Vous êtes sur la page 1sur 8

RESENHA DO TEXTO MITOLOGIAS JURIDICAS DA MODERNIDADE

• Historiador do direito como crítico que coloca em discussão pontos tidos como pacíficos pelos
operadores. Papel questionador e provocativo que busca rever convicções e certezas vigentes,
colocando em xeque o senso comum sobre assuntos jurídicos por meio de uma desmistificação
cultural. O livro tem o objetivo de chamar atenção dos juristas e estudantes de direito para estes
aspectos, evitando que tenham uma visão simplista da história do direito na Europa. Utiliza o
exemplo da subordinação do direito ao poder político na concepção kelseniana onde a lei é a
única fonte de direito que foi elaborada por ato de vontade, e não de conhecimento. Direito
perde seu caráter ôntico e produto das relações sociais, ficando engessado e declarado sem
conexão com a realidade social. Esta visão traz muito conforto aos juristas (otimismo) pois
muitos questionamentos que deveriam ser realizados não o são em troca de uma crença na
plenitude do ordenamento.
• O autor não está a fazer uma proposta, apenas busca a compreensão do seu objeto
historiográfico por meio de comparação a fim de salientar diferenças e oposições fortalecendo
assim a característica crítica de sua atividade.
• Desconfiança do homem comum em relação ao direito pois não o vê como sinônimo de justiça,
mas sim como de lei, desconectado da realidade social e de obrigatória obediência ainda que
não atenda aos anseios sociais. As garantias providas pelo Estado são meramente formais,
provenientes de ritos e órgãos específicos. Apesar da justiça ser um objetivo externo, nem
sempre é obtida, haja vista leis injustas que vigem. O historiador do direito pode demonstrar
que este contexto legalista e formalista, ao contrário do que se pensa, é recente e outras
experiências vigeram durante muito tempo, a exemplo da idade média. A visão histórica tem o
poder de demonstrar que as coisas não são imutáveis, como pode pensar o homem comum,
haja visto que a relativamente pouco tempo eram diferentes, existiam outras certezas. Será
realizada uma comparação entre o direito moderno e o medieval a fim de pela comparação
encorpar a análise e a crítica.
• Na idade média havia o poder político não consumado, que não possuía um projeto totalizante,
não pretendia controlar a integralidade do fenômeno social, mas somente questões alheias ao
governo e coisa pública. Como consequência o social era autônomo, sem obedecer a
regramentos gerais, propiciando o surgimento de infinitas figuras corporativas. Os protagonistas
fundamentais desta sociedade eram a natureza e a sociedade, sem a qual não existia a figura do
indivíduo. O direito não se mostra como fruto de vontade de um poder político contingente ou
de mandatário, mas sim como fenômeno social sem depender de regulamentação pública, mas
baseado nas organizações comunitárias. Nesse contexto o poder político vem no esteio do
surgimento do direito que não é reflexo do poder, a vida cotidiana é regulamentada pelo social,
num denso florescer dos costumes, operada por mestres, juízes, tabeliões e comerciantes. Este
direito não era regulado pelo Príncipe, mas emanava da sociedade civil em sua globalidade. O
direito baseia-se na interpretação dos juízes, tabeliões etc (juristas da época), que tomavam por
base os textos romanos e canônicos, ainda que se opusessem ou fossem além das normas
formalmente válidas à época. Tomás de Aquino teve grande relevância ao direito em suas
considerações sobre ordenamento, trazendo-o para uma dimensão objetiva, que toma
consciência de uma ordem pré-existente que é sistematizada por meio de leis, num exercício de
descoberta da realidade externa e suas verdades. A lei como fruto da observação e não da
vontade, tornando-se razoável e racional uma vez que faz a leitura e medida do real.
