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Ocupo, logo resisto: 50 dias de ocupação em uma escola de Alfenas-

MG

Resumo: O presente trabalho tem por objetivo registrar a duradoura e intensa ocupação de uma escola estadual Mayra Cristina
de Alfenas/MG, que integrou-se ao movimento nacional de ocupações secundaristas ocorridos no ano de 2016 Costa
no Brasil. Foram 50 dias, sendo 19 com paralisação total das atividades. A partir das vivências dos autores nesse Graduanda
processo, são descritos os desafios- de caráter coletivo, subjetivo, institucional, político e social- enfrentados em Química
pelos(as) estudantes, buscando contribuir com reflexões para o campo educacional e apontar para a possibili- (Licenciatura)
dade de construção de uma escola que contemple mais a juventude, compreenda e valorize tais experiências de pela Universidade
resistência. Federal de Alfenas

Abstract: This work aims at recording the long-lasting and intense occupancy of a state school located in Alfe- Gabriel Barreto
nas which joined the national movement of occupancy by high school students which occoured in Brazil in 2016. Lopes
It lasted 50 days, 19 days from them counted on downtime of all activities. From the experience the authors Graduando
got following this process, the challenges – of collective, subjective, institutional, political and social characters em Pedagogia
– faced by the students are depicted, seeking to contribute - through reflections - to the educational field and (Licenciatura)
to point to the possibility of building a school able to contemplate the youth better and able to understand and pela Universidade
appreciate such resistance experiences. Federal de Alfenas.

Palavras-chaves:
Ocupações
Introdução 1. Ocupar: Já estava (inconscientemente) secundaristas.
decidido Educação escolar.
Em 2015, secundaristas de São Paulo ocuparam Juventude.
centenas de escolas como forma de mobilização e Em outubro de 2016, após cerca de 20 dias do iní- Keywords:
luta contra o projeto de reorganização escolar pro- cio do movimento, quando as ocupações secundaris-
posto pelo governador Geraldo Alckmin, que foi revo- High school
tas cresciam pelo país, estudantes de uma turma da
gado como uma vitória significativa desse movimento student occupancy.
segunda série do ensino médio de uma escola da rede
(CATINI & MELLO, 2016; CORTI, CORROCHANO, School Education.
estadual em Alfenas/MG fomentaram uma discussão
SILVA, 2016; PAES & PIPANO, 2017). No ano seguinte, Youth.
sobre a conjuntura nacional. Estes estavam em uma
inspirados por esse processo, no Paraná, São Paulo, aula de geografia5 e iniciaram a discussão sobre a 1 Disponível em: http://ubes.org.
Minas Gerais, Distrito Federal, entre outros estados, Medida Provisória 746 (Reforma do Ensino Médio) e a br. Acesso em: 30 jul.17.
assistiu-se a emergência e consolidação de um movi- PEC 55 (“PEC do Teto de Gastos”). 2 Aprovada no Senado em
mento nacional de ocupações estudantis, que atingiu 13 de dezembro de 2016 e
Por consequência, o movimento de ocupações se- promulgada em 15 de dezembro
o número expressivo de mais de mil universidades,
cundaristas, que vinha ocorrendo em todo o Brasil, de 2016, a PEC 55, conhecida
institutos federais e principalmente escolas de ensino como “PEC do Teto dos Gastos”,
tornou-se tema do diálogo. Em um ponto da conver- foi encaminhada pelo governo
médio1. de Michel Temer, tendo como
sa, os(as) estudantes afastaram as carteiras da sala justificativas o equilíbrio das
Em geral, os(as) estudantes secundaristas colo- de aula para as paredes, sentaram-se todos em roda contas públicas por mecanismos
rígidos de controle de gastos
caram-se como protagonistas contra a situação de e um aluno apresentou em seu celular uma foto e um públicos por 20 anos e um novo
precarização e sucateamento da educação pública manual resumido, cujo título era “Como Ocupar seu
regime fiscal. Contudo, alvo
de discussões na sociedade
no país, tendo como pautas centrais a luta contra Colégio”6. civil, tal proposta foi levantada
como pauta central na luta dos
a Proposta de Emenda Constitucional nº 55/2015 movimentos de ocupações e
A aula de geografia acabou, porém os(as) estu-
(PEC 55)2, a Medida Provisória nº 746/2016 (MP de outros movimentos sociais,
dantes não pararam a discussão por aí, na medida que apontavam para a sua
746/20163), e o Projeto de Lei nº 867/2015 (PL “Es- inconstitucionalidade e para
em que, intrigados, entraram em contato com uni- os impactos negativos sobre
cola sem Partido”4). investimentos essenciais e
versitários da universidade federal do município, cuja estratégicos, como saúde,
Nesse contexto, no município de Alfenas, localiza- reitoria se encontrava ocupada. Após esse contato, os educação e assistência social.
do ao sul de Minas Gerais, o movimento de ocupações secundaristas foram convidados a conhecer a ocupa- 3 Defendendo alterações na
foi iniciado em uma escola pública de ensino médio, ção universitária e sua organização, observando como estrutura do ensino médio,
última etapa da educação
sendo seguida temporalmente por universitários da as comissões se separavam e como havia um esforço básica, tal MP, encaminhada
também pelo governo federal
instituição federal de ensino superior do município e diário para arrecadar doações de alimentos e para ga- e aprovada com mudanças
por mais três escolas públicas. rantir uma programação culturalmente diversa, sem pelo Senado em fevereiro de
2017, propõe a ampliação da
Dito isso, considerando o envolvimento direto dos abrir mão dos debates políticos. carga horária mínima anual,
a implementação de escolas
proponentes deste relato com o movimento de ocu- No dia seguinte a essa visita, esse grupo de es- em tempo integral, tornava
inicialmente facultativo o ensino
pação de uma destas instituições escolares, tomada tudantes secundaristas percorreu todas as salas do da arte e da educação física
como experiência para a presente problematização, ensino médio da escola, recolhendo assinaturas de
nessa etapa, além de outras
mudanças curriculares. Criticada
buscar-se-á alcançar um objetivo não tão preten- todos(as) aqueles(as) que concordavam com a ocupa- por grupos e entidades ligadas
à educação, principalmente pelo
sioso, mas fundamental: registrar, na forma de me- ção daquele espaço escolar, visando registrar de for- seu caráter arbitrário, enquanto
morial, os acontecimentos, para que outras pessoas ma escrita a porcentagem de estudantes favoráveis.
medida provisória, e pela falta de

possam ler e para marcar a história destes estudan- Ademais, junto a essas assinaturas recolhidas, foi fei-
tes (ocupantes e resistentes) na produção científica to o registro daqueles(as) estudantes que, de alguma
da área educacional. maneira, gostariam de ajudar no processo de ocupa- 56
ção da escola, compondo as comissões organizativas,
arrecadando alimentos, entre outras atividades.
Feito isso, na parte da tarde desse dia, tais es-
tudantes realizaram uma reunião na sala de vídeo da
escola para deliberar alguns pontos importantes. Com
as assinaturas recolhidas em mãos, foi concluído que
aproximadamente 90% dos estudantes frequentes do
ensino médio eram favoráveis à ocupação da escola.
Contudo, como a escola em questão funciona em dois
turnos7, era necessário dialogar também com os(as)
estudantes do Ensino Fundamental II. E assim foi fei-
to.
