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SUMÁRIO

ESPECIALIDADE: PSICOLOGIA: I CLÍNICA. PÁGINA

1 Avaliação psicológica: fundamentos da medida psicológica. Instrumentos de 04


avaliação: critérios de seleção, avaliação e interpretação dos resultados. Técnicas
de entrevista.
2 Psicologia do desenvolvimento: o desenvolvimento normal. Psicopatologia do 22
desenvolvimento.
3 Processo saúde-doença: doenças crônicas e doenças agudas; modelo 32
biomédico e modelo biopsicossocial de saúde.
4 Ações básicas de saúde: promoção; prevenção; reabilitação; barreiras e 33
comportamentos de saúde; níveis de atenção à saúde.
5 Psicologia da saúde: a instituição hospitalar; ética em saúde e no contexto
hospitalar.
6 Equipes interdisciplinares: interdisciplinaridade e multidisciplinaridade em saúde.

7 Técnicas cognitivo-comportamentais: psicoterapia individual e grupal.

8 Repertório básico para intervenção: avaliação do nível funcional e necessidades


psicossociais do doente; o sistema psiconeuroendocrinológico; adesão ao
tratamento; teorias e manejos do estresse; teorias e manejo da dor; estilos de
enfrentamento; o impacto da doença e da hospitalização sobre o doente e a
família.
9 Práticas grupais. A atuação do psicólogo na interface saúde/ trabalho/ educação.

10 A violência na infância, adolescência e na velhice.

11 O processo de envelhecimento e as doenças degenerativas.

12 Álcool, tabagismo, outras drogas e redução de danos.

13 Tratamento multidisciplinar da obesidade.

II GESTÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES

1 Conceitos, importância, relação com os outros sistemas de organização.

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2 A função do órgão de Gestão de Pessoas: atribuições básicas e objetivos,
políticas e sistemas de informações gerenciais.

3 Comportamento organizacional: relações indivíduo/organização, motivação,


liderança, desempenho.
4 Competência interpessoal.

5 Gerenciamento de conflitos.

6 Clima e cultura organizacional

7 Recrutamento e Seleção: técnicas e processo decisório.

8 Avaliação de Desempenho: objetivos, métodos, vantagens e desvantagens.

9 Desenvolvimento e treinamento de pessoal: levantamento de necessidades,


programação, execução e avaliação.

10 Gestão por competências.

III APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL.

1 Educação corporativa.

2 Educação a distância.

3 Projeto pedagógico.

IV LEGISLAÇÃO LOCAL.

1 Constituição do Estado do Espírito Santo. 1.1 Da Administração Pública. 1.2 Do


Poder Judiciário.
2 Lei de Organização Judiciária do Estado do Espírito Santo (Lei Complementar
Estadual nº 234/02, com as alterações supervenientes, inclusive as
implementadas pela Lei Complementar Estadual nº 567/10). 2.1 Da Divisão e
Organização Judiciária do Estado do Espírito Santo. 2.2 Do Tribunal de Justiça.
2.3. Da Justiça de 1ª Instância.
3 Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis do Estado do Espírito Santo (Lei
Complementar Estadual nº 46/94, com as alterações supervenientes). 3.1 Das
Disposições Preliminares. 3.2. Dos Direitos e Vantagens. 3.3 Do Regime
Disciplinar.

2
4 Plano de Carreiras e de Vencimentos dos servidores efetivos do Poder Judiciário
do Estado do Espírito Santo (Lei Estadual 7.854/04, com as alterações
supervenientes, inclusive as implementadas pela Lei Estadual nº 9.497/10). 4.1
Das Disposições Preliminares. 4.2 Da Estrutura do Plano de Carreiras e de
Vencimentos. 4.3 Do Vencimento e da Remuneração.
5. Lei de Reestruturação e Modernização da Estrutura Organizacional
Administrativa do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (Lei
Complementar Estadual nº 566/10).

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1 AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA: FUNDAMENTOS DA MEDIDA
PSICOLÓGICA. INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO: CRITÉRIOS DE
SELEÇÃO, AVALIAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS.
TÉCNICAS DE ENTREVISTA.

A avaliação psicológica no Brasil é função privativa do psicólogo, definida pela


lei nº 4.119, de 1962, que regulamenta a profissão; e corresponde ao processo
de coleta de dados e interpretações de informações, por meio de teorias,
métodos e instrumentos psicológicos. Tem por finalidade obter maior
conhecimento do indivíduo, do grupo ou situações, a fim de atingir os objetivos
definidos e, assim, auxiliar em processos de tomada de decisões

A avaliação psicológica é uma atividade ampla e fundamental, cuja utilização


pode se dar em vários contextos de atuação do psicólogo. Trata-se de um
procedimento clínico que envolve um corpo organizado de princípios teóricos,
métodos e técnicas de investigação tanto da personalidade como de outras
funções cognitivas, tais como: entrevista e observações clínicas, testes
psicológicos, técnicas projetivas e outros procedimentos de investigação
clínica, como jogos, desenhos, o contar estórias, o brincar etc. A escolha das
estratégias e dos instrumentos empregados é feita sempre de acordo com o
referencial teórico, o objetivo (clínico, profissional, educacional, forense etc.) e
a finalidade (diagnóstico, indicação de tratamento e/ou prevenção), conforme
Ocampo et al., Arzeno e Trinca.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) criou em 1997, a Câmara


Interinstitucional de Avaliação Psicológica, com o objetivo de fazer um
diagnóstico das condições de ensino na área, e, posteriormente, implantar um
Sistema de Avaliação dos Testes Psicológicos usados no Brasil. Com a
implantação desse sistema e entrada em vigor da Resolução nº 02/2003, o
CFP passou a recomendar somente o uso dos testes avaliados com parecer
favorável da Comissão Consultiva. Os demais, com parecer desfavorável ou
ainda não avaliados, continuam sendo usados apenas em pesquisa.

Embora essas medidas tenham sido cuidadas para dar maior cientificidade aos
instrumentos, na opinião de alguns autores ocorre um fenômeno contraditório
que diz respeito à desvalorização dos testes psicológicos nas práticas de

4
avaliação. Sabe-se que essa desvalorização dos testes psicológicos e, por
extensão, da área de avaliação psicológica é conseqüência também das
mudanças ocorridas nas demandas de intervenção e atuação da Psicologia, na
atualidade, em razão de novos processos de subjetivação e de questões
sociais e políticas que interferem diretamente na qualidade de vida e saúde da
população e exigem de nossas teorias e práticas constantes revisões e
atualizações. No âmbito da Psicologia Clínica isso resultou numa enorme
expansão de abordagens teóricas: psicanalíticas, fenomenológico-existenciais,
cognitivas, comportamentais, sistêmicas, corporais etc.; no desenvolvimento de
novas modalidades de intervenção – grupal, familiar, comunitária; e na atuação
em outros settings – instituições públicas e privadas, hospitais, unidades de
saúde etc.

A Psicologia, assim como o desenvolvimento de suas práticas de avaliação


psicológica, foi, ao longo da história, influenciada por duas principais tradições
filosóficas: o positivismo e o humanismo.

O positivismo, corrente filosófica que tem Augusto Comte como principal re-
presentante, defende o conhecimento objetivo, por meio da neutralidade
científica e da experimentação. Essa corrente de pensamento fundamenta o
método científico adotado pelas ciências naturais que foi, durante muito tempo,
considerado “o modelo de ciência”; na ótica positivista, o homem pode ser
estudado como qualquer outro fenômeno da natureza, ou seja, pode ser
tomado como um objeto de estudo observável e mensurável.

Apóiam-se nessa tradição as práticas de avaliação psicológica, identificadas


com os modelos médico e psicométrico, que caracterizam a primeira fase de
atuação profissional do psicólogo – práticas que valorizam o uso dos testes
psicológicos, a eficiência e a objetividade do diagnóstico como forma de
garantir a cientificidade da psicologia.

O modelo médico influenciou enormemente as práticas de avaliação


psicológica, principalmente no início da expansão da Psicologia, quando os
psicólogos atuavam, basicamente, como auxiliares do médico no diagnóstico
diferencial de psicopatologias. Preocupados em avaliar com objetividade, para
indicar o tratamento mais eficaz, os psicólogos incorporaram às suas práticas

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de avaliação características do modelo de diagnóstico médico, tais como: a
ênfase nos sintomas, o uso da classificação nosológica e o emprego de testes
(exames), para identificar determinadas características patológicas da
personalidade do indivíduo.

O modelo psicométrico manteve a preocupação de avaliar com objetividade e


neutralidade e inaugurou uma fase de maior prestígio da Psicologia, em que os
testes psicológicos passaram a ser usados na classificação e medida da
capacidade intelectual e aptidões individuais. A Psicometria ampliou a área de
atuação da Psicologia – da clínica para as áreas escolar (diagnóstico de
dificuldades de aprendizagem das crianças) e profissional (seleção de
indivíduos para funções específicas). Com essa expansão, o psicólogo ganhou
maior autonomia: os resultados dos testes deixaram de ser obrigatoriamente
entregues ao médico ou a outros profissionais; os próprios psicólogos
começaram a prestar orientação aos pais e professores e até mesmo aos
médicos. No modelo psicométrico, tornou-se menos importante detectar e
classificar os distúrbios psicopatológicos; a ênfase passou a ser dada à
identificação das diferenças individuais e orientações específicas. Esse modelo
foi muito valorizado nos Estados Unidos, especialmente durante a Segunda
Guerra Mundial, quando se atribuiu à Psicologia a função de selecionar
indivíduos aptos e não-aptos para o exército, bem como avaliar os efeitos da
guerra sobre os que retornavam.

O humanismo apóia-se em correntes filosóficas que se contrapõem à visão


positivista e questionam a aplicação do método das ciências naturais às
ciências humanas. Defende que não é possível uma total separação entre o
sujeito e o objeto de estudo, pois a subjetividade tem uma importância
essencial: o sujeito está implicado com o seu objeto de estudo, ele constitui o
objeto e é constituído por ele. Se todo o conhecimento é estabelecido pelo
homem, não se pode negar a participação da sua subjetividade, portanto não é
possível estudar o homem como um mero objeto fazendo parte do mundo, pois
o mundo não passa de um objeto intencional para o sujeito que o pensa.

Essa forma de pensar teve um papel marcante no desenvolvimento de uma


Psicologia humanista, influenciada por vertentes teóricas ligadas

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principalmente à Fenomenologia e à Psicanálise que enfatizam a subjetividade,
a intencionalidade, o sentido e o significado das experiências (e dos sintomas),
o inconsciente e a relação entre sujeito e objeto de estudo. Entre suas
principais influências, estão Heidegger e Freud.

Contrapondo-se à visão reducionista da vertente positivista, a Psicologia


humanista buscava uma compreensão global do homem, na apreensão do
mundo e do seu significado. Sob esse influxo, passou-se a questionar os
modelos de avaliação classificatória, baseados apenas nos testes psicológicos
(estruturados e padronizados). Outras práticas de diagnóstico, mais
identificadas com a Psicanálise e a Fenomenologia, foram surgindo dentro do
chamado modelo psicológico, que deu origem ao psicodiagnóstico e a outros
procedimentos de avaliação, como as entrevistas diagnósticas, com ou sem o
uso de testes ou técnicas (estruturadas ou não) de investigação da
personalidade.

A origem do uso de testes psicológicos no Brasil parece estar associada a um


encadeamento de eventos e de relações entre pesquisadores que remetem a
Wilhelm Wundt (1832-1920). O laboratório de Wundt é considerado o ponto
inicial da psicologia moderna por substituir a experimentação fisiológica pela
experimentação direta de eventos mentais através do método da introspecção.
Wundt tornou-se o principal representante da nova psicologia. De uma forma
ou de outra, promotores de acontecimentos posteriores tiveram alguma relação
com Wundt, através de aulas, contatos pessoais, ou publicações. Há uma
importante dispersão temática, incluindo áreas básicas e áreas aplicadas, em
particular, psicologia educacional, psicologia industrial e psicologia clínica. Os
testes psicológicos aparecem representados pelo conhecido James McKeen
Cattell (1860-1944) e por Rudolf Pintner (1884-1942) reconhecidos por suas
contribuições para o ensino de psicologia, e para os testes psicológicos. Uma
observação curiosa aparece na área de interesse de Edward. A. Pace (1961-
1938) que vai estudar com Wundt, mas volta para ensinar psicologia
escolástica na The Catholic University of América. Certamente, Pace respondia
aos apelos do Vaticano pelo ressurgimento das psicologias de Agostinho e
Tomás de Aquino. No Brasil, os cinco célebres laboratórios citados por
Lourenço Filho (1955) têm ascendência européia.

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Se a realização de experimentos deu à psicologia o seu status de ciência, a
inserção profissional ocorreu através da avaliação psicológica. O exemplo mais
emblemático, neste sentido, é de Hermann Ebbinghaus (1850-1909), autor dos
primeiros estudos experimentais sobre memória. Em 1895, Ebbinghaus dividiu
suas atividades no laboratório com a preparação de um teste para explicar a
diminuição da atenção e o aumento da fadiga em crianças alemãs que
freqüentavam a escola pública.

A contribuição de Ebbinghaus serviu de modelo para construção de itens em


avaliação psicológica. Contudo, a teoria que iria fundamentar a prática de
avaliação psicológica estava sendo delineada na Inglaterra sob influência da
teoria da evolução de Charles Darwin. Os conceitos de seleção, variação e
adaptação redefiniam o conceito de atividade mental. A mente passava a ser
entendida por sua condição de funcionalidade diante das necessidades de
adaptação, e os conceitos seleção e variação reafirmavam o problema das
diferenças individuais, já preconizados pelo psicólogo associacionista
Alexander Bain (1818-1903). Com a teoria da evolução, questões relativas a
aptidões inatas, a caracteres hereditários, e a diferenças individuais passaram
a ser discutidas em bases mais sólidas. Essas questões foram levadas adiante
por Sir Francis Galton (1822-1911) que em 1884 instalou um laboratório para
medidas antropométricas em Londres, com o objetivo de medir, de várias
maneiras, as faculdades mentais (Hothersall, 1984). Ele entendia que a
discriminação sensorial era a base do desempenho intelectual, e que medidas
adequadas, neste sentido, seriam capazes de indicar diferenças entre os mais
e os menos capazes (Anastasi, 1988). As relações entre acuidade sensorial e
mental eram comparadas por técnicas matemáticas desenvolvidas pelo próprio
Galton e que depois foram aperfeiçoadas por seu colaborador Karl Pearson,
que desenvolveu a fórmula coeficiente de correlação produto-momento.

Galton criou diversas técnicas para estudos diferenciais, como por exemplo, o
método biográfico, o método histórico familiar, a prova de associação de
palavras e imagens, o estudo de gêmeos, e a comparação de raças. Para ele,
a capacidade mental era hereditária.. Era enfim uma convergência de posições
da psicologia associacionista preconizadas por Bain, teorizadas por Darwin e
evidenciadas por Galton.

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O encontro das tradições de Wundt e de Galton se deu por meio de James
McKeen Cattell (1860-1944), um jovem americano que em 1880 foi para
Alemanha estudar com Rudolph Hermann Lotze (1817-1881). Lotze faleceu no
ano seguinte. Sem orientador, Cattell retornou aos Estados Unidos por um
curto período, voltando para a Alemanha em 1883, sendo o primeiro americano
a obter o doutorado sob a orientação de Wundt. Em sua pesquisa Cattell
descobriu um erro de medida na aparelhagem usada, levando Wundt a corrigir
conclusões anteriores.

Com o término do doutorado, Cattell transferiu-se para Londres com o


propósito de estudar medicina, mas foi persuadido a continuar trabalhando com
experimentos em psicologia. Foi nesta época que conheceu Galton, vindo a se
interessar pelo tema das diferenças individuais. O trabalho com Galton foi de
1887 a 1889. Em 1890, Cattell escreveu um artigo na revista Mind, onde o
termo testes mentais foi usado pela primeira vez. O artigo descrevia uma série
de testes utilizados em estudantes universitários para medida de nível
intelectual. Os testes eram muito semelhantes àqueles usados por Galton. Uma
tendência que se manteve nos trabalhos de Galton, Cattell e Wundt foi a
medida de processos mentais simples. No seu artigo, Cattell lista as seguintes
medidas psicológicas: dinamômetro de pressão, taxa de movimento) áreas de
sensação, pressão para causar dor, diferença mínima informada sobre peso,
tempo de reação para som, tempo para nomear cores, dividir ao meio uma
linha de 50cm., julgamento do tempo de 10 segundos, número de letras capaz
de lembrar tendo ouvido uma vez. Como se pode notar, tratava-se de medidas
sensoriais simples, tempo de reação, e memória.

No campo da medicina, Emil Kraepelin, outro orientando de Wundt, publicou


em 1895 um trabalho relatando o desenvolvimento de testes para medir o que
ele chamava de fatores básicos do indivíduo. Os testes desenvolvidos
consistiam em operações aritméticas simples para medir efeitos práticos,
memória, e susceptibilidade para fadiga e distração. Os testes eram utilizados
no exame de pacientes psiquiátricos.

Wundt era contrário ao estudo de processos mentais superiores por entender


que tais processos deveriam ser objeto de uma psicologia sócio-cultural e não

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de uma psicologia experimental. Cattell parece ter seguido seu orientador,
trabalhando com medidas de processos mentais simples. Oswald Külpe (1862-
1915), outro orientando de Wundt, contrariou o mestre desenvolvendo estudos
experimentais e qualitativos de processos mentais superiores, e começou a
estudar o pensamento, chegando a organizar a Escola de Psicologia de
Würzburg. No entanto a grande virada na medida de processos mentais
superiores aconteceu na França, com a pesquisa de Alfred Binet (1857-1911).

Binet iniciou seus estudos como um solitário autodidata. A falta do estudo


sistemático em uma escola e da relação interpessoal crítica com colegas pode
estar associada à colaboração ingênua com as demonstrações públicas de
hipnose de Jean-Martin Charcot (1825-1893) e ao dissabor de ter perdido a
posição de diretor dos cursos de psicologia experimental da Sorbonne, para
George Dumas. As novidades da psicologia fisiológica alemã, representadas
pelos trabalhos de Fechner, Helmholtz e Wundt foram divulgadas na França
inicialmente por Théodule Armand Ribot (1839-1916).

O laboratório de psicologia experimental na França foi criado em 1889, na


Sorbonne tendo como diretor Henri Beaunis (1830-1921). Binet começou a
trabalhar voluntariamente no laboratório, assumindo a chefia em 1894. O
interesse francês em psicopatologia e em observações clínicas deu ao
laboratório um perfil diferente dos existentes na Alemanha. O distanciamento
do modelo alemão propiciou a Binet a exploração de alternativas para o estudo
de elementos mentais, no caso, as medidas de inteligência. O laboratório
francês serviu de modelo para a criação dos primeiros laboratórios no Brasil.

As notícias sobre a instalação dos primeiros laboratórios e das primeiras


aplicações em psicologia no Brasil reconhecem a influência francesa,
principalmente, de George Dumas (1866-1946) e Alfred Binet (1857-1911).
Fala-se que Binet planejou o laboratório que foi instalado no Pedagogium em
1906, tendo como primeiro diretor o médico Manoel Bomfim (1868-1932).
Bomfim estudou, em Paris, com Dumas e Binet. O Pedagogium foi uma
instituição criada no Rio de Janeiro, nos fins do século XIX, para expor e
demonstrar novas técnicas e recursos pedagógicos. Do mesmo modo, o
médico Maurício de Medeiros, que também estudou em Paris com Dumas, e

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em Munique com Emil Kraepelin (1855-1926), foi o diretor de um pequeno
laboratório de psicologia instalado no Hospital Nacional de Alienados, no Rio
de Janeiro.

Acredita-se que as escalas de Binet-Simon venham sendo aplicadas no Brasil


deste os meados dos anos 1910, pelo médico pediatra Antonio Fernandes
Figueira (1863-1928) Fernandes Figueira alcançou notoriedade no Rio de
Janeiro das primeiras décadas do século XX pela dedicação e inovação de
práticas pediátricas. É reconhecido por ter sido o primeiro médico a introduzir
as mães nas enfermarias para ficarem ao lado dos filhos.

O desenvolvimento e difusão dos testes mentais estiveram muito relacionados


com o interesse dos educadores por uma pedagogia científica. No Brasil, essas
novidades chegavam por meio de psicólogos franceses e pelas escolas
normais estabelecidas por denominações evangélicas de origem norte-
americana.

Foi assim que em 1914 fundou-se na Escola Normal de São Paulo o


Laboratório de pedagogia experimental, sob a direção do psicólogo italiano Ugo
Pizzoli (1863-1934). O laboratório concentrava-se fortemente em atividades de
avaliação psicológica por meio de sensibilidade externa e interna, audição, tato
e senso muscular, gosto e olfato, grafismos, memória cinética, raciocínio
infantil, e associação de idéias. Pizzoli está entre os primeiros psicólogos a
utilizarem testes psicológicos na Itália. Foi também muito influenciado pelas
idéias do antropólogo, psiquiatria e criminalista italiano Cesare Lombroso
(1835-1909).

O psicodiagnóstico inaugurou uma nova visão da avaliação psicológica,


diferente da realizada pelos “testólogos” da Psicometria. Ao adotar uma
perspectiva clínica, mais identificada com a teoria psicanalítica ou
fenomenológica, distanciou-se da preocupação com a neutralidade e a
objetividade, passando a enfatizar a importância da subjetividade e dos
aspectos transferenciais e contratransferenciais presentes na relação. E o uso
dos testes passou a ser complementado com outros procedimentos clínicos,
com o objetivo de integrar os dados levantados nos testes e na história clínica,
para obter uma compreensão global da personalidade.

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No Brasil, o modelo de psicodiagnóstico, desenvolvido por Ocampo et al. e
Arzeno, tem norteado o trabalho de grande parte dos profissionais da área.
Além dele os modelos compreensivos e fenomenológicos também são bastante
utilizados. O psicodiagnóstico proposto por Cunha é outra referência
igualmente importante no contexto brasileiro.

Ocampo et al. e Arzeno sistematizaram o procedimento do psicodiagnóstico


dentro do referencial psicanalítico e desenvolveram uma concepção ampla e
enriquecedora que valoriza a entrevista clínica (em vez da tradicional
anamnese descritiva), a relação transferencial/contratransferencial e a
devolução, ao final do processo.

Para essas autoras, o psicodiagnóstico é uma prática clínica bem delimitada,


com objetivo, tempo e papéis definidos, diferenciada do processo analítico. É
realizado sempre com o objetivo de obter uma compreensão profunda e
completa da personalidade do paciente (ou do grupo familiar), incluindo
elementos constitutivos, patológicos e adaptativos. Abrange aspectos
presentes (diagnóstico atual) e futuros (prognóstico), sendo indicado para
esclarecimento do diagnóstico, encaminhamento e/ou tratamento. Utiliza, como
principais instrumentos, a entrevista clínica, a aplicação de testes e técnicas
projetivas, a entrevista devolutiva e a elaboração do laudo (quando solicitado).

Como em todo procedimento clínico, tem um cuidado especial com o enquadre:


no início do processo, definem-se o objetivo; os papéis de cada um (psicólogo,
paciente, pais e/ou família); a duração (em média quatro ou cinco sessões, que
podem ser ampliadas ou reduzidas, de acordo com a necessidade); local,
horário e tempo das entrevistas; honorários e forma de pagamento.

Para Ocampo et al., o psicodiagnóstico é um processo que envolve


quatro etapas. A primeira vai do contato inicial à primeira entrevista com
o paciente; a segunda é a fase de aplicação dos testes e técnicas
projetivas; a terceira é o encerramento do processo, com a devolução oral
ao paciente (e/ou aos pais); e a quarta consiste na elaboração do informe
escrito (laudo) para o solicitante.

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Arzeno detalha essas etapas em sete passos. O primeiro passo inclui
desde a solicitação da consulta pelo cliente até o primeiro encontro
pessoal com o profissional. Nessa fase, é importante observar como é
feito o contato inicial, quais as primeiras impressões etc. O segundo
passo envolve a realização das primeiras entrevistas, quando se busca
identificar o motivo latente e manifesto da consulta, as ansiedades e
defesas que o paciente, pais e/ou família apresentam, as expectativas e
fantasias de doença e de cura que trazem. É importante observar como o
paciente se coloca, o que é priorizado no relato, que tipo de relação
estabelece com o psicólogo (e entre si, no caso do casal e/ou família),
para identificar os aspectos transferenciais e contratransferenciais, bem
como as resistências e a capacidade de elaboração e mudança. O terceiro
passo é o momento de reflexão sobre o material colhido e análise das
hipóteses iniciais, para planejamento dos passos seguintes e escolha dos
instrumentos diagnósticos a serem empregados. O quarto passo é o
momento da realização da estratégia diagnóstica planejada – entrevistas
e aplicação dos testes e técnicas selecionadas, de acordo com o caso.
Em geral, age-se conforme o planejado, mas, se houver necessidade,
podem-se introduzir modificações durante o processo. O quinto passo é o
momento da análise e integração dos dados levantados. É o estudo
conjunto do material apreendido nas entrevistas, nos testes e na história
clínica, para obter uma compreensão global do caso. Essa fase exige do
profissional domínio teórico-metodológico e grande capacidade analítica,
a fim de identificar as recorrências e convergências entre os dados, assim
como os aspectos mais relevantes dentro do material, que possibilitam
uma compreensão ampla da personalidade do indivíduo e/ou da dinâmica
familiar e do casal. O sexto passo é o momento da devolução da
informação, que pode ser feita em uma ou mais entrevistas. Geralmente, é
realizada de forma separada – uma com o indivíduo que foi trazido como
protagonista principal da consulta, e outra com os pais e o restante da
família. Freqüentemente, durante a entrevista devolutiva, surgem novos
elementos, os quais ajudam a validar as conclusões ou esclarecer os
pontos obscuros. O último passo envolve a elaboração do laudo
psicológico com as conclusões diagnósticas e prognósticas, incluindo as

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recomendações terapêuticas adequadas ao caso. A elaboração do laudo é
um aspecto importante do processo, pois, quando mal feito, pode prejudicar o
paciente, em vez de ajudá-lo.

O processo diagnóstico do tipo compreensivo, desenvolvido por Trinca é outro


modelo muito difundido entre os profissionais brasileiros, que trabalham com
avaliação psicológica na abordagem psicanalítica. Ele também busca uma
visão totalizadora e integradora da personalidade, por meio de uma
compreensão abrangente das dinâmicas psíquicas, intrafamiliares e
socioculturais. Para isso, utiliza referenciais múltiplos – além da psicanálise, a
análise é complementada com outros referenciais teóricos (teorias do
desenvolvimento e maturação e da família). Tem ainda, como características
importantes, a valorização do pensamento clínico e uma maior flexibilidade, na
estruturação do processo.

O modelo compreensivo se estrutura de acordo com o contexto. O uso ou não


de testes psicológicos ou de outros procedimentos clínicos de investigação da
personalidade fica na dependência do pensamento clínico empregado. Na
interpretação dos dados, o pensamento clínico funciona como um princípio
organizador, define critérios, procedimentos e esquemas de raciocínio, para
integração dos dados e análise. Ele é influenciado não só pela teoria, mas,
também, pela experiência clínica do profissional, pelo contexto e pelas
personalidades do cliente e do psicólogo. Para Trinca:

embora as teorias sejam fatores importantes no background do profissional, é


mister que sua atividade clínica seja empreendida com o mínimo de
interferência de suas teorias sobre sua capacidade de observar e captar os
fatos relevantes.

O psicodiagnóstico fenomenológico introduz algumas mudanças significativas


no modelo proposto por Ocampo et al. e Arzeno. Dentre suas inovações,
destacam-se quatro características principais:

1. Considera o processo psicodiagnóstico uma prática interventiva: diagnóstico


e intervenção são processos simultâneos e complementares;

2. Propõe que a devolução seja feita durante o processo e não ao final;

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3. Enfatiza o sentido da experiência dos envolvidos no processo; e

4. Redefine a relação paciente-psicólogo em termos de poder, papéis e


realização de tarefas.

No modelo fenomenológico, o cliente é um parceiro ativo e envolvido no


trabalho de compreensão e eventual encaminhamento posterior. O psicólogo
se afasta do lugar de técnico ou especialista detentor do saber e estabelece
com o paciente uma relação de cooperação, em que a capacidade de ambas
as partes, de observarem, aprenderem e compreenderem constitui a base
indispensável ao trabalho. Psicólogo e paciente se envolvem, a partir de pontos
de vista diferentes, mas igualmente importantes, na tarefa de construir os
sentidos da existência de um deles – o cliente.

Entrevistas diagnósticas e outros procedimentos clínicos de avaliação


psicológica

O psicodiagnóstico, realizado segundo os modelos anteriormente descritos,


apesar de continuar sendo uma importante estratégia de avaliação psicológica,
fundamental na formação e atuação profissional dos psicólogos, tem sido, nos
últimos anos, objeto de muitas críticas, especialmente pelo uso, muitas vezes
desnecessário, de uma extensa bateria de testes psicológicos, pelo longo
tempo gasto no processo e, também, pelo uso indevido de laudos,
freqüentemente mal elaborados. Tais críticas não anulam a importância e a
indicação do psicodiagnóstico, principalmente em situações específicas que
exigem um estudo mais aprofundado para um diagnóstico diferencial. Mas,
freqüentemente, se o profissional possui experiência clínica e um bom domínio
teórico e técnico, é possível utilizar procedimentos de avaliação mais
simplificados, que exploram com criatividade e profundidade os recursos da
entrevista clínica diagnóstica.

Atualmente, no nosso meio psicológico acadêmico e profissional, alguns


profissionais de formação psicanalítica rejeitam radicalmente o uso de qualquer
teste ou técnica de investigação da personalidade. No trabalho diagnóstico,
utilizam apenas a entrevista psicanalítica nos moldes realizados por Freud,
Lacan e Mannoni.

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Mas a prática mais comum, principalmente com crianças, introduz na entrevista
diagnóstica técnicas menos estruturadas, como o “jogo do rabisco” de
Winnicott ou o brincar de forma livre e espontânea, como propõe Aberastury,
na “hora do jogo”; ou ainda o desenhar e contar estórias, conforme Trinca no
Procedimento de “Desenhos-Estórias”.

Tradicionalmente usadas dentro do processo do psicodiagnóstico, essas


técnicas são, hoje, freqüentemente empregadas de forma mais flexível. Como
aponta Trinca, a flexibilização do uso de técnicas auxiliares, na entrevista
clínica, consolida uma nova maneira de realizar o diagnóstico psicológico como
um procedimento predominantemente clínico.

O campo da avaliação psicológica abarca hoje uma pluralidade de práticas


diagnósticas que podem ou não recorrer a instrumentos estruturados e
padronizados, como os testes psicológicos, e a outras técnicas e
procedimentos menos estruturados, como jogos, brinquedos, desenhos e
estórias. A flexibilidade na escolha de determinada estratégia (ou instrumentos)
é influenciada pela experiência do profissional, referencial teórico e objetivo. O
contexto e as novas demandas das Psicologias (Clínica, Hospitalar, Jurídica,
Institucional etc.) também influenciam na escolha. Quando adotados fora da
clínica tradicional, mais restrita aos consultórios particulares, os procedimentos
clínicos de diagnóstico e avaliação psicológica em geral carecem de
adaptações para atender às peculiaridades de cada caso.

De acordo com as concepções de Almeida, as informações decorrentes do uso


dos testes psicológicos dependem não somente da qualidade do instrumento,
mas também do conhecimento e competência do profissional que o utiliza.

No processo de avaliação psicológica são utilizados testes psicométricos e


projetivos que, após corrigidos e interpretados, culminam em um laudo
psicológico. Os primeiros avaliam as capacidades especificas dos indivíduos
para tarefas rotineiras, que meçam quantitativamente os aspectos específicos
da inteligência geral e as diferenças individuais em termos de rapidez e
exatidão no desempenho.

16
Os testes projetivos constituem-se num modo de obtenção de conhecimento
sobre o individuo, centrado em seus aspectos não aparentes, permitindo uma
variedade ilimitada de respostas, possibilitando ao examinando projetar suas
agressões, conflitos, medos e idéias. É uma forma de comunicação indireta e
impessoal que, para ser válida, necessita de observação direta e contato
clínico.

Os testes psicológicos são adaptados às diferentes categorias, de acordo com


as exigências da situação e com o quadro clínico do examinando em questão.

A adequação dos testes psicológicos e a confecção das baterias devem estar


baseadas nas profissiografias das diferentes categorias e dos requisitos
psicológicos exigidos para o cargo.

A importância dos testes projetivos situa-se no fato de eles avaliarem os


aspectos mais profundos da personalidade de forma global e a sua inclusão
nas diversas baterias em que o equilíbrio emocional seja primordial para o
desempenho da atividade em questão.

Laudos, pareceres e relatórios psicológicos, estudo de caso, informação


e avaliação psicológica.

O laudo psicológico é confeccionado a partir da interpretação da bateria de


testes utilizada na avaliação psicológica. Tem por finalidade sintetizar os
resultados dos testes aplicados.

Deve ser redigido de forma objetiva, ressaltando o que há de mais importante


em cada caso e que merece ser devidamente relatado. A transcrição e a
redação do laudo serão tão explicitas quanto possível e realizadas de acordo
com a Resolução nº 30/2001 do CFP.

O laudo é um documento técnico de caráter demonstrativo que tem como


objetivo apresentar diagnóstico e/ou prognóstico, com vistas a oferecer
orientações, subsidiar decisões ou encaminhamentos, a partir de uma
avaliação psicológica. É também chamado de Relatório Psicológico e quando
sua solicitação decorre de instâncias judiciais tem sido denominado de Laudo
Pericial.

17
Pode ser considerado um instrumento histórico, profissiográfico e situacional,
pois contém elementos estruturais e dinâmicos da personalidade.

Podemos resumir o tema da avaliação psicológica como abaixo:

PSICODIAGNÓSTICO

Função exclusiva do psicólogo

VISÃO HISTÓRICA DO PROCESSO (Ocampo)

 modelo médico: distância do paciente; falta de identidade do psicólogo;


mais importante - aplicar testes; mandar relato a outro profissional; falta
gestalt

 modelo da Psicanálise: marco de referência, influência no estudo da


personalidade (relação); mas é diferente (tem metodologia própria)

 diagnóstico de tipo compreensivo: encontrar sentido - relevante e


significativo; entrar em contato (Trinca)

 diagnóstico interventivo: (Ancona-Lopes)

INSTITUCIONALMENTE, PSICODIAGNÓSTICO é uma situação com papéis


definidos:

CONTRATO

Uma pessoa ou grupo (paciente)

Pede a outra (psicólogo)

Que o ajude - este faz de acordo com suas possibilidades

Definição: Situação bi-pessoal (psicólogo—paciente; psicólogo-grupo familiar)

Objetivos definidos: conseguir a compreensão da personalidade – o mais


completa possível

OBJETIVOS (OCAMPO)

18
 Compreensão da personalidade como um todo

 organizar conhecimentos: vida biológica, intra-psíquica e social

 entender o sintoma: (fenomenológico e dinâmico); ruptura do equilíbrio;


expressa algo a nível familiar

 importância do desenvolvimento (criança) (Ancona-Lopes)

 interação dos fatores orgânicos com os emocionais

 importância dos aspectos intrapsíquicos

 Principal objetivo: esse conhecimento - aspectos passados e presentes


(diagnóstico) e futuros (prognóstico)

 Explicar dinâmica: buscando relações (família, grupo)

 aspectos adaptativos e patológicos/ ser dinâmico

MOMENTOS DO PROCESSO PSICODIAGNÓSTICO

1. Primeiro contato e entrevista inicial (s) com o paciente (pais)

2. Aplicação de testes e técnicas projetivas

3. Encerramento do processo devolução oral ao paciente (e/ou aos pais)

4. Informe escrito ao remetente (se for o caso – laudo)

ENQUADRAMENTO

Enquadramento – constantes variáveis

- Esclarecimento de papéis (limite e natureza da função que cada parte


integrante do contrato desempenha

- Lugares

- Horário e duração do processo (nem muito longo, nem muito curto)

- Honorários (se for o caso)

- Final da 1a entrevista – mais claro o enquadramento

19
ENTREVISTAS

 técnica de investigação (no Psicodiagnóstico) (Bleger)

 importância dos conceitos de transferência e contratransferência

COM CRIANÇAS:

ENTREVISTAS INICIAIS COM OS PAIS- OBJETIVOS

1. Perceber a 1a impressão (linguagem corporal, aparência, etc)

2. Considerar o que verbaliza (forma e conteúdo)

3. Estabelecer o grau de coerência ou discrepância entre o que é


verbalizado/ o não verbal

4. Planejar a bateria de testes e outros instrumentos

5. Estabelecer um bom rapport

6. Captar: transferência e contratransferência

7. Detectar vínculo que une o casal /pais e filhos

8. Avaliar a capacidade dos pais de elaboração da situação diagnóstica


atual e potencial

Situações especiais:

 Pais separados
 Adoção

9 . Investigar o motivo da consulta - esclarecer sintoma: saber motivo manifesto


e latente; fantasia de enfermidade e cura

10. Conhecer a história da família e da criança (anamnese)

HORA DE JOGO DIAGNÓSTICA

Forma de expressão típica da criança para conhecimento inicial. Indicadores:

escolha;

20
modalidade;

personificação;

motricidade;

criatividade;

simbolização;

tolerância à frustração;

adequação à realidade (Ocampo)

TÉCNICAS PROJETIVAS GRÁFICAS

 em geral no início/econômicos e simples

 acessíveis a todas as pessoas/ crianças pequenas

 excelente grau de simbolização

 considerar: nível sócio-econômico-cultural, idade e maturidade; grupo


social

 linguagem gráfica (lúdica) mais próxima do inconsciente.

 mostram o mais regressivo e patológico

 comparação com outros testes projetivos e objetivos

 análise: aspectos formais e de conteúdo

 Instituições: simplicidade/economia de tempo

 Indicadores Psicopatológicos nos Testes Gráficos : Sinais presentes em


diferentes quadros (Grassano)

PRINCIPAIS TÉCNICAS GRÁFICAS

 Desenho Livre : (Lourenção van Kolck)

21
 Desenho da Figura Humana na Técnica de Machover: estudo da
personalidade (aspectos adaptativos, expressivos e projetivos); imagem
corporal (conceito de si mesmo)

 HTP (Desenho da Casa-Árvore-Pessoa) de Buck -: cada tema como


auto-retrato: Casa: aspectos primitivos; Árvore: estrutura; Figura
Humana: aspectos de relacionamento/ atuais.

 Desenho da Família: (Amina Maggi; Corman entre outros)

 Teste das Duas Pessoas : (Bernstein)

TESTES DE NÍVEL MENTAL

 Escalas Wechsler (WISC; WPPSI; WAIS): Análise quantitativa (QIV, QI


E e QI T) e qualitativa (funções)

 Teste de Fator G (Raven-Escalas Especial, Geral e Avançada e muitos


outros)

 Terman Merrill / e outros

TESTES PSICOMOTORES

 importante em crianças com problemas de aprendizagem;


comprometimentos emocionais e neurológicos

 Teste de Bender:completo/ diversas formas de avaliação: (Koppitz,; Hutt,


e outros)

 Outros: Pré-Bender; Ritmo (Stamback); Lateralidade (Piaget-Head) etc.

TÉCNICAS GRÁFICAS E VERBAIS

Procedimento de Desenhos-Estórias (D-E) e Desenho de Família com Estórias


(DF-E):

 desenho como estímulo de apercepção temática : permite estudo


completo (Trinca,)

 análise dos aspectos formais

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 análise de conteúdo: por simples inspeção do material/ com referenciais

 fundamentação psicanalítica: permite análise segundo outros


referenciais, acesso a camadas mais profundas, ampliação do uso/ e
nível de idade dos sujeitos. Não é teste: é instrumento clínico (não
requer aprovação do CFP)

TÉCNICAS VERBAIS

TÉCNICAS DE APERCEPÇÃO TEMÁTICA

 TAT - Teste de Apercepção Temática (Murray): método para revelar


impulsos, emoções, sentimentos conflitos. Relatos a partir de pranchas
ou quadros para adultos e adolescentes; análise formal e de conteúdo;
(Molt, ,Rapaport,; Shentoub,)

 CAT - Teste de Apercepção Infantil (Bellak,): pranchas com cenas de


animais - aspectos importantes do desenvolvimento infantil (fases),
estrutura e dinâmica. Está em fase avaliação pelo CFP.

TESTES DESIDERATIVOS

 QUESTIONÁRIO DESIDERATIVO (BERNSTEIN): (em fase de avaliação


pelo CFP)
 TESTE DE RORSCHACH: estrutura e dinâmica/ todos os aspectos da
personalidade)/ várias escolas.Favorável no CFP.

APORTES DA TEORIA DAS RELAÇÕES OBJETAIS AO ESTUDO DAS


TÉCNICAS PROJETIVAS
 contato com a realidade interna e externa

 objetos incompletos - a serem recriados (reparação)

 respostas mais organizadas (objetos completos e harmoniosos):


personalidade mais evoluída (depressiva)

 fracassos na integração: hostilidade contra objetos internos e


pensamento

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 análise: como a personalidade está organizada

 Produção projetiva: criação pessoal (ansiedades; defesas; relações de


objeto)

PRÁTICA DO PSICODIAGNÓSTICO

 Situação de consultório

 contexto hospitalar - atendimento e pesquisa

 área forense

 instituições

 situações especiais :educação, trabalho.

COMPROMISSO COM O SER HUMANO: responsabilidade técnica e ética

ENTREVISTAS DEVOLUTIVAS

 Importantes no processo
 criança: presença dos pais: imagem do filho corrigida
 oportunidade de insight
 estudo do material/ selecionar o que pode ou não ser dito
 importância da transferência e contratransferência
 relações com a entrevista inicial
 confirma ou modifica o diagnóstico
 com criança: jogo ou desenho
 com adolescentes: com os pais
 Papel do psicólogo: transmitir resultados e observar reações

DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO

 1836 –1930: produção-médico-científica acadêmica;


 1930-1962: estabelecimento e difusão da psicologia no ensino nas
universidades;
 1962-1970: criação dos cursos de graduação em psicologia;
 1970-1987: implantação dos cursos de pós-graduação;

24
 1987 -: emergência dos laboratórios de pesquisa em avaliação
psicológica.
 1os usos de testes (Rio de Janeiro) - 1918, nos trabalhos do médico
Fernandes Figueira que, pela primeira vez, aplica testes de inteligência
(provas de Binet-Simon) na avaliação de internos do Hospital Nacional.
 1960 Psicologia se caracteriza pela regulamentação dos cursos de
formação (graduação) e a consequente expansão do ensino de
psicologia no Brasil.

 Pela Lei n. 4119 de 1962 regulamentação da profissão.

 Criação dos Conselhos Federal de Psicologia e dos Conselhos


Regionais de Psicologia em 1974, pela Lei 5.766.

 Final da década de 60: certo comprometimento na qualidade da


profissionalização dos psicólogos, especialmente na área de avaliação
psicológica.

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA: CAMPO DE CONHECIMENTO E OBJETIVOS

 A necessidade de explicar as condutas dos indivíduos em diferentes


situações criou a possibilidade de estruturar modelos de investigação
sobre as características e as dimensões dos processos psicológicos
subjacentes à natureza das condutas

CARACTERIZAÇÃO DA AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA E SUAS DEFINIÇÕES

 Exame psicológico: é comumente associado a procedimentos de


avaliação psicológica utilizados para fins de seleção de profissionais de
empresas, concursos públicos e obtenção de carteira de motorista
(psicotécnico)

 Psicodiagnóstico: um termo intimamente associado ao trabalho de


avaliação psicológica realizado em situações de atendimento clínico. Na
maioria dos casos, como uma atividade com início e fim previstos a curto
e médio prazo, que tem por finalidade realizar diagnóstico e
encaminhamento específicos para processos terapêuticos

25
 Avaliação psicológica se refere ao modo de conhecer fenômenos e
processos psicológicos por meio de procedimentos de diagnóstico e
prognóstico e, ao mesmo tempo, aos procedimentos de exame
propriamente ditos para criar as condições de aferição ou
dimensionamento dos fenômenos e processos psicológicos conhecidos.

 Medir: apresenta-se como um correlato de identificação e


caracterização de um fenômeno psicológico

O PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO

 Base: consultas terapêuticas


 Impossibilidade de separação: fases de avaliação e intervenção
 Fundamentação psicanalítica
 Propostas anteriores ( Ancona Lopes)

2 PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO: O
DESENVOLVIMENTO NORMAL. PSICOPATOLOGIA DO
DESENVOLVIMENTO.

A Psicologia do desenvolvimento, também conhecida como desenvolvimento


humano, é o estudo científico das mudanças progressivas psicológicos que
ocorrem nos seres humanos. Este campo examina mudanças através de uma
ampla gama de temas, incluindo habilidades motoras e de outros processos
psico-fisiológico, resolução de problemas habilidades de compreensão
conceptual, a linguagem aquisição, moral compreensão, de identidade e de
formação.

Psicólogos do desenvolvimento investigam questões fundamentais, tais como:


saber se as crianças são qualitativamente diferentes dos adultos ou
simplesmente falta a experiência que basear-se em adultos.

Duas questões importantes que dizem respeito à natureza do desenvolvimento:


uma delas diz que o desenvolvimento ocorre através da acumulação gradual
de conhecimento ou por turnos a partir de uma fase de reflexão para o outro. O

26
outro diz respeito a saber se as crianças nascem com conhecimento inato ou
as apreende através da experiência. Uma terceira área significativa da
investigação analisa contextos sociais que afetam o desenvolvimento.

Estudiosos da psicologia aplicada atua em vários domínios, incluindo:


psicologia educacional, psicopatologia infantil e psicologia forense
desenvolvimentista e complementam vários outros campos de investigação
fundamental em psicologia incluindo psicologia social, psicologia cognitiva,
desenvolvimento cognitivo, ecológicos e de psicologia comparativa.

Estudiosos da Psicologia do desenvolvimento.

Sigmund Freud (1856-1939)

Propõe, à data, um novo e radical modelo da mente humana, que alterou a


forma como pensamos sobre nós próprios, a nossa linguagem e a nossa
cultura. A sua descrição da mente enfatiza o papel fundamental do
inconsciente na psique humana e apresenta o comportamento humano como
resultado de um jogo e de uma interação de energias.

Freud contribuiu para a eliminação da tradicional oposição básica entre


sanidade e loucura ao colocar a normalidade num continuum e procurou
compreender o funcionamento do psiquismo normal através da gênese e da
evolução das doenças psíquicas.

Estudou o desenvolvimento psíquico da pessoa a partir do estádio


indiferenciado do recém-nascido até a formação da personalidade do adulto.

Muitos dos problemas psicopatológicos da idade adulta de que trata a


Psicanálise têm as suas raízes, as suas causas, nas primeiras fases ou
estádios do desenvolvimento.

Na perspectiva freudiana, a “construção” do sujeito, da sua personalidade, não


se processa em termos objetivos (de conhecimento), mas em termos objetais.

O objeto, em Freud, é um objeto libidinal, de prazer ou desprazer, “bom ou


mau”, gratificante ou não gratificante, positivo ou negativo.

27
A formação dos diferentes estádios é determinada, precisamente, por essa
relação objetal. (Estádios: Oral, Anal, Fálico, Latência, Genital)

Erik Erikson (1904-1994)

A teoria que desenvolveu nos anos 50 partiu do aprofundamento da teoria


psicossexual de Freud e respectivos estádios, mas rejeita que se explique a
personalidade apenas com base na sexualidade.

Acredita na importância da infância para o desenvolvimento da personalidade,


mas, ao contrário de Freud, acredita que a personalidade se continua a
desenvolver para além dos 5 anos de idade.

No seu trabalho mais conhecido, Erikson propõe 8 estádios do


desenvolvimento psicossocial através dos quais um ser humano em
desenvolvimento saudável deveria passar da infância para a idade adulta. Em
cada estádio cada sujeito confronta-se, e de preferência supera novos desafios
ou conflitos. Cada estádio/ fase do desenvolvimento da criança é importante e
deve ser bem resolvida para que a próxima fase possa ser superada sem
problemas.

Tal como Piaget, concluiu que não se deve apressar o desenvolvimento das
crianças; que se deve dar o tempo necessário a cada fase de desenvolvimento,
pois cada uma delas é muito importante. Sublinhou que apressar o
desenvolvimento pode ter consequências emocionais e minar as competências
das crianças para a sua vida futura.

Jean Piaget (1896-1980)

Jean Piaget (1896-1980) foi um dos investigadores mais influentes do séc. XX


na área da psicologia do desenvolvimento. Piaget acreditava que o que
distingue o ser humano dos outros animais é a sua capacidade de ter um
pensamento simbólico e abstrato. Piaget acreditava que a maturação biológica
estabelece as pré-condições para o desenvolvimento cognitivo. As mudanças
mais significativas são mudanças qualitativas (em gênero) e não qualitativas
(em quantidade).
28
Existem 2 aspectos principais nesta teoria: o processo de conhecer e os
estádios/ etapas pelos quais nós passamos à medida que adquirimos essa
habilidade.

Como biólogo, Piaget estava interessado em como é que um organismo se


adapta ao seu ambiente (ele descreveu esta capacidade como inteligência) - O
comportamento é controlado através de organizações mentais denominadas
“esquemas”, que o indivíduo utiliza para representar o mundo e para designar
as ações.

Essa adaptação é guiada por uma orientação biológica para obter o balanço
entre esses esquemas e o ambiente em que está (equilibração). Assim,
estabelecer um desequilíbrio é a motivação primária para alterar as estruturas
mentais do indivíduo.

Piaget descreveu 2 processos utilizados pelo sujeito na sua tentativa de


adaptação: assimilação e acomodação. Estes 2 processos são utilizados ao
longo da vida à medida que a pessoa vai progressivamente se adaptando ao
ambiente de uma forma mais complexa.

 Capta as grandes tendências do pensamento da criança


 Encara as crianças como sujeitos ativos da sua aprendizagem

Lev Vygotsky (1896-1934)

Lev Vygotsky desenvolveu a teoria sócio-cultural do desenvolvimento


cognitivo. A sua teoria tem raízes na teoria marxista do materialismo dialético,
ou seja, que as mudanças históricas na sociedade e na vida material produzem
mudanças na natureza humana.

Vygotsky abordou o desenvolvimento cognitivo por um processo de orientação.


Em vez de olhar para o final do processo de desenvolvimento, ele debruçou-se
sobre o processo em si e analisou a participação do sujeito nas atividades
sociais → Ele propôs que o desenvolvimento não precede a socialização. Ao
invés, as estruturas sociais e as relações sociais levam ao desenvolvimento
das funções mentais.

29
Ele acreditava que a aprendizagem na criança podia ocorrer através do jogo,
da brincadeira, da instrução formal ou do trabalho entre um aprendiz e um
aprendiz mais experiente.

O processo básico pelo qual isto ocorre é a mediação (a ligação entre duas
estruturas, uma social e uma pessoalmente construída, através de
instrumentos ou sinais). Quando os signos culturais vão sendo internalizados
pelo sujeito é quando os humanos adquirem a capacidade de uma ordem de
pensamento mais elevada.

Ao contrário da imagem de Piaget em que o indivíduo constrói a compreensão


do mundo, o conhecimento sozinho, Vygostky via o desenvolvimento cognitivo
como dependendo mais das interações com as pessoas e com os instrumentos
do mundo da criança

Esses instrumentos são reais: canetas, papel, computadores; ou símbolos:


linguagem, sistemas matemáticos, signos.

Vygostsky sublinhou as influências socioculturais no desenvolvimento


cognitivo da criança:

 O desenvolvimento não pode ser separado do contexto social


 A cultura afeta a forma como pensamos e o que pensamos
 Cada cultura tem o seu próprio impacto
 O conhecimento depende da experiência social
 A criança desenvolve representações mentais do mundo através da
cultura e da linguagem
 Os adultos têm um importante papel no desenvolvimento através da
orientação que dão e por ensinarem.

Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) – intervalo entre a resolução de


problemas assistida e individual.

Uma vez adquirida a linguagem, as crianças utilizam a linguagem/discurso


interior, falando alto para elas próprias de forma a direcionarem o seu próprio
comportamento; essa linguagem mais tarde será internalizada e silenciosa –

Konrad Lorenz (1903-1989)


30
Zoólogo austríaco, ornitólogo e um dos fundadores da Etologia moderna
(estudo do comportamento animal). Desenvolveu a idéia de um mecanismo
inato que desencadeia os comportamentos instintivos (padrões de ação fixos)
→ modelo para a motivação do comportamento.

Considera-se hoje que o sistema nervoso e de controle do comportamento


envolvem transmissão de informação e não transmissão de energias.

O seu trabalho empírico é uma das grandes contribuições, sobretudo no que se


refere ao IMPRINTING e aos PERÍODOS CRÍTICOS.

O imprinting é um excelente exemplo da interação de fatores genéticos e


ambientais no comportamento – o que é inato e específico na espécie e as
propriedades específicas da aprendizagem.

O trabalho de Lorenz forneceu uma evidência muito importante de que existem


períodos críticos na vida onde um determinado tipo definido de estímulo é
necessário para o desenvolvimento normal. Como é necessária a exposição
repetitiva a um estímulo ambiental (provocando uma associação com ele),
podemos dizer que o imprinting é um tipo de aprendizagem, ainda que
contendo um elemento inato muito forte.

Henri Wallon (1879 – 1962)

Wallon procura explicar os fundamentos da psicologia como ciência, os seus


aspectos epistemológicos, objetivos e metodológicos. Considera que o homem
é determinado fisiológica e socialmente, sujeito às disposições internas e às
situações exteriores.

Wallon propõe a psicogênese da pessoa completa (psicologia genética), ou


seja, o estudo integrado do desenvolvimento.

Para ele o estudo do desenvolvimento humano deve considerar o sujeito como


“geneticamente social” e estudar a criança contextualizada, nas relações com o
meio. Wallon recorreu a outros campos de conhecimento para aprofundar a
explicação dos fatores de desenvolvimento (neurologia, psicopatologia,
antropologia, psicologia animal).

31
Considera que não é possível selecionar um único aspecto do ser humano e vê
o desenvolvimento nos vários campos funcionais nos quais se distribuem a
atividade infantil (afetivo, motor e cognitivo).

Vemos então que para ele não é possível dissociar o biológico do social no
homem. Esta é uma das características básicas da sua Teoria do
Desenvolvimento.

Burrhus F. Skinner (1904 – 1990)

Psicólogo Americano, conduziu trabalhos pioneiros em Psicologia


Experimental e defendia o comportamentalismo / behaviorismo (estudo do
comportamento observável).

Tinha uma abordagem sistemática para compreender o comportamento


humano, uma abordagem de efeito considerável nas crenças e práticas
culturais correntes.

Fez investigação na área da modelação do comportamento pelo reforço


positivo ou negativo (condicionamento). O condicionamento operante explica
que um determinado comportamento tem uma maior probabilidade de se
repetir se a seguir à manifestação do comportamento se apresentar de um
reforço (agradável). É uma forma de condicionamento onde o comportamento
acabará por ocorrer antes da resposta.

A aprendizagem pode definir-se como uma mudança relativamente estável no


potencial de comportamento, atribuível a uma experiência - Importância dos
estímulos ambientais na aprendizagem

Albert Bandura (1925-presente)

É, tal como Skinner, da linha behaviorista da Psicologia. No entanto enfatiza a


modificação do comportamento do indivíduo durante a sua interação. Ao
contrário da linha behaviorista radical de Skinner, acredita que o ser humano é
capaz de aprender comportamentos sem sofrer qualquer tipo de reforço. Para
ele, o indivíduo é capaz de aprender também através de reforço vicariante, ou
seja, através da observação do comportamento dos outros e de suas

32
consequências, com contato indireto com o reforço. Entre o estímulo e a
resposta, há também o espaço cognitivo de cada indivíduo.

É um dos autores associado ao Cognitivismo-Social, uma teoria da


aprendizagem baseada na idéia de que as pessoas aprendem através da
observação dos outros e que os processos do pensamento humano são
centrais para se compreender a personalidade:

 As pessoas aprendem pela observação dos outros.


 A aprendizagem é um processo interno que pode ou não alterar o
comportamento.
 As pessoas comportam-se de determinadas maneiras para atingir os
seus objetivos.
 O comportamento é auto-dirigido (por oposição ao determinado pelo
ambiente)
 O reforço e a punição têm efeitos endereços e imprevisíveis tanto no
comportamento como na aprendizagem.
 Os adultos (pais, educadores, professores) têm um papel importante
como modelos no processo de aprendizagem da criança.

Urie Bronfenbrenner (1917 – presente)

Um dos grandes autores que desenvolveu a Abordagem Ecológica do


Desenvolvimento Humano: o sujeito desenvolve-se em contexto, em 4 níveis
dinâmicos – a pessoas, o processo, o contexto, o tempo.

A sua proposta difere da Psicologia Científica até então (70’s): privilegia os


aspectos saudáveis do desenvolvimento, os estudos realizados em ambientes
naturais e a análise da participação da pessoa focalizada no maior nº possível
de ambientes e em contacto com diferentes pessoas.

Bronfenbrenner explicita a necessidade de os pesquisadores estarem atentos à


diversidade que caracteriza o homem – os seus processos psicológicos, a sua
participação dinâmica nos ambientes, as suas características pessoais e a sua
construção histórico-sócio-cultural.

33
Define o desenvolvimento humano como “o conjunto de processos através dos
quais as particularidades da pessoa e do ambiente interagem para produzir
constância e mudança nas características da pessoa no curso de sua vida"

A Abordagem Ecológica do Desenvolvimento privilegia estudos longitudinais,


com destaque para instrumentos que viabilizem a descrição e compreensão
dos sistemas da maneira mais contextualizada possível.

Arnold Gesell (1880-1961)

Psicólogo Americano que se especializou na área do desenvolvimento infantil.


Os seus primeiros trabalhos visaram o estudo do atraso mental nas crianças,
mas cedo percebeu que é necessária a compreensão do desenvolvimento
normal para se compreender um desenvolvimento anormal.

Foi pioneiro na sua metodologia de observação e medição do comportamento


e, portanto, foi dos primeiros a implementar o estudo quantitativo do
desenvolvimento humano, do nascimento até a adolescência.

Realizou uma descrição detalhada e total do desenvolvimento da criança;


realça, com base em pesquisas rigorosas e sistemáticas, o papel do processo
de maturação no desenvolvimento.

Gesell e colaboradores caracterizaram o desenvolvimento segundo quatro


dimensões da conduta: motora, verbal, adaptativa e social. Nesta perspectiva
cabe um papel decisivo às maturações nervosa, muscular e hormonal no
processo de desenvolvimento.

Desenvolveu, a partir dos seus resultados, escalas para avaliação do


desenvolvimento e inteligência. Inaugurou o uso da fotografia e da observação
através de espelhos de um só sentido como ferramentas de investigação.

34
3 PROCESSO SAÚDE-DOENÇA: DOENÇAS CRÔNICAS E
DOENÇAS AGUDAS; MODELO BIOMÉDICO E MODELO
BIOPSICOSSOCIAL DE SAÚDE. 1ª parte ver word
PSICOPATOLOGIA

O modelo biomédico

O discurso da medicina, regra geral, apóia as suas observações e formulações,


exclusivamente, a partir da perspectiva do modelo biomédico. Este modelo
exclui o contexto psicossocial dos significados.

De acordo com este modelo, as doenças advêm do exterior do corpo,


invadindo-o e causando mudanças físicas dentro do mesmo, tendo também
origem em mudanças físicas internas involuntárias. Tais doenças são causadas
por um vasto número de fatores, incluindo desequilíbrios químicos, bactérias,
vírus e a própria predisposição genética.

Na medida em que as doenças são encaradas como algo que surge a partir
das mudanças biológicas que se encontram fora do controle do sujeito, os
indivíduos não são considerados responsáveis pelas suas doenças, muito pelo
contrário, são vistos como vítimas.

Este modelo considera o tratamento das doenças da responsabilidade médica,


e são exemplos de tratamento a vacinação, cirurgias, quimioterapias, entre
outras, mas todas com a finalidade de mudar o estado físico do doente.

Segundo o modelo biomédico não existe uma continuidade entre a doença e a


saúde, ambas são distintas: ou se é doente ou se é saudável.
Este modelo considera que a mente e o corpo funcionam independentemente,
ou seja, a mente é incapaz de influenciar o estado físico, sendo encarada como
algo abstrato e relacionada com os sentimentos e pensamentos. Por sua vez, o
corpo é visto em termos de substâncias físicas como pele, músculos, ossos,
cérebro e órgãos.

De acordo com o modelo biomédico, a doença pode ter consequências


psicológicas, mas não causas psicológicas. Por exemplo, o cancro pode causar
35
infelicidade, contudo o estado emocional do paciente não é visto como algo
que está relacionado quer com o que lhe dá origem quer com a sua
progressão.

O modelo biopsicossocial

A perspectiva que tem como referência o modelo biopsicossocial tem-se


afirmado progressivamente. A emergência da psicologia da saúde veio desafiar
a cisão mente-corpo ao propor um papel para a mente, tanto na causa como no
tratamento da doença, proporcionando uma visão integral do ser humano.
O modelo biopsicossocial representou uma tentativa para integrar o psicológico
(“psico”) e o meio ambiente (“social”) no modelo biomédico (“bio”):

4 AÇÕES BÁSICAS DE SAÚDE: PROMOÇÃO; PREVENÇÃO;


REABILITAÇÃO; BARREIRAS E COMPORTAMENTOS DE
SAÚDE; NÍVEIS DE ATENÇÃO À SAÚDE.

36
A Conferência de Alma-Ata ocorrida em 1978 com a proposta de Saúde para
Todos no Ano 2000 e a estratégia de Atenção Primária de Saúde, que
alcançou destaque especial na Primeira Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde em1986, a promulgação da Carta de Ottawa, e que vem
se enriquecendo com a série de declarações internacionais periodicamente
formuladas nas conferências realizadas sobre o tema é que deram início à
nova forma de gestão da saúde pública no Brasil.

Esta conferência especificou ainda mais que os componentes fundamentais da


atenção primária à saúde eram educação em saúde; saneamento ambiental,
especialmente de águas e alimentos; programas de saúde materno-infantis,
inclusive imunizações e planejamento familiar; prevenção de doenças
endêmicas locais; tratamento adequado de doenças e lesões comuns;
fornecimento de medicamentos essenciais; promoção de boa nutrição; e
medicina tradicional.

A Declaração de Alma-Ata indicou que:

I - A conquista do mais alto grau de saúde exige a intervenção de muitos outros


setores sociais e econômicos além do setor saúde;

III - A promoção e proteção da saúde da população é indispensável para o


desenvolvimento econômico e social sustentado e contribui para melhorar a
qualidade de vida e alcançar a paz mundial;

IV - A população tem o direito e o dever de participar individual e coletivamente


na planificação e na aplicação das ações de saúde;

V - A atenção primária de saúde é, ao mesmo tempo, um reflexo e uma


conseqüência das condições econômicas e das características socioculturais e
políticas do país e de suas comunidades;

VI - Compreende, pelo menos, as seguintes áreas: a educação sobre os


principais problemas de saúde e sobre os métodos de prevenção e de luta
correspondentes; a promoção do aportamento de alimentos e de uma nutrição
apropriada; um abastecimento adequado de água potável e saneamento
básico; a assistência materno-infantil, com inclusão da planificação familiar; a

37
imunização contra as principais enfermidades infecciosas; a prevenção e luta
contra enfermidades endêmicas locais; o tratamento apropriado das
enfermidades e traumatismos comuns; e a disponibilidade de medicamentos
essenciais;

VII - Inclui a participação, ademais do setor saúde, de todos os setores e


campos de atividade conexos do desenvolvimento nacional e comunitário, em
particular o agropecuário, a alimentação, a indústria, a educação, a habitação,
as obras públicas, as comunicações e outras, exigindo os esforços
coordenados de todos estes setores;

VIII - Exige e fomenta, em grau máximo, a auto-responsabilidade e a


participação da comunidade e do indivíduo na planificação, organização,
funcionamento e controle da atenção primária de saúde.

Em 1981 a Primeira Conferência Nacional de Saúde, no Canadá, introduziu a


idéia de que o contexto social era um poderoso determinante da saúde porque
moldava o comportamento individual, admitindo-se que a escolha do estilo de
vida dependia da classe social. Com isto, uma visão ampliada de promoção da
saúde implicava uma atuação sobre as iniqüidades (incluindo o status
socioeconômico), estendendo o âmbito da prevenção e apoiando o povo para
enfrentar essas circunstâncias. Assim, a promoção da saúde passou de sua
base nos estilos de vida à nova orientação centrada nos fatores sociais e
ambientais.

Em 1984, sob a liderança do ministro Jake Epp, na conferência canadense


denominada “Além do Cuidado da Saúde”, com a participação do Escritório
Europeu da Organização Mundial da Saúde (Euro/OMS), dois novos conceitos
foram introduzidos: política pública saudável e cidade ou comunidade saudável.

Com isso, admitiu-se a influência, na situação de saúde, de decisões políticas


externas a esse setor e, com a idéia de ‘cidade saudável’, avançou-se no
conceito de ‘empoderamento’ e participação social, promovendo saúde por
meio da descentralização do poder para as comunidades locais. A estratégia
de atenção primária de saúde (Alma-Ata) com enfoque multissetorial,

38
envolvimento comunitário e componentes de tecnologia apropriada reforçou a
promoção na direção da saúde ambiental.

Com essa motivação foi planejada a Primeira Conferência Internacional sobre


Promoção da Saúde, realizada em Ottawa, em novembro de 1986, em
colaboração com a OMS e a Associação Canadense de Saúde Pública. Tal
seqüência de eventos evidencia a clara inter-relação existente entre os
conceitos de atenção primária de saúde, promoção da saúde e cidades
saudáveis, como se pode observar no quadro a seguir, considerando-se os
componentes contidos em cada uma das respectivas propostas:

ALMA-ATA PROMOÇÃO DA SAÚDE CIDADE SAUDÁVEL


1973-1978 1974-1986 1984
• Outros setores • Capacidade da comunidade para • Comunidade participa dos planos para melhorar o
• Promoção/qualidade melhorar a qualidade de vida ambiente e a qualidade de vida
• Participação/planos • Participação decisória • Amplia a participação
• Atenção primária de • Políticas saudáveis • ‘Empoderamento’
saúde • Abordagem setorial • Compromisso público local
- Educação • Ambientes favoráveis • Políticas saudáveis
- Alimentação • Habilidades pessoais • Ênfase em eqüidade
- Saneamento • Reconvenção do sistema de saúde • Atenção determinante
- Materno-infantil - ênfase na eqüidade • Macrofunção social
- Imunizações - atenção determinante - trabalho e renda
- Prevenção de endemias - extensão da promoção - infra-estrutrura
- Doenças/traumatismos - prevenção, tratamento e reabilitação - desenvolvimento social
- Medicamentos - saúde e nutrição
• Tecnologia adequada
- Ação comunitária
- Autodeterminação
- Auto-responsabilidade

‘EMPODERAMENTO’
SUSTENTABILIDADE SOCIAL

Nesses três esquemas estão presentes a abordagem intersetorial, a


participação e a responsabilidade da sociedade na formulação de políticas
favoráveis à saúde e a uma qualidade de vida melhor, com ênfase em
ambientes saudáveis e eqüidade, campos em que se avançou muito pouco nos
últimos 25 anos. Nos vários pronunciamentos está presente, também, a
reorientação do sistema de serviços de saúde, mas num segundo plano, como
para indicar que, embora importante, não chega a ser considerada prioritária e
que o alcance de sua efetividade dependeria da implementação prévia de seus
primeiros componentes.

39
Entretanto, esse último – o reforço dos serviços – é o que mais se pratica no
contexto da reforma do setor saúde, embora a ênfase ainda corresponda à
atenção terciária e pouco tenha avançado a idéia da integração dos
componentes promocionais, preventivos e curativos dos serviços de saúde em
apoio à atenção primária de saúde.

A partir da Primeira Conferência, e incluindo este evento, foram realizadas sete


iniciativas multinacionais, cinco de caráter internacional/global, respectivamente
em Ottawa (1986), Adelaide (1988), Sundsvall (1991), Jakarta (1997) e México
(1999), e outras duas de caráter sub-regional, em Bogotá (1992) e Port of
Spain (1993). Elas vêm desempenhando importante papel na manutenção da
motivação e interesse sobre o tema, ao mesmo tempo em que promovem
avanços significativos com a contínua ampliação dos campos de ação e
abordagens mais efetivas para o alcance dos objetivos traçados.

Assim, o marco de referência principal da promoção da saúde, estabelecido na


primeira conferência, foi-se ampliando com novos elementos, tais como:

• a responsabilidade internacional que prevê que os países mais desenvolvidos


assegurem que suas próprias políticas resultem em impactos positivos sobre a
saúde das nações em desenvolvimento;

• a ênfase em políticas relativas à saúde da mulher, à alimentação e nutrição,


ao controle do tabaco e do álcool e à criação de ambientes favoráveis;

• a procura de eqüidade, visando a superar a pobreza e lograr um


desenvolvimento sustentável com o pagamento da dívida humana e ambiental
acumulada pelos países industrializados;

• o respeito à biodiversidade, tendo em vista a interdependência entre os seres


vivos e as necessidades de futuras gerações, com especial referência aos
povos indígenas e sua possível contribuição ambiental;

• a ampliação dos determinantes da saúde, com a consideração de fatores


transnacionais, a integração da economia global, os mercados financeiros e o
acesso aos meios de comunicação;

40
• a promoção da responsabilidade social com o ‘empoderamento’ da população
e aumento da capacidade da comunidade para atuar nesse campo;

• a definição de espaços/ambientes para a atuação no processo de promoção


da saúde (escolas, ambientes de trabalho, etc.) e o intercâmbio de informações
sobre a efetividade de estratégias nos diferentes ambientes/territórios;

• o impulso à cultura da saúde, modificando valores, crenças, atitudes e


relações que permitam a produção e utilização de ambientes saudáveis;

• a convocação e mobilização de um grande compromisso social para assumir


a vontade política de fazer da saúde uma prioridade;

• a construção de alianças e coordenação, especialmente com os meios de


comunicação que desempenham importante papel por seu considerável poder
e prestígio, na formulação de políticas e programas que influem na saúde da
população.

Enquanto esse movimento avançava no contexto mundial sob o patrocínio da


OMS, incorporando-se como um novo paradigma na conformação das funções
essenciais da Saúde Pública, no Canadá desenvolveu-se uma ampla
controvérsia entre os líderes da promoção da saúde e uma nova corrente,
denominada ‘saúde populacional’, com diferenças sutis em relação à proposta
original. Seus promotores, provenientes do campo da epidemiologia, insistiam
na necessidade de evidência demonstrativa dos resultados alcançados, que,
no caso da promoção da saúde (analisada predominantemente pelo fator estilo
de vida), pareciam insuficientes.

Sem mais detalhes sobre este debate, que vem se desenvolvendo entre 1994 e
1996, e ainda persiste, para respaldar a importância concedida ao tema, vale
informar a solução encontrada no contexto canadense: ela combina um modelo
de promoção da saúde com o de saúde populacional, numa política
tridimensional que integra os determinantes da saúde com os vários níveis de
população (do indivíduo à sociedade) e as cinco estratégias da Carta de
Ottawa (políticas públicas saudáveis, ambientes favoráveis à saúde, ação
comunitária, habilidades pessoais e reorientação do sistema de saúde).

41
Na prática, o destaque das conexões entre saúde e cuidado de saúde resulta
fundamental para a sustentabilidade dos enfoques não-médicos como meios
primários de melhorar a condição de saúde. E a possibilidade de uma
articulação em toda a amplitude do processo de atenção permitirá estabelecer
um gradiente no qual a superação de problemas críticos do passado poderá
dar lugar a uma apreciação melhor dos benefícios dessa nova saúde pública.

Apenas em 1992, na Conferência de Santa-fé de Bogotá, fórum em que as


nações latino-americanas, dentre as quais o Brasil, elegeram a eqüidade e a
solidariedade como condições indispensáveis ao processo de redução das
situações excludentes, essa relação de mútua determinação entre saúde e
desenvolvimento foi delimitada.

Passados nove anos, a eqüidade e a solidariedade são novamente apontadas,


dessa vez na Declaração do III Encontro de Cúpula das Américas, realizado
em abril de 2001, na cidade de Quebec, Canadá, como elementos importantes
para o desenvolvimento das nações americanas. Os governos signatários
desta declaração, visando a promover o desenvolvimento democrático e
garantir o bem-estar social da população, reconhecem a necessidade de
continuar direcionando esforços para diminuir as desigualdades sociais,
fortalecer o cumprimento aos direitos humanos, melhorar o acesso da
população à educação e promover a integração econômica entre os
hemisférios (Canadá, 2000).

