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Ensino Religioso:

Docência e(m) formação

Laude Erandi Brandenburg


Remí Klein
Iuri Andréas Reblin
Gisela I. W. Streck
(Organizadores)

2013

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© 2013, Faculdades EST
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Os textos contidos nesta coletânea foram originalmente apresentados no IX Simpósio de Ensino


Religioso, realizado entre os dias 29 e 30 de agosto de 2013, promovido pela Pró-Reitoria de
Ensino e Extensão e Grupo de Pesquisa Currículo, Identidade Religiosa e Práxis Educativa da
Faculdades EST, com a coordenação geral da Prof.ª Dr.ª Laude Erandi Brandenburg e o apoio
do Grupo de Pesquisa Educação Religiosa na Infância e Juventude.

Comissão Organizadora do IX Simpósio de Ensino Religioso: Laude Erandi Brandenburg,


Remí Klein, Iuri Andréas Reblin e Gisela Isolde Waechter Streck

Comitê CientíÞco dos textos contidos neste volume: Prof. Dr. Afonso Maria Ligorio Soares
(PUC-SP); Prof. Dr. Arnaldo Érico Huff Júnior (UFJF); Prof.ª Dr.ª Eunice Simões Lins Gomes
(UFPB); Prof. Dr. Lourival José Martins Filho (UDESC); Prof.ª Dr.ª Gisela Isolde Waechter
Streck (Faculdades EST); Prof. Dr. Iuri Andréas Reblin (Faculdades EST); Prof.ª Dr.ª Laude
Erandi Brandenburg (Faculdades EST); Prof. Dr. Leomar Antônio Brustolin (PUC-RS); Prof.
Dr. Remí Klein (Faculdades EST) e Prof. Dr. Sérgio Rogério Azevedo Junqueira (PUCPR)

Revisão: Remí Klein


Compilação: Iuri Andréas Reblin
Capa: Editora Sinodal
Ilustração da capa: Stock xchng: tchor 1974
Produção editorial e gráÞca: Editora Sinodal

Apoio: A publicação deste livro recebeu o apoio do PROEX da CAPES, entidade governa-
mental brasileira de incentivo à pesquisa cientíÞca voltada à formação de recursos humanos.

E61 Ensino religioso: docência e(m) formação / [Organizado por] Laude Erandi
Brandenburg, Remí Klein, Iuri Andréas Reblin e Gisela I. W. Streck. – São
Leopoldo : Sinodal/EST, 2013.

16x23 cm. ; 448p.

ISBN 978-85-8194-011-3
IX Simpósio de Ensino Religioso

1. Educação cristã. 2. Ensino religioso. I. Brandenburg, Laude Erandi.


II. Klein, Remí. III. Reblin, Iuri Andréas. IV. Streck, Gisela I. W. V. IX Simpósio
de Ensino Religioso.

CDU 2:37
Catalogação na publicação: Leandro Augusto dos Santos Lima – CRB 10/1273

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As histórias em quadrinhos
como possibilidade pedagógica para o Ensino Religioso

Iuri Andréas Reblin1

E, assim, é fácil entender por que a Þcção nos fascina tanto.


Ela nos proporciona a oportunidade de utilizar
inÞnitamente nossas faculdades para perceber
o mundo e reconstituir o passado.
Umberto Eco2

As histórias que contamos

Em um romance intitulado A Misteriosa Chama da Rainha Loana,


Umberto Eco narra a história de um colecionador de livros raros que perde
sua memória emocional após sofrer um acidente vascular cerebral. Para re-
construir sua própria história e sua visão de mundo, o protagonista revisita seu
passado por meio das histórias e das imagens dos bens culturais que marcaram
sua infância e juventude, dentre os quais estavam uma série de histórias em
quadrinhos. E é nesse processo de revisitar seu passado que o protagonista
acaba se reinventando e, dessa forma, reacendendo as chamas que o Þzeram
ser quem ele é.3
Essa história bastante peculiar, cujos mistérios e particularidades não
serão revelados aqui, aproxima-se ilustrativamente daquilo que Jorge Larrosa
escreveu sobre a formação humana; isto é, de que para saber quem se é não há
outro caminho a não ser percorrer as ruínas da biblioteca pessoal e dos frag-
mentos das histórias herdadas, recebidas, lidas, incorporadas e adaptadas que

1
Doutor em Teologia com o apoio do CNPq e professor da Faculdades EST, em São Leopol-
do/RS, atuando como coordenador técnico de publicações, eventos e EAD da instituição.
É autor de “Para o alto e avante: uma análise do universo criativo dos super-heróis” e de
“Outros cheiros, outros sabores, o pensamento teológico de Rubem Alves”, além de autor de
diversos artigos e capítulos e organizador de livros envolvendo principalmente os seguintes
temas: teologia, arte e cultura; religião e educação, histórias em quadrinhos, cinema e supe-
raventura. Contato: reblin_iar@yahoo.com.br
2
ECO, Umberto. Seis passeios pelos bosques da Þcção. 9. reimpr. São Paulo: Companhia das
Letras, 2004. p. 137.
3
ECO, Umberto. A Misteriosa Chama da Rainha Loana. Rio de Janeiro: Record, 2005.

