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Debate: “Você Aceitaria Algumas Normas Jurídicas Estrangeiras?

” Legal Affairs (2004)


Não, Obrigado. Nós Já Temos as Nossas Próprias Normas.
Richard Posner

(Tradução realizada com objetivos estritamente didáticos. Alguns trechos foram suprimidos, como indicam
os colchetes: “[...]”.)

A pergunta deste debate é a seguinte: “Decisões legais estrangeiras ou internacionais devem ser
consideradas relevantes para os julgamentos da Suprema Corte dos Estados Unidos?” Em outras palavras:
“Em que circunstâncias deve a Suprema Corte dos Estados Unidos fazer referência a uma decisão tomada
por um tribunal internacional ou estrangeiro?” A segunda formulação da pergunta permite que se perceba
a diferença entre as referências que cumprem função informativa e as referências a um precedente. Qualquer
coisa pode ser mencionada como uma fonte de informação relevante para a tomada de uma decisão judicial.
Imagine que um juiz, por acaso, leia uma decisão do Tribunal Constitucional Alemão sobre o direito ao
aborto e encontre nela um argumento contra o aborto (ou talvez fatos sobre os motivos do aborto ou sobre
o procedimento médico) que ele nunca viu antes e que lhe parece convincente. Imagine que ele queira dar
crédito ao autor do argumento ou simplesmente identificar a sua fonte, pois juízes, como a maioria dos
juristas, adoram fazer citações (um instinto que serve para esconder o que há de subjetivo e instável em boa
parte do raciocínio jurídico.) Também é possível que a decisão tenha relevância jurídica material em
virtude, por exemplo, de uma cláusula contratual que eleja a aplicabilidade de direito estrangeiro no caso
litigado nos EUA [...]. [Esse seria um caso] em que o direito estrangeiro estaria incorporado ao direito
americano.
[...]
Problemas surgem apenas quando se acredita que a decisão estrangeira deve ter poder de
convencimento (mesmo que reduzido) em um tribunal americano pela simples razão de ser uma decisão de
um tribunal estrangeiro reconhecido. Isso ocorre, em suma, quando a decisão é tratada como uma
autoridade, determinante ou não, em um processo americano, embora o assunto seja estritamente local,
como a legalidade do aborto, a execução de pessoas com retardo mental ou o casamento gay.
São quatro os problemas gerados por esse tipo de referência a decisões estrangeiras, além da óbvia
questão de que, a menos que se trate da interpretação de um tratado, a corte estrangeira não terá interpretado
os mesmos textos legais ou precedentes que informariam e estruturariam a análise do tribunal americano.
Antes de mais nada, devo garantir que fiquem claras algumas distinções essenciais: a distinção entre usar
uma decisão como autoridade e fazer referência a ela sem tomá-la como autoridade; e a distinção entre
autoridade determinante e autoridade não determinante.

