Vous êtes sur la page 1sur 57

Ficha Catalográfica elaborada pela EADCON.

Bibliotecária – Cleide Cavalcanti Albuquerque CRB9/1424

Fundação Universidade do Tocantins (UNITINS)


F981l Letras / Fundação Universidade do Tocantins; EADCON. –
Curitiba: EADCON, 2010
438 p.: il.

Nota: Caderno de Conteúdos do 7º período do curso de Letras


(apostila).

1. Professores – Formação. 2. Letras – Educação e Ensino. I.


EADCON. II. Título.

CDD 378
Direitos desta edição reservados à UNITINS
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da UNITINS

FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS


Reitor Interino Lívio William Reis de Carvalho
Vice-Reitor Lívio William Reis de Carvalho
Pró-Reitora de Graduação Suely Cabral Quixabeira Araújo
Pró-Reitora de Extensão e Pós-Graduação Marcia Izabel Barbosa Soares
Pró-Reitor de Pesquisa Arison José Pereira
Pró-Reitor de Administração e Finanças Evandro Borges Arantes
Diretor de EaD e Tecnologias Educacionais Maurício da Silva Pereira
Diretora de Ensino Patrícia Martins Bühler Tozzi
Coordenadora do Curso Cristiane Tavares Jordão de Vasconcelos

SOCIEDADE DE EDUCAÇÃO CONTINUADA – EADCON


Diretor Executivo Julián Rizo
Diretor de Expansão e Qualidade Acadêmica Alfredo Angelo Pires
Diretores Administrativo-Financeiros Ademilson Vitorino
Júlio César Algeri
Diretora de Operações Cristiane Andrea Strenske
Diretora de Marketing Ana Cristina Gomes
Diretor de Expansão em EaD Alex Rosenbrock Teixeira
Diretor de TI Juarez Poletto
Coordenação Geral Dinamara Pereira Machado

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 7ª PROVA – 23/12/2009 APROVADO ____________


Panorama histórico e

1
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

geográfico das literaturas


de expressão portuguesa

Introdução
Este capítulo tem por objetivo levar você à compreensão da abrangência
histórica e geográfica da colonização portuguesa e do surgimento das litera-
turas de expressão portuguesa por meio da expansão nos territórios africanos.
As literaturas de expressão portuguesa são eminentemente o resultado da
colonização de Portugal. Independente dessa influência, você perceberá que há
uma diferenciação que passa pela busca da alteridade, ou seja, da liberdade
de expressão ligada à cultura e à sua identidade pessoal.
Você estudou, em Literatura Portuguesa I e II, que Portugal ocupa uma espe-
cial posição geográfica no mapa da Europa (MASSAUD, 1999), tendo um redu-
zido território que se limita ao Norte e a Leste com a Espanha e ao Sul e a Oeste
com o Oceano Atlântico. Diante desse perfil territorial, temos a visualização de
Portugal como que empurrado contra o mar, por isso, ao partir para as buscas
e conquistas além-mar, como colonizador, Portugal representou um sentimento
e um caminho únicos para os povos que colonizou, pela forma como se deu a
colonização e a posterior independência dos países colonizados.
Com certeza, você já sabe que as aventuras navais portuguesas, iniciadas
no século XV, espalharam o idioma por quatro continentes, entre eles o conti-
nente africano. Esse continente sempre foi marcado, historicamente, por disputas
entre tribos rivais, que fizeram com que a África fosse uma grande “colcha
de retalhos”. Em todos os países que Portugal colonizou e explorou, levando
riquezas e até impondo sua cultura, deixou como herança a Língua Portuguesa
que liga mais de 35 milhões de habitantes africanos.
Para que você tenha uma melhor compreensão deste capítulo é necessária
uma visão histórica sobre a colonização portuguesa, também é importante
recordar seus estudos de Literatura Portuguesa I sobre o início das viagens portu-
guesas e busca por novos territórios e mercados.
Você precisa recordar autores importantes da Literatura Portuguesa que retra-
taram as viagens marítimas como, Luís Vaz de Camões, com sua obra principal,
Os Lusíadas. Essa obra é considerada como um canto de amor e exaltação, uma
epopeia aos feitos e às conquistas portuguesas.
É necessário, ainda, recordar a carta de Pero Vaz de Caminha, como
primeiro documento literário brasileiro, pois, na carta, Caminha descreve ao

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 309

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 309 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

rei de Portugal o que a expedição encontrara no Brasil. Dessa forma, você terá,
com base nessa retomada de estudos, um aparato teórico literário importante
para ajudá-lo na compreensão deste capítulo.

Saiba mais

Para você conhecer na íntegra a carta de “achamento” do Brasil enviada por


Pero Vaz de Caminha, importante documento literário dado como o primeiro
da literatura brasileira, acesse o sítio <http://www.cce.ufsc.br/~nupill/lite-
ratura/carta.html>. Você perceberá que Caminha não somente fala do Bra-
sil, mas também de países africanos colonizados por Portugal. Essa carta é
um relato de viagem e é importante para você compreender este capítulo.

1.1 A colonização portuguesa


As literaturas de expressão portuguesa nasceram da expansão dos portu-
gueses por meio das conquistas de novos territórios. Os portugueses foram os
primeiros europeus a se situarem no continente africano ao atravessarem, em
1415, o chamado Estreito de Gibraltar, e foi, com o auxílio do pidgin (idioma),
de base portuguesa, que comerciantes e marinheiros portugueses estabeleceram
os primeiros contatos. Eles tinham como objetivo principal estabelecer relações
comerciais com o novo território.

Conforme o dicionário Aurélio (on-line), pidgin é também chamada de


“uma língua de contato” e é o nome dado também a qualquer língua que
é criada de forma espontânea, resultado da mistura de outras línguas. É o
sistema de comunicação linguística rudimentar, nascido da simplificação de
línguas e que serve para necessidades limitadas de comunicação.

É por meio do pidgin que houve o primeiro contato que depois evoluiria para
o idioma denominado crioulo, no caso dos PALOPs (Países Africanos de Língua
Oficial Portuguesa): Angola, Moçambique e Cabo Verde. Esse idioma tinha o
objetivo puramente comercial, especialmente nos países em que o comércio era
muito valorizado.
O pidgin e o crioulo conviviam com as outras línguas de origem autóctone,
formando um imenso mosaico linguístico. Esse aspecto foi um fato de desunião

310 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 310 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

para os africanos, pois, por não se compreenderem mutuamente, foram, aos


poucos, sendo absolvidos pelo processo de “aniquilação cultural” que o colo-
nizador punha em prática. Mesmo diante desse processo de assimilação da
cultura do colonizador, os africanos resistiram e, a partir desse aspecto histó-
rico, notamos o aparecimento das literaturas de expressão portuguesa na África,
porém com a representação da identidade sociocultural africana.
Almeida, Almeida e Caetano (2009, p. 38) afirmam que
O aparecimento das literaturas de expressão portuguesa em África
é o resultado de um longo processo histórico de quase quinhentos anos
de assimilação (desde o século XVI), ocorrida basicamente devido
à colonização sofrida por tais países pelo colonizador, Portugal.

Segundo o que os autores colocam, temos o fator da identidade na expressão


literária não somente como elaboração para respaldar a identidade de uma
nação, como também para desempenhar um papel relevante nessa criação,
sendo ao mesmo tempo produtos e constituintes parciais da nação e de seu
sentido coletivo de identidade nacional.
Para tanto, o discurso que constitui a nação é construído pela articulação
de símbolos diversos, não podendo se restringir ao discurso ideológico desen-
volvido e difundido pelo poder autoritário. O estudo da nação, por meio do
seu discurso, por exemplo, literário, chama a atenção para a sua língua, como
também identifica o próprio objeto conceitual que a constitui como nação.
O discurso literário está conectado com as práticas sociais e com a época
e é por meio de um cruzamento de informações entre os acontecimentos sociais
e literários que podemos descobrir e reconstruir, segundo Greenblatt citado por
Augel (2007), os códigos culturais de uma sociedade.
A construção do sentimento de nação foi importante para a não concreti-
zação definitiva do que se chamou de tentativa de aniquilação cultural por parte
da metrópole Portugal em relação às suas colônias.

Saiba mais

Sobre a posição geográfica de Portugal e o pioneirismo português no sé-


culo XV, leia o livro Literatura Portuguesa, de Massaud Moisés, da editora
Cultrix, em especial a Introdução e os capítulos II, III e IV. Nesses capítulos,
você encontrará um estudo importante sobre a literatura de colonização
além de conhecer alguns autores de destaque.

Posterior à tentativa de aniquilação cultural, surge a retomada da conscien-


cialização de um fator importante a ser observado nas literaturas de expressão

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 311

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 311 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

portuguesa, pois, as literaturas africanas, surgem como um produto ulterior forte-


mente esboçado a partir das décadas de 1940 e 1950 e tiveram seu desenvol-
vimento e sua gênese nas denominadas elites lusófonas.
Ao retratar esse aspecto, Almeida, Almeida e Caetano (2009, p. 39) relatam
que
É preciso, aqui, no entanto, retomar as décadas anteriores, nota-
damente ao ano 1926, em que António Salazar, primeiro ministro
ditatorial português, estabeleceu uma lei que diferenciava os
africanos em “civilizados” e “bárbaros”, sendo que, para serem
considerados “civilizados”, teriam de saber falar (e, numa pers-
pectiva idealista, ler e escrever) o português.

É a partir dessa lei que se tem início o chamado gérmen da consciencialização


africana. O aspecto social do negro na África passa a ter uma grande impor-
tância e relevo para a literatura, pois é a literatura que terá a responsabilidade
de passar a imagem cultural africana para o mundo. Nesse processo, é impor-
tante a literatura colonial e dos descobrimentos, duas pontes que nos remetem ao
que futuramente os países africanos colonizados por Portugal enfrentariam.

1.2 Literatura colonial e literatura dos descobrimentos


Talvez você já esteja se perguntando: em que difere a literatura colonial
da literatura dos descobrimentos? A literatura dos descobrimentos era baseada
nos relatos de viagens feitos por navegadores, escritores, comerciantes etc. Ela
narrava fatos e acontecimentos ocorridos ao longo das viagens. A literatura
colonial, por sua vez, retrata a vivência dos portugueses no além-mar. O centro
dessa literatura era o homem europeu e não o homem africano. Nela, predomi-
navam as ideias de inferioridade do homem negro, de teóricos racistas, como,
por exemplo, Gobineau e para as quais o filósofo Lévy Bruhl contribuiu com sua
tese de mentalidade pré-lógica.

Joseph Arthur Gobineau foi um importante filósofo, escritor e etologista fran-


cês, que desenvolveu a teoria do determinismo racial. Essa teoria teve gran-
de influência no desenvolvimento das políticas raciais na Europa do século
XVIII. Gobienau foi também um apreciado autor de histórias ficcionais e de
livros sobre a História e Crítica Literária.

Na literatura colonial, a África era vista como uma paisagem linda, ou até mesmo
um paraíso, tendo como protagonista o homem europeu. Era a literatura meramente

312 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 312 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

com o fundamento da “exploração do homem pelo homem”. Era, portanto, um


ponto de vista político-social muito forte, fruto da mentalidade da época.

Alguns escritores como João de Lemos, que escreveu Almas negras, e José
Osório de Oliveira, que escreveu Roteiro de África, empreenderam uma
busca por entender a mentalidade do homem negro. Suas obras tinham
uma intenção humanística.

O que percebemos, porém, é um grande paradoxo já que todas as manifes-


tações de cunho racista e que tinham como único objetivo aniquilar as culturas
dos africanos, considerados selvagens, acabou por ajudá-los na construção de um
caminho para a libertação. Aumentou, por assim dizer, a chance de firmarem-se
como um povo cuja vastidão cultural é complexa, importante e também autônoma.
A Língua Portuguesa é um dos elementos que influenciaram positivamente
na libertação, pois ela representou um veículo de unificação comunicativa. Os
escritores da literatura africana viveram até a data da independência duas reali-
dades: a sociedade colonial europeia e a sociedade africana.
Toda a sua produção literária resulta dessa tensão existente entre esses dois
mundos. Essa realidade dialética, ora tinha traços de aculturação, ora traços de
ruptura. Na verdade, um escritor africano, naquele momento cultural, compor-
tava-se e produzir como um escritor europeu, com os mesmos temas, mesma
forma, mesmo estilo e ideologia, ou seja, sua obra tinha muito do branco, do
europeu civilizado.

A aculturação significa todo processo de adaptação social por parte de


um indivíduo ou grupo. É o fenômeno decorrente do contato direto entre
integrantes de várias culturas. Nesse processo, os indivíduos adquirem ele-
mentos, traços significativos da cultura de outros grupos socioculturais.

Mesmo com todos os esforços do governo português em manter a alienação


de suas colônias, o escritor africano recebeu importantes influências do exterior,
e o conteúdo de sua escrita começou a revelar os contatos com os movimentos
e as correntes literárias da América e da Europa. Entre os movimentos, desta-
camos nesse processo o movimento de negritude.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 313

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 313 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Saiba mais

Para você saber mais sobre o movimento de negritude, como se originou,


sua luta e ideologia, leia o texto Movimento de negritude, disponível no sí-
tio <http://www.prof2000.pt/users/hjco/alternativas01/Pag00009.htm>.
Aproveite essa dica de leitura para se aprofundar nessa questão que marcou
a produção literária e provocou outras mudanças e conquistas. Boa reflexão!

Durante um bom tempo, o africano tentou adequar-se aos moldes que eram
ditados pela metrópole e isso influenciava, inclusive, em sua autoestima, pois se
achava bárbaro e deslocado se não tivesse em si e no exterior algo de parecido
com o padrão de exigência do europeu.
Era uma busca pela semelhança com o colonizador, fruto da considerada
inocente aculturação. Aos poucos, porém, com o contato com outros povos foi
importante para que os africanos visualizassem outra realidade por trás de tantas
máscaras da colonização.
Surgiu, então, para as literaturas africanas de expressão portuguesa aquilo
que Manuel Ferreira (1977) denominou de processo. Tentando periodizar esse
processo, o autor oferece um esquema que apresenta a emergência da literatura
africana, sobretudo no que toca à poesia, ligada ao que ele considera como “os
momentos/etapas do produtor do texto”
O escritor, para Ferreira (1977), num primeiro momento está em estado
quase absoluto de alienação, absorvido por completo pela cultura do colo-
nizador, reproduzindo, inclusive, seus ideais. Esse momento é marcado pelo
menosprezo e a alienação cultural.

O estado de alienação representava a forma como foi tirada a identidade


cultural do colonizado.

