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AUTARQUIA EDUCACIONAL DE AFOGADOS DA INGAZEIRA

FACULDADE DO SERTÃO DO PAJEÚ- FASP


CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

JÉSSICA NAYARA SILVA

O DISCENTE NEGRO NA ESCOLA CONTEMPORÂNEA: UM ESTUDO


SOBRE O PROCESSO IDENTITÁRIO NA ESCOLA LEVINO CANDIDO

AFOGADOS DA INGAZEIRA-PE
2019
AUTARQUIA EDUCACIONAL DE AFOGADOS DA INGAZEIRA
FACULDADE DO SERTÃO DO PAJEÚ- FASP
CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

JÉSSICA NAYARA SILVA

O DISCENTE NEGRO NA ESCOLA CONTEMPORÂNEA: UM ESTUDO


SOBRE O PROCESSO IDENTITÁRIO NA ESCOLA LEVINO CANDIDO

Trabalho de conclusão de curso/Monografia, apresentada ao


curso de licenciatura em Pedagogia da Faculdade do Sertão do
Pajeú, sob orientação da professora Juliana Carlinda Silva
Ferreira como requisito parcial para obtenção do título de
licenciatura em pedagogia.

AFOGADOS DA INGAZEIRA-PE
2019
Quem é que não se lembra
Daquele grito que parecia trovão?!
– É que ontem
Soltei meu grito de revolta.
Meu grito de revolta ecoou pelos
vales mais
Longínquos da Terra,
Atravessou os mares e os oceanos,
Transpôs os Himalaias de todo o Mundo,
Não respeitou fronteiras
E fez vibrar meu peito...
Meu grito de revolta fez vibrar os peitos de todos os
Homens,
Confraternizou todos os Homens
E transformou a Vida...
... Ah! O meu grito de revolta que percorreu o
Mundo,
Que não transpôs o Mundo,
O Mundo que sou eu!
Ah! O meu grito de revolta que feneceu lá longe,
Muito longe,
Na minha garganta!
Na garganta de todos os Homens.

Amilcar Cabral, emergência da poesia em Amilcar


Cabral:30 poemas
AGRADECIMENTOS
RESUMO

Este trabalho de conclusão de curso traz como proposta analisar as relações étnico-
raciais e o processo de construção identitária dos discentes da escola Levino
Cândido, no Leitão da Carapuça de Afogados da Ingazeira-PE. Visto que esse tema
é de suma importância, é pertinente que saibamos na integra o significado do
conceito de Identidade, e sua influência nas relações intrapessoais e interpessoais
das pessoas negras. Procurei utilizar conhecimentos de cunho histórico já que
perpassei um olhar para a escravatura, indicando um provável surgimento do
racismo nessa época, como também fiz uma breve analise sobre a origem da
palavra raça e o conceito de racismo e suas implicações na construção identitária do
sujeito, utilizei sociólogos como Florestan Fernandes, Stuart Hall e outros, que
contribuíram de forma satisfatória no embasamento teórico desse trabalho. O
racismo é um processo sistemático de discriminação que tem a raça como
fundamento para atribuírem desvantagens e privilégios para determinados
indivíduos que pertencem a raças que não estão dentro das normas e padrões do
branco europeu. A partir disso é possível constatar que é necessário um olhar
aprofundado sobre aquilo que chamamos de naturalização do racismo, e como se
desenvolve e se solidifica a identidade das pessoas negras ao longo da sua história.

Palavras-chaves: Racismo; Raça; Estrutural; Conservadorismo; Identidade.


ABSTRACT

This course conclusion paper proposes to analyze the ethnic-racial relations and the
process of identity construction of the teachers of Levino Cândido school, in the
Carapuça da Afogados da Ingazeira-PE. Since this theme is of paramount
importance, it is pertinent that we fully understand the meaning of the concept of
Identity, and its influence on the intrapersonal and interpersonal relationships of black
people. I tried to use historical knowledge since I looked at slavery, indicating a
probable emergence of racism at that time, as well as a brief analysis on the origin of
the word race and the concept of racism and its implications on the identity
construction of the subject, I used sociologists such as Florestan Fernandes, Stuart
Hall and others, who contributed satisfactorily in the theoretical basis of this work.
Racism is a systematic process of discrimination based on race as the basis for
assigning disadvantages and privileges to certain individuals belonging to races that
are not within the norms and standards of European white. From this it can be seen
that it is necessary to take a deep look at what we call the naturalization of racism,
and how it develops to solidify the identity of black people throughout their history.

Keywords: Racism; Breed; Structural; Conservatism; Identity.


SUMÁRIO
INTRODUÇÃO

O Presente trabalho, tem como finalidade apresentar informações sobre o


discente negro na escola contemporânea: um estudo sobre o processo identitário na
escola Levino Cândido. Tendo em vista a importância e CONSTANTE atualidade É
imprescindível uma discussão aprofundada sobre Identidade e como a mesma se
constrói, SOBRETUDE SE PENSARMOS NA POPULAÇÃO NEGRA visto que É DE
GRANDE RELEVÂNCIA SOCIAL E ESCOLAR A IMPORTANCIA A CONSCIÊNCIA
RACIAL COMO UM IMPORTANTE MOVIMENTO PARA O ENFRENTAMENTO AO
RACISMO DIÁRIO, QUE É INSTITUCIONAL, HUMORÍSTICO, SOCIAL, BEM
COMO REVERBERA EM OUTRAS PRÁTICAS VIOLADORAS COMO O
MACHISMO, O SEXISMO, A HOMOFOBIA ETC.
A NECESSIDADE dos indivíduos em identificar-se, seja em grupos ou em
segmentos, É FATO. OS GRUPOS SÃO CONSTRUÍDOS A PRIORE POR
ELEMENTOS QUE OS APROXIMAM E QUE AO APROXIMAREM-SE
CONSTRUEM TAMBÉM ELEMENTOS SOCIAIS REPRESENTANDO COSTUMES,
CULTURA, IDEIAS, VALORES, ETC.
Dentro dessa perspectiva se tornou fundamental analisar as relações étnico-
raciais e como se dá o processo de construção da identidade negra NA ESCOLA
Levino Cândido, QUE DE FORMA PROPOSITAL FOI SELECIONADA PARA FAZER
PARTE DESTE ESTUDO, UMA VEZ QUE ESTA instituição está localidade em uma
comunidade remanescente DE quilombola, E esperaVA-se que a mesma PUDESSE
CONSTRIBUIR PARA A construa DA CONSCIÊNCIA RACIAL e RESSIGNIFICA-SE
o protagonismo e o pertencimento dE alunos E DE nos diversos espaços.
O TRABALHO ESTÁ SENDO DIVIDIDO EM 03 capítuloS. No primeiro Commented [U1]: MENCIONAR OS SUBTÓPICOS

capitulo SERÁ abordado “Uma questão de identidade”, ajudando a identificar o que


é identidade e como a mesma foi evoluindo de forma cultural ao longo do tempo. No
subtópico 1.1. será abordado sobre “CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO
DE IDENTIDADE”, no 1.2. A INTERSECIONALIZAÇÃO ENTRE IDENTIDADE E
CLASSE e no 1.3. QUAL O LUGAR DO NEGRO/NEGRA NA SOCIEDADE
BRASILEIRA? INVISIBILIDADE? INDISSIBILIDADE? PARA A ORGANIZAÇÃO
DESTE CAPÍTULO OS AUTORES necessários para apresentar à temática SÃO
FERNANDES (1960), CIAMPA (1987), Levi- Strauss (1952), Nascimento (1914) e
Stuart Hall (1932).
No segundo capitulo, TEM COMO TEMÁTICA A SOCIOLOGIA DO
CURRICULO. A partir de uma breve análise histórica da construção do currículo, SE
FARÁ NECESSÁRIO fazer alguns apontamentos sobre o mesmo, BEM COMO a
sua função e seu impasse perante a escola conservadora tão discorrida por Pierre
Bourdieu. O currículo, por exemplo, quando pautado através dos ideais elitistas, Commented [U2]: QUAIS OS AUTORES PARA ESTE
CAPÍTULO.
podem representar um meio de propagação da estratificação social e das
desigualdades raciais, inclusive EYNG (2010) apresenta os perigos do currículo para
a formação Identitária quando os mesmos são fundamentados em relações de
poder.
Vários autores foram apresentados para que pudesse haver um maior
entendimento sobre a função e as implicações do currículo nos espaços escolares,
teóricos como Bourdieu (1964) Passeron (1930), Durkheim (1858), Eyng (2010)
Lawton (1975) e Silva (2009) mostraram como o currículo pode interferir ou ajudar
no espaço escolar a partir de como o mesmo é construído, ora se em um viés
elitista, inibe os grupos sociais menos favorecidos, e se em um viés critico, constrói
identidades. Foi a partir desse entendimento que foi possível transcorrer para 3º
parte desse trabalho: a pesquisa de campo.
Presente no 3º capitulo, a pesquisa de campo se fez importante para a
construção do mesmo. De abordagem social e qualitativa esse objeto de estudo teve
como precursor a escola Levino Cândido como base de pesquisa. Foram elaboradas
entrevistas semiestruturadas e questionários abertos para compor a análise das
práticas pedagógicas da escola, com o objetivo de identificar como se dá o processo
de construção identitária dos alunos, e se a mesma é construída no âmbito escolar
ou em outros espaços fora da escola.
A partir das respostas dos alunos foi composta no 3º capitulo uma análise
dos dados apresentados, como também uma breve explanação sobre a importância
da modalidade da pesquisa social para entender as diversas implicações e
problemáticas presentes na sociedade. Sendo a pesquisa social essencial para a
construção da abordagem, Cruz (1994, p.51) afirma que:

Em ciências sociais, tendo como referência a pesquisa qualitativa, o


trabalho de campo se apresenta como uma possibilidade de conseguirmos
não só uma aproximação com aquilo que desejamos conhecer e estudar,
mas também de criar um conhecimento, partindo da realidade de presente
no campo.

O que necessariamente foi essencial para a conclusão da problemática desse


trabalho, a pesquisa de campo contribuiu para os resultados, visto que foi a partir
das indagações e das respostas dos alunos que se tornou possível analisar e
comparar as respostas com os conceitos dos autores e assim, descobrir se
realmente a escola contribui na formação identitária do aluno. A partir da relevância
desse estudo, se faz interessante descobrir ao longo deste trabalho as relações
entre os brancos e os negros em sociedade, como também contribuir na educação
com um novo olhar acerca do currículo e das práticas pedagógicas em sala de aula.
1. UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE.

1.1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE IDENTIDADE.

Muito se tem discutido, recentemente, acerca do conceito de identidade, seu


significado, a forma que esse termo deve ser empregado e o que necessariamente é
fundamental na construção da mesma, tendo em vista isso, é necessário dizer que
discutir identidade é discutir transformação, visto que não existe uma identidade
definitiva ou estável, e sim uma metamorfose ao longo dos anos, que pode ser
baseada tanto no espaço dado, como no tempo vivido.
A identidade não sendo um conceito fixo então, caracteriza-se pelas mudanças
e modificações realizadas no ser humano desde a hora do seu nascimento, e que
determinarão a compreensão quem ele é como indivíduo. Construída a partir do
social e da vivência, as identidades se realizam e se desenvolvem a partir das
interações entre os sujeitos e o contexto inserido, geralmente, em uma sociedade a
identidade de um indivíduo estará relacionada a de outros indivíduos, e assim
sucessivamente.
Amplamente difundida, a identidade é fruto de uma ligação entre as relações
pessoais, o contexto social e histórico, e a história do indivíduo, ou seja, seus
projetos e o conhecimento da importância de si próprio para a constituição da
sociedade. Quando analisasse todos esses fatores para a construção da mesma,
entende-se que a questão de identidade é uma questão política e está muito
vinculada a condições históricas, visto que ela sempre esteve entre as relações de
poder e conflitos ao longo do tempo.
Segundo Ciampa (1987):

Uma política de identidade do Homem da nossa sociedade, a realização de


tais projetos, para ser coerente com seus propósitos há de ser feita
coletivamente e de forma democrática (entendida aqui como forma
racional). A questão se coloca como uma questão prática e como tal deve
ser enfrentada, conscientemente por nós – cada um de nós, todos nós
(p.74)

A política de identidade como afirma o autor deve ser construída acerca de


uma unanimidade que abranja a todos, tanto coletivamente como
democraticamente, e esse conceito baseasse tanto na identificação como na
compreensão de como o indivíduo se constitui, visto que o primeiro contato com a
construção identitaria ocorre a partir da identidade primaria, onde são formadas no
início da vida as primeiras impressões de ser atuante.
Ao longo do tempo, percebemos que a formação dessa questão identitária
sempre foi pautada na imagem e nas relações sociais dos indivíduos, e são essas
representações dos grupos sociais onde circularam no meio social que produziram
significados e consequências, tanto que algumas dessas representações ganharam
maior visibilidade em detrimento de outras, o que influenciou de maneira negativa
nas relações étnico-raciais atualmente no Brasil.
Essas relações que sempre foram marcadas por ligações de poder e interesses
dominantes de uma cultura eurocêntrica, passaram a ser representadas por um
modelo a ser seguido, visto que a mesma instituiu desde a época da colonização o
sentido de “normalidade” e “anormalidade” entre as pessoas. O modelo eurocêntrico
sempre foi o homem, branco, cristão, heterossexual e economicamente bem-
sucedido, tudo que fugisse dessa “normalidade” seria visto como um abjeto, um
corpo a ser excluído da sociedade.

