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Público • Sábado 20 Novembro 2010 • 39

Espaçopúblico
A situação é tão grave e exige medidas tão difíceis durante tantos anos que apostar no curto prazo é suicida

Ainda não perceberam o buraco em que estamos metidos

M
RUI GAUDÊNCIO
etade da última semana foi passada uma lei do despedimento individual de betão e
a especular sobre se recorríamos ou uma lei de despedimentos colectivos que é man-
não à ajuda do fundo de resgate euro- teiga, o que penaliza tanto os bons trabalhadores
peu e do FMI ou se não precisávamos como as boas empresas. Ao mesmo tempo, será
de o fazer. A outra metade foi a ouvir necessário quebrar o poder das corporações que
declarações piedosas sobre o apoio ao “esforço or- se apoderaram de partes da administração públi-
çamental” português, manifestações de solidarie- ca, umas tomando-as por dentro, outras cercando-
José dade e, por fim, proclamações de intenção sobre o a por fora.
Manuel rigor que não se teve no passado e se terá no futuro. Em suma: mesmo que o “cadernos de encargos”
Fernandes Infelizmente, é tudo espuma. Com ou sem FMI, te- não seja exactamente o que descrevi, o trabalho é
mos e teremos trabalhos de Hércules pela frente. imenso, implicará muitos sacrifícios, gerará temí-
Extremo Com mais palavras a enervar “os mercados” ou mais veis resistências e, para ser absolutamente franco,
ocidental declarações a tentar acalmá-los, não deixámos de não acredito que possa ser concretizado por um só
estar na corda bamba. partido, mesmo que este tivesse a maioria absolu-
Deixemos de lado, por agora, saber como e com ta. Hoje por hoje, é evidente para todos que nunca
quem entrámos para o buraco em que nos encontra- será o actual Governo a levar por diante – mesmo
mos – o tempo é sempre um juiz implacável, mesmo que obrigado pelo exterior – um tal processo de re-
quando se faz esperar. Fixemo-nos antes nos proble- formas. Mas também não imagino que, após umas
mas que temos e em como ultrapassá-los. eventuais eleições antecipadas, uma nova maioria
Comecemos por um breve recordatório dos pro- de centro-direita, se viesse a existir, pudesse con-
blemas. Primeiro que tudo, uma economia anémica, cretizá-las tendo de enfrentar a resistência feroz
incapaz de crescer, quase estagnada há dez longos de um PS regressado à oposição. Cairia o Carmo e
anos, sinal do esgotamento dos factores que propor- a Trindade e não faltariam apelos a que se regres-
cionaram o nosso desenvolvimento nos últimos 50 sasse às trincheiras do “Estado social”.
anos. Depois, um Estado gordo, demasiado presen- Não me surpreendeu, por isso, a entrevista de
te, demasiado burocrático, que asfixia a economia Luís Amado. Ele sabe o que dizem lá fora de Portu-
porque cobra demasiados impostos, porque produz gal, sabe que não temos credibilidade nem margem
regulamentos a mais, porque desconfia dos cida- de manobra e sabe onde (não) nos leva a actual
dãos, porque tem um défice crónico que gera uma solução de governação e o seu primeiro-ministro.
dívida crescente. Por fim, um país que se habituou a Da mesma forma que não me surpreenderam as
viver acima das suas capacidades, com um número reacções de Sócrates ou de Miguel Relvas, a não
excessivo de dependentes do Estado e uma cultura quererem sequer falar do assunto. Ou os textos, no
avessa ao risco e ao empreendorismo, um país onde PÚBLICO, de Vital Moreira e Luís Filipe Menezes, a
há demasiados particulares e demasiadas empresas reduzirem a temática ao simples cálculo partidário:
sobrendividadas. Vital não quer que o PS fique com o ónus das me-
Boa parte destes problemas existe porque, como didas difíceis, Menezes quer que “quem comeu a
disse esta semana Fernando Ulrich, presidente do Quando se afastam com Tem de fazer emagrecer o peso do carne roa agora os ossos”. São duas faces da mesma
BPI, “aquilo que os países que entraram na Zona Estado e das regulamentações, moeda: gincana eleitoral de curto prazo.
Euro fizeram foi aderir ao marco”. Ora “a elite e os desprezo os cenários de única forma de diminuir o défice É por tudo isto que me escuso de fazer previsões,
decisores políticos portugueses não perceberam e, ao mesmo tempo, diminuir as juízos de valor ou mesmo a defender a formação
isto. Não devíamos ter deixado subir os salários e a
uma “grande coligação” contribuições que penalizam o tra- agora ou depois de umas hipotéticas eleições de
