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PRODUÇÃO DE SENTIDOS NO

JORNALISMO DE REVISTA:
UMA REFLEXÃO SOBRE AS
POSSIBILIDADES DE ANÁLISE
PRODUCTION OF MEANINGS IN MAGAZINE JOURNALISM: A
REFLECTION ON THE POSSIBILITIES OF ANALYSIS
PRODUCCIÓN DE SENTIDOS EN EL PERIODISMO DE REVISTAS: UNA
REFLEXIÓN SOBRE LAS POSIBILIDADES DE ANÁLISIS

Rafael Rangel Winch


Doutorando em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Membro dos grupos de pesquisa Crítica de Mídia e Práticas Culturais (USP/CNPq) e
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TRANSVERSO - Estudos em Jornalismo, Interesse Público e Crítica (UFSC/CNPq). Bolsista
FAPESC/CAPES.
E-mail: rangelrafael16@hotmail.com

Daiane Bertasso
Docente na Graduação e na Pós-Graduação em Jornalismo da Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC). Doutora em Comunicação e Informação pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Pesquisadora nos grupos de pesquisa
Jornalismo, Cultura e Sociedade (UFSC/CNPq) e TRANSVERSO: estudos em jornalismo,
interesse público e crítica (UFSC/CNPq).
E-mail: daianebertasso@gmail.com
RESUMO
O artigo reflete sobre como a produção de sentidos no jornalismo de revista pode ser analisada
com base no aporte teórico-metodológico da Análise de discurso de linha francesa, a AD.
Para tanto, apresenta alguns dos principais conceitos e noções operatórias desta perspectiva
discursiva. Além disso, destaca aspectos que particularizam a revista como produto jornalístico,
como a segmentação e a temporalidade. A pesquisa considera que as especificidades do
jornalismo de revista precisam estar devidamente articuladas às propriedades conceituais
da AD em toda investigação que intencione compreender como se engendra o discurso das
revistas.
PALAVRAS-CHAVE: JORNALISMO DE REVISTA; ANÁLISE DE DISCURSO; PRODUÇÃO DE SENTIDOS;
METODOLOGIA.

ABSTRACT
This paper reflects on how the production of meanings in magazine journalism can be analysed
based on the theoretical-methodological contribution of the French Line Discourse Analysis
(DA) framework. For that, the study presents some of the main concepts and operative notions
of this discursive perspective. In addition, it highlights aspects that particularize the journal
as a journalistic product, such as segmentation and temporality. This research states that
the specificities of magazine journalism need to be properly articulated with the conceptual
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properties of DA in any investigation that aims to understand how magazine discourse is
engendered.
KEYWORDS: MAGAZINE JOURNALISM; DISCOURSE ANALYSIS; PRODUCTION OF MEANINGS; METHODOLOGY.

RESUMEN
El artículo refleja sobre cómo la producción de sentidos en el periodismo de revista puede
ser realizado con base en el aporte teórico-metodológico del Análisis de discurso de
línea francesa, la AD. Para ello, presenta algunos de los principales conceptos y nociones
operativas de esta perspectiva discursiva. Además, destaca aspectos que caracterizan a la
revista como producto periodístico, como la segmentación y la temporalidad. Se entiende
que las especificidades del periodismo de revista necesitan estar debidamente articuladas las
propiedades conceptuales de la AD en toda investigación que intente comprender cómo se
engendra el discurso de las revistas.
PALABRAS CLAVE: PERIODISMO DE REVISTA; ANÁLISIS DE DISCURSO; PRODUCCIÓN DE SENTIDOS;
METODOLOGÍA.