“O abjeto designa aqui precisamente aquelas zonas “inóspitas” e


“inabitáveis” da vida social, que são, não obstante, densamente povoadas
por aqueles que não gozam do status de sujeito, mas cujo habitar sob o
signo do “inabitável” é necessário para que o domínio do sujeito seja
circunscrito. ” BUTLER, Judith. Corpos que pesam: sobre os limites
discursivos do “sexo”. In: LOURO, Guacira Lopes (org.). O corpo educado.
Pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2000, p. 155.

Segundo Butler (2000)1 as evidencias corporais sempre foram elementos


utilizados para a determinação das pessoas “habitáveis” e aceitas em sociedade,
como também principal determinador na naturalização das identidades. A abjeção
social citada pela mesma foi propagada a partir do fim do século XIX, onde o
africano escravizado e seus descendentes passaram a ser considerados um abjeto
por causa de suas marcas e características corporais. O corpo aqui passa a ser
determinante daquilo que se é ou do que se deve ser, de acordo com Judith.

1
Sabendo que Judith Butler é uma filosofa que discorre principalmente sobre questões como feminismo e
teoria queer, é importante ressaltar que utilizei o seu discurso de corpos abjetos para ressaltar como a
sociedade utilizou-se da cor da pele para determinar o sujeito, e de como os corpos abjetos utilizados pela
autora também se aplicam em relação as pessoas negras, ora marginalizadas e oprimidas.
Todos esses fatores afetam e desfalcam a construção de uma identidade que
realmente abranja todos de maneira igualitária, e é exatamente essa questão que
interfere de maneira tão negativa na perspectiva identitária da pessoa negra, pois no
que tange esse processo de construção, vemos que as opressões sofridas e as
inúmeras representações de imagens eurocêntricas levaram a pessoa negra a
negação de si próprio; sua cor, sua ancestralidade e sua cultura para se adequar ao
modelo lhes imposto.
Modelo esse que resultou em uma imagem estereotipada do negro que foi se
propagando ao longo dos séculos, e acabou acarretando em uma identidade
desfalcada e inferiorizada, tanto nas relações socioeconômicas como culturais.
Reflexo sempre dessa padronização europeia, branca e heteronormativa, a cor da
pele e as peculiaridades do negro foram culturalmente desvalorizadas.
Segundo Ferreira (2009, p.41) “A elite brasileira auto identifica-se como
branca. Assume as características do branco-europeu como representativas de sua
superioridade étnica. Em contrapartida, o negro é visto como o tipo étnico e
culturalmente inferior”. O modelo ideal a ser seguido é o modelo do branco-europeu,
seja nas vestimentas, na religiosidade ou na cultura, visto que as pessoas que
possuem uma classe econômica superior são brancas. Ferreira deixa claro no seu
discurso o fato da influência dessa classe econômica ser tão prejudicial aos negros,
tanto que as relações serão moldadas a partir das mesmas.

“Além dos órgãos de poder, o governo, as leis, o capital, as forças


armadas, a polícia- as classes dominantes brancas têm a sua disposição
poderosa implementos de controle social e cultural: o sistema educativo, as
várias formas de comunicação de massas- a imprensa, o rádio, a televisão-
a produção literária. Todos esses instrumentos estão a serviço dos
interesses das classes no poder e são usados para destruir o negro como
pessoa e como criador e condutor de uma cultura própria. ”
NASCIMENTO, Abdias do, O genocídio do negro brasileiro: processo de
racismo mascarado/ Abdias Nascimento. 3.ed. São Paulo: perspectivas,
2016.

Como afirma Abdias Nascimento (1914, p. 112), os interesses de poder


sempre foram utilizados para denegrir a imagem dos negros, seja na mídia, onde os
mesmos sempre representaram um papel subalterno, como de empregadas
doméstica, ladrões ou escravos, seja na escola, onde nos currículos escolares o
espaço destinado para a história da África é mínimo considerando toda a influência
afro-brasileira presente no país.
Esse processo de desqualificação sistemática para com as pessoas negras,
criaram referencias preconceituosas e estigmatizantes2 tanto no âmbito físico, na
mão de obra barata, como no intelectual, com a visão de que os negros não são
seres pensantes e inteligentes para ocuparem os mesmos cargos que os brancos.
Foram esses mesmos conflitos e interesses de poder que propagaram
também no Brasil a ideia de uma “Democracia racial”3 para mitigar a consciência de
culpa do opressor e minimizar as acusações contra ele próprio, o conceito em que a
escravidão teria sido “menos dura” no Brasil, sempre iludiu e cegou a população
sobre o verdadeiro genocídio que foi a escravidão, sendo muito mais dificultoso para
a pessoa negra a construção de uma identidade.
Processo de um racismo mascarado, o Brasil sempre foi opressor no que diz
respeito a raça negra, mas que soube esconder isso com seu falso discurso de
benevolência, cultivando a ideia que existiam laços amigáveis entre os senhores e
os escravos, pois as canções, linguagem, religião e outros elementos da cultura
africana não teriam se propagados se não houvesse a ausência de preconceito e
discriminação racial dos brasileiros brancos. Como ressalta Levi- Strauss (1952,
p.97) “Essa posição é reconhecida e invariável. Ela representa a essência mesma
do povo brasileiro, que nasceu da fusão harmoniosa de várias raças que
aprenderam a viver juntas e a trabalhar juntas numa exemplar comunidade”
Para tornar a população mais “branca”, criou-se dois pontos centrais, um deles
seria a ideia do “branqueamento” onde a miscigenação resolveria o problema da
“mancha negra” na sociedade, pois essa tese baseava-se na presunção da
superioridade branca, onde com a relação entre negros e brancos, criaria uma nova
população mais branca que atendesse aos padrões estigmatizados, e que a cada
nova relação, mais brancos se tornariam, tanto fisicamente como culturalmente.

“O processo de miscigenação, fundamentado na exploração sexual da


mulher negra, foi erguido como um fenômeno de puro e simples genocídio.
O “problema” seria resolvido pela eliminação da população
afrodescendente. Com o crescimento da população mulata, a raça negra iria

2
Erving Goffman (1990) antropólogo e sociólogo, conceitua a referida palavra no seu livro Estigma,
como uma marca presente no indivíduo que pode vir a ser tanto uma característica social como física.
Esta característica se torna um estigma quando desde já no primeiro contato social entre os
indivíduos é percebida e socialmente reprovada, gerando assim a discriminação ou a distância social
entre os sujeitos.
3
O mito da democracia Racial, foi utilizado por Florestan Fernandes na análise crítica da obra “casa
grande & senzala” do autor Gilberto Freyre, onde Freyre considerou o Brasil como um país tradicional
e contrário a admissão do preconceito e a discriminação entre raças.
desaparecendo sob a coação do progressivo clareamento da população do
País. Tal proposta foi recebida com elogios calorosos e grandes sinais de
alivio otimista pela preocupada classe dominante. ”
NASCIMENTO, Abdias do, O genocídio do negro brasileiro: processo de
racismo mascarado/ Abdias Nascimento. 3.ed. São Paulo: perspectivas,
2016.

Esse recurso utilizado pelos brancos da sociedade dominante, originaram os


tidos como sangue misto: Pardos, mulatos e morenos, o que acabou satisfazendo
um pouco a ânsia dos dominantes brancos, mas que por outro lado prejudicou de
forma concreta a questão identitária da pessoa negra, visto que os mesmos não
tiveram escolhas a não ser adequarem-se a esse sistema opressor.

Esse mito da democracia racial e do branqueamento trouxeram algumas


consequências para os brasileiros, entre elas foram a crença de que não existem
raças no Brasil, pois o branqueamento teria diluído as marcas originarias das três
raças. Originou-se também a concepção que no lugar de raças, existe no Brasil
apenas uma classificação baseada na cor e que qualquer tentativa de se falar sobre
raça negra seria uma forma de racismo, visto que se não há raças então significa
que não existe racismo, e que todas as formas de falarem dele seria racismo, pois
estariam diferenciando por vontade própria os negros dos brancos.
Estabelecendo que não existe racismo no Brasil o que é a proposta do mito
da democracia racial, inibimos e velamos as práticas raciais sociais no dia a dia,
como também negamos medidas eficazes contra os mesmos, e é esse mesmo
racismo que interfere e dificulta o diálogo entre os grupos raciais, que faz com que a
pessoa negra não enxergue em si uma potencialidade que lhe é mostrada que só
existe na pessoa branca, tornando a sua identidade ambígua e fragmentada.
Segundo Stuart Hall (1990):

[...] estão mudando nossas identidades pessoais, abalando a ideia


que temos de nós próprios como sujeitos integrados. Esta perda de um
‘sentido de si’ estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento –
descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural
quanto dento ou descentração do sujeito. Esse duplo deslocamento si
mesmos – constitui uma ‘crise de identidade’ para o indivíduo (2006, p. 9).

A crise de identidade discorrida pelo autor, revela a ausência da construção


identitária do sujeito nos meios sociais presentes no Brasil, onde a escola pouco ou
de nada contribui, a família não tem respaldo já que a mesma não constituiu ainda
sua identidade e vários outros âmbitos da sociedade, renegam esse direitos a
população negra, entrementes, importa dizer que identidade é construção diária e
constante do sentido de si e pertencimento, é uma representação tanto da cultura
como das vivências sociais e como nos enxergamos nas mesmas, a partir do
momento que se torna consciente da importância do seu corpo, não como reflexo de
estereótipos, mas como uma representação importante do seu lugar de espaço,
começam as lutas por cidadania e acesso a direitos igualitários entre negros e
brancos, como também o reconhecimento do papel ativo que cada um deve
desempenhar em sociedade.

1.2 A INTERSECIONALIZAÇÃO ENTRE IDENTIDADE E CLASSE

Discutir identidade implica, também, falar sobre como a mesma se constrói e


se constitui em uma sociedade extremamente hierarquizante, onde indivíduos e
grupos cada vez mais encontram-se dispostos e divididos com base nas condições
sociais e características físicas. Grupos esses que sempre foram classificados com
base no conceito de “raça”, palavra utilizada principalmente para designar a
agregação de pessoas pertencentes ao um mesmo grupo, geralmente indivíduos
que compartilham os mesmos traços ancestrais, valores e crenças.
Dispor os grupos dessa maneira facilitava a naturalização das desigualdades
sociais, culturais e políticas, uma vez que eleger a raça branca como a mais forte se
tornou mais fácil, pois pessoas que compunham esse grupo faziam parte de um
padrão estético “adequado” ao modelo eurocêntrico. Enquanto isso as pessoas
negras ao longo da história sempre foram consideradas como “infelizes”, “animais
irracionais”, “bestiais”, “supersticiosos”, e “sem história” e a eles foram delegados
condições precárias e a margem da sociedade.
Um olhar aprofundado sobre a realidade social do país mostra que a
discriminação racial está empregada em todos os âmbitos, principalmente na
econômica. Nos anos 50 por exemplo era comum encontrar nas ruas e jornais,
anúncios de emprego com as seguintes frases: “Não se aceitam pessoas de cor”, o
que de certa forma foi “proibido” pela Lei Afonso Arinos de 1951 onde determinou o
fim da discriminação racial nas áreas econômicas, porém de pouco surtiu efeito essa
medida, por que o que antes era o racismo econômico escancarado, hoje ele se
mostra velado, através de anúncios mais requintados como “Procuram-se pessoas
de boa aparência”, ou seja, brancos. Com a lei ou sem a lei a desigualdade racial
continua ativa e difusa.

O que os autores destacam é o fato de que as instituições atuam na


formulação de regras e imposição de padrões sociais específicos. E um
exemplo disso é a exigência de “boa aparência” para se candidatar a uma
vaga de emprego, que simultaneamente é associada a características
estéticas próprias de pessoas brancas. Ou seja, no caso do racismo
antinegro, as pessoas brancas, de modo deliberado, ou não, são
beneficiarias das condições criadas por uma sociedade que se organiza a
partir de normas e padrões prejudiciais a população negra.
ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural? Belo horizonte- MG:
letramento, 2018.

