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COMBATENDO O

RACISMO: Brasil, África do Sul


e Estados Unidos*

Antonio Sérgio Alfredo Guimarães

Como superar o racismo nas sociedades atu- político e científico. Situa-se, assim, naquele espa-
ais, quando já não se reconhece facilmente um ço intermediário onde as idéias ganham forma mas
racista? Como enfrentar hoje, pelo menos no Brasil ainda pedem por crítica para se cristalizar.
e nos Estados Unidos, um problema que é generi- O trabalho compõe-se de nove notas. A pri-
camente desqualificado como exagero ou manipu- meira nota demarca um terreno axiológico comum
lação política, e que muitas vezes aparece realmen- ao anti-racismo, independente da posição dos deba-
te assim envolto? Que pontos mínimos uma agenda tedores na dicotomia racialismo/não-racialismo.1 A
anti-racista deve contemplar hoje em dia? segunda esclarece o significado do termo racismo. A
No texto que segue, faço um esforço para terceira nota procura situar sociologicamente o ra-
identificar minimamente o que podemos chamar cismo nos três países tomados como referência,
hoje de racismo, tomando como referência empíri- fazendo um esforço para determinar a relação entre
ca o debate político e intelectual corrente na África a definição dos direitos da cidadania e a definição da
do Sul, no Brasil e nos Estados Unidos. Do ponto de nacionalidade. A quarta nota explora os tipos de
vista estritamente acadêmico, o texto tem ainda um mecanismos que produzem e reproduzem desigual-
caráter provisório, posto que, apesar de sugerir dades sociais relevantes na distribuição de recursos
novos caminhos teóricos, não aprofunda a discus- e honras sociais. A quinta define melhor a especifici-
são mais conceitual nem discute sistematicamente dade do racismo no Brasil e a sexta, a sétima e a
a literatura sociológica e antropológica sobre o oitava notas discutem o movimento anti-racista hoje
estudo comparado das relações raciais nestes paí- em dia no Brasil, Estados Unidos e África do Sul,
ses, ficando restrito à intersecção entre os embates respectivamente.

* Este texto, preparado para a Southern Education Foun-


1ª nota preliminar: sobre os valores
dation, projeto Comparative Human Relations Initiative,
Há uma visão de sociedade e um ideal de Esta-
coordenado por Lynn Huntley Walker, integrou a série
de seminários Superando o Racismo: África do Sul, do democráticos que parecem comuns a todos os in-
Brasil e Estados Unidos no Século XXI. divíduos e instituições que lutam contra o racismo. Tra-

RBCS Vol. 14 no 39 fevereiro/99


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ta-se da visão de um Estado baseado na igualdade dos gualdade, dando lugar à expressão de ethos sexuais
indivíduos perante a lei e na garantia das liberdades diferentes, na maior parte das vezes em relação
individuais e de uma sociedade que garanta a igualda- assimétrica de poder: o masculino e o feminino. A
de de oportunidades a todos os indivíduos. conquista gerou, por sua vez, a justificativa mais
Nas modernas democracias liberais, tal garan- generalizada da desigualdade entre os povos (o
tia é dada, em geral, independentemente de qual- poder faz o direito — Might is right), que funda-
quer característica coletiva, grupal ou atribuída, menta até hoje, ainda que parcialmente, os Estados
mas, em casos especiais, o Estado pode erigir e a sua soberania.
políticas corretivas para garantir oportunidades Foi a adoção de uma visão equivocada da
iguais aos indivíduos que apresentem certas caracte- biologia humana, expressa pelo conceito de “raça”,
rísticas grupais estigmatizadas. Segundo o credo da que estabeleceu uma justificativa para a subordina-
igualdade de oportunidades e universalidade dos ção permanente de outros indivíduos e povos,
direitos humanos, qualquer diferença entre os indi- temporariamente sujeitos pelas armas, pela con-
víduos só é legítima quando decorrente de caracte- quista, pela destituição material e cultural, ou seja,
rísticas individuais adquiridas. Além do mais, faz pela pobreza. A transformação da desigualdade
parte deste ideal democrático que, independente do temporária — cultural, social e política — numa
desempenho individual, todos os indivíduos sejam desigualdade permanente, biológica, é um produto
portadores de direitos inalienáveis à vida em socie- da ideologia cientificista do século XIX. No entanto,
dade, num certo patamar de dignidade. depois de a justificativa racial ter perdido legitimi-
Sem dúvida alguma, tais ideais são genéricos dade científica, a suposta inferioridade cultural —
o bastante para abrigar diversas correntes de pen- em termos materiais e espirituais — de grupos
samento político, tanto aquelas que enfatizam as humanos em situação de subordinação2 passou a
liberdades individuais, os direitos subjetivos e as ser a justificativa padrão do tratamento desigual.
políticas universalistas, quanto as que enfatizam as O racismo, portanto, origina-se da elaboração
igualdades, os direitos coletivos e as políticas raci- e da expansão de uma doutrina que justificava a
alizadas. desigualdade entre os seres humanos (seja em
Começar por lembrar tais ideais tem a vanta- situação de cativeiro ou de conquista) não pela força
gem de nos pôr, desde o início, sob um patamar ou pelo poder dos conquistadores (uma justificativa
comum de crenças e valores, a partir do qual política que acompanhara todas as conquistas ante-
podemos discutir e negociar nossos diferentes en- riores), mas pela desigualdade imanente entre as
tendimentos e propostas sobre uma questão cru- raças humanas (a inferioridade intelectual, moral,
cial: como combater o racismo ainda presente em cultural e psíquica dos conquistados ou escraviza-
nossas sociedades? dos).3 Esta doutrina justificava pelas diferenças
raciais a desigualdade de posição social e de trata-
mento, a separação espacial e a desigualdade de
2ª nota preliminar: definindo melhor
direitos entre colonizadores e colonizados, entre
o racismo
conquistadores e conquistados, entre senhores e
Na história do Ocidente, a desigualdade entre escravos e, mais tarde, entre os descendentes destes
os seres humanos tem-se originado de diferentes grupos incorporados num mesmo Estado nacional.
formas: pela diferença de sexo, pela conquista e Trata-se da doutrina racista que se expressou na
ocupação de terras estrangeiras, pela escravização biologia e no direito.
ou colonização de outros povos e, mais recente- Hoje, todavia, tanto no Brasil quanto na África
mente, pela migração de indivíduos de outras do Sul e nos Estados Unidos, esta doutrina já não
nacionalidades para Estados capitalistas mais ricos, tem legitimidade social ou vigência legal: a igualda-
na condição de trabalhadores. de de direitos entre todos os cidadãos, independen-
A diferença entre os sexos fundou talvez a te de cor e raça, é formalmente reconhecida e
primeira e a mais duradoura justificativa de desi- garantida nesses países, tanto constitucionalmente
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quanto por leis ordinárias. Chegamos a este pata- Em terceiro lugar, pode-se precisar melhor o
mar por caminhos diversos, mediante histórias e racismo, tal como se manifesta, por suas conseqüên-
lutas muito diferentes, que deixaram as suas marcas cias e dizer que a manutenção e reprodução de
e imprimiram um certo sentido particular ao que desigualdades sociais e econômicas, por meio dos
chamamos hoje de racismo. A ideologia racista já mais diferentes mecanismos, entre grupos de pesso-
não existe mais como justificativa legal e legítima. as identificadas como de diferentes raças, etnias ou
O que, então, significa hoje racismo em nossas cores constituem racismo desde que operem meca-
sociedades? nismos de discriminação que possam ser retraçados
Em primeiro lugar, qualquer explicação ou à idéia de raça. Tal refinamento torna-se necessário
justificativa para diferenças, preferências, privilégi- toda vez que as discriminações que atingem um
os e desigualdades entre seres humanos baseada na determinado grupo humano, seja ou não uma etnia,
idéia de raça pode, em princípio, ser considerada não são explicitamente racialistas (usam, por exem-
racista, posto que não há base científica que possa plo, a idéia de cor ou de cultura), mas motivadas ou
sustentar que o que chamamos de “raças” tenham justificadas por critérios a-históricos e a-sociais, tais
qualquer realidade metasocial ou física. Portanto, como a idéia de raça, de modo que possam ser ou
atribuir desigualdades sociais, culturais, psíquicas e retraçados ou reduzidos a esta idéia. Neste sentido,
políticas à “raça” significa legitimar diferenças soci- o racismo pode prescindir da noção de raça, trans-
ais a partir de diferenças biológicas. mudando-se perfeitamente para operar através de
Mas, em segundo lugar, a noção de superio- tropos desta noção. Neste caso, mesmo deixando de
ridade ou inferioridade cultural de povos, etnias ser uma doutrina, pode continuar informando atitu-
ou grupos, que substituiu a noção de raça nos des e preferências.5
discursos oficiosos, pode também justificar desi- Em quarto lugar, podemos ainda definir o
gualdades e diferenças que se engendram na de- racismo não com referência a atitudes, ações e
sigualdade de oportunidades e de tratamento, na preferências individuais, mas com relação a um
desigualdade política e na interiorização do senti- determinado sistema social (ver, por exemplo,
mento de inferioridade por estas populações. A Blauner, 1972). Isto é possível quando grupos
“cultura” pode tornar-se, assim, uma noção tão humanos considerados raças ou identificados por
fixa e metasocial quanto a “raça”. Trata-se, neste traços raciais ou racializados (como a cor, por
caso, da manipulação de um carisma racial sob a exemplo) são sistematicamente postos em situação
justificativa culturalista.4 desvantajosa do ponto de vista econômico, políti-
Racismo pode, ademais, referir-se não apenas co, social e cultural. Neste caso, as desigualdades
a doutrinas, mas a atitudes (tratar diferencialmente sociais são ditas raciais quando se encontrem e se
as pessoas de diferentes raças e culturas, ou seja, comprovem mecanismos causais operando ao ní-
discriminar) e a preferências (hierarquizar gostos e vel individual e social que possam ser retraçados
valores estéticos de acordo com a idéia de raça ou ou reduzidos à idéia de raça. Neste sentido, racismo
de cultura, de modo a inferiorizar sistematicamente não é mais uma ideologia que justifica desigualda-
características fenotípicas raciais ou características des, mas um sistema que reproduz tais desigualda-
culturais). Encarado como doutrina, atitude ou des. A justificativa, neste caso, pode ser cultural
preferência, o racismo pode ser combatido, dentro (inferioridade ou inadequação) ou de outro tipo. O
de certos limites, pelo desmascaramento e a desle- importante é que grupos que se definem e são
gitimação da idéia de raça. Neste sentido, o anti- definidos por meio de atributos raciais (como a cor)
racismo no Ocidente passou a fazer do anti-racialis- ocupam de modo permanente posições de poder e
mo a pedra de toque da agenda anti-racista. Este posições sociais assimétricas como resultado da
tipo de estratégia, entretanto, é pouco eficiente operação de mecanismos de discriminação. Para
para combater o racismo baseado na noção de que tal configuração seja correta é necessário,
hierarquia cultural e de cultura enquanto herança portanto, demonstrar que os indivíduos de raças ou
imutável, ou seja, o estigma racial ou cultural. cores diferentes não têm as mesmas oportunidades
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de vida e não competem em pé de igualdade pelos social da escravidão ou colonização, primeiro, e


