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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ


CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
DEPARTAMENTO DE DIREITO

SÉRGIO DE OLIVEIRA LUCENA

O ERRO MÉDICO COMO CAUSA DE INDENIZAÇÃO: CULPA OU ERRO DE


CONDUTA

CAICÓ/RN
2017
SÉRGIO DE OLIVEIRA LUCENA

O ERRO MÉDICO COMO CAUSA DE INDENIZAÇÃO: CULPA OU ERRO DE


CONDUTA

Artigo apresentado à banca examinadora do


Curso de Graduação em Direito do CERES da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
como requisito parcial para a obtenção do
título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Fabrício Germano Alves.

CAICÓ/RN
2017
SÉRGIO DE OLIVEIRA LUCENA

O ERRO MÉDICO COMO CAUSA DE INDENIZAÇÃO: CULPA OU ERRO DE


CONDUTA

Artigo apresentado à banca examinadora


do Curso de Graduação em Direito do
CERES da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte como requisito parcial
para a obtenção do título de Bacharel em
Direito.

Aprovada em: ____/____/____

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Fabrício Germano Alves


(Orientador – UFRN)

(Examinador – UFRN)

(Examinador – UFRN)
AGRADECIMENTOS

A gratidão é um dos sentimentos mais nobres que eu cultuo. Não se resume a


expor nesta escrita as pessoas que sempre me ajudaram e estiveram ao meu lado. Mas
serão carregadas no meu coração os diletos professores, os inimagináveis amigos, os
colaboradores invisíveis, a presença constante daqueles que acreditaram no meu projeto
e a força criativa do Universo que sempre me fizeram melhor. Nestes momentos finais,
mas trata-se de uma homenagem a todos, cito o nome da minha querida esposa Renata
Hunka, da minha mãe Sônia Maria Oliveira, dos meus filhos Samuel Lucena e José
Heitor Lucena, dos professores Dimitre Soares, Rogério Lima, Oswaldo Lima e
Fabrício Alves, e dos amigos Hildebran Batista e Ana Paula Dantas. Agradecer é ser
amigo e sempre compreensivo com todos vocês.
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O ERRO MÉDICO COMO CAUSA DE INDENIZAÇÃO: CULPA OU ERRO DE


CONDUTA

Sérgio de Oliveira Lucena

RESUMO

O presente trabalho trata da responsabilidade civil do médico profissional liberal


perante o erro médico e a proteção garantida ao paciente-consumidor pelo Código de
Defesa do Consumidor. Em obediência ao tema proposto, faz-se uma abordagem inicial
sobre o Código de Defesa do Consumidor destacando seus diversos elementos e
garantias ao consumidor. Em sequência, faz-se uma explanação de como o médico
chega ao diagnóstico e as dificuldades técnicas dos testes diagnósticos em relação à
sensibilidade e especificidade, além da própria limitação da ciência humana. A partir de
então é citado um caso concreto na justiça que é analisado à luz dos conceitos
abordados. O trabalho foi desenvolvido por meio de pesquisa bibliográfica de conteúdo
extraído de livros e artigos publicados em sítios virtuais. Ao final conclui-se que diante
de inúmeras limitações da ciência, nem sempre o erro no diagnóstico, mesmo com dano
ao paciente, se deve a negligência, imprudência ou imperícia do médico, e desta forma,
não há o porquê de haver indenização.

PALAVRAVRAS-CHAVE: RESPONSABILIDADE CIVIL; MÉDICO


PROFISSIONAL LIBERAL; ERRO DE DIAGNÓSTICO.

ABSTRACT

The present work treats of the civil responsability of the professional liberal doctor
towards the medical mistake and the guaranteed protection to the pacient-consumer to
the Code of Defense of the Consumer. In obedience to the proposed theme, it is made a
initial approach about the Code of Defense of the Consumer highlightning multiple
elements e guarantees to the consumer. In sequence, it is made a explanation of how the
doctor reach the diagnosis and the tecnical dificulty of the diagnosis tests in relation to
the sensibility and specificity, further the own limitation of human science. From then
on a concrete case in the justice that is analyzed in the light of the concepts discussed is
quoted. The work was developed through bibliographical research of content extracted
from books and articles published on virtual sites. At the end, it is concluded that in the
face of numerous limitations of science, not always the error in the diagnosis, even with
damage to the patient, is due to the negligence, recklessness or imperfection of the
doctor, and thus, there is no reason for indemnity.

KEYWORDS: CIVIL RESPONSIBILITY; LIBERAL PROFESSIONAL DOCTOR;


DIAGNOSTIC ERROR.
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1 INTRODUÇÃO

