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• A existência deste universo (semiosfera) torna reais actos signatórios específicos, não é a junção de vários
actos semióticos separados que o constrói.
Ilustração 1: A integração dos signos no espaço semiótico é que torna possível a existência dos
primeiros, não é a junção destes que cria a semiosfera.
Limites da Semiosfera
• Homogeneidade e individualidade
◦ Conceitos difíceis de definir formalmente;
◦ Dependem de sistemas de descrição;
◦ Actuam ao nível intuitivo → implicam a existência de uma qualquer fronteira entre a semiosfera e o
espaço não ou extra – semiótico que a envolve.
▪ Exemplo I :
“Pontos-limite” da semiosfera ↔ Receptores sensoriais do sistema nervoso.
Adaptam, através da tradução, actores Adaptam os estímulos do meio ao corpo,
externos à esfera semiótica dada. traduzindo-os em impulsos nervosos.
▪ Para os Russos, a crueldade do Czar era algo natural, já não os surpreendia esta larga aplicação
de uma execução, quer relativemente ao número de pessoas envolvidas quer à grande variedade
de estratos sociais.
▪ Os estrangeiros, porém, sentiam-se revoltados pelo facto da culpa de um único homem fazer
sofrer tantos outros.
“Pode ficar surpreendido por se terem exilado também mulheres e crianças. Porém, aqui, quando o chefe da
família cai em desgraça, toda a sua família é alvo de perseguição” (Shubinskij 1874 : 46)
▪ Conceito de colectivo ≠ Personalidade Individual – Esta noção de colectivo faz com que o
indivíduo nele se dilua.
▪ É, ainda, intrínseco ao conceito de Vingança de Sangue, onde os familiares de um assassino são
vistos também como responsáveis pelos crimes por este cometidos.
“Compreende-se que através de uma tão forte unidade patrimonial, através de tão grande responsabilidade de
todos os membros de uma família, de uma raça, perante o outro, o significado da pessoa-indivíduo desaparece,
subjugando-se ao significado de raça, de facto, mesmo a pessoa-singular seria impensável sem uma raça. Até a
mesmo o famoso Ivan Petrov não era pensado como um Ivan Petrov singular, mas somente no sentido de Ivan
Petrov, os seus irmãos e os seus sobrinhos. Através destas ligações entre pessoa e raça: quando a pessoa-singular
se ergue – toda a sua raça ergue-se também; aquando da humilhação de um único membro da raça – toda a raça
é humilhada.” (Solovev 1960 : 679)
1 Boyars (bōyärz'), do Russo боярин, eram membros da alta nobreza Russa (do séc. X ao séc. XVII), cuja inicial
influência e subida a cargos do Governo se deveu principalmente ao facto de terem prestado apoio militar aos
príncipes de Kiev. Assim,e apesar de, rapidamente, todo o seu poder e prestígio ter passado a depender somente dos
contratos de vassalagem, típicos do feudalismo europeu, os boyars ocupavam os mais elevados cargos do Estado e
os seus conselhos eram imensamente prezados pelo príncipe. Aquando da mudança do poder político para Moscovo
(nos séculos XIV e XV) os boyars conseguiram manter a sua influência. Porém, esta foi-se, gradualmente,
dissolvendo, particularmente com a tomada de poder de Ivan III e, posteriormente, de Ivan IV. Os boyars foram,
assim, perdendo grande parte dos seus direitos e privilégios, ao mesmo tempo que viam acrescidos os seus deveres.
Deste modo, com o seu poder cada vez mais enfraquecido, o título de boyar não consegue manter-se até ao século
XVIII, sendo abolido no século XVII por Peter I.
• Portanto, o limite do espaço semiótico:
◦ É a mais importante, funcional e estrutural posição do mesmo;
◦ Impregna de substância o mecanismo semiótico;
◦ É um mecanismo bilingual;
◦ Traduz as comunicações externas para a linguagem interna da semiosfera e vice-versa.
◦ Permite que semiosfera estabeleça contacto com espaços não- e extra-semióticos.
◦ Domínio da semântica – exige que apelemos a uma realidade extra-semiótica, contanto que não nos
esqueçamos que, para uma dada semiosfera, esta realidade apenas se torna numa realidade em si
mesma se traduzida para a linguagem da semiosfera ( do mesmo modo que materiais químicos
exteriores apenas podem ser adoptados por uma célula se transformados nas estruturas bioquímicas
internas desta).
◦ Analogia Semiosfera – Célula
Funções da Fronteira
• A tarefa de qualquer orla ou película, desde a membrana de uma célula viva à visão da biosfera como
uma película que cobre o nosso planeta (Vernadsky) até à delimitação da semiosfera, consiste em:
◦ Nível da semiosfera.
