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FUNDAMENTOS DA

EDUCAÇÃO DE JOVENS
E EDUCAÇÃO POPULAR

autor do original
AGUINALDO MARTINS

1ª edição
SESES
rio de janeiro  2014
Conselho editorial  magda maria gomes da silva, lucia ferreira sasse, marina caprio 

Autores do original  aguinaldo martins, leticia fonseca reis ferreira de castro,


sandra maria maciel nunes

Projeto editorial  roberto paes

Coordenação de produção  gladis linhares

Projeto gráfico  paulo vitor bastos

Diagramação  allan augusto gadelha

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2015.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip)

M379f Martins, Aguinaldo


Fundamentos da educação de jovens e adultos e
educação popular/ Aguinaldo Martins ; Leticia Fonseca Reis
Ferreira de Castro ; Sandra Maria Maciel Nunes.
Rio de Janeiro : SESES, 2014.
112 p. : il.
ISBN 978-85-5548-080-5
1. Educação de jovens e adultos. 2. Educação popular. 3. Política educacional.
4. Pedagogia freiriana. I. SESES. II. Estácio.
CDD 370

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário

1. A História ad Educação Popular e da Educação de


Adultos até 1990 7
Apresentação
Objetivos
Você se lembra? 8
1.1 Educação popular e educação de adultos no período colonial e imperial
da história do Brasil 9
1.2  A educação popular e a educação de adultos a partir do século XX 14
Atividade 29
Reflexão 29
Leitura 30
Referencias 30
Conexão 31

2. A Legislação e Políticas Públicas em Educação de


Jovens e Adultos no Brasil 33

Apresentação
Objetivos
Você se lembra? 34
2.1  A Educação de Jovens e Adultos na Constituição (1988) e na
Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional 34
2.2  A Educação de Jovens e Adultos no contexto das Conferências Inter-
nacionais promovidas pela UNESCO 40
2.3  O Parecer CNE/CEB 11/2000 – Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação de Jovens e Adultos 46
Atividade 59
Reflexão 59
Leitura 60
Referencias 50
Conexão 61
3. O Pensamento Político-Pedagógico Freireano e a
Educação Popular 63

Apresentação
Objetivos
Você se lembra? 64
3.1  Trajetória intelectual de Paulo Freire: vida e obra 65
3.2  Conceitos freireanos de autonomia, conscientização e libertação 69
3.3  A EJA e a Educação Popular numa perspectiva freireana 75
Atividade 80
Reflexão 80
Leitura 81
Referencias 82
Conexão 83

4. Princípios Pedagógicos e Especificidades da EJA 85

Apresentação
Objetivos
Você se lembra? 86
4.1  As características dos alunos da EJA: mundo do trabalho e identidades
juvenis 86
4.2  Desafios da EJA 89
4.3  Currículo e Práticas Curriculares de alfabetização na
Educação de Jovens e Adultos 92
Atividade 100
Reflexão 100
Leitura 101
Referencias 101
Conexão 102
5. Formação do Educador Frente as Particularidades na EJA
103

Apresentação
Objetivos
Você se lembra? 104
5.1  Especificidades do professor da EJA 104
5.2  Diferentes ações desenvolvidas na EJA:
experiências curriculares e sugestões de atividades 109
Atividade 115
Reflexão 116
Leitura 116
Referencias 121
1
A História da
Educação Popular
e da Educação de
Adultos até 1990
Apresentação

Neste primeiro capítulo, vamos estudar a Educação Popular e a Educação


de Adultos ao longo da História da Educação brasileira. Inicialmente abordare-
mos Educação Popular e Educação de Adultos no Período Colonial e Imperial
que vai até o final do século XIX, depois abordaremos a temática a partir do
século XX até o início dos anos de 1990 que coincidem com o processo de rede-
mocratização do país.

OBJETIVOS
O objetivo deste capítulo é apresentar a História da Educação Popular e da Educação de Adultos
ao longo do tempo, buscando verificar suas permanências e mudanças ao longo da História da
Educação Brasileira.

Você se lembra?
Você já conheceu alguém que não teve a oportunidade que aprender a ler e
escrever? Ou então já conheceu alguém que aprendeu a ler e escrever apenas
quando já era adulto? Você conhece a política educacional brasileira voltada
para a Educação de Adultos? A Educação de Adultos esteve presente na História
do Brasil, desde o Período Colonial. Vamos conhecer um pouco desta História.
Sabemos que a Educação de Jovens e Adultos está garantida por Leis e Dire-
trizes. Mas como chegamos hoje a está garantia de educação para aqueles que
não puderam fazê-la enquanto crianças e jovens? Assim faz-se necessário um
histórico da Educação Popular e da Educação de Jovens e Adultos no Brasil.
Antes de iniciarmos nosso histórico acerca da Educação de Jovens e Adul-
tos, vamos diferenciar a categoria Educação Popular da categoria Educação de
Adultos. De acordo com Paiva (2003)

8• capítulo 1
Entende-se por educação popular, frequentemente, a educação oferecida a toda a
população, aberta a todas as camadas da sociedade. Para tanto ela deve ser gra-
tuita e universal. Outra concepção da educação popular seria aquela de educação
destinada às chamadas “camadas populares” da sociedade: a instrução elementar,
quando possível, e o ensino técnico profissional tradicionalmente considerado,
entre nós, como ensino “para os desvalidos”. [...] Em nosso trabalho [...] conside-
rando como educação popular a instrução elementar e como luta pela educação
popular a luta em favor da difusão do ensino primário. De inicio, a educação dos
adultos esta tratado em conjunto. Ela é parte da Educação popular, pois a difusão
da escola elementar inclui as escolas noturnas para adultos que, durante muito
tempo, foram à única forma de educação de adultos praticada no país. Mais tarde,
quando ganha autonomia e pretende-se que sua duração seja menor que aquela
oferecida a população em idade escolar, ela passa a ser tratada como alfabeti-
zação e educação de base (ou educação continuada, como querem hoje alguns).
(PAIVA, 2003, p. 56, 57)

1.1  Educação Popular e a Educação de Adultos no Período Colonial


e Imperial da História do Brasil

Podemos dizer que a educação popular e a educação de adultos começaram


de maneira bastante precária, com a vinda dos primeiros jesuítas ao Brasil em
1549, nos primórdios da colonização. Eles chegaram com Tomé de Souza, pri-
meiro governador-geral da Colônia. Nesse ano, foi criado o Governo-Geral, com
o objetivo de centralizar a administração colonial, apoiando o regime de capi-
tanias hereditárias criado em 1532 pela Coroa Portuguesa.
Segundo Ribeiro (1992) “Entre as diretrizes básicas constantes no Regimen-
to, isto é na nova política ditada então por D. João III (17-12-1548), é encontrada
uma, referente à conversão dos indígenas à fé católica pela catequese e pela ins-
trução”. Assim, a organização das escolas na Colônia estava diretamente ligada
à “política colonizadora dos portugueses” (RIBEIRO, 1992, p. 19). Coube aos
jesuítas e a outros religiosos a função de educar a todos na Colônia.
Os jesuítas passam a organizar as primeiras escolas de “ler e escre-
ver”, destinadas às crianças, escolhendo-se os filhos dos caciques para se-

9• capítulo 1
rem educados. Foram instaladas escolas de “ler e escrever” em São Vicente,
Bahia, Espírito Santo e Pernambuco. Em seguida, organizam-se as classes
de gramática e os colégios, o ensino profissional e, mais tarde, os seminários
(ARANHA, 1989).
De acordo com Paiva (2003), foi através do ensino das crianças que os je-
suítas buscaram atingir seus pais, ja que, para realizar a catequese direta dos
indígenas adultos, eram necessárias a alfabetização e a transmissão da língua
portuguesa. No entanto, o modelo econômico adotado e as atividades econômi-
cas praticadas na Colônia não exigiam uma educação voltada para a população
adulta não alfabetizada, fosse ela composta por portugueses e seus descenden-
tes ou muito menos para a população escravizada, indígena e africana.
Assim:

Esta incipiente “educação de adultos” foi, no entanto, ao lado e através da educação


das crianças decisiva “no progressivo abrandamento das resistências aborígenes e
de suave mas persistente penetração das barreiras étnicas e culturais, [...] facilitando
o êxito da colonização, bem como a sedimentação dos padrões culturais europeus e
da religião cristã no Brasil.

Com a introdução do regime escravagista, também aos negros buscava-se catequi-


sar, combatendo o culto dos deuses africanos e difundindo-se entre eles o catoli-
cismo. Entretanto, era-lhes vedado o sistema formal de ensino e sua educação se
fazia através dos sermões que os exortavam à prática da moral cristã e à fé católica.
PAIVA, 2003, p.56 e 67.

Em 1759, a Companhia de Jesus foi expulsa de Portugal e da colônia brasileira.


Nesse momento em Portugal, estavam ocorrendo as reformas do marquês de Pom-
bal que “empreendeu uma série de reformas no sentido de adaptar aquele país e
suas colônias às transformações econômicas, políticas e culturais que ocorriam
na Europa [...] ideias mais ou menos próximas do Iluminismo” (GHIRALDELLI,
2011, p.26). Segundo Aranha (1989), somente em 1772 foram tomadas as primei-
ras providências mais efetivas com relação à educação na Colônia: iniciava-se a im-
plementação do “ensino público oficial”, o Estado português passou a organizar a
educação, “nomeando professores e estabelecendo planos de estudo e inspeção”.
Implantava-se o sistema de aulas régias de disciplinas isoladas.

10 • capítulo 1
Para Paiva (2003), a expulsão dos jesuítas provocou a “regressão do sistema
de ensino educativo na Colônia”, porém afetou menos a educação popular que
a educação das elites, pois o ensino oferecido pelos jesuítas se transformou em
um sistema cada vez mais direcionado às elites coloniais.

Montado o sistema da educação popular com base no objetivo primordial da cate-


quese e recrutamento de vocações religiosas necessárias à difusão da fé e conso-
lidação do domínio português, puderam os jesuítas, uma vez lograda essas metas,
enfatizar o ensino das elites: além da escola de ler e escrever, eles mantinham na
época de sua expulsão diversos seminários e 24 colégios para a formação das elites.
Na verdade as condições econômicas, sociais e políticas da Colônia – e a forma
como elas evoluíram – não favoreciam o desenvolvimento de um sistema de educa-
ção popular, nem propiciavam grande interesse pelo problema educacional (PAIVA,
2003, p. 68).

Ainda no século XIX não havia uma política educacional sistemática e pla-
nejada. As inovações reforçavam o caráter elitista e aristocrático da educação. A
situação do ensino elementar ainda era precária. Com a Independência do Bra-
sil, seria outorgada a Constituição de 1824 que definiu em seu artigo 79, alínea
32, a “gratuidade da instrução primária para todos os cidadãos” (PAIVA, 2003,
p. 71). Em 1827, uma lei estabeleceu que “em todas as cidades, vilas e lugares
mais populosos, haveria uma escola de primeiras letras que fossem necessá-
rias” (PAIVA, 2003, p. 71-72), porém o cumprimento da referida lei foi realizado
de maneira precária. O Ato Adicional de 1834 promoveu a descentralização do
ensino elementar no Brasil. De acordo com Paiva (2003), era de competência
do Governo-Geral a educação superior destinada às elites e os governos das
províncias ficavam encarregados de promover a instrução popular. Esses gover-
nos com escassos recursos pouco fizeram para promover a instrução popular,
desenvolvida precariamente durante todo Império e grande parte do período
republicano.
Segundo Paiva (2003):

11 • capítulo 1
A descentralização do ensino primário e suas consequências po-
dem ser entendidas se temos presente que nosso sistema econômico-
-social não favorecia a educação popular; em 1823, possuíamos uma população
total de 4 milhões de habitantes, dos quais quase 1.200.000 eram escravos; em
meados do século, para 5.520.000 habitantes livres contávamos com 2.500.000
escravos; mais de 30% da população estava a priori excluída de qualquer participa-
ção de caráter educativo sistemático. [...] acerca das escolas para meninas, os 50%
representados pelas mulheres eram em grande parte marginalizados do processo
educativo escolar [...] Muito poucas frequentavam escolas: as mulheres do povo não
recebiam instrução; as da elite eram educadas em suas casas [...] Em tais condições
pode-se entender que a educação elementar tenha se expandido de forma tão irre-
gular e limitada. As elites adotaram como prática o estudo individual com preceptor
em suas próprias casas, a educação não era sentida como uma necessidade social e
econômica muito forte. (PAIVA, 2003, p.73)

