Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
Carlos Alberto Caó incluiu o racismo entre os crimes inafiançáveis quando foi deputado
constituinte.Reprodução TV Brasil
No próprio discurso, no dia de aprovação da emenda, por 521 votos a favor e três
contrários, em 2 de fevereiro de 1888, Caó convocou parlamentares a construir uma
democracia em que a população negra estivesse representada, depois de três séculos de
escravidão.
Ela ainda dividiu atuação com ele em outros momentos históricos, como a defesa dos
direitos da população quilombola, e também do rompimento das relações entre Brasil e
África do Sul, na época em que vigorava o apartheid (regime que separava brancos e
negros) e Nelson Mandela estava preso.
Muito antes de propor a emenda na Constituinte e a lei que recebeu seu nome, Caó foi
influenciado pelas discussões sobre a questão racial dentro de sindicatos e partidos
políticos, lembra a pesquisadora Elisa Larkin, diretora do Instituto de Pesquisas e
Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro). “Antes, a esquerda, em sua grande maioria,
inclusive, os sindicatos, afirmavam que a questão não era racial, era social, econômica,
de classe, e que esse debate dividia a classe operária”.
Antes de chegar ao Congresso Nacional, Caó teve uma carreia brilhante pelos mais
prestigiados jornais da época, chegando ao cargo de editor de economia do Jornal do
Brasil. “Lembro-me dele também como um dos primeiros jornalistas negros na
televisão brasileira, na época, na TV Tupi, como comentarista de economia,
conceituadíssimo”, recordou Nery.
Nessa época, entre 1970 e 1980, assumiu ainda a presidência do Sindicato dos
Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, por duas vezes, para onde
levou o debate sobre a discriminação no mercado de trabalho, tema discutido até hoje
pela entidade. Paralelamente, participou das articulações que deram origem à Central
Única dos Trabalhadores (CUT). Caó foi ativista desde jovem e, ainda na Bahia, chegou
a assumir a vice-presidência da União Nacional dos Estudantes (UNE), antes de
combater a ditadura e ser perseguido.
Desde a Lei Caó, apesar de entraves, o país tem avançado para punir a injúria racial e
acabar com o racismo institucional, acrescentou o advogado Humberto Adami,
presidente da Comissão da Verdade da Escravidão Negra, da Ordem dos Advogados do
Brasil e ex-ouvidor da Secretaria Nacional de Políticas de Igualdade Racial. Um
exemplo, citou, é o Estatuto da Igualdade Racial, de 2010, do senador Paulo Paim (PT),
também ex-deputado constituinte.
As causas da morte de Caó não foram divulgadas e a família optou por uma cerimônia
de despedida discreta, sem informar local e horário do velório e do enterro ocorridos
hoje (5).
Brasília – Foi criada há exatos 25 anos a Lei 7.716, que define os crimes resultantes de
preconceito racial. A legislação determina a pena de reclusão a quem tenha cometidos
atos de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional. Com a sanção, a lei regulamentou o trecho da Constituição Federal que torna
inafiançável e imprescritível o crime de racismo, após dizer que todos são iguais sem
discriminação de qualquer natureza.
Leia mais:
A lei ficou conhecida como Caó em homenagem ao seu autor, o deputado Carlos
Alberto de Oliveira. A partir de 5 de janeiro de 1989, quem impedir o acesso de pessoas
devidamente habilitadas para cargos no serviço público ou recusar a contratar
trabalhadores em empresas privadas por discriminação deve ficar preso de dois a cinco
anos.
De 1989 para cá, outras legislações importantes na luta contra o preconceito racial
foram criadas, como o Estatuto da Igualdade Racial (2010) –, e a Lei de Cotas (2012),
que determina que o número de negros e indígenas de instituições de ensino seja
proporcional ao do estado onde a universidade esta instalada. “Essas são ações muito
importantes de reparação. Tem alguns fatores que a gente ainda precisa quebrar para
que o negro tenha direitos e oportunidades reais”, acredita Biko.
Para denunciar o crime de racismo ou injúria racial, o cidadão ainda não tem à
disposição um telefone em todo o Brasil. Mas unidades da Federação têm criado os seus
próprios, como o Distrito Federal (156, opção 7) e Rio de Janeiro (21-3399-1300).
Segundo Biko, é importante saber quem é de onde são as pessoas que cometem tal
crime. “Sem dúvida, quando mais espaço de denúncia a gente tiver, mais reforça a luta
conta a esse processo de segregação racial que a gente ainda vive nesse país”, avalia.