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a constituem.4 Em outras palavras, a formação do ser humano – ou, antes, a in-


venção deste, visto que o ser humano cria seus universos simbólico-culturais
na tentativa de se entender no mundo e fazer dele um lugar habitável – passa
pelo ato de contar e ouvir histórias. O ato de contar histórias, orais, escritas ou
audiovisuais, Þccionais, inspiradas ou baseadas em histórias ou experiências
de vida é uma das operações fundamentais da experiência humana de viver,
de criar um universo simbólico, uma memória, enÞm, de construir sua própria
história.5 É por isso que o ser humano tem contado histórias desde os primór-
dios de sua existência, ido a cinemas e teatros, composto músicas, escrito
livros, entoado salmos e orações, lido e produzido histórias em quadrinhos.
As histórias em quadrinhos inserem-se no conjunto de bens culturais
que forjam e alimentam esse universo simbólico do ser humano e elas são
igualmente uma expressão deste. Logo, tudo aquilo que constitui esse uni-
verso simbólico-cultural encontra eco nas histórias em quadrinhos: leitura de
mundo, economia, política, organização social, religião, concepções da reali-
dade. Isso porque toda história, para se tornar inteligível, e, sobretudo, para
corresponder à sua raison d’être, de conceder um sentido para a existência
humana, está baseada no mundo real, na realidade (aqui compreendida sim-
plesmente como um contraponto ao mundo Þccional, o mundo vivido; sem
adentrar nos debates ÞlosóÞcos sobre o que pode ou não ser o real). Nas pa-
lavras de Umberto Eco, “todo o mundo Þccional se apoia parasiticamente no
mundo real, que toma por seu pano de fundo”6. Desse modo, tudo pode ser
encontrado nas histórias, com ênfases e proporções distintas, sujeitas à inten-
ção do autor e da narrativa. E é nessa direção que a religiosidade e a teologia
enquanto facetas do mundo humano adquirem expressão nas diferentes artes
de se contar histórias, entre elas, nas histórias em quadrinhos.

A teologia do cotidiano

O pensamento teológico, as concepções religiosas, a religião tanto en-


quanto fenômeno quanto enquanto instituição, assim como as mais diferentes
experiências do sagrado e suas condensações inteligíveis em argumentações,
símbolos ou bens culturais, fazem parte do universo simbólico-cultural huma-

4
LARROSA, Jorge. Pedagogia Profana: danças, piruetas e mascaradas. 4. ed. 3. reimpr.
Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
5
REBLIN, Iuri Andréas. A Superaventura: da narratividade e sua expressividade à sua po-
tencialidade teológica. 2012b. 257 f. Tese (Doutorado em Teologia) – Faculdades EST, São
Leopoldo, 2012. p. 76-94.
6
ECO, 2004, p. 99.

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no. Aqueles não existem fora deste, visto que emergem justamente da relação
do ser humano com o mundo à sua volta, em sua tentativa incessante de orga-
nizar o mundo na perspectiva de seus valores, ou, como sugeriu Max Scheler,
na perspectiva do amor.7 A religião (e aqui não se referindo à religião enquanto
instituição, mas enquanto experiência) é a expressão máxima desse movimen-
to e, justamente por isso, ela encontra lugar nos mais diversos bens culturais.8
A teologia, por sua vez, é muito mais que um saber acadêmico ou eclesiástico.

A teologia não é apenas ciência eclesiástica. Ela não se restringe a esta. Falar
em teologia não é repetir dogmas, nem apenas pensá-los enquanto que a vida
acontece. Falar em teologia é, principalmente e, em primeiro lugar, mergu-
lhar dentro de cada indivíduo, em sua história pessoal, em seus encontros e
desencontros diante da ambiguidade da vida. Falar em teologia é dizer acerca
das coisas divinas, das coisas sagradas, das coisas melhores, dos relaciona-
mentos entre as pessoas e o mundo que as cercam, da natureza, da fé, das
motivações humanas. Falar em teologia é falar daquilo que faz as pessoas
aguentarem Þrmes diante da morte e aguentarem Þrmes durante a vida, é
falar de situações de desespero, de angústia e também é falar dos sinais de
esperança.9

O movimento de tornar inteligíveis as experiências com o sagrado, a


esperança, o sentido último para o qual a vida humana aspira, a compreensão
ou a insatisfação diante do sofrimento e da morte, a fagulha de esperança por
uma nova ordem quando tudo parece perdido, a certeza de que a vida não se
reduz ao acaso e à coincidência; enÞm, a atividade chamada de teologia per-
meia toda a vida cotidiana. Como asseverado em outra ocasião, “teologia é
jogo que se joga quando a vida está em jogo”10. Ela é inerente à vida humana
e emerge da tentativa humana de se compreender no mundo. Ou ainda como
aÞrmou Rubem Alves: “E é quando a dor bate à porta e se esgotam os recursos
da técnica que nas pessoas acordam os videntes, os exorcistas, os mágicos, os

