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luterano
"Como, pois, seria justo o homem para com Deus, e como seria puro
aquele que nasce de mulher? Eis que até a lua não resplandece, e as
estrelas não são puras aos seus olhos. E quanto menos o homem, que
é um verme, e o filho do homem, que é um vermezinho!" (Jó 25:4-6)
“Que é o homem, para que seja puro? E o que nasce de mulher, para
ser justo? Eis que Deus não confia nem nos seus santos; nem os céus
são puros aos seus olhos, quanto menos o homem, que é abominável e
corrupto, que bebe a iniquidade como a água!” (Jó 15:14–16)
“Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados,
nos quais andastes outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o
príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da
desobediência; entre os quais também todos nós andamos outrora,
segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e
dos pensamentos; e éramos, por natureza, filhos da ira, como também
os demais.” (Efésios 2: 1-3)
"Por que você me chama bom? ", respondeu Jesus. "Não há ninguém
que seja bom, a não ser somente Deus." (Marcos 10:18 / Lucas 18:19)
"Na verdade que não há homem justo sobre a terra, que faça o bem, e
nunca peque." (Eclesiastes 7:20)
Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém
que entenda; Não há ninguém que busque a Deus. Todos se
extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem,
não há nem um só. (Romanos 3:10-12)
“Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como
trapo da imundícia” Isaías 64:6
Ora, nosso entendimento é sempre falso. Se por um acaso, como em Romanos 1, se atesta
a existência de Deus e da Lei natural por meio da razão, não há nada que faça os homens
adorarem verdadeiramente este Deus e seguir a lei [mesmo que esteja presente em sua
constituição natural]. Somente Deus, somente o Espirito Santo por meio do sacrifício de
Cristo nos permite distinguir espiritualmente aquilo que é do Espírito.
Apenas a Palavra de Deus, a Bíblia Sagrada, neste mundo, apenas ela é fonte infalível
para regras de fé, ela é norma normanda, ela é a própria condição sine qua non para a
validade de qualquer outra afirmação. Para validade até de nossas obras. Sem a palavra,
não estamos prontos para fazer coisas por dever, por amor desinteressado, apenas fazemos
por nós mesmos, mesmo que a ação seja externamente boa, não o é em seu gênese, é
corrompida junto com o pensamento do homem.
Como Paulo ensina a seu filho na fé, a boa obra só é boa verdadeiramente depois da fé,
depois da ação do Espirito Santo, que vem da Palavra até nós, torna-nos mansos e gratos
a Cristo, pronto para toda boa obra em sua criação.
A Iluminação
A tradição escolástica herda de Agostinho uma riqueza que atesta ainda mais esta
verdade: A Iluminação.
Toda coisa, enquanto coisa, isto é, enquanto algo que é e não é outro, é ente, e o ente se
entende de dois modos: Como particípio e como substantivo. O primeiro é a coisa
enquanto é, é um ser (participa do ser), como o vivente é da vida. O segundo é a coisa
enquanto é algo e não outra, tal como o vivo é da vida. Pois bem. Uma coisa não teria ser
por si mesma, se não que recebe de outro, e esse outro é sempre eficientemente o próprio
Deus, ou seja, Deus é a própria causa do ser, não só como causa, mas como conservador,
isto é, não só o cria se não que o mantém no ser para continuar sendo. Esse é o caráter
mais intimo do ente enquanto particípio, é seu actus essendi que está ligado
eficientemente a Deus.
Assim sendo, desde nossa primeira cognição (primum cognitum) localizamos pela
abstração o primuns ens. Que é esse caráter participativo do ser. Ao abstrairmos qualquer
coisa, temos o ser não como mera copula logica, se não que há um ser sendo ali, que foi
criado e está sendo conservado por participação no ser. Isso parece bastante obvio, mas
é justamente esse caráter de obviedade que mostra o poder do ser, sua grandiosidade que
se faz presente em cada um de nossos atos como sustentáculo supremo. Esse primuns ens
não é o ser de Deus, pois o ser de Deus não se mistura, ele não é como uma centelha ou
parte de todas as coisas, mas Ele sustenta o ser em seu próprio Ser.
Nossa cognição é a cognição de algo, ou seja, ela tem um termino, um fim. Quando nos
deparamos com algo, a direção de nossa intelecção se encontra perdida na riqueza da
coisa, se encontra perdida ao tentar encontrar o próprio da coisa. Seja perdida em seus
acidentes em relação a outros acidentes, ou nos acidentes em relação a substancia, ou
intra-substantia, isto é, na matéria em relação a sua forma, ou até mesmo, na infinitude
do ser que se conserva ali (em razão do efeito sempre conter de forma menos perfeita as
perfeições de sua causa), isto é, a infinidade do ser enquanto participativo, enquanto Actus
Essendi.
Por fim, nossos aparatos cognitivos não poderiam nunca terminar seu ato de conhecer
pois é uma escalada ad infinitum, (não no sentido que nossa cognição não tenha limites e
possa examinar exaustivamente a coisa, mas que o ser em que a coisa se mantém é
inefável e inexoravelmente rico enquanto nossas potencias, principalmente após a queda,
são potências não-facultadas, pois carecem do auxilio divino para ter acesso a sua criação,
cuja luz, ou principio de inteligibilidade, foi dada pelo Dizer de Deus). Ainda assim,
cognizamos as coisas e conseguimos por abstração ter ideias gerais, mais ou menos
precisas, do que a coisa é ou faz, ou o que nela mesma é acidental à ela. Como isso é
possível?
Aqui não se fala de um processo onto-genetico estrutural que permite isso, senão que
quero dizer: O ser do conhecido, que vem de um conhecer-algo e esse ‘algo’ é um ‘algo-
que-é’, e seu momento mais intrínseco, seu ‘é’ considerado em si mesmo é a participação,
não participação ‘de-algo’ mas participação do ‘ser’ pois o ‘de-algo’ já é um momento
ulterior, pois o ‘de-algo’ é o ‘de-algo-que-é’ tornando circular. Esse ‘ser’, esse actus
essendi é contido em toda e qualquer cognição. Por fim, o ‘conhecer-algo’ acaba por se
perder no caminho para o ‘algo’, sendo impossível completar tal tarefa a não ser por um
elemento ad extra. O elemento ad extra é superior a natureza do homem, é sobrenatural
a ele.
