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Metamorfoses Urbanas: Possibilidades para um Urbanismo social

Leandro Viana1
Faculdade de Economia da
Universidade de Coimbra
leandrovianaf@yahoo.com.br

O processo de urbanização das cidades brasileiras tem sido alvo de diferentes concepções e
abordagens teóricas, especialmente quando se trata das constantes metamorfoses ocorridas no
espaço urbano e nas diferentes relações sociais, culturais políticas e econômicas que ocupam
lugar neste espaço.
A análise por diferentes campos do conhecimento dentro e fora do universo acadêmico
ajudam a compreender como o desenho urbano e suas funções foram se remodelando
conforme a necessidade e interesses dos diferentes grupos e indivíduos. Este texto apresenta
uma proposta de compreender como tais perspectivas sofreram grandes mudanças de carácter
ideológico, explicitando o início das principais influências, até chegar em modelos mais
contemporâneos que buscam uma ferramenta participativa como mecanismo de alargamento
do acesso e da qualidade de vida entre os citadinos.
A cidade de Belo Horizonte, capital do Estado de Minas Gerais, será tomada como modelo de
análise das metamorfoses ideológicas e espaciais de pensar as diferentes faces do urbanismo
contemporâneo. A presença de alguns paradoxos, tanto pela tomada de modelos exemplares
de participação popular na esfera pública, como de traços teóricos de diferentes formas de
pensar o urbanismo, e sua relação com os territórios periféricos, compõem as diretrizes deste
ensaio.
Ao longo de várias décadas ocorreram diferentes mudanças, tanto políticas quanto de
perspectivas ideológicas na maneira de pensar e intervir no planejamento urbano e no desenho
das cidades. O surgimento de diferentes expressões, “cidades dormitório”, “periferias
residenciais”, banlieus, favelas, slums, etc (Fortuna, 2009) são consequências das
trasformações ocorridas nos espaços e por sua vez nas relações e representações que os
indivíduos possuem em relação ao espaço urbano.
A Sociologia Urbana, a Geografia, a Arquitetura e Urbanismo, dentre outras fontes teóricas e
práticas, são comummente utilizadas para o estudo e análise do fenômeno urbano. As
contribuições retiradas para tal análise, fazem o exercício de encontrar os (re) significados
produzidos na percepção histórica e especialmente contemporânea, acerca do
desenvolvimento urbano, hoje visivelmente excludente.
Os indicadores de paradoxos existentes na realidade do ambiente construído de algumas
cidades, conforme aponta Maricato (2001), apresenta um longo trajeto, com herança de
oligarquias políticas, e que segundo ela traz consigo características históricas de uma
sociedade de raizes coloniais, que nunca rompeu com a assimetria em relação a dominação
externa e que, internamente, nunca rompeu tampouco com a dominação fundada sobre o
patrimonialismo e o privilégio.

1
Mestrando em Cidades e Culturas Urbanas pela Faculdade de Econômia da Universidade de Coimbra. Bolsita
International Fellowships Program. Ford Fundation.
O clientelismo e as hierarquias nos espaços de decisão sobre o planejamento urbano
possivelmente sofreram tais influências. Afinal houveram sim, grandes avanços legislativos e
de muitas conquistas por parte dos movimentos organizados. O que ainda não é suficiente
para apagar a visível marca hegemônica do desenho das desigualdades sociais do território
brasileiro.
Diferentes análises apresentam outros fatores que influenciaram a transformação do espaço
urbano, como a globalização da economia (Ferreira, 2007) a reestruturação produtiva
internacional e o ajuste das políticas econômicas orientadas pelo “Consenso de Woshington”
que causaram grande impacto na realidade das cidades.
As análises tendem a engrossar o conflito com o advento da industrialização e o intenso
processo de urbanização decorrido no Brasil e nos demais países da América Latina,
especialmente na segunda metade do século XX.

