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APOLINÁRIO, José Antônio Feitosa. “O ‘mal’ da má consci-


ência em Nietzsche”. RBSE – Revista Brasileira de Sociologia
da Emoção, v. 13, n. 39, pp. 354-367, dezembro de 2014.
ISSN 1676-8965
DOSSIÊ
http://www.cchla.ufpb.br/rbse/Index.html

O ‘mal’ da má consciência em Nietzsche

José Antônio Feitosa Apolinário

Resumo: O presente artigo consiste numa tentativa de interpretação do sentido do adjetivo


‘mau’ vinculado à expressão má consciência, apresentada por Nietzsche na Genealogia da
Moral, no contexto de sua crítica genealógica dos valores morais, bem como dos elementos
argumentativos que a acompanham, muitos deles oriundos da problematização da morali-
dade decorrente de seu pensamento intermediário, com nítidas ressonâncias em sua filoso-
fia madura. Palavras-chaves: moralidade, mal, crueldade, má consciência, doença

“O homem é mau’ – assim me falaram como con- rida obra, apresentada em Ecce Homo,
solo, os homens mais sábios. Ah, se isso ainda
fosse verdadeiro hoje! Pois o mal é a melhor força em que garante: “a questão da origem
1
do homem” . dos valores morais é para mim, portanto
uma questão de primeira ordem, porque
A questão da origem do bem e condiciona o futuro da humanidade”3;
do mal talvez seja entre todas as ques- algo que antes fora exposto no prólogo
tões hauríveis das fendas do pensa- de Genealogia da Moral, no qual con-
mento de Nietzsche, a que ilustra o fessa que desde garoto “o problema da
compromisso mais explícito do filósofo origem do bem e do mal” já se achava
consigo mesmo e com a própria filoso- em seu encalço, tomando-o quase como
fia, seu leitmotiv. Algumas justificativas o seu “a priori”4 particular.
a esse respeito se acham espalhadas ao O que parece emergir dessas
longo de suas obras, conforme o expres- considerações é precisamente a ideia de
sado, por exemplo, no subtítulo de Au- acordo com a qual quaisquer tentativas
rora – ‘reflexões sobre os preconceitos de discussão em torno do mal nos es-
morais’2, e na parte condizente à refe-
3
NIETZSCHE, Friedrich. Ecce Homo. São
1
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 79,
Zaratustra. São Paulo: Companhia das Letras, Aurora § 2. Grifo do autor. Doravante esta obra
2011. p. 273, VI – Do homem superior, § 5. será referendada com a sigla EH, seguida da
Doravante esta obra será referendada com a página, da parte da obra e do respectivo
sigla Z, seguida da página, da parte da obra e do parágrafo.
4
respectivo parágrafo. NIETZSCHE, Friedrich. Genealogia da
2
Cf. NIETZSCHE, Friedrich. Aurora: reflexões moral. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras,
sobre os preconceitos morais [Morgenröte: 2001. p. 09, Prólogo, § 3. Doravante esta obra
Gedanken über die moralischen Vorurteile]. será referendada com a sigla GM, seguida da
São Paulo: Companhia das Letras, 2004. página, da parte da obra e do respectivo
Prólogo, § 3. parágrafo.

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critos de Nietzsche, pelo menos à pri- futuro: somente ele faz com que algo
meira vista, devem ser compreendidas seja bem e mal”7. Porém, na segunda
no âmbito de sua crítica à moralidade. dissertação de Genealogia da Moral, ao
Disso se segue que o horizonte de per- aduzir a má consciência como uma das
quirição apropriado ao conceito de mal três formas de niilismo próprias da ló-
no terreno nietzschiano parte do diag- gica de decadência da civilização oci-
nóstico acerca dos juízos morais instau- dental8, Nietzsche manuseia um signifi-
rado em obras do período intermediário cado de ‘mal’ atrelado a tal expressão, o
e desemboca na empreitada genealógica qual requer um exame mais acurado que
de aferição dos valores morais, caracte- permita identificá-lo e confrontá-lo com
rística dos textos da fase tardia. Em se- outros conteúdos de sua reflexão. Se o
gundo lugar, tal visão mostra a posição ‘mal’ só é possível na condição de in-
adotada pelo filósofo alemão de não terpretação, valor, sentido, e não existe
compartilhamento da maneira tradicio- enquanto entidade em si, supõe-se que o
nal de apreciação filosófico-teológica da ‘mal’ da má consciência também não
questão do mal ou da maldade e de seu passaria de interpretação, construto. No
quadro referencial, o que significa dizer entanto, o que faz Nietzsche optar por
que não há em Nietzsche uma tematiza- essa adjetivação? O que há de mal na
ção desse conceito nos moldes de uma má consciência? Guardaria alguma rela-
teodiceia5; no entanto, isso não lhe ção com a percepção da crueldade que o
impediu de receber a alcunha de “o filó- filósofo desenvolve em seu exame da
sofo do mal”6, como fez Georges Ba- moralidade? Que aspectos dimanan
taille. dessa adjetivação, que, mesmo como
Por essas vias, conforme Ni- compreensão interpretativa, precisam
etzsche, o ‘mal’ (assim como o ‘bem’) é ser sinalizados pelo filósofo? Dessa
declarado tão-somente juízo de valor, perspectiva, teria o mal da má consciên-
interpretação, não existindo como cia alguma função heurística no cerne
substância, coisa (res), algo dado ou da crítica genealógica dos valores?
ontologicamente preestabelecido, o que Com base em tais premissas, o
coloca em xeque a possibilidade de edi- presente artigo tem por objetivo cons-
ficar qualquer discurso moral sob uma truir uma breve tentativa de interpreta-
base transcendente e de caráter univer- ção do sentido entregue por Nietzsche à
sal: “[...] o que é bem e mal, isso nin- noção de ‘mal’ vinculada à expressão
guém ainda sabe – a não ser o criador! má consciência, aduzida em sua Gene-
Mas é tal quem cria um fito para o ho- alogia da Moral. Em vista disso, fare-
mem e dá à terra o seu sentido e o seu mos de início algumas considerações
sobre a problematização nietzschiana
5
Termo criado por Gottfried W. Leibniz em seus acerca dos valores morais concebidos
Ensaios de Teodiceia: sobre a Bondade de
7
Deus, a Liberdade do Homem e a Origem do Z, p. 234, III – Das velhas e novas tábuas.
8
Mal, de 1970, obra na qual lança uma Em relevante estudo, Clademir Araldi refere-se
especulação ponderando motivos sobre a à investigação empreendida em Genealogia da
posição de Deus em relação à substancialidade Moral como “tentativa de caracterizar o
do mal, com grande proximidade com niilismo em suas formas e em sua lógica
pensamento medieval a partir de Agostinho. intrínseca”, afirmando que nela o movimento
Conforme aponta Nicola Abbagnano, Leibniz próprio do niilismo ocidental é concebido
entende que “o mal não é uma realidade; “através de suas três formas fundamentais de
portanto, a responsabilidade por ele não remonta manifestação: o ressentimento, a má-
a Deus” (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário consciência e o ideal ascético” (ARALDI,
de filosofia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, Clademir. Para uma caracterização do niilismo
1998. p. 949). na obra tardia de Nietzsche. Cadernos
6
BATAILLE, Georges. Sobre Nietzsche. Nietzsche. São Paulo: GEN-USP, n. 5, 1998. p.
Voluntad de suerte. Madri: Taurus, 1986. p. 17. 80).

