Sérgio, 60 anos, tabagista com carga tabágica de 35 maços/ano, com
passado de para tuberculose pulmonar tratada há 5 anos. Desde então vem apresentando tosse produtiva, principalmente pela manhã, com expectoração esbranquiçada e, às vezes, purulenta, fazendo uso frequente de antibioticoterapia. Há cerca de 9 meses, começou a apresentar episódios esporádicos de eliminação de sangue vivo pela boca em pequena quantidade, precedido de tosse. Procurou serviço médico, sendo informado que o sangramento era decorrente de “cicatriz” da tuberculose. Vem notando emagrecimento de 5 Kg nos últimos 3 meses, sem perda do apetite e o sangramento passou a ser diário, às vezes só expectoração com raias de sangue, às vezes sangue puro. Ontem, após acesso de tosse, apresentou sangramento de mais de 600ml, com dispnéia intensa, sendo levado por familiares ao Pronto Socorro. O plantonista passou uma sonda nasogástrica achando que se tratava de uma hemorragia digestiva. Durante o atendimento o paciente apresentou novo sangramento e veio a falecer.
Discussões
Conceito
Hemoptise é a expectoração sanguínea ou sanguinolenta proveniente de
hemorragia na árvore traqueobrônquica ou no parênquima pulmonar, ou seja, é a expectoração de sangue originado de vias aéreas inferiores, abaixo da glote.
Classificação
É importante classificar a hemoptise saber a gravidade do caso. A
hemoptise ode ser classificada em maciça ou não maciça baseando-se na quantidade de sangue eliminado. O termo hemoptise maciça é reservada para o sangramento que ocasiona ameaça aguda à vida, no entanto não há uma definição uniforme para essa categoria. Diferentes critérios e valores são utilizados para defini-la, e variando desde perda sanguínea maior de 100 ml a mais de 1000 ml no período de 24 horas. Algumas literaturas consideram hemoptise maciça acima de 600ml, sendo o intervalo entre 100ml e 600ml, considerado de volume moderado. Sem tratamento imediato, a hemoptise maciça apresenta taxa de mortalidade de 50- 100%. É importante a gente atentar que quando a gente fala de uma perda de 600 ml, é praticamente uma doação de sangue, ninguém sai de uma doação de sangue em choque ou hemodinamicamente instável. Então, a hemoptise maciça pode nem causar alguma alteração cardiovascular, não ter hipotensão, não ter taquicardia, porque não há uma depleção de volume intravascular suficiente para causar isso. Só que essa quantidade de volume dentro da via aérea respiratória ocupa os alvéolos, ocupa a área de troca gasosa com essa quantidade de líquido, não fazendo mais troca gasosa, e ele morre de insuficiência respiratória, e não de choque circulatório, como na hematêmese.
É importante diferenciar também da pseudohemoptise, que é quando o
sangue não vem da via aérea inferior, podendo ser do trato digestório ou da via aérea superior, como por exemplo, algum sangramento de seio paranasal ou de corneto posterior que começa a gotejar e a pessoa aspira esse sangue e depois faz a expectoração por meio da tosse.
Epidemiologia
A depender da causa há uma maior proporção em homens, normalmente.
Tem um trabalho que diz que há um maior risco de hemoptise nos meses inverno, porque a gene teria um clima mais frio e seco que irritaria mais a mucosa do trato respiratório propiciando infecção, pneumonia, aumento de risco de infecção tanto de via aérea superior e inferior, sendo a inferior uma causa de hemoptise. E dependendo de cada causa a gente vai ter uma faixa estaria que vai acometer mais, em crianças uma causa relevante seria a aspiração de corpo estranho, o câncer numa faixa acima dos 60 anos, e doenças infecciosas entre os 20 aos 50 anos.
Etiologia
A circulação pulmonar é feita tanto da artéria pulmonar que sai do
ventrículo direito e que leva o debito cardíaco do coração direito para o pulmão, essa circulação é a maior parte da circulação pulmonar, que é uma circulação de baixa pressão quando comparada com a circulação pulmonar que vem da artéria brônquica, ramo da aorta, que recebe sangue sob alta pressão. A gente vai ter menos sangramento relacionado a esta, mas o sangramento relacionado a causas que vem da circulação brônquica tem uma chance muito maior de hemoptise maciça, com maior mortalidade. Nos casos em que há vasoconstrição por hipóxia, trombose intravascular, vasculite e inflamação crônica dos pulmões ocorre liberação de fatores de crescimento angiogênicos, que promovem neovascularização e surgimento de circulação colateral dos vasos adjacentes. Esses novos vasos, geralmente de paredes finas e frágeis, estão expostos a maiores pressões arteriais sistêmicas e mais propensos a sofrer ruptura, resultando em hemoptise. É importante o exercício dos diagnósticos diferenciais e alternativos à hemoptise, como hematêmese, epistaxe e estomatorragia.