As falhas decorrentes de um erro de diagnóstico realizado pelo médico podem


ocasionar grandes dissabores e, algumas vezes, nas patologias graves, agravamento do
quadro de saúde do paciente-cliente com piora do prognóstico. O diagnóstico errado por
si só, não tem necessariamente o condão de gerar o dever de reparar o dano, já que o
médico tem uma obrigação de meio, pois mesmo considerando que a relação jurídica
entre médico e cliente seja disciplinada pelo CDC, segundo o parágrafo 4º, do artigo 14,
do CDC, o profissional liberal responde pelo dano segundo responsabilidade civil
subjetiva, ou seja, deverá ser comprovada a culpa para que o paciente/consumidor tenha
direito a uma indenização.
Um possível quadro de aumento do número de demandas que envolvam a
busca pela reparação de possíveis danos causados em virtude de eventuais erros de
diagnóstico pode resultar em injusta punição aos médicos profissionais liberais, isto
porque, como já em delineado no parágrafo anterior, o médico exerce uma obrigação de
meio, o que o obriga a empregar todas as possibilidades existentes dentro de sua área de
atuação a fim de buscar um resultado.
Delimitar a responsabilidade do médico profissional liberal em relação a erros
de diagnóstico é um trabalho árduo que, por sua natureza, pode gerar consequências ao
próprio profissional, mas também ao paciente/consumidor, já que aquele, por medo de
possíveis condenações, pode se recusar a tratar determinada patologia que se mostrar
complicada e com incertezas quanto ao seu verdadeiro diagnóstico.
Assim, faz-se necessário esclarecer ao operador de Direito, limitações da
ciência, condições da natureza humana e complexidade do campo técnico que podem
levar ao erro de diagnóstico sem que haja culpa do profissional, com a finalidade de
evitar condenações injustas e possíveis recusas por parte do médico profissional liberal
em investigar patologias de difíceis diagnósticos.
O trabalho é baseado em pesquisa bibliográfica e análise de julgados,
apresentados ao longo do texto, acerca da responsabilidade dos médicos profissionais
liberais.
Desta forma, no tópico de número dois é apresentado o que seriam as relações
de consumo tuteladas pelo Código de Defesa do Consumidor, bem como conceitos
básicos como o de consumidor, fornecedor, produto e serviço. Neste último caso,
procura-se enfatizar porque o trabalho desenvolvido por médico profissional liberal se
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enquadra no conceito de serviço e porque é tutelado pelo CDC com o intuito de explicar
por que o médico profissional liberal é fornecedor, o paciente consumidor e a obrigação
do profissional um serviço.
Mais adiante, no tópico três, é abordada a responsabilidade civil no CDC, a
qual é via de regra objetiva, explicando-se a exceção quanto a responsabilidade civil dos
profissionais liberais, já que estes apenas serão responsabilizados mediante a existência
de culpa. Além disso, explica-se a aplicabilidade da responsabilidade civil mediante
culpa do médico profissional liberal, já que este no âmbito de suas atividades se obriga,
em regra, a prestar uma obrigação de meio, razão porque não poderá ser
responsabilizado por não alcançar o resultado desejado pelo paciente/consumidor.
Por sua vez, o tópico de número quatro faz-se um esboço explicativo sobre o
erro médico procurando esclarecer algumas limitações da ciência médica, condições da
natureza humana e complexidades técnicas que podem levar o médico profissional
liberal a um erro de diagnóstico, sem que haja a incidência de culpa deste profissional
para que possa ser entendido que o erro de diagnóstico não acarreta responsabilidade do
médico.
Por fim, no tópico de número cinco, é feita uma análise do caso concreto que
envolve um pedido de reparação por possíveis danos provenientes de um erro de
diagnóstico, no qual é reconhecido que não existe responsabilidade do médico em
virtude de erro de diagnóstico, pois a obrigação do médico é de meio e não de resultado
com a finalidade de exemplificar o que foi tratado ao longo dos tópicos anteriores.

2 RELAÇÃO DE CONSUMO

Relações de consumo traduzem o vínculo jurídico existente entre o fornecedor


e o consumidor. Nesta relação tem-se de um dos lados o consumidor como aquele que
adquire um produto ou serviço e, de outro, o fornecedor que entrega ao consumidor ou
permite que este utilize o objeto da relação jurídica.
No ordenamento jurídico brasileiro, as relações consumeristas estão
disciplinadas na Lei Federal nº 8.078/90, que instituiu o Código de Defesa do
Consumidor, considerado pela doutrina um “microssistema jurídico, pois insere regras
de natureza civil, administrativa, penal e processual civil” (DENSA, 2011, p. 9-10).
As relações jurídicas de consumo são sustentadas por três pilares básicos que
as caracterizam: o primeiro possui caráter subjetivo e é composto pelas partes
envolvidas na relação jurídica, consumidor e fornecedor; o segundo consiste num
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elemento objetivo, o qual recai a relação de consumo, sendo este um produto ou serviço;
já o terceiro pilar trata do fim a que se destina o objeto da relação jurídica de consumo,
o qual exige que o consumidor adquira o produto ou serviço como destinatário final.
Portanto, para que uma relação de consumo seja caraterizada e,
consequentemente, tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor é necessária a
presença destes três pilares básicos.

2.1 CONSUMIDOR

De acordo com o artigo 2°, caput, do CDC, “consumidor é toda pessoa física
ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. No que se
refere à pessoa física a lei não deixa margem à dúvida quanto ao seu enquadramento no
conceito de consumidor. Contudo, no que tange à pessoa jurídica, pode haver incerteza
se esta ocupa posição de vulnerabilidade em relação a um determinado fornecedor e,
consequentemente, se estaria abrangida pelo manto de proteção do CDC.
O conceito de consumidor definido então pelo CDC possui caráter
eminentemente econômico, isto é, considera aquela pessoa, física ou jurídica, que
adquire produtos ou contrata serviços com o intuito de atender uma necessidade pessoal,
não para inserir esse produto ou serviço em uma cadeia de produção (GRINOVER et
al., 2007, p. 28).
O conceito de consumidor definido pelo CDC está de acordo com a Teoria
Finalista, segundo a qual consumidor é aquela pessoa que retira o produto ou serviço do
mercado como destinatário final, isto é, o elemento caracterizador é a destinação final.
Contudo, no Brasil o que tem prevalecido é a ideia de que o consumidor é o destinatário
final fático e econômico. Seria fático porque retira o produto ou serviço da cadeia de
consumo, sendo o último a adquiri-lo e sem transmiti-lo a mais ninguém; econômico,
porque utiliza o produto ou serviço para consumo próprio e não o emprega em uma
cadeia de consumo para lucro, repasse ou transmissão onerosa (TARTUCE, 2012, p.
68). Deste modo, os finalistas só consideram consumidor aquela pessoa, física ou
jurídica, que adquire o produto para necessidades primárias.
Conforme a concepção dos maximalistas, para que a pessoa física ou jurídica
seja enquadrada no conceito de consumidor, basta que adquira o produto ou serviço, não
importando a destinação final fática ou econômica que será dada ao produto ou serviço.
Para pontuar as diferenças entre as duas teorias, (BESSA; MOURA, 2014, p.
82) exemplifica que uma determinada loja que comercializa automóveis, ao adquirir um
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veículo com a finalidade de transportar os seus clientes, teria nesta aquisição a proteção
legal do CDC segundo os maximalistas. Com interpretação diversa, verificando que a
destinação deste veículo faz parte da atividade econômica da referida loja, os finalistas
entendem não ser uma relação consumerista, visto que o produto, no caso a aquisição do
veículo, não se destina às necessidades primárias da empresa. Porém, ainda para os
finalistas, essa mesma pessoa jurídica estaria completamente enquadrada no conceito de
consumidor quando adquirisse um produto ou serviço para suas necessidades primárias,
como, por exemplo, quando adquirisse água para os seus funcionários.
Como é possível observar, os finalistas consideram a destinação final do
produto adquirido pela pessoa física ou pela pessoa jurídica para enquadrá-las no
conceito de consumidor e, assim, garanti-lhes a proteção do CDC. Neste limiar, se o
produto adquirido é empregado na cadeia produtiva, a esta relação não é empregada os
mecanismos de defesa do CDC, mas se é empregada para satisfazer necessidades
primárias, aí sim, garante-se o emprego das normas do CDC.
Conforme informação extraída do Manual de Direito do Consumidor (2014, p.
83), no âmbito do Superior Tribunal de Justiça adotou-se o que Cláudia Lima Marques
chamou de interpretação finalista aprofundada. Neste caso, o STJ tem entendido que
para enquadrar a pessoa física prestadora de serviços ou a pessoa jurídica como
consumidora faz-se necessário considerar sua vulnerabilidade técnica em concreto.
Ainda no que diz respeito ao conceito de consumidor, o artigo 2º, parágrafo
único, do CDC faz menção expressa à figura da coletividade de pessoas. A hipótese
considera a proteção do consumidor em abstrato, tendo como âmbito de abrangência
situações nas quais não é necessário que o consumidor firme um contrato com o
fornecedor. Neste caso, “os interesses e os direitos dos consumidores podem ser
violados sem que, necessariamente, estes integrem relação de consumo como
destinatário final”.
Para exemplificar o que seria o dano acarretado a coletividade de
consumidores, basta imaginar o caso de uma propaganda enganosa na qual é dado, total
ou parcialmente, uma ideia falsa da realidade do produto ou serviço ao consumidor.
Neste caso, mesmo que não haja aquisição do produto ou serviço, há o dano à
coletividade de consumidores (DENSA, 2011, p. 15).
Neste caso, por mais que não tenha sido firmado um contrato de consumo,
existe uma relação de consumo configurada a partir do momento em que o fornecedor
lança a propaganda do seu produto ou serviço com a finalidade de atrair consumidores.
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Portanto, o que se percebe é que o CDC considerou a possibilidade de violação


