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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO


DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
CURSO DE RÁDIO TV E INTERNET

JOSENILDA BARBOSA GOMES

O EMPODERAMENTO FEMININO NA PUBLICIDADE PARA MÍDIAS


SOCIAIS: reflexões sobre o femvertising e suas implicações sociais.

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Recife, 2018

0
JOSENILDA BARBOSA GOMES

O EMPODERAMENTO FEMININO NA PUBLICIDADE PARA MÍDIAS


SOCIAIS: reflexões sobre o femvertising e suas implicações sociais.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Departamento de Comunicação Social no curso
de Rádio, Tv e Internet da Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE) sob orientação da Profa.
Dra. Soraya Barreto

Recife, 2018

1
JOSENILDA BARBOSA GOMES

O EMPODERAMENTO FEMININO NA PUBLICIDADE PARA MÍDIAS


SOCIAIS: reflexões sobre o femvertising e suas implicações sociais.

Banca examinadora:

__________________________________________

XXXXXXXXXXX

__________________________________________

XXXXXXXXXXX

__________________________________________

XXXXXXXXXXX

Recife, PE, __________ de __________________ de 2018

2
RESUMO

Este trabalho tem como proposta fazer reflexões, no campo social, de como as
campanhas publicitárias desenvolvidas para o ambiente das mídias sociais podem
contribuir para se efetivar a noção de empoderamento feminino cujo rótulo as
publicidades tanto se valem enquanto estratégia de marketing. Para tal, realizamos uma
pesquisa de recepção com a exibição de vídeo-campanhas de duas marcas que trazem a
“beleza” da mulher como argumento para a publicidade de seus produtos. Pensamos em
refletir como tais conteúdos e abordagens podem modificar, ampliar ou acelerar (ou em
última hipótese, revelar-se o contrário) o senso de empoderamento da mulher perante a
sociedade como um todo, mais especificamente dentro do contexto social brasileiro.

Palavras-chave: Empoderamento Feminino. Gênero. Mídias Sociais. Publicidade.


Representação.

3
ABSTRACT

This paper aims to raise social questions about how advertising campaigns developed
for the social media environment can contribute to the notion of female empowerment,
whose label advertising is used as a marketing strategy. To do this, we conducted a
survey of the reception with the display of videos campaigns of two brands that bring
the "beauty" of women as an argument for the advertising of their products. Thinking of
demonstrating how such content and approaches can modify, amplify or accelerate (or
in the last to reveal the opposite) the sense of women's empowerment towards society as
a whole, but more specifically within the Brazilian social context.

Keywords: Female Empowerment. Gender. Social Media. Advertising. Representation.

4
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..............................................................................................................6
1. REPRESENTAÇÃO DE GÊNERO: TROCAS CULTURAIS E SIMBÓLICAS
DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA SEGUNDO AS TEORIAS DE
GÊNERO....................................................................................................................... 11

1.1 O masculino e o feminino nas narrativas da cultura de massa ....................16


1.2 Representações de gênero nas imagens
publicitárias...................................22
1.2.1 Representações do feminino na publicidade: A mulher e seus
estereótipos...26
1.1.2 A Identidade feminina na Publicidade .....................................................28
1.2.3 O Corpo feminino na propaganda.............................................................30
2. FEMINISMO PÓS- REDES SOCIAIS: REFLEXÕES SOBRE PUBLICIDADE
E EMPODERAMENTO FEMININO ........................................................................35

2.1 As (novas) forças que estão definindo o novo marketing centrado no ser
humano ....................................................................................................................39
2.1.1 O discurso de humanização como estratégia de aproximação com o
consumidor nas publicidades das mídias sociais. ..............................................42

2.2 Empoderamento Feminino como processo de fortalecimento das mulheres


nos espaços de participação social e democratização política..........................45

2.3 Publicidade e gênero: análise do fenômeno femvertising na criação de


campanhas............................................................................................................48

3. FOCUS GROUP E ANÁLISE..............................................................................51

3.1 Dos Comerciais e das Marcas.........................................................................51


3.1.1 Hope Ensina – Hope Lingerie.......................................................................51
3.1.2 É Pra Mim – Quem disse Berenice...............................................................54

3.2 Das Participantes.............................................................................................57


3.2.1 Participantes...............................................................................................57

3.3 Análise Geral...................................................................................................59

CONSIDERAÇÕES FINAIS .....................................................................................68


ANEXOS.......................................................................................................................73
1 Pesquisa Quantitativa...............................................................................................73
1.1 Perfil .......................................................................................................................73
1.2 Família....................................................................................................................78
1.3 Cultura...................................................................................................................86
1.4 Questão Aberta......................................................................................................93
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................94

5
INTRODUÇÃO

É inegável a noção de que a representação da mulher na televisão brasileira


ainda está muito distante da realidade das mais de 105 milhões de mulheres que
compõem a população feminina do país, segundo dados estatísticos do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para o ano de 2017. De acordo com o
estudo ‘A mulher e seus estereótipos: Comparando 50 anos de publicidade televisiva no
Brasil e Portugal’ da pesquisadora Simone Freitas, durante os últimos 50 anos, “a
imagem feminina é frequentemente julgada a partir do conjunto de crenças que cercam
o mundo feminino, principalmente por sua função de mãe e dona-de-casa, a posição de
sexo frágil, mostrada como objeto sexual, submissa ou serviçal” (MARTINEZ E
MUNOZ, 2009, p.155 apud FREITAS, 2014. p.118).
No levantamento realizado pela Agência Patrícia Galvão no ano de 2013 sobre o
conflito entre o que os espectadores veem e o que gostariam de ver nas publicidades,
quesitos relacionados ao padrão de beleza foram os que tiveram maior taxa de
percepção de disparidade entre a realidade e a sua representação. Contudo, outros
fatores como a percepção de inteligência e a do não retrato da mulher além da posição
mãe/esposa tiveram índices igualmente notáveis.
Na pesquisa, foi revelado que 56% dos entrevistados não acreditam que as
propagandas na TV mostram a mulher da vida real. Sobre o fator mais evidente, padrão
de beleza, 65% acreditam que essa representação está muito distante da realidade.
Enquanto que para 62% dos entrevistados, as propagandas não mostram a mulher além
dos perfis esposa e mãe. Em outro item, os entrevistados acreditam que as propagandas
não associam aos perfis anteriores a mulher que trabalha e estuda, ou seja: a mulher
além da figura arraigada no imaginário social no seio familiar da casa. O mesmo
levantamento releva ainda que apenas 35% das pessoas creem que a mulher nunca é
apresentada como uma pessoa inteligente. Ou seja, a maioria (43%) discorda que as
propagandas representam as mulheres como personagens menos inteligentes.
Os fatores levantados pela pesquisa relacionados aos temas padrão de beleza,
posicionamento da mulher além do lar (trabalho e estudo) e da inteligência se
encontram em temática com o artigo “What Women Watch: Trends Toward
Entrepreneurship, Education, and Empowerment on YouTube”, publicado também em
português com o título “Quer falar com mulheres? Olhe para os dados, não para os
estereótipos”¹ e melhor explicado na tradução livre como “ O que as mulheres assistem:
6
Tendências para o Empreendedorismo, Educação e Empoderamento no YouTube”
publicado pela plataforma Google no Think with Google1 no mês de março do ano de
2017.
O artigo em questão revela mudanças significativas em relação ao olhar da
mulher para a publicidade e para a identificação com as representações propostas pelos
conteúdos publicados na plataforma, “Inspirados pelo tema, tentamos entender o que as
mulheres assistem no YouTube e com quais anúncios elas se identificam. Descobrimos
três tendências: um aumento significativo no watch time de conteúdos sobre negócios, o
desejo de obter conhecimento fora do ambiente de trabalho por meio de vídeos tutoriais
e a preferência por publicidade com mensagem empoderadora para o público.” Dos três
aspectos ressaltados pela autora, esse trabalho tem por opção a análise do último, o
empoderamento, pois acredita que este pode ser a porta para ampliação dos demais.

. [...] O estereótipo dita que as mulheres deveriam consumir, majoritariamente,


conteúdos sobre saúde, beleza e maternidade, mas a realidade é bem diferente:
elas estão muito mais inclinadas a assistir a vídeos no estilo faça-você-mesmo
do que os homens, e 50% delas mais inclinadas que eles a fazer isso
regularmente. [...] as mulheres estão consumindo mais publicidade e, cada vez
mais, as propagandas trazem mensagens empoderadoras. Isso significa que será
cada vez mais forte o impacto dessa mudança de mentalidade sobre as marcas.
(STANDFORD, 2017,p.1)

Como citado pela executiva Kate Standford, e amplamente discutido em outros


estudos, o empoderamento feminino é um assunto que desperta cada vez mais o
interesse das mulheres. Nas palavras da executiva, o interesse delas vai além do
universo da beleza e da maternidade, pois ao buscar conteúdos relacionados ao
empreendedorismo, a educação e ao desenvolvimento pessoal, as mulheres agem de
forma a efetivar parte do conjunto de atitudes que compreendem o conceito de
empoderamento feminino.
Segundo o grupo de Princípios de Empoderamento das Mulheres da
Organização das Nações Unidas (ONU Mulheres), o empoderamento feminino se
constitui de ações de estímulo à igualdade salarial e de oportunidades no mercado de
trabalho através do acesso igualitário à educação para ambos os gêneros na qual

1
Ferramenta online para profissionais de marketing e agências de publicidade. Segundo a plataforma o
Think Insights provê uma enorme quantidade de informações de marketing, proporcionando o acesso às
mais recentes pesquisas e novidades em marketing digital. A ferramenta publica entrevistas com
empreendedores e experts em mídia digital, detalhando os casos de sucesso dos líderes de cada segmento
na aplicação do marketing digital em suas empresas.

7
também haja a promoção da educação familiar e da qual não se represente a mulher
apenas como dona de casa ou sexo frágil. Ou seja, através de ações que transmitam os
valores da dignidade e da integridade feminina em suas mais variadas formas.
Por isso, o empoderamento feminino abordado nesse estudo é enquanto a
possibilidade de se fundamentar uma consciência coletiva acerca do fortalecimento da
figura mulher através do discurso de empoderamento, seja na ordem econômica ou
social, e da ampliação da igualdade de gênero através da publicidade nas mídias sociais.
De acordo com a tese intitulada “O Discurso de Humanização como Estratégia
de Aproximação com o Consumidor nas Publicidade das Mídias Sociais” da mestre em
Comunicação Social Vanda de Souza Machado, “A emancipação do consumidor foi a
mudança mais significativa que a comunicação sentiu nos últimos tempos e que tem
forçado as empresas de mídia de massa a convergirem para os novos meios.”
(MACHADO, 2016, p.33). Todavia, ela atenta para o fato de que

[...] atuar nesse novo habitar da comunicação não é tão simples quanto parece,
as organizações precisam conhecer as diversas facetas que regem a linguagem
da sociedade conectada antes de ingressar nas plataformas sociais, é necessário
estudar o ambiente digital e principalmente o perfil dos usuários e os seus
interesses. (MACHADO, 2016, p. 33)

Por isso sentimos a necessidade de realizar um estudo mais próximo do público


consumidor enquanto usuárias dessa nova ambiência. Como metodologia buscamos
alinhar a pesquisa teórica, primeiro, das questões de gênero, buscando entender como
são formadas as percepções mais recentes do que é ser mulher na sociedade atual.
Dentro do primeiro capítulo ainda desvendamos dentro do recorte beleza e corpo
feminino como estes são utilizados como matéria prima pela publicidade para
circunscrever, na melhor das visões, reproduções e, posteriormente, identificações que
alimentam as representações de gênero do imaginário feminino.
Numa segunda abordagem teórica, traçamos um breve roteiro histórico das lutas
femininas através do movimento feminista, e, em paralelo, prosseguimos na pesquisa
fazendo inserções sobre as possíveis interferências que a ambiência digital propiciou
para o avanço da questão Empoderamento Feminino como estratégia de marketing, e,
numa hipótese otimista, de se pensar como tais podem servir ao propósito de se
diminuírem as lacunas sociais entre homens e mulheres.
Para o capítulo de análise, nos propomos a coleta de dados através de um estudo
de recepção de conteúdo no formato Focus Group, com a exibição de 2 vídeos
campanhas das marcas de lingerie Hope e de cosméticos Quem Disse Berenice?. Para a

8
marca Hope escolhemos a série com 3 spots da campanha de 2011 'Hope Ensina' e o
identificamos como Vídeo 1. E para a marca Quem Disse Berenice? exibimos o vídeo
campanha 'É pra mim' de 2013. Percebemos que no planejamento das campanhas
publicitárias, os repertórios culturais dos receptores contribuem para a criação de um
contexto do qual o Empoderamento Feminino pode funcionar como estratégia de
aproximação, contudo nosso intuito é perceber se tal contexto pode modificar, ampliar
ou acelerar, (ou em última hipótese, revelar-se o contrário) o senso de empoderamento
da mulher perante a sociedade como um todo.
Em nossa pesquisa, isso significa que a partir do cenário das dimensões do
mundo social com as quais a publicidade se articula, nesse caso das mídia sociais, as
práticas de recepção são um lugar da interpretação, leitura e apropriação das mensagens
publicitárias que apesar de partir dos parâmetros definidos pela produção do anúncio,
não necessariamente corresponde a eles. Nessa contradição, buscamos diferenciar nossa
pesquisa, optando não somente pela análise de discurso, mas procurando seus possíveis
reflexos na recepção do público feminino à questão do Empoderamento Feminino
através do viés publicitário.
Ou seja, as mudanças no cenário da comunicação social, da qual as mídias e as
redes sociais são palco atualmente, possibilitaram um ambiente do qual surgem novas
concepção de espaços para a ideia de empoderamento feminino. No artigo “Feminismo
pós-redes sociais: reflexões sobre marcas e empoderamento” da professora de
Comunicação e Cultura Luciana Ferreira S. Prado,
[...] dentro do cenário aqui apresentado, dos debates cada dia mais acirrados
pelo protagonismo das mulheres nas mais diferentes mídias, o que podemos
perceber é um movimento de busca por apresentar não só a imagem de uma
mulher mais acessível ao real, mas também a proximidade com temas que são
correntes nas páginas das feministas do século XXI nas plataformas digitais.
(PRADO, 2016.p.13).

Estes “espaços” que hoje podem ser permeados com mais facilidade pelas
mulheres através da própria dinâmica em rede, promovem a ampliação da discussão
sobre a representação feminina, bem como também, fortalecem o próprio discurso de
empoderamento.
Mas aqui o que nos interessa é o estudo, realizado sob base científica e transcrito
em uma monografia, acerca da recepção por parte do público feminino das estratégias
de engajamento, para além do consumo, que também possibilitam o engajamento social
ou, numa proposta maior, se refletem modificações (ampliação, aceleração, ou se

9
acrescentam) o senso de posição da própria mulher na sociedade quando se dizem de
empoderadoras.
Por último, considerando o YouTube e outras mídias sociais como plataformas
massivas de transmissão de informação, a publicidade para essas mídias será
compreendida como um dos principais meios para que novos posicionamentos ganhem
diariamente novas adeptas. E, em escala mundial, o seu fenômeno proporciona a
mulher, e às suas reivindicações, um lugar com abrangência representativa nunca antes
vista na história atual na humanidade.

10
1. A REPRESENTAÇÃO DE GÊNERO: TROCAS CULTURAIS E
SIMBÓLICAS DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA SEGUNDO AS
TEORIAS DE GÊNERO

Historicamente, segundo Thomas Laqueur em seu livro “Inventando o sexo: corpo


e gênero dos gregos a Freud” (1990), ainda que, até o final do século XVIII, as noções
entre feminino e masculino não fossem ‘tão distintas, o “sexo único” era a única forma
conhecida para as pessoas se referirem tanto aos corpos pertencentes aos homens e
quanto aos corpos das mulheres. Segundo Thomas, em algum momento da história, já
se pensou que o corpo masculino representava a forma mais bem-acabada da
humanidade e o corpo feminino seria a sua versão interna, como se a mulher fosse uma
versão imperfeita do homem.
No mesmo livro, o autor ainda comenta que os prazeres do corpo feminino foram,
por muito tempo, explicados a partir da lógica do corpo masculino. Dessa forma, o
clitóris corresponderia ao pênis e os ovários equivaleriam aos testículos. O autor sugere
que quando se pensava a partir deste modelo, não havia a preocupação em se entender a
constituição real do corpo feminino, entendendo-se como suficiente a compreensão da
fisiologia do corpo masculino para tudo ser explicado.
Apesar de não pretendermos neste estudo fazer um extenso apanhado histórico
sobre o desenvolvimento das teorias de gênero, acreditamos ser pertinente traçar um
breve resumo do conceito de gênero e seus desdobramentos para então iniciarmos a
nossa pesquisa. Isso se deve ao fato de esclarecer sobre como chegamos ao que
julgamos ser gênero.
O conceito de gênero, tal como conhecemos hoje, teve suas primeiras
conceituações delineadas aproximadamente a partir do início no século XIX. Esse foi o
período em que se estabeleceu o modelo de “dois sexos”, sendo eles, então, percebidos
da forma como conhecemos – forma esta tal na qual um não seria uma mera versão do
outro e vice e versa.
Segundo a mestra em comunicação Júlia S. Zamboni, em sua tese “Para que serve
a mulher do anúncio? Um estudo sobre representações de gênero nas imagens
publicitárias” (2013) é nesse período – início do século XIX – que se inicia a ideia da
diferença sexual, e referenciando Laqueur (1990), ela complementa que a mudança no
conceito passa por uma transformação que “se dá devido a desenvolvimentos de ordem
política, social e ideológica e não, necessariamente, pelas descobertas científicas”

11
(ZAMBONI, 2013, p.48). Zamboni busca ressaltar em seu estudo a importância de
ciências como a medicina e a própria biologia no surgimento das primeiras noções de
diferenciação de gêneros.2
Outro estudo que aborda as questões de gênero dentro da ótica da publicidade e da
propaganda é o realizado pela mestre em comunicação Debora M. Campos, em “A
figura da mulher na linguagem da propaganda: implicações sociais.” No qual a autora
defende que o gênero deve ser compreendido como uma representação social
hegemônica que opõem os dois sexos biológicos, sintetizado na seguinte constatação:
“Gênero não é sexo, nem uma condição natural dos corpos, é, antes, uma construção
social do poder.” (CAMPOS, 2010, p.14).
Mas o que de fato seria o gênero? De acordo com Lauretis (1994), o feminino foi
fortemente influenciado pela teoria da sexualidade de Foucault da década de 80, a partir
da qual se passou a contestar a concepção de gênero fundamentada na diferença sexual.
Para ela, a sexualidade é entendida como um dispositivo de poder, como “um conjunto
decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações
arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados
científicos, proposições filosóficas, morais e filantrópicas” (1994, p. 244).
Dessa forma, entendemos que à ideia de gênero estão agregados conceitos que vão
para além da biologia, como discursos e instituições. Para outro autor, Machado (2000,
p.5), “Gênero é uma categoria engendrada para se referir ao caráter fundante da
construção cultural das diferenças sexuais, a tal ponto que as definições sociais das
diferenças sexuais é que são interpretadas a partir das definições culturais de gênero”.
Em suma, o gênero pode ser considerado como uma categoria classificatória que, em
princípio, pode metodologicamente ser o ponto de partida para se desvendar as mais
diferentes formas com as quais as sociedades estabelecerem suas relações sociais entre
os sexos.
Ainda para entendermos como os conceitos de gênero podem assumir
características culturais e sociais, concordamos com Campos, segundo a qual não se

2
Segundo a autora, “Essa distinção social é evidenciada no discurso médico pela lógica cientificista
biológica e impôs às mulheres a destinação para o ambiente doméstico e privado. Margareth Rago (1999)
conclui que os médicos tiveram um importante papel na redefinição dos códigos da sexualidade feminina,
ao buscar na própria anatomia do corpo da mulher os limites físicos, intelectuais e morais à sua integração
na esfera pública. Com isso, o discurso médico, envolto na legitimidade do saber científico, demarcava
traços tipicamente femininos: a função para a maternidade e a fraqueza de seu corpo.” (ZAMBONI, 2013,
p.49)

12
deve partir da ideia de sexualidade, ou das características sexuais dos corpos dos
homens e das mulheres para uma concepção final do que seria gênero. Dentro de uma
concepção social, o gênero estabelece uma relação hierárquica entre os sexos
biológicos, contudo ele em nada tem a ver com o sexo e nem a condição natural dos
corpos, ele é, antes, e acima de tudo, uma construção social de poder. Logo, “cremos
também que o gênero deve ser concebido como uma representação social hegemônica
que opõem os dois sexos biológicos” (CAMPOS, 2010, p.45).
Maria Celeste Mira, em seu artigo “O masculino e feminino na narrativa da
cultura de massas ou deslocamentos do olhar” (2003), nos acrescenta sobre os
elementos que interferem nas noções de gênero que temos, atestando o seguinte:

A relação entre este aspecto da questão dos gêneros, o dos antagonismos e


aproximações entre os mundos masculinos e femininos, pode ser pensada a partir dos
gêneros narrativos que perpassam os meios de comunicação de massa. Para tanto, é
preciso afastar-se de uma visão unilateral da mídia, que a coloca como um poder
externo e imposto à sociedade. Os meios de comunicação de massa fazem parte da
cultura moderna como um todo, existem numa sociedade de base tecnológica, com
enormes aglomerados populacionais, gerida por instituições impessoais como o Estado
e o mercado e, consequentemente, fortemente burocratizada. Mas uma sociedade
também marcada por diferenças de classe, gênero, geração; atravessada por diversidades
geográficas, étnicas e tantas outras. (MIRA, 2003.p.18)

Ainda abordado nesse capítulo, refletiremos sobre a questão mais atual da Teoria
das Representações Sociais, da qual se sugere a existência de um pensamento social
resultante das experiências cotidianas, em que crenças e troca de informações são
reveladas na vida diária. Segundo Pavarino (2010) essas teorias surgidas na década de
60 visam orientar sobre uma suposição menos individualista de que as representações
são criadas para satisfazer o desejo de nos familiarizarmos com aquilo que não é
familiar.
Segundo Moscovici, as representações sociais funcionam como uma ponte que
liga o que é familiar ao que é estranho. Para o autor, o estranho pressupõe uma falta de
comunicação do grupo em relação ao mundo. Estas comunicações corresponderiam a
um modelo recorrente e compreensivo de imagens, crenças e comportamentos
simbólicos compreensíveis em qualquer nível de interação. Daí o autor articula que é na
interação dos indivíduos que surgem as tais representações sociais.
Nas interações surgem as negociações as quais durante todo seu processo de
comunicação trazem símbolos, imagens, influências pessoais e de todas as partes
envolvidas nela. Moscovici (2011, p. 212) define que: “as representações sociais se

13
apresentam como uma rede de ideias, metáforas, imagens mais ou menos interligadas
livremente.”
Retomando a questão da publicidade, segundo Zamboni (2013, p.62), as
representações de gênero trazidas nas peças publicitárias mostram um corpo feminino
sexualizado cuja função serve ao consumo3 e aos prazeres dos homens - “Essa é a
representação que mais nos chega via publicidade nos anúncios que envolvem mulher e
sexualidade”. E a partir desses estímulos, ela nos deixa a seguinte questão: Como
podemos aspirar ser outra coisa que não a “mulher sedutora” e a “mulher sexualizada”?
Adiantando-nos a resposta, ela registra:

Não sobra muito espaço para a escolha pessoal. Não sobra muito espaço para o corpo
que foge aos padrões, para o corpo que tem gorduras, que tem peitos caídos, que tem
celulite, para outros tipos e formatos de corpos. Não sobra muito espaço para adotarmos
outras identidades: de mulher trabalhadora, ativa, de mulher independente, livre e
determinada, de uma mulher que não é reduzida a um corpo sensual e está bem consigo
mesma por ostentar manequim GG. É claro que aqui levo ao extremo. Sabemos que
existem diversas formas de representar as mulheres na publicidade atual. Mas ainda
vemos com bastante frequência o discurso dominante que objetifica e sexualiza.
(ZAMBONI, 2013, p.62)

Outra questão que estará entrelaçada à questão das distinções de gênero vem da
própria reinvindicação do movimento feminista4, o qual será estudado de modo mais
apropriado e com maior profundidade no segundo capítulo, mas que aqui ganha menção
por ser de fundamental importância no que tange a questão da problematização das
formas de identidade e de representação do gênero na publicidade.
O principal tema desse estudo, o qual é derivado de tudo que vimos até aqui é a
questão do empoderamento feminino. Saliento que o termo tem sido velozmente
esvaziado e mais à frente pontuaremos alguns indícios de que a própria publicidade ao
se apropriar pode estar contribuindo de forma significativa para esse esvaziamento.
Contudo, nos cabe dizer neste momento que o empoderamento feminino enquanto força
3
Cabe pontuar que, nesse estudo, não entraremos a fundo na questão mais atual dos diversos conceitos de
consumo, porém faremos referências às noções iniciais acerca dos conceitos de Consumo de Ativismo e
de Consumo Político os quais serão elucidados ao longo dos capítulos.
4
Desde o final dos anos 1960, o movimento feminista e outros movimentos têm contribuído para a
ampliação do debate sobre os significados impressos sobre o corpo. Le Breton (2006) pontua ainda que
“um novo imaginário de corpo, luxuriante, invade a sociedade, nenhuma região da prática social sai ilesa
das reivindicações que se desenvolvem na crítica da condição corporal dos atores.” (LE BRETON, 2006,
p. 9). Essa crítica faz do corpo um símbolo de identidade união, um campo de batalha contra um sistema
social e cultural considerado repressivo, ultrapassado, e que é preciso transformar para favorecer o
desabrochar individual. Por isso, o corpo é tido como constante campo de disputa políticoideológica. A
publicidade, nesse contexto, se utiliza de imagens do corpo para manter e reforçar valores socioculturais
que apontam para um corpo moldado segundo determinados padrões de beleza, criando ou recriando uma
ditadura da beleza que diz o que pode e deve ser consumido pelo corpo e para o corpo. (ZAMBONI,
2013. p.57)

14
se tornou um elemento indispensável na luta pela reversão das assimetrias das relações
de gênero.

