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1. NOÇÕES GERAIS
Relação jurídica obrigacional é a relação de natureza pessoal na qual uma pessoa se com-
promete a uma prestação, positiva ou negativa, em favor de outra, visando à satisfação de interesses
e respondendo com o seu patrimônio, inclusive com execução forçada pelo Poder Judiciário.
Assim, o que especializa as obrigações em relação aos demais deveres jurídicos é a quali-
dade do objeto prestacional, que é qualificado por um dar, fazer ou não fazer.
A relação tem natureza pessoal pois se estabelece entre os sujeitos, não se tratando de uma
situação jurídica sobre determinados bens, como ocorre nos direitos reais.
O objeto da relação obrigacional é dar, fazer ou não fazer algo. Ao dever jurídico (prestação)
imposto ao sujeito passivo (devedor/solvens) corresponde um direito subjetivo do sujeito ativo (cre-
dor/accipiens). Logo, a relação entre eles é interpessoal, não recai sobre o objeto.
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Existem dois elementos que compõem a obrigação: o débito (Schuld) e a responsabilidade
(Haftung). Aquele é a prestação que deve ser espontaneamente cumprida pelo devedor. Esta é a
obrigação que surge ao devedor pelo inadimplemento daquele e recai sobre o patrimônio do devedor,
não sobre sua pessoa. A RESPONSABILIDADE É SEMPRE UMA OBRIGAÇÃO DERIVADA, já que
surge apenas quando a obrigação não for adimplida no prazo.
O devedor responderá, havendo a responsabilidade, com todo o seu patrimônio para o cum-
primento da obrigação, ressalvadas as restrições legais dos bens de família, bens absolutamente
impenhoráveis e inalienáveis etc.
Logo, como a execução não recai sobre a pessoa e sim sobre o patrimônio do próprio deve-
dor, há que se dizer que ela é real. Somente existe execução pessoal no caso de recusa de
alimentos e no Direito Penal.
Importante ressaltar que é possível haver débito sem responsabilidade, como no caso da
prescrição e dívida de jogo (obrigações naturais), assim como responsabilidade sem débito, como
ocorre na fiança ou aval prestados por terceiros.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Ainda que as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da função social tenham mitigado um
pouco essa concepção, tal não ocorreu de forma suficientemente ampla para arraigar na sociedade
uma visão mais humana do significado de obrigação.
O interesse tutelado pelo direito é aquele que promove o ser humano, que aprofunda os laços
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sociais e a solidariedade. Nessa linha de pensamento, o homem não se tornaria satisfeito em
detrimento do outro, mas cresceria culturalmente com o concurso positivo de seu semelhante (sín-
tese axiológica). Os interesses diferenciados, quando justapostos, se completam mutuamente, pro-
movendo a conquista de outros valores em projeção infinita.
É na dialética dos valores que se projeta a síntese da progressão cultural na qual se dinamiza
a evolução sociojurídica do homem; o vínculo obrigacional, dessa forma, consubstancia-se em um
nivelamento de aspirações entre as partes, e tende à execução voluntária. Nesse cenário, quanto
mais as pessoas se conscientizarem do fenômeno de agregação de valores decorrentes de
seus intercâmbios, menos frequentes seriam os inadimplementos.
Com efeito, o cumprimento voluntário de uma obrigação significa a realização da justiça pri-
vada e, como tal, a aquisição de um bem cultural capitaneado pelo bem interessista.
Essa teoria possuiria vários efeitos práticos. Por exemplo, o Judiciário, caso precisasse inter-
vir num determinado contrato inadimplido, o faria não com fulcro no princípio pacta sunt servanda,
mas sim no fato de que o adimplemento contratual agregaria valores na sociedade (analisando, por
conseguinte, se seria o caso).
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Outro exemplo seria a redução das formas negociais ao mínimo necessário. Por ser o inte-
resse das partes voltado à satisfação, buscarão elas suas satisfações recíprocas pela execução vo-
luntária, e não pelo risco de sofrer sanções em caso de descumprimento. O foco passa do medo/su-
jeição para a confiança/cooperação.
Em síntese, com base nessa teoria o Direito deve propiciar a realização do homem sem sub-
trair-lhe parcela de sua cidadania ao limitar sua liberdade de agir.
4. PRINCIPAIS DISTINÇÕES
a) Nos reais não se estabelece relação jurídica individualizada, e sim verdadeira situação
jurídica de poder do titular do direito real sobre o objeto, impondo-se um dever erga omnes. Na obri-
gação, o credor apenas disporá de uma pretensão que poderá ser oposta e satisfeita com o patrimô-
nio do devedor. 3
b) O titular do direito real poderá exercer poder direto sobre a coisa, com atuação imediata
sobre o bem, independentemente de terceiros (direito de sequela). Já na obrigação, o credor depen-
derá do devedor para a satisfação de seu crédito.
c) Os direitos reais são numerus clausus, dotados dos atributos da sequela, preferência e
tipicidade, enquanto os obrigacionais são abertos, não estão plenamente tipificados em lei e não
possuem tais atributos, já que são direitos relativos oponíveis somente contra a pessoa devedora.
Muitos desses conceitos caíram na prova subjetiva do XIII concurso para juiz federal da 1ª
Região.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Dever livre é a obrigação de caráter moral, sendo voluntariamente assumida e não gerando,
em caso de descumprimento, qualquer consequência jurídica em face de quem se obrigou, tão-so-
mente consequências indiferentes ao Direito, de cunho social ou religioso, entre outros.
