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CLAU

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ÍNDICE

CLAU
26 de setembro de 2018 - ano XXIII - n° 1022 

CLAU

Cartas Capitais
Para algumas, #EleSim 
CLAU

Grega
Baleias no caminho 

Rosa dos Ventos


Nasce um presidente
CLAU
Editorial
A união necessária

A Semana
Propaganda enganosa
CLAU

Reportagem de capa
Apreensão e medo

Seu país 2018


A prisão e a facada
Seu país Perfil
De busão com Zé Dirceu

CLAU

Marcos Coimbra
Eleitores e candidatos
CLAU
Seu país Entrevista
“Haddad vai ganhar”

Seu país Eleições


#EleNão
CLAU

Seu país Artigo


Keep quiet!

Economia Indústria
Um novo ovo de Colombo 
Antonio Delfim Netto
Indústria: 13 anos de atraso CLAU

Luiz Gonzaga Beluzzo


Gororoba ideológica 
Nosso Mundo Desglobalização
A era da fragmentação 

CLAU

Plural Arquitetura
Os edifícios da mente 
CLAU

Bravo!
Da oficina de Rafael

QI A História ensina
Getúlio, Perón e Lula 
Afonsinho
CLAU
O vexame que faltava

Vara
Por Severo
Desastre golpista

Acho prematuro cogitarmos uma concorrência Haddad x Ciro e


declararmos voto em Ciro, para ele chegar ao segundo turno. Uma parte da
esquerda, certamente, deve fazer isso. Mas penso que o momento é para
jogarmos todas as cartas no candidato de Lula, não só porque é adequado
na atual conjuntura, mas porque, vitorioso, carregará o simbolismo de
significar um grande desagravo nacional ao ex-presidente, “condenado sem
provas e encarcerado sem crime”.
Mariza Saab Lima
Americana, SP
(Enviado via carta)

Sob a tutela judicial e militar

 O general Villas Bôas prefere deixar a coisa degringolar e agora diz que,
se Bolsonaro ou qualquer outro candidato afinado com seu chefe (Michel
Temer) não for eleito, os militares vão intervir. As Forças Armadas
perderam a oportunidade e correm o risco de também perderem de vez a
vergonha que ainda lhes resta, se não respeitarem as urnas novamente. As
armas de Bolsonaro são as mesmas de Villas Bôas, que se banha nas
águas de Temer. 
Boanerges de Castro 
Rio de Janeiro, RJ 
(Enviado via carta)
Vésperas do pleito

 Hoje céticos, tremendo de medo, ou mesmo mal-intencionados, alguns


segmentos da mídia se põem a questionar se Lula terá carisma e poder
suficientes para transferir ao seu escolhido o “oceano de votos” que as
pesquisas lhe atribuíam no momento em que foi arrancado a fórceps pelo
Judiciário da corrida presidencial, capaz até de levá-lo à vitória em primeiro
turno (mais de 40%, nas primeiras pesquisas do ano). Sem dúvida, trata-se
de uma tarefa monumental, dada a exiguidade de tempo. Faltam apenas
três semanas para a realização do pleito. Para a maioria do povo, a
transfusão de votos de Lula para Haddad começou. Diga-se, para o
desespero do Ministério Público, Polícia Federal, tribunais superiores de
uma maneira geral e, principalmente, de Sergio Moro e sua equipe de
procuradores, adeptos de convicções, achismos e indeterminações.
José Nilton Mariano Saraiva
Fortaleza, CE
(Enviado via carta)

 É necessário um consagrado diretor de encenação teatral para a ágora


tropical que tem sido esta campanha eleitoral à Presidência. A tragédia
(drama) e a comédia (farsa) convergem em uma catarse de quinta
categoria. Tudo muito canastrão, das sabatinas e dos debates aos
atentados. Nem mesmo o atentado contra Bolsonaro foi político ou
ideológico. Foi o ato de um coadjuvante amador e doente mental. Nem
mesmo a imprensa escapa da mediocridade. Preparemo-nos: daqui a dois
anos haverá o repeteco municipal.
Ney José Pereira
São Paulo, SP
(Enviado via carta)

 Hipocrisia, como ensina o Dicionário Aurélio, significa fingimento,


simulação, falsidade. Assim, permito-me afirmar que o Brasil,
administrativamente, é o retrato fiel da hipocrisia. O governo enfrenta o
problema de déficit fiscal simplesmente com a Emenda nº 95, do teto de
gastos, cortando investimentos em educação, saúde e segurança.
Levantamento recente do Unicef aponta que três em cada cinco crianças e
adolescentes, no Brasil, vivem na pobreza. Portanto, sem acesso aos
mesmos direitos fundamentais que Temer quer restringir. Ora, essa
situação é mamão com açúcar para o crime organizado, que domina as
periferias das grandes cidades brasileiras, numa situação de ver- dadeira
guerrilha urbana. Se a Receita Federal e a Justiça fossem eficientes em
relação às evidentes evoluções patrimoniais dos políticos e de seus
familiares, obtidas durante seus mandatos, no combate à corrupção, à
sonegação fiscal e na cobrança dos grandes devedores, não haveria déficit
fiscal. Portanto, chega de hipocrisia. 
Domingos Sávio de Arruda
Brasília, DF 
(Enviado via carta)

Sem voto e sem razão

 A excelente coluna chama nossa atenção para a ascensão do


neoautoritarismo e busca relacionar a postura do ministro Luís Roberto
Barroso com a renovação “do debate jurídico e político da República Velha,
ideólogos das restrições à democracia e da ditadura Estado-Novista”. Na
argumentação, recupera trechos de Oliveira Vianna, incontestável
conservador. Não debato a posição política de Oliveira Vianna, mas ao
leitor vale destacar alguns trechos de seu livro Instituições Políticas
Brasileiras, a respeito do Poder Judiciário. O “autoritarismo” de Oliveira
Vianna era complexo. Não pode ser reduzido ao questionamento da
capacidade das massas de praticar o self-government. Ao que parece,
Oliveira Vianna era um crítico dos liberais, mas principalmente da
impunidade, resultado do arbítrio de poderes locais. Eis o trecho: “O ponto
vital da democracia brasileira não está no sufrágio liberalizado a todo
mundo, repito; está na garantia efetiva do homem do povo-massa,
campônio ou operário, contra o arbítrio dos que ‘estão em cima’ – dos que
detêm o poder, dos que ‘são governo’. Pouco importa para a democracia no
Brasil, sejam estas autoridades locais eleitas diretamente pelo povo-massa
ou nomeadas por investidura carismática: se elas forem efetivamente
contidas e impedidas do arbítrio – a democracia estará realizada”. Mesmo
fora do campo da esquerda, conservadores do porte de Oliveira Vianna têm
muito a nos ensinar sobre a democracia liberal e seus limites na realidade
social brasileira. Penso ser infeliz qualquer redução de seu pensamento a
um conservadorismo antidemocrático. 
Márcio Rocha
São Paulo, SP 
(Enviado via carta)

Errata – Edição 1021, de 19 de setembro de 2018

 Na reportagem “Na boca dos crocodilos”, a pesquisa de Melissa Spröesser


Alonso, ao contrário do afirmado, não se refere a um programa da
prefeitura em parceria com ONG, mas ao Programa Mais Médicos instituído
pelo governo federal em 2013 na gestão do ministro da Saúde Alexandre
Padilha, implantado no País e que no município de Mauá (SP) apresentou,
conforme relata corretamente a matéria, resultados importantes, como
aumento da cobertura da rede de atenção básica, de consultas e visitas
domiciliares, do número de pacientes com acompanhamento e controle de
diabetes e hipertensão, redução dos atendimentos de urgência e redução
da mortalidade de crianças de até 1 ano, entre outros efeitos. 
Francisco Machado
Brasília, DF 
(Enviado via carta)
49% das mulheres não votariam de jeito nenhum em Bolsonaro. Mas 17% delas declararam voto
no candidato

Para algumas, #EleSim

 Pela família não pode ser: o cidadão foi casado três vezes e teve dois
filhos fora do casamento religioso. Cristãos também não, porque estes não
apoiam a tortura. 
Fernando Moraes 
(Enviado via Facebook)

ÍNDICE

 CRÉDITO DA PÁGINA: Heinrich Aikawa/Instituto Lula e Fábio Rodrigues Pozzebom/Abr


Baleias no caminho
TheObserver O intenso tráfego de navios nas Ilhas Gregas acelera o desaparecimento
dos cachalotes

Por Helena Smith

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Em
um

Há ao menos 300 espécimes em águas gregas

escritório numa colina íngreme em um subúrbio litorâneo de Atenas, uma pequena


luz azul pisca num terminal de computador. O doutor Alexandros Frantzis, o mais
conhecido oceanógrafo da Grécia, aponta para ela. A luz acompanha o tráfego
marítimo “em tempo real”, explica. Isso é essencial para salvar uma das populações
de baleias mais ameaçadas do mundo. “Com intervalos de segundos, ela marca a
posição, o curso e a velocidade de um navio que entra em águas gregas”, diz. “Isso
é vital para mapear a densidade da navegação em áreas povoadas por baleias
cachalotes.” 

Frantzis passou quase 25 anos estudando os mamíferos marinhos. Sua mesa,


assim como seu pequeno Instituto Pelagos de Pesquisa de Cetáceos, é testemunha
de uma paixão que ajudou a transformar a compreensão sobre golfinhos, tartarugas
e baleias em um país onde pouco se sabia sobre a vida marinha há apenas duas
décadas. As prateleiras estão cheias de ossos de mamíferos marinhos, grandes e
pequenos. Os restos da mandíbula de um cachalote estão encostados a uma
parede no escritório dos fundos. Em outra sala, os esqueletos de duas baleias –
gigantescos, casquentos e amarelos – estão nitidamente montados pelo chão. 

“O ambiente marinho da Grécia é muito rico em espécies”, diz Frantzis. “Na


Antiguidade, os cetáceos eram levados muito a sério. Aristóteles escreveu o
primeiro estudo científico sobre eles, Historia Animalium. Você poderia dizer que os
gregos foram os primeiros e os últimos a chegar a esse campo, e é por isso que
estão sendo tomadas medidas urgentes.” 

Os cachalotes são o foco da última campanha de Frantzis. Embora prevalentes em


outros mares, há ao menos 300 espécimes em águas gregas, seu maior hábitat no
Mediterrâneo Oriental. Assim como os mamíferos marinhos na maioria dos lugares,
as baleias enfrentam diversas ameaças, como se emaranhar em redes de pesca ou
ingerir lixo plástico que vaga fartamente pelos oceanos. 

Na Grécia há o risco adicional da poluição sonora dos navios de guerra da Otan,


que fazem exercícios submarinos com equipamentos de comunicação, culpados por
desorientar as baleias que têm sua própria forma de sonar para navegar e caçar. As
pesquisas sísmicas, após a descoberta de hidrocarbonetos no fundo do mar,
também representam mais uma séria ameaça. 

“Aristóteles escreveu o primeiro estudo científico sobre os


cetáceos, Historia Animalium”, cita o biólogo Alexandros Frantzis

Frantzis afirma, porém, que o maior perigo para os cetáceos na Grécia é a


probabilidade de colidir com essas embarcações. Ele destaca as águas do
Peloponeso Ocidental, onde há muitas baleias e uma das rotas mais movimentadas
de navios- -tanque, de carga e cruzeiro. Em abril, uma baleia de 9 metros apareceu
na praia, em Santorini. Frantzis tem agora sobre sua mesa um grande osso branco,
um dos dentes do cetáceo. 

Para os cachalotes, a morte por colisão é a mais dolorosa, afirma, pois as hélices
muitas vezes deixam o animal ferido com profundos cortes. “Não sabemos como
ocorreu esse incidente”, suspira, descartando relatos de que foi encontrada grande
quantidade de plástico no trato digestivo do animal. “Mas o que sabemos é que ao
menos uma baleia é morta por ano em consequência de choque com algum navio.
É um índice de mortes a que a espécie nesta parte do mundo não pode
sobreviver.” 

Segundo os conservacionistas, se as rotas de navegação fossem afastadas da


costa, o risco de choques cairia consideravelmente. “Os cachalotes gostam de
águas próximas a um forte declive submarino, mas, infelizmente, a trincheira
Helênica ao largo do Peloponeso é também a rota direta para navios que se
deslocam paralelamente à costa”, disse ao Observer o cientista de mamíferos
marinhos britânico Russell Leaper. 

A Grécia não é a única. A extremidade sul do Sri Lanka, uma das rotas de
navegação mais movimentadas do mundo, representa um perigo semelhante para a
população de baleias-azuis. Os ambientalistas conseguiram o apoio inesperado da
indústria de navegação. A Organização Marítima Internacional, reconhecendo o
problema, traçou diretrizes para melhorar esse quadro. No início deste mês, a
Comissão Internacional da Baleia pediu uma ação urgente do governo grego,
alegando que evidências científicas mostram que os choques de navios precisam
ser abordados. 

“Às vezes, baleias são apanhadas na proa de um navio com a metade da cauda
arrancada”, diz Leaper. “Às vezes, você recebe um corpo que não mostra
ferimentos externos, mas os ossos foram esmagados. Em todos os casos, é uma
morte terrível.” 

A coalizão de esquerda do primeiro- -ministro grego, Alexis Tsipras, deverá


apresentar propostas à OMI, para reorientar as rotas dos navios neste verão.
Frantzis e sua equipe ajudaram a identificar águas com tendência a choques com
navios por causa da alta densidade de baleias. Grande parte da pesquisa baseou-
se em análises matemáticas realizadas por Leaper. Ele acredita que bastaria
deslocar o tráfego 5 milhas para longe do litoral. O cientista também cita o exemplo
de abordagens que foram alteradas no Canal do Panamá e ao largo da Califórnia. • 

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: GETTY IMAGES


Nasce um presidente
Fernando Haddad transmite uma impressão de serenidade e de traquejo,
inclusive diante da mídia. E de total lealdade a Lula

Por Mauricio Dias

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Silva Jardim já sabia dos riscos da conciliação

Embora haja muitas certezas, sustentadas não só pelas pesquisas eleitorais, mas
também por razões políticas, Fernando Haddad tornou-se candidato do Partido dos
Trabalhadores e ultrapassará, mais cedo do que se pensa, o porcentual de intenção
de votos dado a Jair Bolsonaro, o mais direto dos adversários dele. 

Há, de fato, possibilidade de riscos, não muito longe da premonição anunciada


pelas cartas do baralho ou pela leitura de mãos. Estão excetuados, nestas
afirmações, os casos de hecatombes. Ou mesmo de facadas cruéis, condenáveis e
inesperadas. 

A coragem do ex-presidente Lula, somada à paciência, sutileza, e garra de Haddad,


permite dizer que nasceu um novo presidente. Com perfil diferente, porém fiel às
circunstâncias do projeto de esquerda-centro montado por Lula desde o primeiro
governo. 

O ex-presidente não elegeu um poste como provocam adversários atropelados


pelas circunstâncias. Desponta, sim, um novo presidente. De esquerda. 

Haddad tropeçou nos primeiros dias. Principalmente quando enfrentou a


malandragem da mídia. Ou seja, quando ainda não tinha certeza do resultado
costurado no Judiciário. Tranquilo, portou-se como um vice-presidente na chapa
petista. Com toda a lealdade. O provável futuro presidente, é a minha esperança,
não haverá de ser um conciliador sem adaptação às mudanças políticas do tempo.
Creio que, talvez, leitor de Raymundo Faoro, saiba das consequências de se
entregar a conciliação. Dentro dela há conflitos perigosos. 

Silva Jardim, um dos mais importantes políticos durante a luta republicana, sofreu
com isso. Bateu de frente com Quintino Bocaiúva, que armava uma saída
conciliatória do Segundo Reinado para a República. Bobeou e perdeu. Jardim já
alertava para isso. Advertiu: “Você não criará a República, e sim o Terceiro
Reinado”. Perdeu também. Iludido, partiu de navio para a Itália e, dizem, atirou-se
no Vesúvio. 

Haddad enfrentou com muita paciência as entrevistas, em que, em alguma delas,


sofria agressões e também, em certos casos, pressões naturais impostas pelos
repórteres. 

Afirmou, com a serenidade de um chefe de Estado, que os militares estão


subordinados ao presidente. Haddad mandará. E as reações da mídia? Não fugiu
da pergunta. 

“Sou a favor de que não haja excesso de concentração de propriedade. Sobretudo


propriedade cruzada”, considerou, com tranquilidade. 

Ele terminou a explicação com um bico na canela: “A legislação proíbe caciques


regionais, que mandam em tudo”. 

Os caciques, no caso, são também conhecidos como barões da mídia. • 

ANDANTE MOSSO
Ela denuncia o horror

Impecável Conceição
Já está pronta para circular, sair do forno, em 2019, a cinebiografia da economista
Maria da Conceição Tavares, 88 anos, dirigida pelo talentoso documentarista José
Mariani. 

Conceição, portuguesa naturalizada brasileira, dispensa comentários. Ela cria


comentários. Ácidos de preferência. Mariani, também por isso, acertou no
título: Livre Pensar. Dois exemplos saídos do livre-pensamento. 

Eis um: “Uma economia que diz que precisa estabilizar, para depois crescer, para
depois distribuir, é uma falácia, é uma economia que condena os povos a uma
brutal desigualdade de concentração de renda e de riqueza. Isso é coisa de
tecnocrata alucinado, que acha que está tudo ok, e não está tudo ok”. 

E outro: “Não tem nada a ver um sujeito ter sido esquerdista na juventude e virar
direitista, uma coisa horrível, uma desgraça, um horror”. 

Há um enxame deles no Brasil. Que enfiem a cabeça na carapuça. 

Os caminhos de Mourão

Exatamente em setembro de 2017 o general Hamilton Mourão, ainda fardado, falou


como quis em uma Loja Maçônica em Brasília, de forma ameaçadora para um
grupo de pascácios que o aplaudia. 

Ele atropelou, por diversas vezes, a democracia e se disse disposto a “botar a casa
em ordem”. Perguntado diretamente sobre a intervenção militar no processo
democrático, explicou que, caso fosse preciso, seria feito na forma de
“aproximações sucessivas”. Orientou: “Não existe forma de bolo”. 

Grande repercussão. Aparentemente, viu-se forçado a ir para a reserva. O general


Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, parecia sofrer constrangimento.
Engano, pois logo, logorecebeu a visita de Jair Bolsonaro. O encontro foi registrado
pela fotografia. 

Mourão, ainda com cheiro de verde, assumiu a presidência do histórico Clube


Militar. Hoje é um discutido vice- -presidente na chapa do ameaçador Jair
Bolsonaro. 

No brasão do Clube Militar, instituição privada, há uma menção de louvor à


democracia. A história comprova, porém, que este nunca foi um obstáculo para ser
desprezado por certos militares. 

Lembrai-vos

A voz do senador Alvaro Dias, candidato à Presidência da República, assemelha-se


à voz e às inflexões do radialista Alziro Zarur, fundador da Legião da Boa Vontade,
nos anos de 1950. 

As mensagens de Zarur, alastradas País afora, puxariam o Partido da Boa Vontade,


que ele criou e pelo qual disputaria a Presidência em 1965. A eleição foi vetada e os
partidos cassados pela ditadura. 

Tal pai, tal filho


A competição para a Câmara de Deputados, no Rio de Janeiro, tem marcas
profundas dos sucessores dos pais apanhados na Lava Jato. 

Sérgio Cabral, ex-governador, tem o filho Marco Antonio na segunda eleição, assim
como o deputado Leonardo Picciani, filho do poderoso Jorge Picciani, senhor da
Assembleia Legislativa e do ex-PMDB. 

Daniela Cunha, filha do astuto Eduardo, preso em Curitiba, vai testar o poder da
herança eleitoral deixada pelo pai, além dos rastros existentes. 

E, finalmente, Marcelo Crivella, filho do atual prefeito carioca. 

Há quem aposte no número de votos que o pai espera obter. 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: DIFUSÃO


A união necessária
É indispensável que as forças progressistas reconheçam o objetivo comum

Por Mino Carta

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Contra a ditadura, o MDB do doutor Ulysses reuniu todos os resistentes

Ressurge o fantasma fardado na iminência do embate eleitoral. Foi despertado por


uma entrevista do comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, publicada
pelo Estadão domingo 9 de setembro. Indícios posteriores confirmam sua presença
no horizonte. O general soletrou que às Forças Armadas cabe verificar se o
resultado do pleito será aceitável ou não do alto de uma posição de árbitro
irrecorrível. O subtexto proclama aos berros a ameaça golpista, reforçada pelas
repercussões da entrevista. 

Os anos 2016 e 1964 são dos golpes, mas aquele é diferente deste, embora ambos
sejam vincados pela tradicional hipocrisia brasileira, pelo apoio praticamente maciço
da mídia e pela óbvia presença, por trás de tudo, da casa-grande. Cinquenta e
quatro anos atrás, alegou-se o propósito de “pôr o País em ordem”, estancar a
hemorragia inflacionária e impedir a comunistização do Brasil. O golpe dentro do
golpe de 1968 multiplicou a fúria ditatorial. Manteve cinicamente, porém, a presença
de dois partidos na arena política e um calendário eleitoral para a renovação do
Congresso até uma eleição para o governo dos estados em 1982. 

Não poderia haver engano em relação à verdadeira natureza da ditadura, mesmo


porque o regime torturou e matou, censurou parte da mídia resistente e chegou a
enviar seus mestres em tortura para o Chile para prestarem a Pinochet seus
preciosos serviços. Já em 2016, a hipocrisia atingiu seu zênite, legalizou- -se a mais
escancarada ilegalidade com o objetivo final de impedir a candidatura de Lula em
2018. Pela hedionda tramoia atingiu-se o alvo e nem por isso a vitória eleitoral. O
desastre golpista motiva hoje a inquietação dos estrelados. 

Alcançamos um momento crucial da nossa atormentada história. A pesquisa mais


recente prova que, para desespero dos atuais donos do poder e da mídia nativa,
Lula transfere seus votos a Fernando Haddad. Em uma semana depois da
oficialização da candidatura, ele já amealhou metade da porcentagem alcançada
nas pesquisas pelo ex- -presidente ainda candidato. Gostaria de poder imaginar,
como cidadão e jornalista, uma sólida união no campo progressista na hora do
embate final de um pleito polarizado abruptamente entre petistas e antipetistas,
como escreve Marcos Coimbra na sua coluna à página 33. Permito-me um reparo:
entre lulistas e antilulistas. 