recursos sociais, culturais e econômicos. depois do colonato, servidão ou parceria. Ou seja,
Que mecanismos são estes? Bom, em primei- a subordinação e a sujeição política e econômica
ro lugar, há os mecanismos que podemos chamar dos negros foram, primeiro, justificadas pela con-
de psicológicos ou individuais, que consistem na quista e pela força dos senhores, e apenas mais
criação e manutenção de um grande percentual de tarde pela inferioridade biológica e/ou cultural
pessoas com baixa auto-estima em grupos que dos sujeitados, antes de passarem a ser justifica-
apresentem algumas características somáticas ou das pela pobreza e pelas características indivi-
culturais. Tal fenômeno é possível pela sistemática duais e grupais dos sujeitados. Tem razão, neste
inferiorização destas características somáticas ou aspecto, Michel Foucault, mais que Louis Du-
culturais e pela socialização destes valores em mont, quando vê o racismo como uma variante
pessoas pertencentes a estes grupos. Isto ocorre da doutrina da guerra das raças, por sua vez
tanto através da escolarização formal, quanto atra- herdeira da doutrina do direito como força, e não
vés das redes informais de informação de vizinhan- como uma variante do individualismo igualitário
ças em pequenas comunidades.6 Em segundo lu- (Dumont, 1966).
gar, há os mecanismos que atuam na vida cotidiana Os Estados Unidos foram, entretanto, dentre
através da exclusão ou da discriminação direta (de os três, o primeiro país a constituir-se como um
indivíduos em relação a outros indivíduos), ainda Estado de direito e a justificar a desigualdade dos
que discreta, polida ou amável, das pessoas que indivíduos apenas a partir de suas características
apresentem tais características somáticas ou cultu- imanentes (força, ousadia, ambição, perseverança
rais. E, em terceiro lugar, temos, finalmente, meca- etc.), que emergem em situação de competição em
nismos de exclusão e discriminação de pessoas mercados livres. Tal fato, junto com a resistência da
com as características somáticas ou culturais dadas população branca em aceitar a completa igualdade
que atuam de modo quase que impessoal, median- de direitos dos ex-escravos, acabou por facilitar a
te atributos burocratizados pelos mercados, como aceitação de uma doutrina racista para justificar a
os preços das mercadorias e dos serviços, as quali- limitação dos direitos dos negros. Os Estados Uni-
ficações formais ou tácitas exigidas, as qualidades dos abrigaram pois, por um tempo, uma dualidade
pessoais, os diplomas, a aparência etc. de ordem jurídica num mesmo Estado de direito. O
Nas sociedades modernas atuais, o racismo, modo completo, ainda quando dual, como se
como sistema, manifesta-se e exterioriza-se apenas desenvolveu tal Estado de direito foi, talvez, o
por meio de duas situações: a pobreza e a não- responsável pelo fato de que nos Estados Unidos o
cidadania (neste último caso, entretanto, só se racismo, como sistema jurídico, pudesse ser facil-
enquadram hoje os imigrantes e seus descenden- mente desmantelado e revertido, no âmbito do
tes). Tais situações podem ser constituídas e geren- próprio sistema jurídico, sem necessidade de uma
ciadas por estas quatro formas gerais — os direitos, grande transformação do sistema político, ou uma
a auto-estima, a discriminação e os mecanismos reconstrução da nacionalidade. Quando a ideolo-
formais e burocráticos —, que são os meios pelos gia do racismo deixou de ser legítima, deixou
quais são geradas e se reproduzem a situação de também, em pouco tempo, de ser legal, e o racismo
não-cidadania, a posição social de inferioridade e a como sistema passou a ser atacado também por
situação econômica de subordinação. políticas públicas de correção.
Na África do Sul, os conquistadores e coloni-
zadores europeus acabaram por construir um Esta-
3ª nota: o sistema racista na África do
do plurinacional, isolando os povos nativos da
Sul, no Brasil e nos Estados Unidos7
nação sul-africana e não reconhecendo os seus
Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos e direitos à cidadania. Ao mesmo tempo, o Estado
na África do Sul, o racismo, como ideologia, foi nacional sul-africano instituiu subcidadanias para
uma forma transitória de justificativa da ordem incorporar de modo desigual as minorias étnicas
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(coloured e indians). O racismo foi, pois, erigido africanas, ditas publicamente como “incultas” e
em doutrina de Estado, regulando por completo a “incivilizadas”.
vida econômica e política e as relações sociais. A Segundo, a noção de cor substituiu oficial-
destruição do apartheid teve de significar, por isto mente as raças. Através do contínuo de cor, a maior
mesmo, um processo de reconstrução de um Esta- parte da população com alguma ascendência afri-
do propriamente nacional, onde o princípio não- cana continuou a não se classificar como negra (ou
racialista dos direitos humanos pudesse ser, pela preta), mas sim como branca ou mestiça, para o
primeira vez, instituído. que emprega uma grande série de denominações,
No Brasil, o racismo desenvolveu-se diferen- em que prevalece a cor “morena”, designação que
temente. Estará presente nas práticas sociais e nos se dava originalmente ao branco de cabelos escu-
discursos — um racismo de atitudes8 —, mas sem ros e tez mais escura.10 Esta forma de se classificar
ser reconhecido pelo sistema jurídico e sendo nega- racialmente mantém intacta a estereotipia negativa
do pelo discurso não-racialista da nacionalidade. O dos negros, mas elimina desta categoria a maior
Estado liberal de direito que se implanta em 1822, parte dos mestiços que, justamente por isso, conti-
com a Independência, garante, a um só tempo, as nuam a ter a auto-estima perseguida por estes
liberdades individuais dos senhores e das classes estereótipos. No mercado de trabalho, principal-
dominantes e a continuidade da escravidão. Depois mente, estes estereótipos raciais se misturam aos
da abolição, em 1888, tal dualidade de tratamento estereótipos de classe para gerar o mecanismo de
diante da lei estende-se ao sistema de clientelismo e seleção conhecido como “boa aparência” (ver Da-
ao colonato, que substituiu a escravidão. Ou seja, as masceno, 1998), responsável pela reprodução de
liberdades e os direitos individuais constitucional- boa parte das desigualdades raciais de ocupação e
mente outorgados não são garantidos na prática renda.
social; as práticas de discriminação e de desigualda- Terceiro, as relações raciais estão amparadas
de de tratamento continuam sendo a regra das num sistema mais amplo de hierarquização social e
relações sociais. Mas, por outro lado, as elites de desigualdade de tratamento perante a lei que
brasileiras tiveram problemas em aceitar integral- contamina todas as relações sociais. Se a segrega-
mente o racismo como doutrina e acabaram por ção informal dos negros foi a norma no Brasil até
rejeitá-lo por completo, transformando o não-racia- pouco tempo,11 pode-se dizer, sem risco de errar,
lismo e a miscigenação cultural e biológica em que o tratamento desigual dos indivíduos perante a
ideais nacionais, que procuram integrar todos os lei é ainda hoje prática corrente e também informal
indivíduos no Estado-nação.9 Em vista disso, os no Brasil. O mesmo fenômeno de estereotipia
brancos, no Brasil, foram definidos da maneira a negativa dos traços somáticos negros fundamenta o
mais inclusiva possível, de modo a abarcar todos os mecanismo de “suspeição policial” que torna os
mestiços mais próximos das características somáti- negros as vítimas preferenciais do arbítrio dos
cas européias, e mesmo, no extremo, a incluir todos policiais e dos guardas de segurança nas ruas, nos
que usufruem dos privilégios da cidadania. transportes coletivos, em lojas de departamento,
Quais os mecanismos e instituições sociais bancos e supermercados (Guimarães, 1998).
que permitem o funcionamento do racismo como Quarto, o não-racialismo, parte integrante da
sistema não reconhecido juridicamente e apenas construção da moderna nacionalidade brasileira, foi
apoiado no racismo de atitudes? engenhoso e equivocadamente equacionado ao
Primeiro, alterou-se a forma de legitimação anti-racismo. De modo que, no Brasil, negar a
social do discurso sobre as diferenças. As explica- existência das raças significa negar o racismo como
ções das desigualdades sociais pelas raças foram sistema. Ao contrário, reconhecer a idéia de raça e
substituídas por explicações que usavam o concei- promover qualquer ação anti-racista baseada nesta
to de cultura, persistindo, portanto, a noção da idéia, mesmo se o autor é negro, é interpretado
superioridade da cultura e da civilização brancas ou como racismo. Ao contrário, et pour cause, muitas
européias sobre a cultura e civilização negras ou manifestações de discriminação pela cor são pe-
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remptoriamente negadas como tendo qualquer mo- veia weberiana, propôs que o fenômeno racial
tivação racial, posto que as raças não existem, mas fosse estudado sobre a rubrica geral de “carisma
apenas as cores, tidas como características objetivas, grupal”. Seguindo estas sugestões, esboço abaixo
concretas, independentes da idéia de raça; tais os tipos de carismas mobilizáveis na África do Sul,
manifestações são mais prontamente reconhecidas no Brasil e nos Estados Unidos que podem nos
como tendo uma motivação de classe. Deste modo, ajudar a compreender a situação do racismo hoje
o caráter ilegítimo da segregação ou discriminação é em dia.13
retirado. As classes no Brasil, ao contrário dos Como tratei acima dos mecanismos de subor-
Estados Unidos, são consideradas bases legítimas dinação racial que operam ao nível individual,
para a desigualdade de tratamento e de oportunida- redefino agora os termos do ponto de vista do tipo
des entre as pessoas. de carisma ou estigma de grupo que afeta com
Quinto, a situação de pobreza e mesmo de maior força a população negra nos três países. A
indigência em que se encontra grande parte da este respeito, quatro tipos de carisma ou estigma
população brasileira constitui-se, em si mesma, podem ser diferenciados: raça, cor, etnia e classe.
num mecanismo de inferiorização individual e “Raça” é uma forma de carisma ou estigma
conduz a formas de dependência e subordinação grupal baseada na crença de uma herança genética
pessoal que, por si só, seriam suficientes para que define o valor moral, intelectual e psicológico
explicar certas condutas discriminatórias. Posto que de um indivíduo ou de um grupo. Tal tipo de
tais condutas podem ser observadas em relação a carisma parece dominante na situação social dos
não-negros, tal fato ajuda ainda mais a dissimular o negros americanos e sul-africanos ainda hoje em
racismo, do ponto de vista das ações individuais. O dia, sendo uma “categoria nativa” de uso amplo e
mesmo argumento pode também ser utilizado para generalizado. Na verdade, é lugar-comum que não
explicar o caráter de classe da inação dos governos se pode viver nos Estados Unidos sem pertencer a
e das instituições com respeito às desigualdades uma “raça”.
raciais (ver Hasenbalg, 1996; Heringer, 1996). “Cor” é um tipo de carisma baseado na
aparência física de um indivíduo, que mede geral-
mente a sua distância ou proximidade dos grupos
4ª nota: racismo como opressão
raciais. Não se trata, todavia, de apenas uma escala
social: os tipos de carisma e estigma
de valores estéticos; ela é também uma escala de
Robert Blauner (1972, p. 19) observou em valor intelectual e moral. Nos Estados Unidos e na
1972 que “a análise racial pelos cientistas sociais África do Sul opera mais ao nível individual que ao
tem sido moldada pelo pressuposto implícito de nível grupal, principalmente entre os negros ame-
que a preocupação com a cor nas sociedades ricanos. No Brasil, opera ao nível grupal (oficial-
humanas é, em última instância, irracional ou não mente, o censo brasileiro coleta a cor das pessoas
racional”. Tal pressuposto, continua Blauner, teria para formar “grupos de cor”) e é a forma de carisma
sido o responsável pelo subdesenvolvimento da e estigma dominante tanto para marcar as fronteiras
teoria racial, tal como ocorrera anteriormente com dos grupos, quanto no interior destes grupos. O
a teoria da religião. Blauner propõe ainda que a carisma da “raça” no Brasil raramente é evocado de
racionalidade das “raças” está dada pelo conceito modo direto pelos brancos, que preferem utilizar a
geral de “opressão social”,12 que subsume a racio- cor ou a etnia, sendo evocado apenas pelos negros.
nalidade das diversas formas — gênero, raça, cor, “Etnia” é um tipo de carisma ou estigma
etnia, classe, casta — pelas quais os grupos sociais baseado na identidade cultural, regional ou nacio-
são sistematicamente dominados, sujeitados, ex- nal de grupos. Parece predominante na África do
plorados, abusados ou desprezados. Sul, dada a herança do apartheid, que pretendeu
Nobert Elias (1998), alguns anos antes (1964), encobrir suas motivações raciais pelas subdivisões
quando estudava a comunidade inglesa de Wasta étnicas e nacionais dos negros. No Brasil, as etnias
Parva, fez as mesmas observações e, na mesma não são em geral importantes (no que se refere à
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situação dos negros) e aparecem de uma forma classe e de cor. Em geral, o racismo brasileiro,
modificada através de identidades regionais estig- quando publicamente expresso, o é por meio de
matizadas, tais como “baiano”, “paraíba” ou “nor- um discurso sobre a inferioridade cultural dos
destino”, e carismáticas como “sulista” ou “paulis- povos africanos e o baixo nível cultural das suas
ta”. Nos Estados Unidos, as etnias são importantes tradições e de seus descendentes. Grosso modo, tal
tanto no interior da população negra (os afro- racismo atravessou duas grandes fases: a da discri-
latinos, por exemplo) como entre os não-negros minação racial aberta, mas informal e secundada
(asiáticos e latinos). pela discriminação de classe e de sexo, que gerava
“Classe”, tal como a emprego aqui, não é um uma segregação de fato dos espaços públicos e
fenômeno de ordem econômica, tal como concei- privados (praças e ruas, clubes sociais, bares e
tuado por Weber, mas um carisma baseado na restaurantes etc.);14 e a fase atual, quando, com a
posse e no domínio de bens materiais e culturais. discriminação e a segregação raciais sob fogo,
Neste sentido, “classe” define uma qualidade moral apenas os mecanismos estritos de mercado (discri-
e intelectual dos indivíduos e grupos. Ständ talvez minação de indivíduos e não de grupos) ou psico-
fosse o conceito mais adequado para designar o lógicos de inferiorização de características indivi-
agrupamento formado por este carisma, mas en- duais (ou autodiscriminação) permitem a reprodu-
contra-se totalmente em desuso na prática social ção das desigualdades raciais.
cotidiana, substituído pelo termo “classe”, como Assim, o grande problema para o combate ao
nas locuções “uma pessoa de classe“ ou “um racismo no Brasil consiste na eminência de sua
produto de classe”. O carisma de classe no Brasil é invisibilidade, posto que é reiteradamente negado
predominante sobre todos os outros, posto que a e confundido com formas de discriminação de
eles estão associadas atitudes e condutas discrimi- classe. Como, então, o movimento negro tem sido
natórias amplamente aceitas e legitimadas social- capaz, historicamente, de tornar o racismo um
mente. Ademais, dadas as grandes desigualdades problema, ou seja, como o movimento negro tem
sociais entre brancos e não-brancos, é possível conseguido tornar visível o racismo no Brasil?
discriminar abertamente os negros, mulatos ou
nordestinos sem se recorrer explicitamente à evo-
6ª nota: o movimento social dos
cação dos estigmas de raça, cor ou etnia. Nos
negros no Brasil — o anti-racismo
Estados Unidos, onde as liberdades civis estão mais
fundamentadas nas práticas sociais, discriminações A mobilização coletiva dos negros brasileiros
de classe só podem operar por meio de mecanis- neste século começa com a Frente Negra15 dos
mos de mercado, como o preço. Mas este não é o anos 30, ativa primeiramente em São Paulo, que
caso do Brasil, onde existem certos privilégios de tem como alvo principal a luta contra a segregação
conduta e de sociabilidade associados à situação de espacial e social dos negros, que ocorre sistemati-
classe. Por isso, nos Estados Unidos, ao contrário camente através da discriminação racial informal e
do Brasil, é óbvio para alguém que foi discriminado ilegal, mas corriqueira.
socialmente relacionar a discriminação ao estigma A ideologia nacionalista de integração e assi-
da raça, da cor ou da etnia. milação que impregnava a Frente Negra deixou de
fora desta mobilização a defesa das formas culturais
africanas como o candomblé e a umbanda, vistas
5ª nota: o racismo brasileiro: sua
como resquícios primitivos, apesar de cultuadas
especificidade
pela elite intelectual brasileira branca, principal-
O racismo brasileiro operou quase sempre, mente romancistas e antropólogos.
depois da escravidão, mediante mecanismos de O Teatro Experimental do Negro, ativo prin-
empobrecimento, ou seja, de destituição cultural e cipalmente no Rio de Janeiro nos anos 50, ampliará
econômica dos negros, e mecanismos de abuso a agenda anti-racista no Brasil, incluindo, de forma
verbal, utilizando-se principalmente do carisma de incisiva, a luta contra a introjeção do racismo pela
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população negra, principalmente a introjeção do de valores culturais, da recuperação de seu papel