No Segundo Império, observaram-se a criação de algumas escolas elemen-


tares nas províncias e certo avanço na instrução popular oferecida na Corte do
Rio de Janeiro, bem como algumas iniciativas direcionadas à educação dos
adultos, porém as informações são bastante precárias, pois o ensino elementar
já era de responsabilidade das províncias e cada uma se encarregava de organi-
zá-lo sem ter que prestar contas a qualquer órgão central do Império. A educa-
ção popular desenvolvia-se de maneira desigual no país, e a região Centro-Sul
tinha condições mais favoráveis para o desenvolvimento do ensino, sobretudo
pela maior concentração de riqueza, pelo surto de industrialização e pela imi-
gração europeia que exigia maior instrução popular. Assim, houve um aumento
do número de escolas elementares no Brasil. (PAIVA, 2003)
Em 1851, ocorreu a reforma de Couto Ferraz que abrangia o ensino primá-
rio e secundário no município da Corte, no Rio de Janeiro. A reforma foi apro-
vada pela Assembleia Geral Legislativa e só foi regulamentada três anos depois,
gerando o Regulamento de 1854. Esse Regulamento estabelecia que as escolas
públicas de ensino primário deveriam ser divididas em escolas de primeiro e de
segundo grau, com acesso vedado aos escravos e toda educação deveria ser fi-

12 • capítulo 1
nanciada pelos cofres públicos, o poder público deveria fornecer livros e outros
materiais e deveriam ser abertas classes para o ensino de adultos. (PAIVA, 2003)
Assim, a partir do Regulamento de 1854 foram criadas escolas noturnas
para adultos nas províncias e no município da Corte. Em 1860, no Maranhão
foi aberta a primeira escola noturna. Entre os anos de 1870 e 1880, quase todas
as províncias do Império criaram classe noturnas. Em 1876, o Império tinha
117 escolas noturnas. Entretanto, cada vez menos frequentadas muitas esco-
las foram extintas, sendo mantidas apenas as da capital, as escolas criadas nas
casas de detenção e as escolas mantidas por sociedade privadas. (PAIVA, 2003)
Em 1878, foi apresentada no município da Corte a reforma Leôncio de Carvalho e
transformada em Lei por decreto em abril de 1879. Esta lei insistia na obrigatorieda-
de do ensino, tornando obrigatório o ensino entre 7 e 14 anos e eliminava a proibição
aos escravos. Também mencionava a criação de escolas noturnas para a educação
de adultos e cursos para o ensino primário de adultos analfabetos. A partir da refor-
ma eleitoral (Lei Saraiva), nos anos 1880 as escolas noturnas voltaram a ser estimu-
ladas. Nesse período começava-se a discutir a ideia de que a educação levava ao pro-
gresso “[...] além disso, a eleição direta com restrição ao voto do analfabeto provocara
a valorização daqueles que dominavam as técnicas da leitura e da escrita” (PAIVA,
2003, p. 196). Esta Lei ampliava a consulta eleitoral, mas tratou de encontrar outro
fator de seleção, além da renda: a instrução era “capaz de excluir os escravos liber-
tos ou os elementos das classes trabalhadoras que lograssem ultrapassar a barreira
da renda. “[...] A ampliação beneficiava apenas os setores médios emergentes [...]”
(PAIVA, 2003, p. 93).
Assim, de acordo com Paiva (2003), podemos dizer que a educação brasilei-
ra, em especial a educação popular, anterior às primeiras décadas do século XX,
não apresenta uniformidade e o traço comum foi a precariedade quantitativa e
qualitativa do sistema de ensino elementar e a realização de poucos esforços
para sua expansão. Da mesma forma, com raras exceções, a educação de adul-
tos não se distingue de maneira especial da problemática mais geral da edu-
cação popular. A educação de adultos será vista de forma mais independente
somente após a experiência do Distrito Federal (1933-1935) e das discussões re-
alizadas depois da divulgação dos resultados do Censo de 1940, que indicava a
existência de 55% de analfabetos com mais de 18 anos na população brasileira.

13 • capítulo 1
1.2  A Educação Popular e a Educação de Adultos a partir do século XX

Com a proclamação da República em 15 de novembro de 1889 e a ela-


boração da primeira constituição republicana, a discussão da educa-
ção popular estará presente, porém o que veremos nos primeiros anos da
República será a continuidade da política imperial destinada à educação, isto
é, a manutenção da descentralização do ensino elementar. A constituição repu-
blicana eliminou o voto censitário, isto é, a exclusão pela renda, mas manteve a
seleção pela instrução e deu origem:

[...] ao preceito contra o analfabeto, identificado como indivíduo incapaz [...] Até o
final do Império [...] “o não saber ler não afetava o bom senso, a dignidade, o conhe-
cimento, a perspicácia, a inteligência do individuo [...] Somente quando a instrução
se converte em instrumento de identificação das classes dominantes e que se torna
preciso justificar a medida da seleção é que o analfabetismo passa a ser associado à
incompetência (PAIVA, 2003, p. 93).

Nas primeiras décadas do século XX, apesar da orientação descentraliza-


dora, vemos surgir os primeiros trabalhos em torno da temática da educação
nacional. Também vamos verificar algumas iniciativas concretas direcionadas
a educação popular. A exemplo disso, temos a Lei 1617 de 30 de dezembro de
1908 que autorizava o governo federal a ajudar “com um quarto dessas os esta-
dos que já despendessem 10% de suas receitas com o ensino primário” (PAIVA,
2003, p. 97).
A partir dos anos de 1920, iniciou-se uma intensa campanha contra o anal-
fabetismo que está relacionada com as mudanças nos setores econômico, so-
cial e político do Brasil, isto é, ao “fortalecimento do grupo industrial-urbano,
à ampliação dos setores médios e do proletariado urbano” (PAIVA, 2003, p.99).
Ligada às campanhas contra o analfabetismo, temos também a pressão de
políticos em favor da ajuda do governo federal aos estados, para possibilitar a
difusão do ensino elementar. Em 1923, fundou-se a Rádio Sociedade do Rio de
Janeiro, “exclusivamente científico, técnico e artístico e de pura educação po-
pular” (PAIVA, 2003, p. 103). Roquete Pinto, seu fundador, via na rádio educati-
va um meio possível para resolver o problema da educação no Brasil.

14 • capítulo 1
Sabemos que o sistema de ensino popular se mostrava no início do século
XX profundamente insatisfatório. Nem mesmo os estados mais ricos tinham
condições de diminuir o analfabetismo. As mobilizações não promoveram re-
sultados satisfatórios e a educação popular na Primeira República mantinha os
mesmos níveis do Período Imperial.
Com relação à educação de adultos, vale destacar a experiência do Distrito
Federal em 1928, onde reorganizaram-se os cursos elementares noturnos que
passaram a ser chamados de Cursos Populares Noturnos. Esses cursos deve-
riam ministrar o ensino primário elementar no período de dois anos para os
adultos analfabetos, o ensino técnico elementar e o ensino de cultura geral.
Esta reforma não foi totalmente posta em prática em virtude da Revolução de
1930, mas gerou um aumento do número de matrículas. Em 1932, Anísio Tei-
xeira terminou a implementação desta reforma, introduzindo algumas modifi-
cações. (PAIVA, 2003)
Após a Revolução de 1930, intensificaram-se as “reivindicações em favor da
democratização do ensino e da responsabilidade da União pela educação em
todos os níveis através de uma política nacional” (PAIVA, 2003, p.127). Segun-
do a mesma autora ocorreram Conferências Nacionais de Educação, nais quais
foram tratados temas importantes para a educação nacional. Veremos algumas
iniciativas relacionadas à qualificação do magistério que era composto em sua
maioria por professores leigos. Estados, municípios e entidades privadas pro-
moviam cursos de formação e aperfeiçoamento para seus professores. Nesse pe-
ríodo, deu-se continuidade à rádio educativa, em favor da educação popular. Em
1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde e, no ano seguinte, o Conselho
Nacional de Educação. Essas medidas anunciavam o propósito de intervenção
da União na educação.
Em 1932, Fernando de Azevedo e outros educadores assinaram o Manifesto
de 1932, reivindicando um plano unitário de ensino, argumentando que, até
então, o ensino no Brasil era fragmentado, desarticulado e que era necessário
um plano nacional de educação.
Em 1934, a Constituição em seu artigo 150 determinava que a União tinha a
competência para fixar o plano nacional de educação, coordenar e fiscalizar sua
execução em todo o país, além de “exercer ação supletiva, onde se faça necessário
por deficiência de iniciativa ou de recursos” (PAIVA, 2003, p.134). A educação pas-
sou a ser um direito de todos e o ensino primário deveria ser integral, gratuito, de
frequência obrigatória e extensivo aos adultos. Determinou-se que União e mu-

15 • capítulo 1
nicípios deveriam investir 10% na educação e estados e Distrito Federal deveriam
investir 20%. Criaram-se também os fundos especiais. Conforme Paiva (2003),
desde o Ato Adicional, pela primeira vez, uma política nacional de educação tor-
nava-se Lei.
A educação popular, através dos sistemas elementares de ensino, cresceu
na maioria dos estados brasileiros, mesmo sem o auxílio da União. Segundo
Paiva (2003), eram mais de 30 mil escolas em todos os estados do país e cerca de
2.500.000 alunos matriculados; no final do Estado Novo em 1945, eram 40.000
escolas e cerca de 3.500.000 alunos matriculados. A difusão do ensino primário
foi maior do que nos períodos anteriores, mas a aplicação de recursos continu-
ava desigual e a qualidade de ensino era variável de estado para estado, sendo
na maioria das vezes bastante precária.
A partir de 1937, com o golpe e a implantação do Estado Novo, Getúlio Var-
gas pretendeu alfabetizar o “maior número possível, mas também (...) difundir
princípios uniformes de disciplina cívica e moral” (PAIVA, 2003, p.155). Em 1939,
Getúlio Vargas também afirmou que era “indispensável dar a máxima atenção à
campanha de alfabetização do povo, não somente na infância, como em todas as
idades (...) levar a todas as populações do Brasil o culto à Pátria (...)” (PAIVA, 2003,
p.146). Assim o governo deixava claro o objetivo político da difusão do ensino: a
educação como veículo ideológico do novo regime, o Estado Novo.
No Estado Novo, a política nacional de educação – centralização das infor-
mações e das orientações, difusão do ensino elementar – se fez sentir desde o
início. Em 1938, foi criada a Comissão Nacional do Ensino Primário que tinha
como objetivo propor uma política direcionada ao ensino primário, e um plano
para combater o analfabetismo. No mesmo ano, foi criado o Instituto Nacional
de Estudos Pedagógicos (INEP), que tinha como objetivo realizar estudos e cen-
tralizar as informações relacionadas à educação. (PAIVA, 2003)
Um dos primeiros estudos realizados pelo INEP demonstrou a precariedade
do ensino de primeiro grau no país. Em 1941, foi convocada a I Conferência Na-
cional de Educação, que pretendia discutir os problemas da educação escolar,
dentre os temas tratados a difusão e elevação da qualidade de ensino primário,
normal e do ensino profissional. A partir das discussões da I Conferência, o go-
verno federal instituiu o Fundo Nacional do Ensino Primário (FNEP) em 1942,
destinado à ampliação e melhoria do ensino primário em todo o país. Em 1943,
o governo federal, pelo decreto nº 5293, estabeleceu o Convênio Nacional do
Ensino Primário, que propôs a cooperação financeira da União com os Estados,

16 • capítulo 1
mas que só foi regulamentado em agosto de 1945, quando se deu a efetivação
do FNEP. Assim ficava assegurada – em longo prazo – a universalização do ensi-
no primário para a população em idade escolar. (PAIVA, 2003)
A educação de adultos desde os anos de 1920 passou a ter uma importância
maior, embora ainda fosse discutida dentro da problemática do ensino elemen-
tar. No início do governo de Getúlio Vargas, teremos a primeira manifestação em
direção da separação da educação dos adultos da educação elementar comum.
Em 1931, o Convênio Estatístico instituiu a categoria ensino supletivo. A experi-
ência do Distrito Federal também chamou a atenção para a educação de adultos.
Segundo Ferraro (2002), o Censo de 1940 apresentou altos índices de analfabetis-
mo: 61,2 % (população de 5 anos ou mais); 56,7 % (população de 10 anos ou mais)
e 55,9% (população de 15 anos ou mais) e mais uma vez a problemática do analfa-
betismo concentrava as atenções. Assim, o tema passou a ter maior relevância e
destacar-se como uma temática distinta daquela relacionada à difusão do ensino
elementar das crianças em idade escolar. Segundo Paiva (2003) a:

[...] importância assumida pelo problema podia ser observada principalmente a partir
dos primeiros anos da década dos 40 quando, segundo afirma Paschoal Lemme,
discutia-se muito se seria necessário dar ênfase especial à programação destinada
aos adultos ou se o problema do baixo nível educacional da nossa população deveria
ser resolvido a longo prazo, enfatizando-se a difusão do ensino elementar comum
(PAIVA, 2003, p. 144).

