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Muitos são os aspectos envolvidos quando se pretende analisar a eficiência educacional e estes,
inexoravelmente, passam por concepção de currículo e prática docente, mais especificamente as estratégias
utilizadas nesta. Nos limites do presente artigo, estes foram os eixos escolhidos para, como objetivo final,
verificar (pela incidência) o quão aderentes ao tema têm se mostrado as reflexões e discussões de
pesquisadores da área. Este trabalho foi realizado em três etapas. A primeira foi a revisão da bibliografia
sobre a temática de currículos, estratégias e técnicas de ensino. Na segunda etapa realizou-se um estudo
exploratório que teve como crivo a incidência desses temas, como palavras-chave, nas publicações da área.
A última etapa consistiu uma análise qualitativa das publicações e, na sequência, foram elaboradas as
considerações finais. Constatou-se, pela pesquisa, que estes temas estão sendo pouco abordado, o que pode
indicar baixa preocupação na análise da eficiência educacional brasileira. Conclui-se, por fim, dada a baixa
incidência de trabalhos publicados nos principais fóruns da área e, dos publicados, uma tendência em
análises pontuais – além de insignificante ocorrência de relatos de sucesso – que a aderência de
pesquisadores de administração às discussões e reflexões sobre o tema não apresenta consistência capaz de
converter a sensação de ineficiência que paira em nossos cursos.
Many aspects are involved when you want to analyze the educational efficiency and these inexorably
undergo curriculum design and teaching practice, specifically the strategies used in this. Within the limits of
1
Doutoranda em Administração pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Professora da FEA-PUCSP. E-mail:
dfngomes@pucsp.com.br
2
Doutoranda em Administração pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e Professor da Instituto Nacional de
Pós-Graduação. E-mail: simonebarreto@hotmail.com
Currículo e Estratégias de Ensinagem em Administração: Reflexões sobre o grau de 85
Introdução
Pensar educação, analisar processos educacionais, rever políticas e propor práticas não revela
ineditismo ao leitor leigo ou àquele mais experimentado no campo dos saberes. Ambos estão
igualmente interessados, no final das contas, na eficiência de todas as partes envolvidas que,
no mínimo, deságua (ou deveria) no auxílio à construção de um “projeto de si” mais amplo
por parte dos indivíduos em formação (JOSSO, 2007), projeto esse que lhes serve de
propulsão para aprendizagem contínua. Nesse sentido, o aluno passa da simples condição de
precursores (NOT, 1993). Em outras palavras, interessa saber se afinal a educação tem
cumprido seu papel de forjar indivíduos autônomos e pensantes. Por essa razão, consideramos
esse tema (apesar de tão recorrente) nada enfadonho, como bem pontuou Freire (1996).
Um rápido olhar para o cenário da educação brasileira ante os demais países pode dar
pistas do quanto ainda é preciso caminhar. Conforme Barbosa Filho bem explicita, com base
nos dados da PNDA (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio), o Brasil assistiu um
“vigoroso processo de universalização da educação” nas últimas duas décadas, que “elevou os
anos médios de escolaridade da população em idade ativa de 4,2 anos médios em 1995 para
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Aderência de Pesquisadores da Área
6,1 anos médios de escolaridade em 2009” (2012, p.279). Entre os indivíduos na faixa de 20
anos, no mesmo período, a média saiu de 7,1 anos de estudo para 9,5 – o que revela um
significativo avanço, entretanto muito aquém do desejável que é de 11 anos para essa faixa
etária. Ajustando a lente para o quesito qualidade, os dados igualmente não são confortáveis:
no PISA1 2009 o Brasil obteve a 53ª posição em meio a 65 países participantes, ficando atrás
de México e Chile na América Latina. Apesar de todos os questionamentos que possam surgir
Brasil nessa avaliação é fundamental para que se possa aprimorar a qualidade da sua
estes, inexoravelmente, passam por valores e cultura (SILVA, 1986; FREIRE, 1996),
concepção de currículo (SILVA, 2007; SACRISTÁN, 2000), reflexão crítica sobre a escola e
DEAQUINO, 2007) e prática docente no ensino superior (MASETTO, 1998, 2003; GIL,
formal.
