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PÉROLAS

TELÚRICAS
Joana de Oviedo

5 DE SETEMBRO DE 2018
EDITORA DO CARMO
0
BRASÍLIA-DF
ISBN: 978-85-924884-9-9

1
Sumário
MARES... ........................................................................................................ 15
APENAS METADE ........................................................................................ 16
FOTOGRAFIA NA MOLDURA .................................................................... 17
POR QUE TE AMO ........................................................................................ 18
ESSÊNCIA MALDITA ................................................................................... 19
A DOR DA OSTRA ........................................................................................ 20
VERSO TRISTE .............................................................................................. 21
AUSÊNCIA DE PALAVRAS ......................................................................... 22
ECOS DA VIDA ............................................................................................. 23
TAÇAS DA VIDA .......................................................................................... 24
PEDAÇOS ....................................................................................................... 25
VIDA OBSCURA ........................................................................................... 26
MEU BRASIL ................................................................................................. 27
O RETRATO DA DOR ................................................................................... 28
EU SEREI SEU TEMPO ................................................................................. 29
APESAR DO TEMPO ..................................................................................... 30
MEU BATUQUE ............................................................................................ 31
PÉROLAS TELÚRICAS ................................................................................. 32
PARA ONDE FOI O PRÍNCIPE? ................................................................... 33
AMOR NO PORÃO ........................................................................................ 34
SOB AS LUZES DE PARIS ........................................................................... 35
A SANIDADE DO AMOR ............................................................................. 36
SEREIAS E PÉROLAS ................................................................................... 37
O AMANHECER ............................................................................................ 38
A MULHER DOS OLHOS DOURADOS ...................................................... 39
E AS PÉROLAS MORRERAM ...................................................................... 40

2
APRENDIZ DE SOLIDÃO ............................................................................. 41
AQUELA NOSSA CASA ............................................................................... 42
LOUCURA DE AMOR ................................................................................... 43
DEVOLVA-ME ............................................................................................... 44
EU E O ARCO-ÍRIS ........................................................................................ 45
DEPOIS DA JANELA .................................................................................... 46
EU PRECISO .................................................................................................. 47
ASSIM É ESSE MEU AMOR ......................................................................... 48
O VINHO DA JUVENTUDE ESCARLATE .................................................. 49
QUERO ........................................................................................................... 50
POR TUA ALMA É QUE ANELO ................................................................. 51
CACTOS FERIDOS ........................................................................................ 52
AMOR ENLOUQUECEDOR ......................................................................... 53
PALÁCIO AZUL-TURQUESA ...................................................................... 54
JANELA DOS SONHOS ................................................................................ 55
ENVELHECER ............................................................................................... 56
VEM! ............................................................................................................... 57
TAÇAS QUEBRADAS ................................................................................... 58
ESCREVI-LHE POEMAS .............................................................................. 59
CANÇÃO DO AMADO .................................................................................. 60
DUAS FACES DA POESIA ........................................................................... 61
FLAUTA E LIRA ............................................................................................ 62
OS OLHOS DE MINHA MÃE ....................................................................... 63
SE É QUE ME ENTENDE .............................................................................. 64
A GRANDE PÉROLA .................................................................................... 66
AS FLORES DA VIDA ................................................................................... 67
DE DENTRO DA CONCHA .......................................................................... 68

3
A VIRGEM...................................................................................................... 69
O DIA DAS FLORES ..................................................................................... 70
O TREM .......................................................................................................... 71
A CASA AZUL DE VIENA ........................................................................... 72
OUVINDO FLORES E POESIAS .................................................................. 73
APENAS UM TOM ........................................................................................ 74
DESEJO DE FICAR ........................................................................................ 75
SAMPA ........................................................................................................... 76
TATUAGEM ................................................................................................... 77
CARTA AO TEMPO ...................................................................................... 78
MULHERES E LOBOS .................................................................................. 79
RE-CONSTRUÇÃO ........................................................................................ 80
AO REI ............................................................................................................ 81
CANÇÃO A MINHA MÃE ............................................................................ 82
SECRETAMENTE .......................................................................................... 83
POR QUANTO TEMPO ESSE AMOR .......................................................... 84
AMO AS ANTIGAS CATEDRAIS ................................................................ 85
OLHOS PETRIFICADOS ............................................................................... 86
ESPELHO INSANO ........................................................................................ 87
POETA DA MESMA DOR ............................................................................. 88
LINHO FINO .................................................................................................. 89
ROSTO PRIMAVERIL ................................................................................... 90
VIVER É FATAL ............................................................................................ 91
A MORADA NOS CACTOS .......................................................................... 92
MÚSICA PARA VIOLINO ............................................................................. 93
FALSA PRESENÇA ....................................................................................... 94
SEM RETOQUES ........................................................................................... 95

4
GABI GABRIELA .......................................................................................... 96
VAMOS PARA PARIS? ................................................................................. 97
MÃOS .............................................................................................................. 99
SER... ............................................................................................................. 100
ESTAÇÕES ................................................................................................... 101
FOLHAS ........................................................................................................ 102
A ETERNIDADE .......................................................................................... 103
CAMINHOS MARCADOS .......................................................................... 104
POR QUE O AMOR SE VAI? ...................................................................... 105
O SILÊNCIO DAS ROSAS .......................................................................... 106
INVERNO INTERIOR .................................................................................. 107
AUSÊNCIA ABSOLUTA ............................................................................. 108
A DESPEDIDA DE MEU PAI ...................................................................... 109
O TEMPO É A VIDA .................................................................................... 110
GRITO POÉTICO ......................................................................................... 111
MEMORIAL ................................................................................................. 112
QUANDO FOR NOITE ................................................................................ 113
AS MÁSCARAS DOS LOUCOS ................................................................. 114
UM POEMA COMO MEDALHA ................................................................ 115
FUNÉREO CANTO ...................................................................................... 116
IN-SANIDADE ............................................................................................. 117
INACESSÍVEL.............................................................................................. 118
RETRATO NO TEMPO ............................................................................... 119
VOZ FANTASMAGÓRICA ......................................................................... 120
CÂNTICO NOTURNO ................................................................................. 121
GOTAS PÚRPURAS .................................................................................... 122
QUANDO... ................................................................................................... 123

5
NOVO DESENHO ........................................................................................ 124
A LOUCA...................................................................................................... 125
QUANDO CHOVE EM MINAS GERAIS ................................................... 126
A CANÇÃO DA CORUJINHA .................................................................... 127
CAMINHOS INTERIORES .......................................................................... 128
CAVALGADA .............................................................................................. 129
LINDA É A VIDA... ...................................................................................... 130
O AMOR ....................................................................................................... 131
LAMENTO OBSTINADO ............................................................................ 132
DOR ............................................................................................................... 133
NÃO DEIXEM QUE OLHEM EM SEUS OLHOS ...................................... 134
A PARÁBOLA DO SEMEADOR ................................................................ 135
O ILIMITÁVEL ............................................................................................ 136
SAUDADE .................................................................................................... 137
INFÂNCIA... ................................................................................................. 138
ESCULTURA ................................................................................................ 139
ANTÍTESE .................................................................................................... 140
A ROSA NOS VENTOS ............................................................................... 141
CANTO DE ETERNO AMAR ...................................................................... 142
DISTÂNCIA .................................................................................................. 143
E TUDO É O TEMPO ................................................................................... 144
CANÇÕES AOS VENTOS ........................................................................... 145
CASTELOS AOS VENTOS ......................................................................... 146
ILUSÕES DE UMA NOITE QUALQUER ................................................... 147
ROSTO PRIMAVERIL ................................................................................. 148
AS TRÊS FASES DE MARIA ...................................................................... 149
CANCIONEIRO ............................................................................................ 151

6
REMINISCÊNCIAS ...................................................................................... 152
ETERNA JUVENTUDE ............................................................................... 153
SONHO DE UMA NOITE QUALQUER ..................................................... 154
POEMA AO POR DO SOL........................................................................... 155
TUDO ILUSÃO............................................................................................. 156
O AMOR E O TEMPO.................................................................................. 157
O MENINO E A PIPA .................................................................................. 158
AUTOBIOGRÁFICO .................................................................................... 162

7
Pérolas Telúricas

8
NOTA DA AUTORA

A poesia é comparada à breve vida dos lírios, e que provando o


poeta, em seus momentos delirantes essa essência momentânea que ao
morrer com o por do sol, restam apenas os ventos que lhe ferem a carne,
quando, com ele (os ventos), leva o tempo, este, outrora feliz ou triste, e
que sendo triste ainda assim presume-se que seu amor estará latente
qual uma essência doída a persegui-lo, mesmo que esse tempo se esvai,
ferindo-lhe a alma essa insegurança da fugacidade, pois, para o poeta
a esperança é que sua poesia lhe habite por eternidades, mas depois de
prová-la em sua essência, a tem como maldita por que faz sofrer, e
depois de prová-la, só lhe restará morrer, tornando o “sempre” do
poeta, limitado, isto é, durando apenas um dia ou noite, tal qual os lírios.
Nesse antagonismo, sofre ao escrever, mas também por quem se escreve
e por quem se sofre. Mas se há ou não um destinatário para sua
mensagem, impossível saber, já que o poeta prefere morrer a cada
poema escrito para nunca dar explicações, e tudo não passa de um cálice
que ele próprio prepara para sorver e após morrer por amor ou pela
poesia. Então nunca saberemos qual é verdadeiramente sua “Essência
Maldita”, de alguma forma: o amor ou a arte poética. Eu só lhes suplico:
Só não roubem minha poesia, pois eu não viveria sem minha poética
ideologia.

Joana de Oviedo

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APRESENTAÇÃO

Quando fui convidada pela autora, a escrever a apresentação do


livro Pérolas Telúricas, confesso que fiquei surpresa diante de tamanha
responsabilidade, apesar de conhecer tão bem seus poemas desde minha
tenra idade, a cada vez que Joana escrevia e os declamava para mim, por
isso atendendo a seu pedido, por dizer-me que seria um grande orgulho
para ela se o fizesse.
Joana de Oviedo, nasceu aos 18 de novembro de 1.966 na pequena
cidade de Carneirinho, região do Triângulo Mineiro. Concluiu seus
estudos do ensino fundamental, e necessitou deixar a terra onde passou
sua infância em busca da continuação de seus estudos.
Formou-se em Pedagogia, Psicologia e Direito, (Pós-graduada em
Psicopedagogia Clínica). Escreveu dois livros solos: Caminhos interiores
e SER – poesia. Participou com outros poetas nas Coletâneas: Janela
Poética, Ramagens e Mulheres 2017). É sócia fundadora da Academia
municipalista de Letras de Paranaíba, ocupando a 4ª. Cadeira, tendo
Castro Alves como Patrono. É Sócia correspondente do Instituto
Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul.
Sua poesia tem como temática o tempo que assola nossos planos e
também nossos sonhos. Joana nos reporta ao Romantismo francês da
Belle Époque nos cafés da França, quando em seu poema sob as luzes de
Paris, descreve o amor de uma mulher ao costurar as camisas brancas de
cambraia e pregar os botões já arrancados pelo tempo, que é entendido
como uma despedida de seu grande amor ao dizer: “Lembre-se de mim,
ainda que nas ruas de Paris. Lembre-se que fui seu amor (...)”.
Joana insiste em questionar porque o tempo apaga coisas
essenciais. Mas não é só o tempo, esse vilão que a apavora, mas o
“sofrimento”, que ao escrever, compara o poeta à ostra ao produzir suas
pérolas (a poesia), porque há nisso um processo de dor comparado à ostra
quando uma pequena areia é introduzida em seu interior, e a transforma
em pérolas.
Então me pergunto: Por que Pérolas Telúricas? Seria o seu
inclinar-se no pó, enquanto sofre, e de seu cerne, e assim igual à ostra,
retirar sua pérola chamada poesia? Considero não apenas como tal, mas

11
a própria Terra que a partir de seus movimentos internos, explode,
lançando ao mundo o que há de mais sofrido, no entanto, precioso em
seu interior.

Stefânia Caroline Oviedo - Graduanda em Letras


UEMS -Universidade Estadual de Mato Grosso do
Sul – 2018

12
Aos seus e aos meus

À minha família

Dedico minha poesia para meus filhos: Stefânia Caroline Oviedo, Lara
Daniela Oviedo, Altair Rafael Oviedo. Para meus netos (Ivan Filho e
Gabriela Oviedo, para meus irmãos (Dália Oviedo, Fátima Oviedo e
Rosa Oviedo e Raimundo Oviedo, e aos meus sobrinhos: Vitor Oviedo,
Meline Oviedo, Milena Oviedo, João Eduardo Oviedo.