Com efeito, cabe uma ressalva sobre um não consenso geral e acabado sobre uma
definição mais formal do que seria o empoderamento feminino. No artigo “As
assimetrias entre cidadania e igualdade para as mulheres” de, Denise R. Quaresma da
Silva e Mariane C. D’Oliveira concordam que “o empoderamento compreende a
alteração radical dos processos e estruturas que reduzem a posição de subalternidade das
mulheres como gênero”. As mulheres se tornam empoderadas através da tomada de
decisões coletivas e de mudanças individuais. (2016, p.3). Daí o entendimento de
empoderamento enquanto processo.
O empoderamento deve ser efetivado através de atitudes que gerem mudanças
individuais ou coletivas que elevem a mulher da sua posição subalterna. Ou seja, a partir
do empoderamento, devem ocorrer mudanças que diminuam a dominação masculina
tradicional e da qual uma maior participação e autonomia das mulheres sejam os
principais frutos colhidos nesse processo. Ao final, o empoderamento significa uma
mudança na dominação masculina tradicional. Ele representa um desafio ao poder
dominante do homem e à manutenção dos seus privilégios, em especial dentro da
família.
De certo, já podemos nos perguntar de antemão, se diante de um cenário de
reivindicações, como os propostos pelos feminismos, e pela ideia de empoderamento
feminino (como resultado do primeiro) se alguma mudança já foi percebida ou
assimilada por parte das mulheres no momento histórico atual, principalmente no que
toca a questão da representação publicitária nas campanhas voltadas para o público
feminino. Sendo esta então respondida por Zamboni (2013) que diz:

Desde o início do século passado, a representação de gênero se pautou por uma


figuração que colocava o homem na posição de consumidor do produto, ou como um
profissional respeitável, enquanto a mulher era meramente um corpo bonito, com partes
desnudas excessivamente expostas. Percebemos que boa parte da publicidade atual que
envolve a corporalidade começa a dialogar com outra imagem de mulher, vendo-a na
integralidade de consumidora do produto, ou como uma mulher real, não importando
que não se enquadre no padrão ideal de beleza. (ZAMBONI, 2013, p.146)

Para esse primeiro capítulo, valho-me de algumas questões apontadas no estudo


de Zamboni (2013) sobre a representação de gêneros, em especial do feminino, dentro
da publicidade contemporânea, assim buscando, primeiramente, responder sobre como

15
atualmente é representado esse corpo feminino na publicidade. Uma segunda questão a
ser levantada é: será que rompemos a barreira do interdito, do corpo proibido, do corpo
que serve a um outro? e ainda: será que as representações acompanham as novas
tendências de “se fazer mulher” inscritas na contemporaneidade? Como é então
construída a representação do “ser mulher” na publicidade?

Masculino e o feminino nas narrativas da cultura de massas

Partindo do que Simone de Beauvoir já dizia sobre a humanidade ser masculina,


ela afirmava que a mulher se determina e se diferencia em relação ao homem e não este
em relação a ela, pois é nessa busca feminina por reconhecimento, espaço, liberdade de
expressão e pelo direito de definir-se que a mulher transgride como ser único e não
como ser comparado. Essa busca por espaço considerável se dá dentro e fora da família,
no âmbito laboral, social e cultural, insistindo e transgredindo no rompimento das
barreiras do dito mundo masculino (D’OLIVEIRA; QUARESMA DA SILVA, 2016).
Já sabemos que é impossível teorizar o feminino e o masculino apenas a partir de
concepções fixas de gênero e sexo. As noções de masculinidade e de feminilidade não
estão necessariamente abrigadas nos corpos dos homens e das mulheres. Alguns estudos
de gênero anteriores já procuraram esclarecer que não existe uma única maneira de “ser
homem” ou “ser mulher”. Estudos mais antigos como os de Simone de Beauvoir, em o
Segundo Sexo ou, mais atuais, com o da filosofa Judith Butler (2003) no livro
Feminismo e Subversão da identidade, são mais que obrigatórios quando se pensa no
estudo das tensões entre gênero e sexualidade. Aqui adotamos o viés construtivo de que
os gêneros são construídos histórica e culturalmente, podendo variar em número,
intensidade e até desaparecer a depender do momento histórico.
Desde meados do século XIX até a metade do XX, período clássico da indústria
cultural, a noção de igualdade entre homens e mulheres, que por certo havia nas
sociedades de corte, desaparece. Sendo apenas a partir do século XIX, quando o homem
é excluído do universo da moda, ele passa a posição de contemplador e ela a mulher
passa a condição de contemplada, ou seja, ela agora está na vitrine das lojas, ela é
olhada como uma mercadoria a ser adquirida. As mulheres, por sua vez, desenvolvem
uma verdadeira arte ou tecnologia da imagem. Elas fazem da moda e da beleza uma
maneira de expressar, buscando através dela sua individualidade e sua adaptação às

16
convenções da sociedade. Segundo Mira, (2003, p.31), havia um certo fetiche em ser
admirada. As mulheres aprenderam, melhor do que os homens, a manipular os olhares,
fossem eles dos homens ou das outras mulheres e até mesmo o seu próprio olhar sobre
elas mesmas.
Esta lógica advinda da indústria cultural, que nessa mesma época já dava seus
primeiros passos, colocava a sociedade diante de um amplo repertório de ideias,
emoções, sensações, escolhas, imposições e práticas, não necessariamente nessa ordem.
Contudo, damos a exata atenção para o fato de que o universo ideológico e complexo
composto pelas representações dessa sociedade são meticulosamente elaboradas,
construídas, repetidas e transformadas pela veiculação rotineira de textos e imagens nos
mais variados suportes, sejam eles anúncios publicitários, jornais, novelas, revistas,
noticiários, filmes, etc.
Segundo Rocha (2006), esse mundo simbólico possui um saber que se faz
necessário até um determinado grau que o faz despercebido. Seria uma espécie de fala
sistemática, que enquanto ato social, também se estabelece como fala tanto de algo
arranjado quanto infalível. É como se no universo ideológico, a comunicação de massa
sempre se vendesse como razão de ser e como forma de autossustentação. É
compulsório que na venda, o produto ou serviço se socialize para o consumo,
obrigando-se a uma linguagem comum com seu receptor.
Por isso, a mídia só tem sentido no público se compreendida.

Suas representações não são invenção unilateral, e o exercício é de uma relação


concreta entre discurso e audiência através de um código comum. Cada
produção da mídia é uma relação que se estabelece e se fixa com os
pensamentos e práticas dos respectivos mercados consumidores. (ROCHA,
2006, p.45)

Seguindo a lógica da Indústria Cultural, à medida que as construções da


identidade pessoal e social se deslocam, estas vão se adequando a perfis ora
estabelecidos. Nos anos 20, segundo estudos de Gilles Lipovetsky (2000) houve a
explosão da indústria de cosméticos e outros fatos correlatos, e esse momento é
chamado pelo estudioso de década do “boom da beleza”. A aparência corporal passou a
ter mais importância, porém, muito mais para as mulheres do que para os homens.
Definida sob novos padrões, a beleza passou a ser um produto vendido e
divulgado pelo cinema, em especial, o hollywoodiano, pelas revistas e pela publicidade,

17
tornando-a, ao lado da moda, um dos elementos centrais na construção da identidade
feminina (MIRA, 2003, p.31).
O saldo cultural dessa prática ao culto a beleza resultou na responsabilidade pelo
cuidado consigo mesmo, e assim “somos bombardeados a todo momento com a
advertência de que somos o resultado de nossas opções. Que somos responsáveis pelo
corpo, pela saúde e pela beleza que temos ou deixamos de ter.” (ZAMBONI, 2013,
p.69). Contudo, infelizmente, captamos na pele os efeitos nefastos desse tipo de
identificação. Pois sendo a cultura fortemente influenciada por um certo padrão de
beleza, aceito, consagrado ecoado pela excessiva exposição de imagens de mulheres
ideais, principalmente pela publicidade, é utópico pensar que a responsabilidade pelo
corpo e pela beleza que teremos é uma construção individual.
Este é um modelo imposto, limitado e reduzido. E daí é impossível não pensar
na contradição de que ao mesmo tempo que tomamos decisões individuais, somos
programados socialmente para um determinado comportamento. Adotamos o padrão
como verdade e estamos o tempo todo tentando modificar o nosso corpo.
Campos (2010, p.72), referenciando Baudrillard (2005), acrescenta ainda a essa
lógica o papel ilusório do qual discursos construídos pela Indústria Cultural acerca da
beleza como emancipadora da mulher mascara uma estratégia de pseudoemancipação
que mais fomenta o consumo através de sua espetacularização do que como uma real
libertação do “sentir-se” mulher.
Assim, a exploração do corpo feminino pela atividade publicitária pode ser
explicada pela manutenção de uma ordem social androcêntrica, na qual o corpo
feminino foi transformado na mais bela mercadoria. (CAMPOS, 2010, p.51). Isso é o
que Naomi Wolf (1992) chamará de Mito da Beleza. Ela conceitua que o mito da beleza
se constitui de um sistema monetário - semelhante ao ouro - em que pesam um conjunto
de crenças e valores determinados pela ótica masculina que dá valor às mulheres através
da imposição cultural de um padrão estético corporal.
Segundo elas, a "beleza" existe de forma objetiva e universal. Ela seria
justificada por ser de caráter exclusivamente feminino por necessária e natural, pois
estaria biologicamente atrelada a condição da mulher, além de sexual e evolutiva,
devendo ser obrigatoriamente encarnadas pelas mulheres. Wolf (1992) complementa:
"Os homens fortes lutam pelas mulheres belas, e as mulheres belas têm maior sucesso
na reprodução. A beleza da mulher tem relação com sua fertilidade; e, como esse

18
sistema se baseia na seleção sexual, ele é inevitável e imutável. Nada disso é verdade.
(WOLF, 1992, p. 15)".
Nessa relação mercantil, a publicidade se encontra a serviço da Indústria
Cultural quando ela se dirige às mulheres, compactuando com uma ideologia masculina
de dominação que transforma em consumo a espetacularização da beleza. Buscando
entender um pouco mais sobre essas estratégias, Campos (2010) nos traz Foucault e Del
Priori com o objetivo de explicar o termo “performances de gênero”, a fim de distinguir
a ideia de que o gênero pode ser performado a partir da sexualidade (feminina e
masculina), estando ambas num palco de disputa em que uma parece anular o outra.
Dessa forma houve então a necessidade de se criar simbolicamente atributos
relacionados aos homens que seriam invalidados ou inexistentes na mulher. E disso
abstraímos que, segundo Foucault (apud CAMPOS, 2010, p.47), as concepções
correntes sobre a sexualidade feminina e masculina são estratégias discursivas que
visam anular as semelhanças existentes entre homens e mulheres, para por fim, tornar
obrigatórias as performances de gênero.
Desse modo, anseia-se que os homens tenham corpos musculosos - símbolos de
força e de virilidade - e que a masculinidade seja sinônimo de coragem, autocontrole e
agressividade. Para as mulheres, esperam-se formas físicas menos rígidas e mais
curvilíneas. Elementos como o altruísmo, a docilidade de comportamentos, fragilidade e
a submissão e, sobretudo, a capacidade de sedução são performances esperadas da
mulher. Contemporaneamente, segundo mostra Del Priore (1993), depois de todo esse
processo de delimitação e atuações, ocorre a submissão feminina aos ideais de beleza
tão propagados pela publicidade.
Outro conceito que nos é importante na definição do que é o masculino e
feminino na questão publicitária é a trazida por Kathryn Woodward. Woodward (2000)
nos traz o conceito de identidade relacional, estando ela envolvida com algo externo.
Esta identidade relacional depende de algo fora dela para existir, ou seja, a identidade
seria marcada por aquilo que ela não é. Em suma, marcada pela diferença. A partir desse
conceito,
podemos dizer que a publicidade constrói o masculino e o feminino de forma
relacional, simplista e rasa: feminino é o que não é o masculino e vice-versa.
Lembramos, a propósito, que a mulher foi historicamente definida, em séculos
anteriores, como não tendo o que o homem tinha: não tinha força física, não
tinha músculos, etc. (ZAMBONI, 2013, p. 65).

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Essa era uma conceituação relacional e hierarquizada, pois acreditava-se que a
mulher era menos que o homem, que ela sempre estava no patamar inferior da escada.
Dentre todas as definições, a que mais nos interessa é a que diz que o discurso
publicitário vai, quase sempre, apresentar as reproduções do que seja feminino e
masculino de forma quase estanque, com as categorias definidas por estereótipos,
símbolos, e significações pré-estabelecidos, rotulados como típicos de cada gênero.
Zamboni (2013, p.66) nos traz o exemplo da imagem da mulher associada ao batom, ao
salto alto, à cor rosa, quanto ao tipo de comportamento, angelical, frágil, delicada,
passiva. Enquanto para o homem a imagem está associada à força, os músculos, a cor
azul devendo ele ser poderoso, forte, ativo e dominador. Não ocasionalmente, estas
imagens remetem a categorias impostas culturalmente para cada um dos gêneros.
Essas categorias citadas não estariam limitadas a um único campo de
significação. Haveria uma infinidade de possibilidades de caracterização para
representar cada uma delas.
Quando o discurso publicitário articula de modo fixo e estanque, ou seja, em
direção oposta à do discurso construtivista, a publicidade acaba por reforçar
valores sociais e culturais hierarquizados, insistindo numa visão em que o
homem é o pólo superior de uma parceria desigual e desequilibrada.
(ZAMBONI, 2013, p.146).

Disto, concordamos que, até bem pouco tempo, a maior parte das publicidades
reproduzia uma concepção ultrapassada de que os gêneros eram fixos e imóveis, de
modo a delimitar as características e os valores pertencentes ao universo de cada um,
em que homens eram fortes, agressivos, ativos e másculos; e as mulheres, frágeis,
delicadas, sensíveis e passivas.
Para demonstrar como algumas mudanças foram incorporadas ao discurso
publicitário, Mira (2003, p.35) atenta para o fato de que historicamente houve alguns
avanços importantes. Estes aconteceram em meados da década de 80 quando as
mulheres passaram a reivindicar essa relação com o corpo masculino – não
necessariamente pela identificação ou não identificação com o corpo masculino, mas – a
partir de uma atitude reivindicadora quanto à representação da sua própria sexualidade.

O mais importante é que se delineia a partir de então uma mudança no jogo de olhares
masculinos e femininos. A mulher jovem de classe média dos anos 80 já não se
identifica tanto com a heroína da fotonovela, passiva porque predestinada a ser feliz. Ela
é mais atrevida, título de uma das revistas criadas na época para este segmento. O
melhor índice dessa mudança parece ser a sua relação com a imagem do corpo
masculino. Distantes de suas avós ou mães que se maravilhavam com o rosto de seus
astros mais queridos, as gatinhas dos anos 80 vêem seus gatos em poses de corpo
inteiro, bem mais sensuais, com ênfase no tórax, nas virilhas, nos braços musculosos,

20
não de todo nus, mas cada vez com menos roupa. Isto parece indicar que essas mulheres
estejam aprendendo a olhar para o corpo masculino, começando a romper a histórica
barreira criada pela dinâmica da primazia do olhar masculino. (MIRA, 2003, p.35)

Cabe salientar que do lado dos homens, também ocorreram transformações. Nas
duas últimas décadas do século XX, começaram “a emergir, ao menos nos meios mais
urbanizados, o que tem sido chamado de uma “nova masculinidade”, na qual, um dos
aspectos mais relevantes é a preocupação - do homem - com a própria imagem, domínio
até então reservado às mulheres.” (MIRA, 2003, p.36). Segundo a pesquisadora, essa
nova masculinidade derivaria de uma mudança de orientação da ética do trabalho para a
do prazer entre os homens jovens das classes altas, teria a ver com a expansão do
mundo da arte nas grandes metrópoles ou com a ampliação das possibilidades de
estetização da vida cotidiana. Num movimento quase avesso ao do início do século, ela
explica que a partir dos anos 90, o setor de publicidade que mais crescia nas revistas
masculinas era o de moda. E dentro da lógica de consumo tida como tipicamente
feminina, “as estatísticas já mostravam que os homens estavam procurando, cada vez
mais, cuidados estéticos e de rejuvenescimento de todos os tipos.” (MIRA, 2003, p.36).
Adiantando a questão de representação de gênero enquanto uma questão de
estereótipos, conceito que será melhor visto nos próximos subcapítulos, finalizo com a
seguinte constatação de Campos (2010) acerca do que consideramos enquanto
conceituação sobre o masculino e o feminino nas narrativas da cultura de massas,
principalmente na publicidade, recorte desse estudo. À luz do estereótipo, os
espectadores criam modelos de identificação e de distinção do que seria pertencente ao
universo masculino e ao feminino. Repetidamente, essas classificações legitimam e
reproduzem uma forma ideológica de gênero, que na atividade publicitária é reforçada e
ampliada. Outras clivagens como as de raça, a de classe e a de geração também ganham
reforço.
Por conseguinte, a diversidade como bola da vez é incorporada ao planejamento
publicitário, e se apresenta em forma da presença dos “excluídos” – a presença de
pessoas mais velhas, mais gordas, negras ou “pobres” sempre se deu em momentos de
exceção. Contudo, nos cabe salientar que “a presença de tais estereótipos passa pelos
mesmos mecanismos que são usados para colocar o homem branco burguês
heterossexual em condição de supremacia”. (CAMPOS, 2010, p.45).

21
Representações de gênero nas imagens publicitárias

Começamos esse tópico trazendo um pensamento de Debord (2006) que


considera que além de a publicidade se colocar como redutora de representações, ela é
indutora da construção de identidades, e age no espectador de modo a fragilizar sua
própria identidade diante daquela que lhe é induzida pela publicidade. Ele salienta que
alienação do espectador se dá em favor do objeto contemplado, como uma ação
inconsciente em que quanto maior o grau de contemplação, menor vivência e
consciência terá o homem sobre os seus próprios desejos e anseios.

As representações midiáticas se apresentam como redutoras do sujeito, pois se


limitam às representações hegemônicas, funcionando como barreiras para a expansão de
identidades outras. Lipovetsky (2000) entende que a mídia é, de certa maneira,
limitadora das identidades individuais, e estende uma crítica feroz à publicidade que
sujeita as mulheres a uma uniformização e padronização impostas pela nossa sociedade
ocidental.

Máquina destruidora das diferenças individuais e étnicas, poder de uniformização e de


conformismo, instrumento de sujeição das mulheres às normas da aparência e da
sedução, de todos os lados jorram críticas contra a publicidade na superfície leviana,
mas na verdade, tirânica, sexista e mesmo racista, pois impõe a supremacia dos cânones
estéticos ocidentais (LIPOVETSKY, 2000, p. 164).

