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O Livro Didático de Química nas Concepções de

Professores do Ensino Médio da Região Sul da Bahia

Juliana de Oliveira Maia, Luciana Passos Sá, Elisa Prestes Massena e Edson José Wartha

Questões relacionadas ao Livro Didático (LD) no Ensino de Ciências têm sido amiúde discutidas em trab-
alhos reportados na literatura. Na presente pesquisa, tivemos como objetivo especular a respeito dos critérios
de seleção e formas de utilização dos LDs adotados no ensino médio por professores de Química de escolas
estaduais das cidades de Ilhéus e Itabuna, situadas na região sul da Bahia. Os resultados deste estudo apontam
para a necessidade da formação continuada que privilegie, dentre outros aspectos, a reflexão sobre questões
importantes relacionadas à escolha e utilização do LD por professores atuantes na educação básica.

Formação de professores, Livro Didático, Ensino de Química

Recebido em 07/09/2010, aceito em 03/05/2011


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Introdução de Rodrigues e Freitas (2008), por como foco o ensino fundamental,
exemplo, apresenta a trajetória dos incluindo as classes de alfabetização
Nas últimas décadas, o Livro Di- LDs nas escolas brasileiras. De infantil. O Programa assegura ainda a
dático (LD) tem despertado bastante acordo com os autores, os LDs che- gratuidade dos livros e a participação
interesse por parte de pesquisadores garam às escolas em 1929 por meio dos professores na escolha destes.
de diferentes áreas, devido à sua do Instituto Nacional do Livro (INL), Além do PNLD, existe outro pro-
importância no processo de ensino e cuja função era julgar tais livros. Em grama do governo federal criado em
aprendizagem (García e cols., 2002; 1966, houve a criação da Comissão 2004: o Programa Nacional do Livro
Gatti Júnior, 2004; Passos, 2007). No do Livro Técnico e Livro Didático Didático para o Ensino Médio (PN-
que diz respeito a essa importância (COLTED), por meio de acordo entre LEM), que prevê a universalização de
atribuída ao LD, Lajolo e Zilberman o Ministério da Educação (MEC) e a LD para os alunos do ensino médio
(1999, p. 121) ressaltam: Agência Norte-Americana para o De- público de todo o país. A escolha dos
senvolvimento Internacional (USAID), livros é feita por meio do Guia do Livro
Pode não ser tão sedutor que tinha o objetivo de disponibili- Didático, com o qual os professores
quanto às publicações des- zar gratuitamente, num período de das escolas públicas podem sele-
tinadas à infância (livros de três anos, 51 milhões de livros aos cionar os livros de sua preferência
histórias em quadrinhos), mas estudantes. Caberia à USAID todo para serem trabalhados durante um
sua influência é inevitável, o controle sobre o referido acordo período de três anos.
sendo encontrado em todas (produção, edição, ilustração e distri- Os livros disponíveis no Guia do
as etapas da escolarização de buição dos livros), e ao MEC, apenas Livro Didático são selecionados por
um indivíduo: é cartilha quando a responsabilidade de execução. uma equipe de pareceristas, formada
alfabetização; seleta, quando Em 1971, o acordo anteriormente por docentes da educação básica,
da aprendizagem da tradição mencionado foi extinto e o INL ficou com qualificação mínima de mestra-
literária; manual quando do incumbido de gerenciar os assuntos do, e pesquisadores e professores
conhecimento das ciências ou referentes ao LD, passando a desen- universitários, com comprovada
da profissionalização adulta, na volver o Programa do Livro Didático experiência acadêmica, didática e
universidade. para o Ensino Fundamental (PLIDEF). pedagógica. O guia tem a função de
No entanto, somente a partir de 1985 orientar e nortear a escolha do LD. A
Na literatura, encontramos diver- é que foi criado o atual Programa obra selecionada passa a ser válida
sos trabalhos relacionados ao LD, Nacional do Livro Didático (PNLD), para toda a escola. Por essa razão,
com diferentes enfoques. O trabalho substituindo o PLIDEF. O PNLD tem é necessário que os professores de

