Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
britânico Isaiah Berlin adaptou este clássico conto de O populismo está na ordem do dia.
Este artigo dá uma visão geral
das discussões concetuais do fenó‑
fadas às preocupações mais «adultas» com o populismo, meno, e as suas consequências para a
assinalando mesmo um «complexo de Cinderela» no seu teoria e prática democráticas. O artigo
conclui com uma discussão sobre a
estudo. Na versão berliniana, também existe um sapatinho direita radical contemporânea, o seu
(o populismo) mas o final, ao contrário da fábula original, caráter populista, e o impacto do tema
da imigração para a sua ascensão na
continuava em aberto, pois o príncipe vagueava à procura
Europa.
do pezinho certo. Moral da história: o populismo sim‑
plesmente «não cabia», persistia em ser um termo escor‑ Palavras-chave: Populismo, democracia,
Europa, imigração.
regadio e resistente a definições claras 1. No mundo
académico isso significava que a busca pelo pezinho
redentor continuaria pelo tempo fora.
E continua na segunda década do século xxi. Embora o
«final feliz» para o conto de Berlin nunca venha a concre‑
ABSTRACT
tizar-se (isso seria admitir como plausível a implausibi‑
lidade do unanimismo académico), isso não significa que Once upon a time
the Populism…
a delimitação concetual do populismo não tenha progre‑
dido, impulsionada por um número cada vez maior de
estudos sobre o fenómeno. E de tal modo avançou que a
P opulism is on the agenda. This
article gives an overview of the
conceptual discussions about the
(ainda) frequente referência ao caráter intrinsecamente phenomenon as well as its conse‑
quences to democratic theory and
vago do populismo se faça mais por conforto e hábito practice. The article concludes with a
mental do que como reflexo analítico do estado atual da discussion of the contemporary radi‑
cal right, its populist nature, and the
literatura. Em termos de definição a principal divisão que impact of the theme of anti-immigra‑
persiste centra-se na teorização do populismo como estra- tion on its rise in Europe.
tégia e mobilização por parte das elites, como forma de Keywords: Populism, democracy,
chegar ao poder ou cimentá-lo, e o seu enquadramento Europe, immigration
A CÓLERA DE ANTEU
O espectro de Anteu assombra a União Europeia (ue). Foi Umberto Bossi, o fundador
da Liga do Norte, que, num congresso do partido em meados dos anos 1990, comparou
o seu movimento ao gigante da mitologia grega. Se a sua força advinha do contacto
com a terra, «a investida explosiva da Liga vem de baixo, porque a força da Liga vem
da soberania popular, da qual é o intérprete mais direto e qualificado»13. Esta avocação
– a de uma relação única e exclusiva com os sentimentos e aspirações do povo – podia
ser feita por qualquer dos partidos da família política que o campo académico designa
como de direita radical. Muitas vezes categorizada também, desde a sua emergência
nos anos 1980, como «extrema-direita», aos poucos a palavra radical vai-se impondo,
deixando para o campo do extremismo os movimentos extraparlamentares, proponen‑
tes da violência política, ou simplesmente antidemocráticos. Já os partidos radicais
participam em eleições, não defendem nenhuma tomada violenta do poder, e respeitam
tas destas sociedades dos modelos multiculturais difundidos no outro lado da cortina.
Dito isto, e em face da reação, por exemplo, na chamada crise dos refugiados, caso
esse fluxo imigratório acontecesse, a posição anti-imigracionista subiria naturalmente
ao topo da agenda populista da Europa de Leste.
Por ideologia, desleixo, ou incúria dos partidos ditos não populistas, a direita radical
populista apropriou-se, ao longo de décadas, do tema da imigração, tornando-o «seu»
e enquadrando-o como peça principal da sua defesa da soberania popular. Em termos
de performance eleitoral, isso significa que, como de resto é demonstrado por estudos
1 9
B erlin, Isaiah – «To define populism».
Chwalisz, Claudia – The Populist Signal: den , Michael, S argent, Lyman Tower, e
1 de maio de 1967, p. 6. Disponível em: Why Politics and Democracy Need to Change. S tears , Marc – The Oxford Handbook of
http://berlin.wolf.ox.ac.uk/lists/bibliogra- Londres: Policy Network, 2015, p. 97. Political Ideologies. Nova York: Oxford Uni-
phy/bib111bLSE.pdf. versity Press, 2013, p. 504.
10
Mudde , Cas, e K altwasser, Cristóbal
2 18
Freeden, Michael (org.) – Reassessing Rov ir a – «Populism». In F r e e de n , Pirro, Andrea L. P. – The Populist Radi-
Political Ideologies: The Durability of Dis- Michael, S a r gen t, Lyman Tower, e cal Right in Central and Eastern Europe:
sent. Londres: Routledge, 2001, p. 203. S tears , Marc – The Oxford Handbook of Ideology, Impact, and Electoral Performance.
Political Ideologies. Nova York: Oxford Uni- Londres: Routledge, 2015, p. 15.
3
K a lt wa s ser , Cr istóbal Rovir a – versity Press, 2013, pp. 494-498.
19
«Explaining the emergence of populism». Van K essel , Stijn – Populist Parties in
11
In D e L a Torre , Carlos – The Promise and L owndes , Joe, e W arren , Dorian – Europe: Agents of Discontent?. Palgrave
Perils of Populism: Global Perspectives. «Occupy Wall Street: a twenty-first cen- Macmillan, 2015, p. 24.
Lexington: University Press of Kentucky, tur y populist movement?». In Dissent.