Falar em eqüidade significa falar da geração de protagonismos, individual e


coletivo, que se estendem à responsabilização de vários níveis: governo, setor
saúde, setores sociais e econômicos, organizações não-governamentais e
voluntárias, lideranças locais e mídia.

No contexto da América Latina, o Brasil tem o desafio de transformar as


relações excludentes em sua sociedade, conciliando interesses econômicos e
propósitos sociais de bem-estar para todos. Como parte desta tarefa, o
governo brasileiro vem investindo em iniciativas de inegável alcance social,
com o objetivo de reduzir as desigualdades de acesso e de atenção às
necessidades individuais, em áreas de forte impacto no desenvolvimento do
ser humano, das comunidades e das nações, a exemplo da saúde.

42
Nesse sentido, vêm sendo direcionados esforços para a construção de um
novo relacionamento entre os serviços de saúde, os profissionais que neles
atuam, os usuários e a comunidade onde esses serviços estão localizados,
bem como para a continuidade ao processo de fortalecimento da autonomia
política e capacidade gerencial dos municípios, iniciado em 1993, que
estimulou o fortalecimento da participação social no controle do uso dos
recursos públicos. Além disso, os reflexos da implementação da Agenda 21,
nos níveis estadual e municipal, e de projetos sociais voltados à geração de
renda, melhoria das condições de vida em assentamentos rurais e urbanos,
desenvolvimento local integrado e sustentável (DLIS), evidenciaram a
necessidade da articulação intersetorial do setor saúde com demais setores da
administração pública, nos três níveis de governo.

A implantação do Projeto Promoção da Saúde, em 1998, veio atender a estas


demandas incorporando a intersetorialidade, a valorização da qualidade de
vida e a participação social como pressupostos básicos para sua atuação. Sob
tal ética, as linhas de atuação do Projeto direcionam-se para a construção de
municípios mais saudáveis, de escolas e empresas promotoras da saúde,
qualificação de gestores municipais e a promoção de estilos de vida que
proporcionem um envelhecimento saudável. A proposta brasileira de Promoção
da Saúde considera, também, a educação e a comunicação em saúde como
elementos preponderantes para potencializar, de forma matricial, os esforços
das demais linhas de atuação.

A construção da política nacional de Promoção da Saúde constitui uma


prioridade no âmbito do Ministério da Saúde (MS). Embora somente há pouco
mais de dois anos a Promoção tenha se configurado formalmente na
instituição, diversos municípios vêm desenvolvendo ações específicas nesta
área. Ao mesmo tempo, os pressupostos da Promoção da Saúde foram
incorporados nos princípios e diretrizes de iniciativas do MS, como os
programas Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e Saúde da Família (PSF),
focados na reorientação dos serviços de saúde, ampliação do acesso da
população aos mesmos e vigilância à saúde das famílias e dos seus entornos.
Na medida em que promovem articulações e fortalecem alianças em torno da
Promoção da Saúde e, conseqüentemente, da qualidade de vida, o PACS e o

43
PSF constituem, também, mecanismo de geração de emprego e renda no setor
saúde, processo de interiorização da saúde e comprometimento com a
intersetorialidade.

Até abril de 2001, 158.934 agentes comunitários de saúde, trabalhadores


assalariados recrutados e atuantes em suas comunidades, mediante visitas
domiciliares, identificaram, encaminharam, orientaram e acompanharam
procedimentos de saúde de mais de 90 milhões de pessoas, cobrindo cerca de
80% do território brasileiro e o equivalente a 50% da população. Por sua vez,
compostas minimamente por um médico, um enfermeiro, um auxiliar de
enfermagem e cinco a seis agentes de saúde, as 13.337 equipes de Saúde da
Família assistem pouco mais de 46 milhões de pessoas, aproximadamente
30% da população.

A abordagem em Saúde da Família representa uma mudança no paradigma do


modelo assistencial no país. Ao promover um novo relacionamento entre os
serviços e a população e ao buscar o entendimento dos determinantes sociais
do processo saúde-doença, os profissionais de saúde passam a perceber o
indivíduo nos seus diversos ciclos de vida, inserido no contexto das relações
familiares e das relações com a comunidade.

A Promoção da Saúde fundamenta-se na percepção de cada indivíduo e de


cada comunidade acerca dos conhecimentos científicos das práticas de saúde
e na aplicação destes conhecimentos, o que leva a uma prática coletiva
fundamentada no autoconhecimento e no autocuidado, numa evolução
constante na busca do saber viver.

Esta visão contrapõe-se à idéia de que cada indivíduo é, por si só, responsável
por sua saúde ou ausência dela. Considerar estilos de vida não saudáveis –
inexistência de recreação e exercícios físicos, excesso de alimentação,
consumo de bebidas alcoólicas, fumo, dependência de drogas e riscos
ocupacionais (inadaptação ao trabalho, imprudência ao dirigir) – como riscos
autocriados merece cautela. Sob essa perspectiva, intervenções individuais
‘descontextualizam’ o comportamento de risco e falham no investimento de
recursos humanos, materiais e financeiros, uma vez que tais comportamentos
são socialmente gerados e mantidos. Tais intervenções, resguardada a sua

44
importância, não podem ser separadas dos aspectos mais abrangentes como
políticas governamentais, prioridades organizacionais e comportamentos
profissionais.

As investigações vêm demonstrando que uma estratégia integral dirigida à


população é mais efetiva e eficaz do que uma ação no nível de alto risco
individual.

Neste caminhar em direção ao desenvolvimento e à redução das situações


excludentes, o Brasil já detém resultados positivos na mudança do modelo
assistencial, no fortalecimento da autonomia administrativa dos municípios e na
implementação dos níveis de participação social. No entanto, o país, como
outras nações latino-americanas, ainda apresenta um quadro epidemiológico
marcado pela persistência e ressurgimento de doenças endêmicas e
transmissíveis, pelo incremento de doenças associadas ao crescente processo
de urbanização e a agravos decorrentes de causas externas, como acidentes e
violências.

Por esta razão, os projetos prioritários da Promoção da Saúde no Brasil


focalizam a construção de municípios mais saudáveis, comprometidos com a
preservação do meio ambiente, a busca pela melhor qualificação dos gestores
municipais, a redução da morbi-mortalidade por acidentes de trânsito, a
violência na família e na sociedade, a promoção da atividade física para
escolares, trabalhadores, adultos e idosos (para estes últimos, é vista também
como estratégia para a prevenção e controle de doenças crônico-
degenerativas), a capacitação de comunicadores sociais e de profissionais da
grande imprensa, a produção de materiais informativos para professores do
ensino fundamental, escolares, radialistas.

O desenho de estratégias de comunicação é, sem dúvida, um instrumento de


destaque na implementação da Promoção da Saúde. Com base no
entendimento de que os estilos de vida da população não constituem riscos
autocriados, a abordagem da comunicação precisa também privilegiar os
aspectos educativos em vez de valorizar somente os aspectos informativos,
haja vista que a informação em si não provoca mudança de comportamento.
Ao privilegiar os aspectos educativos, a comunicação focaliza o receptor – seus

45
desejos e expectativas, o conhecimento anterior sobre o tema, suas atitudes e
percepções. Dessa forma, as ações de Promoção da Saúde ficam mais
próximas de levar indivíduos e populações a transformarem hábitos e estilos de
vida, construídos com base no exercício da cidadania, gerando, assim,
comportamentos inovadores. No contexto da participação popular e da
mobilização de gestores e profissionais de saúde, essa postura favorece o
desenho de ações mais afinadas com o universo destes importantes atores.

Definitivamente, o Brasil está engajado e empenhado em consolidar a


Promoção da Saúde, entendendo que tal estratégia é um processo político e
social que requer o envolvimento de cada uma e de todas as pessoas.

Os princípios ordenadores dos sistemas de saúde eram, já no século XIX:

- Integralidade do atendimento ofertado à população, com a valorização de


programas de promoção à saúde e de prevenção de doenças.

Prioridade para ações de saúde pública;

- Hierarquização e regionalização do atendimento: o sistema organizar-se-ia


por regiões sanitárias em um sistema de acesso por níveis de complexidade.

O primeiro nível era denominado Atenção Primária à Saúde, e era composto


por uma rede de centros de saúde, localizados em bairros, que deveriam
encarregar- se de 80% dos problemas de saúde sem ajuda dos hospitais.

Depois estaria a atenção secundária, composta por hospitais gerais, de


urgência e centros de especialidade. Cada conjunto desses se ligaria a um
conjunto de centros de saúde localizados em um dado território, formando um
distrito sanitário.

Finalmente, haveria alguns hospitais de alta complexidade, que seriam


referência para populações maiores, originárias de vários distritos ou
municípios.

Esse desenho espalhou-se pelo mundo, demonstrando-se uma alternativa


racional para estender o atendimento com custos suportáveis.

46
Inglaterra, Suécia, Austrália, Canadá, a extinta URSS, Cuba e uma série de
outros países adotaram variações desse modelo. Uma exceção a essa regra foi
os EUA, que insistiram em manter a separação entre saúde pública e mercado
médico.

O Brasil adotou esse modelo a partir de 1988, com a nova Constituição. O


Sistema Único de Saúde foi regulamentado pela lei nº 8080, de 1990.

Promoção da saúde: ênfase na adoção de hábitos saudáveis por parte da


população brasileira, de forma a internalizar a responsabilidade individual da
prática de atividade física regular, alimentação saudável e combate ao
tabagismo.

Atenção básica à saúde: Consolidar e qualificar a estratégia da Saúde da


Família como modelo de atenção básica à saúde e como centro ordenador das
redes de atenção à saúde do SUS.

A Atenção Básica caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no


âmbito individual e coletivo, que abrangem a promoção e a proteção da saúde,
a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a
manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas
gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em
equipe, dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais
assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente
no território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de elevada
complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde
de maior freqüência e relevância em seu território. É o contato preferencial dos
usuários com os sistemas de saúde. Orienta-se pelos princípios da
universalidade, da acessibilidade e da coordenação do cuidado, do vínculo e
continuidade, da integralidade, da responsabilização, da humanização, da
equidade e da participação social.

A Atenção Básica considera o sujeito em sua singularidade, na complexidade,


na integralidade e na inserção sócio-cultural e busca a promoção de sua
saúde, a prevenção e tratamento de doenças e a redução de danos ou de

47
sofrimentos que possam comprometer suas possibilidades de viver de modo
saudável.

A Atenção Básica tem a Saúde da Família como estratégia prioritária para sua
organização de acordo com os preceitos do Sistema Único de Saúde.

A Atenção Básica tem como fundamentos:

I - possibilitar o acesso universal e contínuo a serviços de saúde de qualidade e


resolutivos, caracterizados como a porta de entrada preferencial do sistema de
saúde, com território adscrito de forma a permitir o planejamento e a
programação descentralizada, e em consonância com o princípio da eqüidade;

II - efetivar a integralidade em seus vários aspectos, a saber: integração de


ações programáticas e demanda espontânea; articulação das ações de
promoção à saúde, prevenção de agravos, vigilância à saúde, tratamento e
reabilitação, trabalho de forma interdisciplinar e em equipe, e coordenação do
cuidado na rede de serviços;

III - desenvolver relações de vínculo e responsabilização entre as equipes e a


população adscrita garantindo a continuidade das ações de saúde e a
longitudinalidade do cuidado;

IV - valorizar os profissionais de saúde por meio do estímulo e do


acompanhamento constante de sua formação e capacitação;

V - realizar avaliação e acompanhamento sistemático dos resultados


alcançados, como parte do processo de planejamento e programação; e

VI - estimular a participação popular e o controle social.

Visando à operacionalização da Atenção Básica, definem- se como áreas


estratégicas para atuação em todo o território nacional a eliminação da
hanseníase, o controle da tuberculose, o controle da hipertensão arterial, o
controle do diabetes mellitus, a eliminação da desnutrição infantil, a saúde da
criança, a saúde da mulher, a saúde do idoso, a saúde bucal e a promoção da
saúde.

48
Outras áreas serão definidas regionalmente de acordo com prioridades e
pactuações definidas nas CIBs.

Para o processo de pactuação da atenção básica será realizado e firmado o


Pacto de Indicadores da Atenção Básica, tomando como objeto as metas
anuais a serem alcançadas em relação a indicadores de saúde acordados. O
processo de pactuação da Atenção Básica seguirá regulamentação específica
do Pacto de Gestão.

Os gestores poderão acordar nas CIBs indicadores estaduais de Atenção


Básica a serem acompanhados em seus respectivos territórios.

A promoção da saúde, como uma das estratégias de produção de saúde, ou


seja, como um modo de pensar e de operar articulado às demais políticas e
tecnologias desenvolvidas no sistema de saúde brasileiro, contribui na
construção de ações que possibilitam responder às necessidades sociais em
saúde.

No SUS a estratégia de promoção da saúde é retomada como uma


possibilidade de enfocar os aspectos que determinam o processo saúde-
adoecimento em nosso país como, por exemplo: violência, desemprego,
subemprego, falta de saneamento básico, habitação inadequada e/ou ausente,
dificuldade de acesso à educação, fome, urbanização desordenada, qualidade
do ar e da água ameaçada, deteriorada; e potencializar formas mais amplas de
intervir em saúde.

Entende-se, portanto, que a promoção da saúde é uma estratégia de


articulação transversal na qual se confere visibilidade aos fatores que colocam
a saúde da população em risco e às diferenças entre necessidades, territórios
e culturas presentes no nosso país, visando à criação de mecanismos que
reduzam as situações de vulnerabilidade, defendam radicalmente a equidade e
incorporem a participação e o controle sociais na gestão das políticas públicas.

Nesse sentido, a elaboração da Política Nacional de Promoção da Saúde é


oportuna posto que seu processo de construção e de
implantação/implementação nas várias esferas de gestão do SUS e na
interação entre o setor sanitário e os demais setores das políticas públicas e da

49
sociedade provoca a mudança no modo de organizar, planejar, realizar,
analisar e avaliar o trabalho em saúde.

Na verdade, o texto da Declaração de Alma-Ata, ao ampliar a visão do cuidado


da saúde em sua dimensão setorial e de envolvimento da própria população,
superava o campo de ação dos responsáveis pela atenção convencional dos
serviços de saúde. Entretanto, estes últimos, instintivamente, concediam maior
prioridade à perpetuação das atividades com as quais estavam mais
familiarizados, com os oito elementos mais diretamente relacionados com os
problemas de saúde – aqui considerada no seu sentido clássico de ausência
de enfermidade, e não como o completo bem-estar físico, mental e social que a
própria OMS havia consagrado 35 anos antes, num gesto talvez
excessivamente otimista.

A atenção primária à saúde foi definida como:

Atenção essencial à saúde baseada em tecnologia e métodos práticos,


cientificamente comprovados e socialmente aceitáveis, tornados
universalmente acessíveis a indivíduos e famílias na comunidade por
meios aceitáveis para eles e a um custo que tanto a comunidade como
o país possa arcar em cada estágio de seu desenvolvimento, um
espírito de autoconfiança e autodeterminação. É parte integral do
sistema de saúde do país, do qual é função central, sendo o enfoque
principal do desenvolvimento social e econômico global da
comunidade. É o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e
da comunidade com o sistema nacional de saúde, levando a atenção à
saúde o mais próximo possível do local onde as pessoas vivem e
trabalham, constituindo o primeiro elemento de um processo de
atenção continuada à saúde. (Organização Mundial da Saúde, 1978)

Apesar dessa evolução, é importante notar que a proposição era correta e


desde o princípio apontava para uma nova concepção de promoção da saúde,
que, embora não totalmente delineada, já valorizava a saúde como
componente central do desenvolvimento humano, ressaltando, sem usar a
terminologia de determinantes da saúde, os fatores necessários para assegurar
a qualidade de vida e o direito ao bem-estar social.

O outro elemento que veio a reforçar essa evolução foi o Relatório Lalonde,
com a caracterização do campo da saúde e a evidência de que o tradicional
padrão assistencial era o componente deste campo que menos efeito parecia
ter para promover uma saúde melhor. Com esse documento, passaria a ser
50
concedida maior importância aos outros três componentes – biologia humana,
ambiente e hábitos de vida. Com isto, já na 34ª Assembléia Mundial da Saúde,
na elaboração do Sétimo Programa de Trabalho da OMS (1984-89), foram
incorporados os determinantes da saúde.

A essa altura, na América Latina, essa observação já vinha sendo amplamente


disseminada, em especial na área acadêmica, nos trabalhos de Juan Cesar
Garcia, Cristina Laurell, Jaime Breilh, Cecília Donangelo e Sérgio Arouca, que,
entre vários outros, no desenvolvimento do ensino da medicina preventiva e
social, introduziram importante evidência, resultante da expansão da pesquisa
no campo das ciências sociais aplicadas à saúde. Obviamente, a reação do
que na época era visto como o Terceiro Mundo não alcançou maior
repercussão na evolução das práticas discutidas nos países centrais. No Sul,
destacavam-se as causas sociais e, no Norte, discutiam-se possíveis
abordagens individuais, sem que qualquer interação se viabilizasse entre os
principais atores da época.

SISTEMAS DE SAÚDE

Todo sistema de serviços de saúde possui duas metas principais. A primeira é


otimizar a saúde da população por meio do emprego do estado mais avançado
do conhecimento sobre a causa das enfermidades, manejo das doenças e
maximização da saúde. A segunda meta, e igualmente importante, é minimizar
as disparidades entre subgrupos populacionais, de modo que determinados
grupos não estejam em desvantagem sistemática em relação ao seu acesso
aos serviços de saúde e ao alcance de um ótimo nível de saúde.

Considerando estes fatos, a Organização Mundial da Saúde adotou um


conjunto de princípios para construir a base da atenção primária dos serviços
de saúde. Conhecida como a Carta de Lubliana que propõe que os sistemas de
atenção de saúde deveriam ser:

 dirigidos por valores de dignidade humana, eqüidade,


solidariedade e ética profissional;
 direcionados para a proteção e promoção da saúde;

51
 centrados nas pessoas, permitindo que os cidadãos influenciem
os serviços de saúde e assumam a responsabilidade por sua
própria saúde;
 focados na qualidade, incluindo a relação custo-efetividade;
baseados em financiamento sustentável, para permitir a cobertura
universal e o acesso eqüitativo; e
 direcionados para a atenção primária.

Em quase todos os países, vemos as profissões da área de saúde ficarem


mais fragmentadas, com um crescente estreitamento de interesses e
competências e um enfoque sobre enfermidades ou tipos de enfermidades
específicas em vez de sobre a saúde geral das pessoas e comunidades.

A atenção especializada geralmente exige mais recursos do que a atenção


básica porque é enfatizado o desenvolvimento e o uso de tecnologia cara para
manter viva a pessoa enferma em vez de dar ênfase aos programas de
prevenção de enfermidades ou redução do desconforto causado pelas doenças
mais comuns, que não ameaçam a vida. Embora seja possível que a tendência
à especialização baseada no conhecimento mais atual ofereça uma atenção
altamente eficaz a doenças individuais, é improvável que produza uma atenção
básica altamente efetiva. Por que isso acontece? A especialização direcionada
ao tratamento da enfermidade não pode maximizar a saúde porque a
prevenção da enfermidade e a promoção de um ótimo funcionamento
transcendem as enfermidades específicas e requerem uma perspectiva mais
ampla do que a que pode ser alcançada pelo especialista na enfermidade. A
atenção médica eficaz não está limitada ao tratamento da enfermidade em si;
deve considerar o contexto no qual a doença ocorre e no qual o paciente vive.
Além disso, raramente as enfermidades existem de forma isolada,
especialmente quando apresentadas ao longo do tempo. Assim, os
especialistas em enfermidades podem oferecer a atenção mais apropriada para
as enfermidades específicas dentro de sua área de competência especial, mas
um profissional de atenção primária deve integrar a atenção para a variedade
de problemas de saúde que os indivíduos apresentam com o tempo.

52
Um sistema de saúde orientado para a subespecialização possui outro
problema: ele ameaça os objetivos de eqüidade. Nenhuma sociedade possui
recursos ilimitados para fornecer serviços de saúde. A atenção
subespecializada é mais cara do que a atenção primária e, portanto, menos
acessível para os indivíduos com menos recursos poderem pagar por ela. Além
disso, os recursos necessários para a atenção altamente técnica orientada
para a enfermidade competem com aqueles exigidos para oferecer serviços
básicos, especialmente para as pessoas que não podem pagar por eles.

Ao contrário, a atenção primária envolve o manejo de pacientes que,


geralmente, têm múltiplos diagnósticos e queixas confusas que não podem ser
encaixadas em diagnósticos conhecidos e a oferta de tratamentos que
melhorem a qualidade global da vida e de seu funcionamento.

A saúde é, portanto, vista como um recurso para a vida diária, não o objetivo
dela; abranger os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades
físicas, é um conceito positivo.

A saúde possui muitos tipos de determinantes, dentre eles se encontram: as


características culturais e comportamentais da população e dos pacientes, o
ambiente social e físico e a prática médica. A estrutura da saúde se dá na
prática médica; a atenção (ou processos) está na interseção de dois destes
três elementos (pacientes e médicos) e os resultados, na integração dos três.

Conforme indicado acima, a saúde de um indivíduo ou uma população é


determinada por sua combinação genética, mas grandemente modificado pelo
ambiente social e físico, por comportamentos que são cultural ou socialmente
determinados e pela natureza da atenção à saúde oferecida.

A saúde está diretamente associada à vantagem social em termos absolutos.


Quanto mais recursos sociais de indivíduos e comunidades, maior a
probabilidade de uma saúde melhor. Além disso, a privação social relativa,
mais do que a absoluta, também está associada a uma saúde pior. Ou seja,
quanto maiores as disparidades na riqueza em qualquer população, maior as
disparidades na saúde.

53
Com base apenas na teoria, é provável que a obtenção de efetividade e
eqüidade exija que o sistema de saúde tenha uma forte orientação de atenção
primária.

Para que a atenção primária otimize a saúde, ela deve enfocar a saúde das
pessoas na constelação dos outros determinantes de saúde, ou seja, no meio
social e físico no qual as pessoas vivem e trabalham, em vez de enfocar
apenas sua enfermidade individual. As unidades de atenção primária obtêm a
eqüidade fornecendo atenção no nível mais apropriado.

A atenção primária é aquele nível de um sistema de serviço de saúde que


oferece a entrada no sistema para todas as novas necessidades e problemas,
fornece atenção sobre a pessoa (não direcionada para a enfermidade) no
decorrer do tempo, fornece atenção para todas as condições, exceto as muito
incomuns ou raras, e coordena ou integra a atenção fornecida em algum outro
lugar ou por terceiros. Assim, é definida como um conjunto de funções que,
combinadas, são exclusivas da atenção primária. A atenção primária também
compartilha características com outros níveis dos sistemas de saúde:
responsabilidade pelo acesso, qualidade e custos; atenção à prevenção, bem
como ao tratamento e à reabilitação; e trabalho em equipe. A atenção primária
não é um conjunto de tarefas ou atividades clínicas exclusivas; virtualmente,
todos os tipos de atividades clínicas (como diagnóstico, prevenção, exames e
várias estratégias para o monitoramento clínico) são características de todos os
níveis de atenção. Em vez disso, a atenção primária é uma abordagem que
forma a base e determina o trabalho de todos os outros níveis dos sistemas de
saúde. A atenção primária aborda os problemas mais comuns na comunidade,
oferecendo serviços de prevenção, cura e reabilitação para maximizar a saúde
e o bem-estar. Ela integra a atenção quando há mais de um problema de
saúde e lida com o contexto no qual a doença existe e influencia a resposta
das pessoas a seus problemas de saúde. É a atenção que organiza e
racionaliza o uso de todos os recursos, tanto básicos como especializados,
direcionados para a promoção, manutenção e melhora da saúde.

Vuori sugeriu quatro formas de visualizar a atenção primária: como um


conjunto de atividades, como um nível da atenção, como uma estratégia para

54
organizar a atenção à saúde e como uma filosofia que permeia a atenção à
saúde. Já que existem poucas atividades que sejam exclusivas da atenção
primária, a primeira abordagem é inadequada. Os níveis de atenção, as
estratégias para organização da atenção à saúde e uma filosofia estão inter-
relacionados.

A atenção primária difere da atenção por consulta, de curta duração (atenção


secundária) e do manejo da enfermidade a longo prazo (atenção terciária) por
várias características. A atenção primária lida com os problemas mais comuns
e menos definidos, geralmente em unidades comunitárias como consultórios,
centros de saúde, escolas e lares. Os pacientes têm acesso direto a uma fonte
adequada de atenção que é continuada ao longo do tempo, para diversos
problemas e que inclui a necessidade de serviços preventivos.

Comparada à Medicina subespecializada, a atenção primária é menos


intensiva, tanto em capital como em trabalho, e menos hierárquica em sua
organização. Portanto, é inerentemente mais adaptável e capaz de responder
às necessidades sociais de saúde em mudança.

Na atenção primária, ao contrário, geralmente, o paciente é conhecido pelo


médico, sendo que, a entrada no sistema é dada pelo paciente,
freqüentemente com queixas muito pouco específicas e vagas. A principal
tarefa é a elucidação do problema do paciente e a obtenção de informações
que levem a um diagnóstico e à escolha do manejo mais apropriado. Médicos
da atenção primária, quando comparados com especialistas, lidam com uma
variedade mais ampla de problemas, tanto com pacientes individuais como
com a população com a qual trabalham. Como estão mais próximos do
ambiente do paciente do que os especialistas estão em uma posição melhor
para avaliar o papel dos múltiplos e interativos determinantes da doença e da
saúde.

55
Tabela 1.1

Da atenção médica primária à atenção primária à saúde

Convencional Atenção Primária

_______________________________________________________________

Enfoque

Doença Saúde

Cura Prevenção, Atenção e Cura

_______________________________________________________________

Conteúdo

Tratamento Promoção da saúde

Atenção por episódio Atenção continuada

Problemas específicos Atenção abrangente

_______________________________________________________________

Organização

Especialistas Clínicos gerais

Médicos Grupos de outros profissionais

Consultório individual Equipe

_______________________________________________________________

Responsabilidade

Apenas setor de saúde Colaboração inter-setorial

Domínio pelo profissional Participação da comunidade

Recepção passiva Auto- responsabilidade

56
Podemos supor que nas unidades de atenção primária haja uma maior
porcentagem de consultas classificadas como relacionadas à prevenção.

A abordagem descritiva (empírica) para caracterizar a atenção médica foi mais


bem resumida por White, que distinguiu a atenção primária, secundária e
terciária pela natureza dos problemas de saúde, pelo local da prestação do
atendimento, pelo padrão de encaminhamento, pela duração da
responsabilidade, pelas fontes de informação, pelo uso de tecnologia, pela
orientação do interesse e pela necessidade de treinamento.

Estas abordagens, embora geralmente úteis para o propósito de ilustrar a


singularidade da atenção primária, não oferecem uma base apropriada para o
estabelecimento de metas para obtenção de um alto nível de desempenho dos
serviços de atenção primária.

Abordagens mais novas para avaliação da obtenção de uma melhor atenção


primária mudam de uma abordagem de conteúdo e orientada para tarefas para
uma abordagem que considera o que a atenção primária deveria estar
fornecendo no contexto das características dos sistemas de serviço de saúde.

As funções mais importantes da atenção primária podem ser medidas de uma


forma que ofereça uma base para o estabelecimento de metas e
aperfeiçoamento contínuo em sua realização.

A atenção primária é, agora, amplamente aceita como a oferta da Medicina ao


primeiro contato; a suposição de responsabilidade longitudinal pelo paciente
sem considerar a presença ou ausência de doença; e a integração de aspectos
físicos, psicológicos e sociais de saúde aos limites da capacitação da equipe
de saúde.

A integralidade reconhece que a atenção primária é a via comum e preferida


dentro do sistema de atenção à saúde.

A Associação Médica Canadense considera, explicitamente, a atenção primária


como o ponto de entrada para o sistema de atenção à saúde, estando
interrelacionada aos outros componentes do sistema. Define a atenção
primária como consistindo de avaliação de um paciente ao primeiro contato e a

57
oferta de atenção continuada para uma ampla variedade de questões de
saúde, além de incluir a abordagem de problemas de saúde, prevenção e
promoção de saúde e apoio continuado, com intervenções familiares e
comunitárias, quando necessário. Difere, assim, do relatório do Instituto de
Medicina ao distinguir a atenção ao primeiro contato como uma função crucial e
ao incluir intervenções comunitárias na definição das funções.

A Organização Mundial da Saúde reconhece, explicitamente, o papel da


atenção primária como um sistema de atenção que oferece atendimento
acessível e aceitável para os pacientes; assegura a distribuição eqüitativa de
recursos de saúde; integra e coordena serviços curativos, paliativos,
preventivos e promotores de saúde; controla, de forma racional, a tecnologia da
atenção secundária e os medicamentos; e aumenta a relação custo-efetividade
dos serviços por meio de 12 características:

1. Geral: não é restrita a faixas etárias ou tipos de problemas ou condições

2. Acessível: em relação ao tempo, lugar, financiamento e cultura

3. Integrada: curativa, reabilitadora, promotora de saúde e preventiva de


enfermidades

4. Continuada: longitudinalidade ao longo de períodos substanciais de vida

5. Equipe: o médico é parte de um grupo multidisciplinar

6. Holística: perspectivas físicas, psicológicas e sociais dos indivíduos, das


famílias e das comunidades

7. Pessoal: atenção centrada na pessoa e não na enfermidade

8. Orientada para a família: problemas compreendidos no contexto da família e


da rede social

9. Orientada para a comunidade: contexto de vida na comunidade local;


consciência de necessidades de saúde na comunidade; colaboração com
outros setores para desencadear mudanças positivas de saúde

58
10. Coordenada: coordenação de toda a orientação e apoio que a pessoa
recebe

11. Confidencial

12. Defensora: do paciente em questões de saúde sempre e em relação a


todos os outros provedores de atenção à saúde.

Reconhece, ainda, que determinadas condições estruturais, melhoras


organizacionais e questões de desenvolvimento profissional devem ser
consideradas na oferta de atenção primária de alta qualidade. As condições
estruturais incluem a clara definição de uma unidade de saúde em que os
membros da população têm o direito de optar e mudar a escolha de
profissionais de atenção primária, a capacidade de colocar uma unidade de
saúde na comunidade em que sua população reside, atenção ao primeiro
contato em que o acesso a especialistas é dado por meio do profissional de
saúde de atenção primária e um sistema de remuneração equilibrado para
oferecer toda a variedade de serviços necessários para a população.

Tanto a visão de atenção primária centrada na população como na pessoa


oferecem uma base para um sistema normativo de medição das funções de
atenção primária dentro de um sistema de serviços de saúde.

Os quatro elementos estruturais relevantes à atenção primária são


acessibilidade, variedade de serviços, população eletiva e continuidade. São
definidos como segue:

Acessibilidade: envolve a localização do estabelecimento próximo da


população a qual atende, os horários e dias em que está aberto para atender, o
grau de tolerância para consultas não-agendadas e o quanto a população
percebe a conveniência destes aspectos da acessibilidade.

Variedade de serviços: é o pacote de serviços disponíveis para a população,


bem como aqueles serviços que a população acredita que estejam disponíveis.

Definição da população eletiva: inclui o quanto o serviço de atenção à saúde


pode identificar a população pela qual assume responsabilidade e o quanto os
indivíduos da população atendida sabem que são considerados parte dela.

59
Continuidade: consiste nos arranjos pelos quais a atenção é oferecida numa
sucessão ininterrupta de eventos. A continuidade pode ser alcançada por
intermédio de diversos mecanismos: um profissional que atende ao paciente ou
um prontuário médico que registra o atendimento prestado, um registro
computadorizado ou mesmo um prontuário trazido pelo paciente. O quanto o
estabelecimento oferece tais arranjos e a percepção de sua obtenção pelos
indivíduos na população indica a extensão da continuidade da atenção, seja da
população, seja do indivíduo.

A longitudinalidade pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e


seu uso ao longo do tempo. Assim, a unidade de atenção primária deve ser
capaz de identificar a população eletiva, bem como os indivíduos dessa
população que deveriam receber seu atendimento da unidade, exceto quando
for necessário realizar uma consulta fora ou fazer um encaminhamento. Além
disso, o vínculo da população com sua fonte de atenção deveria ser refletida
em fortes laços interpessoais que refletissem a cooperação mútua entre as
pessoas e os profissionais de saúde

A integralidade implica que as unidades de atenção primária devem fazer


arranjos para que o paciente receba todos os tipos de serviços de atenção à
saúde, mesmo que alguns possam não ser oferecidos eficientemente dentro
delas. Isto inclui o encaminhamento para serviços secundários para consultas,
serviços terciários para manejo definitivo de problemas específicos e para
serviços de suporte fundamentais, tais como internação domiciliar e outros.

Embora cada unidade de atenção primária possa definir diferentemente sua


própria variedade de serviços, cada uma deveria explicitar sua
responsabilidade tanto para a população de pacientes como para a equipe,
bem como reconhecer as situações para as quais os serviços estão
disponíveis. A equipe deveria oferecer e reconhecer a necessidade de serviços
preventivos e de serviços que lidem com sintomas, sinais e diagnósticos de
doenças manifestas.

Também deveria reconhecer adequadamente problemas de todos os tipos,


sejam eles funcionais, orgânicos ou sociais. Este último tipo é particularmente

60
importante, já que todos os problemas de saúde ocorrem dentro de um
ambiente social que freqüentemente predispõe ou causa enfermidades.

A coordenação (integração) da atenção requer alguma forma de continuidade,


seja por parte dos profissionais, seja por meio de prontuários médicos, ou
ambos, além de reconhecimento de problemas (um elemento processual). Por
exemplo, o estado de problemas observado em consultas anteriores ou
problemas pelos quais houve algum encaminhamento para outros profissionais
deveria ser avaliado nas consultas subseqüentes. Este reconhecimento de
problemas será facilitado se o mesmo profissional examinar o paciente no
acompanhamento ou se houver um prontuário médico que esclareça estes
problemas. Assim, tanto a continuidade como o reconhecimento de problemas
são necessários para avaliar a coordenação da atenção.

5 PSICOLOGIA DA SAÚDE: A INSTITUIÇÃO HOSPITALAR; ÉTICA


EM SAÚDE E NO CONTEXTO HOSPITALAR.

Nas relações entre profissionais de saúde-instituição, especialmente na


instituição hospitalar, evidencia-se uma multiplicidade de saberes que
expressam particularidades das diversas lógicas que orientam as profissões e
as dinâmicas dos serviços. Desta perspectiva a integralidade supõe uma
capacidade de agir através de equipes multidisciplinares, nas quais haja uma
efetiva conjugação dos diversos saberes e práticas. Em especial, a gestão da
instituição tem papel fundamental na maneira pela qual os profissionais terão
uma participação mais ou menos articulada e integrada. Um estilo de gestão
que favoreça uma adequada coordenação da multiplicidade de lógicas e de
ações, que promova relações de trabalho mais democráticas, e com maior grau
de participação dos profissionais na definição de caminhos e propostas para o
funcionamento da instituição, oferecerá maiores condições de cuidado integral.

No entanto, aqui também esta tarefa não é nada fácil. Cada vez mais serviços
e profissões se especializam, produzem conhecimentos específicos, ações

61
desarticuladas, e organizam-se segundo uma hierarquização na qual o saber
do médico tem posição superior e central frente às demais áreas. Este quadro
reforça a fragmentação do processo de trabalho, produz insatisfação dos
profissionais quanto às suas condições de trabalho e enquanto sujeitos e
agentes de sua prática, favorecendo o descompromisso com o sofrimento dos
usuários e a fragilização das relações entre os profissionais.

Da perspectiva do lugar da instituição dentro do sistema de saúde a


integralidade supõe uma articulação e comunicação entre instituições que
garanta uma complementaridade de ações entre os diversos níveis de
complexidade do sistema. Aqui contamos também com as lógicas específicas
de cada nível de complexidade funcionando com a mesma fragmentação que
caracteriza a dinâmica interna das instituições e a relação entre as instituições.
Esta desarticulação dificulta consideravelmente uma complementaridade de
serviços e um fluxo integrado de funcionamento. A realidade do sistema público
de saúde, ainda muito burocratizado e verticalizado, tem muito a caminhar no
sentido da integralidade.

É no interior das instituições de saúde e nas práticas que ali ocorrem que é
possível a constituição de espaços de acolhimento destas tensões e de
produção de novas alternativas de funcionamento. Isto implica o
reconhecimento do valor da produção de recortes e de criação de “espaços
locais” para a produção de integralidade. Espaços locais que possam produzir
efeitos nas lógicas instituídas e nas tensões entre elas, seja no sentido de
produção de mudanças, seja na produção de consensos, seja na manutenção
das diferenças com possibilidade de diálogo. A idéia de produção de espaços
locais não se sustenta caso não comporte uma dimensão relacional
envolvendo atores tanto internos quanto externos a esse espaço, ou seja, estes
espaços só se definem em relação a uma teia de inter-relações que compõem
o contexto do qual estão inseridos.

A instalação destes espaços como dispositivos para o exercício de


integralidade tem como pano de fundo uma realidade marcada por uma série
de fatores que trazem enormes desafios para o funcionamento hospitalar. Entre
eles estão aqueles decorrentes dos condicionamentos da administração

62
pública, da complexidade relativa à organização do trabalho em si e das ações
específicas de cada área desse trabalho, de questões estruturais como a
importância política conferida ao setor, de questões de limitações para a
organização interna relativas a recursos financeiros, recursos humanos,
padrões de gestão e de trabalho.

De modo geral, os hospitais têm uma estrutura verticalizada e burocrática, com


poder de decisões bastante centralizado. É composto por setores segmentados
a partir de especialidades técnicas e submetidos ao saber médico. O
funcionamento desses setores é marcado por interesses e objetivos próprios
que lhe conferem isolamento em relação às outras áreas e ao todo da
instituição. A multiplicidade de ações específicas que compõem cada serviço
muitas vezes não conta com uma coordenação e organização do trabalho.

A partir da consideração deste quadro mais genérico do contexto externo e


interno das instituições hospitalares, impõe-se, em direção complementar a
esta, um reconhecimento das enormes discrepâncias entre as realidades
particulares de cada organização. Sabemos das grandes diferenças existentes
em cada hospital, ou mesmo das diferenças internas entre seus diversos
setores e serviços. A experiência obtida com a implantação do PNHAH
confirmou aquilo que já sabíamos desde o princípio de sua criação: não existe
um modelo único de proposta de intervenção que seja adequado a qualquer
hospital ou que possa ser operacionalizado de forma burocrática e
descontextualizado. O respeito à história da instituição, às suas características
e singularidades é fundamental para que haja um verdadeiro engajamento dos
profissionais na criação e implantação de qualquer nova proposta de
funcionamento. O desenho desta proposta precisa ser feito artesanalmente,
com a participação de representantes do maior número possível de áreas,
serviços e categorias profissionais. A participação efetiva do gestor é fator
decisivo para a institucionalização da ação a ser desenvolvida e, portanto, para
sua sustentabilidade.

O modo de construção destes grupos e a lógica de seu funcionamento


oferecem boas pistas para propostas que visem promover articulações e fluxos
através do fortalecimento dos vínculos entre pessoas, setores e serviços e que

63
busquem contribuir para a realização de transformações institucionais no
sentido de estabelecer relações mais democráticas e responsáveis e de
oferecer um cuidado integral aos usuários.

Há quem diga que "O psicológo é o profissional da saúde que tem o


estetoscópio para auscultar o Silêncio do Sofrimento".

Aproximadamente a partir de 1982, a rede Pública de Saúde passou a receber


um novo tipo de profissional, o Psicólogo. Por sua vez, as Instituições
particulares, gradativamente, vêm abrindo espaço para a sua inserção.

A Psicologia Hospitalar é um campo da área da saúde que atua como


amenizador da hospitalização. O paciente/família passa a ser um doente
existencial. O homem é o único ser que tem consciência de sua finitude e o
adoecer o "aproxima" da morte. O adoecer não é Esperado x por que eu? Não
é o Desejado x por que agora? Esse processo transfere para a questão de sua
vivência, valores, culpa, projetos, sonhos, medo, desencadeando sofrimento
psíquico.

A hospitalização remete - paciente e família - à ameaça básica da integridade


narcísica, atinge a fantasia de imortalidade, o controle do próprio corpo e
destino. Vivência a ansiedade da separação das pessoas de seu convívio, de
seu estilo de vida, privacidade, podendo gerar fantasia em torno das
intervenções que são praticadas no corpo.

Esses fatores psicológicos permeiam esta experiência individual, provocando a


Urgência Subjetiva que vai promover a interface com a Emergência Médica.

A doença física, necessariamente, não é o FOCO de atenção do psicólogo,


uma vez que ele (psicólogo) trabalha com o Universo Simbólico, com a
Subjetividade impregnada no corpo, ou seja, com a Representação Psíquica da
doença. O psicólogo avalia como a doença está inserida na Estrutura Psíquica,
quais os limites entre o real e o imaginário e fantasias que estão em cena.

Como cada indivíduo tem uma história singular, viverá a internação de maneira
peculiar e caberá a este profissional disponibilizar espaço psicológico para que
- paciente/família - mobilizem Recursos Internos de adaptação, preservando as

64
funções psíquicas no processo de hospitalização.

E o que dizer da Equipe de Saúde? Em alguns casos, a Equipe passa a ser o


Depositário da raiva e hostilidade como produtos da impotência frente ao
Adoecer, necessitando um olhar mais atento e, por que não dizer, merecendo
um Espaço Psicológico do Serviço de Psicologia Clínica.

Entretanto, é fundamental que o psicólogo aprenda a lidar com a impotência


(impotência do psicólogo), evitar a autocobrança (precisa resolver o caso); mas
seja Natural, Espontâneo, Criativo, Empático e, acima de tudo, Ético. Com
clareza e segurança quanto à linha teórica de abordagem que escolheu.

A inserção de psicólogos e psicanalistas em instituições hospitalares e clínicas


tem crescido consideravelmente criando novos espaços de intervenção.
Considera-se importante, portanto, que associado a esse crescimento exista
uma produção teórica e técnica de qualidade daqueles que se ocupam deste
fazer.
Percebe-se que, cada vez mais, valorosos esforços tem sido empreendidos a
fim de promover um suporte ao desenvolvimento da investigação dos
fenômenos psíquicos frente à ampliação do trabalho nesta área.

A psicologia social, principalmente através da busca de uma caracterização


específica para uma psicologia da saúde (Spink) tem desenvolvido importantes
pesquisas nos sistemas de saúde buscando o aprimoramento e precisão
conceitual.

A psicanálise, a fim de dar conta de sua práxis fora do contexto apregoado por
Freud tem se dirigido, também, a investigação psicanalítica dos sujeitos e das
instituições nestes novos contextos.

Além destes esforços, o campo da psicossomática, através de diferentes


vertentes se dedica ao estudo da borda onde o biológico e o psíquico se tocam
e se circunscrevem.

No hospital, a soberania do discurso médico põe acento na “prescrição” de


medicamentos, dispositivos e inclusive profissionais a fim de que o efeito
maléfico da queixa do doente seja minimizado. Se, por algum acaso, o sujeito

65
se insurge contra a ordem vigente com seus gemidos, contrariedades e
atitudes exacerbadas, uma série de profissionais, especialmente os “psis”, são
solicitados a intervir para sanar o incômodo institucional. Por princípio a
subjetividade do doente é excluída com o intuito de não interferir no
procedimento terapêutico. A menos que a conclusão diagnóstica não revele
uma doença ou patologia visível ao olhar médico. Neste caso, então, o doente
se transforma em “peça essencial” para o seu tratamento, sendo convocado a
desejar sua cura.

Cazeto refere que o doente ao entrar no hospital deve se submeter à disciplina:


seguir suas normas e rotinas: "Espera-se que seja receptivo e colaborador com
o tratamento, mas passivo. Não deve ficar deprimido, não deve ficar muito
emocionado e, principalmente, não deve questionar seu diagnóstico ou
tratamento e deverá concentrar toda sua atenção no esforço de curar-se, nada
mais sendo tão importante quanto isto".

O discurso médico enquanto organizador do sistema hospitalar categoriza os


doentes pela patologia, define número de leitos para cada doença, cria serviços
especializados com o propósito de constituir um saber de domínio sobre o
corpo. Tomando o corpo como aparato essencialmente biológico busca no
ultra-especialismo das disciplinas e funções a comprovação da seriedade
científica.

Para legitimar a mudança do caráter asilar e caritativo para científico-


terapêutico o hospital necessitou o aporte dos dispositivos de medição
objetivos. A soberania do discurso médico na instituição hospitalar, portanto,
configura a afirmação da ciência médica moderna alicerçada sobre os pilares
quantitativistas.
Sousa Santos refere que a ciência moderna em nome do rigor conceitual torna
estanque e incomunicáveis sujeito e objeto estabelecendo uma relação que
interioriza o sujeito à custa da exteriorização do objeto. O rigor no
conhecimento é considerado tanto mais avançado quanto é o registro do objeto
sobre o qual recai sua observação. A parcealização através da especialização,
além de característica a esta forma de saber, engendra a necessidade da
criação de novas disciplinas a fim de resolver os males advindos das primeiras.

66
Sendo que, “os limites deste tipo de conhecimento são qualitativos, não
superáveis com maiores quantidades de investigação ou maior precisão dos
instrumentos”.
Atualmente, muitas têm sido as propostas de alteração no quadro da
assistência hospitalar no Brasil, sendo que, a discussão quanto à importância
da atenção ao padecimento psíquico torna-se freqüentemente cada vez maior
quando se fala em Saúde Pública. Cabe-nos, como tarefa, portanto, diante
desta complexa realidade, refletir sobre o quanto a entrada de diversos
profissionais na instituição conduz o discurso hegemônico a alguns impasses.
Ou se, por outro lado, esta abertura aos diversos discursos na instituição
hospitalar encontra-se regida pela mesma égide, qual seja, a do discurso
cientificista apregoado pela disciplina médica na sociedade contemporânea.
Mais especificamente, temos o compromisso ético de questionar criticamente a
intervenção dos psicólogos e psicanalistas neste contexto.

Em toda a instituição surgem possibilidades de abertura para mudanças e


novas representações sobre os lugares estabelecidos. Onoko, nesta
perspectiva, acentua a necessidade quanto à investigação da existência de
espaços coletivos que cumpram a função de brechas na instituição. Salienta o
caráter de báscula destes espaços por servirem ao mesmo tempo de
promotores de uma reflexão sobre o cotidiano de trabalho ao mesmo tempo em
que são espaços destinados à repetição já estruturada.

Os reflexos, as sombras, aquilo que é exposto para ser olhado, o que é


escondido, as dobraduras, as ranhuras, os nuances compõe o mundo visível
que nos remete ao estranho e ao familiar de nós mesmos.

No atendimento aos pacientes internados nos deparamos com os cheiros, as


secreções, os gritos de dor e alegria, as rotinas de medicação e limpeza, os
carrinhos de comida, a falta de roupa, o atravessamento de outros
profissionais, as portas que necessitam manutenção, os familiares sem
acomodação para permanecerem próximos do doente, as macas nos
corredores. Enfim, nos vemos às voltas com uma realidade que, embora
comum a todos, encontra em cada um sua inscrição particular. Ou seja, a

67
realidade concreta e objetiva remete ao singular e constitutivo de cada um: ao
seu próprio drama.

No hospital a grande maioria das atividades laborais estão perpassadas pelos


relacionamentos humanos. O desenvolvimento do trabalho técnico e o
profissionalismo na prestação da assistência exigem o contato com o
semelhante. E, muitas vezes, a decrepitude do corpo e o contato com o
“indigno” da doença provocam ressonâncias no prestador da assistência.
Segundo Muylaert, a equipe de saúde fica metaforicamente “contaminada” pelo
padecimento do doente.

Na internação hospitalar interagem extremos: a mais alta sofisticação técnica e


o especialismo, por um lado, e por outro prevalece a necessidade do contato
básico diante do sofrimento e da fragilidade humana. Há um clima de tensão
dialetizado pelo conflito entre a vida e a morte, o procedimento invasivo e o
acolhimento ao sujeito, o orgânico e o psíquico. Esta tensão não demanda uma
escolha, mas implica em nuances e facetas da realidade hospitalar.
Um estagiário de psicologia clínica solicita, em supervisão, não mais atender
uma paciente com câncer devido ao odor exalado pela ulceração da doença.
Pergunto-lhe sobre a janela do quarto...se estava aberta ou fechada nos dias
que acompanhava a paciente junto ao leito. Ele mostra-se surpreso com a
pergunta. Tratara-se de um detalhe que ele não prestara atenção e tampouco
entendia a importância de tal observação. Pergunta-me, então, porque deveria
estar atento a coisas como estas uma vez que era a fala da paciente era o que
“verdadeiramente” interessava à escuta analítica. Simplesmente o cheiro o
repugnava.
Após a supervisão o estagiário retornou ao quarto e constatou que a janela
estava fechada. Dirigiu-se à paciente e falou-lhe que iria abrir a janela, pois o
cheiro provocado pela lesão era muito forte. A paciente respondeu-lhe dizendo
que sabia disto, pois ninguém mais entrava no seu quarto. Anteriormente, nos
outros atendimentos, a paciente limitava-se a responder as perguntas que o
estagiário fazia. Dizia como tinha passado a noite, dos exames realizados, se
havia ou não sentido dores. Caracterizando uma relação que chamei de uma
relação de “falsa prestância”, onde paciente e “atendente” estão condenados

68
ao silêncio mútuo e ao tédio. A partir da abertura da janela surge a fala do que
era constantemente velado (o cheiro ruim da ulceração da doença) e a
paciente pode falar então da sensação de solidão e desamparo vividos na sua
própria vida e que se reproduziam na situação da internação hospitalar.

Mannoni, neste sentido, referindo-se a demência senil diz que um dos


problemas encontrados pelos velhos é que ninguém mais lhes fala, fazendo
com que não encontrem, por conseguinte, a forma de expressar seus
desassossegos verbalmente. Situa, também, que o encontro com um ambiente
acolhedor seria importante para fazer frente à angustiada superposição
medicamentosa necessária para a correção de um desequilíbrio orgânico.

Seguiu-se a este desvelamento da solidão da paciente a verificação dos


registros em seu prontuário. Sendo constatado que havia um número reduzido
de anotações diárias considerando o seu extenso período de internação. O
prontuário, que funciona como uma espécie de diário de bordo do “navegador-
atendente” é o local onde são registrados os procedimentos, as observações,
os resultados de exames etc., apresentando uma série de informações sobre o
transcurso do paciente na instituição hospitalar.

Caracterizei, inicialmente, como uma conversa a minha intervenção, acerca da


paciente, junto à equipe de enfermagem. Ao reconstituir a trajetória desta
paciente foi possível perceber os efeitos analíticos ali produzidos pela
possibilidade da “conversa”. Ocorreu que alguém fechou a janela daquele
quarto, outro alguém fechou a porta e, em algum dia em um determinado turno,
uma auxiliar encarregada de fazer a troca de curativo da paciente não realizou
o procedimento. Também no turno subseqüente a paciente não foi atendida.
Considerada FPT (fora de possibilidades terapêuticas) e estando hospitalizada
“apenas” para tratamento clínico de suporte a prescrição médica prescindia da
visita médica de rotina. Esta reconstituição ocorreu com a participação
alternada da enfermeira, de auxiliares de enfermagem e dos médicos
residentes que circulavam no posto de enfermagem. Cada qual desenvolvendo
o seu trabalho ao mesmo tempo em que faziam seus comentários: “Mas

69
ninguém está vendo esta paciente?” “Como é que pode né, uma coisa
destas!!!” “Mas também, os próprios médicos já desistiram dela, o que nós
podemos fazer?” “Também deixar aquilo (o seio) ficar daquele jeito, que nojo!!!”
“Mas tu queres trabalhar com câncer e ser tudo moleza...”

Esta situação é paradigmática quanto ao horror que provoca em cada um a


decrepitude do corpo e a condição de finitude da vida. Também nos mostra
como o “nojo” a “repulsa” existentes no cotidiano do trabalho são
constantemente negados pela equipe que se encarrega da assistência
trabalhando de forma resistencial nos vínculos estabelecidos com a pessoa
assistida. O indigno da doença e, muitas vezes também, das condições de
trabalho impedem o mútuo reconhecimento tão necessário ao prosseguimento
da tarefa, tanto entre os profissionais, quanto com o paciente. A agressividade
necessária para a execução de um procedimento doloroso e invasivo é
deslocada para a pessoa atendida. Assim o distanciamento físico do doente
encobre o medo da proximidade imaginariamente ameaçadora da doença que
o sujeito porta. Fecha-se a janela, fecha-se a porta, busca-se esconder aquilo
que está “daquele jeito", “o nojo”, “a repulsa”. Perpetua-se a ignorância sobre o
sofrimento que está subjacente em todos os envolvidos. Ao abrir a janela, ao
fazer circular o ar, criam-se as condições para a circulação dos significantes
que emergem de cada um a partir das palavras que podem transitar pela
instituição.
Considerar a realidade objetiva e concreta vivida no ambiente hospitalar, longe
de dificultar o trabalho analítico potencializa-o. Esta consideração articula o
discurso dos sujeitos na tessitura institucional. Contempla a palavra nos
movimento da dinâmica e da cultura da instituição não de forma
identificatoriamente amalgamada, mas simbolicamente incluída. Assim, a força
e a propriedade da psicanálise consistem neste desvelamento do reprimido que
faz sintoma considerando cada discurso como único ao mesmo tempo em que
coletivo, devido à própria condição humana.

Como delimitar neste trabalho um único sujeito a quem foi dirigida a


intervenção analítica? Contudo, não cabe falar em um atendimento múltiplo ou
coletivo, tampouco “da instituição.” Quando se trabalha nas situações limites,

70
entre a vida e a morte, entre o posto de enfermagem e o leito do paciente,
entre a supervisão de estágio e a própria intervenção o que se testemunha é a
ressonância dos efeitos particulares no a posteriori do ato em uma série de
relações.
O início do trabalho ocorreu diante da solicitação do cirurgião plástico de
avaliação psicológica para as pacientes antes do procedimento cirúrgico e a
continuidade do acompanhamento psicológico no pós-operatório, na internação
hospitalar. Ocorria a este médico indagar o porquê das queixas das pacientes
quanto ao resultado obtido com a reconstrução mamária. Propunha então a
investigação das fantasias e idealizações das pacientes com relação à
cirurgia.
O médico examina o corpo com a soberania do conhecimento científico acima
da imprecisa realidade psíquica na qual está submersa a paciente. Para o
cirurgião o corpo sobre o qual opera é um corpo cadaverizado. Para o sujeito
que vai ser operado é onde a vida pulsa em todo o seu esplendor; é o lugar do
entrelaçamento de prazer e satisfação, gozo e angústia, dor e erogeneidade. O
cirurgião plástico é, portanto, o depositário de uma série de expectativas a
partir do momento que aceita promover a restauração do dano provocado pela
extirpação da mama. Contudo, o cirurgião plástico não traz de volta o seio
perdido, tampouco põe fim à angustia frente ao retorno da doença.
A cirurgia plástica de reconstrução mamária pode ser realizada basicamente
através de duas técnicas: o enxerto de silicone ou ainda através do
deslocamento da musculatura abdominal até a região onde a mastectomia foi
realizada. Esta segunda técnica exige uma série de intervenções subseqüentes
até que se complete todo o processo.

A mastectomia remete a mulher a situação de perda; neste sentido, além da


perda física de uma parte do corpo, a problemática da castração é re-
atualizada. Portanto, a forma como ela atravessou a conflitiva edípica surge
com uma nova roupagem. A desnaturalização do corpo biológico frente à
inclusão do desejo humano introduz um “para além” da pura necessidade e
desarticula o entendimento de um corpo que funciona de modo interligado e
estruturado. Originalmente não há possibilidade de coincidência entre desejo e
objeto da satisfação. No local cirurgiado concentra-se, também, a

71
representação de um dos símbolos de referência eleitos para representar a
sexualidade feminina e nestas pacientes o símbolo foi amputado devido ao
câncer, restando-lhe, como uma alternativa, a prótese.

Facilmente a mulher, principalmente na histeria, vai cobrar esta falta apontando


para a imperfeição da ciência médica que se mostra incapaz de restaurar a
perfeição original. Utilizar-se-á tanto do discurso médico, quanto do seu próprio
para cobrar a melhoria na auto-imagem a fim de poder novamente sustentar-se
no olhar do outro, seja ele o marido, o companheiro, ou ainda outras mulheres.
A paciente ao entregar seu corpo demanda mais do que a perfeição estética;
demanda a cura, demanda que o médico lhe tire da condição de enferma,
enfim, que lhe restitua uma perfeição originariamente perdida.

Neste momento, é importante situar de que forma se processará o atendimento


solicitado. Se como uma das especialidades convocadas a “purificar” o doente
daquilo que impede o médico de trabalhar. Ou, se a partir do desvelamento
sintomatológico da realidade da assistência.

Naffah Neto alerta para o fato que muitas vezes o trabalho do psicólogo no
hospital geral é banalizado e subavaliado, dadas as condições subalternas e
passivas em que é, normalmente, praticado.

A especificidade da psicanálise, nestas situações, é que diferentemente de


outras práticas terapêuticas que pautam o seu trabalho pelo atendimento do
que é pedido, lê este pedido através da multiplicidade transferencial posta em
jogo na instituição. Desta forma não é suficiente a realização de entrevistas e
avaliação das pacientes submetidas à mastectomia, mas sim a indagação
sobre a representação do câncer e da cirurgia de reconstrução mamária para o
próprio cirurgião, bem como, coube indagar sobre o modo pelo qual situava as
dificuldades advindas das questões subjetivas das pacientes, principalmente,
quanto ao lugar que lhe conferiam enquanto portador de uma promessa.

A insatisfação, portanto, com relação a um ato cirúrgico, não necessariamente


diz respeito ao procedimento enquanto tal. Mas sim se vincula, entre outras
coisas, à possibilidade do luto feito pelo seio perdido, vincula-se também à

72
problemática da castração presentificada pela cirurgia, além da impossibilidade
frente a vontade de cristalizar o médico na figura do príncipe encantado que a
livraria do pesadelo da revelação diagnóstica. Desta forma, de maneira
magistral, as pacientes acometidas de câncer de mama testemunham o
estranho e o familiar de cada um em relação ao corpo próprio pondo em
evidência a dinâmica das produções inconscientes sobre o corpo.

A mulher, principalmente na histeria, vai incessantemente pôr em pauta,


através de sua constante insatisfação, que não há como ter o domínio total,
desejado pelo médico, ao tecer esculturas sobre o seu corpo. Dirá que seu
corpo não é de plástico, seu corpo é o lugar de seu sintoma. Frisará a marca, o
furo, presentificado pela mastectomia, muito mais do que a reconstrução
estética.

O hospital é uma organização ou uma forma menor da mesma que


denominamos estabelecimento. Como tal, é uma forma concreta de realização
ou de efetuação das instituições (econômicas, políticas, de parentesco,
lingüísticas semióticas, laborais, profissionais, científicas etc). Tais instituições
e organizações são geradas pelos processos de produção, reprodução e
antiprodução que são próprios do modo de produção, regime político e sistema
de representação da formação social a que pertencem.

Como sabemos, não existe nenhuma formação que não apresente


contradições de interesses conscientes e pré-conscientes, assim como de
desejos inconscientes. Esses conflitos são resultantes da exploração,
dominação e mistificação que são característicos de cada sociedade. Esses
fenômenos se evidenciam em todas as instituições e organizações, sendo que,
desde este ponto de vista, as pessoas sociais, assim como os sujeitos, são
também organizações, e apresentam os mesmos defeitos e conflitos intra-
subjetivos e intersubjetivos, tanto quanto existem conflitos de classes,
intersetoriais, inter-organizacionais e interpessoais. Os conflitos são dificilmente
evitáveis, mas são muito mais previsíveis e solucionáveis quando a
organização, no nosso caso a hospitalar, tem uma estrutura consultiva,
participativa, ou melhor, ainda, cogestionária, dotada de canais de expressão

73
livres e acessíveis a todos os agentes.

Dito de maneira mais detalhada: os baixos salários, as más condições de


trabalho, a falta de instrumental adequado, a ausência de um plano de carreira,
o excesso de demanda, a inadequada formação profissional ou específica, a
carência de reciclagem periódica de conhecimentos, a concorrência não
construtiva, a exigência de eficiência não sustentada, o autoritarismo, a
verticalidade radical, assim como a liderança indiferente ou ausente, a falta de
comunicação ou as distorções da mesma, a inexistência de uma atenção
médica e psicológica permanente para os agentes e de uma consultoria
periódica institucional para o estabelecimento...são as causas principais de
deflagração de conflitos.

Os conflitos são deletérios quando não são exprimidos ou o são de maneiras


extremas em âmbitos e segundo modalidades inadequados, o qual os torna
dilemáticos, quer dizer, redundantes, repetitivos, não compartilháveis e
insolúveis. A não expressão dos conflitos de formas e em dispositivos
preparados para isso pode torná-los sintomas individuais em nível mental,
corporal e comportamental (enfermidades ou acidentes de trabalho,
individualismo, carreirismo, onipotência, ou ações coletivas como a auto ou
hetero sabotagem, a conspiração, a revolta estéril, os voluntarismos, os
favoritismos, clientelismos, “panelismos”, benefícios ou sanções injustas,
constituição de bodes expiatórios ou de lideranças messiânicas irracionais
etc.).

Os conflitos expostos e deliberados de maneiras relativamente moderadas, em


dispositivos pré-estabelecidos com essa finalidade (que podem ser anônimos,
em livros ou caixas de queixas ou sugestões), bi pessoais, grupais ou coletivos
(assembléia geral) são requisitos indispensáveis para a exposição, discussão e
resolução (o que inclui a tomada de medidas concretas organizativas) de todo
tipo de conflitos. Às vezes, é preciso empregar, na expressão dos conflitos,
técnicas corporais, dramáticas, artísticas ou até esportivas, já que os mesmos
podem estar recalcados e não serem manifestados apenas verbalmente.

74
É importante lembrar, neste ponto, que os conflitos podem estar inspirados
pela ignorância, pela má fé ou pelo recalque. A ignorância se soluciona com
informação, o recalque com as técnicas acima mencionadas e com sua
conscientização, a má fé é que resulta difícil de combater, pois seus atores são
falsos e sorrateiros, apesar de que, em última instância, suas condutas estejam
determinadas pelas causas organizacionais e inconscientes antes
mencionadas.
A solução subjetiva e objetiva dos conflitos é essencial para o bom
funcionamento e o aperfeiçoamento dos serviços, o bem estar e crescimento
dos agentes, assim como para a melhoria do estabelecimento hospitalar como
um todo. Não obstante, nós não acreditamos que os conflitos sejam “o motor
da evolução”, como alguns teóricos afirmam. Pensamos que o verdadeiro
motor do aprimoramento, tanto pessoal quanto grupal e organizacional é a
potência produtiva (não produtivista), ou seja, inventiva, criativa dos seus
agentes. Para desenvolvê-la devem-se proporcionar, ademais de liberdade,
todas as outras condições necessárias mencionadas acima.

O paciente hospitalar geralmente vivencia uma experiência de


despersonalização quando, ao ser internado, se vê transformado em um
número ou reduzido a um sintoma.

Outro aspecto da despersonalização do paciente é o fato de, às vezes, a


equipe médica discutir o seu caso em sua presença, como se ele não estivesse
ali.

Há dois aspectos na relação médico-paciente que não devem ser esquecidos:


honestidade e profissionalismo e emoções e profissionalismo.

Chorar com o sofredor é uma atitude humana e, quando negamos e reprimimos


nossos sentimentos, estamos negando a nossa humanidade.

Veremos agora algumas considerações sobre o atendimento psicológico-


hospitalar: sabemos que a doença é uma fase de crise na vida de qualquer
pessoa: ela causa uma ruptura no cotidiano e com isso, afeta a pessoa
globalmente, atingindo seu nível afetivo-emocional, ir e social. Além disso, a
doença e o sofrimento são manifestações ameaçadoras que geram medos,

75
ansiedade e insegurança.

Em função da separação do paciente com o seu meio-ambiente provocado


pela hospitalização, veremos que do ponto de vista psicológico, a agressão e o
comprometimento físico dos limites do seu EU corporal devem ter intensa
repercussão no seu auto-conceito, na imagem de si mesmo, ameaçando o
reconhecimento de sua própria identidade e de outros aspectos já citados.
Além disto, ao deixar o hospital, esses pacientes deverão adaptar-se a sua
nova realidade enfrentar suas limitações e elaborar novos modos de interagir
com o mundo.

Estas colocações apontam, claramente, para a necessidade e a relevância do


atendimento psicológico ao paciente hospitalar. Porém como implementar este
trabalho?

A implementação deste trabalho deve considerar três vertentes:

I - o hospital

II - o psicólogo

III - o paciente

Em primeiro lugar, a instituição hospitalar (geralmente os médicos) deve


reconhecer a necessidade e a importância da presença do psicólogo na
equipe, aceitando-o pois, historicamente, o hospital é do médico, e neste
contexto é fundamental saber o que a instituição espera do psicólogo.

Com relação ao psicólogo, é importante que ele se pergunte continuamente,


qual o seu papel no hospital e com o paciente uma vez que ele não é um
auxiliar do médico e nem visita para o paciente.

O psicólogo deve ter em mente, também, que a transposição do modelo clínico


para o hospital é inefetivo. O atendimento psicológico hospitalar quebra os
modelos clínicos, pois o contexto é outro, ou seja, o paciente não foi ali à
procura de um psicólogo, ou melhor, de uma psicoterapia. Além disto, a
psicoterapia não cabe no hospital devido à exigüidade do tempo e à
rotatividade dos pacientes. Então cada sessão de atendimento deve ser vista

76
como a última sessão. E isto é motivo de muita angústia para o psicólogo
iniciante; ele sempre deparará com a questão da sua efetividade profissional: o
que faço, ajuda?

Focalizando e terceira vertente, que é o paciente, veremos que, geralmente,


ele apresenta três tipos de problemas:

1 — Subjetivos: PRESENTE X PASSADO

Aceitação da realidade e possibilidade de reorganização

AFETIVIDADE, CULPA E DEPRESSÃO

CONTATO COM O CORPO AUMENTA (imagem corporal)

II — Com a Equipe: FANTASIAS E MEDOS SOBRE O TRATAMENTO

Necessidade de integrar-se com a enfermagem e com os médicos

III — Com a Família: REDISTRIBUIÇÃO DE PAPÉIS

Para que o psicólogo possa trabalhar estes problemas, duas coisas são
essenciais:

l.) Que o paciente reconheça a necessidade do atendimento e consinta em dele


participar; e

2.) Que o psicólogo, através da sua condição pessoal, possa oferecer ao


paciente uma escuta empaticamente compreensiva, ajudando-o a transcender
este momento tão crucial para ele.

E é aqui, que o principio fundamental da ACP, crença na capacidade do


indivíduo, deve estar arraigada na pessoa do psicólogo. Pois, de posse deste
principio operacionalizado conceitualmente na tendência à atualização, o
psicólogo pode oferecer condições facilitadoras para que o paciente se resgate
como pessoa e se reorganize diante da sua nova realidade.

Neste momento, o psicólogo se coloca como uma oportunidade (liberdade


experiencial) para que o paciente, a partir de suas percepções e referências,

77
entenda e aceite a sua nova condição de ser no mundo.

O que a ACP na instituição hospitalar tem a oferecer, é um ouvir sensível


através do qual o paciente será reintroduzido na sua existência.

Quando falamos em identidade do psicólogo no meio hospitalar devemos ter


em conta algumas considerações, como a inserção do psicólogo na instituição
e sua atuação nas clínicas.

A inserção do psicólogo no meio hospitalar se deve a resistências por parte da


instituição, dos médicos e dos próprios pacientes, suscitadas por:

- medo da subjetividade suscitada, trazida à tona pelo psicólogo. Medo da


leitura do não-dito, que permeia muitas das relações, pondo em jogo as
verdades;

- onipotência do médico, que detém o discurso do saber;

- onipotência do psicólogo - que em sua leitura própria do sujeito encontra


todas as respostas, "psicologizando" todas as manifestações orgânicas;

- diversidades de técnicas de atendimento psicológico (que variam de acordo


com as necessidades do paciente e princípios do psicoterapeuta, indo desde
uma escuta analítica até uma intervenção direta e auxiliar como relaxamento);

- vulgarização da psicologia pelos próprios profissionais (quando os


profissionais de psicologia trazem respostas prontas e simplistas, colocando
em dúvida a veracidade das mesmas).

A necessidade de se ter o psicólogo na instituição hospitalar é reconhecida


quando:

- apenas os fatores anatômicos, físicos e químicos não são suficientes para


justificar e tratar determinadas patologias;

- são reconhecidos os fatores inconscientes atuantes em diversas patologias,


como nas doenças psicossomáticas;

78
- através da psicoterapia é possível ao paciente trazer à tona a causa dos seus
sofrimentos, possibilitando ao mesmo elaborá-los.

- há o reconhecimento do conceito de saúde emitido pela O.M.S. (Organização


Mundial de Saúde): "Saúde é o total bem-estar biopsicossocial do homem e
não somente a ausência da doença".

- os resultados práticos do atendimento psicológico repercutem na alta


hospitalar do paciente. Como exemplo, podemos pensar no paciente deprimido
e no que não está deprimido. O paciente não deprimido responderá melhor e
mais eficientemente ao tratamento médico;

- há diminuição de ansiedades pré-cirúrgicas possibilitando ao médico melhor


comunicação com o paciente;

- o sujeito doente sofre desequilíbrio em uma das instâncias biopsicosocial e


através da psicoterapia é possível restabelecer seu equilíbrio anteriormente
existente.

Quando falamos de psicologia hospitalar, falamos do atendimento prestado


àquele paciente que tem como "foco" a causa da sua internação, da sua
doença, portanto motivo este do atendimento.

A atuação da psicologia nas clínicas se faz considerando a especificidade de


cada uma delas e de seus pacientes, onde temos sempre em conta a
"simbologia dos órgãos" afetados, dos órgãos doentes. Um paciente cardíaco
terá fantasias relacionadas à importância do coração, aos mitos referentes a
este.
A atuação pode se dar em ambulatório, enfermaria, CTI e apartamento, onde a
reação do paciente frente a estes lugares se dará de modo específico e
singular. Com certeza um CTI amedronta muito mais a um paciente do que um
apartamento. Não podemos desconsiderar as fantasias suscitadas em cada um
destes lugares. Podendo o paciente ser trabalhado individualmente ou em
grupo, em situações de cirurgia (psicoprofilaxia cirúrgica ou somente em
preparação psicológica para cirurgia), tratamento clínico da doença e/ou
hospitalização - situação em que por si mesma é geradora de ansiedades e

79
angústias, de estressem podendo desencadear problemas psicoafetivos.

Na nossa atuação objetivamos:

- o processamento de informações, ou seja, a forma como o paciente está


processando as informações trazidas pelos médicos, pela enfermagem, pelos
familiares, etc.

- a elaboração da situação vivenciada pelo paciente, trabalhando-o nos níveis


psicodinâmicos (inconsciente e consciente), observando sua compreensão e
insight do que se passa, observando seus limites;

- a diminuição dos medos básicos, da ansiedade e da angústia em níveis


tolerados pelo paciente - quando se trata de situações de cirurgia ou não.
Muitas vezes o stress provocado por uma doença poderá ser o momento
oportuno de reflexões para o paciente, sendo, então, positivo;

- evitar que as "intervenções técnicas" (as cirurgias e os exames


complementares) possam dar lugar a uma organização de características
psicopatológicas na personalidade do paciente, quando começam a aparecer
sintomas que estavam ocultos e não remetem à clínica, aos sintomas clínicos
em questão;

- priorizar ou relativizar as dificuldades do paciente. Um paciente que irá se


submeter a uma cirurgia poderá estar ansioso por medo da anestesia, da morte
etc., cabe ao psicólogo escutar e analisar sua demanda mais imediata.

Atuando de forma interativa e dinâmica junto ao médico, obteremos melhores


resultados no tratamento, porque assim estaremos objetivando a melhora do
paciente enquanto um todo.

É importante que o psicólogo esteja atento à sua onipotência e ter capacidade


de trabalhar conjunta e interativamente com o médico, bem como com toda a
equipe de saúde. Trabalhar conjuntamente implica em respeitar a ciência de
cada um e seus limites e ter espaço para serem colocadas todas as opiniões,
divergências, para que se possa chegar a um denominador comum em relação
ao paciente.

80
A atuação conjunta com o médico é muito rica quando possibilita ao paciente
ser atendido em seus aspectos subjetivos e concretos, sem que seja
fragmentada por cada profissional, oferecendo a ele também uma outra escuta
para seus sofrimentos.

Muitas vezes, por desconhecimento de outros profissionais da saúde e da


própria instituição, o psicólogo é confundido com o assistente social, terapeuta
ocupacional (quando atendendo crianças) e outros. Neste momento é
importante demarcar o seu lugar, esclarecendo as dúvidas que originaram tal
concepção errônea. É um dos momentos oportunos para o psicólogo falar do
seu trabalho e o tornar claro aos outros. Lembrando que sempre cabem as
reflexões sobre as demandas existentes, se são elas dos médicos, do paciente,
etc.

