas nas sociedades
ndo. E tal conceito se impõe “para
mpetição e de conflito nos quais os 25. Embora dois índios estejam respondendo à acusação de assassinato de Chico Quelé, este
que a emergência de uma pertença próprio afirmou, na 6a Câmara, seu receio e das demais lideranças de serem vítimas de novas
“e a crescente tendência de fazer agressões por parte dos fazendeiros.

109
XUKURU DO ORORUBÁ

IIIª Parte. Exame de casos Uma informação é


multaneamente, para vári
de detalhes; presença ou
Atuação nos casos concretos de elementos que corrobo
que a informação revela
Observações preliminares ancianidade da informaçã
primeira mão, detalhada,
A Comissão Especial não perde de vista o fato de que o relatório los, que demonstra um pa
implicará na observação do modo de atuação de algumas instituições cen- Precisão e confiabilid
trais na promoção e defesa dos direitos humanos no Brasil, e parceiras ção de precauções gerais,
permanentes do CDDPH no desempenho de sua função. Com efeito, familiaridade com a fonte
o Ministério Público Federal e a Polícia Federal têm praticamente sido te de informações; tratar
as instituições mais presentes em todas as comissões constituídas pelo evitar basear-se unicamen
CDDPH, e incluídas em todos os esforços de investigação, estudo e análi- mídia.27
se de violações de direitos humanos, e formulação de propostas de supera- Essencialmente, dev
ção. Também nesse estudo essas instituições são vistas como promotoras quem fez o que a quem; quan
de direitos humanos. ser no sentido de identific
Por outro lado, a FUNAI acumula mais de 30 anos de atuação na descrever como a vítima c
questão indígena, tendo em seus quadros inúmeros funcionários e funcio- foi apanhada/mantida.
nárias com imensa experiência, enorme conhecimento, e grande engaja- O ideal é obter rela
mento na luta pela promoção, proteção e defesa dos direitos dos índios. O oportunidades de obtençã
mesmo se diga do CIMI, enquanto órgão que integra a CNBB.
Ao se produzir uma
Ao observar como têm atuado essas instituições, a Comissão Espe- uma forte alegação não é
cial não realizou nenhuma interferência sobre suas atuações. Tampouco o que aconteceu. É també
exerceu influência sobre o desempenho de suas funções. Os contatos re- tados são verdadeiros.
alizados com as mesmas foram em busca de informações, com diálogos
Isso exige um certo
claros e transparentes, apontando pontos que, ao ver da Comissão Es-
para adequada análise da
pecial, mereciam esclarecimentos. Uma vez apresentado o Relatório ao
CDDPH, caberá a este, e às instituições que o compõem, deliberar acerca
de medidas e encaminhamentos que julguem oportuno adotar.

Informação de boa qualidade 26. Exemplo, no caso de tentativa


declarações precisas foram corrob
os laudos (tanatológicos, residogr
Em tudo na vida, mas especialmente em questão de análise de casos já prestou depoimento perante o C
concretos, máxime quando judicializáveis, é necessário se ter à mão infor- 27. GIFFARD, Camille [2000].The T
mação de boa qualidade, com precisão e confiabilidade. versity of Essex. págs. 30 a 47.

110
“Plantaram” Xicão

Uma informação é reputada de boa qualidade quando atenta, si-


multaneamente, para vários fatores, tais como fonte da informação; nível
de detalhes; presença ou ausência de contradições; presença ou ausência
concretos de elementos que corroboram ou enfraquecem a alegação; amplitude em
que a informação revela um padrão de comportamento; atualidade ou
ancianidade da informação. Informação de muito boa qualidade26 é a de
primeira mão, detalhada, coerente, corroborada por vários outros ângu-
o fato de que o relatório los, que demonstra um padrão de conduta, e que é atual.
algumas instituições cen- Precisão e confiabilidade da informação são obtidas mediante a ado-
nos no Brasil, e parceiras ção de precauções gerais, tais como conhecer a fonte das informações; ter
sua função. Com efeito, familiaridade com a fonte e com o contexto; manter contatos com a fon-
al têm praticamente sido te de informações; tratar cautelosamente informações vagas e genéricas;
missões constituídas pelo evitar basear-se unicamente em matérias e reportagens divulgadas pela
vestigação, estudo e análi- mídia.27
ão de propostas de supera- Essencialmente, devem ser registradas informações a respeito de
o vistas como promotoras quem fez o que a quem; quando, onde, por que e como. Portanto, o esforço deve
ser no sentido de identificar a vítima; identificar o perpetrador (agressor);
de 30 anos de atuação na descrever como a vítima caiu nas mãos do agressor; explicar onde a vítima
eros funcionários e funcio- foi apanhada/mantida.
imento, e grande engaja- O ideal é obter relato detalhado e informativo, que proporcione
dos direitos dos índios. O oportunidades de obtenção de corroboração.
ntegra a CNBB.
Ao se produzir uma prova, não se pode perder de vista que fazer
tuições, a Comissão Espe- uma forte alegação não é apenas apresentar a narrativa de alguém sobre
suas atuações. Tampouco o que aconteceu. É também fazer os outros acreditarem que os fatos rela-
funções. Os contatos re- tados são verdadeiros.
nformações, com diálogos
Isso exige um certo distanciamento crítico da fonte de informação,
, ao ver da Comissão Es-
para adequada análise da prova.
presentado o Relatório ao
ompõem, deliberar acerca
portuno adotar.

qualidade 26. Exemplo, no caso de tentativa de assassinato, é o depoimento do jovem Diogo Ruann, cujas
declarações precisas foram corroboradas pelos depoimentos do réu Lourival Frazão, e por todos
os laudos (tanatológicos, residográficos, de balística, etc.) realizados no processo. Diogo Ruann
questão de análise de casos já prestou depoimento perante o CDDPH.
cessário se ter à mão infor- 27. GIFFARD, Camille [2000].The Torture Reporting Handbook. Essex: Human Rights Centre, Uni-
bilidade. versity of Essex. págs. 30 a 47.

111
XUKURU DO ORORUBÁ

Análise dos casos ra as razões do insucesso


conflito pela posse de terr
Caso 1. Assassinato do Cacique Chicão disputa pelo poder dentro
(Francisco de Assis Araújo) Diz o delegado que
patrocinou invasão de terras
O Inquérito policial foi instaurado em 20 de maio de 1998, na Su- da reserva Xukuru, contrar
perintendência Regional de Pernambuco do Departamento de Polícia Chicão era casado e mantinh
Federal sob nr. IPL 211/1998 (posteriormente convertido no Processo público pouco tempo antes de s
2002.83.00.012442-1), objetivando apurar as circunstâncias e a autoria da comunidade indígena (..
da morte do cacique Chicão Xukuru. pretensões de concorrer a cargo
o assassinato de posseiros no i
Ao final foram indiciados José Cordeiro de Santana, o Zé de Riva
(falecido); Rivaldo Cavalcanti de Siqueira, o Riva de Alceu (ainda pre- Segundo o delegado
so); Evandro Tenório de Brito, o Vando de Ageu; e José Genivaldo Alves tigações. Ainda assim, “ex
Pontes, o Tonho de Rita (estes últimos por ameaçarem Riva de Alceu). investigação, não havendo si
O pistoleiro a executar Chicão foi José Libório Galindo, conhecido por que pudesse parecer” (fls. 411
“Ricardo”, assassinado em condições estranhas. E, não encontrando
Em 20 de maio de 1998, quarta-feira, dia de feira em Pesqueira, clui: “verdade seja dita, Chi
Francisco de Assis Araújo, Chicão Xukuru, cacique, foi executado com desafetos e inimigos, podendo
cinco tiros de revólver calibre 38, em frente à casa de sua irmã, por volta no interior do Nordeste, os c
das 10hs, no Bairro Xukuru, Pesqueira. encomenda (pistolagem), mui
No momento em que foi assassinado, o cacique estava dentro do
utilitário Niva (Lada), de propriedade da FUNAI. O culpado foi Chicã
Em depoimento à 6a Câmara (Índios e Minorias), da PGR, em
25.3.98, Chicão afirmou que se sentia ameaçado, em razão da luta pela Em novembro de 2
terra, e particularmente pelo fato de prestar depoimento como testemu- com o desfecho, e insistiu
nha contra o fazendeiro Theopompo Siqueira Brito Sobrinho. camente na quebra de sig
A polícia federal trabalhava tanto a hipótese de crime motivado pela E o processo teve tra
luta pelas terras, como de crime passional, vez que ao cacique Chicão ano, sem qualquer avanç
atribuía-se o fato de envolver-se com várias mulheres, tendo amantes. com a ausência de invest
A viúva de Chicão, Dona Zenilda Araújo, teve suspeitas levantadas internacional do caso tan
contra si, e foi interrogada a respeito. Humanos quanto pelo Co
pelo encaminhamento ao
Um índio – Jurandir Gomes - chegou a ser preso, sendo posterior-
designação de delegado e
mente liberado (v. 1, fls. 265).
Marcos Van Der Veen Cot
Em 27 de setembro de 2000, o DPF Santiago Amaral Fernandes
apresenta relatório do IPL, sem apontar indiciados. Ao contrário, nar-

112
“Plantaram” Xicão

ra as razões do insucesso dos trabalhos: linhas de investigação incluíam


conflito pela posse de terra com fazendeiros e posseiros; crime passional;
acique Chicão disputa pelo poder dentro da tribo.
raújo) Diz o delegado que qualquer das hipóteses seria factível: “o cacique
patrocinou invasão de terras de fazendeiros, e tentava junto à Funai a demarcação
de maio de 1998, na Su- da reserva Xukuru, contrariando o interesse de inúmeros proprietários de terras.
Departamento de Polícia Chicão era casado e mantinha um relacionamento amoroso extra conjugal, tornado
e convertido no Processo público pouco tempo antes de sua morte. Havia divergência entre ele e outros líderes
circunstâncias e a autoria da comunidade indígena (...). Mantinha vínculos com políticos e possivelmente
pretensões de concorrer a cargo eletivo. Finalmente, era suspeito de envolvimento com
o assassinato de posseiros no interior da reserva Xukuru”.(fls. 408, v. 2).
de Santana, o Zé de Riva
Riva de Alceu (ainda pre- Segundo o delegado, a falta de recursos influiu no atraso das inves-
u; e José Genivaldo Alves tigações. Ainda assim, “exauriram-se todas as possibilidades possíveis (sic) de
meaçarem Riva de Alceu). investigação, não havendo sido negligenciado qualquer dado por mais irrelevante
o Galindo, conhecido por que pudesse parecer” (fls. 411).
E, não encontrando um suspeito a quem culpar, o delegado con-
dia de feira em Pesqueira, clui: “verdade seja dita, Chicão angariou ao longo de sua vida grande número de
cique, foi executado com desafetos e inimigos, podendo ser qualquer um deles seu algoz. Não bastasse isso,
asa de sua irmã, por volta no interior do Nordeste, os conflitos não raros são resolvidos através de crimes de
encomenda (pistolagem), muito difíceis de serem apurados”.
cacique estava dentro do
AI. O culpado foi Chicão Xukuru!
Minorias), da PGR, em
do, em razão da luta pela Em novembro de 2000, o MPF manifestou sua não conformação
poimento como testemu- com o desfecho, e insistiu em mais algumas diligências, consistentes basi-
Brito Sobrinho. camente na quebra de sigilo bancário de algumas contas.
se de crime motivado pela E o processo teve tramitação protocolar e burocrática por quase um
ez que ao cacique Chicão ano, sem qualquer avanço, até intervir o CDDPH que, inconformado
lheres, tendo amantes. com a ausência de investigação efetiva, e atento ao acompanhamento
teve suspeitas levantadas internacional do caso tanto pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos quanto pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU, deliberou
pelo encaminhamento ao Ministro da Justiça, José Gregori, pedido de
er preso, sendo posterior-
designação de delegado especial, incidindo a escolha no nome do DPF
Marcos Van Der Veen Cotrim.
ntiago Amaral Fernandes
iados. Ao contrário, nar-

113
XUKURU DO ORORUBÁ

O Ministro da Justiça José Gregori oficiou em 30 de maio de como conseguiu: procuro


2001 ao Diretor Geral do DPF, indagando da possibilidade de de- das polícias civil e militar
signação daquele DPF. Ouvidos, os delegados28 de polícia federal do assassinato de Chicão,
em Pernambuco se manifestaram contrários à designação. Mas o DPF com fama de pistoleiro, ti
Santiago, o último a presidir o inquérito, concordou. (fls. 448). pois, Ricardo surgia na ci
Isto não significou a designação desde logo do DPF Marcos Cotrim. plantel de cavalos.
Uma nova morte, agora a de Francisco de Assis Santana - o Chico Quelé Seguindo a pista, o
-, ocorrida em 23 de agosto de 2001, é que faria renascer o inquérito. É o Libório Galindo, assassina
próprio delegado Cotrim quem diz, ao relatar o caso Chicão: “passados três no Maranhão. Com o retra
anos e meio nada de consistente fora conseguido, quando então ocorreu o homicídio de Chicão, agora morando
de Chico Quelé. Esse, segundo o apurado, nada tem a ver com o assassinato do Ca- vo do autor dos disparos:
cique Chicão, porém um novo tratamento foi dado ao caso Chicão, com a indicação Ficou finalmente esc
de um Delegado exclusivo para o caso” (fls. 927) por sua vida, e temia par
Em 15 de outubro de 2001 o Delegado Marcos Cotrim assumiu, dele sendo José Cordeiro
com exclusividade, os inquéritos dos casos Chicão (IPL 211/98) e Chico trado que este contratou J
Quelé (IPL 406/2001). Daí que foi freqüente testemunhas de um caso pecuru-Mirim31 (MA), em
serem indagadas sobre assuntos e questões do outro caso. Siqueira (Riva de Alceu) p
A primeira pessoa a ser ouvida por Cotrim foi José Cordeiro de San- gou cerca de R$ 50.000,0
tana (fls. 460, v. 2), o Zé de Riva. Que negou qualquer participação no Zé de Riva foi preso
crime, e investiu contra Zé de Santa29, a quem atribuiu a condição de da Polícia Federal. Suicídi
principal interessado na morte de Chicão Xukuru, porque passou a ter Riva de Alceu foi pre
grande prestígio e poder na comunidade indígena, e era amante de Zenil- Ministério Público. O que
da Araújo, viúva de Chicão (e mãe do cacique Marcos Luidson).
Em Junho de 2003 é
Várias testemunhas foram ouvidas. Com o retrato falado do assas- que o acusado tenha de se
sino, o delegado Cotrim faz diligências em São Paulo, Rio de Janeiro, lação criminal (RCCR 61
Maranhão, Rio Grande do Norte, procurando formar a cadeia lógica de Federal da 5a Região nego
informações sobre as autorias do homicídio, e posterior destino dos res- Alceu continua preso.
ponsáveis. Em pouco menos de seis meses foi-lhe possível representar por
prisões preventivas de José Cordeiro de Santana (o Zé de Riva), e Rivaldo
Cavalcanti Siqueira (o Riva de Alceu). É o próprio Cotrim quem explica

28. O Superintendente de Pernambuco Zulmar Pimentel dos Santos disse que as informações
que detinha “desaconselham a redistribuição” (fls. 441, v. 2). E a DPF Joseny Gomes de Melo
Simas, Chefe da Delegacia Regional de Polícia da SR/PE/DPF, disse não vislumbrar necessidade de 30. Antônio Pereira de Araújo, po
designação (fls. 442v). aças, o cacique Chicão começou a
que tais índios não andavam arma
29. José Barbosa dos Santos, que virá a ser indiciado e acusado pela morte de Chico Quelé (Fran-
cisco de Assis Santana). 31. É neste município que, curios

114
“Plantaram” Xicão

ciou em 30 de maio de como conseguiu: procurou informações junto aos serviços de inteligência
da possibilidade de de- das polícias civil e militar de Pesqueira. Colheu informação de que, no dia
dos28 de polícia federal do assassinato de Chicão, um homem conhecido pelo nome de Ricardo,
designação. Mas o DPF com fama de pistoleiro, tinha sido visto em Pesqueira. E poucos dias de-
rdou. (fls. 448). pois, Ricardo surgia na cidade de Venturosa PE, onde morava, com um
o do DPF Marcos Cotrim. plantel de cavalos.
s Santana - o Chico Quelé Seguindo a pista, o delegado identificou Ricardo como sendo José
a renascer o inquérito. É o Libório Galindo, assassinado de modo suspeito em 13 de agosto de 2001,
caso Chicão: “passados três no Maranhão. Com o retrato falado, conseguiu que testemunha da morte
ndo então ocorreu o homicídio de Chicão, agora morando em São Paulo, fizesse o reconhecimento positi-
ver com o assassinato do Ca- vo do autor dos disparos: era José Libório Galindo, o Ricardo.
caso Chicão, com a indicação Ficou finalmente esclarecido que o cacique Chicão Xukuru temia30
por sua vida, e temia particularmente a alguns fazendeiros, o principal
Marcos Cotrim assumiu, dele sendo José Cordeiro de Santana, o Zé de Riva, tendo sido demons-
cão (IPL 211/98) e Chico trado que este contratou José Libório Galindo (o Ricardo, morto em Ita-
testemunhas de um caso pecuru-Mirim31 (MA), em circunstâncias estranhas) e Rivaldo Cavalcanti
outro caso. Siqueira (Riva de Alceu) para executarem o cacique Chicão Xukuru. Pa-
m foi José Cordeiro de San- gou cerca de R$ 50.000,00.
qualquer participação no Zé de Riva foi preso. Com cerca de 20 dias apareceu morto na cela
m atribuiu a condição de da Polícia Federal. Suicídio.
kuru, porque passou a ter Riva de Alceu foi preso. Restou apenas ele para ser denunciado pelo
na, e era amante de Zenil- Ministério Público. O que foi feito em 9 de agosto de 2002.
Marcos Luidson).
Em Junho de 2003 é proferida sentença de pronúncia, fazendo com
o retrato falado do assas- que o acusado tenha de ser submetido a júri popular federal. Houve ape-
ão Paulo, Rio de Janeiro, lação criminal (RCCR 617 PE), a que a 4a Turma do Tribunal Regional
formar a cadeia lógica de Federal da 5a Região negou provimento em 2 de março de 2004. Riva de
posterior destino dos res- Alceu continua preso.
he possível representar por
a (o Zé de Riva), e Rivaldo
prio Cotrim quem explica

Santos disse que as informações


. E a DPF Joseny Gomes de Melo
sse não vislumbrar necessidade de 30. Antônio Pereira de Araújo, por exemplo, a fls. 544, diz que, em razão dos temores das ame-
aças, o cacique Chicão começou a andar com alguns índios Xukuru agindo como seguranças, mas
que tais índios não andavam armados.
o pela morte de Chico Quelé (Fran-
31. É neste município que, curiosamente, Theopombo de Siqueira Brito tem fazenda.

115
XUKURU DO ORORUBÁ

Caso 2. Assassinato de Francisco de Assis Em 7 de junho de 2


Santana, o Chico Quelé quais o Procurador-Chefe
procurador responsável p
Síntese do caso Chico Quelé Xukuru) subscreveram re
são preventiva solicitada.
Foi expedido manda
Em 23 de agosto de 2001, o MPF/PRPE requisita instauração de mente recebido pela autor
inquérito para apurar a morte de Francisco de Assis Santana, o Chico
As testemunhas acim
Quelé, ocorrida por volta das 10:30 da manhã daquele dia. (fls. 14).
zerem presentes à sede do
A morte de Chico Quelé foi comunicada à polícia civil de Pernam-
No dia oito de julho
buco, em Pesqueira, às 13 hs., por José Barbosa dos Santos – Zé de Santa,
em Pernambuco, o DPF
tendo o irmão de Chico Quelé, naquela mesma oportunidade, dito à au-
mentos de testemunhas,
toridade policial civil que a morte tinha sido motivada por causa da posse
homicídio contra Chico Q
de terra e que fazendeiros posseiros estavam envolvidos no homicídio,
entre eles Zé de Riva e Antônio Carlos. (fls. 17). Dona Zenilda Araúj
outros, presentes ao ato, s
O DPF Jorge Alberto de Oliveira Cunha instaurou o inquérito em
dos seus depoimentos par
24 de agosto, e o presidiu até 28 de setembro de 2001, quando houve
distribuição para o DPF Marcos Cotrim. Embora a ouvida fos
se fez presente. E houve pr
ano, quando, na mesma
O inquérito correu em segredo de justiça. ouvida (fls. 418).
Nessa noite de oito
Foram ouvidas várias testemunhas, incluindo lideranças tradicio- ria, João Campos da Silva
nais indígenas, dissidentes dessas lideranças, fazendeiros (incluindo José quem estivera a tarde inte
Cordeiro de Santana – Zé de Riva, assassino de Chicão). José Lourival João Campos da Sil
Frazão – Louro Frazão, que viria a matar dois índios), também foi ouvido. -mente ouvido. É interrog
José Barbosa dos Santos, Zé de Santa, foi ouvido no IPL em janeiro O DPF COTRIM en
de 2002 (fls. 250), em Pesqueira. E João Campos da Silva foi ouvido em
Recife, em março de 2002 (a este depoimento se fez presente procurador Três são os indiciado
da República). Campos da Silva Dandão,
Em junho de 2002, o DPF Cotrim oficiou a PR/PE, solicitando Concluiu a autorida
agendamento para ouvida, como testemunhas no inquérito, entre outros, pistoleiros33, sendo um de
das pessoas de Zenilda Araújo, José Barbosa dos Santos Zé de Santa, João do fato, Djalma.
Campos da Silva Dandão, Djalma Pereira dos Santos Cirilo e Abdias Se-
vero da Hora.(fls. 365). 32. A defesa de Dandão vai argum
nos autos, e pedir a nulidade do pr
Logo após, o DPF Cotrim representou ao MPF, pleiteando a prisão e do escritório de advocacia, quan
preventiva de José Barbosa dos Santos - Zé de Santa, e João Campos da
33. Só apontou um como autor,
Silva - Dandão. (fls. 366). autor.

116
“Plantaram” Xicão

rancisco de Assis Em 7 de junho de 2002, sete procuradores da República, entre os


uelé quais o Procurador-Chefe (que recebera o ofício de agendamento) e o
procurador responsável pela tutela coletiva (responsável pelas questões
Xukuru) subscreveram representação ao Juiz Federal, requerendo a pri-
são preventiva solicitada. (fls. 375).
Foi expedido mandado de prisão em 3 de julho de 2002, e devida-
E requisita instauração de mente recebido pela autoridade policial nesse mesmo dia (fls. 391).
e Assis Santana, o Chico
As testemunhas acima mencionadas foram notificadas para se fa-
daquele dia. (fls. 14).
zerem presentes à sede do Ministério Público Federal em Pernambuco.
à polícia civil de Pernam-
No dia oito de julho de 2002, na sede da Procuradoria da República
dos Santos – Zé de Santa,
em Pernambuco, o DPF MARCOS COTRIM realiza coleta de depoi-
a oportunidade, dito à au-
mentos de testemunhas, nos autos do IPL 406 (o inquérito que apura o
otivada por causa da posse
homicídio contra Chico Quelé).
envolvidos no homicídio,
. Dona Zenilda Araújo é ouvida. João Campos da Silva (Dandão), e
outros, presentes ao ato, são dispensados de ouvida nesse dia, e remarca-
instaurou o inquérito em
dos seus depoimentos para o dia seguinte.
o de 2001, quando houve
Embora a ouvida fosse na PR/PE, nenhum procurador da República
se fez presente. E houve presença, por exemplo, aos 30 de abril do mesmo
ano, quando, na mesma PR/PE, a advogada Maria José do Amaral foi
a. ouvida (fls. 418).
Nessa noite de oito de julho de 2002, logo após sair da Procurado-
uindo lideranças tradicio- ria, João Campos da Silva Dandão foi preso pelo Delegado da PF, com
azendeiros (incluindo José quem estivera a tarde inteira, na sede da PR/PE.
de Chicão). José Lourival João Campos da Silva Dandão é acareado32 com Abdias, e nova-
dios), também foi ouvido. -mente ouvido. É interrogado e qualificado. (fls. 433, v. 2).
ouvido no IPL em janeiro O DPF COTRIM encerra o inquérito em 22 de julho de 2002.
pos da Silva foi ouvido em
se fez presente procurador Três são os indiciados: José Barbosa dos Santos Zé de Santa; João
Campos da Silva Dandão, e Djalma Pereira dos Santos Cirilo.
iou a PR/PE, solicitando Concluiu a autoridade policial que a vítima foi tocaiada por dois
no inquérito, entre outros, pistoleiros33, sendo um deles Dandão, identificado pela única testemunha
s Santos Zé de Santa, João do fato, Djalma.
Santos Cirilo e Abdias Se-
32. A defesa de Dandão vai argumentar, em suas alegações finais, da ausência desse documento
nos autos, e pedir a nulidade do processo. Na verdade, ou falha da secretaria da Vara em informar,
MPF, pleiteando a prisão e do escritório de advocacia, quando da leitura dos autos.
Santa, e João Campos da
33. Só apontou um como autor, o Dandão, mas não conseguiu apontar quem teria sido o outro
autor.

117
XUKURU DO ORORUBÁ

Continuou afirmando ter se tratado de crime de mando, sendo o sucumbiu diante de tiros
mandante o Vice-Cacique Zé de Santa, que teve como motivos funda- da Silva Dandão.
mentais a disposição de denunciar desvios de verbas, de que eram benefi- Zé de Santa foi denu
ciários o cacique Marcos, sua mãe Zenilda, Zé de Santa e Severino. cutor. (fls. 4).
Conclui isto porque “os citados, ao contrário dos demais Xukurus A denúncia narrou q
que estampam a miséria, possuem contas bancárias nas agências do Bra- das instruções de convida
desco, Banco do Brasil e Caixa Econômica nos Municípios de Pesqueira e deia São José. E que Djalm
Belo Jardim PE.” (sic, pág. 479). temido (fls. 337). E que n
Ainda segundo a autoridade policial, a segunda causa fora a retoma- Dandão matar Chico Que
da da Fazenda Santa Rita, e Zé de Santa ficara com ódio de Chico Quelé Destacando a motiv
porque já prometera uma das casas para uma sua filha (de Zé de Santa). que Chico Quelé era sério
Para demonstrar a veracidade dessas alegações, a autoridade poli- outras lideranças Xukuru
cial diz que, sobre os desvios de verbas, colaboraram para tal conclusão mandos cometidos pelo g
diversos depoimentos de testemunhas, e “parte considerável dos recursos ciar injustiças na distribu
desviados foram parar nas contas bancárias do Cacique Marcos, Zenilda, verno federal e por ONG
Severino, Zé de Santa, o que poderá ser comprovado através de uma ve- chamado grupo de Zé de
rificação judicial dos extratos de movimentação bancária dessas dos últi- Complementou indi
mos quatro anos” (sic, fls. 480). zendeiro Geraldo, como se
Deixando claro que ele, Delegado Marcos Cotrim, não fizera ne- que “a retomada foi liderada
nhuma colheita de prova documental do que afirmara, reitera que “en- do grupo de Zé de Santa, mo
quanto não for possível acessar a movimentação bancária das lideranças destinado aquelas terras a pe
xukurus nos últimos quatro anos, as provas disponíveis, após 10 meses por Chico Quelé” (fls. 08/09
de investigações, consistem em aproximadamente 40 depoimentos” (sic, Na denúncia, a teste
fls. 481). Pereira dos Santos (Cirilo)
Dos autos não há notícia de nenhuma representação da autoridade testemunhas na denúncia
policial nem ao Ministério Público nem ao Juiz Federal, requerendo que- Depoimentos presta
bra de sigilo bancário. visão, em vários moment
Em 31 de julho de 2002 o MPF denuncia José Barbosa dos Santos 2002, em Brasília, (estes ú
(Zé de Santa) e João Campos da Silva (Dandão) pelo cometimento do mens teriam sido vistos na
homicídio na pessoa de Francisco de Assis Santana (Chico Quelé). regando armas em um sac
Segundo a denúncia, José Barbosa dos Santos Zé de Santa procurou tanto para a PR/PE quanto
Djalma Pereira dos Santos (Cirilo), para que este convidasse Chico Quelé em oito de abril de 2003,
para reunião com a FUNAI, na Aldeia São José, e o conduzisse por um dora-Geral da República E
caminho previamente estabelecido, diferente do tradicional. E tal teria Em suas alegações fi
sido feito, de modo que, no dia da reunião, dirigindo-se à mesma, na culpabilidade dos réus Jos
altura da Aldeia Goiabeira (Sítio Afetos), Chico Quelé foi emboscado, e dante, e João Campos da

118
“Plantaram” Xicão

crime de mando, sendo o sucumbiu diante de tiros de espingarda 12, desferidos por João Campos
eve como motivos funda- da Silva Dandão.
erbas, de que eram benefi- Zé de Santa foi denunciado como mandante, e Dandão como exe-
de Santa e Severino. cutor. (fls. 4).
ário dos demais Xukurus A denúncia narrou que Djalma atribuiu a Zé de Santa a indicação
árias nas agências do Bra- das instruções de convidar e conduzir Chico Quelé para a reunião na Al-
Municípios de Pesqueira e deia São José. E que Djalma obedeceu por que Zé de Santa er perigoso e
temido (fls. 337). E que não tinha dúvidas de que Zé de Santa mandou
unda causa fora a retoma- Dandão matar Chico Quelé (fls. 356).
com ódio de Chico Quelé Destacando a motivação do delito, o Ministério Público afirmou
ua filha (de Zé de Santa). que Chico Quelé era sério, e não se intimidava nem mesmo em afrontar
gações, a autoridade poli- outras lideranças Xukuru. E que Chico Quelé vinha denunciando des-
oraram para tal conclusão mandos cometidos pelo grupo de Zé de Santa. E teria ameaçado denun-
considerável dos recursos ciar injustiças na distribuição de verbas de projetos financiados pelo go-
Cacique Marcos, Zenilda, verno federal e por ONGs. Citou “Projeto Crescendo Xukuru”. O assim
ovado através de uma ve- chamado grupo de Zé de Santa estaria sendo beneficiado.
o bancária dessas dos últi- Complementou indicando a retomada da Fazenda Santa Rita, do fa-
zendeiro Geraldo, como sendo parte do móvel do crime. A denúncia disse
os Cotrim, não fizera ne- que “a retomada foi liderada, entre outros, pela vítima, o que não encontrou apoio
afirmara, reitera que “en- do grupo de Zé de Santa, mormente tendo em vista que este já havia previamente
ão bancária das lideranças destinado aquelas terras a pessoas de seu círculo, mais uma vez sendo contrariado
isponíveis, após 10 meses por Chico Quelé” (fls. 08/09).
nte 40 depoimentos” (sic, Na denúncia, a testemunha chave do homicídio foi o senhor Djalma
Pereira dos Santos (Cirilo) (vários depoimentos). Outros indicados como
presentação da autoridade testemunhas na denúncia o são da motivação ou de outras circunstâncias.
Federal, requerendo que- Depoimentos prestados perante a 6a Câmara de Coordenação e Re-
visão, em vários momentos, especialmente alguns prestados em abril de
a José Barbosa dos Santos 2002, em Brasília, (estes últimos veiculando a informação de que dois ho-
ão) pelo cometimento do mens teriam sido vistos na manhã do assassinato do índio Chico Quelé, car-
ana (Chico Quelé). regando armas em um saco) embora enviados por aquela unidade do MPF
ntos Zé de Santa procurou tanto para a PR/PE quanto para o DPF Marcos Cotrim, só vieram aos autos
e convidasse Chico Quelé em oito de abril de 2003, quando diretamente enviados pela Subprocura-
sé, e o conduzisse por um dora-Geral da República Ela Wiecko ao Juiz do feito (fls. 692 e segs. V. III).
do tradicional. E tal teria Em suas alegações finais, o MPF reiterou sua convicção quanto à
dirigindo-se à mesma, na culpabilidade dos réus José Barbosa dos Santos Zé de Santa, como man-
o Quelé foi emboscado, e dante, e João Campos da Silva Dandão, como executor. Transcreveu tre-