7
SCHELER, Max. “Ordo amoris”. In: ______. Gesammelte Werke. Zurique: Francke Verlag,
1957. v. 10, p. 347-376.
8
Cf. REBLIN, Iuri Andréas. Teologia, arte e cultura: os caminhos da teologia do cotidiano.
In: JACOBSEN, Eneida; SINNER, Rudolf von; ZWETSCH, Roberto E. (Orgs.). Teologia
Pública: desaÞos sociais e culturais. São Leopoldo: Sinodal, EST, 2012c. p. 181-200.
9
REBLIN, Iuri Andréas. A teologia do cotidiano. In: BOBSIN, Oneide et al. (Orgs.). Uma
religião chamada Brasil: estudos sobre religião e contexto brasileiro. São Leopoldo: Oikos,
2008a. p. 85-86.
10
REBLIN, Iuri Andréas. A não ciência de Deus a partir de Rubem Alves. In: SCHAPER, Va-
lério Guilherme et al. (Orgs.). Deuses e Ciências na América Latina. São Leopoldo: Oikos/
EST, 2012a. p.110-121. p. 111.

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curadores, os benzedores, os sacerdotes, os profetas e poetas, aquele que reza


e suplica, sem saber direito a quem [...]”11. Essa experiência religiosa articu-
lada argumentativamente diante dos desaÞos emergentes da dinâmica da vida
humana transcende os muros eclesiásticos e acadêmicos que permeiam a vida
cotidiana e encontra expressão nos mais diferentes bens culturais. Assim, o
que se encontrará nas histórias em quadrinhos não é um pensamento religioso
ou teológico ortodoxo, mas antes elementos teológicos resultantes de expe-
riências de vida, sujeitos tanto à intencionalidade da narrativa quanto aos va-
lores e às crenças do próprio autor; em um conceito: a teologia do cotidiano12.

A teologia do cotidiano é a articulação da religiosidade do sujeito ordinário


nos mais distintos planos de expressão. Trata-se daquilo que as pessoas em
sua vida diária creem e expressam – frequentemente de forma não tão sis-
tematizada quanto uma academia de teologia ou uma instituição religiosa
o faria – e que não coincide obrigatoriamente com o anúncio proclamado
por uma determinada fé religiosa (institucionalizada) ou com compreensões
Þxadas dogmaticamente. Na verdade, a teologia do cotidiano compreende-
-se de perguntas e de respostas formuladas por não teólogos (i.e., alguém
não formado por uma academia de teologia ou que não seja clérigo de uma
instituição religiosa) diante das situações-problema com as quais esses se
deparam ao longo de suas vidas. Essas perguntas e respostas são capazes
de suprir suas necessidades de sentido, ao menos, em um dado momento de
suas vidas.13

Portanto, realizar um olhar hermenêutico às histórias em quadrinhos


(assim como a outros bens culturais contemporâneos) pode revelar muito não
apenas sobre como o ser humano se entende no mundo e representa sua vida
cotidiana, mas também o que ele crê, espera, teme, anseia; isto é, um olhar
hermenêutico às histórias pode revelar os valores, os temores e as projeções
que o ser humano faz sobre si mesmo, suas crenças particulares e sobre seu
próprio universo. Entretanto, não se trata de simples representação e apre-
sentação da realidade ou uma visão da realidade numa perspectiva narrativa,
pois os bens culturais contemporâneos se inserem nas dinâmicas que regem as
próprias relações da vida social, que representam e correspondem a um tempo
especíÞco.

11
ALVES, Rubem. O que é religião? 6. ed. São Paulo: Loyola, 2005a. p. 12.
12
REBLIN, 2008, p. 82-96. Cf. também REBLIN, 2012b, p. 151ss.
13
REBLIN, 2008, p. 91.

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A narrativa contemporânea e seu super-homem

