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A psicodinâmica de crianças com sintomatologia depressiva: um estudo a partir

da produção gráfica no H T P

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aplicações de diferentes técnicas gráficas de avaliação psicológica em
psicologia da saúde

Ana Carolina Carvalho Silva


Hilda Rosa Capelão Avoglia
Paulo Francisco de Castro (Coordenador)
Instituição: Universidade Metodista de São Paulo / Universidade de Taubaté /
Universidade Guarulhos

Resumo
O desenvolvimento de pesquisas sobre depressão vem merecendo destaque na
área da saúde, em especial quando se refere ao diagnóstico da depressão infantil.
Estudos apontam à necessidade de se especificar indicadores de sintomas
depressivos nas diferentes faixas etárias, a fim de ampliar os recursos diagnósticos
disponíveis. Nesse sentido, o presente estudo teve como finalidade caracterizar a
psicodinâmica de crianças em idade escolar com sintomatologia depressiva.
Estudamos 38 crianças, com idades entre 7 e 10 anos, inscritas na Clínica-Escola de
Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo no período de agosto à dezembro
de 2009. Primeiramente a totalidade das crianças (n = 38) foi submetida à aplicação
individual do Inventário de Depressão Infantil (CDI) a fim de se identificar à presença
de sintomas depressivos. Em seguida, foi aplicado individualmente o H T P (Casa,
Árvore e Pessoa) nas crianças que apresentaram resultado positivo para sintomas
depressivos. O CDI foi analisado conforme Gouveia et al (2002). Quanto ao HTP, foi
elaborada uma síntese qualitativa para cada caso. Os resultados indicaram que 9
crianças (23% do total), foram diagnosticadas como apresentando sintomatologia
depressiva, e a produção no H T P apontou fragilidade egóica caracterizada pela
necessidade de apoio e segurança, além de sentimentos de abandono. Identificou-se
a presença de atitude defensiva diante das relações familiares, marcadas
especialmente pela pressão ambiental e retraimento e pela resposta negativa diante
do calor humano. Por fim, o estudo sugeriu a importância de se considerar
determinados indicadores gráficos como sendo comuns à faixa etária estudada,
portanto merecendo serem relevados quando da interpretação de técnicas projetivas
gráficas.

Palavras-chave: depressão infantil, inventário de depressão infantil (CDI), H. T. P.


(desenho da casa, árvore e pessoa)

Trabalho Integral

Introdução
O estudo da depressão se constitui em um tema freqüente para os mais
diversos profissionais da área da saúde, além de psicólogos e psiquiatras. Nesse
contexto, a depressão infantil em nosso país mostrar-se como sendo menos
investigada, conforme aponta Fonseca et al (2005).
Na criança, a depressão pode apresenta-se como uma experiência diferente da
depressão nos adultos. Para Ajuriaguerra (1983), a depender da idade em que
determinados sintomas se manifestam, considerando aqui a etapa que antecede a
adolescência, é possível que o termo depressão não tenha o mesmo sentido que tem
para o adulto. Com a proximidade da adolescência, Cruvinel e Boruchovitch (2008)
afirmam que há um aumento no número de casos com sintomatologia depressiva.
O diagnóstico da depressão envolve variáveis como a intensidade, gravidade,
freqüência e a duração com que determinados sintomas se manifestam e pode ocorrer
na criança, no adolescente, no adulto ou no idoso, contudo, a sintomatologia deve
levar em conta a faixa etária, como afirma Ajuriaguerra (1983) que discute a
prevalência da sintomatologia como variável, conforme a idade e o sexo, atribuindo a
criança em idade escolar, da qual se ocupa o presente estudo, a inibição afetiva das
pulsões, aspectos psicossomáticos como enurese, onicofagia, manipulação genital,
terrores noturnos e crises de choro e de gritos. Souza (1984) concorda com esta
afirmação e em seus estudos destaca a importância dos processos de maturação de
cada fase do desenvolvimento psíquico nos sintomas e no comportamento depressivo.
De maneira geral, Ballone et al (2007) descreve a presença do sofrimento ou
prejuízo significativo no funcionamento social, profissional ou de outras áreas da vida
do indivíduo e estabelece basicamente três sintomas, que embora suficientes para
identificação do quadro, desencadeiam inúmeras outras manifestações de alterações
no plano afetivo.
Souza (1984), referindo-se a criança em idade escolar, observa que esta já
pode verbalizar sobre seu sentimento depressivo e comumente relata estado de
tristeza, irritabilidade e tédio. Apresenta, de forma sistemática, os principais
indicadores da depressão na criança, tais como: aparência triste, choro fácil, apatia,
fadiga, isolamento, declínio ou desempenho escolar fraco, recusa escolar, ansiedade
de separação, fobias e, eventualmente, desejo de morrer. Ressalta os prejuízos na
concentração e conseqüentemente o comprometimento no desempenho escolar e
afirma que os professores, mesmo sem saber que se trata de um quadro depressivo,
acabam por identificar os sintomas por meio do comportamento da criança.
Sobre a utilização de recursos diagnósticos, destacamos as projetivas gráficas,
mais especificamente o H. T. P. - Desenho da Casa, Árvore e Pessoa (House, Tree e
Person) que busca identificar a projeção de elementos da personalidade e conflitos por
meio de indicadores dos mais diversos transtornos (BUCK, 2003). Retondo (2000)
adverte que a avaliação de um transtorno deve ser baseada em tantas informações
quanto possíveis, pois mesmo sendo o H.T.P sensível à identificação de várias
patologias, há necessidade de cautela ao definir um diagnóstico psicológico. A autora
em seu Manual Prático de Avaliação do H.T.P. e Família (2000) apresenta possíveis
interpretações gráficas para traços de normalidade e outros indicativos de alguma
patologia, entre estes os transtornos depressivos.
A classificação do episódio depressivo é descrito no DSM – IV (1995) a partir
da identificação da presença de cinco ou mais dos seguintes sintomas: humor
deprimido; interesse ou prazer acentuadamente diminuídos; perda ou ganho
significativo de peso; insônia ou hipersonia; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou
perda de energia; sentimento de inutilidade, culpa excessiva ou inadequada;
capacidade diminuída de concentração, de pensamento ou de decisão; pensamento
de morte recorrente ou ideação suicida.

Método
Este estudo contou com a participação de 38 crianças com idades entre 07 e
10 anos, de ambos os gêneros, que buscavam atendimento na Clínica-Escola de
Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo no período de agosto a novembro
de 2009.
Os dados foram coletados na própria Clínica-Escola a partir de agendamento
prévio. De acordo com as exigências éticas, participaram apenas as crianças cujos
pais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido registrando a finalidade
e o procedimento do estudo.
Além dos dados contidos na Ficha de Identificação da criança, utilizamos o
Inventário de Depressão Infantil (CDI) elaborado por Kovacs (1983), normatizado e
adaptado para a realidade brasileira por Gouveia et al (1995).
Para conhecer a psicodinâmica das crianças fizemos uso do H T P, seguindo a
padronização estabelecida por Buck (2003). Sendo uma técnica projetiva gráfica, nos
possibilitou identificar o perfil psicodinâmico, uma vez que nos permitiu obter
informações sobre a individualidade dos sujeitos em relação aos outros e ao ambiente
do lar, analisando conflitos e personalidade (BUCK, 2003).
O procedimento para coletar os dados ocorreu em duas sessões individuais de
aproximadamente uma hora cada uma. Inicialmente foi aplicado o CDI e, conforme o
resultado positivo (acima de 17 pontos), indicando sintomas depressivos, foi aplicado o
HTP.
A partir da análise do material foi elaborada uma síntese qualitativa para cada
caso, sendo, a seguir, sistematizados visando conhecer as características
psicodinâmicas dos participantes.

Resultados
Da totalidade das crianças investigadas (n = 38) obtivemos 23% de resultados
acima de 17 pontos no CDI, ou seja, 9 crianças foram diagnosticadas como
apresentando sintomatologia depressiva. Assim, ao serem analisadas as produções
gráficas no HTP, obtivemos informações que nos permitiram identificar a
psicodinâmica de tais crianças.
No grafismo, verificamos o traçado do tipo fino ou fraco, em especial nas
paredes da casa, que representam a fragilidade egóica ou ainda os limites de Ego
fraco, marcado pela necessidade de apoio e segurança, observados nos desenhos
elaborados nas margens inferiores do papel. Do mesmo modo, os sentimentos de
abandono, inadequação e insegurança puderam ser reconhecidos a partir da posição
dos desenhos predominantemente abaixo do ponto médio da folha.
Identificou-se a presença de atitude defensiva diante das relações familiares,
sinalizando pressão ambiental, retraimento e resposta negativa diante do calor
humano. Observa-se falta de detalhes na figura humana, embora comum em crianças
com menos pequenas, conforme Buck (2003), menores de cinco anos, indicativos de
retraimento. Da mesma forma, encontramos sinais de rigidez e tensão nos vínculos
familiares.
De modo geral, os desenhos denotam descontentamento e regressão com
elevado nível de ansiedade.

Considerações Finais
O estudo sugeriu a importância de se considerar determinados indicadores
gráficos como sendo comuns à faixa etária estudada, portanto merecendo serem
relevados quando da interpretação de técnicas projetivas gráficas em casos de
crianças depressivas.
Consideramos a importância do conhecimento de aspectos gráficos específicos
nos desenhos de crianças que apresentam sintomas depressivos, ampliando-se as
possibilidades de compreensão diagnóstica visando o estabelecimento de ações
interventivas mais efetivas na área da saúde.

Referências

AJURIAGUERRA. J. de. Manual de psiquiatria infantil. São Paulo: Editora Masson,


1983.

BALLONE, G. J. ; ORTOLANI, I.V. e PEREIRA NETO, E. Da emoção à lesão. São


Paulo: Editora Manole, 2007. 2ª. ed.
BUCK. J. Manual e guia para interpretação do H.T.P. São Paulo: Vetor Editora.
2003.

CRUVINEL, M. e BORUCHOVITCH, E. Sintomas depressivos em crianças: estudos


com duas versões do CDI. Brasília. Psicologia Ciência e Profissão. vol.28, no. 3,
p.574-585, 2008.

FONSECA, M. H. G. ; FERREIRA, R. A. ; FONSECA, S. G. Prevalência de sintomas


depressivos em escolares. São Paulo. Pediatria 27(4):223-32, 2005.

GOUVEIA, R.V.; BARBOSA, G.A.; ALMEIDA, H.J.F.; GAIÃO, A.A. – Inventário


de Depressão Infantil – CDI: Estudo de Adaptação com Escolares de João Pessoa.
Jornal Brasileiro de Psiquiatria 44(7): 345-9, 1995.

KOVACS, M.A. – Developmental Perspective on Methods and Measures in the


assessment of Depressive Disorders: The Clinical Interview. In: RUTTER, M; IZARD,
C; READ, P. Depression in Young People: Developmental and Clinical
Perspectives. Guilford Press, New York, 1983.

MANUAL DIAGNÓSTICO E ESTATÍSTICO DE TRANSTONROS MENTAIS – DSM-IV.


Porto Alegre: Editora Artes Médicas, 1995. 4ª. ed.

RETONDO, M. F. N. G. Manual prático de avaliação do H. T. P. e família. São


Paulo: Editora Casa do Psicólogo, 2000.
A psicologia da saúde e a intervenção clínica na escola maternal: um espaço
para a humanização para pais, professores e alunos

Modalidade: Simpósio
Mesa: Por uma psicologia humana na dinâmica das relações escolares

Nágila Batista Lúcio Santos


Renata Ferrarez Fernandes Lopes (Coordenadora)
Instituição: Instituto de Psicologia - Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
Se partirmos do pressuposto de que a Psicologia da Saúde consiste na
aplicação dos conhecimentos e das técnicas psicológicas à saúde, às doenças e aos
cuidados de saúde, então são plurais os espaços disponíveis para a atuação profissional
nesse ramo da Psicologia. A escola é um desses espaços. Essa comunicação de
pesquisa tem como objetivo apontar técnicas da Terapia Cognitivo-Comportamental (por
exemplo: a psicoeducação) como alternativas de intervenção junto a pais, professores e
crianças, dentro do ambiente escolar (maternal). As intervenções foram feitas numa
escola maternal de Tupaciguara (MG) em três grupos: um de pais, composto por duas
mães e uma avó; outro com três crianças, sendo dois meninos e uma menina, entre
quatro e cinco anos de idade e outro com professoras do maternal que eram educadoras
dessas crianças. A queixa trazida pelos pais e professores relacionava-se a
comportamentos de indisciplina das crianças. As intervenções junto aos pais contaram
com 7 sessões semanais de 90 minutos. Ofereceram-se também noções de
desenvolvimento cognitivo e afetivo relacionados à segunda infância aos professores
(total de 3 encontros de psicoeducação de 60 minutos). Para melhor avaliação da
interação pais/filhos, além de entrevistas para a constituição do grupo, aplicou-se o
Inventário de Estilos Parentais de Gomide e o “Child Behavior Checklist” (CBCL). Na
análise do CBCL, percebeu-se que não houve queixa significativa de problemas
internalizantes, como problemas somáticos, medos, etc.; destacaram-se as queixas
externalizantes: maus comportamentos, agressão, irritabilidade, impulsividade. Já os
dados do Inventário de Estilos Parentais (IEP) indicaram um escore médio de 10,33,
sugerindo a prevalência de práticas parentais positivas. Porém, notou-se uma grande
incidência de práticas parentais negativas que necessitavam de intervenção. Com o
grupo de crianças foram realizadas 4 sessões de 90 minutos de duração cada. Por se
tratar de crianças muito jovens, o trabalho interventivo focalizou atividades mais
concretas e diretivas visando o desenvolvimento de habilidades sociais. A intervenção
psicoeducativa despertou nos pais a consciência do seu papel ativo na educação dos
filhos, o que foi possível principalmente por compartilharem suas experiências com os
demais membros do grupo. Os professores parecem ter ampliado suas noções gerais
sobre desenvolvimento e isso favoreceu um relacionamento mais adequado com seus
grupos de alunos e as crianças diminuíram a freqüência de comportamentos hostis e
ampliaram seus repertórios de habilidade social. Esses resultados apontam que alguns
tipos de intervenções grupais em contextos escolares podem auxiliar precocemente na
promoção da saúde mental.

Palavras-chave: psicoeducação, escola maternal, práticas educativas


Acolhimento psicológico interventivo para gestantes de risco no hospital

Modalidade: Simpósio
Mesa: Reflexões em psicologia da saúde: interface com diferentes quadros orgânicos

Eloisa Pelizzon Dib


Erica Ferrari do Nascimento
Helena Rinaldi Rosa
Maria Luísa Louro de Castro Valente
Instituição: Departamento de Psicologia Clínica - UNESP, Assis-SP

Resumo
O momento da gravidez é um momento de mudanças na vida de qualquer
mulher. Ela se depara com uma alta complexidade de sentimentos, experimentando
diferentes emoções no percurso da gestação. Lidar com estas emoções, conduzindo-
as a um bom caminho nem sempre é uma tarefa fácil no nível psíquico, principalmente
em se tratando de gestação de alto risco. Uma parcela de gestantes, por terem
características específicas ou por sofrerem algum agravo, apresenta maiores
possibilidades de evolução desfavorável, tanto para o feto como para a mãe. Esta
parcela constitui o grupo chamado de “gestantes de alto risco”. Por gestação de alto
risco entende-se como sendo aquela na qual a vida ou a saúde da mãe e/ou do feto
tem maiores chances de serem atingidas por complicações que a média das
gestações. O setor de gestação de alto risco do Hospital Regional de Assis - HRA
atende pacientes que necessitam de um atendimento mais cuidadoso quanto à
gestação. Dentre as pacientes atendidas estão adolescentes, principalmente até 15
anos, no qual o “risco” da gestação é maior e mulheres que já ultrapassaram a idade
considerada ideal para a concepção, 35 anos. Também são recebidas mulheres que
apresentam algum problema de saúde, como hipertensão, diabetes, obesidade,
problemas cardíacos, entre outras condições de saúde que podem comprometer o
desenvolvimento normal da gestação. As pacientes são encaminhadas ao HRA pelos
setores público e privado. Todas as pacientes novas têm seu primeiro atendimento
agendado para as segundas-feiras. Neste momento realizam um primeiro contato com
o serviço de enfermagem, passam por consulta médica, sendo encaminhadas,
dependo de cada caso, para as demais especialidades. Ao serviço de psicologia são
encaminhadas todas as adolescentes que realizam o acompanhamento médico.
Quanto às demais pacientes, somente recebem atendimento psicológico quando a
equipe percebe questões emocionais que permeiam este período da gestação, ou
quando as próprias pacientes solicitam. Ao setor de psicologia cabe a realização de
entrevistas, que têm por intuito realizar uma avaliação psicológica interventiva,
percebendo como a gestante lida com a gravidez e oferecendo, assim, uma escuta
acolhedora a essas futuras mães, intervindo de modo sensível para que elas possam
colocar suas angústias, sofrimentos, relações familiares e fantasias neste espaço
oferecido, assim como também consigam compreender qual é o significado desta
criança em sua vida e a importância de uma boa relação entre mãe e bebê desde o
início, dando a elas acompanhamento conforme a necessidade e disponibilidade.

Palavras-chave: psicologia hospitalar, gestação de alto risco, gravidez


Adesão ao tratamento e prevenção da dependência de álcool

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aspectos biopsicossociais e adesão a comportamentos de saúde

Carla Costa Farnesi


Marilia Ferreira Dela Coleta
Instituição: Programa de Pós-graduação em Psicologia – Mestrado, Universidade
Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG

Resumo
Compreender melhor as crenças e expectativas de controle sobre o
comportamento de beber pelo indivíduo mostra-se como uma ferramenta fundamental
para os profissionais e pesquisadores interessados na adesão ao tratamento e
prevenção da dependência de álcool. Este estudo visou ampliar o conhecimento sobre
o papel de fatores cognitivos (crenças comportamentais do MCS e locus de controle
do comportamento de beber) relacionados ao consumo de álcool em 433 servidores
de uma instituição federal de ensino superior (idade média de 46,6 anos e 47,6% do
sexo masculino). Os instrumentos utilizados foram: questionário de dados sócio-
demográficos; AUDIT; Escala de Benefícios e Barreiras percebidos em Evitar o
Consumo de Bebidas Alcoólicas e versão brasileira da escala DRIE (Locus de controle
do comportamento de beber). Com relação ao padrão de consumo de álcool, 11,8%
da amostra apresentaram escore positivo no AUDIT. Os resultados dos testes de
correlação e comparação entre os grupos foram, em sua maioria, coerentes com as
expectativas teóricas. O grupo de bebedores-problema percebeu significativamente
menos benefícios e mais barreiras em evitar o consumo de álcool e mostrou-se mais
externo no locus de controle do comportamento de beber que o grupo de abstêmios ou
usuários de baixo risco. Foram encontradas correlações positivas entre escore do
AUDIT e barreiras percebidas, e correlações negativas entre padrão de consumo de
álcool e benefícios percebidos. Em relação ao locus de controle, o escore no AUDIT
correlacionou-se positivamente somente com a Externalidade. O modelo da análise de
regressão múltipla (variável dependente: escore AUDIT; variáveis independentes:
idade, instrução, benefícios percebidos em evitar o consumo de álcool, barreiras
percebidas em evitar o consumo de álcool, internalidade no locus de controle do
comportamento de beber e externalidade no locus de controle do comportamento de
beber) predisse significativamente o consumo de álcool explicando 16% da variância
total da variável dependente. Assim, visando a prevenção de problemas relacionados
ao consumo de álcool, é possível concluir que é ideal que as pessoas percebam
poucas barreiras e muitos benefícios em evitar o consumo de álcool, e percebam a si
mesmas sob baixo controle externo na determinação de seu nível de consumo de
álcool. Analisar essas crenças no processo de tomada de decisão na adesão de
comportamentos saudáveis possibilita um melhor delineamento de ações preventivas
mais adequadas ao perfil do dependente dentro do processo de mudança e com
maiores chances de sucesso nas intervenções.

Palavras-chave: prevenção, adesão, consumo de álcool


As bases epistemológicas da reforma psiquiátrica e os serviços de saúde mental
no Brasil

Modalidade: Simpósio
Mesa: Psicologia, saúde e políticas públicas: um desafio comum e diferentes enfoques

Moisés Fernandes Lemos


Instituição: Universidade Federal de Goiás – UFG CAC

Resumo
O tratamento da doença mental recebeu atenção diferenciada e ou
especializada ao longo da história, mas somente no período após a Segunda Guerra
observou-se avanços consideráveis na metodologia de trabalho, efetivadas por meio
de experiências como a comunidade terapêutica inglesa, a psiquiatria de setor
francesa e a psiquiatria preventiva comunitária nos EUA. A grande revolução da saúde
mental começa a surgir, no entanto, em decorrência das críticas sobre a natureza e
função social das práticas médicas e psiquiátrico-psicológicas apresentadas nos
trabalhos de Foucault, Goffman, Bastide, Castel, Cooper, Rotelli e Baságlia, entre
outros. Coube a Baságlia promover uma relevante mudança nos cuidados
dispensados ao doente mental quando dispensou a estrutura dos hospitais
psiquiátricos, promovendo uma revolução no tratamento da doença mental na Itália. A
experiência italiana aliada ao clima de democratização acabou, conseqüentemente,
influenciando outras experiências similares pelo mundo. Sendo assim, nesta
oportunidade pretende-se refletir sobre as bases epistemológicas da Reforma
Psiquiátrica, analisando os serviços de saúde mental implantados no Brasil. Serão
resgatadas estratégias de saúde mental praticadas nas sociedades ocidentais do final
do século XVIII até o momento atual, com ênfase naqueles movimentos de reformas
que tiveram influência no país. Uma atenção especial será dedicada ao programa
brasileiro de apoio à desospitalização e à implantação do Sistema Único de Saúde –
SUS, cabendo ainda destaque a rede substitutiva de cuidado em saúde mental e
coletiva, mais especificamente ao processo de reabilitação psicossocial praticado nos
CAPS e nas oficinas terapêuticas, compreendendo-as como o principal instrumento de
viabilização das mudanças preconizadas pela Reforma Psiquiátrica.
Aspectos biopsicossociais e adesão ao tratamento de pessoas com HIV/AIDS
que vivem com HIV/AIDS

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aspectos biopsicossociais e adesão a comportamentos de saúde

Gabriel José Chittó Gauer


Grazielly Rita Marques Giovelli
João Feliz Duarte de Moraes
Prisla Ucker Calvetti
Instituição: Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul – Grupo de Pesquisa Avaliação e Intervenção em
Saúde Mental

Resumo
Este estudo teve como objetivo principal identificar os fatores associados à
adesão ao tratamento de sujeitos portadores do vírus HIV em tratamento com
antiretroviral. Foram avaliados os aspectos sócios demográficos, os sintomas de
depressão, suporte social, qualidade de vida e os marcadores biológicos (CD4+ e
carga viral em 63 sujeitos vivendo com HIV/Aids (média de 42 anos e 57,1% do sexo
masculino). O estudo de caráter transversal descritivo e analítico foi desenvolvido em
um serviço de saúde da rede pública de e em uma Organização Não-governamental
ambos em Porto Alegre, RS. Os instrumentos utilizados foram: Ficha de dados
sociodemograficos e situação clinica; WHOQOL-HIV Bref; CEAT-VIH; Inventário
Depressão de Beck e Escala de Suporte Social para Pessoas Vivendo com HIV/Aids.
O presente estudo teve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital São
Lucas da PUCRS. Para analisar a relação entre os aspectos psicossociais e
marcadores biológicos, os sintomas de depressão, suporte social, adesão e qualidade
de vida, utilizou-se a correlação de Pearson. Para avaliar diferenças entre grupos, foi
utilizado o teste t de Student para duas amostras independentes. Efetuou-se também
uma análise de regressão logística com a finalidade de verificar quais das variáveis
tinham relação/associação com a adesão. Os resultados apontaram que os
participantes apresentam nível de depressão leve. Em relação ao suporte social foi
observado que a maior média foi no fator 1- suporte social emocional. Em relação ao
grau de adesão, a maior concentração de porcentagem está presente em boa/
adequada e estrita, considerando uma amostra com adesão. Entre os domínios físico,
psicológico, de relações sociais e de meio ambiente da qualidade de vida e no
suporte social emocional e instrumental se constatou uma correlação altamente
significativa em relação a adesão.

Palavras-chave: hiv/aids, suporte social, adesão


Considerações sobre elementos psicológicos observados em pacientes renais
crônicos

Modalidade: Simpósio
Mesa: Reflexões em psicologia da saúde: interface com diferentes quadros orgânicos

Armando Rocha Júnior


Paulo Francisco de Castro (Coordenador)
Instituição: Universidade de Taubaté e Universidade Guarulhos

Resumo
O presente trabalho busca uma reflexão sobre os componentes psicológicos
vivenciados por pacientes renais crônicos e sua relação com o quadro clínico que esse
estado provoca. Os rins participam do equilíbrio do meio interno e são responsáveis
pela eliminação de líquidos, solutos e outros produtos que não são desejáveis ao bom
funcionamento fisiológico humano. Os rins podem ser acometidos de várias
patologias, mais brandas ou mais severas, de acordo com a etiopatogenia do quadro.
Dentre as patologias possíveis, uma das mais graves é a insuficiência renal crônica. A
partir do momento em que o tratamento conservador torna-se ineficiente no tratamento
dos pacientes renais, parte-se para o processo de diálise para a manutenção vital dos
pacientes. O quadro renal crônico, associado aos seus procedimentos para
tratamento, pode gerar conseqüências de cunho psicológico nos pacientes. Importante
analisar tal circunstância para compreender melhor os dinamismos psicológicos
envolvidos nesse processo. Em síntese, os componentes psicológicos observados em
pacientes renais crônicos incluem pouca perspectiva diante do futuro, proximidade e
vivência forte de morte, perda de autonomia nas atividades rotineiras e uma estranha
relação de dependência com a máquina de diálise. Além disso, um dos aspectos
importantes no contexto psicológico é a relação dialética que o paciente estabelece
diante de sua situação: de um lado a necessidade de diálise que causa uma profunda
mudança dos hábitos de vida e gera certos desconfortos pela própria intervenção e
por outro lado a relação que se estabelece com a diálise, elemento de suporte de vida
do paciente. Um dos componentes de maior incidência nos pacientes com quadros
renais crônicos é a depressão. Pesquisas indicaram grande prevalência de aspectos
depressivos em pacientes em diálise em diferentes graus e com diferentes
conseqüências. A depressão pode interferir nas estratégias de enfrentamento dos
pacientes, interferindo na maneira pela qual compreendem e se posicionam diante da
doença. Por fim, parece claro a interferência do quadro renal crônico e dos aspectos
psicológicos decorrentes na qualidade de vida dos pacientes. Além das funções
cotidianas, os elementos psicológicos diminuem a qualidade de vida nos indivíduos
que necessitam de diálise constante. Diante dessa reflexão estudos empíricos
associados a elementos psicológicos como personalidade, recursos de enfrentamento
e resiliência mostram-se muito importantes para que a o conhecimento psicológico
possa contribuir para a melhoria da qualidade de vida desses pacientes.

Palavras-chave: psicologia da saúde, psicologia clínica, pacientes renais

Texto Integral

1 INTRODUÇÃO

O presente texto tem como foco a reflexão de componentes psicológicos em pacientes


renais crônicos.

1.1 Justificativa

Situações de comprometimento da saúde física envolvem diferentes aspectos que


devem ser considerados para melhor compreensão do quadro de saúde geral dos
indivíduos.

No caso específico dos pacientes com doença renal crônica não é diferente. O estado
de saúde física envolve uma série de procedimentos e acarreta profundas mudanças
em sua vida, principalmente se há a necessidade de intervenções dialíticas.

A necessidade de hemodiálise muda profundamente a rotina de vida dos pacientes e


gera, indubitavelmente, conseqüências psicológicas que devem ser compreendidas e
observadas pelos profissionais de saúde envolvidos no atendimento a esses
pacientes.
1.2 Objetivo

Refletir sobre os componentes psicológicos vivenciados por pacientes renais crônicos


e sua relação com o quadro clínico que esse estado provoca

2 TEORIA

Em termos anatômicos, o sistema urinário é composto pelas seguintes estruturas


principais: supra-renais, rins, cálices, pelve renal, ureter, bexiga e uretra (TANAGHO,
1992; MOURA; RIELLA; SOUZA, 1996).

Por se tratar de estudo sobre aspectos psicológicos de pacientes com insuficiência


renal crônica, optou-se pelo enfoque de uma breve exposição sobre a estrutura e
funcionamento dos rins.

2.1 Breve exposição sobre a estrutura e funcionamento renal

Os rins são órgãos vitais, localizados no espaço retroperitoneal, dispostos de forma


oblíqua. A posição que se encontra o fígado faz com que o rim direito, que usualmente
é um centímetro menor, situe-se em posição ligeiramente mais baixa que o esquerdo.
Possuem a forma semelhante a um feijão, de cor marrom-avermelhada, revestidos por
uma cápsula fibrosa firme (TANAGHO, 1994; MOURA; RIELLA; SOUZA, 1996;
BARROS; KAROHL; THOMÉ, 1999).

Os rins participam do equilíbrio do meio interno e são responsáveis pela eliminação de


líquidos, solutos e outros produtos que não são desejáveis ao bom funcionamento
fisiológico humano. Para isso, promovem um fino controle do volume, osmolaridade,
da concentração eletrolítica e dos íons ácidos. Além da importante função de eliminar
produtos que poderiam dificultar o bom funcionamento orgânico, também são
responsáveis pela conservação de substâncias que são fundamentais para a
manutenção da vida, como água, aminoácidos, açúcar, sódio, potássio, entre outros.
Dessa maneira, a função renal saudável está em administrar substâncias para a
manutenção da vida, ao eliminar o que não é desejável e manter o que é necessário
(BARROS; KAROHL; THOMÉ, 1999; BOIM; SCHOR, 1998).
Os rins podem ser acometidos de várias patologias, mais brandas ou mais severas, de
acordo com a etiopatogenia do quadro. Dentre as patologias possíveis, uma das mais
graves é a insuficiência renal crônica.

A insuficiência renal crônica foi descrita no século XIX, por Richard Bright, médico no
Guy’s Hospital, em Londres. É um quadro sindrômico caracterizado pela perda
progressiva e geralmente irreversível das funções renais, que resulta na retenção das
substâncias nocivas ao bom funcionamento orgânico e que deveriam ser eliminadas
num processo de filtragem glomerular natural. A instalação do quadro geralmente é
fruto de vários anos de deterioração progressiva dos rins. Apesar dessa definição não
possuir um padrão específico ou quantitativo preciso de perdas de eliminação de
substâncias, a insuficiência renal crônica é classificada em leve, moderada, grave ou
terminal (CENDOROGLO; SARDENBERG, SUASSUNA, 1998; ZATZ, 1996; THOMÉ
et al., 1999; AMEND Jr.; VINCENTI, 1994).

A etiologia do quadro renal crônico possui diversas causas e podem ser divididas em
três grupos: doenças primárias dos rins, doenças sistêmicas que também acometem
os rins e doenças do trato urinário e urológicas. Entre as doenças primárias dos rins
tem-se glomerulonefrites primárias, rins policísticos, Síndrome de Alport. As doenças
sistêmicas que também acometem os rins podem ser hipertensão arterial sistêmica,
diabetes mellitus, colagenoses, vasculites, mieloma múltiplo, gota, oxalose, cistinose,
Doença de Fabry. Além disso, doenças urológicas como nefrolitíase, obstruções
urinárias, refluxo vesicouretral e válvula de uretra posterior também podem
desencadear a insuficiência renal crônica. Associadas aos quadros descritos,
alterações fisiológicas secundárias como desidratação, infecções ou hipertensão
podem ser fatores desencadeantes para a instalação crônica (CENDOROGLO;
SARDENBERG, SUASSUNA, 1998; AMEND Jr.; VINCENTI, 1994).

A doença renal crônica demanda de tratamentos específicos para que os sintomas


possam ser minimizados, tendo-se como alvo a melhoria da qualidade de vida dos
pacientes. Por muito tempo pensou-se que a doença de base fosse responsável pelo
quadro crônico, entretanto, atualmente sabe-se que a situação crônica terminal, ou
seja, falência total dos rins, é resultado de lesões glomerulares, tubulointersticiais e
vasculares, tipicamente resultados das patologias renais (CENDOROGLO;
SARDENBERG, SUASSUNA, 1998). O tratamento deve ser conservador até que se
torne impossível a manutenção de tal prática, partindo-se, a partir disso, aos
tratamentos dialíticos. O tratamento conservador consiste em restrições à dieta,
limitando-se as doses de proteínas potássio e fósforo; associa-se a essa conduta, a
administração de medicamentos que possam ajustar a excreção renal (AMEND Jr.;
VINCENTI, 1994; PEREIRA, 1996).

A partir do momento em que o tratamento conservador torna-se ineficiente no


tratamento dos pacientes renais, parte-se para o processo de diálise para a
manutenção vital dos pacientes. A diálise é um método de filtragem sanguíneo
extracorpóreo, utilizando-se membranas semipermeáveis para a retenção das
substâncias prejudiciais à saúde dos pacientes. Os avanços tecnológicos no
conhecimento de eletrônica, computação e de membranas artificiais permitem extremo
controle do processo de dialítico. O acesso ao sistema vascular pode ser realizado por
cateter ou fístulas arterionevosas ou enxertos quando necessário. Atualmente, a
concentração das sessões varia entre três a cinco horas, três vezes por semana,
procedimento necessário para que os pacientes possam ter atividades mais próximas
de suas rotinas diárias (CENDOROGLO; SARDENBERG, SUASSUNA, 1998;
D‟ÁVILA; FIGUEIREDO, 1996; THOMÉ et al., 1999; AMEND Jr.; VINCENTI, 1994).

Embora mantenha a existência do paciente renal crônico, o processo contínuo de


diálise pode causar efeitos colaterais ao tratamento. O paciente pode, em função dos
procedimentos, desenvolver problemas físicos vasculares, como rompimento de vasos
ou instabilidade vascular; problemas ósseos, infecções, imunodepressão, entre outros.
Além dos elementos físicos, há a possibilidade do desenvolvimento de distúrbios
psicológicos de variado espectro (D‟ÁVILA; FIGUEIREDO, 1996; AMEND Jr.;
VINCENTI, 1994).

2.2 Aspectos psicológicos observados em pacientes renais crônicos

O quadro renal crônico, associado aos seus procedimentos para tratamento, pode
gerar conseqüências de cunho psicológico nos pacientes. Importante analisar tal
circunstância para compreender melhor os dinamismos psicológicos envolvidos nesse
processo.
Reis, Guirardello e Campos (2008) observaram demandas psicológicas específicas em
pacientes renais crônicos que podem gerar demandas de atendimento psicológico,
descrevem elementos como pouca perspectiva diante do futuro, proximidade e
vivência forte de morte, perda de autonomia nas atividades rotineiras e uma estranha
relação de dependência com a máquina de diálise. Nesse caminho, estudo de
Moreiras e Martínez (1993) estudaram o sentido de vida e de existência desses
pacientes, chegando à conclusão que também fica comprometido, relatando que
quanto maior o tempo em diálise, menor o sentido de vida nos pacientes,
principalmente naqueles onde não aconteceu nenhum suporte psicológico.