Precisamos estar atentos para o fato de que ao se buscar uma diferenciação com a
compra de um produto pela promessa de que com a sua aquisição deste nos tornamos
únicos, caímos numa ilusão que nos faz acreditar que ao adquirir mais do mesmo
estamos nos distinguindo. O modo de produção em larga escala faz com que a grande
massa sempre consuma os mesmos produtos.
A publicidade se utiliza do discurso de particularidade para nos convencer que ao
comprarmos um determinado produto, estamos nos diferenciando dos demais
indivíduos. No final, a publicidade nos oferece apenas a ilusão da “diferenciação”, por
isso que muitos comerciais oferecem um produto para tornar o consumidor “único”,
quando na verdade, o está igualando à grande massa consumidora.
Assim, entendemos que as imagens publicitárias são representações de valores
sociais arraigados culturalmente. Entender a importância dessas imagens passa pela
perspectiva de como se constroem os discursos publicitários a partir das representações

22
de gênero. Sendo então, o melhor exemplo que podemos destacar nesse sentido, as
publicidades de cerveja.
A publicidade de cerveja por anos vem trazendo a ideia de objetificação e
sexualização do corpo feminino. Com frequência, elas recorrerem à figura de mulheres
seminuas como estratégia para atrair a atenção masculina, de certo maior público alvo
consumidor. O conceito central dos comerciais de cerveja parece sempre remeter a ideia
de que o espectador ao consumir a cerveja, terá o mesmo prazer que a mulher do cartaz
poderia lhe proporcionar, podendo ele até levá-la de brinde, se assim fosse possível.
Neste sentido, se as peças publicitárias de cerveja têm se mantido por anos
utilizando-se da construção de personagens femininas sexualizadas ou erotizantes é
porque os códigos culturais partilhados em nossa sociedade têm contribuído para esta
manutenção. Se assim não fosse, a estratégia publicitária não seria mantida, já teria
fracassado. Talvez este seja o ethos da publicidade de cerveja, que, a propósito, tem
suas mensagens direcionadas ao público masculino. “Visivelmente as peças são
direcionadas ao público masculino que, apesar de não estar presente graficamente, é o
observador natural e para quem toda a linguagem publicitária é direcionada.” (DIAS,
2011, p. 96 apud OLIVEIRA, 2014, p.52)
Outra estudiosa a analisar a problemática da publicidade de cerveja é a mestre
em comunicação Heloisa Helena Oliveira, que diz: “as mulheres são bastante utilizadas
para vender cerveja, (elas) movimentam e atraem os homens para o consumo, no
entanto, são apagadas na linguagem e no discurso das peças publicitárias da cerveja
Skol (OLIVEIRA, 2014, p.136).”
Em sua dissertação, intitulada A construção das relações de gênero na
publicidade da cerveja Skol: uma análise sobre consumo, cultura e criatividade, ela faz
um estudo minucioso das campanhas publicitárias da marca Skol durante os 23 anos de
existência da marca até a data da pesquisa, atestando, ao final, que existe um estímulo e
até certo ponto, um certo grau de consentimento em se alterar essa configuração.
Contudo, apesar de todo o aparente esforço, as campanhas ainda não conseguem
integrar as mulheres nos seus discursos de forma a refletir um retrato econômico, social
e político mais próximo da realidade (ou das aspirações) que as mulheres vivem nos
dias atuais.
Abrindo um parêntese para relativizar sobre quais seriam as novas concepções
sobre o consumo, temos o entendimento proposto por Giddens (1997) que diz que nas
últimas cinco décadas através de mudanças impulsionadas pela globalização, pela

23
desconstruções de valores tradicionalistas e por uma reflexividade social, ocorreram
mudanças no consumo das pessoas. Com reflexos mais profundos nos países
industrializados, porém com impacto cada vez maior em escala mundial, têm-se dado
maior importância ao papel político do consumo.
Giddens assinala que os indivíduos estão mais engajados em ações de consumo
mais responsáveis, ações estas que ampliam também o sentido da cidadania. Nisso, ele
define que “a cultura do consumo se constitui num campo privilegiado no qual se
situam as reivindicações do sujeito, da mesma maneira que a sociedade industrial
constituía o campo onde se formou o movimento operário” (GIDDENS, 1997, pág.72).
Nessa nova cultura de consumo, haveria uma tendência de mudança da
participação política, da esfera pública para a privada, constituindo-se um novo tipo de
cultura política. E estas se dão pelo fato de que os canais de participação e influência
coletiva têm sido substituídos por canais individuais. A mobilização coletiva tem
perpassado a esfera individual com maior facilidade.
Conforme Beck (2002, p.6), é essa ação individual "que propicia que o
engajamento de atores sociais não organizados em práticas de consumo político,
representando, portanto, uma ampliação do campo político em direção à esfera privada e
à vida cotidiana, o que poderia configurar uma sub-política”.
O consumo político ou de ativismo trata-se de uma tentativa de dar concretude à
adesão a valores em prol de melhorias sociais e ambientais, materializando-os e
tornando-os públicos. Beck nos diz, nesse contexto, que as ações e escolhas mais
triviais e cotidianas são percebidas, podendo influenciar rumos globais das demandas
sociais. Na vida privada, ele é um tipo recente de "ação política em que o aspecto
politizador se constitui no fato de que o microcosmo das condutas pessoais se inter-
relaciona ao macrocosmo dos problemas globais (Beck, 1997, p.4)". Ele cita como
exemplos perfeitos de consumo político as ações de boicote e a racionalização no uso
doméstico de bens e serviços como água, energia, automóvel e etc.
No estudo, veremos a importância desse conceito para se refletir se tais se fazem
presentes na vida das mulheres quando estas reivindicam a sociedade um real processo
de empoderamento. Na publicidade, e mais especificamente, nas redes sociais como
esse tipo de consumo pode se fazer presente, trazendo novas perspectivas de ação e de
engajamento para a causa feminina. Essa nova configuração de consumo possibilita que
o ativismo via consumo político é um caminho efetivo e, como intenção, parece
estar se saindo bem na sua tarefa.

24
Com efeito, trago os mesmos questionamentos feitos pela autora em seu estudo e
que aqui deixo como provocação. E que aqui servem para se questionar qualquer marca
que se proponha a fazer publicidade do feminino. Primeiro: como explicar o
descompasso do avanço das mulheres no mercado de consumo de cerveja e a não
correspondência desse mercado em investir em publicidade para esta fatia da
população? Segundo: estamos falando da alienação do mercado para estas mulheres, ou
seria porque a publicidade não as influencia, ou ainda porque elas estão satisfeitas com
o modo como elas estão sendo apresentadas nas peças publicitárias? (OLIVEIRA, 2014,
p.133).
Como tais questões não poderiam ser ignoradas, cremos que uma possível
resposta poderia vir até do próprio questionamento que aponta a alienação como uma
hipótese para a não reivindicação do público feminino por uma publicidade mais atenta
a uma representação real das consumidoras de cerveja (ou da mulher como um todo).
Esta questão se torna difícil de ser respondida por estarmos ponderando através
de um antigo e complexo sistema, cada vez mais sutil. A combinação das forças do
sistema capitalista com as do patriarcado tem nos reflexos da publicidade de cerveja a
intenção de lucro como também a intenção da manutenção do poderio masculino. Isto
é, não interessa às empresas agregar as mulheres integralmente ao mercado, mas sim
parcialmente, de modo que o poder hegemônico dos homens continue, tanto sobre os
corpos das mulheres quanto sobre a propriedade dos meios de produção.
Sendo assim, a publicidade de cerveja opera (ou até bem pouco, não escondia
operar) o mundo feminino totalmente a serviço dos homens, optando por assim fazer
porque tem poder e estrutura para agir dessa forma. Saindo um pouco da publicidade da
cerveja a qual foi por anos combatida e amplamente criticada pelos seus conteúdos
machistas, além de ser campeã de denúncias feitas ao CONAR5, trazemos mais uma
provocação da qual a mulher brasileira é cercada.
Na publicidade brasileira, a mulher é carregada, com frequência, de estereótipos
como os da mulher “bela por natureza”, com “curvas marcadas” e “sensualidade nata”.
Em contraposição, surge de outro lado o estereótipo arcaico de “rainha do lar” que ora é
a trabalhadora do lar, aquela que faz faxina, cozinha, lava roupa – multiuso, sempre com
um sorriso estampado na cara; ora ela é a mãe, aquela que gerencia a família, cuida dos

5
BEZERRA, Mirthyani. Conar puniu sete peças publicitárias por denúncias de machismo em 2016.
Disponível em https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2017/04/11/conar-puniu-sete-
publicidades-por-denuncias-de-machismo-em-2016.htm?cmpid

25
filhos, dos bebês. Pior é quando ela não concentra todas as funções numa só, sob o
estereótipo da moderninha faz-tudo, que duplica ou triplica a jornada de trabalho,
sempre com ar de satisfação e disposição.
Mas a que nos interessa nesse estudo é exatamente aquele estereótipo que ligado
à beleza, mais enfaticamente a do corpo, aparece como a mulher sexualizada, aquela
que seduz, e se oferece ao homem, prometendo sempre uma performance sexual
extraordinária.
Vemos, principalmente a partir desses dois exemplos, que os discursos sobre o
corpo feminino são reproduzidos com frequência nas representações do feminino na
publicidade. O que nos leva a crer que a publicidade pode ser sim um elemento fixador
de performances de gênero. Contraditoriamente, não se pode descartar também a
possibilidade de desconstrução desses valores pela própria publicidade. Por isso, é
relevante fazer um paralelo das representações femininas na publicidade com os
discursos dominantes sobre a situação da mulher na história brasileira.

1.2.1 Representações do feminino na publicidade: a mulher e seus estereótipos

É notável e imprescindível afirmar que o papel da mulher na sociedade mudou.


As mulheres estão seguindo carreiras estáveis fora do lar e se afirmando em profissões
que já foram campos exclusivos dos homens. As mulheres da nova geração colhem os
frutos das conquistas femininas anteriores, inaugurando um novo modelo de
comportamento, cabendo-lhes acreditar que estes novos modelos podem ser seguidos
(ou recriados) em contraposição aos velhos arquétipos de padrão de comportamento
social.
O termo “estereótipo”, que expressa um juízo de valor acerca de um grupo
social, tem seu sentido vinculado ao contexto de origem. O estereótipo se caracteriza
por expressar um julgamento de valor simbólico que se institucionalizou numa tradição
consentida. A distribuição e reprodução desses estereótipos vai se dar de diversas
formas e em diversos ambientes sociais, desde a manifestação de um comportamento
sexista contra a mulher até pequenos gestos cotidianos de assédio justificados, por
exemplo, pelo tipo de vestimenta da mulher.
Conforme vimos no tópico anterior, a Indústria Cultural trabalha com alguns
estereótipos femininos, fortemente marcados por características como a juventude e a
magreza. A influência dos meios de comunicação na instauração desses padrões de

26
beleza é inegável. Assim, com a reprodução constante de imagens de mulheres jovens e
magras, a publicidade transformou o corpo feminino no mais novo fetiche de mercado.
Ele é um produto anunciado, comentado e desejado por milhares de consumidoras que
veem nele a promessa de felicidade plena e realização como objeto de sedução e prazer.
Cabe também apontar que no trabalho de Pires (2007), no qual são evidenciadas
características marcantes de representação das mulheres a partir da década de 50 –
talvez o grande início dessa tendência. Temos que houve uma mudança muito
significativa ao longo dos anos na forma de se representar as mulheres na publicidade.
No estudo, ela seleciona uma série de anúncios de cada década e analisa as tendências
publicitárias de cada período. Sendo então, nas décadas de 50 e 60, evidente a imagem
da mulher como mãe preocupada com a família, como jovem em busca de um marido, e
também como mulher moderna, principalmente devido ao desenvolvimento das
indústrias de bens de consumo. Os produtos voltados para o público feminino nesse
período exibem signos que remetem essencialmente à sensualidade e à delicadeza
femininas.
A partir das décadas de 70 e 80, se torna crescente a participação das mulheres
no mercado de trabalho, e as publicidades continuam não acompanhando as evidentes
mudanças sociais. Elas prosseguem reforçando o corpo, a beleza, a sensualidade, a
maternidade e a família. Nos anos 90, a mulher passa a aparecer não só como dona de
casa, mas também como uma profissional bem-sucedida. Entretanto, ainda assim, são
percebidos limites na extensão do espaço público destinado aos homens e do espaço
doméstico às mulheres. É evidente a dupla jornada de trabalho para as mulheres nos
comerciais.
A (falta de) sintonia entre as representações femininas e a atualização de valores da
sociedade tem sido alvo de questionamentos e preocupações por parte do próprio
mercado publicitário. Na opinião de Carla Alzamora, diretora de planejamento da Heads
Propaganda, em entrevista ao portal Propmark, as agências e os anunciantes têm se
equivocado ao tentar representar a mulher de forma mais justa pelo caminho óbvio de
“inverter a balança”: “Quando a gente fala de empoderamento feminino é porque esse é
um meio para alcançar a equidade de gêneros. [...] ridicularizar um gênero ou outro não
contribui em nada para a equidade” (Barbosa & Zirondi, 2015 apud OLIVEIRA-CRUZ,
2016, p.13)

Assim, em um contexto de mudanças culturais, das quais se incluem uma


ressignificação das esferas de produção e de difusão de mensagens por parte dos
consumidores, a resposta do público tem sido rápida e alcança proporções significativas
para a imagem da marca. Como veremos mais à frente, as redes sociais e um novo
modelo de se fazer marketing tem contribuído de forma consistente para que os valores

27
contrários ao posicionamento das mulheres na busca por igualdade de direitos nos
domínios público e privado através da circulação de mensagens publicitárias
consideradas machistas sejam fortemente combatidas por ativistas e pelo público em
geral.

1.2.2 A identidade feminina na Publicidade

Começamos por dizer que não há nada fixo em relação à identidade. Quando nos
referimos a ela, estamos nos referindo a um conceito que está sempre em movimento.
Seria ela, na verdade, fruto da construção e da desconstrução dos diversos contextos e
situações que se apresentam aos indivíduos. Para Stuart Hall (2011), a identidade está
em processo de transformação. As velhas identidades estão em declínio, abrindo espaço
para a fragmentação do indivíduo moderno, que antes era visto como um sujeito
unificado, de identidade fixa e sólida. Para ele, a identidade do indivíduo esteve sempre
centrada e unificada num núcleo interior, que emergia pela primeira vez quando o
indivíduo nascia ou quando ele se desenvolvia. A essência de um indivíduo era centrada
em sua identidade. (HALL, 2011)
Ainda nessa questão, Hall enfatiza que as identidades flutuam no ar, sendo
algumas delas identidades que assumimos através da nossas próprias escolhas, e outras
são lançadas e infladas pelas pessoas à nossa volta. O que se faz preciso para ele é estar
em alerta constante para defender as primeiras em relação às últimas.
Outro pensador que da mesma forma tem uma preocupação acerca da construção
de identidade é o filosofo Zygmunt Bauman. Ele avalia que as representações de gênero
da publicidade estão, na verdade, nos dizendo quais identidades devemos assumir,
sendo que, nesse caso, torna-se mais difícil de serem negociadas visto que nos são
oferecidas prontas e limitadas, abrandando a ideia de que são sutilmente impostas.
Acreditamos que uma identidade não é construída isoladamente, ela é sempre
produzida em relação a uma outra identidade. As pessoas assumem posições de
identidade e se identificam com elas, pois se investem daquela posição no discurso que
ela lhes oferece. Por meio da representação, dos simbolismos, dos objetos, e do uso de
ícones, a publicidade constrói os campos semânticos da noção de “masculino” e de
“feminino”.

28
Nas representações publicitárias, ainda que por uma parcela mínima, as
espectadoras constroem suas identidades a partir de como elas se veem representadas
naquela imagem. Contudo, o mais perigoso é quando estas espectadoras e consumidoras
em potencial almejam para si a identidade ali mostrada, o que nos demonstra todo o
poder e fascínio que promete a imagem da mulher na peça publicitária no jogo de
encantamento do qual a maior parte dos anúncios de beleza feminina se valem.
Segundo Goffman (1987), no que toca mais especificamente a construção da
identidade feminina, esta ainda é categorizada em uma relação, ou contraposição, ao
homem. Seu lugar no sistema de classificações e sua posição na hierarquia indicam um
espaço que para ser revestido de valores precisa ter posição diferente e oposta ao
homem.
A identidade da mulher é marcada no sistema publicitário pelo lugar
diferenciado diante do universo masculino, distinguindo-se também da noção de
menina. Para ele, esse lugar pode ser até mesmo o de coisa ou próxima de coisa, mas
diferente de menina e subalterna ao homem. A identidade da mulher vai encontrar um
espaço entre contrastes que, ao mesmo tempo, se reveste de valores e articula todos os
demais. Esse é o momento para Goffman em que surge a atribuição de categoria
indivíduo à identidade feminina.
Para Goffman (1987), a identidade feminina é construída através de valores
diversos, recortada com riqueza e detalhada nas representações publicitárias. Haveria
daí uma espécie de ritualização do feminino nos anúncios publicitários. As imagens da
mulher se encaixam em rubricas como submissa, escondida, criança, brinquedo,
engraçada, dócil e feliz. Em Rocha, temos que “mais de um sentido básico dessa
imagem da mulher no anúncio é obtido pelo contraste em face do mundo masculino,
que clássica uma devida posição hierárquica para a identidade feminina.” (ROCHA,
2006, p.53).
Em suma apreendemos que a maioria dos anúncios colocam em cena homens e
mulheres evocando, aparentemente uma fissura na divisão e na hierarquia tradicional
dos sexos. A mulher aparece frequentemente em posições subalternas ou de assistentes.
Contrariamente, o homem surge em uma posição mais alta, simbolizando um instituto
superior, e sendo representado numa postura protetora variável segundo o meio social
com o qual se relaciona – surgem figuras do homem familiar, do profissional, do
amoroso.

29
A mulher é colocada na posição de “sedutora” como se isto fosse tudo o que a
mulher gostaria de ser, desconsiderando-se qualquer outra face que ela possa apresentar
e tendo como intenção submetê-la a uma redução, a uma simplificação. Quando
analisamos as representações do corpo na publicidade, percebemos que há uma
limitação até maior no que tange à diversidade dos corpos. Assim, compreendemos que,
ao mesmo tempo em que a publicidade disponibiliza algumas possibilidades de
identificação da espectadora com as representações da mulher mãe, ou mulher
misteriosa e sedutora, ou outras, ela limita a possibilidade de representações de seus
corpos a um corpo padronizado, muitas vezes, de pele clara, magra, loira e alta.

1.2.3 O Corpo feminino na propaganda

Quando se trabalha com a publicidade como suporte para um discurso sobre


representações de gênero, tem-se como hipótese de que a publicidade possui certas
especificidades. A publicidade traduz a produção para que esta possa virar consumo,
ensinando modos de sociabilidade enquanto explica o quê, onde, quando e como
consumir, e ainda mais: “é a publicidade que sustenta, em larga medida, a possibilidade
de sermos os alegres receptores cotidianos das diferentes mídias.” (PRADO, 2016, p.
57).
Essa dinâmica representa um grande desafio para as marcas que a todo momento
precisam manter seus discursos vivos e próximos de seus consumidores. É notória a
estratégia das empresas de incorporar aos valores de suas marcas questões que estão em
pauta na mídia, como no caso das empresas de produtos cosméticos e as demandas
feministas. Uma dessas estratégias se dá por meio da utilização dos corpos.
A estratégia publicitária objetiva persuadir o consumidor por meio da
apresentação de um produto associado a um corpo. Por sua vez, não podemos esquecer
que este corpo está inserido em uma determinada formação cultural, social e ideológica
da qual, portanto, se constitui como um modo de presença no mundo. Discursos sobre
os corpos são projetados. O fazer e o pensar carregam toda uma carga sociocultural que
é, por vezes, determinante para a representação da corporeidade.
Uma questão abordada por Bourdieu (2007) que acreditamos ser de vital
importância na problematização do uso do corpo feminino pela publicidade se faz
quando ele considera que a interiorização do habitus dominante faz com as mulheres
permaneçam num constante estado de "dependência simbólica". Para ele, instalou-se na

30
mente das mulheres a ideia de subserviência, criou-se uma expectativa excessiva em
agradar, uma vontade demasiada de atendimento das demandas sociais, dentre elas a da
beleza, a qual desdobra-se numa preocupação descomedida com a aparência.
Essa dependência coloca as mulheres num estado permanente de insegurança
corporal, uma vez que elas encontram-se presas entre sua experiência corporal real e a
imagem de um corpo ideal. Segundo o autor, o corpo feminino foi transformado numa
forma de capital cultural, que, mediado pelo consumo de uma variedade enorme de
produtos de embelezamento, permitiu às mulheres abandonarem a clausura dos lares e
entrarem para a esfera pública. O corpo belo, segundo o autor, nada mais é que o
"corpo-útil"; o "corpo consumidor", que consome não apenas a materialidade dos
produtos anunciados, mas também um conjunto de ideias, valores e estilos de vida.
Atualmente os discursos e dizeres sobre o corpo e sexualidade da mulher são
proferidos por diversas instituições. Percebemos que os discursos das igrejas têm uma
forte influência sobre as práticas e interdições do corpo feminino. O discurso médico
também se pronuncia sobre as práticas de maternidade, parto, gestação, reprodução e
saúde sexual.
Muitas vezes os ideais do movimento feminista se contrapõem a esses discursos,
tendo em vista, por exemplo, a luta do movimento pela liberdade e direito ao próprio
corpo, à sexualidade, ao prazer, e a luta por direitos sexuais e reprodutivos. O que fica
evidente a partir desses discursos é que o corpo da mulher está em constante disputa
ideológica. Zamboni dirá que “o corpo humano traz uma gama de significações e signos
que reafirmam características sociais. Ele é, então, apropriado e construído cultural e
socialmente. É, portanto, um campo de batalha onde vários discursos são constituídos”
(ZAMBONI, 2013. p.43)
Outra autora a analisar as representações da mulher na imprensa brasileira ao
longo dos tempos, tentando entender o discurso midiático sobre o corpo da mulher é a
mestre em comunicação Dulcília Schroeder Buitoni (2009). Em linhas gerais, Buitoni
evidencia que nas décadas de 1910 a 1930 as características emergentes da mulher são
de: “mulher-mãe”, “sacerdotisa da beleza” e a apreciação da beleza da mulher brasileira
com traços marcantes e característicos. Na década seguinte, em 1940 surge a "mulher-
celuloide", símbolo do processo de americanização durante a Segunda Guerra Mundial.
Nas décadas de 50 e 60 começam a aparecer a mulher moderna, fruto da
sociedade industrializada da época. Desde essa época, a mulher passa a ser vista como
um importante mercado consumidor que sofre a febre consumista dos anos do

31
desenvolvimento. Por volta da década de 1970, a liberdade sexual começa a ser pautada
pelos movimentos sociais, surgindo daí a representação da mulher "liberada”.
Enfim, nas décadas de 80 e 90 há um direcionamento para a beleza e estética do
corpo, consumo e culto às celebridades. O corpo assume o posto de elemento essencial
na construção da imagem das mulheres. Nesse sentido, é fundamental que essas
imagens e construções sejam sistematicamente analisadas como uma forma de se
entender como a cultura contemporânea classifica as diferenças entre grupos sociais
através do consumo.
Para Rocha (2006, p.55) “as diferenças começam a aparecer, na representação da
identidade feminina, quando investigamos os valores que são, especificamente,
distribuídos para construir essa individualidade”. Ele resume que a mulher, enquanto
individuo, é esvaziada virando apenas um corpo em que a sua posse, uso, beleza,
tratamento e realce, se tornam um bem de valor.

O corpo como principal posse, a tradução de fato, do indivíduo mulher é recorrente em


vários anúncios. O ponto significativo é que, em muitos deles, diferentemente dos
anteriores, que falam do corpo inteiro, o que é focalizado é um corpo decomposto em
diversas partes. Trata-se do corpo fragmentado. [...] Existem várias possibilidades para a
propaganda traduzir a individualidade feminina como propriedade de um corpo e de
duas partes. Ele é constitutivo da mulher. E os anúncios fragmentam indefinidamente o
corpo, dividindo-o em tantos pedaços quanto forem necessários ao produto – cabelo, pé,
mão, unha, olho, cílio, dente, entre outros. Nesse corpo segmentado, uma parte se
destaca por necessitar constantemente de algum tipo de tratamento. (ROCHA, 2006,
p.56)

Outra observação que aqui nos cabe, e também apontada por Campos (2010) é a
que fala que não é qualquer corpo que vai para o que ele chama de “vitrine”, sendo esse
“apenas o corpo belo, ou seja, aquele que se encaixa nos padrões de beleza socialmente
estipulados. Geralmente são expostos nus, seminus ou transbordantes de erotismo, com
o intuito de despertar o desejo.” (CAMPOS, 2010 p.51). Esse corpo belo não é
simplesmente uma estratégia forjada pela publicidade na tentativa de relacionar o que é
“desejável” com seus produtos, o corpo se transformou num dos produtos mais
relevantes da economia contemporânea.
O corpo está inserido na lógica cultural que o produz. Goellner (2010) afirma que
pensar o corpo como uma produção cultural constitui um desafio na medida em que
rompe com um olhar naturalista – perspectiva a partir da qual muitas vezes o corpo é
observado.