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uma mesma disciplina cheguem a um uma variável no complexo processo elaboradas por especialistas. Cada
consenso a respeito da escolha do de ensino-aprendizagem. Aliado a vez mais se assume que o professor
livro a ser adotado por meio da utili- isso, existe um ponto bastante rele- é um construtivista, que processa
zação de critérios como, por exemplo, vante que é a questão das condições informação, toma decisões, gera
o contexto em que os alunos estão ideais de trabalho para o professor conhecimento prático e que possui
inseridos (Nuñez e cols., 2003). e, nesse quadro, estão inseridas as crenças e rotinas que influenciam a
Outro enfoque verificado em ferramentas utilizadas por eles em sua atividade profissional. No entanto,
trabalhos que discutem a respeito sua prática educativa. Dentre elas, o ainda se verifica uma postura conteu-
do LD é a formação inicial e conti- Livro Didático, que tem sido motivo dista e tradicional por parte de muitos
nuada de professores (Lopes, 1994; de inúmeras discussões (Mendes professores que atuam na educação
Selles, 2002; Carneiro e cols., 2005; Sobrinho e Leal, 2002; Loguercio e básica quanto a aspectos importan-
Batista e cols., 2007). Alguns desses cols., 2001; Choppin, 2004). tes como a escolha de LDs, métodos
trabalhos têm incorporado a ideia A seleção do LD constitui uma de ensino, seleção de conteúdos e
do professor-reflexivo/pesquisador, tarefa de importância vital, pois ele formas de avaliação. De acordo com
para a qual conver- é uma ferramenta De Deo e Duarte (2004, p. 4):
gem as perspectivas importante no pro-
atuais. Nesse sen- García (1999) destaca cesso educacional, Com relação à escolha do
tido, André (2007) ainda que professores uma vez que auxilia LD, não é suficiente ter um
aponta que a tare- não são técnicos que o ensino dos conte- bom material se o professor
fa do professor no executam instruções e údos programáticos, não tiver consciência da prática
dia a dia de sala de propostas elaboradas por sendo o principal e, pedagógica e das limitações
aula é extremamente especialistas. Cada vez mais muitas vezes, o único do LD. O professor deve estar
complexa, exigindo se assume que o professor material utilizado na atualizado, ser reflexivo e bem
decisões imediatas é um construtivista, que prática de profes- preparado para poder valer-se
e ações, muitas ve- processa informação, sores na educação de um livro ruim e transformá-
116 zes, imprevisíveis. toma decisões, gera básica. Além disso, lo, tornando-o uma ferramenta
Nesse particular, os conhecimento prático é importante por seu útil e eficaz em suas aulas.
cursos de formação e que possui crenças e aspecto político e Vemos professores e alunos
inicial têm um pa- rotinas que influenciam a cultural, na medida tornarem-se escravos do LD,
pel importante: o de sua atividade profissional. em que reproduz os perdendo até mesmo sua au-
desenvolver com os valores da sociedade tonomia e senso crítico, pois
futuros professores uma atitude vigi- em relação à sua visão da ciência, da ficam condicionados e não
lante e questionadora que os levem a história, da interpretação dos fatos e aprendem nada efetivamente.
tomar decisões sobre o que fazer nas do próprio processo de transmissão Não há o desenvolvimento da
situações de ensino, marcadas pela do conhecimento (Freitag e cols., autonomia, do pensamento crí-
urgência e pela incerteza. 1989). Portanto, torna-se necessária tico, da competência, mas sim
Outros estudos ainda têm apon- a profunda reflexão, por parte do de um processo de “alienação”
tado para a necessidade de ações professor, diante de questões relacio- constante. Tais colocações
complementares à formação inicial, nadas à escolha e utilização do LD. reforçam a necessidade de
visto que a formação de professores Conforme aponta a literatura, a investimentos na formação do
ocorre em um processo contínuo atividade do professor vai além do professor e na educação como
(Schnetzler, 2002; Rosa e cols., 2001; simples ato de ministrar aulas (Lima, um todo.
Carvalho e Gil-Pérez, 2006). Nessa 1996; Vasconcelos e Souto, 2003). O
perspectiva, Schnetzler (2002) des- educador deverá estar preocupado Delizoicov (1995) defende que
taca que a importância da formação com que o educando aprenda e se o professor deve estar instrumenta-
continuada reside no fato de que esta desenvolva individual e coletivamente lizado para detectar e observar as
promove a socialização de natureza e, para tal fim, é imprescindível que fragilidades implícitas no LD, bem
espontânea, pouco previsível e livre os docentes tenham a capacidade como em qualquer outro material a
de rigorosidade e formalidades entre de analisar, criticar e escolher o LD ser utilizado em sala de aula. Nesse
professores, na qual são valorizadas utilizado em sua sala de aula, como sentido, de acordo com os principais
as interações entre os colegas e os também estarem qualificados para objetivos do PNLD, faz-se necessária
problemas por eles vivenciados. Enfa- avaliar as possibilidades e limitações a participação ativa e democrática do
tiza ainda a necessidade de os cursos dos livros recomendados pelo Minis- professor no processo de seleção do
de formação continuada promoverem tério da Educação (MEC) (Nuñez e LD a ser adotado pela escola. Para
a profissionalização a partir da troca cols., 2003). tanto, o professor necessita possuir
de experiências entre os professores. García (1999) destaca ainda que determinados saberes, critérios e
Por outro lado, vale ressaltar que professores não são técnicos que competências que o tornem apto a
a formação do educador é apenas executam instruções e propostas realizar, juntamente com seus colegas

