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Cristãos e engajamento cultural:

um alerta

Antítese: a guerra não é apenas cultural. Muitos cristãos têm

redescoberto a ideia do cristianismo como uma cosmovisão (uma

“visão total da realidade”, com implicações não apenas para a igreja,

mas para a sociedade)[1] e, com isso, cresce também a percepção de

que o povo de Deus se encontra envolvido numa guerra espiritual

atroz. Desde a queda do primeiro casal, o Senhor pôs uma inimizade

no seio da raça humana; esta inimizade é fundamentalmente entre

Cristo (o descendente da mulher) e a serpente, mas ela se expressa

na história como uma antíteseentre os filhos de Deus e os filhos do

maligno (Gn 3.15).


Essa percepção renovada da antítese tem animado os crentes
ao engajamento cultural. Há um crescente interesse pelas
discussões políticas e econômicas a partir de um ponto de vista
distintamente bíblico; assim como aumenta a reflexão sobre
educação cristã, sobre o lugar da arte e da beleza na criação divina,
sobre a relação entre fé e ciência, e assim por diante. E, à medida
que se multiplicam os livros e os fóruns sobre esses assuntos, vemos
mais e mais crentes nas trincheiras, dispostos a empregarem suas
armas espirituais para anular os sofismas e a altivez da
incredulidade, levando todo pensamento cativo à obediência de
Cristo (2Co 10.4-5).
Guerra cultural e guerra no coração

É fascinante ver esse retorno dos crentes ao envolvimento cultural, e


há muito o que agradecer a Deus por isso. Parece que o dualismo
evangélico (a ideia de que a esfera pública é um “lugar onde cristãos
não enxergam a possibilidade de servir a Deus”)[2] está recuando e a
igreja brasileira, redescobrindo o seu régio papel de “[combater],
nesta vida, o pecado e o diabo” (Catecismo de Heidelberg, 32), não
apenas no âmbito pessoal, familiar e eclesiástico, mas também na
política, na economia, nas escolas, nas universidades e na ciência.
Acontece que, no afã de se alistarem para essa guerra cultural,
muitos crentes têm ignorado a natureza radical da antítese. Sim, há
uma inimizade posta entre os homens, entre a semente da mulher e
a da serpente; mas esse conflito é apenas a expressão da antítese
entre o Espírito de Deus e o espírito de apostasia que atua desde a
queda no pecado. Essa guerra não é simplesmente uma oposição
entre a Igreja de Cristo e os réprobos; antes, ela se manifesta
também – e eu diria, sobretudo – na alma dos próprios eleitos de
Deus: o Espírito contra a carne, a carne contra o Espírito (Gl 5.17).
Há uma antítese no coraçãoque tem sido em grande medida
ignorada – ou, no mínimo, subvalorizada – por aqueles que se
lançam na vida cultural.

Um campo de batalha (quase) esquecido

De que maneiras se expressa esse menosprezo pela antítese no


coração entre aqueles que amam a ideia da cosmovisão cristã e se
dispõem ao engajamento cultural?
Primeiro, subvalorizamos a antítese pela indistinção entre piedade
direta e indireta. Ao redescobrirmos que a vida inteira se dá perante
a face de Deus (coram Deo), e que devemos fazer tudo para a glória
dele, por vezes somos tentados a equiparar aqueles atos de devoção
cujo foco consciente e intencional está no próprio Criador (piedade
direta) – como a oração, a leitura das Escrituras, o culto público etc.
– com aqueles em que Deus é celebrado no desfrute de sua
criação (piedade indireta) – como contemplar uma bela paisagem,
apreciar uma obra de arte ou fazer uma boa refeição.[3] Embora, de
fato, Deus seja glorificado de ambas as formas, ele nos ensina a
distingui-las e a empregar cada uma no tempo e do modo
apropriados. Não devemos, por exemplo, substituir o culto público
por um passeio pelo parque, assim como não podemos obter num
lanche do McDonald’s o benefício que temos ao participar na Mesa
do Senhor.
Segundo, a antítese no coração é menosprezada pelo consumo
desmedido da cultura produzida pelos ímpios. A partir da ideia da
“graça comum”, os pensadores da cosmovisão cristã têm
acertadamente nos relembrado de que Deus é a fonte de toda boa
dádiva, e que ele traz coisas boas ao mundo até mesmo pela mão de
homens que o desprezam: desde energia elétrica, remédios e
vacinas, viagens de avião, até a beleza de um Michelangelo ou a
diversão de uma maratona de Breaking Bad. Por vezes, porém, isso
tem servido de desculpa para o consumo de produtos culturais que
promovem a imodéstia e a sensualidade, ou, mais sutilmente, para
um tipo de apreciação estética que separa radicalmente verdade e
beleza.[4] Na verdade, para fazer jus ao verdadeiro princípio da
antítese, as ideias de graça comum e mandato cultural deveriam
mais estimular os cristãos a produzirem cultura do que justificar o
(ab)uso do que é produzido por gente de outras cosmovisões.
Terceiro, a antítese no coração é ignorada pela confusão do ódio
pelo pecado com a ira pecaminosa. Embora, de fato, haja uma
oposição ferrenha e radical entre os cristãos e o mundo que os cerca
(Jo 15.18), somos também lembrados de que nossa guerra não é
contra pessoas (Ef 6.12). A ideia bíblica da antítese não pode servir
de fundamento ao orgulho espiritual, justamente porque essa mesma
antítese entre o Espírito e a carne está posta também no próprio
coração dos crentes. Cristãos e não cristãos são diferentes em
muitas coisas, mas a consciência do pecado remanescente[5] deveria
nos levar a um envolvimento sempre humilde na guerra cultural. “Tais
fostes alguns de vós”, lembra-nos o apóstolo (1Co 6.11).
Não é sem razão que Herman Dooyeweerd, um dos grandes da
cosmovisão cristã e do engajamento cultural, tomou como mote de
sua filosofia o ensino de Salomão em Provérbios 4.23: “sobre tudo o
que se deve guardar, guarda o coração, pois dele procedem as fontes
da vida”. A antítese é fundamentalmente espiritual, e discerni-la e
encará-la em nosso próprio coração é um item essencial na
armadura do crente que pretende se alistar para a guerra cultural.
Antes de sair para o combate nas linhas inimigas, é preciso ter
certeza de que os portões de nossa própria vida estão bem fechados,
escondidos e protegidos pelo Espírito de Deus.

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