Recordo as eleições de 1974, em plena ditadura. O generoso MDB do doutor


Ulysses abrigava todos os resistentes e venceu em São Paulo e outros estados.
Dias após, encontrei em Brasília o general Golbery, chefe da Casa Civil de Ernesto
Geisel. Fez questão de sublinhar que aquele resultado sugeria intensificar a
chamada abertura. E o Merlin do Planalto sorriu na ponta dos lábios e comentou:
“Eu sou mesmo um parlapatão”. Logo sofreria o descolamento da retina e por
longos meses ficaria longe do governo, até o começo de agosto de 1975, quando
Geisel, na ausência de Golbery, pronunciou o fatídico discurso da “pá de cal”, a
significar o enterro da abertura, por mais lenta, gradual e segura que fosse.
Enquanto o doutor Ulysses comparava o nosso ditador a Idi Amin, o Merlin
planaltino previu a escalada do terror de Estado, que culminaria com a morte de
Vlado Herzog e Manuel Fiel Filho. 

Após a destituição do general Ednardo D’Ávila Mello, comandante do II Exército, o


projeto da abertura foi retomado até a saída do general Figueiredo pela porta dos
fundos do Planalto, em março de 1985. Hoje, diante da calamidade provocada pelo
golpe de 2016, a união das forças progressistas é indispensável para evitar a
ameaça Bolsonaro e iniciar a ciclópica operação destinada a devolver o País à
observância da Constituição e recompô-lo das injúrias materiais e morais padecidas
na mão dos golpistas. Tarefa imponente e certamente de longa duração. A
determinação dos resistentes, sua capacidade representar a maioria é fundamental
diante das incógnitas do pós-eleição. Qual haverá de ser a reação da casa-grande
devota do deus mercado? E como encarar o aparente despertar do fantasma
fardado? • 

ÍNDICE
São Paulo/ Propaganda enganosa
A Justiça Eleitoral proíbe o tucano João Doria de usar imagens de escolas dos
Estados Unidos e da Rússia em material de campanha

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O ex-prefeito abusou da esperteza

João Doria travestiu-se de gari, pintor de paredes e até mesmo cadeirante em sua
passagem pela prefeitura de São Paulo. Hoje na disputa pelo governo paulista, o
tucano busca desesperadamente preservar a puída fantasia de “gestor”, mas
acabou surpreendido ao recorrer a manjados truques de marketing. Na segunda-
feira 17, o Tribunal Regional Eleitoral proibiu o candidato do PSDB de utilizar
imagens de escolas e clínicas da Rússia e dos Estados Unidos em sua
propaganda. 

Para ilustrar alguns de seus feitos, como uma “creche de Primeiro Mundo”, Doria
usou trechos de vídeos comercializados em bancos de imagens estrangeiros,
revelou uma reportagem da Rádio CBN. As cenas usadas no material de campanha
podem ser encontradas em vídeos antigos no YouTube e em canais das redes
norte-americanas NBC e CBS. 

“Há que se considerar ocorrida a divulgação de imagens que não correspondem à


realidade, fato apurado pela imprensa e aparentemente confessado pelos
representados”, afirmou o juiz auxiliar de propaganda eleitoral Afonso Celso da
Silva, ao acolher o pedido de liminar da coligação do candidato petista, Luiz
Marinho. Segundo o magistrado, a legislação proíbe “o uso de trucagem,
computação gráfica, desenhos animados e efeitos especiais, além de terem sido
utilizados meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública,
estados mentais, emocionais ou passivos”. 

A decisão prevê multa de 10 mil reais em caso de descumprimento. De acordo com


a assessoria de imprensa de Doria, a campanha tucana só recorreu aos bancos de
imagens porque o Estatuto da Criança e do Adolescente não permite exibir crianças
sem autorização judicial. 

A onda fake, para usar o estrangeirismo da moda, também é surfada pela campa-


nha de Jair Bolsonaro. Recentemente, o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do
presidenciável do PSL, compartilhou no Twitter um vídeo de “uma mulher negra e
de família pobre”, que diz ter se liber- tado do “vitimismo” e declara voto em
Bolsonaro. A cena, descobriu-se depois, é de um banco de imagens. 

Segundo a BBC Brasil, a mulher retratada é uma executiva canadense de origem


etíope, que no passado trabalhou como atriz. A ShutterStock, plataforma onde o
vídeo foi hospedado, lamentou o “uso indevido de seu conteúdo” e prometeu
investigar o problema. A campanha de Bolsonaro, por sua vez, negou a autoria da
peça de propaganda. 

CartaCapital é premiada
Na quarta-feira 19, CartaCapital recebeu o prêmio “Destaque Econômico do Ano”,
na categoria mídia, oferecido pelo Conselho Federal de Economia, que representa
mais de 230 mil profissionais da área. Manuela Carta, publisher da Editora
Confiança, recebeu a honraria na noite da quarta-feira 19, durante o 26º Simpósio
Nacional dos Conselhos de Economia, realizado em Porto Velho (RO). Na ocasião,
o economista Ladislau Dowbor também recebeu o prêmio “Personalidade
Econômica do Ano”. 

Ficha Limpa/ Garotinho não é Lula


O TSE libera o ex-governador do Rio a prosseguir na campanha até
esgotar todos os recursos. Em situação similar, o ex-presidente não
teve a mesma sorte

Em
O episódio evidencia a “jurisprudência Lula”

situação jurídica similar à de Lula, considerado inelegível após uma condenação em


tribunal colegiado, o ex-governador Anthony Garotinho foi autorizado pelo Tribunal
Superior Eleitoral a prosseguir com sua campanha. No domingo 16, o ministro Og
Fernandes suspendeu os efeitos de uma decisão anterior do Tribunal Regional
Eleitoral do Rio de Janeiro, que havia rejeitado o registro da candidatura de
Garotinho com base na Lei da Ficha Limpa.  

A decisão de Fernandes, em caráter liminar e válida até o julgamento do mérito,


garante que o nome do candidato ao governo fluminense esteja nas urnas e que
seus votos sejam computados. No recurso ao TSE, a defesa de Garotinho observou
que a interdição da candidatura traria “irreparáveis prejuízos, pois lhe impedirá de
efetuar todos os atos relativos à campanha, inclusive utilizar o horário eleitoral
gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome na urna eletrônica”. 

O episódio evidencia o que numerosos juristas chamam de “jurisprudência Lula”,


isto é, aquela que vale somente para o ex-presidente, e ninguém mais.

Rebuliço no Posto Ipiranga


Primeiro, o jornal Folha de S.Paulo noticiou que o economista Paulo Guedes
pretendia recriar a CPMF. Guedes é o “Posto Ipiranga” de Bolsonaro (segundo o
próprio) – recorre a ele, seu “ministro da Fazenda”, sempre que questionado sobre
qualquer assunto relativo à economia. “Ignorem essas notícias mal-intencionadas”,
rebateu o capitão em seu Twitter. “Não procede. Querem criar pânico. Ninguém
aguenta mais impostos, temos consciência disso.” Por fim, o posto pegou fogo
quando Guedes reafirmou sua intenção, desta vez ao Valor Econômico. 

Rio de Janeiro/ A barbárie é míope


Polícia militar confunde guarda-chuva com fuzil e mata um garçom

Na

Rodrigo Silva, de 26 anos, levou três tiros e morreu

segunda-feira 17, o garçom Rodrigo Alexandre da Silva, morador da favela de


Chapéu Mangueira, na Zona Sul do Rio, foi buscar a mulher e os dois filhos perto
de sua casa. Levou consigo o celular e, este o seu azar, um “canguru” e um guarda-
chuva. “Canguru” é aquele suporte para carregar bebês como numa mochila. 

Rodrigo, 26 anos, levou três tiros e morreu. Tiros disparados pela PM, que
confundiu o guarda-chuva com um fuzil. E o “canguru”, com um colete à prova de
balas. No boletim de ocorrência, ainda se anotou: “Agentes foram alertados por
populares que havia criminosos. Chegando ao local, houve troca de tiros e um
breve confronto”. Vai ver o guarda-chuva de Rodrigo era como o de 007. Esta não é
a primeira vez que uma “confusão” da PM carioca mata um inocente. Em 2010, o
Bope eliminou o portador de uma furadeira. Em 2016, um policial militar assassinou
um adolescente com um saco de “drogas”. No caso, pipocas. Aconteceu também
com celulares, chaves de roda e outras ferramentas.
Alemanha/ Deslealdade premiada
Polícia militar confunde guarda-chuva com fuzil e mata um garçom

Maassen desafiou Merkel e saiu ganhando. Sinal de que o poder da chefe está por um fio

chefe dos serviços secretos, Hans-Georg Maassen, manifestou uma estranha


simpatia por extremistas de direita ao pôr em dúvida a autenticidade de imagens de
agressões de imigrantes em Chemnitz, que motivaram uma condenação da chefe
de governo, Angela Merkel, aos protestos dos neonazistas. O Partido Social-
Democrata exigiu sua demissão e Merkel pareceu disposta a atendê-lo, mas
Maassen foi protegido pelo ministro do Interior, Horst Seehofer, da União Social
Cristã (CSU), partido bávaro de direita essencial para a sustentação da coalizão
governamental. 

O acordo, após duas semanas de impasse, evidencia o enfraquecimento de Merkel:


Maassen foi transferido para uma secretaria do Ministério do Interior, uma
promoção com direito a aumento de salário. Maassen, que conversou várias vezes
com membros da xenófoba AfD nos últimos anos, tornou-se um herói da ultradireita.
Suspeita-se de que ele e Seehofer trabalham para tomar o lugar de Merkel em
aliança com os racistas. 

Aposta no tudo ou nada


Em vias de ser emparedado pela maioria fujimorista do Congresso, como aconteceu
com o antecessor Pedro Pablo Kuczynski, forçado a renunciar em março, o
presidente peruano Martín Vizcarra apresentou quatro propostas de reformas
constitucionais a serem submetidas a referendo, associadas a uma moção de
confiança a seu gabinete. Se qualquer das propostas for rejeitada, a Constituição
lhe dará o poder de convocar novas eleições legislativas, pois seria o segundo veto
a um governo no mesmo período presidencial. O fujimorismo, com popularidade em
queda, tem interesse em evitá-las, mas também rejeita as reformas, entre as quais
se inclui o fim da reeleição de deputados, com o objetivo de combater a corrupção.
O desfecho da disputa deve decidir o futuro deste governo, com mandato até 2021. 

Venezuela/ Ninguém quer Os Marines


Sugestão de intervenção de Almagro é repudiada pelo Grupo de Lima

No

Ao servir Trump, Almagro foi rechaçado até por conservadores

sábado 15, ao lado do chanceler do governo uribista da Colômbia, Carlos Trujillo, o


secretário-geral da OEA, Luis Almagro, disse à mídia colombiana não descartar
nenhuma opção para derrubar o governo de Nicolás Maduro: “As ações
diplomáticas estão em primeiro lugar, mas outras não podem ser descartadas”. A
sugestão de intervenção militar estrangeira de Almagro foi rechaçada não só pela
Venezuela e pelas aliadas Bolívia e Cuba, mas também pelo seu Uruguai nativo e
por um comunicado conjunto da maioria dos 14 países que se propuseram a
negociar uma saída para a crise venezuelana e constituem o Grupo de Lima,
inclusive os governos conservadores do Brasil, Argentina, Chile, México e Paraguai.
Apenas Canadá, Colômbia e Guiana se omitiram. A OEA volta a agir, como nos
anos 1970, como mera extensão do Departamento de Estado de Washington, mas
o consenso latino-americano contra intervenções externas explícitas, consolidado
nos anos 1990, ainda se mantém parcialmente de pé. 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: Aloisio Mauricio/Fotoarena, Wanezza soares, JORGE HELY/FramePhoto / AG. O


GLOBO, Juan Manuel Herrera/OAS e arquivo pessoal
Apreensão e medo
Movida a Bolsonarismo e Antipetismo, a inquietação entre muitos militares ameaça
o Brasil. Pela via eleitoral e por aquela tradicional, a do golpe fardado

Por André Barrocal

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A facada recebida na véspera do Dia da Independência levou o deputado Jair


Bolsonaro a um hospital, duas cirurgias e mais pontos na corrida presidencial. O
avanço de Fernando Haddad nas pesquisas desenha para a reta final do primeiro
turno uma campanha com cara de segundo. Quem será mais odiado, Bolsonaro ou
o PT? Da cama, o candidato da extrema-direita foi gravado em vídeo no domingo
16 por um dos três filhos e o que se vê é de arrepiar. Primeiro, sugere que, se
perder a eleição, terá sido trapaça. “A grande preocupação realmente não é perder
no voto, é perder na fraude”, disse, a botar em dúvida a lisura das urnas eletrônicas.
Depois, mostrou que contra o PT vale tudo, até a golpe. “Mais do que a corrupção,
é a questão ideológica.” “Quando vi a reeleição de Dilma Rousseff”, prossegue,
“pensei comigo mesmo: não podemos esperar 2018, porque o Lula vem melhor…
Eles não vão mais sair daí.” 

Seria apenas mais uma leva de declarações tresloucadas, não fosse por uns
detalhes. Bolsonaro foi abraçado como candidato por uma parcela grande do
Exército, uma eleição em que há um número recorde de candidatos militares a
vários cargos. Em 21 anos no poder, na ditadura de 1964 a 1985, o Exército deixou
um legado de mortes, concentração de renda e, sim, de corrupção, embora hoje
seja visto como a instituição mais confiável (78%), conforme um Datafolha de junho
passado. Um CV suficiente para temer um governo Bolsonaro nascido do voto ou
da porrada. “O Bolsonaro era execrado pelos militares, pelo passado de
insubordinação, hoje a visão sobre ele mudou nas Forças Armadas. Ele penetrou
nos dois setores mais efervescentes do Exército: a reserva, que pode falar o que
quer sem ser punida, e os majores e capitães, que estão em um ponto da carreira
em que olham para o futuro”, diz um general. 

O capitão no meio dos eleitores

Recorde-se o motivo da execração. Bolsonaro era capitão em 1987, quando


publicou um artigo na revista Veja a reclamar de salário. Foi preso por 15 dias, por
“ter ferido a ética, gerando clima de inquietação na organização militar”, segundo
um processo aberto no Superior Tribunal Militar. O processo examinou ainda um
segundo fato, mais grave. Inspirada pelo artigo, Vejafizera uma reportagem, em
1988, a relatar que Bolsonaro tinha um plano para chamar atenção para a questão
salarial: estourar bombas pelo Rio. O caso foi julgado, primeiro, por uma comissão
de três coronéis, e terminou em condenação unânime de Bolsonaro. No STM, ele
foi absolvido por 8 a 4. No fim de 1988, elegeu-se vereador na cidade do Rio e aí
virou capitão aposentado. 
Dizia em 2014 um manifesto saído dos quartéis da
“impossibilidade de tirar o PT do poder”, amparado “em forças
paramilitares” a serviço de um projeto comunista

O símbolo do abraço do bolsonarismo por grande parte do Exército foi a escolha do


vice da chapa. O preferido era o general de pijama Augusto Heleno, de 70 anos.
Nascido em Curitiba, é influente na caserna. Foi o primeiro chefe da missão de paz
da ONU no Haiti liderada pelo Brasil, posição ocupada de 2004 a 2005. Esteve à
frente do estratégico Comando Militar da Amazônia de 2008 a 2009 e atacou em
público a política indigenista “caótica” do governo Lula. Pendurou a farda em 2011
com um discurso a favor do golpe de 1964. Na eleição de 2014, foi lançado para
presidente, sinal de que os quartéis se agitam faz tempo, com um manifesto de
dezenas de oficiais. À frente, um general da reserva morto em junho, aos 92 anos,
Pedro Luís de Araújo Braga. O texto apontava “a quase impossibilidade de tirar o
PT do poder”, devido a (loucura) “forças paramilitares a serviço de um projeto de
poder comunista”, e mesmo por meio de “eleições livres, mas viciadas pela prática
de estelionatos eleitorais e fraudes”. 

Não foi coincidência Bolsonaro ter proposto em 2015, como deputado, uma lei do
voto impresso, derrubada pela Justiça. Nem foi um repente o que ele falou agora
sobre fraude. Heleno foi à convenção do PSL que oficializou a candidatura de
Bolsonaro, mas não pôde ser o vice, pois seu partido, o PRP, não deixou. A vaga
ficou com outro general de pijama respeitado pelos colegas, Antonio Hamilton
Mourão. Nascido em Porto Alegre, Mourão, de 65 anos, entrou para a reserva em
fevereiro. De 2014 a 2015, chefiou o Comando Militar do Sul. Saiu do cargo por
dizer certas coisas durante a agonia de Dilma Rousseff. Em setembro de 2015,
convocou colegas para “o despertar de uma luta patriótica”, ou seja, golpe. No mês
seguinte, permitiu que houvesse em uma unidade sob seu comando uma
homenagem ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, torturador de Dilma. Gota
d’água. 
Toffoli chama o general Azevedo e Silva ...

Com Michel Temer, mais verborragia. Em setembro de 2017, em uma palestra num
grupo maçônico em Brasília, Mourão falou várias vezes em intervenção militar como
saída para a crise política. “Os Poderes terão que buscar uma solução, se não
conseguirem, chegará a hora em que teremos que impor uma solução.” Em
dezembro, criticou Temer abertamente. “Nosso atual presidente, ele vai aos trancos
e barrancos, buscando se equilibrar, e, mediante um balcão de negócios, chegar ao
final do seu mandato.” Foi afastado das finanças em seguida. Em fevereiro, entrou
para a reserva. 
... para se resguardar contra as facções mais reacionárias

Mourão tem dito coisas bizarras como Bolsonaro, reveladoras de uma visão elitista,
preconceituosa. Em agosto, comentou em um almoço em Caxias do Sul que o
brasileiro é indolente por causa dos índios e malandro por causa dos negros. Nos
últimos dias, disse que a política externa “Sul-Sul” dos governos petistas nos
aproximou de uma “mulambada”, os países africanos. Que famílias formadas
apenas por mães e avós, sem pais e avôs, são “fábricas de desajustados”,
declaração comentada da cadeia por Lula: “Eu e sete irmãos fomos criados por uma
mulher analfabeta chamada Dona Lindu e duvido que exista alguém na sociedade
brasileira que educou os filhos melhor do que ela”. A visão de Mourão explica ele ter
defendido nos últimos dias, em Curitiba e São Paulo, que o País tenha uma nova
Constituição, escrita apenas por “notáveis”, não por gente eleita pelo povo. 

O brasileiro é indolente por causa dos índios e malandro por causa


dos negros, garante o General Mourão

Em entrevista ao GloboNews, em 7 de setembro, Mourão defendeu que a crise


política brasileira justificaria um autogolpe por parte de um presidente (Bolsonaro,
presumivelmente) ou das Forças Armadas. “Cruzamos os braços e deixamos que o
País afunde?”, disse. “O próprio presidente é o comandante-chefe das Forças
Armadas, ele pode decidir isso. Ele pode decidir empregar as Forças Armadas. Aí
você pode dizer: ‘Mas isso é um autogolpe’. É um autogolpe, você pode dizer isso.”
Uma semana depois, outro general de pijama, Luiz Eduardo da Rocha Paiva, foi à
emissora e disse barbaridades similares. Na reserva desde 2007, Paiva, de 66
anos, tem sido palpiteiro ativo. Em junho de 2016, logo após a queda de Dilma e a
ascensão de Temer, escreveu um artigo em que dizia “não haver fosso ideológico
entre o atual governo e as Forças Armadas”. Saudoso da ditadura de 1964, disse
no GloboNews que “muita gente que é militar vai votar nele (Bolsonaro), não tenha
dúvida”, que o PT está “implantando uma revolução silenciosa, que é a revolução
gramsciana, ocupando espaços”, “o fato de o PT não estar no poder não significa
que tenha perdido poder”. Defendeu o “autogolpe”, pois não dá para confiar nem no
Supremo Tribunal Federal. “Vai fazer o quê? Vai esperar o esfacelamento da
nação?” 

O
O vice de Bolsonaro propõe um “autogolpe”

novo presidente do STF, Dias Toffoli, mostra que os militares se tornaram um


fantasma. Na segunda-feira 17, rebateu as suspeitas de fraude jogadas por
Bolsonaro. “As urnas eletrônicas são totalmente confiáveis”, disse, “é extremamente
necessário e importante para acabar com determinadas lendas que possam surgir.”
E lembrou: Bolsonaro tem sido eleito por esse sistema há duas décadas. Seu gesto
mais significativo foi mais discreto. Pinçou um general para ser seu assessor
especial na presidência do STF. E não um qualquer. Fernando de Azevedo e Silva
era chefe do Estado Maior do Exército até 31 de agosto. Nesse cargo, cabia a ele
assinar a carta de saudações a oficiais promovidos a general, uma categoria com
uns 150 militares subdividida em três subgrupos, sendo a de “general de Exército” o
mais importante. Há uns 15 deles hoje em dia. Na promoção de 31 de março, um
dos saudados a general de Exército foi o paulista Marcos Antonio Amaro dos
Santos, que comandou a segurança pessoal de Dilma na Presidência. 
Na origem, o general Heleno era o preferido em lugar de Mourão

Pessoas experientes e conhecedoras dos tribunais em Brasília acreditam que a


nomeação do general é uma tentativa de Toffoli de abrir um canal com o Exército.
Uma delas, atuante na PGR, está preocupada e acha que o Supremo também.
Bolsonaro tem planos de esvaziar a Corte atual com a ampliação do número de
juízes, todos indicados, claro, em um eventual governo dele. Em abril, o general de
pijama Paulo Chagas, de 69 anos, candidato ao governo do Distrito Federal, estado
em que o Bolsonaro é líder disparado, divulgou uma carta pública inacreditável
dirigida ao juiz Gilmar Mendes. Foi após o STF negar um habeas corpus a Lula.
Mendes votara pelo HC. “Se a última esperança de salvar a Nação do caos,
depositada pelos brasileiros nas mãos dos Ministros do STF, está desmoronando,
onde estará a salvação?”, dizia a carta. “Estamos na fronteira entre a desordem e o
caos total, o limite está bem à nossa frente.” 
Para outra pessoa experiente nas cortes de Brasília, o caso Lula é, provavelmente,
o motivo de Toffoli ter um general por perto. É possível que o juiz bote em
julgamento, no início de 2019, aquelas ações que acabam com a prisão de
condenados em segunda instância, o que libertaria Lula provisoriamente. “Acho que
foi uma segurança para a hipótese de soltarem o Lula e desagradarem a setores
mais reacionários. Ter um general ao lado, sossega a tropa. Como conheço o
Toffoli, acho que é isso”, diz. 
Quando o STF se preparava para julgar o HC de Lula, militares ajudaram a criar um
clima tenso. Um octogenário general de pijama, Luiz Gonzaga Schroeder Lessa,
gaúcho de São Leopoldo, ex-comandante militar do Leste, na reserva desde 2001,
comentou o assunto em uma rádio. Se o STF deixasse Lula solto, seria “indutor” de
violência. E se a Justiça permitisse que ele se candidatasse, “vai ter derramamento
de sangue”. O petista foi generoso com os militares no governo. Pegou o orçamento
das Forças Armadas em 23 bilhões de reais, em 2003, e entregou mais que o
dobro, 53 bilhões, em 2010 – com Dilma, foi a 74 bilhões; em 2019, serão 92
bilhões. Esse papel histórico é reconhecido pela caserna, segundo aquele general
que explicou a bolsonarização da reserva e dos majores e capitães. Hoje com
quase 70 anos, esse general faz parte de um grupo de mensagens de celular com
antigos colegas de farda e espanta-se com a disseminação de ódio contra o petista,
movido, segundo ele, à combinação de “meias verdades e inverdades” sobre
corrupção. 