Outro momento, para Ferreira (1977), corresponde à fase em que o escritor ganha
a percepção da realidade, apontando distinções geográficas e sociais em relação à
metrópole. O discurso revela uma grande influência do meio e contém alguns sinais
de sentimento nacional, como a dor de ser negro, o negrismo e o indigenismo.
Um terceiro momento apontado por Ferreira é aquele em que o escritor
adquire a consciência nacional de colonizado. Nesse momento, promove um

314 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 314 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

pensamento dialético, liberta-se da coibição e da sujeição colonial. Para


Ferreira (1977), existe uma prática literária que se enraíza no meio sociocultural
e geográfico, sendo um reflexo da desalienação e do discurso de revolta.
O quarto momento está ligado à fase histórica da independência nacional.
A partir desse momento, existe a reconstituição da “individualidade” do escritor
africano. As produções de textos dessa fase representam um texto mais autô-
nomo, com mais liberdade e criatividade.
Ao estudarmos as fases da literatura africana, dois ambientes são revelados
como fatores importantes para a composição do cenário e do surgimento das
literaturas africanas de expressão portuguesa: a escola e a prisão.
Esses instrumentos tinham em sua significação algo de muito especial que
influenciou a literatura. Escola e prisão representavam o controle do colonizador
em relação ao colonizado. A escola que deveria promover a independência
intelectual, estética, ética, espiritual e ideológica acabava por ser um instrumento
de favorecimento da metrópole que dominava por meio da educação todo um
sistema e promovia da forma como bem desejasse o ensino.
A prisão que deveria funcionar como um instrumento de coerção e violência,
para qualquer pessoa que tivesse atitudes contrárias àquelas ditadas pelo colo-
nizador, como um estereótipo a ser seguido, foi aos poucos, juntamente com a
escola, servindo de centro de gradativa consciencialização negra.

O termo consciencialização foi cunhado por autores de renome, como Patrich


Chabal, que desenvolveram estudos importantes sobre a história dos países
africanos colonizados e o seu processo de independência. A consciencia-
lização remete ao fato da construção e do aparecimento das literaturas de
expressão portuguesa na África. Essas literaturas são produto de um desejo
de independência e de tomada de consciência dos escritores africanos em
relação à sociedade colonial europeia e em relação à sociedade africana.

Aprendendo na escola a língua do colonizador, sua estrutura e sua cultura, o


colonizado, na verdade, aos poucos, foi descobrindo que tinha uma importante
e forte arma contra o colonizador e podia usá-la como bem entendesse para
minar as ações do oponente. Em contrapartida, a prisão deixou de ser mais um
local de silêncio. Mesmo com os instrumentos de coação, ela se tornou um local
de reflexão e reação sociopolítica.
Ao se pensar, então, na relação das literaturas africanas de expressão portu-
guesa, encontramos nos estudos de Patrich Chabal (2002), referências impor-
tantes relacionadas ao desenvolvimento literário na luta pela consciencialização

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 315

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 315 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

do africano em relação ao colonizador. Veremos, no próximo tópico, um pouco


mais sobre os aspectos de conscientialização, a partir das contribuições de
Patrich Chabal.

1.3 Aspectos da consciencialização


Utilizando uma perspectiva historicista, Patrich Chabal (2002), ao se referir
ao relacionamento do escritor africano com o grande campo de influência que
constitui a oralidade, indica quatro fases da literatura africana.
A primeira fase estaria ligada à assimilação, na qual os escritores africanos,
no momento em que lhes foi dada a oportunidade de produzir esteticamente,
acabam por imitar e copiar os mestres, em especial os europeus. Esse aspecto
converge, como vimos, com o pensamento de Manuel Ferreira (1977).
A segunda fase seria uma fase de resistência, em que o escritor africano
assume a responsabilidade de construtor, como um arauto defensor da cultura
africana. Essa é a fase do rompimento definitivo com os moldes europeus. Tem-se
nela a consciencialização definitiva de que o homem africano é, nos dizeres de
Chabal (2002), “tão sapiens como o europeu”. Essa fase coincide com a da
negritude lusófona.
A terceira fase representa a afirmação do escritor africano depois da inde-
pendência buscando marcar o seu lugar na sociedade Ele se preocupa com uma
definição da sua posição nas sociedades pós-coloniais em que vive.
A quarta fase é a fase da atualidade, da consolidação do trabalho literário.
Basicamente é uma fase em que os escritores traçam novos rumos, dentro das
coordenadas de cada país para o futuro da literatura local. Ao mesmo tempo, os
escritores buscam, ainda, colocar as literaturas nacionais em um patamar mais
elevado no cenário universal.
Você estudou como as literaturas de expressão portuguesa, em destaque a
africana de expressão portuguesa, surgiram de uma tensão que resultou mais
tarde na libertação dos paradigmas da metrópole, ou seja, do colonizador.
A língua colonial, a Língua Portuguesa, confrontou a língua e a tradição de
expressão dos países africanos colonizados. No início, o colonizador impôs
sua cultura, em um processo chamado de aculturação, mas aos poucos essa
identidade fragmentada, em que o negro nem é branco e nem quer ser negro,
resultou de um processo de consciencialização, importante para o avanço da
independência desses países.
No próximo capítulo, você terá a oportunidade de estudar um pouco mais
sobre a formação da língua nacional e da literatura nos países de representati-
vidade nas literaturas de expressão portuguesa. A língua nacional é o destaque
para a chamada consciência nacional.

316 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 316 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 1 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Referências
ALMEIDA, Dalva Pontes de; ALMEIDA, Raquel Pontes de; CAETANO, Marcelo
Moraes. Considerações sobre as Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa.
Soletras, ano IX, n. 17. São Gonçalo: UERJ, jan./jun. 2009.
AUGEL, Moema Parente. O desafio do escombro. Rio de Janeiro: Garamond
Universitária, 2007.
CHABAL, Patrick. Lusophone Africa in historical and comarative perspective.
London: Hurst Company, 2002.
FERREIRA, Manuel. Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa. Lisboa: ICP,
1977.
MASSAUD, Moisés. A Literatura Portuguesa. 29. ed. São Paulo: Cultrix, 1999.
PIDGIN. Dicionário Aurélio on-line. Disponível em: <http://www.dicionariodo-
aurelio.com/dicionario.php?P=Pidgin> Acesso em: 10 ago. 2009.

Anotações

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 317

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 317 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
2
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

A questão da língua
nacional e a literatura

Juntei na mão
os meus poemas
e lanceio-os ao deserto
para que as areias
se transformem em protesto
Costa Andrade

Introdução
A língua nacional e o contato com a literatura nos países africanos coloni-
zados, em especial Moçambique, Angola, Cabo Verde, recebem uma atenção
especial por darem a você um panorama importante da construção sociocultural
das colônias africanas.
Você verá, neste capítulo, como a Língua Portuguesa foi um fator de unificação
comunicativa para os países colonizados por Portugal. Essa unidade linguística
proporcionada pela Língua Portuguesa tornou mais viável o diálogo entre as
colônias, além de ser uma ponte para o surgimento das literaturas de expressão
portuguesa e de todo o ideal de luta pela libertação dos países colonizados.
Para compreender melhor este capítulo, você precisará ter estudado o capí-
tulo anterior no qual apresentamos o contexto histórico para a compreensão da
formação da língua nacional nos países africanos colonizados por Portugal.
O objetivo principal, deste capítulo, é levar você a ser capaz de fazer
comparações entre a formação da Língua Portuguesa nos países colonizados
e a representação da literatura como forma de divulgar a cultura e a vivência
social desses povos e sua luta pela independência.

2.1 A colonização portuguesa: aspectos históricos


Os países africanos Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São
Tomé e Príncipe pertenciam ao antigo Ultramar Português e são hoje países
independentes. Eles conseguiram a independência em 1975, depois de cinco
séculos de colonização.
A formação histórica desses Estados é muito anterior ao surgimento dos
portugueses, à exceção do Arquipélago de Cabo Verde que era desabitado.
Com a expansão mercantilista de Portugal, no séc. XV, é que começaram as
dificuldades desses povos africanos. Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, por

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 319

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 319 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

exemplo, transformaram-se em entrepostos de escravos capturados no continente


africano (ABDALA JÚNIOR; PASCHOALIN, 1985).
Os escravos eram uma fonte de renda e uma forma de mão de obra barata
para os colonizadores. Contudo a partir do século XIX, o trabalho escravo
começou a ficar improdutivo devido ao desenvolvimento capitalista e devido à
proibição do sistema escravocrata. Abdala Júnior e Paschoalin (1985, p. 75)
expõem que
As grandes potências europeias, mais desenvolvidas dentro do
capitalismo, substituíam a política colonialista pela imperialista:
ela era mais econômica e criava uma ilusão de autonomia, que
evitava despesas administrativas e reduzia as militares.

A política colonialista que mantinha o sistema escravocrata passa a ser


contestada pelas grandes potências europeias. A Europa estava passando por
uma fase de transformação política e também social adequando-se aos novos
modelos da política colonialista exigida pelo fator econômico. Mesmo com essa
mudança por parte de países europeus como a Inglaterra, Portugal, contudo,
não modificou a sua forma de governar as colônias ignorando as mudanças das
grandes potências europeias. Portugal apresentava um comportamento peculiar
em relação às políticas externas, bem como a política adotada em suas colônias,
pois apresentava uma estrutura econômica muito atrasada e dependia politica-
mente dos países europeus mais desenvolvidos como a Inglaterra.
Na realidade, não era interessante para as grandes potências a preser-
vação do império colonial português, pois pretendiam explorar sozinhos o conti-
nente africano.

Saiba mais

O continente africano é riquíssimo, tem uma imensa variedade de línguas,


além de uma cultura permeada por uma diversidade de costumes e religiões.
Para você saber mais sobre esse continente, acesse o sítio do Brasil Escola:
<http://www.brasilescola.com/geografia/africa-continente.htm>. Lá, você
verá, ainda, que esse continente é rico em minérios e outras riquezas natu-
rais. Desde aquela época, portanto, o interesse do colonizador era explorar
essas riquezas, entre elas os diamantes e o ouro.

Diante do desejo das grandes potências em destruir o império português,


o cenário social que envolvia as colônias portuguesas começa a mudar. Tem-se
então um verdadeiro “surto de colonização”, intensificando as atividades econô-
micas, além de contribuir para o surgimento de uma ativa burguesia crioula. A

320 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 320 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

partir desse fato, grandes transformações acontecem como a criação de uma


consciência nacional que não interessava de forma alguma ao colonizador.
A consciência nacional teve consequências, pois o colonizador buscou de
todas as formas forçar a desagregação de qualquer grupo que pudesse de
alguma forma contestar o estatuto colonial existente nos países africanos.
Essa atitude era uma forma de manter os colonizados no mais completo
obscurantismo. Abdala Júnior e Paschoalin (1985, p. 76) afirmam que
[...] a República democrática portuguesa (1910) não mudou a
situação: continuava, como os monárquicos, a sonhar com a
África, como fizeram anteriormente com o Brasil. As pequenas
reformas sociais que procederam visaram apenas à manutenção
da situação colonial.
Com o salazarismo, houve a tentativa de integrar as colônias
à metrópole, como se fizessem parte de um mesmo país. Na
verdade, as antigas colônias continuavam colônias, mas passa-
riam a ser chamadas de “Províncias Ultramarinas”.

Conforme você pode observar a monarquia permanece como forma de


governo, Portugal, portanto, não intencionava mudar sua forma de conduzir as
colônias. Tudo isso resulta na busca de uma política assimilacionista, que buscava
desorganizar e até eliminar a cultura própria do país, considerada inferior, e
impor a cultura do colonizador, considerada como um agente de civilização.
A partir de 1954, em Angola, os colonizadores dividiram a população entre
civilizados e não civilizados (ABDALA JÚNIOR; PASCHOALIN, 1985). Mas para
ser considerado civilizado, algumas condições deveriam ser cumpridas como:
• ter 18 anos;
• falar corretamente o português;
• exercer profissão que possibilitasse o sustento da família;
• ter um bom comportamento;
• ter hábitos civilizados;
• não ser desertor do serviço militar e nem refratário.
Conforme Abdala Júnior e Paschoalin (1985), esse estatuto causou uma
revolta geral, pois o percentual registrado apresentava que menos de 5% da
população teria condições de preencher os requisitos da chamada cidadania.
Surgia, então, as organizações nacionalistas para a luta política contra o colo-
nialismo e, na década seguinte, surgia a luta armada.
Um ponto de destaque para a construção da cidadania é a língua nacional,
pois é a partir da sua consolidação que os africanos conseguiram lutar pela
independência. É essa relação da língua como garantia para independência
que você verá no próximo tópico.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 321

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 321 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

2.2 A questão da língua nacional


Para a formação de uma literatura, fazem-se necessárias produções em
língua nacional. No caso específico das literaturas africanas, essas produções
são constituídas a partir do conhecimento da língua do colonizador e do domínio
dessa língua. Nessa tarefa, está o poder de compreender como o colonizador
pensa e age e, por meio desse conhecimento, lutar contra a supremacia do mais
forte. É o domínio das estruturas da língua que vai formar a consciência nacional
nos países africanos colonizados por Portugal.
Mesmo com a independência política que ocorreu em 1975, a consciência
nacional dos países africanos de Língua Portuguesa esteve sempre em constante
processo de afirmação. Abdala Júnior e Paschoalin (1985, p. 79) destacam que
[...] persiste igualmente uma ideologia tribal que é incompatível
com a nacional. E, em Angola e Moçambique, dificuldades linguís-
ticas pela existência de um grande número de línguas diferentes.
A unidade é maior em Cabo Verde, onde o crioulo caboverdiano
(dialeto do português) é falado pela totalidade da população. Ele
coexiste com o português, nesse país, como os crioulos regionais
dos demais países da antiga África portuguesa. Nesses países,
entretanto, o idioma português continua a ser oficial e é aquele
que permite uma comunicação mais geral.

Há um passado colonial entrelaçado com a realidade da língua e sua forma


de expressão, contando, ainda, com a língua tribal, mas, independente disso,
persiste uma África que tem como idioma oficial o português.
A Língua Portuguesa, historicamente, tem sido uma afirmação no sentido de
unidade nacional, já que as línguas tradicionais estão ligadas a regiões peculiares.
A utilização do português tem garantido a não confrontação ou até mesmo a sobe-
rania linguística de uma região sobre a outra. Portanto o português e os vários
crioulos dele decorrentes acabam sendo formas linguísticas dos grandes centros
urbanos e é nesses centros urbanos que estão os grupos sociais mais dinâmicos.
A Língua Portuguesa não desaparecerá, ao contrário, depois da indepen-
dência sua afirmação tem sido maior. A causa disso é a desvinculação da figura
do colonizador.

Saiba mais

Para saber mais sobre o panorama didático da história literária das nações
africanas de Língua Portuguesa, você pode ler Literaturas africanas de ex-
pressão portuguesa, de Manuel Ferreira, do Instituto de Cultura Portuguesa,
Lisboa-Portugal.

322 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 322 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

E a literatura nos países de expressão portuguesa colonizados por Portugal?


É sobre isso que trataremos a seguir, apresentaremos um panorama das litera-
turas de Língua Portuguesa na África.
Esse tipo de literatura, também chamada de literatura africana de expressão
portuguesa, ganhou uma nova designação como uma literatura propriamente de
raiz africana, ou seja, com o advento da independência criou-se, por meio dos
movimentos libertários, uma consciência sobre a literatura africana.
Os movimentos libertários propiciaram uma rebelião literária, ideológica
e linguística que teve início no ano de 1940. Esses movimentos trouxeram uma
maior consciência revolucionária.