aos direitos e interesses do consumidor sem que necessariamente tenha sido firmado
contrato de consumo, bastando, para que haja aplicabilidade das penalidades previstas,
que o fornecedor cometa um ato que caracterize violação dos interesses e direitos dos
consumidores.

2.2 FORNECEDOR

O artigo 3º do CDC define o que vem a ser o fornecedor. O dispositivo


considera para tanto as pessoas físicas e jurídicas, sejam elas de direito público ou de
direito privado, “nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que
desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação,
importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de
serviços”.
O conceito de fornecedor definido pelo CDC é amplo e abrange, inclusive,
entes despersonalizados. Assim, “a leitura pura e simples desse caput já é capaz de nos
dar um panorama da extensão das pessoas enumeradas como fornecedoras. Na realidade
são todas pessoas capazes, físicas ou jurídicas, além dos entes desprovidos de
personalidade".
Com base na legislação, Roberta Densa (2011, p. 16) explica que o CDC
considerou “fornecedor todos aqueles que desenvolvem atividades tipicamente
profissionais, mediante remuneração, excluindo da relação de consumo aqueles que
eventualmente tenham colocado produto ou serviço no mercado de consumo sem o
caráter profissional”. O que define a pessoa como fornecedora é a profissionalização da
sua atividade, isto é, aquela atividade habitual que é exercida mediante remuneração.
O que se denota é que o legislador e a doutrina não conferiram maiores
detalhes ao conceito de fornecedor, se comparado ao de consumidor. Isto porque para
ser considerado fornecedor basta apenas que a pessoa física ou jurídica forneça produtos
ou serviços, de modo que esta atividade seja profissional, de acordo com o disposto
Livro II do Código Civil Brasileiro.
Assim, por ser a proteção do CDC conferida ao consumidor em virtude de sua
vulnerabilidade diante do fornecedor, não figuraria razoável que a Lei determinasse
maiores peculiaridades técnicas para conceituar e, consequentemente, acarretar maiores
de dificuldades para se enquadrar um fornecedor de produtos ou serviços como tal, caso
isto viesse a acontecer a Lei estaria dificultando o seu manto de proteção ao
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consumidor, aquele que na relação jurídica é posto em situação de desvantagem em


relação ao fornecedor sem a proteção conferida pelo Direito das Relações de Consumo.

2.3 PRODUTO E SERVIÇO

O termo produto, para fins de aplicação do CDC, encontra definição no artigo


3º, §1º, deste diploma. Conforme dispõe a legislação supramencionada, “produto é
qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial”. O campo de abrangência
alcançado pela disposição legal do artigo 3º, §1º, do CDC é amplo, levando-se a
compreender que a relação de consumo pode resultar da compra de um apartamento à
aquisição de uma simples peça de vestuário.
Quando formada a relação de consumo, há transferência da propriedade do
objeto da relação de consumo do fornecedor para o consumidor, isso diante de qualquer
bem de consumo, seja ele material ou imaterial; móvel ou imóvel (BESSA; MOURA,
2014, p. 87). Com isso, conclui-se que na relação de consumo, há transferência da
titularidade do bem para o consumidor, o qual é denominado produto,
independentemente da sua natureza.
No que concerne ao conceito de serviço, este é definido no §2º, do artigo 3º, do
CDC, segundo o qual “serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e
securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”. Trata-se de uma
atividade executada por fornecedores de serviços e que é de interesse dos consumidores
como, por exemplo, o serviço de telefonia, de televisão, energia elétrica etc.
A abrangência do CDC relacionada às atividades de natureza bancária,
financeira, de crédito e securitária, prevista no artigo 3º, §2º, do CDC, foi questionada
na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.591/DF, ajuizada pela Confederação
Nacional do Sistema Financeiro – CONSIF, que foi julgada improcedente pelo Supremo
Tribunal Federal que confirmou a constitucionalidade do dispositivo, entendendo “não
haver conflito entre o regramento do sistema financeiro e a disciplina do consumo e da
defesa do consumidor”.
Segundo o STF, o artigo 192 da Constituição Federal exige à edição de Lei
complementar apenas quanto às regras de estruturação do sistema financeiro, o que não
engloba as regras editadas pelo CDC no que se refere a instituições financeiras,
“relativos à exploração das atividades dos agentes econômicos que a integram -
operações bancárias e serviços bancários -, que podem ser definidos por lei ordinária”.
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Considerando as disposições legais do artigo 3º, §2º, do CDC sobre serviços,