Paiva (2003) diz que em 1945, quando da efetivação do FNEP, destinaram-se


25% para a educação de adultos, “à educação primária de adolescentes e adul-
tos analfabetos”. A partir desta determinação vão se originar as campanhas na-
cionais direcionadas à educação de adultos.
A educação de adultos passou a ter autonomia em relação à Educação po-
pular e dispunha de recursos próprios para o seu desenvolvimento. Ela será
objeto de discussões específicas separadas da temática da difusão do ensino
elementar para a população em idade escolar. O auxílio da União aos estados
da federação também vai possibilitar a universalização do ensino primário para
a população adulta. A educação de adultos passou a ter autonomia e ganhou
importância no cenário nacional. (PAIVA, 2003)

17 • capítulo 1
Assim, a autonomia da discussão sobre a temática da educação de adultos
levou às primeiras iniciativas oficiais em âmbito nacional. O FNEP reconheceu
a necessidade da realização de um programa amplo de educação voltado para
adolescentes e adultos. Desta forma, foram lançadas campanhas nacionais di-
recionadas à educação de adolescentes e adultos. Em 1947, foi aprovado o plano
para a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA). A Campanha
nasceu da regulamentação do FNEP, acenando para a possibilidade de “prepa-
rar mão de obra alfabetizada nas cidades, de penetrar no campo e de integrar
os imigrantes e seus descendentes [...] instrumento para melhorar a situação do
Brasil nas estatísticas mundiais de analfabetismo” (PAIVA, 2003, p.206). A CEAA
se orientou a partir das ideias de funcionamento da democracia liberal e da am-
pliação das bases eleitorais. A Campanha “parece ter contribuído para o enfra-
quecimento de algumas oligarquias tradicionais [...] novos eleitores escaparam
ao controle dos “currais eleitorais” [...] possibilitando a desobediência eleitoral”
(PAIVA, 2003, p. 211). A princípio, a CEAA trabalhou com a premissa do que o
analfabeto era um ser marginal e incapaz, porém, com o decorrer da Campanha,
foram sendo incorporadas novas ideias que se referem à capacidade de aprendi-
zagem do adulto analfabeto.
O funcionamento da CEAA se deu a partir do aproveitamento do sis-
tema escolar que já existia, devendo ser ampliada a rede de ensino suple-
tivo e criadas classes de alfabetização que seriam acompanhadas por vo-
luntários. Deveriam ser organizados “Centros de Cultura Popular” em
bibliotecas municipais, assim predominando o aspecto quantitativo e
“extensivo” da Campanha, que deveria alfabetizar um grande número de
adolescentes e adultos analfabetos. Também deveriam ser criados “cur-
sos de continuação” buscando a continuidade dos estudos, o que se cha-
mou de “ação em profundidade”, porém esse aspecto não chegou a ser
concretizado senão de forma bastante restrita e a CEAA, de fato, se caracterizou-
-se por seu aspecto quantitativo e extensivo. (PAIVA, 2003)
De acordo com Paiva (2003) a CEAA desenvolveu suas atividades a partir de
um plano de ensino supletivo para adolescentes e adultos que deveria ser refor-
mulado anualmente. Previam-se para o ano inicial a abertura de 10.00 classes e
matrículas de meio milhão de alunos. Era de competência da União: o planeja-
mento geral; a orientação técnica; o controle geral dos serviços; a prestação de
auxílio financeiro e o fornecimento de material didático. Era de competências
das unidades da federação: a instalação das classes; recrutamento do pessoal e

18 • capítulo 1
a administração e fiscalização dos serviços. Os estados deveriam criar um setor
para organizar a educação de adolescentes e Adultos e, nos municípios, os tra-
balhos deveriam ser apoiados por Comissões Municipais de Educação de Adul-
tos. As classes deveriam preferencialmente ser formadas por alunos entre 15 e
25 anos. Aos professores era oferecida uma gratificação; esta estratégia visava à
participação da comunidade de maneira voluntária no processo de alfabetiza-
ção de adolescentes e adultos, sendo vista como uma tarefa cívica.
Durante os primeiros anos de funcionamento, a CEAA atingiu grande nú-
mero de adolescentes e adultos analfabetos. Segundo Paiva (2003):

[...] o número de classes subiu de 10.416 em 1947 até 17.000 em 1951/53; a ma-
trícula geral alcançou 659.606 em 1947, subindo a 850.685 em 1953. As tiragens
de material de leitura, produzido e editado pelo próprio DNE (Departamento Nacional
de Educação), atingiram 1.695.000 exemplares em 1947, totalizando 5.438.500
entre 1947 e 1950 (PAIVA, 2003, p. 219).

Em 1949, os resultados da CEAA foram apresentados na III Conferência Ge-


ral da Unesco que ocorreu em Beirute. Após a Conferência foi realizado no Bra-
sil um Seminário Interamericano, com o patrocínio da Unesco e OEA (Organi-
zação dos Estados Americanos) e com a participação de educadores de diversos
países da América. O objetivo foi a troca de experiências entre os participantes e
também, através da análise crítica da experiência brasileira, buscar uma orien-
tação, um caminho para solucionar o problema do analfabetismo na América
Latina. Além das discussões se voltarem para a educação de adultos, também
foi debatido o tema da educação popular e da falta de escolas primárias que
seriam responsáveis pelo alto índice de analfabetismo na América. Muitos de-
batedores tinham consciência de que as campanhas de alfabetização em massa
não iriam resolver de fato o problema do analfabetismo e que os estados deve-
riam criar um sistema de educação de adultos e dar maior atenção ao ensino
primário. O impacto desse seminário no Brasil foi a indicação “da criação de
uma Missão Rural de Educação de Adultos – lançada experimentalmente em
Itaperuna – e que dará origem à Campanha Nacional de Educação Rural” (PAI-
VA, 2003, p. 224-225).
Em 1957, segundo Paiva (2003), foi criado o Sistema Rádio Educativo Nacio-

19 • capítulo 1
nal (SIRENA), que fazia parte da CEAA e tinha como objetivo fomentar a criação
do Sistema Rádio Educativo regionalmente. As atividades da CEAA mantive-
ram-se em ascensão e expansão até o início da década de 1950, entretanto a par-
tir de 1954 iniciou-se a fase de declínio da Campanha e, em 1963, ela foi extinta.
As críticas vão na direção da escassez dos recursos devido aos baixos resulta-
dos em relação à sua principal atividade que era alfabetizar o maior número de
adolescentes e adultos. Além disso, o trabalho voluntariado dos professores
praticamente deixou de existir. A gratificação que era oferecida aos professores
era muito baixa e poucos aceitavam o trabalho ou então eram recrutados do-
centes despreparados. Outro problema enfrentado pela campanha foi a evasão
escolar. A falta de verbas também dificultava o funcionamento das classes de
alfabetização, por exemplo, na aquisição de materiais escolares e na falta de
pessoal qualificado para utilizar os aparelhos de projeção fixa e de filmes. O ma-
terial didático também foi alvo de críticas, sendo considerado pouco adequado
aos adolescentes e adultos e não contemplava a diversidade regional brasileira.
Outro aspecto criticado da CEAA foi a desorganização dos estados e municípios
em implementar o plano da Campanha. Nem todos os estados criaram seto-
res que organizavam a campanha de alfabetização e as informações fornecidas
nem sempre correspondiam à realidade, além da improbidade na aplicação
dos recursos destinados à Campanha. Além das críticas mencionadas sobre a
CEAA, generalizou-se a ideia de que a campanha de alfabetização fora criada
para “preparar eleitores”.
De acordo com Paiva (2003):

As atividades da Campanha, com toda sua precariedade, formando grandes con-


tingentes de semianalfabetos, contribuíram – entretanto – juntamente com a maior
difusão do ensino primário para a diminuição dos índices de analfabetismo: eles ca-
íram de 55% em 1940 para 49,31% em 1950 e para 39,48% em 1960, apesar do
elevado crescimento da população (PAIVA, 2003, p. 222).

Em 1952, foi criada a Campanha Nacional de Educação Rural (CNER), como


resultado das discussões realizadas no Seminário Interamericano e sua criação
foi muito importante para o ensino rural. Segundo Paiva (2003), a CNER pre-
tendia:

20 • capítulo 1
[...] contribuir para acelerar o processo evolutivo do homem rural nele despertando o
espírito comunitário, a ideia do valor humano e o sentido da suficiência e responsa-
bilidade para que não se acentuassem as diferenças entre a cidade e o campo em
detrimento do meio rural onde tenderiam a enraizar-se a estagnação das técnicas do
trabalho, a disseminação das endemias, a consolidação do analfabetismo, a subali-
mentação e o incentivo às superstições. Por isso missões educativas penetravam no
interior para incentivar a elevação dos padrões de vida e a solução dos problemas
coletivos através da organização comunitária (PAIVA , 2003, p. 225)

As atividades da CNER tinham como ponto de apoio as Missões Rurais de


Educação, que utilizavam o método da “organização social das comunidades” e
os Centros de Treinamento. A CNER chegou a manter 18 Missões em funciona-
mento em muitos estados do Brasil, principalmente no Nordeste. A Campanha
funcionou até 1963, quando os resultados demonstraram que a “aplicação da
metodologia de desenvolvimento e organização social de comunidades não era
suficiente para provocar o desenvolvimento, que esse dependia de outros fato-
res que não o educativo” (PAIVA, 2003, p.230).
Em 1958, foi convocado o II Congresso Nacional de Educação de Adultos. A
partir do declínio da CEAA, conforme mencionando anteriormente, foi necessá-
ria uma revisão sobre os métodos utilizados para a educação de adultos. O Con-
gresso, realizado entre 9 e 16 de julho de 1958, contou com a participação de enti-
dades públicas e privadas e recebeu o apoio do Ministério da Educação e Cultura.
O “objetivo seria o estudo do problema da educação dos adultos em seus múlti-
plos aspectos, visando seu aperfeiçoamento” (PAIVA, 2003, p. 235). No Seminá-
rio Regional Preparatório em Pernambuco, Paulo Freire apresentou o tema “A
educação de adultos e as populações marginais: o problema dos mocambos”, no
qual o autor chamou a atenção para as causas sociais do analfabetismo dizendo
sua eliminação se daria com o desenvolvimento da sociedade, desta forma per-
cebe-se a configuração de uma nova perspectiva educacional. Para Paiva (2003),
foi o início da transformação do pensamento pedagógico brasileiro, com novas
ideias e novos métodos para a educação de adultos.
Ainda em 1958, foi criada a Campanha Nacional de Erradicação do
Analfabetismo (CNEA), destinada à educação popular em geral e que de-

