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Este relatório foi elaborado por:
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SUMÁRIO
Introdução Geral .................................................................................. 1
Parte I ........................................................................................... 4
Parte II ........................................................................................ 41
Resultados ............................................................................................ 50
Parte IV ....................................................................................... 86
Reuniões de trabalho.....................................................................88
Visitas de campo...........................................................................89
ii
Caracterização arquitetônica dos remanescentes arqueológicos da
fortificação ..................................................................................................91
iii
Observações gerais sobre as ações de divulgação e educação
patrimonial ................................................................................................ 166
Anexo 02: Carta do Baixo Amazonas feita pelo padre Samuel Fritz, datada de
1689. ................................................................................................... 181
Anexo 03: Carta do rio Amazonas feita pelo padre Samuel Fritz, datada de 1707.
........................................................................................................... 182
Anexo 04: Carta do Novo reino de Granada, Nova Andaluzia e Guiana, feita pelo
engenheiro M. Bonne, datada de 1780. .................................................... 183
Anexo 05: Carta Geral da Guiana, feita por N. Buache, datada de 1798........ 184
Anexo 06: Carta de Caracas e Guiana, elaborada por Pinkerton em 1818. .... 185
iv
Introdução Geral
Ao longo dos últimos 11 meses, uma equipe formada por profissionais e
estudantes de várias áreas esteve comprometida para a execução deste Projeto de
Pesquisa Histórica e Arqueológica para Identificação do Forte Cumaú. Sua origem
remonta a demandas da própria comunidade onde está localizada a fortificação, no
bairro Igarapé da Fortaleza, Município de Santana, Amapá. Uma carta enviada por
uma das associações do bairro, ao IPHAN e ao Ministério Público do Estado do
Amapá, serviu como ignição do processo.
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FUNÇÃO NOME / TÍTULO E INSTITUIÇÃO DE
ORIGEM
Coordenador: Com formação na área de João Darcy de Moura Saldanha, MSC
Ciências Humanas e Sociais, pós-graduação em | IEPA
Arqueologia, experiência comprovada de no
mínimo um (01) ano de pesquisa em
Arqueologia; e sem pendências junto ao IPHAN.
Pesquisador I (Pesquisa Histórica): Augusto de Oliveira Junior, Dr |
Formado em História com experiência IEPA
comprovada de no mínimo um (01) ano em
pesquisa documental; desejável conhecimento
em informática
Auxiliar de Pesquisa I(Pesquisa Histórica): Bruno de Souza Barreto | IEPA
Aluno cursando no mínimo o 5º período de
graduação em História.
Pesquisador II (Pesquisa Arqueológica): Fernando Luiz Tavares Marques, Dr.
Formado na área de Ciências Humanas e | MPEG
Sociais, com experiência comprovada de no
mínimo um (01) ano de pesquisa em
Arqueologia Histórica
Auxiliar de Pesquisa II (Pesquisa Marcos Jessé Lopes da Silva, Esp. |
Arqueológica): Com formação na área de IEPA
Ciências Humanas e Sociais, com experiência de
Demanda do IPHAN
campo em arqueologia
Auxiliar de Pesquisa III (Pesquisa Daiane Pereira, Esp. | IEPA
Arqueológica): Com formação na área de
Ciências Humanas e Sociais, com experiência de
campo em arqueologia
Arquiteto ou Engenheiro: Com experiência Eloane Ramos Cantuária, Msc. |
comprovada em patrimônio cultural, em análise UNIFAP
de condições estruturais e físicas e estado de
conservação de patrimônio edificado
Pesquisador em Arqueologia Histórica Zeli Teresinha Company, Dra. | IEPA
Pesquisador em Arqueologia com Mariana Petry Cabral, Msc. | IEPA
Comunidade
Extras
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De forma geral, ao realizarmos a entrega deste último produto do Projeto de
Pesquisa Histórica e Arqueológica para Identificação do Forte Cumaú, consideramos
que está finalizada apenas uma etapa. As pesquisas realizadas nos últimos meses,
nos diversos âmbitos abordados por este projeto, apontam para uma enorme
riqueza cultural relacionada ao Forte Cumaú.
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PARTE I
RELATÓRIO FINAL DA PESQUISA
HISTÓRICA E DOCUMENTAL
(E DE CARTOGRAFIA HISTÓRICA)
Elaborado por:
4
I. Relatório Final da Pesquisa Histórica e
Documental (e de Cartografia Histórica)
A partir das atividades realizadas no que tange a pesquisa de documentação
histórica, foi possível observar que o local do Forte Cumaú encerra uma importante
parcela da história do Amapá ainda bastante desconhecida. Esta foi uma época em
que esta região, ainda sem domínio efetivo de Portugal, foi palco de complexas
interações entre grupos indígenas, tradicionais habitantes da região, e ingleses,
holandeses e franceses, que buscavam, através da instalação de feitorias e
assentamentos fortificados, um lugar no promissor comércio das riquezas naturais
da Amazônia.
5
esgotamento exaustivo de fontes, em especial por algumas dificuldades de ordem
prática. Como é de conhecimento geral, o Estado do Amapá carece de um Arquivo
Histórico, e toda documentação destes períodos mais recuados não está disponível
para consulta no Estado. Uma vez que o orçamento do Projeto não previa
estratégias alternativas, como viagens a Belém e ao Rio de Janeiro, fomos levados
a trabalhar com fontes já publicadas e com fontes secundárias. Ainda que haja
limitações intrínsecas a estas escolhas, o produto alcançado responde às questões
levantadas no Projeto Básico elaborado pelo IPHAN, quais sejam:
6
Joyce Lorimer em 1989. Além das fontes primárias, uma pesquisa deste tipo
demanda a consulta a fontes secundárias, na sua maior parte disponíveis em livros
já publicados.
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A outra ficha elaborada está voltada ao registro de fontes secundárias
consultadas, na sua maior parte obras já publicadas. Esta ficha busca registrar
inicialmente os dados básicos de referenciamento bibliográfico, como Autoria, Título
da obra, Editora, Cidade e Ano de Publicação. Além disso, a ficha também indica o
acervo a qual pertence, mesmo que seja parte de uma coleção particular. Além
destas informações básicas, a ficha tem espaço para indicação de figuras, da
mesma forma que o previsto para a documentação primária, seguida então das
informações básicas de fichamento da obra, que serão usadas para sistematização
de dados e para facilitar futuras consultas. A partir destas fichas, torna-se mais
fácil comparar diferentes versões históricas, assim como mapear informações
consensuais de outras que aparecem em alguma obra específica. Além disso, este
tipo de registro da consulta permite mapear as diferentes posições que os vários
autores consultados apresentam, assim como o tipo de enfoque escolhido,
contribuindo para uma historiografia da História Colonial do Amapá.
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Fortaleza, tendo como objeto de interesse as ruínas de uma fortificação existente
naquela comunidade.
Flavio dos Santos Gomes. (1999). Nas terras do Cabo Norte. Belém.
Universitária UFPA.
Localizada na Avenida Mendonça Furtado numero 53, bairro central. Foi feita
a visita no acervo da biblioteca desta instituição, entretanto não foi encontrada
nenhuma obra específica sobre fortificações, embora tenha sido ofertado um
arquivo em PDF sobre o diagnóstico da ressaca do Igarapé da Fortaleza e Curiaú:
Takyiama, L.R. & Silva, A.Q. 2003. Diagnóstico das Ressacas do Estado do
Amapá: Bacias do Igarapé da Fortaleza e do Rio Curiaú. Macapá: Setec, IEPA,
Sema, Seplan.
Localizada na avenida Almirante Barroso 861, no bairro Santa Rita. Foi feita
a visita neste acervo, entretanto, este não apresentou nenhuma referência acerca
do material sobre forte do Cumaú.
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Cúria Diocesana de Macapá
Esta é uma instituição que pertence a Igreja Católica, sendo parte de sua
estrutura administrativa. Eles mantêm um arquivo de documentações produzidas
por eles, em especial o periódico “A Voz Católica”. A consulta à documentação é
realizada através de uma solicitação formal, a qual foi realizada por nós. Não foi
constatada a existência de documentos de interesse para o projeto nesta
instituição.
10
BARRETO, Anibal. Fortificações do Brasil. Rio de Janeiro: Editora Biblioteca
do Exército, 1958.
No presente artigo escrito por Janaína Valéria Pinto Camilo acima citado,
aborda as questão dos limites estipulados pelos tratados de Tordesilhas, as
questões mitológicas acerca das incursões de outros povos (Ingleses, Irlandeses,
Holandeses e Franceses). Parte das representações apresentadas no trabalho
referem-se aos ingleses, diários de viagens, como o de Théodore de Bry intitulado
Grands Voyages publicado em 1596. O diário apresentava com veemência as
crueldades cometidas pelos conquistadores nos tratos com os índios, onde o
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mesmo reforça que tais crueldades eram cometidas devido a rituais macabros de
antropofagia, falsa justificativa apenas.
Vale ainda ressaltar que este livro aborda assuntos que dizem respeito aos
grandes conflitos entre portugueses e grupos ameríndios principalmente os
denominados de Tupinambás, que por muito tempo, foram alvo de perseguição do
império português. Além disso, a obra se preocupa em traçar um perfil demográfico
do Vale Amazônico, apresentando alguns comentários a cerca de aldeias
espalhadas por diversas áreas da região em questão.
Este livro também reservou espaço para discutir alguns fatos mais
específicos sobre a história colonial do Amapá. São abordagens que contemplam a
região onde hoje se insere o Amapá. Na obra estas abordagens vão sendo
discutidas desde o século XVII tratando sobre o nascimento da então Capitania do
Cabo Norte, por seu primeiro donatário Bento Maciel Parente. O livro também
expressa descrições que viajantes fizeram sobre a região do Cabo Norte, e finaliza
discorrendo sobre os inúmeros tratados assinados entre frança e Portugal, e como
isso foi importante na definição destas terras como pertencentes a Coroa
Portuguesa. Dedica também alguns parágrafos para abordagem sobre a construção
da fortaleza de São José de Macapá, além do que alguns anexos de documentação
histórica que remonta o período discutido no livro.
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gênese da colonização da antiga região denominada de Cabo Norte, bem como os
embates que ocorreram entre nações europeias que a todo custo queriam possuir
esta região. Por isso, esta obra enfatiza reflexões importantes dos primeiros
viajantes que navegaram pela foz do Amazonas e que posteriormente tentaram se
estabelecer criando feitorias na intenção de comercializar produtos (Escambo) com
grupos ameríndios que habitavam a região do baixo amazonas. Além disso,
Cavalcante argumenta sobre a intenção de ingleses e holandeses que fizeram
enumeras tentativas de implantar colônias em terras hoje amapaenses.
Este trabalho foi desenvolvido com intuito de servir como fonte de consultas
para pesquisadores da arqueologia e história. Seu público se estabelece entre
graduados e mestres e doutores.
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de frisar que na costa oriental do Amapá, o comércio era tão lucrativo que cresceu
no período de 1610-1620.
LORIMER, Joyce (Ed.). “English and Irish Settlement on the River Amazon
1550-1646” London: The Hakluyt Society, 1989.
Este livro, editado em 1989 pelo autor Joyce Lorimer é uma atualização,
com novas fontes históricas consultadas, do livro de James WILLIAMSON, “English
Colonies in Guiana and on the Amazon 1604-1668”. Trata, portanto, das tentativas
de colonização inglesa, mas também de irlandeses, da área entre os deltas do
Amazonas e Orenoco. É organizado em 10 capítulos, sendo o primeiro uma
descrição das primeiras explorações inglesas no Amazonas, entre 1553 e 1608. O
capítulo 2 descreve os primeiros assentamentos ingleses e irlandeses na Amazonia,
entre 1611 e 1620. O terceiro capítulo trata da formação e colapso da Amazon
Company. O quarto capítulo trabalha os primeiros problemas com os portugueses,
entre os anos de 1620 e 1625, que levaram ao abandono dos primeiros
assentamentos ingleses e irlandeses. O capítulo 5 trabalha a formação da Guiana
Company. O sexto capítulo trata dos plantadores irlandeses que vão para a
Amazônia com a Dutch West India Company, em 1629. Os capítulos 7 e 8 são de
maior interesse para o presente projeto, pois o primeiro trata sobre as dificuldades
das colônias da Guiana Company e o segundo dos últimos assentamentos ingleses
na Amazônia. Em ambos capítulos há referências sobre o assentamento do Cumaú.
O capítulo 9 descreve uma petição dos irlandeses à coroa espanhola para uma
licença de assentamento na Amazônia. Por fim, o capítulo 10 descreve as últimas
tentativas inglesas e irlandesas para se assentar na região, com extrema
dificuldade devido à força de Portugal, com a monarquia restabelecida. O livro é
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bastante importante pois, além de fornecer o texto interpretativo, apresenta ao
final a transcrição de documentação primária utilizada para os capítulos.
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terceiro capítulo, “Baía, sede do Governo Geral: a “lusitanização” do Estado Brasil”,
é discutido o papel da Bahia de Todos os Santos no empreendimento português de
conquista do espaço brasileiro. O capítulo quarto, “O peso do número: os homens
na organização colonial do espaço”, aponta para as questões demográficas com
relação ao tipo de população que compunha o espaço brasileiro, como por exemplo,
portugueses e brasileiros, população índia, africana e também a questão da
emigração por todo território. No quinto e último capítulo, “A economia colonial:
uma produção agrícola de exportação dominada pelos “ciclos” do açúcar e do ouro”,
o autor apresenta a discussão sobre os produtos mais valiosos nos séculos de
ocupação portuguesa: o açúcar e o ouro.