A industrialização baseada em baixos salários determinou muito do ambiente a


ser construído. Ao lado do grande contigente de trabalhadores que permaneceu
na informalidade, os operários empregados do setor industrial não tiveram seus
salários regulados pelas necessidades de sua reprodução, com a inclusão dos
gastos com moradia, por exemplo. (Maricato,2001, p. 41)

Sem desconsiderar que tais abordagens são fragmentos teóricos de uma realidade muito ampla
e complexa, é possível identificar que as massas que vivem hoje nas cidades ditas “ilegais” ou
cidade “informal” apresentam-se como um subproduto de uma industrialização totalmente
descompromissada com a questão urbana, de um mercado de trabalho precário e somados a
um restrito mercado imobiliário privado que controla os investimentos públicos, e por sua vez
o processo de urbanização. Será que os movimentos sociais possuem conhecimento acerca
destas informações? Este assunto seria uma boa questão para aprofundar esta análise, mas
ficará para próxima oportunidade.
Nesta complexa lógica do tecido urbano, populações com baixas rendas vivem segregadas
tanto do direito, quanto do acesso aos bens e serviços de grande parte da estrutura urbana
existentes nas cidades.
A solução encontrada pela maioria da população excluída dos diversos benefícios de uma
urbanização ampliada, consiste de moradias construídas conforme todas as dificuldades que a
realidade marcada por expedientes de subsistência permitiu. Ou seja de diferentes tipos de
aglomerados com uma urbanização limitada, de barracos construídos em encontas de morros,
debaixo de viadutos, ao lado de córregos e frequentemente sujeitos ao desabamento.
O modelo de cidades que possui contradições tipicas de um capitalismo desorganizado, que
desvincula a produção da reprodução social, são na realidade manobras que levam as cidades
a conflitos de problemas habitacionais, de criação de guetos, de diminuição dos espaços
públicos e que colocam a exclusão social como um paradigma dominante desta realidade.
Sendo assim, vão surgindo os enclaves segmentados, ou seja, os enclaves habitacionais, os
enclaves comerciais, enclaves tecnológicos e administrativos. A cidade passa caracterizar-se
por um urbanismo segmentado ou especialmente fragmentado em pequenos territórios
permeados destes pedaços de urbanização.
Dito assim, a exclusão social pode ser entendida não somente pela falta do capital, mas sim a
possível perda dos vinculos relacionais ou interpessoais que fazem tornar ainda mais difíceis o
acesso à cidade.
A expansão espacial da pobreza cresce em grandes escalas, e simultanêamente cresce o
mercado imobiliário especulativo. Portanto, quais são as alternativas utilizadas pelo
movimentos sociais urbanos para impedir a perversa exclusão e a segregação territorial
presente na crise urbana? Que tipo de estratégias e saberes por parte destes movimentos
podem servir para diminuir o placar desigual contra os excluídos dos padrões mínimos de
uma qualidade de vida na cidade? As teorias sobre a questão urbana apontam para possíveis
linhas de solução deste problema? As perguntas ainda se fazem em maior quantidade que o
número de respostas, mas é importante ressaltar que para a compreensão acerca deste
fenômeno urbano, será necessária a união de diferentes saberes e perspectivas.