No dia seguinte, houve a divisão em duas frentes Fig. 1: Autorização elaborada pelos secundaristas
dos estudantes que haviam se reunido anteriormen-
te: metade ficou responsável por ir à escola recolher era preciso realizar uma assembleia estudantil com
as assinaturas dos estudantes do turno vespertino todos os estudantes da escola, feita na manhã do dia
favoráveis à ocupação e a outra metade foi para as 28 de outubro de 2016, contando com a presença de
ruas do entorno arrecadar alimentos e outros man- três secundaristas de outra escola estadual do muni-
timentos. Entendiam que o diálogo com os(as) estu- cípio —que já se encontrava ocupada há 4 dias —e de
dantes do Ensino Fundamental II era essencial para um advogado, tendo como pautas a discussão sobre
o futuro da ocupação, já que representavam mais de a legalidade das ocupações e os possíveis enfrenta-
50% dos estudantes da escola. Além disso, em mo- mentos futuros.
mento algum, os organizadores da ocupação levaram Mesmo se tratando de uma assembleia dos es-
em consideração que esses(as) estudantes não se- tudantes, foi presenciado que professores e alguns
riam capazes de dialogar e entender a situação por membros da equipe gestora da escola levantavam as
serem mais novos. mãos e chegavam a interromper as falas dos secun-
Nesse sentido, a resposta de uma estudante se- daristas. Contudo, era necessário respeitar a autori-
cundarista, quando questionada sobre o tratamento dade de fala e a legitimidade daquele espaço, sendo
para com os(as) estudantes do Fundamental II e de isso muito bem exposto pelos(as) estudantes.
uma suposta incapacidade de compreensão destes Ademais, essa manhã de discussão deixou os(as)
em relação à ocupação, foi a seguinte: , “Jamais os estudantes eufóricos(as) por mudanças, na medida
subestimamos, não faríamos com eles o que fazem em que, segundo relatos informais dos próprios se-
conosco. Não tem lógica reproduzirmos isso.” (Estu- cundaristas, era perceptível que tinham muitas coi-
dante B, mulher, 17 anos). sas a falar. Alguns deles, inclusive, chegaram a se
Tal resposta parece vir ao encontro de um ques- emocionar ao comentar sobre seus irmãos pequenos,
tionamento feito por nós aos secundaristas, sobre o entendendo que estavam ali dispostos a lutar para
comportamento dos professores e funcionários da que seus familiares não passassem por situações se-
instituição escolar, no período em que organizavam melhantes ou piores do que aquela.
a ocupação, buscando entender se haviam ocorrido Nesse sentido, acreditamos que tal assembleia
maiores discussões e consulta empecilhos ou se alguém tentou os impedir. Uma representou o primeiro momento em que alguns
à sociedade, tornou-se também
pauta de luta das ocupações.. das estudantes respondeu que os organizadores da dos adultos que trabalhavam na escola começaram
4 Tal projeto, pautado na defesa ocupação não enfrentaram nenhuma dificuldade mais a acreditar que os(as) estudantes não iriam recuar.
da neutralidade e imparcialidade
dentro das escolas, buscando
significativa, mas mesmo que os professores e fun- Destarte, ao fim da assembleia, foi entoado pelos(as)
defender os alunos da suposta cionários —salvo algumas exceções—acreditassem estudantes, aos pulos, o grito “ocupar e resistir”, re-
doutrinação de professores,
têm sido alvo de críticas de que a luta fosse legítima, tomavam aquele movimento produzido nacionalmente em várias ocupações secun-
vários movimentos de educação,
destacando os seus riscos e a
como algo imediatista, como “fogo de palha”. Em suas daristas. Estava oficialmente deliberado: a escola seria
censura proposta, principalmente palavras, “Era como se fôssemos invisíveis, como se ocupada às 17h daquele dia.
no que se refere à discussão
de temas como gênero, política, nada estivesse acontecendo na escola.” (Estudante A, A decisão de ocupar na sexta-feira foi uma es-
homofobia, machismo e religião.
mulher, 17 anos). tratégia para não haver enfrentamentos diretos logo
5 É importante registrar que
o professor de geografia não
Quando recolheram as assinaturas, os organiza- no primeiro dia do movimento e os estudantes en-
só iniciou a discussão, mas a dores concluíram que um número muito superior à tendiam também que já havia alimentos suficientes
fomentou, cedendo a sua aula
para que os(as) estudantes metade dos(as) estudantes era a favor do movimen- para que todos passassem o fim de semana naquele
pudessem refletir sobre e
analisar a conjuntura que o
to. A ocupação iria acontecer! Entretanto, pensando espaço. Dessa forma, sendo inclusive instalado um
país se encontrava naquele nos estudantes menores de 18 anos, era preciso ela- chuveiro em um dos banheiros da escola, os(as) estu-
momento..
borar uma autorização, a ser assinada pelos pais ou dantes começaram a trazer suas coisas.
6 Cartilha produzida pela página
“O mal educado”, relatando a responsáveis. Tal autorização, apresentada a seguir, Portanto, considera-se que toda a organização
experiência de estudantes do comprovava a ciência por parte da família de que o(a) e várias decisões importantes foram tomadas de
Chile e da Argentina e explicando
como ocupar uma escola. estudante permaneceria na ocupação e dormiria na maneira muito rápida, já que da aula de geografia à
7 No período matutino são escola. assembleia estudantil se passaram apenas três dias.
ofertadas turmas de Ensino
Médio e no turno vespertino, Os(as) estudantes já haviam dividido as comis- Além disso, no esforço de rememorar tais aconteci-
turmas de Ensino Fundamental
II.
sões: organização, programação, comunicação, lim- mentos e investigar a história da ocupação, percebe-
peza, alimentação e segurança. Tinham também os mos que em nenhum momento, tanto o grupo inicial
registros sobre a quantidade de estudantes que eram de dez estudantes, quanto aqueles que se somaram
57 a favor, a autorização dos responsáveis e uma quan- ao movimento- buscando ajudar de alguma forma,
tidade grande de alimentos arrecadados. Porém, ainda falaram oficialmente ou votaram pela ocupação. Se-
gundo uma das secundaristas, que presidiu a assem- tal fato ficou extremamente latente, pois a ocupação
bleia estudantil do dia 28 de outubro, na qual foi feita possibilitou àqueles(as) que estavam ali olhar para
a deliberação pela ocupação, eles e elas sabiam que dentro de si individualmente e coletivamente— pro-
queriam ocupar e tocaram a organização para fren- cesso que não é fácil ou simples. Além das dificulda-
te. “Perderíamos a coragem se pensássemos demais. des inerentes à movimentação, como o fato de estar
Não era necessário ficar debatendo se queríamos ou o tempo todo em um ambiente que não era nossa
não, já estava inconscientemente decidido” (Estudan- casa, os alimentos regrados e algumas vezes escas-
te A). sos, as retaliações midiáticas e institucionais, havia
ainda, portanto, o “eu para comigo mesmo”.
2. Aspectos gerais da “Ocupa” Portanto, os autores se inseriram no processo en-
tre a organização dos(as) estudantes para a ocupação
se consolidar (descrito anteriormente) e a posterior
Para fins de esclarecimento, é importante regis- eclosão da ocupação total, apresentada a seguir. As
trar como se deu a inserção dos autores desse relato falas relatadas resultam de conversas registradas
no espaço da referida ocupação. Nesse sentido, nos durante e após a ocupação. Por fim, o relato que se
momentos de organização e mobilização menciona- segue é fruto da vivência dos autores e da maneira
dos acima, os autores possuíam relação direta com a como procuraram relacionar-se com a escola, com
escola, visto que a autora realizava estágio supervi- seus estudos educacionais e para onde dirigiram seus
sionado na mesma e o autor coordena um cursinho olhares.
popular que faz uso da infraestrutura da instituição.