O elemento ad extra é o próprio Deus permitindo que nós conheçamos as coisas. Ele não
determina a verdade ou o objeto do conhecimento, mas permite que se conheça. Ele é
causa eficiente do conhecimento, enquanto a nós resta a posição enquanto causa formal
do objeto intencional da consciência [pré-iluminação] e trajeto do conhecimento para a
verdade [pós-iluminação]. O pós-iluminação, que é o caminho para a verdade, não é senão
algo contido virtualiter na iluminação, mas atualizado pelas capacidades do homem.
Mas ora, o que isso tudo implica? Que se o próprio conhecer é dado por Deus em razão
de uma falha derivada da queda, que outro conhecer se iguala àquele que foi inspirado,
escrito, dirigido, movimentado, selecionado e canonizado pelo próprio Deus de forma
sem igual? Esse conhecer não só é instalado por Deus (como no conhecimento da
iluminação) se não que também Deus se instala nele. O conhecer de suas Divinas Palavras
é o conhecimento de Deus daquele que o conhece por meio dele mesmo. É a porta de
entrada para a vida espiritual na Igreja.
A tradição:
A Igreja existe primeiro que as Escrituras. A igreja começou imediatamente após a queda
com o primeiro evangelho proferida pela Palavra Oral (viva voce), quando Deus aplicou
a Lei (gen 3:8-14) e as Promessas (gen 3:15). A Escritura só surgiu em Moisés. E depois
dele, não podemos adicionar uma palavra sequer ao totum da escritura. Esse totum é tanto
in actu como virtualiter. Isto é, não precisamos interpretar as Escrituras por ela mesma
sempre, se não que a razão, a experiência e a mística a ajudam a achar conteúdos
virtualmente inseridos na Bíblia.
Alguns diriam: E a tradição? Não é ela uma autoritas? Sim, ela o é. Mas apenas per
accidens, ou in obliquo, é indiretamente autoridade na medida que está em consonância
com a Palavra do próprio Deus vivo, que esta sim é uma autoritas per se. Os reformadores
chamavam a tradição, a experiência e a razão de normas normadas [em contradição à
norma normanda]. A tradição, ao contrario da Escritura que é totum do Escrito-por-Deus,
a Tradição é o totum da relação homem-e-Deus-revelado, isto é, o total da teologia-da-
Bíblia (aquela teologia que não é bíblica ou que se extraviou, apostatou ou cometeu
heresia não é parte formal da tradição), mesma coisa pras experiências e dogmatizações.
A tradição contem a vida da Igreja e sua relação com o divino. E por ter homens nessa
relação, não é infalível, se não que é infalível na medida que concorda com as Escrituras.
Assim, é permitido o nome Santa Tradição a não ser in obliquo, onde a Tradição é Santa
por concordar com a Santa Escritura.
Dessa forma, aquilo que contradiz diretamente as Escrituras será rejeitado por calunia ao
Santo Espirito de Deus. Aquilo que concorda deve ser adotado em conformidade com a
Palavra. E aqueles outros que parecem ser indiferentes quanto as Escrituras podem ser
validado na mesma medida que concorda com as Escrituras.
Para quem dizer que isto não passa de vã filosofia, um agostinianismo paganizado,
mostrarei estes ensinamentos advindos da boca do próprio Deus:
Jesus, porém, disse: Até vós mesmos estais ainda sem entender? Ainda
não compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para o ventre,
e é lançado fora? Mas, o que sai da boca, procede do coração, e isso
contamina o homem. Porque do coração procedem os maus
pensamentos, mortes, adultérios, fornicação, furtos, falsos
testemunhos e blasfêmias. São estas coisas que contaminam o homem;
mas comer sem lavar as mãos, isso não contamina o homem.”
Todas as coisas são puras para os puros, mas nada é puro para os
contaminados e infiéis; antes o seu entendimento e consciência estão
contaminados. Confessam que conhecem a Deus, mas negam-no com
as obras, sendo abomináveis, e desobedientes, e reprovados para toda
a boa obra” (Tt 1:14-16)
Chega a ser triste ter que notar algo tão obvio: A tradição é sempre do homem,
mesmo a tradição da fé cristã. Ora, a tradição judaica pré-cristianismo não seria
a tradição e um povo que esperava na vinda de Cristo? E essa mesma tradição
não foi mal usada na própria vinda de Cristo?
Contra mim, poderiam levantar que a tradição é a vida da Igreja, antes de Cristo e
depois de Cristo, e essa tradição tem sua parte escrita e sua parte oral. Se a parte escrita
é infalível por ser a vida da Igreja a parte oral também o seria, com base em Paulo:
"Nós vos ordenamos, irmãos, em nome do Senhor Jesus Cristo, que vos
aparteis de todo irmão que ande desordenadamente e não segundo a
tradição que de nós vós recebeste". (Tessalonicenses; 3;6)
Aqueles que se opõem usam desse texto para dizer que existe uma tradição oral que teria
sido preservada pela igreja e que deveria ser seguida com a mesma autoridade da Bíblia.
Paulo fala aqui para os cristãos guardarem o que foi ensinado oralmente, bem como por
epístolas. Todavia, é óbvio que Paulo não poderia dizer para crerem apenas no que estava
nas epístolas, porque o primeiro contato dele com a Igreja de Tessalônica não foi escrito.
Paulo esteve em Tessalônica e pregou aos tessalonicenses, conforme Atos 17.1-9. Logo,
foi oralmente que Paulo disse que Jesus morreu ressuscitou, sendo igualmente oralmente
que Ele pregou as bases do Evangelho. Além disso, a data da epístola nos ensina muito
sobre o que eram as tradições orais que Paulo ensinou:
A Segunda Epístola aos Tessalonicenses foi escrita entre os anos 50-52. O Evangelho de
Mateus, por sua vez, foi escrito entre 60-70. O de Marcos entre 62-69. de Lucas entre 60-
63. e João, que foi o último, entre 85-90 d.C. Logo, quando Paulo escreveu aos
tessalonicenses, os Evangelhos ainda eram ensino oral. Não existia nenhum escrito da
vida e obra de Jesus por parte dos apóstolos.