As histórias em quadrinhos, como outros inúmeros bens culturais


contemporâneos, obedecem à lógica do mercado, característica dos bens cul-
turais da era contemporânea pós-Revolução Industrial. Isso signiÞca que elas,
assim como um bom Þlme, um romance de folhetim impresso ou televisivo,
não apenas apresentam e representam o universo simbólico-cultural huma-
no, como também visam corresponder a uma apresentação ou representação
especíÞca. O que rege o sucesso e a continuidade de uma história, seriada
ou não, é seu potencial mercadológico (grande parte do sucesso de Þlmes
“arrasa-quarteirão”, os blockbusters, deve-se ao fato de corresponder a um
ideal projetado e incutido no telespectador). Isto é, não se trata (somente) se
uma história é capaz de provocar ou evocar uma experiência ou insights em
seus consumidores, mas se ela é capaz de corresponder às expectativas Þnan-
ceiras de seus produtores. Essa equação não é simples de ser resolvida, uma
vez que os próprios anseios que seus consumidores querem ver projetados nas
histórias são, em grande parte, intencionalmente estimulados pelos produto-
res. Esse ideal projetado pelos consumidores de histórias e estimulado por
seus produtores ressoa naquilo que Umberto Eco chamou de “super-homem
de massa”, o protagonista das narrativas contemporâneas.
Uma das características recorrentes da narrativa contemporânea é a
correspondência da expectativa do leitor. Todos esperam que o bandido seja
preso ou mesmo morto no Þnal da trama, que o herói consiga salvar o mundo
e que termine nos braços da garota, assim como ninguém deseja que a história
cristã de salvação termine na cruz. Por mais variadas que as tramas e as arti-
manhas da narrativa sejam, a esperança é que tudo termine em um “Þnal feliz”
ou “satisfatório” a partir do que é imaginado por quem lê a história. Quando
isso acontece (e acontece com muito mais frequência do que se pressupõe),
a narrativa satisfaz o interesse do leitor e se torna consolatória. Essa narrati-
va, chamada igualmente de “popular” (não necessariamente por atingir uma
grande massa, mas justamente por ter essa função consolatória e satisfazer as
angústias de sua audiência, conforme lembrou Eco14), é justamente aquela que
predomina na era contemporânea e está presente nos Þlmes, nas novelas, nos
livros, nas histórias em quadrinhos e, mesmo, nas músicas. Para acionar essa
função consolatória,

14
ECO, Umberto. O Super-Homem de Massa. São Paulo: Perspectiva, 1991. p. 22ss. (Deba-
tes; 238).

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[...] o romance popular acionará numerosos artifícios que já motivaram um


inventário e poderiam dar origem a um sistema. Constitui ele uma combina-
tória de lugares-comuns articulados entre si segundo uma tradição em que
se mesclam o ancestral [...] e o especíÞco [...]. E atuará sobre caracteres
pré-fabricados, tanto mais aceitáveis e amados quanto mais conhecidos: em
todo caso, virgens de toda e qualquer penetração psicológica, à semelhança
das personagens das fábulas. Quanto ao estilo, lançará mão de soluções pré-
-constituídas, aptas a proporcionar ao leitor as alegrias do reconhecimento
do já-conhecido. E jogará com iterações contínuas, a Þm de proporcionar ao
leitor o prazer regressivo do retorno ao esperado. E desvirtuará, reduzindo a
clichês, as soluções, em outras circunstâncias, inventivas da literatura prece-
dente. Mas ao fazê-lo desencadeará tamanha energia, liberará tamanha felici-
dade, se não inventiva pelo menos combinatória, que seria hipócrita ocultar-
mos os prazeres que propicia: porque ele representa o enredo no estado puro;
ileso e livre de tensões problemáticas. Cumpre reconhecermos que a alegria
da consolação responde a profundas exigências se não de nosso espírito, pelo
menos de nosso sistema nervoso. Por isso muitos representantes do romance
“problemático”, e primeiro entre todos Balzac, valeram-se copiosamente do
arsenal do romance popular15.

O super-homem de massa é, por sua vez, o grande protagonista dessas


narrativas e se constitui em um modelo capaz de corresponder aos anseios de
sua audiência. É um personagem carismático, geralmente, um indivíduo, que
pode atuar à margem da sociedade, um “fora da lei”, sobretudo para resolver
as contradições e trazer a justiça (ou um sentimento de justiça) e restaurar
a ordem ou o sistema (a estrutura social) ao seu ponto de partida. Os super-
-heróis agem nessa direção, na medida em que eles atuam como foras da lei,
combatendo as injustiças e trazendo a ordem para a vida social, sem necessa-
riamente questionar a organização dessa vida social e as consequências que
essa organização acarreta. Eles prendem bandidos e evitam que pessoas sejam
assaltadas à noite, sem colocar em xeque os fatores que provocam as dispari-
dades sociais, por exemplo. Entretanto, conforme ressaltou Eco, é necessário
considerar o super-homem de massa “como uma história contraditória onde
questões ideológicas, lógica das estruturas narrativas e dialética do mercado
editorial emaranham-se num nó problemático nada fácil de desfazer”16.
Os entrelaçamentos que constituem as teias narrativas contemporâ-
neas são muito mais complexos e diversiÞcados que o exemplo acima foi ca-
paz de ilustrar. Além disso, é necessário evitar o reducionismo e a concepção

15
ECO, 1991, p. 23-24.
16
ECO, 1991, p. 14.

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As histórias em quadrinhos como possibilidade pedagógica 65

simplista de que as narrativas contemporâneas são ou a expressão da decadên-


cia de uma cultura erudita de outrora ou a consolidação da democratização do
acesso aos bens culturais; isto é, ou há a concentração numa crítica exacerbada
dos bens culturais contemporâneos ou a acentuação numa visão por demais
otimista. A mesma ressalva é válida para a questão do Kitsch ou do coeÞciente
de comercialização desses bens culturais enquanto critério de avaliação do
status de determinada produção artístico-cultural. Tanto um Þlme de Steven
Spielberg quanto um quadro de Picasso possuem um “que” de Kitsch, à medi-
da que são comercializáveis, provocando em sua audiência efeitos. Em outras
palavras, a discussão acerca dos bens culturais da era contemporânea precisa
ir além de uma avaliação a partir de uma organização aristocrática nostál-
gica de um tempo que não existe mais e, ao mesmo tempo, precisa ostentar
uma criticidade calcada nos meandros que forjam a própria estrutura social
contemporânea.17 É necessário, pois, entender as narrativas contemporâneas
como estruturas imbricadas numa rede complexa de relações que compreen-
dem tanto retratos do tempo e do mundo, quanto intenções mercadológicas,
ideologias e a dinâmica das estruturas narrativas.

