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1.1. Tese
Para responder aos problemas que colocam, os filósofos apresentam teses e desenvolvem teorias.
Uma tese corresponde a uma ideia que se quer afirmar a propósito de um dado problema. No âmbito da
filosofia, uma tese constitui uma resposta a um problema em aberto, estando, por conseguinte, sujeita à
discussão. Para defender uma ideia, ou tese, é necessário construir bons argumentos.
Na base do trabalho filosófico estão o pensamento (raciocínio lógico) e a argumentação. Para assegurar
a qualidade e o rigor dos argumentos que apoiam as suas teses e teorias, os filósofos recorrem à lógica.
1.3. Argumento
No âmbito da lógica, o argumento é definido como um conjunto de proposições devidamente articuladas
– a conclusão e a(s) premissa(s) –, no qual a(s) premissa(s) procura(m) defender, sustentar ou justificar a
conclusão. À conclusão também se chamada tese, uma vez que ela traduz a ideia que se quer defender.
O que caracteriza o argumento é o nexo lógico entre as premissas e a conclusão.
Exemplo de um argumento:
Os alunos da turma 10A são estudantes de Filosofia.
Pedro e Miguel são alunos da turma 10A.
Logo, Pedro e Miguel são estudantes de Filosofia.
Um argumento tem subjacente uma inferência ou raciocínio, uma operação mental através da
qual chegamos a uma conclusão partindo de determinadas razões e efetuando a transição lógica entre
proposições. Quando essa transição lógica falha, percebemos que algo está errado. Vejamos:
Os alunos da turma 10A são estudantes de Filosofia.
Pedro e Miguel são estudantes de Filosofia.
Logo, Pedro e Miguel são alunos da turma 10A.
Neste exemplo, compreendemos facilmente que o facto de Pedro e Miguel serem estudantes de
Filosofia não implica que façam parte da turma 10A. Neste sentido, estaremos a cometer um erro de
raciocínio, tornando o argumento inválido e, portanto, nada convincente.
No nosso discurso quotidiano, formulamos constantemente argumentos. Usamos expressões que
indicam a presença de premissas – porque, pois, dado que, sabendo que – e de conclusões – logo,
então, por conseguinte. São estes indicadores que nos permitem descobrir ideias, ou teses, a propósito de
diferentes assuntos e problemas.
1.4. Proposições
É nas frases que usamos no nosso discurso que encontramos expressas as proposições que
compõem os argumentos. Contudo, nem todas as frases expressam proposições. As frases associadas a
atos de interrogar, ordenar, exclamar, pedir, chamar, prometer não se enquadram na categoria das frases
que expressam proposições, pois não podem ser classificadas como verdadeiras ou falsas. Só as frases
declarativas é que expressam proposições, dado que podem ser classificadas como verdadeiras ou
falsas.
A proposição é o pensamento ou conteúdo, verdadeiro ou falso, expresso por uma frase
declarativa. A mesma proposição pode ser expressa por diferentes frases declarativas.
A proposição relaciona pelo menos dois termos. O termo é geralmente entendido como a expressão
verbal do conceito. O conceito constitui o elemento básico do pensamento e é a representação
intelectual de determinada realidade.
A operação mental que permite estabelecer uma relação entre conceitos e que está
subjacente à formação de proposições é o juízo.
No que se refere aos argumentos não dedutivos, que serão referidos mais à frente, a sua
validade depende de aspetos que vão para lá da forma lógica do argumento.
1.6. Falácias
Entende-se por falácia todo o argumento inválido, embora aparente ser válido. As falácias
formais são aquelas que decorrem apenas da forma lógica do argumento, sendo por isso cometidas ao
nível dos argumentos dedutivos. As falácias informais são cometidas ao nível dos argumentos não
dedutivos, resultando de aspetos que vão para lá da forma lógica do argumento. Veremos diferentes
exemplos destes tipos de falácias mais à frente.
Entre as proposições categóricas podem ser estabelecidas diferentes relações lógicas. Essas
relações podem sintetizar-se na seguinte representação, que ficou conhecida como Quadrado da
Oposição.
CONTRÁRIAS
A E
I O
SUBCONTRÁRIAS
Inferir por oposição consiste em tirar de uma proposição outras proposições, alterando a
quantidade e/ou a qualidade, e em concluir imediatamente, a partir da verdade ou falsidade da
proposição inicial, a verdade ou falsidade daquelas que se obtêm.
As teses filosóficas surgem, frequentemente, sob a forma de proposições universais. Para negar
uma proposição universal não é correto apresentar a sua contrária, pois se a verdade de uma delas
implica a falsidade da outra, da falsidade de uma não podemos concluir a falsidade ou veracidade da
outra.
Assim, por exemplo, para negar a tese segundo a qual “Nenhuma guerra é justa”, não é correto
afirmar que “Todas as guerras são justas”; será necessário propor a sua contraditória: “Algumas guerras
são justas”. Da mesma maneira, a negação da proposição “Algumas guerras não são justas” será “Todas
as guerras são justas”.