Então, se Paulo tivesse dito para aceitarem só no que ele escreveu nas cartas aos
tessalonicenses, eles não teriam no que crer. Paulo, todavia, teve um papel
importantíssimo na formação dos Evangelhos posteriormente. Dois dos autores dos
Evangelhos foram seus discípulos. Lucas acompanhou Paulo em suas viagens. Em
Colossenses 4; 14, Paulo envia saudação dele a Igreja de Colossos, mostrando que ele
estava junto a Paulo.
Logo, Lucas está dizendo que ele fez investigações acuradas sobre a vida de Jesus. Ele
usou de várias fontes (possivelmente também o Evangelho de Marcos, que é mais antigo),
e assim, ele teria reduzido a escrito aquilo que era tradição oral, até então. Lucas, que
acompanhou Paulo, certamente sabia de tudo que Paulo ensinava oralmente, tendo escrito
esse ensino em seus dois livros. Marcos, que escreveu seu Evangelho antes de Lucas
ainda, também acompanhou Paulo em suas viagens, conforme Atos 12.25 e 13.5.
Também na Epístola aos Colossenses 4.10, Paulo envia saudação de Marcos. Logo, tanto
Marcos, quanto Lucas, registraram aquilo que ouviram dos apóstolos. Mateus, que era
apóstolo, diferente deles, escreveu Evangelho que conserva e comprova o que ambos
disseram. E por último, João, escreveu o Evangelho para completar o ensino do que era
necessário.
Ademais, nem tudo foi escrito, mas o que foi escrito é suficiente para a salvação pela fé
em Jesus. Por exemplo, Deus não quis em gênesis explicar o porque das leis da física, ou
de buracos negros, ou da redondeza da terra, mas quis apenas explicar o necessário para
a salvação dos judeus escravizados sob a liderança de Moisés. O texto de João 21.25 diz
"há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez. Se todas elas
fossem relatadas uma por uma, creio que nem no mundo inteiro
caberiam os livros que seriam escritos."
Esse verso é usado por muitas pessoas, para afirmar que nem tudo está escrito, logo,
teríamos que ter outras fontes de doutrina além do que está escrito. Todavia, ao lermos o
Evangelho de João em alguns versículos atrás, capítulo 20; 30-31, temos a explicação de
João para o propósito do Evangelho escrito.
"na verdade, fez Jesus diante dos discípulos muitos outros sinais, que
não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram registrados para
que creiais que Jesus é o Cristo, Filho de Deus, e para que, crendo,
tenhais vida em seu nome."
Logo, João não estava dizendo que as pessoas deveriam ter outras fontes de saber sobre
Jesus que não fossem os escritos apostólicos. Ele estava dizendo, na verdade, que aquilo
que foi escrito tinha tudo o que era suficiente para que alguém tivesse fé em Jesus como
o Cristo. João estava dizendo que o não foi escrito era desnecessário, uma vez que o que
alguém precisa para crer em Jesus e ter vida em seu nome é o que ele escreveu. Ao
afirmar que muita coisa não foi escrita, João não está descartando o escrito e sim
afirmando que o escrito é suficiente.
Embora a Escritura não tenha tudo sobre Deus ou sobre a criação, ela tem o que nós
precisamos saber sobre Deus de forma perfeita e infalível para nossa comunhão com Ele
e alcançarmos ao fim disso a salvação de nossas almas pela fé em Jesus.
Bom, não me resta dúvida na suficiência da Escritura como fonte infalível de doutrina
para a Igreja, mas é obvio que a Bíblia não tem todas as respostas sobre tudo que a Igreja
precisa, mas quando alguma dessas respostas está na Bíblia, é a luz da bíblia que se deve
olhar as respostas. Se não estiver diretamente na Bíblia, é ai que entra a tradição! Como,
por exemplo, saber qual o cânon da Bíblia? Podemos ter certa ideia por algumas intuições
simples, como pegar o cânon dos judeus, que era a Igreja agraciada pelo Espirito Santo
que revelou a vinda de Cristo, o Salvador. Rejeitar o cânon tardio dos gnósticos,
justamente por ser tardio e sem fonte primaria, entre outras coisas. Mas é claro que não é
tão simples (ou pelo menos para quem estava lá naquela época), e foi a Igreja que
permaneceu fiel a vontade do Espirito Santo aquela que criou o cânon bíblico.
Não negamos que a Palavra de Deus seja a vida da Igreja, seja ainda sim uma tradição
[escrita]. Não negamos nada disso! Mas ao mesmo tempo, afirmamos nossa incapacidade
epistemológica de conhecer infalivelmente a vida da Igreja senão que o próprio Espirito
Santo nos diga. A Bíblia é a tradição escrita, é parte da vida da Igreja, mas é justamente
a parte infalível. A outra parte da tradição, do ponto de vista epistemológico, é infalível
na medida que concorda com a Bíblia por simplesmente não termos como afirmar a
certeza dos fatos e dos ensinamentos.
Alguns acusam-nos de contrariar a Igreja, dizendo que as portas do inferno não
prevaleceram contra ela, e de fato não o vão. A verdade está com Deus, que nasceu,
morreu e ressuscitou, que trouxe seu Espirito para guiar os profetas e os apóstolos, para
nos guiar no dia em conformidade com o corpo de Cristo por meio de sua Palavra que
opera em nós.
“Saiu dentro vós a palavra de Deus? Ou veio ela somente para vós?
Se alguém cuida ser profeta ou espiritual, reconheça que as coisas que
vos escrevo são mandamentos do Senhor” (1 corintios 14: 36-37)
Bom, nossos adversários falam como se a Igreja fosse infalível, coisa que não o é. Acaso
Jesus, logo depois da confissão de Pedro não foi o mesmo que o rechaçou? Acaso Paulo
não enviou cartas denunciando todo tipo de heresia, que, como vemos nas cartas de
Clemente de Roma e Inácio de Antioquia, permaneceram na Igreja? Não é dito que
sempre haverá falsos profetas entre nós?
Persistentes, ainda, clamam pela passagem que diz que as coisas do Espirito se discernem
espiritualmente. Nada aqui é novidade para nós. Já dissemos que temos o entendimento
quebrado para as coisas de Deus, e que só podemos fazer isso por um meio de graça, que
é a Palavra. Ademais, dentro da Palavra, há passagens que interpretam outras, e é
exatamente assim que chegamos as verdades principais da Escritura, que são evoluídas
posteriormente pela tradição, razão ou experiência em conjunto com as verdades bíblicas.
