Vous êtes sur la page 1sur 201

Análise Funcional

Vitor Balestro, Bruno Santiago e Ralph Teixeira


2

Agradecimentos

A primeira versão dessas notas foi adotada no curso de Análise Funcional do Programa
de Pós-Graduação em Matemática da Universidade Federal Fluminense, no Verão de 2019.
Os autores agradecem aos(às) alunos(as) Andrés Avelino Lipa Carrizales, Crı́sia Ramos
de Oliveira, Deise Lilian de Oliveira, Edgar Ramires Luna, Erick Cargnel Borges Barreto,
Fernando Machado Matias, Gian Marcos Maldonado Ruiz, Lucas Lima Silva Portugal,
Orlando Noel Romero Oblitas e Wilder Pinto Mendes pela leitura cuidadosa, e pelas
inestimáveis contribuições seja apontando erros de digitação, ou sugerindo modificações e
soluções de exercı́cios!
Conteúdo

1 Topologia Geral e Espaços Métricos 5


1.1 Noções básicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 Conjuntos fechados e convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.3 Espaços métricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.4 Espaços compactos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.5 Aplicações contı́nuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.6 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

2 Espaços Normados 25
2.1 Normas em espaços vetoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
2.2 Dimensão finita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.3 Dimensão infinita . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.4 Operadores lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
2.5 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

3 Espaços de Banach: parte I 45


3.1 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
3.2 O teorema de Hahn-Banach . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48
3.3 Outros teoremas importantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
3.4 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61

4 Espaços de Banach: parte II 67


4.1 Mais topologia geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
4.2 A topologia fraca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
4.3 A topologia fraca∗ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
4.4 Espaços reflexivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
4.5 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88

5 Espaços de Hilbert 93
5.1 Definição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
5.2 Representação de Riesz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97
5.3 O adjunto de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
5.4 Bases ortonormais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
5.5 Dimensão de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106
5.6 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107

6 Espaços de funções integráveis 111


6.1 σ-álgebras e medidas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
6.2 Funções mensuráveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116
6.3 Integrais de Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121
6.4 Funções integráveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128

3
4 CONTEÚDO

6.5 Os espaços Lp . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133


6.6 Dualidade, reflexividade e separabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 144
6.7 Exercı́cios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151

7 Soluções dos Exercı́cios 157


7.1 Capı́tulo 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
7.2 Capı́tulo 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161
7.3 Capı́tulo 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 162
7.4 Capı́tulo 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175
7.5 Capı́tulo 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 187
7.6 Capı́tulo 6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 190

Índice 199
Capı́tulo 1

Topologia Geral e Espaços Métricos

1.1 Noções básicas


Nosso objetivo neste capı́tulo é introduzir conceitos básicos sobre topologia geral, e apre-
sentar a topologia dada por uma métrica como um caso particular. Aqui, apenas apre-
sentaremos uma introdução a alguns conceitos que serão centrais em Análise Funcional,
e portanto este texto não é uma referência completa e extensiva da teoria.

Definição 1.1.1. Uma topologia em um conjunto X é uma coleção τ de subconjuntos de


X com as seguintes propriedades:

i. ∅ e X estão em τ ,

ii. τ é fechada para uniões, o que significa que qualquer união de elementos de τ é um
elemento de τ ,

iii. qualquer interseção finita de elementos de τ é um elemento de τ .

Um conjunto X munido de uma topologia τ é chamado espaço topolológico, e os


elementos da topologia τ são chamados conjuntos abertos de (X, τ ), ou abertos da topologia
τ (quando não houver possibilidade de dúvida sobre a topologia fixada, podemos também
usar a expressão abertos de X).
Exemplo 1.1.1. Seja X um conjunto qualquer. O conjunto das partes (denotado por 2X )
de X, que consiste na coleção de todos os subconjuntos de X, é uma topologia em X.
Chamamos essa topologia de topologia discreta. A coleção τ = {∅, X} também é uma
topologia em X (chamada de topologia trivial ).

Definição 1.1.2. Sejam τ1 e τ2 topologias em um mesmo conjunto X. Se τ1 ⊃ τ2 dizemos


que a topologia τ1 é mais forte (ou mais fina) do que a topologia τ2 . Neste caso, também
dizemos que τ2 é mais fraca do que τ1 . Mais ainda, dizemos que duas topologias quaisquer
τ1 e τ2 em um conjunto X são comparáveis se τ1 ⊂ τ2 ou τ2 ⊂ τ1 .

Em geral, é difı́cil descrever todos os abertos de uma topologia. Vamos mostrar como
é possı́vel descrever uma topologia através de uma coleção menor de conjuntos. Esse
conceito será central nas definições de topologias fracas em espaços de Banach.

Definição 1.1.3. Uma base para uma topologia em um conjunto X é uma coleção B de
subconjuntos de X tal que:

5
6 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

i. para cada x ∈ X existe algum B ⊆ B tal que x ∈ B,

ii. Se x é um elemento da interseção de dois conjuntos B1 , B2 ⊆ B, então existe algum


B3 ∈ B tal que x ∈ B3 e B3 ⊆ B1 ∩ B2 .

Se B satisfaz a essas condições, então definimos a topologia τ gerada por B da seguinte


forma: um conjunto U ⊆ X é aberto se para todo x ∈ U existe B ∈ B tal que x ∈ B e
B ⊆ U . Note que, neste caso, os elementos de B são abertos da topologia.

Vamos verificar que a topologia τ gerada por uma base B é, de fato, uma topologia
em X. Primeiro, é claro que ∅ ∈ τ . Agora, seja {Uλ }λ∈L uma subcoleção arbitrária de
abertos de τ , e seja
[
U= Uλ .
λ∈L

Se x ∈ U , então x ∈ Uλ0 para algum λ0 ∈ L. Como Uλ0 ∈ τ , existe B ∈ B tal que x ∈ B


e B ⊆ Uλ0 . Daı́, B ⊆ U , e isso mostra que U é um elemento de τ . Logo, qualquer união
de elementos de τ é um elemento de τ . Note que isso, junto com a propriedade i, garante
que X ∈ τ . Por fim, seja {Uj }nj=1 uma subcoleção finita de elementos de τ , e seja

n
\
V = Uj .
j=1

Se x ∈ V , então x ∈ Uj para todo j = 1, . . . , n, e para cada j existe um conjunto Bj ∈ B


tal que x ∈ Bj e Bj ⊆ Uj . Aplicando a propriedade ii indutivamente, obtemos que existe
B ∈ B tal que x ∈ B e B ⊆ B1 ∩ B2 ∩ . . . ∩ Bn . Como é claro que B1 ∩ B2 ∩ . . . ∩ Bn ⊆ V ,
temos que V ∈ τ .

Se τ é uma topologia em X, então uma coleção B é uma base para τ se B é uma


base (segundo a Definição 1.1.3) e se τ é precisamente a topologia gerada por B (note,
em particular, que toda topologia é uma base para si mesma). Há uma outra maneira de
descrever a topologia gerada por uma base. Isso é feito no próximo lema.

Lema 1.1.1. Sejam (X, τ ) um espaço topológico e B uma base para τ . Então τ é pre-
cisamente a coleção de todas as uniões de elementos de B. Por outro lado, se B é uma
coleção de subconjuntos de X com a propriedade de que τ coincide com a coleção de todas
as uniões de elementos de B, então a coleção B é uma base no sentido da Definição 1.1.3.

Demonstração. Lembre-se primeiro de que os elementos de B são elementos de τ . Como τ


é uma topologia, segue que qualquer união de elementos de B é um elemento de τ . Agora,
vamos mostrar que todo aberto de τ é uma união de elementos de B. De fato, se U ∈ τ ,
então para cada x ∈ U podemos escolher um conjunto Ux ∈ B tal que x ∈ Ux . Como U é
a união de todos os conjuntos Ux escolhidos desta forma, temos o desejado.
Agora, se τ é precisamente a coleção de uniões dos elementos de uma famı́lia B, note
que como X ∈ τ , segue que X é união de conjuntos de B. Daı́, para todo x ∈ X existe
B ∈ B tal que x ∈ B. Além disso, se B1 e B2 são conjuntos de B, e se x ∈ B1 ∩ B2 , enão
como B1 , B2 ∈ τ , segue que B1 ∩ B2 ∈ τ . Logo, B1 ∩ B2 é uma união de elementos de B,
e é claro que um desses elementos contém x.
1.1. NOÇÕES BÁSICAS 7

Definição 1.1.4. Sejam (X, τ ) um espaço topológico e Y ⊆ X um subconjunto. A famı́lia

τY = {Y ∩ U : U ∈ τ }

é uma topologia em Y , que denominamos topologia induzida. Dizemos que (Y, τY ) é um


subespaço topológico de (X, τ ).
Observação 1.1.1. A expressão subespaço topológico será reservada para o caso em que a
topologia do subconjunto é a topologia induzida do espaço ambiente. Se Y ⊆ (X, τ ) está
munido de outra topologia σ que não a induzida por τ , então não diremos que (Y, σ) é
um subespaço topológico de (X, τ ).
Note que os abertos da topologia induzida em Y são as interseções dos abertos da
topologia de X (às vezes chamado de espaço ambiente) com Y . Não é difı́cil verificar que
a topologia induzida é, de fato, uma topologia em Y , e deixamos essa tarefa a cargo do
leitor.
Lema 1.1.2. Se B é uma base para a topologia τ de X, então a coleção

BY = {B ∩ Y : B ∈ B}

é uma base para a topologia induzida τY .


Demonstração. Cada aberto U de (X, τ ) é uma união de elementos de B. Daı́, cada aberto
Y ∩ U da topologia induzida pode ser escrito como
!
[ [
Y ∩U =Y ∩ Bλ = (Y ∩ Bλ ),
λ∈L λ∈L

donde os abertos da topologia induzida são precisamente as uniões de elementos da coleção


BY . Além disso, da igualdade acima também temos que qualquer união de elementos de
BY é, de fato, a interseção de Y com algum elemento de B.

Observação 1.1.2. Algum cuidado com a terminologia é necessário. Se Y ⊆ (X, τ ), então


os conjuntos abertos em X são os elementos da topologia τ de X, enquanto que os abertos
em Y são os conjuntos da topologia induzida τY . Desta forma, os conjuntos abertos em
Y não são necessariamente abertos em X. Entretanto, uma condição suficiente para que
isso aconteça é que Y seja um aberto de X. De fato, nesse caso, se U é um aberto de Y ,
então U = Y ∩ V para algum aberto V de X. Daı́, U é uma interseção finita de abertos
de X, donde é também um aberto de X.
Definição 1.1.5. O interior de um subconjunto V de um espaço topológico (X, τ ) é a
união de todos os abertos contidos em V (note, em particular, que o interior de qualquer
conjunto é um aberto). Denotamos o interior de um subconjunto V por int(V ).
É imediato da definição que um ponto x ∈ V é um ponto do interior de V (ou,
simplesmente, um ponto interior ) se, e somente se, existe um aberto U ⊆ V tal que
x ∈ U . Uma vez que a noção de abertos contendo pontos é muito recorrente, vamos fixar
a seguinte terminologia: uma vizinhança de um ponto x ∈ X é um aberto contendo x.
Desta forma, note que podemos falar que x ∈ X é um ponto interior de V se, e somente
se, V contém alguma vizinhança de x.
Por fim, note que um conjunto A ⊆ X é aberto se, e somente se, A = int(A). De
fato, se A é aberto, então A ⊆ int(A) ⊆ A. Já se A não é aberto, então devemos ter
A 6= int(A), uma vez que o interior de qualquer conjunto é um aberto.
8 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

1.2 Conjuntos fechados e convergência


Definição 1.2.1. Um subconjunto F de um espaço topológico (X, τ ) é fechado se o seu
complementar X \ F é aberto. Equivalentemente, F é fechado se F = X \ U para algum
U ∈ τ.
Como consequência direta da definição de topologia, temos as seguintes propriedades
para os conjuntos fechados:

i. ∅ e X são fechados,

ii. qualquer interseção de conjuntos fechados é fechada,

iii. uniões finitas de fechados são fechadas.

As demonstrações são imediatas, e deixamos os detalhes a cargo do leitor. É impor-


tante notar que um dado subconjunto de um espaço topológico pode não ser nem aberto
nem fechado. Também, ser “aberto”e “fechado”não são propriedades mutuamente exclu-
dentes. Em outras palavras, um conjunto pode ser aberto e fechado ao mesmo tempo.
Isso ocorre, por exemplo, com os conjuntos ∅ e X para qualquer topologia fixada em X.

Exemplo 1.2.1. Seja X um conjunto munido com a topologia discreta. Então todos os
subconjuntos de X são fechados. De fato, como todos os subconjuntos de X são abertos,
para qualquer F ⊆ X temos que X \ F é aberto, donde F é fechado.
Se Y ⊆ (X, τ ) é um subespaço munido da topologia induzida τY , então dizemos que
um subconjunto F ⊆ Y é fechado em Y se F é fechado na topologia induzida, isto é, se
(Y \ F ) ∈ τY .
Lema 1.2.1. Se Y é um subespaço topológico de (X, τ ), então F ⊆ Y é fechado em Y
se, e somente se, F é a interseção de Y com algum fechado de X.
Demonstração. Se F ⊆ Y é fechado em Y , então (Y \ F ) ∈ τY , donde Y \ F = Y ∩ U
para algum aberto U de X. Daı́,

F = Y \ (Y \ F ) = Y \ (Y ∩ U ) = Y ∩ (X \ U ),

e portanto F é a interseção de Y com um fechado de X. Agora, seja F = Y ∩ (X \ U )


a interseção de Y com um fechado de X (U é aberto). Da igualdade acima temos que
Y ∩ (X \ U ) = Y \ (Y ∩ U ), donde F é o complementar (em Y ) do aberto Y ∩ U . Assim,
F é fechado em Y .

Corolário 1.2.1. Se F ⊆ Y é fechado em Y e Y é fechado em X, então F é fechado em


X.
Demonstração. Se F é fechado em Y , então pelo lema anterior temos que F = Y ∩ G
para algum G fechado em X. Como Y é fechado em X, segue que F é interseção finita
de fechados em X, donde F é fechado em X.

Definição 1.2.2. O fecho de um conjunto V ⊆ (X, τ ) é a interseção de todos os conjuntos


fechados que contém V (note que o fecho de qualquer conjunto é fechado). Denotamos o
fecho de V por cl(V ).
1.2. CONJUNTOS FECHADOS E CONVERGÊNCIA 9

Proposição 1.2.1. Seja V ⊆ X um conjunto qualquer. Então:

i. x ∈ X é um ponto do fecho de V se, e somente se, toda vizinhança de x intersecta V .

ii. V = cl(V ) se, e somente se, V é fechado.

Demonstração. Primeiro, assuma que x ∈ cl(V ), e seja U uma vizinhança de x. Se


V ∩ U = ∅, então V ⊆ X \ U . Como X \ U é fechado, e como x pertence a todos os
fechados que contém V , segue que x ∈ X \ U . Isso é uma contradição com o fato de que
U é uma vizinhança de x. Assim, temos que V ∩ U 6= ∅.
Por outro lado, se x ∈/ cl(V ), então existe um fechado F contendo V tal que x ∈ / F,
isto é, x ∈ X \ F . Como X \ F é aberto, e (X \ F ) ∩ V = ∅, segue que x tem uma
vizinhança que não intersecta V .
Para ii, note que se V = cl(V ), então V é fechado pois cl(V ) é sempre fechado. Por
outro lado, se V é fechado, então V é, em particular, um fechado contendo V , donde
cl(V ) ⊆ V . Como a inclusão V ⊆ cl(V ) é consequência imediata da definição, temos
V = cl(V ).

Definição 1.2.3. Uma sequência em um conjunto X é uma aplicação f : N → X, que


sempre denotaremos por (xj )j∈N , onde xj = f (j) para cada j ∈ N. Se X está munido
de uma topologia, dizemos que uma sequência (xj )j∈N em X converge para um ponto
x ∈ X se para toda vizinhança U de x existe n0 ∈ N tal que xn ∈ U para todo n ≥ n0 .
Neste caso, x é um limite de (xj ). Denotamos tal convergência por xj → x, ou então por
x = limj→∞ xj .

O limite de sequências não é necessariamente único. Entretanto, salvo menção em


contrário, sempre vamos assumir que o espaço topológico (X, τ ) é Hausdorff, o que
significa que quaisquer dois pontos distintos de X têm vizinhanças que não se intersectam.
É fácil notar que em um espaço de Hausdorff o limite de uma sequência (quando existe)
é único. Vamos também assumir que todos os espaços topológicos em questão satisfazem
ao primeiro axioma de enumerabilidade: para todo ponto x ∈ X existe uma coleção Bx
enumerável de abertos contendo x tal que toda vizinhança de x contém algum elemento
de Bx (uma tal coleção é chamada de base de vizinhanças de x). Em outras palavras, o
primeiro axioma de enumerabilidade diz que todo ponto de x admite uma base enumerável
de vizinhanças.
Usando sequências há outra maneira de caracterizar o fecho de um conjunto. Para
isso, precisamos do seguinte conceito.

Definição 1.2.4. Um ponto x ∈ X é um ponto de acumulação de um conjunto V ⊆ X


se existe uma sequência (xj )j∈N em V com as seguintes propriedades:

i. xi 6= xj se i 6= j (isto é, os pontos da sequência são distintos dois a dois),

ii. xj → x.

O conjunto dos pontos de acumulação de V é denotado por V 0 .

Proposição 1.2.2. Seja V ⊆ X um subconjunto. Então, x ∈ X é um ponto de acu-


mulação de V se, e somente se, toda vizinhança de x intersecta V em algum ponto dife-
rente de x. Mais ainda, temos que cl(V ) = V ∪ V 0 .
10 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

Demonstração. Se x ∈ X é um ponto de acumulação de V , então existe uma sequência


(xj ) em V de pontos dois a dois distintos com xj → x. Qualquer vizinhança de x contém
infinitos pontos de (xj ), e portanto toda vizinhança de x intersecta V em algum ponto
diferente de x.
Por outro lado, se toda vizinhança de x intersecta V em um ponto diferente de x, então
fazemos a seguinte construção: seja Bx = {Bj }j∈N uma base enumerável de vizinhanças
de x, e tome x1 ∈ V ∩ B1 com x1 6= x. Como a topologia é Hausdorff, podemos tomar
uma vizinhança U2 de x tal que x1 ∈ / U2 . O conjunto B1 ∩ B2 ∩ U2 é uma vizinhança
de x, donde intersecta V em algum ponto x2 6= x. Note que também vale que x2 6= x1 .
Agora, seja U3 uma vizinhança de x que não contém x1 e nem x2 . Daı́ existe um ponto
x3 de B1 ∩ B2 ∩ B3 ∩ U3 que está em V e é diferente de x (e também de x1 e de x2 ).
Prosseguindo indutivamente temos uma sequência (xj ) de elementos dois a dois distintos
que converge para x. Com efeito, se U é uma vizinhança de x, então Bj0 ⊆ U para algum
j0 ∈ R, e xj ∈ Bj0 para todo j ≥ j0 .
Para a outra afirmação, note primeiro que da Proposição 1.2.1 segue que V ∪ V 0 ⊆
cl(V ). Para provar a inclusão inversa, assuma que x ∈ cl(V ) e que x ∈ / V . Como
x ∈ cl(V ), segue que toda vizinhança de x intersecta V em algum ponto, e esse ponto é
diferente de x, uma vez que x ∈ / V . Daı́, vem da primeira afirmação da proposição que
x ∈ V 0.

Observação 1.2.1. Note que se o primeiro axioma de enumerabilidade não vale, então
ainda temos que se x ∈ X é um ponto de acumulação de V ⊆ X, então toda vizinhança
de X intersecta V em algum ponto diferente de x. Entretanto, neste caso a recı́proca não
é necessariamente verdadeira.
Corolário 1.2.2. Seja (X, τ ) um espaço topológico que é Hausdorff e satisfaz ao primeiro
axioma de enumerabilidade. Um subconjunto F ⊆ X é fechado se, e somente se, toda
sequência convergente em F converge para um ponto de F .
Demonstração. Se F é fechado, então F = F ∪ F 0 . Seja (xj )j∈N uma sequência de pontos
em F tal que xj → x para algum x ∈ X. Se existe n0 ∈ N tal que xj = x para todo
j ≥ n0 , então x ∈ F . Caso contrário, (xj ) admite uma subsequência de termos dois a dois
distintos que converge para x. Daı́, x é um ponto de acumulação de F , e portanto x ∈ F .
No outro sentido, se toda sequência convergente de pontos de F converge para algum
ponto de F , segue que F 0 ⊆ F , donde cl(F ) ⊆ F . Como sempre vale a inclusão F ⊆ cl(F )
temos que F é fechado.

Definição 1.2.5. Um subconjunto Y de um espaço topológico (X, τ ) é denso em X (ou


denso, quando não houver possibilidade de dúvida) se todo aberto não-vazio de X contém
algum ponto de Y . Um espaço topológico é dito separável se contém um conjunto denso
enumerável.
Proposição 1.2.3. Sejam (X, τ ) um espaço topológico qualquer, e Y ⊆ X um subcon-
junto. Então Y é denso se, e somente se, cl(Y ) = X. Se (X, τ ) é Hausdorff e satisfaz ao
primeiro axioma de enumerabilidade, então Y é denso se, e somente se, todo ponto de X
pode ser aproximado por uma sequência de pontos de Y .
Demonstração. Assuma que Y é denso em X. Então, se x ∈ X e U ⊆ X é uma vizinhança
qualquer de x temos que U contém pontos de Y . Logo, pelo ı́tem i da Proposição 1.2.1
segue que X ⊆ cl(Y ), donde X = cl(Y ). Por outro lado, se assumirmos que X = cl(Y ),
então dado um aberto não-vazio U ⊆ X temos que um dado ponto qualquer x ∈ U é um
1.3. ESPAÇOS MÉTRICOS 11

ponto do fecho de Y . Assim, U intersecta Y . Isso mostra que qualquer aberto não-vazio
de X intersecta Y .
Para a outra afirmação do enunciado, note que se Y é denso em um espaço topológico
(X, τ ) que é Hausdorff e que satisfaz ao primeiro axioma de enumerabilidade, então segue
da Proposição 1.2.2 que X = cl(Y ) = Y ∪ Y 0 . Assim, se x ∈ X, então x ∈ Y ou x ∈ Y 0 .
No primeiro caso, basta considerar a sequência em que todos os termos são iguais a x. No
segundo caso, x é um ponto de acumulação de Y , e portanto existe uma sequência em Y
que converge para x.

1.3 Espaços métricos


Espaços métricos são conjuntos munidos de uma métrica, que consiste em uma forma de
atribuir distâncias entre pontos. Conforme veremos, uma métrica em um conjunto induz
uma topologia, mas nem toda topologia decorre de uma métrica.

Definição 1.3.1. Uma métrica (ou distância) em um conjunto X é uma aplicação


d : X × X → R com as seguintes propriedades:

i. (positividade) d(x, y) ≥ 0 para quaisquer x, y ∈ X, e a igualdade vale se, e somente


se, x = y,

ii. (simetria) d(x, y) = d(y, x) para quaisquer x, y ∈ X,

iii. (desigualdade triangular) d(x, z) ≤ d(x, y) + d(y, z) para todos x, y, z ∈ X.

Vamos descrever de que maneira uma distância induz uma topologia. Em um espaço
métrico (X, d), a bola aberta de centro p ∈ X e raio ε > 0 é o conjunto

B(p, ε) = {x ∈ X : d(x, p) < ε}.

Denote por Bd a coleção de todas as bolas abertas de (X, d), e perceba cuidadosamente
que, em nossa definição, qualquer bola aberta tem raio positivo.

Lema 1.3.1. A coleção Bd de bolas abertas de um espaço métrico (X, d) é uma base para
uma topologia.

Demonstração. Para cada x ∈ X, tome B = B(x, 1). Daı́, x ∈ B e B(x, 1) ∈ Bd . Agora,


assuma que z ∈ B(x, ε1 ) ∩ B(y, ε2 ). Seja

ε0 = min{ε1 − d(x, z), ε2 − d(y, z)},

e note que ε0 > 0. Afirmamos que B(z, ε) ⊆ B(x, ε1 ) ∩ B(y, ε2 ). Com efeito, se w ∈
B(z, ε0 ), então

d(w, z) < ε0 ≤ ε1 − d(x, z),

donde d(w, z) + d(x, z) < ε1 . Pela desigualdade triangular, segue que d(w, x) < ε1 , isto é,
w ∈ B(x, ε1 ). Pelo mesmo argumento mostramos que w ∈ B(y, ε2 ).
12 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

Deste lema segue que podemos definir naturalmente a topologia τd gerada pela coleção
Bd . Essa topologia é chamada de topologia métrica gerada por d. Os abertos e fechados
da métrica são, respectivamente, os abertos e fechados da topologia métrica gerada por
d. Também, dizemos que uma dada sequência converge na métrica d se ela converge
na topologia métrica gerada por d. Note que qualquer topologia gerada por uma
métrica é Hausdorff e satisfaz ao primeiro axioma de enumerabilidade (para
cada x ∈ X, as bolas abertas de centro em x e raio racional formam uma base enumerável
de vizinhanças de x). Em particular, vale o Corolário 1.2.2.
A seguir, enunciamos de que forma esses conceitos são usualmente introduzidos na
teoria de espaços métricos (isto é, quando não adotamos o ponto de vista de que as
topologias métricas constituem um caso particular das topologias gerais).
Teorema 1.3.1. A topologia τd gerada por uma métrica d em um conjunto X tem as
seguintes propriedades:

i. Um ponto x ∈ X pertence ao interior de um conjunto U ⊆ X se, e somente se, existe


ε > 0 tal que B(x, ε) ⊆ U . Mais ainda, um conjunto A ⊆ X é aberto se, e somente se,
para todo ponto a ∈ A existe um número ε > 0 tal que B(a, ε) ⊆ A.

ii. Um ponto p ∈ X está no fecho de um conjunto V ⊆ X se para todo ε > 0 a interseção


V ∩ B(p, ε) é não-vazia. Consequentemente, um subconjunto V ⊆ X é fechado se, e so-
mente se, para todo x ∈ / V existe ε > 0 tal que V ∩ B(x, ε) = ∅.

iii. Uma sequência (xj )j∈N em um espaço métrico (X, d) converge para um ponto x ∈ X
se, e somente se, para todo ε > 0 existe n0 ∈ N tal que d(x, xj ) < ε para todo j ≥ n0 .
A prova deste teorema decorre imediatamente das definições originais, e do fato de
que toda vizinhança de um ponto x contém uma bola aberta centrada em x.
Seja Y um subconjunto de um espaço métrico (X, d). A restrição dY de d ao produto
cartesiano Y × Y é claramente uma métrica em Y e é chamada a métrica induzida em
Y . Naturalmente, dY induz uma topologia em Y . Esta topologia coincide com a restrição
da topologia métrica de X a Y , como verificaremos a seguir. No que se segue, a bola
aberta de centro p e raio ε na métrica dY será denotada por BY (p, ε). As bolas abertas
na métrica de X seguem sendo denotadas por B(p, ε). Note que para quaisquer y ∈ Y e
ε > 0 temos que
BY (y, ε) = Y ∩ B(y, ε). (1.3.1)
Proposição 1.3.1. A topologia métrica gerada em Y por dY é precisamente a topologia
métrica τd de X induzida em Y .
Demonstração. Por simplicidade, denote por τY a topologia induzida por X em Y , e
denote por ∆Y a topologia gerada pela restrição dY da métrica d a Y × Y . Qualquer
aberto V de τY pode ser escrito como V = Y ∩ U , onde U é um aberto de X. Vamos
mostrar que V ∈ ∆Y . Se y ∈ V , então y ∈ U , e existe ε > 0 tal que B(y, ε) ⊆ V . Daı́,
BY (y, ε) ⊆ V,
donde todo ponto de V contém uma vizinhança da topologia gerada por dY .
Seja agora V um aberto da topologia ∆Y . Para qualquer ponto y ∈ V , existe um
número εy > 0 tal que BY (y, εy ) ⊆ V . Defina
[
U= B(y, εy ).
y∈V
1.4. ESPAÇOS COMPACTOS 13

Da igualdade (1.3.1) segue que V = Y ∩ U . Como U é aberto em X, segue que V ∈ τY .

Definição 1.3.2. Uma sequência (xj )j∈N em um espaço métrico (X, d) é dita uma sequência
de Cauchy se para todo ε > 0 existe n0 ∈ N tal que d(xn , xm ) < ε para quaisquer
n, m ≥ n0 . Um espaço métrico em que todas as sequências de Cauchy são convergentes é
dito um espaço completo.

Observação 1.3.1. Note que, em particular, qualquer sequência convergente é uma sequência
de Cauchy. De fato, se xj → x, então dado ε > 0, tomamos n0 tal que d(xn , x) < ε/2
sempre que n > n0 . Assim, se n, m > n0 , segue que

d(xn , xm ) ≤ d(xn , x) + d(x, xm ) < ε.

Dizemos que uma topologia τ em um conjunto X é metrizável se existe alguma métrica


d em X tal que a topologia métrica τd gerada por d é precisamente a topologia τ . En-
cerraremos esta seção enunciando, sem demonstração, um resultado que dá condições
suficientes para que uma topologia seja metrizável. Mas antes precisamos de uma de-
finição que, em linhas gerais, garante que pontos e conjuntos podem ser separados em
uma topologia.

Definição 1.3.3. Um espaço topológico (X, τ ) é dito regular se dados qualquer ponto
x ∈ X e qualquer fechado F ⊆ X que não contém x existem abertos disjuntos contendo
x e F , respectivamente.

Teorema 1.3.2 (Teorema da Metrização de Urysohn). Se (X, τ ) é um espaço topológico


regular que tem uma base enumerável, então τ é metrizável.

1.4 Espaços compactos


A noção de compacidade é central na Análise Funcional. Vamos começar do ponto de vista
da topologia geral, e depois estudaremos as particularidades do caso onde a topologia é
gerada por uma métrica.

Definição 1.4.1. Uma cobertura de um conjunto X é uma coleção A de subconjuntos de


X cuja união é igual a X (neste caso, também dizemos que A cobre X). Se X está munido
de uma topologia τ , então uma cobertura A é dita aberta se cada um de seus elementos é
um aberto. Um espaço topológico (X, τ ) é compacto se toda sua cobertura aberta possui
uma subcoleção finita que também cobre X. Uma subcoleção de uma cobertura que ainda
cobre X será chamada de subcobertura.

Assuma que (Y, τY ) é um subespaço topológico de (X, τ ). Dizemos que uma coleção
A de subconjuntos de X cobre Y se a união de seus elementos contém Y . Neste caso,
também dizemos que A é um cobertura de Y . A seguir, mostraremos que podemos decidir
se Y é um espaço compacto tomando coberturas formadas por subconjuntos de X.

Lema 1.4.1. Um subespaço topológico Y ⊆ X é compacto se, e somente se, toda cobertura
de Y por abertos de X contém uma subcoleção finita que cobre Y .

Demonstração. Se Y é compacto e A = {Aλ }λ∈L é uma cobertura de Y por abertos de X,


então AY = {Aλ ∩ Y }λ∈L é uma cobertura de Y por abertos de Y . Como Y é compacto,
AY tem uma subcobertura finita {Aλj ∩ Y }nj=1 . Daı́, a coleção {Aλj }nj=1 é uma subcoleção
finita de A que cobre Y .
14 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

Agora, assuma que toda cobertura de Y por abertos de X contém subcoleção finita
que cobre Y . Se AY = {Aλ }λ∈L é uma cobertura de Y por abertos de Y , então para cada
λ ∈ L existe um aberto A0λ de X tal que Aλ = A0λ ∩ Y . Segue que A = {A0λ }λ∈L é uma
cobertura de Y por abertos de X, e portanto admite uma subcoleção finita {A0λj }nj=1 que
cobre Y . Daı́, é claro que a subcoleção {Aλj }nj=1 = {A0λj ∩Y }nj=1 de A é uma subcobertura
finita de Y . Como A é uma cobertura arbitrária de Y por abertos de Y segue que Y é
compacto.

Dizemos que um subespaço topológico Y ⊆ (X, τ ) é fechado se Y é fechado como


subconjunto de X. Note que essa propriedade depende diretamente da topologia de X, e
não da topologia induzida em Y . Em certo sentido, essa propriedade é, portanto, relativa.
Por outro lado, a compacidade é uma propriedade intrı́nseca. Para determinarmos se um
subespaço topológico Y ⊆ X é ou não compacto podemos considerar apenas a topologia
induzida em Y (muito embora o lema anterior nos dê um critério que depende da topologia
de X). A seguir, investigaremos as relações entre esses dois conceitos. Lembre-se de que
ainda estamos tratando de espaços topológicos gerais, em que a topologia não decorre
necessariamente de uma métrica.

Proposição 1.4.1. Se Y é um subespaço fechado de um espaço topológico compacto


(X, τ ), então Y é compacto.

Demonstração. Seja A uma cobertura de Y por abertos de X. Como Y é fechado, temos


que U = X \ Y é aberto, e A ∪ U é uma cobertura de X por abertos. Como X é
compacto, essa cobertura possui subcobertura finita. Segue imediatamente que A tem
uma subcoleção finita que cobre Y . Pelo Lema 1.4.1 temos que Y é compacto.

Proposição 1.4.2. Seja (X, τ ) um espaço topológico de Hausdorff. Se Y é um subespaço


compacto de X, então Y é fechado.

Demonstração. Vamos mostrar que X \ Y é aberto. Com efeito, seja x ∈ X \ Y . Como


X é Hausdorff, para cada y ∈ Y podemos tomar (na topologia de X) vizinhanças Uy de
x e Vy de y tais que Uy ∩ Vy = ∅. A coleção V = {Vy : y ∈ Y } é uma cobertura de Y por
abertos de X, e da compacidade de Y segue que existe uma subcoleção finita {Vyj }nj=1 de
V que cobre Y . Daı́, a interseção finita
n
\
U= Uyj
j=1

é uma vizinhança de x que não intersecta a união


n
[
Vyj ,
j=1

e portanto não intersecta Y . Segue que U ⊆ X \ Y . Isso mostra que todo ponto x ∈ X \ Y
tem uma vizinhança contida em X \ Y , donde X \ Y é aberto.

Em espaços métricos é possı́vel ter uma noção sobre o “tamanho”de um subconjunto


(note que a definição de topologia geral é muito vaga para tal noção).
1.4. ESPAÇOS COMPACTOS 15

Definição 1.4.2. O diâmetro de um subconjunto Y ⊆ (X, d) é o número


diam(Y ) = sup{d(x, y) : x, y ∈ Y }.
Um espaço métrico (X, d) é dito limitado se diam(X) < +∞, ou, equivalentemente, se
existem x0 ∈ X e r > 0 tais que X ⊆ B(x0 , r). Dizemos também que (X, d) é totalmente
limitado se para todo ε > 0 podemos escrever X como uma união finita de subconjuntos
de diâmetro menor ou igual a ε.
Observação 1.4.1. Note que para qualquer subconjunto Y ⊆ X vale que
diam(Y ) = diam(cl(Y )).
Com efeito, como Y ⊆ cl(Y ), a desigualdade diam(Y ) ≤ diam(cl(Y )) é trivial. A desi-
gualdade não pode ser estrita pois dados x, y ∈ cl(Y ) sempre podemos tomar sequências
(xj ) e (yj ) em Y com xj → x e yj → y. Daı́, d(xj , yj ) → d(x, y). Consequentemente, um
espaço métrico é totalmente limitado se, e somente se, para todo ε > 0 podemos escrever
X como uma união finita de subconjuntos fechados de diâmetro menor ou igual a ε.
Prosseguiremos para fornecer algumas caracterizações úteis de compacidade no caso
em que a topologia do espaço é dada por uma métrica. Antes, precisamos definir mais
alguns conceitos.
Definição 1.4.3. Uma subsequência de uma sequência f : N → R é a restrição de f a
algum subconjunto infinito J ⊆ N. Denotaremos uma subsequência de uma sequência
(xj )j∈N por (xnk )k∈N , onde nk = n(k) : N → J é a ordenação natural (crescente) dos
elementos de J. Um espaço topológico (X, τ ) é dito sequencialmente compacto se qualquer
sequência neste espaço possui subsequência convergente.
Teorema 1.4.1. Seja (X, d) um espaço métrico. São equivalentes:

(a) (X, d) é compacto.

(b) (X, d) é sequencialmente compacto.

(c) (X, d) é totalmente limitado e completo.


Demonstração. Suponha que (X, d) é compacto, e seja (xj )j∈N uma sequência em X.
Denote por Z = {xj : j ∈ N} o conjunto cujos elementos são os pontos da sequência.
Se (xj ) não tem subsequência convergente, então Z 0 = ∅. Assim, cl(Z) = Z ∪ Z 0 = Z,
e portanto Z é fechado. Como Z é um subconjunto fechado de um espaço compacto,
segue que Z é compacto (com a métrica induzida). Ainda como consequência de que Z
não tem ponto de acumulação, temos que cada xj ∈ Z possui uma vizinhança Uj tal que
Uj ∩ Z = {xj }. A famı́lia B = {Uj : j ∈ N} é uma cobertura de Z por abertos de X, e
pela compacidade de Z segue que B tem uma subcoleção finita que cobre Z. Daı́, temos
que Z é finito, donde existe z ∈ Z tal que z = xj para todo j em algum subconjunto
infinito J ⊆ N. Assim, a subsequência (xj )j∈J converge para z, e isso prova a implicação
(a)⇒(b).
Agora, assumimos que (X, d) é sequencialmente compacto. Para provar que (X, d) é
completo, seja (xj )j∈N uma sequência de Cauchy em X, e seja (xnk ) uma sua subsequência
convergente, com xnk → x, digamos. Vamos mostrar que xj → x. Com efeito, dado
ε > 0, tome n0 ∈ N tal que m, n ≥ n0 implica d(xn , xm ) < ε/2, e tome k0 ∈ N tal que
vale nk0 > n0 e tal que k ≥ k0 implica d(xnk , x) < ε/2. Daı́, se n > nk0 , então
d(xn , x) ≤ d(xn , xnk0 ) + d(xnk0 , x) < ε,
16 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

e assim temos que xj → x, como querı́amos. Para mostrar que (X, d) é totalmente
limitado, vamos proceder por contradição. Se (X, d) não é totalmente limitado, então
existe um número ε0 > 0 tal que X não pode ser escrito como uma união finita de
subconjuntos de diâmetro menor do que 2ε0 . Isso nos permite fazer a seguinte construção:
tome um ponto x1 ∈ X, e como X 6= B(x1 , ε0 ), tome um ponto x2 ∈ X \ B(x1 , ε0 ). Como
também temos X 6= B(x1 , ε0 ) ∪ B(x2 , ε0 ), podemos tomar um ponto x3 ∈ X que não
pertence a B(x1 , ε0 ) e nem a B(x2 , ε0 ). Uma vez que X não está contido em nenhuma
união finita de bolas de raio ε0 (do contrário X seria a união finita de conjuntos de diâmetro
igual a 2ε0 ), segue que prosseguindo indutivamente obtemos uma sequência (xj )j∈N com
a propriedade de que d(xi , xj ) ≥ ε0 sempre que i 6= j. É claro que, desta forma, (xj )
não tem subsequência convergente, e isso nos dá a contradição desejada. Assim, temos
(b)⇒(c).
Por último, vamos mostrar que (c)⇒(a). Suponha que (X, d) é completo e total-
mente limitado, e seja A uma cobertura por abertos de X. Mais uma vez procedendo por
contradição, assuma que A não tem subcobertura finita. Pela Observação 1.4.1, escreve-
mos X como a união finita de subconjuntos fechados de diâmetro menor do que 1. Ao
menos um desses subconjuntos, que chamaremos de X1 , não pode ser coberto por finitos
elementos da coleção A. É claro que X1 também é totalmente limitado, e então X1 pode
ser escrito como uma união de conjuntos fechados de diâmetro menor do que 1/2. Como
anteriormente, ao menos um desses subconjuntos, que denominaremos X2 , não pode ser
coberto por finitos elementos da coleção A. Prosseguindo indutivamente, construı́mos
uma sequência infinita de conjuntos fechados não-vazios X1 ⊃ X2 ⊃ X3 ⊃ . . . ⊃ Xn ⊃ . . .
tal que diam(Xn ) < 1/n para cada n ∈ N, com a propriedade de que nenhum Xj pode
ser coberto por finitos elementos de A. Para cada j ∈ N, fixe um elemento xj ∈ Xj . É
claro que a sequência assim construı́da é de Cauchy, uma vez que se m, n > n0 temos que
xm , xn ∈ Xn0 e portanto d(xm , xn ) ≤ diam(Xn0 ) < 1/n0 . Como (X, d) é completo, segue
que (xj ) converge para algum ponto x ∈ X. Como cada Xn é um conjunto fechado, e como
(xj )j≥n é uma sequência em Xn que converge para x, segue que x ∈ Xn para todo n ∈ N.
Tome Aλ ∈ A tal que x ∈ Aλ . Como Aλ é aberto, existe ε > 0 tal que B(x, ε) ⊆ Aλ .
Se n0 ∈ N é tal que 1/n0 < ε segue que Xn0 ⊆ B(x, ε). Com efeito, se houvesse algum
ponto y ∈ Xn0 tal que y ∈ / B(x, ε), então terı́amos diam(Xn0 ) ≥ d(x, y) ≥ ε > 1/n0 , uma
contradição. Segue que Xn0 ⊆ Aλ , e isso é uma contradição com o fato de que Xn0 não
pode ser coberto por finitos elementos da famı́lia A.

Corolário 1.4.1. Todo espaço métrico compacto é separável.


Demonstração. Se (X, d) é compacto, então (X, d) é totalmente limitado. Para cada
n ∈ N, podemos tomar uma decomposição de X por bolas de raio igual a 1/n:
k(n)
[
X= B(xnj , 1/n).
j=1

Daı́, o conjunto

Y = {xnj : n ∈ N e j = 1, . . . , k(n)}

é enumerável (uma vez que é a união enumerável de conjuntos finitos) e denso. De fato,
se U ⊆ X é um aberto, então U contém alguma bola aberta B(x, ε). Se n0 ∈ N é tal
que 1/n0 < ε, então x ∈ B(xnj 0 , 1/n0 ) para algum j = 1, . . . , k(n0 ). Logo, xnj 0 ∈ B(x, ε),
donde xnj 0 ∈ Y ∩ U . Isso mostra que todo aberto de X contém um ponto de Y .
1.5. APLICAÇÕES CONTÍNUAS 17

1.5 Aplicações contı́nuas


Definição 1.5.1. Sejam (X, τX ) e (Y, τY ) espaços topológicos. Uma aplicação f : X → Y
é contı́nua se para todo aberto V ∈ τY vale que f −1 (V ) ∈ τX . Em outras palavras, f é
contı́nua se a pré-imagem de todo aberto de Y é um aberto de X.
Note que a continuidade de uma aplicação depende diretamente das topologias dos
espaços envolvidos, e que é imediato da definição que a composição de aplicações contı́nuas
é contı́nua. Na próxima proposição fornecemos um critério mais simples para decidir so-
bre a continuidade de uma aplicação dada no caso em que a topologia do contra-domı́nio
é gerada por uma base. A seguir, mostraremos algumas definições equivalentes de conti-
nuidade.
Lema 1.5.1. Se τY é gerada por uma base B = {Bλ }λ∈L , então f : X → Y é contı́nua
se, e somente se, f −1 (Bλ ) é aberto para todo λ ∈ L.
Demonstração. Se τY é gerada por B, então qualquer aberto V ⊆ Y pode ser escrito como
uma união de elementos de B:
[
V = Bλ ,
λ∈J

onde J ⊆ L. Daı́, vale que


[
f −1 (V ) = f −1 (Bλ ).
λ∈J

Assim, se a pré-imagem de cada conjunto Bλ da base B é aberto, segue que a pré-imagem


de cada aberto de Y é uma união de abertos de X, e portanto um aberto de X.

Teorema 1.5.1. Para uma aplicação f : X → Y entre espaços topológicos as seguintes


afirmações são equivalentes:

(a) f é contı́nua.

(b) A pré-imagem de qualquer fechado de Y é um fechado de X.

(c) Para qualquer A ⊆ X vale que f (cl(A)) ⊆ cl(f (A)).

(d) Dados um ponto x ∈ X e uma vizinhança V ⊆ Y de f (x) existe uma vizinhança


U ⊆ X de x tal que f (U ) ⊆ V .
Demonstração. Vamos começar por (a)⇒(b). Se F é um fechado de Y , então V = Y \ F
é um aberto de Y . Se f é contı́nua, então f −1 (V ) é aberto. Por outro lado, f −1 (V ) =
f −1 (Y \ F ) = X \ f −1 (F ). Segue que o complementar de f −1 (F ) é aberto, donde f −1 (F )
é fechado. Observe que o mesmo raciocı́nio nos dá a implicação (b)⇒(a).
Procedemos agora para a implicação (a)⇒(c). Seja x ∈ cl(A) e seja V uma vizinhança
de f (x). Como f é contı́nua, f −1 (V ) é um aberto que contém x. Uma vez que x ∈ cl(A),
temos que existe algum z ∈ A ∩ f −1 (V ). Daı́, f (z) ∈ f (A) ∩ V , donde segue que toda
vizinhança de f (x) contém um ponto de f (A). Isso mostra que f (x) ∈ cl(f (A)).
Não é difı́cil mostrar que (c)⇒(b). Se F ⊆ Y é fechado, escrevemos

F = cl(F ) ⊇ cl(f (f −1 (F ))),


18 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

e isso significa que f (cl(f −1 (F )) ⊆ F (note que aplicamos a propriedade (c) pondo
f −1 (F ) = A). Tomando pré-imagens, essa inclusão nos dá

cl(f −1 (F )) ⊆ f −1 (F ),

donde cl(f −1 (F )) = f −1 (F ). Isso mostra que a pré-imagem de um fechado de Y é um


fechado de X.
Por último, vamos mostrar (a)⇔(d). Se f é contı́nua, então dados x ∈ X e uma
vizinhança V ⊆ Y de f (x) basta tomar U = f −1 (V ). É claro que U é um aberto que
contém x e tal que f (U ) ⊆ V . Assuma agora que (d) vale e seja V um aberto de Y . Se
x ∈ f −1 (V ), então existe uma vizinhança U de x tal que f (U ) ⊆ V . Daı́, U ⊆ f −1 (V ), e
isso mostra que todo x ∈ f −1 (V ) tem uma vizinhança contida em f −1 (V ). Logo f −1 (V )
é aberto, e isso conclui a demonstração.

A próxima proposição é um importante critério de continuidade de aplicações dado


por convergência de sequências. O leitor deve notar atentamente que necessitamos das
propriedades de um dos espaço topológico envolvidos ser Hausdorff e satisfazer ao primeiro
axioma de enumerabilidade, como é comum em resultados envolvendo convergência de
sequências.

Proposição 1.5.1. Se f : X → Y é uma aplicação contı́nua, então para toda sequência


(xj )j∈N em X que converge para algum ponto x ∈ X vale que f (xj ) → f (x). A recı́proca é
verdadeira se o espaço X é Hausdorff e satisfaz ao primeiro axioma de enumerabilidade.

Demonstração. Assuma que f é contı́nua e seja (xj )j∈N uma sequência em X tal que
xj → x. Se V ⊆ Y é uma vizinhança qualquer de f (x), então f −1 (V ) é uma vizinhança
de x, donde existe n0 ∈ N tal que j ≥ n0 implica xj ∈ f −1 (V ). Assim, para todo j ≥ n0
vale que f (xj ) ∈ V . Segue que f (xj ) → f (x).
Se f não é contı́nua, então existe um aberto (não-vazio) A ⊆ Y tal que f −1 (A) não é
aberto em X. Isso significa que existe um ponto x ∈ f −1 (A) tal que toda vizinhança U
de x contém algum ponto de X \ f −1 (A). Assumindo que a topologia de X é Hausdorff
e satisfaz ao primeiro axioma de enumerabilidade, segue da Proposição 1.2.2 que x é um
ponto de acumulação de X \ f −1 (A), e portanto podemos tomar uma sequência (xj )j∈N
em X \ f −1 (A) tal que xj → x. Como A é um aberto contendo f (x), e f (xj ) ∈ / A para
todo j ∈ N, temos que f (xj ) não converge para f (x).

Definição 1.5.2. Um homeomorfismo é uma aplicação contı́nua f : X → Y entre espaços


topológicos que é bijetiva e tal que sua inversa f −1 : Y → X é também contı́nua.

Os homeomorfismos são aplicações que, em certo sentido, preservam a topologia. Note


que um homeomorfismo f : X → Y induz uma bijeção entre as topologias de X e Y , uma
vez que é claro que U ⊆ X é aberto se, e somente se, f (U ) é aberto em Y . Se existe um
homeomorfismo entre espaços topológicos X e Y , então dizemos que X e Y são espaços
homeomorfos. Intuitivamente, espaços homeomorfos são indistinguı́veis do ponto de vista
da topologia.

Definição 1.5.3. Seja f : X → Y uma aplicação contı́nua e injetiva entre espaços


topológicos, e assuma que sua imagem f (X) = Z está munida da topologia induzida por
Y (isto é, Z é um subespaço topológico de Y ). Se f é um homeomorfismo de X em Z,
então dizemos que f é um mergulho topológico de X em Y .
1.5. APLICAÇÕES CONTÍNUAS 19

A existência de um mergulho topológico de X em Y significa que Y contém uma


“cópia”de X, isto é, um subconjunto que, quando munido da topologia induzida, é to-
pológicamente indistinguı́vel de X.
Prosseguimos agora investigando as relações entre aplicações contı́nuas e compaci-
dade. Vamos mostrar primeiro que a imagem de um compacto é compacta. Em seguida,
discutiremos continuidade em espaços métricos.

Proposição 1.5.2. Seja f : X → Y uma aplicação contı́nua. Se X é um espaço com-


pacto, então f (X) é compacto (com a topologia induzida de Y ).

Demonstração. Seja A = {Aλ }λ∈L uma cobertura de f (X) por abertos de Y . Como
f é contı́nua, temos que f −1 (Aλ ) é aberto para cada λ ∈ L. Além disso, é claro que
−1
S
X = λ∈L f (Aλ ), e como X é compacto, segue que existem λ1 , . . . , λn ∈ L tais que
{Aλj : j = 1, . . . , n} é uma cobertura de X. Assim, temos que

n
[
f (X) ⊆ Aλj ,
j=1

e isso mostra que f (X) é coberto por uma subcoleção finita A. Como A é uma cobertura
arbitrária de f (X) por abertos de Y , segue do Lema 1.4.1 que f (X) é compacto (com a
topologia induzida de Y ).

Teorema 1.5.2. Sejam (X, dX ) e (Y, dY ) espaços métricos, e f : X → Y uma aplicação.


São equivalentes:

(a) f é contı́nua.

(b) Para quaisquer x ∈ X e ε > 0 existe um número δ > 0 tal que dX (x, y) < δ implica
dY (f (x), f (y)) < ε.

(c) Para toda sequência (xj )j∈N em X tal que xj → x para algum x ∈ X, vale que
f (xj ) → f (x).

Demonstração. Note que a equivalência entre (a) e (c) decorre da Proposição 1.5.1 e do
fato de que toda topologia gerada por uma métrica é Hausdorff e satisfaz ao primeiro
axioma de enumerabilidade.
Assuma que f é contı́nua e sejam x ∈ X e ε > 0. A pré-imagem da bola BY (f (x), ε) é
um aberto de X, e portanto existe uma vizinhança U de x tal que U ⊆ f −1 (BY (f (x), ε)).
Em particular, existe um número δ > 0 tal que BX (x, δ) ⊆ U . Assim, se dX (x, y) < δ,
então y ∈ BX (x, δ), donde y ∈ f −1 (BY (f (x), ε)). Logo, f (y) ∈ BY (f (x), ε), e portanto
dY (f (x), f (y)) < ε. Isso mostra a implicação (a)⇒(b).
Agora, suponha que (b) vale, e seja A ⊆ Y um aberto. Se x ∈ f −1 (A), então existem
um número ε > 0 tal que BY (f (x), ε) ⊆ A, e um número δ > 0 tal que dX (x, y) < δ
implica dY (f (x), f (y)) < ε. Em outras palavras, a imagem de BX (x, δ) está contida na
bola aberta BY (f (x), ε), e portanto está contida em A. Segue que BX (x, δ) ⊆ f −1 (A).
Isso mostra que todo ponto de f −1 (A) possui uma vizinhança contida em f −1 (A), e assim
f −1 (A) é aberto.
20 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

1.6 Exercı́cios
Exercı́cio 1.1. Seja τ uma topologia em um espaço X gerada por uma base B. Mostre
que τ é a interseção de todas as topologias de X que contém B.
Exercı́cio 1.2. Mostre que se Z é um subespaço topológico de Y , e Y é um subespaço
topológico de X, então as topologias induzidas em Z por X e Y coincidem (lembre-se da
Observação 1.1.1).
Exercı́cio 1.3. Prove que a interseção arbitrária de uma coleção de topologias em um
conjunto X é uma topologia em X.
Exercı́cio 1.4. Assuma que τ1 e τ2 são topologias em X, e que τ1 é mais forte que τ2 . Se
Y ⊆ X, mostre que as topologias σ1 e σ2 induzidas em Y por τ1 e τ2 , respectivamente,
são tais que σ1 é mais forte do que σ2 .
Exercı́cio 1.5. Sejam (X, τ ) um espaço topológico e (xj )j∈N uma sequência que converge
para algum ponto x ∈ X. Mostre que, se τ 0 é uma topologia mais fraca do que τ , então
xj → x também na topologia τ 0 .
Exercı́cio 1.6. Prove que se τ1 ⊆ τ2 são topologias em um mesmo espaço X, então se X
é compacto com respeito a τ2 , temos que X é compacto com τ1 .
Exercı́cio 1.7. A fronteira de um subconjunto A ⊆ X é o conjunto

∂A = cl(A) ∩ cl(X \ A).

Mostre que:

(a) x ∈ ∂A se, e somente se, toda vizinhança de x contém pontos de A e de X \ A.

(b) cl(A) = int(A) ∪ ∂A.

(c) A é aberto se, e somente se, ∂A = cl(A) \ A.


Exercı́cio 1.8. Mostre que duas topologias τ e τ 0 geradas, respectivamente, por métricas
d e d0 em um conjunto X coincidem se, e somente se, para quaisquer x ∈ X e ε > 0
existem números δ1 , δ2 > 0 tais que Bd (x, δ1 ) ⊆ Bd0 (x, ε) e Bd0 (x, δ2 ) ⊆ Bd (x, ε).
Exercı́cio 1.9. Seja (X, τ ) um espaço topológico. Dado x0 ∈ X, verifique que τx0 =
{U ∈ τ : x0 ∈ U } é uma base de vizinhanças de x0 . Por outro lado, mostre que se para
cada x ∈ X temos que Bx é uma base de vizinhanças de x, então
[
B= Bx
x∈X

é uma base para a topologia τ .


Exercı́cio 1.10. Sejam d1 e d2 métricas em X. Mostre que se existem números α, β > 0
tais que

αd1 (x, y) ≤ d2 (x, y) ≤ βd1 (x, y) (1.6.1)

para quaisquer x, y ∈ X, então as topologias geradas por d1 e por d2 coincidem.


Observação 1.6.1. Duas métricas tais que vale (1.6.1) são ditas equivalentes.
1.6. EXERCÍCIOS 21

Exercı́cio 1.11. Considere a função d1 : Rn × Rn → R dada por

d1 (x, y) = |x1 − y1 | + . . . |xn − yn |,

onde x = (x1 , . . . , xn ) e y = (y1 , . . . , yn ) são pontos quaisquer de Rn . Mostre que d1 é


uma métrica. Prove também que a topologia gerada por d1 é a topologia usual de Rn .

Exercı́cio 1.12. Mostre que em qualquer conjunto X a topologia discreta é metrizável


(veja o Exemplo 1.1.1).

Exercı́cio 1.13. Seja (X, d) um espaço métrico. Mostre que a aplicação d0 : X × X → R


dada por

d(x, y)
d0 (x, y) =
1 + d(x, y)

é uma métrica em X. Prove que a topologia gerada por d0 é a mesma topologia gerada
por d.

Observação 1.6.2. Note que este exercı́cio estabelece que toda topologia metrizável pode
ser obtida por uma métrica limitada (como função de X × X).

Exercı́cio 1.14. Prove que a interseção de um fechado com um compacto é compacta


mesmo que a topologia em questão não seja Hausdorff (neste caso, essa interseção
pode não ser fechada).

Exercı́cio 1.15. Seja f : (X, τ ) → (Z, σ) uma aplicação contı́nua entre espaços to-
pológicos, e seja Y ⊆ X um subespaço topológico. Mostre que a restrição f |Y : (Y, τY ) →
(Z, σ) é contı́nua (onde estamos denotando a topologia de X induzida em Y por τY , é
claro).

Exercı́cio 1.16. Seja f : X → Y um homeomorfismo, e seja Z ⊆ X um subespaço to-


pológico. Mostre que a restrição f |Z é um homeomorfismo sobre sua imagem, considerada
com a topologia induzida de Y .

Exercı́cio 1.17. Seja f : (X, τ ) → (Y, σ) uma aplicação contı́nua entre espaços to-
pológicos. Prove que se (X, τ ) é compacto, então f (X) é compacto com a topologia
induzida de Y . Conclua que a compacidade é preservada por homeomorfismos.

Exercı́cio 1.18. Seja (X, τ ) um espaço topológico, e sejam σ1 e σ2 topologias em um


conjunto Y . Mostre que se existe uma aplicação f : X → Y tal que f é um homeomorfismo
de (X, τ ) em (Y, σ1 ), e que também é um homeomorfismo de (X, τ ) em (Y, σ2 ), então as
topologias σ1 e σ2 coincidem.

Exercı́cio 1.19. Seja fn : X → Y uma sequência de aplicações de um espaço topológico


(X, τ ) em um espaço métrico (Y, d). Dizemos que fn converge uniformemente para
f : X → Y se para todo ε > 0 existe um número n0 ∈ N tal que

d(fn (x), f (x)) < ε,

para quaisquer x ∈ X e n ≥ n0 . Mostre que se fn : (X, τ ) → (Y, d) é uma sequência


de aplicações contı́nuas que converge uniformemente para f : (X, τ ) → (Y, d), então f é
contı́nua.
22 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS

Exercı́cio 1.20. Sejam (X, dX ) e (Y, dY ) espaços métricos. Uma aplicação f : X → Y é


uma isometria se

dY (f (x), f (z)) = dX (x, z)

para quaisquer x, z ∈ X. Mostre que toda isometria é um mergulho topológico.

Exercı́cio 1.21. Uma aplicação f : (X, dX ) → (Y, dY ) entre espaços métricos é dita
uniformemente contı́nua se para todo ε > 0 existe δ > 0 tal que para quaisquer x, z ∈ X,
dX (x, z) < δ implica dY (f (x), f (z)) < ε. Mostre que se f : (X, dX ) → (Y, dY ) é contı́nua
e (X, dX ) é compacto, então f é uniformemente contı́nua.

Exercı́cio 1.22 (Teorema do ponto fixo). (a) Uma contração em um espaço métrico
(X, d) é uma aplicação T : X → X para a qual que existe uma constante 0 ≤ c < 1 com
a propriedade de que

d(T x, T y) ≤ cd(x, y),

para quaisquer x, y ∈ X. Mostre que uma contração em um espaço métrico completo tem
um ponto fixo, isto é, um ponto x ∈ X tal que T (x) = x. Mostre, também, que tal ponto
fixo é único.

(b) Uma contração fraca em um espaço métrico (X, d) é uma aplicação T : X → X com
a propriedade de que

d(T x, T y) < d(x, y),

para todos x, y ∈ X distintos. Prove que uma contração fraca em um espaço métrico
compacto tem um ponto fixo, e que este ponto fixo é único.

(c) Dê um exemplo de uma contração fraca em um espaço métrico completo que não é
uma contração.

Exercı́cio 1.23. Sejam X um conjunto, e F uma famı́lia de funções f : X → R. Dizemos


que F é pontualmente limitada se para todo x ∈ X existe c ∈ R tal que |f (x)| ≤ c
para toda função f ∈ F. Seja (fn )n∈N uma sequência pontualmente limitada de funções
fn : X → R, onde X é enumerável. Mostre que (fn ) possui uma subsequência (fnk )k∈N
tal que a sequência de números (fnk (x))k∈N converge (em R) para todo x ∈ X.

Exercı́cio 1.24 (Teorema de Arzelá-Ascoli). Sejam (X, d) um espaço métrico, e denote


por C(X) o espaço de todas as funções contı́nuas f : X → R. Definimos:

(i) um conjunto F ⊆ C(X) é dito equicontı́nuo se para todo ε > 0 existe δ > 0 tal que
|f (x) − f (y)| < ε para quaisquer f ∈ F e x, y ∈ X tais que d(x, y) < δ.

(ii) F ⊆ C(X) é um conjunto uniformemente limitado se existe c ∈ R tal que |f (x)| ≤ c


para quaisquer f ∈ F e x ∈ X.

Assuma que (X, d) é um espaço métrico compacto, e seja (fn )n∈N ⊆ C(X) uma
sequência equicontı́nua e uniformemente limitada. Então, (fn ) tem alguma subsequência
que converge uniformemente (veja o Exercı́cio 1.19 para a definição de convergência uni-
forme).
1.6. EXERCÍCIOS 23

Exercı́cio 1.25. Mostre que se X é um espaço métrico compacto e (fn )n∈N é uma
sequência pontualmente limitada e equicontı́nua em C(X), então (fn ) é uniformemente
limitada.

Observação 1.6.3. Observe que no teorema de Arzelá-Ascoli podemos exigir que (fn )n∈N
seja pontualmente limitada, ao invés de uniformemente limitada.
24 CAPÍTULO 1. TOPOLOGIA GERAL E ESPAÇOS MÉTRICOS
Capı́tulo 2

Espaços Normados

2.1 Normas em espaços vetoriais


Ao longo do texto, o sı́mbolo K sempre denotará o corpo R dos números reais ou o corpo
C dos números complexos. Faremos isso pois a teoria que trabalhamos neste texto é
desenvolvida de forma mais ou menos análogo para os dois casos. Um K-espaço vetorial
é um espaço vetorial definido com multiplicação por escalares em K.
A seguir, formalizaremos a noção de norma em um espaço vetorial, que, intuitiva-
mente, é uma forma abstrata de atribuir comprimentos a vetores. No que segue, denota-
remos por | · | o módulo usual em R ou C.
Definição 2.1.1. Uma norma em um K-espaço vetorial X é um função || · || : X → R
que satisfaz às seguintes propriedades:

i. (positividade) ||x|| ≥ 0 para todo x ∈ X, com igualdade se, e somente se, x = 0.

ii. (homogeneidade) ||λx|| = |λ| · ||x|| para quaisquer x ∈ X e λ ∈ K.

iii. (desigualdade triangular) ||x + y|| ≤ ||x|| + ||y|| para todos x, y ∈ X.


Um espaço vetorial X munido de uma norma || · || é chamado de espaço normado. A
seguir, vamos verificar que qualquer norma em um espaço vetorial induz uma métrica (e,
portanto, uma topologia).
Lema 2.1.1. Seja || · || uma norma em um espaço vetorial X. A função d : X × X → R
dada por
d(x, y) = ||x − y||
é uma métrica em X.
Demonstração. A única propriedade que não é trivial é a desigualdade triangular. Se
x, y, z ∈ X, então
||x − z|| = ||x − y + y − z|| ≤ ||x − y|| + ||y − z||,
e isso dá d(x, z) ≤ d(x, y) + d(y, z).

É claro que a distância dada pela norma gera uma topologia em X, a topologia da
norma ||·||. Também, é a essa topologia que estaremos nos referindo quando mencionarmos
a topologia de (X, || · ||). Mais à frente, outras topologias em um espaço normado serão
definidas, mas usaremos nomes especiais para elas.

25
26 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

Observação 2.1.1. Note que uma norma é sempre contı́nua com respeito à topologia gerada
por ela própria (onde K está munido da sua topologia usual, é claro). Com efeito, pela
desigualdade triangular é imediato que ||x|| − ||y|| ≤ ||x − y|| para quaisquer x, y ∈ X,
e portanto se xn → x na distância d gerada pela norma, então

||xn || − ||x|| ≤ ||xn − x|| = d(xn , x) → 0,

se n → ∞. Pelo ı́tem (c) do Teorema 1.5.2 temos que || · || é contı́nua.

Exemplo 2.1.1 (Os espaços `np ). A aplicação || · ||∞ : Rn → R dada por

||x||∞ = max{|xj | : j = 1, . . . , n},

para cada x = (x1 , . . . , xn ) ∈ Rn , é uma norma em Rn . Com efeito, a desigualdade


triangular para || · ||∞ decorre diretamente da desigualdade triangular para o módulo | · |
de números reais. O espaço normado (Rn , || · ||∞ ) é denotado por `n∞ . Também, dado
1 ≤ p < ∞, a aplicação || · ||p : Rn → R dada por

n
!1/p
X
||x||p = |xj |p ,
j=1

para cada x = (x1 , . . . , xn ), é uma norma em Rn . A única propriedade que não é imediata
é a desigualdade triangular, que é consequência direta da desigualdade de Minkowski, que
provamos abaixo. O espaço (Rn , || · ||p ) será denotado por `np .
Antes de prosseguir para outros exemplos de espaços normados, vamos provar algumas
desigualdades importantes em nossa teoria, dentre elas a mencionada desigualdade de
Minkowski. No que segue, dois números 1 < p, q < ∞ são ditos conjugados se
1 1
+ = 1.
p q
Neste caso, também vamos nos referir ao par (p, q) como um par de números conjugados
(ou, simplesmente, um par conjugado). Note cuidadosamente que, aqui, não estamos
considerando o par (1, ∞) como um par de números conjugados.
Teorema 2.1.1. Se (p, q) é um par de números conjugados, então valem as seguintes
desigualdades:

a. (desigualdade de Young)
ap b q
ab ≤ + ,
p q
para quaisquer a, b ≥ 0.

b. (desigualdade de Hölder)
n n
!1/p n
!1/q
X X X
|xj yj | ≤ |xj |p |yj |q ,
j=1 j=1 j=1

para qualquer n ∈ N, e quaisquer x1 , . . . , xn , y1 , . . . , yn ∈ R.


2.1. NORMAS EM ESPAÇOS VETORIAIS 27

Além dessas desigualdades, para qualquer 1 ≤ p < ∞, temos a:

c. (desigualdade de Minkowski)
n
!1/p n
!1/p n
!1/p
X X X
|xj + yj |p ≤ |xj |p + |yj |p ,
j=1 j=1 j=1

para todo n ∈ N, e quaisquer x1 , . . . , xn , y1 , . . . , yn ∈ R.


Demonstração. A estratégia é demonstrar primeiro a desigualdade de Young, e depois
obter a desigualdade de Hölder como consequência desta. Finalmente, mostraremos que
a desigualdade de Minkowski é consequência da desigualdade de Hölder.
Vamos, portanto, provar a desigualdade de Young. Se (p, q) é um par conjugado, e
a ≥ 0, considere a função f : [0, +∞) → R dada por
tq ap
f (t) = − at + .
q p

É claro que f é uma função de classe C 1 , e sua derivada é dada por

f 0 (t) = tq−1 − a.

Além disso, observe que f 0 é continuamente diferenciável em (0, +∞), e f 00 (t) > 0 para
todo t > 0. Segue que f tem um mı́nimo global em t = a1/(q−1) . Como
 aq/(q−1) ap
 
1/(q−1) q/(q−1) p 1 1
f a = −a + =a −1+ = 0,
q p q p
vem que f (b) ≥ 0 para todo b ∈ [0, +∞). Isso dá a desigualdade de Young.
Vamos agora para a desigualdade de Hölder. Primeiro, note que se todos os xj ou se
todos os yj se anulam, então a desigualdade é trivial. Desta forma, podemos considerar
apenas o caso em que algum dos xj e algum dos yj não são nulos. Para cada j = 1, . . . , n
defina
|xj | |yj |
aj =  1/p e bj =  1/q .
Pn Pn
j=1 |xj |p j=1 |yj |q

Aplicando a desigualdade de Young para aj e bj temos


|xj yj | |x |p |y |q
1/p P 1/q ≤ P j  + P j ,
n n
P
n n p |x |p p |y |q
j=1 |xj |p j=1 |yj |q j=1 j j=1 j

e a desigualdade de Hölder vem imediatamente somando essa igualdade em j = 1, . . . , n.


Finalmente, para obter a desigualdade de Minkowski, note que o caso p = 1 é trivial, e
que podemos assumir que ao menos um dos xj e um dos yj são não nulos (caso contrário,
a desigualdade é óbvia), e note que

|xj + yj |p = |xj | · |xj + yj |p−1 + |yj | · |xj + yj |p−1 (2.1.1)

para qualquer j = 1, . . . , n e para todo p > 1. Seja q > 1 é o conjugado de p, e denote


n
X
A= |xj + yj |p
j=1
28 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

por simplicidade. Somando (2.1.1) em j, e aplicando a desigualdade de Hölder conveni-


entemente em cada uma das parcelas à direita, temos
n
X n
X
p−1
A= |xj | · |xj + yj | + |yj | · |xj + yj |p−1 ≤
j=1 j=1
n
!1/p n
!1/q n
!1/p n
!1/q
X X X X
≤ |xj |p |xj + yj |q(p−1) + |yj |p |xj + yj |q(p−1) =
j=1 j=1 j=1 j=1
n
!1/p n
!1/p
X X
= A1/q |xj |p + A1/q |yj |p ,
j=1 j=1

onde a última igualdade se justifica uma vez que q(p − 1) = p. Dividindo ambos os lados
da desigualdade por A1/q , e usando mais uma vez o fato de que (p, q) é um par conjugado,
vem
n
!1/p n
!1/p
X X
A1/p ≤ |xj |p + |yj |p ,
j=1 j=1

e isso é a desigualdade de Minkowski.

Observação 2.1.2. Note que as desigualdades de Hölder e de Minkowski também va-


lem no corpo dos números complexos. De fato, se z, w ∈ C, então |zw| = |z| · |w|, e
|z + w| ≤ |z| + |w|, donde o caso complexo se reduz ao caso real demonstrado acima. As-
sim, as normas || · ||p também podem ser definidas analogamente para espaços complexos
Cn .