Três eixos podem ser destacados desse conjunto de elementos para uma análise mais
Nenhuma leitura da realidade (ou mesmo, de projeção de cenários) pode ser dissociada de
inclusive na educação.
concretude: o primeiro pelo registro e o segundo pelo testemunho. Não que se restrinjam a
isso, mas por conta disso são mais facilmente reconhecidos. Uma vez evidenciada a
importância desses eixos temáticos, em que medida a área de Administração tem se mostrado
envolvida nessa discussão? Nos limites do presente artigo, portanto, os referidos eixos foram
objetivo final de verificar (pela incidência) o quão aderentes ao tema têm se mostrado as
discussão da realidade brasileira no tocante aos eixos, mas apresentar subsídios para reflexão
sobre a mesma.
proposições das autoras provocam o que há de mais produtivo na prática docente: uma sincera
autoavaliação para responder em que medida as suas práticas têm atendido à diversidade tão
Metodologia
Este trabalho foi realizado em três etapas. A primeira foi à revisão da bibliografia sobre a
Na segunda etapa realizou-se um estudo exploratório que teve como crivo a incidência
dos temas currículo, estratégias e técnicas de ensino, que foram as palavras-chave, nas
Currículo e Estratégias de Ensinagem em Administração: Reflexões sobre o grau de 89
publicações da área. Na primeira fase do estudo exploratório foi verificada a incidência dessas
palavras-chave nos eventos da ANPAD (EnANPAD, EnEO, EnGPR, EnEPQ). Essa opção
pela ANPAD foi pelo reconhecimento que a academia na área administração tem nestes
fóruns. Para ampliação da pesquisa estabeleceu-se como critério usar o ranking do guia do
universidades em administração da cidade de São Paulo, que foram: FEA/USP, FGV- São
revista RAE e na revista da ESPM. As publicações foram pesquisadas nos sites das
discutida a seguir.
A última etapa consistiu uma análise qualitativa das publicações e, na sequência, foram
A incidência maior das três palavras-chave foi encontrada nos eventos da ANPAD, sendo
um número altamente significante para a palavra currículo. A seguir encontrou-se uma maior
incidência nas publicações da Rausp/Rege com um número igual para as palavras currículo e
Estratégia de ensino. Não foi localizada nenhuma publicação na FGV e na ESPM que
Em 2002 foram encontrados dois artigos nos quais foram analisados os temas de
IES brasileira. Os autores concluíram que a evolução e a reinterpretação das ideias levaram ao
início da formação de um novo imaginário, em torno das novas propostas curriculares, que
caminha para a ideia de um real mais dinâmico, aberto ao mercado e menos ligado às
de Administração de uma universidade estadual entre 1980 e 2004 foram percebidas pelos
conclusão apresentada foi que alunos dos cursos de graduação em Administração de Empresas
perspectiva dos alunos. Foi desenvolvido estudo de campo, com dados coletados junto a 124
avaliados por meio de análise descritiva e das técnicas análise de regressão e análise de
cluster. Os principais resultados foram: (1) os estudantes, em geral, são avessos à disciplina;
necessidade da disciplina; (3) nos grupos delineados na análise de cluster, três no total, foi
observado que aproximadamente três em cada cinco estudantes são críticos da disciplina de
O ultimo artigo encontrado com a busca da palavra currículo foi um estudo realizado
objetivo deste estudo foi avaliar em que medida as ementas dos cursos brasileiros de
gestor que pretende assumir designações internacionais. Para isso, foi selecionada uma
pelo Ministério da Educação e Cultura. Foi utilizada a análise de conteúdo clássica, com base
nas ementas desses cursos, desenvolvida a partir da definição de parâmetros que tiveram
exterior.
Foram avaliadas 1.324 ementas, sendo que em 622 (46,97% do corpus) foi possível
identificar algum tipo de aderência às competências propostas neste estudo. Também foram
observou-se que cerca da metade dos cursos avaliados possuem indicativos de que as
competências estariam sendo desenvolvidas junto aos discentes. Em resumo, destaca-se que
correlação de fatos com importância para a empresa, negócios internacionais (que não chega a
ser competência, mas merece importância e destaque aqui) e capacidade para tratar com
culturas diversas. Destaca-se que, embora essa última tenha relação direta com o trabalho de
outras, o que indica espaço para que alguns conteúdos possam ser repensados. Os autores
contexto internacional.
