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SAÚDE COLETIVA - EAD

O que é política de saúde?


Política de saúde é concebida como uma política pública, e pode ser entendida como a
atribuição definida politicamente de direitos e deveres legais dos cidadãos. Esses direitos
constituem a transferência de dinheiro e serviços com o objetivo de compensar condições de
necessidades e risco para o cidadão que goza de tal direito e não consegue acesso a esses bens
com seus próprios recursos ou dotes individuais. É a ação ou omissão do Estado, enquanto
resposta social, diante dos problemas de saúde e seus determinantes, bem como em relação à
produção, distribuição e regulação de bens, serviços e ambientes que afetam a saúde dos
indivíduos e da coletividade.
 A palavra política é grega: ta politika, vinda de polis - Polis é a cidade entendida
como a comunidade organizada, formada pelos cidadãos nascidos nela, livres e iguais,
portadores de dois direitos inquestionáveis: a isonomia (igualdade perante a lei) e a
isogoria (o direito de expor e discutir em público opiniões sobre ações que a Cidade
deve ou não deve realizar).
 A política pública é resultado de um processo que envolve interesses divergentes,
confrontos e negociações entre várias instâncias instituídas, ou arenas, e entre os atores
que delas fazem parte. A política pública pode ser definida como um conjunto de ações
e omissões que manifesta uma modalidade de intervenção do Estado em relação a
uma questão que chama a atenção, o interesse e a mobilização de outros atores da
sociedade civil. Dessa intervenção, pode-se inferir uma determinada direção, uma
determinada orientação normativa, que, presumivelmente, afetará o futuro curso
do processo social desenvolvido, até então, em torno do tema. (Oszlak e O’Donnell,
1976:21).
O que são sistemas de proteção social?
O termo proteção social é compreendido como a garantia de inclusão a todos os cidadãos que
se encontram em situação de vulnerabilidade e/ou em situação de risco, inserindo os na rede de
proteção social local. A proteção social é hierarquizada em básica e especial.
O que são sistemas de saúde?
Os modelos mais adotados de sistemas de saúde são os instituídos pelo Estado, e as primeiras
iniciativas estatais nessa direção remontam ao final do século XIX na Alemanha, por iniciativa
de Bismarck (Otto Von Bismarck). Geralmente, a iniciativa estatal abrange outras áreas
submetidas a riscos sociais, como classicamente a do envelhecimento e perda da capacidade
laboral . Os sistemas de saúde compoem juntos os sistemas de previdencia, o aparato estatal de
proteção social, tendo como característica a universalização da cobertura visando garantir
segurança para os cidadãos.
No entanto, é no século XX, quando se ampliam os limites da cidadania com a adoção, por
vários países, de garantias sociais como Direito Social, que ocorrem, notadamente após a
Segunda Guerra Mundial, o desenvolvimento e a consolidação dos sistemas de saúde em
diversos países, como o sistema inglês Health National Services (NHS), que serviu de
inspiração para vários outros sistemas em outros países.
A cobertura populacional, o acesso e a oferta de bens e serviços decorrem de fatores políticos
– o tipo de Estado e o grau de organização social – e econômicos – a inserção na economia
capitalista mundial e o grau de riqueza expresso pelo Produto Interno Bruto (PIB) ou Produto
Nacional Bruto (PNB) – e, de alguma forma, são expressos nos modelos de financiamento dos
sistemas de saúde.
Os sistemas de saúde e os sistemas de proteção social adquirem estrutura diferenciada no tempo
e no espaço, admitindo formas múltiplas de organização, cobertura, financiamento e
participação das instituições privadas. No caso da saúde, a forma como a sociedade se organiza
para proteger seus indivíduos e grupos sociais contra os riscos de adoecer e morrer é que vai
determinar a configuração do sistema de saúde, assim como a natureza das relações entre
Estado e sociedade, público e privado, vai definir a oferta dos serviços de saúde.
A tipologia mais frequentemente empregada para os sistemas de saúde é baseada em diferentes
estudos que vinculam os sistemas de saúde aos sistemas de proteção social, historicamente
criados a partir de três classificações: a assistência social; o seguro social; e a seguridade social
(ou sistemas nacionais e universais de saúde).
Os sistemas de saúde compõem-se de estruturas com atividades bastante distintas, mas
conexas, que podem ser classificadas em dois grandes agrupamentos: as estruturas
assistenciais e as estruturas voltadas para a realização das funções do sistema.
 Estruturas assistenciais são integradas pela rede de serviços (hospitais,
ambulatórios, consultórios, laboratórios clínicos e radiológicos, entre outros) e o
pessoal de saúde (profissionais e técnicos com formação específica em saúde e
trabalhadores da saúde). Suas principais atividades vinculam-se ao acesso e à
produção de serviços de acordo com os parâmetros definidos pelo sistema de saúde.
 Estruturas voltadas para as funções são integradas pelos sistemas de
planejamento, informação, controle e avaliação (no caso brasileiro, as unidades
vinculadas a órgãos estatais, como ministérios, secretarias estaduais e municipais
de saúde, agência reguladora, entre outras). Suas principais atividades residem na
organização e na regulação do funcionamento do sistema de saúde, destacando-se
as medidas para sua racionalização.
Os principais componentes dos sistemas de saúde são a cobertura, os recursos (humanos,
econômicos, a rede de serviços, os insumos, a tecnologia e o conhecimento em saúde) e as
organizações.
A dinâmica dos sistemas de saúde pode ser caracterizada por funções e relações que se
estabelecem entre seus componentes, resultam em políticas, ações e serviços prestados,
determinam o desempenho dos sistemas e contribuem para os resultados nas condiçoes de
saúde da população. Funções
Financiamento
Componentes Prestação de Serviço
Cobertura Regulação
Recursos Gestão

Contexto Social, político e econômico


Atores/agentes
Interesses
Projetos
Estratégias

Desempenho dos Sistemas


Condições de Saúde
O financiamento dos sistemas de saúde ocorre exclusivamente por recursos públicos (impostos,
contribuições sociais e renúncia fiscal) ou fundos privados (desembolso direto, copagamento)
e, alternativamente, por um mix dessas fontes, conformando diversos modelos de
financiamento. Destacam-se quatro como os principais meios de financiamento da saúde:
modelos assistencialista, previdencialista, universalista unificado e universalista diversificado.
 No modelo previdencialista, as camadas de baixa renda são as mais prejudicadas, pois
não há recursos definidos para custeio de serviços. Os trabalhadores formais são
financiados pelas contribuições sociais sobre a folha de salário, e as camadas de alta
renda o são também pelo pagamento direto aos serviços prestados.
 No modelo universalista, há um mix de fontes de financiamento: recursos fiscais para
camadas de baixa renda, pagamento direto pelos serviços para trabalhadores formais e
camadas médias, e exclusivamente pagamento direto pelos serviços para camadas de
alta renda.
Apesar de todos os esforços para cumprir com as recomendações do sistema de saúde no âmbito
da prestação da atenção, ainda persistem grandes entraves que impossibilitam a consolidação.
Dos princípios do nosso sistema de saúde. Dentre eles, os mais relevantes são: desigualdade de
acesso aos serviços de saúde, inadequação dos serviços às necessidades de saúde da população
e da demanda do local, baixo nível de qualidade dos serviços oferecidos, pouca ou ausência de
integralidade das ações.
Como se formou o sistema de saúde brasileiro?
A primeira iniciativa do Estado brasileiro na construção do sistema de saúde poderia se
aproximar da noção de proteção social e data de 1923, com a edição da Lei Eloy Chaves e a
criação das Caixas de pensão e aposentadoria, que também garantiam a assistência médica aos
contribuintes. Da década de 1920 até o final de 1980, o que pode ser reconhecido como sistema
de saúde pautava-se majoritariamente pela noção de seguro social (garantia de acesso apenas a
quem contribui) e se caracterizava por uma miríade de instituições públicas e algumas privadas
sem articulação entre si. Nesse período, a assistência médica vinculava-se à previdência social
e as ações coletivas de saúde eram de responsabilidade do Ministério da Saúde. Paralelamente,
desde a década de 1940, foram instituídas as primeiras modalidades de assistência médica
suplementar, inicialmente dirigidas aos funcionários públicos da união e de alguns estados.
Contudo, a primeira empresa de medicina de grupo brasileira surge em 1957 para prestar
serviços à Volkswagen, que inaugurava a sua fábrica em São Bernardo do Campo. Esse
arremedo de sistema imperou no Brasil durante 65 anos, sendo voltado à população urbana,
mais especificamente para os trabalhadores formais e para parcelas do funcionalismo público
federal e de alguns estados, como São Paulo. Suas bases de financiamento eram as contribuições
compulsórias sobre as folhas de salário. aos demais brasileiros, a maior parte da população,
estava reservada a assistência médica privada, por meio das Santas Casas ou a estatal, realizada
pelas poucas instituições públicas de saúde existentes, geralmente vinculadas ao governo
federal e aos estados e municípios mais ricos.
A promulgação da Constituição Federal de 1988 rompeu com essa situação, ao menos no plano
do ideário. A adoção do conceito de seguridade social e a criação do sistema único de saúde
representam uma grande inflexão na política de saúde no Brasil. É também essa mesma Carta
que legitima a atuação do setor privado de saúde, que se arregimenta no sistema supletivo de
assistência médica.
O sistema de saúde brasileiro é constituído por pelo menos dois subsistemas: um
governamental, o Sistema Único de Saúde (SUS), e outro privado, o Sistema Supletivo de
Assistência Médica (SSAM).
De uma perspectiva operacional, há vários pontos de contatos entre eles, principalmente em
relação aos profissionais de saúde e alguns serviços assistenciais. Porém, em termos de
possibilidade de acesso da população, há uma inseparável barreira, uma espécie de muro
intransponível para a maior parte da população, justamente para a parcela relativamente mais
necessitada. Como será argumentado a seguir, o problema não é a existência de um segmento
público e de outro privado no sistema de saúde, mas sim o tipo de relação estabelecida entre
eles, a qual se constitui em enorme empecilho para a efetivação de um sistema universal de
saúde no cotidiano da população, tal como preconizado pela Constituição.
O sistema de saúde brasileiro é constituído por uma variedade de organizações públicas e
privadas estabelecidas em diferentes períodos históricos. No início do século XX, campanhas
realizadas sob moldes quase militares implementaram atividades de saúde pública. A natureza
autoritária dessas campanhas gerou oposição por parte da população, políticos e líderes
militares. Tal oposição levou à Revolta da Vacina, em 1904, episódio de resistência a uma
campanha de vacinação obrigatória contra a varíola sancionada por Oswaldo Cruz, o então
diretor geral de Saúde Pública. O modelo de intervenção do Estado brasileiro na área social
data das décadas de 1920 e 1930, quando os direitos civis e sociais foram vinculados à posição
do indivíduo no mercado de trabalho.
O sistema de proteção social brasileiro expandiu-se durante o governo do presidente Getúlio
Vargas (1930-1945) e dos governos militares (1964-1984). O processo de tomada de decisão
e a gestão do sistema eram realizados sem participação da sociedade e estavam centralizados
em grandes burocracias. O sistema de proteção social era fragmentado e desigual. O sistema
de saúde era formado por um Ministério da Saúde subfinanciado e pelo sistema de assistência
médica da previdência social, cuja provisão de serviços se dava por meio de institutos de
aposentadoria e pensões divididos por categoria ocupacional (por exemplo, bancários,
ferroviários, entre outros), cada um com diferentes serviços e níveis de cobertura. As pessoas
com empregos esporádicos tinham uma oferta inadequada de serviços, composta por serviços
públicos, filantrópicos ou serviços de saúde privados pagos do próprio bolso. Após o golpe
militar de 1964, reformas governamentais impulsionaram a expansão de um sistema de saúde
predominantemente privado, especialmente nos grandes centros urbanos. Seguiu-se uma rápida
ampliação da cobertura, que incluiu a extensão da previdência social aos trabalhadores rurais.
Entre 1970 e 1974, foram disponibilizados recursos do orçamento federal para reformar e
construir hospitais privados. a responsabilidade pela oferta da atenção à saúde foi estendida
aos sindicatos, e as instituições filantrópicas ofereciam assistência de saúde a trabalhadores
rurais. Os subsídios diretos a empresas privadas para a oferta de assistência médica a seus
empregados foram substituídos por descontos no imposto de renda, o que levou à expansão da
oferta dos cuidados médicos e à proliferação de planos de saúde privados. A maior cobertura da
previdência social e um mercado de saúde baseado em pagamentos a prestadores do setor
privado com base nos serviços realizados (fee for service) geraram uma crise de financiamento
na previdência social que, associada à recessão econômica da década de 1980, alimentou os
anseios pela reforma.

O que foi a reforma sanitária no Brasil?


A reforma sanitária brasileira foi proposta num momento de intensas mudanças e sempre
pretendeu ser mais do que apenas uma reforma setorial. Almejava-se, desde seus primórdios,
que pudesse servir à democracia e à consolidação da cidadania no país. A realidade social, na
década de 1980, era de exclusão da maior parte dos cidadãos do direito à saúde, que se constituía
na assistência prestada pelo Instituto Nacional de Previdência Social, restrita aos trabalhadores
que para ele contribuíam, prevalecendo a lógica contraprestacional e da cidadania regulada.
A reforma do setor de saúde no Brasil estava na contramão das reformas difundidas naquela
época no resto do mundo, que questionavam a manutenção do Estado de Bem-estar Social. A
proposta brasileira, que começou a tomar forma em meados da década de 1970, estruturou-se
durante a luta pela redemocratização. |Um amplo movimento social cresceu no país, reunindo
iniciativas de diversos setores da sociedade – desde os movimentos de base até a população de
classe média e os sindicatos –, em alguns casos associados aos partidos políticos de esquerda,
ilegais na época. A concepção política e ideológica do movimento pela reforma sanitária
brasileira defendia a saúde não como uma questão exclusivamente biológica a ser
resolvida pelos serviços médicos, mas sim como uma questão social e política a ser
abordada no espaço público. Professores de saúde pública, pesquisadores da Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e profissionais de saúde de orientação
progressista engajaram-se nas lutas dos movimentos de base e dos sindicatos. O Centro
Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) foi fundado em 1976, organizando o movimento da
reforma sanitária, e, em 1979, formou-se a Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde
Coletiva (Abrasco). Ambos propiciaram a base institucional para alavancar as reformas.
A expressão reforma sanitária foi usada pela primeira vez no país em função da reforma
sanitária italiana. A expressão ficou esquecida por um tempo até ser recuperada nos debates
prévios à 8ª Conferência Nacional de Saúde, quando foi usada para se referir ao conjunto de
ideias que se tinha em relação às mudanças e transformações necessárias na área da saúde. Essas
mudanças não abarcavam apenas o sistema, mas todo o setor saúde, introduzindo uma nova
ideia na qual o resultado final era entendido como a melhoria das condições de vida da
população. No início das articulações, o movimento pela reforma sanitária não tinha uma
denominação específica. Era um conjunto de pessoas com ideias comuns para o campo da
saúde. Em uma reunião na Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) em Brasília, esse
grupo de pessoas, entre as quais estava Sergio Arouca, foi chamado de forma pejorativa de
“partido sanitário”.
Apesar disso, o grupo não se constituía como partido, pois sua mobilização era mais ampla,
sendo considerada uma ação social. Em uma dissertação de mestrado orientada por Sergio
Arouca em 1986, com o título Reviravolta na Saúde: Origem e Articulação do Movimento
Sanitário, a atuação desse grupo foi chamada pela primeira vez de movimento sanitário.
Surgiram, também, outras denominações, como “movimento pela reforma sanitária” e
“movimento da reforma sanitária”. No livro o Dilema preventivista, uma nota feita por arouca
diz que todos esses termos podem ser usados indistintamente.
Considerado “o eterno guru da reforma sanitária”, Sergio Arouca costumava dizer que o
movimento da reforma sanitária nasceu dentro da perspectiva da luta contra a ditadura. Existia
uma ideia clara na área da saúde de que era preciso integrar duas dimensões: a de ser médico e a
de lutar contra a ditadura. Os departamentos de medicina preventiva da universidade de São
Paulo e da Universidade de Campinas e o Instituto de Medicina Social da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro eram os espaços adequados para isso.
Esses locais abriram brechas para a entrada do novo pensamento sobre a saúde, lançado pelo
movimento da reforma sanitária. Essa mudança começou no final dos anos 1960 e início dos
anos 1970 – o período mais repressivo do autoritarismo no Brasil –, quando se constituiu a base
teórica e ideológica do pensamento médico-social, também chamado de abordagem marxista da
saúde e teoria social da medicina.
A forma de olhar, pensar e refletir o setor saúde nessa época era muito concentrada nas ciências
biológicas e na maneira como as doenças eram transmitidas. Há uma primeira mudança quando
as teorias das ciências sociais começam a ser incorporadas. Essas primeiras teorias, no entanto,
estavam muito ligadas às correntes funcionalistas, que olhavam para a sociedade como um lugar
que tendia a viver harmonicamente e precisava apenas aparar arestas entre diferentes interesses.
a grande virada da abordagem da saúde foi a entrada da teoria marxista – o materialismo
dialético e o materialismo histórico – que mostra que a doença está socialmente determinada.
No Brasil, duas teses, consideradas um marco divisor de águas, dão início à teoria social da
medicina. São elas: o Dilema preventivista, de Sergio Arouca, e Medicina e Sociedade, de
Cecília Donnangelo – ambas de 1975. A partir daí, pode-se dizer que foi fundada uma teoria
médico-social para análise de como as coisas se processam no campo da saúde no país. Essa
nova abordagem torna-se conhecimento relevante, reconhecido academicamente, difundido e
propagado.
Durante todo o processo de modificação da abordagem da saúde, várias correntes se juntam
como protagonistas. O movimento estudantil teve um papel fundamental na propagação das
ideias e fez que diversos jovens estudantes começassem a se incorporar nessa nova maneira de
ver a saúde. As semanas de estudos sobre saúde comunitária, realizadas pela primeira vez em
1974, e os encontros científicos dos estudantes de medicina, em especial os realizados entre
1976 e 1978, foram importantes nesse sentido, por serem espaços praticamente ignorados pela
repressão militar, que não identificava o caráter político de suas discussões.
Dentre esses diversos atores do movimento sanitário, destacam-se ainda: os médicos residentes,
que na época trabalhavam sem carteira assinada e com uma carga horária excessiva; as
primeiras greves realizadas depois de 1968; e os sindicatos médicos, que também estavam em
fase de transformação. Esse movimento entra também nos conselhos regionais, no Conselho
Nacional de Medicina e na Associação Médica Brasileira – as entidades médicas começam a
ser renovadas. A criação do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), em 1976, também
é importante na luta pela reforma sanitária. a entidade surge com o propósito de lutar pela
democracia, de ser um espaço de divulgação do movimento sanitário, e reúne pessoas que já
pensavam dessa forma e realizavam projetos inovadores.
Entre 1974 e 1979, diversas experiências institucionais tentam colocar em prática algumas
diretrizes da reforma sanitária, como descentralização, participação e organização. É nesse
momento que a Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp), da Fundação Oswaldo Cruz, se
incorpora como espaço de atuação da abordagem marxista da saúde. Vários projetos de saúde
comunitária, como clínica de família e pesquisas comunitárias, começaram a ser elaborados, e
pessoas que faziam política em todo o Brasil foram treinadas.
Quando a ditadura chegou ao seu esgotamento, o movimento já tinha propostas. Assim, esse
movimento conseguiu se articular em um documento chamado Saúde e Democracia, que foi
um grande marco, e conseguiu enviá-lo para aprovação do Legislativo. Uma das coisas mais
importantes, segundo Arouca, era transferir o Instituto Nacional de Assistência Médica e
Previdência Social (Inamps) para o Ministério da Saúde.
O movimento da reforma sanitária cresceu e formou uma aliança com parlamentares
progressistas, gestores da saúde municipal e outros movimentos sociais. De 1979 em diante,
foram realizadas reuniões de técnicos e gestores municipais, e em 1980 constituiu-se o Conselho
Nacional de Secretários de Saúde.
Em 1986, a 8ª Conferência Nacional de Saúde aprovou o conceito da saúde como um direito
do cidadão e delineou os fundamentos do SUS, com base no desenvolvimento de várias
estratégias que permitiram a coordenação, a integração e a transferência de recursos
entre as instituições de saúde federais, estaduais e municipais. Essas mudanças
administrativas estabeleceram os alicerces para a construção do SUS. Posteriormente,
durante a assembleia Nacional Constituinte (1987–1988), o movimento da reforma sanitária e
seus aliados garantiram a aprovação da reforma, apesar da forte oposição de um setor privado
poderoso e mobilizado. A Constituição de 1988 foi proclamada numa época de instabilidade
econômica, durante a qual os movimentos sociais se retraíam, a ideologia neoliberal proliferava
e os trabalhadores perdiam poder de compra. Simultaneamente a essa reforma, as empresas de
saúde se reorganizavam para atender às demandas dos novos clientes, recebendo subsídios do
governo e consolidando os investimentos no setor privado.
O Sistema Único de Saúde – SUS: estrutura organizacional
As principais noções e os fundamentos do SUS são concebidos pelo Movimento da Reforma
Sanitária Brasileira e sancionados pela 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986. No
ano seguinte, o relatório final da conferência influenciaria os trabalhos da Comissão de Saúde
da assembleia Nacional Constituinte. O SUS é criado com a promulgação da Constituição em
setembro de 1988, aliando-se à melhor tradição de proteção social ao consagrar a saúde
como direito de todos e dever do Estado. Nesses termos, representa um enorme desafio, qual
seja, a construção de um sistema de saúde universal em um país na periferia do capitalismo com
as características do Brasil, isto é, de grande extensão territorial, populoso, com carência de
recursos financeiros, marcado por grande heterogeneidade regional, desigualdade e exclusão
social. Dificuldade adicional significativa é representada pelo modelo federativo brasileiro
praticamente singular no planeta, em que municípios são entes federados e engendram
mecanismos de competição entre si. Tal dispositivo torna muito complexa a estruturação de
um verdadeiro sistema no setor de saúde, devido à autonomia e às salvaguardas legais e
constitucionais próprias dos arranjos federativos, aqui estendidas aos municípios.
 Constituição Federal de 1988, na qual a saúde é um dos setores que estruturam a
seguridade social, ao lado da Previdência e da Assistência Social.
 Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, também conhecida como Lei Orgânica da
Saúde, e que dispõe, principalmente, sobre a organização e regulação das ações e
serviços de saúde em todo o território nacional.
 Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que determinou o formato da
participação popular no SUS e assuntos relacionados ao seu financiamento.
 Normas Operacionais Básicas – NOB de 1993 e 1996. Normas Assistenciais Básicas –
NOAS de 2002.
 Emenda Constitucional nº 29, de 13 de dezembro de 2000.
 Pactos pela Saúde – 2006. Decreto nº 7508 de 2011.
 Lei Complementar nº 141 de 2012.