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como a medula da civilização ocidental, A título de ilustração, no pará-


em suas filosofias intermediária (to- grafo 45 de Humano, demasiado Hu-
mando por base a concepção de morali- mano (1878), Nietzsche aponta uma
dade do costume) e madura (a ideia de dupla pré-história do bem e do mal,
uma genealogia da moralidade), arti- levando em conta elementos histórico-
culando sua compreensão de uma espé- culturais e psicológicos. Em seu olhar,
cie de hermenêutica do mal como cons- inicialmente, tais valores efluiram da
truto. Num segundo momento, busca- alma de grupos dominadores e, num
remos identificar em que consiste pro- segundo instante, da alma de impotentes
priamente a maldade da má consciência e oprimidos, concluindo hipotetica-
no âmbito de sua “psicologia da consci- mente que “nossa moralidade atual
ência”9, instilada na segunda dissertação cresceu no solo das tribos e castas do-
de Genealogia da Moral. Partiremos minantes”11. Ao mesmo tempo em que
mais detidamente de um análise de par- parece antecipar aspectos da importante
tes relevantes ao presente intento, distinção entre moral de senhores e mo-
constante nas obras Humano, demasi- ral de escravos, alavancada em Além do
ado Humano, Aurora e Genealogia da Bem e do Mal § 260, e fundamental ao
Moral. Cumpre dizer que, para tanto, seu programa crítico, o filósofo de
usufruiremos de alguns de seus frag- Röcken dá-nos um nítido sinal de como
mentos póstumos, caso se faça necessá- deve empreender a interpretação em
rio. torno dos valores morais: esta deve vir à
Se no período intermediário a luz com o concurso da história, da psi-
proposta é de levar adiante uma descon- cologia, da medicina, da fisiologia12, da
fiança radical sobre a moralidade, com a etimologia, da filologia, num sentido
dupla perspectiva de indicação dos ele- distinto do idealismo, escolasticismo e
mentos não morais ou a-morais que a fundacionismo típicos do modo com o
estruturam e da impossibilidade de qual os filósofos anteriores trataram a
fundá-la em bases a-históricas ou meta- moral –, adiantando igualmente o pró-
físicas, o período que enceta com Assim prio procedimento genealógico da fase
falou Zaratustra acaba por revelar uma tardia. Consoante o alerta nietzschiano,
hipertrofia desse projeto, cujo apogeu “tudo veio a ser; não existem fatos eter-
consiste na crítica genealógica da moral, nos: assim como não existem verdades
assim enunciada à guisa de uma nova absolutas. – Portanto, o filosofar histó-
exigência: “necessitamos de uma crítica
dos valores morais, o próprio valor des-
ses valores deve ser colocado em ques-
tão”10. Destarte, haveria uma preocupa-
ção protogenealógica no modo de ques- 11
NIETZSCHE, Friedrich. Humano,
tionar a origem dos valores morais he- demasiado humano. São Paulo: Companhia
gemônicos no Ocidente, a qual se de- das Letras, 2003. p. 52, § 45. Grifo do autor.
senvolve no itinerário da reflexão ni- Doravante esta obra será referendada com a
sigla HDH, seguida da página e do respectivo
etzschiana, na medida em que a adoção
parágrafo.
de uma compreensão histórica, cultural 12
Seria inclusive o papel daquilo que Nietzsche
e psicofisiológica do problema já se faz denomina grande política, “fazer da fisiologia
valer antes do chamado ‘período de senhora em quaisquer outros assuntos”
transvaloração’, embora instituída em (NIETZSCHE, F. Sämtliche Werke. Giorgio
Colli e Mazzino Montinari (Org.). Kritische
meio a outras temáticas nodais, disper-
Studienausgabe (KSA). Berlin; New York:
sas em seus escritos. Walter de Gruyter, 1999. v. XIII, 25 [1], p.
638.). Doravante os aforismos póstumos serão
9
EH, p. 97, Genealogia da moral. referendados com a sigla KSA, seguida do
10
GM, p. 12, Prólogo, § 6. Grifo do autor. volume, do número do aforismo e da página.

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rico é doravante necessário e com ele a tradição15 há muito sedimentada, e o