Um dos aspectos importantes no contexto psicológico é a relação dialética que o


paciente estabelece diante de sua situação: de um lado a necessidade de diálise que
causa uma profunda mudança dos hábitos de vida e gera certos desconfortos pela
própria intervenção e por outro lado a relação que se estabelece com a diálise,
elemento de suporte de vida do paciente. Nesse contexto a intervenção psicológica
mostra-se de suma importância, na busca de soluções para as limitações que a diálise
acarreta. O trabalho do psicólogo, integrado aos demais profissionais da equipe de
saúde, deve intervir no paciente e em sua família, dando suporte para sua aderência
ao tratamento, desenvolvendo estratégias de enfrentamento para o quadro
(RESENDE et al., 2007).

A dialética descrita acima envolve também questões de ordem financeira, pois as


limitações que o quadro impõe, as mudanças de vida ocasionadas pela diálise fazem
com que o paciente tenha que se adaptar a novas estruturas econômicas. Estudo
realizado demonstrou que pacientes com suporte financeiro mais estruturado
desenvolvem estratégias de enfrentamento mais adequadas (MACHADO; CAR, 2003).

A adesão ao tratamento dos pacientes é de suma importância para que este consiga
resultados positivos na diálise e consiga enfrentar questões cotidianas da doença.
Contrepas et al. (2006) desenvolveram estudo comparativo entre o estado de saúde
geral entre pacientes com e sem aderência ao tratamento dialítico; observaram que há
significativa melhora em pacientes que apresentaram boas condições psicológicas de
enfrentamento, levando-os a uma aderência adequada ao tratamento de uma forma
geral. Os dados do estudo são corroborados pela investigação de Bertolin et al. (2008)
que buscaram, em artigos publicados, a importância da aderência em pacientes renais
crônicos, onde encontraram concordância total nos autores no que se refere sobre a
importância de estratégias de enfrentamento diante do quadro clínico apresentado.

Um dos componentes de maior incidência nos pacientes com quadros renais crônicos
é a depressão. Pesquisas indicaram grande prevalência de aspectos depressivos em
pacientes em diálise em diferentes graus e com diferentes conseqüências. A
depressão pode interferir nas estratégias de enfrentamento dos pacientes, podendo
aumentar a mortalidade em grupos que se submetem à diálise há muito tempo, a
sensação de desesperança levam o paciente a um quadro debilitado, ampliando a
possibilidade de óbitos (DIEFENTHAELER, et al., 2008). Os sintomas depressivos
também podem diminuir a qualidade de vida nos pacientes, principalmente devido às
vivências de perda sucessiva de suas funções pessoais e capacidade de realizar
tarefas rotineiras (THOMAS; ALCHIERI, 2005). Além dos componentes psicológicos,
também foi pesquisado o comprometimento neuropsicológico, decorrente dos quadros
de depressão, em pacientes renais crônicos, como diminuição da função executiva,
prejudicando elementos cognitivos nos pacientes (DUARTE, 2006).

Parece claro a interferência do quadro renal crônico e dos aspectos psicológicos


decorrentes na qualidade de vida dos pacientes. Além das funções cotidianas, os
elementos psicológicos diminuem a qualidade de vida nos indivíduos que necessitam
de diálise constante. A diminuição de qualidade de vida pode ser observada em
diversos fatores e sob diversas circunstâncias. Pacientes mais adaptados e com mais
condições de enfrentamento, indicaram melhoria gradual na qualidade de vida, que
também influenciou positivamente em seus aspectos psicológicos (THOMAS;
ALCHIERI, 2005); além disso, esses fatores desenvolvem estratégias positivas de
enfrentamento que também levam os pacientes a uma melhor qualidade de vida
(CONTRERAS, et al., 2006). Suporte psicológico e atendimento às demandas
subjetivas dos pacientes também podem interferir positivamente na qualidade de vida
dos mesmos, pesquisas indicam que quanto maior e mais precoce o apoio psicológico
aos pacientes renais crônicos, maior a possibilidade de enfrentamento do quadro
(LOPES et al., 2007; PEDROSO; SBARDELLOTO, 2008; RUDNICKI, 2007).
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A vivência de um quadro renal crônico provoca profundas mudanças na rotina dos


pacientes, levando-os à necessidade de uma conduta de adaptação que, por vezes,
não é fácil.

Os processos de intervenção médica nos quadros renais crônicos e seus


desdobramentos geram, dependendo da estrutura psicológica do paciente, a
diferentes conseqüências psíquicas, tais como depressão, insegurança entre outras.

Nesse sentido, o papel da equipe de psicologia mostra-se fundamental, para que haja
acompanhamento dos pacientes, visando a saúde no contexto integral, com vistas à
melhoria da qualidade de vida dos pacientes e de suas famílias.

Estudos empíricos são imprescindíveis para que as reflexões apresentadas possam


ser fundamentadas em dados objetivos.

REFERÊNCIAS

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etiologia, diagnóstico e tratamento. In SCHOR, N; SROUGI, M. e cols. Nefrologia e
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ZATZ, R. Insuficiência renal crônica: mecanismos de adaptação e progressão. In
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Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1996. p. 450-455.
Convicções de saúde e adesão ao tratamento de crianças doentes crônicos

Modalidade: Simpósio
Mesa: Crenças em saúde e doenças crônicas

Maria Geralda Viana Heleno


Sue Ellen Modesto
Instituição: Programa Mestrado em Psicologia Saúde / Universidade Metodista São
Paulo

Resumo
As doenças crônicas e que exigem atenção e cuidados especiais,
hospitalização prolongada, ou serviços de assistência no domicílio, são aquelas em
que os pacientes apresentam muito mais dificuldades de adesão ao tratamento. Entre
as doenças crônicas com maior gravidade em nosso país encontra-se a diabetes
mellitus. A complexidade que envolve a questão da adesão/não adesão mostra a
impossibilidade de se identificar apenas um fator responsável, pois o processo é
multifatorial e dinâmico e vários aspectos interagem entre si. O presente estudo
pretende discutir como as convicções de saúde podem ser consideradas como um
fator de influência positiva nesse processo de adesão ao tratamento, particularmente
em crianças com Diabetes Mellitus. São apresentados recortes de casos clínicos de
crianças portadoras de Diabetes Mellitus, percepção dos pais, em que foram
observados como o conjunto de convicções de saúde (barreiras, suscetibilidade,
benefícios e severidade) esteve relacionado ao sucesso e como o seu contrário pode
dificultar essa adesão ao tratamento, acrescendo-se ainda a influência da participação,
do envolvimento e das atitudes familiares na qualidade da adesão.

Palavras-chave: convicções de saúde, adesão, diabetes mellitus em crianças


Determinantes ambientais do comportamento alimentar e da obesidade em
crianças e adolescentes

Modalidade: Simpósio
Mesa: Obesidade infantil

Sebastião de Sousa Almeida


Instituição: Laboratório de Nutrição e Comportamento – Depto. De Psicologia e
Educação - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto –
Universidade de São Paulo.

Resumo
Estudos comprovam que o mundo vem passando por uma transição nutricional que se
reflete em uma diminuição progressiva da desnutrição e em um aumento também
progressivo da obesidade. Assim, a obesidade se constitui, hoje, o principal problema
de saúde publica tanto em países desenvolvidos como em países em
desenvolvimento. Considerando-se a tendência secular positiva na prevalência da
obesidade infantil e seu impacto na vida adulta, deve-se destacar a importância do
ambiente e enfatizar a urgente necessidade de pesquisas que possam delinear os
fatores ambientais implicados na etiologia da obesidade infantil. Dentre os diversos
fatores ambientais envolvidos pesquisas recentes têm enfatizado a crescente
influência dos meios de comunicação no estabelecimento e na modificação dos
hábitos alimentares da população. Nesse sentido a televisão tem atraído a atenção
dos pesquisadores, pois são cada vez mais freqüentes relatos que evidenciam o papel
desse meio de comunicação no comportamento alimentar de crianças e adolescentes.
Estudos do Laboratório de Nutrição e Comportamento da USP-Ribeirão Preto
demonstraram que a propaganda de alimentos em canais de sinal aberto de televisão
é a mais freqüente quando comparada a todos as outras categorias de propagandas
analisadas, independente da rede de televisão, do dia da semana e do horário
investigados. Além disso, cerca de 60% dos alimentos veiculados nessas redes de
televisão são classificados como alimentos densamente calóricos como resultado da
adição de altas quantidades de gorduras, óleos, açucares e sal durante sua confecção
pela industrias alimentícias. Pesquisas desse mesmo Laboratório mostram que as
compras das famílias são influenciadas pelas mensagens veiculadas na televisão. A
investigação das preferências alimentares dessas crianças em escolas públicas e
particulares da cidade de Ribeirão Preto mostra uma alta incidência escolha de
alimentos densamente calóricos tanto entre as crianças investigadas quanto entre os
familiares dessas crianças. Finalmente, estudos recentes do mesmo Laboratório
mostram que a exposição de crianças e adolescentes a comerciais de televisão onde
são anunciados alimentos alteram o comportamento de escolha de alimentos no
momento do lanche escolar. Esses dados enfatizam tanto a influência da televisão nas
escolhas alimentares de crianças e adolescentes quanto chamam a atenção para o
papel de um importante determinante ambiental no comportamento alimentar dessa
população.
Educação e cuidado humano: a relação educador/educando e suas implicações
para a formação de indivíduos psicologicamente saudáveis

Modalidade: Simpósio
Mesa: Por uma psicologia humana na dinâmica das relações escolares

Renata Ferrarez Fernandes Lopes (Coordenadora)


Rogério Sousa Pires
Instituição: Faculdade Católica de Uberlândia

Resumo
A educação como parte integrante do pro-jeto humano que se estende no fazer
e transfazer de cada um individual e coletivamente, o individual e o coletivo se
interpenetram formando redes interconectadas. Como seres de possibilidades somos
sujeitos que se relacionam entre si, e o reconhecimento do outro em mim é
fundamental para se trabalhar fenomenologicamente no âmbito da educação, quando
se assume “a postura de busca pelo sentido e significado do que se faz e do que se
escolhe”. Para tanto, uma práxis consciente, clara e comprometida será capaz de dar
fundamentos consistentes para ações eficazes ao se desejar uma formação humana.
E uma práxis educativa sob um olhar fenomenológico “entende a educação como
cuidado com o projeto do humano em suas possibilidades de ser mundano e
temporal”. Trata-se de uma práxis que exige uma atitude vinculada ao mundo-da-vida,
encarnada no mundo, onde estamos inseridos, com experiências próprias. Sendo
assim, a escola é um espaço, um lugar especial que tem “existência” e os entes que
estão aí presentes fazem parte da obra educacional na construção histórico-cultural da
realidade. Por este viés, a escola é o lugar privilegiado da existência, que embaralha-
se com o corpo, pressupõem-se mutuamente, formam uma trama na qual a vida
humana procura estabelecer-se na tessitura de uma rede de significações que
constitui a realidade mundana na qual existimos de modo participativo, seja pela
disposição, familiarização ou intervenção do professor-sendo-com-seus-alunos para
suas realizações. Como resultado, temos a abertura ao professor àquilo que se mostra
à sua consciência, o mundo da educação. Do qual pode dispor na superação da
dicotomização sujeito-objeto, que o impossibilita olhar para o seu aluno, de perceber o
quanto sua realidade escolar pode lhe conferir sentido por meio da vivência das
atividades realizadas nesse mundo, podendo assim, promover a formação de
indivíduos psicologicamente saudáveis.

Palavras-chave: educação, formação humana, relações saudáveis


Efeito de técnicas comportamentais e cognitivas sobre a ansiedade e
desesperança em mulheres com câncer

Modalidade: Simpósio
Mesa: Sentidos da experiência do câncer em mulheres: propostas de avaliação e
intervenção

Renata Ferrarez Fernandes Lopes


Instituição: Instituto de Psicologia - Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
Um dos maiores desafios das múltiplas formas de intervenção
psicoterapêuticas, nas diversas abordagens psicológicas são aqueles ligados a
circunstâncias negativas de vida. A morbidade psicológica associada a doenças
crônicas, em função do estresse contínuo experimentado pelo portador destes tipos de
enfermidade, é um evento complexo inerente a circunstâncias adversas de vida e que
gera muito sofrimento psíquico. Compreender tais circunstâncias e propor métodos
adequados de intervenção constituem metas atuais para o trabalho do psicólogo e de
equipes interdisciplinares. O objetivo deste trabalho foi verificar os efeitos do
relaxamento sobre os níveis de ansiedade e de desesperança de pacientes
diagnosticados com diferentes tipos de câncer e de estadiamento e a importância
desta técnica comportamental para um protocolo de intervenção psicológica cognitivo-
comportamental para estes pacientes. Participaram deste estudo 30 mulheres
diagnosticadas com diferentes tipos de câncer, em diferentes estádios da doença, com
idade média de 40 anos e com liberação médica para treinos de relaxamento. A
amostra foi contatada através de uma ONG (organização não-governamental) que
administra uma casa de hospedagem e acolhimento para mulheres de baixa renda,
portadoras de câncer que fazem tratamento oncológico no Hospital Universitário de
Uberlândia e residem fora da cidade. A intervenção foi feita durante 8 semanas e
incluiu uma entrevista inicial não- diretiva, a aplicação das escalas para o
estabelecimento de linha de base, as técnicas de relaxamento e a reaplicação das
escalas. Os resultados da ANOVA confirmam que o relaxamento foi capaz de baixar
os escores médios do IAB em 9,3 pontos e do IDB em 0,98 ponto, mas este efeito não
se prolongou ao longo das semanas .Uma hipótese para o não prolongamento dos
efeitos diz respeito ao fato de as mulheres permanecerem em tratamento e lidar com
os desafios de uma doença severa como o câncer, podendo suscitar crenças de
vulnerabilidade e perigo, elevando o nível e a manutenção da ansiedade durante o
tratamento, ao mesmo tempo que impede a manutenção dos efeitos do relaxamento
por mais tempo, ou seja, para além das sessões. Uma outra hipótese é que, embora
tenham sido treinadas a usar o relaxamento fora das sessões, elas possam não tê-lo
exercitado o tempo necessário fora da sessão. Conclui-se que o relaxamento pode ser
uma técnica efetiva para compor protocolos de intervenção no tratamento de doenças
crônicas como o câncer, mas ele deve ser acompanhado de outras técnicas que
trabalhem crenças de vulnerabilidade e desesperança.

Palavras-chave: câncer, relaxamento, terapia cognitiva


Eficácia adaptativa de mulheres idosas mastectomizadas por câncer de mama

Modalidade: Simpósio
Mesa: Sentidos da experiência do câncer em mulheres: propostas de avaliação e
intervenção

Cíntia de Jesus Silva


Renata Ferrarez Fernandes Lopes (Coordenadora)
Rita de Cássia Gandini
Instituição: Programa de Pós-Graduação em Psicologia / Instituto de Psicologia /
Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
Os objetivos deste estudo foram o de verificar o grau da eficácia adaptativa e
respectivas variações, por meio da Escala Diagnóstica Adaptativa Operacionalizada
(EDAO e EDAO/R), de mulheres idosas que havia sido mastectomizadas em
decorrência do câncer de mama; além de verificar as pontuações referentes ao
funcionamento psicológico, social e ocupacional obtida pelas mesmas através da
Avaliação Global do Funcionamento (AGF). Para isso participaram 12 pacientes que
estavam sendo atendidas no Setor de Mastologia Malígna do Ambulatório do Hospital
de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia durante o período estipulado para
a coleta de dados. As participantes formaram dois grupos de 6 mulheres, sendo um
deles constituído por aquelas mastectomizadas já na velhice (G1) e o outro pelas
idosas na época em que participaram da pesquisa, mas mastectomizadas por câncer
de mama antes dos 60 anos de idade (G2). Foram verificadas diferenças
estatisticamente significantes entre os dois grupos, quando da comparação segundo
EDAO/R; EDAO/R ora com o setor da produtividade redefinida (Pr/R) ou não (Pr), e
ora com o setor orgânico (Or); Micro-Fatores positivos considerando apenas o setor Pr
ou o conjunto dos quatro setores do funcionamento da personalidade, sendo que em
todas as análises o G2 apresentou-se melhor em comparação com o G1. Além disso,
foram encontradas correlações positivas em alguns estudos intra grupos: para o G1,
quando do somatório da adequação dos setores Afetivo-Relacional - A-R e Pr segundo
a EDAO X adaptação segundo EDAO/R e, adaptação segundo EDAO X EDAO/R. Já
nos seguintes estudos as correlações positivas foram verificadas tanto para o G1
quanto para o G2: pontuação alcançada pela AGF X somatório da adequação dos
setores A-R, Pr, S-C de acordo com a EDAO; pontuação obtida pela AGF X adaptação
segundo EDAO. Concluiu-se que a EDAO foi o instrumento mais sensível dentre os
três utilizados nessa pesquisa para com a população estudada, sendo que as outras
duas puderam complementar os resultados alcançados por aquela. Sugere-se que
novas pesquisas semelhantes a esta sejam desenvolvidas com um número maior de
sujeitos para que a população estudada possa ser beneficiada com atendimentos
principalmente psicológicos no setor de saúde, mais eficazes e adequados.

Palavras-chave: câncer de mama, mulheres idosas, eficácia adaptativa, avaliação


global do funcionamento

Trabalho Integral

Introdução
O Instituto Nacional de Câncer (INCA) estima 49.240 novos casos de câncer de mama
entre mulheres para o ano de 2010 no Brasil (BRASIL, 2010). O câncer de mama
geralmente acomete as mulheres em idades mais avançadas, sendo que para que
haja um controle das taxas de morbidade e mortalidade dessa população a detecção
precoce é a estratégia mais apropriada (FERRAZ, 2006).

Objetivos
Objetivo Geral: verificar, pela EDAO e EDAO/R, o grau da eficácia adaptativa e
respectivas variações de mulheres mastectomizadas por câncer de mama, com 60
anos ou mais, atendidas no Setor de Mastologia Malígna – HC-UFU; verificar o
funcionamento psicológico, social e ocupacional das participantes por meio da AGF.
Objetivos Específicos: verificar a eficácia adaptativa de mulheres idosas
mastectomizadas por câncer de mama; comparar a eficácia adaptativa segundo EDAO
e EDAO/R; correlacionar o somatório dos valores da adequação dos setores A-R e Pr
segundo EDAO e EDAO/R, assim como a eficácia adaptativa segundo EDAO e
EDAO/R; correlacionar as variações dos graus de adaptação segundo EDAO e
EDAO/R; correlacionar a pontuação obtida pela AGF ora com a eficácia adaptativa das
participantes segundo EDAO, ora com o somatório da adequação dos setores: A-R, Pr
e S-C
Método
Fizeram parte do estudo seis pacientes mastectomizadas por câncer de mama já na
fase da velhice, ou seja, com 60 anos ou mais, as quais eram atendidas no
Ambulatório de Mastologia Malígna (HC-UFU), local escolhido para a realização da
coleta de dados. As participantes foram selecionadas aleatoriamente por meio da
checagem dos prontuários médicos no período em que a pesquisadora se dispôs para
realizar as entrevistas, as quais foram gravadas por meio de um gravador, transcritas
e depois de analisadas, as fitas foram destruídas. Para o início da coleta de dados, o
trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob o Protocolo Registro
CEP/UFU 198/09.

Instrumentos
Para avaliar a adaptação e qualidade de vida das participantes utilizou-se a EDAO,
EDAO/R e AGF. Os diagnósticos alcançados por meio da EDAO são realizados
através do princípio adaptativo de acordo com a sua adequação. Esta escala foi
escolhida pelo fato de avaliar quantitativamente o setor Or, o qual atribui-se relevância
no contexto de vida de pessoas com algum prejuízo orgânico. A adequação está
relacionada às respostas do sujeito em busca da solução de problemas para cada um
dos quatro setores de funcionamento da personalidade: Afetivo-Relacional (A-R);
Produtividade (Pr); Sócio-Cultural (S-C); e Orgânico (Or). Uma resposta considerada
adequada, deve solucionar o problema existente; trazer satisfação ao indivíduo; e não
provocar conflitos intra e/ou extra psíquico. A pouco adequada, deve solucionar um
determinado problema, não trazer satisfação ao sujeito e não provocar conflito intra
e/ou extra psíquico ou solucionar um determinado problema, trazer satisfação ao
sujeito e provocar conflitos intra e/ou extra psíquico. Já a resposta pouquíssima
adequada traz a solução do problema, não satisfaz o individuo e provoca conflitos intra
e/ou extra psíquico (SIMON, 1989). A adaptação é o conjunto de respostas dadas pela
pessoa, em diferentes momentos frente a situações que o modificam, a fim de que a
sua organização interna seja mantida o mínimo possível para assegurar sua
compatibilidade com a vida. Para Simon (1989), o sujeito em crise é aquele que não
consegue encontrar uma resposta para a solução do problema (SIMON, 1989).
Com a proposta de redefinição da EDAO (EDAO/R), Simon (1997) propôs a
manutenção da análise qualitativa de todos os setores que compõe a EDAO e a
avaliação quantitativa somente para os setores A-R e Pr, considerados por ele os dois
setores clinicamente mais relevantes na personalidade de uma pessoa. A classificação
da adequação de cada setor da EDAO recebe pontuação 3 para adequado, 2 para
pouco adequado e 1 para pouquíssimo adequado, podendo a adaptação variar de 4 à
12 pontos. Na EDAO/R a pontuação para o setor A-R é igual à proposta pela EDAO e
para o setor Pr passa a ser: 2 para adequado, 1 para pouco adequado e 0,5 para
pouquíssimo adequado. A classificação quantitativa da EDAO/R varia de 1,5 à 5
pontos.
A AGF é uma escala relatada no Eixo V do DSM-IV-TR no Anexo I (2002),
“dividida em 10 faixas de funcionamento” (p. 64), e atribui uma pontuação de 1 à 100
para cada participante. A escala refere-se ao funcionamento atual psicológico,
ocupacional e social de uma pessoa. Cada faixa de 10 pontos é descrita por duas
partes, sendo que a primeira está relacionada à gravidade dos sintomas e a segunda
ao funcionamento propriamente dito.

Resultado
Primeiramente se caracterizará a amostra com alguns dados pessoais bem como a
classificação da eficácia adaptativa segundo EDAO e EDAO/R; e a pontuação obtida
pela AGF. Em seguida será apresentado os estudos e resultados estatísticos.

TABELA 1- CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA, EFICÁCIA ADAPTATIVA SEGUNDO


EDAO E EDAO/R, E PONTUAÇÃO POR MEIO DA AGF

Nome Idade Estado Nível Profissão Tipo de Adaptação Adaptação AGF


fictício civil escolar cirurgia segundo segundo Pont.
EDAO EDAO/R
Azaléia 60 divorcia ensino do lar Quadra Adaptação Adaptação 65
anos da médio n. não eficaz ineficaz
complet moderada moderada
o sem crise sem crise,
grupo III grupo 3
Caméli 79 viúva analfab aposenta Mastec. Adaptação Adaptação 80
a anos eta da não ineficaz,
eficaz, leve sem
moderada crise, grupo
sem crise, 4
grupo III
Dália 68 solteira ensino aposenta Mastec. Adaptação Adaptação 50
anos fundam da não eficaz ineficaz
ental severa grave com
incompl com crise crise, no
eto no setor setor Or,
Or, grupo grupo 5-C
VI
Hortênc 67 casada ensino do lar Quadra Adaptação Adaptação 75
ia anos fundam n. não eficaz ineficaz
ental moderada, leve, sem
complet sem crise, crise, grupo
o grupo III 2
Íris 70 casada ensino do lar Mastec. Adaptação Adaptação 60
anos fundam não ineficaz
ental eficaz, moderada,
complet severa, sem crise,
o sem crise, grupo 3
grupo V
Jasmim 79 casada ensino aposenta Quadra Adaptação Adaptação 51
anos médio da n. não eficaz ineficaz
incompl severa, severa, sem
eto sem crise, crise, grupo
grupo V 4

(Quadran.) Quadrantectomia.
(Mastectomia) Mastec.
(Pont.) Pontuação

- Comparação do grau da eficácia adaptativa e respectivas variações de acordo a


EDAO e EDAO/R:
Com interesse em verificar a existência ou não de diferenças, estatisticamente
significantes, entre o total dos pontos obtidos pelas participantes por meio da EDAO e
EDAO/R, comparando-se o grau da eficácia adaptativa e respectivas variações, foi
aplicado o teste de Wilcoxon (SIEGEL, 1975).
O nível de significância foi estabelecido em 0,05 em um teste bilateral.
O valor da probabilidade encontrada foi 0,257, indicando que não houve
diferenças, estatisticamente significantes, entre o grau da eficácia adaptativa e
respectivas variações segundo EDAO e EDAO/R.
Verificou-se uma relação de equivalência entre o grau da eficácia adaptativa e
respectivas variações segundo a classificação das participantes pela EDAO e pela
EDAO/R.
A EDAO e EDAO/R foram instrumentos eficazes a fim de verificar a qualidade
de vida (QV) das mulheres idosas mastectomizadas por câncer de mama. No estudo
de Robb et al (2007) os autores trabalharam com dois grupos de mulheres com câncer
de mama, sendo um composto pelas idosas e o outro por mulheres jovens, e foi
verificado que as mulheres idosas tiveram menores medidas de escores quanto ao
humor, fadiga e saúde do que as outras. Os autores sugeriram que a menor QV
admitida pelas participantes idosas poderia estar relacionada com o fato das mesmas
poderem estar apresentando doenças comuns e esperadas entre a população com 60
anos ou mais (ROBB et al; 2007). Em outro trabalho, as mulheres mais idosas foram
as que apresentaram maior necessidade de atenção quanto aos aspectos
relacionados às dores e limitações físicas, já as mais jovens tinham maior demanda no
campo emocional (MANGANIELLO, 2008).

- Correlação entre a adequação dos setores A-R e Pr (EDAO) e A-R/R e Pr/R


(EDAO/R); e eficácia adaptativa segundo EDAO e EDAO/R
Com o objetivo de verificar a existência ou não de correlações, estatisticamente
significantes entre os valores da adequação dos setores A-R, Pr segundo EDAO e os
valores da adequação dos setores A-R/R, Pr/R segundo EDAO/R; e entre adaptação
segundo EDAO e segundo EDAO/R; obtidos pelas participantes, foi aplicado o
Coeficiente de Correlação por Postos de Spearman (SIEGEL, 1975), às séries de
dados, analisadas duas a duas.
O nível de significância foi estabelecido em 0,05, em um teste bilateral.
Os resultados estão demonstrados na Tabela 2.

TABELA 2 -VALORES DE RS E DAS PROBABILIDADES A ELES ASSOCIADAS,


ENCONTRADOS QUANDO DA APLICAÇÃO DO COEFICIENTE DE
CORRELAÇÃO POR POSTOS DE SPEARMAN ÀS PONTUAÇÕES
OBTIDAS POR MEIO DOS VALORES DA ADEQUAÇÃO DOS
SETORES A-R, PR SEGUNDO EDAO E OS VALORES DA
ADEQUAÇÃO DOS SETORES A-R/R, PR/R SEGUNDO EDAO/R;
ADAPTAÇÃO SEGUNDO EDAO E SEGUNDO EDAO/R; OBTIDOS
PELAS PARTICIPANTES, ANALISADAS AS SÉRIES DE DADOS,
DUAS A DUAS.

Variáveis Analisadas Valores de rs Probabilidades


Somatório da pontuação proveniente da
adequação dos setores A-R e Pr pela
0,985 0,000*
EDAO X Valores da adequação dos
setores A-R/R, Pr/R pela EDAO/R
EDAO X EDAO/R – Adaptação 0,979 0,001*
(*) p < 0,05

Foram encontradas correlações, estatisticamente significantes, entre os valores


acima estudados, ou seja, uma ligação de dependência entre as variáveis estudadas.
Isto indica que, à medida que os valores de uma das variáveis aumentam, os da outra
também aumentam; à medida em que os valores de uma das variáveis diminuem, os
da outra também diminuem. Sendo assim, à medida que o somatório da pontuação
proveniente da adequação dos setores A-R e Pr pela EDAO aumenta, os valores da
adequação dos setores A-R/R, Pr/R pela EDAO/R também aumenta; e vice-versa.
Além disso, à medida que os valores da adaptação segundo EDAO aumenta, os de
EDAO/R também aumenta; e a medida que a eficácia adaptativa de acordo com
EDAO diminui, a de EDAO/R também diminui.
Apesar da EDAO/R não levar em consideração a avaliação quantitativa do
setor Or, para as pacientes idosas e mastectomizadas por câncer de mama, a
repercussão do câncer de mama no organismo da mulher pode apontar uma melhor
ou pior qualidade de vida. Por este motivo acredita ser importante a utilização de
escalas que avaliem o referido setor. Hansen (2008) concluiu que as mulheres idosas
com câncer de mama apresentam melhor QV após o diagnóstico e submissão aos
tratamentos indicados “em função do bom relacionamento e apoio familiar, da melhora
da saúde física, da fé e principalmente da valorização da vida” (p. 46). No trabalho de
Dalamaria (2008) as mulheres idosas com câncer de mama que apresentaram melhor
QV foram aquelas que não precisaram se submeter à quimioterapia, radioterapia e à
cirurgia da mama.
- Correlação entre os graus de adaptação segundo a EDAO e EDAO/R:
Com o objetivo de verificar a existência ou não de correlações, estatisticamente
significantes entre as classificações da adaptação de acordo com a EDAO e EDAO/R,
obtidos pelas participantes, foi aplicado o Coeficiente de Correlação por Postos de
Spearman (SIEGEL, 1975), às séries de dados, analisadas duas a duas.
O nível de significância foi estabelecido em 0,05, em um teste bilateral.
Para a aplicação deste Coeficiente, as categorias foram numeradas,
considerando-se a ordem decrescente do grau da adaptação. A classificação da
adaptação segundo a EDAO foi transformada da seguinte forma: Adaptação Eficaz
(AE), ordem 3; Adaptação Não-Eficaz Moderada (ANEM), ordem 2; e Adaptação Não-
Eficaz Severa (ANES), ordem 1. Já a classificação da adaptação de acordo com a
EDAO/R foi convertida assim: Adaptação Eficaz (AE), ordem 5; Adaptação Ineficaz
Leve (AIL), ordem 4; Adaptação Ineficaz Moderada (AIM), ordem 3; Adaptação
Ineficaz Severa (AIS), ordem 2; Adaptação Ineficaz Grave (AIG), ordem 1.
Classificações da adaptação: 3 / 2 / 1 X 5 / 4 / 3 / 2 / 1.
O valor de rs encontrado foi = -0,577 e a probabilidade a ele associada foi p = 0,230;
indicando que não houve correlação, estatisticamente significante, entre as duas
séries de valores, isto é os valores admitidos para a classificação da adaptação pela
EDAO não apresentaram ligação de dependência com a classificação da adaptação
pela EDAO/R. Supõe-se que esse resultado foi verificado já que o número de sujeitos
pode ter sido insuficiente para este estudo, à medida que para o aspecto teórico AE /
EDAO é correspondente à classificação de AE/ EDAO/R; assim como ANES / EDAO
corresponde para AIG / EDAO/R; e ANEM / EDAO para AIM / EDAO/R. Além disso,
AIL / EDAO/R corresponde à uma avaliação entre AE e ANEM segundo EDAO; e AIS /
EDAO/R corresponde à uma classificação entre ANEM e ANES por meio da EDAO.

- Correlação entre os valores da AGF e os valores da adequação dos quatro setores


para cada grupo:
Com o objetivo de verificar a existência ou não de correlações, estatisticamente
significantes entre os valores da Avaliação Global do Funcionamento (AGF) e os
valores da adequação dos setores A-R, Pr e S-C segundo EDAO; e entre os valores
da AGF e a adaptação segundo a EDAO; obtidos pelas participantes, foi aplicado o
Coeficiente de Correlação por Postos de Spearman (SIEGEL, 1975), às séries de
dados, analisadas duas a duas.
O nível de significância foi estabelecido em 0,05, em um teste bilateral.
Os resultados estão demonstrados na Tabela 3.

TABELA 3 - VALORES DE RS E DAS PROBABILIDADES A ELES ASSOCIADAS,


ENCONTRADOS QUANDO DA APLICAÇÃO DO COEFICIENTE
DE CORRELAÇÃO POR POSTOS DE SPEARMAN ÀS
PONTUAÇÕES OBTIDAS POR MEIO DA ESCALA AGF E AOS
VALORES DA ADEQUAÇÃO DOS SETORES A-R, PR E S-C
SEGUNDO EDAO; E ENTRE OS VALORES DA AGF E A
ADAPTAÇÃO SEGUNDO A EDAO; OBTIDOS PELAS
PARTICIPANTES, ANALISADAS AS SÉRIES DE DADOS, DUAS A
DUAS.

Variáveis Analisadas Valores de rs Probabilidades


Pontuação da escala AGF X Somatório
da pontuação proveniente da
0,899 0,015*
adequação dos setores A-R, Pr, S-C
segundo EDAO
Pontuação da escala AGF X Adaptação
0,986 0,000*
pela EDAO
(*) p < 0,05

Foram encontradas correlações positivas, estatisticamente significantes, entre


os valores das duas análises estudadas. Isto indica que, à medida que os valores de
uma das variáveis aumentam, os da outra também aumentam; à medida em que os
valores de uma das variáveis diminuem, os da outra também diminuem. Sendo assim,
à medida que a pontuação da escala AGF aumenta e/ou diminui, o mesmo acontece
com o somatório da pontuação proveniente da adequação dos setores A-R, Pr, S-C
segundo EDAO. Essa mesma correlação foi demonstrada com o estudo feito entre a
pontuação da escala AGF e a adaptação pela EDAO. Isto é, foi verificada uma ligação
de dependência entre os valores estudados. Apesar da importância e reconhecimento
internacional da escala de Avaliação Global do Funcionamento, autores como
Goldman et al. já em 1992 abordavam sobre algumas limitações apresentadas pela
mesma e sugeriam que tanto as considerações favoráveis quanto as desfavoráveis
vinculadas à condição orgânica do sujeito deveriam ser pautadas com o seu
funcionamento social e ocupacional. Trabalhos recentes como o de Aas (2010)
ressalta sobre a importância de se realizar novas pesquisas que favoreçam o
desenvolvimento e melhoria da escala em questão.

Considerações finais
Quando da comparação entre EDAO e EDAO/R mostrou-se equivalência entre elas. A
EDAO/R e a AGF devem ser utilizadas em conjunto no estudo envolvendo a
população feminina idosa mastectomizada por câncer de mama, à medida que são
escalas que apresentam limitações quanto à abrangência da avaliação dos diversos
contextos de vida em que as pessoas estão inseridas. Contudo, são instrumentos que
podem ser auxiliados pela EDAO, por ser esta uma escala sensível para verificar o
grau da eficácia adaptativa e respectivas variações de mulheres idosas submetidas à
mastectomia, de forma mais ampla e completa, à medida que através dos quatro
setores de funcionamento da personalidade ela consegue abarcar além da avaliação
qualitativa os aspectos quantitativos referentes à todos setores. Salienta-se a
necessidade de novos estudos semelhantes à este envolvendo um maior número de
sujeitos para que por meio da ampliação de conhecimento a respeito das relações
pessoais, atividades laborais, vivências sociais, e limitações orgânicas de mulheres
idosas mastectomizadas por câncer de mama, políticas públicas específicas possam
ser melhor desenvolvidas à essa população.