Esses padrões de beleza estigmatizados são um empecilho na vida social e


econômica da pessoa negra, visto que os mesmos não seguem esse padrão
imposto pela sociedade, então sofrem em vários âmbitos da esfera social,
principalmente no que diz respeito a discriminação no emprego. Em uma pesquisa
do IBGE (Instituto brasileiro de geografia e estatística) foi comprovado que as
pessoas negras em 2010 representavam 70,8% da população pobre e 69% da
população indigente, sendo a maioria da região nordeste, comparando a estimativa
dos brancos podres, ficou claro que somente 36% da população total é pobre e
somente 31% são indigentes.
A falta do recurso financeiro acarreta a essas condições e situações de
moradias precárias, principalmente nas grandes metrópoles, os negros infelizmente
estão fadados a viverem em favelas por que não tem condições ou meios de alugar
ou comprar sua própria residência, são clausurados a falta de oportunidades que
lhes permitam melhorar suas condições de vida.
É necessário frisar que apesar da desigualdade racial formar um
entrelaçamento entre identidade racial e pobreza, esses dois conceitos nunca
devem confundir-se, pois é a desigualdade racial que gera a pobreza na pessoa
negra, e não uma condição que elas mesmo se impõem.
Como comenta Thales de Azevedo (1973, p.110):

“Verificam-se discriminações indisfarçáveis em seus efeitos coletivos


através da história nacional, no casamento, na admissão aos clubes e
associações recreativas, nas irmandades, nas escolas privadas, nas ordens
religiosas, em cargos e carreiras que tem sido privilégios de classes altas,
ou, pelo menos, dos socialmente brancos, como a diplomacia, e as
camadas mais elevadas da representação política, da governança, das
formações armadas, do clero, do comercio, dos bancos, da indústria. ”
AZEVEDO, Thales de. Democracia racial: ideologia e realidade. Vozes,
Petrópolis. Rio de Janeiro: Ministério da educação e cultura. 1973.

Azevedo utiliza-se dessas palavras para apontar as atitudes e os estereótipos


racistas que estão intrinsecamente enraizados por toda sociedade brasileira, nos
diversos níveis sociais, psicológico, político, cultural e econômico, ou seja a
desigualdade racial não está somente nos empregos, mas também em todos os
âmbitos que compõem mais privilégios as pessoas brancas. O mito da democracia
racial tão analisado e desmascarado por Florestan Fernandes (1960, p. XIV),
somente reforça essa desigualdade, pois a negação do mesmo e o discurso
politicamente correto interferem de maneira significativa no reconhecimento da
diversidade étnica, cultural, econômica e racial entre negros e brancos, como deixa
claro o autor:

“Não existe democracia racial efetiva, onde o intercâmbio entre


indivíduos pertencentes a ‘raças’ distintas começa e termina no plano da
tolerância convencionalizada. Esta pode satisfazer às exigências do bom-
tom, de um discutível ‘espírito cristão’ e da necessidade prática de ‘manter
cada um no seu lugar’. Contudo, ela não aproxima realmente os homens
senão na base da mera coexistência no mesmo espaço social e, onde isso
chega a acontecer, da convivência restritiva, regulada por um código que
consagra a desigualdade, disfarçando-a e justificando-a acima dos
princípios de integração da ordem social democrática. ” (FERNANDES,
1960, p. XIV)4

Essa ordem produzida pelo mito da democracia racial não afeta somente a
sociedade externa, mas afeta também as relações internas para os negros, pois
estipula padrões hierárquicos, naturaliza formas de dominação, e justifica as práticas
racistas como incoerentes. Sendo o racismo como elemento constituinte da política
e da economia, os opressores utilizam-se dessa ideologia da democracia racial para
produzir um discurso racista e que legitima a violência e a desigualdade racial.

4
Prefácio, in F.H. Cardoso e Octávio Ianni. “Cor e mobilidade social em Florianópolis”. São Paulo:
Companhia Editora Nacional, 1960.
O grande e talvez maior problema que esse mito ocasionou foi a
desigualdade socioeconômica5 para os negros no Brasil, e é possível afirmar isso
pois inúmeras pesquisas apontaram o fato de que a raça é um marcador
determinante nessa desigualdade. Até no âmbito escolar isso se faz presente visto
que ao abordarmos a educação vemos que a taxa de analfabetismo em relação as
pessoas negras são altas, segundo o PNAD 20096, as pessoas de 15 anos ou mais
tem uma taxa de 26,7% de analfabetismo, contra 5,9% dos brancos. O tempo de
estudo também varia, enquanto os brancos têm em média 8,4 anos de estudo, a
população negra frequenta somente 6,7 anos de estudo na escola. Até o ensino
superior essa realidade se mostra presente, pois onde 10% da população negra tem
curso superior completo, os brancos em suma maioria conquistam 15% nessa
totalidade.

O que os dados nos revelam sobre os diferenciais na realização


educacional dos grupos raciais é alarmante. Menos alfabetizados, retidos
em patamares educacionais mais baixos, poucos negros conseguem chegar
à universidade. (...) Um negro com Curso superior completo é um
'sobrevivente' do sistema educacional, que, ademais, enfrentará sistemática
discriminação no mercado de trabalho. (Barcelos. 1992:18-9)

Resultado disso segundo Barcelos (1992) é a raridade de um aluno negro


conseguir cursar um ensino superior, chamado de “sobrevivente” ao sistema
educacional, ou seja, sobrevivente a desigualdade racial presente na sociedade,
pois muito desistem sem completarem o ensino médio e o ensino superior, e
consequência disso é a escassez de pessoas negras em cargos profissionais
reconhecidos e de alta remuneração, pois mesmo que concluam o ensino superior
ainda vão martirizar-se na carreira profissional.
A sociedade é organizada por hierarquias sociais, onde os negros compõem a
base da mesma, e os brancos ocupam os lugares mais privilegiados: o topo,
ocupam além da economia, a jurisdição e a política. E é importante que analisemos
que antes de tudo o racismo aqui mostrado é também um processo político,
processo esse que influencia a organização da sociedade, esta que depende do

5 A desigualdade socioeconômica no Brasil se reflete diretamente na saúde, educação, qualidade de


vida e emprego.
6 Dados disponibilizados no livreto “consciência negra e ação política” organizado pelo Grupo Mulher

Maravilha com apoio a CESE/BAHIA- Coordenadoria Ecumênica de serviço 30 anos, e no site:


Agência IBGE notícias, com matéria intitulada: PNDA continua 2016 51% da população com 25 anos
ou mais do Brasil possuíam no máximo o ensino fundamental completo.
poder político para ser seguido e esse poder político é composto majoritariamente
por brancos.
Um exemplo a ser mostrado é o do racismo institucional, que não opera de
modo individual, mas sim como resultado do funcionamento de instituições,
instituições essas que são os modos de orientação e comportamentos estabelecidos
nos indivíduos, como por exemplo o legislativo, judiciário, ministérios públicos,
universidades e empresas. Essas instituições marcam a desigualdade racial na
sociedade pois utilizam-se de fatores para impor seus interesses políticos e
econômicos nas mesmas, geralmente esse racismo é inserido de forma indireta,
onde consiste na dominação de homens brancos em todos os setores das
instituições públicas, configurando privilégios a si mesmos e desvantagens aos
negros. Um exemplo sucinto do racismo institucional na pratica nos é apresentado
por HAMILTON & TURE (1997, P.2):

Quando terroristas brancos bombardeiam uma igreja negra e matam


cinco crianças negras, isto é um ato de racismo individual, amplamente
deplorado pela maioria dos segmentos da sociedade. Mas quando nessa
mesma cidade quinhentos bebês negros morrem a cada ano por causa da
falta de comida adequada, abrigo e instalações medicas, e outros milhares
são destruídos e mutilados fisicamente, emocionalmente e intelectualmente
por causa das condições de pobreza e discriminação na comunidade negra,
isso é uma função do racismo institucional. Quando uma família negra se
muda para uma casa em um bairro branco e é apedrejada, queimada ou
expulsa, eles são vítimas de um ato de manifesto de um racismo individual
que muitas pessoas condenarão, pelo menos em palavras. Mas é o racismo
institucional que mantém os negros presos em favelas dilapidadas, sujeitas
as presas diárias de favelados exploradores, mercadores, agiotas e agentes
imobiliários discriminatórios. (ALMEIDA, 2018, P.34 Apud HAMILTON e
TURE, 1967, P.2)

Os referidos autores na citação acima demonstram por meio dessas palavras


como as instituições de formas sutis atribuem privilégios aos brancos, dedicando aos
negros desvantagens econômicas e sociais, onde todos são vítimas de condições
criadas baseadas nas normas e padrões impostos pelos brancos. A imposição de
regras e padrões racistas por parte da instituição é de certa forma entrelaçada com a
ordem social, configurando então uma estrutura social, em síntese a concepção do
racismo estrutural é a concepção onde o racismo é resultado de uma estrutura
social, ou seja, do modo onde configura as relações raciais na política, economia,
jurídica e familiar, são processos institucionais onde o racismo está profundamente
arraigado nas diversas camadas da sociedade. Um grande exemplo é a relação
estrutural entre o baixo salário das mulheres negras, a construção do sistema
econômico, e a falta da representatividade das mesmas.
O racismo é estrutural7 e estruturante nas relações sociais e na formação do
sujeito quando mesmo entre as pessoas que não aceitam esse tipo de violência, não
existe por parte das mesmas qualquer tipo de ação política efetiva para se voltar
contra isso, pois a violência contra as pessoas negras está naturalizada, dentro do
conceito da normalidade, “cujo racismo é regra e não exceção” ALMEIDA (2018, P.
38). Pois o ser branco e o ser negro, são construções sociais que são vivenciados a
partir de certos privilégios estruturalmente estabelecidos pela sociedade, baseado
na cor da pele e traços fenotípicos.

Se a “raça” nada mais fosse do que a diferenciação político-


econômica, a justiça requereria sua abolição. Entretanto “raça” não é
somente economia política, pois também tem dimensões culturais-
valorativas, trazendo-o para o universo do reconhecimento. Farias (2017. P.
61).

Tendo em consideração a consciência desse conceito de classe, é


imprescindível dizer que o conhecimento da mesma influi de maneira significativa no
reconhecimento da importância da luta por justiça social, e ruptura das estruturas de
dominação. As concepções de pertencimento e aceitação de si mesmos, estão
muito atreladas a identidade, portanto classe social e identidade estão associados.
Quando a aparência da pessoa negra interfere na sua condição social, essa
identidade fica comprometida. As lutas sociais são processos que ajudam na
construção da identidade na pessoa negra, quando mulheres e homens negros
passam a enxergar e se libertar dos processos de dominação, ambos passam a
exigir coletivamente o respeito a justiça, a integração social e a igualdade
econômica.

1.3. QUAL O LUGAR DO NEGRO/NEGRA NA SOCIEDADE BRASILEIRA?


INVISIBILIDADE? INDISSIBILIDADE?

7
Silvio Almeida (2018) entende como Racismo estrutural o conjunto de práticas históricas, institucionais e
culturais que compõem privilégios a determinados grupos étnicos de uma sociedade, e que se propagam a
partir da reprodução das práticas sociais racistas
A linguagem é inerente ao ser humano, pois é a partir dela que a sociedade cria
seus discursos, se legitima e estabelece vínculos sociais com seus semelhantes. O
homem se torna sujeito visível quando entra no universo da linguagem e se torna um
ser falante, ocupando assim um lugar de fala. Quando a visibilidade se torna
concreta e o homem tem poder de fala e se reconhece no discurso do outro como
importante, isso influi na construção da sua identidade. Mas se isso é necessário
para construção identitária, o que é feito dos negros que não tem nenhuma
representação de fala ou não se reconhecem como essenciais no discurso do outro?
Ora, isto é o que sempre ocorreu na sociedade brasileira, muitos espaços ocupados
por brancos, e lugares de fala feitos por brancos e propostos para brancos.
Um dos principais meios de comunicação onde a linguagem é intensificada é
no processo midiático. A mídia hoje se tornou um canal de veiculação de
informações e ideias mais visado da modernidade. Porém, além de benefícios como
a informação na palma da mão, ela trouxe também malefícios, interferindo de
maneira negativa no processo identitário, pois além de propagar a subalternização
do negro, visa principalmente a estética e a padronização de corpos e
comportamentos.
Se as mídias têm o poder de influência sobre as pessoas, é por meio delas que
muitas das disputas sociais ocorrem, sejam por casos individuais ou por grupos que
se auto denominam melhores pela forma que estão estabelecidos socialmente. Isso
é o que nos afirma Freire Filho quando vem discutir sobre os estereótipos da mídia,
segundo ele:

A construção (ou supressão) de significados, identificações, prazeres


e conhecimentos – nos espaços e mercados midiáticos – envolve,
necessariamente, a disputa pela hegemonia entre grupos sociais,
dominantes e subordinados, com consequências bastante concretas no
tocante à distribuição de riquezas, prestígio e oportunidades de educação,
emprego e participação na vida pública. Freire Filho (2005, p. 21).