2.3 As literaturas de Língua Portuguesa


Inicialmente, a literatura de características africanas era escrita em várias
línguas locais misturadas ao português e tinha como objetivo tornar-se impossível
de ser compreendida pelos europeus. Não permitir ao homem branco decodi-
ficar as mensagens era uma forma de protesto. É interessante você observar o
fato de como a luta pela liberdade acaba por passar pelo uso da linguagem,
como forma de um sistema de poder que mantém acesa a força e a capacidade
de um povo de lutar pela sua independência. Essa independência de cunho,
também, cultural é representada pela linguagem.
Como exemplo da força que a língua tem como forma de estabelecer um
poder e uma ideologia, obras de escritores angolanos, como de Agostinho Neto,
António Jacinto, Pinto Andrade, Luandino Vieira, entre outros, foram escritas com
palavras e frases idiomáticas nos dialetos quimbundo e umbundo.
A década de 1940 foi marcada por esse movimento que vai até a inde-
pendência dos países africanos colonizados em meados da década de 1970.
Os escritores contribuem com seus textos impregnados de marcas das revoltas
políticas e mostram, por meio da linguagem, a necessidade de tornar a inde-
pendência uma realidade. A literatura, dessa forma, denuncia uma situação
política que passou do apogeu para o declínio, criando um estado de coisas
que sustenta e estimula a “liberdade” do colonizado e produz um sentimento de
esperança na capacidade humana.
As literaturas africanas de Língua Portuguesa, conforme nos mostram Abdala
Júnior e Paschoalin (1985, p. 82),
[...] inserem-se no quadro dos movimentos de resistência e de luta
pela libertação política de seus países e de afirmação de uma
cultura própria. Não é por acaso que encontramos entre os prin-
cipais escritores os mais importantes líderes revolucionários.

Na verdade, os autores assinalam os pontos de contato existentes entre as


literaturas africanas e as literaturas de Portugal e do Brasil, pois, nessa formação,
concorrem escritores tanto portugueses quanto brasileiros, todos próximos dos afri-
canos por afinidades político-ideológicas, na luta contra o chamado salazarismo.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 323

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 323 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Salazarismo foi um regime político autoritário e corporativista que vigorou


durante 41 anos em Portugal, designado de Estado Novo e centrado em
Antonio de Oliveira Salazar. Era um regime autoritário e corporativo de
inspiração integralista e fascista.

A literatura de expressão portuguesa tem como marca em seu conjunto de obras


literárias a sua africanidade, pois é a África o grande motivo de sua mensagem. A
experiência colonial acabou por gerar estados pluriétnicos, que aglomeravam não
só etnias diversas, mas que dividiam a mesma etnia entre várias fronteiras.
A África erguendo-se de todo o seu processo de colonização, por meio da
literatura, luta contra o modismo europeizante. Nessa literatura, o centro é o
homem africano e não o europeu.
Chaves (2005, p. 191) diz que
[...] podemos compreender que as modificações perpetradas
pelos falantes, por um lado, derivam de sua necessidade de usar
aquilo que não conhecem a fundo; por outro lado, traduzem a
vivacidade de quem percebe certa incongruência entre a língua
e o mundo que ela deveria exprimir. A “imperfeição” no uso se
redimensiona e vira selo de apropriação. As “limitações” e as
“complementações” no texto literário devem ser interpretadas
como uma forma de sancionar esse uso “imperfeito” da língua
em lugar de aderir à norma padrão do idioma de fora trazido.

Para Chaves (2005), portanto, as modificações na língua derivam da


necessidade de domínio dessa mesma língua transformando aquilo que não se
conhece em algo que se possa ter domínio.
Chaves (2005) faz, ainda, alusão ao escritor angolano Luandino Vieira, que
frisa a importância da Língua Portuguesa não ser a única forma de expressão, pois
a necessidade de corrigir o curso das coisas ditadas pela colonização tem em si a
forma da rebeldia da linguagem e da ruptura que impõe a língua do colonizador.

Saiba mais

Para você saber mais sobre os escritos relacionados à identidade nacional,


tema também abordado por Luandino Vieira em suas obras, acesse o sítio <http:
//www.mnoticias.8m.com/luandino_vieira.htm> e leia o texto Língua portuguesa
e identidade nacional, de José Luandino Vieira. Vale lembrar que você estudará
mais sobre o escritor no capítulo 3, deste caderno, dedicado a Angola.

324 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 324 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 2 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Sobre a importância da Língua Portuguesa, Rita Chaves (1985, p. 191)


ressalta que a língua funciona como um sistema de rebeldia e
[...] modificá-la, ampliando o léxico e alterando-lhe a sintaxe, é,
sem dúvida, uma maneira de apropriar-se dela. O padrão norma-
tivo identificado com o colonizador é rejeitado e em seu lugar
emerge uma língua transformada, revigorada pela circulação dos
elementos da terra, revitalizada pela aproximação com as língua
nacionais, num processo de apropriação capaz de converter um
objeto do dominador num signo da angolanidade que se quer
aprofundar. Desse modo, o legado compulsório torna-se objeto
da conquista. Vale referir nesse fenômeno a atuação dinâmica
das linhas da oralidade.

Nas transformações que a língua sofreu, o código herdado do colonizador


representa um esquema pobre diante da multiplicidade das experiências vividas
e da memória do colonizado. São essas memórias que recriam a comunicação,
fator importante de inclusão e um meio para questionar o senso absoluto que o
colonialismo cultuou.

Saiba mais

Para você saber mais sobre o processo de independência dos países


africanos e conhecer mais sobre as literaturas africanas de expressão
portuguesa pode ler Angola e Moçambique: experiência colonial e terri-
tórios literários, de Rita Chaves, publicado pela editora Ateliê Editorial.
Essa obra reúne textos que abrangem um esforço iniciado ao final da
década de 1980, quando o interesse no Brasil pelas culturas africanas
ganhou notoriedade.

Neste capítulo, você estudou sobre a importância da formação das lite-


raturas de expressão portuguesa, tendo como ênfase a literatura africana de
expressão portuguesa. No próximo capítulo, abordaremos o panorama da
Literatura Angolana, mostraremos sua produção literária e as transformações
importantes como participante da literatura de expressão portuguesa.

Referências
ABDALA JÚNIOR, Benjamin; PASCHOALIN, Maria Aparecida. História social da
Literatura Portuguesa. São Paulo: Ática, 1985.
CHAVES, Rita. Experiência colonial e territórios literários. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2005.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 325

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 325 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
3
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Estudo panorâmico:
Literatura Angolana

Introdução
Este capítulo tem por objetivo levar você à compreensão do panorama da
Literatura Angolana, que é um dos países africanos representantes das literaturas
de expressão portuguesa.
Como um espaço de representação periférico, para Rita Chaves (2005),
a história das Letras em Angola se mistura ostensivamente à história do país.
O processo literário se fez seguindo a linha das lutas para conquistar a inde-
pendência nos mais diversos níveis, e é dentro desse contexto colonial que a
Literatura Angolana tem sua instância de resistência, decidida a construir sua
nacionalidade e sua identidade cultural.
Para entender este capítulo, você deverá ter concretizado o estudo dos
outros dois capítulos anteriores que apresentaram um histórico das literaturas de
expressão portuguesa. Neste capítulo, falaremos sobre Angola e sua literatura,
abordaremos seus principais autores e a luta pela independência do país.

3.1 Angola
A história de Angola, como a de qualquer país colonizado, foi marcada por
momentos de repressão representados por um longo colonialismo. As marcas
deixadas pela colonização resultaram num índice alto de analfabetismo.
Só em 1948 que 3% da população alfabetizada resolveu dar uma atenção
especial ao número alto de analfabetismo e lança, em Luanda (capital), um
programa de alfabetização que apresentava como seu tema central “Vamos
descobrir Angola”. Em função de programas como esse, é que, a partir de
1950, vemos o nascimento da literatura angolana. Um dos textos inaugurais
dessa literatura foi Antologia dos novos poetas de Angola.
Essa obra contribuiu, em 1951, para a chamada Associação dos Naturais
de Angola, que reunia intelectuais e escritores com o objetivo de refletir sobre
a literatura que emergia naquele contexto sócio-histórico e, também, sobre o
processo de independência de Angola.
Como membros, alguns intelectuais, lançaram a revista Mensagem, que até
1952, publicou quatro exemplares que colaboraram para criar um clima de
desenvolvimento cultural e político, além de fortalecer a Literatura Angolana.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 327

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 327 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Chaves (2005, p. 88) esclarece que,


[...] com a eclosão do movimento dos Novos Intelectuais de
Angola, em fins da década de 1940, a vida cultural em Luanda é
sacudida por uma série de atividades (concursos literários, lança-
mento de jornais e revista, fundação de cineclubes etc.) cuja fina-
lidade era aglutinar pessoas e mobilizar as discussões sobre a
situação colonial, alimentando a consciência da necessidade de
pôr fim à ordem em vigor.

Como você pôde ver, os aspectos culturais tiveram uma influência importante
nos movimentos pela libertação de Angola, servindo como veículos de luta e
expressão do desejo de liberdade.
E esse mesmo grupo de intelectuais que compunha a Associação dos
Naturais de Angola que, em 1957, lançou uma revista com o nome Cultura, com
o intuito de manter os mesmos ideais e revelar poetas talentosos que mostrariam
a angolanidade.
Essas representatividades, ou seja, os intelectuais da Associação dos Naturais
de Angola, e consequentemente da revista Cultura, possibilitaram a criação de
um movimento popular de libertação de Angola (MPLA). Esse movimento foi de
suma importância para a independência do país.
O MPLA, como representatividade, culminou em repressão policial, levando
o povo a pegar em armas e lutar por sua independência. Esse processo de luta
durou de 1948 a 1960, quando se iniciou um novo momento de representativi-
dade na literatura angolana.
Não podemos deixar de mencionar, ainda, que o MPLA aliado ao momento
histórico contribuiu para a criação da identidade desse povo, além da valori-
zação e da exaltação da sua cultura.
É a partir de 1961, com a luta armada, que a revista Cultura, em plena circu-
lação, animou os guerrilheiros com sua temática nacionalista, gerando um endureci-
mento e uma repressão por parte dos portugueses, por meio do ditador Salazar que
culminou com o encerramento da revista. A repressão do governo colonial gerou o
fechamento de tudo o que pudesse se referir aos ideais da independência.
Contudo essas ações do colonizador não conseguiram acabar com a lite-
ratura de Angola. Houve uma forte resistência por parte de autores, como, por
exemplo, José Luandino Vieira.

Saiba mais

De acordo com o sítio <http://www.mnoticias.8m.com/luandino_vieira.


htm>, o livro Luuanda, de José Luandino Vieira, recebeu o prêmio literá-
rio angolano Mota Veiga, em 1964, e o Grande Prêmio de Novelística

328 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 328 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

da Sociedade Portuguesa de Escritores, de 1965. Por ser Luandino Vieira


prisioneiro político em Angola, as autoridades de Lisboa tentaram retirar o
prêmio, essa retirada pode ter se dado devido ao vocabulário em Kimbun-
du inserido nas estórias, o que lançou suspeitas sobre o conteúdo do livro.
Além disso, em 1972, uma edição de Luuanda pela editora Edições 70,
teve apreensão decretada em Portugal pelo governo de Marcelo Caetano.
Procure visitar esse sítio e ler mais sobre esse assunto.

Chaves (2005) enfatiza que o projeto literário angolano exprime a opção


por um sentimento nativista que, na base, difere das nossas obras românticas
produzidas na fase em que os nossos escritores se mostravam mais enfatica-
mente preocupados com a ideia de fundar a nacionalidade brasileira.
A forma como nossos escritores, por exemplo, eram influenciados pela cultura
europeia e a cultuavam na literatura, repetindo algumas formas de expressão
e características, era diferente da busca do escritor africano por afirmar sua
cultura e seu nacionalismo, já que deseja desvincular-se do estrangeiro.
É importante entender que o apreço pelo localismo como força modula-
dora se imprime, nos dizeres de Chaves (2005), “apoiando-se não nos rincões
distantes dos efeitos da colonização, mas no burburinho dos lugares, onde
marcas do estrangeiro somam-se aos chamados valores de raiz”.
Para compreender melhor como a literatura africana trabalha seus valores e
expressão, estudaremos, a seguir, alguns autores de representatividade.

3.2 Escritores angolanos de representatividade: poesia


A história dos países africanos de Língua Portuguesa foi marcada por uma
dimensão do passado, segundo Chaves (2005), uma visão panorâmica da lite-
ratura angolana permite ver que a valorização do passado é um dos tópicos
do programa elaborado pelo grupo de escritores que se propõe a fundar a
moderna poesia de Angola.
Reunidos em torno da revista Mensagem, no final de 1940, representam um elo
importante da poesia na depuração pela busca de uma expressão genuinamente
angolana. Os poetas de representatividade são: António Jacinto, Agostinho Neto
e Viriato da Cruz. Daremos ênfase ao de maior representatividade na poesia,
Agostinho Neto. No próximo item, conversaremos sobre ele e sua obra.

3. 2. 1 Agostinho Neto
Agostinho Neto nasceu em Catete, Angola, em 1922. Cumpriu seus estudos
primários e secundários em Angola. Licenciou-se em Medicina pela Universidade de
Lisboa. Sua ligação com a atividade política em Portugal foi muito forte e chegou a
fundar a revista Momento, com Lúcio Lara e Orlando de Albuquerque, em 1950.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 329

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 329 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Esse poeta angolano mostrou, em seus escritos, que a cultura angolana


era diferente da cultura que os colonizadores trouxeram. Teve sua importância
também marcada pela maneira como trabalhou o conceito de nação e foi deci-
sivo para a criação não só de uma nova literatura para Angola, mas também
para a efetivação de sua independência.
Autor de Sagrada esperança, obra que é comparada ao clássico Os Lusíadas,
de Camões, mantendo as ressalvas do tempo, do espaço e da cultura.
Em sua obra, Agostinho escreveu de forma épica para mostrar a alienação
social, cultural e política que o negro vivia. Mostra também a exploração econô-
mica, a repressão policial, a prostituição, o alcoolismo, o analfabetismo e a
miséria à qual a população angolana era submetida. Seu objetivo era propor-
cionar uma reflexão, além de mostrar um caminho para a verdadeira identidade
do povo angolano, identidade ligada à liberdade. A obra de Agostinho Neto
é dividida em três momentos. O primeiro tem o estilo neorrealista com a valori-
zação do povo negro. Esse momento vai de 1945 até 1949.
O segundo momento vai de 1949 até 1955, e nele identificamos poucos
momentos neorrealistas. A maior parte de sua obra é ligada à valorização do
ser humano negro, em Angola, estendendo-se à África e ao mundo. O autor
valoriza a solidariedade negra, em que a cultura tribal africana relacionada à
luta de um negro contra o outro é caracterizada como um erro.
O terceiro momento de sua produção é marcado pela sua prisão. O poeta
usa esse acontecimento como uma forma de inspiração e, a partir disso, produz
obras que incitaram a liberdade e a posterior independência de Angola.
Convoca, em sua obra, o povo angolano a lutar, combater e buscar a liberdade
com suas próprias forças. Sua literatura exerce grande influência e é um fator
importante para a libertação do país.