entende-se que a atividade médica desenvolvida por profissionais médicos dentro de
seus consultórios particulares, trata-se de uma verdadeira prestação de serviço tutelada
pelo CDC. Assim, atos ilícitos causadores de danos, praticados pelos médicos
particulares, devem ser analisados à luz da defesa do consumidor.
Neste ínterim, o erro de diagnóstico, se considerado ato ilícito causador de
dano praticado mediante culpa, deve ser condenado conforme dispõe o artigo 14, § 4º,
do CDC, por se tratar o médico particular de profissional liberal.

3 A RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO DE DEFESA DO


CONSUMIDOR

O artigo 6º do CDC dispõe expressamente quais viriam a ser os direitos básicos


do consumidor. No inciso VI encontra-se elencado como tal, o direito à reparação
integral ao dano moral e material que, porventura, venha o fornecedor a causar ao
consumidor. Assim, o campo de abrangência da responsabilidade civil no CDC são os
danos causados em razão do produto ou do serviço, o que, nas palavras de Flávio
Tartuce (2011, p. 124) resume-se a quatro situações geradoras de responsabilidade:
vício do produto; fato do produto (defeito); vício do serviço; fato do serviço (defeito).
No que concerne à responsabilidade por danos decorrentes das relações
consumeristas, o CDC consagrou a regra da responsabilidade civil objetiva. Neste tipo
de responsabilidade não é necessário a comprovação da culpa, o que se exige é o nexo
de causalidade entre a ação ou omissão e o dano. Contudo, antes do CDC, “algumas leis
já previam a responsabilidade civil objetiva como forma de proteção da vítima e
garantia da indenização em razão da dificuldade de se fazer a prova da culpa em juízo”
(DENSA, 2011, p. 54).
O que se destaca é que a legislação consumerista consagrou a regra de que o
consumidor vítima de dano causado no âmbito das relações de consumo deve
comprovar apenas o ato ilícito praticado pelo fornecedor e o nexo de causalidade entre
ação ou omissão e o dano que lhe fora ocasionado, ficando, portanto, isento da
comprovação da culpa do fornecedor, uma vez que este será obrigado a indenizar
independentemente de culpa, consoante assim dispõe os artigos 12 e 14 do CDC.
A responsabilidade civil objetiva do fornecedor adotada pelo CDC encontra
fundamento na Teoria do Risco-Proveito. Como a própria nomenclatura revela, segundo
esta teoria, aquele que aufere vantagens da atividade danosa tem o dever de indenizar,
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mesmo que não tenha contribuído com culpa para o dano. Sérgio Cavalieri Filho (2008,
p. 137) revela que “se o proveito tem o sentido de lucro, vantagem econômica, a
responsabilidade fundada no risco-proveito ficará restrita aos comerciantes e industriais,
não sendo aplicável aos casos em que a coisa causadora do dano não é fonte de ganho”.
A passagem supra revela que a atividade comercial do fornecedor lhe aufere
vantagens econômicas em demasia, por isso, deve ser responsável pelos danos causados
a terceiros em razão de sua atividade, além disso, sugere Sérgio Cavalieri Filho (2008,
p.143) que, não fosse a Teoria do Risco-Proveito, a vítima do dano teria a incumbência
do ônus probante sobre a obtenção do proveito do fornecedor, o que ensejaria um
complexo problema de provas.
Sobre a adoção da responsabilidade objetiva do fornecedor, Flávio Tartuce
(2011, p. 116) conclui que a opção por esse tipo de responsabilidade diante do
consumidor tem o condão de facilitar a “tutela dos direitos do consumidor, em prol da
reparação integral dos danos”.
De fato, a adoção da responsabilidade civil objetiva pelo CDC se mostra de
suma importância para garantir a isonomia no seio das relações consumeristas. Isto
porque, normalmente o consumidor demonstra grande vulnerabilidade em relação ao
fornecedor de produto, seja porque desconhece as especificações técnicas do produto,
seja porque o fornecedor não entrega todos os documentos necessários para
comprovação de peculiaridades relativas à relação.
Um exemplo da vulnerabilidade do consumidor é aquele que diz respeito a
inscrições indevidas em órgãos de proteção ao crédito. Muitas vezes, o consumidor é
vítima de restrições ao crédito sem nunca ter firmado qualquer relação com o
fornecedor que o inscreveu nos órgãos de restrição, o que pode se dá por diversos
motivos, seja por fraude, por falha no serviço, por falta de comunicação entre o banco
que recebe o pagamento e o fornecedor. Diante dessa situação, percebe-se a
imprescindibilidade da adoção da responsabilidade objetiva, pois o consumidor nestes
casos não possui a mínima condição de provar que a inscrição é indevida.

3.1 RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS

Em que pese a opção pela regra da responsabilidade civil objetiva do


fornecedor, pautada na Teoria do Risco-Proveito, o legislador estabeleceu uma exceção
a qual é disciplinada no parágrafo 4º, do artigo 14, do CDC e trata da apuração da
responsabilidade civil subjetiva do profissional liberal.
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Pelo instituto da responsabilidade civil subjetiva, o causador do dano somente