▪ Representa a divisão entre o “eu” e o “outro”, a filtração das comunicações e, daí, a tradução
destas para a sua própria linguagem, tal como a transformação das não-comunicações externas
em comunicações.
▪ O limite remete para a ideia de um mecanismo amortecedor, uma unidade única de tradução, de
transformação da informação.
• A semiosfera identifica-se a si mesma com o espaço cultural assimilado e com o mundo que lhe é
exterior – o caótico reino dos elementos desorganizados.
• Dentro da semiosfera, a distribuição espacial das formas semióticas pode, assim, tomar, de
acordo com a situação, várias configurações:
Estas áreas com múltiplos significados culturais surgem também na fronteira da semiosfera, levando a
uma espécie de creolização2 das estruturas semióticas.
• Podemos tentar explicar o funcionamento do mecanismo de fronteira através de uma analogia com o
romance de Shakepeare, Romeu e Julieta. De facto, a temática desta obra, o amor, a união, a ligação de
dois espaços culturais hostis, revela claramente a essência deste mecanismo.
2 A hibridização de uma cultura, à medida que absorve e tranforma forças a ela exteriores.
• Ou seja, a fronteira pode ser olhada de diferentes modos, encarada de modos distintos:
◦ Como um mecanismo imanente: une duas esferas de semiose.
◦ Do ponto de vista de auto-conhecimento semiótico de uma dada semiosfera: divide as duas esferas.
• Para uma determinada semiosfera pode ser espaço não-semiótico todo o espaço de outras semióticas.
• Assim:
◦ De um ponto de vista interno (de uma semiosfera X): Uma dada cultura (integrada numa
semiosfera Y) pode ser tomada como o mundo externo, não-semiótico.
◦ Olhada por um observador externo: Estabelece-se como a periferia semiótica.
Interacção activa: Raíz dos processos dinâmicos que ocorrem no interior da semiosfera.
• Nível estrutural
◦ Irregularidades:
1. Aumenta a fusão entre os vários níveis.
2. A realidade da semiosfera, a hierarquia das linguagens e dos textos como uma regra, é
perturbada.
3. Os elementos colidem como se coexistissem num mesmo nível.
4. Os textos parecem estar imersos em linguagens que não lhes correspondem, e estão ausentes os
códigos que permitiriam decifrá-los.
3Descrição feita de um ponto de vista interno e em termos oriundos do processo de auto-desenvolvimento de uma
determinada semiosfera
▪ Existe também isomorfismo vertical:
• Surge entre estruturas de diferentes níveis hierárquicos.
• Gera o crescimento quantitativo das comunicações.
• Seguindo a analogia so espelho: um objecto reflectido num espelho origina centenas de
reflexões de si próprio nos fragmentos deste.
• Assim, uma comunicação, introduzida numa estrutura semiótica integral, é rodeada por
pedaços de si mesma nos níveis inferiores.
Significado sem comunicação não seria possível. Neste sentido, podemos dizer que o diálogo precede e dá à luz a
linguagem.
Noção de Semiosfera
Além das características já apresentadas, Lotman considera que, no âmago da semiosfera, jazem
ainda algumas outras noções:
• A junção de formações semióticas precede (não heurística mas funcionalmente) a linguagem isolada e
singular.
• A junção de formações semióticas é uma condição para a existência de linguagem.
• Sem a semiosfera não existe linguagem.
• As diferentes substruturas da semiosfera interligam-se e interagem.
• As diferentes substruturas não funcionam sem o apoio umas das outras.
• Sabemos que ela é repleta de irregularidades e rodeada por um espaço cuja linguagem não compreende.
• Porém, ela não pode estabelecer-se a si mesma como:
◦ Um objecto caótico e irregular.
◦ Uma colecção autónoma de elementos.
• Pode sim definir-se como:
◦ Um Todo em si mesmo, embora não o seja se para fora de si olhar.
◦ Um espaço constituído por partes internamente reguladas e funcionalmente conectadas.
◦ Um espaço cujo comportamento é estabelecido pela relação dinâmica das partes.
▪ O desenvolvimento dinâmico dos elementos da semiosfera (substruturas) é ditado pelas suas
especificações e pelo incremento da sua diversidade interna.
▪ Este dinamismo não destrói a integridade da semiosfera.
▪ É sobre esta integridade que assentam todos os processos comunicativos, tornando-se
mutuamente semelhantes.