A teologia do cotidiano e as histórias em quadrinhos

As experiências religiosas e as teologias inserem-se nas histórias em


quadrinhos à medida que servem aos propósitos da narrativa, quer sejam esses
propósitos internos (atinentes ao enredo), quer sejam externos (atinentes aos
interesses de seus autores ou aos propósitos da editora). Há uma variedade de
produções que apresentam narrativas com temas religiosos, ou melhor, uma
inÞnidade de histórias especíÞcas de determinadas tradições ou conÞssões
religiosas que são traduzidas em histórias em quadrinhos. Essas são prove-
nientes de iniciativas de instituições religiosas ou editoras a essas vinculadas,
editoras independentes (que tentam alcançar uma fatia do mercado religioso)
ou mesmo de autores desconhecidos e renomados que têm a necessidade de
apresentar sua leitura dos eventos religiosos e sua experiência com o sagrado.
Nessa direção, as narrativas bíblico-cristãs são um tema recorrente,
adaptadas para os mais variados estilos e direcionadas aos mais diferentes pú-
blicos. Vale lembrar que, já na década de 1950, a Editora Brasil-América Ltda.
(EBAL) lançou uma versão em quadrinhos da Bíblia, assim como adaptou
outros romances clássicos da literatura brasileira com o intuito de combater

17
Cf. a discussão sobre o status da cultura contemporânea em: ECO, Umberto. Apocalípticos
e Integrados. 6. ed. 1. reimpr. São Paulo: Perspectiva, 2004. p. 7-88. (Debates; 19).

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a visão da época de que as histórias em quadrinhos poderiam ser nocivas ao


desenvolvimento das crianças. Ao contrário, elas podiam contribuir, inclusive,
na compreensão de ensinamentos religiosos. Hoje há uma variedade signiÞ-
cativa de adaptações de textos sagrados voltadas a crianças, jovens e adultos
destinada tanto àqueles que buscam um estilo mais rebuscado quanto àqueles
que se interessam pelo traço mais simples.
Uma dessas adaptações é a versão em mangá dos textos sagrados do
cristianismo (Figuras 1 a 3), representada tanto na interpretação de Siku (Aji-
bayo Akinsiku), que estudou teologia na Escola de Teologia de Londres, quan-
to na visão da Editorial Filhos da Graça. Atualmente não é possível compreen-
der o mangá simplesmente como “quadrinho japonês”, mas como um “estilo
narrativo” largamente empregado na produção das histórias em quadrinhos
e utilizado como técnica para se contar e se adaptar as mais diferentes histó-
rias, devido, sobretudo, ao sucesso e ao consumo astronômico dos quadrinhos
japoneses mundo afora. Uma das peculiaridades desse “estilo” está no traço
simples (sem o impressionismo que reside nos quadrinhos estadunidenses) e
na reprodução técnica (impressão geralmente em preto e branco e papel sim-
ples, o que barateia o custo).

Figuras 1 e 2: A Bíblia em mangá por Siku

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Figura 3: Jesus em mangá da Editorial Filhos da Graça

Também há adaptações mais soÞsticadas, como o projeto concebido


e supervisionado por Alexandre de Freitas e, sobretudo, a de Sérgio Cariello,
que já desenhou histórias de super-heróis das duas maiores editoras dos Es-
tados Unidos, a DC Comics e a Marvel Comics. O primeiro foi realizado por
uma equipe composta por vários artistas do ramo, com o apoio do governo
federal, destinado a crianças e distribuído em creches e escolas da cidade de
Recife, Estado do Pernambuco. O segundo, a “Bíblia em Ação”, de Sérgio
Cariello, por sua vez, foi lançado originalmente nos Estados Unidos e recen-
temente traduzido e publicado no Brasil pela GeográÞca Editora.

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Figuras 4 e 5: A Bíblia segundo


Alexandre de Freitas
e A Bíblia em Ação,
de Sérgio Cariello

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As personagens de Maurício de Souza também apresentam as histó-


rias bíblicas para as crianças por meio da representação das principais narra-
tivas que perpassam os textos sagrados, no traço e no estilo narrativo próprio
da Turma da Mônica (Figura 6).