A obra poética de Agostinho Neto pode ser encontrada em quatro livros,


considerados principais: Quatro poemas de Agostinho Neto, (1975),
Poemas (1961), Sagrada esperança (1974) e a obra póstuma A renúncia
impossível (1982).

A obra de Agostinho representa a poesia engajada, na qual as imagens


poéticas são as vivências do homem angolano, numa referência que vai do
passado ao presente e deste para o futuro. Você poderá observar esse ponto no
seguinte fragmento de Adeus à hora largada, do livro Sagrada esperança.

330 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 330 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Amanhã
entoaremos hinos à liberdade
quando comemorarmos
a data da abolição desta escravatura
Nós vamos em busca de luz
Os teus filhos Mãe
(todas as mães negras
cujos filhos partiram)
Vão em busca de vida.
(Disponível em: <http://www.sitedeliteratura.com/Poesias/A_neto1.
htm>. Acesso em: 20 set. 2009.)

No fragmento, fica bem claro o aspecto do passado como uma referência


importante da característica de escrita de Agostinho Neto, além da projeção
para o futuro.
Para Marcelo José Caetano (1999), a poesia de Agostinho Neto
[...] traz o reconhecimento de que nunca se está só, de que não se
pode ignorar a presença do outro, mesmo que o outro reduza suas
possibilidades de ser. O outro, nas palavras de Agostinho Neto,
mistura-se ao eu-angolano, define-o, mas não lhe rouba as origens.
Antropofagicamente, o outro é assumido, compondo a imagem
autêntica do ser angolano contemporâneo: ser África porque, ‘cali-
banescamente’, o outro - que historicamente determinou os desvios
da cultura originária angolana - se fez presença no corpo de Angola.
Ser África dos caminhos entrecruzados, mas fazer-se África.

De acordo com o comentário de Caetano (1999), podemos perceber que


a poesia de Agostinho Neto trabalha com a necessidade de lutar, de sonhar e
de buscar uma identidade nacional, independente da postura do colonizador.
Ainda como representatividade da contemporaneidade angolana, três escri-
tores são destaques como símbolos dessa literatura: Costa Andrade, Henrique
Abranches e Ruy Duarte de Carvalho.
Segundo Chaves (2005), esses poetas angolanos trazem para o domínio da
literatura o legado da aprendizagem proveniente do exercício de outras lingua-
gens, notadamente o das artes plásticas e do cinema.
Muitos escritores contribuíram para a construção de uma identidade libertária
para Angola. Estudaremos os que tiveram mais repercussão e importância literária.

3.3 Escritores angolanos de representatividade: prosa


Situada na difícil margem de um quadro confuso, dimensionado por inequí-
vocas convulsões históricas, a produção literária angolana conheceu dilemas e

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 331

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 331 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

viu-se, muitas vezes, na contingência de corporificar um lugar de resistência às


conhecidas missões do império lusitano.
É a partir de 1960, conforme Chaves (2005), que se consolida a prosa de
ficção angolana e são as ruas de Luanda que remarcam o cenário preferen-
cial das histórias. Entre os autores representativos, estão José Luandino Vieira,
Pepetela, Ruy Duarte de Carvalho (poeta que faz incursões pela prosa), entre
outros. Esses autores têm como característica principal o fato de escreverem
sobre a consciência e a historicidade de Angola. Vamos conhecer um pouco
mais sobre Luandino e Pepetela.

3. 3. 1 José Luandino Vieira


José Luandino Vieira nasceu em Vila Nova de Ourém, Portugal, em 4
de maio de 1935, foi para Angola aos três anos de idade, por isso é consi-
derado um escritor angolano que nasceu em Portugal. Luandino tornou-se
cidadão angolano porque combateu, ao lado da MPLA, o domínio português
em Angola.
Contribuiu com a criação da República Popular de Angola e foi preso em
1959. Libertado pouco tempo depois, foi preso novamente e condenado a 14
anos de prisão. Cumpriu a pena em Tarrafal, Cabo Verde. Em 1972, em liber-
dade condicional, Luandino foi para Lisboa. Em 1975, com a independência,
voltou para Angola onde permaneceu até meados de 1992. Com o recomeço
de uma nova guerra civil, regressou para Portugal e se isolou de tudo.
Tendo dez livros editados, Luandino é um dos nomes mais respeitados e
prestigiados da ficção africana de Língua Portuguesa. O escritor é tema cons-
tante nas reflexões a respeito da Literatura Angolana, mesmo sem publicar livros
desde 1981. Chaves (2005, p.78) comenta que
[...] as razões de seu prolongado silêncio inquietam leitores e
críticos, no entanto a perplexidade gerada não esbate a convicção
de que o repertório apresentado assegura-lhe a posição conquis-
tada ainda nos anos de 1960.

Podemos perceber pelo fragmento que, para Chaves (2005), a obra de


Luandino não é povoada apenas por personagens exemplares, protótipos de
heróis e mártires, prontos para morrer pela causa. Sua obra tem um apreço
pelos personagens marginais ao lado de militantes empenhados na transfor-
mação, é povoada por homens que assumem o compromisso de mudar a reali-
dade, mesmo que estejam situados fora da ordem, Landino faz da exclusão o
seu traço de identidade.
Suas obras mais representativas, como Luuanda e as narrativas que se
seguiram como Nós, os do Makulusu, além dos contos bem comportados de
Vidas Novas, trazem já na sua linguagem uma gramática do falar coloquial
angolano. Nas passagens do conto Dina, podemos evidenciar isso. Vejamos.

332 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 332 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

O sol já tinha fugido todo, lhe deram berrida nas estrelas inve-
josas e a lua nasceu, pelejando nas nuvens para lé do Rangel.
Um silêncio mais grosso caiu, mesmo com o roncar dos jipes
teimosos, em cima das cubatas escondidas e encostadas nas
pequenas ruas e quintais. Pela cara da noite corre um vento
amu que arreganha as chapas de zinco e levanta papéis e
folhas pelo musseque fora.
(Disponível: <http://www.tempopresente.org/index.php?option
=com_content&task=view&id=4975&Itemid=147>. Acesso em: 20 set.
2009.)

Nos contos de Luandino, os enredos são protagonizados pelos habitantes


do setor mais pobre e marginalizado da cidade e vemos, a cada página, sinais
que atestam a relação do narrador com a matéria narrada.
Outro autor importante para a literatura angolana foi Pepetela. Vamos
conhecer um pouco sobre sua vida e obra?

3.3.2 Pepetela
Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos nasceu em Benguela, Angola, em
29 de outubro de 1941, conhecido como Pepetela, divide com Luandino o esta-
tuto de escritor mais conhecido e premiado de Angola (CHAVES, 2005).

Saiba mais

Para saber mais sobre Pepetela, você pode acessar o sítio <http://www.vi-
daslusofonas.pt/pepetela.htm> e ler o texto Artur Carlos Maurício Pestana
dos Santos. Nesse sítio, você encontrará informações interessantes sobre
Pepetela e sua obra.

Para Chaves (2005), em sua produção, Pepetela recorre a mitos, fontes histó-
ricas, subverte-se, reinventa o passado, critica e organiza a sua visão do que
tem sido a sociedade angolana. E, combinando elementos internos ao quadro
literário angolano com as marcas provenientes de outros processos, escolhe as
referências que melhor podem servir à sua proposta.
Para você visualizar melhor e ter uma compreensão mais ampliada do que
acabamos de comentar, leia um pequeno fragmento de Mayombe, romance de
Pepetela escrito entre 1970 e 1971 e publicado em 1980.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 333

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 333 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

[...] a amoreira gigante está à sua frente. O tronco destaca-se


do sincretismo da mata e o homem percorre seu tronco com os
olhos: a folhagem da árvore mistura-se à profusão de tons ver-
des que o encerra na mata. Só o tronco da árvore se destaca,
se individualiza. Tal é o Mayombe: os gigantes só o são em
parte, ao nível do tronco, o resto confunde-se na massa. Tal o
homem. As impressões visuais são menos nítidas e a mancha
verde predominante faz esbater progressivamente a claridade
do tronco da amoreira gigante. As manchas verdes são cada
vez mais sobrepostas, mas, num sobressalto, o tronco da amo-
reira ainda se afirma, debatendo-se. Tal é a vida. [...]
[...] protegido do sol tórrido da chama, o guerrilheiro deixa-se
cair à sombra compacta das árvores. Fatigado, cai em pesa-
do sono, mas, pouco depois acorda sobressaltado: um raio
de sol vence a copa densa do telhado verde do Mayombe e
projeta-se lentamente sobre seu rosto, como a mira certeira
da arma do inimigo. O homem levanta-se e empreende, mais
uma vez, seu caminho tortuoso pela mata desconhecida, cui-
dando não deixar traços da sua passagem. Para muitas vezes
e decifra com cautela os ruídos da floresta, até que um som
familiar lhe chega aos ouvidos: o rio corre manso à sua frente
e o rumor das águas densas aguça-lhe a sede imensa e anes-
tesia seus ouvidos com seu cantar constante e sutil.
(Disponível em: <http://www.vidaslusofonas.pt/pepetela.htm>.
Acesso em: 20 ago. 2009).

Na leitura dos fragmentos anteriores, podemos perceber o retrato de Angola


por meio de Mayombe.

Saiba mais

Para conhecer um pouco mais sobre o romance Mayombe, de Pepetela, aces-


se o sítio <http://www.casadasafricas.org.br/site/img/upload/849433.
pdf>. Nele, você terá acesso a um estudo de Carlos Serrano, sobre o as-
pecto social da obra Mayombe. O estudo aborda o romance como um do-
cumento social, pois, nas palavras de Serrano, apesar da ficção, Mayombe
revela os fatos sociais vivenciados por Pepetela.

Neste capítulo, você estudou alguns pontos importantes sobre Angola, um


dos países das chamadas literaturas de expressão portuguesa. Teve acesso a

334 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 334 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 3 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

informações sobre alguns de seus escritores mais representativos e influentes e


que contribuíram para a consciência e a independência do país.
No próximo capítulo, você terá um estudo panorâmico da Literatura
Caboverdiana, com um pouco da história desse país africano e seus escritores
mais representativos.

Referências
CAETANO, Marcelo José. O eu e o outro em sagrada esperança. Caderno
CESPUC de pesquisa. PUC Minas, Belo Horizonte, n. 5, abr. 1999.
CHAVES, Rita. Experiência colonial e territórios literários. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2005.
NETO, Agostinho. Adeus à hora largada. Disponível em: <http://www.sitedeli-
teratura.com/Poesias/A_neto1.htm>. Acesso em: 21 set. 2009.
PEPETELA, Mayombe. Disponível em: <http://www.vidaslusofonas.pt/pepetela.
htm> Acesso em: 21 set. 2009.
VIEIRA, Luandino. Dina. Disponível em: <http://www.tempopresente.org/index.
php?option=com_content&task=view&id=4975&Itemid=147>. Acesso em: 21
set. 2009.

Anotações

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 335

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 335 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
4
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Estudo panorâmico:
Literatura Caboverdiana

Introdução
Este capítulo tem como objetivo proporcionar a você um estudo histórico da
Literatura Caboverdiana.
Cabo Verde foi desabitado até a expansão mercantil de Portugal no século
XV. Com essa expansão, Cabo Verde tornou-se um entreposto de escravos
capturados no continente africano e foi transformado em um corredor por onde
passavam e estiveram os ingleses, os franceses, os alemães, os espanhóis e os
italianos.
Cabo Verde é considerado, por isso, um país de raízes românicas ou neola-
tinas e é resultado de um sincretismo ocasionado pelo trânsito marítimo dos
invasores, entre eles os portugueses e os franceses.
Para acompanhar bem este capítulo, você deve refazer uma leitura dos
capítulos anteriores e recordar que as colônias africanas do Império Português
já tinham seus dialetos antes da colonização, pois estudaremos um pouco da
história de Cabo Verde e de sua literatura, além de seus escritores mais represen-
tativos. Vamos começar com um perfil histórico-literário de Cabo Verde.

4.1 Perfil histórico-literário de Cabo verde


Sendo colônia de Portugal, as ilhas de Cabo Verde começaram a vislumbrar
sua independência em meados do século XX. Foi em 1974, com a chamada
Revolução dos Cravos em Portugal, que o levante popular em Cabo Verde surgiu.
O governo português foi forçado a iniciar uma negociação que culminou com a
independência de Cabo Verde em julho de 1975.

Saiba mais

Para você saber mais sobre o processo de independência de Cabo Ver-


de, acesse o sítio <http://imigrantes.no.sapo.pt/page2caboverde.html>.
Nesse sítio, você poderá ter acesso a informações complementares sobre a
história de Cabo Verde, informações que serão muito importantes para que
possa compreender Cabo Verde e seus processos históricos.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 337

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 337 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Cabo Verde é um arquipélago que tem uma literatura expressiva, contém um


cancioneiro popular e o seu folclore registrados no dialeto caboverdiano, além
da literatura em Língua Portuguesa, considerada também, língua de cultura.
Como língua de cultura, o chamado crioulo caboverdiano (dialeto português),
é falado pela totalidade da população, representando uma unidade linguística
para Cabo Verde, é interessante que os escritores caboverdianos, a partir de
1930, acabam por expressar e significar em Língua Portuguesa. Dessa forma, ao
usarem esse idioma, permitem que seus textos dialoguem com os textos brasileiros,
por exemplo, muitos autores caboverdianos fazem referência a autores e obras de
escritores brasileiros. Esse diálogo representa uma identificação, principalmente
porque os escritores africanos veem o Brasil como um modelo de independência.

Saiba mais

Para conhecer um pouco mais as expressões idiomáticas de Cabo Verde


e os sentidos na Língua Portuguesa, você pode acessar o Novo dicionário
Caboverdiano Português On-Line, no sítio <http://www.priberam.pt/dcv-
po/dcvpo.aspx>.

Brasil e Cabo Verde têm afinidades históricas e se ligam por meio da música,
da literatura e do seu processo de formação histórica por questões étnicas. Alguns
escritores caboverdianos fizeram uma releitura de alguns poemas da Literatura
Brasileira, utilizando a técnica literária da paródia.

No guia de Produção Textual da PUC-RS paródia é a recriação de um texto,


geralmente célebre, conhecido, uma reescrita de caráter contestador, irô-
nico, zombeteiro, crítico, satírico, humorístico, jocoso. A paródia constrói,
assim, um percurso de desvio em relação ao texto parodiado, numa espé-
cie de insubordinação crítica, cômica.

No caso específico da releitura feita pelos escritores caboverdianos, privi-


legia-se a ambiguidade ou o paradoxo, estabelecendo o aspecto paródico,
muito comum nas obras dos escritores caboverdianos. Dois poetas parodiados,
por exemplo, por escritores caboverdianos foram Manuel Bandeira e Carlos
Drummond de Andrade.

338 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 338 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Um exemplo interessante que você pode pesquisar e comparar com o ori-


ginal escrito por Manuel Bandeira é o poema Pasárgada, parodiado pelo poeta
caboverdiano Osvaldo Alcântara. Vejamos um trecho dessa paródia.