Os fundamentos so SUS
No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado pela Constituição de 1988 e se inspira
nos sistemas universais ao afirmar que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Essa
Constituição prevê que os serviços de saúde podem ser prestados também pela iniciativa
privada. Desse modo, o sistema de saúde brasileiro é constituído por pelo menos dois tipos
diferentes de sistemas (cada um deles chamado de subsistema): a) um governamental, o Sistema
Único de Saúde (SUS); b) outro privado, o Sistema Supletivo de Assistência Médica (SSAM).
Da maneira como funcionam, há vários pontos de contatos entre eles, principalmente em
relação aos profissionais de saúde (os mesmos profissionais trabalham nos dois sistemas) e
alguns serviços assistenciais (os dois sistemas contratam os mesmos serviços de hospitais e
laboratórios clínicos, por exemplo). No entanto, com relação à possibilidade de a população
poder usar os recursos desses dois sistemas, há uma espécie de muro que barra a utilização do
sistema privado para a maior parte da população – justamente aquela parcela de brasileiros
relativamente mais necessitada. O SUS deve ser entendido a partir de seus princípios e
diretrizes:
 Princípio: aquilo que serve de base, alicerce.
 Diretriz: estratégias para atingir os objetivos.
É importante que seja entendido o conceito desses dois termos para não haver dificuldade
de interpretação. A lguns autores descrevem os princípios do SUS como diretrizes e vice-
versa, chegando a propor a redescrição dessas noções, indicando que, em vez de princípios e
diretrizes, o SUS seja organizado a partir de princípios doutrinários e princípios organizativos.
 Os princípios doutrinários estão relacionados aos valores e concepções que servem de
alicerce ao sistema, e os princípios organizativos seriam os meios e as estratégias para
operacionalização do sistema.
 Para as provas de residência devemos entender esses conceitos de forma equivalente.
PRINCÍPIOS PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS =
base filosófica, cognitiva, ideológica e alicerce.
DIRETRIZES PRINCÍPIOS ORGANIZATIVOS =
estratégias e meios de organização do sistema para sua
concretização.
Princípios doutrinários do SUS
Universalidade
Esse princípio deve ser entendido como um direito à saúde e à vida, pois garante igualdade de
acesso aos serviços de saúde a todos os cidadãos brasileiros – sem distinção de raça, sexo,
orientação sexual, condição financeira, religião e outras variáveis de segregação – em todos os
níveis de assistência. Foi responsável pela substituição do modelo contributivo de seguro social,
que vigorou por um longo período no Brasil e que condicionava o acesso dos contribuintes da
previdência social aos serviços públicos e privados credenciados ao sistema previdenciário.
A universalidade pressupõe a ideia de direito e jamais podemos realizar qualquer menção à ideia
de pagamento ou gratuidade. É uma pegadinha frequente em provas aparecer a associação desse
princípio com gratuidade, portanto, muito cuidado! Para as questões discursivas, devemos saber
que há dois desafios levantados pelo princípio da universalidade, que são:
1. Garantir o acesso às ações e serviços de saúde que, muitas vezes, apresentam uma série
de dificuldades aos cidadãos.
2. Garantir boas condições de vida que possibilitem boas condições de saúde, assegurando
assim um projeto de construção de sociedade mais justa e igualitária.
Equidade
É o princípio de maior dificuldade de compreensão, pois nos remete à perspectiva de igualdade.
Entretanto, é um erro conceitual interpretá-lo sob essa ótica. Esse princípio identifica o espaço
da diferença, e não da igualdade. É fruto de um dos piores problemas da sociedade, que é a
inequidade social. Portanto, essa base conceitual do SUS propõe um desafio de tratar “de forma
desigual os desiguais”, isto é, o Estado deverá atender às necessidades individuais e coletivas
daqueles mais atingidos pelas inequidades sociais. Isso perpassa pela lógica de criar políticas
públicas que englobem o espaço regulador de diferenças e tentem organizá-las, reconhecendo a
diversidade da condição humana e suas potencialidades e necessidades. Geralmente, utilizamos
indicadores epidemiológicos e de distribuição de renda como critérios para determinar políticas
equânimes.
Integralidade
A integralidade das ações de saúde é um princípio que reforça a ideia de sistema único de saúde,
pois garante acesso integral à saúde, que vai das ações preventivas às assistenciais. A
Constituição afirma que devemos priorizar as ações de prevenção, porém sem prejuízos
curativos. Daí a célebre frase que melhor exemplifica esse princípio: “O indivíduo deve ter
acesso garantido, da vacina ao transplante”. Esse princípio também se refere ao atendimento
integral do indivíduo do ponto de vista do novo conceito de saúde. Não podemos mais pensar
na doença apenas como um modelo biomédico, mas sim incorporado às diversas dimensões que
determinam a produção de saúde-doença (sociedade/meio no qual se vive), e então garantir
acesso a todos os tipos de serviços que envolvam promoção, proteção e recuperação da saúde.
As políticas de saúde devem ser desenvolvidas tendo em vista a integralidade, compreendendo
a atenção e as necessidades dos grupos específicos. Exemplo:
 Política de atenção integral à saúde da mulher.
 Atenção às DST/Aids.
Outro aspecto abordado pela integralidade está relacionado à formação dos trabalhadores para
o processo do trabalho em saúde. a formação deles leva em consideração a perspectiva integral
de atenção à saúde.
Princípios organizativos do SUS
 Descentralização
Pela nossa Constituição, o Estado brasileiro é considerado uma federação, e, como tal, os
princípios constitucionais devem ser garantidos e exercidos em cada esfera de governo. O SUS
deve, portanto, se organizar a partir da descentralização, com direção única em cada esfera de
governo. Em outras palavras, o nosso Sistema Único de Saúde (SUS) passa a não ser mais
gerido somente pelo governo federal. Ocorre uma distribuição de poder político, de
responsabilidades e de recursos para os níveis estadual e municipal. De uma maneira mais
simples, podemos ainda concluir que é uma desconcentração do poder da União para os estados
e municípios. Com essa descentralização, o formato do processo de gestão do SUS fica assim
definido:
União – governo federal: Ministério da Saúde.
Estados e Distrito Federal: Secretaria Estadual de Saúde.
Municípios: Secretaria Municipal de Saúde.
A Lei nº 8.080, de 1990, apresenta as atribuições e competências de forma genérica e, segundo
alguns autores, torna a compreensão das especificidades de cada instância gestora um pouco
difícil. Já as Normas Operacionais Básicas (NOB) definem claramente as competências de cada
esfera de governo na organização e operacionalização do SUS. Elas definem de maneira
estratégica e detalhada as condições que os estados e municípios precisam adquirir diante do
processo de implantação e consolidação do SUS
 Regionalização
A rede de serviços do SUS deve ser organizada de forma regionalizada e hierarquizada,
permitindo um conhecimento maior dos problemas de saúde da população de uma área
delimitada, favorecendo ações de vigilância epidemiológica, sanitária, controle de vetores e
educação em saúde, além das ações de atenção ambulatorial e hospitalar em todos os níveis de
complexidade. Em outras palavras, essa diretriz deve focar a organização do sistema em uma
noção de território, levando em consideração os perfis populacionais, os indicadores
epidemiológicos, as condições de vida e o suporte social. Assim, a gestão municipal estará mais
próxima da realidade que a cerca e contribuirá para uma melhor resolutividade dos problemas
que acometem a população que está presente nos distritos e regiões que compõem o município.
Segundo Matta (2006), a lógica proposta é de que quanto mais perto da população, maior será
a capacidade de o sistema identificar as necessidades de saúde e melhor será a forma de gestão
do acesso e dos serviços para a população.
A regionalização deve ser norteada pela hierarquização dos níveis de complexidade requerida
pelas necessidades de saúde das pessoas. O princípio da integralidade deve ser levado em
consideração, pois é a partir dele que vamos organizar o serviço, desde as ações de promoção
e prevenção de doenças até as de maior complexidade como recursos diagnósticos, internação,
cirurgias e transplantes.
 Hierarquização
A hierarquização diz respeito à organização do acesso da população à rede de serviços de saúde
por meio da definição de níveis de atenção à saúde.
O nível primário de atenção deve ser qualificado para atender e resolver os principais
problemas que demandam serviços de saúde. Os que não forem resolvidos nesse nível deverão
ser referenciados para os serviços de maior complexidade tecnológica. O nível primário (baixa
complexidade) é composto pelas unidades básicas de saúde e pelos programas de saúde da
família, e engloba ações de vacinação, consultas básicas, etc. Nesse nível, são resolvidos 80%
dos problemas de saúde da população.
O nível secundário (média complexidade) resolve 15% dos problemas de saúde e está nos
centros de especialidades, nos hospitais com baixa complexidade (clínica médica, pediatria e
obstetrícia), nas clínicas de raio-X, USG, nos laboratórios, entre outros (a maioria desses
serviços está nas Santas Casas e em hospitais privados conveniados ao SUS).
O nível terciário de atenção à saúde (alta complexidade) está nos hospitais de referência,
clínicas de tomografia, hemodiálise, quimioterapia, entre outros, e resolve os 5% restantes dos
problemas de saúde. Atualmente, no SUS, a maioria desses serviços é composta pelos hospitais
públicos brasileiros.
 Participação da comunidade (ou controle social)
Essa diretriz também é definida como participação popular ou participação da comunidade, ou
ainda como participação dos cidadãos e até controle social. Podemos considerar essa diretriz
como um dos marcos históricos da reforma sanitária brasileira, pois garantiu a participação da
comunidade no processo de construção e consolidação do SUS. Seria um erro histórico apontar
essa diretriz e não a relacionar com a 8ª Conferência Nacional de Saúde, pois, durante esse
encontro em Brasília, no ano de 1986, a participação popular foi apresentada como um dos
princípios organizativos do novo sistema nacional de saúde, o qual ainda estava por ser
aprovado, conforme extraído dos manuais do Ministério da Saúde: “[...] participação popular,
através de suas entidades representativas, na formulação da política, no planejamento, na
gestão, na execução e avaliação das ações de saúde” (Matta 2006 apud Brasil, 1996:10). Em
1990, a Lei nº 8.142 trouxe a regulação das instâncias da participação popular no processo
decisório do nosso sistema de saúde, garantindo um caráter permanente de formulação e
acompanhamento das políticas de saúde no Brasil. As instâncias colegiadas de
participação popular no SUS são: conselhos de saúde (municipais e estaduais) e
conferências de saúde (nacional, estadual e municipal). Os conselhos de saúde têm caráter
permanente e deliberativo. Estão presentes nos três níveis de governo, representados pelo
Conselho Nacional de Saúde, Conselho Estadual de Saúde e Conselho Municipal de Saúde. São
órgãos colegiados compostos por representantes do governo, prestadores de serviço privado,
profissionais de saúde e usuários. Atuam na formulação de políticas, estratégias,
acompanhamento das ações e no controle da execução da política de saúde na instância
correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão
homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo. Os
conselhos devem ser formados de forma paritária entre usuários e prestadores:
50% de participação dos usuários (população);
25% de representantes das instituições administradoras
do SUS e prestadores de serviços de saúde;
25% de representantes dos trabalhadores da saúde.
A Lei nº 8.142 também define que as conferências de saúde (veja o capítulo Histórico das
Conferências Nacionais de Saúde) estruturam-se em cada nível de governo e se reúnem a
cada quatro anos, com o intuito de avaliar a conjuntura de saúde vivenciada por cada
uma das áreas de abrangência e propor diretrizes para formulação política em cada
esfera. Elas podem ser convocadas pelo Poder Executivo ou de forma extraordinária pela
própria conferência ou pelos conselhos
A gestão do SUS
A gestão do SUS funda-se no comando único em cada esfera de governo, isto é, na união o
comando é do Ministério da Saúde; nos estados, das Secretarias Estaduais de Saúde; e nos
municípios, das Secretarias ou Departamentos Municipais de Saúde. Os estados e municípios
devem solicitar habilitação em uma das modalidades de gestão; no caso dos municípios a plena
do Sistema ou a Plena da Atenção Básica. Combinado à diretriz da descentralização, esse
dispositivo possibilita, principalmente aos municípios, os meios necessários para a efetivação
de planos de ação adaptados às necessidades locais e/ou regionais. Na atualidade, o pacto pela
Saúde é o instrumento direcionador no qual diversas ações de saúde são estipuladas
consensualmente. Por meio de compromissos específicos da União, dos Estados e dos
Municípios, essas ações deverão ser efetivadas pelo SUS em prazos definidos. No que tange à
remuneração, os prestadores, sejam públicos ou privados, são tratados da mesma forma, isto é,
remunerados por produção de serviços, procedimento que induz o subsídio à oferta de serviços
nem sempre de acordo com as necessidades assistenciais e/ou os preceitos técnicos. Mais
recentemente, têm sido introduzidos em setores específicos mecanismos de remuneração por
compromisso assistencial, como os contratos assinados pelo SuS com hospitais universitários
e de ensino.
A matriz gerencial do SUS é interessante por permitir a coexistência dos níveis técnico e político
com mecanismos de participação direta. Ela é constituída por três instâncias: instituição gestora,
comissão interinstitucional e colegiados participativos.
 As instituições gestoras deveriam ser os organismos encarregados de apresentar as
soluções técnicas para a efetivação das políticas de saúde, além de exercerem as
atividades de gestão, planejamento, controle e avaliação do sistema em seu âmbito de
competência. as comissões intergestores são os espaços em que as esferas de governo
realizam os pactos para a operacionalização do sistema, ou seja, representam um
arranjo para enfrentar as dificuldades advindas do modelo federativo.
 Compostas por representantes do Ministério da Saúde, do Conselho Nacional de
Secretários Nacionais de Saúde (Conass) e do Conselho Nacional de Secretários
Municipais de Saúde (Conasems), deliberam sobre assuntos técnicos e políticos
diversos, como a definição dos tetos financeiros de repasse para cada estado e a
habilitação de estados e municípios nas modalidades de gestão.
 Os colegiados participativos deveriam ser a instância privilegiada para o exercício da
participação direta dos segmentos sociais interessados no SuS. Representados pelos
conselhos de saúde, instituições deliberativas tripartites (gestores e prestadores
privados do SUS; trabalhadores e usuários) e paritárias (os usuários devem compor
pelo menos 50% do total de conselheiros, sendo a outra metade distribuída igualmente
entre trabalhadores e gestores/ prestadores), têm como atribuições em sua esfera de
abrangência definir as diretrizes das políticas de saúde e fiscalizar as ações dos
gestores, inclusive nos aspectos financeiros.
Decreto n° 7.508 de 2011
O Decreto nº 7.508, de 28 de junho de 2011, regulamenta a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de
1990, que dispõe sobre a organização do sistema único de saúde, o planejamento da saúde, a
assistência à saúde e a articulação interfederativa, além de dar outras providências.
Conforme já preconizado pela Lei nº 8.080/90, o SUS deve ser organizado de forma
regionalizada e hierarquizada. por isso, o Decreto nº 7.508/2011 cria as regiões de saúde. Cada
região deve oferecer serviços de atenção primária, urgência e emergência, atenção psicossocial,
atenção ambulatorial especializada e hospitalar e, por fim, vigilância em saúde.
Em relação à hierarquização, o Decreto estabelece que as portas de entrada do SUS, pelas quais
os pacientes podem ter acesso aos serviços de saúde, são: de atenção primária; de atenção de
urgência e emergência; de atenção psicossocial; e, ainda, especiais de acesso aberto. O Decreto
também define quais são os serviços de saúde disponíveis no SUS para o atendimento integral
dos usuários por meio da Relação Nacional de ações e Serviços de Saúde (Renases), que deve
ser atualizada a cada dois anos.
Lei Complementar n° 141 de 2012
A Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, regulamenta o § 3º do art. 198 da
Constituição Federal para dispor sobre os valores mínimos a serem aplicados anualmente pela
união, estados, Distrito Federal e municípios em ações e serviços públicos de saúde; estabelece
os critérios de rateio dos recursos de transferências para a saúde e as normas de fiscalização,
avaliação e controle das despesas com saúde nas três esferas de governo; e revoga dispositivos
das Leis nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e 8.689, de 27 de julho de 1993.
A Emenda Constitucional nº 29 (EC nº 29) foi finalmente regulamentada 12 anos depois de sua
promulgação, em 13 de setembro de 2000. Tinha como objetivo estabilizar o financiamento do
setor saúde com recursos das três esferas de governo, provenientes da aplicação de percentuais
das receitas estabelecidos em lei. Definiu, no caso da União, que o valor mínimo seria aquele
apurado no ano anterior, corrigido pela variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB). Para
os estados e o Distrito Federal, os recursos mínimos equivaleriam a 12% da arrecadação de
impostos e das transferências constitucionais, deduzidas as parcelas transferidas aos municípios.
para os municípios, os recursos mínimos corresponderiam a 15% da arrecadação de impostos e
dos recursos de transferências constitucionais. Com a promulgação da EC nº 29, surgiu a
necessidade da regulamentação dos dispositivos não autoaplicáveis para orientar a correta
execução pelos entes federados e a fiscalização pelos tribunais de Contas quanto ao seu
cumprimento. No Congresso Nacional, a discussão da regulamentação teve como base o projeto
de Lei Complementar (PLC) nº 01/2003 do deputado Roberto Gouveia (PT-SP), que tinha como
objetivo definir o que são ações e serviços de saúde e tornar obrigatória a alocação de 10% das
Receitas Correntes Brutas (10% da RCB) da União para a saúde. Em 2007, o PLC nº 01/2003
já apresentava várias emendas, dentre as quais se destaca o retorno às regras presentes na EC
nº 29, que trata da participação mínima da União no financiamento do SUS, acrescido de
percentuais da receita da CpMF. a não prorrogação da CpMF comprometeu o prosseguimento
desse projeto no Senado, onde passou a tramitar em conjunto com o projeto de Lei do Senado
(PLS) nº 156/2007, de autoria do senador Marconi Perillo (PSDB-GO).
Em abril de 2008, foi aprovado por unanimidade o PLS 121/2007, de autoria do senador Tião
Viana (PT-AC), que contemplava a destinação de 10% das RCBs para a saúde. Enviado à
Câmara dos Deputados, foi aprovado em forma de substitutivo, com a denominação projeto de
Lei Parlamentar (PLP) nº 306/2008, em 21 de setembro de 2008, tendo como relator o deputado
Pepe Vargas (PT-RS). Nesse substitutivo, a Câmara rejeitou a proposta do Senado quanto aos
10% da RCB da União e a do relator Vargas, criando a Contribuição Social para a Saúde (CSS),
resultando em nenhum acréscimo de recursos federais para o SUS. Em devolução ao Senado, o
substitutivo voltou a tramitar como pLS nº 121/2007 e foi aprovado em 7 de dezembro de 2011,
regulamentando a EC nº 29, com a manutenção das mesmas regras de vinculação presentes na
EC nº 29. Dessa forma, a Lei nº 141/2012 não apresentou qualquer vinculação de recursos
federais para a saúde, frustrando a expectativa de ampliação de recursos para o setor. Ela define
o que pode ser considerado despesas em ações e serviços públicos de saúde, valoriza o processo
de planejamento e o controle social e define a transferência regular e automática por meio dos
fundos de saúde para custeio e investimento. A referida lei foi sancionada pelo Poder Executivo
com alguns vetos e está organizada em cinco capítulos: Disposições preliminares; Das ações e
dos Serviços públicos de Saúde; Da Aplicação de Recursos em Ações e Serviços Públicos de
Saúde; Da Transparência, Visibilidade, Fiscalização, avaliação e Controle; e Disposições Finais
e transitórias.

AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE


Vigilância epidemiológica e controle de doenças
Vigilância sanitária
Vigilância nutricional (no âmbito do SUS)
Educação para a saúde
Saúde do trabalhador
Assistência à saúde em todos os níveis de complexidade
Assistência farmacêutica
Atenção à saúde dos povos indígenas
Capacitação de recursos humanos do SUS
Pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico em saúde promovidos por entidades do
SUS
Produção, aquisição e distribuição de insumos setoriais específicos, como medicamentos,
imunobiológicos, sangue e hemoderivados, equipamentos
Determinados tipos de saneamento básico e do meio ambiente
Determinados serviços de saúde penitenciários
Atenção especial aos portadores de deficiência e ações administrativas para a execução das ações
indicadas nos itens anteriores
NÃO SÃO AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE
Pagamento de aposentadorias e pensões
Assistência à saúde que não atenda ao princípio da universalidade (clientela fechada)
Merenda escolar
Saneamento básico
Limpeza urbana e remoção de resíduos sólidos (lixo)
Preservação e correção do meio ambiente, realizadas pelos órgãos de meio ambiente dos entes
federativos e por entidades não governamentais
Ações de assistência social não vinculadas diretamente à execução das ações e serviços de saúde
do SUS
Ações e serviços públicos de saúde custeados por recursos não especificados na base
A participação social no SUS
No período de democratização do país, em uma conjuntura de mobilização política situada
principalmente na segunda metade da década de 1980, o debate sobre a participação social
voltou à tona, com uma dimensão de controle de setores organizados na sociedade civil sobre
o Estado. A participação social nas políticas públicas foi concebida na perspectiva do ‘controle
social’, no sentido de incluir a participação de setores organizados da sociedade, desde as suas
formulações – planos, programas e projetos –, acompanhamento de suas execuções até a
definição da alocação de recursos com o intuito de atender aos interesses da coletividade.
A área da saúde foi pioneira nesse processo devido à efervescência política que a caracterizou
desde o final da década de 1970 e devido à organização do Movimento da Reforma
Sanitária, que congregou movimentos sociais, intelectuais e partidos de esquerda na luta contra
a ditadura, com vistas à mudança do modelo ‘médico-assistencial privatista’ para um sistema
nacional de saúde universal, público, participativo, descentralizado e de qualidade.
A participação no Sistema Único de Saúde (SUS) na perspectiva do ‘controle social’ foi um
dos eixos dos debates da 8a Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986. Nessa
conferência, a participação em saúde é definida como “o conjunto de intervenções que as
diferentes forças sociais realizam para influenciar a formulação, a execução e a avaliação das
políticas públicas para o setor saúde”. O ‘controle social’ é apontado como um dos princípios
alimentadores da reformulação do sistema nacional de saúde e como via imprescindível para a
sua democratização.
Essa participação foi institucionalizada na Lei nº 8.142/90, através das conferências que têm
como objetivo avaliar e propor diretrizes para a política de saúde nas três esferas de governo e
através dos conselhos – instâncias colegiadas de caráter permanente e deliberativo, com
composição paritária entre os representantes dos segmentos dos usuários, que congregam
setores organizados na sociedade civil e nos demais segmentos (gestores públicos, filantrópicos
e privados e trabalhadores da saúde) e que objetivam o ‘controle social’.
Os conselhos de saúde devem atuar de forma autônoma da instância executiva (secretarias
municipais, estaduais ou ministério da saúde), exercendo as funções de fiscalizar a aplicação
dos recursos financeiros (função fiscalizatória), definir as políticas e as prioridades de saúde
(função deliberativa) e avaliar ou opinar sobre convênios ou outras questões da saúde (função
consultiva).
Quem faz parte dos conselhos de saúde?
Os conselhos são instâncias colegiadas (membros têm poderes iguais) e têm uma função
deliberativa. Eles são fóruns que garantem a participação da população na fiscalização e
formulação de estratégias da aplicação pública dos recursos de saúde.
Os conselhos são formados por representantes dos usuários do SUS, dos prestadores de
serviços, dos gestores e dos profissionais de saúde.
Na criação e reformulação dos conselhos de saúde, o poder executivo, respeitando os princípios
da democracia, deverá acolher as demandas da população consubstanciadas nas conferências
de saúde.cálculo
Vários autores brasileiros vêm trabalhando a temática do ‘controle social’ no eixo das políticas
sociais. Essa é uma expressão de uso recente e corresponde a uma moderna compreensão de
relação Estado-sociedade, em que cabe a sociedade estabelecer práticas de vigilância e controle
sobre o Estado.
Na mesma direção, o ‘controle social’ pode ser entendido como a ação estatal dentro da
perspectiva da democratização dos processos decisórios com vistas à construção da cidadania.
os autores destacam que, “ao longo de décadas, os governos submeteram os objetivos de sua
ação aos interesses particulares de alguns grupos dominantes, sem qualquer compromisso com
o interesse da coletividade”. Nesse sentido é que houve a ‘privatização do Estado’. Em
contraponto a essa realidade, o autor afirma que a concepção de gestão pública do SUS é
essencialmente democrática, devendo ser submetida ao controle da sociedade. A expressão
‘controle social’ vem sendo utilizada para designar a participação da sociedade prevista na
legislação do SUS.
Observa-se que, apesar de serem utilizados referenciais teóricos diferentes nas análises sobre
controle social, eles têm em comum tratar o ‘controle social’ dentro da relação Estado e
sociedade civil, apresentando os conselhos ‘gestores’, ou ‘de gestão setorial’, ou ‘de direitos’,
como instâncias participativas, resultado do processo de democratização do Estado brasileiro.
Deixa-se clara a opção por uma análise dessa temática a partir de uma perspectiva classista,
problematizando o ‘controle social’ dentro das contradições da sociedade de classes.
Além dos conselhos e conferências de saúde, a população pode recorrer a outros mecanismos de
garantia dos direitos sociais, em especial o direito à saúde – por exemplo, o Ministério público,
a comissão de seguridade social e/ou da saúde do Congresso Nacional, das assembleias
legislativas e das câmaras de vereadores, a Promotoria dos Direitos do Consumidor (Procon),
os conselhos profissionais, etc. A denúncia através dos meios de comunicação – rádios, jornais,
televisão e internet – também é um forte instrumento de pressão na defesa dos direitos.
Na atualidade, os conselhos de saúde possuem uma relevante representatividade social nas três
esferas governamentais, como consequência do modelo de democracia participativa e da
diretriz de participação da comunidade nas ações e serviços públicos do SUS, previstas
respectivamente no artigo 1º, parágrafo único, e artigo 198, inciso III, da Constituição da
República do Brasil de 1988. Em atendimento a esses dispositivos constitucionais, o legislador
infraconstitucional criou as conferências de saúde e os conselhos de saúde como órgãos de
gestão do SUS, assegurando, nas formatações desses últimos, a representatividade de
segmentos do governo, de prestadores de serviço privados conveniados, ou sem fins lucrativos,
de trabalhadores de saúde e de entidades de usuários, dando critérios norteadores para a
implementação da gestão das políticas públicas de saúde de forma sintonizada com os interesses
da coletividade. Observa-se que o direito constitucional à gestão participativa no SUS é
instrumentalizado para ser exercido especialmente por meio dos conselhos de saúde, que são
órgãos colegiados, incumbidos de zelar pela definição das políticas dos serviços de saúde, bem
como fiscalizar essas ações de relevância pública como meio de viabilizar a atuação da
comunidade.
Assistência médica supletiva
Quando se fala em financiamento, incluem-se os gastos do Estado e também de toda sociedade,
como pessoas, empresas e famílias. além do acesso ao SUS, as pessoas e empresas podem
comprar serviços de saúde. Você provavelmente já pagou por alguma consulta particular com
dentista, exames e remédios, certo? O financiamento da saúde é isso, olhar para os recursos
financeiros, tanto públicos quanto privados, para poder analisar investimentos e gastos.
O financiamento público pode funcionar de diferentes formas nos países. Há países que contam
com doações de organizações internacionais, empréstimos, ou, ainda, ajuda de recursos físicos
e humanos de outros países, situação frequentemente vista em países em situação de guerra.
Contudo, o financiamento a partir de recursos gerados de impostos e contribuições é o mais
frequente.Na Constituição Federal de 1988, ficou estabelecido que a saúde é parte integrante
do Orçamento da Seguridade Social (OSS), e, portanto, receberia valores dos tributos que são
destinados ao OSS. A definição das três áreas que compõem a Seguridade Social pode ser:
 A Saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
 A Assistência Social é a política social que provê o atendimento das necessidades
básicas, traduzidas em proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência, à
velhice e à pessoa portadora de deficiência, independentemente de contribuição à
Seguridade Social.
 Previdência Social tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis
de manutenção, por motivo de incapacidade, idade avançada, tempo de serviço,
desemprego involuntário, encargos de família e reclusão ou morte daqueles de quem
dependiam economicamente.
Chama-se de tributos tanto os impostos quanto as contribuições financeiras pagas ao Estado e
que podem ser pagos por pessoas físicas ou empresas aos três entes federativos: municípios,
estados ou federação. os impostos são coletados de maneira direta ou indireta:
 Imposto direto: Imposto de Renda da Pessoa Física ou Jurídica, que é calculado sobre
a renda da pessoa ou empresa.
 Imposto indireto: Imposto sobre Serviço, que é embutido em quaisquer serviços
prestados.
Os impostos indiretos tributados em produtos de consumo ou em serviços acabam por penalizar
as camadas da população que têm menor poder aquisitivo, pois não são proporcionais à renda de
quem está pagando esse imposto. os impostos diretos podem ser tributados conforme a renda
da pessoa, o que é uma maneira de arrecadar mais de quem tem mais. os impostos podem
ser destinados conforme cada ente federativo decidir, mas as contribuições sociais são de
destino obrigatório para determinado gasto público. temos como exemplo de contribuição a
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que foi destinada ao custeio
da saúde por um tempo no Brasil. Ao inserir a garantia do direito à saúde na CF/88, houve uma
harmonia que foi acompanhada pela criação do SUS e sua inserção no OSS. Esse orçamento
contemplou as contribuições sobre a folha de salário e sobre o lucro das empresas, e houve,
ainda, a criação da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
Todos esses tributos são arrecadados pelos municípios, estados e federação. Mas como
eles são, de fato, emprega- dos no financiamento do sus?
Para compreender a alocação de recursos no SUS é importante recapitularmos os princípios
descentralização, regionalização e hierarquização. Quando o SUS foi criado, os municípios
passaram a ter autonomia maior para alocar recursos e passaram também a receber recursos
específicos para a saúde. Os municípios passam a considerar sua realidade local, porém não são
autossuficientes na oferta de serviços de saúde, é necessário que pactuem com outros
municípios e com o governo estadual a formação de regiões de saúde que ofertem serviços à
população de forma otimizada.
Para fazer esse diálogo de oferta de Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS), criou-se a
Comissão de Intergestores Bipartite (CIB) e a Comissão de Intergestores Tripartite (CIT). Essas
comissões analisam, discutem e negociam a execução de políticas de saúde visando à
integralidade no acesso à saúde, bem como o rateio dessas despesas.
A partir da CF/88, a saúde passa a ser um sistema universal, integral e que conta com recursos
que já ram recolhidos. Além disso, passou a contar também com uma contribuição específica,
a CPMF, lucro de empresas, dentre outros.
Concomitantemente à criação do SuS, outros eventos ocorreram no país e tornaram turbulenta
essa nova forma de financiar a saúde. Em 1993, a tributação sobre os salários deixou de ser
rateada entre as três áreas do oSS para ser direcionada apenas para a previdência social
– tudo isso apenas três anos após a publicação da Lei 8.080/90. Para se ter ideia, o valor
arrecadado desse tributo correspondia a um terço do orçamento do Ministério da Saúde. A
CPMF também ficou vinculada à saúde por pouco tempo, sendo em seguida distribuída entre
areas da seguridade social.
O orçamento da saúde conta com a participação de vários órgãos relacionados à saúde para sua
elaboração e considera as diretrizes propostas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), lei
periódica que norteia a elaboração dos orçamentos anuais, e a previsão de gastos do governo.
Nos anos 1990, foram publicadas as Normas Operacionais Básicas (NOB) e as Normas
Operacionais de Assistência à Saúde (NOAS) que estão resumidas no quadro a seguir. Essas
normas foram elaboradas pelo Ministério da Saúde em conjunto com os gestores do SUS.
A NOB 01/96 trouxe inovações que permanecem até hoje no financiamento da saúde. Uma
delas é o valor per capita repassado aos municípios. Esse tipo de repasse torna parcialmente
equânime a divisão de valores entre municípios, pois os municípios com maior contingente
populacional recebem proporcionalmente. No entanto, as pessoas não têm necessidades iguais
de saúde, tampouco os municípios ou estados. Você se lembra do conceito de equidade? Uma
divisão de recursos que permita o alcance desse princípio acaba por ser uma divisão desigual,
para que os que tiverem maiores necessidades de saúde recebam maiores recursos.
Em 2000 é publicada a Emenda Constitucional 29, que determina a participação financeira de
cada esfera do governo. os municípios devem investir 15% de suas receitas, os estados 12% e, no
caso da união, o percentual mínimo havia sido estabelecido com base no Produto Interno
Bruto (PIB). Essa regra permaneceu até 2016, quando foi aprovada a Emenda Constitucional
95, cujas diferenças podem ser observadas ao final do capítulo.Nos anos seguintes à publicação
da EC29/2000, foram publicadas as Normas Operacionais da Assistência à Saúde (NOAS), que
tinham por objetivo promover maior equidade na alocação de recursos e acesso às aSPS. para
isso, as NOAS têm em seu centro os princípios da regionalização, fortalecimento da gestão do
SuS e mudança nos critérios de habilitação dos estados e municípios.
Saúde suplementar
Antes de tudo, o que significa suplementar? Se você lembrou suplemento, você acertou!
Suplemento significa acrescer, adicionar, ser complementar. A assistência médica privada
funciona de maneira suplementar ao SuS, conforme consta na legislação vista anteriormente.
O funcionamento da saúde pública e privada é diferente ao redor do mundo. Em alguns países,
como Japão e países escandinavos, os serviços privados de saúde são praticamente inexistentes.
Em outros países, os serviços públicos de saúde são os que quase não existem. No Brasil, existe
a divisão entre a saúde suplementar, representada pelos planos de saúde, que cobrem 36,1% da
população (ANS, 2017); e o setor liberal, representado pelos profissionais de saúde liberais ou
autônomos. ter acesso ao serviço privado de saúde não exclui o direito a utilizar o SuS. Ao
contrário do que se pode pensar, a saúde suplementar não pode ser vista totalmente como um
produto de mercado, pois a saúde não é um produto, tampouco um serviço que possa ser orçado
pelo menor preço. a oferta dos serviços de saúde suplementar é regulada pela Agência Nacional
de Saúde (ANS) e instituições profissionais e de ensino. A ANS foi criada pela Lei 9.656 de 1998
e é um setor do Ministério da Saúde.
Síntese
Nesta unidade vimos que no Brasil, não são apenas as classes sociais mais altas que adquirem
planos e seguros de saúde. Não há um grupo populacional específico que os utiliza. Planos e
seguros de saúde no nosso país não apresentam a característica de serem complementares ao
SuS. atualmente, grande parte dos planos e seguros de saúde são contratados por grupos
coletivos, isto é, cooperativas e empresas representam a maior parte das contratações (Bahia,
L.; Scheffer, M., 2012). Um ponto de preocupação sobre o funcionamento da saúde privada é
a duplicidade do uso de recursos em um mesmo setor, caracterizando duas portas de entrada.
os planos e seguros contratados muitas vezes não cobrem a universalidade das necessidades de
saúde de seus clientes, os quais também acessam o SUS devido à sua demanda de saúde
(Pietrobon et al., 2008)

