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ANÁLISE DA MERCANTILIZAÇÃO DO FUTEBOL SOB A LUZ DE PIERRE

BOURDIEU (1980-2010)

Edson Hirata1

RESUMO
A teoria dos campos de Pierre Bourdieu tem sido utilizada para investigar as mais distintas
áreas, dentre elas o campo esportivo. Considerando a relevância do futebol no contexto
esportivo mundial e a sua mercantilização como um fenômeno intrigante no cenário atual,
tivemos como objetivo, no presente estudo, verificar as possibilidades e limitações da
utilização da teoria dos campos de Pierre Bourdieu para análise da mercantilização do
futebol.
Palavras-chaves: Futebol, Pierre Bourdieu, Teoria dos campos

ABSTRACT
The field theory of Pierre Bourdieu has been used to investigate the most different areas,
including the sportive field. Considering the importance of soccer in the sports world and its
commercialization as an intriguing phenomenon in the current scenario, we aim in this study,
to verify the possibilities and limitations of using the field theory of Pierre Bourdieu to
analyze the commercialization of soccer.
Key-words: Soccer, Pierre Bourdieu, Field theory.

INTRODUÇÃO
O esporte pode ser considerado um dos mais proeminentes fenômenos sociais
contemporâneos. Tal afirmação é derivada pela vultosa cifra econômica que o esporte
movimenta, pela multidão de espectadores que aprecia os espetáculos esportivos, pelo
desenvolvimento das virtudes morais que o mesmo propicia, ou ainda pela sua relevância
enquanto agente divulgador das ideologias das nações, protagonista na promoção da saúde ou
como atividade distintiva de classe, dentre outras leituras não menos significativas.
Para estudar esse avolumado leque de vertentes relacionadas às práticas esportivas
surgiram as mais distintas matrizes sociológicas e a escolha de uma delas requer certo
cuidado, uma vez que as mesmas geralmente são indicadas para observar determinados
fenômenos e portam limitações e restrições a outros. O modelo de análise sociológica
escolhido para essa discussão foi a teoria dos campos de Pierre Bourdieu.
Portanto, o objetivo desse texto foi verificar a possibilidade de utilizar a teoria dos
campos, de Pierre Bourdieu, para investigar o fenômeno da mercantilização do futebol, em
especial o recorte temporal delimitado entre 1980 e 2010. Com esse intuito, estruturou-se o

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Professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná e doutorando em História pela Universidade Federal
do Paraná.
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texto em três partes. A primeira parte tratou de apresentar a trajetória do autor e o modo como
constrói seu pensar. No segundo segmento, foi apresentado o modelo de análise sociológica
de Pierre Bourdieu, a teoria dos campos. O tópico seguinte intentou aplicar a teoria ao
fenômeno esporte, que Bourdieu denominou campo esportivo, sobretudo ao aspecto mercantil
progressivamente impregnado no futebol nas últimas 3 décadas.

EPISTEMOLOGIA EM PIERRE BOURDIEU


O sociólogo e antropólogo Renato Ortiz (1994), um dos mais conceituados
comentaristas da obra bourdiana, apresenta o sociólogo da seguinte maneira: Pierre Bourdieu
nasceu em 1930, em Denguin, na França. Graduou-se em Filosofia; foi diretor da Escola de
Altos Estudos em Ciências Sociais em Paris (1964-1980) e exerceu o cargo de diretor e editor
de revistas científicas, entre elas a conceituada revista Actes de la Reserche em Sciences
Sociales. Patrice Bonnewitz (2003) complementa acrescentando que sua matriz teórica está
presente em programas de ensino de economia e sociologia, ao lado de Tocqueville, Marx,
Weber e Durkheim.
A utilização do referencial teórico de Bourdieu é recomendada pelo reconhecimento
internacional que o conjunto de sua obra possui no meio acadêmico, conquistado graças ao
intercâmbio que o mesmo promovia entre os sociólogos através da difusão da revista Liber, as
múltiplas conferências dadas pelo mundo e a organização de seminários que contavam,
freqüentemente, com platéia estrangeira.
Feita a exposição desse singular cientista social, apresenta-se agora as bases
epistemológicas que auxiliaram a construir a sua matriz teórica, e, a partir daí, perscrutar os
conceitos de campos e habitus que são os pilares do seu pensamento.

A elaboração de uma teoria e a construção de conceitos inovadores se baseiam


também em trabalhos sociológicos anteriores. As pesquisas não se efetuam num
vazio teórico, mas repousam sobre o estudo aprofundado dos autores do passado
que lhes servem de inspiração (BONNEWITZ, 2003, p. 18).

