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Esse estudo buscou identificar nos ciberjornais da região Centro de Portugal o uso das redes sociais
para ampliação dos números de usuários-leitores para valoração da "mercadoria audiência", baseada
no número de visitas e tempo de exposição. A estratégia, com nome provisório de “mercadoria
audiência ampliada”, caracteriza-se pela criação de audiências extras em plataformas de
comunicação na Internet, como o WhatsApp, onde são postados conteúdos para serem apropriados e
compartilhados para outros grupos ou espaços, aumentando sua visualização, acessos e,
consequentemente, o valor dos espaços publicitários e interesse da esfera política, por meio da
cultura da convergência (Jenkins, 2009) e da reprodutibilidade (Jenkins, Ford, & Joshua, 2015). Este
trabalho também revisa o conceito da mercadoria audiência desde a concepção inicial, com Murdock
e Golding (1973) e Smythe (1977), e atualizações por Fuchs (2012), Bolaño (2000), Bolaño & Vieira
(2015) e Dantas (2014). É usada estratégia de triangulação metodológica, incluindo levantamento
exploratório sobre os modelos de receita dos meios online na região Centro e análise qualitativa a
partir de grupos de foco realizado pelo projeto Remedia.Lab, da Universidade da Beira Interior.
Observou-se que os meios utilizam de maneira inscipiente os espaços que a internet dispõe para
produção de audiências extras, porém, a análise no perfil de público indica que a implantação da
estratégia pode não trazer resultados eficazes no atual momento, mas mostra-se imprescindível para
os próximos anos.
This study aimed to identify in cyber journals in the Central region of Portugal the use of social
networks to increase the number of reader-readers to value the "audience commodity", based on the
number of visits and exposure time. The strategy, tentatively named “expanded audience commodity”
is characterized by the creation of extra audiences on Internet communication platforms, such as
WhatsApp, where content is posted to be appropriated and shared to other groups or spaces,
increasing their visualization, access and, consequently, the value of advertising spaces and interest
of the political sphere, through the culture of convergence (Jenkins, 2009) and reproducibility (Jenkins,
Ford, & Joshua, 2015). This paper also reviews the concept of audience commodity from the initial
conception, with Murdock and Golding (1973) and Smythe (1977), and updates by Fuchs (2012),
Bolaño (2000), Bolaño & Vieira (2015) and Dantas (2014 ). A methodological triangulation strategy is
used, including an exploratory survey of online media revenue models in the Centro region and
qualitative analysis from focus groups conducted by the Remedia.Lab project of the University of Beira
Interior. It was observed that the media use the spaces that the internet has for the production of extra
audiences in an incipient way, however, the analysis in the public profile indicates that the
implementation of the strategy may not bring effective results at the present time, but it is essential. for
the next few years.
Introdução
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Utilizaremos o termo “ciberjornalismo” para definir o jornalismo produzido na World Wide Web (Web). Murad
(1999) e Canavilhas (2001) utilizam a denominação “webjornalismo” e argumentam que este termo faz referência
ao suporte técnico, usando como exemplo o telejornalismo, para a televisão, e o radiojornalismo, para o rádio.
Porém, para este trabalho, a terminologia “ciberjornalismo” porque iremos trabalhar com o jornalismo cuja
circulação pode ocorrer fora da Web, apesar de utilizar as conexões da internet. Ou seja, o ciberjornalismo é um
termo mais abrangente e adequado ao nosso caso, pois o conceito de origem, o ciberespaço, engloba tanto a
Web quanto os demais espaços de comunicação da Internet, de acordo com Zamith (2008).
estratégia já se torna últil ao detectar aumento do hábito de leitura de notícias acessando-as
a partir das redes sociais e não diretamente ao site na Web. A notícia precisa fazer-se vista
nos espaços onde a audiência está e, como uma isca, atraí-la para o seu ciberjornal para
que possa ser registrada, produzida como uma mercadoria e vendida.
