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cesa, em que tivemos gabinetes frágeis diante de Câmaras
fortes.
O Chile ensina-nos outra proveitosa lição: a mudan-
ça do parlamentarismo para o presidencialismo pouco al-
terou a situação política do país, cujos graves problemas
perduram até hoje. Invoquemos mais uma vez o citado
jurista, que assim resume a modificação: "passamos de
um regime de libertinagem parlamentar para outro ultra-
presidencial" . (2)
Levando em conta apenas a exi~tência da responsa-
bilidade política dos ministros perante o Legislativo, po-
demos dizer que o Uruguai possui a mais longa tradição
parlamentarista da América Latina, ainda hoje subsisten-
te, em associação com o "govêrno colegiado". Desde a se-
gunda metade do século passado, sob a vigência da Cons-
tituição de 1830 - que não era nem podia ser parlamen-
tarista - , os parlamentares passaram a interpelar e cen-
surar ministros. De 1890 a 1917, temos um período de
fortalecimento do Presidente da República. A Constitui-
ção de 1918 estabeleceu o govêrno colegiado, com a res-
ponsabilidade parlamentar dos ministros, ao passo que a
Constituição de 1934 restabeleceu a chefia de Estado uni-
pessoal, sob moldes parlamentaristas mais claros, pois con-
sagrava a dissolução das Câmaras e a responsabilidade po-
lítica do ministros perante a Assembléia Geral (Câmara
dos Representantes e Senado).
A reforma constitucional de 1951 realizou o retôrno
ao govêrno colegial mas manteve a responsabilidade polí-
tica dos ministros, embora suprimisse a dissolução da As-
sembléia Geral. Dêsse modo, o Uruguai apresenta um
dos mais complexos mecanismos políticos dos nossos dias.
O Executivo é formado pelo Conselho de Govêrno, com-
posto de 9 membros eleitos por eleição popular, enquanto
o órgão equivalente na Suíça - o Conselho Federal -
é eleito pela Assembléia Federal (Conselho Nacional e
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Conselho dos Estados). Outra diferença do tipo suíço
é a existência da oposição ou minoria no seio do Conselho
de govêrno, representada por três dos nove conselheiros.
Além disso, temos, ao lado do Conselho de Govêrno, os
ministros - desconhecidos na Suíça - , os quais são po-
liticamente responsáveis perante a Assembléia Geral (ar-
tigos 147 e 148 da Constituição) .
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Um exame da Constituição do Império revela-nos a
adoção de uma espécie de sistema misto, muito em voga
na Europa como uma fórmula de conciliação entre os
ideais democráticos e os interêsses dos monarcas recoloca-
dos nos tronos pelo princípio do legitimismo. A expressão
';govêrno misto" está empregada no sentido que lhe dava
Aristóteles, como uma forma que reunisse os princípios da
monarquia, da aristocracia e da democracia, evitando as
falhas de cada uma destas e consolidando suas respectivas'
virtudes. Foi também assim que um jurista imperial, em
comentário famoso, viu a Constituição de 1824: "O poder
soberano é confiado a um chefe único, com a participação
do elemento aristocrático e do elemento popular em certos
atos do poder". (4)
Os três princípios estavam assim configurados: o mo-
nárquico, no soberano hereditário; o democrático, na Câ-
mara temporária, a Câmara dos Deputados; o aristocrá-
tico, no Senado vitalício, espécie de Câmara dos Lordes,
em que os membros eram investidos por um processo com-
binado de eleição e nomeação. O Imperador nomeava o
senador numa lista de três nomes, formada por eleição.
O esquema da divisão dos podêres foi tomado de Ben-
jamin Constant: Poder Moderador, Legislativo, Executi-
vo e Judiciário. Só uma leve diferença de terminologia:
Benjamin Constant preferia a denominação de Poder Real
à de Poder Moderador. O Moderador e o Executivo eram
enfeixados nas mãos do Imperador. O primeiro era exer-
cido sem necessidade do referendo dos ministros, exigin-
do-se apenas o parecer do Conselho de Estado. Quanto
ao Poder Executivo, o Imperador "inviolável e sagrado"
partilhava-o com os ministros. A Constituição dizia que
o Imperador era "o chefe do Poder Executivo e o exercita
pelos seus ministros de Estado" (art. 102). Bastaria a
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união pessoal dêsses dois podêres para dar predominân-
cia ao princípio monárquico em relação aos demais --
o aristocrático e o democrático_
Sôbre essa estrutura de clara predominância do Po-
der real, as práticas e usos políticos foram, paulatinamen-
te, erguendo uma fachada de linhas parlamentaristas, por
vêzes em visível desarmonia com a arquitetura do texto
constitucional. Se algumas normas da Constituição pa-
reciam possibilitar uma evolução des~a ordem, outras re-
presentavam um estôrvo à adoção do govêrno de gabinete.
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colhendo-os em cada lista tríplice. Ao Imperador cabia
ainda convocar extraordinàriamente a Assembléia Geral
(Câmara dos Deputados e Senado), prorrogar ou adiar os
seus trabalhos, e dissolver a Câmara dos Deputados "nos
casos em que o exigir a salvação do Estado". Essa últi-
ma faculdade era, pois, excepcional - verdadeiro poder
de emergência - , mas perdeu êsse caráter, uma vez que
o monarca era o único juiz da existência ou não do mo-
tivo de "salvação do Estado". O Imperador também era
competente para conceder anistia "em caso urgente, e que
assim aconselhem a humanidade e bem do Estado" .
Em relação ao Judiciário, o Imperador nomeava os
juízes de direito, que eram vitalícios ("perpétuos" é o têr-
mo usado pela Constituição), mas podiam ser removidos
e até suspensos pelo Imperador. Êste dispunha também
do direito de graça.
Mas o maior obstáculo ao sistema parlamentar en-
contrava-se no dispositivo que conferia ao Poder Mode-
rador a prerrogativa de nomear e demitir livremente os
ministros de Estado (art. 101, n.o 6). Êsse item da Cons-
tituição foi dos mais invocados no Império, tanto pelos
defensores das atribuições monárquicas como pelos críti-
cos liberais, cujas propostas de reformas VIsavam princi-
palmente a retirar essa competência das mãos do Impera-
dor. É óbvio que, tomada no rigor da expressão, a liber-
dade de o monarca nomear e destituir os ministros afas-
taria a responsabilidade política dêstes perante o parla-
mento.
Outro artigo, o 126, fornecia pelo menos um argu-
mento literal para a tese de que o Imperador não só rei-
nava mas governava. De fato, aí se usa a palavra "go-
vernar" no seguinte contexto: "Se o Imperador, por causa
física ou moral, evidentemente reconhecida pela plurali-
dade de cada uma das câmaras da assembléia, se impos-
sibilitar para governar, em seu lugar governará, como re-
gente, o Príncipe Imperial, se fôr maior de 18 anos."
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DISPOSITIVOS FAVORÁVEIS A UM ENSAIO DE PARLAMENTARISMO
AS PRÁTICAS PARLAMENTARISTAS
A EXPERttNCIA DO REINADO
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NÃO EXISTIU PARLAMENTARISMO
A MENTIRA ELEITORAL
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