• A transição entre o modelo jurídico medieval e o moderno levou 5 séculos e, num processo
irregular com o confronto entre as novidades e resistências. O Príncipe vai mudando de figura e
conectando-se mais ao direito, abandonando a indiferença anterior e envolvendo-se na
produção do direito em áreas do trato social cotidiano, imbuído do papel de “libertar” os
indivíduos das “amarras” da natureza e sociedade que o condicionavam no direito medievo,
libertando-se por sua vez das velhas limitações medievais num novo projeto político em que
encontrava em si a justificação do poder e que não se submete à natureza ou sociedade, mas
projeta sua vontade. A França se mostra como um grande laboratório histórico entre os séculos
XI e XVIII quando a monarquia francesa percebe cada vez mais a essencialidade do direito no
âmbito do poder estatal e procura atuar como legisladora. A lei ganha protagonismo, mas muda
de figura uma vez que na época medieval imperava a lex permeada pela razoabilidade e bem
comum e agora passa a imperar a loy, fruto de um ato de vontade que busca determinar a
realidade, e que se autolegitima como lei por surgir a partir de uma volição de um soberano. A
lei torna-se um ato formal, podendo ter ou não conteúdo, mas seu elemento de validade passa
ser sua origem. A partir daí nasce a mística da lei, uma herança do absolutismo, que foi
confirmada e intensificada pela Revolução Francesa, agora sob alegação de um viés
democrático. Não há mais integração de diversas fontes do direito (leis, costumes, doutrina,
opiniões especializadas, etc.) uma vez a única fonte passa a ser a lei, que se confunde com a
vontade do Príncipe, o pretérito pluralismo jurídico dá lugar ao monismo. Em 1804 surge na
França o Código Civil, esfera tradicionalmente reservada aos privados.
• O processo de mudança entre o paradigma de direito da idade média e o moderno ocorreu
lentamente ao longo de alguns séculos. No século XVI está consolidado na França a figura do
Príncipe legislador que produz e ao mesmo tempo dá validade a normas jurídicas, o que culmina,
no século XIX, na criação do Código de Napoleão (codificação geral que abrange todas as áreas
do ordenamento). No século XVI Bodin faz distinção entre lei (emanada da vontade do rei) e
direito (proveniente das relações entre membros da comunidade com suas próprias soluções e
regras). O drama da modernidade consiste em absorver todo o direito nas leis, e teve-se
frequentemente um descolamento do direito formal e legal da sociedade civil em constante
movimento. Os juristas atuais já possuem olhar mais crítico a respeito dos dogmas, enxergando
com mais profundidade institutos como leis, dogmas e segurança jurídica.
• A civilização moderna mostra-se como uma formidável construtora de mitos jurídicos, podendo
ser claramente vistos nas grandes correntes do jusnaturalismo do século XVIII. O conjunto de
ideias como estado da natureza, contrato social, representação política, igualdade jurídica,
vontade geral, etc., típicos destes períodos buscam uma fundamentação mítica. O século XVIII
representa um momento de profunda descontinuidade e ruptura com o passado, com a
secularização não houve mais respaldo histórico ao direito que se propunha, fazendo-se assim
uma transposição de plano com o uso de uma meta-realidade, que ao abandonar o lastro
histórico se torna uma entidade meta-histórica, objeto mais de crença que de conhecimento. O
mito torna-se necessário pois nele o absolutismo político consegue justificar-se, dando assim
um lastro às novas ideologias políticas, econômicas e jurídicas. O historiador do direito em sua
reflexão adverte que se trata de uma há uma transfiguração do direito, que muda radicalmente
coberto pela crença, descartando a história, num processo de absolutização, que gera um
produto histórico deformado do seu vulto original com a perda da historicidade. A nova
construída paisagem do século XX é muito mais simples, o que leva à desconfiança do historiador
do direito que enxerga riqueza na complexidade histórica, depreende daí uma construção
artefata de uma engenhosidade que revela uma harmonia de construção geométrica com
exatidão e precisão. Entretanto esta construção não aborda figuras abstratas. A democracia
suplanta a ordem classista, e tem representante da vontade popular o parlamento. A legalidade
torna-se regra fundamental, permitindo o encaixe perfeito das peças, como num silogismo. Por
trás deste raciocínio repousa o Estado monoclassista, onde há uma enorme distância entre a
sociedade e o poder uma vez que impera o elitismo exclusivo das representações em defesa de
interesses. A verdade axiomática de que somente a lei exprime a vontade geral tutela os
interesses particulares dos detentores do poder.