A quarta e última parte do livro é escrita por René Renou e está dividida em
6 capítulos: capítulo 1, “O Clero: divulgador da cultura no Brasil”; capítulo 2, “A
Igreja: suporte de cultura”; capítulo 3, “A religião: expressão de uma cultura”;
capítulo 4, “As Belas Artes religiosas”; capítulo 5, “A literatura cristã sobre o
Brasil”; e capítulo 6, “Emancipação e laicização progressiva da ciência”. O assunto
principal desta parte é o papel da Igreja dentro do projeto português de ocupação
brasileira. O autor aponta como a Igreja difundiu as ideias que Portugal queria
propagar e qual era esse alcance. Também discute como as formas arquitetônicas,
a música, a pintura e a escultura e também o teatro estavam imiscuídos no
cotidiano dos habitantes do Brasil. Outros pontos discutidos nessa parte são a
literatura produzida para relatar a história brasileira, seus personagens principais,
suas preocupações e qual era a impressão que foi relatada pelos sacerdotes e
outros autores religiosos. Termina essa parte discutindo brevemente como a Igreja
se relacionava com a ciência, principalmente por meio da medicina e as ciências
matemáticas, físicas, náuticas e naturais.
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aventureiro dos episódios e personagens; contém muitas imagens e cópias de
documentos manuscritos.
Como o Forte Cumaú foi uma das importantes fortificações construídas a sua
inserção no contexto histórico aparece relatada como mais um dos episódios em
que os soldados portugueses conseguiram recuperar o território ocupado para a
posse de Portugal, bem como da bravura desses personagens.
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REIS, Arthur César Ferreira. A Amazônia e a Cobiça Internacional. 3ª ed. Rio
de Janeiro: Record, 1968.
O livro escrito por Arthur Cezar Ferreira Reis, no ano de 1949, foi publicado
pelo Departamento de Imprensa Nacional no Rio de Janeiro. O autor analisa a
história do Amapá a partir dos anseios dos franceses, ingleses e holandeses em
conquistar essas terras, a colonização portuguesa com o receio de perder parte
desse território, as fortificações e batalhas que asseguram a capitania do cabo
norte pelos luso-brasileiros.
18
No Capítulo II, “A Expedição de Alonso de Hojeda”, o autor pretende discutir
questões a respeito da costa setentrional sul-americana, em relação a sua
verdadeira extensão litorânea explorada em 1499.
SARNEY, José & Costa, Pedro. Amapá: a terra onde o Brasil começa.
Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2004.
SILVA, Marcos Jessé Lopes Da. Forte Cumaú uma abordagem histórica e
arqueológica de sua localização. Trabalho de conclusão de curso de
especialização em patrimônio arqueológico de Amazônia. Universidade do
estado do Amapá, 2012.
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moradores da redondeza associam certas ruínas que se encontram dentro desta
área mencionada como sendo do forte de Cumaú.
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Síntese histórica
Nesta seção, apresentamos na forma dissertativa os resultados da pesquisa
realizada. O que segue, portanto, é uma síntese sobre a história colonial da região
onde hoje está situado o Estado do Amapá. Inicialmente é apresentado o contexto
histórico mais amplo, com ênfase nas diferentes nações que tinham interesse na
região. Em seguida, é apresentada a síntese sobre as fortificações de interesse
direto deste projeto: o Forte Cumaú e o Forte de Santo Antonio de Macapá.
O Contexto Histórico
A expansão ultramarina
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Neste novo desafio da expansão Ultramarina, Portugal foi pioneiro. Esse
pioneirismo luso é ratificado pelas viagens feitas por navios portugueses
contornando a costa do continente africano e de algumas ilhas do oceano atlântico
dando oportunidade a esse país de possuir terras nestas novas paragens.
É preciso salientar ainda, que Portugal nos últimos cinqüenta anos do século
XV começou sua preparação para viagens mais audaciosas, pois havia adquirido
conhecimentos importantes para tal feito (Vicentino, 2002).
Vale também lembrar que no século XV, Portugal já era um reino unificado e
menos sujeito a convulsões e disputas, contrastando com a França, a Inglaterra, a
Espanha e a Itália, todas envolvidas em guerras e complicações dinásticas.
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localização de um navio através da posição dos astros, e a construção da caravela
pelos portugueses data do ano de 1444.
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Assim iniciaram-se dois ciclos de expansão das coroas ibéricas: o ciclo
oriental, onde a coroa portuguesa procurou o comércio e conquista das terras para
o sul e o oriente, contornando a costa africana; e o ciclo ocidental, com Castela
procurando terras pelo Oceano Atlântico (Ibidem).
Foi através deste ciclo espanhol que Cristóvão Colombo, em 1492, acabou
alcançando as ilhas caribenhas, que levou à descoberta do continente americano.
Tal divisão desagradou Portugal, pois este reino julgava que tal acordo feria
direitos adquiridos anteriormente, além de causarem confusão com os termos do
tratado anterior. O rei Dom João II procurou então uma negociação direta com os
reis Fernando II de Aragão e Isabel I de Castela, a fim de mover o meridiano do
tratado para mais à oeste. Foi através desta negociação que, finalmente, foi
assinado entre os dois reinos o Tratado de Tordesilhas, em 1494 (Idem).
Tal tratado dividiu as áreas de influência dos reinos ibéricos através de uma
linha imaginária situada a 370 léguas das Ilhas de Cabo Verde: à oeste ao reino
unificado da Espanha e à leste à Portugal (Ibidem).
Com isto a situação das possessões das coroas Ibéricas no Novo Mundo
estaria resolvida. Entretanto, outras nações européias, como a Inglaterra, França e
Holanda, estavam já se aventurando além-mar, procurando também um nicho nas
propagadas riquezas e maravilhas do Novo Mundo.
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período que os ingleses iniciam o tráfico de escravos para o continente Americano
(Idem).
1
Utilizamos a denominação Guiana para toda a região situada entre a foz do rio Orenoco e a foz
do Rio Amazonas. Esta região, que no início da colonização européia era entendida como uma unidade
geográfica única, hoje em dia esta dividida em cinco países: Venezuela, República da Guiana, Suriname,
França e Brasil (Lézy, 2000).
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ter descoberto as terras brasileiras. Além disso, os primeiros nomes dados a muitos
lugares do estuário amazônico são atribuídos a esse navegador (Idem).
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pelo estuário amazônico, chegando a ter conflitos com nativos, aprisionando vinte
deles (Idem).
Apenas dois documentos reais dão conta da viagem de Diego de Lepe. Uma
carta dos Reis Católicos para o bispo de Córdoba, solicitando licença para retornar
com três caravelas e uma Capitulación, datada de setembro de 1501. Contudo, a
jornada de Diego de Lepe pelo Novo Mundo no século XV está oficialmente revelada
na Probanzas del Fiscal “e tratada pela historiografia espanhola como um
acontecimento importante na expansão marítima de Espanha, a partir da segunda
metade do século XVI, ao ser compendiado pelo Frei Bartolomé de las Casas”
(Idem:74).
O relato informava os problemas que teve com o Conselho das Índias por ter
atacado alguns indígenas e aprisionado muitos, habitantes da Venezuela. A
violência contra os nativos marcou também sua passagem pelo estuário amazônico,
onde morreram onze de seus companheiros (Idem).
O Rio Amazonas foi percorrido por esses viajantes ibéricos com o intuito de
melhor reconhecimento desse imenso rio e seu potencial. Conforme João Renôr
Ferreira de Carvalho, o rio Amazonas foi navegado pelos portugueses e espanhóis
pelo simples valor atribuído a este rio, e não pelo interesse em desbravar o
território no interior da região (Carvalho, 1998).
27
Um Vácuo de Poder Ibérico no Século XVII: a chamada “Costa
Selvagem”
28
diversas aldeias, que eram importantes pontos de apoio para as viagens, e de
comércio com os indígenas.
29
“Conhecido como Tucuju, Tikuju, Tecuju ou Tocoyen, este povo de língua
Aruaque ocupava a costa sul do Amapá, entrando em contato com as primeiras
frentes de expansão colonial na região; por serem aliados dos franceses, dos
holandeses ou dos irlandeses, foram duramente atingidos pela expedição de Pedro
Teixeira, em 1624. Procuraram refúgio no interior do Cabo Norte, mas foram
reduzidos pelos jesuítas numa missão no baixo rio Araguari e pelos capuchinhos no
baixo rio Jari.” (1994: 65).
Desta forma, a boa relação entre os europeus e os índios deveria sempre ser
mantida. O interesse deles na amizade dos indígenas da costa do Amapá acontecia
em devido ao interesse comercial. Os europeus se beneficiavam com tal contato,
pois tendo a confiança dos indígenas eles tinham a oportunidade de comércio. Por
isso, os holandeses, ingleses e franceses mantiveram certa vantagem em relação
ao contato com os grupos indígenas do Cabo Norte, dificultando para a coroa
portuguesa a aproximação de forma pacifica com estes ameríndios (Idem).
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política de verdadeiro extermínio de grupos indígenas que auxiliassem os demais
grupos estrangeiros na região (Nimuendaju, 2004). Esta “política do terror”
instaurada pelos portugueses acabou mesmo por dificultar severamente qualquer
tentativa de instalação de assentamentos ou fortificações, sendo o fracasso do
Forte Cumaú inglês o resultado deste modo de agir dos portugueses.
31
comandada por Roe. Em 1616, os portugueses criam a cidade de Belém e os
holandeses o forte de Gurupá, além de engenhos de açúcar no Cabo Norte, abaixo
do rio Araguari. Em 1620, junto à uma aldeia indígena, ingleses e irlandeses criam
o assentamento “Sapanopoca”, além dos forte Tilletille e Warmeonake, entre os rios
Maracá e Cajarí (Meggers e Evans, 1957).
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Sendo então uma região marginal aos interesses coloniais espanhóis, foram
os portugueses que iniciaram a ocupação do vale do baixo Amazonas em 1630, em
desafio ao Tratado de Tordesilhas. Em 1616 chega Francisco de Castelo Branco ao
que será denominado Grão Pará, tendo dado início à edificação do denominado
forte do Presépio, construção esta que é o ponto de partida para o inicio da
presença portuguesa na Amazônia (Camilo, 2008).
Outro fator que foi utilizado por portugueses como elemento de consolidação
na Amazônia esta ligada as missões religiosas. Para que isto fosse executado, a
governo português tomou algumas ações importantes como permitir a entrada em
terras amazônicas, diversas ordens religiosas (Sarney e Costa, 2004). Além do
mais, foram surgindo várias aldeias missionárias que posteriormente se tornaram
vilas e cidades.
“A área das missões ou “território das missões” foi dividida entre várias
ordens religiosas: carmelitas, franciscanos, mercedários e jesuítas, tendo sido a
distribuição territorial das missões entre essas ordens, regulamentada pela Coroa a
fim de evitar conflitos de jurisdição. Assim sendo, os jesuítas ficaram com o sul do
rio Amazonas até a fronteira com as possessões espanholas, abrangendo os rios
Tocantins, Xingu, Tapajós e Madeira; os franciscanos da Piedade, ficaram com a
margem esquerda do baixo Amazonas e centro de Gurupá até o rio Urubu; os
franciscanos de Santo Antônio, com as missões do Cabo Norte, Marajó e Baixo
Amazonas; os Mercedários com o vale do Urubú e os Carmelitas com o vale dos rios
Negro, Branco e Solimões” (Tavares, 2011: 110).
É preciso dizer ainda, que dentre estas ordens a que mais se fortaleceu
nesta iniciativa portuguesa de consolidar sua presença na vasta região amazônica
foi a dos jesuítas, pois eles promoviam a prática do descimento que consistia em
que esses missionários deveriam subir os rios chegando às aldeias indígenas e
trabalhavam no convencimento dos nativos para se estabelecerem nas missões
jesuíticas (Tavares, 2011).
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Além dessas duas estratégias discutidas acima que contribuíram para a
consolidação Lusa na Amazônia do século XVII, temos que apresentar também a
expulsão de ingleses e holandeses que mantinha assentamentos em várias partes
desta rica região mantendo até mesmo postos fortificados nestas áreas. Sabendo
disto, o império português monta expedições militares contra esses assentamentos,
e em alguns deles, após algumas décadas, resolvem construir fortificações no
intuito de garantir a consolidação da Amazônia.
Sobre este assunto, Fortes (2000), faz uma interessante reflexão abordando
que na expulsão dos inimigos da coroa portuguesa de áreas Amazônicas no século
XVII, os lusitanos começaram a criar novos estabelecimentos militares, bem como
implantando missões religiosas.
34
As Fortificações em Foco
A bordo do Barcke Andover, Roger Fry, com mais dois patachos, chegou ao
Amazonas no final de 1631, descobrindo que o Fort North tinha sido destruído.
“Desanimado, ele enviou de volta para Inglaterra a Barcke Andover e um patacho,
permanecendo no local com apenas quarenta homens, em um sítio chamado de
Cumaú, próximo de Macapá” (Castro, 1999: 151).