virtude da modéstia”13. indivíduo que a ela se sujeita – subme-
Por conseguinte, para o Nietzs- tendo-se aos costumes por ela instaura-
che de Humano demasiado Humano, dos – acaba por ser designado como
bem e mal são postos como frutos de ‘bom’. Quando, na face oposta, “mau é
certas interpretações provenientes de ser ‘não moral’ (imoral), praticar o mal
posições político-sociais na história costume, ofender a tradição”, e em de-
(mas que de alguma forma já nos en- corrência disso, “‘egoísta’ e ‘altruísta’
viam à concepção relacional de poder não é a oposição fundamental que levou
desenvolvida sob a perspectiva da von- os homens à diferenciação entre moral e
tade de poder). ‘Bom’ é o juízo pelo imoral, bom e mau, mas sim estar li-
qual eram chamados os partícipes de gado a uma tradição, uma lei, ou desli-
castas dominantes, dotadas de poder de gar-se dela”16. Donde se segue que os
retribuição e de um sentimento comu- predicados bom e mau resultam de de-
nitário, sendo ‘mau’ o incapaz de retri- terminadas teias de significações arvo-
buir, o submisso e impotente. No jul- radas por uma tradição em razão de sua
gamento desses últimos, ‘mau’ está força edificadora de costumes. Nesse
relacionado a qualquer outro existente caso, o indivíduo não pode ser mau (de
humano, independente de sua posição um ponto de vista ontológico), mas se
na hierarquia social: “‘mau’ é a palavra torna mau à medida que se opõe ao sa-
que caracteriza o homem e mesmo todo crossanto domínio da tradição. E por
ser vivo que se suponha existir, um que então indivíduos submeteram-se a
deus, por exemplo; humano, divino tradições, e por sua vez, às injunções da
significam o mesmo que diabólico, moralidade do costume? Nietzsche res-
mau”14. Essa acepção ‘orgânica’ e recí- ponde, ofertando-nos uma espécie de
proca percebida nas antigas comunida- filogênese da moral: “a moralidade é
des humanas queda implícita na hipó- antecedida pela coerção, e ela mesma é
tese da moralidade do costume, edifi- ainda por algum tempo coerção, à qual a
cada ainda no período em tela. pessoa se acomoda para evitar o despra-
Segundo tal hipótese, a morali- zer. Depois ela se torna costume, mais
dade é produto da existência de uma tarde obediência livre, e finalmente
quase instinto”17.
13
HDH, p. 16, § 2. Essa tônica perscrutativa da Em Aurora (1881), parágrafo 9,
filosofia nietzschiana recebe, entre outras, forte Nietzsche reproduz ipsis verbis a con-
influência dos moralistas franceses dos séculos jectura antevista, desdobrando em sua
XVII e XVIII. A própria adoção da escrita
aforismática nietzschiana acha-se igualmente
15
inspirada na forma como Montaigne, La Enquanto sinônimo de autoridade e condição
Rochefoucauld, Vauvernagues e Chamfort, de conservação de um povo.
16
compuseram suas obras. Deles Nietzsche herda HDH, p. 73, § 96.
17
a negação de princípios transcendentes para HDH, p. 75/76, § 99. À época de Humano,
fundar a conduta humana, analisando-a tal como demasiado Humano, principalmente em seu
é, sem referir-se a conteúdos finalistas e capítulo II (Contribuição à história dos
soteriológicos. Nesse sentido, divide com os sentimentos morais), Nietzsche ainda concebe o
franceses sobretudo o modo de pensar a instinto de conservação e a intenção de buscar o
dimensão humana, pois, conforme Scarlett prazer e evitar o desprazer, como motivadores
Marton, “todos eles, sem exceção, interessam-se das ações tradicionalmente interpretadas como
pelo homem sem recorrer à metafísica ou à ‘más’. Como é sabido, ao operar no registro da
teologia, examinam a conduta humana sem vontade de poder, o último Nietzsche dispensa
buscar fundá-la em princípios transcendentes” uma lógica teleológica intrínseca à ação humana
(MARTON, Scarlett. Nietzsche: das forças ao pensá-la no quadro de uma interpretação do
cósmicas aos valores humanos. 2 ed. Belo acontecer em geral aliado à noção de atividade
Horizonte: Editora UFMG, 2000. p. 76). (Aktivität), propondo assim outra compreensão
14
HDH, p. 51, § 45. do agir. Veja-se Genealogia da Moral, II, § 12.

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análise o corrimão que vai da coerção à decisivas à crítica genealógica: 1) a ad-


introjeção instintual, passando pelo missão de uma historicidade da perda de
costume e pela obediência, insistindo na si, da sujeição de si, do sacrifício de si,
interdependência entre esses dois últi- da auto-imolação em nome da firmação
mos aspectos. A obediência aos costu- das instituições morais como elemento
mes espelharia a obediência a uma ligado à fraqueza, numa equação: a cru-
forma tradicional de agir e avaliar, posi- eldade contra si mesmo como indispen-
cionando-se como o modo historica- sável à fixação e manutenção dos cos-
mente consolidado da ação julgada tumes; 2) a interpretação-avaliação
‘boa’, porquanto alinhada aos ditames deste fenômeno sugere que o mesmo
de uma tradição, resultante do severo está umbilicalmente ligado ao esmore-
sacrifício aos costumes: “o indivíduo cimento e à prostração das potências
deve sacrificar-se – assim reza a mora- vitais de indivíduos. Essa última asser-
lidade dos costumes”18. Novamente, por ção é claramente refletida no final do
oposição, reitera o entendimento sobre a parágrafo ora examinado, e ao mesmo
interpretação da condição do ‘mau’ no tempo abre um meandro interpretativo
cerne dessa moralidade, ao frisar que os ao problema que nos colocamos desde o
imorais são justamente os que se des- início: “sob o domínio da moralidade do
vencilham dos costumes (oferecendo costume, toda espécie de originalidade
Sócrates e os primeiros cristãos como adquiriu má-consciência”20. Nessa dire-
exemplos), entregando-se a programas ção, examinemos mais de perto a dinâ-
morais incipientes e aparentemente inó- mica psicofisiológica de constituição da
cuos frente ao peso da tradição. Por moral que têm no elemento crueldade
isso, como vê o filósofo de Zaratustra, um recurso capital.
estes “afastam-se da comunidade, como Com efeito, a crueldade está as-
imorais, e são maus na mais profunda sociada à acepção habitual de mal ou
acepção. Para um virtuoso romano da maldade, como uma de suas diversas
velha cepa, todo cristão, ‘que antes de predicações (bem como a violência, a
tudo cuidava de sua própria salvação’, – destrutividade, a perversidade, a negli-
parecia mau”19. gência, o vício, a finitude, entre outras).
A gênese histórico-psíquica da Sob esse ponto de vista, predominante
moralidade que se pode desentranhar na cultura ocidental, o sujeito moral
dessas colocações revela duas suposi- soergue-se num sentido oposto à cruel-
ções que acompanharão doravante o dade, e, portanto, a moralidade mesma
percurso filosófico nietzschiano, sendo residiria nos seus antípodas. Tomando
um viés distinto no trato desse fenô-
18 meno, Nietzsche parece dar conta de um
NIETZSCHE, Friedrich. Aurora. São Paulo:
Companhia das Letras, 2004. p. 18, § 9. horizonte que foi reputado segregado de
Doravante esta obra será referendada com a toda instituição dignamente humana e
sigla AU, seguida da página e do respectivo lançado pela filosofia no limbo dos
parágrafo. conteúdos a serem suposta e pretensa-
19
AU, p. 19, § 9. Com Nietzsche, resta claro que
mente superados, expulsos da cena hu-
valores não podem ser tratados como estigmas,
marcas das quais não mais nos livramos: “todo mana por intermédio da conduta mo-
aquele que subverteu a lei de costume existente ral21. Em suas palavras, a crueldade é
foi tido inicialmente como homem mau: mas se,
como sucedeu, depois não se conseguia
20
restabelecê-la e as pessoas acomodavam-se a AU, p. 19, § 9.
21
isso, o predicado mudava gradualmente; – a Para Daniel Lins, há um silêncio sacrificial em
história trata quase exclusivamente desses torno da crueldade na filosofia que partiria de
homens maus, que depois foram abonados, Aristóteles, por quem ela seria enxergada como
considerados bons!” (AU, p. 26/27, § 20. Grifo exterior ao ser do humano: “Aristóteles,
do autor). confundido pelo excesso não humano da