• A burguesia francesa tinha plena ciência da importância que o direito privado tinha e o seu
impacto sobre a esfera patrimonial. Ela enxergava o direito como uma forma de poder e por isso
o positivou, retirando sua produção da esfera social e trazendo para uma instância que poderia
influenciar. Este movimento traz a tona a dimensão autoritária do direito, uma vez que este se
separa do social fazendo surgir uma desconfiança do homem do povo em relação ao direito que
passa a representar algo estranho, um regramento que lhe é imposto. Perde-se a conexão da
fisiologia jurídica com a fisiologia social e o direito passa a ser uma potestade punitiva e
coercitiva do soberano. Para o autor o direito deve ser o espelho da sociedade, não uma
imposição a ela como uma realidade simples e unilinear. O direito foi pensado para o Estado, e
com essa prerrogativa o empobreceram.
• O direito do final do século XIX, reduzido a normas, formas e sanções, trouxe riscos associados.
A norma nessa perspectiva deve ser pensada como a vontade do mandatário no momento de
sua positivação, entretanto este paradigma de direito traz a tona a separação entre concepção
e aplicação da norma, o que por vezes faz a aplicação de um texto ir além e contra ele. Este
cenário conduziu a um formalismo jurídico, no qual Hans Kelsen foi proeminente protagonista
em decorrência de sua tecnicidade jurídica, de ser uma empreitada autenticamente intelectual
e da sua tentativa de separar o poder da norma ao adotar a via formal-normativa. Esta
separação, apesar de teorizada na prática não se observou.
• O autor vê o positivismo de Kelsen como sublimação do direito reduzido a normas e sanções,
tendo um efeito de empobrecimento sobre as relações sociais cotidianas. Defende em insistir o
direito como um ordenamento que presta contas com a realidade, organizando-a e não a
restringindo. Juristas são tidos como herdeiros do iluminismo, que por sua vez busca entender
e reduzir a complexidade do mundo. Para Luhman a paisagem jurídica era simples, centralista,
harmoniosa e, portanto, persuasiva, entretanto estas características lhe trazes vícios como
abstração e artificiosidade. O direito é povoado por modelos extraídos de um mundo irreal e
pré-histórico, perdendo-se a dimensão coletiva da sociedade que foi contraída na cristalização
estatal. No antigo regime havia protagonismo de famílias, clãs, associações e agregações sociais,
o que sacrificada pelo projeto individualista posterior. Lentamente no século XX floresceu uma
consciência mais ampla apta a recuperar estas forças coletivas, mas trata-se de uma difícil
conquista com poucos resultados em seus primeiros passos. Um exemplo disto foi o código civil
italiano de 1942 que reconheceu o fenômeno ainda que de forma reduzida, fazendo prevalecer
a forma contratual, e ignorando as sociedades intermediárias que esperaram até a constituição
de 1948 para serem reconhecidas. Ainda assim o direito é muito mais profundo na Itália que o
patamar alcançado pelas positivações uma vez que ele se desenvolve na sociedade, e parte dele
fica de fora da regulamentação positivada. Esta não correspondência do direito com o
ordenamento jurídico Estatal, segundo o autor, ocorre em todos os lugares, resultando numa
realidade pluri-ordenamental. O autor conclui que a paisagem jurídica é naturalmente complexa
e a idade moderna tentou encolhe-la num horizonte de modelos que sacrificam sua
complexidade, num observatório deformante que baseia a validade da norma no seu ato de
produção e a caracteriza como comando autoritário do titular do poder.