Interesse legítimo é o que resulta do próprio interesse de agir. Numa análise processual,
preenchida a condição de ação “interesse de agir”, o interesse se mostraria legítimo. É o interesse
que se liga ao próprio direito e que se mostra protegido legalmente, do qual possa resultar ou
no qual assente qualquer vantagem de ordem econômica, ou mesmo de ordem moral.
Obrigação potestativa1, por sua vez, é a obrigação em que o sujeito ativo da relação pode
satisfazer seu direito unilateralmente, decorrente do simples exercício de sua vontade, sem sofrer
por parte do devedor qualquer oposição legítima apta a afastar-lhe o direito, tal qual a obrigação
potestativa que tem o devedor de aceitar a escolha do credor nas obrigações alternativas, se tal
cláusula tiver sido pactuada no contrato.
1 Se o direito potestativo não admite violação, se ele só depende do titular, o direito potestativo é exemplo de
interesse público. E por que é de interesse público? Porque quando o titular manifesta a sua vontade, os efeitos
decorrem para todos. Quando o titular exerce seu direito potestativo, os efeitos decorrem automatica-
mente para todos, daí a frase de que todo direito potestativo traz consigo interesse público dos efeitos
que decorrem da vontade do titular.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Ônus jurídico é a necessidade que uma parte tem de adotar uma determinada conduta, não
por imposição legal ou obrigacional, mas como condição de defesa de um interesse próprio. É uma
situação passiva em que inexiste correspondência ativa, como, v.g., a necessidade de recorrer
da sentença para que a parte tenha sua situação melhorada. A parte sofrerá um prejuízo se não
arcar com o ônus, o qual, entretanto, não significa uma sanção prevista no ordenamento jurídico.
Direito objetivo ou norma agendi é o direito posto nas normas jurídicas e vigente durante
certo lapso de tempo, o direito analisado sob um ponto de vista estritamente normativo, sem que se
perquira sobre os destinatários da norma. O direito objetivo é a fonte dos direitos subjetivos.
Tutela jurisdicional representa a espécie de provimento judicial aplicado em cada caso con-
creto com o escopo de solucionar o conflito de interesses que ensejou a propositura da demanda. A
delimitação da tutela, que permite a caracterização da espécie de ação utilizada pelo autor, pressu-
põe a procedência do pedido. A improcedência, como acertadamente anotou Pontes de Miranda,
indica que a sentença prolatada será de natureza declaratório-negativa, ainda que o pedido seja
declaratório positivo, constitutivo, condenatório, executivo ou mandamental.
“Direito subjetivo desprovido de pretensão não passa de uma mera faculdade jurídica.”
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Antigamente, o Direito Civil era regido pelo individualismo puro, a parte devedora era tida
apenas como coadjuvante na relação jurídica, sendo subordinada ao credor. Também havia a falsa
impressão de que a soma pura e simples dos bens individuais corresponderia ao bem de toda a
sociedade.
Hoje, reconhece-se que as coisas não funcionam bem assim. A socialidade serve para har-
monizar os princípios da autonomia da vontade e da solidariedade social, já que, por ser ela o
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
fim do direito subjetivo obrigacional, deverá ser mantida uma relação de cooperação entre os partí-
cipes da relação obrigacional – e entre eles e a sociedade – a fim de que seja possível a consecução
do fim comum.
Antonio Jeová Santos diz que a preocupação do legislador do Código Civil vigente foi regular
os interesses do “homem situado” e não mais do “homem isolado” como fazia a codificação anterior,
na medida em que a vida de relação exige que o homem se projete no mundo e dele participe não
como mero espectador, mas como alguém que interfira no resultado. Dessa forma, a finalidade do
princípio da socialidade é afastar a mera aplicação do Direito Civil às relações dos particula-
res, eis que esses vínculos, em diversas oportunidades, podem interessar à sociedade como
um todo, autorizando, por conseguinte, a intervenção estatal. Em suma: o princípio da sociali-
dade objetiva afastar a visão individualista, egoística e privatística do Código Civil de 1916, influen-
ciado pela visão oitocentista de primeira dimensão civilista.
Rodrigo Reis Mazzei assevera que as relações privadas podem ter enfoques ultrassubjetivos
quando as relações entre os particulares não projetam efeitos apenas sobre eles, mas também sobre
a sociedade como um todo. Na verdade, o novo Código Civil nada mais fez do que adequar o sistema 7
de direito privado à realidade constitucional.
Hoje, as obrigações devem ser pautadas por um comportamento ético, de mútua coopera-
ção, observando-se as cláusulas gerais de boa-fé, função social, abuso de direito, equidade e bons
costumes.
O princípio da eticidade tem por escopo valorizar o ser humano na sociedade, o que se
dá mediante a efetivação dos princípios constitucionais, mormente o da dignidade da pessoa
humana. Alexandre dos Santos Cunha defende que referido princípio, apesar de inserido na Cons-
tituição da República, é, pela sua origem e pela sua concretização, um instituto de direito privado.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Carlyle Popp enfatiza que a dignidade da pessoa humana “significa a superioridade do ho-
mem sobre todas as demais coisas que o cercam; é o homem como protagonista da vida social.
Representa, então, a subordinação do objeto ao sujeito de direito”.
