Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
a resposta é simples:
‘petróleo é dinheiro’, mas não para os brasileiros.
31 de março de 2016
Amigo brasileiro, leia essa matéria importante para entender quem são vossos
reais inimigos.
São Paulo: Em novembro de 2009, The Economist põe o Brasil na capa. “Brasil
Takes Off” [Brasil decola], diz a manchete, sobre uma foto do icônico Cristo
Redentor, como se decolasse sobre o mar azul, feito uma nave espacial.
Prevendo que “o Brasil está a caminho de tornar-se a 5ª maior economia do
mundo, deslocando a Grã Bretanha e a França”, a revista dizia que a maior
economia da América do Sul deveria “tomar maior velocidade nos próximos
cinco anos, com a ativação dos campos de petróleo de mar profundo, e os
países asiáticos ainda famintos de alimento e minérios da vasta e dadivosa
terra do Brasil.”
Aquele não foi um bom ano para o Brasil. A economia patinava e centenas de
milhares de pessoas saíram às ruas em manifestações contra o governo,
pouco antes do início da Copa das Confederações da FIFA, para protestar
contra a corrupção e exigir melhores serviços públicos. A economia parecia
estar completamente paralisada.
Mas… O que deu errado entre 2009 e 2013? Como aconteceu de Rousseff,
que em 2010 a revista Forbes declarara a mulher mais poderosa do mundo,
virar, de repente, fraca e incompetente? Como aconteceu de a história do Brasil
passar, da esperança ao desespero, em tempo tão curto?
Enquanto Lula era detido e liberado, a tensão foi-se acumulando pelo país com
uma parte da sociedade brasileira – classe alta e de maioria branca –
celebrando a ação policial, enquanto a outra parte protestava contra o “golpe”.
O Brasil dividiu-se verticalmente no dia em que Lula foi detido.
História de golpes
Narrativa similar se repetiu nos últimos dias desde a detenção de Lula. Mas
muitos do governo vêem isso como conspiração. “O que está acontecendo no
país é uma conspiração nacional e internacional para destruir o PT e introduzir
no Brasil um modelo econômico como o atual (neoliberal) da Argentina” – disse
o veterano diplomata brasileiro Samuel Guimarães a repórteres, após Lula ser
detido pela polícia. “Isto é um golpe em andamento”.
Em todos os casos, o culpado pela queda dos presidentes foi a alta da inflação,
queda da renda e má administração da economia. Há um claro padrão nisso
tudo. Getúlio Vargas, criador da Petrobras como uma empresa estatal e que
deu direitos sociais aos pobres do país, foi acusado pela elite carioca, liderada
pelo conglomerado midiático, de corrupção que ele nunca cometeu. Em 1954,
pôs fim à humilhação pública ininterrupta com uma bala no peito.
Jânio foi substituído por João Goulart. Líder de centro com visões
progressistas, Goulart começou a implementar políticas de aumento salarial
para os trabalhadores, reforma agrária, direito ao voto para todos os brasileiros
e justiça social. Enquanto o governo brasileiro se dirigia levemente para a
esquerda, John F. Kennedy, o então presidente americano que ainda se
recuperava do infortúnio na Baía dos Porcos em Cuba, começava a discutir
com seus aliados as maneiras de tirar Goulart do poder.
Então, numa virada irônica de grande abalo para a Doutrina Monroe, um país
após o outro, começando pela Venezuela, depois Brasil, Argentina, Uruguai e
Chile elegeram governantes de esquerda. A América do Sul não era mais o
quintal de Washington.
Aécio estava certo de sua vitória após a revista Veja publicar uma matéria na
véspera do 2º turno das eleições em dezembro de 2014, alegando que o
doleiro Yousseff havia dito à polícia que Dilma e Lula sabiam da corrupção na
Petrobras. Mas mesmo assim, Aécio perdeu a eleição. Um mês após o início
do segundo governo Dilma Rousseff, em janeiro de 2015, Aécio iniciou o
pedido de impeachment, ainda tendo o artigo de Veja como “prova” da
cumplicidade da presidente com o escândalo.
O artigo, publicado sem nenhuma resposta de Lula e Dilma, não era exceção.
Os julgamentos da “Operação Lava Jato” estavam tanto na mídia quanto nas
cortes, com vazamentos regulares de acusações feitas em delações
premiadas. O magistrado de Curitiba, declaradamente influenciado pela
operação Mani Pulite da Itália, tornou-se cultuado pela classe média, com suas
fotos e frases espalhadas por revistas e jornais quase que diariamente.
Mas Moro, o juiz, também tem enfrentado críticas por suas táticas de manter os
acusados na prisão, sem fiança, e utilizando-se de acordos de delação
premiada para construir casos contra outros. Até o The Sunday Times de
Londres recentemente publicou artigo sobre o juiz brasileiro, questionando a
forma como ele conduz o caso.
O complexo judicial-jornalístico
Moro pareceu dar importância mínima a essas críticas, quando enviou a Polícia
à casa de Lula para prendê-lo. Apesar de o nome do ex-presidente aparecer
citado em incontáveis artigos que o dão como ligado ao escândalo, a verdade é
que, até hoje ninguém apresentou qualquer tipo de prova contra ele – nem em
tribunais nem em algum veículo de imprensa comercial. Além disso, o ex-
presidente jamais se recusou a cooperar com a investigação. Portanto, quando
Lula foi preso por mandato coercitivo assinado por juiz, muitos entenderam que
o juiz Moro pisara fora da linha. Um juiz da Suprema Corte brasileira, Marco
Aurélio Mello, criticou publicamente o juiz, porque “coerção só se aplicaria se
Lula tivesse sido intimado e se recusasse a depor, o que não aconteceu.”