21 • capítulo 1
fendia a ideia de que o desenvolvimento educacional é uma pré-condição
para o desenvolvimento econômico. A Campanha preocupou-se com “o
problema da ampliação da rede escolar primária e da extensão da esco-
laridade [...] aos adolescentes e adultos [...] contornar o problema da eva-
são [...] programação alfabetizadora através do rádio [...]” (PAIVA, 2003,
p. 246). A CNEA também foi extinta em 1963 juntamente com as demais campa-
nhas do Ministério da Educação.
Em 1961, foi aprovada a Lei 4024 que estabelecia a LDB, que já havia sido de-
batida em 1948. A partir da nova Lei, elaborou-se o Plano Nacional de Educação
e as Campanhas Nacionais de Alfabetização serão extintas nos anos seguintes.
No governo de Jânio Quadros, a educação passou a ter uma ênfase especial.
Para a educação de adultos foram criados o Movimento de Educação de Base
(MEB) e a Mobilização Nacional Contra o Analfabetismo (MNCA).
O MEB foi criado através do Decreto 50.370 de 21 de março de 1961, deter-
minando “que o governo federal forneceria recursos para a realização do Movi-
mento de Educação de Base por intermédio das emissoras católicas, através de
convênio com o MEC [...]” (PAIVA, 2003, p. 251). No funcionamento das escolas
radiofônicas estavam presentes os monitores e colaboradores voluntários do mo-
vimento. A partir de 1962, o MEB começou a se caracterizar como um movimento
de cultura popular. As novas ideias sociais cristãs que se difundiam definiam o
MEB como um “movimento engajado com o povo nesse trabalho de mudança
social [...] aceitando a premissa de que a luta de classe existe no Brasil, como exis-
te em toda sociedade onde os desequilíbrios sociais causam conflitos entre os
interesses dos diversos grupos” (PAIVA, 2003, p. 269). Assim o trabalho educativo
deveria preparar seus alunos para a conscientização e instrumentalizar as comu-
nidades rurais. Em 1963, ano de maior amplitude do Movimento, foram atingi-
dos 14 estados, existiam 59 sistemas e foram 111.066 alunos concluintes. O MEB
não foi extinto em 1964, em função do golpe militar, pois havia um convênio en-
tre a CNBB e a União para o período de 1961 a 1965, entretanto suas atividades
diminuíram significativamente e sua orientação sofreu várias alterações.
Com o decreto 51.222 de 22 de agosto de 1961, foi criada a Mobilização Na-
cional Contra o Analfabetismo (MNCA), mas não chegou a ser implantada em
função da renúncia do presidente da República Jânio Quadros.
Segundo Paiva (2003), os movimentos ligados à promoção da cultura po-
pular que surgiram na primeira metade da década de 1960 estavam preocupa-
dos com a possibilidade de promover a participação política da sociedade e da

22 • capítulo 1
tomada de consciência sobre os problemas da realidade brasileira. Vejamos
quantos movimentos surgiram nesse momento:

No início dos anos de 1960, surgiram alguns dos movimentos mais expressivos de
educação e cultura popular do Brasil: Movimento de Cultura Popular – MCP (1960),
inicialmente implantado no Recife, depois estendido para outras cidades do estado
de Pernambuco; Campanha ‘‘De Pé no Chão também se Aprende a Ler’’, de Natal
(1961); Movimento de Educação de Base – MEB (1961), ligado à Conferência Na-
cional dos Bispos do Brasil (1961); Centro Popular de Cultura da UNE – CPC/UNE
(1961), que se desdobrou em vários CPCs estaduais; e Campanha de Educação
Popular da Paraíba – CEPLAR (1961) (BRASIL, 2009, p.15).

Dentre os movimentos citados pela autora, vamos destacar ao menos três


com estas características: os Centros Populares de Cultura (CPC), os Movimen-
tos de Cultura Popular (MCP) e o Movimento de Educação de Base (MEB) men-
cionado anteriormente.
Os Centros Populares de Cultura (CPC) funcionaram de 1962 ao início de
1964. Os CPC tiveram como ponto de partida o CPC da UNE, fundado em 1962,
e depois outros Centros foram criados em todo o país. Cada Centro era autôno-
mo e sua atividade principal era o teatro; era uma forma de “teatro jornal” que
utilizava a linguagem popular. Outras atividades eram desenvolvidas como:
cursos de teatro, cinema, artes plásticas, exposições, filosofia e programas de
alfabetização. O objetivo geral dos Centros foi o de “contribuir para o processo
de transformação da realidade brasileira, principalmente, através de uma arte
didática de conteúdo político.” (PAIVA, 2003, p. 261). O artista consciente deve-
ria produzir uma arte popular revolucionária.
Paralelamente à organização do CPC, organizaram-se os Movimentos de
Cultura Popular (MCP), que se originaram do MCP de Recife que foi criado em
1960. Esse movimento se originou da iniciativa de estudantes universitários,
artistas e intelectuais do Recife, Pernambuco e estavam aliados com a prefeitu-
ra da capital no combate ao analfabetismo. Segundo a autora Paiva (2003) esse
movimento buscou :

23 • capítulo 1
[...] também aproximar a juventude e a intelectualidade do povo, sob a influência de
ideias socialistas e cristãs. O movimento pretendia encontrar uma fórmula brasileira
para a prática educativa ligada às artes e à cultura do povo e suas atividades esta-
vam voltadas, fundamentalmente, para a conscientização das massas através da al-
fabetização e da educação de base. [...] o movimento passou a atuar também através
do teatro, da organização de núcleos de cultura popular, do incentivo à divulgação
das artes plásticas e artesanato, do canto, da dança e da música popular, da constru-
ção de praças, centros e parques de cultura, da organização de cine e teleclubes e
da galeria de arte, além das atividades educativas sistemáticas destinadas à alfabeti-
zação e educação de base, com as quais se combinavam. Pretendia-se compreender
a cultura popular [...] valorizando a produção cultural de massa [...] O MCP organizava
suas escolas como Associações de Cultura Popular que serviam de ponto de partida
para a participação de todos nas atividades culturais espontâneas da comunidade e
naquelas promovidas pelo próprio movimento (PAIVA, 2003, p. 264-265).

O MCP de Pernambuco, entre setembro de 1961 e fevereiro de 1963, fez uma


experiência de educação pelo rádio, transmitindo programas de alfabetização
e de educação de base. Também organizaram Parques de Cultura, Praças de
Cultura e Núcleos de Cultura. O MCP de Pernambuco “representou uma etapa
importante no desenvolvimento das ideias que estarão presentes na teorização
e na metodologia elaborada por Paulo Freire, colaborador do movimento nos
seus dois primeiros anos de funcionamento” (PAIVA, 2003, p.268).
Em setembro de 1963, no Recife foi realizado o I Encontro Nacional de Al-
fabetização e Cultura Popular. Segundo Paiva (2003), o movimento foi impor-
tante para saber a existência dos Movimentos Populares no país e pela troca
de experiências entre eles. Foi aceito por todos os participantes do Encontro
que era necessário uma coordenação nacional dos movimentos populares. Foi
criada então, em janeiro de 1964, a Comissão Nacional da Cultura Popular que
coincidiu com a apresentação do Plano Nacional de Educação. O PNE refletia a
“recentralização das atividades de educação dos adultos no MEC, utilizando-se
do método Paulo Freire e com preocupações com a promoção da cultura popu-
lar” (PAIVA, 2003, p. 278).
E importante destacar que existia nesse momento, como já foi mencionado
anteriormente, uma busca por novas metodologias para a educação de adultos e

24 • capítulo 1
estas novas ideias pedagógicas estavam preocupadas também com a promoção
da cultura popular. Segundo Paiva (2003), as maiores contribuições foram dadas
pelos grupos cristãos que influenciaram o Centro de Cultura Popular (CPC) de
Pernambuco e também foram responsáveis pelo aperfeiçoamento da metodolo-
gia utilizada pelo Movimento de Educação de Base (MEB). Com explicitado an-
teriormente, pretendia-se a “promoção do homem, sua conscientização e emer-
gência na vida política brasileira através de uma ação pedagógica não diretiva.”
(PAIVA, 2003, p. 279). Assim o pensamento do educador pernambucano, Paulo
Freire, por sua ampla difusão e pela publicação Educação como prática da liber-
dade, exerceu grande influência sobre os profissionais da educação.
De acordo com Paiva (2003), o pensamento de Paulo Freire partia de uma
visão cristã e considerava que a sociedade brasileira estava passando de uma
sociedade “fechada” para uma sociedade “aberta” e o povo emergia nesse pro-
cesso, inserindo-se criticamente e passando a ser “sujeito” da história. A educa-
ção nesse processo deveria ser uma educação reflexiva e corajosa e seu método
deveria permitir que o educar ajuda o homem “a fazer-se agente de sua própria
recuperação através de uma postura conscientemente crítica diante de seus
problemas” (PAIVA, 2003, p.280). A alfabetização deveria partir de situações
concretas e o diálogo seria o único caminho possível dentro de uma perspectiva
de “processo de alfabetização pela conscientização”.
Assim a metodologia se dava a partir do:

[...] levantamento do universo vocabular dos grupos com os quais a equipe pretendia
trabalhar. Em seguida eram escolhidas as palavras no universo vocabular pesquisa-
do, devendo ser selecionadas pela sua riqueza fonêmica, pelas dificuldades fonéti-
cas de língua e pelo engajamento da palavra numa dada realidade social, cultural ou
política. Tais palavras eram relacionadas a situações existenciais típicas do grupo,
que serviam como ponto de partida da discussão à qual se seguia a decomposição
das famílias fonêmicas correspondentes aos vocábulos geradores. Para esse traba-
lho era necessário uma adequada preparação dos coordenadores e a confecção de
material didático através de slides e cartazes (PAIVA, 2003, p. 281).

Após a divulgação dos resultados do método, surgiram diversos grupos inte-


ressados em sua aplicação, dentre eles podemos citar: estudantes paulistas que

25 • capítulo 1
aplicariam o método na cidade de Osasco; a Fundação Campanha de Educação
Popular (Ceplar) da Paraíba; o governo pernambucano que pretendia aplicá-lo
no estado. A primeira grande experiência do método, de forma mais extensiva,
ocorreu no Rio Grande do Norte, em Angicos. O método se espalhava pelo país
e proporcionava a troca de experiência entre os participantes. Em face do êxito
do método, em 1963, iniciou-se um projeto-piloto que seria implantado na ca-
pital da República, utilizando os quadros normais do MEC. (PAIVA, 2003)
Ainda em 1963, organizou-se uma Comissão Nacional de Alfabetização em
Brasília para elaboração do Plano Nacional de Alfabetização (PNA). Esse Plano
foi criado em 21 de janeiro de 1964 pelo Decreto nº 53.465, entretanto já esta-
vam em funcionamento dois planos-pilotos (região Sul e Nordeste) para alfa-
betização de adultos. O PNA utilizaria o método Paulo Freire para alfabetizar
cinco milhões de brasileiros em um prazo de até dois anos e a execução do pro-
grama ficaria sob a responsabilidade do MEC. Porém em 14 de abril de 1964, o
PNA foi extinto pelo Decreto nº 53.886, quando se deu o Golpe Militar. Segundo
Paiva (2003), o desenvolvimento do PNA pelo governo federal, através do MEC,
representava a incorporação das práticas e orientações indicadas pelos diferen-
tes grupos dos movimentos populares que, desde 1962, estavam ligados à edu-
cação de adultos. (PAIVA, 2003)
Segundo Paiva (2003) com o Golpe Militar de 1964, a maior parte dos pro-
gramas de educação de adultos desapareceu ou sofreu a repressão do gover-
no militar. Os programas de alfabetização promovidos pelos movimentos de
educação popular apresentados anteriormente representavam uma ameaça ao
novo governo ditatorial, isto é, um perigo à estabilidade do regime político que
se impunha naquele momento. Entre os inúmeros movimentos de educação
de adultos, apenas sobrevive o MEB, em função de sua vinculação à CNBB, mas
foram feitas mudanças em sua metodologia, em seus materiais didáticos e em
sua orientação.
Durante os dois primeiros anos de governo militar, a questão da educação
de adultos foi negligenciada pelo Ministério da Educação. Entretanto a Unes-
co voltava a reiterar o compromisso dos países signatários em promover pro-
gramas destinados à educação de adultos. Em 1966 o governo retoma algumas
ações direcionadas a educação de adultos, ” [...] através do Ministério da Edu-
cação e do apoio à Cruzada ABC, em colaboração com USAID.” (PAIVA, 2003,
p.288). A primeira delas foi o Plano Complementar ao PNE, estabelecendo que:

26 • capítulo 1
70% dos saldos dos recursos destinados ao ensino primário seriam aplicados na
extensão da educação primária a analfabetos de 10 anos ou mais. Para a população
analfabeta entre 10 e 14 e entre 15 e 20 anos seriam organizados cursos primários
intensivos de 3 anos, enriquecidos com atividades e trabalhos. Aos adultos entre 20
e 30 anos seriam oferecidos cursos intensivos de alfabetização com 8 meses de du-
ração seguidos de cursos rápidos de 6 meses para capacitação profissional em nível
elementar (PAIVA, 2003, p. 292).