Nota
No âmbito da relação de subalternidade, verificada entre as proposições de tipo A e I, por um lado, e E e O, por
outro, A implica I e E implica O, mas o contrário não se verifica. Daí a seta apresentar apenas um sentido.
2. Formas de inferência válida e principais falácias formais
Objetivos
- Explicitar em que consistem as conetivas proposicionais de conjunção, disjunção (inclusiva e
exclusiva), condicional, bicondicional e negação.
- Aplicar tabelas de verdade na validação de formas argumentativas.
- Aplicar as regras de inferência do modus ponens, do modus tollens, do silogismo hipotético, das leis de
De Morgan, da negação dupla, da contraposição e do silogismo disjuntivo para validar argumentos.
- Identificar e justificar as falácias formais da afirmação do consequente e da negação do antecedente.
Vejamos um exemplo:
Expressão canónica Dicionário Formalização
Se é falso afirmar que o mal não P: O mal existe.
existe e o bem é ilusório, então as Q: O bem é ilusório. ( P Ù Q) → R
normas morais têm sentido. R: As normas morais têm
sentido.
Vejamos um exemplo:
Argumento Dicionário Formalização
Se canto, então sou feliz. P: Canto. P→Q
Canto. Q: Sou feliz. P
Logo, sou feliz. \Q
Em vez do símbolo \, também poderemos usar o símbolo , que se designa por “martelo
semântico”. Ambos se leem “Logo”, um indicador de conclusão.
Teremos então o seguinte inspetor de circunstâncias:
Premissa 1 Premissa 2 Conclusão
P Q P → Q, P \Q
V V V V V
V F F V F
F V V F V
F F V F F
A primeira linha exprime a única circunstância em que as premissas são verdadeiras. Ora, dado
que tal circunstância também torna a conclusão verdadeira, o argumento é considerado válido.
P Q R (P Ù Q) → R, R \PÙ Q
V V V F F V V F F
V V F F F V F F F
V F V V V V V V V
V F F V V F F V V
F V V F F V V F F
F V F F F V F F F
F F V F V V V F V
F F F F V V F F V
Há três circunstâncias (1.ª, 5.ª e 7.ª) em que ambas as premissas são verdadeiras e a conclusão é
falsa. Logo, o argumento é inválido.
Modus tollens: Se canto, então sou feliz. Não sou feliz. Logo, não canto.
P→Q
Q
\P
Contraposição: Se há sol, então vou caminhar. Logo, se não vou caminhar, então não há sol.
P→Q
\Q→P
Silogismo disjuntivo (disjunção inclusiva): Penso ou sinto. Não penso. Logo, sinto.
PÚQ
P
\Q
Silogismo hipotético: Se durmo bem, então descanso. Se descanso, então tenho saúde. Logo, se
durmo bem, então tenho saúde.
P→Q
Q→R
\P→R
Leis de De Morgan:
– negação da conjunção: Não é verdade que sou injusto e cruel. Logo, não sou injusto ou não sou
cruel;
(P Ù Q)
\PÚQ
– negação da disjunção: Não é verdade que há sol ou chuva. Logo, não há sol e não há chuva.
(P Ú Q)
\PÙQ
A→B
B
\A
Apresentam-se de seguida as formas de inferência válida, com base nas variáveis de fórmula.
Formas de inferência válida
Modus ponens Modus tollens
A→B A→ B
A B
\B \A
Silogismo disjuntivo Silogismo hipotético
AÚB AÚ B A→ B
A B B→C
\B \A \A→ C
Contraposição Leis de De Morgan
A→B B→A (A Ù B) AÚ B
\B→A \A→B Ù \AÚB \ (A Ù B)
OU A→ B B → A OU (A Ù B) A Ú B
Negação dupla (A Ú B) AÙ B
A A \AÙB \ (A Ú B)
\A \A OU (A Ú B) A Ù B
OU AA
Nota: o símbolo significa, no presente contexto, que tanto
se pode inferir validamente num como noutro sentido.
P →PQ→ Q
Q P
\ P\ Q
Uma das falácias decorrentes do não cumprimento destes requisitos é a falácia da generalização
precipitada, que ocorre quando se conclui abusivamente o geral de apenas um ou poucos casos:
Exemplo
Fiz um teste de Filosofia e foi difícil.
Logo, todos os testes de Filosofia são difíceis.
Outra falácia decorrente do não cumprimento dos requisitos de validade é a falácia da amostra
não representativa, a qual consiste em concluir de um segmento da população para toda a população,
apesar de poder incluir um número significativo de casos.
Exemplo
Com base em inquéritos realizados ao conjunto dos estudantes portugueses do ensino superior,
constata-se que todos eles valorizam este tipo de ensino.
Logo, todos os portugueses valorizam o ensino superior.
(Apesar de o número de casos da amostra ser significativo, os estudantes portugueses do ensino superior
não representam a população portuguesa.)