20
2015, pp. 191-192. Outubro de 21. Disponível em: https:// Citado em Taguieff, Pierre-André –
w w w.dissentmagazine.org/online_ar ti- Du diable en politique: Réflexions sur l’anti-
4
Ostiguy, Pierre – «Flaunting the “Low” cles/occupy-wall-street-a-twenty-first- lepénisme ordinaire. Paris: cnrs Editions,
in politics: a cultural-relational approach -century-populist-movement. 2014, p. 141.
to Populism». In Taggart, Paul et al. – The
12 21
Oxford Handbook on Populism. Nova York: A bromeit, John, et al. – «Introduction» P ew Research C enter – Report – 12
Oxford University Press, 2017. – Transformations of Populism in Europe and de maio de 2014, p. 27. Disponível em:
the Americas: History and Recent Tendencies. h t t p : / / w w w . p e w g l o b a l .
5
D e L a Torre , Carlos – «Las tensiones Londres: Bloomsbury, 2016, pp. xv-xix . org/2014/05/12/a-fragile-rebound-for-eu-
no resueltas entre el populismo y la demo- -image-on-eve-of-european-parliament-
13
cracia procedimental». In Recso: Revista Z úque te , José Pedro – Missionary -elections/.
de Ciencias Sociales. Vol. 2, Ano 2, 2011, Politics in Contemporary Europe. Syracuse,
22
pp. 63-79. NY: Syracuse University Press, 2007, p. 157. S ta nda rd E uroba rome ter 8 4 –
Public opinion in the European Union –
6 14
R oberts , Kenneth, M. – «Populism, Taguieff, Pierre-André – Du diable en outono de 2015, p. 9.
political mobilizations, and crises of poli- politique: Réflexions sur l’antilepénisme
23
tical representation». In D e L a Torre , ordinaire. Paris: cnrs Editions, 2014, Mudde , Cas – «Populist radical right
Carlos – The Promise and Perils of Populism: pp. 189, 271-272. parties in Europe today.» In A bromeit,
Global Perspectives. Lexington: University John, et al., – Transformations of Populism
15
Press of Kentucky, 2015, pp. 147-150. Z úque te , José Pedro – Missionary in Europe and the Americas: History and
Politics in Contemporary Europe, p. 78. Recent Tendencies. Londres: Bloomsbury,
7
M c C ormick , John. P. – «Contempo- 2016, pp. 300-302.
16
rary democracy in crisis and the populist Zúquete , José Pedro – «A Europa, a
24
cry of pain». 3 de junho de 2015, p. 3. Dis- extrema-direita, e o islão». In Locus: A fp – «Juncker urges eu members to
poní vel em: ht tps: // w w w. ac ademia. Revista de História. Vol. 18, N.º 1, pp. 209- resist “populist” rejection of migrants». 5
e du / 2 2 2 2 5 2 8 7/ C o ntemp o r ar y_ dem o - -240, 2012. Disponível em: http://w w w. de agosto de 2015.
cracy_in_crisis_and_the_populist_cr y_ editor aufjf.com.br/rev ista / index.php/
25
of_pain_Public_Lecture_. locus/ article/viewFile/1996/1441. Standard Eurobarometer 84 – Public
opinion in the European Union, p. 13.
8 17
C anovan, Margaret – «Trust the peo- Este ponto é bem explicado, por exem-
26
ple! Populism and the two faces of demo- plo, em M udde , Cas, e K alt wa sser , Van K essel , Stijn – Populist Parties in
cracy». In Political Studies. 47, 1999, pp. 4-6. Cristóbal Rovira – «Populism». In Free- Europe: Agents of Discontent?, p. 32.
BIBLIOGRAFIA
A bromeit, John, et al. – Transformations Chwalisz , Claudia – The Populist Signal: F reeden , Michael, S a rgent, Lyman
of Populism in Europe and the Americas: Why Politics and Democracy Need to Change. Tower, e S tears , Marc – The Oxford Han-
History and Recent Tendencies. Londres: Londres: Policy Network, 2015. dbook of Political Ideologies. Nova York:
Bloomsbury, 2016, pp. xv-xix . Oxford University Press, 2013.
D e L a Torre , Carlos – «Las tensiones no
afp – «Juncker urges eu members to resueltas entre el populismo y la demo- Lowndes, Joe, e Warren, Dorian – «Occupy
resist “populist” rejection of migrants». cracia procedimental». In Recso: Revista Wall Street: a twenty-first century populist
5 de agosto de 2015. de Ciencias Sociales. Vol. 2, Ano 2, 2011, movement?». In Dissent. Outubro de 21. Dis-
pp. 63-79. ponível em: https://www.dissentmagazine.
B erlin , Isaiah – «To define populism». org/online_articles/occupy-wall-street-a-
21 de maio de 1967, p. 6. Disponível em: D e L a Torre , Carlos – The Promise and -twenty-first-century-populist-movement.
http://berlin.wolf.ox.ac.uk/lists/bibliogra- Perils of Populism: Global Perspectives.
phy/bib111bLSE.pdf. Lexington: University Press of Kentucky, M c C ormick , John. P. – «Contemporary
2015, pp. 189-228. democracy in crisis and the populist cry of
C anovan, Margaret – «Trust the people! pain». 3 de junho de 2015, p. 3. Disponível
Populism and the two faces of democracy». F reeden , Michael (org.) – Reassessing em: https://www.academia.edu/22225287/
In Political Studies. 47, 1999, pp. 2-16.
Political Ideologies: The Durability of Dis- Contemporary_democracy_in_crisis_and_
sent. Londres: Routledge, 2001. the_populist_cry_of_pain_Public_Lecture_