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Klepsidra (revista de História, USP) – No prelo.

OS MÉTODOS CIENTÍFICOS E A PESQUISA ECOLÓGICA

Rafael D. Loyola

Programa de Pós-graduação (Doutorado) em Ecologia da Unicamp.

A maioria das pessoas tem uma impressão vaga e freqüentemente confusa do

que é ciência e quais são seus métodos. Entretanto, para realizar pesquisas

científicas, convém refletir um pouco sobre isto. Creio que a ciência é uma tentativa

de entender as relações entre determinados aspectos das coisas e dos eventos do

mundo real. Tal tentativa deve possuir elementos lógicos e intuitivos além de basear-

se na observação e passar pelo crivo de observações adicionais (Heath 1970).

Assim, cientistas tentam apenas entender o mundo atual pela redução da

diversidade e complexidade de padrões e leis básicas.

De forma bastante resumida, podemos dizer que a ciência é a investigação do

relacionamento entre padrão e processo. Como padrão entende-se a repetição de

uma organização, que não pode ser gerada somente pelo acaso.

A ocorrência de um determinado padrão no mundo natural implica em uma causa

por um processo ou processos mais gerais. Por exemplo, todo fruto que cai de uma

árvore atinge o solo. Isto é um padrão claramente observável. O processo que causa

tal padrão é a Gravidade. Desta forma, a ciência avança pela descoberta de padrões

e o desenvolvimento de mecanismos de explicação, os quais tentam esclarecer

teorias e são continuamente postos à prova.


A busca pela compreensão do universo e de como ele funciona existe desde a

antiguidade. Na Grécia antiga, os poetas criavam mitos para explicar a origem das

coisas e do mundo. Quando indagado sobre a origem de seus conhecimentos, as

fontes de seu saber, tais poetas mencionavam a musas inspiradoras ou remetiam-se

a um contato com antepassados que haviam presenciado fatos. Poderiam ainda

citar a sua ida à morada dos deuses, onde lhe havia sido revelada a verdade

(Coutinho 2002). A verdade era, portanto, impregnada de noções supra-humanas e

a explicação baseava-se em motivações humanas, atribuídas a forças e potências

sobrenaturais.

No século VII a.C., surge a Filosofia como um novo modo de interpretar o mundo,

o que rompe com a atitude dos poetas (Coutinho 2002). Os filósofos começam,

então, a justificar e dar razões de suas crenças. Dessa forma, ao passo que um

poeta jamais seria contestado por sua audiência, o que configuraria uma divergência

de opinião sobre a versão dos acontecimentos primordiais, o mesmo não ocorre com

a tradição fundada por Tales de Mileto, o pensamento filosófico (Coutinho 2002).

Na medida em que o conhecimento religioso voltou-se, assim como a Filosofia,

para a explicação de fenômenos da natureza e do caráter transcendental da morte –

os dois temas sobre os quais giravam a grande maioria das indagações humanas da

época – como fundamento de suas concepções, a verdade revestiu-se de caráter

dogmático, baseada em revelações da divindade. O caráter sagrado das leis, da

verdade, do conhecimento, como explicações sobre o homem e o mundo onde vive,

determina uma aceitação sem crítica dos mesmos, deslocando o foco das atenções

para a explicação da natureza da divindade (Lakatos e Marconi 2000).

O senso comum, aliado a Filosofia e a explicação religiosa orientou por muitos

séculos as preocupações dos homens com o universo. Somente no século XVI


inicia-se uma linha de pensamento que deixa de buscar as causas absolutas e

procura compreender as relações entre elas mediante as observações científicas e o

raciocínio (Lakatos e Marconi 2000). Neste momento, surgem os primeiros métodos,

que “são os instrumentos básicos que traçam de modo ordenado a forma de

proceder do cientista ao longo de um percurso para alcançar um objetivo” (Trujillo-

Ferrari 1974). Assim, o método científico pode ser definido como “um conjunto de

procedimentos por meio dos quais se propõem os problemas científicos e colocam-

se à prova as hipóteses científicas” (Kaplan 1975). Mas que hipóteses são estas?