Miguel Reale, definidor do Código Civil como “a constituição do homem comum”, pondera que
o princípio da eticidade afasta o excessivo rigorismo formal ao CONFERIR AO JUIZ “não só
poder para suprir lacunas, mas também para resolver, ONDE E QUANDO PREVISTO, de con-
formidade com valores éticos”.
A forma do direito e a perfeição técnica e gramaticalidade dos diplomas legais não podem ser
óbices ao regular exercício do direito. Este existe para ser executado, para ter efetividade na regula-
ção dos negócios entre os homens, para solucionar as pretensões existentes.
Observa Antonio Jeová Santos que o Código Civil de 2002 pretendeu se livrar do rótulo das
“leis que não pegam”, aquelas que não foram promulgadas para o mundo real, “mas para a satisfação
de algum parlamentar que quis engrossar o seu currículo com o patrocínio de mais uma lei”.
Nesse contexto, José Augusto Delgado diz que, com a entrada do novo Código Civil em vigor,
as normas passaram não apenas a existir, mas também a serem válidas, eficazes e efetivas, já que
o poder conferido aos juízes teve por escopo – além de garantir a busca da solução mais justa para
o caso concreto, conferir maior executividade às sentenças e decisões judiciais.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Bem se vê, pois, que a busca pela Justiça por meio do equilíbrio entre os interesses dos
indivíduos e da sociedade é a marca fundamental do Código Civil de 2002, o que representa avanço
significativo na integração necessária entre Ética e Direito.
6. OBRIGAÇÃO COMPLEXA
6.1. INTRODUÇÃO
A obrigação deve ser vista como complexa, já que é formada por um conjunto de direi-
tos, obrigações e situações jurídicas que extravasam à prestação principal; a obrigação com-
plexa é um processo que se encaminha à finalidade de satisfazer o interesse na prestação.
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As demais obrigações que se acrescem à principal são chamadas de deveres anexos ou
laterais. Claro que, pela existência do bem comum visado na relação obrigacional para satisfazer os
interesses obrigacionais recíprocos, tais anexos cabem a todas as partes envolvidas.
Os deveres de conduta são conduzidos pela boa-fé ao negócio jurídico, destinando-se a res-
guardar o fiel processamento na relação obrigacional em que a prestação se integra.
Os deveres de conduta não surgem apenas com o estabelecimento da relação jurídica; antes
mesmo dela, no momento do contato entre as partes para travar negociações eles já subsistem.
Permanecem também após prestada a prestação principal.
a) Dever de proteção: proteger a contraparte dos riscos de danos à sua pessoa e a seu patri-
mônio, na constância da relação complexa.
b) Dever de lealdade: diretamente ligado à boa fé, impõe às partes a abstenção sobre qual-
quer conduta capaz de falsear ou desequilibrar as prestações reciprocamente acordadas. Este dever
somente será rompido, quando ainda não se houver firmado a obrigação, se uma das partes, sem
motivos, romper injustificadamente as conversações e se estiver havendo negociações.
c) Dever de informação: é o dever de esclarecer a parte sobre questões relevantes que in-
fluam na sua vontade. Logicamente que este dever não surge em relação aos fatos notórios ou que
já deveriam, normalmente, ser conhecidos pela outra parte.
Quando você tem mais de um dever, a prestação é só um dever, só que a boa-fé criou uma
série de outros deveres. Deveres para credor e devedor. Na concessão de um crédito irres-
ponsável, a violação foi por parte de quem? Do credor. No adimplemento substancial, a viola-
ção foi por parte de quem? Do credor. Mas, no cumprimento defeituoso, a violação foi por 10
parte do devedor. Ora teremos a possibilidade de violação dos deveres anexos pelo devedor,
ora teremos a violação dos deveres anexos por parte do credor.
Com a função social do contrato, vislumbra-se que os deveres de conduta não cabem apenas
às partes da relação jurídica. Eles poderão ser oponíveis também a terceiros, assim como po-
derão ser invocados por terceiros prejudicados pela relação estabelecida.
Ora, qualquer contrato irradia seus efeitos para terceiros, assumindo relevância no mundo
econômico. A condição para poder exigir de terceiros a abstenção de fato que prejudicaria o adim-
plemento contratual entre as partes é que estes saibam que seu comportamento é direcionada-
mente prejudicial às partes contratantes.
A boa-fé objetiva compreende um modelo ético de conduta social, caracterizada por uma
atuação de acordo com determinados padrões sociais de lisura, honestidade e correção, aten-
dendo-se às legítimas expectativas das partes.
Na boa fé objetiva, a pessoa deverá atuar com zelo, buscar a realização do direito alheio,
já que no moderno Direito Civil as relações não devem ser consideradas antagônicas, e sim de
cooperação.
Difere a boa-fé objetiva da boa-fé, já que esta deve ser analisada subjetivamente, no âmbito
psicológico do indivíduo, enquanto aquela deve ser analisada objetivamente, nos aspectos externos
da relação. Assim, o contrário de boa-fé objetiva não é má fé, a qual contraria a boa-fé (subjetiva), e
sim ausência de boa-fé objetiva.
Logo, plenamente possível que alguém aja de boa-fé (subjetiva), mas sem boa-fé objetiva,
e vice-versa.