Dito isso, a aproximação de ambos com a movi-
mentação ocorreu por volta de dois dias após a ocu-
3. 19 Dias de Ocupação Total: Criando la-
pação da escola. Inicialmente, houve a intenção de se ços, resistindo e reexistindo
aproximar dos(as) estudantes, conhecer a dinâmica da
ocupação e ajudar no que fosse preciso. Nesse bojo,
cabe mencionar que os(as) estudantes secundaristas
foram muito receptivos(as), acolhendo efetivamente
aqueles(as) que batiam à porta da escola para contri-
buir de qualquer maneira, pernoitando ou não naquele
espaço.
Sendo assim, desde o terceiro dia de ocupação
escolar, os autores passaram a pernoitar na escola
e consideram que integraram-se à mesma, atuando,
principalmente nos dias de ocupação total, como me-
diadores dos diálogos estabelecidos entre os(as) ocu-
pantes e professores, membros da Superintendência
Regional de Ensino e demais estudantes da escola. Fig. 2: Fachada da escola na manhã seguinte à ocupação.
Ademais, pode-se citar outras atividades reali-
zadas pelos autores naquele espaço: arrecadação de
Para garantir o fechamento dos portões e iniciar
doações e de dinheiro para a compra de suprimentos
efetivamente a ocupação, às 17h de 28 de outubro de
alimentícios; contato com educadores da universidade
2016 (sexta-feira), um grupo de estudantes pegou as
pública e de outras instituições municipais para auxi-
chaves de vários espaços da escola. Haviam poucos
liar na organização diária da programação da ocupa-
professores e três funcionários na escola, mas não
ção; integração às comissões de limpeza, entre outras.
houve nenhum tipo de represália nesse momento.
Destarte, considera-se que esse papel de media- Além disso, às 16h do mesmo dia, foi criada então
ção foi importante no processo de estabelecimento de uma página no Facebook, visando garantir a divul-
diálogo entre as diferentes partes daquele contexto, gação das atividades nas redes sociais e solicitar ali-
já que as conversas em roda —realizadas no pátio da mentos e outras ações. Assim, quando a escola foi
escola —apresentaram-se como espaços em que os fechada, os alimentos e produtos de limpeza foram
atores envolvidos se ouviam (ou não), já que, em algu- organizados no pátio de entrada e a cada dia a dis-
mas vezes, não foram totalmente pacíficas. pensa ficava mais cheia, devido ao esforço dos(as)
Além desses espaços, houve conflitos de diferen- estudantes.
tes naturezas durante todo o percurso da ocupação, Embora fosse um final de semana, os(as) estudan-
que não deve ser vista apenas como um movimento tes se preocupavam em não deixar o tempo ocioso,
heroico e em geral, harmonioso. Tais conflitos foram buscando definir as atividades da programação. Logo
de caráter prático: por exemplo, na execução de ta- no primeiro sábado, houve prática de ioga, oficina de
refas e divisão de trabalhos, que foram considerados teatro, confecção de cartazes e slackline8. A cozinha 8 Prática corporal realizada
fáceis de resolver, uma vez que os jovens lançaram trabalhava a todo vapor, por meio do trabalho da co- em uma fita estreita e flexível,
tencionada em dois fixos, onde
mão de maturidade e real disposição para estarem ali; missão de alimentação, sendo que dois irmãos gê- são realizados movimentos,
e conflitos nas relações entre professores específi- meos de origem pernambucana se responsabilizaram
buscando a harmonia entre
corpo e mente. Disponível em:
cos, estudantes que não participaram da ocupação e pelas atividades e pelo revezamento dos auxiliares, http://www.slackproof.com/o-
que-e-slackline. Acesso em:
os(as) estudantes ocupantes, as quais foram se ten- tanto no momento de preparo das refeições quanto 30 jul.17.
sionando com o passar dos dias. no momento de limpeza dos utensílios e lavagem da
Cada estudante ocupante teve também seus cozinha/refeitório. Dessa forma, tornou-se mais que
conflitos subjetivos, sendo que em alguns momentos, um espaço de refeições, mas de sociabilidade e de
58
estreitamento dos vínculos afetivos. pervisão e orientação das escolas do município), pro-
Já que há no município uma feira livre às quar- fessores, equipe gestora da instituição, funcionários,
tas-feiras e aos domingos, os(as) estudantes apro- família, imprensa e a comunidade em geral.
veitaram também esse espaço para a arrecadação Tais enfrentamentos se resumiam principalmen-
dos alimentos. Além disso, estabeleceram outros dois te à necessidade de convencimento e reafirmação —
dias ao longo de cada semana para a arrecadação em frente a esses grupos de pessoas —da legitimidade
residências e no comércio, tanto de comidas quanto das pautas defendidas e da própria ocupação em si.
outras doações. Dessa forma, havia arrecadação em Nesse bojo, na própria segunda-feira, duas estudan-
tes foram submetidas a mais de cinco horas de reu-
niões fechadas, primeiramente com todos os profes-
sores da escola e em seguida com uma representante
regional de ensino, em conjunto com a supervisora
pedagógica da instituição.
Nessa primeira reunião, os(as) demais ocupantes
não aceitaram que houvesse a participação somente
das duas estudantes específicas, consideradas pela
supervisora como líderes, embora fosse reafirmado
a horizontalidade do movimento e a ausência de li-
deranças fixas. Sendo assim, em um determinado
momento da reunião que estava ocorrendo na sala
dos professores, cerca de dez estudantes adentraram
o espaço, justificando que a ocupação era organiza-
da de maneira horizontal e que não havia lideranças,
enfrentando a insistência por parte dos demais de
que era necessário dialogar somente com “as líderes”.
Além disso, nesse mesmo espaço, os(as) estudan-
tes foram acusados de serem “vândalos”, “invaso-
res”, sendo inclusive chamados de “débeis mentais”
por um secretário da escola, que afirmou que “após
aquela palhaçada acabar, cada um iria voltar para sua
vidinha”.
Entende-se que, nesses espaços de conflito entre
gerações e de tentativa de reprodução da hierarquia
Fig. 3: Alimentos arrecadados na feira livre do município em 31/10/16. presente cotidianamente na escola, os(as) estudan-
tes apenas reforçavam as convicções e pautas que
haviam sido reafirmadas na assembleia estudantil, o
que estava exposto nos cartazes e o que estava sen-
quatro dos sete dias de toda semana, como forma
do divulgado na página da ocupação na rede social: a
de garantir a permanência física e psicológica, prin-
conjuntura política, a necessidade de lutar, a organiza-
cipalmente.
ção em comissões e a horizontalidade do movimento.