119
XUKURU DO ORORUBÁ

chos de depoimentos de Djalma Pereira dos Santos (Cirilo) e de testemu- de acareação entre João C
nhas, incriminando os réus. Hora não teria sido juntad
Quanto à motivação, as alegações finais são mais comedidas, res- Criticou o pedido de
tringindo-se a afirmar que Zé de Santa desejava a morte de Chico Quelé mara, feito pelos procura
para “continuar a gerir os recursos que eram destinados ao povo Xukuru que, pelo menos um daqu
da maneira que bem entendia, bem como a planejar as retomadas de ter- tais documentos estavam
ras e a distribuí-las às pessoas que lhe eram próximas”.(fls. 863). Afirmou que o MPF
Rechaçou outra linha de investigação, que apontasse para responsa- denúncia, já tinha toda a
bilidade de fazendeiros, ao argumento de Chico Quelé não ter inimizade vidos pelas lideranças tra
com estes. monstrando a lisura das a
Pediu o desentranhamento das peças de informação enviadas pela dados à mão desde novem
6 Câmara34, por entender ser prova emprestada e inservível, porque não
a as denúncias de malversaç
submetida ao contraditório (fls. 868). Criticou as contradi
O Ministério Público pediu a pronúncia do réu. Insistiu na manu- tério Público, Djalma Per
tenção da prisão de Dandão. vestigações, na linha apon
José Barbosa dos Santos Zé de Santa permaneceu foragido durante Voltou o MPF a se
quase todo o processo, e João Campos da Silva Dandão esteve preso até 2003, de despacho profer
julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do Recurso Ordinário em buco, arquivando proced
Hábeas Corpus 83179, em 1o de julho de 2003. Quase um ano. ção de dinheiro de projeto
Aspecto relevante é que a liberdade de João Campos da Silva Dan- Como diligências fin
dão e José Barbosa dos Santos Zé de Santa foi sustentada pelo MPF com nunciando o réu João Cam
assento no STJ e no STF. Com efeito, negado o hábeas corpus no STJ 2004 para a realização da
(contra o parecer do MPF), foi uma subprocuradora-geral da República Srs. Moacir Santos e Rob
que recorreu ao STF ordinariamente, e obteve reforma do julgado. Regional da FUNAI e ser
munhas do Juízo.
João Campos da Silva Dandão apresentou alegações finais35 em 7 de
julho de 2003. Iniciou sustentando cerceamento de defesa, porque o auto

34. Entre os documentos acostados aos autos, originados da 6a Câmara, está um depoimento
da vítima Francisco de Assis Santana – Chico Quelé – prestado em 5 de junho de 1998, no qual
afirma que boato falso, espalhado pelo fazendeiro e comerciante Leonardo Gomes da Silva, fora
responsável pela ausência de polícia nas ruas de Pesqueira no dia da morte de Chicão. Também
nesse depoimento de Chico Quelé, prestado na Procuradoria Geral da República, ele diz que “for-
maram uma comissão para vir aqui em Brasília para exigirem providências acerca da morte do
cacique Chicão, da homologação de suas terras, e também em virtude de se sentirem ameaçados,
36. Equívoco da defesa. O auto d
especialmente as lideranças, que também temem possa surgir um conflito na área, em virtude
Público, pronunciando-se sobre o
dela ainda não ter sido homologada, bem como a morte de outros índios” (fls. 733, v. 3).
mencionado, por quem quer que
35. Fls. 854 a 874, v. 4 917,v.4). Ou seja, também o Minist

120
“Plantaram” Xicão

ntos (Cirilo) e de testemu- de acareação entre João Campos da Silva (Dandão) e Abdias Severo da
Hora não teria sido juntado aos autos.36
são mais comedidas, res- Criticou o pedido de desentranhamento de documentos da 6a Câ-
a a morte de Chico Quelé mara, feito pelos procuradores em Pernambuco, observando, inclusive,
stinados ao povo Xukuru que, pelo menos um daqueles procuradores já afirmara à 6a Câmara que
nejar as retomadas de ter- tais documentos estavam nos autos.
ximas”.(fls. 863). Afirmou que o MPF/PE, antes mesmo da data de oferecimento da
e apontasse para responsa- denúncia, já tinha toda a documentação de todos os projetos desenvol-
o Quelé não ter inimizade vidos pelas lideranças tradicionais e organizações que as apoiavam, de-
monstrando a lisura das aplicações dos recursos. Só que, embora tendo os
informação enviadas pela dados à mão desde novembro de 2001, o Ministério Público só arquivou
a e inservível, porque não as denúncias de malversação em março de 2003.
Criticou as contradições da única testemunha presencial do Minis-
do réu. Insistiu na manu- tério Público, Djalma Pereira dos Santos. E pediu fossem realizadas in-
vestigações, na linha apontada pelas testemunhas ouvidas na 6a Câmara.
maneceu foragido durante Voltou o MPF a se pronunciar, e fez juntada, em 21 de julho de
Dandão esteve preso até 2003, de despacho proferido por procurador da República em Pernam-
do Recurso Ordinário em buco, arquivando procedimento administrativo, que acusava malversa-
. Quase um ano. ção de dinheiro de projetos (fls. 922 a 964).
ão Campos da Silva Dan- Como diligências finais, antes da sentença, pronunciando ou impro-
ustentada pelo MPF com nunciando o réu João Campos da Silva, foi designado o dia 06 de abril de
o hábeas corpus no STJ 2004 para a realização da audiência, momento em que serão inquiridos os
adora-geral da República Srs. Moacir Santos e Roberto Góes, respectivamente, ex-Administrador
eforma do julgado. Regional da FUNAI e servidor da FUNAI, ambos figurando como teste-
munhas do Juízo.
alegações finais35 em 7 de
o de defesa, porque o auto

a 6a Câmara, está um depoimento


o em 5 de junho de 1998, no qual
nte Leonardo Gomes da Silva, fora
dia da morte de Chicão. Também
eral da República, ele diz que “for-
providências acerca da morte do
virtude de se sentirem ameaçados,
36. Equívoco da defesa. O auto de acareação existe e está a fls. 433/434 do v. 2. Mas o Ministério
r um conflito na área, em virtude
Público, pronunciando-se sobre o fato argüido pela defesa, disse que “em momento algum foi
tros índios” (fls. 733, v. 3).
mencionado, por quem quer que seja, tenha sido essa acareação realizada formalmente” (fls.
917,v.4). Ou seja, também o Ministério Público não localizou uma prova que está nos autos.

121
XUKURU DO ORORUBÁ

Caso 3 Tentativa de Assassinato do Cacique acertou-lhe um tiro no o


Marcos Luidson, o Marquinhos Xukuru Nilson. E se alojou no chã
(e subseqüentes destruições na Fazenda Marcos Luidson saiu
Curral do Boi e na Aldeia Cimbres) paros em sua direção. Di
Cimbres.
No dia 7 de fevereiro de 2003, por volta das 8:30 hs, o cacique Louro Frazão entreg
Xukuru Marcos Luidson conduzia o caminhão F 4000 pela estrada PE (conhecido como Zé Luiz)
219 que liga o município de Pesqueira a Aldeia Cimbres. Ia acompanha- Cabral, o Biá, do acontec
do do seu sobrinho Diogo Ruann (os dois na boléia), e dos índios Joze- Cimbres.
nilson José dos Santos e José Ademílson Barbosa da Silva (na carroceria).
Louro Frazão també
Ao passar em frente à fazenda Curral do Boi, um pouco após as casas Umbuzeiro e Monteiro, n
que ficam às margens da pista, avistou gado pastando sobre a rodovia. em 21 de março de 2003.
Diminuiu a marcha e zigue-zagueou na pista, desviando o gado, até ter
O cacique Marcos Lu
que parar, em razão da quantidade de reses presentes. Nisso, avistou José
ardo Célio, e voltaria ao ce
Lourival Frazão – o Louro Frazão. José Vicente de Carvalho, conhecido
Não se sabia se estava vivo
como Zequinha Vicente, pastorava o gado próximo a Louro Frazão.
Quando a notícia co
Marcos Luidson parou o caminhão, e desceu, para pedir a Louro
acontecido. Formando um
Frazão para tirar o gado. Houve discussão, tendo Louro Frazão puxado
cente a José Ivanildo Alm
revólver e efetuado disparos na direção do cacique Marcos Luidson. Dio-
ocupadas por Louro Frazã
go Ruan, 12 anos de idade, saltou do caminhão, e conseguiu acertar um
tapa em Louro por trás, fazendo com que este desviasse posição do revól- A polícia militar em
ver e a trajetória da bala, que não atingiu o cacique Marcos. Nisso, os dois manhã, através de telefon
jovens índios que acompanhavam o cacique Marcos Luidson saltaram da mandou a operação foi o C
carroceria, e tentaram imobilizar Louro Frazão. Não conseguiram. Louro 30 a 40 policiais militares
atirou nos dois. O primeiro índio a morrer foi Jozenilson José dos Santos, ram por volta das 9:30hs
conhecido por Nilsinho. 24 anos, 1,68m de altura. Tentou segurar Louro estavam pegando fogo. N
Frazão pela frente, mas Louro Frazão deu-lhe um tiro no rosto, e o ma- ça de corpos às margens
tou.37 O segundo índio era José Ademílson Barbosa da Silva – conhecido foram a Cimbres, por volt
pelo nome de Nilson. Tinha apenas 19 anos, e 1,70 m de altura. José Vi- Lá a situação parecia
cente o Zequinha Vicente, munido de um pau, desferiu golpe certeiro na ciaram o retorno a Pesqu
cabeça do índio enquanto Louro Frazão agarrava este pelo pescoço. José conflitos, quando, então,
Ademílson (Nilson) fica prostrado no chão. Sobre esse índio já caído é que Porque os índios mo
Louro Frazão desferiu disparo, atingindo-o e matando-o. Louro Frazão as aldeias para lá se dirigir

37. Depoimento de Diogo Ruan, fls. 101 e 102. Laudo de Exame Tanatoscópico, fls. 346. 38. Lauro Tanatológico, fls. 347 e

122
“Plantaram” Xicão

ssassinato do Cacique acertou-lhe um tiro no ouvido direito38. A bala trespassou a cabeça de


arquinhos Xukuru Nilson. E se alojou no chão.
destruições na Fazenda Marcos Luidson saiu correndo pelo mato, com Louro efetuando dis-
ldeia Cimbres) paros em sua direção. Diogo Ruan saiu correndo na direção da Vila de
Cimbres.
a das 8:30 hs, o cacique Louro Frazão entregou sua arma a José Luiz Almeida de Carvalho
o F 4000 pela estrada PE (conhecido como Zé Luiz). Zé Luiz foi a Cimbres, avisar a Expedito Alves
Cimbres. Ia acompanha- Cabral, o Biá, do acontecido. E, em seguida, dirigiu-se à sua casa, ali no
boléia), e dos índios Joze- Cimbres.
sa da Silva (na carroceria).
Louro Frazão também foi logo à Vila do Cimbres. E seguiu para
oi, um pouco após as casas Umbuzeiro e Monteiro, na Paraíba. Só viria a ser preso 6 semanas depois,
pastando sobre a rodovia. em 21 de março de 2003.
desviando o gado, até ter
O cacique Marcos Luidson fora em busca de socorro na casa de Edu-
sentes. Nisso, avistou José
ardo Célio, e voltaria ao cenário dos acontecimentos poucas horas depois.
e de Carvalho, conhecido
Não se sabia se estava vivo ou morto.
ximo a Louro Frazão.
Quando a notícia começou a se espalhar, vários índios vieram ver o
esceu, para pedir a Louro
acontecido. Formando uma turba, houve queima de um veículo perten-
ndo Louro Frazão puxado
cente a José Ivanildo Almeida de Carvalho, irmão de Zé Luiz, e das casas
que Marcos Luidson. Dio-
ocupadas por Louro Frazão, Zequinha, Lourinaldo e Lourdes.
o, e conseguiu acertar um
desviasse posição do revól- A polícia militar em Pesqueira foi informada por volta das 9hs da
que Marcos. Nisso, os dois manhã, através de telefonema de Expedito Alves Cabral, Biá. Quem co-
arcos Luidson saltaram da mandou a operação foi o Capitão Maurício. Pediu reforços a Belo Jardim.
Não conseguiram. Louro 30 a 40 policiais militares se dirigiram à Fazenda Curral do Boi. Chega-
ozenilson José dos Santos, ram por volta das 9:30hs. A casa de Louro Frazão e outras, e a veraneio
ura. Tentou segurar Louro estavam pegando fogo. Não havia muitos índios. Confirmaram a presen-
um tiro no rosto, e o ma- ça de corpos às margens da pista. Aguardaram a remoção dos corpos, e
bosa da Silva – conhecido foram a Cimbres, por volta das 14 hs.
1,70 m de altura. José Vi- Lá a situação parecia tranqüila. Deram uma volta pela aldeia, e ini-
desferiu golpe certeiro na ciaram o retorno a Pesqueira. Foram informados pelo rádio do início de
va este pelo pescoço. José conflitos, quando, então, retornaram a Cimbres.
re esse índio já caído é que Porque os índios mortos seriam velados em Cimbres, índios de todas
matando-o. Louro Frazão as aldeias para lá se dirigiram, para prestar-lhes últimas homenagens.

e Tanatoscópico, fls. 346. 38. Lauro Tanatológico, fls. 347 e 348.

123
XUKURU DO ORORUBÁ

Em algumas casas foi ateado fogo. Algumas pessoas estavam sem mente da Silva e Paulo J
poder sair, tendo sido iniciado o resgate de várias pessoas, especialmente Elias Ferreira Dodge, PFD
familiares de Expedito Alves Cabral. Os autos do inquérit
Expedito Alves Cabral Biá tinha sido informado dos acontecimen- 95 continuou as investiga
tos por volta das 9hs ou 10 hs por Zé Luiz em sua casa, contando da -se posteriormente na açã
morte dos índios. o IPL 130 (2003.83.00.0
Prevendo que uma grande rebelião poderia estar em curso, Biá cui- veículos e casas.
dou de telefonar para as polícias federal, civil e militar, e para a Funai. Em 11 de fevereiro d
A agitação começou a acontecer no início da tarde, com queima de nação para presidir o inqu
veículos pertencentes a Biá. Expedito Alves Cabral e outras pessoas foram Fez inúmeras diligên
retirados de suas casas pela polícia militar, e conduzidos a lugar seguro. quisitou exames residográ
Várias casas foram queimadas. toscópicos, etc. E o inquér
A agitação em Cimbres deveu-se ao fato de que os índios ligados ao Apuração e conclusõ
cacique Marcos Luidson foram informados de que os mortos seria velados Se a prioridade inicia
naquela aldeia. E, aglomerando-se, souberam que José Luiz Almeida de sas, sendo o Cacique Marc
Carvalho, o Zé Luiz, que estivera na fazenda Curral do Boi pela manhã, do DPF Servilho Paiva a
nos momentos da tentativa de assassinato do cacique Marcos, estava em homicídio.
sua casa.
Conclusão pacífica d
Por volta das 17 hs, os índios foram cercar a casa de Zé Luiz, para ro Frazão – foi o autor d
evitar que fugisse, e foram recebidos à bala. Zé Luiz resistiu até a chega- resultando nas mortes de
da da polícia federal, quando se entregou à polícia federal, por volta das Barbosa da Silva.
23:30 hs, tendo sido arrecadadas em seu poder armas e munição.
Zequinha Vicente –
No dia seguinte, sábado, 8 de fevereiro de 2003, provenientes de co-autor, por ter participa
Brasília, chegaram a Pesqueira o Ministro Nilmário Miranda, Secretário duas mortes, tendo colab
Especial de Direitos Humanos, a Procuradora Federal dos Direitos do cabeça de José Ademílso
Cidadão – Adjunta Raquel Elias Ferreira Dodge, o então Presidente da permitindo que Louro Fra
FUNAI Eduardo Aguiar de Almeida, o Assessor do Ministro da Justiça
Lídio Vasco foi consi
Cláudio Beirão, indo se somar a representantes de ONGs de direitos hu-
do do processo.
manos39 e advogados.
Ao Cacique Marcos
A polícia federal ouviu vários depoimentos, inclusive os de Zé Luiz,
sões, mas o de agente prov
e do cacique Marcos Luidson. Mas suspendeu as oitivas, alegando impos-
sibilidade de continuar a colher os depoimentos. Foram, então, lavrados Portanto, segundo a
termos de declarações de Diogo Ruann de Araújo Mandú, Suenildo Cle- cacique Marcos Luidson. Es
o incidente, e fugido.
39. O Rev. Manoel Morais, que viria se ser designado Membro da CE Res. 18/2003 CDDPH, se fez
Conclusões do MPF,
presente.

124
“Plantaram” Xicão

mas pessoas estavam sem mente da Silva e Paulo John do Nascimento Gomes, pela Dra. Raquel
as pessoas, especialmente Elias Ferreira Dodge, PFDC adjunta.
Os autos do inquérito foram posteriormente desmembrados. O IPL
ormado dos acontecimen- 95 continuou as investigações referentes ao duplo homicídio (converteu-
m sua casa, contando da -se posteriormente na ação penal 2003.83.00.011297-6, 4a Vara PE), e
o IPL 130 (2003.83.00.008677-1) passou a investigar as destruições de
ia estar em curso, Biá cui- veículos e casas.
militar, e para a Funai. Em 11 de fevereiro de 2003 o DPF Servilho Paiva recebeu a desig-
da tarde, com queima de nação para presidir o inquérito, em substituição ao DPF Jorge Cunha.
bral e outras pessoas foram Fez inúmeras diligências. Ouviu testemunhas, apreendeu armas, re-
onduzidos a lugar seguro. quisitou exames residográficos, de balística, de eficiência de armas, tana-
toscópicos, etc. E o inquérito foi concluído em 15 de abril de 2003.
de que os índios ligados ao Apuração e conclusões da PF , no IPL 95 (duplo homicídio)
ue os mortos seria velados Se a prioridade inicial fora para a investigação da destruição das ca-
que José Luiz Almeida de sas, sendo o Cacique Marcos Luidson o principal suspeito, com a chegada
urral do Boi pela manhã, do DPF Servilho Paiva a prioridade passou a ser a apuração do duplo
acique Marcos, estava em homicídio.
Conclusão pacífica do inquérito é que José Lourival Frazão – o Lou-
ar a casa de Zé Luiz, para ro Frazão – foi o autor dos disparos que causaram o duplo homicídio,
Luiz resistiu até a chega- resultando nas mortes de Josenílson José dos Santos e José Ademílson
lícia federal, por volta das Barbosa da Silva.
armas e munição.
Zequinha Vicente – o José Vicente de Carvalho – foi apontado como
de 2003, provenientes de co-autor, por ter participado diretamente dos fatos de que resultaram as
mário Miranda, Secretário duas mortes, tendo colaborado com Louro Frazão, ao desferir golpe na
a Federal dos Direitos do cabeça de José Ademílson Barbosa da Silva, derrubando-o, e com isso
ge, o então Presidente da permitindo que Louro Frazão atirasse e matasse este último.
or do Ministro da Justiça
Lídio Vasco foi considerado mero circunstante, não tendo participa-
de ONGs de direitos hu-
do do processo.
Ao Cacique Marcos não foi reservado o papel de vítima das agres-
s, inclusive os de Zé Luiz,
sões, mas o de agente provocador.
s oitivas, alegando impos-
s. Foram, então, lavrados Portanto, segundo a autoridade policial, não houve atentado à vida do
újo Mandú, Suenildo Cle- cacique Marcos Luidson. Este, porque estava embriagado, teria provocado
o incidente, e fugido.
o da CE Res. 18/2003 CDDPH, se fez
Conclusões do MPF, no IPL 95 (duplo homicídio)

125
XUKURU DO ORORUBÁ

O Ministério Público concordou parcialmente com a autoridade po- IVª Parte. Conclusões
licial, e denunciou José Lourival Frazão – o Louro Frazão – pela prática do
homicídio duplo.
Quanto a José Vicente de Carvalho (o Zequinha Vicente), decidiu-se Análise dos autos
o Ministério Público por pedir o arquivamento do inquérito, sustentando evidências
que aquele agiu em legítima defesa de terceiro, ou seja, em legítima defesa
de Louro Frazão. Dissemos anteriorm
A denúncia também concordou com as conclusões do inquérito, ao qualidade. E que precisão
afirmar que o Cacique Marcos fez a provocação a Louro Frazão, em razão diante a adoção de precau
de sua embriaguez. formações; ter familiarida
tos com a fonte de inform
Ainda, aceitou que os índios mortos José Ademílson Barbosa da
e genéricas.
Silva – conhecido pelo nome de Nílson, e Jozenilson José dos Santos –
conhecido por Nilsinho, estivessem armados. Daí ter Zequinha Vicente Quando da colheita
defendido Louro legitimamente. cisco de Assis Santana (Ch
cique Marcos Luidson, o
Proposta a ação penal, Maria Gorete Barbosa da Silva, mãe de José
tenha tido o cuidado de co
Ademílson, requereu sua habilitação nos autos, como assistente de acusa-
de acordo com a vinculaç
ção. O Ministério Público Federal discordou, alegando que, sendo índia,
que a intensa polarização
seria tutelada, só podendo estar representada em juízo por procurador da
informações prestadas, alt
Funai.
Tome-se por base, p
Maria Gorete obteve liminar em mandado de segurança no TRF
em que restou apurada au
5a, e participa do processo, como assistente de acusação. O Ministério
nílson José dos Santos e Jo
Público Federal não adotara essa posições nas questões criminais anterior-
mente relatadas. A questão da embr
controvertido. As testem
O processo está em fase de conclusão da instrução.
178/180), Marco André V
Quanto ao IPL 130 (processo 2003.83.00.008677-1), está em fase de Freitas (fls. 349/357)
de elaboração de Relatório. Algumas dezenas de índios Xukuru foram quando dos incidentes na
indiciados, inclusive o cacique Marcos Luidson, incurso nas penas do art. Edson (fls. 165), Josefa So
146, § 1o (constrangimento ilegal); art. 163, parágrafo único, I, II e IV estiveram direta e pessoal
(dano qualificado); art. 250, § 1o , II, alíneas a e c (causar incêndio), e art. afirmaram precisamente o
286 (incitação ao crime), c.c. art. 29, todos do Código Pena.
Mas se a embriaguez
estando presente em todo
que o cacique correu pelo
que o zigue-zagueio na pi
decorrido do gado e dos to

126
“Plantaram” Xicão

ente com a autoridade po- IVª Parte. Conclusões e Recomendações


ro Frazão – pela prática do

uinha Vicente), decidiu-se Análise dos autos à luz de suas próprias


do inquérito, sustentando evidências
ou seja, em legítima defesa
Dissemos anteriormente que é necessário ter informação de boa
onclusões do inquérito, ao qualidade. E que precisão e confiabilidade da informação são obtidas me-
a Louro Frazão, em razão diante a adoção de precauções gerais, tais como conhecer a fonte das in-
formações; ter familiaridade com a fonte e com o contexto; manter conta-
tos com a fonte de informações; tratar cautelosamente informações vagas
é Ademílson Barbosa da
e genéricas.
enilson José dos Santos –
Daí ter Zequinha Vicente Quando da colheita de provas nas investigações das mortes de Fran-
cisco de Assis Santana (Chico Quelé) e da tentativa de assassinato do ca-
cique Marcos Luidson, os autos não revelam que a autoridade policial
bosa da Silva, mãe de José
tenha tido o cuidado de contextualizar os depoimentos das testemunhas,
como assistente de acusa-
de acordo com a vinculação aos grupos em conflito. Isto significa dizer
legando que, sendo índia,
que a intensa polarização pode ter exercido uma notável influência nas
m juízo por procurador da
informações prestadas, alterando o rumo das conclusões.
Tome-se por base, por exemplo, as provas produzidas no processo
do de segurança no TRF
em que restou apurada autoria de duplo homicídio sobre os índios Jose-
e acusação. O Ministério
nílson José dos Santos e José Ademílson Barbosa da Silva.
uestões criminais anterior-
A questão da embriaguez do cacique Marcos Luidson é um fato
controvertido. As testemunhas Edílson Lima Lopes Buenos Aires (fls.
nstrução.
178/180), Marco André Valença Genu (fls. 478/488) e Gildo Rodrigues
0.008677-1), está em fase de Freitas (fls. 349/357) afirmaram que o cacique estaria alcoolizado,
de índios Xukuru foram quando dos incidentes na fazenda Curral de Boi. Já as testemunhas José
incurso nas penas do art. Edson (fls. 165), Josefa Solange (fls. 174) e Eduardo Célio (fls. 180), que
parágrafo único, I, II e IV estiveram direta e pessoalmente com o líder Xukuru logo após o conflito,
e c (causar incêndio), e art. afirmaram precisamente o contrário.
Código Pena.
Mas se a embriaguez do cacique é fato controverso, é incontroverso,
estando presente em todos os depoimentos, que havia reses na pista, e
que o cacique correu pelo mato. Isto torna razoável a interpretação de
que o zigue-zagueio na pista, e tombos e cambaleios no mato podem ter
decorrido do gado e dos tocos de mato, não de embriaguez.

127
XUKURU DO ORORUBÁ

O mesmo se diga quanto aos índios mortos portarem ou não armas. violação aos direitos dos ín
Djalma Bezerra (fls. 492/495), e Dorgival Freitas Frazão (fls. omissão da União Federa
535/537), além do próprio José Lourival Frazão, sustentam que os índios direito às suas terras de oc
Josenílson José dos Santos e José Ademílson Barbosa da Silva estavam ar- ção social, seus usos e cost
mados, Adeílson (fls. 151/152), Diogo Ruann (fls. 82) e outros sustentam Responde a União fe
o contrário. nal do Índio repasse de re
O que é incontroverso, quanto a este ponto? É incontroverso que campo, e finalização do pr
os dois jovens índios foram os únicos a morrer. É incontroverso que nem O art. 231 da consti
Louro Frazão nem ninguém do seu lado saiu ferido. É incontroverso que cial, costumes, línguas, cr
os índios mortos não dispararam nenhuma arma (laudo de exame resido- as terras que tradicionalm
gráfico negativo, fls. 327/328). É incontroverso que não foram encontra- imperioso dever de demar
das armas ao lado dos cadáveres. É incontroverso que a arma que Louro dos índios. Para ter certez
Frazão diz ter tomado de um dos índios, em verdade pertencia a José o constituinte originário fi
Luiz, e foi por este utilizada na tarde/noite do dia 7 de fevereiro de 2003 cumprir sua obrigação.
para produzir ferimentos em Romero Lopes de Melo. O artigo 67 do Ato d
Está no Relatório do DPF Servilho, fls. 717, v. 3: termina: A União concluirá
“As perícias comparativas das armas e projéteis, segundo nos adian- anos a partir da promulgaçã
tou os peritos, resultaram no seguinte: Ora, já se passaram
Da arma apreendida em poder de JOSÉ LUIZ ALMEIDA DE ras Xukuru não lhes asse
CARVALHO saíram os dois projéteis que provocaram as mortes dos ín- tradicional.
dios JOSENILSON JOSÉ DOS SANTOS e JOSÉ ADMILSON BAR- Também responde a
BOSA DA SILVA; dar interpretação à const
Da arma apreendida em poder de José Lourival Frazão, o Louro, seu texto, em detrimento
saiu o projétil que atingiu Romero Lopes de Melo.” O § 6º do artigo 231
Disso resulta ocorrência de violações aos direitos dos índios, que se- tos, não produzindo efeitos ju
rão agora apontadas. domínio e a posse das terras a
Completando o sent
e a extinção direito à indeni
Grave violação dos direitos dos índios por
lei, quanto às benfeitorias de
parte da União Federal
A ressalva, portanto
indenização pelas benfeitoria
A primeira observação que se deve fazer é que, embora a Comissão
pação de boa fé deixou d
tivesse que se deter sobre os casos judiciais e as investigações policiais,
reconhecimento de que a
para entender a crise de credibilidade das instituições, e a ruptura do di-
previsto na constituição, n
álogo entre as lideranças tradicionais indígenas e o Cimi, de um lado, e
a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, de outro lado, a grande

128
“Plantaram” Xicão

os portarem ou não armas. violação aos direitos dos índios é de ser atribuída ao Estado brasileiro, pela
gival Freitas Frazão (fls. omissão da União Federal em reconhecer e assegurar aos índios Xukuru
o, sustentam que os índios direito às suas terras de ocupação tradicional, e o respeito à sua organiza-
rbosa da Silva estavam ar- ção social, seus usos e costumes.
fls. 82) e outros sustentam Responde a União federal porque não assegura à Fundação Nacio-
nal do Índio repasse de recursos necessários à conclusão dos trabalhos de
nto? É incontroverso que campo, e finalização do processo demarcatório.
É incontroverso que nem O art. 231 da constituição reconhece aos índios sua organização so-
rido. É incontroverso que cial, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre
a (laudo de exame resido- as terras que tradicionalmente ocupam, e também determina à União o
o que não foram encontra- imperioso dever de demarcá-las, e proteger e fazer respeitar todos os bens
rso que a arma que Louro dos índios. Para ter certeza de que não deixaria indefinida esta questão,
verdade pertencia a José o constituinte originário fixou prazo de cinco anos para o administrador
dia 7 de fevereiro de 2003 cumprir sua obrigação.
Melo. O artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de-
7, v. 3: termina: A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco
jéteis, segundo nos adian- anos a partir da promulgação da Constituição.
Ora, já se passaram quinze anos, e o processo demarcatório das ter-
É LUIZ ALMEIDA DE ras Xukuru não lhes assegurou nem um terço das terras de ocupação
vocaram as mortes dos ín- tradicional.
OSÉ ADMILSON BAR- Também responde a União Federal pelo fato de a sua justiça federal
dar interpretação à constituição em sentido expressamente contrário ao
Lourival Frazão, o Louro, seu texto, em detrimento dos povos indígenas.
elo.” O § 6º do artigo 231 taxativamente determina que São nulos e extin-
direitos dos índios, que se- tos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o
domínio e a posse das terras a que se refere este artigo.
Completando o sentido, o § 6o continua dizendo não gerar a nulidade
e a extinção direito à indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da
dos índios por
lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.
A ressalva, portanto, é o direito de ação, contra a União, para obter
indenização pelas benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé. Mas aquela ocu-
é que, embora a Comissão
pação de boa fé deixou de ser de boa fé quando se tem a declaração e o
as investigações policiais,
reconhecimento de que a terra é indígena. Ainda, o direito à indenização,
tuições, e a ruptura do di-
previsto na constituição, não vem junto com o direito a retenção.
s e o Cimi, de um lado, e
l, de outro lado, a grande

129
XUKURU DO ORORUBÁ

Entretanto, o judiciário federal tem assegurado não aos índios, mas Considerando que a
aos posseiros, mesmo quando já de má fé (ou seja, posterior à declaração administrativa, sem exerc
de ser terra indígena), o direito de retenção de terras indígenas, com ocupação, acontecimentos, sem qua
posse e exploração, até completa indenização, nos valores aceitos pelos ocu- para toda a comunidade,
pantes não-índios. o pronunciamento sobre a
As promessas e compromissos firmados pela Funai com os índios para restaurar liderança e
Xukuru beiram a irresponsabilidade, e alimentam as várias faces das vio- tucionais da FUNAI PE.
lências examinadas. Em 30 dias, no dia
Em março de 2003, em reunião no Gabinete do Ministro da Justi- na Procuradoria da Repú
ça, o então Diretor de Assuntos Fundiários da FUNAI, Antônio Pereira questões referentes aos X
Neto, prometeu que, em 30 dias, todo o processo estaria concluído. foram chamadas, o mesm
fora precipitado, mas que
Em sessão do CDDPH, de 23 de abril de 2003, membro da Comis-
lhos de campo, e até o fina
são Especial fez a leitura de ofício dirigido ao Ministro Nilmário Miranda,
onde dizia: Não estaria.
A questão fundiária, e a desintrusão de não-índios, está na base de A resposta encaminh
uma solução mais duradoura para atenuar e mesmo eliminar a conflitu- solução do problema dos
osidade na Terra Indígena Xucuru. Entretanto, e não obstante a FUNAI uma nova terra, próxima
(leia-se, o Diretor para Assuntos Fundiários, Antônio Pereira Neto) ter constituiu Comissão Técn
afirmado que no prazo de 30 dias (a contar de 19 de março de 2003) com número de casas des
realizaria o pagamento de todas as indenizações, até a presente data a de desterrados, etc.
comissão da FUNAI sequer iniciou os trabalhos de campo, e não houve Concluído o Relatór
nenhum novo pagamento de indenizações. 24 Set 2003.
Assim, a primeira solicitação é no sentido de Sua Excelência o Senhor Minis- A convocação fora d
tro da Justiça determinar à FUNAI que envie, de imediato, equipe para realizar dades de direitos humano
o levantamento fundiário, e efetuar o pagamento das indenizações, como prometido grupo majoritário ligado a
em reunião no Gabinete do Ministro da Justiça, em 19 de março de 2003; tários expulsos do Cimbre
E, atenta ao fato de a administração regional da FUNAI estar no Genivaldo “Canário”. Com
limbo, nem sendo confirmada nem sendo substituída pelo novo governo, As entidades de direitos h
nesse mesmo ofício o CDDPH foi informado de que naquele número, sem que
indígenas das lideranças
A Administração Regional da FUNAI em Recife adotou como estratégia,
demais líderes de aldeias),
na questão da tentativa de assassinato do cacique Marcos Luidson, e na subse-
a própria segurança dos pa
qüente destruição de casas na Vila de Cimbres, a não-obtenção de informação au-
tônoma e independente, optando para valer-se, exclusivamente, das provas colhidas À ponderação, feita
pela Polícia Federal. CDDPH, de que o núme
desterrados, porque legitim
O administrador regional, Rildo Fernando, afirmou que formalizou a en-
to, não deveria significar j
trega do cargo de administrador regional, sem que, até o momento, tenha a FU-
se aquelas presenças pudessem
NAI se pronunciado a respeito da questão.