A análise do discurso midiático trazido aqui por Filho (2005, p.21), remete ao
poder que a mesma detém perante os homens, enquanto vinculadora de
representações, a mídia influência a exclusão simbólica da imagem social do negro,
quando valoriza determinada cultura em detrimento de outras, e essa cultura está
arraigada no modelo eurocêntrico. A partir do momento que isso ocorre, as relações
de representatividade e espaço para as pessoas negras configuram-se praticamente
nulas nesses âmbitos midiáticos.
Um grande exemplo de como pessoas negras são representadas na mídia, é
nas telenovelas, pois o racismo ali se torna sutil e constrói todo um complexo de
imaginário social da situação dos negros, visto que décadas observando mulheres
negras representarem somente empregos domésticos e homens negros oscilarem
em papeis de ingênuos ou criminosos, enquanto brancos ocupam grandes cargos,
acaba estereotipando e determinando qual o lugar de ocupação dos negros; sempre
em favelas, como criminosos ou empregadas.
Esse imaginário racista se constitui em cima tanto no campo econômico, como
no político, pois os dois são os principais responsáveis pela pobreza e a situação de
miséria impostos a sociedade. O sistema econômico, político e jurídico perpetua a
condição de subalternidade para com os negros, suas políticas sempre voltadas
para o favorecimento dos brancos, são negligentes e excludentes para o homem e a
mulher negra, representação disso está nos baixos salários, nos diversos tipos de
violência e na falta do poder de fala nos espaços de decisões.
A invisibilidade e exclusão no setor midiático, e a falta de políticas no sistema
político remete e interfere nos vários setores na sociedade brasileira, no que se
refere a representatividade e a presença dos negros em escolas e universidades, é
possível constatar que há uma desigualdade de oportunidade entre negros e
brancos, uma vez que dados concretos mostram que são os brancos que
concentram maior presença nas escolas brasileiras.
Este fator interfere negativamente na formação escolar e identitária dos negros,
visto que, nos âmbitos preponderantemente ocupados por pessoas brancas, os
privilégios serão imputados a grande maioria, e as desvantagens propagadas e
generalizadas para as minorias. Um grande exemplo disso está presente altas taxas
de evasão nas escolas, pois os conteúdos excludentes e a falta de
representatividade nas salas de aula, causam um impacto grande nas relações
sociais dos alunos, visto que os mesmos não conseguem enxergasse naquele
ambiente constituído, construído e dominado por brancos.

Fato esse tão constatado que os alunos passam uma vida escolar inteira
aprendendo sobre o império romano, o feudalismo a revolução industrial e francesa,
e sabem muito pouco sobre o continente africano pois muitos facilitadores do
conhecimento transmitem para os alunos a história de um continente inteiro em
apenas algumas horas, uma vez por ano, embarcada somente no tema escravidão,
ou no dia da consciência negra, e mesmo a escravidão é abordada do ponto de vista
do colonizador. Commented [U3]: Tem que ser fala dos autores e não as
suas. Esta parecendo que são as suas falas.
O rendimento da criança negra na escola também é tangível no que diz
respeito a essas práticas racistas, visto o elevado número de analfabetos entre a
população negra, aproximadamente 9,9% não estão alfabetizados, cerca do dobro
em relação as pessoas brancas (4,2%) de acordo com os dados da pesquisa
nacional por amostra de domicílios contínua: educação, divulgados pelo IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Além disso pode-se perceber
também os altos índices de desistência e repetência, e o desestímulo a ir à escola
pela falta de uma representatividade seja nos livros didáticos, seja pelos
professores.
Segundo Luz (Apud, 1989:13):

"Evidentemente que há muita diferença entre os conteúdos que foram a


visão de mundo negro e a projeção ideológica neocolonialista da escola
oficial, caracterizada especificamente pelo recalcamento da presença dos
processos civilizatórios constituintes da Nação, elegendo como universal o
processo civilizatório europeu”

O autor deixa bem claro nas suas palavras todo o processo neocolonialista
que os alunos passam em toda sua vida escolar, pois as práticas de muitos
educadores hoje em dia, consistem muitas vezes no baseio de uma sociedade
discriminatória, onde predominam em sala de aula falas preconceituosas, atitudes
discriminatórias, e uma didática excludente contribuindo de forma significativa no
incitamento da discriminação e, por conseguinte a desistência.
A escola reforça o racismo quando não toma medidas educativas contra o Commented [U4]: Aqui você pode utilizar o texto a escola
Conservadora de Bourdieu ao explicar estrutura objetiva e
mesmo, visto que a criança ao ingressar na escola já traz de casa uma amplo estrutura subjetiva mediados pelo Habittu.

vivencia, pois ela vê televisão, escuta o rádio, assiste jornais, tem acesso a redes
sociais e várias inúmeras atividades fora do âmbito escolar, e a escola produz e
reproduz a discriminação racial, desigualdades de oportunidades e preconceito
racial na sua didática, quando ela baseasse e prendesse a esses estereótipos
representados todos os dias pela mídia.
Todos esses fatores montam uma sequência de acontecimentos, pois com os
altos índices de desistência, as grandes taxas de analfabetismos e a falta de
políticas eficazes para erradicar esse problema, impedem de maneira significativa o
ingresso de alunos negros em universidades, e como consequência disso, cada vez
menos é encontrado a presença de negros em profissões graduadas, e assim volta
ao patamar de empregos mal remunerados e subalternos.
A inviabilidade para Benedita da Silva, ex-governadora fluminense, é tida como
uma das piores formas de racismo, pois ao passo que o mito da democracia racial
propaga a ausência de racismo, ele vai acontecendo de forma velada, nas camadas
sociais intrínsecas e assim impede um olhar mais aprofundado sobre o lugar que os
negros ocupam em sociedade em decorrência da desigualdade social. Nas palavras
da mesma: “A invisibilidade é uma das grandes crueldades do racismo. (...) é um dos
maiores instrumentos para perpetuar o preconceito e o racismo no nosso país”
(Silva, 2002, p. 22 e 25).
Ao passo que a mídia é elemento participativo da sociedade, e através dela os
estereótipos e o racismo velado é propagado, se torna necessário frisar que a
mesma pode se reestruturar nas suas relações, visto que há sim como romper a
inviabilidade do negro na sociedade brasileira, contanto que um olhar mais
aprofundado dos representantes e a construção de políticas públicas nessa
intersecção entre identidade e visibilidade sejam efetivados.
Reconhecer que a construção identitaria é necessária, promove o
posicionamento e a reinvindicação de uma organização política igualitária, se
enxergar como essencial e potencialmente capaz em todos os espaços da
sociedade é o primeiro passo para um processo de organização e luta de direitos.
2- A ESCOLA E O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NEGRA

2.1. POR UMA SOCIOLOGIA DO CURRÍCULO.

Abordar o tema currículo nos dias atuais, necessita de uma ampla visão dos
vários conceitos e perspectivas diferentes que se tem do mesmo, pois são vários os
autores que tentam compreender e cingir o seu significado e papel no âmbito
escolar. Esse processo de compreensão do currículo perpassa pela visão simplista
de meros conteúdos aleatórios e enxerga o mesmo como uma construção cultural
que deve ser sempre analisado como um aspecto que vive em constante
modificações e reconstruções no decorrer no tempo.
A palavra currículo, em seu termo etimológico, vem do latim curriculum, que
resinifica o conjunto de dados e conhecimentos específicos para cada ser humano,
analisando as habilidades, necessidades, interesses e problemas que contribuem
para o desenvolvimento individual e coletivo do mesmo. Atualmente segundo
Soares, 1993, p. 68. O currículo tem sido interpretado como “lista de materiais a
estudar sob orientação do professor, experiências de aprendizagem para
desenvolver habilidades que preparem para a vida; seriação de estudos realizados
na escola” (apud Lima Campos, 2009, p.31). Como afirma o mesmo, além da
importância de desenvolver habilidades para a vida, o mesmo de uma forma ampla
torna o papel de se moldar a organização da sociedade e o contexto histórico que se
está inserido.
A sociedade sendo principal produtora de conhecimento, se responsabiliza
por aquilo que a mesma considera importante a ser ensinado, sendo assim, torna
fácil ressaltar que o currículo baseasse nos conhecimentos e perspectivas do povo
em que se está inserido, por tanto, as disciplinas estão relacionadas a aquilo que
devesse ser ensinado de acordo com o que é considerado benéfico para a ordem
social e para o êxito desenvolvimento dos discentes. O conhecimento levado para o
âmbito escolar, pautado nos desejos e anseios da sociedade são vistos como
necessários para atingir as metas propostas pelos currículos, geralmente motivados
para atingir as metas políticas de um país.
Observando a história do currículo é possível perceber que o mesmo surgiu
gradualmente, e foi perpassando por um processo de transformações básicas com o
intuito de manter uma relação direta entre os alunos e a escola, e
consequentemente também com à sociedade. Logo de início, por volta do início do
século XIX a proposta de trabalho e abordagem dos assuntos girava na formalidade
dos conteúdos, estes que eram resultantes da influência da era industrial vivida na
época, então a aritmética, artes plásticas, linguagem, estudos sociais entre outros
conteúdos eram trabalhados com maior enfoque e rigorosidade.
Ao longo do tempo, o currículo passou a ser analisado a partir de duas
partições: as teorias conservadoras tradicionais que se resumiam ao conhecimento
centrado no professor, e o aluno era somente um sujeito passivo que deveria
absorver esse conhecimento, para desenvolver por si só suas características
políticas e sociais, e as concepções críticas onde o aluno passa de ser passivo, que
recebe conteúdos, a ser um ser ativo, que produz e já traz de casa um amplo
repertorio de vida e conhecimento. Foi a partir da década de 30, por influência de
John Dewey8 que se passou a pensar em um currículo que fosse voltado para o
modo de vida e contexto em que se vive o aluno, como também um currículo que
incluísse na sua integra, a transmissão de alguns valores que eram tidos como
necessários para a construção social do mesmo.
Nessa mesma linha de construção, Dewey (1959, p.80) já afirmava que:

“O valor do currículo está na possibilidade de mostrar ao mestre os


caminhos abertos à criança para o verdadeiro, o belo e o bom, permitindo a
esse mestre, determinar o ambiente, o meio necessário para o
desenvolvimento do educando e, assim, dirigir indiretamente a sua atividade

8
Professor e filósofo americano, que defendeu a ideia de unir a teoria e a prática no ensino. Foi um
dos fundadores da escola filosófica de Pragmatismo, pioneiro em psicologia funcional, e
representante principal do movimento da educação progressiva.
mental, porquanto, segundo ele, tudo se resume na atividade em que entra
a inteligência reagindo ao que lhe é externamente apresentado” (Apud Lima
Campos, 2009. P.31)

Essa linha traçada por Dewey compreendia e defendia a necessidade de um


currículo que tivesse como uma das incumbências para com o professor, a
organização e a preparação do ambiente, para que assim a aprendizagem e o
desenvolvimento do aluno ocorram. Kilpatrick 1956, p.84 também contribuinte
acerca dos estudos sobre o currículo, complementa a definição de currículo, quando
ressaltou a importância de um currículo voltado para a reconstrução da experiência
do aluno. Seguidamente o autor Frankin Bobbitt, denominou o currículo como a
junção de coisas e ações que os alunos deveriam vivenciar para desenvolver as
habilidades necessárias para capacitá-los a vida adulta, suas ideias eram
conservadores e propunham que a escola se assemelhava a uma empresa
comercial.
Foi a partir disso que as discussões sobre como se constitui a estrutura do
currículo e a sua relação com a sociedade teve início, pois as concepções que se
tinham do mesmo na década de 60 e 70 se baseavam em um modelo que
atendesse e se adaptasse a ordem capitalista, a racionalidade do homem e meios
para que tornasse as pessoas mais eficientes e rápidas em seu trabalho. Por tanto,
a seleção e organização dos conteúdos, levavam em sua integra uma maior
rigorosidade pautadas em teorias cientificas, ora psicologizante9, ora empresarial.
Segundo segundo Eyng (2015, p. 138) apud (Hennerich 2017 p. 2798).

[...] os conceitos fundamentais de: “ensino, aprendizagem, avaliação,


metodologia, didática, organização, planejamento, eficiência, objetivos”
(SILVA, 2007, p. 17). Tais conceitos subsidiam modelos curriculares
hegemônicos, etnocêntricos e supostamente neutros. Nessa linha, os
currículos são entendidos como normatização, prescrição, centrados nos
conteúdos disciplinares e/ou listas de objetivos. Esses modelos difundiram a
ideia de currículo como equivalente à grade curricular (EYNG, 2010).

Como afirma o autor, o currículo baseava-se em uma organização e gestão


que tinham uma forma burocrática e mecânica de regerem-se, geralmente

9 Palavra cujo significado; 1. Que psicologiza 2. Que tem cunho psicológico: Atribuir às frustrações da
sociedade a causa da violência, é uma visão psicologizante.
procurava-se encontrar o foco de habilidades dos indivíduos e tentavam desenvolvê-
las com primazia para denominar qual a ocupação de trabalho que o indivíduo
desempenharia com maior afinco, dotados de etnocentrismo10 a objetificação do ser,
proposto pelas teorias do currículo que se tinham na época acabavam reproduzindo
as estruturas sociais11 e as desigualdades sociais.
As primeiras teorias críticas do currículo decorreram dessa visão de um
currículo voltado para a preparação do indivíduo para o mundo do trabalho, e o
questionamento pertinente de como a sociedade era organizada. Teóricos como
Pierre Félix Bourdieu (1930-2002) e Jean Claude Passeron (1930) começaram a
questionar a realidade marcada pelas desigualdades sociais e injustiças decorrentes
da organização da sociedade da época, e também, como a escola reproduzia essas
desigualdades, e contribuía para a reprodução da estrutura social. O papel da escola
passou a ser colocado em pauta, visto que as teorias emergentes que se tinham da
grade curricular levantavam maiores interesses a classe dominante, em detrimento
dos grupos menos favorecidos.
Segundo os autores anteriormente citados, a sociedade capitalista tende a
reproduzir as práticas econômicas, e a escola, sendo um fruto da sociedade também
propaga a estratificação social, visto que os grupos sociais que constroem e
determinam o conhecimento e conteúdo a serem transmitidos no currículo
beneficiam prioritariamente os conceitos e interesses das classes dominantes. Essa
insatisfação com o modelo de escola seletivo e excludente se tornou visível
principalmente pelos novos movimentos sociais, que se incomodavam com o
desprendimento de preocupação da educação acerca do tradicionalismo e marcas
conservadoras na época.
EYNG (2010, p. 36) aponta que:

As teorias críticas operam os conceitos fundamentais de: “ideologia,


reprodução cultural e social, poder, classe social, capitalismo, relações
sociais de produção, conscientização, emancipação e libertação, currículo
oculto, resistência” (SILVA, 2007, p. 17). Tais conceitos subsidiam a
compreensão de que os currículos são ideologicamente situados e inseridos
nas relações de poder, especialmente nos interesses das lutas de classe.
Nessa linha, os currículos são entendidos como espaço de resistência,

10 Visão de mundo característica de quem considera o seu grupo étnico, nação ou nacionalidade
socialmente mais importante do que os demais.
11 O termo estrutura social usado por autores como Alexis de Tocqueville e Karl Marx, significa um

sistema de organização da sociedade que decorre da inter-relação e posição (status social) entre
seus membros.
como forma de libertação da opressão econômico-capitalista e possibilidade
de emancipação a partir da conscientização. EYNG (2010, p. 36).