Dessa forma, a primeira reunião foi finalizada para
O primeiro fim de semana prosseguiu sem mui- cessar a tensão, mas logo em seguida começou outra,
tas tensões, mas apesar de tudo estar correndo con- contando com a participação de uma representante
forme os planos estabelecidos, havia uma apreensão regional de ensino, que recebeu uma ligação “emer-
sobre como seria na segunda-feira, quando todos(as) gencial”. Após muita insistência, foi deliberado que
chegassem à escola. No domingo pela manhã, em quatro estudantes e não somente as duas “líderes”
meio a oficina de teatro proporcionada por uma pro- participariam, sendo feita uma série de questiona-
fessora da universidade federal do município, houve mentos para os(as) estudantes a respeito de diversas
a visita surpresa do prefeito e de um vereador re- temáticas: ponto de professores, contrato de profes-
cém-eleitos do mesmo partido, que queriam conhecer sores substitutos, reposição do calendário escolar, as
a ocupação e apoiá-los “no que fosse preciso”. Tais “despesas do Estado” com a ocupação, entre outras.
sujeitos olharam a estrutura da escola, disseram que Entende-se que os(as) estudantes não tinham as
fariam melhorias naquele espaço escolar, pediram por respostas, nem deveriam tê-las, mas os responsáveis
café, mas os(as) estudantes não se esforçaram para por debater os questionamentos não recuaram, sen-
estabelecer diálogo, já que ficaram desconfiados e do a reunião encerrada após uma das estudantes ter
apreensivos. Entretanto, logo os políticos foram em- uma crise de choro e se retirar.
bora e durante os 50 dias de ocupação, não foram
Nos demais dias, enquanto uma programação rica
vistos mais e não foi estabelecido nenhum outro tipo
e diversa de atividades acontecia no pátio, contando
de contato.
com a presença de vários educadores do município,
A partir das 6h30min da segunda-feira, 31 de principalmente professores universitários, vários es-
outubro de 2016, uma série de enfrentamentos foi tudantes eram forçados a se retirar destas para que
iniciada, permanecendo até o último momento da pudessem apresentar as justificativas do movimento
ocupação escolar. Tais enfrentamentos envolviam para os grupos citados acima, o que acabava disper-
diferentes sujeitos: representantes do Estado (ins- sando também aqueles estudantes não-ocupantes,
59 tâncias regionais e estaduais responsáveis pela su- que eram convidados a participar da programação.
Dia após dia, a cada manhã ou tarde, havia esse lado da escola foi assaltado e os indivíduos que come-
tipo de enfrentamento. Era preciso resistência em seu teram o ato delituoso ficaram rondando os muros da
mais puro significado. Conforme era percebido que escola por um longo tempo depois, portando armas de
não iria haver recuos e que os(as) estudantes iriam fogo. Ninguém dormiu aquela noite. Além dessa situ-
manter a ocupação total da escola, com a suspensão ação, pedras e objetos pequenos eram arremessados
das aulas, a própria superintendente de ensino foi en- às janelas enquanto todos dormiam, havia ameaças
viada para falar com os(as) estudantes. de pessoas que passavam pelos portões da escola de
De uma forma que não é possível descrever minu- madrugada, chutando os mesmos, vociferando fra-
ciosamente, devido ao seu caráter subjetivo e ao au- ses de ameaça e repulsa. Portanto, tudo era capaz de
toritarismo vivenciado por nós, tais encontros, vigílias amedrontar aqueles sujeitos que ali estavam.
e outros problemas nas madrugadas constituíram um Contando os finais de semana, foram 19 dias de
espaço extremamente conflituoso. Sendo assim, tal ocupação completa da escola, na qual os(as) estu-
espaço marcou psicologicamente a todos que ali se dantes se esforçaram arduamente para manter os
encontravam na ocupação, sendo necessário inclusive portões fechados e as atividades totalmente parali-
a intervenção e a contribuição de uma psicóloga e sadas, mesmo que houvessem represálias de diferen-
professora universitária, responsável por realizar con- tes natureza, agindo tanto na escola quanto externa-
versações para proteger a saúde mental dos sujeitos. mente, inclusive no âmbito familiar. Nesse contexto,
Mesmo com todas essas tensões, quando a es- cabe mencionar que uma estudante chegou a sofrer
cola se esvaziava no fim de cada período letivo, outro agressões severas de seu pai, devido ao fato de es-
espaço existia. Não havia choro. Havia dança e jo- tar na ocupação, e que após o final desta, conforme
gos. As assembleias estudantis ocorriam sem gritos nos foi relatado, uma outra estudante foi proibida de
e os(as) estudantes não eram acusados de estarem sair de sua casa por meses devido à sua participação,
cometendo crimes. embora seus responsáveis tivessem autorizado for-
malmente no início do movimento.
Era facilmente visível que existia uma dificulda-
de enorme por parte daqueles que estavam de fora Não bastasse tanta pressão, determinados repre-
da ocupação em compreender a horizontalidade da sentantes de canais da imprensa municipal tomaram
mesma, fato que se materializava em diversos mo- atitudes extremamente negativas, publicando notí-
mentos — desde quando queriam achar “uma líder” cias falsas sobre todas as ocupações que ocorreriam
para apontar e culpar, até quando a responsável pela na cidade. Tal fato contribuiu muito para negativar a
gestão regional fazia tentativas frustradas de inter- imagem das ocupações, sendo um fator chave para
romper a fala estudantil. Nesse bojo, pode-se citar se compreender a forma como a opinião pública em
também momentos em que os(as) estudantes foram
“convocados” para comparecer na OAB (Ordem dos
Advogados do Brasil), no Fórum ou na sede de um
partido político.
Ademais, um oficial de justiça bateu à porta da
escola em uma tarde da primeira semana de ocu-
pação dizendo que o juiz queria falar com eles(as),
determinando um dia e horário para comparecerem
ao fórum da cidade. Contudo, obteve a resposta de
que se o juiz quisesse conversar sobre a ocupação, ele
deveria ir até a escola. E respondiam assim a todos
que os chamavam.
Dessa forma, entende-se que na ocupação exis-
tiu a todo momento uma linha muito tênue entre o
que poderia se tornar um desafio e um momento de
paz, como até mesmo dormir, por exemplo. Dormir
de maneira tranquila e saudável era um desafio, já Fig. 4: Nota de Repúdio publicada pelos estudantes.

que a escola aparecia como um ambiente estranho,


por mais que aquele espaço parecesse familiar an- geral se constituiu em relação do movimento. Nesse
tes da ocupação. Além das rondas periódicas durante sentido, foi feita a publicação nas redes sociais de
a madrugada para garantir a segurança dos(as) en- uma nota de repúdio, apresentada abaixo, reforçando
volvidos(as), eram realizadas assembleias ao final de a indignação dos estudantes da ocupação com a mídia
cada dia, bem como uma série de outras atividades local e reafirmando suas pautas e a organização do
para manter a ocupação existindo e resistindo, fazen- movimento.
do com que dormissem mal ou que o sono sempre
fosse interrompido. Porém, apesar de todo e qualquer
problema, às 6h de segunda a sexta-feira, todos os
secundaristas estavam de pé, sendo essas situações Entretanto, a convivência intensa e marcante na-
encaradas como oportunidades de desenvolverem quela situação atípica como um todo, fez com que os
maior disposição para a luta coletiva. sujeitos que se encontravam naquele espaço criassem
Houve também situações específicas de alto risco, uma rede de apoio e se conhecessem intensamente:
em que as pessoas responsáveis pelas rondas emiti- as histórias de vida, os anseios e as dificuldades fami-
ram alertas para que todos se levantassem, como por liares do próximo. Dessa forma, promoveram um forte
movimento de protesto frente à própria instituição 60
exemplo, quando um posto de gasolina localizado ao
escolar, extremamente organizado e articulado, já que
a maioria dos estudantes ocupantes da escola vinham
de bairros periféricos da cidade, considerados pobres
e violentos. Ademais, alguns eram, inclusive, jovens
subjugados e carregados de estereótipos no próprio
cotidiano escolar, vistos como “alunos-problema”.