1. Introdução discurso (e objeto histórico-ideológico), com
A revista é um dos produtos jornalísticos mais materialidade linguístico-simbólica de caráter
investigados em pesquisas da Comunicação e de processual. Sempre em movimento, produzi-
outras áreas. Ao registrar, das mais diferentes do socialmente, o discurso atua não apenas na
maneiras, a atualidade e a história, esse tipo de reiteração de visões do mundo, mas também
periódico contribui para a construção de sen- na transformação deste. Na perspectiva de Mi-
tidos sobre temas, acontecimentos, indivíduos, chel Pêcheux, todo discurso é efeito de sentidos
grupos sociais e instituições. Com este artigo, entre interlocutores (PÊCHEUX, 1995). Tal
intencionamos apresentar e discutir a relevân- assertiva chama a atenção para o fato de que o
cia da Análise de discurso de linha francesa, a discurso ocorre num espaço intervalar, numa
AD, como aporte teórico-metodológico para a situação em que há a presença de sujeitos. Para
análise da produção de sentidos no jornalismo a AD, aporte teórico-metodológico situado nos
de revista. estudos de linguagem, interessa a observação e
O dispositivo teórico da Análise de discurso reflexão acerca de como um determinado dis-
congrega uma série de conceitos relevantes para curso funciona, isto é, como se constrói sentidos
uma compreensão crítica acerca de como as re- e relacionam-se sujeitos – vozes, perspectivas de
vistas engendram sentidos em suas páginas. É enunciação.
sempre partindo da teoria que o pesquisador A noção de sujeito deve ser pensada em sua
irá formular seu dispositivo analítico, atentando dimensão discursiva, visto que a AD não trata
para as demandas e características próprias do diretamente dos sujeitos como indivíduos físi-
seu tema, questão problema e objeto empírico. cos, objetivamente concretos. Pensam-se, as-
Mesmo que nosso propósito seja discutir espe- sim, em lugares discursivos, posições-sujeito,
cialmente a produção dos sentidos a partir da perspectivas de enunciação que os sujeitos fa-
AD, reconhecemos que tal perspectiva discursi- zem uso para construírem sentidos. Todo indi-
36 va possui outros tipos de abordagens possíveis, víduo torna-se sujeito ao ser interpelado pela
como a análise dos sujeitos, do silenciamento e ideologia, ao adentrar um processo discursivo
da estruturação do discurso (BENETTI, 2016). e se posicionar à uma determinada perspecti-
Num primeiro momento do estudo, apresen- va ideológica, ou seja, ao ser interpelado pelo
tamos conceitos e noções basilares da Análise de assujeitamento (ORLANDI, 1999). O sujeito
discurso, enfatizando sua concepção complexa discursivo é constituído, também, a partir de
da linguagem. Em seguida, descrevemos e discu- uma ou mais formação imaginária, conceito
timos as peculiaridades do jornalismo de revista, importante na AD que se refere ao lugar deter-
destacando elementos como a segmentação, a minado na estrutura de uma formação social e
temporalidade, dentre outros. Após isso, aborda- que também é revelador da formação discur-
mos e exemplificamos possibilidades no uso da siva a partir da qual esse sujeito ancora o seu
AD em pesquisas que buscam compreender a pro- discurso. Desse modo, ao enunciar e interpre-
dução de sentidos realizada pelas revistas. Por fim, tar, o sujeito acaba por se posicionar partin-
tecemos breves considerações acerca do trabalho. do da representação imaginária que possui do
receptor (seu interlocutor) e, a partir dela, es-
2. Análise de discurso como aporte tabelece suas estratégias discursivas, tendo seu
teórico-metodológico dizer necessariamente inscrito no imaginário,
O discurso é objeto teórico da Análise de na cultura e na história.
Os sujeitos, ao enunciarem seus discursos, O discurso se manifesta nas mais distintas
procuram construir uma imagem de si e tam- materialidades. Todavia, não se deve confundi-
bém uma imagem do outro, relação que é defini- -lo com o material de caráter empírico, tais
da por Michel Pêcheux (1990) como se referin- como um texto. Embora os sentidos possam ser
do ao conceito de “formações imaginárias”: em localizados em variados conjuntos significantes
que A questiona sobre a imagem de si mesmo (como uma reportagem de revista, por exem-
(“quem sou eu para lhe falar assim?”) e de seu plo), é necessário reconhecer que sua constitui-
interlocutor B (“quem é ele para que eu lhe fale ção é anterior e exterior à textualidade observa-
assim?”); de modo recíproco, B faz uma imagem da. Incorpora-se a este entendimento o concei-
do emissor A (“quem é ele para que me fale as- to de formação discursiva (FD), que podemos
sim?”) e de si mesmo (“quem sou eu para que ele apreender como tudo aquilo que pode e deve ser
me fale assim?”). Assim, os discursos produzem dito a partir de uma dada posição, conjuntura
sentidos ao serem enunciados por sujeitos que e contexto (PÊCHEUX, 1995). Cada FD reúne
ocupam determinadas posições. Estas dizem uma região de sentidos moderadamente delimi-
respeito às relações imaginárias estabelecidas tada, estando também vinculada a uma forma-
pela posição que cada sujeito ocupa na produ- ção ideológica (FI), camada do discurso ainda
ção discursiva. Isso significa que pensar a noção mais ampla que abriga um conjunto complexo
de sujeito em sua dimensão discursiva requer de atitudes e representações sociais.
