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QUATRO ARGUMENTOS PARA ACABAR COM A TELEVISÃO

RESENHA INTERNET

Mander defende que nos libertemos "da ideia de que, só porque a


televisão existe, não podemos acabar com ela." Duas décadas depois,
ainda ninguém se libertou da ideia, mas é positivo que haja quem
combata preconceitos, mesmo que por vezes num delírio semelhante
ao que critica.

Jerry Mander publicou "Quatro Argumentos para Acabar com a


Televisão" em 1977. A tradução surge 22 anos depois. Se é gritante que
o mercado português não proporcione mais edições e mais rápidas de
obras com amplo impacto, é também certo que no caso deste livro os
portugueses não poderiam entendê-lo plenamente há 20 anos atrás.
Muitas das referências que Mander faz ao universo televisivo são
inaplicáveis num mundozinho de dois canais públicos. Hoje, com
quatro canais nacionais e com dezenas por cabo ou centenas por
satélite, e com toda a categorização de programas e publicidade
semelhante à norte-americana descrita por Mander em 1977, é fácil aos
espectadores portugueses entenderem a sua argumentação.Muitos
estudos posteriores ao super-panfleto de Mander vieram preencher
lacunas no conhecimento da relação individual e colectiva com a TV.
Quando escreveu, muitas áreas científicas eram alheias ao fenómeno
televisivo, razão pela qual ele enveredou por um relacionamento de
factos e estudos aparentemente desligados e utilizou-os de forma ora
original ora pré-alucinada, mas sempre marcada por uma linguagem
datada dos anos 70.Mander tentou provar exaustivamente, com provas
"científicas", que a TV é nociva ao corpo e à mente. O livro torna-se
aborrecido em alguns passos, com deambulações "científicas" pouco
consistentes, mas lançou pistas e alertou os leitores para os aspectos
"alienantes" da TV (palavra que ele não utiliza).Muito
americanamente, Mander apresenta as suas teses como "verdades
reveladas". Tal como nos cânticos religiosos se diz, em hossanas, "I was
blind but now I see", ele diz a cada passo coisas do género "tornou-se
de repente óbvio para mim que..." (p. 55).Essa ingenuidade destina-se
a decerto a um público americano, cujo destino ele vê ligado ao
televisor. Mander precisa desse elemento de "Revelação" pessoal, em
que a sua experiência ou a dos seus filhos é repetidamente apresentada
para motivar nos leitores a mesma descoberta da Verdade ou, pelo
menos, sugerir-lhes a "atitude distanciada" perante a mensagem e a
tecnologia televisiva, de forma a fugirem ao seu poder mefistofélico
(palavra que utiliza várias vezes).Mander é radical: a televisão é
diabólica, incorrigível enquanto tecnologia; a TV só serve a publicidade
e o grande capital, a ausência de ideias e a "lavagem ao cérebro,
hipnose, controlo à distância" (p. 210); a TV resulta de uma
conspiração do capitalismo e do poder para adormecer as massas, não
esclarece e é antidemocrática, predetermina o tipo das formas políticas
que "poderá inevitavelmente fazer surgir" (p. 58). Deve ser abolida.O
primeiro dos quatro argumentos diz que a TV, enquanto elemento
fundamental dos "ambientes completamente artificiais" em que
vivemos torna impossível distinguir a verdade da ficção, pelo que
favorece "a implantação de realidades arbitrárias" (p. 61)Mander põe a
hipótese de ter sido inventada por gente malévola pretendendo
provocar nos espectadores a "fantasia esquizofrénica, colocando no
nosso espírito imagens de realidades exteriores à nossa experiência."
Em consequência, "perdemos o controlo das nossas mentes, andamos
perdidos no espaço, o nosso mundo existe apenas na nossa memória."
(pp. 139-140)O segundo argumento afirma que "uma conspiração de
factores tecnológicos e económicos levou inevitavelmente" à situação
em que a TV é "controlada por um punhado de conglomerados
comerciais" e é usada para "recriar seres humanos em novas formas,
adaptadas aos ambientes artificiais e comerciais". (p. 141) Conclui
também que qualquer outra utilização da TV que não seja a publicidade
ou a programação comercial "não faz muito sentido", sendo impossível
uma programação de qualidade. (p. 145).O terceiro argumento aponta
para os efeitos negativos da TV na saúde dos espectadores. Ela "pode
criar doenças", além de causar "o condicionamento necessário ao
controle autocrático" (p. 193), um autêntico caso para "chamar a
polícia" (p.198). A TV induz a violência, priva-nos dos sentidos (pp.
208-9), obscurece a mente (p.239), ultrapassa a consciência (p.248),
inibe a aprendizagem (p.255), pelo que é inútil como forma de
educação, não descontrai, (p.262), "inibe a nossa capacidade de
pensar" (p.266).O quarto argumento fecha a construção ideológica de
Mander: a TV não pode ser alterada nos conteúdos por serem eles
predeterminados pela tecnologia, a qual "implica a manipulação": "isto
não pode ser alterado" (p. 325).Mander conclui que "pobres, índios,
ecologistas, políticos radicais, budistas zen, operários fabris,
revolucionários, artistas, comunistas, ludditas, hippies, botânicos, para
além de muitos outros grupos vítimas de exclusão não poderão ter "o
controlo da televisão". (p. 328). Logo, a TV é nefasta.A sua atitude é,
afinal, a desses ludditas, operários ingleses do início do século XIX que
se opunham à industrialização destruindo e incendiando fábricas e
máquinas, em defesa da sua organização industrial anterior,
corporativa. Mander defende a obliteração da TV em defesa de uma
sociedade ruralista, próxima do ambiente, ecológica, sem predomínio
da luz artifical, semelhante às sociedades índias que tanto protege
(neste livro e em "In the Absence of the Sacred: The Failure of
Technology and the Survival of the Indian Nations", 1992), uma
sociedade local baseada na autarcia/autarquia (que é o tema do seu
livro mais recente, "The Case Against the Global Economy: And for a
Turn Towards the Local", 1997).Nessa sociedade utópica, ou ucrónica,
sem televisão, seria bom viver: "ao imaginar um mundo sem televisão,
apenas entrevejo consequências benéficas", pois "o ser humano, uma
vez liberto da névoa das imagens televisivas" poderá "reconquistar a
felicidade perdida há já algum tempo, e viver de novo numa realidade
menos artificial e imposta na qual a acção pessoal adquira maior
relevo" (p.443-4).Mander gostaria de não ser considerado um
sonhador, terminando o livro com o conselho de nos libertarmos "da
ideia de que, só porque a televisão existe, não podemos acabar com
ela." (p.444). Duas décadas depois, ainda ninguém se libertou da ideia,
mas é positivo que haja sonhadores a lançar pistas e a combater
preconceitos, mesmo que por vezes num delírio semelhante ao que
criticam.

https://www.publico.pt/1999/05/29/jornal/quatro-mandamentos-para-abolir-a-televisao-
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