O currículo sendo um produto do meio cultural, que transmite os valores e


construções sociais de um determinado grupo, é então utilizado como um meio para
legitimar a ordem social, visto que, analisando profundamente como se dá as
relações de poder, é possível vislumbrar que a mesma ocorre através daqueles que
se encontram nos espaços de maior prestigio social e que são estes que
determinam o que deve ser considerado conhecimento e como ele deve ser
distribuído. MONTEIRO (2018, p.48) em sua análise de estudos sobre a obra do
sociólogo francês Pierre, afirma que “Para Bourdieu, a classe dominante, detentora
do capital econômico, define o gosto legitimo. O gosto que serve de referência aos
demais agentes da sociedade, pertencentes as classes médias e populares” o que
interfere também no conhecimento e saberes transmitidos.

A estratificação do conhecimento aqui transmitido, pode ser dividido em dois


segundo Lawton (1975, p.58) apud Candido (1980, p.58) ora, as áreas de alto e
baixo status; onde são elas que apontam uma hierarquia entre quem ensina, o que
se ensina e a quem se é ensinado. Então o alto conhecimento passa a ter um
público especifico, e algumas determinadas áreas no currículo são especificamente
dedicados para os alunos tidos como mais “capazes” e que detém um capital
econômico relativamente alto. Então assim, o currículo como principal fator
determinante para a educação, de uma forma mal administrada pode resultar em
reflexos que irão influenciar os caminhos futuros e as ocupações sociais que os
sujeitos virão a ter.

Silva (2009, p. 35) define como a cultura influencia no ambiente escolar


ideologicamente quando ele vem afirmar que:

[...] a escola não atua pela inculcação da cultura dominante às crianças e


jovens das classes dominantes, mas, ao contrário, por um mecanismo que
acaba por funcionar como mecanismo de exclusão. O currículo da escola
está baseado na cultura dominante: ele se expressa na linguagem
dominante, ele é transmitido através do código cultural dominante. As
crianças das classes dominantes podem facilmente compreender esse
código, pois durante toda sua vida elas estiveram imersas, o tempo todo,
nesse código [...]. Em contraste, para as crianças e jovens das classes
dominadas, esse código é simplesmente indecifrável.
O currículo aqui citado pelo autor traz dentro de si através de suas matérias
suscetíveis uma ideologia12 que atua de forma discriminatória e desigual, visto que
os diferentes campos de estudos vão ter uma enorme diferenciação entre os níveis
de prestígios e o acesso ao conhecimento, consequentemente oportunidades
sociais, ora que, o mesmo decai sobre as pessoas das classes dominadas como
submissão, perante as classes dominantes, classe essa que ficará encarregada pelo
comando e controle social. Por tanto, os lugares sociais e os cargos ocupacionais de
alto poder aquisitivo pertencerão assim aos membros da elite, que já nasceram
dotados de privilégios políticos, educacionais, financeiros e sociais.
A partir dessa vertente de desigualdades entre as camadas da sociedade, se
torna fundamental repensar o currículo escolar, não como objeto *instrumentalista”
que tem como finalidade propagar as diferenças sociais, mas sim como precursor
para a equidade entre todos os que compõem a sociedade. As disciplinas, a
pedagogia dos professores e o próprio objetivo do currículo devem ser analisados e
modificados para trabalhar no discente a aprendizagem necessária para superar
esse sistema de alienação fora e dentro do âmbito escolar.
Tento em vista todos esses fatores, é necessário ressaltar que tratar o
currículo como objeto de conhecimento de uma sociedade e construtor crítico da
mesma, significa dizer que este, antes de tudo deve ser visto como uma finalidade
própria, finalidade esta que busca o desenvolvimento intelectual do aluno, elevando
o conhecimento empírico, suas perspectivas e experiências a criticidade. Como
afirma Young (2011, p.614) “o desenvolvimento intelectual é baseado em conceitos
e não em conteúdo ou habilidades” e como um todo, o currículo deve basear-se na
vivencia do aluno para que consiga elencar e colaborar na construção da identidade
própria de cada um.
A identidade do sujeito não deve se restringir somente nos âmbitos familiares
e outros espaços de vivencias do indivíduo, mas sim, devem serem construídas em
consonância com a escola diariamente em todas suas disciplinas e projetos. A
escola tem como papel fundamental, levar o discente a enxergar a importância de si

12
No marxismo, totalidade das formas de consciência social, o que abrange o sistema de ideias que
legitima o poder econômico da classe dominante (ideologia burguesa) e o que expressa os interesses
revolucionários da classe dominada (ideologia proletária ou socialista).
mesmo no meio social, e faze-lo enxergasse como protagonista, livre da alienação
que torna cego o sistema.

2.2. A ESCOLA CONSERVADORA DE BOURDIEU

A educação sempre foi primordial desde o começo das eras, onde o homem
já sentia a necessidade do aprender e a ânsia do conhecimento. Tida como um
processo de desenvolvimento, a educação se tornou responsável em pautar os
grupos sociais e faze-los corresponder às expectativas da sociedade, sendo esta,
composta e profusa, cada povo tomou como fundamental adequar as
especificidades necessárias da educação, para compor um modelo ideal de homem
a ser seguido de acordo com os padrões ali exigidos. Durkheim (1858-1917. P. 10)
retrata a educação como “algo eminentemente social”, que pode ser diversificada e
especifica de acordo com o meio social apresentado, portanto não existe um modelo
de educação pronta e acabada, ela se adequa as necessidades e sistemas
organizacionais do contexto inserido.
Pierre Bourdieu13, como citado anteriormente, procurou analisar e
compreender como alguns grupos de indivíduos tomaram por si a determinação do
gosto predominante e os espaços mais privilegiados, vindo então a se apoderarem
dos meios de dominação, e como o sistema escolar sendo fruto de uma sociedade
completamente estruturada, se posiciona e legitima essas desigualdades sociais.
Ora, vimos que a cultura de uma determinada sociedade é o fator principal
para a seleção de conteúdos culturais presentes no currículo da mesma, e que é a
partir da ação do privilegio cultural14 que irá determinar os conhecimentos passados
aos alunos, sendo assim; maior enriquecimento para os indivíduos com alto poder
aquisitivo e menor favorecimento para a classe trabalhadora.
Essa hierarquização então, determinará quem irá ficar no topo da escala
social, e estas, determinarão quais os valores, hábitos, e costumes serão
considerados “culturais” para que sejam propagados e seguidos pelos grupos
dominados. Bourdieu em suas obras vem apontar como a sociedade não é um

13
Pierre Bourdieu, (1930-2002) foi um importante sociólogo e pensador francês, autor de uma série
de obras que contribuíram para renovar o entendimento da Sociologia e da Etnologia no século XX.
14 Aqui usado para designar o valor sociocultural positivo, atribuído a um determinado grupo em

detrimento de outro.
espaço harmônico, mas sim estruturado a partir das distâncias e posições sociais
que separam os agentes, e do capital adquiridos pelo os mesmos.

“Os capitais estruturam os campos, estes entendidos como


espaços de práticas. É a quantidade de capital acumulada pelos agentes
que permite ao sociólogo mensurar empiricamente a posição que eles
ocupam. Aqueles que possuem maior quantum de dinheiro se posicionam
no polo dominante do campo da estrutura do espaço social” Monteiro (2018,
P.42)

Os campos aqui apresentados pelo sociólogo remetem aos espaços sociais


ocupados pelos agentes15, segundo o mesmo, os campos podem ser tanto
educacionais como econômicos, culturais, científicos, jornalísticos e etc. Baseado
nessa concepção de capital onde os mesmos estruturam os campos, o referido autor
elaborou três conceitos sobre o mesmo: o capital econômico, que corresponde a
todos os elementos financeiros, como dinheiro e posses acumulados pelos agentes,
o capital social que seria o pertencimento a um grupo social, com ideias ou
obrigações sociais, e por fim aquele que influencia no sistema educacional; o capital
cultural, que consiste nos valores ou direitos adquiridos a partir de uma sociedade,
da família ou pelas instituições escolares como por exemplo; a educação, as
vestimentas, a língua e os estilos de vida de um determinado grupo social.
Segundo o autor, a família transmite para seus filhos, um certo tipo de capital
cultural e um certo ethos16, essa herança cultural de valores implícitos é o que
determina inicialmente a diferenciação das crianças em suas experiências escolares,
visto que a influência deste capital interfere significativamente no êxito escolar da
criança, onde os pais irão transmitir os níveis culturais, as vantagens e
desvantagens que os próprios vivenciaram. Então, em uma análise profunda sobre
as relações familiares e as estruturas sociais é possível perceber segundo Bourdieu
(2003. P.48) que os jovens das camadas superiores estarão mais propensos a
receber resultados significativos em seus conhecimentos culturais, do que aqueles
que pertencem às classes baixas.

15 Bourdieu utiliza a palavra agente para superar a noção de sujeito, pois para o mesmo, os agentes
são aqueles que agem e lutam dentro do campo de interesses, superando assim a posição de ser
estático.
16
Conjunto dos costumes e hábitos fundamentais, no âmbito do comportamento (instituições,
afazeres etc.) e da cultura (valores, ideias ou crenças), característicos de uma determinada
coletividade, época ou região.
O nível de capital cultural proposto a uma criança de uma classe social
elevada, vai ser mais enriquecedor no que diz respeito, a educação e as
oportunidades que os pais oferecerão a mesma, seja na língua, no conhecimento e
informações de mundo, na educação ou na visão simplificada e fácil de como
ascender no meio social, enquanto as classes baixas que continuam tendo uma
visão subalternizadas e oprimidas, irão propagar para seus filhos, uma falta de
perspectiva para com o ensino, e o capital cultural que também foram recebidos
pelos seus pais e avós ao longo dos anos.

[...] assim compreende por que a pequena burguesia, classe de transição,


adere mais fortemente aos valores escolares, por que a escola lhes oferece
chances razoáveis de satisfazer a todas suas expectativas, confundindo os
valores do êxito social com os do prestigio cultural. Diferentemente das
crianças oriundas das classes populares, que são duplamente prejudicadas
no que respeita a facilidade de assimilar a cultura e a propensão para
adquiri-la[...] Bourdieu, (2003. P.48)

A classe operaria não enxerga uma possibilidade de ascensão por meio dos
estudos devido a forma com que o ensino superior é passado, geralmente essa
modalidade de ensino tem um alto custo e devem ser financiadas pelos pais, com
isso também vem o reflexo das estatísticas, pois “as chances objetivas de chegar ao
ensino superior são quarenta vezes mais fortes para um jovem de camada superior
que para um filho de operário” como afirma o autor. Além da baixa estatística que o
aluno da classe operaria tem para concluir o ensino superior, e a falta de
perspectivas em prol do ensino apresentadas pelo pais referente ao modelo
curricular, o aluno ainda irá se deparar com a influência negativa da visão da
educação sobre sua própria condição, educação esta, que deveria ser igualitária e
universal, porém propaga as desigualdades e favorece a estratificação social.
As crianças dos meios mais favorecidos não se beneficiam somente do capital
econômico dos pais, onde detém e provem de todos as regalias que o dinheiro
podem oferecer, mas também desfrutam dos saberes, gostos refinados para a arte,
estética, para o teatro e outros lugares de espaço ocupados por essas classes com
alto poder aquisitivo. Por outro lado, até a língua utilizada pelas classes baixas serão
um empecilho a sua vida acadêmica, onde a falta de um refinamento das palavras
ou de um vocabulário extenso será visto pela instituição escolar com maus olhos,
pois o sistema educacional é voltado para uma cultura aristocrática17 que privilegia
as relações econômicas e o alto poder aquisitivo.
Para Bourdieu a educação escolar sendo um patrimônio adquirido pelo capital
cultural, assim como o capital econômico, determina onde os agentes irão
permanecer ou se locomover nas classes sociais, por tanto a distribuição de
conhecimento estratificasse de indivíduo para indivíduo de acordo com o patrimônio
dos mesmos. Geralmente o espaço escolar contribui para a reprodução dos capitais
entre gerações e gerações, eliminando e marginalizando os alunos das classes
populares, estes que são forçados a receber uma educação em que a cultura
preponderante é de um nível social muito acima dos deles.