Nos dias de ocupação, promoveram para si e para
o outro ao seu lado a ressignificação do espaço esco-
lar, sendo o afeto um fator essencial para as relações
que foram construídas durante a ocupação e determi-
nante para a manutenção e permanência/resistência
naquele espaço. Tal fato foi comprovado, ao ouvirmos,
nas palavras de uma estudante que “Seguramos 50
dias porque tínhamos uns aos outros. Aos olhos de
Fig. 5: “Aulão” sobre a MP 746 (Reforma do Ensino Médio)
alguns, isso não era nada, porém para nós, esse foi o
nosso tudo” (Estudante A). nimo de esforço especialmente por parte dos profes-
sores em entender e legitimar a causa.
4. Da ocupação parcial à desocupação Além disso, em vários momentos os(as) estudan-
tes ocupantes questionaram o fato de que, ao serem
votadas paralisações ou greves, não eram consulta-
Após o feriado de 15 de novembro, a escola foi
dos e convidados a participarem da luta da classe do-
reaberta para a retomada de aulas regulares, resul-
cente, oportunidade para todos se unirem e lutarem
tado principalmente da pressão feita pelas instâncias
por um bem maior. Entretanto, vários(as) docentes da
regional e estadual de ensino. De forma pouco demo-
escola alegavam que o sindicato estadual dos profis-
crática, impuseram que tais aulas deveriam acontecer
sionais em educação não havia veiculado posiciona-
de maneira concomitante à ocupação para que o mo-
mento oficial em relação às ocupações estudantis e
vimento pudesse continuar.
por esse motivo, não se posicionariam.
Ademais, foi acordado com a gestão da escola
Conforme vivenciado, os(as) secundaristas orga-
que todos(as) os(as) estudantes da escola poderiam
nizaram a ocupação de maneira rápida, inteligente e
e deveriam ser incentivados pelos professores a par-
estratégica, sem contarem com nenhum tipo de re-
ticipar das atividades da “ocupa”, e que aqueles que
presentação ou organização sindical. Destarte, quando
optassem por participar não sofreriam prejuízos, per-
se analisa esse cenário, é possível questionar sobre o
seguição ou assédio moral por tal escolha. Entretanto,
papel do sindicalismo e o papel individual assumido
após a reabertura da escola, tais acordos foram sen-
pelos membros sindicalizados. Ainda que o sindicato
do sistematicamente quebrados por parte da equipe
dos professores estivesse sendo omisso (e foi até o
gestora e pelos professores da escola.
fim), cada professor, por escolha individual, poderia
Dia após dia, tais atores minavam o acesso dos ter declarado e materializado seu apoio, sendo per-
ocupantes aos espaços da escola com recados e proi- ceptível —salvo exceções a serem valorizadas —que a
bições, sendo que alguns docentes, além de não li- maioria preferia se colocar em uma posição passiva
berarem os(as) estudantes para participar das aulas de observação dos fatos.
“não-regulares”, desmotivavam os(as) mesmos(as) e
Além disso, destaca-se a posição da instância re-
até permitiam que ficassem ociosos em sala de aula
gional de ensino, que após garantir o consenso para a
para motivar a não participação na programação da
volta das atividades letivas, não apresentou nenhum
ocupação.
tipo de orientação pedagógica à equipe gestora acer-
Nesse sentido, foi registrado por meio de fotos ca de questões burocráticas, como as reposições de
e vídeos, estudantes riscando o quadro, desenhando, aulas e dos conteúdos para os(as) ocupantes, as for-
mexendo em seus celulares durante a manhã toda, mas de avaliação que seriam consideradas legais pelo
tanto na presença quanto na ausência de professor órgão, entre outros elementos. Nesse sentido, além
em sala de aula. Enquanto isso, no pátio, os(as) estu- de serem enviados e-mails solicitando a presença da
dantes que ocupavam a escola promoviam uma série equipe dessa instituição, foi apresentado um docu-
de atividades. Destarte, tal ociosidade foi registrada mento formal pelos(as) ocupantes com solicitações
pelos(as) ocupantes e posteriormente exposta à ins- para a resolução dessas questões, que não foi res-
tância regional de ensino, que não mostrou reação pondido. Tal documento apresentou também algumas
alguma diante do fato. demandas estruturais da escola: a necessidade de de-
Após a reabertura dos portões da escola, os(as) detização do espaço, disponibilização de informações
secundaristas organizaram “aulões” e debates políti- sobre recursos financeiros destinados à construção
cos, com o objetivo de que as pessoas que não es- da cobertura da quadra esportiva, pintura e outras
tavam na ocupação pudessem compreender a PEC melhorias, considerando a situação de precariedade
241/55, a MP 746 e o chamado projeto “Escola sem da referida escola.
Partido”. Nesses espaços, vários discentes e docen- Soma-se a essas situações, o fato de que de-
tes da universidade pública do município, membros da terminados professores começaram a descumprir o
OAB-Alfenas e pessoas vinculadas a outras univer- acordo estabelecido entre os(as) ocupantes e a ges-
sidades e instituições de ensino, estiveram na escola tão da escola: estes(as) não seriam prejudicados(as)
para dialogar sobre uma série de temáticas, incluindo pela sua escolha de estar fora de sala de aula em ho-
61 pautas democráticas. Porém, parecia não haver o mí- rário letivo. Pelo contrário, trabalhos e provas foram
aplicados sem que houvesse a possibilidade de serem do movimento.
repetidos e que eram utilizados como únicos instru- Nesse contexto, o contato com as outras escolas
mentos de avaliação, comprometendo inicialmente a ocupadas foi um ponto importante de apoio e conso-
obtenção de nota pelos(as) estudantes que se encon- lidação da luta secundarista no município. Reuniões
travam na ocupação, e não em sala de aula. com representantes de cada escola ocupada foram
Apesar desses impasses com relação ao desapoio periodicamente marcadas, havendo rodízio entre as
da equipe escolar e a dispersão dos(as) estudantes escolas para sediá-las. Tais ações permitiram o es-
não ocupantes, os(as) secundaristas que moravam treitamento dos vínculos, a troca de experiências e
temporariamente na escola, se esforçavam para que a proposição de estratégias e planos em conjunto,
todos(as) presentes no espaço escolar em horário le- como a divulgação de uma nota de repúdio, um ato
tivo não ficassem ociosos(as), incluindo estudantes do público no centro da cidade e os trancamentos. Ade-
Ensino Fundamental II. mais, as escolas doavam alimentos entre umas para
Em inúmeras ocasiões, os participantes se divi- as outras, partilhando toda a bagagem material, afora
diam em pequenos grupos para chamar aqueles que a imaterial, que vinham adquirindo ao longo de cada
estivessem sentados do lado de fora, inclusive pro- ocupação.
