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- O século é uma unidade estritamente cronológica, cujo início e cujo término não
determinam forçosamente a eclosão ou a morte de movimentos artísticos, de estruturas
literárias, de idéias estéticas, etc.
- Tão inconsistente como a divisão em séculos da história literária, revela-se a fixação dos
períodos literários segundo acontecimentos políticos ou sociais: “literatura do reinado de
Luís XIV”, “literatura elisabetana” ou “vitoriana”, etc. Este enfeudamento da história literária
à história geral, política ou social – enfeudamento que já durou muitos anos e que ainda
persiste –, radical numa concepção viciada do fenômeno literário: este é entendido como
uma espécie de epifenômeno dos fatores políticos e sociais, e portanto como um elemento
carecente de autonomia e desenvolvimento próprio.
- A atitude nominalista é uma atitude cética que reduz a história literária a um acervo
assignificativo, desconhecendo um aspecto essencial da atividade literária: a existência de
estruturas genéricas que, sob múltiplos pontos de vista, possibilitam a obra individualizada.
- Paul Valéry, exprimindo este ceticismo, escreveu (Mauvaises pensées) que é impossível
pensar seriamente com vocábulos como “classicismo”, “romantismo”, “humanismo” e
“realismo”, pois que ninguém mata a sede ou se embriaga com os rótulos das garrafas.
- Parece-nos que o Prof. René Wellek encontrou o caminho justo, ao definir o período
literário como “uma seção de tempo dominada por um sistema de normas, convenções e
padrões literários, cuja introdução, difusão, diversificação, integração e desaparecimento
podem ser seguidos por nós”. Esta definição apresenta o período literário como uma
“categoria histórica” ou como uma “idéia reguladora”, excluindo quer a tendência
nominalista, quer a tendência metafísica, pois os caracteres distintivos de cada período
estão enraizados na própria realidade literária e são indissociáveis de um determinado
processo histórico.
- Na definição proposta por René Wellek, o período é definido por um “sistema de normas,
convenções e padrões literários”, isto é, por uma convergência organizada de elementos, e
não por um único elemento. O romantismo, por exemplo, é constituído por uma
constelação de traços – hipertrofia do eu, conceito de imaginação criadora, irracionalismo,
pessimismo, anseio de evasão, etc, - e não por um único traço.
- Cada um dos elementos formativos da estética romântica pode ter existido anteriormente,
isolado ou integrado noutro sistema de valores estéticos, sem que tal fato implique a
existência de romantismo nos séculos XVI ou XVII, por exemplo.
- Um período não se caracteriza por uma perfeita homogeneidade estilística, mas pela
prevalência de um determinado estilo.
- O historiador italiano Eugenio Battisti diz que “a possibilidade de reduzir tudo a poucos e
simples conceitos é um mito metodológico, somente fruto da ignorância ou da preguiça”.
- Na França, por exemplo, durante o século XVII, coexistem um estilo barroco e um estilo
clássico, com caracteres diferentes e até opostos, mas apresentando freqüentes
interferências mútuas.
- O conceito de período literário, tal como o entendemos, implica ainda outra consequência
muito importante: os períodos não se sucedem de modo rígido e linear, como se fossem
entidades discretas, blocos monolíticos justapostos, mas sucedem-se através de zonas
difusas de imbricação e de interpenetração.
- O processo de formação e desenvolvimento de um período literário é vagaroso e
complexo, subsistindo em cada período novo, em grau variável, elementos do período
anterior. No romantismo persistem elementos neoclássicos, como persistem no realismo
elementos românticos.