“É porque o ensino tradicional se dirige objetivamente aqueles que devem


ao meio o capital linguístico e cultural que ele exige objetivamente é que
esse ensino pode permitir, senão explicitar suas exigências e não se obrigar
a dar a todos os meios de satisfazê-las” (Bourdieu 2003. P.57)

Bourdieu (2003. P. 57) relata acima sobre como as exigências educacionais


na tradição universitária são impostos aos agentes, e que os mesmos devem vê-las
como uma obrigação a ser seguida; pois já que esses indivíduos estão no ensino
superior, segundo a ideologia18 do campo educacional, então são eles que devem se
adequar e agir de acordo com a cultura e estética predominantes, seja na língua,
nos bons modos ou na maneira de portar-se. Contudo, adequar um aluno a um
ensino superior que não remete as suas raízes, reproduzirá as perspectivas
fracassais de um ensino desfalcado e desigual, visto que se a língua for tratada
como fundamental em seu ensino, e em avaliações, um aluno que não se molda
nem se adequa a mesma, pois em suas raízes não teve acesso ao refinamento
linguístico, irá tender ao fracasso em um discurso oral por exemplo
O sistema educacional que impõe exigências segundo o sociólogo, somente
formará, recrutará e atrairá aqueles que são capazes de satisfazer as demandas que
a instituição pede, pois são indivíduos dotados de capital cultural que foram
construídos desde a infância pelos privilégios a eles oferecidos. Enquanto que,
aqueles que não dominam essa herança cultural da classe social dominante irão

17
Aristocracia significa nobreza. É a classe social superior. O termo aristocracia tem origem no grego
“aristokrateia”, que significa “governo dos melhores”. Aristocracia é uma forma de organização social
e política em que o governo é monopolizado por uma classe privilegiada.
18
Aqui utilizado como ideia proposta.
estar condenados a uma crise de “queda de nível” 19 e se constituirão acreditando
que o espaço escolar pouco pode fazer por si, e que as condições de
subalternização são inerentes e irreversíveis.
Como ressalta Pierre (1964, p.59), a escola “transforma as desigualdades de
fato em desigualdades de direito, as diferenças econômicas e sociais em “distinção
de qualidade”, e legitima a transmissão de herança cultural” pois reproduz a
ideologia de um sistema social que permite a elite, ser detentora do conhecimento e
dos benefícios e privilégios ao longo da vida, e legitima as desigualdades quando
enclausura as classes sociais desfavorecidas a sua própria condição de
subalternidade, levando-os a acreditar que suas inaptidões são resultado da sua
condição de inferioridade e que este é seu destino de berço.

2.3. POR UMA EDUCAÇÃO CIDADÃ: OS DIREITOS HUMANOS COMO PAUTA.

Os direitos humanos, documento criado para legitimar a paz entre as nações


foi elaborado no contexto da segunda guerra mundial, nos estados unidos em 1945,
com o intuito de garantir os direitos universais para todos os seres humanos, como a
liberdade, o respeito, a igualdade e a tolerância entre os diversos grupos que
compõem a sociedade, independentemente de cor, etnia, inclinação política ou
credo religioso. A educação também constitui segundo os direitos humanos como
fundamental para concretização dos mesmos, visto que é a partir dela que serão
legitimados o conhecimento e a igualdade entre as diversas culturas.
Para garantir que os direitos previstos no documento fossem reconhecidos e
amplamente difundidos, foi criado no Brasil em 1996 o primeiro programa nacional
de direitos humanos que tinha como intuito, apresentar formulações e soluções para
a efetivação de políticas públicas que viessem a viabilizar a implementação do
mesmo em todas as áreas sociais, inclusive no campo educacional. Umas das
incumbências a serem cumpridas propostas pelo CNEDH20 foi elaborar um plano
nacional de educação em direitos humanos com monitoramento para que o mesmo
fosse cumprido.

19
O sociólogo utiliza essa expressão para descrever o ato de decair socialmente, ou seja, pessoas
economicamente privilegiadas tendem a serem cada vez mais sucedidas, e indivíduos de classes baixas tendem
a cada dia mais descerem ao nível da pobreza.
20 O Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos (2003)
Em 2003 o primeiro modelo de plano elaborado para com a educação em
direitos humanos veio a público realizado pelo comitê em consonância com os
representantes dos estados da confederação, foi revisado e lançado novamente em
2007. Na sua vertente, a proposta seria de ressaltar a importância do mesmo em
todos os modelos de educação, fosse ela formais ou não-formais21 articulando
“valores, atitudes e práticas sociais que expressam a cultura dos direitos humanos
em todos os espaços da sociedade” (BRASIL, 2009, p. 25), como também a
construção coletiva de práticas sociais em defesa e proteção dos direitos, bem como
o combate as diversas violações nos âmbitos institucionais de educação.
Ficou definido então que a educação voltada para os direitos humanos
poderia ocorrer segundo as diretrizes instituídas pelo conselho nacional de
educação com:

Art. 7º A inserção dos conhecimentos concernentes à Educação em Direitos


Humanos na organização dos currículos da Educação Básica e da
Educação Superior poderá ocorrer das seguintes formas:
I - pela transversalidade, por meio de temas relacionados aos Direitos
Humanos e tratados interdisciplinarmente;
II - como um conteúdo específico de uma das disciplinas já existentes no
currículo escolar;
III - de maneira mista, ou seja, combinando transversalidade e
disciplinaridade.

Parágrafo único. Outras formas de inserção da Educação em Direitos


Humanos poderão ainda ser admitidas na organização curricular das
instituições educativas desde que observadas as especificidades dos níveis
e modalidades da Educação Nacional. BRASIL (2012) apud TOSI, FÁTIMA
(2014, p. 56)

Essas ações foram voltadas para todos as modalidades da educação básica


como também a educação superior, educação e mídia e a educação dos
profissionais dos sistemas de justiça e segurança, e todos os lugares que compõem
uma educação não-formal, estabelecendo que as mesmas deviam ser cumpridas e
inseridas no currículo escolar, seja como disciplina ou como um conteúdo
transversal, ao longo de toda a vida escolar do aluno, de forma continuada e global
Segundo o PNEDH22, a educação dentro do cursor de direitos humanos:

21
O sistema de educação não-formal, configura-se em uma educação que não é formalizada, mas
que pode ocorrer em lugares fora do âmbito escolar.
22
Plano nacional de educação em direitos humanos.
“Deve ser um dos eixos fundamentais da educação básica e
permear o currículo, a formação inicial e continuada dos profissionais da
educação, o projeto político pedagógico da escola, os materiais didático-
pedagógicos, o modelo de gestão e a avaliação” (BRASIL, 2009, p. 32)

A escola como sendo um espaço de circulações de culturas, e protagonista


de um currículo construído pelas diversidades e diferenciações da sociedade tem
como papel fundamental estabelecer e garantir que os direitos ao conhecimento e
ao saber sejam incorporados e distribuídos igualmente para todos,
independentemente das classes sociais, religião, etnia, e lugar de origem do sujeito.
O âmbito escolar constituído como um espaço social é um direito garantido no artigo
205 da constituição federal de 1998 que garante e constitui a educação como “direito
de todos e dever do estado e da família” sendo assim fundamental que seja
instituído e garantido a todos os cidadãos.
Infelizmente, uma educação totalmente voltada para os direitos humanos não
foi instituída ainda como prática nas escolas brasileiras, mesmo com os vários
instrumentos legais que procuram viabilizar esse direito, as violações destes estão
cada vez mais frequentes na escola, onde a discriminação, o preconceito e as
violências se tonam presentes. Pois, é visto que historicamente, a população negra
vem sendo excluída nos diversos espaços das sociedades, tanto educacionais,
como jurídicos, econômicos e políticos, devido à falta de adequação da mesma nos
padrões sociais impostos pelos brancos, o que acabou acarretando significadamente
a negação dos seus direitos básicos, previstos no art IIº dos direitos humanos que
institui que:

Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades


estabelecidos nesta declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de
raça. Cor, sexo, língua religião, opinião política ou de outra natureza, origem
nacional ou social, riqueza nascimento ou qualquer outra condição (O.N.U,
1948)

Os direitos humanos buscam por meios de lutas acabarem com a negação


desses direitos sociais entre os indivíduos aplicando na sociedade uma política de
inclusão social, que valorizem e viabilizem a apropriação digna de qualquer indivíduo
à educação, saúde, cultura e condições humanísticas no mercado de trabalho. Para
que assim ocorram entre todos a igualdade plena de direitos básicos a sobrevivência
e atuação do sujeito no meio social. E é sob essa vertente que se torna necessário
reforçar o papel do espaço escolar como legitimador de uma educação igualitária e
inclusiva para todos, elencando as diversas formas de manifestações culturais e
sociais, os valores, comportamentos e atitudes dos sujeitos.
É o âmbito escolar que deve promover nos espaços educacionais à
igualdade, igualdade está para que todos sejam tratados igualmente pois segundo
Candau (2005, p.18) apud Flávia (2018, P.71) “Não se deve contrapor igualdade e
diferença. De fato, a igualdade não está oposta à diferença, e sim à desigualdade, e
diferença não se opõe à igualdade e sim à padronização, à produção em série, à
uniformidade, a sempre o ‘mesmo’, à ‘mesmice”
Para trabalhar na promoção dessa igualdade para todos, implica antes de
tudo, perceber como está constituído o âmbito organizacional da educação, e
analisar o que o currículo propõe para o enfrentamento das violações, visto que, ele
sendo um conjunto de conteúdos e conhecimentos propostos pela sociedade. Uma
sociedade, que cada dia mais se mostra estratificada e preconceituosa, onde as
classes, as relações de gêneros e raça são ignoradas e subalternizadas. O que
infelizmente acaba reproduzindo as violações de direitos ao invés de combatê-las,
como inicialmente é a proposta dos direitos humanos dentro da educação escolar.
Repensar em um currículo pautado nos direitos humanos se torna necessário,
visto que é ele que rege o conhecimento a ser perpassado entre os alunos e
diversos professores. Então, analisar e respaldar conteúdos e disciplinas que
desenvolvam a igualdade, empatia e valores éticos se torna fundamental para
desenvolver uma educação em consonância com a proposta humanística dos
direitos básicos fundamentais a cada cidadão.

“Para uma tomada de consciência e de ação em busca de


materialidade e de realizabilidade dos direitos, faz-se necessária, portanto,
a pratica educacional constante e profissionalmente formadora da
autonomia dos seus sujeitos para além do respeito formas aos mesmos”
(citação do livro de juliana)

Visando essa perspectiva é preciso que o educador saiba descontruir


conceitos equivocados pré-definidos pela sociedade, que promova a inclusão de
direitos iguais em sala de aula, e que leve os alunos a refletir e analisar suas
atitudes. Hoje em dia é de suma importância a compreensão e a acima de tudo a
aceitação das diferenças entre si e o outro, reconhecer a vasta diversidade cultural
presente no país e aceita-la como fator principal para construção de uma sociedade
diversificada.
A construção de uma sociedade ética, igualitária, e sem preconceitos é
necessária, mas para que essa construção ocorra, é no espaço escolar que o
alicerce deve ser construído. Diante dessa perspectiva os educadores devem antes
de tudo fazer um auto analise das suas práticas, e da sua didática em sala de aula,
sempre procurando despertar a criticidade tanto nele mesmo como também no
aluno, excluir terminantemente da sua pratica pedagógica o elitismo, a alienação, a
hierarquização e as violações de direitos, propondo atividades e práticas que
combatam o preconceito nos ambientes escolares. Pois são os professores com sua
pedagogia que motivam os alunos a se engajarem no cotidiano escolar.
3- A PESQUISA CONCLUSIVA

3.1 A METODOLOGIA DA PESQUISA

Desde o início dos tempos se observou a necessidade inerente do ser


humano em conhecer o mundo e as relações que este implicava na vivencia do
homem. Questões sobre a vida, a morte e os fenômenos da natureza, foram por
muito tempo a base de estudos e pesquisas da humanidade, pois procurar a
verdade sobre aquilo que permeia o espaço de vivencia se tornou uma necessidade
básica do ser humano. As teorias sobre a existência dos seres e da própria
natureza, foram evoluindo e crescendo ao longo do tempo, e desse anseio verídico
de buscas originou-se a ciência, imputável e incansável em seus estudos, e o
homem a tornou a base da pesquisa.
São muitos os métodos de investigação utilizados para facilitar o estudo do
objeto, sendo a observação e a experimentação umas das principais formas de
abordagem da ciência. Estudar o objeto a ser analisado implica no observatório de
suas ações e comportamento perante o espaço vivido. Um dos métodos de
investigação se qualifica como pesquisa qualitativa; de caráter intuitivo, essa
modalidade de pesquisa tem o enfoque de recolher os dados e participar ativamente
dos resultados apresentados ao longo do trabalho. Segundo Bogdan & knopp (1964,
P. 16):

Utilizamos a investigação qualitativa, expressão como um termo genérico


que agrupa diversas estratégias de investigação que partilham
determinadas características. Os dados recolhidos são qualitativos,
designados por o que significa ricos em pormenores descritivos
relativamente a pessoas, locais e conversas, e de complexo tratamento
estatístico. As questões a investigar não se estabelecem mediante a
operacionalização de variáveis, sendo, outros sim, formuladas com o
objetivo de investigar os fenómenos em toda a sua complexidade e em
contexto natural.