Referências
AAS, IH Monrad. Global Assessment of Functioning (GAF): properties and frontier of
current knowledge. Ann Gen Psychiatry. V.9, May 2010. Disponível em:<
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2880316/>. Acesso em: 08 ago. 2010

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2010.

DALAMARIA, Julcinéia Miguel. Avaliação da qualidade de vida em mulheres


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Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS, Porto Alegre, 2008. Disponível
em: <http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1938>. Acesso em: 26
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Cláudia Dornelles; 4. Ed. Ver. Porto Alegre: Artmed, 2002.

FERRAZ, Lúcia Teixeira Lopes. O câncer de mama em mulheres envelhescentes e


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São Paulo, São Paulo, 2006. Disponível em: <http://
www.cipedya.com/web/FileDownload.aspx?IDFile=158216>. Acesso em: 10 set. 2008.

GOLDMAN, H.H.; SKODOL, A.E.; LAVE, T.R. - Revising axis V for DSM-IV: a review
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HANSEN, Dinara. Qualidade de vida de idosas após o tratamento cirúrgico de


câncer de mama. Dissertação (Mestrado em Gerontologia Biomédica) Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008. Disponível em:
<http://tede.pucrs.br/tde_arquivos/14/TDE-2009-03-12T142543Z-
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MANGANIELLO, Adriana. Sexualidade e qualidade de vida da mulher submetida à


mastecomia. Dissertação (Mestrado em Enfermagem). Universidade de São Paulo,
São Paulo, 2008. Disponível em:<
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/diaadia/diadia/arquivos/File/conteudo/artigos_te
ses/2010/Biologia/dissertacoes/2mastectomia.pdf>. Acesso em: 26 jul. 2010.

ROBB, Claire.,et al (2007). Impact of breast cancer survivorship on quality of life in


older women. Critical Reviews in Oncology/hematology. v. 62, p.84-91, Apr. 2007.
SIMON, Ryad. Psicologia clínica preventiva: novos fundamentos. São Paulo:
EPU, 1989.

_______ Proposta de redefinição da EDAO (Escala Diagnóstica Adaptativa


operacionalizada). Boletim de Psicologia, v. 47, n. 107, p. 85-93, 1997.
Grupo terapia para relaxamento, entendimento, visualização e enfrentamento
(g.r.e.v.e ) e seus efeitos numa amostra de pacientes mulheres com câncer

Modalidade: Simpósio
Mesa: Sentidos da experiência do câncer em mulheres: propostas de avaliação e
intervenção

Adriana Pereira de Sousa


Jodi Dee Hunt Ferreira do Amaral
Renata Ferrarez Fernandes Lopes (Coordenadora)
Instituição: Psicóloga do Setor de Psicologia da Saúde e Escola Hospitalar do
Hospital das Clinicas da Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
Trata-se de uma comunicação de pesquisa na qual foi utilizada a abordagem
cognitivo-comportamental em um grupo de mulheres com câncer, passando por um
contexto de sofrimento real na vida. Nove pessoas foram convidadas a participar,
inicialmente. Seis realizaram a entrevista e responderam na etapa inicial os Inventários
de Beck de Depressão (BDI), Ansiedade (BAI) e Desesperança (BHS). Os escores
médios do grupo nessa primeira avaliação foram de 27,16 (BDI), 30,5 (BAI) e 7,83
(BHS) pontos. Estes resultados, em comparação a outro estudo brasileiro com
pacientes em condição médico-clínico foram todos mais altos, com exceção apenas do
BHS, quando comparado aos escores de portadores de HIV. Cinco mulheres iniciaram
efetivamente o grupo sendo que quatro pacientes participaram até o final. Realizou-se
um total de doze sessões e as pacientes foram capazes de identificar exemplos de
estresse cotidianos, acessaram o modelo cognitivo, realizaram exercícios de
respiração, relaxamento e visualização, identificaram distorções cognitivas, levantaram
pensamentos alternativos, confeccionaram cartões de enfrentamento e estabeleceram
metas pessoais. A procura e realização de exercício físico, bem como outras
atividades em prol da saúde e a formação de vínculos sociais podem ser apontadas
com fatores positivos alcançados no grupo. Ao final, as escalas Beck foram
reaplicadas e os escores médios do grupo foram de 19,75 (BDI), 28,5 (BAI) e 4,5
(BHS) pontos. Sugere-se a necessidade de mais estudos com um maior número de
pacientes para averiguar se pacientes oncológicos apresentam mais sintomas de
depressão, ansiedade e desesperança do que outras populações em tratamento
médico. Considera-se também a necessidade de um programa continuado da
intervenção grupal para esses e outros pacientes a fim de promover mudanças mais
consistentes no que tange a desesperança e distorções cognitivas.

Palavras-chave: câncer, grupo, hospital, terapia cognitivo-comportamental


Identificação e avaliação de seus determinantes em escolares

Modalidade: Simpósio
Mesa: Obesidade infantil

Angela Maria Miziara


Celia Vectore
Instituição: nstituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
Trata-se de um estudo que teve como objetivo conhecer como as crianças reagem à
sua própria obesidade e às suas possíveis intercorrências no ambiente escolar. Para
tanto, foram avaliadas 622 crianças, no estágio de vida de seis a onze anos e onze
meses, oriundas de uma escola pública, do interior de Minas Gerais. Num primeiro
momento, as crianças foram submetidas à avaliação antropométrica. A seguir, foram
classificadas como eutróficas, pré-obesas ou obesas, sendo identificadas 60 crianças
obesas; destas, foram escolhidas aleatoriamente, 32 para participar do estudo.
Contudo, apenas 19 participaram efetivamente de todas as etapas da pesquisa. Foram
realizadas reuniões com os pais e com os professores das crianças. As crianças
participantes foram divididas em dois grupos (10 alunos no turno da manhã e 9 alunos
à tarde), sendo estipulado duas horas e trinta minutos para os encontros com
atividades lúdicas e cinqüenta minutos, em média, para a aplicação dos testes. Foram
realizados sete encontros em cada grupo, com o seguinte conteúdo; (1)
Estabelecimento de rapport entre a pesquisadora e as crianças; (2) realização de
atividades lúdicas com temas direcionados à obesidade; (3) aplicação do Teste DFH
III (Desenho da Figura Humana), em que se avalia o desenvolvimento cognitivo; (4)
utilização de fantoches para obtenção de histórias vividas na família; (5) realização de
atividades a partir das respostas a um questionário sobre sentimentos. (6) aplicação
da Escala de Stress Infantil – ESI e (7) reflexão junto às crianças acerca dos
encontros. Após os procedimentos, procedeu-se à análise dos resultados e os
principais achados foram: A) em relação à família: a maioria das crianças tinha
genitores obesos. B) em relação aos professores: relatam a presença de
comportamentos ofensivos do grupo em relação às crianças obesas e, quando
percebem, repreendem. C) em relação às crianças: cerca de 80% das crianças
participantes dizem sentir muita raiva, quando são chamadas por apelidos
depreciativos e sentem vontade de agredir o ofensor. Quanto ao potencial cognitivo,
não foi encontrada nenhuma relação com a obesidade. Em relação aos indicadores
de estresse, 26% obtiveram altos índices, sendo um dado preocupante, devido às
conseqüências que podem acometer tanto a saúde física, quanto mental. Embora as
conclusões do estudo não possam ser generalizadas, lança luzes sobre vários
aspectos afetivos que envolvem a obesidade. Além disso, sugere a adequação de
trabalhos conjuntos, tanto avaliativos quanto de intervenção por profissionais da
Nutrição e da Psicologia.

Palavras-chave: crianças, obesidade, psicologia, nutrição


Mulheres portadoras de câncer: como desenham no teste wartegg

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aplicações de diferentes técnicas gráficas de avaliação psicológica em
psicologia da saúde

Ana Paula Mucha


Helena Rinaldi Rosa
Paulo Francisco de Castro (Coordenador)
Instituição: Departamento de Psicologia Clínica – UNESP / Universidade de Taubaté /
Universidade Guarulhos

Resumo
O câncer é um importante problema de saúde pública em países desenvolvidos
e em desenvolvimento. Este trabalho teve como objetivo levantar as características
dos desenhos no teste Wartegg de mulheres com câncer e assim contribuir para a
compreensão dos aspectos psicológicos envolvidos na doença. Foram analisados os
desenhos de 10 mulheres portadoras de CA e 10 mulheres não portadoras, na faixa
etária de 40 a 60 anos, sendo verificada a diferença entre os dois grupos. O primeiro
grupo foi composto por pacientes de dois hospitais do interior do estado de São Paulo
e o segundo, por voluntárias que realizaram o teste na clínica escola da universidade.
A maior diferença entre os dois grupos foi no campo 4: enquanto todas (10) sem
câncer indicaram conseguir lidar com suas angústias, seis mulheres com CA
sugeriram não estarem conseguindo elaborar essas questões. Não houve diferenças
nos campos 3 e 6 sendo que, no 3, somente um sujeito em cada grupo revelou estar
voltado para o futuro e pensando em crescimento pessoal; uma hipótese, além do
pequeno número de sujeitos que torna difícil obter dados conclusivos, seria
relacionada à idade dos sujeitos, já não tão jovens. No campo 6, oito em cada um dos
grupos responderam adequadamente ao estímulo (bons recursos intelectuais não
comprometidos com a doença). No campo 5 praticamente metade em cada grupo
atendeu ao estímulo, metade não, o que pode também estar relacionado à idade dos
sujeitos; pode também indicar que a doença não está afetando a energia vital das
portadora de CA mais do que a das mulheres sem a doença. Houve diferenças entre
os grupos nos campos 1, 2, 7 e 8, em todos com número menor de sujeitos que
responderam ao estímulo adequadamente no grupo de mulheres com câncer,
sugerindo que, com a doença, os sujeitos sentem-se menos centrados (campo 1) e
com menos condições de estabelecer um bom relacionamento tanto afetivo (campo 2)
e pessoal (campo 7) quanto social (campo 8) e menos voltados às questões do mundo
externo. A qualidade global dos desenhos do grupo das mulheres com câncer era
bem inferior, confirmando estes resultados a respeito das dificuldades com a doença.
Assim, o Teste Wartegg mostrou-se sensível para indicar algumas das características
psicológicas presentes em mulheres portadoras de câncer.

Palavras-chave: avaliação psicológica, teste wartegg, oncologia e psicologia,


oncologia e mulheres
O Acompanhamento Psicológico na Saúde do Trabalhador: um novo
direcionamento para o trabalho do psicólogo na empresa

Modalidade: Simpósio
Mesa: Psicologia e Saúde: possibilidades de atuação

Maria Isabel Pinto Garcia


Instituição: Companhia Estadual de Habitação do Rio de Janeiro – CEHAB-RJ

Resumo
Introdução: O início da Psicologia da Saúde na empresa delineou-se, quando a
psicóloga atuante no RH vislumbrou interesse pela Saúde do Trabalhador, realizando
acompanhamento psicológico aos empregados no local de trabalho e nas visitas
domiciliares e hospitalares aos que se encontravam doentes; estendendo-se ainda o
trabalho profissional aos familiares e a outros cidadãos que buscam atendimento.
Essa expansão se tornou um argumento para a instalação de um pequeno gabinete
somente para o trabalho da psicóloga que conscientizou a Diretoria, ser esse, um
trabalho de Políticas Públicas. Os Referenciais teórico-práticos que norteiam o
cotidiano do trabalho executado são a Subjetividade, a Gestalt e a Humanização, que
juntos permitem, ao profissional, o exercício de uma prática positiva e participante nas
demandas funcionais de Saúde x Doença. Metodologia: Por se tratar de uma prática
que leva em conta principalmente a valorização da construção do sujeito, o método
utilizado é a prática qualitativa descritiva. Objetivo: Contribuir para a Promoção da
Saúde, Elevar a auto-estima e Melhorar a qualidade de vida não somente dos
empregados, mas de todos os cidadãos atendidos. Contextualização: As visitas
domiciliares e hospitalares são, juntamente com o Acompanhamento psicológico, um
avanço inovador na empresa, onde saúde era somente, não apresentar sinais visíveis
de doença; etapa vencida pelo saber fazer profissional, que garantiu ainda, um espaço
para o psicólogo. Resultados: A satisfação dos empregados atendidos; O
reconhecimento do trabalho pelo corpo funcional e a Humanização como ele é
desenvolvido, vem apontando resultados satisfatórios no reconhecimento dos direitos
do cidadão pela empresa de modo geral. Considerações finais: Temos em conta que
o lugar do psicólogo é a área de interesse onde ele está atuando e que seu trabalho
se define basicamente no campo das idéias. Trabalhar a Clínica na empresa,
direcionar seu foco para a Saúde do Trabalhador e utilizar como recurso, além dos
atendimentos, as visitas, foi uma vertente encontrada para inovar na prática, o
compromisso social da psicóloga, que trabalha ainda, os aspectos sócio-econômico,
ambiental e familiar; fazendo emergir uma Psicologia da Saúde, cujo foco é a saúde
das pessoas em sua amplitude; e não mais, a saúde como ausência de doença.
O Modelo de Crenças em Saúde e a adesão aos cuidados com a saúde
cardiovascular

Modalidade: Simpósio
Mesa: Crenças em saúde e doenças crônicas

Maria Geralda Viana Heleno


Marilia Ferreira Dela Coleta
Marília Martins Vizzotto
Instituição: Universidade Metodista de São Paulo / Instituto de Psicologia,
Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
O Modelo de Crenças em Saúde é considerado um dos mais utilizados para o
estudo de comportamentos de saúde, sendo formado basicamente por quatro
dimensões: Susceptibilidade Percebida e Severidade percebida em relação à doença,
Benefícios e Barreiras percebidas nos comportamentos de saúde. Um primeiro estudo,
com 50 indivíduos do sexo masculino, mostrou que as crenças da amostra sobre
diversos comportamentos de saúde cardiovascular eram favoráveis à adesão,
entretanto, a prática ficava muito aquém do desejável e era inconsistente com suas
próprias crenças. No segundo estudo, com 71 indivíduos hipertensos e 71 enfartados,
foram feitas análises de regressão múltipla para as variáveis do MCS, incluindo no
modelo variáveis pessoais, clínicas e motivacionais, tendo como variável dependente
treze comportamentos de saúde cardiovascular. Os resultados mostraram que
“Barreiras Percebidas” foi, entre as crenças em saúde e entre as demais variáveis do
modelo proposto no estudo, a que apresentou melhor poder preditivo dos
comportamentos de saúde cardiovascular. A “severidade do enfarte” foi preditora nas
análises dos dois grupos, sugerindo que a percepção de severidade da doença é uma
variável importante para a adesão de doentes crônicos. A ”susceptibilidade ao enfarte”
foi preditora somente na análise de adesão ao tratamento medicamentoso pelos
sujeitos enfartados. A percepção de “benefícios” demonstrou ser uma condição
necessária para a adesão, mas não suficiente, dado que nas diversas fases de coleta
de dados, havia concordância dos sujeitos sobre os benefícios dos comportamentos,
mas não havia adesão e a razão dada era quase sempre uma barreira aos
comportamentos. Uma revisão de 29 estudos publicados entre 1974 e 1984 mostrou
que os melhores resultados foram obtidos com a variável “barreiras”, seguindo-se
“benefícios”, “susceptibilidade” e “severidade”, nesta ordem. É possível concluir que,
ao se planejar estudos com o MCS, devem ser considerados a distinção entre
comportamento na saúde e na doença, a gravidade da doença estudada, o tipo de
tratamento a que o sujeito está submetido, a presença de sintomas, a natureza do
comportamento, o grau em que o comportamento está relacionado ao hábito e em que
é percebido como relacionado à saúde, que tipo de custos envolve, quais os
benefícios obtidos, em quanto tempo é possível perceber os resultados da adesão. As
mesmas questões se aplicam ao tomar decisões sobre procurar o médico, seguir um
tratamento, fazer uma cirurgia ou adotar um hábito de saúde.

Palavras-chave: crenças em saúde, adesão, enfarte

Trabalho Integral

Introdução
O Modelo de Crenças em Saúde (Health Belief Model) foi desenvolvido no início
dos anos 50 por um grupo de psicólogos sociais do Serviço de Saúde Pública dos
Estados Unidos buscando explicar porque as pessoas não se preveniam corretamente
contra certas doenças para as quais já haviam testes ou vacinas (Janz e Becker,
1984).
O modelo foi originalmente formulado por Hochbaum, Leventhal, Kegeles e
Rosenstock, e publicado por Rosenstock em 1966 visando a compreensão da ação
preventiva, porém, nos anos que se seguiram foi aplicado a comportamentos
relacionados à manutenção da saúde em geral, incluindo a procura do diagnóstico e o
atendimento correto às recomendações médicas. Em 1974, em uma edição especial
da revista “Health Education Monographs”, totalmente dedicada ao Modelo de Crenças
em Saúde, Rosenstock (1974a, 1974b) apresenta suas quatro dimensões principais,
aqui reproduzidas de Dela Coleta (2003, 2004):
Susceptibilidade percebida - refere-se à percepção subjetiva do risco pessoal de
contrair uma doença;
Severidade percebida - a gravidade ou seriedade da doença pode ser avaliada
tanto pelo grau de perturbação emocional criada ao pensar na doença quanto pelos
tipos de conseqüências que a doença pode acarretar (dor, morte, gasto material,
interrupção de atividades, perturbações nas relações familiares e sociais, etc.);
Benefícios percebidos - referem-se à crença na efetividade da ação e à
percepção de suas conseqüências positivas;
Barreiras percebidas - os aspectos negativos da ação são avaliados em uma
análise do tipo custo-benefício, considerando possíveis custos de tempo, dinheiro,
esforço, aborrecimentos, etc.
Segundo a formulação original do modelo (Dela Coleta, 1995, 2003, 2004), os
níveis combinados de susceptibilidade e de severidade percebidas na doença
resultam no potencial para a ação, enquanto a modalidade de ação é escolhida em
função da percepção dos benefícios menos as barreiras percebidas nas alternativas
comportamentais. Também fazem parte do MCS alguns estímulos que provocam o
processo de tomada de decisão, que podem ser um sintoma ou a influência da família,
amigos, ou meios de comunicação.
Além destes, fatores biográficos, psicossociais e estruturais podem afetar a
percepção individual influenciando indiretamente a ação final.
A partir da ampliação do MCS para ser aplicado aos comportamentos de saúde
de modo geral, incluindo principalmente a variável motivacional, surgem diversos
estudos nos anos seguintes, a maioria utilizando suas quatro variáveis básicas. Neste
sentido, a primeira revisão de Janz e Becker (1984) cobriu 46 estudos desenvolvidos
entre 1974 e 1984, sendo 24 aplicados a comportamentos preventivos, 18 a
comportamentos na doença e quatro frente ao sintoma. Estes estudos, com resultados
nem sempre consistentes, revelam as tentativas de aplicar o MCS aos diferentes
comportamentos de saúde, sendo muitas as críticas efetuadas por Janz e Becker
(1984), principalmente com relação à variedade de medidas e à inclusão inconsistente
das quatro crenças principais nos estudos. Apesar de todas as limitações apontadas,
os autores concluíram que o MCS é “o principal modelo para explicar e predizer a
aceitação de recomendações sobre cuidados com a saúde” (Janz e Becker, 1984, p.
1).
Posteriormente aos primeiros estudos na década de 70, diversos outros
utilizaram o MCS aplicando-o a diferentes comportamentos de saúde, na prevenção
ou adesão ao tratamento, sendo possível verificar-se a utilidade de cada dimensão
para predição do comportamento de cuidado com a saúde (Dela Coleta, 1995, 2004).
Método
Uma das críticas observadas na literatura refere-se à diversidade de medidas
para as crenças em saúde, dificultando a comparação entre os estudos. Assim,
sugere-se a utilização de escalas específicas para a doença e para os
comportamentos de saúde envolvidos.
Este estudo (Dela Coleta,1995) foi desenvolvido em duas etapas, uma para
construção dos instrumentos e outra para teste do modelo.
A primeira fase tinha como objetivo obter medidas válidas e confiáveis das
crenças em saúde e, para isso, foram utilizados diversos procedimentos de construção
e adaptação.
As escalas de Severidade e de Susceptibilidade Percebidas foram traduzidas e
adaptadas de Champion (1984), cujos itens se referem originalmente ao câncer de
mama. Para os sujeitos hipertensos e saudáveis, os itens foram modificados para se
referir a sofrer “um” enfarto, enquanto para os enfartados os itens se referiam a sofrer
"outro" enfarto, utilizando-se, neste caso, o conceito de reocorrência (resusceptibility)
conforme sugere Becker (1974) para a medida da susceptibilidade percebida em
situação de doença já adquirida. No MCS estas duas medidas compõem a dimensão
"Ameaça Percebida à Saúde". A escala para medida da Severidade Percebida no
Enfarto (SEV) ficou com doze itens que medem a estimativa das conseqüências
negativas da doença cardiovascular em sua forma mais grave, o enfarto do miocárdio.
A escala para medida da Susceptibilidade Percebida ao Enfarto (SUS) ficou
constituída por seis itens e mede a probabilidade subjetiva do sujeito vir a sofrer um
enfarto e o grau de preocupação suscitado por esta probabilidade.
Em todas estas escalas optou-se por utilizar a forma Likert, com cinco níveis de
resposta (discordo totalmente, discordo em parte, indeciso, concordo em parte e
concordo totalmente).
As escalas de Benefícios e Barreiras Percebidos foram construídas a partir de
um estudo prévio, considerando-se que os comportamentos de saúde são específicos
para cada doença e requerem o conhecimento anterior do sujeito sobre as crenças
relativas ao desempenho e aos resultados de sua ação.
Para o desenvolvimento destes dois últimos conjuntos de escalas, duas etapas
foram seguidas, compreendendo a identificação dos comportamentos de saúde
cardiovascular e a construção dos itens, que foram seguidos por testes de validação e
confiabilidade.
Esta etapa iniciou-se com uma consulta à bibliografia referente à etiologia e
tratamento da hipertensão e da doença cardiovascular, seguida de uma análise das
respostas obtidas em entrevistas efetuadas junto a um grupo de dezoito cardiologistas
da cidade de Uberlândia, MG. Orientadas por um roteiro, as entrevistas
individuais com estes médicos tinham por objetivo verificar os comportamentos de
saúde recomendados: a) para se evitar problemas cardiovasculares, b) para sujeitos
diagnosticados como hipertensos e c) para sujeitos definidos como enfartados.
As respostas dos cardiologistas entrevistados foram semelhantes e
permitiram identificar os seguintes comportamentos de saúde cardiovascular:
alimentação com pouco sal, gorduras e carbohidratos, fazer exercícios regularmente,
evitar preocupações, ter horas de lazer ou diversão, ter tempo para descansar ou
relaxar, medir a pressão arterial regularmente, consultar o médico uma vez ao ano,
não fumar, evitar bebidas alcoólicas, controlar o peso e tomar os remédios receitados
pelo médico.
A partir dos treze comportamentos de saúde cardiovascular definidos, a próxima
etapa foi a identificação das crenças relativas aos mesmos comportamentos, junto a
uma amostra de sujeitos do sexo masculino, na mesma faixa etária definida para os
sujeitos do estudo final (homens, de 40 a 70 anos de idade).
Cinqüenta sujeitos foram contatados em escolas, residências, consultórios
médicos e empresas, quando se pedia aos mesmos que colaborassem em uma
pesquisa de opinião sobre questões de saúde. Em cada entrevista buscava-se
basicamente saber, na opinião do sujeito:
(1) “Este comportamento deve ser seguido por pessoas de sua idade? Por que?”
(2) “O senhor faz?”
(3) “Por que faz?” ou “Por que não faz?”
Os resultados mostraram crenças positivas, mas baixa adesão aos
comportamentos de saúde cardiovascular, conforme mostra a tabela que se segue.
Para a construção das escalas de Benefícios Percebidos e de Barreiras
Percebidas, foram utilizadas as respostas sobre o porquê as pessoas devem emitir os
comportamentos, ou porquê o sujeito os emite, que constituíram inicialmente os itens
das escalas de Benefícios Percebidos, enquanto os porquês das respostas negativas
formaram os itens das escalas de Barreiras Percebidas (Dela Coleta, 1995, 2003,
2004).

Resultados das análises das qualidades psicométricas das escalas


Após a tradução e construção das escalas de crenças em saúde, procedeu-se a
uma análise dos seus itens por três juízes especialistas, para verificar sua adequação
teórica aos objetivos pretendidos (validade de conteúdo). Em seguida foi feita uma
aplicação piloto a um grupo inicial de sujeitos para verificar se o instrumento era claro
e sem problemas de ser completado por pessoas de diferentes níveis de escolaridade
(validade semântica).
Seguiu-se a aplicação à amostra final, da qual participaram 232 sujeitos do sexo
masculino na faixa etária de 40 a 70 anos, divididos em três grupos: saudáveis,
hipertensos e enfartados, variando também em nível de escolaridade, região de
origem (região rural, cidade pequena, média ou grande). O objetivo nesta fase era,
além de validação dos instrumentos, verificar a relação das crenças com
comportamentos de saúde cardiovascular, visando a prevenção e o controle de uma
de suas mais graves conseqüências, o enfarto do miocárdio.
As respostas aos questionários foram codificadas e transcritas para uma planilha
de dados do programa SPSS, que efetuou análises de freqüências, testes Qui-
quadrado, análises fatoriais, testes de confiabilidade alfa de Cronbach, correlações de
Pearson e análises de Regressão Múltipla.
Após uma análise das distribuições das variáveis do estudo, procedeu-se ao
estudo da estrutura fatorial das escalas.
Segundo Tabachnick e Fidell (1989), o Método dos Componentes Principais
serve para “reduzir um grande número de variáveis a um número menor de
componentes. É também recomendado como o primeiro passo na análise fatorial, já
que revela muito sobre o provável número e a natureza dos fatores” (pg. 626). Assim,
as escalas foram submetidas a este análise.
Como resultado, a escala de Susceptibilidade Percebida mostrou ser constituída
por um fator único, que explicou 64,4% da variância, enquanto a escala de Severidade
Percebida apresentou dois fatores (49,2%). Após a rotação oblíqua dos fatores, a
escala de Severidade Percebida mostrou ser constituída pelos fatores “Medo” e
“Custos” com relação ao enfarte, confirmando os fatores originalmente propostos por
Champion (1984).
Já os itens das escalas de Benefícios Percebidos e os itens da escala de
Barreiras Percebidas formaram as escalas de crenças comportamentais para posterior
análise. A maioria das treze escalas apresentou os dois fatores esperados (benefícios
e barreiras) e alguns itens foram eliminados nesta análise.
Para verificar a validade discriminante das escalas Severidade e
Susceptibilidade, foram utilizadas análises de variância entre as médias dos grupos-
critério, que foram constituídos pelos sujeitos saudáveis, hipertensos e enfartados.
Nesta análise, maior gravidade do diagnóstico correspondeu significativamente
(p<0,01) a maior Susceptibilidade, Medo e Custo Percebido no enfarte.
Quanto à consistência interna dos itens de cada escala foi utilizado o cálculo do
índice alfa de Cronbach e a análise das correlações de cada item com os escores
totais nas escalas. Os resultados foram considerados satisfatórios: Susceptibilidade
Percebida: alfa =0,91; Medo do enfarte: alfa = 0,88; Custos do enfarte: alfa= 0,74. As
escalas de crenças comportamentais alcançaram alfas entre 0,56 e 0,90, sugerindo
algumas modificações em seus itens visando melhor confiabilidade dos instrumentos.

Resultados relativos à explicação dos comportamentos de saúde


Análises de regressão múltipla foram feitas para cada grupo de variáveis do
modelo, tendo como variável dependente cada um dos comportamentos de saúde,
permitindo verificar quais variáveis estavam interrelacionadas e quais eram efetivas na
predição dos comportamentos de saúde para cada grupo por diagnóstico. Os
resultados foram consistentes entre as análises, mas também apresentaram
diferenças entre os diferentes grupos de sujeitos.
Barreiras Percebidas mostraram o melhor resultado em termos de predição dos
comportamentos de saúde cardiovascular.
Tal resultado é consistente com a análise dos 29 estudos conduzidos com o
MCS de 1974 a 1984 por Janz e Becker(1984), que revela que os melhores resultados
foram obtidos com a crença barreiras, seguindo-se benefícios, susceptibilidade e
severidade, nesta ordem.
Neste estudo a Susceptibilidade foi preditora somente na análise relativa à
adesão ao tratamento medicamentoso pelos sujeitos enfartados. A Severidade não foi
preditor significativo de nenhum dos comportamentos nas análises relativas aos
sujeitos saudáveis, sugerindo que a percepção de severidade da doença é mais
importante frente ao sintoma ou ao diagnóstico da doença. A percepção de benefícios
demonstrou ser uma condição necessária para a adesão, mas não suficiente, dado
que foi encontrada alta concordância dos sujeitos sobre os benefícios dos
comportamentos e baixa adesão, sendo oferecido quase sempre como motivo uma
barreira aos comportamentos.
Os resultados das análises são mostrados nas tabelas a seguir, onde se
obtiveram desde baixos coeficientes até 41% da variância dos comportamentos
explicada pelas variáveis antecedentes.

Análises de Regressão Múltipla para o grupo de hipertensos

Comportamento Crença preditora Beta R2


Alimentação com menos sal SUS 0,34 <0,15
Alimentos com menos gorduras BEN 0,29 <0,15
Alimentos com menos BARR 0,31 0,15
carbohidratos
Lazer BARR 0,27 <0,15
Consultas médicas SUS 0,27 0,25
Análises de Regressão Múltipla para o grupo de enfartados

Comportamento Crença preditora Beta R2


Alimentação com menos sal BARR 0,27 <0,15
Alimentos com menos gorduras BEN 0,34 <0,15
Alimentos com menos BARR 0,27 0,24
carbohidratos
Exames clínicos MEDO 0,29 0,20
Descanso CUSTO 0,28 <0,15
Medida da pressão arterial BEN 0,35 <0,15
Bebidas alcoólicas BARR 0,34 <0,15
Controle do peso BARR 0,50 0,41
Medicação SUS 0,27 0,18

Conclusão e sugestões
A maioria das escalas adaptadas ou construídas e validadas mostrou bons
índices de validade e confiabilidade, e os teste do modelo mostraram que as crenças
em saúde foram preditores significativos de vários comportamentos preventivos do
enfarte nos grupos de sujeitos hipertensos e enfartados, com pesos diferentes para
cada grupo e para cada comportamento.
O MCS mostrou-se uma ferramenta útil para levantar as crenças da população
e mostrar a relação das crenças com os comportamentos de saúde, sugerindo a
possibilidade de intervenção para modificações comportamentais no sentido de maior
adesão aos cuidados com a saúde por parte de indivíduos saudáveis ou enfermos.