De forma não muito diferente, a Dra. Ana Frazão (examinadora do TRF1) dá as seguintes
funções à boa fé objetiva:
a) Função interpretativa-integrativa;
O inadimplemento das obrigações implícitas decorrentes da boa-fé objetiva pode dar ensejo
a pedido de indenização, resolução contratual ou alegação da exceptio non adimpleti contractus em
casos extremos, malgrado o que dispuser a literalidade do contrato. Por exemplo, se a construtora
se comprometeu a entregar as chaves de um apartamento em dezembro de 2012, mas em julho do
mesmo ano se verifica que o prédio nem começou a ser construído, não é necessário esperar até o
termo avençado no contrato para restar caracterizada a mora do construtor ou se pleiteie indenização
em face dele. Na jurisprudência:
[...]
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Há alguns tipos de atos cujas presenças são repudiadas pelo Direito, sendo práticas abusivas.
O primeiro a ser citado é o venire contra factum proprium ou Teoria dos Atos Próprios,
que proíbe o comportamento contraditório. Isso porque ninguém pode voltar atrás, unilateralmente,
numa postura que tenha criado uma legítima expectativa na outra parte.
b) Legítima confiança da outra parte na conservação do sentido objetivo desta primeira conduta;
[...]
- O rol das hipóteses de segredo de justiça não é taxativo, sendo autorizado o segredo
quando houver a necessidade de defesa da intimidade. 14
Recurso especial conhecido e provido.
(STJ, REsp 605687/AM, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
02/06/2005, DJ 20/06/2005, p. 273)
Outro tipo de ato abusivo é a supressio2 e a surrectio. Pela primeira, constata-se que o não
exercício de um direito durante longo tempo poderá significar a extinção desse direito, ou ao menos
o impedimento de seu exercício, quando contrariar o princípio da boa-fé por se demonstrar abusiva
a inatividade de seu titular. Isso por gerar uma expectativa legítima na outra parte.
Stoppel é um instituto civilista que entra na mesma classificação do venire contra factum
proprium, supressio e surrectio e tu quoque. Tais institutos se relacionam com o princípio da boa-fé
objetiva, o qual é fonte de criação de legítimas expectativas de comportamentos sociais de que de-
terminada situação jurídica não será alterada, ou que determinado sujeito não irá atuar de molde a
contradizer seu comportamento socialmente aceito e desejado perante certo cenário fático.
Pode-se conceituar o stoppel como uma barreira ou freio erigido às pretensões de quem re-
clama algo em contradição com o que anteriormente havia aceitado (Judith Martins-Costa). Por meio
dele, se impede, em virtude de uma presunção iures et de iure, uma pessoa de afirmar ou negar a
existência de um fato determinado se antes exercitara um ato, fizera uma afirmação ou formulara
uma negativa em sentido precisamente oposto.
4 Muitas decisões de Cortes nacionais colocaram como requisito, também, a necessidade de que a supressio
promova o equilíbrio contratual, ou seja, de que o seu não reconhecimento cause desequilíbrios entre o bene-
fício e o prejuízo suportado pelas partes.
5 Há, no entanto, quem considere a supressio como uma específica modalidade de venire.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
O instituto tem acolhida no Direito Internacional Público, sendo exemplificado no caso entre
a Tailândia e Sião, de 1908 (Sião hoje em dia faz parte da Tailândia, mas não fazia na época): durante
mais de 50 anos vigeu tratado entre eles reconhecendo seus limites fronteiriços. Porém, o Estado de
Sião tinha uma série de dúvidas, por motivos supervenientes, sobre quais eram os reais limites geo-
gráficos entre eles, enquanto a Tailândia nunca impusera objeção e desfrutara, por todo esse tempo,
da estabilidade que o tratado questionado proporcionara. Nesse caso, a Tailândia não poderia alegar
que os limites antes determinados não foram por ela aceitos.
Ele se diferencia do supressio por não envolver a perda de um direito, mas sim a perda de
uma possibilidade de invocar determinado argumento ou fato. Diferencia-se, também, do tu quoque
por não trazer em questão a malícia pré-concebida de uma parte como forma de conseguir determi-
nada vantagem.
Determinados autores sustentam que as fontes das obrigações podem ser a lei, a vontade
das partes e os atos ilícitos. Entretanto, a lei é a fonte mediata de todas as obrigações. Na verdade, 16
FONTE SERÁ TODO FATO JURÍDICO HÁBIL A PRODUZIR O SURGIMENTO DO DEVER DE
PRESTAR DE ALGUÉM EM FAVOR DE OUTREM.
Dever-se-á analisar, portanto, as obrigações de acordo com suas funções. Porém, adianta-se
como fontes das obrigações as seguintes:
Responsabilidade Civil
O negócio jurídico, manifestação por excelência da autonomia da vontade privada, tem por
principal característica a regulação dos efeitos jurídicos pelas partes, dos encargos obrigacionais.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Deverá ele se pautar nos conflituosos princípios da autonomia da vontade, função social e justiça
negocial.
A obrigação de indenizar por ato ilícito absoluto decorre da responsabilidade civil, legalmente
imposta. Ela poderá ser objetiva ou subjetiva. A regra é que seja subjetiva. Poderá, entretanto, ser
objetiva nos seguintes casos:
O ato ilícito é um ato ilegal, pois viola uma regra de direito; já o abuso de direito é um ato
legal, mas antijurídico, já que nenhuma norma fere, e sim a finalidade social do Direito. Há, entretanto,
discussões, como visto no tópico a seguir.