ideal de embranquecimento, dos valores estéticos na história nacional, do avivamento do orgulho
brancos e da detração da herança cultural africana. racial e cultural; (b) combate à discriminação racial
A ideologia predominante no movimento ainda através da universalização da garantia dos direitos
será, entretanto, nacionalista e integracionista. A e das liberdades individuais, incluindo os negros,
idéia de que somos uma só nação e um só povo é os mestiços e os pobres; (c) combate às desigualda-
casada com a negação das raças como realidade des raciais através de políticas públicas que estabe-
física e com a busca de uma redefinição do Brasil leçam, no curto e médio prazos, um maior equilí-
em termos negro-mestiços. Guerreiro Ramos (1957, brio de riqueza, de prestígio social e de poder entre
3a parte), principalmente, buscará negar a existên- brancos e negros.
cia de uma questão negra no Brasil, preferindo falar A segunda observação refere-se às enormes
de uma questão popular — o negro, no Brasil, é o dificuldades encontradas pelas instituições anti-ra-
povo brasileiro — e de uma patologia do branco cistas para a mobilização coletiva dos negros. Tais
brasileiro, que se acreditaria europeu e branco, dificuldades têm recebido dois tipos de diagnósti-
quando não seria nem uma coisa nem outra. cos: ou se trata o movimento negro como um
Apenas nos anos 80, depois do período dita- movimento de classe média, distante dos interesses
torial, quando a idéia integracionista de “democra- do povo (este mais interessado na sobrevivência
cia racial” se transforma numa ideologia oficial e as material),17 ou se trata o movimento negro como
instituições negras são banidas, o movimento negro presa de equívoco ideológico (ver Hanchard, 1994).
passa a assumir cada vez mais um discurso racialis- Não creio que nenhum destes diagnósticos seja
ta16 e multicultural. Os dois alvos anteriores — a correto per si, no sentido de explicar de modo
luta contra a segregação e a discriminação racial e exclusivo o relativo fracasso da mobilização negra.
a luta pela recuperação da auto-estima negra — são O que eu vejo como principal dificuldade para uma
agora reinterpretados pelo ideário multiculturalista, mobilização coletiva dos negros no Brasil? Deixem-
em que se revaloriza a herança africana, procuran- me explicar.
do desvencilhá-la das adaptações e dos sincretis- Dentre as formas de legitimação da subordi-
mos com a cultura nacional brasileira. Ademais, nação de um povo ou de uma etnia, ou raça ou
abre-se uma outra frente de luta, esta contra as classe social estão: (a) o poder militar demonstrado
desigualdades raciais. Ou seja, além das discrimina- pelos conquistadores; (b) o carisma racial, de cor
ções raciais cometidas individualmente, passa-se a ou étnico (justificativa biológica ou cultural); (c) o
combater também a estrutura injusta de distribuição desempenho socioeconômico e cultural dos indiví-
de riquezas, prestígio e poder entre brancos e duos (a pobreza e sujeição como “prova” de inferi-
negros. Esta frente, descolada agora de qualquer oridade). Pois bem, as formas de resistência à
ideário monocultural e universalista — como o subordinação que conhecemos envolve sempre:
socialismo —, irá desembocar, mais tarde, na rei- (a) solidariedade familiar; (b) solidariedade étnica;
vindicação de políticas corretivas, compensatórias (c) solidariedade racial; (d) solidariedade de classe.
ou afirmativas voltadas para a população negra. Todas elas sendo muito mais eficientes quando
Neste ponto, fazem-se necessárias duas ob- capazes de conformar um arco de alianças em
servações. Primeiro, apesar de ter ocorrido uma torno de alguma ou mais de uma destas formas de
mudança ideológica na mobilização dos negros, a solidariedade. Todas elas pressupondo algum tipo
agenda ou programa delineado nesta mobilização de mobilização carismática que conduza à criação
me parece ideologicamente neutro, ou seja, pode de identidades sociais.
conviver com as mais diferentes tendências ideoló- Ora, no Brasil, a mobilização de classe tem
gicas do movimento negro. Tal agenda pode ser sido a forma mais bem-sucedida de mobilização
resumida a um combate anti-racista em três frentes: popular justamente pelo fato de que certos privilé-
(a) recuperação da auto-estima negra através da gios de tratamento diante da lei e as desigualdades
modificação de valores estéticos, da reapropriação de oportunidade de vida estão mais visível e
COMBATENDO O RACISMO: BRASIL, ÁFRICA DO SUL E ESTADOS UNIDOS 111