32
Entender que o corpo é produzido pela cultura é romper com essencialismos e
desnaturalizar o olhar que se tem sobre ele de forma a questionar os saberes tradicionais
que são considerados como “verdadeiros” e as vezes “únicos”. O corpo é provisório,
mutável, suscetível a inúmeras intervenções e cada cultura cria sobre os corpos suas
respectivas representações e, consequentemente, discursos. Corpos são então
construídos pela imagem que dele se faz e pela linguagem que fala dele. (GOELLNER,
2010)
A imagem da mulher na publicidade é construída de forma bem mais complexa.
Na verdade, a representação da mulher está submetida à representação mais geral do
indivíduo em nossa cultura. A individualidade feminina tende a ser representada
preferencialmente nos anúncios através da posse e do uso do corpo, contudo ela não se
resume exclusivamente a isso. Segundo Zamboni (2013), somos bombardeados por
todos os lados de imagens de corpos “perfeitos”. Seja na Tv, nas revistas, em Outdoors,
na internet ou nas redes sociais os corpos são a matéria prima das publicidades. A ideia
de um corpo culturalmente construído é reforçada pelo conceito de um corpo padrão o
qual ainda passa por um rigoroso tratamento de imagem e edição, tornando-os
verdadeiramente obras de arte.
Sobre esses estereótipos de corpo, Wolf (2012) nos diz com propriedade desde a
Revolução Industrial que as mulheres da classe média têm sido controladas pelos ideais
e pelos estereótipos. Ela analisa que este controle se dá através da mitificação da beleza,
abordado no capítulo anterior, a qual, disfarçada de componente natural, cria a ficção
social do ideal de beleza objetivado pelas mulheres.
É interessante atentar para outro aspecto que Wolf nos aponta de que sobre a
forma como esses estereótipos são apresentados. Fazendo referência as revistas, mas
aqui entendidas como qualquer forma visual de representação, temos:

Imaginem uma revista feminina que mostrasse de forma positiva modelos


rechonchudas, modelos baixas, modelos velhas — ou então não mostrasse nenhuma
modelo, mas mulheres de verdade. [...] Ela iria à falência, perdendo a maior parte dos
seus anunciantes. As revistas, com plena consciência ou com apenas consciência parcial
de agirem assim, têm de projetar a atitude de que aparentar a própria idade é horrível
porque 650 milhões de dólares da sua renda publicitária se originam de empresas que
fechariam se fosse agradável aparentar a própria idade. Elas precisam, conscientemente
ou não, promover o ódio das mulheres ao próprio corpo a um ponto tal que elas passem
fome lucrativamente, já que o orçamento publicitário de um terço da conta de alimentos
do país depende dos alimentos dietéticos. (WOLF, 2012, p.110)

33
Nesse sentido, Wolf (2012) desmascara que os anunciantes que viabilizam a
cultura feminina de massa – que ainda são os mesmos que financiam as campanhas
publicitárias para qualquer outro meio – são dependentes do mal sentimento que as
mulheres têm sobre o próprio rosto e ao próprio corpo a ponto de gastarem mais em
produtos e serviços estéticos objetivando serem belas por natureza.
No final de tudo, é obvio que a mulher, bem como as demais representações
presentes nos anúncios, tem por definição a função de viabilizar a venda de produtos e
serviços. Mas anterior a isso, vem a necessidade de criação de um universo dentro dos
anúncios que mantenha um diálogo intenso e constante com a sociedade, fazendo uma
edição muito próxima e particular das experiências sociais disponíveis.
Concluímos este capítulo parafraseando ROCHA (2006, p. 59): a mulher do
anúncio tem que ser mais do que simplesmente seu corpo. Pensar que o discurso
publicitário vai então, equilibrar e distribuir de forma diferente os dois termos – corpo e
individualidade – entre os gêneros de modo que seus atributos vão pressionar na
identidade masculina, e, inversamente, o corpo e seus atributos, na feminina, seria
pensar de maneira até ingênua.
O corpo traduz a mulher e o indivíduo, na versão feminina, se revelando através
dele. Disso resultando que a mulher não pode ser só corpo. Se faz imprescindível
agregar outros valores para compatibilizar o que se entende pelo retrato da
individualidade da mulher e por uma representação cultural abrangente do que é ser
mulher.

34
2. FEMINISMO PÓS – REDES SOCIAIS: REFLEXÕES SOBRE PUBLICIDADE
E EMPODERAMENTO FEMININO

A história das lutas feministas apresenta-se normalmente constituída por três


grandes ondas. A primeira partir das últimas décadas do século XIX, quando as
mulheres na Inglaterra organizaram-se para lutar por seus direitos em geral, e
particularmente, pelo direito ao voto (Sulfragettes). A segunda onda, com início dos
anos 50, faz referência à publicação da edição de O segundo sexo, de Simone de
Beauvoir, publicado em 1949. Obra da qual Beauvoir estabelece uma das máximas mais
famosas do feminismo: “não se nasce mulher, se torna mulher”. Num segundo capítulo,
a segunda onda continua com os desdobramentos do movimento hippie nos EUA, com a
crítica ao status quo da vida burguesa tradicional e seu lema: “paz e amor”.
Concomitantemente, na França com o “Maio de 68”, estudantes ocuparam a
Sorbone lutando contra diversas correntes burocratizantes na educação, na política e na
organização social. Neste período, a união dos estudantes encabeçou junto às frentes
operárioa em todo o mundo a luta a favor dos direitos femininos. Foi neste período que
emergiram fortemente os discursos sobre o uso da pílula anticoncepcional bem como os
discursos sobre os direitos femininos quanto ao corpo e ao sexo.
Por fim, a última onda, em 1963, Betty Friedan lança o livro que seria adotado
como uma espécie de ‘bíblia’ do novo feminismo: A mística feminina. Bem próximo
desse período (última onda) é que surgem as primeiras conceituações femininas acerca
do fenômeno do empoderamento. O empoderamento enquanto termo começou a ser
utilizado como sinônimo de emancipação social, em que a autoestima dos membros dos
grupos sociais seria ampliada, objetivando a ascensão desses grupos a um patamar de
melhores condições de vida na esfera social.
Em ambientes em que as pessoas possuem acesso a um maior capital social é que se
pode vislumbrar uma amplitude das possibilidades de empoderamento social frente aos
detentores do poder político e do próprio mercado. As primeiras ideias de
empoderamento estão ligadas à organização e a ampliação de redes de interrelação
social em que as comunidades podem desempenhar seu papel na construção de sua
emancipação social de forma mais abrangente e eficaz.
Segundo Iório (2002), nos anos 1970, a partir do movimento Women In
Development – Mulheres no Desenvolvimento (tradução nossa) –, com uma concepção
de empoderamento fortemente vinculada ao “poder sobre”, “para que houvesse um

35
empoderamento seria, então, necessário inverter a situação de poder. Que(m) o
detivesse, deveria ser destituído dessa posição, que passaria a ser ocupada pelas pessoas
empoderadas, nesse caso, as mulheres.” (IÓRIO, 2002, p. 36)

Tal teorização de poder trouxe subjacente a ideia de que para uns ganharem poder
outros teriam que perdê-lo, causando forte resistência por aqueles que se sentiam
ameaçados. Além disso, matinha a mesma lógica de estruturação de poder na sociedade,
na qual alguns detêm e outros não, sem, contudo, sua distribuição ser questionada.
(D’OLIVEIRA; QUARESMA DA SILVA, 2016, pág. 4)

No livro Breve História do Feminismo (2015) de Carla Cristina Garcia, ela nega
que seja impossível que as feministas não estejam de volta às frentes de luta. O Brasil,
segundo ela, se tornou um campo de batalha impulsionado pela reverberação do
movimento na Europa e nos Estados Unidos durante os primeiros períodos de
emancipação do feminismo.
Em sua maior parte, o movimento conseguiu exposição midiática principalmente
nas questões de direitos que envolveram o direito ao voto e, posteriormente, na segunda
e terceira década do século XX, de acordo com Garcia (2001). No Brasil, durante a
década de 70, ela comenta ainda que o feminismo encontra uma série de fatores que irão
impulsionar de modo mais favorável a abertura para sua discussão nos grupos
organizados e na mídia em geral. Contudo, em um movimento contrário a isso, o
contexto das ditaduras latino-americanas, as vozes importantes, por vezes, eram
silenciadas.
Na mesma época, segundo Célia Regina Jardim Pinto (2010), traça-se uma linha
cronológica sobre os principais fatos que vieram contribuir com o fortalecimento da
discussão feminista no Brasil, dentre os quais citamos a I Conferência Internacional da
Mulher (1975), da qual a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou que dali até
os próximos dez anos seriam tidos como a década da mulher. Neste mesmo ano, lançou-
se o Movimento Feminino pela Anistia de autoria de Terezinha Zerbini;

Com o movimento de redemocratização dos anos 1980, surge no cenário diversos


grupos e coletivos em todas as regiões do país. Abordando temas diversos: violência,
sexualidade, direito ao trabalho, igualdade no casamento, direito à terra, direito à saúde
materno-infantil, luta contra o racismo, opções sexuais, e na maior parte dos casos
ligados com fortes ligações aos movimentos populares de bairros e favelas – em grande
parte também atrelados aos grupos das Comunidades Eclesiais de Base da Igreja
Católica, que por sua vez levantavam também as bandeiras por saúde, educação,
moradia. A autora ressalta que este foi um momento particularmente interessante, pois o
movimento feminista brasileiro, que nasce com seus discursos tendo como

36
representantes da classe média letrada e culta passa a ter a contribuição viva com as
classes populares. (QUARESMA DA SILVA; D’OLIVIVEIRA, 2016, pág 4)

Quase uma década depois outros avanços como a Constituição de 1988 que
incorpora a questão da mulher no Artigo 5°, quando diz que “I: Homens e mulheres são
iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. E no Artigo 226,
Parágrafo 5°: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos pelo
homem e pela mulher”. Na teoria, perante a lei, estes dois artigos garantiriam a
condição de equidade de gênero, bem como a proteção dos direitos humanos das
mulheres pela primeira vez na República Brasileira.
Por fim, já no início XXI, Pinto (2010) nos indica que podemos apontar para uma
quarta maior conquista do movimento, que foi a foi a criação da Lei Maria da Penha
(Lei n. 11.340, de 7 de agosto de 2006). Lei na qual, enfim, se regulamentou os
mecanismos legais para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Foram bastante importantes nesse período conquistas como um maior processo de
profissionalização das mulheres, conquistas essas realizadas pelas Organizações Não-
Governamentais (ONGs) que trabalharam incessantemente nas mais diversas demandas
femininas, principalmente nos grandes centros urbanos. Outras demandas a ganharem
maior atenção foram um maior espaço à participação política até medidas de proteção
da saúde e direito ao aborto, por exemplo.
Para muitos estudiosos das questões do feminismo ainda não há um consenso sobre
o número exato de ondas que o movimento vem se configurando na contemporaneidade.
Por isso desse pequeno apanhado histórico para se compreender dentro da linha
histórica do feminismo no Brasil quantos marcos históricos o movimento registra ao
longo da sua história. O uso da tecnologia digital na difusão de ideias de igualdade entre
os sexos ainda poderia ser uma ilusão, apesar de apontar uma nova forma de luta. Em
matéria veiculada pela revista Época, de fevereiro de 2014, uma reportagem trazia
respectivamente como título e chamadas: “A nova luta das mulheres”. Escrita por de
Graziele Oliveira (2014), ela exemplifica que “O feminismo do século XXI se
multiplica em várias tendências. E usa a tecnologia digital para difundir a ideia de que a
igualdade entre os sexos ainda é uma ilusão”.
No texto da matéria se discute sobre o que seria esse “novo” formato de feminismo.
Segundo ela, configura-se de modo multifacetado e é alimentado diariamente por jovens
blogueiras. Este feminismo teria nascido em uma década onde, na teoria, os direitos
entre homens e mulheres já estaria consolidado como uma realidade. Contudo, estas
37
mesmas meninas ao adentrarem ao mundo adulto passam a perceber que nem sempre
esta é a realidade.
Partindo desse exato ponto, lançamos vista sobre o uso das plataformas de
comunicação digital como cenário propício de produção de conteúdo e de discussões
sobre o feminismo. Nesses ambientes, as temáticas ganham novas perspectivas,
inclusive com a propagação de algumas das demandas feministas tendo como porta-voz
campanhas publicitárias de diversas marcas. O olhar das feministas se torna cada vez
mais crítico e propenso a discussões e, principalmente quando partem dos movimentos
organizados em defesa dos direitos das mulheres.

À medida que as mídias sociais se tornarem cada vez mais expressivas, os consumidores
poderão, cada vez mais, influenciar outros consumidores com suas opiniões e
experiências. A influência que a propaganda corporativa tem em moldar o
comportamento de compra diminuirá proporcionalmente. Além disso, os consumidores
estão participando mais de outras atividades como videogames, assistindo a DVDs e
usando o computador; portanto, estão expostos a menos anúncios. (KOTLER et al,
2010, p.19)

Acrescentando-se a isso, a difusão das mídias sociais também contribui para a


disseminação do conceito de femvertising. Conceito que segundo Nascimento e Dantas,
(2015, p.4), “se deu também em conjunto com o ativismo digital, componente crucial da
quarta onda do feminismo (ciberfeminismo) – possibilitando a “viralização” destes
anúncios”.
Dados de pesquisas trazem que “as mulheres representam 51% dos consumidores
de internet no Brasil e buscam por conteúdos relevantes [...] mais da metade das
mulheres entrevistadas afirmou na entrevista que compraram um produto porque
gostaram de como a marca retrata mulheres em seus anúncios. Ademais, 63% das
mulheres consultam redes sociais antes de realizar uma compra (SOPHIA MIND,
2010)”.
Em Kotler et al, (2010, p.19) temos que “como as mídias sociais são de baixo custo
e pouco tendenciosas, será delas o futuro das comunicações de marketing.” O
networking social, como o Facebook e o MySpace, ajudam as empresas a desenvolver
seus insights e pesquisas sobre o mercado. Várias empresas estão buscando na internet,
muitas vezes de forma não tão transparente, coletar dados das redes sociais para
desenvolver perfis e elaborar melhores abordagens de comunicação para seus
empregados e consumidores.

38
Assim, faz-se imperativo dizer que, não obstante toda essa alteração do mercado
em que a causa feminista possa ter ganhado mais um canal de reverberação e
popularização do termo que por muito tempo foi tabu entre mulheres e homens, não se
pode esquecer que o feminismo trata-se de um movimento social, político e econômico
sério. Marcas e empresas que não contemplam o real significado da causa ou que as
desmereçam estão sujeitas a rejeições ainda maiores por parte do público.

2.1 As (novas) forças que estão definindo o novo marketing centrado no ser
humano.

Segundo Kotler et al, (2010, p.18) no seu mais aclamado livro de ensinamentos
sobre marketing, Marketing 3.0., desde o início do ano 2000, a tecnologia da
informação penetrou o mercado mainstream, transformando-se no que consideramos
hoje a nova onda de tecnologia. Para o autor, “essa nova onda abrange uma tecnologia
que permite a conectividade e a interatividade6 entre indivíduos e grupos”.
Essa nova onda de tecnologia seria formada por três grandes forças: computadores
e celulares baratos, internet de baixo custo e fonte aberta. Esta junção permite que os
indivíduos se expressem e colaborem entre si, corroborando para o surgimento de uma
nova era de tecnologia marcada participação, na qual as pessoas criam e consomem
notícias, ideias e entretenimento – a era da participação. A nova onda de tecnologia
transforma as pessoas de consumidores em prosumidores7 (KOTLER et al, 2010, p.18).
Para Rocha (2010, p.224), com tanta disponibilidade de mídias, é possível dizer o
quanto o sistema (midiático) conseguiu emergir se integrando às novas realidades de
mercado, social e cultural da geração atual. Esse modelo de comunicação foi alterado
substancialmente. Num passado não muito distante, o usuário era mediado pelos meios
de comunicação em um sistema hierarquizado, onde o conteúdo era filtrado e
disponibilizado de acordo com os interesses dos meios. Hoje, com o fenômeno da
internet e a criação das plataformas digitais, uma nova cultura foi se formando. A

6
No início de 2009, a Technorati detectou a existência de 13 milhões de blogs ativos ao redor do mundo.
Como ocorre nas mídias impressas, o público e a frequência de leitura dos blogs variam de um país para
outro. Ao contrário do que acontece no Japão, onde 74% dos usuários de Internet leem blogs, nos Estados
Unidos somente 27% dos usuários de Internet o fazem. Embora o número de usuários seja baixo, 34% dos
leitores de blogs nos Estados Unidos são formadores de opinião. Resultado: os blogs americanos
estimulam ações de acompanhamento por 28% de seus leitores.3 Seth Godin, conhecido profissional de
marketing, tem um famoso site que apresenta uma ideia nova por dia para influenciar milhares de pessoas
que optaram por receber seu feed. (KOTLER et al, 2010, p.18)
7
Neologismo da palavra “Produtores” + “Consumidores”. Disponível em:
< https://comuniquec.wordpress.com/2011/04/16/prosumidor-o-que-e-isso/>

39
cultura digital promoveu a quebra de barreiras entre o produtor e o receptor de
conteúdos, tornando esse esquema de comunicação hierarquizado insuficiente.
Para Piedras, (2005, p.66), através da articulação economia, cultura e tecnologia, a
publicidade ocupa um papel central no cotidiano contemporâneo. Nos espaços urbanos,
a vida dos sujeitos é atravessada pelos meios de comunicação. As experiências
modernas — como a urbanização, o desenvolvimento dos transportes e dos meios de
comunicação, a mobilidade geográfica e social, a privatização das instituições, a
democratização dos bens e da cultura, o estabelecimento de uma cultura de consumo, a
intensificação do caráter privado do mundo doméstico, o anonimato e as novas formas
de identidade e de comunidade – foram resultados dessa articulação.
Diante da crise de atenção que a publicidade televisiva vem enfrentando, o alcance
nesse meio está cada vez mais reduzido. Dentro das mídias sociais, o consumidor
passou a receber tanta informação que é incapaz de assimilar todas elas. “Há muitas
informações, contudo, e o tempo para processá-las continua o mesmo: o cérebro,
asfixiado diante de tão grande volume de estímulos, opera em percepção seletiva e só
retém a pequena quantidade que parecer relevante” (VAZ, 2011, p.100). Atualmente, as
produções lançadas em vídeo das publicidades crescem exponencialmente no ambiente
das mídias sociais.
Para MACHADO (2016, p.66), o crescente e promissor mercado de aparelhos
móveis8 e a crise de atenção dos telespectadores têm levado a publicidade a
reposicionar-se na ambiência das mídias sociais. Percebeu-se que após a chegada das
tecnologias de informação e comunicação, o perfil do consumidor passou por mudanças
significativas, alterando todas as cadeias de consumo 9da sociedade. A publicidade
talvez tenha sido o setor que mais sentiu o impacto dessas mudanças, pois sempre foi
utilizada pelas organizações como recurso para se comunicar com os seus públicos
consumidores.
As publicidades veiculadas na televisão e rádio tinham um perfil estático e
unidirecional que impossibilitava o telespectador de interagir com a marca anunciada.
Agora com o estabelecimento das mídias sociais, a publicidade veiculada na televisão

8
No ano de 2014, o mercado brasileiro gastou R$ 72121 milhões com publicidade móvel e essa é uma
tendência para os próximos anos devido ao crescimento dos usuários de aparelhos móveis. (MACHADO,
2016, p.67)
9
Retomando o que foi falado no capítulo 1.2, essas alterações podem ser entendidas como um das formas
de consumo político ou de ativismo. Nele acrescentam-se a constituição de uma ação cotidiana em defesa
de um modo de vida, e mais do que isso, de escolha - deste modo de vida (Portilho, 2009, p.5)

40
passa por uma crise, funcionando em segundo plano e tornando-se para muito
ineficiente no seu intuito de gerar envolvimento.
A superabundância das informações e o uso excessivo das tecnologias levou a
humanidade ao ponto de buscar com muito mais afinco a questão da humanização das
relações. Nunca se falou tanto em humanizar as relações como nos últimos anos. As
pessoas acreditam muito mais em alguém que como elas esperam tomar suas decisões
sem a influência dos meios, pois há um excesso de informações circundantes que, ao
invés de favorecer os processos decisórios, acabam por gerar mais incerteza na mente
das pessoas. Não, por acaso, que a prática do consumidor evangelista tem ganhado
forças nos últimos tempos.
Com surgimento do Marketing 3.0 pressupõe-se que os profissionais de marketing
em vez de tratar as pessoas simplesmente como consumidoras, estarão sensíveis a trazer
abordagens mais humanas. Cada vez mais, os consumidores buscam soluções para
satisfazer seu anseio de transformar o mundo globalizado num mundo melhor. Então se
faz justo que tenham o mesmo intento na relação de compra e consumo.
Há uma tendência de busca por empresas que abordem questões como a de justiça
social, econômica e ambiental em sua missão, visão e valores. Elas buscam mais do que
apenas uma satisfação funcional e emocional imediata, mas também desejam ter uma
satisfação espiritual, nos produtos e serviços que escolhem.
A ideia do Marketing 3.0 é a de colocar as questões culturais no âmago do
modelo de negócios da empresa. Na visão das empresas que se adequaram a essa nova
forma de fazer marketing existe a preocupação com as comunidades a seu redor:
comunidades de consumidores, empregados, parceiros de canal e acionistas. (KOTLER
et al, 2010, p.25). Segundo essas novas práticas, os consumidores não estão apenas
buscando produtos e serviços que satisfaçam suas necessidades, mas também buscando
experiências e modelos de negócios que toquem seu lado espiritual. Segundo os
mesmos autores, “proporcionar significado é a futura proposição de valor do
marketing.” (KOTLER et al 2010, p.27).
Outra característica marcante dos consumidores das novas mídias é que essa
geração nascida numa sociedade já digitalizada apresenta um comportamento mais
reativo que seus pais diante dos anúncios das marcas que eles considerem ofensivos.
Muitos deles consideram inadmissíveis anúncios publicitários invasivos e que não
permitem a interação do consumidor com a história.

41
As mídias sociais têm um código de conduta ou de postura próprio, necessariamente não
escrito, mas planetariamente institucionalizado, e que repudia a truculência, a
arrogância, o abuso do poder econômico e o uso de procedimentos do universo off-line
com o objetivo de sufocar as vozes divergentes, muitas vezes pela supressão legal de
blogs, perfis no Twitter ou Facebook ou de vídeos no YouTube (BUENO, 2015, p.137).