1ª corrente – ato ilícito é sinônimo de ato antinormativo, sendo a culpa um elemento da res-
ponsabilidade civil subjetiva, e não do ato ilícito. Com base nisso o abuso de direito é um ato ilícito,
porque assim prevê o art. 187 do CC/01.
6O art. 186 dispõe que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e
causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Porém, esse conceito está errado,
porque o ato ilícito é a mera violação do direito, seja advindo da lei ou do contrato, independentemente de produzir
um dano, conforme quer fazer crer o Código. Ato ilícito advém da simples violação da norma. E ponto final.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Esse foi o primeiro raciocínio que decorreu do CC, já que os artigos 186 e 187 dizem quais
são os tipos de ato ilícito. O art. 186 o ato ilícito tradicional e o art. 187 o ato ilícito que consiste no
abuso de direito.
Para essa primeira corrente, qualquer ato contrário à lei é ato ilícito, não precisa de nada. A
culpa não é um elemento do ato ilícito, ela é um elemento da responsabilidade civil, então não se
precisa verificar se o ato foi ou não praticado culposamente, como vai dizer a 2ª corrente. Isso é
irrelevante para essa primeira corrente. Em outras palavras: se a pessoa avançar um sinal de trânsito
e voltar de ré, praticou um ato ilícito?
Para essa primeira corrente praticou, pois praticou um ato contrário à lei, não interessa
não ter causado dano, pois o dano é um elemento da responsabilidade civil, e não do ato
ilícito. Não interessa também que não teve culpa, pois isso também é discussão para a responsabi-
lidade civil, e não para a caracterização, para a configuração do ato ilícito. Ato contrário à lei, para
esta primeira corrente, é ato ilícito.
Outro exemplo: eu entrei na sua casa sem autorização e logo em seguida saí. Pratiquei ato
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ilícito?
Agora o que vai dizer, com muito mais técnica, o professor Tepedino, o professor Cavalieri, a
Maria Celina Bodin etc.?
2ª corrente – Gustavo Tepedino, Maria Celina Bodin, Cavalieri – ato ilícito consiste em um
conjunto de pressupostos da responsabilidade civil, incluindo culpa, dano, conduta e nexo causal.
O abuso de direito está mal localizado no CC/02, pois pode haver um exercício abusivo
sem que isso gere dano, mas ainda assim poderá a conduta ser objeto de decisão determi-
nando que ela cesse, ainda que não haja dever de indenizar.
Eles colocam o seguinte: o abuso de direito como ato ilícito restringe o alcance do abuso de
direito. Em vários códigos no mundo o abuso de direito consta no capítulo próprio, que trata do exer-
cício dos direitos de uma maneira geral. Então, É O EXERCÍCIO DO DIREITO VIOLADOR DO FIM
ECONÔMICO, DO FIM SOCIAL, DA BOA-FÉ OBJETIVA, INDEPENDENTEMENTE DE DANO. O
dano é um problema da responsabilidade civil, não é um problema do abuso.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Então, se você exerce abusivamente um direito, mas nem por isso me causa dano, isso não
significa que esse seu exercício seja regular, que o seu ato seja lícito.
Então, dentro dessa perspectiva, só haverá ato ilícito se houver culpa. E onde é que entra o
problema?
Como o abuso de direito independe de culpa, já que O CÓDIGO ADOTA O CRITÉRIO FINALÍS-
TICO-OBJETIVO, surge uma dúvida sobre a qualificação do abuso como ato ilícito. Esse posiciona-
mento vai fazer uma distinção entre ato ilícito em sentido estrito e ato ilícito em sentido amplo.
No primeiro prevalece o conceito clássico de ato ilícito, previsto no art. 186 do CC/01.
Classicamente a ideia de ato ilícito foi construída e desenvolvida pela doutrina europeia em
cima de quatro pressupostos: conduta, dano, nexo causal e culpa.
Assim, pergunta-se: essa posição clássica de ato ilícito está prevista no código civil? 19
O art. 186 – aquele que por ação ou omissão... – o que é isso?
Conduta.
Culpa.
Então, note que no art. 186 estão presentes os quatro pressupostos do conceito de ato ilícito.
Isso é ato ilícito.
Tecnicamente não há ato ilícito na responsabilidade civil objetiva. Há quem diga, como o
professor Tepedino, que há um ato ilícito no sentido amplo; e há quem diga que nem ato ilícito em
sentido amplo há, que apenas existe o risco. Então o pressuposto da responsabilidade civil objetiva
não será o ato ilícito em sentido amplo, será o risco. Então, na verdade, são três posicionamentos.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Para a terceira corrente você teria como fundamento da responsabilidade civil objetiva
o risco.
Essa é uma discussão muito interessante e atualíssima. O abuso de direito tem um campo
de atuação ilimitado.
Não só posso como normalmente tenho, só que eu não preciso discutir culpa.