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“um dos mais antigos e indeléveis transitório) subsistiria na razão direta da


substratos da cultura”22; como assegura atuação de violentas dinâmicas de uma
Rüdiger Safranski, em seu exame crítico espécie crueldade imanente (concebida
da moralidade, Nietzsche intentaria quiçá na ideia de que o acontecer em
“descobrir a crueldade primária escon- geral se dá pela luta, pelo entrechoque
dida na moral”23. Há aqui então uma de forças), que acabariam por compor a
total inversão do entendimento sobre a esfera historicamente serôdia do animal
relação entre crueldade e moralidade: na humano morigerado. Ademais, o filó-
primeira há algo reputado funcional à sofo vê no exercício da crueldade culti-
constituição histórica da segunda, e, da vado por povos antigos duramente cin-
mesma maneira, à própria lógica do turados pelos costumes (que segundo
discurso filosófico-moral e à conduta ele vivam em um suposto ‘estado de
que busca legitimar, em razão da conse- guerra’), uma instância inventiva e insa-
quente atestação interpretativa da parti- ciável associada a um sentimento de
cipação da crueldade nas dinâmicas de prazer que os possibilitava reanimar-se
construção dos tecidos socioculturais e afastar-se da constante cautela quanto
humanos. às ameaças exteriores, e ao mesmo
Ainda em Aurora, Nietzsche tempo dar festejos espetaculares e san-
desenvolve a hipótese da presença ope- grentas oblações aos seus deuses. É
rante da crueldade na forjadura das ar- dessa perspectiva que afirma que “a
regimentações humanas, desde os anti- crueldade está entre as mais velhas ale-
gos estágios de formação cultural. O grias festivas da humanidade”24, donde
agônico processo pelo qual uma cultura se segue a justificação da entrada no
vem a ser até atingir um grau conside- mundo da ideia de sofrimento voluntá-
rável de firmação (não menos tenso e rio, e com esta, o martírio deliberado
protagonizado por tais povos passa a
obter sentido.
crueldade, a exila no campo da bestialidade e da
loucura”, e, portanto, fora da esfera A crueldade era então enalte-
propriamente ética; algo que Schopenhauer faz cida como virtude, o sacrifício de si, o
ver na própria condição vital ao pensar a sofrimento, exaltados em meio a uma
crueldade como inerente à vontade de viver que experiência cultural em que o indivíduo
perpassa o humano (filiando-a à noção de
estava inteiramente dissolvido na co-
sofrimento), para o qual o compromisso ético
será o abandono integral dessa mesma vontade: munidade. De acordo com o filósofo
“para Schopenhauer, o sofrimento é a alemão, essa percepção escapou aos
manifestação de uma força cruel, àquela mesma modernos, para os quais seria “quase
que subentende a Vontade; o sofrimento é para impossível sentir como os imensos pe-
ele o ‘fundamento de toda a vida’. O homem em
ríodos de ‘moralidade dos costumes’,
quem a Vontade se exerce, no mais alto nível, é
o ser mais sofredor. Em Schopenhauer a que precederam a ‘história universal’
crueldade encontra, de fato, uma explicação como a verdadeira e decisiva história
metodológica e se inscreve na natureza do que determinou o caráter da humani-
homem” (LINS, Daniel. Nietzsche e Artaud: por dade”25. Mais detidamente, Nietzsche
uma exigência ética da crueldade. In:
revela o paradoxo condizente à morali-
FEITOSA, C.; CASANOVA, M. A.;
BARRENECHEA, M. A.; DIAS, R. (Orgs.). dade quando da atuação de aspectos
Assim falou Nietzsche III. Rio de Janeiro: 7 cruéis consubstanciados a um senti-
Letras, 2001. p. 50). Em ambos a condição mento de prazer no modo de sentir e
ético-moral se dá no esvaziamento prático- avaliar, mas que, nesse instante da his-
existencial da crueldade, quer como virtudes
éticas, quer como negação búdica da vida.
22 24
EH, p. 97, Genealogia da moral. AU, p. 24, § 18. Essa hipótese é novamente
23
SAFRANSKI, Rüdiger. Nietzsche: biografia aventada e desenvolvida em Genealogia da
de uma tragédia. São Paulo: Geração Editora, Moral, II § 6.
25
2002. p. 171. AU, p. 25, § 18. Grifo do autor.

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toricidade humana, parece dirigir-se gem os deuses canibais, isto não


para fora, descarregando-se na exterio- acontece29.
ridade. Como indica ao versar sobre “a Com essas palavras, Nietzsche
castidade da freira: que olhares castiga- indica o registro desde o qual busca
dores ela não lança ao rosto das mulhe- interpretar as dinâmicas de desenvolvi-
res que vivem de outra forma”26. Essa mento da moralidade: a vida, a existên-
moral que o pensador designa como cia, entendidas à luz do conflito30, da
moral da distinção – um desdobramento tensão, da luta contínua entre aglomera-
da moralidade do costume – é por ele dos de impulsos edificadores de dife-
entendida como “o prazer na crueldade rentes e efêmeros modos de organização
refinada”27, prazer este tornado hábito, da corporeidade humana. Ou, para dizer
herdado pelas gerações ulteriores, e numa de suas muitas fórmulas: “moral
admitido como primeiro degrau do va- como regulador do comportamento dos
lor ‘bem’. É justamente nessa direção impulsos uns com os outros”31. Além
que compreende a sublimação pela qual disso, parece preparar o terreno para a
gradualmente passa a crueldade nos suposição fisiológica segundo a qual a
costumes, reafirmando tal interpretação ‘consciência’ seria expressão tardia de
em A Gaia Ciência: “concedo apenas um transitório apaziguamento de con-
que a crueldade se torna refinada, e que flituosos processos entre impulsos na
suas formas mais antigas ofendem o dynamis do corpo (a própria razão não é
gosto”28. senão impulso), em estreita correlação
Mas filósofo de Röcken não se com a coerção oriunda das injunções da
contenta apenas em sugerir a existência vida gregária.
historicamente determinante desse cul- Pode-se retirar uma inferência
tivo de uma violência mesclada a um inicial sobre as ilações nietzschianas
gozo gerador de sensação de poder na acerca da crueldade em Aurora, a qual
vivência dos povos açambarcados por tem significativas implicações no itine-
tal moralidade. Chama a sua atenção o rário de sua crítica dos valores morais: a
fato de que esse componente não-moral crueldade, a violência, a exploração, a
da moral jamais a abandonou, perten- edificação de hierarquias entre huma-
cendo inclusive aos discurso éticos da nos, fazem parte da agonística dos pro-
Modernidade, pretensamente destituídos cessos vitais, não consistindo em subs-
do selo da crueldade e de seus dispositi-
vos psicofisiológicos (vingança, tortura,
29
dor, sofrimento, entre outros). Nesse AU, p. 162, § 221.
30
sentido, assegura: Discutindo a interpretação de Bataille sobre o
mal em Nietzsche, Antônio Edmilson Paschoal
a moralidade que se mede conforme sustenta a conjetura segundo a qual “a idéia de
o grau de sacrifício é aquela do está- ‘mal’ para o filósofo e escritor francês tem a
gio semi-selvagem. A razão obtém, função de traduzir o caráter conflitante do que
no caso, apenas uma vitória difícil e existe”; dessa perspectiva, Nietzsche conceberia
sangrenta no interior da alma, há “o mal, entendido como um litígio, como o
contra-impulsos violentos a serem movimento de violência que arranca o homem
de sua cômoda integridade e o expõe ao risco de
derrotados; sem uma espécie de cru-
se perder – característico da disputa. Um estado
eldade, como nos sacrifícios que exi- de tensão no qual se revela, tanto para Bataille
quanto para Nietzsche, a condição paradoxal do
homem, com a qual ele tem que se defrontar
caso queira se tornar o que é: um “animal
26
AU, p. 32, § 30. interessante” (PASCHOAL, Antônio Edmilson.
27
AU, p. 32/33, § 30. Nietzsche e Bataille: em torno da questão do
28
NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. 2. ed. “mal”. Tempo da Ciência. Curitiba: PUC-PR,
São Paulo: Companhia das Letras, 2001. p. 74, n. 15, v. 30, 2008. p. 46/47).
31
§ 23. KSA IX, 7 [154], p. 348.