As empresas devem se preocupar com seus discursos. A transparência, a


honestidade e uma publicidade respeitosa são exigências desse público nas mídias
sociais que ao se ver afrontado não demonstra receio em dar um feedback negativo ou
mesmo criar conteúdos que ganham rapidamente a rede, fazendo que muitas marcas
retirem do ar publicidades que possam gerar valor negativo para sua marca.
Ao final, para Kotler et al (2010, p.27) – e para no nosso estudo – a nova onda
de tecnologia facilita a disseminação de informações, ideias e opinião pública, e permite
aos consumidores colaborarem substancialmente para a criação de um juízo de valor
para um determinado produto. A tecnologia impulsiona a ascensão do mercado criativo,
que tem sua visão de mundo mais centrado nas questões imateriais.
Em suma, a era do Marketing 3.0 é aquela na qual as práticas de marketing são
muito influenciadas pelas mudanças no comportamento e nas atitudes do consumidor.
Seria a forma mais sofisticada da era centrada no consumidor. Ele demanda abordagens
de marketing mais colaborativas, culturais e espirituais. E aqui nos interessa dizer que
nessa ambiência, novos padrões culturais são formados. Não se trata de dizer que é
apenas uma forma de comunicar e persuadir, o processo comunicativo publicitário
envolve toda uma dimensão simbólica de ordem econômica, política e social, e que por
isso não deve ser ignorado o seu poder de influência.

2.1.1 O discurso de humanização como estratégia de aproximação com o


consumidor nas publicidades das mídias sociais.

Segundo Gilles Lipovetsky (2000, p. 194) “a publicidade se exerce em outros


domínios que não (só) o do consumo. Ela é cada vez mais mobilizada para despertar
uma tomada de consciência dos cidadãos diante dos grandes problemas do momento e
modificar diversos comportamentos e inclinações.”, Comparando essa ideia a de Erving
Goffman (1987), cujo debate em relação da publicidade com o mundo social através das
imagens e representações criadas por ela leva a crer que “diferente das cenas do real, as
cenas publicitárias têm êxito não apenas pela arte e tecnologia nelas empregadas, nas

42
pelo uso de arranjos institucionalizados socialmente, que orienta os seus participantes.”
(2000, p.194).
Além de usar situações institucionalizadas em suas representações e reconstruir
os imaginários, a publicidade institui novas atitudes e imagens. A publicidade como já
fora mencionado, é um processo comunicativo cujas mensagens produzidas são
atravessadas pelo contexto do sistema econômico quanto pelas práticas culturais dos
sujeitos.
Machado (2016, p.72) lembra-nos que “as organizações precisam entender que o
excesso de informação gerado por suas marcas nas mídias sociais não irão favorecê-
las”, pois pode ocorrer exatamente o contrário. O objetivo não é apenas ‘empurrar
informações’, mas talvez a mais importante contribuição seja estar disposta a dialogar
com os seus usuários, a partir de pautas e agendas por eles definidas, de tal modo que a
perspectiva vertical e unilateral (que não configura efetivamente uma comunicação
autêntica) seja superada.
As marcas que busquem ter uma relação mais humana com seus usuários não
dever estar necessariamente focadas em gerar volume de informações nas mídias
sociais, mas sim devem criar uma comunicação direta e eficaz com seus públicos de
interesse. A humanização das relações entre marcas e consumidores prevê uma
aproximação com seus públicos e o excesso de informação afasta cada vez mais o
consumidor da marca. A humanização das relações exige tempo para absorver conteúdo
do que se é questionado e pressupõe respostas imediatas as marcas tem que se mostrar
abertas a ouvir o que o outro tem a dizer.
A interferência do consumidor na cultura comunicacional produzindo conteúdos
em larga escala é algo novo e fruto das tecnologias. O consumidor não só recebe o
conteúdo do seu círculo de amigos virtuais. Numa versão mais atual, Axel Bruns (2008
p.24), entende que o consumidor da cultura participativa como um produser, uma fusão
de produtor e usuário. A premissa dentro da comunidade de produsage é que quanto
mais participantes puderem examinar, avaliar e expandir essas contribuições terão mais
qualidade e atingirão um público ainda maior.
Os consumidores atuais consomem, produzem, alteram e compartilham
conteúdos. O compartilhamento de informações e conhecimentos é, sem dúvida, o
trunfo da cultura participativa e a menina dos olhos das organizações. Entendemos aqui
cultura participativa com a mesma ideia cunhada por Jenkins (2008) que explica que ela
é o conceito que dá expressão às novas relações entre conhecimento e poder que

43
emergem na cultura da convergência, onde pessoas com diferentes bases de
conhecimento debatem e se organizam através da produção participativa. Pois é a partir
desse processo de troca, por meio dele, que os usuários influenciam e são influenciados.
Segundo Jenkins (2008), os sujeitos hoje podem mais facilmente se apropriar de
conteúdos, recriar e distribuir diferentes materiais de forma mais fácil, rápida e barata.
Coincidentemente, constatou-se que as marcas estão investindo mais em esforços
publicitários para que o consumidor não só curta as suas publicações como também
comente e compartilhe e publicidade para a sua rede de contatos. Quando uma
informação é compartilhada nas mídias sociais, a sua audiência torna-se exponencial.
O compartilhamento de conteúdo, atualmente como peça fundamental do jogo
de engajamento e promoção da marca, é objetivado pelas empresas de marketing, pois
ao compartilhar uma publicação para seus contatos, o usuário envia uma mensagem
implícita nesse ato de que ele aprova aquele conteúdo e por isso quer reparti-lo com as
pessoas. Estamos aqui falando de conteúdo de teor positivo. Porém, e nada mais
democrático, também são os compartilhamentos com a intenção de se negativar a
imagem das organizações, compartilhamentos que visem criticar ou até denunciar uma
postura errada da empresa, precisam de um grande esforço para que a má informação
seja contida em rede.
Muitas vezes, esses engajamentos não acontecem por questões de interesses
comerciais ou financeiros. Essa nova geração de consumidores considera o ‘direito de
modificar’ o conteúdo como um patrimônio hereditário, não importando se é uma marca
que está mediando uma causa ou não. Para eles o que importa é que aquele conteúdo
possa servir para as trocas de informações entre as suas redes de amigos. (MACHADO,
2016, p.50)
As novas mídias democratizaram o controle da informação que estava sob o poder das
grandes corporações e o concedeu a qualquer pessoa. “A empresa de mídia impressa e a
rede de televisão são organizações hierárquicas que refletem os valore de seus
proprietários. As novas mídias, por outro lado, dão o controle a todos os usuários”
(TAPSCOTT, 2010, p.33). A emancipação do consumidor foi a mudança mais
significativa que a comunicação sentiu nos últimos tempos e que tem forçado as
empresas de mídia de massa a convergirem para os novos meios. Mas, atuar nesse novo
habitar da comunicação não é tão simples quanto parece, as organizações precisam
conhecer as diversas facetas que regem a linguagem da sociedade conectada antes de
ingressar nas plataformas sociais, é necessário estudar o ambiente digital e
principalmente o perfil dos usuários e os seus interesses. (MACHADO, 2016, p.33)

Só para relembrar o que foi falado no subcapítulo anterior, que traz as mídias
sociais como lugar onde as primeiras manifestações da Quarta onda feminista tiveram
palco importantíssimo. Nelas houve um fôlego de esperança para as pessoas que
44
ganharam voz e acesso a um mundo de informações e conhecimentos, antes somente
sob o domínio de poucos. Com a sua chegada, as mídias sociais apoderou o consumidor
– aqui no estudo mulheres (consumidoras) de um novo meio de comunicação, passando
elas a usufruir dos seus abundantes benefícios, inclusive o de torná-lo um canal coletivo
de reclamações.
As organizações resistiram ao máximo que puderam à presença das novas mídias,
ignorando as suas potencialidades, receosos da perda de controle sobre os seus públicos.
Contudo, os consumidores foram ganhando forças nas plataformas digitais,
organizando-se em comunidades, criando blogs, elaborando resenhas favoráveis ou
desfavoráveis às marcas, produzindo vídeos e publicando no YouTube etc. Num breve
espaço de tempo, as redes sociais foram povoadas por uma multidão de consumidores
(ativistas ou não) ávidas pelas inúmeras possibilidades de interação que as novas mídias
lhes proporcionaram.

2.2 Empoderamento Feminino como processo de fortalecimento das mulheres


nos espaços de participação social e democratização política

No livro Por que as mulheres compram? (2013), as autoras Lisa Johnson e


Andrea Learned observam que um grande número de mulheres não só contribui com
metade da renda familiar como são proprietárias do próprio negócio. Elas são as
principais agentes10 de compra tanto em casa quanto no trabalho. Dados de outras
pesquisas, como as trazidas no livro Women Want More (Mulheres Querem mais –
Tradução nossa) publicado em 2009 pelos consultores em negócios e criadores do The
Boston Consulting Group, Michael Silverstein e Kate Sayre argumentam que as
mulheres impulsionaram a economia devido a seu poder de compra, na época girando
em torno de US$13 trilhões em renda anual.
Esse montante representava mais do que o dobro da previsão do PIB combinado
da China e da Índia em 2009. Segundo eles, as mulheres controlam o poder decisório
quando se trata de questões importantes como alimentação e fitness - essas duas são a
maior causa de muitos dos problemas sociais relacionados à saúde das mulheres. Nesse
sentido, o investimento no ‘empoderamento’ do consumidor funcionará bem melhor
para as mulheres do que para os homens. Cerca de 44% das mulheres se sentem

10
É necessário considerar também que, de acordo com uma pesquisa realizada pela Sophia Mind18
(2010), as mulheres são responsáveis por 66% de todas as decisões de compra de tudo que é consumido
pelas famílias brasileiras.

45
privadas de autonomia e, por isso, buscam marcas que lhes proporcionem esse
empoderamento.
Deve-se atentar que a utilização do conceito empoderamento pode muitas vezes
servir apenas de disfarce instrumentalizado de maior controle por parte de alguns grupos
e/ou instituições, os quais condicionariam a distribuição de poder aos interesses de seus
grupos corporativos. Fazendo-se necessário, portanto, clarificar o sentido que se
pretende atribuir a esse conceito, identificando limites e possibilidades relacionados a
seu emprego. (KLEBA; WENDAUSEN, 2009, p.735)
Nesse ponto, temos um conceito anterior, conforme Costa e D’Oliveira (2013), do
qual a utilização ampla da terminologia nos Estados Unidos dos anos 1970, com as
primeiras abordagens dadas pelos movimentos de direitos civis, notadamente na ótica
étnico-racial, com intuito de conquista de uma cidadania plena dos negros americanos.
Nesse mesmo período, o movimento feminista começou a fazer uso desse termo,
embora com uma noção conceitual diversa: a de que o empoderamento poderia ser
compreendido como alteração radical dos processos e das estruturas, que reduziriam a
posição subalternizada das mulheres enquanto gênero. (QUARESMA DA SILVA;
D’OLIVEIRA, 2017).
Segundo Horochovski, empoderamento é o equivalente em português do vocábulo
inglês empowerment. Numa primeira mirada, empoderamento é quase sinônimo de
autonomia, na medida em que se refere à capacidade de os indivíduos e grupos de
poderem decidir sobre as questões que lhes dizem respeito, escolher, enfim entre cursos
de ação alternativos em múltiplas esferas – política, econômica, cultural, psicológica,
entre outras. Desse modo, trata-se de um atributo, mas também de um processo pelo
qual se aufere poder e liberdades negativas e positivas. (HOROCHOVSKI, 2006, p.1)
Pensando historicamente, a construção do empoderamento e seus múltiplos
sentidos advêm de várias origens. O empoderamento tem raízes nas lutas pelos direitos
civis, e depois, principalmente, no movimento feminista, assumindo significações que
se referem ao desenvolvimento de potencialidades, ao aumento de informação e
percepção, buscando uma participação real e simbólica que possibilite a democracia
(Baquero, 2005). Mais recentemente, a partir do conceito de desenvolvimento, como
ponto central a relação entre “poder” e “pobreza”, e no debate sobre a “modernização”
ou a “dependência” como causas do subdesenvolvimento, colocam-se em dúvida todas
as explicações anteriores sobre uma definição mais apropriada para o termo, porém
estes trazem uma nova perspectiva para o conceito.

46
Para Foucault (1996, p.736), que conceitua que “diferentemente do que vinha
sendo aportado até então, o poder no empoderamento não se dá de maneira monolítica,
não está num espaço pré-determinado, mas funciona em rede de modo que seu exercício
mais ínfimo passa a encontrar pontos de apoio em outros pontos da rede, podendo se
potencializar e potencializar outros poderes.”

No processo de empoderamento há duas faces, interdependentes, de uma mesma moeda:


a dimensão psicológica e a dimensão política. A primeira refere-se ao desenvolvimento
de um determinado modelo de autorreconhecimento, através do qual as pessoas
adquirem ou fortalecem seu sentimento de poder, de competência, de autovalorização e
autoestima. A segunda implica na transformação das estruturas sociais visando à
redistribuição de poder, produzindo mudanças das estruturas de oportunidades da
sociedade. Nessas dimensões do empoderamento, o desenvolvimento de competências e
da capacidade de enfrentar situações difíceis ocorre nos espaços da micropolítica
cotidiana e é fortalecido no espaço da política macro, à medida que as pessoas se
apropriam de habilidades de participação democrática e do poder político de decisão
(Herriger, 2006 in KLEBA; WENDAUSEN, 2009, p.737)

Quaresma da Silva e D’Oliveira trazem mais profundamente que o processo de


empoderamento feminino traz a à tona uma nova concepção de poder, e se assume com
contornos democráticos, construindo novos mecanismo de responsabilidades coletivas,
de tomada de decisões e de responsabilidades compartilhadas. Elas atestam que “de
fato, dados censitários dão conta de que as mulheres estão paulatinamente, adentrando
no mercado de trabalho em grande número, visto que alcançaram novos níveis de
educação formal” (2017, p.5), passando a exercer um maior controle sobre sua vida
reprodutiva, graças a ampla utilização de métodos contraceptivos. Elas acrescentam
positivamente que a utilidade de se assimilar estas mudanças operam um caminho para
se efetivar a formulação de políticas públicas mais adequadas à realidade das mulheres,
bem como de programas e práticas que busquem promover o empoderamento das
mulheres que ainda vivem à margem da sociedade.
Assim como elas, para esse estudo, ressaltamos e evidenciamos que “o
empoderamento das mulheres representa um desafio às relações patriarcais, em especial
dentro da família, ao poder dominante dos homens e à manutenção dos seus privilégios
de gênero. Uma mudança na dominação tradicional dos homens sobre as mulheres,
significa em grande medida a garantia de autonomia das mulheres no que se refere ao
controle dos seus corpos, da sua sexualidade, do seu direito de ir e vir, bem como um
rechaço ao abuso físico, ao abandono e às decisões unilaterais masculinas que afetam a
toda a família

47
2.3 Publicidade e gênero: análise do fenômeno femvertising na criação de
campanhas.

Difundido por Samantha Skey, conforme menção no capítulo anterior, o termo


femvertising resulta da soma dos termos feminino e propaganda, em inglês. Abordado
no Advertising Week em 2014, evento no qual profissionais discutiram o papel da
publicidade na disseminação de estereótipos negativos com relação ao gênero feminino,
a discussão foi pautada através de falas que tratavam de dados de uma pesquisa
realizada pela plataforma She Knows (2014) de que aponta:

91% das mulheres acreditam que a maneira como são retratadas na publicidade impacta
diretamente à sua autoestima; 51% das mulheres gostam de anúncios “pró-mulheres”,
pois acreditam que eles quebram barreiras de igualdade de gênero; 81% das
entrevistadas afirmaram que os anúncios que retratam mulheres desta maneira são
importantes para as novas gerações; 71% destas acreditam que as marcas devem ser
responsáveis por usar publicidade para promover mensagens positivas para mulheres e
meninas; 62% acham que qualquer marca pode entrar no espaço publicitário pró-
feminino; 94% acreditam que retratar as mulheres como símbolos sexuais em anúncios
é prejudicial; mais da metade disseram ter comprado um produto porque gostaram de
como a marca e sua publicidade retratam mulheres; e 46% têm seguido uma marca nas
mídias sociais , porque eles gostam o que a empresa representa. (SHE KNOWS, 2014).

A conclusão do painel apontou que as marcas estão voltando seus investimentos a


novas abordagens buscando com que o público (mulheres, especificamente) volte a se
identificar com as peças publicitárias. No Brasil, segundo Thais Fabris, “parece que a
publicidade finalmente acordou para a terceira onda do feminismo, que já ganhou a
música e a cultura pop há algum tempo. (FABRIS apud NASCIMENTO; DANTAS,
2015, p.3)” A fundadora da 65/10, consultoria especializada em comunicação com
mulheres, Fabris ainda aponta que “levantar as bandeiras da causa feminista é uma
escolha que está provando dar resultados.” (FABRIS apud NASCIMENTO; DANTAS,
2015, p.3).
Em um mercado em que todos os anos só as mulheres movimentam mais R$ 1
trilhão de reais e do qual 65% delas não se identificam com a forma como são
retratadas, parece bem arriscado investir nas velhas fórmulas de representação. Ao
escolher esse caminho de posicionar as marcas de forma alinhada com a pauta das
conversas e o pensamento dos consumidores, muitos consideram, até bem pouco tempo
um território de investimento até arriscado.
Dessa forma, apesar de entendermos o termo femvertising como publicidade
voltada ao empoderamento feminino carregado de conceitos a favor da capacidade das

48
mulheres nas mensagens e nas imagens, este não é um estado que se pode alcançar de
uma vez só, de forma automática ou definitiva, pois remete a uma perspectiva de
mudança contínua ocorrente no tempo presente.
Para Roo Ciambriello (2014)11, como caminho já percorrido anteriormente outro
fator que veio a endossar a propagação do Femvertising foi a difusão do conceito nas
mídias sociais. A revolução digital provocou diversas transformações na abordagem do
marketing. As marcas voltaram seus esforços para as mídias sociais pela capacidade da
“viralidade” dos conteúdos poderem chegar com mais facilidade ao seu público alvo.
esforços no intuito de impactar os usuários mais ativos de mídia social Neste contexto,
segundo ele as empresas deram-se conta de que as mulheres, além de protagonizarem
tantas as conquistas sociais, elas atualmente reúnem um grande poder nas mãos, sendo
responsáveis por 85% das decisões de compra nas famílias.
No universo das mídias sociais, novos formatos podem ser experimentados. Estes,
diferente da publicidade tradicional fazem com que a audiência não se sinta tão invadida
com apelos comerciais, fator que permite um maior envolvimento do público a ponto de
gerar compartilhamentos espontâneos. Portanto, “a partir do momento em que a própria
marca denomina o vídeo chave da campanha como um experimento social, ela atiça a
curiosidade e desconstrói qualquer preconceito por parte da audiência nutrido por
propagandas” (NASCIMENTO; DANTAS, 2015, p.9)
Outro elemento que tem fortalecido o movimento é a consolidação do fenômeno
femverting e que vem se repetindo com frequência nos últimos anos está intimamente
ligado ao do ativismo digital. Anúncios que provavelmente passariam despercebidos há
algumas décadas, agora são duramente criticados. No ano de 2013, por exemplo, da
Skol com a campanha de Carnaval “Esqueci o não em casa” foi alvo de protestos na
internet por ser considerada uma forma de apologia ao estupro (BARBOSA, 2015). Para
Nascimento e Dantas (2015, p.3) a postura da marca naquele episódio trouxe à tona os
aspectos mais machistas e violentos do Carnaval, dando a entender que a negação da
mulher às investidas sexuais alheias não mereciam atenção, principalmente se esta
tivesse consumido bebidas alcoólicas, ignorando completamente a noção de
consentimento que perpassa o direito de qualquer ser humano.

11
CIAMBRIELLO, Roo. How Ads That Empower Women Are Boosting Sales
and Bettering the Industry. Disponível em <https://www.adweek.com/brand-
marketing/how-ads-empower-women-are-boosting-sales-and-bettering-
industry-160539/> . Acesso em janeiro de 2018.
49
Sendo assim, enquanto estratégia, o femvertising se faz eficaz, porque pode gerar
um buzz em torno da marca, fazendo as mulheres acreditarem que aquela empresa de
fato poder ter essa preocupação como norte de suas ações, mas as políticas de
empoderamento feminino não podem (e nem devem) terminar como um mero vídeo
viral. A empresa precisa mostrar envolvimento real com práticas que promovam a
igualdade. Foi o caso da montadora Audi que, no ano de 2017, montou uma campanha
com uma estratégia de femvertising para anunciar seu comprometimento com iniciativas
de igualdade salarial, porém minutos após a divulgação de seu comercial no evento
esportivo de maior audiência dos EUA, o Superbowl, suas boas intenções foram
desmascaradas por ativistas os quais apontaram que a Audi, na época, não tinha
nenhuma mulher entre os seis integrantes de seu Conselho, e só 16% dos diretores da
empresa eram mulheres12.
Resumindo que todo o percurso que fizemos até aqui, foi para que tivéssemos em
mente que ao apostar no fenômeno de femvertising, as marcas devem ter em mente que
uma peça publicitária não é o suficiente, pelo menos, não deveria ser, para se instaurar
mudanças mais significativas nas estruturas (arcaicas, patriarcais e de privilégio) que
ainda insistem em colocar a mulher em um patamar abaixo da figura masculina. Estas
mudanças devem ter como ponto de partida a própria conscientização, através de uma
reflexão mais atenta acerca das estratégias e das táticas – cada dia mais sutis e
requintadas – que a publicidade tem se valido em seus discursos de publicidade de
empoderamento feminino.
Por fim, as empresas, as marcas e os profissionais de publicidade deveriam
apostar em práticas e políticas que promovam a igualdade dentro e fora do universo
midiático. E sim, embora toda essa agitação do mercado seja positiva, entender que se
fez mais do que necessária dar voz à causa feminista ao se popularizar o termo que por
muito tempo foi tabu entre mulheres e homens, não se pode esquecer que o feminismo
se trata de um movimento social, político e econômico sério. Ficando cada dia mais
difícil, principalmente, pela ‘ameaça’ do monitoramento constante das redes sociais,
que as marcas que não contemplem o real significado da causa estejam elas sujeitas à
rejeições ainda maiores por parte do público.

12
BBC NEWS. 9 vezes em que a publicidade falhou em entender as mulheres
em pleno século 21.
Disponível em: < https://www.bbc.com/portuguese/salasocial-43310941> Acesso em novembro de
2017.

50
3. FOCUS GROUP E ANÁLISE
3.1 Dos Comerciais e das Marcas

3.1.1 Hope Ensina – Hope Lingerie

Segundo o site da própria marca, a HOPE está há mais de 50 anos no mercado e


é uma empresa líder e referência no segmento de moda íntima no Brasil, sendo uma das
primeiras marcas de lingerie do país. Surgida com a simples e ambiciosa proposta de
transformar a vida das mulheres, atualmente a marca engloba outras três grandes
marcas, sendo elas: HOPE, HOPE Resort e Bonjour Lingerie.
No slogan da marca constam as seguintes noções de que a “A HOPE encanta a
mulher brasileira que sabe o que quer; a mulher sofisticada que valoriza a expertise; a
mulher fashion que não abre mão do que é tendência e conforto.” (Disponível em:
<https://www.hopelingerie.com.br/quemsomos>). A marca ganhou significativa
notoriedade depois de convidar atrizes e modelos famosas para estrelarem suas
campanhas, como Ellen Jabour, Juliana Paes e Gisele Bündchen – esta última
protagonista dos comerciais utilizados nesta pesquisa.
A marca Hope domina uma enorme parcela do mercado nacional, tendo iniciado
suas vendas no ano de 1966. Com mais de 4 mil pontos de vendas e 180 franquias no
país, a marca ainda possui mais de 1800 colaboradores diretos e cerca de 7 milhões de
peças produzidas todos os anos. A escolha da série de comerciais ‘Hope Ensina’ se deu
durante a pesquisa pelo encontro de fontes que já haviam estudado sua repercussão
polêmica e, nesse estudo pela possibilidade de se demonstrar como certas campanhas
mais antigas não refletiam certos anseios e possibilidades empoderadoras enquanto os
conceitos que aqui foram abordados.
Em 2011, a marca foi alvo de críticas e denúncias no Conselho Nacional de
Auto-regulamentação Publicitária – CONAR por conta da campanha “Hope Ensina” em
que colocava Gisele Bündchen ensinando as mulheres a darem notícias ruins a seus
maridos. O discurso da publicidade orientava as mulheres a dar essas notícias – que
bateram o carro, ou extrapolaram o limite do cartão de crédito, por exemplo – usando
somente a lingerie da marca. A lógica da publicidade era: a mulher oferece ao homem o
que tem de mais interessante para ele – seu “poder da sedução” representado pelo seu
corpo seminu e, em troca, recebe a compreensão masculina para o fato.