130
“Plantaram” Xicão

urado não aos índios, mas Considerando que a direção local da FUNAI, hoje, está, por opção
eja, posterior à declaração administrativa, sem exercer suas devidas funções, estando a reboque dos
ras indígenas, com ocupação, acontecimentos, sem qualquer papel mais ativo na obtenção de soluções
valores aceitos pelos ocu- para toda a comunidade, quer parecer a esta Comissão Especial inadiável
o pronunciamento sobre a manutenção ou substituição do administrador,
pela Funai com os índios para restaurar liderança e credibilidade administrativa nas funções insti-
am as várias faces das vio- tucionais da FUNAI PE.
Em 30 dias, no dia 24 de abril de 2003, em reunião em Recife,
nete do Ministro da Justi- na Procuradoria da República em Pernambuco, reunião para tratar das
FUNAI, Antônio Pereira questões referentes aos Xukuru, e para a qual as lideranças Xukuru não
so estaria concluído. foram chamadas, o mesmo Diretor para Assuntos Fundiários disse que
fora precipitado, mas que garantia que grupo técnico viria fazer os traba-
2003, membro da Comis-
lhos de campo, e até o final do ano a questão estaria resolvida.
nistro Nilmário Miranda,
Não estaria.
ão-índios, está na base de A resposta encaminhada pelo Diretor de Assuntos Fundiários, para
esmo eliminar a conflitu- solução do problema dos índios banidos do Cimbres, foi a aquisição de
e não obstante a FUNAI uma nova terra, próxima à Terra Indígena Xukuru. Para tanto a FUNAI
Antônio Pereira Neto) ter constituiu Comissão Técnica para efetuar o levantamento da situação,
de 19 de março de 2003) com número de casas destruídas e forçosamente abandonadas; número
ões, até a presente data a de desterrados, etc.
os de campo, e não houve Concluído o Relatório, a Funai realiza reunião na sede do Ibama, em
24 Set 2003.
a Excelência o Senhor Minis- A convocação fora dirigida a vários órgãos públicos, algumas enti-
mediato, equipe para realizar dades de direitos humanos, e a representação dos índios Xucuru, ou seja, do
indenizações, como prometido grupo majoritário ligado ao cacique Marcos Luidson, e dos grupos minori-
19 de março de 2003; tários expulsos do Cimbres e outras aldeias, Expedito Alves Cabral “Biá” e
ional da FUNAI estar no Genivaldo “Canário”. Compareceram mais de 10 (dez) índios desterrados.
ituída pelo novo governo, As entidades de direitos humanos entenderam que a presença de índios
e que naquele número, sem que igual presença fosse concedida a representantes
indígenas das lideranças tradicionais (leia-se, cacique Marcos Luidson e
Recife adotou como estratégia,
demais líderes de aldeias), modificaria o perfil da reunião, e comprometia
Marcos Luidson, e na subse-
a própria segurança dos participantes, em face da conhecida hostilidade.
o-obtenção de informação au-
vamente, das provas colhidas À ponderação, feita por representante da Comissão Especial do
CDDPH, de que o número mais elevado de representantes dos grupos
desterrados, porque legitimados para discutir matéria de seu interesse dire-
firmou que formalizou a en-
to, não deveria significar justo motivo para retirada. Esta só deveria se dar
até o momento, tenha a FU-
se aquelas presenças pudessem por em risco a segurança dos representantes das ONGs.

131
XUKURU DO ORORUBÁ

Indagado sobre esse aspecto – o da segurança –, o Administrador noticiadas novas destruiç


Executivo Regional AER da FUNAI, Manoel Lopes, respondeu que “não Expedito Alves Cabral, o
poderia dar garantias aos representantes das ONGs, até porque sofria ameaças Quanto aos valores, o
pessoais diretas, na FUNAI”. Diante dessa resposta, os integrantes das gos de indenizações, totali
ONGs se retiraram. ha devolvidos aos Xukuru
Sintetizando as conclusões40, as antropólogas fizeram questão de in-
Pondo praticamente
sistir no fato de que, caso a opção fosse por aquisição de nova área, o local
to ao modo de reparação
da mesma deveria levar em conta os anseios dos desalojados, mas levando
em conta, também, o elevado grau de animosidade entre as partes no nhas, o ofício do administ
conflito. Para evitar novos conflitos, compreendem que uma nova área Presidência da FUNAI a r
não poderia ser “colada” à terra indígena Xucuru. de acolhimento das famílias
equipe a ser designada pela F
Acentuaram que o problema foi grandemente gerado por falta de
gestão do território. E a sugestão de aquisição de nova terra parte da consta- A União Federal, po
tação de que grande parte das famílias dos desalojados não sente seguran- ção da situação de violênc
ça em seus retornos às comunidades de origem. institucional de não torna
A Comissão Técnica CT, constituída a partir da reunião de 24 de ocupação tradicional, nem
abril de 2003, não tinha o papel de oferecer soluções, mas simplesmente de Dessa matriz deriva
dimensionar o problema do número de desterrados. O Relatório evidencia que cional quanto interpessoa
fez muito mais, dando valiosa contribuição para a compreensão do fenô- Na base dos casos c
meno, e o encaminhamento de soluções. Entretanto, alguns pressupos- pelo acesso e ocupação de
tos, que parecem já estar sendo adotados como assumidos pela FUNAI pação tradicional dos Xuk
não foram devidamente analisados e explicitados. Por exemplo, não res-
tou explicitado se a FUNAI já considerava a expulsão como fato consolidado
e irreversível. Nem o orçamento da FUNAI para Assistência material atual Pontos preocupantes
(aluguéis, cestas básicas, etc.); aquisição de terra; execução de um crono- formas de violência
grama físico-financeiro do programa de desintrusão.
Outro fato que ficou evidenciado é que a FUNAI AER Recife não A Comissão Especia
conversou sobre o Relatório com seus vários setores (antropólogos, agri- tes dos conflitos, e as ocor
mensores, advogados, etc.). Nem houve conversa articulada com o Ca- sintetizar em pontos obje
cique Marcos Luidson e com as lideranças de aldeia sobre a questão, e a responsáveis pelas invest
proposta de solução em andamento. dos atos de violência entre
Atenta aos desdobramentos desses fatos, a Comissão Especial diri-
giu ofício ao administrador regional da FUNAI em Recife, Manoel Lopes O que a FUNAI fez
Muniz, em 26 de fevereiro de 2004, recebendo resposta, em que eram
1. Morosidade na
40. Anotações feitas por integrante da Comissão Especial, antes da reunião, sintetizam as con-
clusões do seguinte modo: 1. Necessidade de a FUNAI rever os critérios de prioridade de indeniza- dos posseiros;
ção. Necessidade de contemplar os pequenos posseiros não-índios; 2. “Caso a FUNAI decida pela 2. Omissão de co
compra de terra”, atentar para sua localização, que não pode ser “colada” com a TI Xukuru; 3

132
“Plantaram” Xicão

rança –, o Administrador noticiadas novas destruições de casas, ou expulsões, de índios ligados a


Lopes, respondeu que “não Expedito Alves Cabral, o Biá.
s, até porque sofria ameaças Quanto aos valores, o ofício comunica que R$2.902.196,64 foram pa-
posta, os integrantes das gos de indenizações, totalizando, até a presente data, um total de 3.406,31
ha devolvidos aos Xukuru. Menos de 15% das terras reconhecidas.
gas fizeram questão de in- Pondo praticamente abaixo toda lógica seguida pela FUNAI, quan-
sição de nova área, o local
to ao modo de reparação dos índios banidos do Cimbres e aldeias vizi-
desalojados, mas levando
sidade entre as partes no nhas, o ofício do administrador regional informa que “foi determinado pela
ndem que uma nova área Presidência da FUNAI a realização de gestões junto aos dois grupos no sentido
de acolhimento das famílias desaldeiadas, mediando acordo promovido por uma
equipe a ser designada pela Funai/BSB”.
mente gerado por falta de
ova terra parte da consta- A União Federal, portanto, é a grande responsável pela manuten-
ojados não sente seguran- ção da situação de violência entre os Xukuru, porque produz a violência
institucional de não tornar efetivo o direito dos Xukuru às suas terras de
artir da reunião de 24 de ocupação tradicional, nem defendendo nem protegendo seus bens.
ões, mas simplesmente de Dessa matriz derivam as outras formas de violência, tanto institu-
O Relatório evidencia que cional quanto interpessoal e física.
a a compreensão do fenô- Na base dos casos criminais alegadamente se encontra a disputa
etanto, alguns pressupos- pelo acesso e ocupação de terras em Pesqueira, reconhecidas como de ocu-
o assumidos pela FUNAI pação tradicional dos Xukuru,
os. Por exemplo, não res-
ulsão como fato consolidado
Assistência material atual Pontos preocupantes, que evidenciam
a; execução de um crono- formas de violência institucional
usão.
FUNAI AER Recife não A Comissão Especial entende que, já tendo descrito os ante-ceden-
tores (antropólogos, agri- tes dos conflitos, e as ocorrências principais nos autos, tem condições de
ersa articulada com o Ca- sintetizar em pontos objetivos atos ou omissões das autoridades públicas
ldeia sobre a questão, e a responsáveis pelas investigações e processamento de responsabilização
dos atos de violência entre e contra os Xukuru.
a Comissão Especial diri-
em Recife, Manoel Lopes O que a FUNAI fez (ou não fez ) que se revela preocupante
do resposta, em que eram
1. Morosidade na identificação, na indenização e na desintrusão
tes da reunião, sintetizam as con-
critérios de prioridade de indeniza- dos posseiros;
dios; 2. “Caso a FUNAI decida pela 2. Omissão de contribuir no planejamento das reocupações;
er “colada” com a TI Xukuru; 3

133
XUKURU DO ORORUBÁ

3. Omissão no acompanhamento da implantação de projetos por O que o Ministério


associações de índios (e mesmo não-índios), os quais permane- revela preocupante
cem sem controle sistemático e confiável;
4. Omissão na produção de informação própria sobre os acon- 1. Convidou teste
tecimentos na T.I. Xukuru, que resultaram na morte de 2 radoria da Rep
índios, na tentativa de morte do cacique, e na destruição de por suas prisõe
casas e bens; 2. Manteve datas
5. Omissão ou mora inaceitável no trato da questão do banimento; decretada as pr
6. Violação do dever de respeitar o direito do índio ter advogado 3. Não comparec
de sua escolha. crer que nada t
especialmente,
O que a PF fez (ou não fez) que se revela preocupante 4. Não exerceu i
provas produz
dos Santos e Jo
1. O 1o relatório no caso Chicão revela ineficiência e descaso da
polícia federal, e atribui à vítima culpa por sua morte; é pre- 5. Os procurador
conceituoso e difamatório; ter partilhado
minal o conju
2. Relatório no Caso Quelé revela a não apuração adequada dos
evidenciavam
fatos sob investigação (motivação para o crime), e evidencia
gada motivaçã
também preconceito contra as lideranças indígenas;
tana, o Chico Q
3. Utiliza-se de pauta oculta, e nisso envolve o Ministério Públi-
6. A absolvição –
co Federal, para prender o índio João Campos da Silva Dan-
Vicente de Ca
dão: a PF o prende logo após a saída deste da sede da Procura-
prometer a pr
doria, onde passara a tarde inteira à disposição da autoridade
contraria linha
policial;
7. Recusou-se ac
4. No caso do duplo homicídio dos índios na fazenda Curral do
índio José Ad
Boi, de início prioriza apuração dos danos materiais, e investe
acusação, por s
contra o cacique Marcos Luidson, para prendê-lo;
federal desta au
5. Desmembrados os inquéritos, exclui o cacique Marcos Luid- visoriamente s
son da condição de vítima, e o considera agente provocador, no segurança imp
processo em que se investiga, precisamente, o atentado contra
a vida daquele; no inquérito sobre as destruições, é o cacique
indiciado; O que o CIMI fez (n
6. Não pondera adequadamente o papel e a credibilidade das
testemunhas, num ambiente reconhecidamente de polariza- 1. Proferiu algum
ção e suspeição. sa, com acusaç
nambuco, sem

134
“Plantaram” Xicão

mplantação de projetos por O que o Ministério Público fez (ou não fez) que se
ndios), os quais permane- revela preocupante
fiável;
ão própria sobre os acon- 1. Convidou testemunhas para prestarem depoimento na Procu-
esultaram na morte de 2 radoria da República em Pernambuco, quando já representara
cique, e na destruição de por suas prisões;
2. Manteve datas de ouvida desses depoimentos, mesmo após
da questão do banimento; decretada as preventivas requeridas;
eito do índio ter advogado 3. Não compareceu à ouvida das testemunhas, querendo fazer
crer que nada tinha a ver com o ato de ouvida das mesmas ou,
especialmente, com a prisão;
a preocupante 4. Não exerceu inteiramente o devido controle crítico sobre as
provas produzidas pela polícia federal nos casos José Barbosa
dos Santos e José Lourival Frazão;
a ineficiência e descaso da
lpa por sua morte; é pre- 5. Os procuradores com atuação na tutela coletiva não parecem
ter partilhado com os procuradores com atuação na área cri-
minal o conjunto de informações de que dispunham, e que
o apuração adequada dos
evidenciavam a fragilidade (e mesmo a inconsistência) da ale-
para o crime), e evidencia
gada motivação para a morte do índio Francisco de Assis San-
anças indígenas;
tana, o Chico Quelé;
nvolve o Ministério Públi-
6. A absolvição – mediante arquivamento de inquérito – de José
ão Campos da Silva Dan-
Vicente de Carvalho, por “legítima defesa”, pode vir a com-
deste da sede da Procura-
prometer a própria acusação contra José Lourival Frazão, e
disposição da autoridade
contraria linha de evidências contidas nos autos;
7. Recusou-se aceitar Maria Gorete Barbosa da Silva, mãe do
dios na fazenda Curral do
índio José Ademílson Barbosa da Silva, como assistente de
danos materiais, e investe
acusação, por ser tutelada da Funai, exigindo que procurador
ara prendê-lo;
federal desta autarquia representasse seus interesses (fato pro-
ui o cacique Marcos Luid- visoriamente superado, em razão de liminar em mandado de
idera agente provocador, no segurança impetrado junto ao TRF 5a).
amente, o atentado contra
as destruições, é o cacique
O que o CIMI fez (não fez) que se revela preocupante
apel e a credibilidade das
hecidamente de polariza- 1. Proferiu algumas declarações genéricas e graves pela impren-
sa, com acusações a toda a Procuradoria da República em Per-
nambuco, sem individualizar as condutas;

135
XUKURU DO ORORUBÁ

2. Omitiu-se no encaminhamento de gestões junto às lideranças 7. Mas mais imp


tradicionais, para reduzir os efeitos da conflituosidade. lações, cumpre
conflito.
O que as lideranças tradicionais fizeram (não fizeram) que se
revela preocupante O que fazer para tra

1. Negligenciaram seus papéis de líderes de todos os índios; Vários atores referid


2. Não agiram com firmeza contra os que optaram por usar da a serem trilhados, para so
violência contra grupos com posições políticas antagônicas. pecial como que consolida
linhas de recomendações a
O que as lideranças dissidentes fizeram (não fizeram) que se
revela preocupante a) Atuar sobre as
ções, posturas), sobre os c
1. Estabeleceram alianças externas à comunidade Xukuru, en- os conflitos (despolarizand
fraquecendo a força de coesão interna, e tornando vulneráveis
as lideranças tradicionais; b) Isto implica, en
2. Estimularam presença de não-índios na comunidade, dificul- I. Todos os índios t
tando o processo de reocupação do território; vivência, à segurança pess
3. Fizeram coincidir o pleito de reconhecimento como dissidên- e interesses;
cias com o direito à divisão do território, enfraquecendo a luta II. Devem ser fortal
de toda a comunidade pela regularização fundiária; lando-se a adoção de me
4. Estimularam um ambiente de denúncias e suspeições, com- respeito aos direitos e int
prometendo a atuação de órgãos públicos. vergências internas, e da
5. Embora nem de longe comparáveis às graves violações a di- em conta as observações
reitos humanos, produzidas pelos homicídios, como os prati- servem de referência para
cados contra as vítimas já relacionadas nesse Relatório, cada
III. As iniciativas dos
um com sua importância real e simbólica, os atos e omissões
ganização social, e na próp
indicados acima vêm acrescentar motivos para a quebra e o
Xukuru, devem ser tomad
não restabelecimento de diálogo entre as instituições e as lide-
ranças indígenas, e acirramento das divergências.
6. Sua indicação precisa é feita com o sentido de estimular em 41. As conclusões do Parecer sen
cada instituição e seus agentes o exercício de auto-reflexão, Diante das informações expostas a
Os Xukuru estão vivenciando um
para cada uma das partes envolvidas saber o que terá feito que com o estabelecimento de um gru
possa ter provocado no outro a reação gerada. com características baseadas apen
procedimentos administrativos do

136
“Plantaram” Xicão

gestões junto às lideranças 7. Mas mais importante que ter afirmado a ocorrência de vio-
da conflituosidade. lações, cumpre agora afirmar o que fazer, para transformar o
conflito.
(não fizeram) que se
O que fazer para transformar o conflito

es de todos os índios; Vários atores referidos no presente processo apontaram caminhos


que optaram por usar da a serem trilhados, para solução pacífica dos problemas. A Comissão Es-
s políticas antagônicas. pecial como que consolida essas experiências anteriores, e sistematiza em
linhas de recomendações adiante explicitadas:
não fizeram) que se
a) Atuar sobre as atitudes (pressupostos, preconceitos, presun-
ções, posturas), sobre os comportamentos (ações e atos concretos) e sobre
comunidade Xukuru, en- os conflitos (despolarizando, e construindo alternativas criativas)
na, e tornando vulneráveis
b) Isto implica, entre outras providências, reconhecer que:
s na comunidade, dificul- I. Todos os índios têm direito à terra, ao trabalho, à vida, à sobre-
erritório; vivência, à segurança pessoal e coletiva, à defesa jurídica de seus direitos
hecimento como dissidên- e interesses;
ório, enfraquecendo a luta II. Devem ser fortalecidas as formas de organização social, estimu-
zação fundiária; lando-se a adoção de mecanismos internos de participação de todos, e
úncias e suspeições, com- respeito aos direitos e interesses de todos e cada um. A respeito das di-
blicos. vergências internas, e da constituição da dissidência, devem ser levadas
s às graves violações a di- em conta as observações finais do Parecer Antropológico41 produzido, que
omicídios, como os prati- servem de referência para o presente trabalho;
das nesse Relatório, cada
III. As iniciativas dos órgãos públicos, capazes de influenciar na or-
bólica, os atos e omissões
ganização social, e na própria atividade econômica, política e cultural dos
motivos para a quebra e o
Xukuru, devem ser tomadas em estreita articulação com os representan-
re as instituições e as lide-
divergências.
sentido de estimular em 41. As conclusões do Parecer sendo: CONSIDERAÇÕES FINAIS
xercício de auto-reflexão, Diante das informações expostas até o momento, podemos fazer as seguintes considerações:
Os Xukuru estão vivenciando um claro processo de divergências internas que está culminando
saber o que terá feito que com o estabelecimento de um grupo dissidente em Cimbres que vem indicando representantes
ão gerada. com características baseadas apenas nas formas burocráticas do Estado nacional, utilizando-se de
procedimentos administrativos dos órgãos oficiais (FUNAI, FUNASA, INSS) para sua legitimação;

137
XUKURU DO ORORUBÁ

tes legítimos desse povo, levando em conta ainda os direitos e interesses 1. recomendar ao
das comunidades e grupos afetados; Câmara (Câma
IV. Deve ser particularmente reconhecido o direito dos índios se fa- Criminal), seu
zerem representar por advogados e procuradores de sua escolha e con- dores da PR/P
fiança, na defesa dos seus direitos e interesses, sem prejuízo do regular Federal dos Di
Direitos do Cid
desempenho da defesa coletiva dos direitos e interesses dos índios e comu-
to das repercus
nidades indígenas pela FUNAI e pelo Ministério Público Federal;
dos índios Xuk
2. recomendar à
c) Isto implica, entre outras providências, reconhecer que: Reite- sos criminais,
rar os encaminhamentos já feitos ao CDDPH, no sentido de: advogado de í
I. Questão fundiária: como advogad
causídico deve
2. recomendar à FUNAI nacional a agilização, junto à AER/RE-
sentido de real
CIFE, do processo de desintrusão, e indenização;
que representa
3. junto à Presidência da República e ao Ministério da Justiça, as- concordam ou
segurar recursos para a conclusão do processo de regularização ou sugerem su
fundiária, e o projeto de desenvolvimento sustentável;
4. recomendar à FUNAI acompanhar investimentos públicos d) Atentar para a
realizados na área; blica Marcos Costa, no de
II. Questões judiciais em si: ministrativo que apurava
temas ligados às dissidên
mais ampla, integrada po
Tais divergências não apresentam, até o momento, a constituição de uma cisão da sociedade das seguintes entidades:
Xukuru capaz de sustentar a divisão de seu território, devido, principalmente, ao significado que
sua terra tem como um todo, no plano religioso e organizativo do grupo e ao intenso fluxo dos
índios entre as 23 aldeias existentes. I. Comunidade Xuku
Considerando a dinamicidade dos processos sociais e a intensidade dos fluxos no campo inter-
societário em questão, não há como se afirmar ou como delimitar o que seriam características II. FUNAI;
originalmente dos Xukuru e aquelas estabelecidas externamente pelas agências presentes; tal
afirmação constituiria um equívoco teórico e metodológico ao se tratar esta problemática. Mas
é possível perceber que as autoridades, social e historicamente, constituídas pelos xukuru têm
correspondido ao seu caráter tradicional-carismático e que vêm assumindo o estatuto de auto-
ridade legal.
SUGESTÕES DE ENCAMINHAMENTOS: Propor a constituição de uma comissão xukuru formada 42. Procedimento Administrativo
por integrantes de todas as aldeias no sentido de formular um planejamento de ocupação das internas na comunidade indígena x
áreas (imóveis) a serem liberados; Realização de uma conferência sobre o desenvolvimento na ção da situação conflituosa e a m
Terra Indígena Xukuru, em que possam ser apresentados e discutidos (entre índios e represen- desafiam os órgãos públicos e a p
tantes das diversas organizações — governamentais e não-governamentais — envolvidas) todos viabilização de formas de harmoni
os projetos que estão sendo implementados junto a esse grupo e as agências responsáveis por vência que permitam às gerações
eles. Através desse evento, poderia se explicitar os objetivos dos projetos, seus critérios e me- ra a construção de um ambiente
todologias, os recursos alocados, as formas de gerenciamento dos mesmos e a participação e a semelhanças como seres humano
responsabilidade das instituições envolvidas. ambos os grupos étnicos compart

138
“Plantaram” Xicão

nda os direitos e interesses 1. recomendar ao MPF realizar reunião entre integrantes da 6a


Câmara (Câmara dos Índios e Minorias) e 2a Câmara (Câmara
o direito dos índios se fa- Criminal), seus representantes perante a PRR 5a e procura-
res de sua escolha e con- dores da PR/PE, bem assim representantes da Procuradoria
, sem prejuízo do regular Federal dos Direitos do Cidadão e Procuradoria Regional dos
eresses dos índios e comu- Direitos do Cidadão, para analisar formas de encaminhamen-
to das repercussões criminais dos casos de violação aos direitos
io Público Federal;
dos índios Xukuru;
2. recomendar à FUNAI, quando de participação nos proces-
as, reconhecer que: Reite- sos criminais, com procurador federal atuando quer como
no sentido de: advogado de índio acusado de cometimento de delito, quer
como advogado de índio assistente da acusação, a atuação do
causídico deve observar os preceitos éticos dos advogados, no
ilização, junto à AER/RE-
sentido de realizar a defesa dos direitos e interesses das partes
indenização;
que representam, cabendo aos índios interessados dizerem se
o Ministério da Justiça, as- concordam ou não com a designação de procurador específico,
processo de regularização ou sugerem substituição;
mento sustentável;
r investimentos públicos d) Atentar para as observações finais42 do procurador da Repú-
blica Marcos Costa, no despacho de arquivamento do procedimento ad-
ministrativo que apurava denúncias de desvios de recursos de projetos, e
temas ligados às dissidências. E recomendar a constituição de comissão
mais ampla, integrada por representação nacional e representação local
uição de uma cisão da sociedade das seguintes entidades:
principalmente, ao significado que
o do grupo e ao intenso fluxo dos
I. Comunidade Xukuru; III. PF; V. ONGS;
sidade dos fluxos no campo inter-
mitar o que seriam características II. FUNAI; IV. MPF; VI. MJ.
ente pelas agências presentes; tal
o se tratar esta problemática. Mas
te, constituídas pelos xukuru têm
m assumindo o estatuto de auto-

de uma comissão xukuru formada 42. Procedimento Administrativo 1.26.000.000875/2001-39, para apurar notícia de divergências
m planejamento de ocupação das internas na comunidade indígena xukuru em Pesqueira (PE). Parágrafo 115. “É certo que a supera-
ência sobre o desenvolvimento na ção da situação conflituosa e a melhoria da relação comunidade indígena-sociedade envolvente
scutidos (entre índios e represen- desafiam os órgãos públicos e a própria comunidade indígena. Naquela, o desafio centra-se na
ernamentais — envolvidas) todos viabilização de formas de harmonização interna. Nesta, na criação de formas de vivência e convi-
po e as agências responsáveis por vência que permitam às gerações atuais e às gerações futuras de índios e não-índios de Pesquei-
dos projetos, seus critérios e me- ra a construção de um ambiente plural, em que o reconhecimento das diferenças étnicas e das
o dos mesmos e a participação e a semelhanças como seres humanos, dotados da mesma dignidade, permitam aos integrantes de
ambos os grupos étnicos compartilharem uma realidade de respeito e integração”. Pág. 39.

139
XUKURU DO ORORUBÁ

e) Atentar para as conclusões da Comissão Técnica, constituída Adotar as seguintes


pela Funai AER/RECIFE, em suas CONSIDERAÇÕES FINAIS:
I. A decisão por priorizar os maiores imóveis rurais fez com que 1. Indenização ao
os pequenos ocupantes não-índios fossem conduzidos a uma situação de 2. Desintrusão;
extrema penúria. Que se dê prosseguimento ao levantamento fundiário
3. Elaboração de
para que esses impasses sejam superados e se evite uma crise maior.
comunidades X
II. Caso a FUNAI decida pela aquisição de um uma gleba para o NAI;
assentamento das famílias que se encontram fora da TI, deve haver crité-
4. Elaboração e i
rios para a escolha da área em relação a sua localização, e lisura em todo o
mento sustent
processo de. A proximidade da gleba com a terra indígena pode resultar
no acirramento dos conflitos e na impossibilidade de tê-los sob controle. 5. Reparação e r
Cimbres, banid
III. Sugerimos que a FUNAI conduza, juntamente com a comu-
-nidade indígena, um plano de gestão territorial que contemple o con-
trole da ocupação e a elaboração de um programa de desenvolvimento
sustentável. Consideração
IV. A FUNAI sempre estabeleceu um “modelo de índio”, ou seja,
índio para a FUNAI tem que estar ligado à terra. Então o problema é: o As dificuldades enfr
que fazer com os índios que foram expulsos da área e que querem morar promoção e defesa dos dir
em Pesqueira? São dois os modelos da FUNAI: Não indeniza índio e não deradas, para que possam
lida com índios que moram em cidades. É preciso então abdicar da etnia ração.
para poder receber a indenização das casas e demais posses que perderam
A Comissão Especia
no conflito? Na realidade é necessário que a questão seja debatida, procu-
a transformação dos confl
rando inclusive outras experiências dentro da própria instituição.
realizar atos mais perfeito
V. Dificuldade de retorno das famílias egressas da terra indígena. Gandhi, “o mais perfeito ato
Duas posições ficavam bem claras: de um lado temos aqueles que ficaram em si mesmo, é o mais difícil”
na área e que, em sua grande maioria, afirmam que não desejam mais a
De Recife (PE) para
presença daqueles que saíram, principalmente a família Cabral. Dizem
que se eles voltarem, a aldeia vai virar novamente uma “praça de guerra”.
De outro lado, temos uma grande parte da população que saiu da área
afirmando que querem outra terra e que não voltam para a TI de forma
nenhuma. Eles inclusive afirmam que se uma outra área for conseguida,
eles só vão se não for um local próximo à Serra do Ororubá.

140
“Plantaram” Xicão

ssão Técnica, constituída Adotar as seguintes medidas urgentes:


RAÇÕES FINAIS:
móveis rurais fez com que 1. Indenização aos posseiros de boa-fé;
duzidos a uma situação de 2. Desintrusão;
o levantamento fundiário
3. Elaboração de plano de reocupação, a ser desenvolvido pelas
ite uma crise maior.
comunidades Xukuru, em articulação e assessoradas pela FU-
o de um uma gleba para o NAI;
ra da TI, deve haver crité-
4. Elaboração e implantação de um programa de desen-volvi-
lização, e lisura em todo o
mento sustentável;
rra indígena pode resultar
de de tê-los sob controle. 5. Reparação e reinserção social e econômica dos Xukuru de
Cimbres, banidos de sua comunidade.
juntamente com a comu-
ial que contemple o con-
ama de desenvolvimento
Consideração final.
modelo de índio”, ou seja,
ra. Então o problema é: o As dificuldades enfrentadas pelos Xukuru e pelas instituições de
área e que querem morar promoção e defesa dos direitos humanos devem ser criativamente consi-
Não indeniza índio e não deradas, para que possam ser vislumbradas as perspectivas de sua supe-
iso então abdicar da etnia ração.
mais posses que perderam
A Comissão Especial pretende, com esse Relatório, contribuir para
estão seja debatida, procu-
a transformação dos conflitos, por meios não violentos. No esforço de
rópria instituição.
realizar atos mais perfeitos do que os realizados até agora. Como lembra
egressas da terra indígena. Gandhi, “o mais perfeito ato do homem é a paz; e, por ser tão completo, tão pleno
emos aqueles que ficaram em si mesmo, é o mais difícil”.
m que não desejam mais a
De Recife (PE) para Brasília (DF), em 16 de março de 2004.
a família Cabral. Dizem
te uma “praça de guerra”.
opulação que saiu da área
oltam para a TI de forma Luiz Couto
outra área for conseguida, Luciano Mariz Maia
do Ororubá. Manoel Morais
Vânia Fialho

141
XUKURU DO ORORUBÁ

A PRODUÇÃO DE UM CONFLITO: as possibilidades


de compreensão da dissidência xukuru
nambuco, nordeste brasi
em capítulo anterior dest
Luidson foi vítima de uma
Rita de Cássia Maria Neves rio tradicional; em conseq
Vânia Fialho panhavam e identificado
xukuru integrante de um
as mortes e a referida ten
INTRODUÇÃO aldeia de Cimbres e de ou
de famílias xukurus ligad
O presente trabalho objetiva promover uma reflexão sobre a com- e tais famílias foram banid
plexidade do campo social, tomando como referência o relatório técnico Após o conflito que
sobre o conflito instalado em 2003, envolvendo o povo indígena Xukuru. casas das famílias que for
Nosso objetivo é favorecer uma compreensão do conflito que não o apre- pelos próprios xukurus. O
sente apenas como um problema de divisão faccional, mas que envolve violenta ou não, indicava
um conjunto de sujeitos, de atores sociais, que não podem ser percebidos jeto liderado pelo cacique
como agentes externos ou alheios ao quadro apresentado. Trata-se de território, identificava-se
Cimbres. Essa posição sign
uma reflexão sobre a produção do conflito e sobre os seus desdobramen- e crítica à legitimidade do
tos para as ações e empreendimentos na condução do problema. Biá, todos aqueles que es
Iniciamos nossa argumentação com a constatação que descon- Terra Indígena. A ocupaçã
-tinuidades e contradições estão sempre presentes em toda e qualquer ato simbólico de reordena
sociedade. Eric Wolf (2003) bem discute como recebemos a idéia de so- os elementos pessoais, m
ciedade como herança e as dificuldades que temos em indicá-la como poder hegemônico das lid
instrumento conceitual que não se relacione com a noção de vida co- Em decorrência do e
letiva que compõe um todo, uma totalidade, um sistema. Disputas e rou a revolta e as ações ma
divergências fazem parte das negociações cotidianas em torno do esta- rio Público Federal em Pe
belecimento de um acordo mínimo de regulação social. Como desdobra- xukurus por estarem nele
mentos, temos conflitos com diferentes níveis de acirramento que vão sentença numa ação pena
definindo as regras de inclusão e exclusão dos integrantes de cada grupo. incêndio” e os denunciado
13 anos de reclusão, além
Portanto, tomar a harmonia e a coesão como elementos primordiais dos
povos indígenas, visão ingênua e equivocada, só contribui para tornar Com a declaração da
opaca a vivacidade e intensidade das relações sociais e desconsiderar o produzido por uma equip
relatório, da qual as duas a
caráter político presente nas constantes negociações que delimitam as uma releitura da questão
fronteiras de pertencimento social. Dessa forma, considerar o facciona- vivenciaram as etapas de p
lismo xukuru como algo inerente ou não a esse grupo indígena, como para a instituição que o d
geralmente essa questão é evidenciada, é cair num total vazio de inter- disputas entre os vários di
pretação sociológica sobre o problema. trativo e o judicial.
O ponto de partida de nossa reflexão é o evento, ocorrido em 07 A sentença emite, a
de fevereiro de 2003, na Terra Indígena (TI) Xukuru, localizada em Per- com status de verdade, de