Em memória de meus pais: João Oviedo e Maria Aparecida J. Silva.


Mãezinha, paizinho... Nem ventos, nem o tempo são capazes
de apagar os ecos de uma voz após ser propagada no firmamento.

Ao Dono da Poesia: “O vento do meu espírito soprou sobre a vida


e tudo que era efêmero se desfez e ficaste só tu que é Eterno.”

HOMENAGENS
Ao músico - Juscelino Adriano
Aos poetas - Jairo de Araujo Gomes e Edne Cavanha
A minha gratidão

13
Ninguém sabia,
mas ele discretamente mantinha
um diálogo com as estrelas.
Se soubessem,
o chamariam louco,
mas ele não se importaria...
pois realmente o que queria,
era apenas lhes contar o seu segredo.
Amava-as desde sempre,
porque em seu íntimo as possuía.
As possuía somente!
Mas não,
ele não era um demente.

Edne Cavanha

14
MARES...

Amarrei meus sonhos,


juntei os pedaços,
e deitei aos mares...
No seu regaço.
Quisera que suas águas
cobertas de sais
curassem meus males.
De querer sonhar
De querer sorrir.
E os fizessem dormir
nos braços cruzados
De qualquer riacho,
onde ninguém nunca...
Nunca mais os encontrasse!

15
APENAS METADE

Colori de preto a minha dor...


A dor da ausência do seu amor.
E a fragrância das flores, nem percebi.

Pela janela me deixei voar nas asas


de um colibri entre os nimbos da tempestade...

Dormi pela metade,


porque você não estava ali,
e não me trouxe flores...
Também nem percebi.
Porque do amor que contigo vivi
era eu somente metade.
Tão triste, qual noite de tempestade!

16
FOTOGRAFIA NA MOLDURA

Um dia seremos apenas uma fotografia.


Alguém há de perguntar quem é.
E alguém há de responder quem foi.
Dizer: Que foi o amor desse alguém ou,
uma boa alma que com o tempo veloz voou.

Há de perguntar o que houve?


Mas, talvez nada terá havido.
Apenas que tenha partido,
por que o tempo vai e com ele
alguém há de se ter sempre ido.

E tornaremos um dia
apenas uma fotografia.

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POR QUE TE AMO

Amo tuas mãos.


Tem gosto de lençóis
acetinados da infância...

Tuas mãos: Pérolas a tocar-me as faces!

Amo tua voz!


Tem delírio de música erudita
dos palácios reais...

Tua voz... Doce canção a beijar-me a alma!

Amo teu corpo.


Tem calor do manto na estrada
onde passou o bom samaritano e o mendigo.

Teu corpo!
Pois me aquece nas noites frias,
Quando ninguém mais me oferece nada.

Amo-te! Se me podes ser apenas um toque,


um calor e um sussurro!

18
ESSÊNCIA MALDITA

Provei tua essência, oh, alma dos meus delírios!


E pela estrada, suspirei fundo a minha dor...
Sem saber se era amor ou a breve vida dos lírios
que fenecem da noite ao dia amanhecer.

Então, em que crer? Se só uma ilusão vivi?


Se das tuas mãos só o olor sorvi!?
Como troféu recebi na carne os ventos
batendo apressados a levar o tempo.

Provei tua maldita essência...


Oh, alma dos meus delírios!
E morri como os lírios noturnos...
Taciturnos!

19
A DOR DA OSTRA

A Semente
A terra
As mãos.

O broto:
A essência da semente.

E então, as mãos e o riso!


Ou as mãos e as lágrimas!

Mas quem sabe,


a ostra, o mar, a areia...

A dor da ostra
A lágrima
A pérola!

20
VERSO TRISTE

Estou em luto, a poesia morreu.


Morreu nas frágeis mãos de quem a escreveu.
Porque o amor foi para longe, tais quais os monges
que se fecham em antigas catedrais.

E não voltará! Nunca! Nunca mais!


É como a alma sem vestes na noite invernal...
“Nu eu vim do pó e a ele regressarei.”
Sem tema de amor, histórias de rainha ou rei.

E partirei... Cantando ou chorando


os versos que compus para o amor...
O amor que se perdeu e amei tanto!

Mas minha alma purificada,


deixará no chão as folhas orvalhadas
de versos tristes, rabiscadas.

21
AUSÊNCIA DE PALAVRAS

De tudo para quanto vivi,


eras tu do que mais morri.
Da ausência de palavras,
do canto que não ouvi.

Eu sinto porque tu foste,


pelo amor e o desgosto...
Era uma verdade tão vã,
que só durava no afã
das palavras ditas com escárnio
travestindo-se o riso dos falsos
versos de Chamfort.

Era sua verdade tão vã!


De tudo o quanto vivi,
eras tu do que mais morri.

22
ECOS DA VIDA

Tu serás forte... forte... forte!


Ouço o eco do grito da minha alma.
E assim quando anoitece:
Tu serás forte... forte... forte!
Mas sua voz nunca ecoa :
Tu és forte, forte, forte!
Apenas uma mensagem no tempo futuro, soa,
e duramente todos os dias ou noites
é preciso acreditar no eco:
“Serás forte... orte... rte.”
E cada vez o eco se distancia,
deixando-me à própria sorte:
“Forte... orte... te!”
“Sorte... orte... te!”

23
TAÇAS DA VIDA

Havia taças!
Taças da vida...
Não era um brinde
Não era vinho
Não era festa
Não era vício
Era cicuta!
Era tristeza...
Era revolta!
E tanto fazia
beber ou viver.

24
PEDAÇOS

Quando a chuva lavar o meu rosto


do desgosto que a poeira do tempo espalhou,
terei que juntar meus pedaços
no primeiro abraço a que me oferecer.
E lembrar-me-ei então das manhãs
em que mãos enrugadas passeavam
pelas maçãs do meu rosto.
E aqueles olhos, de onde saltavam
as lembranças dos abrolhos,
de uma vida antiga, mas não vivida.
Então nos fitamos e sem palavras
dissemos um eu te amo! Eu entendo!
Ou, não se preocupe!
Talvez, um me desculpe!
Minhas mãos eram pequenas
e eu não retirei os espinhos de seu caminho.
Perdão!

25
VIDA OBSCURA

A vida é tão vida!


A vida é tão dura!
É noite obscura!
Se dia, não torna a alegria.
A vida é tão vida!
A vida é tão dura!
Obscura!
Se há janelas
devia uma fresta haver!
Um céu anil ou uma noite
exibindo estrelas mil...
Nem sempre a vida se faz contente
Porque a vida é tão vida!
Tão dura! Obscura!
Às vezes incoerente.

26
MEU BRASIL

Ainda que meu olhar


Não seja anil.
Dê-me um verde pincel
Para escurecer tuas devastadas matas,
e pontilhar de estrelas o teu céu
Oh, meu Brasil!
E embrenhar-me-ei
em tua fauna, em tua flora
(em tua alma!)
E em vez desse seu riso
branco ou amarelo,
desenharei de ouro e prata
para ti uma outra história.

27
O RETRATO DA DOR

Um marasmo foi o que restou.


E o retrato da dor nos olhos arroxeados.
Tal qual um dia que não amanheceu
E em seu breu trouxe à tona
um corpo que tanto sonhou...
Sonhou com o milagre da vida
que nunca lhe dera tanto!
Alem de prantos e feridas.
E a cada dia que amanhecia
Via no céu a poesia.
E era tão linda de se ler!
Mas nem mesmo interpretar podia.
Sem tempo! Não podia!
Seu tempo era pouco
E a vida não esperaria,
E se esperando tudo Passar...
E passou. Até guardar seus sonhos
como presente que não pudera usar
naqueles olhos fechados, arroxeados.

28
EU SEREI SEU TEMPO

Trago um coração partido.


Guardado nessa casa em que habito.
Então, teus olhos... verei nas estrelas,
ao anoitecer, até nos fundirmos
e tornarmo-nos UM.
E quando chover, se chover,
o verei nas nuvens sangrando
a molhar meu rosto.
Eu serei seu tempo
e você o meu.
Ou serei a chuva e você as nuvens!
mas quem sabe as flores,
e você, o jardim onde me plantarem.
E será bom caminhar descalço
na terra molhada quando chover,
se chover.
Eu serei seu tempo e você o meu.

29
APESAR DO TEMPO
À Ana Lima

E havia sinceridade naquele sorriso.


O de sempre!
Com o mesmo desenho dos lábios,
Apesar do tempo.

Minha amiga!
A de sempre...
E rimos do mesmo riso,
e choramos da mesma lágrima.
Era a nossa dor parecida...
Qual alma gêmea, também nossa lida!

Ainda assim havia sinceridade


naquele sorriso: O de sempre.
Com o mesmo desenho dos lábios,
apesar do tempo!

30
MEU BATUQUE

Escuta o meu batuque! Vai até a madrugada.


Meu batuque é silêncio que me põe a vida pensá...
Deixa ele batucá... té que eu dance a última música
e alguém me põe pra niná.

É batuque com repiques dos sinos lá da aldeia


e dos sons das ondas do mar, de cheiro
de campos floridos, e da areia branca da estrada...
Da canção dos violeros!
Tem gosto de céu estrelado e dos causos
que meu pai contava, à noite, lá no terrero.
Das roupas que mamãe lavava e secava
no varal da minha infância...
De quando levava a gente na cidade pra comprá
os tecidos boladinhos para ela costurá,
vestidos dos contos de fadas mais lindos daquele lugá.

Por isso, deixa meu silencio batucá.


A cada vez que ele batuca
põe-se minha alma a pensá.
Deixa ele batucá... Té que eu dance a última
música e alguém me põe pra niná.

31
PÉROLAS TELÚRICAS

Oh, pérolas!
Por que, e por quem me fez sangrar?
Oh, areia! Que construiu meu deserto
onde tive que passar, e as mais lindas pérolas
de ti transformar?
Com dores de parto, suportar...
Suportar o frio da alma desnuda
e o calor desértico de um sofrer
para um morrer e só então ressuscitar!?

32
PARA ONDE FOI O PRÍNCIPE?

Uma canção para a menina


que foi embora.
Linda menina que brincava
comigo no meu jardim...
E sonhava com seu príncipe!

Vestida, sempre, de chita, saia balonê


e tiara de pedrarias nos cabelos de princesa,
a coroa de sempre dessa menina!

O príncipe... Ah, o príncipe?


Foi só uma história!

33
AMOR NO PORÃO

Se bem te conhecesse
antes de te conhecer
Minha liberdade já estaria
Presa no porão junto a ti.

E tão logo adormecesses,


Eu também estaria ali
a te envolver
E a envolver no sangue
que te fiz sorver.

Pagaria pela vida


Mas não na vida.
Ao amor que não me deu
E que só te ofereci eu.

34
SOB AS LUZES DE PARIS

Nunca de mim se esqueça, ainda que nas ruas


de Paris! Lembre-se que um dia foi meu amor...
Que costurei suas camisas brancas de cambraia,
e nelas deixei minhas digitais:
O símbolo da paixão passado a ferro e a fogo...
E preguei os botões meio arrancados pelo tempo,
com agulhas que feriram meus dedos de sangue
e águas salgadas do mar... meu mar...
Meus olhos a lacrimejar.
Lembre-se de minhas mãos que marcaram
a ferro e a fogo o símbolo da nossa paixão,
tais quais em suas camisas brancas de linho fino,
as minhas digitais, sob as luzes de Paris!

35
A SANIDADE DO AMOR

São poemas...
Nossas juras de amor,
feitas no silêncio pelo olhar...

São dilemas!
As páginas ternas e eternas,
marcados de um livro milenar.

São poemas!
A pena que desliza no papel,
tentando compreender a saudade
que paira no teu céu quando procuras
nas estrelas, o meu olhar.

São poemas...
Essa insanidade das noites de insônias
buscando a sanidade do amor.

36
SEREIAS E PÉROLAS

Foram as sereias que choraram as pérolas.


Dentro das ostras tentou esconder seu pranto...
Musicando seu gemido em triste canto!
E em cada ostra guardou segredos
do fundo do mar.

Foi de tanto chorar as sereias,


que surgiram as pérolas:
amarelas e negras,
pequenas ou grandes...

Talvez, somos sereias,


construindo nossas pérolas
em canto depois do desencanto.

37
O AMANHECER

Retornei-me ao mundo dos mortais,


até revestir-me de imortalidade outra vez.
E caminhei por entre os prados e jardins
para remarcar meus rastros, antes que ventos
os apagassem.

