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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


FACULDADE DE HISTÓRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL DA AMAZÔNIA

MARCELO JOSÉ PEREIRA CARVALHO

AS LETRAS ESCARLATES:
REPRESENTAÇÕES E HISTÓRIAS DE SUICÍDIO EM BELÉM DO PARÁ: 1891-1920

BELÉM – PA
2012
MARCELO JOSÉ PEREIRA CARVALHO

AS LETRAS ESCARLATES:
REPRESENTAÇÕES E HISTÓRIAS DE SUICÍDIO EM BELÉM DO PARÁ: 1891-1920.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


graduação da Faculdade de História da
Universidade Federal do Pará (FAHIS/UFPA),
como exigência parcial para a obtenção do
título de mestre em História Social da
Amazônia.
Orientador: Dr. Aldrin Moura de Figueiredo
(FAHIS/UFPA)

BELÉM – PA
2012
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(Biblioteca de Pós-Graduação do IFCH/UFPA, Belém-PA)

Carvalho, Marcelo José Pereira


As letras escarlates : representações e histórias de suicídio em Belém do
Pará: 1891-1920 / Marcelo José Pereira Carvalho; orientador, Aldrin Moura
de Figueiredo. - 2012.

Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Pará, Instituto de


Filosofia e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em História
Social da Amazônia, Belém, 2012.

1. Belém (PA) - História - 1891-1920. 2. Suicídio - Belém (PA) -


História. 3. Suicídio - Belém (PA) - Cobertura jornalística. Título.

CDD - 22. ed. 981.15


MARCELO JOSÉ PEREIRA CARVALHO

AS LETRAS ESCARLATES:
REPRESENTAÇÕES E HISTÓRIAS DE SUICÍDIO EM BELÉM DO PARÁ: 1891-1920.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


graduação da Faculdade de História da
Universidade Federal do Pará (FAHIS/UFPA),
como exigência parcial para a obtenção do
título de mestre em História Social da
Amazônia.
Orientador: Dr. Aldrin Moura de Figueiredo
(FAHIS/UFPA)

Data de aprovação: 20/12/2012.


Banca examinadora:

_________________________________
Dr. Aldrin Moura de Figueiredo (orientador)

_________________________________
Dr. Márcio Couto Henrique (FAHIS/IFCH/UFPA)

_________________________________
Dra. Valéria Augusti (FALE/ILC/UFPA)
AGRADECIMENTOS

No momento da finalização desta dissertação, um ciclo se encerra na vida deste


pesquisador. É quando se dever olhar ao próprio passado recente e ter o prazer de agradecer a
todos que, material e/ou moralmente, colaboraram em todas as fases de sua elaboração –
desde a escolha do tema até os acertos finais do texto produzido, passando pela lenta e
instigante fase da pesquisa junto às fontes. Em especial, os agradecimentos e a mais sincera
estima, eu os envio para:
Meus queridos pais, José Narciso de Carvalho e Ermelinda Joaquina Pereira Carvalho,
por terem me dado o dom da vida, e me ensinado que os sonhos devem ser conquistados;
Minha irmã, Ma. Marcia Goretti Pereira de Carvalho, pelo suporte de sempre e amor
fraternal até o fim de nossas vidas;
Meu sobrinho, José Afonso Carvalho Pacheco, que nasceu no período da pesquisa e foi
minha maior inspiração para nunca desistir e seguir em frente;
Meus amados Alessandro Dantas Gonçalves e Fabíola Rocha Bueno, por acreditarem no
meu trabalho e sempre colaborarem no que estivesse ao seu alcance;
Meus queridos Luiz Eduardo Burlamaqui e Darialva Vieira, pela acolhida com que fui
recebido na cidade do Rio de Janeiro, fazendo das minhas estadas e das minhas pesquisas
junto à Biblioteca Nacional e aos sebos cariocas momentos inesquecíveis;
A coordenação do programa de pós-graduação em História Social da Amazônia, aqui
representada pela competente Lílian Lopes, pela condução dos trabalhos e pela paciência para
com este discente;
Meus já saudosos colegas do curso de Mestrado em História Social da Amazônia, aqui
representados por Raimundo Nonato de Castro, pela troca de experiências, de informações e
de materiais, mostrando que a pesquisa historiográfica pode – e deve – ser pautada pelo
compartilhamento e pela solidariedade;
Os professores que ministraram as disciplinas nos programas de pós-graduação em
História Social da Amazônia e em Letras – Dra. Magda Maria de Oliveira Ricci, Dr. Márcio
Couto Henrique, Dra. Valéria Augusti e Dra. Tânia Maria Sarmento-Pantoja – pelas valiosas
informações que contribuíram para a condução metodológica do trabalho;
Dra. Netilia Seixas, por me mostrar um pouco do universo e das terminologias próprias
da imprensa;
Os funcionários da Fundação Biblioteca Nacional (BN), em especial a todos da Divisão
de Informação Documental (DINF), que sempre se mostraram competentes e solícitos no seu
dever funcional de prestar as informações necessárias aos usuários;
Os funcionários da Biblioteca Pública Arthur Vianna, da Fundação Cultural do Pará
Tancredo Neves (CENTUR), pelo trabalho e pela dedicação à missão dessa instituição,
fazendo-a referência na disseminação da informação sobre o passado paraense; e
Meu orientador, Dr. Aldrin Moura de Figueiredo, por sua visão peculiar da produção
historiográfica, que nos faz aceitar desafios rumos a novas perspectivas, e por me iniciar no
universo da história da arte.
Agradeço também a todos que, durante esse período, proporcionaram-me momentos de
adversidade e de provação: o que não nos mata, acaba nos fortalecendo.
Pactum serva.
Ophelia drowned in the water
Crushed by her own weight.
(KILCHER, 1998)

Tudo é mentira! O Gozo é uma chimera!


Vida - - és mephistophelico sarcasmo;
Morte - - és o Abrigo que minha alma espera!
(RIBEIRO, 1901, p. 1)
RESUMO

Os periódicos foram os principais meios de divulgação dos suicídios cometidos em Belém do


Pará na virada do século XIX para o XX. Por motivos ligados à própria lógica empresarial
que ganhava espaço na imprensa belenense, os jornais diários e noticiosos deram visibilidade
à ocorrência das práticas suicidas, e se apropriaram da morte voluntária como tema para os
mais variados fins: políticos, comerciais etc. Os registros oficiais, por sua vez, escamoteavam
a ocorrência dos suicídios na cidade, em função do próprio estigma que, há séculos, permeia o
ato e quem o pratica. Desse modo, este trabalho utilizou os jornais como principais fontes
com o objetivo pré-determinado de estudar a historicidade do suicídio em Belém entre os anos
de 1891 a 1920, seja no nível das suas representações, como também na construção de uma
outra memória que permita identificar aspectos que caracterizem modos, motivos e espaços de
se matar em uma cidade amazônica. Memória essa que, confrontada com a que foi
solidificada pela historiografia em torno dos míticos tempos da belle époque, também abre
perspectivas de análises futuras sobre um período ainda muito a ser debatido. Os resultados
desta pesquisa revelaram a coexistência da crença e da descrença no mesmo progresso e nos
rumos da civilização, tendo a Grande Guerra de 1914-1918 como maior quebra de
paradigmas. Com o olhar voltado aos espaços públicos e privados da cidade, percebeu-se o
quanto, na Belém daquele período, também era possível o transitar dos desesperados no meio
da multidão, daqueles cuja identidade e drama pessoal eram colocados à leitura pública pelos
jornais, e cuja vontade de autodestruição preocupava e desafiava as autoridades médicas,
judiciais e religiosas.
Palavras-chaves: Belém, Imprensa, Suicídio
ABSTRACT

The newspapers were the main way to divulge the suicides committed in Belém, state of Pará,
in the turn of the nineteenth century to the twentieth century. For reasons related to the proper
business view which had a special place in the press of Belém, the daily and newsy papers
gave visibility to the occurrence of suicides, and they appropriated the voluntary death as a
theme to various purposes: politics, business and others. The official registers hid the
occurrence of suicides in the city because of the taboo which, along centuries, existed in the
act of suicide and against the person who practiced it. Because of this, this research used the
newspapers as the main source, with the pre-determined goal, to study the historicity of the
suicide in Belém between 1891 and 1920, in the level of its representations as well as in the
construction of another memory that permits to identify the aspects which characterize the
manners, the causes and the space of committing suicide in an Amazonian city. This memory,
compared to one solidified by the historiography in the mythical times of belle époque, also
opens perspectives of future analysis about a historical period that still needs to be discussed a
lot. The results of this research reveal the co-existence of the beliefs and the disbeliefs in the
same progress and in the paths of the civilization, having the First World War (1914-1918) as
the greatest break of paradigms. Looking into the public and private spaces of the city, it has
noticed that, in Belém at that time (belle époque), it was also possible to observe the presence
of the desperates among the people, the ones whose identity and personal drama were
published in the newspapers read by everybody and their will of killing themselves worried
and challenged the medical, judicial and religious authorities.
Keywords: Belém, Press, Suicide
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Imagem 1 – O jornal no cotidiano da vida urbana ............................................................... 28


Imagem 2 – Anúncio da apresentação do “Homem Suicida” .............................................. 35
Imagem 3 – Anúncio da água Superaris .............................................................................. 38
Imagem 4 – Anúncio do filme O Inferno no cinema Olympia ............................................ 40
Imagem 5 – Aspectos do cotidiano da Grande Guerra para as crianças .............................. 45
Imagem 6 – Anúncios comerciais em tempos belicosos ..................................................... 47
Imagem 7 – O cônego Andrade Pinheiro ............................................................................ 50
Imagem 8 – Anúncio de missa para a alma de um suicida .................................................. 56
Imagem 9 – A Belém das Casas Leão da América .............................................................. 77
Imagem 10 – Anúncio do consultório do Dr. Raymundo Faria .......................................... 88
Imagem 11 – Em dois momentos, o mesmo Alfacinha ....................................................... 92
Imagem 12 – Le Suicidé (1877-1881), de Manet ................................................................ 94
Imagem 13 – Os suicidas portugueses: Um drama de amor ................................................ 100
Imagem 14 – Representações do Parque Affonso Penna .................................................... 103
Imagem 15 – Fim de Romance (1912), de Antônio Parreiras ............................................. 109
Imagem 16 – Anúncios de revólver na Folha do Norte ...................................................... 113
Imagem 17 – Frascos contendo verde-Paris ........................................................................ 119
Imagem 18 – O suicídio simbólico de Antônio Lemos ....................................................... 125
Imagem 19 – Entre o ar e as águas: vistas de Belém do início do século XX ..................... 128
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO: À GUISA DE EDITORIAL ................................................................... 10


1 SENSAÇÕES SUICIDAS: O SUICÍDIO PRESENTE NAS PÁGINAS DE JORNAIS
NA BELÉM DA VIRADA DO SÉCULO XIX PARA O XX ........................................ 19
1.1 O confronto entre os jornais e as estatísticas sociais: a visibilidade e a ocultação do
suicídio moderno .......................................................................................................... 20
1.2 Suicídios para fazer rir e vender: A morte voluntária tratada sob a perspectiva do
humor e a sua relação com os anúncios de publicidade ............................................... 30
1.3 A morte do futuro ou o futuro da morte: O debate em torno do suicídio na imprensa
belenense na virada do século XIX para o XX: Ambiguidade e polêmica .................. 39
1.4 Entre o diagnóstico e a terapêutica: Ordem médica, representações do suicídio e
liberdade de expressão na imprensa belenense na virada do século XIX para o XX .. 61
2 A CIDADE SUICIDA: AS PRÁTICAS DE SUICÍDIO NA BELÉM DA VIRADA
DO SÉCULO XIX PARA O XX .................................................................................... 73
2.1 O suicídio e o processo civilizatório na Belém da Belle Époque ................................. 74
2.2 O suicídio na ordem da sociedade belenense da borracha: Pela demarcação dos
vivos, a diferenciação entre os suicidas ....................................................................... 83
2.3 Entre os espaços públicos e privados: A cartografia do suicídio na Belém da virada
do século XIX para o XX ............................................................................................. 93
2.4 Da tradição às novidades do progresso: Os meios de suicídio utilizados pelos
suicidas na Belém da virada do século XIX para o XX ............................................... 104
CONSIDERAÇÕES FINAIS: A FACE OCULTA DA LUA .......................................... 134
LISTA DE FONTES – PERIÓDICOS ............................................................................... 136
LISTA DE FONTES – OBRAS DE REFERÊNCIA ......................................................... 146
LISTA DE FONTES – DOCUMENTOS OFICIAIS ......................................................... 148
LISTA DE FONTES – ICONOGRAFIA ........................................................................... 151
LISTA DE FONTES – FILMOGRAFIA ........................................................................... 152
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 153
10

INTRODUÇÃO: À GUISA DE EDITORIAL

Era a manhã de 3 de outubro de 1900, a poucos meses da mudança do século XIX para
o XX. Os principais jornais diários de Belém do Pará estavam à venda nas ruas da cidade, por
menores jornaleiros com seus pregões sobre os recentes fatos que chamariam a atenção do
público leitor local. Os jornais também podiam ser adquiridos nas suas próprias redações, ou
serem enviados diretamente às residencias daqueles com quem mantinham o velho sistema de
assinaturas. Naquele dia em especial, certamente deve ter causado sensação a todos o caso
ocorrido no decorrer dos dois dias anteriores, de um duplo suicídio na capital, que tanto a
Folha do Norte como A Província do Pará – os maiores (e rivais) jornais diários1 que traziam
notícias variadas sobre o cotidiano da cidade – não tardaram em publicar, pelos padrões de
rapidez da época. O casal de espanhóis Henrique Bosch y Barras e Julia Gonzales, chegados a
Belém há apenas três meses, cumpriram pacto de morte. Não encontrando o sucesso
financeiro que almejavam, e por contraírem dívida – mesmo que de pequena monta – junto à
hospedagem em que se achavam instalados, eles tanto premeditaram como colocaram em
prática o seu plano suicida. Na noite de 1º de outubro de 1900, ambos se lançaram às águas da
Baia do Guajará, que banham a costa oeste da capital paraense, amarrados um ao outro.
Notícias como essa não eram estranhas às folhas diárias dos jornais de Belém naquela
transição de séculos, como também as de outras capitais e cidades brasileiras. No caso
específico da tragédia local desse casal de espanhóis, ressalta-se que pequena nota, a ela
alusiva, também foi registrada na primeira página do jornal paulistano O Diario Popular, de
22 de outubro de 1900. Esse fato fornece dois indícios: a circulação das notícias entre os
jornais, possível em nível nacional; e, principalmente, a recorrência do tema do suicídio como
objeto de leitura diária nas cidades brasileiras.
A comunicação entre as redações dos jornais era facilitada pelas melhorias técnicas de
comunicação operadas ao longo do século XIX, dentro do processo maior de “circulação

1
A Provincia do Pará (1876-1900 e 1901-1912, as duas primeiras fases) e a Folha do Norte (1896-1974)
mantiveram relações amistosas até o rompimento entre o Partido Republicano e o Partido Republicano Federal
a partir de 1899, já endurecendo os embates no ano seguinte pelas eleições para a sucessão do governo
estadual. Desde então, os grupos políticos se polarizaram: os lauristas, tendo à frente o senador Lauro Sodré
chefiando o Partido Republicano Federal, e representados na imprensa pela Folha do Norte; e os lemistas,
liderados pelo então intendente de Belém, senador Antônio José de Lemos, figura de proa do Partido
Republicano, e representados por A Provincia do Pará. Na década de 1910, com a deposição de Lemos da
intendência da capital, a perda do poder político dos lemistas e o incêndio que paralisou as atividades de A
Provincia do Pará por quase oito anos (tudo em agosto de 1912), a rivalidade política passou a ser travada
entre a Folha do Norte, fiel aos ideais lauristas e o recém fundado Estado do Pará (1911-1961), que apoiava o
governo estadual de 1913-1916 de Enéas Martins (BORGES, 1986; ROCQUE, 1968).
11

mundial dos impressos”, que Abreu (2011, p. 115) também chamou de “globalização da
cultura”. Nele, o telefone e o telégrafo, em especial, colocavam-se ao lado das tradicionais
correspondências, a serviço de um novo modelo de imprensa, cujo caráter empresarial já
ganhava contornos bem definidos. Os jornais de Belém deixavam de ser apenas as folhas
comerciais ou a panfletagem política do período imperial, conforme testemunho prestado por
Paulino de Brito (1900). As novas tecnologias de impressão, cuja melhor representação era
expressa pela aquisição das máquinas rotativas Marinoni2, facilitou o barateamento do custo
dos exemplares, aliado à própria mudança na logística de sua distribuição diária. O preço do
exemplar diário avulso indicava não somente a sua venda nas ruas da cidade, como também a
abertura dos jornais locais ao grande público.
No novo ambiente das prensas diárias, em especial na virada do século XIX para o XX,
em que Meyer (1996, p. 98) identificou a formação de um “novo jornalismo de massa”, o
suicídio se constituiu em um dos objetos prediletos para servir de mote ao noticiário impresso.
Momento esse em que os dramas do cotidiano – ou o universo de certo submundo citadino –
passaram a ser expostos com mais intensidade ao leitor comum, para lhes dizer “como eram
os lugares e gentes que [em princípio] ele não freqüentava”, porém de um modo
completamente estetizado (PESAVENTO, 2010, p. 448). As notícias sobre os atos suicidas,
ocorridos na Belém da época, transformavam-se em relatos do extraordinário, marcados por
um profundo sentido moralizante, em que os valores da época eram expressos para indicar ao
leitor o limite entre o certo e o errado.
Em termos de se trabalhar com o tema da morte voluntária, como objeto histórico no
final do século XIX e no início do XX, recorrer às páginas desses velhos jornais se torna, para
além de uma possibilidade, quase que um imperativo, diante dos problemas de ordem
metodológica que se impõem. Para Semler (1998, f. 21), “a ‘realidade’ histórica do suicídio
[...] constitui terreno bastante escorregadio para o historiador”. Acompanhando o estigma
secular que recai sobre o suicídio, as fontes possíveis que lhe dizem respeito se restringem. A
própria Semler (1998, f. 20) toca no ponto central desse problema: sendo “tabu supremo da
civilização ocidental”, os sobreviventes do ato3 procuravam (como ainda procuram) ocultar da

2
O tipógrafo francês Hippolyte Marinori, diretor do famoso jornal noticioso francês Le Petit Journal, em 1883
aperfeiçoou as rotativas, então existentes, para um novo maquinário que aumentou o número das tiragens
diárias a um baixo custo (MEYER, 1998). Na imprensa belenense, foi a redação de A Província do Pará quem
teria introduzido o uso das máquinas Marinori (PARÁ, 1908a), sendo paulatinamente seguida pelos demais
jornais da cidade.
3
O termo “sobreviventes” será usado intencionalmente neste trabalho, embora anacrônico, para designar as
pessoas com quem o suicida se relacionava em vida, e as testemunhas do ato suicida. Esse termo é aplicado
nas discussões psiquiátricas contemporâneas sobre o suicídio, no tocante ao processo de “elaboração do luto”
após a ocorrência do fato (CASSORLA, 1998, p. 23-24).
12

sociedade a sua prática, no mesmo movimento de negação da própria morte em si,


desnaturalizando-a, em um dos aspectos analisados por Volvelle (1997) sobre o luto moderno
e burguês. A escamoteação da verdadeira causa mortis se revela mais que hipótese, e Corbin
(2003, p. 593) mostrou-se cético quanto ao crédito de veracidade a ser dado aos depoimentos
de familiares ou à palavra final das autoridades francesas do século XIX: “tendem a adocicar
os fatos, manipulam os testemunhos, suprimem as fontes”.
No caso específico de Belém, tem-se que os processos judiciais ou de investigação
policial, assim como as estatísticas oficiais se mostram em quantidade diminuta, e mesmo sem
constituir em série regularmente estabelecida ou preservada, frente ao recorte temporal
considerado na pesquisa, que vem a ser a última década do século XIX e as duas primeiras do
XX: basicamente de 1891 a 1920. Assim, compromete-se qualquer execução de um projeto de
história totalizadora a partir da análise de dados seriais e quantitativos, mesmo que esse viesse
a ser a opção historiográfica desta pesquisa.
Entretanto, nesse mesmo período, muito havia sido analisado e, em especial, debatido e
lido sobre o suicídio. Este exercia o seu fascínio, seja pela polêmica das posições; seja pela
preocupação dos saberes médico, jurídico e sociológico em diagnosticá-lo e tratá-lo como
problema nas suas respectivas áreas; e seja pela exploração de seu caráter de sensacional, em
função do próprio estigma que o marca. A morte voluntária foi tema de trabalhos acadêmicos,
de obras de referência, e até mesmo de artigos, de editoriais e de notícias publicadas nas
folhas diárias dos centros urbanos naquela virada do século XIX para o XX. Os periódicos
procuravam, a sua maneira narrativa, manter o diálogo com todos aqueles saberes quanto ao
trato sobre o suicídio e, como considera Semler (1998, f. 56), os jornais constituíram “o
principal veículo de familiarização do suicídio aos olhos do [grande] público”.
O recorte temporal considerado para este trabalho se justifica por ter sido período
especial no desenvolvimento da imprensa belenense e, através desse fato, na formação de uma
opinião pública de maior amplitude, e que impactou na construção das representações sobre a
prática do suicídio. Na virada do século XIX para o XX, a imprensa figurava como um dos
símbolos do que se havia de moderno e de civilizado em uma sociedade. Entre 1891 a 1918,
foram catalogados em torno de quinhentos e sessenta e sete periódicos (entre revistas, anais,
boletins e jornais) lançados ou já em circulação apenas na capital paraense4. Desse montante,

4
Esse montante foi calculado com base nos catálogos organizados por Manoel Cardozo Barata (para os anos de
1822 a 1908), e por Theodoro Braga (para os anos de 1908 a 1918), respectivamente publicados na Revista do
Instituto Historico e Geographico Brazileiro de 1908, e na Revista do Instituto Historico e Geographico do
Pará de 1920.
13

trezentos e trinta e um periódicos vieram à luz em Belém no período de 1908 a 1918. Tais
números são indicativos certos da efervescência presente no meio jornalístico paraense,
mesmo com o início da crise da economia gomífera sofrida à época, e também sinalizam para
a importância que a população de Belém dava “à informação e aos debates veiculados na
imprensa” (FIGUEIREDO, 2005, p. 248).
Desse modo, reconhece-se o necessário recurso aos periódicos, da mesma forma que à
literatura e às memórias, os chamados “traços indiretos” do suicídio (SEMLER, 1998, f. 21).
Por outro lado, essa opção pelo uso dos jornais, como fonte privilegiada ao estudo do suicídio,
não se deu exclusivamente por tais razões de ordem metodológica. Em hipótese alguma os
mesmos foram considerados fontes residuais (as que restaram para se trabalhar). Antes,
reconheceu-se a riqueza e o valor das histórias e das representações neles contidas que, desse
modo, colocam-se à disposição para pesquisas que se abrem a novas perspectivas e
possibilidades.
Considerações especiais devem ser feitas quanto ao uso proveitoso dos jornais
(periódicos no geral) como fonte histórica. Há muito que os historiadores deixaram de encarar
as notícias neles impressas como simples “imagens parciais, distorcidas e subjetivas” na busca
necessária pelo real (LUCA, 2010, p. 112). Em se tratando do suicídio, aliás, não há como
exigir objetividade absoluta em qualquer das fontes disponíveis, conforme já visto. Por outro
lado, os jornais não podem ser tomados como “meros receptáculos de informações” a serem
manipulados como a confirmar hipóteses levantadas em pesquisa (LUCA, 2010, p. 116). Os
vários sentidos e significados com que a prática do suicídio se mostra nas notícias e nos
artigos dos jornais analisados – da condenação à pretensa apologia; da tragédia lamentada à
possibilidade de redenção (para os tipos desviantes da sociedade) – indicam o quanto essas
representações devem ser problematizadas ao invés de apresentar certezas.
Os trabalhos acadêmicos produzidos nacionalmente5 demonstram que as abordagens
historiográficas sobre o suicídio vêm se firmando no ambiente das Universidades brasileiras.
Muitas dessas produções também sinalizam que o uso dos jornais e da literatura, como fontes
históricas, propiciou chegar a tais abordagens: Fabio Lopes, com os jornais campineiros do
século XIX; Susan Semler, com a literatura naturalista norte-americana do século XIX; e
Valéria Guimarães, com o jornal paulistano O Estado de São Paulo da década de 1910.

5
Referem-se, principalmente, à dissertação de mestrado e à tese de doutorado de Fábio Henrique Lopes, pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); à dissertação de mestrado de Jackson André da Silva Ferreira
(2004), pela Universidade Federal da Bahia (UFBA); e às teses de doutorado de Susan Anne Semler (1998) e
de Valéria dos Santos Guimarães (2004), ambas pela Universidade de São Paulo (USP).
14

Nessas experiências, evidencia-se o forte debate, presente nesses impressos (na busca de
referências), com tradições filosóficas e teológicas, e com saberes e práticas científicas, em
especial, as ciências médicas e suas especializações (como a psiquiatria), que ganhavam corpo
na sociedade e espaço nos jornais, definindo os limites da normalidade. Figueiredo (2005, p.
246) também observou o inevitável diálogo das redações dos jornais com a sociedade em que
estavam inseridos, o que garante a cada edição diária de jornal, a cada notícia publicada,
historicidade e “significados e sentidos próprios”.
Esse diálogo, por sua vez, fazia-se à maneira própria do corpo de redatores. Entre eles,
havia profissionais liberais que faziam dos blocos de papéis e das prensas tipográficas a sua
segunda ocupação, e também se identificaram os literatos6. O uso de referências a cânones da
literatura ocidental era frequente, como o “monstro dos olhos verdes” que designou o móvel
da tentativa de suicídio da popular Francisca Maria do Nascimento, conforme notícia da
Folha do Norte de 5 de dezembro de 1905, e serviu de condutor de tantos outros dramas
passionais publicados no mesmo jornal do período (ENVENENADA..., 1905, p. 1)7.
As notícias que levavam ao conhecimento público os casos de suicídios exploravam o
sensacional não apenas pelo tema escolhido, mas pelas formas e pelos recursos narrativos
então empregados. O termo francês fait divers (fatos diversos) acabou sendo aplicado a
designar essas narrativas no geral, e remete ao “relato romanceado do cotidiano real”
(MEYER, 1996, p. 94). Observa-se que as notícias sobre as ocorrências de suicídio não se
tratavam de descrições frias e diretas dos fatos ocorridos – como hoje se pretende atribuir ao
discurso e à técnica jornalísticos. Eram, na sua maioria, narrativas carregadas de efeitos
melodramáticos e de tons coloquiais – que garantiam a sua fácil compreensão e rápida leitura
–, mas marcadas por um fundo moralizante. Algumas dessas notícias assumiam mesmo a
estrutura de fábulas. Os fait divers se prestavam a elevar à potência máxima o absurdo e o
extraordinário de ocorrências trágicas ou que deveriam estar longe da ordem estabelecida,
como o suicídio, à maneira dos velhos folhetins.
Segundo Meyer (1996, p. 100), o uso dessas formas narrativas visava aproximar, ou
melhor, envolver o leitor na própria tragédia descrita. Não de outro modo, percebe-se o grau
de pormenorização com que se revestiam as notícias sobre práticas de suicídio,
principalmente quanto aos que seriam os últimos momentos de vida do suicida. Essa

6
Jornais da época, como a Folha do Norte, contavam com escritores vindo de associações literárias locais como
a Sociedade Mina Literária (1895–1899) (AZEVEDO, 1918).
7
Referência ao diálogo entre os personagens shakespearianos Iago e Otelo sobre o poder do ciúmes: Iago
declarou ao protagonista: “Ó meu senhor, tomai cuidado com o ciúme! É o monstro de olhos verdes que se
diverte com a comida que o alimenta!” (SHAKESPEARE, 1995, p. 745).
15

estratégia narrativa acabou por dar a essas notícias interessante tom ficcional, principalmente
quando o ato era praticado, na maioria das vezes, sem a presença declarada de testemunhas.
Nesse sentido, percebe-se que os fait divers já eram reconhecidos no próprio universo da
imprensa no início do século XX, como estilo de produzir notícias que se vulgarizou, e
justamente no limite entre o fato real e o ficcional. Questões ligadas à própria verossimilhança
e à credibilidade das notícias de sensação publicadas eram postas em debate. Afranio Peixoto,
de modo provocativo, inverteu os papéis entre a realidade e a ficção, segundo artigo publicado
no carioca O Jornal, de 15 de junho de 1929, declarando que:

A realidade tem sobre a ficção vantagem inapreciavel: póde ser inverosímil.


Se a invenção é limitada [...] é infinita a realidade. Por isso, em vez de lêr os
romances dos outros, diverte-me o noticiario, os casos, “fait divers” dos
jornaes, que têm novidade e, às vezes “humour”.

Houve, no decorrer da pesquisa, a cautela e a prudência necessárias em reconhecer, nos


fait divers impressos nos jornais da cidade, o balançar constante da fronteira tênue que separa
o verdadeiro do fictício. O que nos leva a reconhecer as limitações próprias dos jornais como
fontes históricas, mas que não os invalidam. O trânsito pela narrativa ficcional não foi motivo
de maiores preocupações desta pesquisa. Ginzburg (2007) não descarta o valor científico da
narrativa histórica, quando esta se aproxima da ficcional. O historiador italiano, pelo
contrário, considera tal relação como “contenda pela representação da realidade”, em que o
conflito se faz presente, mas pleno de “desafios, empréstimos recíprocos e hibridismo”, em
que se chega ao real, pelo menos, nas suas possibilidades, através dos fragmentos deixados,
mesmo que involuntariamente, no “rastro” das narrativas (GINZBURG, 2007, p. 9-11). Desse
modo, há algo de verossímil nas notícias sobre os suicídios, de modo a torná-las críveis ao
leitor, e por onde se pode compreender, no limite, os valores e as percepções de mundo
daquele ambiente urbano em que se conformava Belém na virada do século XIX para o XX
(FIGUEIREDO, 2005).
Guimarães (2004) chegou a mapear o movimento tomado pelas notícias em fait divers
entre a diagramação e as folhas dos jornais paulistanos, neles reconhecendo a influência do
estilo narrativo folhetinesco. De início, esses fait divers se situavam às margens dos folhetins,
geralmente na primeira página dos jornais, e depois lhes passaram a fazer concorrência pelo
destaque, até migrarem às últimas folhas. No caso dos jornais belenenses, houve a constância
das notícias de sensação como matérias de primeira ou (no máximo) de segunda página,
ocupando, por vezes, grandes espaços nas colunas. Nesse sentido, De Luca (2010, p. 139) já
16

assegurou que “a imprensa periódica seleciona, ordena, estrutura e narra, de uma determinada
forma, aquilo que se elegeu como digno de chegar até o público”. Essas questões, portanto,
relacionadas ao que se tornou notícia e ao destaque que lhe foi conferido no corpo dos jornais,
proporcionaram às notícias de sensação pesos e sentidos diferenciados. Do mesmo modo,
lançam-se possíveis interpretações de análise quanto às intenções e às intervenções de ordem
editorial dos jornais belenenses da época, que acabaram construindo dada representação sobre
a competência e as expectativas, sejam sociais ou estéticas, esperadas do seu respectivo
público leitor (CHARTIER, 1995).
As notícias sobre os suicídios praticados não somente em Belém, mas em qualquer parte
do mundo, não foram postas à leitura naturalmente, assim como todo texto não existe por si,
como abstração. Essa constatação, um tanto quanto óbvia, foi necessária para desenvolver a
pesquisa. Segundo Chartier (2010), qualquer texto não reflete imediatamente a sua própria
realidade social, pois cada obra, impressa ou manuscrita, foi concebida com regras,
referências, modelos e intenções que a regulam. Essa preocupação em discutir a materialidade
dos suportes dos textos, leva ao reconhecimento, no caso dos jornais, do “lugar social da
imprensa”, que não pode ser desprezado (LUCA, 2010, p. 132). Para a diagramação e a
dimensão próprias de cada jornal de Belém da virada do século XIX para o XX, até mesmo
para a qualidade (ou a falta desta) do papel utilizado e de sua impressão, houve práticas
diferenciadas de leitura, o que implicou na produção dos sentidos sobre as representações
construídas.
O reconhecimento de que as mesmas notícias sobre suicídio podiam ser apropriadas por
vários segmentos sociais, principalmente em se tratando de jornais em circulação pública8, faz
partir dos textos para se chegar às possíveis “comunidades de leitores”, que não passam pela
simples clivagem em função da renda – ou mesmo do nível geral de alfabetização9 –, mas de
outras diferenciações sociais válidas (CHARTIER, 1991, p. 180-181). Compreender a
diversidade, no conjunto maior dos leitores de Belém, ajuda a identificar diferentes formas de
interação com todas essas notícias sobre o suicídio, entre os médicos, os religiosos, os

8
Em relação a esse aspecto, é interessante observar dada representação, presente em pequena nota do Diario de
Noticias de 7 de junho de 1891, sobre a forma de circulação dos jornais entre a população de Belém ao final do
século XIX, em que, à base também de empréstimos, as folhas diárias chegavam a um horizonte mais amplo
de leitores: “um assignante, verbi gratia, dá jornal para 20 ou 40 pessoas lerem. Este facto da filagem é muito
commum entre nós.” (É..., 1891, p. 2, grifo do autor).
9
Segundo Meyer (2005, p. 55), ainda no início do século XX persistiam “situações comunitárias de leitura” para
o proveito geral de “um público só em parte alfabetizado”. A pesquisa não trabalhou com os indicadores
relativos às taxas de alfabetização do período, por entender que, por si só, são insuficientes para compreender
as competências de leitura dos habitantes de Belém.
17

populares, os homens e as mulheres, os jovens e os velhos de Belém daquele período,


estivessem ávidos, ou não, pela leitura de fait divers.
Reconhecer na materialidade do ato de ler, na sua inscrição no espaço, na relação dos
leitores consigo e com os outros (CHARTIER, 1991) leva a pensar sobre a operação das
representações dos suicídios, contidas nos textos, na vida pública da cidade. Capelato e Prado
(1980 apud LUCA, 2010, p. 118) percebem o jornal “como instrumento de manipulação de
interesses e de intervenção na vida social”. No caso das notícias de suicídio veiculadas nos
periódicos, abriu-se o campo para o debate e para a disseminação de valores e de saberes, em
especial o discurso médico que por elas perpassava, em um projeto implícito de modernização
do espaço urbano, em que os suicidas – e todas as anomalias e desvios a eles associados – não
tinham lugar.
Chartier (1991, p. 177, 183) entende que as representações coletivas são matrizes para
as práticas sociais, e fazem com que os indivíduos e os grupos dêem “sentido ao mundo que é
o deles”. Assim, as representações estão próximas do real, a procura do qual – ou pelo menos
próximo – o historiador realiza seu ofício. No embate das representações colocadas nas
notícias sobre as práticas de suicídio nos jornais de Belém, na virada do século XIX para o
XX, estabeleceu-se o debate maior sobre o direito humano de se dispor da própria vida, e
sobre o próprio direito de se estabelecer tal debate, visando ao “ordenamento, logo a
hierarquização da própria estrutura social” (CHARTIER, 1991, p. 186).

Este trabalho encontra-se estruturado em dois capítulos, acrescidos da presente


introdução e das considerações finais. No desenvolvimento dos capítulos, procurou-se
identificar as correlações existentes entre três elementos basilares à pesquisa: o suicídio, os
jornais e a cidade de Belém do Pará. Colocou-se em pauta a historicidade da prática milenar
do suicídio, de modo que permitisse pontuar as características presentes nas representações
construídas para o ato a partir dos periódicos em circulação na cidade e, ao final, abrir
possibilidades de se entender o sentido e o modo local de se matar em Belém na virada do
século XIX para o XX. No primeiro capítulo, de título Sensações suicidas: o suicídio presente
nas páginas dos jornais de Belém na virada do século XIX para o XX, demonstrou-se como o
tema do suicídio foi apropriado pelas redações dos jornais de Belém, para os fins os mais
diversos, e com múltiplos sentidos e terminologias, dentro da estratégia de atrair os leitores e
acompanhando o fluxo dos acontecimentos, sejam eles locais ou externos. Entretanto, a
presença recorrente do suicídio nas notícias, nos anúncios, nos editoriais, nas peças literárias e
nas imagens ultrapassou a dimensão do simples mercado dos exemplares de jornais. Chegou-
18

se mesmo a debater o caráter do ato suicida, em que se sobressaiu o sentido de afastá-lo da


ordem natural e do modelo urbano projetado para Belém. Não de outro modo, tentativas
houve de encerrar esse próprio debate nos jornais, estes considerados como veículos de
vulgarização das práticas de suicídio junto à população da cidade. Outros movimentos de
escamoteação foram verificados, especialmente na instância da oficialidade estatal, cujas
fontes históricas nela produzidas – os boletins estatísticos e os inquéritos policiais – puderam
ser confrontados com os periódicos, a fim de problematizar os aspectos ligados ao tratamento
da morte voluntária por aquela sociedade: além das posições ambíguas que oscilavam entre a
apologia e a condenação, também coexistiam a publicidade e o silêncio sobre as práticas
suicidas.
No segundo capítulo, intitulado A cidade suicida: as práticas de suicídio na Belém da
virada do século XIX para o XX, procurou-se problematizar a omissão da historiografia
construída sobre o período da Belle Époque em Belém em relação aos suicidas. A existência
dessa categoria se apresenta nas páginas dos jornais diários belenenses, através das quais pode
ser construída a escrita historiográfica sobre as práticas suicidas mais recorrentes na cidade
daquele período. Os suicídios cometidos no espaço geográfico da Belém daquela virada de
séculos mostram-se carregados de peculiaridades, que lhes permite identificar a historicidade
em uma cidade que oferecia tanto os locais, os meios e os motivos para a sua prática. Nesse
sentido, dimensionou-se o suicídio como um dos aspectos do cotidiano dos habitantes da
cidade de Belém, sendo que as diferenciações sociais e étnicas nela existentes foram
determinantes para a formação das representações sobre as práticas suicidas e sobre os
próprios suicidas.
19

1 SENSAÇÕES SUICIDAS: O SUICÍDIO PRESENTE NAS PÁGINAS DE JORNAIS


NA BELÉM DA VIRADA DO SÉCULO XIX PARA O XX

Na manhã de 8 de dezembro de 1905, o público leitor da Folha do Norte, em Belém do


Pará, foi surpreendido pela observação arguta de um dos articulistas que, ao noticiar a
tentativa de suicídio de Raymundo do Espírito Santo, e diante “dos continuos factos de
suicidio e tentativas de suicidio que [...] se têm dado nesta Capital”, considerou que aquele
mês seria o “dos tresloucados” (TENTATIVA..., 1905, p. 1). De fato, somente em dezembro
daquele ano, o referido jornal já havia noticiado, e ainda passaria a registrar, tantas outras
práticas suicidas. Em 2 de dezembro de 1905, noticiou a tentativa de suicídio da “mundana”
Rosa Portuguesa, de 31 anos (ENVENENAMENTO..., 1905, p. 1). Em 5 de dezembro de
1905, foi a vez de levar ao conhecimento público a também tentativa de suicídio, por ingestão
de querosene, da moradora de cortiço Francisca Maria do Nascimento (ENVENENADA...,
1905, p. 1). Em 6 de dezembro de 1905, publicaram-se tanto o trágico suicídio consumado do
melancólico paraense David Pereira Barros10, como o da portuguesa Felicidade da Rosa
Viegas, que trabalhava no comércio local com o irmão (ACTO..., 1905; MAIS..., 1905a).
Aquela tenebrosa impressão do articulista da Folha do Norte parece ter sido confirmada
quando, em 17 de dezembro de 1905, foi registrado outro ato do gênero, sobre a morte do
cidadão norte-americano William W. Ver-Valem, sugestivamente intitulada como “Mais um
suicidio” (1905b, p. 1).
Desse modo, essas sucessivas ocorrências, somadas a outros dois casos de suicídios
ocorridos em alto-mar, em viagem do paquete Ambrose (DOIS..., 1905), e, finalmente, ao
suicídio de Álvaro Ribeiro de Sá, passado em 21 de dezembro de 1905, fez o articulista expor
seu temor particular de que: “estamos, infelizmente, numa febre louca de suicidios. Rarissimo
é o dia em que não é dado ao noticiarista registar um desses casos de verdadeira loucura.”
(OUTRO..., 1905, p. 1).
É inegável que, em um curto espaço de tempo, houve notícias recorrentes de suicídios
ocorridos somente na capital paraense. A redação da Folha do Norte não deixou de aproveitar
esse fato para dar o caráter de espetaculosidade as suas matérias, ao estilo que requerem as
notícias de sensação. Na edição de 6 de dezembro de 1905, o jornal chegou a demarcar tal
fênomeno: “o fim do anno que expira está se tornando celebre pela loucura dos suicidios. [...]

10
No Arquivo Público do Estado do Pará, encontra-se depositada a ocorrência policial – permanência de 4 para
5 de dezembro de 1905 –, em que se registrou o suicídio de David Pereira Barros, e que corrobora as
informações presentes na respectiva notícia publicada na Folha do Norte.
20

Em menos de 8 dias já foi dado ao noticiarista registar tres tentativas e um suicidio.”


(ACTO..., 1905, p. 1). A qualidade de “mez dos tresloucados”, que havia sido atribuída a
dezembro de 1905 nesse mesmo dia 6, foi reafirmada em 17 do mesmo mês (MAIS..., 1905b).
Nessa sequência de práticas suicidas dadas à leitura no noticiário local em curto espaço
de tempo, notou-se que se envolveram pessoas pertencentes a diversos segmentos sociais,
gêneros e locais de origem. Todas elas servem como amostra representativa dos casos a
serem, oportunamente, analisados neste trabalho. É de se observar, no entanto, que aquele
dezembro de 1905 não constituiu um caso atípico, ou isolado da Folha do Norte,11 ao longo
do recorte temporal da pesquisa. No mesmo jornal, em 12 de julho de 1903, lamentaram-se as
desgraças que se sucediam de “uma só vez” nos jornais, dentre as quais, as dos suicidas (A
SEMANA, 1903, p. 1). Os demais jornais diários, que noticiavam fatos do cotidiano e
circulavam na Belém da virada do século XIX para o XX, como A Provincia do Pará,
chegavam a divulgar semelhantes casos ocorridos na cidade ou em lugares como a Capital
Federal – mesmo que na forma de pequenas notas –, sob o emblemático título de Os Suicidios
(1899a, 1899b). Na edição de 18 de janeiro de 1919, o Estado do Pará publicou a notícia do
suicídio local da “tolerada” Bemvinda da Luz Barros, de 19 anos, em conjunto com o do
lavrador Raymundo Gonçalves de Lima em Bragança, em Os Fracos – amores mal
correspondidos (1919, p.1). Em ambos os casos, os títulos, no plural, remetem à ideia de
seções específicas e regulares na diagramação desses jornais, em que os suicídios seriam
noticiados, dentre tantos outros aspectos da vida cotidiana da sociedade, como atos seriados e
não meramente pitorescos.

1.1 O confronto entre os jornais e as estatísticas sociais: a visibilidade e a ocultação do


suicídio moderno

Se as notícias sobre suicídios eram comuns na imprensa belenense na virada do século


XIX para o XX, por outro lado, não há dados suficientes que permitam afirmar que, naquele
período, tratava-se efetivamente de tempos suicidas na cidade. Na década de 1990, Minois
(1998, p. 16) considerou que os estudos sociológicos contemporâneos demonstravam a
constância nas taxas de suicídio para qualquer “tipo de sociedade”. O historiador francês
também descartou qualquer possibilidade de se realizar análise comparativa entre os números

11
Dos jornais em circulação na Belém entre os anos de 1891 a 1920, a pesquisa trabalhou basicamente com A
Provincia do Pará (1876-1912, 1920-2001), o Diario de Noticias (1880-1898), O Binoculo (1896-1908), a
Folha do Norte (1896-1974), O Jornal (1905-1908) e o Estado do Pará (1911-1961).
21

de suicídios praticados em diversas épocas históricas, pela simples questão metodológica da


pouca disponibilidade das fontes, já que os registros oficiais e eclesiásticos seriam
fragmentados, ou mesmo escassos. Por outro lado, a frequência com que o suicídio é tratado
em textos legislativos, filosóficos, teológicos, e científicos, e até nas páginas diárias dos
jornais, permite avaliar o grau da presença dessa prática, enquanto tema, nos debates de cada
época, servindo de indício acerca de sua regularidade no cotidiano local (MINOIS, 1998).
Como também considera Figueiredo (2009, p. 20), em relação à realidade histórica de Belém,
a “constante divulgação” de situações ligadas ao dia-a-dia citadino – que podiam ir dos casos
de “pagelância” até os suicídios –, e mesmo o “tom de banalidade” com que os mesmos
chegavam a ser tratados nos jornais, servem como perfeitos indicadores de “o quanto eles não
eram atípicos” e, portanto, configuravam como parte integrante das práticas mais triviais dos
habitantes da cidade.
Dois elementos, então considerados representativos do grau de civilização de uma
sociedade, conjugavam-se ou se revezavam para dar ao suicídio a visibilidade e sua feição
moderna, desde o século XVIII: as estatísticas e a imprensa cotidiana. Minois (1998, p. 82)
analisou o fato de o judiciário real inglês – o King’s bench – contar, já em meados do século
XVI, com um eficiente sistema (se comparado ao praticado no restante da Europa) de
registros das mortes ocorridas – conhecido como bills of mortality –, sugerindo que a
regularidade das taxas de morte voluntária ajudou a construir o próprio mito do suicídio como
“mal inglês”, muito difundido a partir do século XVII.
No caso específico de Belém, os dados estatísticos passíveis de serem extraídos dos
registros oficiais, nos anos finais do século XIX e das duas primeiras décadas do século XX,
restam fragmentados e dispersos em poucos boletins (mensais ou anuais) disponíveis à
pesquisa. Ainda assim, foi possível identificar números oficiais sobre a frequência dos
suicídios praticados em Belém para determinado período, através das tabelas expedidas pela
então Diretoria do Serviço Sanitário do Pará12. Para os dezesseis anos compreendidos entre
1896 e 191113, estabeleceu-se o número de mortes, decorrentes de suicídio, em, justamente,

12
Segundo consta em observações presentes ao final do Boletim Mensal de Estatistica demographo-sanitaria da
cidade de Belém, de dezembro de 1905, o trabalho regular e sistemático do governo estadual em produzir e em
publicar dados estatísticos-sociais começou em 1905, substituindo algumas iniciativas esparsas, as quais não
havia sido dada a devida continuidade: “Dos trabalhos anteriores, a maior parte deixou de ser aproveitada,
extraviando-se naturalmente os mappas, pois foi improficuo o tentamem de reunir o que devera existir.”
(PARÁ, 1905L, p. 247).
13
Os dados relativos ao período de 1896-1908 estão agrupados na tabela de Mortalidade Geral na cidade de
Belém, presente no Boletim Mensal de Estatistica demographo-sanitaria da cidade de Belém, de dezembro de
1908 (n. 12). Os dados relativos ao decênio de 1902-1911 se encontram condensados em tabela do Boletim
Mensal de Estatistica demographo-sanitaria da cidade de Belém, de dezembro de 1911 (n. 12).
22

dezesseis casos, assim distribuídos: cinco em 190514; três em 1906; e oito em 1907. Para
efeito de comparação, o total das mortes gerais, registradas nesses três respectivos anos, foi da
ordem de quatro mil e cem; de três mil e quinhentos e noventa e três; e de três mil e
setecentos e quarenta e um. Desse modo, esses casos de suicídios corresponderam à razão
pouquíssimo representativa, ficando bem abaixo da média dos 0,50% (cinquenta centésimos
por cento) do total da mortalidade anual.
No Boletim Mensal de Estatística da Cidade de Belém de março de 1916, ainda sob o
encargo da Diretoria do Serviço Sanitário do Pará, constam dois casos de mortes por suicídio
naquele mês, frente ao total mensal de trezentos e noventa e cinco mortes. Isso corresponde a
0,51% (cinquenta e um centésimos por cento) do total da mortalidade mensal. A despeito
desses reduzidos números, havia, nesses boletins, dentro do item das “mortes violentas”,
subitem dedicado ao registro dos suicídios (sendo estes, em algumas tabelas, até classificados
pelos principais meios de morte empregados), como Causas dos Óbitos. Isso já sinaliza o
interesse crescente das autoridades públicas sanitárias em quantificar e em dimensionar o
acontecimento desse fenômeno no espaço urbano de Belém no decorrer das duas primeiras
décadas do século XX. Essa mesma preocupação não foi verificada no Boletim de Estatística
demographo-sanitario relativo ao primeiro trimestre de 1900, em que o item das “mortes
violentas” não fora detalhado. Nesse sentido e na mensagem enviada ao Congresso
Legislativo do Pará em 7 de setembro de 1905, Augusto Montenegro, então governador do
Estado, colocou os trabalhos da estatística demografo-sanitária como política pública
prioritária, incluindo a publicação dos boletins mensais, cada um a servir como “repositorio
de informações uteis, para a administração e para os que quizerem estudar os assumptos que
se prendem à constituição medica de nossa capital.” (PARÁ, 1905L, p. 247).
Semler (1998, f. 49) analisou como as estatísticas sociais se desenvolveram ao longo do
século XIX e passaram a nortear todos os aspectos da vida citadina – dos nascimentos às
mortes de seus habitantes –, sendo postas a serviço das políticas públicas para melhor
ordenamento do espaço urbano: “guiando-se pela idéia progressista de que a moralidade de
uma sociedade podia ser medida [...], catalogaram e analisaram todas as facetas da existência
humana”.