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de trabalho, a escolha do livro (Nuñez vespertino e noturno e, em cada ter significado isolado, ou seja, são
e cols., 2003). um desses, diferentes professores determinados os núcleos de sentido
Nessa perspectiva, o objetivo da lecionam a disciplina de Química, ha- que compõem a comunicação e cuja
presente pesquisa foi investigar a vendo, em alguns casos, mais de um presença, ou frequência de aparição,
respeito dos critérios usados na se- professor por turno. Para identificar a possa significar alguma coisa para o
leção e utilização do LD adotado nas quantidade de professores das refe- objetivo escolhido.
escolas por professores de Química ridas escolas, entramos em contato
da rede estadual das cidades de com a Diretoria Regional de Educa- Resultados e discussão
Ilhéus e Itabuna, situadas na região ção de Ilhéus (DIREC 06) e Itabuna Nos tópicos a seguir, apresen-
sul da Bahia, bem como diagnosticar (DIREC 07). Em Itabuna, segundo a tamos a discussão dos principais
a respeito da formação acadêmica DIREC 07, 38 professores ministraram aspectos observados na presente
desses profissionais e as suas prio- a disciplina Química em 2008. Em pesquisa. No que diz respeito aos
ridades no que diz respeito à seleção Ilhéus, verificamos a atuação de 25 obstáculos encontrados, cabe res-
dos conteúdos a serem abordados na professores de Química no mesmo saltar as dificuldades em relação à
sala de aula. ano. Para tanto, foi necessário o aplicação dos questionários. Alguns
contato por telefone com cada es- professores preferiram não responder
Metodologia cola, pois não foi possível obter essa e outros demoraram a entregá-lo,
A pesquisa em questão é qua- informação por meio da DIREC 06. tornando mais difícil a realização do
litativa, uma vez que condiz com a O questionário foi o instrumento trabalho.
definição de Bogdan e Biklen (1994, empregado para o registro de da- No entanto, consideramos que o
p. 11), que a entendem como “[...] dos. Preservamos o anonimato das número de professores que respon-
uma metodologia de investigação respostas dadas pelos professores e deram ao questionário seja represen-
que enfatiza a descrição, a indução, asseguramos que o desenvolvimento tativo, uma vez que corresponde a
a teoria fundamentada e o estudo das da pesquisa não produziria nenhum 65% da totalidade, permitindo, por-
percepções pessoais”. Participaram tipo de risco ou desconforto para tanto, tecer algumas considerações
como sujeitos da pesquisa profes- estes. O instrumento consistiu em a respeito da seleção e utilização do 117
sores atuantes no ensino médio, em oito questões estruturadas (Tabela 1), LD adotado nas escolas em que a
2008, de escolas da rede estadual que permitiram obter informações a pesquisa foi realizada.
das cidades de Ilhéus e Itabuna. No respeito do perfil dos professores,
Perfil dos professores
período da pesquisa, 63 professores, critérios de seleção para o LD de
distribuídos nas 28 escolas da rede, Química, dificuldades encontradas No que diz respeito à área de
lecionavam a disciplina de Química. pelos professores na utilização do LD Química, é sabido que, em muitas re-
No entanto, só foi possível contatar e seleção de conteúdos. giões brasileiras, o número de profes-
50 professores e, destes, apenas 41 A análise dos dados foi funda- sores com formação em Licenciatura
participaram efetivamente do estudo. mentada na metodologia de análise em Química não atende à demanda
Das 28 escolas mencionadas, proposta por Bardin (1977). Nesta, das escolas de educação básica,
constatamos que a maioria oferece são destacadas ideias, enunciados principalmente em cidades mais afas-
o ensino médio nos turnos matutino, e proposições do texto que possam tadas de centros formadores de tais
profissionais (universidades federais,
Tabela 1. Questionário aplicado aos professores participantes da pesquisa. estaduais e privadas), ficando a cargo
Prezado professor, por favor, responda às seguintes questões: de profissionais não habilitados à
1. Qual o livro didático de química adotado na escola em 2008?
função de ministrar a disciplina.
Em notícia divulgada no Jornal
2. O que determinou a escolha por tal livro didático? da Ciência, órgão da Sociedade
3. Além do livro principal, você utiliza outros livros ou qualquer outro tipo de material Brasileira para o Progresso da Ciên-
no preparo de suas aulas? Se sim, quais? cia (SBPC) (Amorim, 2008), é apre-
4. Se sua resposta foi positiva para a questão anterior, responda por qual razão você sentado um estudo, com dados do
sente necessidade de recorrer a outro material, além do livro didático. ano de 2008, que mostra um quadro
5. Existe alguma dificuldade em se trabalhar com o livro adotado pela escola? Se sim, preocupante para a educação bra-
quais? sileira, principalmente nas áreas de
6. Você procura trabalhar todo o conteúdo presente no livro didático ou seleciona Ciências. Em Matemática, por exem-
aqueles conteúdos que considera mais importantes? Para qualquer uma das alternati- plo, a demanda por professores com
vas, justifique sua resposta. formação específica estava perto de
7. Quais conteúdos, para você, são prioridades e não podem deixar de ser aborda- 108 mil e, no período, havia cerca de
dos na sala de aula? Quais os seus critérios? 42 mil docentes. O quadro se mostrou
ainda pior em Física, no qual havia
8. Qual a sua formação acadêmica?
menos de 10 mil professores para
Muito Obrigada! atender uma demanda de 56 mil. Nas