Dormi o sono dos justos ou dos injustos,


e despertei-me como qualquer deles...
Ouvindo a melodia dos pássaros.
E o sol brilhava assim mesmo na minha janela.

38
A MULHER DOS OLHOS DOURADOS

Sou a mulher dos olhos dourados.


Dos teus sonhos, a enamorada.
Visito-o todas as noites em tua alcova
Oh, meu príncipe encantado!
E quando acordas, tens a sensação
de se ter amado, e achas em meio aos lençóis, marcas de que por lá seu
amor pousou.

E dizes, oh quem me deras,


se ela por aqui essa noite estivera!
Meus olhos não seriam tão tristes
E a vida, nunca mais a teria por açoite.
.......................................................................
- Não te preocupes! Realmente à noite toda
te amei, e esse sentimento são as marcas
internas da alma com que te presenteei.

39
E AS PÉROLAS MORRERAM

Dizer que te amo para quê?


Se as pérolas que te ofereci
Jogou-as fora ao dia fenecer?
Matou-as com tanta ironia!
com o mesmo veneno que por ti sorvi.

E a flor que te dei, logo murchou,


à neve do triste inverno, não cuidou.
E a caneta de ouro que a ti guardavas
não fazia parte da coleção dos teus
pretensos tesouros!

40
APRENDIZ DE SOLIDÃO

Aprendi a ser só
Aprendi seguir e ousar!
Percebi que para voar
É deixar-me ser levado...
Planar nos ventos
sem suas asas.
Vi o quanto posso...
Eu, pássaro de rapina!
Não perco na noite imensa ou curta.
Aprendi a usar minha retina
tal qual a azul luz da mira de um fuzil.

41
AQUELA NOSSA CASA

Nosso amor nasceu das notas do cantar


da andorinha no galho seco da aroeira,
frente à casa velha...
Era uma canção com notas qual fino linho
e fita dourada nas mãos de uma criança.
E daquela janela com nossos sonhos,
olharíamos a chuva e a flor outonal
nos campos a brotar, e o gado pastando,
parecendo ruminar nossos pensamentos!
E nós, as nossas memórias remoendo
os sonhos envoltos em fino tecido, trazidos
por um anjo: a andorinha que cantava
no galho da aroeira defronte à casa velha!
E nunca mais deixei de olhar pela janela,
a flor do campo, tão amarela, e às vezes
tão verde, e às vezes tão da cor da terra!
Da cor do nada.

23/04/18

42
LOUCURA DE AMOR

Grita, grita! Oh, alma amargurada!


Até acordar-te do teu pesadelo.
O amor existe! Foi apenas um sonho ruim.
Não fora embora seu amado!
Nem há montanhas intransponíveis,
Ou, pássaros de mau presságio.

Escuta! É a mesma canção do vento


que o trouxe um dia! Ele ainda sopra!
Podes sentir o perfume em tuas mãos?
A fragrante essência dos deuses!
Não as lave! Leve à tua boca
e sentirás quão doce sabor!

Acorda-te, desse pesadelo,


Oh, alma amargurada!
O amor ainda existe.
Persiste! Não te enlouqueças
na tua dor!

43
DEVOLVA-ME

Devolva-me as doces palavras


e as mais puras gargalhadas
que tocaram-lhe os ouvidos!
Devolva-me !

Devolva-me os beijos
que com sofreguidão lhe dei,
e as carícias que só eu soube,
ou não soube, mas que desenhei
em seu corpo as marcas da felicidade efêmera.

Devolva-me!
E se quiser, devolverei os beijos e os abraços.
Conceda-me uma noite, apenas!
E daquela estrada, peço que me retorne
de onde juntos seguimos, pois não sei
mais voltar, estou perdida!

Devolva-me!
Devolva-me a direção do caminho!

44
EU E O ARCO-ÍRIS

Vê o arco-íris?
Ele está feliz.
Possui muitas cores,
Por isso é feliz.

Olhe-me!
Vê...
Eu estou em preto e branco...
E feliz!

Não é uma antítese?


Eu amo a cor preta!
O branco é só para
realçar a cor noturna
da minha alma.

45
DEPOIS DA JANELA

Naquele tempo logo ali depois da janela...


Ainda posso ver os namorados de mãos dadas
a caminhar no jardim da praça...
Era um tempo outonal, não esse inverno atemporal que bate nas faces,
deixando um toque, um cortar de ventos malditos a perfurar a frágil
derme da existência.

É logo aí depois da janela... Nem tanto tempo faz! Eu, você, nós, de
mãos dadas sonhando
com o futuro... mas quando será o futuro? Amanhã? E quando for
amanhã,
mais futuro não será, e sim presente.

Então onde está o futuro?


- Na janela logo ali mais à frente...
Onde outros jovens caminharão de mãos dadas,
em cima de nossos rastros, e sonharão
nossos sonhos, alheios a esse inverno atemporal
e aos ventos cortantes que lhes ferirão na derme.

46
EU PRECISO

Eu preciso desse teu corpo de brumas,


ora de mares, ora de espumas a tocar as minhas praias.
E nessa tormenta suplico:
Eu preciso que me olhes nos olhos
e diga nossa palavra mágica para amenizar
a dor do amor entrelaçada à distância,
a transformar minha alma ferida
que nunca cicatriza.

Eu preciso do seu corpo de brumas!

47
ASSIM É ESSE MEU AMOR

Esse amor que é meu e me alimenta


de versos, anelos e ternura.
Que um dia saí a procurar,
a chamar de alma minha...
Há muito já habitava-me os sonhos.

Sua voz macia e um sorriso terno...


Mãos pequenas de pérolas!
E os negros olhos a mirar os meus!
Esse amor seria todo meu paraíso!
E me amaria por tudo e também por nada.

Assim é esse meu amor...


Eu o amaria por tudo e também por nada.

48
O VINHO DA JUVENTUDE ESCARLATE

O vinho que eu bebi em sua boca me enlouqueceu.


Era de uvas frescas colhidas em tempos da juventude escarlate.
Em tempos que o trem apitava ao longe anunciando
sua chegada.
Eu na estação à procura...
Não era mais o menino de alma singela e pura,
mas o homem esbelto com seu paletó aos ombros,
em busca da menina de tranças.
E eu não mais a criança! Não mais o vestido floral.
Era um tempo de estio, não mais um jardim estival.
Jardim que juntos plantamos para selar nosso amor
de criança...
Hoje quando o trem apita, ouço da vida um prenúncio: Não mais o
trem que chega, e sim,
avisa sua partida.
E bebo o vinho embriagante da sua boca, na lembrança.

49
QUERO

Quero ser o sonho que te faz bem...


Que te faz dormir e sonhar.
Eu quero ser sua poetisa a cantar
as melodias mais profundas
das sereias no fundo do mar.
Deixa-me cantar!

Sou também jardineira das flores


E posso uma semente lançar...
As sementes dos amores.
E pintar um jardim tão perfeito
Que não haverá outro jeito
a não ser amar, amar, amar...
Nas profundezas do mar,
ou no mais simples leito.

50
POR TUA ALMA É QUE ANELO

As violetas passaram sobre o meu olhar,


deixando sombras arroxeadas.
E os nardos cobriram a visão da tua passagem...
Indas que ouvia a carruagem de um príncipe,
não pude sentir o gosto por te ver passar...
Mas os olhos da minha alma ferida, sentiu tua sombra... Podes passar-
te, oh majestade!
E sobre mim, essa sombra palpitará, como se meu corpo estivesse
tocado!
Será imenso esse amor que me abrigas.
E nunca mais, nunca mais, haverá um estribilho,
em meus versos onde te pousarás teu brilho:
No encanto da alma, e por quem anelo.
Então apenas os nardos e as violetas se passaram arroxeando meus
olhos e cobrindo-me a visão
da tua breve passagem.
E meu corpo palpitará como se lhe houvesse tocado.

51
CACTOS FERIDOS

Arrancaram-se os cactos onde era o nosso ninho.


E cortaram-se os espinhos!
Perdi meu diamante nas brumas
de uma noite triste!

Desfolharam a flor estranha,


a mais bela do jardim!

Talvez o tempo! O tempo!

E, nossa casa tão sonhada,


ao som de tristes ventos, em horas caladas
se desmoronou...
Não seremos o que sonhamos:
“Pobrezinhos, de mãos dadas a andar pelos caminhos...”
Bastavam-nos nossos cactos onde fizemos um ninho!

Talvez o tempo... O tempo!

Roubaram nossa morada e a arremessaram


aos ventos!

Talvez o tempo... O tempo!

52
AMOR ENLOUQUECEDOR

Amor enlouquecedor
Enlouquece (a dor)
En (dor) enlouquecer...
Endoidecer! En (dor) adoecer.
O amor que aquece no inverno
É o mesmo que enlouquece
E nos esquece e faz a dor:
Esse amor enlouquecedor!

53
PALÁCIO AZUL-TURQUESA

Oh, palácio azul-turquesa!


Por quanto tempo ainda sonharei com teus vitrais?
Com tuas fartas mesas e banquetes ancestrais?
Quando ouvirei Schumann, o menino que sonhava
com o jardim da eterna infância?!

Debaixo das tuas marquises, mendigos e meretrizes,


todos têm seus sonhos vãos, assim, também meus delírios feitos pássaro
de estação, por eternas madrugadas!
E ao toque do campanário, muda-se todo cenário dessa noite
embriagante: Cada pessoa que passa, leva no rosto um sonho e a taça de
vinhos estonteantes.

Meu palácio azul-turquesa...


Quando sentarei à tua mesa?

54
JANELA DOS SONHOS

Amo te amar! E nessa ânsia por teu amor,


busco meu mais intimo desejo, que encontro
nas feridas latentes da saudade:
o teu abraço e o teu beijo!

Eu sei, sempre será assim esse sentimento


que dói... Meu desalento!
- Compartilhar-te com a distância
E não poder sentir-te no meu abraço.

Assim minha voz sumindo, clama aos ventos,


a te dizer que nunca... nunca haverá esquecimento
desse amor a machucar e por que lamento!
Pois fora concebido na poesia da distância.

Amo-te sem mesmo nunca te ver passar.


Apenas daqui da janela dos sonhos,
é de onde vivo a te imaginar.

55
ENVELHECER

Envelheci o quanto pude


e o quanto não queria também.
Mas percebi que a cada cantar das brisas,
uma nota fazia seu caminho musical.
E todos os dias e madrugadas vividas,
Desenhou-se em cicatrizes remontadas
no meu rosto jovial...
Tornando-se apenas sulcos sagrados.
Por isso orgulho-me das rugas,
e de quanto meus olhos se pintaram
de roxas orquídeas a cada por de sol.

Percebi que isso se chama eternidade


e o meu próprio Eu recoberto
desse tempo de sonhar!
E é a vida esse sonhar, sem amarguras...
Apenas com esboço de canto no canto da boca.

56
VEM!

Toca minha alma com os teus lábios ...


e com os dedos perfura-me a epiderme,
e ultrapassa, fantasmagoricamente, a derme!
Se não podes tocá-la nem com os olhos...
Posso sentir os espinheiros, esses abrolhos.
Sou a felina dos outeiros, que dança na selva
e nos picadeiros, onde tudo se faz verdade.
Até a ilusão da eterna felicidade.
Vem! Toma meu corpo junto ao seu...
Olha na janela já se faz breu!
Por entre os montes os pingos regam
a relva que nosso corpo um dia acolheu.
Vem! Que o tempo passa... E se passa,
não há como esticar o braço para, com sofreguidão, segurar, em
desespero, o meu abraço.
- Vem alma minha, pois minha alma perde-se
a calma, enquanto aninha-se em outros ninhos...
Lembro-me o doce perfume, em agonia
das longas noites sem seus carinhos
-Vem, toma meu corpo junto ao seu!

57
TAÇAS QUEBRADAS

Na quimera daquelas taças levantadas aos ventos,


firmamos um eterno compromisso de trilhar
em linha reta a mesma estrada, até o infinito!

Amei-te tanto, e viajei às estrelas,


até se dar conta e sorver meu próprio pranto!
Compreendi que ao amor não se propõe
um brinde em taças que se despedaçam
ao toque de qualquer vento...
E que ainda os ouço ao chegar da noite
tal qual os falsos juramentos.
Nada mais desejo além da brisa no meu rosto,
feito remédio a suplantar tanto desgosto!

Por que te quebrastes, oh, taças, levantadas


ao vento?! Por que morreste, oh, sonhos
de meu tormento?