despesa pública como deixámos”. Ou seja, ao con- não se explica como se balho (como a taxa social única) e uma “grande coligação”. Apenas fico por esta cons-
trário do que por aí se anda a dizer, o problema não as actividades económicas (como o tatação: a situação do país é tão difícil que não vejo
é da Alemanha, que fez o seu trabalho de casa, mas conseguirá a credibilidade IRC). Não vejo forma de isso acon- como poderá um Governo sem uma ampla maioria
de “Portugal, da Grécia e da Irlanda, que tinham de alargada indispensável tecer sem, como vai fazer o Reino enfrentá-los. E nem sequer é garantido que, mesmo
ter a capacidade para gerir a situação”. Não tiveram Unido, dispensar funcionários existindo essa ampla maioria, os partidos que temos
e não vale a pena chorar sobre o leite derramado: à gestão do tempo de públicos. Isso mesmo: quebrar o corrijam os seus péssimos hábitos clientelares e te-
ou fazemos agora o que já devia ter sido feito, ou tabu do “emprego para a vida” na nham o sentido de Estado que há décadas desapa-
arriscamos ficar sem crédito, sem investimento, na
sacrifícios que aí vem administração pública. receu da governação e que tanta falta faz.
bancarrota e a sermos tratados como um simples Também não será possível au- É por isso que também é fundamental existir
protectorado. É certo que há por aí quem ainda vá mentar a competitividade do país – e corrigir a na sociedade um forte movimento a exigir que se
ao Parlamento defender que não nos devíamos preo- enorme injustiça geracional que é o desemprego mude realmente de vida, mas isso é um outro pro-
cupar com a dívida (como sucedeu esta semana com jovem – se não se liberalizar a lei laboral. Temos blema. Jornalista (twitter.com/jmf1957)
o secretário de Estado do Orçamento), mas é tempo
de acabar com tais “estados de negação”.
Ora, romper com o “estado de negação” começa
por assumir que o esforço que teremos de fazer não
Olha que a festa já acabou, pá
é passageiro – é estrutural e deverá exigir muitos
e longos anos de correcção gradual se quisermos a Uma notícia que veio no Uma notícia saída no Correio Estes são apenas mais dois
evitar uma ruptura brutal. Porque só há uma forma PÚBLICO: um tal Pedro Gomes, da Manhã: o Instituto Nacional da pequenos exemplos de como
de sairmos do buraco onde estamos: sermos mais jovem afoito de 26 anos, sem Propriedade Intelectual pagou funciona o Estado clientelar em
competitivos. E só há uma maneira de o conseguir: qualificações conhecidas que 20 mil euros ao ISCTE e a uma que vivemos. Uma minúscula
trabalhando mais, trabalhando melhor, começando não as de funcionário do PS, foi empresa chamada 5.ª Potência parte da ponta do icebergue. Mas
por ganhar menos até conseguir ganhar mais, con- contratado para assessorar uma para criar uma conta no Twitter. o que se avista à vista desarmada
sumindo menos até voltarmos a equilibrar as con- vereadora que milita na secção O extraordinário é que criar uma revela uma desfaçatez no modo de
tas. Poucos políticos têm dito isto preto no branco, que o rapaz “coordena”. Valor da conta nessa rede de microbloguing actuação que só tem uma explicação
mas reconheça-se que entre eles se contam Pedro avença: 3950 euros. Pormenor é gratuito e demora uns cinco possível: num país onde os de cima,
Passos Coelho (no Facebook) e Manuela Ferreira picante: quando o jovem socialista minutos para principiantes. O sobretudo o lá de cima mesmo,
Leite (na AR). ficou “desempregado”, o IEFP mais extraordinário é o INPI ter ficam não apenas impunes como se

U
concedeu-lhe um subsídio de 41.100 emitido um comunicado a justificar riem, ninguém se deveria incomodar
m Governo que queira recolocar Por- euros para criar uma empresa (de o gasto, aludindo ao número de com estas miudezas de quem trate o
tugal no mapa – isto é, um Governo construção civil) e o seu próprio posts (que é ridículo) e ao alcance da aparelho de Estado e o dinheiro dos
que não se satisfaça com deitar fogue- posto de trabalho. Detalhe familiar: mensagem (que mais ridículo é, pois contribuintes como coisa sua.
tes cada vez que faz um novo acordo o pai é funcionário do PS e residiu a conta quase não tem seguidores). É tempo de se cuidarem: a
comercial com a Venezuela ou com a até 2008 numa casa da CML com Aparentemente, quem dirige aquele “festa” está a acabar, e o fim pode
Líbia – tem que tomar muitas medidas estruturais. uma renda de 48 euros/mês. instituto acha que é inimputável. vir a ser feio.

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