fessores e funcionários. Sendo assim, nesse período Com a tramitação e posterior aprovação da PEC
de ocupação parcial, a escola passou a ser frequen- 55 no Senado Federal, que representou uma derrota
tado por um número grande de estudantes. Ademais, para os movimentos em geral, os(as) ocupantes bus-
o contato estabelecido com alguns destes, possibi- caram articular a desocupação do espaço. Entendiam
litou-nos concluir que, embora muitos desejassem que havia sido garantido os meios burocráticos para a
participar da ocupação, sofriam ameaças por parte da avaliação das atividades da ocupação, por meio de um
família e de professores específicos. relatório descritivo dos acontecimentos, e que o des-
Nesse contexto, quer fosse para dormir na escola gaste físico e psicológico era significativo, após mais
ou para acompanhar a programação no horário letivo, de 50 dias de ocupação, de negociações e conflitos.
a falta de apoio familiar e institucional, aliada à ma- Por fim, após 54 dias de ocupação, foi feita a de-
neira como a mídia local e nacional vinha retratando socupação. Porém, entende-se que a história pessoal
o movimento, tirou muitos(as) desses(as) jovens da dos(as) envolvidos(as), da própria instituição e do mu-
ocupação, o que poderia contribuir para o seu fortale- nicípio, serão marcadas por essa experiência singular,
cimento e resistência. com todas as suas crises, contradições e enriqueci-
As tentativas de dialogar com professores, mem- mentos, apresentados de forma resumida, nesse re-
bros da equipe gestora da escola e com a instância lato, como forma de registro histórico.
regional de ensino foram sem sucesso. Portanto, essa
série de descontentamentos por parte dos(as) ocu- A coexistência entre dois modelos de edu-
pantes e o descumprimento de acordos culminaram cação escolar
no trancamento da escola, contando com a participa-
ção de mais de 50 estudantes, organizados para tal.
Tais estudantes dividiram-se para patrulhar pos- Considerando os fatos acima relatados, entende-
síveis pontos de acesso da escola, ficar no portão se -se que, principalmente durante esses mais de 30
comunicando com os(as) que estivessem do lado de dias de ocupação parcial, havia sob o espaço da ins-
fora e para registrar o trancamento com gravações, tituição a coexistência simultânea entre dois modelos
fotos e áudios em pontos estratégicos da escola. de educação escolar. Dessa forma, buscar-se-á nesse
Aqueles(as) estudantes que apoiavam o trancamento, tópico ensaiar algumas considerações teóricas que
foram orientados(as) a entrarem na escola pelo por- permitam compreender a singular experiência forma-
tão lateral da quadra para não serem vistos(as). Além tiva, vivenciada por estes estudantes secundaristas.
disso, em determinado ponto das negociações, foi Segundo Alonso (2009), a virada para o século
permitido ao diretor adentrar a escola para contatar XXI- com o avanço das políticas neoliberais e com ou-
a responsável pela gestão regional de ensino, sendo tras transformações políticas, sociais e econômicas-
exigida a presença da mesma para que as questões trouxe problemáticas novas para se compreender os
fossem resolvidas. movimentos sociais. Surge então a necessidade de
A ação, que representou uma atitude mais radical, interpretação a partir de novos referenciais, devido
chamou a atenção da mídia local e da comunidade principalmente ao caráter simbólico desses, à dimen-
externa, mas principalmente gerou a insatisfação da- são global do ativismo contemporâneo, às inovações
queles(as) que se mostravam contra o movimento. políticas na participação e nas experiências de demo-
Sendo assim, após tratados e negociação, os portões cracia deliberativa.
foram abertos e as aulas reiniciadas, sem haver con- Nesse contexto, Gohn (2011) traça um panora-
flitos mais abertos. ma sobre os movimentos sociais latino-americanos,
Cabe salientar, entretanto, que nas demais escolas direcionando o olhar especialmente aos movimentos
ocupadas do município, na mesma semana, também sociais do Brasil contemporâneo. Segundo a autora,
foram feitos “trancaços”, marcados por uma atuação referindo à dimensão educativa destes,
policial incisiva e truculenta, que invadiu as institui-
ções e chegou a utilizar bombas de gás lacrimogênio “Uma das premissas básicas a respeito dos
e gás de pimenta contra os(as) ocupantes- além de movimentos sociais é: são fontes de inovação
retaliações das equipes gestoras e agressões físicas a e matrizes geradores de saberes. Entretanto,
familiares e estudantes que participavam ativamente não se trata de um processo isolado, mas de 62
caráter político-social (...)”. (GOHN, 2011, p.333)
Dentre os movimentos listados, Gohn (2011) des- des, possibilidades e necessidades, a serem levadas
taca o movimento estudantil e as lutas pela melho- em conta pelas políticas públicas e instituições, como
ria da qualidade do ensino e contra as reformas da a escola.
educação, ocorridas no Chile e no Brasil nas últimas Logo, fica evidente a necessidade de reconhecer
décadas. Tal como afirma Bringel (2012), esse movi- que a juventude pode e deve ser dotada de auto-
mento traz alguns elementos próximos aos demais nomia. Ademais, essa percepção negativa acerca dos
movimentos sociais, mas apresenta especificidades e jovens, vistos como irresponsáveis e até ignorantes
características, que nos permitem pensar a própria políticos, foi um ponto que forçou uma necessidade
ocupação descrita. Pode-se destacar que a ocupa- diária de comprovação da legitimidade das ocupações
ção tinha um objetivo específico de curto prazo, que diante dos demais adultos que estiveram naquele es-
se referia aos questionamentos e disputas contra as paço escolar.
medidas governamentais que vinham tramitando à
Para os autores, as manifestações de junho de
época, que impactavam principalmente a qualidade da
2013, ocorridas em vários estados do Brasil e co-
educação pública brasileira; o caráter não institucio-
nhecidas como “Jornadas de Junho”, apresentaram-se
nalizado do movimento, marcado também por suas
como um impulso de destaque a respeito da capaci-
dinâmicas organizativas e mobilizatórias, tais como a
dade de atuação política dos jovens brasileiros, como
realização das assembleias, a horizontalidade (ausên-
sujeitos mobilizados, críticos, conscientes e partici-
cia de líderes definidos) das decisões e a utilização das
pantes. Sendo assim, a participação aparece como
ferramentas de comunicação, como as redes sociais.
uma questão importante na formação dos jovens, já
Todavia, embora consideremos que o movimento que, em suas palavras,
de ocupações secundaristas esteja permeado de ca-
racterísticas inerentes ao movimento estudantil, es-
“(...) Ela envolve o que se pode denominar de
sas precisam ser analisadas sob outra ótica. A ocupa-
formação teórica para a vida cidadã - aprendi-
ção relatada integrou um movimento em larga escala,
zagem de valores, conteúdos cívicos e históri-
em que centenas de escolas do Brasil foram também
cos da democracia, regras institucionais etc.-
ocupadas, trazendo assim configurações e dinâmicas
e, também, a criação de espaços e tempos
novas aos movimentos estudantis e para o próprio
para a experimentação cotidiana do exercício
campo da Educação, mencionadas a seguir.
da participação democrática na própria insti-
Dito isso, conforme apresentado na ainda escassa tuição escolar e em outros espaços públicos
literatura sobre as ocupações estudantis secundaris- (...)”. (DAYRELL & CARRANO, 2014, p.120)
tas ocorridas nos últimos anos no Brasil, entende-se
que esses movimentos estudantis têm colocado em
Contudo, a partir dos depoimentos e das vivên-
cheque o modelo de educação escolar hegemônico,
cias informadas pelos estudantes durante a ocupa-
problematizando uma série de elementos da cultu-
ção, entende-se que a escola não representava um
ra escolar (currículo, organização, espaço, gestão) e
espaço de exercício efetivo da cidadania e de forma-
evidenciando a crise na própria relação da juventude
ção democrática, na medida em que as decisões eram
com a escola.