A transições de perspectivas sobre a construção do espaço urbano

Os estudos das diversas matrizes teóricas que orientam as diferentes formas de intervenção no
espaço urbano, necessita a compreensão da colocação de Souza (2006) em que não se deve
atribuir aos instrumentos e às tecnicas a responsabilidade de instaurar maior justiça social ou
criar condições para a melhor qualidade de vida, sem antes perceber os fins de tais técnicas e
a dinâmica presente no cotidiano da sociedade. Para tanto, buscaremos algumas reflexões já
existentes sobre o planejamento urbano buscando entender como estes instrumentos
interagem com os desafios de pensar e planejar as cidades.
A busca da clarividência e o questionamento dos diferentes modos de ocupação territórial
excludente, que hoje ocorrem em algumas regiões do mundo, quase todas justificadas no
discursso de desenvolvimento, instigam a comunidade de intelectuais no assunto, seja na área
dos estudos culturais, dos estudos migratórios ou das polítcas urbanas, a perceber as diferentes
formas de atuação no espaço urbano.
É possível encontrar perspectivas tanto pessimistas, quanto bastante otimistas nas correntes
que buscam novos olhares e sobretudo uma maneira de (re) significar as abordagens teóricas e
inclusive práticas. Muitos olhares, se direcionam para novas alternativas que visam se
aproximarem de uma melhor compreensão acerca da praxis urbana, e evitar a conhecida
repetição das “idéias fora do lugar” (Maricato, 2000) bastante presente no planejamento
urbano no Brasil e que acaba por influenciar na atuação dos profissionais que interferem no
espaço das cidades.
De acordo com Maricato (2000) trata-se de maneira resumida, de uma matriz postiça ou
copiada de um urbanismo moderno, possivelmente calcados da racionalidade burguesa (que
atendem os interesses de relações políticas arcaicas, e ao mercado imobiliário restrito e
especulativo) na qual o planejamento e regulação urbanística não tem comprometimento com
a realidade concreta, mas com uma ordem que diz respeito apenas a uma parte da cidade2.
Sendo assim, as idéias de um urbanismo moderno se aplicam a uma parcela da sociedade,
reafirmando e reproduzindo desigualdades e privilégios. Tal modelo, mimetizado de
ideologias e padrões de países “desenvolvidos” gerou nas cidades brasileiras a marca de uma
modernização incompleta e excludente.

2
Em sua contribuição para pensar o planejamento urbano no Brasil, a militante e pesquisadora Erminia Maricato
irá propor algumas alternativas para a crise urbana, discutindo a necessidade de desmontar algumas construções
ideológicas presentes na representação sobre as cidades brasileiras, bem como de alguns “planos mágicos” que
servem para a modernização de uns e a exclusão de vários outros.
Mas a compreênsão exige o retorno na própria construção história das práticas de
planejamento urbano. E de acordo com Abranches (2007) as primeiras reflexões possuem
origem relacionada à prática do urbanismo, entre os perídos de 1900 e 1910, na Europa e nos
Estados Unidos. Tal prática esteve dedicada com a idéia de projeto de reforma social, baseado
no desenvolvimento do pensamento racional-científico e moderno, e como um modelo de
gestão dos conflitos sociais.
Apesar de alguns estudos (Abranches, 2007) apontarem que o início das reflexões sobre a
cidade como forma mais específica de organização social datam do século XIX, seja na área
da historiografia ou seja no campo sociológico, não significa que nos tempos antigos, no
período medieval e no início da Idade Moderna os homens tenham deixado de pensar a cidade
e expressar os seus anseios e expectativas sobre ela. Entretanto, a autora relata que a grande
preocupação dos estudiosos oitocentistas do fenômeno urbano é relativa às suas bases
institucionais.

Dentre aqueles que refletiram sobre os aspectos institucionais da questão


urbana no século XIX, alguns autores mostram uma tendência a entender a
cidade não como um estado derivado da natureza, mas como parte da própria
natureza. Procuram entender a origem da cidade a partir da associação de
agregados e células sociais básicas, como família, ou outros agregados
elementares que dariam origem às formações mais complexas que
corresponderiam às “instituições”. Em perfeita conformidade com os interesses
dos grandes Estados que buscam legitimar neste período as suas instituições,
para estes autores pioneiros a cidade parece se constituir essencialmente, e por
vezes até exclusivamente, em torno de instituições sociais. (Barros apud
Abranches 2007. p.14)

Na sequência, com a emergência das sociedades industriais, a fragmentação dos territórios, os


fluxos migratórios, as revoluções tecnológicas, o acelerado processo de urbanização, etc,
serviram de alimento para as novas reflexões científicas que surgiram sobre o habitat das
cidades no século XX.
Uma multiplicidade de novos aspectos da vida urbana, tais como as preocupações com a
função econômica, como o modo de vida urbano, com a forma de organização social urbana,
com a representação e com o imaginário da cidade, iriam orientar as análises para além do
modelo político-institucional.
No caso do Brasil, diversos autores explicitam a dificuldade de recortar as diferentes teorias
que recaem sobre a cidade e o seu planejamento, entretanto, existem alguns pontos centrais
que podem ser considerados como “feridas” deste processo, e de acordo com Ermínia
Maricato, tal ferida encontra-se na base da “formação social brasileira”.