Dito isto, Bonnewitz (2003) apresenta a influência que a tríade dos grandes
sociólogos, Marx, Durkheim e Weber, tiveram sobre a produção bourdiana.
Para verificar quais conceitos ou procedimentos Bourdieu empresta de Marx, é
imperioso lembrar os seus conceitos centrais. Para Marx, o modo de produção capitalista
baseia-se em relações de produção caracterizadas pela luta entre classes. Lutas que opõem a
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burguesia (proprietária dos meios de produção) e o proletariado (detentores apenas da sua
força de trabalho para vender), onde a primeira explora a segunda através da mais-valia. A
burguesia domina econômica, política, social e ideologicamente, o proletariado.
Não obstante Bourdieu sempre ter se recusado a aderir a esse tipo de pensamento e
tomado como objeto de estudo áreas consideradas menores pelo marxismo ortodoxo, dentre
elas, o esporte, existe uma significativa familiaridade entre a sociologia de Bourdieu e o
marxismo, uma vez que “Ambos pensam a ordem social através do paradigma da
dominação” (BONNEWITZ, 2003, p. 21). Tanto para Marx como para Bourdieu, existe a
necessidade de compreender o espaço social evidenciando os antagonismos de classe, uma
vez que a realidade social é produto das relações de forças de classes historicamente em luta
umas com as outras.
Mesmo com essa similaridade, prevalecem os questionamentos e rupturas de Bourdieu
em relação ao pensamento marxista, especialmente no que diz tange a definição das classes
sociais e a explicação dos mecanismos de dominação.
Bonnewitz (2003) expõe que a teoria bourdiana não tende a privilegiar as substâncias
(“grupos reais, cujos números, limites, membros, etc.”) em detrimento às relações. Ela rompe
também com a propensão de reduzir o campo social apenas ao campo econômico, e, por fim,
apresenta uma ruptura com o objetivismo, que ignora as lutas simbólicas que ocorrem nos
diferentes campos.
A autora lembra que Weber também apresenta similitudes e distinções em relação à
teoria bourdiana, as quais podem ser destacadas, inicialmente, pelo texto que segue: “Na
problemática de Weber, o conceito de legitimidade é essencial. Ele permite compreender
como a autoridade política se perpetua sem recorrer, necessariamente, à coação”
(BONNEWITZ, 2003, p. 24). A autoridade é legítima porque é aceita e reconhecida pelos
membros de uma sociedade. Dito isso, parece fácil relacionar esse tipo de pensamento ao
grande propósito de Bourdieu, que é determinar quais são os mecanismos que fazem os
dominados aceitarem a dominação sob as mais diferentes formas, e por que esses dominados
aderem ao posicionamento dominante para manter a ordem estabelecida.
Embora Bourdieu empreste alguns conceitos e procedimentos de Marx e Weber, a
contribuição de Émile Durkheim é preponderante. Durkheim vale-se do método comparativo,
argumentando que “as mesmas causas sempre produzem os mesmos efeitos” e, baseado nisso,
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estuda as correlações estatísticas entre variáveis que possibilitem formular leis preditivas, ou,
dito de outra maneira, procura encontrar regularidades nos fenômenos abordados.
Essa é uma ambição partilhada por Pierre Bourdieu, como pode ser encontrado em
Marchi Júnior (2004, p. 43), relatando que o modelo de Bourdieu foi elaborado com o intuito
de “identificar os mecanismos sociais que determinam e prescrevem leis de reprodução social.
[...] Bourdieu está centrado no questionamento da reprodução – e suas leis -, que se efetiva
nas relações estruturantes da sociedade”, ou seja, evidenciar ou revelar os fundamentos de
dominação oculta.
Uma vez posto as influências que o trabalho de Bourdieu teve ao construir seu modelo
teórico, tentemos entender como funciona a teoria dos campos.