A participação da Psicologia Hospitalar na equipe multidisciplinar e na equipe


interdisciplinar no contexto hospitalar.

Atualmente percebemos o avanço no atendimento e na assistência ao paciente


hospitalizado por meio da inclusão de diferentes profissionais de saúde
atuando de forma integrada no sentido de proporcionar uma melhor qualidade
de vida e de assistência na situação de internação.

Isso se deu, pelo avanço do conhecimento nas diferentes áreas da saúde,


como fisioterapia, nutrição, psicologia e terapia ocupacional que ganharam
espaço nos hospitais introduzindo-se gradualmente estes outros profissionais
neste contexto.

Dessa forma, a possibilidade do trabalho de equipe proporcionou uma melhor


divisão dos trabalhos, mesmo que, num primeiro momento não de forma
integrada, porém assumindo algumas atividades que antes ou não eram
prestadas, ou ficam sob encargos dos médicos, enfermeiros e auxiliares de
enfermagem.

Com isso passamos a observar no contexto hospitalar a atuação do


nutricionista orientando dietas, o fisioterapeuta prescrevendo e orientando
sobre exercícios físicos, o psicólogo promovendo maior compreensão e

81
facilitação das comunicações, além de oferecer apoio emocional e psicológico
aos pacientes, entre outras atividades realizadas pelos membros da equipe
multidisciplinar instaladas nos hospitais.

O trabalho multidisciplinar se espalhou rapidamente mostrando benefícios e


vantagens na recuperação, no atendimento e na assistência aos pacientes
hospitalizados.

Como trabalho multidisciplinar entende-se a presença de mais de um


profissional ou de mais profissionais alem dos tradicionais das áreas médicas e
de enfermagem atuando no contexto hospitalar.

O trabalho em equipe se desenvolveu tornando uma necessidade a integração


entre estes profissionais, o que resultou na existência de equipes
interdisciplinares.

O trabalho interdisciplinar no contexto hospitalar envolve, portanto, a atuação


dos membros da equipe interagindo entre si, em busca de uma melhor
qualidade de vida para os pacientes.

As equipes interdisciplinares e mesmo as equipes multidisciplinares não estão


presentes em todos os hospitais, mas mostra-se uma tendência que isso
ocorra ao longo dos tempos, pois cada vez é mais comprovado a eficácia e
eficiência, principalmente do trabalho interdisciplinar trazendo resultados
imediatos, consistentes e benéficos aos pacientes, às famílias, à equipe como
um todo e para a própria instituição hospitalar.

A abordagem multidisciplinar que se caracteriza por uma simples justaposição


das áreas temáticas, em que cada disciplina é dedicada à sua especialidade,
sem evidência de uma relação ou alterações ou mudanças nas disciplinas
envolvidas.

A abordagem interdisciplinar considera sofrimento como uma estrutura em que


se procura um quadro comum para a integração de conhecimentos. No
pensamento interdisciplinar, há exigências para se deslocar da
multidisciplinaridade para a interdisciplinaridade, quais sejam: trabalho em
equipe, intenções, flexibilidade, cooperação e reciprocidade recorrente. Isto

82
pode ser conseguido quando o profissional começa a pensar que a sua
disciplina tem um limite, a pensar de uma abordagem que vá além da simples
colocação de limites, ao mesmo tempo sabendo se que há elementos
interrelacionados.

No que diz respeito à saúde, a partir de um quadro conceptual seria definir o


que é saúde, não incidindo diretamente o problema de saber se o trabalho está
fragmentado, que não se pode trabalhar a partir desta abordagem. Tem de ser
uma intenção, uma equipe reunião, principalmente por permitir a integração
dos não-profissionais e de conhecimentos profissionais, permitindo uma
integração de saberes que não tem a ver com o poder.

Elichiry, N. diz que lidar duas disciplinas não é uma interdisciplinares,


argumentando que os problemas disciplinares não têm fronteiras e limites de
cada disciplina; eles não são fixos e determinados. Se, a lógica da hegemonia
é a do indivíduo ou da concorrência do mercado entre as corporações
profissionais, o desenvolvimento de atividades interdisciplinares são grandes
obstáculos. O trabalho interdisciplinar é um trabalho de grupo. A articulação
entre imaginário social e imaginário do grupo e dimensão institucional em que
existe uma atividade estão produzindo os mesmos efeitos, eles trabalham com
os mesmo objetivos.

6 EQUIPES INTERDISCIPLINARES: INTERDISCIPLINARIDADE E


MULTIDISCIPLINARIDADE EM SAÚDE. ITEM 9 SEGER E SESA 2 Trabalho
em equipe interprofissional: relacionamento e competências.

A interdisciplinaridade ganha relevância no mundo ocidental a partir da década


de 1960. O conceito de interdisciplinaridade se relaciona com outros termos,
tais como: disciplinaridade, multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade e
transdisciplinaridade.

Disciplinaridade é uma área homogênea de estudo com fronteiras bem


delimitadas. Na disciplinarização há uma forma de poder subjacente que
controla a produção do discurso.

A multidisciplinaridade implica uma justaposição de diversas disciplinas, o que

83
não pressupõe, necessariamente, trabalho em equipe e coordenação. Na
multidisciplinaridade e na transdisciplinaridade não se acordam conceitos e
métodos. A segunda implica um grau maior de relação entre as disciplinas.

A interdisciplinaridade é conceituada pelo grau de integração entre as


disciplinas e a intensidade de trocas entre os especialistas; desse processo
interativo, todas as disciplinas devem sair enriquecidas. Há julgamento,
comparação e incorporação dos elementos na produção de uma disciplina
modificada.

A transdisciplinaridade não se restringe às interações e à reciprocidade entre


as disciplinas, pois propõe a ausência de fronteiras entre elas.

Nas últimas décadas a interdisciplinaridade vem sendo colocada como uma


necessidade e uma condição do conhecimento atual, resultado do
desenvolvimento das forças produtivas e do desenvolvimento da ciência.

O trabalho interdisciplinar pressupõe novas formas de relacionamento, tanto no


que diz respeito à hierarquia institucional, à gestão, à divisão e à organização
do trabalho, quanto no que diz respeito às relações que os trabalhadores
estabelecem entre si e com os usuários do serviço e a manifestação de
subjetividades.

Embora, pela complexidade de seu objeto, a saúde deva se situar no campo da


transdisciplinaridade, o que se observa é que nos serviços de saúde que
contam com equipes multiprofissionais, a organização do serviço se faz de
forma fragmentada.

Em se tratando da atenção a saúde, os questionamentos acerca da validade e


aplicabilidade do conhecimento fragmentado são relevantes para as
instituições e para os profissionais preocupados com uma assistência de
qualidade e com a realização de um trabalho mais sensível, mais motivador e
de qualidade. O trabalho em saúde possui uma dimensão necessariamente
complementar, de articulação dos saberes e fazeres,

O trabalho em equipe multiprofissional deve expressar a possibilidade de


integração das disciplinas, pois elas se apóiam e se operacionalizam em

84
tecnologias que se refletem no fazer cotidiano.

A partir da década de 70 de século passado, diante das políticas de cunho


racionalizador adotados pelo setor de saúde, as equipes ganham destaque
como forma de alcançar os objetivos propostos.

Com o advento da Reforma Sanitária e as propostas de mudança no modelo


assistencial, que se processaram no fim dos anos 80 e que tem tentado se
efetivar desde os anos 90, as equipes ganham relevância como forma de
buscar a integralidade das ações e a melhor qualidade dos serviços.

Apesar de encontrarmos, em inúmeros trabalhos relatos de equipes que atuam


no campo da saúde, é necessário problematizar a ação parcelar que ainda
existe no trabalho nesta área, que é contrário ao conceito de equipe. Um
conjunto de pessoas que trabalham juntas só se torna uma equipe quando há
elemento de identificação (de natureza simbólica) que as uma, seja física ou
virtualmente.

Este elemento é a resultante de um processo de inter-relação entre os


trabalhadores em saúde e deles com os usuários na produção da saúde. Tal
processo aponta a existência de redes de significados compartilhados cultural e
socialmente e que sustentem a construção da significação de episódios
patológicos. Tais redes são constituídas por elementos cognitivos, afetivos e
experiências, aglutinados nas relações sociais e nas configurações culturais.

O trabalho em equipe, enquanto processo, demanda o repensar dos papéis,


das relações de poder e dos conteúdos já instituídos. O trabalho assim
organizado superaria a inércia burocratizada dos serviços públicos de saúde e
interviria na divisão vertical dos processos de trabalho, considerada impeditiva
da resolubilidade dos serviços. O trabalho em equipe nos serviços de saúde só
se efetivará quando forem trabalhadas as relações de poder, que se
expressam, também, por meio da disciplinarização desse campo. Assim, a
interdisciplinaridade é uma necessidade interna desse campo, seja devido à
complexidade de seu objeto ou como forma de relativizar e trabalhar as
relações de poder implícitas na disciplinarização.

85
De acordo com Luz, o campo da saúde pública se torna interdisciplinar em
meados do século XX quando a crise político-ideológica que imperava nos
setor impulsionou modificações no conceito de saúde e foram introduzidos,
gradualmente, outros saberes para pensar seu campo.

A introdução de outras disciplinas como Direito, Ética e Ciências Sociais


reforça e apóia outras ciências. De acordo com Luz, uma possível
interdisciplinaridade no campo da saúde, incluindo as ciências sociais (e sua
produção), está sendo construída a partir das exigências institucionais de
gestão envolvendo o adoecimento das populações, que atingiram nesta
conjuntura de capitalismo globalizado, uma complexidade inimaginável. A
saúde passa a ser vista agora como um domínio de conhecimento e
intervenção compartilhado com outras disciplinas, e não mais como um objeto,
por mais complexo que seja.

O campo da saúde publica é o campo de correlação de forças no qual as


disciplinas se articulam, tendo como pano de fundo, a consciência social e
política que emerge no confronto das práticas.

A interdisciplinaridade enfrenta neste campo, quatro obstáculos: a tradição


positivista e biocêntrica; os espaços de poder que o encastelamento disciplinar
propicia; a falta de comunicação entre as instituições de ensino e pesquisa; as
dificuldades próprias à interdisciplinaridade: - operacionalização de conceitos,
métodos e práticas entre as disciplinas.

Para que haja interdisciplinaridade, é necessário um projeto no qual os


profissionais invistam seus esforços para a transformação de suas práticas
cotidianas e na construção de novas formas de saber.

A prática interdisciplinar requer singularidade e transformação. Singularidade


nas vivências, na experiência e nos caminhos teóricos escolhidos pelo
profissional e que perpassam sua prática cotidiana. A transformação se refere
à postura de questionamento e à inquietude em busca de soluções e novos
aprendizados.

Partindo de um paradigma mais abrangente que supere a dominação do

86
modelo biomédico e as concepções reducionistas das ciências sociais, é que
se pode chegar à interdisciplinaridade. Dessa forma, faz-se necessária a
reformulação do discurso e da práxis da saúde publica que deve se dar dentro
de uma lógica interdisciplinar; este processo só será legítimo se envolver todos
os atores sociais participantes desse campo.

Acredita-se que é a aproximação com o conjunto destes fatores que caracteriza


o SUS, segundo os princípios defendidos a partir movimento da reforma
sanitária brasileira. Não há humanização sem vínculo, sem garantia de acesso,
sem acolhimento aos usuários, sem participação de trabalhadores e usuários
na definição dos serviços necessários e na forma de utilização dos recursos
disponíveis.

Sobre estes aspectos, a atuação em equipes interdisciplinares parece


contribuir para a construção dos princípios e diretrizes favoráveis à construção
do SUS, bem como possibilita modos mais solidários dos trabalhadores se
relacionarem entre si e com os usuários, contribuindo para a efetivação de
novas formas de organização do trabalho em saúde.

Um dos aspectos fundamentais para a conformação de novas formas de


organização do trabalho é pensar possibilidades de abertura para a expressão
da subjetividade no trabalho.

No entanto, nas organizações de saúde, os limites impostos pela organização


do trabalho, firmado na cultura administrativa tecnicista, com fortes bases
taylorista e burocrática, tendem a encarar normas, condutas e regras
institucionais como definidas, deixando pouco ou nenhum espaço para a
manifestação da subjetividade.

Dejours destaca que para vencer os obstáculos do trabalho real, o trabalhador


necessita colocar muito de si, de suas emoções, paixões e investimento
pessoal e com isso é justo que seu esforço seja reconhecido. O desejo de
reconhecimento não constitui para o autor uma reivindicação secundária
daqueles que trabalham; ao contrário, “mostra-se decisivo na dinâmica da
mobilização subjetiva da inteligência e da personalidade no trabalho”.

87
A prática interdisciplinar aponta para a construção de relações de trabalho que
contribuem para a realização de um trabalho mais criativo e motivador para os
trabalhadores envolvidos com conseqüências positivas para os usuários dos
serviços.

Para que o modelo de reabilitação possa efetivamente superar o modelo


médico, é necessário assegurar a coordenação das atividades exercidas pelas
diferentes categorias profissionais.

Para o desenvolvimento de uma teoria sobre trabalho em equipe de saúde, é


imprescindível conhecer melhor os atributos das equipes, das profissões, das
instituições e do sistema de saúde a partir de uma análise contextual. O
paciente beneficia- se muito mais do programa de reabilitação quando a equipe
funciona de modo articulado e coerente, visto que ele compreende melhor o
que lhe é proposto e pode assim participar mais ativamente do processo
decisório exercendo sua autonomia.

7 Técnicas cognitivo-comportamentais: psicoterapia individual


e grupal. SEGER(PARTE DO ITEM 10) SESA PARTE DO ITEM 7
Psicologia da saúde: fundamentos e prática.

88
A Psicoterapia Cognitivo Comportamental ou TCC é um tipo de tratamento que
tem como objetivo comportamentos específicos, sentimentos e padrões
cognitivos com a intenção de modificá-los.

Geralmente é administrada por um período determinado de tempo durante o


qual se ensina várias técnicas para que consigam controlar seu problema.

Na TCC a ênfase é colocada diretamente na modificação dos problemas e não


nas explicações de por que eles começaram.

Uma abordagem típica da terapia comportamental é chamada de "reversão de


hábito". Envolve o aumento da percepção do paciente de cada episódio que
traz desconforto e da capacidade de interromper isso por meio de uma
resposta competente.

Técnicas para aumentar a consciência incluem identificar os desencadeantes e


as seqüências de acontecimentos associados com o comportamento.

Além disso, a pessoa normalmente monitora e registra cada ocorrência,


anotando informações como dia e hora, localização, pensamentos,
sentimentos, etc. que podem ser úteis ao tratamento.

Um elemento crucial na reversão de hábito envolve a utilização de uma


resposta competente para ajudar o controle da reação.

A resposta competente é aquela que é incompatível com o sintoma.

A pessoa é instruída a usar e manter a resposta competente por períodos


breves quando estiverem entrando em situações de alto risco, quando sentirem
a primeira compulsão ou o primeiro sintoma.

Outros elementos no treinamento de reversão de hábito dizem respeito à


preparação de pessoas para o tratamento, à motivação contínua durante o
tratamento e a treinos de relaxamento.

Outras estratégias de Terapia Cognitivo Comportamental ou TC empregam


procedimentos de "controle de estímulo".

89
Sintomas normalmente ocorrem em certas situações, mas não em outras.

As técnicas de controle de estímulo são usadas em situações nas quais é


provável que o comportamento ocorra e têm como objetivo interferir no
comportamento.

Como quase todos os sintomas freqüentemente aumentam ou reaparecem


juntamente com stress, técnicas de terapia comportamental também podem se
concentrar no ensinamento de maneiras eficientes de controlar o stress:
controle de respiração, relaxamento muscular e técnicas cognitivas para ajudar
o controle da angústia.

Após o controle do distúrbio, a questão da "reincidência" deve ser abordada.


Na prevenção da reincidência, ensina-se às pessoas como lidar com a recaída
limitando os danos e retomando o controle do distúrbio.

O termo psicoterapia abrange todos os métodos de tratamento psicológicos e


busca: remover, modificar ou retardar sintomas existentes; corrigir padrões de
comportamentos inadaptados e promover o desenvolvimento e o crescimento
positivo da personalidade.

Pode-se definir a psicoterapia como um processo cognitivo, emocional,


comportamental e social complexo, que ocorre num contexto interpessoal
(paciente e terapeuta). O processo terapêutico, na perspectiva cognitivo-
comportamental, envolve em geral oito passos ou movimentos: conceituação
do(s) problema(s) enfrentado(s) pelo paciente; desenvolvimento de uma
relação de cooperação/participação ativa (paciente e terapeuta); motivação
para o tratamento; formulação do problema; estabelecimento em comum de
metas; educação do paciente sobre o modelo cognitivo-comportamental;
intervenções cognitivo-comportamentais; e prevenção de recaídas. Ainda nesta
perspectiva, uma relação terapêutica é eficaz quando existe uma interação
entre as qualidades pessoais do paciente e do terapeuta.

A Psicoterapia Cognitivo–comportamental é uma técnica reeducativa e que foi


desenvolvida, aprimorada e extensamente difundida na Europa e nos Estados
Unidos nas últimas décadas e vem mostrando-se eficaz para tratar os estados
de ansiedade e outros distúrbios psicológicos. A TCC (um termo mais comum),

90
pode ou não ser associada a medicamentos, entretanto passa a ser a principal
forma de terapia, quando não há indicação para o uso de medicamento ou este
cause efeitos colaterais intoleráveis ou ainda existe impossibilidade clínica para
o seu uso.

O pressuposto central da Teoria Comportamental é o de que um


comportamento disfuncional foi aprendido e que pode ser desencadeado por
sinais internos e externos associados a ele. A Terapia Comportamental auxilia
o indivíduo a modificar a relação entre a situação que está criando dificuldade e
a habitual reação emocional e comportamental que ele tem naquela
circunstância, mediante a aprendizagem de uma nova modalidade de reação. A
nova aprendizagem é conseguida através de técnicas apropriadas a cada caso.

A Cognição é um termo amplo que se refere ao conteúdo dos pensamentos e


aos processos envolvidos no ato de pensar. Assim, são aspectos da cognição
as maneiras de perceber e processar as informações, os mecanismos e
conteúdos de memórias e lembranças, estratégias e atitudes na resolução de
problemas.

A Terapia Cognitiva nasceu nos EUA na década de 60, com trabalhos pioneiros
de Aaron T. Beck, M.D. e na década de 80 atingiu o status de “sistema de
psicoterapia”, consistindo em: (1) uma teoria de personalidade e de
psicopatologia com sólidos achados empíricos para sustentar seus postulados
básicos; (2) um modelo de psicoterapia com conjuntos de princípios e
estratégias que combinavam com a teoria da psicopatologia e (3) achados
empíricos sólidos embasados em estudos de resultados clínicos para apoiar a
eficácia dessa abordagem. A Terapia Cognitiva tem suas origens em correntes
filosóficas e religiões antigas como o estoicismo grego, taoísmo, budismo que
postulavam a influência das idéias sobre as emoções.

Diversas formas de terapia cognitivo-comportamental foram desenvolvidas por


pesquisadores e teóricos importantes e podem ser classificados sob duas
referencias epistemológicas básicas: o Objetivismo ou Racionalismo e o
Construtivismo – Nos EUA o pioneiro Aaron Beck, Albert Ellis com a terapia
racional-emotiva, Donald Meichenbaum com a terapia de modificação
cognitivo-comportamental, entre outros e os Construtivistas- Na Itália Vittorio

91
Guidano com a terapia cognitiva pós-racionalista, em Portugal Óscar
Gonçalves-com a terapia cognitiva narrativa, Michael Mahoney,
Construtivismo, entre outros.

Sem destacarmos as particularidades de cada uma das referencias


epistemológicas, podemos entender que a terapias Cognitivas baseiam-se no
pressuposto teórico de que os afetos e os comportamentos de um indivíduo
são determinados em grande medida pelo seu modo de estruturar o mundo.

Isto quer dizer que a visão do mundo possuída por uma pessoa, influencia a
forma como pensa, sente e age.

As técnicas psicoterápicas a auxiliam a identificar, avaliar, controlar e a


modificar as crenças que comandam a sua visão de mundo e que podem ser
disfuncionais. Crenças são "certezas" que o indivíduo constrói através da
experiência e algumas podem condicionar a sua vida, perturbando-o, podem
ser: "Tenho que ser perfeito"; "Sou um incapaz"; "O mundo é perigoso".

Como em qualquer programa de tratamento, pode-se optar também pela


utilização do Neurofeedback, como ferramenta terapêutica na
complementação das estratégias cognitivo-comportamentais a serem
implementadas.

O Neurofeedback, conhecido também como EEG Biofeedback ou


Neuroterapia, é um processo de estimulação das capacidades naturais de
desenvolvimento e readaptação do cérebro. Em várias situações clínicas, o
Neurofeedback possibilita otimizar ou modificar comportamentos
desadaptados, melhorando de forma consistente o funcionamento do cérebro.

O equipamento utilizado em Neurofeedback (hardware e software) é 100%


seguro, não produz nem emite irradiação elétrica ou magnética e não há risco
de choque. Utilizando-se dispositivos computadorizados, conectados
a sensores na superfície do couro cabeludo (procedimento confortável, indolor
e não invasivo), a atividade elétrica do córtex cerebral traduzida em ondas
(Delta, Theta, Alfa, etc) é captada, amplificada, filtrada e transformada em
sinais digitais, tornando possível observar-se certos processos mentais, em
tempo real.

92
A partir desses registros, analisa-se a coerência das ondas, de suas
frequencias e amplitudes nas regiões identificadas. Alguns tipos de ondas
cerebrais estão associados a conhecidos estados cognitivos, tais como:
atenção, concentração ou mesmo dispersão, devaneio, ansiedade,
relaxamento ou sono profundo, depressão, entre outros.

Assim, é comum encontrar-se padrões elétricos distintos na área cortical de


indivíduos com transtornos psicológicos : Déficit de Atenção com e sem
Hiperatividade, Depressão e outras perturbações do humor, Obsessivo-
compulsivo, Abusos de substâncias, Ansiedade, Estresse Pós-traumático,etc.

As modificações da atitude mental do paciente serão possíveis, mediante


exercícios cognitivos previamente estabelecidos pelo terapeuta em protocolos
de acompanhamento, promovendo assim uma potencialização elétrica e
química entre os neurônios, essencial para a harmonização das ondas e
consequentemente do desempenho cerebral.

A prévia identificação de ondas cerebrais desarmoniosas, poderá evitar que


outros desajustes psicológicos se manifestem futuramente, tais como: baixa
auto-estima, dificuldades de socialização e desempenho escolar deficitário.

A Terapia Cognitivo-Comportamental atua com base na inter-relação entre


cognição, emoção e comportamento. De acordo com a visão da Psicologia
Cognitivo-Comportamental diferentes eventos, geram diferentes formas de agir
em diferentes pessoas, não em função do evento em si, mas pela interpretação
(pensamento) que é feita do evento – gerando diferentes emoções e
comportamentos. Em função disso, uma mudança em qualquer um desses
componentes (pensamento, emoção ou comportamento) pode iniciar
modificações nos demais.

O trabalho inicia-se logo na primeira sessão; através da queixa do paciente o


terapeuta colhe dados importantes para o diagnóstico clínico. Começa também
a compreender a maneira de ser dessa pessoa, sua forma de
pensar/sentir/agir. Após esses primeiros aspectos o psicoterapeuta começa a
levantar hipóteses sobre como o paciente desenvolveu o transtorno (fonte da
queixa) que o motivou a buscar o tratamento.

93
Essas hipóteses irão guiar o processo, e em função disso, vão sendo
reconstruídas a cada nova sessão, de acordo com o aparecimento de novos
dados. Terapeuta e paciente colaborativamente modificam e refinam suas
formulações confirmando algumas hipóteses e descartando outras.
É feita conjuntamente uma lista de problemas e metas do tratamento que
auxilia a selecionar as intervenções mais adequadas a serem feitas e o
momento adequado, além de facilitar a visualização da evolução do tratamento.
O paciente pouco a pouco vai familiarizando-se com o modelo cognitivo,
permitindo que passe a ter maior autoconhecimento assim com a
compreender-se melhor. Aprende a monitorar-se e a controlar seus
pensamentos, emoções e comportamentos.

Os exercícios, experimentos e tarefas são outro ponto importante desse


processo reeducativo e de autoconhecimento, trazendo maior segurança para
o paciente, promovendo aprendizado e uma ponte sólida entre o setting
terapêutico e o ambiente externo.

É criada uma equação cognitiva específica do sujeito, a qual permite traçar um


plano terapêutico, por sua vez quais serão os alvos das intervenções e por
último quais serão as intervenções técnicas a serem feitas e em que
momentos.

Como pode ser observado o processo e o progresso da Terapia Cognitivo-


Comportamental é fruto da parceria entre terapeuta e paciente, dependendo de
ambos seu sucesso. O paciente tem possibilidade de acelerar ou atrasar seu
tratamento e seus resultados de acordo com sua maneira de agir e
comprometimento.

De forma geral a Psicoterapia Cognitivo-Comportamental permite rapidez nos


resultados, assim como grandes mudanças no indivíduo (de acordo com seu
desejo).
Este processo promove autoconhecimento, aprendizado de novas habilidades
assim desenvolvimento das que já existem, maior controle de seus
pensamentos/emoções/comportamentos, além do tratamento de alguns

94
transtornos.
Seguem abaixo alguns dos transtornos para os quais a Terapia Cognitivo-
Comportamental é muito eficiente e eficaz (alguns dos transtornos necessitam
de acompanhamento psiquiátrico – talvez momentâneo – para viabilizar e
facilitar o processo psicoterapêutico):

*Depressão: visão negativa de si, dos outros e do futuro.

*Hipomania ou episódios maníacos: visão inflada de si, dos outros e do futuro.

*Comportamento suicida: desesperança e conceito autodesqualificador.

*Ansiedade generalizada: medo de perigos físicos e psicológicos.

*Fobia: medo de um perigo físico ou mental iminente.

*Estado paranóide: visão dos outros como manipuladores e mal intencionados.


*Transtorno conversivo: idéia de anormalidade motora ou sensória.

*Transtorno obsessivo-compulsivo: pensamentos continuados e persistentes


sobre segurança; atos repetitivos para se precaver de ameaças.

*Anorexia e bulimia: medo de ser gordo e não atraente.

*Hipocondria: preocupação com doença insidiosa.

"As origens históricas da terapia cognitiva, datando de 1956, podem ser


resumidas como segue. Aaron Beck, na tentativa de fornecer apoio empírico
para certas formulações psicodinâmicas de depressão (que Beck achava
serem corretas na época), encontrou algumas anomalias - fenômenos
inconsistentes com o modelo psicanalítico. Especificamente, a conceitualização
psicanalítica (Freud, 1917/1950) afirma que os pacientes deprimidos
manifestam hostilidade retrofletida, expressada como 'masoquismo' ou uma
'necessidade de sofrer'. Contudo, em resposta a experiência de sucesso
(atribuições de tarefa graduada em um ambiente de laboratório), os pacientes
deprimidos pareciam melhorar em vez de resistir a tais experiências (Beck,
1964; Loeb, Beck & Diggory, 1971). Isto levou Beck e seus colegas a novos
estudos empíricos e observações clínicas, na tentativa de entender as
anormalidade. O eventual resultado foi a reformulação da depressão como um

95
transtorno caracterizado por uma profunda tendência negativa. O conteúdo
fenomenal desta tendência incluía expectativas de resultados negativos
(conseqüências do comportamento) na esfera pessoal, e uma visão negativa
de self, contexto e objetivos. Concomitantemente, foram feitas tentativas de
modificar o conteúdo e as distorções cognitivas negativas, resultando em
desenvovimento e avaliação de estratégias terapêuticas. Subseqüentemente, o
modelo foi aplicado a outros transtornos para testar os limites da nova
formulação.
A partir desse resumo capsular, pode-se ver que a teoria cognitiva originou-se
de tentativas de testar os princípios teóricos específicos da psicanálise.
Quando tal evidência não surgia, outras explicações eram consideradas.
Portanto, a terapia cognitiva desde o começo foi impulsionada por interesses
teóricos."

"1. O principal caminho do funcionamento ou da adaptação psicológica consiste


de estruturas de cognição com significado, denominadas esquemas.
"Significado" refere-se à interpretação da pessoa sobre um determinado
contexto e da relação daquele contexto com o self.

2. A função da atribuição de significado (tanto a nível automático como


deliberativo) é controlar os vários sistemas psicológicos (p.ex.,
comportamental, emocional, atenção e memória). Portanto, o significado ativa
estratégias para adaptação.

3. As influências entre sistemas cognitivos e outros sistemas são interativas.

4. Cada categoria de significado tem implicações que são traduzidas em


padrões específicos de emoção, atenção, memória e comportamento. Isto é
denominado especificidade do conteúdo cognitivo.

5. Embora os significados sejam construídos pela pessoa, em vez de serem


componentes preexistentes da realidade, eles são corretos ou incorretos em
relação a um determinado contexto ou objetivo. Quando ocorre distorção
cognitiva ou preconcepção, os significados são disfuncionais ou maladaptativos
(em termos de ativação de sistemas). As distorções cognitivas incluem erros no

96
conteúdo cognitivo (significado), no processamento cognitivo (elaboração de
significado), ou ambos.

6. Os indivíduos são predispostos a fazer construções cognitivas falhas


específicas (distorções cognitivas). Estas predisposições a distorções
específicas são denominadas vulnerabilidades cognitivas. As vulnerabilidades
cognitivas específicas predispõem as pessoas a síndromes específicas;
especificidade cognitiva e vulnerabilidade cognitiva estão inter-relacionadas.

7. A psicopatologia resulta de significados mal-adaptativos construídos em


relação ao self, ao contexto ambiental (experiência), e ao futuro (objetivos), que
juntos são denominados de tríade cognitiva. Cada síndrome clínica tem
significados mal-adaptativos característicos associados com os componentes
da tríade cognitiva. Todos os três componentes são interpretados
negativamente na depressão. Na ansiedade, o self é visto como inadequado
(devido a recursos deficientes), o contexto é considerado perigoso, e o futuro
parece incerto. Na raiva e nos transtornos paranóides, o self é visto como
sendo maltratado ou abusado pelos outros, e o mundo é visto como injusto e
em oposição aos interesses da pessoa. A especificidade do conteúdo cognitivo
está relacionada desta maneira á tríade cognitiva.

8. Há dois níveis de significado: (a) o significado público ou objetivo de um


evento, que pode ter poucas implicações significativas para um indivíduo; e (b)
o significado pessoal ou privado. O significado pessoal, ao contrário do
significado público, inclui implicações, significação, ou generalizações extraídas
da ocorrência do evento. O nível de significado pessoal corresponde ao
conceito de "domínio pessoal".

9. Há três níveis de cognição: (a) o pré-consciente, o não-intencional, o


automático (pensamentos automáticos); (b) o nível consciente; e (c) o nível
metacognitivo, que inclui respostas "realísticas" ou "racionais" (adaptativas).
Estas têm funções úteis, mas os níveis conscientes são de interesse primordial
para a melhora clínica em psicoterapia.

10. Os esquemas evoluem para facilitar a adaptação da pessoa ao ambiente, e


são neste sentido estruturas telenômicas. Portanto, um determinado estado

97
psicológico (constituído pela ativação de sistemas) não é nem adaptativo nem
mal-adaptativo em si, apenas em relação a ou no contexto do ambiente social e
físico mais amplo no qual a pessoa está.

QUAIS AS COGNIÇÕES QUE SERÃO FALADAS NA TERAPIA?

A) TIPOS DE COGNIÇÕES:

Interpretações, significados, idéias, normas, regras, julgamentos, previsões,


rótulos, memórias (seletivas), imagens, percepções, atribuições (porque as
coisas acontecem), suposições, crenças, conclusões, focos (seletivos) de
atenção.

B) NÍVEIS DE COGNIÇÕES:

1. Pensamentos (ou imagens) automáticos.

A maioria é situação específica.

Ex.: Eu sou uma péssima mãe, porque gritei com os meus filhos.

2. Suposições (condicionais, na forma "se..., então...") e regras subjacentes (=


crenças intermediárias).

Idéias mais gerais transituacionais de como as coisas e as pessoas deveriam


ser.
Ex.: Pessoas/ mães boas nunca gritam com seus filhos.

3. Crenças/esquemas nucleares incondicionais

Ex.: Eu sou mau. Eu sou um fracasso.

C) DISTORÇÕES COGNITIVAS: embora alguns pensamentos automáticos


sejam verdadeiros, muitos são falsos ou apenas possuem algumas parcelas de
verdade. Erros típicos de pensamento incluem:

1. CATASTROFIZAÇÃO OU ADIVINHAÇÃO: predizer o futuro negativamente,


sem levar em consideração outros resultados mais prováveis. Ex.: Estou tão
ansioso que não vou conseguir trabalhar. Vai dar tudo errado.

98
2. DESQUALIFICAR OU DESCONSIDERAR O POSITIVO: falar para si
mesmo, sem razão, que experiências positivas, conquistas e qualidades não
contam. Ex.: Eu trabalhei bem aquele projeto, mas isso não significa que sou
competente; eu tive sorte.

3. EMOCIONALIZAÇÃO OU ARGUMENTAÇÃO EMOCIONAL: pensar que


algo deve ser verdadeiro porque você "sente" (na verdade acredita) tão forte,
ignorando ou descontando evidências contrárias. "Sinto, logo existe". Ex.: Eu
sei que trabalho bem, mas eu sinto que sou um fracasso. Sinto que ela não
gosta de mim.

4. FILTRO MENTAL OU ABSTRAÇÃO SELETIVA: prestar atenção num


pequeno detalhe, ao invés de ver o quadro por inteiro. Ex.: Porque eu tirei uma
nota baixa na minha avaliação (que também continha várias notas altas) estou
fazendo um péssimo trabalho.

5. HIPERGENERALIZAÇÃO OU SUPERGENERALIZAÇÃO: chegar a uma


conclusão negativa abrangente que extrapola a situação em questão. Ex.:
(Porque não me sentir confortável na reunião) eu não tenho o necessário para
fazer amigos.

6. LEITURA MENTAL: acreditar que sabe o que os outros estão pensando,


falhando em considerar outras possibilidades prováveis. Ex.: Ele está
pensando que não sei a primeira parte desse projeto.

7. MAGNIFICAÇÃO/ MINIMIZAÇÃO: ao fazer uma avaliação de si mesmo, de


outra pessoa, ou de uma situação, sem razão magnifica o negativo e/ou
minimiza o positivo. Ex.: Tirar notas medianas significa que eu sou um burro ou
tirar notas altas não quer dizer que sou inteligente.

8. PENSAMENTO POLARIZADO, TUDO-OU-NADA, PRETO-E-BRANCO OU


DICOTÔMICO: perceber uma situação de forma dicotômica, em apenas duas
categorias, ao invés de um continuum. Ex.: Se eu não sou sucesso total, sou
um fracasso. Ou gostam de mim ou me odeiam.

9. PERSONALIZAÇÃO: acreditar que os outros estão se comportando de


determinada forma por sua causa, sem considerar outras explanações mais

99
plausíveis para o comportamento. Ex.: Ela foi indiferente comigo porque eu fiz
alguma coisa errada.

10. OBRIGATORIEDADE (DECLARAÇÕES DO TIPO: EU DEVERIA): ter uma


idéia precisa e fixa de como você e os outros devem comportar-se,
superestimando os efeitos negativos de quando as expectativas não são
satisfeitas. Ex.: É terrível eu ter errado. Eu sempre devo fazer o melhor.

11. ROTULAÇÃO: fixar um rótulo em si mesmo ou nos outros ou em


determinadas situações, sem considerar que as evidências podem levar a
conclusões menos desastrosas. Ex.: Ele é mau. Eu sou uma farsa.

12. VISÃO EM TÚNEL: enxergar apenas determinados aspectos negativos em


uma situação. Ex.: Meu filho não faz nada certo, está sempre perdendo suas
coisas. Minha mulher está sempre reclamando de mim.

D) PENSAMENTOS AUTOMÁTICOS (CARACTERÍSTICAS)

1. Coexistem com um fluxo de pensamentos mais manifestos;


2. Aparecem espontaneamente, e não como resultado de reflexão ou
pensamento voluntário;

3. Frequentemente passam completamente despercebidos;

4. A emoção associada é mais frequentemente reconhecida;

5. Estão associadas com emoções específicas, dependendo do seu conteúdo


ou significado;

6. São, freqüentemente, breves, rápidos e fugazes, de forma telegráfica;

7. São em forma VERBAL ou em IMAGENS;

8. São usualmente aceitos como verdadeiros, sem reflexão ou avaliação.

Pode-se aprender a identificar pensamentos automáticos e avaliá-los em


relação à sua validade e/ou utilidade. Responder racionalmente a pensamentos
automáticos, usualmente, produz uma mudança positiva no afeto.

100
Flecha descendente:

É utilizada devido ao seu uso real de flechas apontando para baixo para ajudar
os clientes a compreenderem a lógica e a seqüência do seu raciocínio. O
terapeuta segue a afirmação de um cliente, perguntando, "Se for assim, o que
acontece?". Isto elucida uma seqüência de pensamentos e crenças, que ajuda
a revelar as suposições básicas do cliente.

Significado idiossincrático:

Trata-se do esclarecimento que tem determinado termo declarado pelo


paciente, visando que o terapeuta possa ter um alto nível de compreensão da
realidade do cliente.

Rotulação das distorções:

Através da rotulação das distorções, os clientes podem identificar


automaticamente quaisquer pensamentos disfuncionais e monitorar seus
padrões cognitivos.

Verificação das opções e alternativas:

Isto envolve rever todas as opções e alternativas possíveis existentes nas


tentativas de se evitar a armadilha de não se encontrar "saída" para uma
circunstância ou situação. A tarefa específica é trabalhar até que o indivíduo
consiga gerar novas opções.

Descatastrofização:
A descatastrofização envolve ajudar indivíduos que decidem se concentrar no
resultado negativo mais extremo de qualquer situação, reavaliando-se a
situação e perguntando: "Qual é a pior coisa que pode acontecer? E se isso
vier a acontecer, será assim tão horrível?".

Paradoxo ou exagero:

Esta técnica pode ser considerada como o inverso da "descatastrofização".


Envolve que o terapeuta leve uma questão ou uma idéia ao extremo para que o
paciente consiga enxergar o absurdo de um ponto de vista exagerado. Isto

101
freqüentemente ajuda o paciente a desenvolver uma perspectiva mais
equilibrada da questão.

Transformar a adversdade em vantagem:

Pegar uma situação infeliz e utilizá-la como uma vantagem pode ser muito útil.
Por exemplo, ser rejeitado pela faculdade que escolheu pode ser um caminho
indireto para uma alternativa mais promissora.

Substituir as imagens:

Na essência, o fato de muitos indivíduos experimentarem sonhos e imagens


negativos indica que o poder da imagem é forte. Por isso, os pacientes podem
ser ajudados a mudar o rumo desses sonhos e imagens para cenas de
enfrentamento mais bem-sucedidas.

Ensaio cognitivo:

Muitos dos comportamentos visados para a mudança estão apoiados na força


da visualização mental do resultado desejado. O uso do ensaio cognitivo pode
ajudar os indivíduos a praticar a positividade, superando a inabilidade no
confronto com as outras pessoas, e assim por diante. Refere-se ao ensaio
detalhado e imaginário de uma determinada tarefa, inclusive dos detalhes dos
passos tomados e das conseqüências.

Registro diário dos pensamentos disfuncionais:

Pode-se ensinar os pacientes a auto-registrar suas cognições com o "Registro


diário de pensamentos disfuncionais". A observação e o registro dos
pensamentos aumentarão a conscientização por parte do paciente sobre o
"fluxo de pensamentos" e o desfile de imagens em seus sentimentos e seu
comportamento. Devem ser registrados a situação, o texto exato do
pensamento e os sentimentos. Baseando-se no auto-registro dos pensamentos
automáticos, o terapeuta e o paciente podem trabalhar juntos para identificar as
situações que disparam os pensamentos automáticos negativos e descobrir os
laços entre cognição e emoção. Tal auto-registro pode permitir também
identificar certos momentos do dia que são particularmente problemáticos e
esboçar alguns planos de enfrentamento.

102
Questionamento da Evidência ou Comprovação da realidade:
Questiona-se o cliente a respeito das evidências reais que ele possui em
relação as suas declarações. Isto permite aos clientes decidir se suas
declarações são baseadas em informações erradas. Por exemplo, pode-se
perguntar ao cliente: "Se tu tiveste que comprovar que este pensamento (ou
esta declaração) é correta, como tu farias?" ou "Quais as evidências reais que
tu tens que comprovam a veracidade desse pensamento?".
A comprovação da realidade ajuda o paciente a obter uma perspectiva mais
realista dos acontecimentos. Perguntas que levam à comprovação da realidade
são:

Que evidência tenho desse pensamento?

Existe uma forma alternativa de ver a situação?

Há alguma explicação alternativa?

Está esquecendo fatos relevantes ou centrando-se excessivamente em fatos


irrelevantes?
Preciso encontrar mais evidências sobre a realidade deste pensamento?

Reatribuição:
A reatribuição envolve simplesmente que o indivíduo distribua adequadamente
as responsabilidades às partes certas e afaste a idéia de que um único
indivíduo seja responsável por tudo. O objetivo não é tirar toda a
responsabilidade dele, mas identificar outros fatores que estejam implicados.
Pode-se perguntar:

O que pensaria uma outra pessoa sobre a situação?

Está superestimando o grau de responsabilidade que tem para que as coisas


caminhem dessa forma?

Está superestimando o grau de controle que tem sobre a maneira como as


coisas funcionam?

Vantagens e desvantagens:

103
Nas tentativas de fazer com que os pacientes abandonem padrões de
pensamento dicotômicos, instruí-los a relacionar as vantagens e desvantagens
de uma situação permite-lhes mudar sua perspectiva e equilibrar as
alternativas.

Solução de problemas:

O primeiro passo implica em uma definição clara do problema. Em segundo


lugar, emprega-se um enfoque de turbilhão de idéias para provocar no paciente
tantas soluções não censuradas quanto seja possível, independente de serem
razoáveis ou não. A avaliação das soluções propostas é realizada na fase
seguinte da solução de problemas, onde examinam cuidadosamente as
vantagens e desvantagens de cada solução. Após a fase de avaliação, o
paciente escolhe uma solução e planeja como realizá-la. Uma vez que o
paciente tenha tentado a solução, o terapeuta e o paciente discutem o grau de
eficácia que teve, se necessita de mudanças ou se deveria tentar outra
solução. Se for sugerida uma nova solução, também deve-se avaliar
posteriormente sua eficácia.

O esboço de experiências:

A pessoa que sofre de depressão freqüentemente não se sente capaz de


reassumir atividades que, normalmente, era capaz de realizar, ou de tentar
outras novas. Sua apatia está motivada constantemente por pensamentos
automáticos autoderrotistas. Então, o terapeuta considera a atividade como um
pequeno exercício - como o paciente sabe que não pode fazer essas coisas se
não tentar? O ponto-chave desta intervenção é, "O que perde por tentar?". A
idéia é conceber a atividade como algo que deve ser tentado, com a atitude de
"ver o que acontece". O paciente não deve sentir nenhuma pressão para que
tenha êxito nessa atividade, simplesmente tentar seria o suficiente.
Na sessão seguinte, discutem-se as reações do paciente a respeito da tarefa: -
tentou?, aproveitou?, fez mais do que se esperava?, quer tentar outra vez?,
etc.

Refutação com respostas racionais:

104
Esta técnica incorpora a seu registro diário de pensamentos disfuncionais uma
nova coluna dedicada às respostas racionais. Estas respostas são
desenvolvidas a princípio junto com o terapeuta, que gradualmente vai
cedendo cada vez mais responsabilidade ao paciente para que as construa.
Exemplo: um paciente pode experimentar depressão (sentimento) às sextas-
feiras à noite quando não tem planejado nenhuma saída (situação) e pensa
"Ninguém me convida porque ninguém me quer e portanto passarei uma noite
fatal" (pensamento). Pode refutar os pensamentos disfuncionais da seguinte
maneira, "Realmente saí ontem à noite com meu amigo Roberto (comprovação
da realidade), com quem tenho um íntima amizade; uma razão pela qual
ninguém me chamou é que muitos dos meus amigos estão estudando para os
exames desta época (retribuição) e se tentar fazer algo interessante como ler
um bom livro ou escrever uma carta poderia passar uma noite agradável
(Experimentação).

Representação de papéis (role play) e inversão de papéis:

Pode surtir efeitos semelhantes ao do ensaio cognitivo. Oferece ao paciente e


ao terapeuta a possibilidade de procederem a uma avaliação do desempenho
do primeiro e então, se necessário, de tentarem outras abordagens.
Ocasionalmente, a inversão de papéis em que o terapeuta representa o papel
do paciente e este desempenha o papel da outra pessoa significativa, pode ser
muito útil. Isso é relevante quando há uma dificuldade em se comportar de
maneira assertiva, pois o paciente pode ter uma noção do impacto provável de
diferentes tipos de interação sobre a outra pessoa significativa.

1. Treinamento dos agentes naturais de mudança:

Os agentes naturais de mudança podem ser definidos como aquelas pessoas


que pertencem de forma natural e estão de maneira relativamente permanente
no local onde têm que acontecer as mudanças de comportamento. Os
professores e os colegas de classe na escola, os pais e os esposos em casa,

105
os irmãos e os amigos na comunidade, os supervisores e os colegas de
trabalho são agentes de mudanças potenciais que se encontram disponíveis
para realizar ou apoiar os procedimentos de tratamento no ambiente natural do
paciente específico.

2. Procedimentos de autocontrole:

O autocontrole é um conjunto de procedimentos esboçados para permitir que


pacientes controlem seu próprio comportamento. O propósito do autocontrole é
o de permitir aos pacientes que controlem tanto quanto possível seu próprio
comportamento. No entanto, as técnicas de autocontrole têm, quando muito,
somente efeitos modestos a curto prazo, quando utilizadas sozinhas. Os
melhores resultados são obtidos quando constituem componentes de pacotes
de tratamento que também contêm procedimentos de mudança de
comportamento e continências de reforçamento.

Alguns recursos de autocontrole são:

1. Ensinar aos pacientes alguma forma de auto-observação, de auto-avaliação


e de auto-registro.

2. Introduzir um critério de "emparelhamento", como aquele em que as auto-


avaliações dos pacientes sejam comparáveis às avaliações pelos professores
ou por outras pessoas significativas.

3. Arrumar a situação para o reforço do comportamento desejado.


4. Ensinar aos clientes a se auto-instruir e/ou a se reforçar para guiar seu
próprio comportamento.

5. Transferir gradualmente o controle do reforçamento aos pacientes.


6. Retirar gradativamente as contingências artificiais quando já ocorreu o auto-
controle.

3. Técnicas de relaxamento:

A prática do relaxamento pode ser dividida em métodos que enfocam o


relaxamento físico e métodos que enfocam o relaxamento mental. Todos os
métodos podem ser igualmente eficazes, sendo que cada pessoa deve utilizar

106
aquele que melhor funcionar para ela. Quando se está relaxado fisicamente, o
relaxamento mental vem a seguir e vice-versa. A prática do relaxamento pode
aliviar a ansiedade, porque é difícil para o corpo ou para a mente estar
simultaneamente relaxado e ansioso. Desenvolvendo-se a capacidade de
relaxar antes e durante situações estressantes, pode-se reduzir
substancialmente a freqüência e severidade da ansiedade experimentada.

3.1- Técnica de relaxamento- respiração controlada:

A respiração controlada é um método de relaxamento baseado na observação


de que muitas pessoas respiram superficialmente ou irregularmente quando
ansiosa ou tensas. Tais padrões de respiração levam a um desequilíbrio de
oxigênio e dióxido de carbono no corpo, o qual pode causar os sintomas físicos
da ansiedade.

É importante praticar a respiração controlada por, no mínimo, 4 minutos,


porque isso é o que aproximadamente leva para restabelecer o equilíbrio do
oxigênio e dióxido de carbono. O equilíbrio funciona de forma mais eficaz se a
pessoa inspira e expira profundamente em uma quantidade igual de tempo.
O paciente deve ser orientado a inspirar contanto lentamente até 4 e expirar
contanto lentamente até 4, durante 4 minutos, fazendo uma breve pausa entre
a inspiração e a expiração, procurando respirar da forma mais confortável
possível. É importante respirar gentilmente, evitando respirar, de uma só vez,
grandes golfadas de ar.

3.2. Relaxamento muscular progressivo:

O relaxamento muscular progressivo é uma técnica na qual os principais


grupos musculares do corpo são contraídos e relaxados alternadamente. O
processo pode ter o sentido da cabeça aos pés ou dos pés à cabeça. O
relaxamento muscular progressivo pode levar a graus profundos de
relaxamento físico e mental. A pessoa contrai e relaxa os músculos da testa,
olhos, queixo, pescoço, ombros, parte superior das costas, bíceps, antebraço,
mãos, abdômen, virilha, pernas, quadris, coxas, nádegas, panturrilhas e pés.
Cada grupo muscular é contraído por 5 segundos e então relaxado por 10 ou
15 segundos, repetindo-se, em seguida, esta sequencia.

107
Pessoas diferentes carregam tensão muscular em partes diferentes do corpo,
de forma que as áreas em particular que precisam ser enfatizadas variam de
pessoa para pessoa.

4. Construção de Hierarquias e Atribuições de Tarefas Graduais


Nesta técnica, o terapeuta estimula o paciente a fazer uma lista de estímulos
evocadores do comportamento visado, buscando ordená-los conforme a
intensidade. A partir disso, terapeuta e paciente trabalham juntos alternativas
de enfrentamento, elaborando tarefas específicas que são dispostas em
etapas, desde as de menor intensidade até aquelas mais ameaçadoras. Isto
permite uma abordagem gradual do confronto com o objeto/acontecimento
ameaçador.

4.1 Construção de hierarquias de ansiedade:

Um hierarquia de ansiedade é uma lista de estímulos evocadores de


ansiedade, relacionados em conteúdo e ordenados segundo a quantidade de
ansiedade que provocam. Estes estímulos podem ser objetos, pessoas,
lugares, sentimentos internos ou uma combinação destas classes de estímulos
numa hierarquia completa.

O terapeuta ajuda o paciente a discutir quando, onde e sob que condições,


acontece a resposta de ansiedade. Pede-se ao paciente que pense e descreva
situações passadas e futuras que poderiam provocar a resposta. Encoraja-se o
paciente a gerar tantos detalhes quanto sejam possíveis sobre a situação
estimulante total. Quanto mais detalhes se obtenham sobre os estímulos
externos e internos, mais capaz será o terapeuta de desenvolver uma cena
clara, provocadora.

Pede-se então ao paciente que escreva todas as possíveis situações


provocadoras de ansiedade que possa se lembrar e que as descreva
detalhadamente em cartões. Este trabalho é prescrito ao paciente como tarefa
para casa e ele e o terapeuta revisam na sessão seguinte. Logo pede-se ao
paciente que coloque os cartões numa determinada ordem, segundo o nível de
ansiedade que provoquem as situações estimulares. Mais tarde, pede-se ao
paciente que proporcione pontuações na escala SUDS para cada uma das

108
situações. Deste modo, há uma estrutura gradualmente ascendente na escala,
o que permitirá aproximações graduais ao item final da hierarquia - para o qual
se experimente o temor mais intenso.

5. Dessensibilização sistemática:

A dessensibilização sistemática (DS) é uma intervenção terapêutica


desenvolvida para eliminar o comportamento de medo e as síndromes de
evitação. O procedimento consta de dois componentes diversos. O primeiro
componente consiste em ensinar ao paciente uma resposta contrária à
ansiedade. O relaxamento progressivo, ou algum outro procedimento geral de
relaxamento, é utilizado normalmente para este propósito; se bem que
qualquer resposta contrária à ansiedade que o paciente tenha, como a
resposta de assertividade, bastará. Por exemplo, uma resposta assertiva inibe
a experiência de ansiedade e, em conseqüência, servirá adequadamente como
um agente antiansiedade. O segundo componente da DS implica em uma
exposição graduada ao estímulo provocador de medo. A exposição pode ser
concretizada através da imaginação ou ao vivo.

A DS conta de quatro passos principais:

1. Treinamento no emprego da escala "SUDS" (escala que gradua as situações


de estímulos segundo seu potencial provocador de ansiedade).

2. Uma completa análise comportamental e o desenvolvimento de uma


hierarquia de medos.

3. Treinamento do relaxamento muscular profundo ou algum outro


procedimento de relaxamento.

4. A combinação da exposição, na imaginação, à hierarquia de medos junto


com o estabelecimento de uma resposta de relaxamento profundo no paciente
- "a dessensibilização propriamente dita".

6. Indução e Redução dos sintomas:

109
Esta técnica é muito utilizada em casos de ansiedade e constitui-se na
apresentação de exercícios terapêuticos nos quais os clientes são instruídos a
realizar uma seqüência de respirações curtas, inspirando e expirando por
aproximadamente três minutos de maneira a reproduzir os sintomas
vivenciados pelo cliente em seus episódios de ansiedade. À medida que os
sintomas vão se configurando, o terapeuta pode obter um relato direto dos
processos de pensamento do cliente e ajudá-lo imediatamente a controlar o
ataque por meio da respiração progressiva e da reestruturação do pensamento.
O objetivo aqui é reproduzir o tipo de situação que pode precipitar um ataque e
depois mostrar aos clientes que eles podem tanto "ligar" como "desligar" os
ataques.
Uma vez que os sintomas foram induzidos, o terapeuta registra a seqüência
dos acontecimentos, prestando uma atenção particular nos sintomas
específicos experimentados, nos pensamentos automáticos que ocorreram e
na reação emocional experimentada como resultado. O terapeuta pode então
começar a intervir com as técnicas de diminuição dos sintomas, trabalhando
em colaboração com o cliente na observação dos sintomas iniciais.

7. Intenção paradoxal:

A intenção paradoxal é muito parecida com a indução do sintoma, pois envolve


uma prescrição comportamental para os clientes apresentarem respostas que
pareçam incompatíveis com o objetivo para o qual estão buscando ajuda.
Entretanto, a diferença específica é que na intenção paradoxal os pacientes
são solicitados a exagerar suas previsões, em vez de induzir
comportamentalmente os sintomas por meio de hiperventilação deliberada. Por
exemplo, os indivíduos que experimentam ataques de pânico e medo
relacionados a morrer de repente ou se tornarem "dominados" seriam
instruídos a "ir em frente e se deixar morrer" ou fazer qualquer coisa que
tivessem medo de fazer. Depois de várias tentativas, freqüentemente
descobrem que são incapazes de obter a resposta temida e então sua
ansiedade diminui. Neste ponto, muitos pacientes são capazes de perceber o
aspecto ridículo ou irracional de suas apreensões, o que é fortemente
encorajado pelo terapeuta. São instruídos a repetir o mesmo procedimento em

110
determinadas ocasiões, em níveis graduados de situações de pânico, até que
experimentem poucos ou nenhum sintoma.

8. Criação de iamgens:

Os métodos de criação de imagens são igualmente eficazes para aprender a


relaxar, sendo, portanto, muito utilizados para controlar a ansiedade. A
imaginação envolve a visualização ativa de cenas tranqüilas e relaxantes. As
cenas podem ser lugares reais que a pessoa conhece onde se sente segura e
relaxada, ou podem ser cenas criadas para serem tranqüilas, seguras e
relaxantes.
Quanto mais sentidos a pessoa for capaz de incorporar à sua imagem, mais
relaxante esta terá chance de ser. Conseguindo-se imaginar cheiros, sons e
sensações táteis, bem como aspectos visuais da cena, maior será a
capacidade de relaxamento.

9. A distração:

Também muito utilizada em casos de ansiedade, a distração consiste em ficar


absorto em outras atividades ou pensamentos, descentrando a atenção dada
aos estímulos evocadores de ansiedade, diminuindo ou eliminando, dessa
forma, os sintomas.

Outra variação da técnica consiste em prestar atenção a um objeto, buscando


descrevê-lo mentalmente com o maior número de detalhes possíveis.

10. Simulação:

O cliente é instruído a imaginar uma situação causadora de ansiedade e a se


imaginar enfrentando-a com sucesso, utilizando as estratégias de
enfrentamento que aprendeu para lidar com sua ansiedade.

11. O contrato comportamental:

O contrato comportamental se refere a uma técnica de terapia comportamental


na qual se discute um acordo e se faz um contrato que especifique os
comportamentos, recompensas e punições necessárias que serão aplicadas a
uma determinada situação. O contrato pode ser verbal ou escrito, embora

111
muitos terapeutas prefiram esta última forma, devido a que acrescenta clareza
e proporciona aos indivíduos envolvidos um registro que guie seu
comportamento e resolva os desacordos que possam surgir.

12. Reforçamento:

Central para todos os métodos operantes, o reforçamento é o principal


procedimento para aumentar o comportamento. É importante selecionar
cuidadosamente tanto o reforçador como o comportamento que se vai reforçar,
considerando que o que constitui um reforçador para um indivíduo não o será
necessariamente para outro.

13. Extinção:

A extinção é, provavelmente, o método operante mais utilizado para diminuir o


comportamento. Implica, em primeiro lugar, em determinar o que está
reforçando o comportamento-objetivo e, em seguida, em eliminar esse
reforçamento.

14. Manejo de recompensa:

É recomendado para quadros fóbico-ansiosos. Cada aproximação do objeto


e/ou situação temida deve ser seguida de alguma espécie de recompensa,
associando-se, dessa forma, uma experiência agradável à vivência de medo.
Além disso, a desconfirmação da conseqüência negativa esperada facilita um
maior engajamento do paciente e leva a um aumento na freqüência das
aproximações do estímulo temido. Da mesma maneira, muitos
comportamentos de medo, indiretamente reforçados pelas demais pessoas,
podem ser eliminados quando essas pessoas são instruídas a não mais
recompensá-los.

15. Modelação:

É uma estratégia que permite ao paciente aprender um novo comportamento


através da observação e imitação de um modelo, no caso, o terapeuta.
Inicialmente, o paciente apenas observa a reação do terapeuta diante do
estímulo temido e depois "copia" o comportamento demonstrado. A
aprendizagem de que é possível ter reações controladas em face de situações

112
temidas reduz o medo e facilita a aquisição de habilidades mais apropriadas. O
terapeuta deve planejar demonstrações de acordo com as finalidades
específicas do paciente.

15.1- Treinamento da positividade:

Um grande componente do treinamento da positividade envolve tanto os


processos cognitivos quanto a prática comportamental. Esta última consiste,
em sua essência, no terapeuta ensinar ou exemplificar para o paciente os
comportamentos desejados nas várias situações sociais. Isto é utilizado
freqüentemente, sobretudo para distúrbios de ansiedade.

16. Ensaio comportamental:

Esta técnica é a contraparte comportamental do ensaio cognitivo. A diferença


é que os próprios comportamentos reais são os temas ensaiados (por exemplo,
auto-afirmação em público ou levantar da cama e ir para o trabalho). O
terapeuta fornece subsídios ao paciente para que este possa seguir uma
direção e desenvolver respostas e estilos eficazes. Também envolve o reforço
das habilidades existentes.

16.1 Role Playing:

O terapeuta modela o comportamento ou a comunicação desejados; depois, os


papéis são trocados. O cliente exerce o papel representando uma reação
desejada ao problema. O treinamento da atitude assertiva pode ser um aspecto
importante desta habilidade, pois freqüentemente estão envolvidas situações
interpessoais. Por exemplo, o cliente pode precisar comunicar seu desconforto
a uma pessoa que lhe é íntima. Na comunicação assertiva, o treinamento e o
role playing podem ajudar a contra-condicionar a ansiedade potencial nessas
situações.

17. Treinamento em habilidades sociais (THS):

O treinamento em habilidades sociais (THS) é utilizado em quadros de fobia


social, baseando-se no princípio de que este transtorno se forma como
conseqüência de déficits em habilidades e que o desenvolvimento de tais
habilidades permite o entrosamento do indivíduo em situações interpessoais,

113
reduzido a sua ansiedade de forma significativa. O paciente pratica o ensaio
comportamental durante as sessões terapêuticas e tenta aplicar o que
aprendeu na vida diária, a fim de aprimorar as habilidades sociais e elevar a
auto-estima. O THS envolve desenvolver habilidades interpessoais (iniciar e
manter conversação, defender os próprios direitos, expressar sentimentos,
criticar e receber crítica, pedir, negar, etc.), bem como performance de falar em
público (construção da fala, pronúncia, concentração no conteúdo da fala, etc.).

18. Biblioterapia:

A prescrição das atribuições de leitura tem sido sempre uma característica


forte da terapia cognitiva. As leituras freqüentemente indicadas aos pacientes
são livros ou artigos destinados ao público em geral. Estas leituras são
designadas como um auxílio à terapia e servem fundamentalmente como um
instrumento didático e de apoio ao processo terapêutico.

19. Exercícios de combate à vergonha:

Consiste em fazer com que os pacientes se envolvam em atividades que


enfatizam sua preocupação pelo que os outros podem pensar deles. Um
exemplo típico poderia ser fazer com que o paciente dissesse em voz alta o
nome da parada de um ônibus, quando está em sua rota e transportando um
grande número de passageiros. O objetivo é ajudar o paciente a perceber
como as pessoas realmente reagem e que aquilo que eles pensam na verdade
não importa.

20.Lição de casa:

Uma das características mais importantes da terapia cognitiva é o uso das


atribuições de lição de casa. Como as sessões de terapia limitam-se apenas a
uma ou duas horas por semana no consultório, é imperativo que as atividades
de apoio ao tratamento tenham continuidade fora das sessões. São enfatizadas
as atribuições de auto-ajuda, que servem como uma continuação daquilo que
foi tratado na sessão anterior.

21. Programação de atividades:

114
É uma técnica muito utilizada com pacientes deprimidos. Consiste em planejar
um programa de atividades para serem realizadas de vez em quando ou a
cada hora. O propósito é a oposição às cognições comuns como "Já não faço
mais nada". Seu objetivo é proporcionar ao paciente certa sensação de eficácia
e de controle.

21.1 Avaliação da destreza e do prazer:

Para cada atividade que se planeje, pede-se aos pacientes que avaliem em
uma escala (p. ex., de 100 pontos) o grau que consideram ter dominado a
tarefa e também o grau em que desfrutaram dela. Estas duas avaliações são
independentes, visto que o paciente pode ter desfrutado ao fazer algo, apesar
de não tê-lo feito tão bem como costumava fazer. O propósito desta tarefa é
opor-se à cognição, "Nada mais me diverte", e reconhecer que o prazer e a
destreza não são fenômenos dicotômicos. Além disso, aponta para certos
vínculos entre situações e sentimentos que podem ter passado despercebidos
durante a avaliação normal. Por exemplo, pode tornar-se claro que o que o
paciente mais gosta é de ver os amigos íntimos e que esta atividade alivia seus
sentimentos de depressão.

22. A inversão do hábito:

Esta técnica costuma ser empregada no tratamento dos tiques e compõe-se de


dois elementos. O primeiro implica no ensinar ao paciente a perceber cada
ocorrência do hábito e emitir uma resposta fisicamente incompatível. O
segundo implica na identificação de pessoas ou situações que possam
desencadear o tique e fazer com que discuta e pratique a maneira pela qual
realizará as respostas incompatíveis nessas situações. Esta técnica exige
também que o paciente repasse com o terapeuta os inconvenientes causados
pelo tique, que identifique os antecedentes associados com episódios nos
quais haja uma alta ou baixa probabilidade de que o mesmo ocorra, que
aumente a percepção do tique reproduzindo-o deliberadamente e
contemplando-o num espelho, que aprenda a relaxar-se, a auto-registrar
diariamente os comportamentos de tique, e que obtenha o apoio social dos
membros da família para controlar este comportamento. Com esta técnica tem-

115
se modificado, entre outros, tiques como chupar o dedo, piscar
excessivamente, roer as unhas e a tricotilomania.

23. A prática massiva:

A prática massiva é um procedimento paradoxal que tem sido aplicado


principalmente com os tiques. O fundamento teórico do tratamento é que, com
a prática voluntária do tique, muitas vezes em um período de tempo
concentrado, se produzirá a fadiga (quer dizer, a inibição reativa). Quando essa
fadiga alcança um ponto crítico, o paciente já não será capaz de executar o
tique.

24. A prevenção da resposta:

Esta técnica tem sido utilizada principalmente no tratamento do transtorno


obsessivo-compulsivo. Nela expõe-se o paciente ante aos estímulos que
causam o pensamento obsessivo, a ansiedade e o comportamento compulsivo.
Então, evita-se que o paciente se entregue ao comportamento ritualizado, o
que inicialmente provoca um aumento da ansiedade e do pensamento
obsessivo. Depois de uma série de sessões, a ansiedade e as obsessões
costumam reduzir-se gradualmente.

Focalização sensorial não-genital e genital:

O casal é orientado na escolha do dia e situações adequados para exercitar


formas de contato íntimo. Os exercícios incluem carícias e massagens mútuas,
inicialmente sem tocar áreas erógenas ou genitais. Não deve haver expectativa
de ereção, lubrificação vaginal, orgasmo ou ejaculação. Essas técnicas visam:

- Relaxar nas situações de contato físico íntimo;

- Perceber o parceiro e suas preferências;

- Aprender a sentir prazer no contato físico não-erótico;

- Aprender a comunicar seus sentimentos de modos preferidos de contato


físico;

- Aumentar o grau de interações positivas.

116
Segue-se o toque em áreas genitais. Esse exercício tem os mesmos objetivos
do precedente, visando aprender a relaxar e sentir prazer com o contato genital
sem a demanda de ereção, lubrificação, orgasmo, ejaculação ou penetração. A
focalização sensorial é útil em todas as disfunções sexuais.

Solução de Problemas:

S especificar a área geral do problema (specify)

C coletar dados (collect)

I identificar padrões ou fontes (identity)

E examinar opções (examine)

N delimitar e experimentar (narrow)

C comparar os dados (compare)

E ampliar, revisar e substituir (extend)

Resolução de Problemas

- Objetivos da Resolução de Problemas:

1) Ajudar os pacientes a identificar os problemas como causas da disforia;


2) Ajudá-los a reconhecer os recursos que possuem para abordar suas
dificuldades;
3) Ensinar-lhes um método sistemático de superar os problemas atuais;
4) Incrementar seu senso de controle sobre os problemas;
5) Oferecer-lhes um método para lidar com problemas futuros.

Definição dos Problemas >>>> Criação de Soluções Potenciais >>>>


Verificação das Soluções mais Eficazes

- Quando Aplicar :

1) Os problemas do paciente podem ser especificados à clara definição inicial;

2) Os objetivos do paciente parecem irrealistas;

3) ausência do doença psiquiátrica aguda;

117
4) Acordo sobre o contrato inicial à natureza, objetivos e extensão da R.P.

- De maneira geral, é possível dividir as pessoas que podem ser ajudadas pela
R.P. em :

1) Aquelas que geralmente enfrentam bem as situações, mas não o estão


fazendo no momento, talvez devido a uma doença ou a natureza do problema
com que deparam;

2) Aquelas com recursos de enfrentamento insatisfatório.

- Definindo "Problema":

"Situações específicas da vida, presentes ou antecipadas, que exigem


respostas para o funcionamento adaptativo, mas que não recebem respostas
eficazes de afrontamento proveniente das pessoas que se enfrentam com as
situações devido à presença de diversos obstáculos. Esses obstáculos podem
incluir a ambiguidade, a incerteza, as exigências contrapostas, a falta de
recursos e/ou a novidade.

Problema não é só uma característica nem do ambiente nem da pessoa por si


só. Pelo contrário, é um tipo de relação pessoa-ambiente que reflete um
desequilíbrio ou uma discrepância percebidos entre as demandas e a
disponibilidade de uma resposta adaptativa" (Nezu, 1996).

- Problemas Potenciais:

- relacionamento com parceiro ou cônjuge;

- relacionamento com outros membros da família, particularmente filhos mais


jovens;

- empregos ou estudos;

- finanças;

- moradia;

- questões legais;

- isolamento social e relacionamento com amigos;

118
- uso de álcool e drogas;

- saúde mental;

- saúde física;

- ajuste sexual;

- privação e perda eminente.

- Passos para Avaliação:

1) Identificar os problemas do paciente (2/3 sessões);

- exercício cooperativo;

- confecção de uma lista de problemas (enumerar);

- automonitoração;

- verificar quais são as mudanças desejadas (mapeamento e hierarquização de


problemas).

2) Identificar os recursos do paciente;

- habilidades que possui;

- qualidades pessoais;

- pontos fortes e apoio disponíveis;

- fatores potencialmente importantes;

- experiências passados quanto à resolução de problemas;

- uso de métodos de fuga ou evitação para enfrentamento no passado;

- extensão da disforia atual;

- capacidade de formular soluções potenciais;

- existência de um confidente;

119
- se há algum outro profissional disponível para ajudar;

- fatores ambientais (moradia e finanças).

3) Informações provenientes de outras fontes (o paciente deve ser informado e


consentir com este passo);

4) Adequação para Resolução de Problemas;

5) Disposições práticas (esclarecimentos);

- nº de sessões (de 4 a 6);

- duração (de 30 a 60 minutos);

- horário;

- decisão de incluir outras pessoas;

- disponibilizar telefone para contato.

6) Contrato terapêutico;

- Estágios e estratégias na Resolução de problemas (estabelecer uma agenda


de itens a serem abordados de comum acordo no início de cada sessão).

1) Escolha do(s) problema(s) a ser(em) abordado(s) primeiro;


- é preferível iniciar por um problema mais simples, o que implica em uma
melhora na auto-estima e redução do sintomas;

- é o paciente que faz a escolha, entretanto, o terapeuta deve mediar a decisão


com o objetivo de assegurar que o paciente escolha um problema que tenha
probabilidade de manejar.

2) Estabelecer objetivo(s) meta(s) de comum acordo:

- objetivos devem ser realistas e descritos, preferencialmente, em termos


comportamentais;
- devem ser registrados por escrito.

120
3) Elaborar os passos necessários para alcançar objetivo(s);
- lista com possíveis soluções, não importando quão plausíveis pareçam.

4) Decidir tarefas iniciais;

- especificar detalhes das tarefas;

- devem ser realistas práticas e planejadas;

- quando, com quem e com que frequencia;

- antecipar consequencias prováveis, dificuldades previsíveis;

- ensaio cognitivo;

- registro por escrito; diário (detalhes do que conseguiram realizar, resultados


obtidos, grau de satisfação);

- combinações para próxima sessão.

5- Revisão do progresso:

- reforçar esforços positivos independentemente dos resultados;


- três categorias de progresso (êxito na realização das tarefas iniciais, êxito
parcial, nenhum progresso).

6- Estágios subsequnetes da terapia:

- decidir próximo passo, considerando o progresso, e estabelecer as tarefas


subseqüentes;
- proceder, como acima, aos objetivos estabelecidos, ou redefinir problemas e
objetivos;
- trabalhar, se necessário, problemas adicionais.

- Técnicas cognitivas frequentemente utilizadas neste processo:

1) Criar possíveis soluções para os problemas (brainstorming);


2) Vantagens e desvantagens das soluções potenciais (técnica das 2 colunas)

121
3- Ensaio cognitivo;

4- Representação de papéis Role Play e inversão de papéis;

5) Programação de atividades (lista de prioridades, tempo disponível,


cronograma),
6) Contestar crenças errôneas (verificação da validade da crença);

7- Manejo contingencial (atribuição de recompensas);

8) Dar informações e orientação.

- Encerramento:

- O paciente deve ser preparado desde o início para o final da terapia;


- Intervalo de 2 ou 3 semanas entre a penúltima e última sessões de
tratamento;
- Estimular o paciente a planejar estratégias para lidar com problemas futuros;
- Relembrar passos da R.P. (pode ser registrado por escrito);
- Avaliação de cada objetivo para verificar resultados obtidos (feedback)
- Auto-avaliações de auto-estima ou capacidade de enfrentar determinadas
situações (auto-confiança, auto-determinação, auto-gestão);
- Inventário Beck para depressão ou a escala de ansiedade Spielberger.
(sugere-se aplicá-la no início da terapia também para constituição de dados
comparativos).

- Tipos de Solução :

- Solução: "Qualquer resposta de afrontamento destinada a mudar a natureza


da situação problemática, as próprias reações emocionais negativas ou
ambas".

- Solução eficaz: "São aquelas respostas de afrontamento que não só


conseguem estes objetivos, mas que ao mesmo tempo maximizam
conseqüências positivas (benefícios) e minimizam outras negativas (custos)".

- Razão do Fracasso:

- Distúrbio psiquiátrico;

122
- Baixa auto-estima e falta de confiança;

- Problemas do paciente refletem dificuldades de personalidade de longa


duração;
- Falha do terapeuta na fase de avaliação e identificação de problemas.