tem o dever de reparação dos danos causados mediante a comprovação da sua culpa,
neste caso, sem culpa não há responsabilidade e a vítima deve enfrentar sozinha os
prejuízos suportados.
Segundo Rizzato Nunes (2007, p. 230-231), para ser caracterizado como
profissional liberal, a pessoa dever obrigatoriamente ter autonomia profissional, prestar
serviços de maneira pessoal, ter suas próprias regras pessoais de atendimento e, por
último, atuação lícita e eticamente admitida. Em vista do caráter personalíssimo dos
serviços prestados por profissionais liberais, Flávio Tartuce (2011, p. 118) esclarece que
a responsabilidade de profissionais liberais como advogados, médicos e dentistas só é
possível no âmbito das relações de consumo se comprovado a existência de culpa, “ou
seja, o seu dolo – intenção de causar prejuízo” ou a culpa, por imprudência, negligência
ou imperícia.
Como se denota, o legislador afastou dos profissionais liberais a
responsabilidade objetiva, mas é preciso considerar que as demandas que envolvam os
serviços prestados por esses profissionais não estão fora do campo de abrangência do
instituto jurídico da inversão do ônus da prova. A inversão do ônus da prova é prevista
no artigo 6º, inciso VIII, do CDC e procura proteger o consumidor, com base na sua
vulnerabilidade, utilizando-se de meios que garantam a efetiva prevenção e reparação
dos danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos. Com base no artigo 6º,
inciso VIII, do CDC, é possível, no caso concreto, observado a vulnerabilidade do
consumidor ou a verossimilhança de suas alegações, inverter o ônus da prova. Isto
acontece, pois neste caso, o consumidor é posto em extremo grau de inferioridade
quando se trata da possibilidade de produção de provas técnicas. Isto significa que, a
partir da inversão do ônus da prova, cabe ao fornecedor provar que não cometeu ato
ilícito causador do dano de reparação reclamada pelo consumidor. Portanto, o
profissional liberal somente pode ser responsabilizado caso seja devidamente
comprovada sua culpa diante do evento danoso, porém, considerando-se a
hipossuficiência do consumidor diante deste profissional, é plenamente possível que
seja decretada a inversão do ônus da prova e o profissional liberal seja instado a provar
que não contribuiu para o dano suportado pelo consumidor.
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3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO: OBRIGAÇÃO DE MEIO E DE


RESULTADO

Antes de entrar no mérito da questão da responsabilidade civil do médico, é


preciso fazer breves considerações acerca das obrigações de meio e de resultado. A
primeira trata-se de uma obrigação na qual o contratado se obriga a utilizar todos os
meios possíveis para a obtenção de um determinado resultado, porém, não pode garantir
que o resultado será atingido; ao passo que, na segunda, o profissional garante chegar ao
fim pretendido.
Em relação ao médico, pode-se exemplificar o que viria a ser uma obrigação de
meio no caso em que o paciente procura o profissional para tratar de uma doença, e
neste caso, não é possível garantir que o paciente alcançará a cura para a sua patologia,
mas que todos os tratamentos existentes para a patologia específica serão empregados.
Como se percebe, o profissional se compromete a fornecer apenas os meios, já que a
garantia da cura não está ao seu alcance.
Já no que diz respeito ao médico cirurgião plástico, este assume uma obrigação
de resultado, já que é contratado para modificar uma parte do corpo do paciente que é
previamente estabelecida. Para um melhor entendimento, basta citar o caso em que um
cirurgião plástico é contratado para executar uma cirurgia plástica no nariz de um
paciente, antes de realizar o procedimento o paciente dirá como deseja que seja o
desenho do nariz e o médico se obriga a fazer a modificação.
Assim, a diferença principal entre a obrigação de meio e a obrigação de
resultado reside na finalidade almejada em cada uma delas, onde na primeira busca-se o
comprometimento do contratado em empregar diligência necessária para um objetivo
pretendido, o qual não é garantido; e, já na segunda, o contratado se obriga a alcançar o
resultado pretendido.
Pontuar a diferença entre obrigação de meio e de resultado tem reflexo direto
no tipo de responsabilidade à qual é submetido o profissional contratado para tais
obrigações. Assim, o dano causado em virtude da contratação de obrigação de meio
gera responsabilidade civil subjetiva, ao passo que o dano decorrente de uma obrigação
de resultado gera responsabilidade objetiva.
Assim, quando um paciente procura um médico porque está doente, é
estabelecida uma obrigação de meio, onde o médico deverá empregar os meios
existentes para diagnosticar e, posteriormente, tratar a patologia. Neste caso, surge um
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interessante questionamento sobre o erro de diagnóstico ou erro de conduta causadora


de dano, podendo levar o paciente a uma piora no seu quadro clínico.
O diagnóstico é a descoberta da doença que o paciente é portador, e a partir
dele o médico tem o dever de prescrever o tratamento adequado ao paciente. Um
diagnóstico errado por si só não tem o condão de gerar o dever de reparar o dano e, por
existir entre o médico profissional liberal e o paciente uma obrigação de meio, não
existe responsabilidade de indenizar, exceto se o erro for grosseiro, ou o médico tenha
agido com culpa. Nestes casos, é necessária uma análise da atuação do médico
verificando se o mesmo empregou a cautela necessária para examinar o paciente e
chegar a uma conclusão acerca da patologia. Caso o médico tenha agido com o zelo que
se exige da classe, no sentido do emprego do conhecimento necessário, não há que falar
em perda de uma chance de um melhor prognóstico para o paciente, isso porque os
protocolos foram cumpridos pelo prestador de serviços ou, em outras palavras, em razão
de prestar uma atividade de meio, o médico só pode ser responsabilizado por um erro de
diagnóstico quando agindo com culpa deixar de empregar o zelo necessário e atuar com
negligência, imprudência ou imperícia.