Trata-se de uma retórica que possui mais proximidade, (antigamente) com a


Europa e (hoje) com os Estados Unidos, do que com a realidade brasileira.
Assim o distanciamento existente entre o discurso e a prática, aliados a uma
inspiração de origem exógena, resultou em; cidadania restrita para uns e
privilégios para outros; uma confusão entre as esferas pública e privada em que
a relação de favor ocupa o lugar do direito; uma matriz de planejamento postiça
que transplantou padrões culturais; um distanciamento em relação a realidade
local (dado pelo olhar emprestado às universidades) e a produção intelectual
estrangeira. (Maricato, 2008,p.53;54)
Portanto a complexidade e as enormes ramificações presentes nas análises, torna necessário
uma avaliação que se propõe a utilizar dados que se aproximem da realidade das cidades,
sendo pertinente a aproximação de análises comprometidas com a realidade local e com o
compromisso ético na construção da representação das cidades.
Responsável por formular políticas e definir estratégias de mudanças sociais e ambientais, o
planejamento urbano carece da união de outros conhecimentos, bem como da atuação de
diferentes profissionais que vão para além da esfera do Estado. De acordo com Abranches:

A ação de planejar deve sempre contemplar, igualmente, a espacialidade e as


relações sociais nas cidades, considerando que estes são permeados por um
conjunto de relações em que a existência de conflitos de interesses e de
dominantes e dominados é uma fator sempre presente (...) deve, ainda,
considerar a participação de atores sociais que estão fora da instituição Estado
para que as decisões sobre o futuro das cidades possasm aproximar-se daquilo
que é idealizado pelos próprios beneficiários e interessados. (Abranches,
2007,p. 36)