Figura 6: A Bíblia com a Turma da Mônica

Entretanto, não são apenas as narrativas bíblico-cristãs que são trans-


postas para as histórias em quadrinhos. Os dois volumes concebidos por Do-
minique Bar, Louis-Bernard Koch e Guy Lehideux, por exemplo, apresentam
a história de vida do papa João Paulo II às novas gerações (Figuras 6 e 7).
Além disso, também há a adaptação de outras personagens religiosas (ecle-
siais) como histórias de santos como Francisco de Assis e de líderes religiosos
como Martin Luther King Jr. (Figura 8).

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Figuras 6 e 7: A história de João Paulo II, volumes 1 e 2

Figura 8: Adaptação da luta de Martin Luther King Jr.,


no Brasil, pela Martins Fontes.

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As histórias em quadrinhos como possibilidade pedagógica 71

Há também produções de
autores que utilizam elementos do
universo religioso para contar ou-
tras histórias, quer sejam anedotas
ou adaptações livres; isto é, não se
trata de uma adaptação das histó-
rias bíblicas, mas da utilização de
motivos atinentes ao imaginário re-
ligioso e as concepções provenien-
tes de um senso religioso comum.
A coletânea das tiras de Laerte pu-
blicada pela Editora Olho D’Água
é um bom exemplo disso (Figuras
9 a 11). Com sagacidade e bom hu-
mor, o artista brinca com conceitos
sedimentados e os mais diferentes
estereótipos relacionados à esfera
religiosa. Não tem a pretensão pela
verdade e pela Þdelidade ao que se
possa falar sobre Deus ou mesmo
sobre o universo do “sobrenatu-
ral”, mas provocar a ironia e o
questionamento das ideias (abso-
lutas) que por vezes se possa vir a
se fazer das coisas sagradas. Como
aÞrmou Frei Betto, no prefácio do
primeiro volume, “O que Laerte
faz é um santo humor. Livra-nos
daquela imagem de um Deus car-
rancudo, mal humorado, provedor
do inferno, para nos aproximar da
imagem evangélica que Jesus nos
passa: Deus é amor, mais íntimo a Figuras 9, 10 e 11: Tiras de Laerte
nós do que nós a nós mesmo, como com motivos religiosos
dizia Santo Agostinho”18. pela Editora Olho d’Água

18
BETTO, Frei. Brincando nos Campos do Senhor. In: DEUS segundo Laerte. 5. ed. São
Paulo: Olho D’Água, 2005. p. 5.

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Nessa mesma direção ca-


minham as tiras de Carlos Ruas,
compiladas em duas coletâneas
“Um sábado qualquer...” e “Bote-
co dos Deuses”, publicadas pela
Devir e pela Verus, respectiva-
mente (Figuras 12 e 13). Por meio
de diálogos entre Deus, Adão, Eva
e o Diabo, o artista questiona e si-
multaneamente apresenta como
o imaginário religioso brasileiro
está constituído. Tanto em Laer-
te quanto em Ruas, há a imagem
do “bom velhinho”, que observa
“de cima” o que está acontecendo
com o mundo, intervindo quando
necessário.
Já Yeshuah é uma adap-
tação livre da história da vida de
Jesus segundo a interpretação de
Laudo Ferreira e Omar Viñole (Fi-
guras 14 e 15). A série, ainda em
andamento (que terá um total de
três volumes), conta a história de
Jesus adaptada livremente a partir
de pesquisas realizadas nos e sobre
os evangelhos canônicos e con-
sultas em produções relacionadas
(textos literários, evangelhos apó- Figuras 12 e 13: O mundo do Deus
crifos, Þlmes etc.). O resultado é cristão e dos deuses do mundo
uma obra instigante, lapidada, com segundo Carlos Ruas
narrativa bem constituída e que
prima pelo cuidado e pelo respeito às fontes.

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As histórias em quadrinhos como possibilidade pedagógica 73

Figuras 15 e 16: volumes 1 e 2 da série Yeshuah,


de Laudo Ferreira e Omar Viñole

Todas essas produções exploram (no bom sentido do termo) elemen-


tos ou temas extraídos do universo religioso. E todas essas produções são
adaptações e releituras desse mesmo universo, cada qual ao seu modo. Por
mais próxima que uma adaptação possa ser daquilo que se considera ortodoxo
em uma conÞssão de fé, há sempre a visão e os propósitos de seu autor embu-
tidos, da mesma forma que os próprios evangelistas inseriram suas próprias
perspectivas e interesses ao redigir seus escritos. Se Lucas enfatiza a discre-
pância social, Mateus prefere dar um tom mais catequético ao seu evangelho,
por exemplo. Isso não anula nem um, nem outro, nem os torna mais ou menos
interessantes para se compreender a experiência de fé. Antes, lança um olhar
plural e diverso sobre essa mesma experiência. E nessa direção residem as
histórias em quadrinhos e quais histórias elas podem contar.
A justaposição harmoniosa entre texto e imagem e a utilização de re-
cursos gráÞcos, assim como o uso de imagens em si, ampliam signiÞcativa-
mente a experiência que a audiência possa vir a ter com a leitura das histó-
rias. Também indicam os interesses e os elementos desse imaginário religioso.
Assim o estilo do traço, as cores, a retratação do ambiente, os discursos são
capazes de revelar os contornos desse imaginário compactuado pelos autores,