considerar e refletir a respeito da formação so- O conceito de formação discursiva tem uma du-
cial, da formação imaginária e da formação dis- pla origem (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU,
cursiva1 que o constitui enquanto sujeito. 2008)2 e deve ser compreendido no âmbito da he-
De acordo com Orlandi (2005), a construção terogeneidade constitutiva dos discursos. Por isso,
de sentidos não pode ser vista como uma mera não é possível pensar essa noção como um lugar
transmissão de informação. A autora nos lem- totalmente ocluso e estável. Ao contrário, toda FD
bra que, pela lógica da AD, não há linearidade tem margens para a entrada de outros sentidos 37
na relação entre os dizeres de um sujeito enun- possíveis, sendo, portanto, instáveis e heterogêne-
ciador para um sujeito receptor, uma vez que as. Essa questão se relaciona à ideia de alteridade,
“eles estão realizando ao mesmo tempo o pro- a presença de “discursos outros” num determina-
cesso de significação e não estão separados de do dizer. Agrega-se aí outra noção fundamental
forma estanque” (ORLANDI, 2005, p. 21). Logo, na AD: o interdiscurso, reconhecido como aqui-
não se trata de produção de “mensagens” e sim lo que atravessa qualquer discurso por conta da
de discursos, relações de sentidos e sujeitos que historicidade dos processos discursivos. Também
ocorrem tanto no espaço da enunciação quanto chamado de memória discursiva, o interdiscurso
da interpretação. Por isso, a escrita, a fala, a lei- caracteriza-se como o conjunto de formulações já
tura e várias outras formas de expressão comu- realizadas – mas que foram esquecidas –, funcio-
nicativas são processos de construção discursi- nando como uma exterioridade constitutiva dos
va, portanto, de produção de sentidos. dizeres, como o lugar do outro.
Para Maingueneau (2007, p. 20), “o interdis-
1 A formação social diz respeito ao espaço a partir do qual se podem
prever os efeitos de sentido a serem produzidos, já que os sujeitos curso tem precedência sobre o discurso”. O au-
ocupam posições em uma dada formação social que condicionam as
condições de produção discursivas, definindo o lugar por eles ocu- 2 Essa noção aparece num mesmo período histórico em textos de
pado no discurso. Já os conceitos de formação discursiva e formação Michel Foucault e Michel Pêcheux. Este segundo autor acabou por
ideológica estão detalhados mais adiante. articular o conceito ao materialismo histórico.
tor propõe a hipótese do “primado do interdis- Os sentidos são sempre resultado de condi-
curso”, argumentando que a unidade de análise ções de produção do discurso. Tais condições
pertinente não é o discurso, mas um espaço de concernem fundamentalmente aos sujeitos e às
trocas entre vários discursos, conforme convém situações de construção dos dizeres. As condi-
ao analista. O interdiscurso age, então, como ções de produção fazem parte da exterioridade
um mecanismo que reconfigura as formações linguística e podemos pensar essa noção a par-
discursivas, fazendo com que o saber destas in- tir de dois planos. No primeiro deles, há as cir-
corpore elementos pré-construídos produzidos cunstâncias da enunciação, ou seja, o contexto
no exterior de si. Logo, tendo em vista o con- imediato. Já numa dimensão mais ampla, temos
tato com o interdiscurso, toda FD não somente o contexto social, histórico e ideológico. Essas
pode produzir sua redefinição e organizar sua condições que permitem que os sentidos exis-
repetição, como também, eventualmente, pode tam, repitam e se transformem estão vinculadas
provocar seu esquecimento, seu apagamento e a dois tipos de relações: de sentidos e de forças.