Apostila 2

Reflexão sobre a expressão informação em saúde


Para demarcar o início do uso do termo informação no campo da saúde, devemos relembrar o
ressurgimento dos estudos em epidemiologia no seu momento de maior intensidade, pois é
nesse momento – a partir do século XIX – que aumenta a necessidade de comunicar questões
relacionadas à saúde das populações. Sendo uma grande alavanca para a disseminação das
informações em saúde. Quase que concomitantemente, a estatística do final do século XIX e
início do século XX, inspiradora de estudiosos como Bentham, Price, Laplace, Galton
(Rosen, 1994), pode ser vista, também, como um ponto de partida importante para a geração de
informações em saúde de forma agregada e preditiva. Deste momento em diante, podemos
relatar as primeiras peças da informação em saúde, compostas pelas estatísticas vitais, pelas
tábuas de sobrevida, enfim, por instrumentos de predição e inferência de estados de saúde a
partir do status atual de um grupo de pessoas em determinado contexto de saúde.
No correr da história, numerosos desdobramentos para a expressão informação em saúde
transformaram-se, praticamente, em subáreas distintas e dirigidas, principalmente, a subsidiar
não apenas a população em geral, mas também gestores da área saúde:
 Sobre: perfil da população (de que adoece e morre dados demograficos e
socioeconomicos); serviços prestados; materiais e medicamentos consumidos; força de
trabalho envolvido.
 Para conhecer: necessidades da população atendida; uso potencial e real da rede
instalada; investimento necessarios.
 A fim de que: planejar, controlar e avaliar as açoes e serviços de saúde.
Como marcos históricos, tem-se, no século XVII, na alemanha, o surgimento da chamada
‘topografia política ou uma descrição das condições atuais do país’, proposta por Leibniz, em
cuja descrição deveriam constar: o número de cidades (maiores e menores) e de aldeias; a
população total e a área do país em acres; a enumeração de soldados, mercadores, artesãos e
diaristas; as informações sobre as relações entre os ofícios; o número de mortes e das causas
de morte (Rosen, 1980). Em decorrência dessa e de outras ações semelhantes, surgiram os
inquéritos de morbidade e as estatísticas dos serviços de saúde. Na gênese da vigilância
epidemiológica, é inegável a influência de Farr, que realizou atividades de coleta,
processamento e análise de dados e sua divulgação para as autoridades sanitárias. Também
devemos relatar o célebre estudo sobre a cólera realizado por Snow. É impossível negar o uso
das informações em saúde constantes nos mapas de ponto e no raciocínio epidemiológico no
controle dessa doença já no século XIX.
 John Snow demonstrou que o cólera era causado pelo consumo de águas contaminadas
com matérias fecais ao comprovar que os casos dessa doença se agrupavam nas zonas
onde a água consumida estava contaminada com fezes, na cidade de Londres no ano de
1854. Nesse ano, cartografou, num plano do distrito do Soho, os poços de água,
localizando como culpado o poço existente em Broad Street, em pleno coração da
epidemia. Snow recomendou que a comunidade o fechasse. A partir disso, foram
diminuindo os casos da doença. Esse episódio é considerado um dos exemplos mais
precoces no uso do método geográfico para a descrição de casos de uma epidemia. O
trabalho realizado por John Snow, na Inglaterra, ajudou a romper com os paradigmas
existentes em uma época em que ainda predominava uma forte crença na teoria
miasmática da doença, também denominada “teoria anticontagionista”. Mais ainda,
Snow sentou as bases teórico-metodológicas do “método epidemiológico”, o qual tem
sido utilizado através da história tanto para a investigação das causas como para a
solução das fontes de todas as doenças transmissíveis. Mais recentemente, tem-se usado
esse método para a investigação de todos os problemas de saúde e doença que afetem
as comunidades humanas.
Destaca-se também a importância do papel fundamental do desenvolvimento das ciências da
computação, no século XX, e, portanto, da informática como instrumental necessário e
multiplicador tanto das metodologias estatísticas quanto das informações em saúde. Ressalte-
se, ainda, que esse desenvolvimento tecnológico tem papel crucial em inovações intrínsecas à
área da saúde, como:
 A disseminação e facilitação da acessibilidade às bases de dados em saúde;
 O surgimento e a propagação da informática médica;
 A concepção e a implementação do prontuário eletrônico do paciente; entre outros.
A expressão informação em saúde, nos tempos atuais, abrange vários outros termos e múltiplas
dimensões, podendo ser tomada, portanto, por uma teoria. Para Moraes, de forma esquemática,
existe a possibilidade de observar a informação em saúde como subsídio para o próprio setor de
saúde: na administração; na assistência; no controle e avaliação; no orçamento e finanças; no
planejamento; nos recursos humanos; na regulação; na saúde suplementar; no
geoprocessamento em saúde; e na vigilância (epidemiológica, sanitária, ambiental).
Em consequência disso, por considerarmos que muitos não resistem à tentação de trabalhar de
forma reducionista, dado o caráter multidimensional da expressão, torna-se imprescindível
dizer, para reforçar o conceito de informação em saúde aqui ancorado, que ele não é:
 Mera transformação, por meio do processamento de dados, do dado registrado em
informação em saúde.
 Disseminação e/ou construção indiscriminada de sistemas de informações em saúde
 Banco de dados de um determinado sistema em saúde.
 Conjunto de indicadores em saúde de determinada região, população ou doença.
 Aparato informático que produz informação.
 Conjunto de relatórios gerados a partir de uma miríade de sistemas de informações
construídos sobre uma lógica fragmentada.

Retomando o que foi mencionado anteriormente, apesar de estar intrínseco à informação seu
potencial de fabricação, desenho (projeto) ou concepção, a informação em saúde, por si só, não
tem significado quando em uma ilha. Informação em saúde apartada de uma política na- cional
de informação e de uma informática na saúde que primem pelo controle social e pela utilização
ética e fidedigna de dados produzidos com qualidade, seja em relação ao cidadão, seja em
relação aos gestores da área saúde, não é mais do que um mote, uma expressão vazia. E, se
assim o for, ela servirá tanto para a produção de informações importantes e per- tinentes quanto,
também, para a disseminação de equívocos e de produtos de manipulação indevida dos dados
em saúde..
De toda forma, mesmo tendo em mente que informação em saúde não é um (nem todos) sistema(s)
de informação(ões) em saúde, muito menos um constructo dependente exclusiva e diretamente
da informática, vale historiar sucintamente a composição dos Sistemas de Informação em Saúde
de Base Nacional, em nosso país, atualmente sediados no Departamento de Informática do
Sistema Único de Saúde (Datasus), uma vez que são incontestáveis mananciais de informações
em saúde. Segundo Camargo Jr. et al. (2007), os avanços significativos na implantação dos
Sistemas de Informações em Saúde de Base Nacional, ocorridos principalmente na década de
1990, são o marco inicial de composição desses sistemas o Sistema de Informação sobre
Mortalidade (SIM), criado em 1975, bem como a criação do Grupo Técnico de Informação em
Saúde, em 1986.
Além disso, destacam-se os avanços na implantação e no acesso a bancos de dados nacionais com
informações sobre nascimentos, óbitos, doenças de notificação, atenção básica, imunizações,
produção de procedimentos ambulatoriais, atendimento de alto custo, hospitalizações,
estabelecimentos de saúde e orçamentos públicos.
Na geração dos indicadores em saúde deve ser destacada, também, a maior acessibilidade às
informações oriundas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referentes
a variáveis demográficas e socioeconômicas coletadas e processadas. Outras informações
produzidas em setores do governo, como benefícios da previdência social e sistemas específicos
implantados nos níveis estadual e municipal, afetas à área da saúde, foram também
disponibilizadas.
Importante considerar, no Brasil, o acesso às bases de dados oriundas do sistema de saúde
complementar que começam a ser disponibilizadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar
(ANS). Essas informações são de suma importância para a análise das condições de saúde da
população que não utiliza, exclusivamente ou não, o Sistema Único de Saúde (SUS).
Assim sendo, mesmo considerando que existem problemas referentes à cobertura dos sistemas,
à qualidade dos dados e à ausência de variáveis importantes para as análises e/ou construção de
indicadores em saúde, esses bancos de dados representam fontes importantes que podem ser
utilizadas rotineiramente em estudos epidemiológicos, na vigilância em saúde, na pesquisa e na
avaliação de programas e serviços de saúde.

O que são sistemas de informação?


Os Sistemas de Informação em Saúde (SIS) são um conjunto de mecanismos de coleta,
processamento e armazenamento de dados que visa à produção e à transmissão de informações
para a tomada de decisões sobre as ações a serem realizadas, avaliando os resultados da sua
execução e o impacto provocado na situação de saúde.
São várias as finalidades de um SIS, entre elas a de produzir informações compatíveis com as
necessidades dos diferentes níveis, contemplando especificidades locais e garantindo uma
avaliação permanente das ações executadas e do impacto sobre a situação de saúde.
Como em qualquer outra atividade, no setor de saúde a informação deve ser entendida como
um redutor de incertezas, um instrumento para detectar focos prioritários, levando a um
planejamento responsável e à execução de ações que condicionem a realidade às
transformações necessárias. Planejamento é um processo de tomada de decisões que, com base
na situação atual, visa à determinação de providências a tomar objetivando atingir uma situação
futura desejada.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define Sistema de Informação em Saúde (SIS) como
um mecanismo de coleta, processamento, análise e transmissão da informação necessária para
planejar, organizar, operar e avaliar os serviços de saúde. Considera-se que a transformação de
um dado em informação exige, além da análise, a divulgação e, inclusive, recomendações para
a ação. No novo modelo de assistência à saúde, é preciso reverter a atual situação de
centralização de dados, de limitação do seu uso, da demora com que são analisados e que
retornam para o nível local, idealizando um novo sistema em que os dados passem a ser
analisados no próprio município, gerando, de forma oportuna, subsídios para o planejamento e
para as ações em saúde, bem como ações para a melhoria da qualidade dos dados. Conhecer os
passos de cada uma das etapas de um sistema de informações é fundamental para garantir não
só a fidedignidade das bases de dados, mas também a sua permanência e a sua plena utilização.

COLETA PROCESSAMENTO

Origem e registros Recebimento e Análise preliminar


dos dados controle (avaliação) dos dados

Ordenamento dos Pedido de Comparação com


documentos da coleta informação adicional parâmetros

Controle da
Identificação e análise
quantidade e do Codificação
das discrepâncias
conteúdo

Transmissão Digitação e crítica Opções de decisão

Classificação e
tabulação

Controle de erros
e inconsistências

Cálculos básicos

Apresentação

Quais são os principais sistemas de informação no sistema de saúde brasileiro?


São vários os sistemas de informação disponíveis no SUS que fornecem dados para a análise
epidemiológica. Alguns são de base populacional, ou seja, propõem-se a contemplar todos os
eventos daquela natureza existentes na população, como:
 Sistema de Informação de Mortalidade (SIM).
 Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc).
 Sistema de Informação de Agravos sob Notificação (Sinan).
Outros sistemas compõem grandes bases de dados nacionais, que podem ser utilizadas na
produção de informações. São eles:
 Sistema de Informações Hospitalares (SIH) SUS: registros de internações
hospitalares no SuS.
 Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) SUS e seu subsistema de registro de
Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade (Apac) – procedimentos
ambulatoriais.
Há ainda outros sistemas, alguns com menor cobertura nacional, que abordam grupos de
agravos e situações específicas, tais como:
 Comunicação de Internação Hospitalar (CIH): internações hospitalares,
independentemente de vínculo com o SuS.
 Sistema de Informação de Avaliação do Programa de Imunizações (API).
 Sistema de Informações das Atividades de Vigilância e Controle de Aedes aegypti
(SISAEDES): vigilância e controle do mosquito transmissor da dengue e da febre
amarela.
 Sistema de Informações e Vigilância de Agravos Nutricionais (SISVAN).
 Sistema de Informações do Programa de Humanização do Pré-Natal e Parto
(Sisprenatal): cadastro de gestantes e acompanhamento do pré-natal.
 Sistema de Informações da Atenção Básica (Siab): cadastro e acompanhamento da
atenção no Programa de Saúde da Família (PSF).
 Sistema de Informações do Câncer na Mulher (Siscam).
 Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (Hiperdia).
 Registro de Câncer de Base Populacional (RCBP).
A informação é elemento-chave para o uso da epidemiologia nos serviços de saúde. No
processo de trabalho de produção da informação, o dado é a matéria-prima, e a informação é o
produto. O profissional de saúde, com um objetivo em mente, vai organizar, tabular e analisar os
dados, utilizando conceitos, indicadores, técnicas e métodos para a obtenção da informação.
Portanto, a informação tem um referencial explicativo que está ausente no dado. Ela é uma
representação da realidade, e no percurso entre o dado e a informação existe sempre um sujeito,
individual ou coletivo, que dá sentido ao dado, transformando-o em informação. Dessa forma,
nos serviços de saúde são profissionais de saúde e usuários que dão sentido à informação, a qual é
uma representação da realidade para eles.

Indicadores e situação de saúde: contexto nacional


Ao trabalhar com informação em saúde é necessário ter conhecimento sobre indicadores de
saúde, sua qualidade metodológica e origem dos dados. Para compreender isso, é necessário
recordar alguns conceitos-chave de epidemiologia.
 Prevalência: é o número total de casos de uma doença, novos e antigos, existentes num
determinado local e período. O coeficiente de prevalência é mais utilizado para doencas
cronicas de longa duração, como hanseniase, tuberculose, Aids e diabetes.
 Incidência: é o número de casos novos dessa doença que iniciou no mesmo local ou
período. Traz a ideia de intensidade com que acontece uma doença numa população e
mede a frequência ou probabilidade de ocorrência de casos novos da doença na
população. Alta incidência significa alto risco coletivo de adoecer.
 Morbidade: são medidas utilizadas para descrever e analisar uma situação existente,
avaliar o cumprimento dos objetivos, das metas e suas mudanças ao longo do tempo,
além de prever tendências futuras.
No contexto da produção de informação em saúde no Brasil, estão envolvidos diferentes setores,
como a saúde, a educação, a pesquisa e a gestão financeira. O advento da internet facilitou
enormemente o acesso a dados e relatórios emitidos por diferentes instituições. Um conjunto de
indicadores espelha a situação de saúde de uma população e serve como base para a vigilância
em saúde. Os indicadores de saúde são base para analisar a situação de saúde da população e
para permitir um planejamento estratégico eficaz e eficiente, além de permitir acompanhar o
desenvolvimento das ações para sua efetividade.
 Indicadores de saúde - São medidas que contêm informação relevante sintetizada sobre
o estado de saúde e o desempenho de saúde. Com frequência são taxas, coeficientes,
proporções, razões ou índices.
A utilização de indicadores de saúde envolve grande trabalho para que a qualidade do dado se
reflita nos resultados obtidos, isto é, faz-se necessário investir em sistemas de informação,
treinamento de recursos humanos, bons instrumentos de coleta e armazenamento de dados.
Atributos
Validade Capacidade de medir o que se pretende.

Confiabilidade Reproduzir os mesmos resultados quando aplicado em condições


similares.
Sensibilidade Capacidade de detectar determinado acontecimento/fenômeno em
saúde.

Especificidade Capacidade de detectar somente o


acontecimento estudado. Isto é, serve
especificamente para aquele desfecho.

Mensurabilidade É elaborado a partir de dados disponíveis e de fácil acesso.

Relevância Responde a questões de saúde necessárias de serem estudadas.

Custo-efetividade O resultado justifica o investimento feito.

Acessibilidade É claro, de fácil compreensão, facilmente analisável.


Observar indicadores demográficos permite ao profissional de saúde gestor compreender
melhor a alocação de recursos das políticas. Um país com maior taxa de envelhecimento
certamente terá que investir em estrutura e rede de saúde para a população, que por sua vez está
vivendo mais. Outros indicadores estão listados a seguir conforme seu eixo:
 Socioeconômicos: taxas de analfabetismo, grau de escolaridade, produto interno bruto
(PIB) per capita, razão de renda, proporção de pobres, taxa de desemprego, taxa de
trabalho infantil.
 Mortalidade: infantil, materna, perinatal, menores de cinco anos, por causas
diarreicas, aparelho circulatório, diabetes, AIDS, doenças transmissíveis.
 Morbidade: incidência de doenças infectocontagiosas, doenças parasitárias, prevalência
de diálise, prevalência de aleitamento materno, sobrepeso, fumantes, consumo excessivo
de álcool, atividade física insuficiente, hipertensão arterial.
Situação de saúde no Brasil
De acordo com relatório publicado em 2015, o Brasil teve uma queda no número de nascimento
e nas taxas de fecundidade entre 2000 e 2013. No momento do parto, as mães são mais velhas do
que nas pesquisas anteriores, mas ainda existe um número importante de maternidade precoce.
Em todo o país, o parto por cesariana tem aumentado, especialmente no sul, sudeste e centro-
oeste. Houve 8,5% de proporção de nascimentos de baixo peso e 12,5% de nascimento pré-
termo(prematuro). A estabilização na taxa de fecundidade permitirá investir mais na saúde da
mulher e da criança.
A mortalidade infantil teve quedas importantes, especialmente a partir de 2010. Influencia este
indicador: a escolaridade materna, o componente cor/raça indígena e afrodescendente. A maior
parte dos óbitos dos recém-nascidos é dos que são prematuros e de baixo peso.
a mortalidade é maior nos homens, especialmente com idade entre 15 e 59 anos, sendo para
essa faixa etária a causa mais frequente de morte a morte por causas externas, como homicídios e
acidentes de trânsito terrestre. Doenças cardiovasculares foram a maior causa de morte para
homens. Para as mulheres, a maior causa de morte foi pneumonia, diabetes e doenças
relacionadas à pressão arterial sistêmica. A mortalidade por homicídios foi maior em pardos,
pretos e indígenas das regiões norte, nordeste e centro-oeste. A mortalidade da população
adulta, em geral por doenças crônicas, é um ponto importante de investimento.
Das doenças transmissíveis, a dengue foi, em 2014, marcada por preocupação constante, e o
sarampo exigiu que a vigilância estivesse mais atenta aos casos e vacinas. A transmissão de HIV,
hepatites virais e sífilis recebeu grande investimento e criação de programas governamentais
para o seu combate.

