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MOTIVAÇÃO

E PERSONALIDADE
(Extrato do capítulo 7 do livro NAMING THE MIND, DE Kurt Danziger)

Nada atesta melhor a enorme ambição da Psicologia norte americana do entre-guerras do que
a invenção de dois campos novos de investigação - motivação e personalidade. Mais do que
quaisquer outras, essas duas categorias estimularam a reivindicação da Psicologia como uma
disciplina especial e privilegiada de conhecimento sobre toda a gama de assuntos humanos.
Um dos primeiros textos sistemáticos nessa área começa como se segue:

Todo comportamento é motivado. Levantar da cama quando o alarme toca, escovar os dentes, fazer a
barba, selecionar a gravata do dia, pedir pão e café ou presunto e ovos no menu, pegar o jornal para ler
as notícias - essas atividades diárias são todas causalmente determinadas. Você as toma como usuais,
geralmente permanecendo inconsciente quanto à quaisquer motivos que determinem o que está sendo
feito. Entretanto uma motivação deEinida está invariavelmente presente (YOUNG, 1936, p.1).

A psicologia cientíNica prometia desvelar os segredos dessa rede invisível mas onipresente de
determinação causal. Nenhuma ação humana, não importa o quão trivial, poderia escapar de
sua alçada. E o que não era coberto pelas leis gerais da motivação, especiNicamente as
diferenças entre indivíduos ao realizar essas ações, poderia ser compensado pelo novo campo
de pesquisa cientíNica da personalidade. Sem interrupção, a psicologia vai dar conta, não
apenas do ‘como’, mas também do ‘porque' de toda atividade humana.

Em sua fase anterior, a psicologia experimental tinha ambições bem mais modestas. Não teria
ocorrido a Wundt ou a Titchener que seu campo tivesse que fornecer explicações da conduta
cotidiana. Os problemas especiais decorrentes da estrutura ou Nluxo da consciência humana,
que eles investigavam, poderiam inNluenciar a atividade humana ordinária ocasionalmente,
mas não havia a pretensão de que os estudos de laboratório pudessem produzir um
conhecimento que, em princípio, poderia explicar porque alguém fez alguma coisa.
Consequentemente, em sua modesta psicologia faltavam as categorias que pudessem oferecer
um quadro adequado para acomodar essas reivindicações. Eles não conheciam ‘motivação'
nem ‘personalidade’. O dicionário abrangente de Baldwin (1901) da virada do século não tinha
qualquer entrada para ‘motivação’. Havia uma entrada para ‘pessoa’, cujo conteúdo é
inteiramente NilosóNico, e uma outra entrada para ‘personalidade’, cujo conteúdo é
inteiramente médico, mas não há psicologia da personalidade. Tanto a psicologia da
motivação quanto a psicologia da personalidade foram construção do período entre-guerras,
os anos 20 e 30 do século XX. Vamos traçar cada uma dessas construções, primeiro
'motivação' e depois 'personalidade'.

O interesse pela motivação

Em 1928 o psicólogo de Harvard, L. T. Troland, publicou o primeiro texto geral com a palavra
‘motivação' no título principal (TROLAND, 1928). Com o surgimento deste texto, os editores de
Psychological Abstracts aparentemente sentiram que era hora de dar a ‘motivação' sua própria
entrada em seu indexador. No ano anterior, outro texto usou ‘motivação' em seu subtítulo
(THOMSON, 1927) e, a partir de então, os textos introdutórios começaram a adicionar um
capítulo sobre esse tema em seus levantamentos sobre a disciplina (por exemplo, DASHIELL,
1928; HOLLINGWORTH, 1928; PERRIN, 1932). Em 1936, o autor de um novo respeitado
manual sobre a motivação foi capaz de mencionar o seu uso como texto em um curso
universitário dedicado a este tópico (YOUNG, 1936). Esses cursos gradualmente se tornaram
comuns. Dois anos depois, ou seja, dez anos depois de seu primeiro reconhecimento como
categoria, Psychological Abstracts trazia 26 entradas sob este título.
O que estava por trás desse crescimento? Uma primeira pista é fornecida pela referência
anterior de Troland à discrepância entre a fonte do interesse dos alunos pela psicologia e o
conteúdo atual da disciplina. Se dizia que os leigos costumavam ser atraídos para a psicologia
em função de seu interesse pelos motivos humanos, mas os manuais mais antigos que
abrangiam o campo não ofereciam nada para satisfazer esse interesse (TROLAND, 1928, p. 1).
Certamente, a orientação de marketing dos professores das faculdades americanas, a pressão
para manter interessados em suas mercadorias os consumidores leigos, era um fator a não ser
ignorado neste contexto. Mas é necessário ir um pouco mais fundo. É preciso perguntar por
que os leigos vieram à psicologia com essa orientação particular na década de 1920, quando
não há indícios de tais expectativas durante o século anterior. Sem dúvida a popularização
massiva da psicanálise no período pós-guerra desempenhou um papel signiNicativo no
estabelecimento de um vínculo entre o tema da psicologia e a exploração de motivos
individuais. Na literatura acadêmica subseqüente sobre o tema da motivação, Freud é sempre
mencionado como um teórico motivacional, mesmo se fosse apenas para que se repudiasse
suas teorias como não cientíNicas. Entre outras coisas, a construção do novo campo de
motivação permitiu que a psicologia acadêmica ampliasse seu domínio aos temas que a
psicanálise havia colocado na agenda e ameaçava monopolizar. A nova ciência da motivação
começou a atuar como um tribunal superior que poderia julgar as reivindicações de verdade
de outras psicologias.