Esse Plano, apesar de provocar o debate, não foi colocado em prática. Para
o Departamento Nacional de Educação (DNE), o analfabeto era visto como uma
“pessoa intelectualmente incapaz de servir-se da comunidade, de servir à co-
munidade, de integrar-se no processo de desenvolvimento político e de parti-
cipar do contexto político” (PAIVA, 2003, p. 294). Entre os anos de 1966 e 1970,
o Ministério da Educação se restringe “ao estudo das fontes de financiamento
de um programa nacional de educação de adultos e à proposição de um novo
Plano de Alfabetização Funcional e Educação Continuada de Adultos a ser co-
ordenado por um Movimento Nacional” (PAIVA, 2003, p. 296).
Um programa destinado à educação de adultos que merece ser mencionado
nesse período foi a Cruzada ABC, que, segundo Paiva (2003), deve ser entendida
como um esforço para anular os efeitos ideológicos dos movimentos populares
anteriores, direcionados à educação de adultos, desenvolvidos no Nordeste. O
objetivo inicial da Cruzada era desenvolver um programa extensivo de alfabetiza-
ção. Entre os anos de 1970 e 1971, a Cruzada foi progressivamente sendo extinta.
De acordo com Paiva (2003) em dezembro de 1967, foi criado pela Lei 5379
o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL). Em 8 de setembro de 1967
(Dia Internacional da Alfabetização), vários decretos foram assinados: Decreto
nº 61.311 criando um Grupo Interministerial para estudo e levantamento de
recursos destinados à alfabetização; Decreto nº 61.312 prevendo a utilização
das emissoras de TV nos programas de alfabetização; Decreto nº 61.313 consti-
tuindo a Rede Nacional de Alfabetização Funcional e Educação Continuada de
Adultos; Decreto nº 61.314 instituindo a educação cívica nas instituições sindi-
cais e a campanha em prol da extinção do analfabetismo. O Grupo Interminis-
terial (GI) buscava encontrar recursos no orçamento que poderiam ser desti-
nados à educação de adultos. O GI era formado por representantes de diversos
ministérios do governo e tinha como objetivo fazer estudos e levantamento dos
recursos necessários para o desenvolvimento do Movimento de Alfabetização.

27 • capítulo 1
No mesmo ano foi criada a Fundação Mobral através da Lei 5.379.
Esta Lei:

[...] atribuía ao Ministério da Educação a tarefa de alfabetização funcional e educação


continuada dos adultos, como prioritária entre as demais atividades educativas, a ser
realizada através da nova Fundação cuja presidência caberia ao diretor do Departa-
mento Nacional de Educação (DNE) (PAIVA, 2003, p. 293).

Assim mais uma vez a proposta era erradicar o analfabetismo através de


uma alfabetização funcional e promover a educação continuada. Mudanças de
orientação do Mobral desvincularam o Movimento do DNE passando ao lança-
mento de uma campanha de alfabetização de massa (programa extensivo de
alfabetização). Em 8 de setembro de 1970 foram iniciadas as atividades regula-
res do Mobral.

[...] o movimento fazia restrições ao método Paulo Freire [...] e dispunha-se a ela-
borar novos materiais didáticos e aplicar novos métodos [...] O novo material incluía
“Livros-cadernos” destinados a alfabetização e iniciação dos neo-alfabetizados em
conhecimentos relativos ao lar, à comunidade, à Pátria e a consolidação de hábitos e
atitudes. (PAIVA, 2003, p. 323)

Em 1971, através da Lei 5.692, seria regulamentado o ensino supletivo como


uma proposta de reposição de escolaridade. Esse ensino se destinava a “suprir
a escolarização regular para adolescentes e adultos, que não tinham seguido ou
concluído na idade própria” (BRASIL, 1971). De acordo com o Parecer CNE/CEB
11/2000, o ensino supletivo abrangia o processo de alfabetização, a aprendiza-
gem, a qualificação, algumas disciplinas e a também a atualização. Os cursos
poderiam ocorrer através do ensino a distância, sendo organizados dentro dos
sistemas de ensino estaduais inclusive os exames, havendo uma grande flexibi-
lidade curricular e de carga horária. O Parecer 699/72 estabelece dentre outras
questões, as quatro funções do ensino supletivo:

28 • capítulo 1
[...] a suplência (substituição compensatória do ensino regular pelo supletivo via
cursos e exames com direito à certificação de ensino de 1º grau para maiores de 18
anos e de ensino de 2º grau para maiores de 21 anos), o suprimento (completação
do inacabado por meio de cursos de aperfeiçoamento e de atualização), a apren-
dizagem e a qualificação. Elas se desenvolviam por fora dos então denominados
ensinos de 1º e 2º graus regulares. (BRASIL, 2000, p. 21).

Em 1985, o Mobral foi extinto sob fortes denúncias de desvio de recursos


que resultaram na formação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)
e não tendo cumprido sua meta que era a erradicação do analfabetismo. Nesse
momento chegamos ao fim do período militar e estamos em pleno processo de
redemocratização do país. Em 1986, foi criada a Fundação Nacional para a Edu-
cação de Jovens e Adultos (Educar), definido como uma fundação de fomento
para a educação de jovens e Adultos, firmando convênios com entidades que
ficariam responsáveis pela concepção, planejamento e execução dos projetos
de alfabetização. Em 1990, o então presidente eleito pelo voto direto Fernando
Collor de Melo extinguiu a Fundação Educar. (PAIVA, 2003)

ATIVIDADE
Leia a entrevista do Prof. Osmar Fávero concedida em 18 de julho de 2003 ao
programa Salto para o Futuro. A entrevista você encontrará neste link: http://
www.tvbrasil.org.br/saltoparaofuturo/entrevista.asp?cod_Entrevista=45
Após a leitura escreve um texto analítico apresentando os principais pontos
destacado pelo professor Osmar Fávero sobre a Educação de Jovens e Adultos
no Brasil.

REFLEXÃO
Após a leitura do texto reflita: A Educação de Jovens e Adultos pode ser um instrumento
ideológico para os que detêm o poder e/ou para aqueles que disputam o poder?

29 • capítulo 1
“A importância da educação como instrumento ideológico poderoso é muito clara
tanto para os que os detêm quanto para aqueles que pretendem disputá-lo. A dife-
rença quanto à possibilidade de sua utilização reside no fato de que os detentores
do poder político se encarregam de determinar a política educacional a ser seguida,
os programas a serem promovidos ou estimulados e o conteúdo ideológico dos mes-
mos. Para os que disputam o poder, a educação é um instrumento somente quando
as contradições dos sistemas, as crises o clima de efervescência ideológica chegou
a um ponto em que os programas educacionais podem ser controlados por aqueles
que se opõem a ordem vigente.” (Paiva, 2003, p. 23).

LEITURA
Gadotti, M. O Pensamento Pedagógico Brasileiro São Paulo: Editora Ática, 2004.
Neste livro o autor aborda a “pensamento pedagógico brasileiro” passando pelos temas
da educação como um ato político, a educação popular, a educação como um instrumento
de luta popular, o saber e o poder popular, a educação e o desenvolvimento social, educação
e poder em uma sociedade de classes dentre outros.

GALVÃO, A. M.; DI PIERRO, M. C. Preconceito contra o analfabeto. São Paulo: Cortez, 2007.
Neste livro as autoras fazem uma analise sobre o preconceito contra o analfabeto, mos-
trando que o estigma contra o analfabeto foi sendo construído ao longo do tempo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação. São Paulo: Editora Moderna, 1989.
BRASIL. Parecer CEB/CNE 11/2000. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e
Adultos, 2000.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra,
1997.
GADOTTI, M. & ROMÃO, J. Educação de jovens e adultos: teoria, prática e proposta. São Paulo: Cortez,
2001.
PAIVA, V. História da educação popular no Brasil. 6. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2003

30 • capítulo 1
RIBEIRO, Maria Luisa Santos. História da educação brasileira: a organização escolar. 21. ed. Campinas:
Autores associados, 2010.
SOARES, M. Alfabetização e letramento. São Paulo: Contexto, 2010.

CONEXÃO
No próximo capítulo discutiremos a Legislação Brasileira atual sobre a Educação de
Jovens e Adultos e as Conferências Internacionais realizadas pela UNESCO.

31 • capítulo 1
32 • capítulo 1
2
A Legislação e
Políticas Públicas
em Educação de
Jovens e Adultos
no Brasil
Apresentação

Neste capítulo veremos como a Educação de Jovens e Adultos foi contem-


plada na Constituição de 1988 e na Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacio-
nal de 1996. Veremos também como foi à tramitação no Congresso Nacional do
Plano Nacional de Educação para sua aprovação. Destacaremos as Conferên-
cias Internacionais realizadas pela UNESCO e faremos uma analise do Parecer
CNE/CEB 11/2000 que delibera sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação de Jovens e Adultos.

OBJETIVOS
O objetivo deste capítulo é refletir sobre a legislação brasileira atual da Educação de Jovens e
Adultos; verificar como a Educação de Jovens e Adultos é pensada no cenário internacional e
analisar o Parecer CNE/CEB 11/2000 que fundamenta a Educação de Jovens e Adultos atu-
almente no Brasil.

Você se lembra?
Você conhece a UNESCO? Sabe qual a relação desta Organização com a
Educação de Jovens e Adultos? Você sabe que esta Organização realiza Confe-
rências Internacionais que discutem a temática do analfabetismo no mundo?
Qual a importância da erradicação do analfabetismo para os atuais governos?
Vamos pensar um pouco sobre isso a luz da legislação brasileira e das Confe-
rencias Internacionais? Vamos lá.

2.1  A Educação de Jovens e Adultos na Constituição (1988) e na


Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional

Após intenso debate na Assembleia Nacional Constituinte, em 1988 foi pro-


mulgada a nova Constituição brasileira. A Educação de Jovens e adultos estará
contemplada nos artigos 208 e 214. De acordo com o artigo 208 da Constituição
Federal é dever do Estado garantir a oferta gratuita, a todos àqueles que não

34 • capítulo 2
tiveram acesso à educação na idade adequada.

CONEXÃO
Leia na integra a LDB
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm

Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de
idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram
acesso na idade própria;
No artigo 214 fica estabelecido que deverá ser elaborado um Plano Nacional de
Educação que deve conduzir a erradicação do analfabetismo e a universalização do
atendimento escolar.
Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com
o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e
definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a
manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e moda-
lidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas
federativas que conduzam a:
I - erradicação do analfabetismo;
II - universalização do atendimento escolar; (BRASIL, 1988)

Em 1996, foi aprovada a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional


(LDBEN) que também contempla a educação de Jovens e Adultos, quando no arti-
go 4 garante o acesso público e gratuito e a oferta desta modalidade de educação.

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Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a
garantia de:
IV – acesso público e gratuito aos ensinos fundamental e médio para todos os que
não os concluíram na idade própria;
VII – oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características
e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se
aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;
(BRASIL, 1996)

E nos artigos 37 e 38, apresenta a Educação de Jovens e Adultos,

Seção V - Da Educação de Jovens e Adultos


Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram
acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.
§ 1º Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos,
que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições
de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.
§ 2º O poder público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalha-
dor na escola, mediante ações integradas e complementares entre si.
§ 3º A educação de jovens e adultos deverá articular-se, preferencialmente, com a
educação profissional, no formado regulamento.
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compre-
enderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de
estudos em caráter regular.
§ 1º Os exames a que se refere esse artigo realizar-se-ão:
I – no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos;
II – no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos.
§ 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios informais
serão aferidos e reconhecidos mediante exames. (BRASIL, 1996)

A Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional


prevê que a educação deve ser garantida a todos como um direito público sub-

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jetivo. Segundo o Parecer CNE/CEB 11/2000 direito público subjetivo é aquele
pelo qual o titular de um direito pode exigir imediatamente o cumprimento de
um dever e de uma obrigação. Trata-se de um direito positivado, constitucio-
nalizado e dotado de efetividade. O titular desse direito é qualquer pessoa de
qualquer faixa etária que não tenha tido acesso à escolaridade obrigatória. Por
isso é um direito subjetivo, ou seja, ser titular de alguma prerrogativa é algo que
é próprio desse indivíduo. O sujeito desse dever é o Estado no nível em que esti-
ver situada esta etapa da escolaridade. (BRASIL, 2000, p. 22-23)
Assim a partir da promulgação da LDBEN em 1996 a Educação de Jovens e
Adultos passa a ser uma modalidade da educação básica nas etapas do Ensino
Fundamental e Médio. Além da garantia legal as instâncias competentes ela-
boraram documentos com diretrizes educacionais dirigidas a esta modalidade
de ensino.
De acordo com a Constituição Federal em seu artigo 214, já mencionado,
“expressa o desejo da nação brasileira de um plano nacional de educação, de
duração plurianual que leve a erradicação do analfabetismo, a universalização
do atendimento escolar, a melhoria da qualidade de ensino [...]” (LIBÂNEO,
2012, p. 182) e de acordo com o Art. 9º da LDBEN a União incumbir-se-á de “ela-
borar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os estados, o Distrito
Federal e os municípios” (BRASIL, 1996, p.13). Ainda de acordo com a LDBEN
no seu artigo 87, dispõe que:

Art. 87. É instituída a Década da Educação, a iniciar-se um ano a partir da publicação


desta lei.
§ 1º A União, no prazo de um ano a partir da publicação desta lei, encaminhará, ao
Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os
dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para
Todos. (BRASIL, 1996, p. 44)

O Plano Nacional de Educação (PNE) foi pensado a partir da necessidade de


se estabelecer metas para Educação para os próximos 10 anos. De acordo com o
PNE os Estados, Municípios e o Distrito Federal deveriam elaborar “planos de-
cenais” correspondentes para adequação do PNE em suas localidades. O PNE
foi pensado para além dos governos que estivessem no poder, deveria represen-

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tar a continuidade das políticas públicas para a Educação.