Itinerário de Pasárgada
(Este poema é uma paródia ao Vou-me embora pra Pasárga-
da, de Manuel Bandeira)
Saudade fina de Pasárgada...
Em Pasárgada eu saberia
Onde é que Deus tinha depositado
O meu destino...

E na altura em que tudo morre...


(cavalinhos de Nosso Senhor correm no céu;
a vizinha acalenta o sono do filho rezingão;
Tói Mulato foge a bordo de um vapor;
O comerciante tirou a menina de casa;
Os mocinhos da minha rua cantam:
Indo eu, indo eu,
A caminho de Viseu...)

Na hora em que tudo morre,


Esta saudade fina de Pasárgada
É um veneno gostoso dentro do meu coração.
(Disponível em: <http://ricardoriso.blogspot.com/2008/04/vera-
duarte-um-tributo-literatura-cabo.html>. Acesso em: 15 ago. 2009).

Percebemos, nos versos de Alcântara, que o desejo idealista de Pasárgada


permanece como um lugar de refúgio e saudade.

Saiba mais

Para você conhecer outros textos parodiados de autores brasileiros por


autores caboverdianos, acesse o sítio <http://www.guesaerrante.com.
br/2005/12/1/Pagina494.htm>. Nele, você encontrará textos interessan-
tes parodiados de Carlos Drummond de Andrade, além de muitos poemas
de poetas caboverdianos.
Você pode ampliar sua pesquisa também buscando comparar o original
do poema E agora, José, de Carlos Drummond de Andrade, com a versão
parodiada da literatura caboverdiana, cujo fragmento disponibilizamos
a seguir.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 339

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 339 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Drummondiana
A vida – sabemos – vai mal
A morte – coitada – nada tem a oferecer-nos de novo
Por isso
faz um poema josé
faz um poema suzana
faz um poema tomé
faz um poema ana
[...]

As afinidades entre a literatura brasileira e a literatura caboverdiana não


terminam nas paródias, temos, ainda, autores brasileiros que servem de modelos
para a literatura que é produzida em Cabo Verde, como Graciliano Ramos,
Jorge Amado, José Lins do Rego, na prosa, e outros poetas, como Jorge Lima e
Ribeiro Couto.
Nos próximos tópicos, estudaremos os principais representantes da Literatura
Caboverdiana.

4.2 Manuel Antonio dos Santos Lopes


Manuel Antonio nasceu em 23 de dezembro de 1907, na ilha de São Vicente,
e morreu em 2005. Estudou no colégio de São Pedro e na Escola Comercial de
Coimbra. Ao regressar a Cabo Verde, trabalhou como telegrafista, foi tesoureiro
da Câmara Municipal de São Vicente e, posteriormente, retornou à profissão
de telegrafista. Foi considerado o último sobrevivente do movimento claridade,
movimento que abriu as portas do modernismo à literatura de Cabo Verde.
Santos Lopes tem, entre suas obras representativas, Chuva braba (romance
de 1956), Os flagelados do vento leste (romance de 1960), O galo que cantou
na Baía (contos de 1959), entre tantos outros que foram também premiados.
Além das suas obras transitarem entre a poesia, o ensaio, o romance e o conto,
esse escritor também se dedicou à pintura, e seu nome é considerado uma refe-
rência cultural caboverdiana, sendo um dos escritores mais conhecidos. Utiliza em
suas obras as expressões do crioulo, mesmo escrevendo os textos em português.
Os flagelados do vento leste é o romance mais representativo do autor. Essa
obra retrata, de forma neorrealista, a seca em Cabo Verde. Por meio desse
viés, o romance evidencia o perfil da seca e da chuva e como isso enfraquece o
camponês a ponto de estabelecer nele uma atitude de passividade e de derrota
diante da força da natureza. Os personagens da obra têm um profundo caráter
psicológico, são motivados pelas emoções do cotidiano, sendo suas vidas
guiadas por esses acontecimentos.

340 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 340 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Esse romance representa o que o autor presenciou durante os anos da década


de1940, em Cabo Verde. Na época em que essa obra foi escrita, a literatura
representava o comprometimento com os problemas sociais e de denúncia. O
romance segue a tendência do neorrealismo e nas suas primeiras páginas, apre-
senta um conteúdo muito descritivo e culpa a natureza das ilhas por todos os
males, defendendo o fato de a natureza ser adversa à presença humana.

Saiba mais

Para conhecer melhor o livro Os flagelados do vento leste, de Manuel Anto-


nio dos Santos Lopes, e apreciar um estudo comparativo entre Vidas secas,
de Graciliano Ramos, e Os Flagelados do vento leste, de Manuel, você
pode acessar o sítio <https://www.sharemation.com/lantuna/Vidas%20
Secas%20e%20Os%20flagelados%20do%20vento%20leste.pdf?uniq=-
m47xay>.
Se você deseja saber mais sobre as literaturas de expressão portuguesa,
em especial a africana, e estar ligado nos congressos e grandes discus-
sões sobre o tema no país, acesse o sítio do Instituto Internacional de Lín-
gua Portuguesa – IIPL: <http://www.iilpcplp.cv/index.php?option=com_
frontpage&Itemid=1>.

O próximo autor que estudaremos será Amílcar Cabral.

4.3 Amílcar Cabral


Nasceu em Bafatá, Guiné-Bissau, em 1924. Sua família mudou-se para Cabo
Verde, estabelecendo-se em Mindelo (ilha de São Vicente), que foi a cidade de
sua infância.
Na juventude, tendo mudado para a cidade de Praia, na ilha de Santiago,
começou seu trabalho na Imprensa Nacional e depois recebeu uma bolsa de
estudos e ingressou no Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa. Regressou
contratado pelo Ministério do Ultramar como adjunto dos Serviços Agrícolas e
Florestais da Guiné, em 1952.
Percorreu, por conta desse trabalho, grande parte do país e, mais tarde,
iniciou suas atividades políticas já em Portugal. Foram suas viagens e sua luta
pela independência de seu país que Amílcar retratou em suas obras, aliando sua
produção literária a essa prática.
Cabral, pela sua experiência, preocupava-se com os perigos da degradação
do continente africano. Alicerçou aos seus escritos toda uma ideologia que
pudesse servir para os propósitos da libertação, salvaguardando os interesses

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 341

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 341 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

do povo africano. Sua obra é composta por: A arma da Teoria e A prática revo-
lucionária, entre outros escritos esparsos. Veja a seguir um pequeno fragmento
de uma poesia de Amílcar, escrita em 1945.

Ilha
Tu vives — mãe adormecida —
nua e esquecida,
seca,
fustigada pelos ventos,
ao som de músicas sem música
das águas que nos prendem…

Ilha:
teus montes e teus vales
não sentiram passar os tempos
e ficaram no mundo dos teus sonhos
— os sonhos dos teus filhos —
a clamar aos ventos que passam,
e às aves que voam, livres,
as tuas ânsias! [...]

Neste fragmento temos a representação da ilha como imagem de um lugar


preso, esquecido, cuja necessidade é de se levantar e de ser livre.

Saiba mais

Você poderá ler este e outros poemas do escritor Amílcar de Castro, na ínte-
gra, acessando o sítio <http://www.didinho.org/a%20poesia%20de%20
amilcar%20cabral.htm>.
Amílcar Cabral compreendeu como ninguém os problemas fundamentais
da sua época. Apesar de sua literatura ter sido pouco estudada e divulga-
da, retratou nela a realidade concreta da sociedade africana. Seu principal
elemento ideológico sempre foi a luta pela libertação nacional.
Para você saber mais sobre o escritor Amílcar Cabral, acesse o sítio <http://
www.didinho.org/africaanteolegadopoliticodeamilcarcabral.html>. Nele,
você terá uma visão mais abrangente sobre a obra de Amílcar e sua histó-
ria de vida e luta pela independência de seu país.

Para a nova expressão da poesia caboverdiana, temos Jorge Barbosa,


representante do movimento literário modernista de 1930. É sobre o que conver-
saremos no próximo tópico.

342 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 342 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

4.4 Jorge Barbosa


Jorge Vera-Cruz Barbosa nasceu em 1902, na ilha de Santiago, Cabo Verde,
vindo a falecer em Cova da Piedade, Portugal, em 1971.
Jorge Barbosa foi um dos membros mais importantes do chamado movi-
mento Claridade. Suas obras foram: Arquipélago (1936), Ambiente (1941) e
Caderno de um Ilhéu (1956). É representante da personalidade e do reencontro
com a humildade crioula.
Sua poesia vai do descritivo do seu primeiro livro a um aprofundamento
das virtualidades para uma forma pessoal. Seus versos são simples, mas
contêm a representatividade da preocupação e da clareza sobre a realidade
das ilhas perdidas no mar. A ilha, portanto, surge em sua poesia com um teor
nostálgico de solidão e distância. Há um inconformismo na poesia de Jorge
Barbosa.
Vejamos a seguir fragmentos de duas poesias Prelúdio e Você: Brasil, de
Jorge Barbosa.

Prelúdio
Quando o descobridor chegou à primeira ilha
nem homens nus
nem mulheres nuas
espreitando
inocentes e medrosos
detrás da vegetação.

Nem setas venenosas vindas do ar


nem gritos de alarme e de guerra
ecoando pelos montes.

Havia somente
as aves de rapina
de garras afiadas
as aves marítimas
de voo largo
as aves canoras
assobiando inéditas melodias.

E a vegetação
cujas sementes vieram presas
nas asas dos pássaros
ao serem arrastados para cá
pelas fúrias dos temporais.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 343

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 343 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Quando o descobridor chegou


e saltou da proa do escaler varado na praia
enterrando
o pé direito na areia molhada [...] (BARBOSA, 1991, p. 156).

Você: brasil
Eu gosto de você, Brasil,
porque você é parecido com a minha terra.
Eu bem sei que você é um mundão
e que a minha terra são
dez ilhas perdidas no Atlântico,
sem nenhuma importância no mapa.
Eu já ouvi falar de suas cidades:
A maravilha do Rio de Janeiro,
São Paulo dinâmico, Pernambuco, Bahia de Todos-os-Santos.
Ao passo que as daqui
Não passam de três pequenas cidades.
Eu sei tudo isso perfeitamente bem,
mas Você é parecido com a minha terra.

E o seu povo que se parece com o meu,


que todos eles vieram de escravos
com o cruzamento depois de lusitanos e estrangeiros.
E o seu falar português que se parece com o nosso falar,
ambos cheiros de um sotaque vagaroso,
de sílabas pisadas na ponta da língua,
de alongamentos timbrados nos lábios
e de expressões terníssimas e desconcertantes.
É a alma da nossa gente humilde que reflete
A alma da sua gente simples,

Ambas cristãs e supersticiosas,


sortindo ainda saudades antigas
dos sertões africanos,
compreendendo uma poesia natural,
que ninguém lhes disse,
e sabendo uma filosofia sem erudição,
que ninguém lhes ensinou.

E gosto dos seus sambas, Brasil, das suas batucadas.


dos seus cateretês, das suas todas de negros,
caiu também no gosto da gente de cá,
que os canta dança e sente,
com o mesmo entusiasmo
e com o mesmo desalinho também...
As nossas mornas, as nossas polcas, os nossos cantares,
fazem lembrar as suas músicas,
com igual simplicidade e igual emoção. [...] (BARBOSA,
1991, p. 156).

344 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 344 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 4 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Como você pode observar, nesses fragmentos, existe a clara alusão e a


preocupação do poeta com a busca da caracterização da identidade de seu
povo. Esses são elementos constantes na escrita de Barbosa.
Nos fragmentos anteriores, está uma amostra da ideologia dos livros de
Barbosa, cujo conteúdo tem sua conotação social e política reveladas, essas são
as grandes temáticas do escritor.

Saiba mais

Para conhecer os poemas na íntegra e saber mais sobre o escritor Jorge


Barbosa, acesse o sítio <http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_afri-
cana/cabo_verde/jorge_barbosa.html>.

Neste capítulo, você pôde estudar um pouco do panorama histórico de Cabo


Verde além de uma visão de sua literatura e alguns escritores representativos da
luta pela libertação do país.
No próximo capítulo, você terá uma visão panorâmica da história de
Moçambique e de sua literatura.

Referências
BARBOSA, Rogério Andrade. No ritmo dos tantãs: antologia poética dos países
africanos de Língua Portuguesa. Brasília: Thesaurus, 1991.
LOPES, Manuel. Os flagelados do vento leste. São Paulo: Círculo do Livro, s/d.
PUC. Guia de produção textual da PUC-RS. Disponível em: <http://www.pucrs.
br/gpt/ >. Acesso em: 21 set. 2009.

Anotações

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 345

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 345 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
5
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Estudo panorâmico:
Literatura Moçambicana

Introdução
Este capítulo tem como objetivo fazer com que você tenha uma noção do
panorama da Literatura Moçambicana e da importância dela para o cenário
das literaturas de expressão portuguesa.
Para que você possa acompanhar este capítulo, é necessário que tenha
compreendido toda a caminhada sobre as literaturas de expressão portuguesa que
estamos fazendo desde o primeiro capítulo deste caderno. Um ponto fundamental
é entender que nosso foco está voltado para as literaturas africanas de expressão
portuguesa e, a partir desse ponto, compreender que elegemos alguns países
representantes dessa literatura, entre eles, Moçambique. É interessante, porém, que
você saiba que outros países africanos também foram colonizados por Portugal e,
também fazem parte desse cenário das literaturas de expressão portuguesa.
Então vamos nos deter em nosso tema central para este capítulo que é o
estudo panorâmico da literatura moçambicana. Ressaltaremos características da
literatura moçambicana, sua importância para o cenário literário das literaturas
de expressão portuguesa e seus principais autores.

5.1 Características da Literatura Moçambicana


Moçambique é separado territorialmente de Angola, mas compartilha com
ela o idioma oficial, a Língua Portuguesa. Moçambique fica na costa oriental da
África e sua formação geográfica faz fronteira com muitos outros países, possi-
bilitando uma rica interação com muitos povos africanos.
É a partir das décadas de 1940 e 1950 que a literatura de Língua Portuguesa
se mostra mais fértil em Moçambique, pois muitos textos são publicados em livros
e jornais. Esse momento é considerado como fruto da instalação da imprensa e
do jornal, que servem como divulgadores das ideias anticoloniais.
É, porém, ao final da segunda guerra, que a Literatura Moçambicana adquire
maturidade, entre os anos de 1945 e 1952. Os anos de desenvolvimento da
Literatura de Moçambique são decisivos para a qualidade que ela alcançaria no
cenário das literaturas de expressão portuguesa.
Escritores e intelectuais moçambicanos lutam contra a forte segregação que
extrapola e separa de forma marcante todas as raças, forçando a formar grupos

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 347

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 347 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

separados. É a partir de 1950 que os escritores e intelectuais formam grupos


e publicam seleções e antologias com ideias sobre a negritude como forma de
pregar a identidade nacional, sem a distinção das raças, pois todos são moçam-
bicanos. Junto a isso estavam os textos neorrealistas que denunciam a péssima
condição humana no país. Esses textos funcionam como uma importante refe-
rência para a conscientização da população.
É no ano de 1964 que se inicia a fase da exortação e a luta armada para o
processo de independência de Moçambique. Nos textos anticolonialistas, surge
a narrativa Nós matamos o cão-tinhoso, de Luis Bernardo Honwana, que mostra
de uma forma alegórica a vitória imposta ao colonizador pelos negros.
É com os textos de Guilherme de Melo, Raízes do ódio, de 1963, e Orlando
Mendes, Portagem, texto de 1966, que é inaugurado o romance moçambicano.
Surgem, então, vertentes importantes representadas por escritores como José
Craverinha, Orlando Mendes, Rui Nogar e Luís Bernardo Honwana, que têm em
sua herança o nacionalismo como resultado das tendências de incorporação do
panafricanismo. Os textos são publicados de forma mais restrita em pequenos
ghettos intelectuais.
Em outra vertente, engendrada para um pequeno público, temos autores
que inspiraram suas obras nos conteúdos de grandes obras universais, desde a
Antiguidade clássica, até a exaltação da cultura ocidental europeia. Destacam-se,
nessa vertente, os autores Rui Knopfli, Eugênio Lisboa, João Pedro, Grabato Dias
e Maria de Lourdes Cortaz.