8 REPERTÓRIO BÁSICO PARA INTERVENÇÃO: AVALIAÇÃO


DO NÍVEL FUNCIONAL E NECESSIDADES PSICOSSOCIAIS DO
DOENTE; O SISTEMA PSICO-NEURO-ENDOCRINOLÓGICO;
ADESÃO AO TRATAMENTO; TEORIAS E MANEJOS DO
ESTRESSE; TEORIAS E MANEJO DA DOR; ESTILOS DE
ENFRENTAMENTO; O IMPACTO DA DOENÇA E DA
HOSPITALIZAÇÃO SOBRE O DOENTE E A FAMÍLIA.
PESQUISAR

9 PRÁTICAS GRUPAIS. A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NA


INTERFACE SAÚDE/ TRABALHO/ EDUCAÇÃO. PESQUISAR

10 A VIOLÊNCIA NA INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA E NA


VELHICE. (FAMILIA É SEGER ITEM 11) PESQUISAR

Nas sociedades ocidentais contemporâneas é na fase da adolescência que


voltam a aflorar os conflitos e angústias do processo de constituição da
subjetividade e da identidade vividos na infância. Entretanto, é nesta fase
também que os jovens se abrem para o mundo e por isso se tornam mais
expostos e vulneráveis aos riscos de serem vítimas de eventos violentos.
Nessa faca de dois gumes os jovens vivenciam, por um lado, as tensões e
ansiedades geradas por uma identidade constantemente ameaçada e que

123
necessita ser reforçada por meio de comportamentos reafirmadores, viris e
agressivos, tornando-os agentes de violência e por outro, a exposição a
agressões e outras formas de violência que estes comportamentos propiciam
transformam-nos em alvo da violência. Não é à toa que é a partir da
adolescência e durante a idade adulta jovem que se tem observado o
crescimento dos índices de violência entre jovens de todos os estratos sociais,
nos quais tomam parte sobretudo como vítimas, mas também como infratores.

Nos indicadores do País, com extensão para os dados em nível mundial,


observa-se o crescente envolvimento de rapazes, cada vez mais jovens, em
situações de violência (OMS, 2002).

Aliado a isso, autores como Cecarelli e Cecchetto destacam o papel


fundamental dos aspectos sociais. Para o primeiro autor, quando o social
apresenta-se de forma perversa (negando as satisfações substitutivas das
pulsões recalcadas), todo o universo psíquico do sujeito corre o risco de se
romper, pois não há porque manter a renúncia pulsional quando não se tem
nada em troca. O resultado é uma ruptura profunda, e até definitiva com o
social.

Dessa forma esse autor explica a delinqüência, ou seja, ela é uma resposta a
um social patológico, perverso. Para a segunda autora a violência não está
referida somente ao gênero masculino.

É mais um sintoma de um problema geral das sociedades, mas é preciso


também problematizar sua vinculação mecânica com a pobreza, aprofundar a
correlação entre pobreza, masculinidade e violência.

Greig) ressalta que precisam ser feitas conexões entre homens, gênero e
violência, a fim de articular mais claramente o papel e a responsabilidade dos
homens no fim da violência baseada no gênero. Para ele é necessário
entender o comportamento dos homens no contexto de suas vidas, focalizar o
processo de socialização que produz conexões entre masculinidade e
violência. Isto destaca o papel da família e da cultura na produção de homens
violentos e inclui questões sobre a violência estrutural de gênero, como uma
construção social que determina uma relação desigual e opressiva entre as

124
pessoas. Inclui ainda questões sobre conexões entre gênero e outras formas
de violência estrutural, em torno da sexualidade, da raça e da classe social e
diferencia o papel e a responsabilidade dos homens em relação a essa
violência.

Significa explorar as conexões entre gênero e violência em um contexto de


estruturas de desigualdade e opressão.

No caso brasileiro essas questões se expressam de forma intensa, tendo em


vista as imensas desigualdades socioeconômicas, estruturais da sociedade e
estruturantes das identidades de gênero, aliadas a uma cultura latina
historicamente machista. Desse modo, enuncia-se o segundo pressuposto do
artigo, o qual considera que tais características constituem o pano de fundo
que serve de cenário para a maior vulnerabilidade do gênero masculino vir a se
envolver com a violência, ora como autor ora como vítima.

Destacam-se a vitimização masculina, os elevados índices de mortalidade e de


internações hospitalares provenientes da violência que incide sobre a
população masculina brasileira contemporaneamente.

As influências das desigualdades sociais nas mortes violentas e alguns


agravos à saúde também foram apontadas nos estudos de Kaplan et al. e
Wallace, mostrando que sociedades com grande concentração de renda
parecem também não investir em políticas públicas sociais.

Os achados de Padilla sobre os efeitos da violência estrutural na saúde mental


de rapazes dos setores urbanos pobres do Peru poderiam ser tomados para se
pensar a realidade brasileira. De acordo com esse autor o desemprego crônico
e a falta de participação geram sentimentos de marginalização e diminuição da
auto-estima provocando crises de identidade, e isso mostra como são
intrincadas as influências dos aspectos sociais no equilíbrio psíquico e bem-
estar, e na participação comunitária do indivíduo.

As reflexões acima, que partem de alguns pontos de vista sociológicos,


encontram respaldo em estudos epidemiológicos que demonstraram a
existência de associações entre mortalidade pós-neonatal e padrões
geográficos de pobreza, indicando que a prevenção da mortalidade infantil

125
deve focalizar características físicas, culturais e psicossociais das comunidades
e que é extremamente necessário atuar em áreas segregadas pela ampla e
extrema condição de pobreza.

Costa et al.), em análise de série temporal sobre a tendência decrescente da


mortalidade infantil no Brasil em um período de crise econômica, observaram
fortes correlações da mortalidade infantil com indicadores demográficos,
socioeconômicos e de atenção à saúde.

Entretanto, questionam se as políticas públicas serão capazes de garantir esse


ritmo de redução caso persistam as crises econômicas e o aumento da
exclusão social com aprofundamento das desigualdades no acesso aos
serviços de saúde e aos bens de consumo coletivo.

No caso específico da mortalidade por violência, Szwarcwald & Castilho


realizaram uma análise espacial da mortalidade por armas de fogo no Estado
do Rio de Janeiro, no período de 1979 a 1992, conforme sexo, idade e região
de residência (capital, cinturão metropolitano e interior do Estado). O estudo
constata o maior crescimento das mortes por armas de fogo entre adolescentes
de 15 aos 19 anos e adultos jovens de 20 aos 24 anos, do sexo masculino e
uma nítida interiorização dessas mortes.

No início do período observou-se uma disseminação em direção aos


municípios situados na costa leste do Estado, seguindo o trajeto da BR-101,
uma rodovia federal que liga o Rio de Janeiro ao Estado do Espírito Santo. Já
no período entre 1990 e 1992, a difusão ocorreu em todas as direções,
mostrando que o fenômeno não se concentra mais nos bolsões de pobreza das
metrópoles. No caso do Rio de Janeiro destacam dois aspectos: 1) o crime
organizado intensificado nos anos 80 em torno do tráfico de drogas e do
contrabando de armas para o controle dos pontos de venda; e 2) o crescente
porte de armas por parte da população civil como forma de se garantir contra o
sentimento de insegurança diante dos crescentes índices de criminalidade.

126
Estudos de Cruz, Najar e Lima também evidenciaram a forte influência das
características das áreas nos diferenciais de mortalidade por violência nas
realidades do Rio de Janeiro e de Pernambuco.

Szwarcwald & Castilho ressaltam a necessidade de compreender por que


certos segmentos populacionais são tão vulneráveis, acarretando uma
propagação tão rápida das mortes por armas de fogo, e lembram que
pesquisas com grupos sociais específicos sugerem relação entre homicídios e
consumo de drogas. Contudo, resultados mais conclusivos associam
homicídios com o tráfico de drogas.

Por outro lado, as conexões entre violência e uso de drogas são debatidas por
Minayo & Deslandes) que apontam as dificuldades e a obscuridade no
estabelecimento das relações causais entre drogas e violência. As autoras
destacam a necessidade de discernir entre o uso de drogas como um fator que
desencadeia comportamentos violentos e esse uso como fator causador.

Para elas a única afirmação que se pode fazer com segurança é a alta
proporção de atos violentos quando as drogas estão presentes.

No caso do Brasil, segundo Szwarcwald & Castilho, a entrada de crianças e


jovens carentes nas atividades ilegais do narcotráfico é um processo facilitado
pelas aparentes vantagens imediatas do dinheiro fácil, a ilusão do poder pelo
porte de armas, a identificação com a imagem do bandido herói, a falta de
outras oportunidades no mercado de trabalho e o desejo de se expor ao perigo
e à aventura, que parece estar ocorrendo entre jovens das diversas camadas
sociais.

No Brasil, parece ser cada vez maior o envolvimento de rapazes de classe


média e alta – denominados pitboys – em eventos violentos como brigas em
boites, espancamentos de pessoas discriminadas como mendigos e
homossexuais, ao mesmo tempo em que também parece ser ascendente a
prática de esportes radicais e arriscados por essa camada jovem da população.

A implantação de políticas alternativas, integradoras e sobretudo inclusivas,


dirigidas para os jovens poderia diminuir os índices de violência e, portanto,
resolveria parcela considerável do problema. Entretanto, também é necessário

127
realizar uma profunda reflexão sobre os valores, as formas de socialização e a
construção das identidades masculina e feminina nas sociedades atuais.
Enquanto pais derem armas de brinquedo ou reais a seus filhos do sexo
masculino e incentivarem neles a competitividade e o individualismo tão
amplamente disseminados socialmente, ao invés da solidariedade; enquanto
não for permitido aos homens expressarem suas fragilidades, sem que isso
signifique a perda de sua masculinidade, estar-se-á contribuindo para a
reprodução e perpetuação desse estado de coisas e os jovens continuarão
morrendo pelas armas e pelo trânsito. Contraditoriamente, esses são os
mesmos meios aos quais aspiram desesperadamente como forma de terem
uma vida e uma identidade reconhecidas.

Para finalizar é importante ressaltar que muito ainda precisa ser investigado,
tanto em termos conceituais como de fatores determinantes e de risco para a
maior compreensão da intrincada dinâmica das relações entre masculinidade e
violência. Um dos pontos que necessita ser aprofundado é a própria noção de
risco com a qual as diferentes disciplinas trabalham.

Como bem lembram Minayo et al. O conceito de risco não tem fronteiras
acadêmicas definidas e pode ser abordado tanto pela epidemiologia (sendo um
de seus conceitos centrais) como pela sociologia, ciências políticas, economia
e antropologia.

Do ponto de vista epidemiológico, o risco, hoje, tem uma conotação negativa.


No entanto, a discussão de Deslandes et al. sobre o risco em relação às
doenças sexualmente transmissíveis e Aids traz uma outra conotação e pode
muito bem ser apropriada para o tema da masculinidade e violência aqui
abordado. Esses autores ressaltam que, do ponto de vista epidemiológico a
noção de “correr risco” exclui qualquer reconhecimento dos benefícios (reais ou
percebidos) pelo indivíduo, o “gosto pela aventura”, a “prova de coragem”. Ora,
isso é exatamente o que se espera sobretudo dos homens jovens, como forma
de garantir uma identidade masculina. Deslandes et al. lembram que nas
abordagens epidemiológicas sobre comportamentos de risco o pressuposto é
que o indivíduo devidamente informado poderia escolher racionalmente, diante
das muitas opções de ações, aquela que não lhe traria danos. Contudo,

128
autores da antropologia como Connors defendem que a vivência do risco e sua
percepção são negociadas na rede de relações sociais. Os comportamentos de
risco são frutos das interações sociais e é neste campo que as estratégias de
prevenção deveriam atuar. Convém salientar que nessas negociações
precisam ser incluídas as identidades e as práticas de gênero, pois,
parafraseando Morelba, a discussão sobre gênero e violência é a via para uma
cultura mais igualitária.

11 O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO E AS DOENÇAS


DEGENERATIVAS.

O aumento do segmento da população idosa coloca para toda a sociedade


inúmeros problemas para o próximo milênio. No setor saúde, por exemplo,
“esta questão apresenta-se como um problema de enorme seriedade,
configurada, entre outras coisas, pela falta de hospitais geriátricos, pela
subtração dos leitos hospitalares e pela falta de profissionais de saúde
especializados em Geriatria e Gerontologia. Por outro lado, a incidência dos
quadros crônico-degenerativos, que atingem principalmente este segmento
populacional, demanda internações mais frequentes e maior uso de
medicamentos (muitas das vezes impossíveis de serem obtidos, tendo em vista
as aposentadorias aviltantes que impedem a aquisição de produtos
farmacêuticos). Podemos acrescentar ainda, a falta de uma política de saúde
voltada para a prevenção, com explicações claras para a população das
consequências que determinados hábitos, como o fumo, o álcool, a ingestão de
gorduras e o sedentarismo poderão acarretar em idade posterior, ou seja, das
possíveis doenças que poderão se manifestar oriundas deste modo de vida”.

Deve-se enfocar que os problemas acima descritos ferem profundamente uma


condição de cidadania estabelecida de forma tão clara na Constituição
Brasileira de 1988 – como o direito à saúde provido pelo Estado – e que, sem
dúvida, o seu desrespeito traz implicações diretas para as condições gerais de
vida dos indivíduos da terceira idade.

A palavra “velho” traduz um arsenal de estereótipos sociais e sentimentos


negativos: é aquilo que não tem utilidade, que está fora de moda, que é antigo,

129
que está gasto, ou que não adéqua-se à realidade presente. Ao contrário, a
palavra “idoso” traduz uma série de valores ainda considerados como
importantes, como experiência, sabedoria, tranquilidade, paciência. A velhice (e
todos os seus estereótipos) é transferida para o outro.

Uma das justificativas que os idosos apresentam para não serem classificados
como velhos é a da lucidez, ou seja, enquanto estão lúcidos (não perderam as
noções de tempo, espaço, reconhecem as pessoas que o cercam, etc.) não
podem ser descritos como velhos.

A velhice não depende da idade cronológica, mas sim das atitudes que o
indivíduo tem perante as circunstâncias da vida. É o que os idosos descrevem
como “estado de espírito”. Desta forma, o fato de ser considerado “velho”
depende de fatores subjetivos, que se traduzem por atitudes pessimistas e
derrotistas.

Outro elemento, que se soma ao que eles descreveram como "estados de


espírito", é o fato de estarem se exercitando, de conseguirem movimentar-se
sozinhos, de não dependerem de terceiros para executar suas tarefas, enfim,
de manterem a sua independência e autonomia.

Um outro ponto que caracteriza uma pessoa como “velha” é a sua capacidade
de exercer uma atividade laborativa. Isto, em outras palavras, significa que: se
podem trabalhar ainda, se conseguem ainda manter o seu sustento e se não
são um “peso” para seus familiares, então, não podem ser considerados como
velhos.

O sentimento de "estar velho" está completamente associado à morte e à


solidão. O idoso acredita que está velho quando seus amigos e parentes
faleceram e ele acabou ficando sozinho, pois não constituiu novos laços de
amizade. Ao constatar a morte dos parentes e das pessoas próximas, imagina
que está chegando a sua “hora” também. Há uma sensação de ter se
aposentado da vida, e ter perdido o interesse pelas coisas.

Seriam os bens materiais a via para se alcançar uma boa qualidade de vida?
Sem dúvida, alguns bens materiais (em seu sentido genérico, que incluem as
artes, a diversão e o lazer) e o seu consumo são indispensáveis para atender

130
às necessidades humanas, visto que, sem eles, o desgaste físico ao qual
estamos sujeitos em nosso cotidiano, oriundo de uma maior carga de trabalho,
reduziria a nossa qualidade de vida. Sem mencionar o fato de que estaríamos
sendo privados do prazer proporcionados por eles.

Entretanto, a sociedade capitalista, na qual vivemos, está constantemente


produzindo novas necessidades, associando a satisfação das mesmas ao bem-
estar (ou felicidade), através da via do consumo. Crocker destaca que, de
acordo com os relatos de Adam Smith, no século XVIII, na Inglaterra, havia a
obrigatoriedade dos homens usarem camisas de linho em aparições públicas.
A importância de estar na moda, para aparecer em público, sem sentir
vergonha, fazia da camisa de linho uma necessidade. Podemos dizer que hoje
as necessidades são, primordialmente, originadas pela mídia que dita a moda e
os costumes. É a lógica do ter como sinônimo de auto-realização.

Mais uma vez, deve-se reforçar que não se está sugerindo aqui que os bens
materiais, que facilitam a vida do homem, sejam dissociados do conceito de
bem-estar, muito pelo contrário, “as pessoas sequer podem ser, para não falar
em ter bem-estar ou uma boa vida, se não dispõem de certos bens”. O que se
busca enfatizar é que não é só através do consumo, incitado a todo instante
pelos meios de comunicação, que o homem pode alcançar o bem-estar, a
felicidade. Até mesmo porque a felicidade proporcionada por determinado bem
material é momentânea se for fruto apenas de um consumismo compulsivo.

Por que é importante para a área de Saúde Pública explorar temas como a
“qualidade de vida”? Em resposta, podemos afirmar que tudo aquilo que se
refira ao ganho de bem-estar e, consequentemente, da melhoria da qualidade
de vida vai estar relacionado à saúde das pessoas. Neste sentido, Dejours
destaca que “quando temos uma doença, esta tem momentos de evolução, de
crises, que não acontecem a qualquer momento da vida. Elas ocorrem
justamente em momentos precisos, quando se passa alguma coisa no plano
psíquico, no plano mental, no plano afetivo”. Em virtude deste fato, o ganho de
bem-estar pode proporcionar a diminuição das doenças psicossomáticas
(relacionadas à tristeza, à melancolia, ao stress etc.), traduzindo-se, portanto,
em melhoria da qualidade de vida.

131
A OMS, por exemplo, define “saúde” como um estado de completo bem-estar
biopsicossocial. Contudo, devemos destacar que esta definição mostra-se
insuficiente, pois não podemos afirmar que exista uma condição de total bem-
estar. O bem-estar não é um estado estável que, uma vez conseguido, possa
ser mantido indefinidamente. Em nossas vidas existem ciclos, momentos de
bem-estar, momentos de angústia, momentos de sofrimento. Dejours afirma
que “não há um estado de bem-estar e de conforto, mas há, (...) fins, objetivos,
desejos, esperanças”. Estamos, portanto, constantemente desejando alcançar
a melhoria da nossa qualidade de vida, através de ganhos adicionais de bem-
estar.

Um outro ponto importante deve ser destacado: a qualidade de vida, como


produto histórico e social, está também enredada pelas condições postas
atualmente pela globalização. Entende-se aqui que a globalização imprime
ritmos e velocidades sem precedentes à informação, derrubando as barreiras
da comunicação e da distância. Hoje é cada vez mais comum falarmos em um
produto global, onde determinado país elabora os projetos, busca-se em outros
países a mão-de-obra mais barata, e em outros a matéria-prima. Isto sem falar
na exportação das linhas de montagens para além das fronteiras, fazendo com
que determinadas peças, ou partes de um produto, sejam fabricadas em
diferentes partes do mundo e, por sua vez, montadas em tantas outras.

Além disso, devem ser salientadas outras consequências que surgiram neste
processo de globalização, como o acirramento dos embates entre os próprios
trabalhadores, através do aumento da competitividade que, em última
instância, causa o rebaixamento dos salários (já que a oferta é maior do que a
procura), desencadeando a pauperização de grandes contingentes operários.
Vaitsman assinala que a globalização da economia, o desenvolvimento de
novas tecnologias de trabalho e a unificação do mercado mundial trazem como
consequências mudanças no que se refere à igualdade social, à fragmentação
social, à favelização das cidades e à exclusão social. Ademais, a violência
apresenta-se como um fator decorrente da precarização das condições sociais.

Estas considerações servem para pontuar que a qualidade de vida se exerce,


também, numa esfera social, portanto, não podemos ignorar os acontecimentos

132
globais que ocorrem atualmente que afetam diretamente milhões de vidas. A
globalização é um deles, pois altera a relação das pessoas com o trabalho e
com o meio ambiente. Além disso, acentua as desigualdades sociais e a
pobreza, contribuindo, desta forma, para a diminuição da qualidade de vida de
grandes contingentes populacionais.

Mas este processo de globalização também possui inúmeros pontos positivos


como, por exemplo, o acesso aos bens facilitadores da vida moderna
(eletrodomésticos, meios de transporte, etc.) que recebem aqui um destaque
devido ao enorme salto que eles proporcionam à humanidade no que tange à
melhoria do bem-estar e, consequentemente, da qualidade de vida.

Ainda neste contexto, o desenvolvimento das tecnologias biomédicas traz à


tona analgésicos mais potentes, tranquilizantes para auxílio do sono, próteses
que garantem maior mobilidade, terapias menos agressivas de combate às
doenças crônico-degenerativas, aparelhos que detectam tumores de forma
bastante precoce, entre tantas outras inovações.

Resta ainda um esclarecimento importante: por que então constantemente


associamos a qualidade de vida da população brasileira a itens como a Saúde,
por exemplo, se esta é tida como universal e um direito de todos? Porque
embora seja de direito não o é de fato. Existe um certo conformismo e uma
certa relativização, uma falta de solidariedade entre as classes que, a princípio,
não mais se chocam, que não se sentem mais absortas ante situações
calamitosas. É o discurso do “isto não me diz respeito, já que trabalho e possuo
o meu plano de saúde privado”. Chegamos, portanto, ao cerne da questão: a
qualidade de vida depende da adoção de princípios éticos por parte de toda a
sociedade. Tais princípios, segundo Almeida & Schramm referem-se “à busca
daquilo que se pode julgar como o bem (ou o bom) numa determinada época
ou sociedade”.

Uma primeira definição para qualidade de vida vem atrelada ao estar no mundo
com os outros, ou seja, ela depende intimamente do relacionamento com o
outro e do convívio familiar.

133
Um outro ponto que deve ser destacado em relação à qualidade de vida diz
respeito tanto às condições financeiras quanto às de saúde. Muitos idosos
associaram diretamente uma vida com qualidade às condições materiais.

No Brasil, foi o SESC, em 1964, que atuou de forma pioneira na implantação


de programas voltados para o bem-estar dos idosos (não asilados), através da
criação de um grupo de aposentados. Já no início da década de 70, surge o
MOPI (Movimento Pró-Idoso), preocupado em “promover a formação de
recursos humanos especializados, assim como desenvolver atividades
socioculturais para os idosos”.

Foi também o SESC, em 1977, que deu origem às Universidades da Terceira


Idade, ao fundar a Escola Aberta da Terceira Idade. Sem dúvida, as
universidades para a terceira idade são uma forma de aumentar a qualidade de
vida

Contudo, somente a partir da década de 90, podemos constatar o aumento dos


programas destinados aos idosos no Brasil. Isto se deve a alguns fatores, tais
como: o Plano de Ação Mundial sobre o Envelhecimento (PAME), a Política
Nacional do Idoso (PNI) e a mobilização da sociedade civil.

No Brasil, entretanto, somente uma década depois do PAME é que podemos


que ver as ações (traduzidas sob a forma de legislação) que foram ao encontro
das necessidades da população idosa, através da PNI (Política Nacional do
Idoso), regulamentada pelo Decreto-Lei nº 1948, de 03 de julho de 1996. Para
que isto ocorresse:

“Foi necessário que o aumento expressivo deste contingente atingisse um


número alarmante nas projeções para as próximas duas décadas para que as
autoridades despertassem para esta realidade latente.

Aliados às projeções dos dados epidemiológicos, como forma de pressão para


a tomada de iniciativas urgentes por parte do Estado, estão os lobbies feitos no
Congresso Nacional, no período que sucedeu a promulgação da Constituição
Federal, de 1988, pelos aposentados em torno dos 147% de aumento dos seus
benefícios, visando à garantia de um patamar mínimo para o reajuste de suas

134
aposentadorias e pensões. Este fato configurou-se como o maior movimento
organizado de expressão nacional nas últimas décadas.

12 ÁLCOOL, TABAGISMO, OUTRAS DROGAS E REDUÇÃO DE


DANOS. ITEM 5 TRATAMENTO E PREVENÇÃO DA DEPENDÊNCIA
QUÍMICA. SESA

Para Dalgalarrondo, drogas psicoativas são substâncias químicas que, quando


ingeridas, produzem efeitos psíquicos e comportamentais, tendo em vista as
modificações de funções do Sistema Nervoso Central (SNC), ocasionadas por
ingestões repetitivas e excessivas. O autor define a Síndrome de Dependência
ao Álcool (SDA) como um estado físico e psíquico ocasionado por uma perda
de controle como conseqüência da repetitiva e compulsiva ingestão de bebidas
alcoólicas de modo contínuo e periódico.

De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais –


DSM-IV, o depressor cerebral utilizado com maior freqüência é o álcool, sendo
que tal utilização resulta em significativa morbidade e mortalidade. Riscos de
acidente, violência e suicídio são observados com maior freqüência em
dependentes de álcool, além de transtornos associados ao seu consumo, como
intoxicação, abstinência, delirium por abstinência, delírio de ciúmes, demência
persistente induzida por álcool, transtorno psicótico, transtorno do humor,
transtorno amnésico, transtorno de ansiedade, disfunção sexual e transtornos
do sono.

Segundo o DSM-IV, a dependência de álcool caracteriza-se por evidências de


tolerância ou sintomas de abstinência. Apesar das conseqüências adversas, os
indivíduos podem continuar consumindo álcool para aliviar os sintomas de
abstinência, que podem ser desagradáveis e intensos. Em caso de consumo
compulsivo, apesar das conseqüências físicas e psicológicas adversas, os
indivíduos continuam usando o álcool.

O abuso está relacionado a situações de consumo em circunstâncias contra-


indicadas, cujos efeitos posteriores possam interferir no desempenho escolar e

135
ocupacional, bem como nas relações sociais ou interpessoais. Quando
acompanhados por evidências de comportamentos compulsivos ou abstinência
e tolerância, deve ser considerado um diagnóstico de Dependência de Álcool.

Zago aponta para estudos que têm atribuído as causas do alcoolismo a fatores
individuais, culturais e sociais e até mesmo a interação desses fatores. Tais
estudos vêm ao encontro da proposição de teorias biológicas,
comportamentais, psicológicas, psicodinâmicas e socioculturais, acerca da
etiologia do alcoolismo, entretanto, sem conclusões definitivas, já que não há
um consenso entre os pesquisadores sobre um fator determinante para uma
explicação causal.

O problema, que afeta a saúde física e mental do indivíduo, além de sua


adaptação familiar, social e ocupacional, tem no alcoolismo, seu grande
responsável.

Os estudos epidemiológicos (6,2%) apontaram para fatores que contribuíam


para o consumo de álcool, como a associação com outras drogas, o baixo nível
de escolaridade, a classe social, o estado civil, a faixa etária, o gênero, a
estrutura familiar, as psicopatologias associadas, dentre outras variáveis
socioculturais. Apesar do predomínio do quadro de alcoolismo encontrado na
população masculina, foram localizadas 14 pesquisas com mulheres
dependentes de álcool, representando 8,7% dos estudos revisados.

Etiologicamente, as pesquisas referiam-se à importância da gênese do


alcoolismo e seu contexto junto às representações sociais entendidas em um
paradigma psico-orgânicosócio-afetivo, a hereditariedade filial cuja
vulnerabilidade de problemas comportamentais e emocionais pôde ser
observada; fatores de predisposição à procura de novidades e o consumo
abusivo de substâncias alcoólicas, propriamente ditas, geralmente iniciadas na
adolescência.

Os fatores orgânicos (15,5%) englobaram estudos sobre crises convulsivas,


neuropatia óptica e outras patologias visuais, doenças gastrintestinais e
hepáticas, efeitos metabólicos e nutricionais na gravidez e no recém-nascido,

136
ritmo circadiano, doença vascular-encefálica, seqüelas neurológicas, entre
outras complicações ocasionadas pela ingestão de álcool.

Entre os transtornos (11,2%) encontraram-se estudos relacionados à fobia


social, à alexitimia, ao neuroticismo, ao transtorno de estresse pós-traumático,
ao transtorno obsessivo compulsivo, ao delírio de ciúmes, à depressão, aos
transtornos somáticos, aos jogos patológicos, ao déficit de atenção, à memória
e ao raciocínio abstrato, à ansiedade, à baixa tolerância à frustração e aos
sintomas histéricos.

Os estudos sobre violência (5%) predominaram nos trabalhos de delineamento


conceitual, sendo um estudo sobre a associação do uso de álcool/ substâncias
psicoativas e criminalidade, três estudos relacionando a violência doméstica
praticada por usuário de álcool, sendo que dois deles estabeleciam uma
correlação entre o abuso sexual em mulheres e posterior dependência de
álcool e drogas. Dois estudos empíricos ressaltaram a relação entre alcoolismo
e violência, sendo que um deles abordou a questão no âmbito familiar.

Entre os aspectos motivacionais (8,9%), cabe destaque às percepções e ações


do alcoolista sobre si mesmo e em sua interação com o meio, o desejo de
parar de beber, a exposição a situações aversivas associadas ao consumo
alcoólico, à esquiva de situações de risco e ao suporte social, inclusive familiar,
como fatores facilitadores para o enfrentamento da dependência e procura de
tratamento, independentemente do sexo. Em contrapartida, os ganhos
associados ao consumo, o favorecimento de encontros coletivos, excesso de
otimismo em si mesmo, a função da substância alcoólica percebida como
anestésico para o sofrimento (perdas afetivas) foram considerados fatores
impeditivos para a reabilitação e percepção da realidade. Alguns estudos
abordaram os estágios motivacionais do alcoolista para parar de beber, que se
encontram intimamente ligados aos aspectos socioculturais.

A compreensão psicodinâmica (11,2%) acerca do alcoolismo foi destacada nos


estudos de revisão de literatura, abordando aspectos relativos ao caráter oral,
às relações objetais e transferenciais, aos objetos transicionais e aos
mecanismos de defesa, com base no trabalho de autores como Freud,
Winnicott, entre outros.

137
Nos estudos empíricos, no delineamento de estudos de caso, as relações
objetais, ansiedades e mecanismos defensivos, religiosidade e sistema familiar
foram abordados.

Nos estudos comparativos, destacaram-se dois trabalhos com filhos de


alcoolistas que apontaram para a timidez, a insegurança e a baixa auto-estima
relacionadas às dificuldades escolares, independentemente do sexo.

Os estudos com mulheres alcoolistas apontaram para a presença de tristeza,


depressão, ansiedade, baixa tolerância à frustração e maior prejuízo nas
relações afetivas.

A dinâmica conjugal foi destacada em 1,9% dos estudos, abordando a


estrutura e a organização da relação do casal e a co-dependência quando um
dos cônjuges era alcoolista, além dos modos de enfrentamento. Nas mulheres
foi apontada uma tendência à minimização do alcoolismo do parceiro, com o
adiamento do enfrentamento do problema; outro estudo referia-se às práticas
supersticiosas por mulheres de alcoolistas.

A referência à dinâmica familiar foi encontrada em 6,2% das publicações. A


ênfase, também, referia-se às pesquisas sobre a organização do sistema
familiar diante de comportamentos e situações de violência decorrentes do uso
abusivo de bebidas alcoólicas, a co-dependência dos familiares e ao papel que
estes exerciam sobre a supressão ou manutenção do consumo alcoólico.

Nos estudos experimentais predominaram os estudos realizados com o


delineamento de estudo de grupos na maioria dos contextos de tratamento:
ambulatorial (29,8%), hospitalar (22,8%). O contexto comunitário fez-se
presente em 14,9% dos estudos e o contexto do ambiente de trabalho em
8,8%, apontando para novas formas de se tratar das questões referentes ao
alcoolismo. Os estudos com crianças e adolescentes predominaram no
contexto escolar (9,6%). Nesses três contextos observou-se também a
preocupação com o rastreamento do alcoolismo e o incremento de
intervenções preventivas. Programas e Núcleos também foram descritos e
destacados em 7,9% dos estudos empíricos.

138
No delineamento de estudo de grupos, a maioria dos resumos revisados
referiam-se a pesquisas com pacientes em tratamento, tais como a auto-ajuda,
principalmente com os grupos dos Alcoólicos Anônimos; tratamento
farmacológico destacando-se os efeitos da carbamazepina-buspirona; o
tratamento psicoterápico, ressaltando a possibilidade de tratamento
psicanalítico para alcoolistas, a orientação familiar, as intervenções
motivacionais breves e outras modalidades terapêuticas não especificadas; o
tratamento psiquiátrico; a prevenção, por meio da inserção do psicólogo em
ações educativas e preventivas ao uso de álcool e outras drogas, a
conscientização com vistas à redução de danos e de recaídas;
reabilitação/enfrentamento; técnicas de avaliação psicológica, com a utilização
de instrumentos para análise e validação; outras modalidades de tratamento,
dentre as quais estão as assistências médicas e de enfermagem.

Nos trabalhos de delineamento conceitual a descrição de Programas e Núcleos


ocorreu em 12,8% dos trabalhos; os aspectos ligados às intervenções
preventivas em 6,4% e a preocupação com o rastreamento em 2,1%.

A magnitude epidemiológica do uso indevido de álcool e outras drogas,


verificada nas últimas décadas, tomou proporção de grave problema de saúde
pública no país. Além disso, este contexto também se reflete nos demais
segmentos da sociedade por sua relação comprovada com os agravos sociais.

Ciente deste fato, o Ministério da Saúde vem definindo, ao longo do tempo,


estratégias de enfrentamento que visam ao fortalecimento da rede de
assistência aos usuários de álcool e outras drogas, com ênfase na reabilitação
e reinserção social dos mesmos.

Inúmeras evidências respaldadas por pesquisas epidemiológicas rigorosas,


como as desenvolvidas pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas
Psicotrópicas – CEBRID e apontadas pela Área Técnica de Saúde Mental na
proposta de normalização, atestam a magnitude crescente dos problemas
relacionados ao uso abusivo de álcool e outras drogas. Estes dados referem-se
às repercussões, como o número de internações psiquiátricas por uso de álcool
e outras drogas, internações em hospitais gerais e consultas ambulatoriais por
complicações clínicas (como cirrose, AIDS, etc...), diminuição da idade de início

139
do consumo, crescimento da violência relacionada ao abuso, inclusive
acidentes, conseqüências no trabalho, como aumento do absenteísmo e queda
na produtividade.

Todas essas evidências provocam o questionamento sobre a insuficiência de


investimentos na abordagem dos problemas relacionados ao uso de álcool e
outras drogas.

O modelo de assistência indicado é fundamentalmente ambulatorial. As


internações são recursos de uso para determinados casos específicos,
devendo ser de curta duração. As indicações de internação são os quadros de
emergência que incluem risco de auto ou hetero agressão, quadros graves de
intoxicação e abstinência.

Internações voluntárias de curta duração, até 15 dias, podem ser indicadas em


situações em que pacientes apresentam uso compulsivo e dificuldade de
aderirem ao tratamento.

As enfermarias de psiquiatria em hospitais gerais são o local para a realização


destas internações. (Internações em hospitais psiquiátricos, com projeto
técnico especifico, só são indicadas no caso em que estas unidades tenham
serviço em espaço específico para o atendimento a usuários de drogas).

ÁLCOOL A maioria das pesquisas realizadas com adultos da população geral


sugerem uma prevalência entre 5 e 10% para abuso e dependência do álcool,
sendo que nos homens encontra-se uma freqüência pelo menos duas vezes
maior que nas mulheres.

O alcoolismo é considerado a quarta causa de morte entre homens de 20 a 40


anos, oitava causa de incapacidade e terceira causa de absenteísmo no
trabalho. Ainda representa 20% do total de suicídios e 40% de separações
conjugais. As características mais importantes da doença são seus aspectos
primário, progressivo, crônico e fatal, mas que pode ser sustada nos seus
estágios evolutivos. Daí a importância do diagnóstico precoce e
recomendações de tratamento específico.

140
É uma doença em que se deve considerar fatores biológicos, sociais,
comportamentais e de estilo de vida, e que também se expressa em função da
vulnerabilidade do indivíduo. A pessoa vista primeiro como tal e depois como
um quadro psicopatológico, precisa ser percebida em um contexto maior, que
envolve a própria família e a comunidade.

A decisão de desintoxicar ou não um paciente no ambiente ambulatorial e


domiciliar traz uma série de implicações a serem consideradas. Para garantir
que a desintoxicação seja segura e bem conduzida, os seguintes fatores
devem ser levados em conta:

Adesão e continuidade do tratamento

O desejo do paciente para se submeter à desintoxicação e aderir às instruções


do médico, por exemplo, não ingerindo outros medicamentos além dos
prescritos e não consumindo álcool, é o passo inicial do tratamento. A adesão é
fundamental quando o paciente permanece em seu ambiente domiciliar e de
trabalho, sendo necessário que ele expresse claramente o desejo de se
submeter à desintoxicação.

Outra situação é aquela em que o paciente precisa ser convencido de que a


desintoxicação é necessária por questões médicas. Neste caso, exames
laboratoriais servem para demonstrar a severidade da condição clínica e a
necessidade para este atendimento.

Considerando as dificuldades para captação do alcoolista e sua sensibilização


para o tratamento, neste Programa enfatiza-se o uso de instrumentos pelo
clínico ou médico de família para detecção do problema na consulta regular.
Para isso foi desenvolvido um protocolo específico a ser usado na consulta
clínica, que identifica sinais que podem estar relacionados a
comprometimentos orgânicos em decorrência do abuso de álcool.

O usuário precisa ser orientado de que as medicações usadas devem ser


apenas aquelas prescritas pelo médico. Faz-se isto porque, com freqüência,
são identificadas pessoas que usam álcool e se automedicam. Esta maneira de
lidar com a frustração e a dor parece ser reforçada por uma cultura de uso

141
abusivo de drogas, que traz riscos à saúde e à vida das pessoas, podendo
chegar à overdose e morte.

No tratamento do alcoolista nas unidades de saúde em Curitiba é oferecida a


possibilidade de realização de um contrato com o paciente, como recurso para
o médico reforçar o compromisso entre o paciente e a equipe que faz o
atendimento. O acordo pode ser verbal ou escrito; neste último caso, existe um
modelo de contrato no Manual do Programa. Este acordo deve ser assinado
pelo paciente e um representante da equipe de saúde, com quem ele
estabelece maior vínculo. Sempre que houver lapsos ou recaídas, o processo
de tratamento deverá ser reiniciado.

Foi definido que o objetivo do tratamento não é apenas alcançar a


abstinência, mas fazer mudanças no estilo de vida, com aquisição de
hábitos de vida mais saudáveis. Neste sentido, o processo de desintoxicação
deve ser entendido pelo paciente como um passo para a mudança. O médico
deve considerar esta doença como uma condição crônica, que requer cuidado
prolongado. Ele pode assumir um papel de terapeuta, fazendo orientações
psicossociais e, quando não se sentir apto, deve encaminhar o paciente para
serviço especializado ou pedir assessoramento.

Acompanhamento do caso e abordagem familiar

A disponibilidade de uma pessoa, por exemplo, familiar ou amigo confiável, que


faça o acompanhamento do paciente durante a desintoxicação é um fator de
relevância para o tratamento. Geralmente os familiares e, de modo especial,
quando são estes os primeiros a buscar atendimento, se dispõem a
acompanhar o paciente em casa nos dias em que este usa a medicação e se
abstém do álcool. A existência de álcool em casa e a identificação de sinais
que provoquem o desejo compulsivo de beber (fissura) são avaliados na
consulta inicial. Um esforço adicional para interpor barreiras ao uso do álcool,
contando com auxílio de outras pessoas, pode ser um fator decisivo na
condução do tratamento.

O tratamento com familiares de alcoolistas inclui a provisão de informação


sobre a enfermidade, como reconhecer sinais de severidade na abstinência e

142
intercorrências que requeiram atenção médica de emergência. Familiares
também devem ser informados sobre o tipo e dose de medicação que o
paciente deve tomar, além dos cuidados que isto envolve e riscos no uso de
dosagem errada. Deve ser enfatizada a importância de abstenção do uso do
álcool, para que o tratamento seja efetivo.

O acompanhamento e prevenção de recaídas incluem intervenções feitas pela


equipe clínica, tanto ao paciente como a sua família, através de orientações
para envolvimento em grupos de ajuda e acompanhamento ao tratamento
ambulatorial. O atendimento a pacientes com capacidade cognitiva
comprometida reforça a necessidade do envolvimento familiar.

A implicação da família no processo de tratamento é enfatizada nas unidades


de Programa de Saúde da Família (PSF). A articulação com equipes do PSF
ocorre através da supervisão feita pelas equipes distritais de saúde mental –
existem oito equipes, uma em cada distrito. As equipes distritais são
constituídas por psicólogos, assistentes sociais e médicos. A supervisão inclui:
discussão de casos clínicos, capacitação em serviço e acompanhamento nas
visitas domiciliares. Esta articulação foi ampliada pela coordenação do
Programa, oferecendo cursos de capacitação em alcoolismo e de trabalho com
grupos. As unidades do PSF têm melhores condições de fazer o trabalho na
prevenção de recaídas, devido à sua disponibilidade de tempo, aproximação do
contexto domiciliar e uso de ferramentas próprias.

A desintoxicação como procedimento clínico é viável em todas as unidades de


saúde e pode ser potencializada com a utilização da metodologia do PSF na
abordagem dos problemas da comunidade, o que permite identificar fatores de
risco e intervenções efetivas no tratamento do alcoolismo. O PSF deve se
estabelecer seguindo os princípios descritos por McWhinney, a saber: (1) o
profissional de saúde da família é um clínico hábil, (2) é uma fonte de recursos
para o paciente, a família e a comunidade, (3) trabalha com base na
comunidade, (4) valoriza a relação equipe-paciente.

Na aplicação destes princípios, o profissional enxerga a pessoa e tem


compromisso com ela, trabalha a escuta qualificada e desenvolve boa
comunicação, percebe o ambiente em que a pessoa vive, isto é, as relações

143
familiares, a situação de emprego e o nível de relação com a comunidade.
Neste espaço o profissional lida com situações comuns daquela comunidade e,
ao identificar situações incomuns, faz os devidos encaminhamentos; como
clínico habilidoso, busca recursos de aprendizado e procura estudar os temas
da sua área de atuação, bem como as formas de intervenção mais atualizadas
e eficazes.

Sendo fonte de recursos para a comunidade, este profissional escuta com


cuidado, atendendo cada problema na sua dimensão real e percebendo os
riscos locais, como, por exemplo, o fácil acesso ao álcool por preço baixo, a
mídia, a pressão de vizinhos, a falta de alternativas saudáveis de lazer e de
desenvolvimento de potencialidades humanas. Para tornar acessíveis os
recursos de atendimento e, especialmente, de prevenção a recaídas eles
precisam ser conhecidos pelo profissional, que usa cada contato com as
pessoas como oportunidades educativas, para transmitir informações
relevantes e mensagens de estímulo para a mudança. Como qualidades
pessoais, o profissional deve procurar aplicar o conteúdo dos seus estudos
melhorando seu desempenho, cultivando posturas de responsabilidade,
flexibilidade, e estando aberto a mudanças.

No seu trabalho com base na comunidade, o profissional lida com situações


indiferenciadas onde, muitas vezes, o paciente pode se mostrar em um quadro
confuso de violência familiar, alterações do estado emocional e carências
sociais. Nestes casos, o comprometimento com álcool deve ser considerado e
investigado cuidadosamente. Algo que distingue a sua atuação é a
possibilidade de cuidar das pessoas em diferentes contextos – na casa, na
escola, na igreja, em espaços públicos e de socialização – onde os fatores que
facilitam o alcoolismo podem ser identificados e abordados, respeitando
diferenças sócio-culturais.

Este profissional, que atua com base na comunidade, encoraja as pessoas,


conhecendo-as pelo nome, valorizando a relação interpessoal e
compreendendo que tem tanto para ensinar como para aprender com os
outros, e, neste processo de troca, profissionais e pacientes se humanizam. O
estabelecimento de vínculo com o paciente é reconhecido como o fator

144
principal de intervenção, respondendo por 40% da possibilidade de adesão e
continuidade à proposta de tratamento.

A abordagem do paciente se define pela qualidade da relação estabelecida


pela equipe de saúde com ele e seus familiares. O vínculo é fator relevante
para o sucesso da intervenção terapêutica. Quanto maior a confiança e a
credibilidade na equipe, maior é a adesão ao tratamento.

Em todo processo de avaliação e acompanhamento de caso é enfatizado o


respeito, a aceitação de limites e promoção de uma relação de proximidade
entre equipe e paciente.

As ações verbais e não verbais privilegiam a escuta, a comunicação qualificada


e esclarecedora, permitindo o reconhecimento e avaliação do problema,
favorecendo a autonomia das decisões do paciente e sua família. Toda esta
abordagem está em consonância com os direitos do indivíduo.

A captação dos pacientes para tratamento se faz a partir das visitas dos
agentes comunitários e também da busca espontânea nas unidades de saúde.
A inscrição no Programa é feita pela enfermagem, seguida pelo atendimento do
médico generalista e, posteriormente, pelo especializado. Este último conforme
indicação e em ambulatório credenciado ao SUS.

Enquadramento do caso como leve ou moderado

A triagem de pacientes para a desintoxicação ambulatorial baseia-se no grau


de severidade do comprometimento. Para o atendimento
ambulatorial/domiciliar o paciente deve ser enquadrado como caso leve ou
moderado (isto é, os sintomas de abstinência devem ser leves, sem história
anterior de delirium ou outras condições que caracterizem severidade). Os
casos graves devem ser encaminhados para atendimento em ambiente
hospitalar, pois apresentam riscos de convulsões e delirium.

Classificam-se como leves os casos em que estão presentes sintomas de


ansiedade, insônia, tremores, sudorese e taquicardia. Nos casos moderados
somam-se aos sintomas anteriores náuseas, vômitos e diarréia. Já nos casos
de severidade ocorrem delirium, alucinose alcoólica aguda e convulsões.

145
O enquadramento do grau de severidade da síndrome da abstinência segue os
critérios descritos na tabela abaixo, que também descreve o fluxo de
encaminhamento, conforme o Consenso Sobre a Síndrome de Abstinência do
Álcool (SAA) e o Seu Tratamento.

SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA

Critérios do grau de severidade e encaminhamento

Grau de severidade Sintomas Encaminhamento

LEVE: Ansiedade, insônia, tremores, sudorese, taquicardia

MODERADA: Somam-se aos sintomas anteriores: náuseas, vômitos e diarréia

1. Desintoxicação ambulatorial na unidade de saúde (básica ou PSF)

2. Grupos de auto-ajuda

3. Ambulatório especializado (se necessário)

GRAVE: Delírium, alucinose alcoólica aguda, convulsão

1. Encaminhamento para desintoxicação hospitalar

2. Grupos de auto-ajuda

3. Ambulatório especializado

Em todas as situações de enquadramento nestes critérios, as unidades de


saúde acompanham o paciente fornecendo medicação, cheques-consulta para
atendimento nos ambulatórios especializados, visitas domiciliares e verificação
e estímulo da continuidade do tratamento.

CO-MORBIDADES

As complicações orgânicas, freqüentes em alcoolistas, são fatores de risco


para quadros graves de abstinência, como delirium, e, também, fatores de mau
prognóstico. Uma criteriosa avaliação clínica e laboratorial para estabelecer
possíveis quadros associados é, portanto, indispensável. A ocorrência de
complicações e ou co-morbidades, detectadas através de exame clínico-

146
psiquiátrico geral, que possam ser exacerbadas no processo de
desintoxicação, devem ser criteriosamente avaliadas. As condições graves ou
complicações devem ser tratadas em ambiente hospitalar especializado e a
família deverá receber orientação a respeito do transtorno.

As principais condições clínicas que devem ser levadas em consideração no


diagnóstico da síndrome de abstinência do álcool são infecções (pneumonia,
meningite e encefalite), traumatismo crânio-encefálico, hematoma subdural,
encefalopatia hepática, má nutrição, distúrbios hidro-eletrolíticos, doença
cardíaca, convulsões e efeitos adversos de outros medicamentos.

Condições como diabetes, hipertensão ou doença hepática severas, devem ser


diagnosticadas para que seja feita uma desintoxicação segura e com riscos
minimizados. A abstinência pode agravar estes quadros clínicos e a existência
dos mesmos caracterizaria situação de severidade, contra-indicando o
tratamento ambulatorial e domiciliar.

A relação álcool/hipertensão é mais importante no homem que na mulher,


sendo maior na faixa etária acima dos 60 anos. A decisão para o tratamento
medicamentoso de alcoolistas hipertensos deve ser precedida da retirada total
do álcool, com avaliação subseqüente do paciente. Na maioria dos casos, a
supressão do álcool determina, em poucos dias, uma regressão nos níveis de
pressão arterial.

Além disso, a ocorrência de doenças psiquiátricas nestas pessoas pode


intensificar os sintomas da abstinência com agitação e confusão mental. Outra
complicação é quando os pacientes usam álcool para aliviar os sintomas do
distúrbio psiquiátrico. Ao cessarem os efeitos do álcool ou outras drogas, os
sintomas psiquiátricos originais que foram suprimidos, podem emergir
simultaneamente com a ocorrência dos sintomas da síndrome da abstinência.

Cerca de 25% a 30% dos indivíduos alcoolistas têm co-morbidade psiquiátrica,


sendo as associações mais freqüentes a depressão e a ansiedade. Estima-se
que 10% dos homens e 22% das mulheres alcoolistas sofram de depressão.

ATENDIMENTO CLÍNICO

147
A disponibilidade de atendimento e acompanhamento durante a desintoxicação
é fundamental para a boa condução do tratamento. Mesmo a desintoxicação
requer pronto acesso em casos de necessidade de intervenção clínica ou
orientação diante de intercorrências. Nas USF, a disponibilidade de
atendimento domiciliar é maior do que nas unidades básicas, mas a
possibilidade de ter acesso ao médico deve ficar clara para o paciente que se
submete à desintoxicação em qualquer circunstância, quer na unidade de
saúde ou no serviço de pronto-atendimento.

Com freqüência, os enfermeiros e auxiliares de enfermagem se engajam


diretamente no atendimento clínico, sob orientação do médico responsável.
Como subsídio teórico para os clínicos – médicos, enfermeiros e auxiliares de
enfermagem, o Manual do Programa, contendo o protocolo de atendimento a
ser seguido nas unidades básicas e de saúde da família, foi disponibilizado.
Este protocolo orienta a avaliação, diagnóstico, tratamento e acompanhamento
com prevenção da recaída, fornece orientação especial para desintoxicação
ambulatorial e domiciliar, contém um anexo com um modelo do formulário de
parceria e faz recomendações práticas sobre hábitos de vida, como, por
exemplo, o desenvolvimento de exercícios físicos e relacionamentos sociais.

A data para iniciar a desintoxicação é definida em comum acordo entre equipe


e paciente, com o cuidado de, se possível, não ter interrupção no fim de
semana, o que pode prejudicar os procedimentos. A clínica da desintoxicação
prevê a reidratação e medicamentos orais sedativos específicos para prevenir
os sintomas de abstinência. Além disso, são prescritas vitaminas do complexo
B e ácido fólico para prevenir as patologias decorrentes do alcoolismo. Outros
medicamentos são administrados em função do estado clínico do paciente.

CRACK A desintoxicação orgânica da droga é apenas uma parte muito


pequena do processo de tratamento, pois o organismo consegue se livrar de
seus efeitos em 72 horas. O maior problema é a dependência psicológica; até
que o usuário encontre seu ponto de equilíbrio, muitas recaídas ocorrem.

148
O dependente necessita receber assistência psicológica e redefinir seus
hábitos diários, pois para reorganizar a vida psíquica, que o uso da droga
compromete, começa-se pelas pequenas coisas da vida prática.

13 TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR DA OBESIDADE.

II GESTÃO DE PESSOAS NAS ORGANIZAÇÕES.

1 Conceitos, importância, relação com os outros sistemas de


organização. (modelos de gestão de pessoas – SEGER)

Podem-se descrever as organizações como "unidades ou entidades sociais,


intencionalmente construídas e reconstruídas, nas quais as pessoas interagem
entre si para alcançar objetivos específicos". Elas são, então, como
empreendimentos humanos dos quais as empresas são exemplos.

É nesse sentido que se diz que as empresas, para funcionarem, requerem um


conjunto de recursos. O ser humano é um desses recursos. E é um recurso
com características bastante exclusivas - possui capacidade de pensar,
imaginar, julgar e decidir.

Em qualquer ramo de atividade, as pessoas formam o subsistema social,


enquanto o subsistema técnico inclui o fluxo de trabalho, as tarefas a serem
executadas e a tecnologia existente, as máquinas, os equipamentos, as
instalações, as técnicas de produção e a estrutura organizacional. Os
resultados dos negócios são influenciados, em grande parte, mais por fatores
sociais (interação, suporte, supervisão, etc.) do que por fatores técnicos
(equipamentos, materiais, etc.) e a produtividade e a Qualidade global da
empresa está relacionada à análise acurada do sistema de necessidades e
requisitos sociais e técnicos.

149
Nesse sentido, sendo as pessoas com suas respectivas necessidades os
recursos que mais influenciam os resultados da empresa, presume-se que a
administração desses recursos deva ser prioritária quando comparada aos
recursos técnicos, permitindo atingir os objetivos empresariais.

O objeto de estudo do comportamento organizacional é a dinâmica da


organização e suas influências sobre o comportamento humano. Com o estudo
sistemático do comportamento humano nas organizações, podemos identificar
elementos que influenciam tal comportamento. Entre as principais variáveis
estudadas neste campo da administração, podemos citar temas como
motivação, liderança, trabalho em equipe, cultura e clima organizacional.

Em qualquer ramo de atividade, as pessoas formam o subsistema social,


enquanto o subsistema técnico inclui o fluxo de trabalho, as tarefas a serem
executadas e a tecnologia existente, as máquinas, os equipamentos, as
instalações, as técnicas de produção e a estrutura organizacional. Os
resultados dos negócios são influenciados, em grande parte, mais por fatores
sociais (interação, suporte, supervisão, etc.) do que por fatores técnicos
(equipamentos, materiais, etc.) e a produtividade e a Qualidade global da
empresa está relacionada à análise acurada do sistema de necessidades e
requisitos sociais e técnicos.

Nesse sentido, sendo as pessoas com suas respectivas necessidades os


recursos que mais influenciam os resultados da empresa, presume-se que a
administração desses recursos deva ser prioritária quando comparada aos
recursos técnicos, permitindo atingir os objetivos empresariais.

A Administração Científica, fundada por Taylor e seus seguidores nos meados


de 1900, representa a primeira tentativa de criar uma Ciência da Administração
para as organizações. Enfatizou as tarefas e o conceito de homem econômico,
ignorando que o trabalhador é um ser humano e social. Para a Administração
Científica a única fonte de motivação do trabalhador é o salário.

Enquanto desenvolvia-se a Administração Científica nos Estados Unidos, na


França, Fayol desenvolvia a chamada Teoria Clássica da Administração,
caracterizando-se pela ênfase na estrutura organizacional.

150
Na verdade, ambas as teorias tinham por preocupação a busca da eficiência
das organizações.

Embora, em sua obra, Taylor fale sobre alguns métodos por ele empregados, a
essência de seu trabalho está em seus três princípios: da análise científica do
trabalho, da adequada seleção e treinamento dos trabalhadores e do
planejamento e controle do trabalhador por parte da gerência.

Seguindo suas proposições, Fayol, Gilbreth e Gantt, cada qual com uma área
de atuação específica, formulam métodos e teorias que se perpetuam e
concretizam a “administração científica do trabalho”.

Entretanto, quem deu prosseguimento e avançou além da abordagem de


Taylor foi Ford que proporciona ao trabalho humano: a desqualificação, a
intensificação, a absorção de uma força de trabalho antes marginalizada, um
aumento do grau de supervisão e controle no trabalho, a padronização de
elementos e a acentuação da mecanização.

Sem romper com a Escola Clássica, Mayo propõe o uso da psicologia social,
através d meios dados pela psicologia industrial aplicada ao trabalho, visando
mais à formação que à seleção dos indivíduos, valorizando símbolos de
prestígio.

Seguem-se a eles, em épocas diferentes, outros pesquisadores como


McGregor, Maslow, Herzberg e Argyris. Todos estes buscam, em suas
formulações, a “humanização” do trabalho sem, no entanto, romper com
qualquer teoria anterior, pela manutenção dos princípios da divisão do trabalho.
A ênfase principal dessa humanização concentra-se na motivação para o
trabalho.

McGregor procura identificar os interesses da empresa com os interesses dos


trabalhadores, tornando-os responsáveis, criativos e comprometidos com os
objetivos da indústria.

Buscando conhecer elementos motivadores e de “higiene” (responsáveis por


“descontentamento”) no trabalho, Herzberg retoma as idéias de McGregor e
critica Taylor e Ford: o primeiro, por não ver os operários como seres humanos;

151
o segundo, por fomentar o homem sem decisão e movido unicamente por
interesses econômicos.

Esses elementos norteiam as pesquisas desenvolvidas posteriormente e


fornecem subsídios para que Agyris, juntamente com análises sobre a
personalidade humana e das organizações e sobre as formas de adaptação
individual e em grupo às atitudes da direção da empresa, formule a
necessidade da ampliação da tarefa e da liderança orientada para a realidade.

São desenvolvidos outros métodos, como:

 Rotação de cargos: onde os trabalhadores fazem a cada período uma


tarefa, percorrendo até o final do ciclo todas as tarefas de seu setor,
quando, então, voltam a fazer a primeira do ciclo;
 Ampliação horizontal: consiste no agrupamento de diversas tarefas da
mesma natureza a cargo do empregado.

O enriquecimento do trabalho se faz pela junção das ampliações, vertical e


horizontal, do trabalho. Assim, o cargo é enriquecido para operário sem que ele
participe do processo como um todo, gerando, ainda, algumas insatisfações.

Os adeptos das “teorias psicologizantes” advogam a humanização no trabalho,


buscam formas de organização baseadas em grupos independentes. Contudo,
a introdução destes métodos, por si sós, não trazem a motivação para as
pessoas embora, como a satisfação no trabalho é influenciada também por
fatores ambientais, e estes devem melhorar, uma proporção maior de
trabalhadores devem encontrar satisfação em seu trabalho.

Buscando a humanização do trabalho, os métodos utilizados são divididos em

Projeto do trabalho Fragmentado, Mais desafios, maiores ciclos de tarefas e


tarefas com ciclos trabalhos com maior variedade e
curtos e sem perspectiva
desafios
Organização da produção Unidades Unidades organizacionais baseadas no
Classe De
organizacionais Para
produto ou em seus componentes
baseadas no
seis classes:
processo
Participação nas decisões Planejamento Maior autonomia e participação do
central detalhado e trabalhador no "como" fazer
supervisão

152
autocrática do
trabalho
Treinamento e assessoria no Educação pré- Treinamento e educação ao longo da vida
desenvolvimento trabalho e
Treinamento
(instruções no
trabalho)
Ergonomia Bases puramente Projeto baseado em considerações
tecnológicas para o humanas e tecnológicas
projeto de
máquinas e
equipamentos
Condições de trabalho Bases puramente Um sistema que considere as
econômicas para o necessidades e aspirações humanas
planejamento tanto quanto as necessidades
empresarial econômicas
Quadro 1
Classes fundamentais e suas mudanças para humanização do trabalho

 Projeto do trabalho;
 Organização da produção;
 Participação nas decisões;
 Treinamento e assessoria no desenvolvimento;
 Ergonomia;
 Condições de trabalho.

Além da humanização do trabalho, e como justificativa de sua existência, a


produção em grupos objetiva também a redução de custos, aumento nos
padrões de qualidade dos produtos, redução dos investimentos em estoque e
melhorias nas condições de trabalho.
Adotando-se a produção em grupo, podem-se descentralizar as decisões,
facilitando, efetivamente, a delegação de atribuições. Entretanto, isso pode
gerar redundância na tomada de decisões na fábrica que, tradicionalmente, era
feita por especialistas.
A diminuição de níveis hierárquicos e a conseqüente redução de possibilidades
de promoção podem gerar insatisfação nos trabalhadores.

Níveis Organizacionais.

Um dos conceitos mais utilizados no estudo da Administração é o dos níveis


organizacionais. O nível organizacional, ou hierárquico, é um bom indicador de
153
como é o enfoque do trabalho de um administrador em uma organização. Os
administradores são classificados em três níveis hierárquicos: estratégico,
tático e operacional.

Estratégico é o nível mais alto da hierarquia, onde os gestores da alta cúpula


(presidentes, diretores, etc.) decidem os temas que afetam a organização de
modo global. As tendências mais importantes na regulação governamental, o
comportamento dos concorrentes, a mudança nos costumes dos
consumidores, o clima e a cultura organizacional, bem como as estratégias e
políticas da organização são alguns dos temas que são trabalhados por estes
administradores.

No nível tático estão incluídos os gerentes ou chefes de divisão. Nesta


posição o administrador é responsável por uma área da organização (Gerência
de Recursos Humanos, Gerência financeira, Divisão de produtos infantis, etc.)
e tem a função de implementar em sua área as estratégias e políticas decididas
no nível acima.

Eles devem saber se relacionar com outros gerentes e com seus subordinados,
resolvendo conflitos e motivando seus funcionários. Sua preocupação
normalmente é com o médio prazo.

No nível operacional os administradores estão focados no curto prazo e em


tarefas específicas, como a produção de bens e serviços. Dentre seus
ocupantes podemos encontrar supervisores e chefes de equipe. Eles devem
seguir as regras e diretrizes estabelecidas no nível tático, motivando seus
funcionários da linha de frente para que façam seu trabalho de maneira
eficiente.

As questões que abordam este tema são normalmente fáceis. Vamos analisar
agora uma questão sobre este tópico:

(CESGRANRIO TERMOAÇU ADMINISTRADOR JR 2008) A seqüência de


níveis hierárquicos de uma empresa, do nível mais alto para o mais baixo, é:
(ADAPTADA)

(A) tático, estratégico, operacional.

154
(B) estratégico, tático, operacional.

(C) tático, operacional, estratégico.

(D) operacional, estratégico, tático.

(E) operacional, estratégico, tático.

Questão bem tranqüila! Como vimos acima, o nível mais alto hierarquicamente
é o estratégico, seguido do tático e do operacional! O gabarito é letra B

2 A FUNÇÃO DO ÓRGÃO DE GESTÃO DE PESSOAS:


ATRIBUIÇÕES BÁSICAS E OBJETIVOS, POLÍTICAS E SISTEMAS
DE INFORMAÇÕES GERENCIAIS. PESQUISAR

PLANEJAMENTO DE PESSOAS LIDERANÇA

Gestão por competência, Consultoria, papel do líder,


recrutamento,seleção, avaliação, cargos
SISTEMA DE desenvolvimento de equipes.
e salários
DESENVOLVIMENTO
EDUCAÇÃO CORPORATIVA
HUMANO QUALIDADE DE VIDA
Gestão do conhecimento

Treinamento Benefícios

CULTURA
RESPONSABILIDADE SOCIAL
Gestão da cultura (valores
compartilhados) Balanço social

3 COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL: RELAÇÕES


INDIVÍDUO/ORGANIZAÇÃO, MOTIVAÇÃO, LIDERANÇA,
DESEMPENHO. Continuar aula 25 do evp

Bergamini define motivação como uma "força propulsora" que leva o indivíduo
a satisfazer suas necessidades e desejos. A motivação no trabalho leva os
recursos humanos, além de buscarem satisfações pessoais, a realizarem os
objetivos da organização. Motivação é, assim, uma "energia interna", algo que
vem de dentro do indivíduo, fazendo com que este se coloque em ação.

155
Segundo Hersey & Blanchard, "a motivação das pessoas depende da
intensidade dos seus motivos". Os motivos podem ser definidos como
necessidades, desejos ou impulsos oriundos do indivíduo e dirigidos para
objetivos, ou seja, são os porquês do comportamento das pessoas. Por isso,
ao pretender influenciar o comportamento de uma pessoa, precisa-se primeiro
conhecer os motivos ou necessidades que são mais importantes para ela
naquele momento.

Motivação são processos psíquicos do indivíduo que o impulsionam à ação. A


motivação, além de ser influenciada por fatores individuais, pode ser
influenciada também pelo contexto, pelas relações estabelecidas no trabalho e
mesmo pelas políticas gerais de gestão de pessoas.

Indivíduos motivados tendem a ter um melhor desempenho, portanto é


fundamental que a organização invista na promoção da motivação. As
seguintes teorias da motivação têm se caracterizado como clássicas:

Teoria da Hierarquia das Necessidades ‐ Maslow.

A teoria da hierarquia das necessidades, também conhecida como a pirâmide


de Maslow (nome de seu criador, o psicólogo Abraham Maslow), é uma das
mais intuitivas teorias de motivação. De acordo com Maslow, o comportamento
do ser humano é motivado por diversos estímulos internos, ou necessidades.

Abraham Maslow procurou explicar a intensidade de certas necessidades, a


qual denominou de hierarquia das necessidades humanas. As necessidades
fisiológicas aparecem em primeiro lugar, pois são necessidades básicas para a
própria subsistência, ou seja, alimentos, roupa, moradia. A partir do momento
que essas necessidades estão satisfeitas, outras necessidades surgem e mais
outras, segundo uma escala hierárquica. Uma vez atendidas as necessidades
fisiológicas, predomina a necessidade de segurança, ou seja, estar livre de
perigo físico e da privação das necessidades fisiológicas básicas. A seguir,
predomina a necessidade social ou de participação, pois as pessoas são seres
sociais e sentem necessidade de pertencerem a vários grupos e de serem
aceitas por estes, buscando conseguir relações com os outros. Depois de
satisfeita a necessidade de participar, as pessoas desejam ser mais que um

156
simples membro do grupo, têm necessidade de estima, tanto de auto-estima
como de reconhecimento por parte dos outros. Estando adequadamente
satisfeita a necessidade de estima, começa a predominar a necessidade de
auto-realização, ou seja, a necessidade de maximizar seu próprio potencial ou
o desejo de tornarem-se aquilo de que são capazes. As necessidades da base
da pirâmide se manifestam primeiro e não há simultaneidade.

Estas necessidades são diversas e ele as classificou em uma hierarquia, desde

as mais básicas, como as fisiológicas e de segurança, como as de nível


superior (estima e auto-realização), conforme o gráfico.

O ponto chave desta teoria é exatamente a hierarquia destas necessidades. A


teoria diz que as necessidades devem ser satisfeitas em uma ordem, ou
seja, é necessário suprir as necessidades fisiológicas (as mais básicas)
antes que deva existir um trabalho de atendimento das necessidades de
estima. Assim que uma necessidade é atendida ela perde importância, sendo
ativada então a necessidade de nível superior.

Maslow disse que as necessidades da base da pirâmide deveriam ter


prioridade no seu atendimento.

157
A teoria de Maslow (ou teoria da hierarquia das necessidades) não se presta a
um tratamento único dado a todos os funcionários, pois cada um estará (ou
poderá estar) em um nível de necessidades diferente dos demais. O que
motivará um estagiário não deverá funcionar com um diretor da empresa com
20 anos de casa.

Teoria ERC de Alderfer: Tentou aperfeiçoar a hierarquia das necessidades de


Maslow, criando três categorias: Existência, Relacionamento e Crescimento.
Existência abrange as necessidades de primeira ordem de Maslow, que são as
necessidades fisiológicas e de segurança. Alderfer dividiu a necessidade de
quarto nível de Maslow (estima) em duas partes: o componente externo da
estima (social) e o componente interno da estima (auto-estima). Assim, no nível
Relacionamento, ele incluiu as necessidades sociais e o componente externo
da estima. Finalmente, no nível Crescimento, Alderfer incluiu a auto-estima e a
necessidade de auto-realização.

A teoria dos dois fatores de Herzberg. A teoria dos dois fatores de Frederick
Herzberg é uma das mais importantes no estudo da Administração, ela
basicamente diz que os fatores que levam à satisfação são diferentes dos que
levam à insatisfação, portanto o nome da teoria: dois fatores

Herzberg descobriu que há dois grandes blocos de necessidade humanas: os


fatores de higiene ou insatisfacientes (extrínsecos) e os fatores motivacionais
ou satisfacientes (intrínsecos). Os fatores de higiene, também chamados
insatisfacientes, são fatores extrínsecos, ou exteriores ao trabalho. Para
Herzberg, eles podem causar a insatisfação e desmotivação se não atendidos,
mas, se atendidos, não necessariamente causarão a motivação. Exemplos:
segurança, status, relações de poder, vida pessoal, salário, condições de
trabalho, supervisão, política e administração da empresa. Os fatores
motivadores, também chamados satisfacientes, são os fatores intrínsecos,
internos ao trabalho. Estes fatores podem causar a satisfação e a motivação.
Exemplos: crescimento, progresso, responsabilidade, o próprio trabalho, o
reconhecimento e a realização.

Ao invés de tentar medir o grau do sentimento, Herzberg focalizou o máximo


de experiências e comparou o apogeu negativo (insatisfação) com o positivo

158
(satisfação). A hipótese proposta foi verificada. Os fatores que levaram à
satisfação contribuem muito pouco para a insatisfação profissional.
Inversamente, os insatisfatórios contribuem muito pouco para a satisfação
profissional.

Os fatores motivacionais seriam os relacionados com necessidades do mais


alto nível, como o reconhecimento das pessoas, o conteúdo do trabalho, a
possibilidade de crescimento profissional e de aprendizagem e o exercício da
responsabilidade. Herzberg disse que quando estes fatores motivacionais não
existem, as pessoas são neutras em relação à motivação (não ficam motivadas
nem desmotivadas). Mas quando estes fatores estão presentes geram um alto
nível de motivação no profissional.

Já os fatores higiênicos influenciam a insatisfação, ou seja, podem gerar


insatisfação se forem negativos, mas não geram satisfação se forem positivos!
Dentre estes fatores estão relacionados: condições de trabalho, remuneração,
segurança, relações pessoais, políticas da empresa e supervisão. No caso da
organização que forneça bons salários, boas condições de trabalho e
segurança, ela pode gerar um ambiente harmônico, mas não necessariamente
um ambiente altamente motivador. O salário não é fator motivacional! A
relação interpessoal também não é motivadora! Ou seja, nem dinheiro nem
pessoas motivam os funcionários.

De acordo com Herzberg, o trabalho do gestor seria o de remover os fatores


higiênicos que estejam criando insatisfação e criar os fatores motivadores para
que seus funcionários atinjam um alto grau de desempenho.

Estes fatores também podem ser chamados de intrínsecos (motivacionais, ou


relacionados com o conteúdo do cargo e ao funcionário em si) e extrínsecos
(higiênicos, ou relacionados ao ambiente da empresa).

A insatisfação não afeta necessariamente a motivação! Imagine um médico


sem‐fronteiras que atue em uma floresta na África! Ele está em um ambiente
de trabalho péssimo, mas está muitas vezes motivado, pois sabe que está
melhorando a vida de milhares de pessoas necessitadas

159
Herzberg formulou uma teoria com aplicação específica para as atitudes no
trabalho que podem ter relação com certos aspectos do potencial humano no
trabalho. A teoria de higiene como motivação das atitudes no trabalho iniciou
com um profundo estudo de entrevistas com mais de 200 engenheiros e
contadores representando a indústria de Pittsburgh (Estados Unidos).

Herzberg formulou uma hipótese na qual os fatores que influíam na produção


de satisfação profissional eram desligados e distintos dos fatores que levavam
à insatisfação profissional. Os estudos realizados por Herzberg levaram-no a
considerar que os dois sentimentos, quer sejam satisfação e insatisfação, não
eram contraditórios entre si. Para o autor, "o oposto de satisfação no
trabalho não é a insatisfação, mas sim nenhuma satisfação no trabalho; e
da mesma forma, o oposto de insatisfação no trabalho não é a satisfação,
mas sim nenhuma insatisfação no trabalho"

Os fatores de higiene descrevem o ambiente das pessoas (fatores extrínsecos


ao trabalho) e têm função primária de prevenir a insatisfação no trabalho.
Herzberg também chamou-os de fatores de manutenção, pois nunca estão
completamente satisfeitos, ou seja, precisam ser mantidos continuamente. Os
fatores de higiene incluem:
 supervisão técnica: competência e incompetência, senso de justiça e
injustiça, boa vontade e má vontade em delegar responsabilidade e
ensinar os subordinados. Também, observou-se o superior que,
freqüentemente chamava a atenção e criticava os subordinados, e de
forma oposta, aquele mais condescendente na maneira de conduzir sua
função;
 relações interpessoais: foram divididas em três categorias: superior,
subordinado e pares;
 condições de trabalho: foram relacionados os aspectos físicos do
ambiente de trabalho como adequação e inadequação de ventilação,
iluminação, equipamentos, espaço;
 salários: aumento ou descumprimento de expectativas do aumento
salarial;
 política e administração: desorganização da companhia no que se refere
à comunicação interna e políticas mal conduzidas;

160
 vida pessoal: questões familiares como problemas de moradia, salário e
outros tipos de problemas;
 status: mudança de posição (cargo) dentro da companhia;
 segurança: os indivíduos demonstraram preocupação com questões
como tempo de serviço, estabilidade e instabilidade de emprego.