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São determinantes [nos Estados Unidos e outros países de common law] a decisão de um tribunal mais
alto e (a depender da exata doutrina de stare decisis aceita no sistema jurídico) a decisão tomada pelo
próprio tribunal no passado. Elas devem ser respeitadas ainda que os juízes pensem que estão incorretas.
Ninguém supõe que decisões estrangeiras tenham esse tipo de autoridade.
Mas, frequentemente, um tribunal citará uma decisão que carece de autoridade nesse sentido forte
porque ela foi emitida por um tribunal de outra jurisdição (talvez seja a decisão da suprema corte de outro
estado ou outro tribunal federal de recursos, por exemplo). Mas a corte atribuirá algum peso àquela decisão
em virtude do fato de ela ter sido tomada por uma corte irmã, cujos valores, tradições e perspectivas são
presumivelmente similares. Independentemente de basear-se ou não em argumentos convincentes, o fato
de ser uma decisão daquela corte tem o seu peso. Se muitas cortes irmãs convergirem em torno de uma
regra ou doutrina particular, o fato da convergência levará ao mesmo resultado a corte que decide a questão
pela primeira vez, a menos que ela tenha sentimentos fortemente contrários em relação a esse caso
particular.
De qualquer forma – seja a autoridade determinante ou não determinante – a decisão anterior é citada
pelo motivo de a corte ter decidido de uma certa maneira, independentemente de quão convincente é o
raciocíno da corte. A decisão é usada porque é um precedente. É muito diferente de fazer referência a uma
decisão estrangeira sem tratá-la como precedente, mas apenas porque ela contém uma fundamentação
convincente [...].
O primeiro problema que há em atribuir até mesmo um peso limitado a decisões estrangeiras ou
internacionais diz respeito às oportunidades promíscuas que ficam disponíveis – um problema que também
tem relação com a prática judicial de limitar as categorias de decisões nacionais que podem ser usados como
precedentes diante de um tribunal. Muitos tribunais nos EUA não permitem que advogados citem como
precedentes decisões nacionais que não tenham sido publicadas por meios oficiais. A proibição é feita
porque decisões não publicadas recebem menos atenção dos juízes do que aquelas decisões que eles
publicam. Permitir que decisões inéditas sejam usadas como precedentes aumentaria a quantidade de
pesquisa jurisprudencial exigida de juízes e advogados, sem garantir melhores resultados. Além disso, a
Suprema Corte economiza seu tempo dando pouco peso a decisões de tribunais federais e supremas cortes
estaduais. Tais decisões raramente são citadas, à exceção daqueles casos em que a Suprema Corte precisa
retratar o estado atual do direito jurisprudencial antes de intervir para estabelecer uma regra que o torne
mais uniforme.
A rejeição de citações estrangeiras faria ainda mais sentido do que essa regra implícita contra a citação
de decisões nacionais. Os sistemas judiciais dos EUA são relativamente uniformes, e a sua jurisprudência
é bastante acessível, enquanto os sistemas judiciais do resto do mundo são imensamente variados, e a
maioria das suas decisões é praticamente inacessível para nossos juízes monoglotas. Se decisões

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estrangeiras pudessem ser usadas livremente, qualquer juiz ávido por uma citação que lhe servisse de apoio
teria apenas de mergulhar profundamente no corpus juris mundial para encontrá-la. Talvez Antonin Scalia
[membro da Suprema Corte dos EUA e crítico das referências a decisões estrangeiras] deixasse de reclamar
da prática de usar decisões estrangeiras e passasse a fazer, ele mesmo, uma pesquisa jurisprudencial bastante
ampla até encontrar algum precedente estrangeiro que estivesse de acordo com suas opiniões sobre
homossexualidade, aborto, pena capital e o papel da religião no âmbito público.
O segundo problema que há em atribuir peso a decisões estrangeiras ou internacionais diz respeito ao
fato de que decisões estrangeiras emergem de um complexo contexto social, histórico, político e
institucional a respeito do qual nossos juízes, como todo respeito, são quase absolutamente ignorantes. (Será
que algum dos membros da Suprema Corte conhece alguma língua estrangeira bem o suficiente para ler
uma decisão que não tenha sido escrita em inglês? E são confiáveis as traduções dessas decisões?)
Por exemplo, para saber quanto peso atribuir a uma decisão do Tribunal Constitucional Alemão que
trate do aborto, você deveria saber, entre outras coisas, como os membros desse tribunal são selecionados
e como juízes constitucionais alemães concebem a sua função. Você deveria saber, sobretudo, como as
opiniões alemãs sobre o aborto foram moldadas por particularidades da história alemã, em especial a
jurisprudência sobre aborto da República de Weimar, que pode ter preparado o terreno para algumas das
atrocidades nazistas, tal como a eutanásia involuntária. E, falando de história, é muito provável que o
repúdio europeu à pena capital (repúdio mencionado por abolicionistas americanos como um indício do
surgimento de um consenso internacional que deveria influenciar a Suprema Corte) está relacionado a duas
coisas: o uso excessivo da pena por nações europeias no passado (basta pensar nas execuções por furtos
triviais na Inglaterra do século XVII, no Reino do Terror na França e no comum emprego da pena de morte
pela Alemanha nazista e pela União Soviética); e o caráter menos democrático da política europeia, que
permite que a opinião da elite derrote a opinião pública com mais frequência do que nos Estados Unidos.
Por exemplo, a opinião pública no Reino Unido apoia a pena de morte com tanta veemência quanto nos
Estados Unidos, o que não impediu o Parlamento de revogá-la em 1965 (abrindo exceção apenas para
alguns crimes militares) e de recusar-se a reconsiderar a questão. Atribuir autoridade ao direito estrangeiro
é namorar a ideia (que eu presumia estar ultrapassada) de um direito natural universal; ou aceitar a fantasia
de que os juízes do globo formam uma única, coesa, sábia e consciente elite de julgadores.
Isso me traz ao terceiro problema, o caráter antidemocrático do uso de julgados estrangeiros. Até
mesmo decisões tomadas por juízes em países democráticos, ou por juízes oriundos desses países que atuem
em tribunais internacionais, estão fora da órbita democrática dos EUA. [...] Além de ser eleita a maioria
dos nossos juízes estaduais, nossos juízes federais são indicados e confirmados por autoridades eleitas: o
presidente e os membros do Senado. Os nossos juízes, portanto, têm certa legitimidade democrática. Mas