Exemplo 2.1.2 (Os espaços `p (N)). Denote por KN o K-espaço vetorial de sequências
(xj )j∈N com entradas em K (as operações de soma e multiplicação por escalares em K são
feitas termo a termo, naturalmente). Para cada p ≥ 1, defina
( ∞
)
X
p p
` (N) = (xj )j∈N ∈ K : N
|xj | < ∞ .
j=1

Tomando limites (quando j → ∞) na desigualdade de Minkowski, verificamos que `p (N) é


fechado para a soma (e portanto um K-espaço vetorial, pois a propriedade de ser fechado
para multiplicação é trivial), e que a função || · ||p : `p (N) → R dada por


!1/p
X
||(xj )j∈N ||p = |xj |p
j=1

é uma norma em `p (N). Além disso, o conjunto


 

` (N) = (xj )j∈N : sup |xj | < ∞
j∈N

é um espaço vetorial normado com a norma

||(xj )j∈N ||∞ = sup |xj |.


j∈N
2.1. NORMAS EM ESPAÇOS VETORIAIS 29

Observe que esse caso é mais simples: o fato de que o conjunto `∞ (N) é um espaço vetorial
e de que a função || · ||∞ é uma norma vem diretamente da desigualdade triangular para
o módulo usual em K.

Observação 2.1.3. Ao longo do texto, os espaços `p (N) e `∞ (N) sempre serão considerados
com as respectivas normas definidas acima, salvo menção em contrário.

Exemplo 2.1.3. Seja X um espaço topológico compacto. Denote por C(X) o K-espaço
vetorial das funções contı́nuas f : X → K (note que é imediato verificar que C(K) é, de
fato, um espaço vetorial). A função
||f ||∞ = max{|f (x)| : x ∈ X}
é uma norma em C(K), chamada norma da convergência uniforme. Para formalizar essa
afirmativa, precisamos mostrar que || · ||∞ está bem definida, isto é, que o máximo de
|f (x)| em X de fato existe. Isso decorre do próximo resultado, que é um conhecido fato
topológico.
Proposição 2.1.1. Seja X um espaço topológico compacto. Se f : X → K é uma função
contı́nua, então existem x0 , y0 ∈ X tais que
|f (y0 )| ≤ |f (x)| ≤ |f (x0 )|
para todo x ∈ X.
Demonstração. O módulo | · | : K → R é claramente uma função contı́nua, e portanto a
função g = |f | é uma composição de funções contı́nuas, portanto contı́nua. Assuma que
não existe x0 ∈ X tal que g(x) ≤ g(x0 ) para todo x ∈ X, e seja
m = sup{g(x) : x ∈ X},
onde possivelmente temos m = ∞. A coleção
A = {g −1 ((−∞, r)) : r ∈ R e r < m}
é uma cobertura de X, uma vez que para cada x ∈ X vale que g(x) < m, donde podemos
escolher r ∈ R tal que g(x) < r < m, e portanto x ∈ g −1 ((−∞, r)). Como g é contı́nua,
temos que cada conjunto g −1 ((−∞, r)) é um aberto de X, e portanto A é uma cobertura
aberta de X. Por compacidade, segue que A contém uma subcoleção finita que cobre X.
Denote tal subcoleção por
A0 = {g −1 ((−∞, rj )) : j = 1, . . . , n},
e assuma que r1 < r2 < . . . < rn . Como rn < m, e m = sup{g(x) : x ∈ X}, segue que
existe x1 ∈ X tal que g(x1 ) > rn . Assim, x1 não pertence a nenhum dos conjuntos da
subcoleção A0 , e isso é uma contradição. Consequentemente, temos que existe x0 ∈ X tal
que g(x) ≤ g(x0 ) para todo x ∈ X. A demonstração da existência de um ponto y0 tal que
g(y0 ) ≤ g(x) para todo x ∈ X é análoga.

Definição 2.1.2. A bola unitária de um espaço normado (X, || · ||) é o conjunto


B||·|| = {x ∈ X : ||x|| ≤ 1}.
Quando não houver possibilidade de dúvida quanto à norma fixada em X, denotaremos
a bola unitária de (X, || · ||) por BX .
30 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

Observação 2.1.4. Note que na terminologia da teoria de espaços métricos, a bola unitária
de (X, || · ||) é a bola fechada de centro na origem e raio 1 tomada na distância induzida
pela norma.
Definição 2.1.3. Um subconjunto K de um espaço vetorial X é convexo se

(1 − t)x + ty ∈ K

para quaisquer x, y ∈ K e t ∈ [0, 1]. Um conjunto K ⊆ X é um corpo convexo se é


convexo, compacto, e tem interior não-vazio (na topologia dada por uma norma qualquer
em X; veja o Teorema 2.2.1).
Lema 2.1.2. A bola unitária BX de um espaço normado (X, ||·||) é um conjunto convexo.
Demonstração. Se x, y ∈ BX e t ∈ [0, 1], então

||(1 − t)x + ty|| ≤ (1 − t)||x|| + t||y|| ≤ (1 − t) + t = 1,

donde (1 − t)x + ty ∈ BX .

2.2 Dimensão finita


O objetivo principal desta seção é mostrar que todas as normas em um dado espaço
vetorial de dimensão finita X geram a mesma topologia. Esta seção e a próxima também
tem por objetivo mostrar algumas diferenças fundamentais entre espaços normados de
dimensão finita e infinita (as definições precisas serão dadas um pouco mais adiante). No
que se segue, o vetor nulo de um espaço vetorial X será comumente denotado por 0X .
Definição 2.2.1. Seja X um K-espaço vetorial. Uma combinação linear finita de vetores
de X é uma soma do tipo
n
X
x= αj xj ,
j=1

onde xj ∈ X e αj ∈ K para cada j = 1, . . . , n. Um subconjunto (possivelmente infinito)


A ⊆ X é linearmente independente se toda para qualquer combinação linear finita de
elementos de A que resulta no vetor nulo vale que todos os seus coeficientes são necessa-
riamente nulos. Em outras palavras, A é um conjunto linearmente independente se vale
a seguinte implicação:
n
X
x1 , . . . , x n ∈ A e αj xj = 0X =⇒ α1 = α2 = . . . = αn = 0.
j=1

Uma combinação linear em que todos os coeficientes são nulos é denominada uma com-
binação linear trivial . Prosseguindo, o subespaço gerado por um subconjunto A ⊆ X é o
conjunto de todas as combinações lineares finitas de elementos de A:
( n )
X
span(A) = α j xj : x j ∈ A e α j ∈ K .
j=1

É um resultado conhecido de Álgebra Linear que para todo A ⊆ X vale que span(A)
é um subespaço vetorial de X.
2.2. DIMENSÃO FINITA 31

Definição 2.2.2. Seja X um K-espaço vetorial não-vazio. Dizemos que X tem dimensão
finita se existe um subconjunto finito B ⊆ X tal que X = span(B). Se X é um espaço
vetorial não-vazio que não tem dimensão finita, então dizemos que X tem dimensão
infinita.

Observação 2.2.1. Note que os conceitos introduzidos na Definição 2.2.1 também valem no
caso em que X tem dimensão infinita, e eles serão mencionados sem maiores comentários
na próxima seção (onde lidaremos com tais espaços). Na presente seção, é apenas a partir
de agora que devemos de fato nos restringir aos espaços de dimensão finita.
Se X tem dimensão finita, então um subconjunto B ⊆ X é uma base de X se B é um
conjunto linearmente independente tal que X = span(B). Note que se B é uma base de
X, então cada vetor de x pode ser escrito de uma única maneira como combinação linear
finita de elementos de B. É também um resultado de Álgebra Linear que quaisquer duas
bases de um espaço vetorial de dimensão finita tem a mesma quantidade de elementos. O
número de elementos de uma base de X é a dimensão de X.
Vamos agora prosseguir para enunciar e provar que quaisquer normas em um espaço
vetorial de dimensão finita geram a mesma topologia. Mas primeiro, vamos enunciar e
provar um resultado que descreve a topologia da bola unitária neste caso (em dimensão
infinita a situação é mais difı́cil de descrever, como ficará claro mais adiante).

Proposição 2.2.1. Se (X, || · ||) é um espaço normado de dimensão finita, então a bola
unitária BX é um corpo convexo.

Demonstração. Do Lema 2.1.2 já temos que BX é convexa. Para verificar que o interior
de BX é não-vazio, note que a bola aberta

B(0X , 1/2) = {x ∈ X : ||x|| < 1/2}

está contida em BX . Assim, falta apenas mostrar que BX é compacta. Como a topologia
gerada pela norma é, na verdade, uma topologia gerada por uma métrica, é necessário e
suficiente mostrar que BX é um espaço sequencialmente compacto. Em outras palavras,
devemos mostrar que toda sequência de pontos de BX tem uma subsequência convergente.
Se {e1 , . . . , en } é uma base de X, e (xj )j∈N é uma sequência em BX , então para cada j ∈ N
escrevemos

xj = αj1 e1 + αj2 e2 + . . . αjn en .



Para cada k = 1, . . . , n, a sequência αjk j∈N é uma sequência limitada de escalares em
K, donde possui uma subsequência convergente. Daı́, indutivamente construı́mos um
conjunto de ı́ndices J ⊆ N tal que (αjk )j∈J converge para todo k ∈ {1, . . . , n}. Denote por
αk o limite de (αjk )j∈J . Afirmamos que a subsequência (xj )j∈J converge para

x = α1 e1 + α2 e2 + . . . αn en .

Com efeito, essa afirmação decorre imediatamente da desigualdade

||xj − x|| ≤ |αj1 − α1 | · ||e1 || + . . . + |αjn − αn | · ||en ||,

que vale para todo j ∈ J. Fazendo j → ∞ em J temos que o lado direito da desigualdade
acima converge para 0.
32 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

Observação 2.2.2. Note que, por enquanto, mostramos que a bola unitária de um espaço
normado de dimensão finita é compacta apenas na topologia dada pela norma fixada.
Em outras palavras, ainda não provamos que a bola unitária correspondente a uma deter-
minada norma é compacta na topologia gerada por outra norma. Observe, entretanto,
que isso é uma consequência direta do próximo teorema.

Teorema 2.2.1. Sejam || · ||1 e || · ||2 duas normas em um espaço vetorial de dimensão
finita X. Então, as topologias geradas por || · ||1 e || · ||2 coincidem.

Demonstração. Dizemos que as normas || · ||1 e || · ||2 são equivalentes se existem números
α, β > 0 tais que

α||x||1 ≤ ||x||2 ≤ β||x||1

para todo x ∈ X. É claro que se || · ||1 e || · ||2 são equivalentes, então as distâncias d1 e
d2 geradas por || · ||1 e || · ||2 , respectivamente, são equivalentes. Por outro lado, se d1 e
d2 são equivalentes, então segue do Exercı́cio 1.10 que as topologias geradas por d1 e d2
coincidem (a solução do exercı́cio vem do fato de que a equivalência das métricas garante
que toda bola aberta de d1 contém alguma bola aberta de d2 com o mesmo centro, e
vice-versa).
Assim, é suficiente mostrar que duas normas quaisquer em um espaço vetorial de
dimensão finita são equivalentes. Fixe uma base {e1 , . . . , en } em X, e note (abusando da
notação) que a função || · ||1 definida por
n
X
||α1 e1 + . . . + αn en ||1 = |αj |
j=1

é uma norma em X. Uma vez que a equivalência entre normas é de fato uma relação de
equivalência (ou seja, é uma relação reflexiva, simétrica e transitiva), basta mostrar que
qualquer norma || · || em X é equivalente à norma || · ||1 definida acima. Primeiro, vamos
mostrar que a norma || · || : X → R é uma função contı́nua com respeito à topologia dada
em X por pela norma || · ||1 . Para isso, vamos usar o critério sequencial. Se d1 é a métrica
induzida por || · ||1 , e (xj )j∈N é uma sequência em X tal que d1 (xj , x) → 0 quando j → ∞,
então decompondo os pontos da sequência (xj ) base {e1 , . . . , en } e escrevendo, temos

xj = αj1 e1 + . . . + αjn en ,

e x = α1 e1 + . . . + αn en , segue que

|αj1 − α1 | + . . . + |αjn − αn | = ||xj − x||1 = d1 (xj , x) → 0,

se j → ∞. Logo, cada uma das parcelas à esquerda converge para 0 quando j → ∞.


Consequentemente, da desigualdade

||xj || − ||x|| ≤ ||xj − x|| ≤ |αj1 − α1 | · ||e1 || + . . . + |αjn − αn | · ||en ||

temos que ||xj || → ||x|| quando j → ∞. Logo, pela Proposição 2.2.1 e pela Proposição
2.1.1 podemos tomar

α = min{||z|| : z ∈ B1 }, e
β = max{||z|| : z ∈ B1 },
2.2. DIMENSÃO FINITA 33

onde B1 denota a bola unitária da norma || · ||1 . Se x 6= 0 é um vetor arbitrário em X,


então y = x/||x||1 ∈ B1 , e portanto
α ≤ ||y|| ≤ β.
Daı́, segue imediatamente que
α||x||1 ≤ ||x|| ≤ β||x||1 ,
para todo x ∈ X (o caso x = 0X é trivial). Isso mostra que as normas || · || e || · ||1 são
equivalentes.

A topologia dada por uma norma em um espaço vetorial X de dimensão finita depende
apenas da dimensão de X, de certa forma. Na realidade, a topologia usual de Kn induz a
topologia de qualquer espaço normado (X, || · ||) de dimensão n: os abertos de X são as
imagens dos abertos de Kn por um isomorfismo T : Kn → X.
Corolário 2.2.1. Todo espaço normado de dimensão finita (sobre um corpo completo) é
completo.
Demonstração. Apresentamos este resultado como corolário do teorema anterior pois,
como todas as normas em um espaço de dimensão finita X induzem a mesma topologia, é
suficiente fixar uma base {e1 , . . . , en } em X e mostrar que X é completo com a topologia
dada pela norma
n
X
1 n
||α e1 + . . . + α en ||1 = |αq |.
q=1

Se (xj )j∈N é uma sequência de Cauchy em X, então escrevendo xj = αj1 e1 + . . . + αjn en


para cada j ∈ N, temos que
n
X
|αjk − k
αm | ≤ |αjq − αm
q
| = ||xj − xm ||,
q=1

para quaisquer j, m ∈ N e todo q = 1, . . . , n. Segue que cada sequência (αjk )j∈N é uma
sequência de Cauchy de escalares em K. Logo, todas essas sequências são convergentes,
e assim podemos escrever αjk → αk quando j → +∞ para cada k = 1, . . . , n. Segue
imediatamente que xj converge para α1 e1 + . . . + αn en , e isso mostra que toda sequência
de Cauchy em X converge para um ponto de X.

Se X é um espaço vetorial de dimensão finita, vamos convencionar que a topologia


de X é a topologia gerada em X por qualquer norma. Note que se K ⊆ X é um corpo
convexo (isto é, um conjunto convexo, compacto e com interior não vazio na topologia
de X) que é simétrico com respeito à origem (isto é, x ∈ K implica −x ∈ K), então o
funcional de Minkowski
||x||K = inf{λ ≥ 0 : x ∈ λK},
definido para vetores x ∈ X, e onde λK = {λx : x ∈ K}, define uma norma em X.
Deixamos a cargo do leitor os detalhes da demonstração de que || · ||K é de fato uma
norma. Consequentemente, há uma correspondência das normas em X com suas respec-
tivas bolas unitárias é uma bijeção do conjunto das normas em X sobre o conjunto dos
corpos convexos simétricos com respeito à origem de X.
34 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

2.3 Dimensão infinita


Relembramos o leitor da Definição 2.2.2, que estabelece que um espaço vetorial não-vazio
X tem dimensão infinita se X 6= span(B) para todo subconjunto finito B ⊆ X. Vamos
mostrar agora uma útil definição equivalente.

Lema 2.3.1. Um espaço vetorial não vazio X tem dimensão infinita se, e somente se,
para todo subconjunto finito linearmente independente A ⊆ X existe um vetor x ∈ X tal
que A ∪ {x} é linearmente independente.

Demonstração. Se X tem dimensão finita, então tomando uma base B de X e um vetor


qualquer x ∈ X, é claro que B ∪ {x} não pode ser linearmente independente, uma vez
que x se escreve como uma combinação linear finita dos elementos de B.
Por outro lado, se X tem dimensão finita e A ⊆ X é um subconjunto linearmente
independente finito, então A não é uma base de X. Daı́, X 6= span(A), e portanto existe
x ∈ X tal que A ∪ {x} é linearmente independente.

Os subespaços vetoriais de um espaço de dimensão infinita são definidos da mesma


forma que em dimensão finita: um subconjunto Y ⊆ X é um subespaço vetorial se Y
é um espaço vetorial com as operações de soma de vetores e multiplicação por escalares
herdadas de X. Um subespaço vetorial é fechado se é fechado na topologia de X. Em
dimensão finita, é fácil mostrar que todos os subespaços vetoriais são fechados, mas isso
não é verdade no caso de dimensão infinita. Entretanto, temos o seguinte lema.

Lema 2.3.2. Um subespaço vetorial Y de dimensão finita em um espaço normado de


dimensão infinita (X, || · ||) é fechado.

Demonstração. Como a topologia de X é dada por uma métrica, é suficiente mostrar que
toda sequência convergente de pontos de Y converge para algum ponto de Y . Se (yj )j∈N é
uma sequência em Y tal que yj → x para algum x ∈ X, então (yj )j∈N é uma sequência de
Cauchy, em particular. A restrição de || · || a Y é uma norma em Y , e portanto (Y, || · ||) é
um espaço normado de dimensão finita, e portanto (Y, || · ||) é um espaço completo. Segue
que yj converge para algum ponto y ∈ Y , e pela unicidade do limite vem x = y. Isso
mostra que toda sequência convergente de pontos de Y converge para um ponto de Y .

Nosso próximo passo é mostrar que, ao contrário do caso de dimensão finita, em um


espaço vetorial de dimensão infinita a bola unitária não é compacta (na topologia gerada
pela norma, é claro). O principal ingrediente da prova é o próximo lema.

Lema 2.3.3 (Lema de Riesz). Seja (X, || · ||) um espaço vetorial de dimensão infinita, e
seja Y ⊆ X um subespaço vetorial fechado próprio. Se α ∈ (0, 1), então existe um vetor
x ∈ X \ Y tal que ||x|| = 1 e inf y∈Y ||x − y|| ≥ α.

Demonstração. Tome um vetor x1 ∈ X \ Y , e note que c = inf y∈Y ||x1 − y|| > 0, uma vez
que Y é fechado (do contrário terı́amos uma sequência de pontos de Y convergindo para
x1 , que não é um ponto de Y ). Consequentemente, para cada número b > c, existe um
vetor y1 ∈ Y tal que c ≤ ||x1 − y1 || ≤ b. Defina

x1 − y 1
x= ,
||x1 − y1 ||
2.3. DIMENSÃO INFINITA 35

e note que claramente temos ||x|| = 1. Além disso, se y ∈ Y , então



x1 − y 1 1 c c
||x − y|| = − y = ||x1 − (y1 + ||x1 − y1 ||y)|| ≥ ≥ ,
||x1 − y1 || ||x1 − y1 || ||x1 − y1 || b

onde a primeira desigualdade se justifica pois y2 = y1 +||x1 −y1 ||y ∈ Y , donde ||x1 −y2 || ≥
inf y∈Y ||x1 − y|| = c. Finalmente, dado α ∈ (0, 1), basta construir o vetor x como acima
tomando b = c/α.

Teorema 2.3.1. A bola unitária BX de um espaço normado (X, || · ||) é compacta se, e
somente se, X tem dimensão finita.

Demonstração. O fato de que a bola unitária de um espaço normado de dimensão finita é


compacta já foi provado na Proposição 2.2.1. Assim, resta mostrar que a bola unitária BX
de um espaço normado de dimensão infinita X não é compacta na topologia da norma.
A topologia da norma induzida em BX é a topologia gerada em BX pela restrição da
(métrica da) norma || · || a BX (veja a Proposição 1.3.1). Assim, a topologia considerada
em BX é metrizável, e portanto, BX é compacta se, e somente se, é sequencialmente
compacta. Logo, para mostrar que BX não é compacta, vamos construir uma sequência
em BX que não tem subsequência convergente.
Comece fixando x1 ∈ BX , e como Y1 = span{x1 } é um subespaço vetorial de dimensão
finita (e, portanto, fechado; veja o Lema 2.3.2) segue do Lema de Riesz que existe x2 ∈ BX
com ||x1 − x2 || ≥ 1/2. Agora, denotando por Y2 = span{x1 , x2 } e usando mais uma vez
o Lema de Riesz, podemos tomar x3 ∈ BX tal que inf y∈Y2 ||x3 − y|| = 1/2. Daı́, temos
em particular que ||x3 − x2 || ≥ 1/2 e ||x3 − x1 || ≥ 1/2. Prosseguindo indutivamente,
construimos uma sequência (xj )j∈N em BX com a propriedade de que ||xi − xj || ≥ 1/2
sempre que i 6= j. É claro que (xj )j∈N não tem subsequência convergente, e portanto BX
não é compacta.

Não é difı́cil notar que o conceito de base de um espaço vetorial dimensão finita não
pode ser imediatamente traduzido para o caso de dimensão infinita. A existência de
algum subconjunto satisfazendo as propriedades “desejáveis”não é nem mesmo garantida
a priori, como veremos a seguir.

Definição 2.3.1. Uma base de Hamel de um espaço vetorial de dimensão infinita é um


subconjunto linearmente independente H ⊆ X com a propriedade de que X = span(H).
Em outras palavras, um subconjunto linearmente independente H ⊆ X é uma base de
Hamel se qualquer vetor de X pode ser escrito como uma combinação linear finita de
vetores de H.

Dado um espaço vetorial X de dimensão infinita, a existência de uma base de Hamel


não é óbvia, e na verdade depende do Lema de Zorn, que é uma importante ferramenta
para lidar com espaços de dimensão infinita. Antes de enunciar o Lema de Zorn, precisa-
mos fixar alguma terminologia. Uma ordenação parcial em um conjunto X é uma relação
v que é reflexiva, transitiva e anti-simétrica, isto é, para quaisquer x, y, z ∈ X temos:

i. x v x,

ii. x v y e y ⊆ z implicam x v z,
36 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

iii. x v y e y v x implicam x = y.

A relação ≤ em R é um exemplo canônico. Se (X, v) é um conjunto parcialmente ordenado


(isto é, se está munido de uma ordenação parcial), então dizemos que x, y ∈ X são
comparáveis se x v y ou y v x. Um conjunto munido de uma ordenação parcial em
que quaisquer dois elementos são comparáveis é dito totalmente ordenado. Se (X, v) é
parcialmente ordenado, e Y ⊆ X é um subconjunto, então dizemos que z ∈ X é um
limite superior de Y se y v z para todo y ∈ Y . Um elemento maximal de um conjunto
parcialmente ordenado (X, v) é um ponto x ∈ X com a propriedade de que x v z implica
z = x.

Lema 2.3.4 (Lema de Zorn). Seja (X, v) um conjunto não-vazio munido de uma or-
denação parcial. Se todo subconjunto totalmente ordenado de X possui um limite superior,
então X tem um elemento maximal.

Observação 2.3.1. O Lema de Zorn é equivalente ao Axioma da Escolha, e portanto, para


alguns, deve ser tratado como um Axioma, e não como um Lema.
Como fora mencionado anteriormente, vamos usar o Lema de Zorn para garantir a
existência de uma base de Hamel. Note cuidadosamente, entretanto, que no caso de
dimensão infinita não podemos afirmar nada sobre a cardinalidade de uma tal base. Ob-
serve, também, que nenhuma referência a uma norma é feita. Em outras palavras, uma
base de Hamel pode ser obtida independentemente de se fixar uma norma no espaço
vetorial.

Teorema 2.3.2. Todo espaço vetorial não-vazio tem uma base de Hamel.

Demonstração. Seja X um espaço vetorial não-vazio, e denote por V a coleção de todos


os subconjuntos linearmente independentes de X (possivelmente infinitos). Note que a
relação de inclusão entre conjuntos define uma relação parcial em V. Mais ainda, se Y é
uma subcoleção totalmente ordenada de V, então a união
[
Y = Yλ
Yλ ∈Y

é claramente um limite superior para Y. Além disso, Y é um subconjunto linearmente


independente de X. Com efeito, todo subconjunto finito de Y deve estar inteiramente
contido em algum dos Yλ0 s, pois do contrário Y admitiria pares não-comparáveis.
Segue que toda subcoleção totalmente ordenada de V tem um limite superior. Assim,
do Lema de Zorn vem que V admite um elemento maximal H ∈ V. É claro que H é
um subconjunto linearmente independente de X, uma vez que todos os elementos V são
subconjuntos linearmente independentes de X. Resta provar que todo vetor de X se
escreve como combinação linear finita de elementos de H, isto é, que X = span(H). Se
/ span(H), então o conjunto H 0 = H ∪ {z} é um conjunto linearmente
z ∈ X é tal que z ∈
independente que contém propriamente H, e isso contradiz o fato de que H é um elemento
maximal de V.

A seguir, definimos um outro conceito de base para um espaço vetorial de dimensão


infinita. A vantagem deste novo conceito é a enumerabilidade (lembre-se de que não
podemos “controlar”a cadinalidade de uma base de Hamel), e a desvantagem é que nem
todos os espaços admitem uma tal base. Note, também, que necessitamos de uma norma
no espaço vetorial para a definição.
2.3. DIMENSÃO INFINITA 37

Definição 2.3.2. Uma base de Schauder em um espaço normado de dimensão infinita


(X, || · ||) é uma sequência (xn )n∈N em X com a propriedade de que para cada x ∈ X
existe uma única sequência (αn )n∈N em K tal que

X n
X
x= αj xj := lim αj xj ,
n→∞
j=1 j=1

onde o limite é tomado na norma.

Exemplo 2.3.1. Se 1 ≤ p < +∞, então o espaço `p (N) definido no Exemplo 2.1.2 possui
uma base de Schauder. Considere o conjunto B = {en }n∈N , em que cada elemento en é
a sequência em que todas as entradas são 0, exceto pela n-ésima, que é 1. Afirmamos
que B é uma base de Schauder em `p (N). Para provar essa afirmação, seja x ∈ `p (N) a
sequência (αj )j∈N . Daı́, temos que

X
|αj |p < +∞,
j=1

e por argumentos usuais de análise na reta, segue que



X
lim |αj |p = 0. (2.3.1)
k→∞
j=k+1

Para qualquer k ∈ N, podemos escrever



k


!1/p
X X
x − αj ej = ||(0, 0, . . . , 0, αk+1 , αk+2 , . . .)||p = |αj |p ,


j=1 p j=k+1

e pela igualdade (2.3.1) vem que a última expressão converge para 0 quando k → ∞.
Segue que
k
X
x = lim αj e j ,
k→∞
j=1

onde o limite é tomado na norma || · ||p . Isso mostra que, de fato, B é uma base de
Schauder em `p (N).
Observação 2.3.2. O leitor deve verificar atentamente que esse argumento não vale para
`∞ (N). Na realidade, esse espaço não admite base de Schauder. Esse fato será provado
mais à frente.
Lembre-se de que um espaço métrico é separável quando tem um subconjunto enu-
merável denso. Um espaço normado é dito separável quando é separável com a métrica
induzida pela norma.

Proposição 2.3.1. Seja (X, || · ||) um espaço normado de dimensão infinita. Se (X, || · ||)
tem uma base de Schauder, então (X, || · ||) é separável.

Demonstração. Seja B = (en )n∈N uma base de Schauder em X. Então, o conjunto


spanQ (B) de combinações lineares racionais finitas dos elementos de B é um subcon-
junto enumerável e denso (se K = C, então abusamos da notação e também usamos Q
38 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

para representar os complexos racionais). Para verificar que spanQ (B) é denso, note que
se x ∈ X e ε > 0, então existem k ∈ N e α1 , . . . , αk ∈ K tais que

Xk ε
x − αj ej < .

2
j=1

Por outro lado, para cada j = 1, . . . , k tomamos qj ∈ Q tal que

ε
|qj − αj | < .
2k||ej ||

Assim, temos a desigualdade



k k k k
X X X X ε ε
αj ej − qj e j ≤ |qj − αj | · ||ej || < = .

2k 2


j=1 j=1 j=1 j=1

E daı́, temos imediatamente da desigualdade triangular que



k
X
x − qj ej < ε,


j=1

e é claro que kj=1 qj ej ∈ spanQ (B).


P

Para a enumerabilidade, note que spanQ (B) está naturalmente identificado com o sub-
conjunto F do espaço QN de sequências com entradas racionaisP que têm uma quantidade
finita de termos não nulos. Com efeito, basta identificar o vetor kj=1 qj ej com a sequência
(q1 , . . . , qk , 0, . . . , 0, . . .). Note que alguns dos qj podem ser nulos também. Para mostrar
que F é enumerável, escreva

[
F = Fn ,
n=1

onde Fn = {(qj )j∈N ∈ F : qj = 0 para todo j > n}. Isto é, para cada n ∈ N, Fn é o
conjuntos das sequências em que todas as entradas depois da n-ésima são nulas. Segue
que Fn pode ser identificado com o produto cartesiano de n cópias de Q, e daı́ cada Fn é
enumerável. Finalmente, F é uma união enumerável de conjuntos enumeráveis, e portanto
enumerável.

Exemplo 2.3.2. O espaço `∞ (N) não é separável, e portanto não admite uma base de
Schauder. De fato, seja {en : n ∈ N} um conjunto enumerável qualquer em `∞ (N), e
denote en = (αjn )j∈N para cada n ∈ N. Construa uma sequência x = (βj )j∈N pondo, para
cada j ∈ N, βj = 0 se |αjj | ≥ 1 e βj = αjj + 1 se |αjj | < 1. Note que x ∈ `∞ (N), pois

||x||∞ = max{|βj | : j ∈ N} = max{|αjj + 1| : |αjj | < 1} ≤ 2.

Por outro lado, para todo n ∈ N temos ||en − x||∞ ≥ 1. Com efeito, se |αnn | ≥ 1, então
βn = 0 e assim vem ||en − x||∞ ≥ |αnn − βn | = |αnn | ≥ 1. Já se |αnn | < 1, então temos
||en − x||∞ ≥ |αnn − βn | = 1. Segue que o conjunto {en : n ∈ N} não é denso em X.
2.4. OPERADORES LINEARES 39

2.4 Operadores lineares


Definição 2.4.1. Um operador linear (também chamado de aplicação ou transformação
linear, ou apenas de operador ) entre K-espaços vetoriais X e Y é uma aplicação T : X →
Y com a propriedade de que
T (x + αy) = T (x) + αT (y),
para quaisquer x, y ∈ X e qualquer α ∈ K.
Os operadores lineares devem ser interpretados como aplicações que preservam as
operações dos espaços vetoriais envolvidos. São resultados conhecidos de Álgebra Linear
que o núcleo e a imagem de um operador T : X → Y , definidos (e denotados) respectiva-
mente por
ker(T ) = {x ∈ X : T (x) = 0X }, e
im(T ) = {y ∈ Y : y = T (x) para algum x ∈ X}
são subespaços vetoriais de X e de Y , respectivamente. Note que esses dois conjuntos
são sempre não-vazios, uma vez que T (0X ) = 0Y . É imediato verificar que, neste caso, as
demonstrações usuais do caso de dimensão finita também valem para espaços de dimensão
infinita. Vale também para o caso de dimensão infinita que T é injetivo se, e somente se,
ker(T ) = {0X }. Um operador bijetivo é dito invertı́vel . Note que se T é um operador
injetivo, então T é invertı́vel sobre sua imagem.
Sejam (X, || · ||X ) e (Y, || · ||Y ) espaços normados sobre o mesmo corpo K, e denote
por BX e BY as bolas (fechadas) unitárias de X e Y , respectivamente. Um operador
T : X → Y é dito limitado se
sup{||T x||Y : x ∈ BX } < ∞.
Observe que temos as seguintes igualdades, que serão bastante úteis:
 
||T x||Y
sup{||T x||Y : x ∈ BX } = sup : x ∈ X \ {0} = sup{||T x||Y : ||x||X = 1},
||x||X
e da primeira delas decorre o próximo lema, que fornece outra caracterização dos opera-
dores limitados.
Lema 2.4.1. Um operador T : (X, ||·||X ) → (Y, ||·||Y ) entre espaços normados é limitado
se, e somente se, existe c ∈ R tal que
||T x||Y ≤ c||x||X
para todo x ∈ X.
Demonstração. Se T é limitado, e
 
||T x||Y
c = sup : x ∈ X \ {0X } ,
||x||X
então segue imediatamente que ||T x||Y ≤ c||x||X para todo x ∈ X \ {0X }. Além disso, a
desigualdade é óbvia para x = 0X . Por outro lado, se existe c ∈ R tal que ||T x||Y ≤ c||x||X ,
temos que
||T x||Y
≤c
||x||X
para qualquer x ∈ X \ {0X }. E daı́ segue que sup{||T x||Y : x ∈ BX } < ∞, donde T é
limitado.
40 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

Um operador linear entre espaços normados é, em particular, uma aplicação entre
espaços topológicos (com as respectivas topologias geradas pelas normas), e daı́ é natural
perguntar sob quais condições um operador é uma aplicação contı́nua.

Teorema 2.4.1. Um operador T : (X, || · ||X ) → (Y, || · ||Y ) entre espaços normados é
contı́nuo se, e somente se, T é limitado.

Demonstração. Se T não é limitado, então para cada c > 0 existe um vetor unitário x ∈ X
tal que ||T x||Y > c||x||X = c. Assim, para cada n ∈ N podemos escolher um vetor xn ∈ X
tal que ||xn ||X = 1 e ||T xn ||Y > n. Logo, a sequência zn = xn /n é tal que ||zn ||X → 0
quando n → ∞, mas ||T zn ||Y > 1 para todo n ∈ N. Segue que T zn não converge para
0Y = T (0X ) quando n → ∞, e daı́ T não é contı́nuo em 0X (veja o Teorema 1.5.2).
Assuma agora que T é limitado, e seja c ∈ R um número tal que ||T x||Y ≤ c||x||X
para todo x ∈ X. Seja (xj )j∈N uma sequência em X que converge para x ∈ X. Da ı́,

||T xj − T x||Y = ||T (xj − x)||Y ≤ c||xj − x||X ,

donde T xj → T x em Y . Isso mostra que T é contı́nuo.

A seguir, verificaremos que a continuidade decorre da linearidade em dimensão finita.


Isso não é necessariamente verdade quando trabalhamos com espaços de dimensão infinita
(veja o Exercı́cio 2.6).

Proposição 2.4.1. Se X tem dimensão finita e T : X → Y é uma aplicação linear, então


T é contı́nua.

Demonstração. Uma vez que as topologias em X e em Y são decorrentes de métricas,


podemos usar o critério sequencial. Sejam x ∈ X um ponto qualquer e (xk )k∈N uma
sequência em X tal que xk → x. Daı́, é claro que a seqência x̂k := xk − x é tal que
x̂k → 0X . Como X tem dimensão finita, podemos fixar uma base {e1 , . . . , en }, e decompor
cada xk como

x̂k = αk1 e1 + αk2 e2 + . . . + αkn en ,

e como x̂k → 0X quando k → ∞, segue que αkj → 0 para cada j = 1, . . . , n. Como

T (x̂k ) = αk1 T (e1 ) + αk2 T (e2 ) + . . . + αkn T (ek ),

donde segue que T (x̂k ) → 0Y . Daı́, segue imediatamente que T (xk ) → T (x), e isso mostra
que T é uma aplicação contı́nua.

Sejam (X, || · ||X ) e (Y, || · ||Y ) espaços normados. Denotamos o espaço de operadores
lineares limitados T : X → Y por L(X, Y ). É fácil notar que L(X, Y ) é um espaço
vetorial com as operações:

(T + S)(x) := T (x) + S(x), e


(αT )(x) = αT (x),

para quaisquer x ∈ X e α ∈ K, onde T, S ∈ L(X, Y ). Mais ainda, podemos dotar L(X, Y )


de uma norma, como mostraremos a seguir.
2.4. OPERADORES LINEARES 41

Proposição 2.4.2. A função || · ||L(X,Y ) : L(X, Y ) → R dada por

||T ||L(X,Y ) = sup{||T x||Y : x ∈ BX }

é uma norma em L(X, Y ).


Demonstração. A única propriedade que não é imediata é a desigualdade triangular. Se
T, S ∈ L(X, Y ), então:

||T + S||L(X,Y ) = sup{||(T + S)(x)||Y : x ∈ BX } ≤ sup{||T x||Y + ||Sx||Y : x ∈ BX } ≤


≤ sup{||T x||Y : x ∈ BX } + sup{||Sx||Y : x ∈ BX } = ||T ||L(X,Y ) + ||S||L(X,Y ) ,

e isso conclui a prova.

A norma ||·||L(X,Y ) é comumente chamada de norma de operadores. Ao longo do texto,


sempre assumiremos que qualquer espaço de operadores lineares limitados está munido
com essa norma, salvo menção em contrário. Mais ainda, a menção ao espaço L(X, Y )
subentende que X e Y são espaços vetoriais normados sobre o mesmo corpo. O próximo
resultado garante que, para que L(X, Y ) seja completo, basta que Y seja completo.
Proposição 2.4.3. Se (Y, || · ||Y ) é completo, então L(X, Y ) é completo com a norma de
operadores.
Demonstração. Seja (Tn )n∈N uma sequência de Cauchy em L(X, Y ), e seja x ∈ X um
vetor não-nulo. Dado ε > 0, seja n0 ∈ N tal que ||Tn − Tm ||L(X,Y ) < ε/||x||X sempre que
n, m > n0 . Daı́, vale que

||Tn x − Tm x||Y ≤ ||Tn − Tm ||L(X,Y ) ||x||X < ε,

para quaisquer n, m > n0 . Segue que, para cada x ∈ X, a sequência (Tn x)nN é uma
sequência de Cauchy em Y (note que o caso x = 0X é trivial). Como Y é completo, existe
o limite

lim Tn x := T x,
n→∞

para cada x ∈ X. É claro que T é linear. Vamos mostrar que T ∈ L(X, Y ) e que
Tn converge para T na norma de operadores. Ainda usando o fato de que (Tn ) é uma
sequência de Cauchy, e usando também a continuidade da norma, temos que, para todo
x ∈ BX ,

||Tn x − T x||Y = lim ||Tn x − Tk x||Y < ε,


j→∞

se n > n0 . Segue daı́ que Tn − T ∈ L(X, Y ), donde escrevendo T = Tn − (Tn − T ) vem


que T ∈ L(X, Y ). Mais ainda, a desigualdade acima garante que ||Tn − T ||L(X,Y ) ≤ ε para
todo n > n0 . Isso mostra que Tn → T na norma de operadores.

Definição 2.4.2. Seja (X, || · ||X ) um K-espaço vetorial normado. Um funcional linear
em X é um operador linear f : X → K. Dizemos que f é um funcional linear limitado
se f é um operador limitado, onde estamos considerando a norma usual | · | (isto é, o
módulo) em K. O espaço dos funcionais lineares limitados em X é o espaço dual de X,
denotado por X ∗ . Em outras palavras,

X ∗ = L(X, K).
42 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS

Note que o espaço dual está naturalmente munido da norma de operadores:

||f ||X ∗ := ||f ||L(X,K) = sup{|f (x)| : x ∈ BX },

que, neste caso, também é denominada norma dual .


Como consequência imediata da Proposição 2.4.3 (e do fato de que K é completo) temos
que o espaço dual X ∗ de um espaço normado é sempre completo, ainda que (X, || · ||X )
não o seja.
Corolário 2.4.1. O dual de qualquer espaço normado é um espaço completo (com a
norma dual).
Definição 2.4.3. Um isomorfismo entre espaços normados X e Y é um operador linear
limitado e injetivo T : X → Y tal que o operador inverso T −1 : Y → X é limitado. Se
existe um isomorfismo entre X e Y , então dizemos que esses espaços são isomorfos. Um
operador linear que preserva a norma é uma isometria. Dois espaços de normados são
ditos isometricamente isomorfos se existe um isomorfismo entre eles que é uma isometria.

2.5 Exercı́cios
Exercı́cio 2.1. Dê um exemplo de um subespaço vetorial de um espaço vetorial de di-
mensão infinita que não é fechado.
Exercı́cio 2.2. Seja X um espaço vetorial de dimensão infinita.

(a) Mostre que se x ∈ X é um vetor não-nulo, então existe uma base de Hamel de X que
contém x.

(b) Mostre que se Y = {x1 , . . . , xn } é um subconjunto linearmente independente de X,


então existe uma base de Hamel de X que contém Y .
Exercı́cio 2.3. Prove que um operador linear T : X → Y entre espaços normados é
limitado se, e somente se para toda sequência (xj ) em X tal que xj → 0X vale que
T (xj ) → 0Y .
Exercı́cio 2.4. Demonstre que um operador linear entre espaços normados é contı́nuo
se, e somente se, é uniformemente contı́nuo (veja o Exercı́cio 1.21).
Exercı́cio 2.5. Seja X um espaço vetorial de dimensão finita

(a) Mostre que dim(X) = dim(X ∗ ).

(b) Construa um isomorfismo entre X e X ∗∗ := (X ∗ )∗ .


Exercı́cio 2.6. Seja P([0, 1]) o espaço vetorial de polinômios em R restritos ao intervalo
compacto [0, 1], e assuma que P([0, 1]) está munido da norma da convergência uniforme
de C([0, 1]), definida no Exemplo 2.1.3. Mostre que o operador derivada D : P([0, 1]) →
P([0, 1]) não é limitado.
Exercı́cio 2.7. Seja T ∈ L(X, Y ). Mostre que vale

||T x||Y ≤ ||T ||L(X,Y ) ||x||X

para qualquer x ∈ X.
2.5. EXERCÍCIOS 43

Exercı́cio 2.8. Mostre que se T ∈ L(X, Y ) e S ∈ L(Z, X), então, a composição T S é


um operador em L(Z, Y ), e prove também que vale a seguinte desigualdade:
||T S||L(Z,Y ) ≤ ||T ||L(X,Y ) ||S||L(Z,X) .
Exercı́cio 2.9. Seja T ∈ L(X, X) um operador limitado em um espaço normado (X, || ·
||X ). Mostre que a composição L(X, X) 3 S 7→ T ◦ S ∈ L(X, X) é contı́nua na norma de
L(X, X).
Exercı́cio 2.10. Assuma que (Tn )n∈N é uma sequência em L(X, X) que converge para
um operador T ∈ L(X, X), e suponha que (xn )n∈N é uma sequência em X que converge
para x ∈ X. Mostre que Tn xn → T x em X.
Exercı́cio 2.11. Prove que o núcleo de um operador limitado é sempre um subespaço
vetorial fechado do domı́nio. Em outras palavras, se T ∈ L(X, Y ), então ker(T ) é fechado
em X.
Exercı́cio 2.12. Seja T : `1 (N) → `1 (N) o operador que associa cada sequência (αj )j∈N
à sequência (αj /j)j∈N . Mostre que:

(a) T é linear, injetivo, e limitado.

(b) ||T ||L(`1 (N),`1 (N)) = 1.

(c) A imagem de T não é um subespaço fechado de `1 (N).

(d) O operador T −1 : imT → `1 (N) não é limitado.


Exercı́cio 2.13. Seja f : X → K uma aplicação linear. Mostre que f é limitada se, e
somente se, ker(f ) é fechado.
Exercı́cio 2.14. Seja (X, || · ||X ) um R-espaço vetorial normado. Dizemos que um vetor
x ∈ X é Birkhoff ortogonal a um vetor z ∈ X se ||x||X ≤ ||x + tz||X para todo t ∈ R.
Denotamos essa relação por x a z.

(a) Mostre que se x a z, então αx a βz para quaisquer α, β ∈ R.

(b) Demonstre a seguinte interpretação geométrica para o caso bi-dimensional: se dim(X) =


2, x é unitário, z 6= 0X , e x a z, então a bola unitária BX está inteiramente contida em
um dos semi-planos determinados pela reta que passa por x e tem direção z.

(c) Por meio de um exemplo, mostre que a ortogonalidade de Birkhoff não é necessaria-
mente simétrica.
Exercı́cio 2.15. Mostre que uma isometria sobrejetiva entre espaços normados é um
isomorfismo.
Exercı́cio 2.16. Seja (X, || · ||X ) um espaço normado. Mostre que T ∈ L(X, X) é um
isomorfismo se, e somente se, existe S ∈ L(X, X) tal que T S = ST = IdX .
Exercı́cio 2.17. Um espaço topológico (X, τ ) é dito localmente compacto se para todo
x ∈ X existem um aberto não-vazio U e um compacto (com a topologia induzida) K ⊆ X
tais que x ∈ U ⊆ K. Em outras palavras, X é localmente compacto se todo ponto admite
uma vizinhança contida em um compacto. Um subconjunto Y ⊆ X é dito localmente
compacto se é localmente compacto com a topologia induzida. Mostre que se (X, || · ||X ) é
um espaço normado de dimensão infinita, então X não contém subconjuntos localmente
compactos.
44 CAPÍTULO 2. ESPAÇOS NORMADOS
Capı́tulo 3

Espaços de Banach: parte I

3.1 Definição
Definição 3.1.1. Um espaço normado (X, || · ||) é um espaço de Banach se é completo
na métrica dada pela norma.

Note que, pelo Corolário 2.2.1 segue que todo espaço normado de dimensão finita é um
espaço de Banach. Entretanto, o mesmo não acontece para espaços de dimensão infinita.
Vamos estudar alguns exemplos.

Exemplo 3.1.1. Os espaços `p (N), 1 ≤ p < +∞ são Banach. Com efeito, seja (xn )n∈N uma
sequência de Cauchy em `p (N), onde denotaremos xn = (αjn )j∈N para cada n ∈ N. Da
desigualdade

|αjk − αjm | ≤ ||xk − xm ||p ,

que vale para quaisquer j, k, m ∈ N, seque que cada sequência (αjn )n∈N é uma sequência
de Cauchy em K (ou seja, os escalares da j-ésima posição de cada sequência formam uma
sequência convergente). Denote

αj = lim αjn ,
n→∞

para cada j ∈ N, onde o limite é tomado no módulo de K. Considere a sequência


x = (αj )jN . Para mostrar que x ∈ `p (N), lembre-se de que toda sequência de Cauchy é
limitada, e seja c ∈ R tal que ||xn ||p ≤ c para todo n ∈ N. Agora, note que para todos
N, n ∈ N vale que
N
!
X
|αjn |p ≤ ||xn ||pp ≤ cp .
j=1

Uma vez que a soma acima tem uma quantidade finita de termos, fazendo n → ∞ obtemos
N
!
X
p
|αj | ≤ cp ,
j=1

e essa desigualdade vale para todo N ∈ N. Daı́ segue que a série das p-ésimas potências
dos módulos das entradas de x converge, e assim temos x ∈ `p (N). Falta mostrar que

45
46 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

xn → x na norma de `p (N). Seja ε > 0 arbitrário. Existe n0 ∈ N tal que se k, m > n0 ,


então vale
N
!1/p
X
|αjm − αjk |p ≤ ||xm − xk ||p < ε
j=1

para qualquer N ∈ N. Uma vez que a primeira soma é finita, podemos fazer m → ∞ e
obter a desigualdade
N
X
|αjk − αj |p ≤ εp ,
j=1

para qualquer N ∈ N, se k > n0 . Assim, fazendo N → ∞, vem que a série à esquerda


acima converge para algum número menor ou igual a εp . Logo, obtemos

!1/p
X
||xk − x||p = |αjk − αj |p ≤ ε,
j=1

para todo k > n0 . Isso mostra que xn → x em `p (N).

Exemplo 3.1.2. O espaço `∞ (N) também é um espaço de Banach. Seja (xn )n∈N uma
sequência de Cauchy em `∞ (N), e continue denotando xn = (αjn )j∈N para todo n ∈ N.
Note que, fixando um j ∈ N, temos
|αjk − αjm | ≤ sup |αjk − αjm | = ||xk − xm ||∞ , (3.1.1)
j∈N

donde segue que cada sequência (αjn )n∈N converge. Escreva


αj = lim αjn ,
n→∞

para cada j ∈ N, e seja x = (αj )j∈N . Para mostrar que x ∈ `∞ (N), suponha o contrário.
Então existe uma subsequência (αjk )k∈N tal que αjk → ∞. se k → ∞. Para cara k ∈ N,
escolha n(k) ∈ N tal que
n(k)
|αjk − αjk | < 1.
n(k)
Daı́, é claro que αjk → ∞ se k → ∞. Mas então temos
n(k)
||xn(k) ||∞ ≥ |αjk | → ∞,
o que é uma contradição, pois toda sequência de Cauchy é limitada. Logo, temos de fato
que x ∈ `∞ (N). Finalmente, usando a desigualdade (3.1.1), temos que se ε > 0, então
existe n0 ∈ N tal que k, m ≥ n0 implicam
|αjk − αjm | ≤ ||xk − xm ||∞ < ε,
para todo j ∈ N. Fixando j ∈ N qualquer e fazendo m → ∞ acima, segue que
|αjk − αj | ≤ ε
para todo k > n0 . Consequentemente, uma vez que a desigualdade acima vale para
qualquer j ∈ N, temos que
||xk − x||∞ = sup |αjk − αj | ≤ ε
j∈N

para qualquer k > n0 . Segue que xk → x.


3.1. DEFINIÇÃO 47

Exemplo 3.1.3. Não provaremos isto agora, mas se X é um espaço topológico compacto,
então o espaço C(X) com a norma da convergência uniforme é um espaço de Banach (veja
o Exemplo 2.1.3).

Exemplo 3.1.4. Note que se X é um espaço vetorial sobre um corpo que não é completo,
então X pode não ser Banach mesmo sendo de dimensão finita. Considere, por exemplo, o
conjunto Q dos números racionais como um Q-espaço vetorial com a norma induzida de R.

Exemplo 3.1.5. O espaço vetorial de sequências convergentes


c = {(αj )j∈N ∈ KN : αj → α para algum α ∈ K}
é um espaço de Banach com a norma
||(αj )j∈N ||∞ = sup |αj |.
j∈N

Note que c é um subespaço vetorial de `∞ (N), e a norma que consideramos acima para
c é a norma induzida de `∞ (N). Vamos provar que c é Banach. Para isso, é suficiente
mostrar que c é fechado em `∞ (N). Seja xn = (αjn )j∈N uma sequência em c tal que
xn → x = (βj )j∈N em `∞ (N), e assuma que
lim αjn = αn ,
j→∞

para cada n ∈ N. Vamos mostrar que (αn )n∈N é uma sequência de Cauchy em K. Note
que
|αn − αm | = |αn − αjn + αjn − αjm + αjm − αm | ≤ |αn − αjn | + |αjn − αjm | + |αjm − αm | ≤
≤ |αn − αjn | + ||xn − xm ||∞ + |αjm − αm |.
Dado ε > 0, escolhemos j suficientemente grande de modo que tenhamos as desigualdades
|αn − αjn | < ε/3 e |αjm − αm | < ε/3. Assim, uma vez que toda sequência convergente é
de Cauchy, tomamos n0 tal que n, m > n0 implica ||xn − xm ||∞ < ε/3. Segue que, se
n, m > n0 , então
|αn − αm | < ε.
Assim, (αn ) é uma sequência de Cauchy em K, e portanto podemos assumir que
lim αn = α.
n→∞

Vamos mostrar que βj → α. Com efeito, note que


|βj − α| ≤ |βj − αk | + |αk − α| ≤ |βj − αjk | + |αjk − αk | + |αk − α| ≤
≤ ||x − xk ||∞ + |αjk − αk | + |αk − α|.
Daı́, tomamos k suficientemente grande de modo que ||x − xk ||∞ < ε/3 e |αk − α| < ε/3.
Segue que se j é suficientemente grande tal que |αjk − αk | < ε/3, então temos

|βj − α| < ε.
Isso mostra que βj → α, e portanto x ∈ c. Note cuidadosamente que esse raciocı́nio
também mostra que o subespaço vetorial
c0 = {(αj )j∈N ∈ KN : αj → 0}
48 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

de sequências de c que convergem para 0 também é um espaço de Banach com a métrica


induzida de `∞ (N). Com efeito, mostramos que se (xn ) é uma sequência em c que converge
para x em `∞ (N), e tal que para cada n ∈ N as entradas da sequência xn convergem para
αn , então a sequência (αn )n∈N converge para algum α ∈ K, e as entradas de x convergem
para α. Se (xn ) é uma sequência em c0 , então αn = 0 para todo n ∈ N, donde α = 0.
Para encerrar essa seção, vamos introduzir a noção de completamento de espaços
normados. O próximo teorema pode ser obtido como consequência da noção mais geral
de completamento para espaços métricos, mas não seguiremos essa estratégia. Ao invés
disso, apresentaremos uma demonstração mais adiante, usando a identificação de um
espaço normado com um subconjunto de seu bi-dual.

Teorema 3.1.1. Seja (X, || · ||X ) um espaço normado. Então, X é isomorfo a um su-
bespaço denso de um espaço de Banach (Y, || · ||Y ). O espaço (Y, || · ||Y ) é chamado de
completamento de (X, || · ||X ). Mais ainda, dois completamentos quaisquer de (X, || · ||X )
são isomorfos.

3.2 O teorema de Hahn-Banach


Esta seção será dedicada a discutir o teorema de Hahn-Banach em algumas de suas di-
versas formas. Vamos começar por uma definição que será importante.

Definição 3.2.1. Seja X um espaço vetorial. Uma função p : X → R que satisfaz

p(λx) = λp(x), e
p(x + y) ≤ p(x) + p(y)

para quaisquer x, y ∈ X e λ > 0 é um funcional sublinear .

Observação 3.2.1. Note que toda norma é um funcional sublinear. Além disso, da primeira
condição temos que p(0X ) = 0.

Teorema 3.2.1 (Hahn-Banach Real). Seja p : X → R um funcional sublinear. Seja


Y ⊆ X um subespaço vetorial, e assuma que g : Y → R é um funcional linear tal que

g(y) ≤ p(y),

para todo y ∈ Y . Em outras palavras, g é dominado por p. Então, existe um funcional


linear f : X → R tal que

i. (f é uma extensão de g) f (y) = g(y) para todo y ∈ Y , e

ii. (f é dominado por p) f (x) ≤ p(x) para todo x ∈ X.

Demonstração. Denote por P a coleção de todos os funcionais lineares h : Z → R que


têm as seguintes propriedades:

(a) Z é um subespaço de X que contém Y ,

(b) h estende g, isto é, h(y) = g(y) para todo y ∈ Y , e

(c) h é dominado por p, ou seja, h(z) ≤ p(z) para todo z ∈ Z.


3.2. O TEOREMA DE HAHN-BANACH 49

Em outras palavras, P é a coleção de todas as extensões de g dominadas por p a subespaços


que contém Y . Note que a coleção P é não-vazia, uma vez que g ∈ P. Dotamos P da
seguinte ordenação parcial: dados funcionais h1 : Z1 → R e h2 : Z2 → R em P, escrevemos
h1 v h2 se Z1 ⊆ Z2 e h2 é uma extensão de h1 .
Com essa ordenação parcial, vamos mostrar que todo subconjunto totalmente ordenado
de P tem limite superior. Com efeito, se Q é uma subcoleção totalmente ordenada, então
definimos
[
Z= Zλ ,
λ∈L

onde {Zλ : λ ∈ L} denota a famı́lia de todos os domı́nios dos funcionais em Q, e definimos


também h : Z → R pondo
h(z) = hλ (z),
sempre que z ∈ Zλ . É claro que Z é um subespaço vetorial de X (uma vez que é fechado
para soma e multiplicação por escalares). Para verificar que h está bem-definido, note que
se z ∈ Zλ1 ∩ Zλ2 , então podemos afirmar sem perda de generalidade que Zλ1 ⊆ Zλ2 e que
hλ2 estende hλ1 . Daı́, hλ2 (z) = hλ1 (z), e isso mostra que hλ (z) tem o mesmo valor para
qualquer λ ∈ L tal que z ∈ Zλ . Para demonstrar que h é linear, note que dados z, w ∈ Z
existe λ ∈ L tal que z, w ∈ Zλ (do contrário haveria dois funcionais não-comparáveis em
Q). Assim, para qualquer α ∈ R temos
h(z + αw) = hλ (z + αw) = hλ (z) + αhλ (w) = h(z) + αh(w).
Segue que h ∈ P. Mais ainda, é claro que h é um limite superior para Q, donde temos
que todo subconjunto totalmente ordenado de P admite um limite superior. Pelo Lema
de Zorn (Lema 2.3.4) vem que P tem um elemento maximal, que chamaremos de f . Uma
vez que f ∈ P, temos que f é um funcional linear que estende g e que é dominado por p,
donde basta mostrar que o domı́nio de f é X.
Denote o domı́nio de f por W , e assuma que W 6= X. Daı́, tome x0 ∈ X \ W . Note
que, como f é um funcional linear dominado por p, valem as desigualdades
f (x) + f (y) = f (x + y) ≤ p(x + y) = p(x − x0 + x0 + y) ≤ p(x − x0 ) + p(y + x0 ),
para quaisquer x, y ∈ W . Segue imediatamente que
f (x) − p(x − x0 ) ≤ p(y + x0 ) − f (y).
para todos x, y ∈ W . Consequentemente, o supremo da expressão à esquerda tomado para
x ∈ W é menor ou igual ao ı́nfimo da expressào à direita com y ∈ W . Assim, podemos
escolher um número β ∈ R tal que
sup{f (x) − p(x − x0 ) : x ∈ W } ≤ β ≤ inf{p(y + x0 ) − f (y) : y ∈ W }.
Agora, definimos W0 = span(W ∪ {x0 }) = {w + tx0 : w ∈ W e t ∈ R} e o funcional linear
f0 : W0 → R dado por
f0 (w + tx0 ) = f (w) + tβ,
para cada w ∈ W e t ∈ R. Vamos mostrar que f0 ∈ P. É claro que f0 é uma extensão
de f , e como f é uma extensão de g, temos que f0 também é uma extensão de g. Além
disso, para quaisquer w ∈ W e t > 0 vale que
f0 (w + tβ) = f (w) + tβ ≤ f (w) + t inf{p(y + x0 ) − f (y) : y ∈ W } ≤
 w   w 
≤ f (w) + t p + x0 − f = p(w + tx0 ),
t t
50 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

e se t < 0, então,

f0 (w + tx0 ) = f (w) + tβ ≤ f (w) + t sup{f (x) − p(x − x0 ) : x ∈ W } ≤


  w  w   w 
≤ f (w) + t f − − p − − x0 = −tp − − x0 = p(w + tx0 ).
t t t
Mais ainda, se t = 0, então f0 (w) = f (w) ≤ p(w), onde lembramos de que f ∈ P. Segue
que f0 é um funcional linear dominado por p, donde f0 ∈ P. Da definição de f0 segue
que f v f0 , e isso contradiz a maximalidade de f em P. Logo, W = X e f é a extensão
procurada.

Observação 3.2.2. Observe que o enunciado do Teorema de Hahn-Banach não faz menção
à uma norma em X. Em particular, os funcionais lineares envolvidos não são necessaria-
mente limitados. Além disso, o teorema de Hahn-Banach é um resultado de existência,
e a unicidade não é garantida (veja o Exercı́cio 3.14). Em alguns momentos, chamaremos
uma extensão dada pelo teorema de Hahn-Banach de extensão de Hahn-Banach.
Mencionamos que a extensão de Hahn-Banach não é necessariamente um funcional
limitado. Entretanto, vamos mostrar que todo funcional linear limitado em um subespaço
Y ⊆ X admite uma extensão a X que preserva a norma (e portanto é limitada). No que
segue, observe que no caso real vale

||f ||X ∗ = sup{f (x) : x ∈ BX }.

Corolário 3.2.1. Sejam (X, || · ||) um R-espaço vetorial normado, e Y um subespaço


vetorial de X munido da norma induzida. Se g ∈ Y ∗ , então existe uma extensão f ∈ X ∗
de g tal que ||f ||X ∗ = ||g||Y ∗ .

Demonstração. Considere o funcional p : X → R dado por

p(x) = ||g||Y ∗ ||x||.

É fácil notar que p é sublinear. Pelo Teorema 3.2.1 segue que existe uma extensão f :
X → R de g que é dominada por p. Assim, para todo x ∈ BX temos

f (x) ≤ p(x) = ||g||Y ∗ ||x|| = ||g||Y ∗ ,

e daı́ vem imediatamente que ||f ||X ∗ ≤ ||g||Y ∗ . Para mostrar a desigualdade inversa, basta
lembrar que BY = BX ∩ Y ⊆ BX e escrever

||f ||X ∗ = sup{|f (x)| : x ∈ BX } ≥ sup{|f (x)| : x ∈ BX ∩ Y } =


= sup{|g(x)| : x ∈ BY } = ||g||Y ∗ ,

onde a segunda igualdade se justifica pois f é uma extensão de g.

Vamos prosseguir para a interpretação geométrica do teorema de Hahn-Banach. Em


Álgebra Linear, é comum descrever hiperplanos por meio de um produto interno, e pela
identificação de Riesz, o produto interno também pode ser usado para descrever funcionais
lineares. Aqui, uma vez que não dispomos de um produto interno, usamos essa inspiração
para descrever hiperplanos por meio de funcionais lineares.
3.2. O TEOREMA DE HAHN-BANACH 51

Definição 3.2.2. Um hiperplano afim (ou apenas hiperplano) em um espaço normado


(X, || · ||) é um conjunto da forma

h(f, α) = {x ∈ X : f (x) = α},

onde f : X → R é um funcional linear, e α ∈ R. Cada hiperplano define dois semi-espaços


fechados, que são os conjuntos

h+ (f, α) = {x ∈ X : f (x) ≥ α}, e


h− (f, α) = {x ∈ X : f (x) ≤ α}.

Por continuidade, temos que se f ∈ X ∗ , então o hiperplano h(f, α) é um subconjunto


fechado de X, uma vez que é a pré-imagem de um fechado da reta (a volta também vale,
como veremos a seguir). Pela mesma razão, os subespaços fechados associados a h(f, α)
também são subconjuntos fechados de X. Além disso, note que h(f, 0) = ker(f ) para
qualquer f ∈ X ∗ .
Proposição 3.2.1. Sejam f : X → R um funcional linear, e α ∈ R. Se o hiperplano
h(f, α) é um subespaço fechado de X, então f é limitado.
Demonstração. Se h(f, α) é fechado, então seu complementar hc é aberto. Tome x0 ∈ hc
e suponha que f (x0 ) < α (caso contrário, bastaria mudar o sinal de x0 ). Seja ρ > 0
tal que a bola aberta B(x0 , ρ) está contida em hc . Afirmamos que f (x) < α para todo
x ∈ B(x0 , ρ). Com efeito, se existe y ∈ B(x0 , ρ) tal que f (y) > α, então o segmento de
reta

{(1 − t)x0 + tx1 : t ∈ [0, 1]} ⊆ B(x0 , ρ)

contém algum ponto z tal que f (z) = α. De fato, basta tomar


f (x1 ) − α
t= .
f (x1 ) − f (x0 )
Isso é uma contradição com o fato de que B(x0 , ρ) ⊆ hc . Como consequência do fato de
que f (x) < α para todo x ∈ B(x0 , ρ) segue que para qualquer x ∈ BX vale que

f (x0 + ρx) < α,

donde vem que


α − f (x0 )
f (x) <
ρ
para todo x ∈ BX . Isso mostra que f é limitado.

Observação 3.2.3. Compare essa proposição com o Exercı́cio 2.13.


Definição 3.2.3. Dizemos que um hiperplano h(f, α) separa dois subconjuntos A, B ⊆ X
se A ⊆ h+ (f, α) e B ⊆ h− (f, α), ou o contrário. Além disso, dizemos que h(f, α) separa
estritamente os conjuntos A e B se existe ε > 0 tal que A ⊆ h+ (f, α+ε) e B ⊆ h− (f, α−ε),
ou vice-versa.
Teorema 3.2.2 (Hahn-Banach Geométrico). Se A, B ⊆ X são convexos não-vazios tais
que A ∩ B = ∅, e se um deles é aberto, então existe um hiperplano fechado que separa A
e B.
52 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

Demonstração. Seja K ⊆ um aberto convexo com 0X ∈ K. Lembre-se de que definimos


o funcional de Minkowski de K como

pK (x) = inf{λ > 0 : x ∈ λK},

para cada x ∈ X. É fácil notar que pK é um funcional sublinear (não-negativo). Além


disso, note que existe uma constante β ∈ R tal que

pK (x) ≤ β||x|| (3.2.1)

para todo x ∈ X. Com efeito, como K é aberto e contém a origem, existe β > 0 tal que
 
1 x
BX = : x ∈ BX ⊆ K.
β β
Se x 6= 0, então é claro que
x 1
∈ BX (⊆ K),
β||x|| β
e assim
 
x
pK ≤ 1.
β||x||
Como pK é um funcional sublinear, vem imediatamente que pK (x) ≤ β||x||. Se x = 0 a
desigualdade é trivial.
Mais ainda, vale que

K = {x ∈ X : pK (x) < 1}. (3.2.2)

A inclusão K ⊆ {x ∈ X : pK (x) ≤ 1} é óbvia, e foi usada acima. Como K é aberto, vem


que se x ∈ K, então λx ∈ K para algum λ < 1, donde de fato temos K ⊆ {x ∈ X :
pK (x) < 1}. Por outro lado, uma vez que 0X ∈ K, temos que se α < λ, então αK ⊆ λK.
Logo, se pK (x) = α < 1, então x ∈ αK ⊆ K.
Agora, seja K = A − B := {x − y : x ∈ A e y ∈ B}. Note que 0X ∈ / K, uma vez
que A ∩ B = ∅. Tomando um ponto −x0 ∈ K, segue que K0 = K + {x0 } é um conjunto
convexo, aberto, e que contém a origem. Além disso, note cuidadosamente que x0 ∈ / K0 ,
uma vez que K não contém a origem, e assim segue de (3.2.2) que

pK0 (x0 ) ≥ 1.

Agora, seja Y = span{x0 } e defina o funcional linear g : Y → R pondo g(tx0 ) = t para


cada t ∈ R. Se t ≥ 0, então

g(tx0 ) = t ≤ tpK0 (x0 ) = pK0 (tx0 ),

e se t < 0, então

g(tx0 ) = t < 0 ≤ pK0 (tx0 ),

onde lembramos que o funcional de Minkowski é sempre não-negativo. Segue que g(y) ≤
pK0 (y) para todo y ∈ Y . Pelo Teorema de Hahn-Banach, existe um funcional linear
f : X → R que estende g e é dominado por pK0 . Assim, vale que f (x0 ) = g(x0 ) = 1, e
para todo x ∈ X temos

f (x) ≤ pK0 (x) ≤ β||x||,


3.2. O TEOREMA DE HAHN-BANACH 53

onde β ∈ R é uma constante dada como em (3.2.1), e daı́ vem que f é limitado. Agora,
se x ∈ A e y ∈ B, então z = x − y + x0 ∈ K0 , e vem de (3.2.2) que pK0 (z) < 1.
Consequentemente,

1 > pK0 (z) ≥ f (z) = f (x) − f (y) + 1,

e assim temos que f (x) < f (y) para quaisquer x ∈ A e y ∈ B. Tomando α ∈ R tal que

sup{f (x) : x ∈ A} ≤ α ≤ inf{f (y) : y ∈ B}

segue que h(f, α) é um hiperplano fechado que separa A e B.

O leitor deve notar que, até aqui, apenas trabalhamos com espaços vetoriais sobre
R. Entretanto, para algumas aplicações posteriores é importante conseguirmos extensões
de funcionais em espaços sobre C. Se X é um espaço vetorial sobre C, então X é um
espaço vetorial sobre R se restringirmos a multiplicação por escalares a R. Denotaremos
esse R-espaço vetorial por XR . É claro que uma norma em X induz uma norma em XR ,
uma vez que a condição de homogeneidade vale para todos os complexos, e portanto vale
também para os reais.
Desta forma, se (X, || · ||) é um espaço vetorial complexo normado, então (XR , || · ||)
é um espaço vetorial real normado, e o seu dual será denotado por XR∗ . No que segue,
adotaremos a notação z = Rez +iImz para a decomposição usual de um número complexo
z ∈ C em parte real e parte imaginária.
Lema 3.2.1. Seja (X, || · ||) um espaço vetorial complexo. Se f ∈ X ∗ , então Re(f ) ∈ XR∗ .
Mais ainda, a aplicação I : X ∗ → XR∗ dada por

I(f ) = Re(f )

é uma isometria R-linear bijetiva.


Observação 3.2.4. Note que X ∗ é um C-espaço vetorial, mas XR∗ é um R-espaço veto-
rial. Uma aplicação R-linear é uma aplicação que preserva a soma e a multiplicação por
escalares reais.
Demonstração. Consideramos Re(f ) como um funcional sobre um espaço vetorial real.
Assim, para verificar a linearidade de Re(f ), sejam x, y ∈ X e α ∈ R. Daı́,

Re(f )(x + αy) + iIm(f )(x + αy) = f (x + αy) = f (x) + αf (y) =


= Re(f (x)) + iIm(f (x)) + α(Re(f (y)) + iIm(f (y))) =
= [Re(f )(x) + αRe(f )(y))] + i[Im(f )(x) + αIm(f )(y)],

onde notamos que, como α ∈ R, os colchetes acima separam a parte real da parte ima-
ginária. Segue que Re(f )(x + αy) = Re(f )(x) + αRe(f )(y), e portanto Re(f ) é linear.
Observe também que a R-linearidade de I é imediata. Vamos agora mostrar que Re(f ) é
limitado. Para isso, note que BX = BXR , e daı́, se x ∈ BXR , então

|Re(f )(x)| ≤ |f (x)| ≤ ||f ||X ∗ .

Mais do que mostrar que Re(f ) é um funcional limitado sobre XR , essa desigualdade
também mostra que

||I(f )||XR∗ = ||Re(f )||XR∗ = sup{|Re(f )(x)| : x ∈ BXR } ≤ ||f ||X ∗ ,


54 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

para qualquer f ∈ X ∗ . Isso mostra que I ∈ L(X ∗ , XR∗ ).


Para a injetividade de I, assuma que f ∈ X ∗ é tal que Re(f ) = 0XR∗ , isto é, Re(f )(x) =
0 para todo x ∈ XR . Em particular, Re(f )(ix) = 0 para todo x ∈ X (lembre-se de que
XR é o mesmo conjunto que X, a diferença está nas estruturas consideradas em cada um).
Como sempre vale que −Im(f )(x) = Re(f )(ix), temos −Im(f )(x) = 0 para todo x ∈ X.
Segue que f (x) = 0 para todo x ∈ X, donde f = 0X ∗ . Portanto, ker(I) = {0X ∗ }, e isso
significa que I é injetiva.
Vamos mostrar agora que I é sobrejetiva. Se g ∈ XR∗ , então ponha

f (x) = g(x) − ig(ix) : X → C.