14
Esse montante não se sustenta, se se considerarem os próprios registros constantes em cada um dos doze
volumes do Boletim Mensal de Estatistica demographo-sanitaria da cidade de Belém, correspondentes a 1905.
O conjunto destes apontam um total de seis casos de suicídios naquele ano, assim distribuídos: em janeiro de
1905, um caso por envenenamento; em maio de 1905, um caso por estrangulamento; em agosto de 1905, um
caso por disparo de arma de fogo; em outubro de 1905, um caso por enforcamento ou estrangulamento; e em
dezembro de 1905, dois casos por “outros meios”.
23

Em notas como a que foi publicada na edição do Diario de Noticias de 4 de março de


1894, evidenciam-se a força da estatística social e a crença em seu valor intrínseco como
verdade científica. Ao serem apresentados, por exemplo, os resultados extraídos das
estatísticas acerca dos dias trabalhados anuais entre as potências mundiais, chegou-se à
convicção de que “parece provar até á evidenbia [sic] que os dias de folga não exercem
influencia alguma na actividade de qualquer nação” (OS DIAS..., 1894, p. 1). Por ocasião da
Grande Guerra de 1914-1918, as estatísticas podiam se prestar ao planejamento das nações
beligerantes na mobilização de suas tropas e, nesse aspecto, trazer certo alívio em meio ao
caos. O Estado do Pará, de 27 de outubro de 1915, publicou, na seção Cousas da Guerra15,
os resultados estatísticos apresentados em conferência por certo professor Régis: “nunca o
numero de alienados foi menor no exercito. Elle não é superior a 0,86 por 1000 entre os
soldados retirados da linha de combate, por ferimento e molestia” (OS CASOS..., 1915, p. 2).
As estatísticas mortuárias, por sua vez, estavam presentes nas notas diárias dos jornais
noticiosos e diários de Belém. Havia seções ou subseções permanentes, como a Estatistica da
Mortalidade (dentro dos Registros Funebres), da Folha do Norte16, em que se relacionavam
nominalmente os mortos, seus dados pessoais (como a idade e o local de origem) e a
respectiva causa mortis, obtidos junto aos registros públicos do dia anterior. No caso dos
suicidas, constava como causa mortis a produzida em razão do meio de morte empregado,
tendo em vista os termos próprios utilizados no jargão da medicina legal. Em 13 de março de
1901, por exemplo, noticiou-se que a índia Cyda Baré – que se enforcara no dia anterior –
morreu em virtude de “asphyxia por estrangulamento” (REGISTRO..., 1901, p. 2).
Chegava-se, também, a tão somente publicar os resultados estatísticos obtidos dos
relatórios oficiais com certa regularidade mensal. A Folha do Norte apresentou, em 8 de
janeiro de 1912, o gráfico contendo os dados da mortalidade geral em Belém de 1905 ao
primeiro semestre de 1911, divididos por meses, e por sexo (ESTATISTICA..., 1912). No
tocante às taxas de suicídios, os jornais belenenses informavam, ocasionalmente, os resultados
de lugares em que essas taxas se pretendiam mais precisas. A Província do Pará divulgou, em
pequenas notas, os números dos suicídios cometidos em certos centros europeus, como
também nos Estados Unidos da América. Na sua edição de 23 de agosto de 1891, noticiou o

15
Ressalta-se que a imprensa de Belém, entre os anos de 1914 a 1918, deu imenso destaque aos acontecimentos
externos que se relacionavam ao que então era chamado de “deflagração europea”, seja em editoriais ou em
seções especialmente criadas para essa finalidade, e com expressivo uso de imagens (clichés) das principais
personalidades envolvidas no conflito, e até dos campos de guerra.
16
Observaram-se as Estatísticas da Mortalidade no jornal Folha do Norte ao longo das duas primeiras décadas
do século XX.
24

rápido crescimento das mortes voluntárias na capital do Reich alemão, apenas na primeira
quinzena de julho daquele ano, chegando à marca de cento e quarenta e sete ocorrências,
tendo-lhe sido atribuída, como causa primeira, a incidência dos casos de alcoolismo entre os
berlinenses ([NOTA...], 1891, p. 3). Passados quase nove anos, o mesmo jornal publicou, em
primeira página, o alarmante número de cinco mil e novecentos e vinte suicídios na nação
norte-americana ao longo de 1898, distribuídos entre homens e mulheres, e entre algumas
ocupações e profissões de fé. Dentre as principais causas alegadas, destacavam-se os suicídios
motivados por loucura, com quinhentos e trinta e oito casos, e os por dificuldades financeiras,
com cento e sessenta e oito casos ([NOTA...], 1899).
A Folha do Norte, na seção Echos do Mundo de 8 de dezembro de 1903, publicou artigo
em que se sustentou que o suicídio “dá se muito bem” no longínquo Japão, tendo em vista
dados estatísticos em que oito mil e quinhentos e oitenta e dois japoneses “atiraram com a
vida para as regiões do Nada, no decorrer dum anno!”, motivados principalmente por questões
culturais: a valorização do suicídio, no universo mental nipônico, como sinal de manutenção
da honra e da dignidade ([NOTA...], 1903, p.1). Em 28 de junho de 1913, o Estado do Pará
fez publicar ligeira nota telegráfica, vinda do exterior, dando conta da cifra significativa de
duzentos e noventa e sete suicídios e de duzentas e oitenta e uma tentativas de suicídio, na
capital argentina durante 1912 (OS DESCONTENTES..., 1913).
Assim, seja partindo de um nível maior ou menor de refinamento estatístico e de
detalhes jornalísticos, percebe-se como tais notícias evidenciavam certos aspectos de outros
povos e sociedades, demarcando-os através da presença de práticas suicidas, como também,
na medida do possível, alertavam o leitor belenense para pontos do próprio cotidiano da
cidade que precisavam ser discutidos ou mesmo combatidos, como o alcoolismo17 e a crise
financeira, que veio com o colapso da economia da borracha já ao final da primeira década do
século XX.
No que tange aos registros mantidos pela Diretoria do Serviço Sanitário Estadual,
percebem-se informações contraditórias em cada um dos boletins mensais de estatísticas

17
Observou-se a apropriação do suicídio, pela imprensa belenense na virada do século XIX para o XX, na
proposta de prevenção contra o uso abusivo de bebidas alcoólicas. Nas notícias em que se vinculavam alguns
casos de suicídio ao alcoolismo, utilizou-se do discurso moral em que a condição de alcóolatra do suicida era
mais destacada – e condenada – que o próprio suicídio. Este era representado como uma das resoluções, finais
e possíveis, de uma vida desviante e degenerada, que tangenciava os limiares da alienação mental. Nesse
sentido, ver: CARVALHO, Marcelo José. Cachaça e vontade de morrer: embriaguez e suicídio nas notícias
impressas nos jornais belenenses: 1891-1908. In: ENCONTRO REGIONAL DE HISTÓRIA DA ANPUH-
RIO, 14., 2010, Rio de Janeiro. Anais eletrônicos... Rio de Janeiro: NUMEM, 2010. Disponível em: <http://
www.encontro2010.rj.anpuh.org/resources/anais/8/1276708290_ARQUIVO_Artigo_Anpuh_Rio_Marcelo_Ca
rvalho.pdf>. Acesso em: 18 out. 2010.
25

demográfico-sanitárias. No período de 1905 a 1909, havia tabelas próprias para relacionar os


exames cadavéricos e as autopsias realizadas pelo serviço médico-legista. Em alguns casos,
constatou-se não terem sido computadas, nos quadros totalizadores dos suicídios ocorridos em
determinados meses ou anos, certas mortes consideradas, pela própria perícia médico-legista,
como decorrentes de suicídios. Em fevereiro de 1908, por exemplo, o exame cadavérico
admitiu o suicídio de João Climaco Coelho, por envenenamento de “bychloreto de
hydrargirio”18, embora não constasse nenhum suicídio para aquele mês nas tabelas mortuárias
(PARÁ, 1908b, p. 47). Do mesmo modo, a morte de Constantino Rodrigues Santabaya por
hemorragia cerebral, mesmo reconhecida como suicídio pelo médico-legista, não entrou no
cômputo final dos suicídios praticados em novembro de 1908, que, assim, ficou registrado
como outro mês sem ocorrências do tipo (PARÁ, 1908d). Aliás, ao final de 1908, segundo o
registro público, nenhum suicídio havia sido praticado em Belém (PARÁ, 1908e). Também
em janeiro de 1909, deixou-se de incluir o suicídio de Alfredo da Cruz Monteiro, intoxicado
por verde-Paris, no rol da mortalidade mensal (PARÁ, 1909).
Desde abril de 1906, com a edição do Decreto estadual nº1.417, de 9 de fevereiro de
1906, a comissão verificadora de médicos-legistas passou a ser obrigada a emitir parecer de
todos os casos de morte em qualquer estabelecimento público. Por essa perspectiva, todas as
tabelas de mortalidade se baseariam “nas listas mensaes, com as informações detalhadas,
remettidas officialmente pela Chefatura de Policia do Estado, merecendo assim inteira fé
quanto á exactidão” (CAMPOS, 1906, p. 245, grifo nosso). A despeito das contradições
presentes (que se observam aos olhos atuais), o governo estadual assegurava a integridade dos
dados estatísticos produzidos em seus quadros técnicos, respaldando-se tão somente na
autoridade moral atribuída, positivamente, às fontes das quais se servia, e no alegado rigor
com que esses dados seriam tratados. Desse modo, reafirmou o grau de verdade incontestável,
no apêndice da edição de dezembro de 1908, do citado boletim. A Diretoria do Serviço
Sanitário do Pará lembrava aos interessados que esses quadros de mortalidade “baseam-se,
rigorosamente, nas guias expedidas, pelo sr. Official do Registro Civil, para as inhumações
nos cemiterios d’esta Capital.” (CAMPOS, 1908, p. 293, grifo nosso).
Entretanto, além da clara omissão dos casos expressamente declarados como suicídios
pelos médicos-legistas, também se constataram situações de perceptível escamoteação das

18
Na edição de 18 de fevereiro de 1908, a Folha do Norte publicou a tentativa de suicídio de João Climaco
Coelho (no que posteriormente resultou em sua morte), através de envenenamento por pastilhas de sublimado
corrosivo, sendo o suicida encaminhado ao hospital da Santa Casa de Misericórdia (OS DESESPERADOS...,
1908). Pelo Diccionario de medicina popular e das sciencias accessorias..., de Pedro Chernoviz (1890), as
pastilhas de sublimados corrosivos se obtinham da combinação entre as substâncias químicas cloro e mercúrio.
26

circunstâncias mais evidentes para determinadas mortes no rol das estatísticas oficiais, o que,
no caso de ter sido suicídio, justifica-se pelo tabu secular que paira sobre o assunto19
(ALVAREZ, 1999). Esse mesmo problema metodológico, no tratamento das fontes, foi
enfrentado por Alain Corbin na análise sobre os suicídios franceses do século XIX, conforme
já visto na parte introdutória deste trabalho. O historiador berlinense Peter Gay (2001, p. 215)
também apresentou reservas em relação às estatísticas europeias sobre suicídios no século
XIX, pois podiam ser “equivocadas e fragmentárias”, assim como inadequados os critérios
adotados para “distinguir a morte deliberada da acidental”.
No contexto de Belém, algo semelhante parece ter se desenhado na passagem do século
XIX para o XX, conforme se observa do modo como foi considerada, oficialmente, a morte
do seringueiro judeu-venezuelano Isaac Belichá a 22 de março de 1908. Pela Folha do Norte
do dia posterior, noticiou-se, em primeira página, que Belichá se suicidara com tiro de
revólver, em um dos quartos do Universal Hotel, localizado no então centro comercial de
Belém. Na relação dos exames cadavéricos, presente no Boletim Mensal de Estatistica
demographo-sanitaria da cidade de Belém de março de 1908, não consta que a morte de Isaac
Belichá se tratasse de um suicídio, havendo apenas a descrição técnica dos efeitos produzidos
pela detonação da arma: “hemorrhagia consecutiva a ferimento penetrante do craneo, por
projectil de arma de fogo” (PARÁ, 1908b, p. 71). Em outros casos, a própria descrição
técnica da causa mortis do falecido não deixa dúvidas de outro tipo de morte que não seja a
produzida por suicídio. Em outubro de 1908, atestou-se que José Gonçalves Vieira Vianna
morrera em decorrência de “asphyxia por enforcamento”, na casa à travessa Campos Sales,
n.73 (PARÁ, 1908c, p. 238). Tanto nessa situação, como na de Isaac Belichá, não foi
registrado nenhum caso de suicídio nos respectivos meses.
Frente ao exposto, fica patente o duplo movimento dos órgãos oficiais em relação aos
dados estatísticos do suicídio: se a sua ocorrência era aceita como um aspecto a ser
computado do mundo civilizado20 – nesse sentido, tem-se a inserção de itens próprios para
quantificar os prováveis casos de suicídios nas tabelas mortuárias dos boletins mensais da
Diretoria do Serviço Sanitário do Pará –; esse reconhecimento não se fez sem reservas ou sem
constrangimentos: as representações da época (fortemente influenciadas pelo discurso médico
e científico) retratavam os suicidas como degenerados, como elementos a serem segregados

19
Secularmente, em maior ou menor grau, a prática do suicídio é estigmatizada, no universo cultural cristão e
ocidental, seja como pecado, como delito ou como antinatural e patológico, sendo que essa última
representação teve contornos mais definidos ao longo do século XIX.
20
Em tópico próprio reservado ao termo “suicídio”, no Diccionario de medicina popular e das sciencias
accessorias para uso das familias..., de Chernoviz (1890c, p. 1015), afirmou-se que as práticas suicidas se
tornam mais frequentes, “quanto mais os povos são civilizados”.
27

do ambiente ideal e higienizado, projetado para as cidades (LOPES, 2007). Quando muito, a
existência dessa categoria era encoberta pela oficialidade, pois iria depor contra as próprias
políticas públicas de ordenamento desses espaços urbanos. Essas subnotificações oficiais dos
casos de suicídio ocorridos em Belém, principalmente na primeira década do século XX,
ficam evidentes quando confrontadas com as publicações dos jornais locais a respeito da
regularidade das práticas suicidas. Apenas em 1905, a Folha do Norte noticiou vinte casos de
suicídio que se consumaram, ocorridos expressamente nos limites da capital paraense (ou às
suas proximidades), enquanto que, como já citado, os registros oficiais notificaram apenas
seis ocorrências naquele ano.
Se o suicídio despontava como preocupação de registro e de quantificação nas tabelas
oficiais do governo – mesmo que precariamente –, por outro lado ganhava força como objeto
de leitura recorrente nos jornais diários de Belém, fazendo-se presente nas notícias que
informavam sobre práticas suicidas na capital paraense e em outros locais, inclusive fora do
Estado e, mesmo, fora do País. Também não deixou de ser comentado em editoriais, em
crônicas e em artigos, sob diversos pontos de vistas e linhas argumentativas, algumas
preponderantes. De igual modo, sua evocação inspirou algumas obras poéticas ou ligeiros
contos publicados nesses jornais, e mesmo prosaicos anúncios dos mais diversos produtos e
serviços. E, como já mencionado, sempre quando permitido, os jornais também publicavam as
taxas de suicídio, o que, por si só, já contribuiu para torná-lo “mais perceptível, enquanto
prática coletiva” (SEMLER, 1998, f. 51).
As intenções de ordem editorial, por parte dos jornais belenenses, eram a de atrair
público leitor e aumentar a vendas dos exemplares, explorando o caráter sensacional de que se
revestiu (e ainda se reveste) o suicídio. Construiu-se a representação de que esses leitores
eram ávidos pelas notícias de sensação, escritas em fait divers. Segundo Guimarães (2004, f.
24-25) o perfil do leitor que “se formou” (e procurava se informar) por ocasião da
consolidação do caráter industrial da imprensa brasileira, já ao fim do século XIX, era aquele
atraído “por temas comuns da cultura popular”, dentre os quais se destacavam os dramas de
sangue (como os assassinatos e os suicídios), e “por uma estrutura inovadora, que combinava
escrita e fórmulas orais, permitindo o acesso à leitura por quem não tinha grande intimidade
com a cultura do impresso”. Assim, “a narrativa escabrosa, a tratar de lugares, personagens e
comportamentos malditos”, tornou-se garantia de sucesso de vendas dos jornais
(PESAVENTO, 2010, p. 448), e a imprensa belenense, uma grande divulgadora do suicídio
junto ao público leigo. Os periódicos circulavam nas ruas da cidade, para além dos gabinetes e
28

dos restritos espaços dos debates acadêmicos, científicos e jurídicos; capazes, portanto, de
fomentar o processo de construção de uma opinião pública sobre o assunto.

Imagem 1 – O jornal no cotidiano da vida urbana

Fonte: Rodolfo Amoedo (s/d)

A leitura diária de jornais se incorporava às práticas cotidianas dos habitantes de Belém


no início do século XX. Mesmo em representações de tempos anteriores, presentes em artigos
de jornais da época imperial, já se evidenciava a penetração dos periódicos na população da
cidade, como bem captado pelo historiador Helder Lima (2006), ao citar coluna assinada por
um certo Sganarello21, publicada no Diário de Noticias de 10 de setembro de 1886:

Mal a aurora rebenta, o operario, antes de sahir ao trabalho, sedento de


noticias, procura as paginas das gazetas e satisfaz-se em correr os olhos no
noticiario e nas anedoctas, antes de satisfazer o estomago com o café de
todos os dias. [...]
A gazeta é lida nos botequins, nas tabernas, nos cantos, nos bonds, nos
trapiches, enfim é uma cidade [Belém] civilizada, encontra-se (sic) jornaes a
cada passo e leitores aos empurrões por causa de uma folha de papel
impressa. (SGANARELLO, 1886, p. 2).

21
Segundo Helder Lima (2006), Sganarello era o pseudônimo de Antônio de Pádua Carvalho, jornalista e
também folclorista de destaque na Belém do final do século XIX.
29

A presença dos jornais no cotidiano dos centros urbanos também figurou como
elemento de composição na obra Cena de café (s/d), pequena aquarela pintada por Rodolfo
Amoedo22. Podendo ser observada pela Imagem 1, o quadro representa um típico café
parisiense (denunciado pela presença dos cartazes afixados na vidraçaria do local, escritos em
francês). As folhas do jornal matutino, de grandes dimensões, destacam-se na composição
cromática – pelo efeito produzido pela grande mancha de diluição entre branco e cinza – da
obra. O jornal figura entre os dois únicos personagens de cena (possivelmente um casal), a
lhes marcar a ausência de comunicação. Apesar de sentados próximos, eles se mantem
distantes em suas próprias temporalidades, e o homem, com trajes burgueses, parece,
justamente, absorto na sua leitura das notícias diárias sob a claridade da manhã.
A relação entre o suicídio e a imprensa diária não era nova, ou típica da virada do século
XIX para o XX. Minois (1998, p. 227) analisou a grande visibilidade dada aos casos de
suicídio na Inglaterra ao longo dos séculos XVII e XVIII: “todos estes suicídios, que foram
largamente difundidos e comentados pela imprensa, provocam uma forte impressão”. Além de
publicarem regularmente os números dos suicídios registrados na bills of mortality, os
periódicos ingleses também difundiam e comentavam os casos mais célebres de suicídio no
reino (em especial os envolvendo autoridades leigas e eclesiais), ou aqueles que viessem a
despertar o interesse público em razão das próprias circunstâncias que os envolviam, e que
emprestavam carga emotiva à narração dos fatos, como o duplo suicídio do casal Smith23.
Para Dapieve (2007), a divulgação, detalhada e abundante, dos casos de suicídio contribuiu, à
sua maneira, para a secularização do fenômeno, mais notadamente a partir do século XVIII,
quando se estabeleceu a pauta de debates pela liberdade individual do homem, inclusive do
direito de se dispor da própria vida. Isso contribuiu para humanizar o ato suicida, retirando-o
do domínio da culpa cristã ou do crime social: “as próprias necessidades intrínsecas ao
moderno texto jornalístico [de imprimir veracidade] facilitavam a compreensão da morte
voluntária e de sua frequência dentro da sociedade.” (DAPIEVE, 2007, p. 87). O fato de os

22
Rodolfo Amoedo (1857-1941), pintor baiano, ingressou na então Academia Imperial de Belas Artes, onde se
instruiu nas bases da pintura academicista. Foi também aluno da École Nationale des Beaux Arts em Paris
durante boa parte da década de 1880 (possivelmente Cena de café seja dessa época). Expondo em salões
oficiais e trabalhando em encomendas oficiais, Amoedo manteve-se firme nos padrões academicistas. Cena de
café, pela pincelada diluída da aquarela, de certo modo se distingue do restante de sua produção pictórica,
marcada pelo “desenho grave, de construção vigorosa” (CAMPOFIORITO, 1983, p. 42).
23
Citado ainda por Dapieve (2007, p. 55-57), o suicídio do casal de operários ingleses Smith, publicado em abril
de 1732, ficou célebre por causar comoção pública à época, não apenas em razão das circunstâncias em que se
deu o fato em si – antes de cumprirem seu pacto de morte, assassinaram o filho pequeno –, mas pelo modo
como foi trabalhada a publicação das cartas de despedida, em que se representou o casal de suicidas, nas
páginas dos jornais, “como seres complexos e contraditórios”, mais dignos de simpatia que condenação.
30

jornais passarem a descrever os casos de suicídio mais pitorescos, quando não eram
censurados, detalhando-lhes as circunstâncias e causas, contribuiu para que o público leitor se
familiarizasse com o tema.

1.2 Suicídios para fazer rir e para vender: A morte voluntária tratada sob a perspectiva
do humor e a sua relação com os anúncios de publicidade

Pode-se dimensionar a compreensão do suicídio na Belém da virada do século XIX para


o XX, sem se recorrer apenas às narrativas jornalísticas. É de se perceber que o suicídio –
mesmo no nível da ideia – fazia-se presente em textos com finalidades as mais diversas. Em
especial, naqueles que continham certa dose de humor, seja para tratar o próprio suicídio no
campo do deboche, seja para utilizá-lo como mote para criticar outros aspectos da vida social
e política da cidade. Minois (1998, p. 247) considera que esse fato – por ele enquadrado no
contexto de “banalização da ideia de morte voluntária” – sinaliza para uma “evolução das
mentalidades” a respeito do suicídio, a caminho de um relativismo que passa ao largo do
tradicional tabu. Sobre o aspecto do humor, Possenti (1998, p. 25-26) afirma que geralmente
as piadas tanto abordam assuntos “socialmente controversos”, como são empregadas para
veicular algum “discurso proibido”, que não poderia ser expresso de outro modo24.
É notável o tom humorístico – acentuado em alguns casos – com que o suicídio se faz
presente nas folhas diárias de muitos jornais cotidianos e satíricos de Belém no final do século
XIX e no início do XX. Esse fenômeno, contudo, não se restringiu ao âmbito local. Nessa
perspectiva, publicou-se o impresso denominado O Fogo-Fatuo25 em 1898, originário de certa
Suicidopolis – mas que se atribui se tratar da cidade paulista de Santos. Apresentando-se com
o lema “mata-te antes que te matem”, propunha-se a ser um “orgam [de divulgação] suicida”.
Seu projeto se sustentava na fictícia premissa de ter sido produzido – da formulação das
notícias à circulação na sua forma impressa – por almas dos suicidas enterrados nos
cemitérios de Santos, conforme expresso em seu editorial:

E os mortos, levantando-se, ao farfalhar das tunicas, recolhem ás suas covas,


na mesma lenta romaria, deixando sob o chorão lastimoso a larga lapide

24
Ressalva-se que Possenti trabalha o sentido do humor (nas piadas) no contexto mais contemporâneo.
25
Há um exemplar (parcialmente danificado) de O Fogo-Fatuo no setor de Obras Raras da Fundação Biblioteca
Nacional (Rio de Janeiro). Constitui-se de um fascículo, de apenas duas folhas, datado de 3 de julho de 1898.
Possui seções típicas dos jornais diários da época, como um editorial, Obituario e Telegrammas; não há
indicação de preço ou de ter circulado em edições regulares; e possui detalhes tipográficos que fogem ao
convencional, como toda a sua impressão feita em letras escarlates.
31

agora salpicada de rubros caracteres, retalhada em columnas e secções,


titulos ao alto, cheia como um jornal.
E é assim, minhas senhoras e meus senhores, que é feito o FOGO FATUO.
(O FOGO..., 1898, não paginado).

A despeito dessa representação do lúgubre e do grotesco logo no seu início, todo o resto
do impresso se caracteriza pela fina ironia ou pelo puro deboche. Elaborado aos moldes dos
jornais de cunho noticioso e cotidiano da época (no aspecto de sua diagramação), O Fogo-
Fatuo usou o humor como estratégia para criticar aspectos sociais, econômicos e políticos de
Santos, ambientando-os em um universo próprio (os subterrâneos da cidade), construído a
partir do tema do suicídio. Nesse mundo particular criado pelo humor, as almas dos suicidas
não padeciam de castigos eternos, mas transitavam livremente entre a realidade e a ficção, e
também elegiam seus elementos indesejáveis:

Um distincto poeta santista tenta, contra os insistentes conselhos dos seus


amigos, publicar os seus versos colleccionados, sob o título – Chocalhos.
É melhor deixal-o publicar, senão, mais dia menos dia suicida-se e temol-o
por cá – com lyra e tudo. (VALLA..., 1898, não paginado, grifo do autor).

Retornando ao contexto dos jornais belenenses, identificou-se O Binoculo como, em


certa medida, o equivalente local daquele impresso santista, de quem era contemporâneo, por
sinal. O Binoculo se autoproclamava “periódico crítico e noticioso”, mas fugia dos padrões de
então, ao preencher a maior parte das suas folhas com textos de alta verve humorística, que
podiam ser eventualmente entrecortados com críticas mais contundentes e em tons mais
sérios. O Binoculo também construiu seu universo particular, em que, sob o pretexto de
mapear o que se passava no circuito boêmio, direcionava o ataque à oficialidade da capital
paraense. Nesse ambiente, circulavam livremente categorias sociais à margem – alcóolatras e
prostitutas, em particular – e o suicídio se manifestava como prática trivial, especialmente em
pequenas notas – semelhantes às da seção telegrammas dos jornais diários. Além disso,
configurava-se como decisão patética das personagens, frente ao absurdo das circunstâncias
envolvidas: “Fenélon, aconselhado por Fernandez, resolveu adiar suicidio, visto descobrir-se
Garapé a travessa 11 de março [...]” (TELEGRAMMAS, 1897a, p. 2); ou “corre como certo...
que a Juvencia, do Bailique, tentou suicidar-se, porque o seu novo amante lhe vizitou
fardado” (CORRE..., 1897, p. 3). Fénelon26 e Juvencia aparecem em edições posteriores d’O

26
Possível referência a François de Salignac de La Mothe, o duque de Fénelon (1651-1715), teólogo católico,
escritor e pedagogo francês. Para Minois (1998, p. 256-257), Fénelon defendia uma espiritualidade pautada no
total abandono, despojamento de si, em uma espécie de aniquilamento espiritual. Na sua obra Diálogos dos
Mortos (Dialogues des morts), enaltece os suicídios bíblicos e clássicos e o martirológico dos protocristãos.
32

Binoculo, a frustar novas tentativas de suicídio ou a se entreter em variadas confusões. No


periódico em questão, o suicídio nunca é tratado sob o aspecto de ato consumado, pois a força
do humor, à semelhança dos folhetins, estava na expectativa da continuação em novos
episódios: Fénelon acabou por “encommendar cordas para a 2ª tentativa [de suicidio]”, pois
na primeira atirou-se em um igarapé com “apenas meia braça d’agua” (TELEGRAMMAS,
1897b, p. 3).
No mesmo tom, o articulista por trás do pseudônimo João Choroso27, em fevereiro de
1891, também elegeu o suicídio como mote para escrever sua Riscos e rabiscos, no jornal
Diario de Noticias. João Choroso utiliza um caso de suicídio, por ingestão de arsênico, para
criticar as mulheres que se matavam por motivos passionais, e o amor romântico em geral.
Por falta de identificação mais concreta e clara dos envolvidos e dos locais, é de se questionar
a veracidade do fato narrado, que se assemelha a uma anedota. Por outro lado, o tratamento
dado ao tema por João Choroso parece evidenciar certa mudança nos jornais de Belém ao
final do século XIX, em direção à banalização do suicídio de que tratou Georges Minois. Ao
se referir aos casos publicados de mulheres que se matavam, o articulista frisa que “na época
em que nasceo meo finado bisavô, [a mania do suicídio] era ainda inédita nos annaes da
chronica elegante da terra” (CHOROSO, 1891, p. 2).
Os jornais diários de Belém, no início do século XX, mantiveram a ironia, mesmo que
reduzida, ao se valer do suicídio para realçar críticas sociais as mais diversas. O próprio uso
da palavra “suicídio” – pelo peso que representa séculos de interdição – reforçava a gravidade
do problema que estava sendo tratado. A Folha do Norte, em 10 de março de 1900, fez duras
denúncias contra a instituição Correio: de extravio de cartas e documentos a desvio de
dinheiro. Antes de as relacionar, porém, começa afirmando que tal situação “ainda ha de levar
algum prejudicado, de animo fraco, ao suicidio...” (A VERGONHEIRA..., 1900, p. 1).
No próprio ambiente da imprensa, podia-se fazer uso de tal expediente com efeito
inverso, ou seja, minimizar o potencial do próprio ato suicida. Em artigo assinado por
Bolótas28, fez-se semelhante alarde para ridicularizar falhas apontadas em publicações do
próprio jornal: “Ante-hontem os reporters da secção commercial cá da FOLHA, andaram
indignados com um furo, que levaram. O Wan-Meyll pensou até em suicidio.” (BOLÓTAS,
1903, p. 2, grifo do autor). Interessante é também a resposta retrucada pelo próprio articulista:

27
Não há identificação possível para o articulista que escrevia sob o pseudônimo de João Choroso, que também
assinava crônicas humorísticas do Diario de Noticias em 1891.
28
Não há identificação possível para o articulista que escrevia sob o pseudônimo de Bolótas, apenas observando
que o mesmo era frequente colaborador da Folha do Norte na virada do século XIX para o XX.
33

“Se formos a nos suicidar por todas as desgraças que nos acontecem, matar-nos-emos mais de
dez vezes por dia!” (BOLÓTAS, 1903, p. 2).
No inquérito policial instaurado, em janeiro de 1902, para apurar o suicídio do preso
Braz Pereira da Silva por enforcamento, o depoimento dado à polícia pelo popular Joaquim
Adelino Ferreira da Costa, alfaite português, é revelador nesse sentido. Indagado sobre o que
sabia a respeito, Joaquim pouco informara, dizendo apenas que vira “grande quantidades [sic]
de povo que se iam [sic] aproximando d’ali [do local do suicídio], sahiu incontinenti para a
casa da sua rezidencia, para almoçar” (PARÁ, 1902, não paginado). O modo quase indiferente
de se tratar o suicídio, presente nessas passagens, revela muito do seu grau de inserção no
cotidiano dos jornais e das ruas de Belém.
Esse mesmo processo de familiarização do público leitor de Belém com o suicídio
atingiu seu ápice, na imprensa, por meio dos anúncios de publicidade, muito presentes em
todos os jornais diários de Belém no final do século XIX e no início do XX. Os anúncios
chegavam a ocupar, no mínimo, o espaço de metade da diagramação de uma edição diária,
principalmente nas duas últimas páginas. Em alguns casos, preenchiam quase totalidade do
jornal, restando pouco para publicação das notícias e dos artigos, como se observa no Diario
de Noticias de 1891. Tal profusão de anúncios evidencia não somente os principais meios de
financiamento dos próprios jornais, como o próprio contexto de crescimento urbano de
Belém, em que havia grande circulação de dinheiro, impulsionada pela economia gomífera.
Materialização impressa da criação das necessidades de consumo (especialmente na ordem
doméstica), os anúncios sugerem o projeto de civilização que se queria implementar para a
cidade (COSTA; SCHWARCZ, 2000). De acordo com Sant’Anna (1997, p. 101), “através
desses anúncios, encontramos [...] a cidade que os constitui”. Da publicidade do Leite Moça
(da fábrica Nestlé) à da máquina de costura Singer, anunciavam-se produtos destinados aos
cuidados do ambiente doméstico e da saúde particular do leitor. Os medicamentos de toda
ordem – aqui compreendidos tanto as drogas reconhecidas como remédios, como outros bens
de consumo com pretensões terapêuticas – sobressaíam-se. Segundo Ramos (1987 apud
SANT’ANNA, 1997), já ao final do século XIX, os fabricantes de remédios constituíam parte
significativa dos anunciantes dos jornais. Nesse contexto, alguns produtos, e mesmo serviços
outros, apresentavam-se enquanto cura ou substituto do suicídio.
Nos anúncios das casas de venda de bilhetes de loterias, observa-se a estratégia de
publicidade em associar a “sorte grande” com grandes ou recorrentes acontecimentos do
momento. Uma maneira, um tanto simples, de prender a atenção do leitor até às últimas linhas
do anúncio, quando, enfim, tentava-se convencê-lo a fazer a aposta no sorteio, mudando
34

radicalmente de assunto, sem a preocupação com a coesão e a coerência de ideias. No período


das intensas chuvas de março de 1908, circularam muitas notícias sobre o fato de a cidade ter
sido tomada por uma série de desabamentos de imóveis. Aproveitando a ocasião, a casa de
loteria Vale Quem Tem mandou publicar anúncio que se inicia, justamente, tratando desses
lamentáveis episódios (DESABAMENTOS..., 1908, p. 2). Já a sua concorrente Agência Geral
de Loteria, sete anos antes, resolvera chamar a atenção do leitor com a exclamação, em caixa-
alta: SUICIDIOS! (1901, p. 2). O título, no plural, como já se comentou, funcionava a indicar
a ocorrência de sucessivos casos, e evidencia como o suicídio era um tema latente na cidade.
Nesse caso, o anúncio trata o desespero como moléstia e oferece a compra de bilhete de
loteria como remédio “de salutares effeitos”. Ao mesmo tempo, tirar a sorte grande se
contrapõe ao “instrumento homicida” com o qual se comete suicídio, que também é
representado como ato criminoso (SUICIDIOS!, 1901, p. 2).
Esse modelo de anúncio, aplicado pelas casas lotéricas de Belém, perdurou, no mínimo,
até meados da década seguinte. Em texto construído para narrar uma típica história que
tivesse o suicídio como desfecho lógico, a Vale Quem Tem fez publicar seu anúncio típico na
Folha do Norte de 17 de maio de 1917. Para tanto, mobilizou alguns dos elementos triviais de
associação ao suicídio, presentes no estilo dos fait divers das notícias comumente impressas
nos jornais diários da cidade: paixão e loucura: “Um amôr que por um triz não acaba em
tragedia [...] o rapaz ao receber a resposta negativa, ficou como louco, quiz suicidar-se”
([VALE...], 1917, p. 4). É interessante observar que essa estratégia na elaboração de anúncios
comerciais, com a intenção de se apropriar dos recursos narrativos das notas de sensação para
despertar o interesse na leitura, acabou se tornando tão evidente aos olhos de todos – dos
leitores aos articulistas e redatores de jornais–, que produziram autocríticas não menos
debochadas, como esta, publicada na Folha do Norte, de 18 de julho de 1917: “Ha gente que
tem tal prevenção com as noticias de epigraphes suggestivas dos nossos jornaes, que chegam
a uma conclusão de deixarem de ler muitas das vezes uma noticia sensacional, por pensarem
que seja blague ou reclame das Loterias do Estado [...]” (COISAS..., 1917, p. 4).
Em anúncio de cigarros publicado na edição de 11 de maio de 1916, do Estado do Pará,
enumeraram-se os fins trágicos de alguns homens célebres da história e, ao se referir ao
suicídio, por veneno, do filósofo grego Demóstenes, ironizou-o justamente por ter sido, ele,
um suicida: “se fumasse Quinze de Agosto é que seria ‘immortal’” ([QUINZE...], 1916, p. 3).
Em outros anúncios, a própria ideia de suicídio se insere como produto a ser comercializado.
No Estado do Pará, de 6 de março de 1919, publicou-se grande anúncio ilustrado do
espetáculo O Homem Suicida a ser apresentado no Palace Theatre, conforme Imagem 2.
35

Tratava-se de números de acrobacia da companhia Shipp & Feltus Circus, que estava a
excursionar pela cidade. Nesse caso, a publicidade positivava o suicídio, associando-o ao
heroísmo e à virilidade, na forma das exclamações: “Audacia! Arrojo! Sangue frio!
Coragem!” ([O HOMEM...], 1919, p. 3).

Imagem 2 – Anúncio da apresentação do “Homem Suicida”

Fonte: [O homem suicida: anúncio] (1919, p. 3)

Quanto aos anúncios de venda de fármacos e de produtos de uso doméstico – que


chegavam a ocupar as últimas folhas dos jornais diários de Belém no início do século XX –,
deve-se atentar para as “exigências sociais” da época, principalmente no tocante aos cuidados
com o corpo (SANT’ANNA, 1997, p. 100). Nesse sentido, observa-se a importância que se
dava aos remédios na vida cotidiana da cidade, apresentados na perspectiva de sua capacidade
em estabelecer a linha que separava o estado de saúde do de desespero e, a depender da
proposta, que separava a vida da própria morte. As representações contidas nesses anúncios
primavam em não esconder os sofrimentos com que os remédios se destinavam a acabar. A
longa descrição de sofrimentos causados por doenças e a presença de testemunhos de pessoas
que estavam “a ponto de desejar a morte” não eram raros (ADMIRAVEL, 1901, p. 4). Os
anúncios das Pílulas de Pião do Magalhães, veiculados na Folha do Norte, de 6 e de 10 de
maio de 1900, apresentavam-se com o sugestivo título Para não morrer: os padecimentos, por
uma série de doenças, estão longamente descritos em formato livre de versos, escritos por um
36

certo Queiroz Coruja, para quem a esperança cedeu lugar ao desespero, levando-o a clamar:
“Oh! morte vem, minha amiga,/ Terminar o meu viver” (CORUJA, 1900a, p. 4).
Esse desejo de fuga dos sofrimentos se faz presente em tantos outros anúncios, muitos
com o sentido do próprio aniquilamento do corpo físico. Em suma, seguia-se uma lógica
simples em que a vontade de morrer se associava ao estado de doença ou de dor insuportáveis.
A suposta eficácia de cura dos remédios era contraposta ao estado de desânimo e ao desejo do
suicídio. Tratava-se de medicamentos que se propunham a curar uma série indistinta de males
a um só tempo e, assim, servir a Nação brasileira, como se faz presente nos anúncios do Elixir
Nogueira, publicados na Folha do Norte em distintos (e distantes) períodos: em abril de 1907
– “mais um descrente da vida / mais um cidadão útil á sociedade” (20..., 1907, p. 2) –; em
abril de 1908 – “Mais um desgraçado! Mais um que a sociedade aproveita!” (MAIS..., 1908,
p. 3) –; e em abril de 1911 – “Dez annos de soffrimentos horrorosos! Parecia um degolado!
Supportava a vida para não ser um suicida!!” (DEZ..., 1911, p. 3).
Observa-se, sobretudo, que os anúncios não se sustentavam apenas na crença do efetivo
poder de cura desses rémedios, mas no valor da responsabilidade da própria ciência em cuidar
da vida do indivíduo. Conforme analisou Sant’Anna (1997, p. 104), tais anúncios de remédios
chegavam a ratificar certa “ignorância” do público leitor (potenciais doentes), “na medida em
que prometiam, sozinhos, realizar toda a cura”.
Alguns bens de consumo se propunham a acabar, eles próprios, com a chamada mania
do suicídio29. Cabe observar que a associação da mente do suicida com as manifestações da
loucura se fortaleceu ao longo do século XIX, juntamente com o aprimoramento das
especialidades psiquiátricas da medicina30. Nesse mesmo período, o saber médico-científico,
em geral, firmava-se como o definidor dos contornos da normalidade e passava a ditar as
regras de conduta das pessoas (LOPES, 1998)31. Paralelamente, ainda se sustentavam teorias
médicas que, apressadamente, alegavam razões bem práticas e fisiológicas para a ocorrência
do suicídio, e que foram apropriadas pelos jornais diários para fins comerciais. Relacionavam

29
Segundo o Grande Diccionario Portuguez (Thesouro da Lingua Portugueza), de 1873, “mania” foi o termo
que, vindo da própria Medicina, significava, na acepção originária, “alienação caracterisada por um delirio
geral com agitação, irascibilidade, furor”, ou “gosto elevado até ao excesso”, daí entrando no vocabulário
leigo como sinônimo de “doudice, desvio de espírito; delírio insensato” (VIEIRA, 1873, p. 101).
30
No início do século XX, o ramo médico da psiquiatria era relativamente novo no Brasil, no que se refere à sua
institucionalização e à sua profissionalização: as cátedras de psiquiatria foram criadas nas faculdades de
Medicina do Rio de Janeiro e da Bahia no início da década de 1880 (RUSSO, 2002).
31
Segundo Lopes (1998, p. 31), ainda nos dias atuais, são os agentes das áreas médicas quem, dominantemente,
criam “sentidos, imagens e referências ao suicídio e ao sujeito que o pratica”, embora sob outras perspectivas
e “relações de poder”, diferentes dos seus congêneres do século XIX: “os discursos e o saber [médico e
científico] também são históricos”.
37

também o suicídio ao funcionamento desregulado de determinados órgãos e sistemas do corpo


humano, como o gástrico-intestinal.
Essas associações remontam, mesmo que indiretamente, ao final do século XIX, como
evidenciado no anúncio das “pílulas anti-dyspepticas do dr. Heinzelmann”, publicado no
Diario de Noticias de 29 de julho de 1894: “durante muitos annos, ap nei [sic] soffrendo dos
intestinos e estomago, constantemente tristezas [...]” (ESTOMAGOS..., 1894, p. 2). A
publicidade do pó Rogé, por sua vez, garantia que “as idéas tristes” são resultantes de prosaica
prisão de ventre, conforme anúncio publicado na Folha do Norte de 24 de abril de 1903 (AS
IDÉAS..., 1903, p. 2). Segundo os anunciadores das pílulas rosadas do dr. Williams para
pessoas pálidas, “o melhor aliado da infelicidade e da desgraça é um estomago mau”, presente
na Folha do Norte de 22 de fevereiro de 1908 (OS MALES..., 1908, p. 3). No anúncio do
composto Ribott, do Estado do Pará de 15 de maio de 1919, as deficiências dos órgãos
digestivos passam a se relacionar com uma gama mais vasta, porém indefinida e abstrata, de
males, vinculando magreza com debilidades física e nervosa.
Corbain (2003, p. 570) identificou, em tratados médicos franceses do século XIX, certa
preponderância dos distúrbios gástricos no conjunto das “doenças femininas”, estas, por sua
vez, genericamente associadas ao universo, ainda nebuloso, da psique da mulher: “atribuem a
clorose [anemia] ao mau funcionamento do estômago, equivalente simbólico do útero”. No
anúncio da água industrializada Superaris32, publicado tanto na Folha do Norte de 12 de maio
33
de 1905, como n’O Jornal de 22 de junho de 1905 – este, presente na Imagem 3 –,
representou-se a relação do aparelho digestivo com as doenças da alma, e com a ideia do
suicídio, em particular. Nesses anúncios, de sugestivo título Combate ao Suicidio, marcam-se
as propriedades medicinais desse simples produto de mesa que, sem rodeios, prometia acabar
com semelhante “crime de lesa humanidade” (COMBATE..., 1905a, p. 2).
A linha argumentativa do anúncio, apropriada à pequena dimensão do espaço ocupado
na diagramação do jornal, respaldou-se em teorias e terminologias médicas, que legitimavam
o discurso empregado. Considerando que “todo o suicida é um dyspeptico acompanhado da
dilatação do estomago ou das gastralgias”, o anúncio sugeria que o suicídio decorre de males
físicos: o aumento irregular do estômago lesionava os órgãos que o rodeavam (como coração
e fígado). Isso acarretaria ao dispéptico uma série nefasta de consequências que “lhe abate o

32
Ressalta-se que o mesmo anúncio da água Superaris – Combate ao Suicidio – foi republicado nas edições da
Folha do Norte de 14 e 15 de maio de 1905. Já n’O Jornal, essa publicidade chegou a ser publicada também
nas edições de 14 de maio, e de 12 e 14 de junho de 1905.
33
Imagem gentilmente cedida pelo M. Raimundo Nonato de Castro.
38

moral e atrophia a intelligencia, apagando o maior instincto nato do homem – o da


conservação”. Bastava, ao doente, ter a digestão facilitada para afastar os pensamentos
suicidas, recomendando-se, portanto, beber a água Superaris “antes, durante e depois das
refeições”, ou misturá-la ao leite, ao refresco de frutas ou ao xarope: constitui-se no próprio
“nectar da existencia” (COMBATE..., 1905a, p. 2).