142
“Plantaram” Xicão

as possibilidades nambuco, nordeste brasileiro. Tal evento foi detalhadamente descrito


dência xukuru em capítulo anterior deste livro. Nessa data, o cacique Xukuru Marcos
Luidson foi vítima de uma tentativa de assassinato dentro do seu territó-
Rita de Cássia Maria Neves rio tradicional; em conseqüência, foram mortos dois índios que o acom-
Vânia Fialho panhavam e identificado como responsável pelos disparos outro índio
xukuru integrante de um grupo opositor ao cacique. Indignada com
as mortes e a referida tentativa de homicídio, a população indígena da
aldeia de Cimbres e de outras circunvizinhas se voltou contra um grupo
de famílias xukurus ligadas ao assassino; casas e carros foram destruídos
ma reflexão sobre a com- e tais famílias foram banidas do seu território.
erência o relatório técnico Após o conflito que chegou ao seu ápice no dia 07 de fevereiro, as
o povo indígena Xukuru. casas das famílias que foram banidas e que se retiraram foram ocupadas
o conflito que não o apre- pelos próprios xukurus. O ato de deixar as residências, seja sob forma
ccional, mas que envolve violenta ou não, indicava aqueles que se opõem às orientações e ao pro-
não podem ser percebidos jeto liderado pelo cacique Marcos Luidson. Quem apoiava a divisão do
apresentado. Trata-se de território, identificava-se com o grupo que se afirmava como Xukuru de
Cimbres. Essa posição significava apoio às ações de Expedito Cabral (Biá)
bre os seus desdobramen- e crítica à legitimidade do cacique Marcos. Assim como os familiares de
ção do problema. Biá, todos aqueles que estivessem a ele relacionados deveriam deixar a
constatação que descon- Terra Indígena. A ocupação posterior das casas constituiu, sobretudo, um
ntes em toda e qualquer ato simbólico de reordenamento das relações na TI e de expurgo de todos
o recebemos a idéia de so- os elementos pessoais, materiais e alegóricos que pudessem fragilizar o
emos em indicá-la como poder hegemônico das lideranças reconhecidas como tradicionais.
com a noção de vida co- Em decorrência do evento do dia 07 de fevereiro, quando se instau-
um sistema. Disputas e rou a revolta e as ações mais violentas contra Biá e seus aliados, o Ministé-
dianas em torno do esta- rio Público Federal em Pernambuco denunciou 35 (trinta e cinco) índios
ão social. Como desdobra- xukurus por estarem nele envolvidos. Em maio de 2009, foi proferida a
de acirramento que vão sentença numa ação penal por “crime de violação de domicílio, dano e
ntegrantes de cada grupo. incêndio” e os denunciados foram condenados a penas que variam de 10 a
13 anos de reclusão, além de vultosas indenizações em dinheiro.
lementos primordiais dos
só contribui para tornar Com a declaração da sentença, nossa intenção é revisitar o material
sociais e desconsiderar o produzido por uma equipe técnica no ano do conflito, em formato de
relatório, da qual as duas autoras desse texto fizeram parte, possibilitando
ciações que delimitam as uma releitura da questão. A partir desse relatório, de como as autoras
ma, considerar o facciona- vivenciaram as etapas de produção do documento e de entrega do mesmo
se grupo indígena, como para a instituição que o demandou, será discutido também o campo de
num total vazio de inter- disputas entre os vários discursos envolvidos: o antropológico, o adminis-
trativo e o judicial.
o evento, ocorrido em 07 A sentença emite, a partir do poder do juiz, uma versão do conflito
ukuru, localizada em Per- com status de verdade, de definição do problema com sanções e juízo de

143
XUKURU DO ORORUBÁ

valores. É evidente, na mesma, a ausência dos elementos que foram apre- Enquanto antropólo
sentados pelo relatório técnico, daí nosso interesse em demonstrar como Xukuru, fomos convidada
um evento pode ser construído a partir dos interesses e dos jogos de poder fim de, se de acordo, comp
em questão. procedimentos necessário
Assim, optamos por
A TESSITURA DO RELATÓRIO um desenhista técnico, um
nista, uma psicóloga, uma
nós duas, únicas que não f
O evento do dia 07 de fevereiro alcançou considerável repercussão.
No mesmo dia do ocorrido, uma comissão da Secretaria Especial de Di- Durante as negociaç
reitos Humanos, acompanhada por representante da 6ª Câmara do Mi- era possível perceber que
nistério Público Federal, da Comissão Nacional de Direitos Humanos e em posições também ant
de várias entidades indigenistas, seguiu para a cidade de Pesqueira a fim os próprios técnicos envol
de mediar e fiscalizar os procedimentos adotados para apuração dos fatos. discurso dos direitos hum
As desconfianças que caracterizaram a relação entre as autoridades do ofuscava a percepção do co
Município, da Polícia Militar e da Policia Federal e os Xukuru provoca- acionados eram vistos com
ram muita tensão naquele momento. Em linhas gerais, é possível dizer teria um papel fundamen
que tais instituições eram acusadas de assumir posições e agir de forma Nosso papel na equ
parcial a favorecer os indígenas que se colocavam como opositores ao ca- em situação de conflito, p
cique Marcos e com esse objetivo agirem de forma arbitrária. O conflito compreensão do problem
estava instaurado de forma bem mais ampla. cial dos Xukuru, os ante
Nos dias que se seguiram, as famílias banidas da área indígena fo- das suas lideranças, as re
ram acolhidas nas cidades de Recife e de Pesqueira e a FUNAI respon- Tomamos como base a idé
sabilizou-se por acomodá-las em locais que não as colocassem em risco acional que enfatiza o estu
e, para tanto, assumiu o aluguel de casas e o fornecimento de cestas bá- interrelacionar os vários ca
sicas. O que foi definido como uma medida emergencial passou a ser Optamos por proce
uma demanda crescente para o órgão indigenista. Diante dos impasses, quantitativos e qualitativ
da ausência de critério para prestar assistência, é que foi levantada a ne- mulários aplicados por tod
cessidade de produção de um relatório por uma Comissão Técnica (CT). nas imediações da Vila de
O principal objetivo da CT consistia em identificar as famílias que entrevistávamos os vizinh
saíram da Terra Indígena, por causa do conflito, e tentar compreender os motivos que provocara
as tensões que culminaram com a tentativa de assassinato do cacique e aliança com as lideranças
expulsão das famílias. O segundo formulár
Uma das necessidades apontadas pela FUNAI para a realização do famílias que deixaram sua
relatório era com base na identificação das famílias, possibilitar a assis- trumento, voltávamos a e
tência àquelas que ficaram em situação de vulnerabilidade em razão do que tinham do conflito, c
conflito de 07 de fevereiro. vivência (as atividades qu

144
“Plantaram” Xicão

lementos que foram apre- Enquanto antropólogas que já haviam realizado pesquisas com os
esse em demonstrar como Xukuru, fomos convidadas para participar de algumas reuniões iniciais a
resses e dos jogos de poder fim de, se de acordo, compor uma equipe multidisciplinar e definirmos os
procedimentos necessários para o trabalho.
Assim, optamos por compor a equipe formada por nove pessoas:
um desenhista técnico, uma assistente social, uma pedagoga, um zootec-
nista, uma psicóloga, uma administradora e três antropólogas, das quais
nós duas, únicas que não faziam parte do quadro funcional da FUNAI.
considerável repercussão.
Secretaria Especial de Di- Durante as negociações para a composição e formalização da equipe,
nte da 6ª Câmara do Mi- era possível perceber que o conflito entre os Xukuru havia se desdobrado
al de Direitos Humanos e em posições também antagônicas entre as agências indigenistas e entre
cidade de Pesqueira a fim os próprios técnicos envolvidos. A interpretação do conflito com base no
os para apuração dos fatos. discurso dos direitos humanos universais e num excesso de pragmatismo
o entre as autoridades do ofuscava a percepção do contexto. Os argumentos antropológicos por nós
ral e os Xukuru provoca- acionados eram vistos como advindo de um campo de especialistas que
as gerais, é possível dizer teria um papel fundamental da condução do problema.
posições e agir de forma Nosso papel na equipe era o de, através de um trabalho de campo
m como opositores ao ca- em situação de conflito, produzir informações que pudessem viabilizar a
rma arbitrária. O conflito compreensão do problema, considerando elementos da organização so-
cial dos Xukuru, os antecedentes do conflito, aspectos da legitimação
nidas da área indígena fo- das suas lideranças, as redes de sociabilidade e as tensões já existentes.
ueira e a FUNAI respon- Tomamos como base a idéia de Van Velsen (1987, p. 369) de análise situ-
ão as colocassem em risco acional que enfatiza o estudo das normas em conflito e da necessidade de
ornecimento de cestas bá- interrelacionar os vários casos, apresentados situacionalmente.
emergencial passou a ser Optamos por procedimentos de pesquisa que envolviam métodos
sta. Diante dos impasses, quantitativos e qualitativos. Os primeiros, através de dois tipos de for-
é que foi levantada a ne- mulários aplicados por toda a equipe. Identificadas as casas abandonadas
Comissão Técnica (CT). nas imediações da Vila de Cimbres, aldeia onde se deu o ápice do conflito,
identificar as famílias que entrevistávamos os vizinhos mais próximos com o objetivo de caracterizar
to, e tentar compreender os motivos que provocaram a saída da casa, as relações de parentesco e
e assassinato do cacique e aliança com as lideranças envolvidas no conflito, e a data de saída.
O segundo formulário foi utilizado nas entrevistas realizadas com as
UNAI para a realização do famílias que deixaram sua moradia da Terra Indígena. Através deste ins-
mílias, possibilitar a assis- trumento, voltávamos a explorar os motivos da sua saída, a compreensão
nerabilidade em razão do que tinham do conflito, como era composta a família, os meios de sobre-
vivência (as atividades que a sustentavam). Os dados resultantes dos for-

145
XUKURU DO ORORUBÁ

mulários foram tabulados, sistematizados para compor um quadro geral A expectativa em to


das famílias envolvidas e subsidiar as ações do serviço de assistência social. minhamento do destino
É importante ressaltar que os formulários foram por nós mais utili- confortáveis para a equip
zados como estratégia para acessarmos as famílias envolvidas no conflito. os índios que ficaram na
Como se tratava de uma situação extremamente tensa e nosso trabalho solicitada para fornecer in
consistia numa aproximação intensa para ser realizada num curto perío- tões que envolviam o confl
do, seria impossível contatar as pessoas sem que utilizássemos de alguns comentários efetuados po
procedimentos que considerassem essas peculiaridades. incentivaram a desconfian
Nossa participação, enquanto antropólogas, também tinha sua es- Os trabalhos resulta
pecificidade. Era nossa incumbência orientar a equipe em relação aos pro- do de denso conjunto de
cedimentos de aplicação dos formulários, situá-los em relação às tensões mações de cunho admin
que já havíamos identificado e possibilitar também uma reflexão sobre menção a portarias, dado
as repercussões e implicações do trabalho que desenvolvíamos naquele assistentes sociais e també
momento. substanciar a compreensã
Ao aplicarmos o formulário também eram registradas, em espaço Optamos por um te
complementar, informações não contempladas no formulário, o que pos- LOMBO, 2005, p. 269).
sibilitou também uma etnografia da situação de conflito. sicionar o argumento ant
“chegar a uma perspectiv
A primeira dificuldade encontrada pela Comissão foi a variedade de
e descrever os fatos como
situações que envolviam a saída das famílias da terra indígena. Tratava-se
pesquisador” (COLOMBO
não apenas da saída provocada pelo conflito do dia 07 de fevereiro, mas
e críticas voltadas para e
envolvia também outras problemáticas, como atritos entre familiares e
objetividade e a afirmação
um intenso movimento de conflitos anteriores. Optamos, dessa forma,
tos fundamentais na dispu
por identificar e separar todas as famílias egressas e situá-las em quadros
1989) que se apresentava
que pudessem elucidar cada situação observada.
O levantamento foi iniciado pela aldeia de Cimbres, onde se encon-
travam as casas que foram destruídas, portanto, o epicentro do conflito ANTECEDENTES
de 07 de fevereiro. Lideranças daquela região acompanharam as primei-
ras entrevistas, realizadas no intuito de demonstrar qual o procedimento O processo de regul
da equipe e dirimir as desconfianças quanto aos objetivos da Comissão. ciado em 1989 quando fo
Em um primeiro momento foram apontadas 14 famílias identifi- ção. A partir desse períod
cadas pelas lideranças como aquelas que realmente haviam sido expulsas estavam envolvidas na di
no dia 07 de fevereiro de 2003. A partir da moradia dessas pessoas é das fronteiras da identida
que iniciamos a aplicação dos formulários. No total, foram três meses de tia territorial foi capaz de e
trabalho de campo em que a equipe ora estava completa, ora havia alter- xava em segundo plano os
nância de seus membros. instituíram as relações loc

146
“Plantaram” Xicão

compor um quadro geral A expectativa em torno das conclusões deste relatório para o enca-
erviço de assistência social. minhamento do destino das famílias promoveu situações bastante des-
foram por nós mais utili- confortáveis para a equipe. Como se não bastassem as acusações entre
ias envolvidas no conflito. os índios que ficaram na TI e os que saíram, a CT era constantemente
nte tensa e nosso trabalho solicitada para fornecer informações e se pronunciar em relação a ques-
ealizada num curto perío- tões que envolviam o conflito entre os Xukuru. O clima de suspeição e os
ue utilizássemos de alguns comentários efetuados por pessoas que transitavam entre os dois grupos
ridades. incentivaram a desconfiança em relação aos trabalhos desta Comissão.
gas, também tinha sua es- Os trabalhos resultaram num relatório de 53 páginas, acompanha-
equipe em relação aos pro- do de denso conjunto de documentos anexados. Estão presentes infor-
-los em relação às tensões mações de cunho administrativo, como detalhes da comissão técnica,
mbém uma reflexão sobre menção a portarias, dados sobre o cadastro das famílias realizado pelas
desenvolvíamos naquele assistentes sociais e também elementos antropológicos que visavam con-
substanciar a compreensão do conflito.
m registradas, em espaço Optamos por um texto que priorizava a “narração realista” (CO-
no formulário, o que pos- LOMBO, 2005, p. 269). Tratava-se de uma escolha intencional para po-
e conflito. sicionar o argumento antropológico. O objetivo deste tipo de narração é
“chegar a uma perspectiva de observação descentrada de modo a acolher
omissão foi a variedade de
e descrever os fatos como se desenvolvem também no distancaimento do
terra indígena. Tratava-se
pesquisador” (COLOMBO, 2005, p. 270). Cientes de todas as limitações
o dia 07 de fevereiro, mas
e críticas voltadas para esse tipo de narração, consideramos que a sua
atritos entre familiares e
objetividade e a afirmação da autoridade do antropólogo, seriam elemen-
s. Optamos, dessa forma,
tos fundamentais na disputa pela definição “do fazer crer” (BOURDIEU,
sas e situá-las em quadros
1989) que se apresentava naquele momento.
a.
e Cimbres, onde se encon-
o, o epicentro do conflito ANTECEDENTES: PARA ENTENDER O CONFLITO
companharam as primei-
strar qual o procedimento O processo de regularização fundiária do território Xukuru foi ini-
objetivos da Comissão. ciado em 1989 quando foi realizada a etapa de identificação e delimita-
adas 14 famílias identifi- ção. A partir desse período, as relações que ali vinham se conformando
ente haviam sido expulsas estavam envolvidas na disputa pelos limites territoriais e pela definição
moradia dessas pessoas é das fronteiras da identidade Xukuru. A mobilização em torno da garan-
total, foram três meses de tia territorial foi capaz de estabelecer um senso de pertencimento que dei-
completa, ora havia alter- xava em segundo plano os vínculos (políticos, afetivos, de compadrio) que
instituíram as relações locais durante grande parte da história Xukuru.

147
XUKURU DO ORORUBÁ

Apesar de a mobilização Xukuru ir de encontro à estrutura fundiária mais que limites geogra
e política que ali se conformara, até o ano de 2000 não havia se processado como área de uma prátic
uma mudança significativa nas relações políticas e econômicas locais. tegoria social. É no inter
A organização dos Xukuru e a sua forma de mobilização tiveram desse grupo se sentem em
repercussões nacionais que vieram a dar destaque à questão indígena no espaço socialmente selecio
Nordeste e o cacique Xicão teve sua liderança projetada regional e nacio- interior do qual essa prátic
nalmente. Os reflexos provocados por essa mobilização podem ser obser- tima. Assim, dentro dos li
vados quando acompanhamos o processo de reconhecimento oficial da TI dos imóveis nele incident
Xukuru, que foi alvo de várias manobras administrativas e políticas, que reocupação dos espaços; h
não possibilitavam uma mudança significativa das relações na região de internas a fim de equaliza
Pesqueira, onde se situa a terra indígena. A violência envolvendo a dispu- A mobilização dos X
ta pelas terras culminou com o assassinato do cacique Xicão em 1998, em regularização fundiária, qu
um total de seis mortes até 2003. Apesar de a maioria das etapas neces- trativo e jurídico do Estad
sárias para a homologação da TI ter sido concretizada desde 1998, esta só rearrumação no plano loca
veio a se dar no ano de 2001. tório mesclado, até então,
Até então, o poder estabelecido pelo controle daquelas terras pouco contro ao projeto dos Xuk
havia sido abalado. As alianças entre os fazendeiros, a população indígena Foi neste momento
e as instituições públicas (incluindo aí a própria FUNAI), garantiam o zação da ocupação do terr
status quo na região. de Xicão, que algumas te
No entanto, com os trabalhos de atualização dos valores das benfei- ausência da liderança de X
torias dos imóveis incidentes na TI e com o começo do pagamento das in- coesão e de controle das re
denizações, começa uma nova fase em que os ocupantes não-índios passam próprios indígenas se confi
a se retirar das terras Xukuru e as relações assumem um novo contorno. jeto de sociedade xukuru r
De maneira bastante explícita, o controle territorial passa a admitir Desde julho de 2000
um domínio em que prevalece a idéia de uma terra com base na apropria- curaram se legitimar com
ção coletiva que impõe limites ao controle externo e prevê formas dife- de 2001, se declararam “i
rentes de controle e gerenciamento da área que reconstroem as relações Xukuru de Cimbres.
sociais na região. O local do confronto passa a ser fundamentalmente a A princípio, esse gr
cidade, a polaridade entre índios e não-índios fica mais clara no contexto terra indígena. A propost
urbano. O controle do território xukuru também significava afirmar o os recursos e projetos vol
controle de recursos importantes para o município, como o acesso à água, seja, nas aldeias Cimbres
pois o principal açude que supre a cidade fica situado na área indígena, e por sua vez, gerenciariam
o controle de estradas que possibilitam o acesso a imóveis produtores de teriormente os Xukuru d
leite na região norte do município de Pesqueira. física do território, em du
Destacamos que a idéia de um novo gerenciamento de território ambos os grupos, no lado
deve ser compreendida de maneira mais ampla; este representa muito

148
“Plantaram” Xicão

ontro à estrutura fundiária mais que limites geograficamente estabelecidos. Deve ser entendido
00 não havia se processado como área de uma prática social, de um comportamento, de uma ca-
as e econômicas locais. tegoria social. É no interior desta região delimitada que os indivíduos
a de mobilização tiveram desse grupo se sentem em afinidade, em segurança; seu território é um
que à questão indígena no espaço socialmente selecionado para a sobrevivência de seu sistema e é no
projetada regional e nacio- interior do qual essa prática social se faz e se crê eficaz, competente e legí-
bilização podem ser obser- tima. Assim, dentro dos limites do território xukuru, com a desocupação
onhecimento oficial da TI dos imóveis nele incidentes, é iniciado um processo de acomodação e de
nistrativas e políticas, que reocupação dos espaços; há também necessidade de acordos e estratégias
das relações na região de internas a fim de equalizar as necessidades e interesses.
ência envolvendo a dispu- A mobilização dos Xukuru começou a se dar com a reivindicação da
cique Xicão em 1998, em regularização fundiária, que coloca a disputa territorial no plano adminis-
maioria das etapas neces- trativo e jurídico do Estado brasileiro, ao mesmo tempo em que há uma
tizada desde 1998, esta só rearrumação no plano local para efetivação de uma hegemonia num terri-
tório mesclado, até então, por interesses políticos e poderes que iam de en-
role daquelas terras pouco contro ao projeto dos Xukuru, inaugurado ainda sob a liderança de Xicão.
iros, a população indígena Foi neste momento de realinhamento das relações e de reorga-ni-
ia FUNAI), garantiam o zação da ocupação do território demarcado, no período posterior à morte
de Xicão, que algumas tensões internas passaram a tomar mais vulto. A
ção dos valores das benfei- ausência da liderança de Xicão, que representava um forte elemento de
eço do pagamento das in- coesão e de controle das relações internas, permitiu que disputas entre os
upantes não-índios passam próprios indígenas se configurassem como ameaças para o já referido pro-
mem um novo contorno. jeto de sociedade xukuru relacionado com a regularização de seu território.
territorial passa a admitir Desde julho de 2000, alguns índios que residiam em Cimbres pro-
rra com base na apropria- curaram se legitimar como um grupo dos Xukuru à parte. Em setembro
erno e prevê formas dife- de 2001, se declararam “independentes” e passaram a se autodenominar
e reconstroem as relações Xukuru de Cimbres.
ser fundamentalmente a A princípio, esse grupo pretendia uma divisão administrativa da
ca mais clara no contexto terra indígena. A proposta era que os Xukuru de Cimbres gerenciariam
bém significava afirmar o os recursos e projetos voltados para a região oeste da terra indígena, ou
pio, como o acesso à água, seja, nas aldeias Cimbres, Cajueiro e Guarda. Os Xukuru do Ororubá,
tuado na área indígena, e por sua vez, gerenciariam os recursos das outras vinte e uma aldeias. Pos-
o a imóveis produtores de teriormente os Xukuru de Cimbres propuseram também uma divisão
. física do território, em duas partes, impossibilitando o livre tráfego de
renciamento de território ambos os grupos, no lado adversário.
la; este representa muito

149
XUKURU DO ORORUBÁ

A família do principal líder desse grupo sempre fora uma das mais AS DIMENSÕES D
abastadas da vila, vivendo na dependência política dos fazendeiros e de ANTROPOLÓGIC
políticos da região. Quando as terras começaram a ser desintrusadas, eles
se viram de uma hora para outra perdendo prestígio e poder, pois os gran- A requisição do relat
des proprietários, ao desocuparem as terras, entregavam-nas às lideran- da necessidade de melhor
ças tradicionais deixadas por Xicão. tanto, até que ponto podem
Estamos, na verdade, lidando com dois paradigmas diferentes. Os que o subsidiaram foram u
Xukuru do Ororubá, através dos esforços e lutas para o ressurgimento de Cabe, a princípio, ex
vínculos étnicos, empenharam-se para uma organização social e política como uma perícia antropo
bem articulada, envolvendo representantes de todas as aldeias e valori- interdisciplinar, o caráter
zando a consulta ao Conselho formado por “lideranças tracionais”, como realizadas. Com intuito d
são consideradas algumas pessoas mais velhas que se destacaram no en- judicial, seu conteúdo ap
volvimento na mobilização pela reconquista territorial e pela sua relação lidade, situou-o historicam
com o plano sagrado, herança deixada por Xicão. Sua identidade étnica que saíram da terra indíge
é baseada no processo de territorialização e na crença nos “encantados”, assumiu um papel mais a
em Mãe Tamain e no Pai Tupã. A sobrevivência econômica desse grupo mandantes e, teoricament
advém do uso e controle da terra como forma de sustento. Consideram para a aquela situação e
a existência do grupo opositor, apoiado pelos latifundiários, baseado na cer de experts na questão.
burocracia e mediação de agências políticas externas, carecendo de legi- uma forma particular de
timidade religiosa. modo peculiar de ligação e
Por sua vez, os Xukuru de Cimbres se organizaram a partir de ações mecânica entre instrumen
políticas de desenvolvimento regional. Toda a organização social criada concretos referidos a reali
por esse grupo em 2000, parte do princípio de que a região tem um enor- a perícia não se reduz a um
me potencial turístico e deve ser explorado. A proposta dos Xukuru de seus contornos geográfico
Cimbres era criar uma infraestrutura nas aldeias de Cimbres e de Cajuei- ca mediante uma questão
ro, que acolhesse o romeiro e o turista. Pensões, pousadas e grandes ho- A expectativa do lu
téis-fazenda acolheriam o turista que deixasse dinheiro na região. Como mentos nos contextos de d
podemos perceber, são duas concepções distintas de desenvolvimento e cisões ainda na esfera adm
de utilização da terra indígena, uma incompatível com a outra. sobre este, como bem sali
criar uma confusão de sab
atribuído ao antropólogo
sabilidades e benefícios.
Ao argumento antr
assim como são impostas
lidade, que engessam o ca
o antropólogo como impo

150
“Plantaram” Xicão

empre fora uma das mais AS DIMENSÕES DO CONFLITO: ARGUMENTAÇÃO


ítica dos fazendeiros e de ANTROPOLÓGICA E A COMPREENSÃO DO PROBLEMA
m a ser desintrusadas, eles
tígio e poder, pois os gran- A requisição do relatório a respeito do conflito foi demandada a partir
ntregavam-nas às lideran- da necessidade de melhor se compreender os conflitos instaurados. No en-
tanto, até que ponto podemos considerar que os elementos antropológicos
paradigmas diferentes. Os que o subsidiaram foram utilizados na condução posterior do problema?
s para o ressurgimento de Cabe, a princípio, explicitar que concebemos o relatório em questão
ganização social e política como uma perícia antropológica. Apesar de ser resultante de um trabalho
todas as aldeias e valori- interdisciplinar, o caráter antropológico preponderou nas considerações
eranças tracionais”, como realizadas. Com intuito de constituir uma peça administrativa e, talvez,
que se destacaram no en- judicial, seu conteúdo apresentou a dinâmica do conflito, sua tempora-
rritorial e pela sua relação lidade, situou-o historicamente, além de também identificar as famílias
ão. Sua identidade étnica que saíram da terra indígena e os correlatos contextos. Ou seja, o relatório
crença nos “encantados”, assumiu um papel mais amplo do que o colocado inicialmente pelos de-
ia econômica desse grupo mandantes e, teoricamente, visava subsidiar as decisões a serem tomadas
de sustento. Consideram para a aquela situação e teria ainda o caráter de apresentar uma pare-
latifundiários, baseado na cer de experts na questão. Almeida (2006, p.22) se refere à perícia como
ternas, carecendo de legi- uma forma particular de produção de conhecimento, expressando um
modo peculiar de ligação entre teoria e intervenção, evitando uma relação
anizaram a partir de ações mecânica entre instrumentos teóricos de sentido universal e problemas
organização social criada concretos referidos a realidades localizadas. Este autor ainda ressalta que
que a região tem um enor- a perícia não se reduz a um “estudo de área” e tampouco se restringe aos
proposta dos Xukuru de seus contornos geográficos, mas de um argumento de autoridade científi-
s de Cimbres e de Cajuei- ca mediante uma questão específica. (ALMEIDA, 2006, p. 23).
s, pousadas e grandes ho- A expectativa do lugar ocupado pelo antropólogo e de seus argu-
dinheiro na região. Como mentos nos contextos de disputas judiciais, e aqui nós estendemos às de-
tas de desenvolvimento e cisões ainda na esfera administrativa, acabam ficando confusos, recaindo
vel com a outra. sobre este, como bem salienta Leite (2004, 67), exigências que parecem
criar uma confusão de saberes, poderes e responsabilidades, a ponto de ser
atribuído ao antropólogo um lugar de juiz, julgando e definindo respon-
sabilidades e benefícios.
Ao argumento antropológico é cobrado um grau de objetividade,
assim como são impostas exigências consideradas éticas, como a neutra-
lidade, que engessam o caráter dinâmico dos processos sociais e colocam
o antropólogo como impossibilitado de emitir pareceres por conta da es-

151
XUKURU DO ORORUBÁ

treita relação mantida com os grupos sociais estudados, o que constitui SOBRE A SENTEN
um elemento fundamental para a realização de etnografias. O “objeto”
do conhecimento não é independente do sujeito cognoscente (OLIVEI- Sobre a responsabilid
RA, 1998, 270) e, portanto, nem antropólogos, nem gestores, nem juí- dualmente, há de se desta
zes, nem qualquer perito são indiferentes ao campo em apreço. Cimbres, pois esta foi mov
Conforme explicitado por Leite, “O trabalho da perícia antropoló- compreensão de que o “su
gica envolve diálogo com esse campo [o do Direito], já que o que está em Esse foi o aspecto que ma
jogo são, principalmente, direitos que foram histórica e culturalmente apresenta sobre o evento.
construídos. E nesse sentido tudo se amplia: o diálogo não é apenas com o Assim, como o olha
jurídico, mas abrange a sociedade e várias áreas do conhecimento, discur- administrativos, a respond
sos, atores e interesses, por vezes antagônicos” (LEITE, 2004, 67). a perspectiva do juiz profe
Há de se atentar, tal como já foi também destacado por Oliveira (1988, ber a sanção. Para esse juíz
270 e 282), que a Antropologia opera com um grau de abstração muito dife- sócio-político não era imp
rente do acionado pelo saber jurídico; sua ênfase se pauta sobre as práticas e envolvidos nos eventos e
a produção simbólica de uma sociedade. O que queremos destacar, por fim, individualmente imputad
é: (a) o antropólogo trabalha com coletividades, logo, seus argumentos só Shiraishi (2006, p. 1
têm sentido se relacionados à compreensão da forma de vida em sociedade comunidade tradicionais,
e que (b) as categorias privilegiadas para sua análise são as denominadas operacionais que carecem
categorias nativas que ressaltam a necessidade de se atentar para as formas fim de relativizar o que é
de nominação e classificação interna a cada grupo, distanciando-se do que preensão das ações socialm
poderia ser considerado como falsa consciência ou simulação. Os atos e as “este movimento de adequ
representações são categorias significativas para o entendimento das rela- ta os antagonismos existen
ções sociais e dos lugares que os sujeitos ocupam no mundo. grupo social; e propriedad
Dentro dessa mesma lógica, é claro para o campo da Antropologia
que, ao ocupar um espaço privilegiado nas arenas de decisão adminis-tra-
É por
tiva e judicial, os laudos antropológicos acabam por assumir um gênero
deman
narrativo próprio, em que também situa seus argumentos no contexto
pensar
de correlações de poder e de interesses de todos os lados envolvidos. Tal
a sua e
afirmativa parece ser contraditória à opção declarada anteriormente de
pode s
que usamos a “narrativa realista”. No entanto, cabe perceber que esta se
Tem-s
constituiu como uma estratégia de convencimento e não como estratégia
dos ou
de compreensão do problema.
do out
Apesar de já estarmos diante da sentença social proferida, o que per-
cebemos no presente caso é a desconsideração - em todo o processo - de
instrumentos, como o laudo produzido sobre o conflito, que possibilita-
riam outra leitura do fato.
43. Sobre a análise dessa sentenç

152
“Plantaram” Xicão

studados, o que constitui SOBRE A SENTENÇA


e etnografias. O “objeto”
to cognoscente (OLIVEI- Sobre a responsabilidade que recai em 35 pessoas43, julgadas indivi-
s, nem gestores, nem juí- dualmente, há de se destacar as características da insurgência na aldeia de
mpo em apreço. Cimbres, pois esta foi movida por um sentimento coletivo que nos leva à
alho da perícia antropoló- compreensão de que o “sujeito” tem um caráter especial para essa etnia.
eito], já que o que está em Esse foi o aspecto que mais se destacou na compreensão que a sentença
histórica e culturalmente apresenta sobre o evento.
iálogo não é apenas com o Assim, como o olhar da FUNAI destacava aspectos operacionais,
do conhecimento, discur- administrativos, a responder quem tinha o direito de receber assistência,
LEITE, 2004, 67). a perspectiva do juiz proferida na sentença salientava quem deveria rece-
stacado por Oliveira (1988, ber a sanção. Para esse juízo, tal qual apresenta a sentença, o componente
au de abstração muito dife- sócio-político não era importante, bastando a prova da participação dos
se pauta sobre as práticas e envolvidos nos eventos em questão para defini-los como réus e serem
ueremos destacar, por fim, individualmente imputados.
logo, seus argumentos só Shiraishi (2006, p. 15), ao tratar das práticas jurídicas de povos e
orma de vida em sociedade comunidade tradicionais, chama a atenção para as dificuldades jurídicas
nálise são as denominadas operacionais que carecem reformular seus princípios e procedimentos a
de se atentar para as formas fim de relativizar o que é definido como crime e de buscar uma com-
po, distanciando-se do que preensão das ações socialmente significativas. O autor ainda ressalta que
ou simulação. Os atos e as “este movimento de adequação das experiências vividas ao direito explici-
o entendimento das rela- ta os antagonismos existentes entre as noções de indivíduo versus povos ou
no mundo. grupo social; e propriedade privada versus território” e continua:
o campo da Antropologia
as de decisão adminis-tra-
É por este motivo que as ‘novas situações’ oriundas das
m por assumir um gênero
demandas desses povos impõem a necessidade de se re-
argumentos no contexto
pensar os modelos jurídicos de modo que possam garantir
s os lados envolvidos. Tal
a sua existência enquanto coletivo diferenciado, que não
clarada anteriormente de
pode ser representado na simples soma dos indivíduos.
cabe perceber que esta se
Tem-se a impossibilidade de dissociar os indivíduos, uns
nto e não como estratégia
dos outros, pois a existência de um está condicionada à
do outro.
ocial proferida, o que per-
- em todo o processo - de
o conflito, que possibilita-