Até a chegada dos modelos de planejamento urbano com traços mais participativos e
democráticos, existiram diferentes concepções sobre o mesmo.
Inicialmente os estudos de Souza (2003) e mais tarde Abranches (2007) apontam as principais
mudanças e características técnicas e históricas das diferentes modalidades de planejamento,
salientando critérios como a idéia força central, se referindo ao objeto essencial no
planejamento; a filiação estética quanto ao traçado urbano e o urbanismo; o escopo do
planejamento, ou seja, se este é somente físico-territorial ou social abrangente; grau de
interdisciplinariedade; grau de análise empírica da realidade; abertura para a participação
popular; atitude diante do mercado; referêncial político-filosófico.
Neste ensaio teórico sobre os fragmentos da urbanização das regiões periféricas da cidade de
Belo Horizonte, é importante salientar que o grau de interdisciplinariedade e a abertura para a
participação popular serão debatidos no final com maior atenção.
As influências de pensadores como Tony Garnier e Le Corbusier, tiveram grande aderência
pelos urbanistas entre as décadas de 40 e 70, conhecidos por blueprint planning. Este modelo
desprezava as tradições e particularidades culturais, históricas locais, regionais e nacionais.
Apesar do grande interesse com as questões sociais, como exemplo a produção de habitacão
social, segundo Abranches (2007) suas preocupações pautaram-se á partir dos marcos e
interesses do capital. Este modelo é criticado por reduzir o planejamento a uma organização
espacial.
Em seguida na década de 70, surgiu a emergência de um estilo de planejamento urbano
popular/progressista, que nasce das intensas críticas dos marxistas e precedidas pelos
humanistas JACOBS (1961) e GANGS (1965) citado por Abranches (2007). Ainda motivados
por idéias modernizantes, tal modelo de enfoque mais sistêmico, influenciado pela Teoria
Geral dos Sistemas é dotado de uma racionalidade instrumental e positivista. Nele a
necessidade do planejamento servia para entender como as cidades e regiões funcionavam,
para em seguida adequar os meios aos fins preestabelecidos.
Na linha histórica dos modelos e ideologias acerca do planejamento urbano, dá se o
surgimento de diversas outras linhas de produção nos finais da década de 70. Dentre eles o
chamado plano estratégico. Nota se aqui uma forte influência da atuação empresarial nas
representação das cidades. O enfoque empresarial buscava convencer que o investimento nos
interesses empresariais pode gerar crescimento econômico e consequentemente, melhorar a posição de
uma cidade na competição interurbana (...) assim, passa-se a investir em grandes projetos urbanísticos
de embelezamento e revitalização urbanos, muitas vezes convenientes para o capital imobiliário.
(Abranches, 2007, p.40). De modo geral, neste modelo a participação popular não obteve peso
algum na tomada de decisões sobre o tecido urbano e tão pouco no atendimento das demandas
coletivas. Apesar de possuir maior interdisciplinaridade, isso ocorreu entre os segmentos
dominantes e o setor imobiliário.
As propostas de planejamento norte americana no final da década de 80 como o New
Urbanism, surgem influênciadas por temáticas como o desenvolvimento sustentável, que no
seu enfoque procurou verificar alguns problemas ambientais presentes nas cidades como
exemplo poluição, lixo, cobertura vegetal, mananciais, etc. Apesar de não centralizar a
questão estética e de possuir certo grau de participação popular, a questão interdiciplinar é
amplamente valorizada e de acordo com Abranches (2007) sua idéia central é o esforço de
compatibilização do desenvolvimento urbano, em seu sentido capitalista, com certos valores
“comunitários”, sem deixar de ser conservador.
Aqui a questão ecológica ganha maior atenção, no entanto, tendo no crescimento econômico a
superação para tais problemas. Nota se também que neste período as práticas de
planejamentos mais participativas ganham maior expressividade, apesar de atenderem
diferentes interesses.
O planejamento colaborativo ou comunicative planning inspiradas no pensamento de
Habermas em torno da razão e do agir comunicativos, ou seja, dentro do contexto do agir
comunicativo, que propõe uma administração pública através da construção de canais de
diálogo e a superação de preconceitos entre diferentes grupos de interesses voltados para
maior justiça social. Apesar desta proposta apresentar grande interdiciplinaridade e
participação popular parece que este modelo tendeu-se ao estilo de governança que serviu aos
grupos dominantes daquele momento.
As contradições e avanços sobre a prática do planejamento urbano, desenvolvidos
especialmente para atingir objetivos do desenvolvimento econômico, podem ser facilmente
encontradas nas diferentes leituras que orientaram este trabalho. A base filosófica de
concepção de justiça de Jonh RAWLS (1972) aponta novas dimensões. Nesta perspectiva os
grupos sociais desprivilegiados, deveriam ser encarados como prioridade para os
planejadores, mesmo a participação popular não sendo garantida. Possivelmente a população
que vive abaixo das linhas de pobreza e em condições precárias seriam ouvidas com maior
atenção, mas segundo Souza (2006) ficariam pendentes alguns obstáculos estruturais que
impedem o alcance de maior autonomia individual neste modelo.
No Brasil, novas propostas de intervenções urbanas foram surgindo, especialmente na década
de 90. Certamente motivados pela Força do Movimento Nacional de Reforma Urbana3 -
MNRU que nos anos 80, contribuiram para grandes avanços nos diálogos sobre a reforma
urbana. Surgiram novos enfoques com concepções mais articuladas de políticas públicas e que
apontavam para caminhos mais comprometidos com a democratização do planejemento e da
gestão das cidades, e não somente com as questões estéticas e funcionais de outrora. A
participação popular no planejamento das cidades tornou-se prioridade para os movimentos
sociais urbanos.

3
O MNRU foi o resultado da união de diversas entidades, organizações de ativistas de bairro, associações de
moradores, acadêmicos, profissionais, movimentos populares que queriam aproveitar a oportunidade de
participar na construção de emendas populares a serem encaminhadas à Assembleia Constituinte, estas emendas
foram parcialmente aproveitadas na constituição de 1988, reduzidas aos artigos 182 e 183 que tratam dos planos
diretores municipais e da lei de usucapião. Ver mais em ABRANCHES, 2007:43
Certas potencialidades foram surgindo nas decisões e práticas de planejamento
com instrumentais mais participativos, fruto das conquistas de técnicos
politicamente compromissados com ideais sociais e de trabalhadores de
organizações não governamentais que lutavam pela democratização das
decisões urbanas. (Abranches, 2007:44)