Imagem 3 – Anúncio da água Superaris

Fonte: Combate ao Suicidio (1905b, p. 3)

Nota-se, ainda, que não havia ineditismo de tal abordagem no quadro geral dos anúncios
publicado nos jornais da época. Já em 19 de maio de 1899, A Província do Pará fizera
publicar, em segunda página, anúncio bem mais modesto. Também associando as
indisposições provocadas por distúrbios digestivos às ideias de suicídio, o licor Paraense,
produzido pela firma Rodrigues Vidigal & C.ª, propunha-se eficaz no combate ao mesmo mal
do que viria a pregar, depois, a água Superaris. Bastar-se-ia tomar um só vidro do elixir para
salvar o suicida irremediavelmente do mal que o acometia. Nesse caso, o suicida seria todo
aquele que sofre de “febres palustres, perniciosas, sezões e inflammação do figado e baço”
(SUICIDA, 1899, p. 2).
39

1.3 A morte do futuro ou o futuro da morte: O debate em torno do suicídio na imprensa


belenense na virada do século XIX para o XX: Ambiguidade e polêmica

Conforme já demonstrado, a prática do suicídio podia assumir diversos significados,


oscilando entre sua negativação e, mesmo, sua positivação, dependendo do efeito que se
esperasse sobre o público leitor. A ambiguidade no trato do suicídio no Ocidente é um tema,
aliás, que perpassa a obra de Georges Minois, Histoire du suicide (História do suicídio),
publicada em 1995. Nela, o historiador francês identifica ambivalentes atitudes de sociedades
(até mesmo no nível individual) e de períodos históricos frente à morte voluntária, mesmo
quando se esperava a absoluta condenação do ato pelas autoridades, como no medievo
europeu. A pesar na elaboração das ideias ou na penalização do suicida, muito contavam as
categorias sociais envolvidas, os motivos alegados, e os meios adotados para a prática do
suicídio, colocando em polos distintos o que seria atitude nobre – a morte pela defesa da
honra ou de um ideal, ou por altruísmo –, e o que seria o mero vulgar – a morte por questões
consideradas menores, como o desespero (desperatio), as dificuldades financeiras ou as
paixões contrariadas. Minois (1998, p. 85) entende que o suicídio revela “um valor moral
positivo quando é praticado por nobres motivos”.
Esse mesmo signo da ambiguidade se revela na Divina Comédia (1307-1321), do
florentino Dante Alighieri. Inscrita no canône literário italiano, a obra chegou a inspirar,
inclusive, uma adaptação cinematográfica italiana na década de 1910: a fita muda O Inferno
(1911), cuja exibição nos cinemas de Belém, no período, pode ser evidenciada pelos anúncios
presentes nos jornais de abril de 1916, conforme Imagem 434. A alegoria dos círculos
infernais, criada por Dante, contribuiu na construção das representações modernas do suicídio
ocidental, por meio da “figuração visualizante” dos castigos infligidos às almas dos suicidas
(HANSEN, 2011, p. 56).
Os suicidas penitentes aparecem no Canto XIII (do Inferno), como os “violentos contra
si mesmos” (DANTE ALIGHIERE, 2011, p. 128). Eles jazem no segundo fosso do sétimo
ciclo infernal, sob a forma de árvores silvestres (como as sarças), na desoladora composição
representada aos olhos humanos: galhos nodosos, folhagem escura e frutos venenosos. Em
considerável cena do filme de 1911, esse lugar dos suicidas foi representado pela imobilidade

34
Possivelmente, a película do cineasta Giuseppe de Liguoro (original de 1911) tratou-se da mesma obra
cinematográfica exibida nos cinemas Olympia e Rio Branco, de Belém, na “Semana Santa” de 1916. No aviso
contido no próprio anúncio, alertou-se o público para não comparecerem “crianças e senhorinhas” em virtude
“das trágicas scenas” e do “realismo de que elle se reveste” ([CINEMA...], 1916, p. 4).
40

de galhos secos, presos a árvores estéreis fincadas em solo árido, entre as quais correm corpos
humanos na humilhação de sua nudez (INFERNO, 2006). A cada galho quebrado, jorra
“imundo sangue”, e as almas dos suicidas – fustigadas por seres monstro-mitológicos, como
as harpias ou “negras cadelas ávidas” – aguardam, nesse martírio do além, a chegada do juízo,
quando dependurarão sobre seus ramos, os corpos daqueles que, um dia, foram em vida, à
semelhança dos corpos dos suicidas enforcados (DANTE ALIGHIERE, 2011, p. 131).

Imagem 4 – Anúncio do filme O Inferno no cinema Olympia

Fonte: [Cinema Olympia: anúncio] (1916, p. 4).

Entretanto, quando Dante, guiado pelo latino Virgílio, sai dos abismos do Inferno e
alcança o portão do Purgatório – ponte segura para os campos verdejantes do Paraíso –, eis
que se lhe mostra Catão35, como velho – em respeito aos “seus austeros costumes” (ZILLER,
2011, p. 363) – e de aparência “de amor tão digno e tanta reverência” (DANTE ALIGHIERE,
2011, p. 232). Mesmo tendo sido pagão e suicida, o derradeiro ato de Catão será, para os
tempos futuros, sempre tema de intensos debates e controvérsias, em que não lhe faltarão as
indulgências ou mesmo os louvores que visavam reabilitá-lo (MINOIS, 1998).
Trata-se de considerações de outras temporalidades, mas que se podem aplicar ao
contexto de Belém da virada do século XIX para o XX, para entender a diferenciação feita
entre os suicidas pelos jornais que circulavam na cidade. Entre 7 e 10 de maio de 1908, a
Folha do Norte deu ampla publicidade ao suicídio do comerciante português João Pereira da
Silva Tavares, no seu escritório comercial, por conta da ingestão letal de estricnina. O motivo
residia no fato de não conseguir resolver as dificuldades financeiras que enfrentava em

35
Catão de Útica, célebre romano que, perdendo embate político com o imperador Júlio César, suicidara-se por
honra no ano 46 a.C. Dilacerou-lhe as entranhas, depois de se auto apunhalar, ao temer seu destino perante as
novas circunstâncias que se lhe apresentavam (MINOIS, 1998; ZILLER, 2011).
41

decorrência da crise no comércio local, o que foi agravado com a decisão judicial de arresto
dos bens do escritório como garantia.
Na publicação da Folha do Norte, utilizaram-se termos que enfatizavam a honra do
suicida, no sentido de fazer dessa tragédia algo que pertencesse à cidade, pois a crise (em
decorrência do declínio da economia da borracha) atingia a todos – reafirmado pela alegação
de que sua morte “causou a mais dolorosa impressão no espírito público” (OS QUE SE
MATAM..., 1908b, p. 1). Apesar de se ter noticiado que João Tavares mantivera o tóxico
guardado em seu cofre há três anos – o que não afasta a possibilidade da premeditação do ato
e o seu reconhecimento como manifestação de loucura –, enalteceu-se a probidade e o caráter
laborioso do comerciante, reconhecido como imigrante atuante na praça de Belém há mais de
quarenta anos. O articulista da Folha do Norte teceu a seguinte consideração: “O acto de João
Tavares põe de relevo a nobreza de seus sentimentos” (OS QUE SE MATAM..., 1908b, p. 1).
Por fim, descreveu-se a sua morte (após a ingestão do veneno), como a de uma serenidade
digna de se equiparar ao símbolo grego do suicídio honrado, o do filósofo grego Sócrates 36.
Do outro extremo da cidade, tanto física como socialmente, e ainda não passado um mês
do suicídio do comerciante português, a mesma Folha do Norte publicou certa tentativa de
suicídio do pardo Joaquim dos Santos Virgolino. Morador de uma barraca “que occupa no
logar Escondido, proximo do telegrapho sem fios”, Santos Virgolino, alcóolatra inveterado,
naquele dia andava a vagar pelas ruas e a pedir dinheiro para comprar bebida. Encontrando-se
em tal estado, rogou “ao Divino que espancasse para sempre a macaca que lhe amargurava a
existencia”. Reclamando de sua miserável vida sem recursos, por fim, atirou-se às águas do
igarapé das Almas37, no meio da noite (INTEMPERANÇA..., 1908, p. 1). Como se pode
supor, a partir dos termos irônicos com o que essa tentativa de suicídio foi trabalhada pelo
jornal, o mesmo não se concretizou, tendo a água fria recobrado a consciência do suicida,
antes perdida pelos efeitos do álcool. Nesse caso, o suicídio é descrito no nível do ridículo,
verificado em tantas outras notícias do gênero, em que a condição social do suicida assim o
permitia. O ato de Santos Virgolino foi reprovado, sobretudo por ser consequência natural de
uma Intemperança perigosa, título com o qual fora noticiado.

36
Sócrates (470?-399a.C.), em vida, condenava a morte voluntária, como ato de vontade humana, respaldando-se
nos pitagóricos, segundo diálogo presente no Fédon (entre 387 e 361 a.C.), de Platão (427?-347a.C.). Porém,
condenado a beber cicuta por um tribunal de cidadãos atenienses, aceitou o destino que lhe fora imposto com
serenidade, como se fora sinal dos deuses. A sua morte acabou se tornando verdadeiro mito suicida para a
posteridade (ALVAREZ, 1999; BROWN, 2001; MINOIS, 1998; PUENTE, 2008).
37
Atual avenida Souza Franco, na cidade de Belém, após os trabalhos de urbanização e de asfaltamento.
42

Pelos próprios termos que intitulavam os vários relatos de casos de suicídio ocorridos,
tanto em Belém como em outros lugares, observa-se o tipo de valoração do ato suicida que
norteará toda a narrativa subsequente. Em muitos casos, reflete-se o contexto do mundo dos
vivos. Percebe-se que, geralmente, utilizavam-se determinados qualificativos para designar os
suicidas, pelos quais se sabia, de antemão, tratar-se de uma notícia sobre suicídio. Havia
títulos como Os vencidos da vida – presente na Folha do Norte de 26 de abril de 1912 –
relativo à notícia da morte do marinheiro que ingeriu ácido fênico a bordo do vapor “Justo
Chermont”; ou Os Fracos – no Estado do Pará, de 18 de janeiro de 1919 –, que abordou não
somente o suicídio de um lavrador em Barcarena, por disparo de arma de fogo no ouvido,
como o de uma prostituta desprezada pelo amante.
Se o filósofo e crítico literário alemão Walter Benjamin (1975) percebia a íntima
relação entre os suicídios e o “heroísmo” das classes trabalhadoras na modernidade da
primeira metade do século XX, as considerações feitas pelos articulistas dos jornais de Belém
do início desse século demonstram como se podia compreender o suicídio, para além de um
estado de fraqueza humana, como o processo natural de exclusão passiva das categorias
sociais que não estariam aptas a vivenciar o processo civilizatório que se almejava, em uma
espécie de darwinismo social38, então em voga.
Jackson Ferreira (2004) identificou como esse derivativo das ideias originais de
Spencer, aplicado aos debates acadêmicos brasileiros, contribuiu na formulação de dada linha
argumentativa que julgava ser o suicídio decorrente da hereditariedade. Para tanto, citou
trechos da tese de Antonio de Paiva Sarmento (1919, p. 8), defendida na Faculdade de
Medicina da Bahia, em que se atribuiu “papel saliente” aos fatores hereditários até na
determinação “das varias perturbações psychicas”, a ponto de iniciar a sua discussão médica
sobre o suicídio justamente por esse aspecto. Segundo ainda o médico baiano, “encontramos
varios membros d’uma mesma familia, que se entregam á morte, todos elles ligados á um
mesmo principio, isto é, a herança.” (SARMENTO, 1919, p. 8-9).
A extensão dessas ideias, no entanto, ultrapassou o âmbito familiar da linha hereditária,
para considerar o suicida como a expressão acabada da degeneração de determinadas raças,

38
O termo “darwinismo social” se refere à apropriação, pelas ciências sociais, da teoria sobre a evolução das
espécies animais, aplicadas pelo naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882), no âmbito da ecologia em
meados do século XIX. Segundo Darwin, a constituição atual dos seres vivos seria decorrente do lento
processo de adaptação ao meio ambiente e da luta pela sobrevivência, em que as espécies mais aptas tendiam
a se perpetuar. As ideias do pensador inglês Herbert Spencer (1820-1903), por sua vez, influenciaram no
surgimento do darwinismo social, que transferiu os conceitos de evolução e de adaptação para a compreensão
das culturas, e desenvolveu “a ideia de que algumas sociedades e civilizações eram dotadas de valores que as
colocavam em condição superior às demais” (SOUSA, 2012).
43

que seriam mais predispostas à prática do suicídio. Esse darwinismo social chegou a
direcionar os estudos sobre o suicídio por um viés racial, habilitando-se os brancos ao
processo civilizatório, em detrimento dos negros e dos mestiços, ou seja, de grande parcela da
população brasileira (FERREIRA, 2004).
A “hereditariedade mórbida”, conceito que se refinou e se difundiu ao longo do século
XIX (CORBIN, 2003, p. 566), tornou-se elemento importante na compreensão do suicídio. O
desejo de se matar, que seria adquirido hereditariamente39, serviu como viés explicativo para
o irromper da loucura, como predisposição inoculada no indivíduo, a brotar por ocasião de
qualquer causa determinante ou ocasional. O temor provocado por essa ideia de degeneração
latente, esse “fundo de perversidade oculto” (GAY, 1990, p. 140) – que aproximava o homem
da bestialidade original –, mostra-se perceptível nas páginas dos jornais belenenses da virada
do século XIX para o XX, nas muitas notícias sobre casos de suicídio ou de loucura. Como
fundo explicativo dessas notícias, observa-se implícito o mesmo conceito de “família
patológica”, empregado por Corbin (2003, p. 565), para tratar da sensibilidade burguesa do
século XIX.
Na extensa notícia publicada a 18 de julho de 1900, na Folha do Norte, sobre os
pormenores envolvendo o suicídio do maranhense Origenes Marques Coqueiro, no bairro da
Pedreira, em Belém, um dado, adicionado ao seu final, não parece ocasional: “um primo de
Origenes, ha dous annos, suicidou-se em Maranhão, ingerindo veneno” (A AGONIA..., 1900,
p. 2). Também ao término da notícia publicada na Folha do Norte de 13 de maio de 1908,
sobre a tentativa de suicídio do prático Fábio Maia da Costa, por ingestão de verde-Paris, há a
informação de que o tio do suicida, o despenseiro Antonino Maia, também havia se
envenenado, em outros tempos, inclusive pelo mesmo tóxico (UM PRATICO..., 1908). Como
se observa nessas duas situações, essa busca pelo passado familiar do suicida, introduzida nos
textos pelos articulistas, parece funcionar como chave explicativa para o ato praticado,
conspirando o suicida contra o próprio “capital genético da família” (CORBIN, 2003, p. 599),
mesmo que, no caso específico de Fábio Costa, tenha sido identificado o fato de ter sido
despejado do lugar em que costumava frequentar, como causa imediata de sua tentativa de
suicídio.
Enquanto ainda vigorava a crença no autoaniquilamento inato de algumas categorias
sociais ou etnias, outro tipo de percepção – e mesmo de preocupação – sobre o suicídio se

39
Segundo Erwin Stengel (1980), a discussão envolvendo suicídio e hereditariedade evoluiu no século XX,
para, na década de 1970, pesquisas apontarem a vinculação do suicídio à formação de determinados genes,
embora sem muito embasamento científico.
44

constrói por ocasião do desenrolar do que, atualmente, é denominado de Primeira Guerra


Mundial, entre os anos de 1914 a 1918. Mesmo que essa conflagração, enquanto conflito
armado, não tenha atingido o solo brasileiro, as repercussões no domínio da quebra das
certezas e dos paradigmas sobre o progresso e os rumos da civilização (HOBSBAWN, 1998),
manifestavam-se também nas notícias dos jornais de Belém da época, inclusive naquelas
sobre os suicídios ocorridos no âmbito local40. Em questão estava a dúvida quanto ao próprio
destino da civilização, dada a sensação de caos sem previsão de término, construída a partir
das representações das atrocidades da guerra noticiadas nos jornais diários de Belém. Seus
leitores tomaram conhecimento, por exemplo, dos trágicos acontecimentos sucedidos na
Bélgica, por ocasião da imediata ocupação alemã, na primeira fase da Grande Guerra:
destruição de povoados inteiros (CONFLAGRAÇÃO..., 1914), ou fuzilamentos em massa de
civis, em especial, de crianças (CARTA..., 1914), passaram a fazer parte do seu cotidiano de
leitura. Os efeitos da guerra sobre as crianças, por sinal, tornaram-se um apelativo corrente a
provocar a sensibilidade dos leitores, e a criar correntes de solidariedade na capital paraense
protagonizadas pela oficialidade. Na Folha do Norte de 24 de outubro de 1917, noticiou-se a
organização de um festival, sob comando do próprio governador do Estado, Lauro Sodré, “em
favor dos orphãos portuguezes da guerra” (EM BENEFICIO..., 1917, p. 1)
Paralelamente, o uso de imagens fotográficas em jornais diários belenenses, como o
Estado do Pará, a Folha do Norte e A Tarde, gradativamente se tornou profuso no decorrer da
década de 1910. Essas imagens, que passaram a documentar o cotidiano europeu naqueles
tempos de guerra, pesaram significativamente no despertar da “atenção pública” para os seus
horrores, a confirmar a premissa de que, “quando há fotos, uma guerra se torna ‘real’”
(SONTAG, 2005, p. 87). A Folha do Norte, na edição de 13 de janeiro de 1918 (quando ainda
não havia perspectivas do término da guerra), estampou, em primeira página, o clichê
apresentando duas crianças a escrever em um banco escolar, ambientado em um espaço
externo (ao mesmo tempo vazio) de representação do estado de desolação. Pelo disposto no
título e na legenda dessa imagem, atribuiu-se como sendo dois órfãos de guerra, conforme se
visualiza na Imagem 5. O impacto que tal representação teve sobre a opinião pública

40
Os traumas psicológicos, decorrentes da guerra européia de 1914-1918, foram representados, na própria
literatura, em associação ao suicídio. O romance Mrs. Dalloway (1925), da escritora inglesa Virginia Woolf
(1882-1941) – marcante pela sua estrutura narrativa fragmentada (em diálogo com a recém linguagem
cinematográfica) – retrata, dentre outros aspectos e personagens, os últimos momentos do jovem e “pálido”
Septimus Warren Smith, ex-combatente no front de batalha italiano, que se suicida, atormentado pelas
recordações da guerra. Na apresentação desse personagem, traçou-se o sentimento que lhe atormentava e o
levaria ao salto mortal de que morreu ao final (Septimus se jogou da janela do prédio): “O mundo alçara seu
látego; sobre que se abateria?” (WOOLF, 1980, p. 17).
45

belenense só pode ser avaliado se se considerar o contexto histórico em que foi publicada. Em
1918 ainda não havia a “saturação” de imagens típica da sociedade atual (com o seu arsenal
de novas tecnologias), ou seja, tratava-se de um tempo passado em que “os jornais ainda não
traziam muitas fotos” (SONTAG, 2005, p. 90)41, especialmente em Belém. Ao mesmo tempo,
deve-se dimensionar a ampliação do alcance da leitura dos jornais, trazida com esses novos
recursos visuais, perante um público leitor que passou a se apegar às imagens, com valor
semântico (LESSA; MENEZES, 2009).

Imagem 5 – Aspectos do cotidiano da Grande Guerra para as crianças

Fonte: Os orphãos da guerra (1918, p. 1)

Naqueles tempos, esteve em pauta, nas redações dos jornais de Belém, informar sobre a
guerra e, principalmente, mostrá-la, enquanto realidade mais palpável, na mesma urgência
com que a mesma foi deflagrada e as tropas beligerantes, mobilizadas. Já em fins de 1914,
podiam-se perceber as preocupações a respeito do destino do mundo civilizado, diante da falta
de boas perspectivas de uma solução rápida ao problema. Com os acirramentos dos conflitos e
o total fracasso da diplomacia, não se conseguia manter a esperança no futuro: “o inquietador
ponto de interrrogação mantem-se [...]” (ALMEIDA, 1917c, p. 1). Em especial, indagava-se

41
A ensaísta norte-americana Susan Sontag (1933-2004) questiona se muito da força de uma imagem está
relacionada “pela maneira como é usada, pelos lugares onde é vista e pela freqüência com que é vista”, e traz
importantes pontos de reflexão sobre a premissa dos críticos da banalização das imagens de violência, de que
a mesma acaba por reduzir a capacidade de reação a elas (SONTAG, 2005, p. 88).
46

se a própria civilização não estaria se suicidando, devorando as próprias entranhas no absurdo


“desta guerra feroz e cruel” (CARTA..., 1914, p. 2). As notícias sobre as tensões, que se
generalizavam entre os Estados europeus, presentes nos jornais belenenses – como a Folha do
Norte e o Estado do Pará – nos meses que precederam a julho de 1914, prenunciavam o
início de um conflito iminente42, mas que não conseguiram antever a dimensão que se tomou
depois. Hobsbawn (1998, p. 267-268) salientou, como “estranho fenômeno”, o sentimento
belicoso que tomou grande parte da juventude e da intelectualidade burguesas na Europa, que
então se mobilizavam para a formação das tropas: “foi com frequência observada, durante os
anos precedentes a 1914, a moda de rejeitar o ideal da paz, da razão e do progresso por outro,
de violência, instinto e explosão”.
Houve quem identificasse a dor do período como sendo a “dôr collectiva da multidão
atormentada pela guerra” (ALMEIDA, 1917b, p. 1). A violência desta, de certo modo, passou
a competir com a do cotidiano das cidades na preferência dos leitores pela leitura de notícias
de sensação. A articulista Virginia de Castro e Almeida (1917a, p. 1), em suas Cartas
publicadas na Folha do Norte43, chegou a declarar que só a apaixonavam as notícias sobre a
guerra “nas columnas dos periodicos que o correio [...] traz regularmente todos os dias”,
sendo que “os crimes passionaes e outros não me distrahem nem me prendem [...]”.
Na medida em que o recrutamento de homens para as tropas das nações envolvidas nos
combates atingia também os membros masculinos das colônias estrangeiras instaladas em
Belém, como a portuguesa e a italiana, todo um ambiance imaginado de guerra se incorporou
ao cotidiano simbólico da cidade. E os jornais diários foram portadores desse movimento,
assimilando muitos termos e imagens que se relacionavam aos conflitos, como nos anúncios
comerciais. Na forma da Imagem 6 (montagem), pode-se observar que o anúncio das pílulas
Vallet representou o cuidado com a saúde física como condição de sobrevivêncía da própria
nação naqueles tempos bélicos: “Está prompto a dar o seu sangue pela patria... Mas só o póde
dar, quem o tiver... ora, para ter sangue, é preciso tomar PILULAS VALLET [...]”

42
Ao longo de 1913, jornais de Belém, como o Estado do Pará, publicavam notas acerca da “Guerra dos
Balkans”, envolvendo os Estados da Sérvia, da Bulgária, da Grécia e da Turquia. Em algumas dessas notícias,
já se manifestava a preocupação com um conflito de maiores proporções: “A tranquillidade européa ainda é
duvidosa [...]. A Europa continúa a atravessar momentos de verdadeira angustia, devido aos acontecimentos
desenrolados na peninsula balkanica.” (ITALIA, 1913, p. 1).
43
Virginia de Castro e Almeida, jornalista, romancista e educadora portuguesa, passou a colaborar com a Folha
do Norte, como correspondente, a partir da edição de 13 de maio de 1911 (AZEVEDO, 1911). Nesse jornal,
assinava as Cartas, geralmente publicadas em primeira página (no espaço da diagramação reservado aos
editoriais), ao longo da década de 1910. Nessa coluna, Vírginia Almeida opinava sobre o que se passava no
continente europeu. Escreveu livros infantis e manuais de moral, como A fada tentadora, Céo aberto, Como
devemos crear e educar os nossos filhos e Educação de raparigas (AZEVEDO, 1911).
47

([PILULAS...], 1914, p. 5). Já o anúncio do Alcatrão-Guyot fez, do próprio frasco do elixir, a


arma de artilharia utilizada na alegoria criada para o combate aos micróbios
(ARTILHARIA..., 1918).

Imagem 6 – Anúncios comerciais em tempos belicosos

Fontes: [Pilulas Vallet: anúncio] (1914, p. 5); Artilharia da hygiene (1918, p. 6)

Do mesmo modo, as notícias de sensação, sobre os dramas cotidianos da capital


paraense, incorporavam termos e significados, então utilizados para se referirem aos episódios
da guerra. Com relação à publicação dos casos de suicídios, não foi diferente. Títulos
presentes nos jornais da cidade, dentre os quais a Folha do Norte e o Estado do Pará, tais
como Os voluntarios da morte (1917, p. 2) ou Os que desertam (BRASIL..., 1915, p. 2) são
evidências de que as notícias sobre os velhos suicídios de sempre, agora eram tratados sob o
aspecto bélico da luta diária pela vida. Em 11 de agosto de 1915, o Estado do Pará publicou a
tentativa de suicídio do estivador Silvino Honorio Ferreira da Silva. Segundo os termos
utilizados nessa notícia – pelo emprego deliberado do trocadilho44–, o suicida travou um

44
Segundo Propp (1992, p. 131), o efeito possível do riso, provocado pelo uso do trocadilho, está na razão do
jogo polissêmico entre o sentido amplo ou geral do termo compreendido por um dos interlocutores, e o
sentido mais restrito ou literal, substituído pelo outro.
48

próprio combate em seu campo de batalha pessoal, em detrimento do conflito mundial que
seria mais digno de luta. Por causa de um amor não correspondido, Silvino Silva “quis [...]
alistar-se na vasta legião de voluntariosos candidatos á cóva, que ultimamente têm
apparecido em Belém” (UM SUICIDA..., 1915, p. 1, grifo nosso).
Mesmo com a assinatura do armistício europeu em 11 de novembro de 1918, o tempo
em Belém não estava somente para o restabelecimento da confiança no futuro da humanidade.
O fim da guerra trouxe também o surto epidêmico de gripe espanhola, que atingiu o solo
belenense em 191845. O impacto dos números dos infectados na cidade foi de tal ordem46, que
até os suicídios – já associados à gama das patologias mentais –, chegaram a ser representados
com alguns dos sintomas típicos de um diagnóstico de influenza. Desse modo, com descrições
de acessos de febre, os casos de suicídio em Belém disputaram o espaço das notícias dos
jornais com o alarmante número de casos registrados da gripe. Na Folha do Norte de 12 de
novembro de 1918, foi publicada a notícia do suicídio do vendedor ambulante Manoel
Barbosa, que “delirando pela febre”, saiu do prédio do hospital da Beneficente Portuguesa e
se lançou às “rodas de um trem” (DESTINO..., 1918, p. 1). Apenas um dia depois, a mesma
Folha do Norte publicou outra notícia sobre suicídio ocorrido na cidade. Dessa vez, fora a do
soldado da brigada militar do Estado, o sergipano Secundino Rosa que, “tomado de febre
alta”, ingeriu grande dose de fenol (UM INFORTUNADO, 1918, p. 2).
Por outro lado, nota-se como o suicídio também era usado, pelas nações beligerantes,
como instrumento simbólico na disputa pela informação nos jornais, através dos telegramas
que eram, neles, publicados. Nesses casos, apropriavam-se do suicídio “para desconsiderar o
adversário” (MINOIS, 1998, p. 108). Da França, veio a nota telegráfica comunicando o
suicídio de um oficial grego da guarnição de Kavalla (FRANÇA, 1917). Já de Londres,
transmitiu-se a nota sobre o suicídio do general austríaco Picker, “atacado de neurasthenia”
(NOVAS..., 1915, p. 1). Essas notícias ligeiras dando conta do suicídio dos atores do teatro da
guerra – das altas patentes militares aos soldados das trincheiras, de um lado e de outro das

45
A gripe espanhola – derivado mortal da influenza – tornou-se verdadeira pandemia, ultrapassando o espaço
europeu, especialmente no segundo semestre de 1918, em função dos quatro anos seguidos de guerra, que
facilitaram sua rápida propagação: pelos “movimentos maciços de pessoas através dos continentes”, e pelas
condições precárias de saúde e de higiene (WILLMOTT, 2008, p. 287). Há o registro, na Folha do Norte de 6
de dezembro de 1918, de quatrocentos e setenta e nove óbitos decorrentes só de gripe, e de oitenta e sete, de
pneumonia, apenas para novembro de 1918 em Belém (A MORTALIDADE..., 1918). Segundo as estatísticas
oficiais, publicadas no periódico Pará-Medico..., a gripe ocupou o primeiro lugar em causa mortis no segundo
semestre de 1918, com quinhentos e setenta e quatro casos de mortes provocadas (ESTATISTICA..., 1919, p.
153).
46
São sintomáticos desse período de grande mortandade pela gripe espanhola, os anúncios que passaram a ser
publicados em jornais, como a Folha do Norte: a casa comercial A Restauração ofereceu ao grande público o
seu “mais completo sortimento em artigos para LUCTO [...]” ([A RESTAURAÇÃO...], 1918, p. 2).
49

linhas de frente – traduziam a guerra travada para além dos campos europeus de batalha, no
imaginário dos leitores de jornais de Belém.
No período estudado, houve também, em Belém, quem, com preocupação, percebia
tamanha presença da morte voluntária, enquanto temática, a correr livre pelos jornais da
capital, e que, sentindo-se incomodado, foi aos mesmos jornais argumentar contrariamente à
prática de suicídios. O cônego José de Andrade Pinheiro47 escreveu, em A Província do Pará
de 23 de maio de 1908, no lugar do editorial, artigo em que reafirmava o posicionamento
milenar da doutrina cristã, condenatório da prática do suicídio. Sua argumentação situou-se,
primordialmente, em bases morais e teológicas.
Na Imagem 7, observa-se Andrade Pinheiro em fotografia posada de estúdio, publicada
em 1898. A simplicidade do cenário e a austeridade da pose, presentes na fotografia,
referenciam-se nas posições firmes e conservadoras do representado. Andrade Pinheiro fez
pousar, sob a mão direita, exemplar da obra Cancioneiro de Leão XIII48. Assim, representou-
se a figura do cônego, sugerindo-o como escritor que era, ligado ao mundo das letras líricas e,
ao mesmo tempo, alinhado ao programa doutrinário do pontificado. Como agente da
romanização em terras amazônicas49, estreitamente ligado ao bispado – e, a partir de 1906, ao
arcebispado – local, Andrade Pinheiro se mostrou ferrenho defensor da moral e da doutrina
cristãs. Como diretor do colégio São José em Belém, o cônego vigiava o comportamento dos
seus internos, reprimindo, com castigos físicos, práticas consideradas desviantes, como as
onanistas e as homoeróticas, tal como notado em pesquisa realizada pela historiadora Cristina
Cancela (2006). Como jornalista, Andrade Pinheiro participou ativamente dos debates
ocorridos nos jornais belenenses – espaços propícios tanto para a defesa dos ideais
romanizados, como para as críticas liberais na virada do século XIX para o XX (MAUÉS,
1994) – e escolhera o suicídio, dentre outros temas candentes, como uma de suas frentes de
combate.

47
José de Andrade Pinheiro, sacerdote secular da Sé de Belém, também foi educador, tendo sido diretor do
colégio São José. Há tempos militava na imprensa cotidiana de Belém, tendo participado do corpo redacional
de A Boa Nova, jornal católico lançado em 1871, e se alinhava ao “discurso conservador da Cúria local”
(FIGUEIREDO, 2005, p. 249). Também escrevia artigos sobre assuntos políticos locais.
48
O papa Leão XIII exerceu a posição de sumo pontífice católico no período de 1878 a 1903.
49
Segundo Maués (1994), o movimento de reforma do Catolicismo no Brasil, operado a partir da segunda
metade do século XIX e conhecido por “romanização”, teve o seu clímax no Pará durante o bispado de D.
Macedo Costa (1850-1890). Visando uma aproximação maior com o pontificado romano, esses bispos
reformadores e seus agentes defendiam “uma ideologia extremamente conservadora” e centralizadora, também
chamada de ultramontana.
50

Imagem 7 – O cônego Andrade Pinheiro

Fonte: José de Andrade Pinheiro (1898).

Treze anos antes dessa publicação n’A Provincia do Pará, Andrade Pinheiro já havia
exposto ideias contrárias ao suicídio, em outro artigo publicado no Diario de Noticias, de 8 de
fevereiro de 189550. Em ambas as ocasiões, o padre não deixou de manifestar sua total ojeriza
ao próprio termo “suicidio”: “basta o pronuncial-o para que tenhamos o espirito como em
sobressalto e assombrado!” (PINHEIRO, 1908, p. 1). No artigo publicado no Diario de
Noticias, recorreu aos dicionários para, de modo didático, definir o objeto do seu
descontentamento: “Que é o suicidio? = Acção d’aquelle que se mata á si mesmo”
(PINHEIRO, 1895, p. 1). Também buscou a definição de suicida, como sendo “a pessôa que
dá a morte á si mesmo”51, levando o leitor a refletir sobre a “temeridade da pessôa, que o
practica” (PINHEIRO, 1895, p. 1).
O recurso de Andrade Pinheiro aos dicionários de sua época revela, de sua parte, certo
incômodo ou dificuldade em assimilar tais palavras no léxico nacional, embora não se
tratassem de nenhum neologismo ao final do século XIX. O termo “suicídio”, na realidade, só

50
O artigo de José de Andrade Pinheiro, publicado no Diario de Noticias de 8 de fevereiro de 1895, depois foi
coligido com outros escritos do cônego, para compor o seu livro Ensaios religiosos e litterarios, de 1898.
51
No Grande diccionario portuguez, edição de 1874, os conceitos de suicídio e de suicida correspondem
exatamente ao informado pelo cônego Andrade Pinheiro, no artigo publicado no Diario de Noticias de 8 de
fevereiro de 1895.
51

passou a ser usado na língua portuguesa ainda no século XVIII, derivado do inglês suicide52
(DAUBE, 1972 apud MINOIS, 1998), para substituir termos combinativos ou perífrases como
“morte voluntária” ou “assassínio de si”. Afirma-se que o verbete “suicídio” é, acima de tudo,
construção moderna, a ponto de revelar a “evolução do pensamento e da crescente frequência
dos debates sobre este assunto” (MINOIS, 1998, p. 228). Segundo Veneu (1994, p. 14), a
introdução desse novo termo nos léxicos nacionais sinalizou a própria “construção da
subjetividade” nas atitudes coletivas frente à morte voluntária: admitiram-se a possibilidade
do autoaniquilamento e a vontade própria para cometer o ato. Tornou-se preciso garantir-lhe
uma designação própria, uma condição autônoma que lhe retirasse o caráter de
excepcionalidade e de dependência com relação às formas usuais de homicídio, tanto
condenadas pela tradição cristã como endossadas pela interpretação elástica de santo
Agostinho (354-430) em relação ao quinto dos mandamentos judaicos-cristãos: “Não matarás
pessoa alguma nem mesmo a ti. Com efeito, quem se mata não é matador de homem?”
(AGOSTINHO, 1990, p. 51, grifo do autor).
Essa nova terminologia, amparada na base latina sui (de si) e caedes (crime), também
aproximou a prática suicida ao sentido nobre do “suicidium pagão de Catão”, por muitos – e
em determinadas épocas – considerado mais aceitável (MINOIS, 1998, p. 228, grifo do autor).
Por outro lado, a ação do suicida ainda se expressa, na língua portuguesa, pelo verbo reflexivo
(não menos redundante) “suicidar-se”53. Para Minois (1998, p. 229), esse fato demonstra que
a ideia sobre o suicídio ainda não conseguiu totalmente se desvincular da “de crime contra si
mesmo”, no contexto cultural luso-brasileiro.
O cônego Andrade Pinheiro não estava sozinho no seu combate contra o suicídio.
Paulino de Brito54 também emitiu considerações a respeito na sua coluna Repercussões, do
Estado do Pará de 18 de março de1919. Nela, o professor amazonense remontou às teses
fundantes da interdição cristã ao suicídio, e retomou algumas das premissas levantadas por
santo Agostinho (1990, p. 46), manifestadas, sobretudo, em A cidade de Deus: “Se a ninguém
é permitido matar, por sua própria vontade [...], pois nenhuma lei concede semelhante direito

52
O termo suicide foi um latinismo empregado, pela primeira vez, na obra Religio Medici, do inglês sir Thomas
Browne, publicada ainda na primeira metade do século XVII, impondo-se o seu uso mais corrente apenas cem
anos depois (ALVAREZ, 1999, p. 63-64).
53
A forma verbal “suicidar-se” também consta no Grande diccionario portuguez, de 1874.
54
Paulino de Brito foi escritor, professor e filólogo amazonense, colaborador de vários jornais diários de Belém,
como A Província do Pará e o Estado do Pará, principalmente com artigos sobre o ensino da língua
portuguesa (DINIZ, 2004). Clóvis Rego (1997, p. 72) descreveu-o como “tímido, místico, modesto por
temperamento e pelos recursos materiais”. Paulino de Brito faleceu a 16 de setembro de 1919, portanto quase
seis meses após a publicação do seu artigo Ladrões de Deus no Estado do Pará.
52

a quem quer que seja, toda pessoa que se mata é homicida, mais culpado, matando-se [...]”55.
Na edição de 7 de julho de 1880 do jornal A Boa Nova – órgão divulgador dos ideais católicos
–, a alusão à doutrina agostiniana havia sido ainda mais explícita: “O mesmo Doutor [santo
Agostinho] [...] refuta as razões e causas, pelas quaes, alguns pensavam falsamente que era
licito matar-se á si proprio” (O SUICIDIO, 1880, p.1)56.
Desse modo, reintroduziu-se, no debate local dos jornais de Belém, o argumento de não
se poder dispor da própria vida, pois a mesma pertenceria à divindade superior: “nada ha que
seja tão alheio como essa consignação [a vida], da qual teremos de prestar severas contas”
(BRITO, 1919b, p. 1); ou mesmo à sociedade na qual se vive: “Todo homem é parte da
communidade, e pertence-lhe como a parte ao todo” (O SUICIDIO, 1880, p. 1). Na sua Suma
Teológica, são Tomás de Aquino (1225-1274) também atribuiu somente a Deus a decisão
final sobre a vida humana: “[...] a passagem desta vida para uma outra mais feliz não depende
do livre arbítrio do homem e sim do poder divino” (AQUINO, 2008, p. 79).
Mesmo após o lento processo, iniciado a partir do século XVIII, de menosprezar ou
atenuar os aspectos morais e teológicos da discussão sobre o suicídio na cultura ocidental,
Paulino de Brito se sustentou na noção implícita de pecado e relegou os suicidas à mísera
condição de “ladrões de Deus”. Para Gay (2001, p. 212-213), o deslocamento da discussão
sobre o suicídio, das esferas estritamente moral e teológica para a civil e médica, não se deu
sem conflitos ou sem recuos, já que os oitocentistas não se viram, de todo, livres da “sombra
da religião”.
Por outro lado e retornando a 1895, a visão mais humanizada do suicídio já ganhava
terreno nas próprias instituições públicas da recém-proclamada República. No final de século
XIX, com a dissolução do regime do padroado régio, afastou-se o então poder legal exercido
pela Igreja Católica nas questões relacionadas à vida civil, como o casamento e o
sepultamento dos mortos (SILVA, 2003). No tocante à descriminalização do suicídio, no
curso do século XIX, o processo gradual da desculpabilização da pessoa do suicida57 começou
a estabelecer pontos de diferenciação entre os conceitos de pecado e de delito, e de “clamar
por uma interpretação exclusivamente civil das leis”58 (ANDRÉS, 2003, p. 294, tradução
nossa). Esse gradual afrouxamento moral em relação ao suicídio, em muito, deveu-se às

55
Segundo Minois (1998), santo Agostinho fora influenciado pela corrente neoplatônica de seu tempo.
56
Indicação de leitura fornecida pelo Dr. Marcio Couto Henrique no decorrer da pesquisa.
57
Como bem salientou Ramón Andrés (2003, p. 297) – ao analisar o debate em torno dos direitos do homem e
do cidadão ao longo do século XVIII –, o suicídio, enquanto prática, todavia não conseguiu a dignidade de ser
declarado como direito civil, pois que o mesmo deve garantir ao homem o seu próprio “futuro” (potestad), e
não o seu fim mais imediato.
58
Do original espanhol: “[...] apelar a una interpretación exclusivamente civil de las leyes”.
53

próprias redefinições que o ato suicida sofrera ao longo dos Oitocentos: primeiro como
exemplo prático de “desarranjos mentais”; depois, como verdadeiro “problema social” (GAY,
2001, p. 214).
Minois (1998, p. 175) observa como o movimento de apropriação do suicídio pelo saber
e discurso médicos, em um nível somático, acabou avançando “no sentido da [própria]
irresponsabilidade daqueles que se suicidam”. Mesmo o cônego Andrade Pinheiro já
reconhecia o fato de o suicídio ter deixado de ser criminalizado pela nova legislação. O
recém-promulgado código penal republicano fora publicado no Diario de Noticias, em série,
ao longo de fevereiro de 189159. Em seu artigo 299, a norma dispôs sobre as penas aplicáveis
apenas a quem induzisse ou ajudasse alguém na prática do suicídio (CODIGO..., 1891).
Em sua interpretação a esse novo código, o advogado e deputado João Vieira de
Araújo60(1901, p. 27), embasando-se no princípio do relativismo no campo jurídico – “nada
ha de [direito] absoluto; ao contrario, tudo é relativo” –, chegou a argumentar que “o direito á
vida é renunciavel e abdicavel por parte de quem é o sujeito delle e assim o homem, como
tem – direito de viver, tem o direito de morrer”. Vieira de Araújo (1901, p. 26) analisou o
suicídio sob a ótica da relação jurídica que se estabelece “pela trama da vida individual no
ambiente social”. Refutou, também, a ideia de o direito da sociedade prevalecer sobre a
existência do indivíduo: “É certo que o individuo tem deveres juridicos para com a sociedade,
mas sómente emquanto vive” (ARAÚJO, 1901, p. 28, grifo do autor). Estava longe, portanto,
o tempo em que o direito civil e o criminal aplicavam sanções ao cadáver e à memória dos
suicidas (ALVAREZ, 1999). Ao problematizar o suicídio do ponto de vista “anthropologico-
juridico” (ARAÚJO, 1901, p. 23), o parlamentar afirmava o Direito como ciência que se
pretendia autônoma, discutida em suas próprias bases.
Nos autos de diligências policiais dos anos iniciais do século XX61, constituídos para
apurar os fatos envolvendo suicídios em Belém, observa-se que os mesmos nunca chegaram a
se constituir em processos judiciais. A decisão final dos juízes era, geralmente, pelo
arquivamento desses feitos, acatando requerimento do promotor público estadual, já que se
constatava o óbito por meio de suicídio, sem a concorrência de terceiros. Nas diligências
abertas para investigar o suposto suicídio de Manoel Octaviano Lennoff de Brito, o despacho

59
O primeiro código penal republicano fora promulgado pelo Decreto federal nº847, de 11 de outubro de 1890.
60
João Vieira de Araújo formou-se na Faculdade de Direito do Recife. Exerceu o mandato de deputado federal,
pelo Estado de Pernambuco, no Congresso Constituinte da primeira Constituição republicana, de 1891
(BRASIL, [20--]).
61
Referem-se aos processos e demais documentos que compõem o arquivo permanente do Tribunal de Justiça do
Estado do Pará, relativos ao século XIX e à parte do século XX. Essa documentação ora se encontra sob
custódia do Centro de Memória da Amazônia (CMA), pertencente à Universidade Federal do Pará (UFPA).
54

do 1º Promotor Público da Capital, em 1º de junho de 1903, é sinal de seu próprio tempo:


“[...] não encontrando provas de que o facto do suicidio de Manoel Octaviano Lennoff de
Brito encontre algum crime, requer [...] se digne mandar archivar as [...] diligencias policiaes”
(PARÁ, 1903a, f. 2).
Entretanto, ainda se podia observar, no início do período republicano brasileiro, o
suicídio tratado no âmbito da criminalidade, ou do mero delito. Em A Provincia do Pará de
10 de fevereiro de 1891, publicou-se notícia sobre o suicídio da “menor” Margarida Monteiro
d’Oliveira, que contava com 19 anos de idade. Mesmo se reconhecendo que a suicida, em
vida, “era uma doente” e que sofria da “monomania do suicidio”, o seu derradeiro ato fora
qualificado ora como “attentado”, ora como “crime” para o qual fora impelida (SUICIDIO,
1891, p. 1). Já no Diario de Noticias de 13 de janeiro de 1891, ao ser noticiada a tentativa de
suicídio, por disparo de revólver, do maquinista José Gregório dos Santos, informou-se que o
mesmo havia entrado em sua alcova e, após fechar as portas, “commetteu o delicto”
(TENTATIVA..., 1891, p. 2).
Por outro lado, o cônego Andrade Pinheiro (1895, p. 1) ainda advertia os leitores do
Diario de Noticias, em 8 de fevereiro de 1895, sobre as sanções eclesiásticas relativas à
“privação das honras fúnebres e da sepultura benta” aos suicidas. Nessa época, porém, com o
advento do regime republicano em 1889 e o projeto de laicização do Estado brasileiro, esteve
em pauta o processo de secularização de muitas das instituições existentes, como os
cemitérios, que, nos tempos imperiais, ficavam “a cargo das differentes confissões religiosas”,
e passaram à administração dos órgãos públicos civis (CONGRESSO..., 1891, p. 2). As
normas canônicas passaram a se restringir aos aspectos morais considerados no âmbito da
ação religiosa da Igreja. Dentre elas, destacam-se as contidas nas Constituições Primeiras do
Arcebispado da Bahia62 que, embora relativas ao início do século XVIII, ainda inspiravam os
paroquianos brasileiros, como parâmetros de conduta moral, na virada do século XIX para o
XX (SILVA, 2003). Em certas notícias sobre suicídio, publicadas na imprensa belenense
desse2 período, observam-se referências às sanções impostas ao corpo do suicida – como a
privação de sepultamento em solo consagrado pela Igreja –, presentes nas referidas
Constituições. Do mesmo modo, nota-se até mesmo a aplicação das excepcionalidades

62
As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia tratam da sistematização dos diversos preceitos cristãos
em normas canônicas aprovadas em sínodo de 12 de junho de 1707, presidido pelo então arcebispo da Bahia,
dom Sebastião Monteiro da Vide. Com declarada inspiração tridentina, as Constituições foram, em princípio,
aplicáveis às paróquias no âmbito do arcebispado da Bahia – depois extensivas às demais dioceses brasileiras
à medida em que estas foram sendo constituídas posteriormentes – para “direcção dos costumes, extirpação
dos vicios, e abusos, moderação dos crimes, e recta administração da Justiça” (VIDE, 1853, não paginado).
55

também admitidas (implicitamente) por esse conjunto de normas. Em seu item 857, inciso III,
assim dispõem: “[Será negada a sepultura eclesiástica] aos que estando em seu juizo perfeito
por desesperação, ou ira voluntariamente se matarem, [...] morrendo tambem sem signaes de
arrependimento.” (VIDE, 1853, p. 300)63.
Essas excepcionalidades no trato ao suicida, presentes no seio da própria doutrina
católica, permitem compreender porque o jovem Marciano de Mello Rodrigues, em 14 de
agosto de 1905, após ingerir grande dose de verde-Paris na cidade de Cametá (interior do
Pará), “já nas vascas da morte, pediu que lhe fossem chamar um padre afim de confessar-se,
no que foi satisfeito [...]” (ENVENENAMENTO..., 1905, p. 1). Antes, a Folha do Norte
publicara, em 28 de abril de 1901, o fato de ser celebrada missa, na “igreja de Nazareth” 64, em
memória de Pedro Maciel de Athayde, praticante de escrivão no vapor “Aripuanã” e
“estimado no seio de seus companheiros de bordo” (SUICIDIO..., 1901, p. 1). Pedro Athayde
se suicidara, lançando-se ao rio nas proximidades de Anajás (baixo Amazonas), quando
apresentava sinais de alienação mental. A referida missa ficou “a expensas do commandante e
officiaes do Aripuanã.” (SUICIDIO..., 1901, p. 1, grifo do autor).
Quinze anos depois, em 14 de março de 1916, o Estado do Pará publicou o anúncio
pago do convite para a missa rezada em favor da alma do comerciante João Martins de
Oliveira, a ser celebrada na mesma “egreja de Nazareth”, conforme Imagem 8. Nela, destaca-
se a presença do símbolo cristão da cruz. Este, mais do que se tratar de recurso tipográfico
recorrente em anúncios dessa ordem, representou a inserção simbólica do morto no universo
do seu próprio credo, mesmo que João de Oliveira tenha se matado, após se lançar do telhado
do hospício de alienados, onde se encontrava internado por “accesso de psychose maniaca
depressiva” (TRISTE..., 1916, p. 2).
Contudo, no início da era republicana, aquela premissa de criação de um estado laico
ainda não tinha sido capaz de abalar o que, segundo Nicolau Sevcenko (2004, p.19),
compreenderia o conjunto das “crenças mais íntimas e sublimes” da maioria da população,
entre as quais a sacralização dos cemitérios. Portanto, houve mesmo autoridade policial a
negar sepultamento ao corpo do suicida Felippe Floriano da Trindade, no cemitério do então
distrito de Bujarú, em agosto de 1899. Trindade, “caboclo, solteiro e lavrador”, matara-se
“disparando uma arma de fogo no peito, [...] sendo o cadaver sepultado fóra do cemiterio.”