Mas a psicanálise estava longe de ser a única fonte de interesse contemporâneo na motivação
humana. A enorme expansão e racionalização do sistema educacional criou situações
problemáticas que não poderiam ser totalmente dominadas pelo recurso à doutrina da
habilidade diferencial ou "inteligência". Que as crianças muitas vezes não tinham interesse em
seus trabalhos escolares não era novidade. O que era novo era a convicção de que essa
condição era tratável por meio da aplicação do conhecimento cientíNico sobre "fadiga" e tudo
aquilo que atuava contra ela: a vontade, os motivos e os interesses, conforme o caso.
Educadores reformistas começaram a apresentar essas idéias no início do século XX. O
primeiro livro a ter "motivação" em seu título não era o de Troland (como ele aNirmou), mas a
'Motivação do Trabalho Escolar’ (1916) de Wilsons. Uma vez que os educadores passaram a
conceituar alguns de seus problemas nos termos da categoria "motivação em sala de aula",
passou a haver um mercado potencial para princípios e técnicas psicológicas rotulados como
pertencentes a esta categoria (KNIGHT and REMMERS, 1923).
Os psicólogos estavam cada vez mais envolvidos nesses mercados, já que vários campos da
chamada "psicologia aplicada"1 estavam se abrindo. Um desses campos era a orientação
vocacional, no qual psicólogos tinham que enfrentar a inNluência de humanistas e moralistas.
O primeiro volume do Journal of Applied Psychology continha um artigo que apontou que se os
psicólogos queriam ter sucesso nesse empreendimento, eles teriam que conNiar menos
exclusivamente em "testes intelectuais" e prestar mais atenção à "psicologia dos interesses,
motivos e caráter "(Folsom, 1917). Nos anos que se seguiram, certamente o Nizeram.

Outra área proeminente da recente 'psicologia aplicada' era a pesquisa publicitária, um ramo
do campo mais amplo da "psicologia do marketing". Aqui, os psicólogos se envolveram com
uma indústria que estava passando de uma preocupação inicial com efeitos perceptivos para
as questões mais fundamentais de indução de novas necessidades e desejos entre potenciais
consumidores. Ao adotar a linguagem da indústria, os psicólogos realizaram investigações que
mostravam que o tipo de publicidade mais eNicaz visava a criação de novos ‘desejos' (STRONG,
1925, STRONG e LOVELESS, 1926). Como em outros campos, o envolvimento crescente dos
psicólogos com problemas práticos contribuiu para a maior relevância das categorias de
discurso psicológico que possuíam conteúdo não cognitivo e não intelectual.
Na indústria, havia várias áreas problemáticas para as quais a questão das recompensas e
incentivos estava começando a parecer particularmente relevante. Mais do que a questão da
produtividade, tradicionalmente tratada de forma bastante mecânica, a crescente
preocupação com as taxas extraordinariamente elevadas de demissão provocou a demanda
por intervenções psicológicas em questões como a 'falta de vontade para trabalhar’ e
'satisfação no trabalho' (FROST, 1920). A centralização constante das decisões de contratação
e demissão em grandes empresas e o aumento da fé na sabedoria de especialistas cientíNicos
também tornaram a aplicação do conhecimento psicológico relevante mais factível. Antes da
Primeira Guerra Mundial, o conhecimento psicológico relativo a recompensas e incentivos
pouco existia; na década de 1920, no entanto, a pesquisa nessa área Nloresceu. Em 1927, a
apresentação do compêndio da subdisciplina de psicologia aplicada incluía capítulos sobre 'a
medição do caráter e do interesse', a 'satisfação como produto do trabalho', assim como seções
dedicadas a temas como a 'força relativa dos desejos', 'preferências dos consumidores' e
'conNlito de motivos’ (POFFENBERGER, 1927). Além disso, há uma discussão de estudos
experimentais sobre punição no contexto do tratamento de delinquentes criminais.
A literatura mais popular de ‘eNiciência pessoal', dirigida a aspirantes e ambiciosos gerentes e
vendedores utilizava a semântica da motivação e personalidade já há algum tempo. Em 1917,
cerca de metade de um livro intitulado O Executivo e seu Controle dos Homens (GOWIN, 1917)
se dedicava à chamada "motivação do grupo". Isso incluía capítulos sobre "recompensas" e
"personalidade". A literatura pós-guerra sobre "inNluenciar as pessoas" popularizou a noção

1 As aspas em torno de "psicologia aplicada" destinam-se a indicar que o termo foi enganador. Naquela época,

havia pouca psicologia "pura" para aplicar a qualquer coisa e, na sua maior parte, os psicólogos aplicados faziam
sua psicologia ao lidar com problemas especíNicos. Muitas vezes, suas inovações levariam a novas questões e
procedimentos na psicologia "básica". Esta cauda era capaz de abalar o cachorro.
de que os indivíduos poderiam ser facilmente manipulados ao se manejar suas necessidades,
interesses e motivos (OVERSTREET, 1925).

Comparando a literatura psicológica e quase psicológica da segunda e terceira décadas do