Para a palavra técnica de ensino localizou-se um artigo, publicado em 2011, com o titulo: A
estudantes de cursos superiores de ciências sociais. O artigo analisou a difusão das estratégias
características sociodemográficas abordadas, estava o gênero, idade, estado civil, renda, tipo
de instituição, turno, período, horas de estágio, horas de trabalho, horas de iniciação científica,
Foram analisadas 21 técnicas de ensino: aulas expositivas, estudos de caso, leituras antes
uso exclusivo do quadro. Dessas técnicas, as preferidas pelos alunos foram os estudos de
caso, aulas expositivas, aulas baseadas na solução de problemas, discussões em sala, visitas a
uso exclusivo de quadro, leituras durante as aulas, aulas com retroprojetor, seminários
mostram a existência de correlação negativa entre a idade dos alunos e sua preferência por
aluno se encontra e sua preferência por jogos e dinâmicas; correlação negativa entre as horas
de estágio e a preferência por leituras prévia; e correlação positiva entre as horas de estudo em
casa e as preferências por leitura prévia e uso exclusivo de quadro. As variáveis renda per
capita e horas de trabalho por semana não apresentaram correlação com nenhum dos fatores.
Testes de diferenças de médias mostram que a preferência pelas técnicas de ensino não variam
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Aderência de Pesquisadores da Área
de acordo com o gênero dos discentes. Em contrapartida, a preferência pelas técnicas variou
de acordo com o tipo de instituição (privada ou pública) e com o turno em que o discente
estuda (manhã ou noite). Os resultados obtidos indicam que, a partir da análise dos aspectos
sociodemográficos dos discentes, os docentes podem lançar mão de técnicas que têm maior
Havard , publicado em 1993, e outro com o titulo: O caso como estratégia de ensino na área
O artigo sobre a estratégia de ensino Havard Business tinha como objetivo levantar o
Administração como dos diversos programas para a educação de executivos. Concluíram que
O caso como estratégia de ensino na área de Administração teve como principal objetivo
feita uma pesquisa bibliográfica que focou especialmente o caso como método de ensino na
sobre o tema, subsidiando análises comparativas de ideias preconizadas por diversos autores.
O último artigo sobre estratégias de ensino foi publicado em 2012. Este artigo analisou a
transpostos do campo empresarial para o ensino, por meio de quatro estratégias de ensino:
Currículo e Estratégias de Ensinagem em Administração: Reflexões sobre o grau de 95
estudo foi realizado com docentes do curso de Administração que ministram disciplinas de
estratégias de ensino em ação e apontam barreiras que limitam o uso de tais estratégias no
ensino.
Considerações Finais
publicações alusivas aos eixos selecionados – currículo e estratégias de ensino – para verificar
o grau que estes temas estão presentes nas reflexões e discussões dos pesquisadores da área de
Administração.
Constatou-se, pela pesquisa, que estes temas estão sendo pouco abordados, o que pode
indicar baixa preocupação na análise da eficiência educacional brasileira. Como síntese dos
sobre o tratamento da ética mostrou uma preocupação generalizada das instituições pela
adequação do currículo as atividades profissionais A conclusão apresentada foi que alunos dos
prática empresarial.
O artigo mais recente sobre a temática currículo foi publicado em 2011 e teve como
contexto internacional.
docentes no entendimento de quais delas gozam de maior aceitação. O estudo apontou que os
As menos apreciadas foram aulas com uso exclusivo de quadro, leituras durante as aulas,
Ressalta-se que a grande maioria dos trabalhos encontrados sobre a temática de estratégias de
ensino é relativa ao uso do caso na prática educativa. O primeiro artigo teve como principal
O último artigo sobre estratégias de ensino foi publicado em 2012. Este artigo analisou a
difusão das estratégias de ensino como método de casos, aprendizagem baseada em problemas,
difusão das estratégias de ensino em ação e apontam barreiras que limitam o uso de tais
isto é, na qualificação dos docentes para a utilização das estratégias de ensino como método
essa necessidade de qualificação uma vez que em outro trabalho as técnicas de ensino que tem
maior aceitação dos alunos foram: estudos de caso, aulas expositivas, aulas baseadas na
Currículo e Estratégias de Ensinagem em Administração: Reflexões sobre o grau de 97
realidade brasileira no tocante aos eixos dos valores e da cultura, concepção de currículo e
Conclui-se, por fim, dada a baixa incidência de trabalhos publicados nos principais fóruns da
discussões e reflexões sobre o tema não apresenta consistência capaz de converter a sensação
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