Tabaré Vazquez mandou prender o chefe do Exército uruguaio por causa de seus palpites
políticos

Após as declarações de Lessa, o chefe do Exér-cito, general Eduardo Villas Bôas,


de 66 anos, gaúcho de Cruz Alta, no cargo desde fevereiro de 2015, reagiu no
Twitter. “Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de
todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à
paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões
institucionais.” Afirmação de certa forma ambígua. Após a facada em Bolsonaro,
deu uma entrevista ao Estadão, e aí a ambiguidade sumiu. “O pior cenário é termos
alguém sub judice, afrontando tanto a Constituição quanto a Lei da Ficha Limpa,
tirando a legitimidade, dificultando a estabilidade e a governabilidade do futuro
governo e dividindo ainda mais a sociedade brasileira.” Referia-se, claro, ao caso
Lula, então ainda pendente de decisão judicial. 

Tio Sam está bem informado a respeito da corrupção brasileira, inclusive nas Forças Armadas

Para o PT, a entrevista de Villas Bôas, que recebeu vários presidenciáveis em


reuniões separadas em junho, algo inédito, foi uma tentativa de “tutela” da
democracia pelos quartéis. Fernando Haddad falou grosso na segunda-feira 17:
“Quem estiver abaixo da autoridade da Presidência não vai poder sabotar a
democracia, nem com gestos, nem com declarações, nem com nada. Se for um
cargo de confiança, está na rua no dia seguinte”. Ciro Gomes, do PDT, havia dito
coisa parecida dias antes. Ex-presidente da OAB do Rio, o deputado petista Wadih
Damous diz que Villas Bôas merecia punição. “A liberdade de expressão dos
militares é limitada, porque eles andam armados, o que por si só tem poder de
intimidação.” Só não houve nada, afirma, é por Michel Temer ser um presidente
sem autoridade moral para punir alguém. Uma lei de 1986 permite a militares da
reserva opinar sobre política, mas o pessoal da ativa é proibido por um regulamento
disciplinar de 2002, no fim do governo FHC. 

O Uruguai acaba de viver uma situação igual. E lá terminou em ordem de prisão.


Em meados de setembro, o presidente Tabaré Vázquez mandou aplicar pena
máxima ao chefe do Exército, Guido Manini Rios, 30 dias de cana, pois o general
deu palpites sobre uma lei proposta pelo governo. A lei muda as regras de
aposentadoria dos militares, e os palpites foram contrários. Lá, como cá, os
militares são subsidiados pela população. Eles recolhem uma ninharia, param cedo
e embolsam quantia gorda. Em 2016, recolheram 3 bilhões de reais, enquanto as
despesas foram de 37 bilhões. Havia, então, 300 mil inativos militares. Significa que
cada um recebeu por mês, em subsídios de cada brasileiro, 9,5 mil mensais. Em
2019, o rombo será de 43 bilhões, segundo a lei enviada pelo governo ao
Congresso. Uma proposta em que se pode ver a mordomia do auxílio-moradia dos
militares: 11 mil mensais para 226 membros da Aeronáutica, 10 mil para 326 da
Marinha e 9 mil para 417 do Exército. Valores superiores ao do famigerado auxílio
pago a juízes, 4,3 mil. 

O General Villas Bôas, na sua entrevista ao Estadão, atribuiu às forças armadas o papel de
árbitro das próximas eleições

Uruguai teve sua ditadura militar, de 1973 a 1985. A daqui foi mais duradoura. Sua
obra? A tese de doutorado em sociologia vencedora de melhor do ramo no ano
passado faz um apanhado da evolução da concentração de renda no Brasil.
Chama-se “A Desigualdade Vista do Topo: A Concentração de Renda Entre os
Ricos no Brasil, 1926-2013”. Segundo seu autor, Pedro Herculano Guimarães
Ferreira de Souza, pesquisador do Ipea, o Brasil tem uma tradicional concentração
no 1% mais rico em um patamar bem acima de outras nações desiguais. Essa casta
morde por aqui uma média histórica de 23% do PIB. Após o governo autoritário de
Getúlio Vargas, de 1945 em diante, essa fatia caiu. Às vésperas do golpe militar de
1964, que derrubou o presidente João Goulart (1961-1964) e suas reformas de
base, ia de 17% a 19%. Daí os militares tomaram o poder e o naco “aumentou
continuamente até 1971, quando atingiu 26%, maior porcentual desde os anos
1940”. 

A explicação para a concentração de renda com os generais é simples, segundo


Souza. A ditadura facilitou os lucros das empresas e dos ricos via isenções ou
reduções de impostos. A alíquota máxima de IR da pessoa física caiu de 65% para
50%, por exemplo. E os trabalhadores? Arrocho salarial neles, conforme o Plano de
Ação Econômica do Governo (Paeg) do primeiro dos golpistas, marechal Castello
Branco (1964-1967). Dissídios seriam homologados na Justiça somente se
seguissem a regra oficial: pegava-se a média salarial dos dois anos anteriores,
somava-se uma taxa de produtividade e mais metade da inflação prevista para o
ano seguinte. O salário mínimo caiu 30% e só se recuperou (pouco) a partir de
1974. Para o arrocho ser aceito sem choro, as greves foram proibidas. 

Tanto Ciro quanto Haddad reagiram corretamente à ameaça de Villas Bôas

Resultado: o crescimento recorde do PIB, o “milagre econômico” do fim dos anos


1960, início dos 1970, foi apropriado pelos ricos. A desigualdade subiu. Em 1973, o
ditador Emílio Garrastazu Médici (1969-1973) fez uma viagem ao Nordeste e
cunhou uma frase famosa: “A economia vai bem, mas o povo vai mal”. Seu
sucessor, Ernesto Geisel (1974-1979), baixou, em 1975, um novo Plano Nacional
de Desenvolvimento, para substituir o Paeg. Dizia o II PND: “É importante que as
classes trabalhadora e média sejam amplamente atendidas no processo de
expansão”. 

Para levar adiante um projeto de nação em que os ricos se esbaldavam e os


trabalhadores eram explorados, era necessário porrete. Um documento americano
vindo a público em maio é devastador. Estava disponível desde 2015 no site do
Departamento de Estado de Tio Sam e foi descoberto por um professor de
Relações Internacionais da FGV, Matias Spektor. Trata-se de um memorando de 11
de abril de 1974 mandado pelo então chefe da CIA, William Colby, a Henry
Kissinger, cabeça da política externa dos Estados Unidos por décadas. Fazia
menos de um mês da troca de Médici por Geisel e Washington tentou saber se a
caçada feroz de Médici seguiria. A resposta era sim, como diz o “assunto” do texto:
“Decisão do presidente brasileiro, Ernesto Geisel, de continuar com as execuções
sumárias de subversivos perigosos, sob certas condições”. 

No

A vitória de Tancredo simbolizou a desaprovação ao legado da ditadura

relato da CIA, Geisel discutira o tema com três generais numa reunião em 30 de
março: João Baptista Figueiredo, que seria o próximo ditador e era então chefe do
Serviço Nacional de Informações (SNI), Milton Tavares, chefe do Centro de
Informações do Exército, e Confúcio Danton de Paula Avelino, que assumiria o CIE.
Era sábado. Geisel pediu para pensar no fim de semana. Na segunda-feira, 1o de
abril, aniversário de 10 anos do golpe, veio a decisão. Com a palavra, a CIA: “O
Presidente Geisel disse ao general Figueiredo que a política deveria continuar, mas
que muito cuidado deveria ser tomado para assegurar que apenas subversivos
perigosos fossem executados. O presidente e o general Figueiredo concordaram
que, quando o CIE prender uma pessoa que possa se enquadrar nessa categoria, o
chefe do CIE consultará o general Figueiredo, cuja aprovação deve ser dada antes
que a pessoa seja executada”. Quer dizer, a matança não apenas era uma política
oficial, como o sinal verde vinha bem do alto. 

Geisel recomendou a Figueiredo que desse continuidade à prática


de tortura com o cuidado de executar apenas “subversivos
perigosos”. Conclusão: até então, não havia cuidado

E para quem acha que havia concentração de renda e repressão, mas ao menos
eram tempos éticos, um aviso: não foi nada disso. Em 2015, o Prêmio Jabuti,
“oscar” da literatura nacional, foi dado na categoria “economia” a um livro que
mergulhou na corrupção na ditadura, capítulo “empreiteiras”. A obra, Estranhas
Catedrais, é do historiador Pedro Henrique Campos, da Universidade Federal Rural
do Rio de Janeiro. Dois exemplos foram citados por ele para esta reportagem.
Posto ali pela ditadura em 1971, Haroldo Leon Peres caiu nove meses depois do
cargo de governador do Paraná, pois se soube que cobrara propina de 1 milhão de
dólares da construtora CCR. O outro caso envolve as obras da Hidrelétrica de
Tucuruí, no Pará. A exploração da madeira da área que seria inundada foi dada
pelo governo, na década de 1970, ao fundo de pensão dos militares, a Capemi. O
fundo pegou grana estrangeira, desmatou 10% do combinado e só. Suspeita-se que
faltou grana devido a desvios, motivo de uma CPI nos anos 1980. A usina em si foi
construída pela Camargo Corrêa, empreiteira que recebeu incentivos fiscais
estimados em 5 bilhões de dólares e que arrancou nada menos que 29 adicionais
contratuais encarecedores da obra. 

A afirmação de que a corrupção correu solta com os generais tem atestadomade


in USA. É o que se vê em um documento enviado ao Brasil pelos Estados Unidos
em algum momento entre 2014 e 2015, apoio americano à Comissão da Verdade
acertado pessoalmente, em Brasília, durante a Copa do Mundo de 2014, por Dilma,
presidente à época, com Joe Biden, vice de Barack Obama. Trata-se de um
telegrama de 1o de março de 1984 da embaixada dos EUA no Brasil ao
Departamento de Estado, em Washington, revelado em junho por O Globo e obtido
por CartaCapital. O assunto era “Corrupção e política no Brasil”. “Entre muitos
oficiais, desde os aspirantes até os mais graduados, existe uma forte crença que os
últimos 20 anos no poder corromperam os militares, especialmente os comandos
mais elevados”, dizia o texto. “Muitos brasileiros médios acreditam que o governo
federal seja corrupto. Essa crítica também se estende ao grande número de cargos
de responsabilidade ocupados por oficiais militares aposentados nas empresas
paraestatais.” As estatais, seguia o telegrama, eram usadas “para empregar altos
oficiais militares aposentados e seus amigos”. 
Apesar disso, “poucas acusações concretas têm sido feitas e ainda menos
condenações têm sido obtidas”. O motivo? “Reticência em acusar as Forças
Armadas ou o governo federal, ainda muito poderoso”, e porque “a prova é muito
difícil de ser obtida”. Parece que a corrupção em estatais não começou com o PT,
antes era abafada, hein? O certo, prosseguia a embaixada, “é que a corrupção, real
e imaginada, está erodindo a confiança dos brasileiros em seu governo”. Em caso
de eleição direta para presidente, o povo teria “uma chance de expulsar esse
conjunto de vagabundos”. Não teve. Semanas depois, a lei das Diretas Já foi
aprovada no Congresso, por 298 votos a 65. Precisava de mais 20 votos.
Figueiredo, o último golpista-presidente, ficaria no cargo até março de 1985, à frente
de um governo contra o qual “existem muitos escândalos que lançam nuvens”,
anotava o Tio Sam. Seu sucessor foi escolhido por deputados e senadores que
tinham sido eleitos em 1982 conforme as regras da ditadura. 

Se estes ditadores fossem argentinos, teriam morrido na cadeia

vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral em 1985 foi o grande símbolo de


desaprovação dos brasileiros ao legado de 20 anos dos militares, na avaliação do
sociólogo Brasilio Sallum Jr., da USP, autor na década seguinte do livro Labirintos:
Dos Generais à Nova República. Um desfecho óbvio, até certo ponto. O
crescimento durante o “milagre”, diz Sallum Jr., produziu um operariado numeroso e
descontente com o arrocho salarial, insatisfação que fez surgir um novo
sindicalismo, Lula à frente. Na classe média, a repressão fortaleceu o apego a
valores democráticos, algo que se refletiu na crescente atuação de entidades como
a OAB, dos advogados, a ABI, da imprensa, e a CNBB, da Igreja Católica. “Esse
conjunto se expressou eleitoralmente na vitória de Tancredo. A vitória dele foi o
maior símbolo da mudança de ventos”, diz o sociólogo. Na marra ou no voto em um
candidato autoritário cercado de militares idem, os brasileiros vão querer aqueles
ventos de novo? • 
ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: Zanone Fraissat/Folhapress, Marcelo Chello/ZUMA Wire/fotoarena, Antônio


Cruz/ABr, Carlos Moura/stf, Gaston Britos, Valter Campanato/Abr, HEULER ANDREY/afp, MAURO PIMENTEL/afp,
Abr e Folhapress
A prisão e a facada
2018 A dinâmica eleitoral parece antecipar o segundo turno entre Fernando Haddad e
Jair Bolsonaro

Por Sergio Lirio

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Em uma semana, o petista cresceu 1,5 ponto porcentual por dia. O deputado, por sua vez,
consolida o voto antilulista

Ciro Gomes tem testado os seus limites. Não deve ser fácil se ver cercado a todo
momento e responder exaustivamente às mesmas perguntas para uma manada de
jornalistas orientados pelos chefes a buscar frases de efeito e não esclarecimentos.
Ossos do ofício, dirão, esforço mínimo para quem se propôs a governar o Brasil.
Diante do enésimo questionamento a respeito do incidente em Roraima, quando
deu uma resposta atravessada a um falso repórter escalado pelo emedebista
Romero Jucá para provocá-lo, Ciro faz uma pausa, respira e esgrime: “Sinto
vergonha de parte da mídia. É uma inversão total dos fatos. Ele estava lá a mando
do Jucá”. 
O quebra-queixo dura mais uns cinco minutos e o pedetista ruma ao elevador do
antigo prédio da Faculdade de Filosofia da USP, na famosa Rua Maria Antônia,
Centro de São Paulo, hoje ocupado em parte pela Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência. A trupe de fotógrafos e cameramen o segue afoita, busca um
instante que não se concretiza. A lente esbarra na orelha do vizinho, a câmera
funga no cangote de um colega mais bem posicionado, uma segurança sai do
caminho antes de ser pisoteada. 

Nas três horas seguintes, Ciro falará de suas ideias para um pequeno grupo de
associados da SBPC (“ciência e tecnologia é o novo nome de soberania”, enfatiza),
exibirá seu reconhecido domínio dos problemas centrais do País, e voltará a criticar
os meios de comunicação, que optaram pela “vulgaridade e a omissão”, embora
considere impossível aprovar no Congresso uma lei para regular a mídia. Também
fará piadas de si mesmo e desfiará seu crescente ressentimento com o PT, a quem
acusa de sabotar sua campanha para se apegar à aventura de Fernando Haddad,
um “FHC redivivo”, “garoto de recados de Lula” e “despreparado” para a missão.
“Se não quiserem resolver nada agora, paciência. 

Na pista. Enquanto Fernando Haddad é guindado pelo lulismo, Ciro Gomes equilibra-se entre a
crítica ao petismo e o combate à ameaça de Bolsonaro

Democracia é isso.” No fim, as críticas de um jovem estudante à escolha da


ruralista Kátia Abreu como vice e à defesa da construção da Hidrelétrica de Belo
Monte alterariam o seu humor. Para reduzir a tensão, Ildeu do Castro Moreira,
presidente da SBPC, longe do olhar do convidado, fez um gesto para o estudante
não insistir na tréplica. Democracia é isso. Nem se fale de um arremedo. As
circunstâncias emparedaram o pedetista e elas nada têm a ver com suas
qualidades ou defeitos. O acaso, indicam a morte de Eduardo Campos em 2014 e o
ataque a Bolsonaro às vésperas de 7 de Setembro, é uma força que não deve ser
ignorada nas eleições brasileiras, mas, se nada de espetacular acontecer nos
próximos 15 dias, restará a Ciro a ingrata missão de se equilibrar entre o
antibolsonarismo e o antipetismo. É um jogo de tentativa e erro, como se vê no
momento. Ora o ex-ministro afirma acreditar na impossibilidade de Bolsonaro
vencer as eleições, ora alerta para os riscos de o candidato do PSL vencer Haddad
no roldão de um novo despertar do ódio a Lula. 

O tucano Geraldo Alckmin está em situação parecida, com enormes desvantagens


em relação a Ciro (falta-lhe o carisma do cearense e sobra-lhe o fardo de ser visto
pelos eleitores como o candidato de fato do abominado Michel Temer). Não por
outra razão, ACM Neto, prefeito de Salvador e um dos coordenadores da campanha
de Alckmin, apela: “O futuro do Brasil não pode ficar entre uma facada e uma
prisão”. 

Será? As últimas pesquisas, nacionais e regionais, indicam exatamente este


cenário. Embora os adversários projetem uma estagnação ou até um recuo nas
intenções de voto de Bolsonaro, o presidenciável do PSL consolidou, após o
atentado em Juiz de Fora, um eleitorado que o garante no segundo turno. Seu azar
é que seu vice, o general Hamilton Mourão, não tem sido de grande utilidade na
hora de agregar eleitores. Ao contrário. A declaração do militar de que filhos criados
por mães e avós são desajustados e sua recusa em se retratar reacenderam a
resistência feminina contra a chapa, relata o editor Rodrigo Martins à página 36.
Para piorar, um ataque de hackers a uma página no Facebook intitulada Mulheres
contra Bolsonaro, que somava 2,5 milhões de seguidoras, tornou o movimento
suprapartidário e acima de qualquer ideologia. 

Lupi, do PDT, lembra a acirrada disputa entre Brizola e Lula em


1989. No fim, recorda, 80% dos brizolistas votaram no PT

Quanto mais avança, no entanto, a transferência de votos de Lula para Haddad,


mais água no moinho de Bol-sonaro, avalia Marcos Coimbra à página 33, dado que
o antipetismo tende, ainda em 7 de outubro, a cerrar fileiras na candidatura com
maiores chances de derrotar o ex-prefeito de São Paulo. No levantamento do Ibope
divulgado na terça-feira 18, Bolsonaro alcançou 28%, em parte à custa de Alckmin,
que encolheu de 9% para 7%, e de Marina Silva (de 9% para 6%). 

É possível que o mesmo aconteça no campo progressista. Ciro manteve 11% no


Ibope e 13% no Datafolha da quarta-feira 19, contra 28% de Bolsonaro, 16% de
Haddad e 9% de Alckmin. Se o avassalador fenômeno da transposição de votos de
Lula para Haddad continuar, porém, na mesma magnitude, será inevitável o
encolhimento do pedetista, que antes da oficialização do ex-prefeito de São Paulo
como candidato do PT havia se beneficiado da dispersão dos lulistas. Em uma
semana, Haddad ganhou, em média, 1,5 ponto porcentual por dia, o que explica
sua ascensão de 7% para 19% no período. No Piauí, ele passa de 41%. Em
Pernambuco, chega a 38%. Ainda assim, o petista incorporou até o momento
apenas metade do potencial de transferência atribuído a Lula: 49% dos brasileiros,
na média das pesquisas, votariam ou poderiam votar em um nome apadrinhado
pelo ex-presidente. A outra metade almejada pelos petistas vive em regiões nas
quais Ciro está bem posicionado: alguns estados do Nordeste e do Norte, o rincão
de Minas Gerais e porções do Centro-Oeste. 

No bunker. Bolsonaro consolida-se como o candidato antipetista. Resta saber se a facada


continuará a render votos

Manter as cidadelas conquistadas exigirá de Ciro acentuar a pregação contra


Haddad, sem descurar das críticas a Bolsonaro. A dúvida é saber se a estratégia
dificulta uma aliança no segundo turno ou, pior, mina as possibilidades de vitória de
um candidato progressista. Carlos Lupi, presidente do PDT, relembra a disputa
entre Leonel Brizola e Lula, em 1989, para afastar esse temor. “O Lula disse que o
Brizola seria capaz de pisar no pescoço da mãe para vencer. Este disse que o
Brasil teria de engolir o ‘Sapo Barbudo’”, recorda. “Isso não impediu que, no
segundo turno, 80% dos brizolistas escolhessem o PT.” 

O QG petista, por sua vez, decidiu reeditar o estilo “paz e amor” de 2002. Evita-se
um confronto não só com Ciro (no caso do pedetista, a ordem é retribuir “balas com
flores”), mas com qualquer outro adversário. As críticas ao mercado financeiro têm
sido atenuadas, apesar de o partido negar a possibilidade de editar uma nova
versão da Carta ao Povo Brasileiro, que, na verdade, refletia um compromisso com
os donos do poder. 

Os coordenadores da campanha minimizam o antipetismo e o poder de influência


da Operação Lava Jato, cujos vazamentos seletivos quase levaram à derrota de
Dilma Rousseff em 2014. Acham que as acusações do ex-ministro Antonio Palocci
não têm credibilidade para provocar um abalo na campanha e que as denúncias de
corrupção não estão restritas ao PT. E lembram que o partido voltou a ser, de
longe, o preferido dos eleitores (20%, contra 4% do MDB, segundo mais citado). 

“Há uma outra compreensão dos cidadãos sobre o que se passou desde 2016”,
avalia um dirigente. “O impeachment da Dilma não melhorou a situação do País,
como se dizia, e ficou clara a parcialidade da Lava Jato e a perseguição a Lula.”