até mesmo sua negação (COURTINE, 2009). O primeiro tipo evidencia que todo discurso se
A relação entre interdiscurso e formação dis- relaciona necessariamente com outros, tantos os
cursiva é abordada por Maingueneau (2007) já enunciados no passado quanto os que ainda
por meio da tríade: universo, campo e espaço serão construídos. O segundo, por sua vez, mos-
discursivo. Para o autor, o universo discursivo tra que o lugar do qual o sujeito fala constitui o
é formado pelo conjunto de formações discur- que ele diz (ORLANDI, 2005).
sivas que coexistem numa determinada con- A perspectiva da AD é pertinente para pes-
juntura; já o campo discursivo representa um quisas que almejam compreender como um
grupo de formações discursivas que se encon- discurso funciona. Seguindo sua dimensão con-
tram em relação de concorrência – que abriga ceitual e metodológica, pode-se problematizar
tanto alianças como confrontos –, delimitando- como um determinado conjunto de dizeres –
38 -se reciprocamente em determinada região do estes pensados não apenas em suas dimensões
universo discursivo; e o espaço discursivo é um verbais – constrói e atualiza sentidos sobre um
subconjunto do campo discursivo. Este espaço é tema, um grupo social, um acontecimento, um
definido pelo analista do discurso com base em indivíduo ou uma instituição, por exemplo. Evi-
seus propósitos de pesquisa. dentemente, existe uma série de outros concei-
As formações discursivas são, ainda, espaços tos relevantes que não foram abordados aqui
de sentidos atrelados à ordem do mesmo e, tam- por motivo de espaço. Como vimos, um dos
bém, do diferente. É o que Orlandi (2005) reco- conceitos principais dessa corrente teórica é o
nhece como tensão permanente da linguagem: de condições de produção do discurso. Pensan-
as relações parafrásticas e polissêmicas. Por um do nisso, a seguir, apresentamos e discutimos
lado, a paráfrase diz respeito à repetição, estabi- elementos que constituem as condições de pro-
lização, retomada dos sentidos. Ela representa, dução discursiva no jornalismo de revista, do-
assim, o retorno aos mesmos espaços do dizer, mínio do presente artigo.
produzindo diferentes formulações do mesmo
dizer segmentado. Por outro, a polissemia está 3. Condições de produção do discurso no
associada ao deslizamento, deslocamento, a am- jornalismo de revista
biguidade, ao equívoco e da ruptura dos proces- Pesquisas de cunho histórico e comunicacio-
sos de significação. nal reconhecem que a revista existe em solo bra-
sileiro há mais de duzentos anos. As primeiras análise, reflexão, concentração e experiência de
revistas brasileiras surgiram aos poucos, logo leitura”.
após a liberação do uso da imprensa com a che- Ao também discorrer sobre a temporalidade
gada da família real portuguesa, em 1808. Os no jornalismo de revista, Benetti (2013) acres-
primeiros periódicos produzidos nem sempre centa que nesse tipo de periódico a noção de
possuíam fronteiras bem demarcadas em rela- presente acaba por ser estendida. Logo, nas
ção aos jornais da época, mas já resguardam, revistas, atual é sinônimo de contemporâneo e
desde então, certas especificidades. Pode-se di- não de novo, como ocorrem nos jornais, estes
zer que tematicamente, por muito tempo, a di- historicamente mais voltados para a cobertu-
visão de trabalho entre jornais e revistas era ar- ra imediata dos acontecimentos. Além do ele-
ticulada com base num acordo tácito em que os mento da temporalidade, Vogel (2013) destaca
jornais se preocupavam de maneira prioritária outros aspectos que particularizam as revistas
com o relato político e do cotidiano, e as revis- como veículos jornalísticos, tais como: a for-
tas, por sua vez, com a contribuição literária e o mulação das pautas, o tempo de apuração, o
relato cultural (CASADEI, 2013). tratamento da linguagem e o desenho das pági-
As bases para a configuração da revista e sua nas. As condições de produção do discurso das
diferenciação diante dos jornais ganham mais revistas são, assim, marcadas por um ritmo de
força no início do XX. Num contexto marcado produção e circulação específico, aspecto forte-
pela massificação da informação e frente aos mente influenciado pela própria segmentação
outros produtos midiáticos que reportam a re- desse modo de jornalismo.