Não é isso justamente o Espirito sendo distinguindo pelo Espirito, ou negam que a
Escritura é advinda do Espirito?
Escolasticos luteranos definem as verdades bíblicas assim:
1 Verdades intra essentia da Escritura.
1.1 Per se: Quando a bíblia fala diretamente uma verdade, sem necessidade de exegese
falamos de verdades per se na essência (ad intra) escriturística. Como quando Jesus
fala que Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida.
1.2 In Obliquo: Quando a bíblia interpreta ela mesma descobrimos as verdades in
obliquo da Escritura que estão contidas na própria essência dela, essas verdades
normalmente vem de inferências ou exegeses, algumas mais simples e outras não,
um exemplo de simples é o caso da masturbação, ora, a Bíblia proíbe o pensamento
pecaminoso sobre qualquer mulher que não seja sua esposa e também diz que o
casamento existe para permitir o prazer direto entre duas pessoas, dessa forma, está
claro que masturbação é errado (há vários outros casos assim também, como
Romanos interpretando gênesis, ou os evangelhos e os escritos messiânicos dos
profetas).
2 Verdades bíblicas per accidens: Aqui está a tradição, razão e experiência, que são
infalíveis se e somente se houver concordância à Bíblia.
Perceba que in obliquio e in recto são distinções dentro da própria essência da coisa, tal
como [respectivamente] é o sorriso e a racionalidade para o homem. Já o acidental é
externo e sua validade depende da substância primeira.
“Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie outro
evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema. Assim,
como já dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos
anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema [...]
Porque não recebi, nem aprendi homem algum, mas pela revelação de
Jesus Cristo" (Gálatas 1:8-9; 12).
Se Paulo não aceita nem mesmo um anjo (que já anunciaram muitas coisas várias vezes
por toda a Bíblia, desde Genesis à Abraão até nos Evangelhos à Maria) troque algum
tijolo deste monumento perfeito que é a Palavra, quem somos nós para colocar-nos ante
a Palavra? Nem mesmo que se diga que um anjo ou servo de Deus veio até a terra anunciar
uma novidade na fé, que seja anathema!
Aquele que nos acusar de destruidores da tradição deve ser humilhado por sua falta de
compreensão em nosso método. Muitos luteranos fizeram a distinção entra sola scriptura
e solo scriptura (sim, o latim não faz qualquer sentido aqui).
Por mais que exista outras tradições protestantes extremamente preocupadas com a
história, tradição, razão e experiência, acabam dando um passo maior que a perna.
Reformados fazem um demasiado uso da razão para assuntos misteriosos. Pentecostais
interpretam na medida que oferece uma verdadeira experiência dos dons do batismo com
o Espirito Santo. Ortodoxos e Romanos interpretam em vista da tradição. Anabatistas
interpretam com sua vontade. Liberais interpretam com a ciência e filosofia. Apenas os
luteranos interpretam primeiramente suas mensagens diretas, secundariamente ela
explicando ela mesma e terceiramente sendo norma para as clausulas da razão e tradição.
Não negamos que a tradição e a razão interprete as escrituras! Mas essas devem ser
interpretadas pelas escrituras antes! Não é assim que a Igreja sempre fez? Ora, Irineu ao
lutar contra os gnósticos não usou a tradição como prova da validade das Escrituras, mas
usou as escrituras para mostrar que sua tradição não contradiz com os ensinos de Jesus e
dos Apóstolos. Qualquer Loci Theologici luterana que abrir, terá primeira a exposição da
fé, depois uma análise da história da Igreja e por fim uma demonstração especulativa da
fé já dogmatizada ali.
É isto que é o livro de Concordia. É a expressão da fé luterana revisando e sendo revisada
por toda historia da Igreja, atestando a catolicidade da nossa fé. A tradição correta
expressa neste livro é o espelho da Bíblia, nada ali contradiz a Escritura e a Palavra de
Deus.
Lucas diz:
“Eles se dedicavam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas
orações” (Atos:42)
Perceba que é citado uma doutrina dos apóstolos que é encontrada nas cartas, nos
evangelhos e no velho testamento e não em uma autoridade eclesiástica formada de
homens falhos. Mesmo a Bíblia não sendo sumarizada e canonizada naquela época, o
Espirito Santo já nos diz que a verdadeira doutrina dos Apostolos deve ser coletada e
reunida, formando o canon.
Razão:
Livrando-se da tradição, nosso pensamento pecaminoso logo corre para criar outro ídolo.
Normalmente, o mais brilhante de todos (e o mais enganador) é a razão. Nós nos
prostramos imediatamente a razão para “desvendarmos a fé”, “descobrir dogmas”,
“iluminar a escuridão”, entre tantos outros chavões usados por racionalistas da fé. Nota
importantíssima: Não criticamos o racionalismo ao mesmo modo que fazem os ortodoxos,
que criticam e rechaçam toda e qualquer tentativa de demonstrar [isto é: não descobrir ou
desvendar, senão que apontar ao que já estava revelado, mas de forma categorizada e
sistematica] verdades da fé, mas criticamos sim apenas aqueles que inventam dogmas e
“verdades da fé” a partir de um exercício de razão.
Alguns tentaram apenas tapar buracos inexplicados criando uma explicação que não
estava nas premissas, tornando-se algo completamente diferente e irreconhecível daquele
conteúdo inicial, que com a evolução da razão acaba por se tornar danoso a Igreja de
Cristo, assim foi com a transusbstanciação, comunhão em uma espécie, purgatório, limbo,
consubstanciação, presença espiritual de Cristo na comunhão, expiação limitada, etc.
Já muitos outros começaram não com uma intenção aparentemente boa, mas começam na
pura idolatria a razão. Esses advogam que as ciências e filosofias podem levar o homem
de forma mais perfeita ao conhecimento de Deus, esses leem a Bíblia por lentes filosóficas
e cientificas. Julgam e subjugam o próprio Espirito de Deus. Torturam a palavra para
agradar a sua ciência. Assim fizeram Schleiermacher e suas crias do idealismo alemão e
liberalismo teológico.
“Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de
filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os
rudimentos do mundo, e não segundo Cristo” (Cl 2: 8)
Devemos ter um Usus Rationis Ministeralis, é principium quo, isto é, uma razão que é
tanto principio de teo-logica e também conserva os ensinamentos bíblicos, trazendo o
virtualiter das mensagens bíblicas atualizados em sua perfeição dogmática e sistemática.
Devemos por outro lado, nos afastar do Usus Rationis Magisteralis, é um principium
quod, é sobre-explicação, para fora do que estava virtualmente contido na Biblia. É
adição, seu início é justamente o fim dos limites da Bíblia.
Usus Rationis Ministeralis Usus Rationis Magisterialis
Sistematizar
Muitos “prostestantes” (o mais adequado seria chama-los pelo nome de anabatistas) hoje
em dia acreditam numa Nuda Scriptura radicalíssima. Coisa combatida por todas as alas
tradicionais da reforma desde seu início, desde Lutero contra Karlstadt e até Calvino em
seus escritos contra a seita anabatista. Esses pensam como positivistas. Estes
“protestantes” acreditam que um verdadeiro conhecimento da Palavra (portanto da fé, e
portanto da salvação) só vem de um conhecimento de métodos históricos, de inúmeros
léxicos gregos, de revisões de crítica e hermenêutica. Esses idolatras da razão buscando
a pureza da palavra, tira dela sua própria pureza (isto é, que vem de Deus) e acaba por
depositar novamente nos homens e seus métodos e instrumentos filosóficos-cientificos
para descobrir Deus, sua Palavra e a habitação do Espirito Santo em nós.
Esses protestantes ainda não entenderam que a sola scriptura não é só um princípio
epistemológico (e mesmo que fosse, não quer dizer que a ciência determina a Palavra),
mas é também o reconhecimento que por não termos completude do Espirito em nós,
(como Adão tinha e por essa mesma razão poderia conhecer Deus deliberadamente) não
podemos por nós mesmos, nossos métodos e análises, conhecer aquilo que é do Espirito.
Apenas Ele entende Ele mesmo, e apenas Ele em nós produz fé, produz alimentação
espiritual advindo da Bíblia. É Ele e apenas Ele que faz a Bíblia ser a Palavra Proclamada
e não apenas um livro. Esses protestantes não confiam em Deus, mas neles mesmos. É
apenas Ele por meio das águas do batismo que nos declara justo, perdoa nossos pecados
passados e futuros para Ele mesmo. É apenas Ele que mantém nossa fé todos os domingos
na leitura do Evangelho e na Comunhão. É apenas Ele que nos absolve de todos os
pecados na consciência na Santa Absolvição. Se a verdadeira religião é a maneira de nos
religarmos (religare) a Deus, a religião não é nossa, é d’Ele, pois apenas o Filho do
Homem pode-nos redimir diante do Pai. Esse positivista cristão, embora proclame com
sua boca a salvação pela fé e pelo evangelho, em sua mente afirma que é a lei que salva,
não as de Deus, mas a da ciência.
Que faremos pois? Baniremos a razão? Não! Obvio que não! Mas apenas nos manteremos
humildemente em nossos limites. A razão não consegue descobrir verdades de fé, se não
que abstrair da Palavra com ajuda do Espirito Santo na iluminação e oração. Se a razão
tem limite e seu limite é justamente onde começa a fé, a razão não tem outra tarefa se não
aceitar a Palavra e seus mistérios indecifráveis ao mesmo tempo que ajuda o homem a
sistematizar e categorizar pensamentos sobre esses mistérios, nunca descobrir algo de
novo a eles mas sim organizando eles. Se a Palavra disser que Jesus é completamente
humano e completamente Deus, o homem não pode encerrar essa contradição [aparente
apenas, não real] dizendo que o homem se faz homem por seu intelecto e o Deus o é por
sua totalidade, onde a conclusão seria que a substancia de Cristo é divino e o intelecto e
sabedoria é humana. O homem não pode desviar da Verdade proclamada, mas apenas
demonstra-la.
Parece paradoxal, mas é por isto que se diz que "o meu povo não conhece o juizo do
senhor", também que “O vento sopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de
onde vem, nem para onde vai. Assim é todo aquele que é nascido do Espirito" "Pois,
desde a criação do mundo, os atributos invisíveis de Deus, o seu eterno poder e sua
divindade se entendem e claramente se veem pelas coisas que foram criadas". A
contradição que existe na Bíblia é aparente, mas não real, necessita-se então uma
aceitação do mistério ao mesmo tempo que há um desdobramento da razão por cima das
verdades da fé, descobrindo seus segredos sem criar mentiras. É claro que a razão não é
infalível por si mesma, infalível é somente ás verdades da qual a razão está sobre.
Experiências místicas:
Nosso entendimento, cansado de criar ídolos para si, procura algo que consegue ser tão
real e concreto como a razão e que é tão inexplicável como a fé. Esse seria o ídolo mais
perfeito, atestado empiricamente e incapaz de ser refutado [justamente por ser
inexplicável]. Um grande exemplo atual disso são os missionários que vão para países
subdesenvolvidos pregar e espalhar o Evangelho. Nesses países a pratica de cultos
místicos é comum entre todos seus povos. Muitos desses missionários ao ver a pratica e
ver que realmente “funciona” deixam sua fé e o evangelho em troca de uma pratica tão
verdadeira e inexorável.
Não é algo comum só a pagãos. É comum dentre os espíritas, dentre os gnósticos,
teurgicos, astrólogos, budistas, hinduístas, satanistas e até mesmo dentro do cristianismo.
“Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vêm até vós vestidos
como ovelhas, mas, interiormente, são lobos devoradores. [...]
Nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor!’ entrará no reino dos céus,
mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos me
dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu
nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não
fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca
vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade.”
(Mateus 7:15-23)
Perceba que eles fizeram coisas em nome do Pai e de Cristo mas essas mesmas coisas não
são da vontade do Pai e de Cristo. Essas coisas que fizeram são reais e até boas (como a
expulsão de demônios, profetizações que se realizaram e outras maravilhas) mas
certamente não levaram nada ao Pai, mas apenas a estes homens. Não é comum hoje em
dia ver muitos homens que fazem milagres e profetizações, mas que em nenhum desses
milagres ou profecias são feitas pela misericórdia de Deus? Ora, não se vê sempre igrejas,
monumentos e oferendas feitas a estes que operam tais maravilhas? Não se vê criando
todo uma moção de crentes de todo mundo em busca de uma migalha da benção de um
homem ou mulher? Mas e Deus? Se vê Deus sendo invocado ali?
“Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos tornardes
como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus. Qualquer,
porém, que fizer tropeçar a um destes pequeninos que crêem em mim,
melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma grande pedra
de moinho, e fosse afogado na profundeza do mar." (Mateus 18:3,6).
Salvação, ou justificação, possui duas descrições de um mesmo ato, uma descrição
forense e uma descrição participativa. Uma descrição que fala sobre como é o nosso status
em relação a Deus, como ele nos olha em seus juízos. E outra descrição que nos mostra
como participamos de Deus, como somos filhos dele, como somos renovados n’Ele, a
descrição de como é nossa vida em Cristo. É de se notar que aquilo que ocorre na
participativa, só ocorre por causa do modo que Deus nos tem em relação a Ele, assim, não
ocorre de modo autônomo da forense, mas depende dela.
Forense/passiva Participativa/ativa
1.a: A justificação forense é usada na bíblia quando se fala em ser justo por imputação,
isto é, pela fé que é dada por Deus a nós, Deus nos imputa a justiça de seu Filho, e assim,
mesmo não tendo a natureza do filho em nós, é nós imputado sua natureza em nosso
nome. No direito legal, imputação significada “ser contado como de X” “ser declarado
como de X”, assim, mesmo quando uma pessoa não tem posse de certa propriedade mas
tem o direito sobre ela, se diz que é imputada a ela o direito sobre aquela propriedade.
Assim é com nossa justiça, certamente não somos justos por nós mesmos, mas somos
justos por termos fé em Cristo e que a justiça de Cristo é imputada a nós (assim como
nossos pecados foram imputados a ele na cruz). Se trata aqui, não de um processo de Deus
na alma para transformar o justo em justo, mas em uma declaração de que a justiça de
Cristo agora é declarada como nossa, assim como Cristo não teve um processo para ter
nossos pecados contados como os dele. Quando Deus olha para nós, ele não nos declara
como pecador pois vê a justiça do filho e suas obras em nós, por termos fé em suas
promessas.
“Noé, porém, achou graça aos olhos do Senhor [...] Noé andava com
Deus” (Genesis 6: 8-9)
Perceba que, não é Noé que atrai Deus por alguma peculiaridade, mas Noé achou graça
por meio dos olhos do Senhor. Para evitarmos os fatigantes debates soteriologicos sobre
vontade antecedente e consequente, basta dizer aqui, que aquele que é causa da graça de
Noé, é o Senhor e é por meio dele que Noé foi eleito para salvar a humanidade do diluvio.
É dito também que Noé andava com Deus. Ora, como alguém pode andar com Deus? Em
Hebreus Paulo nos diz como nos tornamos próximos de Deus:
Por fim, sintetizando tudo exposto sobre a justificação forense, podemos dizer que: As
nossas justiças não são suficientes para mudar meu status perante Deus, assim sendo,
precisamos que o próprio Deus mude esse status. O Pai solene não pode encarar o mal,
assim, quando ele olha para nós, ele vê as justiças de seu filho, sendo imputado a nós a
justiça d’Ele. Por outro lado, quando Jesus morreu na cruz, ele estava pagando pelos
pecados que foram contados como d’Ele mas que de fato nós o possuímos. Uma
imputação extrínseca e formal das justiças do Filho, que obedeceu completamente a Lei,
e mesmo assim morreu, não gratuitamente e sem motivo, mas para cumprir a pena dos
pecados de toda humanidade.
1.b: A justificação participativa fala sobre a operação da fé em nossa vida, isto é, quando
já estamos sendo considerados como justos, Deus Pai começa a nos olhar com outros
olhos, e vendo a natureza do Filho em nós, manda o Espirito Santo que trabalha em nossas
vidas. Assim, essa justificação é sobre as coisas justas que fazemos na nova vida que
Cristo nos deu, se trata de amar os irmãos que estão em Cristo.
Pois assim diz as Escrituras:
“Porei em vós o meu Espirito, farei que andes nos meus estatutos, e
guardeis os meus juízos e observeis” (Ez 36.27)
Não consigo pensar em nada mais claro que isso: A fé é necessária para a salvação. E as
boas obras são necessárias por natureza. Não que não haja fé sem boas obras, mas que a
boa obra testifica a presença o Espirito Santo (que é o único que mantém a fé) assim
dando a certeza e conservação da fé ao fiel. Não cairemos nos erros dos puritanos ao
adotarmos o silogismo pratico, isto é, analisar se uma pessoa está salva ou não de acordo
com suas obras, pois isso é entrar em contradição com os ensinamentos de Cristo.
Obras são signuns adiaphorons. Isto é, não possuem intrinsecamente valor positivo e
podem até serem ruins dependendo da intenção. Aqui vamos para o agostinianismo, a
ratio (palavra) precede (qualitativamente) o signo. Assim sendo, a Palavra interior (tbm
conhecido como pensamento, intenção etc.) oferece valor ao signo (nesse caso, a obra).
Ora, um efeito não pode ser oq ja não estava contido em sua causa, um signo não pode
ser bom se a sua ratio (sua razão, palavra interior ou simplesmente intenção) não for, se
não como mera conformidade à Lei e é fato que Deus julga sondando os corações.
2.a: A justificação, porém, não é um só ato e pronto, mas é Deus mantendo-nos em sua
fé dia após dia a cada segundo de nossas vidas. Como a fé não é um ato psicológico, ela
não depende de que eu esteja operando a fé atualmente para ser valido, por exemplo, se
eu estiver pensando no jogo do flamengo e não no Evangelho e na promessa de Deus, e
morresse neste momento, estaria salvo? Claro! Pois como já disse anteriormente, nós
estamos na fé, um recipiente sólido onde nos movemos livremente dentro dele, liberto
das amarras do pecado.
Contra os neo-puritanos, defendemos que a justificação não é um ato logico anterior, e
depois vem outro que é a santificação que é como o homem se mantém nela. Errado, a
justificação foi “iniciada” na ação da Palavra (portanto, do Espirito) em seu coração e no
Batismo, onde Cristo afogou sua carne pecaminosa nas aguas e fez um novo homem,
declarado justo por meio de vida perfeita de Jesus. A justificação não termina ai, só
começa. Deus então, a cada dia, opera a fé em nós, por meio da Palavra e dos
Sacramentos, criando todo dia um novo eu, “convertendo-nos” todos os dias.