43. Sobre a análise dessa sentença, ver Fialho, Figueiroa e Lobo (2009)

153
XUKURU DO ORORUBÁ

Assim como entre os Paez, na Colômbia (SÁNCHEZ, 2008), o “su- uma proteção ao indivídu
jeito distinto” Xukuru é um sujeito coletivo. Isso quer dizer que a socie- sua casa -, enquanto para
dade Xukuru, em sua totalidade, é o sujeito de direito. O crime cometido, do território, ou seja, a um
na compreensão dos Xukuru é caracterizado pelo desrespeito à autorida- O problema, conseq
de (também sagrada) do cacique, pelo assassinato dos dois índios, que premissas que entram em
não consistiram em alvos individuais, mas representavam o abalo a uma da estejamos dentro de um
ordem socialmente estabelecida. bros a uma cultura majo
A compreensão de sujeito coletivo, conforme salienta Sánchez vida vigente, em detrime
(2008, p. 127-8), é o fundamento básico que explica muitos dos com- como pluralista.
portamentos e que também permite compreender as novas tensões que As discussões aprese
traem as demandas individuais de “liberdade” de alguns indivíduos. Cabe mente que houve um em
às autoridades manter o compromisso de salvaguardar a integridade ét- de Cimbres. Esse confron
nica e cultural do povo. tes, o que gerou duas for
Os membros deste povo, tal como entre os Paez, sabem e sentem afirma Bauman (2003), t
que a presença de um sujeito transgressor em suas comunidades é a ma- entanto, para alcançar a c
nifestação de que o todo social está mal. Não se tratou de um problema ção e liberdade individual
que só afetou um indivíduo, todos se sentiram atingidos. Diante da trans- e sem atritos.
gressão que evidenciou a ruptura de uma ordem, o transgressor foi iden- Nesse contexto de te
tificado e banido, para que “[...] se ingresse ‘otro presente’ que garantice o equilíbrio cindido pelos
un distinto para todos. Ese otro presente en todas las personas es la directriz da sanção ser pessoal, exis
general que debe proteger la autoridad”. (SÁNCHEZ, 2008, p. 128). caso dos Xukuru, em que
A identidade étnica Xukuru é fruto da luta por reconhecimento no ma tem responsabilidade
Estado democrático de direito. Para que esse reconhecimento se efetivas- dos envolvidos no assassin
se, foi necessário estabelecer uma rede de relações entre os diversos povos do cacique.
indígenas, tanto na região Nordeste, quanto em outras regiões do Brasil. Sanchéz (2008) tam
Essa rede de relações propiciou a criação de uma identidade coletiva que caso em análise, pois consi
consolidou uma forma de se afirmar Xukuru. a adoção de uma posição p
Para os Xukuru do Ororubá, a identidade do indivíduo está vincu- assumiam a condição de
lada à identidade coletiva e só pode concretizar-se através de uma rede mente assumiam uma po
cultural. Isso significa que para eles a segurança individual está atrelada à Não se trata de negligenc
segurança do território como um todo. identitário, mas que essa
Nós nos encontramos, assim, diante de um impasse: se por um lado comunitária xukuru. Tais
nossa Constituição responde a uma teoria dos direitos de orientação in- toridade tradicional e o de
dividualista, por outro reconhece a existência de identidades coletivas e, direito, com outros princ
portanto, igualdade de direitos para formas de vida culturais específicas. não buscavam a viabilida
Isso faz com que a forma como o Estado está organizado, aponte para todo o bojo de sustentação
um sistema hegemônico q

154
“Plantaram” Xicão

SÁNCHEZ, 2008), o “su- uma proteção ao indivíduo - no caso, cada indivíduo que foi expulso de
so quer dizer que a socie- sua casa -, enquanto para os Xukuru, a proteção está ligada ao controle
direito. O crime cometido, do território, ou seja, a uma proteção de caráter coletivo.
elo desrespeito à autorida- O problema, conseqüentemente, está em como lidar com essas duas
nato dos dois índios, que premissas que entram em choque permanentemente. É possível que ain-
esentavam o abalo a uma da estejamos dentro de uma estrutura que procura incorporar seus mem-
bros a uma cultura majoritária, impingindo às minorias essa forma de
nforme salienta Sánchez vida vigente, em detrimento do reconhecimento da sociedade brasileira
explica muitos dos com- como pluralista.
nder as novas tensões que As discussões apresentadas no relatório técnico identificam clara-
e alguns indivíduos. Cabe mente que houve um embate entre os Xukuru de Ororubá e os Xukuru
guardar a integridade ét- de Cimbres. Esse confronto teve por princípio dois paradigmas diferen-
tes, o que gerou duas formas distintas de lidar com a realidade. Como
os Paez, sabem e sentem afirma Bauman (2003), ter uma comunidade significa ter proteção, no
uas comunidades é a ma- entanto, para alcançar a comunidade significa perder a liberdade. Prote-
e tratou de um problema ção e liberdade individual são dois valores desejados, mas nunca ajustados
tingidos. Diante da trans- e sem atritos.
m, o transgressor foi iden- Nesse contexto de tensão, a sanção será a única que poderá restaurar
ro presente’ que garantice o equilíbrio cindido pelos agressores do cacique. Apesar de a imputação
las personas es la directriz da sanção ser pessoal, existem casos, como destaca Sánchez e parece ser o
CHEZ, 2008, p. 128). caso dos Xukuru, em que se estende à família, por considerar que a mes-
ta por reconhecimento no ma tem responsabilidade em deter a infração. Daí o banimento da família
conhecimento se efetivas- dos envolvidos no assassinato dos dois índios e na tentativa de assassinato
ões entre os diversos povos do cacique.
m outras regiões do Brasil. Sanchéz (2008) também destaca outro aspecto importante para o
ma identidade coletiva que caso em análise, pois consideramos que o conflito foi se conformando com
a adoção de uma posição por parte dos opositores do cacique Marcos que
e do indivíduo está vincu- assumiam a condição de índio para a sociedade “branca”, mas interna-
ar-se através de uma rede mente assumiam uma postura que mais se aproximava dos não-índios.
individual está atrelada à Não se trata de negligenciar a dinamicidade inerente a qualquer processo
identitário, mas que essa dubiedade era vivenciada nos limites da vida
m impasse: se por um lado comunitária xukuru. Tais contradições mostravam descaso diante da au-
direitos de orientação in- toridade tradicional e o desejo dos opositores de acessar outro sistema de
de identidades coletivas e, direito, com outros princípios, procedimentos e sanções. Tais opositores
vida culturais específicas. não buscavam a viabilidade do diálogo intercultural, mas de negação de
organizado, aponte para todo o bojo de sustentação da unidade social Xukuru e de legitimação de
um sistema hegemônico que nega qualquer tipo de pluralismo.

155
XUKURU DO ORORUBÁ

A PRODUÇÃO DO CONFLITO BOURDIEU, Pierre. A I


uma ReflexãoCrítica sobre
São três as possibilidades de leitura do conflito em questão: (a) o Difel, 1989.pp. 107-132.
técnico, a partir do referencial antropológico, (b) o administrativo, da COLOMBO, Enzo. Descr
FUNAI – necessário para a definição dos critérios de assistência e (c) o pírica. In: MELUCCI, Al
judicial, que define a situação em termos de réus e vítimas e define o que tativa e cultura.Petrópolis:
é o delito, o que é o crime e, por conseguinte, o que é considerado padrão
de comportamento normal e anormal, aceitável ou não socialmente. São FIALHO, Vânia FIGUEI
três possibilidades de compreensão do conflito que necessitavam se ali- lheiros (2009). Narrativas
mentar mutuamente para que as medidas adotadas se aproximassem do Xukuru: um estudo de ca
sentido que o evento teve para os grupos sociais envolvidos. Se conside- e Marcadores Sociais da
rarmos a situação como polarizada entre os indígenas, entre as entidades Direito/USP, ocorrido nos
envolvidas e entre os indígenas e as entidades, a condução da questão vai São Paulo
assumir uma postura maniqueísta e, ao invés de possibilitar acordos e
soluções, contribui para o acirramento do conflito. LEITE, Ilka B. Questões é
com o campo jurídico. In:
Por fim, não coube nesse texto rediscutir os direitos dos que ficaram
E.; ORO; A. P. Antropolog
ou dos que saíram da TI, menos ainda o resultado da sentença, mas cons-
EdUFF, 2004. pp.65-72.
tatar o engessamento das instâncias e instituições responsáveis pela orga-
nização político-administrativa do Estado brasileiro e a sua incapacidade OLIVEIRA, João Pacheco
de lidar com problemas que envolvam o entendimento intercultural. O sibilidades de trabalho do
não uso de um instrumento, como o relatório técnico produzido em pleno Indigenismo e territorializaçã
processo de conflito, ou o pouco diálogo entre as diversas instituições en- 296.
volvidas, tais como FUNAI, ONGs e Ministério Público, não possibilitou
o encaminhamento satisfatório para nenhum dos envolvidos no conflito, SHIRAISHI NETO, J. “P
seja dos que saíram da TI ou dos que ali permaneceram. Mais grave, con- cionais de acesso e uso da t
tribuiu para a criminalização de lideranças xukurus e promoveu a intole- Babaçu Livre: práticas juríd
rância e o preconceito de forma oficializada, judicializada, endossada pelo correlatas. Manaus: PPGS
próprio Estado. SÁNCHEZ, E. “Princípio
ticia que se imparte entre
REFERÊNCIAS cuada, legítima y viable p
dades particulares”, in HU
ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Os quilombos e a Base de lançamento C.;ARIZA, R. Hacia sistem
de foguetes de Alcântara: laudo antropológico. Brasília: MMA, 2006. Stiftung,2008.
BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo WOLF. Eric R. Antropologi
atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. RO, Gustavo Lins (orgs.)
Paulo: Imprensa Oficial do

156
“Plantaram” Xicão

BOURDIEU, Pierre. A Identidade e a Representação. Elementos para


uma ReflexãoCrítica sobre a Idéia de Região. In: O Poder Simbólico. Lisboa,
onflito em questão: (a) o Difel, 1989.pp. 107-132.
(b) o administrativo, da COLOMBO, Enzo. Descrever o social: a arte de escrever e pesquisa em-
érios de assistência e (c) o pírica. In: MELUCCI, Alberto. Por uma sociologia reflexiva: pesquisa quali-
us e vítimas e define o que tativa e cultura.Petrópolis: Vozes, 2005.pp. 265-288.
que é considerado padrão
l ou não socialmente. São FIALHO, Vânia FIGUEIROA; Mariana C. Leão ; LOBO, Sandro Ca-
o que necessitavam se ali- lheiros (2009). Narrativas na Sentença Criminal de Cimbres/ Terra Indígena
tadas se aproximassem do Xukuru: um estudo de caso. Trabalho apresentado no GT Antropologia
is envolvidos. Se conside- e Marcadores Sociais da Diferença, no I Encontro de Antropologia do
ígenas, entre as entidades Direito/USP, ocorrido nos dias 20 e 21 de agosto de 2009 na cidade de
a condução da questão vai São Paulo
de possibilitar acordos e
ito. LEITE, Ilka B. Questões éticas da pesquisa antropológica na interlocução
com o campo jurídico. In: VICTORA, C.; OLIVEN, G. R.; MACIEL. M.
os direitos dos que ficaram
E.; ORO; A. P. Antropologia e ética: o debate atual no Brasil. Niterói/RJ:
do da sentença, mas cons-
EdUFF, 2004. pp.65-72.
es responsáveis pela orga-
leiro e a sua incapacidade OLIVEIRA, João Pacheco de. Instrumentos de bordo: expectativas e pos-
ndimento intercultural. O sibilidades de trabalho do antropólogo em laudos periciais.In: ______.
cnico produzido em pleno Indigenismo e territorialização. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1998. pp. 269-
as diversas instituições en- 296.
o Público, não possibilitou
os envolvidos no conflito, SHIRAISHI NETO, J. “Práticas Jurídicas” diferenciadas: formas tradi-
neceram. Mais grave, con- cionais de acesso e uso da terra e dos recursos naturais. In: ______. Leis do
urus e promoveu a intole- Babaçu Livre: práticas jurídicas das quebradeiras de coco babaçu e normas
icializada, endossada pelo correlatas. Manaus: PPGSCA-UFAM/Fundação Ford, 2006.
SÁNCHEZ, E. “Princípios básicos y formas de funcionamento de la jus-
ticia que se imparte entre los Paeces y los Wayú como forma cultural ade-
cuada, legítima y viable para resolver conflictos y coaccionar a sus socie-
dades particulares”, in HUBER, R; MARTINEZ, J.C.; LANCHENAL,
mbos e a Base de lançamento C.;ARIZA, R. Hacia sistemas jurídicos plurales. Bogotá, Konrad Adenauer
asília: MMA, 2006. Stiftung,2008.
por segurança no mundo WOLF. Eric R. Antropologia e Poder. FELDMAN-BIANCO, Bela & RIBEI-
RO, Gustavo Lins (orgs.) Brasília: Editora Universidade de Brasília: São
Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo: Editora Unicamp, 2003.

157
XUKURU DO ORORUBÁ

U m olhar antropológico acerca do processo


criminal que teve como vítima o cacique
que Xicão? O Estado-Jui
Xukuru na condução do p
Xicão Xukuru44. ponto de vista étnico-cult
e da sua dimensão?
Mariana Carneiro Leão Figueiroa. Caberia, assim, uma
tos fundamentais: primeir
face às prerrogativas juríd
culturalmente diferenciad
APRESENTAÇÃO de que perpassa a constit
coletivo de direitos e, em
Francisco de Assis Araújo, cacique Xicão Xukuru, foi assas-sinado uma percepção mais acura
mediante disparos de arma de fogo na manhã do dia 20 de maio de 1998, sua principal liderança, be
no bairro Xukurus, na cidade de Pesqueira, interior do estado de Per- São exatamente esse
nambuco. Líder indígena atuante, respeitado regional e nacionalmente, tratar neste texto, vez qu
devido a sua importância na luta do povo Xukuru e das demais etnias demonstração da diversid
do Nordeste brasileiro pelo reconhecimento de seus direitos, em espe- (BELTRÃO, 2007, p.359
cial aqueles referentes à demarcação da terra indígena. Sua morte causou aqui fazem parte do “cam
grande comoção e revolta, repercutindo nacional e internacionalmente, tos, ou seja, aquilo que n
chamando a atenção de entidades de defesa dos Direitos Humanos. Os nhas do processo criminal
acusados pelo homicídio, fazendeiros locais, faleceram antes de o processo
chegar ao seu final, tendo sido o mesmo arquivado.
Com o propósito de refletir acerca da diversidade cultural, minhas NAS ENTRELINH
preocupações se voltaram para perceber, no âmbito do poder judiciário
federal no estado de Pernambuco, através dos agentes sociais envolvidos Através das “prática
nesse processo criminal, como se estabeleceu a relação com o cultural- finidas pelo Estado-Juiz ao
mente diferente. Como se constituiu esse diálogo intercultural45 entre o vezes não atende ao unive
poder judiciário e o povo indígena Xukuru no caso da morte do seu caci- A partir da etnografia de
jeito étnico culturalmente
prerrogativas jurídicas de

44. Este texto é parte integrante do quarto capítulo da dissertação da autora. Ad Argumentadum
Tantum: um olhar antropológico acerca do processo criminal da morte do cacique Xicão Xukuru. 46. O termo “Estado-Juiz” e “po
Dissertação de Mestrado em Antropologia, UFPE, 2010. modelo federativo do Estado bra
diciário é um deles, responsável p
45. Entendo por “diálogo intercultural” a definição dada pelo Jurista Fernando Dantas: “O diá-
Estado-Juiz pode ser entendido co
logo intercultural se configura como um espaço e um instrumento da nova cidadania indígena,
regulador da vida em sociedade, s
diferenciada, multicultural, dinâmica, criativa e participativa no sentido de construir e reconstruir
os direitos diferenciados indígenas e, como conseqüência, criar, também, contextos institucionais 47. O termo “práticas judiciárias
plurais e heterogêneos onde a convivência democrática possibilite o desenvolver das ações da (2008), ou seja, o modo pelo qua
vida sem a opressão, sem exclusão”. (DANTAS, 2002, p. 6248). podiam ser julgados em função do

158
“Plantaram” Xicão

rca do processo que Xicão? O Estado-Juiz46 considera os elementos advindos da cultura


ma o cacique Xukuru na condução do processo criminal? O contexto diferenciado, do
ponto de vista étnico-cultural, foi considerado na compreensão do crime
e da sua dimensão?
ariana Carneiro Leão Figueiroa. Caberia, assim, uma leitura mais cuidadosa sobre os seguintes aspec-
tos fundamentais: primeiro, o tratamento dado pelo Estado-Juiz ao caso,
face às prerrogativas jurídico-constitucionais que gozam sujeitos étnicos
culturalmente diferenciados; segundo, a legítima tipologia de coletivida-
de que perpassa a constituição da identidade Xukuru, enquanto sujeito
coletivo de direitos e, em terceiro lugar, não menos importante, caberia
Xukuru, foi assas-sinado uma percepção mais acurada sobre o significado da morte de seu cacique,
o dia 20 de maio de 1998, sua principal liderança, bem como a posterior exumação do cadáver.
nterior do estado de Per- São exatamente esses aspectos fundamentais que me proponho a
regional e nacionalmente, tratar neste texto, vez que “o exercício da antropologia volta-se para a
kuru e das demais etnias demonstração da diversidade cultural na tentativa de compreendê-la”
de seus direitos, em espe- (BELTRÃO, 2007, p.3591), os argumentos (ou interpretações) trazidos
dígena. Sua morte causou aqui fazem parte do “campo de disputa” presente no contexto extra-au-
nal e internacionalmente, tos, ou seja, aquilo que não se evidencia, mas que foi “dito” nas entreli-
os Direitos Humanos. Os nhas do processo criminal.
ceram antes de o processo
ado.
ersidade cultural, minhas NAS ENTRELINHAS DO PROCESSO
mbito do poder judiciário
agentes sociais envolvidos Através das “práticas judiciárias”47 certas formas de verdade são de-
a relação com o cultural- finidas pelo Estado-Juiz ao impor um “modo de estar no mundo” que por
ogo intercultural45 entre o vezes não atende ao universo complexo, dinâmico e plural da sociedade.
caso da morte do seu caci- A partir da etnografia desse processo, observa-se que a condição de su-
jeito étnico culturalmente diferenciado: povos indígenas, que gozam de
prerrogativas jurídicas de acordo com a Constituição Brasileira de 1988

ação da autora. Ad Argumentadum


da morte do cacique Xicão Xukuru. 46. O termo “Estado-Juiz” e “poder judiciário” são tomados como sinônimos neste texto. O
modelo federativo do Estado brasileiro caracteriza-se pela tripartição dos poderes; o poder ju-
diciário é um deles, responsável pela aplicação da lei e resolução dos conflitos, nesse sentido, o
o Jurista Fernando Dantas: “O diá-
Estado-Juiz pode ser entendido como um dos “braços” do Estado brasileiro, enquanto o poder
mento da nova cidadania indígena,
regulador da vida em sociedade, segundo este modelo de Estado-Nação.
sentido de construir e reconstruir
, também, contextos institucionais 47. O termo “práticas judiciárias” será entendido nesse texto, no sentido dado por Foucault
bilite o desenvolver das ações da (2008), ou seja, o modo pelo qual o Ocidente concebeu e definiu a maneira como os homens
podiam ser julgados em função dos erros que haviam cometido.

159
XUKURU DO ORORUBÁ

no que diz respeito ao seu “modo de estar no mundo” ou seus aspectos Desse modo, como
sócio-culturais, pouco altera a lógica de processamento desse crime pelo víduo, mas sim uma repa
poder judiciário federal local. Nesse sentido, cumpre não olvidar que, se mitigado no plano penal,
o direito positivo estatal e o direito indígena são sustentados por valores apontar os autores do “cri
sócio-culturais distintos, para entender este caso a partir de um enfoque na infração, que consiste
intercultural é necessário relativizar algumas bases do Direito Estatal48. ilustração, transcrevo trec
Observa-se que o processo criminal do cacique Xicão teve uma 2008, pelos representante
tramitação protocolar e burocrática, sem considerar algumas espe- em relação ao homicídio d
cificidades do povo Xukuru, nem o contexto político-jurídico que o
mesmo está inserido, pois prevalece o modelo cognitivo49 do poder ju- EXMO
diciário e do aparato policial do Estado na formação e condução desse JUDIC
processo-crime50. Por exemplo, no que diz respeito à vítima, no caso
em questão, prevaleceu o papel da vítima na ação penal de natureza Ref.: I
pública incondicionada - como é o caso de homicídio - na qual seu perfil O MIN
praticamente inexiste51. de seu
Isto ocorre devido ao modelo de Estado de Direito brasileiro, que buiçõe
toma como fundamento o Contrato Social (rousseauniano), com o pres- acima
suposto que todos os integrantes da sociedade firmaram esse pacto, pelo DENU
qual os indivíduos abrem mão de parte de sua liberdade para que o Estado vulgo
regule a vida em sociedade, assim, o Estado-Juiz toma para si o conflito e 12/10
passa a ser o único com legitimidade para julgar as infrações à lei (monis- ti se S
mo jurídico), nesse sentido, “a infração não é um dano cometido por um 1.943
indivíduo contra o outro; é uma ofensa ou lesão de um indivíduo à ordem, te na F
ao Estado, à lei, à soberania, ao soberano.” (FOUCAULT, 2008, p.66). lhido n
incurs
ambos
(fls. 03
48. Já o termo “Direito-Estatal” será entendido como o Direito normativo produzido e positivado fos do
pelo Estado Brasileiro em sentido lato.
49. Por “modelo cognitivo”, entendo-o como “um cânone jurídico que define o que é direito e
o que não é”, nas palavras do sociólogo português Boaventura de Souza Santos (SANTOS, 1988, 52. O processo criminal inicia-se f
p.82), que corrobora com o conceito foucaultiano de “práticas judiciárias”, ou seja, como uma ria privativa do representante do
forma própria de conhecer as relações sociais e solucionar conflitos, partindo de uma lógica nor- sição por escrito dos fatos que co
mativa-processual de um Estado de tipo monista. de que se aplique a lei penal a que
pretensão” (CAPEZ, 2004, p.53). A
50. Quando me refiro à formação do processo estou me reportando ao Inquérito Policial e quan-
promotor de justiça, por meio do d
do falo em condução do processo, refiro-me a Ação Penal e seus desdobramentos.
tidas como criminosas pelo Estad
51. A esse respeito, a Criminologia Crítica vem firmando forte convencimento acerca da neces- vítimas, testemunhas, agentes po
sidade de se debruçar sobre a “vitimologia”, que consiste no estudo/conhecimento da vítima no discurso. Assim, essas narrativas a
processo penal (ROSA DEL OMO, 2004). das e a depender de quem as fala

160
“Plantaram” Xicão

mundo” ou seus aspectos Desse modo, como não há reparação do dano feita a outro indi-
samento desse crime pelo víduo, mas sim uma reparação pela ofensa à lei, o papel da vítima fica
umpre não olvidar que, se mitigado no plano penal, posto que, para o Estado-Juiz, o importante é
o sustentados por valores apontar os autores do “crime” e a comprovação de suas responsabilidades
so a partir de um enfoque na infração, que consiste na violação de uma norma estatal. A título de
ases do Direito Estatal48. ilustração, transcrevo trecho da Denúncia52 oferecida, em 09 de agosto de
cacique Xicão teve uma 2008, pelos representantes do Ministério Público Federal de Pernambuco
onsiderar algumas espe- em relação ao homicídio do cacique Xicão Xukuru, in verbis:
o político-jurídico que o
cognitivo49 do poder ju- EXMO. SR. JUIZ FEDERAL DA 4ª VARA DA SEÇÃO
rmação e condução desse JUDICIÁRIA DE PERNAMBUCO
espeito à vítima, no caso
a ação penal de natureza Ref.: Inquérito Policial 98.0012178-1 (211/98)
micídio - na qual seu perfil O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por intermédio
de seus representantes infra-assinados, no uso de suas atri-
de Direito brasileiro, que buições legais e com base nos autos do inquérito policial
usseauniano), com o pres- acima epigrafado, vem, à presença de Vossa Excelência,
firmaram esse pacto, pelo DENUNCIAR RIVALDO CAVALCANTI SIQUEIRA,
berdade para que o Estado vulgo RIVA DE ALCEU, casado, agricultor, nascido em
z toma para si o conflito e 12/10/1960, em Alagoinha/PE, filho de Alceu Cavalcan-
r as infrações à lei (monis- ti se Siqueira e Verônica Melo Cavalcanti, identidade nº
m dano cometido por um 1.943.433 – SSP/RN, CPF nº 270.399.514-87, residen-
de um indivíduo à ordem, te na Fazenda Vitória, Bom Jesus/RN, atualmente reco-
UCAULT, 2008, p.66). lhido no Presídio Militar de Paratibe, neste Estado, como
incurso nas penas do art. 121, §2º, incs. I e IV, c/c art. 29,
ambos do Código Penal, pelos fatos a seguir descritos.
(fls. 03-10, vol. 1, Proc. Nº 2002.8300012442-1). – gri-
normativo produzido e positivado fos do original.

rídico que define o que é direito e


a de Souza Santos (SANTOS, 1988, 52. O processo criminal inicia-se formalmente com a Denúncia: “é uma peça acusatória de auto-
as judiciárias”, ou seja, como uma ria privativa do representante do Ministério Público (promotor de justiça) e deve conter a expo-
flitos, partindo de uma lógica nor- sição por escrito dos fatos que constituem um ilícito penal, a manifestação expressa da vontade
de que se aplique a lei penal a quem é presumivelmente o seu autor e as provas que alicerçam tal
pretensão” (CAPEZ, 2004, p.53). A Denúncia consiste em uma peça processual escrita na qual o
tando ao Inquérito Policial e quan-
promotor de justiça, por meio do discurso jurídico, imputa a pessoas (físicas e jurídicas) condutas
us desdobramentos.
tidas como criminosas pelo Estado e o faz apropriando-se das narrativas/histórias contadas por
e convencimento acerca da neces- vítimas, testemunhas, agentes policiais e outros colaboradores, no intuito de fundamentar seu
studo/conhecimento da vítima no discurso. Assim, essas narrativas assumem uma função a depender do contexto que estão inseri-
das e a depender de quem as fala (MISHLER, 2002).

161
XUKURU DO ORORUBÁ

Ainda conforme o citado documento, a vítima vem apresentada da ração do seu território trad
seguinte forma na peça inaugural da ação penal: como uma grave violação
faz parte dos argumentos
assumiu o papel de lidera
I- DOS FATOS E DA MATERIALIDADE DELITIVA conflito com os fazendeiro
Em 20 de maio de mil novecentos e noventa e oito de violência54, conforme
(20/05/1998), por volta das 10h da manhã, o indígena município de Pesqueira-P
FRANCISCO DE ASSIS PEREIRA ARAÚJO, conhe- seguir reproduzido:
cido como cacique CHICÃO, líder da tribo dos índios
xucurus, encontrava-se nas imediações de sua residência,
[...] A
na cidade de Pesqueira/PE, acompanhado do índio AN-
ela já v
TONIO SEVERIANO DE SANTANA, vulgo TOTO-
são. E
NHO, quando foi morto em decorrência de ferimentos
ocasionados por projéteis disparados por arma de fogo. com A
Che G
A vítima estacionava o veiculo Lada, placa KHM-2269,
nada,
em frente à sua casa, na Rua Coronel Leonardo, bair-
Natur
ro Xucurus, enquanto TOTONHO aguardava fora do
cuar, t
carro. Nesse momento, o assassino, JOSÉ LOBÓRIO
ningu
GALINDO, vulgo RICARDO, hoje falecido, surgiu ao
lado da porta do motorista e passou a disparar a curta bem fa
distância contra a vítima, provocando-lhe o óbito ates- dispon
tado na certidão de fls, 585 e confirmado pela perícia id=-8
tanatoscópica de fls. 89/91, fugindo em seguida.
Está evidenciada a materialidade delitiva, a qual ainda Com isso, é possível
encontra comprovação no laudo de exame de corpo de além de representar a mo
delito de fls. 764/778, efetivado após a realização de exu- cimento do povo Xukuru
mação realizada consoante fls. 672/673”. (fls. 03-10, vol.
1, Proc. Nº 2002.8300012442-1).
53. Cumpre destacar que, por dif
tange a universalidade dos direito
As narrativas acima assumem um relevante papel na compreensão da sociologia. Entretanto, não irei
sidade de salvaguardar e respeita
do contexto institucional que se desenvolve o processo criminal, enquan- também, como direitos coletivos.
to práticas discursivas imbricadas em estruturas sociais de dominação e 54. Em depoimento prestado à 6
poder (MISHLER, 2002), vez que apresentam-se como um registro de de 2008, o cacique Xicão declaro
indígenas e particularmente pelo
um modus operandi que não está atento as especificidades sócio-cultu- fazendeiro Theopombo Siqueira B
rais de Estados plurais, como é o caso brasileiro. Geraldo Rolim. A assentada desse
tauração do Inquérito Policial.
Com efeito, o fato de a vítima tratar-se de uma importante lide-
rança indígena, assim reconhecida nacional e internacionalmente, que 55. Segundo Fredrik Barth (1969
antropológica para designar uma
estava à frente do processo de mobilização do povo Xukuru pela recupe- gicamente; b)compartilha valores

162
“Plantaram” Xicão

tima vem apresentada da ração do seu território tradicional, caracterizando o homicídio perpretado
l: como uma grave violação aos “direitos humanos” 53, simplesmente não
faz parte dos argumentos da denúncia. Cumpre enfatizar que desde que
assumiu o papel de liderança, a atuação do cacique Xicão instaurou um
RIALIDADE DELITIVA conflito com os fazendeiros da região que passou a sofrer ameaças e atos
ecentos e noventa e oito de violência54, conforme explicitado por ele mesmo em ato público no
0h da manhã, o indígena município de Pesqueira-PE poucos meses antes da sua morte, como a
REIRA ARAÚJO, conhe- seguir reproduzido:
líder da tribo dos índios
ediações de sua residência,
[...] A destruição do nosso povo não começou de agora,
ompanhado do índio AN-
ela já vem de muito tempo. São 500 anos de luta e opres-
ANTANA, vulgo TOTO-
são. Estão querendo fazer comigo o mesmo que fizeram
decorrência de ferimentos
rados por arma de fogo. com Antonio Conselheiro. O mesmo que fizeram com
Che Guevara e com as outras lideranças, mas não tem
Lada, placa KHM-2269,
nada, se esse for o meu destino, se for autorizado pela
Coronel Leonardo, bair-
Natureza, por Deus... estou disponível. Não vou me re-
NHO aguardava fora do
cuar, também não vou me enraivar, nem guardar ódio de
assino, JOSÉ LOBÓRIO
ninguém, porque de uma coisa eu tenho certeza: quem
O, hoje falecido, surgiu ao
passou a disparar a curta bem faz para si é. (Fala extraída do vídeo Xicão Xukuru,
vocando-lhe o óbito ates- disponível em http://video.google.com/videoplay?doc
confirmado pela perícia id=-8537518505098293066#)
gindo em seguida.
ade delitiva, a qual ainda Com isso, é possível perceber que o assassinato do cacique Xicão,
do de exame de corpo de além de representar a morte da principal liderança na luta pelo reconhe-
o após a realização de exu- cimento do povo Xukuru enquanto “grupo étnico”55, e de seus direitos,
672/673”. (fls. 03-10, vol.
2-1).
53. Cumpre destacar que, por diferentes motivos e contextos, existem severas críticas no que
tange a universalidade dos direitos humanos sob uma perspectiva relativista da antropologia e
nte papel na compreensão da sociologia. Entretanto, não irei me deter a essa questão. Apenas pretendo enfatizar a neces-
sidade de salvaguardar e respeitar os direitos dos povos indígenas, enquanto sujeitos coletivos,
rocesso criminal, enquan- também, como direitos coletivos.
as sociais de dominação e 54. Em depoimento prestado à 6ª Câmara da Procuradoria Geral da República, em 25 de março
m-se como um registro de de 2008, o cacique Xicão declarou sentir-se ameaçado devido a luta pela retomada das terras
indígenas e particularmente pelo fato de ter prestado depoimento como testemunha contra o
pecificidades sócio-cultu- fazendeiro Theopombo Siqueira Brito Sobrinho no processo que apurou a morte do Procurador
o. Geraldo Rolim. A assentada desse depoimento foi juntada aos autos processuais quando da ins-
tauração do Inquérito Policial.
de uma importante lide-
internacionalmente, que 55. Segundo Fredrik Barth (1969), “o termo grupo étnico é utilizado geralmente na literatura
antropológica para designar uma comunidade que: a) em grande medida se autoperpetua biolo-
povo Xukuru pela recupe- gicamente; b)compartilha valores culturais fundamentais realizados com unidade manifestada em

163
XUKURU DO ORORUBÁ

representou também o aniquilamento de um líder carismático, de caráter -Juiz 57. Por exemplo, qu
“sagrado”. e não-indígena, os Xuku
No que diz respeito ao papel assumido pela liderança Xukuru, o ca- Nesse sentido é a narrativ
ráter sagrado atribuído se dá pela indicação política da liderança em con- gica processual do povo X
sonância com as orientações dos “encantados”, os “espíritos de luz” que
guiam o povo Xukuru. Os estudos da antropóloga Vânia Fialho (2007) [...] Ve
acerca dessa questão confirmam que: “a autoridade Xukuru como poli- car a l
ticamente constituída, relacionada com a ação coletiva do grupo, com fora nã
o propósito de garantir a ocupação de suas terras e também sua auto- seria p
nomia diante das autoridades dos poderes públicos, mistura-se com as não te
características tradicional-carismática”, apontadas por Weber e Melluci, aldeia?
com base na idéia de ação coletiva e no tipo de autoridade, “sagrada”, nós nã
representada pelo cacique como aquele que fora escolhido pela Natureza porqu
para guiar o seu povo na luta pela terra e na conquista de seus direitos pra ac
(FIALHO, 2007, p.25). chama
pelo er
A história dos povos indígenas da América Latina, assim como a do
dade,
povo Xukuru do Ororubá, é marcada pela expropriação de suas terras,
vai pod
de sua cultura, línguas, crenças e tradições iniciada durante a colonização
ficar u
desses países que perdurou até o final do século XX, quando iniciou o pra pa
processo de multiculturalismo constitucional56 nos Estados latinos que povo X
passaram a reconhecer institucionalmente a diversidade presente no bojo se nós
das sociedades e a necessidade de salvaguardar direitos e garantias às mi- nós est
norias étnicas e culturais. povo X
Entretanto, após séculos de contato com a sociedade não-indígena, viver,
o grande desafio para alguns povos indígenas, especialmente no Nordes- que a
te brasileiro, foi a necessidade de implementar estratégias de transforma- ao ser
ção de alguns de seus costumes para preservar o contexto de continuidade na cad
étnica; como é o caso dos Xukuru que, na tentativa de conviver com o aconte
modelo cognitivo dominante – o da lógica estatal, resignificaram alguns dá um
de seus valores culturais para negociar seus direitos no âmbito do Estado- ai você
(entre
deia S
formas culturais; c) integra um campo comunicativo de interação; d) conta com membros que se
identificam a si mesmos e são identificados pelos outros que constituem uma categoria distinguível
de outras categorias da mesma ordem”. (BARTH, 1969 apud CARDOSOS DE OLIVEIRA, 1976, p.21).
57. Porém, como bem assevera C
56. Movimento que se difundiu na América Latina a partir da Constituição da Guatemala (1986), mudança étnica: “uma etnia pode
desde então todas as constituições latino-americanas em maior ou menor escala prevêem direitos aculturação em que está inserida
e garantias específicos para povos culturalmente diferenciados (PINTO, 2008). DOSO DE OLIVEIRA, 2005, p.19).