alidade, o papel comunicativo da revista e a sua No mercado jornalístico de revistas, as publi-
particularidade jornalística conquistaram seu cações são criadas e, muitas vezes, transforma-
próprio espaço (TAVARES, 2011). Desde tal das para atingir determinados públicos. A partir
período, o produto revista se distingue de seu da segmentação jornalística, os veículos mobi-
parente mais próximo, o jornal, por um con- lizam interesses específicos (ciência, economia, 39
junto de elementos, dentre eles, a temporali- política, moda, meio ambiente, saúde, celebri-
dade, mais alargada e flexível que os impressos dades, esporte, infância, artes, entre outros),
diários. de acordo com uma determinada comunidade
A temporalidade das revistas é expandida, de leitores, o público-alvo. Orientadas pela no-
diversificada e heterogênea. Na esteira de suas ção de segmentação, as revistas são produzidas
lógicas e processos próprios, essas publicações conforme regras e lógicas próprias, o que inclui
organizam, a cada edição, um tempo mais dila- dimensões editoriais, organizacionais, políticas,
tado que o dos jornais e, “com isso, desmontam econômicas e culturais. O processo de segmen-
e remontam os noticiários, as atualidades, as vi- tação de uma revista pode ter relação com um
vências” (VOGEL, 2013, p. 16). A existência e tipo de recorte de público (sexo, idade e classe
propósito da revista, portanto, não se limitam econômica) e temática e tem como efeito prin-
à condição de apresentar informações sobre cipal coberturas e abordagens singulares, isto
os fatos atuais, uma vez que seu compromisso é, formas específicas de apresentar os aconteci-
informativo é complementado com outras atri- mentos, temas e personagens.
buições. Para Scalzo (2008, p. 13), as revistas Em correlação a isso, Storch (2012) indica que
exercem funções “mais complexas que a sim- o pesquisador deverá observar três dimensões
ples transmissão de notícias; entretêm, trazem para a análise do leitor imaginado nas revistas:
(a) a dimensão institucional (índices de seg- a intuição profissional, a demanda dos leitores e
mentação, a publicidade de si e os materiais pro- a ocorrência recente de um acontecimento re-
mocionais); (b) a dimensão publicitária (tipos levante. Há também encontros para discutir a
de produtos e os índices verbais e não-verbais dimensão estética das revistas. Neles são debati-
sobre o leitor presentes nas peças publicitárias); dos a arte de cada página, os lugares, as cores, as
(c) e a dimensão editorial (conteúdo jornalís- fontes, os tamanhos e tipos de fotografias, info-
tico, a visualidade e as manifestações do leitor gráficos, boxes e outros recursos que constituem
explícito). A autora contribui também para pen- as publicações.
sar sobre o modo como as revistas apresentam
a imagem de si (como veremos mais adiante), 3.1 A construção do discurso da ‘imagem
pois convém considerarmos que as revistas de si’ nas revistas
constroem a sua imagem também a partir da Por serem produtos que necessitam cativar
imagem que elas concebem do leitor. constantemente uma determinada audiência, as
A produção de conteúdo de uma revista não revistas não constroem seus materiais somente
se orienta essencialmente por referentes fac- a partir de uma matriz racional, de caráter es-
tuais, como é o caso dos jornais. Por consequ- tritamente informativo. Ao contrário, as publi-
ência da segmentação, que poderá ser mais ou cações procuram estabelecer uma relação dire-
menos evidente, os periódicos tendem a fazer ta e emocional com o sujeito leitor (BENETTI,
uso de abordagens mais interpretativas, refle- 2013), muitas vezes, realizando abordagens in-
xivas e analíticas e que, de alguma maneira, timistas e interpelativas, movimentos que bus-
conservem certo grau de aderência e coerência cam aproximação afetiva com seu público. No
com seus projetos e perfis editoriais. A revista arranjo de dizeres que constroem, as revistas
deve ser pensada, ainda, nas suas conformações não apenas oferecem informações, dados e de-
empresariais, uma vez que sua evolução como talhes diversos, mas também provocam sensa-
40 meio de comunicação tem relação com o avanço ções capazes de manter o leitor interessado pelo
das indústrias culturais. Como explica Tavares que está consumindo. A produção discursiva no
(2011, p. 117), “a revista produz e incorpora um jornalismo de revista tem, desse modo, relação
tipo de jornalismo e, nas processualidades que direta com as expectativas dos sujeitos leitores.