Estabelecer, a partir da aprovação do PNE, programas visando a alfabetizar 10 milhões


de jovens e adultos, em cinco anos e, até o final da década, erradicar o analfabetismo.
Assegurar, em cinco anos, a oferta de educação de jovens e adultos equivalente às
quatro séries iniciais do ensino fundamental para 50% da população de 15 anos e
mais que não tenha atingido esse nível de escolaridade.
Assegurar, até o final da década, a oferta de cursos equivalentes às quatro séries
finais do ensino fundamental para toda a população de 15 anos e mais que concluiu
as quatro séries iniciais.
Estabelecer programa nacional, para assegurar que as escolas públicas de ensino
fundamental e médio localizadas em áreas caracterizadas por analfabetismo e baixa
escolaridade ofereçam programas de alfabetização e de ensino e exames para jo-
vens e adultos, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais.
Estabelecer programa nacional de fornecimento, pelo Ministério da Educação, de
material didático-pedagógico, adequado à clientela, para os cursos em nível de en-
sino fundamental para jovens e adultos, de forma a incentivar a generalização das
iniciativas mencionadas na meta anterior.
Realizar, anualmente, levantamento e avaliação de experiências em alfabetização de
jovens e adultos, que constituam referência para os agentes integrados ao esforço
nacional de erradicação do analfabetismo.
Assegurar que os sistemas estaduais de ensino, em regime de colaboração com os
demais entes federativos, mantenham programas de formação de educadores de
jovens e adultos, capacitados para atuar de acordo com o perfil da clientela, e habili-
tados para no mínimo, o exercício do magistério nas séries iniciais do ensino funda-
mental, de forma a atender a demanda de órgãos públicos e privados envolvidos no
esforço de erradicação do analfabetismo.
Estabelecer políticas que facilitem parcerias para o aproveitamento dos espaços ociosos
existentes na comunidade, bem como o efetivo aproveitamento do potencial de trabalho
comunitário das entidades da sociedade civil, para a educação de jovens e adultos.
Instar Estados e Municípios a procederem um mapeamento, por meio de censo edu-
cacional, nos termos do art. 5º, §1º da LDB, da população analfabeta, por bairro ou
distrito das residências e/ou locais de trabalho, visando localizar e induzir a demanda
e programar a oferta de educação de jovens e adultos para essa população.

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Reestruturar, criar e fortalecer, nas secretarias estaduais e municipais de educação,
setores próprios incumbidos de promover a educação de jovens e adultos.
[...]
26.Incluir, a partir da aprovação do Plano Nacional de Educação, a Educação de Jo-
vens e Adultos nas formas de financiamento da Educação Básica. (BRASIL, 2001,
p. 100, 101, 102)

De acordo com Libâneo (2012), o PNE 2001-2010 resultou da discussão no


Congresso Nacional Brasileiro, de dois projetos de Lei, um apresentado pelo
Ministério da Educação e outro apresentado por entidades e movimentos ci-
vis. Os projetos se mostravam bastante diferentes, principalmente com relação
aos recursos que deveriam ser destinados a execução do PNE. Assim o trecho
a seguir faz uma síntese histórica do processo de elaboração, votação e sanção
presidencial do PNE de 2001:

O ano de 1997 foi dedicado à sua formulação. Dois projetos foram apresentados
à Câmara dos Deputados: o de nº 4.155/98, subscrito pelo Deputado Ivan Valente
e outros, que encaminhava a proposta do II Coned, e o de nº 4.173/98, elaborado
pelo MEC e apresentado pelo governo federal. Seguiram-se três anos 1998, 1999
e 2000 de tramitação legislativa no Congresso Nacional. Ali, um amplo e intenso
programa de debates foi instaurado, emendas foram apresentadas, sugestões, en-
caminhadas. O estudo das diversas contribuições levou o relator, Deputado Nelson
Marchezan, a apresentar um Substitutivo, que, depois de duas revisões e novas
emendas, foi aprovado pela Comissão de Educação, Cultura e Desporto. Requeri-
mento assinado pelos líderes de todos os partidos políticos fez com que o projeto
fosse encaminhado ao Plenário da Câmara dos Deputados, para análise e votação
em regime de urgência. Uma sessão plenária foi transformada em Comissão Geral,
para ouvir especialistas e debater amplamente o projeto naquele Plenário. Seguiu-se
sua aprovação e encaminhamento ao Senado Federal. Esse aprovou sem alterações
o Projeto encaminhado pela Câmara dos Deputados, sendo enviado ao Presidente
da República, para sanção. Em 9 de janeiro de 2001, o Presidente sancionou a lei
que institui o PNE, com vetos a nove metas, propostos pelo Ministério da Fazenda e
do Planejamento, Orçamento e Gestão, que ainda não foram submetidos à votação
do Congresso Nacional.(LIBÂNEO, 2012, p. 182-183).

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Libâneo (2012), nós diz que o PNE foi eficaz para a obtenção de melhorias na
manutenção e desenvolvimento da educação, mas muitas metas estabelecidas
não foram cumpridas em função da falta de recurso. Quando da aprovação do
PNE ficou estabelecido que o governo federal aplicasse 7% do PIB em educação.

2.2  A Educação de Jovens e Adultos no contexto das Conferências


Internacionais promovidas pela UNESCO

No cenário internacional houve uma maior preocupação e reconhecimen-


to da importância da Educação de Jovens e Adultos para o fortalecimento da
cidadania e da formação educacional da população. Nesse contexto podemos
destacar as Conferências organizadas e realizadas pela UNESCO.

CONEXÃO
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) foi
fundada em 16 de Novembro de 1945, após o final da II Guerra Mundial com o objetivo
de contribuir para a paz e segurança no mundo mediante a educação, a ciência, a cultura
e as comunicações. Ver site da UNESCO no Brasil: <http://www.unesco.org/new/pt/
brasilia/>.

Em 1990 foi realizada a Conferência Mundial sobre Educação para Todos,


em Jomtiem na Tailândia. Esta Conferência resultou no documento Declara-
ção Mundial sobre Educação para Todos – Satisfação das Necessidades Básicas
de Aprendizagem. Esse documento reconhecia que a partir da Declaração Uni-
versal dos Direitos Humanos, definida após II Guerra Mundial assegurava que
“toda pessoa tem direito a educação”, porém passado mais de 40 anos persistia
a realidade de:

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mais de 100 milhões de crianças, das quais pelo menos 60 milhões são meninas,
não têm acesso ao ensino primário:
mais de 960 milhões de adultos - dois terços dos quais mulheres – são analfabetos,
e o analfabetismo funcional e um problema significativo em todos os países indus-
trializados ou em desenvolvimento:
mais de um terço dos adultos do mundo não têm acesso ao conhecimento impresso,
às novas habilidades e tecnologias, que poderiam melhorar a qualidade de vida e
ajudá-los aperceber e a adaptar-se às mudanças socias e culturais: e
mais de 100 milhões de crianças e incontáveis adultos não conseguem concluir o
ciclo básico, e outros milhões, apesar de concluí-lo, não conseguem adquirir conheci-
mentos e habilidades essenciais. (UNESCO, 1990, p.2)

Assim os participantes da referida Conferência proclamam dez artigos para a


Educação Para Todos, que buscam relembrar que “a educação é um direito fun-
damental de todos, mulheres e homens, de todas as idades, no mundo inteiro”
(UNESCO, 1990, p.2) e reconhecer que a “educação básica adequada é funda-
mental para fortalecer os níveis superiores de educação e de ensino, a formação
científica e tecnológica e, por conseguinte, para alcançar um desenvolvimento
autônomo” (UNESCO, 1990, p.2).
Foram definidos dez artigos são eles:

Artigo 1 – satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem


1. Cada pessoa - criança, jovem ou adulto - deve estar em condições de aproveitar
as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades básicas de
aprendizagem.[...]
Artigo 2 – expandir o enfoque
1. Lutar pela satisfação das necessidades básicas de aprendizagem para todos exige
mais do que a ratificação do compromisso pela educação básica. É necessário um
enfoque abrangente, capaz de ir além dos níveis atuais de recursos, das estruturas
institucionais; dos currículos e dos sistemas convencionais de ensino, para construir
sobre a base do que há de melhor nas práticas correntes.[...]

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Artigo 3 – universalizar o acesso à educação e promover a equidade
1. A educação básica deve ser proporcionada a todas as crianças, jovens e adultos.
[...]
Artigo 4 – concentrar a atenção na aprendizagem
1. A tradução das oportunidades ampliadas de educação em desenvolvimento
efetivo - para o indivíduo ou para a sociedade - dependerá, em última instância, de,
em razão dessas mesmas oportunidades, as pessoas aprenderem de fato, ou seja,
apreenderem conhecimentos úteis, habilidades de raciocínio, aptidões e valores.[...]
Artigo 5 – ampliar os meios de e o raio de ação da educação básica
A diversidade, a complexidade e o caráter mutável das necessidades básicas de
aprendizagem das crianças, jovens e adultos, exigem que se amplie e se redefina
continuamente o alcance da educação básica, [...]
Artigo 6 – propiciar um ambiente adequado à aprendizagem
A aprendizagem não ocorre em situação de isolamento. Portanto, as sociedades
devem garantir a todos os educandos assistência em nutrição, cuidados médicos e
o apoio físico e emocional essencial para que participem ativamente de sua própria
educação e dela se beneficiem. [...]
Artigo 7 – fortalecer as alianças
As autoridades responsáveis pela educação aos níveis nacional, estadual e municipal
têm a obrigação prioritária de proporcionar educação básica para todos. [...] Novas e
crescentes articulações e alianças serão necessárias em todos os níveis [...]
Artigo 8 – desenvolver uma política contextualizada de apoio
1. Políticas de apoio nos setores social, cultural e econômico são necessárias à
concretização da plena provisão e utilização da educação básica para a promoção
individual e social. [...]
Artigo 9 – mobilizar os recursos
1. Para que as necessidades básicas de aprendizagem para todos sejam satisfeitas
mediante ações de alcance muito mais amplo, será essencial mobilizar atuais e no-
vos recursos financeiros e humanos, públicos, privados ou voluntários. [...]
Artigo 10 – fortalecer a solidariedade internacional
1. Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem constitui-se uma responsa-
bilidade comum e universal a todos os povos, e implica solidariedade internacional e
relações econômicas honestas e equitativas, a fim de corrigir as atuais disparidades
econômicas. (UNESCO, 1990)

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O Ano de 1990 foi considerado o Ano Internacional da Alfabetização, todos
os países participantes se tornaram signatários da Declaração e aprovaram o
Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem com
a finalidade atingir os dez artigos estabelecidos na Declaração. O Brasil assim
como os demais 154 governos assinou a Declaração e se comprometeram em
“garantir uma educação básica para crianças, jovens e adultos, independente-
mente de sexo, etnia, classe social, religião e ideologia.” (PAIVA, 2007, p.7).
Em 1997 foi realizada em Hamburgo, na Alemanha, a V Conferência Inter-
nacional sobre Educação de Adultos - V CONFITEA, com o tema “A educação
das pessoas adultas, uma chave para o século XXI”. Nesta Conferência foi cons-
truída uma Declaração de princípios, conhecida como Declaração de Hambur-
go sobre a educação de asdultos e também foi firmada uma agenda para o futu-
ro da educação de adultos.
Conforme Soares (2007) foi muito significativa e representou um marco, não
apenas pela sua representatividade, mas pela reafirmação de compromissos for-
mais com o desenvolvimento da educação de adultos. Diversamente das confe-
rências anteriores foram firmados compromissos numa agenda para o futuro,
elaborando-se uma estratégia de ação. Esta declaração que foi aprovada na V
CONFITEA, afirma que cabe à EJA suscitar a autonomia e o sentido de responsa-
bilidade nos indivíduos e comunidades para que sejam capazes de lidar com as
mudanças socioeconômicas e culturais ocorridas na contemporaneidade.
Foram discutidos vários temas relacionados a educação de adultos, vamos
destacar alguns itens da Declaração, são eles:

2 - A educação de adultos, dentro desse contexto, torna-se mais que um direito: é a


chave para o século XXI; é tanto consequência do exercício da cidadania como condi-
ção para uma plena participação na sociedade. [...]
3 - A educação de adultos engloba todo o processo de aprendizagem, formal ou
informal, onde pessoas consideradas “adultas” pela sociedade desenvolvem suas ha-
bilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas qualificações técnicas
e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas necessidades e as de sua
sociedade. A educação de adultos inclui a educação formal, a educação não-formal e o
espectro da aprendizagem informal e incidental disponível numa sociedade multicultu-
ral, onde os estudos baseados na teoria e na prática devem ser reconhecidos.

