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O DIREITO MODERNO

teleológica estava a abandonar o formalismo, a incorporar a realidade da


vida no seu campo de estudo.
A importância de Jhering foi muito grande864, nomeadamente no plano
dogmático, ao introduzir a noção de interpretação teleológica865, ou seja, de
uma interpretação (das normas e dos negócios jurídicos) de acordo com as
finalidades que a norma visava prosseguir no sentido de uma ponderação
adequada dos interesses em presença. No entanto, contrariamente ao que
se poderia inferir desta ideia de uma organização espontânea e objetiva
das finalidades sociais, Jhering nunca negou ao Estado o papel de árbitro
dos conflitos de interesses; e, por isso, o monopólio da edição do direito.
Isto explica-se, porventura, tanto pelo impacto do imaginário do Estado
numa Alemanha que acabava de se unificar, como pelo papel que tanto o
pensamento organicista como o pensamento hegeliano tinham atribuído
ao Estado. O primeiro encarando-o como corporização da sociedade e
garante da sua solidariedade (cf., infra, 7.5.4), o segundo vendo no Estado
a síntese que racionalizava as contradições sociais. Daí que o principal
legado dogmático desta escola se situe, como se disse, no plano da teoria
da interpretação (da lei do Estado), não no da teoria das fontes do direito.
Mais tarde – sobretudo após a sua reelaboração por Phillip Heck (1858-
-1943)866 –, esta linha metodológica vem a desembocar em duas correntes
de ambição diferente. Por um lado, numa corrente que se propõe desamar-
rar o direito do Estado da exegese legislativa, procurando-o diretamente
na própria vida – a Escola do Direito Livre (Freie Rechtschule). Por outro,
numa corrente cujas propostas se situam apenas no domínio da teoria da
interpretação – a “jurisprudência dos interesses” (Interessenjurisprudenz)
que desenvolverá a crítica de Jhering à “jurisprudência dos conceitos”
(Begriffsjurisprudenz), típica do formalismo da pandectística.

7.5.2. A Escola do Direito Livre


A Escola do Direito Livre constitui um movimento de contestação mais
radical do formalismo, em nome da atribuição ao juiz de uma maior capa-
cidade de conformação do direito, com base na sua leitura da justiça

864
 Sobre Jhering, v., por todos, Wieacker, 1993, 514-518; Kaufmann, 1994, 144.
865
 De telos (em grego, finalidade).
866
 Gesetzauslegung und Interessenjurisprudenz [Interpretação da lei e jurisprudência dos in-
teresses], 1914; Begriffsjurisprudenz und Interessenjurisprudenz [Jurisprudência dos conceitos e
jurisprudência dos interesses], 1932; sobre ele, Kaufmann, 1994, 145 ss.

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A CULTURA JURÍDICA EUROPEIA

concreta do caso. Na sua origem está a constatação, feita por um jurista


prático – Ernst Fuchs, 1859-1929, Die gemeinschädlichkeit der konstruktiven
Jurisprudenz (O caráter socialmente danoso da jurisprudência constru-
tiva), 1907 –, de que o juiz, no processo de achamento da solução jurídica,
partia sempre do seu sentido de justiça (Rechtsgefühl) e não dos dados da
lei e de considerações de lógica formal. O contributo de um historiador –
Hermann Kantorowicz (1877-1940, Rechtswissenschaft und Soziologie, 1910)
– e de um sociólogo do direito – Eugen Ehrlich (1862-1922, Grundlegung
der Soziologie des Rechtes, 1912) – contribuíram para dar uma maior consis-
tência teórica às propostas de problematização ou abandono do modelo
formalista legalista e conceitualista do direito, a caminho de uma funda-
mentação “livre”, fundada na sensibilidade jurídica comunitária, auscul-
tada, caso a caso, pelo juiz.
Esta ideia de que os juristas decidem com base na sua sensibilidade, só
depois encontrando argumentos racionais ou fundamentos legais corres-
ponde ao senso comum dos juristas, ainda hoje. Mas, no contexto histórico
a que nos referimos, esta insistência no caráter “pessoal” e “não racional”
da decisão não pode ser desligado, por um lado, da crise do conceitua-
lismo da pandectística, mas, também, num âmbito mais geral, de corren-
tes filosóficas de crítica ao racionalismo, que afirmavam ou o primado da
sensibilidade (intuição), da vontade ou da ação (élan vital) como forma de
realização do homem, ou o caráter político (i.e., radicado na vontade de
poder) de todos os valores867.
O extremismo das posições metodológicas da Escola do Direito Livre
foi matizado pela limitação desta liberdade de criação do direito aos casos
em que existissem lacunas da lei. Em todo o caso, os seguidores deste movi-
mento insistiam em que existia uma lacuna sempre que a interpretação
da lei não fosse clara e inequívoca, pelo que, na prática, haveria “tantas
lacunas quantas as palavras da lei” (H. Kantorowicz). Por isso, este movi-
mento – além de ter sido tido como bastante estranho, nos seus interesses
e métodos, ao mundo dos juristas – foi sempre considerado como subver-
sivo para a certeza e segurança do direito868.