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por um grupo ou mesmo uma comunidade. Se o Yeshuah de Ferreira e Viñole


retratam graÞcamente a Palestina, a Bíblia em Ação de Sérgio Cariello nutre-
-se de cores vivas para ilustrar um Jesus relativamente caucasiano e elegante.
São experiências religiosas diferentes, traduzidas graÞcamente de maneira va-
riada, com intencionalidades e interpretações dissonantes, embora emprestem
elementos de um “núcleo religioso comum” para se constituir.
A teologia nas histórias em quadrinhos não reside, entretanto, somen-
te nos traços e nas cores, mas se revela, sobretudo, nos enredos, nos discursos,
ora de maneira mais sutil, ora mais explícita. Ainda assim, a grande maioria
das obras (quando essas não são produzidas ou supervisionadas por uma insti-
tuição religiosa e não possuem intenções catequéticas) não apresenta em suas
entrelinhas a teologia acadêmica ou eclesial, mas a teologia do cotidiano, cal-
cada e constituída pelas experiências forjadas e vividas por quem as idealiza.
Essa mesma teologia transcende os muros das instituições religiosas e pode
se revelar nas mais diversas narrativas, como em A Turma do Minduim, ou
Peanuts, de Charles Schulz, ou mesmo nas histórias de super-heróis, como já
indicado em outro momento.19 Em outras palavras, a teologia do cotidiano não
se restringe a temas religiosos e pode se revelar nos meandros que forjam as
mais diferentes histórias. E olhar para essas narrativas se torna crucial para se
entender como um grupo ou uma sociedade estrutura seu universo simbólico
e se alimenta dele.

Ensino Religioso e histórias em quadrinhos: conexões possíveis

As histórias em quadrinhos são, pois, um jeito particular de se contar


histórias por meio de uma narrativa dialógica condensada em imagens sequen-
ciais. Elas são altamente comunicativas e, para muitos, um dos primeiros con-
tatos das crianças com a leitura. Ao contarem histórias, elas retratam e apresen-
tam um mundo multifacetado aos seus leitores e às suas leitoras, ao descrever
cenários, valores, crenças, visões de mundo, concepções políticas, estruturas
sociais e experiências religiosas. É justamente nesse processo de retratar e
apresentar o mundo que as histórias em quadrinhos expressam não apenas tra-
dições religiosas como também crenças sutis e diversas, em outras palavras, a
teologia do cotidiano.

19
REBLIN, Iuri Andréas. Para o Alto e Avante: uma análise do universo criativo dos super-
-heróis. Porto Alegre: Asterisco, 2008b; e REBLIN, Iuri Andréas. A teologia e a saga dos
super-heróis: valores e crenças apresentados e representados no gibi. Protestantismo em
Revista, São Leopoldo, v. 22, p. 13-21, maio/ago. 2010. Disponível em: <http://periodicos.
est.edu.br/index.php/nepp/article/view/54/63>. Acesso em: 20 ago. 2012.

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As histórias em quadrinhos como possibilidade pedagógica 75

Conforme já apresentando em outro momento20, numa perspectiva


bem ampla de análise, a religião poderá ser encontrada, abordada ou apre-
sentada nas histórias em quadrinhos de duas maneiras: uma maneira explí-
cita – isto é, quando a religião ou a teologia ou ainda o sobrenatural, que é
frequentemente associado ao religioso, for o tema da história, isto é, a história
possui um enredo que remete diretamente a um motivo ou assunto religioso.
Aqui se inserem as adaptações de histórias sagradas como, por exemplo, as
adaptações de histórias bíblicas, as quadrinizações de personagens religiosos,
líderes eclesiásticos e santos ou mesmo abordagens livres que remetem dire-
tamente ao universo da religião: seres sobrenaturais, espíritos, entre outros (as
publicações apresentadas no tópico anterior são exemplos nessa direção) – e
uma maneira implícita – isto é, quando valores religiosos estão implícitos na
narrativa. Perceber a presença desses elementos nas histórias em quadrinhos é
um pouco mais difícil, pois exige tanto um conhecimento prévio dos valores,
temas e concepções compactuados pelas religiões quanto exercício de analo-
gia e de hermenêutica por parte de quem analisa e se ocupa com a história.
Aqui se inserem as mais diferentes produções artístico-culturais do universo
das histórias em quadrinhos. Num sentido amplo, qualquer história aqui pode
vir a ser objeto de leitura, estudo, análise e exercício pedagógico: A turma do
Minduim; Mafalda; as histórias dos super-heróis, entre outros. Há de se con-
siderar, evidentemente, que a abordagem dessas narrativas dependerá tanto
da própria narrativa em si (nem todas as histórias da turma do Minduim ou
da Mafalda, por exemplo, são adequadas a uma abordagem hermenêutico-
teológica) da intencionalidade do autor quanto da percepção do leitor ou pro-
fessor acerca da teologia do cotidiano imiscuída nas imagens e nos diálogos
das histórias.