58
ESCREVI-LHE POEMAS

Escrevi-lhe poemas de amor


E eram como recém-colhida flor a te oferecer...
Mas sem cuidado para reviver,
Murchou ao sol por.
Também, aos ventos,
Rasgou-se a fina folha de papel
onde todo meu sentimento escrevi,
E assim, esses olhos, à noite, cerrou-se
sob um véu de tristeza coberto,
tal qual o rosto de quem findou-se.

Meu poema foi tudo que te dei:


A pérola que recriei: Essência da alma
que a ti guardava, ofereci-te nas palavras
toda minha pena com tinta dourada!

Mas tal qual a flor e o amor,


os poemas também fenecem
na telúrica raiz das pétalas recém colhidas.

59
CANÇÃO DO AMADO

Era madrugada e ela dormia languidamente


sobre o lençol de cetim.
Sonhou que havia alguém batendo à porta
querendo entrar, havia barulhos de mãos
na maçaneta. (Oh, quem seria àquela hora?!)
Era o amado que a chamava para um passeio no jardim, e lhe trouxera
cestas de figos, flores e perfumes... Mas ela estava cansada!
A luminosidade do lençol de cetim a convidava,
dizendo: - Não abra! É muito tarde!
Eis que o amado saiu com frio e o corpo molhado
d’ orvalho, às ruas cobertas de folhagens e pétalas
que a chuva fizera cair...
Ao longe ainda ouviam-se os passos cansados
do amado e um perfume de flor ficara na maçaneta. Sentiu saudades!
Era dele o perfume... Saiu correndo, descalça
e com roupas de dormir.
Havia homens maus nas ruas que a açoitara.
Ela dizia: - Estou atrás do meu amado...
Acaso não o vistes? Ainda há pouco quis estar comigo! Deixem-me ir!
Mas os homens responderam com escárnio:
- Você não tem amado algum!
Se tivesse, o perfume dele estaria em seu corpo,
porém, agora estará em nossas mãos, será prisioneira até que seu
amado venha buscá-la! Pode dormir!
... Agora não mais sobre o lençol de cetim,
mas na calçada suja, molhada; corpo ferido,
sonhando com o amado e com as flores que lhe deixara.

(Reeleitura do Cap. 03 de Cantares de Salomão em forma de poesia.)

60
DUAS FACES DA POESIA

Ontem vi a poesia.
E era vestida de chita fina, enfeitada com colares.
Ia por caminhos de flores, onde se viam os amores encantados, jovens
enamorados, vestidos,
alguns de linhos...

E tinha risos no rosto a poesia.


De mãos dadas por entre os pátios,
entre os parques da cidade, até nas pontes se viam!
E era a poesia tão jovem, pele de pêssego rosado,
cheirando a jasmineiro em flor...
Seu nome era amor.

Hoje pelo mesmo caminho, ia novamente


a poesia...tão linda, mas desencantada!
Seu rosto triste e com lágrimas, faltavam-lhe flores
nas mãos e também pelos caminhos.

Usava um vestido surrado, não era mais um brocado,


nem lhe compunham babados;
Colares? Quebraram todos.
Até as pérolas morreram ao virem a poesia
tão triste! Faces já enrugadas... O corpo meio curvado! E ia a poesia de
hoje, que era a poesia
de ontem.
Não mais na mesma euforia:
Ser jovem! Oh, quem lhe dera!
Naquele viver tão triste, acabara a primavera!

61
FLAUTA E LIRA

Tenho em mim um canto


que já não me encanta...
Um poema que não me delira.

Tenho a flauta, tenho a lira!

Tenho em mim um canto


que já não me encanta...
Mas também tenho a lua...
Branca e nua!

Vou vê-la.

Tenho o vento que assopra notas...


Vou escutá-lo!

62
OS OLHOS DE MINHA MÃE

Eram duas pérolas cravadas em um triste rosto


Havia algo marcado, a beleza e o desgosto.

De dentro da água salgado, saltou-se a ostra


à maresia, e suas partes separadas, banhou-se
no sêmen d’areia molhada.

E seu ventre carregou-se de encanto ou desencanto,


a cada vez que amanhecia, por tantos e tantos dias,
ouvindo a noite gemer para cobrir seu sofrer.

Aflito o grito da alma, de uma alma sem calma...


E aqueles olhos? Nunca eu os vira tão de perto!
Nem sabia se só desertos o seu mundo oferecia,
mas em seu rosto, desenhadas, duas pérolas,
sim, haviam!

63
SE É QUE ME ENTENDE

Minha cara dei a tapas, desde que nasci...


Não porque sou melhor,
Mas é porque sou mulher.
Pensando bem, não foi minha cara
que coloquei a tapas, e sim “meu sexo”.
Queira você, sim ou não, quando eu passar,
vai ter que “abrir alas”
Eu não preciso de horas ou tempo
para (re) construir minha história,
as minhas horas são as que eu passo
lutando na “selva desumana”.
Também não preciso escrever um poema,
cantar uma música, me fazer de “pequena”
para ser acolhida, a própria vida me acolheu,
a própria lida diz quem sou eu.
Não preciso ser só “Cinderela”.
Tenho fogo nos olhos, e na alma um vulcão...
que ora adormece, mas não é sempre não.
Também não preciso contar historinhas

das “Mil e uma noites” para não morrer,


A minha história se consagrou no jardim do Éden,
quando disseram que eu sou Eva e transgredi,
mas também progredi, e não adianta se lamentar.
Não estou aqui para questionar, mas Adão foi
um “maria-vai-com as outras”.
Se é que você me entende!

Minha cara a tapas eu dei desde que eu nasci.


Não porque sou melhor e sim, porque sou mulher.
Mas é preciso explicar:
Não foi minha cara que coloquei a tapas, e sim “meu sexo”.

64
Não porque sou melhor, mas porque sou mulher!
Se é que você me entende...
Mas talvez ninguém nunca entenda!

65
A GRANDE PÉROLA

Todo coração guarda um segredo


qual pérola dentro da concha...
Um amor proibido e um amor
fracassado: Concha vazia!

O mar é a vida que vai.


Vai levando conchas vazias...
Ondas vêm trazendo, talvez, à praia,
a grande pérola.

Mas, o que seria viver


sem essa eterna busca,
e por entre tantas conchas
fazer o sonho valer a pena?

66
AS FLORES DA VIDA

Trago na alma, flores.


que ganhei vida à fora
Algumas apresentam dores...
Outras, o riso de agora.

Nunca as desprezei, porque há um jardim


dentro de mim, e sementes que nem sei.

E é assim a vida...
Se não ganhar tuas flores
podes achar a semente
de uma árvore incontida.

67
DE DENTRO DA CONCHA

Havia apenas vácuo e nudez.


Resolvi a bordar-me com cristais
que as ondas traziam, e afoguei-me
em busca das pérolas...

Então tudo se refez na imensidão


de um azul mar que eu própria desenhei,
a refletir no céu, os corais, e os cristais
feito estrelas incendiando o mar.

Meu desejo intenso, as pérolas.


Então me pus a desenhar
e recriei-me dentro da concha.

68
A VIRGEM

Era a mulher mais bela!


O encanto da aldeia...
Tinha os olhos lindos e castanhos
apesar de seu jeito estranho!
Contudo, os rapazes queriam
seu brilho de perto sentir.
Ela era ela... Ela, ela:
A rainha do por vir.
Com seu corpo de sereia...
Se amava ou não amava
ninguém saber precisava.
Esse seu grande segredo,
Pois de sofrer tinha medo.
Mas o tempo foi passando.
Seus cabelos branqueando...
Os lábios, outrora amados,
cingiram todos enrugados.
A moça mais desejada guardara sua beleza,
e alguns Até diziam que “a terra ia comer.”
Mas quem disse que não?
A vida é breve passagem,
se vamos ou se não vamos
enfim, temos que passar...
E a terra há de comer
qualquer um, feio ou bonito.
Com olhos de violetas
ou pupilas de granito.
E as mãos entrecruzadas
firmando seu compromisso
de nunca ter sido tocada.

69
O DIA DAS FLORES

Hoje o girassol disse: eu sou o sol


Quero não apenas brilhar,
mas embelezar o caminho de alguém...
E assim floriu um lindo jardim de girassóis!
A violeta também disse:
Não sou apenas uma flor roxa, sou a cor
de alguns olhos... Se não posso perfumar,
então vou enfeitar o rosto de alguém.
As rosas, por sua vez, disseram que só perfumar
sabiam, e se espalhariam num tapete colorido
onde o amor fosse passar, exalando perfume no ar...
E houve rosas por todos os lados:
Vermelhas, negras e até azuis encarnados!
E assim as flores queriam, portanto existir!
Os lírios brancos e açucenas escolheram tornarem
qual a lua, a mais prateada, e seriam a cor da alma
de alguém que a noite a fosse contemplar:
Bela e nua!

70
O TREM

Esse tempo que não faz questão de voltar,


é como um trem em sua última viagem,
Não voltará! Por mais que você chore,
o trem chamado tempo, não voltará!
E na memória ainda revê o trem
e ouve seu último apito, ainda assim,
espera que após algum tempo,
irá a mesma estação...
Mas nem mesmo o trem estará lá.
É difícil aceitar que nunca mais voltará,
nunca mais o verá, nem o trem
que levou o amor, nem o tempo
que levou o trem e o amor...
Mas é possível que a memória ainda se lembre
do lenço branco a acenar e da a rosa desfolhada,
dentro do velho livro sobre a rede de dormir.
Não! Não dá para recomeçar.
Não é possível voltar.
Por mais que a mente retorne à estação
de onde o trem partiu, você também não mais estará lá.

71
A CASA AZUL DE VIENA

Na sala azul de Viena junto aos alabastros


e sob luz das velas, no tapete celeste...
Os nossos corpos, nus, olhando para o azul
das paredes cinzas envelhecidas.

Nada se compara ao sublime bater das luzes


da cidade na sala azul de Viena, junto aos alabastros,
onde sob a luz das velas, beijei-te, beijou-me
e nos amamos sob o anil céu, prateado de estrelas
e da alva lua.
E perdemo-nos na noite silente como jovens enamorados,
na celeste casa dos meus sonhos!
A casa azul de Viena! Na sala azul da casa azul
de Viena... Da rua das violetas azuis de Viena!
Ano 2.016

72
OUVINDO FLORES E POESIAS

Vou pelos vales ouvir as flores.


Algumas dizem que estão tristes porque são azuis.
Outras se envaidecem porque são vermelhas,
e retorcidas como quem desfila.
Cada uma traz em si o perfil de uma mulher...
Algumas, da mulher que dança...
Outras, da mulher que chora!
Da mulher que canta, e gosta da madrugada!
Que toca piano, mas prefere a guitarra...
Em cada vale e montanha há um perfil de mulher:
Um corpo, um rosto, um olhar!
Até uma barriga crescendo...
E nas folhas da relva escrevem sua história...
A mulher!
No tom da guitarra ou do piano deixam sons
ou letras, da tristeza ao riso...
As árvores também se encontram...
Parece saber qual é realmente o sonho da mulher,
porque estáticas esperam qual se inclinará
a confessar um beijo!
Até os pássaros desenham,
com suas asas nas nuvens,
o sonho terno da mulher.
E faz a sapatilha daquela bailarina!
E a lágrima caindo da poetisa.
Também o brilho da artista,
quando os raios tocam –lhe as asas brancas,
e imitam essas mulheres.

Eu vou pelos vales ouvir flores...


Ouvir mais outras poesias!

Lara... larara...larari...lará!

73
APENAS UM TOM

O amor é doce, mas dói a alma quando


vai embora, e ficam só as notas da música
que nunca para de tocar.
O amor é verdadeiro, mas verdadeiro que o amor
é a canção que embalou o amor, porque essa sempre há de tocar em
algum lugar a embalar outros amores, porque o amor só toca uma única
vez, e a vida sabe que em nenhuma folhagem, a mesma flor voltará a
brotar.
O vento que sopra nas faces coradas do amor, nunca mais tornará a
tocar, e o amor também sabe disso, por isso a canção faz questão de
estar onde o amor está, e o vento faz questão de passar para lembrar o
amor.
Mas o amor sabe que nunca será o mesmo...
Há diferenças nos contornos dos braços, no cheiro da pele, também na
intensidade do beijo...
Há outro tom na voz, porque o amor só existe num tom, e ninguém
ousará imita-lo... Porque o amor só toca uma vez, e a vida sabe que em
nenhuma folhagem, a mesma flor voltará a brotar.

74
DESEJO DE FICAR

- Gostaria de ter ficado...


Eu viveria assim do seu jeito.

Existe maior declaração de amor?