Apesar da autora apontar o avanço destas práticas no planejamento urbano, especialmente do


caráter politizado desta proposta, afirma que o tema da participação popular ainda não
recebeu devida atenção. Isso afirma que ainda há muito o que ampliar nas discussões sobre o
planejamento democrático das cidades.
Uma idéia sobre o planejamento urbano mais crítico, destacado por Abranches (2007) em que
houve espaço de diálogo com os interesses coletivos, sem descaracterizar a autonomia
individual, aparecem com as idéias de CASTORIADIS (1986c). Nesta proposta o princípio
central para basear os processos e as mudanças sócio-espaciais é a idéia de autonomia
individual e coletiva, possivelmente influênciado pela ekklesía (corpo de cidadãos reunidos
em assembléia). Contudo nesta perspectiva de planejamento o Estado não atua sozinho, é
preciso que a participação popular se radicalize e a sociedade civil se qualifique para se
organizar e elaborar propostas e estratégias para intervir no espaço da cidade. Naturalmente é
preciso reconhecer os instrumentos criados e garantir sua eficácia. Neste tipo de planejamento
não deve haver uma instância de poder separada e acima dos cidadãos e os diagnósticos dos
“especialistas” envolvidos, mesmo contendo a dimensão (inter) subjetiva, necessitam ter a sua
implementação submetida ao parecer popular, na qual serão corrigidas e adequadas.
Certamente este horizonte de pensamento é o resultado de diferentes lutas da sociedade que
através de sua resistência às formas de opressão, buscaram sair da periferia dos diálogos sobre
o planejamento de suas cidades.
Os modelos de planejamento urbano com propostas mais inclusivas e participativas, que no
contexto brasileiro se amplia com a Constituição Federal de 1988, tem conseguido resultados
positivos no que se refere a participação popular na gestão das polítcas públicas,
especialmente porque ao mesmo tempo em que buscam incluir os anseios dos movimentos
sociais nas discussões, proporcionam a necessidade de uma tomada de consciência política
por parte dos agentes envolvidos no momento de interferir no espaço urbano.

Ampliar a dinâmica do planejamento urbano ou repensar as formas de inclusão?