século XX com seu uso anterior, a mudança na semântica do termo "motivo" é bastante
marcante. Tradicionalmente, um "motivo" era um substantivo que se referia a um aspecto ou
entidade especíNica ligada a alguma ação humana. A forma verbal, "motivar" e a forma
abstrata, "motivação", eram bastante raras e não foram documentadas como tendo ocorrido
antes do Ninal do século XIX (OXFORD ENGLISH DICTIONARY, 1989). Mesmo assim, não temos
mais do que uma referência à motivação dos acontecimentos em um romance ou um princípio
de ética (TUFTS, 1904). No século XX, entretanto, ocorre uma verdadeira explosão no uso de
derivados verbais e abstratos do termo "motivo". Se as entradas do dicionário são um guia,
uma grande parte desse desenvolvimento está diretamente associada à literatura de
Psicologia e seus derivados.
O que, antes de tudo, testemunhamos no início do século XX é a nova popularidade e
proeminência da forma verbal "motivar". Esta forma ocorre como parte de um discurso de
"controle social" que estava em rápida expansão. A referência especíNica a este termo era
naquela época direcionada à crescente literatura sobre otimização da publicidade e vendas,
eNiciência industrial, prática docente e desenvolvimento pessoal. Reconheceu-se que essas
otimizações não poderiam ser alcançadas simplesmente pela força ou pela manipulação do
ambiente. Era necessário intervir sobre o que os indivíduos queriam, sobre seus interesses,
sobre o que eles privadamente desejavam. Termos comuns como desejo, vontade, interesse e
também razões (motives), foram usados para representar aquilo sobre o que era necessário
produzir inNluência. Mas nas ciências sociais americanas o "controle social” também adquiriu
um signiNicado mais geral, como um processo que fornecia a base para qualquer tipo de
colaboração ou conformidade social, em uma sociedade imaginada como sendo um agregado
de indivíduos autônomos. Este discurso generalizado de controle social exigia um termo geral
referido à toda gama de aspectos da direção pessoal como um objeto potencial de inNluência
externa. Com o tempo, a "motivação" veio a desempenhar esse papel.
A situação era bastante clara para aqueles que começaram a defender uma psicologia da
motivação na década de 1920. Uma contribuição inicial para esta defesa, publicada na
Psychological Review, começa da seguinte forma:

Uma demanda bastante insistente por uma adequada psicologia da motivação sempre foi feita por
aqueles que estão interessados no controle da natureza humana. Essa demanda veio de economistas,
sociólogos, educadores, anunciantes, mestres escoteiros e investigadores; mais recentemente, foi
expressada por certos psicólogos, particularmente aqueles interessados em personalidade e caráter,
assim como nas várias fases aplicadas da ciência. (PERRIN, 1923)

Os primeiros livros didáticos de motivação continuaram a mostrar consciência dessas raízes


ao introduzir seu tópico. Troland (1928, p. 1) começa seu tratado pioneiro endereçando-o ao
empresário que "deseja saber como jogar com os motivos de outros homens para que eles
possam comprar seus bens e serviços". Young (1936, p. 2) diz ‘candidamente’: 'todos nós
desejamos inNluenciar e controlar o comportamento humano - o nosso e o dos outros' , e na
sequência apresenta uma anedota sobre um aluno que aplicou 'princípios motivacionais
cientíNicos’ a seu trabalho como vendedor 'e antes do Ninal do semestre já havia ganho um
prêmio nacional em vendas'. (Certamente, o autor deste texto sobre motivação também
merecia tal prêmio.)

A forma como o novo conceito de motivação é contextualizado por seus defensores na


psicologia sinaliza uma profunda mudança na compreensão da subjetividade humana. Sempre
houve palavras referentes a diferentes facetas da intencionalidade humana, querer, desejo,
necessidade, vontade, motivo, etc. Estes eram geralmente invocados quando se fazia
necessário explicar ações (próprias ou de outros) que representavam desvios quanto aos
padrões de ação habituais e automáticos que caracterizam a vida cotidiana. A "motivação", no
entanto, se afasta deste uso ao se constituir como uma categoria abstrata que agrupa todos os
referentes mais antigos, o que implica que todos tenham algo importante em comum. Toda
ação, não importa quão trivial ou habitual, é motivada, de acordo com aqueles que estavam
vendendo a motivação.

Em seu caráter de abstração, a "motivação" tem alguma semelhança com o termo do século
XIX "conação" (Hamilton, 1863). Por que, então, foi necessário inventar um novo termo? Por
que a conação desapareceu, justo quando poderia ter ganho uma nova vida? Conação
certamente sofreu em função das companhias que manteve. Era um termo inventado por
Nilósofos e usado por psicólogos ligados à NilosoNia que nunca se tornou parte da linguagem
comum. No século XX, era usado por William McDougall, cuja insistência em sua base
instintiva diNicultou sua difusão entre os psicólogos norte-americanos da década de 1920.
Tradicionalmente, a conação se referia a um princípio ativo na consciência. Referia-se a vida
interior do indivíduo e a evidência de sua existência era em grande parte introspectiva.

Ao contrário, a "motivação" não era abstraída de uma variedade de termos que se referiam à
experiência interna, mas a uma variedade de termos utilizados no contexto da inNluência
sobre pessoas. As palavras - querer, desejo, motivo, etc. - podem ser as mesmas, mas o
contexto de seu uso era diferente.

"Conação" renunia algo que, por exemplo, vontade e desejo tinham em comum na medida em
que eram objetos de experiência interior. No entanto, "motivação" reunia algo que, por
exemplo, desejos e motivos tinham em comum, na medida em que eram objetos potenciais de
manipulação e inEluência. As qualidades da consciência que eram importantes nas discussões
do século XIX sobre a conação eram irrelevantes para o discurso do "controle social” do século
XX.
No entanto, os signiNicados mais antigos não desapareceram do uso comum. O termo
"Conação" pode ter desaparecido, mas os termos de ordem inferior que se buscava com ele
uniNicar ainda estão conosco. A linguagem cotidiana ainda traz muitos termos referidos a uma
experiência interna de intencionalidade ou agência. A disciplina da Psicologia teve que lidar
com a dualidade no uso dos termos que o conceito de "motivação" deveria uniNicar. Os desejos
e os motivos podem ser objetos no exercício da inNluência e do controle, mas também
permanecem ancorados em um discurso de propósitos e intenções subjetivos. Ultrapassar
essa dualidade foi a tarefa teórica fundamental enfrentada pela nova psicologia da motivação.
Quais recursos estavam disponíveis para a realização desta tarefa?

Primeiro, havia um legado da especulação do século XIX sobre a relação entre consciência e
movimento corporal. Isso resultou em uma redução da consciência intencional a uma questão
de mecanismos de hábito que eram sujeitos à inNluência externa por meio de treinamento. De
Alexander Bain à William James se desenvolveu uma literatura sobre "a educação da vontade"
na qual a intencionalidade consciente já havia sido transformada em objeto de controle. Os
motivos foram sutilmente substituídos pela vontade.