Os fatores motivadores, relativos ao trabalho em si (fatores intrínsecos ao


trabalho), são mais eficazes, motivando as pessoas para um desempenho
superior. São eles:

 reconhecimento: necessidade do indivíduo de ser reconhecido pelo seu


trabalho por alguém como: o supervisor, o administrador de forma
impessoal, o cliente, o colega e até pelo público em geral;
 realização: fracasso e ausência de realização relacionada em fazer um
trabalho completo e solucionar problemas;
 possibilidade de crescimento: capacidade de superar a própria
habilidade individual, capacidade de aprender novas técnicas e adquirir
novas perspectivas profissionais;
 progresso: mudança pessoal e profissional na organização com vistas à
questão de status;
 responsabilidade: relacionada com o próprio trabalho, com o trabalho de
outras pessoas e aquisição de novas responsabilidades;
 trabalho em si: situações como variação da rotina, criatividade,
oportunidade de carreira.

OUTRAS TEORIAS DA MOTIVAÇÃO

Teoria da determinação de metas: Considera que a determinação de metas


motiva os trabalhadores. A equipe deve participar na definição das metas
(construção conjunta), que devem ser claras, desafiadoras, mas alcançáveis.

Teoria da equidade: Também conhecida como teoria da comparação social. A


motivação seria influenciada fortemente pela percepção de igualdade e justiça
existente no ambiente profissional. Caso o indivíduo tenha uma percepção de

161
que não há equidade, ele poderá ficar desmotivado ou insatisfeito, e isto terá
reflexos em sua forma de se relacionar com a organização e com ela contribuir.

Teoria da expectativa (ou expectância) de Victor Vroom: Construída em


função da relação entre três variáveis: Valência, força (instrumentalidade) e
expectativa, referentes a um determinado objetivo. Valência, ou valor, é a
orientação afetiva em direção a resultados particulares. Pode-se traduzi-la
como a preferência em direção, ou não, a determinados objetivos. Valência
positiva atrai o comportamento em sua direção, valência zero é indiferente e
valência negativa é algo que o indivíduo prefere não buscar. Expectativa é o
grau de probabilidade que o indivíduo atribui a determinado evento, em função
da relação entre o esforço que vai ser despendido no evento e o resultado que
se busca alcançar. Força, ou instrumentalidade, por sua vez, é o grau de
energia que o indivíduo irá ter que gastar em sua ação para alcançar o objetivo.

Teorias X e Y: McGregor afirmava que havia duas abordagens principais de


motivação e liderança: as teorias X e Y. A teoria X apresentava uma visão
negativa da natureza humana: pressupunha que os indivíduos são
naturalmente preguiçosos, não gostam de trabalhar, precisam ser guiados,
orientados e controlados para realizarem a contento os trabalhos. A teoria Y é
o oposto: diz que os indivíduos são auto motivados, gostam de assumir
desafios e responsabilidades e irão contribuir criativamente para o processo se
tiverem suficientes oportunidades de participação.

McGregor trouxe a idéia de que existem duas “maneiras” de se ver as


pessoas. Estas visões seriam contrárias, ou seja, antagônicas. Uma seria
mais positiva e moderna (a teoria Y, baseada na confiança nos indivíduos),
e a outra seria negativa e antiquada (teoria X, baseada na desconfiança).

Pela teoria X, as pessoas seriam naturalmente preguiçosas, pouco


ambiciosas e sem iniciativa própria. A idéia é que o ser humano não gosta de
trabalhar e irá fazer o menor esforço possível! Se o gestor tem esta visão
negativa das pessoas, ele tende a ser mais fiscalizador e controlador, pois
acredita que quando “virar as costas” o trabalhador parará de trabalhar. Ele

162
vai tratar os subordinados de modo mais rígido e será autocrático (decidirá
tudo sozinho), pois acha que o empregado não gosta de assumir
responsabilidades e não consegue tomar decisões! Não delegará
responsabilidades porque acha que os funcionários são dependentes. Esta
visão seria “antiga”, e mais adequada a uma organização em um ambiente
estável e com um modelo burocrático de gestão.

Já a teoria Y seria mais embasada na confiança nas pessoas! Nesta


situação o gestor acredita que seus funcionários são ambiciosos, gostam de
trabalhar, têm capacidade de decidir e iniciativa. A idéia é que as pessoas
buscam assumir responsabilidades e desafios! Nesta situação o próprio
empregado se controla, não havendo a necessidade de coerção!

Como o administrador acredita no potencial de seus subordinados, ele busca


a participação deles, delega poderes para que eles assumam
responsabilidades e cria um ambiente mais democrático e empreendedor no
trabalho!

Esta teoria é mais adequada a uma organização que esteja em um ambiente


instável e dinâmico, que busque a inovação nos processos de trabalho. Hoje
em dia esta é a visão mais recomendada!

8- LIDERANÇA- TEORIAS

Liderança é um fenômeno social, referente à capacidade do indivíduo para


influenciar outros. Na organização, ela existe tanto no organograma, que tem
as relações de chefia formalmente definidas, como de forma espontânea, em
relações informais, em equipes, ou mesmo na relação entre pares.

A teoria dos traços é uma teoria mais antiga de liderança. Ela diz que existem
traços, características natas do indivíduo, que o habilitam a exercer a liderança.
Hoje, sabe-se que esta teoria é infundada, pois não existe um único estilo de
liderança que seja, por natureza, superior aos demais.

Temos, portanto, as teorias dos estilos da liderança.

163
A liderança autocrática é aquela em que as decisões são tomadas unicamente
pelo líder, sem a participação da equipe no que se refere às decisões. O líder
centraliza todas as decisões, sem pedir a participação dos seus subordinados.
Este líder determina como o trabalho será feito, quem o fará, quando o fará,
etc. A participação dos funcionários no processo é limitada!

A liderança liberal, ou laissez-faire, é o estilo em que o líder dá total liberdade


aos subordinados para decidirem como acharem melhor! O líder tem somente
a função de responder às perguntas ou dúvidas dos funcionários e fornecer os
recursos necessários para o trabalho.

Na liderança democrática, o líder participa e estimula na equipe os


comportamentos desejados, mas a equipe possui relativa autonomia para, com
apoio do líder, decidir. Caracteriza-se pela delegação de autoridade aos
subordinados, que são incluídos no processo de tomada de decisão pelo líder.
A decisão então é tomada em conjunto pelo líder e seus liderados. Este estilo
pode ser classificado como consultivo, no qual o líder pede a opinião dos
subordinados antes de tomar a decisão, ou participativo, em que os
funcionários participam não só com a opinião, mas decidem conjuntamente
com o líder.

Grade gerencial de Blake e Mouton foi uma evolução da teoria de


Tannenbaum e Schmidt (a qual postulava que a liderança era um continuum
entre a liderança orientada para pessoas e a orientada para tarefas), pois
questionou esta visão antagônica (ou era focada em pessoas ou tarefas, e não
nas duas!).

Para Blake e Mouton, tanto a preocupação com as pessoas e com a


produção são fundamentais para se alcançar um bom resultado. Eles
montaram a grade gerencial baseada nas duas dimensões comportamentais:
preocupação com as pessoas e preocupação com a produção (por isso é
chamada visão bidimensional do estilo de liderança), conforme podemos ver no
gráfico abaixo.

164
Cada uma das dimensões é avaliada por meio de uma escala de 1 a 9,
contendo 81 posições para o estilo de liderança. As cinco posições chaves que
Blake e Mouton identificaram foram:

Líder negligente ou liderança empobrecida (1.1): o líder se esforça


minimamente para fazer o trabalho e justificar sua permanência na posição. O
líder é basicamente ausente.

Líder‐tarefa (9.1): o líder se preocupa com a eficiência na produção, mas pouca


preocupação com a motivação e o desenvolvimento dos funcionários. Todo o
foco se concentra nos resultados. É a liderança na base do “chicote”!

Líder‐pessoa ou clube de campo (1.9): Toda a preocupação com as


necessidades dos funcionários e em proporcionar um ambiente agradável, sem
se preocupar muito com a eficiência e eficácia da produção. Neste tipo de
liderança, existe pouca pressão por resultado!

165
Líder meio‐termo (5.5): o líder mantém uma eficiência da produção razoável e
um moral satisfatório.

Líder‐equipe (9.9): Segundo Blake e Mouton, esse é o estilo mais eficaz para
uma organização! O líder se esforça tanto para obter eficiência na produção,
como em manter seus funcionários motivados e em constante
desenvolvimento.

Os estudos posteriores não confirmaram que o estilo líder‐equipe seja


realmente o mais eficaz em todos os casos. A falha de levar em
consideração os fatores situacionais acabou levando ao desenvolvimento
posterior das teorias contingenciais de liderança.

A liderança situacional, ou liderança contingencial, depende da relação entre


líder, liderados e situação, não estando sujeita a um único estilo.

Segundo a Teoria de Fiedler, a eficácia do líder seria determinada pela


interação da orientação do empregado com três variáveis situacionais básicas
que influenciam a favorabilidade de uma situação para um líder: relações entre
líder e membros do grupo; estrutura da tarefa; e posição de poder do líder.
Com base em estudos empíricos, Fiedler constatou que, quando a situação
geral era muito favorável (boas relações líder-membros, tarefa estruturada,
forte influência do líder) ou muito desfavorável (relações líder-membros ruins,
tarefa não estruturada, posição pouco influente), o estilo de liderança mais
eficaz era o autoritário. No entanto, quando a situação se caracterizava por
favorabilidade mediana (por exemplo: boas relações entre líder e membros,
mas tarefa pouco estruturada e pouca influência do líder), o estilo mais eficaz
era o democrático.

Teoria de Hersey e Blanchard, propõe quatro estágios diferentes. O primeiro


estágio é o determinar (E1). Nele, o chefe/líder deve se concentrar no
trabalho, na tarefa. Trata-se de equipe que não possui maturidade (M1)
suficiente para tomar decisões sozinha, ou seja, é o próprio líder que distribui
as tarefas e determina como elas serão feitas. No segundo estágio, o líder
deve persuadir (E2). Neste estágio, o líder deve ter ênfase tanto na tarefa
como nas pessoas, no relacionamento. As pessoas já conhecem os trabalhos,

166
mas ainda não tem maturidade suficiente para assumi-los sozinhas. O terceiro
estágio é denominado compartilhar (E3). As pessoas já conhecem bastante
do trabalho e já têm vontade e competência para tomarem decisões sozinhas.
Nesta fase, o líder e a equipe tomam as decisões juntos, compartilhando
responsabilidades. O quarto e último estágio é o delegar (E4). Nele, o
liderado já tem maturidade suficiente para tomar as decisões sozinho (M4), ou
seja, o líder delega ao liderado as decisões a respeito de como, onde e quando
os trabalhos serão realizados.

Para que os gestores pudessem escolher qual estilo seguir, eles


recomendaram analisar fatores como o nível de conforto do líder com o estilo
de liderança (muitos chefes não tem o perfil para atuar no estilo democrático!),
características dos liderados (são pessoas que estão acostumadas a assumir
responsabilidade? A decidir algo?) e a pressão do tempo (quanto tempo temos
para tomar uma decisão?).

Grande parte das teorias de liderança se baseia no relacionamento entre


líderes e subordinados. Existem, porém estudos que abordam o tipo de
recompensa que o líder oferece, ao invés de analisar o comportamento do
líder em relação aos liderados. Estes estudos apontam dois tipos de líderes:
líderes transacionais e transformacionais.

167
Liderança transacional é aquela onde existe uma relação de troca entre líder
e subordinado. Seu nome vem exatamente desta troca, de transação! O líder
define as metas que devem ser alcançadas e promete os “prêmios” caso os
objetivos sejam atingidos.

O líder transacional deve então esclarecer quais serão as tarefas e os


objetivos, motivar seus funcionários para que eles atinjam suas metas, e
fornecer apoio aos liderados no trabalho, buscando suprir suas necessidades.

A liderança transacional funciona bem quando a organização está em um


ambiente estável. Para que ela seja eficaz, ambos (líder e liderado) devem
estar “satisfeitos com o negócio”, ou seja, deve existir um equilíbrio entre as
recompensas e os esforços.

Na liderança transformacional o papel do líder é de inspirador de seus


subordinados. Esse líder busca que seus liderados transcendam seus objetivos
pessoais em benefício da organização! Ele não se apóia somente nas
recompensas materiais para motivar os seus liderados, mas usa também
outros aspectos, como a visão, os valores compartilhados e as idéias para que
seus subordinados se superem.

Existe uma via de mão dupla neste tipo de liderança. Há um estímulo mútuo,
em que ambas as partes se incentivam para que façam um esforço extra, para
que o mais alto nível de motivação seja atingido.

O líder transformacional é um agente de mudanças e inovações na


organização. Este líder tem características do líder carismático, mas vai além
deste! O líder carismático pode querer que os liderados sigam seu modo de
pensar, e nada além disso. No caso do líder transformacional, ele quer que os
seus seguidores sejam questionadores e empreendedores, que busquem o
novo, que sejam criativos!

168
A liderança transformacional é construída em cima das bases da liderança
transacional. Ela gera esforços e resultados acima dos que a liderança
transacional poderia atingir!

O modelo transformacional assume a ambivalência e a contradição interna, os


aspectos psíquicos, a complexidade dos processos de socialização e
fenômenos simbólicos e inconscientes nas organizações.

O modelo transformacional ressalta o processo dialético de construção e


desconstrução que constitui a evolução das organizações, o que salienta a
importância da perspectiva dialética de análise organizacional. Esse modelo
propõe a extensão da participação dos atores sociais no processo de decisão,
tendo em vista que um número maior de indivíduos dotados de maior
autonomia deve estar envolvido na evolução dos sistemas organizacionais. Os
teóricos desse modelo propõem soluções que consideram a ação dos
indivíduos sob uma ótica menos racionalizada. A mudança implica numa
dialética da ordem e da desordem que coíbe a implantação autoritária de
programas rígidos. Propõe-se assim um tipo de “gestão da desordem”, dos
aspectos contraditórios que caracterizam uma realidade social sempre mutável
e caracterizada por paradoxos. Ações de observação social, projetos
negociados de forma provisória, estruturação de espaços transitórios de
experimentação social e de pesquisa-ação são propostos neste modelo.

Em relação à condução da mudança transformacional, é possível destacar a


necessidade da administração dos sentidos. No contexto de transição de
sistemas sócio-técnicos, o líder deve garantir que o desequilíbrio psíquico
causado pelas transformações no ambiente tenha suas conseqüências
minimizadas nos indivíduos. Isso requer a administração do significado das
mudanças organizacionais, isto é, de como as mudanças serão interpretadas
pelos indivíduos e como elas vão influenciar na construção dos novos padrões
de identidade. Esse é o processo segundo o qual o líder influencia na definição
da realidade dos liderados. Esse processo se caracteriza pela articulação da
experiência e dos sentidos compartilhados do grupo social de forma a viabilizar
determinados modos de ação. Neste processo, o relacionamento entre líder e

169
seguidor é marcado pela necessidade existente ou pela solicitação do seguidor
em potencial.

Este tipo de liderança se caracteriza pelo conhecimento, por parte do líder, das
necessidades intrínsecas do liderado para que aconteça a satisfação
motivacional que permite a ação.
O relacionamento individuo x organização nem sempre é cooperativo e
satisfatório, pois há conflito entre os objetivos a serem atingidos. Apesar disso,
há uma interdependência entre suas necessidades. Por isso, a interação entre
eles é dinâmica e complexa.

O individuo precisa ser eficaz (atingir os objetivos organizacionais) e eficiente


(satisfazer suas necessidades pela sua participação) para sobreviver dentro do
sistema.

A interação psicológica entre empregado e organização é um processo de


reciprocidade: enquanto o individuo busca a satisfação de suas necessidades,
a organização avalia os custos e os esforços pessoais do empregado.

Expectativas do empregado Expectativas da organização


Satisfações pessoais › esforços Contribuição do indivíduo › custos
pessoais para a organização

Comportamento humano nas organizações

Podem-se descrever as organizações como "unidades ou entidades sociais,


intencionalmente construídas e reconstruídas, nas quais as pessoas interagem
entre si para alcançar objetivos específicos". Elas são, então, como
empreendimentos humanos dos quais as empresas são exemplos.

É nesse sentido que se diz que as empresas, para funcionarem, requerem um


conjunto de recursos. O ser humano é um desses recursos. E é um recurso
com características bastante exclusivas - possui capacidade de pensar,
imaginar, julgar e decidir.

170
Em qualquer ramo de atividade, as pessoas formam o subsistema social,
enquanto o subsistema técnico inclui o fluxo de trabalho, as tarefas a serem
executadas e a tecnologia existente, as máquinas, os equipamentos, as
instalações, as técnicas de produção e a estrutura organizacional. Os
resultados dos negócios são influenciados, em grande parte, mais por fatores
sociais (interação, suporte, supervisão, etc.) do que por fatores técnicos
(equipamentos, materiais, etc.) e a produtividade e a Qualidade global da
empresa está relacionada à análise acurada do sistema de necessidades e
requisitos sociais e técnicos.

Nesse sentido, sendo as pessoas com suas respectivas necessidades os


recursos que mais influenciam os resultados da empresa, presume-se que a
administração desses recursos deva ser prioritária quando comparada aos
recursos técnicos, permitindo atingir os objetivos empresariais.

O objeto de estudo do comportamento organizacional é a dinâmica da


organização e suas influências sobre o comportamento humano. Com o estudo
sistemático do comportamento humano nas organizações, podemos identificar
elementos que influenciam tal comportamento. Entre as principais variáveis
estudadas neste campo da administração, podemos citar temas como
motivação, liderança, trabalho em equipe, cultura e clima organizacional.

O comportamento organizacional é o estudo e aplicação do conhecimento


sobre como as pessoas agem dentro das organizações e aplica-se
amplamente ao comportamento das pessoas em todos os tipos de
organizações, tais como negócios, governo, escolas e organizações de
serviços.

Lopes menciona três razões fundamentais que determinam o comportamento:

 "percepção: maneira pela qual o indivíduo sente os estímulos que são


absorvidos seletivamente;

 atitudes: relacionado com as opiniões e valores;

171
 mecanismos de defesa: processo de comportamento usado quando o
feedback do comportamento original indica expectativas não
alcançadas".

Segundo Kanaane "o comportamento está vinculado de certa maneira às


normas e valores socialmente disseminados em dado contexto: o indivíduo
reage a determinadas situações, mas suas ações são também influenciadas
pelas circunstâncias presentes". Ainda, segundo o autor, "é preciso considerar
a existência de diferentes concepções do termo comportamento:

 comportamento individual: retrata as reações inerentes ao indivíduo e


sua condutas no contexto organizacional;

 comportamento grupal: refere-se à gama de reações dos indivíduos que


compõem um grupo; as ações emergentes do comportamento grupal
retratam as múltiplas influências decorrentes da dinâmica existente,
incluindo as pessoas, a interação, o sentimento, as atividades (tarefas),
a comunicação e os objetivos;

 comportamento organizacional: refere-se à manifestações emergentes


no contexto das organizações, indicando os controles, o processo
decisório e os esquemas técnico-administrativos assumidos num dado
momento organizacional".

Por outro lado, afirma Schein, "em muitos casos a percepção, os sentimentos e
as atitudes das pessoas, refletidos nos procedimentos informais, mostram uma
forte lealdade à subunidade à qual essas pessoas pertencem e são moldados
pelo tipo de trabalho que a subunidade executa".

Para Kanaane a compreensão das concepções que os indivíduos e grupos


possuem sobre o trabalho desempenhado possibilita entender as influências
destas concepções no alcance da produtividade, e por conseqüência, da
Qualidade empresarial.

As diferenças departamentais, são, portanto, componentes ativos do


comportamento dos recursos humanos, e, conseqüentemente, da motivação
destes no trabalho.

172
MOTIVAÇÃO é a força que estimula as pessoas a agirem, tem origem em uma
necessidade e é conseqüência de necessidades não satisfeitas. A motivação é
específica: uma pessoa ode estar motivada para uma coisa e não para outra.
Possui uma relação determinante sobre o comportamento.

Bergamini define motivação como uma "força propulsora" que leva o indivíduo
a satisfazer suas necessidades e desejos. A motivação no trabalho leva os
recursos humanos, além de buscarem satisfações pessoais, a realizarem os
objetivos da organização. Motivação é, assim, uma "energia interna", algo que
vem de dentro do indivíduo, fazendo com que este se coloque em ação.

Segundo Hersey & Blanchard "a motivação das pessoas depende da


intensidade dos seus motivos". Os motivos podem ser definidos como
necessidades, desejos ou impulsos oriundos do indivíduo e dirigidos para
objetivos, ou seja, são os porquês do comportamento das pessoas. Por isso,
ao pretender influenciar o comportamento de uma pessoa, precisa-se primeiro
conhecer os motivos ou necessidades que são mais importantes para ela
naquele momento.

O comportamento é causado, motivado e orientado para os objetivos. Os


motivos (desejos/impulsos) são os mantenedores do comportamento dos
indivíduos.

Os motivos tendem a perder força depois de satisfeitos ou quando sua


satisfação é bloqueada; quando não se alcança um resultado positivo, a
tendência é direcionar o comportamento para objetivos substitutivos. Se este
direcionamento for mal sucedido, o individuo pode desenvolver
comportamentos irracionais como agressão, racionalização fuga etc.

Há 2 linhas teóricas básicas:

Teoria de processo: como ocorre a motivação.

Teoria de conteúdo: o quê motiva o sujeito.

173
Numa visão humanística das organizações, pode-se afirmar que os objetivos
básicos de uma empresa incluem proporcionar uma vida condigna às pessoas
que integram e usufruem as ações empresariais, com disponibilidade plena de
informações, formação e qualificação adequadas às funções que irá exercer e
procedimentos motivacionais que atendam às suas expectativas - sem as quais
as ações das pessoas ficam prejudicadas, além da criação de ambientes de
trabalho adequados à ação humana, sem restrições, constrangimentos ou
riscos à integridade física ou psicológica de qualquer espécie. Desejam-se,
para o empregado, condições compatíveis com sua condição de elemento mais
relevante do processo e, simultaneamente, carente de um conjunto de ações
que possibilitem uma vida melhor para si e para sua família.

Para proporcionar tais condições, alcançando a motivação, necessita-se


conhecer o comportamento dos recursos humanos no trabalho.

As diferenças internas nas organizações

O ambiente interno caracteriza-se por ser a parte humana e incontrolável da


empresa, que forma a organização capaz de transformar a matéria-prima, ou
informações, gerando serviços. Configura-se, no ambiente interno, uma
enorme quantidade de relações entre as pessoas, formando a chamada rede
de clientes e fornecedores internos. Os clientes e fornecedores internos são
todas as partes que interagem nos processos produtivos, ou mesmo nos
processos de apoio ao processo principal da organização As áreas vitais ou
processos empresariais críticos são os processos dos quais a empresa
depende para o seu sucesso. Para Harrington "esses processos são tanto mais
críticos quanto maiores forem sua importância e sua oportunidade de
aperfeiçoamento, e, desta forma, estes devem ser os primeiros a serem
atacados". Segundo Rangel), "a instabilidade dos processos vitais traz
conseqüências sérias e adversas às exigências dos clientes da empresa. A
seleção deles é uma fase importante para priorizar os trabalhos de
identificação dos clientes internos e os benefícios para a empresa residem,
entre outros, em estar aplicando melhorias visando atender melhor os clientes
de um processo considerado vital para a empresa".

174
Para o autor, devem-se estabelecer critérios de priorização que podem ser, por
exemplo: número de clientes internos impactados; impacto do processo nos
resultados de venda da empresa; interface do processo com o cliente externo.

A seleção dos processos a serem trabalhados é uma fase crítica dentro do


processo de melhoria. Muito esforço pode ser dispendido e o programa
abandonado, em conseqüência da falta de interesse e de poucos resultados
palpáveis, se forem selecionados processos errados. Os processos
selecionados devem ser aqueles com que a gerência ou os clientes não
estejam satisfeitos. Normalmente, um ou mais dos seguintes motivos
influenciam na seleção: problemas e/ou reclamações de clientes externos;
problemas e/ou reclamações de clientes internos; processos de alto custo;
processos com longo ciclo de execução; possível existência de um meio
melhor de executar o processo; disponibilidade de novas tecnologias;
orientação administrativa baseada no interesse de um gerente específico em
aplicar a metodologia ou envolver uma área que, de outra forma, não seria
envolvida.

Segundo Harrington, "ao selecionar o processo, deve-se ter em mente cinco


fatores: impacto sobre o cliente: qual a importância para o cliente; índice de
mudança (você pode resolver isso?), situação do desempenho (qual o grau de
complexidade do processo?), impacto sobre a empresa (qual a importância
para a empresa?) e impacto sobre o trabalho (que recursos estão
disponíveis?)".

Uma das sistemáticas de seleção dos processos críticos é a realizada pela


administração, que é freqüentemente utilizada para dirigir os esforços de
melhoria para os processos que são mais críticos para o êxito futuras da
empresa, ou para aquelas áreas identificadas como problemáticas pela
administração.

Dentro dessa visão, autores como Paladini propõem que se faça uma
subdivisão do ambiente empresarial, com o propósito de adequar as ações
empresariais para cada área da empresa.

175
Paladini propõe a divisão do ambiente empresarial em três segmentos,
utilizando os conceitos de ambiente in-line, ambiente on-line e ambiente off
line. O ambiente in-line representa o processo produtivo. O ambiente off line,
por sua vez, é o ambiente de suporte, ou seja, nele estão incluídas as pessoas
que não atuam diretamente no processo produtivo. A função de Marketing é um
exemplo disso.

O ambiente on-line dá ênfase ao conceito de cliente na qualidade. É o esforço


feito pela empresa para captar, o mais rapidamente, possível alterações em
preferências, hábitos ou comportamentos de consumo, e repassá-los ao
processo produtivo, de forma a adaptar, no menor espaço de tempo, o
processo à nova realidade do mercado. Aqui estariam incluídas as pessoas
que atuam no contato direto com o cliente.

Segundo o autor anteriormente citado, "se a empresa dá prioridade apenas ao


ambiente in-line, tem-se uma postura prejudicial, à medida que este ambiente:
1) não considera o cliente, suas necessidades e conveniências e 2) não
considera todas as atividades da empresa, mas apenas as mais fortes, aquelas
em que a empresa apresenta maior competência".

Com relação às empresas prestadoras de serviços, autores, como Gianesi &


Corrêa, propõem outra divisão do ambiente interno. Os autores, utilizando um
estudo de Silvestro de 1992, dividem o ambiente interno em front office e back
room. Segundo o autor, a parcela de alto contato com o cliente é normalmente
chamada de front office ou linha de frente, enquanto que aquela que realiza
operações de baixo contato denomina-se back room ou retaguarda.

As atividades de alto contato, devido à presença do cliente, têm um ambiente


mais carregado de incerteza e variabilidade, resultando em menor
produtividade e controle mais difícil. Ao contrário, as atividades de baixo
contato, isoladas do cliente (manufatura), apresentam um ambiente mais
previsível, maior padronização, possibilitando maior controle e maior
produtividade. Para Gianesi & Corrêa,

"os funcionários do front office (aqueles que têm possibilidade de ter contato
com o cliente) necessitam de habilidades diferenciadas em termos de

176
relacionamento interpessoal com o cliente. Os funcionários do back room
certamente também necessitam de habilidades interpessoais para lidarem com
seus companheiros de trabalho e clientes internos, importantes para o bom
desempenho geral da empresa. Entretanto, devido ao aspecto crítico de estar
participando dos momentos de contato com o cliente, os funcionários do front
office devem normalmente ser mais bem preparados para o contato
interpessoal. Isto inclui aspectos tangíveis (como aparência) e intangíveis
(como amabilidade, prestatividade, competência, entre outros) ".

Os autores concluem dizendo que, em relação a este aspecto, é essencial que


a força de trabalho da linha de frente - de contato com o cliente - esteja
motivada e satisfeita e que dificilmente um funcionário insatisfeito com suas
condições de trabalho conseguirá, num contato pessoal, transmitir um bom
nível de serviço ao cliente.

O relacionamento individuo x organização nem sempre é cooperativo e


satisfatório, pois há conflito entre os objetivos a serem atingidos. Apesar disso,
há uma interdependência entre suas necessidades. Por isso, a interação entre
eles é dinâmica e complexa.

O individuo precisa ser eficaz (atingir os objetivos organizacionais) e eficiente


(satisfazer suas necessidades pela sua participação) para sobreviver dentro do
sistema.

A interação psicológica entre empregado e organização é um processo de


reciprocidade: enquanto o individuo busca a satisfação de suas necessidades,
a organização avalia os custos e os esforços pessoais do empregado.

Expectativas do empregado Expectativas da organização


Satisfações pessoais › esforços Contribuição do indivíduo › custos
pessoais para a organização

177
2- Gestão de pessoas por competências. Competência
interpessoal. Conceito e tipologia de competências.
Identificação e priorização de competências. Mapeamento de
perfis profissionais por competências. Avaliação de potencial e
banco de talentos.

Com as grandes transformações que estão sempre ocorrendo nos sistemas


econômicos, lideradas principalmente pela globalização, as empresas
passaram a buscar flexibilidade nas suas operações, com o objetivo de
conquistar novas oportunidades, aumentar sua competitividade e gerenciar os
riscos e ameaças aos seus negócios.

Como resultado de todo esse processo de mudanças, as empresas passaram


a adotar modelos mais complexos de estruturas organizacionais por meio de
matrizes, times de trabalho autogerenciados e estruturas virtuais, modificando
profundamente os processos de trabalho e provocando um forte impacto nas
relações funcionais.

Mesmo contando com recursos financeiros e tecnológicos para operar nesse


ambiente de grandes transformações, as empresas entenderam que os
aspectos mais relevantes de todas as suas estratégias, aqueles que de fato
geraram um diferencial competitivo, são os relacionados a pessoas.

CAPITAL HUMANO

O conceito de capital humano passa pela percepção de que as pessoas não


são ativos perecíveis que devem ser consumidos, mas ativos valiosos, que
devem ser desenvolvidos e que viabilizam os negócios de uma organização.

178
Como conseqüência, o alinhamento da estratégia do negócio com a estratégia
de capital humano é fundamental para alcançar os objetivos organizacionais.

No conceito de recursos humanos, a contratação e o desenvolvimento das


pessoas têm como principal objetivo atender às necessidades de determinadas
áreas ou processos de trabalho, com evidente preocupação acerca da retenção
desses profissionais para ocupar as posições vagas, reforçando o conceito de
recursos, no qual a empresa mantém um fluxo constante de busca,
desenvolvimento, perda, busca de recursos humanos.

Já o conceito de capital humano indica ser fundamental que haja um


alinhamento inteligente entre as estratégias da empresa e as estratégias da
área de administração de pessoas. Com esse entendimento, a organização
consegue identificar os conhecimentos e perfis desejados em seu corpo de
profissionais para que as estratégias de negócios sejam alcançadas. A partir
daí, todos os sistemas e diretrizes de administração de pessoas seguem uma
lógica única, tendo como base a formação de pessoas e sua preparação para
atender às demandas de negócios e gerar valor para a empresa e para os
acionistas. Nesse caso, se a organização perder alguns de seus profissionais,
não estará perdendo apenas alguns recursos humanos, mas uma quantidade
razoável de capital humano, porque esses profissionais, já preparados e
atendendo aos objetivos do negócio, estarão deixando a organização e levando
consigo todo o conhecimento sobre o negócio e a operação, o que em última
análise constitui seu capital pessoal.

A agenda de capital humano tem como finalidade transformar a empresa numa


organização de alta performance por intermédio da identificação e do
desenvolvimento das competências necessárias para atender efetivamente aos
seus objetivos de negócios. A dinâmica de identificação e disseminação de
competências entre os profissionais da empresa a partir das necessidades da

179
organização, criará um círculo virtuoso e desejado, que culminará na retenção
de talentos.

GESTÃO POR COMPETÊNCIAS

É uma forma avançada de administrar pessoas, pois sua base de sustentação


está nos conhecimentos requeridos pela organização para que seus objetivos
de negócios sejam alcançados e na maneira como esses conhecimentos são
disseminados entre os profissionais da organização. A gestão por
competências preocupa-se com os desdobramentos das estratégias em
conhecimentos, habilidades e comportamentos requeridos para todos os
profissionais, auxiliando-os no alcance dos objetivos da organização. Ela busca
a integração dos diferentes tipos de competências no desenho dos perfis dos
profissionais e define os novos padrões requeridos para recrutamento, seleção,
avaliação, desenvolvimento e reconhecimento dos empregados.

PRINCIPAIS OBJETIVOS NA ADOÇÃO DA GESTÃO DE COMPETÊNCIAS

 Entender, organizar e disseminar os conhecimentos ligados ao


negócio e às estratégias da empresa, buscando construir uma organização de
alta performance.

 Garantir que a disseminação dos conhecimentos em meio ao quadro


de funcionários promova a evolução profissional destes e traga à empresa
benefícios como flexibilidade, agilidade, inovação e velocidade, além de dar
respostas para que a organização possa atuar com sucesso em ambientes
competitivos.

 Monitora a efetividade da disseminação do conhecimento para que a


organização alcance o ponto ótimo da relação; formação do capital humano
versus valor agregado + objetivo alcançado.

180
 Ser um instrumento de comunicação das mensagens-chave de
atitudes, conhecimentos e habilidades esperadas em relação a cada
empregado.

 Formar uma base de dados confiável em cada empregado


(resultados das avaliações), tornando-a disponível para a organização.

 Servir como valiosa fonte de informação para as necessidades de


treinamento e de desenvolvimento, plano de sucessão, movimentação na
carreira, seleção interna e externa e remuneração.

 Comprometer o líder na gestão efetiva e no desenvolvimento de sua


equipe.

 Transparência e comunicação em relação aos critérios para


desenvolvimento profissional.

 Incentivo a uma maior integração entre as diversas áreas e setores -


“quebra dos feudos”.

CONCEITO DE COMPETÊNCIA

Competência é o conjunto de características percebidas nas pessoas que


envolve conhecimentos, habilidades e atitudes que levam a um desempenho
superior. Elas envolvem comportamentos observáveis e mensuráveis
relacionados ao trabalho. Seus componentes são:

 Conhecimento = saber adquirido, conhecimento técnico, os conceitos e


as teorias.

 Atitudes = comportamentos do colaborador, a forma como ele age com


pares, superiores e subordinados. As atitudes estão ligadas à sua
personalidade.

 Habilidades= é o saber fazer, ou seja, é o saber colocado na prática.

181
DIMENSÕES DE UM MODELO DE GESTÃO POR COMPETÊNCIAS

Competências essenciais organizacionais requeridas para uma excelente


performance em todos os níveis e funções; competências de processos e
liderança; fatores de sucesso que diferenciam uma alta performance em todos
os níveis e funções e competências de função (cargos).

Competências genéricas / básicas: competências de gestão/liderança e


competências específicas.

A gestão por competências integra todos os sistemas da área de recursos


humanos, constituindo uma ferramenta de administração de pessoas e
viabilizando a convergência das ações de RH.

INDICADORES DE DESEMPENHO EM GESTÃO DO CAPITAL HUMANO

Rugenia Maria Pomi.

Eficácia organizacional: devem ser relacionados ao desempenho dos cenários


macroeconômicos do país em seus diversos ramos de atividade. Os
indicadores que usualmente fazem parte desta área, referem-se às receitas, ao
custo + despesa operacional, à lucratividade, ao retorno do investimento nas
pessoas, ao custo de terceirização etc.

Estrutura de RH, remuneração, benefícios, absenteísmo e rotatividade,


recrutamento e seleção, saúde ocupacional, relações trabalhistas, perfil dos RH
e,

182
Educação e aprendizagem – treinamento de desenvolvimento: na maioria das
empresas, educação é uma das funções de RH que tem recebido maior
atenção, análise, expectativa e cobrança de resultados. A necessidade de
manter e ampliar o capital intelectual exige estratégias contemporâneas e altas
somas de investimento em desenvolvimento humano.

A função primordial da gestão por competências é responder a questões


particulares do cenário empresarial, tais como: à necessidade de superação da
concorrência num mercado globalizado; às exigências por agilidade,
diferenciação e inovação contínuas; às demandas de aprendizagem e de
criação do conhecimento dentre outras.

Seu foco principal se encontra no desenvolvimento de competências e novos


conhecimentos. O modelo pressupõe que a posse de recursos raros, valiosos e
de difícil imitação (representados, sobretudo, pelos conhecimentos e
competências das pessoas que trabalham na organização) confere à mesma
vantagem competitiva.

Portanto, a gestão por competências pode ser definida como uma


metodologia de orientação empresarial para o mercado e para o cliente,
voltado para o desenvolvimento sistemático das competências
profissionais das equipes e dos funcionários. A gestão por competências
representa um importante sistema de informação estratégica que orienta
as ações de desenvolvimento profissional e organizacional.

A proposta de gestão por competências é compreender quais são as


competências organizacionais críticas para o sucesso empresarial, desdobrá-
las em termos de competências profissionais e desenvolvê-las junto ao quadro
funcional. É uma metodologia focada nos negócios, no mercado e no
desenvolvimento profissional permanente.

Ao implantar o modelo de gestão por competências, a organização induz todo o


quadro de funcionários a discutir e focar suas ações no que é fundamental para
a qualidade no trabalho e para o crescimento sustentável da empresa.

183
A gestão por competência direciona sua ação prioritariamente para o
gerenciamento do gap ou lacuna de competências eventualmente existente na
organização ou equipe, procurando eliminá-lo ou minimizá-lo.

10 GESTÃO POR COMPETÊNCIAS.

Antes de entendermos como funciona a gestão por competências devemos


saber o que são competências!

Grande parte dos autores atualmente considera competência como o somatório


de conhecimentos, habilidades e atitudes (CHA - para ajudar a fixar!) no
contexto do trabalho, ou seja, a combinação destes para obter um bom
resultado prático, que adicione valor à organização. Veja como o Cespe vem
cobrando o tema na questão abaixo:

(CESPE - TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS - 2008) Competências


representam combinações sinérgicas de conhecimentos, habilidades e
atitudes, expressas no desempenho profissional em determinado
contexto.

A frase está correta e é retirada dos trabalhos de Carbone. Esta é uma


definição de competências bastante atual, que considera competência não
somente um estoque destes conhecimentos, habilidades e atitudes, mas a
aplicação destes CHA´s no ambiente de trabalho real, trazendo resultados
práticos no contexto da organização.

Vamos entender melhor o que são estes conceitos:

Conhecimentos - Está relacionado ao saber da pessoa! São todas as


informações, os dados e conceitos que o indivíduo armazenou e que podem
ser usados por ele em seu trabalho.

Habilidades - É o saber fazer! A capacidade que a pessoa tem de utilizar


estes conhecimentos que possui na prática. Uma classificação muito conhecida
de habilidades é a de Katz, que menciona as habilidades técnicas, humanas e
conceituais.

184
Atitudes - Está relacionada ao modo como a pessoa lida com seus
sentimentos e maneiras de pensar e como estes afetam seu comportamento
em relação ao trabalho e seus colegas. Existem pessoas que gostam de
liderar, de comandar alguma ação. Outras não se sentem à vontade neste
papel, e terão dificuldade em assumir qualquer posição de chefia em uma
organização.

Ora, pense em um caso simples de um vendedor de automóveis. Ele precisa


ter conhecimento sobre os carros que estará vendendo (consumo, cores,
modelos, acessórios, etc.), habilidades de comunicação e negociação para
que possa argumentar com o consumidor e uma atitude positiva diante do
trabalho de vendas e em relação ao atendimento ao cliente, para que possa ter
sucesso em sua profissão, não é mesmo? De que adiantaria um vendedor que
sabe muito sobre automóveis, tem uma excelente habilidade de se comunicar,
mas está sempre de mau-humor ou detesta trabalhar como vendedor?

Até aqui falamos das competências pessoais, mas outros autores ligaram o
conceito de competência aos grupos ou organizações, como Prahalad e
Hamel, que consideram competência ("core competences" ou competências
essenciais) como a capacidade das empresas de agregar valor que é
percebido pelos clientes, de modo difícil de ser imitado por seus concorrentes,
gerando assim vantagem competitiva (a capacidade da Petrobrás de extrair
petróleo de águas profundas seria um exemplo).

Desta forma as competências podem ser classificadas em humanas (ligadas a


cada indivíduo) e organizacionais (que se relacionariam à capacidade da
empresa), sendo que as competências humanas afetam as organizacionais, e
vice-versa.

Existem várias outras classificações de competências. Vejamos algumas das


mais importantes:

As competências humanas podem ser classificadas de acordo com o papel


que a pessoa ocupa na organização. As competências humanas seriam então
técnicas (relacionadas às posições operacionais ou de assessoria, que não

185
exerceriam formalmente a liderança) e gerenciais (necessárias em ocupantes
de cargos de chefia e direção).

As competências organizacionais podem ser classificadas como básicas


(ligadas ao funcionamento da organização, mas que não diferenciariam a
empresa de seus concorrentes) e as essenciais (as que representam aspectos
que diferenciariam a empresa de seus concorrentes "core competences").

Outra classificação comum das competências organizacionais é em relação à


importância de cada uma com o passar do tempo. Elas seriam classificadas
como emergentes (que tendem a ser mais importantes no futuro), declinantes
(que perderão importância com o tempo), estáveis (manteriam sua relevância
atual) e transitórias (que seriam relevantes somente em um período, como em
uma crise)

COMPETÊNCIA INTERPESSOAL.

Competência interpessoal são os CHA’s: conhecimentos, habilidades e atitudes


do indivíduo para estabelecer, no ambiente de trabalho, relações pessoais e
profissionais proveitosas. Hoje, não basta saber executar as tarefas. É
necessário trabalhar em equipe, dar e receber feedbacks (retornos acerca do
desempenho de outras pessoas), lidar com os chefes e com clientes. No
contexto atual, também é fundamental lidar com a diversidade, aceitá-la,
entender que as pessoas têm diferentes pontos de vista e, cada um à sua
maneira, pode colaborar com a organização.

5 GERENCIAMENTO DE CONFLITOS. ADMINISTRAÇÃO -


GESTÃO DE CONFLITOS - CAUSA DOS CONFLITOS

Nas organizações, convivem muitas pessoas. É natural que, às vezes, elas


queiram seguir caminhos diferentes, queiram disputar recursos limitados ou
simplesmente não gostem do nariz das outras. É aí que surgem os conflitos.
Eles podem ser causados por fatores externos, como disputa por recursos, ou
mesmo por fatores internos, subjetivos, emocionais.

Nem sempre o conflito é uma força negativa na realidade organizacional.


Se entendermos o conflito como uma frustração pela não-obtenção de um

186
recurso, por exemplo, ele pode ser considerado uma força para que o indivíduo
se capacite para, no futuro, não enfrentar o mesmo conflito. O conflito pode
ser inclusive necessário à evolução do ambiente organizacional. O
aproveitamento do conflito dependerá, entretanto, da forma como ele é tratado,
em especial pelos gestores.

Chiavenato ensina que há três abordagens para lidar com o conflito:

• Abordagem estrutural: O líder ou gerente atua na estrutura ou nas condições


causadoras do conflito, de forma a diminuir ou eliminar a percepção de
desigualdade.

• Abordagem de processo: Trata-se de abordagem em que a resolução do


conflito passa pela intervenção no próprio episódio que causou o conflito.

• Abordagem mista: Inclui tanto modificações estruturais, das condições do


conflito, como aspectos processuais, relativos ao episódio que causou o
conflito.

De acordo com Schermerhorn, algumas condições podem aumentar a chance


de um conflito ocorrer. Elas são:

Papel Ambíguo - Ocorre quando o empregado não sabe o que é esperado


dele, ou o que deve fazer exatamente. Pode levar a uma situação em que
pessoas estejam fazendo trabalhos conflitantes, ou em tarefas que levem a um
conflito com outras pessoas na organização.

Recursos Escassos - Se faltam recursos para todos na organização, alguém


ficará insatisfeito! Disputas por recursos são causas muito comuns de conflitos
em uma organização!

Interdependências - Quando dependemos do trabalho de outras pessoas para


fazer nosso trabalho existe um conflito em potencial! Em toda organização
existe uma interdependência entre setores e pessoas, de forma que uma
pessoa deve cumprir seu papel de forma eficiente para que a outra possa fazer
o mesmo.

187
Objetivos Conflitivos - Quando os objetivos da organização não são bem
desenhados, ou são ambíguos (Setor de vendas recebe bônus por vendas
maiores, mas setor de materiais recebe bônus por investimento em estoque
menor, por exemplo) existe uma chance grande de haver conflitos dentro da
organização.

Diferenciação - Diferenças na estrutura da organização ou no perfil das


pessoas de áreas diferentes podem causar conflitos, pois as visões de mundo
e do trabalho poderão ser conflitantes (ex: imagine um setor de finanças com
pessoas com média de idade de 55 anos interagindo com o setor de marketing
recheado de pessoas com média de idade de 25 anos? A diferença de idade e
experiência por si só poderá gerar conflitos!).

Conflitos Anteriores - Quando já ocorreram conflitos entre algumas pessoas


e estes não foram bem resolvidos, estes ressentimentos sempre poderão
ressurgir em novos conflitos!

Vamos ver agora uma questão recente da Cesgranrio sobre este tema?

(CESGRANRIO - CASA DA MOEDA - ANALISTA RH - 2009) A existência de


conflitos é inevitável nas organizações. Por isso, o gestor pode identificar
formas de prevenção de conflitos, conhecendo condições que, via de regra,
conduzem a situações conflituosas. Uma dessas condições é a
interdependência de atividades, que se constitui quando

(A) expectativas são pouco claras ou confusas, levando as pessoas a


trabalharem para propósitos incompatíveis.

(B) cada grupo realiza ou desenvolve tarefas, objetivos, concepções e atitudes


diferenciadas.

(C) determinado grupo não consegue realizar tarefas a menos que outro grupo
realize a sua.

(D) recursos organizacionais são limitados ou escassos e precisam ser


compartilhados.

188
(E) a especialização de tarefas conduz ao estabelecimento de metas
concorrentes.

Como vimos acima, a interdependência ocorre quando dependemos do


trabalho de outra pessoa ou outro grupo para que possamos fazer nosso
trabalho. Sempre que houver um insucesso existirá uma chance de que o
conflito aconteça! É aquela estória freqüente em toda organização: "fulano
pisou na bola e agora o problema é nosso"?. O gabarito é a letra C

6 CLIMA E CULTURA ORGANIZACIONAL

Organização é um sistema de atividades conscientemente coordenadas de


duas ou mais pessoas onde, devido a limitações pessoais, os indivíduos são
levados a cooperarem uns com os outros para alcançar certos objetivos que
a ação individual isolada não conseguiria. Portanto, as organizações se
constituem nessa interação que faz com que elas sejam dinâmicas e
complexas, ou seja, um organismo vivo.

O comportamento organizacional é o estudo e aplicação do conhecimento


sobre como as pessoas agem dentro das organizações e aplica-se
amplamente ao comportamento das pessoas em todos os tipos de
organizações, tais como negócios, governo, escolas e organizações de
serviços.

Lopes menciona três razões fundamentais que determinam o comportamento:

 "percepção: maneira pela qual o indivíduo sente os estímulos que são


absorvidos seletivamente;

 atitudes: relacionado com as opiniões e valores;

 mecanismos de defesa: processo de comportamento usado quando o


feedback do comportamento original indica expectativas não
alcançadas".

189
Segundo Kanaane, "o comportamento está vinculado de certa maneira às
normas e valores socialmente disseminados em dado contexto: o indivíduo
reage a determinadas situações, mas suas ações são também influenciadas
pelas circunstâncias presentes". Ainda, segundo o autor, "é preciso considerar
a existência de diferentes concepções do termo comportamento:

 comportamento individual: retrata as reações inerentes ao indivíduo e


sua condutas no contexto organizacional;

 comportamento grupal: refere-se à gama de reações dos indivíduos que


compõem um grupo; as ações emergentes do comportamento grupal
retratam as múltiplas influências decorrentes da dinâmica existente,
incluindo as pessoas, a interação, o sentimento, as atividades (tarefas),
a comunicação e os objetivos;

 comportamento organizacional: refere-se à manifestações emergentes


no contexto das organizações, indicando os controles, o processo
decisório e os esquemas técnico-administrativos assumidos num dado
momento organizacional".

Por outro lado, afirma Schein, "em muitos casos a percepção, os sentimentos e
as atitudes das pessoas, refletidos nos procedimentos informais, mostram uma
forte lealdade à subunidade à qual essas pessoas pertencem e são moldados
pelo tipo de trabalho que a subunidade executa".

Para Kanaane, a compreensão das concepções que os indivíduos e grupos


possuem sobre o trabalho desempenhado possibilita entender as influências
destas concepções no alcance da produtividade, e por conseqüência, da
Qualidade empresarial.

As diferenças departamentais são, portanto, componentes ativos do


comportamento dos recursos humanos, e, conseqüentemente, da motivação
destes no trabalho.

PESSOAS E ORGANIZAÇÕES

As pessoas buscam, de modo geral, satisfazer às suas necessidades de


pertencimento grupal e de auto-realização quando ingressam no sistema

190
organizacional produtivo. Entretanto, nem sempre estes objetivos são
alcançados, pois inúmeros fatores permeiam as relações de trabalho e
influenciam na satisfação dessas necessidades. Dentre estes fatores, podemos
citar a própria subjetividade humana (motivações, interesses, valores, história
de vida, modo de se relacionar), ou seja, a singularidade de cada sujeito
influencia o grupo como um todo.

Desta forma, o relacionamento interpessoal e o clima dos grupos podem trazer


satisfações ou insatisfações pessoais ou grupais, o que repercutirá na
organização como um todo.

O ambiente interno caracteriza-se por ser a parte humana e controlável da


empresa, que forma a organização capaz de transformar a matéria-prima, ou
informações, gerando serviços.

Configura-se, no ambiente interno, uma enorme quantidade de relações entre


as pessoas, formando a chamada rede de clientes e fornecedores internos. Os
clientes e fornecedores internos são todas as partes que interagem nos
processos produtivos, ou mesmo nos processos de apoio ao processo principal
da organização

Alguns dos processos são vitais à empresa. As áreas vitais ou processos


empresariais críticos são os processos dos quais a empresa depende para o
seu sucesso. Para Harrington "esses processos são tanto mais críticos quanto
maiores forem sua importância e sua oportunidade de aperfeiçoamento, e,
desta forma, estes devem ser os primeiros a serem atacados".

Segundo Rangel, "a instabilidade dos processos vitais traz conseqüências


sérias e adversas às exigências dos clientes da empresa. A seleção deles é
uma fase importante para priorizar os trabalhos de identificação dos clientes
internos e os benefícios para a empresa residem, entre outros, em estar
aplicando melhorias visando atender melhor os clientes de um processo
considerado vital para a empresa".

Devem-se estabelecer critérios de priorização que podem ser, por exemplo:


número de clientes internos impactados; impacto do processo nos resultados

191
de venda da empresa; interface do processo com o cliente externo.

Portanto, o conjunto de preceitos, políticas administrativas, crenças e valores é


que dão forma ao modo especial e único de como as pessoas agem e
interagem dentro de uma organização, de forma a colaborar para o
estabelecimento de uma cultura e clima organizacional.

Nassar define a cultura organizacional como: “... o conjunto de valores, crenças


e tecnologias que mantém unidos os mais diferentes membros, de todos os
escalões hierárquicos, perante as dificuldades, operações do cotidiano, metas
e objetivos. Pode-se afirmar ainda que é a cultura organizacional que produz
junto aos mais diferentes públicos, diante da sociedade e mercados o conjunto
de percepções, ícones, índices e símbolos que chamamos de imagem
corporativa.”

Chiavenato, Nassar, e Vergasta, afirmam que a cultura organizacional


pode sofrer mudanças ao longo do tempo, mesmo que a organização
resista a elas.

De acordo com Vergasta, “A cultura organizacional não é algo pronto e


acabado, mas está em constante transformação, de acordo com sua história,
os seus atores e com a conjuntura.”

Embora as organizações, muitas vezes, estejam inseridas em um mesmo


contexto sócio-econômico-cultural, cada uma delas apresenta características
singulares. Tal fato ocorre devido à presença de inúmeras variáveis, tais como:
modelo de gestão, tipo de liderança predominante, comprometimentos dos
colaboradores, sub-cultura local (crenças e tabus). Estas variáveis constituem a
cultura organizacional.

Cultura organizacional

Da mesma forma que todos nós temos uma personalidade, um modo


razoavelmente estável de agir perante a vida (Se dizemos que alguém é tenso,
é inovador ou simpático, estamos citando traços de personalidade), uma
organização também sua “personalidade”.

192
Esta “personalidade organizacional” chamamos de cultura.

A cultura organizacional refere‐se a significados compartilhados, que


moldam a maneira que seus membros se comportam dentro da organização.
Em todas as organizações existem valores, símbolos, rituais e práticas que
foram se desenvolvendo com o tempo.

A cultura condiciona a forma como os funcionários percebem a empresa e


como respondem a seus problemas e desafios, e tem uma influência direta no
desempenho. De acordo com Schein, cultura é:

“É um modelo de pressupostos básicos, que determinado


grupo tem inventado, descoberto ou desenvolvido no processo
de aprendizagem para lidar com problemas de adaptação
externa e integração interna. Uma vez que os pressupostos
tenham funcionado bem o suficiente para serem considerados
válidos, são ensinados aos demais membros como maneira
correta para se proceder, se pensar e sentir‐se em relação
àqueles problemas.”

A cultura da empresa pode mudar, mas nem sempre como conseqüência de


uma “vontade” dos seus diretores. Essa mudança normalmente ocorre de
acordo com uma relação entre variáveis internas e externas, que criam espaço
para essa mudança da cultura.

A cultura de uma organização pode ser descrita em relação a dez


características principais. De acordo com Robbins elas são:

Identidade do membro – O grau com que os empregados se identificam com


a organização como um todo, e não com o seu tipo de trabalho ou
especialidade profissional;

Ênfase no grupo – O grau com que as atividades de trabalho são organizadas


em torno de grupos em vez de indivíduos;

Foco nas pessoas – O grau com que as decisões da administração levam em


consideração o efeito dos resultados em pessoas da organização;

Integração das unidades – O grau com que as unidades da organização são


estimuladas a operar de uma maneira coordenada ou interdependente;

193
Controle – O grau com que regras, regulamentos e supervisão direta são
usados para inspecionar e controlar o comportamento dos empregados;

Tolerância a risco – O grau com que os empregados são incentivados a ser


agressivos, inovadores e propensos ao risco;

Critérios de recompensa – O grau com que recompensas como aumentos de


salário e promoções são distribuídos por critério de desempenho do
empregado em contraste com o tempo de casa, favoritismo e outros fatores
não‐ligados ao desempenho;

Tolerância a conflito – O grau com que os empregados são estimulados a


expressar conflitos e críticas abertamente;

Orientação meios‐fins – O grau com que a administração enfatiza resultados


ou efeitos em detrimento de técnicas e processos usados para alcançar
aqueles resultados;

Foco em sistemas abertos – O grau com que a organização monitora e


responde a mudanças no ambiente externo.

Normalmente a cultura de uma organização reflete a maneira de pensar de


seus fundadores. Eles foram os criadores da organização, portanto tiveram
também as idéias de como ela deveria se portar em relação aos desafios, ou
seja, como seus ocupantes deveriam se comportar dentro dela. Com o tempo
as experiências vividas por seus funcionários também vai se somando à visão
de seus fundadores, consolidando esta cultura.

Questões sobre este tema:

1. (CESPE – STM / ANAL JUD – 2004) Cultura organizacional é o conjunto de


idéias, normas e valores criados em decorrência da interação cotidiana dos
diversos servidores, em suas trocas de experiências e em seu crescimento
cultural e profissional.

2. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2010) Os pressupostos


básicos da cultura organizacional são de difícil mudança, pois são implícitos,
arraigados e orientadores do comportamento organizacional.

194
3. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2010) Os três níveis da
cultura organizacional são: artefatos observáveis, valores adotados e
pressupostos básicos.

4. (CESPE – MTE / ADMINISTRAÇÃO – 2008) A reunião anual que


tradicionalmente é realizada pela diretoria para apresentar resultados e
homenagear aqueles que alcançaram ou superaram as metas propostas pela
organização pode ser citada como exemplo de artefato da cultura
organizacional.

5. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2010) Quando as


organizações visam promover maior efeito da cultura organizacional sobre o
comportamento dos funcionários, é essencial que se garanta que os
funcionários compreendam os valores praticados em detrimento dos valores
adotados.

6. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2008) A cultura de uma


organização é, muitas vezes, formada a partir dos valores de seus fundadores
e das equipes escolhidas por eles.

7. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2008) Em uma empresa,


a cultura é fruto dos valores compartilhados por uma parte restrita dos
membros dessa organização.

8. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2008) A cultura


intensifica a instabilidade do sistema social de uma organização.

9. (CESPE – HEMOBRÁS/ ADMINISTRADOR – 2008) A cultura organizacional


trata do conjunto de valores, hábitos e condutas adotados pelos membros de
uma organização e que necessitam estar escritos para que sejam aceitos por
todos os envolvidos.

10. (CESPE – HEMOBRÁS/ ADMINISTRADOR – 2008) Percebe‐se a cultura


de uma organização identificando como os membros se vestem e se tratam
mutuamente, como os clientes e fornecedores são tratados e como se dão as
relações entre chefes e subordinados.

195
11. (CESPE – CEARAPORTOS / ANALISTA ‐ 2004) Os níveis da cultura
organizacional podem ser divididos em valores casados, artefatos e certezas
tácitas compartilhadas. Quando se tem o primeiro contato com uma
organização, é possível perceber a cultura instalada por meio da observação
dos artefatos.

12. (CESPE – MIN. COMUNICAÇÕES / ADMINISTRAÇÃO ‐ 2008) Um


servidor que marcou a história do Ministério, sendo citado como exemplo e
modelo a ser seguido pelos novos ingressantes, deve ser entendido como
exemplo de artefato da cultura organizacional.

13. (CESPE – MIN. COMUNICAÇÕES / ADMINISTRAÇÃO ‐ 2008) Na


tradicional classificação de três níveis da cultura organizacional, as
pressuposições básicas constituem o terceiro nível, o mais íntimo, profundo e
oculto.

14. (CESPE – MIN. COMUNICAÇÕES / ADMINISTRAÇÃO ‐ 2008) Na


tradicional classificação de três níveis da cultura organizacional, o primeiro
nível corresponde aos valores compartilhados, que apresentam para as
pessoas da organização as razões pelas quais elas desenvolvem as tarefas.

Gabaritos:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14
C C C C E C E E E C C C C E

Desta maneira, para se analisar e intervir em uma organização, faz-se


necessário englobar todos os componentes organizacionais e dar especial
atenção aos fatos culturais da organização. Neste contexto, é importante
atentar para o perfil dos líderes e clientes internos, os ritos e símbolos
presentes nas relações, os tipos de comunicação adotados, a filosofia que guia
a política de gestão, o clima organizacional, a coerência entre a missão da
organização e as atitudes comportamentais de seus componentes.

Chiavenato assim define a cultura organizacional: “A cultura organizacional


consiste em padrões explícitos e implícitos de comportamentos adquiridos e

196
transmitidos ao longo do tempo que constituem uma característica própria de
cada empresa.”

Para esse autor a cultura organizacional pode ser dividida em um nível visível e
outro invisível. “No nível visível, estão os padrões e estilos de comportamento
dos empregados. No nível invisível, como um iceberg, estão os valores
compartilhados e crenças que permanecem durante um longo período de
tempo. Este nível é mais difícil de mudar.”

Weil, representando a holística apresenta a definição de cultura organizacional


como um fato mutável e nos diz que “... uma cultura organizacional holística é
um conjunto de valores, conhecimentos e costumes ligados a uma visão não-
fragmentada do mundo em que a organização é considerada um organismo
vivo em constante movimento, constituindo um sistema de eventos com uma
constante interação e interdependência de sistemas maiores ou menores.”

A cultura organizacional é um padrão de assuntos básicos compartilhados que


um grupo aprendeu como maneira de resolver seus problemas de adaptação
externa e integração interna, e que funciona bem a ponto de ser considerado
válido e desejável para ser transmitido aos novos membros como a maneira
correta de perceber, pensar e sentir em relação aos seus problemas.

A cultura envolve tanto aspectos formais (como normativos e símbolos) como


informais (comportamentos, crenças). Podemos entender que são dimensões
da cultura:

Valores organizacionais: referem-se à filosofia da empresa. Refletem a visão


compartilhada de “como as coisas devem ser”, dando uma sensação de
direção comum para os seus membros.

Cultura gerencial: é um reflexo dos valores, voltado para o conceito de


autoridade na organização, em termos de estilos predominantes de liderança e
maneiras de se solucionar os problemas.

197
Heróis organizacionais: São modelos de papéis que personificam o sistema de
valores culturais e que definem o conceito de sucesso na organização,
estabelecendo um padrão de desempenho e motivando os integrantes da
empresa.

Histórias e mitos da organização: São narrativas que organizam as crenças


sobre a organização e seu sistema de valores, que ajuda a compreender “como
as coisas são feitas”.

Tabus e rituais da organização: Os rituais são as cerimônias especiais, de


homenagem ou premiação, festas e reuniões anuais, assim como os rituais
diários (hora do cafezinho, reuniões de departamentos). Já os tabus
transmitem a idéia dos limites aceitáveis para os comportamentos e interações.

Símbolos culturais (cultura objetiva): artefatos materiais que representam a


cultura da empresa. Envolvem mobiliário, automóveis, ambiente de trabalho
(escritórios abertos ou fechados, estacionamentos com vagas privativas) e
imagens (logotipo, estilo de vestuário).

A cultura organizacional possui três níveis:

Artefatos: Nível mais superficial e perceptível da cultura. É aquilo que podemos


notar facilmente a partir do que as pessoas falam e como se comportam.
Engloba os produtos, serviços, tipo de vestuário, símbolos, histórias, heróis e
cerimônias anuais das empresas, por exemplo.

Valores compartilhados: É o segundo nível da cultura. “São os valores


relevantes que se tornam importantes para as pessoas e que definem as
razões pelas quais elas fazem o que fazem. Funcionam como justificativas
aceitas por todos os membros”

Pressuposições básicas: “Constituem o nível mais íntimo, profundo e oculto da


cultura organizacional. São as crenças inconscientes, percepções, sentimentos
e pressuposições dominantes, muitas vezes não-escritas e nem sequer
faladas.”

Culturas organizacionais conservadoras são mais difíceis de mudar, enquanto


culturas adaptativas são flexíveis e orientadas à mudança e inovação.

198
Em uma organização, pode haver subculturas (culturas específicas de algumas
áreas, ou de determinados grupos. Caso uma subcultura se oponha de forma
explícita à cultura organizacional, dizemos que ela é uma contracultura.

CLIMA ORGANIZACIONAL
Conceitos:

 O meio interno de uma organização: atmosfera psicológica e


característica que existe em cada organização.
 Ambiente humano onde as pessoas executam seu trabalho. Não pode
ser tocado ou visualizado, mas pode ser percebido psicologicamente.
 Demonstra como seu conjunto de valores e crenças (cultura) é
percebido e assimilado pelo grupo.
 Conjunto de valores, atitudes e padrões de comportamentos, formais e
informais existentes em uma organização.
 Avaliação de até que ponto as expectativas das pessoas estão sendo
atendidas dentro da organização.
 Qualidade do ambiente da organização, e que é percebida pelos
membros da organização como sendo boa ou não, e que influenciam o
seu comportamento.
 É a maneira/forma como os indivíduos percebem o meio, interpretam os
fatores e reagem. É o resultado dessa reação.

Reação: CLIMA + = motivação; CLIMA - = insatisfação.

Logo, o clima não pode ser criado pela organização. Ele existe na organização
como um resultado de fatores internos: decisões tomadas, maneira como o
pessoal é administrado pelos chefes, percepção que tem da empresa.

A dificuldade na conceituação do clima ocorre porque ele é percebido de


diferentes maneiras pelos diferentes indivíduos. O que é bom para um pode ser
ruim para outro. Portanto, a percepção do clima organizacional é subjetiva.

O que interfere no clima?

Fatores internos: decisões organizacionais, posturas a chefia, motivação.

199
Fatores externos: são externos à organização mas afetam muito as decisões
tomadas nela.

Pesquisa de clima

É uma pesquisa realizada internamente com o objetivo de levantar as


necessidades individuais e coletivas dos integrantes da organização bem como
o nível de satisfação destas. Ela deve ser coerente com o planejamento
estratégico da organização e de vê contemplar:

 Integração setorial e interpessoal


 Salário
 Estilo gerencial
 Comunicação
 Desenvolvimento profissional
 Imagem da empresa
 Processo decisório
 Benefícios
 Condições físicas do trabalho
 Trabalho em equipe
 Orientação para resultados.

Etapas da pesquisa de clima:

1. Aplicação do instrumento avaliativo – levantamento de dados:


Elabora o instrumento e decide os indicadores. Aplica na amostragem.
2. Tabulação e cruzamento de dados:
Correção do que foi aplicado e ealboraçao de tabela de resultados.
3. Apresentação do relatório final dos resultados:
Confecção do relatório final com os resultados globais. Além disso deve
constar: número de questionários aplicados, setores e correlatos entre
os mesmos e a organização como um todo.
4. Elaboração do plano de ação:
Definição das ações ratificadoras e retificadoras com relação aos
resultados obtidos.
a. Ressaltar resultados obtidos: e incentivá-los.

200
b. Promover treinamentos: para os pontos fracos.
c. Ampliar a comunicação: entre participantes, promovendo debate
sobre os resultados obtidos.

Não existe pesquisa de clima padrão; ela deve se adaptar à realidade da


empresa. Para que tenha sucesso é necessário: credibilidade no processo,
sigilo e confiança.

Indicadores de satisfação indicados pela pesquisa:

 Comunicação interna
 Salários e benefícios
 Carga horária de trabalho
 Condições de trabalho
 Relações interpessoais
 Relações gerenciais.

Benefícios que a pesquisa traz para a empresa:

 Sinergia entre planejamento estratégico e cultura organizacional.


 Melhoria da qualidade de produção.
 Aumento da motivação.
 Minimização da rotatividade.
 Levantamento das necessidades de treinamento.

Para Bowditch e Buono “o clima é uma percepção resumida da atmosfera e do


ambiente da organização, e tem implicações na satisfação com o trabalho e a
organização, no desempenho, nos padrões de interação em grupos e nos
comportamentos de afastamento (absenteísmo, rotatividade)”. Ou, segundo o
Cespe, “clima organizacional está ligado, diretamente, à maneira como o
colaborador percebe a organização, com a sua cultura, suas normas, seus
usos e costumes, como ele interpreta todos esses pontos e como reage,
positiva ou negativamente, a essa interpretação”.

Ao contrário do que muitos pensam o clima organizacional, em geral, não é


prioritariamente definido por fatores mais óbvios como salário e condições
físicas de trabalho. Muitos outros fatores interferem no clima, tais quais:

201
desafios, reconhecimento, realização, equidade, estilo de liderança,
oportunidades de carreira (crescimento profissional), participação em
programas de treinamento, bolsas de estudo, ambiente de aprendizagem, calor
humano, autonomia, estrutura, recompensas.

O clima organizacional é fortemente influenciado pela cultura, e possui


um horizonte temporal menor, ou seja, muda mais rápido e com mais
facilidade.

O clima organizacional influencia direta e indiretamente nos comportamentos,


na motivação, na produtividade do trabalho e também na satisfação das
pessoas envolvidas com a organização. Luz diz que: “O clima retrata o grau de
satisfação material e emocional das pessoas no trabalho. Observa-se que este
clima influencia profundamente a produtividade do indivíduo e,
conseqüentemente da empresa. Assim sendo, o mesmo deve ser favorável e
proporcionar motivação e interesse nos colaboradores, além de uma boa
relação entre os funcionários e a empresa.”

O clima organizacional também reflete a história dos tipos de pessoas que a


organização atrai, dos seus processos de trabalho, das modalidades de
comunicação e também reflete a história de quem exerce a autoridade dentro
do sistema.

O clima organizacional é resultado, em sua totalidade, da própria cultura,


tradições e métodos de ação de cada organização. Cada novo empregado
espera ter o apoio da empresa e atender seus desejos econômicos, sociais e
emocionais. Através da percepção que tiver, este funcionário produzirá uma ou
outra imagem do clima da organização em sua mente.

As empresas atraem ou mantêm pessoas que se ajustam ou não em seus


padrões de comportamento, que por muitas vezes são perpetuados através da
história da organização.

Portanto, o clima organizacional é o reflexo das motivações


comportamentos e relações estabelecidas entre os agentes

202
organizacionais além de ser um fator que influencia estas mesmas
variáveis.

Edela classificou o clima organizacional como:

a) clima desumano, onde é dada excessiva importância à tecnologia;


b) clima tenso, onde há forte pressão ao cumprimento de normas rígidas,
burocráticas em que os resultados podem levar a punições e/ou
demissões e
c) clima de tranqüilidade e confiança, onde existe plena aceitação dos
afetos, sem descuidar-se de preceitos e do trabalho.

CULTURA VERSUS CLIMA ORGANIZACIONAL

O clima organizacional é de certa forma, o reflexo da cultura da organização,


ou seja, é o reflexo dos efeitos dessa cultura na organização como um todo.

Luz afirma que “Clima é resultante da cultura das organizações; de seus


aspectos positivos e negativos (conflitos).” Portanto, o clima organizacional
influencia e é influenciado pelo comportamento dos indivíduos na organização,
no seu desempenho, motivação e satisfação no trabalho.

Soares afirma que “O clima mapeia o ambiente interno que varia segundo a
motivação dos agentes. Aprende suas reações imediatas, suas satisfações e
suas insatisfações pessoais...”

Como mudanças na cultura organizacional são mais profundas, levam


mais tempo para acontecer. Já o clima é mais fácil de ser percebido e
apresentando uma natureza mais transitória, podendo ser administrado
tanto a curto quanto a médio prazo.

Ao propor mudanças em uma organização é imprescindível conhecer os traços


da cultura nacional. Os traços da cultura brasileira são: a hierarquia
representada pela tendência à centralização do poder dentro dos grupos
sociais, o distanciamento nas relações entre diferentes grupos sociais e a

203
passividade e aceitação dos grupos inferiores; o personalismo, que é
caracterizado pela sociedade baseada nas relações pessoais, a busca de
proximidade e afeto nas relações e o paternalismo; a malandragem incutida
no típico “jeitinho brasileiro” e a adaptabilidade e flexibilidade como meio de
navegação social; o sensualismo, caracterizado pelo gosto do erótico e do
social nas relações sociais; e, finalmente, o traço aventureiro que define o tipo
que tem aversão ao trabalho manual e metódico e é mais sonhador do que
disciplinado.

Portanto, somente com o conhecimento desses traços culturais é possível fazer


uma adaptação dos modelos de gestão importados às organizações brasileiras.

Novos conhecimentos e tecnologias caracterizam mudanças aceleradas, que


trazem consigo uma busca constante à especialização. Desta forma, surge o
fenômeno da diferenciação organizacional e uma conseqüente necessidade de
integração entre profissionais especializados em diversas áreas, que formam
grupos de trabalho que podem ser transitórios, isto é, formados para
executarem uma única tarefa, ou podem ser permanentes, ou seja, para
assessorar projetos a longo prazo.

Contudo, na medida em que se forma uma equipe composta de profissionais


de formações diversas e que pertencem a grupos referenciais diferentes,
criam- se subculturas trazidas para dentro da instituição.

Essas características geram clima de instabilidade e não cometimento, pois a


formação da cultura numa equipe profissionalmente heterogênea é bem mais
lenta.

Nesses casos, a intervenção como meta operacional, requer esforço na


facilitação do desenvolvimento organizacional, ou seja, devem-se criar
condições a partir das quais os conflitos são trazidos à tona pela equipe e
adequadamente conduzidos pelo interventor. Os conflitos devem ser tratados
de forma natural, oportunizando a solução dos problemas e ocasionando
mudança no clima da organização.

PESQUISA DO CLIMA E DA CULTURA ORGANIZACIONAL

204
Pesquisar e analisar o clima e a cultura das organizações exige o
conhecimento da tecnologia indispensável para tal. Esta tecnologia engloba a
postura do pesquisador, o conhecimento de uma metodologia, a escolha de
técnicas apropriadas à investigação, a seleção adequada das categorias de
análise, o esclarecimento dos objetivos da pesquisa e o reconhecimento, da
gerência e colaboradores, no que se refere à importância da pesquisa para
uma intervenção pontual e eficaz.