Saiba mais

Para você conhecer mais sobre a literatura moçambicana e como ela está
hoje, leia a entrevista de Luiz Alberto Machado com o escritor e ator mo-
çambicano Rogério Manjate. Para ver na íntegra essa entrevista, acesse
o sítio <http://www.palavrarte.com/entrevistas/entrev_rogeriomanjate.
htm>. Você terá a oportunidade de conhecer esse autor e como ele entende
a literatura de seu país.

Agora que você já conhece um pouco das características da literatura


moçambicana, estudaremos seus autores mais representativos.

5.2 José Craveirinha


José Craveirinha dedicou-se principalmente à poesia. Com os recursos do
lirismo, montou “afiadas” páginas de denúncia das iniquidades captadas da
realidade que o cercava (CHAVES, 2005).

348 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 348 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Com toda a sua vigorosa produção que contém toda uma dimensão de resis-
tência e intervenção, esse autor está dentro daquilo que Chaves (2005, p.189) deno-
minou de moderna poesia moçambicana. Sua obra é representada por um conjunto
de cinco títulos Xigubo, Karingana ua Karingana, Cela 1, Maria e Badalaze das
Hienas, além de um sem número de poemas publicados em revistas e antologias.
Esse poeta/jornalista moçambicano é destaque em todo processo de liber-
tação. A primeira fase de sua produção é marcada pela expressão neorrealista,
em que traz o tema da tradição popular tribal. Em sua obra, o ser humano é
mostrado cheio de problemas e complicações. O objetivo do autor é conscien-
tizar o leitor do seu real estado de vida.
Sua segunda fase apresenta a negritude. Sua poesia contém versos longos
que enaltecem o negro e suas raízes africanas.
Na terceira fase, o autor representa a “moçambicanidade”, em que a identi-
dade nacional do seu povo é o centro da busca pela verdade e por suas raízes,
tal poesia expressa um desejo profundo pela libertação.
Na última fase, a quarta, Craveirinha apresenta uma poesia escrita em
grande parte na prisão. Leia os versos, a seguir, que são dessa fase.

Em meus lábios grossos fomenta / A farinha do sarcasmo que


coloniza minha Mãe África / E meus ouvidos não levam ao
coração seco / Misturado com o sal dos pensamentos / A
sintaxe anglo-latina de novas palavras.
(Disponível em: <http://br.geocities.com/poesiaeterna/poetas/
mocambique/josecraveirinha.htm>. Acesso em: 20 ago. 2009.)

A última fase desse escritor dá ênfase à temática ligada também à libertação


do povo africano. Você pôde perceber esse desejo no fragmento retirado do
poema África. Nele percebemos a força dos versos que buscam marcar a luta
do povo africano pela liberdade.
A obra poética de José Craveirinha é povoada por homens e mulheres,
que, guardando a dimensão existencial que os humaniza, apresentam-se numa
relação concreta com a vida: eles têm corpo, doenças, tradições, marcas sociais
definidas que os particularizam no conjunto um tanto amorfo a que se poderia
chamar de moçambicano, africano ou mesmo negro (CHAVES, 2005).
Chaves (2005, p. 146) assevera que,
Ao acolher a História, Craveirinha também definiria a geografia
de sua poética: são os bairros periféricos, os subúrbios de
caniço, que cresciam à volta da senhorial Lourenço Marques. O

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 349

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 349 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Xipamanine, as Lagoas, a Mafalala, onde viveu muito tempo e da


qual não se afastou muito, mantendo sua casa a poucas centenas
de metros, serão privilegiadas em sua travessia poética.

Pelo fragmento, você pode ver que a obra de Craveirinha tem muito de sua
vivência e sua experiência pelos bairros de Moçambique. Para você compreender
melhor o perfil aqui traçado por Chaves, leia o fragmento a seguir de Mulata
Margarida

Eu tenho uma lírica poesia


Nos cinquenta escudos do meu ordenado
Que me dão quinze minutos de sinceridade
Na cama da mulata que abortou
E pagou à parteira
Com o relógio suíço do marinheiro inglês.
---------------------------------------------
E eu sei poesia
Quando levo comigo a pureza
Da mulata Margarida
Na sua décima quinta blenorragia.
Disponível em: <http://br.geocities.com/poesiaeterna/poetas/
mocambique/josecraveirinha.htm>. Acesso em: 20 de ago. 2009.

Craveirinha apresenta como tema, nesse poema, a vida difícil da prosti-


tuta, não há idealização, mas cores fortes que enquadram uma moldura viva e
gritante de uma realidade (CHAVES, 2005).
Vejamos um fragmento do poema Aforismo, de Craveirinha.

Havia uma formiga


Compartilhando comigo o isolamento
e comendo juntos.
Estávamos iguais
Com duas diferenças:
Não era interrogada
e por descuido podiam pisá-la.
mas aos dois intencionalmente
podiam pôr-nos de rastos
mas não podiam
ajoelhar-nos. [...]
Disponível em: <http://br.geocities.com/poesiaeterna/poetas/
mocambique/josecraveirinha.htm>. Acesso em: 20 ago. 2009.

350 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 350 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

“Aforismo” significa “sentença” ou “penitência”, Craveirinha representa,


nesse fragmento, a angústia da condenação a que foi submetido. Representa,
ainda, as humilhações causadas pelo colonizador, revela que o tratado recebido
por ele o fez sentir como um ser insignificante, representado e igualado ao inseto
que se arrasta pelo chão. O poema, escrito no tempo pretérito, “havia”, “está-
vamos”, “podiam”, expressa uma ação que passou, portanto existe o agora,
que é a conquista pela liberdade.

Saiba mais

Para ter acesso na íntegra aos textos do poeta José Craveirinha, que foi um
representante importante da poesia de Cabo Verde, acesse o sítio <http://
www.jornaldepoesia.jor.br/cravei.html>. Leia sobre o autor, pesquise sobre
seus textos e tente encontrar neles que as características que apresentamos
neste capítulo.

Outro autor importante da literatura moçambicana é Eduardo White


também é considerado um nome expressivo na poesia moçambicana, desde
os anos de 1980.

5. 3 Eduardo White
White nasceu em 21 de novembro de 1963 em Quelimane, capital da
Zambézia.
Sua obra tem uma qualidade apurada na linguagem e na coerência da
concepção literária (CHAVES, 2005). Escreveu a edição em separado do
poema Homoíne: amar sobre o Índico (1984), O país de mim (1988), Poemas
da ciência de voar e da engenharia de ser ave (1992), Os materiais do amor
seguido de o desafio à tristeza (1996) e Janela para oriente (1999), Dormir com
Deus e um navio na língua (2001), As fadas do escorpião (2002) e O homem
a sombra e a flor e algumas cartas do interior (2004). Todas essas obras são
curtas, mas demonstram a densidade do que Eduardo White tem a dizer. São os
sentidos guardados no espaço que a sua palavra cuidada e sedutora desvela.
Para Chaves (2005), a poesia de White se distingue no contexto da
produção em que se insere pela presença maciça da temática amorosa, fator
que o distancia da profunda marca social que nos habituamos a ver destacada
na literatura de Moçambique.
A poesia de Eduardo reflete a energia de um espaço histórico em flagrante
processo de estruturação. Esses reflexos são a história de seu país, a situação
dramática de seu povo e a necessidade de intervir de alguma maneira.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 351

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 351 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

No fragmento a seguir da obra O país de mim, você poderá perceber as


indagações sobre o amor.

[...] Porquê o amor em meus poemas sempre?


Porquê essa paixão suprema?
Não te perguntes,
Não te expliques,
Inventa e experimenta.

Digo-te:
– Eu já amava e escrevia versos
Nas paredes do útero de minha mãe [...]

Fonte: Chaves (2005, p. 217)

Nesse fragmento, amar e escrever versos são como duas incógnitas de uma
mesma equação. Para Chaves (2005), ao lado da rebeldia de seus poemas, a
aposta de Eduardo White é na crença, na necessidade de resistir e na possibi-
lidade de fazê-lo.
Em seus poemas, inscrevem-se sinais da confiança numa réstia de espe-
rança. Contrariando a tendência ao pessimismo a que a desmedida tragédia
convida sua poesia, mergulhada num tempo e num espaço definidos, procura
detectar sintomas que possam justificar a busca da beleza que é, afinal, uma das
manifestações da relevância do amor.
Concebida também como magia, essa poesia confronta-se com o esforço
pela ruptura dos limites postos pelas contingências do que é humano (CHAVES,
2005). Nesse constante debruçar-se sobre a escrita, a consciência sobre o lugar
do poeta no mundo é alimentada num jogo que inclui elementos externos e
influxos intensos à própria natureza da literatura na sua contemporaneidade.

Saiba mais

Se você deseja saber mais sobre a vida e a obra desse importante es-
critor moçambicano, acesse o sítio <http://books.google.com.br/
books?id=Fpe4L4zKu9MC&pg=RA2-PA63&lpg=RA2PA63&dq=Eduardo
+White+o+pa%C3%ADs+de+mim&source=bl&ots=wynHK0HvAC&sig=-
sorh4RYmRX3XyiknyfMrbp5fQ4&hl=pt-BR&ei=Nd2uSpejGdPQlAeYnJTvBg
&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=9#v=onepage&q=Eduardo%20
White%20o%20pa%C3%ADs%20de%20mim&f=false>. Nesse sítio, você
encontrará um estudo de Rita de Cássia Natal Chaves sobre o autor.

352 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 352 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

A seguir, você estudará sobre Honwana, outro escritor moçambicano de desta-


que e que também fez de sua literatura uma luta pela independência de seu país.

5.4 Luís Bernardo honwana


Escritor moçambicano, cujo nome completo é Luís Augusto Bernardo Manuel,
nasceu em 1941, em Lourenço Marques (atual Maputo). Frequentou o Liceu de
Moamba e exerceu a profissão de jornalista. Publicou, em 1964, um livro de
contos Nós matamos o cão tinhoso, considerado uma das obras mais marcantes
da literatura moçambicana.
Também participou ativamente da luta pela independência de seu país. Essa
luta é a força que alimenta os contos reunidos na obra Nós matamos o cão
tinhoso, no qual é prestada uma homenagem a todos os que o precederam e se
sentem herdeiros dessa terra. Honwana percebe todos os contornos e as carac-
terísticas do colonialismo que serviram de contribuição para que a geração
de 1960 agarrasse a luta por Moçambique. A grande repressão imposta por
Portugal a todos os jovens que desejassem ascender culturalmente diminui e, na
análise de Honwana, o contingente dos nacionalistas, advindos da burguesia
local, é um ponto positivo na luta pela independência.
Em Nós matamos o cão tinhoso, o que interessava para Honwana eram as
pequenas histórias humanas, em que ele reconhece pequenos contos. Nesse livro
de contos, estão histórias carregadas pela inquietude vivida pelo povo moçambi-
cano antes da independência do país. Foi na ordem estabelecida do pós-guerra
que Honwana se inspirou e buscou escrever as pequenas histórias humanas.
Você pode conferir um fragmento do conto A Velhota retirado do livro Nós
matamos o cão tinhoso, de Honwana.

A Velhota
A velhota era insípida e os miúdos eram chatos e barulhen-
tos, sempre com porcarias para resolver. Claro que isso
não era nada que se comparasse àquilo do bar, de há bo-
cado, ou de todos os outros bares, restaurantes, átrios de
cinemas ou quaisquer outros lugares no género em que to-
dos me olhavam duma maneira incomodativa, como que a
denunciar em mim um elemento estranho, ridículo, exótico e
sei lá o que mais. Que nojentos! E eu sem poder rebentar
exactamente por causa do raio da velhota e dos ranhosos
dos miúdos! Aquilo do bar, ainda há bocado, era afinal o
que se passava: eu não consegui bater o tipo porque ele
era todos os outros, e exactamente como isso é que ele me
bateu. Não adianta contemporizar, tudo é a mesma coisa.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 353

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 353 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Mesmo os que têm a mania de que fazem excepção só são


isso em campos neutros ou quando tenham necessidade de vir
até mim, porque, em volta deles edificam muros de tabus e
defendem-se com os mesmos nojentos olhares enojados sempre
que alguém vai para além desses muros. Eu que o diga! Eu
precisava de ir para casa. Ia comer arroz e caril de amen-
doim como eles queriam que fizesse, mas não para encher a
barriga. E precisava de ir para casa para encher os ouvidos
de berros, os olhos de miséria e a consciência de arroz com
caril de amendoim. Sentada na esteira a velhota estava quie-
ta, a ver os miúdos a comer. De vez em quando levantava-se
um e vinha trazer-lhe o prato de alumínio para ela servir-lhe
mais. Foi de uma dessas vezes que a velhota deu comigo.
Estava com a colher de pau erguida, cheia de arroz, e ia
despejá-lo no prato, quando parecendo lembrar-se de qual-
quer coisa, se virou para a porta. Logo que me viu esprei-
tou para o fundo da panela e perguntou-me se queria comer.
— Ainda não sei se quero comer ou não — respondi. Virou-se
para o lume, demorou-se um bocado a olhar para as chamas
com a concha ainda no ar e depois perguntou:
— Estás zangado? Estás tão zangado que não podes comer e
nem sabes se queres ou não?...
— Não, não estou zangado.

Saiba mais

Para ler esse conto na íntegra, acesse o sítio <http://www.macua.org/


livros/caotinhoso.html>. Nele você poderá ler o conto e saber mais infor-
mações sobre esse autor e sua produção literária.