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áreas de Biologia e Química, também tre eles, estão às más condições de livro Química (Feltre, 2004a; 2004b;
foram evidenciados graves proble- trabalho, baixa expectativa de renda, 2004c); sete, Química & sociedade
mas. Na primeira área, eram quase 40 inexistência de planos de carreira, (Santos e Mol, 2005); três, Química
mil professores para uma demanda jornadas de trabalho excessivas, na abordagem do cotidiano (Perruzzo
de quase 60 mil. Em Química, os além de outras questões de natureza e Canto, 1999); uma, Química para o
números foram piores: menos de 10 formativa (Sá, 2009). Todos esses ensino médio (Mortimer e Machado,
mil professores para uma demanda obstáculos contribuem para a escas- 2002); uma, Universo da química – en-
estipulada em quase 60 mil. sez de profissionais especializados sino médio (Bianchi e cols., 2005); e
Na presente pesquisa, em relação atuarem nas escolas. uma, um módulo alternativo, que não
à formação acadêmica, verificamos constava na lista do PNLEM. Apenas
Critérios de seleção para o LD de Química
que, dos 41 professores de Química, em uma não foi possível obter essa
30 são graduados em Licenciatura Segundo Nuñez e cols. (2003), a informação.
Plena em Química; 4 possuem forma- seleção dos LDs para o Ensino de Uma vez verificado os títulos dos
ção em Ciências com habilitação em Ciências constitui uma responsabi- livros adotados pelas escolas, espe-
Biologia; 1 é graduado em Licencia- lidade de natureza social e política. culamos a respeito dos critérios que
tura Plena em Física; 1 é técnico de Destaca ainda que a quantidade de determinaram a escolha destes. Com
Nível Médio em Química Industrial; 1 LDs que circulam no mercado brasi- base em Bardin (1977), foi realizada
possui Licenciatura plena em Agrope- leiro faz da seleção destes uma ta- uma análise temática que consistiu
cuária; e 4 ainda são estudantes de refa ainda mais complexa e exigente em três fases: a) pré-análise; b) explo-
graduação do curso de Licenciatura profissionalmente. Echeverría e cols. ração da resposta dada ao questioná-
em Química. Apesar de a região em (2008, p. 64) também destacam a rio; e c) tratamento dos resultados e
que as escolas estão situadas pos- importância de, a partir de 2008, a es- interpretação. Na pré-análise, fizemos
suir uma universidade colha do LD passar a organização dos dados, realizando
pública que oferece o a ser orientada por uma sistematização preliminar das
curso de Licenciatura Apesar de a região em que “diretrizes político- ideias, a partir do que Bardin (1977)
118 em Química, ainda as escolas estão situadas pedagógicas, e não denomina de “leitura flutuante”. Na
encontramos, atuan- possuir uma universidade somente pelo jogo segunda fase, realizamos novas lei-
do nas salas de aula, pública que oferece o de forças do mer- turas do material de forma atenta e
profissionais sem a curso de Licenciatura cado editorial”. Isso, criteriosa, destacando os principais
devida habilitação em Química, ainda em nosso entendi- termos de cada resposta na tentativa
para a docência na encontramos, atuando nas mento, representa de agrupá-las. Esse agrupamento
área específica. salas de aula, profissionais um grande avanço permitiu a elaboração de categorias
Nesse sentido, no sem a devida habilitação no que se refere a relacionadas aos critérios apontados
trabalho desenvol- para a docência na área questões voltadas pelos professores para a escolha
vido por Sá (2009), específica. à seleção de LDs do LD, conforme apresentamos na
a autora buscou, por professores no Figura 1.
dentre outros aspectos, especular contexto do ensino de Química. A primeira categoria, Contextuali-
a respeito das expectativas profis- De acordo com o PNLEM (MEC, zação, englobou todas as respostas
sionais de estudantes matriculados 2007), esteve previsto para o ano de que apresentavam como critérios
no último ano de um curso de 2008 a distribuição de 7,2 milhões de para adoção do LD a palavra cotidia-
Licenciatura em Química de uma livros de Química a alunos e profes- no, a locução dia a dia ou a própria
universidade pública brasileira. Os sores do ensino médio. Das escolas palavra contextualização. Nessa cate-
resultados obtidos na referida pes- analisadas, verificamos que catorze goria, foi agrupada maior quantidade
quisa apontaram que um número delas adotaram os três volumes do de respostas (11). A seguir, apresen-
significativo de alunos não tem a
pretensão de atuar no ensino médio
após o término do curso. Cursos
de pós-graduação, especialmente
o mestrado e o doutorado em áre-
as específicas da Química, foram
pretensões fortemente enfatizadas
pelos estudantes, e outros ainda
afirmam não ter perspectivas em
relação ao futuro profissional, mas
deixam clara a ideia de que não de-
sejam lecionar na educação básica.
Sabemos que os desafios da
profissão docente são muitos: den- Figura 1. Critérios de seleção dos professores para o LD adotado em 2008.

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tamos exemplos de respostas dadas principais de distorção da prática Respostas classificadas nas ca-
pelos professores, enquadradas educativa (Brito, 2008). tegorias Temas geradores, Tradição
nessa categoria: Outra categoria com um número do livro e Interdisciplinaridade foram
representativo de respostas foi Pro- menos enfatizadas pelos professores.
“Pelo livro abordar textos posta inovadora (4), criada a partir de Apenas dois professores se enqua-
ligados ao dia a dia no contexto respostas que continham as expres- dram em cada uma das categorias
químico.” sões novas tendências pedagógicas mencionadas. As palavras-chave ou
“Observamos a abordagem e propostas pedagógicas. Isso fica expressões-chave para cada catego-
voltada para o cotidiano [...].” evidente nas seguintes falas dos ria foram, respectivamente, temática
“[...] o livro é bem contextuali- professores: ou tema gerador, obra mais conhe-
zado e mostra a química como cida e outra disciplina ou interdisci-
uma ciência bastante presente “Por atender as novas ten- plinaridade. A seguir, apresentamos
na vida do aluno.” dências pedagógicas onde o exemplos de respostas para as três
construtivismo e os aspectos categorias, respectivamente:
Dentre os professores que apre- cognitivos fazem parte do
sentaram respostas incluídas nessa ensino-aprendizagem.” “A abordagem temática dos
categoria, observamos que alguns “Necessidade de escolher conceitos de química.”
adotaram livros considerados mais algum livro que se aproximasse “[...] por ser também uma
tradicionais, o que sugere a pouca da nova proposta do ensino de obra muito conhecida e utiliza-
clareza desses profissionais quanto química em nossa escola [...].” da por décadas [...].”
ao conceito de contextualização, “[...] sugestões no final do
pois utilizam o termo apenas como A quinta categoria Atividades livro para trabalhar com as
uma exemplificação de fatos do co- experimentais foi criada a partir das outras disciplinas.”
tidiano. Não percebemos em suas observações de três professores que
respostas nenhum sentido mais citaram palavras como experimentos Na categoria Outros, foram in-
amplo a respeito desse termo. Como ou laboratório em suas respostas, clusas respostas que não se ade- 119
afirma Loguercio e Del Pino (2000), quando questionados sobre o que quaram nas demais categorias (7).
a apresentação nos livros de figuras determinou a escolha do LD na Cinco docentes apresentaram como
ou textos ilustrativos e nas situações escola. Aqueles que critérios para a esco-
cotidianas são importantes, mas não forneceram esse lha do LD a eleição
promove uma aprendizagem signifi- tipo de resposta em Os resultados obtidos entre os professores
cativa e não garante uma articulação nenhum momento na referida pesquisa da escola. Nenhum
entre a ciência do cotidiano e a ciên- fizeram alusão à na- apontaram que um número dos participantes
cia da sala de aula. tureza das ativida- significativo de alunos da pesquisa apon-
Respostas classificadas na ca- des experimentais, não tem a pretensão de tou como critério de
tegoria Exercícios também foram ou seja, se estas são atuar no ensino médio escolha aspectos
enfatizadas pelos professores (5). de caráter investi- após o término do curso. gráficos, natureza
Inserimos nessa categoria respos- gativo ou ilustrativo Cursos de pós-graduação, das experiências,
tas que faziam menção à palavra (Loguercio e cols., especialmente o mestrado aspectos sociopolíti-
exercícios ou expressões questões 2001). Isso demons- e o doutorado em áreas cos, encadeamento
de vestibulares e questionário de tra que os profes- específicas da Química, dos conteúdos, lin-
fixação, conforme ilustram os exem- sores parecem não foram pretensões guagem abordada
plos a seguir: compreender o ver- fortemente enfatizadas ou obstáculos epis-
dadeiro significado pelos estudantes. temológicos. Não
“[...] diversificação dos exer- da experimentação foi surpreendente o
cícios.” no ensino de Química. Aparentemen- fato de a coleção Química (Feltre,
“Pelo livro apresentar ques- te, a mera existência de atividades 2004a; 2004b; 2004c) ter sido a mais
tões de vestibulares.” experimentais nos LDs parece ser adotada pelas escolas, uma vez que
suficiente para a adoção do livro se trata de livros que apresentam
É sabido que em grande parte pela escola, como verificamos nas uma abordagem tradicional e bas-
das unidades escolares os profes- respostas a seguir: tante conhecida pela maioria dos
sores ainda centram suas expecta- professores.
tivas na aprovação dos estudantes “Por ser um bom livro trazen- Os resultados acima discutidos
no exame de vestibular, enfatizando do trabalhos para laboratório.” nos chamam a atenção para a neces-
conceitos químicos, priorizando leis, “Observamos as experiên- sidade de qualificação do professor
teorias e memorização de fórmulas. cias rápidas.” para torná-lo apto a reavaliar e sele-
Não é de hoje que estudos apontam “Por ser um livro que trabalha cionar o LD fornecido pelo PNLEM, de
o vestibular como um dos fatores atividades com experimentos.” modo que este esteja mais próximo