867
 É clara a consonância de alguns destes pontos de vista com a filosofia, crítica do racionalismo
e exaltadora da ação, de Friedrich Nietzsche (1844-1900) ou de Henri Bergson (1859-1941).
Sobre Nietzsche e o direito, Kaufmann, 1994, 86; Valadier, 1998; Litowitz, 1995, 56-57.
868
 Sobre a Escola de Direito Livre, por todos, Wieacker, 1993, 670 ss., e Kaufmann, 1994, 146 ss.

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O DIREITO MODERNO

Não pode, contudo, deixar de se sublinhar a ênfase que este movimento


deu à natureza política da decisão do juiz (do jurista), insistindo na res-
ponsabilização pessoal que lhe está inerente e, com isto, no compromisso
ético e social do juiz quando decide, compromisso que tinha sido escamo-
teado pelo positivismo, ao apresentar o juiz como um autómato executor
da lei ou dos princípios científicos do direito. O jurista – dizem – decide
livremente e, nessa decisão, ao mesmo tempo que afirma convicções, com-
promete o seu destino pessoal869.

7.5.3. A jurisprudência dos interesses


A “jurisprudência dos interesses” (Ph. Heck, 1858-1943) tem, em certa
medida, um alcance menos ambicioso do que a jurisprudência teleológica
de Jhering (ou a “Escola Livre do Direito”). Enquanto estas davam alguma
abertura em relação a formas antilegalista de “encontrar” o direito, a juris-
prudência dos interesses aceita basicamente os pressupostos do positivismo
legal e tenta apenas resolver um problema “limitado”, a que já o constru-
tivismo pandectista tinha tentado responder – o problema das lacunas
do ordenamento legal – que as grandes mudanças sociais e políticas dos
finais do século XIX e inícios do século XX, incompletamente cobertas
pela legislação, tinham tornado ainda mais evidente.
Na verdade, a sua proposta de base é a de que, constituindo qualquer
caso jurídico um conflito de interesses, a decisão a atingir se deve basear
numa adequada ponderação desses interesses e não na dedução formal a
partir de conceitos. Os conceitos teriam uma função apenas heurística ou
didática. Constituiriam fórmulas sintéticas com auxílio das quais pode-
ria ser descrita a forma típica ou usual de obter a correta ponderação dos
interesses num determinado tipo de casos. E, por isso, sugeririam provi-
soriamente uma solução para o problema a resolver. Mas – ao contrário do
que pretendia a jurisprudência dos conceitos – não teriam qualquer função
decisiva ou final no achamento da solução jurídica. Daí que esta corrente
critique o método dedutivo-conceitual como uma inversão (“método da
inversão”, Umkehrunsmethode), pois coloca no ponto de partida da inven-
ção jurídica o que devia estar no fim.
Se critica o conceitualismo, a jurisprudência dos interesses mantêm-
-se nos quadros do legalismo, pois a ponderação adequada dos interesses

 Importante, neste sentido, Hermann Isay (1873-1938), Rechtsnorm und Entscheidung, 1923.
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