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ICCT – INSTITUTO DE CIÊNCIAS CRIATIVAS E TECNOLÓGICAS

HISTÓRIA DA ARTE

A RESSURREIÇÃO POR PIERO DELLA FRANCESCA

Nilza Cristina Taborda de Jesus Colombo

Piero della Francesca (1410/20–1492).1


A Ressurreição, cerca de 14602.
Afresco, 225 x 200cm.
Museu Cívico, Sansepolcro, Itália.

A ressurreição é um fato narrado na Bíblia, mais especificamente no Novo


Testamento, alusivo ao momento em que Cristo cumpre as previsões
anunciadas já no Antigo Testamento. São João descreve com maior riqueza de
detalhes que os demais evangelistas o que sucedeu o evento:

“1No primeiro dia que se seguia ao sábado, Maria Madalena foi ao sepulcro, de
manhã cedo, quando ainda estava escuro. Viu a pedra removida do sepulcro.
2Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava:
Tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o puseram! 3Saiu então
Pedro com aquele outro discípulo, e foram ao sepulcro. 4Corriam juntos, mas
aquele outro discípulo correu mais depressa do que Pedro e chegou primeiro
ao sepulcro. 5Inclinou-se e viu ali os panos no chão, mas não entrou. 6Chegou
Simão Pedro que o seguia, entrou no sepulcro e viu os panos postos no chão.
Viu também o sudário que estivera sobre a cabeça de Jesus. Não estava,
porém, com os panos, mas enrolado num lugar à parte. 8Então entrou também
o discípulo que havia chegado primeiro ao sepulcro. Viu e creu. 9Em verdade,
ainda não haviam entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia
ressuscitar dentre os mortos”3.

Para os cristãos, a ressurreição representa o momento ápice, pois através dela


Cristo assegurou a salvação e a vida eterna. Em razão da Páscoa de 2016, o
Papa Francisco – chefe da Igreja Católica Apostólica Romana desde 2013 -

1
“Nasceu em Borgo Sansepolcro, entre 1410 e 1420, primogênito de Benedetto, sapateiro e curtidor, e
de Romana di Perino da Monterchi” (LONGHI, 2007, p. 292).
2
A data é sugerida por Roberto Longhi (2007) e citada por Ginzburg (2011), posteriormente, como sem
datação.
3
BÍBLIA, Livro de São João. Bíblia Sagrada. Tradução: Centro Bíblico Católico. São Paulo: Editora Ave
Maria, 1995. João 21, vers. 1-9.
escreveu sobre o evento: “Sobre a cruz, Jesus ofereceu-se a si mesmo levando
sobre si os nossos pecados e descendo ao abismo da morte e na ressureição
os venceu, os tirou e nos abriu a via para renascer para uma vida nova”.4 Neste
sentido, entende-se a importância da leitura de imagem da ressureição pintada
por Piero della Francesca por abordar esse momento da fé cristã e pela maneira
como a sua representação colocou-se como uma rememoração salvífica através
da imponência e grandiosidade com que o artista retratou Cristo.

Em realidade, a ressurreição em si não foi presenciada, tampouco relatada nos


evangelhos, ficando sua representação como resultado da sensibilidade dos
artistas ao longo da história. Piero della Francesca foi um desses artistas e
reproduziu a Ressurreição de Cristo (Fig. 1) com emotividade e imponência.

Figura 1 – Piero della Francesca. A ressurreição de Cristo, c. 1460. Fonte: http://www.wga.hu.

4
Catequese do Papa Francisco. Disponível em: < http://papa.cancaonova.com/catequese-do-papa-
francisco-100413> Acesso em: 12 abr. 2016.
O artista pintou A Ressurreição de Cristo por volta de 1460 na cidade natal de
Piero, Sansepolcro – antiga Borgo de Sansepolcro - na região da Toscana, Itália.
A obra foi encomendada pelos governantes de Borgo de Sansepolcro para o
Palácio Comunal da cidade. Penélope Davies, professora de história da arte,
coloca que “o tema é adequado ao nome da localidade” (2010, p.558).