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das características particulares das sores alega recorrer a mais de uma de suas aulas com o intuito de favore-
escolas e do seu projeto político fonte, além do LD. Nenhum professor cer o processo de ensino e aprendi-
pedagógico. Com base nos dados mencionou livros de Química utiliza- zagem, conforme evidenciamos nos
supracitados, é notória a limitada pre- dos no ensino superior como apoio comentários a seguir:
paração de alguns professores para na elaboração de suas aulas.
participar dos processos de seleção No que diz respeito ao questio- “Enriquecimento da prática
do LD, tarefa bastante exigente para namento anteriormente citado, Reis pedagógica.”
um coletivo que pouco tem recebido (2001) aponta para a necessidade da “Para tornar a aula mais in-
em termos de saberes, competências utilização de outras fontes de pesqui- teressante, além, é claro, de
e habilidades para tal fim (Nuñez e sa, visando à melhor compreensão melhorar minha formação, já
Cols., 2003). dos assuntos e à formação de con- que não sou da área.”
ceitos pelos alunos. Mendes Sobrinho “Para planejar melhor as au-
Utilização de material complementar ao LD
e Leal (2002) destacam ainda que a las, buscar exercícios diferen-
Segundo Freitag e cols. (1989), o utilização de recursos alternativos ao tes e também trazer imagens
LD chegou a um ponto de autonomia LD tem sido apontada como um dos microscópicas e da aplicação
em relação às práticas pedagógicas caminhos a ser seguido pelos do- da química na sociedade no
dos professores de modo que este centes com o objetivo de diversificar uso de vídeos.”
não é mais visto como um instrumen- os recursos utilizados no cotidiano
to auxiliar de complementação de escolar. Neste trabalho, entendemos No que diz respeito às respostas
aprendizagens e conceitos, mas sim o LD da mesma maneira que Molina enquadradas na categoria Motivação
como critério absoluto de verdade e (1988, p. 10): dos alunos, dez professores mencio-
padrão de excelência a ser adotado nam alternativas para relacionar o
na sala de aula. Silveira e Cicillini [...] uma obra escrita (ou or- conteúdo de Química com o cotidiano
(2002) destacam ainda que, lamen- ganizada, como acontece tan- do aluno, evitando, dessa forma, o
tavelmente, nas últimas décadas, tas vezes) com a finalidade es- uso exclusivo do LD.
120 esse recurso foi (e ainda tem sido) pecífica de ser utilizada numa
utilizado não como um apoio instru- situação didática, o que a “Para ampliar os debates em
mental para os docentes nas aulas de torna, em geral, anômala em sala de aula.”
Ciências, mas como outras situações, “Por existir a necessidade
um guia metodológi- não sendo por- do aluno estar inserido na
co de suas ações e Observamos que um tanto, o fim em sociedade e poder utilizar as
de elaboração das número considerável si mesmo, mas informações no seu dia a dia.”
propostas curricula- de professores cita um complemento “Quanto mais recursos me-
res. Isso provoca um critérios importantes e ao trabalho global lhor, amplia o leque de op-
condicionamento da necessários no processo dos professores. ções e trabalho para alunos e
autonomia dos pro- de seleção do LD, mas alunas.”
fessores em relação não esclarecem quanto à Após a identifi-
ao LD, que dita os natureza desses critérios cação dos tipos de Outras respostas apontam ainda
passos das ativida- como, por exemplo, se a materiais alternati- para a insatisfação de sete professo-
des escolares, pois é experimentação por eles vos usados pelos res com o LD adotado pela escola.
considerado o único apontada como essencial professores, busca- Essas respostas foram classificadas
recurso possível de nos LD deve ser de caráter mos compreender as na categoria Insatisfação com o LD.
ser utilizado na sala investigativo ou ilustrativo. justificativas destes
de aula. para tal necessida- “Porque há muita contextuali-
Nesse sentido, questionamos os de. Dentre elas, as mais enfatizadas zação e pouco assunto.”
professores se, além do LD principal foram: qualidade do processo de “O LD é muito tradicional e
adotado pela escola, eles recorriam ensino e aprendizagem, motivação pouco atualizado.”
a outras fontes para a elaboração dos alunos e insatisfação com o “O LD recebido não é didáti-
de suas aulas. Dos 41 professores, LD adotado pela escola. Para cada co, os alunos acham o material
29 revelaram recorrer a outros livros categoria, fez-se necessário a identi- massante [sic] e de difícil inter-
didáticos de Química do ensino ficação de unidades de registros tal pretação.”
médio na elaboração das aulas; 17 como proposto por Bardin (1977).
afirmaram recorrer a sites da internet; Com relação às respostas clas- As respostas de quatro pro-
10, a materiais que apresentem pro- sificadas na categoria Qualidade do fessores não estavam de acordo
postas de atividades experimentais; processo de ensino-aprendizagem, com o questionamento realizado e,
8, a reportagens de jornais e revistas; dos professores entrevistados, 20 portanto, não foram classificadas
4, a artigos científicos; e 3, a vídeos mencionam a necessidade de busca em nenhuma das categorias supra-
educativos. A maioria dos profes- por outros materiais no planejamento citadas. Ainda no que diz respeito à