164
“Plantaram” Xicão

der carismático, de caráter -Juiz 57. Por exemplo, quando ocorre um “crime” envolvendo indígena
e não-indígena, os Xukuru esperam por uma resposta do Estado-Juiz.
a liderança Xukuru, o ca- Nesse sentido é a narrativa do vice-cacique Zé de Santa, ao explicar a ló-
ítica da liderança em con- gica processual do povo Xukuru e a forma como resolvem seus conflitos:
, os “espíritos de luz” que
loga Vânia Fialho (2007) [...] Veja bem, é assim: para o povo Xukuru, nós pode apli-
dade Xukuru como poli- car a lei do povo Xukuru, mas quando é com o povo lá
o coletiva do grupo, com fora não. Porque, pra gente aplicar a lei do povo Xukuru,
rras e também sua auto- seria pra definir do qual o destino da pessoa, mas a gente
blicos, mistura-se com as não tem como manter essa pessoa aqui, vai ficar dentro da
das por Weber e Melluci, aldeia? Porque nós não somos um município, um estado,
de autoridade, “sagrada”, nós não temos uma cadeia, não tem uma delegacia. Até
a escolhido pela Natureza porque o povo Xukuru não julga pra botar na cadeia, é
conquista de seus direitos pra aconselhar, dar resposta, responsabilidades a pessoa,
chamar quem errou e decidir o que ele vai fazer para pagar
pelo erro dele. Então ele vai fazer serviços para a comuni-
a Latina, assim como a do
dade, vai ter alguém junto com a pessoa, essa pessoa não
propriação de suas terras,
vai poder participar das festas dentro do povo Xukuru, vai
ada durante a colonização
ficar uma pessoa neutralizada... com o tempo determinado
ulo XX, quando iniciou o pra pagar aquilo que ele deve... esse é o entendimento do
6
nos Estados latinos que povo Xukuru e que a lei pode nos acobertar, não é? Porque
versidade presente no bojo se nós fomos pegar e julgar uma pessoa pra botar na cadeia,
direitos e garantias às mi- nós estamos fora da nossa tradição, nossa cultura. Porque o
povo Xukuru não julga para trancar, se não dar mais para
a sociedade não-indígena, viver, então retira-se... expulsa. Mas pra prender não por-
especialmente no Nordes- que a gente acha que prendendo você tá indo de encontro
estratégias de transforma- ao ser humano, sabe? E a cadeia não ensina nada as pessoas,
contexto de continuidade na cadeia ele aumenta mais a vontade de fazer raiva, é o que
ntativa de conviver com o acontece nas cadeias do nosso país... Agora, quando você
tal, resignificaram alguns dá uma obrigação a pessoa, dá responsabilidade, aconselha,
itos no âmbito do Estado- ai você pode modificar a visão, a vida de uma pessoa...
(entrevista concedida em 24.10.2009, na escola da Al-
deia São José)
ão; d) conta com membros que se
stituem uma categoria distinguível
RDOSOS DE OLIVEIRA, 1976, p.21).
57. Porém, como bem assevera Cardoso de Oliveira (2005) a mudança cultural não leva a uma
Constituição da Guatemala (1986), mudança étnica: “uma etnia pode manter sua identidade étnica mesmo quando o processo de
ou menor escala prevêem direitos aculturação em que está inserida tenha alcançado graus altíssimos de mudança cultural” (CAR-
s (PINTO, 2008). DOSO DE OLIVEIRA, 2005, p.19).

165
XUKURU DO ORORUBÁ

O povo Xukuru do Ororubá reconhece a jurisdição penal estatal foi tro


como legítima para o julgamento desse tipo de questão, bem como as in- Ele dis
vestigações policiais, porém, não querem ser reféns das mesmas, mas sim botar
que sua identidade étnica seja respeitada e levada em consideração; isto nós qu
é que se pode apreender na fala de uma importante liderança Xukuru, cadeia
Antônio Pereira: você fo
o outr
quem
[...] eles calaram a voz do cacique Xicão, mas não calaram
tar foi
a voz do povo Xukuru. As únicas pessoas que poderão
foi ele
interessar a morte dele são pessoas que tem interesse nas
de Pes
terras indígenas, pessoas que possuem grandes fazendas
eu vou
e que tem interesse naquilo que o índio tem por lei. Mas
não fiz
mesmo assim, eu ainda confio na justiça brasileira, que
ção co
punam o responsável ou os responsáveis pelo crime do
dou m
cacique Xicão. Porque nós não queremos vingança, nós
nem e
queremos justiça. Nós queremos apenas justiça. Para que
24.10
as autoridades competentes desse País, se mobilize e se
movimente em cima dessa questão. Nosso povo está pa-
cífico. (fala extraída do vídeo 20 de maio de 1998 – TV A partir das conside
Viva e Centro de Cultura Luiz Freire) – Grifo meu. e das falas das lideranças
povo Xukuru reconhece c
o julgamento dos respons
Também nesse sentido é a fala do vice-cacique Xukuru, Zé de Santa, o crime e o processament
em relação à entrada de autoridade policial designada exclusivamente para pelo Estado-Juiz e pelos in
levar a cabo as investigações do assassinato do cacique Xicão Xukuru58:
O aparato jurídico e
gar, com uma lógica proc
Quando Cotrim entrou, quando ele chegou aqui, foi feita que Xicão, um dos aponta
uma reunião aqui no posto da FUNAI, e nós disse pra foi julgado por Júri Popula
ele: o que nós povo Xukuru quer de você Cotrim, que de nota: a constituição do
vitimou o cacique Xicão X
precípuas da instituição co
58. O Inquérito Policial que apurava os responsáveis pela morte do cacique Xicão Xukuru tramitou
lentamente por mais de um ano, o inconformismo com a ausência de investigação efetiva levou o
Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana – CDDPH, a denunciar o caso a Comissão Intera- 59. O “Conselho de Sentença” é
mericana de Direitos Humanos da ONU e solicitar ao Ministro da Justiça um delegado especial para participar do julgamento.
concluir as investigações. O então Ministro José Gregori designou o delegado federal Marcos Van Der
Veer Cotrim exclusivamente para o caso, o que a princípio gerou certo “mal estar” na Superintendên- 60. O Júri tem origem mítica, com
cia Regional da Polícia Federal, porém com a concordância daquele que presidia o Inquérito Policial, dios da civilização humana; há hist
o delegado especial assumiu e deu novo tratamento ao caso, pois o delegado anterior concluiu as em povos como os chineses, hind
investigações sem apontar a autoria do crime. (Relatório CDDPH - Os Xukuru e a Violência, 2004). referência para Moisés (BORBA, 20

166
“Plantaram” Xicão

a jurisdição penal estatal foi trocado de delegado, é que você faça a investigação.
questão, bem como as in- Ele disse: “- eu vou investigar e vou botar na cadeia! Vou
féns das mesmas, mas sim botar na cadeia quem quer que seja”; e eu disse: é o que
ada em consideração; isto nós queremos! Nós dissemos para ele: você vai botar na
rtante liderança Xukuru, cadeia, agora faça uma investigação honesta, séria, como
você foi formado pra ser um delegado. Não faça que nem
o outro não, de ficar acusando nós, porque não fui eu
quem mandou matar Xicão. Porque quem mandou ma-
ue Xicão, mas não calaram
tar foi Zé de Riva, o pistoleiro só quem sabe é ele, mas
nicas pessoas que poderão
foi ele quem mandou matar, ele e mais algum fazendeiro
soas que tem interesse nas
de Pesqueira. [...]agora, é o que nós queremos de você e
ossuem grandes fazendas
eu vou ver você fazer isso, tem que fazer. Porque se você
e o índio tem por lei. Mas
não fizer vai sair também... é você fazer uma investiga-
na justiça brasileira, que
ção como tem que ser feita... botar quem de fato man-
sponsáveis pelo crime do
dou matar Xicão na cadeia. Não as lideranças Xukuru,
o queremos vingança, nós
nem eu, nem Zenilda [...]. (Entrevista concedida em
os apenas justiça. Para que
24.10.2009, na escola da Aldeia São José). - Grifo Meu.
esse País, se mobilize e se
stão. Nosso povo está pa-
0 de maio de 1998 – TV A partir das considerações tecidas acima, dos trechos da denúncia
Freire) – Grifo meu. e das falas das lideranças Xukuru colacionadas aqui, observa-se que o
povo Xukuru reconhece como legítimo o sistema normativo estatal para
o julgamento dos responsáveis pela morte do cacique Xicão, entretanto,
que Xukuru, Zé de Santa, o crime e o processamento do mesmo é compreendido de modo distinto
nada exclusivamente para pelo Estado-Juiz e pelos indígenas.
acique Xicão Xukuru58:
O aparato jurídico estatal estabelece uma forma “legítima” de jul-
gar, com uma lógica processual própria e, no caso do homicídio do caci-
o ele chegou aqui, foi feita que Xicão, um dos apontados como responsáveis pelo crime em comento
FUNAI, e nós disse pra foi julgado por Júri Popular. Neste ponto, um aspecto importante é digno
quer de você Cotrim, que de nota: a constituição do conselho de sentença59 que julgou o crime que
vitimou o cacique Xicão Xukuru me fez questionar uma das finalidades
precípuas da instituição conhecida por Tribunal do Júri60, que consiste em
e do cacique Xicão Xukuru tramitou
cia de investigação efetiva levou o
denunciar o caso a Comissão Intera- 59. O “Conselho de Sentença” é formado pelo corpo de jurados sorteados e selecionados para
Justiça um delegado especial para participar do julgamento.
o delegado federal Marcos Van Der
erto “mal estar” na Superintendên- 60. O Júri tem origem mítica, com características de cunho religioso, que remontam aos primór-
ele que presidia o Inquérito Policial, dios da civilização humana; há historiadores que consideram que haveria embriões deste instituto
ois o delegado anterior concluiu as em povos como os chineses, hindus e entre os hebreus, como o Conselho dos Anciãos que era
- Os Xukuru e a Violência, 2004). referência para Moisés (BORBA, 2002). No Brasil, Surgiu após a independência através da Lei 18 de

167
XUKURU DO ORORUBÁ

permitir que em lugar de um juiz togado (investido de jurisdição estatal), na cidade de Caruaru/PE
preso às práticas judiciárias, os acusados de crimes dolosos contra a vida, pronúncia62, sendo os auto
sejam julgados por seus pares, chamados também de “juízes leigos” (CA- de competência processua
PEZ, 2004). vembro do referido ano; lo
Desse modo, nos processos de competência do Tribunal do Júri, o ainda não contava com sa
Estado-Juiz abre mão de parte de sua jurisdição penal e confere legiti- desse modo, o Juízo feder
midade para cidadãos leigos julgarem seus pares, devido à gravidade da salão do júri e a lista de ju
infração cometida (crime doloso contra a vida, que causa repulsa moral: Em cada Júri sorteia
um ser humano tirar ou atentar contra a vida de outrem). É quase um nas sete integraram o con
“olho por olho, dente por dente”, mas dentro das “regras” do Estado, ou jurados, pude perceber qu
seja, sob o seu crivo, pois é o Juiz quem estabelece a pena. O corpo de cionários de instituições g
jurados encarregado da “soberana” tarefa de julgar, não precisa deter ne- mica Federal, SEBRAE, IB
nhum conhecimento técnico-jurídico, ao contrário, “podem olhar os fatos INSS, dentre outras. Emb
a partir de cima e avaliar o maior ou menor ajustamento dos personagens de jurados pode influenci
a modelos de comportamento considerados legítimos e naturais, como Sérgio Adorno em suas p
sejam, o de pai provedor do lar, boa esposa, filho pródigo, vizinho soli- Paulo na década de 1980
dário, etc.” (ADORNO, 1999, p.320). Assim, pode-se falar que no Júri Ademais, se a idéia
Popular não há um julgamento técnico de uma infração penal e sim um julgado pelos seus pares,
julgamento moral de condutas tidas como criminosas, pois “as sessões do compondo o conselho de
júri permitem a seus participantes ler e reler quanto e quando é legítimo um indígena? E o julgam
‘qualquer’ ser humano matar outro” (SCHRITZMEYER, 2007, p.116); poderia ser um caminho
nesses casos, pouco importa a técnica jurídica, mas vale um bom poder de tamente nesse processo?
retórica e argumentação para sensibilizar os jurados da tese que se apre- pragmática e legalista do
senta e se quer ver acolhida pelos mesmos61. culturais do sujeito social
No caso do cacique Xicão Xukuru, a 16ª Vara Criminal da Justiça ção às normas garantidora
Federal, competente para o feito, foi instalada em 21 de maio de 2004 “modo de estar no mundo
A lei adjetiva penal b
so: a) ser brasileiro, nato o
junho de 1822 e limitava sua competência ao julgamento de crimes de imprensa. Somente a partir
da Constituição Imperial de 1824 passou-se a considerar o Júri como órgão do Poder Judiciário,
no perfeito gozo dos seus d
tendo sua competência ampliada para julgar causas cíveis e criminais. O Júri Popular na atual ça Eleitoral e Militar - par
Constituição Brasileira encontra-se disciplinado no art. 5º, inc. XXXVIII, inserido no Capítulo dos
Direitos e Garantias Individuais. Sua finalidade é ampliar o direito de defesa dos réus, funcionando
ocorrerá o Júri. São critério
como uma garantia individual dos acusados pela prática de crimes dolosos contra a vida e permi-
tir que, em lugar do juiz togado, preso a regras jurídicas, sejam julgados por seus pares (CAPEZ,
2004). Seus princípios básicos são: a plenitude da defesa, o sigilo nas votações, a soberania dos
62. Trata-se de uma decisão proc
veredictos e a competência mínima para julgamento de crimes dolosos contra a vida.
admite ou rejeita a acusação, bas
61. Como bem observou a antropóloga Ana Lúcia Pastore em sua pesquisa de doutorado em cídio, o laudo da perícia tanatoscó
alguns Tribunais do Júri da cidade de São Paulo, nesses julgamentos há uma “luta pelo monopólio de autoria, ou seja, a probabilidad
do estabelecimento de formas legítimas de pensar”. (SCHRITZMEYER, 2007, p.126). efetivamente são os jurados, os ch

168
“Plantaram” Xicão

tido de jurisdição estatal), na cidade de Caruaru/PE, quando o processo se encontrava na fase de


mes dolosos contra a vida, pronúncia62, sendo os autos da ação penal remetidos para a mesma (regra
ém de “juízes leigos” (CA- de competência processual penal). O Júri Popular foi marcado para no-
vembro do referido ano; logo, como a instalação da Vara era recente, a JF
cia do Tribunal do Júri, o ainda não contava com salão do júri, nem tão pouco com lista de jurados,
ão penal e confere legiti- desse modo, o Juízo federal solicita ao poder judiciário estadual local, o
es, devido à gravidade da salão do júri e a lista de jurados do mesmo para proceder ao julgamento.
que causa repulsa moral: Em cada Júri sorteiam-se vinte e um jurados, dentre os quais ape-
de outrem). É quase um nas sete integraram o conselho de sentença. Feito o sorteio do corpo de
das “regras” do Estado, ou jurados, pude perceber que todos eles eram cidadãos caruaruenses e fun-
elece a pena. O corpo de cionários de instituições governamentais: Banco do Brasil, Caixa Econô-
lgar, não precisa deter ne- mica Federal, SEBRAE, IBGE, DETRAN, Secretaria da Receita Federal,
rio, “podem olhar os fatos INSS, dentre outras. Embora escolhidos por acaso, o “perfil” desse corpo
tamento dos personagens de jurados pode influenciar o desfecho processual, como bem observou
gítimos e naturais, como Sérgio Adorno em suas pesquisas no Tribunal do Júri no estado de São
lho pródigo, vizinho soli- Paulo na década de 1980 (ADORNO, 1999).
pode-se falar que no Júri Ademais, se a idéia da instituição do Júri Popular é o acusado ser
a infração penal e sim um julgado pelos seus pares, no caso em questão, não deveria ter indígenas
minosas, pois “as sessões do compondo o conselho de sentença, vez que o crime foi cometido contra
uanto e quando é legítimo um indígena? E o julgamento se dá em um sistema altero ao seu? Esse
ZMEYER, 2007, p.116); poderia ser um caminho propício para um diálogo intercultural concre-
mas vale um bom poder de tamente nesse processo? Seria o primeiro passo para conjugar a cultura
rados da tese que se apre- pragmática e legalista do discurso jurídico estatal com as especificidades
culturais do sujeito social envolvido, o povo indígena Xukuru, em aten-
Vara Criminal da Justiça ção às normas garantidoras de respeito à diversidade étnico-cultural e seu
em 21 de maio de 2004 “modo de estar no mundo”?
A lei adjetiva penal brasileira estabelece que para ser jurado é preci-
so: a) ser brasileiro, nato ou naturalizado, maior de 18 anos, alfabetizado,
mes de imprensa. Somente a partir
como órgão do Poder Judiciário,
no perfeito gozo dos seus direitos políticos (ou seja, estar quite com a Justi-
criminais. O Júri Popular na atual ça Eleitoral e Militar - para os homens) e b) ser residente na comarca onde
XXXVIII, inserido no Capítulo dos
o de defesa dos réus, funcionando
ocorrerá o Júri. São critérios jurídico-objetivos e, assim, sendo, segundo os
mes dolosos contra a vida e permi-
m julgados por seus pares (CAPEZ,
gilo nas votações, a soberania dos
62. Trata-se de uma decisão processual de conteúdo meramente declaratório, pelo qual o juiz
dolosos contra a vida.
admite ou rejeita a acusação, bastando comprovar a materialidade do crime (no caso de homi-
m sua pesquisa de doutorado em cídio, o laudo da perícia tanatoscópica, comprovando a existência do corpo da vítima) e indícios
ntos há uma “luta pelo monopólio de autoria, ou seja, a probabilidade que o réu tenha sido o autor do crime, pois quem vai julgar
MEYER, 2007, p.126). efetivamente são os jurados, os chamados “Juízes Leigos” (CAPEZ, 2004).

169
XUKURU DO ORORUBÁ

mesmos, não obsta que um indígena brasileiro que atenda aos referidos posto pela Comissão Nac
critérios seja jurado em um julgamento popular. Entretanto, de acordo ligado ao Ministério da Ju
com o que observei dos autos processuais não houve espaço para esse tipo atual Estatuto do Índio (
de indagação, nem qualquer negociação nesse sentido, pois o processo, vo desse Estatuto foi apro
como já pontuado, seguiu seu trâmite protocolar, de acordo com lógica (Partido da Social Democ
das práticas judiciárias, uma lógica etnocêntrica, que por falta de legis- uma das Mesas da Câma
lação federal que regule a matéria, mas principalmente, por falta de uma versão preliminar a quest
“sensibilidade jurídica diversa”, termina violando os direitos garantidos às a presença de indígenas n
minorias étnicas. Não se trata meramente de prerrogativas processuais, que envolvam membros d
mas da necessidade de um “olhar diferenciado” em processos que figuram
como vítima sujeitos étnicos culturalmente diferenciados, especialmente
Art. 1
aqueles de natureza criminal. Ao comentar o tratamento penal do índio
comun
pela legislação brasileira, Souza Filho (2004, p.111), aduz o seguinte:
ou dis
suas in
Não se pode dizer que não seja ardiloso o Código Penal infam
Brasileiro, ao mesmo tempo que prega uma peça nos es- de mo
trangeiros (curiosa preocupação ao se elaborar uma lei na- quant
cional), que não poderão imaginar a existência de índios Parágr
‘infestando’ a civilização, garantem aos ‘infestadores’ um ticado
escondido direito, de difícil aplicação e singularmente inú- eles, o
til. [...] Está presente neste esconderijo da lei penal a idéia que po
de que os índios acabarão num futuro próximo, quando grifo m
encontrarem a alegria de viver na ‘pacífica, doce, justa e
humana’ sociedade dos civilizados, e então o direito penal
ser-lhes-á aplicado em plenitude e os juristas não se enver- De lá para cá, vários
gonharão mais nos congressos internacionais. É transpa- alterar pontos da legislaç
rente neste episódio jurídico a idéia etnocêntrica e monista índios, a possibilidade de
de que o sonho de todo índio é deixar de sê-lo. É presente a terras indígenas, bem com
incompreensão do direito dos povos indígenas de continu- tório. No ano de 2009 o P
arem a ser índios ainda que em contato longo e até mesmo mara dos Deputados Fede
amistoso com a sociedade não-índia. - grifo meu. de defesa dos direitos ind
Missionário, para aprovaç

Cumpre destacar que, há quase vinte anos, tramita no Congresso


Nacional brasileiro o Estatuto dos Povos Indígenas63 (PL 2057/91), pro- 64. Esta lei de 1973 não cabe a si
indígenas, pois é pautada em uma
passa pela negação da diversidade
63. Histórico do PL 2057/91 disponível em: <http://www.funai.gov.br/ultimas/CNPI/estatuto_in- formulação para regular as questõ
dio/Historico-Estatuto_dos_Povos_Indigenas.pdf> Acesso em 01.12.09. brasileira, pluralista, de respeito à

170
“Plantaram” Xicão

o que atenda aos referidos posto pela Comissão Nacional de Políticas Indigenistas (que é um órgão
ar. Entretanto, de acordo ligado ao Ministério da Justiça), que tem como escopo a reformulação do
ouve espaço para esse tipo atual Estatuto do Índio (Lei 6001/7364). Em 1994, um texto alternati-
sentido, pois o processo, vo desse Estatuto foi aprovado, mas um recurso apresentado pelo PSDB
lar, de acordo com lógica (Partido da Social Democracia Brasileira) acabou por deixá-lo parado em
ca, que por falta de legis- uma das Mesas da Câmara dos Deputados Fedrais desde então. Nesta
almente, por falta de uma versão preliminar a questão da jurisdição própria dos povos indígenas e
o os direitos garantidos às a presença de indígenas no conselho de sentença em processos criminais
prerrogativas processuais, que envolvam membros de grupos indígenas estavam assim disciplinadas:
em processos que figuram
erenciados, especialmente
Art. 106. Será respeitada a aplicação, pelas sociedades e
ratamento penal do índio
comunidades indígenas, de sanções de natureza coercitiva
111), aduz o seguinte:
ou disciplinar contra os seus membros, de acordo com as
suas instituições, desde que não revistam caráter cruel ou
a ardiloso o Código Penal infamante, proibida em qualquer caso a tortura e a pena
ue prega uma peça nos es- de morte, observado o disposto na Constituição Federal
ao se elaborar uma lei na- quanto ao respeito aos direitos e garantias fundamentais.
inar a existência de índios Parágrafo Único. Nos crimes dolosos contra a vida pra-
tem aos ‘infestadores’ um ticados por membros de sociedades indígenas ou contra
cação e singularmente inú- eles, o conselho de sentença do tribunal do júri, sempre
nderijo da lei penal a idéia que possível, deverá ser composto também por índios. –
m futuro próximo, quando grifo meu.
na ‘pacífica, doce, justa e
dos, e então o direito penal
e e os juristas não se enver- De lá para cá, vários outros substitutivos foram apresentados para
internacionais. É transpa- alterar pontos da legislação no que concerne ao tratamento penal dos
éia etnocêntrica e monista índios, a possibilidade de exploração de recursos minerais e hídricos em
eixar de sê-lo. É presente a terras indígenas, bem como mudanças na forma de demarcação do terri-
ovos indígenas de continu- tório. No ano de 2009 o PL 2057/91 voltou a ser alvo de discussão na Câ-
contato longo e até mesmo mara dos Deputados Federais e contar com forte campanha das entidades
ndia. - grifo meu. de defesa dos direitos indígenas, como o CIMI – Conselho Indigenista
Missionário, para aprovação de um novo texto que, apesar de não con-

os, tramita no Congresso


enas63 (PL 2057/91), pro- 64. Esta lei de 1973 não cabe a situação atual e apresenta uma visão discriminatória dos povos
indígenas, pois é pautada em uma política integracionista do indígena a sociedade nacional, que
passa pela negação da diversidade e tutela dos povos indígenas brasileiros. Sendo urgente sua re-
i.gov.br/ultimas/CNPI/estatuto_in- formulação para regular as questões indígenas tomando como base a nova ordem constitucional
01.12.09. brasileira, pluralista, de respeito à diversidade étnica e cultural.

171
XUKURU DO ORORUBÁ

templar a presença de indígenas no corpo de jurados de crimes cometidos O sujeito coletivo X


contra indígenas, traz outros avanços no tratamento jurídico penal dado está localizado no municí
ao indígena pelo Estado brasileiro65. 27.555 (vinte e sete mil, q
logado pelo Presidente da
atualmente em 10.300 (d
O SUJEITO COLETIVO XUKURU
(vinte e quatro) aldeias; c
Cacique, Vice-Cacique, P
Desde o processo de (re) democratização dos países latinos america- por representantes das ald
nos no final do século XX, os povos indígenas vêm reivindicando o reco- Indígenas Xukuru do Oro
nhecimento de seus direitos, enquanto direitos humanos coletivos assim Xukuru do Ororubá – e e
definidos por suas características étnicas e culturais, sobre esse aspecto a balham com projetos de e
socióloga Cecília MacDowell coloca que: Desse modo, por ser
turais específicas, na med
A ênfase nos direitos coletivos dos povos indígenas ou de dade política própria e est
outros grupos sociais pretende refutar a tese da “geração” com elementos culturais p
dos direitos humanos e a supremacia dos direitos civis e “Sujeito Coletivo”, assim
políticos, caracterizados como individuais, sobre os direi- ante um indivíduo isolad
tos econômicos, sociais e culturais, caracterizados como tomado no âmbito de um
colectivos. (SANTOS, 2007, p.21). efetive uma relação indiv
1993, p.211). Trata-se de
mas que confere importan
A identidade étnica e o coletivismo nas sociedades indígenas bra- garantias enquanto sujeit
sileiras, para o jurista Fernando Dantas (2001, p.6241) constituem en-
quanto “um todo em seu modo de ser”, pois noção de pessoa é constru- “El sujeto distinto” (
ída pela cultura em relação complementária com o seu contexto étnico tivo e, em termos de direi
e social; segundo ele, em contraponto ao individualismo, essa noção de Colômbia, têm direito a u
coletivismo gera outro tipo de sujeito, o sujeito coletivo de direito.
[...] Es
ademá
65. Na atual proposta do Estatuto dos Povos Indígenas, há um Título (VIII) dedicado às normas se ven
penais e processuais, cujos princípios assim dispõem:
Art. 207. Serão respeitadas as resoluções de conflitos das comunidades indígenas realizadas entre rente,
seus membros e de acordo com os seus usos, costumes e tradições, inclusive se resultarem de que lo
sanções ou absolvições.
Art. 208. Aos juízes federais compete julgar a disputa sobre direitos indígenas, assim considerada, tinto h
na esfera criminal, as ações em que indígena figure como autor ou réu. mante
§1º Durante o procedimento criminal instaurado para apurar condutas praticadas pelo indígena, o
juiz deverá considerar suas peculiaridades culturais e o respeito a seus usos e costumes.
cas qu
(...) mayor
Art. 210. A ação penal nos crimes praticados por indígenas contra indígenas, será pública condicio-
2008,
nada à representação do ofendido. (grifo meu).

172
“Plantaram” Xicão

rados de crimes cometidos O sujeito coletivo Xukuru compreende o território tradicional, que
mento jurídico penal dado está localizado no município de Pesqueira, agreste pernambucano, com
27.555 (vinte e sete mil, quinhentos e cinqüenta e cinco) hectares, homo-
logado pelo Presidente da República em 2001; uma população estimada
atualmente em 10.300 (dez mil e trezentos) indígenas divididos em 24
(vinte e quatro) aldeias; com organização político-social constituída por
Cacique, Vice-Cacique, Pajé, Conselho de Lideranças – que é composto
dos países latinos america- por representantes das aldeias –, a COPIXO – Conselho de Professores
vêm reivindicando o reco- Indígenas Xukuru do Ororubá –, CISXO – Conselho Indígena de Saúde
humanos coletivos assim Xukuru do Ororubá – e equipe JUPAGO – equipe de indígenas que tra-
urais, sobre esse aspecto a balham com projetos de etnodesenvolvimento.
Desse modo, por ser um grupo étnico com características sócio-cul-
turais específicas, na medida em que seus membros assumem uma uni-
dos povos indígenas ou de dade política própria e estabelecem entre si vínculos de identidade social
refutar a tese da “geração” com elementos culturais próprios, o povo Xukuru assume a categoria de
emacia dos direitos civis e “Sujeito Coletivo”, assim entendido porque “não se pode falar em ‘etnia’
ndividuais, sobre os direi- ante um indivíduo isolado, pois o conceito só adquire sentido quando
rais, caracterizados como tomado no âmbito de um ente coletivo, de um espaço social no qual se
.21). efetive uma relação individuo/grupo social” (ALENCAR E BENATTI,
1993, p.211). Trata-se de uma categoria essencialmente jurídico-política,
mas que confere importante papel no que diz respeito aos seus direitos e
sociedades indígenas bra- garantias enquanto sujeito diferenciado.
, p.6241) constituem en-
oção de pessoa é constru- “El sujeto distinto” (SÁNCHEZ, 2008) Xukuru é um sujeito cole-
om o seu contexto étnico tivo e, em termos de direitos humanos indígenas, assim como os Paez na
vidualismo, essa noção de Colômbia, têm direito a uma personalidade distinta:
coletivo de direito.
[...] Este proceso fue posible entonces porque los paeces,
además de gozar de elementos culturales característicos,
m Título (VIII) dedicado às normas se ven así mismos como parte de uma comunidad dife-
nidades indígenas realizadas entre rente, que debe ser conservada como tal. Esa conciencia
dições, inclusive se resultarem de que los miembros tienen de su condición de pueblo dis-
itos indígenas, assim considerada, tinto ha sido el motor que los ha impulsado a fortalecer e
r ou réu. manter vivas sus instituciones sociales, políticas y jurídi-
ndutas praticadas pelo indígena, o
o a seus usos e costumes.
cas que, no obstante haber sido influídas por la sociedad
mayoritaria, no ha dejado de ser auténticas (SÁNCHEZ,
ra indígenas, será pública condicio-
2008, p.127).