Agora, irei mostrar o outro ponto do Sola Fide, que é pouco mostrado pelos protestantes
atuais, mas que os reformadores tanto se esforçaram para elucidar: Uma fé sem obras é
uma fé morta!
Pode-se imaginar que existe uma contradição entre partes da bíblia, entretanto, como é
dito em direito sobre um sistema legislativo, não existe contradição real, apenas aparente,
assim respondo: As boas obras santificantes surgem de uma moção do Espirito (pois a
transição de uma potência para o ato, só pode ser realizado por um ente externo que
possua tal ato, i.e. os fins sobrenaturais são movidos sobrenaturalmente pelo Espirito
Santo) e não de uma carne morta na fé e sem presença do Espirito e sem envolvimento
com o Corpo Místico de Cristo.
Isso não quer dizer, como os calvinistas faziam, a usar o “silogismo prático”, isto é, ao
ver as boas ações da pessoa e ver que ela tem fé, ela certamente é eleita e está salva. Isso
é errado pois embora os eleitos verdadeiros nunca se apostatam de sua fé, nada nos mostra
que aquele X homem que faz Y nunca se apostatará de sua fé. Assim, defendemos a
permanência sobrenatural dos santos na fé, pois a vontade de Deus é imutável, mas no
mundo prático não há como saber quem são os santos.
“Não sabeis vós que os que correm no estádio, todos na verdade correm, mas
um só leva prêmio? Correi de tal maneira que o alcanceis. Todo aquele que
luta, em tudo se domina. Eles para alcançar uma coroa que perece, nós
porém, para ganhar uma coroa que durará pra sempre. Portanto corro, não
como indeciso; combato, não batendo no ar. Antes subjugo o meu corpo e o
reduzo à servidão, para que, pregando aos outros, eu mesmo não venha ficar
reprovado.
Irmãos, não quero que ignoreis que nossos pais estiveram todos debaixo de
uma nuvem, e todos passaram pelo mar. Todos foram batuzados em Moisés,
na nuvem e no mar; todos eles comeram da mesma carne espiritual e beberam
da mesma bebida espiritual; pois bebiam da pedra espiritual que os seguiam,
que era Cristo. Deus porém, não se agradou da maior parte deles, razão por
que seus corpos foram espalhados pelo deserto.” (1 corintio 9:24 – 10:5)
Considere o antigo Israel. Todos estavam debaixo da nuvem. Tudo passou pelo mar.
Todos foram batizados em Moisés na nuvem e no mar. Todos comeram o mesmo alimento
espiritual. Todos eles beberam a mesma bebida espiritual. Eles foram todos libertados.
Eles tinham sido escravos no Egito e Deus os libertou por sinais miraculosos que ele fez
através de seu profeta Moisés.
E depois o que aconteceu? Eles morreram no deserto. Eles não entraram na Terra
Prometida. Apenas dois desses muitos milhares que foram libertados do Egito realmente
chegaram à Terra Prometida. Deus salvou todos eles. Ele salvou todos eles através de
seus sinais milagrosos. Todos eles atravessaram o Mar Vermelho em terra seca e os
soldados do Faraó se afogaram. Deus salvou todos eles. Mas nem todos eles ficaram
salvos. Ser salvo é se entregar a Deus. Deus nos livra de nossos inimigos. Nossos inimigos
são o pecado, a morte e o poder do diabo. Essa salvação pode ser vista de três lados
diferentes.
1) somos salvos pelo que Jesus, nosso Salvador, fez para nos salvar. Ele obedeceu a
lei de Deus como nosso substituto. Tudo o que Deus nos mandou fazer ele fez e
fez por nós. Ele sofreu por nossa desobediência. Ele desistiu de sua vida como o
sacrifício perfeito para todo pecado e, ao fazê-lo, tirou o pecado do mundo. Ele
disse na cruz: “Está consumado”. Jesus salvou a todos nós naquele momento.
2) Deus nos dá essa salvação. Não podemos voar de volta ao Calvário para sermos
lavados no sangue do Cordeiro. Deus estabeleceu em e para sua igreja meios de
graça, isto é, meios pelos quais ele traz a salvação que Jesus realizou então e ali
para nós aqui e agora. O que Jesus fez deve ser dado a nós se quisermos recebê-
lo e recebê-lo. Deus nos dá a salvação que ele ganhou no evangelho que está
escrito nas palavras da Bíblia. Ele nos dá essa salvação em nosso batismo. Ele nos
dá esta salvação no evangelho que é pregado a nós, na absolvição falada a nós, no
Sacramento do Altar, e nas palavras dos irmãos cristãos que nos consolam com o
evangelho do perdão dos pecados quando nossos espíritos precisam de conforto.
3) A salvação que Jesus conquistou, a salvação que Deus nos dá em seus meios de
graça, deve ser recebida se quisermos recebê-la. É recebido pela fé. Só a fé é como
recebemos o perdão dos pecados e a salvação que Jesus conquistou para nós dois
mil anos atrás e nos dá em seu evangelho e sacramentos, que são seus meios de
graça.
Os filhos de Israel foram resgatados do Egito. Deus os libertou. Eles estavam debaixo da
nuvem e passaram pelo mar. Esse foi o seu batismo. Eles comeram a mesma comida
espiritual e beberam a mesma bebida espiritual. Essa foi a sua ceia do Senhor. Deus se
entregou a eles através desses sinais. Ele os resgatou da escravidão. Ele os fez seus
próprios. Eles eram cristãos! E o que aconteceu? Paulo escreve: “Deus não se agradou da
maior parte deles”.
Das seiscentas mil pessoas que foram resgatadas da escravidão no Egito, apenas duas
delas entraram na Terra Prometida: Josué e Calebe. O resto morreu no deserto. Eles foram
salvos. Então eles estavam perdidos. Há um erro popular promovido em todo o
evangelicalismo: uma vez salvo sempre salvo. Aqueles que adotam esse erro negam que
o batismo salve! Eles argumentam que, uma vez que muitas pessoas que são batizadas
acabam abandonando a fé e indo para o inferno, é óbvio que o batismo não salva. Certo?