Piero apresenta Cristo ressuscitado como um “adulto recém-nascido”


(TREVISAN, 2003). Um homem que, tendo vencido a morte, não se apresenta
em um evento comum. A ressurreição é um fato sobrenatural, o que se
materializa no semblante alheio e na posição de triunfo de Jesus. Os olhos fixos
seguidos de uma rígida e solene postura são herança de um passado bizantino
em que a figura do Pantocrátor5 representava as relações de poder entre Igreja
e estado.6 Neste aspecto é importante retomar a localização da obra, não foi
concebida para uma igreja, e sim para uma sala de governo:

Questa sala era il luogo dove si riunivano i Conservatori dell’antico


Comune che l’aveva fatta costruire appositamente nel 1458. Proprio a
questi anni è da riferirsi l’affresco che, essendo il simbolo stesso della
città, faceva da sfondo agli incontri cittadini.7

Ter a pintura da ressurreição na sala governamental (Fig. 2) significava


homenagem a mesma e complementação de poderes – humano e divino. Uma
reverência à igreja como partícipe dos assuntos de governo da cidade.

5
Figura do Filho de Deus ao mesmo tempo “severo e manso” (TREVISAN, 2003, p. 50).
6
Sobre essas relações ver o segundo capítulo em TREVISAN, Armindo. O rosto de Cristo: a formação do
imaginário e da arte cristã. 2ed. Porto Alegre: AGE, 2003.
7
Tradução livre: “Esta sala era o lugar onde se reuniam os Conservadores da antiga Comuna que a haviam
construído especialmente em 1458. Neste mesmo ano, é referido o afresco que, sendo o mesmo símbolo
da cidade, servia de pano de fundo aos encontros dos cidadãos”. MUSEO CIVICO SANSEPOLCRO.
Disponível em: <http://www.museocivicosansepolcro.it/>. Acesso em: 25 abr. 2016.
Figura 2 – Localização atual da obra. Fonte: http://www.museocivivosansepolcro.it

Na obra, essa manifestação de poder pode ser vista no posicionamento


imponente de Cristo. A pose de triunfo na ressurreição pode ser comparada ao
retábulo gótico de 1380 na Catedral de Norwich na Inglaterra (Fig. 3). Nesta
imagem, Cristo se impõe sobre o túmulo e segura o estandarte, porém mantem
a pose de benção do Pantocrátor. Piero preferiu valorizar a ação de segurar o
estandarte em tamanho e posição – maior e mais à frente em relação ao corpo
de Cristo. Trevisan ressalta o braço musculoso que segura esse objeto, em
contraponto ao franzino do retábulo, eu acrescento o abdômen desnudo e
torneado por Piero, ao contrário do coberto no retábulo. O fato demostra o
caráter contemporâneo ao artista de observação e estudo do corpo humano.
Figura 3 - Detalhe do retábulo da Catedral de Norwinch. Fonte: https://br.pinterest.com

A forma como Piero apresenta a sua versão da ressurreição é fruto da vivência


profissional, que passa pela observação da representação do tema por artistas
anteriores, pela educação atribuída a Domenico Veneziano e a dedicação à
matemática, que segundo Vasari “nunca abandonou” (VASARI, 2011, p. 275),
mesmo quando se entregou à pintura. Essa base deve ser observada para que
o entendimento por parte de quem analisa a obra não seja obscurecido por
opiniões passionais.

Davies (2010) destaca a composição triangular na obra de Piero, relacionando-


a a essa dedicação à matemática e a observação da Santíssima Trindade de
Masaccio (Fig. 4). O afresco finalizado em 1428, está presente na Igreja Santa
Maria Novella em Florença, cidade esta em que Piero aprendeu, pesquisou e
desenvolveu seus estudos junto a Domenico Veneziano por volta do ano de 1439
(VASARI, 2011).
Figura 4 – Composição triangular na Santíssima Trindade de Masaccio. Fonte: http://www.wga.hu com
intervenção da autora.