verbalmente ligados às distinções de classe.18 Não impede que tais diferenças sejam nomeadas, mas
é de estranhar, portanto, que boa parte dos negros onde subsistem privilégios materiais e culturais
se sinta mais atraída por sindicatos e mesmo parti- associados à raça, à cor ou à classe, o primeiro
dos políticos de esquerda do que por instituições passo para uma democratização efetiva consiste
negras (Andrews, 1998). Ademais, o carisma da cor, justamente em nomear os fundamentos destes pri-
amplamente utilizado no Brasil para a monopoliza- vilégios: raça, cor, classe. Tal nomeação racialista
ção de oportunidades de vida, opera sobre uma transforma estigmas em carismas. Longe de ter um
base largamente individual, fazendo com que até o feito desagregador sobre a nacionalidade, como
desenvolvimento de solidariedades familiares se dê querem os que temem o racialismo, ou um efeito
no sentido de apoiar mais fortemente os membros político revolucionário, como querem os que te-
mais claros da família (tal como ocorre comumente mem o não-racialismo, a mobilização do carisma
com os de gênero masculino) do que o conjunto de de raça tem, no Brasil, um efeito muito mais
seus membros. Deste modo, a solidariedade racial circunscrito, apesar de fundamental: possibilitar,
é bem mais difícil de se mobilizar no Brasil do que contornando solidariedades familiares e comunitá-
na África do Sul ou nos Estados Unidos, posto que rias, a transformação de experiências individuais de
se sobrepõe à família de modo não cumulativo; do insubordinação em atos de resistência coletiva.
mesmo modo, a solidariedade étnica no Brasil, O fato, todavia, é que existem queixas gene-
além de restrita a certos espaços de imigração, não ralizadas, à esquerda e à direita, contra o isolamen-
está tão amplamente correlacionada a raça, como to político do movimento negro e contra sua restrita
na África do Sul. capacidade de mobilização das massas e de repre-
Vê-se, portanto, pelo que acabo de dizer, que sentação de seus interesses.
o carisma racial não pode ser utilizado pelo movi- Mas, o isolamento do movimento negro, quan-
mento negro brasileiro apenas para a mobilização do existe, tende a ser rompido, tanto para cima
coletiva, ou seja, que a construção da identidade como para baixo, ou seja, tanto em relação aos
negra não serve primordialmente para a mobiliza- negros bem-sucedidos de classe média alta quanto
ção política, tal como ocorre nos Estados Unidos. A em relação aos negros pobres, à medida que os seus
utilização do carisma racial no Brasil tem sido muito pontos programáticos comecem a fazer sentido para
mais eficaz para reforçar a auto-estima negra — ou estes públicos. Este fato, eu acho, não depende da
seja, no combate à introjeção de valores racistas — ideologia política específica do movimento.
do que no enfrentamento político do sistema de Têm razão aqueles que afirmam que o movi-
racismo. A identidade racial no Brasil tem-se forma- mento negro não arregimenta porque o seu discur-
do e continuará se formando contornando as soli- so, para o povo negro, se parece com os discursos
dariedades familiares ou comunitárias, não tendo, dos perdedores (Andrews, 1998; Twine, 1998; Bur-
portanto, o efeito cumulativo natural que apresenta dick, 1998) ou dos aproveitadores. Ou seja, segun-
nos Estados Unidos ou na África do Sul. Por isso, os do o pensamento popular, quando não se tem força
negros brasileiros encontram seus potenciais alia- para mudar uma situação, melhor ficar calado do
dos seja no campo das classes, seja no plano da luta que se expor à desmoralização através de queixas
mais básica pelo respeito aos direitos inalienáveis impotentes (Twine, 1998). Tal situação, entretanto,
dos seres humanos. está mudando nas duas pontas. Por um lado, o
A mobilização do carisma racial passa, por- movimento tem-se apropriado cada vez mais do
tanto, paradoxalmente, a ser peça fundamental do discurso liberal dos direitos universais, da igualda-
processo democrático brasileiro. E algo que só de de oportunidades e igualdade de tratamento,
pode ser feito pelo movimento negro. Se a demo- abrindo uma importante frente de luta no plano dos
cracia na Europa ou nos Estados Unidos se estabe- direitos e da implementação de uma ordem jurídica
leceu pela negação das diferenças raciais e étnicas igualitária. Este deslocamento discursivo tem pro-
não essenciais à cidadania, em países regidos por piciado a aproximação de setores negros de classe
esta ideologia democrática e universalista, que média mais conservadores, que identificavam o
112 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 39