63
Ao pesquisar os suicídios cometidos na Bahia oitocentista, Jackson Ferreira (2004) identificou a possibilidade
do perdão clerical ao suicida que manifestasse sinais de arrependimento pelo ato cometido, ou que não
apresentasse sinais de seu juízo perfeito.
64
Atualmente, Basílica-santuário de Nossa Senhora de Nazaré, centro local de devoção católica-mariana.
56

(SUICIDIO, 1899, p. 2). A autoridade que lhe negara sepultura fora a mesma que antes havia
realizado o devido exame de corpo de delito. Nessa localidade do interior do Pará,
recuperaram-se as velhas práticas de condenação infligidas ao corpo do suicida, contra as
quais tanto Montesquieu e Voltaire se revoltaram no século XVIII (MINOIS, 1998).

Imagem 8 – Anúncio de missa para a alma de um suicida

Fonte: João Martins de Oliveira: anúncio de missa-convite (1916, p. 6)

Por outro lado, houve registros (embora raros) em que a adjetivação do suicida passava
ao largo dos tradicionais termos a ele empregados, como “vencido”, “desesperado” ou
“louco”. No Diario de Noticias, em 1º de março de 1894, referiram-se ao suicida Raymundo
Rodrigues – cujo corpo fora encontrado enforcado em uma árvore na vila de Ourém, no
interior do Estado – como “cidadão” (ENFORCADO, 1894a, p. 1). Nos primórdios do regime
republicano brasileiro, garantiu-se a cidadania ao morto na descrição daquilo que se tornou o
seu derradeiro ato em vida.
Qualificar um suicida como cidadão seria imperceptível, se comparado ao extenso artigo
publicado na Folha do Norte, em primeira página, de 24 de março de 1905. Através dele,
observa-se que os articulistas dos jornais belenenses buscavam referências em tradições
filosóficas para desenvolver suspeitas apologias do ato suicida em contraposição aos
57

argumentos contrários ao suicídio, como os do cônego Andrade Pinheiro e do professor


Paulino de Brito. O próprio título desse artigo, A morte do futuro, é ambíguo no sentido de
apresentar o suicídio, seja como meio de morte a ser vulgarizado no futuro, ou como o próprio
fim da civilização, sem perspectiva de futuro por conta dessa vulgarização. Nesse último caso,
o recurso ao discurso irônico levaria à própria crítica, velada, do que Andrade Pinheiro (1908,
p. 1) repudiava como a “moda” do suicídio que “pegou”65.
De todo o modo, estabeleceu-se o debate sobre o suicídio nos jornais de Belém na virada
do século XIX para o XX. Aristides Borba66 já havia levado aos leitores locais uma
antecipação desse provável contraponto, quando fez publicar seu artigo A vida e a morte
(assinado em Belém a 15 de maio de 1891), no Diario de Noticias de 31 de maio de 1891.
Nele, o autor considera o viver como o vício da existência: “a vida, nada mais é, que um jogo
perigosissimo, ao qual todos concorremos” (BORBA, 1891, p. 3). Representou-se a cidade
como casa de tavolagem, ambiente da ruína dessa humanidade que, sem receio da sua própria
sorte, volta-se contra si em um ciclo sem fim. Nesse expectro decadentista, o articulista
positivou a morte, no sentido de levar os homens ao esquecimento: “A morte, é o nosso anjo
bom e só ella, pode ser considerada feitura da Providencia.” (BORBA, 1891, p. 3).
Em A morte do futuro, representou-se a defesa da morte voluntária, cujo termo moderno,
por prudência ou por estratégia, apenas aparece, uma única vez, na sentença final: “Resta
apenas que o homem saiba escolher o genero de suicidio que afaste a probabilidade do mais
leve soffrimento...” (P., 1905, p. 1). O artigo afasta do suicídio o sentido de covardia ou de
culpa, reivindicando o direito individual de se decidir sobre a própria morte. Seu autor, por
trás do pseudônimo P.67, procurou demonstrar a lógica racional que haveria na morte
voluntária, retomando o debate iluminista do século XVIII (MINOIS, 1998) em torno da
descriminalização do ato:

Se é lícito ao caminhante sobreonerado com um peso superior ás suas forças,


egualal-o ao seu esforço, alijando o excesso da carga que o opprime, porque
não ha de ser permittido tambem aos infelizes, aos que não podem mais,

65
Nesse sentido, emprega-se o que Linda Hutcheon (2000, p. 50) considerou como o caráter transideológico da
ironia, que serve “para minar ou para reforçar ambas as posições conservadora e radical”. Quanto ao uso do
conceito de natureza “transideológica”, Hutcheon se referencia em Hayden White (1973, p. 38).
66
Obtiveram-se poucas informações a respeito de Aristides Borba. Joseni Pereira Meira Reis (2010) identificou
Aristides Borba no grupo que criou o Grêmio Literário Plínio de Lima em Caetité, município do alto sertão
baiano em 1898.
67
É possível que o pseudônimo P. tenha sido usado pelo jornalista Paulo Maranhão (João Paulo de Albuquerque
Maranhão), que, antes de ser o diretor-proprietário da Folha do Norte e um dos fundadores da Academia
Paraense de Letras (REGO, 2005), já atuava na imprensa local, escrevendo folhetins para o Diário de
Notícias, de onde era secretário da redação no começo da década de 1890 ([NOTAS...], 1891, p. 2) .
58

abreviar e anniquilar a vida que lhes pertence [...]?”68 (P., 1905, p. 1, grifo do
autor).

Atualizando o discurso sobre a impossibilidade de ser feliz, em tempos dos prodígios


tecnológicos produzidos pelo progresso, P. considerou que “a felicidade corre adeante delle
[do homem] com uma velocidade de que não ha simile na terra”, bem como que “são de aço
inquebravel [sic] os grilhões da cadeia que nos escravisa.” (P., 1905, p. 1). Ao jogar com as
referências da própria época – da rapidez nos meios de comunicação e de transporte ao
material utilizado nas construções e nos monumentos públicos (COSTA; SCHWARCZ, 2000)
– o artigo provocou a ordem social ainda hostil à prática do suicídio. Em especial, contra o
discurso médico que condenava a morte voluntária e a situava no âmbito dos distúrbios
mentais: “O que hoje é o resultado de uma allucinação será amanhã, talvez, o fructo da maior
sensatez, o corollario logico do trabalho da razão agindo tranquillamente” (P., 1905, p. 1). Por
essas considerações, A morte do futuro pretendia representar o suicídio como atemporal,
enquanto modo mais prático e racional de morte.
Entretanto, cabe relativizar as posições tomadas por esses polos formados no âmbito do
debate sobre o suicídio na imprensa belenense, para não redundar em algum maniqueísmo
leviano, ou o que Minois (1998, p. 274) considerou se tornar uma “visão caricatural” dos
fatos. Como bem ponderou esse historiador francês, deve-se desmitificar até a ideia de que os
filósofos iluministas fizeram apologia comum ao suicídio: “a posição acerca do problema [do
suicídio] é flutuante e escapa a qualquer tentativa de sistematização” (MINOIS, 1998, p. 274).
É certo que o barão de Holbach69 (c1982, p. 300, tradução nossa) fizera apaixonada defesa em
prol da morte voluntária: “A morte é o único remédio para o desespero; é então quando uma

68
Observam-se, nessas linhas, vagas referências à parte do romance epistolar Júlia ou A nova Heloísa, do
filósofo genebrês Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), em que se representam os sofrimentos da vida como
incômodo, ou como a relação de desvantagem entre força e o peso do fardo. O personagem Saint-Preux trava
um debate sobre o valor da vida e da morte voluntária com o seu conselheiro, milorde Eduardo, através de
cartas: “Sim, Milorde, é verdade, minha alma está oprimida pelo peso da vida. Há muito tempo ela me pesa;
perdi tudo o que podia ma tornar cara, só me restam desgotos.” (ROUSSEAU, 1994, p. 331). Em certo
momento, referenciou-se no Fédon de Platão, e fez a seguinte analogia: “[...] Se sobrecarregas teu escravo
com um vestuário que o incomoda no serviço que te deve, puni-lo-ás por ter abandonado essa roupa para
melhor realizar seu serviço? [...] quando abandonamos nosso corpo, não fazemos mais do que retirar uma
vestimenta incômoda.” (ROUSSEAU, 1994, p. 333). É interessante observar que, nessa obra, Rousseau não
fez apologia conclusiva da morte voluntária, apenas compilou as diversas linhas de pensamento a favor ou
contrárias, existentes na época. Ao final, Saint-Preux pondera sobre seus próprios argumentos e desiste da
ideia do suicídio.
69
No capítulo dedicado ao suicídio, do tratado Sistema da Natureza, publicado originalmente em 1770, Holbach
(1723-1789) utilizou-se de princípios materialistas e contratualistas para criticar as razões, de ordem religiosa,
que condenavam o suicídio. O filósofo franco-alemão, que duvidava da eternidade da alma (MINOIS, 1998),
propôs o suicídio como meio de dissolução do contrato estabelecido entre o homem e a sociedade, quando
esse mesmo pacto não trouxesse mais vantagens ao indivíduo, como parte contratante.
59

arma é o único amigo, o único consolo que resta ao desgraçado.”70. Outros contemporâneos,
porém, como Montesquieu (1689-1755), criticavam mais as penalidades impostas ao corpo e
à memória dos suicidas – como exposto na famosa passagem das Cartas Persas (publicadas
originalmente em 1721) – “As leis da Europa são terríveis contra aqueles que se matam [...].
Parece-me, Iben, que tais leis são contrárias à justiça.”71 (MONTESQUIEU, 1994, p. 113) –,
do que terem sido amplamente favoráveis à prática do suicídio em si (MINOIS, 1998).
A ambiguidade parece ter permeado a discussão em torno do suicídio ao longo dos
séculos, como prova o quão controverso se tornou o tema. Conforme já mencionado, essa foi
também a marca presente no conjunto do material impresso nos jornais de Belém, se
analisado pela perspectiva da duração de três décadas (1891 a 1920). O cônego Andrade
Pinheiro, por sinal, apesar dos seus recorrentes ataques à morte voluntária, também
manifestava visão pouco positiva em relação à vida terrena. Algo parecido a determinadas
vivências místicas e espirituais, introduzidas na esteira da reforma católica ao longo do século
XVII, que Minois (1998, p. 206) considerou como “verdadeiro suicídio espiritual”, pelo
desprendimento em relação às coisas terrenas e aos cuidados com o próprio corpo. Em artigo
publicado por ocasião da celebração do dia de finados, no Estado do Pará de 2 de novembro
de 1915, Andrade Pinheiro analisou a importância do viver a partir da inexorável certeza da
morte: “Está ella [a morte] em nós, dentro de nós, no íntimo do nosso ser, parece que na vida
a vamos acalentando todos os dias.” (PINHEIRO, 1915, p. 2). Para afastar do público leitor o
temor pela morte e enaltecer o “culto das almas”, o cônego até considerou ser esse um tema
que se vulgarizou pela sua pertinência, mas que, pelo contrário, não lhe causava o assombro
provocado pela mesma divulgação que tinha o suicídio:

Vêde: nas rodas sociaes, na vida publica e particular se fala na morte e da


morte, como de um assumpto mais natural, por isso mesmo que é assumpto
urgente, necessario, e que empolga almas, espiritos e intelligencias, os
mesmos genios, os quaes lhe renderam homenagem, vassallagem, verdadeiro
culto. (PINHEIRO, 1915, p. 2, grifo nosso).

Andrade Pinheiro (1915, p. 2) chegou, principalmente, a representar o caráter da morte


como libertadora dos sofrimentos e dos pecados do corpo físico do homem. Para tanto,
respaldou-se no exemplo dos santos cristãos para quem a morte era considerada “bôa

70
Do espanhol: “La muerte es el único remedio para la desesperación; es entonces cuando un arma es el único
amigo, el único consuelo que le queda ao desgraciado.”.
71
Do espanhol: “Las leyes de Europa son terribles contra los que se dan la muerte a sí mismos [...]. Paréceme,
Iben, que son contrarias a la justicia las tales leyes.”.
60

companheira”, e no pensamento paulino: “De facto, segundo a doutrina catholica, este corpo,
na phrase do apostolo das gentes [Paulo], é o carcere da alma, a qual, com a chegada da
morte, se liberta e vae comparecer ao throno do Altissimo[...]”. Dois meses depois, por
ocasião da passagem de ano, publicou-se outro artigo de Andrade Pinheiro, no Estado do
Pará de 1º de janeiro de 1916. Nele, o cônego ponderou sobre as festas de final de ano e a
esperança que as pessoas devotavam a esse novo ciclo de vida que se iniciava, apesar do
desenrolar da guerra na Europa. Contrabalançando o otimismo presente, Andrade Pinheiro
novamente se mostrou cético em relação à vida passada no plano físico:

Os dias felizes da vida são poucos comparados com os dias infelizes, que são
em muito maior escala. A alegria de hoje parece que nunca vem só, ella
mesma já é nuncia da tristeza de amanhã. O anno bom e suas festivas
demonstrações nos lançam o pregão, que a vida tem o seu grande lado
incerto, jungido ao seu lado certo. O que ha mais certo para o homem é o
trabalho, é a pena, é a dôr, é a magua, é a contrariedade; o que ha incerto,
mas muito incerto, é a sua felicidade no descanso. (PINHEIRO, 1916, p. 3).

Nesse artigo, Andrade Pinheiro reuniu elementos possíveis para fazer de sua escrita uma
própria apologia à morte voluntária, tal como presente em tantas argumentações levantadas
em séculos de debate ocidental. Faltou-lhe apenas realizar a defesa aberta do suicídio, o que
não fez. Pelo contrário, o cônego exortou os seus leitores cristãos a “dar graças e pedir
graças” à divindade, e a se resignarem com sua condição de humanos.
A morte do futuro, da Folha do Norte de 24 de março de 1905, por sua vez, pode não ter
passado de pura sátira (embutida de crítica) à defesa do suicídio. Do sentido dúbio que pode
ser atribuído ao título, conforme já citado, ao fato de a palavra “suicídio” aparecer apenas uma
única vez ao final de toda a argumentação desenvolvida, há a possibilidade de que o
articulista P. (1905, p. 1) quisesse alertar o público leitor de Belém para a vulgarização do
suicídio, estampada nas próprias páginas da Folha do Norte: “O homem preparar-se-á para a
morte como agora se apercebe para um passeio [...]”.
Em todo o caso, se P. restringiu seu artigo ao âmbito da discussão sobre a racionalidade
e o direito individual do homem, valendo-se, dentre outros, dos argumentos provenientes das
ideias filosóficas iluministas. Na cultura ocidental, o suicídio passou a ser tratado,
paulatinamente, como derivado dos estados de alienação mental, enquanto deliberação interna
da pessoa que o cometia, já na primeira metade do século XIX. De acordo com Minois (1998,
p. 393), a medicina, através de suas correntes psiquiátricas, fez do suicídio uma “doença
vergonhosa”. Na altura da publicação de A morte do futuro, o suicídio chegou redefinido
61

como exemplo de “agressão patológica”, que o ligava a questões diversas do ponto de vista
meramente moral, “na medida em que implicaram debates sobre julgamentos éticos,
entendimento científico e políticas sociais” (GAY, 2001, p. 212). Segundo Brown (2001, p.
158, tradução nossa), iniciado o século XX, profunda mudança havia sido operada no modo
como o homem ocidental compreendia o fenômeno do suicídio: o “que, antes considerado
como algo heróico, passou a se identificar com o irracional e o patológico”72. Nada mais
contundente do que o afirmado por Minois (1998, p. 396): “no século XIX, o debate está
encerrado: ser ou não ser é uma questão desnecessária, incongruente e chocante. Portanto,
impõe-se silêncio”. A apropriação do suicídio como objeto de estudo pela psiquiatria moderna
estabeleceu novos parâmetros para a sua discussão. O suicídio não deixou de ser evitado e
condenado, mas passou a ser abordado no sentido de sua prevenção (ALVAREZ, 1999).

1.4 Entre o diagnóstico e a terapêutica: Ordem médica, representações do suicídio e


liberdade de expressão na imprensa belenense na virada do século XIX para o XX

No contexto maior correspondente à virada do século XIX para o XX, percebe-se o


gradual processo de intervenção médica e higienista nos aspectos cotidianos das cidades,
levando o saber médico-científico a uma “presença e visibilidade na esfera pública” e a sua
inserção “em uma disputa por uma disciplinarização, normalização e até mesmo adestramento
da população urbana” (LOPES, 1998, f. 40). Bom indício da apropriação do suicídio pelo
saber médico se encontra presente na existência do próprio verbete que o descreve no
Diccionario de medicina popular e das sciencias accessorias..., do afamado doutor Pedro
Luiz Napoleão Chernoviz73. Nele, o autor teceu ligeiras considerações sobre os dados
estatísticos e as classificações do suicídio por categorias sociais, cujas representações, em
obras do gênero, associavam-nas à prática corrente do suicídio: “militares, homens do mar,
gente pobre, litteratos, artistas”. Interessante ainda observar é que se alegou ser o suicídio

72
Do espanhol: “[el concepto de suicidio] que, de ser considerado como algo heroico, pasó a identificarse con lo
irracional y patológico”.
73
Pedro Luiz Napoleão Chernoviz (1812-1881) nasceu em território da atual Polônia (Leste europeu). Formou-
se médico pela Academia francesa e transferiu-se ao Brasil no início da década de 1840, onde permaneceu até
1855. Nesse curto período de tempo em terras brasileiras, atuou em principais instituições médicas da Corte,
como a Academia Imperial de Medicina. O Diccionario de medicina popular e das sciencias accessorias para
uso das familias... tornou-se obra de referência médica e de grande circulação na segunda metade do século
XIX. Lançada em 1842, já contava na sexta edição em 1890, nove anos após a morte do seu autor (RIBEIRO,
[200-?]). Indicação de leitura proposta pelo Dr. Márcio Couto Henrique, por ocasião da qualificação.
62

“verdadeiramente contagioso e epidemico”, tendo sua carga de “hereditario” (CHERNOVIZ,


1890, p. 1015).
A divulgação dos suicídios nos periódicos de Belém do período sofreu, de certo modo, a
influência desse saber que ganhou corpo na sociedade e espaço nos jornais. Por ele, passou-se
a definir os limites da normalidade: a sua apropriação nos artigos, nas notícias, e até nos
anúncios comerciais, serviu como legitimador do próprio discurso perante os leitores
(LOPES, 2007). As notícias então publicadas se referiam às práticas suicidas, respaldando-se
em terminologias próprias empregadas pela medicina (clínica e legal), “segundo a qual o
suicida era o doente, o louco, o desesperado...” (LOPES, 1998, f. 20). Ao lado dos já
comentados títulos Os vencidos da vida ou Os voluntários da morte, outros como Victima do
alcool (1908), Uma desventura emocionante: louca por amôr (1901), ou mesmo Mania do
suicidio (1914), colocavam-se como padrões de apresentação às narrativas dos casos de
suicídios ocorridos.
Em 7 de fevereiro de 1908, a Folha do Norte noticiou que um jovem se matara com tiro
de revólver dentro do rebocador Itacayana. Por ignorarem as causas deste suicídio, a loucura
do morto foi atribuída como a única possível explicação à falta de lógica do ato: “nada
justifica essa nevrose extremamente doentia” (SUICIDIO, 1908, p. 2). Em sua coluna Coisas
do Rio, da Folha do Norte de 26 de janeiro de 1911, o paraense Arthur Vianna74 fez longa
digressão condenando o suicídio, a partir de um caso recentemente ocorrido, porém
exclusivamente em termos de discussão médica sobre a loucura. O suicídio foi considerado
“uma entidade morbida, enquadrada nos vastos dominios das molestias mentaes”, pois não se
enxergava qualquer racionalidade no fato de alguém atentar contra a própria existência
(VIANNA, 1911, p. 1).
Mesmo em poemas que faziam alusão à ideia de morte e de suicídio – não raramente
publicados nas primeiras páginas de alguns dos jornais diários de Belém – utilizaram-se,
como inspiração poética, tanto os conceitos de loucura, como os termos médicos
(relacionados à descrição de órgãos do corpo humano). Esses elementos, combinados para
formar uma “figuração visualizante” (à maneira de Dante), pretendiam garantir, por exemplo,
o impacto de Vencido, publicado na Folha do Norte de 9 de fevereiro de 1908, e de autoria de

74
Arthur Octavio Nobre Vianna (1873-1911), tendo cursado farmácia em Belém, mudou-se para a Capital
Federal a fim de estudar Medicina. Porém, lá veio a falecer aos 38 anos, em 14 de setembro de 1911, portanto
meses após ter o seu artigo sobre suicídio publicado na Folha do Norte. Arthur Vianna foi, no período de
1899 a 1907, diretor da Biblioteca e Arquivo Público do Estado do Pará (FUNDAÇÃO CULTURAL DO
PARÁ TANCREDO NEVES, 2012).
63

Leocadio Guerreiro75(1908, p. 1): “[...] Dos que vão para a morte, heroicos ou vencidos,/ os
cerebros a arder nas febres de loucura/ ou, então, por uma bala, os cerebros partidos!”.
Em todas essas representações, demarcavam-se os campos possíveis de existência e de
discussão do suicídio, como prática associada a várias causas ocasionais ou predisponentes,
como a loucura, as paixões (também doentias), ou mesmo as condutas desviantes, a exemplo
do alcoolismo. Há de se lembrar, por exemplo, dos dados estatísticos que, publicados em A
Província do Pará de 23 de agosto de 1891, associavam a alta taxa de suicídios em Berlim ao
grande consumo de bebidas alcóolicas. As causas do suicídio seriam, assim, marcadas pelo
sentido da patologia, da degeneração da espécie, em que se percebem as variáveis naturais
sendo também consideradas.
Nesse sentido, coube ao saber médico definir o que estaria nos limites da normalidade
nas práticas suicidas, e estabelecer parâmetros pelos quais se poderia atribuir a culpa e a
responsabilidade ao suicida (LOPES, 2007). Minois (1998) conseguiu catalogar diversos
casos observados nos tribunais europeus, em que a alegação de insanidade mental do suicida
foi utilizada para evitar as penas, tanto civis como eclesiásticas, aplicadas contra o corpo e a
memória do suicida e a seus familiares. Ao mesmo tempo (em uma possibilidade que não
pode ser descartada), ao atribuir a insanidade mental ao suicida, também se eximia a
responsabilidade moral dos sobreviventes ao ato suicida – dos parentes do morto à sociedade
em geral.
A mínima evidência de perturbação da ordem do cotidiano podia ser sinal para alarme.
No inquérito policial aberto para apurar as circunstâncias do suicídio de Manoel Octaviano
Lennof de Brito, secretário de inspetoria da Alfândega, o depoimento de sua esposa aponta
nesse sentido: considerando que o caráter do marido era “concentrado, no seu natural, [...]
notou entretanto que de uns dias a esta parte elle parecia muito aprehensivo e triste” (PARÁ,
1903a, f. 5). Por outro lado, em outros autos de diligência policial, os respectivos depoimentos
prestados ao escrivão pela viúva e pelo amigo advogado de Hamilton de Moura Ferro – que se
suicidou por ingestão de ácido fênico – dão conta de que, momentos antes do ocorrido, o
suicida se encontrava “calmo o que concorreo para que suspeita alguma lhe inspirasse” ou que
não se encontrava “nada de anormal [no comportamento do suicida] que prenunciasse o
desenlace fatal de que foi quasi testemunha” (PARÁ, 1903b, f. 5-7). O cotidiano de Hamilton

75
Leocadio Guerreiro, pseudônimo de Nogueira de Faria: escritor e jornalista. Tendo nascido em 1884, atuou em
A Província do Pará e também colaborou na Folha do Norte no início do século XX. Adepto do kardecismo,
nos primórdios do desenvolvimento da doutrina espírita no Pará, fez textos críticos ao Catolicismo
(AZEVEDO, 1918). Ainda segundo Rego (2005), Nogueira de Faria também possuía o título de
desembargador.
64

Ferro, aliás, contrapunha-se ao ato do suicídio – geralmente representado como ocorrência


desestabilizadora – pois “vivia na melhor harmonia com a sua familia”, segundo
representação contida no depoimento daquele seu amigo (PARÁ, 1903b, f. 8).
A preocupação que se sobressai, nesses depoimentos, é a de encontrar respostas por
meio das quais os sobreviventes do suicídio, à época, pudessem entender as possíveis formas
de transmissão de tais “sinistros designios” (OS DESESPERADOS..., 1907, p. 1). Como já
citado, o fator da hereditariedade se constituiu numa das explicações mais recorrentes, sendo
que a noção da predisposição ao suicídio ainda se fez presente em obras médicas para além de
1920. Contudo, a herança patológica passou a dividir terreno, no plano das argumentações,
com a ideia do contágio – Florival Seraine (1936, p. 35) afirmou ser necessária “a existencia
de um terreno especial, ‘mais ainda que aptidão: espécie de estado latente’” para que se
verificasse a forma de contágio do suicídio –, ou mesmo perdeu seu significado, no modo
como Quintino da Costa (1927, p. 8) descartou a possibilidade de o fator hereditário ter papel
decisivo nas questões da alma: “Uma propriedade da alma, do espírito, não é entretanto
transmissível pela gestação.”76.
Em 13 de dezembro de 1907, a Folha do Norte publicou, em primeira página, a
tentativa de suicídio do português, residente em Belém, Armindo Ferreira Brandão por meio
da ingestão de sublimado corrosivo77. Tendo sido acometido de perturbação mental no início
daquele ano, viajara à terra natal para recolhimento no hospital Passos Ferreira, na cidade do
Porto. Em novembro de 1907, regressara a Belém após sentir certas melhoras. Nesse caso,
porém, a loucura diagnosticada do português não teria sido a causa única para o seu suicídio.
A umidade equatorial de Belém também teria concorrido nesse sentido: “Com a mudança do
clima, aggravou-se-lhe o estado de saude, sendo, por vezes, trahido pela memoria, pois que o
enfraquecimento cerebral accentuava-se-lhe cada vez mais.” (OS DESESPERADOS..., 1907,
p. 1).
Ainda na primeira metade do século XIX, médicos, como o cirurgião inglês Forbes
Winslow, atribuíam o aumento nos casos de suicídio, dentre outros, à “umidade atmosférica”,
contra a qual prescreveram métodos terapêuticos envolvendo “banhos frios e laxantes”

76
Deve-se registrar que o acadêmico baiano Quintino Castellar da Costa se manifestou, favoravelmente, à
doutrina espírita em sua tese, citando termos próprios como “encarnação” ou “espírito obssessor”, associando
loucura com possessão, e mesmo transcrevendo mensagens psicografadas como elementos válidos para
defender suas argumentações. Dessa filiação religiosa, crê-se que advém o seu posicionamento quanto à
separação entre espírito e corpo.
77
Armindo Ferreira Brandão viria a falecer dias após, conforme noticiado na Folha do Norte de 17 de dezembro
de 1907, em decorrência do veneno ingerido. Entretanto, erroneamente, o nome do suicida foi trocado para
“Armindo Ferreira Gomes” (HOSPITAL..., 1907, p. 2).
65

(ALVAREZ, 1999, p. 211). Já no século XX, a relação entre os fatores climáticos e o desejo
do autoaniquilamento perdera muito da sua força. Quintino Costa (1927, p. 9), apenas se
reportou a estudos anteriores, reproduzindo a tese de que “as temperaturas extremas têm sido
incriminadas de despertarem nos individuos certas tendencias ao crime, como ao suicídio.”.
Seraine (1936, p. 11), por sua vez, considerava que a temperatura e o clima desempenhavam
apenas “um papel adjuvante na gênese do áto”, respaldando-se em resultados contraditórios
obtidos por métodos estatísticos.
No século XIX, o ambiente rural se contrapôs, física e moralmente, às cidades no
imaginário ocidental, especificamente no que dizia respeito à superpopulação, à vida agitada e
à insalubridade desses centros urbanos. Thomas (1988, p. 293) assim se referiu como “a
convenção clássica segundo a qual os moradores do campo eram não apenas mais saudáveis,
porém moralmente mais admiráveis que os habitantes da cidade [...]”. Em teses acadêmicas e
em outras obras médicas de referência, observam-se propostas profiláticas e terapêuticas de
contenção do suicídio, mais elaboradas que aquela sugerida nos anúncios comerciais da água
Superaris, de 1905.
O recolhimento asilar dos diagnosticados loucos consolidou-se a partir do século XIX,
com os estabelecimentos das clínicas e dos centros de internação. Paralelamente a esse
aspecto da intervenção médica, também se aprimorou “uma medicina natural despertada por
um projeto ecológico ainda pouco explícito” (CORBIN, 2003, p. 599), voltando-se o olhar
terapêutico ao cultivo de um tempo livre das atividades do cotidiano, mas ao mesmo tempo
ocupado por outras tarefas, que iam dos exercícios físicos ao deslocamento e ao isolamento no
campo. Nas teses de Quintino Costa (1927) e de Seraine (1936), percebe-se a preocupação em
disciplinar o corpo e os hábitos cotidianos para prevenir – ou, ao menos, retardar – o despertar
da mania suicida inoculada nos predispostos, com ênfase nas leituras ou em outras práticas
culturais (dança, teatro, cinema), desde que devidamente filtradas e controladas. Isso em
alternativa aos tratamentos médicos por meio do isolamento, da vigilância constante, da dieta
apropriada, dos banhos prolongados, de alguns tratamentos medicamentosos, e até mesmo da
intervenção psicanalítica (SERAINE, 1936). Nesse sentido, também se empregaram as
variáveis naturais.
Ao lado do fortalecimento da instrução moral (incluindo a valorização das formas
tradicionais de arranjos familiares) e da propaganda contra o alcoolismo e outros vícios,
prescreveram-se, em especial, a higiene corporal, o exercício físico regulado, além do contato
direto com a natureza. Portanto, o deslocamento do doente para outro ambiente, mesmo que
seja para a sua terra natal, fazia parte dessa terapêutica, tal como acontecera ao suicida
66

Armindo Ferreira Brandão, que vinha de uma estadia em um hospital português (OS
DESESPERADOS..., 1907, p. 1). Segundo Glaura Lima (2006, p. 243): “Aliada aos fatores
climáticos, a variação de lugar, alterando hábitos ou incorporando outros, tornava-se vital ao
alívio do ritmo em crescente tensão nos centros urbanos”78.
O exercício regular da imprensa, um dos símbolos da modernização das grandes
cidades, também foi alvo de algumas das propostas de combate ao suicídio. Estas tinham por
suporte a concepção de que era necessário selecionar o que deveria ser lido pelas pessoas,
para a boa concentração das suas energias. Essa leitura selecionada passava, primeiramente,
por critérios mais rigorosos quanto ao que se podia publicar nos jornais e nos romances, em
especial no que dizia respeito à divulgação dos suicídios ocorridos. Segundo Seraine (1936, p.
67), devia-se “evitar o conhecimento de fatos, lançados ao público através da imprensa. Não
consentir na leitura de obras literárias em que seja feita, embora discretamente, a apologia do
suicídio.”. A percepção, na virada do século XIX para o XX, de que os jornais diários haviam
se tornado meios preferenciais de divulgação do suicídio para o público em geral, fez com que
se estabelecesse a vigilância sobre o conteúdo das notícias que divulgavam tais práticas.
Como já observado por Minois (1998), a ordem era encerrar o debate sobre o suicídio:
enquanto sua prática estivesse contida na ordem do privado, melhor seria para a eficácia do
combate proposto pelas autoridades médicas. Sevcenko (2004, p. 30-39) observou que a
expansão crescente da imprensa contribuiu para a formação de uma “consistente esfera
pública”, que necessitava ser disciplinada, tendo o jornal se constituído, antes do advento das
mídias de maior alcance (como a rádio e a televisão), no espaço e no momento de se
“compartilhar simultaneamente as mesmas notícias [...]”.
A maior das críticas feitas à imprensa estava no fato de o suicídio ser levado à esfera
pública, através do estilo fait divers das notícias dos jornais, naquilo que havia de mais
privado: a descrição dos locais em que se encontravam os corpos dos suicidas, bem como o
que se imaginava passar em suas mentes por ocasião do ato. Em contrapartida, observa-se
que, nos trabalhos acadêmicos ou nas obras médicas do mesmo período, o suicídio foi tratado,
geralmente, no seu sentido mais abstrato, e os exemplos, retirados de números estatísticos e de
casos ocorridos no exterior, em especial na França e na Itália, de onde vinha a maior parte da
literatura médica a respeito.

78
Glaura Teixeira Nogueira Lima estudou as novas dinâmicas sociais em pequenas cidades do interior mineiro,
com a proliferação de estâncias hidrominerais na primeira metade do século XX no Brasil.
67

Assim, a partir do momento em que o suicídio é levado a essa esfera pública pelos
relatos pormenorizados e constantes dos periódicos diários, teorias ligadas à ideia de contágio
alertaram as autoridades e as instituições médicas de Belém para uma tentativa de intervenção
nas redações dos jornais79. A Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, recém-criada em 191480,
estabelecera que as notícias de sensação publicadas sobre toda sorte de fatos agressivos –
dentre os quais se incluíam os casos de suicídios – deviam compor parte das suas
preocupações pela saúde social de Belém. Esse projeto de intervenção se concretizou em
janeiro de 1918: aquela associação fez publicar, nos dois principais jornais diários à época – o
Estado do Pará e a Folha do Norte –, proposta aprovada em reunião interna de requerer à
Associação da Imprensa do Pará a sua colaboração no sentido de persuadir os noticiaristas dos
jornais para “a modificação no relato [pormenorizado] dos mesmos factos [criminais], que
continuando a ser feito pela forma actual, vem attentar contra os mais comezinhos principios
de prophylaxia social.” (OLIVEIRA, 1918 apud MAGALHÃES, 1918, p. 1; SOCIEDADE...,
1918a, p. 2)81. Os facultativos de Belém percebiam a cidade a partir de seus próprios
referenciais, e clamavam para que a imprensa local não concorresse ao “desenvolvimento da
nevrose passional e do crime, que tanto infelicita as sociedades modernas” (MAGALHÃES,
1918, p. 1).
A influência dos jornais e da literatura podia acionar o “fundo de perversidade” presente
em cada indivíduo, ideia essa que perpassara as concepções médicas ao longo do século XIX
(GAY, 1990, p. 140). Em artigo publicado na revista Pará-Medico, órgão de divulgação da
referida Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, o médico Castro Valente (1919, p. 67) alertou
seus leitores ao conteúdo de determinadas leituras, e respaldando-se, genericamente, em séries
estatísticas estrangeiras82, indagou o que, na verdade, era a própria afirmativa de seu
convencimento sobre o influência da imprensa: “as notícias dos jornaes sobre [...] suicidios,

79
Nos dias atuais, ainda se considera a publicidade sensacionalista de suicídios como um dos “fatores” que
podem levar a mais práticas suicidas, conforme documento produzido pela Organização Mundial da Saúde –
que faz parte do sistema das Nações Unidas – em 2000, na forma de um manual para prevenção do suicídio
(Suicide Prevention Program), especificamente destinado aos profissionais da mídia: “o relato de suicídios de
uma maneira apropriada, acurada e cuidadosa, por meios de comunicação esclarecidos, pode prevenir perdas
trágicas de vidas” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2000, não paginado).
80
Fundada a 12 de julho de 1914, a Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará foi oficialmente inaugurada em 15 de
agosto de 1914, em solenidade ocorrida no salão nobre da Santa Casa de Misericórdia de Belém, e divulgada
nos jornais locais (SOCIEDADE..., 1914).
81
Trata-se de trecho da proposta assinada pelo médico Porto de Oliveira, em 16 de janeiro de 1918, e enviada à
Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, em reunião ordinária realizada nessa mesma data. Esclarece-se que não
se encontrou o original ou a cópia desse manuscrito, tão apenas a sua transcrição nos jornais de Belém.
82
Lopes (2007, p. 143), ao analisar os trabalhos científicos sobre o suicídio desenvolvidos no Brasil oitocentista,
observou que “os médicos brasileiros no século XIX não utilizavam dados estatísticos em suas teses. Isso só
aconteceu no século XX, talvez por influência do estudo de Durkheim”.
68

[...] já não foram, ha muito, condemnadas pelos psychologos e sociologos como nocivas e
anti-hygienicas á saude espiritual dos leitores?”. Dezessete anos depois, no Ceará, Florival
Seraine reforçou o mesmo argumento da sugestão literária para a prática do suicídio. Também
lançou críticas contundentes às notícias de suicídio publicadas nos jornais, pois as relacionara
ao leitor mediano, que passaria a ser indiferente a tais notícias pela formação de certo hábito
de leitura. Por outro lado, reconheceu que havia, justamente, demanda do público para a
criação dessas notícias:

A notícia, cheia de pormenores e ás mais das vezes ilustrada com fotografías


e encimada por suggestivas epígrafes, que os jornalistas costumam entregar á
avidez dramática do povo que lê, é de início acolhida com alguma repulsão.
Fatigada, porém, dessa constante, mas, inútil revolta interior, a criatura
protesta já, em seguida, quási timidamente. E, por fim, como nada mais
tirânico que o hábito, chega a uma indiferença quási completa. (SERAINE,
1936, p. 45-46).

Entretanto, o primeiro ensejo de intervenção na forma e no conteúdo das notícias


impressas nos jornais belenenses não foi essa proposição da Sociedade Médico-Cirúrgica do
Pará, e sim considerações oriundas do meio eclesiástico. Se Andrade Pinheiro, no artigo
publicado no Diario de Noticias de 8 de fevereiro de 1895, lamentava o silêncio da imprensa
frente aos suicídios locais recentemente ocorridos, no sentido de alertar a população para a
provável proliferação dos casos83, o cônego voltou ao assunto com Suicidio, impresso n’A
Província do Pará de 23 de maio 1908. Nesse novo momento, entretanto, lamentou o excesso
de publicidade dada às ocorrências de suicídio nos jornais da Capital: “tempo houve em que a
imprensa tomára o alvitre de não contar os casos de suicidio [...] Depois mudou de pensar, e
agora conta-os a reportagem arguta até pormenorizada!”, o que estaria levando todos a pensar
que a “moda [do suicidio] pegou” (PINHEIRO, 1908, p. 1). Na época do regime imperial, o
jornal local A Boa Nova84, em 15 de novembro de 1879, já considerava ser prejudicial tal
publicidade, “como o prova a quasi total ommissão de taes noticias em nossa folha”. Assim,
transcreveu-se a seguinte notícia, oriunda de um jornal estrangeiro:

83
O cônego Andrade Pinheiro (1916, p. 2), de fato, reconhecia a grande influência exercida pela imprensa, e
reclamava maior responsabilidade das redações dos jornais, conforme publicado no Estado do Pará, de 13 de
junho de 1916: “Nesse rico pedaço do Brasil [Belém] vae ella [a imprensa] exercitando a sua elevadissima
missão, e pois não de balde [sic] se lhe dá também o formoso apellido de missionaria das idéas e dos
pensamentos”.
84
Ressalta-se, conforme já citado, que o cônego Andrade Pinheiro fazia parte do corpo editorial de A Boa Nova,
conforme se observa na sua edição n.50, de 7 de julho de 1880.
69

Muitos homens de sciencia profunda, são de parecer que este mal se


propaga, pelo contagio, isto é, que uma noticia dada por um jornal, vae
influir em outro individuo preoccupado e desgostoso , fazendo-lhe reviver a
ideia do suicidio, se, por accaso, não se lembrar de tal. (O SUICIDIO, 1879,
p. 3).

Aproximadamente três meses antes da deliberação local da Sociedade Médico-Cirúrgica do


Pará, a sua congênere na capital federal, a Sociedade de Medicina e Cirurgia, em conjunto
com a Liga pela Moralidade, também havia encaminhado ofícios à Associação da Imprensa,
solicitando às redações dos jornais cariocas para que fossem “laconicas e velladas as noticias
sobre suicidios, adulterios e outros crimes [...]” ([NOTA...], 1917, p. 3). Percebe-se que se
tratava de um movimento em nível nacional, ocorrido também na São Paulo na década de
192085.
Na realidade, a proposição da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará foi motivada pela
iniciativa isolada de Tito Franco86 (1918, p. 1), quando este fez publicar, no Estado do Pará
de 11 de janeiro de 1918 (à guisa de editorial), carta-apelo para que os jornais de Belém não
dessem o destaque sensacionalista – como vinha ocorrendo – aos casos passionais, a fim de
que os “transviados” que cometessem crimes, motivados pela paixão, percebessem que “o seu
acto não deve nem póde provocar sympathias; que a sua loucura não encherá mais columnas
da imprensa [...]”. Tito Franco, influenciado pela ideia-chave do contágio, não deixou de se
referir às notícias sobre suicídios na sua conclamação aos jornalistas. Em sua minuciosa
recomendação, observa-se o combate aos elementos constitutivos de um fait divers:

Basta que, quando qualquer criança ridicula e desmiolada, sem razões


plausiveis, houver tentado matar a namorada e depois volver a arma contra si
propria, a local saia, em poucas linhas sobrias, numa segunda ou terceira
pagina, quasi despercebida, sobretudo sem adjectivações ou partidarismos
dispensaveis, como outra e vulgar occorrencia diaria e policial... (FRANCO,
1918, p. 1, grifo nosso).

85
Lopes (1998) citou os discursos dos médicos James Ferraz Alvim e Alfredo Ellis Junior, pronunciados à Liga
Paulista de Higiene Mental na sessão de 6 de agosto de 1927, em que foi reprovada a prática jornalística de
noticiar casos de suicídio, então sendo solicitado às Sociedades de Medicina e Cirurgia e de Biologia e
Higiene que oficiassem os jornais de São Paulo para cessarem tais publicações.
86
Crê-se que se trata do filho (homônimo) do parlamentar, jurista, escritor e jornalista paraense Tito Franco de
Almeida, posto que este último falecera em 1899, e em cuja homenagem mudou-se a denominação da antiga
“Estrada de Bragança”, hoje avenida Almirante Barroso, principal saída rodoviária de Belém (BORGES,
1986, p. 128). Tito Franco de Almeida, o filho, considerado por Ricardo Borges (1986, p. 128) de “fulgurante
talento e invulgar cultura”, foi advogado, magistrado e redator-chefe do Estado do Pará, morrendo,
prematuramente, aos 39 anos, a 10 de março de 1918 (DR TITO..., 1918, p. 2), portanto quase dois meses
após ter publicado a sua carta-apelo contra as notícias sensacionalistas dos jornais belenenses.
70

Essa manifestação de Tito Franco, que não se fez isolada87, também serve para
problematizar as próprias representações construídas a partir das estratégias editoriais dos
jornais belenenses do período em publicarem os fait divers sobre os dramas de sangue da
cidade. Essas notícias não foram unanimidades de aceitação, fora do circuito acadêmico dos
médicos. Nesse sentido, interessante se tornar reportar novamente a Paulino de Brito que, em
artigo publicado em 10 de junho de 1919, no mesmo Estado do Pará, expressou a sua
reprovação pela leitura diária do gênero:

Nos factos de natureza policial que os noticiarios da imprensa desenrolam,


com enscenação mais ou menos aparatosa, aos olhos dos leitores, não ha, as
mais das vezes, um ponto onde estes se possam deter sem asco: as acções
são torpes; os caracteres são repellentes; protagonistas e comparsas valem
uns os outros: é uma sordicia geral. (BRITO, 1919a, p. 1).