Mas havia outro recurso que estava prontamente disponível para a superação do fosso entre a
experiência subjetiva de empenho (striving) e a "motivação" como objeto de controle. A
poderosa metáfora da "energia". A mesma literatura popular e de livros didáticos que
postulava "motivação" como objeto de inNluência geralmente também empregava a metáfora
da energia para dar conta do lado subjetivo de seu tópico. Esta metáfora surgiu no século XIX e
promoveu a naturalização da vontade. No início do século XX, tornou-se muito popular como
veículo de autocompreensão. O que fora antes descrito em termos voluntaristas, como uma
ação da vontade, agora é mais freqüentemente representado como mobilização de energia. Na
literatura de aconselhamento mais atualizada, o sucesso dos executivos não é apresentado
como dependendo da exortação à força de vontade, mas sim do fato de se ter uma
personalidade energética e do controle do "nível de energia" de seus subordinados (GOWIN,
1917). Existe um interesse generalizado no que se denomina "mobilização das reservas
ocultas de energia", ou obtenção de um “novo fôlego", e a preocupação generalizada, não com
a fraqueza da vontade, mas com o esgotamento do estoque de energia (KUGELMANN, 1992).
William James foi um dos primeiros colaboradores dessa literatura. Em sua conferência de
1906 intitulada "As energias dos homens” (The energies of men) aNirmou que "o indivíduo
humano. . . energiza abaixo do seu máximo "(JAMES, 1911, p. 12). Apontando o caminho para
a psicologia da motivação que se desenvolveria alguns anos depois, ele apresenta o problema
da seguinte maneira:

A grosso modo, podemos dizer que um homem que se energiza abaixo do seu máximo normal falha muito
em tirar proveito de suas oportunidades na vida; e que uma nação cheia de tais homens é inferior a uma
nação que funciona em maior pressão. O problema é, então, como os homens podem ser treinados até o
mais alto grau de sua energia útil? E como as nações podem tornar esse treinamento mais acessível para
todos os seus Eilhos e Eilhas. Isso, aEinal, é apenas o problema geral da educação, formulado em termos
ligeiramente diferentes (James, 1911, p. 8).

Observe como o habilidoso desenvolvimento de James da metáfora da energia permite que ele
deslize suavemente entre a linguagem da engenharia das coisas sendo executadas em alta
pressão e a linguagem da política social. Essa mistura fácil de moral e Nísica caracteriza toda a
sua apresentação do tema e dá o tom do discurso psicológico sobre a motivação que estava
por vir. James (1911: 32) nos diz que "a ideia da honra de alguém, por exemplo, desbloqueia a
energia", e generaliza da seguinte maneira: "Os Nisiólogos chamam um estímulo de
‘dinamogênico’ quando ele aumenta as contrações musculares dos homens a quem é aplicado;
m a s o s a t r a t i v o s p o d e m s e r d i n â m o g ê n i c o s , t a n t o m o r a l m e n t e q u a n t o
muscularmente” (JAMES, 1911: 15). Essa ambigüidade da linguagem "dinâmica" da energia
psicológica, este deslizamento entre o moral e o muscular, estava para fornecer a fórmula
mágica que trouxe a psicologia da motivação à existência.
À época da abordagem de James, sujeitos em um estudo psicológico já estavam fornecendo
relatos introspectivos que se referiam à "força" de um motivo (BARRETT, 1911), enquanto as
teorias psicológicas de Janet e Freud operavam com conceitos de força mental. O que a
literatura subsequente sobre "motivação" acrescentou foi a estrutura metafórica que
permitiria a domesticação deste discurso de subjetividade vigorosa pelos imperativos de
controle social e engenharia social. A "energia", que poderia ser mental, mas projetada como
energia Nísica, era a chave para essa estrutura.

A emergência do conceito de drive

O interesse prático pela "motivação" e pela energia humana criou uma área de discurso que
pareceu madura para a uniNicação teórica. Se essa área estava para ser anexada com êxito pela
disciplina da Psicologia, teria que mostrar que possuía conceitos e práticas que poderiam
fornecer uma base cientíNica.
Infelizmente, a disciplina não estava bem equipada para esta tarefa. Seu núcleo experimental,
preocupado com estudos laboratoriais de problemas cognitivos, era bastante afastado de tais
preocupações. Em um período mais recente, pesquisas de inspiração biológica ofereceram
mais esperança, especialmente no plano da prática. Como vimos no capítulo anterior, uma
subdisciplina de estudos de comportamento animal cresceu dentro da Psicologia Americana.
Ao contrário do seu contraponto europeu, este campo adotou uma postura distintamente
intervencionista em relação a seu objeto de estudo. Os animais foram confrontados com
ambientes estranhos e problemas que lhes eram alheios. A criatura em que os
experimentadores americanos estavam interessados era o animal na ativa2. Mas animais em
atividade, assim como pessoas em atividade, exigem incentivos para mantê-los em atividade.
Estes poderiam ser positivos, como comida e sexo, ou negativos, como escapar da punição por
choque elétrico ou conNinamento. De início, o uso de tais incentivos era secundário ao
principal interesse do experimentador, voltado para a forma como o animal resolvia as tarefas
em que tinha sido posto a trabalhar. Mas gradualmente, os próprios incentivos tornaram-se o
foco de atenção, de modo que os experimentos foram projetados para explorar sua eNicácia
relativa. No início da década de 1920, havia uma literatura considerável sobre esse tema
(SIMMONS, 1924).
Esta era uma literatura psicologicamente orientada, e não zoológica. Não se pretendia
contribuir para o treinamento mais eNiciente de animais de circo, mas para o desenvolvimento
de princípios fundamentais que também se aplicassem à efetividade relativa de diferentes
incentivos em seres humanos. Esses trabalhos forneceriam, potencialmente, insights
cientíNicos básicos que então poderiam ser aplicados por pessoas concernidas com o