Mercadoria Audiência
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Ao conceituar a Indústria Cultural, no singular, Adorno e Horkheimer (1946) destacam que ela constitui um
mesmo sistema, onde o rádio, a TV, as revistas e o cinema, por exemplo, são setores desse todo. “[...] Cada setor
é coerente em si mesmo e todos o são em conjunto. Até mesmo as manifestações estéticas de tendências políticas
opostas entoam o mesmo louvor do ritmo de aço” (1946,p. 57). Mas, apesar de atuarem sob a mesma
racionalidade, Raymond Willians (1974) apontou diferenças entre as indústrias culturais que quebrariam a
unidade do sistema. Por esse motivo, atualmente, o termo é utilizado no plural, com a finalidade de indicar que
as várias indústrias culturais, como o cinema, o rádio, a TV, internet e a imprensa escrita possuem estruturação e
lógicas distintas, sistemas de produção, consumo, trabalho e funcionalidades diferentes para o capital.
fundamental para a realização do capital, a manutenção institucional da empresa de
comunicação e a manutenção ideológica do sistema capitalista.
Figura 1 - Adaptação própria do gráfico simplificado das funções das Indústrias Culturais no contexto
da comunicação de massa com base na Televisão Aberta. (Bolaño, 2001, p. 238)
O anunciante não escolhe cada usuário que será alcançado pela publicidade, mas
sim grupos categorizados de acordo com indicadores estabelecidos pelas
empresas que disponibilizam os espaços para anúncios (localização geográfica,
perfil financeiro, gostos pessoais, entre outros), ou mesmo o mecanismo completo
de direcionamento automático da mensagem publicitária ao indivíduo, à medida
que este insere informação. (Bolaño & Vieira, 2014, p. 80)
Acrescenta que quem trabalha para transformar esses dados em mercadorias são
os funcionários das empresas manuseando e elaborando os algoritmos da rede social, por
exemplo. “O que o usuário produz não tem nenhum valor de troca, pois toda a sua atividade
rastreada, assim como o conteúdo eventualmente produzido por ele somente interessa à
empresa como matéria bruta para que os trabalhadores informacionais produzam a
mercadoria audiência de fato” (p.79). Ou seja, a lógica de produção de uma mercadoria
audiência na internet é a mesma dos meios de massa convencionais, como a TV. A principal
diferença, conforme Bolaño & Vieira (2014) e Fuchs (2012) é que ela é produzida por meio
das informações elaboradas pelo próprio usuário, “em geral sem que ele perceba” (Bolaño &
Vieira, 2014, p.80).
Neste ponto devemos observar que a mercadoria em si seria os espaços
publicitários por tempo determinado em paginas de usuários que tenham perfil de
consumidor aproximado do buscado pelo anunciante. Pouco muda na forma de valoração
desses espaços: quanto mais usuários determinada empresa em disputa concorrencial no
ecossistema digital atrair a atenção de usuários, mais valor terá a mercadoria audiência. O
destaque é que a forma de identificar a audiência é muito mais complexa e precisa que os
mecanismos dos meios tradicionais.
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Digital News Report 2019, in: http://www.digitalnewsreport.org/survey/2019/portugal-2019/ Visto em
24/06/2019.
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No âmbito do projeto Remedia.Lab foi realizada pesquisa com grupos de foco com jornalistas e
representantes de direção dos meios regionais da região Centro do país. Foi identificado o
crescimento do número de acessos ao site dos ciberjornais originários das redes sociais e não
diretamente (Noronha, 2019)
remete a visualização para as experiências de navegação da audiência, incluindo os
diversos motivos que fazem a pessoas repassar mensagens e conteúdos a outros.
Assim, para uma definição, consideramos a mercadoria audiência ampliada como
uma estratégia na instância de produção para ampliar o número de usuários e,
consequentemente, o valor de troca da mercadoria audiência. Temos como base
levantamento exploratório sobre a estratégia de ciberjornais de Teresina, capital do Estado
do Piauí, no Brasil, ao criarem grupo de leitores no WhatsApp, o aplicativo para troca
mensagens mais utilizado no país5 e no Piauí6. Nesses espaços são postados links para as
notícias do site original, que podem ser lidas, discutidas, remixadas e propagabilizadas para
outros grupos e usuários individuais no WhatsApp ou mesmo outros espaços sociais online.
Para estruturar a proposta para uma análise materialista, devemos ter como base o
processo de produção apontado por Fuchs (2012): com a produção em dois momentos (P¹ e
P²). Desta forma, com a inserção da estratégia da mercadoria audiência ampliada, o media
oferece dois serviços no primeiro momento de produção (P¹): o primeiro seria o ciberjornal e
o segundo seria o grupo de leitores no WhstsApp, espaço onde usuários ingressam para
receber informações e participar de discussões. Nesse espaço também são postadas as
notícias do ciberjornal em forma de links que poderão ser acessados e compartilhadas. O
usuário que clicar nos links é levado para a página do ciberjornal onde terá sua visita e
tempo de exposição registrados juntamente aos leitores que acessam diretamente a página
Web. Na medida em que estejam atentos e interagem com a publicação no site original são
produzidos como mercadoria audiência para ser vendida à publicidade (P2).