35
A represália aplicada a mais essa tentativa de fixação no território, foi a
maior expedição até então organizada no Pará, de acordo com Castro. “Uma
companhia foi enviada na frente da força, para hostilizar o inimigo, e Feliciano
Coelho de Carvalho partiu com 140 colonos e 5.000 índios flecheiros, navegando
em 127 canoas”. Durante essa passagem, os portugueses fizeram um ataque
preventivo contra a nação Ingahiba ou Nhengaíba, para que eles não se juntassem
aos ingleses (Idem).
O que havia no forte Cumaú foi dado como despojo aos soldados
portugueses que participaram dessa investida ao forte em questão, e o restante da
estrutura do Cumaú, Feliciano Coelho mandou seus subordinados arrasá-lo (Baena,
1969). É a finalização de mais uma tentativa de instalação de feitoria inglesa na
costa do Amapá.
36
Tanto que em 1685, segundo Castro, o rei de Portugal, D. Pedro II, enviou uma
ordem a Gomes Freire de Andrade, governador general do Maranhão (1685-1687),
para que ele verificasse a possibilidade de se construir uma fortaleza ou povoação
no Cabo do Norte (Castro, 1999).
Gomes Freire responde a carta deixando claro que “a fortaleza que se pode
fazer que melhor assegura estes sertões das invasões dos estrangeiros é na terra
firme, aonde chamam o Torrego”. Aceitando o aconselhamento de Freire, o rei
manda levantar a fortaleza no lugar indicado (Idem).
37
É importante ressaltar também que nesta carta endereçada ao rei e que
expunha algumas sugestões do cuidado do forte recém-construído, há também
informações que descrevem a paisagem natural do lugar onde estava erguido o
forte Santo Antonio de Macapá. Para Azevedo que foi o escritor da carta o rei
deveria erguer um fortim na ponta de uma ilha que fazia frente com o forte de
Santo Antonio, pois como esse local ficava em uma enseada, o fortim poderia
avisar a guarnição que se encontrava no forte de Santo Antonio (Idem).
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Depois de abandonada esse forte foi construída por volta de 1729, uma Casa
Forte na Ilha de Santana. Apesar do Forte de Santo Antonio de Macapá ser uma
grande fortificação defensiva, ela não possuía a localização privilegiada da nova
Casa Forte, além de já não atender mais as preocupações e novas políticas do
governo português. Devesse ainda destacar que, durante todo o tempo de sua
existência, apesar do novo nome dado ao local, correspondências européias ainda
tratavam o forte como “Cumaú”.
2
Entre os sites consultados estão
http://cartotecadigital.icc.cat/cdm/landingpage/collection/america
http://www.antique-prints.de e http://www.mapsofantiquity.com
39
pequeno desenho que possivelmente faz referência á uma igreja ou
fortificação. Esta carta, modificada para mostrar em detalhe a
localização do forte Cumaú esta no Anexo 01.
Carta do Baixo Amazonas feita pelo padre Samuel Fritz, datada de
1689. Nela também é possível visualizar a localização do forte Cumaú
desta vez junto à linha do equador e junto á margem esquerda do rio
Matapí. Esta carta, modificada para mostrar em detalhe a localização
do forte Cumaú esta no Anexo 02.
Carta do rio Amazonas feita pelo mesmo padre Samuel Fritz, é, no
entanto, datada de 1707. Nela também é possível visualizar a
localização do forte Cumaú junto à linha do equador e junto á
margem esquerda do rio Matapí. Esta carta, modificada para mostrar
em detalhe a localização do forte Cumaú esta no Anexo 03.
Carta do Novo reino de Granada, Nova Andaluzia e Guiana, feita pelo
engenheiro M. Bonne, datada de 1780. Nela também é possível
visualizar a localização do forte Cumaú junto à linha do equador e
junto á margem esquerda do rio Matapí. Esta carta, modificada para
mostrar em detalhe a localização do forte Cumaú esta no Anexo 04.
Carta Geral da Guiana, feita por N. Buache, datada de 1798. Nela
também é possível visualizar a localização do forte Cumaú, logo
abaixo da Vila de Macapá. Esta carta, modificada para mostrar em
detalhe a localização do forte Cumaú esta no Anexo 05.
A última referência encontrada com a localização do Cumaú é a Carta
de Caracas e Guiana, elaborada por Pinkerton em 1818. Cumaú esta
descrito logo abaixo da localização de Macapá. Esta carta, modificada
para mostrar em detalhe a localização do Cumaú esta no Anexo 06.
Por fim, foi possível obter uma planta da fortificação no Cumaú,
datada de 1765, quando ela já se encontrava arruinada. Esta planta,
pela data, não é a da fortificação original inglesa, e sim do forte de
Santo Antônio de Macapá, que continuou sendo denominado de
Cumaú. Esta carta encontra-se no Anexo 07.
40
PARTE II
RELATÓRIO FINAL DA
PESQUISA ORAL
Elaborado por:
41
II. Relatório Final da Pesquisa Oral
A pesquisa desenvolvida pela equipe do Projeto de Pesquisa Histórica e
Arqueológica para Identificação do Forte Cumaú, como indicado no Projeto Básico,
esteve estruturada em uma base múltipla, que abarca a pesquisa em documentos
históricos, a pesquisa arqueológica em campo e laboratório, a avaliação
arquitetônica das ruínas, o registro cadastral da área e a pesquisa com os
moradores do entorno, a partir de uma perspectiva da história oral, com foco sobre
esta fortificação e suas ruínas. Aqui, apresentamos justamente os resultados da
pesquisa oral empreendida no bairro Igarapé da Fortaleza. Esta teve como principal
objetivo endereçar a questão da identidade da comunidade que mora no entorno
das ruínas, buscando registrar as formas de relação que estas pessoas mantêm
com a fortificação e sua história. Além disso, como sugerido no Projeto Básico, a
pesquisa de história oral também esteve atenta a indicações a respeito dos
vestígios materiais da área.
42
pessoas selecionadas para compor a documentação oral foram informadas sobre o
objetivo do projeto e firmaram Termos de Cessão de Direitos e Uso de Imagem, de
acordo com o termo padrão utilizado pelo IPHAN.
43
pesquisa quantitativa, seguida então da análise das entrevistas gravadas. Nesta
parte, tivemos especial atenção em apresentar os entrevistados, buscando
contextualizar suas posições e relatos, além de justificar suas escolhas como
figuras importantes para esta pesquisa. Por fim, buscamos compor este conjunto de
conhecimentos orais em uma narrativa que contasse o histórico recente da área e
da própria identidade dos moradores em relação à fortificação.
44
Aportes para a pesquisa oral
A realização de pesquisas científicas com foco em testemunhos orais já é
uma prática institucionalizada há muitas décadas em diferentes áreas do
conhecimento. A antropologia, que tem nos relatos orais uma de suas mais
marcantes fontes de pesquisa, faz uso de técnicas de coleta e análise deste tipo de
fonte desde o fortalecimento das pesquisas etnográficas em campo, no final do
século XIX e início do XX. A história, desde meados do século XX, tem também se
voltado aos depoimentos orais como fontes de pesquisa, levando a
institucionalização da História Oral como um ramo importante da disciplina já na
década de 1970. Mesmo a arqueologia, tida como uma disciplina voltada para o
estudo da cultura material, ampliou mais recentemente sua área de atuação ao
abarcar relatos orais na produção de seu conhecimento.
No caso do presente projeto, o foco sobre as fontes orais tem como principal
objetivo estudar a percepção dos moradores no entorno das ruínas da fortificação
do século XVII sobre este patrimônio histórico, investigando suas relações com ele
e seu papel na formação de suas próprias identidades. Esta pesquisa oral, portanto,
baseia-se em uma trama entre patrimônio, memória e identidade. Como parte do
estudo de um processo histórico, estamos particularmente interessados nos
processos de apropriação desse patrimônio, nas formas como os moradores têm
construído suas histórias em relação à fortificação. Neste sentido, seguimos a
sugestão de Benito Schmidt (2011a) de que a história oral pode contribuir para
“(...) desnaturalizar os patrimônios, evidenciando sua condição de produtos de
interesses e conflitos sociais, ligados a projetos e contextos contraditórios, e, acima
de tudo, históricos” (p.9).
45
que os moradores do entorno têm em relação à fortificação. Em consonância com
isso, a partir de uma série de entrevistas gravadas também instigamos os
entrevistados a contar sobre a história do tempo presente na comunidade,
permitindo alcançarmos narrativas importantes sobre o crescimento urbano e o
afastamento da fortificação do convívio dos moradores.
46
Silva 2003: 166). Levantamentos sócio-econômicos realizados na área indicam que
esta é uma área de urbanização desordenada, com saneamento básico precário,
resultando na poluição crescente do igarapé (Aguiar & Silva 2003; Cunha et al
2003; Cunha et al 2004).
47
de História, Midiani Maciel, é moradora do bairro e trabalha como docente na Escola
Estadual Igarapé da Fortaleza. Ela finalizou em 2011 o Curso de Especialização em
Patrimônio Arqueológico da Amazônia, oferecido pela Universidade do Estado do
Amapá (UEAP), quando desenvolveu uma monografia sobre o potencial de uso da
arqueologia no ambiente escolar.
48
casa de pais e mesmo sobre as ruínas da fortificação. Em alguns casos, os próprios
entrevistados pediam para realizar a entrevista no momento do primeiro contato,
demonstrando sempre muita disposição em falar sobre a história do bairro e da
fortificação.
49
Resultados
55 a 64 anos 15 a 24 anos
45 a 54 anos
25 a 34 anos
35 a 44 anos
Gráfico da distribuição dos entrevistados em questionários nos grupos de faixa etária (t:198).
50
De acordo com os dados do IBGE (2010), 60% da população do bairro
(considerando parcelas nos dois municípios) é formada por pessoas com mais de 15
anos. Ao compararmos nosso universo amostral com os dados do IBGE, podemos
observar que – no que tange as faixas etárias – nossa amostra é relativamente
representativa do bairro.
Com exceção dos dois grupos de faixa etária mais baixa, em que nossa
amostra tem uma inversão, os demais grupos mantêm uma porcentagem similar, o
que fortalece a representatividade do universo amostral.
51
conhecimento sobre este forte ainda tem raízes fixas na paisagem, o que parece
indicar que este sítio arqueológico ainda é um ponto de convergência das memórias
dos moradores.
Quando perguntamos aos entrevistados o que deveria ser feito na área onde
está o forte, atualmente dentro de uma área privada, usada como porto de
desembarque de mercadorias, as respostas tenderam à manutenção da situação
atual. Quase metade dos entrevistados preferiu não responder à questão, o que
parece indicar que não há nada para ser feito. Entre a outra metade (103
entrevistados), 70 pessoas sugeriram mudanças que transformam a atual
propriedade privada em área de uso público, sendo que apenas uma não indicou
um uso voltado para lazer, turismo ou preservação histórica.
52
conhecimento coletivo, partilhado principalmente pelos mais velhos, como indicado
pelos nominativos de respeito utilizados em frente ao nome de muitos dos
indicados (como Dona ou Tia Fulana e Seu Fulano). Podemos considerar estas
pessoas como “detentores da tradição” ou “detentores do conhecimento”, o que
fortalece a ideia de que esta história tem ressonâncias no coletivo, com
disseminação em diversas parcelas da comunidade.
53
entanto, seguimos as orientações do Manual de História Oral elaborado por Verena
Alberti (2005), em que a autora destaca que “[a] escolha dos entrevistados não
deve ser predominantemente orientada por critérios quantitativos, por uma
preocupação com amostragens, e sim a partir da posição do entrevistado no grupo,
do significado de sua experiência” (p.31). Nossa busca, portanto, foi obter
entrevistas com pessoas de diferentes famílias que moram na área há bastante
tempo, além de registrar também depoimentos de pessoas que estiveram
diretamente envolvidas com as solicitações para a realização da pesquisa na área
(representantes da associação de moradores). Assim, do conjunto de entrevistas
realizadas, temos depoimentos de treze pessoas, que representam seis famílias.
A primeira pessoa com quem conversamos foi o Sr. José Lobato, que
convidou sua filha, Rilene Lobato, a participar da entrevista. O Sr. Lobato foi
presidente da Associação Comunitária Esperança de Fortaleza há alguns anos,
quando enviou – em 2005 – uma solicitação à Sub-Regional do IPHAN em Macapá
inquirindo sobre o “tombamento do Forte Cumaú”. Segundo ele mesmo relata, uma
carta de teor similar também foi encaminhada ao Ministério Público Federal, o que
54
resultou – em 2009 – em um Procedimento Administrativo Cível encaminhado ao
IPHAN para conhecimento. Foi, portanto, esta movimentação liderada pelo Sr.
Lobato que acabou levando à execução do presente projeto, tornando-o certamente
uma figura essencial para a pesquisa oral.
O Sr. Lobato foi uma das pessoas mais citadas nos questionários como
referência sobre a história do forte, sendo reconhecido como um estudioso do tema
no bairro. No entanto, como chegou na área em um período mais recente que as
demais famílias entrevistadas, notamos alguns conflitos sobre a legitimidade de seu
conhecimento, o que aponta para disputas internas sobre essa história. Sua
chegada ao bairro ocorreu no final da década de 1980, vindo de Almeirim em busca
de melhores condições para criar os filhos.