• A visão ordenamental de direito tem a possibilidade de reverter o quadro até então delineado
pois o ordenamento necessita da realidade, que será ordenada. Ele pode servir de mediador
entre a sociedade e autoridade detentora do poder. Traz consigo o rigor necessário ajustar e
compor o conflito entre fatos históricos e transformar em direito a realidade social. O direito
fruto deste ordenamento não é dócil por precisa respeitar a complexidade e pluralidade real, e
para se atingir uma unidade realizada mediante a ordem não é simples pois precisa comportar
as diversidades sem deixar se aniquilarem. Ressalta-se, entretanto, que os 2 séculos de
positividade do direito trazem muitos obstáculos ao ordenamento em decorrência de seu
conceito e práticas. Um exemplo notório disto é o artigo 12 do código civil italiano de 1942 que
fixa os limites da juridicidade identificando-os com os do Estado.
• Zaccaria convidou outros juristas para discutir sobre “Direito positivo e positividade do direito”
onde defende o funcionamento necessariamente plural para a positividade, buscando sua
ampliação. Este convite não foi substancialmente atendido pelos estudiosos do direito positivo
que se mantiveram envolvidos no manto protetor do normativismo legalista. Ele destacou a
dimensão hermenêutica como elemento interno, buscando aproximar o momento normativo e
o interpretativo. A norma deveria ser vista como um procedimento que não se cumpre com a
produção, mas que possui um momento subsequente de interpretação, como se estivesse
dentro da criação da norma. Para tanto os juristas não podem diminuir a importância da
interpretação, mas devem concebê-la como parte da vida da norma e entender que a
comunidade não possui um papel meramente passivo, admitindo uma pluralidade de sujeitos
que constroem o direito. O direito é mais que a aplicação de uma norma, ele é ordenamento e
sua autoridade reside em seus conteúdos à medida que faz uma leitura objetiva da realidade
num processo de racionalização do real.
• As leis são vistas como recipientes vazios que aceitam qualquer conteúdo (ex: leis racistas),
bastando que se respeite o processo formal de sua criação. Este panorama tem se modificado
lentamente. A Corte Constitucional italiana passou a fazer apelos à razoabilidade como limite da
ação legislativa. As mitologias não tem conseguido se manter diante das necessidades da
sociedade contemporânea. Substituição da legalidade formal por uma que leve em consideração
também o nível constitucional da legalidade, entendendo-se este como a expressão dos valores
que a sociedade carrega, superando-se assim a ideia que o direito é feito somente pelo
legislador. Não são necessárias leis e códigos minuciosos que carregam uma pormenorizada
regulamentação da vida econômica e social que corre o risco de permanecer letra morta,
rejeitada pela comunidade. A rapidez das transformações cotidianas exalta o primado da práxis,
com institutos modelados na prática cotidiana, especialmente no direito dos negócios, sendo
impossível ao legislador inovar, mas somente regulamentar o que já havia sido estabelecido.