Vigilância em saude e epidemologia


 Vigiar: observar atentamente, estar atento a, atentar em, estar de sentinela, procurar,
campear, cuidar, precaver-se, acautelar-se.
A vigilância acompanha o conceito de saúde ao longo dos tempos. Por essa razão, foi por muito
tempo associada somente ao impedimento da aparição de doenças contagiosas. o isolamento é
uma das práticas mais antigas de intervenção social relacionada à saúde dos homens. No final
da Idade Média, o modelo médico e político de intervenção que surgia para a organização
sanitária das cidades deslocava-se do isolamento para a quarentena. Três experiências iniciadas
no século XVIII, na Europa, irão constituir os elementos centrais das atuais práticas da vigilância
em saúde: a medicina de Estado, na Alemanha; a medicina urbana, na França; e a medicina
social, na Inglaterra. Na era da bacteriologia, descobrem-se técnicas de controle de doenças, em
especial a vacinação. a vigilância passa a ser denominada a função de observar os doentes
atingidos pelas doenças contagiosas. Nos anos 1950, a denominação amplia-se para
“acompanhamento sistemático de eventos adversos à saúde na comunidade”. Em 1963,
Alexander Langmuir conceituou “vigilância em saúde” como a “observação contínua da
distribuição e tendências da incidência de doenças mediante a coleta sistemática, consolidação
e avaliação de informes de morbidade e mortalidade, assim como de outros dados relevantes, e
a regular disseminação dessas informações a todos os que necessitam conhecê-la”.
Nas décadas de 1960 e 1970, a campanha de vacinação contra a varíola impulsionou o uso da
vigilância pelo mundo. Em 1975, o Brasil cria o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica
e o Sistema de Notificação de Doenças Compulsórias. No ano seguinte, cria-se a Secretaria
Nacional de Vigilância Sanitária e, nos anos 1990, começa-se a discutir a importância da
vigilância ambiental. Ainda nos anos 1990, a vigilância é reformulada para que contenha pelo
menos três eixos:
 Vigilância de efeitos sobre a saúde, como agravos e doenças, tarefa tradicionalmente
realizada pela vigilância epidemiológica.
 Vigilância de perigos, como agentes químicos, físicos e biológicos que possam
ocasionar doenças e agravos, tarefa tradicionalmente realizada pela vigilância sanitária.
 Vigilância de exposições, por meio do monitoramento da exposição de indivíduos ou
grupos populacionais a um agente ambiental ou de seus efeitos clinicamente ainda não
aparentes (subclínicos ou pré-clínicos).
No Brasil, foram implantados os Distritos Sanitários, estratégia que buscava redefinir os serviços
e práticas de saúde a partir da demanda espontânea e das necessidades identificadas na
população. A preocupação em reorganizar tais práticas trouxe a ampliação do conceito para
vigilância em saúde, que busca não somente observar a epidemiologia, os perigos e as questões
ambientais, como também englobar determinações sociais de doença, distribuição desigual nos
agravos à saúde.
Neste modelo de vigilância da saúde, os atores passam a ser mais o médico ou sanitarista, mas
sim as equipes de saúde e os cidadãos.
Meios de Formas de
Modelo Sujeito Objeto
trabalho organização

édico-assistencial Médico Tecnologi Serviços de saúde,


Doença e
privatista especialista doentes. a especialmente o hospitalar.
médica.
Tecnologi Campanhas de vacinação, sistemas
Sanitarista Sanitaristas Modos de
transmissão e a de vigilância epidemiológica e
fatores de risco. sanitária. sanitária.
Tecnologias de
Danos, riscos, comunicação social, Políticas públicas saudáveis.
Equipe de
Vigilância necessidades e planejamento local Promoção, proteção e prevenção.
saúde e
da saúde condições de conforme a Operações em grupos populacionais
população
vida e trabalho. situação, específicos.
tecnologias Intersetorialidade.
médico-sanitárias.
A formulação de propostas para a educação profissional em saúde, muito embora possa
representar importante colaboração para as mudanças almejadas, sempre encontrará limitações
dadas pela própria cultura institucional e a organização das práticas de saúde. A formação para
o trabalho na vigilância em saúde deve ter a pesquisa como eixo central para a realização da
prática estratégica – informação/decisão/ação, através do reconhecimento do
território/população, do domínio do planejamento como ferramenta capaz de mobilizar os
diversos atores na resolução dos problemas identificados e da ação comunicativa.

Vigilância epidemiológica
 “[...] um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção
de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou
coletiva com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle
das doenças ou agravos.”
Inicialmente, a vigilância epidemiológica foi utilizada para programas de monitoramento e
controle de doenças transmissíveis no Brasil. Em 1969, as secretarias estaduais de saúde
passaram a alimentar informações semanais para a elaboração do boletim epidemiológico
quinzenal. Em 1999, foi instituída a Programação Pactuada Integrada – Epidemiologia e
Controle de Doenças, que financiava as ações de saúde coletiva e na qual estava incluída a
vigilância epidemiológica.
Propósito e funções da vigilância epidemiológica
A vigilância epidemiológica tem como propósito:
 Dar orientação técnica permanentepara os profissionais de saúde que têm a
responsabilidade de decidir sobre a execução de ações de controle de doenças e agravos.
 Disponibilizar informações atualizadas sobre a ocorrência de doenças e agravos, bem
como dos fatores que as condicionam, numa área geográfica ou população definida.
 Ser instrumento para o planejamento, a organização e a operacionalização dos serviços
de saúde, bem como para normatização das atividades técnicas correlatas.
A vigilância epidemiológica tem como funções:
 Coleta de dados.
 Processamento dos dados coletados.
 Análise e interpretação dos dados processados.
 Recomendação das medidas de controle apropriadas.
 Promoção das ações de controle indicadas.
 Avaliação da eficácia e efetividade das medidas adotadas.
 Divulgação de informações pertinentes.
A eficiência do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica depende do desenvolvimento
harmônico das funções realizadas nos diferentes níveis. Quanto mais capacitada e eficiente for
a instância local, mais oportunamente podem ser executadas as medidas de controle. Os dados
e informações produzidos serão mais consistentes, possibilitando melhor compreensão do
quadro sanitário estadual e nacional e, consequentemente, o planejamento adequado da ação
governamental. Nesse contexto, as intervenções oriundas dos níveis estadual e federal tenderão
a tornar-se seletivas, voltadas para questões emergenciais ou que, por sua transcendência,
requerem avaliação complexa e abrangente, com participação de especialistas e centros de
referência, inclusive internacionais.

Vigilância sanitária
Com a Constituição brasileira assumindo a saúde como um direito fundamental do ser humano
e atribuindo ao Estado o papel de provedor dessas condições, a definição de vigilância sanitária,
apregoada pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, passa a ser, nesse contexto, conforme
o artigo 6º, parágrafo 1º, a seguinte:
Entende-se por vigilância sanitária um “conjunto de ações capazes de eliminar, diminuir ou
prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da
produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, abrangendo: o
controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a saúde,
compreendidas todas as etapas e processos, da produção ao consumo; o controle da prestação de
serviços que se relacionam direta ou indiretamente com a saúde”.
Essa definição amplia o seu campo de atuação, pois, ao ganhar a condição de prática capaz de
eliminar, diminuir ou prevenir riscos decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de
bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, torna-se uma prática com poder de
interferir em toda a reprodução das condições econômico-sociais e de vida, isto é, em todos os
fatores determinantes do processo saúde-doença.
A noção de meio ambiente hoje, mais do que o conjunto de elementos naturais físico-biológicos,
significa também as relações sociais do mundo construído pelo homem, abrangendo o ambiente
de trabalho. Essa atribuição de intervenção no meio de trabalho é reforçada pelo parágrafo 3º
do mesmo artigo 6º da Lei nº 8.080/90. Através das vigilâncias epidemiológica e sanitária,
busca-se “a promoção e proteção à saúde dos trabalhadores”, bem como sua recuperação e
reabilitação em decorrência “dos riscos e agravos advindos das condições de trabalho [...]”.
Destacam-se quatro dimensões inerentes à prática de vigilância sanitária:
 A dimensão política: como uma prática de saúde coletiva, de vigilância da saúde,
instrumento de defesa do cidadão, no bojo do Estado e voltada para responder por
problemas, situa-se em campo de conflito de interesses, pois prevenir ou eliminar riscos
significa interferir no modo de produção econômico-social. Essa é sua dimensão
política, relacionada ao propósito de transformação ou mudança desses processos em
benefício, a priori, da população. Contudo, os entraves serão maiores ou menores
dependendo, de um lado, do grau de desenvolvimento tecnológico dos setores
produtores e prestadores e de suas consciências sanitárias ou mercantilistas, e, de outro,
da concreta atuação e consciência dos consumidores.
 A dimensão ideológica: significa que a vigilância deverá responder às necessidades
determinadas pela população, mas enfrentar os atores sociais com diferentes projetos e
interesses.
 A dimensão tecnológica: refere-se à necessidade de suporte de várias áreas do
conhecimento científico, de métodos e de técnicas que requerem uma clara
fundamentação epidemiológica para seu exercício. Nessa dimensão, está incluída sua
função de avaliadora de processos, de situações, de eventos ou agravos, expressa por
meio de julgamentos a partir da observação ou cumprimento de normas e padrões
tecnicos e de uma consequente tomada de decisão
 A dimensão jurídica: distingue-se das demais práticas coletivas de saúde, conferindo-
lhe importantes prerrogativas expressas pelo seu papel de polícia e pela sua função
normatizadora. A atuação da vigilância sanitária tem implicações legais na proteção à
saúde da população, desde sua ação educativa e normativa, estabelecendo
obrigatoriedades ou recomendações, até seu papel de polícia, na aplicação de medidas
que podem representar algum tipo de punição. Assentada no Direito Sanitário, sua
atuação se faz no plano do jurídico, significando que qualquer tomada de decisão afeta
esse plano. Para isso, suas ações devem estar corretamente embasadas em leis. Torna-se
imprescindível para aquele que exerce a ação o conhecimento dos instrumentos
processuais, das atribuições legais e responsabilidades.
Qual o campo de abrangência da vigilância sanitária?
A definição atual da vigilância sanitária, como já foi visto, torna seu campo de abrangência
vasto e ilimitado, pois poderá intervir em todos os aspectos que possam afetar a saúde dos
cidadãos. Para facilitar a exposição, assumimos que seu campo de abrangência é composto por
dois subsistemas, subdivididos em: bens e serviços de saúde e meio ambiente.
Bens e serviços de saúde
Subsistema de produção de bens de consumo e serviços de saúde que interferem direta ou
indiretamente na saúde do consumidor ou comunidade. São bens e serviços de saúde que
interessam ao controle sanitário:
 As tecnologias de alimentos, relacionadas aos métodos e processos de produção de
alimentos necessários ao sustento e à nutrição do ser humano.
 As tecnologias de beleza, limpeza e higiene, relacionadas aos métodos e processos
de produção de cosméticos, perfumes, produtos de higiene pessoal e saneantes
domissanitários.
 As tecnologias de produção industrial e agrícola, relacionadas à produção de outros bens
necessários à vida do ser humano, como produtos agrícolas, químicos, drogas
veterinárias, etc.
 As tecnologias médicas, que interferem diretamente no corpo humano na busca da cura
da doença, alívio ou equilíbrio da saúde. Compreendem medicamentos, soros, vacinas,
equipamentos médico-hospitalares, cuidados médicos e cirúrgicos e suas organizações
de atenção à saúde, seja no atendimento direto ao paciente, seja no suporte diagnóstico,
terapêutico, seja na prevenção ou apoio educacional.
 As tecnologias do lazer, alusivas aos processos e espaços onde se exercem atividades
não médicas, mas que interferem na saúde dos usuários, como centros esportivos,
cabeleireiros, barbeiros, manicures, pedicuros, institutos de beleza, espaços culturais,
clubes, hotéis, etc.
 As tecnologias da educação e convivência, relacionadas aos processos e espaços de
produção, englobando escolas, creches, asilos, orfanatos, presídios, cujas condições das
aglomerações humanas interferem na sua saúde.
Meio ambiente
Subsistema relacionado ao conjunto de elementos naturais e de elementos que resultam da
construção humana e suas relações sociais:
 Omeio natural, correspondente à água, ao ar, ao solo e à atmosfera. Interessam ao controle
sanitário as tecnologias utilizadas na construção de sistemas de abastecimento de água
potável para o consumo humano, na proteção de mananciais, no controle da poluição do
ar, na proteção do solo, no controle dos sistemas de esgoto sanitário e dos resíduos
sólidos, entre outros, visando à proteção dos recursos naturais e à garantia do equilíbrio
ecológico e, consequentemente, da saúde humana.
 O meio construído, relacionado às edificações e às formas do uso e parcelamento do
solo. Aqui o controle sanitário é exercido sobre as tecnologias utilizadas na construção
das edificações humanas (casas, edifícios, indústrias, estabelecimentos comerciais, etc.)
e a forma de parcelamento do solo no ambiente urbano e rural; sobre os meios de
locomoção e toda a infraestrutura urbana e de serviços; sobre o ruído urbano e outros
fatores, no sentido de prevenir acidentes, danos individuais e coletivos e proteger o meio
ambiente.
 O ambiente de trabalho, relacionado às condições dos locais de trabalho, geralmente
resultantes de modelos de processos produtivos de alto risco ao ser humano. o controle
sanitário dirige-se a esse ambiente, em que frequentemente encontra cidadãos que são
obrigados a dedicar grande parte de seu tempo ao trabalho em condições desagradáveis,
em ambientes fechados e insalubres, em processos repetitivos, competitivos e sob
pressão, o que altera e põe em risco a saúde física e psicológica e a vida dos indivíduos
e da comunidade.
No processo histórico de conformação de seu campo de atuação e na divisão das tarefas de
vigilância sanitária, vários órgãos de governo assumem o todo ou parte desses subsistemas. Na
área de alimentos, por exemplo, o Ministério da Agricultura compartilha as ações de controle
de alimentos in natura. Nas radiações ionizantes, em seu uso em terapêutica médica, tem sido a
Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen) a responsável pelo controle e segurança das
fontes. A gestão do sistema de vigilância ambiental em saúde, em todo o território nacional,
passou a ser atribuição do Centro Nacional de Epidemiologia (Cenepi), conforme o Decreto nº
3.450, de 10 de maio de 2000. Com relação à vigilância do ambiente de trabalho, em várias
unidades federadas, o controle sanitário tem sido exercido por órgãos ligados ao Ministério do
Trabalho e Secretarias do Trabalho ou outros órgãos relacionados ao Programa de Saúde do
Trabalhador.
Determinantes sociais da saúde
A comissão homônima da Organização Mundial da Saúde (OMS) compreende os determinantes
sociais da saúde como condições sociais em que uma pessoa vive e trabalha. São os fatores e
mecanismos por meio dos quais as condições sociais afetam a saúde e que potencialmente podem
ser alterados por ações baseadas em informação. Para Buss e Pellegrini, são considerados os
fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que
influenciam a ocorrência de problemas de saúde e fatores de risco à população, como moradia,
alimentação, escolaridade, renda e emprego.
Estudos sobre determinantes sociais apontam que há distintas abordagens possíveis. Além disso,
indicam que há uma variação quanto à compreensão sobre os mecanismos que acarretam
inequidades de saúde. por isso, os determinantes sociais não podem ser avaliados somente pelas
doenças geradas. Eles vão além disso, influenciando todas as dimensões do processo de saúde
das populações, do ponto de vista tanto do indivíduo quanto da coletividade na qual se inserem.
Os determinantes sociais de saúde apontam tanto para as características específicas do contexto
social que afetam a saúde quanto para a maneira com que as condições sociais traduzem esse
impacto sobre a saúde.
Entre os desafios para entender a relação entre determinantes sociais e saúde está o
estabelecimento de uma hierarquia de determinações entre os fatores mais gerais de natureza
social, econômica, política e as mediações através das quais esses fatores incidem sobre a
situação de saúde de grupos e pessoas, não havendo uma simples relação direta de causa e
efeito. Daí a importância de o setor de saúde se somar aos demais setores da sociedade no
combate às inequidades. Todas as políticas que assegurem a redução das desigualdades sociais
e que proporcionem melhores condições de mobilidade, trabalho e lazer são importantes nesse
processo, além da própria conscientização do indivíduo sobre sua participação pessoal no
processo de produção da saúde e da qualidade de vida.
A partir de discussões e comentários, foi nos anos 1970 e no início dos anos 1980 que surgiu o
conceito de determinantes sociais de saúde. As limitações das intervenções sobre a saúde eram
destacadas quando orientadas pelo risco de doença nos indivíduos. As críticas afirmavam que
para compreender e melhorar a saúde, é necessário focalizar as populações, com pesquisas e
ações de políticas direcionadas às sociedades a que esses indivíduos pertencem. Foi sugerido
um movimento “contrário à correnteza” no que diz respeito tanto aos fatores de risco individuais
quanto a padrões e modelos sociais que moldam as chances das pessoas serem saudáveis. Um
ponto comum a essas críticas foi o argumento de a atenção médica não ser o principal fator de
auxílio à saúde das pessoas. pelo contrário, o conceito de determinantes sociais está ligado aos
“fatores que ajudam as pessoas a ficarem saudáveis, ao invés do auxílio que as pessoas obterão
quando ficarem doentes”. Nos anos 1990, a partir da reforma sanitária e da 8ª constituinte e de
acordo com a Lei 8.080, vigente desde 19 de setembro de 1990, também são descritas as relações
e os cuidados com a saúde com base no entendimento dos determinantes sociais:
 “Artigo 2 - A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover
as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. 1º O dever do Estado de garantir a
saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à
redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que
assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção,
proteção e recuperação.”
O famoso modelo de Dahlgren e Whitehead explica como as desigualdades sociais na saúde
são resultado das interações entre os diferentes níveis de condições, desde o nível individual até
o de comunidades ao que compete ao Estado fornecer todos os subsídios em saúde para a
manutenção e bem-estar da população, independentemente de suas diversidades psicossociais e
socioeconômicas. Existem diferentes concepções para o tema desigualdades sociais de saúde.
Muitas vezes utiliza-se o termo diferenciais de saúde ou iniquidades. Entretanto, em todos os
termos utilizados está presente a relação com o processo social de partilha de bens ou de saúde
e a posição que o indivíduo ocupa na sociedade.
 Iniquidade em saúde: desigualdades em saúde que são sistemáticas, injustas e
evitáveis.O termo iniquidade deriva da palavra equidade, um dos princípios do SUS
que vimos no módulo anterior. Equidade é atender cada indivíduo de acordo com suas
necessidades. Logo, as iniquidades, além de não serem o atendimento justo de cada
indivíduo, são desigualdades que agravam o que já era desigual.
Os determinantes de saúde continuam a ser compreendidos, em alguns contextos, como
características do indivíduo, como a rede de apoio social da pessoa, ou o salário, ou função.
Entretanto, a população não é meramente uma coleção de indivíduos. as causas da má saúde
agrupam-se em padrões sistemáticos. Além disso, os efeitos sobre um indivíduo podem
depender da exposição sobre outros indivíduos e de suas consequências. Isso ocorre porque os
determinantes de características individuais diferentes em uma população podem não ser os
mesmos determinantes de diferenças entre as populações.
Diante disso, é útil distinguir dois tipos de questões etiológicas: a primeira busca a causa dos
casos, e a segunda, as causas das incidências. Quando se trata de determinantes sociais,
queremos compreender como as causas dos casos individuais estão relacionadas às causas da
incidência nas populações. Por que observamos uma relação gradual entre a posição social e
um status de saúde que afeta as pessoas em todos os níveis da hierarquia social? Como ela muda
com o tempo? Os fatores determinantes sobre a saúde estão mudando para melhor? O mesmo
ocorre para todos? onde e para quem eles estão mudando para pior?
Nos últimos anos, vários modelos foram desenvolvidos para demonstrar os mecanismos através
dos quais os determinantes sociais de saúde afetam os resultados na saúde; para deixar claras
as conexões entre diferentes tipos de determinantes de saúde; e para localizar pontos
estratégicos para as ações de políticas. Dentre os principais modelos, há aqueles propostos por
Dahlgren e Whitehead (1991); Mackenbach (1994); Diderichsen e Hallqvist (1998, adaptado
subsequentemente por Diderichsen, Evans e Whitehead, 2001); e Marmot e Wilkinson (1999).
Esses modelos foram particularmente importantes para demonstrar as formas de contribuição
dos determinantes sociais de saúde sobre as iniquidades na saúde em vários grupos sociais.

Dahlgren e Whitehead: influências em camadas


O famoso modelo de Dahlgren e Whitehead explica como as desigualdades sociais na saúde
são resultado das interações entre os diferentes níveis de condições, desde o nível individual até
o de comunidades afetadas por políticas de saúde nacionais. os indivíduos estão no centro da
figura e têm idade, gênero e fatores genéticos que, indubitavelmente, influenciam seu potencial
de saúde final. O padrão de vida de uma dada sociedade, por exemplo, pode influenciar a
escolha de um indivíduo sobre habitação, trabalho e interações sociais, assim como hábitos
alimentares. Da mesma forma, alguns fatores podem influenciar o padrão de vida e a posição
socioeconômica, dependendo das crenças culturais sobre a posição das mulheres na sociedade,
ou da atitude geral sobre as comunidades étnicas minoritárias.
Diderichsen et al.: estratificação social e produção de doenças
O modelo de Diderichsen e Hallqvist, de 1998, foi adaptado por Diderichsen, Evans e
Whitehead (2001). Este modelo enfatiza a criação da estratificação social pelo contexto social,
que delega aos indivíduos posições sociais distintas. A posição social das pessoas determina
suas oportunidades de saúde. As consequências sociais referem-se ao impacto que um certo
evento pode ter sobre as circunstâncias socioeconômicas que afetam um indivíduo ou uma
família. Este modelo inclui uma discussão de pontos para ações de políticas, um aspecto que
retomaremos em uma seção adiante.
Mackenbach et al.: seleção e causa
O modelo de Mackenbach enfatiza os mecanismos que geram as desigualdades na saúde:
seleção versus causa. O modelo inclui o ambiente na infância, os fatores culturais e os fatores
psicológicos, e demonstra sua contribuição às desigualdades na saúde, tanto como fator de
seleção quanto como fator causal.
Brunner, Marmot e Wilkinson: múltiplas influências no decorrerda vida
Esse modelo foi desenvolvido para ligar as perspectivas da saúde clínica (curativa) às da saúde
pública (preventiva). Subsequentemente, o modelo foi aplicado ao processo social subliminar
às desigualdades na saúde, gerando um modelo de fatores sociais que causam mau estado de
saúde e que contribuem para as desigualdades na saúde. Este modelo liga o padrão social à
saúde e à doença por caminhos materiais, psicossociais e comportamentais. Fatores genéticos,
de infância e culturais também são influências importantes sobre a saúde da população.
Determinantes de saúde no Brasil
Em 2008, a Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais de Saúde publicou um relatório
com as causas principais das iniquidades em saúde no nosso país.
 Urbanização: em 40 anos o Brasil teve sua população rural reduzida de 55% para 19%,
enquanto a população urbana aumentou de 56% para 81%. Essa mudança é considerada
rápida para a organização de um país. Os serviços e políticas não acompanharam tal
crescimento, o que gerou alta demanda por serviços e infraestrutura.
 Transição demográfica: a urbanização e a rápida industrialização foram responsáveis
pelas mudanças no padrão de fecundidade da população. A queda da taxa de
fecundidade no Brasil foi muito mais rápida do que em países desenvolvidos. Mulheres
com menor renda possuem maior taxa de fecundidade.
 Crescimento econômico e distribuição de renda: a má distribuição das riquezas do
país agravam as condições sociais. Embora o Brasil tenha aumentado sua concentração
de riquezas, isso não se refletiu na melhora social.
 Educação e saúde: O Brasil reduziu consideravelmente as taxas de analfabetismo e
aumentou a escolaridade dos chefes de família nos últimos anos. Contudo, observa-se
ainda que as regiões norte e nordeste têm as menores taxas.
Na Conferência Mundial de Determinantes Sociais de Saúde, estabeleceu-se as cinco principais
intervenções que devem ser realizadas pelos países para combater as iniquidades em saúde:
 Governança para o enfrentamento das causas mais profundas das iniquidades em saúde:
implementar de ações sobre os determinantes sociais da saúde.
 Promoção da participação: lideranças comunitárias para a ação sobre os determinantes
sociais.
 O papel do setor, incluindo os programas de saúde pública, na redução das iniquidades
em saúde.
 Ações globais sobre os determinantes sociais: alinhar prioridades e grupos de interesse.
 Monitoramento do progresso: medir e analisar para informar as políticas sobre
determinantes ociais.
Síntese
Nesta unidade, você pôde observar que as informações são fundamentais para perceber
problemas, investigar suas causas, planejar soluções e avaliar as intervenções realizadas. As
informações são transformadas em indicadores que servem de análise para situações de saúde,
sociais ou demográficas. Nesse sentido, a vigilância em saúde busca monitorar e alertar para
todas as dimensões que envolvem e determinam a saúde do indivíduo e do coletivo.