acompanham tal característica, não foge ao fato Marcadas pela especialização, tais publicações
de ser um negócio”. Sendo, assim, um produto a costuram, ao longo de suas edições, caracterís-
ser consumido, toda publicação traz consigo e ticas próprias que acionam sentidos não apenas
faz circular uma série de ideologias, imaginários sobre temas e fatos variados, mas também acer-
e comportamentos. ca de sua identidade, por meio da construção de
Como explica Araújo (2013), o processo pro- uma ‘imagem de si’ – ethos discursivo (MAIN-
dutivo inicia-se na reunião de pauta, que geral- GUENEAU, 2008a, 2008b) – através do modo
mente ocorre logo após o fechamento de uma como enunciam seus discursos.
edição. É comum que ocorram várias reuniões Apesar de cada periódico possuir relação
separadas por cadernos, áreas específicas. Numa com outros títulos, seja pela concorrência ou
reunião de pauta não se discute apenas o que parentesco editorial, toda revista mantém uma
será feito, mas como será a produção de cada identidade própria, um propósito e modo de
conteúdo. Os assuntos abordados em cada edi- ser particular. Para garantirem destaque nas
ção surgem de uma conjunção de fatores, como bancas e entre os assinantes, as publicações
valoram positivamente seus perfis, missões e tar conceitos e procedimentos possíveis para a
contribuições para a vida de sua audiência. As análise da produção de sentidos no jornalismo
revistas se posicionam como veículos autoriza- de revista. Ressaltamos a inexistência de um ca-
dos, capacitados e competentes para falar sobre minho padrão recomendável para investigar a
a realidade social a partir de qualidades parti- construção de sentidos nas revistas. Apresenta-
culares. Esse discurso da imagem de si integra a mos, então, apenas possibilidades de utilização
formação do ethos jornalístico das publicações, de alguns conceitos e noções operatórias da AD
que necessitam, a cada edição, se mostrar atu- que podem ser pertinentes na formulação da
ais, relevantes e necessárias para sua comunida- análise.
de de leitores. A construção de sentidos sobre O primeiro passo, comum a qualquer traba-
si é prática comum no jornalismo, ganhando lho, é a escolha do âmbito temático e do objeto
contornos e lógicas específicas quando se trata de estudo (relativo ao problema de pesquisa).
do produto revista. Em seguida, deverão ser feitos questionamen-
No caso do jornalismo de revista, a identida- tos acerca de como os sentidos sobre um tema,
de se constrói de maneira institucional. Como acontecimento, indivíduo, grupo social ou
lembram Benetti e Hagen (2010, p. 126), a voz instituição são construídos, articulados, reite-
jornalística é, antes de qualquer coisa, uma voz rados e atualizados pelo jornalismo de revis-
institucional. Assim, os periódicos costumam se ta. Se a pesquisa optar por trazer mais de um
apresentar como veículos que defendem valores objeto empírico – duas revistas semanais de
nobres, tais como a verdade, a independência, variedades, por exemplo –, é fundamental que
o profissionalismo, a democracia, a liberdade, a as particularidades de cada publicação sejam
ética, entre outros. Quanto mais segmentada for devidamente rastreadas, descritas e discutidas.