Até parece letra de música.
Não me importava sua camisa surrada,
nem seus cabelos de jovem da ditadura.
Queria beber café amargo com você
sentados no banco de madeira.

Era tudo que podia me dar e não deu.


Queria estar em seus poemas, em seus desejos!
Nas suas noites, na sua cama.
Mas agora... Até mais! Preciso ir.
Tornou-se letra de música ...
Não é um poema, nem mesmo canção.
É somente letra porque não teve melodia
nem mesmo um tom de uma poesia.

75
SAMPA

Tem tanta gente em Sampa.


Tanta gente, tanta!
Será que todo mundo é bandido,
Será que todo mundo é herói?
Será que todo mundo é querido?
Ou nem mais isso dói?
Tem tanta gente na “fila”;
Tem tanta gente que brilha;
Outras esperam em vão, alguns,
impacientes se vão...
Se vão por outros trilhos.
(aqui em Sampa é o que tem.)
Tem gente que come na rua...
Tem gente de alma nua
e mora no casarão.
Não sei se também é bandido,
Não sei se é um herói.
Dói! Ver mãos estendidas...
Dói ter que disfarçar o olhar.
Será que até eu sou bandido?
Tem tanta gente em Sampa...
Tanta gente... Tanta!

76
TATUAGEM

Tenho muitas tatuagens!


Não, feitas por mãos de artista.
Mas feita pela vida...
Cada caminho, cada lida.
São os amores? São dores?
Felicidade? Não sei.

Esse meu rosto, rosto de outrora, menina!


Enfim... Cansada, desacreditada!
Tenho várias tatuagens...
Não só no rosto ou corpo.
Trago na alma, feridas!

Agora mulher... Nem por isso, amada.


E sigo meu caminho... Preciso andar...
Não tenho tempo!

Preciso levar as feridas...


Preciso lavar as feridas!

77
CARTA AO TEMPO

Senhor tempo!
Peço que espere o meu príncipe sair do relógio
e me buscar para o altar, antes que meu sapato
de cristal seja quebrado por uma falsa e descuidada Cinderela...
Que seja trazido por um pombo-correio
enviado pela fada –madrinha, junto ao vestido rosa
de princesa e a coroa de cristal!
Que você nunca se apresse... Eu sei esperar!
Mas que no altar, minhas rugas se desfaçam.
Senhor tempo! Que me conceda tempo de ser feliz...
e que eu passe a crer que a felicidade valha mais
que um “triz”.

78
MULHERES E LOBOS

Mulheres e lobos se assemelham.


Selvagens! Saem à caça na noite,
com seus olhos enigmáticos.
Mulheres e lobos selvagens têm o mesmo faro
ao olhar a lua e as estrelas...
Elas se deitam na relva onde os lobos passam
em câmera lenta, sobre flores amarelas...
Quando adormecidas sobre as folhas do campo,
se assemelham aos lobos selvagens.
Enquanto os bichos buscam suas caças
e as saboreiam em qualquer capim, mulheres
se inclinam sobre a relva e olhando a lua e estrelas,
sonham com lobos que as venham caçar.

79
RE-CONSTRUÇÃO

Não tenho medo que o tempo


apague minha memória, afinal,
ele constrói, reconstrói e destrói.
Talvez destruir, também,
seja um forma de reconstrução.

80
AO REI

Busca-me nas palmas das tuas mãos!


Na Tua genealogia. Sou tua herdeira!
Nas imensas linhas das mãos,
podes buscar e encontrar-me-ás...
Se não estiver na mão esquerda,
procure na mão direita, estarei lá, cravada
com sangue carmesim e, desde a fundação
do mundo, Tu já me chamavas pelo nome...
Majestoso! Me conheces de longe!
Sou tatuagem... e só se tatua
o que imensamente se deseja.
Deste-me a harpa também as notas,
as canções para toda eternidade.
Sou teu anjo: aprendiz de Serafim.
Chamar-te-ei, Senhor!
E todos os dias te cantarei canções.
Ainda que eu fugir, encontrar-me-ás
e outra vez mostrar-me-á:
“Olha o teu nome na minha mão!”,
Então cantarei: Majestoso! Senhor meu!
Em diferentes tons!

81
CANÇÃO A MINHA MÃE

Vou vê-la a costurar do meu jardim.


(aqui não há jardim)
Mas vou olhá-la até a exaustão...
Do meu jardim!
Parar o relógio, nada compor,
Para não macular o momento.
E olho... Sinto o tempo no vento
Que se esvai, mesmo com o relógio parado.
Ela tem olhos de fadas, talvez seja mesmo
alguém encantada em mãe, transformada.
Seres eternos que voam ao toque do relógio tempo.
Por isso vou vê-la costurar do meu jardim!

82
SECRETAMENTE

Tenho o mar dentro da concha...


Tenho a chuva dentro do mar
E após a tempestade, tenho o luar
Que me faz a pérola desejar.
Por que não tê-la?
Na imensidão de tantos mares...
Se ostras se machucam para procriar?

83
POR QUANTO TEMPO ESSE AMOR

Nem mais sei por quanto tempo hei de te amar...


Amar-te é deixar-me à deriva de seus desejos.
Não sei mais por quanto tempo, seus beijos,
hei de ter, ou se uma lágrima há de correr-me
nos lábios em trajeto quais águas marítimas,
salinizando-me o sabor, de antes, mel.
Nem sei por quanto tempo hás de me amar...
Se tens gosto de luares! E os lobos se atiram
sem pudores, em busca do dulçor que na alma
te habitas!
Sei, que mesmo à deriva hei de te amar,
e por muito tempo, em sonhos, sua boca
vou beijar. Ainda que salinizem os lábios
de lágrima e sejam como o imenso mar.
E em sonhos, seu corpo em enleios,
farei meu trajeto em busca do que ficou de mim...
Hei de gritar por ti, como os lobos, clamando pela alva lua.

84
AMO AS ANTIGAS CATEDRAIS

Amo as antigas catedrais


Feitas de vitrais desenhados,
por artistas tristes... na cor escolhida!
A buscar no espírito, sua própria lida.
Amo os cantos ouvidos nas antigas catedrais,
assim também amam as pessoas que nunca
as adentrariam jamais: os mendigos das calçadas,
os abandonados, relegados!

Os sinos dessas catedrais anunciavam um fim


ou o momento de orar, para as penitências pagar.
Mas cada qual sabe se pode em seus
bancos assentar-se, ou do lado de fora continuar.

As rendas e os vitrais...
Amo-os das antigas catedrais!
Seus poemas, suas penas!

85
OLHOS PETRIFICADOS

A poesia morreu nos olhos dela!


Transformando-a numa estátua,
e sua loucura o faz vê-lo todos os dias
naquele triste lugar do adeus...

Seu amor o transformara em uma estátua


linda que apenas ela via.
E como se nunca mais fossem se separar,
ela permanecia estática olhando o infinito...
E aqueles olhos, mesmo petrificados,
a buscar os dele, sangravam de ternura!

86
ESPELHO INSANO

Em um passado não tão distante


esqueci minha criança abandonada.
Ela chorou por todos os musicais da vida
E percorreu as trilhas dos caminhos, a buscar-me.
Por tempo eu a havia esquecido,
a havia abandonado!
Mas um choro noturno
não me permitia dormir.

Todas as noites, olhando as estrelas,


à procura! Queria poder ouvir outra vez
a voz melódica, angelical, mas ela já não estava.

Corri por caminhos escuros!


Ouvi passos nas calçadas,
pressenti sombras nas janelas.
Era ela! Havia chegado a buscar-me!
E eu havia saído a procurá-la.

87
POETA DA MESMA DOR

Eu ainda tinha um coração em paz quando te encontrei.


Não sabia o que era a chuva torrencial, então chorei.
Chorei de medo de ficar só e sem amparo eu própria me deixei. Deixei-
me levar pelos teus passos que nem mesmo você sabia para onde ia.
E a lugar nenhum fomos:
Você e eu. Não sabemos até hoje o porquê
Nossa estrada se desvencilhou, nosso rumo se perdeu...
Não tínhamos a chegada, somente partida
e o que nos encontrasse na estrada.

Eu ainda tinha o coração em paz quando te encontrei.


Você e eu, poeta da mesma dor.
Agonia do mesmo amor!

88
LINHO FINO

A poesia é um eterno bordar em linho fino.


O linho são os papeis,
e a caneta a agulha e a tinta as palavras.
E bordaremos e bordaremos...
Até que um dia alguém nos tome
a agulha e a linha e os sonhos e a inspiração.

89
ROSTO PRIMAVERIL

Ah, quem me dera!


Se voltasse a minha
Primeira manhã de primavera!
Debulhasse puros botões
de flores dos laranjais!
Palpitasse aquele aroma
que nem aos campos voltam mais...
As faces douradas da mocidade!
Onde um cantar fosse o maior pecado
E a pureza um canto desesperado.
Ah, quem me dera!
Se voltasse a minha primeira
Manhã de primavera:
Estação fugaz da mocidade.
Só cai serenamente na lembrança,
a saudade.

90
VIVER É FATAL

O que és tu vida? Alguém há de perguntar.


E alguém haverá de responder que és um amontoado
de borboletas sugando as últimas gotículas de sangue do seu cadáver,
enquanto outros seres putrefadores da cadeia alimentar aguardam sua
vez
para degustar o corpo que ora habitava sua alma.
Alguns preferirão logo seus olhos para interromper-lhe a visualização...
Para que não sofra com a própria destruição... Da essência ora
existente.
E as fezes expelidas nos dias quentes, e também se for noite fria.
Isso é a vida... Os poros se abrindo e deixando derramar, bem devagar
o suor que outrora, umidificava o corpo para não desidratar e agora...
tudo explodindo... Implodindo!

Enfim, é a vida... Fezes futuras para adubar a terra


onde plantinhas nascerão sobre sua cabeça
e lhe taparão os ouvidos e cobrirão sua boca para esconder
o desejo das palavras que você preferiu não dizer.
Viver é estar sempre em estágio terminal!
Viver é fatal!

91
A MORADA NOS CACTOS

Adormeci pensando...
Pensando nas peculiaridades do seu corpo.
Senti saudades!
Um vento ousado trouxe-me a lembrança
do afago das mãos pequenas e cálidas,
em noite estrelada...
E o desenho de seu corpo esculpido no meu.

Nada mais se amoldará com igual forma!


Nenhuma outra flor far-se-á tão conhecida
do meu jardim...
Como se nascêssemos do mesmo caule!

Nenhuma outra pétala se amoldará


à minha pétala: Flor estranha, nas entranhas...
Mas tão conhecida da poesia!
Era meu canto outonal. Eu quisera tanto!
Que me agarrei aos espinhos perfurantes
e deles fiz nosso ninho: A nossa morada
nos cactos onde bebíamos a seiva:
O veneno que nos fazia viver, sem antídoto.
Habitemo-nos nele, para sempre,
qual casebre do poeta pobre, que só pode possuir
as estrelas e o desenho de nossos corpos, um no outro esculpidos.

92
MÚSICA PARA VIOLINO

Dos sonhos de violinos nascem notas musicais


E nesse eterno nascimento de melodias
e amores, ao som do vento...
Pelas calçadas, nas ruas, defronte ao mar,
um turbilhão de corpos a bailar.
[É preciso apenas nós, e a voz de um nunca terminar.]
Então, onde está a poesia divina que nos trouxe à vida?
Nela está também o tempo.
O tempo de rir, e cantar.
Tempo de minha voz ecoar um hino!
E no palco os espectadores, com aplausos,
jogando, no ar, rosas de tantas cores!
E os violinos tecem suas canções, feito tecelão
de linhos finos...
E tecem também os ‘des-nós’ da minha voz,
parecida com algum canto de outrora,
minha sempre música de ninar, meu macio
lençol de linho fino ao deitar.
E os aplausos?
O eterno carinho dos meus pais.

93
FALSA PRESENÇA

Quando fitares a ausência.


Ausência do teu amor,
amor de um tempo
que veio, foi e te esqueceu.
Quando de lágrimas molharem
os caminhos, caminhos teus.
Do homem que foste, só saudade restar
[das encantadas festas...]
Ah! Os abrolhos ferem os pés
mas é nos olhos que sangram...
Se tocar essa ausência
anda na luz da lembrança
que é falsa presença.
E vive outra vez na tez
o calor do antigo amor.

94
SEM RETOQUES

Meus olhos tornaram se foscos


depois do seu adeus...
Perderam a cor após fazê-los brilhantes!
E sumir na imensidão de um caminho,
sem deixar quem fizesse
o retoque da maquiagem.