• Polissemia da palavra código que tanto vem a tratar de constituições como a normas
fundamentais como o Código de napoleão, como endereça a sistematização legal de
determinado assunto a exemplo do código dos consumidores. Entre ambos os casos o elemento
ligante é que o código busca a estabilização do instável. Para os historiadores do direito existe,
porém, o Código que irrompe com determinado momento histórico, fruto de uma revolução
cultural que acaba com os fundamentos jurídicos até então vigentes, num ato de ruptura com o
passado, ele encarna um mito, ou símbolo, sendo o criado por Napoleão I. Em contraste se
coloca o Código Civil criado num momento pré-revolucionário que levou em conta institutos
cunhados e aplicados na práxis consuetudinária, aceitos e presentes na vida cotidiana. O direito
pré-revolucionário possuía 3 características marcantes: ele era transbordante ao não impor
margens vinculantes à sociedade, mas se formar de opiniões comuns (até mesmo aos juristas)
que se acumulavam e posteriormente eram impressas pelos tribunais em coleções; era pluralista
por estar em conexão com a sociedade e aberta à influência das mais diversas forças sociais; e
era extra-estatal, exceto pelas zonas que tratavam de soberania, sendo o Direito Civil, até a
edição do Código, extra-estatal. Esse cenário é apagado com a codificação que reduziu boa parte
do direito a um corpo de leis soberanas, sendo visto até como um ato de coragem, haja visto
que nem mesmo Luis XIV se aventurou a codificar o direito civil, por ter considerado que este
ramo permanecesse regulamentado pelos costumes. A historicidade do direito não atende ao
Príncipe, que rejeita sua complexidade como desordenada e confusa, revelando assim sua
filiação ao iluminismo. As normas são tidas como legitimamente pensadas como universais e
eternas, e adotando uma fundamentação jusnaturalista, o Código traduz uma leitura da
natureza das coisas, cuja legitimidade da leitura recai sobre o Príncipe, que se encontra num
patamar afastado dos conflitos e paixões, e portanto em condições de fazer uma leitura serena
e objetiva da realidade. O jusnaturalismo posteriormente vem desembocar no positivismo
jurídico e o código é reduzido à voz do soberano. Bodin afirma que ocorre então o dissídio
(continuado permeado por lutas e resistências, mas com vitória monárquica) entre a lei e o
direito, onde o primeiro representa a práxis consuetudinária que visa a equidade, e o segundo
representa a vontade potestativa do Príncipe. A idealização da figura do Príncipe reflete na
idealização de sua vontade que gera a imagem da cristalização normativa da lei, delineando-se
aí a mística da lei. Neste contexto a lei é a única fonte capaz de expressar a vontade geral,
fechando-se o sistema de fontes em uma ordem hierárquica entrando-se na época do monismo
jurídico. A divisão dos poderes vem contribuir a este cenário, fundamentando novamente o
monopólio jurídico nas mãos do legislador, o que no fundo é uma estratégia burguesa para a
conquista do poder político.
• A tipicidade impar do Código é um elemento que o distingue das demais fontes do direito. Ele é
a fonte unitária, espelho e fundamento da unidade de um ente estatal, além de ser fonte
completa e exclusiva. Ele se mostra como fruto extremo do comportamento geral da mística
legislativa, uma operação ideológico-cultural compacta, no topo de uma rígida hierarquia, que
reduz toda a experiência do sistema anterior extremamente articulado e minucioso. Há,
entretanto, Códigos que remetem ao direito medieval, como é o caso do ABGB (código civil
austríaco) que indica claramente influências do jusnaturalismo alemão e do direito da idade
média vivido no território germânico. Giorgio del Vecchio interpreta 3 das disposições
preliminares do código civil italiano de 1865 como provenientes do direito natural, uma vez que
há nelas margem para o preenchimento de lacunas legislativas. O código imperial germânico
possui brechas para que os juízes decidirem com base no mundo dos fatos. O Código Suíço surge
imerso numa realidade consuetudinária, dando ao juiz maior liberdade para absorver as
mensagens sociais. O código canônico ainda permite, em nome do princípio da equidade, que o
juiz não aplique uma norma escrita. O Código sempre realiza uma operação redutiva da
realidade, buscando a abstração e igualdade jurídica, tendo como protagonistas sujeitos
abstratos que possuem relações igualmente abstratas, sem a bagagem da carnalidade humana
que era própria do Antigo Regime ou fatos. A factualidade começa a ser discutida na Itália no
final do século XIX por civilistas em que sujeitos são pessoas reais. A abstração e a igualdade
formal mostram-se grandes armas da burguesia na defesa do código, e da abstração deriva a
incomunicabilidade (expressão em língua nacional, culta e literária, se afastando assim de
qualquer localismo e vernáculos acessíveis à compreensão popular) que este possui com a
comunidade. Esta característica tem como fonte o Estado monoclassista e como objetivo manter
dialogo somente com a burguesia que conduziu a revolução efetivando seus desejos sobre a
propriedade (código francês enfatiza a terra como objeto de propriedade) e livre circulação de
mercadorias. O único instrumento legal de caráter não estatal admitido passa a ser o contrato
entre privados. Nesse cenário o procedimento de normatização conclui-se em que a norma é
produzida, deixando-se a aplicação em um segundo plano de relevância, numa mentalidade
tipicamente iluminista, numa ideia de código que não concebe a possibilidade de incidência no
momento da aplicação. Os filões mais inovadores do século XX buscam uma valorização cada
vez maior da interpretação. Ballot-Beaupre elogia a codificação francesa em seu centenário
levando em conta as lacunas que possui o que dá oportunidade aos juízes franceses de
construírem seus significados.