É claro que f preserva a soma em X. Assim, para verificar que f é linear em X, basta
mostrar que f preserva a multiplicação por escalares de C. Para isso, dados λ = α+iβ ∈ C
e x ∈ X, temos

f (λx) = g(λx) − ig(iλx) = g(αx + iβx) − ig(iαx − βx) =


= g(αx) + g(iβx) − ig(iαx) + ig(βx) = αg(x) + βg(ix) − iαg(ix) + iβg(x) =
= (α + iβ)g(x) − (α + iβ)ig(ix) = λ(g(x) − ig(ix)) = λf (x),

onde usamos o fato de que g preserva a multiplicação (apenas) por escalares reais. Agora,
perceba que para cada x ∈ BX vale que ix ∈ BX , e daı́ temos |f (x)|C ≤ |g(x)|R +|g(ix)|R ≤
2||g||XR∗ , onde notamos, mais uma vez, que X = XR (como conjuntos). Segue que f ∈ X ∗ ,
e como é claro que Re(f ) = g, temos que I é de fato sobrejetiva.
Falta apenas mostrar que I é uma isometria, e já temos a desigualdade ||I(f )||XR∗ ≤
||f ||X ∗ para qualquer f ∈ X ∗ . Assuma que f ∈ X ∗ e x ∈ X são tais que f (x) 6= 0. Denote
g = I(f ) e seja

f (x)
λ= ∈ C.
|f (x)|

Daı́,
 
1 x x ix x
|f (x)| = f (x) = f =g − ig =g ,
λ λ λ λ λ

onde a última igualdade se justifica pois |f (x)| ∈ R e g assume valores reais. Assim, segue
que
 x  x
|f (x)| = g ≤ ||g||XR∗ = ||g||XR∗ ||x|| = ||I(f )||XR∗ ||x||,

λ λ
e daı́ vem que ||f ||X ∗ ≤ ||I(f )||XR∗ . Isso conclui a prova.

Proposição 3.2.2. Seja (X, || · ||) um espaço normado complexo, e seja Y ⊆ X um


subespaço vetorial complexo de X. Se g ∈ Y ∗ , então existe uma extensão f ∈ X ∗ de g tal
que ||f ||X ∗ = ||g||Y ∗ .

Demonstração. Sejam IY : Y ∗ → YR∗ e IX : X ∗ → XR∗ as isometrias bijetivas dadas como


na proposição anterior. Se g ∈ Y ∗ , então seja ϕ ∈ XR∗ uma extensão de IY (g) tal que
||ϕ||XR∗ = ||IY (g)||YR∗ , cuja existência é garantida pelo Corolário 3.2.1. A extensão de g
−1
procurada é f = IX (ϕ).
3.3. OUTROS TEOREMAS IMPORTANTES 55

3.3 Outros teoremas importantes


Nesta seção, iremos enunciar e demonstrar três ferramentas importantes no estudo dos
espaços de Banach: o princı́pio da limitação uniforme, o teorema da aplicação aberta, e o
teorema do gráfico fechado. Nesta seção, salvo menção em contrário, todos os espaços ve-
toriais são considerados sobre K = R ou C. Para começar, precisaremos de um conhecido
resultado de topologia de espaços métricos.

Teorema 3.3.1 (Teorema de Baire). Seja (X, d) um espaço métrico completo, e seja
(Yn )n∈N uma sequência de subconjuntos tal que Yn é aberto e denso para cada n ∈ N.
Então, o conjunto

\
Z= Yj
j=1

é denso.

Demonstração. Seja U um aberto não-vazio qualquer de X. Vamos mostrar que U ∩Z 6= ∅.


Primeiro, fixe x0 ∈ U e ρ0 > 0 tal que cl(B(x0 , ρ0 )) ⊆ U . Como Y1 é aberto e denso, tome
x1 ∈ B(x0 , ρ0 ) ∩ Y1 e ρ1 > 0 tal que cl(B(x1 , ρ1 )) ⊆ B(x0 , ρ0 ) ∩ Y1 . Assuma também que
ρ1 < ρ0 /2. Repetindo o argumento, podemos tomar x2 ∈ B(x1 , ρ1 ) ∩ Y2 e 0 < ρ2 < ρ1 /2
tais que cl(B(x2 , ρ2 )) ⊆ B(x1 , ρ1 )∩Y2 . Prosseguindo indutivamente, temos uma sequência
(xn )n∈N em X e uma sequência (ρn )n∈N em R tais que

cl(B(xn+1 , ρn+1 )) ⊆ B(xn , ρn ) ∩ Yn+1 , e 0 < ρn+1 < ρn /2

para cada n ∈ N. Note que, para quaisquer m > n, temos


m−1 m−1 ∞
X X X ρ0
d(xn , xm ) ≤ d(xj , xj+1 ) ≤ ρj ≤ →0
j=n+1 j=n+1 j=n+1
2j

se n → ∞. Daı́, segue que (xn )n∈N é um sequência de Cauchy. Como (X, d) é completo,
temos que xn → x para algum x ∈ X. Agora, note que xm ∈ B(xn , ρn ) para todo n ≥ m.
Assim, x ∈ cl(B(xn , ρn )) para qualquer n ≥ 0. Como cl(B(xn , ρn )) ⊆ Yn temos que x ∈ Z.
Além disso, é claro que x ∈ U . Isso mostra que todo aberto U de X tem algum ponto de
Z, donde Z é denso.

A seguir, enunciamos dois corolários que são algumas vezes apresentados como o te-
orema de Baire. Suas demonstrações são imediatas, e omitiremos os detalhes. Para o
primeiro deles, note que Y ⊆ X é denso se, e somente se, int(X \ Y ) = ∅.

Corolário 3.3.1. Seja (X, d) um espaço métrico completo, e seja (Xn )n∈N uma sequência
de subconjuntos de fechados de X tal que int(Xn ) = ∅ para todo n ∈ N. Então,

!
[
int Xj = ∅
j=1

Corolário 3.3.2. Se uma sequência (Xn )n∈N de fechados de um espaço métrico completo
(X, d) é tal que sua união tem interior não-vazio, então existe n0 ∈ N tal que Xn0 tem
interior não-vazio.
56 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

Teorema 3.3.2 (Princı́pio da limitação uniforme). Sejam (X, ||·||X ) um espaço de Banach
e (Y, || · ||Y ) um espaço normado. Também, seja {Tj }j∈L uma famı́lia de operadores em
L(X, Y ). Assuma que

sup{||Tj x||Y : j ∈ L} < ∞

para cada x ∈ X. Então, vale que

sup{||Tj ||L(X,Y ) : j ∈ L} < ∞.

Em outras palavras, existe uma constante c ∈ R tal que ||Tj x||Y ≤ c||x||X para quaisquer
j ∈ L e x ∈ X.

Demonstração. Para cada n ∈ N, seja

Xn = {x ∈ X : ||Tj x||Y ≤ n para todo j ∈ L}.

Por continuidade, cada conjunto Xn é fechado em X. Além disso,



[
Xj = X.
j=1

Com efeito, se x ∈ X, então pondo c = sup{||Tj x||Y : j ∈ L} segue que x ∈ Xn se n > c.


Segue do Corolário 3.3.2 que existe n0 ∈ N tal que intXn0 6= ∅. Assim, podemos tomar
x0 ∈ X e ρ > 0 tais que a bola fechada x0 + ρBX ⊆ Xn0 . Segue que para todo x ∈ BX e
para todo j ∈ L, temos

||Tj (x0 + ρx)||Y ≤ n0 .

Segue da desigualdade triangular e da linearidade de cada Tj que

n0 + ||Tj x0 ||Y n0 + supj∈L ||Tj x0 ||Y


||Tj x||Y ≤ ≤
ρ ρ

para quaisquer j ∈ L e x ∈ BX . Daı́,

n0 + supj∈L ||Tj x0 ||Y


||Tj ||L(X,Y ) ≤ ,
ρ

para todo j ∈ L. Isso conclui a prova.

Observação 3.3.1. Note que o teorema vale para qualquer famı́lia de operadores. Em
particular, não precisamos assumir enumerabilidade.

Corolário 3.3.3. Sejam (X, || · ||X ) um espaço de Banach, e Z ⊆ X um subconjunto. Se


para todo f ∈ X ∗ vale que a imagem

f (Z) = {f (z) : z ∈ Z}

é limitada em K (com respeito à métrica dada pelo módulo), então Z é limitado em X.


3.3. OUTROS TEOREMAS IMPORTANTES 57

Demonstração. Para cada z ∈ Z, defina o funcional linear Tz : X ∗ → R por

Tz (f ) = f (z).

Note que Tz ∈ L(X ∗ , R). De fato,

|Tz (f )| = |f (z)| ≤ ||f ||X ∗ ||z||X ,

donde |Tz (f )| ≤ ||z||X para qualquer f ∈ BX ∗ (lembre-se de que z está fixo na definição
de Tz ). Agora, para qualquer f ∈ X ∗ , note que

sup{|Tz (f )| : z ∈ Z} = sup{|f (z)| : z ∈ Z} < ∞,

uma vez que f (Z) é limitado em K. Segue que podemos aplicar o princı́pio da limitação
uniforme para a famı́lia (Tz )z∈Z : existe c ∈ R tal que

|f (z)| = |Tz (f )| ≤ c||f ||X ∗ (3.3.1)

para quaisquer z ∈ Z e f ∈ X ∗ . Dado um vetor não-nulo z ∈ Z, sejam z0 = z/||z||X e f0


o funcional dado como no ı́tem (a) do Exercı́cio 3.13, isto é, tal que

||f0 ||X ∗ = f0 (z0 ) = 1,

donde vem que f0 (z) = ||z||X . Daı́, aplicando a desigualdade (3.3.1) para f0 e z, temos

||z||X = |f0 (z)| ≤ c||f0 ||X ∗ = c,

e isso mostra que Z é limitado, uma vez que o lado direito da desigualdade acima não
depende do vetor z ∈ Z considerado.

No que segue, lembre-se de que denotamos por BE (p, r) a bola aberta de centro em
p ∈ E e raio r > 0 no espaço normado (E, || · ||E ). A bola unitária (fechada) de E é
denotada por BE . Lembre-se, também, de que para A, B ⊆ E e α ∈ K, denotamos

A + B = {a + b : a ∈ A e b ∈ B}, e
αA = {αa : a ∈ A}.

Necessitaremos de dois lemas técnicos antes de prosseguir para o próximo teorema. O


primeiro deles trata de algumas propriedades das operações descritas acima, e o segundo
afirma que o fecho de um conjunto convexo é convexo.

Lema 3.3.1. Sejam (X, || · ||) um espaço normado, e A ⊆ X um subconjunto. Então,


valem

i. αBX (x, ρ) = BX (αx, |α|ρ) para quaisquer x ∈ X, α ∈ K não-nulo, e ρ > 0. Conse-


quentemente, int(αA) = αint(A)

ii. cl(αA) = αcl(A).

iii. Se K ⊆ X é convexo, e se α, β > 0, então αK + βK = (α + β)K.


58 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

Demonstração. Se y ∈ BX (x, ρ), então ||αx − αy|| < |α|ρ, donde αy ∈ BX (αx, |α|ρ),
e daı́ vem a inclusão αBX (x, ρ) ⊆ BX (x, |α|ρ). Agora, seja y ∈ BX (αx, |α|ρ). Como
||αx − y|| < |α|ρ, vem imediatamente que y/α ∈ BX (x, ρ), e portanto y ∈ αBX (x, ρ).
Segue que BX (αx, ρ|α|) ⊆ αBX (x, ρ). O fato de que int(αA) = αint(A) vem como
consequência imediata.
Para mostrar que cl(αA) = αcl(A), basta notar que xn → x em X se, e somente se,
αxn → αx em X.
Agora, se K ⊆ X é convexo, então a inclusão (α + β)K ⊆ αK + βK é imediata. De
fato, se x ∈ K, então basta escrever

(α + β)K 3 (α + β)x = αx + βx ∈ αK + βK.

Para a outra inclusão, se x, y ∈ K, então pondo t = β/(α + β), temos

αx + βy = (α + β)[(1 − t)x + ty] ∈ (α + β)K,

uma vez que o segmento {(1 − t)x + ty : t ∈ [0, 1]} está contido em K.

Lema 3.3.2. Seja K um subconjunto convexo de um espaço vetorial X, e seja T : X → Y


uma aplicação linear de X em um espaço vetorial Y . Então, a imagem T (K) é convexa.
Mais ainda, o fecho de K com respeito a uma norma qualquer em X é convexo.
Demonstração. Se x, y ∈ K e t ∈ [0, 1], temos (1 − t)T (x) + tT (y) = T ((1 − t)x + ty) ∈
T (K), uma vez que (1−t)x+ty ∈ K. Isso mostra a convexidade de T (K). Agora, assuma
que || · || é uma norma fixada em X. Se x, y ∈ cl(K), então podemos tomar sequências
(xn )n∈N e (yn )n∈N em K tais que xn → x e yn → y. Para quaisquer t ∈ [0, 1] e n ∈ N,
temos que (1 − t)xn + tyn é um ponto de K. Mais ainda,

||(1 − t)x + ty − [(1 − t)xn + tyn ]|| ≤ (1 − t)||x − xn || + t||y − yn ||,

e portanto, para cada t ∈ [0, 1] fixado, a sequência (1−t)xn +tyn converge para (1−t)x+ty.
Logo, (1 − t)x + ty ∈ cl(K)

Observação 3.3.2. Veja também o Exercı́cio 3.17.


Teorema 3.3.3 (Teorema da aplicação aberta). Sejam (X, || · ||X ) e (Y, || · ||Y ) espaços
de Banach, e seja T ∈ L(X, Y ) um operador sobrejetivo. Então, existe c > 0 tal que

BY (0Y , c) ⊆ T (BX (0X , 1)).

Demonstração. Vamos começar mostrando que existe c > 0 tal que

BY (0Y , 2c) ⊆ cl(T (BX (0X , 1))).

Para isso, note que, como T é sobrejetiva, temos



[ ∞
[ ∞
[
Y = T (BX (0X , n)) = nT (BX (0X , 1)) ⊆ cl(nT (BX , (0X , 1))) ⊆ Y.
n=1 n=1 n=1

Na última inclusão todos os conjuntos envolvidos são fechados, e portanto segue do teo-
rema de Baire que o interior de algum deles é não-vazio. Do Lema 3.3.1 vem que

int(cl(T (BX (0X , 1)))) 6= ∅.


3.3. OUTROS TEOREMAS IMPORTANTES 59

Assim, podemos tomar y0 ∈ Y e c > 0 tais que BY (y0 , 4c) ⊆ cl(T (BX (0X , 1)). Pela
simetria da bola, segue que −y0 ∈ cl(T (BX (0X , 1))). Se z ∈ BY (0Y , 4c), então y0 + z ∈
BY (y0 , 4c) ⊆ cl(T (BX (0X , 1))), de sorte que podemos escrever
z = (y0 + z) − y0 ,
como a soma de dois vetores de cl(T (BX (0X , 1))). Logo,
BY (0Y , 4c) ⊆ cl(T (BX (0X , 1))) + cl(T (BX (0X , 1))) = 2cl(T (BX (0X , 1))),
onde a última igualdade se justifica pois cl(T (BX (0X , 1))) é convexo. Segue imediatamente
que
BY (0Y , 2c) ⊆ cl(T (BX (0X , 1))),
e pelo Lema 3.3.1 isso significa que
BY (0Y , c) ⊆ cl(T (BX (0X , 1/2))).
Agora, vamos mostrar que vale BY (0Y , c) ⊆ T (BX (0X , 1)). Para isso, seja y ∈ BY (0Y , c)
dado arbitrariamente. Uma vez que, em particular, y ∈ cl(T (BX (0X , 1/2))) temos que
para todo ε > 0 existe z ∈ BX (0X , 1/2) tal que
||y − T z|| < ε.
Pondo ε = c/2, seja z1 ∈ BX (0X , 1/2) tal que ||y − T z1 || < c/2. Agora, como y − T z1 ∈
BY (0Y , c/2) ⊆ cl(T (BX (0X , 1/4))), segue que existe z2 ∈ BX (0X , 1/4) com a propriedade
de que
c
||y − T z1 − T z2 || < .
4
Prosseguindo indutivamente, obtemos uma sequência (zn )n∈N em X com as propriedades
de que
1
||zn || < , e
2n
c
||y − T z1 − T z2 − . . . − T zn || < n ,
2
para todo n ∈ N. Da primeira propriedade, segue imediatamente que a sequência das
somas parciais xj = z1 + . . . + zj é de Cauchy em X, donde existe

X n
X
x= zj = lim zj ,
n→∞
j=1 j=1

o limite tomado na norma de X (lembre-se de que X é um espaço de Banach). Mais


ainda, observe que
∞ ∞
X X 1
||x|| ≤ ||zj || < = 1,
j=1 j=1
2j

e portanto x ∈ BX (0X , 1). Finalmente, note que


!
n n
X X c
||y − T x|| = y − T lim zj = lim y − T zj ≤ lim n = 0,

n→∞ n→∞ n→∞ 2
j=1 j=1

e daı́ temos y = T x. Logo, y ∈ T (BX (0X , 1)), e isso dá a inclusão BY (0Y , c) ⊆
T (BX (0X , 1)).
60 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

Corolário 3.3.4. Seja T ∈ L(X, Y ) um operador bijetivo entre espaços de Banach.


Então, a inversa T −1 : Y → X é um operador limitado.

Demonstração. O que o teorema anterior diz que um operador linear limitado sobrejetivo
entre espaços de Banach é uma aplicação aberta, ou seja, uma aplicação em que a imagem
de um aberto é sempre um aberto. Com efeito, seja T : X → Y é um operador linear
limitado e sobrejetivo entre espaços de Banach, e tome U ⊆ X aberto não-vazio. Dado
y ∈ T (U ), sejam x ∈ U tal que y = T x, e r > 0 tal que BX (x, r) ⊆ U . Assim, como
BX (x, r) = x + rBX (0X , 1), vem que

T (BX (x, r)) = T (x + rBX (0X , 1)) = y + rT (BX (0X , 1)) ⊇ y + rBY (0Y , ρ) = BY (y, ρr),

onde ρ > 0 é dado como no teorema da aplicação aberta. Segue que BY (y, ρr) ⊆
T (BX (x, r)) ⊆ T (U ), e isso mostra que T (U ) é aberto.
Portanto, temos que se T é limitado e bijetivo, então a pré-imagem de todo aberto de
X por T −1 é um aberto de Y . Logo, T −1 : Y → X é um operador contı́nuo.

Definição 3.3.1. No que segue, definimos o gráfico de uma aplicação T : X → Y (entre


conjuntos quaisquer) naturalmente como

graf(T ) = {(x, T x) : x ∈ X} ⊆ X × Y.

Se (X, || · ||X ) e (Y, || · ||Y ) são espaços normados sobre K, então o produto cartesiano
X × Y é um K-espaço vetorial com as operações usuais, e será considerado um espaço
normado com a norma

||(x, y)||X×Y = ||x||X + ||y||Y , (3.3.2)

para todo (x, y) ∈ X × Y . Um operador linear T : X → Y entre espaços normados é


fechado se o seu gráfico é um subconjunto fechado de X × Y . Veja os Exercı́cios 3.23 e
3.24.

Teorema 3.3.4 (Teorema do gráfico fechado). Sejam X, Y dois espaços de Banach, e


seja T : X → Y um operador linear. Se T é fechado, então T é limitado.

Demonstração. Denote, como usual, as normas de X e Y por || · ||X e || · ||Y . No espaço


X, defina uma nova norma pondo

||x||T = ||x||X + ||T x||Y

para cada x ∈ X. Note que o fato de que || · ||T é uma norma vem diretamente da
linearidade de T , e observe também que ||x||T = ||(x, T x)||X×Y para qualquer x ∈ X.
Vamos verificar que (X, || · ||T ) é um espaço de Banach. Seja (xn )n∈N é uma sequência de
Cauchy neste espaço normado. Temos

||xn − xm ||T = ||xn − xm ||X + ||T (xn − xm )||Y = ||(xn − xm , T (xn − xm ))||X×Y ,

para quaisquer n, m ∈ N. Segue que (xn , T xn )n∈N é uma sequência de Cauchy em X × Y .


Como X e Y são Banach, temos que X × Y é Banach (veja o ı́tem (a) do Exercı́cio 3.23).
Assim, segue que existe o limite

lim (xn , T xn ) = (x, y)


n→∞
3.4. EXERCÍCIOS 61

tomado na norma de X × Y . Como T é um operador fechado, temos que (x, y) ∈ graf(T ),


donde segue que y = T x. Daı́,
||xn − x||T = ||(xn − x, T (xn − x))||X×Y = ||(xn , T xn ) − (x, y)||X×Y → 0
quando n → ∞. Segue que xn → x na norma || · ||T , e assim X é Banach com essa norma.
Pela hipótese, X também é Banach com sua norma original || · ||X , e é claro que vale
|| · ||X ≤ || · ||T .
Pelo Exercı́cio 3.21 temos que as duas normas são equivalentes, donde existe uma cons-
tante c ∈ R tal que vale
c|| · ||T ≤ || · ||X ,
e é claro que c ≤ 1. Da desigualdade acima vem que
||T x||Y ≤ (1 − c)||x||X ,
para qualquer x ∈ X. Isso mostra que T é um operador limitado.

Observação 3.3.3. A volta também vale, mesmo que os espaços envolvidos não sejam
Banach. Veja o ı́tem (b) do Exercı́cio 3.24.

3.4 Exercı́cios
Exercı́cio 3.1. Encontre um subespaço vetorial de `1 (N) que não é Banach (com a norma
induzida).
Exercı́cio 3.2. Seja (X, || · ||) um espaço normado de dimensão infinita. Construa um
funcional linear f : X → R que não é limitado.
Exercı́cio 3.3. Prove que o espaço C([0, 1]) de funções contı́nuas f : [0, 1] → R é um
espaço de Banach com a norma da convergência uniforme.
Exercı́cio 3.4. Considere o conjunto
( )
|f (x) − f (y)|
C 0,α ([0, 1]) = f ∈ C([0, 1]) : sup <∞ ,
x,y∈[0,1],x6=y |x − y|α

das funções α-Hölder contı́nuas em [0, 1], onde 0 < α ≤ 1 é um número fixado. Prove que
C 0,α ([0, 1]) é um subespaço vetorial, que o funcional
|f (x) − f (y)|
||f ||α = ||f ||∞ + sup
x,y∈[0,1],x6=y |x − y|α

é uma norma em C 0,α ([0, 1]), e demonstre que (C 0,α ([0, 1]), || · ||α ) é Banach.
Exercı́cio 3.5. Considere o subespaço vetorial X = {u ∈ C([0, 1]) : u(0) = 0} de C([0, 1])
munido com a norma da convergência uniforme. Mostre que o funcional
Z 1
f : X 3 u 7→ u(t) dt
0

é limitado, e calcule sua norma. Existe um vetor unitário u ∈ X tal que f (u) = ||u||X ∗ ?
Verifique também que X é um espaço de Banach.
62 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

Exercı́cio 3.6. Verifique que `1 (N) ⊆ c0 . Mostre que `1 (N) não é fechado em c0 , isto é,
que `1 (N) não é fechado na topologia dada em c0 pela norma || · ||∞ . Conclua que `1 (N)
não é Banach com a norma || · ||∞ .

Exercı́cio 3.7. Considere o espaço c0 com a norma induzida de l∞ (N). Seja f : c0 → K


o funcional linear dado por

X 1
f (x) = αn ,
j=1
2n

para cada x = (αj )j∈N ∈ c0 .

(a) Mostre que f está bem-definido, isto é, que a série acima converge para qualquer
x ∈ c0 .

(b) Prove que f ∈ c0∗ .

(c) Encontre uma sequência (xn )n∈N de vetores unitários de c0 tal que f (xn ) → ||f ||c0∗ .
Exercı́cio 3.8. Escreva X ' Y para espaços normados que são isometricamente isomor-
fos. Mostre que

(a) `1 (N)∗ ' `∞ (N).

(b) `p (N)∗ ' `q (N) se 1 < p, q < ∞ são conjugados.

(c) c0∗ ' `1 (N).


Observação 3.4.1. Note que do ı́tem (a) segue que o dual de um espaço de Banach se-
parável não é necessariamente separável.
Exercı́cio 3.9. Seja T : `1 (N) → `1 (N) o shift dado por

T (α1 , α2 , . . . , αn , . . .) = (α2 , α3 , . . . , αn , . . .).

Denote por T n = T ◦ . . . ◦ T a composição do shift n-vezes. Mostre que para cada


(αj )j∈N ∈ `1 (N) vale que T n (αj )j∈N → 0`1 (N) quando n → ∞, mas que (T n )n∈N não
converge para o operador nulo em L(`1 (N), `1 (N)).
Exercı́cio 3.10. Seja (X, || · ||X ) um espaço de Banach, e seja T ∈ L(X, X) um operador
limitado tal que ||T || < 1. Denotando por T j a composição de j vezes o operador T (e
convencionando que T 0 = IdX ), mostre que o limite de pontos de L(X, X) dado por

X N
X
j
S= T := lim T j,
N →∞
j=0 j=0

existe. Mostre também que IdX − T é um isomorfismo, e que S = (IdX − T )−1 .


Exercı́cio 3.11. Seja (X, ||·||X ) um espaço de Banach, e denote por Iso(X) o subconjunto
de L(X, X) formado por isomorfismos T : X → X. Assuma que Iso(X) está munido da
norma de operadores induzida de L(X, X).
3.4. EXERCÍCIOS 63

(a) Prove que, se T, S ∈ Iso(X), então T S ∈ Iso(X).

(b) Mostre que, se T ∈ Iso(X), e S ∈ L(X, X) é tal que

1
||T − S||L(X,X) < ,
||T −1 ||L(X,X)

então S ∈ Iso(X).

(c) Conclua que Iso(X) é aberto em L(X, X).

Exercı́cio 3.12. Um espaço normado (X, ||·||) é dito estritamente convexo se a igualdade
||x + y|| = ||x|| + ||y|| implica que os vetores x e y são linearmente dependentes. Mostre
que X é estritamente convexo se, e somente se, para quaisquer x, y ∈ BX distintos vale
que ||(1 − t)x + ty|| < 1 para todo t ∈ (0, 1).

Exercı́cio 3.13. Sejam (X, || · ||) um K-espaço normado e x0 ∈ X tal que ||x0 || = 1.

(a) Mostre que existe um funcional linear f0 ∈ X ∗ tal que

||f0 ||X ∗ = f0 (x0 ) = 1.

(b) Prove que se X ∗ é estritamente convexo, então o funcional obtido no ı́tem anterior é
único.

(c) Dê um exemplo que mostre que a hipótese de convexidade estrita do dual é necessária
para a unicidade do funcional construı́do no ı́tem (a). Você pode usar um exemplo em
dimensão finita.

Exercı́cio 3.14. De forma mais geral, mostre que se X é um espaço normado cujo dual
é estritamente convexo, Y ⊆ X é um subespaço vetorial de X, e g ∈ Y ∗ , então uma
extensão de g que preserva norma é unica (veja o Corolário 3.2.1).

Exercı́cio 3.15. (a) Seja Y um subespaço vetorial de um espaço normado real (X, || · ||).
Mostre que Y é denso em X se, e somente se, o único funcional de X ∗ que se anula em Y
é o funcional nulo.

(b) Seja (X, || · ||) um espaço normado real. Mostre que se o dual X ∗ é separável, então
X é separável.

Exercı́cio 3.16. Prove a seguinte versão geométrica do Teorema de Hahn-Banach: sejam


A, B ⊆ X são convexos não-vazios de um R-espaço vetorial X, com A ∩ B = ∅. Se A é
fechado e B é compacto, então existe um hiperplano fechado que separa estritamente A
e B.

Exercı́cio 3.17. Seja K ⊆ X um subconjunto convexo de um R-espaço vetorial X.


Mostre que int(K) e cl(K) são convexos. Prove também que se int(K) 6= ∅, então cl(K) =
cl(int(K)).

Exercı́cio 3.18. Seja (X, || · ||) um espaço normado. Seja K ⊆ X um conjunto convexo,
aberto e limitado. Assuma também que K é simétrico com respeito à origem. Mostre que
o funcional de Minkowski de K é uma norma em X equivalente à norma original || · ||.
64 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I

Exercı́cio 3.19 (Teorema de Banach-Steinhaus). Sejam (X, || · ||X ) e (Y, || · ||Y ) espaços
de Banach. Assuma que (Tn )n∈N uma sequência em L(X, Y ) tal que para cada x ∈ X a
sequência (Tn x)n∈N converge em Y . Denote limn→∞ Tn x = T x.

(a) Mostre que supn∈N ||Tn ||L(X,Y ) < ∞.

(b) Prove que T ∈ L(X, Y ).

(c) ||T ||L(X,Y ) ≤ lim inf n→∞ ||Tn ||L(X,Y ) .


Exercı́cio 3.20. Sejam X e Y espaços de Banach, e seja (Tn )n∈N uma sequência em
L(X, Y ) com a propriedade de que para cada Tn x converge para um ponto de Y , que
denotaremos por T x. Prove que se xn → x em X, então Tn xn → T x em Y .
Exercı́cio 3.21. Seja X um espaço vetorial, e sejam || · ||1 e || · ||2 duas normas em X,
tais que X é um espaço de Banach com cada delas. Assuma que existe uma constante
C ≥ 0 tal que ||x||1 ≤ C||x||2 para qualquer x ∈ X. Prove que as normas || · ||1 e || · ||2
são equivalentes, isto é que existe c ∈ R tal que c||x||2 ≤ ||x||1 .
Exercı́cio 3.22. Determine normas || · ||1 e || · ||2 em C([0, 1]) tais que a aplicação iden-
tidade

Id : (C([0, 1]), || · ||1 ) → (C([0, 1]), || · ||2 )

seja um operador limitado, mas não um isomorfismo.


Exercı́cio 3.23. Sejam X e Y espaços normados, e considere o produto X × Y com a
norma dada em (3.3.2).

(a) Mostre que X × Y é Banach se, e somente se, X e Y são Banach.

(b) Sejam π1 : X × Y → X e π2 : X × Y → Y as projeções dadas por π1 (x, y) = x


e π2 (x, y) = y para cada (x, y) ∈ X × Y . Prove que π1 e π2 são operadores lineares
limitados.
Exercı́cio 3.24. Seja T : X → Y um operador linear.

(a) Mostre que T é fechado se, e somente se, para toda sequência (xn )n∈N com a propri-
edade de que xn → x em X e T xn → y em Y , vale que T x = y.

(b) Prove que, se X e Y são espaços normados, então todo operador T ∈ L(X, Y ) é
fechado.

(c) Assuma que Y é Banach, e seja X ⊆ Y um subespaço vetorial com a norma induzida.
Demonstre que um operador linear T : X → Y tal que graf(T ) é fechado em Y × Y é
limitado se, e somente se, X é Banach.
Exercı́cio 3.25. Seja (X, || · ||) um espaço de Banach, e seja Y um subconjunto qualquer
do dual X ∗ . Assuma que para cada x ∈ X o conjunto Yx = {f (x) : f ∈ Y } é limitado em
K. Mostre que Y é limitado.
Exercı́cio 3.26. Sejam X e Y espaços de Banach, e seja b : X × Y → K uma forma
bilinear que tem as seguintes propriedades:
3.4. EXERCÍCIOS 65

i. para cada y ∈ Y fixado a aplicação x 7→ b(x, y) é contı́nua em X, e

ii. para cada x ∈ X fixado a aplicação y 7→ b(x, y) é contı́nua em Y .

Prove que existe uma constante c ∈ R tal que

|b(x, y)| ≤ c||x||X ||y||Y ,

para quaisquer x ∈ X e y ∈ Y .
66 CAPÍTULO 3. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE I
Capı́tulo 4

Espaços de Banach: parte II

4.1 Mais topologia geral


Até aqui, apenas consideramos em um espaço de Banach (X, || · ||) a topologia métrica
dada pela norma, que às vezes será chamada de topologia forte de X. Nesta seção intro-
duziremos outras topologias que são importantes para o estudo dos espaços de Banach
(por exemplo, com uma delas a bola unitária é compacta). Para o que segue, lembramos
ao leitor que se duas topologias τ1 e τ2 em um conjunto X são tais que τ1 ⊆ τ2 , então
dizemos que τ1 é menos fina, ou mais fraca, do que τ2 .
Teorema 4.1.1. Sejam X um conjunto, (Yj )j∈L uma coleção de espaços topológicos, e
F = {fj : X → Yj : j ∈ L} uma famı́lia de aplicações. Considere a coleção de topologias
C = {τλ : λ ∈ Λ} de X com respeito às quais todas as aplicações de F são contı́nuas. A
interseção
\
τ= τλ
λ∈Λ

é uma topologia em X, e é a topologia menos fina de X com respeito à qual todas as


aplicações de F são contı́nuas, no sentido de que não existe topologia propriamente contida
em τ com essa propriedade.
Demonstração. Observe que C é uma coleção não-vazia, uma vez que a topologia discreta
em X faz com que qualquer aplicação definida em X seja contı́nua. Mais ainda, do
Exercı́cio 1.3 segue que τ é, de fato, uma topologia. Agora, se j ∈ L e Uj ⊆ Yj é um
aberto, então fj−1 (Uj ) ∈ τλ para todo λ ∈ Λ, donde fj−1 (Uj ) ∈ τ . Portanto, todas as
aplicações de F são contı́nuas com respeito a τ . Finalmente, se σ é uma topologia em
X com respeito à qual todas as aplicações de F são contı́nuas, então σ = τλ para algum
λ ∈ Λ, donde σ ⊇ τ .

Observação 4.1.1. Para que todas as funções de F sejam contı́nuas, devemos exigir que
fj−1 (Uj ) seja um aberto da topologia de X para quaisquer j ∈ L e Uj aberto da topologia
de Yj . Dessa forma, o Teorema 4.1.1 tem por objetivo descrever, em certo sentido, qual
é a topologia “com menos abertos”que tem essa propriedade. Entretanto, para fins de
caracterização, necessitaremos de um resultado mais “descritivo”. Isso será feito a seguir.
Teorema 4.1.2. Considere a mesma notação do Teorema 4.1.1, e para cada j ∈ L,
denote por τj a topologia de Yj . Considere a coleção
AF = fj−1 (Uj ) : j ∈ L e Uj ∈ τj .


A coleção BF de todas as interseções finitas de conjuntos de AF é uma base para τ .

67
68 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Demonstração. É imediato que BF é um base no sentido da Definição 1.1.3. Note que


tomamos as interseções finitas de AF para que a condição ii seja cumprida. Se τF é a
topologia gerada por BF , então é claro que todas as aplicações de F são contı́nuas com
respeito a τF , uma vez que AF ⊆ BF ⊆ τF . Segue que τ ⊆ τF . A inclusão τF ⊆ τ é uma
consequência imediata do Exercı́cio 1.1. Com efeito, τ é uma topologia que contém BF ,
e τF é a interseção de todas as topologias que contém BF .

Como consequência do Lema 1.1.1, a topologia menos fina de X com respeito à qual
todas as aplicações da coleção F = {fj : X → Yj : j ∈ L} são contı́nuas é precisamente
a coleção das uniões arbitrárias de interseções finitas dos elementos de AF , que são as
pré-imagens dos abertos dos espaços topológicos Yj pelas respectivas aplicações fj .
Definição 4.1.1. Se A é uma coleção de subconjuntos de X com a propriedade de que a
famı́lia de todas as interseções finitas de elementos de A é uma base para uma topologia
σ, então dizemos que A é uma sub-base de σ.
Nas duas proposições abaixo investigamos algumas propriedades da topologia que
acabamos de construir e caracterizar. Para esses resultados, continuaremos denotando
por (Yj , τj )j∈L uma coleção de espaços topológicos, por F = {fj : X → Yj : j ∈ L}
uma famı́lia de aplicações, e por τ a topologia menos fina com respeito à qual todas
as aplicações de F são contı́nuas. No que segue, a convergência de uma sequência com
σ
respeito a uma dada topologia σ será denotada por → −.
Proposição 4.1.1. Uma sequência de pontos (xn )n∈N em X converge para x ∈ X na
topologia τ se, e somente se, fj (xn ) converge para fj (x) na topologia τj de Yj para todo
j ∈ L.
τ
Demonstração. Assuma que xn → − x, e seja j ∈ L. Se Uj é uma vizinhança de qualquer
−1
fj (x) em Yj , então fj (Uj ) é um aberto de τ . Assim, existe n0 ∈ N com a propriedade
de que xn ∈ fj−1 (Uj ) para todo n > n0 . Segue que fj (xn ) ∈ Uj para todo n > n0 , e isso
τj
mostra que fj (xn ) −→ fj (x).
Assuma agora que uma sequência (xn )n∈N em X e um ponto x ∈ X são tais que
τj
fj (xn ) −
→ fj (x) para qualquer j ∈ L. Seja U ∈ τ uma vizinhança qualquer de x. Usando
o Teorema 4.1.2, segue que existe uma interseção finita
V = fj−1
1
(Uj1 ) ∩ . . . ∩ fj−1
m
(Ujm )
de pré-imagens de abertos Ujk de Yjk por fjk , k = 1, . . . , m, tal que x ∈ V ⊆ U . Da
hipótese, segue que existe n0 ∈ N tal que n > n0 implica que fjk (xn ) ∈ Ujk para quaisquer
k = 1, . . . , m e n > n0 . Consequentemente, xn ∈ V (⊆ U ) para todo n > n0 , e isso mostra
τ
que xn →− x.

Proposição 4.1.2. Seja (Z, σ) um espaço topológico. Então, g : (Z, σ) → (X, τ ) é


contı́nua se, e somente se, fj ◦ g : (Z, σ) → (Yj , τj ) é contı́nua para cada j ∈ L.
Demonstração. É claro que se g é contı́nua, então fj ◦ g é contı́nua para qualquer j ∈ L,
uma vez que a composição de aplicações contı́nuas entre espaços topológicos é sempre
contı́nua. No outro sentido, assuma que fj ◦ g é contı́nua para cada j ∈ L, e seja U ∈ τ
um aberto de X, e seja p ∈ g −1 (U ). Como g(p) ∈ U , e U é um aberto de τ , existem
ı́ndices j1 , . . . , jm ∈ L e abertos Ujk ∈ τjk , k = 1, . . . , m, tais que
g(p) ∈ V = fj−1
1
(Uj1 ) ∩ . . . ∩ fj−1
m
(Ujm ) ⊆ U.
4.2. A TOPOLOGIA FRACA 69

Por continuidade, (fjk ◦ g)−1 (Ujk ) é um aberto de Z para cada k = 1, . . . , m. Segue


que g −1 (V ) é uma interseção finita de abertos de Z, logo é um aberto de Z. Como
p ∈ g −1 (V ) ⊆ g −1 (U ), segue que g −1 (U ) é um aberto de Z, donde g é contı́nua.

Exemplo 4.1.1 (A topologia produto). Considere o produto cartesiano


( )
Y [
Xλ = x : L → Xλ : x(λ) ∈ Xλ para todo λ ∈ L
λ∈L λ∈L

de uma famı́lia {Xλ : λ ∈ L} de conjuntos. Para cada β ∈ L, a projeção sobre Xβ é a


aplicação
Y
πβ : Xλ → Xβ
λ∈L
Q
definida por πβ (x) = x(β) para cada x ∈ λ∈L Xλ . Se cada Q Xλ é um espaço topológico
(Xλ , τλ ), então a topologia produto no produto cartesiano λ∈L Xλ é a topologia menos
fina tal que todas as projeções são contı́nuas. Denotaremos esta topologia por ⊗τλ .

4.2 A topologia fraca


A partir de agora, denotaremos a topologia menos fina de X com respeito à qual todas
as aplicações de uma dada famı́lia F = {fj : X → (Yj , τj ) : j ∈ L} são contı́nuas por
σ(X, F). Além disso, para o que segue note que o dual X ∗ de um espaço normado (X, ||·||)
é uma coleção de aplicações de X no corpo K com a topologia usual.

Definição 4.2.1. A topologia fraca em X é a topologia menos fina com respeito à qual
todos os funcionais de X ∗ são contı́nuos. Conforme a notação introduzida acima, essa
topologia será denotada por σ(X, X ∗ ).

Observação 4.2.1. Observe que a topologia forte de (X, ||·||) é mais fina do que a topologia
fraca σ(X, X ∗ ), uma vez que todos os funcionais de X ∗ são contı́nuos na topologia forte.
Em outras palavras, todos os abertos da topologia fraca são abertos da topologia forte,
mas o contrário pode não ocorrer. Na verdade, veremos mais à frente que as topologias
fraca e forte coincidem se, e somente se, X tem dimensão finita.

Proposição 4.2.1. A topologia fraca de um espaço normado (X, || · ||) é Hausdorff.

Demonstração. Sejam x, z ∈ X pontos distintos. Seja Y = span{z − x}, e defina o


funcional linear g : Y → K pondo

g(t(z − x)) = t||z − x||.

É claro que ||g||Y ∗ = 1, e portanto g admite uma extensão linear f : X → K tal que
f ∈ X ∗ . Uma vez que

f (z) − f (z) = f (z − x) = g(z − x) = ||z − x||,

segue que f (z) − f (x) é um número real positivo, donde

Re(f (z)) − Re(f (x)) = f (z) − f (x) > 0,


70 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

e daı́ existe α > 0 tal que Re(f (x)) < α < Re(f (z)). Assim, pondo

U1 = (Re ◦ f )−1 ((−∞, α)), e


U2 = (Re ◦ f )−1 ((α, +∞)),

onde notamos que Re ◦ f : X → R é contı́nua (nas topologias fraca de X e usual de R)


pois é composição de aplicações contı́nuas. Segue que x ∈ U1 , z ∈ U2 , e U1 ∩ U2 = ∅.
Como é claro que U1 e U2 são abertos de σ(X, X ∗ ) temos o desejado.

Do Teorema 4.1.2 temos que as pré-imagens dos abertos de K pelos funcionais de X ∗


formam uma sub-base da topologia fraca. Entretanto, vamos verificar que não precisamos
considerar todos os abertos de K, uma vez que a topologia usual de K é gerada pelas
bolas abertas do módulo em K.
Proposição 4.2.2. Dado x ∈ X, f ∈ X ∗ e ε > 0, seja

V (x, f, ε) = {z ∈ X : |f (z) − f (x)| < ε} = f −1 (BK (f (x), ε)) .

A coleção

V = {V (x, f, ε) : x ∈ X, f ∈ X ∗ e ε > 0}

é uma sub-base para a topologia fraca de X.


Demonstração. Primeiro, note que é imediato notar que a coleção BV das interseções
finitas dos elementos de V é uma base no sentido da Definição 1.1.3. Por simplicidade,
denote a topologia usual de K por τK . Pelo Teorema 4.1.2, já temos que a coleção

A = f −1 (V ) : f ∈ X ∗ e V ∈ τK


é uma sub-base para σ(X, X ∗ ). Assim, se U ∈ σ(X, X ∗ ) e x ∈ U , então existem


f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e V1 , . . . , Vm ∈ τK com a propriedade de que

x ∈ f1−1 (V1 ) ∩ . . . ∩ fm
−1
(Vm ) ⊆ U.

Daı́, como cada Vj é aberto, segue que para cada j = 1, . . . , m podemos tomar εj > 0 tal
que BK (fj (x), εj ) ⊆ Vj . Consequentemente, temos

x ∈ f1−1 (BK (f1 (x), ε1 )) ∩ . . . ∩ fm


−1
(BK (fm (x), εm )) ⊆ U. (4.2.1)

Isso mostra que para qualquer U ∈ σ(X, X ∗ ) e qualquer x ∈ U existe um conjunto B ∈ BV


tal que x ∈ B ⊆ U . Segue da Definição 1.1.3 que BV é uma base de σ(X, X ∗ ), donde V é
uma sub-base da topologia fraca de X.

Observação 4.2.2. Na demonstração acima, observe que (4.2.1) pode ser escrito como

x ∈ V (x, f1 , ε1 ) ∩ . . . ∩ V (x, fm , εm ) ⊆ U.

Isso significa que se U ∈ σ(X, X ∗ ) e x ∈ U , então existe uma interseção finita B de


conjuntos de V com centro em x tal que x ∈ B ⊆ U . Note que isso é um pouco mais
forte do que dizer que V é uma sub-base de σ(X, X ∗ ). Mais ainda, escrevendo

V (x, f1 , . . . , fm , ε) := V (x, f1 , ε) ∩ . . . ∩ V (x, fm , ε) =


= {z ∈ X : |fj (z) − fj (x)| < ε para todo j = 1, . . . , m},
4.2. A TOPOLOGIA FRACA 71

e tomando ε = min{εj : j = 1 . . . , m} segue que

x ∈ V (x, f1 , . . . , fm , ε) ⊆ U.

Consequentemente, todo aberto U ∈ σ(X, X ∗ ) de x contém alguma vizinhança do tipo


V (x, f1 , . . . , fm , ε), onde f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0. Em outras palavras, para cada x ∈ X,
a coleção

Vx = {V (x, f1 , . . . , fm , ε) : f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0}

é uma base de vizinhanças


S de x na topologia σ(X, X ∗ ). Segundo o Exercı́cio 1.9, temos
em particular que x∈X Vx é uma base da topologia fraca de X.

Definição 4.2.2. Dizemos que uma sequência (xn )n∈N em um espaço normado (X, || · ||)
converge fracamente para um ponto x ∈ X se (xn )n∈N converge para x na topologia fraca.
Denotaremos a convergência fraca por xn * x.

Observação 4.2.3. Vamos seguir denotando a convergência na norma (ou seja, na topologia
forte) por xn → x. Observe que no espaço dual e no corpo K esta notação (→) significa
convergência na norma dual e no módulo, respectivamente.
Nas próximas proposições vamos investigar algumas propriedades da convergência
fraca. Da Observação 4.2.1, note que se xn → x em X, então xn * x em X, uma
vez que a topologia fraca é menos fina do que a topologia forte.

Proposição 4.2.3. Uma sequência (xn )n∈N em um espaço normado (X, || · ||) converge
fracamente para x ∈ X se, e somente se, f (xn ) → f (x) em K para todo funcional linear
f ∈ X ∗.

Demonstração. Este resultado é uma consequência imediata da Proposição 4.1.1.

Nosso próximo objetivo é mostrar que toda sequência que converge fracamente em um
espaço de Banach é limitada na norma. Para isso, precisamos introuzir alguns conceitos
que também serão importantes. Lembre-se de que o bi-dual X ∗∗ de um espaço normado
X é o dual do seu dual, isto é X ∗∗ = (X ∗ )∗ .

Proposição 4.2.4. Seja (X, || · ||X ) um K-espaço normado. Para cada x ∈ X definimos
uma aplicação J(x) : X ∗ → K por

J(x)(f ) = f (x),

para cada f ∈ X ∗ . Dessa forma, valem:

i. Para cada x ∈ X, temos que J(x) ∈ X ∗∗ .

ii. A aplicação J : X → X ∗∗ é uma isometria linear.

Em particular, a imagem de J é um subespaço de X ∗∗ que, com a norma induzida, é


isomorfo a X.

Demonstração. Seja x ∈ X. Daı́, se f, g ∈ X ∗ e α ∈ K, então

J(x)(f + αg) = (f + αg)(x) = f (x) + αg(x) = J(x)(f ) + αJ(x)(g),


72 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

e isso mostra que J(x) é uma aplicação linear. Por outro lado, se ||f ||X ∗ ≤ 1, então temos

|J(x)(f )| = |f (x)| ≤ ||f ||X ∗ ||x||X ≤ ||x||X ,

donde ||J(x)||X ∗∗ ≤ ||x||X . Isso mostra que J(x) ∈ X ∗∗ . Para provar a desigualdade
inversa podemos assumir que x 6= 0X , uma vez que claramente J(0X ) = 0X ∗∗ . Daı́, pelo
Exercı́cio 3.13, tome f0 ∈ X ∗ tal que
 
x
f0 = ||f0 ||X ∗ = 1.
||x||X

Como f0 ∈ BX ∗ , temos que

||J(x)||X ∗∗ ≥ |J(x)(f0 )| = |f0 (x)| = ||x||X ,

e assim temos ||J(x)||X ∗∗ = ||x||X , donde J é uma isometria. Para verificar que J é linear,
sejam x, z ∈ X e α ∈ K. Daı́, para qualquer f ∈ X ∗ vale que

J(x + αz)(f ) = f (x + αz) = f (x) + αf (z) = J(x)(f ) + αJ(z)(f ),

e isso mostra que J(x + αz) = J(x) + αJ(z). A última afirmação decorre do fato de que
uma isometria linear entre espaços normados é sempre um isomorfismo sobre sua imagem
(veja o Exercı́cio 2.15).

Definição 4.2.3. A aplicação J : X → X ∗∗ definida na proposição anterior é chamada


de aplicação canônica de X em X ∗∗ . Se X é Banach e J é sobrejetiva, então dizemos que
(X, || · ||) é um espaço reflexivo. Note que isso é equivalente a dizer que X e o seu bi-dual
são isometricamente isomorfos pela aplicação canônica.

Observação 4.2.4. A condição de que X seja isometricamente isomorfo ao seu bi-dual


não é suficiente para que X seja reflexivo. Observe cuidadosamente que, pela nossa
definição, exigimos que a aplicação canônica seja um isomorfismo. Os espaços reflexivos
serão estudados em maior detalhe mais adiante.

Proposição 4.2.5. Seja (X, ||·||) um espaço normado. Se xn * x em X, então (||xn ||)n∈N
é uma sequência limitada de números reais. Além disso, ||x|| ≤ lim inf n→∞ ||xn ||.

Demonstração. Considere a aplicação canônica J : X → X ∗∗ , e por simplicidade denote


J(x) = x̂. Note que, se f ∈ X ∗ , então

sup{|x̂n (f )| : n ∈ N} = sup{|f (xn )| : n ∈ N} < ∞,

uma vez que f (xn ) → f (x) em K. Segue que podemos aplicar o princı́pio da limitação
uniforme (Teorema 3.3.2) para a famı́lia de operadores {x̂n : X ∗ → K : n ∈ N}, onde
observamos que X ∗ é Banach mesmo que X não o seja, e tomar c ∈ R tal que

|x̂n (f )| ≤ c,

para quaisquer n ∈ N e f ∈ BX ∗ . Para cada n ∈ N tal que xn 6= 0X , seja fn um funcional


tal que
 
xn
fn = ||fn ||X ∗ = 1,
||xn ||
4.2. A TOPOLOGIA FRACA 73

cuja existência é garantida pelo Exercı́cio 3.13. Segue que c ≥ |fn (xn )| = ||xn || para todo
n ∈ N, donde (||xn ||)n∈N é limitada. Para a outra afirmação, note que da convergência
fraca vem que para todo funcional f ∈ X ∗ vale que

x̂(f ) = lim x̂n (f ),


n→∞

e, além disso, como J é uma isometria, temos ||x̂||X ∗∗ = ||x|| e ||x̂n ||X ∗∗ = ||xn || para cada
n ∈ N. Se f ∈ BX ∗ , então

|x̂n (f )| ≤ ||x̂n ||X ∗∗ ||f ||X ∗ ≤ ||x̂n ||X ∗∗ = ||xn ||,

isto é, para f ∈ BX ∗ fixado, temos que a sequência |x̂n | é dominada pela sequência ||xn ||.
Assim, fazendo n → ∞ temos

|x̂(f )| ≤ lim inf ||xn ||,


n→∞

para qualquer f ∈ BX ∗ . Tomando o supremo do lado esquerdo em BX ∗ , obtemos

||x|| = ||x̂||X ∗∗ = sup{|x̂(f )| : f ∈ BX ∗ } ≤ lim inf ||xn ||,


n→∞

e isso conclui a prova.

Observação 4.2.5. Optamos por dar uma prova detalhada deste resultado, devido à sua im-
portância. Entretanto, note que ele é uma consequência imediata do teorema de Banach-
Steinhaus (Exercı́cio 3.19) pondo Tn = x̂n ∈ L(X ∗ , R) = X ∗∗ . É claro que também
usamos o fato de que J é uma isometria. Intuitivamente, usamos J para “enxergar”os
pontos de X como operadores limitados, e daı́ podemos aplicar o princı́pio da limitação
uniforme.
A seguir, mostraremos que as topologias fraca e forte nunca coincidem em um espaço
normado de dimensão infinita. Em outras palavras, há abertos da topologia forte que
não são abertos na topologia fraca. Este fato seguirá como consequência imediata do
próximo lema, que dá uma interpretação geométrica das vizinhanças da topologia fraca
(veja também o Exercı́cio 4.7).

Lema 4.2.1. Seja (X, || · ||) um espaço normado de dimensão infinita, e tome finitos
funcionais f1 , . . . , fm ∈ X ∗ . Então, se Y é um subespaço vetorial de X tal que dim(Y ) >
m, existe um vetor não-nulo y ∈ Y tal que fj (y) = 0 para todo j = 1, . . . , m.

Demonstração. Considere a aplicação linear

(f1 , . . . , fm ) : Y → Km .

Como dim(Y ) > m = dim(Km ) segue que existe um vetor não-nulo y ∈ Y tal que
(f1 (y), . . . , fm (y)) = 0Km . Assim, fj (y) = 0 para cada j = 1, . . . , m.

Corolário 4.2.1. Em um espaço normado de dimensão infinita, nenhum aberto não-vazio


da topologia fraca é limitado na norma. Em particular, a topologia forte é estritamente
mais fina do que a topologia fraca.
74 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Demonstração. Um aberto não-vazio U ⊆ σ(X, X ∗ ) contém alguma vizinhança do tipo


V (x, f1 , . . . , fm , ε). Tomando um vetor não-nulo y ∈ X tal que fj (y) = 0 para todo
j = 1, . . . , m, segue que

{x + ty : t ∈ R} ⊆ V (x, f1 , . . . , fm , ε),

e como ||x + ty|| ≥ |t| · ||y|| − ||x|| temos que existem vetores de norma arbitrariamente
grande em V (x, f1 , . . . , fm , ε). Segue que as topologias fraca e forte são diferentes, uma
vez que a topologia forte contém abertos limitados na norma (qualquer bola aberta da
norma, por exemplo). Uma vez que já sabemos que a topologia fraca é menos fina do que
a topologia forte, temos que essa relação é estrita.

Observe que a existência de uma reta passando por x em uma vizinhança qualquer
V (x, f1 , . . . , fm , ε) da topologia fraca tem a seguinte consequência geométrica intuitiva:
qualquer vizinhança de um ponto do interior da bola unitária BX deve intersectar a
esfera unitária de (X, || · ||):

SX = {x ∈ X : ||x|| = 1}.

É claro que isso não é verdade para a topologia forte. Segue que os pontos de BX são
pontos do fecho de SX na topologia fraca. A seguir, vamos provar formalmente que esses
dois conjuntos são, de fato, iguais. Para o que segue, o fecho de um subconjunto A ⊆ X
na topologia fraca será denotado por clσ(X,X ∗ ) (A). Por simplicidade da notação, o fecho
de A na norma (ou seja, na topologia forte) continuará sendo denotado por cl(A).

Proposição 4.2.6. Se (X, || · ||) é um espaço normado de dimensão infinita, então vale
que

clσ(X,X ∗ ) (SX ) = BX .

Em particular, a esfera unitária SX não é fechada na topologia fraca.

Demonstração. Vamos começar provando que BX ⊆ clσ(X,X ∗ ) (SX ). Primeiro, se ||x|| = 1,


então x ∈ SX ⊆ clσ(X,X ∗ ) (SX ), e portanto assuma que ||x|| < 1. Seja U uma vizinhança
de x na topologia fraca. Precisamos mostrar que U ∩ SX 6= ∅. Sabemos que existem
funcionais lineares f1 , . . . , fm e um número ε > 0 tais que

x ∈ V (x, f1 , . . . , fm , ε) ⊆ U.

Pelo Lema 4.2.1 podemos tomar um vetor não-nulo y ∈ X tal que fj (y) = 0 para cada
j = 1, . . . , m. Daı́, afirmamos que

{x + ty : t ∈ R} ⊆ V (x, f1 , . . . , fm , ε).

Com efeito, para todo t ∈ R e para qualquer j = 1, . . . , m vale que |fj (x + ty) − fj (x)| =
0 < ε. Agora, note que a função g : R → R dada por

g(t) = ||x + ty||

é contı́nua, e que g(0) = ||x|| < 1. Como sempre vale que g(t) ≥ |t| · ||y|| − ||x||, temos
 
||x|| + 1
g ≥ 1.
||y||
4.2. A TOPOLOGIA FRACA 75

Pelo teorema do valor intermediário segue que existe t0 ∈ R tal que ||x + t0 y|| = 1. Assim,
x + t0 y ∈ U ∩ SX , e portanto temos que BX ⊆ clσ(X,X ∗ ) (SX ).
Agora, vamos mostrar a inclusão reversa. Para isso, é suficiente mostrar que BX é
fechado na topologia fraca, uma vez que a inclusão SX ⊆ BX implica imediatamente que

clσ(X,X ∗ ) (SX ) ⊆ clσ(X,X ∗ ) (BX ).

Afirmamos que

x ∈ BX ⇐⇒ |f (x)| ≤ 1 para todo f ∈ BX ∗ . (4.2.2)

De fato, se x ∈ BX e f ∈ BX ∗ , então |f (x)| ≤ ||f ||X ∗ = 1. Por outro lado, se x ∈


/ BX ,

então ||x|| > 1. Daı́, pelo Exercı́cio 3.13, tome um funcional f0 ∈ X tal que
 
x
f0 = ||f0 ||X ∗ = 1
||x||

Segue que f0 ∈ BX ∗ , mas |f0 (x)| = ||x|| > 1. Agora, note que de (4.2.2) vem imediata-
mente
\
BX = {x ∈ X : |f (x)| ≤ 1}.
f ∈BX ∗

Como a interseção arbitrária de fechados é um fechado, segue que é suficiente mostrar


que cada um dos conjuntos Cf = {x ∈ X : |f (x)| ≤ 1} é fechado na topologia fraca. Para
isso, provaremos que X \ Cf é aberto. Se x0 ∈ X \ Cf , então assuma que |f (x0 )| = 1 + ε,
com ε > 0. Daı́, temos que
 ε n εo
X \ Cf ⊇ V x0 , f, = x ∈ X : |f (x) − f (x0 )| < .
2 2
De fato, se x ∈ V (x0 , f, ε/2), então
ε ε
|f (x)| = |f (x0 ) − f (x0 ) + f (x)| ≥ |f (x0 )| − |f (x) − f (x0 )| > 1 + ε − = 1 + > 1,
2 2
donde x ∈ X \ Cf . Como V (x0 , f, ε/2) é um aberto da topologia fraca, segue que X \ Cf
é um aberto da topologia fraca. Isso conclui a prova.

Como mencionado anteriormente, em dimensão finita as topologias fraca e forte coin-


cidem. Porém, antes de seguir para provar isto, vamos explorar mais uma propriedade
geométrica da topologia fraca em dimensão infinita.

Proposição 4.2.7. Seja, (X, || · ||) um espaço normado e K ⊆ X um conjunto convexo.


Então, K é fechado na topologia fraca se, e somente se, é fechado na topologia forte.

Demonstração. Se K é fechado na topologia fraca, então K é fechado na topologia forte,


uma vez que todos os fechados da topologia fraca são fechados da topologia forte. Assuma,
portanto, que K é um convexo fechado na topologia forte. Vamos provar que X \ K é
aberto na topologia fraca. Primeiro, suponha que X é um R-espaço vetorial. Dado x0 ∈
X \ K, segue do Exercı́cio 3.16 que existe um hiperplano h(f, α) que separa estritamente
os conjuntos {x0 } e K. Assim, podemos assumir que

f (x0 ) < α < f (x),


76 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

para todo x ∈ K. Logo, pondo U = f −1 ((−∞, α)) segue que U é um aberto da topologia
fraca que contém x0 e não intersecta K, e isso mostra que X \ K é aberto. Agora, se
X é um C-espaço vetorial, considere XR como no Lema 3.2.1 e seja f ∈ XR∗ como dado
anteriormente. Daı́, se g : X → C é dado por

g(x) = f (x) − if (ix),

segue do lema mencionado que g ∈ X ∗ e f = Re(g). Em particular, esta última igualdade


escreve f como a composição das aplicações contı́nuas g : X → C (na topologia fraca) e
Re : C → R. Segue que f : X → R é continua na topologia fraca, donde f −1 ((−∞, α)) é
um aberto da topologia fraca X.

Proposição 4.2.8. Em um espaço normado de dimensão finita (X, ||·||) a topologia fraca
coincide com a topologia forte.
Demonstração. É claro que é suficiente mostrar que toda bola aberta da topologia forte é
um aberto da topologia fraca. Seja B(x0 , ρ) uma bola aberta da norma, e fixe uma base
E = {e1 , . . . , en } de X em que todos os vetores são unitários. Para cada j = 1, . . . , n seja
fj o único funcional linear em X tal que fj (ej ) = 1 e fj (ei ) = 0 se i 6= j. Afirmamos que

V (x0 , f1 , . . . , fn , ρ/n) ⊆ B(x0 , ρ).

Com efeito, seja x ∈ V (x0 , f1 , . . . , fn , ρ/n) e considere as decomposições


n
X n
X
x0 = αj ej , x= βj ej
j=1 j=1

de x0 e x na base E. Uma vez que fj (x0 ) = αj e fj (x) = βj ) para cada j = 1, . . . , n, segue


que
n n n n
X X X X ρ
||x − x0 || = (βj − αj )ej ≤ |βj − αj | = |fj (x) − fj (x0 )| < = ρ,


j=1

j=1 j=1
n j=1

donde x ∈ B(x0 , ρ). Isso conclui a prova.

Teorema 4.2.1. Sejam (X, || · ||) e (Y, || · ||) espaços de Banach, e seja T : X → Y um
operador linear. Então, T é contı́nuo com respeito às topologias fortes em X e Y se, e
somente se, T é contı́nuo com respeito às topologias fracas em X em Y .
Demonstração. Primeiro, suponha que T é contı́nua nas topologias fortes de X e Y . Para
mostrar que T : (X, σ(X, X ∗ )) → (Y, σ(Y, Y ∗ )) é contı́nua, vamos usar a Proposição 4.1.2.
Precisamos mostrar que f ◦ T : (X, σ(X, X ∗ )) → K é contı́nua para qualquer f ∈ Y ∗ .
Note que, se f ∈ Y ∗ , então f ◦ T ∈ X ∗ (composição de aplicações contı́nuas na topologia
forte). Segue da definição da topologia fraca que f ◦T é contı́nua com respeito à σ(X, X ∗ ).
Agora, assuma que T é contı́nua nas topologias fracas de X e Y . Para mostrar
que T : (X, || · ||) → (Y, || · ||) é contı́nua. O gráfico de T em X × Y é fechado na
topologia produto σ(X, X ∗ ) × σ(Y, Y ∗ ) em X × Y , que claramente igual à topologia
σ(X × Y, (X × Y )∗ ). Como todo conjunto fracamente fechado é fortemente fechado, segue
que graf(T ) é fechado na topologia forte de X ×Y . Assim, pelo teorema do gráfico fechado
segue que T é contı́nua nas topologias fortes de X e Y .
4.3. A TOPOLOGIA FRACA∗ 77

4.3 A topologia fraca∗


Lembre-se de que a imagem J(X) da aplicação canônica J : X → X ∗∗ é um subespaço
vetorial de X ∗∗ que é isométricamente isomorfo a X (veja a Proposição 4.2.4 e a Definição
4.2.3). Em outras palavras, o bidual de X sempre contém uma “cópia”de X.
Definição 4.3.1. Seja (X, || · ||) um espaço normado. A topologia fraca∗ no seu dual
X ∗ é a topologia menos fina em X ∗ tal que todos os funcionais de J(X) são contı́nuos.
Podemos denotar a topologia fraca∗ em X por σ(X ∗ , J(X)), é claro. Abusando um pouco
da notação, também podemos denotá-la por σ(X ∗ , X).
Observação 4.3.1. O dual X ∗ de um espaço normado é um espaço normado, e portanto
tem uma topologia fraca σ(X ∗ , X ∗∗ ), que, por definição, é a topologia mais fraca que faz
com que todos os funcionais do seu dual X ∗∗ sejam contı́nuos. Para obter a topologia
fraca∗ , restringimos a famı́lia de funcionais considerados à imagem da aplicação canônica
J(X) ⊆ X ∗∗ . Como consequência, segue do Exercı́cio 4.1 que σ(X ∗ , J(X)) ⊆ σ(X ∗ , X ∗∗ ),
isto é, que a topologia fraca∗ é menos fina do que a topologia fraca. Além disso, note que
se X é reflexivo, então σ(X ∗ , X ∗∗ ) = σ(X ∗ , J(X)).

A convergência de sequências na topologia fraca∗ será denotada por fn * f , enquanto
que a convergência fraca em X ∗ será denotada por fn * f , uma vez que sempre será claro
se a sequência em questão é formada por pontos de X ou por funcionais de X ∗ . Para o
que segue, lembre-se de que denotamos J(x) = x̂.
Proposição 4.3.1. A topologia fraca∗ é Hausdorff.
Demonstração. Sejam f1 , f2 ∈ X ∗ funcionais limitados distintos. Então, existe x ∈ X tal
que f1 (x) 6= f2 (x). Se Re(f1 (x)) 6= Re(f2 (x)), então tome α ∈ R tal que
Re ◦ x̂(f1 ) = Re(f1 (x)) < α < Re(f2 (x)) = Re ◦ x̂(f2 ),
donde
f1 ∈ U1 = (Re ◦ x̂)−1 ((−∞, α)),
f2 ∈ U2 = (Re ◦ x̂)−1 ((α, +∞)).
Os conjuntos U1 e U2 são abertos, uma vez que x̂ é contı́nua na topologia fraca∗ , e portanto
Re ◦ x̂ : (X ∗ , σ(X ∗ , X)) → R é composição de funções contı́nuas, donde contı́nua. Além
disso, é claro que U1 ∩ U2 = ∅. Isso prova diretamente o caso em que X é um R-espaço
vetorial, mas se X é um C-espaço ainda podemos ter Re(f1 (x)) = Re(f2 (x)). Neste caso,
temos Im(f1 (x)) 6= Im(f2 (x)), e assim basta tomar os funcionais −if1 , −if2 ∈ X ∗ e repetir
o argumento para o caso em que as partes reais são distintas.

Na Proposição 4.2.2 e na Observação 4.2.2 descrevemos uma sub-base para a topologia


fraca, bem como uma base de vizinhanças para cada ponto. Para isso, usamos conceitos
de topologia geral que descrevem uma sub-base da topologia menos fina dada por uma
famı́lia de aplicações, bem como o fato de que as bolas abertas são uma base da topologia
de K. É claro que o mesmo pode ser feito para a topologia fraca∗ em X ∗ , uma vez que
tal topologia é dada por uma famı́lia de funcionais de X ∗ em K.
Proposição 4.3.2. Seja f ∈ X ∗ . Os conjuntos da forma
V (f, xˆ1 , . . . , xˆm , ε) = {g ∈ X ∗ : |x̂j (g) − x̂j (f )| < ε},
onde x̂1 , . . . , x̂m ∈ J(X) e ε > 0 formam uma base de vizinhanças de f na topologia
fraca∗ .
78 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Demonstração. A argumentação é identica àquela descrita na Observação 4.2.2, uma vez


que a famı́lia
A∗ = {x̂−1 (V ) : x ∈ X e V ∈ τK }
é uma sub-base da topologia fraca∗ .

Observação 4.3.2. Em algumas ocasiões denotaremos as vizinhanças da topologia fraca∗


sem usar o ˆ para os pontos de J(X). Isto é, V (f, x1 , . . . , xm , ε) denota a vizinhança da
topologia fraca∗ em que os funcionais de X ∗∗ considerados são x̂1 , . . . , x̂m .
Proposição 4.3.3. Seja (fn )n∈N uma sequência em X ∗ . Então, valem as seguintes afir-
mativas:

(a) fn * f se, e somente se, fn (x) → f (x) em K para todo x ∈ X.

(b) Se fn → f , então fn * f e fn * f .

Demonstração. O ı́tem (a) é uma consequência imediata da Proposição 4.1.1. Para o


ı́tem (b), basta notar que as topologias fraca e fraca∗ em X ∗ são menos finas do que a
topologia forte.

Proposição 4.3.4. Seja X um espaço de Banach. Se fn * f , então (||fn ||X ∗ ) é uma
sequência limitada, e ||f ||X ∗ ≤ lim inf n→∞ ||fn ||X ∗ . Como consequência, temos que se

fn * f em X ∗ e xn → x em X, então fn (xn ) → f (x) em K.
Demonstração. Para mostrar que (||fn ||X ∗ ) é limitada e que ||f ||X ∗ ≤ lim inf n→∞ ||fn ||X ∗
basta usar o teorema de Banach-Steinhaus (Exercı́cio 3.19). Com efeito, {fn : X → K :
n ∈ N} é uma famı́lia de operadores limitados entre espaços de Banach com a propriedade
de que
sup{fn (x) : n ∈ N} < ∞

para qualquer x ∈ X (veja também a prova da Proposição 4.2.5). Agora, se fn * f em
X ∗ e xn → x em X, seja c ∈ R tal que ||fn ||X ∗ ≤ c para todo n ∈ N. Daı́,
|fn (xn ) − f (x)| ≤ |fn (xn ) − fn (x)| + |fn (x) − f (x)| ≤
≤ ||fn ||X ∗ ||xn − x||X + |fn (x) − f (x)| ≤ c||xn − x||X + |fn (x) − f (x)|,
e isso mostra que fn (xn ) → f (x) quando n → ∞. Note que |fn (x) − f (x)| → 0 quando

n → ∞ pois fn * f .