95
GABI GABRIELA

Gabriela, pérola que faltava no meu colar


para me tornar mais bela...
Veio de uma Viagem Lunar, concebida
na madrugada, hora de poeta reminiscenciar,
fazer canções e rabiscar seus corações
de lembranças e ternura pura, feito ela:
Gabriela... O nome diz ser enviada de Deus.
Também, pudera! Será tão bela! Minha Gabriela!
E assim quando ela Chegar,
meus braços estarão estendidos para niná-la.
Meu coração enternecido para amá-la.
Poderei chorar... E que mal há se eu chorar?
Ela... Gabriela vai chegar... Ela... Gabriela:
A Minha Pérola, anjo divinal!
Será poeta também? Viverá assim, além?
Ou apenas será bela? Imagino como será seu rosto?
Seu olhar... Suas Mãos... Sua Alma e tudo de bom
que lhe há de habitar... Ela... A Minha Gabriela,
só rima mesmo com bela... Com Pérola!

96
VAMOS PARA PARIS?

Vamos para Paris? Quem sabe Em Paris


a gente pode ser feliz?
Ouviremos músicas em francês...
Lá é quase tudo em francês...
Cantaremos até em inglês...
Poderemos ser mais feliz...
Mas se a saudade apertar,
a saudade de querer voltar...
Voaremos no primeiro avião da Gol
ao nosso recôndito lar...
Em Paris há flores lindas que nunca por aqui vi
e arvoredos nas alamedas e neve no telhado
onde o último pombo branco se esconde.
Mas se não gostar de Paris, prometo!
Te levo para ver o Sena,
o rio dos últimos românticos...
E se a tristeza persistir e então
ficar “triste, tão triste de não ter jeito”
Te trago de volta aos Brasis...
Aqui também dá pra ser feliz (?)...
Podem-se ver neve nos filmes românticos
feitos em Paris e, então podem-se também ser feliz!
Mas antes iremos à Itália, então te direi:
“ Come te amo, amore mío!” às margens
de qualquer rio! Podemos ir até a Somália...
Apesar de rimar com Itália veremos
que a nossa tristeza é tão pequena e, não depende do Sena, nem dos
sonhos secretos: Cenas de um coração que não sabe ser feliz nesses chãos
de brasis, apenas coberto pelas estrelas!
Que bom ainda poder vê-las, antes que amanheça...
A estrela d’alva... tão alva! Vê-la-á no céu de Paris?
Mas... Vamos para Paris...
Quem sabe lá a gente não seja um pouco,

97
mais ou menos feliz?
É... Deve ter um monte de gente querendo ir para Paris!”

Participação especial do último verso de Paulo


Alves Domingos 29/12/2.009.

98
MÃOS

Mãos pálidas...
Ternas e cálidas!
Aveludadas para carícias
a outras mãos aveludadas.
Mesmo assim ouso desejá-las
Mais que seus olhos desejam
ao me ver passar.
Mãos pálidas!
Ternas e cálidas...
Aveludadas!
Quem me dera poder tocá-las!
Eu quisera senti-las:
Pálidas, ternas ...
Cálidas... Aveludadas!

99
SER...

Ser como as flores,


que buscam ser sem a ansiedade por ser,
e não se angustiam quando não são.
Ser, simplesmente...
Perfumadas ou não;
com espinhos ou livres...
Ser, somente ser.

100
ESTAÇÕES

Tudo passa!
E pela janela do tempo vejo tudo passar:
- O frio do inverno passa no mendigo
pouco agasalhado. E é rápido...
Amanhã da mesma janela poderei ver
o amadurecer dos frutos nas árvores,
É o brotar do outono!

Daqui a pouco o sol escaldante estará nas mãos calejadas de quem leva
às costas a enxada que limpam os campos e lançam as sementes para
depois de amanhã haver pão nas mesas.

Já na outra estação eu verei uma aquarela


da minha janela o retrato do amor que nunca
deveria envelhecer, e as flores que para mim pintou
O grande artista.
Então serei feliz apesar de tudo passar,
porque nada é em vão... “E há razão em cada passar.”

101
FOLHAS

Não quero ser


como as folhas
que caem soltas
aos ventos... Em qualquer lugar.
E se vão, e se vão... Longe do caule,
do perfume da flores e das cores.
Sedenta de seiva!
E nunca mais volver ao tronco,
e nunca mais poder ser verde,
sentir o rocio da madrugada.
E nunca mais... E nunca mais...
Ser somente folhas secas aos ventos!

102
A ETERNIDADE

A eternidade não é a soma de infinitos anos.


Pode ser alguns dias, horas ou minutos.
Depende o que se quer e o desejo
com que se busca.
A angústia da espera é a eternidade.

103
CAMINHOS MARCADOS

Vejo-te: Passos de quem partiu e partiu agora...


Há pegadas na areia, nos caminhos...
Pelo orvalho, ainda molhadas.

Fiz da eternidade algumas horas...


E sempre olharei para o horizonte
à espera... à espera da tua chegada,
com lenços brancos a acenar,
e no enleio de que voltas apenas
de um passeio, estarão as areias
ainda marcadas como se acabasses de sair.

104
POR QUE O AMOR SE VAI?

Por que o amor vai embora?


Se custa tanto a chegar?
E quando vai, custa tanto ir-se?
Pois indo, fica a lembrança
e uma dolorosa saudade persiste.

São todos eles assim...


Se chega, vai de repente.
Deixa tristezas, vem outro amenizá-las.
Depois se vai também.
Ficam as lágrimas mais doídas,
a outro que acontecer, enxugá-las.

105
O SILÊNCIO DAS ROSAS

As rosas florescem
nem por isso envaidecem.
Rapidamente fenecem,
nem por isso choram.
“As rosas não falam”,
mas dizem muito no silêncio.
Quando murchas,
não será esse um jeito
estranho de chorar ?
Se belas, não é assim
que envaidecem ?

As pessoas poderiam
ser como as rosas, existirem apenas,
tranquilas e silenciosas.

106
INVERNO INTERIOR

Por que chega o inverno,


e as lindas flores se enclausuram
ao por do sol?

Frio orvalho as faz lamentar


por noites enluaradas...
o céu nem é mais azul – cinza,
nevoento e neblinoso.

Alguns pássaros sobrevoam,


mas são pássaros da fria estação...
Tudo é reticente nos caminhos
porque já se vai longe a estação das flores.

Para o ser humano, a tristeza é como estar


desabrigado no inverno, e não poder contemplar
nenhuma cor, nenhum brilho de estrela.

107
AUSÊNCIA ABSOLUTA

Um dia meu canto quedará eterno


Nas entranhas do teu ser.
E como pássaros, revoará teus pensamentos
feito tortura, feito lamento.
Então... que será de teus prantos,
da solidão noturna do teu querer?
Se para ti não mais meus lábios cantarão?
[a roçar teu peito aos ventos, ao relento...]
Possuirei a poesia da eternidade
E dela deixarei um pouco em tua alma.
Caminhando com outra, lembrar-me-ás,
como faz-me lembrar-te as noites tristes.

Não mais estarás!


Serás então a saudade da melodia emudecida
de um tempo em que para mim não cantas,
e cantarás a outra uma canção triste,
pois em sua vida eu não mais existo.
Estarei nas sombras dos que caminham
por entre as lápides de um cemitério taciturno.
A um canto noturno sairei na busca,
na busca de pensar que é teu o pranto.
Então nada mais serei que essas sombras,
ou restos de gente nas alfombras
que a chuva faz brotar e transformar em flores...
E eu nessas flores sorrirei para ti, e meu sorriso
será a brisa a tocar nas folhas, a balançar as plantas.
Um dia meu canto quedará eterno
nas entranhas do teu ser...

Serei saudade, eternidade!


E me ouvirás ainda que outra
a ti ouse cantar, e eu não mais.

108
A DESPEDIDA DE MEU PAI

Nada vi além dos olhos tão fixos em mim...


Até parecia o fim de um caminho de abrolhos.
Mãos suadas e fragilizadas, nem tive coragem
de tocá-las, tais quais rosas macias... perigo de esmagá-las! Rosas
noturnas tornaram, essas palmas de outrora, o meu rosto a enxugar, e
agora, tantas lágrimas, não puderam mais tocar-me.

E então, nada mais que a oração e o suplício da partida...


O desejo de ficar, nos olhos a marejar, parados
a contemplar, meu rosto todo de luto e o adeus
a esperar.

Pobre homem tão cansado!


Carregou o seu calvário e nada fiz para lhe salvar.
Nada vi além dos olhos, olhos verdes cor de mar
e um caminho de abrolhos que ajudei a caminhar.

109
O TEMPO É A VIDA

Nas planícies da minha infância


Havia flores azuis, de todas as cores.
Os prados eram verdes como um tapete
macio e fresco... Pelas janelas olhava a chuva
da primavera, ao entardecer.
Via a vida como um horizonte próximo
de minhas mãos, e eu podia tocá-lo.

Hoje, as planícies são planaltos e distantes.


Já não há flores azuis, e os prados não mais
apresentam um tapete verde e macio.
Nas janelas, agora, vejo um inverno cinza.

O tempo passa! Como passa!


Um horizonte afastando-se à medida
que minhas mãos se estendem para tocá-lo.

[O tempo é a vida!]

110
GRITO POÉTICO

A ninguém era dado escutar aquela voz


Sussurrada, mas ensurdecedora,
que gritava do convés da alma.
Apenas o poeta decifrar-lhe-ia,
pois só ele possuía o poder de arrancar
das estranhas de um ser o chamado
mais doce clamando por socorro, pelo seu amor!
Somente a ele era dado tal poder de retirá-la
de sua dor dilacerante.
Era o grito de um poeta triste
que só outro poeta poderia fazer-se calar
diante da sua dor dilacerante: - O amor!

111
MEMORIAL

Sei, não foi em vão.


Gotas de sangue caídas ao chão.
O pecado?
Sou culpado!
Cena dramática - a trajetória.
Vida e morte é a história.
Sei...
Não foi em vão...
Escrever de vermelho
na alma... no coração.
E caem palavras: O poema!
Marcando papel e pena d’abrolhos,
quais gotas dos olhos.
Na boca o amargor, n’alma, dulçor...
Memorial! Culpa fatal!
Não foi em vão o sangue vertendo
gota a gota da alma nas faces...
Nas mãos!

112
QUANDO FOR NOITE

Amarás as coisas que amei...


As mais simples de que não gostava.
Quererás encontrar dentre os guardados,
meus rabiscos de poesias que dizia não entender.
Procurarás no quarto de despejo o vestido roto
e pendurarás no cabide ao lado de sua camisa...
Mas será só um vestido!
Dentre meus discos, não acharás a minha música,
Nunca foi a nossa!
Eu sei... Por entre as trilhas que passei, seus pés
tentarão adivinhar onde minhas pegadas marquei,
mas os ventos do tempo as apagaram.
E quando vires uma mulher de olhar triste a vagar,
a olharás tão forte, tentando me reconhecer nele.
Não! Não! Não estarei naquele olhar sofrido!
Tentarás adivinhar e amar as coisas que eu amei.
Mas será noite, e o vento tempestuoso terá apagado
toda minha imagem e os caminhos por onde passei.
Amarás as coisas que eu amei, mas amarás em vão,
porque por certo estarei dormindo e nada mais amarei eu.

113
AS MÁSCARAS DOS LOUCOS

Só os loucos esquecem suas máscaras


Quando vão sair.
Só os loucos! Porque há muito se despiram delas,
preferindo enlouquecer em paz.
Despindo-se das máscaras do tédio, das pessoas “normais”, das
máscaras do “riso” que têm que representar.
Só os loucos ignoram tais máscaras...
Porque é melhor sentir a brisa na epiderme das faces e olhar frente a
frente no seu espelho...
“Espelho mágico”, espelho insano!
Onde o “outro” se pode verdadeiramente enxergar, reconhecer a
fragilidade da essência que habita o corpo e tocá-la com o olhar, o que
há de mais belo,
sem disfarce.
Só os loucos esquecem suas máscaras...
Bem no começo da estrada...
E nos ventos, em vez de poeira,
as máscaras dos lou..

114
UM POEMA COMO MEDALHA

Era um menino pobre, pequenino.


Não sei se teve pipa de papel azul,
nem barquinho na enxurrada.
Não sei se viu papai-noel na chaminé,
ou se alguém lhe contou estórias encantadas.

Era um menino...
Que cresceu e cresceu...
Contou-me estórias e se vestiu de papai-noel
por tanto tempo na minha memória.
As estórias que ele me contou,
eu não sei quem lhe ensinou.
Esse menino tão pequenino!
Cresceu e cresceu...
Hoje, herói de tantas batalhas!
Porém, sem medalhas.