Errado! Todo Israel foi salvo. Mas eles caíram de sua fé. É possível nascer de novo no
Santo Batismo, aprender a fé cristã, confessar, ouvir o evangelho e crer nele, comer e
beber o corpo e o sangue de Cristo para o perdão dos pecados, e estar no caminho para o
céu e depois cair da fé e se perder.
É por isso que não tomamos fé como garantida. Quando se trata de nossa fé cristã,
deixamos de lado todo o resto como sendo de menor importância e exigindo menos
exigências de nosso tempo e atenção do que permanecer firmes na verdadeira fé cristã.
O apóstolo Paulo fala sobre isso em termos de treinamento de um atleta para competição.
Especificamente, ele usa os exemplos de um corredor e um boxeador. O atleta que quiser
vencer o concurso vai disciplinar seu corpo. Para ganhar uma corrida requer
condicionamento físico e treinamento físico. Requer temperança, isto é, autocontrole.
Você não come a junk food e não bebe a cerveja. Você não fuma. Você não pula o treino
diário. Quando você está correndo e seu intestino começa a doer, você corre mais rápido,
não mais devagar, porque você sabe que se você se recusar a abraçar a dor que você
perderá. Sem dor sem ganho. Se você realmente quiser ganhar o concurso, você vai
disciplinar seu corpo e assumir o controle sobre ele.
E assim é com a alma. A salvação é somente pela graça. Jesus vence no Calvário. Deus
nos dá no evangelho e nos sacramentos. É recebido por nós através da fé no evangelho
que nos é dado. Essa fé também é um presente de Deus. Mas isso não significa que a fé é
fácil. Se fosse fácil, poderíamos acreditar sem os meios da graça. Nós não precisaríamos
de batismo. Nós não precisaríamos de igreja no domingo de manhã. Nós não
precisaríamos de um pregador para pregar o evangelho de Deus para nós. Nós não
precisaríamos do corpo e sangue do sacramento de Cristo. Se a fé fosse fácil, poderíamos
nos entregar à fé, simplesmente por um ato de nossa própria vontade.
Mas a fé não é fácil. É por isso que precisamos ouvir a palavra de Deus puramente
proclamada. Nós não precisamos ouvir isso ensinado por professores que se dedicam a
falsos ensinamentos. Só porque tem o rótulo de "cristão" e é promovido por um cristão
não faz ensino cristão. Se você quiser manter sua fé, você se importará com a pureza do
ensinamento que lhe é ensinado e se afastará do ensino falso. Não é suficiente que o
ensino e a pregação sejam puros. Você precisa ouvir. Você deve tomá-lo como uma
alma sedenta, bebendo água fria. O treinamento físico tem tudo a ver com o controle
do seu corpo. O treinamento espiritual é sobre a obtenção de sua alma sob controle. Não
é seu controle. Você não está no controle. Deus está no controle. Mas como Deus exerce
seu controle sobre nossa alma? Como Deus nos mantém na fé cristã?
Ele faz isso através de sua palavra, através de seus ensinamentos. "Bem, eu não tenho
tempo para ir à igreja ou ler a Bíblia em casa ou assistir às aulas da Bíblia, mas eu rezo."
Bom para você! Oração é boa. Mas a oração não é um meio de graça. A oração está
pedindo a Deus. Isso é o que a palavra significa. É por isso que a oração e a escuta da
palavra de Deus sempre andam juntas. Mas e aquele que ora a Deus, mas não frequenta
os Serviços Divinos, não lê a Bíblia, nunca frequenta aulas bíblicas e nunca lê literatura
devocional doutrinariamente válida? Falar com Deus é bom, mas só quando você ouve o
que ele tem a dizer. A oração é boa disciplina espiritual, mas somente quando é guiada
pela palavra de Deus. Se Deus vai estar no comando de sua vida espiritual, você não vai
colocá-lo no comando, orando uma oração piedosa, dedicando a sua vida a ele, ou se
rendendo a ele em algum tipo de ato religioso de devoção. Se Deus vai estar no comando
de sua alma, ele se encarregará de si mesmo. Ele faz isso através de sua palavra.
Deus quer te ensinar. Não apenas quando você é criança, mas quando você está lutando
para criar uma família, quando está enfrentando as dificuldades da velhice, quando está
enfrentando prosperidade ou pobreza, ou quando a vida é apenas uma chatice. Deus quer
te ensinar. A parábola dos obreiros na vinha ilustra para nós aqueles que se apegam à
igreja, desprezando a palavra de Deus e aqueles que estão genuinamente ligados à igreja
pela fé sincera no evangelho. Para aqueles que trabalham duro e por muito tempo sob o
calor escaldante do sol, ouvir a palavra de Deus é uma tarefa árdua. É trabalho duro pelo
qual eles querem ser pagos. Para aqueles que amam o evangelho de Cristo e o desejam
acima de tudo, levando-o ao coração e valorizando-o como o bem mais precioso que
possuem, o trabalho que fazem como cristãos voa tão levemente quanto um pássaro nas
asas. Jesus diz:
Fé em quê? Na rocha espiritual que seguiu Israel. Na comida espiritual que comiam e na
bebida espiritual que bebiam: a carne e o sangue do Filho do Homem. Você não pode
comê-lo se estiver cheio do alimento da auto-justiça. Então se arrependa. Arrependa-se
todos os dias. Admita à sua própria insensatez em colocar suas opiniões acima da verdade
de Deus. Admita ao seu fracasso em amar como você foi amado. Jogue de lado toda a
confiança em suas boas ações, esforços piedosos e orações fervorosas. Não reivindique
nada mais do que aquilo que aquele bebê indefeso afirma: a lavagem da regeneração e
renovação do Espírito Santo que ele lhe deu em seu batismo. Reivindicar nada, mas a
obediência de Jesus e seu sangue derramado na cruz por você. Nomeie e reivindique, pois
é seu. Apresenta-te perante Deus como justo aos olhos dele. Nós não confiamos em uma
doutrina falsa, uma vez salva e sempre salva, inventada por homens. Nós poderíamos cair
assim como o antigo Israel caiu. Poderíamos. Mas enquanto Deus estiver falando conosco
em seu evangelho e nós estivermos ouvindo, enquanto Deus nos sustentar por sua palavra,
isso não acontecerá. Deus nos manterá na fé e nos dará a coroa da vida eterna.