51
A Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República –
SPM/PR, recebendo diversas reclamações de consumidoras, entrou com representação
no CONAR pedindo a suspensão da propaganda. Após o episódio, a Hope ganhou
bastante notoriedade, pois o assunto foi pauta em diversas mídias.
Então para este estudo, a Hope, e mais especificamente o comercial publicitário
‘Hope Ensina’, se projeta na preocupação de analisar imagens publicitárias que
envolvem corpo e sexualidade como proposições de empoderamento emancipador da
mulher que a marca faz uso nessa sua publicidade. Nele aparece flagrante a figura da
mulher sexualizada, com a exposição excessiva de um corpo padronizado e
plasticamente “perfeito” com o propósito final da sensualidade.
Segundo Zamboni, “Muitas vezes a mulher é exposta como um excelente
produto a ser consumido. E a mulher brasileira é, então, o mais “belo” dos produtos. Ela
“já vem com sensualidade de fábrica”, conforme proclama um anúncio da Hope,
reproduzido e analisado mais adiante neste mesmo capítulo.” (ZAMBONI, 2013, p.77)
No anúncio da Hope, vemos Gisele Bündchen, em um primeiro momento,
vestida de modo casual, sem apelos sensuais e até demonstrando um certo pudor com
uma postura despojada e discreta. Ela inicia os três comercias se dirigindo para a
câmera como se estivesse se dirigindo para o seu marido/esposo. Seu gestual é
comedido e suas expressões denotam um certo constrangimento ao anunciar a ‘má’
notícia que possivelmente desagradará seu companheiro. Ao final do quadro, em cada
anúncio aparece o lettering ‘Errado’ marcados ao lado por uma sinalização em “x” em
um quadrado. No próximo quadro, ela surge ainda de pé, vestindo calcinha e sutiã da
marca em pose sensual, repetindo o mesmo texto do quadro anterior, porém sua postura
agora é mais altiva, com uma leve entonação, sexualizada, quase dissimulada e
apelativa. Ao final desse segundo quadro, surgem os dizeres ‘certo’ com caixinha
quadrada e o símbolo . Ao final, o slogan é dito em off por um narrador “Você é
brasileira. Use seu charme”.
Como vimos anteriormente, quando abordamos a questão das representações via
o uso dos estereótipos e do mito da beleza como uma forma de induzir as mulheres a
insatisfação pelos seus corpos, trouxemos os exemplos das cervejas, mas aqui com o
comercial da Hope Ensina, vemos o lado mais sinistro de toda questão.
Comerciais voltados para o público feminino com produtos também destinados a
estas que simulam apontar para a emancipação da mulher através do empoderamento de
sua beleza – neste caso aqui também da sua sexualidade - como forma de se mostrar

52
uma atitude astuta e inteligente pelo convencimento do companheiro pelo “encanto”
através de seus dotes corporais, nos mostra mais um exemplo do uso do corpo da
mulher como objeto, pois esta serve, inicialmente, ao olhar e ao consumo masculino e,
numa segunda reflexão, a esvazia de competência para lidar com aquelas situação de
forma mais inteligente que não seja pelo corpo, ou seja, pelo sexo. Ela é vista como um
corpo que depois de desnudo, não importando o que é dito, tudo estará perdoado. No
comercial, ela usa corpo dela para compensar o fato negativo, e este só serve aos
interesses sexuais do marido.
O corpo se torna, então, um objeto, consumível, desumanizado e impessoal. A
objetificação do corpo é maléfica porque é uma maneira de tratar o corpo a partir de
uma perspectiva utilitarista, segundo a qual este só serve a um interesse, em geral, o
interesse de uma terceira pessoal, e não de si próprio. A objetificação acontece quando
há o tratamento de uma pessoa apenas pelo seu corpo, ou partes dele, inexistindo outros
aspectos a serem observados.
Segundo Zamboni, “o problema de a publicidade usar a imagem de uma mulher-
objeto é o fato de aquela mulher que figura na peça publicitária estar ali representando o
gênero “mulher” (ZAMBONI, 2013, p.88)”. E a dificuldade maior de se desvincular
desse tipo de representação, vem do fato de repetidamente as publicidades de produtos
de beleza e correlatos não conseguirem se desvincular dessa necessidade de que se faça
uso daquele objeto (ou serviço) somente para agradar o outro – que por muito tempo foi
apenas a necessidade de agradar o olhar masculino.
O problema é representar a mulher como objeto quando sabemos que existem
infinitas formas de ser mulher no mundo e que também existem infinitas formas de se
autorrepresentar. No caso em questão, se eu sou mulher, isso aumenta
significativamente a possibilidade de identificação com aquela imagem da Gisele
Bündchen dissimuladamente tentando convencer seu marido a não repreendê-la,
incitando a um possível sexo como forma de compensação e solução para os
“problemas” apresentados por ela – ou seja, ser representada por uma “mulher-objeto”,
mesmo que eu não me autorrepresente dessa forma.
Com essa mesma interpretação, após a denúncia ao CONAR, a defesa dos
anunciantes justificou que a publicidade se valeu de “brincadeira”, e do “bom humor”,
num “jogo sensual” para tornar legítima sua ideia. O fato é que os publicitários e as
empresas se utilizam com frequência desse argumento quanto das ambiguidades,

53
polissemias, sutilezas e ironias para velar um discurso que pode ser ofensivo ou
desrespeitoso às mulheres.
Acrescentando-se ainda a essa lógica, temos como evidência também o papel
ilusório no qual são construídos discursos pela Indústria Cultural acerca da beleza como
emancipadora da mulher. No comercial da Hope temos a sensação de que a sua
estratégia gera mais um efeito de pseudoemancipação que mais fomenta o consumo –
fazendo com que as mulheres desejem ser como a Gisele Bündchen com o uso das
lingeries da marca – do que como uma real libertação do “sentir-se” mulher.

3.1.2 É Pra Mim – Quem disse Berenice?13

A publicidade escolhida pra representar o momento mais atual de


transformações do entendimento que propomos para o presente trabalho foi o ‘É Pra
Mim’ da marca de cosméticos Quem disse Berenice?. A quem disse, Berenice?,
segunda marca de estudo deste trabalho, tem como público-alvo mulheres jovens, tendo
sido lançada como submarca pelo Grupo Boticário14 no ano de 2012. Seu sucesso já
garantiu uma boa parcela no mercado da beleza com 238 pontos de vendas espalhados
por todo o Brasil, além de um e-commerce.
Segundo o slogan da marca, esta nasceu para “pra questionar e ampliar os
conceitos sobre maquiagem. A gente quer inspirar as mulheres a serem livres para se
sentirem mais bonitas e experimentarem diferentes possibilidades de produtos até
encontrarem o que mais combina com elas!”. A marca traz na sua página em linguagem
bem coloquial e jovem o seguinte diálogo com seu público: “Inspire-se, arrisque-se,
divirta-se! Chega desse "pode e não pode". queremos você livre! Quem disse que olho
preto só pode a noite? ou que as unhas do pé e da mão precisam ser pintadas da mesma
cor? quem disse que beleza tem que ter tantas regras?”.
A partir da ideia de questionamento nos parece que o propósito da Quem disse
Berenice? é ser uma marca de quebra de regras e paradigmas, sendo seu principal valor
o de sempre questionar tudo. Segundo Oliveira (2016), o propósito da marca está
alinhado com o pensamento atual, pois, em tese, nenhuma regra social deveria prender

13
http://www.clubedecriacao.com.br/ultimas/e-pra-mim/
14
.A quem disse, Berenice?, marca que pertence ao grupo O Boticário, foi lançada no mercado de
cosméticos em 2012 e tem como público-alvo jovens adultas, extrovertidas e expressivas. (OLIVEIRA,
2016, p.46)

54
as mulheres, principalmente quando se tratar de maquiagem, que é o negócio da marca.
Segundo ela, A quem disse, Berenice? foi precursora nesse diálogo com as mulheres. A
marca buscou um tipo de estratégia comunicativa, na qual elas pudessem “externar,
através da maquiagem, seus desejos reprimidos por um padrão de beleza estipulado pela
sociedade, que dizia que o neutro e discreto era o aceitável para esse momento.”
(OLIVEIRA, 2016, p. 48).
Agora chegando à questão cerne do nosso estudo, percebemos que a atuação da
marca no ambiente digital foi de fundamental importância como sua estratégia de
posicionamento sempre focada na questão do empoderamento feminino. Segundo
Oliveira, “A quem disse, Berenice? nasceu em um ambiente praticamente saturado por
um incontável número de marcas com produtos de mesma qualidade do que os seus e
usou o posicionamento diferenciado para atrair as consumidoras.” O lançamento de
canais de comunicação diretos com as consumidoras possibilitou a marca não apenas a
possibilidade de um canal de divulgação dos produtos, mas havia a ideia de naturalizar
o pertencimento dessa marca a esse meio. “A quem disse, Berenice? está presente nas
redes em canais como o Facebook, o Instagram, o Twitter e o Youtube.
A marca tem a preocupação de adequar a sua linguagem de discurso conforme a
necessidade de cada meio, tendo uma forte presença nas mídias sociais. O seu canal no
YouTube está ativo desde 26 de julho de 2012, com sua primeira postagem a contar de
9 de agosto do mesmo ano. Até o dia da coleta dos dados para este trabalho, o canal teve
190 vídeos postados que somam 49.572 inscritos com um total de 68.662.403
visualizações.
O conteúdo dos vídeos é composto predominantemente por dicas e tutoriais de
maquiagem, usando os produtos da marca. Contudo, os vídeos com maior número de
visualizações são os institucionais, com destaque para o vídeo da campanha “é pra
mim!”, postado em 7 de setembro de 2015, que acumula até o dia da captação dos dados
6.821.215 visualizações.
No comercial escolhido, a marca de cosméticos traz na sua campanha online ‘É
pra mim’ mulheres riscando com batons todos os “Não é pra mim” das frases escritas
por um projetor nas paredes do cenário. O comercial de 68 segundos de duração foi
assinado pela agência Santa Clara e apresenta vários conceitos como “ser chefe não é
pra mim”, “comprar camisinha não é pra mim” e “batom vermelho não é pra mim” os
quais são questionados e tem a palavra ‘NÃO’ riscada em todas elas. Como se fossem

55
regras, as frases são projetadas sobre as mulheres que, com uma postura segura, riscam
o “não”, como se estivessem se libertando das imposições sociais.
A escolha do comercial 'É pra mim' se deu por este ser considerado
um femvertising ou, traduzindo, um comercial de empoderamento feminino. Nele
percebemos um discurso mais humanizado (MACHADO, 2016) para a questão das
imposições sociais as quais as mulheres são costumeiramente condicionadas através de
falas e crenças que limitam a mulher a uma série de negativas.
No comercial, esse discurso humanizado traz as mulheres como protagonistas
da narrativa por mostrá-las como personagens principais de uma mudança de atitude.
Com o gesto de riscar a palavra "NÃO" das frases, elas rechaçam qualquer ideia
limitante que lhes é imposta. O vídeo chave da campanha da Quem disse Berenice?
surge nesse contexto como um experimento social (NASCIMENTO; DANTAS, 2015).
Essa atitude das mulheres evidenciada no comercial é considerada como de
empoderamento por provocar a sociedade a (re)pensar os motivos da existência dessas
negativas. Dentro do que foi falado sobre o femvertising, este se dirige ao
empoderamento feminino pelo emprego de conceitos a favor da postura das mulheres
nas mensagens e nas imagens com o objetivo de qualificar as mulheres a novas
perspectivas de visão de si mesmas.
O local onde são propagadas, com toda abrangência e possibilidade de alcance,
fortalece o movimento de consolidação do fenômeno femvertising. Ao nosso ver, por ter
sido lançado na plataforma do Youtube, e sua ambiência natural ser o das redes,
a “viralização” destes tipo de anúncio contribui com propagação da ideia de uma
atitude empoderada por parte das mulheres. Fato que colabora também para a
disseminação do conceito de femvertising, cujo resultado vem de uma
postura estratégica mais ativa da marca em relação às percepções
do ciberfeminismo (Nascimento e Dantas, 2015).
Em Machado (2016) vimos que a apropriação de elementos pertencentes ao
consumidor, como as suas histórias de vida, fotos e vídeos é uma estratégia da
publicidade que visa atrair a atenção do consumidor. No caso da propaganda escolhida,
vemos que esta se deu pela apropriação de uma demanda que é a de libertação dos
ditames sociais que limitam a mulher a certas condições, por vezes, fundamentadas no
machismo ou no subjulgamento feminino a interesses alheios aos dela.

56
3.2 Das Participantes
3.2.1 Participantes

Como vimos, uma parte desse estudo se destinou a apresentar uma pesquisa
quantitativa (online) que contou com a participação de 80 mulheres em suas mais
diversas orientações, idades e ocupações. Cabe ressaltar que essa é uma amostra de
conveniência, mas tentamos diversificar as mulheres o máximo possível atendendo a
uma diversidade de marcadores de classe, raça e faixa etária.
Nessa parte da pesquisa, tivemos o objetivo de traçar um panorama sociocultural
das possíveis participantes em que foram questionados itens como condição financeira e
participação dela no sustento da casa, formação cultural, papel dela (ou do homem) nos
afazeres do lar, de questões de ordem afetiva, como a iniciativa na conquista amorosa e
outros. Contudo, todas as perguntas fechadas se objetivaram para que traçássemos um
perfil comportamental o qual seria confrontado com a pergunta final, que era aberta, e
que perguntava àquelas mulheres se elas se consideravam feministas.
Dessas participantes, contamos com a participação de 5 a 6 convidadas para um
Focus Group que aconteceu no dia 19 de Outubro de 2018. Das que participaram do
questionário, foram convidadas cerca de 30 mulheres para participar do Focus Group.
Para muitas dessas foi feito o convite, pois já era sabido que muitas se encontravam em
domicílio em outro estado, ou em viagem, ou por terem respondido a pesquisa através
da indicação de amigas.
Optei por fazer o contato direto via telefone ou por mensagem de WhatsApp,
pois tinha o objetivo de conquistar a confiança das mulheres a serem entrevistadas sem
dar muitos indícios de como e qual seria o tema central da entrevista, buscando assim
não as prepará-las para a discussão – gostaria que elas dessem suas opiniões sem muito
preparo ou elaboração prévia. Dos 30 convites feitos, 5 aceitaram de imediato e, assim,
finalizamos nossa lista inicial, como segue na tabela abaixo.
Contudo, dois dias antes da data combinada, por receio de que alguma
participante pudesse faltar ao evento, como de fato aconteceu, fiz um convite extra,
sendo aceito por uma outra participante da pesquisa inicial. Então, ao final, com 6
convites aceitos, 5 mulheres compareceram à entrevista que realizou-se numa das salas
de aula do Departamento de Comunicação da UFPE, iniciada às 11h30 da manhã do dia
19 de outubro de 2018.

57
Tabela Resumo das Participantes
Mídias e Redes
Participante Idade Est. Civil Religião Estudo Ocupação
sociais
1. PARTICIPANTE A 26 União - 1º grau Garçonete Facebook, Youtube,
Estável incompleto WhatsApp,Instagra
m, Outra (s)

2. PARTICIPANTE B 53 Solteira Evangélica Superior Professora Facebook, Youtube,


Completo WhatsApp,
Instagram
3. PARTICIPANTE C 29 Solteira Não possui Superior Militar Facebook, Youtube,
Incompleto WhatsApp
(cursando)

4. PARTICIPANTE D 65 Divorciada Espírita Ens. Médio Do Lar Facebook,


Completo (Pensionista) WhatsApp

5. PARTICIPANTE E 31 Solteira Espírita Superior Desempregada Youtube,


Completo WhatsApp,
Instagram

As 5 mulheres que participaram do Focus Group no dia 19 apresentaram um


perfil social bem diversificado. Na tabela abaixo reunimos algumas informações sobre
as mulheres dentro dos aspectos sócio-culturais nos quais incluíam filhos, opção sexual,
sustento da casa, condição salarial, prioridades da vida e se a mulher se considerava
feminista, como podemos observar em seguida.

Tabela Sócio Cultural Resumida


Salário No geral, se
Sustento O quem vem em
Participante Filhos Opção Sexual Atende as considera
Casa 1º lugar
Necessidades feminista
1. PARTICIPANTE A SIM Heterossexual Eu mesma e Eu mesma e meu Depende
outro (a) Não bem-estar

2. PARTICIPANTE B NÃO Heterossexual Eu mesma Sim A família Não

3. PARTICIPANTE C NÃO Bissexual Eu mesma Sim Eu mesma e meu Sim


bem-estar

4. PARTICIPANTE D SIM Heterossexual Eu mesma Sim A família Não

5. PARTICIPANTE E NÃO Homossexual Outro (a) Não Eu mesma e meu Depende


bem-estar

Das participantes apenas 1 (uma) se disse feminista, duas responderam


“depende” e outras duas responderam que “não se consideravam feministas”.

58
3.2. Análise Geral

Foram escolhidas as seguintes perguntas a serem realizadas durante a entrevista:


Você acha que das imagens apresentadas nos comerciais nos dá um retrato positivo ou
negativo das mulheres ou não tem significado?; você se sente representada nos
comerciais apresentados? Por que?; você compartilharia esses vídeos nas suas redes
sociais? Por que?; você se sente motivada a experimentar ou a comprar mais produtos
dessa marcar depois desses comerciais?; você entende o conceito de Empoderamento
Feminino? Você acha que esses comerciais empoderam as mulheres? Você se sente
empoderada ao ver estes comerciais?;
Após orientação e apresentação dos vídeos, com a repetição de cada um uma vez
mais, as perguntas foram feitas uma a uma, dando espaço para que as mulheres as
respondessem de forma livre e que pudessem interagir umas com as outras num bate-
papo. Foi dada a liberdade para concordarem umas com as outras, tendo apenas a
pergunta como referência para que pudessem expor suas opiniões acerca do que foi
perguntado.
Para a primeira pergunta, ‘Você acha que das imagens apresentadas nos
comerciais nos dá um retrato positivo ou negativo das mulheres ou não tem
significado?' As mulheres, no geral, sentiram que no segundo comercial ‘É pra mim’ da
Quem disse Berenice? houve uma maior identificação de retratos positivos do que no
primeiro comercial - ‘Hope Ensina’. Elas revelaram de imediato a percepção em um dos
comerciais – o segundo com maior intenção – com indícios de Empoderamento, sendo
proferida a seguinte fala por uma delas utilizando o termo.

Participante E: O segundo, na minha opinião é mais empoderamento. E o


primeiro, ela sexualiza muito a mulher, pelo fato de mostrar ela sem roupa.
Tipo...A mulher... tanto que na primeira quando ela vai dar as notícias a
primeira ela está de roupa... E pode prestar atenção, que na segunda que ela tá
sem, a forma de dizer já é diferente. Já é mais uma coisa mais ... Ela sensualiza.
E segundo, eu acho que em relação as perguntas...O primeiro é uma forma
negativa pra mim. E o segundo, eu acho que é positivo, porque mostra o
empoderamento. Elas necessariamente não estão sem roupa pra mostrar que
podem ou não fazer certas coisas. (transcrito)

Outras complementaram a fala da Participante E dizendo que havia uma


intenção no primeiro comercial de trazer a sensualidade como foco principal, ignorando
a própria mulher e privilegiando satisfação do olhar masculino, por isso considerando-o
como negativo e que o segundo privilegia o empoderamento por que mostra “falas”

59
negativas que as mulheres escutam todos os dias, como disse a Participante A no
seguinte trecho:

Participante A : Essa foi a intenção do comercial... que o primeiro foca de um


jeito que ele negativou o que ela disse. Como ele viu ela com uma lingerie
sensual, de um jeito que ele queria ver, ele se esqueceu do que ela tava falando.
No segundo já foca no que, realmente no empoderamento da mulher. Homens
falam que (as mulheres) não podem fazer nada do que tava dizendo ali, mas
você pode. (transcrito)

Essas falas nos rementem dentro do nosso estudo, primeiro, ao que diz Bourdieu
(2007) quando ele afirma que a interiorização do habitus dominante faz com que as
mulheres permaneçam num constante estado de "dependência simbólica".Elas parecem
sempre estar preocupadas em agradar ou desdobrando-se numa preocupação incansável
com a sua aparência. Ele afirma que o corpo feminino foi transformado numa forma de
capital cultural, que, mediado pelo consumo de incontáveis produtos para
embelezamento, e seguindo a cadeia econômica, permitiu a construção da imagem do
corpo belo e perfeito, que segundo o autor, nada mais é que um "corpo-útil”, um
"corpoconsumidor", que consome não apenas a materialidade dos produtos anunciados,
mas também um conjunto de ideias, valores e estilos de vida.
E, segundo, o que para (OLIVEIRA, 2014, p.58) seria uma premissa ligada às
“responsabilidades” da mulher com a família e por conseguinte ao marido. Ela nos diz
que a mulher por muito tempo foi representada na publicidade predominantemente com
uma imagem liga à família, sendo ela responsável pela escolha de diversos produtos
relacionados ao gosto dos seus entes. Com as modificações que ocorreram na condição
da mulher na sociedade, elas parecem não estar mais seduzidas por discursos que as
liguem a necessidade de agradar aos homens, contudo, nesse caso especifico a
Participante E parece ter notado ainda no vídeo 1 tal conotação.
Numa interpretação mais aglutinante das duas interpretações sobre o depoimento
da participante, temos o que ZAMBONI (2013) nos diz acerca da construção desse tipo
de representação. Ela afirma que (2013, p.145) “a sexualidade feminina é construída a
partir da representação de um corpo subjugado, que aparenta não possuir sexualidade e
vontade próprios, existindo para manter uma lógica de prazer voltada para a satisfação
sexual masculina.”
A concepção negativa do primeiro comercial, foi explicada pela Participante C,
pelo jogo linguístico e visual que o comercial faz com o emprego da mulher vestida no
primeiro quadro e a simbologia gráfica do “X” e a palavra ‘ERRADO’ e no segundo

