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A guerra dos opostos, entre as margens de um rio, reside na fluidez inexorável das suas
águas em contraponto às margens – aparentemente – estáticas, mas também na oposição
entre a história oficial, cartográfica e documentada, e as memórias que as pessoas
guardam, envoltas em atmosferas ficcionais, narrativas afetivas e contos fantásticos.
História movente, também em reconstrução ininterrupta.
Essa exposição pretende, assim, ser uma devolução para o público de parte do material
recolhido nessas incursões; propõe, sobretudo, uma reflexão sobre como constituir
narrativas a partir de um referente que desliza e não se deixa apreender de forma
objetiva. Trata-se de um ensaio tateante, que busca dar contornos ao seu objeto, ciente
de que a imprecisão é a regra, posto que o rio segue se transformando à medida que se
revela apenas parcialmente.
Com os amadores fotografando cada vez mais, e utilizando diversas ferramentas que
incrementam esteticamente suas imagens, a capacidade que a imagem tem de criar
mundos paralelos à realidade, mais do que simplesmente certificar a existência do
visível, tem ficado cada vez mais notória para o grande público. Essa massificação da
fotografia seria, portanto, uma das responsáveis por legitimar, enfim, as teorias que
sinalizavam para o poder de ficcionalização da fotografia.
Essa percepção levou o fotojornalismo a uma crise ainda insolúvel. O coletivo Garapa é
formado por três fotógrafos egressos de redações de jornais e revistas. Ao se juntarem e
criarem um núcleo de produção de trabalhos em plataformas multimídia, incorporaram
também uma atitude interdisciplinar ao pensar a elaboração de suas reportagens,
documentários e trabalhos autorais, inclusive cruzando todas essas classificações e
embaralhando as noções entre trabalho comercial, autoral, conceitual, jornalístico e
artístico.
Essa atitude libertária baliza as ações que levaram à pesquisa e produção do projeto “A
Margem”, assim como já havia ocorrido nos bem-sucedidos projetos “Mulheres
Centrais” e “Morar”. Modalidades renovadas de narrativas surgem a partir da expertise
do fotojornalismo que agora é pensada à luz de pesquisas bem alinhadas sobre arte
contemporânea, noções de antropologia visual, referências à história da arte, um olho
aguçado a perceber as mudanças comportamentais da sociedade e uma atualização
constante sobre as tecnologias multimídia que, mais que ferramentas, potencializam
conceitualmente os cruzamentos entre as tantas áreas de interesse do coletivo.
Alinhar tantas questões é exercício de muitos embates. Esse é o dilema diário, fruto de
longas discussões do coletivo, mas também a razão de existência dele. Afinal, o grupo
deve saber como incorporar as dissonâncias tantas que correm nesse rio, sabendo que as
margens que o contêm devem reconstituir a experiência dessa viagem pelas águas da
representação de forma intensa para os novos viajantes que agora se aventuram pelos
seus próprios rios. Afinal, há sempre um novo rio a nossa espera.
Eder Chiodetto