Assim como o conhecimento se desenvolveu, o método também sofreu

transformações. O primeiro a tratar do assunto, no âmbito científico, foi Galileu

Galilei – primeiro teórico do método experimental. Galileu propõe um método

indutivo que se baseia em observações particulares para criar enunciados gerais ou

universais. Por exemplo, observando cisnes em uma lagoa detecto que o cisne 1 é

branco, que o cisne 2 é branco, que o cisne n é branco... Logo, deduzo que todos os

cisnes do mundo são brancos. Ou seja, parto de observações particulares (os cisnes

na lagoa) e faço inferências gerais (todos os cisnes do mundo). Todavia, como não

sou capaz de observar todos os cisnes do planeta, nada me garante que, algum dia,

não encontrarei um cisne de outra cor.

Depois de Galileu veio Francis Bacon, que sistematiza o método indutivo,

embora comece a expor críticas a seu respeito. Tal método, posteriormente, foi

diretamente confrontado pelas idéias de Descartes em sua obra Discurso sobre o

método, da qual origina-se o método dedutivo. Este método difere-se do indutivo,

pois nele parte-se de enunciados gerais para sua aplicação em casos particulares.

Por exemplo, se todo mamífero tem um coração e todo cachorro é um mamífero,

logo todo cachorro tem um coração. A generalização é feita com base em premissas
verdadeiras e gerais e, portanto, a conclusão é verdadeira. Como no método

indutivo, minha conclusão projeta-se além das premissas (todo cisne é branco,

embora tenha observado apenas alguns), ela não é necessariamente verdadeira.

Depois de Descartes, vários filósofos começaram a criticar o uso do indutivismo

(por exemplo, Leibnitz e Spinoza), porém de todos os autores que puseram em

dúvida este método, o mais famoso foi Sir Karl Raymund Popper, que lançou as

bases do método hipotético-dedutivo e do critério de falseabilidade (teste de

hipóteses) (Lakatos e Marconi 2000). Segundo Popper, o único método científico é o

método hipotético-dedutivo que consiste na construção de hipóteses, cujas

predições devem ser submetidas a testes e ao confronto com os fatos para ver que

hipóteses são comprovadas.

As etapas do método hipotético-dedutivo, segundo Popper (1959), podem ser

assim esquematizadas: (1) conhecimento prévio (teorias existentes) – a partir dos

quais podemos detectar uma (2) lacuna, contradição ou problema (normalmente

expresso através de uma pergunta). Uma vez que o problema foi detectado, passo à

etapa seguinte que é a de (3) propor uma solução para o mesmo (criação de uma

hipótese). Toda hipótese tem uma (4) predição, que nada mais é do que aquilo que

eu esperaria que ocorresse se a minha hipótese fosse verdadeira. A etapa seguinte

consiste em (5) encontrar uma maneira de testar minha predição e testá-la

efetivamente. Por fim, (6) analiso os resultados e os comparo com minha hipótese

inicial. Neste momento só há duas situações: ou ocorreu o que eu esperava (minha

hipótese foi corroborada) ou não ocorreu o esperado (minha hipótese foi refutada), e

devo formular uma nova hipótese que explique satisfatoriamente o problema inicial.

Uma grande vantagem do método hipotético-dedutivo é que, uma vez seguidas de

forma criteriosa todas as etapas acima descritas, se sua hipótese inicial não é
corroborada, têm-se argumentos científicos para criticar os conhecimentos prévios

existentes (teorias, paradigmas) e assim contribuir, de forma eficaz, para a geração

de novos conhecimentos e para o progresso da ciência.