60
quadro ela usando a lingerie da marca (seminua) em conjunto com simbologia gráfica
do “” e a palavra ‘CERTO’. Para ela, isso seria uma forma de imposição ou forma de
padronizar uma apresentação das esposas para seus respectivos companheiros em que a
exibição de um corpo bonito, sensual, que o agrade seja moeda de troca em relação a
uma notícia possivelmente desagradável para o homem. No segundo comercial, ela
considerou que este fugiu dessa passividade, considerando-o positivo.
Apenas a Participante D, no primeiro comercial, considerou haver aspectos
positivos no vídeo 1, considerando que via através da figura da Gisele Bündchen – fora
do personagem, a Gisele Top Model, uma forma de identificação positiva que as
mulheres poderiam usar como referência. Em uma de suas falas, ela diz: “ Acho que é
positivo. A da top model... Ela é a Gisele.” E, nesse mesmo, a Participante B corrobora
com a Participante D, complementando com um tom positivo “Ele é uma referência de
mulher perfeita, de mulher ideal. ”, porém, mais à frente na discussão, ela expressa o
seguinte: “Aí no caso também, por ser Gisele Bündchen, [...] Porque não poderia ser...
botar ela só com uma peça íntima? Poderia ser que no primeiro comercial, na primeira
propaganda poderia ser com ela vestida.... Eu acho que também pra convencer o
marido ...” fazendo referência ao tom persuasivo da personagem.
Achamos importante pontuar que a fala da Participante D nos remete a ideia de
que vivemos cercados de imagens que publicidade que não se cansam de produzir (e
reproduzir) a promessas de um corpo perfeito, de um poder sedutor, de uma vida repleta
de conquistas, sonhos e felicidade. Quando a mulher acima nos diz que a Gisele
Bündchen “é uma referência de mulher perfeita” vemos que essa imagem já foi
internalizada. Ela aderiu aquele argumento como verdadeiro, de que aquele padrão,
loiro, alto, branco, magro, e plasticamente “perfeito” representa o conceito de perfeição
e ideal. “E por um momento, desejamos ser aquela mulher, nos identificamos com ela,
afinal, ela também é mulher, e é linda, é desejada, é encantadora e sedutora.”
(ZAMBONI, 2013.p.57)
Diante do comentário da Participante D, temos mais um exemplo que se inscreve
dentro do mito da beleza de Wolf (1992, p.233), pois ele aqui não articula apenas a
noção da mulher perfeita como mito, ilusório, nunca alcançado, mas também como
estratégia para se potencializar infinitamente o lucro das empresas, pois quando
pensamos em uma cultura de consumo, cujo qual estamos imersas, vemos que esta
beleza é ideal por simplesmente não existir. Insistimos em não perceber as mais
variadas anomalias fundamentadas a partir da busca incessante por esse perfil de

61
perfeição – sejam elas na saúde, no trato social, nas relações afetivas, na religião ou no
ordenamento político com a interferência do Estado nos ditames da fertilidade e da
contracepção do corpo feminino, entre outros.
Outra questão que veio à tona na fala da Participante D foi a questão da
violência atrelada a questão do modo da mulher se vestir, assim ela diz: “Eu acho que
hoje, tá muito evidente que a mulher é vítima por ser mulher. Agora tem se falado muito
que não é (pela) a roupa que o homem vai ter o direito matar ninguém. Só porque ele
dá isso, ou ofender. Então, eu acho que tá confirmado que as mulheres podem usar o
que elas quiserem. ” Numa interpretação, mais subjetiva, nos pareceu que ela quis
justificar sua escolha pelo retrato positivo do primeiro comercial pelo fato de que a
mulher representada no primeiro comercial – sendo ela Gisele Bündchen ou não – pode
usar a roupa que quiser, ou seja, caso ela preferisse se reportar ao seu marido de lingerie
ou não ela tem essa liberdade por que o homem não tem o direito de ofendê-la ou
violenta-la por esse motivo.
Nesse trecho, podemos encontrar talvez a seguinte identificação proposta por
Zamboni (2013) e que aqui pode justificar a mesma assimilação cultural da Participante
D. As espectadoras criam uma identidade momentânea com Gisele Bündchen por ela
ser ser brasileira, e por isso, passam a se ver representada na figura da modelo. A
imagem dela nos faz pensar que, já que somos brasileiras, temos um charme inato, que
também deve ser “usado”. Porém, perto do biótipo típico das brasileiras, a Gisele
apresenta um padrão de beleza mais próximo das europeias.
Contudo, algo mais evidente nos chamou a atenção. Quando a
participante cita que entende que a mulher pode usar a roupa que quiser, no caso do
comercial usar a lingerie, mas estendendo essa interpretação para qualquer tipo de
vestimenta. Avaliamos que são inúmeros os casos que trazem algum tipo relação entre a
violência, verbal ou física, acometidas em menor ou maior grau às mulheres justificadas
pelo uso “inapropriado” de suas roupas. Em um estudo realizado pelo Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no ano de 2014, divulgado em uma matéria no
Correio 24, (https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/para-65-dos-brasileiros-
mulher-de-roupa-curta-merece-ser-atacada-revela-ipea/), 65% das pessoas entrevistadas
disseram concordar com a frase “mulheres que usam roupas que mostram o corpo
merecem ser atacadas”, ou seja, ainda existe uma forte tendência de se culpar a mulher
nos casos de violência sexual por causa da sua roupa. Em muitos casos de estupro, as
vítimas são questionadas sobre as roupas que vestiam no momento da agressão sexual,

62
com base no mito de responsabilização da vítima. Há ainda a ideia de que ela seria, em
parte, culpada por ter sido estuprada. Em muitos países, assim como no Brasil, existe
uma ideia presente de que um vestuário considerado provocativo justificaria ataques
sexuais. E por esse motivo achamos que seria bastante equivocada a afirmação da
participante sobre essa dita liberdade.
Para a segunda pergunta, tivemos a seguinte proposição ‘Você se sente
representada nos comerciais apresentados?’ A maioria se sentiu representada no
segundo comercial ‘É pra mim’ da Quem disse Berenice?, porém alguns pontos foram
destacados pelas participantes sobre o porquê de não se sentirem tão representadas no
primeiro o ‘Hope Ensina’. Elas consideraram que havia no primeiro uma idealização de
beleza a partir do olhar masculino. Consideraram também que ele mostrava apenas um
padrão de beleza, e apenas uma forma de se apresentar (forma sexualizada), manipulada
de forma a representar uma mulher que dissimula um comportamento passivo
mascarado pelo atrativo do seu corpo. Outras consideraram que o comercial coloca a
mulher numa posição inferior, pois a coloca na situação de dependência financeira. Em
oposição a isso, com interpretação positiva sobre o vídeo 1, a Participante D, salientou
que:
Participante D: A dependência financeira é a única coisa que pega ali (primeiro
comercial). Porque... continuo falando que a Gisele,... Isso é um comercial.
Isso é uma imagem que ela representa a mulher de hoje sim. Não por causa do
interesse, não por causa de nada. Por que ela é uma mulher que a postura dela é
uma de uma mulher que tá muito bem na vida. Não tá na “ôia” (sic) de
ninguém. A Gisele Bündchen ela já tem isso com ela. E isso é um comercial.
Então eu acho que ELA representa sim uma mulher. Ela passou 15 dias em
meio da Amazônia dentro uma tribo com o namorado dela, o cineasta lá, e ela
usava biquíni, andava com ele pra cima e pra baixo e ela sentava no chão ...
então pra quem não conhece a pessoa, fica difícil dividir. Mas ela mostra
sempre quem ela é.

E então, logo em seguida a essa fala, a Participante B ponderou que infelizmente


muitas mulheres usam de artifícios – O poder da beleza – para conseguirem algo de um
homem, porém ao final ela disse que se “encaixava” melhor no segundo comercial,
“Por que a mulher tem que se maquiar, tem que se vestir bem. Se sentir bem, se vestir
bem pra você. Se vestir bem pra ser olhada por outra mulher. Pra ser elogiada por
outra mulher. Pra ser elogiada pelo homem e vice e versa.”
Para a terceira pergunta, apresentamos ‘Você compartilharia esses vídeos
nas suas redes sociais? Por que?’. Nessa proposição, ainda solicitei que se elas fossem
escrever alguma descrição dos vídeos em suas postagens, o que elas escreveriam sobre
63
os vídeos. As participantes A,B,C e E, compartilhariam o segundo vídeo em suas redes
sociais. A Participante A disse, na verdade, que compartilharia os dois vídeos. Um
fazendo de forma positiva (vídeo 2) e o outro de forma negativa (vídeo 1). A
Participante E considerou desnecessário o compartilhamento do vídeo ‘Hope Ensina’,
não escolhendo nenhuma mensagem para postagem. O mesmo aconteceu com a
Participante C que disse que não colocaria nada. A participante B disse que escreveria
“A mulher pode tudo” como mensagem para o compartilhamento do vídeo da Quem
disse Berenice?. E a Participante B escolheu a frase “Diga não ao não”. A participante
D explicou seu posicionamento, porém não explicitou se faria o compartilhamento de
algum dos vídeos em suas redes sociais.
Por isso, resgatamos um dos pensamentos que trouxemos antes que diz que o
compartilhamento de informações e conhecimentos – em rede ou não - é, sem dúvida, o
trunfo da cultura participativa é a menina dos olhos das organizações (TAPSCOTT;
WILLIAMS, 2007, p.28). Por meio dele, que os usuários influenciam e são
influenciados. Ou seja, existiu nas mulheres participantes o interesse de influenciar
outras mulheres sobre os questionamentos levantados no vídeo 2. E na nossa
interpretação, ao associar de forma negativa o vídeo 1, a participante A desejava que a
audiência também pudesse percebera influência negativa do comercial. As marcas,
cada dia mais, estão investindo em esforços publicitários para que o consumidor não só
curta as suas publicações como também comentem e as compartilhem (MACHADO,
2016, p.50). Quando uma informação é compartilhada nas mídias sociais, a audiência
torna-se exponencial.
E daí temos que diferente da publicidade tradicional, a ambiência das redes
carrega um enredo de simbolismo e estímulos experienciais que propiciam a geração de
empatia com o público. (NASCIMENTO; DANTAS, 2015). Há uma busca por uma
identificação mais sutil, e tal estratégia faz com que a audiência não se sinta tão
invadida com apelos comerciais, o que permite um maior envolvimento do público com
aquele conteúdo, e por conseguinte, compartilhamentos espontâneos. Estes se dariam
com maior empatia no com o compartilhamento do vídeo da Quem disse Berenice?
Para a pergunta ‘Você se sente motivada a experimentar ou a comprar mais
produtos dessa marcar depois desses comerciais?’, as mulheres pareceram não levar
muito em conta o fato da mensagem por trás das propagandas. Algumas justificaram
que, no primeiro vídeo, por exemplo, (Participante E) por ser um item necessário,
aquele tipo de comercial não modifica a necessidade das mulheres da compra de uma

64
lingerie. (Participante C). Ela articulou que os produtos da primeira marca continuam
sendo muito bonitos e que toda mulher gosta de se sentir desejada, por isso ela não faria
boicote à marca por conta do comercial, mas (numa comparação) ficaria mais inclinada
a comprar o segundo. O mesmo comparativo, posteriormente, fez a Participante E “A
segunda marca instiga mais”. A Participante A disse categoricamente,

“ Com certeza, da Berenice. Com certeza, o da maquiagem! ”. (Logo em seguida, ela


continua sobre a marca Hope), “A propaganda é alma do negócio. Tipo coca cola... às
vezes você não gosta muito, mas às vezes passa tanto aquele comercial que você fica
tentada a experimentar. Tem um poder sim. Eu ficaria motivada a experimentar. Poderia
até não usar. ”.”

A Participante D não opinou diretamente, mas comentou “Eu não me sinto


atraída pela roupa. Eu tenho muitos batons, tenho um monte de curso de maquiagem,
mas não uso nada".
Na questão quatro, consideramos esta questão chave a do estudo, pois não
menos importante que o boicote dos consumidores, as redes sociais virtuais, como lócus
em que o usuário troca informações com outros usuários de maneira eficiente e
dinâmica contribuem para uma “cascata de informações”. Nelas é permitido que seja
criado um espaço de interação em que as plataformas online auxiliem nos contatos
interpessoais virtuais, independente do espaço físico ou geográfico, ou seja, elas se
tornam elemento essencial no processo de divulgação dos produtos, mas estes também
podem ser utilizados a favor das mulheres quando estas se apropriam da ideia de
consumo de ativismo, visto anteriormente, se engajando na defesa e na responsabilidade
mais ampla de cidadãs.
Citamos os exemplos das reivindicações em rede contra as campanhas de cerveja
que ensejaram sérias consequências na imagem das marcas e, na sequência, financeiras
devido ao boicote em massa ou ao feedback negativo dado em outros meios. Como
contraponto, o boicote é aqui entendido não apenas como negeção à compra, esta se
refere opção consciente de aquisição de produtos e serviços percebidos como social e
ambientalmente responsáveis. (PORTILHO, 2009, p.4). Muitas delas precisaram criar
novas estratégias de posicionamento, e por que não aconteceria o mesmo com as
empresas de cosméticos e produtos de beleza, caso as mulheres tivessem uma atitude
parecida?
Para a última e principal pergunta de todo esse breve estudo, temos a questão
central que foi deixada por último para que se pudesse observar os discursos das
mulheres e como estes poderiam embasar a construção de diálogos que trouxessem

65
marcas da noção de empoderamento, mas, que no final, pudessem ser comprovados se
havia uma consciência sobre as suas definições. Tivemos como última proposição o
seguinte questionamento, ‘Você entende o conceito de Empoderamento Feminino?
Você acha que esses comerciais empoderam as mulheres? Você se sente empoderada ao
ver estes comerciais? ’
A Participante E tomou a palavra no primeiro segundo: “É, a gente tem ouvido
bastante.” Quando então a Participante C prossegue “Eu acho que qualquer mulher
quando vê o segundo (comercial) se sente (empoderada) por que tem essa pegada de
você se livrar do rótulo, das imposições, as vezes cobram das mulheres. E o primeiro
fica meio que, ninguém vai se sentir poderosa vendo o primeiro que a mulher está à
mercê do cara. O uso do corpo dela. ” E a Participante B, acrescenta, “Empoderar vem
de poder. O segundo com certeza. Não vou nem generalizar. Eu acho que toda mulher
sente (isso). O segundo leva você à sua autoestima, a se levantar, a tomar uma atitude,
a mudar. ” Por fim, a Participante E diz, “Minha implicância com o primeiro não é nem
da lingerie em sim, mas com o contexto. O contexto que ele coloca realmente, a mulher
se oferecendo assim. Oferecendo o corpo, exatamente (concordando com a fala de
outra participante).”
Nesse momento, exibo a imagem escolhida para representar o vídeo 1 – uma
imagem da Gisele Bündchen de lingerie em um dos comerciais da série, e provoco as
mulheres perguntando a elas se elas acham que aquela imagem as empodera.
A Participante E diz, sobre a pergunta “Eu acho que ela (Gisele) mostra
(postura empoderada). Talvez se o texto fosse diferente, talvez a gente também achasse
empoderamento. Ela também se mostra empoderada. Lógico ela pode. Eu sou a Gisele
Bündchen. Estou aqui numa lingerie. Mas isso poderia ser qualquer outra mulher, sem
ser ela, também pode ser uma mulher empoderada independente. ”
Já a Participante C, afirma, “Eu acho que quando põe esse comercial, na
primeira tomada, que ela aparece toda com a roupa e normal, assim, o comercial faz
com que essa imagem dela, essa imagem parece uma imagem fraca. E no segundo
quando ela tá mostrando o corpo é que aparece o poder. Coloca o poder como se fosse
uma coisa sexual. Na beleza. Um poder que vai deixar o cara louco, que o cara não vai
pensar no carro mais. E no segundo, o poder não está nisso aí.”
A Participante A, acrescenta que em comparação com o primeiro comercial, o
segundo aparenta ser mais democrático, pois apresenta mais estereótipos. Este são
vistos aqui como estratégia, mas estes podem (e devem) ser plurais e mais diversos. E

66
por fim, ela atesta, “Eu concordo com o que disseram sobre o segundo. Apesar de
Gisele ser linda e maravilhosa, no segundo são pessoas com vários tipos de idade,
vários tipos de jeito, gorda, magra, idosa, adolescente, que tem piercing, que usa saia,
pessoas comuns.”
Nesse momento final, a Participante B provoca as outras: “Por que não pode ser
outra modelo? Por que tem que ser a Gisele Bündchen?” E, então, a Participante C
responde o seguinte “É tipo botam uma mulher ideal. A mulher perfeita. ”
A Participante D finaliza a entrevista evidenciando algumas falas conhecidas da
Top Model Gisele Bündchen em defesa da sua representação no primeiro vídeo. “Eu
acho que a Gisele, a gente tá falando dela. Ela fala muito isso ‘Você pode tudo’”- e faz
um longo relato de um episódio na qual a top model foi interpelada por uma fã e que lhe
solicitou uma foto, e sobre o fato relatado, complementou, que na ocasião ela disse para
a sua fã: “Você tem todo o direito. Você pode. (Sobre o direito de as pessoas pedirem
um autografo a ela). Ela é assim. Você pode tudo. Não se rebaixe. Ela fala. Ela nunca
fala assim ‘você nunca será como eu’. ”

67
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desde as primeiras linhas deste trabalho, enfatizamos o papel da configuração


contemporânea da publicidade vinculada ao capitalismo. Esta como tal, tem sido
desenhada desde o início da década de 80, porém, anteriormente, passando por
profundas transformações desse a segunda metade do século XX. A publicidade
vinculada com seu papel de produção cultural na realidade social propõe práticas e
articulações que a compõem dentro sua relação global com o mundo social. Estas
últimas, sendo compostas por economia, cultura e política - não se remetendo a uma
combinação perfeitamente igualitária, contudo, a reciprocidade e grau de relação dessas
forças se dará em detrimento da natureza, do poder e da hierarquia que cada uma delas
pode ter em determinada sociedade.
O conceito que retomamos aqui é a de a publicidade se constitui como um
“sistema”, comercial e “mágico” que dá vitalidade na organização e na reprodução do
capitalismo. Ela ultrapassou a barreira comercial de bens e serviços e começou a se
envolver com o ensinamento de valores pessoais e sociais. Bens materiais e simbólicos,
tem na publicidade a constituição de um padrão cultural cujos objetos não são
suficientes, mas precisam ser validados, estes passam a ter significados pessoais e
sociais.
Ela é um sistema altamente profissionalizado e organizado que induz a
satisfações mágicas, soluções rápidas e a felicidades plenas. Os signos culturais dos
anúncios publicitários não trabalham conotando sentidos naturais, mas sim, denotando
valores referentes à uma ideologia do modo de produção hegemônico. Ela um
importante meio de conseguir facilmente a confiabilidade do público é a busca pela
identificação. As identidades, então, se confundem e se fundem com as representações
sociais.
E daí, pensamos que se a identidade é construída por meio das práticas sociais de
um indivíduo, ela deve propor algo como chamariz que seja inerente a ele, ou seja, deve
ser aceita e acolhida por aqueles que seguem essas determinadas práticas. Nesse sentido,
as representações são produtoras de significados que ajudam na construção das
identidades. No caso das imagens publicitárias, grupos e indivíduos são representados
dentro de um campo de significações, a este limitado, de modo a ficarem circunscritos
dentro de fronteiras identitária estrategicamente demarcadas.

68
Nesse sentido, uma de nossas preocupações foi refletir como essas identidades e
representações podem ser percebidas ou apreendidas dentro do contexto social atual. A
nossa escolha pelo método de pesquisa de recepção através de um Focus Group que tem
como principal método a percepção de tais assimilações na ordem mais prática e mais
próximas do que poderia vir a ser uma análise de comportamento social. Com a
temática do Empoderamento Feminino, a ideia central sempre foi cruzar as influências
da publicidade, com as novas formas de troca de informações propiciadas pelas
tecnologias e pelas plataformas comunicativas como as mídias sociais, apontando os
reflexos que estes aludem na visão das mulheres acerca da questão social feminina.
Numa escala mais ampla, sendo o tema do empoderamento, um tema caro para a
sociedade, abre-se campo para diversos debates acerca da necessidade dos indivíduos e
das comunidades de adquirirem mais recursos, mais ações e mais pensamentos
autônomos que melhorem a relação social dos indivíduos. Um desafio até maior quando
se restringe a temática ao público feminino. Podemos dizer que, com a aceitação do
termo Empoderamento pelo mainstream acadêmico, político e econômico, ele tem sido
amplamente utilizado, contudo há uma deturpação que diverge significantemente dos
objetivos originais traçados por seus formuladores. Nesse caso, mais especificamente
nesse pequeno esboço cabem algumas reflexões. Estas, baseadas em todo arcabouço
teórico anteriormente referenciado, na análise do questionário sociocultural aplicado as
mulheres e, por fim, um Focus Group realizado ao final.
Dentre estas, concluímos que, primeiro, a emancipação do consumidor
proporcionada pelas novas mídias alterou toda a extensão da cultura, refletindo-se
profundamente na relação das organizações com seus clientes. Como vimos no exemplo
dos depoimentos com relação ao comercial da ‘Quem disse Berenice?’ esse diálogo
esteve presente em todo comercial. Este tinha sido o primeiro contato das mulheres da
pesquisa com o comercial, e ele, mesmo assim, trouxe questões que ainda são tabu na
vida de muitas mulheres na sociedade brasileira e também da vida das mulheres
participantes no estudo.
Existe ainda a intenção em se admitir os erros, ou equívocos que as gerações
anteriores tiveram – vide o caso das marcas de cerveja, relatadas ao longo desse estudo
ou das marcas de cosméticos que modificaram seus discursos baseados na exploração da
imagem sexualizante da mulher como tema-objeto. No caso do comercial da Quem
disse Berenice? existe uma provocação muito bem planejada sobre estas ideias

69
equivocadas de que mulher não pode fazer nada. E essa maior liberdade de diálogo com
o público consumidor, se dá nessa nova ambiência das Mídias Sociais.
Novas regras de convivência entre organizações e consumidores ainda estão
sendo estabelecidas, mas existe algo que aponta para um relativa e significativa
mudança de postura das marcas. Uma conversa menos verticalizada parece ter tomado
conta dos discursos publicitários. E isso foi percebido pelas participantes. Houve uma
aproximação, o que possibilitou uma maior identificação com o comercial.
Uma segunda reflexão importante é sobre como de fato a desconstrução de
certos valores ganha força nos discursos das propagandas, e este é assimilado de forma
bastante crítica pelo público estudado. A forma de comunicação da marca ‘Quem disse
Berenice? se apresentada de forma amigável, próxima das consumidoras, com
linguagem simples. Sua linguagem é semelhante à usada pelo público jovem que atinge
- mulheres entre 14 e 35 anos.
No ambiente das redes, a marca sempre se comunica e se coloca à disposição
para responder dúvidas e, na maioria das vezes, de maneira bem direta e pessoal,
fazendo com que as consumidoras entendam que a interação não é feita por uma
máquina programada para dar respostas padrões, mas talvez e sim por outras mulheres
que entendem as suas necessidades. Há uma humanização no tratamento e no diálogo
com as consumidoras. E isso também foi percebido pelas mulheres. Nenhuma delas
havia visto o comercial antes, e elas se sentiram intimamente questionadas sobre
aqueles modelos negativos – que talvez também fizeram parte de sua vida.
Na entrevista, elas deram, muitas vezes, relatos positivos àquelas perguntas,
sempre afirmando que “sim, que elas poderiam sim se permitir àquelas atitudes”. Por
isso, tivemos, ao final, mais retratos positivos relativos ao segundo vídeo –‘É pra mim’
da Quem disse Berenice? – do que no primeiro ‘Hope Ensina’. Tanto no primeiro
quanto no segundo, elas perceberam quais retratos poderiam estar representados em
forma de machismo. No discurso do primeiro, mais do que exatamente na imagem e, no
segundo vídeo, pelos valores negativos apresentados em cada pergunta. Não sendo estes
valores que elas escolheriam para si – não poder vestir a roupa que quiser; escolher a
cor do batom que quiser; não optar por ser chefe ou deixar de comprar preservativos por
que se é mulher.
Aqueles valores se tornaram inadequados, e cada uma problematizou a visão do
que estaria por trás daquelas negativas – concluindo elas, ao final, que o machismo