2 Nota do tradutor - Há aqui um trocadilho com a expressão ‘at work’. Em inglês essa expressão pode signiNicar

tanto ‘em atividade’ assim como ‘trabalhando’.


funcionamento de incentivos na indústria, na sala de aula, na administração da justiça, e assim
por diante. Mas só se poderia ter fé nessa promessa, se se aceitasse de forma acrítica a
analogia entre os animais ativos de laboratório e humanos em ambientes institucionais. Essa
analogia dependia, em larga medida, de um uso altamente elástico de certos termos-chave.
Devia-se supor que o que foi classiNicado na categoria de "incentivos" nas fábricas, escolas,
prisões, etc., era essencialmente semelhante ao que se chamava de incentivo no laboratório de
animais. Caso contrário, não haveria fundamento para a crença de que a investigação de um
levaria ao conhecimento sobre o outro. Por trás das armadilhas do procedimento cientíNico se
escondia um realismo verbal ingênuo: porque algo era chamado de recompensa em uma
situação, tinha que ser semelhante, em algum nível profundo, a outra coisa que se chamava
recompensa em um cenário muito diferente. O que impulsionou tais arcos da razão era uma
ideologia do essencialismo biológico, a crença de que a conduta humana era diretamente
governada por princípios biológicos universais, independentemente do seu contexto.
No entanto, havia limites óbvios na gama de problemas para os quais estudos de incentivos
realizados com animais de laboratório poderiam ser considerados relevantes. Grandes áreas
da experiência humana, até então explicadas por conceitos tais como vontade, motivação e
atitude, não foram tocadas por tais estudos. Se uma psicologia biológica fosse ampliar sua
inNluência sobre essas áreas de conteúdo, seria necessário algo mais do que estudos de
incentivos animais. Era necessário encontrar novas categorias teóricas que pudessem
consolidar a ancoragem biológica dessas áreas de experiência humana.

Mas primeiro era necessário decidir qual perspectiva em biologia se deveria defender, pois
existiam ainda duas perspectivas, a vitalista e a mecanicista. A primeira foi representada
psicologicamente por William McDougall, um propagandista incansável da idéia de que todo
comportamento humano era conduzido por um número Ninito de instintos Nixos. A categoria
de instinto desfrutou de um período de grande popularidade entre aqueles que sentiram que
Darwin havia destrancado a porta pela qual a psicologia tinha que passar para se tornar uma
verdadeira ciência. William James se entusiasmou com os instintos, assim como muitos de
seus contemporâneos. Mas a versão de McDougall era diNícil de engolir, pelo menos em um
ambiente americano (KRANTZ e ALLEN, 1967). Estava muito intimamente ligada a um
Ninalismo explícito que ofendeu a sensibilidade mecanicista de seu público. Além disso, sua
maneira de abrir espaço para as inNluências ambientais, por meio da crença bastante
antiquada de seu autor na herança das características adquiridas, tornou-a pouco atraente
para uma geração que estava depositando suas esperanças nas rápidas soluções
ambientalistas3.
Se uma categoria de instintos fundamentada no Ninalismo era inviável, no que diz respeito à
uniNicação da psicologia da motivação, talvez a biologia mecanicista tivesse a resposta.
Tentativas nessa direção não faltaram. A característica comum dessas tentativas foi a redução
da categoria de "motivo" a de "reNlexo". Todo comportamento, animal ou humano, simples ou

3 O contraste entre a pouca recepção que as idéias de McDougall receberam na América e seu sucesso muito

maior na Grã-Bretanha (a primeira edição de sua Introdução à Psicologia Social foi lá publicada em 1908, a 33ª
edição em 1950) fornece um exemplo bastante vívido do enraizamento cultural da teoria psicológica.
complexo, era uma questão de estímulos especíNicos que provocavam respostas especíNicas.
Como todas as pretensas abordagens cientíNicas da motivação, esta era baseada na noção
ambígua de "energia", mas, neste caso, a fonte da energia que dirigia a ação estava localizada
no meio ambiente e não no organismo. Fazer uma coisa ao invés de outra signiNicava entrar
sob a inNluência de um conjunto especíNico de estímulos em vez de outro. Esta visão, ancorada
nas idéias de tropismo da biologia mecanicista do Ninal do século XIX (PAULY, 1987), implicava
uma interpretação energética da categoria de estimulação. O poder de provocar o movimento
residia, em última instância, nos estímulos, não nos organismos, e as questões de motivação
eram, portanto, redutíveis às questões de competição entre estímulos quanto a qual deles se
tornaria preponderante em qualquer momento particular. Os primeiros behavioristas
optaram por essa abordagem, mas não era necessário se identiNicar com todos os aspectos do
programa para fazê-lo. Troland, cujo primeiro texto sobre motivação já foi mencionado,
também favoreceu esse tipo de teorização. No entanto, a longo prazo, a enorme carga teórica
colocada na vaga noção de estimulação se provou pesada demais, mesmo para esta categoria
extremamente elástica. Algo mais distinto era necessário para reunir todos os pedaços que
constituíam o novo campo da "motivação".
A tarefa foi realizada pelo conceito de drive (impulso), inventado no Ninal da I Guerra Mundial
e que alcançou o domínio teórico do campo na década de 19304. Seu inventor foi Robert
Sessions Woodworth, um experimentalista proeminente locado na Universidade de Columbia,
a quem nós encontraremos novamente no Capítulo 9. Sua própria explicação de sua invenção
do "impulso" não é sem interesse:

Estou certo de que não obtive a palavra de nenhum psicólogo anterior. Eu a tirei da mecânica. Uma máquina possui
um mecanismo, de modo que, se for posta em movimento, ela opera de determinada maneira; mas deve ser
conduzida para se mover. O drive de uma máquina é o suplemento de energia que a coloca em movimento (YOUNG,
1936: 71).