tomadas de maneira hierarquizada, não envolvendo a
Segundo Dayrell e Carrano (2014), tomando os participação ativa destes(as), inclusive na deflagração
estudos da sociologia da juventude, a instituição de greves ou paralisações por parte de professores,
escolar têm enfrentado desafios cotidianos que en- que afetavam diretamente o calendário anual.
volvem os diversos atores (professores, estudantes,
Portanto, a ocupação parece ter se consolidado,
gestores, funcionários, familiares e comunidade). No
mesmo que em um marco temporal relativamente
centro desse complexo movimento, destacam-se os
curto, como um espaço de “experiência participativa”
jovens estudantes, sujeitos do processo educativo
(DAYRELL & CARRANO, 2014, p.121) desse público.
que precisam ser reconhecidos em sua diversidade de
As oficinas, atividades e passeatas não envolviam
experiências, saberes e identidades culturais.
apenas a dimensão formativa, tradicionalmente mar-
Entretanto, cada pela transmissão unilateral de conteúdos, mas
apresentaram-se como uma experiência educativa e
“(...) É uma tendência da escola não considerar política, na qual os(as) estudantes foram os prota-
o jovem como interlocutor válido na hora da gonistas na construção de suas pautas, projetos e
tomada de decisões importantes para a insti- ações, tomadas conjuntamente. Conforme apresen-
tuição. Muitas vezes, ele não é chamado para tam os autores,
emitir opiniões e interferir até mesmo nas
questões que dizem respeito a ele, diretamen- “Nesse sentido, a participação pode ser en-
te”. (DAYRELL & CARRANO, 2014, p.106) tendida como um processo educativo que po-
tencializa os processos de aprendizagem no
Percebe-se assim a dificuldade da instituição em interior da escola. E, da mesma forma, pode
estimular e muitas vezes compreender a participação contribuir para a constituição de amplos pro-
e o protagonismo desse público, sendo levantados cessos formativos”. (DAYRELL & CARRANO,
uma série de estereótipos, que fortalecem uma ima- 2014, p.121)
gem negativa acerca da juventude, entendida como
um período problemático da vida. Nesse sentido, os Ademais, desenvolveram no espaço habilidades
autores ressaltam a importância de se considerar os discursivas, de convivência, de respeito às diferenças,
63 jovens a partir de um novo olhar, enquanto sujeito de estimulando também novas aprendizagens. Portanto,
direitos, reconhecendo também as suas potencialida-
levando em conta as discussões de Dayrell e Carrano
(2014, p.123), questionava-se a capacidade do modelo Nesse sentido, reconhece-se que em uma so-
hegemônico de educação escolar de possibilitar tem- ciedade cada vez mais individualista, a ocupação se
pos, espaços e relações de qualidade, contribuindo configurou também como um espaço de empatia e
para a experimentação e desenvolvimento das po- de democracia, onde perceberam, reconheceram e
tencialidades desses jovens, tanto na dimensão social respeitaram o outro, em suas diferenças — apesar
quanto subjetiva. de todos os conflitos já descritos. Portanto, o espaço
Reconhecendo a juventude enquanto uma catego- escolar representa também um espaço importante de
ria histórica e socialmente produzida, que relaciona-se sociabilidade e de estabelecimento de relações afeti-
aos campos simbólicos e culturais e aos condicionan- vas e simbólicas, sendo ressignificado pelos(as) ocu-
tes econômicos e sociais que estruturam as socieda- pantes, contribuindo inclusive para o autorreconhe-
des, entende-se também que é preciso, por parte da cimento e para a própria constituição da identidade.
instituição escolar e do seu corpo docente, a compre- Além do espaço, a ocupação vivenciou uma rein-
ensão do perfil social, cultural e afetivo dos jovens, venção da própria organização temporal da escola,
buscando conhecê-los sob essas dimensões. No caso marcada pela divisão e exigência da temporalidade
dos estudantes da referida escola periférica, a maio- e que continuava sendo vivenciada pelos estudantes
ria era oriunda de uma condição social marginalizada, não-ocupantes. Destarte, entende-se que a noção de
experenciando a condição juvenil a partir de um leque cultura escolar, que tem trazido contribuições impor-
limitado de oportunidades, levando para a escola as tantes para se estudar o espaço interno e o cotidia-
contradições e conflitos da sociedade brasileira exclu- no das práticas escolares no campo da pesquisa da
dente e impondo desafios à instituição, percebidos e educação escolar, permite algumas problematizações.
vivenciados nos dias em que a ocupação ocorreu.
Em torno da centralidade dessa categoria, vários
Acrescenta-se ainda que, nas palavras de Maia objetos de pesquisa têm sido investigados, relaciona-
(1998): das ao interesse em conhecer e compreender as prá-
ticas culturais produzidas e reproduzidas nos espa-
“A realidade escolar que vigora atualmente ços escolares por parte dos sujeitos que ali ocupam,
no Brasil, no bojo das ‘modificações’ econô- levando em conta também a relação dialética entre
mico-sociais que ocorrem mundialmente e em sociedade e escola. Nessas discussões, há por parte
acordo com elas, persiste sendo profundamen- de alguns autores, o esforço em atentar-se para as
te antidemocrática e excludente. (...) A escola características e modos de vida internas que particu-
brasileira não tem sido capaz de cumprir seu larizam a instituição escolar e que estão relacionados
papel em uma sociedade desigual, qual seja, o às dimensões materiais e aos significados simbólicos.
de ‘ir contra a corrente’, resistir ao processo de Considerando as diferentes formas que a catego-
progressivo fechamento das brechas que per- ria tem sido utilizada no campo educacional, segundo
mitem fazer avançar o processo democrático, Gonçalves e Filho (2010, s/p), a cultura escolar pode
mantendo uma ordem social bárbara”. (MAIA, ser definida como,
1998. p. 24)
“Forma como são representados e articulados
Dessa forma, para além do ensino da lista de con- pelos sujeitos escolares os modos e as cate-
teúdos prescritos nos currículos formais, a meta prio- gorias escolar, os conhecimentos, as sensibi-
ritária das instituições escolares, segundo Dayrrel e lidades e os valores produzidos/transmitidos/
Carrano (2014, p.27), seria propiciar espaços-tempos aprendidos na escola, a materialidade e os mé-
educativos e promover processos de aprendizagem todos escolares”.
para que os sujeitos reconheçam a si mesmos e aos
outros. Além da formação técnica, configurar práticas
Entre os elementos da cultura escolar, podem-se
que contribuam para a construção de identidade e
destacar os discursos e as linguagens, os próprios
projetos de vida dos jovens, como sujeitos de direitos
conteúdos do currículo e as práticas pedagógicas dos
e de autonomia.
professores, reproduzidas e produzidas na escola co-
Tal “postura de escuta” (DAYRELL & CARRANO, tidianamente. Entretanto, entendendo que as práticas
2014, p.128), constitui um desafio, na medida em que educativas envolvem elementos culturais e a institui-
implica assumir a própria identidade e entrar na re- ção escolar aparece como um espaço por excelência
lação com esse jovem, que apresenta sentidos, signi- de disputa e de poder, é preciso atentar-se também
ficados distintos dos sujeitos adultos e das institui- para as formas de resistência mobilizadas nas prá-
ções, gerando uma série de conflitos, como aqueles ticas pelos sujeitos escolares aos processos de do-
vivenciados nos dias da ocupação. Para os autores, minação, principalmente em condições de ruptura ou
crise social.