20
REBLIN, 2008b; 2010; 2012b e também REBLIN, Iuri Andréas. Os super-heróis e a jorna-
da humana: uma incursão pela cultura e pela religião. In: VIANA, Nildo; REBLIN, Iuri An-
dréas (Orgs.). Super-heróis, cultura e sociedade: aproximações multidisciplinares sobre o
mundo dos quadrinhos. Aparecida: Idéias e Letras, 2011, p. 55-92 e REBLIN, Iuri Andréas.
O Planeta Diário: rodas de conversa sobre quadrinhos, super-heróis e teologia. São Leopol-
do: EST, 2013 (e-book). Disponível em: <http://www.est.edu.br/downloads/pdfs/biblioteca/
livros-digitais/O_Planeta_Diario_PDFA_Final.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2013.

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Figura 17: Superman tentando acabar com a fome no mundo,


no álbum Superman: Paz na Terra, de Alex Ross e Paul Dini.
Alusão bíblica à parábola do semeador

Diante disso, quanto ao exercício pedagógico do Ensino Religioso,


podem-se destacar duas abordagens: 1) As histórias em quadrinhos como lei-
tura, crítica e análise e 2) As histórias em quadrinhos como construção de co-
nhecimento tridimensional e interdisciplinar a partir de oÞcinas de quadrinhos
em sala de aula. Quanto à primeira, trata-se de uma abordagem hermenêutica
das histórias, isto é, de exercícios de compreensão e interpretação da narra-
tiva a partir de um olhar ao que a história expressa em termos simbólicos,
gráÞcos, visuais, textuais, enÞm, narrativos. Quanto à segunda, trata-se da
realização de oÞcinas de quadrinhos como forma de apreensão, tradução e ex-
pressão de conteúdo. Motivar discentes a produzirem histórias em quadrinhos
a partir de temas abordados em sala de aula possibilita não apenas a tradução
de determinado conteúdo numa linguagem inteligível quanto provoca a ativi-
dade interdisciplinar: ao produzir histórias em quadrinhos, tirinhas, cartuns
ou charges, o discente lida com formas de conhecimento e técnicas artísticas
diversiÞcadas, combina criatividade e epistemologia. Em ambos os casos, um
conhecimento prévio do que são histórias em quadrinhos ou como as histórias
em quadrinhos comunicam sua mensagem torna-se uma ferramenta importan-
te para uma boa análise e para a produção criativa de uma história.21

21
Nessa direção, um referencial teórico importante torna-se o livro SANTOS NETO, Elýdio
dos; SILVA, Marta Regina Paulo da (Orgs.). Histórias em Quadrinhos & Educação: for-
mação e prática docente. São Bernardo do Campo: Metodista, 2011. Um vídeo ilustrativo

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As histórias em quadrinhos como possibilidade pedagógica 77

Não uma conclusão, mas um “continua...”

EnÞm, esse olhar panorâmico e ilustrativo indica o grande potencial


das histórias em quadrinhos, tanto em termos de expressividade quanto em
termos de leitura hermenêutica para o exercício cientíÞco e pedagógico vi-
sando à construção de um conhecimento tridimensional. Um olhar atento às
histórias em quadrinhos pode revelar muito como pessoas e grupos estruturam
suas percepções a partir do imaginário religioso que compactuam. E esse é o
grande “barato” de se ocupar com as histórias em quadrinhos: elas contam
histórias; e o ser humano precisa das histórias para (re-)estruturar continua-
mente seu universo simbólico e se reinventar, para dizer de si mesmo para si
mesmo, reaÞrmando valores, atualizando-os, transformando-os. O que não se
pode perder de vista, naturalmente, é que toda história possui uma intencio-
nalidade ou várias (ideológica, mercadológica etc.). Entender essa intenciona-
lidade e atentar para as dinâmicas que se movem nos meandros dos produtos
artístico-culturais pode trazer o equilíbrio entre uma visão pessimista e uma
visão ingênua dos bens culturais contemporâneos. Em todo o caso, uma coisa
é certa: as histórias em quadrinhos são um caldeirão de inÞnitas possibilidades
quando o tema é a experiência religiosa, a experiência humana com o sagrado.
Aventurar-se por seus balões e suas Þguras e mergulhar na história que contam
pode ser sempre, sem dúvida, uma viagem de descobertas. Inicie logo a sua!

acerca de oÞcinas de quadrinhos também pode ser conferido no canal da Metodista no


YouTube. Cf. OFICINA de Quadrinhos – parte 1. MetodistaWebTV. Disponível em: <http://
www.youtube.com/watch?v=3qb9zDT8pas>. Acesso em: 20 jun. 2013; cf. também OFICI-
NA de Quadrinhos – parte 2. MetodistaWebTV. Disponível em: <http://www.youtube.com/
watch?v=yOYtIqyo9Ag>. Acesso em: 20 jun. 2013.

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