Woodworth introduziu o drive no mundo psicológico em uma monograNia de 1918, intitulada


Psicologia Dinâmica5. Aproximando o organismo vivo a uma arma carregada com energia
armazenada, ele observou que um estímulo agia como um drive para liberar essa energia.
Reconhecendo que isso diNicilmente poderia ser equiparado à operação de um motivo, ele

4 Ocasionalmente se encontra a sugestão grotesca de que 'drive' poderia ter sido derivado do Trieb alemão, que

os psicólogos anglo-saxões encontraram nos escritos de Freud. Fora o fato de que o equivalente alemão de drive,
usado na psicologia americana, não é Trieb, mas Antrieb, o signiNicado e os antecedentes de 'drive' e Trieb são
totalmente diferentes. A derivação moderna do drive do mundo das máquinas está bem documentado. Trieb, no
entanto, tem um longo pedigree na NilosoNia alemã e psicologia NilosóNica. Ele desempenhou um papel na versão
de Kant da Psicologia das Faculdade, representou a atividade pura do ego na NilosoNia de Fichte e tornou-se a base
para a auto-realização de sujeitos vivos na psicologia hegeliana. Era um conceito básico na maioria das versões
da psicologia NilosóNica alemã do século XIX e foi utilizado por Wilhelm Wundt, que o considerava como provendo
a base da atividade mental. No Ninal do século XIX, Trieb começou a adquirir uma tonalidade mais biológica, mas
suas conotações continuaram sendo muito diferentes do termo inglês instinto. A tarefa dos tradutores de Freud
era impossível, porque simplesmente não há equivalente em inglês para Trieb. O termo sintetiza os caminhos
muito diferentes das psicologias anglo-saxã e alemã durante o século XIX.

5 'Dinâmico' tornou-se um slogan psicológico que geralmente indicava o emprego de alguma variante da metáfora

da energia, mas acabou se tornando quase sem sentido por uso excessivo.
colocou em questão "se podemos encontrar o caminho que vai do drive como estímulo
externo ao drive como motivo interno" (WOODWORTH, 1918, p. 38).

Ele pensou que ele poderia realizar essa transformação com base nas idéias sobre a atividade
nervosa desenvolvidas pelo neuro-Nisiologista Sir Charles Sherrington, com quem havia
trabalhado (WOODWORTH, 1961). Como vimos no Capítulo 4, Sherrington estava em uma
linha de desenvolvimento que resultou em uma convergência da NilosoNia mentalista empirista
e a bioenergética. Woodworth contou com as seguintes noções Sherringtonianas em sua
construção do conceito de drive: (1) o sistema nervoso foi organizado em sub-sistemas
(reNlexos) que armazenavam e liberavam energia; (2) a liberação de energia por um segmento
nervoso poderia ocorrer durante um período de tempo, especialmente se a liberação direta
não fosse possível; (3) a liberação de energia em um segmento nervoso poderia desencadear a
liberação de energia em outros segmentos; (4) os mecanismos acima são subjacentes a duas
classes distintas de reações organísmicas, consumatórias e antecipatórias. As reações
consumatórias são aquelas que constituem o Nim natural ou o termo Ninal em uma seqüência
de movimentos do organismo, como engolir a carne da presa que foi caçada, morta e ingerida.
As ações antecipatórias são todas aquelas que levam às consumatórias (SHERRINGTON, 1961,
cap. 9).
Woodworth simplesmente generalizou essas noções de modo a produzir um quadro para a
explicação de qualquer tipo de conduta humana. À ação hipotética de um segmento sobre o
outro (número 3 acima) ele chamou de drive, evocando a analogia da máquina que tinha em
mente. Uma ação dirigida que tivesse particular importância biológica ocorreria quando os
segmentos nervosos que servissem às ações consumatórias fossem energizados mas não
pudessem se descarregar (no caso de não haver comida para engolir, por exemplo),
terminando por desencadear a atividade de outros segmentos que servem à ações
"preparatórias" (as "ações antecipatórias" de Sherrington). Isso possibilitou, por exemplo,
falar do "impulso da fome" como "motivador" de todo tipo de ações levando ao ato de comer. A
ação dirigida passível de ser atribuída à atividade consumatória biológica passou a ser
chamada de "primária", mas Woodworth (1918: 42) estava bastante certo de que "qualquer
mecanismo poderia ser um drive".
Embora a derivação Sherringtoniana tenha sido logo esquecida, o conceito de drive
rapidamente se tornou popular. Sua equação de drives animais e drives mecânicos conduziu à
tentativas orquestradas de medir a força do primeiro da mesma forma que se poderia medir o
último, colocando-o contra uma força oposta de medida conhecida. Assim, Moss (1924) mediu
o drive (impulso) em termos da força do choque elétrico que os animais estavam preparados
para receber na tentativa de alcançar um objeto alvo. Outros psicólogos (DASHIELL, 1925;
WARDEN, 1931) logo se juntaram a este empreendimento. Richter (1927), biólogo,
desenvolveu um programa de pesquisa de longo prazo sobre as condições Nisiológicas do
"drive animal". Durante algum tempo, estes drives foram procurados principalmente nos
sistemas sanguíneo e digestivo, ao invés de no cérebro. Isso permitiu o recurso a noções
Nisiológicas de “homeostase” (CANNON, 1929) ao explicar a ação dos drives. Somente no
período pós-Segunda Guerra Mundial houve um retorno à especulação neuroNisiológica a
respeito da base Nísica da motivação (HEBB, 1949).
O termo logo encontrou caminho nos livros didáticos de psicologia, fornecendo o conceito
uniNicador para o tratamento da motivação. Os motivos humanos deveriam ser redutíveis às
drives "primários", equiparados aos "drives de animais" manipulados em estudos
laboratoriais. Neste ponto, o conceito de drive desempenhou exatamente o mesmo papel que
o conceito de instinto tinha realizado uma geração antes. Foi o veículo para um reducionismo
biológico radical na psicologia, embora a biologia agora favorecida fosse de caráter
extremamente mecanicista.
Na década de 1930, o conceito de drive assumiu a forma como iria sobreviver no resto do
século. Foi utilizado pelas duas principais versões da doutrina neobehaviorista, a de Tolman e
a de Hull. Como é característico do neobehaviorismo, o conceito de drive sobreviveu ao
desaparecimento dos traços mais idiossincráticos desses sistemas teóricos (SMITH, 1984). Em
ambos os sistemas a noção de drive era um componente crucial da estrutura do
instrumentalismo mecanicista que impunham a toda atividade, humana e animal. Tolman
(1932), que havia feito uma confortável mudança de instintos a drives, assumiu do biólogo
Craig uma distinção entre reações "consumatórias" e um estado de "apetite" que as precede.
Isso foi semelhante à distinção Sherringtoniana entre atividade consumatória e
"antecipatória" anteriormente adotada por Woodworth. Em ambos os casos, houve uma
separação rigorosa de componentes direcionais e energéticos. O estado referido como
"apetitivo", "antecipatório", "preparatório", ou simplesmente como drive, é um "estado de
agitação" (Tolman, 1932, p. 273), cujo papel é o dinamismo do comportamento. O componente
direcional é fornecido por uma característica diferente, que Tolman chama de "expectativa" ou
“prontidões-meio-Nim". Na versão de Hull (1943b), o comportamento também é ativado pelo
drive, mas o componente direcional consiste em conexões encadeadas de estímulo-resposta
chamadas ‘hábito'. Não se deve permitir que as diferenças teóricas envolvidas aqui
obscureçam a semelhança fundamental: ambos os sistemas foram construídos sobre uma
distinção básica entre componentes energéticos e diretores, universalmente aplicáveis a todos
os comportamentos, humanos e animais.