• Autor questiona se o modelo de código ainda é atual. A transformação social antigamente era
lenta, o que mudou no cenário atual, obrigando o legislador a agir de maneira muito mais rápida,
modificando a norma pouco depois de sua produção. Em 1804 a complexidade da civilização
dava-se em um patamar reduzível, entretanto a complexidade da sociedade moderna se alargou
em todos os sentidos. A globalização também é um fator que causa dificuldade a novos códigos,
que se tornou lei nacional e nela se identificou. Quando o código nasceu surgiu a constituição
do estado burguês, na sequencia surgiram diversos níveis de códigos buscando regular o
disposto constitucionalmente, já no século XX surgiram constituições que regulavam até os
níveis mais concretos do direito, portadoras de um harmonioso sistema de valores. O autor cita
exemplos da lex mercatoria e do corpus iuris para demonstrar o problema da criação de códigos
para regular a realidade, na media em que esta demanda. Em sua opinião o código deveria ser
somente uma grande moldura, citando Rodota que defendia um código dos princípios. O autor
defende o repensar no sistema formal de fontes para torna-lo mais conforme à constituição,
repensando o papel da lei como uma moldura necessária à vida jurídica. Não se propõe a fixação
de linhas fundamentais pelo estado, mas o protagonismo dos indivíduos na organização jurídica
estatal, nos moldes das transformações sociais.
• Tendo em vista que o direito é uma ciência ordenadora, o jurista busca ordem nos elementos
da natureza social. Ele padece do mal de esquecer-se de relativizar no tempo e espaço o rico
conhecimento que seu objeto de estudo traz, caindo por vezes na tentação de absolutizá-lo
como verdade única. Neste ponto faz-se extremamente útil a figura do historiador do direito,
que atua como a consciência do jurista.
• O autor discorre sobre a mitificação feita em relação a revolução francesa nos tempos atuais,
questionando como é possível na idade contemporânea se mistificar eventos do passado.
Argumenta que o distanciamento do evento, o exame maniqueísta dos eventos, a crença em
relação ao fato histórico, o exílio da igreja ao interior de seus muros e o abandono das fundações
metafisicas contribuíram para este cenário. A mitificação deste momento histórico foi essencial
para sua duradoura observância, e ele se mostra como um laboratório mitológico aos olhos dos
historiadores.
• A revolução francesa durou mais de um quinquênio, possuindo diversas fases, sendo a mais
radical delas a em que se deu a construção de um modelo sócio-político-jurídico duradouro
armado com uma couraça de mitificação extremamente sólida construída pelo jacobinismo,
num discurso que permaneceu intacto por séculos, constituindo-se obstáculo para livre
adequação do direito ao longo do tempo. Há a ideia de Estado transformador da sociedade e
modelador do povo que desconfia do social por não poder controlá-lo e confia na classe política
organizada em partidos. Tem-se então um direito monista produzido unicamente pelo aparelho
estatal, caracterizado pela assembleia de representantes populares que atua em nome do povo,
que por sua vez assiste a tudo passivo, sem poderes, mecanismos de controle ou censura. O
direito se resume à lei, única fonte que exprime, na concepção da época, a vontade popular,
com todos os cidadãos considerados abstratamente iguais. O Estado jacobino não é neutro,
possui princípios ortodoxos e defende verdades indiscutíveis, fabrica conclusões que não devem
ser criticadas, apenas cridas.