4 CONCEITO DE ERRO MÉDICO PARA FINS DE RESPONSABILIZAÇÃO

Por se tratar de profissionais liberais, as relações de consumo entre os médicos


que prestam serviços em seus consultórios particulares e os clientes por eles atendidos
se enquadram perfeitamente na regra da Responsabilidade mediante comprovação de
culpa, prevista no artigo 14, §4º, do CDC.
Nos dias atuais, têm-se observado nitidamente o elevado número de demandas
judiciais indenizatórias por responsabilidade civil do médico. A responsabilidade
subjetiva exige a culpa do agente causador do dano, além do nexo causal entre o ato
lesivo e o dano ao lesado, podendo ser provocado, como visto, por imprudência,
negligência ou imperícia.
Para caracterizar o erro de diagnóstico como responsabilidade civil médica,
exige-se o entendimento do complexo campo técnico, a limitação imposta pela ciência,
a própria condição humana, bem como a ação ou omissão do próprio paciente. Isto
dificulta enormemente a apreciação judicial diante de cada caso concreto. Assim, neste
cenário de elevado número de processos contra profissionais médicos, é de fundamental
importância ao operador de Direito entender alguns conceitos da arte médica, bem como
alguns requisitos que podem levar ao chamado erro médico.
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Com base nisso, Genival Veloso da França e Júlio Cézar Meirelles Gomes
(1998, p.243-256) citam brilhantemente que “muitos dos pacientes não estão morrendo
nas mãos dos médicos, mas nas filas dos hospitais, a caminho dos ambulatórios, nos
ambientes miseráveis onde moram e na iniquidade da vida que levam”. O que se infere
das palavras dos autores é que elas vêm a denunciar um problema que foge à
responsabilidade do médico como profissional liberal e passa à esfera estatal, a quem
compete garantir condições mínimas de existência à sociedade e, consequentemente, os
meios necessários para um atendimento digno na rede pública de saúde.
Genival Veloso da França e Júlio Cézar Meirelles Gomes (1998, p.243-256),
ainda concluem que, com o aumento das demandas judicias, não é de estranhar que
esteja ocorrendo aposentadoria médica precoce, exagero nos pedidos de exames
complementares e a recusa em procedimentos de maior risco, o que contribui
decisivamente para a consolidação de uma “medicina defensiva”. Há uma nítida
perturbação emocional do médico e posição defensiva, contribuindo para uma
diminuição na assistência aos pacientes de risco, expondo-o a uma série de efeitos
secundários e consequente agravamento de sua saúde e da sociedade como um todo.
A confirmação de um diagnóstico pelo médico diante da suspeita de alguma
doença ao paciente-consumidor que o procura, se inicia pela anamnese, que é a história
das queixas e sintomas relatados pelo paciente ou algum familiar. Por questões
múltiplas, é comum o prejuízo nestas informações oriundas do paciente, seja de forma
consciente ou não, bem como o olhar clínico de cada médico ter a variabilidade natural
do ser humano. Em seguida é realizado o exame físico, ato por demais complexo,
altamente variável, e que depende de uma ampla formação e experiência de cada
médico com suas particularidades e vantagens em cada exame de um sobre o outro.
É natural, após esses procedimentos, que os médicos solicitem exames
complementares para a confirmação da hipótese diagnóstica. No entanto, para tal, são
incontrolavelmente dependentes da sensibilidade, especificidade, valor preditivo, entre
outros fatores de cada um destes exames. Estes conceitos, abordados a seguir, darão
uma real dimensão da complexidade e tecnicidade a que está sujeito o médico na
confirmação de um diagnóstico, o que o leva inúmeras vezes a erros diagnósticos sem
que haja qualquer culpa1.

1
GUIMARÃES, M. Carolina S. Exames de Laboratório: Sensibilidade, Especificidade, Valor Preditivo
Positivo. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 18(2): 117-120, Abr-Jun, 1985.
17

O “erro, derivando de uma apreciação subjetiva em um caso cientificamente


duvidoso ou com opiniões diferentes na doutrina médica, não pode causar
responsabilidade ao médico”, o que é claramente justificável, pois se nem a ciência
médica conseguiu dirimir as diversas opiniões acerca da doutrina médica que se discutir
no caso concreto, não seria razoável que o médico profissional liberal respondesse por
esta imprecisão.
Inequivocamente, falhas em diagnósticos de patologias graves, por trazer
graves consequências físicas, psicológicas e morais têm redundado, em boa parte das
vezes, em buscas por indenização por responsabilidade civil médica, sem que haja
culpa.
Consoante se infere da leitura do acórdão proferido na Apelação Cível n°
1.0024.06.025795-3/001, o posicionamento jurisprudencial do TJ/MG, no entendimento
da complexidade e das imprecisões na ciência médica, exige o erro grosseiro do
diagnóstico, tornando-o inescusável pelo profissional.
Antes de aprofundar os conceitos, importante também deixar esclarecido o
acidente imprevisível e o resultado incontrolável. Este é o decorrente de situação
incontornável, de curso inexorável, próprio da evolução da doença, quando até o
momento da ocorrência, a ciência e a competência profissional não dispõem de solução.
Já aquele é o resultado lesivo, advindo de caso fortuito ou força maior, incapaz de ser
previsto ou evitado, qualquer que seja o autor em diversas circunstâncias, conforme
relata Genival Veloso da França (1998, p. 243-256).
Continua o autor levantando uma discussão de profunda pertinência se o
médico responderia por erro de diagnóstico ou erro de conduta. Assim, pode ocorrer o
erro profissional quando a conduta médica foi correta, porém a técnica empregada não
foi a mais adequada, sendo erro imputado à limitação da profissão e da natureza
humana. O médico foi absolutamente diligente, observador da lex artis, mas que diante
de um caso de suposta complexidade, errou no diagnóstico e/ou tratamento, mas não
teve culpa. Se admitiria que o erro de diagnóstico não é culpável, desde que não tenha
sido por manifesta negligência, imprudência ou imperícia, seja examinando
inadequadamente o paciente, desprezando as regras e técnicas atuais e disponíveis,
subestimando as análises e resultados durante a emissão do diagnóstico, ou que tenha
optado por uma hipótese remota ou absurda.
Exceder-se na terapêutica ou nos meios propedêuticos constituem o que
chamam de desvio de poder, podendo levar a um dano e a inegável responsabilidade
18

profissional. Conceitua-se como dever subjetivo de cuidado, pois havia a capacidade de