A pesquisa qualitativa como bem nos informa os autores, é realizada por meio
das observações constantes com o objeto ou sujeito de estudo, podendo assim ser
recolhido os dados após o contato direto do sujeito no seu contexto e analisados de
uma perspectiva ampla e participativa. Bogdan & knopp (1964, P. 16) ressaltam que,
para que a análise seja bem-sucedida, o pesquisador deve ter em mente o objetivo
da sua pesquisa para que assim consiga guiar-se nos seus estudos, pois,
determinar as interrogativas ao longo do trabalho ajudam-no a conseguir melhores
resultados. O investigador antes de sair a campo deve fundamentar-se teoricamente
para compreender as nuances e informações recolhidas, procurando sempre
desprender-se de preconcepções, pautando sua pesquisa puramente nos seus
estudos teóricos.
O ambiente natural é imprescindível para o êxito da investigação, é a partir da
convivência e o contato direto, que serão recolhidos os dados necessários; esses
dados podem ser reunidos tanto por blocos de papel ou por ferramentas
audiovisuais. Os investigadores qualitativos visitam frequentemente o ambiente de
estudo por que intentam a analisar todo o contexto, podendo assim investigar desde
os protagonistas primários de sua pesquisa até os secundários, com entrevistas,
visitas, observações, etc. A pesquisa qualitativa é descritiva pois utiliza-se de
imagens ou palavras, podendo assim variar seu tempo de estudo dependendo do
grau de intensidade e dificuldade em recolhimentos dos dados dispostos ao longo do
objeto a ser estudado.
Para toda pesquisa se torna necessário que o pesquisador tenha em mente
os objetivos e a delimitação do seu estudo, levando sempre em conta o tema da
investigação como também os métodos mais eficazes para o recolhimento dos
dados, visto que é imprescindível que ele não se distancie do caminho a ser
seguido. O assunto a ser trabalhado deve condizer comas perspectivas éticas a ele
destinado, ou seja, o mesmo deve ter o comprometimento de não estar intimamente
envolvido com o objeto a ser estudado, pois isso poderá atrapalha-lo, principalmente
no que concerne as conclusões que irá divulgar ao público alvo.

Para saber construir o objeto e conhecer o objeto que é construído, é


necessário ter consciência de que todo o objeto propriamente cientifico é
consciente e metodicamente construído, e é necessário conhecer tudo isso
para nos interrogarmos sobre as técnicas de construção das perguntas
formuladas ao objeto. Peirre (1930. P.64)

Convém ressaltar que o pesquisador qualitativo não se dispõe a investigar,


com o objetivo de confirmar ou declarar como verdadeiras hipóteses provenientes
das suas preconcepções, e sim o oposto, à medida que os dados são recolhidos é
que ele analisará todos os aspectos da sua operação. As diferentes perspectivas do
contexto social são observadas, e a visão do informador é valorizada, o pesquisador
aqui citado, sempre irá tentar compreender as experiências e os anseios do
informante acerca do mundo, pois o significado dessas visões serão primordiais,
visto que serão elas que levarão a conclusão do projeto trabalhado por meio dos
estudos do investigador.
Assim como a pesquisa qualitativa, a pesquisa social também analisa o
contexto em que vive seu objeto de estudo, entrementes, esse contexto é analisado
de maneira ampla, visto que o pesquisador social é responsável por estudar a
sociedade e suas implicações, então questões concernentes como o desemprego,
racismo, violência de gênero, etc. são de responsabilidade da pesquisa social, esta
que procura construir representações da vida social e compreende-las
completamente tem como função responder as perguntas importantes que muitas
pessoas almejam, inclusive o próprio cientista social.
O objeto das ciências sociais segundo Minayo (2013, p.12) é “histórico”, pois
cada sociedade se organiza de forma diferenciada, seus costumes e crenças
divergem de povo para povo de acordo com o tempo vivido, sendo percebido então
pelas ciências sociais, esta que analisa desde a cronologia aos atos humanos de
acordo com o tempo histórico em que o sujeito vive. Tendo uma abordagem
qualitativa, a pesquisa social procura recolher os dados cuidadosamente através dos
recursos ferramentais, procurando sempre estudar os membros da sociedade
desprendido totalmente dos seus conhecimentos empíricos na sua arguição.

Todos os seres humanos, em geral, assim como grupos e sociedades


especificas dão significados a suas ações e a suas construções, são
capazes de explicitar as suas intenções de seus atos e projetam e planejam
seu futuro, dentro de um nível de racionalidade sempre presente nas ações
humanas. O nível de conhecimento histórico das ciências sociais está
referido ao nível de consciência histórica da sociedade de seu tempo,
embora essas criações humanas não se confundam. Minayo (2013, p. 12)

A autora deixa explicito essa necessidade do homem de dar uma significação


maior aos seus atos e como o cientista social deve valer-se disso nos seus estudos,
visto que sendo uma parte integrante da sociedade, o pesquisador também se
constitui como ser histórico, que vivencia ou presencia os anseios e frustações do
grupo em que pertence, e que ele sendo também afetado ou favorecido no seu
objeto de estudo, deve-se analisar as implicações que lhe atinge, em outras
palavras, tornar-se também objeto de estudo e questionamento para que consiga
enxergar a sua contribuição da realidade que o cerca.
São muitas as premissas que guiam o trabalho do cientista social, desde a
sua organização as suas ações no campo. Izquierdo (ano, p.10) elenca vários
passos para conduzir a pesquisa com êxito, segundo o mesmo, é necessário que
antes de qualquer passo, haja uma “formulação e execução de um projeto de
pesquisa” seguido de “estudo de obras teóricas relevantes” para que assim, o
pesquisador social tenha embasamento e conhecimentos teóricos necessários para
formular as suas “hipóteses” acerca do estudo que o mesmo está regendo. Assim
como Minayo (2013, p.20) Izquierdo (ano, p.10) reconhece que este conhecimento
compõe o discurso ao decorrer da pesquisa e que para que este trabalho tenha
êxito, a “coleta de dados” e sua análise é necessária.
A pesquisa social, assim como a pesquisa qualitativa pode valer-se de várias
ferramentas para efetuar a sua coleta de dados, meios como entrevistas,
questionários, gravações, imagens entre outros recursos podem ser usados a fim de
auxiliar o pesquisador. Tendo em vista isso e sendo o objeto de pesquisa desse
presente trabalho a identificação da construção identitária dos alunos e alunas
negros na escola Levivo Cândido, foi necessário utilizar algumas ferramentas
citadas logo mais. De início, foi aplicado em uma turma de 9º ano do ensino
fundamental II no turno da tarde, um questionário referente a vida pessoal do aluno
e a sua percepção sobre o papel da escola na sua formação identitária.
Dez alunos se dispuseram a responder o questionário, com idades variantes
entre 14 a 15 anos, todos os alunos, visualmente negros, pertencentes a
comunidade. Sete destes que responderam as questões propostas, são
remanescentes quilombola e estudam na escola desde a educação infantil. Logo
após, foi realizado uma entrevista com quatro alunos que se dispuseram a
responder o questionário. Essa entrevista realizada tinha como função identificar se
a escola contribui na formação identitária do aluno e como esse processo acontece.
Questões referentes sobre os conhecimentos gerais e sociais, como políticas
públicas e o sistema de cotas foram utilizados.

3.2. AS CARACTERÍSTICAS DO SUJEITO DA PESQUISA.

A maioria do público que habita e utilizasse do ensino proporcionado pela


escola compõe-se de indivíduos remanescente quilombolas, visto que a própria
comunidade em sua totalidade é composta por este grupo social. A maioria das
famílias residentes na localidade vivem principalmente da agricultura e do bolsa
família, inclusive os alunos que corroboraram para esta pesquisa são em sua
totalidade filhos de agricultores, e se constituíram vendo os pais trabalharem com a
lavoura para garantir sustento. Os estudantes que proporcionaram os dados para
pesquisa estudam no 9º ano da referida escola, possuindo uma idade variante entre
14 e 15 anos, todos residentes na Carapuça. Visualmente é possível enxerga-los
como sendo negros, porém os mesmos preferem se identificarem como pardos, o
que acabou comprovando além dos registros deixados pelo PPP da escola, a falta
de um projeto ou intervenção elaboradas pela escola na construção identitaria
desses alunos.

3.3. OS RESULTADOS

No Bloco 01 a pergunta se insere sobre “o conhecimento acerca das políticas


auto afirmativas“, Todos os alunos responderam que nunca tinham ouvido falar
sobre as políticas auto afirmativas, portanto não saberiam dizer para quem são
destinadas essas ações e qual a finalidade das mesmas, com essa informação é
possível deduzir que parece haver um desconhecimento por parte dos alunos e
alunas acerca das políticas de inserção de negros no ensino, promovendo a
invisibilidade da igualdade racial.
Referente a questão do Bloco 02 sobre as questões apresentadas, as
respostas mostram que, no que concerne as cotas raciais, aparenta haver uma
apreciação e reconhecimento da importância da existência das mesmas,
principalmente nas vagas que são destinadas às pessoas negras, entrementes,
levando em contraponto a resposta destes mesmos alunos no Bloco 1, é
inconfundível o desconhecimento deles acerca da nomenclatura “auto afirmativas”,
visto que os mesmos não se apropriaram totalmente sobre os objetivos destas
políticas, e desconhecem que as cotas raciais configuram-se como politicas auto
afirmativas.
O Bloco 03 apresenta questões acerca das “relações étnico-raciais” no brasil,
as respostas dos alunos demonstram que existe a carência de um olhar crítico sobre
a discriminação, por parte dos mesmos. A grande maioria destes discentes
responderam que nos dias atuais as pessoas negras não sofrem tanto e que vivem
harmonicamente em sociedade. Pautados em uma visão errônea propagados ao
longo dos séculos, estes, não conseguem perceber o racismo implícito presente nas
ações discriminatórias em sociedade.
O Bloco 04 evidencia o fato de que, os alunos associam a instituição escolar
como uma “adaptadora” de comportamentos. Esta que desperta no aluno a
concepção de que o mesmo deve ser sempre um “cidadão comportado” acaba
demostrando características de uma escola conservadora, visto que procura
estimular nos seus discursos a formatação do indivíduo perante os padrões sociais
exigidos.
Concernente a questão sobre a “perspectiva para o futuro”, o Bloco 05 elucida
que em relação aos anseios dos alunos para o futuro, torna-se claro a perspectiva
dos mesmos perante o egresso no ensino superior, baseado na esperança de uma
mudança de classes social, estes procuram desenvolver-se tanto social como
economicamente.
O Bloco 06 torna claro que perante a contribuição da escola na “formação
identitária” do aluno e da aluna negra é possível perceber que as discussões e
práticas pedagógicas se restringem sobre tudo ao mês de novembro, onde as
práticas pedagógicas não são totalmente eficazes, visto que restringem somente a
brincadeiras e algumas palestras na semana da consciência negra.