55
Outros relatos importantes, que muito contribuem para a reconstrução das
ruínas anteriormente aos impactos recentes, foram fornecidos por dois senhores
que trabalharam por muitos anos em uma fábrica de palmitos que contém em seu
terreno parte da estrutura do forte. O Sr. Raimundo Alves do Nascimento e o Sr.
Joaquim Coutinho fazem parte da lista de referências indicadas durante a aplicação
dos questionários, e a pedido deles realizamos a entrevista em conjunto sobre as
ruínas do forte. A condição de trabalhadores na área onde está localizado o forte
lhes ofereceu um lugar privilegiado para acompanhar a história recente da
fortificação, nos oferecendo narrativas muito interessantes sobre o histórico de
impactos e mesmo sobre o período anterior. É importante destacar que o Sr.
Joaquim Coutinho é descendente do Sr. Nilo Coutinho, reconhecido por todos
entrevistados como o primeiro dono da área do forte e um dos primeiros moradores
do bairro.
Os primórdios do bairro
Expressões como “não tinha nada” e “era tudo mato” foram recorrentes nas
falas de todos moradores mais velhos, que comparam com a situação de hoje: “isso
virou cidade”. Essa mudança de um ambiente de interior para um povoado urbano
56
traz certa nostalgia para os mais antigos, que lembram do tempo em que não era
preciso trancar a porta de casa, em que ninguém roubava, quando era possível sair
à noite sem medo. Entre os mais jovens, no entanto, o sentimento é que a situação
do bairro melhorou bastante, e a abertura de ruas é citada como uma melhoria
importante.
Nesta fala da Sra. Helena Pantoja também podemos observar esta postura:
“Era mato. Era mato. Era mato. Pensa que tinha gente como tem
agora? Só tinha aí na serraria porque era serraria e gente vinha
trabalhar. Nós que morávamos... eram três moradores. Uma desse
lado e duas do lado de lá. Aí pronto. Foram acostumando, foram
acostumando e pessoal vinha trabalhar aí. Foram chegando, foram
chegando e aí foram metendo máquina aqui e arrumaram máquina
pra meter ali na rua. Até que foi, foi e olha agora como está?
Quem viu o tempo quando nós chegamos pra cá, diz assim: Poxa,
que vocês já demoraram muito aqui. Isso aqui já está quase uma
cidade e tudo” (Helena Pantoja, 2012).
Naquela época, não havia ruas, apenas caminhos que ligavam as casas e
levavam a outros povoados, como a chamada Serraria e o próprio porto de
Santana:
57
Já no que se refere a área onde estão as ruínas, a recorrência está em
salientar que o trânsito era livre:
“Era tudo aberto, depois que eles fizeram [o muro], depois que
venderam para uma empresa Arnave. O pessoal vinha, era tudo
aberto, vinham tomar banho de rio aqui” (Arcângela Nepomuceno,
2012).
“Aqui é, num tinha muro, a terra vinha até aqui mais ou menos, aí
já vinha diminuindo por causa das casas que já iam sendo
construídas. Era só árvores, aqui tudinho. Aí, pra você ir pro rio,
tinha uns caminhozinhos que você ia descendo por debaixo das
árvores, subia a montanha pra depois descer pro rio” (Joseja
Nepomuceno, 2012).
Ainda que não tenhamos conseguido mapear com precisão de que forma
este nome chegou à comunidade, há algumas sugestões interessantes. Os
moradores mais antigos remetem o uso do nome aos pais ou pessoas mais velhas:
58
“(...) quando nós se entendemos, aí meus pais foi começando a
explicar pra nós: E olha, quando eu cheguei pra cá isso aqui já
existia, isso é o forte Cumaú, isso é a Fortaleza (Joaquim
Coutinho, 2012).
“Sempre sabia que isso aqui era o Forte Cumaú, todo mundo aqui
sabia que era o forte, sempre soube” (José Elivaldo Pinheiro,
2012).
No entanto, outra versão é sustentada pelo Sr. José Lobato e sua filha. Ele
faz referência a uma linha de ônibus que ligava o bairro à cidade de Macapá, e que
tinha como nome Cumaú. Ele ficou curioso com este nome e acabou ouvindo, em
um programa de rádio, uma entrevista com o historiador Nilson Montoril, que lhe
ofereceu uma explicação.
Para Rilene Lobato, foi seu pai quem trouxe para a comunidade a utilização
do nome Cumaú, pois antes dele começar a se interessar por esta história,
ninguém falava sobre o forte.
59
Descrições do forte e sua história
Uma vez que os relatos são bastante ricos nestas descrições, optamos aqui
em fazer uma separação, criando um item específico apenas para lidar com as
narrativas sobre a destruição da estrutura e de seu processo de fechamento em
uma propriedade privada. Desta forma, nesta primeira parte, vamos nos deter na
exposição dos detalhes de como era a estrutura antes dos impactos mais recentes.
Nestes relatos, também são feitas algumas referências a materiais históricos e
arqueológicos que foram encontrados na área, enriquecendo ainda mais as
descrições, e fornecendo informações importantes para a caracterização do bem
patrimonial.
“Era muito bonito isso aqui. Era um negócio muito, muito bem
organizado” (Raimundo Nascimento, 2012).
“Isso aqui era muito bonito, era muito maravilhoso” (José Elivaldo
Pinheiro, 2012).
60
foram unânimes em ressaltar que costumava ser mais alto, e destacam ainda a
dificuldade que era cruzar sobre estas barreiras. O Sr. Benedito Pantoja descreveu
a área assim: “Então esse forte lá ele tem uma ribanceira alta, tipo recortado com
uma máquina, e ainda existe lá”. É interessante esta comparação com o trabalho
de uma máquina, em função da característica de ser reto e plano, algo que já não é
possível observar nos vestígios existentes hoje.
Joaquim Coutinho: Dava, pra ver tudo. Era uma fortaleza, tipo
uma fortaleza.
Raimundo Nascimento: Maravilhosa.
JC: Esse canto aí é muito bem preparado.
RN: Esse cantinho aqui que a gente pode ver a formatura como é.
Essa parte que tá cavada aqui, foram eles que cavaram, isso tudo
era bem certinho muito bonitinho.
(...) Isso aqui foi, aquele pedaçinho já foi construído. Aqui tem
uma parte do desenho como era tudinho. O forte.
(...) Olha, aqui, aqui que tou dizendo, aqui que era as valas, né?
Que dividia o Forte.
(...) E então só tinha uma entrada, a que a gente entrava pra cá
pra dentro do Forte que era por lá. Aqui era tudo assim, num tinha
entrada de nada.
(...) É porque num podia subir. É muito alto né? Só tinha dela pra
cá. Aí quando eles diminuiu, quando ele meteram máquina, a
primeira coisa que eles fizeram foi abrir tudo e tirar. Porque em
cada, em cada um canto desse era assim. Como tá aqui ó. Tem
esse aqui e aí vai um pra lá e aí vai outro pra lá. Tinha até fechar.
Era assim que era.
Mariana Cabral: E essas valas, sempre existiram, tavam aí?
RN: Tava ora, era, era o marco do Forte.
(...) Olha, essas valas, essas valas que vocês estão vendo aqui,
fizeram a vala pra fazer a parede.
JC: Era a da Fortaleza.
RN: A parede que era pra fazer como era a de Macapá. Essa valas
daqui num era...
JC: Ficou tudo pronto. Todas elas.
RN: Já escavavam as valas já pra levantar o concreto.
JC: Concreto não, naquele tempo era pedra.
RN: Era pedra. (Joaquim Coutinho & Raimundo Nascimento, 2012)
61
O que observamos é que a estrutura parecia estar bem conservada,
conformando um modelo geométrico com cantos bem marcados. Além disso, na
parte de fora, valas eram visíveis. É interessante ressaltar que os vestígios da ruína
que ainda podem ser vistos hoje são justamente de um dos cantos da estrutura e
parte da vala na sua porção externa. A partir destes vestígios, os entrevistados que
gravaram seus testemunhos na área do forte indicaram a continuidade das paredes
e onde estavam localizados os outros cantos do forte. No trecho abaixo, o Sr. José
Elivaldo descreve como era a estrutura:
62
RN: Isso eu não sei, mas eles foram para Macapá. Foram construir
a fortaleza.
O Sr. José Lobato também faz esta relação entre o Forte Cumaú e a
Fortaleza de São José:
Ou ainda:
“Como eu lhe falei, foi o início de uma fortaleza. Eles fizeram aí,
viram que não, que o porto não era propício, que batia muito na
parte baixa do rio, daí foram procurar pra lá, daí fizeram pra lá,
daí mudaram” (Benedito Pantoja, 2012).
“Eles falavam que isso aqui era pra tomar de Macapá, né? Que
todo navio que chegava enxergava. O forte ia ser aqui.
(...) O que esse senhor [Nilo Coutinho, um dos primeiros
moradores da área do forte] falava para nós é que antes foi
construído aqui, depois Macapá. Mas não deu certo porque a visão
aqui não era tão boa, nem terminaram aqui e foram pra Macapá”
(José Elivaldo Pinheiro, 2012).
63
“Na época, quando eu participei, quando eu engajei na equipe de
trabalho aí, a gente ainda percebia as montanhas completas ainda,
modelo fortaleza, que nem a de Macapá. Porque o projeto que eles
queriam [era] fazer aquela fortaleza como foi feita em Macapá e
esta seria a segunda fortaleza, Forte Cumaú, devido a essa ilha
que tem bem na frente aí, que não tem a visão, os navios
poderiam vir por trás, né? E pegar de surpresa aqui, a frente de
Santana, né? Então eles colocariam uma segunda proteção. Seria
feito o Forte Cumaú que não foi feito não sei porquê.” (Joel
Nepomuceno, 2012).
64
e seriam “um ou dois”. Já o senhor Benedito Pantoja, descreve ainda a presença de
tijolos:
“Então esse forte lá, ele tem uma ribanceira alta, tipo recortado
com uma máquina, e ainda existe lá. Então tinha dois tubo de
canhão lá, e tinha resto de tijolo, de um tijolo que não é visto por
aqui. Um tijolo assim mais pequeno, tijolo assim meio estranho,
bem grosso, estreito e tinha uma boa parte assim, tipo um metro,
metro e meia. (...) como se começaram a fazer um muro e não
conseguiram terminar, daí eles pararam com a obra. Deixaram
esses vestígios aí, tubo de canhão e esse muro aí” (Benedito
Pantoja, 2012).
“Na época, acho que vieram fazer é derrubar, tirar, então como eu
falei, a gente não tinha quase conhecimento, a gente era leiga,
não é? Não tinha essa mentalidade que hoje em dia temos, que se
65
hoje em dia fosse acontecer isso, a gente ligava, denunciava, acho
que na época não tinha nem telefone público aqui” (Joseja
Nepomuceno, 2012).
66
Seu Lobato falou que queria preservar aí, mas não tem como, as empresas vieram
aí tomando conta”. O poder econômico, neste contexto, está sempre acima do
interesse histórico na preservação de um bem cultural.
“Isso aqui era muito bonito. Na época era um deserto, tinha umas
dez casas só. Depois foi enchendo de população, foi enchendo.
Mas nunca destruiu como destruiu com esse Roberto Rodrigues.
Ele tirou tudo de uma vez” (José Elivaldo Pinheiro, 2012).
67
profundos aconteceram, com a terraplanagem da área, quando tratores e caçambas
foram usados para remover as grandes quantidades de terra. Os impactos, no
entanto, não acabaram aí:
68
alguns casos, esta situação foi vista como impeditiva para realização de qualquer
alteração na área:
Joaquim Coutinho: Tudo tem todo isso aí, tem dono, e aí num
pode.
Mariana Cabral: Mas e se não tivesse dono?
Raimundo Nascimento: Se não tivesse dono seria outra coisa. A
gente ia levantar um pedido aí pra levantar uma estalta, um
monumento aí que representasse o Cumaú.
“Eu acho que devia fazer um, eu digo assim, não sei não, acho que
um ponto turístico aqui. O governo assumir, isso aqui era uma
coisa tão linda. O governo devia fazer o porto dele mesmo, isso
aqui tá entregue às baratas” (José Elivaldo Pinheiro, 2012).
“Eu acho assim, que no dia de hoje que nós vivemos hoje, isso daí
ficou um descaso do governo federal e do governo estadual, tudo
bem que os empresários, porque os empresários eles colocam que
estão ajudando a comunidade, dando ajuda, dando emprego, mão
de obra, ajudando as famílias, mas eu acho que o governo federal
junto com o governo do estado do Amapá, eles deviam fazer um
projeto que viesse beneficiar a comunidade como um todo, como
um porto marítimo” (Joel Nepomuceno, 2012).
69
Oralidade e a história recente do Forte Cumaú
Quando iniciamos o Projeto de Pesquisa Histórica e Arqueológica para
Identificação do Forte Cumaú, nossa visão a respeito dos vestígios materiais que
essa fortificação ainda apresenta centrava-se em especial no quanto as ruínas
estariam (ou não) preservadas. Com o desenvolvimento da pesquisa oral, e a
vivência decorrente do andamento da pesquisa, entramos em contato com os
moradores da área e aprendemos a olhar para aqueles vestígios com outros olhos,
ou a partir de outras perspectivas.