A própria imprensa, ocasionalmente, em uma espécia de mea culpa, reconhecia o


exagero na publicação de notícias sobre violência e demais tragédias: “É [...] sempre motivo
de alegria para nós o poder proporcionar ao leitor alguma notícia que não lhe recorde senão o
lado bello da existência [...]” ([NOTA...], 1908, p. 2). Em outras ocasiões, fazia-se coro aos
manuais médicos e se culpavam os romances pela influência exercida nos suicídios. Publicou-
se, na Folha do Norte de 18 de abril de 1911, o artigo de Jacques Rolla88 intitulado A
philosophia do desalento. Nele, dentre outros aspectos, um dos cronistas mais conhecidos da
imprensa local (na virada do século XIX para o XX), recuperou antigas censuras ao livro Os
sofrimentos do jovem Werther (1774)89, atribuindo-lhe – o que se tornou mítico – o efeito
multiplicador do desejo suicida entre os leitores. A despeito do valor literário da produção

87
Em 13 de janeiro de 1918, publicou-se no Estado do Pará, em primeira página, carta de apoio à iniciativa de
Tito Franco, assinada pelo desembargador Alfredo R. Barradas, em que o mesmo manifesta não se tratar de
um anseio isolado, mas de interesse “COMMUM” a todos.
88
Pseudônimo mais conhecido de José Eustachio de Azevedo, escritor, crítico literário e jornalista paraense.
Atuou na redação da Folha do Norte. Ao final do século XIX, foi a figura central em torno da qual circulavam
os literatos locais que fundaram a Mina Literária (1895-1899). Nela, o “mineiro” José Eustachio de Azevedo
tinha o pseudônimo de Muriato. Foi o autor da obra de referência sobre a literatura paraense do período:
Anthologia Amazônica: poetas paraenses, cuja primeira edição é de 1904 (REGO, 1997, 2005). O artigo de
Jacques Rolla, publicado na Folha do Norte de 18 de abril de 1911, depois foi coligido com outros escritos do
cronista, para compor a sua obra Vindimas, de 1913.
89
Ao longo do século XIX, uma série de processos judiciais foi instaurada nos tribunais europeus contra os
romances julgados perniciosos à formação do caráter dos seus leitores, naquilo que Gay (1990, p. 137)
considerou como a verdadeira “disputa entre os campos estético e ético”. Muitos moralistas do período
condenavam “a ficção de seu tempo como uma das causas mais importantes do sofrimento e do suicídio”
(GAY, 1990, p. 137). Caso clássico desse embate, o livro de Goethe fora acusado de ter desencadeado uma
série de suicídios na Europa, a partir da Prússia de fins do século XVIII. Mito esse presente até em
representações atuais, como a de Alvarez (1999, p. 208): “foi Werther quem fez o ato [do suicídio] parecer
realmente desejável para os jovens românticos de toda a Europa”.
71

romântica do criador de Werther, o alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832),


Jacques Rolla condenou ambos – escritor e obra – sob o aspecto moral. Em relação à obra,
pelo seu suposto efeito de liberar a “agressividade” interna90 que levaria à prática de crimes e
ao suicídio: “Werther tem produzido mais desalentos e mortes do que as epidemias; é um
livro perigosissimo, a sua leitura envenena a alma, e ai! daquelle que o tomar a sério”
(AZEVEDO, 1911, p. 1). Quanto ao autor, a condenação estava no fato de o mesmo ter feito a
distinção entre a sua vida particular e o enredo das ficções por ele criadas, e não ter posto em
prática a resolução suicida tomada pelo atormentado personagem:

“Os envenenadores do cerebro são criminosos irresponsaveis [...] Goëthe,


creando o romance do desespero, fazendo descrentes, desesperados e
suicidas, era um escriptor falso, um bon vivant que, apesar de suas tristezas
escriptas, amava o prazer, as alegrias e as mulheres [...]” (AZEVEDO, 1911,
p. 1, grifo do autor).

Por outro lado, observa-se que a imprensa local mantinha relações em diversos níveis e
segmentos da sociedade belenense do período. Em relação à classe médica, não foi diferente.
Na própria sessão inaugural da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, na noite de sábado de 15
de agosto de 1914, encontravam-se presentes os “representantes da Folha do Norte, Estado do
Pará, Correio de Belem e da ‘Imprensa’” (ACTA..., 1915, p. 4)91. Ao final, pelo que se
percebe nas notícias publicadas posteriormente pelos jornais belenenses, nada foi feito no
sentido de se atender ao apelo da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará92. Decorridos cinco
meses após a divulgação da proposta original do doutor Porto de Oliveira, tanto a Folha do
Norte como o Estado do Pará noticiaram, em 18 de maio de 1918, a reunião ocorrida na sede
daquela associação em 15 de maio de 1918. Nela, os médicos Porto de Oliveira, Cruz Moreira
e Penna de Carvalho lembraram da apresentação da referida proposta, constatando “que
infelizmente o apello [...] não tem sido comprehendido como devera ser” (SOCIEDADE...,
1918b, p. 1). Na mesma data, também se divulgou o recebimento, pela Associação de
Imprensa, do ofício expedido pela Sociedade Médico-Cirúrgica com a solicitação para
modificar as notícias “na ‘imprensa indigena’ sobre defloramentos e suicidios”

90
Utilizou-se, intencionalmente, termo empregado por Peter Gay (1990, p. 146).
91
Sobre a inauguração da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, a imprensa local, aliás, teceu lisongeiras
considerações, positivando o evento como acontecimento social: “foi uma solennidade que deixou bem
patente o espirito de harmonia que ha de reinar sempre entre os associados da novel agremiação para a pratica
do bem e para a consecução dos fins altruisticos a que ella se destina.” (SOCIEDADE..., 1914, p. 2).
92
Segundo Fabio Henrique Lopes (1998), igual resultado acontecera com a proposição das Sociedades de
Medicina e Cirurgia e de Biologia e Higiene junto à imprensa de São Paulo.
72

(ASSOCIAÇÃO..., 1918, p. 1). Por essa época, observou-se que a própria Associação de
Imprensa estava mais interessada em festas cívicas, como as alusivas à batalha de Tuyuty,
para eternizar a Guerra do Paraguai na memória local (24..., 1918, p. 1). Na sessão ordinária
de 12 de fevereiro de 1919, o mesmo doutor Porto de Oliveira continuou a se insurgir contra
as publicações nos jornais locais. Agora, repudiava o fato de um repórter “estar exibindo uma
galeria de photographias de gatunos, em um dos matutinos d’esta capital, não obstante o voto
já emittido, por esta Sociedade relativamente a taes publicações [...]” (A SOCIEDADE...,
1919, p. 91). Entretanto, no início da década de 1910, houve quem entendesse que as notícias
impressas nos jornais não deveriam ser levadas a sério, pois tudo não passava de puro
entreternimento: “o jornal, na sua secção noticiosa, é uma industria, um commercio, não é um
tratado de moral [...]” (LIMA, 1911, p. 1).
A despeito desse ambiente de aparente embate entre os jornais locais e as autoridades
constituídas, sejam médicas ou eclesiásticas, é interessante observar que a própria imprensa
fez uma autorepresentação em que, ela mesma, também era vulnerável a um dos principais
combustíveis que abasteciam sua notícias explosivas: o suicídio. Afinal, a atividade de
jornalista na Belém daquela virada de séculos não devia ser fácil. Reproduzindo a transcrição
de uma (não menos) provável carta de despedida deixada por um suposto redator de jornal,
acabou-se por evidenciar as tensões gerais mantidas com o seu público leitor, que é o que
mais lhe interessava, conforme publicação no Diario de Noticias de 8 de janeiro de 1898:

“Não ha cousa mais difficil do que dirigir um periodico. [...]


“Se se publica muitas noticias, o publico desgosta-se porque diz que são
puras mentiras; se omittem, dizem os leitores que se supprimem para
occultar ao povo a verdade. (AS TORTURAS..., 1898, p. 1).

Depois, como aconteceria em qualquer outro artigo ou notícia em que eram enumerados
desgostos diversos, apresentou-se uma das possibilidades narrativas de finalização do texto,
com o derradeiro ato do imaginário redator de jornal: “Suicido-me, pois, para libertar-me de
tantas calamidades.” (AS TORTURAS..., 1898, p. 1).
73

2 A CIDADE SUICIDA: AS PRÁTICAS DE SUICÍDIO NA BELÉM DA VIRADA DO


SÉCULO XIX PARA O XX

Em 23 de abril de 1912, o guarda-livros93 Francisco Barata cometeu suicídio, com um


tiro de revólver. Sofria já há algum tempo de doença incurável (câncer), para os padrões da
medicina da época. Em vida, o suicida trabalhara na empresa de seguros Garantia da
Amazônia, e teria realizado (e planejado) o seu último ato com tanta calma, que assombrara o
noticiarista da Folha do Norte, na edição do dia seguinte. Mesmo demonstrando tal frieza no
seu último proceder, o senhor Barata não deixou de ser classificado no rol dos “vencidos da
vida”, título da notícia que informava sobre sua morte. Quase dois anos mais tarde, o inglês
Percy W. Thompson repetiu o ato suicida de seu colega de profissão Francisco Barata, e se
matou com um tiro de revólver na cabeça, em um dos quartos do Central Hotel, localizado na
praça de Santa Anna, no centro comercial da cidade. Na descrição da Folha do Norte de 9 de
janeiro de 1914, o contador estrangeiro do River Plate Bank também pertenceu ao grupo
daqueles “vencidos da vida”. No dia anterior, o mesmo jornal havia publicado o caso da
jovem que viera de Abaetetuba (hoje município do baixo Tocantins) – no mesmo vapor em
que viajava a comitiva do então governador do Estado, Enéas Martins –, em direção à Capital
paraense, a fim de ser recolhida ao hospital de Caridade. O estado de saúde de Brazilina de
Souza Sant’Anna inspirava sérios cuidados, em função do fato de ela própria se ter
desfechado três tiros na cabeça, uma vez “reprehendida por ter ido a um baile”. Para a
imprensa local, essa melindrada suicida também pertenceu ao grupo dos “vencidos da vida”
(OS VENCIDOS..., 1914, p.1).
Cinco anos mais tarde, em 18 de janeiro de 1919, o Estado do Pará publicou, sob o
título de Os Fracos, a tentativa de suicídio cometida pela “tolerada”94Bemvida da Luz Barros,
mais conhecida em seu meio como “pé de anjo” (em função do tamanho desproporcional dos
pés). A prostituta ingerira sublimado, por ter sido desprezada por seu amante (OS FRACOS...,
1919). Poucos meses depois, em 22 de junho de 1919, o mesmo jornal noticiou o suicídio do
paraense e lavrador Honorio Nascimento da Silva que, estando bastante embriagado, lançou-
se às águas da Baia do Guajará, na altura da doca do Ver-o-Peso, não retornando mais o seu

93
Antiga terminologia utilizada para designar quem escriturava a movimentação comercial e financeira de uma
empresa e que equivale, por aproximação, a quem hoje ocupa a função de contabilista (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2008).
94
Uma das formas depreciativas de se referir à prostituta na virada do século XIX para o XX nas notícias de
jornais, assim como “mundana” ou “horizontal”.
74

corpo para ser resgatado. Inscrevia-se, na imprensa local, mais um membro ao grupo dos
“vencidos da vida” (OS VENCIDOS..., 1919, p.4).
O uso de termos como “fraco” ou “vencido” denotavam certa representação da imprensa
local sobre a prática do suicídio e, em especial, sobre a própria pessoa do suicida – conforme
citado no Capítulo anterior –, ao lado de tantas outras como aquela que associava o suicídio às
patologias ou às degenerações do desenvolvimento mental. Assim, havia a possibilidade de se
perceber o ato de se infligir a própria morte como sentido de fraqueza suprema, de sucumbir
perante os obstáculos do mundo, e o suicida, como o perdedor no cotidiano struggle of life da
modernidade. Na década de 1910, a cidade de Belém sentia os efeitos negativos que se
abateram sobre sua vida econômica. Diversas publicações de leilões judiciais de massas
falidas e de liquidações de estoques de estabelecimentos comerciais passaram a ser comuns já
por volta de 1908, em jornais diários como a Folha do Norte. Tais anúncios oferecem bons
indícios sobre o impacto do colapso sofrido pela economia local, então baseada na extração
do látex, que perdeu espaço no mercado mundial frente à concorrência da produção da goma
elástica nas colônias britânicas do sudeste asiático.
Por outro lado, não se pode restringir as práticas de suicídio em Belém ao franco
declínio da economia da borracha e da mítica Belle Époque (período da fase áurea do seu
desenvolvimento). Pela análise dos jornais locais desde a última década do século XIX,
percebe-se que havia recorrentemente casos de suicidas a estamparem as suas primeiras
páginas, nas notícias de sensação. Por outro lado, basta se lembrar da crítica irônica à situação
de desgoverno e de corrupção dos Correios, na publicação da Folha do Norte de 10 de março
de 1900, em que “ainda ha de levar algum prejudicado, de animo fraco, ao suicidio...” (A
VERGONHEIRA..., 1900, p.1). A relação entre suicídio e fraqueza já se fazia presente
mesmo em outras épocas. Desse modo, torna-se interessante analisar a presença do suicídio
em um contexto histórico da cidade de Belém, cuja memória se cristalizou ao longo das
décadas posteriores, conhecido como a Belle Époque, em torno da virada do século XIX para
o XX. Em suma, perceber, no ambiente mítico de edênica prosperidade, a visibilidade de seus
suicidas, através das brechas abertas pela imprensa, tanto no nível local como nacional.

2.1 O suicídio e o processo civilizatório na Belém da Belle Époque

A formação do mito da Belle Époque se deve, em parte, à historiografia local produzida


ao longo do século XX, principalmente a partir das biografias construídas sobre a figura
pessoal de Antônio Lemos, que ficou à frente da Intendência de Belém entre os anos de 1897
75

a 1910. Obras, como as de Carlos Rocque, Antônio Lemos e sua Época (1973); de Leandro
Tocantins, Santa Maria de Belém do Grão-Pará (1963); de Correa Pinto, Belém: Imagens e
Evocações (19??); e de Ernesto Cruz, História do Pará (1973), foram citadas e revisadas por
Maria de Nazaré Sarges em sua Belém: riquezas produzindo a Belle-Époque: 1870-1912
(2000), fruto de sua dissertação de mestrado (defendida em 1990). Na visão da historiadora
paraense, esses intelectuais acabaram por construir a memória da capacidade intelectual e
administrativa de Lemos em gerir as transformações urbanísticas pela qual Belém teria
passado, e que a transformariam na feliz expressão, em terras amazônicas, do ideal de
modernidade e de progresso à época em voga. Os estudos de Sarges, considerados por muitos
como pioneiros nos estudos sobre a cidade de Belém, serviram de referencial ao movimento
de revisão crítica local, nos últimos 25 anos, sobre esse período da Belle Époque em Belém.
A historiadora Franciane Lacerda (2010) estudou, dentre outros aspectos, as tensões
enfrentadas pelos migrantes nordestinos com a ordem pública estabelecida na cidade de
Belém no período da virada do século XIX para o XX, principalmente no que se refere à
adaptação dessa categoria social no espaço geográfica e culturalmente diferenciado como o
amazônico – nesse sentido, observa-se a presença de muitos estrangeiros no rol de suicidas ao
longo deste capítulo. Cristina Cancela (2008) analisou como a qualidade de vida trazida por
uma proclamada modernidade não se fez presente em toda a extensão do território da cidade
de Belém. Para Cancela, os benefícios, introduzidos no cotidiano da sociedade belenense,
restringiram-se a determinados segmento e espaço físico da cidade daquele período, em uma
espécie de cartografia da exclusão social. Se por um lado, Belém era inserida no “cenário das
urbes mais contemporâneas”, por outro, “a forma de uso e vivência desses serviços mostrava-
se diferenciado para os diversos segmentos sociais e estavam distantes do dia-a-dia de muita
gente” (CANCELA, 2008, p. 84-85).
Em suas pesquisas, a própria Sarges (2002, p. 142) já apresentava reflexões sobre as
ambiguidades e as contradições inerentes àqueles tempos de modernidade, lançando bases de
questionamento sobre como “as contradições sociais inerentes ao sistema capitalista
afloravam muito mais” naquela Belém da Belle Époque, já que o suposto desenvolvimento
local produzido pela economia gomífera “trazia em seu bojo o paradoxo do progresso, da
modernidade, onde convivem [...] toda uma gama enorme de desgraças sociais com o fausto e
o luxo de uma burguesia que consumia, fundamentalmente, o importado”. Partindo da leitura
dos próprios jornais – dentre os quais o Diário do Gram-Pará de meados do século XIX –,
Sarges (2002, p. 32) notou como a capital paraense “também viveu intensamente os conflitos
cotidianos e as tensões inerentes a uma sociedade que sofreu transformações econômicas”.
76

O outro lado da cristalização da memória sobre esse período da história de Belém está
na própria ação recente do poder governamental, cuja expressão mais acabada, do ponto de
vista tipográfico, está na produção de Belém da Saudade: A Memória da Belém do Início do
Século em Cartões-Postais (1996). Obra produzida pelo governo estadual, por meio de
projeto desenvolvido pela Secretaria de Estado da Cultura, a publicação fora concebida na
forma de um álbum de família. Nesse álbum, evocou-se a memória sobre o espaço urbano da
cidade nos anos iniciais do século XX, justamente no auge da fase da Belle Époque, pelas
imagens de espaços públicos e privados retratados em cartões-postais. O material selecionado
para compor a obra apresenta uma Belém valorizada positivamente e apropriada
simbolicamente pelo Estado, despertando, quase cem anos depois, o mais profundo
sentimento de nostalgia de uma época não vivida, mas sonhada, como revelam as palavras
iniciais do então Secretário de Estado da Cultura: “Nos últimos dias, revendo a belle époque
dos teus retratos, venho sonhando os teus sonhos de modernidade, os teus desenganos e, por
que não, o teu amanhã?” (FERNANDES, 1996, p. 7).
As representações dessa cidade idealizada já se construíam na própria virada do século
XIX para o XX, seja em razão dos fins ou do público a que se destinavam, ou mesmo em
função do viés pelo qual a cidade era apresentada aos olhos dos visitantes. Em seu primeiro
número de 29 de maio de 1898, o jornal L’Eco Del Pará95 descreve como seriam as noites
típicas do verão amazônico na capital paraense, em que os habitantes da cidade se voltavam
ao teatro urbano da exibição pública, nas suas avenidas recém-abertas, e na presença de
alguns dos elementos representativos do estilo de vida civilizado do burguês citadino: os
“simpáticos cafés” lotados; a “modernidade” bela e artística do Theatro da Paz; as centenas de
bicicletas a percorrer as calçadas e as praças; e estas, com a densidade verde adequada para
uma arborização domesticada. Para Mascarenhas Dias (2007, p. 119), ao analisar o caso
análogo de Manaus, a organização desses novos espaços urbanos tinha, para além da política
de projetar ao mundo a prosperidade local, o propósito bem específico de “impressionar e
atrair os investidores estrangeiros”. Nessa representação de Belém como cidade de “vida
elegante” e, portanto, atraente, o artigo de L’Eco Del Pará não deixou de notar os elementos
indesejáveis a esse convívio público, mas que eram inerentes ao próprio processo

95
O L’Eco Del Para se colocava como “Organo settimanale degl’interessi del Parà in Italia e di quelli italiani nel
Parà”: “órgão semanal dos interesses do Pará na Itália e dos italianos no Pará” (tradução nossa).
77

civilizatório. Belém garantia sua condição de cidade cosmopolita em pé de igualdade com


importantes centros urbanos europeus e norte-americanos:

Revemos, saindo celeramente do alto de suas “macchine” e reaparecer,


depois de poucos minutos, vagas senhoritas em trajes de verão
deslumbrantíssimos; os jovens que, em todo o curso do dia, trabalharam com
tenacidade britânica nos formidáveis armazéns do “quartiere” comercial, e
entre aquelas e estes, o inevitável grupo mundano dos ociosos, dos
desocupados, dos amadores, e das damas de “amores fáceis”, que forma a
nota perpétua de todas as reuniões do gênero, em todos os países do mundo,
para o fim do século.
Passam e atravessam os “tramways” cheios de passageiros; por tabelas,
embalados de consumidores, toda uma variedade original de tipos de cada
maneira e de cada cor sussurram, falam, gritam em todas as línguas do
mundo com uma nota intensamente cosmopolita que seduz e encanta.96 (LA
VITA..., 1898, p. 2, tradução nossa).

Imagem 9 – A Belém das Casas Leão da América

Fonte: [Leão da América: Anúncio] (1898, p. 4)

96
Do italiano: “Rivedremo, sfuggire celeramente dall’alto delle loro ‘macchine’ e riapparire, dopo pochi minuti,
vaghe signorine in toelette estive smagliantissime; i giovanotti che hanno in tutto il corso della giornata,
lavorato con tenacia britannica nei formidabili fondaci del quartiere commerciale; e fra le une e gli altri,
l’inevitabile gruppo mondano di sfaccendati, di buontemponi, di dilettanti e di dame galanti che sono la nota
perpetua de tutte le riunioni del genere, in tutti i paesi del mondo, alla fine del secolo.
Passano e s’incrociano i tramways sovraccarichi di passeggeti; ai tavolini, zeppi di consumatori, tutta una
varietà originale di tipi d’ogni foggia e d’ogni colore susurrano, parlano, gridano in tutte la lingue del mondo
com una nota vivacemente cosmopolitica che seduce ed incanta.”.
78

No mesmo ano de 1898, o Diario de Noticias publicou sucessivos anúncios da casa


comercial Leão da América, com uma interessante representação visual do centro comercial
de Belém, conforme Imagem 9. Nela, observa-se o frenesi das ruas movimentadas do
comércio sob o céu carregado de nuvens de Belém. Nesse ambiente, mais afeito aos
propósitos de propaganda do anúncio, transparecem outros símbolos atribuídos à
modernidade: a profusão de coches e de bondes; os postes de transmissão de energia elétrica;
as vitrines da loja de produtos importados, em exposição com os últimos lançamentos, mas
também servindo de espelho que reflete o espaço público da rua, ele próprio uma vitrine
móvel da ostentação de seus transeuntes.
Decorridos dez anos, na edição especial do Jornal do Brasil de 20 de setembro de 1908,
o suplemento da Revista da Semana é dedicado ao Estado do Pará e a sua Capital, Belém.
Ricamente ilustrado com imagens da suntuosidade de prédios públicos e de residências de
grande porte; com a oficialidade dos eventos e das exposições artísticas; com a natureza
domada do bosque público e dos parques e praças arborizadas; com os dados estatísticos de
rendas estadual e municipal, esse suplemento evidenciou a cidade e o Estado que, na
realidade, eram zelosos pela construção de suas próprias imagens, principalmente perante a
Capital Federal: “Um Estado onde os elementos da civilisação moderna e a arte têm tal
acolhimento só póde ser um Estado adiantado e em franca via de progresso” (OURIQUE,
1908).
Tendo-se passado outros dez anos, veio à luz a obra Notas de Viagem: Norte do Brazil
(1918), do escritor paranaense Rocha Pombo97. Espécie de diário de bordo, nele o autor
descreveu sua longa viagem pelo que, até então, era considerado o Norte do País (que se
estendia da Bahia ao Amazonas). Em sua passagem por Belém, Rocha Pombo já chegara à
cidade com a ideia formada de adentrar em um “mundo phantastico”. Em solo, o escritor foi
ciceroneado por integrantes da elite intelectual – dentre os quais membros do Instituto
Histórico e Geográfico do Pará – e autoridades públicas. A cidade vista por Rocha Pombo se
restringia, basicamente, à fração espacial correspondente ao alcance das melhorias
urbanísticas. Conforme observação do viajante, Belém, fora do seu núcleo histórico,
constituía-se em “uma grande cidade moderna [...] feita só de avenidas e parques” (POMBO,
1918, p. 136). Rocha Pombo resumira sua admiração pela cidade na seguinte confissão: “a

97
José Francisco da Rocha Pombo (1857-1933), poeta e escritor, nasceu na histórica cidade de Morretes, no
Paraná. Fora eleito membro da Academia Brasileira de Letras, mas não tomou posse, por falecer meses
depois. Lançou livros na área da historiografia como: História da América, História do Rio Grande do Norte,
e História do Paraná; além de Nossa Pátria, esta com mais de quarenta edições (ZEFERINO, 2006, p.17).
79

capital da Pará [sic] despertou-me um sentimento que é mais de orgulho que só de alegria”
(POMBO, 1918, p. 135). É no cerne da mítica imagem construída de uma Belém próspera,
civilizada e que sobrevivia ao declínio da economia da borracha, seja aos olhos do viajante
como da oficialidade, que se vê desenrolar narrativas as mais diversas sobre casos de suicídio
nas páginas diárias do jornais. No contexto da virada do século XIX para o XX, entretanto,
ocorrências de suicídio e civilização não eram incompatíveis entre si, muito embora essa
coexistência fosse problemática, para o temor das autoridades médicas, e em Belém não foi
diferente.
A associação existente, a partir do debate médico e sociológico, entre civilização e as
taxas de suicídio, foi incorporada aos jornais. Em certos discursos, o suicídio era tomado
como o melhor índice do grau de civilização, pois justamente estava em desacordo com o
mais natural dos instintos: o da autopreservação (ALVAREZ, 1999, p. 69). No artigo
publicado no Diário de Notícias de 8 de fevereiro de 1895, o cônego José de Andrade
Pinheiro reivindicava o fim do suicídio em favor da moralidade e do respeito à religião: “[o
suicidio] é ainda a prova de que elle [ o povo] está trabalhando pela descrença religiosa [...] de
que os vinculos das leis moraes estão profundamente frouxos”. Já no que foi posteriormente
impresso n’A Província do Pará de 23 de maio de 1908, o cônego atualizou as argumentações
para os novos tempos, de modo a aproximá-las do discurso científico. Não deixou de
reafirmar a posição da doutrina católica contrária à morte voluntária, na condição de pecado
desta, mas também estabeleceu a sua condenação sob o “ponto de vista natural, social e
civilizador” (PINHEIRO, 1908, p. 1).
“O que é contra a natureza é sempre mau e reprovado”. Sob essa premissa, Andrade
Pinheiro representou o suicídio como um câncer a ser extirpado da sociedade, muito embora
produzido pela própria civilização. O cônego buscou no ambiente da floresta – em
contraposição ao urbano – o exemplo maior de obediência às leis naturais na figura do
selvagem que, ao contrário do homem considerado civilizado, não havia perdido o amor à
vida: “ainda não ouvimos dizer que os selvagens se suicidem lá pelas brenhas, onde vivem
isolados do convivio social” (PINHEIRO, 1908, p.1).
Andrade Pinheiro questionava o quanto poderia ser considerada adiantada uma
sociedade que tolerava o suicídio. Assim, criticava duramente o fato de a civilização produzir
o seu próprio aniquilamento, o que não seria permitido mesmo pelos “filhos das selvas”. O
sacerdote, ao voltar seu olhar sobre o estado primitivo de certa natureza humana, percebeu o
sentido da recuperação da razão nos próprios animais, pela preservação do instinto de
sobrevivência que o homem perdera. “Se nos entes irracionaes, se nos bichos das mattas, ha o
80

natural instincto da conservação [...], como é que o homem não apprende esta lição dos entes,
cujos destinos são tão inferiores aos seus?!...” (PINHEIRO, 1908, p.1). Conforme esse
argumento, que não deixa de ser antropocêntrico, Andrade Pinheiro colocou os humanos em
condição vergonhosa no aprendizado edificante que se deve tomar junto aos animais98.
Segundo Minois (1998, p. 394), a associação entre o aumento das taxas de suicídio e o
progresso da civilização se tornou perceptível na metade do século XIX, com a obra De
l’influence de la civilisation sur le suicide (1855), de Brière de Boismont. A representação
segunda a qual o processo civilizatório trouxe, em seu bojo, sua parcela de irracionalidade –
mediante a proliferação dos vícios, ou a tolerância para com o suicídio –, verifica-se em obras
médicas brasileiras ainda na década de 1930. No Ceará, Seraine (1936, p. 15), considerou que,
com base em estatísticas e outros estudos, “as classes mais ilustradas e os povos mais cultos
contribuem com maior soma á morte voluntaria (...) a propria civilização é apontada como
determinante do fenomeno”. Por outro lado, denunciando a oferta dos vícios (como o álcool)
e a vida estressante nos populosos centros urbanos, a classe proletária também seria outra
vítima desse “Molóque autocída” (SERAINE, 1936, p. 17).
Essa face moderna do suicídio é tratada com fina ironia em uma das passagens de O
Martello, semanário de Belém, na sua edição de 20 de julho de 1913. Tratando da sensação de
“delírio de progredimento” que tomara de assalto a cidade, o articulista enumera os
acontecimentos que, recorrentemente, são postos à vista pública diariamente, nessa ordem:
“assassinatos, suicidios, gatunagens, esmagamentos por automoveis, defloramentos etc”
(HEBDOMADARIAS, 1913). Aqui, o recurso ao discurso irônico – dentre as suas várias
possibilidades semânticas – teve o efeito de desconstruir aquela mítica idealização de Belém
“como uma cidade ordenada e sem problemas”, ao expor as contrapartidas de seu processo de
urbanização (DIAS, 2007, p. 118). Certamente também desconcertara o leitor da época, na
medida em que desmascarou o seu próprio “mundo como uma ambiguidade” (KUNDERA,
1986, p. 134 apud HUTCHEON, 2000, p. 33)99. Assim, O Martello apresentou as práticas de
suicídio, juntamente com a própria proliferação de jornais e de revistas, ao lado das
construções de arquiteturas modernas e dos meetings a fervilhar em espaços públicos, como
elemento medidor do grau de civilização a que chegara Belém, como capital brasileira que
aspirava à modernidade.

98
Diferente das percepções tomadas na modernidade clássica inglesa, identificadas por Thomas (1988, p. 46),
nos artigos de Andrade Pinheiro o suicídio não foi representado como bestializado, mas como resultado da
corrupção do instinto de que seriam dotadas, naturalmente, todas as criaturas.
99
Hutcheon (2000) analisa como o texto irônico pode, ou não, ser usado como arma, já que dispõe de um caráter
próprio transideológico.
81

Essa presença do suicídio no cotidiano não chegou ao ponto de se notar a existência, na


capital paraense, dos chamados clubes de suicídio. Basicamente, constituíam-se em
associações onde os seus membros poderiam por em prática seus desejos de se matarem em
locais e tempo julgados apropriados. Rumores sobre a existência dessas casas proliferaram
nos periódicos europeus até o século XIX. Na edição de 4 de março de 1838, um artigo (sem
autoria atribuída), do periódico espanhol Semanario Pintoresco Español, tratou o suicídio
como efeito da imitação. Alertando para o perigo iminente dessa forma de propagação,
comentaram-se os boatos da existência de um “club de suicidio” na Berlim do início daquele
século (SUICIDIOS..., 1838, p. 594-595 apud ANDRÉS, 2003, p. 323). Por outro lado, tais
sociedades foram, incontestavelmente, imortalizadas no cânone literário dos Oitocentos, pelo
escritor escocês Stevenson100 no conto O Clube do Suicídio (1878), cuja ação se passa no
submundo londrino, em ambientes noturnos, masculinos e claustrofóbicos.
Há quem considere que as representações sobre os suicide clubs sejam um fenônemo
típico das sensibilidades românticas do século XIX (ALVAREZ, 1999, p. 210). Entretanto,
Minois (1998, p. 369) identificou a existência de “verdadeiros clubes suicidários” nos
regimentos militares da França já no século XVIII. Em setembro de 1756, no jornal inglês
World, apelou-se para a criação de “apartamentos adequados”101 (TRISTMAN, 1823, p. 194,
tradução nossa), chamados de “‘departamento para suicidios’”102, em que “fossem oferecidos
os meios refinados e nobres para alguém se matar” (TRISTMAN, 1823, p. 195 apud MINOIS,
1998, p. 326, tradução do autor)103. Na percepção dos seus próprios contemporâneos, a
divulgação dos clubes de suicídio, na Inglaterra do século XVIII, relacionava-se ao estilo de
vida ocioso e debochado da nobreza inglesa (MINOIS, 1998, p. 326), o que, de certo modo, já
prefigurava a associação que se estabeleceu entre o suicídio e as facilidades trazidas com o
progresso do mundo civilizado.
Se não há provas de que houve clubes de suicídio em Belém na virada do século XIX
para o XX, os jornais locais trataram, pelo menos, de popularizá-los junto aos seus leitores. A
Folha do Norte de 29 de abril de 1907 publicou, em primeira página, notícia dando

100
Robert Louis Stevenson (1850-1894), escritor escocês, autor de obras célebres, muitas voltadas para o público
infanto-juvenil, como A ilha do tesouro e O médico e o monstro (O estranho caso do Dr. Jekyll e Mr. Hyde).
101
Do inglês: “[I have contracted for a piece of ground near the Foundling-hospital, and procured credit with a
builder to erect] convenient apartments [for the reception of all such of the nobility, gentry, and others, as are
tired of life]”.
102
Do original inglês: “The receptacle for suicides.”.
103
Na edição portuguesa de História do Suicídio (1998), de Georges Minois, atribuiu-se a autoria das partes ora
transcritas a Edward Moore, no jornal World de 16 de setembro de 1756. Porém, checando a cópia
digitalizada da edição compilada (1823) do original, observa-se que o autor assina como John Anthony
Tristman, no World de 9 de setembro de 1756.
82

conhecimento da existência do “Instituto de Suicidio” na cidade norte-americana de Nova


York. O noticiarista principiou, porém, ressalvando que não se tratava de produção original de
nenhum “dos jornalistas paraenses”, mas tão somente a transcrição de um despacho
telegráfico, publicado na edição de 5 de março de 1907 do The Washington Times. O
surpreendente nesse caso – além do próprio interesse em publicar tal transcrição em primeira
página – está na declaração prestada pelo suposto idealizador de tal empresa, o professor
Lethe, que julgava ser, o referido instituto, fruto de seu próprio tempo: “póde lá haver cousa
menos vulgar? É uma creação requerida pela epocha [...]” (INSTITUTO..., 1907, p. 1). Quatro
anos antes, a 6 de abril de 1903, a mesma Folha do Norte já publicara pequena nota, na
coluna Chronica de Portugal, sobre a ideia de se fundar uma casa de suicídios em terras
lusitanas “onde houvesse todos os generos de morte”, de acordo com o “espírito lucidissimo
de Fialho de Almeida” (CASA..., 1903, p. 1).
Tais notícias reforçavam a representação de que o suicídio moderno seja derivado
natural das condições do mundo civilizado. Por outro lado, entendia-se mesmo que a morte
voluntária fosse uma necessidade humana, tal como argumentou Walter Benjamin (1975, p.
20), para quem o suicídio seria inerente ao próprio homem “e à sociedade que o forma; e é
mais forte que o seu instinto de sobrevivência”. Aqui, percebe-se o diálogo entre Benjamin e
Émile Durkheim, o autor da tese sociológica O Suicídio (1898), segundo o qual cada tipo de
sociedade fornece às estatísticas sociais a sua própria cota regular de suicidas.
Benjamin (1975, p. 12-13) chegou a analisar como a ideia da modernidade, expressa na
obra do poeta francês Charles Baudelaire (na metade do século XIX)104, carregava em si
certo heroísmo, construído no labor cotidiano das classes trabalhadoras. Estas responderiam,
apaixonadamente, aos obstáculos postos pela própria civilização que ajudam a sustentar, pela
via do suicídio. Desse modo, a modernidade carregaria consigo a “matéria bruta” necessária
ao fomento das condições ideais do suicídio, assim visto positivado, à espera desse “herói
moderno” que o viesse representar. Baudelaire, segundo Benjamin (1975, p. 13), havia
percebido o suicídio como “a conquista da modernidade no campo das paixões”.
Esse é o mesmo suicídio que depois aparece, na linha argumentativa desenvolvida por
Benjamim (1975, p. 20), como espectro ameaçador a esgueirar-se por entre a massa – ao
mesmo tempo uniforme e frenética –, vista sob o olhar observador lançado no alto das
grandes cidades ocidentais. E para iluminar essa tela imaginada da modernidade e do universo

104
No ensaio sobre a representação da produção poética de Baudelaire – em Die Moderne –, Benjamin
descortina ao leitor a sua ideia sobre o sentido da modernidade.
83

citadino, que perpassaria ainda o século XX, Benjamin sugere a proeminência simbólica das
cores preta e cinza, a circular visualmente pelas vias públicas das cidades naquela virada de
séculos. Cores essas estampadas na “roupa do desespero” a homogeinizar a moda burguesa
dos ternos e das sobrecasacas (BENJAMIN, 1975, p. 14). Ainda nesse sentido, parafraseando
Pastoureau (1997), o preto e o cinza se constituíram nas cores preferenciais para representar
as vestes cotidianas dos habitantes das grandes cidades105, tal como presente no anúncio das
Casas Leão da América (Imagem 9, de f.77).
Aliás, é uma característica moderna, nas representações sobre o suicídio, sua acentuada
associação aos espaços urbanos, ao individualismo e, por assim dizer, à solidão. Porém, acima
de tudo, os espaços urbanos são compreendidos como locais em que “se produz a loucura
pública dos tempos modernos”106 (BROWN, 2001, p. 164, tradução nossa). Nas análises
desenvolvidas por Minois (1998, p. 233), constatou-se que “a maioria dos exemplos [de casos
de suicídios] relatados pelos jornais são urbanos”, na medida em que, nas cidades,
aglutinaram-se os elementos que favoreceram a desestruturação das “tradicionais formas de
solidariedade” e a constituição de um modelo nuclear de família. Ainda para Brown (2001, p.
163-164, tradução nossa), as iconografias do final do século XIX representam as cidades
como “um espaço caracterizado pela loucura” ou como a “própria loucura em si”, tal qual se
observa na tela O grito (1895), do pintor norueguês Edward Munch, como expressão máxima
“da personificação seminal da ansiedade, em uma ponte da qual se atiravam os suicidas”107.

2.2 O suicídio na ordem da sociedade belenense da borracha: Pela demarcação dos


vivos, a diferenciação entre os suicidas

Muitas foram as notícias publicadas nos jornais belenenses sobre os suicídios ocorridos,
especificamente, nos limites da capital paraense naquela virada do século XIX para o XX.
Pela amostragem relativa aos anos iniciais do século XX108, pode-se contar em torno de

105
Segundo Pastoureau (1997, p. 141), a cor preta é ambígua em relação aos significados que lhe são atribuídos
na cultura ocidental, pois ao mesmo tempo em que pode evocar a ideia de melancolia, de tristeza, ou mesma
da morte em si; pode também ser eleita a cor, por excelência, da modernidade, por emprestar ares de
refinamento e de elegância naquilo que cobre.
106
Do espanhol: “[la ciudad] donde se produce la locura pública de los tiempos modernos”.
107
Do espanhol: “personificación espermática de la ansiedad, en un puente desde el que se solían tirar los
suicidas”.
108
Para efeito dos números e das médias percentuais anuais, correspondentes aos anos iniciais do século XX,
conforme serão demonstradas ao longo deste Capítulo, tomaram-se por base as notícias sobre suicídios
ocorridos em Belém, publicadas na Folha do Norte para os anos completos de 1900, 1901, 1903, 1905 e
1907.
84

noventa e sete os casos noticiados, entre tentativas e atos consumados. Nessa relação de
suicidas estão presentes os habitantes da cidade e aqueles que nela estavam de passagem. Tais
suicidas pertenciam aos mais variados segmentos sociais: do juiz togado ao preso custodiado
da Justiça; de esposas de altos representantes da sociedade às prostitutas. Na estatística
divulgada por A Provincia do Pará de 23 de março de 1899, na coluna De toda a parte, sobre
o número de suicídios nos Estados Unidos da América em 1898, identificaram-se suicidas
pertencentes às variadas classes, entre homens e mulheres: médicos, banqueiros, jornalistas,
advogados, artistas e até em pastores. Mais que divulgar peculiaridades de outro país, nota-se
a intenção de informar que a assimilação da prática do suicídio estava “em toda a parte”.
Na dimensão da economia da borracha, até seus atores principais, seringueiros e
seringalistas, cometiam suicídios. Em alguns desses casos, percebem-se histórias pessoais
marcadas por dificuldades de vida, ou mesmo de adaptação às condições naturais da floresta,
no sentido de que não apenas o espaço da cidade abrigava as práticas suicidas. Sobretudo,
tratava-se de pôr termo a existências marcadas pelo signo da desilusão, de qualquer sorte,
diretamente ou não ligadas à sedução da prosperidade rápida pela extração da goma elástica.
Segundo Wolff (1999, p. 195), a violência, em si, atingia todos os níveis de relações sociais
nas áreas extrativistas de seringais nos rincões do Acre. Utilizada como “linguagem”
reconhecida nesse ambiente, essa violência marcou o cotidiano das relações entre seringalistas
e seringueiros, sendo utilizada por ambos os lados. Desse modo, reconhece-se o “suicídio
honroso” como um dos recursos empregados por seringueiros, com o sentido de libertação da
exploração sofrida, quando não podiam fugir das áreas de seringais para a floresta (WOLFF,
1999, p. 206).
Mesmo que tais dramas ocorressem fora do espaço urbano e com relativa distância da
capital paraense, chegavam ao conhecimento dos habitantes da cidade pelas publicações nos
jornais. Somente no primeiro semestre de 1908, a Folha do Norte noticiou cerca de quatro
casos – alguns em notas rápidas – sobre engenheiros, ou homens doentes de malária, que se
lançam ao rio, na altura do Madeira-Mamoré (no atual Estado de Rondônia), ou ainda sobre o
imigrante, de origem síria, Francisco Dib Haddad, que se mata com tiro de revólver em um
quarto de hotel em Xapuri, no Acre (A “MADEIRA-MAMORÉ”..., 1908; NO DELIRIO...,
1908; [SUICIDIO de um engenheiro...], 1908; [SUICIDIO de um syrio...], 1908). Por outras
vezes, um seringueiro se matava na própria Belém, o que ganhava certo destaque na imprensa.
85

A Folha do Norte de 23 de março de 1908 publicou, em primeira página, o suicídio do


judeu, naturalizado venezuelo, Isaac Belichá109. O fato de Belichá ter trabalhado “na
extracção de caucho” foi ressaltado logo no subtítulo da notícia: Os vencidos da vida: um
seringueiro que se suicida [...]. Ao resumir a trajetória de vida do seringueiro, o articulista
enfatizou o sentimento que movia milhares de homens e mulheres a migrarem para as regiões
de seringais: “ha tempos seguira para o Acre embalado pela fagueira esperança de angariar
naquella região o sufficiente para viver tranquillo”. Entretanto, não foram dificuldades
financeiras que motivaram Belichá a pensar no suicídio. Uma doença cardíaca agravara o seu
estado de saúde, e fez com que o seringueiro procurasse por tratamento tanto em Manaus
como em Belém, o que, por outro lado, evidencia as precárias condições em que viviam as
pessoas nos seringais. Trancando-se em um dos quartos no qual se encontrava hospedado no
Universal Hotel, próximo às docas do Ver-o-Peso, em Belém, Isaac Belichá se matou às
primeiras horas da manhã do domingo de 22 de março de 1908, com um disparo de arma de
fogo. O corpo foi sepultado no cemitério dos judeus, às expensas da própria colônia israelita
local (OS VENCIDOS..., 1908, p. 1).
O outro lado do chamado “fausto amazônico”, pode ser comprovado pelos suicídios
motivados por dificuldades financeiras. Na obra A Medicina em Belém, o médico maranhense
Lobão Junior (1901, p. 46-54) deteve-se largamente sobre a situação financeira dos
comerciantes da capital paraense, como fator principal da incidência das doenças do coração
entre esse grupo, mas não chegou a fazer qualquer relação com as taxas locais de suicídio. Foi
nas páginas diárias dos jornais, ao lado dos anúncios de leilões e de liquidações de lojas
comerciais, que as notícias de suicídios dizem muito a respeito da fragilidade da economia da
borracha (como qualquer outra assentada em bases capitalistas).
O título da notícia sobre o suicídio do comerciante português João Pereira Tavares, na
publicação da Folha do Norte de 7 de maio de 1908, já indicava a associação entre a crise na
economia da borracha – que em 1908 atravessava o seu primeiro momento – e a vontade de
morrer dos habitantes de Belém: Os que se matam – Effeitos da crise – um commerciante que
se suicida... Em depoimento prestado na ocasião do inquérito policial aberto para apurar as
circunstâncias do suicídio de Hamilton Ferro, ocorrido em 26 de novembro de 1903, sua
mulher nunca percebera, no ambiente do lar, a leve suspeita de intenção do marido em se
suicidar. A viúva apenas atribuia “o acto desesperador de seo marido á perda de seus haveres

109
Isaac Belichá fora o mesmo suicida, cujas circunstâncias da morte foram escamoteadas no relatório da
Diretoria do Serviço Sanitário estadual (na relação dos exames cadavéricos), presente no Boletim Mensal de
Estatística demographo-sanitaria da cidade de Belém, de março de 1908, citado no capítulo anterior.
86

pois que desgosto mais nenhum possuia”. Do mesmo modo, o advogado Laudelino Baptista,
amigo do suicida, reforçou a ideia de que causas externas concorreram exclusivamente para a
ocorrência do suicídio de Hamilton Ferro, precisamente os negócios comerciais mal-
sucedidos, em contraposição à harmonia do lar: “só motivos commerciaes de caracter
summariamente grave leval-o-hia a pratica do acto que commetteo” (PARÁ, 1903b, f. 6-8).
Em algumas notícias publicadas nos jornais, a própria existência de dificuldades
financeiras já era indicativo da ocorrência de suicídio, quando havia dúvidas a respeito da
verdadeira natureza da morte. Em 24 de janeiro de 1911, a Folha do Norte noticiou a morte
do imigrante português Manoel Valente, encontrado esmagado sobre os trilhos do trem. Dada
as circunstâncias misteriosas em que ocorreu o fato, a declaração prestada por um dos
conhecidos do morto foi a de que o mesmo “andava muito apprehensivo, por motivo de
embaraços nos seus negocios”, motivo suficiente para atribuir, como proposital, a morte de
Manoel Valente (MORTE..., 1911, p. 1). Cinco anos depois, o Estado do Pará de 20 de
fevereiro de 1916 dava a notícia do suicídio do pintor e decorador português Francisco da
Rocha Branco. Por se encontrar desempregado e sem condições de se manter com a
companheira Minervina de Oliveira, Rocha Branco disparou um tiro de revólver no ouvido,
em um dos quartos de aluguel em que residia à travessa de Santo Antônio, esquina com a rua
Paes de Carvalho (MATA-SE..., 1916, p. 4).
Segundo Minois (1998, p. 134) os motivos sócio-econômicos avançaram nas alegações
para os suicídios, na mesma medida da “escalada do capitalismo”, pois a própria essência do
sistema capitalista – que se pauta no individualismo, no risco e na concorrência –, acirrou os
sentimentos do homem moderno de vulnerabilidade e de fragilidade. Algumas representações
locais sobre os suicídios ligados a dificuldades econômicas chegavam a se circunscrever ao
universo masculino dos negócios e das ruas, o que não se diferenciava das ocidentais típicas
do século XIX, e que podem ser analisadas pela categoria de gênero: “o suicídio masculino
está relacionado com problemas econômicos e o feminino, com desenganos amorosos”
(BROWN, 2001, p. 160, tradução nossa)110.
Entretanto as notícias de jornais também demonstravam que os suicídios por questões
financeiras não eram apenas praticados por homens. Invertendo a lógica dos papéis de gênero
esperados, houve mulheres que procuraram se suicidar em função de se encontrarem em
situação financeira ruim. Entretanto, nesses casos, tratava-se de mulheres que eram

110
Do espanhol: “el suicidio masculino está relacionado con problemas económicos y el femenino con
desengaños amorosos”.
87

consideradas à margem da sociedade. Consuelo Alves das Flores tentara se matar, ingerindo
verde-Paris, conforme notícia da Folha do Norte de 29 de outubro de 1914. Havia deixado, há
poucos meses, o marido no Ceará e partira para Belém com “um individuo que a seduzira”.
Consuelo Flores passou a morar na rua Riachuelo, entre as travessas 1º de Março e 15 de
Agosto, à época já conhecido centro de meretrício (mesmo no centro da cidade). Abandonada
pelo novo amante, e passando “a viver uma vida cheia de privações”, a suicida foi retratada
como alguém guiada em um mundo essencialmente masculino: sem o amparo de nenhum
provedor, restou-lhe “um sentimento de tedio á vida” e a vontade de morrer (TENTATIVA...,
1914, p. 2). Apenas quatro dias após, o mesmo jornal noticiou, em 2 de novembro de 1914,
outro caso de tentativa de suicídio, embora com toques mais trágicos: o da prostituta Nila
Fabble. Moradora à travessa 1º de Março, portanto às proximidades da casa de Consuelo
Flores, Nila Fabble se mostrava cansada da exploração de seu “caften”, por sinal ex-
funcionário do consulado inglês em Belém. Pelo que foi noticiado, os “effeitos da crise”
também se faziam sentir no meio em que vivia a suicida, pois “Nila, de ha muito, vem
luctando com serias difficuldades para manter-se”. Desse modo, procurou se suicidar, ateando
fogo às suas roupas, valendo-se de “uma garrafa de petroleo” (EFFEITOS..., 1914, p. 2).
Minois (1998, p. 135) também observou outra característica do suicídio moderno, que
vem a ser a diversidade quanto aos motivos alegados: “o suicídio-chantagem, o suicídio
simulado, o suicídio-vingança, o suicídio-instrumento de astúcia”. Na Belém da virada do
século XIX para o XX, as causas de suicídio iam além da insolvência de dívidas ou da quebra
nos negócios. Na publicação d’A Provincia do Pará de 23 de março de 1899 (sobre as taxas
de suicídio nos Estados Unidos da América em 1898), elencaram-se alguns dos motivos que
levariam às pessoas a pensar em suicídio, e que não deixou de retratar a percepção local de
então. Além da miséria, figuravam a loucura, os amores não correspondidos, e até o próprio
“aborrecimento da vida” (ESTATÍSTICA..., 1899, p. 1). Esta última causa não se tratava de
fenômeno propriamente moderno, pois já se notava o desgosto pela vida como o suicídio
filosófico, verificado na antiguidade clássica com o questionamento sobre a validade no viver,
depois revalorizado pelos debates iluministas sobre o direito individual de dispor da própria
vida, no século XVIII (MINOIS, 1998).
Entretanto, como bem pondera Andrés (2003, p. 300-301, tradução nossa), a própria
descriminalização do suicídio foi, de certo modo, alcançada por meio de uma perspectiva
médica ao longo do século XIX: “foi a Medicina que justificou, com argumentos errôneos ou
não, o ato de acabar com a vida sob o pretexto da loucura ou de qualquer transtorno
88

mental”111. Assim, independente dos motivos que podiam ser alegados por testemunhas, pelas
autoridades policiais ou pelas notas dos repórteres, geralmente, ao final, as considerações
acerca dos suicidas recaia no nível da alienação mental. De acordo com os termos
qualificativos empregados nas respectivas notícias, tresloucados foram tanto o pintor
desempregado Rocha Branco, a cearense Consuelo Flores que abandonou o seu lar, como a
“horizontal” Nila Fabble, cansada de ser explorada (EFFEITOS..., 1914; MATA-SE..., 1916;
TENTATIVA..., 1914). Assim, observa-se que, na atribuição das causas desses suicídios, em
muito contribuíram as condições sociais dos suicidas, ou os papéis sociais que eles
desempenharam. Assim, levaram-se às narrativas sobre os suicídios as mesmas demarcações
sociais existentes no mundo dos viventes, do mesmo modo que se estabeleceram
diferenciações simbólicas entre os motivos alegados para se suicidar, sendo que “as causas
[consideradas] vulgares do suicídio nas classes médias e inferiores estão essencialmente
ligadas às vicissitudes de uma vida quotidiana bastante rude e implacável.” (MINOIS, 1998,
p. 355).