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os juízes estrangeiros, por mais democráticos que sejam os países onde atuam, não têm legitimidade
democrática aqui. Eleições estrangeiras não são eventos integrantes da nossa democracia.
Particularmente questionável nesse sentido é o uso de decisões estrangeiras para estabelecer a
existência de um consenso internacional que deveria ter influência sobre as decisões de juízes americanos.
Isso é comparável a sujeitar legislação criada pelo nosso Congresso à avaliação da Assembleia Geral das
Nações Unidas. Eu creio que, além de um erro jurídico, a Suprema Corte cometeria um erro político ao
pedir (como fez um dos seus membros em um voto) que o povo americano aceite que decisões da Suprema
Corte do Zimbábue influenciem as decisões da nossa Suprema Corte. Acredito que a maioria dos
americanos acharia absurda a ideia de permitir que juízes no Zimbábue, por mais distintos que eles sejam,
determinem o nosso direito.
A última objeção contra o uso de decisões estrangeiras em tribunais americanos é que isso é mais um
exemplo da falta de transparência judicial. Poucos juízes são cosmopolitas a ponto de quererem seguir as
tendências da Europa ou de qualquer outra região estrangeira. Em casos politicamente sensíveis, tal como
a decisão sobre sodomia (Lawrence v. Texas), que suscitou todo esse debate, juízes seguem suas
experiências pessoais, seus valores, intuições, impressões sobre a opinião pública e ideologias. Nenhum
desses fatores de influência tem sido determinado pelo estudo de casos estrangeiros. Alguns países
criminalizam a sodomia; outros, não. Devemos supor que os juízes no caso Lawrence refletiram sobre os
argumentos formulados em outras nações sobre a criminalização da sodomia?
Juízes provavelmente citam decisões estrangeiras pelo mesmo motivo que preferem citar precedentes
em vez de estabelecer uma posição nova: eles evitam falar com suas próprias vozes e têm medo de expor
suas posições pessoais e de parecerem inconstantes. Estão sempre à procura de referências e citações que
ofereçam apoio a teses que tenham adotado sem o auxílio de algum precedente. Pesquisa profunda
normalmente acontece depois de os juízes votarem [...]. O recurso a decisões estrangeiras é provavelmente
um esforço, consciente ou inconsciente, por esconder as decisões políticas que estão no centro daquilo que
a Suprema Corte produz.
Eu não quero sugerir que nossos juízes devem ser provincianos e que devem ignorar o que fazem outras
nações. Assim como os nossos estados são laboratórios para experimentos sociais, a partir dos quais podem
aprender outros estados e o governo federal, nações estrangeiras também são laboratórios cujos
experimentos legais podem nos instruir. O problema não é aprender com a experiência estrangeira; o
problema é tratar decisões judiciais estrangeiras como se tivessem autoridade, como se o mundo fosse uma
comunidade jurídica só.

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