Haddad vai intensificar as viagens antes do primeiro turno. A agenda prevê visitas a
todas as regiões, embora a campanha escolha, por razões óbvias, priorizar os
estados com maior número de eleitores: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro,
Bahia, Ceará, Pernambuco e Paraná. Os petistas esperam, até lá, alcançar a
liderança das pesquisas. • 

OS TUCANOS E A TENTAÇÃO DO PODER

Jereissati fez um mea-culpa. Alckmin ainda não


mais lúcida crítica partiu de um tucano remido. Em entrevista ao jornal O Estado de
S. Paulo, o senador Tasso Jereissati penitenciou-se pela sucessão de “erros
memoráveis” do partido, desde a derrota nas urnas em 2014. “Fomos engolidos
pela tentação do poder”, argumenta o cearense, ao desfiar os equívocos. “O
primeiro foi questionar o resultado eleitoral. Não é da nossa história e do nosso
perfil. Não questionamos as instituições, respeitamos a democracia (...) Mas o
grande erro foi entrar no governo Temer. Foi a gota d’água.” 

O mea-culpa não é gratuito. A tentação do poder cobrou rapidamente o preço do


PSDB. De artífice do golpe, ávido por herdar a cadeira do Palácio do Planalto após
o mandato-tampão de Temer, o partido corre o risco de desaparecer, tornar-se uma
força regional irrelevante ou se transfigurar de forma definitiva, dando adeus às
veleidades social-democratas da fundação e se convertendo em uma legenda
de yuppies neoliberais sob a batuta do empreendedor João Doria. 

Com José Serra em retiro forçado, Aécio Neves enrolado com a Justiça e Geraldo
Alckmin prestes a colher o pior desempenho da legenda em uma eleição
presidencial desde 1994, o tucanato não é mais capaz de representar o antipetismo.
Acabou engolido pelo monstro que liberou da lâmpada, como lembrou Fernando
Haddad em entrevista a CartaCapital: “Serra e Aécio abriram uma avenida para o
obscurantismo no Brasil”. O PSDB, recordou Haddad, introduziu de forma distorcida
e eleitoreira os debates sobre aborto, gênero e maioridade penal, assuntos que
insuflaram o reacionarismo fascistoide e a candidatura de Jair Bolsonaro.
Atualmente, os tucanos são considerados “frouxos” demais pelo eleitorado que
sonhou controlar. 

Alckmin não tem sido abandonado só pelo Centrão, que, como esperado, cada vez
mais se divide entre Bolsonaro e Haddad, em busca de um lugar ao sol no próximo
governo, seja qual for ele. O sofrível desempenho do ex-governador paulista nas
pesquisas e a desoladora perspectiva eleitoral excitam as desavenças internas.
Antigo desafeto da nomenclatura paulista da legenda, o amazonense Arthur Virgílio,
faixa preta de judô, abre mão de qualquer reflexão intelectual e vai direto ao ponto,
quando fala do correligionário que disputa a Presidência: “Não leva o meu apoio,
não leva o meu voto, nem o do Amazonas”. 

Criado para disputar com o PT a hegemonia na centro-esquerda, de verniz


democrático e intelectual, o PSDB, quem diria, acabou no Irajá..

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: Felipe Oliveira/EC Bahia, NELSON ALMEIDA/afp, NELSON ALMEIDA/afp e Fabio
Rodrigues Pozzebom/ABr
De busão com Zé Dirceu
PERFIL Viajando de ônibus pelo Brasil, o controverso ex-ministro é o mercador de
suas memórias e o militante pop star em campanha por Haddad

Por Fred Melo Paiva

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Antes e depois. No ônibus alugado para a caravana. E em 1968, ao lado de Antônio Guilherme
Ribeiro Ribas, morto no Araguaia em 73

Sob os primeiros movimentos da Marcha Triunfal, executados por um tosco, porém


valente naipe de metais, adentra o grande salão um senhor de olhos incrédulos,
como a se espantar com aquele Verdi em tamanha recepção. Está atrasado uma
hora e meia, e por isso, talvez, um tanto esbaforido. Veste uma camisa azul
ordinária dobrada até os cotovelos, coberta depois pela jaqueta laranja dos
petroleiros, personalizada com seu nome e as iniciais da CUT. Avança por
entre folders de si mesmo em fotos do passado, jovens ativistas, senhores e
principalmente senhoras que no passado teriam supostamente se dedicado à luta
armada ou, em hipótese menos aventurosa, às miçangas e maricas de Durepoxi. É
apalpado pelas feministas, beijado pelas LGBT, cercado pelo Levante Popular. Dá-
se início à potente cantoria, no que se corta o Verdi pela raiz: “Nas ruas, nas
praças, quem nunca te esqueceu! Aqui está presente a juventude Zé Dirceu!” Eis o
controverso pop star, redivivo como um Keith Richards – José Dirceu de Oliveira e
Silva, 72 anos, em turnê de apresentação de suas “várias vidas”. 

Embora se erga da plateia uma senhora a afirmar “Zé, você está mais lindo do que
quando foi preso”, Dirceu ainda não alcançou essa plena condição de gato: conta
até agora, segundo o próprio, apenas quatro vidas. Antes do exílio em Cuba, entre
Cuba e a clandestinidade no Brasil, a vida como “Carlos” no interior do Paraná, e,
por fim, a de cassado, condenado e preso depois do mensalão. As três primeiras
encarnações compõem o livro Zé Dirceu – Memórias Volume I (Editora Geração),
495 páginas escritas por ele na cadeia com caneta Bic, sentado na cama porque
não havia mesa nem cadeira em sua cela. É sem dúvida o caso raro e concreto de
uma vida que daria um filme, o que já está em negociação com produtores
estrangeiros. Sua quarta existência, a do presidiário, José Dirceu contará
no Volume II, a ser lançado no primeiro semestre do ano que vem, prudentemente
depois das eleições. Segundo uma fonte, “vai sobrar para Dilma”, assim como no
volume primeiro sobra para Palocci e até Lula, não obstante sobre também para o
próprio Dirceu. 

“Quebraram o nariz, mexeram nos olhos. Imagina uma plástica em


Cuba em 1970. Eu era doido”

Para o pop star José Dirceu, entrar num aeroporto e subir num avião é mais ou
menos como se Xororó fosse ao palco de um concerto de punks: a vaia seria tão
certa quanto sem dúvida. Motivo pelo qual decidiu embarcar em um busão alugado
e fazer do lançamento de sua biografia uma caravana que já passou por Rio,
Maricá, Vitória, Salvador, Aracaju, Maceió e Recife, e que intenta chegar ainda a
Natal, Fortaleza, São Luiz, Teresina e Belém – e esta é apenas uma de três fases
da peregrinação. A bordo do Volvo nacionalista de cortinas amarelas, cadeiras
verdes e encostos de cabeça azuis, trocando biscoitos de polvilho e esticando os
pés descalços naquela descompostura típica, viajam Dirceu e “a mulher amada”
Simone Patricia Tristão Pereira, 40 anos. Além de uma diminuta equipe de
profissionais da comunicação, entre eles um membro da campanha de Lula, agora
Haddad. Explica-se: disfarçado de mercador de livros, Dirceu é um comprometido
militante em campanha por Haddad. Pairando hoje sobre as variadas tendências do
partido, cumpre a função de aparador de arestas, incentivador da militância,
agregador de sindicalistas, feministas, movimentos diversos, a juventude petista.
Em “showmícios” como aquele de Verdi, em Salvador, ou no famoso palco do Circo
Voador, no Rio de Janeiro, gasta a lábia no discurso tanto ou mais que a Bic com a
qual assina livros a rodo, para tanto recorrendo ao telegráfico “um abraço Zé
Dirceu”. 
No ônibus de José Dirceu esteve embarcado este repórter, viajando entre Salvador
e Aracaju. Disposto a entrevistá-lo, fui aconselhado a aguardar uma inevitável sesta
que se seguiria a um almoço no qual, de acordo com o interlocutor, Zé tomara “uns
birinights”. Como a sesta não se verificou, e tampouco os birinights pareciam
impedi-lo de soprar o bafômetro, fui posto em uma mesa aos fundos do coletivo
frente a frente com Dirceu, enquanto o coletivo sacolejava já nos entornos de
Mangue Seco. O ex-ministro, livre desde 26 de julho e no aguardo de dois
julgamentos, no TRF e STJ, não parecia abatido como nas fotografias recentes. Era
um Dirceu gordinho e sem rugas, e eu quis saber se aquilo decorria, quem sabe, da
plástica que fizera em Cuba para voltar clandestino ao Brasil durante a Ditadura.
“Evidente que não.” 

Carta Capital: O que exatamente mudaram no seu rosto?


José Dirceu: Quebraram o nariz, abaularam ele assim, mexeram nos olhos,
esticaram aqui para o lado. Tinham aprendido isso com os russos e acharam
melhor fazer. 

CC: Mudou muito? Você ainda parece com suas fotos anteriores à plástica...
JD: As mulheres disseram que fiquei mais feio. Mas eu não ligava. Imagina o que
era uma cirurgia plástica em Cuba em 1970... 

CC: Cê é doido...
JD: Doido pra caralho. 

As mulheres. Há mulheres em profusão na biografia de José Dirceu. Uma delas é


Clara Becker, com quem se casou assim que voltou clandestino, sob o codinome
Carlos Henrique Gouveia de Mello. Ainda em Cuba, inventou e decorou todo um
passado para Carlos, desde o nascimento em Guaratinguetá (SP) até as principais
famílias da cidade, seus políticos, escolas, lazer, economia. Depois de um ano de
ensaios e toda a sorte de documentos falsificados, Carlos Henrique, “brigado com a
família e os irmãos”, tentaria a sorte em outras plagas. Já em Cruzeiro do Oeste
(PR), acabou casando-se de verdade com Clara em 1976. Mas só revelou sua
verdadeira identidade em 1979, quando ela e “Carlos” já tinham o filho Zeca, hoje
deputado federal pelo PT. Disse ser um daqueles “das fotos e dos jornais, o José
Dirceu, trocado com mais 15 companheiros pelo embaixador americano Charles
Elbrick”. Clara ficou “absolutamente perplexa, mas serena, às vezes revoltada, mas
solidária e companheira”. 
Rio de Janeiro. No palco do famoso Circo Voador, o senhor de punho cerrado, sob a sombra do
passado

Aqui, um parêntese: logo após o escândalo do mensalão, o jornal O Estado de S.


Paulo enviou este incauto repórter a Cruzeiro do Oeste. Lá chegando, ao contrário
do que previam os editores, Clara não guardava ressentimento de Dirceu. Por
causa do mensalão, estava solidária ao “velho amigo”. Fiz longa entrevista com ela,
que, à época uma fabricante de biquínis, posou para a foto da matéria na piscina de
sua casa trajando uma peça da coleção. A imagem era algo entre o improvável e o
engraçado. E ganhou ares de surrealismo quando surgiu uma enorme estrela
vermelha do PT azulejada no fundo da piscina. O que este pobre repórter poderia
fazer? Evidentemente, a entrevista jamais seria publicada. Os casos amorosos
relatados na autobiografia do ex-ministro motivaram críticas ao livro por parte da
grande imprensa, que pelo visto prefere engavetadas as mulheres de Dirceu. 

JD: Um outro lá escreveu que sou cheio de pavonear minha vida amorosa... Como
posso escrever uma biografia e não falar dos meus namoros, das mulheres que
amei? Quando a Simone leu os originais, me perguntou: “Quer dizer que em Cuba
você passou quatro anos e nunca... Não teve nada?” Tinha alguma coisa errada,
né? Quem aguenta ler apenas análises políticas? 
Personagens. O candidato a governador e o candidato a presidente em 1994. Como o clandestino
“Carlos”, com Clara Becker e Zeca, em 79

Mais do que as análises, os bastidores da política preenchem boa parte das


memórias de Dirceu. Passagem especialmente interessante relata sua decisão de
demitir-se da Casa Civil no primeiro governo Lula, na esteira do mensalão. O
presidente “não me pediu para ficar, não me propôs nenhuma tarefa, simplesmente
me demitiu. Foi melancólico e simbólico, como se tudo já estivesse decidido,
poucas palavras, monossilábicas, uma cena um tanto derrotista e pequena para os
protagonistas, para nossa história de vida e luta”. Depois, diante de Lula,
Mercadante, Gilberto Carvalho, Gushiken e Palocci, chorou. Pensou nos que
morreram na tortura, sem ceder. “Como era possível que companheiros e
companheiras de tantos anos no PT simplesmente me abandonassem, sem mais
nem menos? Fui abandonado à minha própria sorte. Não havia nenhuma proposta
sobre o meu futuro. Que contraste, que abismo entre meus camaradas de armas e,
agora, muitos de meus companheiros de PT!” É claro que tal passagem soou como
um acerto de contas com o antigo chefe. 

JD: Dizem que falei mal do Lula, mas falei mal de mim também. Ninguém pode me
acusar de ter mágoa ou ressentimento. Minha lealdade a ele é inquestionável, mas
isso não significa que eu seja lulista no sentido que a palavra ganhou. Devoto só
sou da dona Olga, minha mãe, que já nos deixou. 

“Como era possível que amigos do PT simplesmente me


abandonassem?”
A última vez que Dirceu se encontrou com Lula foi em 2015. Quatro anos antes,
“estava em Fernando de Noronha pescando e fazendo caipirinha quando chegou a
notícia de que ele estava com um câncer”, o que o motivou a procurá- -lo. Agora,
não pretende visitá-lo na cadeia “porque não há necessidade da presença física”,
algo que “não ajuda nem a ele nem a mim, nem ao PT nem ao País”. Concordou
tanto com a estratégia de Lula de manter-se candidato até o limite possível,
endossa de tal forma a escolha de Fernando Haddad, que galhofeiramente crê em
algum tipo de transimento de pensação. “Eu e Lula não precisamos nos encontrar”,
diz. “Há certas questões que trabalhamos por telepatia.” 

Em meados de 2008, Lula disse ao diretor de redação de CartaCapital, Mino Carta:


“Acho que o Zé enricou”. De fato, entre 2007 e 2012, teria faturado em média 350
mil reais por mês (“faturado, não lucrado”) como consultor, segundo o próprio
Dirceu. Para o juiz Sergio Moro, as consultorias disfarçavam o pagamento de
propinas em esquema na Petrobras. Em 2016, foi condenado a 23 anos de prisão
por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, aumentada depois,
em segunda instância, para 30 anos e nove meses. Em 2017, somou mais 11 anos
em nova sentença de Moro, também relativa à Petrobras e pelos mesmos tipos de
crime. Em razão da primeira condenação, passou um ano e nove meses preso no
Complexo Médico-Penal (CMP) de Pinhais, Região Metropolitana de Curitiba –
onde escreveu as memórias motivado principalmente pelo desejo de deixar à filha
Maria Antônia, hoje com 8 anos, a sua versão da história. 

Volume II. Vem aí a segunda parte de sua biografia, prudentemente depois das eleições. “Vai
sobrar para a Dilma”
CMP de Pinhais abriga 700 presos em seis alas. A primeira e a segunda, uma
espécie de manicômio judicial. A terceira e a quarta, um hospital que trata desde a
tuberculose e a Aids até a perna quebrada. A quinta e a sexta estão reservadas a
funcionários públicos, agentes penitenciários, policiais, empresários do crime
organizado, pedófilos, “uns três ou quatro idosos, e nós, os políticos”. Numa galeria
de 60 metros por 10, 36 celas em cada lado do corredor, Dirceu foi colega de
Marcelo Odebrecht, Márcio Faria, Rogério Araújo, André Vargas, Vaccari, Luiz
Argolo, Renato Duque, Léo Pinheiro e Jorge Zelada, entre outros. Dividiu a cela
com Vaccari, Vargas e Argolo. 

JD: São três camas de aço, pra você não quebrar e usar como arma. Aí tem um
murinho que separa a privada e o tanque. Privada turca, né? Pra quem tem
dificuldade por alguma razão, hemorroidas, por exemplo, eles botam uma cadeira
pra ajudar. A privada turca deve ser mais cara do que um vaso normal, com certeza
gasta mais água, mas eles gostam dessas coisas. Você acostuma. 

“ Na cadeia perdi totalmente a ansiedade. E, claro, você fica mais


humilde. É duro”

CC: Como era o seu dia a dia?


JD: Dormia cerca de 7 horas por noite, o resto consumia em trabalho, serviços de
limpeza, jogar conversa fora, dominó, rodinha, ginástica na cama, nas grades ou no
chão. E leitura, né? Li cerca de 100 livros, fichei uns 30. Li o Velho Testamento,
mas não fiquei mais religioso, não. É fantástico. Aquele Deus lá é que deveria
aparecer no Brasil para cuidar da elite brasileira, o Agamenon. E tem a maldita da
televisão! Trinta e seis televisões ligadas o dia inteiro, só tevê aberta. Novela, série,
Jornal da Band, noticiário da noite, programas sobre crime. Muita gente faz
artesanato. Se eu desenvolvi alguma habilidade assim? Eu não! Aprendi a escrever
com caneta Bic. 

ZÉ DIRCEU MEMÓRIAS VOLUME I


José Dirceu.
Editora Geração

CC: A cadeia te ensinou alguma coisa?


JD: Perdi totalmente a ansiedade. Aprendi a aceitar as piores coisas com
tranquilidade – antes, era muito exigente com todo mundo, não suportava o erro. E,
claro, você fica mais humilde. É algo muito duro. 

CC: Você pode voltar a ser preso, e desta vez por muito mais tempo. Como se
sente com isso?
JD: Se eu tivesse 40 anos, não tava nem aí. Teria mais 40 pela frente. Em todo
caso, tenho uma vantagem sobre todo mundo: as quatro vezes em que tive de
começar tudo de novo. • 

“EU REPILO”
O que diz José Dirceu sobre suas supostas ligações com o enrolado banqueiro
Daniel Dantas

No fim de 2005, o diretor de redação de CartaCapital, Mino Carta, esteve com o


então diretor da Polícia Federal, Paulo Lacerda. No ano anterior, um disco rígido do
Banco Opportunity, de Daniel Dantas, fora apreendido pela Operação Chacal –
mas, entregue à ministra Ellen Gracie, do STF, curiosamente permanecia fechado.
Mino questionou Lacerda sobre a razão da demora em acessar o HD. Ouviu dele o
seguinte: “Se abrirem, acaba a República”. O diretor da PF admitiu estar sofrendo
pressão de políticos, entre eles o então chefe da Casa Civil, José Dirceu. “O
ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos era um amigo pessoal, fui eu quem o
apresentou a Lula, mas jamais interferi em assuntos dele”, defende-se Dirceu. “E
nunca na vida conversei com Paulo Lacerda.” 

O nome de Dirceu apareceria depois nas investigações da Operação Satiagraha.


Telefonemas interceptados pela PF mostraram que ele se reuniu com o ex-
deputado do PT e advogado de Dantas, Luiz Eduardo Greenhalgh, num hangar do
Aeroporto de Congonhas, em São Paulo. “Eu não tinha nada com Daniel Dantas,
tanto que ele acabou por perder o controle da Brasil Telecom para os fundos de
pensão, que tinham razão naquela disputa.” A Satiagraha, como se sabe, foi
anulada pelo STF. Dantas está bilionário com negócios na pecuária. Claro, acusado
de operar em terras ilegais. 

Em outro caso que envolve as telecomunicações, Dirceu foi apontado como lobista
do Grupo Portugal Telecom para negócios no Brasil. “Não tem nada de mais,
apenas incentivei o grupo a investir em mídia no Brasil, porque eram sócios da
maior rede de tevê de Portugal, e seu acionista era casado com uma brasileira e,
portanto, a lei os favorecia. Só isso.” 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: CRISTIAN CANCINO, BERNARDO VIEIRA, CRISTIAN CANCINO


“Haddad vai ganhar”
ENTREVISTA Celso Amorim manifesta preocupação com a movimentação dos
militares e o crescente isolamento do País, mas aposta na vitória do petista em
outubro

A Miguel Martins e Mino Carta

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Recentemente, Celso Amorim, ex-chanceler de Lula e ex-ministro da Defesa de


Dilma Rousseff, encontrou-se em Paris com um antigo amigo da diplomacia: o ex-
premier francês Dominique de Villepin, que também atuou como chanceler do
presidente Jacques Chirac. Representante da direita republicana, Villepin
demonstrou preocupação com o isolamento do Brasil no cenário internacional e as
ameaças à democracia, sobretudo após Lula ser impedido de disputar as eleições. 

Dessa conversa surgiu a ideia de organizar um seminário internacional em São


Paulo. Confiado à competente organização da Fundação Perseu Abramo, o evento
reuniu ainda, na sexta-feira 14, o filósofo americano Noam Chomsky, o ex- -
primeiro-ministro da Itália Massimo D’Alema e o ex-premier espanhol José Luis
Zapatero, entre outras personalidades. Em visita à redação de CartaCapital,
Amorim falou sobre o encontro e demonstrou preocupação com os
pronunciamentos políticos dos militares a respeito das eleições. A íntegra da
entrevista, em vídeo, está disponível em www. cartacapital.com.br. 

CartaCapital: Como interpretar a declaração de Villas Bôas sobre a legitimidade do


futuro governo?
Celso Amorim: Conheci Villas Bôas quando ele era Comandante Militar da
Amazônia. Eu era Ministro da Defesa. Ele, um bom militar, bastante profissional,
conhecedor, respeitoso. Se nós recordarmos bem, em alguns momentos do
governo de Michel Temer, teve uma posição muito moderada. As coisas que ele
tem dito me causam alguma surpresa, sobretudo após a declaração que ele fez na
véspera do julgamento do habeas corpus de Lula. Ele dizia que o Exército defendia
valores, a Constituição, mas entrava também na questão da impunidade. Aquilo dito
na véspera do julgamento tinha um endereço certo. Agora, as declarações após o
ataque ao candidato Bolsonaro foram muito pouco felizes. Dizer que há uma
instabilidade e que isso pode deslegitimar o resultado da eleição é algo muito grave.
Ele não é um analista. É comandante do Exército, o que ele diz tem peso. Quem
comanda um grande número de indivíduos armados tem de tomar muito cuidado
com as palavras. Quero crer que ele teve a intenção de fazer uma ameaça. 

