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RESUMO
Este artigo visa problematizar o campo do Direito Penal e sua relação com os
“economicamente desfavorecidos” na sociedade, numa perspectiva sociológica,
evidenciando os discursos utilizados para provocar e legitimar uma relação de
dominação exercida pelos países centrais. Para tanto, do ponto de vista teórico,
foram escolhidas para compor a base principal deste trabalho as pesquisas
realizadas pelo jurista Eugenio Raúl Zaffaroni1 e pelo sociólogo Loïc Wacquant2,
pesquisas estas que figuram nas obras Em busca das penas perdidas e As prisões
da miséria, respectivamente.
INTRODUÇÃO
*
Aluno do segundo semestre do curso de Direito da Universidade do Estado da Bahia – UNEB.
1
Diretor do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e Tratamento
do Delinqüente.
2
Professor na Universidade de California-Berkeley e pesquisador no Centro de Sociologia Européia
do Collège de France, membro fundador do grupo de ativistas acadêmicos "Raisons d’Agir" e
colabora regularmente para o Monde Diplomatique.
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3
Frase muito proferida pelo juiz e professor de Direito Penal da UNEB Dr. Moacyr Pitta Lima Filho,
apenas traduzindo o que as estatísticas prisionais informam: a imensa maioria dos presos não tem
acesso algum à Justiça, são em sua maioria analfabetos e, portanto, excluídos de qualquer chance
no mercado de trabalho. Deve-se apenas ter cuidado para não inverter os termos daquela
proposição, o que resultaria dizer que o pobre é criminoso. Convém ressaltar que no dia 20/10/2007,
em palestra proferida na própria UNEB, o Dr. René Silva, delegado e ex-diretor do presídio Lemos de
Brito, apresentou estatísticas prisionais que, entre outras coisas, nos permitiram tomar conhecimento
dessa questão.
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A grande questão é que os crimes são cometidos pelos mais variados sujeitos das
mais variadas classes sociais, mas somente os pobres são realmente punidos,
muitas vezes nem contando sequer com o direito de defesa. Atendendo ao discurso
de que a criminalidade é inerente à pobreza, “compramos a suposta segurança que
o sistema penal nos vende” (ZAFFARONI, 2001, p.27), não nos dando conta de que
o preço pago é alto demais...
Pode-se verificar que houve, em larga medida, a incorporação desse discurso por
parte dos setores sociais mais diversos dos países periféricos. Acha-se comum a
prisão de um negro, de um pobre, ou ainda de pessoas “mal afeiçoadas”. Em
contrapartida, há surpresa quando pessoas de um nível econômico mais elevado –
que às vezes cometeram crimes mais graves – são, mesmo que temporariamente,
presas.
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Foi um professor universitário e criminologista italiano, nascido em 6 de novembro de 1835, em
Verona. Tornou-se mundialmente famoso por seus estudos e teorias no campo da caracterologia, ou
relação entre características físicas e mentais.
5
5
Politólogo e especialista em matéria de Welfare State durante o governo de Ronald Reagan (1981-
1989).
6
“Mais do que de Estado-providência, seria justo falar de Estado caritativo, na medida em que os
programas voltados para as populações vulneráveis foram desde sempre limitados, fragmentários e
isolados do resto das atividades estatais [...]. O princípio [...] não é a solidariedade, mas a compaixão
[...] (WACQUANT, 2003, p. 20)
6
Para dar uma resposta a esse aumento, a cidade de Nova Iorque, apoiando-se nas
idéias do criminologista James Wilson8, implanta o programa Tolerância Zero.
Como era de se esperar, os presídios estaduais não tinham estrutura para atender
tantos “clientes”, e, por mais sórdido que possa parecer, a iniciativa privada
enxergou um “grande negócio”. Isso porque, com essa nova política, o governo
preferiu amputar as somas destinadas às ajudas sociais (v. supra), à saúde e à
educação para aumentar os orçamentos destinados ao sistema carcerário,
sobretudo o privado porque o governo, assim, não teria de “tutelar” diretamente os
delinqüentes. Aprisionar a miséria em “depósitos de indesejáveis” virou um negócio
altamente rentável.
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Vale ressaltar que a extrema rigidez penal é amplamente apoiada pela população norte-americana.
8
duplamente punida: a primeira punição faz com que ela atravesse os portões do
cárcere e a segunda faz com que ela não possua a mínima condição de sair.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os países periféricos, em sua maioria, aderem à ideologia que vem dos países
centrais em prejuízo próprio, pois sofrem com essa postura uma segunda
colonização.
Diferentemente dos países centrais, os países marginais não têm sequer a estrutura
necessária para manter uma política criminal nos moldes daqueles discursos, mas
ainda assim o fazem.
Se a intenção das nações periféricas for, algum dia, possibilitar a seus “filhos” a
cidadania plena, rompendo com as amarras do passado, tornar-se-á imprescindível
aumentar os investimentos em educação e em políticas públicas efetivas para que a
criminalidade, antes de ser punida, seja prevenida.
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REFERÊNCIAS
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. 15. ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1983.
______. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. 2. ed. Rio
de Janeiro: Revan, 2003.