• O movimento jacobino ocorre de forma organizada recolhendo ideais e convicções iluministas
colocando o Estado como único produtor do direito e a lei como única fonte. A lei passa a ser o
instrumento ordenador da sociedade e o legislador um agente idealizado voltado à felicidade
pública. O importante era que a lei fosse criada pelo devido processo formal, estando seu
conteúdo então confiado, uma vez que foi produzido pelo legislador, o que se mostrou fonte de
abusos tanto em democracias burguesas como em regimes totalitários. Surgiu um cenário com
somente 2 protagonistas, o individuo e o Estado, cenário que expurgava toda a complexidade
pretérita das relações sociais, e deixava tudo simples, como em linhas geométricas. Ignorava-se
que a complexidade significava história de princípios, regras instituições, etc. O novo modelo
deveria abstrair todo este contexto em generalizações a formar um sistema unitário e coerente.
Como resultado positivo atingia-se a coerência racional, ao custo de ocultar misérias e
vergonhas naturais à história de um povo. O explica que não está a elogiar o antigo regime, pois
o reconhece como caótico e permeado por iniquidades era, numa sociedade desigual que
possuía lugares perversos socialmente aceitos, entretanto fruto de tradição milenar
sedimentada através dos costumes onde havia a contemplação desencantada do indivíduo de
carne e osso que era incluído no ventre da sociedade. Neste sentido Edmund Burke critica o
movimento francês que entendia simplificar demasiadamente a realidade, descartando o
passado e toda sua riqueza.
• O autor defende que o reducionismo positivista deve ser premissa para avaliação da “Carta dos
direitos fundamentais da União Europeia”, agora parte integrante da Constituição Europeia. Já
o Tribunal de Justiça da União tem realizado referência constante às tradições constitucionais
comuns, concretizando uma experiencia viva à identificação judiciaria de diversos direitos.
• A redução do direito em cartas é peculiar à história do direito moderno, em uma suprema ilusão
em um movimento otimista. Os Códigos são manifestações da atividade redutiva a partir do
século XIX, aprisionando o direito em página de um livro em uma rede de regras. No ano de 2000
a carta de Nice segue este mesmo caminho, enrijecendo e imobilizando o modo de agir do
Tribunal, e posteriormente sendo incorporada à constituição europeia. Santi Romano defende
que as constituições devam ser meros índices não completos de um código infinitamente mais
amplo.
• O individualismo que domina a carta de Nice mostra sua herança iluminista, com recorrentes
menções ao indivíduo. Sua concepção como um ser isolado e abstrato, sem contexto ou
carnalidade histórica, de pouca humanidade, que não é pessoa por não estar inserido em
nenhum feixe de relações, sujeito não comunitário. A dicotomia do quanto mais se tem mais se
é sobre a qual se articula a civilização burguesa não traz menos anonimidade ao indivíduo na
Carta de Nice, pois ela não considera seu peso patrimonial.
• O autor enxerga o indivíduo cimentado na dimensão econômica e por isto o considera um ser
egoísta, que toma como premissa o lucro para orientar seu relacionamento com os demais,
buscando sempre a satisfação pessoal, e resultando numa característica psicológica de
insularidade. Suas liberdades são afetadas pela insularidade, uma vez que numa ilha deserta um
homem não se considera livre, pois encontra-se num vazio social. As liberdades não podem ser
construídas sobre um molde individual, somente sobre o coletivo pois somente nele elas se
mantêm.