70
foi aproveitado, uma história abortada. Isto é tanto mais interessante ao
considerarmos que esta é a história local sobre este Forte, é a construção histórica
que a comunidade criou ao longo dos anos para dar conta de explicar não apenas a
existência do forte, mas também suas profundas diferenças com a Fortaleza de São
José.
Se esta história tem persistência ainda hoje, pudemos notar na vivência com
a comunidade que ela já não tem o mesmo vigor que costumam destacar para o
passado. Ou seja, é uma história sobre a qual cada vez se fala menos. Como
narrado por alguns entrevistados, as crianças nas escolas já não conhecem essa
história, não conhecem o lugar onde a história aconteceu. Notamos, em alguns
momentos, o desânimo dos entrevistados ao pensarem sobre o futuro desse lugar
onde estão as ruínas, desacreditados, como se já não houvesse uma alternativa
para resgatar essa história, o que é tanto mais forte entre os mais velhos.
As mudanças profundas foram ocorrer mais tarde, e o forte, como nos disse
o Sr. José Lobato, tornou-se um porto. Máquinas pesadas, como um trator e
caçambas, quebraram as paredes de terra, colocando abaixo as “montanhas altas”
e abrindo o caminho para a entrada de caminhões. Uma ponte de concreto foi
construída na beira da água, para permitir que barcas trazendo itens de consumo
pudessem atracar em melhores condições. Muros foram construídos no entorno, um
grande portão de ferro instalado. Os moradores ficaram do lado de fora. O forte
virou porto e – acima de tudo – propriedade privada. Isolado, restrito, fechado.
71
Ao investigarmos sobre uma possível identidade dos moradores do bairro do
Igarapé da Fortaleza em relação às ruínas de uma fortificação histórica, à beira do
Rio Amazonas, descobrimos que essa é uma história que está se esmaecendo. O
processo recente de destruição e restrição de acesso à área onde estão as ruínas
parece contribuir para esta situação. Quebrada e arrasada, fechada atrás de muros,
a fortificação corre o risco de tornar-se apenas uma memória antiga.
O Forte Cumaú, como é conhecido no bairro, fez parte por muitos anos da
paisagem da comunidade. Era um local de trânsito livre, usado como área de lazer
e mesmo como porto para pequenas embarcações. Ainda que a área seja vista
como propriedade privada há muito tempo, inclusive com indicação de histórico de
proprietários, foi após a implantação do porto de desembarque que este estatuto
estabeleceu a restrição de acesso. Como um processo de velamento, estar
afastada, isolada, faz com que esse local aos poucos deixe de compor a paisagem
do bairro, e com isso o forte pode virar apenas uma lembrança. A memória viva
dos moradores é o que garante ainda a manutenção de uma história do Forte
Cumaú que não pode ser encontrada em documentos históricos, pois reside nas
suas lembranças e é ativada pela presença material das ruínas.
72
PARTE III
RELATÓRIO FINAL DE
LEVANTAMENTO CARTOGRÁFICO E
CADASTRAL
Elaborado por:
73
III. Relatório Final do Levantamento
Cartográfico e Cadastral
Para a realização do levantamento cartográfico e cadastral sobre o bem
devemos destacar inicialmente uma dificuldade estrutural que impede alcançarmos
um dos objetivos estabelecidos no Projeto Básico. Durante a realização da pesquisa
histórica e documental, já havíamos percebido que o chamado Forte Cumaú carece
de documentação iconográfica específica, havendo tão somente um produto
cartográfico conhecido em que ele é representado em detalhe (figura abaixo). Esta
situação, aliada à ausência de um arquivo histórico em Macapá, onde documentos
originais pudessem ser consultados, fez com que optássemos pela realização de
uma pesquisa cartográfica através da rede mundial de computadores. Uma vez que
atualmente há uma série de documentos históricos disponibilizados em meio digital,
fizemos uso destas ferramentas tecnológicas. Tal situação, no entanto, impede o
acesso aos documentos nos seus formatos originais, não sendo possível realizar a
entrega de cópias desta documentação nas escalas originais, já que estas são
desconhecidas.
74
Planta baixa e perfil da fortificação chamada de Cumaú, produzida em 1765 (Viana 1905).
75
bastante precisa a esta iconografia detalhada do Cumaú. Tal situação corrobora o
uso que a população do entorno deste sítio arqueológico faz do nome Forte Cumaú,
e contribui para dissolver as dúvidas sobre sua localização. Com isso, a pesquisa
cartográfica histórica contribui de maneira significativa com mais um elemento para
a identificação desta fortificação.
“Amapá
LPM/1831, no trecho entre o Rio Sirga e Grand Crique no
município de Calçoene;
LPM/1831 nos trechos compreendidos entre a Av. JK, no Bairro
Araxá, até a Rua Ana Néri, no Bairro Nossa Senhora do Perpétuo
76
Socorro, no município de Macapá, e entre o Igarapé Fortaleza até
a extremidade sul da área urbana do município de Santana;”
(Reschke et al, 2008: 16; grifo nosso)
77
Imagem de satélite do ano de 1969, onde é possível observar a expansão urbana e a localização
aproximada do Forte Cumaú. Em função da baixa resolução, não é possível observar em detalhe a área
da fortificação, mas nota-se sua proximidade com a malha urbana (Imagem Google Earth de
31/12/1969).
Imagem de satélite do ano de 2004, com o atual porto construído na configuração atual (Imagem
Google Earth de 05/10/2004).
78
Imagem de satélite do ano de 2007. A ausência de nuvens faz com que esta seja a melhor imagem de
satélite disponível livremente da área. (Imagem Google Earth de 28/07/2007).
Imagem de satélite do ano de 2010, em que podemos perceber a manutenção de uma mesma estrutura
no terreno desde pelo menos o ano de 2004. (Imagem Google Earth de 20/06/2010).
79
Santana, mostra a malha urbana da localidade Igarapé da Fortaleza, ainda que sem
qualquer menção à presença da fortificação. Nesta cartografia, é possível
observamos a localização do terreno onde está situada a fortificação, ao final da
Rua Trombetas.
Detalhe da Carta SA22VBIII2NOD (Takiyama et al 2012), com localização da malha urbana na localidade
Igarapé da Fortaleza. A demarcação do terreno onde está a fortificação foi realizada pela equipe do
Projeto.
80
Mapa cadastral do terreno e vizinhanças do Forte Cumaú. 1: terreno onde está localizada a fortificação,
de propriedade de Roberto Rodrigues; 2. Empresa ‘King of Palms’, propriedade de Claudio Almeida
Magalhães Guimarães; 3. Residência, propriedade de Raimundo Nepomuceno; 4. Terreno, propriedade
de André Alcolumbre.
81
Em consulta ao Centro de Ordenamento Territorial (COT), vinculado ao IEPA,
foi possível observar que não existem registros na escala necessária para uma
definição mais clara referente a posse, propriedade ou uso dos terrenos
relacionados com o Forte Cumaú. Como apresentamos no relatório anterior, em
uma recente cartografia produzida pelo IEPA (Takiyama et al 2012), que fez uso
das bases de dados do COT, já era possível prever a inexistência de registros em
escalas maiores.
82
Mapeamento de lotes urbanos no Igarapé da Fortaleza, disponibilizado pela Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e de Resíduos Sólidos (SEMDURES) da Prefeitura Municipal de Santana. O
terreno de interesse deste projeto está hachurado com mais intensidade, e tem como indicação de
proprietário “Dabel – Distribuidora Amapaense de Bebidas Ltda”.
83
sem referência à matrícula do imóvel. Este parece ser um indício de que o terreno
onde estão os vestígios estruturais do forte não está regularizado.
“PREÂMBULO
Nós, os primeiros Deputados Estaduais, representantes do povo
amapaense, reunidos em Assembléia Estadual Constituinte para
instituir o ordenamento básico e reafirmar os valores que
fundamentam os objetivos e princípios da Constituição da
República Federativa do Brasil, invocando a proteção de Deus,
inspirados no ideal de a todos garantir justiça, liberdade e bem
estar, promulgamos a CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO AMAPÁ.
(...)
TÍTULO X
ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS
(...)
Art. 32. A área onde estava edificado o Forte de Santo Antônio de
Macapá, antigo Forte Cumaú, no Município de Santana, às
proximidades da foz do Igarapé da Fortaleza, passa a ser área de
preservação histórico-cultural e de lazer.
(...)
Macapá – AP, 20 de dezembro de 1991.
Adonias Trajano, Amiraldo Favacho, Antônio Teles, Aluízio Gomes,
Dáqueo Ribeiro, Felix Ramalho, Fran Júnior, Geraldo Rocha, Hildo
Fonsêca, Janete Capiberibe, Jarbas Gato, Jefri Hippolyte, João
Dias, Júlio Miranda, Luís Barreto, Manoel Brasil, Maurício Júnior,
Milton Rodrigues, Nelson Salomão, Nilde Santiago, Ricardo Soares,
Regildo Salomão, Sebastião Rocha, Waldez Góes.” (Amapá 1991).
84
elemento apenas reforça a importância histórica e cultural deste lugar para a
identidade do Estado do Amapá.
Vale lembrar que esta mesma Constituição destaca que “A Fortaleza de São
José de Macapá, as Vilas de Mazagão Velho, Cunani e Curiaú são patrimônios
históricos protegidos pelo Estado” (Amapá 1991, Título IX, Art.344). Com isso, o
Forte Cumaú é reconhecido como parte deste patrimônio histórico-cultural
especialmente relevante para o Estado do Amapá, ainda que tratado em um Título
diferente. Esta situação pode ser resultante da menor visibilidade que
historicamente caracteriza o Forte Cumaú, mas o fato de existir um Artigo
Constitucional específico para ele sugere que o poder político constitucional estava
particularmente sensível na sua proteção e valorização. Se de fato isto não ocorreu,
como podemos observar isto na atualidade, o mecanismo legislativo segue válido, e
portanto deveria ser acionado.
85
PARTE IV
RELATÓRIO FINAL DE
DIAGNÓSTICO DE DANOS
SOBRE O BEM
Elaborado por:
86
IV. Relatório final de Diagnóstico de Danos
sobre o Bem
Este é o relatório que trata do diagnóstico dos danos sobre o bem do projeto
de pesquisa histórica e arqueológica para identificação do chamado Forte Cumaú,
fortificação histórica construída no século XVII, às margens do Rio Amazonas. Esse
item é um dos produtos constantes do escopo da pesquisa, que complementa a
pesquisa histórica, arqueológica e cadastral da área.
87
Atividades realizadas
As atividades aqui descritas dizem respeito às ações empreendidas para a
elaboração do diagnóstico de danos sobre o bem, documento que complementa as
informações das pesquisas histórica e arqueológica, conforme plano de atividades
constantes no projeto básico do Contrato nº 05/2012, de Prestação de Serviços
Técnicos Especializados de Pesquisa Histórica e Arqueológica para Identificação do
Forte Cumaú.
Reuniões de trabalho
88
Marques à equipe, além de marcar o início das pesquisas arqueológicas na área do
“Forte Cumaú”. O arqueólogo Fernando Marques apresentou uma planta do forte
Santo Antônio, elaborada no século XVIII, e que viria a ser base para as
investigações de campo.
Visitas de campo
89
descobertas advindas das escavações. Neste encontro, constatou-se a existência de
parte da estrutura externa da fortificação, construída em “taipa de formigão”,
técnica construtiva utilizada nos tempos do Brasil colônia, que possui variante como
a taipa de pilão e a taipa de mão (Colin, 2010). O talude prospectado encontra-se a
leste, no limite da rampa que dá acesso ao embarcadouro.
Figura 01: Vista panorâmica da área. A elevação de terra é parte da ruína do forte. Notar os galpões
atrás das ruínas. Fotografia: Eloane Cantuária
Durante o período das escavações, realizou-se mais uma visita no local das
ruínas, no dia 15/11/2012. As prospecções estavam bastante avançadas e dois
novos cortes haviam sido realizados, um no lado oposto ao do talude prospectado,
a oeste da estrutura e outro no terreno ao lado da área da pesquisa, na intenção de
conhecer o entorno e buscar uma possível delimitação para o sítio arqueológico.
90
O diagnóstico de danos sobre os remanescentes
arqueológicos do Forte de Santo Antônio, chamado de
Forte Cumaú
Figura 2 – Planta do forte Santo Antônio, com a indicação das estruturas que compõem a fortificação.
Fonte: Viana (1905). Desenho modificado pela autora
91
Atualmente, os remanescentes da fortificação configuram como um monte
de terra irregular com paredes em talude, coberto por vegetação rasteira, gramínea
e árvores de pequeno, médio e grande porte (Figura 3). Existem ainda vestígios do
fosso a oeste da estrutura, entretanto, nesta pesquisa o local não pode ser
escavado porque o fosso é o limite entre os lotes e existe um muro de alvenaria em
toda sua extensão reconhecível (Figura 4).
92
A partir das visitas de campo, pode-se observar que nos remanescentes do
reparo da fortificação (Figura 5) não foram visualizados nem parapeitos ou
banquetas, apenas o terrapleno, que provavelmente teve seu nível rebaixado pela
exposição às intempéries e por ações humanas. As escarpas interiores e exteriores
também podem ser visualizadas nos remanescentes da estrutura, entretanto, em
alguns pontos pode-se notar o desbarrancamento da terra.