Referências bibliográficas
Champion, V. L. (1984). Instrument development for Health Belief Model constructs.
Advances in Nursing Science, 6(3), 73-85.
Dela Coleta, M. F. (1995). O Modelo de Crenças em Saúde: uma aplicação a
prevenção e controle da doença cardiovascular. Tese de Doutorado,
Universidade de Brasília, DF.
Dela Coleta, M. F. (2003). Escalas para medida das crenças em saúde. Avaliação
Psicológica, 2 (2), 111-122.
Dela Coleta, M. F. (2004). Modelo de Crenças em Saúde. In Marilia F. Dela Coleta
(org.) Modelos para pesquisa e modificação de comportamentos de saúde (27-61).
Taubaté: Cabral Editora.
Janz, N. K. e Becker, M. H. (1984). The Health Belief Model: A decade later. Health
Education Quarterly, 11(1), 1-47.
Rosenstock, I. M. (1974a). Historical origins of the Health Belief Model. Health
Education Monographs, 2(4), 328-335.
Rosenstock, I. M. (1974b). The health belief model and preventive health behavior.
Health Education Monographs, 2(4), 354-387.
Tabachnick, B. G. & Fidell, L. S. (1989). Using Multivariate Statistics. 2nd. ed. New
York: Harper Collins Publishers.
Oficinas itinerantes: uma idéia, um obstáculo, um movimento constituinte de
subjetividades

Modalidade: Simpósio
Mesa: Oficinas terapêuticas na saúde mental

Aline Miranda Schwartz de Araújo


Maria Lúcia Castilho Romera (Coordenadora)
Instituição: Universidade Federal de Uberlândia – UFU

Resumo
O Conceito de Oficina no âmbito da saúde e de educação vem sendo
gradativamente elaborado e a ação que dele se desdobra tem sido muito utilizada em
centros de saúde –CAPS – escolas e outros dispositivos que estão postos. No
presente trabalho adjetivamos as Oficinas com o ITINERANTE. Trata-se de uma
reflexão feita a partir da pesquisa de mestrado, sendo uma das autoras a
pesquisadora e a outra a orientadora do IPUFU-PGPSI. As perguntas que nos
atravessam e que norteiam essa pesquisa surgiram quando estávamos ministrando
oficinas terapêuticas em um casarão antigo em um bairro da Cidade de Uberlândia,
onde havia um imenso quintal. Esse era um lugar, grande, fresco, gostoso, protegido
de muitos olhares estrangeiros ou de estranhamento. Talvez, ainda escondidos, mas,
ocupando um lugar intermediário entre o dentro e o fora. Assim, se originam nossas
inquietações. Não estaríamos nós, oficineiros repetindo o “modelo‟ asilar? Será que
estaríamos escondendo nossos pacientes? Inicialmente, saímos em busca de
atividades que pudessem dar movimento a esta oficina. Alguns pequenos passeios
como: ir à padaria da esquina comprar um lanche. Mas ainda havia um incômodo. E
outra questão nos veio: será que esta oficina está sendo terapêutica de fato? E assim,
como esta, várias outras questões nos ocuparam em um ritmo crescente e constante
resultando em alguns pequenos projetos fora do quintal do antigo casarão...
Apresentando-nos o trânsito. No entanto, “no meio do caminho havia uma pedra”, a
clínica passou por uma crise e resolveu fechar as portas. Lá se vai nosso quintal... Lá
se foi o nosso casarão... E fomos empurrados para rua, dando inicio às oficinas em
diversos pontos da cidade: Praças, shoppings, ruas, casas, brechós, cafeterias, lojas
de vídeos, lanchonetes, enfim vários dispositivos urbanos.
Em meio a este “acaso” circunscrevia uma espécie de caos, começamos vislumbrar
saídas possíveis dos dês-vãos da des-ordem. Em algum lugar das inúmeras
conversas que tentavam elaborar tal questão alguém nomeou de Itinerante o
movimento que nos destinava para os lugares inusitados do urbano cotidiano em
companhia de nossos fiéis escudeiros. Começamos a enxergar uma possível Oficina
Itinerante, e descobrimos em Fábio Herrmann (2001) a Clínica Extensa, que não
consiste apenas na saída do consultório, na verdade é a extensão do método
psicanalítico para o mundo, ou seja, para a produção de sentidos humanos.
Oficinas temáticas com pacientes psiquiátricos: o método interpretativo e sua
destinação terapêutica

Modalidade: Simpósio
Mesa: Oficinas terapêuticas na saúde mental

Carolina Rodrigues Martins


Layla Raquel Silva Gomes
Maria Lúcia Castilho Romera
Instituição: Universidade Federal de Uberlândia – UFU

Resumo
O presente trabalho trata da realização de duas Oficinas Terapêuticas na
Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia –HC –
UFU, em dezembro de 2009. As Oficinas Terapêuticas surgem no contexto da reforma
psiquiátrica, contribuindo para a reabilitação psicossocial, isto é, buscando resgatar a
cidadania do doente mental por meio de ações que passam fundamentalmente por
sua inserção no trabalho e/ou em atividades artísticas, artesanais. O tema das oficinas
terapêuticas aqui descritas foi inspirado nas festividades natalinas. Tais oficinas
tiveram como objetivo, além de oferecer aproximação ao espírito natalino na
Enfermaria de Psiquiatria, introduzir atividades lúdicas que permitissem que os
pacientes se expressassem e extraíssem daí efeitos terapêuticos. A intervenção-
investigativa dentro da perspectiva da psicanálise norteou nossas ações. As etapas
metodológicas foram: (1) contato com a psicóloga que trabalha na psiquiatria, (2)
agendamento dos dias de realização das oficinas, (3) coleta de materiais artísticos
diversos, (4) planejamento das atividades principais que seriam realizadas nas
oficinas, (5) realização de duas oficinas terapêuticas e (6) elaboração de dois
relatórios pelas organizadoras das oficinas. Partiu-se de uma perspectiva que defende
a arte como uma estratégia terapêutica produtiva e as oficinas como um espaço de
reinserção social e exercício da cidadania. Tendo sempre em vista que o importante
não é o produto das oficinas em si, mas sim as interações e relações que dali emerge.
Definimos como resultados dessa experiência, a aprendizagem das organizadoras em
relação ao estudo das psicopatologias, a aproximação entre a teoria e a prática, bem
como os benefícios terapêuticos observados através do envolvimento dos pacientes
psiquiátricos nas atividades e suas expressões. Observamos que a oportunidade de
resgatar o Natal com todo seu conteúdo simbólico foi importante para que os
pacientes expressassem e encontrassem um espaço de tranqüilidade, resolução de
angústias, desabafo de questões familiares, interação social e valorização de sua
produção subjetiva.
Oficinas terapêuticas na saúde mental: um dispositivo em desdobramentos

Modalidade: Simpósio
Mesa: Oficinas terapêuticas na saúde mental

Maria José Castro Nascimento


Maria Lúcia Castilho Romera (Coordenadora)
Instituição: Universidade Federal de Uberlândia – UFU / Hospital de Clínicas da UFU

Resumo
Este trabalho propõe-se a refletir sobre as possibilidades e alcances das
Oficinas Terapêuticas na Saúde Mental. Inicialmente, serão revisitados alguns
conceitos elaborados sobre este dispositivo. Serão, também, levantados alguns
questionamentos sobre os fundamentos de tal prática, assim como o desdobramento
dos seus efeitos a partir de uma postura ou posição interpretativa. O referencial teórico
é a Psicanálise e a Clínica Extensa, na perspectiva da Teoria dos Campos de Fabio
Herrmann. Tentar-se-á articular um posicionamento acerca do lugar ocupado e da
função terapêutica exercida por aqueles que trabalham com a construção das
Oficinas. A partir disso buscaremos refletir sobre uma particular maneira das oficinas
terapêuticas em se constituir clínica. Atenção pontual será dada ao método que
concede às oficinas o seu valor terapêutico. Tal método é o interpretativo. A
interpretação, por ruptura de campo, sustentada por uma postura interrogante, pode
recolocar o humano, o frágil, o diagonal, por assim dizer, nas relações lineares de
formatação acanhada dos quadros nosográficos. Abre possibilidades de novas
configurações de sentido para aquilo que parecia não ter outra saída senão a
padronização. Nossas considerações e investigações nos conduzem a concluir que na
envergadura do método psicanalítico, uma clínica das Oficinas Terapêuticas pode ser
construída quando um sentido se desvela – ao debruçar-se sobre algo, sobre um
fenômeno humano –, conferindo-lhe a produção de subjetividades e simbolização. Isto
é o que concede à Clínica das Oficinas Terapêuticas o sentido de Clínica Psicanalítica
na sua extensão, onde o método psicanalítico se encarna. Neste sentido as oficinas
terapêuticas poderão ser realizadas em diferentes lugares dentro do locus circunscrito
pela interpretação. Nas Enfermarias de Psiquiatria, no conturbado momento da crise,
onde a contenção se faz necessária, contribuindo para que tal contenção não se
transforme em confinamento. Além disso, para que a condição de criatividade e de
direitos seja preservada nos sujeitos internados. No desenvolvimento de
investigações acerca da loucura e da contemporaneidade, as Oficinas poderão ser
constituintes de um diálogo com diferentes perspectivas teóricas no enfrentamento de
complexas questões no âmbito da Saúde Mental.
Perfil psicológico do paciente da clínica de DTM

Modalidade: Simpósio
Mesa: Reflexões em psicologia da saúde: interface com diferentes quadros orgânicos

Eda Marconi Custódio


Lígia Mitsuko Furusawa
Instituição: Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo e Universidade
Metodista de São Paulo

Resumo
O presente estudo parte de uma experiência de atuação psicológica no Serviço
de Oclusão e ATM (SOA), da Faculdade de Odontologia da Universidade de São
Paulo, clínica odontológica especializada em tratamento de desordens
temporomandibulares (DTM). Articulação temporomandibular (ATM) é uma estrutura
dinâmica formada de várias partes que realiza movimentos dos mais complexos e está
relacionada com praticamente todas as funções do aparelho mastigatório. A desordem
da articulação temporomandibular é um distúrbio crônico caracterizado por dor, tensão
e alteração funcional da mandíbula. Os pacientes apresentam dificuldades
mastigatórias, limitações para abrir e fechar a boca, cefaléias, dores de ouvido,
zumbidos e vertigens, entre outros sintomas. A observação dos pacientes permite
constatar que essa disfunção interfere na vida social, familiar e profissional,
repercutindo na qualidade de vida dos mesmos. Vários estudos reconhecem a
necessidade de encaminhamento dos mesmos para outros profissionais entre eles os
da Psicologia. Também se observa que as queixas dos pacientes, comentadas em
conversas na sala de espera da clínica odontológica, são muito freqüentes na clínica
psicológica, especialmente na área da psicossomática. Percebe-se que os quadros
psiquiátricos/psicológicos encontrados também precisam ser levados em conta e
tratados para a melhora e alta dos pacientes. A partir destas observações, buscou-se
na literatura específica informações para traçar um perfil psicológico da pessoa
portadora de DTM. Ainda se constata uma carência de estudos o que revela
preocupação pequena com os problemas psicológicos desses pacientes. A partir
desses estudos e das avaliações realizadas no SOA foi possível observar que esses
pacientes, de modo geral, apresentavam sinais e sintomas característicos de
depressão e suas co-morbidades, tais como fibromialgia, transtorno obsessivo-
compulsivo, transtorno de pânico. Também tinham características comportamentais
muito parecidas entre eles: excesso de responsabilidades, exagerada disponibilidade
para a família e colegas de trabalho, dificuldade em delegar tarefas, dificuldade para
aceitar ajuda e culpa em relação a qualquer atividade prazerosa ou que fosse de
cuidado pessoal não-médico Os resultados indicam que é necessário uma intervenção
feita por equipe multidisciplinar, pois as características de personalidade
provavelmente antecedem ao sintoma e se não houver uma atenção adequada poderá
não ocorrer uma boa adesão ao tratamento e retardamento da alta clínica.

Palavras-chave: disfunção temporomandibular, depressão, equipe multidisciplinar


Psicanálise e saúde pública

Modalidade: Simpósio
Mesa: Psicologia, saúde e políticas públicas: um desafio comum e diferentes enfoques

Elzilaine Domingues Mendes


Instituição: Universidade Federal de Goiás - UFG CAC

Resumo
Este trabalho tem como objetivo refletir sobre a prática psicanalítica nas
instituições de saúde pública, especialmente, nos ambulatórios de saúde (PSF) e
Centros de Atenção Psicossociais (CAPS). Herrmann (2005) ao analisar o exercício da
psicanálise na contemporaneidade, explica que a prática psicanalítica tem se
concentrado nos consultórios privados o que representa uma redução do pensamento
freudiano. Na origem da psicanálise, Freud voltou seu olhar clínico para o mundo. A
psicanálise surge da prática clínica individualizada, no entanto não se reduz a ela.
Freud foi um pensador da cultura, escreveu vários trabalhos nos quais fazia uma
análise dos problemas sócio-culturais do seu tempo. Além disso, na construção da
teoria psicanalítica Freud recorre às lendas, mitos e demais produções culturais
acreditando que essas produções são fontes de conhecimento do psiquismo, contem
vestígios do inconsciente. A psicanálise ocupava um território bem maior do que o dos
consultórios privados. A nossa realidade exige a extensão da aplicação do método
psicanalítico a outros campos. A partir destas reflexões Herrmann propõe o conceito
de clínica extensa buscando ampliar a prática psicanalítica tanto nas instituições
privadas quanto nas instituições públicas como os Centros de Atenção Psicossociais,
os ambulatórios de saúde pública, os hospitais, as escolas, e de modo geral, a pratica
junto à população desprovida de recursos. Para Herrmann a essência da psicanálise é
o método interpretativo. Neste sentido, Herrmann resgata o pensamento freudiano
reatualizando-o e ampliando a aplicação dos conhecimentos psicanalíticos para além
dos consultórios privados que era desde o início da criação da psicanálise, a proposta
freudiana. Retomamos o texto “A história do movimento psicanalítico” onde Freud
expõe as condições essenciais para alguém se dizer psicanalista. Dentre elas se
destacam: a aceitação dos processos psíquicos inconscientes, o reconhecimento da
resistência e do recalcamento, a consideração da sexualidade e do complexo de
Édipo. Concluímos que o que garante a legitimidade da psicanálise é o respeito aos
seus conceitos essenciais.
Psicologia Hospitalar x Psicologia no Contexto Hospitalar: Implicações Políticas
para a Psicologia da Saúde

Modalidade: Simpósio
Mesa: Psicologia e Saúde: possibilidades de atuação

Rebeca de Cassia Daneluci (Coordenadora)


Instituição: Universidade de São Paulo (USP)

Resumo
Esta comunicação apresentará parte da discussão realizada a partir da revisão
de literatura, em nossa pesquisa de mestrado, já em fase de finalização. Para tanto,
direcionaremos nossa atenção para o fato de as instituições hospitalares terem se
tornado referência para a Psicologia no campo da Saúde. Destacamos dois fatores
que acompanharam a inserção do psicólogo na área da saúde, na década de 80, a
saber: a) a crise econômica ocorrida pela retração do mercado liberal e b) a luta pela
democracia da atenção psicológica, sendo que a ênfase na saúde se deu
primeiramente no contexto da Psicologia Clínica, fortemente influenciada pela
psicanálise. No entanto, em relação ao Hospital, tem se registro desta atuação desde
1945. Tal fato decorre do histórico da constituição das políticas de saúde em nosso
país, em que o Hospital foi colocado como o local privilegiado para os cuidados em
saúde. Acrescentamos a isso, que o Brasil é o único país que se tem a especialidade
“Psicologia Hospitalar”. Todavia, questiona-se tal especialização, na medida em que
esta se dirige ao nível terciário, enquanto que a denominação “Psicologia da Saúde”
(usualmente utilizada em outros países) abarca todos os níveis de atenção. Nesse
sentido, alguns autores postulam que seria mais adequado considerar a Psicologia
Hospitalar como um sub-especialidade da Psicologia da Saúde, visto que tal prática se
remete a um local específico, o que segundo Chiattone (2000) ao invés de referenciar
as atividades desenvolvidas, o próprio local se torna referência para determinar as
áreas de atuação. Dito isto, o levantamento bibliográfico pesquisado tem apontado
para diversos locais de atuação, mas o psicólogo da saúde ainda se mostra
fortemente vinculado ao Hospital, fato não necessariamente desfavorável,
considerando a importância de trabalhos nestes locais, no entanto problematizamos tal
situação a fim de discutir as conseqüências da soberania deste sobre os demais locais
de atuação na área da Saúde.
Psicologia social e saúde

Modalidade: Simpósio
Mesa: Psicologia, saúde e políticas públicas: um desafio comum e diferentes enfoques

Cintia Bragheto Ferreira


Instituição: ILES ULBRA Itumbiara

Resumo
A Psicologia da Saúde é uma área que surgiu e tem se desenvolvido na
tentativa de refletir e contribuir com diversas temáticas, dentre as quais podemos citar:
os cuidados em saúde oferecidos pelo modelo médico; as modalidades
interdisciplinares de cuidado e, as próprias mudanças das doenças. Todos esses
campos apresentam desafios constantes para o psicólogo quanto às abordagens
teórico-metodológicas possíveis de serem utilizadas. Sendo que mais recentemente
podemos citar o ingresso da Psicologia Social, no campo da saúde, como uma
estratégia de contribuição para o exercício da clínica ampliada. Mais especificamente,
propomos a discussão da inserção do Construcionismo Social enquanto uma
abordagem teórico-metodológica para a compreensão e atuação no campo do
processo saúde doença e cuidado, na medida em que rompe com o modelo de
culpabilização do doente por sua enfermidade e ao apontar ainda possibilidades de
compreensão da doença enquanto um fenômeno psicossocial, historicamente
construído e culturalmente determinado. Para tanto, nos sustentamos em pesquisas
anteriores que realizamos sobre o diagnóstico e tratamento para o câncer de mama
feminino, nas quais identificamos, dentre outros relatos: o câncer como sinônimo de
morte, o que pode ser encontrado nos registros históricos do câncer enquanto uma
doença incurável, apesar dos avanços científicos para o tratamento da doença, assim
como uma provação, sendo que historicamente também se acreditava que o câncer
era capaz de purificar uma pessoa por meio do sofrimento imposto pela enfermidade.
A partir disso então podemos refletir sobre as contribuições do Construcionismo Social
para o campo da Psicologia da Saúde ao propor possibilidades de conscientização e
não de culpabilização.
Reflexões sobre a vulnerabilidade ao estresse no trabalho em funcionários
públicos

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aplicações em psicologia da saúde: considerações sobre a saúde do
trabalhador em diferentes contextos

Paulo Francisco de Castro (Coordenador)


Viviane Moreira Tineu de Melo
Instituição: Universidade de Taubaté e Universidade Guarulhos

Resumo
O presente trabalho apresenta um levantamento acerca da vulnerabilidade ao
estresse no trabalho vivenciado por um grupo de funcionários públicos municipais.
Atualmente, o Homem passa boa parte de seu tempo em ambiente de trabalho, o que
torna essa relação laboral propensa ao desenvolvimento de diferentes quadros de
sofrimento psicológico. A Escala de Vulnerabilidade ao Estresse no Trabalho - EVENT,
avalia quanto as circunstâncias do cotidiano do trabalho influenciam a conduta da
pessoa, a ponto de caracterizar certa fragilidade psicológica e propensão ao estresse.
O instrumento relaciona-se com medidas de estresse, e grupos profissionais podem se
diferenciar em relação à intensidade com que percebem sua vulnerabilidade.
Participaram do estudo 100 funcionários públicos municipais, com idade entre 21 e 60
anos, média em 36 anos, sendo 69% do sexo feminino e 31% do sexo masculino,
atuantes em dez secretarias distintas e todos os participantes desempenham suas
funções em atividades diretamente relacionadas ao atendimento ao público. Os
sujeitos foram submetidos à EVENT, de acordo com as especificações técnicas do
instrumento. A aplicação aconteceu no ambiente de trabalho, respeitando-se as
orientações quanto às condições necessárias para a aplicação de um teste
psicológico. Após correção do material dos testes, os seguintes resultados foram
obtidos: no que se refere aos valores considerados elevados tem-se que 17% dos
participantes indicou classificação superior, revelando que possuem grande
vulnerabilidade ao desenvolvimento de quadros de estresse, em seguida tem-se 24%
com classificação média superior, que indica grande tendência ao desenvolvimento de
estresse laboral; apenas 4% dos servidores possuem valores classificados como
médios no que tange à vulnerabilidade ao estresse, revelando que estes possuem
inclinação ao estresse semelhante à maioria da população, não diferem da maior parte
dos indivíduos quanto a esse aspecto; quando se trata de valores diminuídos de
vulnerabilidade, observa-se 38% dos colaboradores com classificação média inferior o
que significa que estes possuem pouca possibilidade de desenvolverem quadros de
estresse laboral, além disso, 17% indicaram valores inferiores na classificação da
vulnerabilidade ao estresse, o que indica que possuem pouca probabilidade de
apresentarem um quadro de estresse no trabalho. Assim, é possível observar que a
maioria dos servidores pesquisados possui uma classificação clara de vulnerabilidade
ao estresse, encontrando-se vulneráveis ou não diante do estresse no trabalho. Pela
relevância do tema, outros estudos são necessários, considerando outras funções
profissionais, amostras mais amplas, interação com outros constructos psicológicos,
entre outras variáveis.

Palavras-chave: avaliação psicológica, estresse, funcionalismo público

Trabalho Integral

1 Introdução

O conceito de estresse é discutido em vários âmbitos por diversos autores.


Etimologicamente, estresse deriva do latim stringere, significando apertar, cerrar,
comprimir (HOUAISS; VILLAR; FRANCO, 2001). Não há um consenso sobre o termo
estresse. Alguns autores entendem que representa uma adaptação inadequada à
mudança imposta pela situação externa, uma tentativa frustrada de lidar com os
problemas (HELMAN, 2003), mas estresse também pode ser definido como um
referente, tanto para descrever uma situação de muita tensão quanto para definir a
tensão a tal situação (LIPP; ROCHA, 1994).

Ao longo do tempo a etimologia do termo estresse passou a ser indagada e novas


concepções foram estudadas. A partir do século XVII, o termo estresse, derivado do
latim, aparece relacionado à “adversidade ou aflição”. Em fins do século XVIII, seu uso
evoluiu para denotar força, esforço e tensão. É um mecanismo bioquímico antigo de
sobrevivência do homem, aperfeiçoado ao longo de sua própria evolução
biofisiológica. O “estado de estresse” reflete um conjunto de reações e de respostas
do organismo, necessário para a preservação de sua integridade (SANTOS, 2006).

A relação entre os fatores de estresse e a reação a eles é complexa, a exemplo disto


temos um mesmo fenômeno que pode causar estresse em um determinado sujeito e
não em outro. Segundo Cruz (2008) o termo estresse no trabalho se refere ao produto
de reações fisiológicas e psicológicas dos indivíduos a situações de trabalho,
consideradas reversíveis ou prejudiciais, geralmente vivenciadas pelos trabalhadores
como em estado desagradável e ameaçador ao seu bem-estar, segurança estima.

Nas formulações iniciais, preponderava o foco sobre o evento estressor por si, mas
atualmente existe grande consideração nas diferenças individuais e nas variáveis
cognitivas e motivacionais (LAZARUS, 1993). Sendo assim, é importante considerar
não só a imensa quantidade de fatores potencializadores de estresse, mas também,
os aspectos individuais, a maneira como cada um reage às pressões cotidianas, bem
como os aspectos culturais e sociais aos quais os sujeitos estão submetidos. Fatos
como problemas familiares, acidentes, doenças, mortes, conflitos pessoais, dificuldade
financeira, desemprego, aposentadoria, problemas no ambiente de trabalho, guerras e
inúmeros outros podem ser experienciados de maneira diversa por dois indivíduos
diferentes, em um mesmo contexto histórico, cultural e social, por exemplo, assim
como problemas críticos na ordem social de um país podem potencializar o estresse
patológico em diversos indivíduos (HELMAN, 2003).

A Escala de Vulnerabilidade ao Estresse no Trabalho – EVENT, avalia o quanto as


circunstâncias do cotidiano do trabalho influenciam a conduta da pessoa, a ponto de
caracterizar certa fragilidade. O instrumento relaciona-se com medidas de estresse, e
grupos profissionais podem se diferenciar em relação à intensidade com que
percebem sua vulnerabilidade. (SISTO; BAPTISTA; NORONHA; SANTOS, 2007).

Com a disponibilização desta escala pretendeu-se instrumentalizar os pesquisadores e


psicólogos da área do trabalho para poderem desenvolver avaliações padronizadas
sobre estresse laboral e, dessa forma, auxiliarem profissionais de todas as áreas de
uma organização a conhecerem suas vulnerabilidades. A partir dessas informações é
possível desenvolver estratégias pessoais e organizacionais, prezando-se pela
melhora da qualidade de vida do trabalhador. Avalia os componentes relacionados ao
estresse no trabalho, tais como: clima e funcionamento organizacional; pressão no
trabalho e infra-estrutura no trabalho (SISTO; BAPTISTA; NORONHA; SANTOS,
2007).

2 Objetivo

Apresentar um levantamento da vulnerabilidade ao estresse no trabalho, observada


em uma amostra de funcionários públicos municipais, submetidos à EVENT.

3 Método

Participaram do presente estudo 100 funcionários públicos, lotados em várias funções


e departamentos nos serviços oferecidos em uma cidade do Vale do Paraíba, interior
do estado de São Paulo. Todos os colaboradores desempenham suas funções em
atividades diretamente relacionadas ao atendimento ao público.

Todos responderam a um breve questionário que versava sobre dados sócio-


demográficos e submeteram-se às questões propostas pela EVENT. A aplicação da
referida escala aconteceu no ambiente de trabalho, respeitando-se as orientações
quanto às condições necessárias para a aplicação de um teste psicológico.

4 Resultados e Discussão

4.1 Perfil dos participantes

Participaram do estudo 100 funcionários públicos municipais, sendo 31% do sexo


masculino e 69% do sexo feminino, com idade entre 21 e 60 anos, média em 39 anos,
com tempo de atuação no serviço público variado.

Tabela 1. Distribuição por escolaridade.


Escolaridade %
Fundamental Completo 1
Ensino Médio Incompleto 4
Ensino Médio Completo 43
Ensino Superior Incompleto 19
Ensino Superior Completo 33
Total 100

Como é possível verificar na Tabela 1, a maior parte dos colaboradores da pesquisa


possuíam ensino médio completo (43%), seguido de ensino superior completo (33%) e
de ensino superior incompleto (19%), poucos foram os servidores com ensino
fundamental completo e ensino médio incompleto. Tal aspecto minimiza uma possível
dificuldade em compreender os itens da escala, permitindo avaliação clara do
construto indicado.

Tabela 2. Área de atuação dos servidores.


Áreas %
Finanças 31
Saúde 24
Administração 17
Educação 7
Planejamento 7
Obras 5
Gabinete 5
Jurídico 2
Desenvolvimento 1
Integração 1
Total 100

A Tabela 2 indica as áreas onde os participantes desenvolvem suas atividades


funcionais, onde é possível observar que 31% dos servidores atuam na área de
finanças, que envolve atividades ligadas ao ISS, à fiscalização fiscal do município, às
atividades no pedágio e arrecadação; seguido por 24% da área de saúde, envolvendo
funções relativas ao atendimento ao contribuinte, além de ações que envolvem
práticas gerais em saúde, como vacinação, visitas, entre outras; 17% dos servidores
que atuam em áreas administrativas, principalmente ligadas aos serviços de protocolo;
com 7% de incidência tem-se os funcionários de atendimento em secretaria de escolas
e atendimento na secretaria de planejamento; com menor incidência observa-se
servidores das outras áreas.
4.2 Caracterização da vulnerabilidade ao estresse

Após análise do material obtido pela EVENT, identifica-se os seguintes dados no que
tange à vulnerabilidade ao estresse no trabalho:

Tabela 3. Vulnerabilidade ao estresse na amostra.


Classificação %
Superior 17
Média Superior 24
Média 4
Média Inferior 38
Inferior 17
Total 100

A Tabela 3 apresenta os dados relativos à vulnerabilidade ao estresse nos servidores:

Quando se trata de valores diminuídos de vulnerabilidade ao estresse, maioria dos


dados obtidos, observa-se que 38% dos colaboradores com classificação média
inferior o que significa que estes possuem pouca possibilidade de desenvolverem
quadros de estresse laboral, além disso, 17% indicaram valores inferiores na
classificação da vulnerabilidade ao estresse, o que indica que não possuem
probabilidade de apresentarem um quadro de estresse no trabalho.

Apenas 4% dos servidores possuem valores classificados como médios no que tange
à vulnerabilidade ao estresse, revelando que estes possuem inclinação ao estresse
semelhante à maioria da população, não diferem da maior parte dos indivíduos quanto
a esse aspecto.

No que tange aos valores elevados de vulnerabilidade ao estresse, tem-se que 17%
indicou classificação superior, revelando que possuem grande vulnerabilidade ao
desenvolvimento de quadros de estresse, seguido de 24% com classificação média
superior, que indica grande tendência ao desenvolvimento de estresse laboral.
5 Considerações Finais

O estresse é, hoje, um dos fatores mais preocupantes da saúde em geral e também


saúde do trabalhador. Em algumas atividades profissionais é uma das maiores causas
de afastamento para tratamento de saúde.

No caso na amostra de servidores municipais, alvo da presente investigação,


observou-se quantidade maior de indivíduos com baixa vulnerabilidade ao estresse
(55%), mas uma proporção considerável indicou vulnerabilidade ao estresse elevada
(41%).

Assim, é possível observar que a maioria dos servidores pesquisados possui uma
classificação clara de vulnerabilidade ao estresse, encontrando-se vulneráveis ou não
diante do estresse no trabalho.

O serviço público, envolvendo suas funções administrativas e rotineiras, é cada vez


mais procurado por causa da estabilidade, tão importante em um cenário econômico
inseguro. O que não se supunha era a quantidade de profissionais com tendência ou
pelo menos facilidade para desencadear situações de estresse ligadas diretamente às
funções que exercem. Por isso, estudos mais amplos, abrangendo outras atividades e
outros níveis de funcionalismo público são relevantes para a caracterização desse
cenário em âmbito maior.

Referências
CRUZ, R.M. Prefácio. In: TAMAYO, A. (Org.). Estresse e Cultura Organizacional.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008, p.17.
HELMAN, C.G. Cultura, Saúde & Doença. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2003.
HOUAISS, A.; VILLAR, M.S; FRANCO, F.M.M. (Orgs). Dicionário Houaiss de Língua
Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
LADEIRA, M. B. O processo de stress ocupacional e a psicopatologia do trabalho.
Revista de Administração, v. 31, n. 1, p. 64-74, 1996.
LAZARUS, R. S. From psychological stress to the emotions: A history of changing
outlooks. Annual Review of Psychology, v. 44, p. 1-21, 1993.
LIPP, M. N.; ROCHA, J. C. Stress, hipertensão arterial e qualidade de vida: Um
guia de tratamento ao hipertenso. Campinas: Papirus,1994.
SANTOS, O.A.S.G.S. Estresse e estratégias de enfretamento: um estudo de caso
no setor produtivo. 2006. 143 p. Dissertação (Mestrado em Gestão e Desenvolvimento
Regional) - Departamento de Economia, Contabilidade e Administração, Universidade
de Taubaté.
SISTO, F.F; BAPTISTA, N.M; NORONHA, P.P.A; SANTOS, A.A.A; EVENT: Escala de
vulnerabilidade no trabalho. São Paulo: Vetor, 2007.
Relações entre convicções de saúde e adesão ao tratamento: consistência
teórica e as contribuições da psicologia

Modalidade: Simpósio
Mesa: Crenças em saúde e doenças crônicas

Marília Vizzotto
Instituição: Programa Mestrado em Psicologia Saúde / Universidade Metodista São
Paulo

Resumo
O presente propõe-se a discutir as relações entre as convicções de saúde e a
adesão de pacientes ao tratamento, bem como discutir a consistência de ambos como
constructos teóricos. A importância de se discutir e questionar tais conceitos dá-se
principalmente pelo fato de que o processo de adesão a tratamentos médicos é tido
como um dos grandes responsáveis para o sucesso terapêutico e, seu contrário a não
adesão implica em altos custos em saúde pública e resulta em desperdício de
recursos e muita frustração para os profissionais e clientes. Nessa discussão, é
apresentado o conceito de adesão, aceito como a capacidade ativa do paciente em
seguir as recomendações médicas de modo cooperativo, e adequação da terapêutica
proposta; somado à responsabilidade compartilhada do médico e do paciente em uma
série de cuidados. E também apresenta as concepções sobre convicções de saúde
que têm sido concebidas como a capacidade do sujeito em ter susceptibilidade,
eficácia própria, reconhecer a severidade, os benefícios do tratamento, e transpor as
barreiras. Após, são questionados ambos os conceitos no que diz respeito a sua
consistência teórica, o caráter subjetivo que os envolve e quais as bases psicológicas
que podem contribuir para os conceitos.

Palavras-chave: convicções de saúde, adesão, cuidadores


Relato de um caso clínico de violência sexual infantil

Modalidade: Simpósio
Mesa: Experiência técnica do pólo não violência da cidade de Sorocaba

Sonia Maria Machado de Oliveira Nukui


Instituição: UNIP de Sorocaba

Resumo
A violência está fortemente presente no âmbito urbano, escolar, familiar etc.
Não é um aspecto por excelência restrito à condição moderna, estando presente na
vida humana desde os tempos mais remotos. A cidade de Sorocaba por meio de
alguns segmentos (terceiro setor, segurança, saúde e universidade) vem se
organizando e mobilizando esforços para minimizar o sofrimento das vítimas de
violência. Este trabalho objetiva relatar um caso clínico de violência sexual infantil. A
vítima é uma garota(11 anos) que sofreu abuso sexual por parte do pai e foi
encaminhada pela instituição PACIN (Projeto e Apoio a Cidadania e a Infância) para
ser atendida no Pólo Não Violência da clínica escola da Universidade Paulista.
Quando o caso do abuso sexual veio à tona, o pai da vítima suicidou-se. Contudo, a
família escondeu tal fato da criança, revelando que o pai havia sofrido uma parada
cardíaca. O atendimento foi realizado em Psicoterapia Breve Psicodinâmica, buscou-
se garantir que a cliente pudesse finalizar um processo de forma consciente, diferente
do ciclo de violência recorrente vivido por ela. Desse modo, realizou-se um
atendimento individual com a mãe da cliente, almejando sensibilizá-la sobre a
importância de sua filha apropriar-se do real motivo do falecimento do pai. Utilizaram-
se intervenções esclarecedoras e suportivas, buscando o fortalecimento egoico de
potenciais antes desconhecidos. Além disso, outros recursos tais como: caixa lúdica,
realização de desenhos e a aplicação do procedimento DF-E foram utilizados com
intuito de auxiliar a criança a expressar os conteúdos emocionais vividos em relação à
violência assim como em relação ao falecimento do pai. A omissão e o silêncio no
meio familiar da cliente foram evidenciados e puderam ser trabalhados para que mãe
e filha compreendessem a importância de romper com o silêncio. Torna-se lícito
afirmar que o objetivo do atendimento psicológico foi alcançado, uma vez que a
situação vivida pela criança foi trabalhada terapeuticamente durante o processo.
Logicamente, que tal situação deixou marcas profundas que a acompanharão.
Portanto, ainda existem aspectos intrapsíquicos que podem ser trabalhados
futuramente em psicoterapia a longo prazo.

Palavras-chave: violência sexual, psicoterapia breve, criança

Texto Integral

I. INTRODUÇÃO
Discorrer sobre violência é certificar-se que este tema é bastante amplo,
estando fortemente presente no contexto urbano, escolar, familiar etc. Os meios de
comunicação quase que diariamente divulgam vários tipos de violência praticados
sistematicamente contra a mulher, contra o idoso, contra a criança e o adolescente.
De acordo com Ribeiro et al (2004), a violência é uma das grandes
preocupações em nível mundial por afetar a sociedade como um todo. Como parte da
chamada questão social, ela revela formas de dominação e opressão
desencadeadoras de conflitos, sendo praticada por indivíduos contra outros indivíduos
e manifestando-se de várias maneiras.
Para Eastman (2002), apud Pimentel et al Araújo (2006):
“A Organização Mundial da Saúde, no Relatório Mundial sobre
Violência e Saúde definem violência como: o uso intencional
da força física ou do poder, real ou por ameaça, contra a
própria pessoa, outra pessoa, um grupo ou comunidade que
pode resultar ou tem alta probabilidade em morte, lesão, dano
psicológico, problemas de desenvolvimento ou de privação” (p.
12).
Pode-se dizer que a violência não é um aspecto por excelência restrito à
condição moderna, já que vigora na vida humana desde os tempos mais remotos.
Para Souza (2009), dentre tantos registros de violência que marcam a estória da
humanidade, destaca-se a vil violência praticada durante a Segunda Guerra Mundial.
Naquele contexto, atos covardes e desumanos foram praticados contra aqueles que
não conseguiam se defender. Contudo, graças à declaração Universal dos Direitos
Humanos - documento criado após Segunda Guerra Mundial- a humanidade pode
refletir sobre sua própria condição. “Para as gerações que têm se seguido desde então
ficaram dois grandes desafios: o de manter vivo o espírito da Declaração e o de fazer
com que esses princípios penetrem, cada vez mais, no dia a dia das sociedades”(
p.1)
Parece lícito afirmar que, a Declaração Universal dos Direitos Humanos
enquanto movimento ético possibilitou que leis fossem criadas no enfrentamento à
violência em suas mais diversas manifestações. No Brasil temos leis que são
consideradas como um avanço no combate à violência tais como: Lei nº 8.069/1990 –
Estatuto da Criança e do Adolescente; Lei no 10.778 de 24/11/2003 – Notificação
compulsória de violência contra a mulher em serviços de saúde públicos ou Privados;
Lei nº 10.741/2003 – Estatuto do Idoso etc. Contudo, torna-se ilusório acreditar que
somente essas leis poderão assegurar os direitos dos vitimizados. Incontestavelmente,
será preciso que a sociedade em seus diversos segmentos esteja de fato
comprometida com esta questão.
Gomes et al (1999), apontam que há um considerável material produzido no
Brasil (dissertações, teses, livros etc) sobre estratégias de prevenção à violência
contra a criança e adolescente. Tais estratégias são imprescindíveis para evitar danos
graves à saúde desse grupo. Contudo, estes autores destacam que não basta
pesquisar e publicar se essas estratégias de prevenção não puderem ser assimiladas
pelos profissionais e, se o tema da prevenção não for implementado pelas políticas
públicas que lidam com essa população. Ou, em outras palavras, faz-se necessária a
criação de um programa de prevenção que envolva ações governamentais e civis
conjuntas.
Por tudo isso, há de considerar que a formação e a metodologia do trabalho
profissional precisam ser repensadas já que a violência vem sendo reconhecida como
um problema de saúde e educação. A cidade de Sorocaba por meio de alguns
segmentos (terceiro setor, segurança, saúde, universidade e sociedade civil) vêm
mobilizando esforços no enfretamento da violência.
Dentre os vários tipos de violência, nota-se que o abuso sexual vem ganhando
assustadoramente destaque em nosso meio. Em especial, o abuso sexual praticado
contra criança e adolescente.
Para Ribeiro et al (2004) o abuso sexual é uma das facetas do fenômeno
violência que atinge todas as faixas etárias, classes sociais e pessoas de ambos os
sexos. Na maioria das vezes, as vitimizações sexuais são de difícil notificação, já que
a vitima fica paralisada frente ao medo de sofrer descrédito. Pimentel et al Araújo
(2006) corroboram com tal assertiva ao enfatizarem que isso pode se intensificar
principalmente, quando o abuso sexual acontece na própria família, envolvendo
parentes que vivem ou não sob o mesmo teto. É a chamada violência intrafamiliar.
Para Kristensen e col (2001) apud Pimentel et al Araújo (2006):
“Abuso sexual é um tipo de agressão definido como o
envolvimento de crianças e adolescentes dependentes e
evolutivamente imaturos em atividades sexuais que eles não
compreendem, para os quais não são capazes de dar
consentimento informado, e que violam os tabus sexuais dos
papéis familiares. Fundamentalmente, estabelece-se uma
relação de poder ou controle entre o agressor e a vítima que,
não necessariamente, é uma pessoa adulta”.
De acordo com Araújo (2002) o abuso sexual infantil é uma forma de violência
que poderá envolver poder, coação e/ou sedução. Em alguns casos é praticado sem o
uso da força física, não deixa marcas visíveis e, portanto, dificulta a sua comprovação.
Grosso modo, o abuso sexual pode variar de atos que envolvem o contato sexual com
ou sem penetração bem como atos em que não há contato sexual, como o voyeurismo
e o exibicionismo.