Hoje em dia toda a responsabilidade civil, teoricamente, vai se dirigindo à ideia de reparação
de dano. O dano é o pressuposto principal da responsabilidade civil. Hoje em dia o caminho da
responsabilidade civil, dentro de uma interpretação civil-constitucional, dentro da diretriz da solidari-
edade, é reparar o dano, tanto é que as teorias sobre o nexo de causalidade, essas teorias tradicio-
nais, como a da causalidade adequada e a da causa direta e imediata vêm sendo criticadas doutri- 20
nariamente, o nexo causal é um elemento impeditivo de repartimento desse dano. Então, já se fala
até em se defender uma responsabilidade civil sem nexo de causalidade. Há autores modernos que
discutem todas as teorias modernas flexibilizadoras do nexo de causalidade, mas conduta tem que
ter. Você não pode imputar responsabilidade civil para uma pessoa que não praticou uma ação ou
omissão. Conduta sempre vai existir, mas a conduta causadora de dano injusto significa dever de
reparar. A ideia de culpa e a ideia de nexo causal sempre foram os dois grandes filtros da responsa-
bilidade civil. A responsabilidade civil, quando o juiz não quer condenar, é filtrada como? Quando o
juiz não quer julgar procedente o pedido, ele filtra como a responsabilidade civil?
Pelo nexo ou pela culpa, na subjetiva. Como a subjetiva vem caindo e vem crescendo a res-
ponsabilidade objetiva, resta o quê?
No nexo causal tem-se hoje, na responsabilidade civil objetiva, o grande elemento im-
peditivo da aplicação do princípio constitucional da solidariedade, ou seja, o grande fator impe-
ditivo do ressarcimento do dano e do risco.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Por fim, há uma discussão sobre se para se configurar o abuso de direito exige-se culpa ou
não. Rui Stoco defende veementemente que se exige, devendo prevalecer a teoria subjetiva, a
significar que este se caracteriza quando presente o elemento intencional, ou seja, o agente deve ter
consciência de que seu direito, inicialmente legítimo e secundum legis, ao ser exercitado, desbordou
para o excesso ou abuso, de modo a lesionar ou ferir o direito de outrem.
Como não poderia deixar de ser, há os que adotam a teoria objetiva, prescindindo da análise
do elemento subjetivo para a configuração ou não do abuso.
Penso que, em sociedades de massa, é mais prático e garantidor adotar a teoria objetiva, de
acordo com o critério finalístico-objetivo.
Tem por finalidade remover de um patrimônio os acréscimos patrimoniais indevidos. Não re-
quer a prática de um ato ilícito ou de abuso do direito, mas tão-somente a obtenção de uma vantagem
sem contraprestação.
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8.1.4. Obrigações por Atos Unilaterais
Nos atos unilaterais, a obrigação não nasce de um contrato ou da prática de um ato ilícito ou
nem necessariamente de uma declaração de vontade (isso porque muitas vezes o dever jurídico
decorre da lei, como no caso da gestão de negócios). Uma obrigação nasce em decorrência de uma
conduta unilateral de alguém, que se obriga ou obriga a outrem por simples previsão legal, ainda
que genérica, de determinada situação.
Os atos unilaterais não são, via de regra, declarações unilaterais de vontade, como o são os
títulos de crédito.
Promessa de Recompensa
Gestão de Negócios
Pagamento Indevido
Recompensa para ser entendida é preciso fazer menção ao direito real. Ela é atribuída a
quem acha COISA ALHEIA MÓVEL PERDIDA, que no CC/16 era chamada de INVENÇÃO, que era
tratada como forma de aquisição da propriedade de coisa móvel. No atual CC/02, não houve a ex-
tinção da invenção, mas sim atribuição de outra nomenclatura (DESCOBERTA) e colocação em outro
lugar dentro do código, agora está tratada no artigo 1.2337, em seção dentro do capítulo DA PRO-
PRIEDADE EM GERAL.
Quem acha coisa alheia móvel perdida tem direito a uma recompensa, que será arbitrada
pelo juiz em valor não inferior a 5% do valor da coisa encontrada (artigo 1.2348). Mas essa re-
compensa pode ter sido prometida pelo dono da coisa (não pode a promessa ser inferior ao mínimo
que o código determina); quando há a promessa de recompensa, o dono estará obrigando-se por
ato unilateral.
Artigo 854. Aquele que, por anúncios públicos, se comprometer a recompensar, ou gratifi-
car, a quem preencha certa condição, ou desempenhe certo serviço, contrai obrigação de
cumprir o prometido.
Artigo 855. Quem quer que, nos termos do artigo antecedente, fizer o serviço, ou satisfizer 22
a condição, ainda que não pelo interesse da promessa, poderá exigir a recompensa es-
tipulada.
Parágrafo único. O candidato de boa-fé, que houver feito despesas terá direito a reembolso.
Artigo 857. Se o ato contemplado na promessa for praticado por mais de um indivíduo, terá
direito à recompensa o que primeiro o executou.
Artigo 858. Sendo simultânea a execução, a cada um tocará quinhão igual na recompensa;
se esta não for divisível, conferir-se-á por sorteio, e o que obtiver a coisa dará ao outro o
valor de seu quinhão.
Artigo 1234. Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo antecedente, terá direito a uma recom-
pensa NÃO INFERIOR A CINCO POR CENTO DO SEU VALOR, e à indenização pelas despesas que houver
feito com a conservação e transporte da coisa, SE O DONO NÃO PREFERIR ABANDONA-LA.
Parágrafo único. Na determinação do montante da recompensa, considerar-se-á o esforço desenvolvido pelo
descobridor para encontrar o dono ou o legítimo possuidor, as possibilidades que teria este de encontrar a
coisa e a situação econômica de ambos.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
Artigo 859. Nos concursos que se abrem com promessa pública de recompensa, é condição
essencial, para valerem, a fixação de um prazo, observadas também as disposições dos
parágrafos seguintes.