Mas, mesmo com a tática dura de Moro, a detenção de Lula não saiu conforme
o script. Tão logo a notícia da prisão espalhou-se por São Paulo, começaram
as brigas a murros na calçada em frente ao prédio onde Lula mora. E a conta
do PT no Twitter lançou mensagem em que Lula era chamado de “preso
político”. Com as mídias sociais fervilhando de notícias sobre o “sequestro” de
Lula pela polícia, centenas de pessoas começaram a reunir-se pelas ruas em
São Paulo, gritando “Não vai ter golpe” [N. Quando já começavam a chegar
notícias de multidões mobilizadas em outras cidades do país, o ex-presidente
Lula foi deixado partir.] E dirigiu-se diretamente à sede do Partido dos
Trabalhadores, onde falou a uma multidão de ativistas e estudantes. “Mereço
mais respeito nesse país” – disse Lula, com ar cansado, mas resoluto. Na
mesma noite, Lula estava numa reunião de sindicalistas, onde disse que, sim,
pode candidatar-se à presidência em 2018. “Sinceramente, espero que tenha
outras pessoas para serem candidatas. Agora, uma coisa pode ficar certa: se
for necessário, eu vou para a disputa em 2018” – disse Lula a uma multidão
reunida para ouvi-lo, no centro de São Paulo.
Num país cuja população apresenta 50% de brancos, 11% apenas, com
formação universitária e menos de 6% classificados nos grupos de mais alta
renda, não é difícil entender quem, afinal de contas, manifestava-se nas ruas
contra o governo Rousseff. Praticamente todos ali eram representantes da elite
da sociedade brasileira: ricos, brancos e conservadores.
Poucos países viram, em toda a história, mudança social tão ampla, em tão
pouco tempo. Assim como os ricos explodiram em fúria nos tempos de
mudanças nos governos de Getúlio Vargas e João “Jango” Goulart,também
dessa vez as classes privilegiadas do Brasil estão furiosas contra o PT por dar
dinheiro diretamente às mães pobres, no programa Bolsa Família – que
inspirou o programa indiano Mahatma Gandhi National Rural Employment
Guarantee Act, MNREGA (Lei Mahatma Gahdhi de Garantia Nacional de
Emprego Rural).
Embora não haja prova de que os protestos antigoverno de 2013 tenham sido
arquitetados de fora, também ali, sem dúvida possível, a multidão era
indiscutivelmente ‘elite’. Pesquisa da Datafolha feita naquele momento mostrou
que 90% dos manifestantes eram brancos; 77% com formação universitária.
Desde 2013, todos os protestos contra o governo acontecem em áreas de
classe média rica, longe das áreas onde vive a maioria da população mais
pobre. Mas as mídias comerciais sempre falam da “indignação dos brasileiros”,
como se todos fossem igualmente ricos, ou igualmente pobres.
Nos anos Rousseff, a guerra tornou-se ainda mais suja. O massacre contra os
governos petistas sempre foi comandado pelo Grupo Globo, que inclui dúzias
de jornais, revistas, canais de TV e websites. O conglomerado, que tem
monopólio quase total sobre noticiário, entretenimento, futebol e carnaval,
sempre, historicamente, foi anti-PT. O grupo também apoiou ativamente o
golpe militar de 1964 e cresceu, com lucros gigantes, durante os 21 anos do
governo dos militares.
Mas o tom beligerante da TV Globo não caiu bem entre os brasileiros pobres e
das classes médias, e muitos já trabalham para boicotar a rede. Um dia depois
que o canal de TV do grupo exibiu a fita da conversa entre Lula e Rousseff, o
famoso ator brasileiro Wagner Moura, astro de Narcos em Netflix, distribuiu um
vídeo por sua página de Facebook, manifestando preocupação com o “circo
midiático” e a “agenda política” do Judiciário. “A mídia, claro, se examina o
passado, todos os grupos estiveram envolvidos no golpe de 64” – diz Moura no
vídeo.
Pode soar alarmista, mas há medo no ar, no Brasil, pelo modo como as coisas
vão-se desdobrando: medo pelo futuro da democracia e do Estado de Direito.
A disputa final
Como voz do Big Oil, The Economist põe o Brasil outra vez na capa, essa
semana. “Time to go” [Hora de sair], diz a revista, sobre uma foto de Dilma com
ar desolado. Repetindo o mesmo velho script de “má administração da
Economia”, a revista ‘exige’ a remoção, do governo, de uma governante eleita,
que recebeu seu mandato, de pleno direito, em eleições livres e justas,
ocorridas há menos de 15 meses.
25/3/2016, Shobhan Saxena,* de São Paulo, Br, para The Wire, Mumbai, Índia
http://thewire.in/2016/03/25/a-coup-is-in-the-air-the-plot-to-unsettle-rousseff-lula-and-
brazil-25893/
Nele se lêem opiniões de William Waack, em conversas com o Cônsul Geral dos EUA:
(C) O jornalista William Waack conversou detalhadamente com o [Cônsul Geral] CG São
Paulo, em recente fórum de negócios do qual participaram Serra, Rousseff, Neves e
Gomes. Segundo Waack, Gomes é o mais forte de todos; Neves, o mais carismático (sic),
Serra desligado mais claramente competente; e Rousseff a menos coerente”.
Fonte: Pravda.ru
https://dinamicaglobal.wordpress.com/2016/03/31/brasil-o-que-deu-errado-a-resposta-e-
simples-petroleo-e-dinheiro-mas-nao-para-os-brasileiros/