Apostila 3
O normal e o patológico
 Normal: aquilo que é usual, regular, conforme a norma, exemplar.
 Patologia: parte da medicina que estuda as doenças. Desvio do que é considerado
normal; desvio do ponto de vista fisiológico e anatômico e que constitui ou caracteriza
uma doença
Usualmente, é mais fácil refletirmos sobre o que o conceito de doença representa na nossa
sociedade ou para nós. Definir o que é saúde torna-se um pouco mais difícil, pois levamos em
consideração diferentes faces da realidade em que estamos inseridos ou em que contexto o que
queremos definir como saudável está inserido. Logo, saúde não tem o mesmo significado para
todos. para considerar o que é normalidade parte-se da situação mais positiva ou benéfica e
mais frequente, ou seja, do que é mais comum.
Desde que a humanidade existe, a doença a acompanha. tentamos sempre, incansavelmente,
encontrar meios de detê-la. o mundo passou por ondas de epidemias e pandemias que, na
verdade, ainda nos atingem. Será que a doença estaria restrita somente a estes casos
“contagiosos”?
Na literatura, é mais comum encontrar a história do conceito doença do que a do conceito saúde.
primeiramente, o conceito doença era entendido como resultado de fatores externos, e a saúde
como uma recompensa. Em razão disso, compreendia-se a vontade dos deuses ou de seres
místicos e das forças sobrenaturais. A leitura que se faz é a da unicausalidade, isto é, uma
única causa definiria a saúde ou a doença de uma comunidade inteira. Na ausência de
conhecimentos que permitissem elaborar terapias, era a cultura que mais determinaria a
percepção de doença.
Na Antiguidade Clássica, houve um afastamento da ideia religiosa ou de fé sobre o surgimento
das enfermidades. As doenças eram percebidas ainda como resultado do desequilíbrio entre os
elementos calor, frio, água, terra e ar; ou eram ainda relacionadas às estações do ano. Surge
também neste período a observação entre o trabalho, a posição social e a doença. Observe que,
de certa forma, a humanidade percebia a relação entre qualidade da água e do ar com a situação
de saúde e, por essa razão, atribui-se a este período o surgimento da ideia de contágio. No
entanto, não havia ainda nessa época sequer o conceito de microrganismos para que se pudesse
fazer uma relação mais direta. É importante ressaltar que, na Antiguidade Clássica, aparece a
consciência sobre a condição social do indivíduo, que já estudamos ser um dos determinantes
sociais de saúde. Os gregos tinham como ponto forte a pesquisa, a ciência e o estudo. Por essa
razão, buscavam a causalidade dos problemas que acometiam a saúde da população na época.
É no ápice da civilização grega que surge o rompimento com a superstição e a magia. A
medicina grega cultuava a divindade de asclépius. Suas práticas, no entanto, iam além da
ritualística, envolvendo o uso de ervas medicinais e de métodos naturais. Na mitologia grega,
asclépius teve duas filhas a quem ensinou a sua arte: Hygeia (de onde deriva ‘higiene’) e Panacea
(deusa da cura). Os médicos eram filósofos que procuravam entender a relação da doença do
homem com a natureza.
Hipócrates foi um médico e filósofo grego considerado o pai da medicina. Ele elaborou a teoria
miasmática e escreveu sobre as endemias, classificando-as como doenças que ocorrem de
maneira regular e contínua entre habitantes de uma comunidade. Depois descreveu as epidemias
como o surgimento repentino de um grande número de casos na população. Na época da
medicina hipocrática, os médicos eram notórios observadores. Eles registravam
meticulosamente as relações com o quadro de doença e, também, realizavam avaliação médica
que consistia em: exploração do corpo (ausculta e manipulação sensorial); conversa com o
paciente (anamnese); entendimento sobre o problema (raciocínio diagnóstico); e estabelecimento
de procedimentos terapêuticos ou ações indicadas para as queixas mencionadas (prognóstico).
Hipócrates postulou a existência de quatro fluidos (humores) principais no corpo: bile amarela,
bile negra, fleuma e sangue. Desta forma, a saúde era baseada no equilíbrio desses elementos.
Ele via o homem como uma unidade organizada e entendia a doença como uma desorganização
desse estado.
 Teoria miasmática: teoria que entende como causa das doenças as impurezas e odores
fétidos contidos no ar, conhecidos como miasmas.
Os romanos eram conhecidos por seu excelente planejamento de cidades e organização urbana.
Eles construíram notórios aquedutos que abasteciam a cidade e tinham um sistema de
esgotamento de dejetos conhecido como cloaca máxima. além disso, uma marca cultural desta
civilização eram os banhos públicos, que demonstravam a preocupação com a higiene. Apesar
dos avanços feitos por gregos e romanos, a Idade Média (500 d.C. – 1500 d.C.) herdou práticas
supersticiosas que recomendavam aos doentes utilizar amuletos com a palavra mágica
abracadabra e que os reis tocassem as pessoas para que elas fossem curadas. Claro que essa
última prática era apenas privilégio da monarquia.
O cristianismo pregava que a doença era uma forma de expiação dos pecados, de purificação da
alma e, por esse motivo, inicialmente, era considerado a religião dos pobres. Essa forma de
interpretação da doença dava sentido ao sofrimento. Certamente, surgiram epidemias nessa
época, que eram explicadas como formas de livrar os pecados do mundo. algumas doenças
tinham estigma social, como a lepra (a impureza), cujos pacientes ficavam reclusos em lugares
distantes das cidades conhecidos como leprosários. Antes de serem enviados para esses locais,
os doentes eram considerados como mortos e tinham rezada uma missa de corpo presente. Essa
forma de “tratamento” dos doentes nos lembra a primeira medida de controle epidemiológico
que vimos na unidade 2, usada até hoje: o isolamento. por não dar conta da redução das
enfermidades, a Igreja reforça as instituições de caridade que cuidarão dos excluídos, das viúvas
e dos indigentes. Muitas instituições de caridade são hoje hospitais do nosso país – a exemplo
das Santas Casas de Misericórdia –, legados do período pós-colonial. outras doenças que
assolavam este período histórico foram sífilis, varíola, rubéola, sarampo, influenza, erisipela
– doenças que existem até os dias de hoje.
 Cultura pode ser definida como um conjunto de elementos que mediam e qualificam
qualquer atividade física ou mental, que não seja determinada pela biologia, e que seja
compartilhada por diferentes membros de um grupo social. Trata-se de elementos sobre
os quais os atores sociais constroem significados para as ações e interações sociais
concretas e temporais, assim como sustentam as formas sociais vigentes, as instituições
e seus modelos operativos. A cultura inclui valores, símbolos, normas e prática.” Fonte:
Langdon EJ, Wilk FB. Antropologia, saúde e doença: uma introdução ao conceito de
cultura aplicado às ciências da saúde. Rev. Latino-Am. Enfermagem 18(3):[09
telas]mai-jun 2010.
Toda essa pestilência serviu para alguns avanços sanitários, como canalização das águas,
ampliação das ruas, restrição da circulação de animais perto de rios e fontes de água. É na Idade
Média que surge a quarentena como medida de vigilância e a notificação de casos suspeitos às
autoridades. Cabe lembrar que, nesse período, as crenças de cura relacionadas a outras religiões
eram vistas como bruxaria e sofreriam as consequências da Inquisição.
Perto de 1500, surge o Renascimento com suas descobertas acerca de contaminação e formas
de contágio. Nessa época, iniciou a expansão comercial, que levou ao descobrimento do Brasil.
Nosso país contém muitas crenças sobre doença que são oriundas de índios e escravos, que
construíram muito da nossa cultura. No período Colonial, os feiticeiros, pajés e xamãs foram
grandes curandeiros que utilizavam benzeduras, rezas, chás e feitiços. Para um grupo de índios
que vive na fronteira entre Brasil e Venezuela, os Sarrumá, nenhuma morte é por causas
naturais. Para eles, em casos de morte, basicamente algum feitiço tem que ter sido feito contra
a pessoa, mas não necessariamente outra pessoa faz o feitiço, pois ele pode ter sido realizado por
algum desentendimento, um espírito maligno ou espírito do animal que a pessoa comeu.
Passaram a ser desenvolvidos estudos de anatomia, fisiologia e de individualização da descrição
das doenças, fundados na observação clínica e epidemiológica. A experiência acumulada pelos
médicos forneceu elementos para a especulação sobre a origem das epidemias e o fenômeno do
adoecimento humano.
Na Idade Moderna, com a introdução da máquina a vapor intensifica-se o ritmo produtivo, as
fábricas passam a demandar mais mão de obra e as cidades crescem nas periferias. Assim, as
péssimas condições de trabalho começam a chamar a atenção dos administradores. O corpo,
tomado como meio de produção pelo capitalismo emergente, torna-se objeto de políticas,
práticas e normas, surgindo as primeiras regulações visando à saúde nas fábricas.
No século XIX, há um grande avanço nas descobertas bacteriológicas com Louis Pasteur, com
a descoberta de microrganismos, vacinas e soros. A era bacteriológica causou uma grande
revolução, pois pela primeira vez em séculos surge uma nova explicação para a causa do
adoecimento, o qual tinha agora também prevenção e cura. Concomitantemente a esses
progressos surge a epidemiologia e a estatística e o entendimento de que, se a saúde de um
indivíduo pode ser mensurada em números de batimentos, de respiração e de temperatura, o
mesmo deveria poder acontecer com a dimensão social das pessoas por meio de indicadores.
Em 1779, surge na Alemanha a ideia de intervenção estatal na saúde por meio da polícia
sanitária. Na França, surge a saúde urbana, entendida como um planejamento da cidade para
evitar aglomerados de pessoas, sobretudo próximo às águas, e para controlar a higiene de
cemitérios e matadouros. Na Inglaterra, o desenvolvimento do proletariado industrial leva a
medicina inglesa a tornar-se social por meio da ‘lei dos pobres’. Caracterizada pela assistência e
pelo controle autoritário dos pobres, a implantação de um cordão sanitário que impunha o
controle do corpo da classe trabalhadora por meio da vacinação, do registro de doenças e do
controle dos lugares insalubres visava tornar a pessoa mais apta ao trabalho e menos perigosa
para as classes ricas.
Em 1860, surgiram estudos de Louis Pasteur com hipóteses sobre a relação entre doenças e
microrganismos, e em 1870 os estudos de Robert Koch estabeleceram as regras de investigação
desse tipo de hipótese. No decorrer da segunda metade do século XIX, a teoria microbiana das
doenças foi gradualmente aceita pela maioria dos médicos e pelo público. A era bacteriológica
conviveu durante algum tempo com a teoria dos miasmas, sendo influenciada por ela. Em meados
do século XIX, houve grandes epidemias de cólera na Europa, matando milhões de pessoas.
Autoridades médicas, como William Farr, tinham certeza de que sua causa era um miasma.
Pasteur fez parte de uma comissão que procurou identificar o modo pelo qual essa doença era
transmitida. Provavelmente influenciado pela teoria dos miasmas, tentou encontrar no ar algum
microrganismo que fosse responsável pela doença. Nada encontrou. Depois, descobriu-se que o
cólera era transmitido principalmente pela água. Na era bacteriológica, os índices de
mortalidade por doenças contagiosas reduzem drasticamente e muitas doenças têm sua cura
descoberta ou, ao menos, sua forma de prevenção revelada. Por descobrir-se a prevenção,
muitas modificações nas condições de vida das pessoas foram indicadas.
As explicações de cunho microbiológico estavam tão fortes que começou a surgir crítica sobre a
ignorância em relação aos fatores sociais que causam as doenças. Os contagionistas enfatizavam a
busca de uma causa verdadeira e específica da doença. Os anticontagionistas, apesar de também
estarem tentando precisar a especificidade da doença e sua etiologia, enfatizavam a importância
de estudar a predisposição do corpo e do ambiente para o surgimento da doença. a
predisposição, noção originalmente relacionada à teoria da constituição epidêmica, denotava,
no contexto desta teoria, um estado, uma totalidade que não se expressava como um conceito.
A partir de 1970, surge o modelo multicausal de doença. A determinação social da saúde/
doença procura articular as diferentes dimensões da vida envolvidas nesse processo. assim, são
considerados os aspectos históricos, econômicos, sociais, culturais, biológicos, ambientais e
psicológicos que configuram uma determinada realidade sanitária.
 “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.”(Constituição Federal, 1988)
Conceitos de saúde
A saúde como ausência de doença resulta dos pensamentos racionais e objetivos que buscam
causa e tratamento – um agente causador e um agente de cura. Esse modelo foi vencido por
outros, mas ainda permeia o imaginário das pessoas. após a Segunda Guerra Mundial, a OMS
define a saúde como o bem-estar físico, psíquico e social. Esse conceito trouxe muitas polêmicas,
porque implica uma definição do que é esse bem-estar e, portanto, do que é normal ou não.
Assim, tudo que foge a esse conceito está passível de ser medicalizado. Essa é a realidade que
observamos com o ritmo frenético de vida da nossa sociedade, que resulta no surgimento de
várias novas doenças do mundo moderno e para as quais há sempre novas medicações.
A saúde como direito social é o conceito mais ampliado de saúde. Constitui-se como resultado
da garantia de acesso a diferentes outros direitos como: condições de alimentação, habitação,
educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse
da terra e acesso aos serviços de saúde.
Racionalidade Médica
 Holístico ou holista é um adjetivo que classifica alguma coisa relacionada com o
holismo, ou seja, que procura compreender os fenômenos na sua totalidade e
globalidade.
 Paradigma é um modelo ou padrão a seguir.
 Iatrogenia é um resultado negativo decorrente de um tratamento médico.
 Médico: pessoa que exerce medicina; o que cura um mal (físico ou moral);
 Médico espiritual: confessor; relativo à medicina
A partir dos anos 1960 – no movimento a favor do naturismo e de contracultura –, começa a
surgir um discurso a favor do fortalecimento da natureza. Nessa época, as características mais
marcantes eram os Estados unidos e a Europa voltados para impulsionar a tecnologia, a ciência
e a inteligência artificial. No campo da saúde, esse movimento de contracultura gesta a ideia da
promoção de saúde e de práticas terapêuticas naturistas, ao contrário da prevenção de doenças
ou de tratamentos com remédios.
Nos anos 1970, a crítica à farmacologia foi impulsionada pelas publicações de autores como
Foucault e Illich. um dos destaques desses discursos eram a iatrogenia médica e farmacêutica,
a medicalização social como forma de controle dos cidadãos, os deslocamentos da saúde para a
lógica de produção de mercado. acontecia ainda no campo saúde a redução da saúde ao seu
aspecto biológico, usando, por meio da lógica farmacêutica, uma maneira de reduzir os
sofrimentos, como se eles fossem de origem biológica apenas.
Em 1972, a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano
destaca como condição de nossa sobrevivência a preservação do meio ambiente, nele
compreendida a nossa fonte de bem-estar biológico e social. Em 1978, a Conferência de Alma-
Ata, realizada na antiga União Soviética, aponta que os cuidados primários em saúde são o
mínimo para que as nações alcancem um nível de saúde aceitável. o próprio diretor da OMS
na época declarou que a medicina tecnológica era insuficiente para resolver os problemas de
saúde da população mundial, os quais acometiam dois terços da população.
Em 1986, a I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde realizada em Ottawa,
Canadá, afirmou que não apenas os fatores biológicos, mas também os políticos, econômicos,
sociais, culturais, de meio ambiente e de conduta podem intervir a favor ou contra a saúde. Entre
outros aspectos, a Carta de ottawa defendeu que os serviços de saúde adotem “uma postura
abrangente, que perceba e respeite as peculiaridades culturais” e incentivem “a participação e a
colaboração de outros setores, outras disciplinas e, mais importante, da própria comunidade”.
Esse entendimento de saúde aparece traduzido no texto da Constituição Federal que menciona
“atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas”, entendendo-se que pela
integralidade seriam proporcionados todos os níveis de saúde à população. Os anos 1970 e 1980
são marcados por um resgate popular de práticas orientais de saúde, como a medicina
ayurvédica, a medicina tradicional chinesa, e as práticas religiosas vinculadas ao xamanismo e
a religiões afro-indígenas. Foram denominadas práticas alternativas as terapias que utilizavam
como métodos o que fosse holístico, energético, natural, ou que, frequentemente, derivavam de
conhecimentos anciãos de curandeiros, xamãs, rezadores, parteiras, pajés, etc.
O que se percebeu foi a necessidade de poder estabelecer uma relação entre a medicina
biomédica e as demais que existiram e existem em paralelo. Assim, observou-se que existe uma
lógica comum a esses raciocínios médicos, ao que se deu o nome de racionalidade médica.
ATENÇÃO PARA OS CONCEITOS A SEGUIR!
 Morfologia humana: define a estrutura e a forma de organização do corpo.
 Dinâmica vital humana: define o movimento da vitalidade, seu equilíbrio ou
desequilíbrio no corpo, suas origens ou causas.
 Doutrina médica: define, em cada sistema, o que é o processo saúde-doença, o que é a
doença ou adoecimento, em suas origens ou causas, o que é passível de tratar ou curar.
 Sistema de diagnose: determina se há ou não um processo mórbido, sua natureza, fase
e evolução provável, origem ou causa.
 Sistema terapêutico: determinam-se as formas de intervenção adequadas a cada
processo mórbido (ou doença) identificado pela diagnose.
 Cosmologia: são os sentidos, símbolos, metáforas que sustentam o imaginário das
demais dimensões das racionalidades médicas.
**Racionalidade médica é um sistema médico estruturado com as cinco dimensões de forma
siste- matizada em maior ou menor grau. Isso não é uma comparação entre melhor ou pior entre
as racionalidades.
Existe o paradigma entre o biomédico e o vitalista. Biomédico é aquele que enfatiza questões
materiais, mecânicas, centradas na doença e no controle do corpo biológico e social, tendo,
dessa forma, controle também sobre a natureza. Essa visão deriva do período renascentista e do
discurso racional posterior à idade média. A natureza passa a ser objeto dominado pelo ser
humano, que pensa poder controlá-la pela tecnologia. Entende-se, assim, que as doenças podem
ser do nosso controle. Muitas críticas surgem ao fato de esta racionalidade reduzir o processo
saúde-doença a critérios biológicos ou catalogados, que excluem a subjetividade da pessoa
atendida e enfraquecem – desmancham – o vínculo entre profissional e paciente, sendo, assim,
pouco integral. Já a visão vitalista busca a harmonia entre meio ambiente social, natural e a
pessoa. Nessa harmonia, é entendida a saúde. Existe a valorização da subjetividade das pessoas,
a prevenção e promoção da saúde e a integralidade do cuidado. Dessa forma, a sustentabilidade
é uma das premissas deste ponto de vista, que cresce a partir dos anos 1960 como resultado da
contracultura.
Em todas as racionalidades médicas estudadas, foi observada a coexistência de duas formas de
interpretação das situações de saúde-doença: uma baseada na teoria e regida pela razão, outra
baseada no empirismo, ou seja, na sensibilidade do profissional ou terapeuta.
 Práticas Integrativas Complementares (PIC) - O campo das práticas integrativas e
complementares contempla sistemas médicos complexos e recursos terapêuticos, os
quais são também denominados, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), medicina
tradicional e complementar/alternativa (MT/MCA). Tais sistemas e recursos envolvem
abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e
recuperação da saúde por meio de tecnologias eficazes e seguras, com ênfase na escuta
acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano
com o meio ambiente e a sociedade. Outros pontos compartilhados pelas diversas
abordagens abrangidas nesse campo são a visão ampliada do processo saúde-doença e
a promoção global do cuidado humano, especialmente do autocuidado.
As PICs foram entendidas como parte de uma racionalidade médica, um instrumento ou um
método que, com certa frequência, é utilizado isoladamente. Você já deve ter ouvido falar de
várias PICs, como acupuntura, reiki, iridologia, florais e fitoterapia.
A visão mais convencional é a biológica, que necessita se fazer comprovada, executada, testada.
Dessa forma, houve uma resistência no mundo ocidental para que as outras racionalidades
médicas se inserissem e fossem aceitas. Cada vez mais se encontram profissionais de saúde que
utilizam PICs e outras racionalidades médicas como forma de ofertar um atendimento mais
amplo, mais holístico. o mundo esquece que as terapias ditas “alternativas” são milenares e
ancestrais ao modelo biomédico. De acordo com Luz (1997): “[...] a racionalidade médica
esqueceu-se de que era mais do que um saber científico, isto é, de que era também a arte de
curar sujeitos doentes, distanciando-se da sua dimensão terapêutica, na busca de investigar,
classificar, e explicar antigas e novas, sobretudo novas, patologias através de métodos
diagnósticos crescentes e sofisticados”.
Essa maneira unilateral e caolha de ver a saúde reflete-se no meio acadêmico pela epidemia de
estudos e pesquisas sem relevância e aplicabilidade social; pesquisas que existem para
comprovar o que não é necessário.
No campo da integralidade, o paciente é um ser biopsíquico e social, que é singular, devendo
ser ele o objetivo final e não o seu tratamento. Essa visão está presente nas racionalidades
médicas orientais e ditas alternativas. A formação do profissional de saúde voltado para o
paciente ao invés de para a doença é o que fará a demanda pela integralidade crescer.
O profissional com visão biomédica excludente gera pacientes que demandam tratamento,
medicação, exames e cura sem se preocupar em primeiro lugar com o diagnóstico. Da mesma
forma, um diagnóstico centrado na doença não poderia encontrar outros recursos de tratamento
senão os medicamentosos e químicos, posto que não se conhece o paciente, sua vida, seu meio
social e suas crenças.
Na medida em que se dispõe de altas tecnologias diagnósticas acompanhadas da sedução
tecnicista da precisão do acerto, a relação terapeuta-paciente fragiliza-se. O diagnóstico médico
envolvia como parte importante do exame o toque físico do paciente, lógica que está ameaçada
pela visão fragmentada da saúde. Nas medicinas alternativas, o aspecto psicológico do paciente
é elemento importante de cura. Isso expõe a questão da eficácia e da resolutividade do
tratamento convencional: a satisfação do paciente com relação ao tratamento faz parte do
sucesso.
O crescimento das práticas alternativas resulta de outra vantagem: o baixo custo tecnológico
que apresentam, sobretudo em países que enfrentam dificuldades financeiras para organização e
funcionamento dos seus serviços de saúde. Essas práticas envolvem o paciente/cidadão no
processo de cura, o tornam participativo, autônomo e ator do seu processo de saúde. Essa lógica
aproxima-se mais da visão da atenção primária à saúde, que tem como um de seus atributos a
participação social.
Certamente, é vantajoso que as racionalidades médicas não sejam excludentes, mas sim
complementares entre si. O eixo biológico é fundamental, como vimos na história do conceito
saúde, mas ele passa a ser essencial se integrado às práticas holísticas que vão otimizar a
integralidade do cuidado e a resolutividade do atendimento à saúde.
** Lembre que falar de racionalidades médicas nada tem de exclusivo aos profissionais que se
formaram em medicina. Os profissionais que restringem sua visão de atendimento a uma
questão biomédica estão também utilizando a racionalidade que tem este nome.Considerar as
dimensões culturais, afetivas, psíquicas do que as pessoas comem, sentem, dormem, vivem,
enfim, de como a vida delas transcorre é ter uma visão ampliada de saúde.
 Holismo x Individualismo - Individualismo é aquela ideologia que valoriza indivíduos
e negligencia o social, ou subordina este social ao homem. A visão holística é aquela
que considera o todo, a sociedade e seu meio. Na sociedade atual, vivenciamos a
ideologia individualista que ignora o coletivo e fica centrada no indivíduo.
Práticas Alternativas de Saúde
Várias racionalidades médicas insistem que o cuidado com a saúde é um meio para o objetivo
final de realização enquanto ser humano (discurso também da promoção da saúde), concebendo
um processo de transformação e realização pessoal como trajetória individual, ainda que seja
para religar e re-harmonizar a pessoa com o cosmo, o mundo, os outros. Esse é o objetivo do
caminho das práticas tradicionais do yoga ou do tai chi chuan, inseridas nas racionalidades
médicas tradicionais da índia e da China.
 “É usual que essas racionalidades ofereçam práticas, valores e técnicas de promoção de
saúde que se realizam também coletivamente em pequenos grupos e valorizam e
fomentam a solidariedade, a troca entre os praticantes, o empoderamento comunitário.
as meditações, as massagens e automassagens, os exercícios psicofísicos ou energéticos,
se bem que voltados para o indivíduo, mostram repercussões positivas na sociabilidade,
na construção de redes de apoio social, na discussão da participação social e política. Não
é por acaso que profissionais do SUS envolvidos com atividades coletivas de tipos
variados, inclusive usando técnicas complementares, não raro testemunham que os
grupos costumam fomentar cidadãos mais atuantes e mesmo conselheiros locais de
saúde. portanto, é no polo individual e grupal, numa perspectiva relacional microssocial,
que as práticas complementares podem contribuir para a promoção da saúde.” (tesser,
C.D. práticas complementares, racionalidades médicas e promoção da saúde:
contribuições poucos exploradas. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 25(8):1732-1742,
ago, 2009)
Existem racionalidades médicas (ayurveda, medicina tradicional chinesa, homeopatia, etc.) e
existem as práticas (yoga, tai chi chuan, cupuntura, meditação, reiki, acupuntura, biodança,
automassagem, homeopatia).
A utilização das PAS tem mostrado resultados que vão para além do indivíduo. Estudos
apontam que a criação de grupos que exercem estas práticas promove a autonomia individual, a
participação social e a vinculação entre os participantes dos grupos. além disso, gera uma
percepção positiva de saúde, em que o indivíduo deixa de se perceber como portador de uma
doença para se enxergar como próprio instrumento de cura. Essas racionalidades e práticas
carecem de pesquisas científicas, especialmente por terem muito ligadas a si os conhecimentos
populares, empíricos e nem sempre verdadeiros. as políticas de fomento a estas práticas já
existem no SUS (veremos a seguir), mas cabe aos profissionais, e sobretudo aos cidadãos,
demandar que elas sejam ofertadas por meio da participação nos conselhos locais de saúde.
Política Nacional de práticas Integrativas eComplementares (PNPIC)
Em virtude da crescente demanda da população brasileira, por meio das conferências nacionais
de saúde e das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) aos Estados-
Membros para formulação de políticas visando à integração de sistemas médicos complexos e
recursos terapêuticos (também chamados de Medicina Tradicional e Complementar/Alternativa
(MT/MCA) ou Práticas Integrativas e Complementares (PIC)). Aos sistemas oficiais de saúde,
além da necessidade de normatização das experiências existentes no SUS, o Ministério da
Saúde aprovou a política Nacional de práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no SUS,
contemplando as áreas de homeopatia, plantas medicinais e fitoterapia, medicina tradicional
chinesa/acupuntura, medicina antroposófica e termalismo social – crenoterapia.
Síntese
A política nacional de práticas integrativas e complementares (pnpic) tem como objetivos:
 Incorporar e implementar as práticas integrativas e complementares no sus, na
perspectiva da prevenção de agravos e da promoção e recuperação da saúde, com ênfase
na atenção básica, voltada ao cuidado continuado, humanizado e integral em saúde.
 Contribuir para o aumento da resolubilidade do sistema e ampliação do acesso à pnpic,
garantindo qualidade, eficácia, eficiência e segurança no uso.
 Promover a racionalização das ações de saúde, estimulando alternativas inovadoras e
socialmente contributivas ao desenvolvimento sustentável de comunidades.
 Estimular as ações referentes ao controle/participação social, promovendo o
envolvimento responsável e continuado dos usuários, gestores e trabalhadores nas
diferentes instâncias de efetivação das políticas de saúde.
Entre suas diretrizes, destacam-se:
 Estruturação e fortalecimento da atenção em pic no sus.
 Desenvolvimento de estratégias de qualificação em pic para profissionais do sus, em
conformidade com os princípios e diretrizes estabelecidos para educação permanente.
 Divulgação e informação dos conhecimentos básicos da pic para profissionais de saúde,
gestores e usuários do sus, considerando as metodologias participativas e o saber
popular e tradicional.
 Estímulo às ações intersetoriais, buscando parcerias que propiciem o desenvolvimento
 integral das ações.
 Fortalecimento da participação social.
 Provimento do acesso a medicamentos homeopáticos e fitoterápicos na perspectiva da
ampliação da produção pública, assegurando as especificidades da assistência
farmacêutica nestes âmbitos na regulamentação sanitária.
 Garantia do acesso aos demais insumos estratégicos da pnpic, com qualidade e
segurança das ações.
 Incentivo à pesquisa em pic com vistas ao aprimoramento da atenção à saúde, avaliando
eficiência, eficácia, efetividade e segurança dos cuidados prestados.
 Desenvolvimento de ações de acompanhamento e avaliação da pic para
instrumentalização de processos de gestão.
 Promoção de cooperação nacional e internacional das experiências da pic nos campos
da atenção, da educação permanente e da pesquisa em saúde.
 Garantia do monitoramento da qualidade dos fitoterápicos pelo sistema nacional de
vigilância sanitária.