movimento anterior com as ideários esquerdistas. com os mesmos argumentos brandidos no Brasil
Por outro lado, o movimento pelos direitos huma- pelos liberais, progressistas e nacionalistas, desde
nos, os serviços de SOS Racismo (Carneiro, 1998), sempre: (a) que o racismo pertence ao passado de
as comunidades carnavalescas que mobilizam o escravidão e segregação legal e que, portanto, não
carisma negro, e até mesmo o movimento pente- é algo importante no presente; (b) que a melhor
costalista, segundo John Burdick (no prelo), têm maneira de enfrentar o racismo sobrevivente é
ampliado a experiência popular com o tratamento ignorá-lo, posto que se trata apenas de resquício de
igualitário em espaços públicos e aumentado o um passado que será inelutavelmente superado
sentimento de auto-estima de seus respectivos pelo modo de vida moderno; (c) que a melhor
públicos, o que torna plausível as denúncias de tática para combater o racismo é apagar de nossas
discriminação e abuso racial para os ouvidos de mentes a noção de “raça”, proscrevendo-a; (d) que
brancos e negros igualmente. o melhor que um negro tem a fazer é agir como um
Parece-me ser em outra frente, na frente de indivíduo, desembaraçando-se dos familiares ou
luta contra as desigualdades raciais — e não na vizinhos que ficaram para trás; (e) que qualquer
mobilização do carisma racial para construção da política pública, para ser anti-racista, precisa ser
identidade negra — que o movimento anti-racista universalista e color-blind.
enfrenta as maiores dificuldades no Brasil. Isto por Tais argumentos ganham força crescente nos
dois motivos. Primeiro, porque a sociedade brasi- Estados Unidos à medida que os anos passam e que
leira não reconhece o racismo, seja de atitudes, seja as políticas de ação afirmativa, adotadas a partir dos
de sistema, como responsável pelas desigualdades anos 60, mostram-se impotentes para reverter a
raciais no país. Segundo, e como conseqüência, situação de desigualdade racial na educação, no
porque as próprias desigualdades raciais são vistas emprego, na renda, na saúde, na moradia etc. Por
como desigualdades sociais de classe, que afetam o um lado, tais políticas não-universalistas, quando
conjunto da sociedade brasileira e são provocadas atingem mais de uma geração, passam a conflitar
pelo imperialismo, o subdesenvolvimento econô- com os ideais liberais e democráticos de igualdade
mico, a pobreza etc. Assim, seja para fazer face à de tratamento e de oportunidades. Por outro lado,
discriminação e à estigmatização social, seja para o desempenho medíocre dos negros, em média,
tentar reverter as desigualdades raciais, o movi- em testes escolares e a situação de violência urbana
mento negro enfrenta um senso comum fortemente a que estão submetidos nos guetos e nas inner-
estabelecido. Um senso comum criado e reproduzi- cities atestam que a população negra americana
do por dois aspectos já apontados: o gradiente de está submetida a formas de racismo muito mais
cor, que transforma todos os brasileiros, mesmo os indiretas e próximas das que atingem o negro
de ascendência negra mais próxima, em partícipes brasileiro. Não apenas o racismo de atitudes, gostos
ativos do sistema de estigmatização dos mais escu- e preferências, que quebra a auto-estima da popu-
ros; e a prática generalizada da desigualdade de lação negra, mas o racismo sutil que se manifesta
tratamento ou, se preferirem, de personalização do em distinções e discriminações baseadas em status
tratamento. 19 social e em situações de classe.
Ao mesmo tempo, a preferência dada aos
negros mais claros e mais próximos fenotipica-
7ª nota: as dificuldades do anti-
mente ao ideal estético branco volta a se instalar
racismo nos Estados Unidos
mais abertamente e a ser também reincorporada
Que dificuldades enfrenta hoje o anti-racismo por parte crescente da população negra america-
nos Estados Unidos? Sem querer fazer glosa gratui- na, ameaçando reverter conquistas importantes do
ta, diria que a preocupação americana hoje é não movimento negro dos anos 50, 60 e 70.20 Tal
ser, no futuro, um outro Brasil, em termos raciais. situação é tão mais perigosa quanto maior é a
De fato, os ativistas anti-racistas nos Estados diversificação étnica da população negra america-
Unidos, desde os anos 70, passaram a se defrontar na, principalmente a diversidade étnica e racial da
COMBATENDO O RACISMO: BRASIL, ÁFRICA DO SUL E ESTADOS UNIDOS 113