Observação 4.3.3. Observe que aqui precisamos assumir que X é um espaço de Banach
para poder usar o teorema de Banach-Steinhaus. Isso não foi necessário na Proposição
4.2.5, uma vez que naquele caso os funcionais são definidos em X ∗ , que é Banach mesmo
se X não o for.
É fácil perceber que se X é um espaço normado de dimensão finita, então J(X) = X ∗∗
(isto é, todos os espaços de dimensão finita são reflexivos). Segue, portanto, que neste caso
as topologias fraca e fraca∗ em X ∗ coincidem. Essas topologias também coincidem com
a topologia forte em X ∗ , uma vez que as topologias fraca e forte coincidem em dimensão
finita, e é claro que a dimensão de X ∗ é finita.
Antes de prosseguir, precisamos de dois lemas técnicos sobre álgebra linear em espaços
de dimensão finita. A prova do primeiro deles é muito simples, e dessa forma a omitiremos.
4.3. A TOPOLOGIA FRACA∗ 79

Lema 4.3.1. Sejam Y ⊆ Kn um subespaço vetorial próprio, e x0 ∈ Kn \ Y . Existe um


funcional linear f : Kn → K tal que f |Y = 0 e f (x0 ) =
6 0.
Lema 4.3.2. Sejam X um espaço vetorial, e g, g1 , . . . , gm : X → K funcionais lineares
com a propriedade de que g(x) = 0 sempre que g1 (x) = . . . = gm (x) = 0. Então, existem
escalares λ1 , . . . , λm ∈ K tais que
m
X
g= λj gj .
j=1

Demonstração. Defina G : X → Km+1 por


G(x) = (g(x), g1 (x), . . . , gm (x)),

para cada x ∈ X. É claro que G é linear, e portanto Im(G) é um subespaço de Km+1 . Note
que da hipótese temos que o ponto e1 = (1, 0, . . . , 0) não pertence a Im(G), e portanto
segue que Im(G) é um subespaço próprio. Assim, do Lema 4.3.1 segue que existe um
funcional linear f : Km+1 → K tal que f |Im(G) = 0 e f (1, 0, . . . , 0) 6= 0. Denote por
{en : 1 ≤ n ≤ m + 1} a base canônica de Km+1 . Ponha λ = f (e1 ), e βj = f (ej+1 ) para
cada j = 1, . . . , m. Daı́, para todo x ∈ X temos
m
X
0 = f (G(x)) = f (g(x)e1 + g1 (x)e2 + . . . + gm (x)em+1 ) = λg(x) + βj gj (x).
j=1

Note que λ = f (e1 ) = f (1, 0, . . . , 0) 6= 0. Assim, escrevendo λj = −βj /λ, para cada
j = 1, . . . , m, segue a igualdade desejada.

Proposição 4.3.5. Se ϕ : X ∗ → K é um funcional linear contı́nuo na topologia fraca∗ ,


então ϕ = J(x) para algum x ∈ X.
Demonstração. Como ϕ é contı́nua na topologia fraca∗ , segue que g(·) = |ϕ(·)| : X → R
também é contı́nua na topologia fraca∗ , e assim g −1 ((−∞, 1)) ∈ σ(X ∗ , X). Uma vez que
ϕ é linear, temos que ϕ(0X ∗ ) = 0, e portanto 0X ∗ ∈ g −1 ((−∞, 1)). Segue que existem
x̂1 , . . . , x̂m ∈ J(X) e ε > 0 tais que
V = V (0X ∗ , x̂1 , . . . , x̂m , ε) ⊆ g −1 (−∞, 1)),
e isso significa que |ϕ(f )| < 1 para todo f ∈ V . Por outro lado, se f ∈ X ∗ é tal que
x̂1 (f ) = . . . = x̂m (f ) = 0, então claramente temos
{tf : t ∈ K} ⊆ V,
uma vez que |x̂j (tf ) − x̂j (0X ∗ )| = 0 < ε para todo j = 1, . . . , m. Segue que 1 > |ϕ(tf )| =
|t| · |ϕ(f )| para qualquer t ∈ K. Assim, ϕ(f ) = 0. Logo, pelo Lema 4.3.2 segue que existe
λ1 , . . . , λm ∈ K tais que
m m m
!
X X X
ϕ(f ) = λj x̂j (f ) = λj f (xj ) = f λ j xj ,
j=1 j=1 j=1

para qualquer f ∈ X ∗ . Portanto, segue que


m
!
X
ϕ=J λj xj ,
j=1

como querı́amos.
80 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Observação 4.3.4. Observe cuidadosamente que esta proposição diz que qualquer funcional
linear contı́nuo na topologia fraca∗ é um funcional de J(X).
Corolário 4.3.1. Seja X um espaço de Banach. As topologias fraca e fraca∗ no seu dual
X ∗ coincidem se, e somente se, X é reflexivo.
Demonstração. Se X é reflexivo, então as famı́lias de funcionais J(X) e X ∗∗ coincidem,
portanto as topologias fraca e fraca∗ são iguais. Agora, se σ(X ∗ , X) e σ(X ∗ , X ∗∗ ) coinci-
dem, segue que se ϕ ∈ X ∗∗ , então ϕ é contı́nua com respeito à topologia fraca∗ . Assim,
f ∈ J(X), e isso mostra que X é reflexivo.

Vamos prosseguir para o importante teorema de Banach-Alaoglu-Bourbaki, que afirma


que a bola unitária de X ∗ é compacta na topologia fraca∗ . O ingrediente principal é o
teorema de Tychonoff , que estabelece que o produto cartesiano de espaços topológicos
compactos é compacto com a topologia produto (veja o Exemplo 4.1.1).
Observação 4.3.5. Antes de prosseguir, vamos fixar uma terminologia que será muito usada
a partir de agora. Se Y ⊆ X é um subconjunto, então dizemos que Y tem uma dada
propriedade de espaços topológicos (como ser compacto, ou ser metrizável, por exemplo)
na (ou com a) topologia fraca, se o espaço topológico obtido induzindo a topologia fraca
de X em Y tem essa propriedade. O mesmo vale para subconjuntos de X ∗ na topologia
fraca∗ . Lembre-se da Definição 1.1.4.
Teorema 4.3.1 (Teorema de Banach-Alaoglu-Bourbaki). Seja X um espaço normado.
A bola unitária BX ∗ = {f ∈ X ∗ : ||f ||X ∗ ≤ 1} do espaço dual X ∗ é compacta na topologia
fraca∗ de X ∗ .
Demonstração. Seja KX o produto cartesiano de cópias de K indexadas por X. Mais
formalmente, KX é o conjunto de todas as aplicações de X em K. Considere que KX
está munido da topologia produto (onde, é claro, cada cópia de K está munida de sua
topologia usual), que denotaremos por ⊗τK . Por simplicidade, denotaremos os elementos
de KX por γ = (γx )x∈X , onde γ(x) = γx ∈ K para cada x ∈ X.
Observe que o espaço dual X ∗ é um subconjunto (próprio) de KX , uma vez que é um
espaço de aplicações de X em K. A estratégia da demonstração é mostrar que o espaço
X ∗ com a topologia fraca∗ é homeomorfo a X ∗ com a topologia produto induzida de KX .
Para provar isso, vamos verificar que a inclusão
ψ : (X ∗ , σ(X ∗ , X)) → (KX , ⊗τK ),
que podemos escrever como ψ(f ) = (f (x))x∈X , é um homeomorfismo sobre sua imagem
quando a topologia de X ∗ é a topologia fraca∗ e a topologia de KX é a topologia produto.
Para a continuidade de ψ, observe que pela Proposição 4.1.2 segue que isso ocorre se, e
somente se, a aplicação
πx ◦ ψ : (X ∗ , σ(X ∗ , X)) → K
é contı́nua para todo x ∈ X, onde πx : KX → K é a projeção usual definida por πx (γ) =
γ(x) para cada γ ∈ KX . Por outro lado, para cada f ∈ X ∗ , vale que
πx (ψ(f )) = f (x) = x̂(f ),
e como x̂ é contı́nua na topologia fraca∗ , segue que cada πx ◦ ψ é contı́nua na topologia
fraca∗ , e isso prova a nossa afirmação. Agora, vamos verificar que a aplicação inclusão
inversa
ψ −1 : ψ(X ∗ ) → (X, σ(X ∗ , X))
4.3. A TOPOLOGIA FRACA∗ 81

também é contı́nua, onde ψ(X ∗ ) está munido da topologia produto induzida de KX . De


novo pela Proposição 4.1.2 segue que é suficiente mostrar que
x̂ ◦ ψ −1 : ψ(X ∗ ) → K
é contı́nua para todo x ∈ X. Para isso, observe que se γ = ψ(f ) ∈ ψ(X ∗ ), então
x̂ ◦ ψ −1 (γ) = x̂ ◦ ψ −1 (ψ(f )) = x̂(f ) = f (x) = πx (γ)
e portanto x̂ ◦ ψ −1 é a restrição da projeção πx a ψ(X ∗ ). Como πx é contı́nua na topologia
produto de KX segue que x̂◦ψ −1 é contı́nua na topologia produto induzida em ψ(X ∗ ), veja
o Exercı́cio 1.15. Uma vez que é claro que ψ é injetiva, segue que ψ é um homeomorfismo
de X ∗ com a topologia fraca∗ sobre ψ(X ∗ ) com a topologia produto induzida por KX .
Como a compacidade é preservada por homeomorfismos (veja o Exercı́cio 1.17), preci-
samos mostrar que a imagem K = ψ(BX ∗ ) da bola unitária de X ∗ é compacta na topologia
produto induzida de KX . O conjunto K pode ser escrito como a interseção K = K1 ∩ K2 ,
onde
K1 = {γ ∈ KX : |γx | ≤ ||x||X , para todo x ∈ X}, e
K2 = {γ ∈ KX : γx+y = γx + γy e γλx = λγx para quaisquer x, y ∈ X e λ ∈ K}.
De fato, γ ∈ K2 garante que f = ψ −1 (γ) é um funcional linear, e γ ∈ K1 nos fornece que
||f ||X ∗ ≤ 1. O conjunto K1 pode ser escrito como
Y
K1 = cl(BK (0K , ||x||X )) ,
x∈X

e como as bolas fechadas são compactas em K, segue do teorema de Tychonoff que K1 é


compacto na topologia produto (veja também o Exercı́cio 4.3).
Agora, vamos mostrar que K2 é fechado na topologia produto. Para isso, fixe λ ∈ K
e x, y ∈ X e defina os conjuntos
Sx,y = {γ ∈ KX : γx+y = γx + γy }, e
Pλ,x = {γ ∈ KX : γλx = λγx }.
É claro que
! !
\ \
K2 = Sx,y ∩ Pλ,x ,
x,y∈X λ∈K,x∈X

e portanto é suficiente provar que cada um dos conjuntos Sx,y e Pλ,x é fechado na topologia
produto. Mas isso vem diretamente das igualdades
Sx,y = (πx+y − πx − πy )−1 (0), e
Pλ,x = (πλx − λπx )−1 (0),
que mostram que Sx,y e Pλ,x são pré-imagens de conjuntos fechados por aplicações contı́nuas
(lembre-se de que as projeções são contı́nuas na topologia produto), donde são fechados.
Segue que K é a interseção de um compacto na topologia produto com um fechado
na topologia produto, e portanto K é compacto na topologia produto. Com efeito, K1 é
fechado na topologia produto, em particular (veja a Proposição 1.4.2 e o Exercı́cio 4.2).
Assim, se A é uma cobertura por abertos de K, então A ∪ {KX \ K} é uma cobertura por
abertos de KX , e em particular, uma cobertura por abertos de K1 . Como K1 é compacto,
segue que essa cobertura admite subcobertura finita A0 ∪ {KX \ K}. Daı́, temos que a
coleção finita A0 cobre K, e isso mostra que toda cobertura de K por abertos admite
subcobertura finita.
82 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

4.4 Espaços reflexivos


Nesta seção vamos investigar em um pouco mais de detalhe os espaços reflexivos, que
são os espaços de Banach em que a aplicação canônica é sobrejetiva, e portanto um
isomorfismo. Em outras palavras, os espaços reflexivos são os espaços de Banach que são
isomorfos aos seus respectivos bi-duais pela aplicação canônica (veja a Definição 4.2.3).
Exemplo 4.4.1. Do Exercı́cio 3.8 temos que c0 não é reflexivo. Com efeito, temos c0∗ '
`1 (N) e `1 (N)∗ ' `∞ (N). Segue do Exercı́cio 4.23 que c0∗∗ ' `∞ (N). Se J : c0 → c0∗∗ é
um isomorfismo, então c0 e `∞ (N) são isomorfos. Mas isso não acontece, uma vez que c0
é separável (pois tem base de Schauder, veja a Proposição 2.3.1) e `∞ (N) não o é (veja o
Exemplo 2.3.2).
Uma propriedade muito importante dos espaços reflexivos é que, nesses espaços, qual-
quer sequência limitada na norma tem alguma subsequência que converge fracamente.
Nosso objetivo principal nesta seção é provar este teorema, mas antes precisamos de di-
versos outros resultados. O primeiro deles é um lema técnico que será útil mais adiante.
Lema 4.4.1. Seja X um K-espaço normado, e fixe f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e α1 , . . . , αm ∈ K.
As propriedades a seguir são equivalentes:

(i) Para todo ε > 0 existe xε ∈ BX tal que

|fj (xε ) − αj | < ε

para qualquer j = 1, . . . , m.

(ii) Vale a desigualdade


m m
X X
βj αj ≤ βj fj



j=1 j=1 X∗

para quaisquer β1 , . . . , βm ∈ K.
Demonstração. Primeiro, assuma que (i) vale, e sejam β1 , . . . , βm ∈ K dados arbitraria-
mente. Dado ε > 0, seja xε ∈ BX como em (i). Assim,
m m
m m
X X X X
βj fj (xε ) − βj αj ≤ |βj | · |fj (xε ) − αj | < ε |βj |,



j=1 j=1 j=1 j=1

e daı́ segue que



Xm X m m
X Xm m
X
βj αj ≤ βj fj (xε ) + ε |βj | ≤ βj fj +ε |βj |,



j=1 j=1 j=1 j=1 X∗ j=1
Pm
onde a última desigualdade é obtida pois j=1 βj fj é um funcional de X ∗ , e ||xε ||X ≤ 1.
Uma vez que a desigualdade acima vale para qualquer ε > 0, segue que (ii) vale.
Agora, assuma a propriedade (ii). Assuma que Km está munido da norma `m ∞ (veja o
Exemplo 2.1.1), e construa a aplicação (linear) G : X → Km por

G(x) = (f1 (x), . . . , fm (x)).

Assim, é claro que a propriedade (i) é equivalente a

v = (α1 , . . . , αm ) ∈ cl(G(BX )),


4.4. ESPAÇOS REFLEXIVOS 83

onde o fecho é tomado na norma `m ∞ (ou em qualquer outra norma, uma vez que K
m

tem dimensão finita). Assuma que v ∈ / cl(G(BX )). É claro que podemos considerar Km
como um espaço vetorial sobre R, e assim, como cl(G(BX )) é fechado e convexo, segue
do Exercı́cio 3.16 que existe um hiperplano real que separa estritamente v e cl(G(BX )).
Em particular, existem α ∈ R e um funcional R-linear g : Km → R tais que
g(y) < α < g(v)
para todo y ∈ cl(G(BX )). Além disso, como cl(G(BX )) é simétrico com respeito à origem
(pois BX o é, e G é linear), temos que |g(y)| < α < g(v) para qualquer y ∈ cl(G(BX )).
Se {e1 , . . . , em } é a base canônica de Km (como K-espaço vetorial) e βj = g(ej ) para cada
j = 1, . . . , m, então para todo x ∈ BX vale que
m
X
|g(G(x))| = |g(f1 (x), . . . , fm (x))| = βj fj (x) < α,


j=1

donde tomando o supremo em x ∈ BX temos



Xm m
X Xm
βj fj ≤ α < g(v) = g(α1 , . . . , αm ) = βj αj ≤ βj αj ,



j=1 X∗ j=1 j=1

e isso contradiz a hipótese (ii). Segue que v ∈ cl(G(BX )), e portanto (i) vale.

A topologia fraca∗ no bi-dual X ∗∗ de um espaço normado X é dada pela cópia de X ∗


em X ∗∗∗ dada pela aplicação canônica J ∗ : X ∗ → X ∗∗∗ do espaço dual X ∗ em seu bi-dual
X ∗∗∗ . Como é usual, denotaremos essa topologia por σ(X ∗∗ , J ∗ (X ∗ )) ou σ(X ∗∗ , X ∗ ).
Proposição 4.4.1. Seja X um espaço de Banach. A imagem J(BX ) da bola unitária de
X pela aplicação canônica é densa em BX ∗∗ na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ). Consequentemente,
a imagem J(X) é densa em X ∗∗ na mesma topologia.
Demonstração. Vamos começar provando que J(BX ) é denso em BX ∗∗ , isto é, que toda
vizinhança V de um ponto φ ∈ BX ∗∗ na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ) contém algum ponto de
J(BX ). Ponha
V = V (φ, f1 , . . . , fm , ε),
onde f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0. Devemos mostrar que existe x ∈ BX tal que J(x) ∈ V ,
isto é, com a propriedade de que
|fˆj (φ) − fˆj (x̂)| = |φ(fj ) − x̂(fj )| = |fj (x) − φ(fj )| < ε

para todo 1 ≤ j ≤ m, onde fˆj denota a imagem de fj ∈ X ∗ pela aplicação canônica de


X ∗ em X ∗∗∗ . Pelo Lema 4.4.1 basta mostrar que
m m
X X
βj φ(fj ) ≤ βj f j



j=1 j=1 X∗

para quaisquer β1 , . . . , βm ∈ K. Mas isso vem imediatamente re-escrevendo usando a


linearidade de φ para re-escrever o primeiro termo:
!
Xm X m Xm Xm
βj φ(fj ) = φ βj fj ≤ ||φ||X ∗∗ βj f j ≤ βj fj ,



j=1 j=1 j=1 X∗ j=1 X∗
84 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

onde a última desigualdade vem do fato de que φ ∈ BX ∗∗ .


Um ponto de X ∗∗ que não está em BX ∗∗ pode ser escrito αφ ∈ X ∗∗ para algum α ∈ K
com |α| > 1 e algum φ ∈ BX ∗∗ . Seja
V = V (αφ, f1 , . . . , fm , ε)
uma vizinhança de αφ na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ). Se ψ ∈ X ∗∗ , então da igualdade
 
ˆ ˆ

ˆ ψ ˆ

|fj (ψ) − fj (αφ)| = |α| · fj
− fj (φ)
α
vem que V (αφ, f1 , . . . , fm , ε) = αV (φ, f1 , . . . , fm , ε/|α|). Como J(BX ) é denso em BX ∗∗
na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ), tome
ψ0 ∈ J(BX ) ∩ V (φ, f1 , . . . , fm , ε/|α|),
e escreva ψ0 = J(x0 ). Assim, αψ0 = J(αx0 ) ∈ J(X), e αψ0 ∈ V . Isso conclui a prova.

Teorema 4.4.1 (Kakutani). Um espaço de Banach X é reflexivo se, e somente se, sua
bola unitária BX é compacta na topologia fraca.
Demonstração. Suponha que X é reflexivo. Assim, J(BX ) = BX ∗∗ , e pelo teorema de
Banach-Alaoglu-Bourbaki (Teorema 4.3.1) temos que BX ∗∗ é compacta na topologia fraca∗
σ(X ∗∗ , X ∗ ) do bi-dual X ∗∗ . Logo, é suficiente mostrar que
J −1 : (X ∗∗ , σ(X ∗∗ , X ∗ )) → (X, σ(X, X ∗ ))
é uma aplicação contı́nua. Pela Proposição 4.1.2 vale que a aplicação acima é contı́nua se,
e somente se, f ◦ J −1 : (X ∗∗ , σ(X ∗∗ , X ∗ )) → K é contı́nua para cada f ∈ X ∗ . Isso ocorre,
de fato. Para verificar esta afirmação, note que se f ∈ X ∗ , então como X é reflexivo,
temos que todo elemento de X ∗∗ é da forma x̂ para algum x ∈ X, e
f ◦ J −1 (x̂) = f (x) = x̂(f ) = J ∗ (f )(x̂),
onde o leitor deve se lembrar de que J ∗ : X ∗ → X ∗∗∗ é a aplicação canônica de X ∗ . Segue
que f ◦ J −1 é um funcional de J ∗ (X ∗ ), e portanto é contı́nuo na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ).
Lembre-se de que σ(X ∗∗ , X ∗ ) é, por definição, a topologia menos fina em X ∗∗ com respeito
à qual todos os funcionais de J ∗ (X ∗ ) são contı́nuos.
Assuma agora que BX é compacta na topologia fraca de X. A aplicação canônica J
de X com as topologias fraca no domı́nio e fraca∗ na imagem:
J : (X, σ(X, X ∗ )) → (X ∗∗ , σ(X ∗∗ , X ∗ ))
é contı́nua. Com efeito, usando a Proposição 4.1.2 novamente, basta verificar que fˆ ◦ J :
(X, σ(X, X ∗ )) → K é contı́nua para qualquer fˆ = J ∗ (f ) ∈ J ∗ (X ∗ ). Se fˆ ∈ J ∗ (X ∗ ), então
fˆ(J(x)) = fˆ(x̂) = x̂(f ) = f (x)
para todo x ∈ X, donde fˆ ◦ J = f ∈ X ∗ . Como todos os funcionais de X ∗ são contı́nuos
na topologia fraca em X, segue que fˆ◦J é contı́nua. Agora que temos a continuidade de J
nas topologias fracas de X e fraca∗ do bi-dual, segue que hipótese que J(BX ) é compacta
na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ). Como a topologia fraca∗ é Hausdorff, segue que J(BX ) é fechado
na topologia σ(X ∗∗ , X ∗ ). Assim, da Proposição 4.4.1 segue que
J(BX ) = clσ(X ∗∗ ,X ∗ ) (J(BX )) = BX ∗∗ ,
onde lembramos que sempre temos J(BX ) ⊆ BX ∗∗ , uma vez que J é uma isometria. Dessa
igualdade vem imediatamente que J(X) = X ∗∗ , isto é, que X é reflexivo.
4.4. ESPAÇOS REFLEXIVOS 85

Corolário 4.4.1. Todo subespaço vetorial fechado (na topologia forte ou na topologia
fraca) de um espaço reflexivo é reflexivo (com a norma induzida).
Demonstração. Primeiro, lembre-se de que um subespaço vetorial é um conjunto convexo,
e portanto é fechado na topologia fraca se, e somente se, é fechado na topologia forte (veja
a Proposição 4.2.7). Seja X um espaço reflexivo, e seja Y ⊆ X um subespaço vetorial
fechado. A bola unitária BY = BX ∩ Y de Y é a interseção do compacto BX da topologia
fraca com o fechado Y da topologia fraca. Segue do Exercı́cio 1.14 que BY é compacto com
a topologia σ(X, X ∗ ) induzida. Uma vez que, pelo Exercı́cio 4.17, a topologia σ(X, X ∗ )
induzida em Y coincide com a topologia σ(Y, Y ∗ ), temos que BY é compacto na topologia
σ(Y, Y ∗ ), portanto Y é reflexivo.

Proposição 4.4.2. Um espaço de Banach é reflexivo se, e somente se, seu dual é refle-
xivo.
Demonstração. Primeiro, assuma que X é reflexivo, e lembre-se de que denotamos a
aplicação canônica de X ∗ por J ∗ : X ∗ → X ∗∗∗ . Precisamos mostrar que J ∗ é sobrejetiva.
Portanto, seja ϕ : X ∗∗ → K um funcional linear de X ∗∗∗ . é claro que ϕ ◦ J : X → K é
um funcional de X ∗ , e assim escrevemos ϕ ◦ J = f ∈ X ∗ . Vamos mostrar que ϕ = J ∗f .
Com efeito, como X é reflexivo temos que todo elemento v do domı́nio de ϕ é da forma
Jx para algum x ∈ X. Daı́,
ϕ(v) = ϕ(Jx) = f (x) = x̂(f ) = Jx(f ) = v(f ) = J ∗f (v),
e assim temos o desejado.
Agora, assuma que X ∗ é reflexivo. Uma vez que já sabemos que o dual de um espaço
reflexivo é reflexivo, temos que X ∗∗ é reflexivo. Pelo Exercı́cio 4.28, temos que J(X) é
um subespaço vetorial fechado de X ∗∗ , e portanto, pelo Corolário 4.4.1 vem que J(X) é
reflexivo (com a norma induzida de X ∗∗ , é claro). Como J é um isomorfismo sobre J(X)
com a norma induzida, segue do Exercı́cio 4.29 que X é reflexivo.

Teorema 4.4.2. Seja X um espaço de Banach. Então, X é reflexivo e separável se, e


somente se, X ∗ é reflexivo e separável.
Demonstração. Se X é reflexivo e separável, então o seu bi-dual X ∗∗ é separável, uma vez
que a separabilidade é preservada por isomorfismos. Assim, pelo Exercı́cio 3.15 segue que
X ∗ é separável. O fato de que X ∗ é reflexivo vem da Proposição 4.4.2.
Assuma, agora, que X ∗ é reflexivo e separável. De novo pelo Exercı́cio 3.15 vem que
X é separável, e usando mais uma vez a Proposição 4.4.2 temos que X é reflexivo.

Lembre-se de que um espaço topológico é metrizável se sua topologia coincide com


alguma topologia métrica. Para o que segue, também sugerimos que o leitor tenha em
mente a Observação 1.1.4 e a Proposição 1.3.1.
Teorema 4.4.3. Um espaço de Banach X é separável se, e somente se, a bola unitária
BX ∗ do seu dual é metrizável com a topologia fraca∗ .
Demonstração. Assuma, primeiro, que X é separável. Pelo Exercı́cio 4.33, temos que BX
é separável, donde podemos tomar um conjunto A = {an : n ∈ N} ⊆ BX enumerável e
denso em BX . Para cada f ∈ X ∗ , defina

X |f (aj )|
||f ||A = .
j=1
2j
86 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Observe que a série converge, uma vez que |f (an )| ≤ ||f ||X ∗ ||an ||X ≤ ||f ||X ∗ . Dessa
desigualdade, também segue que ||f ||A ≤ ||f ||X ∗ para todo f ∈ X ∗ . Além disso, é
imediato notar que a aplicação || · ||A : X ∗ → R é uma norma em X ∗ . Assim, || · ||A induz
naturalmente uma métrica dA em X ∗ por dA (f, g) = ||f − g||A . Nossa estratégia é mostrar
que a topologia induzida em BX ∗ por dA coincide com a restrição da topologia fraca∗ a
BX ∗ .
Vamos começar mostrando que toda vizinhança da topologia fraca∗ em BX ∗ de um
ponto qualquer f0 ∈ BX ∗ contém uma vizinhança de f0 na topologia métrica gerada por
dA . Pelo Exercı́cio 4.18, podemos assumir que a vizinhança considerada
V = V (f0 , x1 , . . . , xm , ε) ∩ BX ∗
da topologia fraca∗ é tal que ||xj ||X ∗ ≤ 1 para qualquer 1 ≤ j ≤ m. Vamos mostrar que
V contém uma bola métrica de dA centrada em f0 (restrita a BX ∗ ). É claro que, para
cada 1 ≤ j ≤ m, existe um ponto anj ∈ A tal que
||xj − anj ||X < ε/4.
Escolha ρ > 0 com a propriedade de que 2nj ρ < ε/2 para todo j = 1, . . . , m. Afirmamos
que a bola aberta de dA
BA (f0 , ρ) = {f ∈ X ∗ : dA (f0 , f ) < ρ}
é tal que BA (f0 , ρ) ∩ BX ∗ ⊆ V . Com efeito, se f ∈ BA (f0 , ρ) ∩ BX ∗ , então

X |f (aj ) − f0 (aj )|
1
|f (a n j
) − f 0 (a nj
)| ≤ = ||f − f0 ||A < ρ,
2nj j=1
2j

para cada j = 1, . . . , m. Segue que


|x̂j (f ) − x̂j (f0 )| = |f (xj ) − f0 (xj )| ≤ |f (xj ) − f (anj )| + |f (anj ) − f0 (xj )| ≤
≤ |f (xj ) − f (anj )| + |f (anj ) − f0 (anj )| + |f0 (anj ) − f0 (xj )| ≤
≤ ||f ||X ∗ ||xj − anj ||X + 2nj ρ + ||f0 ||X ∗ ||xj − anj ||X ≤
ε ε
≤ 2||xj − anj ||X + 2nj ρ < + = ε,
2 2
para qualquer 1 ≤ j ≤ m. Assim, temos que f ∈ V (f0 , x1 , . . . , xm , ε), e portanto f ∈ V .
Isso mostra que todo aberto de BX ∗ na topologia fraca∗ é também um aberto de BX ∗ na
topologia métrica dada por dA .
Agora, vamos mostrar que toda bola métrica de dA em BX ∗ contém alguma vizinhança
da topologia fraca∗ induzida em BX ∗ . Sejam f0 ∈ BX ∗ e r > 0 dados arbitrariamente, e
defina
B = BA (f0 , r) ∩ BX ∗ .
1
Seja m ∈ N tal que 2m−1
< 2r . Assim, afirmamos que
V = V (f0 , a1 , . . . , am , r/2) ∩ BX ∗ ⊆ B.
De fato, assuma que f ∈ V . Primeiro, observe que como f e f0 são pontos de BX ∗ , temos
que ||f − f0 ||X ∗ ≤ ||f ||X ∗ + ||f0 ||X ∗ ≤ 2. Além disso, como A é um subconjunto de BX ,
temos que ||aj ||X ≤ 1 para cada j ∈ N. Assim,
∞ m ∞
X |f (aj ) − f0 (aj )| X |f (aj ) − f0 (aj )| X |f (aj ) − f0 (aj )|
||f − f0 ||A = = + ≤
j=1
2j j=1
2j j=m+1
2j

m ∞ ∞
r X 1 X ||f − f0 ||X ∗ ||aj ||X r X 1 r 1
≤ j
+ j
< + j−1
= + m−1 < r,
2 j=1
2 j=m+1
2 2 j=m+1 2 2 2
4.4. ESPAÇOS REFLEXIVOS 87

e isso mostra que f ∈ B. Isso nos dá que todo aberto de BX ∗ na topologia métrica gerada
por dA é um aberto da topologia fraca∗ induzida em BX ∗ . Consequentemente, as duas
topologias coincidem em BX ∗ .
Agora, suponha que a topologia fraca ∗ induzida na bola unitária BX ∗ do dual de X
coincide com a topologia gerada por uma métrica d em BX ∗ , e para cada n ∈ N, seja

Bn = Bd (0X ∗ , 1/n) = {f ∈ BX ∗ : d(f, 0X ∗ ) < 1/n}.

Como 0X ∗ é um ponto do interior de Bn na topologia da métrica d, segue que 0X ∗ também


é um ponto do interior de Bn na topologia fraca∗ restrita a BX ∗ . Assim, para cada n ∈ N,
existe uma vizinhança Vn de 0X ∗ na topologia fraca∗ tal que Vn ⊆ Bn . Escrevemos

Vn = BX ∗ ∩ V (0X ∗ , xn1 , . . . , xnm(n) , εn ),

para εn > 0 e xnj ∈ X, com 1 ≤ j ≤ m(n). Agora, para cada n ∈ N denote o conjunto de
pontos de X que definem a vizinhança Vn por En = {xn1 , . . . , xnm(n) }, e escreva
[
E= En .
n∈N

O conjunto E é enumerável por ser união enumerável de conjuntos finitos. Mais ainda,
afirmamos que cl(span(E)) = X, onde o fecho é tomado na topologia forte. Usando o
ı́tem (a) do Exercı́cio 3.15, devemos mostrar que o único funcional f ∈ X ∗ que se anula
em span(E) é o funcional nulo. Com efeito, se f (x) = 0 para todo x ∈ span(E), então
f (xnj ) = 0 para todo n ∈ N e todo 1 ≤ j ≤ m(n). Segue que f ∈ Vn para todo n ∈ N,
e como Vn ⊆ Bn , temos que d(f, 0X ∗ ) < 1/n para qualquer n ∈ N. Assim, f = 0X ∗ .
Finalmente, como cl(spanQ (E)) = cl(span(E)), segue que spanQ (E) é um subconjunto
enumerável e denso em X (veja a demonstração da Proposição 2.3.1).

Observação 4.4.1. Com uma prova inteiramente análoga é possı́vel mostrar que se o dual
X ∗ de um espaço de Banach X é separável, então a bola unitária BX de X é metrizável
na topologia fraca de X. A volta deste resultado também vale, mas sua demonstração é
bem mais difı́cil.

Corolário 4.4.2. Seja X um espaço de Banach separável. Toda sequência (fn )n∈N de X ∗
que é limitada na norma dual possui subsequência que converge na topologia fraca∗ .

Demonstração. Se (fn )n∈N é uma sequência limitada na norma dual, então podemos assu-
mir que ||fn ||X ∗ < M para qualquer n ∈ N. Segue que a sequência definida por gn = fn /M
é uma sequência em BX ∗ . Como a topologia fraca∗ em BX ∗ é metrizável (pois X é se-
parável), segue do Teorema 1.4.1 que (gn ) tem uma subsequência (gnk ) convergente na
topologia fraca∗ . Pela versão do resultado do Exercı́cio 4.16 para a topologia fraca∗ (veja
o ı́tem (c) do Exercı́cio 4.20) , segue que (fnk ) converge na topologia fraca∗ .

Finalmente, podemos enunciar e provar o principal teorema desta seção, que afirma
que toda sequência limitada em um espaço reflexivo possui uma subsequência fracamente
convergente.

Teorema 4.4.4. Seja X um espaço reflexivo. Qualquer sequência (xn )n∈N em X que é
limitada na norma possui subsequência que converge na topologia fraca de X.
88 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Demonstração. Seja (xn )n∈N uma sequência limitada em X, e ponha Y = cl(span{xn }). É
claro que Y é um subespaço vetorial fechado de X, e portanto é reflexivo (veja o Corolário
4.4.1). Note que Y também é separável (mais uma vez, o argumento é semelhante ao usado
na Proposição 2.3.1).
Como a aplicação canônica é uma isometria, temos que (x̂n ) é uma subsequência
limitada em Y ∗∗ . Pelo Corolário 4.4.2 temos que existe uma subsequência (x̂nk ) que
converge na topologia fraca∗ de Y ∗∗ para algum ponto de Y ∗∗ . Como Y é reflexivo,
esse limite é da forma x̂ para algum x ∈ Y . Segue que para qualquer f ∈ Y ∗ , vale
que JY ∗ (f )(x̂nk ) → JY ∗ (f )(x̂), onde JY ∗ : Y ∗ → Y ∗∗∗ é a aplicação canônica de Y ∗ .
Lembramos ao leitor que a topologia fraca∗ em Y ∗∗ é a topologia menos fina que faz com
que todos os funcionais da imagem de JY ∗ sejam contı́nuos, e estamos usando a Proposição
4.1.1. Como
JY ∗ (f )(ŷ) = ŷ(f ) = f (y)
para todo y ∈ Y , temos que f (xnk ) → f (x) para todo f ∈ Y ∗ . Agora, seja g ∈ X ∗
arbitrário. A restrição g|Y = f é claramente um funcional em Y ∗ , e portanto g(xnk ) =
f (xnk ) → f (x) = g(x). Assim, usando mais uma vez a Proposição 4.1.1, temos que
xnk * x em X.

4.5 Exercı́cios
Exercı́cio 4.1. Sejam X um conjunto, e F1 e F2 coleções de aplicações de X sobre
espaços topológicos. Mostre que se F1 ⊆ F2 , então σ(X, F1 ) ⊆ σ(X, F2 ).
Exercı́cio 4.2. Mostre que se (Xλ , τλ )λ∈L é uma famı́lia de espaços topológicos de Haus-
dorff, então o produto
Y

λ∈L

é Hausdorff com a topologia produto.

Q Seja (Xλ , τλ )λ∈L uma famı́lia de espaços topológicos, e seja ⊗τλ a topologia
Exercı́cio 4.3.
produto em λ∈L Xλ . Para cada λ ∈ L, seja Yλ ⊆ Xλ um subconjunto, e denote a
topologia
Q induzida em Yλ porQτYλ . Prove que a topologia produto ⊗τλ induzida em
Y
λ∈L λ como subconjunto de λ∈L Xλ coincide com a topologia produto ⊗τYλ .
Exercı́cio 4.4. Seja X um espaço normado, e seja K ⊆ X um subconjunto que é com-
pacto na topologia forte. Seja (xn )n∈N uma sequência em K tal que xn * x para algum
x ∈ X. Prove que x ∈ K e que xn → x.
Exercı́cio 4.5. Sejam X um espaço normado e Y ⊆ X um subconjunto qualquer. Mostre
que intσ(X,X ∗ ) (Y ) ⊆ int(Y ), e cl(Y ) ⊆ clσ(X,X ∗ ) (Y ).
Exercı́cio 4.6. Seja (X, || · ||) um espaço normado, e assuma que xn * x em X e que
fn → f em X ∗ . Mostre que fn (xn ) → f (x) em K (caso haja dúvida quanto à notação,
consulte a Observação 4.2.3).
Exercı́cio 4.7. Seja (X, || · ||) um espaço normado de dimensão infinita, e sejam x ∈ X,
f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0. Mostre que para todo k ∈ N existem vetores linearmente
independentes y1 , . . . , yk ∈ X tais que
{x} + span{y1 , . . . , yk } ⊆ V (x, f1 , . . . , fm , ε).
Verifique, também, que isso não ocorre para espaços normados de dimensão finita.
4.5. EXERCÍCIOS 89

Observação 4.5.1. Este exercı́cio mostra que, em dimensão infinita, qualquer aberto da
topologia fraca contém translações de subespaços vetoriais de dimensão finita arbitraria.
Exercı́cio 4.8. Em um espaço normado de dimensão infinita, prove que a bola aberta da
norma B(0X , 1) = {x ∈ X : ||x|| < 1} não é aberta na topologia fraca.
Observação 4.5.2. Mais ainda, B(0X , 1) tem interior vazio na topologia fraca, assim como
qualquer conjunto limitado na norma (veja o Corolário 4.2.1). O mesmo vale para a
topologia fraca∗ .
Exercı́cio 4.9. Uma combinação convexa (finita) de vetores x1 , . . . , xn de um espaço
vetorial X é um vetor da forma

x = λ1 x1 + λ2 x2 + . . . + λn xn ,

onde λj ≥ 0 para todo j = 1, . . . , n e λ1 + . . . + λn = 1. Se A ⊆ X, então definimos


a envoltória convexa de A como o conjunto de todas as combinações convexas de finitos
elementos de A, isto é
( m m
)
X X
conv(A) := λj xj : xj ∈ A, λj ≥ 0 e λj = 1 .
j=1 j=1

(a) Mostre que a envoltória convexa de qualquer conjunto é um conjunto convexo.

(b) Prove que conv(A) é a interseção de todos os conjuntos convexos que contém A.

(c) Demonstre que K ⊆ X é convexo se, e somente se, K = conv(K).


Exercı́cio 4.10. Seja (X, || · ||) um espaço normado, e seja (xn )n∈N uma sequência em X
tal que xn * x para algum x ∈ X (lembre-se de que o sı́mbolo * denota a convergência
na topologia fraca). Mostre que a sequência (zn )n∈N definida em X por
1
zn = (x1 + . . . + xn )
n
converge fracamente para x.
Exercı́cio 4.11. Assuma que xn * x em um espaço normado X. Prove que existe uma
sequência de combinações convexas finitas dos (xn ) que converge fortemente para x.
Exercı́cio 4.12. Prove o seguinte resultado mais geral do que a Proposição 4.2.7: se X
é um espaço normado, e se K ⊆ X é um subconjunto convexo, então o fecho de K na
topologia forte é igual ao fecho de K na topologia fraca.
Exercı́cio 4.13. Sejam x ∈ X, f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0. Prove que a vizinhança
V = V (x, f1 , . . . , fm , ε) é convexa. Conclua que o fecho de V é fechado na topologia fraca.
Mais ainda, mostre que

cl(V ) = clσ(X,X ∗ ) (V ) = {z ∈ X : |fj (z) − fj (x)| ≤ ε para todo 1 ≤ j ≤ m}.

Exercı́cio 4.14. Sejam x ∈ X, f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0. Prove que para quaisquer


x0 ∈ X e α 6= 0 vale que

x0 + αV (x, f1 , . . . , fm , ε) = V (αx + x0 , f1 , . . . , fm , |α|ε)

Conclua que se U um aberto da topologia fraca de um espaço normado X, então para


quaisquer x0 ∈ X e α 6= 0, o conjunto x0 + αU é aberto na topologia fraca de X.
90 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II

Exercı́cio 4.15. Sejam x0 ∈ X e α ∈ K não-nulo. Mostre que a translação Tx0 : X → X


dada por Tx0 (x) = x + x0 e a multiplicação Pα : X → X definida por Pα (x) = αx são
homeomorfismos na topologia fraca.
Exercı́cio 4.16. Seja X um espaço normado, e seja α ∈ K um escalar não-nulo. Mostre
que xn * x em X se, e somente se αxn * αx.
Exercı́cio 4.17. Seja X um espaço normado, e seja Y ⊆ X um subespaço vetorial. Prove
que a topologia fraca σ(X, X ∗ ) induzida em Y coincide com a topologia σ(Y, Y ∗ ).
Exercı́cio 4.18. Mostre que a famı́lia de vizinhanças V (x, f1 , . . . , fm , ε) com 0 < ||fj ||X ∗ ≤
1 e ε > 0 é uma base de vizinhanças para x da topologia fraca. Enuncie e prove resultado
análogo para a topologia fraca∗ .
Exercı́cio 4.19. Mostre que em um K-espaço normado X, a soma de vetores e o produto
por escalares são aplicações contı́nuas na topologia fraca, onde os domı́nios X ×X e K×X
dessas aplicações estão munidos da topologia produto.
Observação 4.5.3. Um espaço vetorial com uma topologia tal que a soma de vetores e o
produto por escalares são aplicações contı́nuas é chamado de espaço vetorial topológico.
Verificamos, portanto, que um espaço vetorial com sua topologia fraca é um espaço ve-
torial topológico. Mais ainda, é fácil verificar que a topologia forte também tem essas
propriedades.
Exercı́cio 4.20. Sejam f ∈ X ∗ , xˆ1 , . . . , xˆm ∈ J(X) e ε > 0, e seja V = V (f, x̂1 , . . . , x̂m , ε).

(a) Prove que V é um conjunto convexo.

(b) Assuma que dim(X) = ∞. Mostre que V não é limitado na norma dual X ∗ .

(c) Enuncie e prove resultados análogos aos dos Exercı́cios 4.14, 4.15 e 4.16 para as
vizinhanças da topologia fraca∗ .
Exercı́cio 4.21. Como consequência da versão do Exercı́cio 4.15 para a topologia fraca∗ ,
prove que para quaisquer f0 ∈ X ∗ e α ∈ K não-nulo a bola f0 + αBX ∗ é compacta na
topologia fraca∗ .
Exercı́cio 4.22. Sejam ϕ : X ∗ → K um funcional linear não-nulo, e seja α ∈ K. Prove
que se o hiperplano

h(ϕ, α) = {f ∈ X ∗ : ϕ(f ) = α}

é fechado na topologia fraca∗ , então ϕ é contı́nua na topologia fraca∗ .


Exercı́cio 4.23. Sejam X, Y espaços normados isomorfos. Mostre que os duais X ∗ e Y ∗
são isomorfos.
Exercı́cio 4.24. Sejam X um espaço normado, e Y ⊆ X um subespaço vetorial. O
complemento ortogonal de Y é o conjunto Y ⊥ definido por

Y ⊥ = {f ∈ X ∗ : f (y) = 0 para todo y ∈ Y }.

Note cuidadosamente que Y ⊥ é um subespaço vetorial de X ∗ . Mostre que se X é um


espaço normado, e Y ⊆ X é um subespaço vetorial, então Y ⊥ é fechado na topologia
fraca∗ .
4.5. EXERCÍCIOS 91

Exercı́cio 4.25. Na mesma notação do exercı́cio anterior, mostre que a interseção Y ⊥ ∩


BX ∗ = BY ⊥ é compacta na topologia fraca∗ de X.

Exercı́cio 4.26. Mostre que a topologia σ(X ∗ , J(Y )) restrita a Y ⊥ é a topologia trivial
em Y ⊥ .

Exercı́cio 4.27. Seja X um espaço de Banach, e seja J sua aplicação canônica. Prove
que J(BX ) é fechado em BX ∗∗ na topologia forte. Conclua que J(BX ) é denso em BX ∗∗
na topologia forte se, e somente se, X é reflexivo.

Exercı́cio 4.28. Mostre que a imagem J(X) da aplicação canônica de um espaço de


Banach é um subespaço vetorial fechado na topologia forte de X ∗∗ .

Exercı́cio 4.29. Sejam X e Z espaços de Banach isomorfos. Prove que se X é reflexivo,


então Z é reflexivo.

Exercı́cio 4.30. Mostre que o espaço `1 (N) não é reflexivo.

Exercı́cio 4.31. Mostre que se X é um espaço reflexivo, e K ⊆ X é um subconjunto con-


vexo, limitado (na norma) e fechado na topologia forte, então K é compacto na topologia
fraca σ(X, X ∗ ).

Exercı́cio 4.32. Seja (X, || · ||) um espaço normado de dimensão infinita. Prove que a
norma não é contı́nua na topologia fraca σ(X, X ∗ ). Mostre, também, que a norma dual
em X ∗ não é contı́nua na topologia fraca∗ de X ∗ .

Exercı́cio 4.33. Prove que um subconjunto de um espaço métrico separável é separável.

Exercı́cio 4.34. Seja X um espaço normado. Mostre que se (BX ∗ , σ(X ∗ , X)) é metrizável,
então (x0 +αBX ∗ , σ(X ∗ , X)) é metrizável para todo x0 ∈ X e para qualquer escalar α ∈ K
não-nulo. Conclua que se X é um espaço de Banach separável, então todas as bolas
(fechadas) da norma dual são metrizáveis com a topologia fraca∗ .

Exercı́cio 4.35. Sejam X um espaço de Banach, e A ⊆ X um subconjunto compacto na


topologia fraca. Prove que A é limitado na norma. Conclua que (X, σ(X, X ∗ )) não é um
espaço topológico localmente compacto (veja o Exercı́cio 2.17).

Exercı́cio 4.36. Sejam X um espaço de Banach, e X ∗ o seu dual. Prove que um sub-
conjunto F ⊆ X ∗ é compacto com a topologia fraca∗ se, e somente se, F é fechado na
topologia fraca∗ e limitado na norma.

Exercı́cio 4.37. Seja X um espaço de Banach reflexivo, e seja (xn )n∈N uma sequência
com a propriedade de que para qualquer f ∈ X ∗ a sequência (f (xn ))n∈N converge em K.
Prove que existe x ∈ X tal que xn * x.
92 CAPÍTULO 4. ESPAÇOS DE BANACH: PARTE II
Capı́tulo 5

Espaços de Hilbert

5.1 Definição
Neste capı́tulo, continuamos a trabalhar com espaços vetoriais sobre um corpo K = R ou
C. O conjugado de um escalar α = Re(α) + iIm(α) é o escalar ᾱ = Re(α) − iIm(α). É
claro que ᾱ = α se, e somente se, α ∈ R. Além disso, observe que α + β = ᾱ + β̄ e que
αβ = ᾱβ̄ para quaisquer α, β ∈ K, e que o conjugado de ᾱ é α.
Definição 5.1.1. Um produto interno em um K-espaço vetorial é uma aplicação h·, ·i :
X × X → K tal que para quaisquer x, y, z ∈ X e α ∈ K valem:

(i) hαx + y, zi = ᾱhx, zi + hy, zi.

(ii) hx, yi = hy, xi.

(iii) hx, xi ≥ 0, com igualdade se, e somente se, x = 0X .

Um espaço vetorial munido de um produto interno é chamado de espaço de produto in-


terno.
Observação 5.1.1. Da propriedade (ii) temos que hx, xi ∈ R para todo x ∈ X, e por
isso a propriedade (iii) faz sentido. Além disso, observe que as propriedades (i) e (ii)
combinadas implicam que
hx, αy + zi = hαy + z, xi = ᾱhy, xi + hz, xi = αhy, xi + hz, xi = αhx, yi + hx, zi,
donde segue que um produto interno é sempre linear na segunda variável. Uma aplicação
T : X → Y entre K-espaços vetoriais é dita antilinear se T (x + αz) = T (x) + ᾱT (z)
para quaisquer x, z ∈ X e α ∈ K. É claro que se X é um R-espaço vetorial, então T é
antilinear se e somente se é linear. Um produto interno é sempre antilinear na primeira
variável, e um produto interno em um R-espaço vetorial é sempre uma aplicação bi-linear
e simétrica.
Uma aplicação T : X → Y entre K-espaços vetoriais é dita antilinear se T (x + αz) =
T (x) + ᾱT (z) para quaisquer x, z ∈ X e α ∈ K.
Exemplo 5.1.1. Considere o espaço X = C([0, 1]) das funções contı́nuas f : [0, 1] → K. A
aplicação h·, ·iX : X × X → K dada por
Z 1
hf, giX = f (t)g(t) dt
0

é um produto interno em C([0, 1]). Veja o Exercı́cio 5.1.

93
94 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

Lema 5.1.1. Seja h·, ·i um produto interno em um espaço vetorial X. A aplicação || · || :


X → R dada por
p
||x|| = hx, xi

tem a propriedade de que

|hx, yi| ≤ ||x|| · ||y||, (5.1.1)

para quaisquer x, y ∈ X, e a igualdade vale se, e somente se, x e y são linearmente


dependentes. Consequentemente, || · || é uma norma em X.

Demonstração. Se hx, yi = 0, então a desigualdade (5.1.1) é imediata. Suponha, portanto,


que hx, yi =
6 0. Daı́, x e y são não-nulos, e para qualquer α ∈ K vale que

0 ≤ hx − αy, x − αyi = ||x||2 − αhx, yi − ᾱhy, xi + |α|2 ||y||2 .

Assim, para α = hy, xi/||y||2 segue que

|hx, yi|2
0 ≤ ||x||2 − ,
||y||2

donde vem a desigualdade desejada. A igualdade ocorre se, e somente se, x = αy. Para
verificar que || · || é uma norma, apenas a desigualdade triangular não é imediata. Sejam,
portanto, x, y ∈ X. Daı́,
p p
||x + y|| = hx + y, x + yi = ||x||2 + 2Rehx, yi + ||y||2 ≤
p p
≤ ||x||2 + 2|hx, yi| + ||y||2 ≤ ||x||2 + 2||x|| ||y|| + ||y||2 =
= ||x|| + ||y||,

e isso conclui a prova.

Observação 5.1.2. A desigualdade (5.1.1) é conhecida como desigualdade de Cauchy-


Schwarz .

Definição 5.1.2. A norma introduzida em um espaço de produto interno (X, h·, ·iX )
como no Lema 5.1.1 é chamada de norma do produto interno. Se X é um espaço de
Banach com essa norma, então dizemos que (X, h·, ·iX ) é um espaço de Hilbert. Se || · || é
uma norma emp um espaço vetorial X para a qual existe um produto interno h·, ·i em X
tal que || · || = h·, ·i, então dizemos que || · || deriva de um produto interno.

Observação 5.1.3. Em espaços de Hilbert, sempre assumiremos que a norma considerada


é a norma do produto interno, salvo menção em contrário.
Exemplo 5.1.2. O espaço `2 (N) é um espaço de Hilbert com o produto interno

X
h(αn ), (βn )i`2 (N) = ᾱj βj ,
j=1

onde (αn ) e (βn ) são sequências em `2 (N). De fato, a norma induzida por esse produto
interno é a norma usual de `2 (N). Veja o Exemplo 6.5.2.
5.1. DEFINIÇÃO 95

Definição 5.1.3. Seja X um espaço de produto interno. Dois vetores x, y ∈ X são ditos
ortogonais se hx, yi = 0. Denotaremos a ortogonalidade de vetores por x ⊥ y. Dizemos
que dois subconjuntos Y, Z ⊆ X são ortogonais (e denotamos por Y ⊥ Z) se hy, zi = 0
para quaisquer y ∈ Y e z ∈ Z. Dado Y ⊆ X, o conjunto

Y ⊥ = {x ∈ X : hx, yi = 0 para todo y ∈ Y }

é o complemento ortogonal de Y . Observe que o complemento ortogonal de qualquer


subconjunto de X é um subespaço vetorial de X.
Observação 5.1.4. Para espaços de Banach, introduzimos complementos ortogonais como
subconjuntos do espaço dual. Mais à frente, o teorema da identificação de Riesz mostraá
que o produto interno fornece uma identificação de um espaço de Hilbert com seu dual,
e que o complemento ortogonal em X fica identificado com o complemento ortogonal em
X ∗ como definido para espaços de Banach.
Definição 5.1.4. Sejam X um espaço vetorial, e Y, Z ⊆ X subespaços vetoriais. Dizemos
que X é a soma direta de Y e Z se todo x ∈ X admite uma única decomposição x = y + z
com y ∈ Y e z ∈ Z. Neste caso, denotamos X = Y ⊕ Z.
Teorema 5.1.1. Sejam (X, h·, ·i) um espaço de Hilbert, e Y ⊆ X um subespaço vetorial
fechado na topologia gerada pela norma do produto interno. Então, vale que

X = Y ⊕ Y ⊥.

Como consequência, temos que (Y ⊥ )⊥ = Y .


Demonstração. Seja x ∈ X. Se x ∈ Y , então escrevemos a decomposição x = x + 0X ,
que é única pois Y ∩ Y ⊥ = {0X } (veja o Exercı́cio 5.5). Daı́, suponha que x ∈
/ Y . Nosso
primeiro objetivo é mostrar que existe um ponto em Y que “realiza” a distância de x a Y .
Assuma que δ = inf y∈Y ||x − y|| e seja (yn )n∈N uma sequência em Y tal que ||x − yn || → δ.
Pelo Exercı́cio 5.6, temos que

2||yn − x||2 + 2||ym − x||2 = ||yn − ym ||2 + ||yn + ym − 2x||2 =


2
2
yn + ym
= ||yn − ym || + 4
− x .
2

Note que (yn + ym )/2 ∈ Y , e portanto a igualdade acima fornece a desigualdade


2
2 2 2
yn + ym
||yn − ym || = 2||yn − x|| + 2||ym − x|| − 4 − x ≤
2
≤ 2||yn − x|| + 2||ym − x||2 − 4δ 2 ,
2

e isso mostra que (yn ) é uma sequência de Cauchy na norma do produto interno. Como
X é um espaço de Hilbert, segue que existe y ∈ X tal que yn → y (na norma), e como Y
é um subespaço fechado, temos que y ∈ Y . Além disso, uma vez que a norma é contı́nua
na topologia forte, temos que ||x − y|| = limn→∞ ||x − yn || = δ.
Em dimensão finita, temos a intuição geométrica de que a distância de um vetor w a
um subespaço que não contém w é realizada na projeção ortogonal de w sobre o subespaço.
Vamos obter algo semelhante aqui: mostraremos que x − y ∈ Y ⊥ . Para isso, note que
dados quaisquer z ∈ Y e t ∈ K, vale que

||(x − y) + tz|| = ||x − (y − tz)|| ≥ δ = ||x − y||,


96 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

onde a desigualdade vem do fato de que y − tz ∈ Y . Segue do Exercı́cio 5.4 que x − y ⊥ z,


e uma vez que z ∈ Y foi tomado arbitrariamente, segue que x − y ∈ Y ⊥ . Portanto, temos
uma decomposição
x = y + (x − y),
onde y ∈ Y e x − y ∈ Y ⊥ , como querı́amos. Finalmente, para provar que X = Y ⊕ Y ⊥ ,
basta mostrar que essa decomposição é única. Se x = z + w com z ∈ Y e w ∈ Y ⊥ . Daı́,
podemos escrever
w − (x − y) = y − z.
Os vetores w e x − y são vetores de Y ⊥ , e portanto y − z ∈ Y ⊥ . Como y, z ∈ Y , segue
que y − z ∈ Y ∩ Y ⊥ , donde y = z. Assim, também vale que w = x − y. Isso mostra que
a decomposição é única.
Para mostrar que (Y ⊥ )⊥ = Y , primeiro observe que a inclusão Y ⊆ (Y ⊥ )⊥ é óbvia.
Agora, seja x = (Y ⊥ )⊥ , e escreva x = y + z, com y ∈ Y e z ∈ Y ⊥ . Note que
0 = hx, zi = hy + z, zi = hz, zi,
onde a primeira desigualdade se justifica pois x ∈ (Y ⊥ )⊥ e z ∈ Y ⊥ , e a segunda desigual-
dade se justifica pois y ∈ Y . Segue que z = 0X , e portanto x = y ∈ Y .

Definição 5.1.5. Sejam (X, h·, ·i) um espaço de Hilbert, e Y ⊆ X um subespaço vetorial
fechado na norma do produto interno. Para cada x ∈ X, seja x = y + y ⊥ a decomposição
de x dada pelo Teorema 5.1.1, e denote y = projY (x). Em outras palavras, projY (x)
é a componente em Y da decomposição de x na soma direta Y ⊕ Y ⊥ . Denominamos
y = projY (x) a projeção ortogonal de x sobre Y . A aplicação projY : X → Y é a projeção
ortogonal sobre Y .
Proposição 5.1.1. Seja Y um subespaço fechado não-trivial de um espaço de Hilbert
(X, h·, ·i). A projeção ortogonal projY : X → Y é um operador linear, limitado (onde Y
é considerado com a norma induzida) e sobrejetivo.
Demonstração. A decomposição de y ∈ Y é y = y + 0X , donde a restrição da aplicação
projY a Y é o operador identidade de Y , e daı́ segue a sobrejetividade. Para a linearidade,
sejam x, z ∈ X, e escreva as decomposições
x = y + y⊥,
z = w + w⊥ ,
com y, w ∈ Y e y ⊥ , w⊥ ∈ Y ⊥ . Seja, também, α ∈ K. Daı́, escrevemos
x + αz = y + αw + (y ⊥ + αw⊥ ),
e notamos que, como Y e Y ⊥ são subespaços vetoriais, valem que y+αw ∈ Y e y ⊥ +αw⊥ ∈
Y ⊥ . Da unicidade da decomposição na soma direta Y ⊕ Y ⊥ , segue que
projY (x + αz) = y + αw = projY (x) + αprojY (z),
e isso mostra a linearidade. Para verificar que projY é um operador limitado, note que
decompondo x = y + z, então pelo Exercı́cio 5.3 temos
||x||2 = ||y||2 + ||z||2 ≥ ||y||2 ,
donde ||projY (x)|| = ||y|| ≤ ||x||. Segue que ||projY ||L(X,Y ) ≤ 1. Na realidade, temos de
fato que ||projY ||L(X,Y ) = 1, uma vez que ||projY (y)|| = ||y|| para qualquer y ∈ Y .
5.2. REPRESENTAÇÃO DE RIESZ 97

5.2 Representação de Riesz


Nesta seção, nosso primeiro objetivo é que um espaço de Hilbert é naturalmente iden-
tificado com seu dual através do produto interno. Uma vez que sempre consideramos a
norma do produto interno em um espaço de Hilbert, segue que o dual de um espaço de
Hilbert é sempre construı́do com respeito à norma do produto interno.
Teorema 5.2.1 (Representação de Riesz). Seja (X, h·, ·iX ) um espaço de Hilbert, e seja
X ∗ seu dual. Para cada x ∈ X, considere o funcional fx : X → K dado por

fx (z) = hx, ziX .

Então, fx ∈ X ∗ com ||fx ||X ∗ = ||x||X . A aplicação F : X → X ∗ definida por F (x) = fx é


uma isometria bijetiva antilinear. A aplicação F é denominada a identificação de Riesz
do espaço de Hilbert X.
Demonstração. Note primeiro que F (0X ) = f0X é o funcional nulo. Assim, vamos assumir
que x 6= 0X . O fato de que fx ∈ X ∗ vem da desigualdade de Cauchy-Schwarz. Para todo
z ∈ X, temos

|fx (z)| = |hx, ziX | ≤ ||x||X ||z||X ,

e assim vem que ||fx ||X ∗ ≤ ||x||X . Para verificar que a igualdade vale, apenas note que
|fx (x)| = |hx, xiX | = ||x||2X . Isso significa
 

fx x
= ||x||X ,
||x||X
donde ||fx ||X ∗ ≥ ||x||X . Observe que isso mostra que F : X → X ∗ é uma isometria.
Vamos provar que F é sobrejetiva. Se f ∈ X ∗ , então ker(f ) é subespaço fechado de X
(pois é a pré-imagem do fechado {0} ⊆ K pela aplicação contı́nua f : X → K), e assim,
pelo Teorema 5.1.1, podemos escrever X como a soma direta

X = ker(f ) ⊕ ker(f )⊥

Se f = 0X ∗ , então é claro que F (0X ) = f , então podemos assumir que f não é o funcional
nulo. Nesse caso, o núcleo ker(f ) é um subespaço próprio, e daı́ segue que ker(f )⊥ não
é trivial. Consequentemente, ker(f )⊥ contém um vetor não-nulo x0 , e multiplicando por
um escalar podemos assumir que ||x0 ||X = 1. Observe que

f (f (x)x0 − f (x0 )x) = 0

para qualquer x ∈ X. Assim, f (x)x0 − f (x0 )x ∈ ker(f ) para todo x ∈ X. Como


x0 ∈ ker(f )⊥ , temos que

0 = hx0 , f (x)x0 − f (x0 )xiX = f (x)||x0 ||2 − hx0 , f (x0 )xiX = f (x) − hf (x0 )x0 , xiX
 
para qualquer x ∈ X. Logo, temos que f = F f (x0 )x0 , e isso mostra que F é sobreje-
tora. A injetividade vem do fato de que se F (x) = F (z), então hx − z, ·iX : X → K é o
funcional nulo. Portanto, hx − z, x − ziX = 0, donde x = z. Finalmente, se x, z ∈ X e
α ∈ K, então

F (x + αz)(y) = hx + αz, yiX = hx, yiX + ᾱhy, ziX = F (x)(y) + ᾱF (z)(y),

para todo y ∈ X. Logo, F (x + αz) = ᾱF (z).


98 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

Observação 5.2.1. A representação de Riesz garante que todo funcional em X ∗ é da forma


hx, ·iX : X → K para um único x ∈ X. A existência dessa identificação é uma diferença
fundamental entre os espaços de Hilbert e os espaços de Banach. Também, observe que
se X é um espaço vetorial sobre R, então a identificação de Riesz é linear.
Corolário 5.2.1. Se X é um espaço de Hilbert, então a norma dual de X ∗ deriva de um
produto interno. Consequentemente, X ∗ é um espaço de Hilbert com esse produto interno.
Demonstração. Defina a aplicação h·, ·iX ∗ : X ∗ × X ∗ → K por

hfx , fz iX ∗ = hz, xiX (5.2.1)

para todos x, z ∈ X. Do teorema da representação de Riesz (Teorema 5.2.1), vem ime-


diatamente que h·, ·iX ∗ é um produto interno em X ∗ . Mais ainda, a norma dual deriva
deste produto interno, uma vez que se fx ∈ X ∗ , então

||fx ||2X ∗ = ||x||2X = |hx, xiX | = |hfx , fx iX ∗ |,

onde usamos o fato de que a identificação de Riesz X 3 x 7→ fx ∈ X ∗ é uma isometria.


Como a norma dual é sempre Banach, segue que (X ∗ , h·, ·iX ∗ ) é um espaço de Hilbert.

No que segue, o dual X ∗ de um espaço de Hilbert X será sempre considerado como


um espaço de Hilbert com o produto interno definido em (5.2.1). A seguir, por exemplo,
a identificação de Riesz de X ∗ será mencionada (e para isso precisamos fixar um produto
interno em X ∗ , é claro).
Corolário 5.2.2. Seja (X, h·, ·iX ) um espaço de Hilbert. Sejam FX : X → X ∗ a iden-
tificação de Riesz de X, e FX ∗ : X ∗ → X ∗∗ a identificação de Riesz de X ∗ . Então, a
composição FX ∗ ◦ FX : X → X ∗∗ é a aplicação canônica de X. Consequentemente, todo
espaço de Hilbert é reflexivo.
Demonstração. Seja x ∈ X. Devemos mostrar que

FX ∗ ◦ FX (x) = x̂,

o que significa provar que FX ∗ ◦ FX (x)(f ) = x̂(f ) para qualquer f ∈ X ∗ , onde notamos
que FX ∗ ◦ FX (x) ∈ X ∗∗ , e portanto é um funcional cujo domı́nio é X ∗ . Seja FX (x) = fx .
O funcional FX ∗ (FX (x)) = FX ∗ (fx ) ∈ X ∗∗ é definido como

FX ∗ (FX (x))(·) = hfx , ·iX ∗ : X ∗ → K

Dado f ∈ X ∗ arbitrário, assuma que f = FX (z) = fz para algum z ∈ X. Temos

FX ∗ (FX (x))(f ) = hfx , f iX ∗ = hfx , fz iX ∗ = hz, xiX = fz (x) = f (x) = x̂(f ),

e isso mostra o desejado. Como FX e FX ∗ são sobrejetivas, segue que a aplicação canônica
de X é sobrejetiva.

Corolário 5.2.3. Toda sequência limitada em um espaço de Hilbert possui subsequência


que converge na topologia fraca.
Demonstração. Como todo espaço de Hilbert é reflexivo, isso segue diretamente do Teo-
rema 4.4.4.
5.2. REPRESENTAÇÃO DE RIESZ 99

Nosso próximo objetivo é enunciar e demonstrar o teorema de Lax-Milgram, que é


uma poderosa generalização do teorema da Representação de Riesz.
Definição 5.2.1. Sejam X e Y K-espaços vetoriais. Uma aplicação b : X × Y → K é
uma forma sesquilinear se é antilinear na primeira variável e linear na segunda variável.
Se X e Y são espaços normados, dizemos que b é limitada se

||b||sesq := sup{|b(x, y)| : x ∈ BX e y ∈ BY } < ∞,

onde lembramos ao leitor que BX e BY denotam, respectivamente, as bolas unitárias


(fechadas) de X e Y . Note que se X e Y são R-espaços vetoriais, então uma forma é
sesquilinear se e somente se é bilinear.
Observe que um produto interno é uma forma sesquilinear, que é limitada com respeito
à norma que induz (isso é consequência da desigualdade de Cauchy-Schwarz). Para o que
segue, lembramos de que, se X e Y são espaços normados, então L(X, Y ) denota o espaço
de operadores limitados T : X → Y . Se X e Y são espaços de Hilbert, então denotamos
por L(X, Y ) o espaço de operadores T : X → Y que são limitados com respeito às normas
dos produtos internos de X e Y , naturalmente.
Proposição 5.2.1. Sejam X e Y espaços de Hilbert, e seja b : X × Y → K uma forma
sesquilinear limitada. Existe um único operador T ∈ L(X, Y ) com a propriedade de que

b(x, y) = hT x, yiY

para quaisquer x ∈ X e y ∈ Y .
Demonstração. Para cada x ∈ X fixado, temos que bx : Y → K definido por bx (y) =
b(x, y) é um funcional linear em Y . É claro que se x = 0X , então bx é o funcional nulo, e
se x 6= 0X , então para todo y ∈ BX vale que
 
x
|bx (y)| = |b(x, y)| = ||x||X b , y ≤ ||x||X ||b||sesq < ∞,
||x||X
donde segue que bx ∈ Y ∗ . Se FY é a identificação de Riesz de Y , então para cada x ∈ X
existe um vetor de Y , que denotaremos por T x, tal que FY (T x) = bx , donde

b(x, y) = bx (y) = hT x, yiY

para todos x ∈ X e y ∈ Y . Vamos mostrar que a aplicação T : X → Y determinada


dessa forma é linear. Se x, z ∈ X e α ∈ K, então, por definição, FY (T (x + αz)) = bx+αz .
Para qualquer y ∈ Y vale que

hT (x + αz), yiY = bx+αz (y) = b(x + αz, y) = b(x, y) + ᾱb(z, y) =


= bx (y) + ᾱbz (y) = hT x, yiY + ᾱhT z, yiY = hT x + αT z, yiY ,

e daı́ vem que T (x + αz) = T x + αT z. Falta mostrar que T é limitada. Se x = 0X , então


é claro que T x = 0Y . Se x 6= 0X , então observando que T x = FY−1 (bx ), e lembrando que
FY é uma isometria, temos que para todo x ∈ BX , vale a desigualdade

||T x||Y = ||FY−1 (bx )||Y = ||bx ||Y ∗ = sup{|bx (y)| : y ∈ BY } =


= sup{|b(x, y)| : y ∈ BY } ≤ ||b||sesq < ∞,

e assim temos ||T ||L(X,Y ) ≤ ||b||sesq .


100 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

Observação 5.2.2. Note que temos, de fato, a igualdade ||T ||L(X,Y ) = ||b||sesq . Isso vem da
igualdade ||T x||Y = ||bx ||Y ∗ , que vale para todo x ∈ X, conforme mostrado acima. Assim,
||T x||L(X,Y ) = sup{||T x||Y : x ∈ BX } = sup{||bx ||Y ∗ : x ∈ BX } =
= sup{|b(x, y)| : x ∈ BX e y ∈ BY } = ||b||sesq .

Definição 5.2.2. Seja (X, ||·||) um espaço normado. Uma forma sesquilinear b : X ×X →
K é dita coerciva se existe uma constante c > 0 com a propriedade de que |b(x, x)| ≥ c||x||2
para qualquer x ∈ X.
Note que o produto interno é uma forma sesquilinear coerciva (na norma induzida por
ele próprio, é claro). Isso vem diretamente da definição da norma do produto interno:
vale que |hx, xi| = ||x||2 para qualquer x ∈ X, então basta tomar c = 1.
Teorema 5.2.2 (Lax-Milgram). Sejam (X, h·, ·iX ) um espaço de Hilbert, e b : X ×X → K
uma forma sesquilinear limitada e coerciva. Para todo f ∈ X ∗ existe um vetor zf ∈ X
tal que
f (x) = b(zf , x)
para todo x ∈ X.
Demonstração. Considere a aplicação T : X → X tal que
b(z, x) = hT z, xiX
para quaisquer z, x ∈ X (dada pela Proposição 5.2.1). Vamos usar a coercividade de b
para mostrar que T : X → X é uma bijeção. Para a injetividade, observe que se T w = T z,
então b(z, x) = b(w, x) para qualquer x ∈ X. Em particular, b(z − w, z − w) = 0, donde
0 = |b(z − w, z − w)| ≥ c||z − w||2 ,
e assim temos z = w. Para a sobrejetividade, vamos começar provando que im(T ) é um
subespaço vetorial fechado em X. Para isso, seja (T zn )n∈N uma sequência em im(T ) tal
que T zn → y. Para quaisquer n, m ∈ N vale que
||T zn − T zm ||X ||zn − zm ||X ≥ |hT zn − T zm , zn − zm iX | = |b(zn − zm , zn − zm )| ≥
≥ c||zn − zm ||2X ,
e portanto (zn ) é uma sequência de Cauchy em X (uma vez que (T zn ) é de Cauchy, pois
é convergente). Como X é Hilbert, existe z ∈ X tal que zn → z. Por continuidade segue
que T zn → T z (lembre-se de que T é limitado), e isso prova que a imagem de T é fechada.
Assim, pela Proposição 5.1.1, podemos escrever X como a soma direta
X = im(T ) ⊕ im(T )⊥ .
Por outro lado, se w ∈ im(T )⊥ , então, em particular, temos
0 = |hT w, wiX | = |b(w, w)| ≥ c||w||2 ,
e, portanto, vem que w = 0X . Isso mostra que im(T )⊥ é o espaço vetorial trivial, e daı́
segue que im(T ) = X.
Agora, dado f ∈ X ∗ , seja z ∈ X tal que FX (z) = fz = f , onde FX é a identificação
de Riesz de X. Pondo zf = T −1 (z) temos
b(zf , x) = b(T −1 z, x) = hT (T −1 z), xiX = hz, xiX = fz (x) = f (x)
para todo x ∈ X. Para verificar a unicidade de zf , basta aplicar o mesmo argumento
usado para provar que T é injetiva.
5.3. O ADJUNTO DE HILBERT 101

5.3 O adjunto de Hilbert


Lembre-se de que o operador adjunto de um operador limitado T : X → Y entre espaços
de Banach é o operador T a ∈ L(Y ∗ , X ∗ ) definido por

T a (g) = g ◦ T,

para cada g ∈ Y ∗ (veja o Exercı́cio 4.23 e a Observação 7.4.3). Dessa forma, um operador
limitado entre espaços de Banach induz um operador limitado entre seus duais. Se os
espaços envolvidos são Hilbert, então usando a identificação de Riesz podemos representar
o adjunto como um operador entre os espaços originais, e não mais entre seus duais.
Definição 5.3.1. Sejam X e Y espaços de Hilbert, e denote por FX e FY as identificações
de Riesz de X e Y , respectivamente. Se T ∈ L(X, Y ), então o adjunto de Hilbert de T é
o operador T ∗ definido por

T ∗ = (FX )−1 ◦ T a ◦ FY : Y → X.