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8 - [...] O Estado ainda é o principal veículo para assegurar o direito de educação para
todos, particularmente, para os grupos menos privilegiados da sociedade, tais como as
minorias e os povos indígenas. [...] Além disso, empresários, sindicatos, organizações
não-governamentais e comunitárias e grupos indígenas e de mulheres têm a res-
ponsabilidade de interagir e de criar oportunidades, para que a educação continuada
durante a vida seja uma realidade possível e reconhecida.
11 - Alfabetização de adultos. A alfabetização, concebida como o conhecimento bási-
co, necessário a todos num mundo em transformação em sentido amplo, é um direito
humano fundamental. [...] Oportunidades de educação para todos, incluindo os afas-
tados e os excluídos, é a preocupação mais urgente. A Conferência vê com agrado a
iniciativa de se proclamar a década da alfabetização, a partir de 1998, em homenagem
a Paulo Freire.
12 - O reconhecimento do “Direito à Educação” e do “Direito a Aprender por Toda a
Vida” é, mais do que nunca, uma necessidade: é o direito de ler e de escrever; de ques-
tionar e de analisar; de ter acesso a recursos e de desenvolver e praticar habilidades e
competências individuais e coletivas.
13 - O fortalecimento e a integração das mulheres. As mulheres têm o direito às mes-
mas oportunidades que os homens. [...] Qualquer argumentação em favor de restrições
ao direito de alfabetização das mulheres deve ser categoricamente rejeitada. Medidas
devem ser tomadas para fazer face a tais argumentações.
14 - Cultura da paz e educação para a cidadania e para a democracia.
15 - Diversidade e Igualdade. A educação de adultos deve refletir a riqueza da diver-
sidade cultural, bem como respeitar o conhecimento e formas de aprendizagem tradi-
cionais dos povos indígenas. O direito de ser alfabetizado na língua materna deve ser
respeitado e implementado. A educação de adultos enfrenta um grande desafio, que
consiste em preservar e documentar o conhecimento oral de grupos étnicos minori-
tários e de povos indígenas e nômades. Por outro lado, a educação intercultural deve
promover o aprendizado e o intercâmbio de conhecimento entre e sobre diferentes
culturas, em favor da paz, dos direitos humanos, das liberdades fundamentais, da de-
mocracia, da justiça, da coexistência pacífica e da diversidade cultural.
21 - A população de idosos. [...] Portanto é fundamental que eles tenham a mesma
oportunidade de aprender que os mais jovens. Suas habilidades devem ser reconheci-
das, respeitadas e utilizadas.

44 • capítulo 2
22 - Na mesma linha da Declaração de Salamanca, urge promover a integração e a
participação das pessoas portadoras de necessidades especiais.
23 - Devemos agir com urgência para aumentar e garantir o investimen-
to nacional e internacional na educação de jovens e adultos. Da mes-
ma forma, devemos atuar de modo a garantir o engajamento dos recursos
do setor privado e das comunidades locais nessa tarefa. A Agenda para o
Futuro, que nós adotamos aqui, visa à consecução desses objetivos (PAIVA, 2007,
p. 37-43).

Em 2000 foi realizada a Fórum Mundial de Educação, em Dacar no Senegal,


Educação para Todos: Cumprindo nossos Compromissos Coletivos. No Fórum
Mundial de Educação de Dacar foi possível avaliar a ultima década com relação
a Educação. Nesse Fórum foi reafirmado os compromissos firmados na Confe-
rência Mundial sobre Educação para Todos, em Jomtiem na Tailândia, em 1990
e foi construído o documento Marco de Ação de Dacar Educação Para Todos.
Nesse documento vamos destacar as seis metas estabelecidas para a Edu-
cação de Todos, destaque para os itens três, quatro e seis que dizes respeito a
Educação de Jovens e Adultos:

Expansão e aprimoramento da assistência e educação da primeira infância,


1 especialmente para as crianças mais vulneráveis e desfavorecidas.

Garantir que em 2015 todas as crianças, especialmente meninas, crianças em


situações difíceis e crianças pertencentes a minorias étnicas, tenham acesso a
2
uma educação primária de boa qualidade, gratuita e obrigatória, e possibilidade
de completá-la.

Assegurar que as necessidades de aprendizagem de todos os jovens e adultos


3 sejam satisfeitas mediante o acesso equitativo à aprendizagem apropriada e a
programas de capacitação para a vida.

45 • capítulo 2
Atingir, em 2015, 50% de melhora nos níveis de alfabetização de adultos, es-
4 pecialmente para as mulheres, e igualdade de acesso à educação fundamental
e permanente para todos os adultos.

Eliminar, até 2005, as disparidades existentes entre os gêneros na educação


primária e secundária e, até 2015, atingir a igualdade de gêneros na educação,
5 concentrando esforços para garantir que as meninas tenham pleno acesso,
em igualdade de condições, à educação fundamental de boa qualidade e que
consigam completá-la

Melhorar todos os aspectos da qualidade da educação e assegurar a excelên-


cia de todos, de modo que resultados de aprendizagem reconhecidos e mensu-
6
ráveis sejam alcançados por todos, especialmente em alfabetização, cálculo e
habilidades essenciais para a vida (PAIVA, 2007, p.146-147).

A Assembleia Geral das Nações Unidas adotou a Resolução 56/116 chamada


de “Década das Nações Unidas para a Alfabetização para Todos”, nesta resolu-
ção foi proclamado “o período entre 2003-2012 como a Década das Nações Uni-
das para a Alfabetização, com o objetivo de levar a educação a todos. A proposta
de uma Década das Nações Unidas para a Alfabetização foi [...] endossada na
mesa-redonda reunida no Fórum Mundial de Educação, realizado em Dacar,
em 2000.” (PAIVA, 2007, p.146). Assim a Década das Nações Unidas para a Alfa-
betização para Todos, irá impulsionar todos os seis objetivos do Marco de Ação
de Dacar.

2.3  O Parecer CNE/CEB 11/2000 – Diretrizes Curriculares


Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos

O Parecer CNE/CEB 11/2000 delibera sobre as Diretrizes Curriculares Na-


cionais para a Educação de Jovens e Adultos que foi proposto pelo Ministério
da Educação. Esse documento foi resultado de inúmeras reuniões, audiências
públicas e teleconferências, e a partir de agora passaremos a analisá-lo.

46 • capítulo 2
CONEXÃO
Leia na integra o Parecer CNE/CEB 11/2000 no link: <http://portal.mec.gov.br/cne/ar-
quivos/pdf/PCB11_2000.pdf>.

A partir daí a Câmara de Educação Básica (CEB), estudando colegiadamente


a matéria, passou a ouvir a comunidade educacional brasileira. As audiências
públicas, realizadas em 29 de fevereiro de 2000 em Fortaleza, em 23 de março
de 2000 em Curitiba e em 4 de abril de 2000 em Brasília, foram ocasião para se
reunir com representantes dos órgãos normativos e executivos dos sistemas,
com as várias entidades educacionais e associações científicas e profissionais
da sociedade civil hoje existentes no Brasil.
Duas teleconferências sobre a Formação de Educadores para Jovens e Adul-
tos, promovidas pela Universidade de Brasília (UnB) e o Serviço Social da Indús-
tria (SESI), com o apoio da UNESCO, contaram com a presença da Câmara de
Educação Básica representada pela relatoria das diretrizes curriculares nacio-
nais desta modalidade de educação. Tais eventos se deram, respectivamente,
em 28/11/99 e 18/04/00.
Tais iniciativas e encontros, intermediados por sessões regulares da CEB,
sempre com a presença de representantes do MEC, foram fundamentais para
pensar e repensar os principais tópicos da estrutura do parecer. As sugestões,
as críticas e as propostas foram abundantes e cobriram desde aspectos pontu-
ais até os de fundamentação teórica. (BRASIL, 2000, p.2)
O Parecer esclarece e regulamenta as Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação de Jovens e Adultos para os “sistemas de ensino e seus respectivos
estabelecimentos que venham a se ocupar da educação de jovens e adultos sob
a forma presencial e semipresencial de cursos e tenham como objetivo o forne-
cimento de certificados de conclusão de etapas da educação básica.” (BRASIL,
2000, p.4)
Parecer também considera que o Brasil ainda mantém um alto índice de
analfabetismo e o mesmo se concentra no grupo de pessoas com “mais idade,
de regiões pobres e interioranas e provenientes dos grupos afro-brasileiros”
(BRASIL, 2000, p. 5). Sabemos que historicamente estes grupos sociais foram
excluídos da escola, seja pela falta de acesso ou pela repetência, reprovação ou
evasão. Não fazer parte da cultura letrada implica não ter acesso ou não poder

47 • capítulo 2
usufruir de maneira adequada a diferentes campos da vida em sociedade, tais
como o mercado de trabalho, práticas de convívio social, acesso ao lazer e a cul-
tura e acesso as novas tecnologias da informação e da comunicação, resultando
em um problema para a conquista da cidadania desses grupos sociais. Segundo
o Parecer suas raízes

são de ordem histórico-social. No Brasil, esta realidade resulta do caráter subalterno


atribuído pelas elites dirigentes à educação escolar de negros escravizados, índios
reduzidos, caboclos migrantes e trabalhadores braçais, entre outros. Impedidos da
plena cidadania, os descendentes destes grupos ainda hoje sofrem as consequências
desta realidade histórica. Disto nos dão prova as inúmeras estatísticas oficiais. A rigor,
estes segmentos sociais, com especial razão negros e índios, não eram considerados
como titulares do registro maior da modernidade: uma igualdade que não reconhece
qualquer forma de discriminação e de preconceito com base em origem, raça, sexo, cor
idade, religião e sangue entre outros.(BRASIL, 2000, p. 6)

Desta forma a Educação de Jovens e Adultos significa uma dívida social que
ainda não foi reparada, inclusive para as mulheres, como aponta o Parecer “[...]
opor obstáculos ao acesso de mulheres à cultura letrada faz parte da tradição
patriarcal e machista que, por longo tempo, preponderou entre muitas famílias
no Brasil.” (BRASIL, 2000, p.6)
Considerando os dados mais recentes sobre analfabetismo e de acordo com
as estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a partir
dos dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios (PNAD) de 2011,
a taxa de analfabetismo entre pessoas com 15 anos ou mais é de 8,6 %, assim
o Brasil ainda mantém um alto índice de analfabetismo. Desta forma temos
12,9 milhões de habitantes que não tiveram acesso à leitura e a escrita e muito
menos tem o domínio sobre elas, estão à margem de uma escolaridade básica.
Segundo o Parecer “[...] Sendo leitura e escrita bens relevantes, de valor prático
e simbólico, o não acesso a graus elevados de letramento é particularmente da-
noso para a conquista de uma cidadania plena.”.
O Parecer critica a visão preconceituosa que a sociedade tem do analfabetis-
mo e do analfabeto. Para Freire (2001) existem concepções distorcidas acerca
do analfabetismo.