115
FUNÉREO CANTO

Ah, meu amor!


Te espero ainda.
Como é longa e fria a noite,
a rua, as estrelas!
Talvez, fria como a vida,
feito lápide nua de flores.
Ah! Um amor curto e veloz!
Nem começado.
Talvez como a própria vida.

Ouço uma canção sombria.


É o vento que passa,
E a roupa esvoaça
fantasmagórica por sobre mim.
Vivo ainda e choro.
O frio perpassa-me os poros
A tecer-me um funéreo canto.

116
IN-SANIDADE

Loucura, talvez seja uma forma de ser


original, e originalidade é despir-se de máscaras.
(J. Oviedo)

Sinto a sanidade dos sãos.


Também a loucura dos loucos
Quando estou sã, tenho certeza da loucura.
Quando louca, a incerteza da sanidade.

117
INACESSÍVEL...

Inacessível voz!
Difícil! Perdida no tempo,
na distância e ausência
que a emudece.

Inacessível...
Seu corpo às mãos.
Nuvem que passa a desfazer-se
repentina diante dos olhos.
Voo de pássaro sem pouso,
deixando no vazio do azul
apenas ideia e sombra.
Sombra que magoa.]
Delimitando um pensamento
seduzido por doces palavras.
Pronúncia de uns lábios
que não me toca e não se toca.

Lábios... Traidores e traiçoeiros!


Desculpando-se na ausência,
escondendo-se na distância.

118
RETRATO NO TEMPO

Vejo-te amor antigo:


Fotografia na moldura;
nem tempo ou eternidade desfará.
E quando as horas passarem.
Longas... Silenciosas
no mundo exterior,
envelhecendo nossas noites sem luar;
os lábios e os beijos...
Tu estarás: intacto... estático:
O mesmo riso, o mesmo rosto.
E abraçarei teu retrato como se assim
pudesse conter-te, eternamente,
por entre os braços.

119
VOZ FANTASMAGÓRICA

Minha voz gritou tão alto.


Mas eras feito de pedra
não podias me ouvir.
Eu tinha uma linda canção
feito orvalho a cair nas folhas.
E dizia: Ama-me! Ama-me!
Quem sabe um dia eu já nem cante,
mas ouças a canção sussurrada
a murmurar em seus ouvidos:
- Ama-me! - Ama-me!
Ou, ainda quando ouvires o ruído
d’orvalho a cair nas folhas, poderás
lembrar da minha voz que um dia gritou
tão forte, desesperadamente:
- Ama-me! - Ama-me!
Docemente, fantasmagoricamente,
nas noites frias, em seus ouvidos de pedra.

120
CÂNTICO NOTURNO

Tenho medo d’amargura


que chega com a noite escura.
Tenho medo que apague as estrelas
dos meus olhos e fiquem só os abrolhos
da estrada na minha caminhada.
Dura caminhada! É triste seguir!
O amor ? foi só dor...
Sofreu enquanto durou.
Agora tanto faz!
Nem sei o que é melhor,
a desilusão eu sei de cor.
E quando chega a noite escura
tenho desejo de ouvir do amor a voz tão pura,
a sussurrar palavras lindas,
não, o barulho aterrorizante dos bichos noturnos
que fazem da noite um cemitério taciturno
de sonhos agonizantes.

121
GOTAS PÚRPURAS

São gotas púrpuras seus versos,


arrancadas de um grande desalento.
É alma esmagada de tão fundas mágoas!
São olhos inundando de lágrimas os ventos.

Lágrimas da alma a transmitir desejos...


Luz pequenina invejando ao lume.
Que tristeza, pobre poeta!
Resta da primavera, vago perfume.

De uma cisma em vãos momentos,


Tristes dias arrancam-lhe os versos,
no seu caminho longo e incerto.

Poeta, poema é simplesmente gotas púrpuras


arrancadas da alma por desalento!

122
QUANDO...

Quando outro amor chega,


até parece a primeira vez!
É como se nosso tesouro,
o mais precioso estivesse guardado
para um dia muito especial.
E a gente se vai nas asas do vento,
na beleza da flor, na valsa lírica.
E embala a alma, e embala a vida.
Sonhando fica. Sonhando com a noite!
Com o mais terno e eterno beijo
desse amor que o coração promete ser infinito.

123
NOVO DESENHO

Não são meus olhos que choram,


é a primavera que não mais perfuma.
Não são meus lábios que não mais
Sorriem... é o novo desenho
do arquiteto tempo!

Esculpiu-os assim:

VA GA RO SA MEN TE!

Um rosto não se transforma,


muda-se a expressão diante
do mutável exterior.

É o novo do arquiteto tempo!]

18/02/04

124
A LOUCA

A louca escrevia poemas...


Tinha os olhos tristes
e as faces enrugadas,
apesar de jovem.

A louca embalava pequenos olhos


em seus braços:
Foi feliz também!

A louca amava e era sábia,


por isso era louca...
Por isso amava.

125
QUANDO CHOVE EM MINAS GERAIS

Os pingos caem silenciosos e preguiçosos!


Parecem querer dizer que não há pressa de chover.
Morros se esbranquiçam e adormecem
de tanta preguiça!

Saudades de Minas Gerais!


Tempos breves não voltam mais.

Vem-me na chuva feito miragem, sua imagem.


[Tempos breves não voltam mais!]

A chuva cai, o tempo vai,


as despedidas e também a vida...

E os pingos caem...
Silenciosos e preguiçosos!

126
A CANÇÃO DA CORUJINHA

- Corujinha, corujinha,
é tão doce teu cantar!
Tem som de melancolia.

Os teus olhos iluminam


minhas noites sem luar.

Na vida não existia


uma canção preferida
antes da chegada tua.

- Corujinha, corujinha!
Se todos pudessem ouvir
a melodia que cantas!
Mas só cantas para mim.

127
CAMINHOS INTERIORES

Eu fui a brisa que passou


e continua a passar,
por terras distantes
em qualquer lugar.

Fui o coração que amou,


do céu a estrela cadente
que se apagou de repente.

Fui as lágrimas dos olhos...


Ou quem sabe, os abrolhos de um caminho.

Ou simplesmente pés tão pequenos


que em busca de sonhos
se perderam sozinhos.

128
CAVALGADA

Meu amor é um eterno cavalgar.


Cavalgar a paisagem tigresa do teu olhar...
Os caminhos íngremes e bucólicos:
Teu corpo a desnudar-se.

Pudera! Eu quisera!
Nesse eterno cavalgar,
feliz, em sua boca, um beijo pousar.

129
LINDA É A VIDA...

Linda é a vida que se abriga


numa enorme barriga!

Linda é a vida!
De mãos dadas, nos parques
na lida... afora na vida!

Linda é a vida!

Nos olhos tristes d’alma ferida...


No vagar sozinho, ainda assim de
lábios risonhos por qualquer caminho!

Linda é a vida no compasso dos passos...


Apressados ou lentos em busca de sonhos!

Linda é a vida...
Na lida...
A vida!

130
O AMOR

O amor chega se faz absoluto.


Um dia diz que vai embora
para ver se alguém chora.
E o amor resolve voltar e ficar,
Mas quando fica já não é amor;
é saudade e dor, pois mesmo
querendo ficar, foi...
de nossos sentimentos.

131
LAMENTO OBSTINADO

Na paisagem bucólica ao entardecer,


as cigarras entoam um hino.
Parecem querer mostrar ao mundo
que se sabem cantar.
Cessa um coro e outro prossegue a música.
É assim em todas as tardes...

Pássaros verdes deixam no ar o desentoo


de seus cantos, vão atrás do sol que morre
no horizonte avermelhado.

O tempo passa, e mais um dia se despede.


Por isso todas as canções do mundo
ao entardecer, são lamentos obstinados.
Ainda que assim, deve-se cantar.
Mesmo as cigarras e os pássaros verdes,
nas tardes tristes, cantam em vez de chorar.

Todas as canções do mundo,


ao entardecer, são lamentos obstinados.

132
DOR

Rasgo meu peito.


Vê, meu amor,
A minha dor,
E a tristeza
que não tem jeito?

Pobre...
Amei-te assim!
Rasgo meu peito...
Vê tu dentro de mim?

133
NÃO DEIXEM QUE OLHEM EM SEUS OLHOS

Já não me faz rir nem mesmo chorar.


Acabou-se seu poder sobre mim
Acertei e aprendi a lição
por que veio a me ensinar.

Não sou mais a menina dos belos olhos


que um dia te conquistou.
E dizia: - não deixe ninguém olhar em seus olhos...

Ganhei a liberdade a preço de noites claras


Posso agora mostrar esse olhar
tanto a príncipes e plebeus
e, a quem quiser contemplar
esses olhos que são meus.

134
A PARÁBOLA DO SEMEADOR

O coração é um caminho onde florescem


lindas rosas ou afiados espinhos.
Depende quem por lá passar,
e qual semente lançar.
Será eterno o que florescer...
Estará viçosa a vida inteira, em qualquer estação.
Se semear canção, quando todas as músicas do mundo
lhe fizer chorar, terá acalento para o coração.
Se semear amor e partir, poderá voltar em qualquer tempo
e um jardim achará a florir.
Mas se alguém semear a dor e um dia retornar,
dolorosos espinhos estarão à espera do semeador.

135
O ILIMITÁVEL

Meus horizontes são como se olhasse


pela janela: Um mundo tal como tela
pintada, limitável através da moldura,
porém belo. Céu azul-cinza, árvores
e pássaros verdes, mas tristes, e o sonho
de uma mão a delinear a própria paisagem.
Bem podiam meus pássaros terem voos
mais rápidos e verdadeiros; e cantos líricos
a embalar numa paisagem pintada,
não pelas mãos que delimitam na moldura,
e sim pelos ideais de liberdade onde pudesse
extravasar além da tela fria, mas bela, o ilimitável.
Porque nas telas não se pintam
as melodias dos amores impossíveis.
Podem-se cravar notas de músicas estáticas,
mas nunca serão músicas de verdade,
e os amores jamais se chamarão amores...
Permanecerão símbolos e indeléveis.
Nessa mesma moldura,
da minha janela faz-se noite sem brisa.
O céu outrora azul e as árvores verdes
da tarde, negras ficaram.
Os pássaros se foram à Liberdade!

136
SAUDADE

Ainda posso contemplar os lilases;


galhos que balançam aos ventos.
Também olharei o céu azul-negro
e os ventos que trazem tempestades;
as chuvas que horas eu fitava...
[de você a interrogação, porque eu olhava...]
Hoje, ninguém mais vê que gosto
de olhar a chuva...
Ninguém mais me aquece das tempestades.

........................................................................

E na vidraça a chuva... O tempo...

137
INFÂNCIA...

Música que entretemos a ouvir.


Tela que passa pintada de nenúfares
diante dos olhos.
Mas passa silenciosa,
coroada de nuvens...
Ferindo!
Não podemos segui-la.
Estáticos, envelhecemos.

138
ESCULTURA

Talhei seu corpo em meus sonhos mais lindos!


Até sua calidez refiz num afago.
Seu suor, seu riso e o mais fundo suspiro,
pensamentos e delírios, compus num olhar.

Se nesse sonho eu pudesse esculpir


Numa noite sem lua, meu momento presente!
Minhas mãos que delineiam,
meu olhar que cultua...

Eu talhei o seu corpo junto ao meu


Nesse sonho tão lindo!

139
ANTÍTESE

Invejo a beleza das flores


e também a dureza das pedras.
As flores perfumam,
mas frágeis, esvaem-se.
As pedras não têm essência
porém são pedras.

140
A ROSA NOS VENTOS

Vejo o tempo na vida que passa


que passa no vento, que a chuva traz.

E o vento que traz essa chuva,


que traz a rosa a perfumar
aos olhos, ao riso do rosto perdido
sem razão para sorrir.

Então o tempo passa...


E a vida é o tempo,
é a rosa nos ventos, na chuva
que cai das faces a trazer frio
aos braços cruzados de quem não afaga.

141
CANTO DE ETERNO AMAR

Vem, noite enluarada!


Derramar seu manto prata
nas faces do meu amor:
suavemente, qual gotas d’orvalho
na flor intacta da madrugada.

Reflete nessas faces enamoradas


sonhos que outrora ousei ter:
razão do pranto...
Faz, agora, real esses sonhos
e eternos os pequeninos cantos.
Sonhos de poder com ele estar
e além dos campos, livres sem amanhãs!
Sorriso de eternidade em doce afã;
Sentir serenos da noite nos olhos
e não prantos...
Dá-me esse canto de eterno amar!