população latina nos Estados Unidos e a popula- entretanto, perseguidas por ele; e nos Estados
ção crescentemente importante de mestiços assu- Unidos, lutaram pelos direitos à cidadania e os
midos. E isto não apenas porque estes migrantes obtiveram; quarto, viram a vitória dos direitos
trazem interiorizados escalas estéticas e axiomáti- civis esvair-se das mãos, posto que as desigualda-
cas diferentes das desenvolvidas nos anos 60, mas des raciais continuaram a aumentar.
porque têm, de fato, identidades raciais baseadas Do mesmo modo, o movimento social negro
em cor e não em raça. recente, nos dois países, seguiram, grosso modo,
Ou seja, é como se, à medida que os Estados uma mesma trilha: (a) mobilização do carisma
Unidos rotinizam as conquistas dos direitos civis racial para fazer face ao estigma racial e aos
das minorias, principalmente dos negros, ficassem mecanismos de introjeção do racismo; (b) luta
mais próximo do sistema racista brasileiro: igualda- contra a discriminação racial e contra as atitudes
des formais; mecanismos de discriminação racial racistas; (c) luta pela reversão das desigualdades
embutidos em escalas de preferência e de status raciais mediante políticas afirmativas.
amplamente aceitas; rituais sociais de negação do As duas últimas décadas de luta contra as
racismo e de esquecimento do passado; reprodu- desigualdades raciais nos Estados Unidos, por meio
ção da desigualdade racial mediante mecanismos de políticas de ações afirmativas, mostram, todavia,
de mercado e tratamento social baseado em status os limites desta agenda. Mostram, principalmente,
e prestígio. o entranhamento do racismo nas nossas socieda-
Ademais, assistimos hoje nos Estados Unidos des, tanto entre brancos quanto entre negros. Seria
à emergência de formas intelectualmente refinadas esta dificuldade devida ao fato de serem os negros
de justificativas do racismo, tais como o chamado minorias demográficas e políticas no Brasil e nos
“racismo racional” (De Souza, 1995), além da acei- Estados Unidos? A África do Sul parece, a este
tação e veiculação corrente pela mídia do velho respeito, um caso totalmente diverso.
argumento sobre a superioridade ou a inferioridade
da cultura de certos povos, etnias ou grupos.
8ª nota: o que a África do Sul pode
Assistimos também, nos Estados Unidos, à retoma-
ensinar
da crescente do conceito biológico de raça, não
apenas pelas ciências médicas e biológicas, mas A África do Sul enfrenta hoje o desafio de
também por psicólogos e jornalistas, que o utilizam reconstruir-se como nação e como Estado. Sendo
mesmo para explicar as desigualdades raciais, sen- um país africano, boa parte de seus habitantes teve
do tal emprego amplamente aceito socialmente.21 suas etnias fortemente consolidadas durante o apar-
Diante das convergências entre o racismo theid; ademais, uma parte considerável de sua
brasileiro e norte-americano, e diante da escalada população é de origem européia (afrikaner e ingle-
deste tipo de racismo que não se quer racista, que sa, principalmente) e asiática (indiana, principal-
agenda comum se pode traçar para o combate do mente). É, portanto, um país multirracial e multiétni-
racismo em nossas sociedades? co. Se o povo sul-africano escolheu construir um
As populações negras, no Brasil e nos Esta- Estado não-racialista, o que é coerente com o
dos Unidos, foram presas, no passado, a um universalismo que deve presidir a lógica das rela-
mapa que pode ser desenhado assim: primeiro, ções sociais e políticas numa democracia, resta-lhe,
apegaram-se ao movimento iluminista contempo- todavia, definir o que é uma nação africana moder-
râneo, que negou validade à noção biológica de na. A África do Sul não pode, por um lado, definir-se
raça; segundo, aceitaram, todavia, ainda que inte- como um prolongamento da Europa, como o Brasil
riormente, o estigma da inferioridade cultural de e Estados Unidos fizeram, sob pena de alienar a
suas origens e as renegaram; terceiro — e aqui há grande maioria de sua população africana; mas não
duas vias alternativas —, no Brasil, tiveram os poderá também definir-se segundo as tradições
direitos à cidadania aceitos e buscaram escapar, africanas mais provincianas, ignorando mais de três
através da noção de cor, ao estigma racial, sendo, séculos de contato e transformação cultural. O que é
114 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 39