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tratos ou faces de uma maldade inerente como moral dos senhores e moral de
à condição humana, como todo raciocí- escravos”35.
nio naturalizador do mal preconiza32. A hipótese genealógica deslinda
Embora se refira a uma ‘maldade da dos escombros da linguagem as condi-
força’, Nietzsche o faz inscrevendo-se ções de criação e recriação dos valores
no âmbito fisiológico, lendo-a em ter- morais dominantes na tradição ociden-
mos de desafogo de impulsos e diferen- tal, encontrando na dicotomia moral
çando-a de uma ‘maldade da fraqueza’ à entre tipologias senhoris e escravas uma
qual atribui o desejo de fazer e ver so- chave hermenêutica. Por meio dos sig-
frer: “a maldade da força fere o outro nos morais Nietzsche ausculta profun-
sem pensar nisso – ela tem que se desa- dos arranjos vitais – “estados morais são
fogar; a maldade da fraqueza quer ferir estados fisiológicos”36 – os quais
e ver os sinais do sofrimento”33. Longe reverberam modos de doar sentido e
de sustentar que tais forças são substan- avaliar, pensados já sob a perspectiva da
cialmente más, posto que só há maldade vontade de poder. Tal como aponta,
como interpretação, Nietzsche revela a nosso intelecto, nossa vontade, e
percepção de si e a percepção de ou- também nossas sensações dependem
trem como decisivos a essa distinção, de nossas estimativas de valor: estas
pois “quando o homem está com o sen- correspondem a nossos impulsos e a
timento de poder ele se percebe como suas condições de existência. Nossos
bom e assim se denomina: e precisa- impulsos são redutíveis à vontade de
mente então os outros, nos quais ele poder. A vontade de poder é o derra-
deve descarregar seu poder, percebem- deiro fato a que chegamos37.
no como mau e assim o chamam!”34. Por este ângulo, o vir a ser his-
Como registra Marco Brusotti, “o forte tórico das estimativas de valor ‘bom’ e
não pode ser de outro modo, ele precisa ‘ruim’, e ‘bom’ e ‘mau’, exposto na
desafogar sua força sobre os outros. Ele dissertação inaugural de Genealogia da
também não se sente como mal, apenas Moral, obedeceria a circunstâncias de
os outros – especialmente suas vítimas – produção de alguma maneira já alvitra-
o sentem como tal”; arrematando ao das em Aurora. O Nietzsche genealo-
afirmar que nessa asserção de Aurora já gista defende que o juízo de valor ‘bom’
está posta “a dupla óptica do enfoque de resultaria de indivíduos que se sentiam
Genealogia da Moral determinada como bons (o sentir-se como um inter-
32
pretar-se a partir de uma experiência de
A imagem-conceito da vontade de poder é o fruição de si), passando assim a se ava-
recurso que Nietzsche cria e utiliza para dar
conta dessa percepção. A título de ilustração,
liar como bons. Estes seriam os podero-
em Além do Bem e do Mal, escreve o filósofo: sos de castas nobres e senhoriais. Além
“em toda parte sonha-se atualmente, inclusive disso, como esclarece Vânia D. de Aze-
sob roupagem científica, com estados vindouros redo, “há uma estreita ligação entre o
da sociedade em que deverá desaparecer o sentir-se bom e a correspondente avali-
‘caráter explorador’ – a meus ouvidos isto soa
como se alguém prometesse inventar uma vida
ação daquilo que seria bom, enquanto
que se abstivesse de toda função orgânica. A
‘exploração’ não é própria de uma sociedade
corrompida, ou imperfeita e primitiva: faz parte
35
da essência do que vive, como função orgânica BRUSOTTI, Marco. Die Leidenschaft der
básica, é uma consequência da própria vontade Erkenntnis: Philosophie und Ästhetische
de poder, que é precisamente vontade de vida” Lebensgestaltung bei Nietzsche vom
(NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do Morgenröthe bis Also sprache Zaratrhustra.
mal. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, Berlin; New York: Walter de Gruyter, 1997. p.
2001. p. 171, § 259). 71.
33 36
AU, p. 207, § 371. Grifo do autor. KSA IX, 6 [445], p. 313. Grifo do autor.
34 37
AU, p. 133, § 189. Grifo do autor. KSA XI, 40 [61], p. 661. Grifo do autor.