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utilização de material complementar des mais enfatizadas, destacam-se dos comentários dos professores a
ao LD, é importante salientar que não a existência de erros conceituais, respeito das dificuldades relaciona-
existe LD ideal, que atenda a todas material desatualizado, conteúdos de das ao uso do livro:
às necessidades e expectativas do difícil compreensão, dificuldades dos
educando e do professor. O LD por alunos na resolução dos exercícios “A maior dificuldade é o aluno
si só nunca será autossuficiente, ca- propostos e interpretação textual. A que não leva o livro para sala
bendo, portanto, ao professor saber o seguir, depoimentos de alguns dos de aula citando vários motivos:
momento certo de adotá-lo, adaptá-lo professores: volume, peso etc.”
e complementá-lo. “Existem muitos textos e os
“O livro é muito desatualiza- alunos não estão com hábito
Dificuldades encontradas pelos professo-
do, tradicional, além de conter de leitura, tentam criar resistên-
res na utilização do LD
alguns erros na abordagem do cias nesse sentido.”
De acordo com Vasconcelos e ensino de química.” “Adequar o conteúdo progra-
Souto (2003), a leitura atenta da maio- “Os alunos apresentam di- mático à sequência do livro,
ria dos LDs de Ciências, disponíveis ficuldades para resolução de ausência de formação prévia,
no mercado brasileiro, revela uma dis- alguns exercícios.” dificuldade de leitura e inter-
posição linear de informações e uma “Em alguns assuntos a com- pretação de textos [...].”
fragmentação do conhecimento que preensão não é tão fácil.” “É em relação ao tempo de
limitam a perspectiva interdisciplinar. aula disponível à Química (2h/
Os autores ressaltam ainda que: Com relação ao livro Química & aulas semanais) nas escolas
sociedade (Santos e Mol, 2005), cada estaduais, que se situa a prin-
A abordagem tradicional unidade está associada a um tópico cipal dificuldade enfrentada
orienta a seleção e a distribui- do conteúdo específico de Química para que se possa desenvol-
ção dos conteúdos, gerando e refere-se a um tema de natureza ver plenamente as atividades,
atividades fundamentadas na tecnológica, vinculado à Química e experimentações e reflexões
memorização, com raras possi- ao cotidiano dos alunos, por meio de propostas.” 121
bilidades de contextualização. textos que buscam estabelecer essa
Ao formular atividades que não relação. Na sequência, os conceitos Das três escolas que adotaram
contemplam a realidade ime- químicos do programa são intro- o livro Química na abordagem do
diata dos alunos, perpetua-se duzidos, buscando-se estabelecer cotidiano (Perruzzo e Canto, 1999),
o distanciamento entre os ob- relações com o tema da unidade, quatro professores responderam
jetivos do recurso em questão que é retomado em outros textos, que ao questionário. Apenas um deles
e o produto final. Formam-se apontam a necessidade de estudos relata não ter sentido dificuldades
então indivíduos treinados de outros conceitos. A abordagem em trabalhar com o livro, enquanto
para repetir conceitos, aplicar temática, geralmente, prossegue em os outros mencionam ter enfrentado
fórmulas e armazenar termos, um modelo curricular em forma de es- dificuldades devido à fragmentação
sem, no entanto, reconhecer piral, possibilitando que o tema seja do conteúdo existente e a falta de
possibilidades de associá-los explorado em diversos momentos. contextualização. Segundo um dos
ao seu cotidiano. O conheci- Ao final da unidade, são introduzidas professores:
mento não é construído, e ao questões que suscitam o debate do
aluno relega-se uma posição tema sob diferentes pontos de vista, “O tipo de abordagem é feita
secundária no processo de explorando vários aspectos socio- de modo desconexo e estan-
ensino-aprendizagem. (p. 94) científicos relacionados a ele (Zanon que como se a química fosse
e Maldaner, 2007). dividida em “pacotes” de con-
Das 14 escolas que adotaram Treze dos professores cujas es- teúdos, os quais seriam à parte
a coleção Química (Feltre, 2004a; colas adotaram o referido livro alega- do dia a dia do ser humano.”
2004b; 2004c), 17 professores res- ram ter encontrado dificuldades em
ponderam ao questionário. Como já trabalhar com o material. Dentre as Apenas uma das escolas optou
mencionado anteriormente, a referida dificuldades mencionadas por estes, pelo livro Química para o ensino
coleção apresenta uma abordagem destacam-se: resistência dos alunos médio: fundamentos, pressupostos
mais tradicional que os demais livros em relação ao LD (não levam o livro e o fazer cotidiano (Mortimer e Ma-
mencionados e é bastante conhecida para sala de aula devido ao peso); chado, 2002). O enfoque contextual
pela maioria dos professores. dificuldade do aluno com leitura e sugerido no livro pretende privilegiar
Dos 17 professores, 11 alegaram interpretação textual; despreparo a resolução de problemas abertos,
apresentar dificuldades quanto ao do professor em relação ao tipo de nos quais o aluno deve considerar
uso do referido livro e 6 disseram não abordagem proposta no livro; e falta não apenas aspectos técnicos como
apresentar nenhum problema quanto de tempo para realizar as atividades também sociais, políticos, econômi-
à sua utilização. Dentre as dificulda- propostas. A seguir, são apresenta- cos e ambientais, o que resulta em