Causas
Tuberculose, tanto ativa quanto suas complicações. Então, na
tuberculose ativa tem o Micobacterium proliferando e comendo o pulmão, levando o processo inflamatório infeccioso, aquilo vai fazer uma lesão, vai levar a uma necrose pulmonar naquela região e então, quando for eliminado com a tosse, pode eliminar sangue junto. E entre as sequelas da tuberculose, temos o aneurisma de Rasmussen, que seria a evidencia de algum vaso sanguíneo na parede da caverna, e aquilo tem uma chance muito maior de erodir e ter um sangramento. Outra complicação seria a bola fúngica ou miscetoma, causada principalmente pelo Aspergilus, que pode infectar, colonizar e proliferar em uma caverna e formar uma bola de fungo e esse processo pode erodir a parede e causar sangramento, e por último, a bronquiectasia, que uma das principais causas de hemopstise, atualmente. Antigamente era tuberculose ativa, mas com o tratamento ela diminuiu bastante em incidência. Bronquiectasia é quando a gente tem infecção de repetição do parênquima pulmonar, o brônquio sofre um processo de inflamação e cicatrização, assim o brônquio vai dilatando e se espessando, tendo dilatações e estreitamentos da parede do brônquio, e na região das dilatações há uma dificuldade de batimento ciliar, podendo causar acúmulo de secreção e infecção, gerando hemoptise. No raio x forma-se uma imagem muito parecido com um favo de mel. Câncer de pulmão, bronquite, pneumonia, abcesso pulmonar, podendo vir acompanhada por vômica, bronquioaspiração, coagulopatias por uso de medicamentos ou não, endocardite de coração direito, principalmente, de válvula tricúspide ou pulmonar que vai cair no pulmão, levar um êmbolo séptico e começar a fazer necrose de parênquima pulmonar, e normalmente a lesão é múltipla, com várias imagens de infiltrado pulmonar ao raio-x. Endometriose pulmonar, que seria a presença do endométrio no pulmão e o que chama a atenção é que se trata de uma hemoptise que tem uma relação com o ciclo menstrual. Tromboembolismo pulmonar, ocasionado por uma trombose venosa profunda, com deslocamento do trombo, que volta pelo retorno venoso, passa pelo átrio e ventrículo direito, artéria pulmonar e pulmão, apresentando sintomatologia com dispneia, dor pleurítica, tosse e febre baixa. No raio x pode aparecer na região do infarto do pulmão, isquemia e posterior necrose, podendo haver uma imagem de um triangulo invertido, com uma pobreza de vascularização na região, assim como, presença de infiltrado pulmonar. Trauma contuso, aberto, fechado, por acidente, por corpo estranho, secundário a procedimentos cirúrgicos, a implante de cateter e, principalmente, relacionado a intubação de via aérea, a traqueostomia, a ventilação mecânica sob pressão positiva, gerando barotrauma. Doenças autoimunes como: o Lupus Eritematoso Sistêmico, mais frequente no sexo feminino e em idade fértil, apresentando febre, artralgia, artrite, FAN positivo, além disso, o Lupos pode dar uma endocardite asséptica, conhecida como Libman-Sacks; o Síndrome de Goodpasture, onde o nosso organismo começa a produzir anticorpo contra a membrana basal do glomérulo e reage também com a membrana basal do alvéolo, então é um paciente que vai se apresentar com glomerulonefrite progressiva e hemoptise; o Granulomatose de Wegener, uma vasculite que pega principalmente, epitélio de via aérea superior e inferior, então, na anamnese, a gente vai ter um paciente, normalmente de mais idade, com história de sinusopatia de repetição e hemoptise. Artrite Takayasu, podendo causar fístula aortopulmonar Leptospirose, com vasculite secundária a leptospira, causa de síndrome pulmão rim. Uso de cocaína e, inclusive, droga injetável causando endocardite do lado direito. Causas cardíacas: insuficiência cardíaca, insuficiência ventricular esquerda, estenose de válvula mitral, que leva aumento de pressão da circulação pulmonar. O paciente joga para fora um sangue diluído em um liquido rosado que lembra muito edema agudo de pulmão.
Diagnóstico
Começa pela anamnese e exame físico. As características importantes
para perguntar sobre o sangramento seria a coloração do sangue, sendo mais comum um sangue vermelho vivo, associado com secreção, com liquido espumoso, que indica estar vindo de uma região aerada, outro aspecto avaliado seria o odor, já que na hematêmese poderia haver odor de vômito, a associação com a tosse, se eu tiver falando de hematêmese seria mais comum ser precedido por náuseas e vômitos, e na hemoptise poderá ter um PH mais básico comparado a hematêmese. No exame físico, deve realizar ausculta pulmonar para avaliar se há alguma patologia pulmonar associada, avaliar presença de edema assimétrico de membros inferiores, exame cardiovascular para pensar em insuficiência cárdica, alteração valvar e endocardite; avaliar cianose; exame abdominal para exclusão de hematêmese; presença de febre como indicativo de infecção ou TEP. Para pensar em doenças autoimunes podemos avaliar a presença de púrpuras e petéquias em membros inferiores. Petéquias para pensar, também, em plaquetopenia, equimoses, hematomas e sangramentos em outros locais para pensar em coagulopatias. Toque retal para descartar diagnóstico diferencial. Nos exames complementares, não haverá alteração significativa no hemograma, as doenças por si só causarão alteração no hemograma, dificilmente haverá anemia, poderá haver leucocitose com desvio a esquerda para pensar em infecção, e plaquetopenia, em casos de coagulopatias. Cultura, baciloscopia, exame de escarro para investigação de infecção, bronquioscopia, e, principalmente, raio x, para ver se no raio x há alguma alteração que justifique a hemoptise e avaliar de onde vem o sangramento e extensão do acometimento da lesão. Caso o raio x não consiga estabelecer um diagnóstico podemos abrir mão de tomografia de tórax, ressonância e broncofibroscopia, que além de diagnóstica pode ser terapêutica. Qualquer hemoptise é uma emergência médica, porque não temos como predizer a chance da recidiva da hemoptise.