II. OBJETIVO
Este trabalho tem por objetivo apresentar considerações sobre um caso clínico
de abuso sexual. A intervenção aconteceu em um nível de prevenção terciária, já que
a violência sexual já havia ocorrido.

III. APRESENTAÇÃO DO CASO


A vítima é uma criança do sexo feminino a quem chamarei de K (11 anos) que
compareceu ao Centro de Psicologia Aplicada no Pólo de Atendimento a Não
Violência acompanhada por sua mãe e por um responsável pela instituição PACIN
(Projeto e Apoio a Cidadania e a Infância). A instituição já havia entrado em contato
informando que a criança havia sofrido violência sexual por parte do pai. A mãe da
criança foi convidada para conversar sobre o motivo da procura do atendimento
psicológico. Contudo, enfatizou que gostaria que somente a filha fosse atendida, já
que naquele momento não se sentia preparada para abordar o assunto.
III. 1- PRIMEIRO CONTATO COM A CRIANÇA
Num primeiro momento, buscou-se estabelecer um rapport entre a psicóloga
e a cliente. A conversa aconteceu sob um clima descontraído, sem adentrar,
precipitadamente no motivo da procura. Desse modo, apresentou-se o trabalho do
psicólogo, como um profissional que poderia ajudar as pessoas a falarem sobre
sentimentos bons ou ruins. À medida que a conversa prosseguiu, K foi apresentando
sua família. Tem duas irmãs e um irmão por parte de pai, sendo a filha mais velha.
Seus pais eram namorados, quando sua mãe engravidou. Contudo, romperam o
namoro antes do nascimento da filha.
Sua mãe se casou com outro homem alguns meses após o nascimento de K,
mudando-se para outra cidade. Desse modo, K. ficou sob os cuidados da avó materna
até os 5 anos de idade. Posteriormente, foi morar com a mãe e o padrasto, o que se
mantém até o momento. Quanto ao pai de K, o mesmo se casou por duas vezes,
tendo outros dois filhos de cada um dos relacionamentos.
Quase ao final deste primeiro encontro, K comentou: “gostei de vir aqui,
pensei que fosse chato como quando fui na médica e me fizeram um monte de
perguntas”(sic). Aproveitei desse comentário, questionando se ela teria algo que
gostaria de contar, reassegurando que seria importante falar sobre o que sentisse. K
relatou que foi ao hospital porque apareceu uma verruga na vagina. “Aquela médica
falou que tinha acontecido alguma coisa, que alguém tinha mexido comigo. Ficaram
perguntando e aí tive que falar que meu pai pedia para que eu e a minha irmã
ficássemos sem roupa, aí ele colocava o pênis dele na minha vagina. Eu nunca falei
porque tinha medo que meu pai me batesse. Ele dizia que se eu contasse para
alguém ia me matar de tanto bater, eu fiquei com medo”(sic).
Segundo a criança, seu pai começou a abusar dela e da irmã, quando ela
estava com cinco anos e a irmã com três. Tal fato acontecia quando ficavam com o pai
durante as férias escolares. Quando K. completou dez anos, o pai finalizou com o
abuso sexual.
Como K demonstrou interesse em continuar com os atendimentos, a mãe foi
consultada sobre essa possibilidade, aceitando prontamente. Ademais, a mãe
confidenciou rapidamente que o pai de sua filha se suicidou quando o caso do abuso
sexual veio à tona. Assim, a filha não sabia até o momento do real motivo da morte do
pai, acreditando que o mesmo sofrera uma parada cardíaca.
III. 2 - ESTRATÉGIAS TERAPÊUTICAS
K realizou 11 atendimentos psicológicos sempre às quartas-feiras às 8h. O
objetivo principal foi o de oferecer um espaço de acolhimento para que pudesse
manifestar seus sentimentos em relação à violência sofrida. Igualmente, realizaram-se
dois encontros com a mãe da criança, buscando sensibilizá-la quanto ao fato da filha
apropriar-se do verdadeiro motivo da morte do pai.

III. 3- PROCEDIMENTOS
Utilizaram-se durante os atendimentos psicológicos algumas intervenções
esclarecedoras, suportivas, injuntivas de acordo com as considerações de Fiorini
(1982), objetivando o fortalecimento egoico de potenciais antes desconhecidos. Além
disso, outros recursos tais como: caixa lúdica, realização de desenhos e a aplicação
do procedimento DF-E (Trinca, 1997) foram utilizados com intuito de auxiliar a criança
a expressar os conteúdos emocionais vividos em relação à violência assim como em
relação ao falecimento do pai.

III. 4- ETAPAS DO TRABALHO DO PONTO DE VISTA TÉCNICO


A criança se mostrou participava, estabeleceu um bom vínculo terapêutico,
tanto que não faltou em nenhum atendimento. Era notória a dificuldade que tinha em
concretizar a morte do pai, já que toda e qualquer referência ao mesmo se fazia como
se ainda estivesse vivo.
A criança relatou bons momentos vividos com seu pai, lembrando-se
carinhosamente que o pai (na época que tinha salão de cabeleireiro) alisava e cuidava
do seu cabelo. Além disso, o pai costumava brincar com ela e a irmã (pega-pega;
esconde-esconde etc). Quando K completou dez anos, o pai finalizou com o abuso
sexual. Porém, tal fato só veio à tona após a criança ter percebido uma verruga em
seu órgão genital, vindo a se assustar.
Para Gabbard (2007), entrar em contato com a violência exige
comprometimento tanto por parte do terapeuta como do cliente, já que não é um tema
fácil para ser abordado. Desse modo, primeiramente, cabe ao terapeuta avaliar suas
condições emocionais para o atendimento de cada caso. Somente assim é que será
possível nos momentos iniciais de investigação ter uma leitura das reais capacidades
egoicas do sujeito sobre o fato ocorrido (sobretudo avaliando os mecanismos de
defesa mais utilizados por ele), avaliando simultaneamente os aspectos saudáveis
ainda preservados que podem ser trabalhados terapeuticamente.
Ainda de acordo com Gabbard (2007), o cliente pode não estar convencido
quanto ao fato de ter sofrido alguma violência por parte do agressor (geralmente
alguém próximo da família) e sequer tem consciência dos reais danos
psíquicos/emocionais/relacionais/sociais causados em sua vida.
Considerando o caso atendido, torna-se possível conjecturar que K tinha
sentimentos ambivalentes e confusos em relação ao pai. Trazia o pai como um
homem que abusava dela e da irmã, mas, que também era um bom pai que cuidava,
brincava. As investidas do pai aconteciam de forma carinhosa. Isto é, a violência
sofrida se deu a partir da sedução que se fazia proeminente nos cuidados que o pai
dispensava a sua filha. “Eu sei que ele fez uma coisa muito errada comigo e com a
minha irmã. Só que ele também era muito legal, brincava com a gente, eu amo muito
meu pai. Sabe, meu pai teve um salão de cabeleireiro, então, ele cuidava do meu
cabelo” (sic).
Tornou-se perceptível que durante os atendimentos a criança nutria certo
sentimento de culpa em relação ao falecimento de seu pai. “Eu fiquei pensando se
ele tinha morrido porque eu tive que contar o que ele fez, será que ele ficou nervoso
com medo de ir preso? Sabe, ele tinha problema de respiração (...)” (sic).
Desse modo, marcou-se um atendimento individual com a mãe da cliente,
objetivando conscientizá-la e sensibilizá-la sobre a importância de contar para sua filha
o real motivo do falecimento do pai. A mãe (que foi chamada para uma orientação
sobre como lidar com o fato da morte violenta do pai) se comprometeu a revelar o
verdadeiro motivo. No penúltimo atendimento, K relatou que a avó paterna e sua mãe
contaram sobre a morte do pai. Assim, demonstrou sentimento de culpa ao alegar que
seu pai tomara tal decisão por medo de ser preso. As intervenções suportivas e
esclarecedoras puderam auxiliar a cliente a compreender que o fato do pai brincar e
cuidar dela e de sua irmã, não eximia o fato dele também ter agido erroneamente ao
abusar sexualmente de ambas.
Cabe frisar que se o terapeuta não tiver uma dimensão real sobre as
artimanhas vividas na violência, seu trabalho poderá ficar comprometido. De acordo
com Gabbard, (2007) durante o processo o cliente tenderá a repetir
transferencialmente com o terapeuta a mesma dinâmica vincular sedutora,
controladora, agressiva, dominadora, submissa etc vivida com seu agressor.
Pode-se hipotetizar que a cliente tentou reproduzir uma dinâmica vincular
sedutora, controladora e dominadora ao se negar finalizar o processo terapêutico.
Outra hipótese é a de que K. estava diante de mais uma possibilidade de perda,
rompendo um vínculo bom já conhecido por ela, recusando-se em aceitar que poderia
seguir sozinha com os ganhos da relação terapêutica.
Gabbard (2007) considera a importância de reconhecer com o cliente e/ou
pessoas envolvidas, recursos internos para o enfrentamento da angústia toda vez que
a violência surgir após o atendimento de modo que a pessoa perceba que é capaz de
superar o ocorrido e de forma vigilante cuidar para que a mesma não se repita.

III. 5- ENFRENTANDO A ANGÚSTIA DA VIOLÊNCIA VIVIDA.


Reconhecer com o cliente e/ou pessoas envolvidas com a violência, recursos
internos para o enfrentamento da angústia toda vez que ela surgir após o atendimento
de modo que a pessoa perceba que é capaz de superar o ocorrido e de forma vigilante
cuidar para que a mesma não se repita. No caso de K, trabalhou-se seu potencial de
enfrentamento da real causa da morte do pai e seus sentimentos bons nutridos por
ele, apesar da violência, de modo a tentar preservar a figura masculina em sua vida.

IV. FINALIZAÇÃO DO PROCESSO.


O atendimento em Psicoterapia Breve Psicodinâmica tem sido uma técnica
utilizada no Pólo para garantir que o cliente que sofreu a violência possa finalizar um
processo de forma consciente, diferente do ciclo de violência recorrente vivido por ele
ou pela família.
Considerando o caso atendido, torna-se lícito afirmar que o objetivo do
atendimento psicológico foi alcançado. Tal assertiva é possível em decorrência da
temática violência ter sido abordada sistematicamente durante os atendimentos
psicológicos. Além disso, a omissão e o silêncio no meio familiar da cliente foram
evidenciados e pôde ser trabalhado conscientizando os membros envolvidos da
importância de se falar sobre a verdade sobre o ocorrido.
Logicamente, que a situação do abuso sexual vivido pela cliente, deixou
marcas profundas que a acompanharão. Assim, ainda existem aspectos
intrapsíquicos que podem ser trabalhados futuramente em psicoterapia individual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, M. F. VIOLÊNCIA E ABUSO SEXUAL NA FAMÍLIA. Psicologia em Estudo,


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Psicologia- CRP. São Paulo, n, 158, dezembro/janeiro de 2008/2009.
TRINCA, W . Apresentação e aplicação. In: Trinca, W. (org.). Formas de
Investigação Clínica em Psicologia. São Paulo, 1997.
Relato de uma experiência sobre o trabalho técnico no Pólo Não Violência na
cidade de Sorocaba

Modalidade: Simpósio
Mesa: Experiência técnica do pólo não violência da cidade de Sorocaba

Ione Aparecida Xavier


Instituição: UNIP de Sorocaba

Resumo
O serviço de Atendimento psicológico no Pólo não Violência da UNIP é
constituído por alunos e ex-alunos interessados em trabalhar com o tema como
possibilidade de extensão universitária e consiste no atendimento imediato aos
clientes que chegam encaminhados e/ou acompanhados por uma pessoa em parceria
com a instituição PACIN na cidade de Sorocaba, após a denúncia em delegacia e
após ter passado por exames de corpo e delito no IML e ter recebido os primeiros
atendimentos preventivos quando é ministrado o coquetel antiviral contra doenças
sexualmente transmissíveis. Geralmente, o fato (violência) recém vivido ou
descoberto, quando deflagrado ou vem a publico, causa na pessoa abusada reações
que a mobilizam. Em geral, a decisão pela procura por ajuda psicológica depende de
um profissional que a apóie incondicionalmente, alertando-a para a necessidade de
alívio da angústia com profissional experiente. A primeira entrevista no Pólo serve
como acolhimento ao cliente para estabelecer uma aliança terapêutica de modo que
ele possa escolher voltar ou não para um próximo encontro. O primeiro encontro tem
caráter emergencial e sempre fica a critério do cliente voltar ou não. Assim sendo,
consideramos que o enquadre para esta demanda específica, composta por mulheres
adultas ou crianças comporta particularidades que o diferem dos enquadres
psicoterapêuticos tradicionais. Apresenta alguns casos clínicos para elucidar a técnica
empregada em diferentes situações de abuso sexual contra crianças e adulto que
foram atendidas pelo Pólo. Os resultados ainda são iniciais, mas demonstram a
importância do trabalho de extensão universitária, envolvendo alunos e ex-alunos com
esta temática social e da relevância do atendimento imediato nestes casos para
garantir que a condução do mesmo seja menos traumática no caso das crianças que
sofreram o abuso ou violência.
Palavras-chave: violência, abuso sexual, técnica

Texto Integral

INTRODUÇÃO

Centro de Psicologia Aplicada da UNIP de Sorocaba


O Centro de Psicologia Aplicada de Sorocaba iniciou suas atividades em 2000,
quando ainda funcionava no Bairro Éden todas as atividades do campus da
Universidade Paulista. Atualmente, funciona na Rua: Gustavo Texeira, nº 285 no
bairro do Mangal. O horário de funcionamento do Centro de Psicologia Aplicada é de
2ª às 6ª feiras, das 8h às 23h, e aos sábados, das 8h30 às 12h00. O telefone/FAX do
Centro de Psicologia Aplicada é o 15 - 32217970. Nos períodos de férias dos meses
de Janeiro e Julho o Centro de Psicologia Aplicada não atende ao público. Alguns
casos de urgência podem ser encaminhados para os nossos ex-alunos (sob
supervisão de um professor da UNIP) que atendem gratuitamente ou a um preço
simbólico.
Enquanto Centro de Psicologia Aplicada, vinculado a Universidade, está sob a
responsabilidade técnica da Profª Drª Ione Aparecida Xavier e atende a duas
demandas: 1) dos alunos que vêm cumprir o estágio obrigatório para a aquisição do
diploma de psicólogo e 2) dos clientes que vêm em busca de tratamento psicológico.
Conta com regulamento específico, objetivando cumprir as demandas apresentadas.
Desse modo, cumpre com sua responsabilidade social e mantêm convênio com várias
instituições, empresas, escolas, hospitais e Ongs.
Os atendimentos psicológicos individuais e grupais estão contemplados nas
duas ênfases de acordo com as Diretrizes Curriculares - Clínica e Relações Humanas
- dos estágios regulamentados, objetivando a produção de conhecimento científico em
diferentes níveis como. O atendimento apresentado neste trabalho, por exemplo,
pretende que o conhecimento sobre a violência seja trabalhado em um nível
psicológico preventivo e interventivo.
Todo cliente que procura Centro de Psicologia Aplicada passa por, pelo menos,
duas entrevistas, e, a partir da análise desta demanda inicial e considerando-se as
diversas áreas de atendimentos existentes, faz-se o encaminhamento.
Os serviços oferecidos à comunidade de Sorocaba e Região nos estágios aos
alunos dos 7º e 8º Semestres são:
Triagem/Psicodiagnóstico Compreensivo
Psicodiagnóstico Interventivo
Os serviços oferecidos à comunidade de Sorocaba e Região nos estágios
escolhidos pelos alunos dos 9º e 10º Semestres são:
1. Relações Humanas:
Grupos-comunidades e Instituições
Atendimento Clínico a Criança
Grupo Adulto
Psicologia Jurídica
Diagnóstico Psicológico em Organizações
Psicologia Escolar
Atendimento em Instituição de Saúde.
Oficina de Criatividade
2. Clínica:
Atendimento Breve Criança
Atendimento Breve Adulto
Atendimento Breve Familiar
Plantão Psicológico
Acompanhamento terapêutico
Feito o devido encaminhamento, o cliente passa por um processo de pelo menos
dez atendimentos, podendo ser reencaminhado para algum outro serviço dentro ou
fora do Centro de Psicologia Aplicada. A lista de espera tem sido constantemente
atualizada, buscando atender o cliente o mais prontamente possível, com espera entre
seis meses a um ano (em alguns casos), quando uma das modalidades de
atendimento citadas acima não é contemplada pelos alunos no decorrer daquele ano.
O atendimento institucional e comunitário tem crescido a cada ano e alguns
programas junto ao Estado de São Paulo e parceiros tem sido realizados, por
exemplo, nos estágios dos alunos na Penitenciária da Cidade, Casa do menor,
Pastoral do menor, Hospital Regional etc.
O atendimento do Pólo Não Violência prioriza os clientes que vêm com uma
demanda específica de violência, que são atendidos prontamente.
Pólo Não Violência
O Centro de Psicologia Aplicada é único na cidade, atendendo a mais de 1.000
casos por ano no âmbito psicológico e a cada dia chegam novas demandas de
atendimento que reforçam a importância do serviço prestado na cidade.
Recentemente, o Centro de Psicologia Aplicada iniciou atividades de atendimento à
população vítima de violência inaugurando o Pólo Não Violência.
O Pólo surgiu depois de dois anos, em que a Universidade Paulista UNIP de
Sorocaba vinha participando de encontros junto ao “Projeto Viva” estabelecendo
parceria com a prefeitura e demais instituições no enfrentamento da violência,
objetivando ajudar na construção de uma rede na cidade.
Em resposta à missão da universidade como de local de produção de
conhecimento, o “Núcleo de Estudos e Trabalhos Estratégicos no Trato com a
Violência” foi criado (duas vezes por mês) na UNIP para realizar pesquisas e capacitar
profissionais das diferentes instituições da cidade.
O ritmo de atendimento do Pólo às vítimas da violência tem sido paulatino por
parte dos alunos para atender em plantões de 3ª (manhã) 4ª (manhã e noite) e 5ª
feiras (manhã e tarde).
A tomada de atitude com a criação do Pólo veio como resposta ao nosso
compromisso formando cidadãos no universo acadêmico que entendem seu dever em
contribuir preventivamente, acreditando que “Uma sociedade é a sua infância; o seu
modo de pensar e de proteger, o seu futuro, encontra-se todo no destino que a
sociedade reserva à infância” (Eligio Resta).
O compromisso na formação também perpassa pela ação de promover
profissionais críticos que devem se perguntar em sua práxis: como queremos que seja
a nossa sociedade? Como ela se encontra na atualidade? ou Como podemos lhe
oferecer um destino melhor?
No trabalho com a violência não podemos deixar de considerar sua forma cíclica a
transgeracionalidade pelas quais vivem as famílias.
Outra questão para ser pensada no trabalho com a violência é a forma como o seu
povo passa por ela. Quanto mais consciente uma nação de suas mazelas, melhor sua
capacidade de reparação, e no caso do povo brasileiro, ao longo dos últimos anos,
parece que este tem acordado para suas responsabilidades e compromisso rumo à
ética como nação.
“É dever da família, da sociedade e do estado, assegurar à criança e
adolescente com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação... à convivência familiar e comunitária, além
de colocá-la a salvo, de toda forma de negligência, de discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão”. (Constituição Federal,
art. 227)
O Pólo Não Violência parte do pressuposto de que o profissional deve ter uma
postura crítica e política no que refere ao enfrentamento à violência. Esta deve ser
considerada como todo e qualquer ato coercivo ou contrário à vontade de uma pessoa
(físico, psíquico, social, ambiental etc).
O nosso compromisso é o de ajudar as famílias a romper o ciclo da violência
alertando-as para a dificuldade da tarefa.
Nosso apoio deve ser incondicional e o trabalho de rede/parcerias é fundamental.
Em conjunto com PACIN, o CREAS e com o Hospital Regional da Cidade estamos
atendendo algumas vítimas da violência que necessitam de um acolhimento imediato
e gostaríamos de divulgar as primeiras impressões sobre este trabalho.
Alunas do nono e décimo semestres de psicologia e uma ex-aluna compõem a
equipe de atendimento
Exemplos clínicos de atendimento a vítima de violência sexual no Pólo Não
Violência
Caso de Marta
A mulher que será apresentada no caso a seguir será chamada de Marta, 38 Anos.
Auxiliar de cozinha e retrata bem como ocorre, ainda nos dias de hoje, a violência do
ponto de vista social contra a mulher em uma cidade do interior.
Motivo: Abuso sexual – estupro. Um único atendimento
Marta chega muito desconcertada ao iniciar sua fala “e dizer que não quer mais
pensar no que lhe aconteceu”, ou seja, sobre o abuso sexual que sofreu na última
segunda-feira dia 23 de março de 2009. Diz que está muito envergonhada e que não
conseguiu retomar suas atividades desde que foi violentada. Lamenta-se, dizendo que
não conseguiu voltar ao trabalho, dizendo que sabe que estava errada em aceitar uma
carona de um estranho, mas justifica seu ato, dizendo que o ônibus que pega todos os
dias (último da noite) havia passado minutos antes de chegar e não parou para que
ela pudesse subir.
O abusador que estava de carro e bem vestido, foi convincente, fazendo-a
acreditar que seu destino era para o Bairro onde ela mora (no Éden), sem antes
mesmo perguntar para a mesma onde ela morava.
Ele a leva até metade do caminho e depois toma outra direção, fechando as
portas do carro, pedindo-lhe para ficar quieta, pois ele só queria “fazer amor” (sic) com
ela.
No meio do percurso, Marta começa a chorar e tenta convencer o abusador a
deixá-la ali mesmo, mas ele se afasta de qualquer ponto movimentado e para o carro,
dizendo que se ela não cooperasse algo de ruim poderia acontecer com ela, alterando
a sua voz neste momento. Após o abuso, ele a deixou no bairro Aparecidinha,
dizendo-lhe que não era de Sorocaba, era de São Paulo e que no dia seguinte ela
poderia voltar a acenar para o ônibus que este pararia no ponto, como de costume.
Marta é separada e vive apenas com um filho de 12 anos, sozinha na cidade
de Sorocaba. Sua separação aconteceu há dois meses. Não contou o fato para o filho,
querendo poupá-lo, mas contou para os pais que vivem em São Paulo e eles pediram
que ela voltasse para São Paulo, mas ela teme ter que mudar de novo, pelo filho, pois
esta é a segunda vez que tenta viver em Sorocaba e ele já perdeu dois anos de sua
vida escolar.
Ela só não está segura de voltar ao seu local de trabalho, pois teme sofrer com
possíveis brincadeiras que possam ser dirigidas à sua pessoa. Pensamos juntas sobre
as possíveis respostas que ela poderia dar às possíveis provocações que pudessem
ocorrer a respeito de um estupro a uma senhora de 38 anos (no caso, ela). Tratamos
de apontar para a Marta sua qualidades e fortalecê-la egoicamente, ao fazer o
apontamento de como ela optou por morar sozinha, assumir sua vida longe da família
etc.
Ao final, ela colocou que morava em um interior Paulista e que lá era comum pegar
carona das pessoas, pois a cidade era pequena e podia-se confiar nas pessoas. Foi
encorajada pela psicóloga a voltar ao trabalho, reforçando novamente que se tratava
de uma mulher de atitude, dona de sua própria vida, o que foi confirmado pela mesma,
ao dizer que por muito tempo foi arrimo de família e que sempre resolveu os
problemas da sua família de origem. Ao final, quando parecia mais tranqüila, também
foi encorajada a escrever sobre o ocorrido até que consiga dissipar a emoção contida
em si. O pólo foi colocado à disposição para quando necessitasse voltar.
Caso de Vera
A próxima mulher que será apresentada no caso a seguir será chamada de Vera,
34 anos, do lar, vítima da violência do ponto de vista transgeracional no contexto
familiar, associado à deficiência.
Motivo: Abuso sexual do pai para com os três filhos. Dois atendimentos.
1º Atendimento
Vera chega para o atendimento, acompanhada por uma profissional do PACIN
com quem mantemos uma parceria, dizendo que não sabe o que vai falar. Eu a
acolho, dizendo-lhe do propósito do Pólo, quando ela inicia, dizendo que já passou por
psicóloga e por psiquiatra, mas não deu continuidade ao tratamento. Quando
questionei o por que, ela diz que não sabe, simplesmente parou de ir. Vera parece ter
algum tipo de desadaptação social ou emocional, pois não apresenta um pensamento
coerente e sua fala é totalmente desprovida de qualquer emoção. Fala, por exemplo,
sem emoção, de seu histórico de vida, quando perdeu a mãe aos 9 anos de derrame
cerebral e que depois disso esteve na casa de diferentes famílias (pois a mãe
distribuiu os filhos antes de morrer) até que a sua mãe adotiva, a Ana, a encontrou
mais ou menos quando tinha uns 15 anos (ela não se recorda) e a trouxe para
Sorocaba, onde trabalhou a ajudou a Ana a cuidar de sua filha. Ficou com a Ana até
encontrar um marido (em uma festa na casa da Ana) passando a viver com ele e com
a sogra. Depois de dois meses se casou e teve três filhos: a mais velha tem 11 anos, a
do meio tem 6 anos e o filho caçula tem 1 ano e meio. Ao relatar sobre o abuso da
filha maior a mãe não expressa sentimento sobre a gravidade do fato, referindo-se à
filha apenas como “coitadinha, ele a amarrava e fazia aquilo com ela” (sic). Seu
discurso confuso não permitiu que me relatasse que todos os filhos tinham sido
abusados pelo pai (informação trazida pela profissional da instituição PACIN). A mãe
só disse que as filhas ficaram com a Ana sua mãe adotiva e que ela ficou com mais
novo porque não podia sustentar mais dois filhos. Desde o episódio (quando falou com
o médico sobre o abuso com a mais velha e este acionou o conselho tutelar que
também acionou a polícia) ela não sabe dizer se o pai foi preso ou não. Alega que
agora não tem onde morar, dependendo de parentes e desta mãe adotiva para lhe
darem abrigo em troca dos serviços domésticos. Na atual casa onde se encontra
(segundo ela, casa de uma tia) ela alega que trabalha muito e sofre muita humilhação
por parte do seu filho mais velho de 15 anos que também briga e desrespeita a tia.
Pretende se mudar nos próximos dias para a casa de uma amiga que a convidou.
Vera diz que tem muitas dores pelo corpo e que às vezes amanhece chorando e
sem ânimo para nada. Questionada sobre ter alguma habilidade manual que pudesse
lhe dar uma renda ela respondeu que não sabe fazer nada e que só queria ter uma
casa só para ela, mas não sabe como. Vê as filhas de vez em quando e imagina que
quando se mudar só poderá vê-las aos finais de semana, pois vai para a periferia da
cidade. Diz que a filha não gosta de tocar no assunto do abuso e ela não sabe como
fazer isso como mãe. Foi orientada a voltar com a filha se ela quisesse, pois que
juntas poderíamos conversar sobre o ocorrido.
2º Atendimento
Vera chega novamente acompanhada pela profissional do PACIN sem a criança
que ficou com a mãe adotiva (que na verdade é a sua irmã – esta foi uma informação
passada pela profissional). Depois desta informação, percebi que Vera não tem noção
dos seus laços familiares aqui em Sorocaba. A tia da qual me falava na semana
passada também é uma de suas irmãs e esta informação ela não assimilou. Ela
realmente se mudou de casa e agora mora com outra irmã que pensa que é apenas
uma amiga da Ana (quem considera sua mãe adotiva). Ao descrever a casa onde está
morando ela disse que ainda está em construção, “não tem esgoto e que precisam
fazer coco no saquinho, pois só dá pra fazer xixi na casa.” (sic). Disse que não tem
contra-piso e que acabou de se mudar par lá. A casa tem um quarto, sala e cozinha.
Ela disse que dorme no quarto do filho da Adriele com o seu filho caçula e que as
roupas e móveis ainda estão encaixotados pelo meio da casa. Para Vera é melhor
morar lá porque durante o dia não tem ninguém que a mande fazer as coisas ou que a
xingue. Eu ainda perguntei o que ela mais gostava de fazer na sua vida e ela pensou
muito para responder, dizendo que “é fazer serviço” (sic). Então perguntei para Vera
se havia alguma coisa que ela não gostava e ela me disse que não tinha entendido a
questão. Motivada a pensar pela psicóloga, Vera pensa por um longo tempo e diz que
não gosta de “lavar roupa”.(sic).
Neste encontro Vera chorou muito porque disse que sua suposta mãe adotiva (a
Ana) a chamou de irresponsável, pois ela tirou o menino da escola e agora ele fica
com ela todo o dia. Disse que a Ana a xinga e não acredita que ela tenha dores pelo
corpo ou que precise de ajuda psicológica.
Apesar de toda dificuldade de entendimento desta mãe precisei fazer intervenções
num nível bem concreto próximo de sua realidade para ajudá-la a pensar sobre sua
subjetividade, por exemplo, o que gosta e o que não gosta sua vida. Utilizamos
também a linha do tempo para que ela pudesse se situar no tempo e espaço. Estas
foram atividades que Vera fez com muita dificuldade. Ao final pudemos falar sobre
seus sentimentos, pois na linha do tempo ela só se lembrou dos filhos que teve e eu
aproveitei para lhe dizer que parecia que os filhos eram realmente importantes na vida
dela e se realmente eram importantes isso significava que ela não era assim tão
irresponsável como disse a sua mãe adotiva Ana. Ela chorou mais uma vez e foi
encorajada a seguir desenhando a linha da sua vida, pensando sobre como ela queria
conduzi-la a partir das coisas mais importantes. Vera saiu mais aliviada da sessão.
Caso de Gilda e Alice
As próximas adolescentes atendidas serão chamadas de Gilda, 14 anos e Alice
de 13 anos, estudantes, retratando a realidade da violência em famílias isoladas
socialmente.
Motivo: Vítimas de abuso sexual por parte do tio (irmão do pai). Um
atendimento.
1º Atendimento
A mãe vem da área rural Vila Elvio, de ambulância (que fica esperando a
finalização do atendimento), para trazer as duas filhas que estavam sendo abusadas
sexualmente pelo tio (irmão do pai)
Quando eu encontro a mãe que estava com um bebê de cerca de 1 ano no colo e
lhe pergunto se ela gostaria de falar comigo primeiro a respeito do que aconteceu ela
diz que veio por causa das filhas e me apresenta Gilda e Alice. Eu me apresento e
pergunto a idade das meninas, em seguida pergunto se elas gostariam de falar comigo
juntas ou separadas e elas dizem que querem ir juntas. Como duas adolescentes,
sobem atrás de mim, rindo entre si, encantadas com a novidade do lugar.
Ao estabelecer o “rapport” sobre o papel do psicólogo percebo que as duas estão
muito envergonhadas, sobretudo a Alice. Percebo ainda que existe uma certa
“cumplicidade” entre elas. Ao apresentar o trabalho que realizo no Pólo eu pergunto se
elas reconhecem que o que aconteceu com elas era um tipo de violência e as duas
concordam. Eu peço que relatem como foi e porque estão ali e neste momento elas
permanecem em silêncio. A Gilda insiste com a Alice para que ela fale, mas Alice põe
a blusa na boca e diz que tem vergonha. Retomo novamente o “rapport” sobre o meu
papel em estar ali para ajudá-la. Ela se vira para a irmã e sussurrando um som apenas
com as cordas vocais, sem emitir uma palavra ela se refere à irmã, pedindo que esta
conte sobre o fato ocorrido. Percebo que este é um tipo de comunicação conhecido e
já estabelecido pelas duas, pois não precisam de palavras para saber o que a outra
está pensando ou sentindo.
Ainda assim, as duas permanecem em silêncio, que eu tento quebrar,
esclarecendo os diferentes tipos de violência pelos quais uma pessoa pode passar. Ao
final, eu pergunto se elas entenderam e se elas se reconhecem em algum dos tipos
relatados.
Iniciamos um diálogo neste momento quando Alice diz que a mãe sempre briga
com ela quando ela vai falar alguma coisa (referindo-se à violência psicológica).
Perguntei se eram irmãs do mesmo pai e se tinham mais irmãos em casa e elas
confirmaram, dizendo que ainda têm mais três irmãos. Uma mais velha de 20 anos, as
duas de 14 e 13 anos, uma outra de 10 anos e o caçula de 1 ano. Quando eu comento
que a mãe poderia estar estressada por conta do número de filhos que tinha para
cuidar a Alice não entende a palavra “estressada” e eu explico. Elas concordam. Eu
pergunto como elas dividiam as tarefas em casa e a Alice diz que ela limpa o quarto e
lava a louça e a Gilda lava o banheiro e limpa a sala. A mãe se ocupa do bebê e a
mais velha faz a comida. A mãe não trabalha. Eu pergunto como é a casa delas e elas
dizem que a casa está em um sítio e que o pai cuida dos carneiros. A casa, muito
simples e pequena (quarto sala e cozinha), fica próxima a um galpão onde os
carneiros dormem.
Alice e Gilda não têm noção de cálculos matemáticos e a memória (sobretudo a
emocional) parece estar comprometida. Não souberam me dizer a quanto tempo vem
acontecendo a agressões, sequer quando foi a última vez.
Eu pergunto quem era o agressor e elas dizem que foi o irmão do pai (Alfredo),
conhecido como “brancão”, que morava em um sítio próximo do deles e que sempre
as levava para limpar a casa, quando costumava abusar das duas, uma de cada vez,
levando-as para o quarto, enquanto a outra trabalhava. Eu pergunto se aconteceu
muitas vezes e a Gisele diz que com ela foi só uma vez, mas com a Gilda foi mais de
uma vez. Eu pergunto quanta e a Alice diz que não sabe. Eu pergunto se ele dava
dinheiro em troca e elas confirmam.
Eu pergunto se elas gostavam de fazer a limpeza e a Gilda diz que sim, mas a
Alice diz que não.
Eu comento que as duas são meninas muito bonitas e pergunto, por exemplo, se
elas tem muitos paqueras na escola. Gilda diz que os meninos paqueram, mas elas
não podem namorar, porque a mãe não deixa.
Pergunto se elas gostam da escola e Gilda diz que sim, mas Alice diz que não,
pois não gosta de ler e esquece muitas coisas. Pergunto se elas costumam usar o
computador da escola e elas dizem que nunca viram ou manusearam um. Não sabem
como funciona.
Ao falar, Alice coloca a blusa na boca, dizendo que está frio e fica difícil entender o
quer dizer. A irmã Gilda diz em tom incisivo: “Tira a blusa da boca pra falar” (sic).
Neste momento eu digo que a Gilda parece com a mãe dela, dizendo-lhe o que
deve e o que não deve fazer e ela ri.
Eu pergunto novamente há quanto tempo elas vêm sofrendo o abuso e elas não
sabem dizer “A gente não lembra” (sic).
Para ajudá-las a pensar, pergunto quem é que gosta de matemática dentre as
duas e a Gilda diz que ela gosta. Então começamos a pensar em que série as duas
estão no ensino fundamental, uma está na sétima e outra na oitava seria. Pergunto em
que série elas estavam quando os abusos começaram para ver se elas conseguem
associar a idade ao ano letivo. Gilda não se lembra, mas Alice diz que estava na
quarta série quando começou a ir para o sítio do tio com a irmã. Estimuladas a
fazerem as contas nenhuma das duas consegue. Eu pergunto para a Gilda quantos
anos ela tem hoje e quantos anos tinha no ano passado, associando a idade à série e
elas com muita dificuldade para fazer a associação junto comigo conseguem dizer que
há 4 anos (pois as duas repetiram de ano) vêm sofrendo o abuso. Eu pergunto como a
família ficou sabendo e a Gilda diz que a Alice tentou dizer para a mãe que não
acreditava nela, mas quando a mãe perguntou para a ela (Gilda) então a mãe
acreditou.
Com a mãe
Ao final do atendimento eu pedi para falar com a mãe que me contou a história do
ponto de vista dela. Disse que o conselho tutelar foi até a sua casa e falou que as
filhas estavam sendo abusadas. Alguém do bairro havia feito a denúncia. A mãe disse
que todo mundo via o tio (que era o único que tinha carro na família, por perto –
freqüentava a sua casa todos os fins de semana) sair com as meninas e passar a mão
nas pernas delas na frente de qualquer pessoa. Sem contar que entrava pelos
canaviais com as duas sem se preocupar se era dia ou noite. A mãe diz que o pai,
quando ficou sabendo, saiu nos tapas com ele (que fugiu logo em seguida). O pai foi
querer bater nas filhas e a mãe o impediu, com um grito, dizendo-lhe para não
esquecer que ela também tinha tido a mesma história e que não mereciam apanhar.
Foi quando o pai se deteve. A mãe disse que aos nove anos a mesma coisa
aconteceu com ela. Era abusada por um homem que morava no mesmo bairro rural.
Ela explica da situação difícil que vive a família, sem dinheiro sequer para vir ao
tratamento em Sorocaba. Para chegar ali às 9h eles tiveram que sair às 5h da manhã
de casa e só conseguiram vir porque a prefeitura ajudou com a ambulância. O tio
ainda está foragido e a mãe diz que na casa dela ele não pisa mais.
A mãe foi orientada e seguir falando com as filhas (e em família) sobre o ocorrido
em suas vidas para que pudessem ter um futuro alicerçado na verdade como tem sido
a vida dela e que passasse a confiar mais nas filhas e na sua intuição de mãe para
protegê-las.
Em nossa experiência, sabemos que uma família pode passar anos de sua
existência submetida aos abusos e violência sem se dar conta do estado de feitiço no
qual se encontra. Muitas destas famílias, de Sorocaba e região, encontram-se isoladas
do macro social (vindas de realidades rurais), desprovidas de recursos e profissionais
que as ajude a identificar o agressor como alguém que precisa ser detido em seus
atos.
Esperamos que os atendimentos relatados até o momento possam propiciar
reflexões iniciais da práxis do psicólogo no enfrentamento da violência sexual,
buscando diferentes técnicas, considerando caso a caso e a realidade que cercam
estas pessoas. Sabemos que as diferentes realidades culturais, os impedimentos
sociais e econômicos que distanciam estas famílias de recursos imediatos de ajuda
podem dificultar o trabalho do psicólogo causando-lhe, sobretudo, sentimentos de
impotência quando não se tem uma rede de apoio mútuo que ampare estas famílias,
mas este não deve ser um impedimento para não seguirmos enfrentando situações
complexas que envolvem esta temática. O Centro de Psicologia Aplicada pode ser um
importante elo entre universidade e instituições privadas ou públicas na construção
desta rede de enfrentamento. Por esta razão propomos a seguir reflexões e
possibilidades técnicas a partir de nossa prática no Pólo Não Violência.
Perspectivas do trabalho no pós-violência
Com os profissionais –
Médicos, profissionais do serviço social, enfermeiros, professores etc estão
diretamente implicados com a problemática. Cada profissional deve estar atento ao
tema na sociedade e deve à medida de sua práxis fazer o seu papel para ajudar a
vítima ao descobrir o fato e encaminhá-la aos devidos setores de psiquiatria ou
psicologia.
O atendimento à vítima apenas começa ao ser detectada a violência na escola
ou em uma consulta médica. O ideal seria que as vítimas chegassem para o
atendimento psicológico para trabalharmos o trauma (com o abusado), sem haver
vivido constrangimento ou traumas em suas relações com estes profissionais (o
que geralmente não acontece por falta de preparo dos mesmos, ou pelo
sentimento de impotência frente ao fato).
Todos nós profissionais (sobretudo nas áreas da saúde, da educação, das
humanas e biomédicas) estamos implicados com o tema da violência e
deveríamos encontrar meios de criar uma rede de apoio mútuo.
Do ponto de vista psicológico, podemos propor uma sugestão técnica para os
profissionais abordarem o tema com as crianças que sofreram uma violência
sexual.
Quando o caso vem à tona, o profissional, para se aproximar de uma criança
que chega em sua sala, pode se sentar no mesmo nível que ela, procurando evitar
se posicionar de maneira que fique superior a ela, pois esta relação (física,
espacial e não verbal) de poder ela já conhece por parte do abusador.
Deve-se aproximar perguntando se ela já esteve em algum médico e se sabe o
que fazem os médicos (ou profissionais do serviço social etc). Não devemos nos
esquecer que quando a criança chega em um atendimento para averiguação do
abuso é porque ela ou alguém comunicou o fato (que está ocorrendo ou já vinha
ocorrendo no passado). A criança, geralmente, associa sua vinda ao médico ao
que foi dito, comunicado, denunciado, e não ao fato em si. Isto quer dizer que ela
deverá passar ao médico, enfermeiro, ou profissional do serviço social porque seu
segredo foi revelado, o que no seu pensar pode lhe custar sua vida ou colocar a
vida de alguém que ama muito em perigo. É por esta perspectiva que o
profissional deve iniciar seu contato.
Se o profissional terá como rotina de trabalho o atendimento a crianças,
deveria se preocupar em ter em seu ambiente uns poucos materiais lúdicos que
facilitem a aproximação com a mesma. Do aspecto comunicacional podemos
propor que tenham por perto telefones de brinquedo, livros de contos de fada, ou
livros só com gravuras para os pequenos, bonecos caracterizando uma família,
dentre outros. O brinquedo deve funcionar como recurso mediador para aliviar
alguma tensão (culpa ou angústia) vivida pela criança desde que o tema abuso foi
revelado com a quebra do sigilo, deixando-a mais à vontade para falar do assunto
com o profissional.
Uma das possibilidades para se iniciar um contato comunicacional é
perguntando se a criança conhece alguns contos de fada. Pode-se apresentar o
Conto de Fadas da “Branca de Neve“, associando a história relatada ao fato
ocorrido com ela e esperando que ela espontaneamente se manifeste em relação
ao fato do abuso. Estes procedimentos podem levar mais tempo que o esperado e
o profissional deve estar disponível para ouvir a criança, sem a preocupação com
o tempo, pois o estabelecimento do vínculo é fundamental para que a criança se
sinta à vontade para entender o que se passou com ela. Tipos de associação que
podem ser feitas:
Branca de Neve é uma menina que não tem ninguém por ela, está sozinha e
não pode contar com sua mãe, pai ou irmãos. Não tem com quem compartilhar as
maldades que sofre por parte da madrasta.
Branca de Neve é bonita e sua beleza única atrai a madrasta (que é adulta).
Ela quer ser igual a ela, ou seja, quer possuir a beleza dela.
A madrasta usa de seu poder para fazer a Branca de Neve sua escrava,
sobrando para a mesma os piores serviços da casa. Branca de Neve fica numa
posição submissa e não tem outra opção senão a de obedecer à madrasta.
Branca de Neve está sempre disposta a ajudar e fazer tudo o que lhe pedem,
ao contrário, a madrasta está sempre pensando em si mesma e só se preocupa
com seu próprio desejo, ela quer realizar seu desejo de ser a mais bonita.
Branca de Neve tem o lado bom e a madrasta tem o lado mau. A madrasta
quer tirar da Branca de Neve o que lhe é mais sagrado, ou seja, o seu coração que
é cheio de sentimentos bons, pois ela acredita que roubando o coração de Branca
de Neve ela vai possuir tudo o que deseja.
Branca de Neve encontra pessoas boas no seu caminho que a ajudam a fugir
da madrasta e preservar o seu coração (seus sentimentos) e sua vida.
A madrasta nunca desiste, pois acredita que o coração da Branca de Neve lhe
pertence e vai atrás dela, só que agora de maneira disfarçada, fingindo ser alguém
que não é (uma velhinha sensível, fraca, faminta) que precisa ser cuidada. Ela
conhece o coração de Branca de Neve e sabe que ela vai ceder mais uma vez.
Branca de Neve cede mais uma vez e acaba comendo a maçã oferecida pela
velhinha (madrasta) disfarçada que a enfeitiça para dormir eternamente.
Branca de Neve só cai no feitiço da madrasta porque não vê maldade em sua
intenção.
Só um príncipe que vem de longe (vem de fora, de outras terras) pode salvar a
Branca de Neve. Só ele pode quebrar o feitiço da maçã e libertar a Branca de
Neve para ser feliz pra sempre.
A madrasta vai ser procurada e perseguida pelos sete anões até que seja
encontrada e tem um fim cruel ao cair no penhasco, como castigo por todos os
erros que cometeu.
Estas são algumas das associações que o profissional pode utilizar para ajudar
a criança a perceber o que aconteceu com ela e o abusador, quando tem a
suspeita que a criança sofreu algum tipo de abuso, dizendo-lhe que ela pode ser
ajudada e viver feliz para sempre como foi a Branca de Neve da mesma forma que
o abusador merece ser procurado e castigado, como ocorreu com a madrasta.
O conto de fada pode servir como um instrumento facilitador comunicacional
para a criança perceber que o que ocorreu com ela (ou seja, uma relação de
domínio, submissão, bem e mau etc) é algo mais comum do que ela pensa ou
pensava até então ao manter o sigilo por tanto tempo.
O aspecto dos cuidados físicos com a criança no que refere a ter que submetê-
la a exames de rotina para a constatação do abuso deveria ser algo que
acontecesse paulatinamente de modo que ela se sentisse participante no
processo, percebendo a necessidade de mostrar ao profissional o que estava por
trás da quebra do segredo que foi a causa dela estar ali.
Nos dias de hoje o profissional que trabalha na linha de frente com os casos de
violência tem buscado capacitação para desenvolver sua práxis de forma mais
segura, embora ainda nos deparamos com profissionais que se encontram
isolados em suas realidades, assumindo a tarefa sem um respaldo de orientação
técnico ou de discussão dos casos atendidos por ele.
A dificuldade de programas prontamente estabelecidos pelos diferentes
governos (estadual ou municipal) em resposta a uma demanda social política
como vem sendo o caso de instalações de CPIs sobre abuso sexual, sobretudo
contra crianças é que estes programas acontecem antes mesmo de terem sido
planejados em suas realidades e no caso do trabalho com a violência,
especificamente, uma rede re apoio mútuo deve ser ao menos identificada em
cada contexto de forma que o profissional não se sinta impotente diante de um
fato sem poder encaminhá-lo ou lhe dar um desfecho que o satisfaça.
Com a família
Sabe-se através dos estudos já realizados (Azevedo, 1998, Perrone, 1997
dentre outros) que a família que possui um abusador tende negar ou negligenciar o
fato, até que ele venha à tona. A família, assim como o abusado, parece estar
enfeitiçada e impedida de reagir para não entrar em contato com aspectos vividos
no passado de sua história transgeracional, possivelmente associadas à violência
ou abuso.
Assim, a família acaba se tornando vulnerável em sua função protetora e
desenvolve mecanismos no seu funcionamento psicodinâmico geradores de
Ansiedade de separação (não consegue se ver livre do agressor) e de Culpa, ao
ser confrontado com suas responsabilidades social pelo ocorrido.
Para concluir, o estado emocional vulnerável do grupo familiar que vive sob a
pressão do agressor violento é visível em seus membros que apresentam
características enfraquecidas em seu funcionamento psíquico desenvolvendo falta de
autoconfiança, submissão, além do comportamento de evitação, cuja tendência é a de
colocar no outro a responsabilidade pelo ocorrido.
O que muitas vezes pode estar camuflado por trás destes comportamentos é o
Transtorno de Personalidade Dependente - TPD descrito por Zaretsky, 1997, apud
Perry, 2005, que se caracteriza em ambientes em que a autonomia e a dependência
são excessivamente estimuladas, desencorajadas, ignoradas ou punidas, podendo a
dependência se tornar cada vez mais acentuada ou patológica. Também podem
ocorrer quando as necessidades e sentimentos da pessoa com TPD são ignorados ou
punidos demais ou quando passam pelo fracasso em suas realizações. O TDP como
patologia só será perceptível no contexto social quando o indivíduo for incapaz de
realizar qualquer ação diante de um problema em sua vida, ou seja, só quando ele
chega ao seu limite e pede ajuda.
Tratamento –
Acreditamos que é possível conseguir êxito nos atendimentos de casos de TPD no
trabalho psicoterápico breve, contudo, podem se tornar prolongados, dependendo do
sujeito e do terapeuta, de seus objetivos, da aliança e das técnicas empregadas.
Não é um tema fácil de trabalho e por esta razão não encontramos muitos
profissionais capacitados para trabalhar com a problemática.
É possível realizarmos um trabalho eficaz se estivermos amparados por
conhecimento técnico e por uma rede.
É preciso estar fortalecido emocionalmente para entrar em contato com a violência
sofrida (abusado e família cuidadora).
Faz parte do tratamento esgotar as possibilidades de angústia vividas pelo
abusado (se possível com o membro cuidador) em nível intrapsíquico.
Garantir, durante o processo, que o abusado possa entrar em contato com
potenciais psíquicos antes desconhecidos. Ajudar o abusado a desenvolver
estratégias pessoais de superação em relação ao abuso sofrido.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AZEVEDO, M. A. e GUERRA, V.N.A. Infância e violência fatal em família. IGLU