Na obra de Piero, a disposição da pintura está emoldurada por elementos


arquitetônicos - colunas coríntias – recurso que Masaccio também utiliza na
Santíssima Trindade. Na Ressureição de Cristo de Piero, o enquadramento
dessa arquitetura enfatiza a centralidade ocupada pela figura imponente do
Ressuscitado. A composição dentro da obra sugere uma estrutura triangular cujo
vértice é Cristo (Fig. 5) e a base os soldados que, adormecidos, ignoram o evento
que poderiam ter testemunhado.

Figura 5 – Composição triangular na Ressureição de Piero. Fonte: http://www.wga.hu com intervenção da


autora.
A Domenico Veneziano, Davies (2010) atribui a forma como Piero trabalha sua
paleta de cores. Na Ressurreição de Cristo a luz complementa o mistério envolto
ao tema. Pela descrição bíblica o fato ocorreu pela manhã, e a paleta de cores
utilizada no céu “translúcido e perolado” (LABNO, 2011, p. 42) reforça o relato.
A figura de Cristo é destacada também pelo recurso da cor. Ele é retratado com
um tom de branco bastante acentuado, visivelmente contrastante em relação aos
soldados e ao próprio fundo. Piero emprega na tonalidade das vestes dos
soldados pigmentos terrosos com mescla de branco de chumbo sobre base
verde. “Infelizmente, o branco de chumbo pode se tornar transparente com o
tempo, permitindo que o verde apareça” (idem). A expressividade distinta em
cada um deles é recurso que o autor utiliza para demostrar sua capacidade
estilística. Acredito que a brancura excessiva de Cristo é mais um recurso
cromático que o artista utiliza para diferenciá-lo dos soldados, ressaltando seu
caráter divino.

Esses homens adormecidos estão vestidos como soldados romanos, recurso


também utilizado por Luca della Robia em sua Ressurreição de terracota vidrada
(Fig. 6) em 1445 na catedral de Florença. Posteriormente, em 1490, esses
soldados vestidos de romanos aparecem na Ressurreição de Botticelli, porém
atrás do sepulcro (Fig. 7), distintamente ao posicionamento de Piero. Em
Botticelli, Cristo apresenta um movimento corpóreo mais acentuado que na
Ressurreição de Piero. Nesta, o artista enfatiza a frontalidade de Cristo, em
Botticelli, o movimento.
Figura 6 – Luca della Robia, Ressurreição. Fonte: http://www.wga.hu

Figura 7 – Sandro Botticelli, Ressurreição. Fonte: https://pt.wikipedia.org

Andrea Mantegna também utilizou da temática da ressurreição em sua pintura


(Fig. 8). Em 1459, a representou em uma gruta com árvores saído dela com se
simbolizassem a gana que Jesus sai do mundo dos mortos. Em Piero a natureza
representa uma sutileza entre o antes e depois da ressurreição. A quantidade de
folhas nas árvores ao fundo, um crescente da esquerda para a direita, se coloca
como uma relação entre a vida e a falta dela. São os sinais citados por Roberto
Longhi, historiador de arte italiano, que não nos deixam “tirar os olhos dessa
visão, sem a certeza de que a mensagem foi lida em cada dobra da pintura”
(2007, p. 75).
Figura 8 – Andrea Mantegna, Ressurreição, 1457-1459. Fonte: http://www.louvre.fr/

O caminho do Calvário não representou uma experiência de facilidades,


tampouco a descida à mansão dos mortos. Essa dificuldade também é
representada no acentuado grau de elevação da perna de Cristo, (Fig. 9)
movimento que faz para sair do túmulo, para se distanciar dessa agonia.

Figura 9 – Posicionamento da perna. Piero Della Francesca, Ressurreição, c. 1460. Fonte:


http://www.wga.hu com intervenção da autora.