3.4 ANÁLISE DOS DADOS

A problemática acerca da construção da identidade negra na escola Levino


Cândido, gerou algumas indagações acerca do entendimento dos alunos sobre
algumas questões concernentes tanto para a formação social como identitária dos
mesmos. O objeto de estudo bem definido, de início indiciou nos resultados sobre o
entendimento dos discentes sobre as políticas públicas autoafirmativas. Os
resultados obtidos apresentados no bloco 1 mostram como esta problemática carece
de maior visibilidade no que diz respeito ao conhecimento e procura das mesmas,
visto que os alunos pouco ou nada sabiam sobre a originalidade das ações auto
afirmativas.
Referente essa questão, se torna cada vez mais necessário às discussões e
ampliações dessas ações na área da educação, pois, os altos índices de
analfabetismo e a ausência de pessoas negras nas universidades apresentados
anteriormente no sub tópico “A interseccionalização entre identidade e classe”
demonstram a falta de representatividade da população negra nesse espaço.
Fazendo um comparativo da fala dos alunos com a visão de Barcelos (1992) é
possível perceber as nuances entre a falta de conhecimento dos alunos e a
ausência de oportunidades garantidas aos mesmos. A grande maioria como afirma o
autor são atingidos com os altos índices de repetência, abandonando a escola antes
de chegarem ao nível superior, o que poderia ser minimizado se os mesmos
soubessem o que são as políticas de autoafirmação, como o PROUNI.
Novamente, a fala de Barcelos (1992) é pertinente quando o mesmo relata
que “os indicadores educacionais mostram que o Brasil ainda não consegue
assegurar igualdade de realização a todos os grupos raciais” pois a desigualdade Commented [U5]: Coloque a tabela aqui e faça o
comentário.
racial é fruto de muitas condições precárias, entre elas se destacam principalmente
a segregação social, a invisibilidade da igualdade racial, e os problemas econômicos
que assolam os negros e os tornam minorias nos espaços de instituições superiores. Commented [U6]: Isso aqui pode ser um dos comentários
da tabela. Apesar da tabela mostrar um quadro de
A escola parece contribuir para essa invisibilidade quando silencia na indicação de desigualdade, o desejo dos alunos é ingressar e permanecer
no ensino superior.
caminhos necessários para as garantias de direitos dos alunos, também perceptível
quando relatam que o foco central da escola é a adaptação comportamental,
indicador de estratégia preventiva a indisciplina, que por mais que a pergunta aos
sujeitos seja referente ao que ele espera da escola, a resposta não está relacionada
a um processo de construção de conhecimento em uma abordagem cientificista,
mas ancorado em um abordagem psicologia da comportamental, por mais que os
profissionais nem compreendam isto.
O foco das discussões apresentadas no 1º e 2º bloco temático demonstram a
dificuldade dos alunos em compreenderem o uso da nomenclatura “Ações
afirmativas” visto que a instituição escolar carece de ações voltadas ao
reconhecimento e valorização de políticas auto afirmativas, impedem assim de levar
o aluno a reconhecer que existem direitos que concedem aos mesmos, o acesso e
permanecia no ensino superior. A estratificação social e as desigualdades raciais
estão presente em todos âmbitos da sociedade, reconhece-las é um passo para a
procura de melhorias tanto educacionais como sociais.
O problema dessa identificação de reconhecimento de direitos e
pertencimento da população negra encontra-se parcialmente naquilo que se
considera igualdade e discriminação, ou seja, parece haver uma não consciência
racial que reverberam na permanência de não identificação do racismo e de outras
violações como sexismo, homofobia, machismo. Quando indagados sobre a Commented [U7]: Trazer citação citação de hall
presença da mulher e do homem negro na sociedade, grande parte dos mesmos
relataram acreditar que há uma democracia racial, pois os negros não são mais tidos
encarcerados como na época da colonização do Brasil. Esta questão é
extremamente preocupante uma vez que mesmo que a escola não direcione
trabalhos para o enfrentamento aos racismo, a disciplina de História do Brasil parece
que também está sendo apagada, uma vez que não se compreende que sem a
escravidão a estrutura econômica brasileira não teria existido, ou seja, o negro
escravizado foi a espinha dorsal da nova economia, fazendo crescer a riqueza do
país que pagava com o seu suor e sangue a apropriação de tudo pela aristocracia
branca. Passamos a citar fala dos alunos: Commented [U8]: Trazer falas dos alunos

Por meio dessas indagações, é possível inferir que o alunado enxerga como
ato de discriminação somente a representação de agressões físicas ou verbais
explícitas, desconsiderando todos os indícios de falta de representatividade nos
espaços sociais, invisibilidade e impedimento ao direito da fala. A partir disso é
inegável que cada vez mais concebe-se intrinsecamente contido no aluno o mito da
democracia racial, este que foi-se propagando ao longo dos séculos e ainda
continua presente no discursos e percepções dos sujeitos na contemporaneidade.
Florestan (1989): na década de 60 já discorria sobre os perigos da
convencionalidade desse pensamento, visto que os resultados de nada seriam
favoráveis aos negros.
O mito - não os fatos - permite ignorar a enormidade da preservação
de desigualdades tão extremas e desumanas como são as desigualdades
raciais no Brasil; dissimula que as vantagens relativas ‘sobem’ - nunca
‘descem’ - na pirâmide racial; e confunde as percepções e as explicações -
mesmo as que têm como ‘críticas’, mas não vão ao fundo das coisas - das
realidades cotidianas.

O autor mostra que enxergar pacificidade entre negros e brancos torna


perigosa às relações étnico-raciais entre os mesmos, pois na medida que essa visão
plácida é propagada, acaba inibindo e naturalizando as práticas preconceituosas e o
sistema de dominação presente nos diversos âmbitos da sociedade. Mais de 50
anos depois, o discurso de Fernandes ainda continua muito atual, uma vez que, o
mito ainda inibe o tratamento desigual e discriminatório e evidencia cada vez mais
as diferenças sociais e os privilégios econômicos dos brancos.
Infelizmente, os alunos da escola Levino Cândido ainda não foram capazes
de identificar essas evidências e por causa disso enxergam as relações étnico
raciais em um canto de superficialidade. A escola nitidamente aquiesce essa visão
quando evita os diálogos e a percepção critica entre as relações de poder presentes
na sociedade. Os alunos parecem não compreender que através da era da
escravidão de 1530 a 1888, o Brasil levou a cabo uma política de liquidação
sistemática dos africanos.
No bloco 04 referente à Escola Conservadora, fica transparente que as Commented [U9]: Falas dos alunos

desigualdades e as estruturas sociais tão citados por Bourdieu (1964), ultrapassam


os muros da escola, onde as desigualdades e o acesso ao conhecimento são
restritos e limitados, e o currículo se configura como um reflexo de legitimação da
dominação dos brancos, ou seja, quanto mais capital cultural mais prevalece o
Habitu.
A escola torna-se um meio de conservação social segundo Bourdieu (1964 )
quando procura formatar o sujeito segundo os padrões sociais impostos pela
dominação branca, as ações, o comportamento e o modo de enxergar o mundo são
limitados aos olhos da cultura branca, judaica e cristã. Com relação ao discurso
parece se tornar evidente essa perspectiva de Bourdieu sobre a escola
conservadora, quando os alunos questionados sobre o papel da escola, respondem
sobre um possível aprendizado para viverem “pacificamente”, ou seja dentro de uma
moral como afirmava Durkhem. No meio social, grande maioria parece compactuar
com a ideia de que a escola tem um papel formador na vida dos mesmos, e que é
imprescindível frequenta-la assim poderão aprender a se comportar em sociedade e
se transformarem em cidadãos de “bem”.

Além de permitir à elite se justificar de ser o que é, a “ideologia do dom”


chave do sistema escolar e do sistema social, contribui para encerrar os
membros das classes desfavorecidas no destino que a sociedade lhes
assinala, levando-os a perceberem como inaptidões naturais, o que não é
senão efeito de uma condição inferior, e persuadindo-os de que eles devem
o seu destino social [...] à sua natureza individual e à sua falta de dons.
Bourdieu (1964, p.59)

Com esse exemplo de Bourdieu (1964/, fica evidente as relações presentes


na escola como o ensino está marcado de desigualdades, onde levam o aluno a
acreditar que seu destino já está totalmente traçado e acabado, e que a base do seu
insucesso provém da sua própria condição social inferiorizada. Desta forma se o
aluno vier a ser um sujeito bem ou mal sucedido, a culpa não será da escola, mas
do próprio aluno.
As práticas dos profissionais da educação também merecem serem revistas
segundo Bourdieu (1964), pois no que concerne a legitimação de desigualdade, o
autor deixa claro que evidentemente os professores também se incluem nessa
perspectiva, visto que serão eles que transmitem o ensino. É importante ressaltar
que o autor reconhece o fato que os educadores também são produtos de uma
cultura aristocrática, e que sendo eles representantes dos meios sociais favorecidos,
tendem a transpassar o conhecimento a partir de suas perspectivas. Então os
valores e os conhecimentos transmitidos pela escola, serão sempre favoráveis a
elite. Commented [U10]: Depois vem para cá 2

No bloco 6, intercalasse essa visão de Bourdieu com as respostas dos


discentes, onde é explicito a necessidade de práticas pedagógicas relacionados a
construção identitária do aluno, ora, se identidade negra não faz parte da vivência e
preocupação da elite, nem muito menos da maioria dos brancos,
consequentemente, os professores não percebem a importância do trabalho voltado
à construção da mesma no seu aluno negro e continuam a legitimar a problemática
da falta de reconhecimento e pertencimento das classes menos favorecidas nos
ambiente sociais. Commented [U11]: Começa aqui 1

Reverter esse quadro torna-se impossível se a escola não se propõe a


mudança, o currículo, o plano político pedagógico e os objetivos da em estudo
devem andar em consonância com a formação critica dos sujeitos/agentes que
frequenta o seu espaço, logicamente, se esta escola oferece um ensino voltado para
uma comunidade quilombola, os alunos anseiam que o ensino esteja voltado a
construção identitária dos mesmos. Bourdieu (1964), Florestan Florestan (1989) e
Barcelos (1992) mostram os erros e os caminhos a serem seguidos para a melhoria
e a mudança. Cabe à escola pautar-se nessa travessia e elevarem o olhar crítico a
necessidade da construção identitária negra no seu espaço.
CONCLUSÃO

Dado o objeto de pesquisa desse trabalho a identificação da construção


identitária negra dos alunos e alunas da Escola Levino Cândido, no município de
Afogados da Ingazeira, foram possíveis alguns apontamentos acerca das práticas
pedagógicas, do trabalho da escola e dos referenciais teóricos apresentados. De
início, foi possível compreender que o processo de auto reconhecimento e a
construção identitária do aluno negro perpassa por algumas problemáticas, visto que
as discussões sistemáticas das relações étnico raciais são inexistentes no que
dizem respeito a equidade entre negros e brancos. Casos esporádicos acontecem
em datas eventuais, como o Dia da Consciência Negra. As identidades pautadas na
vivencia e na representação da sociedade, parecem sofrer um desfalque muito
grande no que diz respeito às suas configurações, pois a cultura dominante é a
branca causando um apagamento das demais culturas, o que decorre na falta de
consciência racial. De tal forma a representatividade negra é silenciada, não
autorizada, não havendo um afrocentrismo.
Há uma invisibilidade na representação negra que ainda caminha a passos
pequenos considerando toda a diversidade étnico que possuímos, pois as imagens
apresentadas na mídia, os espaços sociais, e os currículos escolares ainda
continuam sendo ocupados pela cultura dominante/branca, tornando complicado a
percepção de pertencimento das classes e grupos sociais menos favorecidos.
Essa falta de pertencimento encontrada no âmbito escolar, configura-se como
um problema a ser enfrentado pela população negra estudantil, se esta a
conseguisse enxergar.
Essa percepção vai além do pertencimento, a maioria das pessoas negras
subalternizadas e enclausuradas nas suas próprias condições de inferioridade,
aparentam não perceber também como estão dotados de falta de estruturas e
ausentes de uma visão crítica a cerca de sua própria realidade, pois o mito da
democracia racial ainda é muito presente, e é ele que vela os olhos dos indivíduos e
mascara o racismo com um discurso insuficiente de que negros e brancos vivem
pacificamente, vivem ao invés disso em uma posição social desfavorecida, em uma
falta de representatividade, em uma classe social subalternizada e às margens da
sociedade brasileira.
A partir da análise realizada, podemos perceber que mesmo a partir da Lei
10.639/2003 as escolas vêm à contra mão sobre o estudo desta lei. Na escola em
tela, não se fez diferente. A falta da consciência racial, que é antes de tudo um ato
político e sendo um ato político de resistência, pode-se também ser vista como um
silenciamento sobre a história desta população. Tem que ser também muito mais
que uma simples compreensão da visão simplista cotidiana do racismo. É
fundamental a politização que é situada no âmbito de um movimento social.
São dois grandes paradoxos: de um lado uma escola construída a partir de
uma ideologia antiracial, mas que no seu fazer diário se torna reprodutora de
práticas pedagógicas racistas, invisibilizadora, quando não evidencia histórias de
meninos negros e meninas negras no seu cotidiano. Qual o papel deste currículo?
Qual o papel desta escola? Para que serve a escola? O que na verdade objetiva-se
o PPP? São questões que devem ser pensadas a fim de se construir um norte de
trabalho para este espaço escolar, diverso e negro. Tais questionamentos não
fazem parte do nosso objeto de estudo, mas como toda pesquisa tem vida própria,
não seria diferente com esta. Não tivemos a pretensão de respondê-la, mas temos a
obrigação de socializa-las.
Esse processo de silenciamento pela escola reforça e funciona para enaltecer
e privilegiar a etnia racial, da classe social dominante: a branca. Com isso não
estamos afirmando que a escola constrói estas práticas conscientes, pelo contrário.
São práticas construídas e reproduzidas muitas vezes de forma inconsciente, mas
que se fazem necessário serem coibidas, desmontadas e outras serem construídas.
E ao fazer isso justifica e legitima os privilégios gozados e praticados por eles
durante séculos não só no Brasil mas em toda América Latina. É necessário se
“Afrocentrar”.
A escola conservadora de Pierre Bordieu mais uma vez, parece se adequar a
realidade de muitas instituições presentes do Brasil, inclusive na escola base dessa
pesquisa. Esta que é dotada de práticas voltadas a um sistema de ensino
individualista e elitista, parece impor aos alunos e alunas somente a preparação dos
mesmos para o mercado de trabalho. Indubitavelmente, os alunos veem a escola
como um espaço de imposições de comportamentos e de fabricação de “cidadãos
de bem”, e consideravelmente não enxergam uma formação identitária, portanto as
politicas afirmativas soam como uma recusa a locais de subalternização destinados
a negros e negras. Se a escola não legitima, enquanto institucionalizado, os saberes
desta população, é a resistência que vai fazer com esse patrimônio, as memórias
sejam vivas. A cota é curta, mas o corte é profundo.

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