“A compreensão dos processos de socialização Pensando na ocupação, podemos destacar algu-
contemporânea dos jovens, o reconhecimen- mas práticas mobilizadas, que colocaram em cheque
to dos entraves para a vivência do ciclo de o próprio currículo, a gestão escolar e as interações
vida e a entrada na vida adulta, bem como (relações afetivas) professor-aluno e aluno-aluno.
o reconhecimento de experiências positivas, No que diz respeito ao currículo, por exemplo, temas
saberes, culturas e possibilidades de ação, po- como racismo e preconceito, papéis de gênero, ma-
dem contribuir para o diálogo inter-geracional chismo, feminismo, educação ambiental, conjuntura
no cotidiano escolar”. (DAYRELL & CARRANO, política, entre outros, eram constantemente incluídos 64
2014, p.127)
como centrais do movimento. Além disso, foi incluída mostrou fundamental para a ocupação ter decorrido
uma série de atividades de caráter lúdico, para movi- de maneira forte, intensa e árdua, mas sobretudo de
mentar o corpo e a mente: música, pintura, artes, te- maneira leve.
atro, hip hop, ioga, pilates, além de atividades espor- Na ocupação, nos foi possibilitado, como educador
tivas. Impossível não confrontar esses dois modelos e educadora, vivenciar uma forma muito próxima e
que coexistiram diante de nossos olhos e pensando comprometida de relação educacional. O afeto, vínculo
nas palavras de Thiesen (2008, p.552): constituído cotidianamente diante da convivência, dos
problemas e da subjetividade de cada um, nos permi-
“A escola enquanto lugar legítimo de aprendi- tiu refletir na sua centralidade para a forma com que
zagem, produção e reconstrução do conheci- nos colocamos nas relações ensino-aprendizagem e
mento (...) deve ser construída de maneira que para nos posicionarmos diante de enfrentamentos
seja um ambiente de vida e ao mesmo tempo e de problemas. Conforme apresenta Souza (2012,
um instrumento de acesso ao sujeito à auto- p.05),
nomia. Não possui um fim em si mesma. Ela
deve constituir-se como processo de vivência “Os afetos são produzidos pela experiência da
e não de preparação para a vida. Por isso, sua compreensão. Viver os afetos perto impulsiona
organização curricular, pedagógica e didática à ação.” Ver perto é sentir em sua intensidade
deve considerar a pluralidade de vozes, con- o afeto e não apenas carregar esse afeto em
cepções, experiências, ritmos, culturas, inte- seu ser. “Ver perto nos permite ver longe. Ver
resses. A escola deve conter em si a expres- longe não é ver de longe, ver longe é ampliar
são da convivialidade humana, considerando a visão”.
toda a sua complexidade”.
A ocupação tinha um objetivo principal: lutar pela
Perguntamo-nos: qual dos dois modelos que vi- não aprovação da PEC. Embora tal objetivo não te-
mos coexistir se aproximam das palavras do autor nha sido atingido, os outros ganhos de experiências
acima? e de vivências naquele espaço nos permitem, mesmo
Assim, tais atividades formativas organizadas pela que momentaneamente, sentir vitoriosos; além de se
ocupação, ocorriam sempre de maneira dialogada, uti- constituírem como um complexo objeto de estudo,
lizando-se de recursos diversificados, que não eram devido à riqueza dos elementos citados acima e de
necessariamente caros ou inacessíveis. Do outro lado outros.
da escola, entretanto, aulas consideradas tradicionais Cada uma das mais de 1000 escolas que foram
ocorriam dentro das salas de aula, reproduzindo um ocupadas por todo o país teve suas peculiaridades e
modelo que muitas vezes não dá conta dos anseios questões. Porém, o que cada uma tinha em comum
da juventude. era um mesmo ideal: a voz dos estudantes sempre
No que diz respeito à gestão estudantil, promo- clamou por ser entoada e propagada e no seio das
veu-se uma gestão coletiva e não hierarquizada, que ocupações, e foi!
incentivava a autonomia dos sujeitos e que contri- Um modelo de escola que muitas vezes é con-
buía para a coexistência democrática com as aulas siderado idealizado em vários estudos acadêmicos
regulares e com os(as) estudantes não-ocupantes. no campo da Educação, foi concretizado ou teve a
As decisões a serem tomadas eram decididas em possibilidade real de se concretizar no espaço das
assembleia, de modo que eram feitas tentativas de ocupações. Por isso, consideramos que era neces-
discussão e solução coletivas para todos e quaisquer sário registrar e propagar essa história, entendendo
problemas — com relação à estrutura, à programação, a contribuição dessas reflexões para a nossa futura
à alimentação ou problemas com os(as) próprios(as) prática docente.
ocupantes.
Que tipo de escola queremos construir? O que as
Entende-se que isso confrontou os demais atores ocupações deixam para nós? Enquanto (futuros) edu-
escolares em vários sentidos, principalmente no que cadores, nossa prática docente se pautará em quais
se refere às tentativas fracassadas de se apontar um elementos? A resposta é ambígua e incerta, mas a
estudante para se culpar. Assim, frente a essa or- movimentação desses jovens nos diz que algo deve
ganização horizontalizada e democrática, distinta do ser feito e abre espaços para algumas possibilidades,
9 A secundarista, então com próprio modelo hegemônico de gestão escolar, tais na medida em que podemos avançar na direção de
16 anos, ficou nacionalmente
conhecida por um discurso sujeitos lidaram com uma série de questionamentos não sermos coniventes com a escola posta atualmen-
feito aos deputados estaduais, sobre os seus próprios métodos, seja por si mesmos te, que não atende às demandas da juventude.
na Assembleia Legislativa do
Paraná (ALEP) em Curitiba, em ou pelos(as) estudantes.
outubro de 2016, defendendo Ademais, não podemos contribuir para o processo
a legitimidade das ocupações Por fim, o terceiro aspecto que mais se desta- que a secundarista Ana Júlia Ribeiro9, classifica como
no estado.
cou nesse período, principalmente durante a ocupação “desesperador”, quando questionada em uma entre-
10 Durante uma reunião do parcial, em que esses dois modelos de escola coexis-
“Grupo de Estudos sobre a vista ao nosso grupo de estudos10, sobre como é vol-
Juventude de Alfenas/MG”, em tiam e eram vivenciados por todos(os) os(as) envol- tar para a escola depois que a ocupação se passou e
junho de 2017, coordenado pelo
Prof. Dr. Luís Antônio Groppo, vidos(as), foi a maneira com que foram construídas que não houveram grandes mudanças. Em suas pa-
Ana Júlia foi entrevistada, via
Skype, relatando as experiências
as relações entre as pessoas que se encontravam lavras, “É desesperador. É desesperador ver o que a
nas ocupações paranaenses e naquele espaço: importávamos uns com os outros. escola é em vista do que ela poderia ser”.
após o término destas.
Os problemas de um eram problemas de todos. Des-
sa forma, a partilha da convivência trouxe também
65 a partilha de problemas e realidades, e tudo culmi-
nou em uma relação íntima e intersubjetiva que se
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