Teorema 5.3.1. Sejam X e Y espaços de Hilbert, e seja T ∈ L(X, Y ). O adjunto de


Hilbert T ∗ de T é um operador linear limitado de Y em X, e vale que ||T ∗ ||L(Y,X) =
||T ||L(X,Y ) . Mais ainda, vale que

hT ∗ y, xiX = hy, T xiY (5.3.1)

para quaisquer x ∈ X e y ∈ Y , e T ∗ é o único operador limitado com essa propriedade.


Demonstração. Se y ∈ BY , então como FX e FY são isometrias, e como ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) =
||T ||L(X,Y ) (veja a Observação 7.4.3), temos que

||T ∗ y||X = ||FX−1 (T a (FY (y)))||X = ||T a (FY (y))||X ∗ ≤ ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) ||FY (y)||Y ∗ =
= ||T ||L(X,Y ) ||y||Y ,

e daı́ segue ||T ∗ ||L(Y ∗ ,X ∗ ) ≤ ||T ||L(X,Y ) . Para verificar que a igualdade vale, seja (gn )
uma sequência em BY ∗ tal que ||T a gn ||X ∗ → ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) , e para cada n ∈ N seja
yn = FY−1 (gn ). Assim, cada yn é um ponto de BY (pois FY ) é uma isometria, e

||T ∗ yn ||X = ||FX−1 (T a (gn ))||X = ||T a gn ||X ∗ ,

donde ||T ∗ yn ||X → ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) = ||T ||L(X,Y ) quando n → ∞. Consequentemente, temos
||T ∗ ||L(Y,X) ≥ ||T ||L(X,Y ) , e portanto vale a igualdade.
Agora, sejam x ∈ X e y ∈ Y arbitrários. Por simplicidade, denote FY (y) = gy . Temos

hT ∗ y, xiX = hFX−1 (T a (gy )), xiY = T a (gy )(x) = gy (T x) = hy, T xiY ,

onde T a (gy )(x) denota o funcional T a (gy ) ∈ X ∗ avaliado em x ∈ X. A unicidade de T ∗


vem do Exercı́cio 5.11 e da Proposição 5.2.1, e está discutida na Observação 7.5.1.

Definição 5.3.2. Seja X um espaço de Hilbert. Um operador T ∈ L(X, X) é dito


auto-adjunto se T = T ∗ .
Teorema 5.3.2 (Hellinger-Toeplitz). Sejam X um espaço de Hilbert, e T : X → X um
operador linear que satisfaz

hT x, ziX = hx, T ziX ,

para quaisquer x, z ∈ X. Então, T é limitado. Consequentemente, T é auto-adjunto.


102 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

Demonstração. Seja x ∈ BX . A aplicação fx (z) = hT x, ziX é um funcional linear em X,


e da desigualdade de Cauchy-Schwarz vem que

|fx (z)| = |hT x, ziX | ≤ ||T x||X ||z||X ,

e daı́ vem que

||fx ||X ∗ ≤ ||T x||X ,

donde fx ∈ X ∗ (lembre-se de que x está fixado). Além disso, a desigualdade

|fx (z)| = |hT x, ziX | = |hx, T ziX | ≤ ||x||X ||T z||X ≤ ||T z||X

que vale sempre que x ∈ BX para qualquer z ∈ X, garante que a famı́lia de operadores
entre espaços de Banach

F = {fx : X → K : x ∈ BX }

tem a propriedade de que

sup{|fx (z)| : x ∈ BX } < ∞

para cada z ∈ X fixado. Segue do princı́pio da limitação uniforme (Teorema 3.3.2) que
existe um número c > 0 tal que

|fx (z)| ≤ c||z||X

para quaisquer x ∈ BX e z ∈ X. Em particular, para todo x ∈ BX vale que |fx (T x)| ≤ c,


e daı́

||T x||2X = |hT x, T xiX | = |fx (T x)| ≤ c||T x||X ,

e assim vem ||T x||X ≤ c para todo x ∈ X. Isso mostra que T é limitado.
Pelo Teorema 5.3.1, o adjunto de Hilbert T ∗ de T é o único operador linear com a
propriedade de que hT ∗ x, ziX = hx, T ziX para quaisquer x, z ∈ X. Como T tem essa
propriedade por hipótese, segue que T = T ∗ .

5.4 Bases ortonormais


Definição 5.4.1. Uma base ortonormal em um espaço de Hilbert X é um subconjunto
{eλ }λ∈L ⊆ X com as seguintes propriedades:

(i) ||eλ ||X = 1 para todo λ ∈ L.

(ii) eλ ⊥ eα sempre que λ, α ∈ L com λ 6= α.

(iii) cl(span{eλ }λ∈L ) = X.


Observação 5.4.1. Um subconjunto que satisfaz (i) e (ii) é dito ortonormal . Um subcon-
junto Y de um espaço normado X com a propriedade de que span(Y ) é denso (na norma)
em X é dito total . Assim, uma base ortonormal é um subconjunto ortonormal total.
Exemplo 5.4.1. A base canônica {en }n∈N de `2 (N), formada pelas sequências en em que
todas as entradas são iguais a 0, exceto a n-ésima, que é igual a 1, é uma base ortonormal.
5.4. BASES ORTONORMAIS 103

Lembramos ao leitor que span(Y ) é o conjunto das combinações lineares finitas de


vetores de Y . Em um espaço de dimensão finita Kn , uma das motivações para usar bases
ortonormais é que, se {e1 , . . . , en } é uma dessas bases, então todo vetor x ∈ Kn admite a
decomposição

x = hx, e1 ie1 + hx, e2 ie2 + . . . + hx, en ien .

Vamos investigar sob que condições algo similar pode ser feito em espaços de dimensão
infinita. Observe que uma base ortonormal em um espaço de Hilbert pode não ser nem
mesmo enumerável, e portanto não podemos definir um análogo direto da soma acima para
o caso de dimensão infinita. Antes, vamos estudar a existência de bases ortonormais. É
um resultado clássico de álgebra linear que todo espaço de Hilbert de dimensão finita
(não-trivial) possui uma base ortonormal. Agora, vamos enunciar e provar um resultado
de existência que também vale para espaços de Hilbert com dimensão infinita.
Teorema 5.4.1. Todo espaço de Hilbert não trivial tem base ortonormal.
Demonstração. Se X um espaço de Hilbert não-trivial, então podemos tomar um vetor
x ∈ X com x 6= 0X , e segue que {x/||x||X } é um subconjunto ortonormal de X. Assim, a
coleção E de subconjuntos ortonormais de X é não-vazia. A inclusão define uma ordenação
parcial em E, e se E 0 ⊆ E é uma subcoleção totalmente ordenada, então a união de todos
os elementos de E 0 é um limite superior para E 0 . Pelo lema de Zorn (Lema 2.3.4), segue
que E possui um elemento maximal E, que vamos provar ser uma base ortonormal. Como
E ⊆ E, temos que E é ortonormal, e portanto, devemos mostrar que cl(span(E)) = X.
Se isso não é verdade, então escrevendo X como a soma direta

X = cl(span(E)) ⊕ cl(span(E))⊥ ,

obtemos que cl(span(E))⊥ é um subespaço vetorial não-trivial. Assim, se z ∈ cl(span(E))⊥ ,


então E ∪ {z/||z||X } é um subconjunto ortonormal de X, e isso contradiz a maximalidade
de E.

Proposição 5.4.1 (Desigualdade de Bessel). Seja {eλ }λ∈L um subconjunto ortonormal


de um espaço de Hilbert X. Para cada x ∈ X valem as seguintes propriedades:

(i) O conjunto N = {λ ∈ L : heλ , xiX 6= 0} ⊆ L é enumerável.

(ii) λ∈N |heλ , xiX | ≤ ||x||2X , onde a soma é tomada com respeito a qualquer enumeração
P
de N .

Esta desigualdade é conhecida como desigualdade de Bessel.


Demonstração. Considere, primeiro, um subconjunto enumerável {eλj }j∈N , e seja x ∈ X.
Para cada n ∈ N, ponha
n
X
xn = x − heλj , xiX eλj ,
j=1

e note que xn ⊥ eλj para quaisquer n ∈ N e 1 ≤ j ≤ n, e assim


n
X
xn ⊥ heλj , xiX eλj
j=1
104 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

para qualquer n ∈ N. Logo, pelo Exercı́cio 5.3 temos que


n 2 n 2 n
2
X X X
heλj , xiX eλj ≤ ||xn ||2 + heλj , xiX eλj = xn + heλj , xiX eλj = ||x||2X


j=1 X j=1 X j=1 X

Como {eλj }n∈N é um subconjunto ortonormal, segue que


2
Xn n
X
heλj , xiX eλj = |heλj , xiX |2 ,


j=1 X j=1

e portanto vem que vale a desigualdade


n
X
|heλj , xiX |2 ≤ ||x||2X (5.4.1)
j=1

para qualquer n ∈ N. Se L é um conjunto finito, então basta ordenar L e tomar esta


desigualdade com n0 = max{L}. Se L é infinito e enumerável, então podemos assumir
que λj é uma enumeração de L, e notamos que a sequência
n
X
zn = |heλj , xiX |2
j=1

é uma seqência monótona e limitada (por ||x||2X ) de números reais. Segue que zn converge,
e que

X
lim zn = |heλj , xiX |2 ≤ ||x||2X ,
n→∞
j=1

e isso é a desigualdade de Bessel para o caso enumerável. Agora, assuma que L não é
enumerável, e para cada m ∈ N considere o conjunto

Lm = {λ ∈ L : |heλ , xiX | ≥ 1/m},

e note que da desigualdade (5.4.1) temos que cada conjunto Lm é finito. Como é claro
que

[
N= Lm ,
m=1

segue que N é uma união enumerável de conjuntos finitos, e portanto N é enumerável.


Isso conclui a prova, uma vez que já demonstramos a desigualdade de Bessel para o caso
de um conjunto enumerável de ı́ndices.

Note que, para a desigualdade de Bessel, não assumimos que {eλ }λ∈L é uma base
ortonormal, mas sim que é um conjunto ortonormal. A seguir, vamos investigar o caso
em que {eλ }λ∈L é, de fato, uma base ortonormal.
Teorema 5.4.2. Sejam X um espaço de Hilbert, e E = {eλ }λ∈L uma base ortonormal.
Para qualquer x ∈ X, a série de Fourier de x com respeito a E, definida como
X
heλ , xiX eλ ,
λ∈L
5.4. BASES ORTONORMAIS 105

onde a soma é tomada com respeito a qualquer enumeração de N = {λ ∈ L : hx, eλ iX 6= 0}


converge (na norma) para x. Além disso, para todo x ∈ X vale a identidade de Parseval:
X
|heλ , xiX |2 = ||x||2X ,
λ∈L

onde, mais uma vez, a soma é feita com respeito à qualquer enumeração de N .
Demonstração. Se x ∈ X, então pela Proposição temos que N = {λ ∈ L : heλ , xiX 6= 0}
é enumerável, e assim, fixando uma enumeração j 7→ λj qualquer de N , podemos denotar
eλj = ej , para cada j ∈ N. Assim, queremos mostrar que
n
X ∞
X
x = lim hej , xiX ej = hej , xiX ej .
n→∞
j=1 j=1

Vamos primeiro garantir que o limite acima existe. Para isso, vamos usar a Proposição
5.4 e mostrar que a sequência de somas parciais é uma sequência de Cauchy em X. Se
m, n ∈ N são tais que m > n, então
m 2 2
X Xn m
X m
X
hej , xiX ej − hej , xiX ej = hej , xiX ej = |hej , xiX |2 → 0


j=1 j=1 X j=n+1 j=n+1

quando n, m → ∞, uma vez que da desigualdade de Bessel vem que a série ∞ 2


P
j=1 |hej , xiX |
é convergente. Como X é completo vem que a soma de fato converge para algum z ∈ X.
Para mostrar que z = x, observe que do Exercı́cio 5.14 temos que é suficiente provar que
x − z ⊥ eλ para todo λ ∈ L. Essa ortogonalidade é imediata se λ ∈ / N . Caso contrário,
eλ = ek para algum k ∈ N, e temos
D ∞
X E D n
X E
hek , x − ziX = ek , x − hej xiX ej = lim ek , x − hej , xiX ej = 0,
X n→∞ X
j=1 j=1

onde usamos a continuidade do produto interno na segunda igualdade (veja o Exercı́cio


5.2). Note que o produto interno dentro do limite acima é igual a 0 para todo n ≥ k.
Para a identidade de Parseval, primeiro observe que vale as igualdades
D X n E n
DX E n
X
x, hej , xiX ej = hej , xiX ej , x = |hej , xiX |2 ,
X X
j=1 j=1 j=1

para todo n ∈ N. Daı́ segue que


n
2 n

X X
2 2
x − hej , xiX ej = ||x||X − |hej , xiX | ,


j=1 X j=1

para qualquer n ∈ N. Pela convergência da série de Fourier que acabamos de mostrar (e


pela continuidade da norma), temos que o primeiro termo da igualdade acima converge
para 0 quando n → ∞. Logo, pela continuidade do módulo vem que
n
X ∞
X
||x||2X = lim 2
|hej , xiX | = |hej , xiX |2 ,
n→∞
j=1 j=1

e isso conclui a demonstração.


106 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

5.5 Dimensão de Hilbert


Em um espaço vetorial de dimensão finita, quaisquer duas bases têm a mesma quantidade
de elementos. Essa quantidade é a dimensão do espaço. Em espaços de Hilbert em
dimensão infinita, nada foi discutido ainda sobre a cardinalidade de uma base ortonormal.
Isso será feito agora.

Proposição 5.5.1. Seja X um espaço de Hilbert. Todas as bases ortonormais de X tem


a mesma cardinalidade.

Demonstração. O caso de dimensão finita é um resultado de álgebra linear. Vamos assu-


mir, portanto, que X tem dimensão infinita. Sejam E = {eλ }λ∈LE e F = {fσ }σ∈LF bases
ortonormais de X. Pela Proposição 5.4 temos que para cada σ ∈ LF o conjunto

Eσ = {eλ ∈ E : heλ , fσ iX 6= 0}

é enumerável. Além disso, para cada eλ existe σ ∈ LF tal que heλ , fσ iX 6= 0. Com efeito,
se eλ ⊥ fσ para todo σ, então temos que eλ = 0 (veja o Exercı́cio 5.14). Daı́, segue que
[
E= Eσ .
σ∈LF

Ou seja, E se escreve como uma reunião de conjuntos contáveis indexados por LF . Segue
que #E ≤ #F . Repetindo o argumento para F segue a desigualdade inversa. Isso mostra
o desejado.

Definição 5.5.1. A dimensão de Hilbert de um espaço de Hilbert é a cardinalidade de


uma sua base ortonormal.

É um resultado clássico de álgebra linear que dois espaços vetoriais têm a mesma
dimensão se, e somente se, são isomorfos. A noção de isomorfismo em espaços de Hilbert
é dada pelos operadores unitários, definidos no Exercı́cio 5.13. Vamos enunciar e provar
um análogo para essa relação entre isomorfismo e dimensão em espaços de Hilbert.

Proposição 5.5.2. Dois espaços de Hilbert (sobre um mesmo corpo K) são unitariamente
equivalentes se, e somente se, têm a mesma dimensão de Hilbert.

Demonstração. Sejam X e Y espaços de Hilbert, e assuma que U : X → Y é um operador


unitário. Seja E = {eλ }λ∈L uma base ortonormal de X. Vamos provar que U (E) é uma
base ortonormal de Y . Com efeito, como U preserva o produto interno, é imediato que
U (E) é um conjunto ortonormal. Mais ainda, se y ∈ Y , então y = U x para algum x ∈ X.
Seja (xn )n∈N uma sequência em span(E) tal que xn → x. Como U é isometria, temos
que U xn → y, e por linearidade também vale que U xn ∈ span(U (E)) para cada n ∈ N.
Assim, segue que cl(span(U (E))) = Y , e portanto U (E) é, de fato, uma base ortonormal
de Y . Da Proposição 5.5.1 vem que X e Y tem a mesma dimensão de Hilbert, uma vez
que têm bases ortogonais com a mesma cardinalidade.
Agora, assuma que X e Y são espaços de Hilbert com a mesma cardinalidade. Sejam
E = {eλ }λ∈L e F = {fσ }σ∈L bases ortonormais de X e Y , respectivamente, e note que
usamos o mesmo conjunto de ı́ndices pois E e F têm a mesma cardinalidade. Defina o
operador U0 : span(E) → Y por

U0 (α1 eλ1 + . . . + αn eλn ) = α1 fλ1 + . . . + αn fλn ,


5.6. EXERCÍCIOS 107

para quaisquer n ∈ N, λ1 , . . . , λn ∈ L e α1 , . . . , αn ∈ K. Observe que U0 é claramente


uma aplicação que preserva o produto interno, donde é uma isometria. Entretanto, U0 não
está definida em X. Para resolver este problema, note que se (xn )n∈N é uma sequência em
span(E) com xn → x em X, então (U0 xn )n∈N é uma sequência de Cauchy em Y , donde
U0 xn → y para algum y ∈ Y . Assim, podemos definir U : X → Y tal que U = U0 em
span(E), e
U x = lim U0 xn
n→∞

para x ∈ X \span(E), onde (xn ) é qualquer sequência em span(E) tal que xn → x. É claro
que U x independe da sequência escolhida, uma vez que se (zn )n∈N é uma sequência em
span(E) tal que zn → 0X , então U0 zn → 0Y . Além disso, a linearidade de U é imediata, e
também temos da continuidade do produto interno (veja o Exercı́cio 5.2) que U preserva
o produto interno. Assim, para provar que U é um operador unitário, basta verificar que
U é sobrejetivo. Se y ∈ Y , então y = limn→∞ yn para alguma sequência yn ∈ span(F ).
Para cada n ∈ N, escreva
yn = α1n fλ1 + . . . + αkn fλk ,
onde k = k(n) é a quantidade de termos da decomposição de yn como combinação linear
finita de yn . Assim, é claro que
U0 (α1n eλ1 + . . . + αkn fλk ) = yn .
Escrevendo, para cada n ∈ N, xn = α1n eλ1 + . . . + αkn eλk , vem que (xn )n∈N é uma sequência
de Cauchy em X (de novo, estamos lembrando que U0 é uma isometria). Logo, xn → x
em X, e, por definição, U x = y. Isso conclui a prova.

No caso de dimensão infinita, a cardinalidade mais “simples” é a dos conjuntos enu-


meráveis. Assim, é natural investigar espaços de Hilbert em que as bases ortonormais são
enumeráveis. O próximo resultado estabelece que essa propriedade é equivalente a uma
propriedade topológica do espaço.
Proposição 5.5.3. Um espaço de Hilbert tem uma base ortonormal enumerável se, e
somente se, é separável (na topologia da norma).
Demonstração. Se X é separável, então do Exercı́cio 5.17 segue que X contém um sub-
conjunto enumerável linearmente independente que é total. Aplicando o processo de
Gram-Schmidt clássico indutivamente, obtemos uma base ortonormal de X.
No outro sentido, seja E = {ej }j∈N uma base ortonormal de X. Uma vez que
cl(span(E)) = X, segue que cl(spanQ (E)) = X. Além disso, spanQ (E) é enumerável.
Portanto, X é separável.

5.6 Exercı́cios
Exercı́cio 5.1. Mostre que a aplicação h·, ·iX introduzida no Exemplo 5.1.1 é, de fato,
um produto interno.
Exercı́cio 5.2. Seja h·, ·i um produto interno em um espaço vetorial X. Prove que para
cada y ∈ X fixado, a aplicação x 7→ hx, yi : X → K é contı́nua na topologia dada em X
pela norma do produto interno. Mostre que isso também é verdade se fixarmos a primeira
coordenada.
108 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

Exercı́cio 5.3. Seja (X, h·, ·i) um espaço de produto interno, e seja ||·|| a norma induzida
pelo produto interno. Mostre que se x ⊥ y, então ||x + y||2 = ||x||2 + ||y||2 .

Observação 5.6.1. Note que também vale ||x − y||2 = ||x||2 + ||y||2 quando x ⊥ y.

Exercı́cio 5.4. Sejam x, y ∈ (X, h·, ·i). Prove que x ⊥ y se, e somente se,

||x + ty|| ≥ ||x||

para todo t ∈ K. Em outras palavras, a ortogonalidade de Birkhoff na norma induzida


pelo produto interno é equivalente à ortogonalidade de produto interno. Veja também o
Exercı́cio 2.14 (para o caso real).

Exercı́cio 5.5. Sejam X um espaço de produto interno, e Y ⊆ X um subconjunto.


Mostre que Y ∩ Y ⊥ ⊆ {0X }.

Exercı́cio 5.6. Prove que se || · || é uma norma induzida por um produto interno em um
espaço vetorial X, então vale que

||x + y||2 + ||x − y||2 = 2||x||2 + 2||y||2 ,

para quaisquer x, y ∈ X. Este resultado é conhecido como lei do paralelogramo.

Observação 5.6.2. A volta deste resultado também vale: se a norma de um espaço normado
satisfaz à lei do paralelogramo, então essa norma deriva de um produto interno.

Exercı́cio 5.7. Seja Y um subespaço fechado de um espaço de Hilbert X, e seja projY :


X → Y a projeção ortogonal sobre Y (veja a Definição 5.1.5). Mostre que

projY ◦ projY = projY , e que


projY ⊥ = IdX − projY .

Conclua que projY ⊥ ◦ projY = 0L(X,X) .

Observação 5.6.3. É claro que o exercı́cio acima também vale se trocarmos as posições de
Y e Y ⊥ , uma vez que (Y ⊥ )⊥ = Y .

Exercı́cio 5.8. Prove que qualquer norma dada por um produto interno é estritamente
convexa (veja o Exercı́cio 3.12).

Exercı́cio 5.9. Sejam X um espaço de Hilbert e f ∈ X ∗ um funcional não-nulo. Mostre


que dim(ker(f )⊥ ) = 1. Verifique que a única direção de ker(f )⊥ é dada pela identificação
de Riesz.

Exercı́cio 5.10. (a) Seja Y um subespaço vetorial fechado de um espaço de Hilbert X.


Assuma que x = y + y ⊥ , onde y ∈ Y e y ⊥ ∈ Y ⊥ . Prove que y e y ⊥ são os únicos elementos
de Y e Y ⊥ , respectivamente, cujas distâncias a x são minimais.

(b) Mostre que um subconjunto convexo, fechado e não-vazio K de um espaço de Hilbert


X tem um único elemento de norma minimal.
5.6. EXERCÍCIOS 109

Exercı́cio 5.11. Sejam X e Y espaços de Hilbert, e seja T ∈ L(X, Y ). Defina b : Y ×X →


K por
b(y, x) = hy, T xiY .
Prove que b(y, x) é uma forma sesquilinear limitada. Pela Proposição 5.2.1, segue que
existe um único operador limitado S : Y → X tal que
b(y, x) = hSy, xiX .
Mostre que S é o adjunto de Hilbert de T .
Exercı́cio 5.12. Seja T ∈ L(X, Y ) um operador entre espaços de Hilbert. Mostre que
(T ∗ )∗ = T .
Exercı́cio 5.13. Sejam X e Y espaços de Hilbert. Um operador linear U : X → Y é
unitário se é sobrejetivo e vale que hU x, U ziY = hx, ziX para quaisquer x, z ∈ X. Dois
espaços de Hilbert X e Y são ditos unitariamente equivalentes se existe um operador
unitário U : X → Y .

(a) Demonstre que um operador unitário é um isomorfismo entre os espaços de Banach


X e Y com as normas induzidas pelos respectivos produtos internos.

(b) Seja U ∈ L(X, Y ) um operador invertı́vel. Prove que U é unitário se, e somente se,
U −1 = U ∗ .

(c) Mostre que o subconjunto de L(X, X) de operadores unitários é um grupo com a


operação de composição de operadores.
Exercı́cio 5.14. Seja E = {eλ }λ∈L um subconjunto ortonormal de um espaço de Hilbert
X. Prove que E é uma base ortonormal se, e somente se, o único vetor x ∈ X com
a propriedade de que x ⊥ eλ para todo λ ∈ L é o vetor nulo (em outras palavras,
E ⊥ = {0X }).
Exercı́cio 5.15. Prove que toda sequência ortonormal em um espaço de Hilbert X con-
verge fracamente a 0X , mas não tem subsequência fortemente convergente.
Exercı́cio 5.16. Sejam X e Y dois espaços de Hilbert, e seja U : X → Y um operador
unitário. Prove que a imagem de uma base ortonormal de X por U é uma base ortonormal
de Y .
Exercı́cio 5.17. Mostre que um espaço normado é separável se, e somente se, contém
um subconjunto enumerável e linearmente independente que é total.
Exercı́cio 5.18. Seja (X, h·, ·iX ) um espaço de Hilbert sobre C, e seja T : X → X um
operador linear. Prove que se hT x, xiX = 0 para todo x ∈ X, então T é o operador nulo.
Exercı́cio 5.19. Prove que se T ∈ L(X, X), onde X é um C-espaço de Hilbert, então T
é auto-adjunto se, e somente se, hT x, xiX ∈ R para todo x ∈ X.
Exercı́cio 5.20 (Propriedades do adjunto de Hilbert). Sejam X e Y espaços de Hilbert,
α ∈ K um escalar, e T, S ∈ L(X, Y ) operadores limitados.

(a) Prove que (T + S)∗ = T ∗ + S ∗ , e que (αT )∗ = ᾱT ∗ .

(b) Mostre que se T é um isomorfismo, então (T −1 )∗ = (T ∗ )−1 .

(c) Se X = Y (com o mesmo produto interno), demonstre que ker(T ) = im(T ∗ )⊥ .


110 CAPÍTULO 5. ESPAÇOS DE HILBERT

Exercı́cio 5.21. Sejam T e S operadores limitados entre espaços de Hilbert tais que a
composição T ◦ S está bem definida. Prove que (T ◦ S)∗ = S ∗ ◦ T ∗ .
Capı́tulo 6

Espaços de funções integráveis

6.1 σ-álgebras e medidas


Definição 6.1.1. Seja X um conjunto. Uma coleção Σ de subconjuntos de X é uma
σ-álgebra em X se satisfaz:

(a) X ∈ Σ.

(b) Se A ⊆ Σ, então X \ A ∈ Σ.

(c) Se {An }n∈N é uma coleção enumerável de elementos de Σ, então



[
An ∈ Σ.
n=1

Um conjunto X munido de uma σ-álgebra Σ é dito um um espaço mensurável. Os


conjuntos de Σ são chamados de conjuntos mensuráveis.
Em outras palavras, uma σ-álgebra em um conjunto X é uma coleção Σ de subconjun-
tos de X que é fechada para complementação e para união enumerável, e tal que X ∈ Σ.
Note que como consequência imediada de (a) e (b), temos imediatamente que ∅ ∈ Σ.
Além disso, vem de (c) que Σ é fechada para união finita, isto é, se A1 , . . . , Am ∈ Σ, então
m
[
An ∈ Σ.
n=1

De fato, basta tomar An = ∅ se n > m na propriedade (c) da definição. Finalmente,


uma σ-álgebra também é sempre fechada para interseções enumeráveis. Para verificar
isto basta escrever
∞ ∞
!
\ [
An = X \ X \ An ,
n=1 n=1

e usar as propriedades (b) e (c) da definição.


Se X é um conjunto qualquer, então é claro que as coleções {∅, X} e 2X são σ-álgebras
em X (lembre-se de que 2X denota o conjunto das partes de X). Para exemplos menos
triviais de σ-álgebras, referimos o leitor aos Exercı́cios 6.2 e 6.3. A seguir, mostraremos
que uma interseção de σ-álgebras é uma σ-álgebra. Isso será importante para definir uma
σ-álgebra “conveniente”em um dado espaço topológico de forma que todos os conjuntos
abertos sejam mensuráveis.

111
112 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Lema 6.1.1. Seja F = {Σj }j∈J uma famı́lia qualquer de σ-álgebras de um conjunto X.
A interseção de F é uma σ-álgebra de X.

Demonstração. Por simplicidade, denote


\ \
F= Σj = {E ⊆ X : E ∈ Σj para todo j ∈ J}.
j∈J

T
Como X ∈ Σj para cada j ∈ J, segue que X ∈ F. Se A ∈ Σj para todo j ∈ J, então T
como cada Σj é uma σ-álgebra, temos que X \A ∈ Σj para
T cada j ∈ J. Daı́, X \A ∈ F.
Finalmente, se {An }n∈N é uma coleção enumerável
T em F, então sua união pertence a
cada Σj , e portanto pertence à interseção F.

Este lema simples tem a seguinte consequência: se C ⊆ 2X é uma coleção de subcon-


juntos de X, então podemos definir a menor σ-álgebra que contém C como a interseção
de todas as σ-álgebras de X que contém C (compare com o Teorema 4.1.1).

Lema 6.1.2. Equivalentemente, a menor σ-álgebra que contém uma coleção C de subcon-
juntos de X, que denotaremos por ΣC , é a única σ-álgebra contendo C que está contida
em qualquer σ-álgebra que contém C.

Demonstração. Primeiro, vamos verificar a unicidade da σ-álgebra com a propriedade


enunciada acima. Se Σ1 e Σ2 são σ-álgebras contendo C que estão contidas em qualquer
σ-álgebra que contém C, então segue que Σ1 ⊆ Σ2 e Σ2 ⊆ Σ1 , e portanto Σ1 = Σ2 .
Denote
T por FC a famı́lia de todas as σ-álgebras de X que contém C, e observe que
ΣC = FC . Se Σ é uma σ-álgebra de X que contém C, então Σ ∈ FC , e portanto
\
ΣC = FC ⊆ Σ.

Isso mostra que ΣC está contida em qualquer σ-álgebra de X que contém C. Observe que
isso garante que de fato existe uma σ-álgebra com a propriedade descrita no enunciado, e
a unicidade que demonstramos anteriormente garante que ela é precisamente a interseção
de todas as σ-álgebras que contém C. Mais ainda, note que essa interseção é não-vazia,
uma vez que 2X ∈ FC .

Definição 6.1.2. A σ-álgebra de Borel de um espaço topológico (X, τ ) é a menor σ-


álgebra de X que contém a topologia τ . Os conjuntos da σ-álgebra de Borel de (X, τ ) são
chamados de conjuntos de Borel (ou borelianos).

Observação 6.1.1. Observe que segue diretamente da definição de σ-álgebra (Definição


6.1.1) que todos os fechados de (X, τ ) são conjuntos de Borel, bem como todas as uniões
enumeráveis de fechados, e todas as interseções enumeráveis de abertos. Intuitivamente,
isso faz com que, em geral, a σ-álgebra de Borel seja “maior”do que a topologia, no sentido
de que tem mais conjuntos.
Vamos prosseguir introduzindo a importante noção de medida. Intuitivamente, uma
medida em uma σ-álgebra é uma forma de atribuir “volume”a cada conjunto mensurável.
Uma vez que gostarı́amos de assumir que alguns conjuntos têm “volume infinito”, suge-
rimos ao leitor que consulte o Exercı́cio 6.4 antes de prosseguir.
6.1. σ-ÁLGEBRAS E MEDIDAS 113

Definição 6.1.3. Uma medida σ-aditiva (ou, simplesmente, uma medida) em um espaço
mensurável (X, Σ) é uma função µ : Σ → [0, +∞] que satisfaz:

(a) Para qualquer coleção enumerável {An }n∈N de conjuntos mensuráveis mutuamente
disjuntos (isto é, tais que Ai ∩ Aj = ∅ sempre que i 6= j) vale que

! ∞
[ X
µ An = µ(An ).
n=1 n=1

(b) µ(∅) = 0.

Um espaço mensurável (X, Σ) munido de uma medida µ : Σ → [0, ∞] é dito um espaço


de medida. Se µ(X) < ∞, então µ é uma medida finita, e se µ(X) = 1, então µ é uma
medida de probabilidade. Um espaço mensurável com uma medida de probabilidade é
chamado de espaço de probabilidade.

Observação 6.1.2. A propriedade (a) é chamada de σ-aditividade, e a propriedade (b)


pode ser substituı́da por exigir que exista algum conjunto A ∈ Σ com medida finita. Com
efeito, se esse é o caso, então basta escrever A = A ∪ ∅ ∪ ∅... e usar a propriedade (a) para
verificar que µ(∅) = 0.
Antes de estudar algumas propriedades das medidas, vamos exibir alguns exemplos
importantes. Veja, também, o Exercı́cio 6.6.
Exemplo 6.1.1 (A medida de Dirac). Seja (X, Σ) um espaço mensurável não-vazio, e seja
x0 ∈ X. A medida de Dirac de X em x0 (ou concentrada em x0 é a medida δx0 : Σ →
[0, +∞] definida como

1, se x0 ∈ E
δx0 (E) = ,
0, se x0 ∈
/E

para qualquer E ∈ Σ. Note que a medida de Dirac é uma medida de probabilidade.


Exemplo 6.1.2 (A medida de contagem). A função µ : 2N → [0, +∞] definida por µ(E) =
#E para cada E ⊆ N é uma medida na σ-álgebra 2N de N. Chamamos essa medida de
medida de contagem de N.

Proposição 6.1.1. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Então valem:

(a) Se m ∈ N e E1 , . . . , Em ∈ Σ são disjuntos dois-a-dois, então


m
X
µ(E1 ∪ E2 ∪ . . . ∪ Em ) = µ(Ej ),
j=1

isto é, µ é aditiva.

(b) Se A, E ∈ Σ são tais que A ⊆ E, então µ(A) ≤ µ(E).

(c) Para qualquer sequência {Ej }j∈N em Σ vale a desigualdade



! ∞
[ X
µ Ej ≤ µ(Ej ).
j=1 j=1
114 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Demonstração. Para (a), basta considerar que Ej = ∅ para todo j > m e as propriedades
de µ:

! ∞ m
[ X X
µ(E1 ∪ . . . ∪ Em ) = µ Ej = µ(Ej ) = µ(Ej ).
j=1 j=1 j=1

Prosseguindo, obtemos a afirmação do ı́tem (b) escrevendo E = A ∪ (E \ A) e usando a


aditividade mostrada em (a) para obter

µ(E) = µ(A) + µ(E \ A) ≥ µ(A),

uma vez que µ(E \ A) ≥ 0.


Para (c), escreva A1 = E1 , A2 = E2 \ E1 , A3 = E3 \ (E1 ∪ E2 ), e para cada n > 3,
n−1
!
[
An = En \ Ej .
j=1

Assim, {An }n∈N é uma sequência de conjuntos mutuamente disjuntos em Σ (veja o


Exercı́cio 6.1). Também, é claro que

[ ∞
[
An = Ej ,
n=1 j=1

e daı́ vem

! ∞
! ∞ ∞
" n−1
!#
[ [ X X [
µ Ej =µ An = µ(An ) = µ(E1 ) + µ(En ) − µ Ei =
j=1 n=1 n=1 n=2 i=1
∞ ∞ n−1
! ∞
X X [ X
= µ(En ) − µ Ei ≤ µ(En ),
n=1 n=2 i=1 n=1

onde a terceira igualdade vem imediatamente do fato de que µ(A \ B) = µ(A) − µ(B)
sempre que A, B ∈ Σ (veja o Exercı́cio 6.7).

Nas mesmas condições da proposição anterior, temos os seguintes resultados sobre


sequências crescentes e decrescentes de conjuntos.

Proposição 6.1.2. (a) Se {Ej }j∈N é uma sequência crescente de conjuntos mensuráveis,
isto é, com a propriedade de que Ej ⊆ Ej+1 para qualquer j ∈ N, então vale a igualdade

!
[
µ Ej = lim µ(Ej ).
j→∞
j=1

(b) Seja {Ej }j∈N uma sequência decrescente em Σ, isto é, com a propriedade de que
Ej ⊇ Ej+1 para cada j ∈ N. Se µ(E1 ) < ∞, então

!
\
µ Ej = lim µ(Ej ).
j→∞
j=1
6.1. σ-ÁLGEBRAS E MEDIDAS 115

Demonstração. Para (a), para cada n ∈ N defina An+1 = En+1 \ En , e ponha A1 = E1


(por simplicidade, ponha também E0 = ∅). Assim, como {An }n∈N é uma sequência de
conjuntos mutuamente disjuntos cuja união é igual à união dos Ej ’s, temos
∞ j j
! ∞
! ∞
[ [ X X X
µ Ej = µ An = µ(An ) = lim µ(An ) = lim [µ(En ) − µ(En−1 )] =
j→∞ j→∞
j=1 n=1 n=1 n=1 n=1

= lim µ(Ej ).
j→∞

Vamos agora provar o ı́tem (b). Para cada n ∈ N defina An = En \ En+1 . Assim, a
sequência {An }n∈N é formada por conjuntos disjuntos dois-a-dois, e com a propriedade de
que

! ∞
!
\ [
En = Ej ∪ Aj (6.1.1)
j=1 j=n
T∞
para cada n ∈ N. Com efeito, se x ∈ En e x ∈
/ j=1 Ej , então x ∈
/ Em para algum m > n,
e portanto x ∈/ Ej para todo j > n. Logo, podemos tomar m0 = max{j : x ∈ Ej }, e é
claro que x ∈ Em0 \ Em0 +1 = Am0 . Consequentemente, pra cada n ∈ N vale a igualdade

! ∞
\ X
µ(En ) = µ Ej + µ(Aj ).
j=1 j=n
P∞
Como µ(E1 ) < ∞, segue da igualdade acima (para n = 1) que a soma j=1 µ(Aj ) é
convergente. Logo, vale que

X
lim µ(Aj ) = 0,
n→∞
j=n

e portanto fazendo n → ∞ na igualdade (6.1.1) vem o desejado. Note que o limite


limn→∞ µ(En ) existe pois {µ(En )}n∈N é uma sequência não-crescente de números reais
limitada inferiormente.

Um cubo (n-dimensional ) em Rn é um produto cartesiano C = I1 ×I2 ×. . .×In de n in-


tervalos limitados não-degenerados. Intuitivamente, calculamos o volume (n-dimensional )
de C por
voln (C) = (b1 − a1 ) · (b2 − a2 ) · . . . · (bn − an ), (6.1.2)
onde, para cada j ∈ {1, . . . , n}, os números aj e bj (aj < bj ) são as extremidades de Ij
(observe que não importa se Ij é aberto ou fechado em cada uma das suas extremidades).
Se n = 1, é claro que um cubo é um intervalo limitado não-degenerado, e o volume
n-dimensional é o comprimento do intervalo. Gostarı́amos de estender essa noção de
volume a conjuntos mais gerais do que cubos. Faremos isso, sem demonstração, a seguir.
O próximo exemplo será muito importante mais à frente.
Exemplo 6.1.3 (A medida de Lebesgue). Seja Bn a σ-álgebra de Borel de Rn (com a sua
topologia usual). A medida de Lebesgue em Rn é a única medida µn : Bn → [0, ∞] com a
propriedade de que
µn (C) = voln (C)
para qualquer cubo C ⊆ Rn , onde voln (C) é dado por (6.1.2). Vale notar que a medida
de Lebesgue é invariante por translações: se B ∈ Bn e x ∈ Rn , então µn (x + B) = µn (B).
116 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Observação 6.1.3. Na realidade, a medida de Lebesgue em Rn pode ser definida para uma
σ-álgebra que contém propriamente a σ-álgebra de Borel. Entretanto, esse ponto de vista
foge ao escopo deste texto.
Sabemos que a σ-álgebra de Borel de um espaço topológico possui, em geral, conjuntos
que não são abertos e nem fechados. Entretanto, a medida de Lebesgue em Rn de conjun-
tos “complicados”pode ser aproximada pelas medidas de conjuntos abertos ou fechados,
como verificaremos a seguir.
Definição 6.1.4. Seja (X, τ ) um espaço topológico, e seja B a sua σ-álgebra de Borel.
Uma medida µ : B → [0, ∞] é dita regular se para qualquer E ∈ B valem as igualdades

µ(E) = inf{µ(A) : A ∈ τ ∩ B, A ⊇ E} = sup{µ(F ) : F ∈ F ∩ B, F ⊆ E},

onde F denota a coleção de subconjuntos fechados de X.


Em outras palavras, uma medida é regular se o valor da medida de todo conjunto
mensurável E é igual ao ı́nfimo dos valores das medidas dos abertos mensuráveis que
contém E, e igual ao supremo dos valores das medidas dos fechados mensuráveis contidos
em E. Isso significa que a medida de qualquer boreliano E pode ser aproximada pelas
medidas dos abertos que contém E ou dos fechados contidos em E. Vamos assumir, sem
demonstração, o seguinte teorema.
Teorema 6.1.1. Para cada n ∈ N, a medida de Lebesgue em Rn é regular.

6.2 Funções mensuráveis


Definição 6.2.1. Sejam (X, ΣX ) e (Y, ΣY ) espaços mensuráveis. Uma aplicação f :
(X, ΣX ) → (Y, ΣY ) é uma aplicação mensurável se f −1 (E) ∈ ΣX para todo E ∈ ΣY .
Em outras palavras, uma aplicação é mensurável se a pré-imagem de cada conjunto da σ-
álgebra de Y é um conjunto da σ-álgebra de X. Uma função mensurável é uma aplicação
f : (X, ΣX ) → R̄ que é mensurável com respeito à σ-álgebra de Borel de R̄ (com respeito
à topologia usual de R̄, definida no Exercı́cio 6.4).
Observação 6.2.1. Em alguns momentos, também usaremos o termo função mensurável
para funções f : (X, ΣX ) → R que são mensuráveis com respeito à σ-álgebra de Borel da
topologia usual de R.
Vamos fixar outra terminologia: uma aplicação f : (X, τX ) → (Y, τY ) entre espaços
topológicos (X, τX ) e (Y, τY ) será dita mensurável (ou Borel mensurável ) se for mensurável
com respeito às σ-álgebras de Borel de τX e τY .
Exemplo 6.2.1 (Função caracterı́stica). Seja E um subconjunto de um conjunto X. A
função caracterı́stica χE : X → R̄ de E é a função definida por

χE (x) = 1, se x ∈ E .
0, se x ∈ /E

Se (X, Σ) é um espaço mensurável, então χE é mensurável se, e somente se, E ∈ Σ. Com


efeito, observe que E = χ−1
E ((0, 2)), e o intervalo (0, 2) é um aberto de R̄, e portanto um
mensurável de R̄.
Proposição 6.2.1. Sejam (X, ΣX ) um espaço mensurável, e (Y, τY ) um espaço topológico.
Assuma que BY é a σ-álgebra de Borel de (Y, τY ). Uma aplicação f : (X, ΣX ) → (Y, BY )
é mensurável se, e somente se, f −1 (B) ∈ ΣX para qualquer B ∈ τY .
6.2. FUNÇÕES MENSURÁVEIS 117

Demonstração. A ida da bi-implicação é trivial. Portanto, vamos mostrar o outro sentido.


Pelo Exercı́cio 6.11, basta mostrar que BY ⊆ f∗ ΣX . Mas isso vem imediatamente da
definição da σ-álgebra de Borel, uma vez que a hipótese e o Exercı́cio 6.11 garantem que
f∗ ΣX é uma σ-álgebra de Y que contém τY .

Observação 6.2.2. Se τY admite uma base enumerável EY , então f : (X, ΣX ) → (Y, BY )


é mensurável se, e somente se, f −1 (E) ∈ ΣX para todo E ∈ EY . Com efeito, se B ∈ τY ,
então existe uma coleção enumerável {Ej }j∈N em EY tal que

[
B= Ej ,
j=1

e portanto,

[
−1
f (B) = f −1 (Ej ) ∈ ΣX ,
j=1

uma vez que ΣX é fechada para uniões enumeráveis.


Corolário 6.2.1. Toda função contı́nua entre espaços topológicos é Borel mensurável.
Demonstração. Se f : (X, τX ) → (Y, τY ) é contı́nua, então para todo B ∈ τY vale que
f −1 (B) ∈ τX ⊆ BX , onde BX denota a σ-álgebra de Borel de (X, τX ). Logo, pela Pro-
posição 6.2.1 segue que f é mensurável.

Como consequência da Proposição 6.2.1, temos também uma útil caracterização das
funções mensuráveis. Lembre-se de que a topologia em R̄ está definida no Exercı́cio 6.4,
e tenha em mente que essa topologia possui uma base enumerável de abertos.
Proposição 6.2.2. Sejam (X, ΣX ) um espaço mensurável e f : (X, ΣX ) → R̄ uma
função. São equivalentes:

(a) f é mensurável.

(b) f −1 ((a, +∞]) ∈ ΣX para qualquer a ∈ R.

(c) f −1 ([−∞, a)) ∈ ΣX para todo a ∈ R.


Demonstração. As implicações (a)⇒(b) e (a)⇒(c) vêm diretamente da definição. Agora,
assuma que (b) vale. Daı́, como

\
[a, +∞] = (a − 1/n, +∞].
n=1

para qualquer a ∈ R, segue que



\
−1
f ([a, +∞]) = f −1 ((a − 1/n, +∞]) ∈ ΣX ,
n=1

uma vez que ΣX é fechada para interseções enumeráveis. Agora, como [−∞, a) = R̄ \
[a, +∞], segue que
f −1 ([−∞, a)) = X \ f −1 ([a, +∞]) ∈ ΣX ,
118 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

pois ΣX é fechada para complementação de conjuntos. Isso prova que (b)⇒(c), e a


implicação inversa é análoga. Portanto, para concluir a prova é suficiente provar que
(b)⇒(a). Para isso, vamos usar a Observação 6.2.2. A coleção formada pelos intervalos
dos tipos (a, b), (a, +∞] e [−∞, a) onde a, b ∈ Q e a < b é uma base enumerável da
topologia de R̄. De (b) e (c) (que é consequência de (b), como demonstramos) vem que
as pré-imagens dos intervalos (a, +∞] e [−∞, a) são mensuráveis. Por outro lado, note
que

(a, b) = [−∞, b) ∩ (a, +∞],

donde f −1 ((a, b)) é mensurável. Segue que as pré-imagens de todos os conjuntos de uma
base enumerável de R̄ são mensuráveis, e portanto a Observação 6.2.2 garante que f é
mensurável.

Observação 6.2.3. Os intervalos (a, +∞] e [−∞, a) nos ı́tens (b) e (c) acima podem ser
substituı́dos por [a, +∞] e [−∞, a], respectivamente.
Para o que segue, observe que a topologia usual de Rn admite uma base enumerável
de cubos abertos. Com efeito, basta tomar os cubos da forma

C = (a1 , b1 ) × (a2 , b2 ) × . . . × (an , bn ),

com aj < bj e aj , bj ∈ Q para cada j = 1, . . . , n.

Proposição 6.2.3. Seja (X, Σ) um espaço mensurável e seja f = (f1 , . . . , fn ) : (X, Σ) →


Rn uma aplicação. Então, f é mensurável (com respeito à σ-álgebra de Borel da topologia
usual de Rn ) se, e somente se, cada função fj : X → R é mensurável.

Demonstração. Para cada j = 1, . . . , n a projeção πj : Rn → R é contı́nua, e portanto


é mensurável. Assim, se f é mensurável, então escrevendo fj = πj ◦ f segue que fj é a
composição de funções mensuráveis, e portanto é mensurável (veja o Exercı́cio 6.10).
Agora, suponha que cada função fj é mensurável. Se C = (a1 , b1 ) . . . (an , bn ) é um
cubo qualquer em Rn , então vale que
n
\
f −1
(C) = fj−1 ((aj , bj )),
j=1

e portanto f −1 (C) é uma interseção finita de conjuntos de Σ. Segue que f −1 (C) ∈ Σ.


Como a topologia de Rn admite uma base enumerável de cubos, segue da Observação
6.2.2 que f é mensurável.

Proposição 6.2.4. Seja (X, Σ) um espaço mensurável, e seja {fj : X → R̄}j∈N uma
sequência de funções mensuráveis. As funções inf j∈N fj : X → R̄ e supj∈N fj : X → R̄
definidas por

inf fj (x) = inf{fj (x) : j ∈ N}, e


j∈N

sup fj (x) = sup{fj (x) : j ∈ N},


j∈N

para cada x ∈ X, são mensuráveis.


6.2. FUNÇÕES MENSURÁVEIS 119

Demonstração. Seja a ∈ R. Dado x ∈ X, temos que supj∈N fj (x) > a se, e somente se,
existe k ∈ N tal que fk (x) > a. Consequentemente, temos a igualdade
 −1   [∞
sup fj (a, +∞] = fj−1 ((a, +∞]),
j∈N
j=1

e o lado direito é uma união de conjuntos mensuráveis, e portanto é mensurável. Segue


da Proposição 6.2.2 que supj∈N fj é mensurável. Para a função inf j∈N fj , basta escrever

inf fj = − sup(−fj ),
j∈N j∈N

e observar que se f é uma função mensurável, então −f também o é.

Corolário 6.2.2. Nas mesmas hipóteses da proposição anterior, as funções lim supk→∞ fk :
X → R̄ e lim inf k→∞ fk : X → R̄, definidas por

lim sup fk (x) = lim sup(fk (x)), e


k→∞ k→∞
lim inf fk (x) = lim inf (fk (x)),
k→∞ k→∞

para cada x ∈ X, são mensuráveis


Demonstração. Basta notar que

lim sup fk = inf sup fk , e


k→∞ j∈N k≥j

lim inf fk = sup inf fk .


k→∞ j∈N k≥j

Aplicando a Proposição 6.2.4 (duas vezes em cada caso) segue que lim supk→∞ fk e
lim inf k→∞ fk são mensuráveis.

Definição 6.2.2. Uma função simples é uma função s : X → R cuja imagem é um


subconjunto finito de R.
Se s é uma função simples cuja imagem é dada por im(s) = {a1 , . . . , am }, então
denotando Ej = s−1 (aj ), para cada j = 1, . . . , m, podemos escrever
m
X
s= aj χEj .
j=1

Note também que a coleção {Ej }m


j=1 é uma partição de X (veja o Exercı́cio 6.3). Em
alguns momentos, vamos nos referir à igualdade acima como representação canônica da
função simples s : X → [0, ∞).
Lema 6.2.1. Uma função simples s : (X, Σ) → R é mensurável se, e somente se, s−1 (a) ∈
Σ para cada a ∈ im(s).
Demonstração. Assuma primeiro que s : (X, Σ) → R é uma função simples mensurável.
Como im(s) é um subconjunto finito de R, segue que se a ∈ im(s), então existem c, b ∈ R
tais que (c, b) ∩ im(s) = {a}, donde s−1 ((c, b)) = s−1 (a). Como (c, b) é um conjunto da
σ-álgebra de Borel de R temos que s−1 (a) ∈ Σ.
120 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Agora, suponha que im(s) = {a1 , . . . , am }, e que s−1 (aj ) ∈ Σ para cada j = 1, . . . , m.
Seja B ⊆ R um conjunto mensurável. Daı́, se B ∩ im(s) = {ai1 , . . . , aik }, então
k
[
s−1 (B) = s−1 (aij ),
j=1

e portanto s−1 (B) ∈ Σ. Isso mostra que s é mensurável.

Veremos a seguir que as funções mensuráveis (positivas) podem ser aproximadas por
funções simples. Recomendamos ao leitor observar que as funções simples sempre assu-
mem valores na reta, enquanto que as funções mensuráveis que aproximaremos por elas
assumem valores na reta estendida.

Teorema 6.2.1. Sejam (X, Σ) um espaço mensurável, e f : X → R̄ uma função. Então,


f é mensurável se, e somente se, existe uma sequência {sn : X → R}n∈N de funções
simples com as seguintes propriedades:

i. (monotonicidade pontual) sn (x) ≤ sn+1 (x) para quaisquer n ∈ N e x ∈ X.

ii. (dominância por f ) sn (x) ≤ f (x) para quaisquer n ∈ N e x ∈ X.

iii. (convergência pontual) limn→∞ sn (x) = f (x) para qualquer x ∈ X.

Ou seja, para cada x ∈ X temos que sn (x) é uma sequência não-decrescente que converge
para f (x).

Observação 6.2.4. O limite em iii é tomado com respeito à topologia de R̄ (veja o Exercı́cio
6.4).

Demonstração. Primeiro, suponha que i, ii e iii valem para uma função f : X → R̄ e


para uma sequência de funções sn : X → R. Como sn (x) é não-decrescente, segue de iii
que

f (x) = sup sn (x),


n∈N

para cada x ∈ X. Assim, f = supn∈N sn , e consequentemente vem da Proposição 6.2.4


que f é mensurável.
Agora, assuma que f : X → R̄ é uma função mensurável. Para cada n ∈ N, defina a
função φn : [0, ∞] → [0, ∞) por
 −n
k2 , se k2−n ≤ t ≤ (k + 1)2−n e k = 0, 1, . . . , n2n − 1,
φn (t) =
n, se t ≥ n.

Vamos olhar para a construção de φn (recomendamos ao leitor esboçar o gráfico de φn ,


inclusive). Observe que estamos particionando a reta estendida nos (finitos) intervalos
{[k2−n , (k + 1)2−n ] : k = 0, . . . n2−n − 1} e [n, ∞], e em cada um desses intervalos φn é
constante. Assim, φn é uma função simples, e do Lema 6.2.1 segue que cada φn é uma
função Borel mensurável. Além disso, é fácil notar que vale a desigualdade

φn (t) ≤ φn+1 (t) ≤ t (6.2.1)


6.3. INTEGRAIS DE LEBESGUE 121

para quaisquer t ∈ [0, ∞] e n ∈ N. Agora, seja t ∈ [0, ∞) e para cada natural n ≥ t seja
k(n) ∈ {0, 1, . . . , n2−n − 1} tal que

k(n)2−n ≤ t ≤ (k(n) + 1)2−n .

A existência de k(n) é provada na solução do Exercı́cio 6.13. Pela definição de φ(n), temos
que

φn (t) = k(n)2−n ,

para cada n ∈ N. Além disso, de novo pela solução do Exercı́cio 6.13, vale que

lim k(n)2−n = t.
n→∞

Portanto, segue que limn→∞ φn (t) = t para qualquer t ∈ [0, ∞). Na realidade, essa
igualdade vale para t em [0, ∞], uma vez que φn (∞) = n para cada n ∈ N. Finalmente,
para cada n ∈ N defina sn : X → [0, ∞) por

sn = φn ◦ f.

Cada uma das funções sn é mensurável, uma vez que é a composição de funções men-
suráveis. De (6.2.1) vem que sn (x) ≤ sn+1 (x) ≤ f (x) para qualquer x ∈ X, e do fato de
que limn→∞ φn (t) = t vem que

lim sn (x) = lim φn (f (x)) = f (x),


n→∞ n→∞

para cada x ∈ X. Logo, sn é uma sequência de funções mensuráveis que cumpre i, ii e


iii. Isso conclui a prova.

Observação 6.2.5. Por simplicidade de notação, se (fn )n∈N é uma sequência de funções
mensuráveis que converge pontualmente e monotonicamente (de forma não-decrescente)
para uma função f , escreveremos fn % f .

6.3 Integrais de Lebesgue


É usual estudar as integrais de Riemann em um curso usual de Análise. Nesta seção,
vamos introduzir a integral de Lebesgue, que não só estende a integral de Riemann em
Rn para uma classe “maior” de funções como também está definida em quaisquer outros
espaços de medida. Como o leitor notará, começaremos definindo e estudando a integral
de Lebesgue para apenas funções não-negativas. O caso geral virá na próxima seção.
Definição 6.3.1. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e s : X → [0, ∞) uma função
simples, mensurável e não-negativa. Assuma que s tem a forma
m
X
s= aj χEj ,
j=1

onde {a1 , . . . , am } = im(s) e Ej = s−1 (aj ) para cada j = 1, . . . , m. Se E ⊆ X é um


conjunto mensurável, a integral de Lebesgue de s sobre E é definida por
Z Xm
s dµ := aj · µ(Ej ∩ E).
E j=1
122 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS
R
Note que podemos ter E s dµ = ∞, no caso em que algum dos conjuntos Ej ∩ E tem
medida infinita.
Agora, seja f : X → [0, ∞] uma função mensurável (não-negativa) qualquer, e seja
E ⊆ X um subconjunto mensurável. Definimos a integral de Lebesgue de f sobre E como
Z Z 
f dµ := sup s dµ : s ∈ Sf ,
E E

onde Sf é a coleção de todas as funções simples, mensuráveis e não-negativas tais que


s(x) ≤ f (x) para todo x ∈ X.

Observação 6.3.1. Note que o contra-domı́nio de uma função simples não-negativa é sem-
pre [0, ∞). Entretanto, a definição de integral acima vale para funções cujo contra-domı́nio
é [0, ∞] (essas funções podem ser aproximadas por funções que assumem apenas valores
em [0, ∞), veja o Teorema 6.2.1). A principal razão para isso é que todas as sequências
monótonas não-decrescentes em [0, ∞] são convergentes. Isso facilitará os argumentos em
alguns casos, uma vez que poderemos assumir que determinados limites existem sem a
necessidade de separar o caso infinito. Apesar disso, o leitor deve observar que na próxima
seção voltaremos a nos restringir a funções que assume valores apenas em R. Faremos
isso pois as funções envolvidas não mais serão necessariamente não-negativas, e desejamos
evitar a soma não-definida ∞ + (−∞).
A seguir, vamos estudar algumas propriedades da integral de Lebesgue. Em alguns
momentos, as demonstrações serão feitas primeiro para funções simples, e depois estendi-
das ao caso geral. Começamos com um lema simples e útil que permite escrever a integral
de uma função sobre um subconjunto mensurável E ⊆ X como uma integral sobre X.

Lema 6.3.1. Seja f : X → [0, ∞] uma função mensurável em um espaço de medida


(X, Σ, µ), e seja E ⊆ X um subconjunto mensurável. Então,
Z Z
f dµ = f χE dµ.
E X

Demonstração. Primeiro, observe que

(f χE )−1 (a) = f −1 (a) ∩ E.


Pm
Daı́, se s : X → [0, ∞) é uma função simples mensurável dada por s = j=1 aj χEj , onde
Ej = s−1 (aj ) para cada j. Então,
Z m
X m
X Z
sχE dµ = aj · µ((sχE )−1 (aj )) = aj · µ(Ej ∩ E) = s dµ. (6.3.1)
X j=1 j=1 E

Tomando o supremo em Sf vem a igualdade


Z  Z
sup sχE dµ : s ∈ Sf = f dµ.
X E

Por outro lado, pela definição temos que


Z Z 
f χE dµ = sup u dµ : u ∈ Sf χE ,
X X
6.3. INTEGRAIS DE LEBESGUE 123

onde Sf χE denota a coleção das funções simples, mensuráveis, não-negativas e tais que
u ≤ f χE em X. Logo, é suficiente provar que
Z  Z 
sup sχE dµ : s ∈ Sf = sup u dµ : u ∈ Sf χE .
X X

Para isso, note primeiro que se s ∈ Sf , então sχE ∈ Sf χE , donde vem a desigualdade
Z  Z 
sup sχE dµ : s ∈ Sf ≤ sup u dµ : u ∈ Sf χE .
X X

Agora, observe que se u ∈ Sf χE , então como f é não negativa temos uχE ≤ f em X,


donde uχE ∈ Sf . Assim, notando que χE · χE = χE e usando (6.3.1) temos
Z  Z  Z 
sup sχE dµ : s ∈ Sf ≥ sup uχE dµ : u ∈ Sf χE = sup u dµ : u ∈ Sf χE ,
X X E

e essa desigualdade conclui a demonstração.

Proposição 6.3.1. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida, e sejam f, g : X → [0, ∞]


funções mensuráveis e não-negativas. Se E ∈ Σ é um conjunto mensurável tal que f ≤ g
em E, então vale a desigualdade
Z Z
f dµ ≤ g dµ.
E E

Demonstração. Seja s ∈ Sf (lembre-se de que Sf denota a coleção de todas as funções


simples, mensuráveis e não-negativas com a propriedade de que s ≤ f em X), e note que
sχE ≤ f ≤ g em E. Segue que sχE ∈ Sg . Da definição da integral de g, e como sχE = s
em E, segue que
Z Z Z
s dµ = χ
s E dµ ≤ g dµ.
E E E

Tomando o supremo do lado esquerdo para s ∈ Sf (a função s ∈ Sf foi tomada arbitrari-


amente) segue a desigualdade desejada.

Observação 6.3.2. A partir de agora, vamos convencionar que em [0, ∞] o produto de R


é estendido como 0 · ∞ = 0 e a · ∞ = ∞ se a 6= 0. Observe que, com essa convenção, não
vale necessariamente que “o limite do produto é o produto dos limites” no caso em que
um dos limites é infinito e o outro é 0.

Proposição 6.3.2. Seja f : X → [0, ∞] uma função mensurável em um espaço de medida


(X, Σ, µ), e seja c ∈ [0, ∞) um número. Então, para qualquer subconjunto mensurável
E ⊆ X vale
Z Z
cf dµ = c f dµ.
E E

Demonstração. Se c ∈ (0, ∞) e s é uma função mensurável não-negativa, então s ≤ f se,


e somente se, cs ≤ cf . Segue que s ∈ Sf se, e somente se, cs ∈ Scf . Além disso, vem
124 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

imediatamente da definição que se s é uma função simples, mensurável, e não-negativa


vale que
Z Z
cs dµ = c s dµ.
E E

Assim,
Z Z   Z 
cf dµ = sup u dµ : u ∈ Scf = sup c s dµ : s ∈ Sf =
E E E
Z  Z
= c · sup s dµ : s ∈ Sf = c f dµ,
E E

como querı́amos. O caso c = 0 vem do fato de que


Z
0 dµ = 0.
E

Essa igualdade se dá uma vez que todas as funções S0 se anulam em E (veja também a
Observação 6.3.2).

Corolário 6.3.1. Se E ⊆ F são subconjuntos mensuráveis de um espaço de medida


(X, Σ, µ) e f : X → [0, ∞] é mensurável, então
Z Z
f dµ ≤ f dµ.
E F

Demonstração. Pelo Lema 6.3.1 e pela Proposição 6.3.1 temos


Z Z Z Z
f dµ = f χE dµ ≤ f χF dµ = f dµ,
E X X F

onde a desigualdade se justifica pois f é não-negativa e χE ≤ χF (isso é uma consequência


imediata da inclusão E ⊆ F ).

Nosso próximo objetivo é obter propriedades das integrais da soma funções men-
suráveis não-negativas. Para isso, precisamos antes de um importante teorema sobre
a convergência das integrais de uma sequência de funções que converge pontualmante.

Teorema 6.3.1 (Convergência Monótona). Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e {fn :


X → [0, ∞]}n∈N uma sequência de funções com a propriedade de que

fn (x) ≤ fn+1 (x)

para quaisquer n ∈ N e x ∈ X. Assim, note que o limite limn→∞ fn (x) existe em [0, ∞]
para cada x ∈ X (veja o ı́tem (e) do Exercı́cio 6.4). Defina a função f : X → [0, ∞] por

f (x) = lim fn (x)


n→∞

para cada x ∈ X. Então, f é mensurável e


Z Z
f dµ = lim fn dµ.
X n→∞ X
6.3. INTEGRAIS DE LEBESGUE 125

Demonstração. O fato de que f é mensurável vem da Proposição 6.2.4, uma vez que a
monotonicidade garante que f = supn∈N fn . Pela Proposição 6.3.1 vem a desigualdade
Z Z
fn dµ ≤ fn+1 dµ, (6.3.2)
X X

para cada n ∈ N, donde existe em [0, ∞] o limite


Z
L = lim fn dµ.
n→∞ X

É claro que fn R≤ f para qualquer


R n ∈ N. Assim, usando a Proposição 6.3.1 mais uma
vez, temos que X fn dµ ≤ X f dµ para cada n ∈ N, e portanto
Z
L≤ f dµ.
X

Falta estabelecer a desigualdade inversa. Sejam 0 < α < 1 um número e s : X → [0, ∞)


uma função simples, mensurável, não-negativa e tal que s ≤ f . Para cada n ∈ N, defina

En = {x ∈ X : fn (x) ≥ αs(x)}.
S
Assim, é claro que En ⊆ En+1 para cada n ∈ N, e X = n∈N En . Além disso, usando
Proposição 6.3.1 de novo temos que
Z Z Z
fn dµ ≥ αs dµ = α s dµ,
En En En

onde a última igualdade vem da Proposição 6.3.2. Daı́, segue que


Z Z Z
L≥ fn dµ ≥ fn dµ ≥ α s dµ = αµs (En ),
X En En

onde a primeira desigualdade vem de (6.3.2), a segunda desigualdade se justifica pelo


Corolário 6.3.1 e µs é a medida em Σ dada pela função simples s : X → [0, ∞) como no
Exercı́cio 6.14. Logo, vale que µs (En ) ≥ L/α para qualquer n ∈ N. Pelo ı́tem (a) da
Proposição 6.1.2 vem que

Z !
[ L
s dµ = µs (X) = µs En = lim µs (En ) ≤ .
X n=1
n→∞ α

Uma vez que s ∈ Sf foi tomada arbitrariamente, tomando o supremo temos imediatamente
Z Z 
L
f dµ = sup s dµ : s ∈ Sf ≤ .
X X α
Finalmente, como α pode ser tomado arbitrariamente próximo de 1, segue a desigualdade
desejada. Isso conclui a prova.

Proposição 6.3.3. Sejam f, g : X → [0, ∞] funções mensuráveis definidas em um espaço


de medida (X, Σ, µ). Para qualquer subconjunto mensurável E ⊆ X vale a igualdade
Z Z Z
(f + g) dµ = f dµ + g dµ.
E E E
126 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Demonstração. Para provar a igualdade igualdade, vamos começar pelas funções simples.
Sejam s, u : X → [0, ∞) funções simples, mensuráveis, e não-negativas, que podem ser
escritas como
m
X
s= aj χEj , e
j=1
n
X
u= bi χAi ,
i=1

respectivamente, onde Ej = s−1 (aj ) para cada j e Ai = u−1 (bi ) para cada i. Daı́, é claro
que vale a igualdade
m X
X n
s+u= (aj + bi )χEj ∩Ai . (6.3.3)
j=1 i=1

Essa é a representação canônica da função (simples) s + u, a menos de somas iguais aj + bi


para pares i, j diferentes. De qualquer forma, a integral de s + u é dada por:
Z m X
X n
(s + u) dµ = (aj + bi )µ(Ej ∩ Ai ∩ E).
E j=1 i=1

Além disso, como os conjuntos EjSsão mutuamente disjuntos, e E ⊆ m


S
j=1 Ej , temos para
m
cada i a decomposição Ai ∩ E = j=1 Ai ∩ E ∩ Ej , onde a união é disjunta. Assim,
m
X
µ(Ai ∩ Ej ∩ E) = µ(Ai ∩ E)
j=1

para cada i. É claro que a igualdade análoga


Sn também vale para a decomposição de cada
Ej ∩ E como a união disjunta Ej ∩ E = i=1 Ej ∩ E ∩ Ai . Daı́, reorganizando os termos
em (6.3.3) temos
Z m X
X n
(s + u) dµ = (aj + bi )χEj ∩Ai =
E j=1 i=1
m
X n
X n
X Xm
= aj µ(Ej ∩ Ai ∩ E) + bi µ(Ej ∩ Ai ∩ E) =
j=1 i=1 i=1 j=1
m
X n
X Z Z
= aj µ(Ej ∩ E) + bi µ(Ai ∩ E) = s dµ + u dµ,
j=1 i=1 E E

como querı́amos.
Agora, vamos ao caso em que se funções envolvidas não são necessariemante simples.
Sejam f, g : X → [0, ∞] funções mensuráveis e não-negativas, e assuma primeiro que
E = X. Pelo Teorema 6.2.1, podemos tomar sequências de funções (sn )n∈N e (un )n∈N de
funções simples, mensuráveis e não-negativas tais que sn % f e un % g (veja a Observação
6.2.5). Segue que sn + un % f + g, e pelo Teorema 6.3.1 temos
Z Z Z Z
(f + g) dµ = lim (sn + un ) dµ = lim sn dµ + lim un dµ =
X n→∞ X n→∞ X n→∞ X
Z Z
= f dµ + g dµ,
X X
6.3. INTEGRAIS DE LEBESGUE 127

onde na segunda igualdade usamos a aditividade da integral das funções simples demons-
trada anteriormente. Para o caso em que a integração é feita sobre um subconjunto
próprio E ⊆ X basta usar o Lema 6.3.1:
Z Z Z Z Z Z
(f + g) dµ = (f + g)χE dµ = f χE dµ + g χE dµ = f dµ + g dµ.
E X X X E E

Note que também poderı́amos ter seguido essa ordem para as funções simples: poderı́amos
ter mostrado a aditividade de funções simples para a integral sobre X, e depois usado
o Lema 6.3.1 para estender o resultado às integrações sobre subconjuntos próprios men-
suráveis. Por outro lado, também não é difı́cil estender o Teorema 6.3.1 para o caso em
que as hipóteses (e as integrais) são consideradas apenas em um subconjunto próprio
mensurável E ⊆ X.