A TEORIA DOS CAMPOS


Bourdieu (2003) formulou o conceito de campos com o desígnio de torná-lo um
modelo teórico que fosse capaz de analisar universos diversos. Empregou esse método
repetidamente em micro-cosmos distintos, tais como a literatura, alta costura, filosofia,
política, etc. Deu a esses espaços sociais, o nome de campos.
Estudando espaços sociais diferentes, Bourdieu percebeu haver homologias estruturais
e funcionais entre os mesmos, podendo assim, ser possível transferir os conhecimentos
adquiridos na análise de um campo para interrogar outro. Com essa perspectiva, o autor
descobriu que os campos têm, simultaneamente, propriedades específicas e leis comuns. Essas
leis comuns aos distintos campos, o autor denominou de normas invariantes.
A princípio, vejamos como Bourdieu define campos:
“[...] espaços estruturados de posições (ou de postos) cujas propriedades dependem
das posições nestes espaços, podendo ser analisadas independentemente das
características de seus ocupantes (em parte determinada por elas)”. (BOURDIEU,
1983a, p.89)
No texto “Algumas propriedades dos campos”, Bourdieu (1983a) expõe mais
detidamente como funciona o campo, especialmente relatando as suas principais
propriedades. O autor explica que num campo estão manifestas relações de poder, o que
implica entender que ele se estrutura a partir de uma desigualdade, e essa desigualdade
determina a posição de um agente específico. Acrescenta ainda, que dentro de cada campo
existem lutas entre o novo, que tenta garantir sua participação através de estratégias de
subversão, e o dominante, que defende a manutenção da ordem e o monopólio, objetivando
exterminar a concorrência.
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Entretanto, mesmo havendo uma tendência para os campos funcionarem de maneira
similar, existem especificidades que devem ser observadas, mas que muitas vezes passam
despercebidas pelas pessoas que não se formaram no interior desse determinado campo.
Portanto, a garantia de funcionamento de um campo é dada pela existência de objetos de
disputa e de pessoas portadoras de habitus que conheçam e reconheçam as leis deste jogo,
legitimando-as.
Habitus deve ser entendido como:
[...] um sistema de disposições adquiridas pela aprendizagem implícita ou explícita
que funciona como um sistema de esquema geradores, é gerador de estratégias que
podem ser objetivamente afins aos interesses objetivos de seus atores sem terem
sido expressamente concebidas para este fim (BOURDIEU, 1983a, p. 94).

Bourdieu (1983b) relata ainda que essa noção de habitus permite uma aproximação ao
que se conhece por hábito, com a diferença de que este último tem o sentido de repetição
mecânica, e aquele apresenta uma ligação com a história individual, é encarnado no corpo de
forma durável e pressupõe um capital adquirido. Além disso, habitus tem a característica de
ter um potencial gerador de transformações e não apenas de reproduzir. Portanto, para agir
dentro de um determinado campo os atores devem estar dotados do habitus específicos desse
campo.

A CONSTITUIÇÃO DO CAMPO ESPORTIVO


Bourdieu (1983b), valendo-se da sua teoria dos campos, procura verificar a
possibilidade de se constituir o campo esportivo, onde se analise em que medida as práticas e
os consumos esportivos oferecidos aos agentes sociais podem ser entendidos como uma oferta
destinada a encontrar determinada demanda social. Na tentativa de constituição desse modelo
surgem dois conjuntos de questionamentos
A primeira questão intenta saber se:
[...] existe um espaço de produção dotado de uma lógica própria, de uma história
própria, no interior do qual se engendram os “produtos esportivos”, isto é, o
universo das práticas e dos consumos esportivos disponíveis e socialmente
aceitáveis em um determinado momento? (BOURDIEU, 1983b, p. 136)