Também devem ser analisados os fatores externos à organização que


influenciam os clientes internos e, conseqüentemente, o clima e na cultura da
organização.

Ao considerar os fatores externos à organização, na pesquisa do clima e


cultura organizacionais, é necessário obter informações pertinentes e
percepções do mercado do qual a organização faz parte. Antes de escolher os
focos a serem incluídos na avaliação é necessário considerar os objetivos do
pesquisador e da organização ao solicitar a pesquisa.

A seleção dos itens pertinentes à pesquisa poderá ser discutida com os


gestores da organização. Ao escolher e elaborar os instrumentos de pesquisa é
necessário considerar o grau de escolaridade dos colaboradores, o tempo
disponível para realizá-la e fazer a testagem dos instrumentos com alguns
funcionários para corrigir possíveis falhas.

A pesquisa deve atingir o máximo de funcionários para não gerar angústia


tanto no grupo que participou quanto no que não fez parte da mesma.

Realizado o diagnóstico do clima organizacional, são sugeridas medidas a


serem implementadas na organização, pois sabe-se que a produtividade da
mesma é também o resultado da motivação e estado de espírito dos indivíduos
que dela fazem parte.

Como afirma Luz, “A pesquisa do Clima Organizacional pode ser considerada


como um instrumento que, aplicado de forma consciente e metódica, tem
condições de assegurar consistência em quase todas as mudanças
empresariais que busquem eficiência, eficácia e qualidade.”

205
Com esta medida garante-se também maior comprometimento e seriedade nas
pesquisas subseqüentes.

MUDANÇAS DE PARADIGMAS CULTURAIS

Chiavenato classifica três paradigmas culturais que são:

a) autocracia e desconfiança - considera os indivíduos/colaboradores


como subordinados destituídos de inteligência, iniciativa e criatividade;
b) conformismo - as pessoas se ajustam e aceitem o status quo;
c) individualismo - as pessoas agem isoladamente do grupo,
fragmentando as tarefas e causando muitas vezes o confinamento social
dos indivíduos na organização. O individualismo faz com que as
pessoas, muitas vezes, esqueçam de levar em conta os objetivos da
própria organização
E afirma que esses paradigmas ainda estão presentes na maioria das
organizações, constituindo-se em “barreiras sólidas” à mudança e à inovação
das empresas.

As mudanças culturais e organizacionais dependem basicamente da mudança


de paradigmas. Esta tarefa não é fácil, pois as organizações são constituídas
de seres humanos que estão em constante desenvolvimento e que interagem
entre si; ao mesmo tempo em que trazem sua própria cultura às organizações,
assimilam a cultura vigente. Essa inter-relação cultural pode transformar-se em
uma nova cultura e por que não, em mudanças de paradigmas.

Todas as propostas de gestão devem estar embasadas em um conhecimento e


compreensão mais profundos da organização a intervir.

As mudanças significativas não ocorreram a curto prazo, devido à dificuldade


natural de não só mudar a cultura vigente como também de conseguir
administrar as forças e influências externas à organização

Portanto, refletir sobre clima e cultura organizacional significa rever vários


fatores internos e externos que influenciam diretamente no desenvolvimento
das organizações.

206
É inviável adotar um modelo de gestão, medidas em relação às políticas de
recursos humanos ou promover qualquer mudança organizacional se os
gestores não tiverem conhecimento de que todo o investimento pode ser em
vão se essa premissa não for considerada.

A investigação da cultura e do clima organizacional é tarefa árdua e os


profissionais da área devem fazê-lo com muita seriedade, coerência, prudência
e bom senso, através de uma metodologia adequada à realidade para, com
isso, evitar erros e descrédito das novas propostas.

Socialização organizacional

Ambientação/aculturamento: maneira pela qual a organização recebe os novos


escolhidos e os integra à sua cultura, ao seu contexto, ao seu sistema, para
que eles possam se comportar de maneira adequada às expectativas da
organização.

Socialização organizacional: processo bidirecional e recíproco – cada parte


procura influenciar e se adaptar à outra, tentando uma adaptação mútua.

Métodos de socialização:

Planejamento do processo seletivo: informações sobre a organização


recebidas durante a seleção.

Conteúdo inicial da tarefa: gerente dá ao principiante tarefas desafiadoras para


que experimente o sucesso e a motivação decorrentes.

Papel do gerente: gerente é a imagem da organização.

Grupos de trabalho: gerente atribui a integração ao grupo, que deve aceitá-lo


positivamente.

Programas de integração: programas intensivos de treinamento para


familiarizar os novatos com a cultura e as regras da organização.

Conceitos de cultura:

 Sistema compartilhado de significados dentro de uma organização, o


qual determina, em grande parte, como os funcionários agem.

207
 Normas informais e não escritas que orientam o comportamento dos
membros de ma organização e direcionam suas ações para a realização
dos objetivos organizacionais.
 Conjunto de hábitos e crenças, estabelecidos através de normas,
valores, atitudes e expectativas compartilhados por todos os membros.
 Espelha a mentalidade que predomina em uma organização.
 Modelo de pressupostos básicos criado pelo grupo para lidar com
problemas de adaptação externa e integração interna.
 Importante objeto estratégico: revela o comportamento e a tomada de
decisão de seus integrantes.

Valores: são princípios adotados pelos integrantes para determinar que ações
são ou não desejadas pelo grupo. Elas podem ser:

 Finais: resultados que as pessoas gostariam de obter (missão


organizacional);
 Intermediários: comportamentos esperados.

Valores compartilhados são aqueles que tanto os empregados quanto a


empresa têm em comum.

Crenças: expressão de tudo que é tido como verdade na organização.

Shein é um autor de referência quando falamos em cultura. Em suas palavras


“a cultura passa a existir quando não é mais necessário pensar sobre um
problema racionalmente. Ela é um padrão de aspectos básicos compartilhados
e que funciona bem a ponto de ser considerado válido e desejável para ser
transmitido aos novos a maneira correta de perceber, pensar e sentir em
relação àqueles problemas.

Fluxograma de Schein:

Um VALOR leva a um COMPORTAMENTO que cria

Respostas
aprendidas
PRESSUPOSTO
SOLUÇÃO
208 SUBJACENTE
uma que produz como as
coisas são
realmente

na medida em que como VERDADE


INTERNALIZADO

sai do nível CONSCIENTE e se torna VERDADE


INQUESTIONÁVEL

A cultura organizacional não é palpável. Não é percebida ou observada em si


mesma, mas através dos seus efeitos e conseqüências. Lembra um iceberg:

ASPECTOS FORMAIS E ABERTOS: componentes visíveis e


publicamente observáveis, orientados para aspectos
operacionais e de tarefas cotidianas. Ex: estrutura
organizacional,descrição de cargos, objetivos e estratégias,
práticas, políticas e diretrizes, métodos e procedimentos,
medidas de produtividade e medidas financeiras.

ASPECTOS INFORMAIS E OCULTOS: componentes invisíveis


e ocultos, afetivos e emocionais, orientados para aspectos
sociais e psicológicos. Ex: padrões de influenciação e
poder, percepções e atitudes,sentimentos e normas
grupais, valores e expectativas, padrões de interações
formais e relações afetivas.

Camadas da Cultura Organizacional ou Níveis da Cultura.

A classificação mais conhecida dos níveis da cultura é a de Schein. De acordo


com ele a cultura existe em três níveis:

209
1. Artefatos – É o primeiro nível, o mais superficial. Basicamente é tudo o
que percebemos assim que temos contato com uma organização.
Dentro deste nível temos os produtos, padrões comportamentais, o
vestuário, o espaço físico, os símbolos, os logotipos, a linguagem, a
tecnologia, prédios e instalações, produtos e serviços.
2. Valores e crenças – Relacionados com a crença no que é certo ou
errado dentro da organização. Existe em um nível consciente e são
utilizados para explicar e justificar o comportamento dos integrantes.
Podem ser percebidos nas histórias, lendas, na linguagem e nos
símbolos que as pessoas dizem ou fazem cotidianamente, filosofias,
estratégias e objetivos.
3. Pressuposições básicas – São as verdades inquestionáveis. Valores tão
arraigados que nem mais são explicitados. São as fontes originais dos
valores. É o nível mais profundo e difícil de ser mudado. Como os
valores, podem ser percebidos nas histórias, lendas, na linguagem e nos
símbolos. Crenças inconscientes, percepções e sentimentos, concepção
da natureza humana e pressuposições predominantes.
4. Padrões de comportamento – tarefas, processos de trabalho, normas e
regulamentos. ( não é classificado pelo autor).

Conceitos importantes sobre Cultura: Cultura Forte e Cultura Fraca.

Todas as organizações têm cultura, mas nem toda organização tem uma
cultura forte.

Uma cultura forte é aquela nas quais os valores principais são respeitados e
compartilhados. O tamanho da organização, a rotatividade dos funcionários e o
tempo de existência são fatores que tornam a cultura forte ou fraca.

Quanto mais os membros de uma organização respeitam e compartilham seus


valores, mas forte é sua cultura! Uma cultura forte gera coesão, lealdade,
comprometimento organizacional e diminui a necessidade da organização de
fixar regulamentos e regras de comportamento.

210
Estudos indicam que a cultura forte tem um poder maior de influenciar o
comportamento dos seus funcionários e geram um desempenho superior para
a organização.

Uma Cultura forte gera, de alguma maneira, um impacto maior no individuo.


Quanto mais forte a cultura, maior poder ser a modificação do comportamento
e maior o impacto na estrutura.

 Cultura fraca: não há valores compartilhados dominantes. O efeito na


estrutura é menos claro.
 Cultura dominante: compartilhada pela maioria dos membros.
 Cultura corporativa: conceito ligado a empresas visionárias que
deixaram de lado os números e investiram em valores que afetam a vida
dos membros da organização. Conseqüência: redução do absenteísmo
e do turnover e aumento da produtividade.
 Subcultura: compartilhada por parte da organização. Ex: departamento.
 Contracultura: manifestação, por parte de grupos maiores ou menores,
de cunho reacionário, contra valores culturais tradicionais, que revelam
insatisfação. Daí buscar por inovação. Resistência à adoção de valores
comuns para o atingimento de objetivos comuns.

Elementos ou componentes da Cultura

Existem várias maneiras de uma cultura poder ser transmitida dentro de uma
organização. Dentro destas maneiras estão as histórias, os rituais, os símbolos
e os slogans.

Eles servem não só para transmitir a cultura, mas para podermos identificar e
interpretar a cultura de uma organização. De acordo com Sobral os principais
elementos são:

Histórias – narrativas que explicam a origem da organização, sua importância


no contexto econômico e social. São contadas aos novos funcionários para
manter vivos os valores da organização, assim como para ajudar a
compreender sua natureza e seus propósitos;

211
Rituais – Referem‐se às atividades repetidas que expressam e reforçam os
valores-chave da organização. Os rituais de socialização correspondem às
estratégias de integração do indivíduo na organização, tornando possível a
transmissão de valores e comportamentos para novos membros. Os programas
de treinamento e integração de novos funcionários desempenham este papel.

Símbolos – Podem ser objetos, ações ou eventos que transmitem significados


aos membros da organização. A forma como as pessoas se vestem, o tipo de
carro que os administradores usam, o layout dos escritórios são alguns dos
símbolos organizacionais.

Slogans – São frases que expressam de forma sucinta valores organizacionais


importantes. As empresas podem fazer uso de slogans para facilitar a
incorporação de valores. A missão corporativa é um exemplo de declaração
pública que retrata os valores defendidos pela organização.

Cultura Mecanicista e Cultura Orgânica.

Esta classificação de culturas se originou do trabalho de Morgan sobre


modelos estruturais. As culturas mecanicistas são caracterizadas por uma
rigidez, uma formalidade e controle sobre seus integrantes. Esta cultura foi
dominante na época da industrialização e é mais adequada a organizações
estáveis, em que as metas e objetivos não mudem constantemente, com
funcionários mais propensos a aceitarem a submissão as regras e participar
pouco do processo decisório.

A cultura orgânica (deriva de organismos vivos, da Biologia) é mais


preocupada com a interação com o meio ambiente (fornecedores, clientes,
governos, etc.). Seus princípios são: flexibilidade, adaptabilidade e
informalidade. Seus funcionários participam ativamente do processo decisório.
Em ambientes dinâmicos esta é a cultura recomendada.

Cultura Dominante e Subculturas.

O reconhecimento de que a cultura de uma organização possui características


comuns não significa que somente existe uma cultura dentro de uma

212
organização! Podem existir subculturas. Grande parte das grandes
organizações possui uma cultura dominante e algumas subculturas.

De acordo com Robbins, uma cultura dominante expressa os valores


principais que são compartilhados pela maioria dos seus membros. Quando
falamos da cultura de uma organização, nos referimos à cultura dominante.

As subculturas se desenvolvem em grandes organizações para lidar com


problemas e situações diferentes que seus membros enfrentam. Os
funcionários da área de compras podem ter uma subcultura diferente da do
pessoal de vendas. Uma subcultura inclui os valores principais da cultura
somados aos valores presentes na subcultura.

Disfunções da Cultura.

Até agora não analisamos se uma cultura é boa ou ruim. Muitas de suas
características podem ser vantajosas. A cultura traz uma estabilidade ao
sistema social na organização, proporciona um sentido de identidade aos
integrantes da organização e proporciona um comprometimento com algo
maior do que os interesses pessoais.

Entretanto a cultura pode ser negativa em certas circunstâncias. Algumas


características destas disfunções são:

Barreiras às mudanças – a cultura pode ser negativa quando há um ambiente


dinâmico (com muitas mudanças acontecendo), e essa cultura impede que a
organização se adapte aos novos desafios. A consistência no comportamento
não é positiva em ambientes dinâmicos, apenas nos estáveis;

Barreiras às diversidades – culturas fortes põem pressão nos integrantes


para se “encaixarem” em um perfil de comportamento considerado adequado.
A contratação de pessoas de cor, raça, idade, sexos ou outras diferenças pode
colidir com essa “visão” do que é aceitável na organização. Esta cultura pode
então dificultar a assimilação de pessoas diferentes, que são necessárias para
que a organização tenha qualidades e características que somente pessoas
diferentes trazem a uma organização;

213
Barreiras às aquisições e fusões – a maior dificuldade que duas
organizações costumam encontrar ao ocorrer uma fusão ou aquisição é como
conciliar duas culturas diferentes (principalmente quando elas são grandes!).
Normalmente só eram considerados os fatores financeiros ou quais os
produtos envolvidos, mas atualmente os fatores culturais passaram a ser
considerados.

Questões sobre o tema:

1. (CESPE – SEGER ES / EPPGG – 2007) Disfunções na cultura


organizacional são desvios no comportamento coletivo, não percebidos pelos
próprios membros e que correspondem a degenerações sociais. Uma dessas
disfunções se traduz na resistência à aceitação de outras culturas e na falta de
reconhecimento de pontos de vista alheios ao próprio grupo.

2. (CESPE – AGU‐ AGENTE ADM. – 2010) De modo geral, toda investigação e


produção teórica a respeito de cultura organizacional assenta‐se,
invariavelmente, em duas perspectivas: uma integradora, que propõe a
existência de uma cultura forte e única, dominando toda a estrutura de forma
coesa; e outra diferenciadora, que enfatiza a heterogeneidade existente no seio
de qualquer instituição, propondo a existência de um conjunto de subculturas
que se entrecruzam no cotidiano organizacional.

3. (CESPE – TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS – 2008) A cultura


organizacional está presente, de maneira explícita, por exemplo, na missão,
nos objetivos e na visão declarados para a empresa, e, de maneira implícita,
nos comportamentos e nos valores compartilhados por seus membros.

4. (CESPE – TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS – 2008) São funções da


cultura organizacional: assegurar aos membros da organização uma identidade
individual, facilitar o compromisso individual, promover a estabilidade
organizacional e moldar o de seus membros diante da vida.

5. (CESPE – TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS – 2008) A alteração da


cultura organizacional determinar mudanças em grande parte dos
comportamentos organizacionais, como nas relações interpessoais, na
comunicação e na busca da qualidade.

214
6. (CESPE – TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS – 2008) De acordo com Beyer
e Harrison, os ritos servem para confirmar os valores da organização e
envolvem seis tipos básicos: de passagem, de degradação, de confirmação, de
reprodução, de redução de conflitos e de integração.

7. (CESPE – TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS – 2008) A mudança de


cultura organizacional é um processo complexo, mas que acontece de forma
rápida quando há apoio da alta administração da empresa.

8. (CESPE – TCU/ ACE GESTÃO DE PESSOAS – 2008) Para diagnosticar a


cultura de uma organização, o pesquisador deve utilizar técnicas múltiplas de
coleta de dados, tais como observação, análise de documentos, técnicas
qualitativas e técnicas quantitativas.

9. (CESPE – ANAL. GESTÃO PESSOAS‐ SERPRO – 2008) A cultura de uma


organização constitui um passivo quando os valores partilhados não estão de
acordo com aqueles que promovem a eficácia da organização.

10. (CESPE – HEMOBRÁS/ ADMINISTRADOR – 2008) Uma cultura


organizacional forte se caracteriza sempre como uma vantagem para a
organização.

11. (CESPE – TCU / ACE ‐ 2007) As repartições públicas são organizações


caracterizadas pela cultura mecanicista, típica de um funcionamento sempre
igual e sujeitas a regras estritas. É a cultura adequada a condições instáveis, a
ambientes com os quais a organização não tem familiaridade, nas quais a
natureza cooperativa do conhecimento é mais importante que a especialização.

12. (CESPE – UEPA / ADMINISTRADOR ‐ 2007) A instabilidade e a


imprevisibilidade do cenário da segurança pública do Rio de Janeiro
demandam que o BOPE, como um sistema social, adote uma estrutura
mecanicista.

13. (CESPE – CEARAPORTOS / ANALISTA ‐ 2004) Apresentar uma cultura


forte deve ser o objetivo de todas as organizações, pois ela encoraja
comportamentos positivos e adaptáveis a mudanças.

215
14. (CESPE – MIN.COMUNICAÇÕES / ADMINISTRAÇÃO ‐ 2008) As culturas
organizacionais caracterizam‐se mais conservadoras ou mais flexíveis,
dependendo da receptividade à mudança de seus valores e de suas
pressuposições básicas.

Gabaritos:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14
C C C E C C E C C E E E E C

A. Histórias: casos que aconteceram e são contados, perpetuados.


B. Rituais: eventos repetitivos (diferente de cerimônias, que são ocasiões
especiais).
C. Heróis: modelos de comportamento.
D. Símbolos: Ex: uniforme e instalações (quanto mais importante, maior a
cadeira).
E. Linguagem: comunicação, “expressões”.
F. Crenças: idéias valorizadas.

Para Jean Pierre Marras, os elementos são:

1. Valores: crenças e conceitos que moldam o contorno cultural de um


grupo, estabelecendo padrões de comportamento, de avaliação e de
imagem.
2. Ritos: praticados com a finalidade de perpetuar os valores
organizacionais e tornar a cultura mais coesa.
3. Mitos: figuras imaginárias geralmente oriundas de fatos não-concretos e
que são utilizadas para reforçar crenças organizacionais com o intuito de
manter certos valores históricos. Renovados pelos ritos.
4. Tabus: função de orientar comportamentos e atitudes com foco em
questões de proibição ou de coisas que não são bem vistas.

A cultura é mutável, dinâmica e sujeita a mudanças internas e externas. É


consensual, não imposta.

216
De onde vem a cultura de uma organização?

Como ela reflete a missão ou visão de seus fundadores, eles é que


estabelecem a cultura inicial. Então, a cultura é resultado de:

 Preferências e suposições dos fundadores;


 O que os primeiros funcionários aprendem subseqüentemente de suas
próprias experiências.

Posturas empresariais

As mais encontradas nas empresas que direta ou indiretamente mantêm


vínculo com culturas estrangeiras:

1. Postura etnocêntrica: organizações crêem que são “superiores” `s


demais em termos culturais e, portanto, em seu interior fazem prevalecer
seus valores originais (seu país).
2. Postura policêntrica: pressupõe que o local (ou país) que a hospede
possui uma cultura que a organização considera mais conveniente
adotar, implementando, assim, atitudes e procedimentos provenientes
da cultura local.
3. Postura geocêntrica: proveniente de um “mix” entre as duas posturas
anteriores – enquanto mantêm seus valores e crenças básicas originais,
procura adaptar-se às diferenças regionais do local onde está inserida.

7 RECRUTAMENTO E SELEÇÃO: TÉCNICAS E PROCESSO


DECISÓRIO. PESQUISAR PARTE ESTARÁ NO SEGER ITEM 3

A consultoria busca equilibrar as prioridades estratégicas e as competências


essenciais para definir as bases do recrutamento. São ouvidos os diversos
interlocutores para estabelecer em conjunto o melhor perfil. Este deve ser
alinhado aos desafios da posição e da equipe de trabalho para tornar o time
mais forte e complementar.

217
A equipe participa da seleção por meio de entrevistas e/ou dinâmicas de
grupos, sempre tendo o perfil de competências requeridas como referência de
comparação. Podem ser aplicadas provas situacionais e testes específicos.

Os valores e planos futuros do candidato pesam muito na escolha. Sua


experiência, além do âmbito profissional também é considerada (voluntariado,
esportes, associações etc.).

Dá-se preferência a candidatos internos, mas sem perder a objetividade da


escolha e da necessidade de renovação quando for o caso.

Os processos, sistemas e ferramentas de atração de profissionais e


movimentação de pessoas com base nas competências deverão ser
desenvolvidos e organizados para refletir as competências que foram definidas
para a organização.

A elaboração do dimensionamento das pessoas, também conhecido como


planejamento estratégico de pessoal, apesar de não ser exatamente uma ação
apenas vinculada aos processos de recrutamento e seleção, é uma atividade
fundamental e de grande importância para a orientação dos processos de
obtenção de profissionais.

O planejamento estratégico de pessoal, dentro da gestão de competências,


define o nível de proficiência esperado para cada competência de cada
colaborador, bem como a quantidade de colaboradores na equipe, definindo o
quadro de pessoal (quantitativo e qualitativo), as ações relacionadas à gestão
de pessoas em todos os sistemas, as prioridades dessas ações e o orçamento
com despesas de pessoal.

Espaço ocupacional é o termo utilizado para definir o cargo ou agrupamento de


cargos dentro de uma estrutura organizacional. É no espaço ocupacional que
são definidas as trajetórias, os requisitos e os critérios para a evolução na
carreira de um profissional na organização, que se dá por meio de
movimentações horizontais e verticais.

A carreira horizontal representa a progressão do colaborador dentro de um


mesmo espaço ocupacional e ocorre por intermédio da aquisição de maiores

218
níveis de proficiência nas competências, comprovada através de um processo
de avaliação de competências.

A carreira vertical significa a mudança de espaço ocupacional para outro


hierarquicamente superior (promoção) e ocorre quando o profissional comprova
ter alguns pré-requisitos exigidos, como escolaridade, e um número
determinado de competências com um mínimo de proficiência em cada uma
delas.

8 AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO: OBJETIVOS, MÉTODOS,


VANTAGENS E DESVANTAGENS. PESQUISAR

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO

Deve envolver dois aspectos:

 Acompanhamento da performance de cada um de seus profissionais


no sentido de verificar sua evolução na carreira por meio do aumento do seu
nível de proficiência em uma competência já adquirida ou pela conquista de
uma nova competência.

 Acompanhamento do desempenho individual no tocante ao alcance


de metas estabelecidas.

Os itens a ser avaliados (competências genéricas ou especificas,


atitudes, metas etc.) são definidos em função dos parâmetros estabelecidos
para o processo de avaliação, permitindo seleção de itens específicos tanto
para avaliadores quanto para avaliados.

219
Os resultados das avaliações, com base nos perfis das competências,
fornecerão inputs

importantes para a gestão do capital humano:

 ações de investimentos- T&D

 banco de dados de potenciais/talentos e de futuros gestores – carreira

 job rotation – carreira

 aumentos salariais e promoções -carreira

 desligamentos – oxigenação e dimensionamento do quadro.

Algumas competências podem envolver testes e exames no seu


processo de avaliação.

Eficácia organizacional: devem ser relacionados ao desempenho dos cenários


macroeconômicos do país em seus diversos ramos de atividade. Os
indicadores que usualmente fazem parte desta área, referem-se às receitas, ao
custo + despesa operacional, à lucratividade, ao retorno do investimento nas
pessoas, ao custo de terceirização etc.

Estrutura de RH, remuneração, benefícios, absenteísmo e rotatividade,


recrutamento e seleção, saúde ocupacional, relações trabalhistas, perfil dos RH
e,

Educação e aprendizagem – treinamento de desenvolvimento: na maioria das


empresas, educação é uma das funções de RH que tem recebido maior
atenção, análise, expectativa e cobrança de resultados. A necessidade de
manter e ampliar o capital intelectual exige estratégias contemporâneas e altas
somas de investimento em desenvolvimento humano.

220
9 DESENVOLVIMENTO E TREINAMENTO DE PESSOAL:
LEVANTAMENTO DE NECESSIDADES, PROGRAMAÇÃO,
EXECUÇÃO E AVALIAÇÃO.

7 TREINAMENTO E DESENVOLVIMENTO (T&D). IDENTIFICAÇÃO DAS


NECESSIDADES DE TREINAMENTO POR COMPETÊNCIA. O PAPEL DO
T&D NOS PROGRAMAS DE GESTÃO DE COMPETÊNCIA. PARTE ESTÁ
NO ITEM 9 TJ

TREINAMENTO/EDUCAÇÃO

TREINAMENTO EDUCAÇÃO

A consultoria orientava a elaboração da programação A consultoria


considera o fortaleci-

de treinamento com base no levantamento de neces- mento da cultura, a


visão, as priori-

sidades através de questionários e reuniões, principal- dades estratégicas


vis-a-vis com o

mente com gerentes e supervisores. balanço de competências


(existentes

Os treinamentos privilegiavam os aspectos versus necessárias) na


orientação

técnico-operacionais e as habilidades especificas dos programas de


educação.

eram avaliadas com ênfase na reação dos partici- As diretrizes desses


programas são

221
pantes no final dos programas. amplamente debatidas na
organização. A direção considera o tema
estratégico

e busca equilibrar as necessidades de

curto prazo com a visão de longo prazo.

Os programas são diversificados e balan-

ceados, integrando-se às necessidades

empresariais e às de desenvolvimento

das pessoas. São utilizadas, portanto,

diferentes formas de avaliação dos

resultados.

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO GESTÃO DE DESEMPENHO

A consultoria preparava supervisores para A consultoria apóia


gestores e

suas equipes utilizando formulários especí- equipes a desenvolver um


processo

ficos e entrevistas de informação. O foco transparente e


participativo. O

era o desempenho passado e a relação de primeiro cuidado é definir


os

222
autoridade condicionava a avaliação. indicadores de desempenho
esperados

levando-se em conta as prioridades

estratégicas e as competências especí-

ficas de cada posição.

Feedbacks são trocados sistematica-

mente entre todos, sem limites de

hierarquia, visando-se corrigir distorções


e aprimorar o desempenho individual

e coletivo. Há um forte compromisso

com a prática de valores (respeito,

responsabilidade, franqueza) e com

os resultados.

MODALIDADES ESTRATÉGICAS

Estudo da Cultura empresarial: Pesquisa as diferenças entre os valores


empresariais praticados e os almejados. Procura estabelecer um plano de ação
que permita a consolidação da prática dos valores desejados, que aprimorem
suas relações internas e externas e fortaleçam seus diferenciais competitivos.

Desenvolvimento da visão estratégica: Promove estudo para construir a visão


do futuro da empresa, integrando as expectativas de acionistas, clientes,

223
colaboradores, parceiros estratégicos etc. Identifica a distância entre a situação
real e a desejada e desenvolve plano de mobilização para todos.

Reflexão estratégica: Com base na visão, estuda-se o melhor posicionamento


competitivo da empresa, seu mercado-alvo, competências-chave, talentos
requeridos etc.

Modelo de governança: Levando-se em conta a natureza dos negócios e as


prioridades estratégicas, estudam-se os fóruns de decisão, delegação de
poderes, mecanismos de controle etc., buscando-se favorecer a inovação, a
experimentação, a complexidade e a velocidade das decisões.

Modelo de organização: Estuda-se a melhor forma de organização que


favoreça a complementação da estratégia e o aproveitamento dos talentos e
das competências essenciais.

Indicadores estratégicos de gestão: Definem-se os indicadores de resultados


esperados de forma equilibrada, integrando-se as demandas dos acionistas,
clientes, colaboradores, parceiros e da comunidade.

Contratos de gestão: Por meio de indicadores de gestão, estabelecem-se os


compromissos compartilhados com cada pessoa sobre prioridades, resultados,
desenvolvimento, sucessão, remuneração etc.

Remuneração por resultados: Definem-se as bases de remuneração pelos


compromissos contratados, buscando-se equilibrar a contribuição individual e
de equipe, os resultados de uma área e os da empresa, o curto e o longo prazo
etc.

224
TREINAMENTO E DESENVOLVIMENTO

As ações de capacitação constituem-se, em geral, em meios de


obtenção de proficiência nas competências e na conseqüente progressão na
carreira. As principais atividades consideradas são: planejamento; execução;
avaliação e gerenciamento.

As atividades de planejamento têm por objetivo definir e organizar as


ações de capacitação, buscando consolidar as necessidades de
desenvolvimento das competências identificadas pela organização, bem como
definir as prioridades e planejar sua execução.

As atividades de execução têm por objetivo viabilizar as ações de


capacitação conforme planejado, elaborando o desenho e o planejamento
detalhado da ação, bem como executando e gerenciando as atividades.

As atividades de avaliação têm por objetivo criar processos que


monitorem a efetividade das ações de capacitação (eficiência + eficácia) e a
efetividade da área de treinamento e desenvolvimento como um todo. Deverão
ser feitas avaliações de todas as ações de capacitação.

As atividades de gerenciamento devem ser contínuas e ter como


principal objetivo administrar as ações de capacitação para que os recursos
(físicos, financeiros e tecnológicos) sejam bem aproveitados e as competências
dos colaboradores sejam desenvolvidas com o intuito de concretizar o
direcionamento estratégico da organização

Para interpretar, conviver e colaborar com a adaptabilidade das pessoas no


mundo das organizações, da família e da vida social, cada vez mais surgem

225
cursos, seminários, workshops e consultores especializados em
autoconhecimento. Conhecer-se passou ser a chave da virada para o sucesso
profissional e a realização pessoal.

"Antigamente o foco das empresas estava na tecnologia e no processo de


produção. Hoje tudo está voltado para o indivíduo e seu aperfeiçoamento como
pessoa e profissional. É preciso entendê-lo e o incorporar aos sistemas de
gestão das empresas. E o mais importante é deixá-lo à vontade com o seu
meio social

O ambiente de trabalho tem que estar composto de três tipos de


relacionamentos interconectados: entre os funcionários e a direção da
empresa, entre os funcionários e seu trabalho e entre os funcionários e os
outros funcionários.

Entre os três tipos de relacionamentos citados, Levering considera o mais


importante e fundamental o que está centrado no funcionário e a direção da
empresa. "Para que este tipo de relacionamento tenha sucesso, o ingrediente
essencial é a confiança", relata. A direção da empresa deve ter credibilidade
junto aos funcionários, apresentado uma capacidade em lidar com conflitos. "É
importante lembrar que para ganhar confiança das pessoas, os executivos
devem estar dispostos a ouvir duras verdades e não crucificar aqueles que
falam", adverte Levering. A confiança envolve respeito e os empregados
precisam sentir que são respeitados e tratados como seres humanos e que
fazem a diferença. "Parte disso advém da atribuição de maiores
responsabilidades a eles e do seu envolvimento em decisões que afetem seu
trabalho", completa. Embora a confiança na relação empregado-direção da
empresa seja considerado por Levering o elemento mais importante na criação
de um ambiente bom para se trabalhar, é preciso prestar atenção na relação do
empregado com seu próprio trabalho.

..."As pessoas desenvolvem o orgulho quando sentem que seu trabalho tem
um significado especial. E para se sentirem assim, os empregados precisam
acreditar que fazem a diferença e devem ter um senso de propriedade em
relação ao produto ou serviço que realizam. Além disso, precisam perceber que
estes têm algum significado para outros", argumenta Levering, ressaltando que

226
uma das formas que os executivos da empresa podem cultivar essa atitude é
ajudando os empregados a enxergar como suas tarefas se encaixam no
contexto da organização e como os clientes usam os produtos. O último fator
que afeta a qualidade do ambiente de trabalho, apresentado por Levering, é a
camaradagem que representa, segundo ele, a forma como cada funcionário se
relaciona com o outro no trabalho. "As pessoas precisam de aceitação,
compreensão, apreciação e diversão em suas interações pessoais com os
colegas", afirma. De acordo com Levering, a camaradagem pode ter um grande
impacto na cooperação entre os funcionários, sendo que "em alguns dos
melhores lugares para se trabalhar as pessoas se sentem como integrante de
uma família e em outros como parte de um mesmo time", finaliza.

CICLO DE TREINAMENTO

Levantamento das Escolha de


necessidades métodos
específicas de adequados à
treinamento instrução
Aplicação dos
princípios de
aprendizagem
Colheita de
material e dados
para a instrução

Relatório do Elaboração do
treinamento programa de
treinamento

Avaliação e Execução Treinamento


controle dos do dos
resultados treinamento instrutores
227
______________ Atividade de Linha

............................ Atividade de Staff

As atividades de Linha e Staff são responsáveis por todo o processo para a


execução do treinamento.

Entende-se Atividade de Staff como sendo uma equipe de pessoas que dá


assessoria a um dirigente ou executivo de uma empresa.

Segundo Marras, “estruturas de linha são aquelas que exercem atividades de


“execução e comando” e possuem responsabilidades sob atividades-fins do
negócio”.

Marras comenta também que: “Estrutura Staff caracteriza-se por não executar
e não comandar na pirâmide organizacional. Sua ação está limitada a
influenciar e aconselhar as unidades de linha”.

Chiavenato faz a seguinte abordagem da avaliação do programa de


treinamento:

Como os programas de treinamento representam um investimento em custo –


os custos incluem materiais, tempo do instrutor, perda de produção enquanto
os indivíduos estão sendo treinados e por isso estão afastados dos seus
cargos – requer-se um retorno razoável desse investimento.

Basicamente, deve-se avaliar se o programa de treinamento atende às


necessidades para as quais foi desenhado. Respostas às questões abaixo
podem ajudar a determinar a eficácia do programa de treinamento:

As rejeições e refugos foram eliminados?

As barreiras foram removidas?

Os custos por trabalho por unidade diminuíram?

As pessoas se tornaram mais produtivas e felizes?

228
A organização alcançou seus objetivos estratégicos e táticos?

Se a resposta às questões acima foi positiva, o programa de treinamento foi


bem sucedido. Se for negativa, o programa de treinamento não atingiu seus
objetivos e o seu esforço foi inválido e sem efeito.

Deste modo, a organização deverá buscar ferramentas para avaliar o seu


processo.

Marras fala sobre alguns dados que poderão servir como avaliação do
resultado do treinamento:

Aumento da produtividade

Melhorias na qualidade dos resultados

Redução dos custos (retrabalhos, etc.)

Otimização da eficiência

Otimização da eficácia

Modificação percebida das atitudes e comportamentos

Elevação do saber (conhecimento, conscientização)

Aumento das habilidades

Redução do índice de acidentes

Melhoria do clima organizacional

Aumento da motivação pessoal

Redução do absenteísmo

De acordo com Borges-Andrade e Abbad, uma das características essenciais


do conceito de “Treinamento” Desenvolvimento de medidas em avaliação de
treinamento (T) é a noção de que ele representa um esforço despendido pelas
organizações para propiciar oportunidades de aprendizagem aos seus
integrantes. Ele está tradicionalmente relacionado à identificação e superação
de deficiências no desempenho de empregados, preparação de empregados

229
para novas funções e adaptação da mão de obra à introdução de novas
tecnologias no trabalho. O conceito de “Desenvolvimento” (D), na literatura
clássica da área, é compreendido como mais abrangente, incluindo ações
organizacionais que estimulam o livre crescimento pessoal de seus membros,
que não visam necessariamente à melhoria de desempenhos atuais ou futuros.

Devido às rápidas e vertiginosas mudanças tecnológicas, econômicas e sociais


que caracterizam o atual mundo do trabalho e das organizações, T & D têm
crescido de importância.

Através deles, são adquiridas habilidades motoras ou intelectuais e


informações e desenvolvem-se estratégias cognitivas e atitudes, que poderão
tornar o indivíduo mais competente para desempenhar vários papéis, no
presente ou no futuro e em diversas organizações. No caso de “Treinamento”,
essa aquisição seria feita de uma forma mais sistemática, utilizando-se uma
tecnologia instrucional, enquanto “Desenvolvimento” estaria mais baseado na
autogestão da aprendizagem. Ao analisar os problemas conceituais da área,
Bastos sugere que uma das maneiras de diferenciar T & D seria pelos critérios
da intencionalidade em produzir melhorias de desempenho e do controle
exercido pela organização sobre o processo de treinamento.

A noção de crescimento pessoal contínuo, inicialmente colocada como um


assunto de decisão pessoal tornou-se um requisito organizacional que dele
retirou a noção de “escolha livre e pessoal”, embora tenha sido mantido ou
fortalecido o discurso de que se trata de autogestão da aprendizagem.

O desenvolvimento de competências pessoais diversificadas se transformou


em estratégia organizacional, cuja efetivação leva evidentemente a maiores
expectativas de controle e a uma redução drástica do âmbito do que pode ser
realmente considerado como autogestão. Por outro lado, um treinamento
cuidadosamente formulado, para resolver problemas específicos de
desempenho, de um indivíduo ou uma categoria ocupacional, pode ser visto,
por outros indivíduos ou categorias, como uma oportunidade de
desenvolvimento que garantiria melhor empregabilidade no mercado interno ou
externo à organização.

230
As noções de sistematização, de tecnologia e de intencionalidade, que
pareciam mais restritas ao conceito de “Treinamento”, podem ser sorvidas pelo
conceito de “Desenvolvimento”, quando este é hoje posto em prática como
estratégia organizacional e num contexto de grande competição por trabalho e
emprego. Da mesma forma que as chamadas aprendizagens individual e
organizacional precisam coexistir num mesmo espaço de tempo e lugar, T & D
parecem estar intimamente relacionados e seus conceitos podem estar
perdendo as claras fronteiras que os separavam há menos de duas décadas.

Atualmente, as estratégias de gestão de aprendizagem mais usadas pelas


organizações são os programas formais de treinamento, desenvolvimento e
educação (TD&E). Porém, apesar dos altos investimentos, muitas
organizações ainda utilizam sistemas de treinamentos inadequados à sua
realidade, em virtude da ausência de um processo sistemático de levantamento
de necessidades e de avaliação dos resultados obtidos por meio de
treinamentos. É essencial o desenvolvimento de estudos que visem produzir
conhecimentos na área de avaliação, desenvolver soluções técnicas para a
busca de sistemas que ofereçam maior produtividade, lucratividade e
competitividade para as empresas e para os indivíduos.

O desenvolvimento e utilização das novas tecnologias de informação e


comunicação (NTICs) em treinamentos corporativos e abertos estão se
tornando essenciais para facilitar a aquisição e atualização de conhecimentos
dos indivíduos.

Borges-Andrade faz uma observação às rápidas mudanças tecnológicas,


econômicas e sociais que estão ocorrendo no ambiente do trabalho e das
organizações. Segundo o autor, a busca pelo desenvolvimento de
competências pessoais deixou de ser uma decisão pessoal e passou a ser
estratégia organizacional, e treinamento, por sua vez, passa a ser visto pelos
indivíduos como oportunidade de melhorar o desempenho, não so mente no
cargo atual como também em cargos futuros e em outras organizações. O
autor concluiu que os conceitos de TD&E podem estar apresentando um
enfraquecimento nas fronteiras que os separavam há menos de duas décadas,
já que programas de desenvolvimento e educação, assim como treinamentos,

231
estão sendo usados pelas empresas e organizações como estratégia
organizacional. Verifica-se que, apesar de diferentes conceitualmente, as
ações de TD&E, instrução e informação, quando usadas adequadamente e em
conjunto, visam promover e acelerar o processo de aprendizagem nas
organizações. As diferenças entre elas, na verdade, são as vantagens
específicas que cada ação pode oferecer para a organização.

T & D podem ser vistos como um sistema, integrado por três elementos:

(a) avaliação de necessidades;

(b) planejamento do treinamento e sua execução e

(c) avaliação do treinamento.

Do primeiro para o segundo e deste para o terceiro, os referidos elementos


mantêm entre si um constante fluxo de informações e produtos, sendo que o
subsistema “avaliação de treinamento” seria o principal responsável pelo
provimento de informações que garante a retroalimentação e, portanto, o
aperfeiçoamento constante do sistema. Esta avaliação pode ser definida como
um processo que inclui sempre algum tipo de coleta de dados usados para se
emitir um juízo de valor a respeito de um treinamento, ou um conjunto de
treinamentos.

Hamblin propôs que uma avaliação de treinamento deveria seguir cinco níveis:
(I) reação, que levanta atitudes e opiniões dos treinandos sobre os diversos
aspectos do treinamento, ou sua satisfação com o mesmo;

(II) aprendizagem, que verifica se ocorreram diferenças entre o que os


treinandos sabiam antes e depois do treinamento, ou se os seus objetivos
instrucionais foram alcançados;

(III) comportamento no cargo, que leva em conta o desempenho dos


indivíduos antes e depois do treinamento, ou se houve transferência para o
trabalho efetivamente realizado;

232
(IV) organização, que toma como critério de avaliação o funcionamento da
organização, ou mudanças que nela possam ter ocorrido em decorrência do
treinamento, e

(V) valor final, que tem como foco a produção ou o serviço prestado pela
organização, o que geralmente implica em comparar custos do treinamento
com os seus benefícios.

Em qualquer planejamento de treinamento poderiam ser encontrados,


explicitados ou não, objetivos esperados relativos a cada um desses níveis.

A lógica do planejamento organizacional seria, desse modo, a de formular os


objetivos do nível de valor final e deles derivar os objetivos do nível seguinte, e
assim por diante, até os objetivos do nível I. Para alcançá-los, existiriam muitos
possíveis tipos de ações, sendo que a maioria delas não envolveria
treinamento. Isso sugere, portanto, que T & D não deveriam ser considerados
panacéias para resolver todos os problemas organizacionais.

A seqüência em que ocorreriam os efeitos seria iniciada pelas reações dos


treinandos e terminaria no nível V. O modelo sugere uma cadeia de relações
de determinação, em que os resultados do primeiro nível seriam os maiores
responsáveis pela aprendizagem dos indivíduos, que produziriam mudanças no
seu desempenho no trabalho e assim por diante. Em cada um desses níveis,
no entanto, se agregariam outras variáveis interferentes, de modo que os
efeitos atribuíveis ao treinamento se tornariam dependentes de um conjunto
gradativamente mais amplo de fatores, o que dificultaria mais a sua detecção.

Vergara comenta que, “[...] as empresas precisam de pessoas motivadas para


que o tão propalado binômio produtividade-qualidade aconteça”.

Não adianta apenas motivar o empregado deve-se também qualificá-lo para o


seu melhor desenvolvimento dentro da organização. Formam-se assim duas
ferramentas para o seu crescimento: a motivação e a qualificação. É de suma
importância realizar uma análise da influência do treinamento no
comportamento do indivíduo para a realização do seu trabalho na empresa,
pois produtividade e bom desempenho estão diretamente relacionados à
satisfação do profissional.

233
De acordo com MARRAS, o treinamento tem como finalidade melhorar o
desenvolvimento profissional do ser humano na organização e no desempenho
das suas funções. É um processo que visa à preparação e ao aperfeiçoamento
das habilidades e dos conhecimentos dos funcionários de uma organização.
“Treinamento é um processo de assimilação cultural a curto prazo, que objetiva
repassar ou reciclar conhecimento, habilidades ou atitudes relacionadas
diretamente à execução de tarefas ou à sua otimização no trabalho”

Robbins comenta que: “A maioria dos treinamentos visa à atualização e ao


aperfeiçoamento das habilidades técnicas dos funcionários”. O mesmo autor
acrescenta: “O treinamento pode ser muito importante no resultado da
empresa”.

Entende-se que o treinamento deve incentivar ao funcionário a se


autodesenvolver, a buscar o seu próprio meio de reciclagem.

De acordo com Chiavenato “O treinamento é uma maneira eficaz de delegar


valor às pessoas, à organização e aos clientes. Ele enriquece o patrimônio
humano das organizações”.

É importante lembrar que existe uma diferença entre treinamento e


desenvolvimento de pessoas. O treinamento: tem a finalidade de melhorar as
habilidades do profissional no desempenho de suas funções. Já no
desenvolvimento de pessoas, o foco está voltado a novos cargos a serem
abertos na organização com novas capacidades e habilidades a serem
aprendidas pelo empregado.

De acordo com Chiavenato “O treinamento é orientado para o presente [...] e o


desenvolvimento de pessoas para cargos a serem ocupados futuramente [...]”.

Sabe-se que a principal estratégia para a realização do treinamento é a


estrutura preparada e desenvolvida pela organização. Portanto, este processo
deve estar equilibrado em uma linha de realizações. Ainda conforme
Chiavenato, “O treinamento é um processo cíclico e contínuo composto de
quatro etapas: diagnóstico, desenho, implementação e avaliação”.

234
É importante lembrar que o treinamento tem a responsabilidade de atingir
níveis de desempenho estabelecidos pelas organizações, através da
continuidade do seu desenvolvimento.

Robbins nos diz que um dos motivos para a crescente importância do


treinamento é devido: “À competição intensificada, às mudanças tecnológicas e
à busca de aumento da produtividade, que estão aumentando as demandas de
qualificação dos funcionários”.

Já para Minicucci “O treinamento pode ser considerado um esforço planejado,


organizado, especialmente projetado para auxiliar os indivíduos a
desenvolverem suas capacidades”.

Marras define os objetivos específicos do treinamento:

Formação Profissional: tem como base, elevar o conhecimento do profissional,


para ampliar o desempenho nas suas atividades.

Especialização: oferece a oportunidade ao empregado de receber treinamentos


voltados a uma área de conhecimento específico.

Reciclagem: é a oportunidade de se atualizar dos conhecimentos já aprendidos


na sua rotina de serviço.

Objetivos genéricos – são os que trazem oportunidade de elevação do


desenvolvimento do empregado e a melhoria de sua motivação dentro da
organização.

O retorno do treinamento está no aumento da qualidade da produção e em


fazer com que o empregado alcance o desenvolvimento organizacional exigido
pela empresa.

Robbins define dois métodos de treinamento:

Treinamento Formal – Ele é planejado com antecedência e com formato


estruturado;

235
Treinamento Informal – Não estruturado, não planejado e facilmente adaptável
às situações e aos indivíduos – serve para ensinar habilidades e manter os
funcionários atualizados.

Portanto, um dos objetivos do treinamento é a qualificação da mão-de-obra e a


intensificação do conhecimento dos seus profissionais.

LEVANTAMENTO DA NECESSIDADE DO TREINAMENTO

Para realização do treinamento, o levantamento da sua necessidade deve ser


tratado com muita atenção, para não ser desviado da sua finalidade.

Devem-se buscar informações relevantes e ter uma percepção dos problemas


provocados pela carência de treinamento. As perguntas abaixo devem ser
realizadas durante o diagnóstico para o treinamento.

1. Quem deve ser treinado?

2. O que deve ser aprendido?

Chiavenato comenta que: ”O levantamento de necessidade de treinamento


deve fornecer as seguintes informações para que possa traçar a programação
de treinamento”.

O que deve ser ensinado?

Quem deve aprender?

Quando deve ser ensinado?

Onde deve ser ensinado?

Como se deve ensinar?

Quem deve ensinar?

Entende-se que a organização deve priorizar as suas necessidades para


escolher o tipo de treinamento a ser realizado.

Essas necessidades serão descobertas de acordo com a atividade da


empresa. Por exemplo, em uma empresa de segurança, são alteradas as

236
normas de trabalho de um dos seus contratos. A empresa vai treinar apenas os
empregados lotados naquela empresa, pois eles são os responsáveis pelo
serviço prestado.

Com base neste exemplo, podemos perceber que houve a verificação de quem
e o que deveria ser treinado.

O treinamento deve possibilitar a aprendizagem do treinando e observar todo o


seu processo.

Em todo processo de treinamento deve-se ter o conhecimento de quem vai ser


treinado e os recursos (entrada)que serão utilizados; posteriormente, o
processo deve ser avaliado e planejado (programas de treinamento) e
aplicados conforme a sua necessidade (saída). Após todo o processo deverá
ser realizada sua avaliação (retroação).

Segundo Chiavenato, “O processo de treinamento assemelha-se a um modelo


de sistema aberto, cujos componentes são: entrada – processo – saída –
retroação”. Conforme figura 1:

Entrada Processo Saída

Programa de Conhecimento.
Treinados Atitudes.
treinamento.
recursos orga- Processo de Habilidades.
aprendizagem Eficácia
nizacionais organizacional
individual

Retroação

Avaliação dos

resultados

Segundo Marras, o “levantamento de necessidade de treinamento é o primeiro


passo no processo do sistema de treinamento e desenvolvimento”.

237
O levantamento das necessidades de treinamento deve ser contínuo dentro
das organizações, pois as mesmas devem se adequar às constantes
mudanças do mercado.

Marras comenta que o levantamento de necessidade de treinamento detecta e


diagnostica carências em dois diferentes cenários: relativo e prospectivo.

Cenário relativo ou ação corretiva – é a realização do treinamento após a falha


ocorrida. O treinamento é realizado para corrigir o erro.

Cenário prospectivo ou ação preventiva – é a antecipação do treinamento para


prevenir possíveis falhas no andamento do serviço.

Ações corretivas e preventivas são aplicadas quando da ocorrência de uma


não conformidade no processo do serviço.

PLANEJAMENTO

Entende-se que planejar o treinamento é definir o seu objetivo e a abordagem


necessária à sua realização. O planejamento do treinamento segue o processo
do diagnóstico das necessidades do treinamento.

O planejamento deve ser realizado seguindo os princípios da organização.


Marras diz que “O planejamento do treinamento é o elo de ligação entre
políticas, diretrizes e ações formais e informais que regem as relações
organizacionais”.

Gil ao abordar o tema planejamento de treinamento comenta que: O


planejamento é a escolha das técnicas a serem utilizadas no sentido de
otimizar a aprendizagem, ou seja, alcançar o maior volume de aprendizagem
com menor dispêndio de esforço, tempo e dinheiro. Estas técnicas podem ser
classificadas quando ao uso, tempo e local de aplicação.

Percebe-se que, para realização do treinamento, existe a necessidade de


verificar as prioridades e ações necessárias a serem realizadas.

Todo o processo deve ser realizado após definição dos meios a serem
utilizados. Busca-se definir os recursos necessários para a aplicação do
treinamento, utilizando as seguintes perguntas:

238
* Quem será o instrutor?

* Quais equipamentos serão utilizados (vídeo, data show, projetor, materiais,


apostilas, etc...).

Gil comenta que planejamento é: “Um processo desenvolvido a partir da


realidade fornecida pelos diagnósticos e que visa proporcionar com a máxima
eficácia possível o desencadeamento das ações necessárias para o alcance
dos objetivos pretendidos”.

EXECUÇÃO DO TREINAMENTO

Entende-se que execução do treinamento é a realização do treinamento, após


todo o processo de levantamento e planejamento. Para a execução do
treinamento, todos os aspectos anteriores já foram analisados e avaliados pelo
setor estratégico e tático da empresa.

De acordo com Marras, “A execução é aplicação prática daquilo que foi


planejado e programado para suprir as necessidades de aprendizagem
detectadas na organização”.

Entende-se que o importante na execução do treinamento é o trabalho de unir


o treinador e os treinandos em uma linha específica da empresa, a saber: o
aprendizado do empregado e posterior crescimento de seu conhecimento, o
que agregará valor e importância à organização.

Gil comenta que: “A execução do treinamento centra-se na relação instrutor –


treinando”.

Chiavenato faz uma abordagem da execução do treinamento e a decompõe


em dois termos: “instrutor x aprendiz” e assim os define:

Aprendizes são as pessoas situadas em qualquer nível hierárquico da empresa


e que necessitam aprender ou melhorar seus conhecimentos sobre alguma
atividade ou trabalho.

Instrutores são as pessoas situadas em qualquer nível hierárquico da empresa,


experientes ou especializados em determinada atividade ou trabalho e que
transmitem seus conhecimentos aos aprendizes.

239
Treinar é “O ato intencional de fornecer os meios para proporcionar a
aprendizagem” comenta CHIAVENATO e Mendes acrescenta: “Treinar significa
garantir que seu processo e seu funcionário, te darão toda a segurança e
retorno desejado. É a garantia certa de que tudo irá correr de acordo com o
previsto.”

AVALIAÇÃO DO TREINAMENTO

A avaliação do treinamento é a etapa de verificação de todo o processo para


saber se o treinamento ocorreu a contento. Será verificada desde a estratégia e
a estrutura aplicada até o resultado alcançado pelos treinados.

Segundo Marras a avaliação de treinamento: “Tem por finalidade aferir os


resultados conseguidos comparativamente àquilo que foi planejado e esperado
pela organização”.

Entende-se que o que mais importará para a organização é estar ciente do tipo
de retorno que o programa de treinamento irá trazer para a empresa. Portanto,
ao terminar um treinamento deve-se avaliá-lo para saber se ele trouxe
realmente retorno para a empresa.

Toledo e Milioni comentam que: Ao se investir em treinamento espera-se que


haja aumento de produtividade, mudanças de comportamento, melhoria do
clima humano na organização, redução de custos e de acidentes, rotação de
pessoal, além de outros resultados.

Conforme comentado por Toledo e Milioni, o retorno do treinamento deverá ser


o maior conhecimento por parte do empregado das atividades exercidas e com
isso a melhoria da sua atividade profissional dentro da organização.

Chiavenato define a avaliação de treinamento como sendo: “A etapa final do


processo de treinamento; é a avaliação dos resultados obtidos. O programa de
treinamento deve ter uma avaliação de sua eficiência”.

Vê-se que o importante após a realização do treinamento é a constatação se


as metas sugeridas foram alcançadas.

240
Esta etapa é de grande importância para a organização, pois caso as metas
não sejam alcançadas, as etapas de treinamento deverão ser revistas e o
treinamento novamente realizado, para o atendimento eficaz de suas
necessidades.

Gil busca como conceito de avaliação de treinamento o conceito de Hamblin:


“Qualquer tentativa de obter informações sob os efeitos de um programa de
treinamento e para determinar o valor do treinamento à luz dessas
informações”.

A verificação da eficácia se torna a ferramenta para confirmar a assertividade


do processo na sua aplicação e se o tratamento foi realizado e aplicado de
acordo com as necessidades existentes.

Para Ferreira, “Avaliação e controle engloba a coleta de dados que permitem


comparar a situação anterior com a situação pós-intervenção”.

Em resumo, pode-se dizer que a avaliação dos resultados é a comparação das


atividades realizadas antes e após a realização do treinamento.

Para se conseguir um resultado positivo deve-se trabalhar todos os processos


do treinamento.

Conforme Gil, “O Treinamento cobre uma seqüência programada de eventos


[...]”.

Chiavenato aborda uma seqüência de 09 (nove) fases no Ciclo de


Treinamento, conforme figura 2:

O papel da avaliação de treinamento seria o de coletar dados relativos aos


efeitos nos diferentes níveis e compará-los com aqueles que seriam esperados.

Contudo, dados nem sempre seriam colhidos em todos os níveis.

A construção de medidas de reação reclama a resposta a três questões: O que


medir? Com o que medir? Como medir?

A resposta sobre o que medir passa por uma outra decisão, pois se pode obter
uma medida global, com um único item, ou múltiplas medidas de reação, que

241
direcionam o foco do respondente para distintos aspectos do treinamento. O
uso de um item, como indicador global, apresenta riscos quanto à sua
confiabilidade. O uso de vários itens pode ser muito facilitado por um quadro de
referências que guie a elaboração de questões que cubram apropriadamente
todos os aspectos do treinamento a serem considerados. O Modelo de
Avaliação Integrado e Somativo – MAIS tem servido bem a esse propósito, pois
sua base teórica privilegia justamente os aspectos instrucionais e
administrativos que geralmente produzem reações nos treinandos. Ele sugere
que uma avaliação deve considerar múltiplas variáveis, classificadas em cinco
componentes: insumos, procedimentos, processos, resultados e ambiente (com
quatro subcomponentes). Componentes e subcomponentes que são vizinhos
(separados por linhas contínuas ou pontilhadas), principalmente no sentido
esquerdo - direito, seriam aqueles em que haveria maior probabilidade de
existirem relações de dependência.

Insumos, no referido modelo, são definidos como os fatores físicos e sociais e


estados comportamentais, geralmente associados ao treinando, anteriores ao
treinamento e que podem afetar sua realização (ex.: experiências anteriores na
organização e motivação antes do treinamento).

Procedimentos são as operações realizadas para produzir os resultados


instrucionais, geralmente controladas pelo instrutor ou por algum meio de
entrega da instrução (ex.: seqüência de objetivos, exercícios realizados,
retroalimentação recebida pelo treinando).

Processos são definidos como as ocorrências resultantes da realização dos


procedimentos e geralmente associadas a desempenhos intermediários dos
treinandos, mas podendo predizer resultados finais (ex.: relações interpessoais
desenvolvidas no treinamento).

Resultados, outro componente do MAIS, compreendem o que foi aprendido


pelos treinandos ou por eles alcançado ao final do treinamento (ex.: qualquer
habilidade adquirida ou atitude desenvolvida). Ele corresponderia ao nível II do
modelo de Hamblin.

242
O modelo MAIS se encerra com o componente ambiente, que é divido em
quatro subcomponentes: necessidades existentes no ambiente de trabalho e
que geralmente são definidas como lacunas ou discrepâncias entre
desempenhos esperados e apresentados, podendo influenciar os insumos;
apoio, que abrange variáveis no lar, na organização ou na comunidade, que
influenciam diretamente os insumos, procedimentos e processos, e
indiretamente a aprendizagem e os resultados a longo prazo (e.g., instalações,
proporção treinando/ instrutor, suporte social para transferência do aprendido
ao trabalho); disseminação, que arrola outros aspectos que podem contribuir
para a procura ou escolha do treinamento, tais como os meios e estratégias
usados para sua divulgação e resultados a longo prazo, ou as conseqüências
ambientais do treinamento medidas após algum tempo, estando neles inseridos
os níveis III a V propostos por Hamblin.

A construção dos itens, para mensuração das reações, é feita com base no
quadro de referências oferecido por esse modelo e levando em consideração
as peculiaridades do contexto organizacional e do sistema de “T & D” em
funcionamento.

Seria ideal possuir instrumentos contendo itens de reação aplicáveis a qualquer


contexto organizacional, mas isso teria o alto custo da perda da especificidade
dos mesmos.

Assim, a tendência tem sido a de construir questionários específicos para cada


organização, embora tomando o MAIS como modelo ou quadro de referências.
Um exemplo disso foi a experiência desenvolvida por Lima e Borges- Andrade,
que construíram um questionário para avaliar reações a uma grande variedade
de treinamentos oferecidos pela Embrapa. Contudo, esses autores não
investigaram a validade de construto do seu instrumento, nem a confiabilidade
dos escores que poderiam ser obtidos a partir dos itens elaborados com base
no modelo MAIS. Fazer isso para cada organização é um desafio. É preciso
contar com treinamentos variados e em grande quantidade, uma organização
disposta a se submeter a esse processo e uma equipe bem capacitada.

243
Experiências bem documentadas e com indicadores apropriados de validade
de construto (usando análises fatoriais) e de confiabilidade (calculando alfas de
Cronbach) foram feitas na Telebrás, e no Tribunal de Contas da União (TCU).

Essas experiências demonstraram que é possível desenvolver instrumentos de


reações confiáveis e extrair fatores que mantêm uma correspondência razoável
com o quadro de referências que os inspirou e que se ajustam às
peculiaridades das organizações e de seus sistemas de “T & D”.

Contudo, essa última vantagem é também um ponto fraco, pois em todos os


casos não se pode garantir maior generalidade dos instrumentos, ou que eles
se comportariam de maneira equivalente em outros contextos. Outro problema
tem a ver com o próprio MAIS, que pretende abranger todos os aspectos do
treinamento, tornando-se um recurso que produz “explosões de criatividade”
nos elaboradores de questões e resultando em questionários inicialmente muito
extensos.

Eles provocam resistências mesmo nas aplicações de teste dos mesmos, até
que as análises dos primeiros dados obtidos possam sugerir o que eliminar.

Há duas outras questões a serem consideradas. Com o que medir? As


respostas podem ser com lápis e papel, entrevistas ou observações.

Como medir? Isso pode ser feito com registros de observação. Ou com
questões fechadas ou abertas. As experiências têm sido com lápis e papel, o
que exige um certo nível de escolaridade dos respondentes, e quase sempre
questões fechadas, o que limita as chances de serem detectadas ocorrências
não previstas, mas reduz o tempo de análise e aumenta a confiabilidade dos
resultados.
Os questionários geralmente incluem uma questão aberta, que exige uma
análise de conteúdo trabalhosa, utilizando-se um conjunto de categorias com
base no próprio MAIS. As análises quantitativas e qualitativas têm usualmente
um alto grau de correspondência, já que as várias questões fechadas podem

244
influenciar o que é escrito nas questões abertas. Isto é, na verdade, um outro
problema de mensuração.

Para evitar os problemas dos questionários de lápis e papel, Abbad, Sallorenzo


e Gama construíram e aplicaram um roteiro de observação do instrutor em sala
de treinamento.

Os resultados finais obtidos foram animadores, demonstrando que é possível a


obtenção de índices de concordância entre observadores acima de 90%. Mas o
método exige um grande esforço de coordenação e treinamento de
observadores e é limitado aos aspectos diretamente observáveis, não sendo
sensível para a detecção da satisfação e opiniões dos participantes. Ao invés
de focalizarem o desempenho do instrutor, Pantoja, Lima e Borges-Andrade
relatam um método de análise de documentos relativos a programas de cursos,
utilizando uma lista de verificação, abrangendo aspectos relacionados ao
planejamento instrucional. Nesse caso, o problema foi que as naturezas do
instrumento e do procedimento de coleta de dados inviabilizaram um
tratamento estatístico que verificasse a confiabilidade dos dados obtidos e a
validade de construto das medidas. O método compartilha, com o anterior, a
desvantagem de que não revela a satisfação dos participantes.

Em resumo, para responder às três questões colocadas no início desta seção,


é necessário levar em consideração a natureza da organização e do seu
sistema de “T & D”, os tipos de clientela desse sistema e os recursos
disponíveis.

As experiências já realizadas demonstram que se avançou no sentido de


enfrentar os desafios da construção de medidas de reações, embora as
soluções desenvolvidas tenham igualmente produzido outros desafios. Há
dilemas que persistirão, pois as alternativas de resposta tendem a atender a
uma ou duas dessas considerações, mas deixam as demais sem cobertura.

O desenvolvimento de medidas de aprendizagem tem como primeiro desafio a


seguinte questão: os parâmetros, contra os quais será comparado o

245
desempenho de cada treinando, devem ser fornecidos pelo desempenho do
grupo de treinandos ou pelos desempenhos explicitados nos objetivos do
treinamento? No primeiro caso, a construção dos itens é geralmente feita a
partir de uma amostragem dos conteúdos do programa, enquanto no segundo,
o item é deduzido diretamente dos objetivos formulados. O primeiro vem de
uma tradição de seleção: procuram-se os mais aptos. O segundo vem de uma
tradição de ensino: deseja-se determinar quem aprendeu. Embora a resposta
pareça óbvia, pois a finalidade imediata de um treinamento é a aprendizagem,
o fato de que muitos treinamentos não possuem objetivos formulados em
termos de desempenho impede que a segunda tradição seja seguida. Então,
elabora-se um conjunto de itens baseado numa amostragem do conteúdo
incluído no programa. Assim, o controle do processo dificilmente fica nas mãos
do avaliador, passando para as do especialista em conteúdo, o que impede
uma apropriada construção e análise de itens.

Em muitas organizações, é tal a autonomia dada ao instrutor, que este ou os


responsáveis pelo sistema de “T & D” considerariam inconveniência, ou
intromissão, a participação do avaliador ou pesquisador na elaboração de itens.

Outro problema é que uma boa medida de aprendizagem deveria comparar


desempenhos antes e depois do treinamento. Isto é dificilmente viável, pois
quase sempre não existem baterias de itens efetivamente similares para serem
usadas nestes dois momentos. Além disso, começar um treinamento com uma
avaliação pode ser fator de constrangimento em muitas culturas
organizacionais. Mesmo a avaliação realizada somente ao final do treinamento
é vista como imprópria ou considerada como algo inerente ao ensino formal e
não a organizações de trabalho. Algumas estratégias têm sido utilizadas para a
obtenção de quaisquer indicadores de aprendizagem. Pantoja et al. e Abbad
utilizaram resultados de pós-testes construídos e corrigidos pelos próprios
instrutores e encontraram poucas correlações significativas ou correlações de
Spearman-Brown abaixo de 0,30 entre esses indicadores e variáveis relativas a
outros componentes do MAIS ou a outros níveis do modelo proposto por
Hamblin . Em vez de questionar as hipóteses desses modelos, os autores
preferiram reconhecer a fragilidade de suas medidas de aprendizagem, pois

246
não tiveram acesso aos processos de construção e análise dos itens, nem
controle sobre os mesmos. Não tendo sequer conseguido essas medidas, mas
podendo contar com objetivos de treinamento formulados em termos de
desempenho, Borges- Andrade, Morandini e Machado e Lima e Borges-
Andrade recorreram a auto-relatos de aprendizagem, em que listavam os
objetivos de ensino e solicitavam aos respondentes que julgassem sua
aquisição durante o treinamento.

A não ser pelo fato de terem verificado consistência interna entre esses
julgamentos, seus resultados não foram mais animadores, pois foram auto-
avaliações “pós-fato”.

São grandes as barreiras que impedem o desenvolvimento de instrumentos de


mensuração no nível de aprendizagem. O que foi feito até agora permite
concluir que os avanços absolutos foram pequenos. Comparando-se o que foi
alcançado neste nível com aquilo já relatado no nível de reação, conclui-se que
também não houve avanços em termos relativos. Quando o balanço das
perdas e ganhos é feito, chega-se a acreditar que foram produzidas mais zonas
de sombra do que de luz. Há que considerar que as pesquisas sobre avaliação
de treinamento tiveram como focos de interesse o nível anterior (reação) ou o
próximo (desempenho no cargo) e os indicadores do nível de aprendizagem
foram coadjuvantes ou complementares. Para que progressos substantivos
possam ocorrer neste nível, um esforço mais metódico e uma visão finalista
são necessários.

Tal como na mensuração de reações, no processo de desenvolvimento de


medidas no nível de comportamento no cargo já existe sistematização para a
tomada de decisões.

As seguintes questões devem ser respondidas:


(1) O que medir? - Comportamento ou resultado?
(2) Em que nível de complexidade? - De “profundidade” ou “largura”?
(3) Como medir? - Observar ou perguntar?

247
(4) Quem deve fornecer os dados? - Treinandos, supervisores, colegas ou
clientes?

As respostas, como demonstrado a seguir, dependem de condicionantes como


disponibilidade de recursos humanos e financeiros no subsistema de avaliação,
natureza dos objetivos de treinamento, tipo de cargo ou função, cultura da
organização e tipo de clientela a ser avaliada.

A decisão sobre “o que medir” é tomada após uma análise dos objetivos
formulados para o treinamento. Na maioria dos casos, essa análise sugere que
o foco permaneça em comportamentos, mas há também situações em que ele
fica em resultados deduzidos a partir dos comportamentos descritos nos
objetivos. Estes, quando existentes, são freqüentemente escritos num nível de
especificidade apropriado para planejamento da instrução, mas
excessivamente detalhado para uma avaliação no cargo. Uma eliminação dos
detalhes ou dos objetivos estritamente instrucionais é necessária, sendo que as
justificativas utilizadas para implementar o treinamento ou o diagnóstico de
necessidades realizado podem ajudar muito nessa decisão.

Obtida uma lista de itens que descrevem comportamentos ou resultados do


treinamento esperados no trabalho, tem sido solicitado aos respondentes que
opinem com o apoio de uma escala tipo Likert. Borges-Andrade e Siri utilizaram
uma escala de julgamento de nível de impacto no trabalho, avaliando um
programa de treinamento oferecido para membros de organizações operando
na América Latina e Caribe, que tinha uma lista bem clara de comportamentos
e resultados esperados, na área de planejamento, acompanhamento e
avaliação da pesquisa agrícola. Borges- Andrade, Azevedo, Pereira, Rocha e
Puente, no Banco do Brasil, e Pilati, Borges-Andrade e Azevedo, numa
empresa privada de televisão por assinatura, aplicaram uma escala de
freqüência de utilização, no trabalho, do aprendido em vários treinamentos
oferecidos em todo o Brasil.

A escala foi sempre a mesma, mas foram muitas as listas de comportamentos


esperados no cargo, já que os treinamentos variaram muito quanto à natureza

248
de seu conteúdo (técnicos, operacionais e gerenciais) e quanto à natureza das
capacidades ensinadas (habilidades intelectuais, informações verbais e
atitudes).

As tentativas realizadas por esses autores, no sentido de verificar a validade de


construto e a confiabilidade dos instrumentos, resultaram em estruturas
unifatoriais e alfas de Cronbach entre 0,80 e 0,90. Contudo, quando o número
de treinandos por treinamento é pequeno, esse tipo de análise estatística fica
inviabilizado, pois ele precisa ser feito para cada lista de comportamentos
esperados. Isso só pode ser superado quando são realizadas avaliações de
poucos treinamentos oferecidos em caráter massificado ou em organizações
de grande porte.

O primeiro grande desafio ocorre quando não existem objetivos formulados em


termos de comportamentos esperados do treinando. Isto acontece porque o
planejamento segue uma abordagem que rejeita essa formulação de objetivos,
ou só os formula em termos do que é esperado dos instrutores, ou só os
formula no decorrer do próprio treinamento, após discussão com os
participantes, ou só faz listagens de conteúdos a serem abordados. Outras
razões, bem mais prosaicas, são as de que o sistema de “T & D” é tão
desorganizado que não existe documentação registrando os planejamentos ou
é totalmente terceirizado, a ponto de não fazer sentido uma política de
arquivamento desse tipo de informação. Várias experiências foram
desenvolvidas para tentar resolver esse problema.

A primeira foi a de construir perguntas que servissem para avaliar o impacto de


qualquer treinamento no trabalho, independentemente da abordagem de “T &
D” ou da política adotada pelas organizações. Lima, Borges-Andrade e Vieira
identificaram três importantes indicadores e solicitaram aos respondentes que
utilizassem uma escala de concordância tipo “Likert”, para julgar o impacto do
treinamento que tinham realizado. A mesma estratégia foi depois usada por
Leitão e Paula. As medidas pareciam promissoras, pois contornavam o
problema apresentado, podendo ser usadas em qualquer organização e para
qualquer treinamento, havendo evidências de validade de conteúdo. Mas

249
careciam de uma melhoria substancial, verificando-se, por exemplo, sua
validade de construto e confiabilidade.

Abbad envidou esse esforço de melhoria, tomando os itens já utilizados nessas


experiências e a eles acrescentando outros que emergiram de um
levantamento exploratório feito com entrevistas. As análises estatísticas
realizadas revelaram uma estrutura unifatorial e índice de confiabilidade (alfa
de Cronbach) acima de 0,90. Outras tentativas, já usando o novo instrumento
desenvolvido, foram descritas por Borges-Andrade, Gama e Oliveira-Simões,
Borges-Andrade et al., Pantoja et al. e Martins, Pinto Jr. e Borges-Andrade,
que encontraram resultados de análises fatoriais e de confiabilidade muito
similares aos da autora, o que possibilitou concluir sobre a generalidade dos
mesmos para outras organizações.

Outro esforço foi realizado por Alves e Tamayo que não tomaram como base
os indicadores anteriores. Eles realizaram toda a construção de seu
instrumento a partir da opinião de treinandos e gerentes da Telebrás e
encontraram estruturas multifatoriais, incluindo dimensões tais como
motivação, relacionamento, autovalorização, atitude crítica e organização do
trabalho, a maioria delas com índices de confiabilidade (alfas de Cronbach)
acima de 0,80. Não existe registro, no entanto, de que esse instrumento tenha
sido posteriormente aplicado em outras organizações.