142
DISTÂNCIA

Para quem são teus beijos,


agora de mim distante?
E para quem teus abraços?
Eu sinto frio de saudade.
Então abraçarei a noite escura!
Sorrirei às estrelas frias quando
a chuva dos olhos passar.
Quem sabe cantarei uma canção
somente para te lembrar.

Pelas calçadas ouvirei passos,


pensarei ser teus a chegar de madrugada.
Mas o tempo não se vai depressa!
É necessário percorrer estradas:
Quem sabe frágil e vagarosa...
Se tivermos pressa, não vamos chegar!

Não se pode avançar sobre as horas


ou fazê-las passar!
Mas eu pudera
outra vez te abraçar.

143
E TUDO É O TEMPO

Um dia vivido intensamente.


Alegre ou triste...
Viver ... vivê-lo simplesmente.
Outro dia para o coração disparar,
Pensando poder buscar o objeto de sonho
perdido há tempo esquecido.
Um dia para construir outro sonho...
De lembranças; dá-los asas, risos,
moldá-los aos da infância.
Aguardar o renascer da semente,
aguardar o florescer da árvore em nós.
Enfim, desatar dos sonhos os nós.
Outro dia para poder rir de algo engraçado
que aconteceu ou chorar de saudade por outro instante
que o tempo tão presente esqueceu...

E tudo é o tempo... Um buscar, um passar,


um pesar... Um deixar-se para trás.

144
CANÇÕES AOS VENTOS

Canto! Canto para o teu amor.


Ele já se foi, mas permanece em mim.
Deixei-me no ventre, alvo ventre do tempo
que se transformou em rosto e corpo de mulher.
Mas nada é eterno...
Ouve! Lá fora cantam liricamente.
Faz-me lembrar teus beijos, faz-me lembrar ternura!
É tarde... E as tardes trazem lembranças...
Ainda que ninguém nos ventos veja canções,
te sinto voltando nas melodias das leves brisas
que lá fora cantam liricamente.

145
CASTELOS AOS VENTOS

Canto para o nosso amor que passou


mas não passou em mim.
É triste a noite e os ventos suspiram
minha eterna dor.
Até quando vou sofrer?
Minhas mãos estão frias,
e teus braços não mais me aquecem.
A lembrança vai comigo nos caminhos...
O tempo passa, e tênue a primavera finda.
Em busca te vais onde possas construir
outros castelos, mas todos os castelos
são areias na noite... Aos ventos.

146
ILUSÕES DE UMA NOITE QUALQUER

Nas noites frias e solitárias


Talhei sua boca no meu beijo quente.
Esculpi o mais fundo delírio
no travesseiro vazio de ti.

Quanta doçura fiz do teu olhar!


Quanta calidez refiz do teu corpo,
E no vazio desenhei tua imagem
no perfil de eternas madrugadas.

Do vento fiz teu mais doce murmúrio!


e da madrugada fiz o meu caminho, tão sombrio!
E triste, então vaguei sozinho à sombra de uma ilusão.
Fiz de outras tantas noites a dor triste de ser só...
E o murmúrio ofegante de uns lábios sussurrando.

147
ROSTO PRIMAVERIL

Ah, quem me dera!


Se voltasse a minha primeira
manhã de primavera!
Debulhasse puros botões
de flores dos laranjais!
Palpitasse aquele aroma
que nem aos campos voltam mais...
As faces douradas da mocidade!
Onde um cantar fosse o maior pecado
E a pureza um canto desesperado.
Ah! quem me dera!
Se voltasse a minha primeira
Manhã de primavera:
Estação fugaz da mocidade.
Só cai serenamente na lembrança, a saudade.

148
AS TRÊS FASES DE MARIA

Maria menina...
Venha ver o por do sol!
Veja quanta beleza!
Os raios douram seus sonhos
Flamejam nas faces risonhas.

Venha com os pássaros brincar!


Correr no campinho!
Venha balançar no parquinho.
Deixe seus rastros marcados
Nesse caminho que há de ser longo!

Maria menina...
É primavera... Perene primavera da vida.
Cante, cante uma canção
ao compasso do coração!
Maria menina...
Já não é tão menina!
Como um botão pequenino
passou o tempo, desabrochou...
Sorriu... chorou... apaixonou-se!
Maria moça...Tão moça!
Faces alvas anoitecidas, frescas pétalas de rosas,
Virgem formosa...
Sonhos lindos nos olhos encerram;
Mas o tempo passa...

Maria moça!
Quase moça! Ah, se não fosse o tempo!
Os anos foram, tantas primaveras floriram,
tantos sonhos murcharam.
Maria moça...
Quase senhora na vida.

149
Cada passo, cada gesto é um sorriso;
talvez, uma lágrima que cai por aí esquecida,
para marcar sua imagem, pura miragem do tempo.

Maria, mulher... Venha ver o por do sol!

Não. Venha mostrá-lo a alguém!


Cante uma canção qualquer
Que embale um coração em botão.

Maria, menina, moça, mulher...


Porque o tempo passou.
Ah, se não fosse o tempo!

150
CANCIONEIRO

Cancioneiro que de longe vens,


que me trazes?
Uma flor ou a primavera?
Um amor ou o outono?
Teus braços quentes, ou o inverno?
Cancioneiro! Há tempos ouvi canções,
ao longe, como apito de navios perdidos.
qual grito desesperado, sofrido.
O mundo parece pequeno,
mas as estradas são tão compridas!
Diz-me o caminho que andou...
Cancioneiro que de longe vens,
Que me trazes?
Simplesmente uma canção?

151
REMINISCÊNCIAS

Há uma menina na janela


olhando as borboletas...
Querendo as nuvens tocar
com seus dedos de ninfeta.
.........................................................
Há uma moça na janela...
Os lábios colorindo,
ora sonhando, ora sorrindo.
Sonhando que nas asas dos ventos
virá um príncipe para amá-la
em tardes de primavera.
...........................................................
Há uma mulher na janela
contando ao filho que a vida inteira sonhou,
e das histórias que conta até já perdeu
as contas de quanto o tempo passou.
........................................................
Essa mulher...
Sua imagem diz que foi tão bela!
Lembra que da mesma janela um dia,
sua infância e juventude viu passar.

152
ETERNA JUVENTUDE

Todas as manhãs
refletem seu fulgor.
Na calidez da pele há sulcos.
Outras flores perfumam,
Ainda os lábios sorriem...
Tênue, a primavera se vai
E a pureza do coração.

153
SONHO DE UMA NOITE QUALQUER

Após tanto tempo passado,


Ressurge um vento atrevido
a trazer-me lembranças esquecidas:
As portas cinzas da humilde escolinha na aldeia;
e os olhos risonhos de uma menina.
Quem os via chorava sua pena.
Era tão pequena!
Sonhos lindos nas cândidas faces pousavam.
Amanhã se acordar...
Oh, que pena! Oh, que pena!
Ser criança é apenas sonho de uma noite qualquer.
É agora uma mulher!
Oh, que pena!

154
POEMA AO POR DO SOL

Lembras os esguichos de uma fonte luminosa!


Inundas o cais de nostalgia.
Numa dessas tardes em que há saudades!

À sombra de tantos fazes transparecer.


E no espelho: águas claras, pousam
os primeiros raios de luar.

Lembras o âmago do silêncio soturno.


Minha tarde presencia esse adeus,
e da tua mórbida face cai o último olhar
sobre meus versos.

155
TUDO ILUSÃO

Estou pensando em você.


Pensando no seu olhar, imaginando-o a me fitar.
Estou sentindo seus beijos aqui nos lábios meus.
(É apenas ilusão – tudo se perdeu...
É apenas a saudade que de repente bateu.)
E persegui todos os caminhos onde te encontrar.
Pena, não te encontrei!
Mas existe um lugar...
Eu sei, aqui dentro de mim,
você, ainda, deve estar.

156
O AMOR E O TEMPO

Como não chorar, se o tempo passa?


Como não sofrer, se alguém não há.
O tempo passou e o amor não chegou!
Uma lágrima ficou, alguém não me amou.
Não viu meus olhos cobertos de sonhos,
nem viu a esperança nos lábios risonhos.
Não ouviu a música do amor a embalar,
feito pássaros sem asas, não pude voar.

Ah, o tempo passou...


O amor não chegou!
Um vento soprou, nem por isso
meu pranto enxugou.

157
O MENINO E A PIPA

O menino brincando
Consegue tocar o céu
Com sua pipa de papel
Bem colorida...
Mas o que ele quer mesmo
Saber da vida é medir
A distância do sol...
Saber a cor da nuvem ‘camaleã’..
Se é amarela, vermelha ou avelã...
E assim vai até o entardecer...
Tecendo sua linha, qual a imaginação.
Ao escurecer, esquece o que queria saber
E volta a contar as estrelas, então se curva.
Porque os carneirinhos de lã
dormindo, dormindo estão.

158
A DONZELA E O PLEBEU

“Seu pai chegou feito príncipe em um cavalo branco.”


Ouvia a menina estórias que o povo da vila contava:
- Que de tanto o animal correr mundo, o coitado ficou manco.
Fora buscar a mais linda donzela que tinha nas Minas Gerais.
Moça tímida, bela e pura naqueles chãos quase não se via mais.
Ela, de soslaio na janela, ouvia o povo dizer:
- Vem lá o estrangeiro!
Sua tez ficou vermelha, de timidez se escondeu.
Era moça preferida dentre as demais da vila,
mas seu coração tinha a sina, ser do estrangeiro a menina, que até
pulou-lhe no peito porque de tudo sabia.
Seu nome era Maria... Cinturinha de pilão,
cabelos dourados de fada, compridos, sem se cortar.
E o estrangeiro sem eira, nem beira, em sua vida
veio habitar. Falava guarani, castelhano em poesia,
vestido sempre de linho, do jeitinho dos poetas da cidade.
E suas guarañas cantava bem junto à janela
onde a bela dormia... Se pudesse, bem a roubava,
e a cavalo levava pra longe da “estrebaria”.
Maria, menina doente. Mas não morreu não,
tinha a sina de se casar com o plebeu, e muitas vezes
a menina chorou por outro que amor que foi seu.
Mas o estrangeiro de breve a desposou....
Tiveram quatro meninas, o tempo em que a bela amou... Não mais que
algumas luas até deixar-lhe de alma nua.
Nua de tanta tristeza!
Via noite amanhecer... Via dia anoitecer.
Por mais de quarenta anos ainda se conta os causos
porque a donzela sofreu.
Sofreu não sei por que:
Anorexia... Doença da Psicologia. Mas se não era de amor, então o
porquê da dor?
Suas quatro menininhas eram toda sua vida

159
e a vida do plebeu. Uma delas que por sina, estudou Psicologia e
escreveu poesia.
- Obrigada meu Senhor, pela donzela e o plebeu!

160
PARA QUANDO VOLTARES

Eu sempre guardarei uma foto sua


para quando voltares, não precisar dizer quem és.
Saberei pela cor e pelo brilho dos teus olhos
que ainda há de guardar todos os nossos sonhos.
Então direi: podes entrar...É tua essa casa...
A rede ainda estará na varanda a esperar
com teu livro no travesseiro...
Mas acaso se não voltares deixarei para sempre
esse cenário, e em mim, os fitos olhos que fotografaram nossas noites
de histórias contadas ao luar.
Eu sempre guardarei sua foto...
E te reconhecerei pelo brilho verde dos teus olhos
e lhe direi: podes entrar!
É tua essa casa e a rede ainda está no mesmo lugar.

161
AUTOBIOGRÁFICO

Eu queria muito mais que uma noite,


um sonho de ternura, onde pudesse viajar.
Ir além das nuvens...
Desenhar no ar um papai-noel diferente
com roupas da cor do céu.
Que desse a todos muitos presentes
Quem sabe um potinho de ouro
Ou o mapa do tesouro!
Desenharia também uma estrela-cadente,
mas que fosse diferente para ninguém confundir
a obra do autor e a biografia seria simplesmente
meus desenhos feitos a dedos no ar, só para se imaginar.
Porque sou toda ternura...
A rima e a estrutura da poesia
Eu queria muito...
Queria mais que a noite.
Enfim, a eternidade, para viver brincando
de fazer desenhos e rabiscos no ar.

162
(I)
De todos os mares, existe um mais imenso e salgado:
Aquele que me habita a alma.

(II)
Saudade é gestar a vida que passou
sem ter forças para trazê-la novamente à luz.

163

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