Parece ser plenamente possível reconhecer a existência desse campo esportivo


preconizado por Bourdieu, onde atuem agentes e instituições ligados à prática e ao consumo
esportivo, quais sejam: produtores e vendedores de materiais esportivos, profissionais que
prestam serviços úteis à prática do esporte e produtores e vendedores de espetáculos
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esportivos e de bens associados (malhas, fotos dos campeões, revistas e loterias esportivas).
Este campo esportivo pode ser entendido como um local de lutas concorrenciais que
envolvem os agentes e instituições esportivas.
O futebol brasileiro adéqua-se a essa configuração e a linha que a investigação
pretende trilhar posteriormente, a da mercantilização, está intrinsecamente reportada ao
consumo esportivo.
Bourdieu (1990) ressalta que para que se compreenda um esporte é preciso reconhecer
a posição que ele ocupa no espaço dos esportes. Deve-se pensar o esporte como um sistema
no qual cada elemento recebe seu valor distintivo. Esse pressuposto se sustenta pela
necessidade de pensar comparativamente que Bourdieu adota e demonstra ser válido na
análise desse momento de progressiva mercantilização que o futebol atravessa.
O futebol brasileiro, sobretudo nas três últimas décadas, aumentou consideravelmente
as suas receitas financeiras, aumentando exponencialmente a diferença de poderio mercantil
em relação às outras modalidades.
O espaço que um determinado esporte ocupa no mundo dos esportes – que Bourdieu
chama de campo esportivo – pode ser constituído a partir de um conjunto de indicadores. No
estudo da mercantilização do futebol os indicadores mais significativos estarão ligados
geralmente a economia. A título de exemplo para situar o futebol no mundo dos esportes
poderíamos citar as cifras que a modalidade movimenta com venda de ingressos, venda de
direitos de transmissão ou a comercialização de produtos licenciados, a exposição midiática,
os patrocínios, etc.
Contudo, Bourdieu (1983b) salienta que há de se pensar que o esporte está inserido em
um universo de práticas e consumos, estruturados e constituídos como um sistema. Porém,
mesmo sabendo que existem razões para entender o espaço das práticas esportivas como um
espaço relativamente autônomo, o consumo esportivo não pode ser analisado independente do
consumo alimentar ou do consumo de lazer em geral.
Isto pode ser exemplificado com uma situação recente da conjuntura econômica. A
despeito do campo esportivo ter sua autonomia, a crise mundial que assolou todo o planeta em
2009, certamente exerceu influência sobre muitos aspectos econômicos do futebol. A crise
econômica afastou os patrocinadores dos clubes, diminuiu a venda de cotas de televisão,
obrigou os clubes a ter um elenco mais modesto, reduziu as vendas dos ambulantes, enfim, a
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crise econômica mundial teve reflexos claros no mundo do futebol. Esta influência indica que
a autonomia do campo esportivo é relativa.
Essa autonomia relativa do campo esportivo é mais reconhecida na faculdade que o
esporte tem para se auto-administrar e regular, ou seja, o esporte tem regras e leis específicas
e esse controle é feito por instituições reconhecidas para tal, sobrepondo ou sombreando as
normas da sociedade em geral. Contudo, as mazelas administrativas e a corrupção no futebol
têm motivado intervenções do poder público sobre a modalidade e colocado essa autonomia
em cheque.
O segundo conjunto de questões formuladas por Bourdieu (1983b) objetiva determinar
quais os princípios que regem a escolha por uma determinada prática ou um consumo
esportivo.
Esse conjunto de questões parece ser fundamental para analisar o futebol, em especial
nesse recorte temporal eleito para o estudo, 1980 a 2010, uma vez que contribuirá
sobremaneira para o entendimento desse novo paradigma: o futebol enquanto espetáculo.
O modelo de análise bourdiano pode auxiliar na verificação do modo como se
constituiu o “gosto” pelo futebol, em especial, pelo espetáculo esportivo. Marchi Júnior
(2004, p. 43), argumenta que o modelo de análise de Bourdieu, seja na perspectiva “do
processo de espetacularização, pela incidência dos mecanismos estruturais da sociedade
capitalista ou pela formação de habitus esportivos sociais”, possibilita refletir o esporte
moderno, ou seja, a mercantilização do futebol, enquanto um subproduto desse esporte
moderno pode ser investigado sob a luz dessa teoria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar da brevidade das reflexões apresentadas, a teoria dos campos de Pierre
Bourdieu demonstra-se capaz de analisar o campo esportivo e parece pertinente para
investigar o fenômeno da mercantilização do futebol. A força da utilização desse modelo
reside na análise da relação entre agentes dotados de habitus que atuam nesse campo
esportivo e que determinam as transformações ou sustentações no mesmo.
O modo como Bourdieu trata o esporte espetáculo é outro indicador que sua teoria
pode ser muito fecunda no estudo desse tema, proeminentemente pela lógica do consumo que
o autor propõe para perscrutar o campo esportivo.
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A relativa autonomia do campo esportivo defendida pela teoria dos campos é outra
peça fundamental nessa investigação, uma vez que é imprescindível discuti-la para entender
as motivações que deram origem às recorrentes contestações.
Por fim, necessário esclarecer que apesar da riqueza e solidez da teoria bourdiana,
estudos que demonstrem dependência exclusiva dessa teoria, possivelmente, serão passíveis
de críticas, destarte, sugere-se o cuidado da aplicação conjunta dessa teoria com outros
modelos explicadores para o referido tema.

REFERÊNCIAS
BONNEWITZ, P. Primeiras lições sobre a sociologia de P. Bourdieu. Petrópolis: Vozes,
2003.
BOURDIEU, P. Programa para uma sociologia do esporte. In: _______. Coisas ditas. São
Paulo: Brasiliense, 1990.
BOURDIEU, P. Algumas propriedades dos campos. In: _______ . Questões de sociologia.
Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983a.
BOURDIEU, P. Como é possível ser esportivo? In: ________. Questões de Sociologia. Rio
de Janeiro: Marco Zero, 1983b.
BOURDIEU, P. A gênese dos conceitos de habitus e de campo. In: _______. O poder
simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
MARCHI JÚNIOR. , W. “Sacando” o voleibol. São Paulo: Hucitec, 2004.
ORTIZ, R. (org.). Introdução. In: __________. Pierre Bourdieu. 2a ed. São Paulo: Ática,
1994.

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