▪ Este princípio dinamismo-semelhança é construído sobre a combinação de simetria–assimetria
com o refluxo periódico e o fluxo de todos os processos vitais de todas as formas.
(ao nível da linguagem esta característica estrutural foi descrita por Saussure como o “mecanismo de semelhanças
e diferenças”)
Simetria - Assimetria
• A repetição cíclica torna-se a base de um crescimento rotativo em torno dos eixos de simetria.
• O efeito combinado destes dois princípios pode ser observado a diferentes níveis:
◦ Plano de Simetria → Antítese: Plano do Tempo Mitológigo vs. Plano do Tempo Histórico
Cíclico Dirigido
▪ Os eixos de simetria repetem-se ciclicamente, opondo-se à explosão atómica unidireccional.
▪ O mundo do cosmos opõe-se ao mundo animal.
◦ Esta combinação adquire um carácter estrutural e, assim, os seus efeitos repercutem-se:
▪ Nos limites da sociedade humana.
▪ Em todo o mundo vivo - novas estruturas gerais surgem.
• A questão da simetria – assimetria remete-nos para um outro traço dicotómico da Semiosfera e dos
elementos que nela se integram: Homogeneidade - Heterogeneidade
◦ A possibilidade de diálogo sugere, simultaneamente, uma heterogeneidade e uma homogeneidade
dos elementos.
◦ A heterogeneidade semiótica implica uma estrutura heterogénea – Diversidade Estrutural.
◦ Assim, os textos não são idênticos, não formam um Todo homogéneo, mas, na sua heterogeneidade,
são semelhantes o suficiente para que a sua conversão mútua se torne possível.
◦ Se os participantes numa relação dialógica fossem iguais esta não existiria sequer, eles têm de ser
distintos e “de conter, no interior da sua estrutura, uma imagem semiótica de contra-agente”
(Paducheva 1982).
“Eugene Onegin”:
• “Ela” ama “ele” - enfatiza o seu amor numa carta.
• “Ela” é friamente repudiada por “ele”.
◦ N.Tarabukin sugeriu que a regra da composição pictórica, de acordo com eixos diagonais da tela:
▪ Do canto inferior direito ao canto superior esquerdo: sensação de passividade.
▪ Do canto inferior esquerdo ao canto superior direito: actividade e intensidade.
• Consideremos o quadro de Jericho, “A Jangada de Medusa”.
◦ A sua composição é construída com base em duas malhas diagonais: a passiva e a activa.
◦ A trajectória da jangada, agitada pelo vento, move-se da direita para a esquerda, mergulhando nas
profundezas. - Personifica a espontaneidade das forças da Natureza, arrastando consigo as vítimas do
naufrágio, já sem forças.
◦ No sentido inverso, na linha activa, o artista colocou algumas figuras que, reunindo as suas últimas
forças, tentam resolver a trágica situação, não desistindo da luta.
◦ Acima delas, surge um único indivíduo que, com a sua ajuda, hasteia a bandeira, de modo a chamar a
atenção de um navio que apareceu no horizonte distante.
(Tarabukin 1973 : 479)
• Assim: Uma mesma tela, organizando segundo a simetria de espelho a uma gravura pintada, altera a
semântica-emocional para o seu estado inverso, pois:
1. Os objectos reflectidos possuem a sua própria estrutura de superfície, simétrica ou assimétrica.
2. Através da transformação enantiomórfica, a simetria superficial é neutralizada e não pode ser
mostrada de nenhuma outra forma, enquanto que a assimetria se torna estruturalmente
significante.
3. Assim, a simetria-espelho representa, como já vimos, a estrutura primária das relações
dialógicas.
• Todos os níveis da semiosfera – desde a personalidade humana ao texto individual, passando pela unidade
semiótica – constituem um grupo, aparentemente, interligado de múltiplas semiosferas.
• Cada uma delas é, simultaneamente, participante no diálogo (como parte da semiosfera) e espaço de
diálogo (quando se encara esta semiosfera como um Todo).
• Em cada uma delas podem, ainda, ser identificadas manifestações de “direitismo” e “esquerdismo” e,
quer tendendo para um ou para o outro lado, todas possuem, no seu interior, estruturas pertencentes ora
mais a um lado ora mais ao outro.
É esta, segundo Lotman, a caracterização, a delimitação, a irregularidade e os mecanismos, deste espaço por ele
idealizado que é o espaço de todos os processos de criação de sentido, um espaço cultural, simultaneamente
homogéneo e heterogéneo, simultaneamente todo e parte. Ou seja, é assim que Yuri Lotman nos descreve o espaço
da Semiosfera.