Nas ruínas do forte identifica-se também o que deveria ter sido parte da
praça interna (Figura 6), contudo, o nível dela também deve ter sido modificado
pelo deslizamento de terra do terrapleno, pela ação das intempéries e ação
humana.
Figura 5 – Vista dos remanescentes do terrapleno do reparo. Notar as escarpas interna (a esquerda) e
externa (a direita). Figura 6 – Vista dos vestígios da praça interna, destruída para a construção do
galpão a direita da foto .
93
Em um segundo momento de intensa destruição da área, foram construídos
dois galpões exatamente sobre o forte, representado o tiro de misericórdia nas
estruturas da fortificação. Cabral e Saldanha (2012b:30-31) no relatório da
pesquisa oral relatam que:
94
Já para o Forte de Santo Antônio de Macapá, construído pelos portugueses
sobre o Forte Cumaú, existe uma citação de Castro (1999: 159), baseada nas
Cartas Régias ao governador do Pará, datadas de 2 de setembro de 1691 e de 11
de novembro de 1692, que relata que “os trabalhos levaram muito tempo, por ser
uma grande fortificação, construída em cantaria e por sofrer os problemas
inerentes à região: falta de mão-de-obra, as constantes chuvas e as doenças do
clima equatorial.” À exceção desta citação sobre o método construtivo, na pesquisa
histórica não se encontrou outras indicações sobre o processo construtivo do forte
português.
95
que devem ser executadas sobre uma fundação de pedra, para evitar a umidade do
solo.
Quaresma (2011) também fala sobre o termo formigão, afirmando que ele
“significa um tipo de construção semelhante à taipa, mas em que a terra é
substituída por cal hidráulica, fazendo uma argamassa de grande consistência e
durabilidade. Já os romanos utilizaram esta técnica para obterem massas tão duras
como o cimento e mais duráveis (o opus signinum)”.
Figura 7 – Vista da parede externa da antiga Intendência Municipal de Macapá. Figura 8 – Detalhe da
taipa de formigão encontrada na parede da Intendência.
É importante salientar que o uso do barro não era muito comum nas
fortificações de maior porte, seu uso era restrito a pequenos fortins ou fortes de
terra e fachina, em razão da baixa resistência e dos problemas de manutenção,
especialmente em áreas úmidas e chuvosas como a região Amazônica. As
construções de maiores vulto, como fortes, igrejas e prédios oficiais, geralmente
utilizavam em sua estrutura a pedra. Também é possível encontrar edificações com
paredes auto-portantes de alvenaria de tijoleira.
96
Contudo, em regiões onde a ocorrência da pedra e da cal era rara, era
comum a utilização da terra, também chamada de barro ou saibro. Quaresma
(Idem) relata que a construção em terra pode ser encontrada em todo o mundo,
especialmente nos locais onde falte pedra, e este parece ser o caso de Macapá e
seus arredores, a dificuldade em se encontrar jazidas de pedra, especialmente as
mais utilizadas como material de construção como calcários, arenitos e granitos
(Colin, 2010).
97
Diagnóstico dos danos e estado geral de conservação
dos remanescentes arqueológicos do forte de Santo
Antônio de Macapá, também chamado de Cumaú
O mapeamento de danos e diagnóstico do estado de conservação dos
remanescentes arqueológicos da fortificação chamada de Cumaú buscou seguir as
orientações e critérios recomendados pelas principais instituições nacionais e
internacionais de proteção do patrimônio cultural.
98
Neste projeto, o mapeamento de danos e a avaliação do estado geral de
conservação dos vestígios do forte chamado Cumaú serão efetuados a seguir.
99
Figura 11 – Vista panorâmica do forte. Notar a alta presença de lixo na área.
A ação da água do rio sobre a escarpa também é uma das maiores geradora
de danos sobre o local, necessitando de estruturas de proteção como muro de
arrimos, gabiões ou outra estrutura que auxilie na diminuição da degradação do
maciço de terra pela ação das águas do rio.
100
PARTE V
RELATÓRIO FINAL DE PESQUISA
ARQUEOLÓGICA
Elaborado por:
101
V. Relatório Final da Pesquisa Arqueológica
A pesquisa arqueológica realizada dentro do projeto seguiu todos os
encaminhamentos necessários para o desenvolvimento das atividades de acordo
com a legislação vigente. Um projeto de pesquisa, intitulado “Investigações
Arqueológicas nas Possíveis Ruínas do Forte Cumaú”, foi encaminhado ao IPHAN
para a solicitação de Permissão de Pesquisa.
102
como foram realizadas estas diferentes atividades, buscando tornar claro não
apenas a localização, mas os resultados obtidos em cada uma das áreas e das
atividades. Ao fim da seção, apresentamos ainda algumas observações gerais sobre
as intervenções e o que foi possível alcançar através delas.
103
Levantamento topográfico
A primeira etapa da pesquisa arqueológica na área de localização das
estruturas da fortificação foi o levantamento topográfico das estruturas presentes
no sítio e da situação do terreno no entorno. Com o auxílio de uma estação total,
foram tomados pontos (com detalhamento entre 0,5 e 1 metro) na área das
estruturas da fortificação (paredes externas, fossos, área interna, etc.).
Muralhas
Fosso
104
Podemos observar uma porção recentemente desmoronada deste monte, em que a
estratigrafia mostrava uma sucessão de camadas de terra preta relativamente
horizontais, que indicam sua construção artificial. No entorno destas estruturas
conservadas é possível verificar grandes quantidades de cerâmica indígena,
misturadas em meio à terra preta.
Muralhas
Vista 3D da área do sítio, com demarcação das construções recentes (blocos amarelos) junto às ruínas.
Mapa de localização das intervenções arqueológicas e das estruturas construídas relacionadas ao Forte
Cumaú (muralhas e fosso), sobre modelo de curvas de nível indicando relevo atual.
105
Intervenções Arqueológicas
No que tange o componente interventivo da pesquisa arqueológica,
organizamos a apresentação iniciando com os resultados das ações de caráter
prospectivo. Os resultados das escavações são apresentados na sequência, com
detalhamentos sobre as diferentes áreas de intervenção. Ao final, algumas
considerações sobre as escavações são traçadas.
106
Mapa de localização das tradagens.
Para denominar cada uma das tradagens, fizemos uso do sistema numérico
de coordenadas X/Y, utilizando como ponto inicial uma das estações topográficas
implantadas no terreno. Nomeamos este ponto inicial como 5000/5000, sendo que
– seguindo um padrão cartesiano – as coordenadas aumentam em direção a norte
e leste. Para a distribuição das tradagens no terreno, buscamos distanciá-las cerca
de 25m entre si, no entanto, em função de obstáculos no terreno, algumas
adaptações foram feitas, como pode ser observado no próprio nome das tradagens.
107
Tradagem Profundidade Observação
alcançada
5000/5000 50cm Camada superficial com 20cm, seguida de camada
laterítica. 01 fragmento de cerâmica colonial na camada
superficial.
5000/5025 40cm Camada superficial com 10cm, seguida de camada areno-
argilosa, sobre camada laterítica aos 40cm. 05 fragmentos
de cerâmica indígena
5000/5050 18cm Camada superficial com 18cm, sobre camada laterítica.
Sem material arqueológico.
5000/5075 35cm Camada superficial com 20cm, seguida de camada
laterítica compacta. 01 fragmento lítico.
5025/5075 36cm Camada superficial com 20cm, contendo entulho de
construção (telha e lajota), seguida de camada com mais
lateritas, e ainda com entulho. 02 fragmentos de cerâmica
colonial entre 20 e 30cm.
5041/5075 40cm Camada superficial com entulho e lateritas, seguida de
camada com lateritas. Sem material arqueológico.
5041/5100 32cm Camada superficial com entulho chega a 20cm, seguida de
camada sem entulho (até 32), sobre camada laterítica. 02
fragmentos de cerâmica colonial entre 0 e 30cm.
5041/5125 20cm Camada laterítica, área impactada por abertura de acesso
para carros. Sem material arqueológico.
5062/5125 50cm Camada superficial com 20cm, seguida de camada com
entulho (até 40cm), sobre camada laterítica. Sem material
arqueológico.
5062/5150 47cm Camada superficial com 20cm, húmica, contendo carvões
esparsos; seguida de camada com carvões esparsos até
40cm; e camada laterítica a seguir. Sem material
arqueológico.
5062/5175 40cm Camada superficial com pouca laterita até 20cm, seguida
de camada areno-argilosa até 40cm, quando alcançou
camada laterítica. Sem material arqueológico.
5062/5190 60cm Camada superficial com entulho alcança até 20cm,
seguida de camada com pouca laterita e concreções de
argila, sobre camada com pouquíssima laterita e
sedimento solto, seguida de camada laterítica. Sem
material arqueológico.
Tabela de informações sobre as tradagens realizadas.
Como pode ser observado na tabela acima, foi possível identificar vestígios
arqueológicos em sete tradagens. É interessante ressaltar que todas estão
localizadas em um contínuo, o que indica que esta é uma área com alto potencial,
oferecendo boas condições para a continuidade das pesquisas. Também foi possível
observar que a camada contendo as peças arqueológicas já não está aparente ao
distanciar-se das estruturas, e também aumenta a perturbação recente, com
presença de entulho e até lixo.
108
Através das informações oferecidas pelas tradagens, em conjunto com as
informações coletadas em percorrimentos em outras áreas no entorno, podemos
afirmar que o sítio arqueológico, apesar de bastante impactado no entorno entre
norte e leste das estruturas, tem porções bem preservadas a oeste. Além disso, há
outras porções bem preservadas a leste, no terreno vizinho, onde não foram
implantadas construções recentes. Como apresentamos mais abaixo, realizamos
uma escavação nesta área (Trincheira 4) que aponta exatamente para esta ótima
preservação do sítio. Com isso, os resultados obtidos nestas atividades
prospectivas muito contribuem para uma caracterização melhor deste patrimônio
arqueológico.
109
A seleção das áreas a serem escavadas partiu das informações coletadas
durante as prospecções e visitas exploratórios. Foi assim, por exemplo, que
optamos por abrir a Trincheira 4, em uma área afastada das estruturas, mas com
fragmentos cerâmicos em superfície. No mesmo sentido, a delimitação das
estruturas construídas (fosso e muralhas) serviram como guia para a escolha das
intervenções voltadas para a compreensão do processo construtivo e do histórico
de ocupação da área.
110
Ao todo, quatro unidades principais foram alvo de intervenções, cada uma
utilizada para resolver problemas específicos da pesquisa. Uma destas áreas, de
fato, denominada “Perfil leste”, não foi escavada no sentido habitual, já que se
caracteriza como um perfil estratigráfico exposto pelas ações anteriores de impacto
ao sítio arqueológico. Houve ainda uma unidade que não chegou a ser trabalhada
de fato (Trincheira 3), e sobre a qual não há informações a serem apresentadas.
111
A unidade denominada “Trincheira1” foi situada no topo da porção oeste dos
atuais vestígios da muralha, objetivando obter, em complementação ao “Perfil
Leste”, informações sobre o processo de construção das mesmas, bem como obter
informações sobre artefatos e estruturas “In situ”. Ao todo foram escavadas 6,5
unidades de 1m² nesta trincheira.
Outra unidade, denominada “Trincheira 3”, chegou a ser locada no sítio. Esta
trincheira tinha dimensões 1m x 1m, estando localizada na meia encosta das ruínas
da muralha, próxima à Trincheira 02. É importante salientar que em decorrência do
surgimento de uma raiz de árvore extremamente grossa no meio da quadrícula ela
teve somente o início do nível de 0-10 cm escavado, não sendo possível dar
continuidade à escavação. Além disso, sua posição em meio encosta mostrou-se
pouco propícia à identificação de novos elementos, e com isso optamos por não dar
continuidade, não havendo, portanto, informações sobre esta unidade.
Perfil Leste
112
Feita a limpeza da parede, foi possível evidenciar o perfil estratigráfico dessa
parede, oferecendo contribuições importantes para a compreensão de como foram
construídas as muralhas dessa fortificação, com uma técnica denominada de taipa
de formigão (ver relatório de Danos ao bem para uma melhor definição deste
método construtivo). É importante frisar também que na limpeza da parede foram
retirados vários fragmentos de cerâmica indígena, encontrados misturados a uma
terra preta, um tipo de solo característico de sítios arqueológicos indígenas na
Amazônia.
113
Arqueológica (TPA), e de fato é formado por terra oriunda de um sítio arqueológico
indígena, o que explica em parte a alta densidade de fragmentos de cerâmica
indígena nesta unidade.
Registro fotográfico da unidade “Perfil Leste”, em que se pode observar a parede vertical construída em
taipa de formigão e seu aterro interno realizado com terra preta arqueológica (TPA) que compõe o
entorno do sítio. A malha de quadriculamento com unidades de 1m² serviu de base para o registro
gráfico.
Ainda não está claro, no entanto, se este sítio arqueológico ainda era
habitado por populações indígenas durante a construção do forte. De qualquer
forma, o material arqueológico recolhido nas escavações sobre as muralhas e no
interior da estrutura (Trincheiras 1 e 2) indica que a presença indígena era
significativa durante a ocupação portuguesa desta área. Isto significa que povos
indígenas e europeus conviveram durante o funcionamento deste sítio colonial, o
que também é indicado nas fontes históricas, desde o tempo da construção do forte
inglês, no século XVII.