A indução por previsão é o argumento que, baseando-se em casos passados, antevê casos não
observados, presentes ou futuros.
Exemplo
Todos os cavalos observados até hoje nasceram quadrúpedes.
Logo, o próximo cavalo a nascer também nascerá quadrúpede.
Quando estes requisitos não se cumprem, estamos perante a falácia da previsão inadequada.
Exemplo
A temperatura na Terra nunca apresentou variações significativas no passado.
Logo, ela nunca apresentará variações significativas no futuro.
(A conclusão é ilegítima porque existe informação disponível que dá conta do aquecimento global.)
B. O argumento por analogia consiste em partir de certas semelhanças ou relações entre dois
objetos ou duas realidades e em encontrar novas semelhanças ou relações. Baseia-se, assim, na
comparação que se estabelece entre as realidades, supondo semelhanças novas a partir das já
conhecidas.
Exemplo
O cantor A canta bastante bem.
O cantor B tem um timbre e uma extensão vocal semelhantes aos do cantor A.
Logo, o cantor B também canta bastante bem.
Exemplo 2
O médico A, que estudou numa Universidade de prestígio, é um profissional excelente.
O médico B estudou na mesma Universidade.
Logo, O médico B também é um profissional excelente.
(Neste caso, as semelhanças relevantes no que diz respeito à conclusão não são em número suficiente.)
Exemplo 3
As máquinas não são conscientes de si.
A mente humana é como uma máquina.
Logo, a mente humana não é consciente de si.
(Neste caso, existem diferenças relevantes entre a mente humana e as máquinas, no que diz respeito
àquilo que é afirmado na conclusão.)
C. O argumento de autoridade pode ser definido como o argumento que se apoia na opinião de
um especialista ou de uma autoridade para fazer valer a sua conclusão.
Exemplo
Galileu afirmou que todos os corpos caem com aceleração constante.
Logo, todos os corpos caem com aceleração constante.
Quando estes requisitos não são cumpridos, comete-se a falácia do apelo ilegítimo à autoridade.
Exemplo 1
Estudos indicam que comer um ovo por dia prejudica a saúde.
Logo, comer um ovo por dia prejudica a saúde.
(Será necessário referir quem foram os autores do estudo; existe controvérsia entre os especialistas
relativamente a este assunto; além disso, o argumento talvez seja mais fraco do que o argumento
contrário.)
Exemplo 2
Um membro do governo afirmou que, desde que o governo iniciou funções, a felicidade dos cidadãos
aumentou bastante.
Logo, desde que o governo iniciou funções, a felicidade dos cidadãos aumentou bastante.
(Além de não ser referido o nome da pessoa invocada, talvez também não se trate de uma autoridade
efetiva na área em questão, sendo inclusive alguém com interesses pessoais no âmbito do assunto em
causa; além disso, existe certamente controvérsia entre os especialistas relativamente a este assunto.)
A falácia do falso dilema é a falácia que consiste em reduzir as opções possíveis a apenas duas,
ignorando-se as restantes alternativas, e em extrair uma conclusão a partir dessa disjunção falsa. “Falso
dilema” é sinónimo de “falsa dicotomia”.
Exemplos de disjunções falsas
Ou votas no partido x ou será a desgraça do país.
(Outros partidos são ignorados.)
Embora seja válido em termos dedutivos, este argumento exprime um falso dilema: ignora-se a
possibilidade de todos os outros partidos poderem evitar a desgraça do país.
A falácia da falsa relação causal – conhecida também como “post hoc, ergo propter hoc”, que
significa “depois disto, logo por causa disto” – é a falácia que se comete sempre que se toma como
causa de algo aquilo que é apenas um antecedente ou uma qualquer circunstância acidental. Trata-se, por
isso, de concluir que há uma relação de causa e efeito entre dois acontecimentos que se verificam em
simultâneo ou em que um se verifica após o outro.
Exemplos
Sempre que eu entro com o pé direito no campo, a minha equipa ganha o jogo.
Logo, a causa das nossas vitórias é o facto de eu entrar com o pé direito no campo.
A falácia ad hominem é a falácia que se comete quando, em vez de se atacar ou refutar a tese de
alguém, se ataca a pessoa que a defende.
Exemplos
A tua tese de que tudo é composto de átomos está errada, porque cheiras mal da boca sempre que a
proferes.
Sartre estava errado a respeito do ser humano, porque não ia regularmente à missa.
A falácia ad populum é a falácia que se comete quando se apela à opinião da maioria para fazer
valer a verdade de uma conclusão.
Exemplos
A maioria das pessoas considera que a leitura é uma perda de tempo. Logo, a leitura é uma perda de
tempo.
A falácia do apelo à ignorância é a falácia que se comete quando uma proposição é tida como
verdadeira só porque não se provou a sua falsidade ou como falsa só porque não se provou que é
verdadeira.
Exemplos
Não existem fenómenos telepáticos, porque até agora ninguém provou que eles existem.
A alma é imortal. Isto porque ninguém provou que a alma morre com o corpo.