Apostila 4
O modelo de atenção à saúde no Brasil
Segundo alves e Silva Júnior, o modelo assistencial diz respeito ao modo como são organizadas,
em uma dada sociedade, as ações de atenção à saúde, envolvendo os aspectos tecnológicos e
assistenciais. ou seja, é uma forma de organização e articulação entre os diversos recursos
físicos, tecnológicos e humanos disponíveis para enfrentar e resolver os problemas de saúde de
uma coletividade. Existem, no mundo, diversos modelos assistenciais calcados na compreensão
da saúde e da doença, nas tecnologias disponíveis em determinada época para intervir na saúde
e na doença e nas escolhas políticas e éticas que priorizam os problemas a serem enfrentados
pela política de saúde.
No Brasil, dois modelos antagônicos de assistência à saúde garantem o acesso aos serviços de
saúde para a população brasileira. Esses modelos são extremamente contraditórios por
apresentarem formas de orientação muito diferentes. Em alguns momentos, eles se
complementam, garantindo assim a assistência em grande parte das intervenções em saúde. os
dois modelos existentes em nosso país são: modelo médico-assistencial privatista e modelo
assistencial sanitarista. Há autores ainda que incluem um terceiro modelo, chamado de saúde
da família, pautado em uma estratégia de (re)organização da atenção primária em nosso país, que
será abordado melhor mais à frente. Os dois principais modelos assistenciais constituídos no
decorrer da história do sistema de saúde no Brasil estão voltados para dois aspectos importantes:
demanda espontânea de saúde e necessidades de saúde da população.
Modelo médico-assistencial privalista
O modelo médico-assistencial privatista está destinado a conter a demanda espontânea dos
usuários. A população tem livre iniciativa para procurar os serviços de saúde, seja em hospitais,
centros de saúde, unidades de saúde, prontos-socorros, consultórios particulares ou
laboratórios. Caracteriza-se por ser um modelo voltado para o imediatismo, isto é, o indivíduo
o procura por apresentar algum sinal ou sintoma de alguma enfermidade. O objetivo da
população é apenas resolver o sofrimento naquele momento. É uma abordagem centrada na
doença e na resolução imediata do problema. Por esse motivo, é o mais difundido e o mais
prestigiado por grande parte das pessoas. O grande entrave desse modelo é o fato de estar
atrelado ao grau de conhecimento e/ou sofrimento dos indivíduos sobre determinadas doenças.
Logo, aqueles que não percebem a existência de agravos ou de doenças propriamente ditas
deixarão de ser abordados pelo sistema de saúde. Esse modelo reforça a ideia de saúde como
sendo a ausência de doença e por isso só necessitam de cuidados os que estão verdadeiramente
doentes ou que apresentam algum mal físico. É um modelo que tem sua gênese na assistência
filantrópica e na medicina liberal e que se consolidou com o desenvolvimento da medicina
capitalizada. Reproduz-se tanto no setor público como no setor privado de saúde com um único
objetivo: caráter curativo. Isso tende a prejudicar o atendimento integral do indivíduo e da
comunidade da qual ele faz parte, além de interferir negativamente no impacto sobre o nível de
saúde da população. (Rouquaryol, 2003).
Modelo assistencial sanitarista
Esse modelo, quando citado, na maioria das vezes é abordado como sinônimo de saúde pública.
É caracterizado por campanhas e programas focalizados em algum problema específico de
saúde, o qual o modelo hegemônico anterior não conseguiu resolver ou dar conta. No século
XX, o Brasil passou por diversos problemas de saúde que só foram contidos graças a campanhas
específicas como, por exemplo, as diversas epidemias que acometeram nossa população no
passado (febre amarela, varíola, peste, entre outras). Recentemente, vivenciamos as epidemias de
dengue e, mais especificamente, a pandemia de gripe pelo vírus influenza A H1N1. Esse
controle também se deve à instituição do calendário vacinal obrigatório, que conseguiu obter
bons resultados no controle e erradicação de determinadas doenças. A campanha de reidratação
oral conseguiu diminuir consideravelmente o índice de mortes por desidratação em crianças em
áreas desprovidas de serviços adequados de saúde. Alguns programas focais, como os da
tuberculose, hanseníase, hipertensão, diabetes e saúde da criança, também são exemplos desse
modelo de intervenção em saúde. Essas ações são extremamente importantes, porém não
contemplam os problemas de saúde em sua real dimensão, pois priorizam determinados agravos
ou grupos de risco em detrimento de políticas mais gerais e que gerem um verdadeiro impacto
no modo de estruturação e prestação de serviços em saúde. Outra grande dificuldade dessas
políticas é o caráter temporário que elas assumem. Com exceção de alguns programas que se
tornaram permanentes, as campanhas focais têm caráter efêmero e, no momento em que
ocorrem, desviam recursos federais para sua execução, modificando também todo um
planejamento previamente elaborado, sem contar com a infraestrutura e a disposição de recursos
humanos para tais políticas. Na verdade, podemos instituir a metáfora do “apagar incêndios”
para designar as ações que essas campanhas desempenham. Entretanto, acabam se constituindo
em um mal necessário. Os programas focais também geram problemas no sistema de saúde, pois
dispõem de administração vertical e única que individualiza os serviços e desintegra o sistema,
uma vez que não conseguem integrar as diversas ações desses programas às outras atividades
do sistema. Esse modelo é desenvolvido exclusivamente pelo setor público e tem vínculo e
financiamento direto do Ministério da Saúde e de suas subsecretarias de gestão.
Atualmente, no Brasil, o sistema de saúde é fragmentado e organizado por níveis de atenção. E
é exatamente essa descentralização a responsável por promover um melhor atendimento à
população, uma vez que cada um desses níveis corresponde a determinado conjunto de serviços
assistenciais disponibilizados aos usuários (sendo alguns de maior complexidade e outros mais
básicos). Essa forma de organização e hierarquização das redes assistenciais do modelo de
atenção à saúde envolve uma imagem em pirâmide, bem como a ideia da complexidade
crescente em direção ao topo, com o hospital no topo e a rede básica como porta de entrada do
sistema de saúde. a pirâmide organiza a assistência em graus crescentes de complexidade, com
a população fluindo de forma organizada entre os vários níveis por meio de mecanismos formais
de referência e contrarreferência (normas de fluxos de usuários na busca de alternativas de
assistência.
Níveis de atenção à saúde
Nos sistemas de saúde, são organizados níveis de atenção à saúde a partir da combinação dos
recursos assistenciais disponíveis. Eles dependem de tecnologia material incorporada (máquinas
e equipamentos de diagnóstico e terapêutica), capacitação de pessoal (custo social necessário
para formação) e perfil de morbidade da população-alvo. São, então, identificados três níveis de
atenção à saúde: nível primário (primeiro nível: atenção primária à saúde); nível secundário
(nível intermediário: atenção secundária); e nível terciário (atenção terciária).
No entanto, deve-se advertir que os arranjos possíveis na distribuição desses três elementos em
sistemas de saúde frequentemente não apresentam a mesma regularidade, pois dependem das
características do sistema em termos dos meios financeiros, materiais e de pessoal disponíveis e
das políticas de saúde implementadas em cada país.
O nível primário é aquele em que estão os equipamentos com menor grau de incorporação
tecnológica do sistema (os equipamentos de geração tecnológica mais antiga, como aparelhos
básicos de raio-X, sonar e, eventualmente, ultrassom). A capacitação de pessoal para esse nível
apresenta necessidades de uma formação geral e abrangente para atender aos eventos mais
prevalentes na população (os problemas de saúde mais frequentes), e o quadro de profissionais é
preenchido por médicos de família e clínicos gerais. Estima-se que entre 85 a 90% dos casos
demandados à atenção primária são passíveis de serem resolvidos nesse nível da atenção.
Ao nível secundário cabem os equipamentos com grau intermediário de inovação tecnológica
(aparelhos de raio-X com alguma sofisticação, ecocardiógrafo, ultrassom de geração mais nova,
aparelhos para endoscopia). a capacitação de pessoal – a dos médicos, em particular– situa-se
em áreas especializadas originárias (clínica médica, cirurgia geral, ginecologia e obstetrícia,
pediatria) e em outras, como oftalmologia e psiquiatria. Essas especializações, no caso dos
médicos, requerem 2 a 3 anos após a graduação para atingir a formação, que se realiza por meio
da residência médica. Os serviços de atenção secundária devem estar aparelhados com pessoal
e equipamentos para atender às situações que forem encaminhadas pelo nível primário.
O nível terciário concentra os equipamentos com alta incorporação tecnológica, aqueles de
última geração e, portanto, mais caros (ressonância magnética e pEt scan). o pessoal que
trabalha nesse nível necessita de formação especializada mais intensiva, no caso dos médicos
até em áreas superespecializadas (neurocirurgia, cirurgia de mão, nefrologia pediátrica,
cancerologia, entre outras) que demandam de 3 a 5 anos de residência médica para obter a
capacitação. O nível terciário deve estar aparelhado para atender a situações que o nível
secundário não conseguiu resolver e eventos mais raros ou aqueles que demandam assistência
desse nível do sistema.
Para dar os resultados esperados, um sistema de saúde com esse tipo de organização exige que
um determinado número de pessoas vincule-se a um determinado serviço (unidade básica,
ambulatório de especialidade, hospital) – a adscrição de clientela –, e requer uma distribuição
homogênea dos serviços para garantir que as pessoas possam ser atendidas em suas
necessidades assistenciais. Em linguagem mais técnica, significa usar a noção de escala na
distribuição de serviços, ou seja, os serviços de atenção primária devem estar distribuídos de
modo que cada um esteja preparado para atender até 20 mil habitantes. assim, para cada grupo
de serviços de atenção primária (um certo número de unidades básicas de saúde) deve existir
um serviço secundário de referência (ambulatório de especialidades e hospital geral) e, da
mesma forma, para cada conjunto de serviços de atenção secundária (grupo de hospitais) deve
haver hospital e ambulatórios especializados de referência.
Atenção terciária: incorpora um alto grau de complexidade e precisa ser desenvolvida
essencialmente em nível hospitalar, no qual os universitários são de grande importância.
Congrega equipamentos com alta incorporação tecnológica e, portanto, mais caros (ressonância
magnética, pEt scan). o pessoal incorporado necessita de formação especializada mais
intensiva, no caso dos médicos até em áreas superespecializadas (neurocirurgia, cirurgia de mão,
nefrologia pediátrica, cancerologia, entre outras), que demandam de 3 a 5 anos após a graduação
para completar a capacitação. o nível terciário deve estar aparelhado para atender situações que
o nível secundário não conseguiu resolver, eventos mais raros ou aqueles que demandem
assistência desse nível do sistema.
Atenção secundária: congrega os equipamentos com grau intermediário de inovação
tecnológica (como raio-X com alguma sofisticação, ecocardiógrafo, ultrassom e aparelhos para
endoscopia), capacitação de pessoal, em particular dos médicos, e geralmente situa-se em
áreas especializadas originárias (clínica, cirurgia, ginecologia, obstetrícia, pediatria) e em
outras, como oftalmologia e psiquiatria. os serviços de atenção secundária devem estar
aparelhados com pessoal e equipamentos para atender às situações que o nível primário não
absorveu – geralmente cursos atípicos ou complicações dos eventos mais frequentes e outros
mais raros que demandam assistência compatível a esse nível.
Atenção primária: caracteriza-se como a entrada do usuário no sistema de saúde. Estudos
mostram que possui um grau de 85 a 90% de resolutividade. Consegue alocar os equipamentos
com baixo grau de incorporação tecnológica como, por exemplo, eletrocardiógrafo, aparelhos
básicos de raio-X, sonar, eventualmente ultrassom e laboratório básico. A capacitação dos
profissionais para este nível apresenta necessidades de uma formação geral e abrangente para
atender aos eventos mais prevalentes na população-alvo, respeitadas as possibilidades de
intervenção neste nível de complexidade assistencial. É o nível de atenção que vem ganhando
notoriedade dentro dos países que querem atingir excelência em seu grau de desenvolvimento.
Esses níveis de atuação devem estar relacionados entre si para que consigam resolver e atender
às necessidades de saúde de toda população. para cada serviço de atenção primária deve haver
um serviço de referência para atenção secundária e terciária. Esse serviço de referência serve
para apoio no processo de resolutividade das enfermidades da população. Um dos grandes
dilemas atuais de qualquer sistema de saúde é fazer que haja, de fato, a integração dos diversos
níveis do sistema, e que eles cumpram realmente com seus respectivos papéis. A atenção
primária deve cumprir com sua função e assumir literalmente a porta de entrada do sistema. os
demais níveis, secundário e terciário, devem servir como referência para os problemas que não
puderam ser finalizados no nível anterior, assumindo suas verdadeiras funções.
Forma de estruturação do sistema de saúde
Nível terciário: atenção hospitalar
(resolve cerca de 5% dos problemas de saúde)
Nível secundário: centros de especialidades e serviço de apoio diagnóstico
terapêutico (SADT) (resolve cerca de 15% dos problemas de saúde)
Atenção básica: unidades básicas de saúde e estratégia de saúde da família
(resolve mais de 80% dos problemas de saúde)
Santos discorre que a organização do SUS em nosso país está assentada em três pilares: rede
(integração dos serviços interfederativos), regionalização (região de saúde) e hierarquização
(níveis de complexidade dos serviços). Estes são os pilares que sustentam o modelo de atenção
à saúde, conforme dispõe o art. 198 da Constituição Federal. a Constituição, ao estatuir que o
SUS é um sistema integrado, organizado em rede regionalizada e hierarquizada, definiu o
modelo de atenção à saúde e a sua forma organizativa.
A organização dos serviços de saúde promove um ordenamento de fluxo de usuários entre os
níveis de atenção, constituindo o nível primário/atenção básica o local de primeiro contato com o
sistema de saúde e de atendimento às necessidades dos usuários ao longo da vida – ressalvadas as
situações de urgência e emergência médicas. assim, à assistência primária compete ordenar o
fluxo de usuários nos sistemas de saúde – tarefa das mais complexas se imaginarmos o número
e a natureza das situações envolvidas, bem como os requisitos de formação técnica e os meios
operacionais necessários para identificar adequadamente o que encaminhar e quando fazê-lo.
Esse sistema de encaminhamento interníveis de atenção denomina-se referência e geralmente
se dá de modo crescente, isto é, do nível primário para o secundário e desse para o terciário. Já
o fluxo inverso, isto é, o retorno do usuário para um nível mais abaixo, denomina- se
contrarreferência e pode se dar tanto em ordem imediatamente decrescente ou, às vezes, do
terciário diretamente para o primário. a boa norma recomenda que os encaminhamentos
interníveis sejam realizados por meio de relatórios detalhados. Claro está que, para funcionar,
um sistema de saúde assim organizado exige adscrição de clientela (vinculação de clientela a
serviços, especialmente no nível primário) e uma distribuição homogênea dos serviços para
garantir, de modo igualitário, o acesso e atender adequadamente às necessidades assistenciais dos
usuários.
Níveis de prevenção de doenças
Leavell & Clark, em 1965, propuseram o modelo da história natural da doença, composto por
três níveis de prevenção, são eles: prevenção primária, secundária e terciária. Nesse modelo, a
promoção da saúde limitava-se e compunha um nível de atenção da medicina preventiva
(prevenção primária), constituindo ações destinadas ao desenvolvimento da saúde e bem-estar
gerais no período de pré-patogênese.
Modelo da história natural da doença
Prevenção primária Prevenção secundária Prevenção terciária