Você pôde perceber a preocupação com o humano, por meio da exposição


da fome, do estado das coisas, como a casa e os lugares da casa, além da
forma como a velhota se relaciona com o ambiente e as pessoas.
Esses são alguns aspectos da obra de Honwana que, como todos os autores
envolvidos nas questões da luta pela libertação de seu país, também esteve
engajado nas transformações políticas e culturais vividas por Moçambique.
Mudanças que a literatura soube expressar e representar muito bem. Todas
essas representações contribuíram para a formação de uma identidade moçam-

354 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 354 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 5 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

bicana. As questões envolvendo o aspecto da identidade ganharam força, mas


se enquadraram, de acordo com Chaves (2005), num espaço de tensão que
foi expresso na literatura, fazendo-se, assim, o movimento identitário num solo
de mudança. Se o continente revela abalos e assimetrias, a ilha convida a uma
paragem, um exílio que, afinal, nem chega propriamente a ser (CHAVES, 2005).
Mergulhar na história dos povos, para Chaves (2005), é perceber a sucessão
de impasses que esses povos enfrentaram e observar que, no conjunto das rela-
ções ali processadas, as cores da violência tingem o desenho da contradição
que é, afinal, a marca essencial de sua existência.
A literatura foi a ponte que evocou e estabeleceu um vínculo de libertação,
pois no palco da colonização, os confrontos entre os dois universos culturais,
entre dois modos de estar no mundo, como colonizado e como colonizador,
resultaram em conflitos que culminaram nas lutas pela independência.
Neste capítulo, você estudou sobre a história e a identidade de luta pela
independência de Moçambique e pôde conhecer alguns escritores representa-
tivos que, por meio da literatura, conscientizaram o povo sobre os ideais de
liberdade diante do colonizador.
No próximo capítulo, você estudará sobre a relação da literatura brasileira
com as literaturas africanas de expressão portuguesa, principalmente no que se
refere aos autores brasileiros referendados e parodiados por autores africanos.

Referências
A POESIA eterna. José Craveirinha. Disponível em <http://br.geocities.com/
poesiaeterna/poetas/mocambique/josecraveirinha.htm> Acesso em: 22 set.
2009.
CHAVES, Rita. Angola e Moçambique: Experiência colonial e territórios literá-
rios. São Paulo: Ateliê Editorial, 2005.

Anotações

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 355

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 355 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
O Brasil e as Literaturas

6
CAPÍTULO 6 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Africanas de Língua
Portuguesa

Introdução
Este capítulo tem como objetivo proporcionar a você um panorama das
relações de influência da cultura brasileira nas Literaturas Africanas de Língua
Portuguesa, principalmente no que tange a alguns autores que foram citados por
escritores africanos.
A interação entre as culturas brasileira e africana vai além das raízes da
colonização portuguesa, fator que já identifica o Brasil com os países africanos
de Língua Portuguesa. Destacamos, neste capítulo, alguns escritores brasileiros
que despertaram o interesse dos escritores africanos.
Nesse âmbito, encaixa-se a produção nacional conhecida como prosa regio-
nalista de 1930, e os autores contemplados pelos escritores africanos foram
Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, Érico Veríssimo e,
principalmente, Jorge Amado. Esses escritores estão ligados aos escritores afri-
canos pela forma de denúncia das contradições sociais, do sofrimento “da gente
pobre” e das injustiças sociais. Dessa forma, a literatura é uma ponte para as
transformações necessárias e abre um caminho de ligação importante com as
literaturas africanas de expressão portuguesa.
Para você compreender bem este capítulo, é necessário que tenha compreen-
dido os capítulos anteriores e estar ciente do processo de colonização sofrida, não
só pelos países africanos, mas pelo Brasil e a forma em que se deu a independência
dos países africanos colonizados por Portugal e a independência brasileira.

6.1 O Brasil como inspiração


O Brasil também foi fonte importante de inspiração para os africanos que
propugnavam uma forma de independência e ruptura definitiva com a metró-
pole. Em Moçambique, por exemplo, o modelo de independência brasileiro
esteve no pensamento de personagens importantes que desejavam a liberdade
dos países africanos colonizados.
De acordo com Chaves (2005), o inventário das relações entre Brasil e
o continente africano é um capítulo ainda a ser escrito em nossas histórias.
Para ela, no domínio cultural, as marcas africanas aqui são visíveis, justificando
grande interesse por estudos por parte da academia.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 357

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 357 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 6 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Saiba mais

Se você deseja saber mais sobre os estudos sobre a relação da literatura


africana com a literatura brasileira, leia os livros Os Agudás, de Milton Gu-
rán, e a obra Diálogos brasileiros: uma análise da obra de Roger Bastide,
de Fernando Peixoto.

Na literatura africana dos países de Língua Portuguesa, aos olhos dos


angolanos, dos caboverdianos e dos moçambicanos, o Brasil, segundo Chaves
(2005), emergia como um espaço no qual se projetavam os sonhos de uma
sociedade marcada pelas limitações presentes no quadro de exclusão da reali-
dade colonial.
Sob o signo da paixão, o escritor Ernesto Lara Filho declara a energia de sua
ligação com o Brasil, o que fica claro nas páginas de suas crônicas. Vejamos o frag-
mento de uma delas, extraído dos comentários e estudos de Chaves (2005, p. 277):

Sou uma espécie de brasileiro. Um angolado, nascido em


Benguela, filho de pai minhoto. Um português de Angola, que
conhece melhor Érico Veríssimo, José Lins do Rego e Gracilia-
no Ramos do que Eça de Queiroz e Aquilino Ribeiro.
Sou um angolano capaz de sentir o Brasil, capaz de recitar
de cor um poema de Manuel Bandeira, capaz de sambar
com intenção ao som de uma marchinha de Luiz Gonzaga,
ouvindo o bater ritmado dum tambor com acompanhamento
de reco-reco.

Nesse fragmento, você pôde observar claramente a ligação e a referência


ao Brasil, não só de seus traços culturais, mas de autores representativos da
literatura brasileira.
Na continuação do texto, Ernesto Lara Filho declara, ainda, o seu amor ao
Brasil, “amo o Brasil”. Um amor que não tem explicação, principalmente quando
está ligado às raízes e à identidade cultural, um amor que transcende ao pessoal
e passa para a coletividade, realizando um projeto unificador de universos
distantes, mas ligados pela imagem cultural e histórica. Mesmo passados quase
dois séculos de nossa independência política, para Candido (1981), os funda-
mentos da nacionalidade e sua repercussão no processo cultural brasileiro ainda
é motivo para estudos e ensaios.

358 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 358 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 6 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Nos países africanos colonizados por Portugal, sem perder a diversidade,


observamos um processo similar, tingido por cores mais fortes. Mesmo tendo
conquistado a independência política em meados dos anos de 1970, países
como Angola e Moçambique confrontam-se ainda com o legado do processo
colonial que, segundo Chaves (2005), prolongou-se e pautou-se por um sistema
de exploração intensificado, também, pela precariedade da metrópole, ela
própria cada vez mais empobrecida e atrasada.
Craveirinha, ao expressar o seu sentimento de amor e identidade em relação
ao Brasil, diz:
Eu devia ter nascido no Brasil. Porque o Brasil teve uma influência
muito grande na população suburbana daqui [...] desde o futebol.
Eu joguei bola com jogadores brasileiros, como, por exemplo [...],
o Leônidas da Silva, inventor da bicicleta. Nós na escola éramos
obrigados a passar por um João de Deus, um Dinis, os clássicos
de lá (CHAVES, 2005, p. 282).

Por intermédio das palavras de Craveirinha, percebemos mais e mais as


ligações que corroboram com o Brasil. São as letras de um lado e o esporte de
outro influenciando as vivências, numa configuração ligada à identidade.
Além do esporte e das letras, há, ainda, a música, em uma projeção que
alimentava o povo e continha um repertório que atingia diversas camadas
sociais, penetrando profundamente e de forma abrangente no imaginário de
“significativas parcelas da população urbana ou periurbana desses territórios”
(CHAVES, 2005, p. 283).
No fragmento, a seguir, retirado do livro Encontros com escritores (CHAVES,
2005), veremos o retrato de uma dialética que serviu de fonte de inspiração.
O Brasil funcionou de uma maneira muito interessante. Havia, da
parte do próprio governo português, uma maneira de amolecer
um pouco os nossos corações: pondo música brasileira.

Podemos verificar que o Brasil também serviu de fonte de inspiração para o


poder de a metrópole acalmar os ânimos das colônias africanas.
Segundo Chaves (2005), os nacionalistas, naturalmente, apostavam na
independência como um pressuposto para realizar a utopia que o Brasil parecia
representar.
Os mais críticos incorporavam, nos dizeres de Chaves (2005), a concepção de
literatura de denúncia que o chamado romance de 1930 praticava. Atraía-os a possi-
bilidade de transformar em personagens os seres socialmente excluídos, os negros,
os mulatos marginalizados pelo código colonial. Convertê-los em protagonistas de
mudanças, em contraposição ao lugar de mero elemento do cenário que lhes era
reservado na literatura colonial, era um modo de defender a humanidade.
Nos dizeres de Calane da Silva citado por Chaves (2005), com a perspec-
tiva que o afastamento temporal propicia, podemos compreender que mais do

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 359

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 359 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 6 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

que uma força de relaxamento, a ressonância da cultura brasileira disseminou


energia para a ruptura protagonizada pelos nacionalistas africanos. No campo
da literatura, talvez seja mais correto dizer que as opções em curso na produção
de nossos escritores viriam confirmar algumas das aspirações já presentes entre
os escritores de Angola e Cabo Verde, por exemplo.
Carlos Everdosa se refere “a um grito do Ipiranga”, que chegava a esses
territórios como uma força legitimadora da identificação da atividade literária
com o destino da gente mais oprimida. Esse era um dos sentidos da autonomia
desejada, o que colocava em foco, de acordo com Chaves (2005), o sério
problema do tratamento da língua a ser usada na expressão de seu mundo.
Desde os fins de 1940, as obras comprovam uma clara afinidade das
escolhas. A valorização do registro popular, segundo Chaves (2005), em detri-
mento do respeito à gramática da norma culta, um dos tópicos defendidos pelos
modernistas, definiu-se como uma boa solução ao impasse gerado pela situação
linguística, pois, se a expressão em Língua Portuguesa colidia com a busca de
valores refratários à cultura imposta pela colonização, por outro lado, por outras
razões, o recurso das línguas nacionais mostrava-se inviável.
A apropriação da língua, aproximando-a da “língua errada do povo/
língua certa do povo”, como nos dizeres de Manuel Bandeira, adequava-se ao
sentimento experimentado pelos escritores africanos. E já que citamos Manuel
Bandeira, é importante que você relembre as paródias feitas pelos escritores
africanos de poemas brasileiros.
A admiração provocada pelos brasileiros não se limitou, como você já
estudou, aos regionalistas, nem mesmo aos ficcionistas, mas também conquistou
espaço na poesia. E foi por meio do lirismo de Manuel Bandeira, que os escri-
tores africanos se viram apaixonados por Pasárgada, o topônimo da fantasia
cantado pelo poeta pernambucano num de seus mais famosos textos tornou-se
uma recorrência da poesia caboverdiana.
As temáticas de Manuel Bandeira, segundo Chaves (2005), mobilizaram os
escritores do arquipélago. Ao seu lado, situavam-se ainda Carlos Drummond de
Andrade, Jorge de Lima e Ribeiro Couto.
Essa identificação, explicada também pela raiz colonial de nossos povos,
foi alimentada pelos meios de comunicação. A Revista O cruzeiro, por exemplo,
teve um papel notável na formação cultural dos africanos nas décadas de 1950
e 1960. Mesmo com a influência do discurso colonialista, os nacionalistas afri-
canos, em sua opção pelo Brasil e sua cultura, ficaram apenas com os aspectos
que poderiam contribuir para a sua luta. De acordo com Chaves (2005, p. 271),
Felizmente, para os movimentos nacionais e para a nossa autoes-
tima, seria triunfante a imagem propícia à ruptura, à libertação.
No plano sociopolítico, prevaleceria a aposta na certeza de que
uma sociedade mais democrática e com justiça social era incom-

360 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 360 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 6 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

patível com a manutenção do império. No terreno literário, os


princípios escolhidos por Mário de Andrade (o brasileiro) para
uma síntese do nosso Modernismo – a atualização da inteli-
gência brasileira, a estabilização de uma consciência nacional e
o direito permanente à pesquisa – adequavam-se ao momento em
que se pode detectar um processo de modernização da literatura
africana de Língua Portuguesa.

A questão da afirmação de uma identidade, presente em nossos moder-


nistas, era um dado central nas reflexões dos africanos. Graças às ligações
estabelecidas entre os grupos empenhados pela libertação de seus países e
setores progressistas brasileiros, o diálogo no campo da literatura seria também
reforçado no plano da política. Essa ligação estabelecida pela literatura acaba
por marcar uma espécie de travessia, ou ligação, entre Brasil e África.
Para Chaves (2005), essa travessia foi inaugurada sob o signo da dor e da
exploração, cruzando os séculos, realizou-se no compasso de diferentes ritmos e
materializou-se em trocas de natureza vária.
Em todos esses séculos de história comum, o Brasil, inicialmente uma marca
de exílio, ligado ao sofrimento e morte, foi convertido em lugar da boa convi-
vência racial, liberdade e solidariedade, apontando para um terreno utópico,
como você pôde verificar em vários depoimentos de autores africanos, neste
capítulo.
Todas as rotas foram revitalizadas nessa utopia que desempenhou uma função
excepcional na real transformação da realidade das ex-colônias africanas.
É nas questões que envolvem a discussão sobre o tema da identidade,
ligação forte entre o Brasil e África, que encontramos, como esclarece Chaves
(2005), nos mais representativos pensadores, a convicção de que, sobretudo
entre os povos vitimados pela empresa colonial, a construção da identidade é
um processo em curso.
Segundo Chaves (2005), é nesse itinerário, que os efeitos dos gestos práticos
interagem com as formas simbólicas, o que significa dizer que “ao teatro do real”
se associam as voltas do imaginário, espaço importantíssimo na relação entre o
colonizador e o colonizado. O Brasil foi uma representação desse espaço que
se projetou de maneira extraordinária para a África.
E, felizmente, inclusive para nossa autoestima, contrariando
a perspectiva da metrópole, entre os vários brasis que lá
iam desembarcando, os escritores africanos souberam cata-
lisar numa chave progressista as imagens que convidavam à
mudança. E o seu impulso para a transformação permite, inclu-
sive, compreender como a nossa realidade – povoada pelas
injustiças e pelos preconceitos que conhecemos – acabou por se
converter num vetor de mobilização para a consecução de um
projeto conduzido pelo sentido da liberdade e outras utopias
(CHAVES, 2005, p. 285).

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 361

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 361 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 6 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Ficam bem delimitadas as questões que ligaram e fizeram do Brasil um país


de referência por meio da sua literatura para os escritores africanos, além, é
claro, das ligações históricas de colonização dos países africanos e do Brasil.
Neste capítulo, portanto você estudou sobre a ligação entre Brasil e África,
ou seja, viu a ligação existente entre a literatura brasileira e as literaturas em
expressão portuguesa na África. No próximo capítulo, você estudará aspectos
ligados ao pós-colonialismo, à alteridade e ao multiculturalismo.

Referências
CÂNDIDO, Antônio. Formação da Literatura Brasileira. 6. ed. Belo Horizonte:
Itatiaia, 1981.
CHAVES, Rita. Experiência colonial e territórios literários. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2005.