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produção desses mesmos homens”38. criador e gera valores”42. Doravante, a


Também o juízo de valor ‘ruim’ adviria esteira de compreensões ligadas aos
de tais indivíduos, enquanto algo deri- juízos ‘bom’ (como sinônimo de po-
vativo porque fruto da afirmativa dife- tente, guerreiro, nobre, dominador) e
renciação destes com relação àqueles de ‘ruim’ (designando baixo, ignóbil, sim-
linhagem baixa, plebeia, e àquilo que ples, comum) dentro da moral aristo-
fazem. Destarte: “o pathos da nobreza e crática, sofre uma radical reavaliação
da distância, como já disse, o dura- quando o ‘bom’ desta moral é então
douro, dominante sentimento global de julgado como ‘mau’, e o ‘ruim’ como
uma elevada estirpe senhorial, em sua ‘bom’, no solo ressentido-reativo da
relação com uma estirpe baixa, com um moral de escravos. Conforme expressa
‘sob’ – eis a origem da oposição ‘bom’ Nietzsche,
e ‘ruim’”39. Recorrendo a inferências como são diferentes as palavras
etimológicas, Nietzsche constata uma ‘mau’ e ‘ruim’, ambas aparentemente
gama de termos nos quais são divisadas opostas ao mesmo sentido de ‘bom’:
radiculares articulações entre o que se perguntemo-nos quem é propria-
entende como bom e a condição nobili- mente ‘mau’, no sentido da moral do
árquica nas culturas senhoriais, e igual- ressentimento. A resposta, com todo
mente o que se entende como ruim e a o rigor: precisamente o ‘bom’ da ou-
condição de não-nobre, adotando essa tra moral, o nobre, o poderoso, o do-
atestação como justificação de sua hi- minador, apenas pintado de outra cor,
pótese40. interpretado e visto de outro modo
pelo olho de veneno do ressenti-
Se a oposição entre ‘bom’ e
mento43.
‘ruim’ acha-se por sua vez tematizada
no caráter distintivo dos tipos nobres, De início, a suposição nietzs-
resta ao filósofo analisar a situação axi- chiana denota a volatilidade com a qual
ológica mediante a qual vem ao mundo os valores são criados e impingidos, na
a oposição entre ‘bom’ e ‘mau’. Para medida em que não são atributos fixos,
Nietzsche, esta resultaria de uma inver- mas interpretações fixadas em um refe-
são dos valores aristocráticos, uma rente, e inteiramente franqueáveis44. Em
transvaloração nutrida pela impotência específico, é possível deduzir que a in-
(uma condição fisiológica), geratriz de terpretação consagrada da maldade pela
um ódio vingativo capaz de rearranjar cultura ocidental de matriz judaico-
valores, protagonizada pelo povo judeu: cristã seria um fruto da reviravolta axi-
“foram os judeus que, com apavorante ológica promovida pelo ressentimento
coerência, ousaram inverter a equação judeu. E mais, a inversão ressentida
de valores aristocrática”41. Com eles operada por estes se dá porquanto a
inicia-se a moral de escravos, tendo no espécie de organização fisiológica neles
ressentimento seu motor propulsor: “a atuante é marcada pelo negativo: de-
rebelião escrava na moral começa manda a existência de outrem o qual
quando o próprio ressentimento se torna nega, como única possibilidade de valo-

42
GM, p. 28, I § 10.
38 43
AZEREDO, Vânia Dutra de. Nietzsche e a GM, p. 32, I § 11. Grifo do autor.
44
dissolução da moral. São Paulo: Discurso Conforme Antônio Edimilson Paschoal, “para
Editorial & Editora Unijuí, 2003. p. 59. o Nietzsche adulto, não existe um conceito de
39
GM, p. 19, I § 2. bem e mal anterior às contingências do mundo,
40
Veja-se Genealogia da Moral, I § 4, 5, 6, 10 e que poderia ser tomado como um pressuposto
11. para avaliar todas as coisas e todas as ações
41
GM, p. 26, I § 7. Essa conjetura fora lançada humanas” (PASCHOAL, Antônio Edmilson.
pela primeira vez em Além do Bem e do Mal § Nietzsche e Bataille: em torno da questão do
195. “mal”. Op. cit. p. 48).

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rar e vir a ser. Portanto, uma tal moral credor e devedor. Sustenta haver na
seria resultante de uma composição humanidade antiga uma correspondên-
vital reativa, impotente, incapaz de por cia entre dano e dor que servia de su-
si mesma instaurar valores. Entretanto, porte às relações entre credor e devedor:
ao mesmo tempo em que se desenvol- uma dívida contraída e não honrada
veu negando a diferença e edificando colocava em jogo dispositivos reparató-
uma unilateralidade político-moral45, a rios sanguinários. “Nesta esfera, a das
reação escrava logrou persuadir por obrigações legais”, escreve o filósofo,
meio de uma manobra imaginária os “está o foco de origem desse mundo de
tipos fortes a se considerarem fracos conceitos morais: ‘culpa’, ‘consciência’,
através da noção de culpa: “todo esse ‘dever’, ‘sacralidade do dever’ – o seu
mecanismo construído tem por objetivo início, como o início de tudo grande na
incutir na força uma culpa pelas suas terra, foi largamente banhado de san-
manifestações espontâneas”46. Com gue”47. Isso posto, compensava-se qual-
base nesse paralogismo que ficticia- quer dívida infligindo dor mediante toda
mente separa a força daquilo que ela sorte de torturas, mutilações, privações,
pode, o forte é convencido de que é cul- o que revela uma apoderação do corpo
pado pelas suas ações espontâneas e do outro apenas para consolidar junto ao
livres, e ao mesmo tempo, a ficção de credor o direito de ser cruel, seja ele um
um agente (alma, sujeito) subjacente às indivíduo ou o poder institucionalizado
ações ganha terreno. da comunidade.
É exatamente nesse contexto da Mas tal dinâmica, como Nietzs-
reflexão nietzschiana que vem à tona a che faz ver, não quedou para trás na
problematização da má-consciência e história humana. Segundo entende, toda
uma densa retomada da perspectiva cultura reputada superior (civilizada,
outrora esculpida sobre a crueldade. Na emancipada, racional, numa expressão,
primeira vez que menciona a expressão moderna), e, sobretudo, todos os basti-
má-consciência em Genealogia, se- ões morais que lhe conferem essa con-
gunda dissertação § 4, Nietzsche a rela- dição, não podem ser compreendidos
ciona com o sentimento de culpa, pro- em sua lógica intrínseca sem “o pro-
pondo uma genealogia do conceito de cesso de internalização e espiritualiza-
culpa alicerçada na noção de dívida, ção da crueldade”48. Nietzsche também
baseando-se na relação material entre procura rechaçar a ideia segundo a qual
o castigo despertaria nos castigados o
sentimento de culpa, ao depreender que
45
Compartimos o exame do instinto judeu na pré-histórica49 trama humana de
(jüdischer Instinkt) realizado Jorge Luiz
constituição das armações da morali-
Viesenteiner, especialmente quando vincula a
negação absoluta do diferente ínsita ao dade, e das próprias relações de justiça,
ressentimento judaico à perspectiva de a vivência do castigo estaria longe de
edificação de uma unilateralidade fazer florescer no castigado uma culpa-
homogeneizadora e aniquiladora do outro, bilidade, pertencendo este unicamente à
discurso imposto na razão direta do abafamento
de qualquer alteridade moral: “o triunfo da
47
perspectiva judaica de valoração e a negação de GM, p. 55, II § 4.
48
todo o resto e de todo outro como consequência, GIACOIA JR., Oswaldo. Nietzsche. São
significam os primeiros passos também para o Paulo: Publifolha, 2000. p. 64.
49
triunfo da própria unilateralidade, que como Numa asserção, Nietzsche deixa clara a
bem se percebe possui como sua principal adoção de uma pré-história por ele concebida à
produtora a dinâmica do niilismo” guisa de postulado, enquanto experiência
(VIESENTEINER, Jorge Luiz. A grande humana aberta e insuperável: “sempre
política em Nietzsche. São Paulo: Annablume, utilizando a medida da pré-história (pré-história
2006. p. 38). aliás, que está sempre presente, ou sempre pode
46
AZEREDO, Vânia Dutra de. Op. cit. p. 106. retornar)” (GM, p. 60, II § 9).