Corolário 6.3.2. Seja fj : X → [0, ∞] uma sequência de funções mensuráveis definidas


em um espaço de medida (X, Σ, µ). Defina f : X → [0, ∞] por

X
f (x) = fj (x)
j=1

para cada x ∈ X. Então, vale que f é mensurável, e que


Z ∞ Z
X
f dµ = fj dµ.
X j=1 X

Demonstração. Para cada n ∈ N, seja ϕn : X → [0, ∞] dada por


n
X
ϕn = fj
j=1

É claro que ϕn % f , e então vem do Teorema 6.3.1 e da Proposição 6.3.3 que


Z Z Z X n
! n Z
!
X
f dµ = lim ϕn dµ = lim fj dµ = lim fj dµ =
X n→∞ X n→∞ X n→∞ X
j=1 j=1
∞ Z
X
= fj dµ.
j=1 X

Teorema 6.3.2 (Lema de Fatou). Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e {fn : X →


[0, ∞]}n∈N uma sequência de funções mensuráveis. Então,
Z Z
(lim inf fn ) dµ ≤ lim inf fn dµ,
X n→∞ n→∞ X

onde a função lim inf n→∞ fn : X → [0, ∞] é definida como no Corolário 6.2.2.

Demonstração. Por simplicidade, denote

lim inf fn = f.
n→∞
128 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Para cada k ∈ N, defina gk = inf j≥k fj . Pela Proposição 6.2.4 segue que cada uma dessas
funções é mensurável. Além disso, é fácil notar que a sequência (gk )k∈N é pontualmente
monótona (não-decrescente). Como consequência, temos

lim gk (x) = sup gk (x) = sup inf fj (x) = lim inf fn (x) = f (x),
k→∞ k∈N k∈N j≥k n→∞

para qualquer x ∈ X. Daı́, segue que gk % f . Pelo teorema da convergência monótona


(Teorema 6.3.1) segue que
Z Z
f dµ = lim gk dµ. (6.3.4)
X k→∞ X

Além disso, para todo k ∈ N vale que

gk (x) = inf fj (x) ≤ fi (x)


j≥k

para quaisquer i ≥ k e x ∈ X. Consequentemente,


Z Z
gk dµ ≤ fi dµ
X X

sempre que i ≥ k (esse fato decorre da Proposição 6.3.1). Isso implica, para qualquer
k ∈ N, a desigualdade
Z Z
gk dµ ≤ inf fi dµ.
X i≥k X

Finalmente, usando essa desigualdade em (6.3.4) temos


Z Z Z   Z 
(lim inf fn ) dµ = f dµ = lim gk dµ ≤ lim inf fi dµ =
X n→∞ X k→∞ X k→∞ i≥k X
 Z  Z
= sup inf fi dµ = lim inf fn dµ,
k∈N i≥k X n→∞ X
R 
e isso conclui a prova. A penúltima igualdade se justifica pois inf i≥k X
fi dµ k∈N é uma
sequência não-decrescente em [0, ∞].

Observação 6.3.3. A desigualdade no Lema de Fatou pode ser estrita. Referimos o leitor
ao Exercı́cio 6.19, onde um exemplo é construı́do.

6.4 Funções integráveis


Nosso primeiro objetivo nesta seção é estender o conceito de integral de Lebesgue para
funções que não sejam necessariamente não-negativas. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de
medida, e f : X → R uma função mensurável. Escrevemos

f (x) = f + (x) − f − (x), (6.4.1)

para cada x ∈ X, onde

f + (x) = max{f (x), 0}, e


f − (x) = max{−f (x), 0},
6.4. FUNÇÕES INTEGRÁVEIS 129

para qualquer x ∈ X. As funções f + , f − : X → R são chamadas a parte positiva e a


parte negativa de f , respectivamente. Note que essas duas funções são não-negativas. Do
Exercı́cio 6.12 segue imediatamente que elas são mensuráveis, e portanto podemos definir
a sua integral de Lebesgue. Além disso, é claro que

|f | = f + + f − ,

e portanto segue da aditividade da integral para funções mensuráveis não-negativas que


Z Z Z
|f | dµ = +
f dµ + f − dµ.
X X X

Segue que a integral de |f | é finita se, e somente se, as integrais de f + e f − são ambas
finitas.

Definição 6.4.1. Uma função mensurável f : X → R definida em um espaço de medida


(X, Σ, µ) é dita integrável (ou Lebesgue integrável ) se
Z
|f | dµ < ∞.
X

Uma vez que a integrabilidade de uma função depende da medida µ considerada na σ-


álgebra Σ, também diremos que uma função integrável é µ-integrável (essa terminologia
é útil quando a medida considerada não é completamente clara do contexto). Pela ob-
servação acima, se f é integrável, então as integrais das suas partes positiva e negativa
sobre X (e portanto sobre qualquer subconjunto mensurável) são finitas. Assim, definimos
a integral (de Lebesgue) de f sobre um conjunto mensurável E ⊆ X por
Z Z Z
f dµ := +
f dµ − f − dµ. (6.4.2)
E E E

A seguir, vamos enunciar e demonstrar algumas propriedades da integral de Lebesgue


de uma função mensurável qualquer. A maior parte das demonstrações será consequência
quase imediata das versões provadas para as funções não-negativas, estudadas na seção
anterior.

Lema 6.4.1. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e f : X → R uma função integrável.


Então, vale que
Z Z
f dµ = f χE dµ
E X

para qualquer E ∈ Σ.

Demonstração. É fácil notar que f + χE = (f χE )+ e f − χE = (f χE )− . Daı́, como f + e f −


são não-negativas podemos usar o Lema 6.3.1 para obter
Z Z Z Z Z

f dµ = +
f dµ − f dµ = +χ
f E dµ − f − χE dµ =
E E Z E X
Z XZ

= (f χE )+ dµ − (f χE )− dµ = f χE dµ,
X X X

onde a primeira e a última igualdade vêm da definição da integral de uma função qualquer,
dada em (6.4.2).
130 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Proposição 6.4.1. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e sejam f, g : X → R funções


integráveis. Daı́, a função f + g : X → R é integrável e vale a igualdade
Z Z Z
f + g dµ = f dµ + g dµ
X X X

para qualquer E ∈ Σ. Além disso, se c ∈ R é uma constante qualquer, então a função


cf : X → R é integrável e temos
Z Z
cf dµ = c f dµ,
E E

para todo subconjunto mensurável E ⊆ X.


Demonstração. Primeiro, note que |f + g| ≤ |f | + |g|, e então segue da Proposição 6.3.1
e da aditividade da integral para funções não negativas que
Z Z Z Z
|f + g| dµ ≤ |f | + |g| dµ = |f | dµ + |g|d µ < ∞.
E E E E

Isso mostra que f + g é integrável. Agora, observe que

f + − f − + g + − g − = f + g = (f + g)+ − (f + g)− .

Daı́, (f + g)+ + f − + g − = (f + g)− + f + + g + , e as funções dos dois lados da igualdade


são não-negativas. Segue que
Z Z
(f + g) + f + g dµ = (f + g)− + f + + g + dµ.
+ − −
E E

Agora, usamos a aditividade da integral de funções não negativas e reorganizamos os


termos para obter
Z Z Z Z Z Z

+
f dµ − f dµ + +
g dµ − g dµ = (f + g) dµ − (f + g)− dµ,
− +
E E E E E E

e, pela definição da integral de uma função mensurável qualquer dada por (6.4.2), essa é
a desigualdade que querı́amos provar.
Agora, vamos provar a outra igualdade. Note que a integrabilidade de cf vem da igual-
dade |cf | = |c||f |. Vamos usar a versão para funções não-negativas, dada na Proposição
6.3.2. Se c = 0, então o resultado é imediato. Se c > 0, então é claro que (cf )+ = cf + e
(cf − ) = cf − . Logo,
Z Z Z Z Z

+
cf dµ = (cf ) dµ − (cf ) dµ = +
cf dµ − cf − dµ =
E E E E
Z Z  E Z
=c f + dµ − f − dµ = c f dµ.
E E E

Se c < 0, então temos (cf )+ = (−c)f − e (cf )− = (−c)f + . Daı́,


Z Z Z Z Z 
+ − − +
cf dµ = (cf ) dµ − (cf ) dµ = −c f dµ − f dµ =
E E E E E
Z
= c f dµ,
E

e isso conclui a prova.


6.4. FUNÇÕES INTEGRÁVEIS 131

Proposição 6.4.2. Sejam f, g : X → R funções integráveis definidas sobre um espaço de


medida (X, Σ, µ). Se f ≤ g em um subconjunto mensurável E ⊆ X, então
Z Z
f dµ ≤ g dµ,
E E

Demonstração. Observe que

f + − f − = f ≤ g = g+ − g−,

e portanto temos a desigualdade f + + g − ≤ g + + f − . Como as funções dos dois lados da


desigualdade são todas não-negativas, podemos usar a Proposição 6.3.1 e a aditividade
para obter
Z Z Z Z Z Z
− − −
+
f dµ + g dµ = +
f + g dµ ≤ +
g + f dµ = +
g dµ + f − dµ.
E E E E E E

Reorganizando os termos, vem


Z Z Z Z

+
f dµ − f dµ ≤ +
g dµ − g − dµ,
E E E E

e essa é a desigualdade desejada, uma vez que pela definição dada em (6.4.2), o lado
esquerdo é a integral de f sobre E e o lado direito é a integral de g sobre E.

Corolário 6.4.1. Se f é integrável, então


Z Z

f dµ ≤ |f | dµ,

E E

para qualquer subconjunto mensurável E ⊆ X.

Demonstração. A desigualdade que desejamos provar é equivalente à desigualdade


Z Z Z
− |f | dµ ≤ f dµ ≤ |f | dµ.
E E E

Como −|f | ≤ f ≤ |f |, temos da Proposição 6.4.2 que


Z Z Z Z
− |f | dµ = −|f | dµ ≤ f dµ ≤ |f |, dµ.
E E E E

Note que na primeira igualdade usamos a Proposição 6.4.1 (com c = −1).

Teorema 6.4.1 (Convergência Dominada). Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida, e seja


g : X → [0, ∞) uma função integrável. Assuma que {fn : X → R}n∈N é uma sequência
de funções integráveis que satisfaz:

(i) (fn ) é uma sequência dominada por g, isto é, |fn (x)| ≤ g(x) para quaisquer n ∈ N e
x ∈ X.

(ii) Para cada x ∈ X, a sequência (fn (x))n∈N converge em R.


132 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

A função f : X → R definida por

f (x) := lim fn (x)


n→∞

para cada x ∈ X é integrável, e vale a igualdade


Z Z
f dµ = lim fn dµ,
E n→∞ E

para todo E ∈ Σ.
Observação 6.4.1. A função f : X → R é chamada o limite pontual da sequência de
funções (fn )n∈R .
Demonstração. Observe que como cada sequência (fn (x))n∈N é convergente, temos a igual-
dade

f (x) = lim fn (x) = lim inf fn (x)


n→∞ n→∞

para cada x ∈ X. Assim, pelo Corolário 6.2.2 que f é mensurável. Além disso, como
|fn (x)| → |f (x)| para cada x ∈ X, pelo Lema de Fatou (Teorema 6.3.2) segue que
Z Z Z Z Z
|f | dµ = lim |fn | dµ = lim inf |fn | dµ ≤ lim inf |fn | dµ ≤ g dµ < ∞,
X X n→∞ X n→∞ n→∞ X X

e isso mostra que f é integrável. Note que a última desigualdade vem do fato de que
(fn ) é dominada por g, e da Proposição 6.4.2. Como fn (x) → f (x) para cada x ∈ X
e |fn | ≤ g para todo n ∈ N, segue que |fn (x)| ≤ g(x) para todo x ∈ X. Logo, temos
|fn − f | ≤ |fn | + |f | ≤ 2g, e isso fornece

2g − |fn − f | ≥ 0

para qualquer n ∈ N. Assim, podemos aplicar o Lema de Fatou (Teorema 6.3.2) para a
sequência de funções não-negativas (2g − |fn − f |)n∈N
Z Z   Z 
2g dµ = lim inf 2g − |fn − f | dµ ≤ lim inf 2g − |fn − f | dµ =
X X n→∞ n→∞ X
Z  Z  Z Z
= 2g dµ + lim inf − |fn − f | dµ = 2g dµ − lim sup |fn − f | dµ,
X n→∞ X X n→∞ X

onde na primeira igualdade usamos o fato de que lim inf n→∞ |fn (x) − f (x)| = 0 para todo
x ∈ X, que vem imediatamente da convergência pontual fn → f , e na última igualdade
lembramos que para toda sequência (an )n∈N de números reais vale que

lim inf (−an ) = − lim sup an .


n→∞ n→∞

Como consequência da desigualdade acima, temos


Z
lim sup |fn − f | dµ ≤ 0.
n→∞ X

A igualdade vale, uma vez que estamos calculando o limite superior de uma sequência de
números não-negativos. Daı́, segue que
Z
lim |fn − f | dµ = 0.
n→∞ X
6.5. OS ESPAÇOS LP 133

Assim, do Corolário 6.4.1 temos


Z Z Z Z

lim fn dµ − f dµ = lim fn − f dµ ≤ lim
|fn − f | dµ = 0,
n→∞ X X n→∞ X n→∞ X

e isso conclui a demonstração para o caso em que a integração é feita sobre X. Se a


integração é feita sobre um subconjunto mensurável E ⊆ X basta considerar as funções
fn χE e usar o Lema 6.4.1. É claro que fn χE → f χE pontualmente e que (fn χE )n∈N é
uma sequência dominada por g.

Observação 6.4.2. É claro que se fn → f pontualmente a menos de um conjunto de


medida nula, então o teorema da Convergência Dominada continua valendo.

6.5 Os espaços Lp
Nesta seção, vamos introduzir e estudar alguns espaços (vetoriais) de funccões integráveis
definidas em espaços de medida. Nesses espaços de funções, introduziremos normas que
os tornam espaços de Banach. Começamos por definir uma propriedade requerida para
os espaços de medida.
Definição 6.5.1. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Dizemos que µ é uma medida
σ-finita se existe uma coleção enumerável {En }n∈N em Σ com as propriedades de que
µ(En ) < ∞ para cada n ∈ N e

[
X= Ej .
j=1

Observação 6.5.1. Observe que se uma medida é σ-finita, então podemos tomar
S os con-
n−1
juntos En sendo mutuamente disjuntos. Basta definir A1 = E1 e An = En \ j=1 Ej
para cada n ≥ 2.
Nesta seção, todas as medidas serão consideradas σ-finitas, salvo menção em
contrário. O espaço de funções integráveis definidas em um espaço de medida (X, Σ, µ)
é claramente um R-espaço vetorial (isso é decorrência imediata da Proposição 6.4.1).
Desejamos introduzir uma norma neste espaço. Uma primeira tentativa, que é análoga à
norma introduzida no espaço `1 (N), seria
Z
f 7→ |f | dµ.
X

Note que o somatório é a integração com respeito à medida de contagem em N (veja o


Exemplo 6.1.2), e portanto `1 (N) é o espaço das funções f : N → R que são integráveis
com respeito à medida de contagem. Entretanto, no caso geral essa definição tem um
problema: se f, g : X → R são funções integráveis com a propriedade de que existe um
conjunto N ∈ Σ tal que µ(N ) = 0 e f = g em X \ N (isto é f = g a menos de um
conjunto de medida nula), então
Z Z Z Z Z
|f | dµ − |g| dµ = |f | − |g| dµ = |f | − |g| dµ + 0 dµ = 0,
X X X N X\N

onde a penúltima igualdade se justifica pelo Exercı́cio 6.17 (e pelo fato de que |f | = |g| em
X \ N , e a última igualdade vem do Exercı́cio 6.18. Como consequência dessa igualdade,
134 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

temos que qualquer função que não é identicamente zero somente a menos de um conjunto
de medida nula teria “norma” zero.
Note que o comportamento de uma função integrável sobre um (conjunto contido em
um) conjunto de medida nula não importa do ponto de vista da integração. Por essa
razão, fixamos a seguinte terminologia: quando estamos trabalhando com um espaço de
medida (X, Σ, µ), dizemos que uma determinada propriedade vale em quase toda parte (ou,
abreviando, µ-q.t.p) se existe um conjunto N ⊆ X de medida nula tal que a propriedade
vale em X \ N . Em particular, isso induz uma relação de equivalência no espaço de
funções definidas em um espaço de medida X. Dadas duas funções f, g : X → R, dizemos
que f e g são iguais em quase toda parte (ou iguais em µ-q.t.p) se existe um conjunto de
N ⊆ X tal que f = g em X \ N e µ(N ) = 0. Denotaremos essa relação de equivalência
por f ∼µ g.

Definição 6.5.2. O espaço L1 (X, Σ, µ), que também será denotado por L1 (X) quando
não houver possibilidade de dúvida com respeito à medida fixada em X, é o espaço
quociente do conjunto de funções integráveis f : X → R pela relação de equivalência ∼µ .
Isto é,
{f : X → R : f é integrável}
L1 (X, Σ, µ) := .
∼µ

Observação 6.5.2. Os elementos de L1 (X, Σ, µ) são classes de equivalência formadas por


funções integráveis que são iguais em quase toda parte. Entretanto, uma vez que estamos
interessados em integração, não é importante para nós qual representante de cada classe
estamos usando. Portanto, abusando um pouco da terminologia, vamos nos referir aos
elementos de L1 (X, Σ, µ) como funções. Ao escrever f ∈ L1 (X, Σ, µ), convencionamos que
f : X → R é uma função integrável que é representante de alguma classe de equivalência
pertencente a L1 (X, Σ, µ). Além disso, L1 (X, Σ, µ) tem a estrutura natural de espaço
vetorial induzida em um espaço quociente: a soma de classes de equivalência é a classe
de equivalência da soma de dois respectivos representantes, e o produto de uma classe de
equivalência por um escalar real é a classe de equivalência do produto de um dos seus
representantes por esse escalar. Assim, podemos denotar as operações em L1 (X, Σ, µ) da
mesma forma que denotamos as operações para funções.

Lema 6.5.1. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. A aplicação || · ||L1 (X) : L1 (X) → R
dada, para cada f ∈ L1 (X), por
Z
||f ||L1 (X) = |f | dµ
X

é uma norma em L1 (X).

Demonstração. O vetor nulo de L1 (X) é a classe de equivalência de todas as funções


integráveis que são identicamente nulas em quase toda parte. Assim, um elemento de
L1 (X) é não-nulo quando é diferente de zero em algum conjunto de medida positiva.
Assuma que f ∈ L1 (X) é tal que ||f ||L1 (X) = 0. Se existe um conjunto E ⊆ Σ tal
que µ(E) > 0 e f 6= 0 em E, então segue que |f | > 0 em E. Para cada n ∈ N, defina
En = {x ∈ E : |f (x)| >S 1/n}. É claro que vale que En ⊆ En+1 para cada n ∈ N, e
também temos que E = ∞ n=1 En . Assim, do ı́tem (a) da Proposição 6.1.2 segue que


!
[
0 < µ(E) = µ En = lim µ(En ),
n→∞
n=1
6.5. OS ESPAÇOS LP 135

donde segue que existe n0 ∈ N tal que µ(En0 ) > 0. Assim,


Z Z Z
1 µ(En0 )
||f ||L1 (X) = |f | dµ ≥ |f | dµ ≥ dµ = > 0,
X En0 En0 n0 n0

e essa desigualdade é uma contradição. Segue que se ||f ||L1 (X) = 0, então f = 0 em
quase toda parte, como querı́amos. As outras propriedades (positividade, homogeneidade
e desigualdade triangular) são imediatas.

Definição 6.5.3. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e 1 < p < ∞. O espaço


Lp (X, Σ, µ), que também denotaremos por Lp (X), é o espaço quociente do conjunto de
funções mensuráveis tais que as p-ésimas potências de seus respectivos módulos são in-
tegráveis pela relação de equivalência ∼µ . Ou seja,
{f : X → R : f é mensurável e |f |p ∈ L1 (X, Σ, µ)}
Lp (X, Σ, µ) :=
∼µ
Observe que se f é mensurável, então |f |p também o é, e assim a condição |f |p ∈
1
L (X, Σ, µ) é equivalente à
Z
|f |p dµ < ∞.
X

Observação 6.5.3. Assim como no caso dos espaços L1 (X, Σ, µ), ao escrevermos f ∈
Lp (X, Σ, µ) convencionamos que f é um representante de uma das classes de equivalência
de Lp (X, Σ, µ), ou seja, f é uma função mensurável para a qual a desigualdade acima
vale. De novo abusando da terminologia, vamos nos referir aos elementos de Lp (X) como
funções.
Note que não é claro, a princı́pio, que Lp (X, Σ, µ) é fechado para a soma. Mostra-
remos que isso é uma consequência da versão integral da desigualdade de Hölder, que
enunciaremos e provaremos a seguir. Para o que segue, lembre-se de que dois números
p, q ∈ (1, ∞) são dito conjugados quando 1/p + 1/q = 1.
Teorema 6.5.1 (A desigualdade de Hölder). Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e sejam
p, q ∈ (1, ∞) números conjugados. Se f ∈ Lp (X) e g ∈ Lq (X), então f g ∈ L1 (X) e vale
a desigualdade
Z Z  p1 Z  1q
p q
|f g| dµ ≤ |f | dµ |g| dµ . (6.5.1)
X X X

Demonstração. Pela desigualdade de Young (veja o Teorema 2.1.1), temos que se λ > 0,
então
λp 1
|λf (x)g(x)| ≤ |f (x)|p + |g(x)|q
p q
para todo x ∈ X, e daı́ segue que
λp−1 1
|f (x)g(x)| ≤ |f (x)|p + |g(x)|q ,
p λq
para qualquer x ∈ X. Consequentemente, pela Proposição 6.4.2 temos a desigualdade
λp−1
Z Z Z
p 1
|f g| dµ ≤ |f | dµ + |g|q dµ. (6.5.2)
X p X λq X
136 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Finalmente, assumimos que a integral de |f | é estritamente positiva (se f = 0 ∈ L1 (X),


então a desigualdade é trivial), e escolhemos
Z  p1
q
|g| dµ
X
λ = Z  p1 .
|f |p dµ
X

Substituindo λ em (6.5.2) vem a desigualdade desejada.

Proposição 6.5.1. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida, e p ∈ (1, ∞). O conjunto

Lp := {f : X → R : f é mensurável e |f |p ∈ L1 (X, Σ, µ)}

é um espaço vetorial. Consequentemente, Lp (X, Σ, µ) é um espaço vetorial (com as


operações usuais induzidas no espaço quociente, veja a Observação 6.5.2). Mais ainda, a
função || · ||Lp (X) : Lp (X) → R dada por
Z  p1
p
||f ||Lp (X) = |f | dµ
X

é uma norma em Lp (X).

Demonstração. Devemos provar que Lp é fechado para a soma (as outras propriedades
são imediatas). Para isso, basta mostrar que se f, g : X → R são funções mensuráveis
tais que
Z Z
p
|f | dµ < ∞ e |g|p dµ < ∞,
X X

então vale que


Z
|f + g|p dµ < ∞.
X

Com efeito, como p > 1, temos que se 0 < a < b, então ap < bp . Daı́,
p p
|f (x) + g(x)|p ≤ |f (x)| + |g(x)| ≤ 2 max{|f (x)|, |g(x)|} ≤
p p
≤ 2|f (x)| + 2|g(x)| = 2p |f (x)|p + |g(x)|p ,


e segue da Proposição 6.4.2 que


Z Z Z
p p p p
|f + g| dµ ≤ 2 |f | dµ + 2 |g|p dµ < ∞,
X X X

como querı́amos.
Agora, vamos mostrar que || · ||Lp (X) é uma norma. A única propriedade que não
é imediata é a desigualdade triangular. Para demonstrá-la, sejam f, g ∈ Lp (X, Σ, µ), e
observe que
Z Z Z
p p p−1
||f + g||Lp (X) = |f + g| dµ ≤ |f + g| |f | dµ + |f + g|p−1 |g| dµ. (6.5.3)
X X X
6.5. OS ESPAÇOS LP 137

Seja q ∈ (1, ∞) o conjugado de p. Afirmamos que |f + g|p−1 ∈ Lq (X, Σ, µ). De fato, como
1/p + 1/q = 1, temos pq = p + q, donde p = pq − q = q(p − 1). Assim,
Z Z
p−1 q
|f + g|p µ < ∞.

|f + g| dµ =
X X

Agora, usando a desigualdade de Hölder para as funções |f | ∈ Lp (X, Σ, µ) e |f + g|p−1 ∈


Lq (X, Σ, µ), temos
Z Z  p1 Z  1q
p−1 p p−1 q

|f + g| |f | dµ ≤ |f | dµ |f + g| dµ =
X X X
Z  p1 Z  1q
p/q
= |f |p dµ p
|f + g| dµ = ||f ||pLp (X) ||f + g||Lp (X) .
X X

Analogamente, usando a desigualdade de Hölder para as funções |g| ∈ Lp (X, Σ, µ) e


|f + g|p−1 ∈ Lq (X, Σ, µ), vem
Z
p/q
|f + g|p−1 |g| dµ ≤ ||g||pLp (X) ||f + g||Lp (X) .
X

Essas desigualdades estimam os dois termos do lado direito em (6.5.3). Além disso,
observe que p/q = p − 1. Daı́,
||f + g||pLp (X) ≤ ||f + g||p−1

p
L (X) ||f ||Lp (X) + ||g||Lp (X) ,

e isso fornece a desigualdade triangular para || · ||Lp (X) . Note que se ||f + g||Lp (X) = 0,
então a desigualdade triangular é trivial.

Observação 6.5.4. A desigualdade de Hölder (6.5.1) pode ser reescrita como


||f g||L1 (X) ≤ ||f ||Lp (X) ||g||Lq (X) ,
sempre que f ∈ Lp (X) e g ∈ Lq (X). Para extensões e consequências da desigualdade de
Hölder, referimos o leitor aos Exercı́cios 6.21, 6.22 e 6.23.
Um conjunto de medida total em um espaço de medida (X, Σ, µ) é um conjunto E ∈ Σ
com a propriedade de que µ(X \ E) = 0. Se µ é uma medida finita, então E ∈ Σ tem
medida total se, e somente se, µ(E) = µ(X).
Definição 6.5.4. Uma função mensurável f : X → R é dita essencialmente limitada se
existem uma constante c > 0 e um conjunto de medida total E ⊆ X com a propriedade
de que |f (x)| ≤ c para todo x ∈ E.
Lema 6.5.2. O espaço das funções essencialmente limitadas em um espaço de medida
(X, Σ, µ) é um espaço vetorial.
Demonstração. A única propriedade que não é imediata é que a soma de duas funções
essencialmente limitadas é essencialmente limitada. Portanto, sejam f1 , f2 : X → R
funções mensuráveis tais que existem conjuntos de medida total E1 , E2 ∈ Σ e c1 , c2 ∈ R
com a propriedade de que |f1 | ≤ c1 em E1 e |f2 | ≤ c2 em E2 . Daı́, temos que |f1 + f2 | ≤
|f1 | + |f2 | ≤ c1 + c2 em E1 ∩ E2 . Como,
 
µ X \ (E1 ∩ E2 ) = µ (X \ E1 ) ∪ (X \ E2 ) ≤ µ(X \ E1 ) + µ(X, \E2 ) = 0,
segue que E1 ∩ E2 tem medida total. Daı́, f1 + f2 é essencialmente limitada.
138 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Definição 6.5.5. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. O espaço L∞ (X, Σ, µ), que
também será denotado por L∞ (X), é o espaço quociente do conjunto de funções essenci-
almente limitadas f : X → R pela relação de equivalência ∼µ .
{f : X → R : f é essencialmente limitada}
L∞ (X, Σ, µ) = .
∼µ
Observação 6.5.5. Assim como fizemos para os espaços Lp (X) com p ∈ [1, ∞), usaremos
naturalmente a terminologia funções para nos referirmos aos elementos de L∞ (X), apesar
de tais elementos serem, na verdade, classes de equivalência.
Proposição 6.5.2. A função || · ||L∞ (X) : L∞ (X) → R definida por

||f ||L∞ (X) = inf{c ∈ R : |f | ≤ c em quase toda parte}

é uma norma em L∞ (X).


Observação 6.5.6. O número ||f ||L∞ (X) é chamado às vezes de supremo essencial de f .
Demonstração. Primeiro, observe que a ||·||L∞ (X) não é dada por uma integração, então já
não é mais imediato que representantes diferentes da mesma classe de equivalência forne-
cerão o mesmo resultado. Assim sendo, precisamos começar provando que os supremos
essenciais de duas funções que são iguais em quase toda parte coincidem.
Assuma, portanto que f, g : X → R são funções mensuráveis tais que existe um
conjunto mensurável E ∈ Σ com as propriedades de que µ(E) = 0 e f = g em X \ E.
Seja c ∈ R um número para o qual existe um conjunto N ∈ Σ de medida nula com a
propriedade de que |f | ≤ c em X \ N . Daı́, em X \ (E ∪ N ) vale que |f | = |g| ≤ c. Como

µ(E ∪ N ) ≤ µ(E) + µ(N ) = 0,

segue que µ(E ∪ N ) = 0, e portanto |g| ≤ c em quase toda parte. Assim, mostramos
que se |f | ≤ c em quase toda parte, então |g| ≤ c em quase toda parte. Isso fornece a
desigualdade

||g||L∞ (X) ≤ ||f ||L∞ (X) .

Repetindo o argumento trocando f por g temos a desigualdade inversa. Logo, segue que
||f ||L∞ (X) = ||g||L∞ (X) .
Agora que sabemos que || · ||L∞ (X) está bem-definida em L∞ (X), vamos mostrar que
essa função é, de fato, uma norma. É claro que ||f ||L∞ (X) ≥ 0 para toda f ∈ L∞ (X), e
a homogeneidade também é imediata. Assuma que f ∈ L∞ (X) é tal que ||f ||L∞ (X) = 0.
Devemos mostrar que f = 0 em quase toda parte. A condição ||f ||L∞ (X) = 0 garante que
para cada n ∈ N o conjunto

En = {x ∈ X : |f (x)| ≥ 1/n}

é tal que µ(En ) = 0. Além disso, é fácil notar que En ⊆ En+1 para cada n ∈ N. Por outro
lado, temos

[
En = {x ∈ X : f (x) 6= 0}.
n=1

Portanto, segue do ı́tem (a) da Proposição 6.1.2 que



µ {x ∈ X : f (x) 6= 0} = lim µ(En ) = 0.
n→∞
6.5. OS ESPAÇOS LP 139

Isso mostra o desejado. Falta mostrar a desigualdade triangular. Sejam f, g ∈ L∞ (X).


Se c1 ∈ R e N1 ∈ Σ são tais que µ(N1 ) = 0 e |f | ≤ c1 em X \ N1 e se c2 ∈ R e N2 ∈ Σ
têm as propriedades de que µ(N2 ) = 0 e |g| ≤ c2 em X \ N2 , então vale que

|(f + g)(x)| ≤ |f (x)| + |g(x)| ≤ c1 + c2

em X \ (N1 ∪ N2 ). Como µ(N1 ∪ N2 ) = 0, segue que |f + g| ≤ c1 + c2 em quase toda


parte. Daı́,

||f + g||L∞ (X) = inf{c ∈ R : |f | ≤ c em quase toda parte} ≤ c1 + c2 .

Observe que a desigualdade acima vale para quaisquer números c1 , c2 ∈ R tais que |f | ≤ c1
em quase toda parte e |g| ≤ c2 em quase toda parte. Logo, podemos passar aos respectivos
ı́nfimos para obter

||f + g||L∞ (X) ≤ inf{c ∈ R : |f | ≤ c em µ−q.t.p} + inf{d ∈ R : |g| ≤ d em µ−q.t.p} =


= ||f ||L∞ (X) + ||g||L∞ (X) .

Isso conclui a demonstração.

O próximo passo é provar que os espaços Lp (X) são espaços de Banach, isto é, são
completos com respeito às suas respectivas normas definidas acima.
Observação 6.5.7. convencionamos que todos os espaços Lp mencionados no texto (não
apenas nesta seção) são definidos para espaços de medida σ-finitos, salvo menção em
contrário. Mais ainda, vamos nos referir à convergência na norma de Lp (X) simplesmente
como convergência em Lp (X). Para outros tipos de convergência nos espaços Lp referimos
o leitor aos Exercı́cios 6.26, 6.27 e 6.28.

Teorema 6.5.2. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida. Então Lp (X), || · ||Lp (X) é um
espaço de Banach para todo 1 ≤ p ≤ ∞.

Demonstração. Vamos começar pelo caso p = ∞. Seja (fn )n∈N uma sequência de Cauchy
em L∞ (X). Para cada k ∈ N, existe mk ∈ N tal que se m, n ≥ mk , então ||fm −fn ||L∞ (X) <
1/k. Daı́ existe um conjunto Ek ∈ Σ de medida nula tal que

1
|fn (x) − fm (x)| <
k
para todo x ∈ X \ Ek . Seja

[
E= Ek .
k=1

É claro que µ(E) = 0, e para cada x ∈ X \ E a sequência (fn (x))n∈N é uma sequência de
Cauchy de números reais. Portanto, podemos definir f0 : X \ E → R como

f0 (x) = lim fn (x),


n→∞

para todo x ∈ X \ E. Estendemos f0 a uma função f : X → R pondo f (x) = 0 para


cada x ∈ E. Vamos mostrar que f ∈ L∞ (X). Para isso, lembre-se de que toda sequência
de Cauchy em um espaço normado é limitada e tome M ∈ R com a propriedade de que
140 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

||fn ||L∞ (X) ≤ M para todo n ∈ N. Segue que para cada n ∈ N existe um conjunto Fn ∈ Σ
de medida nula tal que

|fn (x)| ≤ M para todo x ∈ X \ Fn .


S∞
Seja F = n=1 Fn . É claro que µ(F ) = 0, e vale que

|fn (x)| ≤ M para quaisquer n ∈ N e x ∈ X \ F.

Segue imediatamente que |f (x)| ≤ M para qualquer x ∈ X \ F , e isso mostra que f é


essencialmente limitada, donde f é um representante de alguma classe de equivalência de
L∞ (X). Finalmente, vamos mostrar que fn → f na norma de L∞ (X). Dado ε > 0, tome
k ∈ N tal que 1/k < ε, e note que vale
1
|fn (x) − fm (x)| ≤ <ε
k
para quaisquer m, n ≥ mk e qualquer x ∈ X \ E. Por outro lado, em X \ E o valor de f (x)
é definido como o limite da sequência (fn (x))n∈N . Assim, fazendo n → ∞ na desigualdade
acima, segue que

|f (x) − fm (x)| < ε

para quaisquer m ≥ mk e x ∈ X \ E. Logo, para qualquer m ≥ mk temos que a função


f − fm é limitada superiormente em quase toda parte por ε (afinal, a desigualdade acima
mostra que essa função é limitada superiormente por ε exceto no conjunto de medida nula
E). Daı́,

||f − fm ||L∞ (X) < ε

sempre que m ≥ mk . Isso conclui a prova do caso p = ∞.


Agora, assuma que 1 ≤ p < ∞ e seja (fn )n∈N uma sequência de Cauchy em Lp (X).
Para mostrar que (fn ) converge é suficiente mostrar que alguma sua subsequência con-
verge. Escolha uma subsequência (fnk )k∈N tal que
1
||fnk+1 − fnk ||Lp (X) <
2k
para qualquer k ≥ 1. Para cada n ∈ N, defina gn : X → R por
n
X
gn (x) = |fnj+1 (x) − fnj (x)|.
j=1

Observe que cada gn é claramente uma função mensurável, e que gn ∈ Lp (X), uma vez
que
n n
X X 1
||gn ||Lp (X) ≤ ||fnj+1 − fnj ||Lp (X) < j
< 1. (6.5.4)
j=1 j=1
2

Pelo teorema da Convergência Monótona (Teorema 6.3.1) segue  que (gn )n∈N converge pon-
tualmente para uma função g : X → [0, ∞], e portanto |gn |p ) n∈N converge pontualmente
para |g|p . Pelo mesmo teorema, também vale que
Z Z
p
||g||Lp (X) = p
|g| dµ = lim |gn |p dµ = lim ||gn ||pLp (X) ,
X n→∞ X n→∞
6.5. OS ESPAÇOS LP 141

e o último limite acima existe pois a sequência ||gn ||pLp (X) é uma sequência monótona


não-decrescente de números reais limitada superiormente por 1, conforme mostra a de-


sigualdade (6.5.4). Note que uma consequência da igualdade acima é que o conjunto
E∞ ⊆ X de pontos em que g = ∞ tem medida nula, donde, redefinindo g para valer 0
nesses pontos, por exemplo, podemos assumir que g ∈ Lp (X). Mais ainda, em X \ E∞
temos

|fnj (x) − fni (x)| ≤ |fnj (x) − fnj−1 (x)| + . . . + |fni+1 (x) − fni (x)| ≤

≤ g(x) − gi−1 (x) ≤ g(x)

sempre que j ≥ i ≥ 2. Uma vez que gn (x) % g(x) em R para todo x ∈ X \ E∞ , segue que
a desigualdade acima garante que (fnk (x))k∈N é uma sequência de Cauchy em R. Assim,
podemos definir

f (x) = lim fnk (x)


k→∞

para cada x ∈ X \ E∞ , e estendemos f a X pondo f = 0 em E∞ . Agora, fazemos j → ∞


na desigualdade |fnj (x) − fni (x)| ≤ g(x) e elevamos os dois lados a p para obter

|f (x) − fni (x)|p ≤ g(x)p

para quaisquer i ≥ 2 e x ∈ X \ E∞ . A desigualdade acima tem duas consequências: a


primeira é que f ∈ Lp (X). De fato, |f |p ≤ |fni |p + g p em todos os pontos em que f é
não-nula, e daı́ a integral de |f |p é finita. A segunda é que podemos usar o teorema  da
Convergência Dominada (Teorema 6.4.1) para a sequência de funções |f − fni |p i≥2 , que
converge pontualmente para 0 em X \ E∞ , para obter
Z Z
0 = lim p
|f − fni | dµ = lim |f − fni |p dµ = lim ||f − fni ||pLp (X) ,
i→∞ X\E∞ i→∞ X i→∞

donde fnk → f em Lp (X). Observe que a segunda igualdade vem do fato de que µ(E∞ ) =
0. Isso conclui a demonstração.

A seguir, vamos mostrar que os espaços Lp (X) são reflexivos para 2 ≤ p < ∞. Isso
também vale para 1 < p ≤ 2, mas esse caso será tratado apenas na próxima seção, obtido
como consequência da caracterização dos duais dos espaços Lp (X). Veja o Corolário 6.6.1.

Definição 6.5.6. Um espaço de Banach é uniformemente convexo se para todo número


ε > 0 existe um número δ > 0 com a propriedade de que se x, y ∈ BX são tais que
||x − y|| > ε, então

x + y
2 < 1 − δ.

Observe, em particular, que em um espaço de Banach uniformemente convexo a esfera


unirária não pode conter segmentos de reta. Consequentemente, todo espaço uniforme-
mente convexo é estritamente convexo (a volta não vale, veja o Exercı́cio 6.29).

Teorema 6.5.3 (Milman-Pettis). Todo espaço de Banach sobre R que é uniformemente


convexo é reflexivo.
142 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Demonstração. Seja φ ∈ BX ∗∗ (se a norma de φ for maior que 1, então apenas precisamos
normalizá-lo). Devemos mostrar que existe x ∈ BX com a propriedade de que φ = x̂.
Como J(BX ) é fechado com respeito à topologia forte em X ∗∗ , é suficiente provar que
para todo ε > 0 existe xε ∈ BX tal que ||x̂ε − φ||X ∗∗ ≤ ε.
Dado ε > 0, seja δ > 0 tal que ||(x + y)/2||X < 1 − δ sempre que x, y ∈ BX são tais
que ||x − y||X > ε. Escolha f ∈ X ∗ com ||f ||X ∗ = 1 e tal que
δ
φ(f ) > 1 − . (6.5.5)
2
Note que isso é possı́vel pois ||φ||X ∗∗ = sup{φ(g) : g ∈ BX ∗ } = 1. Considere a vizinhança

V = V (φ, f, ε) = {η ∈ X ∗∗ : |η(f ) − φ(f )| < δ/2}

de φ na topologia fraca∗ σ(X ∗∗ , X ∗ ) de X ∗∗ . Uma vez que a imagem J(BX ) é densa em


BX ∗∗ na topologia fraca∗ de X (veja a Proposição 4.4.1) temos que V ∩ J(BX ) 6= ∅. Daı́,
seja x ∈ BX tal que x̂ ∈ V . Vamos mostrar que ||x̂ − φ||X ∗∗ ≤ ε. Para isso, suponha (por
absurdo) que ||x̂ − φ||X ∗∗ > ε. Daı́, temos que

φ ∈ X ∗∗ \ (x̂ + εBX ∗∗ ) := W,

onde W é aberto na topologia fraca∗ de X ∗∗ , uma vez que pelo teorema de Banach-
Alaoglu-Bourbaki (Teorema 4.3.1) a bola BX ∗∗ é fechada nessa topologia (veja também o
Exercı́cio 4.21). Segue que V ∩ W é uma vizinhança de φ na topologia fraca∗ de X ∗∗ , e
portanto, usando a Proposição 4.4.1 mais uma vez, segue que V ∩ W ∩ J(BX ) 6= ∅. Logo,
podemos tomar z ∈ BX tal que ẑ ∈ V ∩ W . Como ẑ ∈ W , temos que ||x̂ − ẑ||X ∗∗ > ε,
donde segue (do fato de que a aplicação canônica é uma isometria linear) que

||x − z||X > ε.

Portanto, segue que ||(x + z)/2||X < 1 − δ. Por outro lado, como x̂, ŷ ∈ V , temos que

φ(f ) − x̂(f ) ≤ |x̂(f ) − φ(f )| < δ/2, e


φ(f ) − ẑ(f ) ≤ |ẑ(f ) − φ(f )| < δ/2,

onde as primeiras desigualdades em cada linha são justificadas meramente pela definição
do módulo de um número real. Somando as duas desigualdades e reorganizando os termos
vem

2φ(f ) < x̂(f ) + ẑ(f ) + δ ≤ |x̂(f ) + ẑ(f )| + δ.

Assim, segue da desigualdade (6.5.5) que

||x + z||X = ||x̂ + ẑ||X ∗∗ ≥ |x̂(f ) + ẑ(f )| > 2φ(f ) − δ > 2 − 2δ.

Consequentemente, temos que ||(x + z)/2||X > 1 − δ, e essa contradição conclui a prova.

Antes de mostrar que os espaços Lp são reflexivos para 2 ≤ p < ∞, precisamos de um


lema técnico.
Lema 6.5.3. Se p ≥ 2, então vale que

αp + β p ≤ (α2 + β 2 )p/2

para quaisquer números α, β ≥ 0.


6.5. OS ESPAÇOS LP 143

Demonstração. Por homogeneidade, podemos provar o caso em que β = 1 (note que se


um dos dois números é zero, então o resultado é trivial. Considere a função g : [0, ∞) → R
dada por

g(x) = (x2 + 1)p/2 − xp − 1.

Para todo x ∈ [0, ∞), vale que


p p
g 0 (x) = p(x2 + 1) 2 −1 x − pxp−1 ≥ p(x2 ) 2 −1 x − pxp−1 = 0,

donde g é não-decrescente (observe que na desigualdade acima usamos o fato de que


p ≥ 2). Como g(0) = 0 segue que g(x) ≥ 0 para qualquer x ∈ [0, ∞), donde pondo
x = α/β segue a desigualdade desejada.

Proposição 6.5.3. Se 2 ≤ p < ∞, então Lp (X) é reflexivo.


Demonstração. Pelo teorema de Milman-Pettis (Teorema 6.5.3), é suficiente mostrar que
para 2 ≤ p < ∞ o espaço Lp (X) é uniformemente convexo. Sejam a, b ∈ R, e ponha

a + b
α = , e
2

a − b
β =
2
no lema anterior. Obtemos
!p/2  2 2 p/2
a + b p a − b p a + b 2 a − b 2

a b 1 p p

2 + 2 ≤ ≤ |a| |b|
+ = + + ,
2 2 2 2 2

onde a última desigualdade decorre da convexidade da função x 7→ |x|p/2 . Como con-


sequência imediata, temos que para quaisquer funções f, g ∈ Lp (X) vale
f + g p f − g p

1 p p

2 p + 2 p
≤ ||f ||Lp (X) + ||g||Lp (X) .
L (X) L (X) 2

Assim, se ε > 0 e f, g ∈ BLp (X) são tais que ||f − g||Lp (X) > ε, temos que
f + g p
 ε p

2 p
< 1 − .
L (X) 2

Observe que se ε > 2, então não existem f, g ∈ BLp (X) tais que ||f − g||Lp (X) > ε. Assim,
assumindo ε ≤ 2, se δ > 0 é tal que
h  ε p i1/p
1− = 1 − δ,
2
então f, g ∈ BLp (X) e ||f − g||Lp (X) > ε implicam

f + g

2 p
< 1 − δ,
L (X)

e daı́ segue que Lp (X) é uniformemente convexo, e portanto reflexivo.


144 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

6.6 Dualidade, reflexividade e separabilidade


Ao longo desta seção, continuamos sempre assumindo que (X, Σ, µ) é um espaço de me-
dida tal que µ é σ-finita. Nosso objetivo é caracterizar os duais dos espaços Lp (X) a
menos de isomorfismos isométricos (veja a Definição 2.4.3). Lembre-se de que, como
Lp (X) é um espaço normado, seu dual é definido usualmente como o espaço vetorial dos
funcionais lineares φ : Lp (X) → R contı́nuos com respeito à norma de Lp (X). Observe
cuidadosamente que estamos nos restringindo ao caso real. Começaremos pelo caso em
que 1 < p < ∞.
Teorema 6.6.1. Assuma que 1 < p, q < ∞ são números conjugados, isto é, que 1/p +
1/q = 1. Para cada φ ∈ Lp (X)∗ existe uma única uφ ∈ Lq (X) com a propriedade de que
Z
φ(f ) = uφ f dµ
X

para toda f ∈ Lp (X). A aplicação Ip : Lp (X)∗ → Lq (X) definida desta forma é um


isomorfismo isométrico.
Demonstração. Vamos começar assumindo que 2 ≤ p < ∞. Considere a aplicação T :
Lq (X) → Lp (X)∗ que associa cada função u ∈ Lq (X) ao funcional T u ∈ Lp (X)∗ dado por
Z
T u(f ) = uf dµ
X

para cada f ∈ Lp (X). Note que T está bem-definida pois como u ∈ Lq (X) e f ∈ Lp (X),
segue da desigualdade de Hölder (veja a Observação 6.5.4) que uf ∈ L1 (X), e portanto a
integral acima é finita.
É claro que é suficiente mostrar que T é uma isometria linear, uma vez que nesse caso
a aplicação Ip é apenas a inversa de T . A linearidade é óbvia, então vamos prosseguir
mostrando que T é uma isometria. Seguindo a notação para a bola unitária de um espaço
normado introduzida no Capı́tulo 2, vamos denotar
BLp (X) = f ∈ Lp (X) : ||f ||Lp (X) ≤ 1 .


Para cada u ∈ Lq (X), temos


n o  Z 

||T u||Lp (X)∗ = sup |T u(f )| : f ∈ BLp (X) = sup uf dµ : f ∈ BLp (X) .
X

Usando a desigualdade de Hölder, segue que sempre que f ∈ BLp (X) vale
Z

uf dµ ≤ ||u||Lq (X) ||f ||Lp (X) ≤ ||u||Lq (X) ,

X

donde segue que ||T u||Lp (X)∗ ≤ ||u||Lq (X) . Para provar que a igualdade vale, dada u ∈
Lq (X) com u 6= 0 (o caso nulo é trivial), defina g : X → R por

|u(x)|q−2 u(x), se u(x) 6= 0,
g(x) = .
0, se u(x) = 0
Daı́, é fácil notar que |g|p = |u|q , e dessa igualdade segue que g ∈ Lp (X), e que ||g||Lp (X) =
q/p
||u||Lq (X) . Além disso,
Z Z
|u|q dµ = ||u||qLq (X) .
2 q−2

|T u(g)| = u |u| dµ =
X X
6.6. DUALIDADE, REFLEXIVIDADE E SEPARABILIDADE 145

Consequentemente,
||u||qLq (X)
 
g
||T u||Lp (X)∗ ≥ T u
= = ||u||Lq (X) ,
||g||Lp (X) ||u||q/p
q
L (X)

uma vez que q − q/p = 1. Isso mostra que ||T u||Lp (X)∗ = ||u||Lq (X) . Falta mostrar que T é
sobrejetiva. Para isso, primeiro observe que a imagem T (Lq (X)) é um subespaço fechado
de Lp (X)∗ . Isso se dá pois T é uma isometria e Lq (X) é Banach. Assim, é suficiente
mostrar que T (Lq (X)) é denso em Lp (X)∗ . Para isso, vamos usar o ı́tem (a) do Exercı́cio
3.15. Assuma que ϕ ∈ Lp (X)∗∗ é tal que ϕ(T (u)) = 0 para todo u ∈ Lq (X). Como Lp (X)
é reflexivo (isso vem da Proposição 6.5.3, uma vez que estamos assumindo 2 ≤ p < ∞),
segue que existe h ∈ Lp (X) tal que ϕ = ĥ. Daı́
Z
0 = ϕ(T u) = T u(h) = uh dµ
X

para qualquer u ∈ Lq (X). Tomando u = |h|p−2 h segue imediatamente que u ∈ Lq (X), e


Z
0= |h|p dµ = ||h||pLp (X) = ||ϕ||pLp (X)∗∗ ,
X

donde ϕ = 0. É claro que Ip = T −1 , e isso conclui a prova do caso 2 ≤ p < ∞ (lembre-se


de que uma isometria bijetiva é um isomorfismo).
Assuma, agora que 1 < p ≤ 2. Dessa forma, o conjugado q ∈ R de p é tal que 2 ≤ q <
∞. Daı́, do caso que acabamos de provar temos que a aplicação T : Lp (X) → Lq (X)∗ que
associa cada f ∈ Lp (X) ao funcional T f ∈ Lq (X)∗ dado por
Z
T f (u) = uf dµ
X

para cada u ∈ Lq (X) é um isomorfismo isométrico. Consequetemente, o adjunto de


Banach T a : Lq (X)∗∗ → Lp (X)∗ de T , que é dado por
T a ϕ = ϕ ◦ T,
para quaisquer ϕ ∈ Lq (X)∗∗ , é um isomorfismo isométrico (referimos o leitor à Observação
7.4.3). Uma vez que 2 ≤ q < ∞, temos que Lq (X) é reflexivo (de novo pela Proposição
6.5.3). Daı́, se Jq : Lq (X) → Lq (X)∗∗ denota a aplicação canônica de Lq (X), então a
composição T a ◦ Jq : Lq (X) → Lp (X)∗ é um isomorfismo isométrico (pois é a composição
de isomorfismos isométricos), e para cada u ∈ Lq (X) e cada f ∈ Lp (X) vale
Z
a a
T (Jq (u))(f ) = T (û)(f ) = û(T f ) = T f (u) = uf dµ.
X

Assim, segue imediatamente que Ip = (T a ◦ Jq )−1 . Consequentemente, Ip é um isomor-


fismo isométrico também no caso 1 < p ≤ 2.

Corolário 6.6.1. Para qualquer 1 < p < ∞ o espaço Lp (X) é reflexivo.


Demonstração. Já sabemos que se 2 ≤ p < ∞, então Lp (X) é reflexivo. Assuma, por-
tanto, que 1 < p ≤ ∞. Daı́, como o seu conjugado q ∈ R é tal que 2 ≤ q < ∞, segue
que Lq (X) é reflexivo, donde o dual Lq (X)∗ também o é (veja a Proposição 4.4.2). Pelo
teorema anterior, temos que Lp (X) é isomorfo a Lq (X)∗ , donde vale que Lp (X) é reflexivo
(veja o Exercı́cio 4.29).
146 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Em resumo, acabamos de mostrar que se 1 < p, q < ∞ são conjugados, então os


espaços Lp (X) e Lq (X)∗ são isometricamente isomorfos. Mais ainda, no Teorema 6.6.1
exibimos explicitamente um isomorfismo isométrico entre esses dois espaços. Além disso,
obtemos que todos os espaços Lp (X) com 1 < p < ∞ são reflexivos. A seguir, estudaremos
os espaços L1 (X) e L∞ (X). Antes, definimos a função de n-truncamento Tn : R → R
para cada n ∈ N como

 −n, se ρ < −n
Tn (ρ) = ρ, se |ρ| ≤ n .
n, se ρ > n

Definimos, também, a função sinal sign : R → R por sign(ρ) = ρ/|ρ| se ρ 6= 0, e


sign(0) = 0. Observe que ρ · sign(ρ) = |ρ| para qualquer ρ ∈ R.
Teorema 6.6.2. Para cada φ ∈ L1 (X)∗ existe um único uφ ∈ L∞ (X) com a propriedade
de que
Z
φ(f ) = uφ f dµ
X

para toda f ∈ L1 (X). A aplicação I1 : L1 (X)∗ → L∞ (X) definida desta forma é um


isomorfismo isométrico.
Demonstração. Lembre-se de que estamos assumindo que todos os espaços de medida
envolvidos são σ-finitos, e portanto podemos tomar uma sequência {En }n∈N de conjuntos
mensuráveis tais que X = ∞
S
n=1 n e µ(En ) < +∞ para cada n ∈ N. Lembre-se também
E
de que χE : X → {0, 1} denota a função caracterı́stica de E e, por simplicidade, denote
χEn por χn para cada n ∈ N.
Antes da existência, vamos primeiro provar a unicidade. Se que uφ , vφ ∈ L∞ (X) têm
a propriedade descrita no enunciado, então temos que
Z
(uφ − vφ )f dµ = 0
X

para toda f ∈ L1 (X). Pondo f = χn · sign(uφ − vφ ) vem


Z Z
0= (uφ − vφ ) dµ = |uφ − vφ | dµ,
X En

e portanto uφ = vφ para quase todo ponto em cada En . Segue imediatamente que uφ = vφ


em quase toda parte, e isso mostra a unicidade.
Vamos agora à existência. É claro que, considerando uniões, podemos assumir que a
sequência En é crescente, isto é,

E1 ⊆ E2 ⊆ . . . ⊆ En ⊆ En+1 ⊆ . . . ,

donde, convencionando que E0 = ∅ e denotando An = En+1 \ En , temos



[
X= An
n=1

Defina g : X → [0, +∞) pondo


1
g(x) = p ,
n
2 µ(An )
6.6. DUALIDADE, REFLEXIVIDADE E SEPARABILIDADE 147

sempre que x ∈ An e µ(An ) = 0, e g(x) = 1 se x ∈ An e µ(An ) = 0. Daı́, a função g é


claramente mensurável, e tem as seguintes propriedades:

(i) para cada n ∈ N, temos


( )
1 1
g(x) ≥ min 1, p ,..., p := εn > 0,
2µ(A1 ) 2n−1 µ(An−1 )
para todo x ∈ En . Com efeito, isso decorre do fato de que En = A1 ∪ A2 ∪ . . . ∪ An−1 .

(ii) g ∈ L2 (X). De fato, seja J = {n ∈ N : µ(An ) 6= 0}. Assim,


Z ∞ Z XZ
2 2
X
2 1 X 1
||g||L2 (X) = g dµ = g dµ = n µ(A )
dµ = n
≤ 1.
X n=1 A n n∈J A n
2 n
n∈J
2

Pela desigualdade de Hölder (veja a Observação 6.5.4), o produto de funções de L2 (X) é


uma função de L1 (X). Assim, um funcional φ ∈ L1 (X)∗ pode ser avaliado no produto de
funções L2 (X), e portanto definimos o funcional Gφ : L2 (X) → R como
Gφ (h) = φ(gh),

para qualquer h ∈ L2 (X). É claro que Gφ é linear, e também vale a estimativa


|Gφ (h)| = |φ(gh)| ≤ ||φ||L1 (X)∗ ||gh||L1 (X) ≤ ||φ||L1 (X)∗ ||g||L2 (X) ||h||L2 (X)
para qualquer h ∈ L2 (X), donde segue que Gφ ∈ L2 (X)∗ , uma vez que ||φ||L1 (X)∗ e
||g||L2 (X) são finitos. Aplicando o Teorema 6.6.1 para Gφ , segue que existe uma função
v ∈ L2 (X) com a propriedade de que
Z
Gφ (h) = vh dµ
X
2
para qualquer h ∈ L (X). Defina
v(x)
u(x) =
g(x)
para cada x ∈ X. Vamos mostrar que u é a função procurada. Primeiro, note que u está
bem-definida uma vez que g(x) > 0 para qualquer x ∈ X. Afirmamos que u ∈ L∞ (X) e
que ||u||L∞ (X) ≤ ||φ||L1 (X)∗ . Para provar essa afirmação, assuma que c > ||φ||L1 (X)∗ e seja
A = {x ∈ X : |u(x)| > c}.
Note que |u| = |v|/g, e podemos escrever |v| = v · sign(v). Além disso, para cada n ∈ N,
a função
χA∩En · sign(v)
hn =
g
é uma função de L2 (X). Isso decorre do fato de que hn é limitada no conjunto de medida
finita En e se anula em X \ En . Assim, para todo n ∈ N vale que
Z Z Z
sign(v)
c · µ(A ∩ En ) = c dµ < |u| dµ = v· dµ =
A∩En A∩En A∩En g
χA∩En · sign(v) χA∩En · sign(v)
Z  
= v· dµ = Gφ = φ(χA∩En · sign(v)) ≤
X g g
≤ ||φ||L1 (X)∗ ||χA∩En · sign(v)||L1 (X) = µ(A ∩ En ) · ||φ||L1 (X)∗ ,
148 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

onde a última igualdade se justifica pois, com |u| > c > ||φ||L1 (X)∗ ≥ 0 em A, segue que
|v| > 0 em A, e portanto |sign(v)| = 1 em A. Daı́,
Z Z
χ
|| A∩En · sign(v)||L1 (X) = χ
| A∩En · sign(v)| dµ = χA∩En · |sign(v)| dµ =
X Z X
Z
= |sign(v)| dµ = dµ = µ(A ∩ En ).
A∩En A∩En

Logo, temos c · µ(A ∩ En ) ≤ µ(A ∩ En ) · ||φ||L1 (X)∗ , e como c > ||φ||L1 (X)∗ isso implica
S∞ que
µ(A ∩ En ) = 0. Uma vez que n ∈ N foi tomado arbitrariamente, e que X = n=1 En ,
temos que µ(A) = 0, e isso mostra que
||u||L∞ (X) ≤ ||φ||L1 (X)∗ . (6.6.1)
Agora, seja f ∈ L1 (X). Observe que fn := χn · (Tn ◦ f ) ∈ L1 (X) para cada n ∈ N, pois
fn é limitada em En e se anula em X \ En . É claro que fn converge pontualmente para f .
Com efeito, se x ∈ X, então basta tomar n0 ∈ N suficientemente grande tal que x ∈ En0
e |f (x)| < n0 . Assim, fn (x) = f (x) sempre que n > n0 . Como vale que |fn (x)| ≤ |f (x)|
para quaisquer n ∈ N e x ∈ X, e uma vez que |f | ∈ L1 (X), segue do Exercı́cio 6.27 que
fn → f em L1 (X), e portanto
φ(f ) = lim φ(fn ),
n→∞

pois φ é um funcional linear contı́nuo de L1 (X). Por outro lado, é claro que fn /g ∈ L2 (X)
para cada n ∈ N, uma vez que fn /g é limitada no conjunto de medida finita En e se anula
em X \ En . Assim,
Z Z  
fn fn
ufn dµ = v· dµ = Gφ = φ(fn ). (6.6.2)
X X g g
É claro que ufn → uf pontualmente, e como u ∈ L∞ (X) temos que |uf | é integrável.
Assim, uma vez que |ufn (x)| ≤ |uf (x)| para quaisquer n ∈ N e x ∈ X segue do teorema
da Convergência Dominada (Teorema 6.4.1) que
Z Z
uf dµ = lim ufn dµ.
X n→∞ X

Tomando o limite para n → ∞ na igualdade (6.6.2) segue que


Z
φ(f ) = uf dµ.
X

Assim, pondo u = uφ = I1 (φ) temos uma aplicação injetiva I1 : L1 (X)∗ → L∞ (X).


A linearidade e a sobrejetividade de I1 são imediatas. Além disso, j temos de (6.6.1) que
||I1 (φ)||L∞ (X) ≤ ||φ||L1 (X)∗ . Portanto, para concluir a prova do teorema basta mostrar a
desigualdade inversa. Para isso, note que para cada f ∈ BL1 (X) , vale que
Z Z Z

|φ(f )| = uφ f dµ ≤ |uφ f | dµ ≤ ||uφ ||L∞ (X) |f | dµ = ||I1 (φ)||L∞ (X) ||f ||L1 (X) ≤
X X X
≤ ||I1 (φ)||L∞ (X) ,
e consequentemente

||I1 (φ)||L∞ (X) ≥ sup |φ(f )| : ||f ||L1 (X) ≤ 1 = ||φ||L1 (X)∗ ,
e isso conclui a prova.
6.6. DUALIDADE, REFLEXIVIDADE E SEPARABILIDADE 149

Em contraste com o caso dos espaços Lp (X) para 1 < p < ∞, os espaços L1 (X) e
L∞ (X) não são sempre reflexivos (quanto têm dimensão infinita, é claro). Investigaremos
este fato a seguir.

Proposição 6.6.1. Assuma que (X, Σ, µ) é um espaço de medida que tem a propriedade
de que para todo ε > 0 existe E ∈ Σ tal que 0 < µ(E) < ε. Então, L1 (X) não é reflexivo.

Demonstração. Usando a hipótese sobre a medida, construı́mos uma sequência de con-


juntos mensuráveis {En }n∈N com as seguintes propriedades:

(i) E1 ⊇ E2 ⊇ . . . ⊇ En ⊇ En+1 . . ., isto é, {En }n∈N é decrescente,

(ii) µ(En ) > 0 para todo n ∈ N, e

(iii) µ(En ) → 0 quando n → ∞.

Para construir tal sequência, comece tomando conjuntos mensuráveis Ak com a proprie-
dade de que 0 < µ(Ak ) < 1/2k para cada k ∈ N. Então, defina

[
En = Ak .
k=n

É imediato verificar que a sequência assim construı́da tem as propriedade descritas acima.
Suponha, por contradição, que L1 (X) é reflexivo. Para cada n ∈ N, denote χn := χEn , e
defina
χn
un = .
||χn ||L1 (X)

Note que a definição faz sentido, uma vez que como ||χn ||L1 (X) = µ(En ) < ∞ temos
χn ∈ L1 (X). Observe, também, que ||un ||L1 (X) = 1 para cada n ∈ N, donde (un )n∈N é uma
sequência limtada. Como estamos supondo que L1 (X) é reflexivo, decorre do Teorema
4.4.4 que (un ) tem uma subsequência que converge na topologia fraca σ(L1 (X), L∞ (X))
para alguma função u ∈ L1 (X). Aqui, estamos usando a identificação L1 (X)∗ ' L∞ (X)
dada no Teorema 6.6.2. Por simplicidade, denotamos un * u. Daı́, segue imediatamente
do teorema mencionado que a convergência fraca un * u é equivalente a
Z Z
un φ dµ → uφ dµ,
X X

para qualquer φ ∈ L∞ (X). Para cada k ∈ N fixado, temos que χk ∈ L∞ (X), e para
qualquer n > k vale a igualdade

µ(En ∩ Ek )
Z Z
1
χ
un k dµ = χn · χk dµ = = 1,
X
χ
|| n ||L1 (X) X µ(En )

uma vez que En ⊆ Ek (lembre-se de que a sequência {En } é decrescente). Tomando o


limite com n → ∞, concluı́mos que
Z
uχk dµ = 1 (6.6.3)
X
150 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

para todo k ∈ N. Por outro lado, a sequência (uχk )k∈N converge pontualmente para a
função nula, exceto possivelmente nos pontos do conjunto

\
E= Ej ,
j=1

que tem medida nula. Com efeito, E ⊆ En para todo n ∈ N, donde segue que µ(E) ≤
µ(En ) para qualquer n ∈ N. Como µ(En ) → 0 quando n → ∞ vem que µ(E) = 0. Além
da convergência pontual uχk → 0 em quase toda parte, observe que |uχk (x)| ≤ |u(x)|
para quaisquer x ∈ X e k ∈ N, e lembre-se de que u é integrável (donde |u| também o
é). Assim, decorre do teorema da Convergência Dominada (Teorema 6.4.1, veja também
a Observação 6.4.2) que
Z
uχk dµ → 0
X

quando k → ∞, e assim temos uma contradição com (6.6.3).

Como a medida de Lebesgue restrita a qualquer aberto não-vazio X ⊆ Rn satisfaz


à hipótese da proposição acima, segue que os espaços L1 sobre abertos de Rn não são
reflexivos. Sumarizamos isso a seguir.
Corolário 6.6.2. Seja X ⊆ Rn um subconjunto aberto não-vazio, e sejam ΣX e µX
a σ-álgebra de Borel de Rn restrita a X e a medida de Lebesgue de Rn restrita a X,
respectivamente (veja o Exercı́cio 6.9). Então, L1 (X, ΣX , µX ) não é reflexivo.
Também, nas hipóteses da Proposição 6.6.1 temos que L∞ (X) não é reflexivo. Com
efeito, se L∞ (X) fosse reflexivo, então L1 (X)∗ também o seria (uma vez que a reflexividade
é preservada por isomorfismos, veja o Exercı́cio 4.29). Daı́, da Proposição 4.4.2 terı́amos
que L1 (X) é reflexivo.
O espaço dual de L∞ (X) contém uma cópia de L1 (X), isto é, um subespaço vetorial
que é isomorfo a L1 (X). Com efeito, como L1 (X)∗ ' L∞ (X), segue do Exercı́cio 4.23
que L∞ (X)∗ ' L1 (X)∗∗ , e a imagem de L1 (X) pela aplicação canônica é um subespaço
de L1 (X)∗∗ que é isomorfo a L1 (X).
Para finalizar essa seção, discutimos brevemente a separabilidade dos espaços Lp .
Vamos mostrar que Lp (Rn ) é separável para qualquer 1 ≤ p < ∞, onde consideramos a
medida de Lebesgue usual na σ-álgebra de Borel de Rn . Por outro lado, o espaço L∞ (Rn )
não é separável, mas não provaremos este fato.
Teorema 6.6.3. Para cada 1 ≤ p < ∞ o espaço Lp (Rn ) é separável.
Demonstração. Denote por CQ a coleção de cubos da forma C = nj=1 (aj , bj ), onde aj , bj ∈
Q
Q para qualquer j = 1, . . . , n. Considere o conjunto das combinações lineares racionais
das funções caracteriı́sticas dos cubos de CQ :

F := spanQ {χC : C ∈ CQ }.

Sejam f ∈ Lp (Rn ) e ε > 0 dados arbitrariamente. Pelo Exercı́cio 6.30, podemos tomar
g ∈ Cc (Rn ) tal que ||f − g||Lp (Rn ) < ε/2. Assuma que C ∈ CQ é um cubo que contém o
suporte de g. Dado δ > 0, por compacidade podemos decompor C em uma quantidade
finita de cubos {Cj }N
j=1 com a propriedade de que

osc(g|Cj ) := sup(g|Cj ) − inf(g|Cj ) < δ


6.7. EXERCÍCIOS 151

para cada j = 1, . . . , N . Daı́, pondo


N  
X sup(g|Cj ) + inf(g|Cj )
h= · χCj
j=1
2

segue que h ∈ F e supx∈Rn |h(x) − g(x)| ≤ δ, donde

||h − g||Lp (Rn ) ≤ δ · vol(C)1/p .

Assim, basta fazer a construção acima para δ > 0 de modo que se tenha δ·vol(C)1/p < ε/2.
Segue da desigualdade triangular que ||f − h||Lp (Rn ) < ε, e isso mostra que F é denso em
Lp (Rn ). Como F é enumerável, temos que Lp (Rn ) é separável.

Corolário 6.6.3. Seja X ⊆ Rn um aberto, e assuma que X está munido da σ-álgebra


de Borel e da medida de Lebesgue induzidas por Rn . Então, para qualquer 1 ≤ p < ∞,
Lp (X) é separável.
Demonstração. Basta notar que Lp (X) é isometricamente isomorfo a um subespaço de
Lp (Rn ): para cada f ∈ Lp (X), estendemos f como 0 em Rn \ X.

6.7 Exercı́cios
Exercı́cio 6.1. Seja (X, Σ) um espaço mensurável. Mostre que se A, B ∈ Σ, então
A \ B ∈ Σ.
Exercı́cio 6.2. Seja X um conjunto infinito não-enumerável, e considere a coleção Σ ⊆ 2X
formada pelos subconjuntos A ⊆ X com a propriedade de que A é não-enumerável ou o
seu complementar X \ A é não-enumerável. Mostre que Σ é uma σ-álgebra de X.
Exercı́cio 6.3. Uma coleção {Ej }i∈J de subconjuntos não-vazios S de um conjunto X é
uma partição de X se Ei ∩ Ej = ∅ sempre que i 6= j e se X = j∈J Ej = X (em outras
palavras, uma partição de X é uma cobertura de X cujos elementos são disjuntos dois-a-
dois). Prove que a coleção das uniões arbitrárias dos conjuntos de uma partição de X é
uma σ-álgebra de X.
Exercı́cio 6.4 (O espaço R̄). Considere o conjunto

R̄ = R ∪ {−∞, ∞},

denominado reta real estendida, que também denotaremos por [−∞, ∞]. Estenda a
operação usual de soma a R̄ definindo

a + ∞ = ∞ + a = ∞, e a + (−∞) = −∞ + a = −∞

para qualquer a ∈ R, bem como

∞ + ∞ = ∞, e − ∞ + (−∞) = −∞.

Mais ainda, assuma que a relação de ordem de R é estendida para R̄ pondo −∞ ≤ a ≤ ∞


para qualquer a ∈ R̄. Denote também

(a, ∞] = (a, ∞) ∪ {∞}, e [−∞, a) = {−∞} ∪ (−∞, a),


152 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

para qualquer a ∈ R. Observe que a soma não está definida se {a, b} = {−∞, ∞}. Nosso
objetivo é introduzir uma topologia em R̄, e estudar algumas de suas propriedades.