Em parceria com o ex-premier francês Villepin, o chanceler de


Lula organizou um seminário sobre as ameaças à democracia no
Brasil

CC: O senhor acha que o discurso autoritário de Mourão, que sugeriu um


“autogolpe” e uma nova Constituição sem Constituinte, se restringe mais aos
generais da reserva?
CA: Bolsonaro e Mourão são vozes minoritárias. No alto-comando, um pensamento
mais extremado não representa a maioria. Não quero dizer que a reserva não tenha
influência. Sei porque tive de lidar com esse problema na Comissão da Verdade. O
pessoal da reserva falava o diacho de mim. Preocupa-me o fato de 28% dos
brasileiros estarem inclinados a votar no Bolsonaro. É um fato assustador, não por
eles serem militares, mas porque parte expressiva da sociedade busca esse tipo de
solução. 

CC: Em que medida essas declarações do comandante do Exército podem


influenciar no resultado final da eleição?
CA: Na realidade, não influenciam. O que me preocupa é a ameaça que fica no ar.
As eleições devem se realizar normalmente e o resultado, respeitado. 
CC: A palavra tranquilizadora não deveria caber a Villas Bôas?
CA: Ele não precisava ter falado. Já que ele falou, poderia dizer agora: “Minhas
palavras estão sendo mal interpretadas, não quero de maneira nenhuma acenar
com a ideia de autoritarismo”. Até porque, quando você junta a declaração dele com
a do Mourão, mesmo que elas não estejam conectadas, é natural todo mundo ficar
preocupado. Não podemos esquecer que tivemos 21 anos de ditadura. 

CC: Mourão chegou a usar o termo “mulambada” para se referir à América Latina e


à África, ao criticar a política externa dos governos petistas.
CA: Não merece resposta. É inacreditável. A gente fala dos outros países, mas
Trump parece um intelectual iluminista quando ouvimos o que diz o general
Mourão. 

CC: Como o senhor avalia a decisão da Justiça Eleitoral de não levar em conta a


liminar que foi concedida pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU a Lula?
CA: Fui embaixador da ONU por quatro anos no governo de Fernando Henrique
Cardoso e duas vezes embaixador em Genebra, onde está a sede do comitê.
Cuidava também de direitos humanos, então falo com certa autoridade. Quando
ouço coisas do tipo “é um comitêzinho”, vejo uma ignorância incrível. O comitê é o
órgão para fazer cumprir aquele tratado, o Pacto Internacional de Direitos Civis e
Políticos. É composto de peritos, no melhor sentido da palavra. Não se pode dizer
“cada macaco no seu galho”. Primeiro, porque a ONU não é um galho, é a árvore.
Até Trump, ao não querer seguir as diretrizes do clima, tomou o cuidado de se
retirar do tratado. Não dá para dizer que o tratado não vale. 

CC: E quais as consequências de violar um pacto internacional?


CA: Abala a credibilidade do País. Lidei muito com esse tema. Só conheço uma
exceção de violação do pacto: o Taleban, para o qual a Sharia, a lei islâmica, era
mais importante do que a lei internacional. Os outros, todos, mesmo quando eles
não cumprem, alegam motivos. Claro, quando se tem um enorme arsenal atômico e
se é a maior potência econômica do mundo, pode se dar ao luxo de perder a
credibilidade, porque os outros dependem de você. Não é o nosso caso. O Brasil
sempre defendeu o multilateralismo. É um país grande, mas não é uma
superpotência. Para nós, interessa que as regras multilaterais sejam seguidas, que
os tratados sejam respeitados. 

CC: Qual é o seu palpite sobre as eleições?


CA: Fernando Haddad vai ganhar. Provavelmente, ficará perto de um empate no
primeiro turno, se não passar logo Bolsonaro. E, no segundo turno, ele ganha a
eleição. 

CC: Não é importante que as forças progressistas saibam se unir na hora H?


CA: Acho que antes da hora H. Tem de competir, claro que vão competir, dizendo
quem tem o melhor plano para barrar o fascismo, quem tem o melhor plano para
vencer o neoliberalismo e dar crescimento ao Brasil. Mas não pode um falar mal do
outro. Isso cria feridas e, depois, mesmo que elas se recomponham, os eleitores às
vezes não se recompõem. 

CC: Como o senhor avalia os resultados do seminário?


CA: A mídia praticamente não noticiou, à exceção de uma notinha aqui ou ali. O
mais interessante, a meu ver, foi como nasceu a ideia. O evento surgiu de uma
conversa com o ex-premier Villepin, que também foi ministro do presidente Jacques
Chirac, representante da direita republicana na França. Uma direita que respeita as
leis. 

CC: E o que Villepin lhe disse?


CA: Ao reencontrá-lo em Paris, ele próprio sentiu a necessidade de falar sobre o
resgate da democracia no Brasil, com um governo legítimo, até porque o País
desapareceu da cena internacional. O Brasil está completamente isolado, só parece
preocupado em endurecer com a Venezuela. Daí surgiu a ideia do seminário. O
evento trouxe figuras muito importantes, como o D’Alema, um humanista, defensor
da democracia, que foi a Curitiba visitar Lula. Temos uma situação curiosa. O Brasil
é o único país no qual uma prisão, na capital de uma província, é mais disputada
que o palácio presidencial por grandes autoridades (risos). • 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: WANEZZA SOARES


Eleitores e candidatos

Analisar o cenário com base em gênero, renda ou região induz a


erros. É a disputa do petismo com o antipetismo que marca o
confronto

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Nas análises sobre as pesquisas, muita coisa está equivocada. Quase sempre se
insiste em generalizações que talvez fizessem sentido há algum tempo, mas cuja
validade venceu. Há exceções, interpretações que identificam o que é efetivamente
relevante para explicar como pensa e se comporta o eleitorado. A regra, no entanto,
é outra. Perde-se tempo na descrição de aspectos que, na melhor hipótese, são
secundários. 

As manchetes atuais baseadas em pesquisas são como as de antigamente: “Fulano


cresce no Nordeste”, “Sicrano melhora entre mulheres”, “Jovens se dividem entre
Mengano e Beltrano”, e coisas semelhantes. Não que sejam falsas, mas significam
pouco. 

Os eleitores brasileiros, à medida que lhes foi permitido acostumar-se com eleições
regulares e com regras institucionais razoavelmente estáveis (no fundamental),
deixaram de ser entes cuja natureza podia ser compreendida através da geografia e
da demografia. A cada eleição, em que preferências e escolhas anteriores tiveram
de ser revistas e atualizadas, as pessoas foram adquirindo características novas e
se diferenciando. 

Em 1989, o comportamento eleitoral de um nordestino (ou paulista, carioca ou


qualquer outro) talvez pudesse ser explicado por seu lugar de vida e perfil
demográfico. Faltava às pessoas, como regra, uma identidade política e ideológica,
e até cabia designá-las usando categorias reducionistas e simplificadoras,
provenientes da geografia ou da sociologia descritiva. 

Hoje, não há qualquer razão para continuar a pensar dessa maneira. Ao contrário,
persistir nesse simplismo induz a erros e cristaliza estereótipos e preconceitos. 

A primeira questão a considerar é que, em termos políticos, a sociedade brasileira


está dividida. Por completo: os nordestinos (bem como os sulistas, os moradores do
Sudeste, do Norte e do Centro-Oeste) estão divididos, as mulheres (e os homens)
estão divididas, os jovens, os maduros e os velhos estão divididos. Os ricos estão
divididos e os pobres também. 

Por razões que não cabe aqui discutir, a linha de clivagem política fundamental em
nossa sociedade é a que separa três grandes grupos: as pessoas que apoiam Lula
e o PT, as antipetistas, contra ambos, e as que se definem como neutras, não
sendo nem a favor nem contra o petismo. 

Faz tempo que essa divisão é conhecida e que o tamanho de cada grupo está
dimensionado: em termos amplos, são iguais, cada um englobando cerca de um
terço da opinião pública. Em épocas “normais”, são quase idênticos, mas, conforme
as circunstâncias, um pode crescer em detrimento do outro. 

No auge do desgaste do PT, na crise de imagem que antecedeu a deposição de


Dilma Rousseff, o antipetismo chegou a 40%. Durante o recrudescimento da
campanha anti-Lula movida por seus inimigos no Judiciário, o petismo cresceu,
ultrapassando 35%. Agora, a menos de um mês da eleição, aumentam os “neutros”,
pois muita gente se assusta com a radicalização dos dois grupos. 

Estão erradas as avaliações que afirmam, por exemplo, que “O Nordeste está
dividido entre Fernando Haddad e Ciro Gomes”. Existe, na região, um tipo de eleitor
que, de fato, se divide entre os dois, mas há também um eleitorado antipetista, que,
como no restante do País, se inclina em direção a Bolsonaro. O peso relativo de
cada segmento é que varia de um lugar para outro. O mesmo vale para
generalizações semelhantes a respeito ”dos jovens”, “das mulheres”, “dos pobres”. 

Há pobres com Jair Bolsonaro e não são poucos, como se vê através dos números
que sua candidatura atingiu, embora o que mais chame atenção na estrutura atual
das intenções de voto é a extensão alcançada pelo bolsonarismo nas classes
médias (especialmente de renda mais elevada) e entre pessoas de escolaridade
alta. 
Quem acompanha com atenção as pesquisas terá percebido que seu crescimento
recente, depois do episódio da “facada”, se deu através de uma quase unificação do
antipetismo, incluindo o voto feminino antipetista, que relutava em apoiá-lo. 

Fernando Haddad é favorito, porque a indicação de Lula o torna destinatário da


quase totalidade do voto petista e porque tem mais entrada no voto “neutro”, onde
predominam segmentos sociais mais próximos daquilo que representa. Nas últimas
quatro eleições, a maioria desses eleitores votou no PT. 

É a disputa do petismo contra o antipetismo por esse voto que vai marcar o
segundo turno. Pouco a ver com gênero, idade, renda, escolaridade e região, as
cinco chaves que antigamente eram consideradas suficientes para analisar as
pesquisas e fazer prognósticos. • 

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 CRÉDITOS DA PÁGINA: Ilustração: Baptistão


#EleNão
ELEIÇÕES As mulheres estão na linha de frente da resistência a Bolsonaro

Por Carol Castro e Rodrigo Martins

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Xô machismo. Patrícia Pillar, Maria Ribeiro e Daniela Mercury ajudaram a difundir


as hashtags contra o candidato

Atrês semanas das eleições, atrizes, apresentadoras e cantoras aderiram à


campanha contra Jair Bolsonaro nas redes sociais. Das sempre combativas Camila
Pitanga, Daniela Mercury e Patrícia Pillar a celebridades de perfil conservador ou
até reacionário, como Claudia Raia e Rachel Sheherazade, elas ajudaram a difundir
publicações com as hashtags #EleNão e #EleNunca, em repúdio às atitudes
misóginas, homofóbicas, racistas e intolerantes do presidenciável do PSL. O
movimento espontâneo ganhou força após a página no Facebook “Mulheres Unidas
Contra Bolsonaro”, com mais de 2,5 milhões de participantes, ser hackeada no
sábado 15 e restaurada no dia seguinte, um ataque orquestrado por bolsonaristas
que, desde o início, tentam intimidar as responsáveis pela criação do gigantesco
grupo de discussão política. 

“Não à violência, não ao machismo, não ao preconceito, não à homofobia, não à


intolerância, não à xenofobia e não para toda forma de pensamento que pregue o
retrocesso de nossos direitos”, escreveu Claudia Raia. “Não tem a ver com política
(só). Tem a ver com moral. Com a liberdade e a dignidade de ‘ser’ e de pensar, que
eu espero que a minha filha tenha. E os filhos de todos vocês tenham também. É
por isso que #EleNão”, justificou no Twitter a também atriz Deborah Secco. 

A cantora Daniela Mercury compartilhou uma antiga declaração da atriz Fernanda


Montenegro: “Pedir a volta dos militares é coisa de doentes mentais”. Patrícia Pillar,
por sua vez, fez uma bem-humorada edição da célebre obra O Grito, de Edvard
Munch. Na versão da artista global, o personagem retratado pelo pintor norueguês
expõe claramente a razão de seu horror: “Ele não!” 

Após o general Hamilton Mourão, vice de Bolsonaro, afirmar que lares chefiados por
mães e avós são “fábricas de desajustados”, mão de obra do narcotráfico, até
mesmo Sheherazade, que numerosas vezes desrespeitou os direitos humanos nos
telejornais do SBT, aderiu à campanha. “Sou mulher. Crio dois filhos sozinha. Fui
criada por minha mãe e minha avó. Não. Não somos criminosas. Somos heroínas!
#EleNão”, escreveu no Twitter. Atacada por um séquito de bolsonaristas, a
apresentadora não recuou: “Pare de se iludir e tentar encobrir todas as atrocidades
do seu candidato. Faça um exame de consciência e veja se é esse clima de ódio
que você deseja para o nosso país”. 

A adesão das celebridades deve fermentar protestos convocados por mulheres para
o sábado 29. Pelo Facebook, mais de 65 mil indivíduos confirmaram presença no
ato do Largo da Batata, em São Paulo. Outros 210 mil manifestaram a intenção de
participar. No Rio de Janeiro, a convocatória para a Cinelândia contava, até a
quarta-feira 19, com 17 mil confirmações e 75 mil interessados. Eventos
semelhantes estão previstos em capitais como Belo Horizonte, Porto Alegre,
Fortaleza e Recife. Na verdade, o número de mulheres dispostas a ocupar as ruas
pode estar subestimado após os ataques cibernéticos promovidos por
bolsonaristas, que roubaram dados pessoais de administradoras do grupo
“Mulheres Unidas Contra Bolsonaro” para ameaçá-las. O caso é investigado pelo
Grupo Especializado de Repressão aos Crimes por Meios Eletrônicos, da Polícia
Civil da Bahia. 

O movimento espontâneo não perdoa a misoginia, a homofobia e a


intolerância na política

Na avaliação do advogado Jonatas Lucena, especializado em crimes digitais, os


responsáveis pelo ciberataque podem ter incorrido em várias práticas ilegais. “Se
você acessa o perfil de outra pessoa, age como se fosse ele. É falsidade
ideológica”, explica. Ao ameaçar divulgar dados das administradoras do grupo para
forçá-las a deletar a página, os hackerstambém podem ter cometido crime de
extorsão, punido com até dez anos de reclusão. “Soube que elas foram xingadas.
Isso pode render outro processo por calúnia e difamação.” Para a advogada Paula
Bernardelli, os invasores violaram ainda a legislação eleitoral. Como representante
da candidata a deputada distrital Ilka Teodoro (PSOL), ela apresentou uma
denúncia à Procuradoria-Geral Eleitoral. “A propaganda negativa é lícita, e só pode
ser retirada se configurar ofensa à honra, ser caluniosa, difamatória, injuriosa ou
divulgar fatos mentirosos. O pedido para que não se vote, a oposição organizada,
como o grupo, não desborda esses limites, sendo mera propaganda espontânea de
eleitor”, distingue a advogada. A legislação pune, no entanto, aqueles que tentam
ou conseguem “inutilizar, alterar, perturbar ou impedir a propaganda”. A pena
prevista é de multa a seis meses de prisão. “O ataque pode ter configurado o
impedimento do exercício desse direito, uma vez que as mulheres ficaram sem
acesso ao grupo”, diz Paula Bernardelli. 

Inimigo comum. Mesmo celebridades de perfil mais conservador, como Rachel Sheherazade e
Claudia Raia, uniram-se no repúdio ao presidenciável do PSL
reação truculenta dos partidários de Bolsonaro não chega a surpreender. “O
incômodo é porque eles sabem da potência desse grupo. Mais de 2 milhões de
mulheres organizadas, motivadas e discutindo são capazes de mobilizar suas
mães, filhas e amigas. Imagine o impacto disso”, afirma a antropóloga Rosana
Pinheiro-Machado, docente da Universidade Federal de Santa Maria (RS) e
professora visitante da Universidade de Oxford, no Reino Unido. “Não nos quiseram
nas redes, agora terão de nos aguentar nas ruas”, emenda a pesquisadora. 

Desde que foi vítima de um ataque à faca, Bolsonaro tem crescido nas pesquisas.
Dois dias antes do atentado, ele figurava com 22% das intenções de voto, segundo
o Ibope. Na sondagem divulgada na terça-feira 18, tinha 28%. Mas a rejeição ao
capitão da reserva do Exército atinge 42% dos eleitores, a mais elevada entre todos
os postulantes ao Planalto. Seu calcanhar de aquiles é justamente o eleitorado
feminino: 49% das mulheres dizem que não votariam em Bolsonaro de modo algum,
de acordo com o Datafolha de 14 de setembro. 

“O eleitor típico de Bolsonaro é o homem branco, de classe média, com ensino


superior completo e das regiões Sul e Sudeste”, observa a socióloga Esther Solano,
professora da Universidade Federal de São Paulo e autora do livro O Ódio Como
Política (Boitempo Editorial). Segundo Solano, a existência de um candidato sem
pudor de encampar um discurso preconceituoso e intolerante permitiu à extrema-
direita sair do armário. “Não podemos esquecer que temos uma sociedade muito
machista e racista. O Brasil é o país que mais mata transgêneros no mundo, que
tem elevada taxa de feminicídios. Infelizmente, é um país construído sobre uma
base de ódio contra o diferente, no discurso e na prática.” 
Poder. Dois milhões de mulheres organizadas e motivadas realmente causam enorme incômodo,
observa a antropóloga Rosana Pinheiro-Machado

Enquanto as mulheres resistem a Bolsonaro, algumas celebridades do universo


masculino seguem na contramão. No domingo 16, o volante palmeirense Felipe
Melo dividiu a torcida do seu time ao dedicar a Bolsonaro o gol do empate contra o
Bahia. Dois dias antes, a equipe masculina de vôlei da Seleção Brasileira postou
uma foto com suposto apoio ao presidenciável – Wallace e Maurício parecem
reproduzir, com os dedos, o número do candidato do PSL. A torcida atleticana, por
sua vez, protagonizou um lamentável espetáculo de intolerância. “Ô cruzeirense,
toma cuidado, o Bolsonaro vai matar viado”, entoou um ruidoso grupo, durante a
última partida entre as duas equipes, em Belo Horizonte. 

A diretoria do Palmeiras limitou-se a publicar uma lacônica nota, na qual afirma que
o posicionamento do seu jogador foi “uma manifestação particular, e não da
instituição”. O Atlético Mineiro manifestou “repúdio a quaisquer gestos de
preconceito ou de incitação à violência” por parte da sua torcida. A Confederação
Brasileira de Vôlei apagou a polêmica foto em seu perfil no Instagram e disse não
compactuar com manifestações políticas de atletas no momento em que eles
representam a Seleção. 

49% das mulheres não votariam em Bolsonaro de modo algum,


atesta o Datafolha

O ambiente conservador favorece esse tipo de conduta, lamenta o cientista social


Marcel Tonini, pesquisador da Universidade de São Paulo que estuda o racismo no
futebol. “Não consigo imaginar um atleta, em uma entrevista após o jogo, apoiar um
político como o Lula, por exemplo”, diz. “Se ele soltasse um ‘Lula Livre’, a
repercussão seria absurdamente maior e as represálias no clube também seriam
piores. Acho que não seria mais nem convocado para as próximas partidas.” • 

*Colaboraram Carol Scorce e Gabriel Bonis. 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: CESAR ALVES/GLOBO, RENATO ROCHA MIRANDA/GLOBO, PEDRO


CURI/GLOBO, RAMÓN VASCONCELOS/GLOBO, JOANA BERWANGER
Keep quiet!
ARTIGO É importante que as forças de esquerda deem voz a um discurso realista
para denunciar o estado calamitoso em que o País se encontra

Por Michel Plon*

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Situações como as que vivemos podem levar à violência os mais frágeis psiquicamente

Não é nada fácil observar o Brasil hoje. Sobretudo para um estrangeiro que
conhece pouco este país, seus problemas e mesmo os dramas de vários anos, que
se sucedem, principalmente depois de 2016, na história desse quase continente
que nos envolve de admiração e fascinação, por um lado, e de tristeza e até horror,
por outro. 

Algumas horas depois da agressão – tentativa de assassinato? – contra Jair


Bolsonaro, tido como favorito para o primeiro turno da eleição presidencial de
outubro, homem que temos todo o direito de detestar por suas declarações racistas,
homofóbicas, sexistas e nostálgicas da ditadura, da qual, pelo que se vê, ele espera
o retorno, os ersatz de análise deste ato em termos de complô – palavra-chave de
uma tagarelice destruidora com pretensão política – não deixaram de aparecer. 

Complô? Somente uma investigação judiciária escrupulosa poderá estabelecer isso,


mas não é ingenuidade acreditar em tal possibilidade, levando-se em conta o que
se passa nos últimos tempos no Brasil, onde a Justiça perdeu a sua independência
e se colocou a serviço de um poder tão usurpado quanto corrompido? É importante
para as forças políticas de esquerda não se inscreverem nessa problemática de
complô e dar voz a um discurso mais realista, menos fantasioso. 

Considerando-se tudo o que se passa no Brasil atualmente – seja a insegurança


generalizada, seja o abandono pelo Estado de tudo o que diz respeito ao serviço
público, desde as portas que fazem barragem ao fogo no Museu Nacional até os
hidrantes sem água, passando pelo abandono, prelúdio de uma destruição total,
dos setores da saúde e da educação ou da privatização acelerada das riquezas do
País, para não falar da destruição da Floresta Amazônica, do massacre de índios e
de membros do MST –, somos forçados a reconhecer que o País se encontra num
estado deletério, desesperador, e isso tem consequências de ordem psicológica
sobre muitos habitantes. 

Entre eles, os mais frágeis – aqueles que o discurso comum tenta qualificar de
desequilibrados – são suscetíveis, em tal contexto, de cometer aquilo que a
psiquiatria e a psicanálise chamam de passages à l’acte, isto é, a ação, que se
pode dizer inconsciente, do que era até então um fantasma silencioso. O estado do
País, mas também o do Estado mesmo, é de tal forma fonte de angústia – o Estado
é tido como não protetor, fonte de insegurança – em que pessoas psiquicamente
débeis, fóbicas ou angustiadas podem procurar segurança e até mesmo se dar a
ilusão de existir, de ter um lugar na realidade, cometendo atos violentos em busca
de uma sensação de libertação. 

Em tais condições políticas, econômicas, ideológicas, no sentido de que não há


mais referências, um detalhe provavelmente significante serve de apelo para um
indivíduo e vai constituir as condições de uma “passagem ao ato”. É o aparecimento
de condições delirantes, ilusórias – como no caso presente a explicação dada pelo
agressor de uma ordem vinda de Deus. 