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lógica compensatória do dano a ser re- ganização social mais ou menos estável
parado. somente fora possível por atos de pro-
Após tecer essas interpretações, funda violência praticados por bandos
o filósofo se vale de uma primeira visão de indivíduos guerreiros conquistadores,
sobre a origem da má-consciência: fundadores de ‘Estado’ enquanto estru-
“vejo a má consciência como a pro- turas de dominação. A participação
funda doença que o homem teve de destes na produção da má consciência é
contrair sob a pressão da mais radical um componente lógico do discurso ni-
das mudanças que viveu – a mudança etzschiano, o que não significa dizer
que sobreveio quando ele se viu defini- que eles compartilhem dela: “neles não
tivamente encerrado no âmbito da soci- nasceu a má consciência [...] mas sem
edade e da paz”50. Nietzsche acredita ter eles ela não teria nascido”, achando-se
havido nessa origem a experiência mais apenas nos arrebanhados, nos quais
lastimável pela qual o ente humano até medrou e ganhou contornos mais am-
então passou, geratriz de um enorme plos: “esse instinto de liberdade repri-
mal-estar, quando instintos que antes se mido, recuado, encarcerado no íntimo,
descarregavam na exterioridade são por fim capaz de desafogar-se somente
inibidos, interditados, voltando-se para em si mesmo: isto, apenas isto, foi em
um dentro do humano até então ainda seus começos a má consciência”52.
não existente, que se constrói na medida Disto se pode deduzir que a má consci-
em que retém os impulsos que retornam ência foi um engendro concomitante da
por esse movimento reverso. O que se cessação do extravasamento instintual
encontra em jogo é a própria constitui- motivado pelo cruel represamento im-
ção da ‘alma’ ou ‘consciência’ humana posto desde fora pelos violentos organi-
segundo sua conjetura, obra de um pro- zadores sociais, e da forçada interioriza-
cesso violentíssimo em que instintos do ção de impulsos ocorrida consoante a
homem selvagem são freados e recon- mesma dinâmica violenta, em escala
duzidos para trás, para uma ‘interiori- menor, cujos desdobramentos geram o
dade’ simultânea e duramente engen- enraizamento de um ‘eu’.
drada por ele mesmo: “a hostilidade, a Os próximos passos conduzem
crueldade, o prazer na perseguição, no da fixação cada vez mais epidêmica do
assalto, na mudança, na destruição – humano domesticado até a condição na
tudo isso se voltando contra os possui- qual esse humano detentor-cultivador da
dores de tais instintos: esta é a origem má consciência reinterpreta o âmbito de
da má consciência”51. Com esta, inocu- seus impulsos vitais como âmbito da
lou-se na humanidade uma doença da culpabilidade, já no quadro referencial
qual ela ainda não conseguiu curar-se: o da deidade judaico-cristã. Para Nietzs-
terrível sofrimento do humano consigo che, “esse homem da má consciência se
mesmo. apoderou da suposição religiosa para
Ao desenvolver essa percepção, levar seu automartírio à mais horrenda
Nietzsche a complementa sustentando culminância”53. Em síntese, o derradeiro
que tal alteração no estágio semi-selva- degrau operativo da má consciência
gem da humanidade não ocorreu de leva às últimas consequências a relação
modo gradativo ou voluntariamente, entre credor (Deus) e devedor (homem)
mas à maneira de uma grande ruptura, e a própria execração dos instintos, que
de uma cisão irreprimível. Também de agora em diante (junto à natureza, à
assegura que a arregimentação de po- vida e à existência) são culpados, sua
pulações inteiras em uma forma de or- expiação é tida por irreparável (dívida
50 52
GM, p. 72, II § 16. Grifo nosso. GM, p. 75, II § 17. Grifo do autor.
51 53
GM, p. 73, II § 16. Grifo do autor. GM, p. 81, II § 22.

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eterna). O sentido dado pelo homem da nentes fisiológicos, biológicos e psico-