114
com camadas lateríticas, que devem ter qualidades geológicas que contribuem para
sua resistência. Esta é observada na “parede” vertical de coloração laranja exposta
no perfil. Depois de levantada esta “parede”, o solo de terra preta era depositado.
O perfil estratigráfico mostra claramente que a deposição deste solo foi realizada
em camadas relativamente horizontais, com porções de terras alaranjadas entre
elas, permitindo uma reconstrução dos múltiplos eventos que resultaram nesta
muralha de cerca de oito metros de altura.
Trincheira 01
115
nível natural até que se chegasse à camada arqueológica, o que ocorreu entre os
níveis 60cm, 70cm e 80 cm.
Cotidiano da escavação da unidade denominada “Trincheira 01”, ainda em seus primeiros níveis.
116
Sobre a composição e textura dos solos escavados nas quadrículas da
Tricheira 01, observamos que até o nível 60 cm de profundidade o solo apresentou
uma coloração Marrom Alaranjado de textura areno argilosa, com presença muito
intensa de lateritas e também materiais cerâmicos, tanto construtivos (tijoleiras,
telhas) quanto utilitários (principalmente cerâmica manual indígena, mas também
foi encontrada faiança, possivelmente portuguesa). Descendo do nível 70 aos 80
centímetros, a coloração do solo começou a ter uma mudança entrando em
transição para um marrom mais escuro. Vale frisar que continuava a presença de
lateritas e materiais arqueológicos. Chegando a camada de terra arqueológica em
todas as quadrículas da trincheira 01, foi realizado o processo de limpeza da
mesma para que em seguida fossem feitos os devidos registros fotográficos e
gráficos.
Detalhe do limite da taipa de formigão e da terra preta, evidenciando uma distinção muito clara entre os
dois pacotes estratigráficos.
117
Este pequeno detalhe foi essencial para conseguirmos associar esta
estrutura de fortificação com a iconografia histórica do Forte Cumaú. Isto se deu
porque o alinhamento desta parede externa segue o mesmo alinhamento indicado
na iconografia, ou seja, não é uma linha perpendicular ao rio, e sim uma linha
inclinada.
Relação entre as evidências materiais e iconográficas que permitiram identificar ruínas com a fortificação
histórica conhecida como Forte Cumaú.
118
Trincheira 02
Etapa inicial das escavações da denominada “Trincheira 2” (que totalizou 4 unidades de 1m²).
119
Cotidiano da escavação, em cena de registro gráfico da estratigrafia na Trincheira 2.
120
Trincheira 02, contrapiso em terra escura evidenciado, com duas possíveis marcas de buracos de poste.
Perfil Norte da Trincheira 2 ao final da escavação. Na parte mais funda está evidenciada a camada de
terra preta arqueológica, sobreposta por camadas de nivelamento de contrapiso.
121
Trincheira 04
Escavação da unidade “Trincheira 4”. O muro à direita demarca o limite do terreno onde estão as ruínas
da fortificação.
122
Situação final da Trincheira 04, alcançando o solo alaranjado estéril.
123
A partir das informações evidenciadas no Perfil Leste, as escavações na
Trincheira 1 foram realizadas também com o objetivo de averiguar se havia
continuidade na técnica construtiva em outras porções da muralha. Os resultados
foram ainda mais relevantes do que o esperado. Para além de observarmos o
mesmo processo de construção nos dois pontos, sugerindo a congruência desta
técnica talvez por todo amuralhamento, identificamos um elemento que confirma
serem estes os vestígios do Forte Cumaú. Com isso, as escavações arqueológicas
somam-se à história oral partilhada pelos moradores, e conflui com a única
iconografia detalhada deste forte histórico. Foi de fato uma surpresa alcançarmos
um resultado tão relevante em uma pesquisa ainda embrionária.
124
Corte Estratigráfico do Perfil Leste
125
126
127
128
Estudos de laboratório sobre o material arqueológico
organização do material;
lavagem e numeração;
quantificação de todo material;
seleção das amostras;
análise detalhada do material arqueológico selecionado;
documentação gráfica de artefatos;
informatização dos dados;
pesquisa bibliográfica e síntese
Quantificação da coleção
129
cerâmica colonial, cerâmica indígena, cerâmica construtiva, etc.) e na sua natureza
(borda, base, corpo, etc).
Perfil Leste
558
600
500
400
300
200
100 14 10 8 53 6 5 3 5 9 1 2 12
0
fainça
outro
borda lisa
borda incisa
metal
telha
borda pintada
borda excisa
lítico lascado
lítico polido
laterita
assador
lítico bruto
tijolo
corpo inciso
corpo exciso
vidro
130
Trincheira 01
1167
1200
1000
800
600
400
200 68 56 89
3 16 3 4 7 1 4 1 7 34 8 2 23 16
0
laterita
vidro
tijolo
metal
corpo inciso
borda pintada
borda incisa
borda excisa
lítico lascado
lítico polido
lítico bruto
fainça
telha
corpo liso
corpo pintado
outro
base
borda lisa
corpo exciso
assador
Trincheira 02
982
1000
900
800
700 531
600
500
400 251
300 143
200 1 16 3 23 4 7 1 2 26 7 12 10 3 26
100
0
fainça
borda lisa
borda incisa
borda excisa
laterita
metal
borda pintada
lítico lascado
lítico polido
assador
lítico bruto
tijolo
telha
corpo exciso
vidro
outro
base
corpo liso
corpo pintado
corpo inciso
131
Na Trincheira 4, foram encontrados 386 artefatos cerâmicos indígenas, 4
peças líticas, 12 fragmentos de vidro, 10 fragmentos de faiança, 19 fragmentos de
telha, além de 2 outras peças não identificadas.
Trincheira 04
343
350
300
250
200
150
100 19 2
50 6 14 2 15 5 1 1 3
0
borda incisa
lítico polido
laterita
fainça
telha
vidro
outro
metal
borda lisa
borda pintada
borda excisa
tijolo
corpo liso
corpo pintado
corpo exciso
lítico lascado
lítico bruto
assador
corpo inciso
base
132
populações nativas mesmo após o contato até há pouco tempo atrás. Ainda em
cerâmica não torneada, identificou-se a presença de cachimbos, com uma
variedade de elementos decorativos nos fornilhos, como motivos florais, zoomorfos,
antropomorfos, geométricos. É atribuída sua predominante utilização entre as
populações nativas, desde a pré-história.
Faianças (FA). Louças que apresentaram tipo de pasta interna com textura
terrosa e coloração amarelo-parda ou bege. No revestimento das peças há
variações entre engobado (terroso), transparente (vidrado) e opaco (esmaltado).
Apesar de raramente poder ocorrer em material de construção, como os azulejos,
seu emprego se refere mais aos objetos relativos aos serviços de mesa, como
pratos, xícaras, tigelas, pires, sopeira, terrinas e saladeiras. Há casos de estarem
também relacionados à higiene, como urinóis, ou mesmo à saúde, como os
contentores de produtos farmacêuticos. Destaca-se ainda a reutilização de
fragmentos, que eram arredondados, para utilização em brincadeiras ou jogos.
Apesar da maioria de peças brancas, verificou-se a presença motivos geométricos,
florais, paisagísticos, pintados em tons de azul, ou vinoso, ou preto, e também de
multicoloridos. Em sítios históricos brasileiros, este tipo de louça na maioria dos
casos é de origem portuguesa, e tem sido registrada sua difusão principalmente
desde fins do século XVI até início do século XIX.
133
Faianças-Finas (FF) Neste grupo estão as louças cuja pasta interna
apresenta-se na cor branca, de textura porosa, opaca ou brilhante, com ou sem
revestimento. Em meio aos padrões de decoração também detectou-se grande
variedade entre monocromáticos ou policromáticos, destacando-se: entre os
modelados, aqueles de padrões “trigal” e “royal”; e entre os pintados, ocorrência
dos seguintes padrões: bordas decoradas ou “shell edge”, incisos e pintados, em
azul ou verde; anelares como “dipped wares”, “wave” e “mocha”, em diversas
cores; pintados à mão, ou “Peasant Style”, em azul ou em policromia; impressos ou
“tranfer printed”, com motivos paisagísticos nas cores azul, verde, vermelho, preto,
roxo e vinho; carimbados, c/motivos florais e geométricos; e salpicados, em azul,
marrom, verde e vermelho. Assim como no caso da faiança, sua utilização foi muito
comum também nos serviços de mesa da sociedade colonial, como pratos, pires,
xícaras, canecas, tigelas, travessas, sopeiras, terrinas, chaleiras, etc., frasco para
creme dental. Também igualmente à faiança, são possíveis as peças arredondadas
usadas em jogos, entre outras. Este tipo de louça passou a ser largamente
produzido na Inglaterra, França, Alemanha e Holanda, a partir da segunda metade
do século XVIII.
134
Ferramentas: compassos, martelos, facões, pás, enxadas, etc.
Materiais construtivos: dobradiças, fechaduras, chaves, ferrolho,
ferraduras, cravos e pregos;
Vestuário: botões, medalhas, insígnias e dedais relacionados aos
fardamentos da guarda colonial.
Cozinha: colheres, garfos e facas...
Uso religioso: crucifixo, medalha com esfinges de Santos.
135
Apesar de haver uma quantidade significativa de artefatos relacionados ao
período colonial na coleção obtida durante as escavações no Forte Cumaú, a maior
parte deles possui pouco poder informativo, por tratarem-se, majoritariamente, de
cerâmicas construtivas, como telhas e tijoleiras.
Faianças
136
4. Fragmentos de corpo de prato, decorado em tons de azul, com motivos
anelar e floral.
Fragmento de Porcelana
137
Conta de Vidro
Cerâmica Colonial
138
3. Fragmento de alça com banho monocrômico vermelho. Sua altura é
9,1cm, largura de 5cm e espessura de 2cm.
Cachimbos
139
Análise da coleção de cerâmicas indígenas
Amostra analisada
140
Aspectos tecnológicos: Antiplástico
1
caco moído
1
15 3 3 22 1
18 cariapé
42
quartzo
cariapé + quartzo
42
51
roletado
Não identificado
141
Aspectos tecnológicos: Espessura dos fragmentos
120 104
100
80 64
60 44
40
20
0
0,2 - 0,6 cm 0,7 - 0,9 cm 1,0 - 1,3 cm
142
1 Oxidação externa e
13 3 interna com presença
de nucleo
46 Oxidação total
Não identificável
5 3
36 Incisa/excisa
Pintada
92 Pintura\Excisão
Aplique
143
Exemplos de decorações incisas observadas na coleção.
144
Exemplo de borda cerâmica com incisão.
O estudo funcional de vasilhas tem uma base teórica que vale a pena
destacar. Rice (1995) nos informa de três amplas categorias de função nos quais
vasilhames tomam parte: estocagem, transformação ou processamento, e
transferência ou transporte, podendo estas categorias serem subdivididas em
funções mais específicas.
145
facilidade de alcançar o conteúdo, a eficiência na absorção e retenção do calor, e
sua resistência ao choque térmico.
146
Foram analisadas 9 amostras deste tipo, todas de bordas. Seu contorno é
predominantemente infletido. Os pontos de inflexão, que delimitam o início da
construção da borda, podem ocorrer entre 1 e 2,5 cm abaixo do lábio, dependendo
do tamanho da vasilha. O ângulo da borda varia entre 65o e 97o. Em 4 casos
ocorrem reforços de borda. Os lábios deste tipo de vasilhas são predominantemente
arredondados (100%).
Em dois casos foram dispostas incisões retilíneas, tanto nas partes interna e
externa quanto somente na parte interna da vasilha.
147
Tipologia morfológica das cerâmicas indígenas do Forte Cumaú.
148
Observações gerais sobre a coleção arqueológica
149
de telhas quanto de tijoleiras. Elas foram principalmente localizadas junto à
trincheira 2, o que indica que, no interior do recinto formado pelos muros da
fortificação, haveriam construções. O fato de não haver nenhuma estrutura
arquitetônica visível no que seria a praça central do Forte Cumaú deve-se ao fato
da coleta predatória destes materiais durante o período de abandono do Forte,
inclusive a fim de suprir a construção do Forte de São José de Macapá. Mesmo
assim, restaram, de forma bastante fragmentada, evidências destas construções,
principalmente localizadas no interior da fortificação.
Por fim, deve-se registrar que não foram encontrados artefatos relacionados
à ocupação inglesa do Forte Cumaú. As faianças encontradas estão relacionadas ao
período de ocupação portuguesa. Isto pode se dever a três fatores: a pouca área
escavada devido à presença de construções recentes; a baixa permanência dos
ingleses no local, que não deixaram registro denso de sua cultura material; o fato
da construção do forte português ter destruído e obliterado qualquer evidência
inglesa. É possível que uma conjunção entre diferentes fatores, ou mesmo todos
juntos, tenham contribuído para esta situação.