Complô contra a direita fomentado por ela própria, para construir um cenário de
martiriologia e apelar a um “poder forte”, complô organizado pela esquerda para se
ver livre fisicamente de um adversário político considerado uma pessoa que não
deve ter seu lugar na política, complô contra o País inteiro organizado pelo
“estrangeiro” para apoiar um dos lados políticos? 

Qualquer uma dessas hipóteses não seria mais que o delírio de uma pessoa, mas
um delírio ou paranoia generalizada, propícia ao desenvolvimento acelerado de
insegurança e violência. As forças de direita são livres para se deleitar com tal
clima, alimentando essa violência, que eles vão tentar justificar se apresentando
como garantidoras de uma ordem militar-fascista. As forças de esquerda devem
unir-se para fazer frente aos delírios e outras fantasmagorias, para tentar manter a
calma, ou melhor, salvar e reconstruir uma democracia, que é “o menos ruim de
todos os regimes. • 

*Michel Plon é psicanalista em Paris, coautor, com Elisabeth Roudinesco, do


Dictionnaire de la Psychanalyse 

ÍNDICE
Um novo ovo de Colombo
INDÚSTRIA Em vez de concentrar esforços na busca da alta tecnologia, o Brasil deve
desenvolver setores de média tecnologia, aconselha especialista

Por Carlos Drummond

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É raro seminários contribuírem com propostas de avanço econômico realistas


fundamentadas na experiência histórica, como ocorreu no evento A Retomada da
Indústria: Uma Estratégia de Longo Prazo, realizado pela Associação Brasileira da
Infraestrutura e Indústrias de Base, a Abdib, na segunda-feira 10 em São Paulo. O
objetivo, segundo o presidente da entidade, Venilton Tadini, era formular
proposições para o processo eleitoral e, a julgar pelos comentários de participantes,
houve avanços. “O seminário com especialistas mostrou que o Brasil tem grandes
desafios macroeconômicos que hoje são de maior urgência para o desenvolvimento
econômico, e o quadro fiscal é o maior destaque. A política industrial faz muito
sentido, em especial porque existe uma nova geração de políticas industriais que,
se tiverem bons protocolos de aplicação, podem levar um país a se reindustrializar.
O ‘bom protocolo’ significa uma política temporária, um processo disciplinado de
avaliação, metas claras e término dos incentivos, caso as metas não sejam
atingidas, além da obsessão pelo Economia objetivo de exportar e atender o
mercado global”, disse a CartaCapital o presidente da Siemens Brasil, André Clark. 

O pano de fundo da fala de Clark foi, entre outras, a exposição do principal


conferencista, professor Mushtaq Khan, do Departamento de Economia da
Universidade de Londres. Países como o Brasil, recomendou, em vez de concentrar
esforços na transição para os setores de alta tecnologia, devem empenhar-se no
desenvolvimento doméstico dos segmentos de média tecnologia ou de bens
intermediários, que foi o ponto de partida nos casos de sucesso das últimas
décadas. Bens intermediários são aqueles utilizados na fabricação de produtos
finais, a exemplo de autopeças e componentes eletrônicos. “Políticas que se
concentram ou no setor de alta tecnologia ou no de baixa tecnologia estão
equivocadas, pois o que cria enormes graus de liberdade para a indústria doméstica
são principalmente os setores de média tecnologia, mostra a história bem-sucedida
de crescimento da China e da Índia. O meu trabalho compara países do Nordeste e
do Sudeste da Ásia, de transição recente, mas acho que tem tremendo significado
para o Brasil”, ressaltou. 

Erra quem vê a indústria 4.0 como atalho. Ter uma base industrial
forte é indispensável

Khan tratou desse assunto no contexto de uma abordagem sistemática e histórica


das políticas industriais contemporâneas, de grande complexidade em razão de
envolverem sistemas de produção e de organização nas empresas. Mostrou que os
padrões de estruturação e de avanço são muito semelhantes e que o deslanchar da
industrialização nada tem a ver com a cultura dos países, mas com a política e a
ação imprescindível do Estado. Uma das vantagens da estratégia de concentrar
esforços na expansão do setor de bens intermediários, disse, é o fato de a média
tecnologia ser mundialmente generalizada, portanto acessível, mostram exemplos
como o do Japão, que iniciou seu percurso de sucesso copiando a tecnologia
mundial disponível naqueles segmentos. Recorde-se que o Brasil teve uma rica
experiência de setores de bens intermediários de componentes eletrônicos e de
autopeças significativos, ambos dizimados pela crise da dívida dos anos 1980 e por
políticas neoliberais que agravaram os problemas da economia a partir dos anos
1990. 
Khan. Para elevar padrões de vida e ter crescimento inclusivo é indispensável uma ampla base de
produtividade crescente, e isso requer uma indústria globalmente competitiva

“Tende-se a associar inovação, crescimento e progresso tecnológico à alta


tecnologia. A literatura especializada sempre aponta como os países têm de evoluir
para aumentar cada vez mais a participação desse segmento e, com frequência, se
dá pouca atenção aos de média tecnologia. Só que, quando se fala em como
amparar a alta tecnologia, isso remete a toda uma cadeia de suprimentos que está
no setor de média tecnologia, daí a importância da ênfase de Khan nesse
segmento”, reforçou Igor Rocha, diretor de planejamento e economia da Abdib. 

Para elevar padrões de vida, ter crescimento inclusivo e muitos trabalhadores com
salários em alta, salientou Khan, há necessidade de uma ampla base de
produtividade crescente na sociedade e isso requer um setor manufatureiro
globalmente competitivo. Cabe lembrar que há quem defenda, inclusive no Brasil, o
uso da indústria 4.0, aquela que engloba as principais inovações tecnológicas da
automação e do controle e tecnologia da informação aplicadas aos processos de
manufatura, como um atalho para chegar à alta tecnologia, mas isso é um
equívoco, conclui-se desta explicação de Khan: “As pessoas falam de
industrialização 4.0 como se nós pudéssemos saltar por cima da indústria
manufatureira e cair diretamente dentro de serviços de alta qualidade e criação de
tecnologia. Isso não é o que acontece nos países avançados. Se você olha para os
Estados Unidos e a Europa, eles estão trazendo a indústria de volta. E a razão
disso é que inovação de alta tecnologia não pode acontecer sem uma base
industrial forte”, alertou o economista. 
Clark. Políticas industriais, em especial as da nova geração, fazem muito sentido e, se tiverem
bons protocolos de aplicação, podem levar um país a se reindustrializar

Mesmo quando há concordância quanto à necessidade de um setor industrial


abrangente, diz, com frequência se esquece, particularmente em países
emergentes, do segmento de média tecnologia. “É extremamente difícil constituir
grandes conjuntos de empresas de média tecnologia, mas o meu argumento é que,
se o país falha nisso, os seus setores de alta tecnologia não serão muito bem- -
sucedidos nem competitivos, porque os produtos manufaturados requerem
conjuntos de produtores de componentes e é aí que reside o verdadeiro segredo do
sucesso asiático na Coreia, na China e de modo crescente no Sul da Ásia e no
Vietnã. O ponto em que eu quero insistir é que, se você tem uma política industrial e
cria muitos setores de média tecnologia, isso de fato ajuda os de alta tecnologia,
pois os últimos não podem inovar sem setores domésticos de produtores de
componentes.” Outro ponto importante, acrescenta o economista, é que esses
setores domésticos de componentes podem replicar muito rapidamente e o
resultado é um horizonte de rápido crescimento industrial. 

Os setores automobilístico, de vestuário e têxtil, ferro e aço da Índia tornaram-se


globalmente competitivos nos anos 1980 e Khan recorreu ao exemplo da produção
de automóveis, de média tecnologia, para explicar como foi esse percurso. Na
década de 1960, disse, a Índia construiu sua indústria automobilística por meio de
uma “velha política industrial” que produzia 50 mil carros por ano que não tinham,
entretanto, competitividade internacional. Em 2009, a produção alcançou 2 milhões
de unidades vendidas no mundo e o país tornou-se o quarto maior exportador
global, até mesmo de marcas nacionais indianas. O sucesso teve por base o
desenvolvimento e a atualização dos produtores nacionais de tecnologia média. A
configuração da política adotada surgiu de uma joint venture entre a estatal indiana
Maruti e a multinacional japonesa Suzuki na década de 1980. A política previa o
embolso de ganhos só após o resultado, forma adotada com o objetivo de criar
exigências para a Suzuki investir primeiro no desenvolvimento de capacidades dos
produtores indianos de componentes. Os ganhos eram acessíveis à Suzuki sob
condições que a induziam a um grande empenho, dadas as peculiaridades da
política definida, o poder relativo da empresa e as agências de governança. 

Os

Palma. Os asiáticos fizeram produtos de alta tecnologia e aí se obrigaram a criar um sistema


educacional excelente para permanecer naquela fronteira

ganhos da Suzuki após a obtenção de resultados vieram na forma de acesso a um


grande mercado que ainda estava protegido por tarifas entre 60% e 85% no período
de 2006 a 2007 e a empresa estrangeira só poderia desfrutá-los se satisfizesse
certas condições, sendo a principal delas atingir 60% de uso de conteúdo local,
inclusive componentes, dentro de um prazo cinco anos. Para conquistar isso e, ao
mesmo tempo proteger sua marca, a Suzuki precisou investir e empenhar-se na
construção de capacidades organizacionais de produtores indianos. O êxito foi
rápido: a estatal Maruti conquistou 50% do mercado doméstico em 1983 e, durante
os anos 1990, o desenvolvimento de capacidades continuou, conduzido por joint
venturessimilares e por meio de uma política semelhante com outros investidores
estrangeiros. No início dos anos 2000, os fabricantes já entregavam carros de
marca indianos globalmente competitivos por dispor de fornecedores domésticos de
componentes de alta qualidade. 
A Índia uniu uma estatal à japonesa Suzuki, exigiu conteúdo local
e fez a 4ª montadora do mundo

Na parte do seminário reservada aos debates, as atenções voltaram-se para a


discussão entre Samuel Pessoa, professor da Fundação Getulio Vargas no Rio de
Janeiro, e José Gabriel Palma, professor titular emérito da Faculdade de Economia
da Universidade de Cambridge. Pessoa expôs sua visão sobre competitividade,
produtividade, relação entre macroeconomia e preços importantes e políticas
industriais, estas entendidas por ele como em geral ineficazes, mas acolhidas por
muitos em razão de serem consideradas responsáveis pelo enorme sucesso
econômico de vários países asiáticos, leitura a seu ver enganosa. “Os asiáticos
fizeram muitas outras coisas, em particular criaram sistemas públicos de educação
fundamental universais de altíssima qualidade, o que o Brasil não conseguiu”,
afirmou o professor da FGV. Palma contestou: “Você disse que o sistema
educacional da Ásia é maravilhoso, mas esqueceu de um ponto importante. Por que
o fizeram? Por serem mais iluminados, mais inteligentes que nós? Ou por
compulsão? Porque a manufatura de alta tecnologia não é possível se não há um
sistema educacional que gere os melhores engenheiros, físicos, químicos. Portanto
qual é o ovo e qual é a galinha? Se você espera gerar primeiro um sistema
educacional maravilhoso para depois entrar na alta tecnologia, é como Penélope,
passa o resto da vida esperando. Eles se atiraram à piscina e aí aprenderam a
nadar. Começaram a fazer produtos de alta tecnologia e aí por compulsão tiveram
de fazer o melhor sistema educacional do mundo, porque, se não o fizessem, não
poderiam se manter na fronteira produtiva de alta tecnologia. E, nesse sentido, qual
é o ovo e qual é a galinha é um ponto que a economia ortodoxa sempre confunde”.
A discussão do tema prosseguiu e, ao final, Pessoa reconheceu: “A gente discorda
nisso, vou estudar melhor esse negócio, vou pensar e tentar elaborar melhor”. • 

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 CRÉDITOS DA PÁGINA: GERALDO LIMA/ABDIB, GERALDO LIMA/ABDIB


Indústria: 13 anos de
atraso

Temos agora uma eleição que talvez possa restituir o “espírito do


crescimento” que nos abandonou

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O Brasil é um país extraordinário. Nos seus cinco séculos de existência, já


experimentou as mais perversas e mais emocionantes instituições: foi colônia,
império, república democrática (três vezes) e ditadura (duas vezes), durante os
quais expandiu e assegurou a posse do quinto maior território mundial. Consolidou
uma só língua, integrou lentamente o território e vai, aos trancos e barrancos,
metabolizando preconceitos e confirmando a riqueza da miscigenação do ponto de
vista estético e da imaginação criadora da sua periferia, como sugeriu o ministro
Antonio Dias Toffoli, agora na presidência do Supremo Tribunal Federal. 

Positivamente, o Brasil não é um fracasso. Somos 210 milhões de habitantes, com


uma renda média de 14,103 dólares (em dólares de paridade de poder de compra
de 2011), o que nos coloca como a oitava economia do mundo em termos de PIB,
mas a 81ª em termos de PIB per capita. Pois bem, o PIB per capita é apenas o
outro nome da produtividade média da população do País, medida em termos
físicos dos bens e serviços que produz. Estamos presos num círculo vicioso: somos
pobres porque produzimos pouco e produzimos pouco porque somos pobres.
Superamos esse círculo vicioso entre 1939 e os anos 1980 do século passado,
quando crescemos mais que o mundo. A partir daí, infelizmente, não conseguimos
reengrenar o crescimento. Temos agora uma eleição que talvez possa nos devolver
o “espírito do crescimento” que nos abandonou. 

O avanço do processo eleitoral oferece surpresas. A carta de Lula ao seu sucessor


não honra a sua reconhecida “sabedoria” (que é muito mais poderosa do que
qualquer educação formal) e muito menos o seu compromisso democrático
confirmado, quando com 82% de aprovação em 2010 resistiu à tentação de aceitar
um terceiro mandato, o que jamais aconteceria, nas mesmas circunstâncias, com
um intelectual. 

A carta propõe ao seu alter ego uma volta ao passado em ambiente social e
econômico adverso interna e externamente. Essa sugestão é um típico autoengano.
Admiro, desde sempre, a sua aguda inteligência, seu carisma e sua imensa
liderança, e tenho Fernando Haddad em alta conta. É um intelectual visionário
(provavelmente, seria um bom prefeito de Amsterdã) que administrou São Paulo
com cuidado. Foi, porém, uma das maiores vítimas da tragédia promovida pelo
próprio Lula: o governo Dilma Rousseff (2011-2016). Nem Lula nem Haddad têm
como fingir que não sabem que se trata do pior quinquênio da história econômica
do último século. Um gráfico vale mais do que mil palavras. Proponho ao leitor que
veja o triste episódio sob a perspectiva de um importante indicador da higidez da
economia: o índice de produção industrial com ajuste sazonal (média 2003 = 100)
desde o início do governo Lula, revelado no gráfico abaixo. 

As
coisas caminharam bem até a grande crise de 2008, da qual saímos rapidamente,
mas sem reconhecer que os “bons tempos externos” tinham terminado. A partir daí,
exageramos na dose dos Programas de Aceleração do Crescimento nunca
concluídos, dos subsídios equivocados, dos abusos do BNDES e acumulamos
desequilíbrios que Dilma tentou corrigir em 2011. Entretanto, quando a economia
perdeu o fôlego em 2012 (o crescimento do PIB de 4% em 2011 caiu para 1,9%),
dobrou-se a aventura até entrarmos em recessão no começo de 2014 na “reeleição
a qualquer custo”. Quando Dilma deixou o governo, a produção industrial tinha sido
dizimada e voltou ao nível de 2003. A triste e insuperável verdade é que o PT em
seus 13 anos impôs 13 anos de atraso à indústria nacional. Haddad e o PT
precisam acertar suas contas com o passado e não prometer uma volta a ele. •

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 CRÉDITOS DA PÁGINA: Ilustração: Baptistão


Gororoba ideológica

Não nos iludamos com a balela de que a privatização visa a


melhora das condições de vida do cidadão

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Os assessores econômicos dos candidatos liberais – e de outros nem tanto –


proclamam as maravilhas da privatização no atacado. O economista Paulo Guedes,
Posto Ipiranga de Jair Bolsonaro, promete arrecadar trilhões com a venda de
empresas estatais. 

A privatização é essencialmente uma “invenção” do grande capital financeiro


internacionalizado. Seus sócios menores são os banqueiros e os empresários mais
taludos dos chamados países emergentes. As transformações nas estratégias das
empresas explicam a sanha das privatizações de bens públicos. O rentismo exercita
seus propósitos ao se beneficiar de um ativo já existente, criado com dinheiro
público e gerador de renda monopolista. 

A onda de privatizações obedece à lógica patrimonialista e rentista do moderno


capital financeiro, em seu furor de aquisições de ativos já existentes. Nada tem a
ver com a qualidade dos serviços prestados, mesmo porque os exemplos são
péssimos. Em geral, no mundo, a qualidade dos serviços prestados pelas empresas
privatizadas declinou acompanhando o aumento de tarifas e a deterioração dos
trabalhos de manutenção. 
Trata-se fundamentalmente de um movimento típico do capitalismo avançado,
monopolista e comandado pelo poder das massas de dinheiro que circulam
livremente pelo mundo afora. O objetivo é diversificar a riqueza de cada grupo
privado, distribuí-la por vários mercados e assegurar o máximo de ganhos
patrimoniais a curto prazo. Quem não consegue engolir o concorrente corre o risco
de ser deglutido por ele. Esse é o mercado competitivo do capitalismo formado por
empresas gigantes. Os agentes dessas operações são, em geral, os bancos de
investimento. São eles que definem os novos proprietários, os métodos de
financiamento, a participação acionária dos grupos, as estratégias de valorização
das ações antes e depois dos leilões de privatização. 

Não é, portanto, de espantar que, no processo brasileiro de venda de ativos


públicos para os grupos privados, o confronto entre os pesos pesados da economia
mundial e da nativa tenha de ser arbitrado por funcionários do Estado. O
capitalismo dos monopólios e da alta finança é promíscuo e pegajoso em suas
relações com o Estado. O resto é conversa mole. 

É ingenuidade supor que a venda do patrimônio público ficasse restrita a uma


concorrência livre, limpa e desimpedida, considerados os volumes de recursos
envolvidos nas transações, o tamanho das empresas e a natureza dos setores a ser
privatizados. 

Os assessores passam a motoniveladora ideológica para atropelar a realidade.


Preferem o refúgio na retórica liberaloide, aquela da livre concorrência e da igual
oportunidade garantida a todos os interessados. Nessa história nem a Velhinha de
Taubaté cai mais, apesar de as mídias impressa e eletrônica continuarem tentando
nos engrupir com semelhante gororoba. Conversa de embrulhões. 

E tem mais. A experiência internacional mostra que, depois de um período breve de


“concorrência”, as empresas tendem a fundir-se, provocando uma enorme
concentração do capital e produzindo, portanto, situações de monopólio, com
graves implicações para a fixação de tarifas e para a qualidade do serviço. 

Em 2018, no encontro patrocinado pelo Federal Reserve em Jackson Hole, o


economista John Van Reenen, da Sloan School of Management, apresentou um
estudo a respeito do poder de monopólio das grandes empresas. Van Reenen
demonstra as relações promíscuas entre a letargia do investimento empresarial, os
salários modorrentos dos trabalhadores, a “geração de valor” para os acionistas e a
aflitiva busca de resultados a curto prazo. 

Lido com atenção, o livro O Capital no Século XXI, de Thomas Piketty, investiga a
tendência “natural” do capitalismo à valorização de ativos já existentes sobre as
aventuras do investimento produtivo. “Quando o empresário tende inevitavelmente a
se tornar um ‘rentier’, dominante sobre os que apenas possuem o próprio trabalho,
o capital se reproduz mais velozmente que o aumento da produção e o passado
devora o futuro.” 

Não vamos nos iludir com a balela de que a privatização está comprometida com a
melhora das condições de vida do consumidor e do cidadão. Isso pode até ocorrer
em alguns casos. Não tem sido a regra geral e isso é sabido por quem se dedica a
estudar o fenômeno no âmbito da economia global. A celebrada privatização
inglesa, por exemplo, promoveu um salto tão espetacular nas tarifas de água e
esgoto, em determinadas regiões, que o jeito foi mudar de residência para escapar
da fúria dinheirista das empresas privadas. • 

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 CRÉDITOS DA PÁGINA: Ilustração: Baptistão


A era da fragmentação
DESGLOBALIZAÇÃO Os governos têm hoje menos razões para cooperar e menos
recursos para enfrentar uma crise mundial como a de 2008

Por Antônio Luiz M. C. Costa

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Alvo esquecido. Os protestos do Occupy foram reprimidos e a ira deflagrada pela crise
reorientada contra imigrantes e outros bodes expiatórios

Em 15 de setembro completaram-se dez anos de um evento mais determinante


para nossos tempos do que o 11 de Setembro de 2001: a falência do banco
Lehman Brothers, marco do início da crise financeira e econômica de 2008. Se as
consequências do atentado da Al-Qaeda ainda ressoam sobre o Oriente Médio,
aquelas do colapso do mercado de derivativos de hipotecas subprime afetam não
apenas 200 milhões de desempregados oficiais do mundo, mas praticamente cada
pessoa, cada decisão política e cada eleição do planeta. 
Some-se a isso que, embora pouco ou nada se tenha feito para enfrentar as raízes
do terrorismo, foram adotadas em quase todos os países medidas de segurança e
vigilância que tornam muito difícil cometer hoje, ao menos com métodos
semelhantes, um atentado comparável àquele que atingiu as Torres Gêmeas e o
Pentágono. Praticamente nada foi feito para evitar a repetição de uma crise
financeira de proporções mundiais. Os bancos foram salvos de sua própria
incompetência com dinheiro público, a maioria dos responsáveis não foi punida, as
promessas de reduzir a concentração do setor foram esquecidas e as poucas
medidas de controle e regulamentação adotadas na época têm sido revogadas. 

O 15 de setembro de 2008 nos define mais que o 11 de Setembro


de 2001

Se algo mudou, foi no sentido de reforçar a despreocupação dos financistas. Estão


certos de que os governos, depois das consequências da falência do Lehman,
nunca mais se atreverão a deixar falir um grande banco. Entretanto, querer não é
poder. Os governos atingidos ainda arcam com o aumento da dívida à qual se
obrigaram para resgatar o sistema financeiro e com a compressão de gastos pela
“austeridade” imposta a desempregados, minorias e necessitados para garantir os
lucros e dividendos dos acionistas dessas corporações. 