Psicologia motivacional como normativa

A distinção energia versus direção proporcionou a base para a interpretação de todos os


comportamentos em termos instrumentalistas (KOCH, 1956). Apenas algumas ações, como
comer e copular, foram classiNicadas como "consumatórias". Para o resto, a "consumação" era
extrínseca à ação ela mesma, embora a "necessidade" de tal consumação deveria fornecer a
energia sem a qual nenhuma ação ocorreria. Para a disciplina de Psicologia, a vantagem deste
modelo foi que possibilitou a integração de imperativos práticos e cientíNicos. O crescente
interesse prático pela "motivação" como meio de controle social, discutido na seção anterior,
pressupõe o instrumentalismo. Poderíamos inNluenciar as ações das pessoas como produtores
e consumidores, jogando nos motivos que eles tinham para trabalhar ou para comprar
produtos. Esses motivos foram pensados como extrínsecos às próprias ações. Os indivíduos
poderiam ser induzidos a trabalhar de forma mais intensa ou mais consistente excitando
ambições pessoais; a comprar sua marca de drogas ou cosméticos excitando medo e inveja.
Implicitamente, houve uma notável falta de fé nas atrações intrínsecas do trabalho, de muitos
produtos de consumo e, mais geralmente, de atividade socialmente valiosa. O que uma ciência
de "motivação" poderia fornecer eram princípios para orientar as tentativas de inNluenciar as
ações das pessoas, controlando os motivos extrínsecos que governavam essas ações.
Tais esperanças combinavam confortavelmente com o modelo de engenharia predominante
da ciência. Os princípios a serem procurados assumiram a forma de sequências lineares de
causalidade eNiciente. Na situação experimental paradigmática, matar o rato de fome era
concebido como sendo análogo a puxar uma alavanca de controle em uma peça de maquinaria
que desencadeasse uma cadeia de causas e efeitos. Conceitualmente, isso foi representado,
tanto por Tolman quanto por Hull, em termos de uma série de ligações entre variáveis
antecedentes, intervenientes e conseqüentes6.
Uma característica importante do uso neo-behaviorista do conceito de drive foi sua natureza
estipulativa. A separação básica dos componentes energéticos e diretores, a ubiquidade da
motivação extrínseca, a noção de que os motivos devem atuar como as causas eNicientes da
mecânica, foram todos princípios não empíricos incorporados em uma estrutura conceitual
para interpretar o comportamento de ratos de laboratório e de humanos . Não havia nenhuma
maneira de qualquer um desses princípios ser refutado sem abandonar esse quadro. Aderir ao
quadro signiNicava estipular a validade universal desses princípios. Isso poderia facilmente ter
implicações normativas. A qualidade - profundamente arraigada, culturamente enraizada e
dada como certa – dos princípios, signiNicou que, para muitos, as interpretações alternativas
tornavam-se literalmente impensáveis.
Talvez isso explique a popularidade contínua do conceito de drive e seus análogos durante o
período pós-Segunda Guerra Mundial, apesar do fato de que, em 1950, sua inadequação era
visível, mesmo no mundo fechado da experimentação animal (KOCH, 1951). Durante as
décadas que se seguiram, o drive continuou a funcionar como "a principal construção
motivacional em todo o amplo espectro de estudos psicológicos", embora, reconhecidamente,
seu uso “tenha se tornado cada vez mais vago" (BINDRA, 1985, p. 347). Em parte, essa
imprecisão se deveu a uma prática que conduziu aos piores excessos da teoria do instinto e
estava afetando cada vez mais o conceito de drive: uma coleção de atividades particulares
dirigidas a objetivos recebeu um nome geral que foi usado como o nome de alguma força
interna hipotética, designada como instinto, impulso, necessidade ou motivo, que deveria ser a
causa de todas as atividades particulares. Desta forma, psicólogos como William James (1890)
postularam instintos de rivalidade, aquisição, segredo e limpeza. Mais de meio século depois,
encontramos conversas sobre drives inatos responsáveis por processos cognitivos gerais,
como conhecer, aprender e compreender (NISSEN, 1954). A circularidade de tais "explicações"
é óbvia, pois os fatos que essas pulsões ou instintos devem explicar são idênticos aos fatos
aduzidos para estabelecer sua existência.
Mas se as deNiciências lógicas de tais "explicações" são tão evidentes, o que explica sua
popularidade aparentemente inextinguível? Para responder a essa pergunta, temos que
analisar alguns desenvolvimentos futuros do conceito de drive que estão ainda mais próximos
da lista de James de instintos do que dos drives cognitivos de Nissen. Pouco antes da II Guerra
Mundial, H.A. Murray, o chefe da Clínica Psicológica de Harvard, compilou uma lista de