§ 1o. A decisão da pessoa nomeada, nos anúncios, como juiz obriga os interessados.
§ 2o. Em falta de pessoa designada para julgar o mérito dos trabalhos que se apresentarem,
entender-se-á que o promitente se reservou essa função.
§ 3o. Se os trabalhos tiverem mérito igual, proceder-se-á de acordo com os artigos 857 e 858.
Artigo 860. As obras premiadas, nos concursos de que trata o artigo antecedente, só ficarão
pertencendo ao promitente, se assim for estipulado na publicação da promessa.
O dono da coisa pode preferir abandoná-la a pagar a recompensa, como consta do artigo
1.234, parte final acima transcrito, consistindo em uma obrigação alternativa. O descobrir não pode
exigir que o devedor abandone, ele pode exigir a recompensa, o dono pode abandonar ou não a
coisa se quiser.
Artigo 861. Aquele que, sem autorização do interessado, intervém na gestão de negócio
alheio, dirigi-lo-á segundo o interesse e a vontade presumível de seu dono, ficando respon-
sável a este e às pessoas com quem contratar.
EXEMPLO 01: vizinho que percebe que a casa do vizinho, que está viajando, não tem como
ter contato, está ruindo por um defeito; assim, o vizinho que fica providencia o conserto da casa,
criando para o dono da casa a obrigação de indenizá-lo.
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
EXEMPLO 02: dois amigos estão viajando, quando um deles morre e o outro cuida de todas
as despesas de traslado e tratamento do corpo; o amigo sobrevivente cria a obrigação de indeniza-
ção para os herdeiros, sob pena de enriquecimento sem causa.
Assim, na gestão de negócio, o indivíduo cria uma obrigação para terceira pessoa, que deve
ratificar a gestão, verificando que realmente houve proteção de seu interesse. A obrigação do dono
do negócio passa a ser uma obrigação decorrente de uma conduta do gestor, ou seja, não é uma
obrigação decorrente de uma declaração unilateral de vontade. O seu fundamento é evitar o enri-
quecimento sem causa daquele que tem seu negócio gerido por terceiro, em seu proveito,
proveito do dono do negócio.
A preliminar que mudou do CC/16 para o CC/02 reside no fato de que no Código anterior, a
gestão estava sendo tratada no capítulo do mandato (espécie contratual). Isto não estava adequado,
porque na gestão de negócios não há ajuste prévio, ao contrário, sua principal característica é exa-
tamente a ausência de acerto prévio (ausência de ajuste negocial). O legislador de 16 situou a gestão
nesse lugar em razão de um certo paralelismo entre as consequências da gestão de negócio e do
mandato. Assim, caminhou bem o legislador de 2002, ao tratar a gestão fora dos contratos. 24
8.1.4.3. Pagamento Indevido
O pagamento indevido é um pagamento sem causa, que é feito sem corresponder a uma
obrigação que o justifique, pelo menos não em relação à causa que está sendo tratada.
O pagamento indevido, a rigor, não extingue obrigação nenhuma, ele faz nascer uma obriga-
ção, por isso fez bem o novo Código, que o considerou como uma forma de NASCIMENTO DA
OBRIGAÇÃO, qual seja, a obrigação de restituir9.
O pagamento indevido é um ato unilateral que faz nascer obrigação restituitória a outrem,
mas não é uma declaração unilateral de vontade.
Artigo 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir, obri-
gação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.
Para garantir a repetição do indébito, aquele que pagou deve demonstrar que o fez por
erro, como exige o artigo 877, sendo que no CC/16, já existia dispositivo semelhante. O CC poderia
ter preferido uma redação diversa ou nem mesmo ter repetido essa regra, já que não se pode pre-
sumir uma liberalidade quando a pessoa que pagou erroneamente manifesta sua vontade de
ter restituída a coisa.
Artigo 877. Àquele que voluntariamente pagou o indevido incumbe a prova de tê-lo feito por
erro.
25
Artigo 878. Aos frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações sobrevindas à coisa dada em
pagamento indevido, aplica-se o disposto neste Código sobre o possuidor de boa fé ou de
má fé, conforme o caso.
Artigo 879. Se aquele que indevidamente recebeu um imóvel o tiver alienado em boa
fé, por título oneroso, responde somente pela quantia recebida; mas, se agiu de má
fé, além do imóvel, responde por perdas e danos.
Parágrafo único. Se o imóvel foi alienado por título gratuito, ou se, alienado por título oneroso,
o terceiro adquirente agiu de má fé, cabe ao que pagou por erro o direito de reivindicação.
Artigo 880. Fica isento de restituir pagamento indevido aquele que, recebendo-o como parte
de dívida verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou abriu mão das
garantias que asseguravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe de ação regressiva
contra o verdadeiro devedor e seu fiador.
Artigo 881. Não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou cumprir
obrigação judicialmente inexigível.
No novo CC/02, há previsão que não existia no CC/16, um artigo com uma previsão ótima,
mas, colocada em local errado; consistente na perda do direito de receber o indébito se foi pago para
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
a obtenção de fins ilícitos e quem recebeu deverá reverter os valores à instituição beneficente, esco-
lhida pelo juiz de direito.
Artigo 883. Não terá direito à repetição, aquele que deu alguma coisa para obter fim
ilícito, imoral, ou proibido por lei.