Vamos agora imaginar uma situação real para a aplicação do método hipotético-

dedutivo. Cada etapa será numerada como na explicação anterior. (1) Como biólogo

(ecólogo) vou ao campo e faço observações em uma planta (naturalmente precisas,

pois já tenho um conhecimento prévio sobre plantas e suas interações com outros

organismos). Observo então que, as folhas desta planta estão cobertas por tricomas

(“pêlos”) e que estas folhas são menos comidas (predadas) por lagartas de

borboletas que aquelas, de outra planta, que não possuem pêlos. (2) Surge então

um problema expresso pela pergunta: “Será que a presença de pêlos dificulta a

predação das folhas pelas lagartas?” A partir desta pergunta formulo (3) uma

hipótese de trabalho: “a presença de pêlos dificulta a predação de folhas por

lagartas de borboletas” e dessa hipótese (4) gero minha predição “se oferecer folhas

da mesma planta com pêlos e sem pêlos a lagartas de borboleta, as folhas sem

pêlos serão mais comidas (predadas)”. (5) Para testar tal predição, vou ao campo

com uma lâmina de barbear e retiro, aleatoriamente, os pêlos de algumas das folhas

daquela planta. A seguir, faço observações e (6) analiso se o que acontece está de

acordo com minha hipótese inicial. Ou seja, se as folhas que foram “depiladas”

realmente foram mais predadas, minha hipótese é corroborada. Se por outro lado,

não houve diferença entre a predação das folhas “depiladas” ou “peludas”, então

minha hipótese é refutada. Portanto, devo procurar outra explicação para o fato de

folhas com pêlos serem menos comidas por lagartas de borboleta.

A pesquisa em ecologia, hoje em dia, é basicamente orientada pelo uso do

método hipotético-dedutivo. A grande maioria dos trabalhos ecológicos publicados


em boas revistas vale-se de tal método e deixam bastante claro quais foram as

hipóteses de trabalho testadas. Aliás, essa tem sido uma exigência constante de

revisores e editores de periódicos de renome, sejam nacionais ou internacionais. O

uso do método hipotético-dedutivo é uma ferramenta poderosíssima que deve ser

empregada em pesquisas ecológicas para a geração de novos conhecimentos e

críticas a conhecimentos já estabelecidos. De fato, espera-se que o uso de manuais

e métodos bem desenvolvidos leve a sua melhoria e até mesmo substituição e,

finalmente, a uma maior eficiência da ecologia em lidar com explicações,

entendimentos e capacidades de predição (Mentis 1988). Faz-se necessário,

entretanto, entender sua lógica de funcionamento e conhecer as teorias ecológicas

existentes. Lembremo-nos sempre do que propõe Carl Popper: a observação não é

feita no vácuo e tem um papel decisivo na ciência, contudo, toda observação é

precedida por um problema que só pode ser identificado se conhecemos a teoria –

conhecimento prévio é a chave!


REFERÊNCIAS:

COUTINHO, F.A., 2002. Conhecimento. In: MARTINS, R. P. & MARI, H. (Eds), 2002.

Universos do conhecimento. Faculdade de Letras da UFMG, Belo Horizonte.

HEATH, O. V. S. 1981. A estatística na pesquisa científica. Coleção Temas de

Biologia. Editora da Universidade de São Paulo, São Paulo.

KAPLAN, Abraham, 1969. A conduta na pesquisa: metodologia para as ciências do

comportamento. São Paulo:Herder/USP.

LAKATOS, E. M & MARCONI, M. A., 2000. Metodologia científica. Editora Atlas S.

A., 3ª ed. São Paulo.

MENTIS, M. T., 1988. Hypothetico-deductive and inductive approaches in ecology.

Functional Ecology 2: 5-14.

POPPER, K. R. 1959. The logic of scientific Discovery. Hutchinson, London.

TRUJILLO-FERRARI, Alfonso. Metodologia da Ciência. 2ª ed. Rio de Janeiro:

Kennedy.

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