Anotações

362 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 362 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
7
CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Pós-colonialismo, alteridade
e multiculturalismo

Introdução
Este capítulo tem como objetivo levar você a compreender alguns conceitos
ligados ao pós-colonialismo e a sua historicidade, bem como as representações do
que sejam alteridade e multiculturalismo nas literaturas de expressão portuguesa.
Para você acompanhar este capítulo, é preciso que tenha entendido toda a
trajetória teórica apresentada nos capítulos anteriores, em relação aos países
africanos de literatura portuguesa. Busque compreender o processo de coloni-
zação desses países e o processo de independência, pois essa caminhada repre-
senta a alteridade e o multiculturalismo no pós-colonialismo, temas que iniciamos
nos capítulos anteriores e que aprofundaremos neste capítulo.
A alteridade, na África, surge como uma condição de hierarquia, de
subjugo, relacionada com o conflito gerado pelas relações entre o colonizado e
o colonizador.
É diante do fato de usar a expressão da metrópole, não apenas no seu aspecto
discursivo, mas também no seu aspecto comportamental e ideológico que ocorre
para o africano uma notória visualização de algo em desajuste em relação ao
ambiente europeu que ele constrói. A partir disso, ocorre a sua busca pela alteridade
e a descoberta, por intermédio dessa alteridade, da diversidade multicultural.

7.1 A alteridade
O fenômeno da alteridade na literatura de expressão portuguesa na África
é representado por uma tensão criativa na busca pela identidade, em que a
chamada africanização do elemento linguístico, a Língua Portuguesa, se confi-
gura numa grande força para a construção dessa mesma alteridade.

A palavra alteridade significa se colocar no lugar do outro, na relação inter-


pessoal considerando fatores como valorização, identificação e diálogo. A
alteridade se dá, na prática, no relacionamento entre os indivíduos perten-
centes a grupos culturais, religiosos, científicos e étnicos distintos.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 363

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 363 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

A grande flexibilidade fonética da Língua Portuguesa eliminou, na maior


parte, o abismo entre o “querer dizer e o poder dizer”, dando ao africano a
possibilidade de construir sua forma de expressar sem abrir mão de suas quali-
dades e especificidades culturais.
Na realidade, a alteridade nas literaturas africanas de expressão portuguesa
é um processo que representa tanto uma técnica, quanto um tema. Ela apresenta
aspectos literários, sociais e humanos, ou seja, ela é uma alteridade discursiva que
busca libertar o colonizado de todos os pontos de vista impostos pelo colonizador,
sejam eles éticos, estéticos, psicológicos ou culturais que, por fim, representaram
uma fragmentação cultural que a metrópole (Portugal) impôs às suas colônias.
A alteridade ficará representada na tentativa de resolver a angústia existen-
cial caracterizada e expressada nos escritos de representatividade africana. O
escritor africano, conforme foi se conscientizando, passou a recorrer à ancestra-
lidade e à infância na busca do “eu” como forma de alcançar esse reconheci-
mento por meio da linguagem.

Saiba mais

Se você deseja saber mais sobre o tema da alteridade, acesse o sítio


<http://www.adital.com.br/site/noticia2.asp?lang=PT&cod=7063>.
Nele, você encontrará um texto de Frei Beto sobre o assunto. Esse texto
procura enfocar as relações de alteridade no Brasil, trabalha as questões
pertinentes à cultura religiosa e aos aspectos sociais de nosso povo.

Você já estudou, em capítulos anteriores, que as literaturas africanas de


expressão portuguesa surgem, também, da negação da tentativa, por parte da
denominada metrópole, de impor seu modo de vida e de organização social e
cultural sobre a colônia.
Na busca pela alteridade, o africano quer retratar o que tem de peculiar
e contribuir para a história, não como um representante ou um mero simulacro
do colonizador, no caso, Portugal. Todas as vozes africanas têm um objetivo
comum: a libertação do jugo colonial e a conquista da sua dignidade como
indivíduos e como sociedade.
Um elemento muito importante na alteridade africana, no caso específico da
literatura é o “eu” africano no embate com o “outro”, representado pelo europeu
“africanizado”.

A expressão “africanizado” é um termo que designa aqueles que, embora


pertencentes ao estatuto de colonizadores, por várias razões, como étnicas,

364 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 364 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

sociais, econômicas, tinham ideologias africanas, contribuindo, inclusive,


para a sua libertação.

Veja, no poema de Craveirinha, a referência à prisão e à necessidade de


uma identificação por meio do uso da palavra. Esse poema pode ser utilizado
como forma de busca por desencadear e estabelecer um diálogo com a liberdade
demonstrando a necessidade gritante de ver-se liberto do colonizador. A prisão é
uma forma de inspiração e um grito contra o que lhe foi imposto, como a privação
de sua liberdade, que representa a privação da liberdade de todo um povo.

Cela 1
José Craveirinha
[...] Aqui estou neurastênico
Como um cão
Danado a lamber a salgada
Crosta das velhas feridas
E em que língua
E com que rosto
Aos meus filhos órfãos de pai
Eu vou dizer que se esqueçam? [...]
(CRAVEIRINHA, 1980, p. 10)

No poema de Craveirinha, ao se referir à prisão, o eu poético não estabe-


lece uma relação apenas com a sua pessoa, mas a prisão funciona como um
elemento de metonímia, ou seja, uma figura de linguagem que tem como objetivo
substituir uma palavra ou expressão por outro sentido, havendo entre eles uma
relação de lógica. Assim a palavra prisão não se refere apenas ao sentimento de
estar preso do eu poético, mas ao sentimento de prisão de todo um povo.

Saiba mais

Para você ter acesso a outros fragmentos e comentários sobre o texto de


Craveirinha, acesse o sítio <http://ricardoriso.blogspot.com/2007/11/
craveirinha-e-malangatana-comunicao.html>. Para você saber mais sobre
alteridade e representatividade africana, acesse o sítio <http://www.uesc.
br/seminariomulher/anais/PDF/Mesas/Maria%20Aparecida%20Andra-
de%20Salgueiro.pdf>.

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 365

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 365 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Todas as representações em relação ao desejo e à busca pela independência


e a alteridade expressada por meio da imagem da prisão e sua identificação
com o sofrimento do povo africano mostram o universo de José Craveirinha,
escritor tão envolvido com sua terra e sua gente. Se você reler o fragmento
anterior, observará que o poema tem uma característica que é o tom narrativo
próprio dos poemas desse autor. São escritores como Craveirinha, engajados
na luta pela libertação, que contribuem para a consciência de um povo e sua
posterior libertação.
No próximo tópico, você estudará um pouco sobre o pós-colonialismo e os
novos cenários que surgem a partir dele.

7. 2 O pós-colonialismo, novas realidades e multiculturalismo


Você já compreendeu, no decorrer dos capítulos, que, em todos os territó-
rios africanos colonizados por Portugal, a produção literária chamada nacional
nasce sob o signo da reivindicação, trazendo para si a função de participar no
esforço de construir um espaço de discussão sobre a condição colonial.
Nos textos angolanos, encontramos, desde o século XIX, aquilo que se esta-
belece, por exemplo, em Moçambique a partir dos anos 1930. Uma prática lite-
rária mediada pelo compromisso com algo que, sem desconsiderar a dimensão
estética dos textos, busca ultrapassá-la, empenhada em potencializar seu poder
de intervenção (CHAVES, 2005).
Mesmo tendo alcançado pela via das armas, a independência, perseguida por
tanto tempo, os países africanos colonizados não conseguiram pôr um fim definitivo
nos quadros de acirradas contradições. O peso das relações fundadas, a partir
da ocupação portuguesa, repercute no presente, seja na ligação com a realidade
diária, seja na relação dos bens simbólicos ali gerados e que ali circulam.
Chaves (2005, p. 286), ao refletir sobre esse aspecto, nos diz que
O que se passa na relação entre os homens tem inequívocas
marcas no domínio das obras por eles produzidas, e desse
sistema não pode escapar a construção literária. Examinar a
trajetória da vida literária nesses países é, portanto, um modo de
compreender a verticalidade da contradição como marca consti-
tutiva do processo colonial.

Com as independências dos países africanos colonizados por Portugal, uma


nova geração de escritores dá um impulso à prosa, com a utilização de novos
estilos e novas estéticas, proporcionando uma nova visão de mundo.
Uma nova realidade começou a surgir e a deixar para trás as lutas liberta-
doras nacionais. Angola, por exemplo, no período de transição, tem a primeira
novela Mestre Tamoda, de 1974, do escritor Agostinho André Mendes Carvalho,
assinada Uanhenga Xitu, nome kimbundo do escritor.

366 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 5ª PROVA – 16/12/2009 –1 of 1 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________


CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

Pepetela, Manuel Rui Monteiro, Manuel dos Santos Lima e José Sousa Jamba
são alguns dos autores representativos da literatura pós-independência, que você
já teve oportunidade de estudar em capítulos anteriores.
Nessa nova etapa, a narrativa moçambicana tem seu representante, de
início, em Albino Magaia, autor da novela Malungate, de 1987. Ainda dessa
geração, temos um autor que enfatiza e denuncia a tirania e o terror Ungulani
Ba Ka Xosha.
Ao contrário de como a independência era retratada em escritos ante-
riores, agora a mensagem de independência tem um caráter voltado para uma
mensagem de paz. Os autores estavam dispostos a utilizar o português, língua
colonizadora, como uma representação do idioma e da unidade nacional.
Nos musseques, bairros de Angola, por exemplo, a sintaxe do português é utili-
zada e, entre os seus principais escritores da moderna literatura angolana, desta-
cam-se Cordeiro da Matta, Assis Júnior, Viriato da Cruz, Mário Pinto de Andrade,
António Jacinto, Agostinho Neto e Luandino Vieira, este último já estudado por
você em capítulos anteriores, além do mencionado Pepetela, entre outros.
Já em Cabo Verde, a representação da literatura pós-colonialismo esteve
ligada ao movimento literário que se formou em torno da revista literária
Claridade, revelando autores como Baltazar Lopes da Silva, Manuel Lopes, José
Barbosa, Antonio França e Germano Almeida, entre outros.

Saiba mais

Para você saber mais sobre o tema do pós-colonialismo e o multicultura-


lismo, acesse o sítio <http://www.webartigos.com/articles/17843/1/o-
multiculturalismo-e-a-ciencia-os-discursos-e-as-tendencias-no-contexto-entre-a-
filosofia-e-as-ciencias-sociais/pagina1.html>. Nesse artigo, você terá uma
visão geral sobre multiculturalismo, além de uma definição sobre o tema
ligado às questões políticas e sociais com relação à identidade cultural.

A consciência pós-colonial é confrontada com situações que representam


uma reedição, por assim dizer, de objetivos e métodos do antigo período colo-
nial, numa troca pelo novo período, designado pela pós-independência.
Essa demanda reporta-se a uma imposição que o escritor tem com o fato de
consumir seus próprios preconceitos. Por isso, Luandino Vieira faz emergir de
seus personagens um contexto de tendência monolíngue, representado por uma
cultura urbana e resultado também de um processo de multiculturalismo, repre-
sentado na língua (ALMEIDA; ALMEIDA; CAETANO, 2009).

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 367

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 367 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

A poesia dos países lusófonos foi de grande representatividade na lírica afri-


cana, resultado de uma expressão livre que visava a conjugar o multiculturalismo,
resultando numa transformação do português e criando uma língua própria.
Stuart Hall (2003, p. 52-53) afirma que
Na verdade, o “multiculturalismo” não é uma única doutrina, não
caracteriza uma estratégia política e não representa um estado
de coisas já alcançado. Não é uma força disfarçada de endossar
algum estado ideal ou utópico. Descreve uma série de processos
e estratégias políticas sempre inacabados.

O multiculturalismo só é possível na representação daqueles que se estru-


turaram nas lutas sociais por meio de todos os que experimentaram a discrimi-
nação e o preconceito, por exemplo, nas sociedades colonizadas.
Segundo as concepções e os estudos de Hall (2003, p. 53), existem
[...] inúmeros tipos de multiculturalismo como o conservador,
liberal, pluralista, comercial, corporativo e crítico. Pode-se afirmar
que o multiculturalismo conservador pressupõe a assimilação
da diferença às tradições, costumes e experiência da maioria,
aceitando-as e respeitando-as. O liberal por sua vez, insere na
minoria nos padrões da maioria, com as diferenças toleradas no
campo particular, sem reconhecê-lo na esfera pública. Enquanto
que o pluralista pondera que cada grupo deve viver dividido,
ou seja, cada um com a sua identidade, mas não está inserido
com os demais. De forma similar, o multiculturalismo industrial
argumenta que as diferenças surgem em “nichos” de mercado,
dada a importância de fornecer os desejos destes nichos. É inte-
ressante notar que os anseios das minorias para estancá-las é a
missão do multiculturalismo corporativo.

Nesse processo, é importante que você entenda que “cultura” e “identidade”


sempre foram pontos importantes para os países de literaturas de expressão
portuguesa, foram aspectos que influenciaram a literatura como um processo
contínuo da representação da liberdade e da alteridade.
O multiculturalismo representa uma mistura de culturas e é configurado
como uma nova sensibilidade cultural e crítica. A política do multiculturalismo
resiste à homogeneidade cultural e submete outras culturas que coexistem numa
diversidade cultural e étnica e formam a identidade de uma nação.

Saiba mais

Para você pesquisar sobre pós-colonialismo e poder comparar com os es-


tudos feitos neste capítulo, acesse o sítio <http://www.omarrare.uerj.br/
numero8/inocencia.htm>. Nele, você terá acesso a um artigo sobre a obra
A crítica literária africana e a teoria pós-colonial: um modismo ou uma

368 7º PerÍOdO • LeTrAs • UniTins

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 368 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________
CAPÍTULO 7 • LiTerATUrAs de exPressãO POrTUgUesA

exigência, de Inocência Mata. Esse artigo discute algumas questões sobre


a literatura pós-colonial e a literatura produzida atualmente nos países afri-
canos de Língua Portuguesa.

Entender o multiculturalismo é compreender e observar o “indivíduo” fora


de sua “prisão social”, reconhecer sua democracia, seus direitos coletivos e
também individuais, tendo a clareza de que seu cotidiano cultural sempre estará
permeado por lutas e conflitos ocasionados pelas diferentes relações que refletem
na pluralidade cultural.

Referências
ALMEIDA, Dalva Pontes de; ALMEIDA, Raquel Pontes de; CAETANO, Marcelo
Morais. Considerações sobre as Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa.
Soalternativas, ano IX, n. 17. São Gonçalo: 60 UERJ, jan./jun.2009.
CHAVES, Rita. Experiência colonial e territórios literários. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2005.
CRAVEIRINHA, José. Cela 1. Lisboa: Edições 70, 1980.
HALL, Stuart. Da diáspora: identidades e mediações culturais. Belo Horizonte:
UFMG, 2003.

Mensagem final
Espero ter atingido suas expectativas e contribuído, por meio desta disciplina,
para ampliar sua visão e seu conhecimento sobre a formação das Literaturas
de Expressão Portuguesa. Continue estudando os conteúdos de literatura como
forma de aplicá-los em sala de aula.
Abraços fraternos e desejos de sucesso!

Anotações

UniTins • LeTrAs • 7º PerÍOdO 369

06 LETRAS – 7º PERÍODO – 4ª PROVA – 03/12/2009 – 369 of 438 APROVADO NÃO ( ) SIM ( ) ____________

Vous aimerez peut-être aussi