Parágrafo único. No caso deste artigo, o que se deu reverterá em favor de estabelecimento
local de beneficência, a critério do juiz.
Para que a regra possa ser utilizada tem que ser dada uma interpretação extensiva a quem
pode requerer a desconstituição do pagamento, isso porque quem pagou (legítimo para requerer)
jamais vai questionar o recebimento, porque sabe que irá perdê-lo.
Para que a regra não caia no vazio, deve-se imaginar que o MP tenha a legitimidade para 26
propor esse tipo de ação, para que o pagamento possa reverter para instituição que tem finalidade
social, e o MP é o representante dos interesses da sociedade. Há uma correlação com a legitimidade
que o MP tem em fazer executar o encargo com fim social decorrente de doação; na falta do doador,
o MP poderá propor a ação de cumprimento coativo do encargo, verdadeiramente, uma execução
específica.
Se o artigo10 tivesse sido previsto em outro lugar seria excelente, porque consagra no direito
civil uma providência que já acontecia no Direito Penal (cestas básicas, suspensão do processo).
Assim, se estive no DANO MORAL, seria a solução de um problema fundamental no direito, qual
seja a fixação do valor do dano moral.
O que ocorre no dano moral é que de um lado o juiz deve encontrar um valor compensatório
(não é reparatório, porque o agravo a direito da personalidade é irreparável), mas que não pode
significar um enriquecimento indevido; não pode permitir que a vítima tenha “vontade” de ser agre-
dida novamente. Por outro lado, o valor deve ser um desestímulo para que o ofensor volte a praticar
a conduta violadora dos direitos da personalidade.
Porém, em alguns casos práticos, não se consegue alcançar o equilíbrio entre os requisitos
acima. EXEMPLO: cidadão que é gravemente ofendido pelo Banco Bradesco, o juiz não conseguirá
que o mesmo valor seja compensatório da vítima (sem ser fonte de enriquecimento) e relevante para
o Bradesco. Assim, quando houver uma desproporção financeira grande entre a vítima e o ofensor,
nunca o juiz encontrará o valor certo. A solução seria a devolução de parte do valor da condenação
à instituição altruística.
Mas, essa providência (reversão de pagamento para instituição altruística) não foi prevista
para o dano moral, mas, sim para o pagamento indevido.
Art. 41. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo,
nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do in- 27
débito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção mo-
netária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
a) Caráter transitório;
b) Vínculo jurídico entre as partes, pelo qual se pode exigir da outra, coercitivamente, o adim-
plemento;
Logo, o que distingue obrigação de dever jurídico é o objeto prestacional, qualificado por ser
um dar, fazer ou não fazer.
Podem ser pessoas físicas ou jurídicas, independentemente de capacidade. Caso haja inca-
paz envolvido, ele deverá ser representado ou assistido. Os sujeitos não precisam ser determinados,
porém devem ser determináveis, como ocorre nas obrigações propter rem, os quais serão individu-
alizados no momento do adimplemento.
Poderá haver substituição de sujeitos, com exceção das obrigações intuitu personae.
a) Lícito: não pode atentar contra a lei, a moral, a ordem pública ou os bons costumes.
b) Possível: possibilidade física e jurídica, esta geralmente associada à ausência de uma ve-
dação que o impossibilite. Como o direito privado se caracteriza pela liberdade e autonomia da von-
tade, a impossibilidade deverá ser expressa em lei (CR: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de
Direito Civil - Introdução ao Direito das Obrigações
fazer algo senão em virtude de lei). Não havendo vedação, ainda que genericamente enquadrável
nas cláusulas gerais, o objeto será em tese possível.
Nas obrigações naturais, nas quais somente existe o débito, sem responsabilidade, o
vínculo jurídico não tem caráter coercitivo. LOGO, HÁ VÍNCULO JURÍDICO DESPROVIDO DE
PRETENSÃO.
O vínculo pode ser bipartido em (são seus elementos): dívida - débito (liame que vincula o
devedor ao credor) e responsabilidade do devedor (quando houver o inadimplemento, o devedor
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responde com o seu patrimônio pelo cumprimento do débito). A definição de que o vínculo contém
esses dois elementos resulta da aplicação da TEORIA DUALISTA DA OBRIGAÇÃO. CRÍTICA: os
adeptos da TEORIA UNITÁRIA DA OBRIGAÇÃO entendem que débito (Schuld) e responsabilidade
(Haftung) não são separáveis.
Em verdade, três são as teorias que tentam explicar a ideia sobre a participação do vínculo:
a) Monista: limitação para o vínculo jurídico, sendo mais importante a dívida – débito. Des-
preza a responsabilidade, que seria questão de direito processual.
c) Eclética ou mista: adotada pelo nosso código, valoriza tanto a dívida quanto a responsa-
bilidade, dando o mesmo valor às duas.
Evidentemente que pode não haver a conversão em perdas e danos, o que não impede que
junto ao adimplemento da obrigação principal o credor exija o pagamento de perdas e danos a título
de indenização, cumulativamente. 30
A execução pelo Poder Judiciário somente se procederá, por óbvio, a requerimento, não
sendo possível a jurisdição de ofício, ante o princípio da inércia.
Como o dever jurídico é um gênero, que engloba a obrigação (dever jurídico qualifi-
cado), pode-se dizer que a responsabilidade civil decorre da violação de um dever jurídico.