Essas experiências de construção de instrumentos com itens idênticos


parecem ser apropriadas para situações em que a natureza dos objetivos
(quando eles existem) não permite a elaboração de listas de desempenhos
esperados para cada treinamento ou quando o sistema de “T & D” é
extremamente grande e a organização deseja avaliar comparativamente todos
os eventos realizados. Contudo, a tomada de decisão no sentido de elaborar
tais instrumentos exige que se disponha de recursos financeiros, de pessoal
capacitado para construí-los e de uma cultura organizacional que compreenda
os procedimentos de pesquisa e esteja disposta a aguardar pelos seus
produtos. Isso pode ser contornado como uso do instrumento já desenvolvido,
cuja generalidade foi demonstrada, mas é preciso alertar que ele não permite

250
que se leve em conta medidas de comportamento no cargo específicas de
cada ambiente organizacional.

Uma segunda alternativa para resolver o desafio antes colocado é fazer um


levantamento exploratório, de caráter qualitativo, utilizando entrevistas e leitura
de documentos e abrangendo todas as pessoas que estiveram envolvidas com
o treinamento. Assim, é feito um grande esforço de recuperação e
sistematização de informações que estão dispersas ou existentes somente na
memória das pessoas. A organização que deseja fazer isso paga, em termos
dos recursos financeiros e humanos que deverá utilizar no subsistema de
avaliação, o preço de não ter documentado e organizado seu subsistema de
planejamento de “T & D” ou de ter decidido terceirizá-lo. Mesmo assim, essa
alternativa pode não servir para qualquer tipo de cargo ou função, clientela de
treinamento ou cultura organizacional.

Além dos indicadores poderem se diferenciar em termos de comportamentos e


resultados, seu nível de complexidade pode ser de “profundidade” ou “largura”.

No primeiro caso, o foco da avaliação é estritamente no que está previsto no


programa do treinamento, mesmo que isso não esteja escrito e que seja
necessário fazer um levantamento exploratório. Portanto, os instrumentos de
coleta de dados limitam-se a questionar o uso dos conhecimentos e
habilidades aprendidas ou atitudes desenvolvidas, ou o seu impacto no
trabalho. Várias pesquisas já descritas aqui seguiram essa estratégia.

Entretanto, sob certas culturas e políticas organizacionais é possível, ou é


preciso, verificar se existem evidências de que o adquirido em treinamento está
tendo impacto em dimensões do desempenho individual que vão além
daquelas diretamente relacionadas àqueles conhecimentos, habilidades e
atitudes previstos em programas de treinamento.

Não cabe ao subsistema de avaliação de treinamentos o papel de definir


desempenhos esperados em toda a organização e, se isso for tentado, poderá
ser considerado, em muitas culturas organizacionais, como uma intromissão

251
indevida. Além disso, a atual política de flexibilização ocupacional tem colocado
à prova as práticas de descrição de cargos e funções. Uma esperança, para os
que desejarem desenvolver medidas nesse nível de complexidade, é o
movimento de gestão de competências, que tem retomado essas práticas de
descrição.

A terceira questão a ser respondida diz respeito a como a medida será


realizada: observar ou perguntar?

No nível de mensuração de comportamento no cargo, a primeira alternativa


limita a avaliação ao que pode ser diretamente observado, durante o tempo em
que houver observador presente. Isso traz sérias limitações, considerando-se
que atualmente a maioria dos treinamentos espera que as pessoas
desenvolvam uma ampla variedade de desempenhos complexos e difíceis de
serem observados em ambientes e tempos predefinidos (e.g., habilidades para
solucionar problemas, estratégias cognitivas e posturas éticas e de civismo
organizacionais ou extra-organizacionais). Além disso, na maioria de
treinamentos, podem-se esperar mudanças de desempenhos em períodos pós-
treinamento muito diversificados, já que os indivíduos são colocados em
ambientes com desenhos de trabalho com amplas e elevadas alternâncias
ocupacionais, ou em que cada equipe define como e quando cada tarefa será
realizada. Talvez por todas essas razões, mais os fatos de que a presença de
observadores é vista como ingerência indesejável em muitas culturas
organizacionais (especialmente quando os treinamentos são gerenciais ou
estratégicos) e que procedimentos de observação requerem atividades de
coordenação e treinamento que demandam muitos recursos, a mensuração
tem sempre acabado por ser feita na forma de perguntas.
As perguntas podem ser respondidas pelos próprios ex-treinandos (auto-
avaliação) ou por seus supervisores, colegas ou clientes (heteroavaliação), ou
por uma combinação desses tipos de respondentes. Contudo, se os
treinamentos foram feitos de forma massificada, aos gerentes caberá avaliar
simultaneamente o seu impacto em todos os indivíduos de seu setor, o que
significará a suspensão ou redução de suas atividades, para poderem
responder a tantos questionários.

252
Em culturas organizacionais mais tradicionais, pode não ser bem vista a
consulta a colegas ou clientes. A combinação de estratégias seria o ideal,
porque permitiria a verificação de diferenças e coincidências de opiniões. Mas
é ela que também exige mais recursos, pois demanda grande esforço de
coordenação na coleta de dados, para que a correspondência entre eles não
seja perdida, no momento da análise. Além disso, também a coleta cruzada de
informações pode não ser muito bem vista, se for interpretada como
desconfiança pelo avaliador.

Os estudos no nível de comportamento no cargo demonstram que se avançou


no sentido de enfrentar os desafios da construção de medidas. Igualmente, as
soluções encontradas produziram, elas próprias, outros desafios. Há dilemas
que persistirão, pois as soluções tendem a atender alguns condicionantes do
processo de tomada de decisão descrito, mas deixam outros a descoberto.

Ao contrário do nível anterior, no processo de desenvolvimento de medidas de


avaliação de treinamento no nível organizacional não existe sistematização
metodológica similar para a tomada de decisões. Contudo, pode-se tentar fazer
alguns paralelos. O que se deseja efetivamente medir são mudanças que o
treinamento possa ter provocado na organização. O foco deve ser no
comportamento da organização ou de suas unidades e, contrariando o nível
anterior, nunca em seus resultados, pois isso já significaria estar no próximo
nível: o de valor final. A medida pode ser feita através de observação (isto inclui
documentos) e perguntas. Os dados podem ser fornecidos pela mesma
variedade de atores do nível anterior.

As decisões dependerão dos condicionantes já descritos, mas sabe-se que o


processo de avaliação seria muito facilitado, se existisse um sistema de
controle e avaliação organizacionais em funcionamento e se este incluísse
indicadores que fossem minimamente sensíveis para a detecção de efeitos de
treinamento. Infelizmente isso raramente acontece, pois esses sistemas
(quando existem) não são desenhados com o foco em “T & D”, que para seus

253
construtores é “micro” demais, para ser levado em consideração no nível
“macro” em que aqueles sistemas são desenvolvidos.

Fazendo uma analogia com o nível anterior, seria como dispor de boas
descrições de cargos ou funções, ou de competências, que pudessem servir de
parâmetros para se verificar o impacto do treinamento. A diferença é que se
estaria esperando por indicadores equivalentes, no nível da organização como
um todo ou de suas unidades. Se a presença de tais indicadores, no nível
anterior, já não é tão freqüente, talvez fosse otimismo em demasia acreditar
que eles pudessem existir e estarem apropriadamente definidos, para servirem
ao presente nível de mensuração.

Em princípio, as mudanças de comportamento da organização a serem


verificadas deveriam ser derivadas dos desempenhos esperados do conjunto
dos indivíduos treinados, que por sua vez deveriam ser deduzidos dos
objetivos dos treinamentos.

Ao desafio que já existia e foi anteriormente descrito, de fazer essa dedução


destes objetivos, acrescenta- se aqui o de derivar mudanças de
comportamento da organização a partir de desempenhos individuais
esperados, que raramente estão definidos, até porque a tendência de
flexibilizar ocupações torna esse trabalho eternamente inacabado. As
mudanças nunca deveriam ser modificações no nível do comportamento dos
ex-treinandos e poderiam estar localizadas na cultura, em processos ou em
estruturas organizacionais. O desafio, neste caso, é o de dispor de indicadores
apropriados.
Há muito que avançar, no que tange ao desenvolvimento de medidas no nível
organizacional. O caminho a seguir parece ser análogo ao que foi trilhado no
nível de comportamento no cargo. Existem desafios a vencer, mas as soluções
parecem mais bem dimensionadas, ou existe maior capacidade desenvolvida
para superá-los, do que aquilo que foi descrito no nível de mensuração de
aprendizagem.

254
Nos quatro níveis anteriores, a descrição das questões para tomada de decisão
e das experiências de mensuração teve como base os modelos e quadros
referenciais vindos da Psicologia, Educação e Administração. Os indicadores
que têm sido usados para realizar a avaliação do treinamento no nível de valor
final, bem como os procedimentos que levam à sua obtenção, pertencem a
uma outra disciplina: a Economia. Eles baseiam-se numa tradição de cálculo
de retorno de investimentos que teve seu apogeu há mais de trinta anos,
principalmente na Economia da Educação.

O primeiro desafio para realizar estudos de avaliação de treinamento no quinto


nível é o de contar com profissionais capacitados vindos dessa subárea. O
segundo desafio já foi objeto de apreciação aqui, só tornando-se mais
complexo, neste último nível: para identificar seus parâmetros de avaliação, é
preciso perguntar sobre as mudanças organizacionais e de comportamento
individual esperadas do treinamento e, além disso, conhecer os seus objetivos
instrucionais. Se não houve planejamentos nos níveis anteriores, ou se esse
planejamento não foi documentado na organização ou em seu sistema de “T &
D”, será preciso recuperar essas informações em todos os níveis anteriores.

Definidos os parâmetros específicos da organização e do treinamento, eles


certamente envolverão indicadores de custos diretos e indiretos (isto deve
incluir até os salários diretos e indiretos dos treinandos, durante o período em
que estiveram participando dos eventos) e de benefícios diretos, como a
parcela do aumento de produtividade e lucro atribuível ao treinamento, e às
vezes indiretos (esses são extremamente difíceis de serem estimados e por
isso são muitas vezes ignorados).

O problema, em seguida, seria coletar os dados e depois fazer os cálculos,


para os quais já foi dito que existe metodologia sistematizada (estimativa de
retorno de investimentos) na Economia da Educação.

Raramente se consegue implementar avaliações de treinamento no nível de


valor final, apesar de essa metodologia não ser recente.

255
O ideal é envolver todos os programas ou políticas organizacionais em “T & D”.
Não é igualmente recomendável que a coleta dos dados seja feita para curtos
períodos de tempo de treinamento.

Apesar de existir muito pouca experiência realizada no nível de mensuração de


valor final, há métodos desenvolvidos e disponíveis para isso. Portanto, a
questão aqui não parece ser a de existir uma necessidade de avanço da
pesquisa, mas de tomadas de decisão que são condicionadas pelos fatores já
citados e que encontram os desafios anteriormente mencionados.

III APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL. PESQUISAR

1 Educação corporativa.

2 EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA.

Conhecida a tendência do enfraquecimento das fronteiras existentes entre os


conceitos de TD&E, o treinamento a distância (TaD) pode ser entendido como
um conjunto de ações educacionais, sistematicamente planejadas,
desenvolvidas na maior parte do tempo no contexto de flexibilidade espacial e
temporal entre professor e aluno, de sincronidade e assincronidade, de
interação e interatividade e de abertura dos espaços físicos, utilizando-se de
meios tecnológicos que facilitam o aperfeiçoamento e a aquisição de
conhecimentos, habilidades e atitudes (CHAs) por meio do autogerenciamento
da aprendizagem do indivíduo. Os CHAs adquiridos podem ser aplicados no
trabalho atual ou futuro, em empresas diferentes, e, no caso de usuários
autônomos, aplicados nas diversas atividades profissionais desenvolvidas pelo
indivíduo.

O TaD pode facilitar o desenvolvimento de carreiras dentro e fora das


organizações por meio de currículos e trilhas educacionais voltados para
educação continuada. Em função disso, as características que distinguem o
treinamento a distância de treinamentos presenciais deveriam estar produzindo

256
mudanças nos modelos de avaliação de treinamentos a distância e em seus
instrumentos de coleta de dados.

Em cursos a distância pela Internet, as características individuais podem ter


maior influência nos efeitos do treinamento por se tratar de uma aprendizagem
que depende muito mais do esforço do próprio indivíduo (autogestão da
aprendizagem) do que dos recursos instrucionais em si; o indivíduo
provavelmente utilizará diferentes estratégias usadas nos cursos presenciais
em função dos novos procedimentos instrucionais específicos de treinamentos
baseados na Web (TBWs). O estudo das estratégias de aprendizagem pode
ser útil para auxiliar o planejamento instrucional de cursos a distância ao
verificar as estratégias e estilos mais utilizados pelos indivíduos, bem como ao
analisar para quais pessoas são mais adequados determinados procedimentos
oferecidos.

Segundo Warr e Allan existem três conceitos que eventualmente podem gerar
dúvidas: habilidades/hábitos de estudo, estilos de aprendizagem e estratégias
de aprendizagem. Hábitos de estudo envolvem os procedimentos utilizados
pelo aluno para integrar os melhores aspectos contextuais e maneiras de
estudo com o objetivo de melhorar a aquisição e retenção da aprendizagem.
Exemplo de hábitos de estudo são habilidades de leitura, gerenciamento do
tempo, uso efetivo de biblioteca, procedimentos de revisão e fazer anotações,
entre outros.

Estilos de aprendizagem são as preferências do estudante referentes aos


aspectos contextuais e às maneiras de estudo. Compreendem a preferência
dos indivíduos por determinadas estratégias de aprendizagem e por aspectos
do contexto em que esta ocorre. Exemplo de estilos de aprendizagem: nível de
ruído e temperatura do ambiente ao estudar, horário de preferência de estudo,
forma de estudo (individual, em grupo), maneira de adquirir e processar as
informações (pedir ajuda a colegas, consultar o material).

Estratégias de aprendizagem são procedimentos utilizados pelos indivíduos


durante as atividades de aprendizagem para serem bem- sucedidos. As
estratégias variam mais do que os estilos, já que podem ter a influência das
preferências gerais do indivíduo. Além disso, os autores dizem que as

257
estratégias podem ser modificadas em treinamento com o intuito de aumentar a
efetividade da aprendizagem em uma atividade ou ambiente específico. Isso
significa dizer que não existem estratégias melhores, e sim estratégias mais
adequadas ao tipo de atividade a ser aprendida.

Warr e Allan atribuem a mesma importância ao estudo de estilos e estratégias


de aprendizagem, já que informações sobre as preferências do indivíduo
podem ser úteis para adaptar os procedimentos utilizados no evento
instrucional. Já informações sobre estratégias utilizadas podem identificar
pontos a serem trabalhados no indivíduo para melhorar seu aproveitamento
durante o curso sem necessariamente modificar os procedimentos.

Conhecida a discussão sobre a dificuldade dos alunos em se adaptarem às


novas tecnologias de ensino, tais como o uso de chats, fóruns, troca de e-mails
e como salvar arquivos, entre outros, informações sobre as estratégias usadas
em cursos oferecidos pela Internet serão de extrema utilidade para verificar,
empiricamente, se as ferramentas disponibilizadas estão sendo usadas de
maneira efetiva pelos alunos ou se será necessário um pré-treinamento para
ensinar- lhes estratégias adequadas a fim de aumentar o aproveitamento das
atividades oferecidas.

Warr e Allan propuseram uma taxonomia de estratégias de aprendizagem para


treinamento profissional em adultos. Os autores consultaram diversos
inventários de estratégias de aprendizagem utilizados nos contextos escolar e
universitário para tornar possível a construção da taxonomia em questão. A
taxonomia é formada por três categorias, as quais compreendem diferentes
níveis de análise; a saber:

· Estratégias de Aprendizagem Cognitiva são compostas pelas estratégias:

1) Repetição – repetição mental da informação na forma em que foi


apresentada;

2) Organização –identificação de idéias centrais do material e criação de


esquemas mentais que agrupam e relacionam elementos que foram
aprendidos; e

258
3) Elaboração – reflexão sobre implicações e conexões possíveis entre o
material aprendido e o conhecimento já existente.

· Estratégias de Aprendizagem Comportamentais agrupam as estratégias:

1) Busca de ajuda interpessoal – obtenção de auxílio de outras pessoas, como


pares e professores, para tirar dúvidas sobre o material. Representa um
comportamento proativo do indivíduo de solicitar ajuda ao invés de utilizar
apenas as constantes informações do próprio procedimento instrucional;

2) Busca de ajuda no material escrito – obtenção de informações em


documentos escritos, manuais de instruções, programas de computador e
outras fontes que não envolvam contato social; e

3) Aplicação prática – aprimoramento do conhecimento por meio de aplicação


prática do que foi aprendido.

· Estratégias auto-regulatórias são formadas pelas estratégias:

1) Controle da emoção – controle da ansiedade e prevenção de dispersões de


concentração, causadas por sentimentos de ansiedade;

2) Controle da motivação – controle da motivação e da atenção, apesar de


existência de um interesse limitado na tarefa a ser aprendida; e

3) Monitoramento da compreensão – avaliação do processo de aquisição de


aprendizagem e modificação do comportamento do indivíduo quando
necessário.

Warr e Downing construíram e validaram um instrumento de 45 itens


distribuídos em 8 fatores com bons índices de consistência interna. Os autores
sugerem a aplicação de pré e pós-teste para avaliar as mudanças ocorridas
nas estratégias de aprendizagem do começo até o fim do treinamento. Essa
sugestão pode facilitar a diferenciação entre o que pode ser considerado
resultante do processo do evento instrucional e o que pode ser atribuído às
características disposicionais do indivíduo. Para Borges-Andrade, variáveis de
processo referem-se a tudo o que o aluno sente, diz, pensa ou faz à medida
que os procedimentos são implementados. Nesse sentido, se as estratégias

259
cognitivas, motivações e outras características disposicionais são modificadas
durante o evento instrucional, elas podem ser analisadas como variáveis de
processo, na concepção de Borges-Andrade

Figura 1 – Modelo geral de avaliação do impacto de treinamento via Web no


trabalho

1. Características da Clientela

 Variáveis Demográficas
 Estratégias de Aprendizagem
 Hábitos de Estudo

2. Reações
4. Impacto do Treinamento
 Desempenho do Tutor no Trabalho
 Procedimentos Instrucionais

3. Falta de Suporte à Transferência de


Treinamento

Em cursos a distância, variáveis referentes a “características da clientela”


podem assumir maior relevância na explicação de impacto. Isso porque se
sabe que o estudante de cursos a distância precisa ter em seu repertório
competências complexas de autogestão da aprendizagem, as quais,
provavelmente, são fortemente influenciadas por disposições individuais como
locus de controle, autoeficácia

e, principalmente, variáveis motivacionais. O “valor instrumental do


treinamento” para o indivíduo talvez seja uma das mais importantes variáveis
antecedentes de resultados de cursos abertos e gratuitos como o IPGN, já que
esse conceito se refere às escolhas particulares do indivíduo e aos benefícios

260
que o treinamento pode oferecer para o próprio participante relacionados a
resultados futuros.

261
262
263
264
265
266
3 Projeto pedagógico.

267
SESA GESTÃO

1 Relações humanas.

A teoria organizacional trata as relações humanas de forma dominantemente


racionalista, instrumental e prescritiva, integrando-as apenas parcialmente a
seu elemento central: a emoção.

A questão dos relacionamentos interpessoais, e de sua inerente dimensão


emocional, é crucial para a vida associada, pois são esses processos
interativos que formam o conjunto de sistemas que a organizam. As condições
em que ocorrem tais relacionamentos definem a forma de convivência entre os
seres humanos, que são seres de relações, e destes com a natureza. Fazem a
diferença entre sofrimento e bem-estar e definem como a vida social é
construída em seu cotidiano. Deteriorações nas relações interpessoais
resultam em deterioração das relações sociais, das relações inter e intra-
organizacionais.

A psicologia social, a comportamental e a clínica; a biologia cognitiva; as


neurociências em geral; ou as grandes tradições religiosas; sem falar em
algumas correntes filosóficas, têm enfatizado a importância das relações
interpessoais para a vida humana.

Todavia não se pode identificar, no campo dos estudos organizacionais, uma


“teoria dos relacionamentos”, em que as dimensões emocional e ética sejam
seus componentes indissociáveis, conferindo-lhe perfil substantivo. Muito do
que sabemos sobre relacionamentos interpessoais é inexato e desarmônico
para constituir uma teoria confiável e prescrever comportamentos.

O relacionamento interessoal aparece implícito no estudo das emoções e em


diversas teorias (gupos, papéis, liderança, motivação, conflito, decisão,
mudança etc.), ou dissociando o interpessoal do interorganizacional, com
enfoque dominantemente instrumental.

268
Como uma teoria geral, as relações humanas foram tratadas como uma
justificativa ideológica da estrutura institucional vigente, voltada para os
problemas de ajustamento dos indivíduos e esquivando-se do trato dos
conflitos.

O mesmo ocorre na escola comportamental, onde o estrutural delimita o


comportamento. Em qualquer escola, a instrumentalização domina e as
relações interpessoais têm caráter eminentemente técnico.

Nord e Fox observam que a ênfase nos estudos organizacionais, a partir dos
anos 1980, vem se deslocando de uma visão do indivíduo, independente de
seu contexto, para considerar a interação entre indivíduos e seus contextos; o
mesmo deslocamento observado da psicologia cognitiva para a psicologia
sociocognitiva. Os dois autores lembram que os trabalhos de Foucault
influenciaram diversos autores nessa passagem para uma visão relacional e
dinâmica. Passagem que envolve o reconhecimento de que indivíduos são
constituídos por meio de domínio social, descobrindo o sociobiológico na vida
social, sem esconder seu caráter relacional. Mas nada até aí se configura na
busca de uma teoria substantiva do relacional.

As recentes contribuições identificadas como teoria dos stakeholders (TS) e o


movimento de responsabilidade social corporativa (RSC), com versões
instrumentais e normativas, representam um avanço na compreensão das
relações interpessoais e interorganizacionais no ambiente empresarial, mais do
que a teoria dos custos de transação, as teorias das relações intergrupais
incrustradas, a teoria do agente, ou a teoria das partes interessadas do
Stanford Research Institute dos anos 1960. Mas há ainda limitações em todas
elas.

Aquele grupo de contribuições, da TS e da RSC, ainda é criticado, quanto à


sua validade teórica e aos seus fins, por diversos teóricos das organizações e
pela ortodoxia capitalista, que assume posição antagônica à perspectiva de
Polanyi, quando este afirma que a economia do homem, como regra, está
submersa em suas relações sociais.

269
Ainda hoje, para os muitos seguidores de Milton Friedman, a única
responsabilidade das empresas é para com seus acionistas.

O que mais importa é que aquele conjunto de contribuições trata de


relacionamentos econômicos, desprezando outros aspectos da vida humana e
se preocupando com riscos, com a sobrevivência imediata da empresa,
mapeando os interesses econômicos da organização. Mesmo em algumas de
suas versões éticas, preocupadas com a dignidade humana e implicações
socioambientais, o emocional do relacionar está ali desconectado.

Entender a interação emoção-razão, demonstrada pela neurofisiologia, exige


reexaminar o pressuposto da racionalidade limitada, assumido por aquele
conjunto de teorias.

A corrente normativa da teoria dos stakeholders, de orientação substantiva,


considera indivíduos e grupos mais do que simples entidades maximizadoras
de lucros; são um fim em si mesmos, devendo todos os processos
administrativos respeitar sua dignidade. Essas variadas contribuições, que
incluem os trabalhos de vários estudiosos não estão atentas à natureza dos
relacionamentos interpessoais e ao papel central que a emoção representa
neles. Mesmo o ético está nelas desligado do emocional, pois seguem a
tradição racionalista, oriunda do iluminismo, são objetivistas e não penetram
mais fundo na identificação de sua qualidade. Até porque sua força relacional
visa, pragmaticamente, a força mercadológica, deixando vazios teóricos na
compreensão da natureza desses relacionamentos e da natureza de seu
conhecimento. A teoria dos stakeholders não foi capaz de responder à questão
de quanto aos motivos que tornaram a perversão a forma privilegiada dos
relacionamentos humanos em uma sociedade que instrumentaliza seus
indivíduos. A história do capitalismo é de deterioração das relações e a razão
que tornou hegemônico o capital, sufocou a dimensão emocional da vida.

O trato dos relacionamentos interpessoais de maneira instrumental, como


forma de dominação sobre o trabalho, gera resultados limitados e perversos,
tanto ao bem-estar no trabalho, quanto à produtividade para haver aumento
espontâneo da produtividade do trabalho é preciso elevar o nível de qualidade
nos relacionamentos entre todos que operam a empresa.

270
Mais do que isso, humanizar a empresa pode significar aumento da sua
capacidade de sobrevivência e a do próprio planeta, pois as empresas têm
grande responsabilidade sobre a crise socioambiental que vivemos.

No que até agora foi feito sobre esses temas interdependentes,


relacionamentos interpessoais e relacionamentos interorganizacionais, nas
muitas contribuições daquilo que se denominou teoria dos stakeholders e
responsabilidade social corporativa, há mais prescrição do que descrição ou
explicação e, menos ainda, compreensão da importância desses conceitos
para a gestão de empresas.

O que aquelas duas correntes têm em comum é a idéia de fazer negócios com
sustentabilidade e ética, apesar de não terem ainda definições universalmente
aceitas.

Talvez seja mais produtivo retomar a pesquisa básica sobre esses conceitos
interligados, para desenvolver uma teoria dos relacionamentos na
administração de empresas, com mais coerência teórica, evidência empírica,
viabilidade e conhecimento de suas implicações. Para tanto será necessário
reexaminar a natureza do fenômeno relacionamento e a natureza de seu
conhecimento, mas em bases interdisciplinares. Precisamos entender “o que é”
esse fenômeno.

Também precisamos de pesquisas para entender o “como é” e não tanto o


“como deve ser” pois, os estudos sobre o comportamento vêm enfatizando a
importância da participação, cooperação, coletivismo ou empowerment, antes
de alcançar suficiente embasamento empírico. Os modelos prescritivos
precisam incorporar o conhecimento descritivo para serem mais eficazes.

Insistindo nesse ponto, se as pessoas não são maximizadores racionais, como


pressupõem os economistas liberais, precisamos entender a maneira pela qual
nos afastamos da racionalidade.

Assumindo que as decisões são fundamentais, tanto para entender quanto


para mudar comportamentos em organizações, ou ainda, assumindo que
grande parte do conhecimento organizacional que orienta as decisões provém
de processos interativos, então devemos conhecer mais profundamente como

271
e até onde os relacionamentos interpessoais podem explicar o comportamento
na empresa.

Está implícito aqui que adquirimos conhecimento e seu conjunto de


significados, uns com os outros, como explica a biologia cognitiva e o
sociocognitivismo.

A importância dada aos relacionamentos parte do pressuposto de que as


necessidades e interesses das organizações são as necessidades e interesses
dos indivíduos de forma coletiva. Suas necessidades se originam no ser
complexo que somos e que, necessariamente, passam pela emocionalidade
das relações sociais e suas trocas intersubjetivas.

Maturana afirma que não é a razão que nos leva à ação, mas a emoção. E a
emoção fundamental que torna possível a história da hominização é o amor,
sem preocupação com a visão cristã desse termo, mas sim com algo que é
constitutivo da vida e fundamento da vida associada. Nesta, nos comportamos
pelo sentir/pensar/agir e não apenas pelo pensar/agir como pressupõe o
racionalismo.

As principais contribuições ao conhecimento das emoções, no âmbito da


administração de empresas, vieram da psicologia comportamental e da
psicologia clínica a partir dos anos 1940, tratadas em termos de sentimentos,
humor, moral, pertencimento a grupos ou comprometimento com tarefas.

De 1950 a 1970 o tema aparece em estudos sobre atitudes, principalmente


quanto à satisfação no trabalho, e nos anos 1970 retoma-se o enfoque
cognitivo do comportamento humano em termos de expectativas, informação e
solução de problemas, com ênfase nas emoções ditas positivas.

Os primeiros esforços para unificar cognição (razão) e emoção surgem nos


anos 1980 e 1990, mais voltados para a avaliação de desempenho e estudo da
decisão. É nesse período que começam a ser divulgadas pesquisas no campo
das neurociências, particularmente da neurofisiologia, mostrando a
interdependência entre razão e emoção no operar do cérebro humano , mas
que pouco penetraram a teoria organizacional, para desmantelar de vez a idéia
de que somos maximizadores racionais de utilidade.

272
A emoção penetra o ambiente organizacional associada à constituição das
tarefas, preocupada, em última instância, com o desempenho lucrativo,
seguindo a crença estabelecida pela força do racionalismo de que a ordem
organizacional e a eficiência das relações entre gerentes e trabalhadores
devem ser tratadas racionalmente.

Em suma, “boas” organizações são as que têm emoções gerenciadas e a


teoria organizacional deveria se preocupar mais com processos cognitivos e
controle comportamental. Um viés problemático à pesquisa.

Recentemente começaram a surgir estudos sobre a influência da organização


e das relações interpessoais no comprometimento afetivo em empresas, como
o estudo de Hui, Lee e Rousseau em empresas chinesas, com temas para
correlacionar às emoções muito variados. Como são variadas as escolhas
temáticas em outros autores.

Geralis e Terziouski descobriram que dar poder aos indivíduos gera emoções
positivas com imediata repercussão sobre a motivação para o trabalho, a
qualidade dos serviços e os resultados operacionais.

O estudo de Calahan relaciona gestão com comportamento emocional e suas


implicações para a mudança cultural.

Mayer, Caruso e Salovey tomam o conceito de inteligência emocional para


associá-lo a um conjunto de habilidades cognitivo-afetivas que as pessoas
usam para administrar suas emoções.

Conceito também utilizado por Wong e Law relacionado ao estudo da liderança


e avaliação de desempenho. Mas o emocional é percebido como sentimento e
não como impulsionador da ação, como na visão biológica.

Linha similar foi seguida por Cavallo na Johnson & Johnson, para verificar
competências específicas em líderes que os caracterizem como de alto ou
baixo desempenho, concluindo que os líderes de alto desempenho são os de
mais alta competência emocional.

Offermann e co-autores também trabalharam com o conceito de competência


emocional e habilidade cognitiva para verificar suas implicações no

273
desempenho de grupos, atitudes e percepções das lideranças. E Ashkanasy e
Daus visualizaram o gerenciamento das emoções como uma importante
ferramenta no kit de trabalho de um gerente, pois as mais simples e mundanas
emoções devem ser “administradas”.

Tais contribuições, no entanto, apresentam um quadro dominante: são


racionalistas, instrumentais-objetivas, fortemente quantitativas e prescritivas,
seguindo a maneira funcional-positivista de ver.

E como lembram Nord e Fox, o indivíduo tem aí um papel preponderante, de


forma semelhante aos estudos anteriores sobre satisfação e atitudes no
trabalho. Remetendo ao psicólogo Edward Sampson, eles observam que o
individualismo foi sempre tratado como um evento sócio-histórico e não como
um evento natural, seguindo os pressupostos do individualismo liberal.

Na maioria dos estudos, os relacionamentos interpessoais aparecem de forma


implícita; a integração relacionar-emocionar não tem vínculo ontológico.

Os relacionamentos emergem quando esses estudos assumem que as


emoções são primordialmente reações individuais causadas por interações
sociais e são vistas como fenômenos sociais. Emoções surgem, então, como
reações a relacionamentos em um processo interativo de influência mútua e
não omitem a influência da cultura organizacional ou de processos
comunicativos. Emoções são aí freqüentemente visualizadas como
conseqüências do que os outros dizem ou fazem, por outros entendemos
indivíduos ou normas.

A literatura sobre emoções e organizações apoiou-se sempre na


essencialidade do indivíduo e só recentemente vem se voltando para o
contextual, para o que é relacional. Pressupõe, portanto, papel relevante ao
uso da palavra e dos significados que elas podem alcançar, no diálogo, embora
isso nem sempre esteja explícito nesses estudos, pois a busca da linearidade e
simplificação acaba excluindo os múltiplos elementos que enriquecem um
processo complexo.

Rejun e Zigang reconhecem que as emoções se contextualizam no campo das


relações interpessoais, por meio de um processo de ações e reações entre

274
pessoas. Tal visão coloca o locus das emoções nas relações interpessoais,
mas não explicita a quem cabe a iniciativa da ação, à emoção ou à razão, o
que faz diferença para a compreensão do comportamento humano.

A maior parte do tempo investido em pesquisas sobre o tema não foi para
descrever esse locus e sim para associar ou correlacionar emoções com
cultura, comunicação, conhecimento, motivação, liderança, aprendizagem e
mudança.

Um comportamento emocional reificado e examinado por meio de associações


binárias constituem as abordagens dominantes.

Vários desses estudos deixaram a descoberto suas limitações quanto à


compreensão desse fenômeno biopsicoantropossocial, suas múltiplas
dimensões e implicações para a vida organizacional. São variadas as
definições de emoção, de sentimento e para o significado de satisfação no
trabalho. Weiss lembra que tais distinções são comuns na literatura e mostra
como modelos racionais sobre emoções — a objetivação do subjetivo —
sugerem visões distorcidas.

As críticas são também diversas, vindas de dentro ou de fora da corrente


dominante. Lucas, Diener e Suh afirmam que os julgamentos de satisfação
medidos pelos níveis de experiências negativas e positivas não foram bem-
sucedidos, pois tais fatores são muito subjetivos para permitir modelização.

Por outro lado, as emoções foram traduzidas em formas organizacionais


aceitáveis e sua expressão pode gerar produtos organizacionais positivos, mas
também criar um “torpor emocional”,.

Críticas como as de Mumby e Putnam, Conrad e Witte indicam outras


dificuldades em lidar com o tema. Albrow observa que faltou maior
compreensão do sentir-pensar-agir nas organizações, considerando a natureza
contingencial, heterogênea e fragmentária dos processos sociais.

Na expressão de Morin o tema é mais acessível às abordagens analógico-


subjetivas (compreensão) do que às lógico-objetivas (explicação) usadas
naqueles estudos, pois estas não entendem o que é subjetivo. De forma mais

275
elementar, Jahn e Dune lembram que o objetivo é a moeda dos processos de
informação utilizada para transmitir conhecimento impessoal, quantitativo,
próprio a dígitos binários, enquanto o subjetivo transmite valores, significados e
perspectivas não valorados naquela moeda.

Assim se justificam as críticas aos estudos sobre emoções nas empresas


direcionadas por abordagens racionalistas, sobretudo as centradas em
modelagem e indicadores de desempenho, objetivando prescrever
comportamentos “administráveis”. Dito de outra maneira por Behncke: Não é
possível conhecer objetivamente fenômenos sociais nos quais o próprio
observador-pesquisador está envolvido... Essa noção do “conhecer” bloqueou
firmemente a passagem do conhecimento humano para a compreensão de
seus próprios fenômenos sociais, mentais e culturais.

A questão metodológica é, na realidade, crucial para a compreensão dos


relacionamentos interpessoais, levando os biólogos Francisco Varela, Jonathan
Shear e outros a um esforço para construir as bases de uma ciência da
consciência que inclua a experiência subjetiva como componente ativo e
explícito nas relações humanas.

A questão epistemológica transparece no tratamento dado à natureza das


emoções no contexto organizacional. A previsível dominância do racionalismo,
autêntico mito modernista, cria bloqueios e vieses inibidores do acesso à
ontologia desse fenômeno humano e a seu caráter multirrelacional e
interdisciplinar.

Os limites impostos pelo paradigma dominante, a força do cognitivismo, as


prisões ideológicas e psicológicas do sentir-pensar, se associam para dificultar
a penetração no denso mundo da subjetividade humana. A emoção sempre foi
afastada do aprendizado escolar e universitário, despreparando, desde cedo,
os futuros cientistas para lidar com sua investigação. A demonização das
emoções como sentimentos acabou por inibir sua compreensão como
comportamento, inclusive a emoção amorosa, fundamental à integração
humana em toda atividade social.

276
O modernismo vem tratando os relacionamentos como se fossem coisas,
concebendo o que é processo de uma forma linear, discreta e fragmentada.

Por meio de uma racionalidade instrumental crescente vê a administração de


empresas preocupada com controle e colonização progressiva das pessoas e
do ambiente natural. Vem pontuando os relacionamentos, para reduzir a
complexidade da rede de relações e torná-los mais gerenciáveis. Mas, para
compreender o papel dos relacionamentos entre pessoas é preciso privilegiar a
dinâmica do processo, as micropráticas organizacionais, com o que a maioria
dos pesquisadores tem dificuldade ou rejeita lidar metodologicamente.

Precisamos ainda apreender a organização de nosso pensamento não apenas


em sua lógica, mas também no seu emocional, buscando conhecimento nas
neurociências.

O problema das relações sociais aparece de forma crítica no marxismo, na


teoria crítica e nos pensadores pós-modernos, mas nenhuma dessas correntes
foi capaz de libertar-se dos limites impostos pelo racionalismo. Apesar de sua
preocupação substantiva com o pensar ético, esses críticos não perceberam o
vínculo com as emoções, apontado posteriormente por neurocientistas e pela
biologia cognitiva.

Tais limites epistêmicos e metodológicos têm dificultado compreender, de


forma analógico-subjetiva, as influências mútuas dos relacionamentos
interpessoais, interorganizacionais e sociais. O poder dos relacionamentos
interpessoais para influir nos processos e estruturas organizacionais
permanece fragmentado, visto como algo estático e separado da experiência
humana, que é também subjetiva, pois envolve a relação consciência-
inconsciência em nossos atos, relação denunciada na obra de Freud.

Nos estudos organizacionais, a racionalidade sistêmica e sua proposta de


integração pareciam ter vindo para colaborar com essa dimensão comunitária
da vida organizacional, mas sua visão das empresas como sistemas,
subsistemas e supersistemas, não só disfarçou as relações de poder, como
ignorou as pessoas, tratadas como funções. Tratou de relações entre funções.

277
As visões estrutural e funcionalista também estiveram mais preocupadas em
favorecer a diretividade e a manipulação, dominadas por uma lógica econômica
e técnica, recusando penetrar a dimensão substantiva e emocional da vida
associada, vital para o entendimento da mudança.

Os estudos organizacionais desenvolveram uma visão ordenada do mundo


empresarial, assumindo a realidade administrativa como racional, controlável e
passível de uniformização. Em seu conjunto, a teoria organizacional, na ânsia
de oferecer soluções, descuidou-se do essencial de seus problemas: as
condições do homem no ambiente de trabalho e suas implicações sociais. Mais
preocupada com a visão do capital, levou à conjugação de produtividade com
destrutividade e opressão. É inevitável lembrar a conhecida crítica de Prestes
Motta ou a crítica de Guerreiro Ramos sobre a visão sociomórfica do homem
na TO, que o reduz a um ser economicamente motivado e toma o mercado
como categoria fundamental para desenhar e comparar sistemas sociais. Ou
ainda, quando aponta um indivíduo preocupado com sua autopreservação, de
interesses imediatos e práticos, os seus pontos de referência básicos para o
relacionamento com os outros, ou seja, uma visão fortemente instrumental da
relação. Diz ele que a organização econômica formal não permite
relacionamentos interpessoais livres de pressão e a principal é, certamente, a
exercida por aquilo que denominou política cognitiva centrada no mercado,
como se esta fosse uma viseira compressora do cérebro humano.

Tal visão do relacionar substitui o padrão ético inerente a uma teoria


organizacional substantiva, o objetivo de Guerreiro Ramos em sua obra. E
também tornaria difícil pensar numa teoria dos relacionamentos na
administração de viés substantivo, ou seja, de natureza ética e crítica, que
envolvesse um ser humano dotado de razão, emoção e espiritualidade. Uma
teoria que não separasse valores de fatos, pois só uma teoria substantiva
poderia levar à compreensão do homem nas variedades históricas de sua
condição que é biopsicoantropossocial e não apenas econômica e técnica.

Em uma perspectiva substantiva, o objeto central da teoria deveria estar na


qualidade dos relacionamentos intra e interorganizacionais, qualidade definida
aqui como o relacionamento em que um indivíduo reconhece o outro como

278
legítimo outro na relação, com as implicações daí decorrentes para a vida das
pessoas e das organizações. Conceito que tem claras implicações éticas.

O conceito de qualidade de relacionamento interpessoal aqui adotado rejeita


automaticamente os comportamentos dos sistemas mecanicistas de gestão
que assumem relacionamentos rígidos, baseados na autoridade com
obediência, com origem no paradigma militar-taylorista. Um tipo de
relacionamento que faz Maturana distinguir relações sociais de não sociais,
incluindo as relações de trabalho nesta última categoria, pois se fundam no
compromisso de cumprir tarefas, aquilo que realmente importa para o gestor.
Razão pela qual tais relações precisam ser reguladas por contratos e normas.

O fato de as pessoas terem outras dimensões relacionais não tem maior


pertinência nas relações de trabalho. Mas as empresas onde existe maior
qualidade nos relacionamentos interpessoais são as que menos recorrem aos
sistemas legais.

Nessa visão, relações hierárquicas e de poder não são relações sociais e os


seres humanos não são todo o tempo seres sociais. Só o somos na dinâmica
das relações de aceitação mútua. Com tal sentido, as relações de poder e as
formas economicistas e tecnicistas de ver o trabalho obliteram as relações
sociais.

E isto tem implicações no psiquismo e no bem-estar das pessoas, além de


dificultar todo tipo de trabalho grupal, onde as dificuldades de interação
prejudicam seus resultados.

É uma visão biológica, mas que lembra o teórico crítico Erich Fromm, em suas
obras dos anos 1960, quando apontava o crescente afastamento do ser
humano de sua condição natural nas sociedades urbano-industriais, por ele
construídas. O que Maturana retoma, quando se refere às nossas criações
culturais afastadas de nossa natureza biológica.

Assume-se aqui, portanto, que a hipertrofia — e a enfatizamos — de um


pensar instrumental, econômico e técnico acaba por reduzir as demais
características humanas, tornando o indivíduo mais competitivo que
cooperativo e mais individualista do que coletivista. Além de reduzir o que é

279
reflexivo e ético, com imagináveis conseqüências para a qualidade dos
relacionamentos intra e interorganizacionais.

Dos sistemas mais simples aos mais complexos, as relações entre indivíduos
são interações cooperativas, diretas ou indiretas, ou não seria possível a
sobrevivência dos sistemas sociais.

Temos que compreender o tipo de ambiência biopsicoantropossocial que torna


a vida associada, em particular, a organizacional, mais ou menos cooperativa.
E, como já observado, o domínio das ações (cooperativas ou não) depende do
tipo de emoção presente nas relações interpessoais de dado ambiente.

Lembre-se que a aceitação do outro tem sua fonte no emocional, mas também
se desenvolve no âmbito da razão, pois assim é que interagem o sistema
límbico (emoção) e o neocórtex (razão) de nosso cérebro: uma estrutura
neurocognitiva de partes indissociáveis e complementares no seu operar, onde
o sistema límbico é o mais ágil, colocando a emoção à frente da razão nas
respostas ao ambiente.

Maturana esclarece que a aceitação apriorística das premissas que constituem


um domínio racional pertence ao domínio da emoção e não da razão. Logo,
todo sistema racional tem um fundamento emocional, o que a ortodoxia
positivista-cartesiana ignora. O modernismo tem apresentado o homem como
um ser racional, como se isso tivesse um fundamento transcendente de
validade universal, independentemente do que fazemos como seres vivos. Mas
todo sistema racional se baseia em premissas aceitas, porque as preferimos,
gostamos delas. Essa denúncia da Escola de Santiago tem implicações
imediatas para a condução da pesquisa no âmbito do humano- social, mas
permanece marginalizada dada a força da ortodoxia racionalista.

E indica que precisamos estudar a qualidade dos relacionamentos na empresa,


a partir da tríplice conexão emoção-razão-ação, onde a emoção é o ponto de
partida. É preciso assumir o pressuposto de que o emocional define o caminho
do racional, abandonando o pressuposto dominante de que a razão deve
afastar a emoção e levar isso para o desenvolvimento de novas metodologias
de pesquisa.

280
Os relacionamentos, por meio de interações recorrentes, no seio dos grupos
humanos é um processo vital na existência e sobrevivência das organizações
sociais. Maturana e Bunnell lembram que a humanidade começou junto com a
linguagem e é ela que possibilita a comunicação, mas a linguagem não é algo
puramente abstrato, pertence ao espaço concreto dos afazeres. São as
conversas sobre os afazeres que propiciam espaço para mudá-los e o
aparecimento de novos afazeres, possibilitando a mudança organizacional.

Seria elementar tal lembrança se não ocorressem até hoje tantas limitações ao
uso da linguagem, da conversação nas empresas, como vêm martelando
autores da linha humanista. É a linguagem, dizem os dois biólogos, que
permite a reflexão e esta a responsabilidade.

A corrente humanista da gestão tem enfatizado o papel da linguagem, da


argumentação ou da gestualidade, para mostrar um novo ângulo dos
processos comunicativos e fugir à visão mecanicista com que o funcionalismo
tratou a questão. Mas isso não foi incorporado a uma teoria de
relacionamentos, ateve-se ao exame pontual desse elemento central no
processo. Aqueles autores também não penetraram o que Maturana e Bunnell
consideram peculiar ao ser humano e é também central às relações humanas:
o amor em seu sentido comportamental, que significa aceitar o outro como ser
legítimo, sem ter de concordar com o que diz ou faz, ou ter de gostar dele.

Tal emoção, segundo aqueles autores, estabiliza os relacionamentos, expande


o comportamento inteligente e a criatividade, além de abrir espaço de
interações recorrentes com os outros. Já emoções como o medo ou a rejeição,
comuns nas culturas autoritárias, restringem nossa capacidade de ver e
dialogar, não disponibilizando todo nosso conhecimento, além de restringir a
criatividade.

A conversação surge aí como o entrelaçamento entre a linguagem e a emoção.


Então, toda cultura empresarial que restrinja esse amor-ação inibe a
convivência produtiva.

Outra decorrência dessa nova perspectiva, quanto à qualidade dos


relacionamentos, está em como se exerce o poder. Como ele surge da emoção

281
da obediência, onde não existe colaboração espontânea, só possível quando a
relação se baseia na aceitação legítima da coexistência, tais formas de
relacionamento não viabilizam a co-inspiração, que abre espaço psicológico
também à conversação e à amizade, com implicações para o ambiente
favorável ao trabalho grupal. A democratização das relações tem implicações
diretas sobre a qualidade dos relacionamentos no trabalho e envolve o
problema da liberdade.

Maturana e Bunnell dizem que autoridade e obediência dão origem à


irresponsabilidade e que liberdade é a experiência responsável por sua própria
responsabilidade. Nessa concepção, a liberdade não tem a ver com
possibilidades, mas como as vivemos.

Uma questão primordial nessa linha de argumentação biológica é que seres


humanos se tornam humanos a partir de sua convivência com os outros
humanos, das interações ocorridas em seu processo de socialização, ou seja,
surgimos e nos desenvolvemos a partir de relacionamentos. Descobrimos
nossa existência na existência do outro, dizem aqueles biólogos.

Para a biologia somos seres estruturalmente determinados, mas não


predeterminados, nossa constituição genética define um ponto de partida, mas
o que vamos ser depende de um padrão emergente e tem a ver com a cultura
em que nos criamos.

Por isso afirmamos anteriormente sermos seres de relações, pois elas estão na
formação de nossa identidade. E qualquer forma de associação humana que
atente contra nossa identidade, dificultando a convivência, é fonte de mal-estar.
Razão pela qual vivemos, historicamente, procurando macro e microssistemas
que facilitem a convivência: uma busca crescentemente dificultada pela
instrumentalização de todas as dimensões da vida.

Nessa busca transitamos entre amor e agressão, concorrência e cooperação,


apropriação e partilha, autoritarismo e autonomia, num emaranhado de
contribuições vindas das ciências humano-sociais.

Maturana e Bunnell dizem também que a história da transformação da Shell,


multinacional petrolífera, é uma história de amor. Ali as mudanças não teriam

282
ocorrido por meio de luta, competição ou autoritarismo, mas — como em outros
casos de mudanças bem-sucedidas — ocorreram sob o domínio dessa emoção
(ação) criativa. Entendem que esse seria o caminho duradouro de empresas
bem-sucedidas, o caminho para afastar o medo, a desconfiança e a
insegurança existentes na vida organizacional.

Em suma, esses biólogos da escola de Santiago estão desconstruindo o


racionalismo que assumiu o caráter de ideologia na sociedade moderna.

O estudo de caso de Leitão e Kurtz , em uma empresa metalúrgica de


Piracicaba, concluiu que a qualidade dos seus relacionamentos interpessoais
favorecia a aprendizagem de tarefas e de comportamento. Na pesquisa, com
amostra superior a 50% dos funcionários, usando análise de conteúdo, os
entrevistados indicaram como propiciadores de qualidade, em ordem de
importância: solidariedade, diálogo, liberdade, igualdade, compreensão,
confiança, respeito, responsabilidade, amizade, honestidade, sinceridade e
justiça.

Os relacionamentos entre os funcionários e com a gerência aparecem em


quarto lugar, entre 10 motivações possíveis para aprender, superados apenas
pelo desejo de crescimento pessoal, participação nos resultados e salário
(presente e futuro).

No total dos estudos realizados nessas empresas, a diferenciação nesses


relacionamentos, quando comparados às empresas de orientação mais
instrumental, é ponto comum.

3 LAUDOS, PARECERES E RELATÓRIOS PSICOLÓGICOS,


ESTUDO DE CASO, INFORMAÇÃO E AVALIAÇÃO
PSICOLÓGICA pesquisar

4 ANÁLISE INSTITUCIONAL pesquisar

5 TÉCNICAS DE ENTREVISTAS está no TJ em avaliação


psicológica

283
6 PSICOLOGIA DA SAÚDE: FUNDAMENTOS E PRÁTICAS 7
psicologia da saúde: fundamentos e prática. PARTE SE ENCONTRA EM
TJ- TCC

O psicólogo é um dos profissionais que faz parte de uma equipe


ineterdsiciplinar. Para escapar da lógica de produção de atos de saúde como
procedimentos e “realizarmos no agir diário, junto aos outros, dentro de nossos
campos de responsabilidades e competências, processos relacionais
comprometidos com a construção de sujeitos sociais protagonizadores de seus
modos de caminhar na vida individual e coletiva e sermos comprometidos com
a permanente ótica de cuidar dos outros, das relações, de si e do mundo”, é
preciso enfrentar uma série de desafios que vão muito além dos aspectos
burocráticos ou administrativos e da delimitação de espaços profissionais.

No campo da saúde pública, para fazer avançar uma política cuja lógica está
voltada para a produção do cuidado em saúde, torna-se necessário fazer
escolhas teóricas e metodológicas que possibilitem a sua concretização.

Como diz Deleuze, uma teoria é exatamente como uma caixa de ferramentas,
é preciso que sirva, que funcione e que funcione para outros. Se não tem
pessoas que se servem dela, incluindo o próprio teórico, é que a teoria não
vale nada. Além disso, vale lembrar “que não são quaisquer ferramentas que
permitem agir em um modelo centrado no usuário, que visa a um novo modo
de produzir o cuidado e o forjamento de novos sujeitos em ação
comprometidos radicalmente com a defesa da vida individual e coletiva, dentro
de uma ótica de direitos sociais plenos”.

Algumas ferramentas apresentam mais possibilidades do que outras; umas


estão mais cheias de força crítica, de tornar visível a invisibilidade de forças
que nos atravessam, os saberes e afetos instituídos, de nos fazer inventar atos
cuidadores.

Uma anamnese, por exemplo, circunscrita à queixa e sintomas para a


elaboração de diagnóstico tem funcionado, na maioria dos casos, como uma
ferramenta pobre para fazer emergir a complexidade de fatores envolvidos
naquilo que se apresenta enquanto necessidade de saúde. Portanto, a maneira
como certas ferramentas são construídas, como certas modalidades de
intervenção são pensadas e executadas, já reflete sua dimensão tutelar ou
geradora de autonomia, ou seja, é preciso, antes de qualquer coisa, pensar
onde essa ou aquela ferramenta pode nos levar.

Como isso afeta a Psicologia? Essa discussão indica que a Psicologia precisa
operar uma série de enfrentamentos importantes relativos à sua base
conceitual e ao seu repertório de práticas quando se trata da sua inserção no
campo da saúde pública.

284
Os pressupostos subjacentes à atenção produzida independentemente do local
de atuação: visão de mundo, valores, crenças, concepção de subjetividade, de
saúde/doença, de normal/patológico, de neutralidade etc, que fundamentam o
saber e a prática psicológicos; algumas marcas presentes no mundo psi: o
ideário individualista, a fusão identitária com a psicanálise, a formação
acadêmica descontextualizada concepção de sujeito/indivíduo, modelo clínico
tradicional, foco nos referenciais modernos de razão e cidadania etc.

Tudo isso concorre para a produção de uma cultura profissional, de uma forma
específica de ser psicólogo, de ver o mundo, de organizar seu trabalho e de
relacionar-se com a instituição de saúde, por exemplo, campo que é alvo desse
trabalho.

Essa forma específica de se situar na vida é caracterizada por alguns pontos, a


saber:

1. Escravização às técnicas, refletida na crença na neutralidade e na sua


eficácia intrínseca (seja individual ou grupal). A técnica é o fim em si. O que
importa é saber usar, aplicar corretamente, desempenhar a tarefa, é realizar o
ideal de atuação entendido como o emprego da técnica. Não é à toa que uma
das maiores reclamações dos psicólogos inseridos na rede pública de saúde
seja relativa à falta de setting/espaço adequado, de possibilidade de realizar o
acompanhamento individual e de falta de entendimento dos gestores sobre o
trabalho do psicólogo bem como dos usuários.

2. Concepção de liberdade/autonomia apenas dentro de uma ótica privatista,


que não tem absolutamente a ver com a idéia de liberdade como ação política,
coletiva, como diálogo no sentido de produzir novas formas de sociabilidade.

3. Desejos de adaptação, seja das técnicas (não se pensa na produção de


outras alternativas) seja da diferença, da diversidade humana, dentro de
modelos pré-estabelecidos.

Considera-se que grande parte das teorias e práticas psicológicas está


norteada pelo princípio da disciplina, da normatização e cristalização das
referências identitárias, seja em que contexto for.

Nesse sentido, destaca-se a necessidade de construção de um modo de fazer


Psicologia articulado aos princípios e estratégias de intervenção do SUS, modo
que vai sendo gestado ao longo da formação, e a universidade deve
responsabilizar- se por isso. Não se trata de uma especialização, mas de um
modo de ser no exercício profissional.

Considero que a finalidade por excelência de qualquer trabalho em Psicologia


seja operar cotidianamente essa máquina desejante que articula profissionais,
usuários, organizações, tecnologias, encontros de sujeitos, que produz uma
movimentação que implica processos cooperativos, potentes, prazerosos ou

285
não, tal como relata grande parte dos trabalhadores em saúde. É nesse jogo
cotidiano que nos inserimos de forma particular com nossos saberes e fazeres.

Operar essa máquina desejante é um trabalho árduo, cansativo, sem garantias,


pois implica perceber que “o desejo investe contra si mesmo e a favor do
fortalecimento do status quo”. Significa se permitir ser atravessado por uma
indagação spinozana: Por que as pessoas lutam por sua própria opressão
como se estivessem lutando por liberdade? Por que produzimos modos de
existência tiranos que fazem com que a hierarquia e a exploração sejam
desejadas? Por que costuramos tantas burcas, mesmo de cores e tecidos
variados, mas sempre fôrmas-prisões?

Esses questionamentos nos indicam que somos capturados constantemente


pela tentação do conforto das formas e dos equilíbrios; indicam também que
empreendemos, a todo momento, processos de institucionalização da vida, que
ajudamos a modular os sistemas de saberes-poderes que nos atravessam e a
conservar as redes invisíveis de subjetivação moral que sabotam as forças
vivas da vida, a potência do novo, do desconhecido, do inusitado, da diferença.
Chamamos isso “desejos de manicômio”.

É uma lógica, são marcas invisíveis que produzem formas de subjetivações.


Segundo Machado e Lavrador essa lógica se expressa “através de um desejo
em nós de dominar, de subjugar, de classificar, de hierarquizar, de oprimir e de
controlar. Esses manicômios se fazem presentes em toda e qualquer forma de
expressão que se sustente numa racionalidade carcerária, explicativa e
despótica".

Entretanto, o que é mais importante é que essa cultura manicomial não está
restrita a um campo específico de práticas, ou seja, a fabricação desses modos
de existência capturados em sua força de invenção, de devires fascistas que se
voltam, em nome da razão, à correção de tudo o que escapa à normalidade, à
vigilância ininterrupta para não sairmos da ordem, à produção de práticas e
tecnologias de disciplinarização, é algo que perpassa o cotidiano, que alimenta
os modos pelos quais circulam as pessoas nos espaços sociais, nos nossos
atos e formas de pensar.

Portanto, não é algo produzido especificamente no contexto da saúde ou


próprio de nossa categoria profissional, mas são movimentos que atravessam o
socius, o tornar-se humano contemporâneo. Isso quer dizer que ela envolve
todos nós; está dentro e fora dos muros das instituições de saúde.

Nesse sentido, mesmo sabendo que não há receitas prontas e definitivas,


talvez a especificidade do nosso exercício profissional seja produzir certa
disposição para construir problemas nos espaços por onde circulamos, nos
coletivos de trabalho, entre usuários e para nós mesmos.

286
Que nosso foco seja interrogar sobre como ocupamos as cenas, como as
produzimos: enquanto interditores ou produtores de vida? Que nosso agir seja
lutar contra o ímpeto da prescrição de modos de existir no mundo, o que nos
faz técnicos da correção e da modelagem.

Entendo que a PNH, política que tem um compromisso com esse debate,
convoca-nos a recusar o ideal de homem e a enfrentar as redes invisíveis de
subjetivação moral bem como as resistências afetivas que bloqueiam nossa
capacidade de inventar maneiras de ser antimanicomial.

Ela nos pede para jogar esse jogo e colocar nossa capacidade de explorar o
funcionamento paradoxal dessa rede em saúde construindo estratégias
provisórias, “uma política de invenção na qual se mantém vivo o aprender a
aprender, em que o saber aprendido não se separa de repetidas
problematizações....uma prática do tateio e de experimentação, composição e
recomposição incessante”.

Cotidianamente, estamos inseridos em vários setores do sistema de saúde,


desde a atenção básica até o nível terciário de atenção, passando pelo
planejamento e gestão dos serviços. Em cada um desses níveis, atuar como
aprendiz, construindo rede com outros saberes, produzindo escutas-
intervenções que alarguem os sentidos e as possibilidades de criação e
transformação do cotidiano, essa é a nossa missão na saúde pública.

Sabemos que o conceito de formação generalista está banalizado, impedindo


avanços para sentidos que possam ser mais interessantes para a formação.
Diante disso, nosso argumento central é afirmar que a formação em Psicologia
jamais foi generalista, no sentido que será construído aqui, e que ainda temos
muito trabalho a fazer para promover as articulações com os princípios do
SUS, principalmente o da integralidade.

Para isso, três pontos são considerados fundamentos para prosseguirmos:

1. Em primeiro lugar, consideramos a Psicologia como uma prática social,


ou seja, sujeita ao que, na etnometodologia chamamos de princípio da
reflexividade.
2. Em segundo lugar, o texto orienta-se por uma perspectiva pragmática,
ou seja, volta-se para os usos e efeitos das diretrizes curriculares na
formação em Psicologia e em suas articulações (ou ausência delas) com
os princípios do SUS,
3. Em terceiro, destacamos a importância das interanimações dialógicas,
isto é, além dos posicionamentos,endereçamentos etc, o texto possui
várias vozes que o compõem.

Pretende, dessa forma, fazer parte do debate que produz a implantação das
diretrizes curriculares.

287
De imediato, é importante lembrar que um dos protagonistas nessa articulação
entre o SUS e os cursos de Psicologia é o próprio Fórum Nacional de
Educação das Profissões da Área da Saúde (FNEPAS), que tem por missão
potencializar as reformas na graduação a partir da reflexão coletiva sobre as
diretrizes curriculares.

A formação produz cultura (e vice-versa). A cultura influencia a formação


profissional: ela constrói, molda e formata os sujeitos. Tal formação é
produzida, para além de outros elementos, por meio do próprio currículo e dos
processos que levam à sua organização.

A maioria das políticas curriculares oficiais não problematiza conhecimento e


cultura como campo plural de conflitos e acordos (campo de relações
dialógicas), fazendo, assim, com que a função cultural da escola fique
“submetida à lógica do mercado, da formação para habilidades e competências
cuja definição não passa por um debate social amplo”.

A reforma curricular é quase sempre percebida como simples mudança de


disciplinas comumente observada nos corredores e salas dos departamentos:
geralmente, a troca de disciplinas fica à mercê dos ditames do mercado, na
carona do conteúdo que está mais em voga no momento.

Nesse sentido, por exemplo, as dimensões do que se chama


(equivocadamente, diga-se de passagem) de clínica psicológica encontra
terreno fértil para as propostas: saem de cena os fenômenos relacionados à
tristeza, melancolia etc, e entra a depressão. Estresse, toxicomanias, síndrome
do pânico, dentre outras, fazem sucesso nas propostas de alterações
curriculares. Focada em conteúdos, as síndromes e transtornos de plantão
junto à mídia medicamentosa impulsionam as reformas, promovendo trocas de
disciplinas (ou de conteúdos das disciplinas), mercantilizando o currículo e a
formação profissional. Há uma enxurrada de novas síndromes apresentadas
diariamente.

A lógica conteudista, na maioria das vezes, caminha lado a lado com


posicionamentos pouco críticos para reformas.

Mas a compreensão de currículo como uma peça técnica não possibilita


pensarmos reformas curriculares como um processo em que se mesclam
relações de poder, redes e jogos de interesses, fruto de negociações de
sentidos e relações dialógicas entre seus variados participantes. Ora, reformas
curriculares são produções políticas e coletivas, caso contrário estaremos
vivenciando processos de privatização e de apropriação indébita de perfis
formativos. Exemplo disso: a enorme distância entre as diretrizes curriculares
para os cursos de Psicologia e as políticas públicas em geral e, em especial, as
da saúde no País.

288
Reformas curriculares não podem ser reduzidas à troca de disciplinas. Não é
trocando a disciplina de Psicologia clínica por políticas públicas em saúde que
resolveremos a questão da própria política pública em saúde.

A formação em Psicologia, no Brasil, há tempos é alvo de muitos estudos e


pesquisas. Apesar disso, desde a aprovação da resolução que estabelece o
currículo mínimo para os cursos de Psicologia, datada de 1962, nenhuma
mudança foi materializada em termos documentais.

Nesses 42 anos, muitas experiências locais e pontuais foram construídas e


vivenciadas, algumas com sucesso e outras nem tanto.

A formação em Psicologia no Brasil (marcada por encontros entre retóricas


técnico-científicas com lógicas neoliberais), desde seus primórdios, jamais foi
uma formação generalista. Ao contrário, foi, desde sempre, marcada por ser
uma formação fragmentada, reducionista, liberal, individualizante e com
especialização precoce.

as ênfases curriculares da Psicologia possuem duas raízes distintas: por um


lado, a herança da Psicologia aplicada originária da Psicologia brasileira,
marcada por uma retórica técnico-científica.

A formação em Psicologia é marcada por determinadas características, dentre


outras, a hegemonia da Psicologia aplicada (consolidando uma perspectiva
tecnicista, com especialização precoce e fragmentação da formação) e
centrada em uma perspectiva individualizante enquanto modelo de atuação.
Essa perspectiva individualizante inicia-se, num primeiro momento, na escola,
depois se expande para as fábricas e para o universo do trabalho e consolida-
se na clínica.

A outra raiz é oriunda das estratégias e lógicas neoliberais, presentificadas por


meio das chamadas habilitações no debate sobre a formação em Psicologia.

Ao final da década de 1990, essas duas raízes se encontram nos primeiros


debates e documentos das diretrizes curriculares.

Na compreensão da primeira raiz das ênfases, argumenta-se que a Psicologia


aplicada é, em grande parte, responsável pela fragmentação da formação em
Psicologia em distintas áreas (Psicologia Clínica, Psicologia Escolar, Psicologia
Organizacional etc).

Segundo Patto, na esfera da Psicologia Educacional, destaca-se (embora


possa ser estendida para outras áreas) a perspectiva individualizante e curativa
como modelo de atuação, orientada para o diagnóstico e o ajustamento dos
indivíduos.

289
Isso fica claro desde o início da área, com a fundação do primeiro laboratório
de Psicologia Aplicada à Educação no Brasil, o Pedagogium, instituído no Rio
de Janeiro, em 1890, e do laboratório da Escola Normal de São Paulo,
inaugurado em 1914. Contribuiu para isso, também, o rápido desenvolvimento
do ensino da Psicologia nos programas do ginásio nacional e das escolas
normais.

Na área da Psicologia Organizacional, a atuação dos psicologistas

(como inicialmente eram chamados os profissionais psi), sempre foi orientada


para funções de recrutamento, seleção, orientação e treinamento de pessoal
para a crescente indústria brasileira (vale lembrar a mudança na matriz
econômica no país, durante a década de 1930, de uma base agrária para
industrial) assim como para a abertura de postos públicos de trabalho.

Exemplar disso é a afirmação de Mancebo sobre o Instituto de Seleção e


Orientação Profissional (ISOP), ao argumentar que foi referencial para muitos
profissionais.

Para ela, o ISOP: Com suas práticas, difundiram a profissão, divulgaram-na,


construíram o clima necessário à regulamentação da Psicologia e imprimiram
sua marca na Lei que regulamentou a profissão de psicólogo.

A influência da Psicologia aplicada na regulamentação da profissão e na


formação é também destacada por Martins: O primeiro anteprojeto de
profissionalização foi criado pelo ISOP e pela Associação Brasileira de
Psicotécnica, dos quais Mira y López era diretor e secretário geral,
respectivamente. A presença dos psicotécnicos nos mais variados setores da
vida pública nacional acarretou a necessidade de se estabelecer algum
mecanismo que normalizasse a proliferação desses profissionais.

Em relação à clínica, o exercício clínico entre os psicólogos sempre teve seus


limites claramente estabelecidos: o psicólogo, historicamente, foi concebido
como auxiliar do médico, podendo, no máximo, exercer funções de orientação
e acompanhamento clínico. Funções ou exercícios vinculados a cargos de
direção de estabelecimentos e instituições de saúde eram exclusivos da classe
médica. Como exemplo, a disputa com a Medicina, que, no art. 11, inciso III, do
Projeto de Lei n° 3.825, de 1958, (primeiro projeto a ingressar no Congresso
Nacional visando a regulamentar a Psicologia como profissão) ao falar das
funções do psicologista, diz o seguinte:

Não poderão os licenciados de uma ou outra modalidade (da Psicologia)


responder pela organização e direção de serviços de Psicologia clínica, os
quais requerem a direção de médico devidamente capacitado; poderão,
entretanto, nesses serviços, exercer funções de assistentes técnicos.

290
Os psicólogos, dessa forma, ao encontrar brechas na legislação da época para
exercer, como profissionais liberais, a Psicologia Clínica, o fazem dando
continuidade ao modelo de atuação individualizante, hegemônico até então no
país, por meio da Psicologia Aplicada. Configura- se aí, portanto, um processo
que reduz clínica à relação dual (em determinado setting asséptico e
influenciado pelas escolas teóricas norte-americanas) e vincula-o a certas
concepções de Psicoterapia.

A clínica naturaliza-se e inicia um processo de psicologização das relações


cotidianas, a cultura psi, que terá duras conseqüências para a Psicologia (visto
seu aproveitamento pela ditadura militar), como podemos ver nos trabalhos de
Coimbra e Figueira, dentre outros.

A formação em Psicologia no Brasil é originária da Psicologia

Aplicada, que se consolidou nas três áreas tradicionalmente instituídas:

a) Psicologia Escolar,
b) Psicologia Organizacional (ou do Trabalho)
c) Psicologia Clínica.

A institucionalização desse processo está na lei n. 4.119/62, que regulamenta a


profissão do psicólogo. Ali, o art. 16 apresenta que: “As faculdades que
mantiverem cursos de psicólogo deverão organizar serviços clínicos e de
aplicação à educação e ao trabalho (...)”.

Esse processo de fragmentação da Psicologia ainda se encontra em franca


expansão. Atualmente, são inúmeras as especialidades da Psicologia.

Esse processo estabelece repercussões diretas na graduação em Psicologia,


por exemplo, os currículos recortados e “entupidos” de tantas disciplinas de
distintas áreas quanto a formação dos professores permite, disciplinas sem
nenhuma, ou pouca, proposta de articulação entre si e isoladas da proposta
político- pedagógica do curso.

Mas, ao naturalizar e cristalizar o fenômeno da Psicologia Aplicada, a retórica


técnico-científica transforma em inevitáveis as áreas de atuação que se
encontram na formação (Psicologia Clínica, Psicologia Escolar e Psicologia
Organizacional, principalmente), divisão que pode cristalizar-se e renovar-se,
atualmente, com o conceito de ênfases curriculares. A maioria dos cursos de
Psicologia no país adota, desde a implantação do currículo mínimo, a divisão
oriunda da Psicologia Aplicada.

Assim, corremos o risco de ver as reformas curriculares substituírem


“Psicologia Clínica” por “Psicologia e Processos Clínicos”; “Psicologia Escolar”
por “Psicologia e Processos Educativos” etc.

291
Reduzir as ênfases às áreas da Psicologia Aplicada é dar um passo atrás. Isso
em um duplo sentido: primeiro se estabelece o continuísmo como princípio
organizador da reforma. Aí, perguntamos: o que iremos reformar? Se o eixo
principal da reforma não se modifica... Em segundo, a diferença entre a matriz
formativa anterior e a nova é que, em boa parte dos cursos, os alunos
percorriam as três áreas distintas, configurando sua formação dessa maneira.

Com o novo modelo, o curso pode manter as distintas aplicações, e o aluno


opta por uma delas, reduzindo sua participação e vivência no processo de
formação. As ênfases podem provocar a radicalização da especialização da
formação em Psicologia já na graduação.

Em termos de formação, isso representaria o que Certeau caracteriza como o


empobrecimento da experiência, tão comum no cotidiano, ao se referir aos
limites impostos às pessoas em função de políticas neoliberais, seja no campo
do trabalho, seja no da educação.

Outra fragmentação a ser superada origina-se de uma certa lógica liberal. Diz
respeito às antigas habilitações: bacharéis, licenciados e psicólogos. A Lei nº
4.119/62 e a Resolução de 19/12/1962, que definem o currículo mínimo para os
cursos de Psicologia, são claras: existem três cursos de Psicologia:

a) bacharel,
b) licenciado
c) formação do psicólogo.

Em 1977, com o parecer n. 12/77, do antigo Conselho Federal de Educação


(contrariamente aoparecer do ano anterior, nº 1.677/ 76), os distintos cursos
são forjadamente interpretados como habilitações.

A implicação disso é que, dessa forma, possibilitava-se a criação de cursos


mais curtos e baratos por parte das universidades particulares.

O contexto de aprovação desse parecer coincide com o momento do boom das


universidades particulares no país. Vale lembrar que o número de cursos de
Psicologia durante a década de 1970, no Brasil, cresceu assustadoramente.

Além de tornar os cursos mais baratos, as distintas habilitações eram


preocupações de alguns profissionais psicólogos acadêmicos que trabalhavam
no campo da pesquisa. Dessa forma, poderiam, rapidamente, dar conta de
suprir a lacuna da pesquisa psicológica no país, por isso o bacharelado em
Psicologia ser uma habilitação com carga horária menor que em relação à
formação de psicólogos.

Atualmente, apesar de não haver mais referências diretas (com exceção de


que a licenciatura em Psicologia será remetida às diretrizes das licenciaturas),
é aqui que as duas raízes se encontram: a estratégia neoliberal (das

292
habilitações) encontra-se com a retórica da Psicologia Aplicada (fragmentação
da Psicologia) por meio das ênfases curriculares. É comum não somente
percebermos que os cursos estão provocando um certo continuísmo no perfil
formativo do psicólogo ao reeditar as áreas tradicionais, mas também
escutarmos as tentativas de construção de ênfases em pesquisa.

Aliás, o próprio documento deixa isso claro, quando relaciona como sugestão
de ênfase em primeiro lugar a “Psicologia e os processos de investigação
científica”.

Será que pesquisa é algo a ser deixado para a ênfase? Isso implica o fato de
que o psicólogo que não fizer essa ênfase não será um pesquisador? E aquele
que fizer essa ênfase não poderá ser um psicólogo, no sentido estrito do
termo? Por que ainda a manutenção dessas fragmentações?

Trata-se, portanto, da reedição da lógica das habilitações no interior das


ênfases. Os processos de pesquisa são importantes e devem estar presentes
no núcleo comum e serem estendidos para todas as ênfases.

O abandono da idéia de que formaremos um psicólogo ou um pesquisador


ainda é um dos maiores entraves nos processos de reforma curricular.
Queremos um psicólogo pesquisador e um pesquisador psicólogo
simultaneamente.

Assim, como superar essas duas fragmentações: das áreas clássicas oriundas
da Psicologia Aplicada e das habilitações oriundas da lógica liberal? Como
superá-las trabalhando com uma perspectiva que almeja uma formação
generalista?