Se ou quando ocorrer uma nova grande crise internacional, haverá menos gastos a
serem cortados e menos espaço para aumento das dívidas públicas. Também
haverá menos disposição dos governos a cooperarem para contê-la. Em 2008,
havia no Ocidente pouca contestação à globalização neoliberal, o que, se, por um
lado, criou condições para a crise ao esvaziar a supervisão de bancos e facilitar a
circulação de fluxos financeiros, também criou um consenso entre os governos
sobre o caminho a seguir. As elites da América do Norte, Europa e Ásia sabiam
estar no mesmo barco e precisar agir em conjunto para evitar seu naufrágio – à
custa da plebe, naturalmente. Dez anos depois, principalmente por causa das
consequências desse resgate sobre o eleitor comum, os egoísmos nacionais e os
movimentos isolacionistas estão em alta e as organizações multilaterais,
desmoralizadas. Comércio e finanças internacionalizados, talvez mais que há dez
anos, combinados com um sistema político cada vez mais fragmentado, é uma
combinação incendiária, principalmente neste momento. 

Os
Lição desdenhada. A falência do Lehman abalou o mundo e os governos saíram em socorro dos
demais grandes bancos. Isso não os fez mais prudentes

esforços para estimular a economia e minimizar as consequências da crise


resultaram em quase dez anos de juros básicos reais negativos e oferta ilimitada de
dinheiro pelos bancos centrais dos países ricos. Em consequência da fraqueza da
demanda – consumidores desempregados ou com temor do desemprego relutaram
em se endividar, mesmo com juros baixos – e da escassez de inovações
tecnológicas capazes de atrair grandes investimentos, boa parte do dinheiro, talvez
a maior, foi desperdiçada em especulação improdutiva, da qual o sintoma mais
agudo foi a febre da Bitcoin e outras criptomoedas, que atingiu seu pico no fim de
2017. Entretanto, essa conjuntura sem precedentes na história do capitalismo não
poderia durar indefinidamente sem pôr em questão os próprios pressupostos do
sistema. 

No ano passado, considerando não haver mais risco de recessão nos EUA, o Fed
começou de novo a aumentar a taxa, de 2% desde junho de 2018. Embora ainda
não supere a inflação do dólar – 2,7% nos 12 meses até agosto, 2,4% esperados
para os próximos 12 –, bastou para atrair de volta aos EUA capitais especulativos
espalhados pelo mundo e pôr em apuros quem aproveitou a era dos juros negativos
para tomar empréstimos. 

O primeiro canário na mina, como dizem os economistas (alusão ao costume de


mineiros de carvão de ter gaiolas nos túneis para que a morte desses pássaros,
muito sensíveis a gases tóxicos, servisse de alarme), foi a Argentina, incapaz de
resistir à fuga desses recursos e rolar sua dívida com juros em alta. O dólar subiu
de menos de 15 pesos no início de 2017 para 40 hoje. Buenos Aires recorreu ao
FMI, mas há dúvidas sobre se o empréstimo de emergência em discussão basta
para dar conta dos pagamentos previstos até o fim do ano, quanto mais para 2019.
A relação entre a dívida pública e o PIB, que era de 46% no fim do governo de
Cristina Kirchner, deve chegar a 111% em dezembro. 

Outro possível canário é a Turquia. Enquanto Mauricio Macri conta em tese com a
simpatia do governo de Donald Trump e dos economistas ortodoxos por seu rigor
neoliberal e alinhamento incondicional com os Estados Unidos, Recep Tayyip
Erdogan é aluno rebelde de economia e geopolítica, às turras com Washington e
Bruxelas, e um teste da fragmentação do Ocidente, ao qual ainda se supõe
pertencer como integrante da Otan. Até agora, apesar do envolvimento militar na
Síria, Ancara resistiu melhor que Buenos Aires, mas pode desencadear uma crise
financeira mais grave, dado o comprometimento de bancos europeus com
investimentos nesse país, principalmente o espanhol BBVA (também envolvido na
Argentina e outros países latino-americanos), seguido pelo italiano Unicredit, de um
país cujos sistemas financeiro e político foram especialmente fragilizados pela
crise. 

Das armadilhas que podem deflagrar a nova crise, a maior é a


guerra comercial
Os mercados imobiliários também são armadilhas em potencial. Em Londres, os
preços estratosféricos dos imóveis podem cair bruscamente com a perda
do status de capital financeira da Europa após o Brexit de março de 2019, salvo um
acordo cada vez mais improvável. Nos EUA, sustentar a recuperação dos preços
dos últimos anos parece cada vez mais difícil: os jovens, com dificuldade crescente
de pagar as prestações do crédito educativo, não estão em condições de comprar
casas próprias e aqueles que conseguiram comprá-las com financiamento
imobiliário na era dos juros negativos não querem vendê-las para comprar outras
maiores porque isso implica assumir novas dívidas, com juros bem mais altos. 

Temeridade. Encorajado pelo acordo com o México, Trump pensa ser capaz de dobrar a China à
sua vontade. Isso pode dar muito errado

Riscos maiores em dimensão são, porém, aqueles dos investimentos em cadeias


de produção ameaçadas pelas guerras comerciais recém-deflagradas. O risco de
dissolução total do Nafta e de paralisação de um fluxo comercial de 314 bilhões
anuais do México para os EUA e 243 bilhões no sentido contrário foi aparentemente
contornado por um acordo que, grosso modo, garante o uso de um porcentual de
mão de obra estadunidense sem desmantelar as fábricas instaladas no México,
reduzindo a importação de componentes europeus e asiáticos. Isso força
transnacionais a repensarem suas linhas de produção, e deve encarecer um pouco
o produto final, mas não é o fim do mundo. O maior problema é que obter um
acordo à custa de ameaças e arrogância encorajou Trump a tentar dobrar a China
com a mesma estratégia. 
Temeridade. Encorajado pelo acordo com o México, Trump pensa
ser capaz de dobrar a China à sua vontade. Isso pode dar muito
errado

Na segunda-feira 17, a Casa Branca anunciou tarifas de 10%, a serem aumentadas


para 25% em janeiro, sobre 200 bilhões anuais de importações de produtos
chineses. Somados aos 50 bilhões anteriormente tarifados, isso significa quase a
metade dos 505 bilhões de vendas da China aos EUA – e Trump ameaçou tarifar
também o restante se Pequim retaliasse. Xi Jinping fez exatamente isso, tarifando
60 bilhões além dos 50 bilhões de importações de produtos dos EUA anteriormente
afetados, ou que representa 85% dos 130 bilhões de 2017. 

O governo republicano tem, nesse caso, mais apoio interno. A linha dominante dos
democratas defende o Nafta, visto como uma das realizações de Bill Clinton, mas
se alinha com as queixas das transnacionais dos EUA sobre concorrência desleal e
roubo de propriedade intelectual pelos chineses – e democratas de esquerda como
Bernie Sanders, se são menos simpáticos ao Nafta, são ainda mais hostis ao
comércio com a China. Há hoje consenso nos EUA de que a China é a principal
ameaça à sua hegemonia e precisa ser enquadrada. Como no século XIX, trata-se
de forçar a abertura de seus portos e desarmar sua estratégia protecionista, a
mesma que fez dos EUA, da Alemanha e do Japão países ricos e poderosos. 

Por

Temeridade. Encorajado pelo acordo com o México, Trump pensa ser capaz de dobrar a China à
sua vontade. Isso pode dar muito errado
outro lado, a China não está disposta a ceder – e mesmo se lhe faltam mais
importações dos EUA a tarifar, tem outras maneiras de retaliar, incluindo despejar
no mercado trilhões em títulos do Tesouro em suas mãos, sabotar a diplomacia e a
estratégia internacional de Washington e cortar o fornecimento de insumos cruciais
para empresas dos EUA. Para Pequim, não é uma questão de toma-lá-dá-cá, mas
de preservar o desenvolvimento, o prestígio internacional e o próprio regime,
ameaçado tanto pela pressão popular por melhores salários e condições de
trabalho quanto pelo crescente endividamento interno, parte desconhecida do qual
referente a créditos podres de bancos a projetos industriais e de infraestrutura
malsucedidos ou golpeados pela crise internacional. 

O confronto pode durar anos e desorganizar o comércio internacional de forma


muito mais extensa do que qualquer outra disputa imaginável – exatamente o
contrário do que aconteceu em 2008, quando estava na moda o conceito de
“Chimérica” (simbiose entre China e EUA), Pequim amenizava os riscos para o
sistema financeiro comprando títulos e seu crescimento reduzia ou adiava o impacto
da crise sobre os exportadores de matérias-primas. Uma crise hoje é tão provável
quanto há dez anos e mais perigosa, porque é muito provável que, desta vez, as
grandes nações disparem entre si em vez de buscar uma saída comum. • 

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 CRÉDITOS DA PÁGINA: XINHUA/ZUMA WIRE/FOTOARENA E BEN STANSALL/AFP, EITAN


ABRAMOVICH/AFP E NICHOLAS KAMM/AFP
Os edifícios da mente
ARQUITETURA Exposição detém-se nos projetos não construídos de Paulo Mendes
da Rocha e revela seus sonhos e sua antevisão libertária

Por Jotabê Medeiros

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Arquitetura como desejo. Mendes da Rocha: “Visão única”, segundo a Bienal de Veneza

Aquilo que o arquiteto nunca materializou como edificação contém uma parte
expressiva da sua imaginação libertária. Um aquário no litoral que acalenta planos
de se estender até o mar; um reservatório de água no interior que sonha ser um
espelho do céu, em vez de alojar-se nos subterrâneos; uma baía recortada que
rejeite os dejetos da cidade; uma piscina pública no centro da metrópole erguida
sobre os pilares dos movimentos da multidão. 
No detalhe, “bicicleta a vela”, esboço davinciano que emoldura o território da imaginação

A Ocupação Paulo Mendes da Rocha, uma mostra de arquitetura alicerçada, em


vez de no brutal concreto da modernida de, na pura imaginação, celebra, entre
outras coisas, esses projetos irrealizados e a presença poética do arquiteto,
urbanista e professor capixaba Paulo Mendes da Rocha na arte brasileira. Não é
uma exposição monumental. Seu encanto está basicamente na forma como
manuseia as visões de um gênio sonhador, em vez de jactar-se das técnicas da
arquitetura. Maior nome da arquitetura do País na atualidade, Mendes da Rocha
completa 90 anos no próximo dia 25 de outubro. 

A razão da arquitetura, ele ensina, é amparar a imprevisibilidade da vida e se


constituir em algo que impulsione “o andamento da consciência”. Daí o sorriso que
o visitante esboça quando se vê em frente ao desenho de uma singela bicicleta a
vela, um delírio ao estilo Leonardo da Vinci. A lírica bicicleta está postada bem ao
lado de uma intervenção maciça: as fotos do mais recente projeto realizado pelo
arquiteto, o Sesc 24 de Maio, gigante de lazer e abrigamento de 28 mil metros
quadrados no Centro de São Paulo. Em vez de um choque de ambiências, a
bicicleta que uma vela inflada em forma de balão puxa à frente parece ser feita do
mesmo material que sugere que alguns meninos levitam brincando sobre o espelho
d’água do 11º andar do Sesc monumental. 

São
Democrático. O Sesc 24 de Maio, obra mais recente do arquiteto, intervenção vigorosa na rotina
do Centro degradado de São Paulo

apresentados na mostra, com curadoria de Guilherme Wisnik, plantas, maquetes e


ilustrações de oito projetos do arquiteto que nunca foram realizados num leque de
50 anos de trabalho: o Reservatório Elevado em Urânia (Urânia, SP, 1968), a
Cidade do Tietê (entre Lins e Novo Horizonte, no estado de São Paulo, 1980), o
Aquário Municipal de Santos (Santos, SP, 1991), a proposta para a Baía de Vitória
(Vitória, ES, 1993), a Baía de Montevidéu (Montevidéu, Uruguai, 1998), um plano
para a Praça da República (São Paulo, SP, 2001), o Parque da Grota (São Paulo,
SP, 1974) e a Biblioteca de Alexandria (Alexandria, Egito, 1988). 

“Nós estamos condenados a transformar o pensamento em coisas”, diz o arquiteto.


A exposição faz o caminho inverso: reconstrói o percurso da coisa até o
pensamento. Os desenhos de pessoas, as fotos de família, os ensaios, as
brincadeiras e a chegada até o projeto concreto, está tudo ali. Até o impacto que
teve no arquiteto a mudança da paisagem, o eco antigo da derrubada do Morro do
Castelo na reforma urbanística de 1922 no Rio de Janeiro. 

O arquiteto celebra 90 anos em vigorosa atividade e notável


capacidade criativa

A exposição também inclui exibições do filme Tudo É Projeto Paulo Mendes da


Rocha, documentário ainda inédito sobre a vida e obra do arquiteto, dirigido por sua
filha, Joana Mendes da Rocha, e Patricia Rubano, com produção de Gal Buitoni e
Luiz Ferraz. Tudo É Projeto começa com cenas do Museu Cais das Artes, risco
original de 2007 ainda em construção em Vitória (ES), onde o arquiteto nasceu, com
as visões implícitas dos navios na baía da capital. “Não existe isso de ‘a sua
arquitetura’. Ou melhor, ela só existe, a arquitetura, porque não é ‘sua’. Ela já existia
antes, é um desejo humano.” O arquiteto, se se dispuser a ir atrás desse desejo do
gênero humano, continua, buscará a satisfação dos desejos do outro. “Não é você
que faz para você”, diz Mendes da Rocha, com sua simplicidade desconcertante. 

Museu Brasileiro da Escultura. Gênio brutalista, como definido por colegas, ou simplesmente um
visionário das formas, o arquiteto deixa sua marca inconfundível na paisagem da grande
metrópole

filme recupera os discursos e as justificativas dos grandes prêmios mundiais que a


arquitetura de Mendes da Rocha recebeu: o Pritzker de 2006 e o Leão de Ouro de
Veneza (2016). “O atributo mais marcante da arquitetura de Paulo Mendes da
Rocha é sua visão única. Ele é um homem desafiador assim como um realista
apaixonado. Uma pessoa capaz de unir, compartilhar e coletar esforços, bem como
alguém capaz de atrair outras pessoas para um ambiente arquitetônico melhor”, diz
o curador da Bienal de Veneza em off, enquanto as imagens mostram os canais e a
fluidez da comunicação. 

O filho, o pai e o avô. Estão emparelhadas na exposição as presenças tanto de


Paulo Archias Mendes da Rocha (filho), Paulo Mendes da Rocha (pai) e Francisco
Mendes da Rocha (avô), como uma espécie de indução à ideia de continuidade, o
projeto de um País que sonhou com a integração. O avô, Francisco, dirigiu o serviço
de navegação do Rio São Francisco, conhecido como “Rio da Unidade Nacional”, e
mais tarde presidiu a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Era especialista em
“navegação interior, portos, rios e canais”. Quando tinha 8 ou 9 anos de idade, o pai
(engenheiro que foi, nos anos 1940, professor de engenharia naval e recursos
hídricos na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo) o levava para ver as
obras navais, e a maquinaria em marcha o fascinava. Portanto, de uma forma até
hereditária, a água é um elemento que coopta Mendes da Rocha, que crê na
capacidade de o homem intervir na natureza (“a primeira e primordial arquitetura é a
geografia”) de forma criteriosa. “É impossível não imaginar uma certa convocação”,
conta, revelando até uma inclinação edipiana na arquitetura que erigiu, quem sabe,
para impressionar o pai. 

Urbanismo: cidades não vivem mais do interesse exclusivo pelo


edifício, pondera

Habitante convicto do Centro da cidade que adotou como sua, São Paulo, no qual
mantém escritório, ele se bate também contra os inimigos invisíveis da metrópole.
Um deles, a neurose, “moléstia mental, a preocupação do paulistano com a
segurança”, que faz com que se coloquem grades até em torno dos monumentos,
como o que ele fez na Praça do Patriarca, marco controverso na paisagem. E o que
o povão achou do monumento, a tal arquitetura com lógica, com discurso? “Eu não
sei o que o povão achou, porque eu não tenho coragem de perguntar”, diz Paulo.
“De repente, o cara fala assim: ‘Eu acho uma porcaria’.” 

A outra convicção é o combate à hegemonia do fordismo, da “estupidez do


automóvel”, como define. “Um carro pesa 700, 800 quilos e transporta um de nós,
que pesa 60 quilos. Então, você transporta... uma lataria. Todo esse panegírico de
extração de petróleo, transformar matéria sólida pesante de todo o sistema da
mecânica celeste, de conservação da energia pela matéria, tudo isso, você
transforma em matéria volátil para transportar lataria de lá para cá, de cá para lá”,
analisa. “Portanto, a visão de transporte público, a concentração da população para
a eficiência do transporte público, a verticalização, tudo isso são engenhosidades
que não podem ser vistas como balela para pôr mercadoria para vender. Nós temos
de fazer a crítica também da exacerbação da ideia de mercado, que exige e
desfruta da propaganda.” 

Paulo Mendes da Rocha mantém-se no Centro, ele mesmo, como um testemunho


de suas convicções. “A arquitetura saiu do interesse do edifício como um fato
isolado e deteve-se na questão da cidade”, diz. “O objeto da arquitetura hoje é a
cidade, a realização da cidade. E aí entram conflitos incríveis entre razões de
caráter utópico, do que seja a cidade, e as razões do mercado, que destroem tudo,
passam por cima de tudo, necessidades e desejos de modo concomitante.” • 

OCUPAÇÃO PAULO MENDES DA ROCHA.


Itaú Cultural Avenida Paulista, 149. Grátis. 
De terça a domingo.
Até 4 de novembro.

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: ANA OTTONI E MATHEUS JOSÉ MARIA , ALF RIBEIRO/FOLHAPRESS


ARTES VISUAIS  Da oficina de Rafael
Reunindo telas de diversos museus italianos e coleções brasileiras, exposição mapeia
influência do pintor

Por Jotabê Medeiros

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A excelência da tela Testa di Madonna, de Rafael Sanzio, e o estilo cristalizado pelo ateliê do
mestre

Uma tapeçaria monumental de 4 x 5 metros, feita de lã, seda, prata e ouro e


executada com base em desenho de Rafael Sanzio, surge como se fosse uma
rampa de skate à frente do visitante. São muitas surpresas e detalhes que vão
aparecendo no percurso das oito seções da grande mostra Rafael e a Definição da
Beleza – Da Divina Proporção à Graça, em cartaz na Avenida Paulista. Um
desenho original de Rafael para a famosa tela Escola de Atenas, que ele produziu
para o Vaticano, alinha-se a uma projeção gigante do afresco que está na galeria
Stanza della Segnatura, perfazendo um percurso de elucidação artística. Há telas
vindas do Palazzo Barberini e da Galeria Borghese, de Roma; do Museo Nazionale
di Capodimonte, de Nápoles; da Galleria Estense, de Modena; do Museo Antico
Tesoro della Santa Casa di Loreto, de Ancona. E quadros da coleção de Jorge
Yunes, histórico escudeiro de Paulo Maluf, e da Fundação Klabin. 

A maior imagem que ilustra essa página é de uma joia da arte renascentista: Testa
di Madonna (Cabeça da Virgem), que somente em 2010, após um minucioso
restauro, foi atribuída definitivamente por especialistas a Rafael como uma de suas
obras tardias. 

Rafael Sanzio de Urbino (1483-1520) foi o mais jovem da tríade fundadora que tinha
ainda Leonardo da Vinci e Michelangelo. “Mais novo, Rafael pisou em ombros de
gigantes e isso permitiu que enxergasse além deles”, diz a curadora, Elisa Byington.
Na exposição, os discípulos mais fiéis ao mestre Rafael, como Gianfrancesco Penni
e Giulio Romano, emparelham-se com as técnicas e os ensaios mais famosos
sobre a produção do ateliê de Rafael e de sua vida. Logo no início da mostra há
uma sequência de duas impressionantes telas de Pietro Vanucci, o Perugino (1450-
1523), grande inspirador de Rafael. Diversas obras da Biblioteca Nacional expostas,
como o livro Divina Proporção, de Luca Pacioli (1445-1517), escrito entre 1494 e
1497, mostram a prodigiosidade do acervo daquela instituição.

Rafael e a Definição da beleza – Da Divina proporção à graça. 


(Avenida Paulista, 1313). Até 16 de dezembro. Grátis. 
De terça a sábado, das 10h às 22h (dom., 10h às 20h).

 LIBERDADE VERSUS
TEATRO

FELICIDADE
Por Eduardo Nunomura
O Grande Inquisidor – Século XXI. De Fiódor Dostoievski. No Ágora Teatro, em São Paulo, aos sábados,
domingos e segundas-feiras, até 29 de outubro. Ingressos a 50 reais.

Escrito em 1879, portanto, 139 anos atrás, o romance Os Irmãos Karamázov, do


escritor russo Fiódor Dostoievski, impõe-se como o clássico dos clássicos da
literatura mundial, capaz de influenciar e inspirar de Sigmund Freud a James Joyce,
de Franz Kafka a José Saramago. Uma de suas passagens mais célebres é O
Grande Inquisidor, na qual o personagem Ivan fala do retorno de Jesus à Terra
durante a Inquisição espanhola e é contestado por um cardeal, que o sentencia à
prisão. Dostoievski percorre questões filosóficas sobre a natureza humana, a
liberdade, a felicidade e as formas tirânicas do poder político ou religioso. A
potência dessa narrativa permitiu ao ator Celso Frateschi encenar uma terceira
versão dessa mesma passagem – as duas anteriores foram nos anos de 2010 e
2016. Desta vez, Jesus não reencarna, mas ressurge onipresente como um grafite
de São Paulo, portanto a releitura se dá em tempos recentes. O Grande
Inquisidor ganha o aposto Século XXI no título da peça, mas bem poderia ser 2018.
O cardeal aponta o dedo para o salvador e afirma que “Ele e os Seus” se gabam de
terem suprimido a liberdade para tornar os homens felizes. Estamos, neste país de
democracia golpeada, aceitando perder o direito de ser livres por uma suposta
liberdade? 

CINEMA  A BANDIDA DA LUZ


VERMELHA
Por Pedro Alexandre Sanches

O cinema de Helena Ignez brota das cinzas de Glauber e Rogério Sganzerla


A Moça do Calendário. De Helena Ignez. Brasil, 2018. 