70
também estava presente ali em forma de discurso a cada negativa que foi riscada, e elas,
bem como as mulheres da propaganda, concordaram em riscá-las também de suas vidas.
Uma terceira reflexão que nos é apropriada é sobre a construção da insegurança
e perversão dessa ditadura da beleza para as mulheres a qual foi representada na série de
vídeos da campanha da Hope. Como na maioria das publicidades de lingerie, existe uma
indução que busca convencer as mulheres a serem sensuais e charmosas, para
alcançarem uma função elevada – o que pode facilmente ser confundido com
Empoderamento.
No caso especifico da campanha ‘Hope Ensina’ a conquista não é de fato a
intenção da personagem, mas o uso da sensualidade como forma de persuasão. A
intenção da publicidade está em dizer que ao vestir-se daquela forma a mulher irá ficar
tão irresistível que será “perdoada” por ser erros e escolhas (bater o carro, estourar o
limite do cartão ou aceitar morar com a mãe). Porém percebemos que as mulheres
participantes se mostraram atentas ao comentar que no vídeo da Hope havia apenas um
padrão de beleza mostrado. Uma delas comentou que não se identificava também com a
personagem por não ter aquele corpo. E daí avaliamos que naquela peça - vídeo 1 – há a
intenção em fazer as mulheres se sentirem culpadas por não terem aquele corpo, numa
insinuação de que com a lingerie além de solucionar o problema com o marido, você se
sentiria tão empoderada quanto a personagem, se fosse ela.
Diferente da segunda peça que mostra uma maior diversidade nas personagens, é
flagrante que o vídeo 1 promove uma padronização e tem a intenção de gerar um certo
tipo de desconforto das mulheres com seus corpos na comparação entre o corpo da
“perfeito” modelo (como dito pelas participantes) e o corpo delas mesmas.
Em suma, de toda a entrevista do Focus Group um dos itens que mais nos deixou
com expectativa foram os itens que descreveriam a postura das mulheres em suas redes
sociais (perguntas 3 e 4), pois um dos objetivos desse estudo era saber se a atitude das
mulheres em rede seria mesma dentro do convívio social - fora das redes. Todas
disseram que compartilhariam com certeza o segundo vídeo, porém nenhuma delas
disse que boicotaria ou não indicaria a marca para algum conhecido.
Para o nosso estudo, vemos a não divulgação dos produtos de uma marca, ou a
não motivação para a compra como uma das ferramentas que as mulheres teriam como
forma de reivindicar maior respeito das marcas para a questão feminina na vida real
(fora da rede) e esse recurso de ação parece ter sido ignorado pelas participantes. Disso,
como resultado, temos que, elas pareceram ter consciência das injustiças as quais foram

71
vítimas por tantos anos, culpa do machismo institucionalizado e propagado nas
publicidades. Porém, apesar delas terem demonstrado ter conhecimento do termo
Empoderamento (reposta afirmativa de todas para a última pergunta da entrevista),
infelizmente, elas não demonstraram se importar muito com o fato de que elas podem
também dizem ‘não’ (na compra ou na indicação dos) produtos e serviços de empresas
que desrespeitam a sua autoestima, a sua autoconfiança e a luta das mulheres de modo
geral.
Por fim, o Empoderamento depende dos sujeitos. Ele é um processo em que os
diferentes agentes – órgãos do Estado, empresas e as organizações da sociedade civil –
nada mais são do que mediadores, cuja função é facilitar, apontar caminhos e auxiliar no
que for preciso para o alcance dos objetivos de determinada demanda, mas nunca
determinar pura e simplesmente o que deve ser feito, sob pena de verem emergir
resistências que simplesmente inviabilizem estas boas intenções.
Como nos disse uma estudiosa abordada nesse estudo, - Oliveira (2016) – “A
quem disse, Berenice? nasce nesse momento em que a ditadura cultural da beleza está
sendo questionada e se aproveita da provocação de regras sociais machistas não serem
mais aceitas para tomar para si essa ideologia como valor para a marca.” E diante disso,
o que esperamos para um futuro próximo é que tais valores sejam tão enraizados na
mente das mulheres como ideologia e, muito mais, em atitudes como, por exemplo, de
boicote às marcas que desrespeitem de qualquer forma a figura da mulher. Que um não
compartilhamento, ou um comentário negativo, reverbere muito mais, resultando em
mulheres com autoestima, confiança e o corpo que elas quiserem ter, independente de
padrões, e cuja as ações de reivindicação visem também reflexos no ambiente familiar,
social e afetivos pela garantia de um maior espaço de atuação nos setores de trabalho,
menos violência contra a mulher, maior liberdade e participação nas cadeiras políticas,
ou seja, por mais acesso e uma maior valorização do que seria verdadeiramente o
Empoderamento Feminino.

72
ANEXOS

1 Pesquisa quantitativa

1.1 Perfil

O levantamento permitiu delinear o perfil das mulheres participantes. Foram 80


respostas recebidas com o questionário o qual esteve disponível através do endereço
<https://goo.gl/forms/FzGGIh4lAHYh9kwp1> do dia 21 de setembro de 2018 ao dia 10
de outubro de 2018. O questionário quantitativo revelou que as mulheres participantes
são, em sua maioria, jovens adultas com mais de 30 anos: 14 têm até 19 anos e 25 estão
na faixa etária entre 20 e 29, e 41 delas tem mais de 29 anos. Portanto, 51,25% das
mulheres participantes têm mais de 29 anos.

Figura – Faixa Etária das participantes

O estado civil mostrou que 60 % das participantes, são solteiras.

73
Figura - Estado civil

No quesito escolaridade, 38,7% delas possuem o ensino médio completo, acompanhada,


logo em seguida, do índice de 30% com o nível superior completo.
Figura. - Escolaridade das mulheres

Sobre a cor da pele, a maioria se considera branca, com 46,3% das respostas
para esse item. Na variante preta e parda, temos respectivamente 11,3% pretas e 33,8%
pardas. As demais responderam serem da variante amarela ou não souberam responder.

74
Figura - Cor das participantes

No quesito religião, a maior parte das participantes consideram-se católica e


protestante, correspondendo a 31,3 % e 22,5 % respectivamente, perfazendo mais de
53,8 % da população amostrada.

Figura – Religião

A escolaridade foi algo que nos chamou a atenção positivamente, pois, mais de
38,7 % das participantes afirmaram ter o segundo grau completo; e um número bastante
elevado afirmou estudar no momento em que responderam ao questionário: 51,2 %.
Acreditamos que dentro desse espectro muitas devam estar buscando uma formação
superior, ou numa segunda formação – tecnológica ou profissionalizante.

75
Figura – Escolaridade

Sobre a opção sexual, 18,8 % se declararam homossexuais ou bissexuais; 2,5 %


preferem não falar e 78,8 % disseram ser heterossexuais.

Figura - Opção sexual

Ao cruzarmos os dados sobre o estado civil e se elas têm filhos, soubemos que 4
jovens são mães e se mantêm solteiras, sendo apenas 5 % do total. Do grupo de
mulheres estudando, 2 tem filhos, ou seja, 2,5% do total que têm filhos.

76
Figura - Filhos

Quanto ao padrão hegemônico estético, 53,8% se consideram fora dele e 46,3%


disseram estar acima. Na nossa pesquisa, pelo menos quanto à autoimagem, o grupo de
mulheres estudado se considera fora dos padrões estéticos predominantes na nossa
sociedade. Apesar da expressiva maioria afirmar fora do padrão estético, acreditamos
que não houve uma discrepância muito fora da média quanto as diferenças.

Figura - Padrões estéticos

77
1.2 Família

O bloco ‘Na Família’ incluiu 14 perguntas de múltipla escolha que buscam saber
como é o comportamento quanto às representações sociais dessas mulheres na família, e
traz indagações que podem ajudar a compreender persistências, avanços e rupturas
quanto à divisão social dos sexos e a divisão sexual do trabalho. Também tentamos
reunir alguns dados que possibilitem refletir sobre possíveis imbricações entre as
condições de vida; disponibilidade de tempo para se dedicar à carreira e aos estudos e a
divisão sexual do trabalho.

O bloco é composto pelas perguntas: ‘Quem é responsável pelo sustento da sua


casa?’; ‘Quem você acha que deveria ser responsável por sustentar a casa’; ‘Quem cuida
do seu filho enquanto você trabalha’, ‘Quem cuida do seu filho enquanto você
trabalha?’; ‘Se você pudesse, deixaria de trabalhar para ficar em casa?’; ‘Quando você
sai com seu marido, namorado ou companheiro, quem paga a conta?’; ‘Você considera
sua condição de vida’; ‘Seu salário atende às suas necessidades e de sua família:’; ‘Você
demora quanto tempo para chegar ao trabalho’; ‘Você mora com:’; ‘Quem limpa a
casa:’; ‘Quem faz a comida:’; ‘Quem lava a roupa:’ e ‘Quem faz compras no mercado:’.

Na pergunta sobre quem é responsável pelo sustento da casa, as duas opções que
mais aparecem mostram que a divisão das despesas entre homens e mulheres é a prática
mais usual em suas casas: 7,7 % escolheram a alternativa ‘Você e seu
marido/companheiro’ e 15,5 % para ‘Seu pai e sua mãe’. E 23,3 % dessas mulheres são
arrimo da família.

Outra questão que vêm à tona a partir desses dados é sobre as mulheres que são
responsáveis pelo sustento da casa. Somando os 36 % que responderam que são elas
próprias as responsáveis, com os 12 % que disseram que suas mães são as responsáveis,
temos que 48 % desse grupo têm a mulher como principal provedora da família.

Com relação à questão sobre quem deveria ser o responsável por sustentar a
casa, que nos dá algumas pistas sobre a representação que predomina sobre papéis dos
homens e das mulheres na nossa sociedade. 11,6 % responderam ‘Eu mesma e meu
esposo(a)/ companheiro(a)’. 5 % responderam que deveria ser apenas ‘meu esposo(a)/

78
companheiro(a)’; 3,8 % indicaram só ‘o pai’, indicando que, na opinião de 9% das
mulheres que participaram do estudo, deveria como tradicionalmente foi, ser um
homem.

Um dos dados que nos chama mais a atenção se colocado em relação com
outros, como o estado civil: apenas 1 solteira demonstra que seus ganhos podem ser
apenas complementares à renda familiar. Além disso, quando perguntamos quem era o
responsável pelo sustento da família, somente 11,6 % das solteiras afirmaram serem
elas próprias e 15,5 % das casadas disseram que dividem esta responsabilidade com
marido ou companheiro. A maior parte, embora bastante distribuído, afirmou que o
sustento da casa fica a cargo dos progenitores ou outras pessoas: 29,9 % o pai ou 27,3%
a mãe; 13% outros e 11,7 % apenas o esposo (a) ou companheiro (a).

Figura - Quem é responsável pelo sustento da casa?

Este é um dado interessante para ser apontado para transformações no modo de


ver a família em que os papéis que cada um desempenha nela. O homem como provedor
para esse público estudado parece não ser mais uma versão da realidade dessas
mulheres.15

15
“ Segundo SANTOS (2011), “A ‘tradicional’ divisão sexual do trabalho, que consiste na especialização
dos homens no papel de provedores do lar e das mulheres como cuidadoras da família, está sendo alterada
pela rápida incorporação das cônjuges no mercado de trabalho.” De 1981 a 1990, “a taxa de participação
das mulheres cônjuges passou de 27,4% para 37,7%” (SORJ, 2008, p. 79) Em 2005, essa taxa alcançou
58,5%.”

79
Figura - Quem deveria ser responsável pelo sustento da casa

A maternidade, na nossa sociedade, é outro traço a ser considerado que que é ser
feminino e por isso uma representação do que é ser mulher. Quisemos, então, entender
como a responsabilidade com os filhos é tratada por este grupo. Como 81% dessas
mulheres não têm filhos, para essa pesquisa somente 15 mulheres que são mães.
Perguntamos quem cuida dos filhos enquanto elas trabalham: 21% respondeu que elas
mesmas ; 14 %, com o segundo filho (a) e 45% com outra pessoa contratada para este
fim. E apenas 2 participantes confirmaram dividir os cuidados do seu filho com seu
esposo (a)/companheiro (a). Assim, 50 % delas recorrem a terceiros para conseguirem
manter sua vida profissional. Dentre essas, 21% dos filhos dessas participantes ficam
sob a responsabilidade do marido ou companheiro.

80
Figura – Se você pudesse, deixaria de trabalhar pra ficar me casa

Ainda para entender um pouco mais sobre as representações dessas mulheres


quanto ao seu papel no mundo do trabalho, na família e na sociedade, perguntamos
quem paga a conta quando sai. Houve uma expressiva contagem na alternativa ‘Outro’.
A opção ‘Meu esposo (a)/ companheiro caiu no segundo lugar com 45,6%. Porém a
opção mais marcada foi a opção ‘Eu mesma’ que somou 52,9% do total.16

Figura- Quando você sai acompanhada de um homem, quem paga a conta?

16
Segundo o DIEESE, em 2010, as mulheres ganhavam 75,7% do salário dos homens e essa proporção é
mais desvantajosa em profissionais com nível superior: elas recebem 63,8%.

81
Sobre a condição de vida, 20%, afirmaram ser ótima e as 56,3% que disseram
ser boa; e 23,8% disseram ser razoável. Quanto ao salário, 43,7% delas disseram que
este atende parcialmente às suas necessidades e 9,9% que às vezes não cobre as
despesas. Esta visão sobre as condições e o salário pode estar atrelada ao fato de que a
maioria delas não é a responsável pelo sustento da casa e, muitas, ou que muitas ainda
estão iniciando sua vida profissional.

Figura – Você considera sua condição de vida

Figura - Seu salário atende suas necessidades e de sua família?

44,3% dessas mulheres moram com suas mães e 25,3% com seus pais. 16
mulheres responderam morar com o pai e com a mãe, dessas 4 responderam haver uma
outra pessoas morando com eles. 32,9%, com o marido ou companheiro; 24,1% com
outros e 30,4% moram sozinha
82
Figura - Você mora com quem?

Um número significativo de mulheres, 50%, residem em locais próximos à


empresa, levam cerca de 30 minutos para chegar ao trabalho. Entretanto, 50% delas
(somatória de todos os outros tempos) demoram entre menos de uma hora e mais de
duas horas para ir de casa para o trabalho.

Figura - Tempo gasto para chegar ao trabalho

Sobre os cuidados com a casa e a família, perguntamos quem limpa a casa, quem
faz a comida, quem lava as roupas e quem faz as compras. A casa é limpa por 57% das
mulheres que responderam o questionário; 29% delas também fazem a comida; a sogra
ou mãe faz a comida em 29% dos casos e 33% dividem essa tarefa. 39% delas também
lavam a roupa; 37% são as mães ou sogras e 21% dividem essa tarefa. Se considerarmos

83
que apenas 5% moram sozinhas é possível dizer que, mesmo na posição de filhas, elas
também assumem várias tarefas em casa.
A divisão de tarefas prevalece na limpeza da casa (67,5%), mas esse percentual
cai para 58,4% quando perguntamos quem cozinha. E a maioria, é de mulheres com esta
tarefa: as próprias participantes (67,5%) e mãe (24,7%), o que indica que ainda
prevalece a divisão sexual do trabalho, com pouca mudança, apenas 14,3% do grupo
apontou um homem, no caso, ‘marido ou companheiro’ como a pessoa que cozinha.
A lavagem da roupa reduz ainda mais a divisão de tarefas, que fica em 13%. Em
63,6% das casas deste grupo, a roupa é lavada por elas mesma: 27,3% por mães e 63,6%
pelas próprias mulheres.

Figura – Quem limpa a casa17

17
Em SANTOS, ainda temos sobre a questão de quem limpa a casa “Por exemplo, sobre quem limpa a
casa, nenhuma delas conta com a ajuda de empregada ou faxineira. Esse tipo de ajuda, enquadra-se no
modelo proposto por Hirata e Kergoat (2007), o da delegação, que se configura na contratação de uma
terceira pessoa, comumente outra mulher, parente ou empregada para cuidar dos filhos e das tarefas
domésticas. Este modelo se tornou mais comum com a emergência de profissionais liberais e mulheres
em cargos de chefia, o que permitiu que mulheres contratassem mulheres, fenômeno denominado de
polarização, devido aos extremos em que se encontram essas mulheres.”

84
Figura - Quem cozinha

Figura - Quem cuida da roupa

A pergunta sobre quem faz as compras 44,2% afirmaram que não fazem essa
tarefa sozinha - dividem essa tarefa ou não realizam - já 55,8% responderam que elas
mesmas fazem as compras.

85
Figura 37 – Responsável pelas compras de mercado

1.3 Cultura

Das participantes, 23,8% usam seu tempo livre para cuidar da casa e 46,3% para
fazer cursos ou estudar. Dado interessantíssimo sobre o olhar mais focado na melhoria
da capacidade intelectual em detrimento dos cuidados com a casa.
Figura - O que você faz com o tempo livre?

Atividades de lazer que fazem com mais frequência é assistir tevê (65%); sair
com os amigos (46,3%); ouvir música (67,5%) e ler livros (41,3%).

86
Figura - Principais atividades de lazer

A pergunta sobre os ‘Programas mais vistos pelas participantes’ visou buscar


informações sobre o tipo de programação que elas assistem no meio televisivo e na
internet. Esse nos dará indícios de quais delas estão mais propensas a ter contato com as
propagandas voltadas para as redes sociais. Sendo grande parte delas maior
consumidoras de conteúdo online de documentários, filmes e seriados, e, em menor
grau, (quase equivalente) de programas informativos, de humor e entrevistas tanto na
televisão quanto na internet.
Figura - Programas mais vistos pelas participantes

87
Dentre os assuntos que interessam a este grupo se distribuem da seguinte forma:
68,8% consomem conteúdo de ‘Saúde e Beleza’ e ‘Viagens e Passeios’; depois 47,5%
‘Política’ e em terceiro lugar ‘Tecnologia’ com 36,3% de escolha; e 15% ; ‘Artistas,
Celebridades e Famosos’ recebeu 9,1% das opções.

Figura - Os assuntos que interessam

O meio de comunicação favorito dessas mulheres foi a Internet com 35%, sendo
o segundo mais votado a ‘Internet no celular’ com 22,5%. A Tv ficou com 11,2% das
opções de escolha.

Figura - Meio de comunicação favorito

O principal meio de informação dessas mulheres, campeão disparado, foi a


Internet com 76,3%. Em segundo lugar os telejornais surgem com 21,3% de votos.

88
Figura - Principais fontes de informação

As próximas perguntas tiveram o objetivo de obter informações de como essas


mulheres vêem o papel da mulher, mais ainda o seu papel como mulher na sociedade.
Para 87,5% delas, a conta deve ser paga por ambos quando saem, enquanto apenas 2,6%
acham que ‘Ele’deve pagar a conta’ (2 respostas apenas para essa escolha). E para 10%
delas, a iniciativa na paquera continua a cargo dos homens.

Figura - Saindo acompanhada de um homem, quem deve pagar a conta?

89
Figura - Quem deve tomar a iniciativa em uma paquera?

Ser mulher, para 47,5% das participantes, atualmente, é saber conciliar tudo, ou
seja, todas as seis alternativas anteriores; 57,5% julga que é ser independente e 27,5%
acha que é ser alguém na vida, estudar. 12,5% consideraram que ser mulher não estava
presente em nenhuma das alternativas apresentadas.

Figura- Quais alternativas retratam melhor o que é ser mulher

Também acham que atualmente, a mulher precisa “Conquistar a igualdade na


sociedade” (52,5%); “Saber conciliar lar e trabalho” (27,5%); “Estudar e batalhar
muito” (8,8%); Ser boa profissional (5% ); “Cuidar da aparência, estar sempre bem
arrumada” (3,7%). E por último, ser boa mãe por apenas com 2,5%.

90
Figura - Necessidade da mulher atual

Para 45%, ‘Ela mesma e seu bem estar’ vem em primeiro lugar e logo depois,
com 43,7% a família; Estudos e Profissão ambos com 3,8% das escolhas. A saúde e o
corpo, a alimentação e o meio ambiente juntos somaram menos de 5% do percentual.
Como a maioria é solteira, 58%, cruzamos os dados do estado civil e do que elas
consideram que vem em primeiro lugar. Para 28% das solteiras, a família vem em
primeiro lugar e para 56% das casadas ou que moram com um companheiro.

Figura - O que é mais importante em sua vida

As dificuldades que a mulher encontra hoje em dia são, para 57,5%, “A


violência física contra a mulher em casa e em outros lugares”; bem como quase o

91
mesmo quantitativo acredita que é “A violência psicológica em casa e em outros
lugares” (56,3%).

Figura - Principais dificuldades encontradas pela mulher nos dias de hoje

Quanto aos objetivos dessas mulheres, 75% desejam ser boas profissionais;
56,3% desejam ser respeitadas; e 37,5% deseja ser uma boa mãe de família;

Figura - Quais são seus objetivos de vida?

92
1.4 Questão aberta

Por fim, solicitamos as mulheres que respondessem a seguinte questão aberta


‘Você se considera feminista?’ e solicitamos uma justificativa. Desta, obtivemos 45
respostas positivas, 30 respostas negativas, 4 repostas vagas - que não indicavam
posição negativa ou positiva - e 1 não sei. Das repostas positivas (45), 6 foram sem
justificativas, dizendo apenas “Sim” como resposta. Seis (6) apresentaram uma certa
inconsistência ou até dubiedade – como se as mulheres não tivessem muita segurança ao
assim se posicionar como feministas. E as demais 32 trouxeram em suas justificativas
algumas frases como ‘luta pela igualdade’; ‘não se aceitar como inferior’; ‘luta
organizada contra a violência’; ‘busca por respeito na sociedade’; ‘conquistar nosso
espaço social’; ‘busca por independência’; ‘ter liberdade’; ’ a mulher merece ser
respeitada e ser o quiser;
Das respostas negativas (30), 16 foram sem justificativa (apenas o “não” como
resposta) e 14 com um certo grau de inconsistência ou dubiedade na justificativa - como
se as mulheres não tivessem muita segurança ao assim se posicionar na pesquisa. Das 4
respostas consideradas vagas ou sem consistência, haviam as seguintes justificativas: (1)
“Não, de forma alguma. Tenho foco em outras questões de vida que não foram
abordadas neste questionário. Também senti falta de mais opções de respostas como
*nós* ou *ambos* e questões tendenciosas, onde não havia nenhuma das respostas a ser
selecionada e não era permitido. ”; (2) “Não. Acho que os pensamentos extremos são
ruins. ”; (3) Me considero meio termo, apoio todo direito da mulher, mas não apoio
violência em nenhuma situação, tudo de forma contida me agrada mais”; (4) “Eu acho
que é até contraditório não ser feminista hoje em dia. Quem quer ser/estar em posição
inferior aos homens? ”. E apenas uma das mulheres respondeu ‘Não Sei’.

93
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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