Diferentes exemplos de avanços podem ser identificados nas políticas públicas no que se
refere ao exercício da participação na esfera política e na ampliação da democracia no
planejamento das cidades. Na realidade a reinvenção destes processos participativos, no
Brasil, possui na década de 80 o início de um conjunto de mudanças essenciais para inclusão
de novos temas levantados pela sociedade.
Este período confere grande importância para o cenário das políticas urbanas, com destaque
para as diversas lutas pela democratização das decisões políticas acerca da gestão urbana. Foi
dado como exemplo o Movimento Nacional pela Reforma Urbana e á partir dele alguns sinais
de descentralização do poder e intervenção do Estado começam a reluzir. De modo algum
essa foi a única característica que provocou a redução do papel do Estado neste período.
Os desdobramentos destas lutas ajudou a fortalecer a cidadania política de diferentes
movimentos sociais e permitiu o surgimento de propostas alternativas para os problemas
sociais em que o Estado, sozinho não era capaz de solucionar.
É necessário apontar que este trabalho pretende visibilizar as práticas participativas que estão
apoiando os municípios na construção de uma plataforma mais inclusiva para os indivíduos da
sociedade, no entanto, não possui no momento o objetivo de fazer uma análise profunda
acerca de cada uma delas.
Visto como um espaço político-administrativo que emerge representações de diferentes
interesses coletivos, os Conselhos Municipais constituem um componente importante no
processo de democratização da governança urbana. Estes recentes canais institucionais de
participação desempenham atualmente um papel fundamental sobre a elaboração, execução e
controle das políticas públicas.
Segundo Santos Junior (2004) os conselhos em geral possuem composição paritária, e são
compostos por representantes tanto da sociedade organizada quanto do governo. Suas
atribuições não se restringem à formulação de sugestões, ou encaminhamento de demandas,
podem abranger a deliberação sobre as diretrizes das políticas temáticas no ambito federal
como saúde, educação, assistência social, de proteção a criança e adolescente. Contudo,
existem também os conselhos regulamentados no ambito estadual em que temos exemplos a
política urbana, meio ambiente, transporte, etc.
Em pesquisa4 realizada sobre o “perfil dos conselhos municipais” nota-se um significativo
aumento destes instrumentos que possuem na dinâmica da participação um elo de
aproximação entre o poder público e a sociedade organizada.
Outro instrumento utilizado para uma dinâmica participativa da sociedade na esfera política,
conhece-se como Orçamento Participativo e tem sido alvo de diferentes análises. Em sua
maioria, otimistas enquanto um projeto de ampliação da cidadania. Este instrumento é
entendido como o resultado de diferentes esforços, institucionais e extra-institucionais, além
de ser uma das heranças da Constituição de 1988 (Avritzer:2003) na qual foi reconhecida a
importância da participação das associações civis no processo de planejamento urbano.
O Orçamento Participativo surge na cidade de Porto Alegre como tentativa das Associações
de moradores em participar na aplicação do orçamento da cidade. E atualmente é utilizado
por diferentes municípios brasileiros, com formatações distintas, como no caso de Belo
Horizonte que elaborou o OPH - orçamento participativo da habitação. O OPH aproxima à
população do direito de decidir sobre ações, obras, serviços, orçamentos e programas em
torno da questão da moradia. Apesar de co-existirem com diferentes críticas, ambos
instrumentos facilitam a ampliação da participação coletiva na construção do ambiente, bem
como ajudam a (re) significá-lo. Isso é um grande avanço para as novas intervenções que
terão espaço de agora em diante.
O orçamento participativo destaca-se como importante alternativa de organização social
dentre os modelos de instâncias decisórias, mas vale lembrar que existem algumas arestas
neste modelo (Avritzer, 2002) (Allegretti, 2006) e que hoje estão sendo bastante analisadas,
tanto pelos movimentos sociais como no universo acadêmico.
Assim como foi dito no início do texto, os diferentes profissionais e coletivos que atuam no
tecido urbano, engenheiros, arquitetos-urbanistas, sociólogos, psicólogos, movimentos
sociais, técnicos-gestores, e inclusive os cidadãos, devem estar atentos a clarividência
sugerida por Milton Santos, em que se tenta visualizar no presente o que se projeta no futuro.
4
“O Perfil dos Conselhos Municipais da RMBH” pesquisa realizada pelo Observatório de Políticas Urbanas da
Região Metropolitana de Belo Horizonte da PUC Minas em 2000/2001.
Abandonando de vez a busca por uma solução única para os conflitos urbanos. Claro que as
respostas precisam ser ponderadas e analisadas em cima da realidade em que vivemos hoje,
mas em qual realidade vivemos hoje?
Certamente que existem outras experiências e lutas por formas democráticas de intervenção
no planejamento urbano nas diferentes espacialidades do território brasileiro, como é o caso
do Estatuto da Cidade em 2000, a criação do ministério das cidades em 2003, as conferências
Nacionais das cidades, etc.
Acredito que todos apontam para a tarefa de construir um urbanismo social que congregue os
anseios e direitos de todos os seres que habitam no contexto urbano. Trazem também a
emergência de um olhar reflexivo, de diálogos entre as diferentes instâncias, de abertura para
novas formas de intervenção e atuação profissional, da quebra com os modelos de “planejar”
mimetizados e importatos de outras cidades, originando as “idéias fora do lugar” (Maricato,
2007) que hoje, ou talvez nunca, tiveram ligação com a realidade das cidades brasileiras.
Mas é preciso ter muito claro que apenas a participação não é suficiente, ou seja, precisa ser
incorporada nas novas congruências que a sociedade produz, enquanto metamorfose. Não
existe uma solução única para os problemas urbanos e é preciso ampliar a agenda para não
estancar na questão da participação enquanto único meio de diálogo para construir cidades
mais inclusivas.
O século XXI, coloca cada vez mais em evidência a necessidade de pensar novas posturas e
práticas para o uso do solo urbano. Todas elas comprometidas em fazer da inclusão o novo
paradigma.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÀFICAS

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