Promoção da Proteção Diagnóstico e Limitação da


Reabilitação
saúde específica tratamento precoce invalidez

• Educação sanitária; • Uso de • Medidas • Tratamento • Prestação de


• Bom padrão de imunizações individuais e adequado serviços
nutrição, ajustado às específicas. coletivas para para hospitalares e
várias fases de • Atenção à descoberta de interromper o comunitários para a
desenvolvimento da higiene pessoal. casos. processo reeducação e
vida. • Hábito de • Pesquisas de mórbido e treinamento a fim de
• Atenção ao saneamento triagem e exames evitar futuras possibilitar a utilização
desenvolvimento do ambiente. seletivos. complicações máxima das
da personalidade. • Proteção • Objetivos: e sequelas. capacidades restantes.
• Moradia adequada, contra riscos - curar e evitar o • Provisão • Educação do
recreação e ocupacionais. processo da de meios público e indústria,
condições agradáveis • Proteção doença. para limitar no sentido de que
de trabalho. contra - evitar a invalidez e empreguem o
• Aconselhamento acidentes. complicações e evitar a reabilitado.
matrimonial e • Uso de sequelas. morte. • Emprego tão
educação sexual e alimentos - encurtar o completo quanto
genética. específicos. período de possível.
• Exames • Proteção invalidez. • Colocação seletiva.
seletivos contra • Terapia
periódicos. substâncias ocupacional em
carcinogênicas hospitais.
. evitação • Utilização de asilos.
contra
alérgenos.
Existe um quarto conceito mais recente de prevenção, o de prevenção quartenária, que apareceu
após reflexões de que as ações em saúde, tanto preventivas quanto curativas, têm sido
consideradas, em algumas situações, excessivas e agressivas, tornando-se também um fator de
risco para a enfermidade e a doença. por essa razão, em 1995, Jamoulle e Roland propuseram
o conceito de prevenção quartenária (prevenção da Iatrogenia), aceito pelo Comitê
Internacional da organização Mundial dos Médicos de Família (WoNCa) em 1999. Esse novo
nível de prevenção pressupõe ações clínicas centradas na pessoa e pautadas na epidemiologia
clínica e na saúde baseada em evidências, visando melhorar a qualidade da prática em saúde,
bem como a racionalidade econômica.
Portanto, as ações devem ser cultural e cientificamente aceitáveis, necessárias e justificadas,
prezando pelo máximo de qualidade da atenção com o mínimo de quantidade/intervenção
possível. ainda neste contexto, Almeida descreve outro objetivo da prevenção quartenária,
que é construir a autonomia dos usuários e pacientes por meio de informações necessárias e
suficientes para poderem tomar suas próprias decisões, sem falsas expectativas, conhecendo as
vantagens e os inconvenientes dos métodos diagnósticos, preventivos ou terapêuticos propostos.
Portanto, consiste na construção da autonomia dos sujeitos e na detecção de indivíduos em risco
de sobretratamento ou excesso de prevenção, para protegê-los de intervenções profissionais
inapropriadas e sugerir-lhes alternativas eticamente aceitáveis.
Neste contexto, esse modelo contribuiu para destacar as ações sobre o ambiente e sobre os
estilos de vida, além de ações clínicas, o que foi fundamental dentro do processo de transição
epidemiológica vivenciado no último século, com as doenças crônico-degenerativas ocupando
um lugar de destaque. Dessa maneira, a promoção da saúde, além de se associar a medidas
preventivas, passou a englobar a promoção de ambientes e estilos de vida saudáveis.
Promoção da saúde
A promoção da saúde vai além dos cuidados de saúde. o enfoque biológico e social do processo
saúde-doença esteve no centro do debate entre saúde pública e medicina durante boa parte do
século XX, até que, em abril de 1974, o Relatório Lalonde, produzido na gestão do Ministro da
Saúde canadense Marc Lalonde, destacou a importância do estilo de vida (comportamento)
como foco principal, ao lado da biologia humana e de fatores ambientais como as principais
causas de morbimortalidade, passando a ser um referencial importante nos debates e
documentos que foram produzidos desde então.
A I Conferência Internacional de promoção da Saúde realizada em Ottawa, no Canadá, em
novembro de 1986, enfatizou a importância da atenção primária em saúde defendida pela OMS
como a chave para uma promoção da saúde de caráter universal. Nessa conferência, em
decorrência dos progressos alcançados após a Declaração de alma-ata para a atenção primária
à saúde, em 1978, e a partir do documento da OMS as Metas da Saúde para todos, foi elaborada
a Carta de ottawa, que passou a ser uma referência permanente na reflexão sobre os
determinantes sociais em saúde em todas as conferências que se seguiram e na evolução
conceitual da promoção da saúde.
A Carta de Ottawa ampliou o conceito de promoção da saúde para além de um estilo de vida
saudável, e lista os seguintes pré-requisitos como básicos para alcançar a saúde: paz, habitação,
educação, alimentação, renda, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e
equidade. As dimensões socioeconômicas, políticas e culturais incidem sobre as condições de
saúde, não sendo, assim, responsabilidade exclusiva do setor de saúde. Além disso, a Carta de
Ottawa indica que a promoção da saúde demanda uma ação coordenada entre governo, setor de
saúde e outros setores sociais e econômicos a fim de: estabelecer estratégias que devem refletir
as necessidades locais e as diferenças socioeconômicas e culturais para a construção de políticas
públicas saudáveis, ambientes favoráveis; reforçar a ação comunitária na direção dos assuntos
de saúde; desenvolver habilidades pessoais por meio da divulgação de informação, desenvolver
uma educação para a saúde; e reorientar os serviços de saúde para a promoção da saúde com a
participação da comunidade e de outros setores.
Seguiu-se, em 1988, a II Conferência Internacional sobre promoção de Saúde, em Adelaide, na
Austrália, cujo tema central foi voltado para as políticas públicas saudáveis. a conferência
identificou quatro áreas prioritárias para promover ações imediatas em políticas públicas
saudáveis: apoio à saúde da mulher, alimentação e nutrição, tabaco e álcool e ambientes
saudáveis. Os participantes da Conferência de Adelaide reafirmaram os compromissos
assumidos na Carta de ottawa, e a III Conferência Internacional sobre promoção da Saúde,
realizada em Sundsvall (Suécia), em 1991, precedendo a Conferência Mundial sobre o Meio
Ambiente, pautou como tema principal os ambientes favoráveis à saúde, identificando que a
expressão “ambientes favoráveis” refere-se, no contexto da saúde, aos aspectos físico e social
e à sua importância para a saúde. Essa conferência elencou quatro estratégias para o
desenvolvimento das ações em saúde pública, visando promover a criação de ambientes
favoráveis e promotores da saúde:
 Reforçar a defesa da proposta por meio de ações comunitárias, particularmente pelos
grupos organizados de mulheres;
 Capacitar comunidades e indivíduos sobre saúde e ambiente por meio da educação e
maior participação nos processos de tomada de decisão;
 Construir alianças para a saúde e os ambientes favoráveis, de maneira a reforçar a
cooperação entre as campanhas e estratégias nas áreas da saúde e do ambiente;
 Mediar os interesses conflitantes na sociedade, de modo que se possa assegurar o
acesso igualitário a ambientes favoráveis à saúde.
Na américa Latina, o primeiro Encontro Internacional sobre promoção da Saúde ocorreu em
Santa Fé de Bogotá (Colômbia), em 1992, e reuniu os representantes de 21 países da américa
Latina, Canadá e Espanha, com o objetivo de debater princípios e definir o significado da
promoção da saúde na américa Latina. a situação de saúde vigente caracterizava-se pela
persistência ou ressurgimento de endemias, como malária, cólera, tuberculose e desnutrição;
pelo aumento de problemas como câncer e doenças cardiovasculares; pelo surgimento de novas
enfermidades, como aids e as resultantes da deterioração ambiental; e pelo aumento da
violência, causando inúmeros problemas psicossociais e um aumento de riscos para a saúde.
A partir dessa análise, é destacada a importância de trabalhar a promoção da saúde voltada
prioritariamente para a identificação dos fatores que favorecem a inequidade e a proposição de
ações que diminuam seus efeitos (OMS, 1992).
Considerar os princípios da Carta de Ottawa como indispensáveis para a promoção da
saúde na América Latina.
 Reorientar o setor de saúde, colocando em relevo a estratégia de promoção da saúde.
 Impulsionar o conceito de saúde condicionado por fatores políticos, econômicos,
sociais, culturais, ambientais, de conduta e biológicos.
 Promover a saúde como estratégia para modificar esses fatores condicionantes.
 Articular as forças sociais para aplicar a estratégia de promoção da saúde, colocando os
propósitos sociais à frente dos interesses econômicos a fim de criar e manter ambientes
familiares, físicos, naturais, de trabalho, sociais, econômicos e políticos que tenham a
intenção de promover a vida, e não de degradá-la.
 Incentivar políticas públicas que garantam a equidade e favoreçam a criação de
ambientes e opções saudáveis.
Em 1997, é realizada a IV Conferência Internacional de promoção da Saúde em Jacarta
(Indonésia). Essa foi a primeira conferência a ter lugar em um país em desenvolvimento e a
incluir o setor privado no apoio à promoção da saúde. Foi uma ocasião para refletir sobre o que
se aprendeu sobre promoção da saúde, reconhecendo que cada vez mais é um elemento
essencial para a redução das inequidades em questões de saúde mediante ações sobre os
determinantes sociais.
A Declaração de Jacarta sobre a promoção da saúde oferece uma visão e um enfoque para a
promoção da saúde no século XXI. Após 10 anos, as precondições para a saúde estabelecidas
na Carta de Ottawa são ampliadas. São elas: paz, abrigo, instrução, segurança social, relações
sociais, alimento, renda, direito de voz das mulheres, ecossistema estável, uso sustentável dos
recursos naturais, justiça social, respeito aos direitos humanos e equidade. São recomendações
da Conferência para a promoção da saúde no século XXI:
 Promover a responsabilidade social para com a saúde;
 Aumentar os investimentos para fomentar a saúde;
 Consolidar e expandir parcerias em prol da saúde entre os diferentes setores e em todos
os níveis de governabilidade e da sociedade;
 Aumentar a capacidade comunitária e dar direito de voz ao indivíduo.
Para conseguir infraestrutura para a promoção da saúde, faz-se necessário encontrar novos
mecanismos para seu custeio nos níveis local, nacional e mundial. Localidades para a saúde
representam a base organizacional necessária para a promoção da saúde. a V Conferência
Internacional sobre promoção da Saúde, realizada na Cidade do México (México), em 2000,
constata que, nos últimos anos, houve melhoria significativa da saúde e aumento do acesso aos
serviços de saúde em muitos países do mundo. Mas, apesar desse progresso, ainda persistem
muitos problemas de saúde que prejudicam o desenvolvimento social e econômico. É
recomendada a necessidade urgente de abordar os determinantes sociais, econômicos e
ambientais da saúde, sendo preciso fortalecer os mecanismos de colaboração para a promoção da
saúde em todos os setores e níveis da sociedade e colocar a promoção da saúde como prioridade
fundamental das políticas e programas locais, regionais, nacionais e internacionais. Além disso,
é necessário um papel de liderança para assegurar a participação ativa de todos os setores e da
sociedade civil na implementação das ações de promoção que fortaleçam e ampliem as
parcerias na área da saúde.
Em 2005, foi realizada a VI Conferência Global de promoção da Saúde, em Bangcoc, na
Tailândia. Nessa conferência, foram identificadas as ações para abordar os determinantes da
saúde por meio da promoção da saúde e alguns fatores críticos que influenciam a saúde. Foram
propostas algumas estratégias a fim de abordar os determinantes da saúde em um mundo
globalizado por meio de intervenções efetivas do setor de saúde, com o objetivo de que mais
avanços sejam obtidos na implementação das ações de promoção da saúde, e a fim de
complementar os valores e princípios da promoção da saúde estabelecidos pela Carta de
Ottawa para a promoção da saúde, assim como as recomendações das conferências
internacionais subsequentes. Em novembro de 2009, foi realizada em Nairóbi a VII Conferência
Global de promoção da Saúde, organizada pela oMS e pelo Ministério da Saúde pública do
Quênia, que reafirmou os compromissos das conferências anteriores. O tema dessa conferência
foi “promovendo a Saúde e o Desenvolvimento: quebrar as lacunas de implementação”.
As discussões desenvolveram-se em torno dos seguintes assuntos:
 Empoderamento da comunidade (autonomia comunitária). Conhecimento sobre saúde
e comportamento (autonomia individual). Reforço dos sistemas de saúde.
 Parcerias e ação intersetorial.
 Construção de competências para a promoção da saúde
No Brasil, o conceito ampliado de saúde e a associação entre determinantes sociais e condições
de saúde tiveram contribuição significativa a partir do movimento da reforma sanitária
brasileira, especialmente nas discussões ocorridas durante a VIII Conferência Nacional de
Saúde Brasil, de 1986, que definiu que a “saúde é resultante das condições de alimentação,
habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade,
acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde” e que “há necessidade de o Estado assumir
explicitamente uma política de saúde consequente e integrada às demais políticas econômicas
e sociais”, condições asseguradas posteriormente em 1988 no texto constitucional – seção II da
Saúde – e na Lei orgânica da Saúde.
Atenção primária à saúde
Internacionalmente, tem-se apresentado Atenção Primária à Saúde (APS) como uma estratégia
de organização da atenção à saúde voltada para responder, de forma regionalizada, contínua e
sistematizada, à maior parte das necessidades de saúde de uma população, integrando ações
preventivas e curativas, bem como a atenção a indivíduos e comunidades. Esse enunciado
procura sintetizar as diversas concepções e denominações das propostas e experiências que se
convencionaram chamar internacionalmente de APS.
No Brasil, a APS incorpora os princípios da Reforma Sanitária, levando o Sistema Único de Saúde
(SUS) a adotar a designação atenção Básica à Saúde (ABS) para enfatizar a reorientação do
modelo assistencial a partir de um sistema universal e integrado de atenção à saúde.
Historicamente, a ideia de atenção primária foi utilizada como forma de organização dos
sistemas de saúde pela primeira vez no chamado Relatório Dawson, em 1920. Esse documento
do governo inglês procurou, por um lado, contrapor-se ao modelo flexineriano americano de
cunho curativo, fundado no reducionismo biológico e na atenção individual, e, por outro,
constituir-se numa referência para a organização do modelo de atenção inglês, que começava a
preocupar as autoridades daquele país devido ao elevado custo, à crescente complexidade da
atenção médica e à baixa resolutividade.
Primeiro contato (porta de entrada ao sistema de saúde)
Significa acesso e utilização do serviço de saúde para cada novo evento de saúde ou novo
episódio de um mesmo evento. Um serviço é porta de entrada quando a população e a equipe
identificam-no como o primeiro recurso de saúde a ser buscado quando há uma
necessidade/problema de saúde. Para isso, deve ser de fácil acesso e disponível. Se não o for, a
procura será adiada, talvez a ponto de afetar negativamente o diagnóstico e o manejo do
problema. O acesso tem dois componentes: a) o acesso geográfico, que envolve características
relacionadas à distância e aos meios de transporte a serem utilizados para obter o cuidado; b) o
acesso sócio-organizacional, que inclui aquelas características e recursos que facilitam ou
impedem os esforços das pessoas em receber os cuidados de uma equipe de saúde. Por exemplo,
o horário de funcionamento, a forma de marcação de consulta e a presença de longas filas podem
significar barreiras ao acesso. O mesmo ocorre com: as horas de disponibilidade da unidade de
saúde; a oferta de cobertura após o horário de funcionamento e a explicitação dos serviços a
serem utilizados pela população quando a unidade de saúde não está disponível; a facilidade de
acesso para idosos e portadores de deficiências físicas; o tempo médio gasto na sala de espera;
a ausência de dificuldades com linguagem; as barreiras relacionadas a gênero; as acomodações;
a aceitabilidade das diferenças culturais; a disponibilidade de brechas para consultas de
emergências; o intervalo de tempo entre marcação e consulta; a disponibilidade para visitas
domiciliares; a oferta de cuidados para grupos que não procuram espontaneamente o serviço; a
busca ativa; etc. A organização da agenda para garantir consultas programadas permite que as
ações de promoção e prevenção em saúde – como acompanhamento pré-natal e aconselhamento
em doenças crônicas – sejam realizadas. A utilização dos serviços de APS pela população
depende da boa resolutividade das equipes, do acolhimento, da capacidade de delimitar os
recursos necessários para resolver os problemas e de uma prática baseada na pessoa (e não na
doença), na família e na comunidade. As equipes de saúde da família têm inovado na busca de
formas que garantam acessibilidade e maior utilização da APS como primeiro contato com o
sistema de saúde. O acolhimento, a exposição de cartazes com horários de funcionamento e
disponibilidade dos integrantes da equipe, os turnos vespertinos e agenda aos sábados são alguns
exemplos de esforços nesse sentido. O trabalho em parceria com as comunidades para diminuir
as barreiras de acesso e melhorar a utilização dos serviços é essencial. As diretrizes da Estratégia
Saúde da Família buscam a ampliação do acesso e da utilização dos serviços de APS como
porta de entrada ao sistema ao proporem que as unidades de saúde estejam próximo do local de
moradia das pessoas, que haja vinculação populacional e a responsabilidade pelo território.
As vantagens do primeiro contato
A utilização de um serviço de APS como o primeiro recurso de saúde por uma determinada
população traz as seguintes vantagens:
 Ocorre redução dos seguintes aspectos: número de hospitalizações, tempo de
permanência no hospital quando ocorre hospitalização, número de cirurgias, uso de
especialistas em doenças, número de consultas para um mesmo problema e número de
exames complementares.
 São maiores: o número de ações preventivas, a adequação do cuidado, a qualidade do
serviço prestado e a oportunidade da atenção (maior chance de que ocorra no tempo
certo).
 As equipes de saúde, especialistas em APS, lidam melhor com problemas de saúde em
estágios iniciais, utilizando a adequada abordagem ver, esperar e acompanhar, diferente
dos especialistas em doenças que, acostumados a ver problemas em fases mais
adiantadas, solicitam mais exames complementares e realizam mais procedimentos.
Os desafios da porta de entrada no SUS
A utilização da atenção primária à saúde como porta de entrada ao sistema de saúde brasileiro
melhorou muito desde a criação da Estratégia Saúde da Família, seja ampliando o acesso das
populações aos serviços, seja disponibilizando uma gama maior de ações de promoção,
prevenção e tratamento. Porém, muitos desafios precisam ainda ser enfrentados para alcançar
mais equidade e observar, traduzidos nos indicadores de morbimortalidade, melhores resultados
em saúde. Dentre esses desafios, destacam-se a valorização da APS na rede de serviços de
saúde, o aumento da resolutividade da APS e o cuidado de enfocar as necessidades em saúde
da população. Os serviços de emergência são ainda inadequadamente utilizados por grande
parcela da população. Embora sejam as melhores portas de entrada na ocorrência de
emergências, não contemplam a integralidade da atenção, a longitudinalidade do cuidado e a
coordenação das ações. A cultura da busca pelo especialista e da livre demanda, próprias do
modelo médico hospitalocêntrico, já é questionada. Vários países restringem o acesso a
especialistas ao encaminhamento do médico da atenção primária, com repercussões positivas
nos custos e na eficiência do sistema.
Longitudinalidade do cuidado (ou vínculo e responsabilização)
A essência da longitudinalidade é uma relação pessoal que se estabelece ao longo do tempo,
independentemente do tipo de problema de saúde ou mesmo da presença de um problema de
saúde, entre indivíduos e um profissional ou uma equipe de saúde. Uma equipe de APS tem a
oportunidade de acompanhar os diversos momentos do ciclo de vida dos indivíduos, de suas
famílias e da própria comunidade, e assim, por meio dessa relação, conhecer as pessoas, suas
famílias e comunidade, os quais, por sua vez, conhecem a equipe de saúde. O vínculo e a
responsabilização contidos na proposta brasileira referem-se a esse conceito. A
longitudinalidade pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e seu uso ao longo do
tempo, o que significa uma unidade de saúde com equipes estáveis. A rotatividade de pessoal nas
equipes de saúde é um fator impeditivo do alcance da longitudinalidade. A continuidade do
cuidado, por outro lado, significa o acompanhamento durante um episódio de doença. Não é uma
particularidade da APS, ocorrendo também nos demais níveis de atenção.
As vantagens da longitudinalidade
A longitudinalidade está associada a diversas vantagens: menor utilização de serviços de saúde,
melhor cuidado preventivo, atendimentos mais precoces e adequados, menor frequência de
doenças passíveis de prevenção, maior satisfação das pessoas com o atendimento e custo total
mais baixo. Quando há estabilidade dos profissionais e dos serviços, observa-se com maior
frequência que:
 Os tratamentos instituídos são completados e são realizadas mais ações de prevenção. »
há melhor utilização dos serviços de saúde pela população, que compreende e respeita
os alcances e os limites das equipes de saúde.
 Ocorre menor proporção de hospitalizações. » aumenta a capacidade dos profissionais
em avaliar adequadamente as necessidades das pessoas; há maior integralidade do
cuidado e coordenação das ações e serviços; e há maior satisfação dos usuários.
A longitudinalidade é especialmente vantajosa para pessoas com doenças crônicas e em
comorbidades, situações muito frequentes e que exigem da APS uma reestruturação dos
serviços, cuja tradição é se organizarem para o enfrentamento de problemas agudos.
Os desafios da longitudinalidade no SUS
Os desafios da longitudinalidade no Brasil estão especialmente relacionados à rotatividade de
profissionais nas equipes de saúde e à qualidade do registro das informações em prontuários.
Integralidade
Cuidado integral é a capacidade da equipe de saúde em lidar com a ampla gama de necessidades
em saúde do indivíduo, da família ou das comunidades, seja resolvendo-os, o que pode ocorrer
em 85% das situações por meio da oferta de um conjunto de ações e serviços, descritos no
Capítulo 3, seja referindo-se aos outros pontos de atenção à saúde, que podem ser aos cuidados
secundários, terciários ou a outros setores (educação, saneamento, habitação, entre outros). A
integralidade pressupõe um conceito amplo de saúde, no qual: necessidades biopsicossociais,
culturais e subjetivas são reconhecidas; a promoção, a prevenção e o tratamento são integrados
na prática clínica e comunitária; e a abordagem é voltada para o indivíduo, sua família e seu
contexto. A integralidade depende da capacidade de identificar as necessidades percebidas e as
não percebidas pelos indivíduos, da abordagem do ciclo vital e familiar e da aplicação dos
conhecimentos dos diversos campos de saberes. Uma condição essencial para a integralidade é
a atuação interdisciplinar das equipes de saúde, pois cotidianamente se apresentam, nas
unidades de saúde e territórios das equipes de APS, situações cuja complexidade exige a
intervenção coordenada de profissionais de diversas disciplinas. A condição estrutural para que
a integralidade se dê é a disponibilidade de uma variedade de serviços, incluindo recursos que
normalmente não são utilizados nos cuidados secundários, como visitas domiciliares, ações em
organizações comunitárias (creches, clubes de mães, grupos de apoio, etc.) e articulações
intersetoriais para estratégias de promoção da saúde e prevenção de doenças. Decidir quais são
os serviços adequados é uma importante atividade que deve estar baseada no conhecimento das
necessidades da população
.
As vantagens da integralidade
A integralidade do cuidado está associada a mais ações de prevenção, maior adesão aos
tratamentos recomendados e maior satisfação das pessoas.
Os desafios da integralidade no SUS
Os desafios da integralidade no Brasil estão menos relacionados ao conceito amplo de saúde e
mais relacionados a problemas estruturais, que limitam a gama de serviços oferecidos, e a
problemas na organização dos serviços.
Coordenação do cuidado (ou organização das respostas ao conjunto de necessidades)
Coordenação, o quarto componente, é essencial para o sucesso dos demais. Um conceito amplo
de saúde permite que as várias necessidades dos indivíduos, suas famílias e comunidades sejam
identificadas, e a ação de uma equipe multidisciplinar é necessária para responder a tais
necessidades. Contudo, é fundamental que haja coordenação das ações/respostas. Sem
coordenação, a longitudinalidade perde muito de seu potencial, a integralidade não é viável e o
primeiro contato torna-se uma função puramente administrativa. A essência da coordenação é a
informação − a disponibilidade de informação (sobre a pessoa, sua história, seus problemas, as
ações realizadas, os recursos disponíveis, informação propiciada pelos sistemas de informação,
mecanismos de transmissão da informação e comunicação) e a utilização da informação,
possibilitada pela fácil obtenção das informações, por registros facilmente disponíveis, por
reconhecimento de informações prévias, por mecanismos de referência e contrarreferência e
recomendações escritas aos pacientes.
 Os desafios da coordenação estão situados em diferentes contextos:
 Na unidade de saúde, quando vários membros da equipe dispõem de diferentes aspectos
da informação do paciente.
 Entre diferentes serviços, nos casos de referência e contrarreferência.
 Entre diferentes setores, como educação, saneamento, transporte, etc. A melhora da
coordenação do cuidado é um desafio crucial para que a APS ocupe seu papel no sistema
de saúde (APS como base, estrutura do sistema de saúde).
As vantagens da coordenação
Muitas vantagens estão associadas à coordenação do cuidado: melhor identificação dos
problemas de saúde; melhor adesão a tratamentos, dietas, execução de exames e consultas de
encaminhamento; menos hospitalizações e menor solicitação de exames complementares
Os desafios da coordenação no SUS
Esse componente da APS ainda precisa ser fortalecido no Brasil, salientando-se alguns desafios:
melhora da qualidade da informação nos prontuários de saúde, para permitir que haja
coordenação do cuidado dentro da equipe multidisciplinar de saúde; implantação de prontuários
eletrônicos; constituição de redes de atenção, otimizando o acesso e a utilização dos demais
recursos de saúde da rede, assegurando os mecanismos de comunicação, o que qualifica o
cuidado (a referência e a contrarreferência); informatização dos sistemas de informações,
permitindo que as informações relacionadas aos pacientes estejam disponíveis em qualquer
ponto da rede de atenção à saúde.
O Relatório Dawson organizava o modelo de atenção em centros de saúde primários e
secundários, serviços domiciliares, serviços suplementares e hospitais de ensino. os centros
de saúde primários e os serviços domiciliares deveriam estar organizados de forma
regionalizada, e a maior parte dos problemas de saúde deveria ser resolvida por médicos com
formação em clínica geral. os casos que o médico não tivesse condições de solucionar com
os recursos disponíveis nesse âmbito da atenção deveriam ser encaminhados para os centros
de atenção secundária, em que haveria especialistas das mais diversas áreas, ou, então, para os
hospitais, quando existisse indicação de internação ou cirurgia. Essa organização
caracteriza-se pela hierarquização dos níveis de atenção à saúde.
Os serviços domiciliares de um dado distrito devem estar baseados num centro de saúde
primária, uma instituição equipada para serviços de medicina curativa e preventiva a ser
conduzida por clínicos gerais daquele distrito em conjunto com um serviço de enfermagem
eficiente e com o apoio de consultores e especialistas visitantes. Os centros de saúde primários
variam em seu tamanho e complexidade de acordo com as necessidades locais e com sua
localização na cidade ou no país. Mas a maior parte deles é formada por clínicos gerais dos seus
distritos, pertencendo os pacientes aos serviços chefiados por médicos de sua própria região
(Ministry of Health, 1920).
Essa concepção elaborada pelo governo inglês influenciou a organização dos sistemas de saúde
de todo o mundo, definindo duas características básicas da APS. A primeira seria a
regionalização, ou seja, os serviços de saúde devem estar organizados de forma a atender às
diversas regiões nacionais, através da sua distribuição a partir de bases populacionais, e devem
identificar as necessidades de saúde de cada região. A segunda característica é a integralidade,
que fortalece a indissociabilidade entre ações curativas e preventivas.
Os elevados custos dos sistemas de saúde, o uso indiscriminado de tecnologia médica e a baixa
resolutividade preocupavam a sustentação econômica da saúde nos países desenvolvidos,
fazendo-os pesquisar novas formas de organização da atenção com custos menores e maior
eficiência. Em contrapartida, os países pobres e em desenvolvimento sofriam com a inequidade
dos seus sistemas de saúde, com a falta de acesso a cuidados básicos, com a mortalidade infantil
e com as precárias condições sociais, econômicas e sanitárias.
Em 1978, a organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações unidas para a Infância
(Unicef) realizaram a I Conferência Internacional sobre Cuidados primários de Saúde em alma-
ata, no Cazaquistão, na antiga união Soviética, e propuseram um acordo e uma meta entre seus
países-membros para atingir o maior nível de saúde possível até o ano 2000, através da APS. Essa
política internacional ficou conhecida como Saúde para Todos no Ano 2000. A Declaração de
alma-ata, como foi chamado o pacto assinado entre 134 países, defendia a seguinte definição
de APS, aqui denominada cuidados primários de saúde:
“Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e
tecnologias práticos, cientificamente bem-fundamentados e socialmente aceitáveis, colocados
ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação
e a um custo que a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento,
no espírito de autoconfiança e autodeterminação. Fazem parte integrante tanto do sistema de
saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto do
desenvolvimento social e econômico global da comunidade. Representam o primeiro nível de
contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, pelo qual
os cuidados de saúde são levados o mais proximamente possível aos lugares onde pessoas
vivem e trabalham, e constituem o primeiro elemento de um continuado processo de assistência
à saúde.”(Opas/OMS, 1978)
No que diz respeito à organização da APS, a Declaração de alma-ata propõe a instituição de
serviços locais de saúde centrados nas necessidades de saúde da população e fundados numa
perspectiva interdisciplinar envolvendo médicos, enfermeiros, parteiras, auxiliares e agentes
comunitários, bem como a participação social na gestão e controle de suas atividades. O
documento descreve as seguintes ações mínimas, necessárias para o desenvolvimento da APS
nos diversos países: educação em saúde voltada para a prevenção e a proteção; distribuição de
alimentos e nutrição apropriada; tratamento da água e saneamento; saúde materno-infantil;
planejamento familiar; imunização; prevenção e controle de doenças endêmicas; tratamento de
doenças e lesões comuns; fornecimento de medicamentos essenciais.
A Declaração de alma-ata representa uma proposta num contexto muito maior que um pacote
seletivo de cuidados básicos em saúde. Nesse sentido, aponta para a necessidade de sistemas de
saúde universais, isto é, concebe a saúde como um direito humano; para a redução de gastos com
armamentos e conflitos bélicos e o aumento de investimentos em políticas sociais para o
desenvolvimento das populações excluídas; para o fornecimento e até mesmo a produção de
medicamentos essenciais para distribuição à população de acordo com as suas necessidades;
para a compreensão de que a saúde é o resultado das condições econômicas e sociais e das
desigualdades entre os diversos países; e também estipula que os governos nacionais devem
protagonizar a gestão dos sistemas de saúde, estimulando o intercâmbio e o apoio tecnológico,
econômico e político internacional (Matta, 2005).
Apesar de as metas de alma-ata jamais terem sido alcançadas plenamente, a APS tornou-se uma
referência fundamental para as reformas sanitárias ocorridas em diversos países nos anos 1980
e 1990. Entretanto, muitos países e organismos internacionais, como o Banco Mundial,
adotaram a APS numa perspectiva focalizada, entendendo a atenção primária como um
conjunto de ações de saúde de baixa complexidade, dedicada a populações de baixa renda, no
sentido de minimizar a exclusão social e econômica decorrente da expansão do capitalismo
global, distanciando-se do caráter universalista da Declaração de alma-ata e da ideia de defesa
da saúde como um direito (Mattos, 2000).
No Brasil, algumas experiências de APS foram instituídas de forma incipiente desde o início do
século XX, como os centros de saúde em 1924, que, apesar de manterem a divisão entre ações
curativas e preventivas, se organizavam a partir de uma base populacional e trabalhavam com
educação sanitária. a partir da década de 1940, foi criado o Serviço Especial de Saúde pública
(Sesp), que realizou ações curativas e preventivas, ainda que restritas a doenças infecciosas e
carenciais. Essa experiência inicialmente limitada às áreas de relevância econômica, como as
de extração de borracha, foi ampliada durante os anos 1950 e 1960 para outras regiões do país,
mas represada de um lado pela expansão do modelo médico-privatista e, de outro, pelas
dificuldades de capilarização local de um órgão do governo federal, como é o caso do Sesp.
Nos anos 1970, surge o programa de Interiorização das ações de Saúde e Saneamento do
Nordeste (piass), cujo objetivo era fazer chegar à população historicamente excluída de
qualquer acesso à saúde um conjunto de ações médicas simplificadas. Caracterizava-se como
uma política focalizada e de baixa resolutividade, sem capacidade para fornecer uma atenção
integral à população.
Com o movimento sanitário, as concepções da APS foram incorporadas ao ideário reformista,
compreendendo a necessidade de reorientação do modelo assistencial, rompendo com o modelo
médico-privatista vigente até o início dos anos 1980. Nesse período, durante a crise do modelo
médico-previdenciário representado pela centralidade do Instituto Nacional de assistência
Médica da previdência Social (Inamps), surgiram as ações Integradas de Saúde (AIS), que
visavam ao fortalecimento de um sistema unificado e descentralizado de saúde voltado para as
ações integrais. Nesse sentido, as AIS surgiram de convênios entre estados e municípios e foram
custeadas com recursos transferidos diretamente da previdência social, visando à atenção
integral e universal dos cidadãos.
Essas experiências, somadas à constituição do SUS (Brasil, 1988) e sua regulamentação (Brasil,
1990), possibilitaram a construção de uma política de ABS que visasse à reorientação do
modelo assistencial, tornando-se o contato prioritário da população com o sistema de saúde.
assim, a concepção da aBS desenvolveu-se a partir dos princípios do SUS – principalmente a
universalidade, a descentralização, a integralidade e a participação popular –, como pode ser
visto na portaria que institui a Política Nacional de Atenção Básica, definindo a ABS como:
 “[...] um conjunto de ações de saúde no âmbito individual e coletivo que abrange a promoção
e proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e
manutenção da saúde. É desenvolvida através do exercício de práticas gerenciais e sanitárias
democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de
territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a
dinamicidade existente no território em que vivem essas populações. Utiliza tecnologias de
elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior
frequência e relevância em seu território. É o contato preferencial dos usuários com os
sistemas de saúde. Orienta-se pelos princípios da universalidade, acessibilidade e
coordenação do cuidado, vínculo e continuidade, integralidade, responsabilização,
humanização, equidade e participação social.” (Brasil, 2006
Atualmente, a principal estratégia de configuração da ABS(Atenção Básica de Saúde) no Brasil
é a saúde da família, que tem recebido importantes incentivos financeiros visando à ampliação
da cobertura populacional e à reorganização da atenção. a saúde da família aprofunda os
processos de territorialização e responsabilidade sanitária das equipes de saúde, compostas
basicamente por médico generalista, enfermeiro, auxiliares de enfermagem e agentes
comunitários de saúde, cujo trabalho é referência de cuidados para a população adscrita, com
um número definido de domicílios e famílias assistidos por equipe.
Entretanto, os desafios persistem e indicam a necessidade de articulação de estratégias de acesso
aos demais níveis de atenção à saúde, de forma a garantir o princípio da integralidade, assim
como a necessidade permanente de ajuste das ações e serviços locais de saúde, visando à
apreensão ampliada das necessidades de saúde da população e à superação das inequidades entre
as regiões do país. Ressalta-se também na ABS a importante participação de profissionais de
níveis básico e médio em saúde, como os agentes comunitários de saúde, os auxiliares e técnicos
de enfermagem, entre outros responsáveis por ações de educação e vigilância em saúde.
Atributos constitutivos da Atenção Primária à Saúde
A APS é uma forma de organização dos serviços de saúde, uma estratégia para integrar todos os
aspectos desses serviços, tendo como perspectiva as necessidades em saúde da população. Esse
enfoque está em consonância com as diretrizes do SUS e tem como valores a busca por um
sistema de saúde voltado a enfatizar a equidade social, a corresponsabilidade entre população e
setor público, a solidariedade e um conceito de saúde amplo. Em sua forma mais desenvolvida, a
atenção primária é a porta de entrada ao sistema de saúde e o local responsável pela organização
do cuidado à saúde dos indivíduos, suas famílias e da população, ao longo do tempo. as
evidências demonstram que a atenção primária tem capacidade para responder 85% das
necessidades em saúde, realizando serviços preventivos, curativos, reabilitadores e de promoção
da saúde; integrando os cuidados quando existe mais de um problema; lidando com o contexto
de vida; e influenciando as respostas das pessoas aos seus problemas de saúde. A atenção
primária diferencia-se da secundária e da terciária em diversos aspectos, entre eles: dedica-se
aos problemas mais frequentes (simples ou complexos) que se apresentam, sobretudo em fases
iniciais, e que são, portanto, menos definidos. Nas unidades de saúde, consultórios
comunitários, escolas ou asilos e nos espaços comunitários, observa-se grande variedade de
necessidades em saúde, forte componente dedicado à prevenção de doenças, alta proporção de
pacientes já conhecidos pela equipe de saúde e maior familiaridade dos profissionais, tanto com
as pessoas quanto com seus problemas. a atenção primária tem, portanto, qualidades únicas que a
caracterizam e diferenciam dos demais níveis de atenção. para realmente entendermos o que é
a APS, devemos conhecer os elementos que a constituem. Para fins didáticos, essas
características são, a seguir, apresentadas separadamente, mas salienta-se que elas são
interdependentes e complementares.
 Curiosidade: O Relatório Dawson tornou-se um marco na história da organização dos
sistemas de saúde. Ele propõe a implantação de um sistema integrado de medicina
preventiva e curativa por meio de ações primárias, secundárias e terciárias. O Relatório
Dawson está na base do sistema de saúde britânico e inspirou a organização de sistemas
de saúde em vários outros países. Apresentou, entre outros, os conceitos de: território,
populações adscritas, porta de entrada, vinculo/acolhimento, referencia e atenção
primaria como coordenadora do cuidado.
Estratégias saúde da família
A saúde da família é uma das principais estratégias, propostas pelo Ministério da Saúde do
Brasil, para reorientar o modelo assistencial do sistema único de saúde a partir da atenção básica
(BRASIL, 1997). Ela procura reorganizar os serviços e reorientar as práticas profissionais na
lógica da promoção da saúde, prevenção de doenças e reabilitação, enfim, da promoção da
qualidade de vida da população, constituindo-se em uma proposta com dimensões técnica,
política e administrativa inovadoras. Ela pressupõe o princípio da vigilância à saúde, a inter e
multidisciplinaridade e a integralidade do cuidado sobre a população que reside na área de
abrangência de suas unidades de saúde (BRASIL, 1998).
Sua expansão ganhou impulso com a Norma operacional Básica (NOB-96) (BRASIL, 1997), que
operacionalizou a descentralização de recursos e a municipalização da saúde, apresentando as
orientações para o repasse, a aplicação e os mecanismos de controle e acompanhamento dos
recursos financeiros que compõem o Piso da Atenção Básica (PAB), assim como a
responsabilidade dos municípios enquanto gestores (COIMBRA et al., 2005). A Estratégia
Saúde da Família incorpora os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 2000) e
se estrutura a partir da unidade Saúde da Família (USF), conforme contextualizado a seguir
(BRASIL, 2006):
Integralidade e hierarquização
A Unidade de Saúde da Família (USF) está inserida na atenção primária à saúde. Suas equipes
devem realizar o diagnóstico de saúde do território adscrito, identificando o perfil
epidemiológico e sociodemográfico das famílias, reconhecendo os problemas de saúde
prevalentes e os riscos a que esta população está exposta, elaborando, com a sua participação,
um plano local para o enfrentamento dos problemas de saúde. O cumprimento desses dois
princípios pressupõe que os profissionais envolvidos nas equipes de saúde compreendam que
seus serviços estão organizados em níveis de complexidade crescentes, desde o nível local de
assistência até os mais especializados − esse sistema é denominado referência e
contrarreferência, sendo que a referência se dá do nível de menor para o de maior complexidade,
inversamente à contrarreferência. A articulação entre esses dois sistemas é bastante difícil, uma
vez que a demanda de serviços mais complexos excede ao número de solicitações por parte da
atenção básica, dificultando atingir excelência no atendimento aos clientes que necessitam de
serviços especializados.
Territorialização e adscrição da clientela
A USF trabalha com território de abrangência definido, sendo responsável pelo cadastramento e
acompanhamento desta população. Recomenda-se que a equipe seja responsável por, no
máximo, 4.000 pessoas do território.
Equipe multiprofissional
Composta por um enfermeiro, um médico generalista ou de família, um auxiliar de enfermagem
e agentes comunitários de saúde (ACS). Além desses, odontólogos, assistentes sociais e
psicólogos, dentre outros, poderão fazer parte das equipes ou formar equipes de apoio, de acordo
com as necessidades locais.
Caráter substitutivo
É a substituição das práticas tradicionais de assistência, com foco nas doenças, por um novo
processo de trabalho, centrado na vigilância à saúde (SANTANA e CARMAGNANI, 2001).
A operacionalização desses objetivos ocorre por meio da definição territorial da clientela, da
noção de família como foco da assistência, do trabalho em equipe interdisciplinar e
multiprofissional e do vínculo entre os profissionais e as famílias assistidas (COSTA e
CARBONE 2009). Segundo o Ministério da Saúde (BRaSIL, 1997), a territorialização
pressupõe o diagnóstico das características sociais, demográficas e epidemiológicas e deve
impactar, de forma favorável, as condições de saúde da população adscrita. para tal, as equipes de
saúde devem realizar o cadastramento das famílias por meio de visitas domiciliares. Este
diagnóstico permite:
 Identificar os problemas de saúde prevalentes e as situações de risco desta população.
 Elaborar, em conjunto com a comunidade, um plano de ação para o enfrentamento dos
determinantes de processo saúde/doença.
 Prestar assistência integral na uSF, na comunidade, no domicílio, além do
acompanhamento nos serviços de referência ambulatorial ou hospitalar.
 Desenvolver ações educativas e intersetoriais para o enfrentamento dos problemas de
saúde.
A composição das equipes de saude da famila
Um ponto importante é o estabelecimento de uma equipe multiprofissional (equipe de Saúde
da Família – ESF) composta por, no mínimo:
 Um médico generalista, ou especialista em saúde da família, ou médico de família e
comunidade.
 Um enfermeiro generalista ou especialista em saúde da família.
 Dois auxiliares ou técnico de enfermagem.
 Seis agentes comunitários de saúde.
Podem ser acrescentados a essa composição os profissionais de saúde bucal: cirurgião-dentista
generalista ou especialista em saúde da família, auxiliar e/ou técnico em saúde bucal, que
apoiarão duas equipes de saúde da família. Cada Equipe de Saúde da Família (ESF) deve ser
responsável por, no máximo, 4.000 pessoas, sendo a média recomendada de 3.000 pessoas,
respeitando critérios de equidade para essa definição. Recomenda-se que o número de pessoas
por equipe considere o grau de vulnerabilidade das famílias daquele território, sendo que,
quanto maior o grau de vulnerabilidade, menor deverá ser a quantidade de pessoas por equipe.
Há também as equipes de saúde da família ribeirinhas e as unidades básicas de saúde fluviais.
Estão direcionadas para o atendimento da população ribeirinha da amazônia Legal e pantanal Sul-
Mato-Grossense, respectivamente. Considerando as especificidades locais, os municípios
podem optar entre dois arranjos organizacionais para equipes de saúde da família, além dos
existentes para o restante do país.
Núcleos de apoio à saude da família
Os Núcleos de apoio à Saúde da Família (NASF) foram criados pelo Ministério da Saúde em
2008 com o objetivo de apoiar a consolidação da atenção básica no Brasil, ampliando as ofertas
de saúde na rede de serviços, assim como a resolutividade, a abrangência e o alvo das ações.
Atualmente regulamentados pela Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, configuram-se
como equipes multiprofissionais que atuam de forma integrada com as equipes de Saúde da
Família (ESF), as equipes de atenção básica para populações específicas (consultórios na rua,
equipes ribeirinhas e fluviais) e com o Programa Academia da Saúde.
Essa atuação integrada permite realizar discussões de casos clínicos, possibilita o atendimento
compartilhado entre profissionais tanto na unidade de saúde como nas visitas domiciliares, e
permite a construção conjunta de projetos terapêuticos de forma a ampliar e qualificar as
intervenções no território e na saúde de grupos populacionais. Essas ações de saúde também
podem ser intersetoriais, com foco prioritário nas ações de prevenção e promoção da saúde.
Poderão compor os NASF as seguintes ocupações: médico acupunturista; assistente social;
profissional/professor de educação física; farmacêutico; fisioterapeuta; fonoaudiólogo; médico
ginecologista/obstetra; médico homeopata; nutricionista; médico pediatra; psicólogo; médico
psiquiatra; terapeuta ocupacional; médico geriatra; médico internista (clínica médica); médico
do trabalho; médico veterinário; profissional com formação em arte e educação (arte-
educador); e profissional de saúde sanitarista, ou seja, profissional graduado na área de saúde
com pós-graduação em saúde pública ou coletiva ou graduado diretamente em uma dessas
áreas. A composição de cada um dos Nasf será definida pelos gestores municipais, seguindo os
critérios de prioridade identificados a partir dos dados epidemiológicos e das necessidades
locais e das equipes de saúde que serão apoiadas.
Assistencia ambulatorial e hospitalar especializada no Brasil
Os serviços de atenção especializada são espaços de saber-fazeres profissionais, onde se
concretiza o encontro das tecnologias leves e leves-duras ofertadas sobre a infraestrutura
tecnológica dura.
 Hierarquização e Regionalização, princípios operacionais do SUS - a rede de serviços do SUS
deve ser organizada de forma que permita um conhecimento maior dos problemas de saúde da
população de uma área delimitada, favorecendo ações de vigilância epidemiológica e sanitária,
controle de vetores, educação em saúde, além das ações de atenção ambulatorial e hospitalar
em todos os níveis de complexidade. o acesso da popu- lação à rede deve se dar através dos
serviços de atenção básica, distribuídos regionalmente, que precisem estar qualificados para
atender e resolver os principais problemas que deman- dam serviços de saúde.
Para entender a rede de serviços de atenção especializada como um território estratégico de
intervenção do sistema de saúde, deve-se reconhecer que é a atenção básica que tem redefinido os
papéis da atenção secundária e terciária. Enquanto a rede de serviços de atenção básica deve
ser extremamente capilarizada com unidades de pequeno porte distribuídas o mais próximo
possível de onde os usuários vivem e trabalham, tendo, portanto, como sua principal
característica a descentralização, a atenção especializada deve ser preferencialmente ofertada
de forma hierarquizada e regionalizada, garantindo a escala adequada (economia de escala) para
assegurar tanto uma boa relação custo/benefício quanto a qualidade da atenção a ser prestada.
O cuidado integral em saúde produzido pela atenção ambulatorial especializada exige:
“Corresponsabilização entre especialistas, de modo a acompanhar os efeitos das intervenções
em saúde e de outros elementos em suas vidas, ajustar condutas quando necessário, evitar a
perda de referências e diminuir os riscos de iatrogenia decorrentes do desconhecimento das
histórias de vida” (BRaSIL, 2011).
A atenção básica é entendida como o conjunto de ações de saúde no âmbito individual e coletivo
que abrangem a promoção e proteção da saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento
e reabilitação. É desenvolvida sob a forma de trabalho em equipe e orienta- se pelos princípios
da universalidade, acessibilidade e coordenação do cuidado, vínculo e continuidade,
integralidade, responsabilização, humanização, equidade e participação social.
A atenção básica organiza-se para assumir sua função central de acolher, escutar e oferecer uma
resposta positiva, sendo capaz de resolver a grande maioria dos problemas de saúde da
população, minorar danos e sofrimentos e responsabilizar-se pela resposta, ainda que esta seja
ofertada em outros pontos de atenção da rede.
Essa proximidade e a capacidade de acolhimento, vinculação e resolutividade são fundamentais
para a efetivação da atenção básica como contato e porta de entrada preferencial da rede de
atenção. Ela ocupa uma posição nuclear na organização da rede de atenção no MSp pela
proximidade com as necessidades de saúde da população, pela responsabilidade que deve
assumir na atenção contínua e integral, pelo cuidado multiprofissional, pelo compartilhamento
de objetivos e pelos compromissos com os resultados sanitários e sociais. Estrutura-se, portanto,
de forma a desenvolver um processo de trabalho que compreenda o cidadão como sujeito de
direito e que promova a articulação de saberes e práticas multiprofissionais, o vínculo e a
responsabilização com porta aberta aos usuários e seus problemas de saúde. as ações da atenção
básica requerem a retaguarda de serviços especializados para a continuidade e integralidade do
cuidado. Neste sentido, a Atenção Especializada Ambulatorial (AEA) assume o papel de
executante e, eventualmente, de solicitante nas redes, apoiando a atenção básica na elucidação
diagnóstica, ou na solicitação de consultas e exames de apoio diagnóstico, ou no
acompanhamento prolongado desses pacientes.
A atenção básica assume, assim, o papel de coordenadora do cuidado e ordenadora do sistema,
sendo a porta de entrada prioritária da rede de atenção à saúde. a atenção Especializada
ambulatorial (aEa), por sua vez, assume um papel de suporte para a atenção básica e
coadjuvante no cuidado à saúde do paciente. a atenção especializada oferece tecnologias que
permitem apoio à atenção básica na elucidação diagnóstica, na definição de condutas e na
manutenção dos tratamentos. para que não haja uso abusivo dessas tecnologias, ocasionando
represamento de filas de espera na atenção básica para acesso à atenção especializada,
preconiza-se que a prática da atenção básica seja feita baseada em evidências, respeitando os
protocolos de regulação de acesso vigentes ou a serem elaborados. a regulação do acesso à aEa
inicia na atenção básica com a regulação local.
Redes de atenção à saude no sistema de saude brasileiro
Para Ouverney e Noronha é possível conceber as redes de atenção como sendo uma estratégia de
organização da atenção à saúde especificamente voltada para promover a integração do cuidado,
a partir da combinação entre flexibilidade de alocação de práticas e tecnologias e coordenação
do cuidado para a garantia da longitudinalidade do cuidado.
O estímulo à organização de redes integradas de atenção à saúde nos sistemas municipais e
estaduais de saúde como forma de garantir a integralidade, universalidade e equidade da atenção
à saúde da população brasileira adquire maior relevância no final da década de 1990 e culmina
com a publicação da portaria GM nº 4.279, de dezembro de 2001.
Esta discussão ocorre no interior do Sistema Único de Saúde (SUS), diante de um perfil
epidemiológico alarmante, comumente caracterizado pela tripla carga de doenças. Este
processo decorre de profundas transformações socioeconômicas e, consequentemente, de estilo
de vida, e impacta diretamente na saúde dos indivíduos e comunidades. uma das consequências
mais claras é a ascensão das condições crônicas de doença. Em outras palavras, as condições
crônicas (CC), antes incipientes, agora assumem papel de destaque junto às prioridades da
agenda de saúde. a rápida ascensão epidemiológica das CC demonstrou, entre outros fatores, a
ineficácia do sistema de saúde brasileiro em lidar com essa demanda, já que está centrado em
eventos agudos e organizado segundo preceitos de hierarquização, fragmentação e
medicalização. por isso, é urgente que se estabeleçam novos processos organizativos, de gestão e
atenção à saúde no SUS, baseados em evidências científicas, que levem em conta as reais
necessidades de saúde da população e que, de fato, sejam efetivos e eficientes.
Nesta conjuntura, as redes de atenção à saúde surgem como uma possibilidade para a
reestruturação dos serviços e processos de saúde, rumo ao restabelecimento da coerência entre
os princípios e diretrizes do SUS e o perfil epidemiológico da população brasileira.
Em nível internacional e nacional, tem-se estabelecido um consenso gradativo de que a
organização dos sistemas de saúde sob a forma de redes integradas é a melhor estratégia para
garantir atenção integral, efetiva e eficaz às populações assistidas, com a possibilidade
de construção de vínculos de cooperação e solidariedade entre as equipes e os níveis de gestão
do sistema de saúde.
Mendes conceitua redes de atenção à saúde como organizações poliárquicas de conjuntos de
serviços de saúde, vinculados entre si por uma missão única, por objetivos comuns e por uma
ação cooperativa e interdependente, que permite ofertar uma atenção contínua e integral a
determinada população, coordenada pela atenção primária à saúde — prestada no tempo certo,
no lugar certo, com o custo certo, com a qualidade certa e de forma humanizada —, e com
responsabilidades sanitária e econômica por esta população.
Uma vez instituída, uma rede de atenção apresenta-se como um conjunto articulado e
interdependente de unidades de saúde com o objetivo de prover atenção integral e contínua de
acordo com as necessidades de cada cidadão, a partir de uma combinação custo/efetiva de
alocação de recursos. Em grande parte da literatura, o conceito de redes está estreitamente
relacionado ao de cuidados integrados, sendo quase sinônimo desse.
O quadro a seguir apresenta uma síntese dos princípios de organização de redes de atenção e
um conjunto de tecnologias e estratégias sugeridas com maior ênfase pela literatura para
promover a integração do cuidado.
Fundamentos
• Orientação para as necessidades de saúde
• Complexidade da abordagem
• Multidisciplinaridade da intervenção
• Longitudinalidade do cuidado
• Interdependência e compartilhamento de análise clínica
• Responsabilização clínica
• Territorialização
• Intersetorialidade
• Eficiência econômica
• Melhoria contínua da qualidade