uma moderna nação africana? Como abrigar nesta efetivas de construção de privilégios22 nas três
nação as diferentes etnias e diferentes tradições sociedades. Nos Estados Unidos, a mobilização do
culturais que compõem hoje a África do Sul? carisma racial é tão efetiva que faz com que os
Acredito que a África do Sul poderá nos brancos, independente de sua classe, se beneficiem
indicar um modelo de nação multicultural, multi- da opressão racial; no Brasil, o carisma da cor é
étnica e não-racialista de fundamental importân- mobilizado conjuntamente com a classe, fazendo
cia para a agenda anti-racista no Brasil e nos com que os brancos pobres estejam numa situação
Estados Unidos. De um lado, no plano do Estado mais próxima dos negros e mestiços que dos
e dos direitos, tem-se a tarefa gigantesca de rever- brancos de classe média; na África do Sul, o carisma
são das desigualdades raciais acumuladas histori- racial está associado também ao carisma étnico.
camente pelo colonialismo, pela escravidão, pela Estas diferentes constelações de opressão fazem
segregação e pelo racismo; de outro lado, no com que as políticas públicas corretivas ou de ação
plano da identidade social, tem-se a tarefa não afirmativa tenham de se diversificar: no Brasil, para
menos colossal de construir uma identidade naci- dar conta das populações pobres de diversas cores;
onal que não desmereça ou anule as identidades na África do Sul, para dar conta das etnias africanas.
étnicas e que não traga embutida em si o racismo Ademais, no Brasil e na África do Sul há uma
de atitudes e de preferências que está entranhado condição preliminar: garantir o respeito aos direitos
nas identidades nacionais européias e americanas, humanos de todos os cidadãos e o igual tratamento
do Norte e do Sul. Se conseguir isto, a África do de todos perante as leis.
Sul estará não apenas preservando a auto-estima, Ao nível da nação, parece-me que o grande
o potencial criativo e a competitividade de sua desafio do século XXI será a reconstrução das
população negra, mas também sinalizando o ca- nacionalidades em bases pluriculturais e pluriétni-
minho para as novas nacionalidades do século cas. Os ideais de assimilação e de integração do
XXI. Estado-nação terão de ser substituídos pela integra-
ção ao nível do Estado (dos direitos) e por uma
política de valorização das diversas etnias e heran-
Conclusão: para uma agenda
ças culturais dos grupos sociais que hoje compõem
integrada do anti-racismo
a população de qualquer país. Ao invés da equação
Para efeitos analíticos, pode-se pensar uma do século XIX (um Estado= uma nação= uma raça=
agenda anti-racista em três dimensões: o Estado, a uma cultura), teremos: um Estado= várias heranças
nação, os indivíduos. culturais= várias raças= várias etnias. Não que não se
No nível do Estado, a principal preocupação possa desenvolver uma cultura cívica particular,
deve ser a busca de garantias para as liberdades e mas tal cultura não pode significar a negação das
os direitos individuais, independente de qualquer diversas heranças e tradições culturais que formam
filiação identitária ou carismática — sexo, raça, uma nação (ver Appiah, 1998). Do mesmo modo, o
religião, etnia, cor, classe. A declaração deste prin- não-racialismo a este nível não faz sentido. Se existe
cípio, inclusive o não-racialismo, já consta nas discriminação e preconceito raciais, a melhor ma-
cartas constitucionais dos três países; trata-se, por- neira de combatê-los é dando oportunidade para
tanto, de obter garantias legais e práticas para o seu que estigmas se transformem em carismas. O com-
cumprimento, principalmente no Brasil e na África bate ao racismo pressupõe tanto a garantia das
do Sul. liberdades individuais e da igualdade de tratamento
O princípio do não-racialismo do Estado, (ao nível do Estado) quanto a garantia da positivida-
todavia, não significa que legislações especiais — de das identidades grupais (ao nível dos indiví-
com escopo temporal e alvos precisos — não duos), sendo neutro ao nível da nacionalidade.
possam ser desenhadas para atacar formas prevale- Ao nível dos indivíduos e de suas identidades
centes e duradouras de opressão social. Para isso é grupais, o anti-racismo deve visar aos estigmas
necessário que se leve em consideração as formas raciais (de cor, raça e classe, no Brasil; de raça e
COMBATENDO O RACISMO: BRASIL, ÁFRICA DO SUL E ESTADOS UNIDOS 115