• Segundo o autor a Carta de Nice projeta a dimensão coletiva do sujeito de forma insuficiente,
numa tradição jurídica e politica burguesa que hostiliza a coletividade onde o sujeito possa a vir
encontrar condicionamentos a sua liberdade. Durante a revolução foram anuladas as sociedades
intermediarias, fato que tem raízes na mitologia individualista. A redução da complexidade
sócio-política ao binômio sujeito-Estado sacrificou a riqueza plural da sociedade, tornando-a
inexpressiva, o que tem sido atualmente mitigado pelo pensamento do individuo dentro do
tecido social.
• A tradição católica teve o mérito de manter a confiança nas sociedades intermediárias, um apelo
a revisão do estatalismo. Os últimos 200 anos foram dominados pela estatolatria apresentando
o Estado moderno como uma conquista, a racionalização de forças sociais, sem que houvesse
crítica a seu processo de formação. Passou a ser político somente o que se ligava ao Estado,
empobrecendo-se assim este conceito. Este modelo de Estado não tolera a sociedade
intermediária porque ela torna o terreno social acidentado e fragmentado, ele harmoniza-se ao
indivíduo pois em decorrência de sua projeção econômica não tem pretensões políticas, mas
não com a pessoa porque esta representa um risco por sua natureza relacional comum a
criaturas não anônimas. Devido a sua compactação, o Estado apresenta forte insularidade, razão
pela qual não foi possível um projeto unificador transnacional europeu mais amplo. A Carta de
Nice não leva em consideração a dimensão coletiva do sujeito.
• Além da dimensão coletiva, a social também não recebe satisfatório espaço na Carta de Nice. O
contraponto direito/dever é o que possibilita a socialização do indivíduo e sua inserção em uma
relação mais complexa, transformando-o numa criatura carnal. A Carta faz somente uma
menção genérica a deveres em seu preambulo, sendo estranha a responsabilidades ao longo de
seu texto. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias realizou uma identificação por via
judiciaria de direitos fundamentais embasando-se no direito vivo europeu. O conselho de
Colônia (1999) foi pelo caminho contrário, fixando estes direitos lentamente descobertos em
uma Carta, que ficou imóvel no tempo. Esta Carta mostra-se como último elo de ligação aos
eventos de 1789, levando a crer que o fio que liga a Europa às soluções do grande evento
revolucionário nunca se interrompeu.
• O autor mostra-se repetitivo ao longo do livro, trazendo repetidamente o mesmo conteúdo e
ideias, pouco modificando suas formas de exposição.
• É compreensível o ponto de vista do autor em sua concepção de direito medievo como um
direito social, no qual o popular tem participação ativa na criação e aplicação, deixando ao
direito estatal somente aspectos mais genéricos e concernentes a outras áreas do direito que
não a social e civil.
• Todavia o caráter histórico do direito por ele defendido tomou lugar em uma época de forte
descentralização demográfica, onde fazia sentido as pequenas sociedades se auto organizarem
socialmente, sem normatividade social comum a toda uma população. Já no contexto atual de
adensamento populacional e de extrema mobilidade geográfica questiona-se a viabilidade de
um projeto deste tipo.
• É certo que se faz cada vez mais necessária a participação popular nos rumos do direito,
participando de sua produção e entendendo a interpretação utilizada em sua aplicação a fim de
melhor se auto organizar, entretanto não se vê no texto propostas ou exemplos que como isto
poderia se materializar.
• O texto apresenta diversos problemas do direito moderno e contemporâneo, numa visão quase
que romântica (apesar do autor afirmar que não) do direito medievo, entretanto furtando-se de
apontar algum tipo de direcionamento para mudança de paradigma, mas somente exemplos
pontuais e isolados de pontos de vista que vão ao encontro do direito nos moldes medievais tão
exaltado.
• A reflexão causada pelo autor sobre outro tipo de direito mostra-se importante ao aluno de
direito a fim de lhe dar um panorama mais amplo e rico das possíveis manifestações do direito,
que muito podem divergir da concepção clássica que tomam importante espaço no imaginário
popular sobre a origem do direito.

Vous aimerez peut-être aussi