Como trabalhar com uma formação generalista por meio das chamadas
ênfases curriculares?

Essas respostas são construções coletivas, dialógicas e de longo prazo, mas


algumas pequenas questões estão mais claras: trabalhamos com uma
concepção de formação generalista que não se reduz à área de conhecimento
ou ao campo de atuação. Também não trabalhamos com definições para
formação generalista que estabelece a possibilidade de o profissional atuar em
distintas áreas ou campos, recolhendo um pouquinho da experiência de cada
uma delas; tampouco como um profissional eclético, que conhece um pouco de
cada coisa, estabelecendo vôos panorâmicos pelas escolas psicológicas;
menos ainda aquele que fica com sua formação somente no núcleo comum...
Formação básica é outra coisa.

São muitos os sentidos produzidos para definir formação generalista. Não


pretendemos elaborar uma definição única, mas contribuir com novos sentidos
que talvez falem mais das possibilidades de a Psicologia brasileira articular-se

293
visceralmente com seus contextos e poder trabalhar a favor de um plano
civilizatório mais humano, solidário e ético.

Como afirma Eizerik: “Não é o lugar que define a postura de um profissional -


embora nem todos pensem assim - é antes a capacidade de refletir
criticamente sobre teorias, métodos e práticas, avaliando resultados e
pensando acerca das necessidades do país em que nos encontramos”.

Preferimos trabalhar no sentido de que formação generalista diga respeito ao


perfil do pensamento crítico e de levar em conta a complexidade do que
chamamos de realidade. Trata-se de uma modalidade de formação que permite
a articulação de distintos temas oriundos das áreas clássicas,
independentemente do local de atuação ou do referencial teórico utilizado pelo
profissional, mas sempre sensível ao seu contexto.

Em uma escola (campo de atuação), por exemplo, várias áreas estão


presentes e não somente a Psicologia Escolar: Psicologia Clínica, Psicologia
Organizacional ou do Trabalho, Psicologia Social, Psicologia Comunitária,
Psicologia jurídica, Psicologia do Esporte etc.

As possibilidades são infinitas. Mas podemos avançar, pois as articulações não


são entre as áreas, e, sim, entre o que deriva delas: sofrimento, processos e
relações de trabalho, relações comunitárias, familiares etc. É uma concepção
de formação generalista, portanto, que rompe com a fragmentação da
Psicologia.

É aquela que consegue dar conta da complexidade que é a articulação entre os


distintos temas ou questões que derivam de um campo ou área qualquer.

Mas, como fica isso quando tratamos da implantação de ênfases curriculares?


Podemos pensar as ênfases por meio de um processo lingüístico, o oxímoro,
que é a figura de linguagem em que se combinam palavras de sentido oposto
que parecem excluir-se mutuamente, mas que, no contexto, reforçam a
expressão, ou seja, é a junção de termos contraditórios entre si; por exemplo,
“pensar o impensável” ou “comparar o incomparável”. Assim, no campo da
formação em Psicologia, como construir uma ênfase ampla?

Na tentativa de construção de uma ênfase ampla, é necessária a ruptura com a


retórica técnico-científica e também com as demandas neoliberais. Não se
deseja mais um psicólogo pela metade, fragmentado, reduzido a concepções
psicologicistas.

O processo de adjetivação da Psicologia (Psicologia Clínica, Psicologia


Escolar, Psicologia Organizacional etc) não sustenta mais a formação na
graduação. As ênfases não podem ser reduzidas às áreas de conhecimento,
tampouco aos campos de atuação; também não podem ser reduzidas quando
de sua materialização em um estágio ou a uma ou outra disciplina.

294
Para a construção de ênfases amplas, sugerimos a construção deênfases
substantivas, por exemplo: saúde. Não se trata da Psicologia da saúde, mas
saúde enquanto substantivo.

O processo de substantivar as ênfases se dá por meio de questões centrais na


vida em sociedade; no caso do exemplo saúde, é estabelecer articulações com
os processo de saúde e adoecimento das pessoas, os processos de ensino-
aprendizagem, as novas tecnologias, as redes de atenção, as comunidades, o
consumo, a diversidade organizacional, a gestão do trabalho, o trabalho formal
e o informal, o trabalho infantil etc.

Ainda como desafios para os cursos na construção da reforma em geral e, em


especial, das ênfases, outras indagações são importantes: que demandas
focam a existência desse curso? Qual é a história da região e do curso? Que
profissional está sendo formado para essas demandas? Que perfil formativo é
o mais interessante no atendimento/transformação dessas demandas? A que
visam os cursos? Que proposta político-pedagógica está aí construída? Trata-
se de uma proposta construída coletivamente?

Enfim, que vocações (vozes, no sentido bakthiniano) compõem esse curso?


Que diferentes posições e negociações (no campo político) são engendradas
na composição dos cursos?

Vale lembrar que a palavra ênfase vem do latim emphàsis,is, e significa “força
enunciativa”; portanto, que enunciados ou vozes compõem um curso ou uma
ênfase?

Carvalho afirma que: É necessário criar mais canais de retroalimentação para


os cursos: tornar o contato entre o curso e a sociedade mais concreto e mais
direto (não depender apenas de leis, por exemplo). Acho que isso pode ser
feito de várias formas: pelo contato com condições concretas em que
psicólogos estão atuando, principalmente aquelas que, de alguma forma, fujam
às atuações convencionais e representem uma expansão nas modalidades de
atuação; pela pesquisa sobre necessidades que efetivamente poderiam ser
atendidas pelos psicólogos, e desenvolvimento de instrumentos para esse
atendimento, e até pela simples conscientização dos alunos sobre as relações
entre a profissão e a sociedade.

Dessa forma, a construção de ênfases amplas, substantivas e, portanto,


temáticas pode ser um bom caminho, um caminho que rompe com a lógica da
Psicologia aplicada e com as estratégias neoliberais. As políticas públicas, em
geral, apresentam temas que podem ser explorados nessa perspectiva. Os
princípios do SUS, por exemplo, estabelecem uma excelente oportunidade
para as rupturas que se desejam.

295
A questão central das competências é que elas podem acirrar o discurso
individualizante na Psicologia, ou seja, a noção de competências compreendida
como capacidades, habilidades ou atitudes do indivíduo aprofunda a lógica de
que os sucessos e os fracassos são de exclusiva responsabilidade do próprio
indivíduo.

Nesse sentido, na escola, a criança fica como única responsável pelo fracasso
escolar; no universo do trabalho, é o trabalhador o responsável pelo
adoecimento ou pelo acidente do trabalho; na comunidade, é o cidadão o único
responsável pela sua própria miséria; na clínica, é o sujeito o único responsável
por seu sofrimento etc. Em suma, é um conceito que naturaliza as relações
depositando no indivíduo a responsabilidade pelos acontecimentos.

No campo da formação, trata-se de um conceito que foi, diríamos,


psicologizado. Centrado no indivíduo, marcado em seu corpo (ou psiquismo),
qualifica-o ou não para um determinado saber-fazer. Retira-se, portanto, o
caráter político da formação, creditando exclusividade ao indivíduo pela
responsabilidade da formação. Esse posicionamento reforça o caráter
tecnicista marcante na formação em Psicologia. Afasta o psicólogo do campo
político, dialógico e crítico. Retira-se, dessa forma, a possibilidade de
realização de leituras que levem em conta a complexidade disso que
chamamos realidade.

Presenciamos, dessa forma, uma sobrevalorização do indivíduo que,


simultaneamente, resgata e repotencializa os ideais liberais. Uma implicação
imediata disso para a Psicologia é que os objetos que compõem a realidade
psicológica são lidos como originários de uma suposta natureza humana, nas
quais já estariam naturalmente preestabelecidos.

Podemos perder, por exemplo, a possibilidade de, no debate atual sobre


formação em Psicologia, competências e habilidades não serem
compreendidos como conceitos derivados de relações dialógicas.

Boa parte dos sentidos produzidos para designar competências deriva das
chamadas pedagogias pedagógicas. A lógica dos currículos por competência,
quando competência é reduzida às pedagogias psicológicas, possui, por
conseqüência, a permanência da lógica conteudista herdada do currículo
mínimo. Bernardes argumenta que o repertório lingüístico utilizado para o
debate sobre a formação em Psicologia modificou-se ao longo dos tempos
(principalmente após a entrada da nova LDB, em 1996), porém seus sentidos
permaneceram os mesmos, ocorrendo uma substituição na seguinte ordem:
“matérias” foram substituídas por “competências”; “disciplinas”, por
“habilidades”; “ética”, por “atitudes e condutas”; “conteúdos”, por
“conhecimentos”; ou seja, a lógica disciplinar é ainda a sustentadora das
relações de ensino-aprendizagem.

296
Segundo Machado: A organização da escola é, e continuará a ser,
marcadamente disciplinar; os professores são, e continuarão a ser, professores
de disciplinas, não havendo qualquer sentido na caracterização de um
professor de “competências”.

O desafio é claro: como podemos dar significado, de outras formas, ao que


venha a ser competência? Como produzir outros sentidos que possam tornar
complexas as relações de ensino-aprendizagem e proporcionar uma leitura
crítica da relação entre cultura e formação? Como podemos desnaturalizar
esse conceito?

Propomos que a construção do perfil formativo por meio das competências leve
em consideração uma perspectiva etnometodológica, ou seja, uma proposta de
pensar “competência” como uma relação dialógica, um processo de reflexão
compartilhado, em que várias questões estão em jogo: a compreensão dos
percursos realizados pelos alunos e alunas; a busca de intervenções
pedagógicas favoráveis à aprendizagem de todos; a compreensão da sala de
aula como um espaço dialógico; a reflexão constante sobre o cotidiano; a
realização de trabalhos coletivos e solidários; o saber e o não saber como
simultâneos e complementares; a busca da diferença em função do
enriquecimento do processo de ensino-aprendizagem; a negociação cotidiana;
a memória das instituições envolvidas e seus contextos; a possibilidade de
construção de projetos coletivos de ação em âmbito político e social, etc. A
idéia é ampliarmos o conceito para uma competência relacional ou, em outros
termos, uma competência dialógica, e não reduzi-la a uma lista de capacidades
individuais e psicológicas (habilidades), mas dar condições para a dialogia e, a
partir daí, perguntar o que, na proposta político-pedagógica do curso, podemos
avançar para garantir as condições de dialogia.

Por exemplo, ao definirmos as competências para o trabalho políticas públicas


em saúde, é importante que tais definições se dêem a partir do diálogo entre
professores, supervisores acadêmicos, alunos, representantes do curso,
supervisores locais, trabalhadores, usuários e familiares daquele campo em
especial. Não se trata mais de uma competência circunscrita a um feixe de
habilidades que o aluno possa vir a desenvolver, mas de ressignificar o próprio
sentido de competência e, por conseguinte, da formação.

Dois artigos tentam definir o núcleo comum nas diretrizes curriculares; são
eles:

Art. 6º - A identidade do curso de Psicologia, no país, é conferida através de


um núcleo comum de formação, definido por um conjunto de competências,
habilidades e conhecimentos.

297
Art. 7º - O núcleo comum da formação em Psicologia estabelece uma base
homogênea para a formação no país e uma capacitação básica para lidar com
os conteúdos da Psicologia, enquanto campo de conhecimento e de atuação.

Justificando a introdução da noção de núcleo comum nas diretrizes, a


Resolução nº 0062/2004afirma que: “A identidade do curso de Psicologia no
País, por sua vez, é garantida por um núcleo comum, que assegura uma base
homogênea para a formação e para a capacitação para apreender e lidar com
os conhecimentos da área.

O núcleo comum é definido por um conjunto de competências básicas que se


reportam a desempenhos e atuações iniciais requeridas do formando em
Psicologia e visam a garantir ao profissional o domínio de conhecimentos
psicológicos e a capacidade de utilizá-los em diferentes contextos que
demandam a investigação, análise, avaliação, prevenção e intervenção em
processos psicológicos.

A primeira questão, portanto, parece ser não reduzir núcleo comum a


conteúdos básicos. Os conteúdos básicos são parte da trajetória do aluno em
seu curso e fazem parte do núcleo, mas não se encerram nele. Talvez seja
interessante trabalhar núcleo comum como um acordo, no campo dialógico,
entre distintos cursos do país ou de uma determinada região. Ganha relevo,
assim, o campo político para a constituição da formação.

Dessa forma, temos também a possibilidade de articulações entre distintos


cursos em uma mesma região ou localidade. Esse diálogo é fundamental e
aqui há um grande espaço de trabalho entre os representantes dos cursos e
entidades como a ABEP.

d) Eixos estruturantes:

Assim como o núcleo comum, os eixos também são diferenciais das diretrizes
em relação às propostas educacionais anteriores. As diretrizes definem os
eixos estruturantes como: “Tais eixos têm por finalidade garantir a congruência
dos cursos, que devem explicitar seus pressupostos e fundamentos
epistemológicos e históricos, teórico-metodológicos, de procedimentos,
interfaces e práticas e garantir a assimilação de conhecimentos já
sedimentados no campo da Psicologia” (Parecer n° 0062/2004, p. 2).

São apresentados, a partir daí, seis eixos estruturantes:

. Fundamentos epistemológicos e históricos;

. Fundamentos teórico-metodológicos;

. Procedimentos para a investigação científica e a prática profissional;

. Fenômenos e processos psicológicos;

298
. Interfaces com campos afins do conhecimento;

. Práticas profissionais.

O trabalho com os eixos possibilita construir a estrutura e a organização


curricular, com possibilidade de escapar da lógica disciplinar. O curso pode, a
partir daí, ser pensado de várias formas, por exemplo, lógicas modulares
atravessando e sustentando toda a proposta curricular.

A idéia é que os eixos sejam transversais ao curso, estabelecendo articulações


horizontais entre os módulos ou disciplinas e articulações verticais entre o
núcleo comum e as ênfases.

3) Algumas possibilidades de articulações entre o SUS e os cursos de


Psicologia.

Esse segundo tópico problematiza algumas possibilidades (ou não) de


articulações entre os princípios do SUS e os cursos de Psicologia.

Vale lembrar que jamais (ou pouco) a formação em Psicologia orientou- se


para as políticas públicas. Ao contrário, a formação orientou-se (e ainda se
orienta) para produzir um profissional liberal e para estabelecer relações de
privatizações com os espaços públicos - vide o que ocorre em grande parte das
clínicas-escola nos cursos de Psicologia, em que, além de existirem
profissionais que pouco contato ou interesse possuem com as políticas
públicas, são isoladas dos cursos e distantes de suas propostas político-
pedagógicas.

O documento das diretrizes curriculares possui algumas potências que podem


ser bem exploradas, por exemplo, abre margens para possíveis cursos de
Psicologia com ênfases curriculares em questões derivadas de políticas
públicas. Para que isso ocorra, claro, não basta somente a inclusão de uma ou
outra disciplina na grade curricular do curso. A articulação entre a formação em
Psicologia e as políticas públicas poderia, nesse sentido, ser orgânica e
perpassar toda a proposta pedagógica dos cursos de Psicologia, estar
diretamente vinculada às próprias diretrizes curriculares. Para que isso ocorra,
não basta a mobilização entre professores e alunos, mas também entre
supervisores locais, usuários, gestores dos serviços de saúde, conselhos,
sindicatos, etc.

Uma das possibilidades de articulações, nesse momento, se dá por meio de


experiências locais, regionais, específicas e pontuais que, interligadas com
outras, construam uma rede de diálogos e ações, ampliando-se cada vez mais,
com experiências que sejam reflexivas, críticas e que possam romper com
alguns mitos relacionados à produção de conhecimento psicológico, por
exemplo, o próprio lugar da Psicologia tendo o significado de uma prática social
como qualquer outra e a problematização de seus usos e efeitos no cotidiano.

299
Uma dessas discussões pode ser pela problematização do que venha a ser a
clínica.

Em nosso entendimento, a academia está muito distante de preocupações com


essa articulação. Em contrapartida, parece que o Ministério da Saúde começou
a movimentar- se ao afirmar querer chegar à: “Construção de relações de
cooperação entre o SUS e as instituições formadoras, o que deve resultar em
melhor integração dos serviços, maior produção de conhecimento dirigida às
necessidades do sistema e, sobretudo, intensificação dos processos de
mudança na formação de graduação dos profissionais de saúde.”

Já o documento “Políticas de Formação e Desenvolvimento para o SUS:


caminhos para a educação permanente em saúde”, da Secretaria de Gestão do
Trabalho e da Educação na Saúde e do Departamento de Gestão da Educação
na Saúde, do Ministério da Saúde, propõe como metas nas mudanças dos
cursos de graduação as seguintes questões:

- Desenvolver a orientação ao Sistema Único de Saúde e a perspectiva da


multiprofissionalidade e transdisciplinaridade sob o conceito de clínica ampliada
de saúde (o trabalho em equipe e a integralidade da atenção à saúde) (grifos
nossos).

Os pontos convergentes entre uma formação generalista e o princípio da


integralidade do SUS são apresentados tomando por base o trabalho de
Mattos.

O autor, em busca de uma definição para integralidade, argumenta que esse


conceito é polissêmico, pleno de sentidos os mais diversos, sem uma definição
única, mas com uma proposta política claramente estabelecida.

Mattos traz, ao menos, um conjunto de sentidos distintos para a compreensão


do conceito de integralidade: o primeiro conjunto é oriundo do leque que vai da
Medicina integral à prática da integralidade. Esse conjunto realiza duras críticas
à fragmentação da Medicina e ao seu reducionismo biologicista. Estabelece, a
partir daí, uma perspectiva de que tanto a fragmentação quanto o reducionismo
são conseqüências da formação a que os profissionais em saúde são
submetidos.

Esse conjunto delimita a integralidade como quase exclusivamente centrada a


uma atitude do profissional da saúde, que poderia ser trabalhada no período de
formação do sujeito. É a atitude dos médicos de não reduzir o paciente ao
aparelho ou sistema biológico que, supostamente, produz o sofrimento.

Essa atitude, para esse conjunto de sentidos de integralidade, deveria ser


produzida nas escolas médicas. Ora, no caso da formação em Psicologia, a
fragmentação do saber em áreas de conhecimento autônomas e distintas
produz efeitos próximos. Os reducionismos psicologicistas, depositando no

300
indivíduo a responsabilidade por todos os acontecimentos da vida, são
pensamento corrente em nossa área, e, por fim, a crítica de que esses
problemas são originários da formação, já é lugar comum.

O segundo conjunto vem da saúde coletiva e estabelece um novo foco para


críticas: descentra a questão da formação, ou curricular, e orienta-se para as
relações de trabalho. São elas que devem ser modificadas, pois a prática
médica está calcada em um modelo liberal de atuação, e presenciamos, cada
vez mais, o assalariamento dos médicos.

Outro foco problematizado pela saúde coletiva é a crescente medicalização da


sociedade, sustentada principalmente pela racionalidade médica. Para além de
provocar o afastamento entre a saúde coletiva e a Medicina, essas questões
tornaram mais complexas o conceito de integralidade, trazendo para dentro das
práticas de saúde o foco da questão.

Em outras palavras, a fragmentação e o reducionismo não são originários


somente das escolas profissionais mas também da própria forma como se
organizam as relações de trabalho entre os profissionais.

Assim, por enquanto, o conceito de integralidade varia de uma atitude de certos


profissionais à marca da prática profissional. Mattos propõe a articulação entre
as distintas concepções, pois, para o autor, a postura dos profissionais é algo
fundamental para a integralidade, mas, em muitas situações, a integralidade só
se realizará com incorporações ou redefinições mais radicais da equipe de
saúde e de seus processos de trabalho.

Há ainda, um terceiro conjunto de sentidos para integralidade. Trata-se de


determinadas configurações de políticas específicas que tentam dar conta de
um problema de saúde em especial. Geralmente, são respostas
governamentais aos problemas de saúde. São as políticas especiais, cuja
característica principal é não reduzir os sujeitos de suas políticas a objetos
descontextualizados.

O movimento feminista foi um dos principais organizadores dessa perspectiva,


pois se recusava a reduzir as políticas de atenção à saúde da mulher a um
conjunto de órgãos ou sistemas característicos do sexo em questão.

A partir desses conjuntos, a integralidade, portanto, passa a ser não somente


uma questão de formação, mas um modo de organização do trabalho que
busca uma apreensão ampliada das relações entre saúde e doença, ou seja, a
integralidade emerge como um princípio organizador do processo de trabalho
nos serviços de saúde e da ampliação das possibilidades de apreensão das
necessidades de saúde da população.

Nesse sentido, Mattos argumenta que a relação dialógica é princípio básico


para o exercício da integralidade. Resumidamente, Mattos ao estabelecer

301
pontos comuns para os vários sentidos de integralidade, propõe pensarmos
como uma implicação a recusa à fragmentação e ao reducionismo, recusa à
objetificação dos sujeitos e uma afirmação para a abertura ao diálogo.

Ampliando a questão para a Psicologia, o que nós, psicólogos, temosa oferecer


às políticas públicas em geral e às de saúde em particular? Claro, não há
possibilidade de pensarmos as reformas curriculares de forma isolada ou
afastada das práticas dos profissionais em Psicologia da rede de saúde. Boa
parte dos locais de estágios dos cursos de Psicologia dá-se exatamente na
rede pública de saúde! Claro, a relação ainda é quase exclusivamente locatária
dos cursos em relação às instituições, mas, independentemente disso, como é
organizado o exercício de estágio com os alunos? Que possibilidades de
organização de processos articuladores de teorias e práticas existem aí? Que
compromissos são estabelecidos? Que acompanhamentos existem? Como é a
relação com os supervisores locais (quando existem) com os alunos? E essa
mesma relação coma equipe profissional da instituição? Como são os contatos
e trabalhos conjuntos com os professores e supervisores dos cursos? Os
profissionais da rede de atenção à saúde participam das reformas nos cursos?
São convidados?

Acreditamos que, pelo caminho da formação, a questão seja respondida em


parte, ou seja, recusa à fragmentação do saber psicológico, recusa ao
reducionismo psicologicista, individualizante e objetificador, ampliação das
possibilidades de modos de atuação que não somente as centradas no
profissional liberal, abertura e sensibilidade às competências e relações
dialógicas. Dessa forma, acreditamos que os sentidos de formação generalista
possam ser minimamente articulados aos princípios do SUS e, em especial, ao
de integralidade.

7 PROGRAMAS EM SAÚDE MENTAL: ATUAÇÃO EM


PROGRAMAS DE PREVENÇÃO E TRATAMENTO,
INTERVENÇÃO EM GRUPOS VIVENCIAIS E INFORMATIVOS
pesquisar

8 ÉTICA PROFISSIONAL pesquisar; é item 14 SEGER

9 EDUCAÇÃO EM SAÚDE pesquisar

10 PANEJAMENTO E PROGRAMAÇÃO, MONITORAMENTO E


AVALIAÇÃO DO PROGRAMAS DE SAÚDE pesquisar

302
11 DIAGNÓSTICO DA SITUAÇÃO DE SAÚDE NO BRASIL
pesquisar

12 ANÁLISE DOS INDICADORES DE SAÚDE NO BRASIL


pesquisar

SEGER
5 PSICOPATOLOGIA GERAL. Ver nos seguintes documentos:

6 IMPACTO DIAGNÓSTICO; PROCESSO DE ADOECIMENTO;


ENFRENTAMENTO DA DOENÇA E ADESÃO AO TRATAMENTO. Idem 5

7 PSICOSSOMÁTICA. Idem 5 e 6

8 NOÇÕES DE PSICOLOGIA SOCIAL.

No final do século XIX, iniciam-se os primeiros estudos sobre fenômenos


psicossociais – Le Bon, G. sobre “movimentos de massa” e Triplett, N. a
respeito de “desempenho grupal e em condições de isolamento”. Para Lane, S.
após a Primeira Guerra Mundial, em função da necessidade de reconstrução
das sociedades, para que se pudesse produzir mais, surgiram estudos sobre
liderança, preconceito, atitudes, comunicação, relações pessoais etc.

De acordo com Lane do início dos anos 50 até o final dos anos 60, a Psicologia
Social tradicional ou clássica – sob uma perspectiva congnitivo-comportamental
praticada, principalmente, nos EUA – chegava ao seu ápice e as temáticas
estudadas continuavam sendo as mesmas.

303
A Psicologia Social pretendia seguir o paradigma tradicional da ciência: um
saber “puro e desinteressado” politicamente, que, em sua forma clássica,
tentou compreender a relação indivíduo-sociedade, através da descrição dos
comportamentos sociais como fatos dados, ou seja, não-históricos. A partir daí
procurou entender o comportamento do indivíduo na sociedade,
fundamentalmente, através de causas internas no indivíduo.

Desse modo, uma forte crítica feita à Psicologia Social norte-americana é a de


que, apesar de reconhecer a mútua influência entre indivíduo e sociedade,
acaba por construir uma separação entre estes dois fenômenos, ao buscar as
determinações de comportamento do indivíduo “dentro” dele.

O objeto da Psicologia Social tradicional é a interação humana, que não é vista


como processo histórico por esta abordagem. Dessa maneira, este objeto
reflete uma noção estreita do social, sem levar em conta o conjunto das
produções humanas que constroem a realidade social. Os métodos utilizados
pela Psicologia Social clássica são aqueles que tentam apreender
objetivamente a realidade, e, entre eles, um dos mais utilizados é a pesquisa
experimental.

No final dos anos 60, os estudos da Psicologia Social, desenvolvida


basicamente nos EUA, não respondem mais aos graves problemas sociais de
violência, injustiça social, preconceito, individualismo, miséria etc. que
acompanham a realidade de outros países.

Assim, cai por terra a vontade dos psicólogos sociais norte-americanos de


globalizar, através de leis universais, o conhecimento produzido nos EUA e,
então, emerge a crise da Psicologia Social.

De acordo com Lane, S., é na França e na Inglaterra que se iniciam, ao final da


década de 60, críticas fortes à Psicologia Social tradicional, denunciando o seu
caráter ideológico e, portanto, mantenedor de relações sociais injustas.

A crise da Psicologia Social é denunciada no Congresso de Psicologia


Interamericana, realizado em Miami, 1976. No Congresso de 1979, no Peru,
além da assinalação da crise, discute-se a possibilidade de uma Psicologia
Social voltada para as condições próprias de cada país latino-americano. Ainda

304
neste Encontro, foi requerida a necessidade de intercâmbios entre os
psicólogos sociais de cada país.

Ainda segundo Lane, após este Congresso, um grupo de psicólogos sociais


brasileiros resolveu criar a Associação Brasileira de Psicologia Social
(ABRAPSO). Uma nova Psicologia Social passou a ter compromisso com
grupos e organizações populares.

Desse modo, psicólogos sociais brasileiros começaram a produzir


conhecimento científico com raízes na realidade brasileira e assim paravam de
“importar” teorias que não se coadunavam com a realidade social deste país,
estabelecendo uma nova visão de Psicologia Social, sob uma perspectiva
sócio-histórica.

A Psicologia Social crítica, que então iniciava sua construção, não busca mais
leis universais como a Psicologia Social tradicional, mas conhecimentos
particulares – produto da mediação indivíduo e sociedade – que, entretanto, se
estruturam em categorias universais, tais como: atividade, representação
social, consciência social, identidade social e outras. Em 1984, Silvia Lane e
Wanderley Codo deram forte impulso na sistematização da abordagem sócio-
histórica e se propuseram a estudar categorias como as referidas
anteriormente. Na década de 80 cresceu o trabalho dos psicólogos sociais
brasileiros em comunidades.

Assim, cabe à Psicologia Social crítica recuperar o indivíduo na interseção de


sua história com a história de sua sociedade. O seu objeto de estudo são as
relações sociais. Utiliza-se de vários métodos, sobretudo da pesquisa
participante.

Quando se toma uma postura crítica em Psicologia Social, verifica-se que há


uma impossibilidade em delimitar os conhecimentos em áreas estanques que
compõem as ciências humanas e sociais: Psicologia, Sociologia, Antropologia,
Economia, História etc., contribuem, sobremaneira, para a compreensão
concreta do ser humano, pois suas fronteiras são permeáveis.

Portanto, é necessária a construção de uma interzona de conhecimento que


contemple saberes que – a despeito de terem fundamentos diferentes, como

305
em algumas correntes da análise institucional, na abordagem materialista
histórico-dialética, em determinadas Escolas de Psicanálise e, em muitos
outros – possam ser articulados em um arcabouço teórico crítico.

Este é um dos desafios e, ao mesmo tempo, um dos possíveis disparadores de


novas digressões teóricas e práxis.

Como se pode perceber, estas duas correntes da Psicologia Social, a


tradicional e a crítica, constituem, com suas especificidades, a curta história
desta disciplina no Brasil. Os sentidos e os desdobramentos de ambas são,
entretanto, bastante diversos, e, neste caso, pensar sobre seus paradigmas é
um exercício não somente técnico, e sim, político, como também é toda e
qualquer ciência.

Finalmente, a aposta é a de que o psicólogo social seja agente de sua história,


e que os indivíduos e os grupos possam passar da condição de sujeitados a
sujeitos transformadores do socius. Assim, em nossa opinião, não existe
ciência social neutra. Contribuir para relações sociais democráticas é menos
um ideal a ser atingido e mais uma resultante da luta vital cotidiana que, como
bom combate, nos faz tentar alcançar a potência de vivermos de forma justa e
solidária.

10 TEORIAS E TÉCNICAS PSICOLÓGICAS. PESQUISAR

11 A VIOLÊNCIA NA INFÂNCIA, NA ADOLESCÊNCIA E NA FAMÍLIA. TJ


COMO ITEM 10

No Brasil, sabemos que são altos os níveis de incidência da violência familiar


doméstica, no entanto, não encontramos estatísticas oficiais sobre casos
notificados deste tipo de violência praticada contra crianças e adolescentes,
bem como estudos sistemáticos sobre a incidência e prevalência do fenômeno,
mas sabemos que a porcentagem de casos não notificados superam, e muito,
a dos casos notificados, devido ao complô de silêncio descrito por Azevedo.

No final da década de 90, iniciou–se um processo de articulação e mobilização


envolvendo a sociedade civil e alguns órgãos governamentais, com o intuito de
compreender e criar mecanismos para conter e prevenir a violência que, em

306
geral, começa no âmbito familiar e direciona–se contra crianças, adolescentes,
mulheres e idosos.

A partir de então, a violência contra crianças e adolescentes que ocorre no


âmbito intrafamiliar tem a cada dia sido mais exposta, tanto em seu caráter
perverso quanto na possibilidade de divulgação da mesma, devendo–se
ressaltar a importância das campanhas publicitárias brasileiras e do
aparecimento do tema na mídia (como nas telenovelas). Abordar publicamente
algo mantido em sigilo nas famílias parece propiciar a conscientização sobre as
formas de violência, abrindo a possibilidade para a denúncia e quiçá para uma
mudança na forma de lidar com a mesma. Apesar de toda essa mobilização, a
realidade é que o montante de notificações, apesar de ter aumentado no
decorrer dos anos, nem de longe expressa o real número de agressões, não
denunciadas pelo temor que encerra.

Denunciar uma situação de agressão doméstica ainda não faz parte do


imaginário coletivo, não faz parte de nossa cultura patriarcal, na qual ainda
persiste a idéia de que os pais são os melhores amigos e conselheiros, só
desejando o bem–estar dos filhos.

No final dos anos 80, com a Convenção Internacional dos Direitos Humanos,
com a Constituição Federal de 1988, e, no início de 1990, com o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) – Lei Federal nº 8069/90, a possibilidade de
articulação entre sociedade e governo na mobilização para a consciência do
direito de cidadania de crianças e adolescentes, com o intuito de protegê–los
integralmente, assumiu um caráter legal. Embora conheçamos as falhas
existentes no ECA e a dificuldade de sua implantação, essa lei possibilita um
respaldo para se denunciar e atuar.

Sabe–se que na prática, nem sempre os Conselhos Tutelares suprem as


necessidades de atendimento jurídico, médico, social e psicológico dos
agredidos e dos agressores, ora devido ao tamanho da demanda, ora pela
dificuldade de se denunciar as agressões, ora por causa do próprio despreparo
da equipe que os compõe.

307
As modalidades de violência doméstica notificadas, principalmente nos
Conselhos Tutelares, abrangem a violência física, a violência sexual, a
violência psicológica, a negligência e o abandono. Cabe notar quenão raro as
modalidades de violência apresentam–se associadas, como mostrado nas
pesquisas realizadas pelo Laboratório de Estudos da Criança (LACRI, 2000) e
pelo Centro Regional de Atenção aos Maus–Tratos na Infância do ABCD
(CRAMI, 2000).

A violência física corresponde ao emprego de força física no processo


disciplinador da criança ou adolescente, seja por meio de uma ação única ou
repetida, não acidental, cometida por um adulto que provoque conseqüências
leves ou extremas como a morte.

A violência sexual caracteriza–se "por um ato ou jogo sexual, em uma relação


hetero ou homossexual, entre um ou mais adultos e uma criança ou
adolescente, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou
adolescente, ou utilizá–la para obter uma estimulação sexual sobre sua ou
outra pessoa".

A violência psicológica, "também designada ‘tortura psicológica’, ocorre


quando o adulto constantemente deprecia a criança, bloqueia seus esforços de
auto–aceitação, causando–lhe grande sofrimento mental. Ameaças de
abandono também podem tornar uma criança medrosa e ansiosa,
representando formas de sofrimento mental".

A negligência consiste em uma omissão em termos de prover as


necessidades físicas e emocionais de uma criança ou adolescente.

O abandono, segundo Guerra caracteriza–se como a ausência de um


responsável pela criança ou adolescente, podendo ocorrer o abandono parcial
(ausência temporária dos pais expondo–a a situações de risco) e o total
(afastamento do grupo familiar, ficando as crianças sem habitação,
desamparadas, expostas a várias formas de perigo).

As diversas formas de violência ou abuso afetam a saúde mental da criança ou


adolescente, visto este se encontrar em um processo de desenvolvimento

308
psíquico e físico, produzindo efeitos danosos em seu desempenho escolar, em
sua adaptação social, em seu desenvolvimento orgânico.

Vários estudos relacionam a violência doméstica com o desenvolvimento de


transtornos de personalidade, comportamentos agressivos, dificuldades na
esfera sexual, doenças psicossomáticas, transtorno de pânico, entre outros
prejuízos.

Muitas vezes, a porta de entrada para a denúncia dos casos de violência


doméstica é o Conselho Tutelar.

12 A CLÍNICA DA TERCEIRA IDADE. TJ COMO ITEM 11

13 PSICOLOGIA E SAÚDE DO TRABALHADOR.

O trabalho é visto ora como propiciador de qualidade de vida (chegando a sua


subtração ser um fator importante no desencadeamento de quadros mórbidos e
até de mortalidade); ora como agravante da qualidade de vida, em virtude das
condições dilapidadoras que impõe ao ser humano.

O trabalhador seja sob que circunstância se encontre, mesmo que tenha vivido
sob o jugo de uma administração despótica, nunca é totalmente extirpado de
seu poder criador. Os macetes do ofício, passados de geração para geração de
trabalhadores, são uma prova disto. Através deles pode-se prever o que as
máquinas não podem antecipar. É o saber advindo do cotidiano, do concreto,
do vivido que marca a trajetória histórica da luta dos trabalhadores contra o
aniquilamento da natureza humana. É esse também o diferencial que faz com
que o trabalho mecanizado, repetitivo possa ser suportado.

309
A separação entre concepção e execução do trabalho se dá inicialmente com
os princípios formulados por Taylor, no final do século XIX e início deste
século, visando a aplicação de métodos e técnicas, designados como
“científicos”, para responder às demandas crescentes do capitalismo em
expansão, tentando com isto controlar o ritmo do trabalho, intensificando-o ao
máximo, a fim de aumentar a extração de mais-valia.

Na teoria formulada por Taylor, podemos destacar um princípio fundamental: o


uso, por parte da gerência, do conhecimento técnico para planejar e controlar a
execução do processo de trabalho. Assim, o operário dentro da ideologia
taylorista configura-se apenas como mais uma engrenagem que se soma às
máquinas, desprovido de iniciativa e totalmente afastado da concepção
humanística do trabalho. Aos administradores caberia organizar, esmiuçar,
controlar todas as fases do processo de trabalho, submetendo e subordinando
os trabalhadores.

Se encontramos na concepção taylorista a drástica separação entre concepção


e execução, vemos com o fordismo a implementação e intensificação destes
preceitos, com a introdução da linha de montagem, com esteiras rolantes e
carretilhas aéreas; divisão pormenorizada do trabalho, com a fragmentação das
funções; e a redução ao mínimo dos movimentos, intensificando com isto o
ritmo da produção.

Contudo, se por um lado o taylorismo e o fordismo representaram sérios danos


para a classe operária – através da alienação e da espoliação – ocasionaram
também o barateamento das mercadorias produzidas, a maior procura por
bens e o consequente aumento da produção, gerando também maior oferta de
empregos. Este fato configura-se como um impulso sem precedentes na
produção capitalista. Esta forma adotada pelo capitalismo propiciou também o
fortalecimento da organização dos trabalhadores (como, por exemplo, o
fortalecimento do movimento sindical), já que a concentração dos
trabalhadores nas fábricas era um facilitador deste processo. Além disso, o
taylorismo também desencadeou uma avalanche de oposição com os
sindicatos, que criticavam a destituição do conhecimento do ofício por parte
dos trabalhadores.

310
No final da década de 20, novas proposições foram sendo criadas para a
organização do trabalho contestando o modelo taylorista. A empresa
americana Western Eletric, por exemplo, já buscava a correlação existente
entre fatores psicológicos e o aumento da produtividade. É interessante
ressaltar que a introdução destes novos fatores não visava alterar a
organização do trabalho (divisão de tarefas, separação entre execução e
concepção, etc.), mas só atuava introduzindo novas modificações periféricas.
Dentro desta linha, surge a proposta de enriquecimento de cargos como uma
alternativa para o modelo taylorista, que desde esta época mostrava-se
insuficiente, pois tratava os homens como crianças e não levava em conta as
suas aspirações, fator indispensável para manutenção da satisfação com o
trabalho – o que implica em última instância no aumento da produtividade.
Noriega aponta que neste mesmo período surge a Escola de Relações
Humanas, de Elton Mayo. Esta Escola, segundo o autor, conseguiu demonstrar
que se podia constatar um aumento da produção apenas introduzindo a
possibilidade do trabalhador decidir quando fazer as pausas para o descanso.
Além disso, foi através da Escola de relações Humanas que se passou a
reconhecer a importância das relações pessoais, dos sentimentos dentro da
empresa.

Da Escola de Mayo, surgiu a proposta dos “círculos de qualidade”, na década


de 60, que é aprofundada e desenvolvida de maneira bastante forte no Japão.
Estes círculos, presente até nos dias atuais, são uma tentativa de resposta aos
erros do modelo taylorista (que dificultavam a possibilidade de tomada de
decisão e concepção do trabalho por parte do trabalhador), visto que neles
pequenos grupos de pessoas trabalham em equipes e buscam soluções
diversificadas para os problemas da produção. Segundo Noriega, a intensidade
do trabalho não foi modificada, mas sim a ideologia, pois se incute a idéia de
que o operário deve trabalhar mais e melhor porque é parte da empresa. O
autor destaca ainda que esta forma de organização do trabalho não exclui o
modelo taylorista e, pelo contrário, constantemente estão associados em um
mesmo local de trabalho. Não obstante, a perversidade desta proposta se dá
na diferenciação entre os trabalhadores mais qualificados, que podem trabalhar

311
nos círculos de qualidade, e os menos qualificados, que devem trabalhar sob o
regime taylorista.

Daniellou et alli mostram ainda que a falência do modelo de gestão


taylorista/fordista pode ser avaliado pelas suas consequências negativas:

a) para o trabalhador: ao gerar ansiedade (devido a falta de confiança nos


indicadores teóricos que os dispositivos de controle da produção fornecem
versus a sua própria experiência); tiques nervosos (oriundos das exigências do
trabalho); envelhecimento precoce (estar “velho” para executar determinada
tarefa); absenteísmo; resistência às mudanças (que são vistas, por parte dos
trabalhadores, como uma sobrecarga de trabalho, em virtude da atividade
mental suplementar que será lhes exigida);

b) para a sociedade: custos sociais que retornam à empresa sob a forma de


tributos; desemprego oriundo das dispensas por envelhecimento precoce;
custos com reconversão profissional;

c) para a empresa: baixa produtividade, baixa qualidade, absenteísmo,


rotatividade.

Em vista da insuficiência do modelo taylorista/fordista, qual seria a saída? Yves


Clot afirma que a eficácia está cada vez mais relacionada ao trabalho de
equipe (personalizado) e mais distante do sistema que calcula
pormenorizadamente as tarefas. As modificações demandadas pelo mundo do
trabalho, em resposta às lacunas deixadas pela produção sob a gerência
taylorista/fordista, incluem um novo olhar para dimensões do ser humano
esquecidas, ou mesmo extirpadas, por este modelo de gerenciamento.
Acselrad aponta que o taylorismo traz consigo essa idéia de
“dessubjetivização” do trabalho, além de ignorar, segundo Athayde, as
atividades mentais e psíquicas que são necessárias para manter a regularidade
da produção, bem como a variabilidade da atividade que descrevia.

Cocco ressalta que “os novos modelos produtivos mobilizam uma subjetividade
que se constitui antes de sua integração nos arranjos produtivos”. Neste
cenário, o que se espera é que o trabalhador seja convocado por inteiro na
oficina. O trabalhador pós-fordista tem a capacidade de adaptar-se às

312
variações quantitativas e qualitativas, é polifuncional e é capaz de conceber as
condições de execução de determinada tarefa. Cocco destaca ainda que “no
pós-fordismo, a linha de produção fala, é comunicante”, o que suscita o
entendimento de que cooperação é um fator indispensável entre os
trabalhadores (atores) no processo de trabalho.

As contribuições trazidas pela experiência italiana trouxeram conclusões


interessantes ao afirmar que: embora a gerência “científica” separasse
totalmente a concepção da execução, nenhum tipo de trabalho, por mais
embotador que fosse, pode ser desprovido de inteligência. O fato do operário
se submeter a um ritmo extenuante e repetitivo durante todo o seu dia não o
faz menos capaz de perceber os sistemas que estão ao seu redor, e mais,
partindo da sua percepção, constrói códigos e sistemas de comunicação com
outros trabalhadores, enfim, constrói um saber prático, a partir de problemas
concretos presentes no seu cotidiano. Sendo assim, mesmo sob condições
desprivilegiadas de trabalho, os operários não perderiam de vista as
implicações do processo de trabalho em relação aos possíveis agravos à sua
saúde.

A Ergonomia Situada e a Análise Ergonômica do Trabalho (AET)

A Ergonomia Situada é uma outra metodologia de investigação que segue, em


alguns pontos, a mesma orientação do modelo italiano. Ela é um instrumento
que tenta reconhecer e desvendar os aspectos mentais e psíquicos relativos ao
trabalho e à produção, preconizando que em qualquer atividade humana, por
mais controlada que seja, haverá uma operação inteligente, ou seja, todo
trabalho manual não está isento de inteligência e as tarefas envolvem sempre
um processo de pensamento.

Estas considerações introduzem a apreensão do conceito de pessoa por inteiro


e não como uma alavanca, extensão da máquina. Para Yves Clot, a mão não é
somente a mão. Não se pode separar a atividade mental da pessoa que está
colocando-a em ação. Um ponto central adotado por esta abordagem sugere
que a percepção e a fala no ambiente de trabalho vão ter um papel importante
na análise da atividade.

313
A atividade de trabalho, como objeto, para a ergonomia situada, segundo
Athayde, possui as seguintes características:

a) está em construção/reconstrução com os sujeitos envolvidos no trabalho;

b) não pode ser apreendida diretamente, mas através das representações


sociais;

c) “configura-se como um processo, e não como um objeto estabilizado”.

Esta abordagem entende também que na atividade de trabalho estão presentes


componentes como o compromisso entre as pessoas para a solução de
problemas concretos e, para isso, a inteligência estratégica do indivíduo será
utilizada. Existe um saber mobilizado para a atividade de trabalho, fruto das
trocas e intercâmbios entre as pessoas da equipe. Com esta percepção
individual, construída coletivamente no ambiente de trabalho, os indivíduos
constróem diagnoses, tem idéia dos problemas através da observação dos
sinais de alerta, e podem identificar possíveis panes no sistema.

Daniellou et alli ressaltam que os operários geralmente conseguem perceber


os sinais que precedem um acidente (através do seu conhecimento), e interferir
antes que torne-se um problema de vulto, coisa que a automatização não pode
fazer, já que as máquinas somente identificam a pane após a ocorrência.

As análises das visões ergonômicas centram-se no fato de que sempre existirá


um distanciamento entre aquele trabalho que é designado pelos técnicos e
administradores e aquele que de fato será executado. Daniellou et alli mostram
que o “trabalho prescrito” é a maneira como o trabalho deve ser executado,
incluindo tempo das tarefas, uso correto de máquinas, normas e modos
operatórios (a parte que pode ser observada de um método de trabalho:
gestos, sua ordem no tempo e no espaço). Já o “trabalho real” é aquele que de
fato é executado pelos operários.

Frequentemente ao trabalho prescrito são somadas sub-operações


complementares que partem da iniciativa dos operários. Um dos problemas
que surgem é que as normas não conseguem prever os acidentes que podem
ocorrer nas sub-operações.

314
Os distanciamentos entre trabalho prescrito e real se dão devido:

a) mau conhecimento da forma como funciona o organismo humano, inclusive


das regulações internas do sistema nervoso;

b) não reconhecimento da existência de disfunções dos sistemas técnicos e


organizacionais.

Clot aponta que existirão sempre as diferenças entre o que é prévia e


tecnicamente determinado e as ações efetivas dos operários, pois o raciocínio
muda de acordo com as situações que, por sua vez, possuem sempre variáveis
diferentes. O funcionamento normal da atividade produtiva é atípico, sendo
marcada pela variabilidade. São os operadores quem reduzem estas
variabilidades durante a produção.

Não só as condições desgastantes são fatores inegavelmente


desencadeadores de doenças, mas também o não-trabalho pode ser gerador
de enfermidades, como veremos mais adiante.

Um segundo elemento, interessante de se explorar na dialética existente na


Psicopatologia do Trabalho, revela que, mesmo sob condições desfavoráveis, o
trabalho pode produzir, de alguma forma, um certo grau de satisfação nas
pessoas, bem como pode ser propiciador do equilíbrio mental e da saúde. Para
Dejours, o trabalho inclusive pode conferir ao organismo “uma resistência maior
contra a fadiga e a doença, contra os tóxicos industriais, os vírus e as
condições climáticas”.

Na relação existente entre saúde/doença e trabalho, Dejours afirma que:

“O trabalho nem sempre aparece, como tendíamos a considerar a dez anos


nas pesquisas de Psicopatologia do Trabalho, como uma fonte de doença ou
de infelicidade; ao contrário, ele é às vezes operador de saúde e de prazer. (...)
o trabalho nunca é neutro em relação à saúde, e favorece seja a doença, seja a
saúde”.

Desta forma, podemos vislumbrar mais um elemento do trabalho: a sua não


neutralidade em relação à vida e à saúde das pessoas. E aí está, novamente, a

315
sua dialética: ao mesmo tempo em que oprime, liberta; produz saúde e doença;
é fonte de prazer e de angústia.

Considerando a magnitude do campo psíquico e a sua estreita relação com as


mais diversas doenças, é interessante incluir alguns pontos explorados pela
Psicopatologia do Trabalho, em relação ao conceito de “normalidade”, e desta
forma finalizar essa multiplicidade de aspectos que podem estar associados ao
trabalho.

Dejours comenta que o que há de novo na Psicopatologia do Trabalho é o fato


de que o não-trabalho pode engendrar sofrimento e doenças:

“O fato de não trabalhar pode desencadear uma porção de doenças.


Apressamo-nos em dizer que há uma espécie de discurso completamente
falacioso, que consiste em pensar que quando as pessoas lutam contra certos
aspectos perigosos, nocivos ao trabalho, de fato, elas só têm uma idéia: a de
não querer fazer nada. (...) A Psicopatologia do Trabalho mostra que isso não é
verdadeiro. O objetivo das pessoas não é o de não fazer nada e, geralmente,
para um psiquiatra, quando as pessoas não fazem nada e podem manter-se
num estado de inatividade total, é sinal de que estão muito doentes”.

Dentro desta lógica, Dejours assinala que o problema não está no fato de
trabalhar ou não trabalhar, mas está em “qual trabalho?”, ou seja, em quanto a
organização do trabalho (que inclui a divisão das tarefas e a divisão dos
homens) pode estar causando sofrimento e perturbações no aparelho psíquico.

Sob o ponto de vista metodológico, a Psicopatologia do Trabalho não vai


enfatizar a doença mental, mas sim a normalidade:

“não se trata mais de pesquisar, observar ou descrever as doenças mentais do


trabalho, mas de considerar que, em geral, os trabalhadores não se tornam
doentes mentais do trabalho”.

O indivíduo é capaz de reagir e de se defender das forças oriundas das


pressões do trabalho que poderiam empurrá-lo para a doença mental,
utilizando para isso as “estratégias de defesa” – individuais ou coletivas – na
busca de um bem-estar. Estas estratégias são procedimentos de regulação

316
para manter-se na normalidade e buscam explorar o sofrimento não com o
intuito de negá-lo, mas de superá-lo através da mobilização da “inteligência
astuciosa”. Em outros termos, a Psicopatologia do Trabalho não propõe
eliminar o sofrimento, mas sim transformá-lo em algo criativo. O sofrimento,
desta forma, pode ser positivo porque mobiliza para a descoberta de novas
estratégias de defesa, a fim de que o indivíduo possa manter-se na
normalidade. Daí também, a importância de levar-se em conta a trajetória do
sujeito, a sua história anterior, a sua experiência acumulada, já que estas
influenciam nas respostas dadas às diversas situações.

Os trabalhadores criam algumas estratégias para superação do sofrimento,


inclusive, a banalização do perigo; a consciência do risco pode levar a um
estado de paralisação, onde a pessoa sequer consegue cumprir as tarefas que
lhe são designadas.

A necessidade de explorar esse outro lado do trabalho, exposto pela


Psicopatologia do Trabalho, pode ser importante para não estabelecer apenas
pontos axiomáticos e inquestionáveis sobre o trabalho, a saber: como fonte de
doenças derivadas das condições degradantes. O trabalho é dialético porque
ao mesmo tempo em que pode dar prazer, pode proporcionar a dor e, não raro,
são os casos em que o seu afastamento, como nas aposentadorias, por
exemplo, desencadeiam quadros de morbidade e até de mortalidade.

O trabalho aparece de tal forma preenchendo a vida das pessoas que podemos
imaginar o quanto a sua supressão representa para elas, principalmente no
período pós-aposentadoria. Não raro são os relatos em que os idosos
descreveram que sentiam um imenso vazio em suas vidas, uma total falta de
referência em relação às suas expectativas, projetos e possibilidades após o
afastamento do trabalho.

Entretanto, o trabalho pode ser fonte de desprazer quando o elemento que


gera satisfação é excluído.

Uma nova questão aparece aqui. O trabalhar “obrigado” para sobreviver, por
necessidade. Ou seja, o elemento que garantia a sua criatividade e colocação

317
das suas habilidades e inteligência para funcionar foi excluído, a única coisa
que fazia com que permanecesse no trabalho era a questão financeira.

A hierarquia aparece também em algumas entrevistas como um outro problema


que impede ou elimina a possibilidade de exercer uma função ou trabalho
prazeroso, em virtude de terem de se submeter às ordens superiores e
afastarem-se de uma função que gostavam para uma outra que lhes causava
stress ou descontentamento.

Um outro aspecto que torna o trabalho mais satisfatório é este reconhecimento,


já apontado no depoimento acima. O fato de ter o seu trabalho reconhecido,
traz um estímulo positivo, fazendo com que a pessoa sinta-se valorizada e
consiga, com isto, ter mais prazer com o seu trabalho.

Em resumo, o prazer e o desprazer que a pessoa sente no trabalho envolve


uma série de fatores, como: estar pondo em ação as suas habilidades; poder
colocar sua inteligência em ação; a relação que mantém com a empresa; e
receber o reconhecimento, os méritos pelo seu trabalho. Todos estes pontos
podem estar diretamente relacionados com a obtenção de satisfação, de prazer
com o trabalho. Uma ressalva deve ser feita em relação ao vínculo que se
estabelece com a empresa (que não pode ser resultado de uma interação
despretensiosa e alienada), mas deve necessariamente ser fruto de uma troca,
onde os limites devem ser estabelecidos, e não serem vistos como gratidão e
benevolência por parte dos patrões.

O trabalho na pós-aposentadoria remete-nos a alguns pontos importantes,


tendo dois eixos centrais: o primeiro, diz respeito a voltar a trabalhar por
necessidade; o segundo, a voltar a trabalhar por prazer, para ocupação do
tempo livre e manutenção de uma atividade física e mental. Porém, não voltar a
trabalhar pode significar também a libertação da rotina, do desprazer, da
obrigação. O não- trabalho, neste caso, pode proporcionar o alcance de alguns
prazeres da vida (como, por exemplo, ver os netos crescerem, fazer ginástica,
assistir aos jogos de futebol, etc.) e ser uma compensação para os anos da
infância e da adolescência perdidos, forjados pelo trabalho.

4.3 O Significado da Aposentadoria

318
Um ponto inicial a ser mencionado, destacado nas entrevistas, é o fato da
aposentadoria ser por “tempo de serviço” ou por “invalidez”. A aposentadoria
por invalidez traz consigo um estereótipo de que a pessoa foi “encostada” no
INSS, não conseguiu cumprir, portanto, o seu tempo de serviço socialmente
determinado:

“Aposentei por invalidez, não foi por tempo de serviço. Há sete anos atrás, eu
comecei a sentir mal, essa é a segunda vez que eu vou operar. De lá pra cá,
eu fiquei uns tempos mal e depois eu aposentei, antes de operar eu fiquei
encostado e depois que eu operei é que eu me aposentei definitivo. Eu fui
obrigado...” (PBP, 64 anos).

Essa menção ao fato de ter se aposentado por tempo de serviço aparece


também nas duas falas seguintes. Devemos atentar também para o fato de que
a aposentadoria, comunicada de forma inesperada, parece ser um choque
para as pessoas: o afastamento do trabalho, das relações de amizade, do
mundo público.

O trabalho assume uma dimensão grande na vida das pessoas, pois ocupa boa
parte do tempo que temos disponível. A quase totalidade das horas de um dia
é destinada ao trabalho, as restantes devem ser divididas entre família, o
descanso e o lazer.

Mesmo nos casos em que a aposentadoria pode ser uma decisão da própria
pessoa, o afastamento do trabalho também é muito difícil. Todos os dias
passam a ser intermináveis fins-de-semana: a falta de rotina, a falta da
ocupação do tempo livre, de ter uma atividade de responsabilidade, que exija a
sua presença faz com que o afastamento do trabalho seja algo complicado.

Além da dificuldade do afastamento do mundo do trabalho, os entrevistados


apontaram para a desvalorização dos seus rendimentos ao se aposentarem e,
em muitos depoimentos, pode-se constatar pendências com processos na
Justiça para reavaliação das suas aposentadorias, por estarem defasadas ou
com valores abaixo do que deveriam ter.

O que fazer? O trabalho não pode ser a única resposta para ocupação do
tempo livre do qual os idosos dispõem. O trabalho, desde que fonte de prazer,

319
sem dúvida é uma alternativa interessante, mas não a única. Os idosos podem
e devem também aproveitar seus anos futuros de vida de uma maneira
prazerosa, independente, ou não, do trabalho. No Capítulo 5 veremos algumas
destas alternativas.

4.4 Trabalho e Saúde

Nas entrevistas com idosos aposentados, as associações feitas entre trabalho


e saúde foram bastante curiosas: primeiro, porque os entrevistados (quase
metade deles) relataram que não tinham nenhum problema de saúde
atualmente, portanto, não faziam nenhuma associação de doença com
trabalho, ou com as condições de trabalho. Segundo, existe um
desconhecimento da existência de doenças. Nos depoimentos, os
entrevistados mencionaram que não procuravam médico porque não sentiam
nada, logo, não estavam doentes. Em muitos discursos apareceu a frase: “se
eu for ao médico, vou descobrir alguma doença”.

Uma primeira questão: a saúde para os entrevistados é um estado subjetivo,


em outras palavras, eles associam diretamente o fato de sentirem-se bem, ao
de não serem portadores de nenhuma doença, sendo assim, sentir-se bem é
um sinônimo de estar saudável.

O fato de nunca terem ficado (ou se sentido) doentes em todos os anos de


trabalho aparece como um fator importante em suas vidas, já que não
utilizaram o auxílio-doença, nunca ficaram, como eles mesmos descrevem,
“encostados” na Previdência Social, conforme podemos ver abaixo:

Embora exista esta associação existe também um outro aspecto, que parece
ser contraditório, a banalização da doença, ela passa a ser vista como uma
coisa menor, sem importância. Vemos nestes depoimentos a frase implícita:
“de resto, não tive maiores problemas de saúde”.

Outro ponto, diz respeito a sentir uma melhoria no seu estado de saúde após
se aposentarem. Boa parte dos entrevistados, mesmo os que estavam com
problemas de saúde, como os do PASI (Programa de Atenção à Saúde do
Idoso) e os do Hospital de Cardiologia de Laranjeiras, relataram uma
constância no seu estado de saúde.

320
A saúde é representada de uma forma bastante peculiar: é o resultado do
equilíbrio (na vida passada e atual) na alimentação, nos prazeres da vida, no
descanso e na prática de exercícios. Em suma, moderação, comedimento: a
pessoa deve “se cuidar, não abusar” (PBP, 64 anos) para ter uma boa saúde.
Vejamos alguns destes depoimentos:

Em boa parte das entrevistas, o trabalho não aparece como agravante da


qualidade de vida, ou como agravante do estado de saúde. Existe uma
aceitação deste estado como inerente ao biotipo, à constituição física, às
características hereditárias e ao que poderíamos chamar de “estilo de vida”
(fumar, beber, evitar excessos de todos os tipos). A associação entre o trabalho
e as condições de vida, a qualidade de vida e a saúde não foram, na grande
maioria dos casos, feitas. Muitos entrevistados sequer lembravam das doenças
ocupacionais.

Este tipo de postura em relação as doenças de trabalho,entendendo-as como


normais, próprias de quem pertence a este universo, caracterizam também
uma postura de ser “forte” em relação ao trabalho. Boltanski (1989), menciona
que a atividade laborativa das classes populares impede que as mesmas
prestem demasiada atenção no corpo e, em geral, “esperam, antes de
consultar o médico, que a sensação da doença tenha atingido uma
necessidade tal que os impeça de fazer uso normal do corpo, como se
esperassem sempre que aquilo ‘passasse sozinho’ ” (p.152).

O medo sempre esteve presente no ambiente de trabalho; a empresa sempre


foi um ambiente estressor. O aumento do desemprego estrutural amplificou o
medo no ambiente de trabalho, tornando o trabalhador mais vulnerável e mais
fragilizado. “Na relação com o sujeito, o trabalho invade e permeia todas as
suas atividades e é determinado pela estrutura política, social e cultural,
entrando na composição de sua identidade (exemplo das telefonistas..Dejours).

A intensificação do trabalho e o aumento do sofrimento subjetivo e a


neutralização da mobilização coletiva, são dois dos quatro efeitos principais
para a mobilização do medo , segundo Dejours.

321
O medo se transforma em produtividade, pois que esta se intensifica pela fusão
dos postos de trabalho, pelas exigências dos programas de gestão e os
trabalhadores sofrem os efeitos da dominação e do controle produzidos pela
organização através da maximização dos resultados, o que se transforma de
medo em sujeição.

Excluir um cidadão do mercado de trabalho (subclasse) pode levá-lo não


apenas à privação material,mas à restrição de direitos, de segurança
socioeconômica e de auto-estima. Isso porque o desemprego não representa
um risco como qualquer outro (doença, acidente de trabalho etc.). a sua
generalização por longo tempo pode implicar, muitas vezes, a maior fragilidade
ante os demais riscos da sociedade, pois o quase pleno emprego foi uma das
principais garantias do Estado de bem-estar social.

Dessa forma, as tensões da vida moderna – como risco de demissão, estresse,


mercado competitivo e falta de tempo para o lazer – são situações que tendem
a alterar o estado emocional de grande parte das pessoas, levando-as à beira
do seu próprio limite físico e psíquico. O resultado é o desequilíbrio emocional.
Percebendo o tamanho desse problema, as empresas passaram a incorporar o
autoconhecimento, autoconsciência, empatia, auto-aceitação e intuição em
palavras de ordem, transformando os funcionários em foco das atenções.

Entretanto, a nova realidade exige também uma revisão de valores e quebra de


paradigmas. Para ajudar a promover essas mudanças comportamentais, a
consultora Teca Kuperszmit, da Tecnologia em Comunicação Avançada (TCA),
vem realizando o Programa de Desenvolvimento Individualizado para
Executivos.

...O objetivo do programa é trabalhar aspectos limitadores ou prejudiciais ao


desenvolvimento do profissional, promovendo um melhor aproveitamento de
suas capacidades intelectuais, emocionais e motoras. Segundo Teca, para
cada estado/comportamento inadequado é proposto um estado desejado, que
se torna uma meta a ser atingida pelo executivo no final do processo, que
desenvolverá sua competência social, ou seja, sua capacidade de se relacionar
bem com colegas, superiores hierárquicos e subordinados, ser cooperativo e
saber trabalhar em equipe.

322
...A consultora age como uma espécie de personal trainer comportamental,
levantando focos comportamentais e emocionais que precisam ser trabalhados
junto à empresa e ao próprio executivo. Em alguns casos, pares, subordinados
e o superior imediato são entrevistados para obtenção de referências e
acompanhamento dos resultados. "Levantamos dois ou três aspectos mais
relevantes e traçamos um plano de ação. A partir daí, orientamos o executivo
para as mudanças e adequação de alguns traços específicos, trabalhando as
limitações pessoais e profissionais de forma individualizada", afirma Teca.

..."Segundo a consultora, os problemas mais comuns são gerados pelo


despreparo dos executivos para lidar com determinadas situações. Entre eles,
destacam-se os de relacionamento em geral, principalmente entre pares,
subordinados, superiores, clientes externos e internos; dificuldades no controle
emocional, revelando sentimentos como agressividade, medo de exposição,
insegurança, passividade, entre outros; relutância no gerenciamento de
equipes, delegação, motivação, promoção e liderança; rigidez e centralização
no gerenciamento, além de bloqueios na afetividade, julgamento e pretensão,
formas de poder e vaidade intelectual.

...Dentro deste programa, as limitações são trabalhadas através da discussão


de conceitos, reestruturação e atualização de valores e crenças, exercícios
práticos e mentais. Estes instrumentos oferecem condições para melhorar a
comunicação interna e externa, como forma de obter maior retorno e satisfação
e são aplicados por meio de técnicas psicológicas, programação
neurolinguística, conceitos de expansão da consciência e autoconhecimento.
"Em alguns casos, como apoio ao trabalho que desenvolvemos, sugerimos
programas complementares, como por exemplo, de oratória ou de
treinamento", diz a consultora. Para ela, a grande vantagem desse método é o
resultado rápido, com uma duração média de três meses, dependendo da
análise e disposição de cada caso.

...Teca, que é psicóloga, psicoterapeuta e master-pratictioner em programação


neurolinguística, também desenvolve programas organizacionais como o
Programa de Comunicação e Criatividade em Vendas; Programa Intensivo de
Metas e Estratégias; Programa para o Desenvolvimento Gerencial; workshop

323
sobre Valores e Crenças; workshop sobre Criatividade e Flexibilidade, além de
seminários dirigidos a profissionais de RH, realizados de acordo com a
necessidade de cada empresa, na própria organização ou em regime de
imersão, em locais próprios para este tipo de evento.

A Revolução Industrial levou para as fábricas a força física dos trabalhadores,


proibidos de levarem suas cabeças, emoções e idéias para o lado de dentro
dos portões.

Mercado globalizado, acirramento da competitividade, avanço tecnológico que


elimina milhares de postos de trabalho. O que tem surgido é a necessidade de
se encontrar saídas para os problemas causados por esses fatores, pois tanta
mudança nas organizações levou os funcionários a deixarem a criatividade de
lado, cedendo espaço para a insegurança. Se por um lado essas mudanças
agiram como fonte de desequilíbrio interno para a maioria dos profissionais e
como fonte de incerteza para muitas empresas, Sônia Café, consultora editorial
da Editora Pensamento & Cultrix, acredita que as transformações
organizacionais acabaram por agir de forma positiva para o encontro da
espiritualidade dentro das empresas. "No Brasil, a partir dos anos 90 e após os
anos de vício e dependência de um modelo econômico inflacionário, muitas
empresas tiveram que se enxugar, e ao fazê-lo passaram pelas primeiras
iniciações na sua espiritualização: ou morreram (e a morte é uma maneira de
estar frente a frente com o transcendente), ou foram em busca de um
propósito, visão e missão que lhes apontassem um novo rumo", argumenta
Sônia.

Passadas décadas, as empresas caminharam para reestruturações profundas,


acreditando que o indivíduo funciona como um conjunto de corpo, mente e
espírito. A espiritualidade talvez seja uma nova forma de gerenciar pessoas
que está surgindo no final deste século. Este conceito, ao contrário do que se
possa imaginar, não tem nenhuma relação com qualquer tipo de atividade
religiosa. A ordem é fazer com que as pessoas descubram em si mesmas a
felicidade e a realização de atividades mais prazerosas. E Sônia explica que,
para isso, é preciso primeiro ser o que se é verdadeiramente, para estar

324
motivado a fazer o que precisa ser feito, de modo a ter o que é justo e
necessário.

Segundo Jack Hawley, autor do livro O Redespertar Espiritual no Trabalho,


cada vez mais os indivíduos serão chamados a encarar o que existe dentro
deles, sem sacerdotes, sem igrejas e cerimônias, simplesmente dentro de sua
própria natureza. Ele começará, então, a fazer perguntas tais como: qual é o
sentido de tudo, qual é o meu objetivo aqui, no trabalho, na vida; quem sou eu,
para onde isso tudo leva; meu trabalho é um benefício para quem; onde está a
paz mundial e a minha própria? "O final do século 20 está trazendo à tona a
emoção, a qualidade de vida. Viaja-se para todos os lugares. Só está faltando
viajarmos para dentro de nós mesmos", complementa Cortella. E como disse
Ken O’Donnel, diretor para a América do Sul da Brahma Kumaris, em evento
ocorrido em São Paulo, trabalhar com números e lógica pede o uso da
inteligência racional; para lidar com outras pessoas, é preciso desenvolver a
sensibilidade da inteligência emocional, e para trabalharmos com nós mesmos
é imprescindível a inteligência espiritual.

Jack Canfield, especialista em desenvolvimento do potencial humano, e


Jacqueline Miller, especialista na área de auto-estima, autores do livro Coração
no Trabalho, acreditam que a natureza e o significado de trabalho estão
passando por uma profunda evolução. "Duas forças estão ajudando a catalisar
o momento dessa evolução: o medo como motivador e a emergência de uma
espiritualidade mais pessoal. A espiritualidade indica o desejo de uma razão
maior para o trabalho do que a sobrevivência", citam eles. O medo a que se
referem os autores é o das conseqüências advindas das reestruturações
empresariais. Já a questão da espiritualidade se reflete na preocupação e no
envolvimento com o meio ambiente. "O ambiente sustenta a vida e nos dá uma
consciência e conscientização do todo", dizem Canfield e Jacqueline.

A busca pela integração do corpo, mente e espírito é a base da espiritualidade,


que pode ser expressada nas mais diversas maneiras que as empresas
encontram para melhorar o ambiente de trabalho e o desenvolvimento dos
seres humanos. Pessoas felizes trabalham mais, desgastam-se menos e
permanecem mais tempo nos seus empregos. Para Sônia, da Editora

325
Pensamento & Cultrix, produtividade tem a ver com satisfação pessoal, sentido
de propósito, agregação de valor à vida do indivíduo e à coletividade. João
Alberto Ianhez, diretor de comunicação social do Banco Fenícia, acredita que
em alguns momentos o sentido de espiritualidade pode ser deixado de lado, e
isso geralmente ocorre no momento que a pessoa começa a raciocinar, e tende
a esquecer seu lado espiritual, tomando atitudes nem sempre condizentes com
aquilo que ela realmente sente. "Espiritualidade é colocar o pensamento
positivo naquilo que você faz. Naturalmente as empresas começarão a
perceber isso, e assim irão se sobrepôr às demais. Um exemplo disso são as
organizações que, mesmo quando há cortes, procuram ajudar seus
funcionários, pois elas têm a consciência de que não podem tratar de maneira
superficial as pessoas que trabalharam com ela", completa Ianhez. Para que as
organizações se tornem espiritualizadas, diz Sônia, elas terão que funcionar
multidimensionalmente em termos de tempo e espaço e se curarem da doença
do curto-prazismo. "Ou a espiritualidade será o fator presente e transformador
da consciência humana, em termos de ética compartilhada na diversidade de
crenças e valores que os seres humanos manifestem neste planeta, ou não
haverá futuro possível", completa.

Canfield e Jacqueline citam, no livro Coração no Trabalho, alguns benefícios


que a espiritualidade pode trazer ao trabalho, como pessoas em contato com
sua fonte de criatividade, a pedra fundamental da empresa, que traz
revitalização e alegria; maior autenticidade e verdade na comunicação;
ampliação da ética e do comportamento moral, além de promover a expressão
do talento, inteligência e genialidade: talento no sentido de nossas dádivas
divinas; inteligência em termos de intelecto e intensidade de nosso brilho,
genialidade como algo que todas as pessoas possuem. "Em um local de
trabalho espiritualizado, a produtividade é alcançada através do estímulo da
expressão do Eu e do espírito", salientam. E Cortella complementa: " As
pessoas querem gostar do que fazem, querem encontrar sentido nas suas
ações, pois sentem que o tempo está passando muito rapidamente".

Cortella acredita que o fato de algumas empresas estarem demonstrando


maior preocupação com sua função social, é um dos caminhos que vão de
encontro aos princípios da espiritualidade. E a empresa se preocupa

326
oferecendo boas condições de trabalho aos seus funcionários. Programas que
enfatizam a melhoria da qualidade de vida no ambiente de trabalho, como as
atividades contra stress, uso da música, ginástica, entre outros, podem estar
relacionados à espiritualidade, alerta Sônia, desde que o que esteja em jogo
seja a ampliação da consciência humana numa autêntica melhora da qualidade
de vida. "Estaria desvinculado do sentido real de espiritualidade se o que se
almeja é exclusivamente o ganho material ou se essas experiências sejam
vistas como tendências passageiras", define. E Sônia conclui: "As pessoas
ainda estão aprendendo a seguir a própria bem-aventurança, citando a frase do
professor e escritor Joseph Campbell, ‘Siga a sua bem-aventurança’. Talvez
essa seja a tarefa das organizações durante o século 21".

14 CÓDIGO DE ÉTICA PROFISSIONAL. ITEM 9 SESA

II COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL

1 Possibilidades de intervenção na área psicossocial: planos, programas,


projetos e atividades de trabalho, psicoterapia breve, terapia de grupo.

2 Teorias da motivação.

3 Percepção, atitudes, valores e diferenças individuais.

4 Comunicação interpessoal.

5 O relacionamento interpessoal.

6 O comportamento social e o desenvolvimento de equipes – a Sociometria.

7 Teorias e técnicas de dinâmica de grupo.

8 Liderança: teorias.

9 A organização como sistema e o desenvolvimento organizacional:


pressupostos básicos, processos, técnicas.

10 Qualidade de vida no trabalho.

11 Clima organizacional.

327
12 Cultura organizacional.

13 Métodos e técnicas de pesquisa organizacional.

III GESTÃO DE PESSOAS

1 Modelos de gestão de pessoas. PESQUISAR

2 Gestão de pessoas por Competências. Conceito e tipologia de competências.


Identificação e priorização de competências. Mapeamento de perfis
profissionais por competências. Avaliação de potencial e banco de talentos. TJ
ITEM 4

3 Recrutamento e seleção de pessoal: planejamento, técnicas, avaliação e


controle de resultados. Seleção por competências. PARTE EM TJ ITEM 7

4 Análise de cargo: objetivos e métodos. PESQUISAR

5 Avaliação de perfil comportamental: teorias, métodos e técnicas.


PESQUISAR

6 Instrumentos psicológicos - testes projetivos, cognitivos, inventários


aprovados pelo Conselho Federal de Psicologia: fundamentos, aplicação,
correção, levantamento, análise, elaboração de laudos e tabelas. PARTE ESTÁ
EM TJ AALIAÇAO PSICOLOGICA ITEM 1

8 Avaliação e gestão de desempenho. Indicadores de desempenho. Avaliação


de resultados. PESQUISAR

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