cor, nos Estados Unidos; de raça e de etnia, na 8 Isso não significa que o racismo de atitudes não possa
África do Sul). Isto significa interferir nas políticas ser legitimado por leis, como o foi nos Estados Unidos
e África do Sul.
educacionais dos governos, mas também fortalecer
9 Este é um tema bem estudado no Brasil. Tal dificuldade
as instituições que possam, pelo combate à discri- das elites brasileiras foi atribuída à matriz cultural
minação racial e de cor e pela revalorização e portuguesa e católica, à grande miscigenação e conse-
reinterpretação das heranças culturais, sustentar a qüente incorporação de mulatos às elites, dada a escas-
sez demográfica, etc. Ver Freyre (1933) e Skidmore
auto-estima das populações negras. (1976), entre outros.
Todos sabem, entretanto, que esta agenda
10 Hoje em dia, apenas entre 5% (censo) a 10% (pesquisas
genérica ou qualquer outra, para ter alguma viabi- amostrais) da população brasileira se denomina negra
lidade, precisa ser acordada e negociada em cada ou preta. John Burdick (1998) chama corretamente a
Estado nacional, a partir de um amplo arco de atenção para o fato de que o percentual de negros que
se definem como tal no Brasil é grande, apesar do modo
aliança política. A força política do movimento como é reportado pelos sociólogos. No meu caso, o
negro em cada país é, pois, uma preliminar univer- “apenas” na frase acima significa tão-somente que um
sal (mas ultrapassa o objeto destas notas). grande número de pessoas que seriam classificadas por
outros, mais claros, como negros não se classificam
assim, mas como “pardos”.
11 France Winddance Twine (1998) detecta, através de
NOTAS entrevistas, que numa pequena cidade do interior do
Rio de Janeiro, a prática de segregação dos negros
durou até, praticamente, as discussões da Assembléia
Constituinte, em 1987, que criminalizou o racismo.
1 “Racialismo” é usado por mim com o sentido de “crença
na existência de raças humanas”, o que, em princípio, 12 “Opressão social é um processo dinâmico pelo qual um
não constitui racismo, ou seja, não significa acreditar na segmento da sociedade consegue poder e privilégio
inferioridade moral, intelectual ou cultural de alguma através do controle e exploração de outros grupos, que
raça. Os significados do termo “racismo” desenvolvo são literalmente oprimidos, ou seja, sobrecarregados e
mais adiante no texto. puxados para os níveis mais baixos da ordem social.”
(Blauner,1972, p. 22).
2 A situação de subordinação voluntária mais corrente
nos dias de hoje é aquela que se dá pela via da 13 As sugestões de Elias não se chocam com o modo como
imigração ilegal para países mais desenvolvidos, à Frederick Barth (1969) ou Thomas Eriksen (1993) trata-
margem dos direitos universais da cidadania. ram a etnicidade ou mesmo como Everret Hughes
(1994) a tratou em 1948. Entretanto, Elias apresenta a
3 Ver a este respeito Arendt (1951) e Foucault (1997).
vantagem de remeter a teorização de raças, etnias e
4 “Carisma”e “estigma” serão usados neste texto com o outras formas de criação de outsiders ao âmbito geral da
sentido sociológico que lhes foi emprestado por Max sociologia weberiana. Ver também os esforços de Ban-
Weber e definido posteriormente por Nobert Elias ton (1987) e, mais recentemente, de Peter Wade (1997).
(1988), como “um pleito bem-sucedido de um grupo a
14 Tal segregação está bem documentada pela literatura
graças e virtudes superiores, através de um dom eterno,
antropológica e sociológica, que, entretanto, em alguns
em comparação a outros grupos, condenando-os efeti-
casos, preferiu observar que alguns negros influentes
vamente a qualidades adscritas coletivamente como
furavam tal segregação. Ver, entre outros, Pierson
inferiores e como atributos eternos.”
(1942), Azevedo (1955) e, recentemente, Twine (1998).
5 É o que os europeus chamam de racismo sem raça. Ver,
15 Informações e interpretações sobre a Frente Negra
entre outros, Miles (1993) e Turguieff (1987).
Brasileira encontram-se principalmente em Bastide e
6 Diz Nobert Elias: “[…] uma das muitas armas pelas quais Fernandes (1955) e Leite (1992). Ver também Bacelar
o grupo superior defende suas reivindicações carismá- (1996).
ticas e mantém os estranhos e proscritos em seu lugar é
16 Racialista no sentido de evocar o carisma da raça negra
o mexerico [gossip]” (Elias, 1998, p. 107).
e de visar à formação de uma identidade racial negra.
7 Análises comparativas do sistema racial dos três países
17 Ver, nesta tradição, entre outros, Costa Pinto (1953) e
foram feitas recentemente por Anthony Marx (1998) e
Andrews (1998).
George Fredrickson (1998). Ver também Michael Ban-
ton (1967) e Pierre van der Berghe (1967). Análises 18 Os estudos sobre as mobilizações operárias no Brasil
comparativas entre a África do Sul e o Brasil foram feitas também mostram que valores morais, como a dignida-
por Fernando Rosa Ribeiro (1993). As comparações de, têm maior importância que interesses materiais para
entre Estados Unidos e África do Sul são mais numero- o sucesso das mobilizações. Ver, a este respeito, Abra-
sas, dentre as quais se sobressaem os estudos de George mo (1990).
Fredrikson (1981 e 1995).
116 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 39

19 “Personalização” é um termo que nos remete mais BURDICK, John. (1998), “The lost constituency of
prontamente aos aspectos mais sociólogicos, não ape- Brazil’s Black movements”. Latin American
nas jurídicos, da desigualdade de tratamento. Ver a Perspective, issue 98, 25.
respeito Da Matta (1990).
20 Ver, entre outros, Bell Hooks (1994).
__________. (no prelo), “Pentecostalism and Black
identity in Brazil: an impossible mix?”. Latin
21 O livro de Richard Herrnstein e Charles Murray, The Bell American Research.
curve, vendeu cerca de milhares de cópias e mereceu
mais de uma resenha elogiosa em jornais prestigiosos CARNEIRO, Sueli. (1998), Estratégias legais para pro-
nos Estados Unidos. mover a justiça social. Rio de Janeiro, The
22 “Defino privilégio em termos de uma vantagem injusta, Comparative Human Relations Iniciative.
uma situação preferencial, ou primazia sistemática na
busca de valores sociais (seja dinheiro, poder, posição, COSTA PINTO, Luis A. (1953), O negro no Rio de
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