150
Curadoria e guarda da coleção arqueológica
O material arqueológico coletado durante as atividades da pesquisa
arqueológica foram transportados ao Núcleo de Pesquisa Arqueológica do IEPA,
localizado na Avenida Feliciano Coelho, 1509, Bairro Trem, em Macapá. Nesta
instituição, funciona o Laboratório de Arqueologia Peter Hilbert, no qual a Reserva
Técnica de Arqueologia está inserida. Desde 2011, quando foi finalizado o Guia de
Boas Práticas do Laboratório de Arqueologia Peter Hilbert (Pereira & Cabral 2011),
todo o material arqueológico que chega à instituição passa pelos procedimentos
básicos de curadoria, como higienização (que pode ser amostral, a depender do
tipo de material, objetivos do projeto e dimensão do acervo), sistematização dos
registros e organização do acervo. Após isso, o acervo é então inserido na Reserva
Técnica, que mantém não apenas o acervo material, mas também um acervo
documental (com toda documentação relacionada), e um acervo digital (com cópias
digitais do acervo documental).
À esquerda, vista geral do pavimento térreo da Reserva Técnica de Arqueologia (IEPA). À direita,
localização do acervo do Forte Cumaú, em caixas padrão, na estante 7.
151
O material documental produzido na pesquisa arqueológica está localizado
na Pasta 46 do Arquivo Documental, e consiste de desenhos de perfis
estratigráficos, fichas e diários de quadrícula, fichas de tradagens, plantas ou
croquis e fichas de topografia. Estes documentos já têm suas versões digitalizadas
e inseridas no acervo digital da instituição.
152
PARTE VI
RELATÓRIO FINAL DE AÇÕES DE
DIVULGAÇÃO DO PROJETO
Elaborado por:
153
VI. Relatório de Ações de Divulgação do Projeto
e de Educação Patrimonial
O Projeto de Pesquisa Histórica e Arqueológica para Identificação do Forte
Cumaú tem como origem uma demanda que partiu da população no entorno desta
ruína. Os moradores do Igarapé da Fortaleza, uma localidade na foz deste Igarapé
com o Rio Amazonas, no exato limite entre os Municípios de Santana e Macapá, em
área urbana, encaminharam há alguns anos uma solicitação ao Ministério Público
Federal e ao IPHAN para realização de pesquisas na ruína a fim de promover o
processo de tombamento deste bem.
154
É importante salientar, no entanto, que apesar deste projeto ter curta
duração, já começamos a ver desdobramentos de prazo mais longo. Isto é
resultado, em especial, do interesse dos moradores locais nos últimos anos pelo
tema do Forte Cumaú, mas também do perfil da nossa instituição, com base local e
foco no desenvolvimento sustentável do Estado do Amapá (Saldanha & Cabral
2012). Estes desdobramentos apontam, portanto, para resultados importantes
destas atividades, como o envolvimento de diferentes setores da comunidade e
mesmo de agentes públicos. Cabe agora criar estratégias para que estes interesses
tenham visibilidade e alcancem um resultado mais sólido para a proteção real do
patrimônio arqueológico como uma herança partilhada por todos.
155
Reflexões sobre divulgação e educação patrimonial
como arqueologia pública
Desde a implantação da Portaria IPHAN nº230/2002, quando atividades de
Educação Patrimonial tornaram-se um dos requisitos essenciais para a realização
de pesquisas arqueológicas no país, muito tem se discutido sobre as ações
realizadas e os resultados alcançados (entre outros, ver Silva 2003; Oliveira &
Oliveira 2004; Hilbert 2006; Carneiro 2008; Bezerra 2009, 2010a, 2010b; Cabral &
Saldanha 2009; Bezerra & Ravagnani 2012). Estas reflexões têm apontado não
apenas para as dificuldades práticas destas atividades, mas em especial para
obstáculos teóricos. Como destacado por Klaus Hilbert, o processo de aproximação
entre arqueólogos e moradores locais torna-se muitas vezes confuso:
156
Ao pensar e praticar uma educação patrimonial dentro do viés de uma
arqueologia pública nosso interesse é colocar a população local em relação com o
patrimônio arqueológico que é o foco de estudo do projeto. Esta relação, no
entanto, deve ser mediada por suas próprias concepções deste objeto e da sua
própria história. Partindo do princípio de que a educação patrimonial demanda a
experiência direta deste patrimônio (Horta 2003), construindo sua valorização a
partir das formas de fruição que os moradores de seu entorno desenvolvem
(Bezerra 2011), este projeto buscou evidenciar as formas como as pessoas desta
comunidade percebem o patrimônio arqueológico Forte Cumaú, fortalecendo seu
interesse na valorização deste patrimônio e contribuindo para sua preservação
através da atualização das identidades locais.
157
A prática: múltiplas estratégias de aproximação e
diálogo
Para o desenvolvimento das ações, estabelecemos como base estratégias
metodológicas que estão, de um lado, embasadas na metodologia da educação
patrimonial como proposto por Horta e colegas (1999), e de outro, em uma
aproximação de base etnográfica às pessoas e aos seus conhecimentos, como tem
sido aplicado em diferentes projetos arqueológicos no Brasil e no exterior
(Castañeda & Matthews 2008; Edgeworth 2006; Hamilakis & Agnostopoulos 2009;
Bezerra 2011).
158
agir dos moradores, ajudando na construção de diálogos que tenham interesse para
os diferentes grupos envolvidos.
159
Igarapé da Fortaleza para a realização de visitas de turmas de estudantes às
escavações e ao sítio arqueológico.
Um dos conhecedores da história do Forte Cumaú, Sr. José Lobato, conversa com arqueólogos durante
as escavações.
Turma de estudantes da Escola Estadual Igarapé da Fortaleza em visita guiada ao Forte Cumaú.
160
Um dos objetivos desta ação induzida de visitação foi apresentar aos jovens
moradores o lugar Forte Cumaú, que na maior parte dos casos nunca havia sido
visitado anteriormente. Ao buscar inserir este lugar na memória dos jovens, não
apenas simbolicamente, mas essencialmente como espaço real, apostamos na força
que a experiência direta do patrimônio pode ter para sua valorização. Se o Forte
Cumaú já não é um espaço de convívio social, como foi há algumas décadas,
mostrá-lo aos mais jovens contribui para fortalecer sua presença física, e com isso
pode ajudar na sua valorização, ao invés de seu esquecimento.
Esta relação mais próxima com a escola foi essencial para garantir as visitas
dos alunos, já que era necessária a autorização de saída das turmas para realização
de atividades extra-classe. Sem este apoio, certamente teríamos menos sucesso
em levar as várias turmas ao Forte Cumaú.
161
Dentro da escola, logo ficou evidente que havia um interesse muito grande
de grupos de professores, na maior parte moradores do bairro, em realizar
atividades relacionadas ao Forte Cumaú. Cientes da nossa obrigação em realizar
uma palestra, fizemos uma proposta à escola de montar um evento cultural onde a
palestra seria inserida.
O Fest Cumaú foi planejado como um evento que envolvia música, dança,
teatro, exposições, oficinas e palestras, e tendo por objetivo aproximar a escola, a
comunidade, e o projeto de pesquisa desenvolvido pelo IEPA. O foco estava na
valorização da cultura e da história local.
162
Exposição “A História do Forte Cumaú”, contada pela turma do sexto
ano (Profª Midiani Maciel)
Oficina de Fotografia – Ministrada por Karinny Magalhães (Casa Fora
Do Eixo Amapá)
Oficina de Educação Ambiental – Ministrada por Yuri Silva (Casa Fora
Do Eixo Amapá)
Oficina “Como trabalhar com o Forte Cumaú em Sala de Aula” –
Ministrada por Mariana Cabral (IEPA)
Outra exposição realizada neste evento foi organizada pela Profª. Dora
Figueiredo e seu grupo de estudantes e voluntários. Eles apresentaram resultados
do “Projeto Ponte para o Futuro”, voltado para a valorização da cultura local e do
meio ambiente através de oficinas de arte e artesanato, com produção de biojóias e
objetos decorativos.
A Profª. Midiani Maciel também organizou com sua turma do sexto ano a
exposição “História do Forte Cumaú”, apresentada em uma sala de aula através da
produção de desenhos, de uma maquete da fortificação e de um livro de redações
sobre o tema. Esta ação é um exemplo que demonstra o potencial da metodologia
de Educação Patrimonial proposta por Horta e colegas (1999). Esta turma passou
pelas quatro etapas metodológicas, através de um trabalho conjunto da arqueóloga
163
e da professora, que iniciou dentro de sala de aula e foi levado ao sítio
arqueológico, culminando na criação de formas de expressão artística para uma
apropriação do tema discutido.
Outra oficina foi ministrada pela arqueóloga Mariana Cabral (IEPA), e teve
como mote a inserção de conteúdos sobre o Forte Cumaú em sala de aula. Esta
oficina foi voltada para professores, e buscou apresentar resultados sistematizados
da pesquisa arqueológica e histórica empreendida neste projeto. Além disso, foram
debatidas estratégias para incentivar a curiosidade dos alunos pela história local.
164
Seminário Forte Cumaú: História, Arqueologia e Comunidade
Esta maquete foi produzida sob coordenação do Dr. Manuel Calado (IEPA), e
contou com colaboração de técnicos e estudantes do Núcleo de Pesquisa
Arqueológica, além da consultoria técnica de pesquisadores deste projeto. Ela
apresenta uma releitura sobre o Forte Cumaú, situado ao lado de uma aldeia
indígena. Além das estruturas construídas, o maquete conta ainda com um
165
conjunto de figuras humanas e cultura material, buscando apresentar uma ideia
viva deste patrimônio.
166
As ações realizadas no âmbito deste projeto contribuíram para desencobrir
não apenas sua história, mas principalmente memórias e sentimentos, que se
encontram agora animados pelo interesse na proteção. Cabe a cada um que
participou deste projeto, em suas diferentes fases, não deixar este ânimo baixar.
167
Registro Fotográfico das Ações de Divulgação e
Educação Patrimonial
Fest Cumaú. Estudantes observam exposição de peças arqueológicas oriundas do Forte Cumaú.
168
Fest Cumaú: Oficina de Fotografia ministrada por Karinny de Magalhães.
169
Fest Cumaú: estudantes do sexta ano preparam a exposição sobre história do Forte Cumaú.
170
Seminário Forte Cumaú, no Auditório do Museu Sacaca, em Macapá.
171
Exposição “Cumaú: a Fortaleza do Igarapé”, no espaço Casa de Vidro do Museu Sacaca.
Maquete do Forte Cumaú, produzida sob coordenação de Manuel Calado. Parte da Exposição “Cumaú: a
Fortaleza do Igarapé”, no espaço Casa de Vidro do Museu Sacaca.
172
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178
ANEXOS
Anexo 01: Carta da América de Clemendt de Jongue, datada de 1640.
Anexo 02: Carta do Baixo Amazonas feita pelo padre Samuel Fritz, datada de
1689.
Anexo 03: Carta do rio Amazonas feita pelo padre Samuel Fritz, datada de
1707.
Anexo 04: Carta do Novo reino de Granada, Nova Andaluzia e Guiana, feita
pelo engenheiro M. Bonne, datada de 1780.
Anexo 05: Carta Geral da Guiana, feita por N. Buache, datada de 1798.
Anexo 06: Carta de Caracas e Guiana, elaborada por Pinkerton em 1818.
Anexo 07: Planta da fortificação no Cumaú, datada de 1765
Anexo 08: Questionário estruturado da pesquisa oral (quantitativa)
Anexo 09: Boletim de Informação de Cadastramento Imobiliário referente ao
terreno situado à Av. Rio Trombetas, nº 54 (Acervo da Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e de Resíduos Sólidos, PMS)
Anexo 10: Mapa de matrículas de terrenos no Igarapé da Fortaleza,
disponibilizado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e de Resíduos
Sólidos (SEMDURES) da Prefeitura Municipal de Santana
Anexo 11: Lista definitiva da coleção arqueológica armazenada
Anexo 12: Material de divulgação do Seminário Forte Cumaú: História,
Arqueologia e Comunidade
Anexo 13: Diagnóstico do bem: áreas fragilizadas na estrutura arquitetônica
179
Anexo 01: Carta da América de Clemendt de Jongue,
datada de 1640.
180
Anexo 02: Carta do Baixo Amazonas feita pelo padre
Samuel Fritz, datada de 1689.
181
Anexo 03: Carta do rio Amazonas feita pelo padre
Samuel Fritz, datada de 1707.
182
Anexo 04: Carta do Novo reino de Granada, Nova
Andaluzia e Guiana, feita pelo engenheiro M. Bonne,
datada de 1780.
183
Anexo 05: Carta Geral da Guiana, feita por N. Buache,
datada de 1798.
184
Anexo 06: Carta de Caracas e Guiana, elaborada por
Pinkerton em 1818.
185
Anexo 07: Planta da fortificação no Cumaú, datada de
1765.
186
Anexo 08: Questionário estruturado da pesquisa oral
(quantitativa)
187
Anexo 09: Boletim de Informação de Cadastramento
Imobiliário referente ao terreno situado à Av. Rio
Trombetas, nº 54 (Acervo da Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e de Resíduos Sólidos, PMS)
188
Anexo 10: Mapa de matrículas de terrenos no Igarapé
da Fortaleza, disponibilizado pela Secretaria de
Desenvolvimento Urbano e de Resíduos Sólidos
(SEMDURES) da Prefeitura Municipal de Santana
189
Anexo 11: Lista definitiva da coleção arqueológica
armazenada
190
Anexo 12: Material de Divulgação produzido para
Seminário Forte Cumaú: História, Arqueologia e
Comunidade
191
Anexo 13: Diagnóstico do bem: áreas fragilizadas na
estrutura arquitetônica
192