Imagem 10 – Anúncio do consultório do Dr. Raymundo Faria

Fonte: [Clínica medico-cirurgica do dr. Raymundo Faria: anúncio] (1915, p. 3)

Aproximadamente seis meses após a Sociedade Médico-Cirurgica do Pará ter solicitado


às redações dos jornais maior cuidado na divulgação pormenorizada dos casos de suicídio, a
própria instituição foi surpreendida pelo suicídio de um dos seus mais respeitáveis membros,
o clínico Raymundo Faria a 1º de julho de 1918. Ele havia disparado contra si dois tiros de
revólver, ou mais especificamente (na escrita visualizante do articulista) o médico lhe havia
“atravessado” o crânio. O fato se dera no início da tarde em sua própria residência, à avenida

111
Do espanhol: “[...] fue la Medicina la que justificó, com argumentos erróneos o no, al que se quita la vida, so
pretexto dae locura o de cualquier trastorno mental”.
89

São Braz, n.78, o mesmo local que constava dos anúncios publicados nos jornais, oferecendo
os serviços prestados pelo médico, como publicado na Folha do Norte de 10 de julho de 1915,
segundo apresentado pela Imagem 10.
O caso de Raymundo Faria é interessante para identificar, nos jornais de Belém do
início do século XX, que as atitudes da sociedade belenense perante a morte voluntária
também se relacionavam à condição social do suicida mantida em vida. Diferente de suicidas
como David Pereira Barros – que a 4 de dezembro de 1905 matara-se com um tiro de
espingarda –, o médico não era, como este, “um desses obscuros filhos do povo que
conseguem, no trabalho, a dura codea de cada dia” (ACTO..., 1905, p. 1). A partir dessa
diferenciação social, estabeleceram-se as demarcações para construir as suas imagens
enquanto suicidas, e as representações de seus próprios suicídios pelos jornais. Não obstante o
suicídio de Raymundo Faria ter sido atribuído à existência de uma doença incurável – pelo
qual o médico havia, inclusive, premeditado o ato suicida –, em nenhum momento o suicídio
por ele praticado foi tratado no nível das discussões sobre as patologias mentais. Pelo
contrário, termos como “fatalidade” e “infortúnio” pontuaram a descrição da morte de
Raymundo Faria, conforme se pode observar a seguir, pelo impresso na Folha do Norte de 2
de julho de 1918:

Segundo informações que obtivemos o nosso desditoso amigo foi levado ao


terrivel infortunio pela convicção que nutria de não mais poder curar-se da
molestia que, por duas vezes, em curto praso, já o havia prostado
gravemente. E essa resolução, que bastante o torturava, elle não a occultava
nem a procurava dissimular, sentindo assim, ao que parece, um grande
allivio physico podendo effectual-a. (DR. RAYMUNDO..., 1918, p. 1).

Nessas notas, observa-se mesmo a recuperação de um princípio platônico, pelo qual não
se poderia reprovar o suicídio motivado pelo fato de o suicida sofrer de “doença bem dolorosa
e incurável” (MINOIS, 1998, p. 63). Nem o fato de Raymundo Faria ter morrido solteiro aos
46 anos foi cogitado como causa estimulante ao seu suicídio112. Valorizaram-se a sua
condição de filho legítimo de Agostinho Ignacio de Faria e de Senhorinha Maria da
Conceição Faria; de ter defendido brilhantemente sua tese de doutoramento na Alemanha; e,
especialmente, de ter sido membro da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, e membro

112
Guimarães (2004, f. 85-86) citou trecho selecionado do Anuário Estatístico de Seção de Demografia (1904),
do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo, em que se evidencia a representação que associava a instituição
do casamento – em oposição ao celibato e à viuvez – com a prevenção da loucura e do suicídio, tanto para os
homens como para as mulheres.
90

honorário do Supremo Conselho Geral da Ordem Maçônica do Brazil, além de outros títulos e
passagens por lojas maçônicas da Capital.
Enquanto a notícia da morte do médico foi encimada pelo título alusivo apenas ao
nome famoso do suicida – Dr. Raymundo Faria –, a que tratou do suicídio de David Barros
foi intitulada Acto de Loucura. E como louco, além de “desgraçado”, David foi representado.
Com 44 anos, vivendo da profissão de fogueteiro, amasiado com Maria do Ó (mas solteiro
civilmente), e pai de dois filhos menores de idade, David também premeditara o ato. O modo
como engatilhara a espingarda e a fez detonar “com o auxílio de um dos dedos do pé direito”,
demonstrou certo cálculo e meticulosidade em ritualizar o suicídio. Segundo a notícia
divulgada de sua morte, “o desventurado vivia dominado por uma profunda tristeza ficando
longo tempo pensativo e alliciado de tudo que o cercava”, além de frisar que o suicida estivera
internado no “asylo de alienados” em duas ocasiões anteriores e que, momentos antes de se
matar, demonstrava estar “num dos seus habituaes momentos de alteração mental” (ACTO...,
1905, p.1). Na ocorrência policial datada de 4 para 5 de dezembro de 1905, Virgilio da
Fonseca – proprietário da casa em que David Barros morava –, declarou que apenas
“difficuldades monetarias” teriam sido a causa do dito suicídio (PARÁ, 1905, v.57, f. 59).
Embora a alegação de insanidade mental, em momentos diversos da história do suicídio
no Ocidente, tenha sido reivindicada como estratégia para desculpabilizar o suicida, também
contribuiu para retirar do ato suicida qualquer valor de heroicidade. O que depois levou a
diferentes conformações da memória construída acerca desses dois suicidas: enquanto o nome
de David Pereira Barros restou grafado entre as inúmeras ocorrências policiais depositadas no
Arquivo Público do Estado do Pará, o de Raymundo Faria foi motivo de menção em sessão
ordinária da Sociedade Médico-Cirúrgica do Pará, decorridos apenas sete meses de sua morte.
Nesse último caso, para a construção da memória sobre o médico a partir da mais ressaltada
de suas qualidades, como homem das ciências: o seu gosto pelo conhecimento. Em fins de
janeiro de 1919, publicou-se, no Estado do Pará, que “o dr. Caribé da Rocha apresentou o
alvitre de compra, por parte da sociedade [Médico-Cirúrgica], da bibliotheca que pertenceu ao
dr.Raymundo Faria” (SOCIEDADE..., 1919, p. 1).
Esse não foi o único caso verificado nos jornais de Belém na virada do século XIX para
o XX, na tentativa de consagrar a memória de um suicida. Em primeira página da Folha do
Norte de 1º de outubro de 1901, publicou-se o artigo intitulado Manoel Ferreira Vasques.
Nesse caso, tratou-se de celebrizar uma efeméride peculiar e restrita: os dez anos do suicídio
do comerciante Manoel Ferreira Vasques. Descrito como “um perfeito intellectual”, Vasques,
que também pertencera à maçonaria, foi colaborador na imprensa belenense, além de
91

proprietário da firma M. F. Vasques & C.ª. É curioso observar que o ponto central do referido
artigo foi justamente o relato visualizante do suicídio de Manoel Vasques, valorizado
positivamente como um episódio marcante, em que não se observa uma palavra de
condenação ao ato por ele praticado. Pelo contrário, desde a descrição de cada gesto
empregado no ato do suicídio até às últimas palavras atribuídas ao suicida – “Os valentes que
me chamem covarde” –, construiu-se a imagem de Manoel Vasques como a do héroi que
sucumbe: “Cahira de costas, em frente de um grande espelho, diante do qual se collocara a
fim de melhor apontar para a região em que se queria ferir” (MANOEL..., 1901, p. 1). O
antigo comerciante se matara com dois tiros de arma de fogo.
Essa demarcação estabelecida em função da categoria social a que pertencia o suicida
não estava isenta, ela própria, das tensões e das intenções correspondentes ao tabu secular
imposto à prática do suicídio. Nos espaços próprios da diagramação dos jornais belenenses na
década de 1910, destinados à exposição dos acontecimentos ligados às personalidades e às
famílias abastadas da cidade – em uma espécie de protocolunismo social –, a mínima alusão
ao suicídio era interdita e literalmente colocada à margem. Sob o título Os que se matam, foi
divulgado o suicídio de Maria Vasconcelos Nogueira Lima aos 27 anos, exatamente ao lado
da coluna Dia Social, na segunda página do Estado do Pará de 31 de janeiro de 1913. Casada
com o oficial da marinha mercante Antonio Nogueira Lima, e cunhada do professor de
desenho do Instituto Lauro Sodré, Leonel Lima, Maria Lima ingeriu três pastilhas de
sublimado corrosivo. Um dos aspectos salientados por essa notícia foi o fato de o suicídio ter
ocorrido nos fundos “daquelle estabelecimento de ensino profissional, no Marco da Legua”
(OS QUE SE MATAM..., 1913, p. 2). Tratava-se do mesmo Instituto Lauro Sodré que
aparecera retratado no número especial da Revista da Semana do Jornal do Brasil (de 20 de
setembro de 1908), como símbolo do investimento governamental para o progresso de Belém
na área da educação. Na edição do dia seguinte, dentro da própria Dia Social, publicou-se
pequena nota sobre o sepultamento da suicida Maria Lima, enfatizando tão somente a sua
ligação com a alta sociedade local, silenciando-se sobre as circunstâncias em que se deu seu
óbito, conforme transcrição a seguir:

No cemiterio de Santa Izabel foi dado á sepultura hontem o cadaver de d.


Maria Vasconcellos Nogueira Lima, esposa do sr. Antonio Nogueira Lima.
O feretro da extincta que contava largo circulo de estima em nossa
sociedade, sahiu da avenida Paes de Carvalho, no Instituto Lauro Sodré.
(ENTERRAMENTOS, 1913, p. 3)
92

Decorridos exatos três anos desse episódio, situação semelhante ocorreu com o
conhecido livreiro Eduardo A. Fernandes, proprietário da Livraria Alfacinha113, situada na rua
Conselheiro João Alfredo, a “rua das livrarias”, próximo ao velho largo das Mercês (que fora
ajardinado na Intendência de Lemos), então o centro comercial da cidade (MACHADO, 2008,
p. 84). Popularizado “entre os homens de lettras e de estudo” pela alcunha de “Alfacinha”,
Eduardo Fernandes se lançou ao oceano Atlântico, estando a bordo do paquete Antony com
destino a Lisboa, Portugal, em janeiro de 1916 (O “ALFACINHA”, 1916, p. 1). A notícia,
que trouxe a público o seu suicídio, enfatizou o caráter empreendedor do morto, com o qual
elevou à fama ao seu estabelecimento comercial entre o meio intelectual da cidade.

Imagem 11 – Em dois momentos, o mesmo Alfacinha

Fontes: Livraria Alfacinha (1996, p. 211); Lucto (1916, p. 2)

Em suma, representou-se esse “affectuoso camarada de todas as rodas finas” com as


qualidades próprias da honradez masculina: trabalhador laborioso, aliando audácia e
honestidade. Ao final do século XX, na citada obra Belém da Saudade: A memória da Belém
do início do século em cartões-postais (1996), tomou-se Alfacinha como um dos símbolos da
Belém da Belle Époque. Em imagem posada de um cartão-postal, a figura do livreiro aparece
centralizada à frente do seu negócio, como homem bem sucedido. Com essa mesma

113
Segundo Victorino Miranda (1996, p. 12), a Alfacinha era uma das grandes livrarias de Belém, ao lado da
Tavares Cardoso (Livraria Universal), e da Bittencourt, tendo nelas “o que de melhor se publicava na
Europa”.
93

dignidade, estampou-se o clichê do comerciante na coluna A Vida Mundana114, da edição do


Estado do Pará de 25 de janeiro de 1916, em que o realce à excelência da figura do morto
ofusca a natureza de sua morte, então escamoteada sob o juízo de “trágico fim”. Em ambos os
momentos, conforme a Imagem 11 (montagem), a memória da imagem de comerciante do
Alfacinha sobreviveu ao suicídio do homem Eduardo A. Fernandes.

2.3 Entre os espaços públicos e privados: A cartografia do suicídio na Belém da virada


do século XIX para o XX

Em artigo publicado na edição de 19 de abril de 1866 do jornal L’Evénement, Emile


Zola privilegiou um acontecimento então recente, em detrimento da própria crítica de arte
sobre a exposição do Salão Anual de Arte de Paris a que estava destinado a fazer. Tratava-se
do suicídio de um obscuro artista, cujas telas haviam sido recusadas pelo júri daquele Salão. O
escritor francês descreveu, minuciosamente, o quarto em que fora encontrado o corpo do
suicida – da luminosidade à posição dos objetos nele existentes –, permitindo ao leitor
visualizar mentalmente o local em que ocorreu o ato: “o ateliê é pequeno, decorado com certo
luxo [...] nos cantos encontram-se outros móveis [...] espécies de baús com painéis e gavetas
[...] lacrados com um barbante fixado por dois selos vermelhos. Percebe-se que a morte
passou subitamente por ali” (ZOLA, 1989, p. 16). A narrativa de Zola (1989, p. 15) também
elaborou a visualização do próprio ato, pois nas primeiras linhas do artigo, substituiu o verbo
suicidar-se pelo da ação tomada pelo suicida como meio de morte: “pensei que tinha o dever
de falar sobre um pintor que estourou os miolos há alguns dias”.
Em contexto temporal e espacial semelhante ao do artigo de Zola, o pintor francês
Édouard Manet produziu o pequeno óleo sobre tela – Le Suicidé (1877-1881)115, apresentado
na Imagem 12 –, em que se pode visualizar o tipo de representação que Brown (2001, p. 161,
tradução nossa) avaliou ser o “estudo do ‘homem’ como ser físico, intelectual e social, mais
que espiritual”116, ao analisar as iconografias produzidas no século XIX sobre o suicídio.

114
A coluna Vida Mundana substituiu a Dia Social, no jornal Estado do Pará. O pseudônimo Sonia, com que se
assinava a coluna, reforçava a representação de que o espaço, destinado à divulgação dos acontecimentos
ligados à alta sociedade belenense, seria espaço próprio do feminino.
115
Édouard Manet (1832-1883), pintor francês que quebrou com algumas das convenções academicistas da
pintura, estabelecendo novas possibilidades estéticas, com o movimento impressionista em França, em que as
cores se sobrepunham, em grau de importância, ao desenho das formas (GOMBRICH, 1999). A tela Le
Suicidé, produzida em pequenas dimensões e nos últimos anos de vida do próprio Manet, representa o
suicídio de um “anônimo dândy”, cuja real identidade ainda intriga os especialistas (PARADIS, 2005). Para a
crítica de arte, Le Suicidé representa uma obra marginal, algo atípico no universo das demais produções de
Manet, pela “brutalidade gráfica” com que evoca a loucura e a desolação (PARADIS, 2005).
116
Do espanhol: “estudio del ‘hombre’ como ser físico, intelectual y social más que espiritual”.
94

Imagem 12 – Le Suicidé (1877-1881), de Manet

Fonte: Édouard Manet (1877-1881)

Em Le Suicidé, o personagem suicida se apresenta na solidão do seu quarto, como único


responsável pela deliberação do seu ato, caso não fosse tomado por alienado. Na composição
de cena da tela, utilizando-se parcos elementos, destaca-se a amplitude de uma cama com os
seus lençóis e cobertores em desalinhos. Estes estão separados entre si, e diametralmente nas
tonalidades branca e vermelha, pelo próprio corpo do suicida do qual a cama serve de amparo:
uma possível representação da carne e do sangue. A luminosidade que se projeta no ambiente
pintado, embora não deixe de se relacionar à opção estética de Manet em explorar as
possibilidades de cores e de matizes – em que a mancha vermelha na camisa do suicida,
correspondente à ferida produzida pela detonação da arma de fogo, centraliza toda a
composição da tela –, sugere a presença das autoridades policiais, dos vizinhos, de repórteres
a visualizar e a registrar a cena. Todas essas possíveis personagens se transferem ao olhar
observador do próprio espectador da obra, que revela muito sobre a publicidade dada aos
casos de suicídio pelos jornais.
A descrição do interior do quarto do suicida, visualizada na tela de Manet, remete o
espectador a uma espécie de realismo que se contrapõe às idealizações e aos temas clássicos
das pinturas academicistas de escolas anteriores. Para Pereira (2008, p. 76), esse tipo de
realismo não apenas “abriu caminho para a vida comum”, em que o suicídio se manifestava
enquanto um dos aspectos do seu cotidiano, como “derrama sobre ela um olhar aproximado”.
95

As notícias pormenorizadas sobre suicídios e outros fatos de sensação, desenvolvidas ao estilo


dos fait divers, tinham por objetivo principal aproximar o seu leitor, afetivamente, dos fatos
narrados (MEYER, 1996). Assim, quando ainda o uso de imagens pela fotografia ainda não se
fazia presente em larga escala, e a força de convencimento residia, sobretudo, na palavra
escrita, tais notícias descreviam até as vestes com as quais fora encontrado o corpo já frio do
suicida, em muitas ocasiões reveladoras do momento de intimidade em que o mesmo se
encontrava no ato de sua morte. Por exemplo, o cadáver do imigrante espanhol Lourenço
Saforcada fora encontrado, pelos seus vizinhos, trajando calça de casemira e paleto branco,
sem camisas e descalço (UM DESGRAÇADO..., 1900).
Assim, essas notícias fizeram com que o público leitor de periódicos de Belém
adentrasse na intimidade das alcovas, dos quartos coletivos, das cozinhas, das salas de jantar,
das sentinas, e demais compartimentos das casas, dos sobrados, das estâncias e dos cortiços de
Belém, na mesma medida em que se redimensionava o sentido e o significado desses espaços.
Segundo Cancela (2008, p. 86), as casas passaram a assumir, naquela virada do século XIX
para o XX, “as funções de uso exclusivo de moradia [...] agregando sentimentos de intimidade
e domesticidade”. Tratava-se, sobretudo, da urgência reclamada pelo discurso higienista,
disciplinando o espaço destinado à vida familiar. O médico Lobão Junior (1901, p. 92),
citando o crítico literário paraense José Verissimo, protestou contra a vida comunitária
praticada entre os segmentos populares, e clamava por uma vida familiar “regularmente
organisada”, onde a preservação da intimidade estaria na base de seus anseios.
Os interiores de casas e de escritórios foram locais preferenciais para as práticas de
suicídio em Belém na virada do século XIX para o XX. As descrições sobre corpos de
suicidas encontrados em alcovas e em quintais eram as mais recorrentes nos jornais. A título
exemplificativo, tem-se que, dos casos de suicídios ocorridos na Capital, estima-se a média
anual de 52,81% (cinquenta e dois e oitenta e um centésimos por cento) para os praticados em
ambientes privados, mesmo quando a casa fosse apenas um ponto de referência ou de
alojamento provisório. Os quartos fechados garantiam a necessária intimidade para o ato de se
entregar à morte, principalmente quando o próprio sentido da mesma, dentro de um conjunto
de sensibilidades modernas construídas ao longo dos séculos XVIII e XIX, em muito foi
incorporado ao da individualização do ser: a morte vista como experiência única e isolada de
cada indivíduo (ARIÈS, 2003).
Desse modo, o maquinista José Gregorio dos Santos, levado por alegados motivos
particulares, despediu-se de seus familiares e, trancando-se na alcova de sua casa à rua de S.
Vicente, tentou disparar contra si dois tiros de revolver, no início da tarde de 12 de janeiro de
96

1891 (TENTATIVA..., 1891). O português Américo Gomes Soeiro, após ter almoçado,
precipitadamente subiu aos seus aposentos e lá “desfechou um tiro sobre o parietal direito,
cahindo desamparadamente no meio do quarto, banhado em sangue”. O local do suicídio de
Américo Soeiro se situava no andar superior ao estabelecimento comercial em que o próprio
suicida trabalhava (e que pertencia a sua família), situado à rua João Alfredo, no centro
comercial da Capital, que logo foi invadido por “enorme massa de povo [...] attrahido pela
rapida divulgação do facto”117 (UM ACTO..., 1905, p. 1).
O comerciante português João Pereira Tavares (citado no capítulo anterior), por sua vez,
procurou dar cabo à existência em seu próprio escritório à travessa 7 de Setembro, também no
centro comercial de Belém. Por sinal, foi neste local em que se conservara guardado, por
anos, o vidro com a estricnina da qual se serviu depois. Apesar de ter escolhido o local de
trabalho para morrer – considerando que esse suicídio foi justificado por problemas
financeiros que, assim, ligava-se ao mundo público dos negócios – João Tavares ainda teve
forças para fazer o curto trajeto entre o escritório e sua residência, no largo de São João para
lá morrer abraçado à sua família, composta nuclearmente pela esposa e pelos filhos (OS QUE
SE MATAM..., 1908a).
O espaço da casa, local privilegiado do exercício da intimidade, não sem razão parecia
propício à ritualização do ato suicida, na medida em que quem o praticava o revestia de
cuidados. É interessante observar que, na divulgação do suicídio do espanhol Saforcada, a 13
de julho de 1900, o noticiarista da Folha do Norte registrou o zelo que o suicida devia ter
pensado para com o seu próprio corpo após sua morte, posto que “matou-se deitado, para
evitar, naturalmente, a quéda do côrpo” (UM DESGRAÇADO..., 1900, p. 2).
Do mesmo modo, a ritualização do suicídio podia servir a que o suicida atribuísse
significados para a sua morte, mesmo que perceptíveis apenas a si próprio. No depoimento
prestado pela viúva de Hamilton de Moura Ferro às autoridades policiais em 27 de novembro
de 1903, ela informara que, na noite em que o marido havia se suicidado com a ingestão de
ácido fênico, encontrara-o a passear, calmamente, na puxada da casa, “de onde lhe perguntou
se queria tomar um calise [sic] de vinho do Porto”. O fato de a mulher ter recusado a bebida,
já que “lhe faria mal”, sugere que não se tratava de um hábito cotidiano partilhado entre o
casal. Ao final, uma das filhas do casal acabou por partilhar com seu pai o vinho oferecido.
Horas depois, os moradores da casa foram acordados na madrugada com os gemidos do

117
Segundo Cancela (2008, p. 81) , nos espaços ainda nobres na cartografia da cidade no final do século XIX,
como o centro comercial, poder-se-iam encontrar indivíduos ou famílias inteiras, de relativa condição
econômica, morando em “hóteis, sobrados e no alto das lojas”.
97

marido, em decorrência do tóxico que bebera, achando-se a garrafa de vinho “quase


exgotada” (PARÁ, 1903b, f. 5).
Nos suicídios praticados em ambientes domésticos observam-se os sentimentos de
consternação e de piedade, por parte dos vizinhos, das autoridades policiais, dos jornalistas e
dos demais que acorrem à casa, segundo se observa nos depoimentos das testemunhas
prestados às autoridades policiais. A prática do suicídio no domínio da privacidade faz com
que a tragédia se feche exclusivamente nos familiares e nos demais moradores do lar do
suicida. Foi cercada pelos vizinhos – “que acudiram aos gritos que de sua casa partiam” – que
a esposa de Hamilton Ferro se viu, depois da constatação do suicídio do marido e o alvoraço
na casa por ele causado (PARÁ, 1903b, f. 4). Do mesmo modo, e também em função da
posição social que o suicida ocupava em vida, observam-se repercussões diferenciadas dos
suicídios entre os habitantes da cidade, ou a forma como estas foram representadas pelos
articulistas dos jornais. Na seguinte notícia publicada n’A Provincia do Pará de 18 de
novembro de 1920, o articulista assume como o pesar de toda a cidade a notícia da morte do
comerciante João Luiz de la Rocque, mesmo que o suicida mantivesse seu círculo maior de
relações vinculados a determinado segmento social:

Hontem, ás primeiras horas do dia, a cidade foi abalada pela contristadora


noticia de se ter suicidado, com um tiro no craneo, em sua residencia o velho
e estimado commerciante e capitalista, sr. João Luiz de la Rocque.
Essa triste occorrencia teve repercursão dolorosa, não so no meio
commercial de que o extinto era figura proeminente, como na alta sociedade
de Belem, onde desfructava consideração elevada e merecida estima.
(SUICIDIO, 1920, p. 2).

Os suicídios praticados nos espaços dos quartos dos cortiços e das estâncias, por sua
vez, podiam não despertar tanto sentimento de compaixão por parte dos demais moradores.
Segundo Sevcenko (2004, p. 30), o “gozo da privacidade” ainda não era assegurado para todo
espaço privado, não estando ao alcance da grande parte da população que morava nas
habitações coletivas. Pelas notícias de suicídio publicadas nos jornais belenenses, em
ambientes de vida mais comunitária, a quebra dos laços de solidariedade interna, causada pela
vontade de alguém em se matar, podia despertar os sentimentos mais hostis. O imigrante
português Antonio Marques, morador de um dos quartos do cortiço localizado à rua
arcypreste Manoel Teodoro, tentou se enforcar uma vez que não era correspondido pela
“preta” Apollinaria. Ambos habitavam naquilo que o articulista da Folha do Norte de 26 de
abril de 1900 associou a uma “colméia”, dado o frenesi de movimentação de pessoas e a
98

disposição e as dimensões dos quartos que serviam de habitação. Como o suicida havia
apenas deixado a porta de seu quarto encostada, Felismina, outra moradora do local, atraída
pelo ruído que de dentro saía, resolveu empurrar a porta, e eis que “o espectaculo que se lhe
deparou deixou-a estarrecida [...]. O ar apatetado com que ella ficou na porta attrahiu os
outros habitantes do cortiço, que acudiram a ver o que era”. Estes não perdoaram o ato do
suicida: “todo o cortiço quis metter-lhe o páo, de raiva”; logo após ter sido salvo do
estrangulamento por sua vizinha curiosa (MAL..., 1900, p. 2).
Havia também outro espaço propício à prática do suicídio na Belém em fins do século
XIX e início do XX: os quartos de hotéis e de pensões. Apesar da movimentação de pessoas
nos corredores, nos seus interiores havia a privacidade necessária tanto para premeditar o ato
suicida como para praticá-lo. Na publicação da Folha do Norte de 29 de abril de 1907, sobre a
existência de um Instituto de Suicidio em Nova York, a citação, a seguir, evidencia a força
que os quartos de hotéis exerciam sobre certo imaginário do suicídio no início do século XX:

– E que fazem os desesperados?


– Vão a um bello hotel, alugam um quarto e com um tiro derramam os
miolos.
Os tapetes e os moveis ficam inutilisados, o proprietario enraivecido e os
hospedes amedrontados. (INSTITUTO, 1907, p. 1).

Se, no caso norte-americano, alugavam-se quartos de hotéis para se matarem, na Belém da


mesma época, observa-se que esses cômodos eram locais privilegiados para o suicídio dos
estrangeiros, ou dos que simplesmente se encontravam em trânsito pela cidade, em especial
numa rota de circulação envolvendo os dois pontos centrais da economia da borracha: as
cidades de Belém e de Manaus.
Em 1º de outubro de 1900, o casal de espanhóis Henrique Bosch y Barras e Julia
Gonzales ritualizaram o último almoço no Hotel das Ilhas, então localizado na rua da
Industria118, sem despertar a desconfiança dos demais hóspedes e dos funcionários. Depois de
almoçarem, trajando suas melhores vestes, rumaram em direção da baía do Guajará à altura
do antigo Curro Público, e se lançaram amarrados ao rio, sem antes deixarem ambos de tomar
veneno. O motivo para o pacto suicida fora o medo da inadimplência junto aquele hotel,
conforme citado na introdução deste trabalho. Em 4 de agosto de 1901, o alemão Carlos
Geehns, também recém-chegado à Belém, vindo de Manaus pelo vapor “Fluminense”,
matou-se dentro do quarto número 2, do Hotel do Commercio, em que estava hospedado.

118
Atualmente, trata-se da rua Gaspar Vianna, no centro comercial de Belém, paralela ao boulevard Castilho
França.
99

Alarmaram-se os demais hóspedes que, “espantados, correram todos para aquelle sitio e ahi
chegando, arrombando a porta, viram Geehns empunhando um revólver na direcção da bôcca.
Nova detonação, e Geehns cahiu por terra banhado em sangue.” (OS QUE SE MATAM, 1901, p.
2). O seringueiro Isaac Belichá se matou em um dos quartos do Universal Hotel no centro
comercial de Belém, havendo rebuliço entre os que se encontravam lá hospedados, em virtude
do barulho provocado pela detonação da arma de fogo com que o suicida se matou (OS
VENCIDOS..., 1908).
A partir da utilização dos recursos da fotografia na construção da notícia pelos jornais –
verificada mais regularmente na imprensa belenense a partir da década de 1910 –, refinaram-
se as representações dos suicídios já originalmente construídas a partir das narrativas em fait
divers. Agora, o grande público poderia observar as imagens de cadáveres de suicidas em
primeira página. Segundo Brown (2001, p. 172-175), os primeiros usos da linguagem
fotográfica, em relação aos tradicionais relatos de suicídios nos jornais, podiam ter tirado o
próprio “valor do suicídio como notícia”, já que as fotografias de cadáveres de suicidas
resultavam, por demais, “chocantes”. Por outro lado, as imagens de suicidas também podiam
despertar qualquer ideia de ausência de virilidade, de falta de masculinidade 119, no sentido
mesmo daqueles que foram derrotados em vida, o que, ficando no âmbito apenas do “outro”
que se mata, confortaria o leitor atraído pela sua visualização.
O que se observa nos jornais belenenses que mais publicavam imagens de suicidas na
década de 1910 – como o Estado do Pará e A Província do Pará –, é que esses suicidas eram
retratados quando estavam vivos, tal como aquele clichê do livreiro Alfacinha (em pose de
estúdio), publicado no Estado do Pará de 25 de janeiro de 1916, ou em ângulos que não
permitiam a visualização dos corpos como objetos grotescos. O mesmo periódico estampara
anos antes, na primeira página da edição de 5 de junho de 1913, o clichê relativo aos corpos
dos suicidas portugueses Antônio Pinto de Mesquita e Berllamina Corrêa de Castro e Silva,
conforme Imagem 13. Nele, a iconografia substituiu o texto, quase por completo, para
descrever o duplo suicídio desse casal de amantes concretizado no quartel do 6º Regimento da
Infantaria do Porto, Portugal.
Na imagem dessa “photographia mostrando a posição em que os mesmos [os suicidas]
foram encontrados” (NO PORTO..., 1913, p. 1), pode-se analisar os corpos dos dois suicidas
sob a perspectiva da representação de gênero. A forma como eles se encontram distribuídos,

119
Brown (2001) analisa a iconografia produzida sobre o suicídio no século XIX, especialmente na perspectiva
de gênero, e de suas representações como ato vinculado ao feminino, ligado à fluidez das paixões e pouco
racional.
100

na composição da cena, sugere certa intencionalidade na construção do próprio cenário, a


partir do arranjo na disposição dos corpos. A ilusão de movimento produzida pelo jogo de
cena em que o cadáver do soldado se encontra arqueado, diagonalmente, sobre o corpo
horizontalmente deitado da mulher, revela o sentido da virilidade residual ligada ao suicida. O
corpo do soldado comunica ao olhar do público a representação do papel ativo do amante, em
tomar a iniciativa, e em finalizar o pacto suicida. À semelhança da tela de Manet, a cama, em
desalinho, ocupa lugar central na composição do cenário fotografado.

Imagem 13 – Os suicidas portugueses: Um drama de amor

Fonte: No Porto (Portugal): Um drama de amor (1913, p.1)

Os ambientes internos eram comumente relacionados a espaços que serviam “de teatro
à tragedia” (O MYSTERIO..., 1908, p. 893), termos geralmente utilizados nas notícias do
gênero. Nessa perspectiva, a cama aparece como ponto central de referência na cena descrita
ou retratada. Como símbolo da evocação do sono, ou do próprio leito de morte, a presença
desse mobiliário emprestava certa dignidade ao ato suicida. No entanto, nas notícias sobre
suicídios publicadas nos jornais belenenses no início do século XX, pode-se observar outro
elemento bastante usual na vida doméstica em uma cidade amazônica: a rede de dormir. Nela
101

foi encontrado o cadáver do espanhol Saforcada, com “as pernas e os braços pendentes e a
cabeça derreada um lado, quase pendente também” (UM DESGRAÇADO..., 1900, p. 2). Em
outro caso, uma mulher, tão misteriosa quanto incerto o seu verdadeiro nome, adentrou à casa
de Maria Felippa, na rua do Bailique, e desferiu vários golpes em seu próprio pescoço, o que
provocou sua morte na rede armada em um dos cômodos (DESESPERO..., 1905, p. 1).
Outros ambientes fechados, no entanto, eram representados como desprovidos de
dignidade, mesmo porque se representava o suicídio como expiação de culpa. Em uma cela
simples da estação de segurança pública localizada à rua de São Matheus 120, foi encontrado,
após a hora do almoço de 28 de janeiro de 1902, o corpo de Braz Pereira da Silva, suspenso,
pelo pescoço, por uma ceroula amarrada às grades da prisão, a modo de corda improvisada.
Preso há dois dias por acusação de assassinato de Ignez Gomes dos Santos – fato este já
motivo de notas de sensação em jornais como A Província do Pará – Braz Pereira se
encontrava na fase dos interrogatórios. O corpo frio do suicida comunicava à multidão que se
aglomerara à porta da cela toda a sua miserabilidade, estando quase suspenso, com os “pés já
rentes com o chão, ao que parece devido ao esticamento da ceroula” (PARÁ, 1902, não
paginado). Por fim, seu corpo foi retirado da posição em que se encontrava e estendido no
chão da cela, e ali exposto à curiosidade pública por um tempo, antes de ser transportado ao
necrotério, conforme noticiado por A Província do Pará de 29 de janeiro de 1902 (UM
CASO..., 1902).
Embora não muito frequentes, os suicídios também se davam em logradouros públicos
da cidade. Não se deve perder de vista a própria dimensão pública garantida pela visibilidade
dada aos os casos de suicídio nas notícias de sensação dos jornais belenenses na virada do
século XIX para o XX, que se “constituem formas e modos [peculiares] de exposição”
(JOSEPH, 1999, p. 13). Desse modo, os olhos dos leitores adentravam nos cômodos e nos
demais recantos da intimidade, sendo esta domiciliar ou não. Os suicídios cometidos em
locais públicos ganhavam outra dimensão, em razão do ordenamento imposto a esses espaços
em Belém, transformados por “uma nova concepção estética burguesa do urbano” (SARGES,
2002, p. 169). Na Folha de Norte de 18 de julho de 1900, a circunstanciada notícia do suicídio
de Orígenes Marques Coqueiro se inicia com a descrição detalhada do lugar em que o fato se
dera: um espaço público, então localizado em zona periférica da cidade. Nela, percebe-se que
o local ainda permanecia inalterado. Tratava-se de um espaço público sem urbanização,
apesar das reformas urbanísticas e sanitárias pelas quais a cidade vinha passando, como a

120
Atual travessa Padre Eutiquio, fazia a ligação entre o comércio e uma das zonas periféricas da cidade.
102

demarcar o locus reservado para a prática do suicídio, ou seja, à margem do processo


civilizatório:

Denominam Pedreira, no Umarizal o fim da travessa 22 de Junho [...].


Conserva esta via até ahi a mesma largura, tendo, porem, o leito sido tomado
por embaubeiras o matto alto que não permittem atravessar se de uma para
outra margem.
Ao fundo, onde a matta fecha, fica uma pedreira, da qual se origina o nome
do bairro e por onde passa um corrego.
Extensa fila de casinhas brancas, quasi em sua totalidade cobertas de palha,
tomam as margens da travessa.
Foi no espaço limpo, que fica entre duas dessas casinhas [...], embaixo de
um taperebaseiro, que Origenes Marques Coqueiro pôz termo á sua
existencia ante-hontem, ás primeiras horas da noite. (A AGONIA..., 1900, p.
2).

Os jornais, entretanto, também divulgavam a ocorrência de suicídios em locais


abarcados pela ação do poder público, inclusive naqueles modelados (ou remodelados) para
servirem de vitrine de uma cidade civilizada e que projetavam a imagem desejada de
modernidade. Dentre esses espaços, destacam-se as praças de Belém, que logo se tornaram
“lugares públicos de lazer e [...] onde todos querem ir para serem vistos” (SARGES, 2002, p.
170). Nessas notícias, observa-se que, além dos moradores de rua, pessoas com residência e
empregos fixos buscavam o espaço público das praças para cometerem suicídio. Em horários
apropriados, que combinassem, ao mesmo tempo, a oportunidade do suicídio e a atenção
despertada dos transeuntes, as praças também serviam de “teatro da ação”121 àquela parcela de
citadinos que queriam se matar, dentro da ritualização traçada ou do efeito esperado sobre a
população da cidade.
Em 10 de abril de 1900, Adelio Figueiredo de Mello, “operario da officina de concertar
instrumentos de musica à rua 13 de Maio”, dirigiu-se ao Largo da Independência e “alli
mesmo, sob o claro céo, á beira de um taboleiro de verdura, tomou uma terça parte do
conteúdo da caixa do ‘Mata-ratos’.” (TENTATIVA..., 1900, p. 2, grifo nosso). Nessa
publicação sobre a tentativa de suicídio de Adelio de Mello, observa-se que o noticiarista
exprimiu certa admiração quanto ao local e ao horário escolhidos pelo suicida para tomar o
veneno, pois se construiu dado imaginário local sobre os locais esperados para a ocorrência de

121
Termo tomado, por empréstimo, de Isaac Joseph. Para melhor compreensão da “filosofia da ação e da
linguagem comum”, empregados pelo autor na composição dos espaços públicos modernos, ver: JOSEPH,
Isaac. Paisagens urbanas, coisas públicas: Introdução. Tradução Regina Martins da Matta. Caderno CRH,
Salvador, n. 30/31, p. 11-40, jan./dez. 1999.
103

um suicídio. Assim, evidencia-se certa representação sobre a discrição, julgada esperada, para
a prática do ato suicida e que, provavelmente, também era requerida por Manoel Ribeiro de
Almeida. Esse português, de 28 anos de idade, casado e empregado no Hotel dos
Extrangeiros, “occultando-se numa mouta de arbustos” dos jardins da praça da República,
disparou contra si um tiro no ouvido direito, “cahindo no chao quase morto” na alvorada de
16 de janeiro de 1903 (SUICIDIO, 1903a, p. 1). Tendo sido encontrado por um guarda fiscal
que se encontrava de plantão naquela praça, Manoel Almeida não resistiu e morreu nas
escadarias da Santa Casa de Misericórdia, situação ideal para o desfecho de uma narrativa ao
estilo fait divers.
Quando o suicídio ocorria em locais públicos de grande visibilidade, estes chegavam a
requerer mais atenção que o próprio ato em si. Na Imagem 14 (montagem), o nome do
logradouro em que o suicida se matou ganhou destaque no título da própria notícia. José
Simões Pinto ingerira forte dose de verde-Paris “no parque Affonso Penna” na manhã de 16
de março de 1916 (NO PARQUE..., 1916, p. 2). O Parque Affonso Penna, por sinal, era a
nova denominação dada ao Largo da Independência em que Adelio tentara se suicidar122.
Situava-se em frente às sedes de dois poderes, o local (a Intendência Municipal) e o estadual
(o Palácio do Governo do Estado).

Imagem 14 – Representações do Parque Affonso Penna

Fontes: No Parque Affonso Penna um popular suicida-se (1916, p. 2); Praça da Independência (Praça D. Pedro II)
(1996, p. 125)

122
Originalmente denominado de Largo do Palácio, o Parque Affonso Penna já fora também chamado de Largo
da Constituição e, depois, viria a ser a Praça da Independência (PARÁ, 1996, p. 124). Atualmente, atende
pelo nome de Praça Dom Pedro II, localizada no centro histórico da cidade, entre as docas do Ver-o-Peso e a
sede da Prefeitura Municipal de Belém e o antigo Palácio do Governo (atual Museu do Estado do Pará).
104

Conforme enfatiza o noticiarista, José Simões Pinto “vivia sempre a vagar pelas ruas
da cidade” e resolveu se recolher no próprio “edificio do palacete Municipal”, onde faleceu
sem elucidar ao público presente o motivo que o levara ao suicídio. No romance naturalista O
Missionário (1888), do paraense Inglez de Souza, o mesmo logradouro havia sido descrito
pelo seu espesso conjunto arbóreo: “Quase em frente ao Ver-o-Peso, [...] o velho casarão do
governo fechava a vasta praça verdejante” (SOUZA, [198-], p. 229). Possivelmente essas
características, ligadas à dimensão e à composição do local, tenham contribuído para que,
tanto José Pinto como Adelio de Mello, escolhessem o Parque Affonso Penna como cenário
ideal para seus suicídios. Na Imagem 14 (montagem), tem-se também a vista panorâmica
desse local (ainda com a denominação de Praça da Independência), tomada a partir de um dos
quartos do Hotel América, então localizado às proximidades: de um lado a outro, dois espaços
possíveis para se suicidar.