Ed. 1997.
PERRONE, R. e NANNINI, M. Violência y abusos sexuales en la família, Paidós
Terpia Familiar, 1997.
PERRY J.C. Transtorno de Personalidade Dependente. Cap 27 in: Gabbard, G.O. e
cols. Compêndio de Psicoterapia de Oxford, 2007.
Representação do luto em profissionais de enfermagem: contribuições do
desenho-estória com tema

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aplicações de diferentes técnicas gráficas de avaliação psicológica em
psicologia da saúde

Natália Aparecida Ramos Galvão


Paulo Francisco de Castro (Coordenador
Instituição: Universidade de Taubaté / Universidade Guarulhos

Resumo
O presente trabalho reflete sobre a representação do luto em um grupo de
profissionais de enfermagem, submetidos ao desenho-estória com tema. Discute-se a
necessidade de vivenciar sentimentos emergentes durante a morte de alguém cujo
vínculo de qualquer ordem foi estabelecido, dentre estes sentimentos o luto, entendido
como uma reação normal frente à perda de um vínculo e que tem como função
proporcionar recursos para a adaptação do indivíduo frente às mudanças ocorridas em
conseqüência das perdas, merece destaque. Ainda mais quando se trata de
profissionais da área de enfermagem, que convivem rotineiramente com os pacientes
e estabelecem com esses uma relação de cuidado. Participaram do estudo vinte
profissionais da área de enfermagem, entre técnicos e enfermeiros, com idade entre
26 e 60 anos, com variada experiência em enfermagem e vivência diante de perdas e
mortes relacionadas a pacientes que receberam seus cuidados. Todos os
colaboradores responderam a um breve questionário sobre informações sócio-
demográficas e foram submetidos aos procedimentos de aplicação do desenho-estória
com tema em que foi solicitado para o participante que realizasse um desenho sobre
„um profissional que acabou de vivenciar uma morte no seu local de trabalho‟, após a
produção gráfica foi solicitado que o colaborador narrasse uma história sobre seu
desenho, seguida por um inquérito realizado a partir das questões que emergiram da
narrativa. Após análise das histórias, os dados de maior incidência foram os seguintes:
Atitude básica de aceitação (N=16), revelando resignação diante da situação de luto
evocada pela produção gráfica; Figura fraterna positiva (N=17), indicando que os
objetos significativos envolvidos na associação com a morte e luto mostram-se
catexizados de maneira positiva e acolhedora; Sentimentos derivados do instinto de
vida (N=12), que remetem à associação construtiva e organizada diante das vivências
decorrentes da morte e luto na prática profissional; Tendências construtivas (N=19),
que podem ser associadas ao movimento de cuidado, típico nos profissionais de
enfermagem, mesmo diante da perda de um paciente; Impulsos amorosos (N=20),
significando o elemento emocional de cuidado e acolhimento dos profissionais de
enfermagem diante dos pacientes, principalmente diante da morte dos mesmos;
Mecanismo de defesa de racionalização (N=10), significando que os recursos que
esses profissionais reúnem para elaborar os sentimentos de morte e luto são
provenientes de elaboração racional, buscando uma explicação lógica e coerente para
essa vivência. Pela grande importância dos profissionais de enfermagem no cuidado e
na saúde das pessoas, outros estudos que versem sobre seu estado psicológico são
importantes.

Palavras-chave: avaliação psicológica, luto, enfermagem

Trabalho Integral

1 Introdução

Questões relativas à morte sempre indagaram o homem, porém a forma que ele lida
com a mesma sofreu alterações ao longo dos anos. É possível observar que a morte
deixou de acontecer no lar e passou a acontecer em hospitais, diferentes sentimentos
relacionados ao tema também sofreram mudanças, sendo que hoje são tidos, por
muitos, como sinônimo de fraqueza, algo a ser desprezado, escondido.

Estudiosos apontam para a necessidade de vivenciar estes sentimentos emergentes


durante a morte de alguém cujo vínculo foi estabelecido, dentre estes sentimentos o
luto, entendido como uma reação normal frente à perda de um vínculo e que tem como
função proporcionar recursos para a adaptação do indivíduo frente às mudanças
ocorridas em conseqüência das perdas, merece destaque. Em conseqüência desta
atitude (suprimir o luto) alguns autores já citam termos como luto patológico ou luto
complicado que seria uma resposta inadequada frente à morte podendo acontecer, por
exemplo, inibição ou prolongamento das respostas decorrentes do luto em si.
Devido ao movimento que o processo de morrer sofreu, deixando de ser um evento
situado no núcleo familiar para ocorrer em diferentes enfermarias surgiu à
necessidade de estudar como os profissionais representam o luto vivido em sua
prática. Dentre os profissionais da saúde a enfermagem destaque-se, pois permanece
mais tempo com o paciente e é a primeira equipe a recorrer suas necessidades.
Estudos mostram que há um sofrimento na equipe perante a morte de um paciente,
pois esta situação é encarada como uma derrota, todo o estigma que envolve o tema e
a agilidade e rapidez exigida pela função fazem com que o profissional não vivencie o
luto, ou se sintam culpados por terem estes sentimentos acreditando assim que
deixaram de ser profissional. Mas é preciso dedicar maior atenção para estas equipes,
pois o sofrimento prolongado pode levar ao aparecimento de estresse.

Nas últimas décadas podem-se observar as grandes descobertas feitas pela ciência e
os surpreendentes avanços tecnológicos. O conhecimento humano deu um grande
salto tanto qualitativo, quanto quantitativo, porém o homem continua a se indagar com
uma das questões mais antigas da humanidade: a morte e todo mistério nela
envolvido. “Quando retrocedemos no tempo e estudamos culturas e povos antigos,
temos a impressão que o homem sempre abominou a morte e, provavelmente sempre
a repelirá” (KÜBLER-ROSS, 1996, p. 14). Porém a forma com que ele lida com a
mesma sofreu alterações ao longo da história, a morte passou de um evento íntimo
situado no núcleo familiar para se tornar institucionalizada, amparada por tecnologia
de ponta, os antigos médicos que eram amigos da família e partilhavam de sua
intimidade foram substituídos por profissionais cada vez mais especialistas, fazendo
necessário percorrer vários deles para um diagnóstico.

Mesmo com estas mudanças visíveis a morte continua sendo tratada como um tabu,
algo que deve ser evitado, escondido.

Segundo Costa e Lima, (2005, p. 152) “observa-se que a morte está ausente do dia-a-
dia do mundo familiar, pois foi transferida para os hospitais e as crianças são
impedidas, pelos adultos, de participarem dos cerimoniais de despedidas”.

Embora o luto não siga um processo linear, de acordo com os autores supracitados é
possível observar algumas fases vividas durante a elaboração do luto como:
Fase do choque onde podem prevalecer sentimentos de isolamento e irritabilidade;
fase do desejo onde o enlutado tem um desejo intenso de reencontrar a pessoa
perdida; fase da busca onde misturada com a fase anterior ocorre desorganização e o
desespero, pois esta perda traz consigo outras secundárias, cuja intensidade
dependerá das características da personalidade e das experiências prévias do
enlutado e do apoio recebido por parte da sociedade e da família e a fase da
reorganização quando ocorre aceitação da perda (OLIVEIRA; LOPES, 2008).

Assim, o luto é considerado organizado quando a pessoa consegue passar pelas


fases e perceber que é preciso continuar a seguir a própria vida, como relata Oliveira e
Lopes (2008).

O desenho-estória com tema “trata de uma extensão do desenho estória para


estudos específicos de determinados temas” (CUNHA, 2000, p. 437). O
procedimento de desenho-estória “foi introduzido por Walter Trinca, em 1972, para
se prestar à exploração da dinâmica inconsciente da personalidade” (CUNHA,
2000, p. 428). Uma das principais características desta técnica consiste na “[...]
detecção de angústias inconscientes fundamentais que estão presentes na
personalidade do cliente em determinado momento de sua vida” (TRINCA, 1987,
p.xiii).

O desenho estória com tema é um procedimento de investigação clínica da


personalidade, que foca diferentes aspectos psicodinâmicos da personalidade dos
sujeitos, entre esses, os mecanismos de defesa do ego.

2 Objetivo

Refletir sobre a representação do luto em um grupo de profissionais de enfermagem,


submetidos ao desenho-estória com tema

3 Método

Participaram do estudo vinte profissionais da área de enfermagem, entre técnicos e


enfermeiros, com idade entre 26 e 60 anos, com variada experiência em enfermagem
e vivência diante de perdas e mortes relacionadas a pacientes que receberam seus
cuidados.

Todos os colaboradores responderam a um breve questionário sobre informações


sócio-demográficas e foram submetidos aos procedimentos de aplicação do desenho-
estória com tema onde foi solicitado para o participante que realizasse um desenho
sobre „um profissional que acabou de vivenciar uma morte no seu local de trabalho‟,
após a produção gráfica foi solicitado que o colaborador narrasse uma história sobre
seu desenho, toda a história foi registrada pelo examinador, assim como o inquérito
posterior que foi realizado a partir das questões que emergiram da narrativa.

4 Resultados e Discussão

Após a coleta de dados, as narrativas foram analisadas de acordo com a proposta de


Tardivo (1997) os dados foram categorizados de acordo com a referida versão,
configurando-se os seguintes resultados:

Tabela 1. Atitudes básicas observadas na história


Atitude N %
Aceitação 16 80
Oposição 2 10
Insegurança 1 5
Identificação positiva 0 0
Identificação negativa 1 5
Total 20 100%

No que se refere às atitudes básicas, ou seja, a relação que o protagonista da história


estabelece consigo e com o ambiente, tem-se, como é possível observar na Tabela 1,
que a maior parte dos profissionais (80% - N=16) indicou uma atitude de aceitação,
submetendo-se às demandas do meio externo no que se refere às vivências de morte
e luto.

Tabela 2. Figuras Significativas


Figura N %
Figura materna positiva 0 0
Figura materna negativa 0 0
Figura paterna positiva 2 10
Figura paterna negativa 0 0
Figura fraterna positiva 17 85
Figura fraterna negativa 1 5
Total 20 100%

Em relação às figuras significativas presentes na pesquisa, tal como apresentado na


Tabela 2, enfatiza-se a figura fraterna ou figura sentida como positiva (85% - N=17),
na qual existe a identificação pautada no instinto de vida defendido pela proposta
freudiana, sendo comprova a necessidade dessa figura positiva no que se refere aos
elementos ligados ao luto.

Tabela 3. Sentimentos Expressos pelo Protagonista


Sentimentos N %
Sentimentos derivados do instinto de vida 12 60
Sentimentos derivados do instinto de morte 0 0
Sentimentos derivados do conflito 7 35
Sem indicação de sentimentos 1 5
Total 20 100%

Conforme exposto na Tabela 3, destaca-se os sentimentos expressos pelo


protagonista da história como originários e derivados do instinto de vida (60% - N=12),
mostrando a necessidade de construção e positividade frente ao ambiente, a partir da
expectativa de melhora da situação diante do luto vivenciado. Entretanto, há incidência
de sentimentos derivados do conflito (35% - N=7) em um grupo de profissionais que
indicou dificuldade em processar adequadamente as vivências de morte e luto.
Apenas um colaborador não expressou qualquer tipo de sentimento diante da vivência
da morte, conjectura-se, nesse caso, que o mesmo tenha utilizado processos
defensivos que levassem à supressão emocional diante dos elementos de luto.

Tabela 4. Tendências e Desejos do Protagonista


Necessidade N %
Necessidade de suprir faltas básicas 1 5
Tendências construtivas 19 95
Tendências destrutivas 0 0
Total 20 100%

Destaca-se na Tabela 4, frente às tendências e desejos, que a motivação dos


profissionais de enfermagem (95% - N=19) foca-se em tendências construtivas,
revelando uma motivação para resolver o possível impasse psicológico decorrente da
vivência de morte e luto.

Tabela 5. Impulsos expressas pelo protagonista


Impulsos N %
Amorosos 20 100
Destrutivos
Total 20 100%

A Tabela 5, expõe que todos os sujeitos participantes da pesquisa indicaram atitudes


que se baseiam nos impulsos amorosos do indivíduo diante da vivência da morte e
luto, por trabalhar de forma para que o ambiente se torne menos hostil e mais
aceitável.

Tabela 6. Ansiedades apresentada pelo protagonista


Ansiedades N %
Ansiedades paranóides 7 35%
Ansiedades depressivas 13 65%
Total 20 100%

Frente às ansiedades, destaca-se a ansiedade depressiva (65% - N=13), onde o


indivíduo tende a elaborar constantes mecanismos de defesa para lidar com tais
situações angustiantes a partir da morte e luto no desenvolvimento de suas funções
profissionais.
Tabela 7. Mecanismo de Defesa observada na narrativa
Mecanismo de Defesa N %
Cisão 3 15
Projeção 1 5
Repressão - -
Negação/Anulação 4 20
Regressão - -
Racionalização 10 50
Isolamento 1 5
Deslocamento - -
Idealização - -
Sublimação - -
Formação reativa 1 5
Total 20 100%

Em relação aos mecanismos de defesa utilizados como recursos para enfrentar as


situações advindas da vivência de morte e luto, tem-se a metade dos profissionais de
enfermagem utilizando o mecanismo de Racionalização, nesse mecanismo os
indivíduos fazem uso da razão para enfrentar a situação, por meio de explicações
razoáveis e mediadas por elementos lógicos; a seguir 20% (N=4) dos profissionais
lançam mão da Negação/Anulação, que representa uma postura de retirar da
realidade as emoções geradas pelo luto e morte, como se deixassem de existir em
suas vivências; além desses 15% (N=3) fazem uso da cisão, ou seja, rompem as
vivências, separando-as em positivas e negativas, dessa maneira podem relacionar-se
somente com os componentes positivos da vivência.

5 Considerações Finais

Após análise das histórias, os dados de maior incidência foram os seguintes:


Atitude básica de aceitação (N=16), revelando resignação diante da situação de
luto evocada pela produção gráfica;
Figura fraterna positiva (N=17), indicando que os objetos significativos envolvidos
na associação com a morte e luto mostram-se catexizados de maneira positiva e
acolhedora;
Sentimentos derivados do instinto de vida (N=12), que remetem à associação
construtiva e organizada diante das vivências decorrentes da morte e luto na prática
profissional;
Tendências construtivas (N=19), que podem ser associadas ao movimento de
cuidado, típico nos profissionais de enfermagem, mesmo diante da perda de um
paciente;
Impulsos amorosos (N=20), significando o elemento emocional de cuidado e
acolhimento dos profissionais de enfermagem diante dos pacientes, principalmente
diante da morte dos mesmos;
Mecanismo de defesa de racionalização (N=10), significando que os recursos que
esses profissionais reúnem para elaborar os sentimentos de morte e luto são
provenientes de elaboração racional, buscando uma explicação lógica e coerente
para essa vivência.

Pela grande importância dos profissionais de enfermagem no cuidado e na saúde das


pessoas, outros estudos que versem sobre seu estado psicológico são importantes.

Referências

COSTA, J.C.; LIMA, R.A.G. Luto da equipe: revelações dos profissionais de


enfermagem sobre o cuidado à criança/adolescente no processo de morte e morrer.
Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 13, n. 2, abr.
2005 .
CUNHA, A.J. e cols. Psicodiagnóstico-V. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.
KÜBLER-ROSS, E. Sobre a morte e o morrer: o que os doentes têm para ensinar os
médicos, enfermeiros, religiosos e aos próprios parentes. 7. ed. São Paulo: Martins
fontes, 1996.
OLIVEIRA, J.B.A.; LOPES, R.G.C. O processo de luto no idoso pela morte de
cônjuge e filho. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 13, n. 2, Jun. 2008.
TARDIVO, L. S. L. P. C. Análise e Interpretação. In TRINCA, W. (org.). Formas de
investigação clínica em psicologia. São Paulo : Vetor Editora, 1997. p.115-156.
TRINCA, W. Investigação Clínica da Personalidade: o desenho livre com estímulo
de percepção temática. 2. ed. São Paulo: E.P.U., 1987.
Resiliência e saúde: a interface no relacionamento “transitório” entre
cuidadores, crianças e adolescentes de uma instituição

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aplicações em psicologia da saúde: considerações sobre a saúde do
trabalhador em diferentes contextos

Juliana Carvalho Azevedo


Marilza Terezinha Soares de Souza
Paulo Francisco de Castro (Coordenador)
Instituição: Universidade de Taubaté / Universidade de Taubaté / Universidade
Guarulhos

Resumo
O objetivo desse estudo foi identificar crenças e práticas de cuidadores em
uma instituição localizada no Vale do Paraíba e analisar como as mesmas constituem-
se em fatores protetores ou de risco para a saúde das crianças e adolescentes e dos
próprios cuidadores. Foi utilizado o método qualitativo, que teve em sua concepção a
modalidade de pesquisa exploratória e como delineamento o estudo de caso. Foram
entrevistados quatro cuidadores representantes de cada setor de uma instituição
destinada ao abrigo temporário de crianças e adolescentes denominada Casa
Transitória. Compuseram a amostra cozinheira, uma berçarista, uma cuidadora de
crianças de três a dez anos e uma cuidadora de adolescentes. O instrumento utilizado
foi a entrevista individual semi-estruturada e a análise dos dados foram utilizados
alguns procedimentos da Grounded Theory Methodology. Os resultados obtidos
mostraram que a crença dos cuidadores em relação à imagem das crianças e
adolescentes institucionalizados é de que são vitimizadas e sem futuro com conflitos
na adolescência de difícil solução. Além dos cuidados básicos de higiene e
alimentação, o vínculo estabelecido entre os cuidadores e as crianças e
adolescentes, é distante, na medida em que existe a premissa de que não é permitido
aproximação física ou afetiva para que a criança não se acostume e não sofra
posteriormente. As crenças sobre educação da criança e adolescente são permeadas
pela experiência pessoal das cuidadoras, sendo consideradas indefesas as crianças e
rebeldes os adolescentes. Enquanto os cuidados propiciados como a rotina, higiene e
alimentação são fatores protetores à essas crianças e adolescentes, constata-se que
a falta de orientação e suporte às cuidadoras é fator de risco para stress e fadiga. A
dificuldade na identificação de seu papel como profissional ou como mãe, o número de
funcionários insuficientes, a repressão no estabelecimento de vínculos, o contato com
o sofrimento dessas crianças e a falta de apoio no esclarecimento do que significa
“transitoriedade” e desenvolvimento humano, contribuem para situações de
nervosismo tornando-se fatores de risco para a saúde dessas cuidadoras. Como o
desenvolvimento humano saudável das crianças e adolescentes está intimamente
relacionado aos vínculos que se estabelecem entre as mesmas e seus cuidadores, e
considerando ainda que esses vínculos são interrompidos quando essas crianças e
adolescentes são encaminhados ao abrigo, “transitoriamente”, a condição de tornar-
se “saudável” e desenvolver a resiliência é transferida para a interface da interação
circular estabelecida entre cuidadores e crianças, propiciando a ambos fatores de
risco e proteção.

Palavras-chave: resiliência e saúde, cuidadores, crianças e adolescentes


institucionalizados

Trabalho Integral

Texto originado do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “Instituição Abrigo:


crenças e práticas dos cuidadores de crianças e adolescentes e suas
implicações para fatores de resiliência” realizado pela segunda autora e orientado
pela primeira.