Esse passo do sepulcro para o mundo dos vivos possivelmente já havia sido
analisado por Piero della Francesca em sua infância na catedral da cidade de
Borgo Sansepolcro. Pouco se tem registro de sua vida antes de despontar
como artista, porém é provável que Piero tenha entrado em contato com a obra
de Niccoló de Segna na igreja (LONGHI, 2007): o retábulo da catedral de 1348
(Fig. 10). A semelhança da composição e do movimento da perna de Cristo é
evidente.

Figura 10 – Retábulo da Catedral de Sansepolcro. Fonte: http://www.arezzoora.it com intervenção da


autora.

Esse retábulo também pode ter influenciado Piero na representação dos


soldados. Niccoló de Segna os representou estendidos paralelamente ao
túmulo, no entanto Piero aplicou seus conhecimentos matemáticos e de
perspectiva para fugir dessa figuração e os colocou em primeiro plano na pintura.

Os conhecimentos matemáticos de Piero também o levaram a representar esses


soldados em movimentos distintos, como aquele em que a tradição afirma ser o
seu autorretrato (Fig. 11 e 12).
Figura 11 – Detalhe: Autorretrato. Fonte: http://www.wga.hu.

Figura 12 – Relação entre o desenho e a pintura de Piero. Fonte: http://www.wga.hu com intervenção da
autora.

A Ressurreição de Cristo, de Piero della Francesca, exorta a reflexão sobre esse


evento analisando o cenário e as manifestações ocorridas. Conforme
mencionado, não houve testemunhas, Maria Madalena chegou quando Cristo
não estava mais ali. Tomada pelo pavor da perda do único elemento memorativo
– o corpo – saiu alarmando o fato. Piero não muda esse imaginário, seus
soldados estão dormindo: o sono do afastamento, da negação, da alienação.
Porém representa o seu modo de ver a ressurreição, com seus antecedentes,
experiências e inovações. Com a sua matemática, sensibilidade e cores.
Referências

AREZZO ORA. Disponível em: <http://www.arezzoora.it>. Acesso em: 24 abr. 2016.

BÍBLIA, Livro de São João. Bíblia Sagrada. Tradução: Centro Bíblico Católico. São
Paulo: Editora Ave Maria, 1995. João 21, vers. 1-9.

CANÇÃO NOVA. Disponível em: <http://papa.cancaonova.com/catequese-do-papa-


francisco-100413>. Acesso em: 12 abr. 2016.

GINZBURG, Carlo. Investigando Piero. Tradução: Denise Bottmann. São Paulo:


Cosac Naify, 2010.

DAVIES, Penélope; et al. A nova história da arte de Janson: mundo ocidental. 9 ed.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2010.

LABNO, Jeannie. Os segredos do Renascimento. Tradução: Eliana Rocha. São


Paulo: PubliFolha, 2011.

LONGHI, Roberto. Piero dela Francesca. Tradução: Denise Bottmann. São Paulo:
Cosac Naify, 2007.

MUSEU CIVICO SANSEPOLCRO. Disponível em:


<http://www.museocivicosansepolcro.it/>. Acesso em: 25 abr. 2016.

MUSEU DO LOUVRE. Disponível em: < http://www.louvre.fr>. Acesso em: 12 mai. 2016.

PINTEREST. Disponível em: < https://br.pinterest.com>. Acesso em: 15 mai. 2016.

TREVISAN, Armindo. O rosto de Cristo: a formação do imaginário e da arte cristã.


2ed. Porto Alegre: AGE, 2003.

VASARI, Giorgio. Vida dos Artistas. Edição de Lorenzo Torrentino. Tradução: Ivone
Castilho Bennedetti. São Paulo: Editora WMF Mastins Fontes, 2011.

WEB GALLERY OF ART. Disponível em: <http://www.wga.hu>. Acesso em: 24 abr.


2016.

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