Por fim, ressaltamos que essa situação ocorre em um ambiente de disputa
intercapitalista, conforme descrito por Bolaño (2000), onde os grandes meios possuem mais
condições técnicas para elaborarem ferramentas e conteúdos capazes de atrair a maior
parte do público. Tornam-se marcas reconhecidas e referenciadas, que para Aguado &
Castellet (2013) continuam sendo instrumentos fundamentais para atrair e cativar as
audiências. Porém, novos atores podem alcançar grande atenção utilizando padrão de
qualidade alternativo ao das grandes coorporações de mídia.
Caberia então aos meios regionais procurar um padrão alternativo que alie: reforço
da marca como boa referência em serviço de informação na região; a produção constante
de conteúdo de valor local, considerando que há demanda por notícias de proximidade não
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Dados do próprio WhatsApp, em 2017 o Brasil era o segundo país com maior contingente de
pessoas que utilizam a ferramenta, com 76% respondendo que fazem uso regular. O aplicativo é
utilizado por aproximadamente 120 milhões de pessoas no país, equivalendo a 10% dos usuários no
mundo.
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Pesquisa realizada pelo Instituto Piauiense de Opinião Pública Ltda – Amostragem – para o
Governo do Estado do Piauí, no período de 26 a 30 de janeiro de 2018. Respondendo a pergunta:
qual rede social costuma acessar? Amostra de 1.137 eleitores em 47 municípios Confiabilidade de
95% com margem de erro de 2,85% para mais ou para menos.
coberta por meios nacionais; e, após conseguir atrair uma audiência significante, ter um
plano de negócios capaz de monetizar esses serviços de forma sustentada.
Conclusões
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Digital News Report 2019, in: http://www.digitalnewsreport.org/survey/2019/portugal-2019/ Visto em
24/06/2019.
ciberjornais dificultam a produção de audiências extras que justifiquem maior interesse de
anunciantes e, consequentemente, aumento do CPM dos espaços publicitários e de outras
formas de rentabilidade para esse setor. Ou seja, apesar de ser uma boa alternativa para
agregar valor à mercadoria audiência das indústrias culturais, a estratégia da audiência
extra teria, neste momento, barreiras que dificultam sua efetividade. Por outro lado, há
expectativas de que aumente consideravelmente o consumo de notícias online, porém, até o
momento os ciberjornais regonais não encontraram um modelo que consiga superar a
cultura da gratuidade e rentabilizar-se por este meio, nem os dados levantados em diversas
pesquisas indicam isso. Com base nessas conclusões, quais estratégias os ciberjornais
regionais da região Centro de Portugal devem utilizar para se sustentarem financeiramente?
Primeiramente seria reforçar sua marca como produtora de jornalismo de
qualidade para as notícias locais. Para tanto é necessário investimentos em pessoal e
recursos técnicos como requisitos para a busca de um padrão tecnoestético alternativo
capaz de competir com os maiores grupos de mídia ao oferecer com maior presteza a
notícia de proximidade como um produto de valor aos leitores. Alguns jornais regionais em
papel são referência na área que atuam (por exemplo, o Diário de Coimbra), mas precisam
começar a fazer o mesmo no online.
O segundo direcionamento é utilizar um portifólio amplo de opções de negócios
tanto para o acesso pago aos conteúdos, quanto para agregar valor e comecialização de
publicidade. Por exemplo, ao optar em cobrar por conteúdo deve-se oferecer várias opções
de assinaturas, o que não impede de também ofertar a possibilidade de pagamento por
unidade ou lotes, por meio de micropagamentos. Por fim, utilizar as redes sociais para dar
visibilidade às notícias e fazer com que mais pessoas tenham a possibilidade de acessá-las
mesmo não acendendo diretamente ao site.
Bibliografia
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Murdock, G., & Golding, P. (1973). For a Political Economy of Mass Communications. The
Anexo 1
Tabela resumo de levantamento exploratório sobre modelos de receita dos meios regionais
online da região Centro de Portugal