previsibilidade do dano. No entanto, se optou por procedimento invasivo, mas com a
indicação correta e seguindo as regras técnicas no procedimento, mesmo sabendo do
risco do dano, e com devida autorização e total informação ao consumidor dos riscos,
não há de ser responsabilizado.
Os “testes diagnósticos” não se resumem aos exames de laboratório. A própria
anamnese, que é a informação clínica obtida da história, bem como o exame físico,
radiografias e demais exames de imagem seguem os mesmos princípios dos exames
laboratoriais quanto à sensibilidade e especificidade.
Quando o resultado do exame é negativo, mas o paciente apresenta a doença,
diz-se que o exame é falso-negativo. Deste modo, para Yan Carvalho “sensibilidade é a
capacidade de um teste diagnóstico identificar os verdadeiros positivos nos indivíduos
verdadeiramente doentes”. Assim, quando um teste é sensível, raramente deixa de
diagnosticar as pessoas que estão com a doença. Isso é de fundamental importância para
o diagnóstico de doenças tratáveis e que não podem passar despercebidas.
Já segundo as considerações de Yan Carvalho, a especificidade é a capacidade
de um teste diagnóstico identificar os verdadeiros negativos nos indivíduos
verdadeiramente sadios. Os testes com boa especificidade são importantes para afastar
doenças de difícil tratamento ou incuráveis, além de grande importância sanitária e
psicológica. Quando um paciente sadio realiza um exame e o resultado é positivo para a
doença, diz-se que se trata de um resultado falso-positivo, sendo comum nos testes
diagnósticos de baixa especificidade. O exame de alta especificidade é crucial para o
médico confirmar um diagnóstico, visto que um teste positivo o direciona à quase
certeza da doença.
Para se determinar a sensibilidade e especificidade de um exame, é utilizado
um outro exame chamado padrão-ouro que já é conhecido e utilizado amplamente, e
sendo mais preciso no diagnóstico da doença, serve de referência para a comparação.
Na prática o que ocorre é um trade-off desses parâmetros, pois um teste altamente
sensível é pouco específico e vice-versa. O teste perfeito com sensibilidade e
especificidade próximos de 100% são raros.
Outro ponto de suma importância são os valores preditivos de um teste.
Embora a sensibilidade e especificidade de um teste sejam fixas, os valores preditivos
de um teste são variáveis, pois dependem da prevalência da doença na população.
19

O valor preditivo positivo (VPP), ou taxa de precisão, ou probabilidade pós-


teste de doença, representa a proporção de doentes com resultados de teste positivo que
têm a doença. VPP = VP/VP+FP = Número de doentes positivos/ todos os resultados
positivos. (VP = Verdadeiros positivos, FP = Falsos positivos).
O valor preditivo negativo (VPN) representa a proporção de doentes do
controle com resultados de teste negativos que estão corretamente diagnosticados. VPN
= VN/VN+FN = Número de controles negativos/ todos os resultados negativos. (VN =
Verdadeiros negativos, FN = Falsos negativos).
Quanto menor a prevalência da doença, menor será o valor preditivo do
resultado positivo e maior o resultado preditivo do valor negativo. Ao se avaliar uma
doença com baixa prevalência, haverá vários falsos-positivos mesmo se tratando de um
teste bastante específico, ou seja, quanto menor for a prevalência da doença, menor será
o valor preditivo do resultado positivo e maior o resultado preditivo do resultado
negativo. Se a prevalência é alta, será verificado um maior número de resultados falsos
negativos na aplicação de teste com boa sensibilidade.
Na prática, mesmo um teste com alta sensibilidade de 99% deixaria de
confirmar a hipótese diagnóstica de um cliente dentre 100 efetivamente doentes, bem
como um teste com especificidade de 98% rotularia como doentes dois entre 100
pacientes-clientes que efetivamente não o são. A situação torna-se mais preocupante
quando se trata de doenças de baixa prevalência na população. Em um teste sorológico
de sensibilidade 99% e especificidade 96% para uma doença que tem prevalência na
população de 2% e em outra a prevalência de 15%, os valores preditivos seriam
respectivamente de 33% e 81% nas populações referidas. Portanto, na primeira
população teríamos 67 exames falsos-positivos, enquanto na segunda apenas 19% com
diagnóstico errôneo. Estes erros grosseiros não ocorrem porque os pacientes que são
encaminhados a um laboratório constituem uma população não aleatória, mas
previamente selecionado pelo médico, o que faz que a prevalência neste grupo seja bem
mais alta que a população em geral. Somente em condições de prevalência superior a
50% é que o valor de predição positivo se aproxima da sensibilidade do teste.
Para um melhor entendimento dos nossos conceitos, façamos uma avaliação de
uma patologia muito comum na prática clínica: a faringite. Trata-se de uma doença com
alta prevalência na comunidade. O exame clínico, que é a abertura da boca e a busca por
achados clínicos, tais como, vermelhidão, edema, pontos purulentos, trata-se da
primeira avaliação que o médico realiza e na maioria das vezes é o único teste (exame
20

clínico também é teste) que se baseia para tomar sua conduta em tratar ou não tratar.
Assim, numa amostra de 150 clientes quanto ao diagnóstico de faringite através de
cultura, que é considerado um teste padrão ouro, 38 estavam doentes e 112 deram
resultado negativo. Nesta mesma amostra, ao exame clínico, 102 foram considerados
positivos e 48 como negativos. Só o exame clínico seria suficiente para se chegar ao
diagnóstico? A resposta para a indagação está na Tabela 1.

Tabela 1 – Meio de Cultura


Positivo Negativo Total
Exame Positivo 8 (a) 94 (b) 102
Clínico Negativo 30 (c) 18 (d) 48
Total 38 112 150N
Fonte: Misodor.

Tabela 2 – Cálculos
Sensibilidade = a / (a+c) = 8 / 38 = 0,21 (baixa)
Especificidade = d / (b+d) = 18 / 112 = 0,16 (baixa)
Valor Preditivo (+) = a / (a+b) = 8 / 102= 0,078 (baixo)
Valor Preditivo (-) = d / (c+d) = 18 / 48= 0,38 (baixo) 0,38 (baixo)
Fonte: Misodor.

Os vários indicadores apresentados acima mostraram baixos valores, o que


indica que o exame clínico não é o recomendável para proceder ao diagnóstico de
faringite. Na prática, grande maioria dos diagnósticos de faringite se baseiam apenas no
exame clínico associado a outros exames inespecíficos como o hemograma. O paciente
se queixa de febre, dor na garganta, apresenta vermelhidão ao exame físico e
leucocitose (aumento dos leucócitos no hemograma), levando ao médico prescrever um
antibiótico ou apenas anti-inflamatório para o tratamento. Nesta situação hipotética,
suponhamos que o médico tenha colhido o meio de cultura e dias depois seja constatado
que não havia faringite. O cliente poderia julgar que houve um dano devido à
imprudência do médico ao prescrever uma medicação desnecessária, com risco de criar
uma resistência bacteriana, além do gasto financeiro com a medicação. Vale lembrar
que o meio de cultura só constata a patologia alguns dias depois, e o atraso no
diagnóstico poderia levar a um quadro mais grave, além do que não é um exame de fácil
acesso.
21

Como outro exemplo e para clarear o entendimento, numa avaliação de 120


pacientes, quanto à incidência de câncer de próstata, foram realizados os métodos de
toque retal (exame-padrão) e o laboratorial PSA. Obtiveram-se os seguintes resultados:
Tabela 3 - Toque retal.
PSA POSITIVO NEGATIVO TOTAL
POSITIVO 06 (a) 4 (b) 10
NEGATIVO 34 (c) 76 (d) 110
TOTAL 40 80 120N
Fonte: Misodor.