2.4 Da tradição às novidades do progresso: Os meios de suicídio utilizados pelos suicidas


na Belém da virada do século XIX para o XX

Dentro do ritualismo associado ao suicídio, a escolha do meio apropriado para dar fim à
própria vida reflete, em princípio, a personalidade de quem o pratica. Saber escolher o método
de suicídio que lhe seja próprio e, ao mesmo tempo, eficaz constitui uma das preocupações
maiores do suicida. Como se assinalou anteriormente, o comerciante João Pereira Tavares
guardara a estricnina – que depois ocasionou a sua morte em 1908 – em um cofre do seu
escritório por anos seguidos (OS QUE SE MATAM..., 1908). Os preparativos para o suicídio
podiam também ocorrer nos momentos imediatamente anteriores, como no caso de Maria
Epiphania do Amaral, que se matou com um tiro de revolver, na noite de 9 de julho de 1915.
Conforme a notícia que divulgou seu suicídio, este ocorreu após ela ter atentado contra a vida
do suposto amado. A moça havia comprado o revólver, do modelo Smith Wesson, no
comércio de Belém, na manhã do mesmo dia em que o utilizaria para efetuar os disparos
(DOLOROSO..., 1915). Em certos casos, o suicídio pode ter sido fruto de uma deliberação
precipitada, e de acordo com os recursos existentes no local (mesmo que parcos). Foi o caso
do preso Braz Pereira da Silva que, de sua própria ceroula, improvisou a corda com a qual se
enforcara na cela da prisão localizada a rua de São Matheus (UM CASO..., 1902).
Na virada do século XIX para o XX, os métodos utilizados para se cometer suicídio já
eram bem diversificados em relação aos recursos tradicionais. A partir do momento em que
novas tecnologias vinham sendo introduzidas para melhorar a vida dos vivos, os suicidas
105

percebiam novas formas de por em prática seu desejo de pôr fim à vida. Entretanto, ainda se
encontravam cristalizadas as figuras daqueles que: enforcavam-se, com as representações que
se sucederam a partir da passagem bíblica do arrependimento e morte de Judas Iscariotes 123;
golpeavam-se, com a espada ou o punhal, como os casos romanos de Catão e de Lucrécia124;
deixavam-se morrer pelo veneno da serpente, como a rainha egípcia Cleópatra; e ainda
lançavam-se de um penhasco, ou ao mar ou ao rio, como a shakesperiana Ofélia125. Desse
modo, observam-se as referências que ainda se faziam marcantes nos versos do poeta
piauiense Alcides Freitas126(2005), provavelmente escritos no início do século XX: “Onde um
recurso ao mal que me banha e transborda? / Minha dor é sem fim! Eu só tenho um remédio: /
O suicídio – uma bala... um punhal... uma corda!...”.
Além dessas referências clássicas, nas modernas representações do suicídio, passam a
coexistir as imagens daqueles que se colocavam sobre a linha férrea do trem; dos que se
precipitavam de altos edifícios; ou mesmo dos que experimentavam novas fórmulas de
tóxicos, como a morfina e a cocaína. Em relação a este último caso, é eloquente a descrição
resumida da fita muda O Sonho de Ópio, “empolgante trabalho da arrojada fabrica ‘Nordisk-
film’ de Copenhague”, cuja estreia se dera na casa de cinema Olympia, de Belém, a 19 de
junho de 1914. Nela, evidencia-se a preocupação com o advento das novas drogas: “são estes
os peiores vicios que levam as almas aos horripilantes crimes: é o opio, a morphina, a cocaina,
o ether, com que se viciam infelizes degenerados e que pelo abuso delles vêm a se tornar
criminosos, ou quando não, idiotas, loucos ou suicidas” ([CINEMA...], 1914, p. 4). Em suma,

123
O suicídio de Judas podia ser evocado por ocasião das celebrações anuais da Paixão de Cristo, como no artigo
A Consciência de Judas, publicado na Folha do Norte, de 21 de abril de 1905. Nele, fora representado como
libertação dos remorsos, expiação dos erros cometidos: “o esquecimento completo das torturas morais, a paz
absoluta do espírito e da matéria”. As referências utilizadas no seu enforcamento – a corda atada a um “ramo
de figueira brava” em uma estrada deserta – construíram a ambiência da solidão e do desespero (A
CONSCIENCIA..., 1905, p. 1).
124
O suicídio de Lucrécia – mulher da nobreza romana, que se apunhalou depois de ter sido violentada – foi
motivo de sucessivas representações na pintura ocidental do século XV. Nesse sentido, ver ANDRÉS,
Ramón. Historia del suicidio en Occidente. Barcelona: Ediciones Península, 2003. Segundo ainda Minois
(1998, p. 75) Lucrécia se tornara a referência de um suicídio à maneira clássica, em que “a aliança da beleza
do corpo feminino e do gesto de morte é uma das ambiguidades da nova era [o século XV da fase final
renascentista e do movimento protestante]”.
125
Personagem de Hamlet (1600), do dramaturgo William Shakespeare, ícone do teatro inglês do período
elisabetano (a virada dos séculos XVI e XVII). Ofélia se deixa afogar em um rio, sem que seja apresentado
um claro motivo ao leitor/espectador, a não ser por um “trágico desprezo” (MINOIS, 1998, p. 136) ou por
uma alegada “forma de loucura” (VENEU, 1994, p. 45-46). A temática do suicídio, aliás, mostra-se tão
frequente na obra do autor inglês – para Dapieve (2007, p. 79), “nas tragédias de Shakespeare, as pessoas se
suicidam de todas as formas e por todos os motivos” – e da própria dramaturgia inglesa, no geral, nesses
referidos anos elisabetanos, que se revela como uma espécie de catarse coletiva do público (MINOIS, 1998,
p. 140).
126
Alcides Freitas (1890-1912) nasceu em Teresina, Piauí. No mesmo ano de sua morte precoce, foi publicado
seu livro de poesias Alexandrinos (em parceria com o irmão Lucídio Freitas), e sua tese de doutorado em
fisiopsicopatologia, pela Faculdade de Medicina da Bahia (MIRANDA, A., 2005).
106

os meios encontrados para se dar à morte também evidenciam a sua própria disponibilização
no local em dado recorte temporal.
As estatísticas sociais, por outro lado, em muito colaboraram para o conhecimento de
novos métodos de suicídio. Nas tabelas presentes nos boletins de estatísticas demográficas e
sanitárias de Belém de 1905, os suicídios foram classificados em oito possíveis categorias dos
meios empregados de morte: por veneno; por asfixia; por estrangulamento, ou enforcamento;
por submersão; por armas de fogo; por instrumentos cortantes e perfurantes; por precipitação
de lugar elevado; e por esmagamento (PARÁ, 1905). Nos próprios jornais belenenses do
período, faziam-se presentes referências às estatísticas como meio formador das ideias sobre
os meios possíveis de se suicidar. A Província do Pará, em edição de 6 de maio de 1891,
transcreveu ligeiras passagens dos Annaes medico-psychologicos, recém-publicados pelo dr.
J. Moreau em França. Neles, o autor afirmou que os métodos de suicídio se agrupam em
“muitas categorias claramente determinadas por numerosas estatísticas” (OS SUICIDIOS,
1891, p. 3). Embasando-se em dados extraídos de levantamentos europeus, conclusões, como
as de Moreau, acabaram por formar as expectativas locais sobre os métodos empregados pelos
suicidas em Belém, como se pode notar nas categorias estabelecidas naqueles boletins
estatísticos de 1905:

Na Europa, a estrangulação é o modo mais empregado; a submersão vem


depois e com menores proporções; depois seguem-se as armas de fogo. A
propensão para se precipitarem de logares elevados nota-se mais em França
e na Italia do que nos outros paizes. O veneno é muito empregado em
Inglaterra e especialmente na Irlanda; é raro nos outros paizes, com
excepção da Italia. (OS SUICIDIOS, 1891, p. 3).

Já na irônica proposta da criação de estabelecimentos reservados ao suicídio, defendida


no jornal inglês World, em setembro de 1756, demarcava-se a que categorias sociais se
reserva cada instrumento próprio de suicídio: “punhais e venenos para os actores, espadas
fixas no solo para os soldados, pistolas carregadas de balas em forma de dados para os
jogadores[...]” (TRISTMAN, 1823 apud MINOIS, 1998, p. 326), e a forca reservada aos “que
não tem o gosto para as soluções nobres”127 (TRISTMAN, 1823, p. 194, tradução nossa). Ao
final daquela notícia de sensação, publicada a 29 de abril de 1907, em que a Folha do Norte
divulgara a existência do Instituto de Suicídio na cidade norte-americana de Nova York,
constou a transcrição da tabela de preços, expressos em dólares, dos “serviços” prestados pela

127
Do inglês: “who have no taste for the genteeler exits”.
107

casa. Nessa relação, marcou-se a representação moderna dos recursos que seriam,
recorrentemente, utilizados pelos suicidas, mas também com acentuado sentido de clivagem
social. Na medida em que havia grande diferença de valores entre os supostos preços,
observa-se a demarcação entre os suicidas ricos e os pobres:

Tiro de revólver com espelho e polvora sem fumaça $10.50


Asphyxia, gaz e divan $7.98
Asphyxia por submersão com pesos para as mãos e pés $6.25
Tiro de espingarda $5.40
Navalha com todos accessorios $44.39
Venenos á escolha $3.67 (INSTITUTO,
1907, p. 1).

O estabelecimento de diferenciação social no trato do suicídio, levando-se em conta os


métodos para ele empregados, não se tratava de nenhum traço moderno. Essa clivagem e o
valor atribuído a cada tipo de suicídio repercutiam na própria atitude cultural de cada
sociedade, a cada tempo, perante o ato suicida, o que faz do suicídio uma prática
historicamente construída. Na Roma antiga, por exemplo, os suicídios cometidos por meio do
golpe da espada ou de outra arma branca, eram comumente tratados como atitudes heróicas, e
“relatados com admiração pelos historiadores romanos”, além de associados aos nobres
(MINOIS, 1998, p. 72).
Muito tempo depois, o que se observa é que os meios empregados para o suicídio, na
Belém da virada do século XIX para o XX, estavam à disposição das mais variadas categorias
sociais. Todavia, diferentemente do teor das inúmeras notícias que davam conta das práticas
suicidas na cidade, havia representações nos jornais belenenses do período em que a
vinculação do suicídio com o ideal de civilização reclamava por mais requinte e elegância em
sua execução128, mesmo em artigos anedóticos de crítica social. Assim, pelo discurso irônico
presente em Um homem de expediente, da Folha do Norte de 4 de setembro de 1907129, o
direito individual de dispor da própria vida passaria também pelo grau de inserção da pessoa
nos espaços da cidade beneficiados pelo progresso:

Quem não tem dinheiro não sabe nada, não brinca de bond electrico, não
anda nas ruas, não fuma, não bebe, não come...nem nada!
O proprio suicidio requer dinheiro para ser levado a cabo. (Z., 1907, p. 1).

128
A relação do suicídio com a elegância já se fazia presente mesmo na literatura europeia do século XVII,
segundo Bayet em sua tese de doutoramento O Suicidio e a Moral (1922 apud MINOIS, 1998, p. 278).
129
Esse artigo fora assinado sob o pseudônimo Z., que se julga ter pertencido a Humberto Gotuzo, “médico e
escritor, subscritor da Seção ‘Registro’, do ‘Jornal do Comércio’”, Rio de Janeiro, “sobre acontecimentos da
vida social” (REGO, 2005, p. 38).
108

De todos os instrumentos disponíveis para o suicídio, o uso de armas – sejam elas as


tradicionais armas brancas (espadas, lanças, navalhas e facas), ou as modernas armas de fogo
(pistolas e revólveres) – sempre tiveram tratamento diferenciado nas representações sobre o
suicídio ao longo dos séculos pela cultura ocidental. Com valorização positiva, o sangue
provocado pelo corte profundo, ou pelo dilaceramento da carne evocava a mítica do heroísmo
e da virilidade, recuperando-se esses arquétipos masculinos. As estatísticas sociais em muito
colaboraram para estabelecer as diferenciações de gênero entre os suicidas e os métodos por
eles empregados. Nas transcrições da obra Annaes medico-psychologicos publicadas na
edição d’A Província do Pará de 6 de maio de 1891, o doutor Moreau afirmou que “em regra
geral, verifica-se que o homem [...] faz saltar os miolos, ou corta as guellas maior numero de
vezes que a mulher” (OS SUICIDIOS, 1891, p. 3).
Na iconografia nacional, destaca-se a obra Fim de Romance (1912), do pintor
fluminense Antônio Parreiras130, que se apropriou dessas referências para a composição da
tela, conforme Imagem 15. Nela, observa-se o suicida, já cadáver, em destaque centralizado
no primeiro plano. Esse corpo está estendido no meio de uma estrada deserta, aberta na relva,
e que pode simbolizar a interrupção do seu fluxo vital, especialmente quando as marcas dos
pincéis, feitas pelo artista, criaram o efeito de terra molhada a lembrar o fluxo corrente de um
rio. A opção estética do artista em retratar uma cena de suicídio fora do seu locus preferencial
– os espaços interiores – não deixou de evocar a subjetividade que permeia o ato. Na
amplitude da paisagem deserta, pintada ao ar livre, evocou-se a solidão do suicídio.
Percebem-se ecos, também, da constituição dos heróis típicos da literatura norte-americana do
século XIX, tão bem estudados por Semler (1998, f. 131): “homens solitários, másculos,
nômades [...]”. No caso de Fim de Romance, tem-se a representação de um cavaleiro gaúcho
em seus trajes típicos e com sua montaria, esta, a única companhia ao corpo suicida.
O cavalo, símbolo do vigor, encontra-se em posição de reverência à virilidade do
morto, com a cabeça e a crina pendentes, representando a força que se esvai, assim como o
chapéu caído sobre a relva e as pontas das boleadeiras131 estendidas sobre a terra batida, na

130
Antônio Diogo da Silva Parreiras (Niterói, RJ, 1860-1937), pintor egresso da Academia Imperial de Belas
Artes, e que depois fez parte do chamado “Grupo Grimm”, alusivo às aulas de paisagem ao ar livre
ministradas pelo alemão Johann Grimm. Consagrando-se como paisagista, Parreiras também enveredou pelo
nu artístico e, especialmente, pela pintura histórica. Desta última, destaca-se a obra Conquista do Amazonas,
finalizada em 1907 como encomenda ao Governo do Estado do Pará (CAMPOFIORITO, 1983). Dois anos
antes, Parreiras realizara exposição individual de quarenta e uma telas a óleo na capital paraense (CASTRO,
2011). Desse modo, Fim de Romance foi produzido posteriormente a esse período de contato com Belém, e
hoje faz parte do acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo, vinda de transferência da Secretaria do
Interior paulista em 1915.
131
Antigo instrumento usado para laçar animais, as boleadeiras se constituem de três bolas forradas de couro e
presas à extremidade de tiras de couro (ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS, 2008).
109

medida em que o sangue escoa da cabeça repousada. A pequena porção de vermelho, alusivo
ao fio de sangue, e de cinza, referente à cor da pistola, dão inteligibilidade à tela, dentro do
seu conjunto cromático, sobre o suicídio praticado pelo cavaleiro. O meio utilizado foi,
justamente, o disparo de bala no lado direito do crânio. Aliás, essa posição era recorrente nas
notícias sobre os suicídios praticados com arma de fogo na Belém na virada do século XIX
para o XX. O comerciante Américo Gomes Soeiro subira aos seus aposentos para também
desfechar, sobre o “parietal direito”132, o tiro que o fizera cair “banhado em sangue”(UM
ACTO..., 1905, p. 1).

Imagem 15 – Fim de Romance (1912), de Antônio Parreiras

Fonte: Antônio Parreiras (2009, p. 106)

Pelos estudos de Minois (1998) sobre a história do suicídio na Europa Ocidental – da


antiguidade greco-romana ao período moderno –, são inúmeros os exemplos encontrados na
literatura e nas memórias em que se exaltou a beleza visual e plástica do gesto suicida
provocado pelo uso da arma, ou se reconheceu certa dignidade e nobreza no ato. Nesse
sentido, cabe citar a observação presente na revista setecentista The Connoisseur: “o suicídio
com uma pistola finamente lavrada[...] confere ao seu elegante proprietário um pomposo
enterramento e um monumento que perpetue as suas virtudes na Abadia de
Westminster”(THE CONNOISSEUR, 1755, p. 298 apud MINOIS, 1998, p. 184).

132
Termo, empregado pela Anatomia, para se referir à região dos ossos da parede lateral do crânio (ACADEMIA
BRASILEIRA DE LETRAS, 2008).
110

Dessa sátira moderna, pode-se observar que, além da questão de gênero, havia também a
vinculação do suicídio pelo uso de armas com os segmentos sociais mais abastados.
Entretanto, na Belém do início do século XX, uma arma poderia estar à disposição de todos.
De fato, o percentual médio de casos de suicídios praticados com o uso de arma de fogo, e
noticiados nos jornais belenenses do período, foi de 20,10% (vinte e dez centésimos por
cento). O articulista P., em A Morte do Futuro – publicada na Folha do Norte de 24 de março
de 1905 –, ilustra a tese de que o suicídio é “o corollario logico do trabalho da razão agindo
tranquillamente”, com o exemplo de um homem pobre que, após tomar as atitudes
pragmáticas para não deixar sua mulher, futura viúva, totalmente desprovida de recursos,
planeja ritualizar o seu último ato do seguinte modo: “Pedirá á mulher o seu revolver Smith
Wesson, carregará o tambor da arma, fincará o cano, com calma, no ouvido direito, dará
tranquillamente ao gatilho e tudo estará acabado” (P., 1905, p. 1). Por outro lado, a relação de
gênero se mantem nesse artigo, ao atribuir lógica e racionalidade para o suicídio em função da
atitude e iniciativa masculinas de o praticar, o que legitimaria a tese então defendida.
Segundo Brown (2001), essa valorização do suicídio como ato racional, e mesmo viril,
em muito estava decaída ao iniciar o século XX ou, no limite, encontrava-se diluída ou
matizada. Deve-se o fato às várias representações, segundo as quais o suicídio passou a ser
debatido no nível da patologia e da fisiologia mentais: “ao longo do século XIX, a imagem
racional do suicídio se opunha à ideia do suicídio como produto de uma mente doentia”133
(BROWN, 2001, p. 158, tradução nossa). A Folha do Norte de 26 de fevereiro de 1914
noticiou o suicídio do “respeitado guarda-livros” da Companhia de Seguros Amazônia,
Joaquim Ildefonso da Matta Silveira, que havia desfechado tiro de revólver no próprio ouvido,
sendo que no anúncio da notícia, o seu suicídio foi tomado por “acto de loucura”. Convém se
lembrar dos qualitativos de “vencidos da vida”, atribuídos a vários suicidas de Belém, como o
que a mesma Folha do Norte, em 24 de abril de 1912, garantiu ao guarda-livros Francisco
Barata que, igual ao seu colega Joaquim Silveira, havia se suicidado com um tiro de revólver.
Por outro lado, ainda se permitia comparar certos suicídios, praticados por homens, com
determinadas referências a clássicos ou míticos suicídios heróicos. Esse “paralelismo” se
fundava na representação de “uma batalha perdida, ainda que neste caso se tratasse de uma
batalha contra forças econômicas, naturais, cruéis ou insurpotáveis”134 (BROWN, 2001, p.

133
Do espanhol: “A lo largo del siglo XIX se opuso la imagen racional del suicidio a la idea del suicidio como
producto de una mente enferma”.
134
Do espanhol: “[las muertes masculinas] que se representaba como una batalla perdida, aunque en este caso se
trataba una batalla contra unas fuerzas económicas, naturales, crueles o insoportables”.
111

159-160, tradução nossa). Foi nesse sentido, por exemplo, que a Folha do Norte de 13 de
julho de 1900 tratou a notícia da morte do espanhol Lourenço Saforcada, de 54 anos de idade,
que se matara, justamente, com um tiro de revólver na cabeça, como a um velho combatente
de guerra:

Tinha razão o pobre homem. A velhice não tem mais de onde tirar estímulos
para vencer a lucta pela existencia, maximé quando essa velhice, não
encontra no agreste desconforte da sua solidão, o balsamo de um conselho
amigo que lhe suavise as feridas da desdita. (UM DESGRAÇADO..., 1900, p.2).

O tema do homem vencido, nas batalhas contra as agruras da vida moderna, fez-se
recorrente nos poemas que se publicavam nos jornais belenenses daquele período. Na edição
de 21 de maio de 1891 de A Província do Pará, estampou-se na seção Accordes... o poema
assinado por M.A.N., com os seguintes versos:

[...] Já não sou o homem forte,


Que lucta pelo porvir!
Já não sou, oh! Triste sorte,
Mais que um sôpro a s’esvair! (Livra!) [...]

Já me vou pr’a fria campa


Somno eterno adormecer;
Já me vou pr’a fria campa...
Adeus, vida! Vou morrer!...

Pará, 19 – Maio – 1891. (ACCORDES..., 1891, p. 3).

A sigla, que se forma pelo pseudônimo adotado, faz clara referência à palavra inglesa
man, designativa do masculino. Sua presença completa o sentido que se atribui ao poema: é o
lamento do homem da cidade, perdido na busca por novos paradigmas que definam o seu
papel na nova ordem trazida pela égide do progresso e da civilização. Nesses versos, já se
prefiguram a aliança estabelecida entre dois elementos que, dezessete anos depois, vão nortear
os versos daquele poema Vencido, de Leocadio Guerreiro, que a Folha do Norte publicara, em
primeira página, a 9 de fevereiro de 1908: o desânimo e a vontade de morrer, mediados pela
presença impulsionadora de um revólver:

Lucto, – mas é em vão a minha heroicidade!


Inimigos crueis, demonios inclementes,
o tedio me aquebranta a força de vontade,
a duvida me tolhe os impetos valentes. [...]
112

Ouvindo-os, mais ainda eu me acobardo e tremo...


E quedo-me a scismar na tragica amargura,
nas allucinações do desespero extremo.

Dos que vão para a morte, heroicos ou vencidos,


os cerebros a arder nas febres de loucura
ou, então, por uma bala, os cerebros partidos!

Belem, 8-2-908. (GUERREIRO, 1908, p.1).

Por outro lado, as notícias publicadas nos jornais belenenses da época também se
referem a mulheres que chegavam ao ato violento do suicídio com armas de fogo, apesar de,
reconhecidamente, serem em número bastante inferior ao dos homens. Apenas em janeiro de
1905, a Folha do Norte registrou os casos de Maria da Cruz Pinheiro, que atentara contra a
própria vida com um tiro de revólver no ouvido, e de Altina Alves de Souza, que conseguiu se
matar com um “certeiro tiro de revólver no ouvido esquerdo” (O SUICIDIO..., 1905, p. 1).
Em ambas as notícias, circunstâncias semelhantes garantiam o retorno aos papéis de gênero
dos envolvidos, momentaneamente invertidos pelas atitudes de essas mulheres cometerem
suicídio de um modo externo e visualmente violento. Tanto a primeira – que morava em
Belém (à travessa de São Matheus, próximo à praça Batista Campos) –, como a segunda –
cujo suicídio ocorreu na cidade pernambucana do Recife – foram qualificadas como loucas:
Maria da Cruz sofreria de mania da perseguição, apresentado “melindroso estado de alteração
mental” (TENTATIVA..., 1905, p. 2), enquanto que Altina Souza, há meses que só “lhe
preoccupava o espirito a ideia do suicidio” (O SUICIDIO..., 1905, p. 1), fazendo com que
ambas vivessem sob constantes vigilância e cuidados de seus respectivos companheiros. As
representações construídas sobre essas mulheres mostram ao leitor duas personalidades à
sombra de homens. Entretanto, tais estados de guarda, sob o mando masculino, quebraram-se
com as detonações das armas que – como um dos símbolos domésticos do poder patriarcal –
pertenciam aos respectivos maridos, e que lhes foram subtraídas pelas duas suicidas no
momento em que os mesmos se encontravam fora de casa.
As notícias de jornais também informam sobre a relativa facilidade de se conseguir tais
instrumentos de morte. Ao que parece, homens e mulheres de Belém conseguiam comprar
seus revolveres no tradicional centro comercial da cidade. Cabe lembrar o caso de Maria
Epiphania do Amaral, que adquirira sua arma na manhã de 9 de julho de 1915
(DOLOROSO..., 1915, p. 1). Américo Rocha, o “imberbe maneco de 20 annos presumiveis”
adquirira seu revólver em um armazém de ferragens localizado no boulevard da República,
utilizando-o contra si mesmo logo depois (UM QUE..., 1901, p. 2). O caixeiro Antonio de
113

Britto Magno, de 17 anos de idade, comprou a arma com a qual se suicidou “para os lados do
Ver-o-Peso” (ACTO..., 1901, p. 2). Anúncios sobre comércio de armas de fogo portáteis –
inclusive de modelos importados – podiam ser encontrados nas seções comerciais dos
principais jornais diários de Belém no início do século XX, como nos constantes da Folha do
Norte de 2 de janeiro de 1914 e de 2 de fevereiro de 1914, apresentados pela Imagem 16
(montagem), demonstrando se constituir em produto de consumo urbano e doméstico.

Imagem 16 – Anúncios de revólver na Folha do Norte

Fontes: [Vêlo-Dog: Anúncio] (1914a, p. 4; 1914b, p. 4)

Por outro lado, de todas as marcas de revólveres existentes à época, nenhuma outra
parece ter exercido tanto fascínio aos suicidas como a norte-americana Smith Wesson. De
modelos portáteis, portanto adequados ao manejo doméstico, foi com uma Smith Wesson que
o caixeiro Antonio de Britto Magno e Maria Epiphania do Amaral se suicidaram. Similares
também eram utilizadas para esse fim, desde que se mantivesse a evocação ao original: a arma
com que o guarda-livros Joaquim Ildefonso da Motta Silveira tentara contra si “é imitação
S.W. [iniciais de Smith Wesson]” (OS QUE ABORRECEM..., 1914, p. 1). Não se deve
esquecer que, no artigo A Morte do Futuro, da Folha do Norte de 24 de março de 1905, a
citação ao revólver Smith Wesson é utilizada para a leitura visualizante do ato suicida
exemplificado ao seu final.
O nível de inserção da marca de revólver Smith Wesson no universo suicida não se
restringia a Belém. Nas representações sobre os instrumentos para o suicídio, podem-se
encontrar referências ao Smith Wesson até mesmo no santista O Fogo-Fatuo (1898). Dentro
dos estilos de linguagem trabalhados pelos seus idealizadores, o Smith Wesson se personificou
114

e mesmo “assinou” um artigo, de sugestivo título Tiros. Nele, estabeleceu-se o jogo de


sedução entre a arma e a leitora em potencial, na relação de gênero em que o revólver se
assumiu como símbolo da potência masculina, espaço esse negado à mulher, caso ela tivesse a
ousadia de lhe fazer flerte:

Não se assuste, Leitora; eu estou descarregado.


E que não estivesse,
Em lidando com moças, ou melhor, em lidando ellas commigo, torno-me tão
inoffensivo como qualquer desses revolverzinhos feitos á minha imagem e
semelhança, com os quaes as creanças brincam, fazendo detonar espoletas de
papelão.
Mas ainda assim cuidado, que mesmo descarregado...
Dizem que o diabo, d’uma vez armou uma tranca e ... e bumba.
Eu, porém, estou certo de que isso não se ha de dar commigo, se a Leitora
quizer.
Porque está nas mãos da Leitora evitar que eu carregue o meu cylindro com
balas terriveis, assassinas e faça uma porção de desatinos, de loucuras.
É isso tão fácil! [...]
Humilde e dedicado Servo
Smith Wesson (TIROS, 1898, p. 3-4).

Apesar do fascínio exercido pelas armas de fogo, foram os igualmente perigosos tóxicos
que constituíram, de sua parte, os instrumentos mais utilizados para os suicídios na Belém nos
anos iniciais do século XX. Nesse período, observou-se que a ingestão dos mais variados
tipos (ou combinações) de substâncias venenosas correspondeu à média anual de 41,36%
(quarenta e um e trinta e seis centésimos por cento) do total dos suicídios praticados.
Na memória construída sobre o universo do suicídio ao longo dos séculos, na cultura
ocidental, o recurso ao veneno, como meio de morte, equiparou-se ao uso das armas para fins
de se atribuir certa honradez ou dignidade ao ato suicida. O suicídio precoce (aos 17 anos) do
poeta inglês Thomas Chatterton, em 1770 – talvez “um dos ícones mais populares do seu
tempo”135 (BROWN, 2001, p. 161, tradução nossa) e referência à geração romântica que lhe
sucedeu – concretizou-se com a dose mortal de veneno tomada em seus aposentos.
Na Belém da virada do século XIX para o XX, observa-se que os venenos foram os
meios mais utilizados pelos chefes de família para se matarem e escaparem de dificuldades
financeiras. O comerciante Hamilton de Moura Ferro, por alegadas “infelicidades em
negocios”, envenenou-se em 26 de novembro de 1903 pela ingestão da mistura de vinho do
Porto com ácido fênico. Meses antes, a 30 de abril de 1903, o funcionário da alfândega local,
Manoel Octaviano Lennhoff Britto havia se envenenado com a combinação dos conteúdos de

135
Do espanhol: “[Chatterton] uno de los iconos más populares de su tiempo [...]”.
115

um frasco de láudano de Sydenham com de ácido oxalico, na varanda de sua casa à travessa
de Cintra, em tradicional bairro residencial da Cidade. O motivo para o seu suicídio residiria,
supostamente, em problemas enfrentados em seu local de trabalho. No depoimento à polícia
prestado por sua viúva, consta a descrição do ato que, horas depois, ela própria viria a
constatar ter sido a preparação do suicídio cometido pelo marido: “[ele] parecia estar
preparando uma bebida qualquer n’um copo que tendo elle demorado muito tempo em mecher
com uma colher [...]” (PARÁ, 1903, f. 5). Na notícia sobre o suicídio de Lennhoff Britto,
publicada na Folha do Norte, de 2 de maio de 1903, esses mesmos prosaicos utensílios
domésticos ganharam destaque na descrição dos acontecimentos: o copo, a colher e os frascos
vazios figuraram como importantes elementos de cena e como provas periciais – eram as
marcas visuais denunciadoras do suicídio que ali se havia executado.
Entretanto, nas referências gerais aos suicídios cometidos pelo uso de venenos, nas
páginas dos jornais de Belém do período, ainda havia forte marcação de gênero que o
vinculava a uma prática feminina, reforçada por dados estatísticos. Nesse sentido, Corbin
(2003, p. 593) identificou que, entre as suicidas francesas do século XIX, “é o veneno que,
depois do afogamento, parece a solução mais apropriada”. Na própria divulgação do nova-
iorquino Instituto de Suicídio (da Folha do Norte de 29 de abril de 1907), os exemplos
apresentados do que seriam os suicídios típicos diferenciavam os papéis de gênero. Neles, a
prática feminina do suicídio, fortemente vinculada à ingestão de veneno, ganhou conotações
de uma histeria patológica, e a própria motivação para o ato foi ridicularizada no nível do
patético: “Uma moça é infeliz nos seus amores. Vae a uma pharmacia e adquire um veneno,
toma-o mesmo na rua, grita horrivelmente, espanta toda a gente, fazendo uma scena
desagradavel” (INSTITUTO..., 1907, p. 1).
A associação dos suicídios por envenenamento com os referenciais femininos se
relacionava, sobretudo, a uma suposta carga reduzida de violência para com o corpo do
suicida, o que, de certo modo, deveu-se a um saber então recém-produzido pelas ciências
médicas ao longo dos Oitocentos. Lopes (2007) observou, no Dictionnaire Encyclopédique
des Sciences Médicales (1884), obra francesa de De Chambre, considerações pontuais sobre
algumas das diferenças de métodos de suicídio escolhidos por homens e por mulheres. Estas
últimas prefeririam os que as conduzissem a uma morte menos trágica, no sentido de não
produzirem marcas visualmente externas em seus corpos. Ao atribuir às mulheres essa
preocupação estética com o estado de beleza física no pós-morte, acabou-se por estabelecer
quais seriam aqueles métodos “próprios para elas” (DE CHAMBRE, 1884 apud LOPES,
2007, p. 148).
116

Por outro lado, algumas representações, contidas em notas dos jornais belenenses no
início do século XX, dão conta de que os envenenamentos, a seu modo, acarretavam certa
dose de violência ao suicida, muito embora não fosse aparente. Segundo o que fora publicado
na coluna Cartas do Rio, da Folha do Norte de 27 de fevereiro de 1905, ingerir “kerozene”
não era o meio mais prático de suicídio, “porquanto é de facil comprehensao os soffrimentos
terriveis que um desgraçado ha de passar, com as carnes carbonisadas e o corpo reduzido a
uma única chaga” (VARIAS, 1905, p. 1). Do mesmo modo, a notícia sobre o suicídio do
carregador Ignacio Barbosa, morador ao largo da Sé de Belém, na Folha do Norte de 13 de
abril de 1900, relatou os sofrimentos passados pelo mesmo, após sucessivas doses tomadas de
azebre às escondidas. Foram os seus vômitos que despertaram a desconfiança de seus
companheiros de moradia. Certa vez, não podendo mais esconder o fato, “o Barbosa cahiu,
começou a soffrer dolorosamente, e, então, confessou o que tinha feito” (SUICIDIO, 1900, p.
2). Do mesmo modo, os moradores da casa do sr. Rubim Guimarães só descobriram a
intenção de se suicidar da criada Philomena Maria da Conceição, quando encontraram esta
“em afflictivo estado”, “vomitando verde, em abundancia” (SUICIDIO, 1903, p. 1, grifo do
autor), decorrente da ingestão de grande quantidade de verde-Paris, conforme Folha do Norte,
de 11 de junho de 1903.
A grande violência produzida pelos venenos, no entanto, raramente eram relatadas nas
notícias dos jornais: os estragos produzidos nos órgãos internos dos corpos. Como essas
observações dependiam dos resultados finais das análises químicas a que eram submetidas as
vísceras retiradas dos suicidas – e que poderiam demorar dias após o ocorrido –, não
integravam a narração dos fait divers dos suicídios. É justamente nos processos de diligências
policiais, que se pode dimensionar a violência física interna provocada pelo ato suicida do
envenenamento. Na autópsia feita no cadáver de Lennhoff Britto, a 1º de maio de 1903, pelo
modo de responder aos quesitos formulados pela perícia médico-legal, há a descrição
vizualizante dos efeitos corrosivos sobre a carne, produzidos pela mistura de tóxicos que o
mesmo tomara:

Procedemos o exame e autopsia no cadaver de Manoel Octaviano Lennhoff


de Brito, branco, o qual trajava, calça, collete e casaco de cazemira preta
sobre camisa e ceroila brancas. Retiradas as vestes nada encontramos que
nos despertasse a attenção e resolvemos então proceder a abertura das
cavidades. [...] Na cavidade abdominal, porem, avultou-se logo aos nossos
olhos a congestão de todas as viceras, principalmente o figado, o estomago e
a primeira parte do intestino delgado – o duodenum – A mucosa do
estomago muito congestionada em alguns pontos, em outros achava se
até destruida, nos pontos que se avisinhavam do pylorum, o que julgamos
117

devido ao contacto prolongado de um liquido de côr escura que encontramos


nesta parte do apparelho digestivo. No duodenum encontramos lesões da
mesma natureza, porem mais attenuadas. As viceras e o liquido encontrado
no estomago foram retiradas e enviadas [sic] para a Directoria digo para a
Directoria do Serviço Sanitario Estadoal, para se proceder o exame chimico
[...]. (PARÁ, 1903, f. 8-9, grifo nosso).

Desse modo, é preciso ter a cautela necessária para analisar aquelas demarcações de
gêneros no tocante aos suicídios por envenenamento. Devem-se contrapor tais representações
com as práticas suicidas mais próximas da realidade, de que informam as notícias impressas
nos jornais belenenses na primeira década do século XX. Pela amostragem considerada dos
casos noticiados nesses periódicos, percebe-se que os homens correspondiam à média de
61,33% (sessenta e um e trinta e três centésimos por cento) do total dos suicidas que se
envenenavam na cidade. Assim, evidencia-se que o uso de venenos era muito fluído entre
homens e mulheres. Ambos lançavam mãos dos mais variados tóxicos – ou das misturas dos
mesmos – que se encontravam à disposição na cidade. Nesse ponto, é oportuno articular tal
observação com a constatação feita por Meyer (1996, p. 265), em relação à proliferação e à
diversidade dos tipos de venenos, presentes nos enredos, trágicos ou rocambolescos 136, dos
romances-folhetins que circulavam na imprensa ocidental no século XIX: com esse farto
material “poder-se-ia escrever verdadeiro tratado de toxicologia”. De todos os tóxicos
disponíveis em Belém, porém, pode-se destacar o uso mais frequente de dois: o próprio
querosene e o verde-Paris.
Em relação ao primeiro, havia mesmo representações dando conta de sua extrema
popularidade. Na Cartas do Rio, da Folha do Norte de 27 de fevereiro de 1905, tratou-se o
querosene como “o meio mais escolhido para dar cabo da existência” (VARIAS, 1905, p. 1).
Quando esse mesmo jornal diário havia noticiado a tentativa de suicídio do chefe de família
Manoel Xavier, que havia comprado certa dose de querosene para beber, ressaltou-se ser esse
“um dos vehiculos mais baratos de morte” (MAL..., 1900b, p. 2). O mesmo querosene podia
servir de base para misturas envolvendo outros tóxicos. O antigo oficial da fábrica de malas,
Manoel Seabra, encontrando-se sem emprego em razão da tuberculose pulmonar que o
vitimara há algum tempo, fez um preparado contendo querosene, vidro moído e certa dose do
próprio medicamento que o seu médico lhe havia prescrito para o tratamento da doença
(TENTATIVA..., 1901, p. 1).

136
Termo que passou a designar as narrativas pletoras de aventuras extraordinárias, suspense e reviravoltas. Faz
alusão ao personagem de sucesso Rocambole que, primeiramente, surgiu nos romances-folhetins do escritor
francês Ponson du Terrail (1829-1871) e, após a morte deste, foi adotado por outros folhetinistas (MEYER,
1996).
118

O título conferido ao querosene – de ser o meio mais popular de suicídio no início do


século XX –, de certa maneira, guarda correspondência com os casos relatados pelos jornais
de Belém naquele período. Nesse sentido, o caso da cozinheira Raymunda de Senna Ferreira
foi ao encontro de tal representação. Segundo a notícia veiculada na Folha do Norte, de 5 de
maio de 1905, Raymunda Ferreira, vinda do interior do Estado (natural da cidade de Vigia),
empregara-se na cozinha da família do sr. Raymundo Rodrigues Pimenta nas imediações da
praça Batista Campos, à rua Arcipreste Manoel Theodoro. Ao ser acusada de furto pelo seu
patrão, a cozinheira lançou mão do instrumento que se lhe encontrava à disposição no seu
ambiente de trabalho, assim que se vira sozinha: “poz um copo e meio de kerozene e bebeu-o
de um trago” (ENVENENAMENTO, 1905, p. 2). Depois, retirando-se para o seu local de
moradia – uma estância137 localizada a algumas quadras de onde se encontrava – ainda bebeu
uma dose de “sal de azedas”138, que potencializou os efeitos do querosene. Por outro lado, a
disponibilidade do querosene, junto às camadas sociais de baixa renda, pode ser também
compreendida, considerando o seu uso corrente na própria iluminação doméstica. Segundo
Cancela (2008, p. 82), a iluminação elétrica – recém-introduzida na cidade – não estava ao
alcance de grande parte da população, que ainda fazia uso de formas tradicionais de produção
de luminosidade, como a combustão do querosene139. Desse modo, ainda que com reservas,
pode-se estabelecer relação entre os suicídios por ingestão de querosene e a parcela da
sociedade alijada dos benefícios do progresso.
O verde-Paris, por seu turno, constituiu-se num dos meios mais recorrentes de
envenenamento dos habitantes de Belém nos anos iniciais do século XX. De todas as
substâncias tóxicas utilizadas pelos suicidas da cidade, o uso do verde-Paris correspondeu à
média anual de 27,05% (vinte e sete e cinco centésimos por cento) dos casos. Fabricado à
base de arsênico e de cobre, tem por nome científico “acetoarsenito de cobre” 140, e se
encontra, atualmente, no rol dos produtos químicos perigosos à saúde humana. Também
denominado verde imperial, verde esmeralda, apresenta-se na coloração esverdeada, na forma
inodora e sólida de pó (SÃO PAULO, [200-?]), conforme se observa da Imagem 17. Era

137
Estância era um tipo de moradia popular, coletiva, semelhante ao cortiço.
138
Segundo o Diccionario de medicina popular e das sciencias accessorias... de Chernoviz (1890), o sal de
azedas tem por nome científico “oxalato de potassa”. De cor branca e de sabor ácido, embora fosse
empregado em “pastilhas refrigerantes”, era utilizado para tirar manchas de tinta e de ferrugem nas roupas.
139
Cancela (2008), em seu trabalho sobre a cartografia traçada dos benefícios das novas tecnologias na vida
cotidiana do belenense no final do século XIX, observa o alto custo de aquisição dos itens que serviam à
iluminação elétrica.
140
O verde-Paris chegou a ser designado pelo termo arsenicato de cobre, ou verde de Scheele, conforme presente
no laudo pericial feito em 5 de junho de 1901, após análise química das vísceras da suicida Maria Luiza
(PARÁ, 1901).
119

solúvel em líquido, o que fazia com que os suicidas geralmente misturassem o tóxico em
água, ou em líquidos mais característicos da região, como o popular açaí. O embarcadiço
Antonio Marinho Maia, por exemplo, ingeriu grande quantidade do verde-Paris contido em
um copo de “assahy”, conforme noticiado pela Folha do Norte em 18 de setembro de 1905
(SUICIDIO, 1905, p. 2) Dez anos depois, o Estado do Pará noticiou sob o título de Um
suicida original, o drama do estivador Silvino Honorio Ferreira da Silva que, querendo
engendrar “um fim mais philosophico e elegante” – “para não morrer de modo trivial como os
outros, que só encontram creolina, lysol, acido phenico [...] e outros corrosivos baratos” –,
misturou “arseniato de cobre” com o “assahy” (UM SUICIDA..., 1915, p. 1).
A ingestão de verde-Paris, contudo, não se tratava de um fenômeno próprio a Belém no
universo suicida daquele início de século. Pequenas notas telegráficas também dão conta do
seu uso por suicidas do interior do Pará e até de outros Estados brasileiros. A Folha do Norte,
apenas no período aproximado de um mês, em 1903, fez publicar dois casos de suicídios – de
duas mulheres, sendo uma delas, prostituta – por envenenamento de verde-Paris em
Pernambuco (OS DESESPERADOS..., 1903; PERNAMBUCO, 1903). Nesse Estado, o
tóxico também possuía a denominação derivativa de “verde-francez” (PERNAMBUCO,
1903, p. 1). Já em 26 de outubro de 1905, a Folha do Norte noticiou o envenenamento, por
verde-Paris, de Armindo Antonio Rodrigues em Juçara, localidade do município de Cametá,
no baixo Tocantins, no Pará (UM MOÇO..., 1905).

Imagem 17 – Frascos contendo verde-Paris

Fonte: Sérgio Prata ([201-?])

Os inúmeros casos de envenenamento por verde-Paris, divulgados nos jornais de Belém,


também fornecem importantes evidências de como esse produto era adquirido, até com certa
facilidade, pelos habitantes da cidade. O seu uso ordinário, e principalmente os seus efeitos
nocivos à saúde humana, eram de conhecimento de grande parte dessa população.
120

Atualmente, nas artes plásticas, pode-se verificar sua utilização na pigmentação de óleos,
embora deva ser evitado (PRATA, [201-?]). No início do século XX, porém, havia outros
usos locais para o verde-Paris. A criada Philomena Maria da Conceição, por exemplo, havia
obtido “consideravel dóse” do verde-Paris, com que se matara a 9 de junho de 1903, junto à
sobra do material utilizado na pintura da casa dos patrões, e que “fôra deixado alli pelo
pedreiro” (SUICIDIO, 1903, p. 1). Do mesmo modo, até crianças podiam adquirir o tóxico no
comércio local. Nesse sentido, é digno de transcrição o trecho a seguir, tratando da notícia
sobre a tentativa de suicídio do menor Lauro Gomes de Oliveira, que tentara por termo à
existência por ter sido acusado, pela mãe, do sumiço de certa quantia de dinheiro em casa.
Nele, observam-se as estratégias utilizadas para ludibriar a fiscalização que, porventura,
viesse a existir:

[...] Lauro dirigiu-se á mercearia Sagica, que fica proximo de sua casa, e
pediu um pacote com 100 grammas de verde Paris mandando debital-o na
conta de seu pae.
O empregado da casa, não obstante nada ter desconfiado, perguntou-lhe para
que era o verde Paris, respondendo-lhe o menor ser para exterminar saúvas.
(OS BRIOS..., 1905, p. 1).