Breve Histórico da Infância e Institucionalização


A família, de acordo com Martins e Szymanski (2004), tem sido apontada como
uma das únicas possibilidades de desenvolvimento social e emocional para uma
criança pequena. As autoras afirmam que a história tem mostrado que a forma como a
família, a infância e o modo de tratamento à criança se transformaram no decorrer do
tempo.
Segundo Ariès (1973/1981 apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004) até o século
XVII, a criança era vista como algo insignificante, tendo pouca importância para a
própria família, sendo abandonada à própria sorte, pois representava um grande
sacrifício. Badinter (1985 apud MARTINS; SZYMANSKI, 2004) afirma que esse
abandono ocorria não somente por problemas de ordem econômica, mas pelo próprio
egoísmo dos pais.
No lar Aristocrático, conforme Martins e Szymanski (2004) as crianças estavam
nas mãos de fâmulos e criados e eram consideradas pequenos animais, não objetos
de amor e afeição. Com o triunfo do Cristianismo por estabelecer rígidos padrões
morais para a família, a Igreja provocou um aumento significativo do abandono,
porque condenava o adultério (MESGRAVIS, 1976 apud MARTINS; SZYMANSKI,
2004).
No Brasil Colonial, e mesmo durante a época do Império, havia a Roda
instalada em orfanatos ou instituições religiosas, era um modo de abandonar crianças
pequenas sem identificar-se. A Roda era um cilindro oco de madeira com abertura em
uma das faces onde ficava uma janela, por onde eram colocadas as crianças. A mãe
batia na madeira para avisar ao porteiro, que ficava do lado de dentro para não ver
seu rosto e girava a Roda, recolhendo o abandonado. O abandono através da Roda
estendeu-se até o período Republicano e, em decorrência do crescente número de
crianças abandonadas, foram sendo criados grandes orfanatos, patronatos e
seminários.(Martins e Szymanski 2004).
Ao final do século XIX, no Brasil, constituíram-se novas políticas
assistencialistas envolvendo preocupações médicas e jurídicas. A demanda acentuada
de crianças pelas ruas ou abandonadas e as altas taxas de mortalidade infantil
resultaram no surgimento de instituições para abrigo desses menores (MESGRAVIS,
1976; RIZZINI, 1993; LEITE, 1997; MARCÍLIO, 1998 apud MARTINS; SZYMANSKI,
2004).
Através da sua institucionalização, os "abrigos", cumpriam sua função que -
ao recolher os abandonados - preservava a sociedade funcionando como controle da
ordem social. À medida em que o infanticídio e o aborto foram sendo criminalizados
pela crescente cristianização dos costumes, abandono, tornou–se a prática
socialmente aceita para "solucionar" os casos de adultério e de gravidez indesejada,
no decorrer da história (ABBUD, 1999).
No Brasil, a partir do século XX, começa a existir um modo mais humano de
lidar com a criança e um novo sentimento de afeto é dedicado a ela. Entretanto,
muitas ainda sofrem maus tratos e são abandonadas pelos seus pais. Em decorrência
disso, a prolifera-se o número de instituições ou casas de amparo a crianças
abandonadas. (Martins e Szymanski, 2004). Desde a última década do século XX e
nesse início do século XXI outras mudanças ocorreram, principalmente com a criação
do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA em 1990 (Brasil, 1990).
De acordo com o Art. 2º da Lei nº 8069/90, que instituiu Estatuto da Criança e
do Adolescente - ECA, “considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até
doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de
idade” (Brasil,1990, p. 15). As Medidas de Proteção do ECA, para serem cumpridas
necessitam que tanto os responsáveis por sua aplicação quanto seus executores -
entre os quais as entidades que oferecem abrigo para as crianças e adolescentes e os
seus cuidadores - tenham amplo conhecimento do estatuto, recebam treinamento
adequado, e ainda contribuam para que estas crianças e adolescentes sob suas
guarda provisória, possam exercer plenamente seus direitos, especialmente o da
convivência familiar e comunitária, evitando assim o isolamento representado pela
institucionalização.
As “casas-abrigo” destinadas a acolher crianças e adolescentes desamparados
ou tutelados pela justiça multiplicaram-se depois do ECA, porém, com o propósito de
servir de abrigo temporário, e não de moradia fixa, como era o caso dos orfanatos
(PARREIRA; JUSTO, 2005; CORRÊA, 2006). Contudo, conforme afirmam Siqueira e
Dell‟Aglio (2006) apesar do programa de abrigo estar previsto pelo ECA (Brasil, 1990)
como medida provisória e transitória, a permanência breve ou continuada no abrigo
está relacionada à história de cada criança ou adolescente. Assim, a permanência
nestas instituições pode durar anos sem a possibilidade da criança ou adolescente
estar em famílias substitutas, ou ainda, sem poder voltar para suas famílias de origem.
Devido à negligência por parte de algumas instituições, crianças e
adolescentes vivem conseqüências muitas vezes graves, como por exemplo, a perda
seus vínculos familiares, do referencial de autoridade e a capacidade afetiva. Desta
forma, os institucionalizados criam um mundo artificial, deixando-os absolutamente
dependentes de outras pessoas. Quando ocorre a permanência na instituição por um
período de tempo indefinido, esta, ao invés de ser um local provisório, torna-se um
local de moradia (ILANUD, 2008).
O ECA preconiza a desinstitucionalização valorizando o papel da família, as
ações locais e as parcerias no desenvolvimento de atividades de atenção. Assim, as
instituições de abrigo devem estar configuradas em unidades pequenas, com poucos
integrantes e manter um atendimento personalizado. No atendimento à crianças e
adolescentes deve-se evitar a transferência destas crianças e adolescentes para
outros abrigos, preservar o grupo de irmãos e ser estimulada a participação em
atividades comunitárias (SIQUEIRA; DELL‟AGLIO, 2006).
No Brasil, há centenas de instituições que abrigam crianças e adolescentes por
diversos motivos, tais como, a miséria, o desemprego prolongado, a desagregação
familiar, a dependência das drogas e a violência doméstica, causas que se configuram
em problemas estruturais da sociedade brasileira (FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS
PARA A INFÂNCIA – UNICEF, 1998; WEBER, 2001; CARVALHO, 2002 apud
CORRÊA, 2006).
Dados sobre a realidade das instituições de abrigo apontam que, estas vivem
quase sempre em condições precárias como a superlotação das entidades, o
despreparo dos educadores para lidar com as vicissitudes do desenvolvimento em
condições de extrema vulnerabilidade social, a massificação e a despersonalização
dominantes no cuidado de bebês (GUIRADO, 1986; ALTOÉ, 1993; GAGNO; WEBER,
1996; WEBER; KOSSOBUDZKI, 1996; WEBER, 1998 apud CORRÊA, 2006).
Segundo Ribble (1975), quando pensamos em Abrigos, percebemos que os
cuidadores necessitam de conhecimentos técnicos para desenvolverem os cuidados
adequados com as crianças. Sabe-se que a oportunidade de praticar certas
habilidades comuns na vida familiar é impossível na instituição, por serem várias
crianças sob a responsabilidade de um cuidador apenas. Por esse motivo muitas
vezes a criança é confinada ao berço, limitada na locomoção e exploração ambiental,
além de não ser observada individualmente.
Segundo Cesca (2004), a internação em instituições tem sido uma “saída”
controvertida como prática social de cuidado com a infância. De um lado há um
consenso de sua inevitabilidade, quando se trata do atendimento às populações que
não dispõem de recursos financeiros e psicológicos. De outro, há também consenso
sobre os prejuízos para a criança, sobretudo em termos de afetividade. Além disso, de
acordo com Siqueira e Dell‟Aglio (2006) são observados problemas funcionais, como o
número inadequado de funcionários que levam à dificuldades no cumprimento das
funções, sobrecarga das tarefas e um atendimento pouco eficaz.
Para Carvalho (2002 apud SIQUEIRA; DELL‟AGLIO, 2006), o ambiente
institucional não se constitui no melhor ambiente de desenvolvimento, pois o
atendimento padronizado, grande número de crianças sob a responsabilidade de um
único cuidador, a falta de atividades planejadas e a fragilidade das redes de apoio
social e afetivo são alguns dos aspectos relacionados aos prejuízos que a vivência
institucional pode operar no indivíduo.
Em função desse e outros fatores, pesquisas revelaram que o tipo de violência
que mais prevalece nas instituições é a negligência (ILANUD, 2008).
Rizzini (1995 apud ALEXANDRE; VIEIRA, 2004) afirma que, abandonar ou
enviar uma criança para um abrigo é privá-la de ter uma família, de ter intimidade e
cumplicidade, o que não é possível em abrigos, pois há uma proporção grande de
crianças em relação a adultos.
Porém, de acordo com Siqueira e Dell‟Aglio (2006) não se pode negar que
existem situações em que as crianças devem ser criadas fora de seus próprios lares,
como quando for absolutamente impossível tornar o lar adequado à criança. Tirar as
crianças e os adolescentes de um ambiente onde seus direitos não estão sendo
respeitados e onde correm sérios perigos em relação à sua integridade física e/ou
psíquica pode ser visto como uma interdição legítima do Estado (PARREIRA; JUSTO,
2005).
O estudo de Yunes et al. (2002 apud SIQUEIRA; DELL‟AGLIO, 2006), sobre
abrigos mostra a existência de uma predominância da função assistencialista da
instituição, apoiada na perspectiva de somente ajudar as crianças institucionalizadas,
havendo pouco compromisso com as questões do desenvolvimento da infância e da
adolescência. Contudo, em certos lares, o meio ambiente físico e social é tão
empobrecido e caótico que a colocação de uma criança em uma instituição pode
proporcionar a recuperação e um crescimento psicológico (BRONFENBRENNER,
1996 apud SIQUEIRA; DELL‟AGLIO, 2006).
Segundo Justo (1997 apud PARREIRA; JUSTO, 2005), estar em situação de
abrigado coloca o sujeito em lugar de passagem, onde os vínculos se tornam
temporários e as relações, instáveis. Os autores ainda afirmam que mesmo que a
criança permaneça na instituição por um longo tempo, dificilmente reconhecerá aí sua
própria imagem, pelos estigmas que pesam sobre os asilados.
A maior parte das famílias, não recebe apoio adequado para enfrentar e ter a
possibilidade de reverter a situação que levou a criança ou adolescente à
institucionalização. Com isso a maioria das crianças acabam não retornando ao lar de
origem (CESCA, 2004).
Bronfenbrenner (1979/1996 apud SIQUEIRA; DELL‟AGLIO, 2006) declara que
apesar da instituição ser um contexto possível de desenvolvimento, não fornece um
equivalente funcional familiar para seus internos. Sendo assim, uma das principais
preocupações de uma criança abrigada, de acordo com Parreira e Justo (2005), é
reencontrar seus pais ou encontrar uma família que a adote.
Alexandre e Vieira (2004) afirmam que após a separação de suas famílias, as
crianças tentam encontrar outras figuras de apego em diferentes situações. Bowlby
(1973/1998 apud SIQUEIRA; DELL‟AGLIO, 2006) destaca que a presença de uma
pessoa conhecida e/ou de objetos familiares no novo ambiente de desenvolvimento da
criança e a presença de cuidados maternais de uma mãe substituta colaboram para a
diminuição das reações negativas frente à separação de crianças e suas mães.
Segundo Ribble (1975), o contato físico entre a criança e seu cuidador, é um
estímulo necessário para que ocorra o crescimento e o desenvolvimento da percepção
da criança, além de ajudar a estimular reações emocionais. Ainda, segundo a autora,
o contato físico vai além de dar banho e alimentação, pois estes logo se tornam
mecânicos, é necessário também acariciar, afagar, cantar e falar com a criança.
Assim, a relação estabelecida da criança com os cuidadores desempenha papel
central na vida das crianças e dos adolescentes abrigados, à medida em que serão
estes adultos que assumirão o papel de orientá-los e protegê-los, constituindo, neste
momento, os seus modelos identificatórios. Além disso, o contato com os pares de
idades variadas pode configurar num apoio social e afetivo, operando como fator de
proteção para as crianças e adolescentes institucionalizados (SIQUEIRA;
DELL‟AGLIO, 2006).
A instituição, os cuidadores e o processo de resiliência
Entende-se como fatores de risco, segundo Williams et al. (2005 apud MAIA;
WILLIAMS, 2005) quanto ao desenvolvimento infantil todas as modalidades de
violência doméstica, tais como a violência física, a negligência e a violência
psicológica. No campo de Psicopatologia do Desenvolvimento, quando ocorrem
fatores de risco podemos presumir que há existência de uma probabilidade estatística
em uma determinada população para a ocorrência de algum transtorno(MASTEN;
GARMEZY, 1985 apud CECCONELLO, 2003). Para as autoras citadas, o risco possui
potencial para predispor pessoas e populações a resultados negativos específicos.
Neste caso, o resultado negativo ou indesejado pode significar uma manifestação de
doença ou algum comportamento desadaptado (COWAN; COLS, 1996 apud
CECCONELLO, 2003).
Widom (1989 apud MAIA; WILLIAMS, 2005), aponta que, crianças que foram
maltratadas fisicamente, foram identificadas por agências de assistência social, como
tendo o dobro de probabilidade (15,8%) em relação às outras crianças (7,9%) de
serem presas mais tarde por cometerem crimes violentos.
Barnett (1997 apud MAIA; WILLIAMS, 2005) enfatiza que, as crianças mais
jovens ou bebês estão mais pré-dispostos a sofrerem abuso físico, pois não são
capazes de escapar de pais ou cuidadores eminentemente abusivos.
A negligência, de acordo com Beserra, Corrêa e Guimarães (2002) é um tipo
de violência em que o agressor é passivo, mas não se pode esquecer que é crime, já
que suas conseqüências podem provocar a morte ou deixar seqüelas na saúde da
criança para o resto da vida. Segundo pesquisas, podemos notar o descaso e muitas
vezes a negligência de cuidadores em relação aos cuidados com as crianças e
adolescentes institucionalizados. Neste caso, as crianças e adolescentes, acabam
desenvolvendo um relacionamento artificial, inicialmente com que cuida e em seguida
transfere para outras relações (CALDEIRA, 2007)
Muitas vezes por falta de treinamento dos cuidadores e condições adequadas
de trabalho, além de crenças pessoais, ocorre nas instituições este tipo de violência, a
psicológica, que prejudica para um desenvolvimento sadio dos abrigados (CALDEIRA,
2007). Azevedo e Guerra (2002 apud PIMENTEL; ARAUJO, 2006), afirmam que,
essas atitudes de violência psicológica, incluem a rejeição, o não reconhecimento da
criança em sua condição de sujeito; degradação ou subvalorização da criança,
expondo-a à humilhação pública e atribuindo apelidos depreciativos, ameaças, surras,
reprimendas, castigos, isolamento, exploração.
Ainda segundo Souza e Cerveny (2006), o contexto de alto risco é entendido
como a existência de eventos altamente estressantes e mais duradouros, que pode
ser a separação de pais, pobreza ou falta de instrução. Entre os indicadores de risco
que se constituem em dificuldades e problemas para a família, Antoni e Koller (2000
apud PINHEIRO, 2004) relacionaram o descontrole emocional, a culpa, a falta de
responsabilidade e de diálogo, drogas, ausência dos pais, violência doméstica e na
comunidade, transição da infância para a adolescência e a ausência das redes de
apoio.
Do ponto de vista psicológico, Yunes e Szymanski (2001), referem-se à
resiliência como uma capacidade de qualquer pessoa resistir à situações adversas
sem perder o seu equilíbrio inicial, ou seja, a capacidade de se acomodar e
reequilibrar constantemente.
Já Walsh (1998) define a resiliência como um processo que é desenvolvido ao
longo do tempo por meio da superação de desafios e estabeleceu o que chamou de
processos-chave para que ocorra. Tais processos são o Sistema de Crenças, Padrões
de Organização e Processos de Comunicação. O Sistema de Crenças é considerado
o ponto central no processo de resiliência, visto que por meio dele que os eventos,
situações e são avaliados e lhes são atribuídos valores e formas de enfrentamento.
Resumidamente, os Padrões de Organização referem-se aos tipos de liderança,
recursos de apoio e rotinas do cotidiano e os Processos de Comunicação referem-se
à clareza, empatia e esforço colaborativo. Esses processos-chave, dependendo de
como se desenvolvam, constituem-se em fatores protetores que afetarão o processo
de resiliência.
Entre os desafios já citados pelos autores acima, qualquer situação de estresse
esperada e inesperada é entendida como um desafio. Assim, a situação de estresse
para a criança que é retirada da família é complementada pela incerteza da mudança,
de ser levada ao abrigo. Os cuidadores passam a ser os substitutos dos pais, e que
desempenharão as tarefas relacionadas aos processos-chave. A partir do
relacionamento com os pais ou cuidadores, a criança desenvolve expectativas que
podem estar relacionadas a si mesmo e ao cuidador, e mais tarde isso irá guiá-la para
os relacionamentos com outras pessoas. O apego seguro é parte do processo em que
a resiliência é observada (SOUZA; CERVENY, 2006).
A Relação entre Cuidadores e institucionalizados
Retomando o Sistema de Crenças estabelecido por Walsh (1998), segundo
Motta (2002), a maioria das crianças institucionalizadas, quando internadas em uma
instituição, trará consigo problemas anteriores. Estes poderão ser agravados ou
aliviados, isso dependerá da conduta assumida e das crenças e pré-conceitos em
relação à ela. Para a autora, a atribuição à criança de um bom ou mau caráter, de uma
boa ou má índole, a priori, estruturará as relações dos cuidadores e também de seu
grupo para com ela.
Segundo Motta (2002) é necessário ficar atento para que não ocorra a
massificação, a padronização das crianças, para que se possa manter a
individualidade, o senso crítico, a criatividade e a capacidade de iniciativa de cada
uma delas. Bebês que foram privados do contato com a mãe logo ao nascer devem
ser ajudados a se constituir apesar dessa falta primordial e para isso o cuidador tem
um papel fundamental (MACHADO; MELO; CASTILHO, 2008).
Machado, Melo e Castilho (2008), falam da importância da formação do
cuidador de bebês, onde o cuidador além de treinado nas funções de alimentar, e
prover os cuidados com higiene corporal da criança, precisa também servir de
referência de mundo para elas. Caso não ocorra a substituição da figura materna
a criança sentir-se-á insegura e rejeitada (ANDRADE; PELICIARI; CARVALHO, 2007).
As autoras concluíram em sua pesquisa que, as crianças sempre buscam alguém,
para representá-las e atuar em suas vidas de acordo com a figura materna, pedem
colo, ficam abraçando, brincam de mãe-filho e algumas até chamam o cuidador de
mãe. Concluiu-se também que as crianças mais velhas criavam expectativas de
quando poderiam ir embora e essa situação deixava as crianças angustiadas e
inseguras.
Quando a criança precisa ser separada da família e desta forma, encaminhada
a um abrigo, necessita de um cuidado diferenciado, pois a quebra do vínculo com a
família de origem pode trazer inúmeras conseqüências para seu desenvolvimento.
Bowlby (1990) identifica que não é qualquer separação que vai provocar distúrbios de
personalidade, mas são aquelas que causam privação à criança que vão causar
conseqüências realmente prejudiciais - porque constituem uma experiência em que a
criança não chega a desenvolver um vínculo real.
O cuidador é um empregado da instituição, é um papel que uma pessoa
qualquer exerce, com a intenção de cumprir uma tarefa. E o que ocorre muitas vezes é
que as instituições não têm um olhar diferenciado que vá além do cuidado formal
(MACHADO; MELO; CASTILHO, 2008).
Dada a questão da reciprocidade na formação do vínculo cuidador-crianças e a
sua influência no desenvolvimento de ambas as partes, focalizamos nesse trabalho a
visão os cuidadores enquanto profissionais, os desafios com os quais se deparam, e
sua relação de “transitoriedade” incerta com os menores.
A Pesquisa
Nesse estudo que originou-se de um Trabalho de Conclusão de Curso, tivemos
por objetivo identificar crenças e práticas de cuidadores em uma instituição localizada
no Vale do Paraíba e analisar como as mesmas constituem-se em fatores protetores
ou de risco para a saúde das crianças e adolescentes e dos próprios cuidadores. Foi
utilizado o método qualitativo, que teve em sua concepção a modalidade de pesquisa
exploratória e como delineamento o estudo de caso. Foram entrevistados quatro
cuidadores representantes de cada setor de uma instituição destinada ao abrigo
temporário de crianças e adolescentes denominada Casa Transitória. Antes de sua
aplicação o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa com Seres
Humanos da Universidade de Taubaté;
Formou-se uma amostra com os cuidadores de crianças e adolescentes de 0 a
18 anos incompletos responsáveis pelos cuidados diários, tais como, higiene,
alimentação e recreação. Compuseram a amostra uma cozinheira, uma berçarista,
uma cuidadora de crianças de três a dez anos e uma cuidadora de adolescentes.
Esses participantes aqui denominados Cuidadores Sociais, trabalham em turnos de
12/36 hs e fizeram um concurso público para trabalhar na instituição.
O instrumento utilizado foi a entrevista individual semi-estruturada e para a
análise dos dados foram utilizados alguns procedimentos da Grounded Theory
Methodology. Os níveis de análise incluíram os procedimentos de codificação aberta,
categorização e codificação axial.
Resultados e Conclusão
Os resultados obtidos mostraram que a crença dos cuidadores em relação à
imagem das crianças e adolescentes institucionalizados é de que são vitimizadas e
sem futuro com conflitos na adolescência de difícil solução. Além dos cuidados
básicos de higiene e alimentação, o vínculo estabelecido entre os cuidadores e as
crianças e adolescentes, é distante, na medida em que existe a premissa de que não é
permitido aproximação física ou afetiva para que a criança não se acostume e não
sofra posteriormente. As crenças sobre educação da criança e adolescente são
permeadas pela experiência pessoal das cuidadoras, sendo consideradas indefesas
as crianças e rebeldes os adolescentes. Enquanto os cuidados propiciados como a
rotina, higiene e alimentação são fatores protetores à essas crianças e adolescentes,
constata-se que a falta de orientação e suporte às cuidadoras é fator de risco para
stress e fadiga. A dificuldade na identificação de seu papel como profissional ou como
mãe, o número de funcionários insuficientes, a repressão no estabelecimento de
vínculos, o contato com o sofrimento dessas crianças e a falta de apoio no
esclarecimento do que significa “transitoriedade” e desenvolvimento humano,
contribuem para situações de nervosismo tornando-se fatores de risco para a saúde
dessas cuidadoras. Como o desenvolvimento humano saudável das crianças e
adolescentes está intimamente relacionado aos vínculos que se estabelecem entre as
mesmas e seus cuidadores, e considerando ainda que esses vínculos são
interrompidos quando essas crianças e adolescentes são encaminhados ao abrigo,
“transitoriamente”, a condição de tornar-se “saudável” e desenvolver a resiliência é
transferida para a interface da interação circular estabelecida entre cuidadores e
crianças, propiciando a ambos fatores de risco e proteção.
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SOUZA, M. T. S.; CERVENY, C. M. O. Resiliência: Introdução à compreensão do
conceito e suas implicações no campo da psicologia. Revista Ciências Humanas,
Taubaté, v.12n.2, p. 21-29, jun/Dez. 2006.
SOUZA, M. T. S. A resiliência na terapia familiar: construindo, compartilhando e
ressignificando experiências. Tese (Doutorado em Psicologia)- Departamento de
Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2003.
YUNES, M. A. M.; SZYMANSKI, H. Resiliência: noção, conceitos afins e
considerações críticas. In: TAVARES, J. (org) . Resiliência e educação. São Paulo:
Cortez Editora, 2001. p. 13-43.
WALSH, F. Strengthening family resilience. New York, The Guilford Press Ed.,
1998, 338 p.
1
Levantamento Nacional de Abrigos para Crianças e Adolescentes da Rede SAC;
Reordenamento de Abrigos Infanto-Juvenis da Cidade de São Paulo e
Reordenamento de Abrigos no Município do Rio de Janeiro.
Saúde psicológica em prática no ensino superior: estágio clínico supervisionado
em psicoterapia fenomenológico-existencial

Modalidade: Simpósio
Mesa: Por uma psicologia humana na dinâmica das relações escolares

Renata Ferrarez Fernandes Lopes (Coordenadora)


Roberta da Costa Borges
Instituição: Professora do Instituto Luterano de Ensino Superior de Itumbiara, Goiás
(ULBRA)/ Membro do Grupo de Pesquisa Sexualidade Vida (CNPQ/LATTES)

Resumo
O objetivo deste trabalho é apresentar a Fenomenologia-Existencial sendo
utilizada como referencial teórico e prático em estágio clínico supervisionado III,
voltado para alunos(as) do décimo período de Psicologia do Instituto Luterano de
Ensino Superior de Itumbiara, Goiás (ULBRA), cujo trabalho refere-se ao atendimento
psicológico de adolescentes e adultos na Clínica-Escola da ULBRA, sob supervisão de
psicóloga responsável. O objetivo do estágio clínico é a promoção de saúde
psicológica para a comunidade de Itumbiara, Goiás. O estágio clínico, atualmente, tem
duração de seis meses e, no período referente ao primeiro semestre do ano de 2010,
nove alunas realizaram os atendimentos psicológicos toda semana, cada um com
duração de cinqüenta minutos. As supervisões dos casos clínicos atendidos pelas
alunas foram realizadas semanalmente. A cada supervisão semanal foram
selecionados em média três casos das alunas para serem ouvidos e esclarecidos
mediante todo o grupo de estagiárias. As alunas foram incentivadas a utilizarem o
instrumento fenomenológico-existencial para a supervisão de psicoterapeutas
iniciantes que são as “Versões de Sentido”, ou seja, no fim de cada sessão de um
atendimento terapêutico, imediatamente após seu término, escreve-se alguma coisa.
Isso que se escreve não pretende ser um relato do que aconteceu em sua
materialidade, mas uma tentativa de dizer a experiência imediata do terapeuta
enquanto pessoa naquele momento, e enquanto ainda referida à sessão que acaba de
terminar. Inclui sua percepção e sentimentos não apenas acerca de si mesmo, mas
inclusive em relação às vivências trazidas pelo(a) seu(sua) cliente. Sendo assim,
entendemos que a tarefa da psicoterapia inclui o conhecimento teórico, a vivência
técnica, o vínculo autêntico com o paciente, a satisfação com o trabalho, além do
desenvolvimento pessoal do outro e de si mesmo como seres humanos. Portanto,
requer do psicoterapeuta uma síntese pessoal da teoria e da técnica, de forma a não
escravizá-lo nem a uma nem à outra. Intentamos, dessa forma, contribuir para a
reflexão e formação de futuros psicólogos na abordagem fenomenológico-existencial e
continuidade da promoção de saúde psicológica.

Palavras-chave: ensino superior, fenomenologia existencial, saúde psicológica


Trabalho noturno, saúde do trabalhador e relações familiares: estudo com
profissionais da cidade de Taubaté e São José dos Campos

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aplicações em psicologia da saúde: considerações sobre a saúde do
trabalhador em diferentes contextos

Adriana Leônidas de Oliveira


Paulo Francisco de Castro (Coordenador)
Tatiane Paula de Oliveira
Instituição: Universidade de Taubaté / Universidade Guarulhos

Resumo
O trabalho noturno é um tema de relevância na atualidade, devido sua
utilização em um grande número de empresas, por razões técnicas, sociais e
econômicas. Pesquisas têm demonstrado, entretanto, que este tipo de turno pode
trazer prejuízos à saúde do trabalhador, assim como perturbações na vida familiar e
social. Esta pesquisa teve como objetivo levantar e analisar as repercussões do
trabalho noturno na saúde e na vida familiar de profissionais das cidades de Taubaté e
São José dos Campos, ambas situadas no Vale do Paraíba, segundo a visão dos
próprios trabalhadores. Foi realizado um estudo exploratório, com abordagem
quantitativa, por meio do delineamento de levantamento. A amostra foi composta por
84 trabalhadores noturnos, de ambos os sexos, que trabalham no turno noturno fixo ou
rodiziante há no mínimo um ano. Foi utilizado um questionário para a coleta de dados
e os mesmos foram analisados quantitativamente por meio do software SPHINX.
Quanto à saúde, segundo a percepção dos trabalhadores, os resultados revelaram a
presença de alterações no sono, sendo apontados fatores como cansaço, desgaste,
estresse, irritabilidade, sonolência e dor de cabeça como associados à qualidade do
sono. Quanto à vida familiar as principais dificuldades enfrentadas em decorrência do
trabalha noturno são o pouco tempo para se dedicar à família devido à
incompatibilidade de horários, prejuízos na afetividade e qualidade das relações
devido à irritabilidade, falta de paciência e distanciamento. Os sujeitos da pesquisa
também percebem interferência do trabalho noturno nas atividades de lazer e no
relacionamento social, sendo que os trabalhadores do turno rodiziante percebem
maiores prejuízos nas relações sociais do que os trabalhadores do turno noturno fixo.
Pode se concluir que o trabalhador noturno percebe as conseqüências deste tipo de
trabalho na sua saúde e nas suas relações familiares, estando sujeito a diversas
variáveis que interferem negativamente em seu cotidiano, afetando o seu bem-estar e
de sua família. Enfatiza-se a importância de políticas de prevenção contra os possíveis
prejuízos à saúde física e mental do trabalhador, em busca da manutenção de uma
boa qualidade de vida dentro e fora do trabalho.

Palavras-chave: trabalho noturno, saúde, relações familiares

Trabalho Integral

1 INTRODUÇÃO

O trabalho é uma atividade essencial na vida cotidiana do ser humano, uma


vez que contribui para a manutenção da sua sobrevivência, e surgiu nos primórdios
dos tempos. Ao longo da história da humanidade o trabalho vem se
modificando,moldando-se e adaptando-se ao momento vivido pela sociedade, a fim se
atender as demandas de cada época. Conforme é organizado, o trabalho pode trazer
benefícios ao homem, mas também pode causar malefícios físicos e/ou mentais,
podendo afetar a saúde e o bem-estar do trabalhador.
Com a sociedade capitalista, houve a necessidade de aumentar a jornada de
trabalho, e abrir turnos para se poder dar conta da produção e atender a demanda.
Assim, o trabalho que era predominantemente diurno, passou a ser realizado em
turnos noturno. Segundo Santos (2008) o trabalho em turnos é caracterizado pela
continuidade da produção ou da prestação de serviços realizada por várias turmas,
sendo que estas se sucedem nos locais de trabalho, podendo modificar seus horários
de trabalho ou permanecer em horários fixos.
De acordo com Fischer, Moreno e Rotenberg (2003), a organização temporal
do trabalho em turnos e noturno causa importantes impactos no bem-estar físico,
mental e social dos trabalhadores. Este tipo de turno é amplamente empregado no
Brasil, e também aqui no Vale do Paraíba, em diferentes tipos de organizações.
Assim, o objetivo da presente pesquisa foi levantar e analisar as repercussões do
trabalho noturno na saúde e na vida familiar de profissionais das cidades de Taubaté e
São José dos Campos, ambas situadas no Vale do Paraíba, segundo a visão dos
próprios trabalhadores.

2 MÉTODO

O tipo de pesquisa realizada foi a de levantamento. Segundo Gil (2006), a


pesquisa deste tipo caracteriza-se pela interrogação direta das pessoas cujo
comportamento se deseja conhecer. Basicamente, procede-se à solicitação de
informações a um grupo significativo de pessoas acerca do problema estudado para,
em seguida obterem-se as conclusões correspondentes aos dados coletados.
Quanto à abordagem, trata-se de uma pesquisa quantitativa e assume um
caráter exploratório, pois conforme aponta Alves (2003), o objetivo é tornar mais
explícito o problema e aprofundar idéias sobre o objeto de estudo. Permite-se o
levantamento bibliográfico e a interrogação junto a pessoas que já tiveram
experiências acerca do objeto a ser investigado.
A pesquisa foi realizada em duas cidades do Vale do Paraíba: São José dos
Campos e Taubaté e foi aplicada em fábricas, condomínios residenciais, empresas de
segurança e outros lugares onde se encontram trabalhadores noturnos. O tipo de
amostragem adotada nesta pesquisa foi a não-probabilística por acessibilidade, e para
ser incluído na amostra, o participante deveria atender aos seguintes critérios: ser
trabalhador (a) noturno; trabalhar em turno fixo ou rodiziante há no mínimo 1 ano, ser
maior de 18 anos e trabalhar em Taubaté ou São José dos Campos. Foram abordados
homens e mulheres, independentes do nível de escolaridade e formou-se uma
amostra com 84 trabalhadores.
O instrumento utilizado para a coleta de dados foi o Questionário. Segundo
Alves (2003), questionário é constituído de um rol de perguntas que podem ser
respondidas sem a presença do pesquisador.
Todos os participantes da pesquisa assinaram um Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido. Os dados foram analisados por meio de técnicas quantitativas
com o auxílio do software SPHINX.

3 RESULTADOS
Quanto ao sexo 90,5% dos participantes são do sexo masculino e 9,5% são do
sexo feminino. Quanto à idade os participantes que têm até 20 anos são 1,2%, e os
que têm entre 21 a 30 anos são 26,2%, os que têm entre 31 a 40 anos são 36,9%, e
entre 41 a 50 anos são 26,2%, de 51 a 60 anos são 2,4% e acima de 61 anos são
3,6%.
Quanto à escolaridade, a maioria possui 2º grau completo (56%). Os demais
estão distribuídos da seguinte forma: 6,0% dos participantes possuem 1º grau
completo, 2,4% possuem 1 ºgrau incompleto, 6,0% possuem 2º grau incompleto,
11,9% possuem superior completo e 13,1% possuem superior incompleto.
As profissões apontadas pelos respondentes foram : 19 participantes são
policiais militares, 10 são vigilantes, 9 são eletricistas, 8 são industriários, 8 são
operadores de veículos industriários, 7 são operadores de máquina, 4 são mecânicos,
2 são funileiros, 2 são operadores de torno, 2 são da produção, 2 são soldadores, 1 é
analista, 1 é auxiliar de planejamento e produção, 1 é carpinteiro, 1 é coordenador de
produção, 1 é ferramenteiro, 1 é fresador, 1 é funcionário público, 1 é inspetor de
qualidade, 1 é líder de produção e 1 é operador logístico, e 1 não respondeu a esta
questão.
Com relação ao local de trabalho 71,4% dos participantes trabalham em
fábrica, 4,8% trabalham em condomínio e 23,8% trabalham em outros locais não
especificados.
Quanto à renda familiar, 3,6% dos participantes não responderam esta
questão, 13,1% recebem de 1 a 2 salários mínimos, 50,0% recebem de 3 a 5 salários
mínimos, 22,6% recebem de 6 a 8 salários mínimos e 10,7% recebem acima de 8
salários mínimos.
Com relação a dados familiares, 77,4% dos participantes têm filhos, 19,0% não
têm filhos e 3,6% não responderam esta questão. Quanto à idade dos filhos 9,5% dos
participantes possuem filhos com idade de 0 a 2 anos, e 35,8% possuem filhos com
idade de 3 a 12 anos, e 25,3% possuem filhos com idade entre 13 a 20 anos e 10,5%
possuem filhos com idade acima de 21 anos.
Com relação ao tipo de turno, 88,1% dos participantes trabalham em turno fixo
e 11,9% em turno rodiziante. Em relação as horas trabalhadas durante o dia, 65,5%
dos participantes trabalham até 8h por dia, 11,9% de 9h à 10h por dia e 22,6% de 11h
à 12h por dia.
Em relação ao tempo trabalhado em turno, 12,4% não responderam esta
questão, 25,0% trabalham até 1 ano, 20,2% de 1 ano e 1 mês até 3 anos, 11,9% de 3
anos e 1 mês até 5 anos e 40,5% acima de 5 anos.
Conforme pode ser visto no Gráfico 1 em relação à qualidade do sono, 46,4%
dos participantes consideram o sono bom, 35,7% regular, 14,3% insuficiente e 3,6%
como muito bom.

Bom 46,4%

Regular 35,7%

Insuf iciente 14,3%

Muito bom 3,6%

Gráfico 1 -Qualidade do sono


Analisando a qualidade do sono com relação ao gênero, pode se constatar que
as mulheres apontam uma qualidade de sono insuficiente em maior número do que os
homens, conforme pode ser observado no quadro 1:
Qualidade do s ono Insuf iciente Regular Bom Muito bom TOTAL
Se xo
Feminino 25,0% 37,5% 25,0% 12,5% 100%
Masculino 13,2% 35,5% 48,7% 2,6% 100%
TOTAL 14,3% 35,7% 46,4% 3,6% 100%

Quadro 1- Qualidade do sono x Sexo


Analisando a qualidade do sono e o tipo de turno, constata-se que os trabalhadores do
turno rodiziante têm o sono com menos qualidade do que a do trabalhador de turno
fixo.
Qualidade do s ono Insuf iciente Regular Bom Muito bom TOTAL
Tipo de turno
Fixo 13,5% 36,5% 47,3% 2,7% 100%
Rodiziante 20,0% 30,0% 40,0% 10,0% 100%
TOTAL 14,3% 35,7% 46,4% 3,6% 100%

Quadro 2: Qualidade do sono x Tipo de turno


Em relação à média de horas dormidas, 9,5% dos participantes afirmam dormir
menos de 5 horas, 13,1% dormem 5h, 46,2% dormem 6h, 16,7% dormem 7h, 13,1%
dormem 8h e 2,4% dormem mais de 8h.
O Gráfico 2 traz dados sobre se há interrupções durante o sono, e 61,9% dos
participantes responderam sim e 38,1% responderam que não.