6 Este esquema não se limitava à explicação da motivação. Seu signiNicado mais amplo é discutido no Capítulo 9.
"necessidades" humanas, como aquelas de aquisição, superioridade, autonomia e realização
(MURRAY, 1938). A diferença entre esse conceito de "necessidade" e o conceito de drive
prevalecente foi que o fundamento da biologia mecanicista foi abandonado. A psicologia da
motivação humana tornou-se autônoma e a experimentação animal perdeu seu status
privilegiado como fonte de conhecimento básico sobre motivação em geral. No pós-guerra,
essa abordagem foi popularizada por psicólogos como McClelland (MCCLELLAND et al.,
1953), que estabeleceram uma indústria menor dedicada à "motivação de realização" e
Maslow (1954), para quem o conceito de necessidades humanas forneceu um componente
crucial de uma abordagem que passou a ser conhecida como psicologia "humanista".
Os hipotéticos mecanismos biológicos já não desempenhavam nenhum papel signiNicativo na
construção de qualquer um desses conceitos motivacionais. O lugar deles foi ocupado pelas
convenções culturais empregadas na justiNicativa cotidiana das ações. Tais explicações
cotidianas sobre os motivos das ações de uma pessoa podem simplesmente se referir a um
objetivo especíNico perseguido pela pessoa, mas às vezes a explicação é em termos de uma
qualidade pessoal geral, como a ambição ou a ganância do indivíduo. Nesse caso, uma certa
classe de ações se distingue das outras com base em certas características que todos os
membros da classe supostamente compartilham. Esses recursos são então atribuídos à pessoa
que realiza as ações. Mas na criação de tais distinções, as convenções culturais e linguísticas
desempenham um papel crucial. Ao escolher características comuns entre diferentes ações
realizadas em diferentes contextos, faz-se uso de categorias nomeadas que são atuais na
própria cultura e que fornecem uma explicação aceitável das ações dos indivíduos. As
sociedades diferem muito nas categorias disponíveis e reconhecidas para esse Nim. Eles
também diferem historicamente nas categorias que estão disponíveis e reconhecidas em
qualquer momento especíNico. O que a psicologia das chamadas necessidades humanas fez foi
tomar categorias que estavam em voga em uma determinada sociedade em um determinado
período e reiNicá-las ao utilizá-las como nomes de forças hipotéticas dentro da pessoa que
supostamente seriam responsáveis por produzir todas as ações às quais poderia ser dada a
etiqueta correspondente.
O papel desta forma de psicologia da motivação como uma espécie de apologética cultural é
inconfundível. Elevar um conjunto de convenções historicamente contingentes para o status
de necessidades humanas universais não só enfatizou sua importância para a sociedade em
que se originaram, mas forneceu uma justiNicativa para os esforços de proselitismo em outros
lugares. Isto foi especialmente evidente no caso das mais populares dessas supostas
necessidades, as de "realização" e de "auto-realização". Estando tão intimamente ligado aos
valores culturalmente santiNicados e às convenções não examinadas, esta versão da psicologia
da motivação era reconfortante e carecia das implicações potencialmente subversivas que a
alternativa freudiana já havia abrigado (MARCUSE, 1956). Além disso, a psicologia das
necessidades humanas perpetuou a crença mais geral e historicamente mais profundamente
enraizada de que os motivos da conduta humana deveriam ser buscados, não em situações
sociais particulares, mas em forças hipotéticas que habitavam indivíduos, as “springs of
action", como elas tinham sido tão vividamente chamadas em uma idade anterior (BENTHAM,
1969).
Esse tipo de recurso foi indubitavelmente benéNico para a ciência da psicologia. Mas, mais
especiNicamente, permitiu que "motivação" continuasse a ser reconhecido como um sub-
campo dessa ciência. Embora o campo assumisse a aparência de uma confusão de tópicos sem
uma estrutura comum (ver, por exemplo, Weiner, 1992), a crença de que a "motivação"
constituía um "tipo natural" psicológico, potencialmente uniNicado por um conjunto de
princípios, continuou inabalável. Desde o início, os psicólogos que escreveram sobre a
motivação alegaram que seu tópico tinha como objetivo fornecer respostas à questão do
"porquê" do comportamento humano. Na verdade, eles estavam interessados em apenas um
tipo de resposta, o tipo que postulava impulsos intra-individuais. Foi esse compromisso
fundacional que criou o campo. No entanto, mesmo no auge da psicologia motivacional, havia
aqueles que apontavam que as respostas para a pergunta 'por que’ poderiam ser de muitos
tipos (PETERS, 1958), e que o grande defeito das explicações psicológicas prevalentes era que
eles universalizavam um tipo de resposta como o único tipo aceitável. Se as implicações desta
crítica não fossem ignoradas, não haveria nada para manter o campo em conjunto, mesmo na
sua forma altamente tênue posterior.

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