Tabela 4 – Cálculos.
Sensibilidade = a / (a+c) = 6 / 40 = 0,15 (baixa)
Especificidade = d / (b+d) = 76 / 80 = 0,95 (alta)
Valor Preditivo (+) = a / (a+b) = 6 / 10 = 0,60 (médio)
Valor Preditivo (-) = d / (c+d) = 76 / 110 = 0,68 (média)
Fonte: Misodor.

Este exemplo deixa bem claro que embora o exame de PSA tenha baixa
sensibilidade, a sua especificidade é elevada, o que dá a segurança ao médico de que se
o PSA for negativo, é bastante confiável de que o cliente não apresenta câncer de
próstata. Mesmo assim, 5 dentre 100 pacientes terão o resultado falso-negativo.

5 ANÁLISE DE CASO CONCRETO

Com intuito de confirmar a posição do ordenamento jurídico brasileiro a


despeito da responsabilidade do médico de atuação liberal, passa-se à análise da decisão
monocrática proferida no Agravo em Recurso Especial nº 705.832 - PR (2015/0075107-
5). No caso houve interposição do agravo em razão de decisão que negou seguimento ao
recurso especial que atacava acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Paraná.
Nas suas razões recursais, a recorrente sustentava ter razão o seu pedido de
indenização por danos morais em razão do erro de diagnóstica feito pelo médico que a
atendeu no Hospital Irmandade da Santa Casa de Londrina, após sofrer um acidente de
trânsito. Ainda em sua razões, a Recorrente sustentava que a responsabilidade civil
residia no fato de, após um exame de radiografia, o médico que a atendeu, não observou
uma lesão grave que havia em seu tornozelo.
22

No mérito, sustentou a Recorrente que, em relação a diagnósticos, a obrigação


do médico seria uma obrigação de resultado, na qual o médico se obriga a encontrar a
patologia que acomete o paciente.
Por sua vez, no mérito, o relator assentou que sua jurisprudência é firme no
sentido de que a obrigação firmada entre o médico e o paciente é de meio e que o
médico profissional liberal só possui o dever de reparar os danos quando, agindo com
culpa, causar danos ao paciente. Assim, deve-se atentar para o fato de que, por ser uma
obrigação de meio, quando se tratar o fato de erro de diagnóstico, é extremamente
necessário comprovar que o médico não empregou as técnicas e os meios disponíveis
para diagnosticar a patologia do paciente de acordo com o desenvolvimento da ciência
médica.
Além disso, asseverou o relator que consoante analisou o tribunal de origem,
não ficou comprovado substrato fático de que o médico em questão não empregou a
cautela necessária para firmar o diagnóstico da recorrente e, por outro lado, considerou
a posição do TJPR, segundo a qual restou confirmado pelo perito que se tratava de
fatura muito pequena e de difícil localização, por isso não existiu erro médico.
Consoante se infere da análise da decisão monocrática proferida no Agravo em
Recurso Especial nº 705.832 - PR (2015/0075107-5), o posicionamento adotado pelo
Ministro Relator encontra perfeita simetria com o ordenamento jurídico brasileiro, uma
vez que, considerando o acórdão proferido pelo TJPR, chegou a conclusão de que não
houve ofensa à lei federal e, tampouco, restaram evidentes elementos autorizadores para
impor ao médico em questão o dever de indenizar a recorrente.
Deste modo, verifica-se que no caso em comento houve evidente aplicabilidade
das normas do CDC referentes a responsabilidade civil dos profissionais liberais, a qual
somente persiste quando devidamente comprovado que agem com culpa.

6 CONCLUSÃO

A Lei ampara a pessoa que sofre um dano devido a um ato ilícito, e diante da
hipossuficiência do consumidor, o Código de Defesa do Consumidor estabelece a
responsabilidade objetiva como forma de garantir o direito de não ser lesado. A exceção
se faz aos profissionais liberais, dos quais se exige a comprovação da culpa para que
sejam responsabilizados pelo dano.
Conforme foi observado ao longo do trabalho, com o crescente número de
demandas judiciais que buscam reparação por possíveis danos oriundos de erro de
23

diagnóstico, não basta apenas proferir decisão judicial no sentido de condenar os


médicos profissionais liberais, mas reconhecer que há limitações da própria ciência e
dificuldades técnicas impostas à arte médica que podem levar ao erro de diagnóstico e
consequente dano sem que o profissional tenha culpa.
Portanto, é claramente necessário ao entendimento do aplicador do direito
observar que existem limitações que dificultam o diagnóstico e que devem ser levadas
em conta; que nas doenças mais graves, complexas e de menor prevalência na
sociedade, o erro é mais comum, e para tanto, o médico deve optar por mais exames e a
opinião de um segundo especialista; que é fundamental o parecer de perito para se
chegar a uma convicção da culpa ou não do médico; contribuindo assim para conduzir
um processo por indenização civil diante do erro médico de modo que sejam dadas
decisões justas no sentido de reconhecer apenas a responsabilidade dos médicos
profissionais liberais quando estes agirem por culpa na hipótese de erro grosseiro,
devidamente caracterizado por negligência, imprudência ou imperícia.
24

REFERÊNCIAS

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Consumidor. 4. ed. Brasília: Ministério da Justiça, 2014.

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do consumidor e dá outras providências.

______. Superior Tribunal de Justiça. Agravo em Recurso Especial nº 705.832 - PR


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______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade n°


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______. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Apelação Cível n° 1.0024.06.025795-


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