Sim 61,9%

Não 38,1%

Gráfico 2- Interrupções durante o sono


Quando questionados sobre a causa que interrompe o sono : 38,1% não
responderam, 21,4% apontaram barulho externo e interno, 17,9% escolheram o
barulho interno, 13,1% escolheram outros e 9,5% apontaram o barulho externo.
No Gráfico 3 podem ser visualizados os sintomas associados à qualidade do
sono : 20,3% sentem cansaço, 16,8% desgaste, 13,3% estresse, 10,2% irritação, 9,8%
sonolência, 7,4% nervosismo, 5,5% dor de cabeça, 5,5% exaustão, 4,7% preguiça,
3,1% fadiga, 2,3% nenhum, 0,8% outro e 0,4% não responderam.

Cansaço 20,3%

Desgaste 16,8%

Estresse 13,3%

Irritação 10,2%

Sonolência 9,8%

Nervosismo 7,4%

Dor de cabeç a 5,5%

Exaustão 5,5%

Preguiça 4,7%

Fadiga 3,1%

Nenhum 2,3%

Outro 0,8%

Não resposta 0,4%

Gráfico 3-1 Sintomas associados a qualidade do sono


Ainda sobre o sono do trabalhador noturno, 50,0% dos participantes afirmam
sentir sonolência no horário de trabalho, 48,8% afirmam não sentir e 1,2% não
responderam. No quadro 3 pode se visualizar que em relação à sonolência no horário
de trabalho o sexo feminino é mais atingido. Diferenças também foram observadas
com relação ao tipo de turno, ou seja, os trabalhadores do turno rodiziante sofrem
mais sonolência do que os trabalhadores do turno fixo (Quadro 4)
Sonolência no horário de trabalho Não Sim Não TOTAL
Se xo respos ta

Feminino 0,0% 62,5% 37,5% 100%


Masculino 1,3% 48,7% 50,0% 100%
TOTAL 1,2% 50,0% 48,8% 100%

Quadro 3- Sonolência no horário de trabalho x Sexo


Sonolência no horário de trabalho Sim Não TOTAL
Tipo de turno
Fixo 47,3% 51,4% 100%
Rodiziante 70,0% 30,0% 100%
TOTAL 50,0% 48,8% 100%

Quadro 4- Sonolência no horário de trabalho x Tipo de turno


Em relação à avaliação da saúde, 65,5% dos trabalhadores consideram a sua
saúde boa, 21,4% consideram como regular, 11,9% consideram como muito boa e
1,2% não responderam. Quando questionados se associam alguma enfermidade ao
trabalho, 1,2% não responderam a esta questão, 28,6% responderam que sim e
70,2% responderam que não.
No quadro 5 pode ser visualizado que, em relação ao tempo de trabalho de
turno, as enfermidades associadas ao trabalho aparecem mais entre os profissionais
com 3 a 5 anos de trabalho.
Enfe rm idade as sociada ao trabalho Sim Não TOTAL
Te m po que trabalha por turno
A té 1 ano 4,8% 95,2% 100%
De 1 ano e 1 mês até 3 anos 29,4% 70,6% 100%
De 3 anos e 1 mês até 5 anos 60,0% 30,0% 100%
A cima de 5 anos 32,4% 67,6% 100%
TOTAL 28,6% 70,2% 100%

Quadro 5- Enfermidade associada ao trabalho x Tempo que trabalha por turno


No quadro 6, podemos visualizar que 22 pessoas responderam quais são as
enfermidades asssociadas ao trabalho. Assim 5 pessoas responderam dores na
coluna, 5 estresse e irritação, 5 L.E.R, 2 desgaste no ombro direito, 1 depressão, 1
dor de cabeça, 1 dor no estômago, 1 dores nos braços e 1 gastrite.
Qt. cit.
V alores

Dores na coluna 5
estresse, irritaç ão 5
L.E.R 5
Des gaste no ombro direito 2
Depressão 1
Dor de cabeça 1
Dor no estômago 1
Dores nos braços 1
Gastrite 1
TOTAL 22

Quadro 6- Quais são as enfermidades associadas ao trabalho


Analisando as questões relativas às relações familiares, foi questionado se há
conflitos em decorrência do trabalho noturno, e 71,4% responderam que não há
conflitos, 23,8% responderam que sim e 4,8% não responderam.
Vinte e um profissionais responderam quais os principais conflitos vivenciados
em decorrência do trabalho noturno. As respostas foram: 5 pouco tempo de dedicação
à família, 2 estresse, 2 incompatibilidade de horários, 2 irritação, 1 conflitos com os
filhos, 1 desgaste físico e psicológico devido a grande responsabilidade, 1 dormir
demais, 1 esposa quer conversar quando estou dormindo, 1 excesso de trabalho, 1
falta de diálogo, 1 filhos se desentendem, 1 incompreensão, 1 pequenas discussões e
1 saudades pela ausência.
Em relação às atitudes adotadas pelo grupo familiar para adaptação ao
trabalho noturno, obtivemos as seguintes respostas: 59,3% evitam o barulho, 18,5% o
trabalhador dorme menos para ter mais contato com a família, 14,8% desligam o
telefone, 5,6% outro e 1,9% não responderam.
Com relação à interferência do trabalho noturno na comunicação familiar,
70,2% disseram que não interferem e 29,8% disseram que sim.
Quando questionados se as situações associadas ao trabalho noturno
prejudicam a afetividade da familia, 52,4% disseram que sim e 47,6% disseram que
não. Em relação aos sentimentos considerados prejudiciais estão : 37,1% não
responderam, 27,6% falta de paciência, 19,0% distanciamento, 7,6% intolerância,
5,7% inconformismo e 2,9% outro. Em relação aos sentimentos positivos que
aparecem no relacionamento familiar, as respostas foram: 30,3% respeito, 28,3%
responsabilidade, 27,6% cooperação, 11,8% proteção, 1,3% não responderam e 0,7%
outro.
Os profissionais foram questionados se o trabalho noturno interfere nas
atividades de lazer, e 50,0% dos participantes responderam sim, 46,4% responderam
não e 3,6% não responderam. Pode ser visualizado no quadro 7 que, em relação à
interferência no lazer, para o sexo masculino a interferência é maior do que para o
sexo feminino.
Interferê ncia no laz er Não Sim Não TOTAL
Se xo respos ta

Feminino 0,0% 37,5% 62,5% 100%


Masculino 3,9% 51,3% 44,7% 100%
TOTAL 3,6% 50,0% 46,4% 100%

Quadro 7- Interferência no lazer x Sexo


Quando questionados quais as interferências nas atividades de lazer, 19,3%
sentem necessidade de descansar, 17,8% apontam o trabalho no fim de semana,
16,3% afirmam que atividades noturnas de lazer são incompatíveis com o horário
disponível, 15,6% tempo reduzido durante a semana e 2,2% outro.
Quanto à interferência do trabalho noturno no relacionamento social,
responderam que não interferem 57,1% e 42,9% disseram que sim. No quadro 8 pode
ser visualizado que, em relação à interferência do trabalho noturno no relacionamento
interpessoal, no turno rodiziante a interferência é maior do que no turno fixo.
Interfe no relacionamento interpess oal Sim Não TOTAL
Tipo de turno
Fixo 40,5% 59,5% 100%
Rodiziante 60,0% 40,0% 100%
TOTAL 42,9% 57,1% 100%

Quadro 8- Interfere no relacionamento interpessoal x Tipo de turno


Com relação à avaliação do relacionamento social 53,6% classificaram como
bom, 25,0% como regular, 15,5% como muito bom e 6,0% como insuficiente.

4 DISCUSSÃO
Podemos perceber nesta pesquisa que foi predominante o sexo masculino no
trabalho noturno, devido aos locais que foram coletados os questionários. O sexo pode
variar de acordo com o local de trabalho. Por exemplo, em linhas de produção de
fábricas e em empresas de segurança, podemos encontrar mais profissionais do sexo
masculino; em hospitais, podemos encontrar mais profissionais do sexo feminino. A
maior parte da amostra trabalha em linha de produção de fábricas da região, o que
determina a predominância do sexo masculino.
Pode ser visto que a faixa etária que concentra mais trabalhador noturno é
entre 31 a 40 anos. Nesta amostra de 84 trabalhadores noturnos, a maioria possui o 2º
grau completo. Na presente pesquisa, pode ser visto que a maioria dos trabalhadores
noturnos trabalha em turnos fixos e o restante em turno rodiziante. De acordo com
Fischer et al., (1995 apud FISCHER; MORENO; ROTENBERG, 2004) um estudo
realizado pela Fundação SEADE constatou que trabalhadores residentes na área
metropolitana de São Paulo, 8,6% eram trabalhadores noturnos, dentre estes, 3,3%
trabalhavam em turnos fixos e 3,0% em turnos rodiziantes e 2,3% em turnos
irregulares. Nesta pesquisa, pôde-se constatar que na realidade, a maioria trabalha
em turno fixo, diferentemente da realidade encontrada em Fischer et al., em que houve
um equilíbrio entre os tipos de turno.
Segundo Akerstedt et al., (1991 apud FISCHER; MORENO; ROTENBERG,
2004) O sono durante o dia não é o mesmo que à noite, pois, é de menor duração e
pode comprometer a saúde do trabalhador noturno. Mas nesta pesquisa pode ser visto
que embora a maioria dos trabalhadores tenha classificado seu sono como bom,
35,7% dos participantes o classificaram como regular e 14,3% como insuficiente. Tais
dados, portanto, vão ao encontro com o que afirmaram Akerstedt e colaboradores.
Nesta pesquisa podemos perceber que a maioria dos trabalhadores dorme em média
6h por dia. De acordo com Rutenfranz, Knauth e Fischer (1989) a necessidade de
quantidade de horas dormidas, varia de acordo com cada organismo, pois, uns
precisam de mais horas e outros precisam de menos. Como podemos ver a maioria
dos participantes respondeu que há interrupções durante o sono, e segundo
Rutenfranz et al., (1989) há ruídos principalmente se houver crianças em casa. Assim,
o barulho de crianças atrapalha o sono, além do que, os pais têm que cuidar da
alimentação e levar até à escola.Podemos ver que 21,4% dos participantes citaram
que tanto o barulho externo quanto o interno, interrompem o sono e 17,9% apontaram
que o barulho interno interrompem o sono.
Nesta pesquisa, em relação aos sintomas associados à qualidade do sono, o
que mais foi citado pelos participantes foi o cansaço. Acreditamos que se a qualidade
do sono for ruim, acaba gerando cansaço. Nesta pesquisa constatou-se que 50,0%
dos participantes sentem sonolência no horário de trabalho, mas a pesquisa de
Akerstedt (apud FISCHER; MORENO; ROTENBERG, 2004) revelou um índice mais
alto de trabalhadores noturno que sentem sonolência no horário de trabalho, que é de
75,5%. Diversos autores afirmam que o trabalho noturno deteriora as condições de
saúde, e interfere no sono, na alimentação e também nos hábitos alimentares
(HARRINGTON, 1978; WATERHOUSE et al., 1992; COSTA, 1996 apud FISCHER;
MORENO; ROTENBERG, 2004).
Na presente pesquisa a maioria dos trabalhadores noturnos classifica como
boa a sua saúde. Entretanto, 28,6% dos trabalhadores responderam que houve
alguma enfermidade associada ao trabalho. Costa (2003 apud CHILLIDA, 2003) afirma
que o índice do impacto do trabalho noturno aumentou muito nos últimos tempos.

5 CONCLUSÃO

Concluiu-se com esta pesquisa que quanto à saúde, segundo a percepção dos
trabalhadores, os resultados revelaram a presença de alterações no sono, sendo
apontados fatores como cansaço, desgaste, estresse, irritabilidade, sonolência e dor
de cabeça como associados à qualidade do sono.
Quanto à vida familiar pode se concluir que as principais dificuldades
enfrentadas em decorrência do trabalha noturno são o pouco tempo para se dedicar à
família devido à incompatibilidade de horários, prejuízos na afetividade e qualidade
das relações devido à irritabilidade, falta de paciência e distanciamento. Os sujeitos da
pesquisa também percebem interferência do trabalho noturno nas atividades de lazer
e no relacionamento social, sendo que os trabalhadores do turno rodiziante percebem
maiores prejuízos nas relações sociais do que os trabalhadores do turno noturno fixo.
Pode se concluir que o trabalhador noturno percebe as conseqüências deste
tipo de trabalho na sua saúde e nas suas relações familiares, estando sujeito a
diversas variáveis que interferem negativamente em seu cotidiano, afetando o seu
bem-estar e de sua família. Enfatiza-se a importância de políticas de prevenção contra
os possíveis prejuízos à saúde física e mental do trabalhador, em busca da
manutenção de uma boa qualidade de vida dentro e fora do trabalho.

REFERÊNCIAS

ALVES, M. Como Escrever Teses e Monografias: Um roteiro passo a passo. 5 ed.


Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.

GIL, A. C. Como Elaborar Projetos de Pesquisa. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

FISCHER, F. M; MORENO, C. R. C; ROTENBERG, L. Saúde do Trabalhador na


Sociedade 24 horas. São Paulo em Perspectiva,v.17, n.1, p. 34 - 46, 2003.

FISCHER, F. M; MORENO, C. R. C; ROTENBERG, L. Trabalho em Turnos e


Noturno na Sociedade 24 horas. São Paulo: Atheneu, 2004.

RUTENFRANZ, J; KNAUTH, P; FISCHER, F. M. Trabalho em Turnos e Noturno.


São Paulo: Hucitec, 1989.

SANTOS, T. C. M. M. dos. Estresse Ocupacional em Enfermeiros da Região do


Vale do Paraíba Paulista. 2008. Dissertação (Mestrado em Gestão e
Desenvolvimento Regional) Universidade de Taubaté, São Paulo, 2008.
Variáveis e modelos psicossociais relacionados com adesão a comportamentos
de saúde

Modalidade: Simpósio
Mesa: Aspectos biopsicossociais e adesão a comportamentos de saúde

Marilia Ferreira Dela Coleta


Instituição: Instituto de Psicologia, Universidade Federal de Uberlândia

Resumo
Buscando testar um modelo composto de variáveis sócio-demográficas,
clínicas, cognitivas e motivacionais para explicação de comportamentos preventivos,
de controle e de tratamento de diversas enfermidades, temos desenvolvido diversos
estudos sobre comportamentos preventivos relacionados com câncer, Aids, diabetes e
doenças cardiovasculares. Os primeiros destes estudos nortearam os posteriores e
mostraram a necessidade de melhor definição operacional das variáveis, de acréscimo
de outras, de construção de escalas para sua medida, do emprego de análises
multivariadas e de verificar o seu valor preditivo dos diversos comportamentos
estudados. Entre os principais resultados, para uma amostra de 315 mulheres
verificou-se que aquelas que praticam o auto-exame de mamas e as que realizam o
preventivo do câncer cervical com regularidade apresentam crenças na
controlabilidade do câncer, na baixa susceptibilidade pessoal e em benefícios
decorrentes do exames, não percebendo barreiras à realização dos mesmos. As
mulheres que não fazem os exames não percebem seus benefícios, apresentam
algumas barreiras, mostram crenças na incontrolabilidade do câncer e não sabem
estimar a própria susceptibilidade a esta doença. Em outro estudo, com 360
universitários, as variáveis do Modelo de Crenças em Saúde, o lócus de controle da
saúde, variáveis sócio-demográficas, tomada de risco e atitudes com relação ao
preservativo masculino correlacionaram-se significativamente com o uso deste para
prevenção à contaminação pelo HIV, mas diferiram quando se consideraram
isoladamente cada sub-grupo por sexo. Em um estudo mais recente, com 232 sujeitos
do sexo masculino na faixa etária de 40 a 70 anos, os objetivos eram verificar a
relação das crenças com comportamentos de saúde cardiovascular, visando a
prevenção e o controle do enfarto do miocárdio. A amostra incluía indivíduos
saudáveis, hipertensos e enfartados, variando também em nível de escolaridade,
região de origem (rural, cidade pequena, média ou grande) e tipo de assistência
médica (particular ou sistema público de saúde). Todas as variáveis do modelo
correlacionaram-se aos comportamentos de saúde cardiovascular, com diferenças
entre os grupos e em função do tipo de comportamento, se relacionado com dieta,
consultas e exames ou hábitos de beber ou fumar. Com os resultados desta linha de
pesquisa espera-se oferecer a pesquisadores e profissionais da área um instrumental
teórico e metodológico para a compreensão dos conteúdos cognitivos relacionados
com a adesão, facilitando tanto a pesquisa nesta área quanto a prática diária voltada à
educação em saúde.

Palavras-chave: lócus de controle, crenças em saúde, prevenção


Violência infantil intrafamiliar e sua conseqüência no âmbito escolar

Modalidade: Simpósio
Mesa: Experiência técnica do pólo não violência da cidade de Sorocaba

Margarida Aparecida da Silva Yo


Instituição: UNIP de Sorocaba

Resumo
A violência vem sendo abordada nos meios de comunicação de forma maciça,
mostrando sua forte presença na sociedade através dos diversos espaços da vida
humana, seja no âmbito urbano, escolar, trânsito, político. Compreende-se que para
romper o ciclo da violência dependemos de ações integradas das instituições e
diferentes esferas da sociedade tais como educação, justiça e saúde. Trata-se de um
problema de saúde publica e na cidade de Sorocaba algumas ações vêm sendo
praticadas no enfrentamento da violência. Este trabalho objetiva relatar um caso
clínico atendido no Pólo Não Violência do serviço-escola da Universidade Paulista.
Trata-se de um garoto (9 anos) cuja família buscou ajuda psicológica para
enfrentamento da agressividade e indisciplina escolar. Há três anos a criança está
morando com a avó e um tio de vinte anos numa edícula nos fundos da casa de outro
tio paterno que é casado. O pai é falecido há seis anos, tendo sido morto por tiros.
Durante a gravidez a mãe era espancada pelo pai e ela faleceu, durante o período de
atendimento da criança, com o diagnostico de Aids. A criança cresceu no meio das
brigas dos pais e das drogas. Nosso objetivo foi ajudá-lo a se apropriar de sua história
e de seu potencial, entrar em contato com seus potenciais psíquicos antes
desconhecidos e ajudá-lo a desenvolver estratégias pessoais de superação em
relação à violência sofrida. Realizamos um atendimento individual com a avó e tia do
cliente, visitas domiciliar e escolar além das sessões com a criança. A avó foi
orientada para ser mais assertiva e contar a verdade a respeito da morte do pai. Os
resultados mostraram que foi possível através de orientação ajudar a família no
enfrentamento da violência vivida, de modo que o silêncio e a omissão sobre a morte
do pai da criança fossem deflagrados.

Palavras-chave: criança, violência, enfrentamento


Texto Integral

Introdução
Ultimamente o tema da violência tem sido interesse de vários autores que
refletem suas conseqüências sobre diferentes aspectos como podemos constatar no
decorrer dos anos.
A violência vem sendo abordada nos meios de comunicação de forma maciça,
mostrando sua forte presença na sociedade através da violência em diversos espaços
da vida humana, seja no âmbito urbano, escolar, trânsito, político. Encontramos esta
violência sendo praticada contra a mulher, contra o idoso, contra a criança e o
adolescente. (Pinto Júnior, 2001).
Para Pinto Júnior (2001), ser criança dentro deste mundo violento se tornou
uma tarefa muito difícil, onde todos os seres humanos têm um papel indispensável no
combate à violência e proteção aos direitos da criança e do adolescente, permitindo
um desenvolvimento saudável e o mais livre possível de eventos perturbadores para
seu crescimento enquanto pessoa integrada.
Para Vecina e Silva Cais (2002), violência refere-se a “uma conduta de abuso e
poder, muitas vezes invisível e/ou encoberta, que envolve situações de força e tensão,
assimetria e desigualdade social, danosas para a constituição do indivíduo e da
sociedade” (p. 59).
Segundo Weber et al. (2002), a violência contra crianças e adolescentes existe
desde a Antiguidade, em todas as classes sociais e nas mais diferentes culturas; as
crianças não eram consideradas como seres com vontades próprias e a agressão era
considerada forma de educação e respeito; também não possuía leis específicas de
proteção aos direitos da criança.
A preocupação em esclarecer e compreender os maus-tratos contra crianças
surge tardiamente, na metade do século XIX, coincidindo com a importância social
dada em torno da família. Como descreve Ariés (1986), apud Weber et al. (2002), a
família é o espaço onde encontramos a expressão de afeições necessárias que são
trocadas entre seus membros.
Violência Intrafamiliar
Araújo (2002) designa violência intrafamiliar àquela que ocorre no espaço
familiar, envolvendo parentes que podem morar ou não sob o mesmo teto, todavia as
ocorrências são maiores entre parentes que convivem no mesmo espaço. A autora
relata que, apesar de algumas mudanças institucionais, políticas e jurídicas, a
violência intrafamiliar continua ocorrendo, devido à impunidade, políticas públicas
enfraquecidas e práticas de intervenção e prevenção deficientes.
Pimentel e Araújo (2006) relatam que no decorrer do século XX, a violência
praticada contra crianças e adolescentes deixou de ser apenas um problema
interpessoal para adquirir um caráter social. Ao estudarem a violência, os autores
perceberam que existem relações de opressão em meio às relações sociais, relações
essas muitas vezes entendidas como “naturais”.
Estes autores ainda relatam que a revelação de práticas culturais sociais e
familiares que violam os direitos da criança e adolescente tem evidenciado que a
violência geralmente ocorre no âmbito intrafamiliar.
Podemos dizer que uma família fracassa no cumprimento de suas funções
quando não cumpre o papel social de protetora de sua prole, de transmissora de
valores culturais. (Ferrari, 2002). A autora observa que entre os membros de tais
famílias existe a falta de relações verdadeiras, incoerência entre seus membros, são
relações de duplo vínculo, de pseudomutualidades. (p.40).
Winnicott (1999, p. 139), apud Bezerra (2006) diz que ao ser fornecido à
criança um ambiente facilitador satisfatório, isto permitirá seu desenvolvimento, sua
interação e crescimento. No entanto se este ambiente não for satisfatório, a criança
não conseguirá alcançar a plenitude pessoal.
Pereira (2000), apud Viodres Inoue e Ristum (2008) destaca que a família vai
gradativamente perdendo seu papel de protetora e defensora dos direitos da criança e
adolescente porque, de acordo com dados estatísticos, é dentro do seio familiar que
ocorrem, em grandes proporções, a violência.
Pereira (2000), apud Viodres Inoue e Ristum (2008) aponta a família como a
maior violadora dos direitos infanto-juvenis.
Repetição da Violência
Santos (2007, p. 22) conceitua “multigeracionalidade como a possibilidade do
adulto reproduzir com crianças da família as experiências de violência vividas em sua
infância”.
A autora enfatiza, ainda, que não podemos generalizar padrões de
relacionamento uma vez que comportamentos aprendidos na infância podem ou não
ser repetidos nas próximas gerações.
Na família do tipo disfuncional todos são vítimas, inclusive o abusador por
isso precisa ser tratada.
Devemos considerar a forma cíclica da transgeracionalidade, pois é possível
quebrar o ciclo ao fazer uma boa leitura do que acontece naquele núcleo familiar e
estabelecer estratégias. O profissional, ao iniciar seu trabalho com a família, deve
alertá-la para a dificuldade do rompimento do ciclo.
Profissionais
Viodres Inoue e Ristum (2008) descrevem que as questões relacionadas à
revelação do abuso ocorrido, a denúncia efetivada e a prevenção da violência
encontram caminhos muitas vezes tortuosos. Alguns profissionais mesmo sabendo do
ato violento cometido contra a criança e o adolescente, optam muitas vezes pelo
comodismo da dúvida e do silêncio, fugindo da responsabilidade que lhe cabe e
negligenciando os direitos do outro.
Habigzang e cols. (2005) relatam que além da falta de capacitação dos
profissionais na identificação e diagnóstico da violência sexual e também na promoção
de ações para prevenção e tratamento tanto da criança e adolescente como para suas
famílias, as autoras comentam a respeito de algumas decisões judiciais que exigem
provas materiais do abuso que nem sempre podem ser coletadas ou constatadas,
postergando assim as medidas preventivas e protetivas, aumentando as chances de
agravamento do quadro clínico das vítimas. Percebe-se que é preciso formar uma
rede de profissionais que trabalhem a violência sexual de forma integrada para que
seus resultados sejam eficazes e promovam um enfrentamento da violência sofrida
com crianças e adolescentes e sua família.
Existe certo receio de envolvimento nestes casos de violência por parte dos
profissionais segundo Gonçalves e Ferreira (2002), apud Azambuja (2005) por não
receberem em sua graduação o devido preparo sobre o diagnóstico e manejo dos
casos de maus-tratos. Os profissionais se questionam sobre a quebra do sigilo
profissional, desconhecendo a permissão para esses casos; não querem se
responsabilizar pela notificação do abuso, por não se sentirem seguros e protegidos
para tal ação, considerando o caso “pesado” e desgastante devido à própria família
dificultar a notificação. Existe também a preocupação em se tornar um intruso na
autoridade dos pais.
Surgimento do Pólo Não Violência no serviço-escola UNIP de Sorocaba
O projeto VIVA foi lançado na cidade de Sorocaba em 2007 dentro do Fórum
Municipal de Enfrentamento de Violências e Acidentes. É ligado diretamente à
Vigilância Epidemiológica e o projeto VIVA congrega importantes parceiros, como o
CREAS, o CIM Mulher, a UNIP, o CEREST, além das Secretarias de Comunicação,
Educação e Juventude e Conselhos Municipais de Assistência Social e do Idoso.
A UNIP, como parceira e produtora de conhecimento, instituiu no Serviço-
escola, o Pólo Não Violência cuja estratégia de intervenção objetiva:
romper o ciclo perverso das relações familiares violentas
fortalecer a pessoa que sofreu o abuso em suas potencialidades
psíquicas para o enfrentamento da violência.
participar no processo de mobilização social contra a violência
propicia aos alunos e ex-alunos da UNIP como também para
profissionais que atuam campo da violência repensar sua prática e
responsabilidade a partir de um espaço privilegiado de extensão
universitária,
Relato de caso em atendimento no Pólo de Atendimento a Não Violência
no serviço-escola da UNIP de Sorocaba
G. é um menino de nove anos cuja família procurou o serviço-escola. Passou
pela triagem com a psiquiátrica da clínica, quando se descobriu que a família havia
procurado ajuda da assessoria de um vereador da cidade (alegando que o menino
havia presenciado a morte do pai) para que o atendimento iniciasse imediatamente.
Em seguida foi encaminhado para atendimento específico no serviço-escola no
Pólo Não Violência. No primeiro encontro, compareceu acompanhado pela avó e pela
tia avó.
A avó trouxe como queixa a indisciplina escolar e agressividade. Quando
contrariado, torna-se violento e diz que quer matar a avó, os tios, os professores.
Agride os colegas na escola, larga o material escolar na sala de aula. A escola é
período integral, recusa-se a fazer as atividades propostas, joga fora o que faz; sai da
sala de aula e muitas vezes abandona a escola. Briga na rua é agressivo verbal e
fisicamente. Gosta de videogame, mas está sem porque roubaram o dele. Sai passear
com a tia materna. Tem uma irmã por parte da mãe de 15 anos que morava com a
mãe e avó materna. A criança tem contato esporádico com a irmã, os dois se “dão
bem”.
O pai é faleceu há seis anos, e por questões de tráfico com drogas foi morto
por tiros. O pai e a mãe eram envolvidos com drogas. Vivia no meio das brigas dos
pais e das drogas (drogas que ficavam disponíveis sobre a mesa de sua casa, junto
com seu alimento, com sua mamadeira). Durante a gravidez de G. a mãe era
espancada pelo pai. Durante o período de atendimento a mãe faleceu, era viciada em
drogas e apresentava muitas complicações em relação à sua saúde devido ao
diagnóstico DST-AIDS. Há três anos a criança está morando com a avó e um tio de
vinte anos numa edícula nos fundos da casa de um tio paterno casado e que tem um
filho de treze anos.
G. dorme com a avó paterna. É muito apegado à avó, tanto que na sala de
espera fica sempre muito próximo dela. A criança não aceita os castigos de não sair
para a rua; não aceita, não cumpre, fugindo pelo telhado. A avó diz que a criança
quando acorda não quer vir para a sessão, sempre pede algo em troca, quer doces,
balas, brinquedos ou cadernos. G. disse que briga e bate nos colegas que roubam
suas coisas e que xingam sua mãe.
Os atendimentos foram iniciados e na discussão do caso em equipe
percebemos a complexidade do mesmo o que nos levou a pensar que uma criança
que utiliza mecanismos primitivos negativos, ausência de culpa, distorção da
realidade, encontrará dificuldades para se desenvolver de forma saudável
psiquicamente. Estabelecemos como objetivo inicial do trabalho um acompanhamento
terapêutico de modo que a criança entre em contato consigo mesma e com suas
potencialidades e estabeleça uma relação de confiança com a avó.
Sobre a tia
A avó sempre comparece acompanhada da tia/avó de G. (que é a cunhada da
avó que sempre a leva de carro para os atendimentos e foi quem a orientou para dar
entrada nos papéis para obter a guarda e a pensão de G.).
Orientação para a avó
Orientação para a avó de que fosse mais assertiva, que contasse a verdade a
respeito da morte do pai. A verdade, por pior que seja tem que ser dita, sendo assim,
expliquei que o menino tinha direito de saber sobre sua história. Foi apontado para a
avó que eles podem se comunicar de uma forma mais clara, mais segura de modo a
não precisar se defender sempre. Falou-se da necessidade do menino ter seu espaço,
pois ainda dorme com a avó, que ainda dá banho nele.
Dinâmica da avó e da tia
As duas têm conhecimento dos contatos do tráfico do pai de G. e o utilizam
para obter favores (procuram ajuda política para agilizar atendimento ao menino e
para conseguir a guarda provisória). A Tia passa por atendimento psiquiátrico e está
convencida que G. também precisa de ajuda psiquiátrica, inclusive de controle
medicinal. A avó necessita sair do estado emocional de negação dos fatos a respeito
da vida e da morte do filho. Sempre que questionada sobre o mesmo, apresenta
dificuldade de falar sobre sua vida, seu envolvimento com o tráfico elogiando-o e
idealizando muito.
A tia quer que a avó de G. se mude de casa, sobretudo agora que está
recebendo uma pensão de G. e que vá morar perto da sua casa em um bairro vizinho
e a avó aceitou a proposta, pois não está satisfeita morando nos fundos da casa do
filho. A tia “antevê” o destino do menino como uma repetição da história do avô (que
bebia muito sendo esta sua causa mortis) e do pai (que morreu em decorrência do seu
envolvimento com as drogas). A tia diz que o pai do menino era muito amoroso como
ele e que não queria ver os pais, nem os irmãos morrerem antes dele. O pai da
criança era extremamente amoroso, responsabilizando-se em dar o coquetel antiviral
ao menino quando este nasceu. Diz que a sobrinha dela (que mora na frente da casa
do G.) tem ciúmes dele, acha que é o “neto preferido” (sic) e diz que não quer ele
morando lá.
O menino demonstra que gosta da escola, faz menção da comida “variada e
gostosa”(sic). Disse que gostaria de mudar de casa, mas quer continuar estudando na
mesma escola.
Percepção do potencial de G. durante o atendimento
O menino tem um bom vínculo com seu tio e tia maternos. Eles os levam para
passear, organizam festa de aniversario para ele. Em quase todas as sessões ele faz
menção carinhosa a esse tio, relembrando dos bons momentos em que passam
juntos. Em um de nossos encontros o encontrei na recepção com uma revista de
SURF nas mãos, levando-a para a sessão, mostrando as figuras para mim,
recordando dos passeios com o tio e disse que ganhou dele uma prancha. A seguir
pegou massinha da caixa lúdica e modelou uma onda “radical”, um surfista e uma
mulher na praia.
Relatou que fica muito chateado quando sua avó sai à noite e ele não sabe
para onde vai, deixando-o sozinho em casa.
Visita Domiciliar
Quando da visita domiciliar o único material escolar que estava em perfeito
estado de conservação era o caderno de matemática; é na matéria que ele não
apresenta dificuldades. Sua casa é muito pequena; a entrada é pela cozinha, na sala
tem um sofá em “L” de alvenaria onde dorme a avó e o menino. Na sala tem uma
pequena escada que dá acesso ao quarto do tio e ao banheiro da casa. No quarto
existe uma estreita varanda onde se avista a quadra de sua escola, ou seja, sua casa
dá de fundos para a escola onde ele estuda. Quando cheguei para essa visita, ele
vibrou da janela ao me ver. G. estava na casa da frente, jogando vídeo game com o
primo e os tios não se encontravam, pois estava trabalhando.
Não pode se deparar com sua essência, não tem uma casa, um espaço, não
tem uma subjetividade. Seu ambiente não é protetor, é um ambiente de rua.
Visita escolar
Quando da visita escolar a coordenadora não soube dar muitas informações a
respeito do comportamento de G. Lembrou-se do comentário de uma professora que o
viu na rua muito tarde da noite, acrescentando ainda que a avó “gosta de beber
cerveja” (sic).
Objetivo estabelecido com G.
Ajudá-lo a se apropriar de sua história e de seu potencial, entrar em contato
com seus potenciais psíquicos antes desconhecidos. Ajudá-lo a desenvolver
estratégias pessoais de superação em relação ao abuso sofrido.
Do aspecto técnico do trabalho
Durante os atendimentos psicológicos tenho utilizado intervenções
esclarecedoras e suportivas objetivando o fortalecimento egoico de potenciais antes
desconhecidos (Fiorini, 1982). Outros recursos são utilizados tais como: caixa lúdica,
realização de desenhos com a finalidade de auxiliar a criança a expressar conteúdos
emocionais.
As intervenções Interpretativas não são via de regra, mas podem surgir no
momento em que ele utiliza seu lado instintivo e primitivo que ele desconhece de
modo que possa dar conta de suas reações impetuosas.
Brinca sempre com o revólver, monta uma cena e destrói os bonecos, algumas
vezes tenta reparar, cuidando dos feridos. Entendemos que G. é uma criança que até
agora não pode entrar em contato com o lado bom só com a violência (viveu isso
desde pequeno com as brigas dos pais).
Conclusões
O caso em questão continua em atendimento, pois entendemos que G.
necessita de entrar em contato afetivo com sua realidade e com suas potencialidades
para lidar com a complexa vida social e afetiva na qual se encontra neste momento.
Procuramos com este trabalho oferecer um espaço para que as pessoas
possam falar sobre a violência se confrontar com o fato até esgotá-lo.
Através dos atendimentos estamos aprendendo o quanto é difícil suportar a dor
das mais diversas violências e através do estudo e reflexão e proposta técnica para
cada caso em particular, idealizar caminhos na busca de uma sociedade menos
violenta.

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