173
XUKURU DO ORORUBÁ

A noção de coletividade dos Paez e dos Xukuru deve ser percebida nistério da Justiça, por del
como uma manifestação de unidade, de sujeito coletivo. Com isso, quero Pessoa Humana (CDDPH
dizer que a sociedade Xukuru, em sua totalidade, é um sujeito coletivo de presidir o feito e dar conti
direito e um crime cometido contra seu cacique, importante liderança, na lações aos direitos human
compreensão dos Xukuru, é caracterizado como um desrespeito à autori- fez a seguinte observação:
dade (também sagrada) do cacique, além de representar um abalo a uma
ordem socialmente estabelecida devido a sua importância para manuten-
Foi fei
ção da identidade étnica e organização social do seu povo. Entretanto, essa
bem a
é uma questão que não aparece em nenhum momento no processo, pois
por ai.
como já ressaltado anteriormente, o rito de julgamento do homicídio do
trário,
cacique Xicão se dá dentro dos parâmetros das práticas judiciárias e “corre
toleiro
como de costume”, ao passo que este importante líder indígena se resume
Zé de
nos autos a Francisco de Assis Pereira Araújo, vítima de homicídio doloso,
matar
apenas o indivíduo: “predomina, no entanto, uma abordagem liberal, in-
de Xic
dividualista e de divisibilidade desses direitos coletivos na prática judicial
tinha m
e política à escala local, nacional e internacional” (SANTOS, 2007, p.02).
Mas, a
O inquérito policial, que enquanto “forma de saber-poder”, nos mol-
a gent
des foucaultianos, apresenta um rico exemplo desta questão. As primei-
impun
ras “linhas investigativas” apontavam como motivação do crime questões
sando
de disputa interna do povo Xukuru e até mesmo crime passional, levando
recia..
a autoridade policial a concluir o Inquérito Policial sem apontar autoria66.
delega
Tal fato levou o CIMI – Conselho Indigenista Missionário - e o GAJOP
[...]
– Gabinete de Assistência Jurídica às Organizações Populares - a ofere-
cer denúncia à Corte Interamericana de Direitos Humanos da ONU; e Ai o r
a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) recomendou justiça
ao Estado brasileiro que fosse dada a devida atenção ao caso, bem como ção co
garantisse a proteção necessária às lideranças Xukuru que estavam sendo co na
ameaçadas em virtude do processo67. O governo brasileiro, através do Mi- que ti
24.10

66. O delegado conclui em seu Relatório Final: “[...] verdade seja dita, Chicão angariou ao longo
de sua vida grande número de desafetos e inimigos, podendo ser qualquer um deles seu algoz. Com o ingresso do d
Não bastasse isso, no interior do Nordeste, os conflitos não raros são resolvidos através de cri- gações, o Inquérito Policia
mes de encomenda (pistolagem), muito difíceis de serem apurados”. (fls. 407-411, vol.1, Proc. Nº
2002.8300012442-1). (fls. 500, vol. 2, Proc. Nº
67. No final do ano de 2002, o caso do cacique Xicão e as ameaças sofridas pelas lideranças
Xukuru durante as investigações, foram encaminhados pelo GAJOP e CIMI à Comissão Interameri-
cana de Direitos Humanos – CIDH – por flagrante violação aos direitos indígenas. Essas denúncias ramericana de Direitos Humanos,
se pautam em normas de tratados e acordos internacionais, como a Convenção 169 da OIT e a reconhecer os direitos dos povos
Declaração Universal dos Povos Indígenas, dos quais o Brasil é signatário. A CIDH e a Corte Inte- ridades étnicas e culturais (SANTO

174
“Plantaram” Xicão

ukuru deve ser percebida nistério da Justiça, por deliberação do Conselho de Defesa dos Direitos da
coletivo. Com isso, quero Pessoa Humana (CDDPH), designou uma nova autoridade policial para
e, é um sujeito coletivo de presidir o feito e dar continuidade às investigações face às flagrantes vio-
, importante liderança, na lações aos direitos humanos. A esse respeito, o vice-cacique Zé de Santa
o um desrespeito à autori- fez a seguinte observação:
presentar um abalo a uma
mportância para manuten-
Foi feito o enterro de Xicão, após o enterro, não lembro
seu povo. Entretanto, essa
bem a data, mas acho que uns 15 dias depois, um mês,
omento no processo, pois
por ai... as investigações começaram a tomar rumo con-
gamento do homicídio do
trário, que o assassinato de Xicão não tinha sido por pis-
práticas judiciárias e “corre
toleiro nem mando de fazendeiro, tinha sido mando ou de
e líder indígena se resume
Zé de Santa encoloado mais Zenilda que tinha mandado
tima de homicídio doloso,
matar Xicão. Zé de Santa porque queria tomar o cacicado
ma abordagem liberal, in-
de Xicão e Zenilda por conta que Xicão era mulherengo e
oletivos na prática judicial
tinha mulher e ela com ciúme mandou matar Xicão. [...]
” (SANTOS, 2007, p.02).
Mas, a partir dali nas investigações o rumo foi esse... ai
de saber-poder”, nos mol-
a gente chamou um relator da ONU e denunciamos a
desta questão. As primei-
impunidade, a perseguição as lideranças, a polícia lá acu-
tivação do crime questões
sando nós de ter feito, né? No processo era isso que apa-
o crime passional, levando
recia... a gente denunciou a ONU e pedimos a troca do
cial sem apontar autoria66.
delegado da polícia federal, foi quando entrou Cotrim.
Missionário - e o GAJOP
[...]
ações Populares - a ofere-
os Humanos da ONU; e Ai o relator da ONU veio aqui e chamou o pessoal da
nos (CIDH) recomendou justiça e disse: ‘- nós queremos que faça uma investiga-
enção ao caso, bem como ção completa.’ Então quando foi coisa de um mês e pou-
ukuru que estavam sendo co na frente, a polícia federal foi lá e pegou Zé de Riva
o brasileiro, através do Mi- que tinha mando matar. [...] – Entrevista concedida em
24.10.2009, na escola da Aldeia São José. Grifo meu.

eja dita, Chicão angariou ao longo


ser qualquer um deles seu algoz. Com o ingresso do delegado Marcos Cotrim para presidir as investi-
aros são resolvidos através de cri- gações, o Inquérito Policial passou a ser batizado de “Operação Xukuru”
rados”. (fls. 407-411, vol.1, Proc. Nº
(fls. 500, vol. 2, Proc. Nº 2002.8300012442-1), mas manteve sua for-
ameaças sofridas pelas lideranças
JOP e CIMI à Comissão Interameri-
direitos indígenas. Essas denúncias ramericana de Direitos Humanos, ambas ligadas à ONU, já firmaram jurisprudência no sentido de
como a Convenção 169 da OIT e a reconhecer os direitos dos povos indígenas como direitos coletivos em virtude de suas particula-
signatário. A CIDH e a Corte Inte- ridades étnicas e culturais (SANTOS, 2007).

175
XUKURU DO ORORUBÁ

ma burocrática, ao invés de perceber as especificidades do povo indígena a gent


Xukuru e como isso repercute nos conflitos instaurados devido à disputa vingan
de terras. Não se atentou para o fato que a infração penal fora cometida essas p
contra o indivíduo Francisco de Assis Pereira Araújo, mas também contra meça
a sociedade Xukuru como um todo, que como conseqüência gerou um as açõ
abalo na organização social do grupo e no processo de mobilização pela justam
recuperação do território tradicional, pois Xicão Xukuru assume a carac- tava re
terística de individuo diferenciado, vez que essa individualidade reforça começ
a coletividade do grupo. É isso que se pode apreender da fala do cacique niões,
Marcos Xukuru, filho de Xicão, ao descrever esse crime: ria que
assim
escola
É a interrupção de um sonho do povo Xukuru, que é a
recuperação total de nosso território, demarcado, homo-
logado e desentrusado, e da qualidade de vida mesmo, Diante das discussõ
do projeto de futuro dos nossos filhos, dos nossos netos... álogo, o sujeito coletivo X
Então, matando Xicão foi a interrupção de um sonho negociar seus direitos e vê
naquele momento, quando assassinaram Xicão foi justa- medida em que o Estado
mente nesse intuito de paralisar o processo de demarca- jeito individual de direito
ção, nós sabíamos, tínhamos consciência disso. Quando de direitos (art. 231 CFB/
ele foi assassinado, pronto! Acabou a luta do povo Xuku- lógica para garantir que es
ru... não é? Ninguém vai mais assumir, ninguém vai mais cebe, por exemplo, neste c
colocar a sua cara, seu peito para receber bala novamente, colheita das provas que fo
para ser assassinado... Até pela figura de Xicão, que pa- esses direitos quando não
pai representava: respeito, o respeito que o povo tinha ao líder morto, conforme pas
cacique Xicão não só aqui mas num universo maior do
que as fronteiras do povo Xukuru... E de fato quase que (DES) PLANTADO
conseguiram, porque o povo Xukuru, com o assassinato XICÃO E DE SUA
de Xicão, muitas pessoas queriam desistir... as lideranças
mesmo falavam: ‘- olhe não vamos mais porque mataram
Xicão, se mataram Xicão vão matar a gente.’ Então, as- Desde o ano seguint
sim... de fato desestabilizou o povo Xukuru, mas algumas o povo Xukuru do Ororu
pessoas como o pajé, a minha mãe e outras lideranças dis- conotações: ritual fúnebre
seram: ‘-não! O sonho de Xicão não pode ser interrom- tração de coesão social e
pido!’ O sonho de Xicão, o sonho do povo Xukuru não antropóloga Rita Neves a
pode ser interrompido, até pelo fato de nós já temos uma
estrutura organizacional bastante forte e que ele sempre O ritu
dizia que se ele morresse não queria vingança, queria que impor

176
“Plantaram” Xicão

cidades do povo indígena a gente desse continuidade na luta. Ele dizia: ‘-não quero
taurados devido à disputa vingança, quero que vocês continuem a luta’ e, pegando
ração penal fora cometida essas palavras dele, a gente começa a refletir, a gente co-
aújo, mas também contra meça a pensar e algumas lideranças interrompem todas
o conseqüência gerou um as ações externas e se volta para o internamente... que é
cesso de mobilização pela justamente para trabalhar o fortalecimento do povo que
o Xukuru assume a carac- tava recuando: ‘- não vou... não quero...’ e tal... E a gente
sa individualidade reforça começa a fazer esse trabalho interno de conversas de reu-
eender da fala do cacique niões, explicando e dizendo que o cacique Xicão não que-
se crime: ria que desistisse, que teria que continuar esta luta, né? E
assim foi feito. – Entrevista concedida em 25.10.2009, na
escola da Aldeia São José. Grifo meu.
do povo Xukuru, que é a
itório, demarcado, homo-
ualidade de vida mesmo, Diante das discussões que foram postas, percebe-se que, neste di-
filhos, dos nossos netos... álogo, o sujeito coletivo Xukuru se viu preterido no que diz respeito a
nterrupção de um sonho negociar seus direitos e vê-los efetivados pelo Estado-Juiz; posto que, na
assinaram Xicão foi justa- medida em que o Estado brasileiro reconhece um sujeito distinto do su-
ar o processo de demarca- jeito individual de direito, os povos indígenas enquanto sujeito coletivo
onsciência disso. Quando de direitos (art. 231 CFB/88), suas instituições devem aproximar-se dessa
bou a luta do povo Xuku- lógica para garantir que essa diferença seja respeitada. Não é o que se per-
assumir, ninguém vai mais cebe, por exemplo, neste caso. A condução das investigações e a forma de
a receber bala novamente, colheita das provas que formam o processo criminal, terminam por violar
figura de Xicão, que pa- esses direitos quando não leva em conta o caráter sagrado e político do
speito que o povo tinha ao líder morto, conforme passo a analisar a seguir.
s num universo maior do
uru... E de fato quase que (DES) PLANTADO? O SIGNIFICADO DA MORTE DE
Xukuru, com o assassinato XICÃO E DE SUA EXUMAÇÃO
am desistir... as lideranças
mos mais porque mataram
matar a gente.’ Então, as- Desde o ano seguinte à morte do cacique Xicão, no dia 20 de maio,
ovo Xukuru, mas algumas o povo Xukuru do Ororubá realiza um ato público que ostenta várias
mãe e outras lideranças dis- conotações: ritual fúnebre, fortalecimento da identidade étnica, demons-
ão não pode ser interrom- tração de coesão social e superação das dificuldades (NEVES, 2007). A
nho do povo Xukuru não antropóloga Rita Neves assim o descreve:
fato de nós já temos uma
nte forte e que ele sempre O ritual do dia 20 de maio acontece em lugares simbólicos
ueria vingança, queria que importantes para os Xukuru. A Pedra do Rei, na aldeia

177
XUKURU DO ORORUBÁ

Pedra D’Água, em torno do túmulo de Xicão, e o local para os Xukuru, a terra “M


apropriado para preparar emotivamente os Xukuru para mente, a coerência cultur
as performances que serão realizadas ao longo do dia. [...] modo, ao “acolher seu filh
No dia 20 de maio, os Xukuru fazem o caminho inverso descendentes. Expressão e
do que fez Xicão no dia em que foi assassinado. Xicão ção, que fez a viúva Don
morreu em Pesqueira, na frente da casa da sua irmã, foi “Acolhe teu filho minha M
levado para a aldeia de Cimbres, depois passou por San- vai ser sepultado, minha
tana, Pedra D’Água, e foi enterrado na Pedra do Rei. No dele nasça novos guerreiro
dia 20 de Maio, os Xukuru iniciam o ritual na Pedra do Viva, 1998). Também nes
Rei, seguem para Santana, descem a pé a Serra do Ororu- abaixo:
bá e encerram as atividades na frente da casa da irmã de
Xicão, em Pesqueira. (NEVES, 2007, p.116/117).
[...] ag
Não é
É possível perceber que, após a morte, a figura do cacique Xicão tado!
Xukuru passou a ocupar outros patamares não só para o povo Xukuru cada c
como também e para outros povos indígenas, especialmente do Nordeste é isso:
brasileiro, o de “líder indígena martirizado”: “Xicão agora não está mais semen
vivo, nem tampouco morto, tornou-se um mito, um ideal de comporta- 24.10
mento e liderança” (PALITOT, 2003, p. 48).
Assim, neste contexto, a morte do líder indígena assume duplo sig- Nesse contexto, os re
nificado: sagrado, por integrar o mundo sobrenatural dos “encantados” e importância tal que pass
e político, como estratégia do grupo para reafirmar a identidade étnico- e, nesse sentido, o antrop
-cultural e poder negociar seus direitos no âmbito do estatal. Com isso, da “vida social do corpo d
o processo de mobilização para a regularização fundiária e coesão social de simbólica, os restos m
se pauta agora não só no território tradicional e nos rituais, mas também política, pois marcam o fim
no novo herói mítico, o cacique Xicão que deu a vida pelo bem estar do Com efeito, a morte do ca
seu povo. ma para o povo Xukuru, n
Para os Xukuru, na morte não há finitude, há apenas uma trans- sentido de morte para o g
posição de “lugar no mundo” - Xicão deixou de atuar no plano físico espaço para “acolher” o c
para atuar no plano espiritual (PALITOT, 2003). A partir de Xicão, os tégia política do grupo.
indígenas Xukuru passaram a ser enterrados, ou “plantados”, no cemi- Diante disso, o fato q
tério Espaço Sagrado do Povo Xukuru do Ororubá, localizado na Pedra é justamente a exumação
do Rei, terra indígena Xukuru. Essa relação de sacralidade que os povos tiu para o povo Xukuru?
indígenas têm com a terra, para além dos aspectos de regulação fundiária,
se orienta pela crença espiritual na ligação com seus antepassados, tam-
bém chamados de “encantados” ou “irmãos de luz”. Assim como para os 68. Essa fala de Dona Zenilda, viúv
Gavião Parkatêje, povo indígena localizado no estado brasileiro do Pará, Outro Mundo de Xicão Xukuru”, d

178
“Plantaram” Xicão

úmulo de Xicão, e o local para os Xukuru, a terra “Mãe Natureza” é quem lhes oferece, tradicional-
ivamente os Xukuru para mente, a coerência cultural e a coesão social (BELTRÃO, 2007); e desse
zadas ao longo do dia. [...] modo, ao “acolher seu filho plantado” ela fará com que dele germine seus
fazem o caminho inverso descendentes. Expressão eloqüente disso é o misto de desabafo com ora-
ue foi assassinado. Xicão ção, que fez a viúva Dona Zenilda quando do sepultamento de Xicão:
e da casa da sua irmã, foi “Acolhe teu filho minha Mãe Natureza, acolhe teu filho! Porque ele não
es, depois passou por San- vai ser sepultado, minha Mãe Natureza... ele vai ser plantado, para que
rrado na Pedra do Rei. No dele nasça novos guerreiros”68 (Fala extraída do vídeo Xicão Xukuru, TV
ciam o ritual na Pedra do Viva, 1998). Também nesse sentido é a fala do vice-cacique Zé de Santa,
em a pé a Serra do Ororu- abaixo:
frente da casa da irmã de
2007, p.116/117).
[...] agora para o povo Xukuru, Xicão não é um morto.
Não é uma pessoa enterrada... Xicão é um homem plan-
figura do cacique Xicão tado! Ele nasce a cada instante, em cada liderança, em
o só para o povo Xukuru cada criança que nasce do povo Xukuru... Para nós Xicão
specialmente do Nordeste é isso: é um pé de árvore que tá dando frutos... flores,
Xicão agora não está mais sementes e mais frutos... [...] – Entrevista concedida em
o, um ideal de comporta- 24.10.2009, na escola da Aldeia São José. Grifo meu.

dígena assume duplo sig- Nesse contexto, os restos mortais desse líder detêm uma sacralidade
natural dos “encantados” e importância tal que passam a ser uma referência política para o seu povo
rmar a identidade étnico- e, nesse sentido, o antropólogo italiano Adriano Favole (2003a), ao falar
bito do estatal. Com isso, da “vida social do corpo depois da morte”, pontua que além da sacralida-
o fundiária e coesão social de simbólica, os restos mortais de líderes representam uma importância
nos rituais, mas também política, pois marcam o fim de um estado político para dar início a outro.
a vida pelo bem estar do Com efeito, a morte do cacique Xicão marcou uma mudança de paradig-
ma para o povo Xukuru, não apenas no sentido de ressignificar o próprio
de, há apenas uma trans- sentido de morte para o grupo, no que diz respeito aos ritos fúnebres, ao
de atuar no plano físico espaço para “acolher” o corpo morto, como também em relação à estra-
03). A partir de Xicão, os tégia política do grupo.
ou “plantados”, no cemi- Diante disso, o fato que mais chama atenção nesse processo criminal
rubá, localizado na Pedra é justamente a exumação do cacique Xicão. Como essa questão repercu-
sacralidade que os povos tiu para o povo Xukuru? Como isso foi negociado entre eles e o Estado-
tos de regulação fundiária,
m seus antepassados, tam-
luz”. Assim como para os 68. Essa fala de Dona Zenilda, viúva do cacique Xicão Xukuru, foi incorporada à letra da música “O
estado brasileiro do Pará, Outro Mundo de Xicão Xukuru”, do grupo musical pernambucano Mundo Livre S/A.

179
XUKURU DO ORORUBÁ

-Juiz? Haja vista que o corpo fora sepultado em um cemitério particular a exumação de Xicão, o ev
– “espaço sagrado” - do povo Xukuru, que detém especificidades étnico- o descrito no bojo do proc
-culturais que devem ser levadas em consideração na hora de exumar ou
“desplantar” um corpo 69 de relevante caráter sagrado e político.
I –An
A respeito dos meandros das relações interétnicas, o antropólogo
Em fin
Roberto Cardoso de Oliveira (2005) destaca que em situações de contato
cional
interétnico e intercultural a variável cultural não pode deixar de ser con-
recebe
siderada quando nela estiverem expressos “valores nativos” de percepção
deral e
dos agentes sociais, neste caso, estatais, inseridos na situação de diálogo.
do Ca
Certamente, a falta de preparação dos agentes estatais para lidar um pr
com essa diversidade cultural é notória. O caso do processo criminal do ca- pica, l
cique Xicão Xukuru aponta como está se configurando o diálogo do Esta- penetr
do-Juiz com os valores sócio-culturais desse grupo étnico, senão vejamos: cia Civ
durante o Inquérito Policial que apurava as circunstâncias da morte do realiza
cacique Xicão, a autoridade policial que presidia o feito solicitou a exuma- havido
ção dos restos mortais do cacique na tentativa de localizar um projétil no tar, po
corpo e submetê-lo a exame balístico, para verificar se o mesmo teria sido Presum
expelido ou não do cano do revólver pertencente a José Libório Galindo – poster
“Ricardo” – pistoleiro contratado por fazendeiros locais para matar Xicão. Deleg
Nos autos processuais, a exumação aparece de forma jurídico-for- de daq
mal, no sentido que, os laudos técnicos (Auto de Exumação para Colheita sido en
de Provas e Auto de Exumação e Exame Cadavérico) não tratam de ques- da faz
tões próprias da lógica Xukuru, que é diferente da lógica de sociedade rio po
compartilhada pelos não indígenas, conforme assevera Rezende (2009, pelas
p.21): “a relação dos povos indígenas com o sobrenatural, com os mitos e corpo
tabus, os seus rituais, seu modo de se vestir, de se pintar, de se alimentar, entant
de curar as doenças, são marcantemente diferentes das sociedades não -se à c
indígenas e denotam uma outra forma de compreender o mundo”. Daí a espirit
necessidade de um Estado verdadeiramente plural, que contemple dife- legado
rentes lógicas em suas práticas judiciárias. tentan
Segundo o Relatório do Conselho Indigenista Missionário, da lavra exuma
da Dra. Rosane Lacerda, assessora jurídica do referido órgão, no que tange [...]
IV –A
[...] N
69. A antropóloga Liliane Souza esclarece que, no modelo etiológico Xukuru: “O corpo é enten-
dido como uma totalidade que compreende as esferas biofísica, emocional e espiritual” (SOUZA,
muito
2007, p.143). lo. A

180
“Plantaram” Xicão

m um cemitério particular a exumação de Xicão, o evento foi bem mais complexo e conturbado que
ém especificidades étnico- o descrito no bojo do processo criminal, vejamos parte desse Relatório:
ção na hora de exumar ou
agrado e político.
I –Antecedentes:
terétnicas, o antropólogo
Em fins de janeiro de 2002, estando no Secretariado Na-
e em situações de contato
cional do Cimi por ocasião do Curso de Formação Básica,
ão pode deixar de ser con-
recebemos do Cimi NE a informação de que a Polícia Fe-
ores nativos” de percepção
deral estaria pretendendo efetuar a exumação do corpo
os na situação de diálogo.
do Cacique Chicão, a fim de que pudesse ser encontrado
gentes estatais para lidar um projétil mencionado no Laudo de Perícia Tanatoscó-
do processo criminal do ca- pica, localizado na região glútea, com ferimento apenas
urando o diálogo do Esta- penetrante (e não transfixante). Devido à greve da Polí-
po étnico, senão vejamos: cia Civil de Pernambuco à época do crime, o exame fora
rcunstâncias da morte do realizado no Hospital Getúlio Vargas, onde, por não ter
a o feito solicitou a exuma- havido aparelho de Raio X disponível, não se pode ten-
de localizar um projétil no tar, por aquele método, a exata localização do projétil.
ficar se o mesmo teria sido Presumiu-se então ter o mesmo permanecido no corpo,
e a José Libório Galindo – posteriormente sepultado na terra indígena. Segundo o
os locais para matar Xicão. Delegado de Polícia Federal à frente do caso, a necessida-
ece de forma jurídico-for- de daquele tipo de perícia teria advindo do fato de terem
e Exumação para Colheita sido encontradas duas armas suspeitas, numa determina-
érico) não tratam de ques- da fazenda no estado do Maranhão, fazendo-se necessá-
te da lógica de sociedade rio portanto a confrontação entre os projéteis disparados
assevera Rezende (2009, pelas mesmas e aquele que poderia ser encontrado no
brenatural, com os mitos e corpo através da exumação. [...] O Cacique Marcos, no
se pintar, de se alimentar, entanto, pressionou para que a perícia fosse feita dando-
entes das sociedades não -se à comunidade indígena um tempo para se preparar,
preender o mundo”. Daí a espiritual e emocionalmente. Soubemos então que o de-
ural, que contemple dife- legado teria comentado que “forças malignas” estariam
tentando influenciar o Cacique a não concordar com a
nista Missionário, da lavra exumação dos restos mortais de seu pai.
ferido órgão, no que tange [...]
IV –A Exumação:
[...] Na mata da Pedra D’Água, antes das nove horas,
ológico Xukuru: “O corpo é enten-
a, emocional e espiritual” (SOUZA,
muitos índios já começavam a chegar ao local do túmu-
lo. A exumação estava marcada para as 9:00hs, mas o

181
XUKURU DO ORORUBÁ

tempo avançava e os policiais e peritos não chegavam. e nesse


A demora nos preocupava em razão das informações de des
passadas pelo Sr. João Jorge, quanto à profundidade do do loc
túmulo (a altura de um homem de braços estirados para próxim
cima) e grande presença de água no nível do caixão, o que riores
implicaria num processo demorado. Enquanto se aguar- haviam
dava a chegada dos policiais, os índios realizavam danças conser
rituais em torno do túmulo. [...] Por volta das dez horas lar (m
chegou o pessoal do Centro Luiz Freire, trazendo um ci- ral). E
negrafista. O Cimi, com a concordância da Dra. Michael, projét
entendiam importante o registro de todos os passos da que se
exumação, a fim de a assistência de Acusação também aquele
poder vir a produzir as suas provas. [...] O delegado, ritos n
juntamente com outros agentes, peritos e dois legistas, dos pa
acompanhados da irmã de Chicão, só chegaram ao local uma f
por volta das 10:30 da manhã. A partir desse momento, dos pe
por solicitação do Cacique Marcos, retiraram-se da mata feito, n
todos aqueles que não eram membros da família, para tores d
que no local ficassem apenas os familiares, policiais, pe- em co
ritos e os advogados presentes. [...] Foram cerca de duas lo em
horas e meia de trabalho com duas pás, fornecidas pelos para r
próprios índios. Quatro homens (dois índios – um deles da bac
Severino, e dois funcionários da prefeitura) se revezavam produ
na remoção da terra. Por volta da uma hora da tarde, de- vas cir
pois de muitos baldes de água e muita lama, finalmente mater
se chegou ao caixão. Neste momento, o trabalho parou visível
para que os índios pudessem fazer a sua reverência, com horas
o toque de flauta. A comoção aumentou. Muitas pessoas morta
começavam a se aproximar do local. Para a remoção do dios fa
corpo foi necessário se tomar “emprestado” ao Padre Bar- Grifos
tolomeu, uma lona grossa e uma corda. Passou-se a lona
por baixo do tecido do fundo do caixão, de modo que a
Também o Relatóri
lona ficasse sob o corpo. A corda foi amarrada nas extre-
pela CDDPH – Xukuru
midades de cima e de baixo, e com ela o corpo foi puxado
de negociação com a fam
para cima e para fora do túmulo. Neste momento a co-
ficou caracterizado por um
moção foi muito grande e as pessoas que antes estavam
de reviver o luto pela mor
fora foram chegando para mais perto. A lona foi aberta
revolta e perda:

182
“Plantaram” Xicão

e peritos não chegavam. e nesse momento as mulheres irromperam em um choro


m razão das informações de desespero. Seu Cícero, o pai, teve que ser removido
quanto à profundidade do do local. No entanto, algumas crianças ficaram lá, bem
m de braços estirados para próximas, assistindo a tudo. Da cabeça, membros supe-
a no nível do caixão, o que riores e inferiores e parte média e superior do tronco, só
rado. Enquanto se aguar- haviam ossos. Parte do tronco, no entanto, estava ainda
s índios realizavam danças conservada, devido ao formol – escutei um dos peritos fa-
.] Por volta das dez horas lar (mas para os índios a explicação era outra, sobrenatu-
iz Freire, trazendo um ci- ral). Esse fato implicou em que o trabalho de busca pelo
ordância da Dra. Michael, projétil acabasse sendo muito mais difícil e demorado do
tro de todos os passos da que se imaginava, pois o local preservado era justamente
cia de Acusação também aquele onde se teria de procurar a bala. Além disso, os pe-
provas. [...] O delegado, ritos não se precaveram em levar instrumentos adequa-
es, peritos e dois legistas, dos para este tipo de situação. Acabamos tendo que pedir
cão, só chegaram ao local uma faca “emprestada” a alguém do povo, para que um
A partir desse momento, dos peritos pudesse fazer o seu trabalho. Sobre como foi
cos, retiraram-se da mata feito, não convém aqui relatar, a fim de se poupar os lei-
membros da família, para tores do relatório, mas foi um trabalho minucioso, feito
s familiares, policiais, pe- em condições difíceis, com o povo formando um círcu-
[...] Foram cerca de duas lo em volta dos peritos, que ficavam meio sem ar puro
duas pás, fornecidas pelos para respirar. Um dos legistas chegou, por fim, ao osso
ns (dois índios – um deles da bacia onde pudemos ver claramente uma perfuração
a prefeitura) se revezavam produzida à bala. Insistentemente, com as mãos (e lu-
da uma hora da tarde, de- vas cirúrgicas), os legistas checaram novamente todo o
e muita lama, finalmente material já visto, e nada encontraram. A frustração era
omento, o trabalho parou visível entre o delegado e os peritos. Por volta das quatro
azer a sua reverência, com horas da tarde, os trabalhos foram encerrados e os restos
umentou. Muitas pessoas mortais levados novamente ao túmulo, enquanto os ín-
local. Para a remoção do dios faziam novas reverências sob o toque da flauta. [...].
mprestado” ao Padre Bar- Grifos meus.
ma corda. Passou-se a lona
do caixão, de modo que a
Também o Relatório elaborado pela Comissão Especial instituída
da foi amarrada nas extre-
pela CDDPH – Xukuru e a Violência, 2004 –, dá conta que o processo
om ela o corpo foi puxado
de negociação com a família do de cujus para a realização da exumação
lo. Neste momento a co-
ficou caracterizado por uma grande tensão, acerca da necessidade ou não,
essoas que antes estavam
de reviver o luto pela morte de Xicão e com isso atualizar sentimentos de
s perto. A lona foi aberta
revolta e perda:

183
XUKURU DO ORORUBÁ

Os registros da exumação mostram o clima de como- povos indígenas e o Estado


ção em que parte da comunidade (adultos e crianças) posto por Geertz (2001),
acompanhou não apenas a retirada do corpo, mas todo de direitos encobertas pel
o processo de perícia, que foi realizada ao lado do seu “verdade real” e em nome
túmulo na Pedra D’Água, local que possui importante O antropólogo italia
significado religioso para os Xukuru. Os restos mortais cessos de “Apropriação, In
foram ali expostos sobre uma lona cedida por um padre de povos indígenas da O
que acompanhava a exumação e explorados com uma muitas organizações nativ
faca peixeira “emprestada” por um índio. A violação do indevidamente de objeto
corpo de Chicão que havia sido plantado e não enterra- portamentos violentos e/o
do, conforme depoimento de vários índios, atualizou os “I bianchi, incuranti dell’
sentimentos de perda e revolta [...] (CDDPH – Relatório condano i corpi dei mort
Comissão Especial, 2004) cimiteri, depositi di “reliq
fini di studio o di esposizio
Como é possível perceber “nas entrelinhas do processo”, não fica Segundo o referido
clara a necessidade da mencionada perícia, vez que havia projéteis de mais difundida pelos colon
arma de fogo extraídos do corpo do cacique Xicão arquivados no Museu dos; ele se reporta ao caso
do Crime de Pernambuco. Em um primeiro momento, os Xukuru não Company e presidente da
concordaram em “desplantar” o cacique, porém, como o delegado da Po- em colono e proprietário
lícia Federal afirmava a necessidade da perícia para a elucidação do crime sua pátria o crânio de Ar
e para não serem acusados de obstruir o trâmite processual da justiça, Arawarra foi o responsáv
aceitaram a exumação desde que lhes fosse garantido o direito de realizar canibalismo, foi sepultado
um ritual para tal intento. É importante destacar que a perícia balística local próximo as terras do
poderia ser feita com um dos projéteis arquivados no Museu do Crime, sepultura para retirar os re
sem a necessidade de “desplantar” o cacique Xicão, meramente para ten- era possível associá-los a a
tar produzir essa prova, tanto é assim que, como não foi localizado o pro- escreveu na carta que aco
jétil na exumação, o exame balístico foi realizado com aqueles projéteis -wadi para a Inglaterra:
que já estavam arquivados.
Caberia, nesse particular, uma discussão de ordem técnico-jurídica a Tenho
respeito da produção de provas à luz do princípio da dignidade da pessoa trata d
humana, bem como das omissões por parte do Ministério Público Federal precio
local, que enquanto instituição responsável em preservar os direitos indí- que em
genas, não exerceu inteiramente o devido controle crítico sobre as provas
a serem produzidas pela Polícia Federal, como no caso da exumação, por
70. “Os brancos, responsáveis pe
exemplo. Entretanto, por ser uma questão de ordem mais jurídica que corpos dos mortos, não teriam exi
antropológica, me detenho apenas a pontuar que esse evento assinala a “relíquias”, desde que encontrass
necessidade de estabelecer um diálogo intercultural equânime entre os ou exposição” (FAVOLE, 2003b, p.