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uma demanda por abordagens inter- vestibular ou ainda qualificá-lo para o de partida as situações de interesse
disciplinares no ensino médio (Zanon mercado de trabalho. imediato do aluno, o que ele vive, co-
e Maldaner, 2007). Dessa escola, Damasceno e cols. (2008), em nhece ou sofre influências, atingindo
foi possível obter a resposta de três sua pesquisa sobre conteúdos e os conhecimentos químicos histori-
professores. Em relação a esse livro, programas de Química para o en- camente elaborados, de forma que
estes apontaram dificuldades em sino médio na região sul da Bahia, lhe permitam analisar criticamente a
relação à sua utilização, tais como: constataram que os diários de classe aplicação destes na sociedade em
conteúdos de difícil compreensão e dos professores de Química, de es- que estão inseridos (Brasil, 1999).
dificuldades de usá-lo com turmas colas da rede estadual, apresentam Nessa perspectiva, buscamos co-
numerosas. A seguir os comentários geralmente a mesma sequência dos nhecer quais conteúdos de Química
dos docentes: tópicos presentes nos LDs adotados são prioridades para esses docentes
pelas escolas. Segundo os autores: e que não podem deixar de ser abor-
“O autor trabalha numa linha dados na sala de aula (Figura 2).
de demonstração, comprova- Mesmo apresentando um Analisando a Figura 2, observa-
ção, contextualização surgin- planejamento que indique uma mos quais conteúdos, na opinião
do a dificuldade pelo grande abordagem semelhante às dos professores, são prioritários e
número de alunos em sala de orientações dos documentos não podem deixar de ser abordados
aula e desinteresse por parte oficiais, seus registros reve- durante o ensino médio: as funções
dos mesmos em participação lam uma sequência linear de orgânicas foram mencionadas por 12
das aulas.” tópicos de conteúdos muito professores; 12 destacaram a tabela
“A abordagem dos conteú- semelhantes aos do livro didá- periódica; 9, as propriedades da ma-
dos não é de fácil compreen- tico que adotam. No lugar de téria; 8, os modelos atômicos; e 9, as
são pelos alunos que recla- recurso, como apoio, o livro ligações químicas. Outros conteúdos
mam muito dizendo que o livro didático acaba por nortear todo foram citados em frequência menos
é difícil.” trabalho docente e discente representativa. Todos os professores
122 [...]. Podemos afirmar que na destacaram mais de um conteúdo
Nas escolas que adotaram o livro maioria das escolas onde tive- como prioridade. Dentre os critérios
Universo da química – ensino médio mos acesso aos documentos mencionados pelos professores para
(Bianchi e cols., 2005) e o Módulo e registros dos professores a seleção dos conteúdos, os mais
Alternativo, só foi possível questionar o ensino de Química é ainda enfatizados foram tópicos necessá-
um professor em cada instituição e conteudista, livresco, ou seja, rios para aprovação no exame de
estes não alegaram qualquer tipo muito distante daquele ensino vestibular e outros que apresentam
de dificuldade em trabalhar com tais de química preconizado tanto relação com o cotidiano do aluno.
materiais. nos PCNEM como na área de Diante do exposto, cabe o ques-
pesquisa em Educação Quí- tionamento levantado por Chassot
Seleção de conteúdos
mica. (p. 8) (1990): O ensino de Química, como
De acordo com Chassot (1990), é feito, é útil para quem? As escolas
a ideia de que a química deve favo- Conforme menciona um dos devem ensinar Química para preparar
recer a melhor interação do cidadão documentos oficiais que rege a o cidadão para a vida, o trabalho e o
com o mundo em que vive deve educação brasileira, os Parâmetros lazer, isto é, educar por meio da Quími-
ser o indicador para a seleção dos Curriculares Nacionais para o Ensi- ca. Ainda segundo o autor, a tarefa de
conteúdos a serem abordados na no Médio (PCNEM), na seleção dos selecionar conteúdos que favoreçam
sala de aula. Nesse sentido, questio- conteúdos deve-se ter como ponto uma melhor leitura da realidade não
namos os professores a respeito da
seleção dos conteúdos de química
por eles abordados na sala de aula.
A partir das respostas obtidas para
essa questão, verificamos que 41
professores alegaram selecionar
os assuntos que consideram mais
importantes, uma vez que, segundo
eles, a carga horária não é suficiente
e os assuntos têm que ser seleciona-
dos de acordo com a realidade dos
alunos. Por outro lado, dez alegaram
trabalhar todo o conteúdo presente
no LD, com a justificativa de preparar
o aluno para a série seguinte, para o Figura 2. Conteúdos prioritários para os professores.