uma publicação, mais ela evidenciará seus atri- Uma investigação que tenha o propósito de
butos peculiares como produto e meio de comu- compreender a construção de sentidos sobre
nicação. Com ênfase na perspectiva editorial das o tema do meio ambiente em diferentes peri- 41
revistas semanais de informação, a pesquisa de ódicos deverá, assim, considerar as condições
Bertasso (2014) mostra que estas revistas cons- de produção do discurso em suas dimensões
troem sentidos sobre si mesmas que reafirmam estritas e amplas (ORLANDI, 2005). Como já
dois compromissos principais com os leitores: dito anteriormente, compõem tais condições
narrar a realidade e autenticá-la (‘sei, porque es- elementos de ordem editorial, gráfica, estética,
tava lá’) e tratar de modo criativo e adequado organizacional, institucional, além de aspectos
(‘sei expressar diversos temas’) a ampla gama de da conjuntura histórico-social em que as publi-
assuntos que, conforme a representação que elas cações se inscrevem.
têm referente às expectativas dos leitores, deve Ainda na seleção do (s) objeto empírico (s),
fazer parte de uma revista semanal. poderão ser mobilizados as noções de univer-
so, campo e espaço discursivo de Mainguene-
4. Articulações entre discurso e revista na au (2007). Neste caso, se um estudo intencione
análise da produção de sentidos entender como as revistas femininas constro-
O jornalismo de revista pode ser investigado em sentidos sobre a moda, o espaço discursivo
de diversas maneiras a partir dos contributos será constituído pelo conteúdo efetivamente
teórico-metodológicos da AD. Como já pon- analisado, podendo ser toda a revista ou peças
tuamos, interessa-nos, neste artigo, apresen- jornalísticas específicas como, por exemplo, as
reportagens de capa. O campo discursivo, por cursivas, regiões do discurso que condicionam a
sua vez, abrigará os discursos da instituição jor- produção de dizeres a partir de um dado lugar,
nalística sobre o tema, isto é, como o jornalis- posição e conjuntura (PÊCHEUX, 1995). Cir-
mo, de modo geral, costuma tratar a questão. cunscrever as redes de paráfrases às formações
Já o universo discursivo será formado por um discursivas é um movimento de análise que evi-
amplo conjunto de discursos referentes à moda dencia, também, posições-sujeito, ou seja, pers-
que circulam historicamente na sociedade. Tais pectivas de enunciação dos dizeres.
noções são pertinentes para assinalar traços do O estudo desenvolvido por Winch (2017)
interdiscurso (discursos outros) constituidor exemplifica essa possibilidade de movimento
dos sentidos em análise. analítico. Logo após rastrear uma série de re-
O mapeamento de sentidos exige que o pes- des de paráfrases sobre a mudança climática no
quisador defina um recorte temporal e corpus discurso da revista Superinteressante, o autor
de pesquisa representativos do discurso que se relaciona tais conjuntos de dizeres a formações
propõe analisar. Essas definições devem resultar discursivas concernentes ao tema. Neste caso, o
numa quantidade de material plausível para ser reconhecimento e discussão das FDs permitiu
investigado e que contemple o funcionamento relacionar os sentidos ofertados pela publica-
ordinário do discurso em análise. Na etapa ini- ção com determinados discursos que circulam
cial da identificação dos sentidos, um conceito socialmente e associam-se às diferentes – mas
oportuno é o de paráfrase, que sinaliza a repeti- nem sempre excludentes – matrizes ideológicas.
ção de dizeres (logo, de sentidos também) e re- Esse gesto também destacou marcas do interdis-
torno aos mesmos espaços de enunciação (OR- curso (discursos outros) constituinte dos senti-
LANDI, 2005). Ao buscar compreender a arti- dos reiterados pela publicação em questão.