184
“Plantaram” Xicão

ostram o clima de como- povos indígenas e o Estado-Juiz brasileiro, no “ir e vir hermenêutico” pro-
dade (adultos e crianças) posto por Geertz (2001), para que não venham a ocorrer outras violações
irada do corpo, mas todo de direitos encobertas pelo manto da investigação criminal, em busca da
realizada ao lado do seu “verdade real” e em nome da “justiça”.
al que possui importante O antropólogo italiano Adriano Favole (2003b), ao estudar os pro-
ukuru. Os restos mortais cessos de “Apropriação, Incorporação e Restituição de Restos Humanos”
ona cedida por um padre de povos indígenas da Oceania por seus colonizadores, observou que
o e explorados com uma muitas organizações nativas acusam os ocidentais de terem se apropriado
r um índio. A violação do indevidamente de objetos sagrados e restos mortais, por meio de com-
o plantado e não enterra- portamentos violentos e/ou manobras aplicadas em nome da “ciência”:
vários índios, atualizou os “I bianchi, incuranti dell’universale rispetto di cui le società umane cir-
[...] (CDDPH – Relatório
condano i corpi dei morti, non avrebbero esitato a profanare siti sacri,
cimiteri, depositi di “reliquie”, pur di procurarsi ossa e altri resti umani a
fini di studio o di esposizione”70 (FAVOLE, 2003b, p.03).
as do processo”, não fica Segundo o referido antropólogo, a modalidade de “apropriação”
ez que havia projéteis de mais difundida pelos colonizadores foi o saque a cemitérios e locais sagra-
cão arquivados no Museu dos; ele se reporta ao caso de um médico-cirurgião inglês, da East India
momento, os Xukuru não Company e presidente da Australian Philosophical Society, transformado
m, como o delegado da Po- em colono e proprietário de terras na Austrália, que em 1827 enviou à
para a elucidação do crime sua pátria o crânio de Arawarra, guerreiro da comunidade wadi-wadi.
mite processual da justiça, Arawarra foi o responsável por ataques contra os colonos e acusado de
antido o direito de realizar canibalismo, foi sepultado na areia segundo os costumes do seu povo, em
car que a perícia balística local próximo as terras do médico-cirurgião, esse não exitou em violar a
ados no Museu do Crime, sepultura para retirar os restos mortais, considerados “preciosos”, pois lhe
cão, meramente para ten- era possível associá-los a alguns dados biográficos do morto, como assim
o não foi localizado o pro- escreveu na carta que acompanhou envio dos restos do guerreiro wadi-
ado com aqueles projéteis -wadi para a Inglaterra:

e ordem técnico-jurídica a Tenho o prazer de expedir uma amostra craniológica, se


io da dignidade da pessoa trata da cabeça de um ex-chefe que vivia nas vizinhanças,
Ministério Público Federal precioso pela história do personagem ao qual pertence,
preservar os direitos indí- que em parte nos é conhecida [...] todavia – sinal de eter-
ole crítico sobre as provas
no caso da exumação, por
70. “Os brancos, responsáveis pelo respeito universal do qual a sociedade humana circunda os
ordem mais jurídica que corpos dos mortos, não teriam exitado em profanar os locais sagrados, cemitérios e depósitos de
que esse evento assinala a “relíquias”, desde que encontrassem ossos e outros restos humanos, com a finalidade de estudo
ultural equânime entre os ou exposição” (FAVOLE, 2003b, p.03) - Tradução minha.

185
XUKURU DO ORORUBÁ

na Justiça – aos seus ossos não foi concedido repousarem ral, do


na sua catacumba e se espera que o seu crânio jogue tal “-nós
luz sobre a ciência que possa ser suficiente para espiar os Vai pa
crimes por ele cometido71”(BARRY, 1827 apud FAVO- eu vi..
LE, 2003b, p.06). inteiro
destrin
cos faz
Desse modo, quando o colonizador usurpa os restos do guerreiro
wadi-wadi em nome da “ciência”, ele não leva em conta a importância
simbólica e política que o corpo morto assume na lógica cultural desse M: E c
povo. É possível traçar uma analogia do caso com a aquiescência do povo ZS: É
Xukuru quando da exumação de seu cacique: a PF utiliza-se de um argu- uma p
mento de autoridade – realizar perícias científicas a partir dos restos mor- estilha
tais de Xicão, por ser legítima a investigação policial -, dentro do modelo E a po
cognitivo do Estado-Juiz. Xuku
Para o povo Xukuru esse episódio no curso das investigações po- tavam
liciais, a exumação dos restos mortais do seu líder, é recordado até os cobra
dias de hoje como um dos eventos mais traumáticos que passaram neste nosso
caso. Esse sentimento pode ser apreendido através da fala do vice-cacique médic
Xukuru, Zé de Santa, em entrevista concedida a mim, quando lhe per- Xuku
guntei se ele estava presente na exumação do corpo e se ele recordava dico ve
como foi conduzida a questão, trago a colação esta parte dessa narrativa: ai tinh
ne, Pa
Teve q
M: O senhor estava aqui quando foi feita a exumação do
corpo do cacique Xicão? O senhor se recorda de como foi M: E t
conduzida essa questão?
ZS: Te
ZS: Eu tava aqui sim! Ah minha querida... foi muito, do ele
muito doloroso.... O delegado Cotrim chegou aqui e disse ranças
o seguinte: “-não vai participar ninguém da exumação!” nós ta
ele chegou informando que ia ter a exumação, mas que guém
não ia ter a participação de ninguém, só da polícia fede- com o
(Entre
71. Tradução minha. Texto original: “Ho il piacere di spedirle un campione craniologico: si tratta deia Sã
del teschio di un ex-capo che viveva nelle vicinanze, prezioso per il fatto che la storia del persona-
ggio a cui appartenne ci è in parte nota […] tuttavia – segno dell’eterna Giustizia – alle sue ossa
non è stato concesso di riposare nella loro tomba e c’è da augurarsi che il suo cranio getti una tale À luz dessas reflexõ
luce sulla scienza che possa essere sufficiente a espiare i crimini da lui commessi”. (BERRY, 1827,
apud FAVOLE, 2003b, p.06). evidência de violação do

186
“Plantaram” Xicão

foi concedido repousarem ral, do médico e quem ele chamasse. Mas a gente disse:
que o seu crânio jogue tal “-nós vamos botar nossos advogados e o povo Xukuru!
r suficiente para espiar os Vai participar todo mundo, quem tiver coragem de ir...” E
ARRY, 1827 apud FAVO- eu vi... vi os restos, os pedaços, tinha pedaço de couro dele
inteiro ainda... pegado nos ossos... e a gente ali, vendo
destrinchar, cortar os pedaços, cortar os ossos... e os médi-
cos fazendo aquele negócio lá, tirava os pedacinhos dele.
pa os restos do guerreiro
a em conta a importância
e na lógica cultural desse M: E como foi compartilhado isso pelo povo Xukuru?
m a aquiescência do povo ZS: É dolorido... é dolorido, não é? Você ver o corpo de
PF utiliza-se de um argu- uma pessoa que a gente ama, ver esse corpo além de ser
as a partir dos restos mor- estilhaçado por bala, ser estilhaçado com estilete, faca...
olicial -, dentro do modelo E a policia ali dizendo: “- vou provar que foi bala dos
Xukuru que mandou matar e não dos pistoleiro...” Eles
rso das investigações po- tavam ali pra fazer isso, né? Pra dizer que Xicão criou
líder, é recordado até os cobra pra matar ele mesmo. Se não tivesse ninguém do
áticos que passaram neste nosso povo lá, a versão que ia ficar era dele, né? Desde o
vés da fala do vice-cacique médico, o médico foi eles quem trouxe, não foi o povo
a a mim, quando lhe per- Xukuru que disse: “- o médico vai ser esse aqui”. O mé-
corpo e se ele recordava dico veio de Recife, eles trouxeram um médico deles. Mas
esta parte dessa narrativa: ai tinha os nossos advogados, tinha Sandro, tinha Rosa-
ne, Paulinho, os nossos aliados tavam vendo também.
Teve que ser na presença deles.
do foi feita a exumação do
hor se recorda de como foi M: E teve algum ritual específico? A polícia deixou fazer?
ZS: Teve, teve sim! Nós fizemos, problema deles. Quan-
nha querida... foi muito, do eles tiraram o corpo ficou só a família e algumas lide-
Cotrim chegou aqui e disse ranças de começar o trabalho deles. Quando terminou
r ninguém da exumação!” nós também fez, mas muito pouco, porque também nin-
ter a exumação, mas que guém agüentava mais... foi muito sofrido... mexeu muito
nguém, só da polícia fede- com o povo sabe?
(Entrevista concedida em 24.10.2009, na escola da Al-
un campione craniologico: si tratta deia São José).
er il fatto che la storia del persona-
dell’eterna Giustizia – alle sue ossa
rarsi che il suo cranio getti una tale À luz dessas reflexões trazidas acima é possível perceber a clara
ni da lui commessi”. (BERRY, 1827,
evidência de violação do direito à diversidade étnica e cultural do povo

187
XUKURU DO ORORUBÁ

Xukuru em contraposição ao seu “modo de estar no mundo”, por parte nidade ética de trabalhar
do Estado-Juiz ao infringir o disposto na Constituição Federal brasileira quando estes foram extraí
de 1998 que, em seu artigo 231, reconhece aos indígenas brasileiros o Como reflexão final
direito a sua organização social, seus costumes, línguas, crenças e tradi- parte do arcabouço doutr
ções, além dos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente dos grupos étnicos em âm
ocupam, devendo o Estado protegê-los e fazer respeitá-los. Nesse ponto, internacional na defesa de
o processo apresenta uma tipologia de inconstitucionalidade. cessitam de maior “sensib
O respeito à diversidade cultural e, conseqüentemente, aos valores atividades o escopo essen
das diversas culturas, garante ao sujeito coletivo de direito a faculdade de ética de cultural da socied
não se “contaminar” por valores que não sejam os seus, nesse sentido, os
juristas argentinos Zaffaroni e Pierangeli (2004) trazem um elucidante
CONSIDERAÇÕES
exemplo ao tratar do “erro de compreensão culturalmente condiciona-
do”, in verbis:
O Estado-Juiz brasil
mativo, dotado de uma ló
Se visitarmos a casa de um esquimó e seu ocupante quer consegue dar conta da div
agradar-nos, oferecendo-nos sal mulher perfumada com sociedade e dialogam entr
urina, para nós será muito difícil aceitar o presente, e, curso oficial, o Estado Dem
embora saibamos que o anfitrião tomará isto como uma funda no respeito à divers
ofensa, será extremamente árduo internalizar a regra de nas suas práticas há uma d
conduta que evite a injúria que lhe fazemos. Da mesma do não se atém a certas es
maneira, o indígena de uma comunidade que tem seus procedimentos investigat
próprios ritos para funerais e sepultamentos [...] mas é tomadas de decisões por p
muito duro exigir-lhe que abandone todas as regras para envolve sujeitos étnicos cu
acolher as nossas e reprovar-lhes porque não o tenha fei- O crime doloso cont
to. (FOUCAULT, 2008, p.83) ciário, que teve como vítim
Xukuru) e como motivaçã
Com a apropriação dos restos mortais de seu líder morto, pelos ração do território tradicio
agentes estais, é possível dizer que o povo indígena Xukuru sofreu uma perceber como o “olhar n
espécie de “dano cultural”, pois para a cultura Xukuru, sua principal lide-
rança não está morta nem viva, mas “plantada”, como uma árvore, para
que dela nasçam os frutos da luta do seu povo; logo, “desplantá-lo”, ou 72. “Discursos como práticas que
CAULT, 1966 apud IÑIGUEZ, 2005,
“arrancá-lo da terra”, da “Mãe Natureza”, fere, brutal e arbitrariamen- discurso, o discurso é visto como
te, essa lógica cultural. Isso se dá, porque os restos humanos não detêm possível definir as condições de su
apenas um valor científico, mas também são cheios de valores afetivos 73. Desde o processo de (re) dem
além de significados culturais específicos e, como bem observou Favole de 1988, o Brasil tem adotado im
direitos e garantias fundamentais,
(2003b), a “comunidade científica” deve interrogar-se sobre a oportu- ternacionais de direitos humanos

188
“Plantaram” Xicão

tar no mundo”, por parte nidade ética de trabalhar com esse tipo de material humano, ainda mais
tituição Federal brasileira quando estes foram extraídos com violência ou engano.
os indígenas brasileiros o Como reflexão final, resta pontuar que, mesmo a prescindir que
, línguas, crenças e tradi- parte do arcabouço doutrinário jurídico que tutela os direitos específicos
ras que tradicionalmente dos grupos étnicos em âmbito local e oferece, ainda, instâncias de âmbito
respeitá-los. Nesse ponto, internacional na defesa desses direitos, são as práticas judiciárias que ne-
tucionalidade. cessitam de maior “sensibilidade jurídica”, focalizando na rotina de suas
qüentemente, aos valores atividades o escopo essencial a ser perseguido: o respeito à diversidade
o de direito a faculdade de ética de cultural da sociedade plural.
m os seus, nesse sentido, os
4) trazem um elucidante
CONSIDERAÇÕES FINAIS
ulturalmente condiciona-
O Estado-Juiz brasileiro possui um modelo cognitivo próprio, nor-
mativo, dotado de uma lógica processual pragmática, que por vezes não
uimó e seu ocupante quer consegue dar conta da diversidade de modelos cognitivos que existem na
l mulher perfumada com sociedade e dialogam entre si através das “práticas discursivas”72. No dis-
ícil aceitar o presente, e, curso oficial, o Estado Democrático de Direito brasileiro se reconhece e se
ão tomará isto como uma funda no respeito à diversidade étnica e cultural73 (CFB/88). Entretanto,
uo internalizar a regra de nas suas práticas há uma dificuldade no respeito a essa diversidade quan-
e lhe fazemos. Da mesma do não se atém a certas especificidades, principalmente na condução dos
omunidade que tem seus procedimentos investigativos judiciais e administrativos, bem como nas
sepultamentos [...] mas é tomadas de decisões por parte de seus órgãos jurídicos quando a demanda
ndone todas as regras para envolve sujeitos étnicos culturalmente diferenciados.
es porque não o tenha fei- O crime doloso contra a vida, objeto de julgamento pelo poder judi-
ciário, que teve como vítima o líder de um povo indígena (cacique Xicão
Xukuru) e como motivação a disputa com fazendeiros locais pela recupe-
de seu líder morto, pelos ração do território tradicional do povo Xukuru, é um bom exemplo para
gena Xukuru sofreu uma perceber como o “olhar normativo” do Estado-Juiz leu e entendeu este
Xukuru, sua principal lide-
”, como uma árvore, para
; logo, “desplantá-lo”, ou 72. “Discursos como práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam” (FOU-
CAULT, 1966 apud IÑIGUEZ, 2005, p.93). A partir da perspectiva foucaultiana de análise crítica do
e, brutal e arbitrariamen- discurso, o discurso é visto como uma prática discursiva e, como qualquer outra prática social, é
estos humanos não detêm possível definir as condições de sua produção.
cheios de valores afetivos 73. Desde o processo de (re) democratização do país e, especialmente, a partir da Constituição
mo bem observou Favole de 1988, o Brasil tem adotado importantes instrumentos normativos voltados à proteção dos
direitos e garantias fundamentais, além de avanços decorrentes da incorporação de tratados in-
rrogar-se sobre a oportu- ternacionais de direitos humanos (PINTO, 2008).

189
XUKURU DO ORORUBÁ

caso. Não foi minha intenção fazer uma “investigação criminal” no senti- reconhecimento explícito
do de apontar culpados, mas interpretar esse evento a partir de princípios concernentes aos povos in
relativistas que considerem a compreensão dos Xukuru, até mesmo por-
que o julgamento se deu em um sistema altero ao dos índios.
Referências
A morte do cacique Xicão foi um marco para o povo Xukuru sob
vários aspectos: 1- fortaleceu a luta do povo na reconquista do território
ADORNO, S. Crime, Ju
tradicional, porque após a morte de Xicão houve um grande esforço in-
TO, C.;FALCÃO, J. (org.)
terno do grupo, através das demais lideranças, para não “interromper o
de sociologia jurídica. 2 ed.
sonho do povo Xukuru”, como eles mesmos afirmavam; 2- foi um marco
no processo de criminalização que vem sofrendo o povo Xukuru por parte ALENCAR, J. M. E BEN
do poder judiciário local e perdura até hoje com a condenação de mais de Étnicos: questões sobre o
trinta lideranças pela Justiça Federal local, explicitando a falta de sensibi- ord.). Os Direitos Indígenas
lidade desse órgão estatal no trato da diversidade étnico-cultural; 3- além Sérgio Antônio Fabris Edi
ter acentuado o caráter sagrado da liderança, pois Xicão é hoje visto como
um mártir que deu sua vida pelo povo Xukuru. BELTRÃO, J. F. Povos Ind
pólogos. CONPEDI, Anais
Vale pontuar, entretanto, que além da violência sofrida pelo povo
http://www.conpedi.org/m
Xukuru com a perda do seu principal líder à época, durante o trâmite
pdf Acesso em 13.01.10.
do procedimento judicial, esse sujeito coletivo passou a sofrer violências
institucionais por parte do poder judiciário local. Essas violências são tra- BORBA, L. A. Aspectos Re
duzidas na forma de condução do procedimento investigativo (IP), que gandi, Teresina, ano 6, n.
num primeiro momento acusa os próprios indígenas de serem algozes de com.br/doutrina/texto.asp
seu cacique e depois, com a entrada de uma nova autoridade policial, es-
pecialmente designada para esse feito, terem sido constrangidos a verem BRASIL. Constituição Fede
o “corpo plantado” ser arrancado da terra (“a mãe natureza” importante nização por Luiz Flávio G
referencial cultural desse povo), destroçado e mutilado, meramente para
BRASIL. Vade Mecum. 3 ed
fins de colheita de uma prova pericial, que restou infrutífera.
Evidentemente, este caso revela uma total falta de sensibilidade por CAPEZ, F. Curso de Process
parte dos agentes estatais para lidar com a diversidade e a necessidade
do diálogo com a antropologia jurídica como instrumental para repensar CARDOSO DE OLIVEI
essas relações interculturais. Um raciocínio conclusivo me faz crer firme- moral. Revista Antropológ
mente que o procedimento de exumação do cacique Xicão caracterizou- sitária da UFPE, 2005.
-se como um dano cultural irreversível ao povo Xukuru, pois não foram ______. Identidade, Etni
levadas em consideração as suas crenças, seus usos, costumes e tradições ra Editora, 1976.
na condução da questão, sendo inclusive estas prerrogativas Constitucio-
nais (art. 231 CF/88). E, esse modelo constitucional pluralista, além de CDDPH – Conselho de
implicar um reconhecimento dos direitos coletivos, implica também o Xukuru e a Violência – Rela

190
“Plantaram” Xicão

igação criminal” no senti- reconhecimento explícito e prático por parte do Estado-Juiz dos direitos
ento a partir de princípios concernentes aos povos indígenas.
Xukuru, até mesmo por-
ao dos índios.
Referências
para o povo Xukuru sob
a reconquista do território
ADORNO, S. Crime, Justiça Penal e Desigualdade Jurídica. In: SOU-
uve um grande esforço in-
TO, C.;FALCÃO, J. (org.) Sociologia e Direito: textos básicos para a disciplina
para não “interromper o
de sociologia jurídica. 2 ed. Atual. São Paulo: Pioneira, 1999.
rmavam; 2- foi um marco
o o povo Xukuru por parte ALENCAR, J. M. E BENATTI, J. H. Os Crimes Contra Etnias e Grupos
m a condenação de mais de Étnicos: questões sobre o conceito de etnocídio. In: SANTILLI, J. (co-
icitando a falta de sensibi- ord.). Os Direitos Indígenas e a Constituição. Núcleo de Direitos Indígenas e
de étnico-cultural; 3- além Sérgio Antônio Fabris Editor. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1993.
is Xicão é hoje visto como
. BELTRÃO, J. F. Povos Indígenas e Direitos Humanos: como desafio de antro-
olência sofrida pelo povo pólogos. CONPEDI, Anais de Congresso. Manaus, 2007. Disponível em
época, durante o trâmite http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/bh/jane_felipe_beltrao.
passou a sofrer violências pdf Acesso em 13.01.10.
l. Essas violências são tra- BORBA, L. A. Aspectos Relevantes do Histórico do Tribunal do Júri. Jus Navi-
to investigativo (IP), que gandi, Teresina, ano 6, n. 54, fev. 2002. Disponível em: http://jus2.uol.
genas de serem algozes de com.br/doutrina/texto.asp?id=2695 Acesso em 10.04.10.
va autoridade policial, es-
do constrangidos a verem BRASIL. Constituição Federal. Código Penal. Código de Processo Penal. Orga-
mãe natureza” importante nização por Luiz Flávio Gomes. 9 ed. São Paulo: RT, 2007.
mutilado, meramente para
BRASIL. Vade Mecum. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
ou infrutífera.
l falta de sensibilidade por CAPEZ, F. Curso de Processo Penal. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
versidade e a necessidade
nstrumental para repensar CARDOSO DE OLIVEIRA, R. Identidade étnica, reconhecimento e mundo
clusivo me faz crer firme- moral. Revista Antropológicas, ano 9, vol. 16 (2). Recife: Editora Univer-
cique Xicão caracterizou- sitária da UFPE, 2005.
o Xukuru, pois não foram ______. Identidade, Etnia e Estrutura Social. São Paulo: Livraria Pionei-
usos, costumes e tradições ra Editora, 1976.
prerrogativas Constitucio-
cional pluralista, além de CDDPH – Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana. Os
tivos, implica também o Xukuru e a Violência – Relatório da Comissão Especial, março/2004.

191
XUKURU DO ORORUBÁ

DANTAS, F. A. C. A Noção de Pessoa Jurídica e sua Ficção Jurídica: a pessoa REZENDE, G. M. Índio:
indígena no direito Brasileiro. Universidade do Estado do Amazonas: 2001.
SÁNCHEZ, E. Princípios
FAVOLE, A. Resti Di Umanità: vita sociale del corpo dopo la morte. Roma- ticia que se imparte entr
-Bari: Laterza, 2003a. adecuada, legítima y viab
sociedades particulares. I
______. Appropriazione, Incorporazione, Restituzione Di Resti Umani: NAL, C.;ARIZA, R. Ha
casi dall’ Oceania. In: Corpi. Annuario diretto da Ugo-Fabiette, anno 3, Adenauer Stiftung, 2008
nummero 3. Milano - Università Bicocca, 2003b.
______. El Peritaje Antrop
FIALHO, V. R. P. S. Associativismo, Desenvolvimento e Mobilização In- tropología Jurídica. Bogo
dígena em Pernambuco. In: ATHIAS, R. (org.) Povos Indígenas de Pernam-
buco: identidade, diversidade e conflito. Recife: Ed. Universitária da UFPE, SANTOS, C. M. Xucuru
2007. lutas pela terra-segurança
BEIRO, A. S. (org.) Pós-C
FOUCAULT, M. A Verdade e as Formas Jurídicas. 3 ed. 4 reimp. Rio de bra, 2007.
Janeiro: NAU Editora, 2008.
SANTOS, B de S. Por um
GEERTZ, C. O Saber Local: novos ensaios em antropologia interpretativa. 4 ed. nos. In: Boaventura de So
Petrópolis: Vozes, 2001. Janeiro: Civilização Brasil
IÑIGUEZ, L. Manual de Análise do Discurso em Ciências Sociais. Petrópolis: ______. Una Cartografia
Vozes, 2005) menos a una concepcíon posm
MISHLER, E. G. Narrativa e Identidade: na mão dupla do tempo. In: cas - Venezuela, noviembr
LOPES, L. P. M. Discursos de Identidades: discurso como prática de construção SCHRITZMEYER, A.
de gênero, sexualidade, raça, idade e profissão na escola e na família. Campinas: Júri. Tempo soc., São Pa
Mercado das Letras, 2003. http://www.scielo.br/sc
NEVES, R. C. M. Resistência e Estratégias de Mobilização Política entre -20702007000200004&
os Xukuru. In: ATHIAS, R. (org.) Povos Indígenas de Pernambuco: identida- 10.1590/S0103-2070200
de, diversidade e conflito. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2007. SOUZA FILHO, C. F. M
PALITOT, E. M. Tamain Chamou Nosso Cacique: a morte do cacique Xicão e Curitiba: Juruá, 2004.
a (re)construção da identidade entre os Xukuru do Ororubá. Monografia apre- ZAFFARONI, E. R. PIE
sentada no Curso de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba. sileiro: parte geral. 5 ed. S
Fevereiro, 2003.
PINTO, S. R. Reflexões sobre Pluralismo Jurídico e Direitos Indígenas na Amé-
rica do Sul. Revista de Sociologia Jurídica. N 06 – Janeiro-Junho/2008.

192
“Plantaram” Xicão

sua Ficção Jurídica: a pessoa REZENDE, G. M. Índio: tratamento jurídico-penal. Curitiba: Juruá, 2009.
tado do Amazonas: 2001.
SÁNCHEZ, E. Princípios básicos y formas de funcionamiento de la jus-
corpo dopo la morte. Roma- ticia que se imparte entre los Paeces y los Wayú como forma cultural
adecuada, legítima y viable para resolver conflictos y coaccionar a sus
sociedades particulares. In: HUBER, R; MARTINEZ, J.C.; LANCHE-
ituzione Di Resti Umani: NAL, C.;ARIZA, R. Hacia Sistemas Jurídicos Plurales. Bogotá: Konrad
da Ugo-Fabiette, anno 3, Adenauer Stiftung, 2008.
3b.
______. El Peritaje Antropológico como Prueba Judicial. VI Congreso de An-
vimento e Mobilização In- tropología Jurídica. Bogotá - Colombia: octubre, 2008.
Povos Indígenas de Pernam-
. Universitária da UFPE, SANTOS, C. M. Xucuru do Ororubá e Direitos Humanos Indígenas:
lutas pela terra-segurança e Estado no Brasil. In: SANTOS, B. S. e RI-
BEIRO, A. S. (org.) Pós-Colonialismos. Portugal: Universidade de Coim-
as. 3 ed. 4 reimp. Rio de bra, 2007.
SANTOS, B de S. Por uma Concepção Multicultural dos Direitos Huma-
pologia interpretativa. 4 ed. nos. In: Boaventura de Souza Santos (org.). Reconhecer para Libertar. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
Ciências Sociais. Petrópolis: ______. Una Cartografia Simbólica de las Representaciones Sociales: prolegró-
menos a una concepcíon posmoderna del derecho. Nueva Sociedad, n. 16, Cara-
mão dupla do tempo. In: cas - Venezuela, noviembre-diciembre, 1991.
o como prática de construção SCHRITZMEYER, A. L. P. Etnografia Dissonante dos Tribunais do
la e na família. Campinas: Júri. Tempo soc., São Paulo, v. 19, n. 2, Nov. 2007. Disponível em
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
Mobilização Política entre -20702007000200004&lang=pt. Acesso em 05.02.2010. DOI:
as de Pernambuco: identida- 10.1590/S0103-20702007000200004 .
a da UFPE, 2007. SOUZA FILHO, C. F. M. O Renascer dos Povos Indígenas para o Direito.
: a morte do cacique Xicão e Curitiba: Juruá, 2004.
Ororubá. Monografia apre- ZAFFARONI, E. R. PIERANGELI, J. H. Manual de Direito Penal Bra-
sidade Federal da Paraíba. sileiro: parte geral. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

Direitos Indígenas na Amé-


– Janeiro-Junho/2008.

193
XUKURU DO ORORUBÁ

S OBRE OS AUTORES MARIANA CARNE


Advogada, Mestre em
so Penal e Prática Penal na
IVSON FERREIRA Projeto Nova Cartografia S
cleo de Diversidade e Ident
Antropólogo – FUNAI/Recife e colaborador do Projeto Banco de Da-
dos/Atlas das Terras Indígenas do Nordeste - FUNDAJ/LACED/MN-UFRJ
RITA DE CÁSSIA M
LUCIANO MARIZ MAIA Antropóloga. Atualm
Procurador Regional da República na 5a Região (PE), mestre em Di- nambuco (UPE). Doutora e
reitos Humanos pela Universidade de Londres e doutor em Direito pela Uni- de Santa Catarina (2005). M
versidade Federal de Pernambuco (2006), com vivência e atuação na questão Sociais- NDIS/UPE e do N
indígena no nordeste e no norte do país, tendo também integrado a 6a Câ- e pesquisadora do Projeto N
mara (Índios e Minorias) da Procuradoria Geral da República. Professor de Tem experiência na área de
Direito Constitucional e Direitos Humanos na UFPB. na, atuando principalment
Performances e Festas.

LUIZ COUTO
SHEILA BRASILEIR
Deputado Federal pelo PT/PB. Membro da Comissão de Direitos Hu-
manos da Câmara dos Deputados. Relator de Comissões Parlamentares de Antropóloga. Mestre
Inquérito, incluindo CPI sobre a pistolagem no Nordeste do Brasil. Ex-pre- Bahia (1996). Atualmente
sidente da CDH da Assembléia Legislativa da PB. Experiência na questão Tem experiência na área d
indígena, na luta contra o crime organizado, e contra a pistolagem. gena. Atuando principalm
Kiriri.

MANOEL MORAIS
VÂNIA FIALHO
Professor de Direitos Humanos e Ciência Política do curso de Direito
pela Faculdade Maurício de Nassau. Leciona na Pós-Graduação em Direito Antropóloga. Atualm
Penal pela Faculdade Joaquim Nabuco. Mestre em Ciência Política e Cências Pernambuco (UPE) e Profe
Sociais pela Universidade Federal de Pernambuco. Ex-Coordenador do Mo- ação em Antropologia da
vimento Nacional de Direitos Humanos em PE (2001-2002 e 2008-2010). em Sociologia pela UFPE (
Signatário do PNDH3 e participante eleito das Conferências Nacionais de Social – núcleo de Pernamb
Direitos Humanos e Segurança Pública. Membro da Coordenação Executiva dades Sociais- NDIS/UPE
do GAJOP (Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares). /UFPE. Tem experiência n
sobre povos tradicionais, at
cidade, territorialização, po

194
“Plantaram” Xicão

MARIANA CARNEIRO LEÃO FIGUEIROA


Advogada, Mestre em Antropologia pela UFPE, Professora de Proces-
so Penal e Prática Penal na Faculdade de Olinda - FOCCA, Pesquisadora do
Projeto Nova Cartografia Social - núcleo de Pernambuco. Membro no Nú-
cleo de Diversidade e Identidades Sociais- NDIS/UPE.
r do Projeto Banco de Da-
NDAJ/LACED/MN-UFRJ
RITA DE CÁSSIA MARIA NEVES
Antropóloga. Atualmente é professora adjunta da Universidade de Per-
egião (PE), mestre em Di- nambuco (UPE). Doutora em Antropologia Social pela Universidade Federal
outor em Direito pela Uni- de Santa Catarina (2005). Membro no Núcleo de Diversidade e Identidades
vência e atuação na questão Sociais- NDIS/UPE e do Núcleo de Estudos sobre Etnicidade -NEPE /UFPE
ambém integrado a 6a Câ- e pesquisadora do Projeto Nova Cartografia Social – núcleo de Pernambuco.
da República. Professor de Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Etnologia Indíge-
FPB. na, atuando principalmente nos seguintes temas: Saúde Indígena, Educação,
Performances e Festas.

SHEILA BRASILEIRO
Comissão de Direitos Hu-
omissões Parlamentares de Antropóloga. Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal da
Nordeste do Brasil. Ex-pre- Bahia (1996). Atualmente é Técnica Pericial do Ministério Público Federal.
B. Experiência na questão Tem experiência na área de Antropologia , com ênfase em Etnologia Indí-
ntra a pistolagem. gena. Atuando principalmente nos seguintes temas: Faccionalismo, Índios,
Kiriri.

VÂNIA FIALHO
Política do curso de Direito
Pós-Graduação em Direito Antropóloga. Atualmente é Professora Adjunta da Universidade de
m Ciência Política e Cências Pernambuco (UPE) e Professora Colaboradora do Programa de Pós-Gradu-
o. Ex-Coordenador do Mo- ação em Antropologia da Universidade Federal de Pernambuco. Doutora
2001-2002 e 2008-2010). em Sociologia pela UFPE (2003), Pesquisadora do Projeto Nova Cartografia
Conferências Nacionais de Social – núcleo de Pernambuco. Membro no Núcleo de Diversidade e Identi-
da Coordenação Executiva dades Sociais- NDIS/UPE e do Núcleo de Estudos sobre Etnicidade -NEPE
zações Populares). /UFPE. Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase nos estudos
sobre povos tradicionais, atuando principalmente nos seguintes temas: etni-
cidade, territorialização, política indigenista e identidade étnica.

195

Vous aimerez peut-être aussi