(a) Seja τ a coleção de uniões arbitrárias de intervalos abertos de R (possivelmente vazios)


e conjuntos dos tipos (a, ∞] e [−∞, a), com a ∈ R. Mostre que τ é uma topologia na
reta estendida (chamamos essa topologia de topologia usual de R̄). Verifique também que
a topologia usual de R é a restrição da topologia de R̄ a R.

(b) Mostre que (R̄, τ ) é Hausdorff e admite uma base enumerável de vizinhanças.

(c) Prove que R̄ é um espaço topológico compacto com sua topologia usual.

(d) Em análise real, dizemos que uma sequência (an )n∈N é tal que limn→∞ an = ∞ quando
para todo M > 0 existe n0 ∈ N com a propriedade de que an > M para qualquer n > n0 .
Demonstre que essa definição coincide com a convergência para ∞ ∈ R̄ na topologia usual
de R̄. Verifique o análogo para sequências convergindo para −∞.

(e) Mostre que qualquer sequência monótona em R̄ é convergente.

Observação 6.7.1. É possı́vel mostrar que a topologia usual da reta estendida é metrizável,
e que R̄ com essa topologia é um homeomorfo a um intervalo compacto de R.

Exercı́cio 6.5. Mostre que a medida de Dirac definida no Exemplo 6.1.1 é, de fato, uma
medida.

Exercı́cio 6.6. Seja {Ej }j∈J uma partição em um conjunto X, e assuma que Σ é a σ-
álgebra definida por essa partição como no Exercı́cio 6.3. Seja f : J → [0, ∞] uma função
qualquer, e defina µ : Σ → [0, ∞] por
!
[ X
µ Aj = f (j)
j∈L j∈L

para qualquer subconjunto de ı́ndices L ⊆ J. Prove que µ é uma medida em (X, Σ).

Exercı́cio 6.7. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e sejam A, B ∈ Σ. Prove que


µ(A \ B) = µ(A) − µ(B).

Exercı́cio 6.8. Uma medida finitamente aditiva em um espaço mensurável (X, Σ) é uma
função µ : Σ → [0, ∞] tal que µ(∅) = 0 e com a propriedade de que para toda coleção
finita {Ej }mj=1 em Σ vale

m
! m
[ X
µ Ej = µ(Ej ).
j=1 j=1

Seja Σ uma σ-álgebra em um espaço topológico (X, τ ), e denote por C a coleção dos
subconjuntos compactos de X. Uma medida finitamente aditiva µ : Σ → [0, ∞] é dita
regular (com respeito à topologia τ ) se para todo E ∈ Σ valem as igualdades

µ(E) = inf{µ(G) : G ∈ τ ∩ Σ, G ⊇ E} = sup{µ(K) : K ∈ C ∩ Σ, K ⊆ E}.

Em outras palavras, uma medida em um espaço topológico mensurável é regular se a me-


dida de cada conjunto mensurável E é igual ao ı́nfimo das medidas dos abertos mensuráveis
6.7. EXERCÍCIOS 153

que contém E e igual ao supremo das medidas dos compactos mensuráveis contidos em E.
Prove que toda medida finitamente aditiva regular é σ-aditiva (e portanto é uma medida
no sentido da Definição 6.1.3). Mostre, também, que neste caso, se τ é Hausdorff e se Σ
é a σ-álgebra de Borel de (X, τ ), então µ é regular no sentido da Definição 6.1.4.

Observação 6.7.2. Compare a definição de regularidade de uma medida finitamente aditiva


com a Definição 6.1.4. Observe que no exercı́cio não exigimos que a σ-álgebra considerada
em X seja a σ-álgebra de Borel da topologia τ , a princı́pio. As hipóteses mais restritas
consideradas na Definição 6.1.4 foram adotadas por conveniência uma vez que estamos,
em geral, mais interessados na medida de Lebesgue dos borelianos de Rn .

Exercı́cio 6.9. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e seja E ∈ Σ um conjunto men-


surável. Prove que a coleção

ΣE = {A ∈ Σ : A ⊆ E}

é uma σ-álgebra em E. Mostre também que a restrição µE = µ|ΣE da medida µ a ΣE é


uma medida em (E, ΣE ).

Exercı́cio 6.10. Prove que a composição de aplicações mensuráveis é mensurável.

Exercı́cio 6.11. Seja f : (X, ΣX ) → Y uma aplicação de um espaço mensurável (X, ΣX )


em um conjunto Y . O pushforward da σ-álgebra ΣX é a coleção de subconjuntos de Y
dada por:

f∗ ΣX = {B ⊆ Y : f −1 (B) ∈ ΣX }.

Mostre que f∗ ΣX é uma σ-álgebra em Y . Prove também que uma aplicação f : (X, ΣX ) →
(Y, ΣY ) entre espaços mensuráveis é mensurável se, e somente se, ΣY ⊆ f∗ ΣX .

Exercı́cio 6.12. Seja (X, Σ) um espaço mensurável e sejam f, g : X → R função men-


suráveis. Mostre que as funções f + g, f g, max{f, g}, min{f, g} e |f | são mensuráveis.

Exercı́cio 6.13. Mostre que o conjunto

A = {k2−n : n ∈ N e k = 0, 1, . . . , n2n − 1}

é denso em [0, ∞).

Exercı́cio 6.14. Seja s : X → [0, ∞) uma função simples e mensurável em um espaço de


medida (X, Σ, µ). Mostre que a função µs : Σ → [0, ∞] dada por
Z
µs (E) = s dµ
E

para cada E ∈ Σ é uma medida.

Exercı́cio 6.15. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e f : X → [0, ∞] uma função


mensurável. Prove que se (En )n∈N é uma sequência de conjuntos mutuamente disjuntos,
então
Z X∞ Z
f dµ = f dµ,
E j=1 Ej

S∞
onde E = j=1 Ej .
154 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Exercı́cio 6.16. Seja f : X → [0, ∞] uma função mensurável em um espaço de medida


(X, Σ, µ). Mostre que a função µf : Σ → [0, ∞] dada por
Z
µf (E) = f dµ,
E

para cada E ∈ Σ. Prove também que


Z Z
g dµf = f g dµ
E E

para qualquer função mensurável g : X → [0, ∞] e qualquer subconjunto E ⊆ X men-


surável.
Exercı́cio 6.17. Seja f : X → R uma função integrável definida em um espaço de
medida (X, Σ, µ). Prove que se {En }n∈N ⊆ Σ é uma coleção de conjuntos mensuráveis
mutuamente disjuntos cuja união é E, então
Z X∞ Z
f dµ = f dµ.
E j=1 Ej

Exercı́cio 6.18. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e f : X → R uma função in-


tegrável. Mostre que se E ∈ Σ tem medida nula, então
Z
f dµ = 0.
E

Exercı́cio 6.19. O objetivo deste exercı́cio é mostrar, por meio de um exemplo, que a
desigualdade no Lema de Fatou (Teorema 6.3.2) pode ser estrita. Sejam (X, Σ, µ) um
espaço de medida, e seja E ∈ Σ tal que 0 < µ(E) < µ(X). Defina a sequência (fn )n∈N
pondo fn = χE se n é par, e fn = 1 − χE se n é ı́mpar. Prove que
Z Z
lim inf fn dµ < lim inf fn dµ.
X n→∞ n→∞ X

Exercı́cio 6.20. Sejam (X, τ ) um espaço topológico, Σ a sua σ-álgebra de Borel e µ :


Σ → [0, +∞] uma medida. O suporte de µ é o conjunto
supp(µ) = {x ∈ X : µ(U ) > 0 para todo aberto contendo x}.
Prove que supp(µ) é fechado na topologia de X.
Exercı́cio 6.21. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e sejam p, q ∈ (1, ∞) números reais
tais que
1 1 1
+ = ≤ 1.
p q r
Sejam f ∈ Lp (X) e g ∈ Lq (X). Mostre que f g ∈ Lr (X), e que vale a desigualdade
||f g||Lr (X) ≤ ||f ||Lp (X) ||g||Lq (X) .
Exercı́cio 6.22. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e sejam p1 , . . . , pk ∈ (1, ∞) números
reais tais que
1 1 1 1
+ + ... + = ≤ 1.
p1 p2 pk p
Para cada j = 1, . . . , k seja fj ∈ Lpj (X). Prove que f = f1 f2 . . . fk ∈ Lp (X), e mostre
que vale a desigualdade
||f ||Lp (X) ≤ ||f1 ||Lp1 (X) ||f2 ||Lp2 (X) . . . ||fk ||Lpj (X) .
6.7. EXERCÍCIOS 155

Exercı́cio 6.23. Seja (X, Σ, µ) um espaço de medida, e p, q ∈ R números reais (não


necessariamente conjugados) tais que 1 < p ≤ q < ∞. Prove que se f ∈ Lp (X) ∩ Lq (X),
então f ∈ Lr (X) para qualquer p ≤ r ≤ q. Mostre que, nesse caso, vale a desigualdade de
interpolação:

||f ||Lr (X) ≤ ||f ||αLp (X) ||f ||1−α


Lq (X) ,

onde α ∈ [0, 1] é tal que


1 α 1−α
= + .
r p q
Exercı́cio 6.24. Assuma que µ é uma medida em um espaço mensurável (X, Σ) que é
combinação linear positiva de medidas de Dirac (veja o Exemplo 6.1.1) concentradas em
pontos x1 , . . . , xm ∈ X. Isto é,

µ = λ1 δx1 + . . . + λm δxm ,

onde λj > 0 para cada j = 1, . . . , m. Mostre que Lp (X, Σ, µ) é um espaço vetorial de


dimensão finita para cada 1 ≤ p ≤ ∞.

Observação 6.7.3. Um átomo de um espaço de medida (X, Σ, µ) é um conjunto mensurável


A ∈ Σ com as propriedades de que µ(A) > 0 e se E ⊆ A é um mensurável tal que
µ(E) < µ(A), então µ(E) = 0. Em outras palavras, um átomo é um conjunto mensurável
de medida positiva que não contém um subconjunto mensurável com medida estritamente
menor do que a sua.
Uma medida é dita puramente atômica (ou, simplesmente, atômica) se, denotando
por U a união de todos os átomos, vale que qualquer mensurável E ⊆ X \ U tem medida
nula. Uma medida que não contém nenhum átomo é dita difusa. É fácil notar que as
combinações lineares de medidas de Dirac são medidas atômicas. Os átomos são os pontos
em que a medida está concentrada.

Exercı́cio 6.25. Assuma que (X, Σ, µ) é um espaço de medida com µ(X) < ∞. Mostre
que se existe ε > 0 tal que para qualquer E ∈ Σ com µ(E) > 0 vale que µ(E) ≥ ε, então
µ é puramente atômica.

Exercı́cio 6.26. Dizemos que uma sequência de funções {fn : X → R}n∈N definidas em
um espaço de medida (X, Σ, µ) converge em quase toda parte (ou converge em µ-q.t.p) se
existe um conjunto de medida nula N ∈ Σ tal que (fn ) converge pontualmente em X \ N .
Para qualquer 1 ≤ p < ∞, prove que se fn → f em Lp (X) então existe uma subsequência
de (fn ) que converge em quase toda parte para f . Mais ainda, mostre que a se fn → f
em L∞ (X), então (fn ) converge para f em quase toda parte.

Observação 6.7.4. Em outras palavras, a convergência em Lp implica a convergência em


µ-q.t.p de uma subsequência (não é necessário passar a uma subsequência se p = ∞). No
próximo exercı́cio, vamos verificar sob quais condições que vale a “volta” deste enunciado.

Exercı́cio 6.27. Sejam (X, Σ, µ) um espaço de medida e {fn : X → R} uma sequência


de funções em Lp (X), para algum p ∈ [1, ∞). Assuma que (fn ) converge em quase toda
parte para uma função f : X → R. Prove que se existe uma função g ∈ Lp (X) tal que

|fn (x)| ≤ g(x)

para quaisquer x ∈ X e n ∈ N, então f ∈ Lp (X) e fn → f em Lp (X).


156 CAPÍTULO 6. ESPAÇOS DE FUNÇÕES INTEGRÁVEIS

Exercı́cio 6.28. Uma sequência de funções {fn : X → R}n∈N converge uniformemente


para uma função f : X → R se para todo ε > 0 existe n0 ∈ N tal que

|fn (x) − f (x)| < ε

para quaisquer n ≥ n0 e x ∈ X. Assuma que (X, Σ, µ) é um espaço de medida com µ(X) <
∞, e seja p ∈ [1, ∞]. Prove que se (fn )n∈N é uma sequência de funções (representantes
de classes) em Lp (X) que converge uniformemente para uma função f : X → R, então
f ∈ Lp (X) e fn → f na norma de Lp (X).

Exercı́cio 6.29. Prove que o espaço `1 (N) munido da norma

|| · || = || · ||1 + || · ||2

é estritamente convexo, mas não é uniformemente convexo.

Exercı́cio 6.30. Sejam (X, τ ) um espaço topológico e V um espaço vetorial. O suporte


de uma função f : X → V é o conjunto

supp(f ) := cl {x ∈ X : f (x) 6= 0} .

Considere o espaço Rn munido de sua topologia usual e da medida de Lebesgue na σ-


álgebra de Borel dessa topologia. Denote por Cc (Rn ) o conjunto de funções contı́nuas
f : Rn → R que têm suporte compacto. Verifique que Cc (Rn ) ⊆ Lp (Rn ) para todo
1 ≤ p < ∞, e que, mais ainda, Cc (Rn ) é denso em Lp (Rn ) na topologia da norma para
cada 1 ≤ p < ∞.
Capı́tulo 7

Soluções dos Exercı́cios

7.1 Capı́tulo 1
Exercı́cio 1.1 Denote por F = {τλ : λ ∈ L} a coleção de todas as topologias em X que
contém B. É claro que τ ∈ F, uma vez que a topologia gerada por B contém B. Assim,
temos que
\
τλ ⊆ τ.
λ∈L

Portanto, temos que provar a inclusão reversa. Sejam U ∈ τ e λ ∈ L. Para cada x ∈ U ,


seja Bx ∈ B tal que x ∈ Bx ⊆ U (a existência de tal conjunto B se dá pois τ é gerada por
B). Como B ⊆ τλ , temos que Bx ∈ τλ . Assim, podemos escrever
[
U= Bx ,
x∈U

donde U é união arbitrária de abertos de τλ . Segue que U ∈ τλ . Como λ ∈ L é qualquer,


isso mostra que todo aberto de τ é um aberto de toda topologia que contém B. Daı́,
\
τ⊆ τλ ,
λ∈L

e isso conclui a prova.



Exercı́cio 1.6 Uma cobertura por abertos de τ1 é, em particular, uma cobertura por
abertos de τ2 , e portanto tem subcobertura finita pois (X, τ2 ) é compacto.

Exercı́cio 1.9 A coleção τ0 é uma base de vizinhanças de x0 uma vez que para cada
aberto U contendo x0 vale que U ∈ τx0 . Agora, assuma que para cada x ∈ X a coleção
Bx é uma base de vizinhanças de x, e seja B a união de todas essas bases de vizinhanças.
Para mostrar que B é uma base no sentido da Definição 1.1.3, note que a condição i é
imediata. Para a outra condição, se B1 , B2 ∈ B e z ∈ B1 ∩ B2 , então como B1 e B2
são abertos de τ , segue que B1 ∩ B2 é um aberto de τ , donde existe B3 ∈ Bz tal que
z ∈ B3 ⊆ B1 ∩ B2 . Finalmente, só falta verificar que a topologia gerada por B é τ . Com
efeito, se U é um aberto de τ , e x ∈ U , então tome B ∈ Bx ⊆ B tal que x ∈ B ⊆ U .


157
158 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Exercı́cio 1.14 Se F ⊆ X é fechado e K ⊆ X é compacto, então tome uma cobertura A


de F ∩K por abertos da topologia de X. Daı́, X \F é aberto, e portanto A1 = A∪{X \F }
é uma cobertura de K por abertos. Segue que A1 admite uma subcoleção finita A0 que
cobre K. Assim, A0 cobre F ∩ K, e como (X \ F ) ∩ (F ∩ K) = ∅, a subcoleção finita
A0 \ {X \ F } de A cobre F ∩ K. Segue que F ∩ K é compacto.

Exercı́cio 1.15 Seja V ⊆ Z um aberto. Daı́,

(f |Y )−1 (V ) = f −1 (V ) ∩ Y.

Como f é contı́nua, segue que f −1 (V ) é um aberto de X. Pela definição de topologia


induzida vem que (f |Y )−1 (V ) é um aberto de τY . Logo, a pré-imagem de todo aberto de
Z por f |Y é aberta em Y , donde f |Y é contı́nua.

Exercı́cio 1.16 Do Exercı́cio 1.15, temos que f |Z é contı́nua. Além disso, é claro que
f é bijetiva sobre sua imagem. A inversa da aplicação f : Z → f (Z) é precisamente a
restrição de f −1 a f (Z), que é contı́nua (onde f (Z) está munido da topologia induzida por
Y ) pelo Exercı́cio 1.15 aplicado para f −1 |f (Z) (lembre-se de que f −1 : Y → X é contı́nua
pois f é um homeomorfismo). Isso mostra que f : Z → f (Z), onde Z tem a topologia
induzida por X e f (Z) tem a topologia induzida por f (Z), é contı́nua, bijetiva, e tem
inversa contı́nua, donde é um homeomorfismo.

Exercı́cio 1.17 Seja A = {Vλ }λ∈L uma cobertura de f (X) por abertos de Y . Como f é
continua, temos que f −1 (Vλ ) é aberto para cada λ ∈ L, e portanto a coleção {f −1 (Vλ ) :
λ ∈ L} é uma cobertura por abertos de X. Como X é compacto, segue que existem
finitos λ1 , . . . , λm ∈ L tais que

X ⊆ f −1 (Vλ1 ) ∪ . . . ∪ f −1 (Vλm ),

e daı́ segue que f (X) ⊆ Vλ1 ∪ . . . ∪ Vλm . Assim, toda cobertura de f (X) por abertos de Y
admite subcobertura finita. Segue do Lema 1.4.1 que f (X) é compacto com a topologia
induzida de Y .
Note que se f : (X, τ ) → (Y, σ) é contı́nua e sobrejetiva, e se (X, τ ) é compacto, então
(Y, σ) é compacto. Logo, temos que a compacidade é uma propriedade preservada por
homeomorfismos.

Exercı́cio 1.18 Escrevemos IdY = f ◦ f −1 : (Y, σ1 ) → (Y, σ2 ) como uma composição de


homeomorfismos. Logo, U ⊆ Y é aberto na topologia σ1 se, e somente se, IdY (U ) = U é
aberto na topologia σ2 .

Exercı́cio 1.22 (a) Fixe x1 ∈ X e defina recursivamente a sequência xn+1 = T xn . Vamos


mostrar que essa sequência é de Cauchy. Primeiro, vem da hipótese que

d(xn , xn+1 ) = d(T xn−1 , T xn ) ≤ cd(xn−1 , xn ) ≤ c2 d(xn−2 , xn−1 ) ≤ . . . ≤ cn−1 d(x1 , x2 ),


7.1. CAPÍTULO 1 159

para qualquer n ≥ 2. Agora, se m > n são naturais, então


d(xm , xn ) ≤ d(xn , xn+1 ) + d(xn+1 , xn+2 ) + . . . + d(xm−1 , xm ) ≤

!
X
≤ (cn−1 + cn + cn+1 + . . . + cm−2 )d(x1 , x2 ) ≤ cj d(x1 , x2 ),
j=n−1

e a soma no último termo converge para 0 quando n → ∞ uma vez que c < 1, e portanto
a série das potências de c converge. Segue que (xn )n∈N é de Cauchy, e como X é completo,
temos que xn → x para algum x ∈ X. Afirmamos que x é um ponto fixo de T . Como T
é claramente contı́nua, temos
 
T x = T lim xn = lim T (xn ) = lim xn+1 = x,
n→∞ n→∞ n→∞

e isso prova o desejado. Para a unicidade, note que se y ∈ X é outro ponto fixo, então
d(x, y) = d(T x, T y) ≤ cd(x, y) < d(x, y), uma contradição.

(b) Defina f : X → R por f (x) = d(T x, x). Primeiro, vamos verificar que f é contı́nua.
Se xn → x em (X, d), então
|f (xn ) − f (x)| = |d(T xn , xn ) − d(T x, x)| ≤
≤ |d(T xn , xn ) − d(T xn , x)| + |d(T xn , x) − d(T x, x)| ≤ d(xn , x) + d(T xn , T x),
e o último termo vai para zero se n → ∞, uma vez que T é claramente contı́nua. Agora,
como f é contı́nua e X é compacto, existe x0 ∈ X tal que
f (x0 ) = min f (x).
x∈X

Afirmamos que x0 é ponto fixo de T . De fato, se T x0 6= x0 , então,


f (T x0 ) = d(T (T x0 ), T x0 ) < d(T x0 , x0 ) = f (x0 ),
o que é uma contradição. Para verificar que x0 é o único ponto fixo de T basta usar o
mesmo argumento que no ı́tem (a).

(c) Considere f : [0, +∞) → R dada por


f (x) = x + e−x .
Note que
f 0 (x) = 1 − e−x > 0
em (0, +∞), donde f é estritamente crescente. Sem perda de generalidade, sejam x, y ∈
[0, +∞) tais que x < y. Assim, a desigualdade
y + e−y − x − e−x = f (y) − f (x) = |f (y) − f (x)| < |y − x| (= y − x)


ocorre se, e somente se


e−y < e−x ,
e isso sempre ocorre se y > x. Daı́, f é uma contração fraca. Para verificar que f não é
uma contração, note que
lim [f (x + 1) − f (x)] = lim (1 + e−x−1 − e−x ) = 1 + lim e−x (e−1 − 1) = 1,
x→∞ x→∞ x→∞

e assim, para todo c < 1 existe x ∈ (0, ∞) tal que f (x + 1) − f (x) > c = c(x + 1 − x).
Segue que f não é uma contração.
160 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS


Exercı́cio 1.23 Uma vez que X é enumerável, escreva X = {xj : j ∈ N}. A sequência
(fn (x1 ))n∈N é uma sequência limitada de números reais, donde possui uma subsequência
convergente, que denotaremos por (f1,k (x1 )). Agora, como (f1,k (x2 ))k∈N é uma sequência
limitada, segue que (f1,k (x2 )) possui subsequência convergente, que denotaremos por
(f2,k (x2 ))k∈N . Observe que (f2,k (x1 ))k∈N também é convergente, uma vez que (f2,k ) é uma
subsequência de (f1,k ). Agora, como (f2,k (x3 )) é limitada, tomamos uma subsequência
convergente (f3,k (x3 )). Prosseguindo indutivamente, para cada m ∈ N temos um con-
junto de ı́ndices {(m, k)}k∈N com a propriedade de que (fm,k (xj )) é convergente para
todo j ≤ m. Mais ainda, como cada um desses conjuntos de ı́ndices é obtido retirando
elementos do conjunto de ı́ndices anterior, temos que a ordem dos ı́ndices é preservada,
no sentido de que (m, k + 1) > (m, k) ≥ (m − 1, k). Finalmente, considere a sequência
diagonal (fm,m )m∈N (que está bem-definida por causa da observação anterior). Para cada
n ∈ N, vale que exceto pelos primeiros n − 1 elementos a sequência (fm,m )m∈N é uma
subsequência de (fn,k )k∈N . Consequentemente, (fm,m (xj ))m∈N converge para cada j ∈ N,
donde (fm,m ) é a subsequência procurada.

Exercı́cio 1.24 Pelo Corolário 1.4.1, podemos tomar um subconjunto enumerável Z =


{zj : j ∈ N} que é denso em X. Como (fn ) é, em particular, pontualmente limitada em
Z, segue do Exercı́cio 1.23 que existe uma subsequência (fnk ) com a propriedade de que
(fnk (zj )) é uma sequência convergente de números para cada zj ∈ Z. Dado ε > 0, seja
δ > 0 tal que sempre que x, y ∈ X e d(x, y) < δ vale |fn (x) − fn (y)| < ε para todo n ∈ N,
e denote

Vδ (x) = {y ∈ X : d(x, y) < δ},

para cada x ∈ X. Uma vez que Z é denso em X, segue que para qualquer x ∈ X existe
zj ∈ Z tal que d(x, zj ) < δ. Consequentemente, a coleção

A = {Vδ (zj ) : zj ∈ Z}

é uma cobertura de X por abertos. Da compacidade, segue que A tem subcobertura


finita. A menos de reorganizar os termos, podemos escrever

X ⊆ Vδ (z1 ) ∪ Vδ (z2 ) ∪ . . . ∪ Vδ (zm ).

Como (fnk (zj )) converge para cada um dos (finitos) j ∈ {1, . . . , m} fixados, podemos
tomar k0 ∈ N com a propriedade de que se k > k0 , então

|fnk (zj ) − fni (zj )| < ε

para quaisquer i, k > k0 e todo j ∈ {1, . . . , m}. Seja x ∈ X arbitrário, e assuma que
x ∈ Vδ (zj0 ). Daı́, como d(x, zj0 ) < δ (e da desigualdade acima) vale que

|fnk (x) − fni (x)| ≤ |fnk (x) − fnk (zj0 )| + |fnk (zj0 ) − fni (zj0 )| + |fni (zj0 ) − fni (x)| < 3ε

sempre que i, k > k0 (note cuidadosamente que k0 não depende de x, mas apenas de ε).
Isso mostra que (fnk (x)) é uma sequência de Cauchy para cada x ∈ X, donde (fnk ) é
pontualmente convergente em X. Pondo

f (x) := lim fnk (x)


k→∞
7.2. CAPÍTULO 2 161

para cada x ∈ X, temos que (fnk ) converge uniformemente para f em X. Com efeito,
fazendo i → ∞ na desigualdade acima segue que

|fnk (x) − f (x)| ≤ 3ε

para quaisquer x ∈ X e k > k0 . Lembre-se de que ε > 0 foi tomado arbitrariamente.

Exercı́cio 1.25 Seja ε > 0 arbitrário. Como (fn )n∈N é uma sequência equicontı́nua, segue
que existe δ > 0 tal que para quaisquer x, y ∈ X com d(x, y) < δ e n ∈ N vale

|fn (x) − fn (y)| < ε.

Pelo Teorema 1.4.1, temos que (X, d) é totalmente limitado, donde existe um subconjunto
finito {x1 , . . . , xm } ⊆ X com a propriedade de que
m
[
X⊆ B(xj , δ).
j=1

Como (fn ) é uma sequência pontualmente limitada, para cada j = 1, . . . , m existe cj ∈ R


tal que |fn (xj )| ≤ cj para todo n ∈ N. Afirmamos que (fn ) é uniformemente limitada pela
constante c + ε, onde c = max{c1 , . . . , cm }. Com efeito, sejam x ∈ X e n ∈ N quaisquer.
Temos que x ∈ B(xk , δ) para algum k ∈ {1, . . . , m}, e portanto |fn (x) − fn (xk )| < ε. Vem
da desigualdade triangular que

|fn (x)| ≤ |fn (xk )| + ε ≤ ck + ε ≤ c + ε,

e isso conclui a prova.

7.2 Capı́tulo 2
Exercı́cio 2.8 Seja z ∈ BZ . Daı́,

||T Sz||Y ≤ ||T ||L(X,Y ) ||Sz||X ≤ ||T ||L(X,Y ) ||S||L(Z,X) ||z||Z = ||T ||L(X,Y ) ||S||L(Z,X) .

Como a desigualdade acima vale para qualquer z ∈ BZ , segue o desejado.

Exercı́cio 2.9 Assuma que Sn → S em L(X, X). Para todo n ∈ N, vem do Exercı́cio 2.8
que

||T Sn − T S||L (X, X) ≤ ||T ||L(X,X) ||Sn − S||L(X,X) ,

E assim T Sn → T S. Isso mostra a continuidade da composição com T (lembre-se de que


T está fixo).


162 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Exercı́cio 2.15 Seja T : X → Y uma isometria sobrejetiva entre espaços normados.


Primeiro, note que se T x = 0Y , então 0 = ||T x||Y = ||x||X , donde x = 0X . Segue daı́ que
T é injetiva. Então, T é invertı́vel, e devemos mostrar que T −1 : Y → X é um operador
linear limitado. Se y, z ∈ Y e α ∈ K, temos

T (T −1 (αy + z)) = αy + z = αT (T −1 y) + T (T −1 z) = T (αT −1 y + T −1 z),

donde, da injetividade de T , segue que T −1 é linear. Para verificar que T −1 é limitado,


tome y ∈ BY arbitrário, e seja x ∈ X tal que T x = y. Daı́, x = T −1 y. Mas como T é
uma isometria, segue que ||x||X = ||T x||Y = ||y||Y = 1. Portanto,

||T −1 y||X = 1,

para todo y ∈ BY . Logo, T −1 é limitado.

Exercı́cio 2.16 Se T é um isomorfismo, basta tomar S = T −1 . Suponha, então, que


T ∈ L(X, X) e S ∈ L(X, X) satisfazem T S = ST = IdX . Daı́, se x 6= y, então como
S(T x − T y) = x − y 6= 0X vem que T x 6= T y, donde T é injetiva. Por outro lado, para
qualquer x ∈ X note que T (Sx) = x, e portanto T é sobrejetiva. Para verificar que a
inversa T −1 é um operador limitado, seja y ∈ BX e assuma que T x = y, ou seja, que
x = T −1 y. Note que

||T −1 y||X = ||x||X = ||ST x||X = ||Sy||X ≤ ||S||L(X,X) ||y||X = ||S||L(X,X) ,

e isso conclui a prova. Note que, neste caso, é claro que temos T −1 = S.

Exercı́cio 2.17 Como a bola unitária BX não é compacta, segue que nenhuma bola
fechada

B̄(x, ε) = {z ∈ X : ||z − x||X ≤ ε}

é compacta. Se U ⊆ X é um aberto e K ⊆ X é um compacto que contém U , então K


contém alguma bola fechada B̄(x0 , ε). A topologia de K é dada pela restrição da norma a
K, e portanto B̄(x0 , ε) é fechado em K. Com efeito, se (xn ) é uma sequência em B̄(x0 , ε)
tal que xn → x em K, temos que ||xn ||X → ||x||X , donde x ∈ B̄(x0 , ε). Da Proposição
1.4.1 segue que B̄(x0 , ε) seria compacto, uma contradição. Assim, em um espaço normado
de dimensão infinita nenhum compacto contém um aberto não-vazio, e portanto nenhum
subconjunto é localmente compacto.

7.3 Capı́tulo 3
Exercı́cio 3.1 Considere o subconjunto F de sequências em `1 (N) que têm uma quanti-
dade finita de entradas não-nulas. É claro que F é um subespaço vetorial. Considere a
sequência (xn )n∈N em F definida por
 
n 1 1 1
x = 1, , , . . . , n , 0, . . . , 0, . . . ,
2 4 2
7.3. CAPÍTULO 3 163

ou seja, denotando xn = (αjn )j∈N , temos αjn = 1/2j se j ≤ n, e anj = 0 se j > n. Agora,
x = (αj )j∈N a sequência tal que αj = 1/2j para cada j ∈ N. É claro que x não é um ponto
de F . Note que
∞ ∞
n
X X 1
||x − x||1 = |αjn − αj | = ,
j=1 j=n+1
2j

e o último somatório converge para 0 se n → ∞. Segue que xn → x em `1 (N). Em


particular, (xn ) é uma sequência de Cauchy de pontos de F que não converge para um
ponto de F . Segue que F não é Banach.

Exercı́cio 3.2 Uma vez que a linearidade de um funcional f implica

f (α1 v1 + . . . + αk vk = α1 f (v1 ) + . . . + αk f (vk ),

para quaisquer v1 , . . . , vk ∈ X e α1 , . . . , αk ∈ K, segue que é suficiente definir f nos vetores


de uma base de Hamel de X. Seja H uma tal base, e assuma que todos os vetores de
H são unitários. Tome um subconjunto enumerável E = {en : j ∈ N} ⊆ H, e defina o
funcional linear f : X → K pondo

f (en ) = n, para todo n ∈ N,


f (v) = 0, se v ∈ H \ E.

É claro que f não é limitado, uma vez que en ∈ BX para cada n ∈ N.

Exercı́cio 3.3 Seja (fn )n∈N uma sequência de Cauchy em C([0, 1]). Para cada x ∈ [0, 1],
note que

|fn (x) − fm (x)| ≤ ||fn − fm ||∞ ,

e assim temos que (fn (x))n∈N é uma sequência de Cauchy em K. Assim, para cada
x ∈ [0, 1] existe o limite

lim fn (x) := f (x).


n→∞

Vamos mostrar que a aplicação f : [0, 1] → K definida desta forma é contı́nua. Se


x, y ∈ [0, 1], então para todo n ∈ N vale a desigualdade

|f (x) − f (y)| ≤ |f (x) − fn (x)| + |fn (x) − fn (y)| + |fn (y) − f (y)|.

Daı́, para ε > 0 dado, tomamos n0 suficientemente grande de forma que |f (x)−fn (x)| < ε
e |fn (y) − f (y)| < ε, donde ficamos com a estimativa

|f (x) − f (y)| ≤ 2ε + |fn0 (x) − fn0 (y)|.

Agora, usamos o fato de que fn0 é contı́nua. Tomamos δ > 0 tal que |x − y| < δ implica
|fn0 (x) − fn0 (y)| < ε. Segue que se |x − y| < δ, então

|f (x) − f (y)| < ε,


164 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

e isso mostra que f é contı́nua. Finalmente, vamos mostrar que fn → f na norma da


convergência uniforme. Dado ε > 0, tome n0 ∈ N tal que ||fn − fm ||∞ < ε para quaisquer
n, m > n0 . Assim, dado x ∈ [0, 1] qualquer, se n > n0 temos que

|fn (x) − f (x)| = fn (x) − lim fm (x) = lim |fn (x) − fm (x)| ≤ ε, (7.3.1)

m→∞ m→∞

onde a segunda igualdade vem da continuidade do módulo em K, e a última desigualdade


se justifica pois a sequência de números reais |fn (x) − fm (x)|m∈R é tal que
|fn (x) − fm (x)| ≤ ||fn − fm ||∞ < ε
para qualquer m > n0 . Consequentemente, se n > n0 , então
||fn − f ||∞ = max{|fn (x) − f (x)| : x ∈ [0, 1]} ≤ ε,
uma vez que a estimativa (7.3.1) vale para qualquer x ∈ [0, 1]. Isso mostra que fn → f
na norma || · ||∞ .

Observação 7.3.1. Note que o resultado também vale trocando o intervalo [0, 1] por qual-
quer espaço topológico compacto de Hausdorff.

Exercı́cio 3.4 Seja (fn )n∈N uma sequência de Cauchy em (C 0,α ([0, 1]), || · ||α ). Note que
||fn − fm ||∞ ≤ ||fn − fm ||α ,
para quaisquer n, m ∈ N. Assim (fn )n∈N é uma sequência de Cauchy em (C([0, 1]), ||·||∞ ),
e portanto fn → f na norma || · ||∞ para alguma função f ∈ C([0, 1]). Vamos mostrar
que f ∈ C 0,α ([0, 1]). Sejam x, y ∈ [0, 1] com x 6= y. Daı́,
|f (x) − f (y)| |f (x) − fn (x)| |fn (x) − fn (y)| |fn (y) − f (y)|
α
≤ + + ≤
|x − y| |x − y|α |x − y|α |x − y|α
||fn − f ||∞ |fn (x) − fn (y)| ||fn − f ||∞
≤2 α
+ α
≤2 + ||fn ||α
|x − y| |x − y| |x − y|α
Tome n suficientemente grande tal que ||fn − f ||∞ < |x − y|α , e seja M > 0 tal que
||fn ||α < M para todo n ∈ N (lembre-se de que toda sequência de Cauchy é limitada).
Assim, ficamos com
|f (x) − f (y)|
≤ 2 + M,
|x − y|α
e isso mostra que f ∈ C 0,α ([0, 1]). Agora, falta mostrar que fn → f na norma || · ||α . Para
isso, dado ε > 0, tome n0 ∈ N tal que se m, n > n0 , então valem que ||fn − f ||∞ < ε e
||fn − fm ||α < ε. Afirmamos que, para quaisquer z, x, y ∈ [0, 1] com x 6= y, temos
|(fn − f )(x) − (fn − f )(y)|
|fn (z) − f (z)| + ≤
|x − y|α
(7.3.2)
|(fn − fm )(x) − (fn − fm )(y)|
≤ ||fn − f ||∞ + lim < 2ε
m→∞ |x − y|α
se n > n0 . Com efeito, se n > n0 , então
|(fn − fm )(x) − (fn − fm )(y)|
≤ ||fn − fm ||α < ε
|x − y|α
7.3. CAPÍTULO 3 165

para todo m > n0 . Segue que

|(fn − fm )(x) − (fn − fm )(y)|


lim < ε,
m→∞ |x − y|α

se n > n0 . Como (7.3.2) vale para quaisquer z, x, y ∈ [0, 1] com x 6= y, segue que
||fn − f ||α < 2ε para todo n > n0 . Daı́, fn → f em || · ||α .

Exercı́cio 3.6 A primeira afirmação vem do fato de que se a série



X
|αj |
j=1

converge, então αj → 0. Agora, considere a sequência (xn )n∈N em `1 (N) definida, para
cada n ∈ N fixado, por:
 
n n 1 1 1
x = (αj )j∈N = 1, , , . . . , , 0, 0, . . . , 0, . . . ,
2 3 n

isto é, αjn = 1/j se 1 ≤ j ≤ n, e αjn = 0 se j > n. Uma vez que xn é uma sequência
com finitas entradas não-nulas, temos que xn ∈ `1 (N) de fato. Mais ainda, (xn )n∈N é uma
sequência de Cauchy na norma || · ||∞ de c0 , uma vez que, dados n > m, temos

1
||xn − xm ||∞ = max{|αjn − αjm | : j ∈ N} = .
m+1
Entretanto, em c0 temos que xn converge para a sequência
 
1
x= ,
j j∈N

/ `1 (N). Segue que `1 (N) não é fechado em c0 .


ex∈

Exercı́cio 3.8 (a) Para cada sequência x = (αj )j∈N ∈ `∞ (N) considere a função fx :
`1 (N) → K dada por

X
fx (y) = αj βj , (7.3.3)
j=1

para cada y = (βj )j∈N ∈ `1 (N). Desejamos mostrar que a aplicação que leva x em fx é
um isomorfismo isométrico de `∞ (N) em `1 (N). Vamos dividir a prova em etapas.

(1) fx está bem definida. Note que o somatório em (7.3.3) converge para algum escalar
em K. Para isso, note que
N
X N
X ∞
X
|αj βj | ≤ sup |αj | |βj | ≤ ||x||∞ |βj | = ||x||∞ ||y||1 ,
j∈N
j=1 j=1 j=1
166 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

para qualquer N ∈ N. Daı́ segue que a série em (7.3.3) é absolutamente convergente,


donde convergente. Segue que fx de fato é uma função de `1 (N) em K. Note que, como
consequência da desigualdade acima, temos também

X
|fx (y)| = αj βj ≤ ||x||∞ ||y||1 , (7.3.4)


j=1

para quaisquer x ∈ `∞ (N) e y ∈ `1 (N).

(2) fx é um funcional linear limitado. A linearidade de fx é imediata. O fato de que


fx é limitado vem da desigualdade (7.3.4):

||fx ||`1 (N)∗ = sup{|fx (y)| : ||y||`1 (N) = 1} ≤ ||x||∞ . (7.3.5)

Dessa forma, denote por T : `∞ (N) → `1 (N)∗ a aplicação T (x) = fx .

(3) T é linear. Sejam x = (αj )j∈N e z = (γj )j∈N sequências em `∞ (N), e seja θ ∈ K.
Assim, para todo y = (βj )j∈N ∈ `1 (N) temos

X ∞
X ∞
X
T (θx + z)(y) = fθx+z (y) = (θαj + γj )βj = θ α j βj + γj βj =
j=1 j=1 j=1

= θfx (y) + fz (y) = θT (x)(y) + T (z)(y),

e portanto, de fato, vale que T (θx + z) = θT (x) + T (z) para quaisquer x, z ∈ `∞ (N) e
todo θ ∈ K. Lembre-se de que já provamos que todas as séries acima são convergentes.

(4) T é uma isometria. Note que a desigualdade (7.3.5) pode ser escrita como

||T x||`1 (N)∗ ≤ ||x||∞ ,

para todo x ∈ `∞ (N). Por outro lado, para cada n ∈ N, seja y n ∈ `1 (N) a sequência tal
que sua n-ésima entrada é 1 e todas as outras são 0. É claro que ||y n ||1 = 1 para todo n.
Escrevendo, de novo, x = (αj )j∈N ∈ `∞ (N), temos

||T x||`1 (N)∗ = sup{|fx (y)| : ||y||`1 (N) = 1} ≥ sup{|fx (y n )| : n ∈ N} =


= sup{|αn | : n ∈ N} = ||x||∞ ,

e portanto temos ||T x||`1 (N)∗ = ||x||∞ para todo x ∈ `∞ (N), isto é, T é uma isometria.
Note que isso garante que T é injetiva.

(5) T é sobrejetiva. Seja f ∈ `1 (N)∗ , e para cada j ∈ N, seja

αj = f (y j ),

onde y j é a sequência em que todas as entradas são 0, exceto a j-ésima, que é igual a 1
(já havı́amos usado esses termos no passo anterior). Se x = (αj )j∈N , então afirmamos que
f = T x. Com efeito, sabemos do Exemplo 2.3.1 que (y n )n∈N é uma base de Schauder de
`1 (N), e que se y = (βj )j∈N ∈ `1 (N), temos que

X n
X
j
y= βj y = lim βj y j ,
n→∞
j=1 j=1
7.3. CAPÍTULO 3 167

o limite tomado na norma de `1 (N). Como f é comtı́nua e linear, segue que


n
! n
! n
X X X
j j
f (y) = f lim βj y = lim f βj y = lim βj f (y j ) =
n→∞ n→∞ n→∞
j=1 j=1 j=1
n
X ∞
X
= lim βj αj = αj βj = fx (y) = T (x)(y).
n→∞
j=1 j=1

Isso mostra que T é sobrejetiva. Como T é uma isometria sobrejetiva, segue do Exercı́cio
2.15 que T é um isomorfismo. Isso conclui a prova.

(b) Para cada x = (αj )j∈N ∈ `q (N), defina



X
fx (y) = αj βj ,
j=1

para y = (βj )j∈N ∈ `p (N). Tomando limites na desigualdade de Hölder, temos





∞ ∞
!1/q ∞
!1/p
X X X X
|fx (y)| ≤ αj βj ≤ |αj βj | ≤ |αj |q |βj |p = ||x||q ||y||p ,


j=1 j=1 j=1 j=1

donde segue que fx ∈ `p (N)∗ (a linearidade de fx é imediata). Agora, basta mostrar que
a aplicação T : `q (N) → `p (N)∗ dada por T x = fx é um isomorfismo isométrico. Os
argumentos são semelhantes aos do ı́tem (a).

(c) Considere a aplicação T : `1 (N) → c0∗ dada por



X
T ((αj )j∈N )((βj )j∈N ) = α j βj
j=1

para cada (αj ) ∈ `1 (N) e (βj ) ∈ c0 . Primeiro, vamos mostrar que, de fato, para cada
(αj ) ∈ `1 (N) a aplicação T (αj ) : c0 → R está bem-definida e é um funcional linear. Com
efeito, note que

X
|αj βj | ≤ ||(βj )||∞ ||(αj )||`1 (N) ,
j=1

donde T (αj ) : c0 → R está bem-definida. A linearidade deste funcional é imediata,


e a desigualdade acima também garante que T (αj ) ∈ c0∗ . Note que a linearidade de
T : `1 (N) → c0∗ também é imediata da definição de T , e pela desigualdade acima temos
que

||T ||L(`1 (N),c0∗ ) = sup{||T (αj )||c0∗ : (αj ) ∈ B`1 (N) } =


= sup{|T (αj )(βj )| : (αj ) ∈ B`1 (N) e (βj ) ∈ Bc0 } ≤ 1,

e portanto T é um operador linear limitado de `1 (N) em c0∗ . A injetividade de T é


imediata, e para verificar que T é sobrejetiva, seja f ∈ c0∗ . Considere a base de Schauder
{en } usual de `1 (N) e c0 , em que todas as entradas são nulas, exceto a n-ésima, que é 1.
Para cada j ∈ N, ponha αj = f (ej ). Afirmamos que a sequência (αj ) obtida desta forma
168 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

é um elemento de `1 (N), e que T (αj ) = f . A menos de mudar o sinal de alguns dos ej ,


podemos escrever
N N N
!
X X X
|αj | = f (ej ) = f ej ≤ ||f ||c0∗ , (7.3.6)
j=1 j=1 j=1

para qualquer N ∈ N. A última desigualdade se justifica pois e1 + . . . + eN ∈ Bc0∗ para


qualquer N ∈ N. Agora, para cada (βj ) ∈ c0 vale que
N
! N N ∞
X X X X
j j
f (βj ) = f lim βj e = lim βj f (e ) = lim βj αj = α j βj ,
N →∞ N →∞ N →∞
j=1 j=1 j=1 j=1

donde f = T (αj ). Finalmente, (7.3.6) garante que se f ∈ c0∗ , então ||T −1 f ||`1 (N) ≤ ||f ||c0∗ ,
e portanto o operador T −1 : c0∗ → `1 (N) é limitado. Logo, T é um isomorfismo.

Exercı́cio 3.9 Para a primeira afirmativa, note que para (αj )j∈N ∈ `1 (N) fixado, vale que

X
n
||T (αj )||`1 (N) = |αj | → 0
j=n+1

quando n → ∞, pois (αj ) ∈ `1 (N). Para mostrar que T n não converge para o operador
nulo em L(`1 (N), `1 (N)), é suficiente mostrar que ||Tn ||L(`1 (N),`1 (N)) ≥ 1 para qualquer
n ∈ N. Dado n ∈ N, tome a sequência xn = (αjn )j∈N tal que αjn = 0 para todo j 6= n + 1,
n
e αn+1 = 1/(n + 1). Assim, é claro que ||xn ||`1 (N) = 1, e
||Tn ||L(`1 (N),`1 (N)) = sup{||Tn x||`1 (N) : x ∈ B`1 (N) } ≥ ||Tn (xn )||`1 (N) =
= ||(1, 0, 0, . . . , 0, . . .)||`1 (N) = 1,
e isso conclui a prova.

Exercı́cio 3.10 Note que a sequência
N
X
SN = T j.
j=0

N ∈ N, é uma sequência em L(X, X). Queremos mostrar que (SN )N ∈N converge para
algum ponto de L(X, X). Para isso, é suficiente mostrar que (SN ) é uma sequência de
Cauchy (lembre-se de que L(X, X) é Banach). Seja ||T || = δ < 1. Daı́, se m > n, temos
m n

X X
j j
||Sm − Sn ||L(X,X) = T − T = ||T n+1 + . . . + T m ||L(X,X) ≤


j=0 j=0 L(X,X)

X
n+1 m n+1 m
≤ ||T ||L(X,X) + . . . + ||T ||L(X,X) < δ + ... + δ < δj ,
j=n+1

e como 0 < δ < 1, segue que a soma à direita vai para 0 quando n → ∞. Daı́, (SN ) é
uma sequência de Cauchy, e como L(X, X) é Banach, segue que existe S ∈ L(X, X) tal
que
N
X ∞
X
j
S = lim SN = lim T = T j.
N →∞ N →∞
j=0 j=0
7.3. CAPÍTULO 3 169

Agora, vamos mostrar que o operador (IdX − T ) é um isomorfismo. Primeiro, note que é
imediato que IdX −T é limitado. Para a injetividade, assuma que (IdX −T )x = (IdX −T )y
para x 6= y. Daı́, vem imediatamente que
 
x−y
T = 1,
||x − y||

e isso contradiz a hipótese ||T || < 1. Para mostrar que IdX − T é sobrejetivo, se y ∈ X,
então defina

X N
X
j
x= T y = lim T j y.
N →∞
j=0 j=0

Para verificar que o limite de fato existe, note que a sequência das somas parciais é de
Cauchy. Com efeito, se n, m ∈ N com m > n, então:
m n

X X X
T jy − T j y ≤ ||T n+1 y|| + . . . + ||T m y|| ≤ (δ n+1 + . . . + δ m )||y|| ≤ ||y|| δj ,



j=0 j=0 j=n+1

e pelo mesmo argumento anterior temos o desejado. Afirmamos que (IdX − T )x = y. De


fato,

! ∞ N
!
X X X
(IdX − T )x = (IdX − T ) T jy = T j y − T lim T jy =
N →∞
j=0 j=0 j=0
N
! N
!
X X
= x − lim T jy = x − lim T jy − y = y,
N →∞ N →∞
j=1 j=0

donde usamos a continuidade da composição (Exercı́cio 2.9). Falta apenas verificar que
(IdX − T )−1 é limitado. Se ||y|| = 1 e x = (IdX − T )−1 y, então

1 = ||y|| = ||x − T x|| ≥ ||x|| − ||T x|| ≥ ||x|| − ||T ||L(X,X) ||x|| = (1 − δ)||x||,

e, como δ < 1, vem


1
||(IdX − T )−1 y|| = ||x|| ≤ ,
1−δ
e essa desigualdade vale para qualquer y ∈ BX . Segue que o operador (IdX − T )−1 é
limitado.
Agora, de novo pela continuidade da composição (Exercı́cio 2.9), vem
N
! N ∞
!
X X X
T S = T lim T j = lim T j = lim T j − IdX = S − IdX .
N →∞ N →∞ n→∞
j=0 j=1 j=0

Daı́, segue imediatamente que

IdX = (IdX − T )S.

E assim, como IdX − T é um isomorfismo, temos que (IdX − T )−1 = S.


170 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Exercı́cio 3.11 (a) Já sabemos que se T e S são limitados, então T S é limitado. Além
disso, a bijetividade é imediata, e o operador inverso é claramente dado por S −1 T −1 .
Como T −1 e S −1 são limitados segue que S −1 T −1 é limitado.

(b) Seja T0 = T −1 (T − S). Note que

||T0 ||L(X,X) ≤ ||T −1 ||L(X,X) ||T − S||L(X,X) < 1.

Assim, pelo exercı́cio anterior temos que IdX − T0 é um isomorfismo. Por outro lado,

T (IdX − T0 ) = T − T T −1 (T − S) = S,

donde S é uma composição de isomorfismos. Segue do ı́tem (a) que S é um isomorfismo.

(c) O ı́tem (b) mostra que para todo T ∈ Iso(X), a bola aberta (na métrica de L(X, X))
 
1
S ∈ L(X, X) : ||T − S||L(X,X) <
||T −1 ||L(X,X)

está contida em Iso(X). Daı́, segue imediatamente que Iso(X) é aberto em L(X, X).

Exercı́cio 3.12 Se X não é estritamente convexo, então podemos tomar vetores linear-
mente independentes x, y ∈ X tais que ||x + y|| = ||x|| + ||y||. Pondo

||y||
t= ,
||x|| + ||y||
temos que

x y x y = ||x + y|| = 1.

(1 − t) + t = +
||x|| ||y|| ||x|| + ||y|| ||x|| + ||y|| ||x|| + ||y||
Para a outra implicação, também procederemos pela contrapositiva. Se existem vetores
distintos x, y ∈ BX e t ∈ (0, 1) tais que ||(1 − t)x + ty|| ≥ 1, então note primeiro que, como
||(1 − t)x + ty|| ≤ (1 − t)||x|| + t||y|| = 1, segue que ||(1 − t)x + ty|| = 1. Mais ainda, é
claro que x e y são linearmente independentes, uma vez que são distintos e têm a mesma
norma. Assim, x̂ = (1 − t)x e ŷ = ty são linearmente independentes, e finalmente

||x̂|| + ||ŷ|| = (1 − t)||x|| + t||y|| = 1 = ||(1 − t)x + ty|| = ||x̂ + ŷ||,

e daı́ segue que X não é estritamente convexo.



Exercı́cio 3.13 (a) Seja Y = span{x0 }, e defina o funcional linear limitado g : Y → K
por g(λx0 ) = λ para cada λ ∈ K. É claro que ||g||Y ∗ = 1. Pelo Corolário 3.2.1 (caso real)
e pela Proposição 3.2.2 (caso complexo), segue que existe uma extensão f0 ∈ X ∗ de g tal
que ||f0 ||X ∗ = ||g||Y ∗ = 1. Alél disso, temos que f0 (x0 ) = g(x0 ) = 1.

(b) Assuma que há dois funcionais lineares f0 , g0 ∈ X ∗ distintos tais que

||f0 ||X ∗ = f0 (x0 ) = 1, e


||g0 ||X ∗ = g0 (x0 ) = 1.
7.3. CAPÍTULO 3 171

Daı́,

2 = ||f0 ||X ∗ + ||g0 ||X ∗ ≥ ||f0 + g0 ||X ∗ ≥ |(f0 + g0 )(x0 )| = 2,

e assim segue que ||f0 + g0 ||X ∗ = ||f0 ||X ∗ + ||g0 ||X ∗ , donde X ∗ não é estritamente convexo.

(c) Considere X = R2 com a norma `1 :

||(α, β)||1 = |α| + |β|.

Tome x0 = (0, 1), e defina os funcionais f0 , g0 : R2 → R por

f0 (α, β) = β − α, e
g0 (α, β) = α + β.

Note que f0 (x0 ) = g0 (x0 ) = 1. Além disso, se (α, β) ∈ B1 , então |α| + |β| ≤ 1, e isso
implica

|f0 (α, β)| = |β − α| ≤ |β| + |α| ≤ 1, e


|g0 (α, β)| = |α + β| = |α| + |β| ≤ 1,

e assim temos que ||f0 ||X ∗ = ||g0 ||X ∗ = 1.

Exercı́cio 3.14 Se g ∈ Y ∗ e f1 , f2 ∈ X ∗ são extensões de g que preservam a norma, então

2||g||Y ∗ = ||f1 ||X ∗ + ||f2 ||X ∗ ≥ ||f1 + f2 ||X ∗ = sup{f1 (x) + f2 (x) : x ∈ BX } ≥
≥ sup{f1 (x) + f2 (x) : x ∈ BX ∩ Y } = sup{2g(y) : y ∈ BY } = 2||g||Y ∗ ,

e assim temos que ||f1 + f2 ||X ∗ = ||f1 ||X ∗ + ||f2 ||X ∗ . Como o espaço X ∗ é estritamente
convexo, devemos ter f1 = αf2 para algum α ∈ R. Por outro lado, como ||f1 ||X ∗ =
||g||Y ∗ = ||f2 ||X ∗ , segue que α = 1, e portanto f1 = f2 .

Exercı́cio 3.15 (a) Assuma que Y é denso e que f ∈ X ∗ é tal que f (y) = 0 para todo
y ∈ Y . Seja x ∈ X, e tome uma sequência (yn )n∈N uma sequência em Y com yn → x. Por
continuidade, temos que

lim f (yn ) = 0,
n→∞

e portanto f é o funcional nulo. Agora, suponha que Y ⊆ X é um subespaço vetorial que


não é denso. Assim, cl(Y ) é um subespaço vetorial próprio fechado de X, donde podemos
tomar um vetor x0 ∈ X \ cl(Y ). Uma vez que cl(Y ) é fechado, temos

inf{||x0 − y|| : y ∈ cl(Y )} = δ > 0,

e vamos usar este fato para construir um funcional limitado não-nulo que se anula em Y .
Seja W = span(cl(Y ) ∪ {x0 }) e defina g : W → R pondo

g(y + αx0 ) = αδ,


172 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

para quaisquer y ∈ cl(Y ) e α ∈ R. É claro que g|Y = 0. Além disso, g é dominado pela
norma em W , pois
y
g(y + αx0 ) = αδ ≤ |α|δ ≤ |α| · + x0 = ||y + αx0 ||,

α
para quaisquer y ∈ cl(Y ) e α 6= 0 (o caso α = 0 é trivial), onde a segunda desigualdade se
justifica pois −y/α ∈ cl(Y ). Como a norma é um funcional sublinear, segue do teorema
de Hahn-Banach que g admite uma extensão linear f : X → R tal que f (x) ≤ ||x|| para
todo x ∈ X. Dessa desigualdade temos que f ∈ X ∗ . Além disso, f |Y = g|Y = 0, e
f (x0 ) = 1. Em outras palavras, f é um funcional em X ∗ que se anula em Y , mas que não
é identicamente nulo.

(b) Seja F = {fn : n ∈ N} um subconjunto denso e enumerável em X ∗ , e para cada


n ∈ N, escolha um vetor xn ∈ BX tal que
||fn ||X ∗
|fn (xn )| ≥ ,
2
onde nos lembramos de que ||fn ||X ∗ = sup{|fn (x)| : x ∈ BX }. Agora, definimos
Y = spanQ {xn : n ∈ N},
que é um subespaço enumerável de X. Vamos mostrar que Y é denso. Para isso, considere
um funcional f ∈ X ∗ tal que f |Y = 0, e seja (fnk ) uma subsequência de F tal que fnk → f .
Note que
||fnk ||X ∗
||f − fnk ||X ∗ ≥ |(f − fnk )(xnk )| = |fnk (xnk )| ≥ ,
2
donde ||fnk ||X ∗ ≤ 2||f − fnk ||X ∗ para qualquer nk . Assim,
||f ||X ∗ ≤ ||f − fnk ||X ∗ + ||fnk ||∗X ≤ 3||f − fnk ||X ∗ ,
e o último termo converge para 0 quando nk → ∞. Segue que ||f ||X ∗ = 0, donde f é o
funcional nulo. Pelo ı́tem (a) vem que Y é denso em X, e portanto X é separável.

Exercı́cio 3.16 Seja K = A − B. É claro que K é convexo e fechado, e como A ∩ B = ∅
temos que 0X ∈ / K. Como o complementar de K é aberto, segue que existe ρ > 0 tal
que ρBX ∩ K = ∅ (basta tomar uma bola aberta contida em X \ K centrada na origem
e tomar ρ como a metade do seu raio). Pelo Teorema 3.2.2 (Hahn-Banach Geométrico),
segue que existe um hiperplano fechado h(f, α) que separa K e ρBX . Sem perda de
generalidade, assuma que K ⊆ h− (f, α). Assim, para quaisquer x ∈ A, y ∈ B e z ∈ BX ,
temos x − y ∈ K e −ρz ∈ ρBX , donde temos
f (x) − f (y) = f (x − y) ≤ α ≤ f (−ρz) = −ρf (z) ≤ −ρ||f ||X ∗ ,
e daı́ vem imediatamente que
ρ||f ||X ∗ ρ||f ||X ∗
f (x) + ≤ f (y) −
2 2
para todo x ∈ A e todo y ∈ B. Finalmente, fazendo ε = ρ||f ||X ∗ /2 e escolhendo β ∈ R
tal que
sup{f (x) + ε : x ∈ A} ≤ β ≤ inf{f (y) + ε : y ∈ B}
segue que o hiperplano fechado h(f, β) separa estritamente A e B. Com efeito, se x ∈ A,
então da primeira igualdade acima vem que f (x) + ε ≤ β, donde x ∈ h− (f, β − ε). De
forma similar mostramos que B ⊆ h+ (f, β + ε).
7.3. CAPÍTULO 3 173


Exercı́cio 3.19 (a) Fixe x ∈ X. Uma vez que Tn x converge em Y , segue que

sup{||Tn x||Y : n ∈ N} < ∞.

Assim, pelo princı́pio da limitação uniforme (Teorema 3.3.2) vem que existe c ∈ R tal que

sup{||Tn ||L(X,Y ) : n ∈ N} = c.

(b) A linearidade de T é imediata, e portanto precisamos apenas mostrar que T é um


operador limitado. Observe que, pelo ı́tem (a), vale ||Tn x||Y ≤ c||x||X para quaisquer
x ∈ X e n ∈ N. Assim, se x ∈ BX , temos

||T x||Y = lim Tn x = lim ||Tn x||Y ≤ c||x||X ,

n→∞ Y n→∞

e daı́ segue que T ∈ L(X, Y ) com ||T ||L(X,Y ) ≤ c.

(c) Para cada x ∈ BX , temos que

||Tn x||Y ≤ ||Tn ||L(X,Y ) ||x||X ≤ ||Tn ||L(X,Y ) .

Assim, a sequência ||Tn x||Y é dominada pela sequência ||Tn ||L(X,Y ) . Fazendo n → ∞ vem
que

||T x||Y ≤ lim inf ||Tn ||L(X,Y ) ,


n→∞

para qualquer x ∈ BX . Tomando o supremo em BX do lado esquerdo da desigualdade


acima temos

||T ||L(X,Y ) ≤ lim inf ||Tn ||L(X,Y ) ,


n→∞

como querı́amos.

Exercı́cio 3.20 Observe que como, para um dado x ∈ X, a sequência (Tn x)n∈N é conver-
gente, segue que

sup{||Tn x||Y : n ∈ N} < ∞

para cada x ∈ X. Assim, pelo princı́pio da limitação uniforme segue que

sup{||Tn ||L(X,Y ) : n ∈ N} = c < ∞,

Agora, seja xn → x em X. Então,

||Tn xn − T x||Y ≤ ||Tn xn − Tn x||Y + ||Tn x − T x||Y ≤


≤ ||Tn ||L(X,Y ) ||xn − x||X + ||Tn x − T x||Y ≤ c||xn − x||X + ||Tn x − T x||Y .

Dado ε > 0, podemos tomar n suficientemente grande tal que ||xn − x||X < ε/2c e ||Tn x −
T x||Y < ε/2 (lembre-se de que T x = limn→∞ Tn x). Segue que para n suficientemente
grande temos

||Tn xn − T x||Y < ε,

donde Tn xn → T x em Y .
174 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS


Exercı́cio 3.21 Considere a aplicação identidade
IdX : (X, || · ||2 ) → (X, || · ||1 ).
Note cuidadosamente que a identidade é claramente linear, mas não é necessariamente
limitada se as normas definidas no domı́nio e no contra-domı́nio são distintas. No nosso
caso, entretanto, a hipótese nos dá
||IdX (x)||1 = ||x||1 ≤ C||x||2 ,
para todo x ∈ X. Isso mostra que a identidade é contı́nua nas normas consideradas. Uma
vez que as duas normas fazem com que X seja Banach, podemos aplicar o Teorema da
Aplicação aberta, e garantir que existe c > 0 tal que
B1 (0X , 2c) ⊆ IdX (B2 (0X , 1)) = B2 (0X , 1),
onde os números subscritos indicam de qual norma é a respectiva bola aberta. Se x 6= 0,
então cx/||x||1 ∈ B1 (0X , 2c), e portanto cx/||x||1 ∈ B2 (0X , 1). Logo,

cx
||x||1 < 1,

2

e isso nos dá c||x||2 < ||x||1 . No caso x = 0X temos a igualdade c||0X ||2 = ||0X ||1 , e
portanto vem que c||x||2 ≤ ||x||1 para todo x ∈ X, como querı́amos.

Exercı́cio 3.22 Considere || · ||1 = || · ||∞ , e defina
Z 1
||f ||2 = |f (t)| dt.
0

O fato de que || · ||2 é uma norma vem da continuidade das funções em C([0, 1]). Note que
Z 1
||Id(f )||2 = ||f ||2 = |f (t)| dt ≤ max{|f (t)| : t ∈ [0, 1]} = ||f ||∞ ,
0

para qualquer f ∈ C([0, 1]), e portanto a identidade é um operador limitado com as


normas consideradas. Uma vez que a identidade é claramente bijetiva, temos que mostrar
que o operador inverso não é limitado. Para cada n ∈ N com n > 2, defina a função
fn : [0, 1] → K por
 2
 n x, se 0 ≤ x ≤ 1/n
fn (x) = −n2 x + 2n, se 1/n ≤ x ≤ 2/n .
0, se 2/n ≤ x ≤ 1

É fácil notar que cada função fn assim definida é contı́nua. Note que, para cada n > 2,
temos ||fn ||2 = 1. Com efeito,
Z 1/n Z 2/n
2
||fn ||2 = n t dt + (−n2 t + 2n) dt = 1.
0 1/n

Por outro lado, ||fn ||∞ ≥ |fn (1/n)| = n para cada n ∈ N. Segue que
sup{||Id(f )||∞ : ||f ||2 = 1} = ∞,
donde o operador inverso Id : (C([0, 1]), || · ||2 ) → (C([0, 1]), || · ||1 ) não é limitado.
7.4. CAPÍTULO 4 175

Exercı́cio 3.24 (a) Primeiro, assuma que T é fechado. Se xn → x em X e T xn → y em


Y , então é claro que (xn , T xn ) → (x, y) em X × Y . Como (xn , T xn )n∈N é uma sequência
de pontos do subconjunto fechado graf(T ), segue que (x, y) ∈ graf(T ). Logo, y = T x.
Para a volta, seja (xn , T xn )nN uma sequência em graf(T ). Se (xn , T xn ) converge para,
digamos (x, y) ∈ X × Y , então é imediato que xn → x em X e T xn → y em Y . Pela
hipóese, temos que y = T x, e assim (x, y) ∈ graf(T ). Isso mostra que T é fechado.

(b) Sejam T ∈ L(X, Y ) e (xn , T xn )n∈N uma sequência em graf(T ) tal que (xn , T xn ) →
(x, y) em X × Y . Daı́, xn → x em X, e como T é contı́nuo temos T xn → T x em Y . Segue
que T x = y, donde graf(T ) é fechado.

(c) Afirmamos que o gráfico de T : X → Y é fechado em X × Y . De fato, se (xn , T xn ) →


(x, y) ∈ X × Y , então em particular temos (x, y) ∈ Y × Y , donde (x, y) ∈ graf(T ).
Portanto, T é um operador limitado entre espaços de Banach, e segue do teorema do
gráfico fechado (Teorema 3.3.4) que T é limitado. Agora, assuma que X não é Banach, e
tome uma sequência de Cauchy (xn )n∈N que não converge em X. Uma vez que (xn ) é de
Cauchy em Y , que é Banach, segue que xn → y para algum y ∈ Y \ X. Se T é limitado,
então (T xn )n∈N é de Cauchy em Y , pois

||T xn − T xm ||Y ≤ ||T ||L(X,Y ) ||xn − xm ||Y ,

para quaisquer n, m ∈ N, onde lembramos que a norma em X é a induzida por Y . Daı́,


T xn → z para algum z ∈ Y . Segue que (xn , T xn ) → (y, z) em Y × Y , e como o gráfico de
T é fechado em Y × Y segue que (y, z) ∈ graf(T ), donde y ∈ X. Essa contradição conclui
a prova.

7.4 Capı́tulo 4
Exercı́cio 4.1 Se F1 ⊆ F2 , então toda aplicação de F1 é contı́nua com respeito à topo-
logia σ(X, F2 ). Segue da definição que σ(X, F1 ) é menos fina do que σ(X, F2 ), isto é,
σ(X, F1 ) ⊆ σ(X, F2 ).

Exercı́cio 4.4 Primeiro, observe que (xn )n∈N possui subsequência fortemente convergente,
pois K é compacto na topologia forte, e portanto é sequencialmente compacto (isso vem
do Teorema 1.4.1, uma vez que a topologia forte é métrica). Denote uma tal subsequência
convergente por (xnk )k∈N , e seja z = limk→∞ xnk . Como a convergência forte implica
a convergência fraca, temos que xnk * z, e portanto vem que z = x (note que, em
particular, x ∈ K).
Agora, assuma que xn não converge fortemente para x. Daı́, existem um número ε0 > 0
e uma subsequência (xnj )j∈N tais que ||xnj −x||X > ε0 para qualquer j ∈ N. Como (xnj )j∈N
é uma sequência de pontos de K, temos que (xnj ) tem uma subsequência convergente,
que denotaremos por (xm )m∈N por simplicidade. É claro que limm→∞ xm = x0 6= x, uma
vez que ||xm − x|| > ε0 para qualquer m ∈ N. Como a convergência forte implica a
convergência fraca, temos que xm * x0 . Mas isso é uma contradição, uma vez que (xm )
é, em particular, uma subsequência de (xn ), e x0 6= x.
176 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Observação 7.4.1. Em qualquer espaço topológico, vale que a convergência de uma sequência
implica a convergência de qualquer uma de suas subsequências.
Exercı́cio 4.5 Seja A(Y ) a coleção de todos os abertos da topologia forte de X que estão
contidos em Y , e seja Aw (Y ) a coleção de todos os abertos da topologia fraca de X que
estão contidos em Y . É claro que Aw (Y ) ⊆ A(Y ). Assim,
[ [
intσ(X,X ∗ ) (Y ) = Aw (Y ) ⊆ A(Y ) = int(Y ).

Agora, como todos os fechados da topologia fraca são fechados na topologia forte, segue
que se F(Y ) e Fw (Y ) são as famı́lias dos fechados das topologias forte e fraca, respecti-
vamente, que contém Y , então temos Fw (Y ) ⊆ F(Y ). Assim,
\ \
cl(Y ) = F(Y ) ⊆ Fw (Y ) = clσ(X,X ∗ ) (Y ).

Exercı́cio 4.6 Se xn * x, então pela Proposição 4.2.5 existe c ∈ R tal que ||xn || ≤ c
para todo n ∈ N. Assim,

|fn (xn ) − f (x)| ≤ |fn (xn ) − f (xn )| + |f (xn ) − f (x)| ≤


≤ ||fn − f ||X ∗ ||xn || + |f (xn ) − f (x)| ≤
≤ c||fn − f ||X ∗ + |f (xn ) − f (x)|.

A convergência forte fn → f em X ∗ significa precisamente que ||fn − f ||X ∗ → 0 quando


n → ∞. Além disso, a convergência fraca xn * x garante que |f (xn ) − f (x)| → 0 quando
n → ∞. Segue, portanto, da desigualdade acima, que fn (xn ) → f (x) em K.

Exercı́cio 4.7 Se X tem dimensão infinita, então podemos tomar Y1 , . . . , Yk subespaços


vetoriais de dimensão m + 1 tais que Yi ∩ Yj = {0X } se i 6= j. Pelo Lema 4.2.1, cada
subespaço Yj contém um vetor yj 6= 0X tal que f1 (yj ) = . . . = f (ym ) = 0. Segue que

{x} + span{y1 , . . . , yk } ⊆ V (x, f1 , . . . , fm , ε),

uma vez que para quaisquer t1 , . . . , tk ∈ R e j = 1, . . . , m vale

|fj (x + t1 y1 + . . . + tm ym ) − fj (x)| = 0 < ε.