culação que se dá entre simplicidade e consumo Como ressaltamos em nossa síntese teórica,
no discurso da revista Vida Simples, Reginatto toda formação discursiva mantém relação com
42 (2011) localizou processos parafrásticos que si- uma anterioridade e exterioridade constituti-
nalizam como a publicação reitera sentidos re- va dos dizeres, uma formação ideológica. Logo,
lacionados a questões como qualidade de vida, após o pesquisador reconhecer cada FD, a análise
bem-estar, sustentabilidade e consumismo. Em pode prosseguir com a demarcação deste espec-
toda pesquisa que utilize o conceito de paráfra- tro discursivo mais amplo. É o caso da pesquisa
se, a noção de polissemia aparecerá de maneira de Furtado (2013), que objetivou compreender
subjacente, sobretudo, quando o analista do dis- como o discurso jornalístico da revista Recreio
curso perceber e discutir os deslizamentos, des- busca acionar o desejo de consumo das crianças.
locamentos, entrecruzamentos e rupturas numa Neste caso, a pesquisa desenvolveu teoricamen-
sucessão de dizeres. te conhecimentos de áreas específicas, como da
Além do mapeamento das regularidades de infância e do consumo. Isso evidencia que o ma-
sentidos presentes num dado tipo de discurso, peamento dos sentidos não basta por si só, sendo
bem como de suas descontinuidades, as pesqui- vital, ainda, que toda investigação relacione os
sas que trabalham com o jornalismo de revista resultados desta etapa com discursos-outros de
podem fazer uso da noção de formação discur- outros campos dos saberes. Além disso, os sen-
siva (FD). Assim, além da observação de redes tidos mapeados devem ser tensionados com as
parafrásticas, o analista poderá congregar os propriedades específicas da (s) publicação (s) que
sentidos mapeados em torno de formações dis- geraram o objeto e corpus de pesquisa analisado.
Partindo de conceitos e noções operatórias compreensão crítica das construções de senti-
da AD, como paráfrase e formação discursiva, dos realizadas a partir das revistas.
é possível, também, observar e problematizar O jornalismo de revista resguarda uma série
como as revistas constroem sentidos sobre si, de especificidades que devem ser levadas em
ou seja, como funciona o discurso que valora consideração numa análise discursiva. São os
seus papéis e práticas profissionais, como já ci- aspectos particulares desse tipo de produto jor-
tado nas pesquisas de Benetti e Hagen (2010) nalístico – segmentação, temporalidade, identi-
e de Bertasso (2014). Ao analisar a imagem de dade, entre outros – que operam como condi-
si de publicações semanais informativas, por ções de existência e circulação de certos dizeres,
exemplo, poderão ser localizados regularida- ideologias e imaginários. Assim, as pesquisas
des discursivas que destaquem competências, que trazem a revista como objeto e mobilizam
habilidades e valores importantes na afirmação a AD como perspectiva conceitual e metodoló-
editorial e social dos periódicos. O analista do gica não podem menosprezar teoricamente as
discurso não pode perder de vista, todavia, que dimensões editoriais, estéticas, organizacionais,
as representações (imagem de si) construídas institucionais, históricas, socioculturais, econô-
nem sempre acabam por ser a realidade do fazer micas e políticas que conformam essa modali-
jornalístico das revistas (BENETTI; HAGEN dade singular de jornalismo.
2010). A AD requer um movimento de constante
desconstrução, construção e compreensão dos
5. Considerações finais discursos postos em análise. Por essa razão, é
Apresentamos, neste artigo, a Análise de Dis- preciso que o pesquisador reconheça a com-
curso (AD) como perspectiva teórico-meto- plexidade teórica dessa perspectiva e utilize os
dológica oportuna para a análise da produção conceitos e noções operatórias de maneira aten-
de sentidos no jornalismo de revista. Eviden- ciosa e vigilante. Sempre tramado em relações
temente, por conta do limite de espaço, não de poder, todo discurso, incluindo o construído 43
abordamos todas as possibilidades de uso dessa pelas revistas, traz consigo uma aparência pri-
perspectiva em análises sobre o funcionamento mária de transparência, único sentido possível e
dos discursos engendrados pelas publicações. dizer linear. No entanto, cabe ao analista mape-
Focalizamos, assim, conceitos basilares deste ar, descrever, problematizar e compreender os
aporte, como condições de produção do discur- sentidos diversos que são ofertados nas páginas
so, interdiscurso, paráfrase e formação discur- das publicações, considerando estas também
siva, dentre outras noções basilares para uma como produtos complexos e relacionais.
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