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é fácil porque esses conteúdos não porque é adotado por determinado LD. Dentre as dificuldades mais enfati-
aparecem de forma estruturada, então Apontam também que mesmo aqueles zadas pelos professores quanto ao uso
é mais cômodo “transferir” o que está professores com formação docente do LD adotado pela escola, destacam-
nos livros-texto. Há clássicas desculpas nem sempre fizeram, durante sua for- se: a resistência dos alunos em relação
para isso: a necessidade de cumprir o mação inicial, um estudo sobre os LDs. ao livro, dificuldades relacionadas à lei-
programa ou preparar os alunos para Neste estudo, observamos que um tura e interpretação textual, despreparo
o exame de vestibular, afirmações que número considerável de professores do professor com abordagens diferen-
também foram fortemente evidencia- cita critérios importantes e necessários ciadas e falta de tempo para realizar
das na nossa pesquisa. Chassot (1990, no processo de seleção do LD, mas as atividades propostas. No que diz
p. 35) destaca: não esclarecem quanto à natureza respeito aos conteúdos selecionados
desses critérios como, por exemplo, pelos docentes e de suas justificativas
Mesmo que o professor tenha se a experimentação por eles apon- para a escolha destes, observamos
dificuldades em selecionar as- tada como essencial nos LD deve ser ainda a valorização excessiva da pre-
suntos mais ligados ao cotidiano de caráter investigativo ou ilustrativo. paração para o exame de vestibular
e preferir, por encontrar nisso Tais constatações são preocupantes e em detrimento de uma educação mais
apoio nos livros-textos, os “con- alertam para a necessidade premente voltada para a formação do cidadão
teúdos clássicos” (aqueles que de espaços que permitam ao professor crítico e atuante na sociedade.
se disse que são universalmente a reflexão sobre aspectos importantes Cabe salientar também que enfren-
ensinados), é preciso questionar na escolha e utilização do LD. Concor- tamos dificuldades para concluir essa
de uma maneira enfática: o damos com Schnetzler (2002) quando pesquisa por conta da própria resis-
que ensinar sobre determinado sinaliza para a necessidade de um con- tência de alguns professores atuantes
assunto? tínuo aprimoramento profissional do nas escolas em participar da pesquisa.
professor, com reflexões críticas sobre No entanto, apesar dos obstáculos,
Considerações finais sua prática pedagógica, no ambiente acreditamos que a investigação nos
coletivo de seu contexto de trabalho. possibilitou compreender questões
a análise dos dados revela que um No que diz respeito à utilização de importantes relacionadas à seleção e 123
número significativo de profissionais materiais complementares ao LD, cons- utilização do LD e que possa servir de
sem a devida formação acadêmica tatamos que a maioria dos professores subsídio para futuros estudos relacio-
ainda atua como professores de Quí- recorre a outro LD de Ensino Médio nados ao tema.
mica no ensino médio na região sul para elaborar suas aulas, tornando
Juliana de Oliveira Maia (julianamaia14@usp.br),
da Bahia (Brasil) devido à escassez evidente a forte influência que esse tipo licenciada em Química pela Universidade Estadual
de profissionais habilitados para tal de material exerce na prática docente de Santa Cruz (UESC) (BA), é mestranda do Pro-
função. De acordo com Echeverría desses profissionais. Sites da internet, grama de Pós-Graduação Interunidades em Ensino
e cols. (2010), a profissão docente é materiais com propostas de atividades de Ciências da Universidade de São Paulo. Luciana
culturalmente desvalorizada, permitin- experimentais, reportagens de jornais Passos Sá (lucianapsa@gmail.com), doutora em
Ciências pela Universidade Federal de São Carlos, é
do que profissionais de outras áreas, e revistas, artigos científicos e vídeos docente do Departamento de Ciências Exatas e Tec-
sem a devida qualificação, assumam educativos foram recursos também nológicas da UESC. Elisa Prestes Massena (elisamas-
a função pedagógica. mencionados pelos professores. Tava- sena@yahoo.com.br), doutora em Educação pela
No que diz respeito à determinação res (2009) recomenda o emprego des- Universidade Federal do Rio de Janeiro, é docente
da escolha do LD, Echeverría e cols. ses recursos como forma de possibilitar do Departamento de Ciências Exatas e Tecnológicas
da UESC. Edson José Wartha (ejwartha@yahoo.
(2010) sinalizam ainda que o profes- outros olhares que auxiliem na seleção, com.br), doutorando em Ensino de Ciências pela
sor leigo não sabe por que ensina na organização e no tratamento dos Universidade de São Paulo, é docente do Núcleo
determinado conteúdo e muito menos conceitos a serem ensinados. de Química da Universidade Federal de Sergipe.

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Abstract: The Didactic Book of Chemistry in the conceptions of high school teachers in the South of Bahia. Issues related to Science Teaching’s Didactic Books have often been discussed in works
presented within the literature. The present study had as objective speculate about the selection criteria and forms about how to use the Didactic Books adopted in public high school for chemistry
teachers in the cities of Ilhéus and Itabuna, located in southern of Bahia. The results of this study indicate the need for continued teachers’ formation that focus, among other things, on the reflection
of important issues related to selection and use of the Didactic Books by teachers working in Basic Education.
Keywords: Teacher’s Formation, Didactic Book, Chemistry Teaching.

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