Nessa linha de raciocínio, pode-se perceber como se encontravam disponíveis às


práticas suicidas os meios de morte na cidade, por mais elaborados que fossem. O jovem
Antônio de Almeida Medeiros tentara se envenenar com “uma solução de gramma e meia de
chlorhydrato de cocaina”, obtida no próprio estabelecimento em que era empregado, a
“pharmacia Itatiaya”, localizada na avenida 16 de Novembro, às proximidades do centro
comercial da cidade (OS FARTOS..., 1913, p. 2). O caso do comerciante João Pereira da
Silva Tavares, que guardara a estricnina – que o mataria em 6 de maio de 1908 – no cofre de
seu escritório, é emblemático para demonstrar que, raramente, havia substâncias tóxicas
inacessíveis ou desconhecidas aos suicidas.
Se o uso normal da “strychinina” era tratado, como terapêutico, em trabalhos como o do
médico Lobão Junior (1901, p. 71), que inclusive recomendava a sua alta dosagem para tratar
paraplegias, nota-se, por outro lado, que o conhecimento acerca dessa substância (como de
tantas outras) não se restringia aos círculos médicos e acadêmicos. Os jornais diários, a seu
modo, divulgavam as suas propriedades ao público leigo de Belém. Assim o fez o Diário de
Noticias que, na sua edição de 26 de maio de 1894, divulgou as qualidades da planta indiana
“stricnos”, “do qual se extrae o veneno mortal, conhecido sob o nome de stricnina [cujo
121

princípio ativo foi extraído] pela primeira vez em 1818 por 2 chimicos francezes [...]” (O
“STRICNOS”, 1894, p. 2).
Na Belém dos anos iniciais do século XX, os suicídios cometidos por asfixia (em
decorrência de enforcamento) não foram significativos, se comparados aos decorrentes de
ingestão de veneno, mas tampouco deixaram de ser percebidos. A média percentual anual
encontrada para os enforcamentos foi da ordem de 12,20% (doze e vinte centésimos por
cento), do total dos suicídios noticiados pela imprensa local. Entretanto, as representações
sobre esses suicídios na imprensa reproduziam, em muito, os estigmas construídos no próprio
universo suicida em relação a esse instrumento de morte.
Por séculos, a morte por enforcamento foi particularizada como o meio de suicídio mais
degradante e repudiado nos debates e nas referências. A morte voluntária, por enforcamento,
era geralmente representada como algo infame, desprezível ou covarde, e atribuída a práticas
das categorias inferiores do ordenamento social no caso inglês (MOORE, 1790 apud
MINOIS, 1998, p. 234-235). Entretanto, segundo Corbin (2003, p. 593), ainda havia um
sentido de virilidade no uso da corda “para o camponês e para o homem do povo” francês do
século XIX, justamente em razão da visualização externa das marcas da violência no corpo.
Assim, associados geralmente a motivações ligadas a um cotidiano de miséria e de
sofrimentos, os enforcamentos remontavam ao suicídio praticado pelos pobres. Esses
suicídios “populares” foram representados como os que “não provocam entusiasmo, porque
não são justificados pelas grandes ideias, não correspondem aos cânones do heroísmo e
recorrem quase sempre ao uso da corda” (MINOIS, 1998, p. 342).
Na Belém da virada do século XIX para o XX, pelo que se percebe das notícias
veiculadas na imprensa local, recorrer ao uso da corda estava no âmbito das possibilidades
daqueles suicidas que ocupavam a condição de empregados nas casas das grandes famílias da
cidade. Por essa perspectiva, os locais da ocorrência desses suicídios se davam nos espaços
das residências em que tais pessoas melhor se representavam, no plano do simbólico, dentro
desse universo doméstico. Em 12 de março de 1901, a esposa do senhor Cezar Augusto de
Andrade Pinheiro encontrou o corpo suspenso de Cyda Baré, estrangulada que estava por uma
corda americana atada ao pescoço “em duas voltas”, na sentina que ficava no quintal dos
fundos de sua residência, esta localizada à praça Baptista Campos. Ao olhar aterrorizado da
dona da casa, o cadáver se mostrou na grotesca composição do “rosto desfigurado, horrivel” e
dos “pés dentro do buraco da privada”. Na notícia, identificou-se Cyda Baré como indígena
122

da tribo dos Barés141, que há quatro anos vivia junto àquela família, “sempre alegre e
satisfeita”, pelo que o próprio noticiarista resumiu a resolução tomada pela suicida a “um acto
de loucura” (SUICIDA, 1901, p. 2). Entretanto, é possível articular esse caso com a análise
efetuada por Wolff (1999, p. 192-193) sobre a dimensão relacional não somente de gênero,
mas também de etnia. O ato derradeiro de Cyda Baré, incompreensível ao olhar da redação da
Folha do Norte, perfeitamente pode ter servido para estabelecer a comunicação que inexistia
quando em vida142, protestando contra as condições reais de existência a que estava submetida
e que não fora reproduzida (intencionalmente ou não) na notícia de sua morte. A índia baré,
com o corpo sobre a latrina, podia informar ao vivos a autonomia conquistada em decidir
sobre a própria morte.
Na valoração negativa atribuída ao uso da corda, também se construiu uma forte
imagem do enforcamento como meio de expiação de culpas. Minois (1998, p. 24) lembrou
dos afrescos medievais de Giotto, em que a Desperatio é retratada se enforcando. A
associação desse meio de suicídio com a passagem bíblica da morte do enforcamento do
discípulo Judas será sempre recorrente desde então, tornando-se a morte pela forca o
“merecido final da vida de um malvado”143 (BROWN, 2001, p. 181, tradução nossa). No
século XVIII, Denesle (1766, p. 459 apud MINOIS, 1998, p. 342, tradução do autor)
vaticinava que “a corda é um tipo de morte cuja infâmia é tão bem decidida que um homem
que a escolhesse no meio do desespero, a menos que não fosse da escória do povo, seria
irremediavelmente desonrado entre as pessoas honestas”144.
Foi por um extremo sentimento de culpa perante o patrão, o comandante Antonio
Gomes Bissau, que o amazonense Tarquinio Marques da Costa se enforcou em Belém na
madrugada de 28 de outubro de 1905, ao pensar ter traído a confiança de Bissau por
engravidar uma das “creadinhas” da casa em que trabalhava. Ele escolhera justamente o
banheiro da casa do patrão, sendo seu cadáver encontrado suspenso, “pendente de uma corda,
ao centro de um tanque que servia para tomar banho” (ENFORCADO, 1905, p. 1). Entretanto,
parecia haver um locus específico para a prática dos suicídios por enforcamento, e que melhor

141
Foi utilizado o termo “tribo”, tal como presente na notícia original da Folha do Norte de 13 de março de
1901.
142
Esse sentido do suicídio, como comunicação, foi aqui empregado a partir da visão metafórica de Rubem
Alves (1998, p. 11-12), para quem o suicídio é o “gesto” que externa o desejo interno do suicida, cujo corpo
funciona como o “término de uma melodia que vinha sendo preparada no silêncio do seu ser” e que, portanto,
necessita ser ouvida, ou a produção de um “texto para ser lido”.
143
Do espanhol: “Merecido final de la vida de un malvado”.
144
Do original francês: “[Aujourd’hui] c’est un genre de mort dont l’infamie est si bien décidée, qu’um homme
qui le choisitoit dans de désespoir, à moins qu’il ne fût de la lie du Peuple, seroit irrémissiblement deshonoré
parmi les honnêtes – gens”.
123

representava a ideia de expiação da culpa: as celas das prisões. A Folha do Norte de 1º de


março de 1905 publicou o caso do preso que se enforcara na cadeia do município de Breves,
na região sul da ilha do Marajó, no interior do Pará. Acusado de ter violentado a própria filha,
Manoel Innocencio de Brito sucumbira às pressões de sua própria consciência. O interessante
nessa pequena notícia sobre a morte do pai encarcerado está na ênfase dada a sua condição de
alcoólatra, o que o teria levado a cometer aquele primeiro delito. O suicídio de Manoel de
Brito surge, então, como o final merecido, mesmo que também represente a fuga da aplicação
das normas penais: “o infeliz, que era uma victima do alcoolismo, serviu-se duma das cordas
da rêde que lhe haviam dado para dormir, para levar a effeito o tragico desenlace em que se
furtou á vindicta da lei e ao proprio castigo da consciencia.” (UM PAE..., 1905, p. 2).
No ambiente escasso das celas de prisões, as improvisações se faziam, já que, para se
enforcar, poucos recursos eram necessários, dependendo das disposições do próprio espaço.
Já foi mencionado que Braz Pereira, encerrado numa das celas da estação de segurança à
travessa São Matheus em Belém, fez do tecido de sua própria ceroula a corda com a qual se
enforcou aos 28 de janeiro de 1902. Quase uma década após, a Folha do Norte, de 13 de abril
de 1911, publicou nota telegráfica sobre caso semelhante ocorrido em prisão da Capital
Federal no dia anterior. Ambos são evidências de como a prática do suicídio conseguia ser
oportunizada através das brechas abertas pela vigilância da ordem.

Rio, 12. No xadrez da delegacia, o ex soldado de policia João Avelino dos


Santos arrancou a manga da camisa e amarrou á grade, tentando suicidar-se.
([SUICIDIO...], 1911, p. 2).

Há também outra questão importante a se considerar no que diz respeito ao estigma


produzido sobre o uso da forca: as condições em que o cadáver do suicida é encontrado. O
desconforto nas testemunhas, provocado pela visão do corpo em suspensão e desfigurado,
pode ser a razão, conjeturada pelo próprio Minois (1998, p. 66), para a depreciação da prática
suicida por enforcamento desde séculos: na Roma clássica, particularmente, tal método era
considerado “particularmente maléfico” em relação aos demais. Nesse exato sentido, a Folha
do Norte, de 29 de outubro de 1905, nomeara o caso do enforcamento do serviçal Tarquinio
Marques da Costa como um “espectaculo horroroso”. Em sua narrativa ao estilo fait divers,
reforça-se a dramaticidade desse suicídio nos detalhes de como o corpo fora achado no
banheiro da residência: “o desgraçado [...] mordera a lingua e entreabrira os labios como
quem procura tomar folego, distendera os braços e ficara com a cabeça pendida sobre o
hombro esquerdo” (ENFORCADO, 1905, p. 1). Diferente das demais descrições sobre os
124

corpos de suicidas mortos por outros métodos, percebidas nas notícias impressas nos jornais
locais, o cadáver do enforcado assume, geralmente, uma postura ativa, como se vivo ainda
estivesse: as expressões dos músculos faciais e corporais, paralisadas no seu corpo gelado e
inerte, informam sobre a realidade da morte145.
No caso do enforcamento do detento Braz Pereira da Silva a 28 de janeiro de 1902,
Martinho Ribeiro Pinto, identificado como “reporter” de A Província do Pará, se encontrava
na estação de segurança, no momento exato em que o corpo do suicida fora encontrado em
uma das celas. Do seu depoimento prestado no inquérito policial aberto – no qual foi arrolado
como testemunha – naquele mesmo dia, para a notícia veiculada na edição do referido jornal
do dia seguinte, percebe-se a diferença na descrição sobre o mesmo fato, conforme as
respectivas transcrições a seguir. Tal diferença se explica pelas estratégias comuns
estabelecidas pelos noticiaristas da imprensa belenense da época, em provocar a sensibilidade
dos leitores, mobilizando as referências visuais abjetas do suicídio por enforcamento:

Preso pelo pescoço ás grades da prisão jazia um individuo, de côr preta que o
respondente reconheceu ser Braz Pereira da Silva, preso há dois dias atraz
por suspeita de ser o assassino de Ignez Gomes dos Santos; que na mesma
occasião o respondente tocou no corpo do individuo para ver se este já havia
morrido e verificou estar morto o mesmo pois que já o cadaver estava frio.
Nada mais tendo a fazer alli retirou-se para o interior da Estação, vindo
escrever as suas notas com relação ao suicidio que acabava de dar. (PARÁ,
1902, não paginado).

O cadaver dava as costas para o lado da rua e da bôcca escorria-lhe


abundante baba que ensopava o local onde elle tinha os pés. A lingua
conservava se recolhida, embora a bôcca estivesse semi-aberta. Os olhos,
muito abertos, tinham uma expressão horrível de desespero. O rosto
apresentava grande pallidez. O braço esquerdo distendia-se ao longo do
corpo e o direito apoiava-se n’um dos varões horizontaes da grade. (UM
CASO..., 1902, p. 1).

Do mesmo modo, e como parte dessa estratégia, as notícias que tratavam dos casos de
suicídio por enforcamento, geralmente, enfatizavam o meio de morte empregado, nos seus
respectivos títulos. Com Enforcado, a Folha do Norte publicou o suicídio de Tarquinio

145
Segundo Seligmann-Silva (2005, p. 39), é na exposição (sob qualquer forma visualizante) do cadáver que
está a “manifestação privilegiada” do abjeto. O conceito de abjeto se aplicou às artes em geral,
principalmente a partir da estética romântica no século XIX, como possibilidade de representação do real,
quando o “choque” passou a fazer parte da pauta cotidiana da vida moderna, e difere do conceito
renascentista do Belo como a necessária expressão do objeto no nível da idealização (SELIGMANN-SILVA,
2005). Respaldando-se na teoria psicanalítica de Julia Kristeva – expressa em Poderes do Horror, de 1980 –,
Seligmann-Silva (2005, p. 39-40) analisa as formas como esse Abjeto provoca a sensibilidade do seu
espectador (ou do seu leitor); ou seja, “abala-o” no sentido de ativar um “recalque originário”, anterior à
formação do “eu” psíquico, como manifestação sobretudo ligada a um sentimento de perda.
125

Marques da Costa em 29 de outubro de 1905. Onze anos antes, em 6 de março de 1894, o


Diário de Noticias fizera publicar o suicídio de Geraldo Pedro Ferreira sob esse mesmo título.
O corpo desse suicida teria sido encontrado “enforcado em uma das escapulas da sala” de sua
casa, por uma criança moradora do local. Nessa notícia, ainda se percebe a discreta
mobilização dos estigmas envolvendo o ato do enforcamento – embora se tenha alegado a
alienação mental do morto como causa do suicídio –, ao contrastar o caráter trágico do ato
com a inocência infantil da testemunha, que pensava estar o morto “dormindo em uma corda”
(ENFORCADO, 1894b, p. 1).

Imagem 18 – O suicídio simbólico de Antônio Lemos

Fonte: Salvador Costa (1912, p. 1)

Por ser considerado uma prática infamante, o enforcamento também “manterá até à
época moderna uma conotação claramente pejorativa” (MINOIS, 1998, p. 66). Nesse sentido,
percebe-se até mesmo o uso político que o Estado do Pará, em edição de 6 de abril de 1912,
fez da imagem gráfica do enforcado para criticar a administração e a política do então
Intendente de Belém, o senador Antônio Lemos. Na charge impressa em primeira página,
observam-se múltiplas referências ao personagem-símbolo maior dos enforcados na cultura
126

cristã: Judas Iscariotes. Do “Sabbado de Alleluia” à figueira de ramos secos 146, passando
pelos urubus locais a servirem como aves de rapina147, essas referências se entrecruzam, para
vincular o velho político às ideias do erro, da culpa e da necessária punição, conforme
Imagem 18. Aqui, o enforcamento alegórico de Lemos representou suas práticas à frente de
seu grupo político que o conduziriam ao seu “suicídio” moral como homem público, no
sentido real de seu ocaso político; e prefigurou a sua eminente deposição, e o exílio que após
se sucedeu em agosto de 1912.
Havia diferenças entre o corpo suicida lançado com ou sem uma corda amarrada ao
pescoço, e que se tratavam mais do simples questão de método empregado. Os suicídios
cometidos por precipitação – em que o suicida se atirava de lugares altos ou se lançava às
águas do rio – também fizeram parte do universo suicida dentro dos limites da cidade de
Belém nos anos iniciais do século XX. Essa modalidade representou a média percentual anual
de 16,92% (dezesseis e noventa e dois centésimos por cento) dos casos relatados pelos jornais
locais no período, portanto acima dos casos de enforcamento. Entretanto, dessa média apenas
1,11% (um e onze centésimos por cento) corresponderam a suicidas que se lançaram ao solo
das janelas, dos telhados, das platibandas dos prédios e demais pontos elevados da cidade.
Constituindo-se num método de suicídio raro na Belém da virada do século XIX para o XX,
serve como indicativo da relação dos habitantes da cidade para com as suas edificações que,
no geral, ainda mantinham o padrão de pequeno a médio porte. Como citado em momento
anterior deste capítulo, nos sobrados ou nos compartimentos dos altos de estabelecimentos
comerciais, moravam determinadas categorias de profissionais autônomos, como caixeiros,
alfaiates, sapateiros, nos bairros de Nazaré e da Campina em Belém (CANCELA, 2008).
Nesse sentido, a Folha do Norte publicou em primeira página, a 9 de fevereiro de 1905,
o suicídio de Maria Augusta Vidal, companheira de José Nunes, ambos proprietários de uma
alfaiataria à rua 28 de Setembro, na Campina, região de comércio em Belém. O título da
notícia, De uma janella abaixo, destaca e antevê ao leitor a precipitação como o meio
empregado de morte. Segundo a publicação, Maria Vidal se lançara de “uma das janellas do
pavimento superior do prédio” em que funcionava a sapataria, “levada por um desejo
insoffrido de pôr termo á existencia”. Cansada de uma vida doméstica marcada pela violência,

146
Por outro lado, a imagem das ramagens secas também faz referência à representação dos suicidas presente em
O Inferno, de Dante Alighieri, conforme citado no Capítulo 1.
147
Podem-se observar os urubus a figurar como elemento de representação da cidade de Belém em O
Missionário (1888), como parte do cotidiano ligado ao entorno do tradicional mercado local: “Quase em
frente ao Ver-o-Peso, [...] o velho casarão do governo fechava a vasta praça verdejante [Praça da
Independencia], em que os sendeiros da polícia montada pastavam sossegados, sob o olhar cobiçoso de
numerosos urubus, empoleirados no alto do telhado do Palácio [...]” (SOUZA, [198-], p. 229-230).
127

a suicida se lançara janela abaixo também no intuito de escapar de mais um momento de


agressão, por ocasião do jantar da família. Tendo recebido, como causa mortis, “commoção
cerebral consecutiva a traumatismo”, Maria Vidal expirara “banhada em sangue” (DE UMA
JANELLA..., 1905, p. 1).
Onze anos depois desse episódio, o Estado do Pará de 9 de março de 1916 publicou a
notícia relacionada a outro suicídio por precipitação ao solo em Belém. O comerciante João
Martins de Oliveira – o mesmo em memória de quem, posteriormente, mandou-se celebrar
missa na igreja de Nazaré (citado no capítulo anterior) – conseguiu a oportunidade de estar
longe da vigilância do hospício de alienados em que se encontrava internado, e se jogou do
telhado desse estabelecimento, “servindo-se das grades de uma das janellas do edificio”. De
certo modo, atribuiu-se o fato de o suicida ter tomado tal procedimento, pelo seu estado de
“superexcitação” em decorrência de alegada “psychose maniaca depressiva”. Pela notícia,
João Oliveira morreu em decorrência dos ferimentos decorrentes da “violencia da quéda”, o
que valoriza a precipitação como meio eficiente de suicídio (TRISTE..., 1916, p. 2).
Alguns outros episódios envolvendo suicidas que se lançavam do alto de prédios em
Belém, noticiados na imprensa local no início do século XX, não vinculavam tal atitude a
decisões movidas por desesperação momentânea, ou pela falta patológica da razão. Foi o caso
de Francisco Ave-Maria que, empregado à Fabrica Palmeira148, tentou se matar, atirando-se
da platibanda do edifício desse estabelecimento a 24 de abril de 1905. O motivo de tal
tentativa de suicídio foi o fato de o suicida “ser um dorminhoco impenitente e servir este
defeito de chacota aos seus companheiros [...]” (UM DORMINHOCO..., 1905, p. 1). A
Fábrica Palmeira foi referência simbólica de conjunto imobiliário da belle époque de Belém,
sendo sua imagem reproduzida em cartões-postais149 como demonstrado na parte esquerda da
Imagem 19 (montagem). Apesar dessa importância, o imponente prédio da Fábrica Palmeira
foi cenário de episódio tratado no nível do pitoresco. Segundo a referida notícia, aquela
tentativa de suicídio realizou-se “com tanta felicidade que, embaraçando-se nos fios da

148
A Fábrica Palmeira, estabelecimento fundado em 1892, produzia gêneros alimentícios, como pães e artigo
finos em biscoitos, doces e outros. O seu imponente prédio ocupava o espaço em torno de 15.000 m 2. Ponto
de referência da mítica belle époque de Belém, esse prédio não mais existe no espaço localizado, atualmente,
na rua Senador Manoel Barata, no centro comercial de Belém (FÁBRICA..., 1996).
149
Segundo Velloso (Nov. 2000/Feb. 2001), houve verdadeira “febre” na produção e na circulação de cartões-
postais nas primeiras décadas do século XX no Brasil, tornando-se, eles mesmos, um dos símbolos visuais do
que se entendia por modernidade, à medida em que passou a incorporar os elementos da fotografia “e os
processos de reprodução fotomecânicos sobre papel” em sua composição. Acima de tudo, os cartões-postais
foram eficazes instrumentos de divulgação dos ideais de progresso e de civilização. Tinham geralmente, por
temática, expor os “aspectos que compunham o cenário de uma cidade ‘higiênica e moderna’, com suas
avenidas, prédios em estilo eclético, parques, jardins e sua gente chique”.
128

illuminação electrica, [Francisco Ave-Maria] cahiu em pé, maguando apenas ligeiramente o


pé direito” (UM DORMINHOCO..., 1905, p. 1).
Nas duas reproduções alusivas a Belém do início do século XX, presentes nos cartões-
postais apresentados na Imagem 19 (montagem), fica evidente a presença de pontos elevados
na cidade. No primeiro, vê-se o imponente prédio da Fábrica Palmeira, ao fundo do qual se
destaca o reservatório de água Paes de Carvalho, construção daquele período montada em
ferro. O segundo representa, justamente, a vista de parte da cidade tomada do referido
reservatório, em que se observa a presença de inúmeros sobrados, provavelmente semelhantes
àquele do qual se atirou Maria Augusta Vidal. Entretanto, o que se sobressai nesse último
cartão-postal são as águas da baía do Guajará, com o seu grande número de embarcações, em
fluxo de entrada e de saída ou ancoradas.

Imagem 19 – Entre o ar e as águas: vistas de Belém do início do século XX

Fontes: Fábrica Palmeira (1996, p. 218); Vistas Panorâmicas (1996, p.65)

Principal porta de entrada de Belém naquele início de século, a baía do Guajará ainda se
impunha à cidade, como referência, frente às construções edificadas. Foi a partir desse ponto
que, no romance naturalista O Missionário (1888), o personagem padre Antônio de Morais
viu a cidade de Belém pela primeira vez, com as linhas características das torres da Catedral e
da Igreja do Carmo a atravessarem o horizonte cortado pelo conjunto do “casario, sujo de pó
vermelho, aglomerado em ruas estreitas” na segunda metade do século XIX (SOUZA, [198-],
p. 229). Anos depois, o testemunho prestado por Rocha Pombo, nas Notas de Viagem (1918),
informa sobre as mudanças realizadas na cidade, em terra. Entretanto, ainda continuava sendo
a baía do Guajará o ponto referencial do primeiro olhar sobre a cidade. A bordo do vapor
Manáos, na entrada da baía, o escritor já prefigurava o que correspondia ser uma cidade-
monumento:
129

A vista da bahia, entre o continente e a ilha das Onças, é admiravel.


Belem, contemplada do mar, dá idéa de uma cidade gigantesca, monumental,
com as suas grandes construcções, os seus palacios, as suas torres, o seu
porto vasto e movimentado, o seu extenso caes e enormes armazens.
(POMBO, 1918, p. 132).

As práticas dos suicídios por afogamento, em parte, ligavam-se à importância do rio ou


do mar para a vida da cidade. Minois (1998, p. 387) observou a regularidade de suicídios por
afogamento no rio Sena, na Paris do século XVIII, em que até alguns pontos da cidade –
como pontes e docas – tornaram-se “conhecidos pela frequência de afogamentos”. Por essa
perspectiva, pode-se compreender – dentro do gênero dos suicídios por precipitação – como,
em Belém, havia mais quem se jogasse às águas da baía do Guajará, do rio Guamá (que banha
a parte sul da cidade) ou dos inúmeros igarapés que a cortavam, do que propriamente aqueles
que se lançavam ao solo. No universo próprio dos suicidas, deixar a vida terrena também
podia significar fugir de Belém. No movimento inverso ao daqueles que chegavam à cidade,
procuravam o sentido da baía, lançando-se às suas águas do cais do porto, dos trapiches ou
dos vapores recém-chegados e ancorados. A média anual de porcentagem dos suicidas que se
precipitavam ao rio foi apurada em 15,81% (quinze e oitenta e um centésimos por cento) nos
anos iniciais do século XX.
Brown (2001), por sua vez, discutiu o conjunto de iconografias – que vai das ilustrações
ou xilogravuras impressas em periódicos ingleses do século XIX, como o Illustrated Police
News, até às telas expostas em salões de arte – construído a partir das pontes de Londres,
tornando-se estas referências de locais de suicídio. Em especial, sob a análise de gênero,
percebeu o quanto tais imagens evocavam geralmente o suicídio feminino: a mulher, mesmo
morta, ainda se constituía em objeto de consumo, de mera observação, ou de pura crítica do
espectador “vitoriano”150. Atribuíam-se tais mortes femininas a causas consideradas
passionais e, portanto, menores, tais como decepção amorosa ou o estado de desonra. Tais
representações ainda reforçavam a vinculação dos casos de afogamento ao suicídio ligado ao
feminino, pelo que o ato de se afogar constituía-se em método “mais passivo” de morrer
(BROWN, 2001, p. 159). Para Corbin (2003, p. 593-594), em função dos dados estatísticos
franceses do século XIX, o afogamento tinha a preferência de metade das mulheres suicidas.
Notícias vindas de fora do Pará, transmitidas na forma resumida de notas telegráfica por

150
Acredita-se que o termo “vitoriano”, empregado por Ron Brown, restringiu-se ao universo cultural britânico
do século XIX. Entretanto, aqui foi empregado intencionalmente, tomando de empréstimo o seu sentido
generalizado, o mesmo adotado por Peter Gay (2002, p. 16-17): “em suma, o nome da soberana [Reinado da
rainha Vitória: 1837-1901] vem sendo aplicado de maneira ampla ao século XIX [...]”, embora, assim como
faz o mestre berlinense, deva-se “celebrar as diferenças”.
130

jornais como a Folha do Norte, no início do século XX, reforçavam tal associação dos
afogamentos a um determinado gênero feminino de suicídio:

Buenos Aires, 27: duas senhoritas abraçadas se atiram ao mar e só uma


consegue ser salva. (DO EXTRANGEIRO..., 1903, p. 1).

Rio, 28: suicidou-se em Copacabana, afogando-se d. Paula de Castro


Barbosa, 65 annos, enlouquecera quando jovem, porém recuperando depois
a razão, deixou bilhete, estava cansada de viver contrariada. ([NOTA...],
1907, p. 2)

Na Folha do Norte de 4 de outubro de 1905, o noticiarista reclamou pela patrulha


policial diária na ponte do Porto do Sal, pois o local havia se tornado ponto de reunião de “um
grupo de mulheres da vida facil, constantemente em deploravel estado de embriaguez”, à
espera por marinheiros que desembarcavam dos navios de guerra fundeados próximo
(LOUCURA..., 1905, p. 1). Segundo tal notícia, no início da tarde do dia anterior, a mundana
de prenome Anna se atirou da referida ponte às águas do rio com o intuito de se suicidar.
Ignorando-se o real motivo para o ato, especularam se os efeitos da embriaguez ou os
sintomas de loucura se aplicavam a alguém da condição social de Anna, pelos valores da
época. E pelo mesmo juízo de valor formado, essa suposta tentativa de suicídio foi relatada no
nível das amenidades, e Anna, depois de salva por populares, retirou-se para sua residência,
“fresquinha pelo banho que tomara” (LOUCURA..., 1905, p. 1). Doze anos depois, em 30 de
agosto de 1917, a mesma Folha do Norte publicava outro caso de mulher que se lançava aos
rios que banhavam a cidade, dessa vez por motivos mais concretos. Desgostosa pelo atual
estado em que se encontrava, “desempregada com a ‘crise’”, Laura Reis, de apenas 17 anos,
tentou se matar jogando-se da escadinha do Port of Pará às águas da baía do Guajará. Do
mesmo modo que Anna, Laura conseguiu ser salva e também foi desqualificada enquanto
suicida, já que lhe foi atribuído certo “espírito fraco” para cometer semelhante ato (QUASI...,
1917, p. 4).
Da amostragem tirada dos casos de suicídio por afogamento, relatados pela Folha do
Norte nos anos iniciais do século XX, percebe-se que esse ato não era, necessariamente,
feminino. Pelo contrário, os homens corresponderam, aproximadamente, a 71% (setenta e um
por cento) dos que se precipitavam nos rios ou em poços de água. Na realidade, para essa
prática suicida, destacava-se determinada categoria social, tão fluída e instável quanto as
correntezas que arrastam o grande volume de água dos rios amazônicos: os que migravam ou
que estavam em trânsito pela cidade. Nesses casos, as diversas embarcações que cruzavam os
131

rios da região serviam de cenário, ou melhor, de trampolim para que alguns de seus
passageiros se lançassem às águas.
Em 25 de novembro de 1902, instaurou-se inquérito policial para averiguar as condições
da morte do austríaco, naturalizado cidadão argentino, José Lauberer que, deliberadamente,
atirou-se à baía do Guajará do rebocador paraense Wanda, quando se finalizava o
procedimento de descarga do vapor Amazonas, da companhia alemã de navegação Sud-
Amerika Dienst, ali fundeado. Os depoimentos prestados no inquérito dão mostra, no mínimo,
da intensa circulação de estrangeiros na região naquele período. Compareceram: os suecos
Francisco Holmquist e Johannes Laison, respectivamente maquinista do rebocador Wanda, e
carpinteiro a bordo do Amazonas; os súditos alemães Carl Bär (da Saxônia) e Carlos Fuhrt (da
Prússia), nas respectivas funções de imediato e de contra-mestre do vapor Amazonas; o
paraibano Francisco Tavares da Costa, guarda da alfândega; e os paraenses Severino Pinto do
Carmo, guarda da alfândega, e Arthur Franklin de Mendonça, marítimo. Do conjunto dessas
declarações multilíngues e contraditórias, colocou-se em pauta o sentido atribuído ao ato
suicida e às águas da baía: José Lauberer procurava se libertar dos castigos sofridos enquanto
membro da tripulação do referido navio alemão. Na condição de fugitivo, preferiu deixar-se
afogar na agitação das águas do Guajará – recusando qualquer espécie de salva-vidas que lhe
atiravam – a voltar a bordo do Amazonas (PARÁ, 1902-1903).
Cinco anos após o trágico afogamento do austríaco Lauberer, a Folha do Norte publicou
denúncias que partiam de alguém que preservava a identidade através da alcunha “Um
Cearense”. Nas edições de 7, 10 e 12 de maio de 1907, aquele jornal noticiou a tentativa de
suicídio de um dos tripulantes do vapor Velhote Silva – então fundeado às imediações de
Belém –, que se lançara às águas. A Folha do Norte alimentou ligeiro debate junto a sua rival,
A Provincia do Pará, sobre as reais circunstâncias em que esse tripulante se atirara ao rio.
Com informes e declarações contraditórios, chegou-se a afirmar que o suicida sofria de
delírios da mania de perseguição (PELOS INFELIZES..., 1907a, 1907b, 1907c). Em uma das
versões, o referido tripulante, uma vez salvo, alegou fugir dos maus-tratos sofridos, a bordo,
pelo mesmo “individuo que o contractara para ir extrahir borracha no Amazonas” (PELOS
INFELIZES..., 1907c, p. 1). A partir daí, tal tentativa de suicídio serviu de mote para criticar a
prática de recrutamento de novos seringueiros nos estados vizinhos, e as condições precárias
de viagem e de vida a que depois eram submetidas essas pessoas. Transformou-se em
verdadeiro apelo às autoridades governamentais dos Estados vizinhos “onde são seduzidos os
nossos pobres patricios uma providencia para pôr paradeiro ao ignobil trafego de carne
humana” (PELOS INFELIZES..., 1907b, p. 1).
132

De todos os casos noticiados pela imprensa local naquela virada do século XIX para o
XX, o do pacto suicida firmado pelo casal de espanhóis, Henrique Bosch y Barras e Julia
Gonzalez, melhor representou a desilusão e o desânimo que marcaram o lado (mantido)
oculto do mundo propagado de progresso e civilização. Conforme citado na introdução, o
motivo desse duplo suicídio estava na situação de insolvência do espanhol para com os
credores, agravada ainda pelo fato de o mesmo se encontrar sem trabalho. Ambos procuraram,
na discrição garantida pela escuridão noturna, a solução para os seus problemas financeiros no
repouso final nas águas da baía do Guajará. Os dados pormenorizados, sobre os fatos que se
sucederam, chegaram a oscilar nas publicações da Folha do Norte e d’A Provincia do Pará.
As duas narrativas, entretanto, concordaram em afirmar que o casal ingerira certa quantidade
de tóxico, antes de rumarem em direção à baía, nas proximidades do matadouro público.
Chegando lá, lançaram-se às águas, amarrados um ao outro, “para que nas ancias da agonia da
morte que procuravam não pudessem separar-se” (LIGADOS...,1900, p. 2). O acaso, porém,
fez com que os dois suicidas, debatendo-se nas águas, ainda fossem descobertos por
moradores próximos e, por eles, resgatados. Henrique acabou morrendo afastado de Julia, em
um dos leitos da Santa Casa de Misericórdia, como bem ironizara o noticiarista da Folha do
Norte.
Os articulistas, em especial os da Folha do Norte, foram mais além na formação de
juízo de valor sobre o casal suicida. Com a dose necessária de dramaticidade, própria de um
fait divers, mobilizaram as representações sobre o masculino e o feminino, para provocar as
reações subjetivas e passionais esperadas do público leitor. Desse modo, embora estivessem
juntos e pactuados no mesmo ato, diferenciou-se Henrique Bosch y Barras de Julia Gonzalez.
Enquanto os jornais procuraram apenas enfatizar a beleza e a juventude da suicida,
informaram-se detalhes sobre a vida do suicida, a começar pelas suas ocupações nas oficinas
gráficas de Belém, nos poucos meses em que viveu na cidade, entre a sua chegada da Espanha
e a sua morte. Bosch y Barras ocupara o trabalho de “lytographo” e, no seu local de trabalho,
“muito boa conta o tinham seus collegas de officina” (LIGADOS..., 1900, p. 2). N’A
Provincia do Pará foi noticiado que o espanhol, “além de chromonista era photographo.”
(DUPLO..., 1900, p. 2). Na apresentação de ambos, observam-se as condições específicas
reservadas a cada um: ao homem, o papel de provedor da família e de estar inserido na esfera
masculina (e pública) do trabalho; à mulher, a preocupação maior em manter a formosura
jovial, no caso, mesmo após a morte.
Nessa mesma medida, a premeditação do suicídio dos dois espanhóis, uma vez que sua
motivação fora estabelecida no nível das preocupações financeiras, foi atribuída ao homem,
133

como elemento ativo no pacto suicida: “a idea de suicidio concebeu-a Bosch com o espirito
atribulado pela certeza de não poder remir a divida que contrahira” (LIGADOS..., 1900, p. 2).
Na Folha do Norte de 4 de outubro de 1900, atribuiu-se ao colaborador de nome Ulysses151,
as duras críticas feitas à solução, adotada por Bosch y Barras, para os seus problemas – em
total incompatibilidade com aqueles tempos “com excesso de luzes e de electricidade!” (O
SUICIDIO..., 1900, p. 1).
O julgamento mais severo, porém, foi feito à decisão tomada por Julia Gonzalez.
Melhor dizendo, à alegada falta de decisão da mesma, posto que teria sido levada apenas pela
vontade de suicídio do seu companheiro, sem questioná-lo, pois a ela caberia cumprir o único
papel possível de “amante fiel e toda devotada a quem a recebera como esposa diante de Deus”
(LIGADOS..., 1900, p. 2). Na carta enviada por Ulysses, Julia também é representada, na
condição de mulher, como destituída de qualquer poder decisório sobre a sua vida e a sua
morte. Movida unicamente pela paixão, e totalmente irresponsável, Julia “cheia de amôr,
quente e apaixonada até á loucura, vae com elle para a morte como se fossem para um pic-nic
d’amor” (O SUICIDIO..., 1900, p. 1). Como acontecia na maioria das notícias relacionadas a
casos de suicídios de fundo passional – em cuja esfera se vinculava, intimamente, a mulher –,
a participação de Julia Gonzalez no ato conjunto de suicídio foi representada como algo de
menor importância, beirando o nível da comicidade.

Se os moradores próximos ao matadouro público conseguiram resgatar os corpos dos


dois suicidas espanhóis, coube aos jornais belenenses, da virada do século XIX para o XX,
dar a publicidade de seus dramas íntimos e do amor que, literalmente, ligou-os no caminho
para morte. Tal visibilidade, como se sabe, alcançou pontos distantes do país, como em São
Paulo, em que o drama particular do casal Henrique Bosch y Barras e Julia Gonzalez ficou
conhecido pela pequena nota publicada n’O Diario Popular de 22 de outubro de 1900. Hoje,
esses mesmos jornais contribuem, a sua maneira, para a construção da memória sobre as
práticas suicidas ocorridas na Belém do período. De outra forma, muito provavelmente, as
detonações das armas de fogo não se fariam ressoar para muito além das alcovas das casas ou
dos hotéis; as cordas se romperiam com o peso dos corpos e pela ação do tempo; os restos
líquidos dos venenos evaporariam pelo calor típico da região; e os corpos putrefatos dos
suicidas ficariam sepultados sob as águas do esquecimento.

151
Não há identificação possível para quem escrevia sob o pseudônimo de Ulysses. Apenas se sabe que o mesmo
era frequente colaborador da Folha do Norte na virada do século XIX para o XX.
134

CONSIDERAÇÕES FINAIS: A FACE OCULTA DA LUA

A pesquisa junto aos jornais que foram publicados e circularam na cidade de Belém,
entre os anos de 1891 a 1920, permitiu identificar as práticas de suicídios locais enquanto
fatos históricos. Ocultados pela historiografia que privilegiou apenas a face do progresso e das
melhorias urbanísticas por que passou a cidade nesse período, os suicidas estão presentes nas
folhas diárias daqueles periódicos, com suas razões particulares, e com seus meios e locais
escolhidos para decidirem quando, como e onde por termo às próprias existências. Como
resultado, percebeu-se um modo de se matar que, se não se pode atribuir como amazônico no
geral, caracterizou a Belém do período como uma cidade com projetos próprios de
modernização, mas que não perdia a sua ligação com a floresta que a circundava. Desse
modo, ao mesmo tempo em que suicidas belenenses também utilizavam a Smith Wesson para
detonar contra suas cabeças, houve quem não suportasse o gosto amargo da morte sem
misturá-lo ao açaí, e quem tomasse a decisão “ofeliana” de procurar, nas águas barrentas e
caudalosas do rio Pará (da baía do Guajará), a tranquilidade para seus tormentos íntimos.
Na historicidade dos suicídios cometidos nesse contexto, elementos desses dois espaços
– o natural e o construído – foram mobilizados no modo como os suicidas decidiram sobre
seu próprio destino, dependendo de quem vinha, de quem saía e de quem permanecia na
cidade. Em suma, ligava-se à adaptação, ou à falta desta, ao local e ao momento vivenciados,
no enfrentamento de um mundo que lhes era estranho e/ou hostil. Entre a indígena que foi
levada para a cidade a fim de trabalhar na casa de influente família da sociedade da borracha,
e o judeu venezuelano que teve sua saúde agravada pelas condições precárias vivenciadas nos
seringais acreanos, pessoas em circulação, ou mesmo “estrangeiras” em sua própria terra,
procuraram no suicídio o porto seguro ou o ponto final às instabilidades de suas vidas.
As notícias sobre os suicídios locais também explicitam o sentimento de desencanto de
parte dos habitantes da Belém para com o estado de coisas em que os benefícios do progresso
e os sucessos das ciências e das novas tecnologias não proporcionavam qualidade de vida a
todos os seus habitantes e o desenvolvimento da cidade fomentava a solidão, o individualismo
e a quebra dos laços de solidariedade. O escritor e crítico literário paraense José Veríssimo,
em artigo publicado na Folha do Norte de 21 de janeiro de 1899, demonstrou a frustação de
sua geração para com as potencialidades que não se cumpriam em favor do ser humano: “um
mal estar geral, um sentimento que não é inteiramente de triunfo [...] e com a vaga
consciencia de um successo incompleto”.
135

Por outro lado, reconhecem-se as limitações próprias dos periódicos enquanto fontes
históricas, observando que em cada notícia, em cada anúncio, em cada artigo havia
representações dos suicídios e dos próprios suicidas, segundo os valores morais dos
articulistas e dos anunciantes que, a seu modo, também dialogavam com seu próprio tempo.
Nesse sentido, parafraseando o historiador italiano Carlo Ginzburg (2007), essas publicações
foram trabalhadas como textos cheios de histórias. Histórias essas que evidenciam: o
fortalecimento de um saber e discurso médico nos debates locais sobre a prática suicida; a
permanência e endurecimento do discurso católico pela interdição da morte voluntária em
tempos de romanização; as atitudes ambivalentes perante o suicídio, reproduzindo nas
considerações sobre os suicidas as diferenciações sociais então presentes no universo dos
vivos; e a própria vulgarização das práticas do suicídio enquanto objeto corrente de leitura.
Apesar dessa vulgarização, não se pode afirmar que, no recorte temporal escolhido, o
número de suicídios praticados em Belém fosse extraordinário. A ponderação entre os limites
do ficcional e do real, presentes nas notícias dos jornais, teve de ser feita. Ademais, fez-se
necessário articular essa leitura dos jornais com a das fontes oficiais que se encontravam
disponíveis, da produção imagética (aí incluindo a incipiente arte cinematográfica) e de obras
médicas, jurídicas e religiosas do período, para perceber no mesmo movimento cambiante de
visibilidade e de ocultação do suicídio, as argumentações favoráveis e contrárias a essa
prática. Desse modo, pode-se mesmo afirmar que, em todas as épocas, o debate em torno da
morte voluntária está envolto em polêmicas e contradições. Se ficou patente a subnotificação
oficial dos casos de suicídio na cidade – conforme apurado nos dados estatísticos do início do
século XX mantidos pelo governo estadual –, a leitura dos jornais possibilitou compreender,
pelas representações neles presentes, o ato de se suicidar na mesma Belém da Belle Époque,
como a desvendar o lado oculto da lua, que não aparece refletido (e distorcido) nas águas da
Baía do Guajará, mas que está lá ...
136

LISTA DE FONTES

PERIÓDICOS

20 annos de martyrios. Folha do Norte, Belém, n. 3380, p. 2, 8 abr. 1907.

24 de Maio. Estado do Pará, Belém, n. 2569, p. 1, 25 maio 1918.

A AGONIA de um suicida. Folha do Norte, Belém, n. 1654, p. 2, 18 jul. 1900.

A CONSCIENCIA de Judas. Folha do Norte, Belém, n. 2675, p. 1, 21 abr. 1905.

A “MADEIRA-MAMORÉ”: um homem que se lança ao rio... Folha do Norte, Belém, n.


3796, p. 1, 24 maio 1908.

A MORTALIDADE em Belém. Folha do Norte, Belém, n. 8508, p. 1, 6 dez. 1918,

[A RESTAURAÇÃO: anúncio]. Folha do Norte, Belém, n. 8486, p. 2, 14 nov. 1918.

A SEMANA. Folha do Norte, Belém, n. 2733, p. 1, 12 jul. 1903.

A SOCIEDADE Medico-Cirurgica do Pará atravez das suas sessões. Pará-Medico: Archivos


da Sociedade Medico-Cirurgica do Pará, Belém, ano 5, v. 2, n. 7, p. 91, maio 1919.

A VERGONHEIRA do Correio. Folha do Norte, Belém, n. 1523, p. 1, 10 mar. 1900.

ACCORDES... A Provincia do Pará. Belém, n. 4475, p. 3, 21 maio 1891.

ACTA da sessão inaugural da “Sociedade Medico-Cirurgica do Pará”. Pará-Medico:


Archivos da Sociedade Medico-Cirurgica do Pará, Belém, ano 1, v. 1, n. 1, p. 3-4, maio 1915.

ACTO de loucura. Folha do Norte, Belém, n. [1821], p. 2, 5 jan. 1901.

ACTO de loucura: Um louco que se suicida... Folha do Norte, Belém, n. 2893, p. 1, 6 dez.
1905.

ADMIRAVEL. Folha do Norte, Belém, n. 1854, p. 4, 7 fev. 1901.

ALMEIDA, Virginia de Castro e. Cartas. Folha do Norte, Belém, n. 7952, p. 1, 27 maio


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______. Cartas. Folha do Norte, Belém, n. 8030, p. 1, 13 ago. 1917.

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ARTILHARIA da hygiene. Folha do Norte, Belém, n. 8293, p.6, 4 maio 1918. 1 imagem,
p&b.

AS IDÉAS tristes. Folha do Norte, Belém, n. 2657, p. 2, 24 abr. 1903.


137

AS TORTURAS do jornalista. Diario de Noticias, Belém, n. 5, p. 1, 8 jan. 1898.

ASSOCIAÇÃO da Imprensa no Pará. Folha do Norte, Belém, n. 000, p. 1, 18 maio 1918.

AZEVEDO, José Eustachio de. A philosophia do desalento: Goëthe ás claras. Folha do


Norte, Belém, n. 4837, p. 1, 18 abr. 1911.

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[CLÍNICA medico-cirurgica do dr. Raymundo Faria: anúncio]. Folha do Norte, Belém, n.


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COISAS que me fazem rir. Folha do Norte, Belém, n. 8004, p. 4, 18 jul. 1917.

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[COMPOSTO Ribott: anúncio]. Estado do Pará, Belém, n. 2923, p. 2, 15 maio 1919.


138

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out. 1914.

CONGRESSO Constituinte: Discurso do deputado dr. Raymundo Nina Ribeiro. A Provincia


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CORUJA, Queiroz. Para não morrer. Folha do Norte, Belém, n. 1580, p. 4, 6 maio 1900.

______. ______. Folha do Norte, Belém, n. 1584, p. 4, 10 maio 1900.

COSTA, Salvador. Sabbado de Alleluia: Frei Lemos na figueira. Estado do Pará, Belém,
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DE UMA JANELLA abaixo: a morte da infeliz. Folha do Norte, Belém, n. 2604, p.1, 9 fev.
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DESABAMENTOS e desabamentos: só uma cousa fica de pé! Folha do Norte, Belém, n.


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DESESPERADOS! Diario Popular, São Paulo, n. 5287, 22 out. 1900. Noticiario, p. 1.

DESESPERO ou loucura? Suicidio de uma mulher. Folha do Norte, Belém, n. 2644, p. 1, 21


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DESTINO implacavel. Folha do Norte, Belém, n. 8484, p. 1, 12 nov. 1918.

DEZ annos de soffrimentos horrorosos!... Folha do Norte, Belém, n. 4842, p. 3, 23 abr. 1911.

DO EXTRANGEIRO: via Rio. Folha do Norte, Belém, n. 2572, 28 jan. 1903. Telegrammas,
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