Observe que esse argumento pode falhar em dimensão finita se a vizinhança conside-
rada tiver tantos funcionais quanto a dimensão do espaço. Explicitamente, assuma que
dim(X) = n, e fixe uma base {e1 , . . . , en } em X. Para cada j = 1, . . . , n, considere o
(único) funcional linear fj : X → K tal que fj (ej ) = 1 e fj (ei ) = 0 se i 6= j. Afirmamos
que para quaisquer x ∈ X e ε > 0 a vizinhança V (x, f1 , . . . , fn , ε) não contém nenhuma
reta passando por x. Com efeito, se y 6= 0X é tal que

{x + ty : t ∈ R} ⊆ V (x, f1 , . . . , fn , ε),

então ε > |fj (x + ty) − fj (x)| = |t| · |fj (y)| para quaisquer t ∈ R e j = 1, . . . , m.
Consequentemente, devemos ter f1 (y) = . . . = fm (y) = 0. Se y = α1 e1 + . . . αn en , então
essas igualdades garantem que α1 = . . . = αn = 0, donde y = 0X .
7.4. CAPÍTULO 4 177

Exercı́cio 4.8 Vamos apresentar duas soluções. A mais simples delas segue imediata-
mente do Corolário 4.2.1. Mas também podemos usar o fato de que a esfera unitária não
é fechada na topologia fraca. De fato, pela Proposição 4.2.6, segue que a bola unitária
BX é fechada na topologia fraca, mas a esfera unitária SX não o é. Se B(0X , 1) é aberta
na topologia fraca, então X \ B(0X , 1) é um conjunto fechado da topologia fraca. Como
temos claramente que

SX = BX ∩ (X \ B(0X , 1)),

segue que SX é a interseção de dois fechados da topologia fraca, donde fechada na topologia
fraca. Esta contradição mostra que B(0X , 1) não é aberta.

Exercı́cio 4.9 (a) Sejam x = α1 x1 + . . . + αn xn e z = β1 z1 + . . . + βm zm pontos de


conv(A). Se t ∈ [0, 1], então p vetor
n
X m
X
(1 − t)x + tz = (1 − t)αj xj + tβk yk
j=1 k=1

é uma combinação linear de vetores de A em que todos os coeficientes são não-negativos.


Além disso, sua soma é
n
X m
X n
X m
X
(1 − t)αj + tβj = (1 − t) αj + t βj = 1,
j=1 k=1 j=1 k=1

e portanto (1 − t)x + tz é uma combinação convexa de pontos de A.

(b) Como conv(A) é um convexo que contém A, temos que conv(A) contém a interseção de
todos os convexos contendo A. Portanto, devemos provar que esta interseção está contém
conv(A), e isso é o mesmo que mostrar que conv(A) está contido em qualquer convexo
que contém A. Para isso usaremos um argumento de indução. Seja K um convexo que
contém A. É claro que toda combinação convexa de dois elementos de A pertence a K.
Suponha, então, que toda combinação convexa de n − 1 pontos de A está em K. Daı́,
escrevemos uma combinação convexa de n pontos de A como
n n−1
X X αj
x= αj xj = (1 − αn ) xj + α n xn ,
j=1 j=1
1 − αn

e como α1 + . . . + αn = 1, segue que


n−1
X αj
= 1.
j=1
1 − αn

Daı́, o vetor
n−1
X αj
z= xj
j=1
1 − αn
178 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

é uma combinação convexa de n − 1 vetores de A, donde temos z ∈ K. Como αn ∈ [0, 1]


segue que x = (1 − αn )z + αn xn é um ponto de K. Isso conclui a prova.

(c) Se conv(K) = K, então é claro que K é convexo, uma vez que conv(K) é convexo.
Para o outro sentido, suponha que K é convexo. É claro que K ⊆ conv(K), e a outra
inclusão vem do ı́tem (b), onde notamos que K é um convexo que contém K.

Exercı́cio 4.10 Sejam f ∈ X ∗ e ε > 0 arbitrários. Seja n0 ∈ N tal que n > n0 implica
ε
|f (xn ) − f (x)| < .
2
Assim, para qualquer m ∈ N, vale a desigualdade

f (x1 ) + . . . + f (xn0 ) + f (xn0 +1 ) + . . . + f (xn0 +m )
|f (zn0 +m ) − f (x)| = − f (x) ≤
n0 + m
max1≤j≤n0 |f (xj ) − f (x)| mε max1≤j≤n0 |f (xj ) − f (x)| ε
≤ + < +
n0 + m 2(n0 + m) n0 + m 2
Tomando m0 ∈ N com a propriedade de que
max1≤j≤n0 |f (xj ) − f (x)| ε
<
n0 + m 2
sempre que m > m0 (observe que o numerador não depende de m), segue que se n >
n0 + m0 , então |f (zn ) − f (x)| < ε. Consequentemente, temos que f (zn ) → f (x) para
qualquer f ∈ X ∗ , donde zn * x.



Exercı́cio 4.11 Seja K = conv {xn : n ∈ N} . Pelo ı́tem (a) do Exercı́cio 4.9, temos que
K é convexo. Como o fecho cl(K) de K na topologia forte é um fechado convexo, segue
da Proposição 4.2.7 que cl(K) é fechado na topologia fraca. Como {xn : n ∈ N} ⊆ K ⊆
cl(K) e xn * x, temos que x ∈ cl(K). Finalmente, como a topologia forte é uma topologia
métrica, e portanto é Haudorff e tem o primeiro axioma de enumerabilidade, os pontos de
cl(K) são precisamente aqueles que podem ser aproximados por uma sequência de pontos
de K, que por suas vez são combinações convexas finitas dos pontos da sequência (xn ).

Exercı́cio 4.12 Se K é convexo, então cl(K) é convexo e fechado na topologia forte.


Segue da Proposição 4.2.7 que cl(K) é fechado na topologia fraca, e portanto vem da
Proposição 1.2.1 que

clσ(X,X ∗ ) (cl(K)) = cl(K).

Assim, para provar que clσ(X,X ∗ ) (K) = cl(K) basta mostrar que

clσ(X,X ∗ ) (cl(K)) ⊆ clσ(X,X ∗ ) (K),

uma vez que a inclusão inversa é óbvia (se A é subconjunto de B, então o fecho de A
é subconjunto do fecho de B). Seja y ∈ clσ(X,X ∗ ) (cl(K)). Precisamos mostrar que toda
vizinhança de y na topologia fraca contém algum ponto de K, e sabemos que uma tal
7.4. CAPÍTULO 4 179

vizinhança sempre tem algum ponto de cl(K). Portanto, seja V = V (y, f1 , . . . , fm , ε) uma
vizinhança arbitrária de y na topologia fraca, e seja y0 ∈ V ∩ cl(K). Ponha

max |fj (y0 ) − fj (y)| = ε1 (< ε), e


1≤j≤m

M = max ||fj ||X ∗ .


1≤j≤m

Como y0 ∈ cl(K), temos que existe y1 ∈ K tal que


ε − ε1
||y0 − y1 ||X < .
M
Afirmamos que y1 ∈ V . Para verificar isso, note que para cada j = 1, . . . , m vale a
desigualdade

|fj (y1 ) − fj (y)| ≤ |fj (y1 ) − fj (y0 )| + |fj (y0 ) − fj (y)| ≤ ||fj ||X ∗ ||y1 − y0 ||X + ε1 ≤
≤ M ||y1 − y0 ||X + ε1 < ε − ε1 + ε1 = ε,

e isso significa que y1 ∈ V , de fato. Como consequência, temos que toda vizinhança de y
na topologia fraca contém algum ponto de K, e portanto y ∈ clσ(X,X ∗ ) (K). Isso conclui a
prova.

Exercı́cio 4.13 Denote V = V (x, f1 , . . . , fm , ε) por simplicidade, e sejam y, z ∈ V , e seja
t ∈ [0, 1]. Para cada 1 ≤ j ≤ m, temos

|fj ((1 − t)y + tz) − fj (x)| = |(1 − t)(fj (y) − fj (x)) + t(fj (z) − fj (x))| =
= (1 − t)|fj (y) − fj (x)| + t|fj (z) − fj (x)| < (1 − t)ε + tε = ε,

donde (1 − t)y + tz ∈ V (x, f1 , . . . , fm , ε). Agora, como cl(V ) é fechado na topologia forte,
vem da Proposição 4.2.7 que cl(V ) é fechado na topologia fraca. Uma vez que o fecho de
V na topologia fraca é a interseção de todos os fechados da topologia fraca que contém
V , e como V ⊆ cl(V ), temos que

clσ(X,X ∗ ) (V ) ⊆ cl(V ).

A inclusão reversa vem diretamente do Exercı́cio 4.5, e portanto temos que cl(V ) =
clσ(X,X ∗ ) (V ). Para a igualdade remanescente, usaremos a topologia forte, isto é, provare-
mos que

cl(V ) = {z ∈ X : |fj (z) − fj (x)| ≤ ε para todo 1 ≤ j ≤ m},

pois a topologia forte é Hausdorff e tem o primeiro axioma de enumerabilidade, donde


podemos usar o critério sequencial. Se z ∈ cl(V ), então podemos tomar uma sequência
(zn )n∈N em V tal que zn → z. Daı́, pela continuidade dos funcionais e do módulo, vem
imediatamente que

|fj (z) − fj (x)| ≤ ε

para todo j = 1, . . . , m, e isso nos dá uma das inclusões. Por outro lado, se z ∈ X é tal
que |fj (z) − fj (x)| ≤ ε para todo 1 ≤ j ≤ m, tome uma sequência (εn )n∈N de números
reais positivos com as propriedades de que εn → ε e εn < ε para todo n ∈ N, e ponha
εn z (ε − εn )x
zn = + .
ε ε
180 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

É claro que zn → z. Além disso, note que


ε εn ε
n n
|fj (zn ) − fj (x)| = fj (z) − fj (x) = |fj (z) − fj (x)| ≤ εn < ε,

ε ε ε
donde (zn ) é uma sequência em V . Assim temos a inclusão que faltava.

Exercı́cio 4.14 Se z ∈ V (x, f1 , . . . , fm , ε), então |fj (z) − fj (x)| < ε para qualquer 1 ≤
j ≤ m. Daı́,

|fj (x0 + αz) − fj (αx + x0 )| = |α| · |fj (z) − fj (x)| < |α|ε

para j = 1, . . . , m. Segue que x0 + αz ∈ V (αx + x0 , f1 , . . . , fm , |α|ε), donde x0 +


αV (x, f1 , . . . , fm , ε) ⊆ V (αx + x0 , f1 , . . . , fm , |α|ε). A primeira igualdade acima também
mostra imediatamente a inclusão reversa.
Se U é aberto da topologia fraca, então cada ponto x ∈ U tem uma vizinhança
V (x, f1 , . . . , fm , ε) ⊆ U . Daı́, para o ponto x0 + αx ∈ x0 + αU temos que

x0 + αx ∈ V (x0 + αx, f1 , . . . , fm , |α|ε) ⊆ x0 + αU,

e isso prova que x0 + αU é aberto na topologia fraca.

Exercı́cio 4.15 É claro que Tx0 é uma bijeção. Do Exercı́cio 4.14 vem que para qualquer
vizinhança V = V (x1 , f1 , . . . , fm , ε) da topologia fraca vale que

Tx−1
0
(V ) = V (x1 − x0 , f1 , . . . , fm , ε),

ou seja, um aberto da topologia fraca. Segue que Tx0 é contı́nua. Para verificar que a
inversa de Tx0 é contı́nua na topologia fraca, note que Tx−1 0
= T−x0 . Para a aplicação Pα ,
note que
 
−1 x1 ε
Pα (V ) = V , f1 , . . . , fm , .
α |α|

Assim, a pré-imagem de um aberto da topologia fraca por Pα é um aberto da topologia


fraca, donde Pα é contı́nua. Para mostrar que a inversa de Pα é contı́nua, observe que
Pα−1 = Pα−1 .

Exercı́cio 4.16 Assuma que xn * x, e seja U um qualquer aberto da topologia fraca


contendo αx. Pelo Exercı́cio 4.14, o conjunto α1 U é um aberto da topologia fraca. Além
disso, é claro que α1 U contém x, e portanto existe n0 ∈ N tal que xn ∈ α1 U para todo
n > n0 . Segue que αxn ∈ U para todo n > n0 . Isso mostra que αxn * αx. A volta segue
diretamente: se αxn * αx, então multiplicando a sequência e o limite pelo escalar 1/α
temos que xn * x.


7.4. CAPÍTULO 4 181

Exercı́cio 4.17 Seja V = V (y, f1 , . . . , fm , ε) com f1 , . . . , fm ∈ X ∗ e ε > 0 uma vizinhança


de um ponto y ∈ Y na topologia σ(X, X ∗ ). Daı́, temos que

Y ∩ V (y, f1 , . . . , fm , ε) = V (y, f1 |Y , . . . , fm |Y , ε) ,

e como cada fj |Y é um funcional de Y ∗ , segue que Y ∩ V é uma vizinhança de y na


topologia σ(Y, Y ∗ ). Assim, os abertos da topologia σ(X, X ∗ ) induzida em Y são abertos
da topologia σ(Y, Y ∗ ).
Agora, seja V = V (y, g1 , . . . , gm , ε) com g1 , . . . , gm ∈ Y ∗ e ε > 0 uma vizinhança de
y ∈ Y na topologia σ(Y, Y ∗ ). Pelo teorema de Hahn-Banach (mais precisamente, veja o
Corolário 3.2.1 e a Proposição 3.2.2) cara gj admite uma extensão fj ∈ X ∗ . Logo, é claro
que

V (y, g1 , . . . , gm , ε) = Y ∩ V (y, f1 , . . . , fm , ε),

e isso prova que todo aberto de σ(Y, Y ∗ ) é a interseção de Y com um aberto de σ(X, X ∗ ),
ou seja, um aberto da topologia σ(X, X ∗ ) induzida em Y .

Exercı́cio 4.18 É suficiente mostrar que toda vizinhança V (x, f1 , . . . , fm , ε) contém al-
guma vizinhança em que as normas duais dos funcionais envolvidos são todas menores ou
iguais a 1. Seja

M = max{||fj ||X ∗ : 1 ≤ j ≤ m}.

Assim, pondo gj = fj /M para cada j = 1, . . . , m temos imediatamente que ||gj ||X ∗ ≤ 1


sempre que 1 ≤ j ≤ m. Afirmamos que

V (x, g1 , . . . , gm , ε/M ) ⊆ V (x, f1 , . . . , fm , ε).

Com efeito, se y ∈ V (x, g1 , . . . , gm , ε/M ), então

|fj (y) − fj (y)| = M |gj (y) − gj (x)| < ε

para cada j = 1, . . . , m. A prova para a topologia fraca∗ é completamente análoga.

Exercı́cio 4.21 Da versão do Exercı́cio 4.15 para a topologia fraca∗ , segue que Tf0 ◦ Pα :
(X ∗ , σ(X ∗ , X)) → (X ∗ , σ(X ∗ , X)) é um homeomorfismo. Assim, a sua restrição a BX ∗ :

(Tf0 ◦ Pα )|BX ∗ : (BX ∗ , σ(X ∗ , X)) → (X ∗ , σ(X ∗ , X))

é contı́nua (pelo Exercı́cio 1.15). Como a imagem dessa restrição é precisamente a bola
f0 + αBX ∗ , e como (BX ∗ , σ(X ∗ , X)) é compacto (pelo Teorema 4.3.1), segue do Exercı́cio
1.17 que f0 + αBX ∗ é compacta com a topologia fraca∗ .

Observação 7.4.2. Como consequência do Exercı́cio 1.16 temos de fato que a restrição
(Tf0 ◦ Pα )|BX ∗ é um homeomorfismo de BX ∗ em f0 + αBX ∗ , ambos com a topologia fraca∗
(ou ambos com a topologia fraca, ou com ambos com a topologia forte, uma vez que Tf0 ◦Pα
é um homeomorfismo de X ∗ sobre si mesmo com qualquer uma dessas topologias).
182 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Exercı́cio 4.23 Seja T : X → Y um isomorfismo. Se g ∈ Y ∗ , então afirmamos que


g ◦ T : X → K é um funcional linear limitado. A linearidade é imediata, e para todo
x ∈ X vale que

|g(T (x))| ≤ ||g||Y ∗ ||T x||Y ≤ ||g||Y ∗ ||T ||L(X,Y ) ||x||X , (7.4.1)

donde g ◦ T é limitado. Assim, essa construção fornece uma aplicação T a : Y ∗ → X ∗ dada


por

T a g = g ◦ T,

para todo funcional g ∈ Y ∗ . Note que T a é injetiva, pois T a g = T a h implica g(T (x)) =
h(T (x)) para todo x ∈ X, e como T é sobrejetiva segue que g(y) = h(y) para qualquer
y ∈ Y . Para verificar que T a é sobrejetiva, primeiro note que se f ∈ X ∗ , então vale a
desigualdade

|f (T −1 (y))| ≤ ||f ||X ∗ ||T −1 (y)|X ≤ ||f ||X ∗ ||T −1 ||L(Y,X) ||y||Y , (7.4.2)

para todo y ∈ Y , e daı́ temos que f ◦ T −1 ∈ Y ∗ . Então a sobrejetividade de T a segue


imediatamente da igualdade T a (f ◦ T −1 ) = f . Agora, observe que

T a (g + αh) = (g + αh) ◦ T = g ◦ T + αh ◦ T = T a g + αT a h,

e isso mostra que T a é uma aplicação linear. Agora, note que

||T a g||X ∗ = sup{|T a g(x)| : x ∈ BX } = sup{|g(T (x))| : x ∈ BX } ≤ ||g||Y ∗ ||T ||L(X,Y ) ,

para qualquer g ∈ Y ∗ . Assim,

||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) = sup{||T a g||X ∗ : g ∈ BY ∗ } ≤ ||T ||L(X,Y ) ,

e isso mostra que T a é limitado. Assim, para mostrar que T a é um isomorfismo, falta
apenas provar que sua inversa (T a )−1 é um operador limitado. Se g = (T a )−1 f , então
f = T a g. Assim, se T x = y, então

g(y) = g(T (x)) = T a g(x) = f (x) = f (T −1 (y)),

e portanto (T a )−1 f = f ◦ T −1 . Logo, para cada f ∈ X ∗ , vem da desigualdade (7.4.2) que

||(T a )−1 f ||Y ∗ = sup{|(T a )−1 f (y)| : y ∈ BY } = sup{|f (T −1 (y)| : y ∈ BY } ≤


≤ ||f ||X ∗ ||T −1 ||L(Y,X) ,

e daı́ segue que ||(T a )−1 ||L(X ∗ ,Y ∗ ) ≤ ||T −1 ||L(Y,X) , donde (T a )−1 é limitado. Isso conclui a
prova de que T a é um isomorfismo entre Y ∗ e X ∗ .

Observação 7.4.3. O operador T a : Y ∗ → X ∗ definido acima é o operador adjunto de


T . Note que o operador adjunto pode ser definido para qualquer operador T : X → Y
entre espaços normados. Mostramos, em particular, que se T é um isomorfismo entre
X e Y , então o adjunto T a é um isomorfismo entre Y ∗ e X ∗ . Entretanto, se apenas
assumirmos que T é limitado, então segue imediatamente da desigualdade (7.4.1) que T a é
limitado, com ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) ≤ ||T ||L(X,Y ) . Mais ainda, podemos mostrar que de fato temos
a igualdade ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) = ||T ||L(X,Y ) . Com efeito, se T = 0L(X,Y ) a igualdade é óbvia, e se
7.4. CAPÍTULO 4 183

T 6= 0L(X,Y ) , então podemos tomar uma sequência xn ∈ BX tal que ||T xn ||Y → ||T ||L(X,Y ) ,
e podemos assumir que T xn 6= 0Y para todo n ∈ N. Defina
T xn
yn = ,
||T xn ||Y
para cada n ∈ N, e do Exercı́cio 3.13 considere gn ∈ Y ∗ tal que
gn (yn ) = ||gn ||Y ∗ = 1.
Assim, cada gn é um ponto de BY ∗ , e portanto
||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) ≥ ||T a gn ||X ∗ = ||gn ◦ T ||X ∗ ≥ |gn (T xn )| = ||T xn ||Y |gn (yn )| = ||T xn ||Y .
Como ||T xn ||Y → ||T ||L(X,Y ) segue que ||T a ||L(Y ∗ ,X ∗ ) ≥ ||T ||L(X,Y ) .

Exercı́cio 4.24 Se f ∈ clσ(X ∗ ,X) (Y ⊥ ) então, em particular, para todo y ∈ Y vale que
V (f, ŷ, 1) ∩ Y ⊥ 6= ∅.
Portanto, dado y ∈ Y arbitrário, seja gy ∈ V (f, ŷ, 1) ∩ Y ⊥ . Temos que
|f (y)| = |ŷ(f ) − ŷ(gy )| < 1,
e segue que |f (y)| < 1 para todo y ∈ Y . Isso só pode ocorrer se f |Y = 0, e portanto
f ∈ Y ⊥ . Isso prova que Y ⊥ é fechado na topologia σ(X ∗ , X).

Exercı́cio 4.25 Pelo teorema de Banach-Alaoglu-Bourbaki (Teorema 4.3.1) temos que
BX ∗ é compacta na topologia fraca∗ . Assim, Y ⊥ ∩ BX ∗ é compacto pois é a interseção de
um fechado com um compacto (veja o Exercı́cio 1.14).

Exercı́cio 4.26 É suficiente mostrar que toda vizinhança não-vazia da restrição de


σ(X ∗ , J(Y )) a Y ⊥ contém Y ⊥ . Sejam g ∈ Y ⊥ , ŷ1 , . . . , ŷm ∈ J(Y ) e ε > 0. Para qualquer
f ∈ Y ⊥ vale que
|ŷj (f ) − ŷj (g)| = |f (yj ) − g(yj )| = 0 < ε,
para todo 1 ≤ j ≤ m, uma vez que f, g ∈ Y ⊥ . Segue que Y ⊥ ⊆ V (g, ŷ1 , . . . , ŷm , ε).

Exercı́cio 4.27 A topologia forte é métrica, então para mostrar que J(BX ) é fechado em
BX ∗∗ , tome uma sequência (xn )n∈N em BX tal que J(xn ) → φ para algum φ ∈ BX ∗∗ . Como
J é uma isometria, segue que (xn ) é uma sequência de Cauchy em BX , donde xn → x
para algum x ∈ BX (lembre-se de que X é Banach, e de que BX é fechada). Segue da
continuidade de J nas topologias fortes de X e X ∗∗ (J é isometria) que J(xn ) → J(x),
donde φ = J(x) ∈ J(BX ).
É claro que se X é reflexivo, então J(BX ) é denso em BX ∗∗ . De fato, nesse caso temos
J(BX ) = BX ∗∗ . Por outro lado, se J(BX ) é denso em BX ∗∗ na topologia forte, então
temos
J(BX ) = cl(J(BX )) = BX ∗∗ ,
onde a primeira igualdade vem do fato, que acabamos de provar, de que J(BX ) é fechado
em BX ∗∗ na topologia forte. Como J(BX ) = BX ∗∗ vem imediatamente que J(X) = X ∗∗ ,
donde X é reflexivo.
184 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS


Exercı́cio 4.28 A prova é semelhante à do Exercı́cio 4.27. Seja (xn )n∈N ∈ X uma
sequência em X tal que Jxn → y em X ∗∗ . Uma vez que J é uma isometria linear, temos
que (xn ) é uma sequência de Cauchy em X, e portanto temos que xn → x para algum
x ∈ X. Por continuidade, segue que Jxn → Jx, e portanto y = Jx ∈ J(X).

Exercı́cio 4.29 Se X e Z são isomorfos, então o operador adjunto T a : Z ∗ → X ∗ é um
isomorfismo (veja o Exercı́cio 4.23). Seja T aa : X ∗∗ → Z ∗∗ o adjunto de T a , cuja imagem
para cada ψ ∈ X ∗∗ é o funcional T aa ψ : Z ∗ → K em Z ∗∗ dado por
T aa ψ(f ) = ψ(T af ),

para cada f ∈ Z ∗ . É claro que T aa é um isomorfismo. Denote por JX e JZ as aplicações


canônicas de X e Z. Seja ϕ ∈ Z ∗∗ , e assuma que T aa ψ = ϕ para ψ ∈ X ∗∗ . Como X é
reflexivo, tome x ∈ X tal que JX x = ψ, e seja T x = z ∈ Z. Assim, para qualquer f ∈ Z ∗
vale
ϕ(f ) = T aa ψ(f ) = ψ(T af ) = ψ(f ◦ T ) = JX x(f ◦ T ) = f (T (x)) = f (z) = JZ z(f ),
e portanto ϕ = JZ z. Isso mostra que JZ é sobrejetiva.

Exercı́cio 4.30 Denote por (en )n∈N a base canônica de `1 (N): para cada n ∈ N, en é
a sequência em que todas as entradas são iguais a 0, exceto pela n-ésima, que é 1. Se
`1 (N é reflexivo, então do Teorema 4.4.4 segue que existe uma subsequência (enk )k∈N que
converge na topologia fraca σ(`1 (N), `∞ (N)) para um ponto x ∈ `1 (N). Aqui, lembramos
que `∞ (N) ' `1 (N), veja o Exercı́cio 3.8.
Para cada j ∈ N, seja φj ∈ `∞ (N) a sequência em que todas as entradas até a j − 1-
ésima são 0, e todas as demais são 1. Identificando cada φj naturalmente como um
funcional linear em `1 (N), temos
φj (enk ) = 1
sempre que nk > j. Assim, para cada j ∈ N vale que φj (enk ) → 1 quando k → ∞. Vem
da convergência fraca enk * x que φj (x) = 1 para todo j ∈ N. Por outro lado, como
x ∈ `1 (N), temos que escrevendo x = (xm )m∈N vem

X
φj (x) = xm → 0
m=j
P∞
quando j → ∞, uma vez que m=1 xm < ∞ pois x ∈ `1 (N). Essa contradição conclui a
prova.

Exercı́cio 4.31 Observe que K é fechado na topologia fraca (veja a Proposição 4.2.7).
Como K é limitado, temos que existe c > 0 tal que K ⊆ cBX . Como X é reflexivo, temos
que BX é compacta na topologia fraca σ(X, X ∗ ) de X (veja o Teorema 4.4.1), e como
consequêcia do Exercı́cio 4.14, temos que cBX também é compacto na topologia σ(X, X ∗ ).
Segue que K é um subconjunto fechado de um espaço topológico que é compacto com
a topologia σ(X, X ∗ ), e portanto também é compacto com a topologia σ(X, X ∗ ) (veja a
Proposição 1.4.1).
7.4. CAPÍTULO 4 185


Exercı́cio 4.32 Pelo Corolário 4.2.1, temos que nenhum aberto não vazio da topologia
fraca é limitado. Segue que a pré-imagem do intervalo aberto (0, 1) ⊆ R pela norma
não é aberto na topologia fraca. Segue que a norma não é aberta na topologia fraca.
Pelo Exercı́cio 4.20, temos que a topologia fraca∗ também não contém abertos não-vazios
limitados, e daı́ usamos o mesmo argumento para mostrar que a norma de X ∗ não é
contı́nua na topologia fraca∗ .

Exercı́cio 4.34 Pela versão do Exercı́cio 4.15 para a topologia fraca∗ , temos que a
aplicação
Tx0 ◦ Pα : (BX ∗ , σ(X ∗ , X)) → (x0 + αBX ∗ , σ(X ∗ , X))
é um homeomorfismo (veja também o Exercı́cio 1.16). Seja d uma métrica em BX ∗ que
gera a topologia fraca∗ , e defina a métrica d0 em x0 + αBX ∗ por
d0 (x0 + αx, x0 + αy) = d(x, y)
para quaisquer x, y ∈ BX ∗ . Como
Bd0 (x0 + αx, ρ) = Tx0 ◦ Pα (Bd (x, ρ))
para todos x ∈ BX ∗ e ρ > 0, segue que
Tx0 ◦ Pα : (BX ∗ , d) → (x0 + αBX ∗ , d0 )
é um homeomorfismo. Assim, segue que a topologia gerada por d0 em x0 + αBX ∗ coincide
com a topologia fraca∗ induzida em x0 + αBX ∗ (veja o Exercı́cio 1.18).

Exercı́cio 4.35 Pelo Corolário 3.3.3, é suficiente mostrar que a imagem f (A) é limitada
em K para cada f ∈ X ∗ fixado. Se f é o funcional nulo, então é claro que a imagem de
A por f é limitada em K, e se f 6= 0X ∗ , então a famı́lia
Af = {V (a, f, 1) : a ∈ A}
é uma cobertura de A por abertos da topologia fraca. Como A é compacto nessa topologia,
temos que existem finitos pontos a1 , . . . , am ∈ A tais que
m
[
A⊆ V (aj , f, 1).
j=1

Defina M = max1≤j≤m |f (aj )|. Para a ∈ A dado arbitrariamente, então existe k ∈


{1, . . . , m} tal que a ∈ V (ak , f, 1), e assim
|f (a) − f (ak )| < 1,
donde segue da desigualdade triangular que
|f (a)| < |f (ak )| + 1 ≤ M + 1.
Isso mostra que a imagem de A por f é limitada em K. A outra afirmativa decorre
imediatamente do fato de que qualquer compacto da topologia fraca tem interior vazio:
com efeito, nenhuma vizinhança da topologia fraca é limitada na norma, e portanto um
compacto da topologia fraca não pode conter uma vizinhança de σ(X, X ∗ ).
186 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS


Exercı́cio 4.36 Seja F ⊆ X ∗ compacto com a topologia fraca∗ induzida. Temos ime-
diatamente que F é fechado na topologia fraca∗ pois essa topologia é Hausdorff (veja a
Proposição 1.4.2 e a Proposição 4.3.1). Devemos mostrar, portanto, que F é limitado na
norma, e para isso vamos usar uma estratégia semelhante à usada no Exercı́cio 4.35, mas
agora usando o Exercı́cio 3.25. Basta mostrar que para cada x ∈ X fixado, o conjunto
Yx = {f (x) : f ∈ F } é limitado em K. Dado x ∈ X, a famı́lia

Ax = {V (f, x̂, 1) : f ∈ F }

é uma cobertura de F por abertos da topologia fraca ∗ , e portanto existem finitos


f1 , . . . , fm ∈ F com a propriedade de que
m
[
F ⊆ V (fj , x̂, 1).
j=1

Seja M = max1≤j≤m |fj (x)|. Para qualquer f ∈ F , existe k ∈ {1, . . . , m} tal que f ∈
V (fk , x̂, 1), e portanto

|f (x)| < |f (x) − fk (x)| + |fk (x)| ≤ M + |x̂(f ) − x̂(fk )| < M + 1,

e assim Yx é limitado em K.
Agora, assuma que F é fechado na topologia fraca∗ e limitado na norma. Seja m > 0
tal que F ⊆ mBX ∗ . Pelo Exercı́cio 4.21, temos que mBX ∗ é compacto na topologia
fraca∗ . Como F é fechado como subconjunto de (X ∗ , σ(X ∗ , X)), segue que F é fechado
como subconjunto de (mBX ∗ , σ(X ∗ , X)). Finalmente, F é um subconjunto fechado de um
espaço topológico compacto, e da Proposição 1.4.1 vem que F é compacto com a topologia
fraca∗ .

Observação 7.4.4. Note que provamos que F é compacto com a topologia fraca∗ induzida
por mBX ∗ (que é a topologia fraca∗ de X ∗ induzida em mBX ∗ , é claro). O leitor pode se
perguntar se realmente F é compacto com a topologia fraca∗ induzida por X ∗ . Isso vem
do seguinte fato topológico: se Z ⊆ Y ⊆ (X, τ ), e τY é a topologia τ de X induzida em
Y , então as topologias (τY )Z e τZ que τY e τ induzem em Z, respectivamente, coincidem.
Com efeito, todo aberto de τZ é da forma U ∩Z, para algum U ∈ τ , e todo aberto de (τY )Z
é da forma U ∩ Y ∩ Z, para algum U ∈ τ . Como Z ⊆ Y , temos que U ∩ Z = U ∩ Y ∩ Z
para qualquer aberto U de X. Assim, todo aberto de τZ é aberto de (τY )Z e vice-versa.
Exercı́cio 4.37 Seja J : X → X ∗∗ a aplicação canônica, e para cada x ∈ X denote
J(x) = x̂, como usual. Tome a sequência (x̂n )n∈N como uma famı́lia de operadores
lineares em L(X ∗ , K) e observe que para cada f ∈ X ∗ vale que

sup{x̂n (f ) : n ∈ N} < ∞,

uma vez que x̂n (f ) = f (xn ) é uma sequência convergente. Pelo princı́pio da limitação
uniforme, segue que a sequência (x̂n )n∈N é uma sequência limitada em X ∗∗ , e como a
aplicação canônica é uma isometria vem que (xn )n∈N é uma sequência limitada em X.
Como X é reflexivo, temos que (xn ) tem uma subsequência fracamente convergente xnk .
Assuma que x ∈ X é tal que xnk * x quando k → ∞. Isso significa que para qualquer
f ∈ X ∗ , temos f (xnk ) → f (x), e como f (xn ) é convergente, vem que f (xn ) → f (x).


7.5. CAPÍTULO 5 187

7.5 Capı́tulo 5
Exercı́cio 5.1 O fato de que h·, ·iX é um produto interno decorre imediatamente de
propriedades da integral. Com efeito, se f ∈ C([0, 1]), então
Z Z
f (t) dt = f (t) dt,

R1
e, por continuidade, se 0
|f (t)|2 dt = 0, então temos que f é a função identicamente nula.

Exercı́cio 5.2 Como a topologia da norma é métrica, podemos usar o critério sequencial.
Seja (xn ) uma sequência em X com xn → x na norma do produto interno. Devemos
mostrar que hxn , yi → hx, yi em K. Para verificar isso, basta notar que

|hxn , yi − hx, yi| = |hxn − x, yi| ≤ ||xn − x|| ||y||,

e o lado direito converge para 0 quando n → ∞. Agora, fixando x ∈ X, a função


y 7→ hx, yi é a composição da função y 7→ hy, xi, que já demonstramos ser contı́nua, com
a conjugação, que também é contı́nua.

Exercı́cio 5.4 Primeiro, suponha que x ⊥ y. Daı́, calculamos

||x + ty||2 = hx + ty, x + tyi = ||x||2 + |t|2 ||y||2 ≥ ||x||2 ,

para qualquer t ∈ K. Daı́, segue que x e y são Birkhoff ortogonais.


Agora, assuma que ||x + ty|| ≥ ||x|| para todo t ∈ K. É claro que podemos supor que
x e y são ambos não-nulos, pois do contrário já temos a ortogonalidade x ⊥ y. Note que
a hipótese implica a desigualdade

0 ≤ ||x + ty||2 − ||x||2 = 2Re(thx, yi) + |t|2 ||y||2

para qualquer t ∈ K. Pondo t = −hy, xi/||y||2 temos

|hx, yi|2 |hx, yi|2 |hx, yi|2 |hx, yi|2 |hx, yi|2
 
0 ≤ −2Re + = −2 + = − ,
||y||2 ||y||2 ||y||2 ||y||2 ||y||2

e portanto segue que −|hx, yi| ≤ 0. Assim, devemos ter x ⊥ y.



Exercı́cio 5.5 Se y ∈ Y ∩ Y ⊥ , então vale que hy, yi = 0. Isso só pode ocorrer se y = 0X .

Exercı́cio 5.9 Primeiro note que se f 6= 0X ∗ , então pelo Teorema 5.2.1 segue que existe
um vetor não-nulo x0 ∈ X com a propriedade de que f (x) = hx0 , xiX para qualquer
x ∈ X. Para qualquer z ∈ ker(f ) vale que 0 = f (z) = hx0 , ziX , e assim segue que
x0 ∈ ker(f )⊥ . Isso implica que dim(ker(f )⊥ ) ≥ 1. Mais ainda, observe que já temos que
a direção associada a f pela identificação de Riesz está em ker(f )⊥ .
Falta provar que x0 é a única direção em ker(f )⊥ . Para isso, suponha que y0 ∈ ker(f )⊥ .
Daı́, o vetor v0 = f (x0 )y0 − f (y0 )x0 é uma combinação linear de vetores de ker(f )⊥ , e
portanto temos que v0 ∈ ker(f )⊥ . Por outro lado, é claro que f (v0 ) = 0, e portanto
188 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

v0 ∈ ker(f ). Logo, como ker(f ) ∩ ker(f )⊥ = {0X }, temos que v0 = 0X , e portanto


f (x0 )y0 = f (y0 )x0 . Como f (x0 ) = ||x0 ||2 6= 0, escrevemos
f (y0 )
y0 = x0 ,
f (x0 )
e isso mostra que ker(f )⊥ = span{x0 }.

Exercı́cio 5.10 O ı́tem (a) é consequência imediada da prova do Teorema 5.1.1. Para o
ı́tem (b), seja δ = inf x∈K ||x||. Daı́, existe uma sequência (xn )n∈N em K tal que ||xn || → δ.
Vamos mostrar que (xn ) é uma sequência de Cauchy. Para isso, note que para quaisquer
t ∈ [0, 1] e n, m ∈ N, a lei do paralelogramo fornece a igualdade
2||txn ||2 + 2||(1 − t)xm ||2 = ||txn − (1 − t)xm ||2 + ||txn + (1 − t)xm ||2
Pondo t = 1/2 e reorganizando os termos, ficamos com
xn + xm 2 1

1 2 1 2 1 2 ≤ ||xn ||2 + 1 ||xm ||2 − δ 2 ,
||xn − xm || = ||xn || + ||xm || −
4 2 2 2 2 2
onde a última desigualdade se justifica pois (xn + xm )/2 ∈ K. Segue que
||xn − xm ||2 = 2||xn ||2 + 2||xm ||2 − 4δ 2 ,
e fazendo n, m → ∞ vem que o lado direito converge para 0. Assim, (xn ) é uma sequência
de Cauchy. Como X é Hilbert, segue que existe limn→∞ xn = x0 , e como K é fechado,
temos que x0 ∈ K. Pela continuidade da norma, temos que

||x0 || = lim xn = lim ||xn || = δ,

n→∞ n→∞

e portanto x0 é um elemento de norma minimal em K. Falta mostrar a unicidade. Pri-


meiro, observe que se x0 = 0X , então a unicidade é óbvia. Se x0 6= 0X , então ||x0 || > 0, e
consequentemente 0X ∈ / K. Assuma que x1 ∈ K é tal que ||x1 || = ||x0 || = inf x∈K ||x|| = δ.
Observe que (x0 + x1 )/2 é um ponto de K, e portanto

x0 + x1 x0 x1
δ ≤ ≤ + = δ,
2 2 2
donde

x0 + x 1
2 = δ.

Segue que x0 /δ e x1 /δ são pontos da esfera unitária tais que o seu ponto médio também
é um ponto da esfera unitária. Logo, devemos ter x0 = x1 , uma vez que toda norma dada
por um produto interno é estritamente convexa.

Exercı́cio 5.11 A sesquilinearidade de b é imediata. Se x ∈ BX e Y ∈ BY , então
|b(y, x)| = |hy, T xiY | ≤ ||y||Y ||T x||Y ≤ ||T ||L(X,Y ) ||x||X ≤ ||T ||L(X,Y ) ,
e isso mostra que b é limitada. Para mostrar que S = T ∗ , note que do Teorema 5.3.1
temos a igualdade
hT ∗ y, xiX = hy, T xiY = b(y, x)
para quaisquer x ∈ X e y ∈ Y . Da Proposição 5.2.1 vem que S é o único operador de
L(Y, X) com a propriedade de que b(y, x) = hSy, xiX para quaisquer x ∈ X e y ∈ Y , e
daı́ vem que S = T ∗ .
7.5. CAPÍTULO 5 189


Observação 7.5.1. Como consequência desse exercı́cio, temos que o adjunto de Hilbert T ∗
de T ∈ L(X, Y ) é o único operador limitado com a propriedade de que
hT ∗ y, xiX = hy, T xiY
para quaisquer x ∈ X e y ∈ Y . Com efeito, se T ∗ tem essa propriedade, então T ∗ é o
operador dado pela Proposição 5.2.1 para a forma sesquilinear limitada
b(y, x) = hy, T xiX
definida em Y × X, e esse operador é único.

Exercı́cio 5.14 Assuma primeiro que E é uma base ortonormal, e seja x ∈ X um vetor
tal que x ⊥ eλ para todo λ ∈ L. Daı́, para todo ε > 0 existe uma combinação linear finita
m
X
y= αλj eλj
j=1

tal que ||x − y||X < ε. Como x ⊥ y, segue do Exercı́cio 5.3 que
||x||2X ≤ ||x||2X + ||y||2X = ||x − y||2X < ε2 ,
e portanto segue que x = 0X . Agora, assuma que E ⊥ = {0X }, e seja Y = span(E). Pela
Proposição 5.1.1 segue que X = cl(Y ) ⊕ cl(Y )⊥ . Se cl(Y ) 6= X, então existe um vetor
não-nulo y0 ∈ cl(Y )⊥ , donde Y ⊥ contém um vetor não-nulo y. Como y ⊥ w para todo
w ∈ Y , temos em particular que y ⊥ eλ para qualquer λ ∈ L (pois E ⊆ Y ). Assim,
y ∈ E ⊥ , e isso contradiz a hipótese. Logo, cl(span(E)) = X, e portanto E é uma base
ortonormal de X.

Exercı́cio 5.15 Seja (ej )j∈N é uma sequência ortonormal em um espaço de Hilbert X.
Tome um funcional qualquer f ∈ X ∗ . Pelo teorema da representação de Riesz, existe
x ∈ X com a propriedade de que f (z) = hx, ziX para qualquer z ∈ X. Por outro lado,
pela desigualdade de Bessel temos que a série

X ∞
X ∞
X
2 2
|f (ej )| = |hx, ej iX | = |hej , xiX |2
j=1 j=1 j=1

é convergente. Segue que f (ej ) → 0 = f (0X ) quando j → ∞. Uma vez que isso vale para
qualquer f ∈ X ∗ temos que en * 0X .
Para verificar que (ej )j∈N não tem subsequência convergente apenas note que nenhuma
subsequência de (ej ) é de Cauchy. Com efeito, se i 6= j, então pelo teorema de Pitagoras
temos ||ei − ej ||2X = ||ei ||2X + ||ej ||2X = 2.

Exercı́cio 5.16 Seja E uma base ortonormal de X. Como U preserva produto interno, é
claro que U (E) é um conjunto ortonormal. Resta mostrar que cl(span(U (E)) = Y . Para
isso, vamos usar a sobrejetividade de U , e o fato de que U é uma isometria. Se y ∈ Y ,
então podemos tomar x ∈ X tal que U x = y. Como E é base ortonormal de X, segue que
existe uma sequência (xn ) em span(E) tal que xn → x. Como U é isometria, temos que
||U xn − y||Y = ||U (xn − x)||Y = ||xn − x||X , donde U xn converge para y. Por linearidade,
cada U xn é um vetor de span(U (E)). Isso conclui a demonstração.
190 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS


Exercı́cio 5.18 Para quaisquer x, y ∈ X, temos
0 = hT (x + y), x + yiX = hT x, yiX + hT y, xiX , e
0 = hT (x + iy), x + iyiX = ihT x, yiX − ihT y, xiX .
Dividindo a segunda igualdade por i, e somando com a primeira, temos que hT x, yiX = 0
para todos x, y ∈ X. Segue que T é o operador nulo.

Exercı́cio 5.19 Primeiro, assuma que hT x, xiX ∈ R para qualquer x ∈ X, e seja T ∗ o
adjunto de Hilbert de X. Daı́,
hT ∗ x, xiX = hx, T xiX = hT x, xiX ,
onde a última igualdade se justifica pois o conjugado de um número real é ele próprio.
Assim, segue que
h(T ∗ − T )x, xiX = 0
para todo x ∈ X. Do Exercı́cio 5.18, segue que T ∗ = T . Agora, assuma que T é auto-
adjunto. Assim, hT x, xiX = hx, T xiX = hT x, xiX para todo x ∈ X. Isso conclui a
prova.

7.6 Capı́tulo 6
Exercı́cio 6.8 Seja {En }n∈N umaScoleção enumerável de conjuntos de Σ tal que Ej ∩Ei = ∅
sempre que i 6= j, e denote E = ∞ j=1 Ej . Devemos mostrar que


X
µ(E) = µ(Ej ).
j=1
Sn
Para cada n ∈ N, temos que En ⊆ E, e portanto
j=1

n
! n
[ X
µ(E) ≥ µ Ej = µ(Ej ).
j=1 j=1

Os termos da sérieP ∞
P
j=1 µ(Ej ) são todos
P∞não negativos, e portanto se a série não é

convergente, então j=1 µ(Ej ) = ∞. Se j=1 µ(Ej ) = ∞, então da desigualdadeP acima
temos µ(E) = ∞ e daı́ vem a igualdade desejada. Portanto, assuma que a série ∞ j=1 µ(Ej )
é convergente. Pela desigualdade acima temos imediatamente que

X
µ(Ej ) ≤ µ(E).
j=1

Agora, vamos provar a desigualdade invrsa. Seja ε > 0 arbitrário. Usando a regularidade
de µ, para cada n ∈ N tome um aberto mensurável Gn contendo En com a propriedade
de que
ε
µ(Gn ) < µ(En ) + n .
2
7.6. CAPÍTULO 6 191

Se K é um compacto mensurável contido em E qualquer, então



[ ∞
[
K⊆ Ej ⊆ Gj ,
j=1 j=1

donde {Gj }∞j=1 é uma cobertura de K por abertos de (X, τ ). Segue do Lema 1.4.1 que
essa cobertura admite uma subcobertura finita, donde podemos tomar m ∈ N tal que
m
[
K⊆ Gj .
j=1
S 
Como µ é finitamente aditiva, segue que µ m ≤ m
P
G
j=1 j j=1 µ(Gj ). A demonstração
desta desigualdade é análoga ao caso em que µ é σ-aditiva (veja o ı́tem (c) da Proposição
6.1.1). Consequentemente,
m m h ∞ ∞
X X ε i Xh εi X
µ(K) ≤ µ(Gj ) < µ(Ej ) + j ≤ µ(Ej ) + j = ε + µ(Ej ).
j=1 j=1
2 j=1
2 j=1

Como ε > 0 é arbitrário, temos que para todo compacto mensurável K ⊆ E vale que

X
µ(K) ≤ µ(Ej ).
j=1

Assim, uma vez que µ é regular tomamos o supremo das medidas dos compactos men-
suráveis contidos em E para obter a desigualdade desejada:

X
µ(E) = sup{µ(K) : K ∈ Σ ∩ C, K ⊆ E} ≤ µ(Ej ),
j=1

onde C denota a coleção os subconjuntos compactos de X. Isso mostra que µ é σ-aditiva.


Agora, assumindo adicionalmente que a topologia τ é Hausdorff e que Σ é a σ-álgebra de
Borel de (X, τ ), observe que denotando por F a famı́lia de fechados de (X, τ ), vem
µ(E) = sup{µ(K) : K ∈ C ∩ Σ, K ⊆ E} ≤ sup{µ(F ) : F ∈ F ∩ Σ, F ⊆ E},
uma vez que todo compacto é fechado (veja a Proposição 1.4.2). Por outro lado, é claro
que
sup{µ(F ) : F ∈ F ∩ Σ, F ⊆ E} ≤ µ(E),
pois o supremo é tomado sobre subconjuntos de E. Assim, temos µ(E) = sup{µ(F ) : F ∈
F ∩ Σ, F ⊆ E}, e portanto µ é regular no sentido da Definição 6.1.4.

Exercı́cio 6.11 Como f −1 (Y ) = X ∈ ΣX , segue que Y ∈ f∗ ΣX . Para verificar que f∗ ΣX
é fechada para complementação, note que se B ∈ f∗ ΣX , então f −1 (Y \ B) = X \ f −1 (B) ∈
ΣX . Assim, Y \ B ∈ f∗ ΣX . Falta mostrar que a coleção f∗ ΣX é fechada para união
enumerável. Para isso, observe que se {Bj }j∈N ⊆ f∗ ΣX , então

! ∞
[ [
−1
f Bj = f −1 (Bj ) ∈ ΣX ,
j=1 j=1

uma vez que cada f −1 (Bj ) é um conjunto de ΣX .


Agora, se f : (X, ΣX ) → (Y, ΣY ) é mensurável, então f −1 (B) ∈ ΣX para qualquer
B ∈ ΣY . Daı́, ΣY ⊆ f∗ ΣX . Por outro lado, se ΣY ⊆ f∗ ΣX , então qualquer conjunto
mensurável B ∈ ΣY é um conjunto de f∗ ΣX , donde f −1 (B) ∈ ΣX . Logo, f é mensurável.
192 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Exercı́cio 6.12 Seja φ : X → R2 a aplicação dada por φ(x) = (f (x), g(x)). Pela
Proposição 6.2.3, segue que φ é mensurável. As funções de R2 em R dadas por
s(a, b) = a + b, p(a, b) = ab, M (a, b) = max{a, b}, e m(a, b) = min{a, b}
são contı́nuas, e portanto mensuráveis (veja o Corolário 6.2.1. Agora, observe que
f + g = s ◦ φ, f g = p ◦ φ, max{a, b} = M ◦ φ, e min{a, b} = m ◦ φ,
que são composições de funções mensuráveis, donde são mensuráveis (veja o Exercı́cio
6.10). Para mostrar que |f | é mensurável, basta notar que | · | : R → R é contı́nua, e
portanto mensurável, e usar de novo o Exercı́cio 6.10.

Exercı́cio 6.13 Seja t ∈ [0, ∞), e assuma que t ≤ n0 . Note que para cada n ∈ N, vale
que
n −1
n2[ h i
[0, n] = k2−n , (k + 1)2−n ,
k=0

e portanto para cada n ≥ n0 existe k(n) ∈ {0, . . . , n2−n − 1} tal que


k(n)2−n ≤ t ≤ (k(n) + 1)2−n .
Segue que pondo xn = k(n)2−n para cada n ≥ n0 temos

|xn − t| = k(n)2−n − t ≤ 2−n ,

e portanto xn → t.

Exercı́cio 6.14 Vamos assumir que a representação canônica de s é


m
X
s= aj E j ,
j=1

onde Ej = s−1 (aj ) para cada j. Pela definição de integral sobre um subconjunto men-
surável, temos que
Z Xm Xm
µs (∅) = s dµ = aj µ(Ej ∩ ∅) = aj µ(∅) = 0.
∅ j=1 j=1

Falta mostrar que µs é σ-aditiva. Seja {An }n∈N uma coleção de conjuntos mensuráveis
que são mutuamente disjuntos. Daı́,

! Z m ∞
! m ∞
[ X [ X X
µs An = S s dµ = aj µ Ej ∩ An = aj µ(Ej ∩ An ) =

n=1 n=1 An j=1 n=1 j=1 n=1
∞ m
! ∞ Z ∞
X X X X
= aj µ(Ej ∩ An ) = s dµ = µs (An ),
n=1 j=1 n=1 An n=1

e isso concui a prova.


7.6. CAPÍTULO 6 193

Exercı́cio 6.15 Para cada n ∈ N, defina a função fn : X → [0, ∞] por


n
X
fn = f χEj .
j=1

Pela aditividade da integral (Proposição 6.3.3) e pelo Lema 6.3.1 segue a igualdade
Z n
Z X n Z
X n Z
X
fn dµ = f χEj dµ = f χEj dµ = f dµ. (7.6.1)
X X j=1 j=1 X j=1 Ej

Agora, observe que, como f é não-negativa, a sequência de funções (fn )n∈N é pontualmente
monótona. Mais ainda, se x ∈ X, então x ∈ Ej0 para um único j0 ∈ N, ou x ∈ / E. No
primeiro caso, temos fn (x) = f (x) para todo n ≥ j0 , e no segundo caso temos fn (x) = 0
para todo n ∈ N. Segue que

lim fn (x) = f χE (x)


n→∞

para qualquer x ∈ X. Segue que fn % f χE , e portanto podemos usar o teorema da


convergência monótona (Teorema 6.3.1) para obter
Z Z Z
lim fn dµ = χ
f E dµ = f dµ,
n→∞ X X E

onde na última igualdade usamos o Lema 6.3.1 mais uma vez. Finalmente, pela igualdade
acima e por (7.6.1) temos
Z Z n Z
X ∞ Z
X
f dµ = lim fn dµ = lim f dµ = f dµ.
E n→∞ X n→∞ Ej Ej
j=1 j=1

Exercı́cio 6.16 Seja s ∈ Sf , isto é, s = m χ


P
j=1 aj · Ej é uma função simples, mensurável
−1
e não-negativa tal que s ≤ f (onde, como usual, s (aj ) = Ej ). Daı́,
Z m
X
s dµ = aj µ(Ej ∩ ∅) = 0.
∅ j=1

Passando ao supremo em Sf , temos


Z
µf (∅) = f dµ = 0.

A σ-aditividade de µf decorre imediatamente do Exercı́cio 6.15. Isso mostra que µf é


uma medida.
Para a outra afirmação, vamos primeiro considerar o caso em que a integração é feita
sobre X. Neste caso, assuma inicialmente que g = χA para algum subconjunto mensurável
A ⊆ X. Daı́, como χA é uma função simples, temos
Z Z Z
χA dµf = µf (A) = f dµ = f χA dµ,
X A X
194 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

onde a segunda igualdade vem da definição de µf e a terceira igualdade


Pm decorre do Lema
6.3.1. Agora, assumindo que g é simples, e que tem a forma g = j=1 aj χEj , então
Z m
X m
X Z m
X Z Z m
X
g dµf = aj · µf (Ej ) = aj f dµ = aj f χEj dµ = f aj χEj dµ =
X j=1 j=1 Ej j=1 X X j=1
Z
= f g dµ,
X

onde usamos, mais uma vez, a aditividade da integral e o Lema 6.3.1. Isso prova a
afirmativa do enunciado para o caso em que g é simples. Finalmente, assuma que g é
uma função mensurável não-negativa qualquer. Pelo Teorema 6.2.1 podemos tomar uma
sequência (sn )n∈N de funções simples, mensuráveis e não-negativas com a propriedade de
que sn % g. Pelo teorema da convergência monótona (Teorema 6.3.1) segue que
Z Z Z
g dµf = lim sn dµf = lim sn f dµ.
X n→∞ X n→∞ X

Agora, note que (sn f )n∈N é uma sequência monótona (pois f é não-negativa) que converge
pontualmente para f g. Daı́, aplicando o Teorema 6.3.1 mais uma vez temos
Z Z
lim sn f dµ = f g dµ,
n→∞ X X

e isso conclui o caso em que a integração é feita sobre X. Agora, se a integral é feita sobre
um subconjunto mensurável E ⊆ X, então pelo Lema 6.3.1 vem
Z Z Z Z
g dµf = g χE dµf = f g χE dµ = f g dµ.
E X X E


Exercı́cio 6.17 Pelo Exercı́cio 6.15, temos que
Z X∞ Z
+
f dµ = f + dµ,
E j=1 Ej

e vale a igualdade análoga para f − . Além disso, uma vez que f é integrável, temos que o
lado esquerdo da igualdade acima é finito, donde a soma do lado direito é convergente. É
claro que o mesmo vale para f − . Consequentemente,
Z Z Z X∞ Z X∞ Z

f dµ = +
f dµ − f dµ = +
f dµ − f − dµ =
E E E j=1 Ej j=1 Ej
∞ Z Z ! ∞ Z
X X
+ −
= f dµ − f dµ = f dµ,
j=1 Ej Ej j=1 Ej

e isso conclui a prova.



Exercı́cio 6.18 Vamos começar assumindo que f é não-negativa. Nesse caso, lembre-se
de que pela definição temos
Z Z 
f dµ = sup s dµ : s ∈ Sf ,
E E
7.6. CAPÍTULO 6 195

onde Sf é o conjunto dePtodas as funções s : X → [0, ∞) que são simples, mensuráveis, e


tais que s ≤ f . Se s = m χ
j=1 aj Ej é uma função qualquer de Sf , então temos

Z m
X
s dµ = aj · µ(E ∩ Ej ) = 0,
E j=1

uma vez que µ(E) = 0 implica µ(E ∩ Ej ) = 0 para cada j = 1, . . . , m. Segue que a
integral de todas as funções de Sf sobre E são iguais a zero, e portanto passando ao
supremo temos
Z
f dµ = 0.
E

Agora, se f : X → R é uma função integrável qualquer, então f + e f − são não-negativas,


e assim
Z Z Z
f dµ = +
f dµ − f − dµ = 0.
E E E

Exercı́cio 6.19 Seja x ∈ X. Se x ∈ E, então fn (x) = 0 para qualquer n ı́mpar, e se


x∈
/ E, então fn (x) = 0 para qualquer n par. Nos dois casos, temos

inf fj (x) = 0
j≥n

para qualquer n ∈ N. Assim, segue que

lim inf fn (x) = sup inf fj (x) = 0


n→∞ n∈N j≥n

para qualquer x ∈ X. Isso mostra que lim inf n→∞ fn é a função nula. Consequentemente,
Z
lim inf fn dµ = 0.
X n→∞

Agora, observe que se n é par, então


Z Z
fn dµ = χE dµ = µ(E),
X X

e se n é ı́mpar, temos
Z Z
fn dµ = 1 − χE dµ = µ(X) − µ(E) = µ(X \ E).
X X
R 
Assim, a sequência X fn dµ n∈N é formada apenas pelos números µ(E) e µ(X \ E)
aparecendo alternadamente. Segue que
Z Z
lim inf fn dµ = min{µ(E), µ(X \ E)} > 0 = lim inf fn dµ,
n→∞ X X n→∞

como querı́amos. Note que na desigualdade acima usamos a hipótese 0 < µ(E) < µ(X).


196 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

Exercı́cio 6.21 Observe que como f ∈ Lp (X), temos que |f |r ∈ Lp/r (X). Da mesma
forma, |g|r ∈ Lq/r (X). Da hipótese

1 1 1
+ = ≤ 1,
p q r

segue que p/r e q/r são conjugados. Assim, usando a desigualdade de Hölder (veja a
Observação 6.5.4) temos que |f g|r ∈ L1 (X), e vale a desigualdade

|f g|r 1 ≤ |f |r Lp/r (X) |g|r Lq/r (X) .
L (X)

Por outro lado, note que


Z

|f g|r = |f g|r dµ = ||f g||rLr (X) ,
L1 (X)
X
Z r/p
r p
|f |
Lp/r (X)
= |f | dµ = ||f ||rLp (X) , e
X
Z r/q
r q
|g|
Lq/r (X)
= |g| dµ = ||g||rLq (X) .
X

Substituindo as três igualdades acima na desigualdade anterior e elevando os dois lados


ao expoente 1/r temos o desejado.

Exercı́cio 6.22 Vamos proceder por indução em k. Pelo Exercı́cio 6.21, o resultado vale
para k = 2. Assuma que k > 3 é um número natural, e que o resultado que desejamos
provar vale para k − 1 números p1 , . . . , pk−1 ∈ (1, ∞) e k − 1 funções f1 , . . . , fk−1 com
fj ∈ Lpj (X) para cada j = 1, . . . , k − 1. Denote

1 1 1
+ ... + = ≤ 1,
p1 pk−1 q

Pela hipótese de indução, segue que g = f1 . . . fk−1 ∈ Lq (X), e vale a desigualdade

||g||Lq (X) ≤ ||f1 ||Lp1 (X) . . . ||fk−1 ||Lpk−1 (X) (7.6.2)

Daı́, como

1 1 1 1 1
+ = + ... + = ≤1
q pk p1 pk p

e g ∈ Lq (X) e fk ∈ Lpk (X), usamos o Exercı́cio 6.21 mais uma vez para obter que
gfk ∈ Lp (X), e vale a desigualdade

||gfk ||Lp (X) ≤ ||g||Lq (X) ||fk ||Lpk (X) . (7.6.3)

Como g = f1 . . . fk−1 , segue que f1 . . . fk ∈ Lp (X), como querı́amos. Para a desigualdade


desejada, basta usar (7.6.2) em (7.6.3).


7.6. CAPÍTULO 6 197

Exercı́cio 6.23 Se p ≤ r ≤ q, então existe α ∈ [0, 1] tal que


1 α 1−α
= + .
r p q

Como f ∈ Lp (X), temos que |f |α ∈ Lp/α (X) e, da mesma forma, uma vez que f ∈ Lq (X)
segue que |f |1−α ∈ Lq/(1−α) (X). Assim, segue do Exercı́cio 6.21 que |f | = |f |α |f |1−α ∈
Lr (X), e vale a desigualdade
Z α/p Z (1−α)/q
1−α
||f ||Lr (X) ≤ |f |α Lp/α (X)
|f |
Lq/(1−α) (X)
= p
|f | dµ q
|f | dµ =
X X
= ||f ||αLp (X) ||f ||L1−α
q (X) .

É claro que f ∈ Lr (X) se e somente se |f | ∈ Lr (X). Isso conclui a prova.

Exercı́cio 6.25 Assuma que µ não é atômica. Então, se U é a união dos átomos de X,
existe E0 ⊆ X \ U tal que µ(E0 ) > 0. Em particular, E0 não contém nenhum átomo. Seja

c0 := inf{c > 0 : ∃ F ⊆ E0 , F ∈ Σ com µ(F ) = c},

e observe que c0 ≥ ε. Tome uma sequência de conjuntos (Fi )i∈N com a propriedade de
que µ(Fi ) → c0 quando i → ∞, e seja F a famı́lia de todas as interseções enumeráveis de
medida positiva dos conjuntos Fi (em outras palavras, descarte as interseções enumeráveis
cuja medida é nula). A inclusão de conjuntos define uma ordem parcial em F, que
tem a propriedade de que toda subfamı́lia totalmente ordenada tem um limite inferior
em F. Basta tomar a interseção de todos os membros da subfamı́lia: com efeito, essa
interseção pode ser escrita como alguma interseção enumerável de elementos da subfamı́lia
totalmente ordenada (como cada um desses conjuntos tem medida maior ou igual a ε vem
da Proposição 6.1.2(b) que a sua interseção também tem medida maior ou igual a ε).
Segue que F tem um elemento minimal F0 que, por estar em F, tem medida positiva,
e portanto µ(F0 ) ≥ ε.
Por outro lado, como F0 ⊆ Fi para todo i ∈ N, temos que µ(F0 ) ≤ c0 , donde µ(F0 ) =
c0 . Consequetemente, F0 é um átomo. Com efeito, se E ⊆ F0 é tal que µ(E) < µ(F0 ),
então devemos ter µ(E) = 0, pois do contrário terı́amos E ∈ F com µ(E) < c0 .

Exercı́cio 6.26 Vamos começar mostrando que a convergência em L∞ (X) implica a


convergência em quase toda parte. Assuma que ||fn − f ||L∞ (X) → 0. Para cada k ∈ N,
existe nk ∈ N tal que se n ≥ nk , então
1
||f − fn ||L∞ (X) <
k
Isso significa que existe um conjunto Ek ∈ Σ de medida nula tal que
1
|f (x) − fn (x)| <
k
para quaisquer n ≥ nk e x ∈ X \ Ek . Seja E = ∞
S
k=1 Ek . É claro que µ(E) = 0, e também
vale que fn converge pontualmente para f em X \ E. De fato, se x ∈ X \ E e ε > 0, basta
198 CAPÍTULO 7. SOLUÇÕES DOS EXERCÍCIOS

tomar k ∈ N tal que 1/k < ε e para n ≥ nk vale que |f (x) − fn (x)| < 1/k < ε, uma vez
que X \ E ⊆ X \ Ek , e portanto x ∈ X \ Ek . Daı́ fn (x) → f (x).
Vamos agora ao caso p ∈ [1, ∞). Se fn → f em Lp (X) então, em particular, (fn )
é uma sequência de Cauchy. Logo, podemos tomar uma subsequência (fnk )k∈N com a
propriedade de que
1
||fnk+1 − fnk ||Lp (X) <
2k
para todo k ∈ N. Pela prova do Teorema 6.5.2, temos que fnk converge pontualmente em
quase toda parte para uma função que denotaremos por f0 . Ainda pela prova do Teorema
6.5.2 vale que fnk converge para f0 na norma. Pela unicidade do limite segue que f = f0 .

Exercı́cio 6.27 Pela definição de convergência em quase toda parte (veja o Exercı́cio
6.26), existe um conjunto N ∈ Σ com a propriedade de que fn → f pontualmente em
X \ N . Segue que |f (x)| ≤ g(x) para qualquer x ∈ X \ N , donde
Z Z Z
p p
|f | dµ = |f | dµ ≤ g dµ < ∞,
X X\N X\N

e portanto f ∈ Lp (X). Além disso, |fn − f |p → 0 em X \ N , e |fn − f |p ≤ 2g p .


Aplicando o teorema da Convergência Dominada (Teorema 6.4.1) para a restrição das
funções envolvidas a X \ N temos que
Z Z Z
p p p
||fn − f ||Lp (X) = |fn − f | dµ = |fn − f | dµ → 0 dµ = 0,
X X\N X\N

e isso conclui a prova.

Exercı́cio 6.28 Dado ε > 0, seja n0 ∈ N tal que |fn (x) − f (x)| < ε para quaisquer n ≥ n0
e x ∈ X. Daı́,
Z 1/p Z 1/p
p p
||fn − f ||Lp (X) = |fn − f | dµ ≤ ε dµ = εµ(X)1/p ,
X X

donde segue que fn → f em Lp (X).


Índice

`np , 26 conjunto equicontı́nuo de funções, 22


`p (N), 28 conjunto fechado, 8
`∞ (N), 28 conjunto linearmente independente, 30
`n∞ , 26 conjunto mensurável, 111
KN , 28 conjunto ortonormal, 102
R, 25 conjunto parcialmente ordenado, 36
µ-q.t.p, 134 conjunto pontualmente limitado de funções,
σ-álgebra, 111 22
σ-álgebra de Borel, 112 conjunto total, 102
átomo, 155 conjunto totalmente ordenado, 36
conjunto uniformemente limitado de funções,
aditiva, 113 22
aplicação aberta, 60 convergência, 9
aplicação antilinear, 93 convergência em Lp (X), 139
aplicação canônica, 72
convergência em quase toda parte, 155
aplicação contı́nua, 17
convergência fraca, 71
aplicação mensurável, 116
convergência uniforme, 21
aplicação uniformemente contı́nua, 22
cubo, 115
base de Hamel, 35
base de Schauder, 37 desigualdade de Cauchy-Schwarz, 94
base de um espaço vetorial, 31 desigualdade de Hölder, 26
base de vizinhanças, 9 desigualdade de interpolação, 155
base ortonormal, 102 desigualdade de Minkowski, 27
base para uma topologia, 5 desigualdade de Young, 26
bi-dual, 71 diâmetro, 15
bola aberta, 11 dimensão de Hilbert, 106
bola unitária, 29 distância, 11
Borel mensurável, 116
envoltória convexa, 89
cobertura, 13 esfera unitária, 74
coerciva, 100 espaço compacto, 13
combinação convexa, 89 espaço completo, 13
combinação linear finita, 30 espaço de Banach, 45
combinação linear trivial, 30 espaço de Hilbert, 94
complemento ortogonal, 90, 95 espaço de medida, 113
completamento, 48 espaço de probabilidade, 113
conjunto aberto, 5 espaço de produto interno, 93
conjunto convexo, 30 espaço dual, 41
conjunto de Borel, 112 espaço estritamente convexo, 63
conjunto de medida total, 137 espaço limitado, 15
conjunto denso, 10 espaço localmente compacto, 43

199
200 ÍNDICE

espaço métrico, 11 medida σ-finita, 133


espaço normado, 25 medida de contagem, 113
espaço reflexivo, 72 medida de Dirac, 113
espaço regular, 13 medida de Lebesgue, 115
espaço separável, 10 medida de probabilibade, 113
espaço sequencialmente compacto, 15 medida difusa, 155
espaço topológico, 5 medida finita, 113
espaço totalmente limitado, 15 medida finitamente aditiva, 152
espaço uniformemente convexo, 141 medida finitamente aditiva regular, 152
espaço vetorial topológico, 90 medida puramente atómica, 155
espaços isometricamente isomorfos, 42 medida regular, 116
espaços isomorfos, 42 mergulho topológico, 18
espaços unitariamente equivalentes, 109
essencialmente limitada, 137 núcleo, 39
extensão de Hahn-Banach, 50 números conjugados, 135
norma, 25
fecho, 8 norma da convergência uniforme, 29
forma sesquilinear, 99 norma de operadores, 41
fronteira, 20 norma do produto interno, 94
função µ-integrável, 129 norma dual, 42
função caracterı́stica, 116
função integrável, 129 operador adjunto, 182
função Lebesgue integrável, 129 operador auto-adjunto, 101
função mensurável, 116 operador invertı́vel, 39
função simples, 119 operador limitado, 39
funcional de Minkowski, 33 operador linear, 39
funcional linear, 41 operador projeção ortogonal, 96
funcional linear limitado, 41 operador unitário, 109
funcional sublinear, 48 ordenação parcial, 35
ortogonalidade de Birkhoff, 43
gráfico, 60
parte negativa, 129
hiperplano, 51 parte positiva, 129
homeomorfismo, 18 partição, 151
ponto de acumulação, 9
identidade de Parseval, 105 ponto interior, 7
identificação de Riesz, 97 primeiro axioma de enumerabilidade, 9
imagem, 39 produto cartesiano, 69
integral, 129 produto interno, 93
integral de Lebesgue, 121, 129 projeção, 64, 69
interior, 7 projeção ortogonal, 96
isometria, 22, 42 pushforward de uma σ-álgebra, 153
isomorfismo de espaços normados, 42
reta estendida, 151
lei do paralelogramo, 108
limite, 9 série de Fourier, 104
limite pontual, 132 semi-espaço fechado, 51
separa, 51
métrica, 11 separa estritamente, 51
métrica induzida, 12 sequência, 9
métricas equivalentes, 20 sequência de Cauchy, 13
medida, 113 soma direta, 95
ÍNDICE 201

sub-base, 68
subconjuntos ortogonais, 95
subespaço gerado, 30
subespaço topológico, 7
subespaço vetorial fechado, 34
subsequência, 15
suporte de uma função, 156
suporte de uma medida, 154
supremo essencial, 138

Teorema de Arzelá-Ascoli, 22
teorema de Tychonoff, 80
topologia, 5
topologia da norma, 25
topologia discreta, 5
topologia forte, 67
topologia fraca, 69
topologia fraca∗ , 77
topologia Hausdorff, 9
topologia induzida, 7
topologia métrica, 12
topologia mais fina, 5
topologia metrizável, 13
topologia produto, 69
topologia trivial, 5
topologias comparáveis, 5

vetores ortogonais, 95
vizinhança, 7

Vous aimerez peut-être aussi