Atriz e companheira de Glauber Rocha e de Rogério Sganzerla na juventude, a


baiana Helena Ignez reinventou-se no papel de cineasta. Aos 76 anos, ela
apresenta A Moça do Calendário, mais uma fabulação em torno dos filmes de
Sganzerla, inspirada num roteiro original que o diretor elaborou em 1987. Se o ano
de exceção de 1968 produziu O Bandido da Luz Vermelha, de Rogério, o ano de
exceção de 2018 vai além de um devaneio viúvo por sobre um roteiro dos anos
1980. Helena reflete com humor e picardia os efeitos do golpe de Estado de 2016,
sobre personagens marginalizados da mesma estirpe daqueles do filme de 1968
que ela coestrelava. Estamos no mesmo ambiente, o Centro de São Paulo, mas 50
anos mais degradado e abandonado. Barracas de sem-teto espalham-se por
cenários que já eram caros ao Cinema Novo e ao cinema marginal dos anos 1960 e
1970. Celso Patrão, “empresário de mim mesmo, yes we can!”, tem por emprego
explorar e assediar os funcionários de uma oficina mecânica, num macrocosmo de
ex-garis, sem-terra, uberdomésticas, índios Guarani, afro-brasileiros explorados.
Um deslocamento perturba a “ordem natural” saudosista e arremete a um futuro
medonho. Os personagens expressam-se como típicos representantes das classes
médias/altas intelectualizadas. Mecânicos e prostitutas filosofam, leem Freud,
atacam a violência de gênero, falam o que Glauber e Rogério não falariam 50 anos
atrás. A aposentadoria não virá e o tempo de almoço será de meia hora, seja para
mecânicos, seja para operários de cinema e mídia. “As coisas vão mudar. O Lula
vai voltar”, sonha um dos párias da marginália sobrevivente de Helena. O presente
vibra, entre o desespero e a esperança. 
CDs  OS NOVOS DE NOVO
A originalidade é o traço comum entre brasileiros da geração 2010 que
elegem o desvio e o risco como metas musicais

SAULO DUARTE, NA PONTE PA-


CE-SP
Por Pedro Alexandre Sanches

Avante Delírio. De Saulo Duarte. 

Saulo Duarte nasceu em Belém (PA), cresceu em Fortaleza (CE) e vive há uma
década em São Paulo. Essa circulação nutriu a sonoridade de três discos gravados
com a banda A Unidade, cujos traços essenciais Saulo conserva na estreia solo
com Avante Delírio. Uma recombinação entre ritmos paraenses, brega nordestino,
jovem guarda, samba-rock e rock paulistano provê a originalidade de sua música
serena (Não Existe Resposta para “Eu Te Amo”), descontraída (Rebuliço),
provocativa (Tropa de Meninxs, Praça de Guerra). 

AS LIBÉLULAS ROBÓTICAS DE
EDGAR
Por Pedro Alexandre Sanches
Ultrassom. De Edgar. Deck 

Vão distantes os tempos do “rap raiz”. Mais nova revelação do gênero, o paulista
(de Guarulhos) Edgar chega com Ultrassom, desatado dos nós de obrigatoriedades
quaisquer e influenciado por referenciais tão híbridos quanto música eletrônica do
tipo psy trance, videogame, Kraftwerk, poesia concreta, pós-samba de Elza Soares
e robótica. Do plástico que o embala, Edgar tenta se desvencilhar em criações
como Felizes Eram os Golfinhos e Antes Que as Libélulas Entrem em Extinção. 

JOSYARA, DA BAHIA RIBEIRINHA


Por Pedro Alexandre Sanches

Mansa Fúria. De Josyara. Independente/Tratore. 

A Bahia menos tropicalista que sertaneja entrega ao Brasil Josyara, nascida às


margens do Rio São Francisco, quase Pernambuco, na mesma Juazeiro de João
Gilberto. O título Mansa Fúria remete à influência da roqueira conterrânea Pitty, mas
a fúria em Josyara não é explícita. Temas autorais como Nanã, Terra Seca,
Remanso, Fogueira e Engenho da Dor pendem à terra e à agua, ao ar e ao fogo, à
celebração dos Novos Baianos e à agridoçura de Alceu Valença. Se Josyara
vocaliza alguma fúria, é a da natureza. 
AVA ROCHA, PAN-AMERICANA
Por Pedro Alexandre Sanches

Trança. De Ava Rocha. Circus/Natura Musical. 

Filha de Glauber Rocha e da franco-colombiana-brasileira Paula Gaitán, Ava Rocha


chega ao terceiro álbum com Trança, uma ode às forças da natureza que principia
pela ancestralidade africana em Maré Erê e se posiciona num múltiplo (não)lugar
entre Periférica, Lilith, Continente, Patrya, Joana Dark, Fog, Assumpção, Dorival
etc. Entre o trans-Milton Nascimento de João Três Filhos e o pan-americanismo de
Canción para Usted e Frio, o excêntrico é o centro de Ava Patrya Yndia Yracema,
nome de batismo. 

BIXIGA 70, DA ÁFRICA A


ADONIRAN BARBOSA
Por Pedro Alexandre Sanches

Quebra-Cabeça. De Bixiga 70. Traquitana/Deck. 


Quebra-Cabeça é o quarto trabalho da big band paulistana Bixiga 70, que opera no
registro do afrobeat inventado pelo nigeriano Fela Kuti e o expande em intercâmbios
com a vanguarda (não apenas) paulista de Itamar Assumpção e Arrigo Barnabé, os
sons pantaneiros da família Espíndola, entre outros. 

RODRIGO CAMPOS E O PÓS-


SAMBA DE SÃO MATEUS
Por Pedro Alexandre Sanches

9 Sambas. De Rodrigo Campos. YB. 

Rodrigo Campos estreou solo em 2009, com o manifesto São Mateus Não É Um


Lugar Assim Tão Longe, viajou pela Bahia Fantástica (2012) e pelo Japão
de Conversas com Toshiro (2015) e volta às origens com 9 Sambas, em que o ritmo
matricial é hibridizado com jazz, João Bosco, Baden Powell e Moacir Santos, o
morro carioca.... 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: Archivio dell’Arte / Pedicini fotografi, Joao Caldas, Cristiano Prim e Rafael Pereira
Getúlio, Perón e Lula
Coincidências históricas que referendam os líderes populares – aqueles que os
inimigos do povo chamam de “caudilhos” ou “populistas”

Por Nirlando Beirão

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Desterrado em São Borja, ele conseguiu eleger até quem o traiu

Getúlio Vargas, não o revolucionário de 1930, e sim o autocrata do Estado Novo, foi
derrubado por um golpe militar no dia 29 de outubro de 1945, ao fim de um longo
período de turbulência política e social para o qual a derrota das ditaduras do Eixo
na Segunda Guerra serviu de definitivo combustível. O Brasil lutara ao lado dos
Aliados, por conveniências mais pragmáticas do que ideológicas, mas o sentimento
democrático intoxicava a sociedade, os adversários do regime se mobilizavam, a
caserna estava inquieta. O anseio pela redemocratização já motivara, em 1943, a
Carta dos Mineiros, assinada por ilustres liberais de cátedra. 

Em abril de 1945, Vargas ensaiara uma abertura por meio da anistia, a qual, entre
outros efeitos, tirava da clandestinidade o Partido Comunista – reconhecendo-se
assim, como acontecia na Europa Ocidental, o papel dos resistentes comunistas
nas nações ocupadas e o da União Soviética na derrota do nazifascismo. Não foi
suficiente para acalmar o mal-estar. O movimento denominado “queremismo”
buscava uma solução à brasileira: Constituinte com Vargas. O estopim da queda foi
a nomeação de Benjamin Vargas, irmão mais novo do presidente, como chefe de
Polícia do Distrito Federal. A oposição divulgou, com “Beijo” Vargas na chefatura,
que as principais lideranças militares seriam encarceradas. Quatro dias depois,
Getúlio estava na rua.

De

Carisma. O “queremismo”, Constituinte com Getúlio, não evitou sua queda.

comum acordo, o ex-ditador retirou-se para a sua estância, em São Borja, na


remota fronteira com a Argentina. Uma foto emblemática o mostra sentado numa
rede, como se estivesse de costas para o Brasil – e para a política. Na verdade, não
estava. 

O
Dutra elegeu-se com os votos do getulismo, derrotando o Brigadeiro.

presidente do Supremo Tribunal, José Américo, no comando interino do País (não


havia vice-presidente e, com o Congresso fechado, nem presidentes da Câmara e
do Senado), convocou eleição presidencial para o dia 2 de dezembro.
Simultaneamente, seria eleita uma Assembleia Constituinte. Entre os partidos
recém-organizados, a União Democrática Nacional (UDN) posicionava-se como
uma frente ampla de oposição ao Estado Novo. Este, por sua vez, era representado
pelo Partido Social-Democrático (PSD), conservador, com raízes da oligarquia rural,
e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), urbano, identificado com o legado social do
getulismo. Um rosário de agremiações regionais fazia figuração. 
Brizola fez carreira defendendo o legado social de Vargas

Estava para se encerrar o último comício de Eurico Gaspar Dutra, candidato do


PSD à Presidência, e faltavam apenas cinco dias para as urnas serem abertas.
Uma mensagem de última hora chega de São Borja: “O candidato do PSD, em
repetidos discursos, e ainda agora, em suas últimas declarações, colocou-se dentro
das ideias do programa trabalhista. Ele merece, portanto, os nossos sufrágios!”
Assinado: Getúlio Vargas. A carta é lida do palanque. Até o dia da eleição, milhões
de panfletos inundam o País: “Ele disse: votai em Dutra”. Nem precisava dizer quem
era “ele”. 

A demora não fora só estratégica. Getúlio resistiu porque o general Dutra tinha sido
um dos militares que o apearam do poder. Mas o líder do PTB, Hugo Borghi, insistiu
com Vargas que uma vitória do brigadeiro Eduardo Gomes, candidato da UDN,
seria um mal maior. Certeira profecia: a UDN, assim como futuramente o PSDB,
nunca aceitou pacificamente suas derrotas nas urnas, não trazia o compromisso
democrático no DNA. A carta pró-Dutra enfiou uma estaca no peito da UDN. Dias
antes, Eduardo Gomes, em discurso, dispensou o voto “dessa malta de
desocupados que apoia o ditador”. A versão que se popularizou dizia que o
brigadeiro declinava do voto dos “marmiteiros”. Um desastre. 

A cinco dias do pleito, o ex-ditador resolve apoiar Dutra. A eleição


está decidida
A mídia, predominante antipopular, duvidou que em tão curto prazo de tempo
Getúlio pudesse transferir, em votos, seu carisma e seu prestígio para o apatetado
Dutra. Os Camarotti de então produziam melífluos raciocínios para justificar
seu wishful thinking. O general teve 3.251.507 votos (55,39% do total). O brigadeiro,
2.039.341 votos (34,74%). O comunista Yedo Fiuza conseguiu 569.818 (9,71%). O
eleitor reconhecia o legado de Vargas (em 1951, iria conduzi-lo de novo à
Presidência, enfrentando Eduardo Gomes e os maus bofes da UDN). 

A liderança de Getúlio, tão contestada pela direita de farda, de toga e de tipografia,


já seria estrepitosamente confirmada a poucas semanas de sua deposição. Para a
Assembleia Constituinte, o candidato poderia apresentar-se em quantas jurisdições
eleitorais quisesse. O ex-presidente foi eleito senador pelo Rio Grande do Sul e por
São Paulo, e deputado por seis estados e pelo Distrito Federal. 

Com o equivalente getulista do outro lado do Prata o fenômeno repetiu-se


insistentemente. Até hoje o sobrenome “peronista” dá uma tremenda força aos
políticos, mesmo que esse conceito não tenha uma coerência ideológica visível, que
tenha virado uma viscosa fantasmagoria. Difícil imaginar que caibam no mesmo
rótulo figuras tão politicamente díspares como o ex-presidente Carlos Menem, o
casal Kirchner, o ex-piloto Carlos Reutemann, o cantor Palito Ortega e o guerrilheiro
Mario Firmenich. 

O
Legado. Enquanto teve Evita, Perón governou com a força dos descamisados; sem ela, morta em
1952, fraquejou.
coronel Juan Domingo Perón fez do quartel um trampolim para a política. Seu
prestígio de pai dos descamisados nasceu quando era secretário do Trabalho e da
Segurança Social, na primeira metade dos anos 40. E, já tendo como companheira
a valente Evita, desagradou aos militares eternamente golpistas, que exigiram sua
cabeça no dia 9 de outubro de 1945 e o colocaram na prisão. Evita mobilizou os
trabalhadores, Perón foi libertado e novas eleições presidenciais foram convocadas.
Perón trinfou com 53% dos votos. Em 1951, seria reeleito com 62%. 

Nos
dois
Do exílio, conseguiu eleger o adversário Frondisi, que governou sob tutela militar.

mandatos, fez tudo aquilo que o cânone conservador mais execra. De cara,
nacionalizou os bancos estrangeiros, as ferrovias e as companhias de eletricidade,
estatizou o Banco Central e contemplou os trabalhadores com um arco de
benefícios bem maior do que o que Getúlio Vargas oferecia no Brasil: aumento do
salário mínimo, folgas semanais, redução da jornada de trabalho, 13º salario,
aposentadoria, férias pagas, seguro-saúde e cobertura para acidentes de trabalho. 
Figuras disparatadas como Menem e o casal Kirchner atuaram à sombra do peronismo

Resultado: os salários reais dispararam, os juros caíram, o consumo turbinou a


economia, que, até 1948, cresceu a uma taxa recorde de 8,5% ao ano. Na política
externa, Perón repetiu Vargas, esquivando-se das armadilhas da Guerra Fria ao fim
da Segunda Guerra Mundial, assim como se preservara neutro no embate das
democracias ocidentais com o nazifascismo, ele que, pessoalmente, assim como
Vargas, nutria pela democracia representativa um afeto muito remoto. 

No segundo mandato, Perón enfrentou um golpe simbólico antes de sofrer outro,


bem real. Em 1952, morreu de câncer, aos 32 anos, a combativa Evita. A Argentina
pranteou nela o coração sensível do governo peronista, a campeã dos excluídos, a
jovem mãe dos pobres. No dia do enterro, faltaram flores de Porto Alegre até a
Patagônia. Os impenitentes golpistas sentiram que Perón se fragilizaria e o
depuseram a 21 de setembro de 1955. Antes, em junho, a Aviação Naval
promovera uma carnificina, bombardeando Buenos Aires. Morreram cerca de 400
civis e outros 800 ficaram feridos. Perón exilou-se na Espanha. Os inimigos
respiram aliviados, o peronismo ia embora com ele. 

Com o líder banido, a saída foi: Cámpora no governo é igual a


Perón no poder

Nada disso. Arturo Frondisi, o advogado eleito presidente em 1958, era candidato
da União Cívica Radical, mas resolveu firmar um acordo eleitoral com seus
tradicionais adversários do peronismo. O acordo foi subscrito por Perón, lá de
Madri. O caudaloso acervo de votos do peronismo seria transferido, com as
bênçãos de Perón, para Frondisi, o qual, por sua vez, prometia anular as leis que
haviam proscrito o Partido Justicialista. A transfusão de votos funcionou, Frondisi
ganhou e fez um governo progressista. Sobreviveu a seis tentativas de golpe por
parte dos gorilas irrequietos. 

Sempre no exílio, Perón estava para a política argentina assim como Gardel estava
para o tango. As sucessivas turbulências não empanavam seu poder virtual. Os
trapaceiros fardados, obstinados desafetos da democracia, subiam ao poder a seu
bel-prazer, mas, felizmente, um substrato de insubmissão política impedia que as
aventuras castrenses fossem longe. Juan Carlos Onganía depôs o presidente eleito
Arturo Illia, em 1966, para ser ele próprio derrubado, em 1971, por outro general,
Alejandro Lanusse, que assumiu o posto prometendo eleições livres. 

Livres ma non tropo. Marcadas para 11 de março de 1973, elas traziam um


casuísmo restrito a Perón. Impedia que concorresse à Presidência quem não
tivesse domicílio eleitoral há pelo menos seis meses. Enquanto a direita se
regozijava com a esperança de que Perón não conseguisse eleger seu “poste”–
como se vitupera hoje no Brasil de Lula –, o proscrito radicalizou: indicou como seu
candidato um noviço da política, o dentista Héctor Cámpora, que o servia também
como secretário particular. A oposição chiava: “fantoche”, “tutelado”. Os peronistas
respondiam: Cámpora no governo, Perón no poder. 
A Frente Justicialista de Liberación (Frejuli) deu um show na urna. Cámpora
convocou nova eleição presidencial e em 20 de junho Perón embarcava em Madri
para pôr fim a 18 anos de exílio. Um banho de realidade esperava pelo líder já na
chegada. O peronismo, rachado entre a esquerda armada protagonizada pelos
Montoneros e a direita pelega que colaborara com a violência de Estado, fez da
recepção no Aeroporto de Ezeiza, em Buenos Aires, um confronto de sangue.
Avisado, Perón e comitiva tiveram de pousar num aeroporto militar. Cerca de 1
milhão de fiéis o esperavam em Ezeiza, enquanto as facções rivais se atacavam
com fuzis, punhais e socos-ingleses. Uma centena de combatentes morreu. 

Perón foi reeleito pela terceira vez, mas, fraco e doente, governou por meros nove
meses. Sem ele, a Argentina iria mergulhar em mais um ciclo de instabilidade e
ingovernabilidade. Assim como no Brasil, na Argentina a direita tem ódio do povo e
descompromisso com a democracia. Não se constrange em promover o caos, com
a eventual ajuda dos militares, do Judiciário e de núcleos religiosos. O contraponto
a isso são os líderes de verdade. A História é construída por eles. • 

ÍNDICE

 CRÉDITOS DA PÁGINA: FOLHAPRESS, AP, VICTOR ROJAS/AFP E ARCHIVO GENERAL DE LA NACIÓN


O vexame que faltava
O

retrato do futebol: jogadores empurram ambulância no Estádio


Nacional Mané Garrincha

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Dada a largada na Liga dos Campeões, em termos de futebol destes tempos “cessa
tudo...” – mesmo logo depois de mais uma Copa do Mundo. E olha que a Copa não
foi lá essas coisas, como um sinal dos tempos. Pelo menos talvez possamos falar
mais de outros esportes, o que sempre nos faz falta e aos leitores também, com
certeza. 

Pouco se tem a dizer agora sobre o futebol jogado por estes lados. Explica-se: tudo
depende sempre de quem dirige, da cabeça pedida dos dirigentes maiores do
nosso futebol. Assim não se pode ir muito longe. A saúde financeira dos clubes é a
única saída para melhorar o nosso futebol, alguns deles se equilibram, outros têm
se movimentado bem, além de iniciativas como o Profut, visando um alívio ao
governo. A maioria, no entanto, insiste na falsa malandragem de raspar os clubes e
deixar para depois, seguindo o exemplo da política pública. 

O Inter gaúcho parte para uma campanha de ampliação do seu quadro de sócios,
pensando em sair de 85 mil para 200 mil associados, caminho louvável do poderoso
Colorado. A mudança maior deve ser no regime político dos clubes, promovendo a
participação ativa dos sócios, sua democratização, fugindo à péssima tendência dos
times com donos espalhados por aí. 

Os dois clubes brasileiros que mais investem não possuem sequer um grande ídolo.
Todos sabem, seus dirigentes e, principalmente, a torcida, que, em qualquer
hipótese, são os ídolos que sustentam o clube, o qual vive de jogadores que
simbolizam a sua grandeza. Apesar de todas as contratações, o Palmeiras, por sua
vez, não tem um jogador extraclasse, e o último que cumpriu esse papel foi Gabriel
Jesus, mesmo sendo ainda muito jovem. 

A mesma coisa no Flamengo com o nosso Paquetá, que, ao que parece, tem os
dias contados no Rubro-Negro da Gávea. Convocado merecidamente, passou ao
patamar exigido pelos europeus para o nível maior de valorização. A situação é tão
absurda que já estão jogando em suas costas a “culpa” pelos tropeços do time.
Bem verdade que tem dado mostras de deslumbramento, compreensível em sua
juventude e difícil de conter num clube de massa. 

Vem à lembrança o sufoco encarado pelo extraordinário Rivelino, sobre cujos


ombros eram jogados os maus momentos do “Coringão”. Ou saía ou ia para o
hospício. O Flamengo faz corretamente o que fez o Santos com Neymar. Vale-se de
sua grande revelação que vai se valorizando cada vez mais, mas até quando? 

A última rodada do Brasileirão foi pródiga em zero a zero e queixas de torcedores


de que os atacantes não fazem gols, apesar de contratados depois de serem
artilheiros em seus times de origem. O Flamengo abriu mão de Everton, o qual,
mesmo sem ser ponta autêntico, fazia os gols que safavam o time, agora serve ao
São Paulo, que vai se segurando na liderança. 

O Brasil, terra de Garrincha, Julinho Botelho, Canhoteiro, Edu e Denílson, apenas


para citar alguns, fica assistindo pela tevê (estádios vazios) aos centroavantes
passarem horas batendo a cabeça no muro das defesas fechadas, com todo mundo
reclamando que ninguém faz gols. Fora isso, pouco resta para se falar do futebol
brasileiro neste momento, cujas cenas se passam, infelizmente, no “desgramado”
do Maracanã ou o vexame de ver os jogadores empurrando a ambulância no
clássico Vasco x Flamengo na “Arena” de Brasília. 

Temos observado por aqui o aumento da incidência de choques, principalmente


cabeça com cabeça, mas também corpo a corpo e lembramos do Sócrates, que era
da opinião de que a Fifa deveria diminuir de 11 para 10 o número de jogadores em
cada time, uma vez que a preparação física evoluiu muito, além dos materiais
esportivos. Ao contrário, a entidade padronizou os campos em suas medidas
menores e os gramados, na maioria das vezes, são molhados antes dos jogos, tudo
em nome de aumentar a velocidade das partidas cada vez mais mecanizadas,
concorrendo com os “games”. 
O que foi feito da Primeira Liga, sufocada pelo calendário do ano de Copa? O que
impede a criação de outras entidades (federações), como existem em outros
lugares e outros esportes, com novos modelos de funcionamento? Apenas mais
uma comprovação da escravização a que somos submetidos, a exemplo das
comunicações e tudo o mais. 

A declaração de voto de Felipe Melo, apesar de todas as reações que causou, foi
bastante esclarecedora do instante que vivemos com a proximidade das eleições,
um verdadeiro Fla-Flu, a polarização entre uma campanha movida a ódio e
incitação à violência, que a nada conduz, senão a multiplicar-se, e as propostas de
afirmação do Brasil como país autônomo, livre. Lula Livre! Haddad é Lula lá! • 

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 CRÉDITOS DA PÁGINA: Ilustração: Baptistão


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