má consciência às dores de sua tortura lógicos aos quais Nietzsche recorre para
interna é o de culpar-se por elas – culpa dar vasão à sua argumentação.
torna-se falta, e a má consciência, a Heuristicamente, má é, por-
consciência que catalisa essa culpa: “o tanto, a ‘crueldade voltada para trás’, o
homem passa, assim, a ser responsável movimento de descarga para a exterio-
pela própria dor porque é culpado”54. ridade, característico dos instintos ani-
Nisso residiria, segundo Nietzsche, a mais, voltando-se contra si próprio,
mais bestial crueldade psicológica que o consistindo num processo ‘antinatural’56
homem doentio criou para si. E para que de alguma forma é possibilitado em
tanto, teve o auxílio inventivo do sacer- razão do modo de conceber a energética
dote ascético, mediante a introjeção da vital, vista como incessante combate
ideia de pecado: “assim se chama a re- entre forças, pulsões, instintos, a asse-
interpretação sacerdotal da ‘má consci- nhorear-se e apoderar-se provisoria-
ência’ animal (da crueldade voltada para mente uns dos outros em uma multipli-
trás)”55. cidade incomensurável e inconciliável
A sutileza argumentativa ni- (vontade de poder). Disso resulta
etzschiana em torno dessa concepção igualmente um paradoxo da reflexão
nos permite então ventilar algumas pos- nietzschiana: não obstante em seu está-
sibilidades interpretativas sobre a ques- gio ulterior de desenvolvimento a má
tão que nos propomos responder acerca consciência revele-se locus de negação
do sentido do mal da má-consciência, e dos instintos e da corporeidade, violen-
se ele guarda ou não afinidades com a tando-se refinadamente (a imagem de
percepção da crueldade trabalhada pelo Nietzsche é a do humano como ‘câmara
filósofo de Röcken. Em nossa primeira de tortura’), não é senão enquanto mer-
tentativa de inferência, consideramos gulhada na dinâmica mesma da vontade
que o ‘mal’ da má consciência parece de poder e, por conseguinte, da expan-
ser a única compreensão de mal válida sividade e assenhoramento, que procura
para Nietzsche, porquanto interpretação manter-se (aqui também deve-se levar
que se reconhece perspectivística (uma em consideração o papel central exer-
vez que nada existiria ‘em si’ para o cido pelo sacerdote ascético, no redire-
pensador alemão), tomada unicamente cionamento do ressentimento57).
como algo que possui uma ‘gênese’ Outrossim, a crueldade pode ser
histórico-fisiológica e um ulterior de- aqui depreendida em um quadro ambi-
senvolvimento concomitante ao próprio valente, pois, como notamos, se ela re-
desenvolvimento hipertrófico da moral side nas entranhas da vida mesma,
ocidental e de sua aparelhagem ficcio- comparecendo em meio às produções
nal. Dizemos ‘válida’ porque essa noção desta, seja num grau maior ou menor
é – de acordo com nosso entendimento (mais espiritualizadamente), não signi-
– claramente assumida por Nietzsche fica dizer que Nietzsche não a interpreta
em sua relação de tensão com a própria em profunda consonância com o caráter
linguagem filosófica, contaminada se-
gundo ele por preconceitos morais, e 56
Em Crepúsculo dos Ídolos, afirma Nietzsche:
incorporada a seu pensamento no ambi- “a moral antinatural, ou seja, quase toda moral
ente da crítica genealógica da moral a até hoje ensinada, venerada e pregada, volta-se,
fim de cumprir uma função heurística. pelo contrário, justamente contra os instintos da
vida – é uma condenação, ora secreta, ora
Tal função afigura-se a nós apenas se se
ruidosa e insolente, desses instintos”
levar em conta os importantes compo- (NIETZSCHE, Friedrich. Crepúsculo dos
Ídolos. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
54
AZEREDO, Vânia Dutra de. Ibidem. p. 165. p. 36, V § 4. Grifo do autor).
55 57
GM, p. 129, III § 20. Cf. Genealogia da Moral, III § 15.

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mau da má consciência, não tomando, cultura ocidental, como condição para


consequentemente, partido por ela. In- uma humanidade futura mais saudável?
clusive, uma de suas críticas desferidas Destarte, partindo da visada ge-
contra o imperativo categórico da ética nealógica nietzschiana, teria então o
de Kant, a fim de desqualificá-lo, con- período no qual a humanidade apostou
siste em nele ver o aspecto coercitivo da na moralidade um duplo significado?
crueldade58. Isso nos dá a entender que Poder-se-ia tomá-lo como um período
o filósofo de Röcken abriria mão da de declínio e decadência e, simultanea-
forma através da qual o fenômeno da mente, uma faixa de tempo na qual são
crueldade adentra na composição da má preparadas as condições para o desen-
consciência, principalmente no mo- volvimento posterior de uma humani-
mento de seu exacerbo no cerne da mo- dade altiva (saudável)? Não estaríamos
ral cristã, e daqueles reputados seus desse modo ante uma dura contradição?
rebentos filosóficos. Talvez, e aqui ar- Utilizando uma indagação de Müller-
riscamos uma errância, a chave concei- Lauter, para quem os antagonismos
tual a ser usufruída no ensaio de pensar fazem parte do exercício filosófico ca-
a ‘maldade’ da má consciência esteja racterístico dos escritos nietzschianos,
justamente em sua frequente designação “a má consciência, tomada como exem-
como sendo uma doença. plo disso, seria a doença do fastio da
Nesse sentido, Nietzsche utili- vida que leva ao autoaniquilamento, ou
zaria uma significação do mal bastante se trataria de uma doença, apenas no
próxima da ideia de mal médico, donde sentido ‘em que a gravidez é uma do-
se segue uma vez mais a presença da ença’?” 60. Talvez seja precisamente
fisiologia como horizonte inerente à sua nesse ponto que deva ser compreendida
filosofia, na medida em que a má cons- a senha nietzschiana da experiência de
ciência é lida em termos de condição um futuro ‘para além do bem e do mal’.
patológica, debilitação fisiológica, e o
Referências
exame genealógico de sua ‘origem’ e
desenvolvimento, tal como uma pato- ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de
gênese. Dessa perspectiva é igualmente filosofia. 2. ed. São Paulo: Martins
possível depreender o discurso nietzs- Fontes, 1998.
chiano da saúde, dos indícios acerca ARALDI, Clademir. Para uma caracte-
daquilo a que chama de uma grande rização do niilismo na obra tardia de
saúde59, como transbordamento dos Nietzsche. Cadernos Nietzsche. São
impulsos, plasticidade da potência, sen- Paulo: GEN-USP, n. 5, p. 77-94, 1998.
timento de poder, plenitude, caracterís- AZEREDO, Vânia Dutra de. Nietzsche
ticos a nosso ver de uma expansiva di- e a dissolução da moral. São Paulo:
nâmica de exercício instintual, como Discurso Editorial & Editora Unijuí,
discurso ao qual parece filiar-se o filó- 2003.
sofo alemão. Mas em quantas outras BATAILLE, Georges. Sobre Nietzs-
passagens Nietzsche não nos convida a che. Voluntad de suerte. Madri: Taurus,
interpretar um certo caráter necessário 1986.
da doença, da debilitação dos impulsos, BRUSOTTI, Marco. Die Leidenschaft
quando por exemplo versa sobre o nii- der Erkenntnis: Philosophie und
lismo em todas as suas manifestações na Ästhetische Lebensgestaltung bei Ni-
etzsche vom Morgenröthe bis Also
58
“O imperativo categórico cheira a crueldade”
60
(GM, p. 55, II § 6). MÜLLER-LAUTER, Wolfgang. Nietzsche:
59
Veja-se a título de ilustração Humano, sua filosofia dos antagonismos e os
demasiado Humano, Prólogo § 4 e A Gaia antagonismos de sua filosofia. São Paulo:
Ciência § 382. UNIFESP, 2009. p. 119.

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2001. Paulo: Annablume, 2006.
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou
Zaratustra. Tradução de Paulo César

Abstract: This article is an attempt to interpret the meaning of the adjective 'bad' expres-
sion linked to bad conscience, by Nietzsche in Genealogy of Morals, in the context of his
critique of moral values, as well as the argumentative elements that accompany it, many of
them coming from the problematization of morality deriving of its intermediate thought,
with clear resonances in his mature philosophy. Keywords: morality, evil, cruelty, bad
conscience, disease

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