Tecnologias e Estratégias
• Planos de cuidado (projetos terapêuticos individuais e familiares)
• Cartão do usuário
• Gerenciamento de doenças
• Prontuários eletrônicos
• Sistemas de apoio diagnóstico e terapêutico
• Equipes multiprofissionais
• Linhas de cuidado
• Complexos de regulação
• Colaboração entre unidades (integração horizontal e/ ou vertical)
• Metodologias de classificação de risco
• Apoio matricial e equipes de referência
• Sistemas de apoio logísticos
• Telecuidado, telessaúde e telemedicina
• Sistemas integrados de informação
• Primazia da atenção primária
• Sistemas de transporte em saúde
• Sistema de suporte à decisão clínica
• Roteiros de diagnóstico de situação de saúde
• Articulação com outras políticas públicas
• Sistemas de apoio logístico
• Protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas
• Práticas de certificação de qualidade
• Dispositivos de segurança do paciente
• De forma geral, as estratégias operacionais de construção de redes de atenção fornecem
subsídios para organizar os sistemas de saúde a partir de sete diretrizes organizacionais
principais: definição de uma população vinculada a um território e conhecimento de suas
características socioeconômicas e culturais; projeção de um cenário desejado (imagem-
objetivo); estabelecimento de um primeiro nível de atenção como porta de entrada; definição
de um conjunto diversificado de serviços de saúde; provisão de ações e serviços especializados;
aporte de ações e cuidados sociais; e organização de estruturas de suporte à atividade clínica.
No caso do SUS, a aplicação das diretrizes de organização de redes de atenção deve ser
orientada por cinco outros fundamentos que definem a gestão e a governança do sistema: o
caráter unificado da seguridade social; os princípios constitucionais (universalidade,
integralidade e equidade); a responsabilização territorial; o comando público governamental; e
a governança federativa (relações intergovernamentais). Sendo assim, no caso brasileiro,
grande parte dos fatores que motivam a busca por maior integração no contexto internacional
tem se intensificado na última década, ampliando o desafio de construção de um sistema de
saúde fundamentado nos princípios de universalidade, integralidade e equidade, tal como
proposto na Constituição de 1988, em um país de expressiva extensão territorial e elevado nível
de desigualdade socioeconômica. Assim, as redes de atenção à saúde no SUS podem ser
caracterizadas por:
 Formar relações horizontais entre os diferentes pontos de atenção: essa característica pressupõe
que os pontos de atenção passem a ser entendidos como espaços onde são ofertados alguns
serviços de saúde, sendo todos igualmente importantes para que sejam cumpridos os objetivos
da rede de atenção. Ao contrário da forma de trabalho em sistemas de saúde hierárquicos, de
formato piramidal e organizado segundo a complexidade relativa de cada nível de atenção
(atenção primária, de média e de alta complexidade), as redes de atenção à saúde são espaços que
visam assegurar o compromisso com a melhora de saúde da população, ofertando serviços
contínuos no âmbito dos diferentes níveis de atenção à saúde. Assim, para a lógica das redes de
atenção à saúde, um pronto-socorro e um centro de especialidades, por exemplo, são igualmente
importantes na garantia da atenção à saúde do usuário, pois ambos cumprem papéis específicos
para necessidades específicas.
 Atenção primária à saúde como centro de comunicação: embora seja preconizada a relação
horizontal, ou seja, não hierárquica entre os níveis e pontos de atenção à saúde, isso não significa
que um deles não deva ser priorizado − considerando investimentos e alocações de recursos. A
lógica de organização do SUS em redes de atenção a partir da APS reafirma o seu papel de (1)
ser a principal porta de entrada do usuário no sistema de saúde; (2) de ser responsável por
coordenar o caminhar dos usuários pelos outros pontos de atenção da rede, quando suas
necessidades de saúde não puderem ser atendidas somente por ações e serviços da APS; (3) e de
manter o vínculo com estes usuários, dando continuidade à atenção (ações de promoção da
saúde, prevenção de agravos, entre outras), mesmo que estejam sendo cuidados também em
outros pontos de atenção da rede. Essa posição estratégica da APS no fluxo da atenção à saúde
do usuário objetiva potencializar a garantia da integralidade, continuidade, eficiência e eficácia
do sistema de saúde. A Figura na tabela a seguir, ilustra bem a APS como centro de comunicação
da RAS.
 Planejar e organizar as ações segundo as necessidades de saúde de uma população específica:
as ações, os serviços e as programações em saúde devem basear-se no diagnóstico da população
adscrita à equipe de saúde, considerando fatores e determinantes da saúde desta população. Na
prática, tem se traduzido sob o fenômeno da tripla carga de doenças, mais precisamente nas
condições crônicas de doença. Além disso, a ação das equipes deve basear-se em evidências
científicas devidamente constatadas.
 Cuidado multiprofissional: faz-se necessária a composição multiprofissional das equipes de
saúde porque os problemas de saúde muitas vezes são multicausais e complexos e necessitam de
diferentes olhares profissionais para o seu devido manejo. Porém, mais do que a
multiprofissionalidade, a ação interdisciplinar da equipe deve ser um objetivo a ser estabelecido,
de modo a garantir o compartilhamento e a corresponsabilização da prática de saúde entre os
membros da equipe.
 Compartilhar objetivos e compromissos com os resultados, em termos sanitários e econômicos:
a missão de uma equipe de saúde deve contemplar objetivos sanitários (como o aumento do
aleitamento materno na região adscrita, maior e melhor atendimento à população, entre outros)
e objetivos econômicos (como melhor alocação dos recursos humanos, tecnológicos e
financeiros), de modo a gerar o melhor custo benefício para a população atendida
Síntese
• Nesse sentido, considerando o esforço prospectivo voltado para o aperfeiçoamento da política
de saúde do país, é importante buscar subsidiar futuras estratégias nacionais de organização da
atenção à saúde nas diversas dimensões do sistema de saúde. As informações contidas nesse
texto fornecem subsídio para a discussão da organização do cuidado à saúde visando à
promoção da atenção integrada especificamente ajustada para a consolidação do sistema de
saúde brasileiro, escopo de atuação para todos os profissionais de saúde.

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