48 • capítulo 2
A concepção, na melhor das hipóteses, ingênua do analfabetismo o encara ora como
uma “erva daninha” – daí a expressão corrente: “erradicação do analfabetismo” –, ora
como uma “enfermidade” que passa de um a outro, quase por contágio, ora como uma
“chaga” deprimente a ser “curada” e cujos índices, estampados nas estatísticas de
organismos internacionais, dizem mal dos níveis de “civilização” de certas sociedades.
Mais ainda, o analfabetismo aparece também, nesta visão ingênua ou astuta, como a
manifestação da “incapacidade” do povo, de sua “pouca inteligência”, de sua “proverbial
preguiça”. (FREIRE, 2001, p.15)

Além destas concepções distorcidas apresentadas acima Freire (2001) tam-


bém destaca a concepção da “natural inferioridade” dos analfabetos. Para o
autor estas concepções distorcidas tem um “caráter ideológico” que vão mas-
carar a realidade, determinando uma situação de dominação ideológica sobre
os analfabetos. Assim como o Parecer, o autor Paulo Freire (2001) diz que “[...]
o analfabetismo não é nem uma ‘chaga’, nem uma ‘erva daninha a ser erradi-
cada’, nem tão pouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas
de uma situação social injusta.” (FREIRE, 2001a, p. 18). Para Freire não temos
analfabetos, mas sim “alfabetizandos”.
Para o Parecer o analfabeto não deve ser visto como “inculto” ou “vocacio-
nado” a tarefas e funções “desqualificadas”, pois

Muitos destes jovens e adultos dentro da pluralidade e diversidade de regiões do país,


dentro dos mais diferentes estratos sociais, desenvolveram uma rica cultura baseada
na oralidade da qual nos dão prova, entre muitos outros, a literatura de cordel, o teatro
popular, o cancioneiro regional, os repentistas, as festas populares, as festas religiosas
e os registros de memória das culturas afro-brasileira e indígena. (BRASIL, 2000, p. 5).

Mas sabemos que em uma sociedade predominantemente grafocêntrica o


analfabetismo é um problema a ser enfrentado e a Educação de Jovens e Adul-
tos pode fazer a reparação desta realidade, reconhecendo o princípio da Igual-
dade. Assim,

49 • capítulo 2
a função reparadora da EJA, no limite, significa não só a entrada no circuito dos direitos
civis pela restauração de um direito negado: o direito a uma escola de qualidade, mas
também o reconhecimento daquela igualdade ontológica de todo e qualquer ser humano.
(BRASIL, 2000, p. 7)

Segundo o Parecer esta função pode ser entendida como

Esta função reparadora da EJA se articula com o pleito postulado por inúmeras pessoas
que não tiveram uma adequada correlação idade/ano escolar em seu itinerário educacio-
nal e nem a possibilidade de prosseguimento de estudos. Nesse momento a igualdade
perante a lei, ponto de chegada da função reparadora [...] (BRASIL, 2000, 9-7).

Outra função destacada no documento é a função equalizadora, sendo seu


ponto de partida a igualdade perante a Lei para se chegar a igualdade de opor-
tunidades. Assim a equidade é a forma pela qual se distribuem os bens sociais
de modo a garantir uma redistribuição e alocação em vista de mais igualdade,
consideradas as situações específicas.

Segundo Aristóteles, a equidade é a retificação da lei onde esta se revela insuficiente


pelo seu caráter universal. (Ética a Nicômaco, V, 14, 1.137 b, 26). Nesse sentido, os
desfavorecidos frente ao acesso e permanência na escola devem receber proporcio-
nalmente maiores oportunidades que os outros. Por esta função, o indivíduo que teve
sustada sua formação, qualquer tenha sido a razão, busca restabelecer sua trajetória
escolar de modo a readquirir a oportunidade de um ponto igualitário no jogo conflitual
da sociedade. [...] Nesta linha, a educação de jovens e adultos representa uma pro-
messa de efetivar um caminho de desenvolvimento de todas as pessoas, de todas as
idades.12 Nela, adolescentes, jovens, adultos e idosos poderão atualizar conhecimen-
tos, mostrar habilidades, trocar experiências e ter acesso a novas regiões do trabalho
e da cultura. Talvez seja isto que Comenius chamava de ensinar tudo a todos. A EJA é
uma promessa de qualificação de vida para todos, inclusive para os idosos [...] (BRASIL,
2000, p. 10).

50 • capítulo 2
Chegamos a terceira função da Educação de Jovens e Adultos que pode ser
chamada de permanente ou qualificadora, sendo considerada o próprio sen-
tido da Educação de Jovens e Adultos, um apelo para a educação permanente.
Assim,

Na base da expressão potencial humano sempre esteve o poder se qualificar, se


requalificar e descobrir novos campos de atuação como realização de si. Uma oportu-
nidade pode ser a abertura para a emergência de um artista, de um intelectual ou da
descoberta de uma vocação pessoal. A realização da pessoa não é um universo fe-
chado e acabado. A função qualificadora, quando ativada, pode ser o caminho dessas
descobertas. (BRASIL, 2000, p. 11).

Após delinear as funções da Educação de Jovens e Adultos o Parecer oferece

“alguns elementos históricos para relembrar alguns ordenamentos legais já extintos e


possibilitar o apontamento de temas e problemas que sempre estiveram na base das
práticas e projetos concernentes à EJA e de suas diferentes formulações no Brasil.”
(BRASIL, 2000, p. 13).

Estes elementos já foram discutidos no Capítulo 1 desta disciplina.


Em seguida o Parecer apresenta as bases legais que fundamentam a Educa-
ção de Jovens e Adultos. O artigo 205 da Constituição Federal estabelece como
princípio da educação o “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para
o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”, esse princípio foi
retomado no artigo 2 da LDBEN. A Educação de Jovens e Adultos participa des-
se princípio sendo uma modalidade estratégica para a igualdade de acesso a
educação. No artigo 208 da Constituição Federal fica assegurado o direito ao
Ensino Fundamental obrigatório e gratuito para todos, inclusive aqueles não
tiveram acesso em idade adequada. O Parecer enfatiza a necessidade de uma
política educacional integrada da Educação de Jovens e Adultos entre União,
Estados e Municípios.

51 • capítulo 2
Portanto, seja no que se refere à cooperação técnica, seja no que se refere aos investi-
mentos, o regime de colaboração tão acentuado na Constituição Federal torna-se aqui
uma necessidade imperiosa. Isto significa uma política integrada, contínua e cumulativa
entre os entes federativos, financiada com recursos suficientes e identificáveis em vis-
ta de sua sustentabilidade. (BRASIL, 2000, p.26)

A Educação de Jovens e Adultos a partir dos artigos 37 e 38 da


LDBEN passa a ser uma modalidade da Educação Básica, nas suas etapas Fun-
damental e Média. Nesse caso o termo modalidade é entendido como:

O termo modalidade é diminutivo latino de modus (modo, maneira) e expressa uma


medida dentro de uma forma própria de ser. Ela tem, assim, um perfil próprio, uma fei-
ção especial diante de um processo considerado como medida de referência. Trata-se,
pois, de um modo de existir com característica própria. Esta feição especial se liga ao
princípio da proporcionalidade para que esse modo seja respeitado. A proporcionalida-
de, como orientação de procedimentos, por sua vez, é uma dimensão da equidade que
tem a ver com a aplicação circunstanciada da justiça, que impede o aprofundamento
das diferenças quando estas inferiorizam as pessoas. Ela impede o crescimento das
desigualdades por meio do tratamento desigual dos desiguais, consideradas as condi-
ções concretas, a fim de que esses eliminem uma barreira discriminatória e se tornem
tão iguais quanto outros que tiveram oportunidades face a um bem indispensável como
o é o acesso à educação escolar. (BRASIL, 2000, p.27)

A autonomia dos sistemas de ensino permite que os entes federados pos-


sam definir a organização, a estrutura e o funcionamento da Educação de Jo-
vens e Adultos, buscando a universalização do ensino obrigatório e gratuito e a
erradicação do analfabetismo.

52 • capítulo 2
A legislação educacional existente hoje é bem mais complexa. Ela, além dos dispositivos
de caráter nacional, compreende as Constituições Estaduais e as Leis Orgânicas dos
Municípios. Dentro de nosso regime federativo, os Estados e os Municípios, de acordo
com a distribuição das competências estabelecidas na Constituição Federal, gozam de
autonomia e assim podem estabelecer uma normatividade própria, harmônica e diferen-
ciada. A quase totalidade dos Estados repete, em suas Constituições, a versão original do
art. 208, bem como a necessidade de um Plano Estadual de Educação do qual sempre
constam a universalização do ensino obrigatório e a erradicação do analfabetismo. Em
muitas consta a expressão ensino supletivo. (BRASIL, 2000, p. 28)

O Parecer esclarece que mesmo permanecendo o termo supletivo para os


exames, tratando-se apenas de uma “manutenção nominal”. Destaca que a
Educação de Jovens e Adultos hoje é uma

parte constitutiva da lei de diretrizes e bases, tornou-se modalidade da educação bá-


sica e é reconhecida como direito público subjetivo na etapa do ensino fundamental.
Logo, ela é regular enquanto modalidade de exercício da função reparadora. Portanto,
ao assinalar tanto os cursos quanto os exames supletivos, a lei os tem como compre-
endidos dentro dos novos referenciais legais e da concepção da EJA aí posta. (BRA-
SIL, 2000, p. 30).

A oferta da modalidade de Educação de Jovens e Adultos é obrigatória pelos


poderes públicos e sua organização, duração e estrutura, respeitando-se as de-
terminações das Diretrizes Nacionais, faz parte da autonomia dos entes federa-
dos, isto é, os sistemas estaduais e municipais (ensino fundamental). Esta mo-
dalidade de ensino poderá ser ofertada sob forma presencial, semipresencial
ou de cursos não presenciais. A oferta de exames de exames supletivos deve ser
prestado somente em instituições autorizadas, credenciadas e avaliadas. Para
prestar o exame deve-se considerar a idade estabelecida no artigo 38 da LDBEN,
considerando maiores de quinze anos para o ensino fundamental, e maiores de
dezoito anos para o ensino médio.
O aproveitamento de estudo na Educação de Jovens e Adultos é mencionado

53 • capítulo 2
no Parecer e considerado válido, pois esses alunos trazem “saberes” que foram
aprendidos fora dos bancos escolares ou em etapas posteriores alfabetização
que podem ser ressignificados e articulados com os saberes escolares.

A LDB incentiva o aproveitamento de estudos e sendo esta orientação válida para todo
e qualquer aluno, a fortiori ela vale mais para esses jovens e adultos cujas práticas pos-
sibilitaram um saber em vários aspectos da vida ativa e os tornaram capazes de tomar
decisões ainda que, muitas vezes, não hajam tematizado ou elaborado estas compe-
tências. A EJA é momento significativo de reconstruir estas experiências da vida ativa
e ressignificar conhecimentos de etapas anteriores da escolarização articulando-os
com os saberes escolares. A validação do que se aprendeu “fora” dos bancos escola-
res é uma das características da flexibilidade responsável que pode aproveitar esses
“saberes” nascidos desses “fazeres”. (BRASIL, 2000, p. 34).

O Parecer destaca a importância da Educação de Jovens e Adultos estar con-


templada no Plano Nacional de Educação (PNE). O Plano apresenta em seu
diagnóstico um quadro ainda bastante severo em relação ao índice de analfa-
betismo no Brasil e propõe agir sobre a população analfabeta com a Educação
de Jovens e Adultos como agir na população de crianças e jovens em idade ade-
quada para acesso e permanência no Ensino Fundamental e Médio.
Atualmente a União desempenha uma função de articuladora da Educação
de Jovens e Adultos, induzindo ações continuadas e integradas entre os entes
federados. O Ministério da Educação tem editado materiais didáticos apropria-
dos a modalidade de ensino e tem desenvolvido Programas de Alfabetização.
A Iniciativa privada também contribui com a Educação de Jovens e Adultos.

54 • capítulo 2
Há, uma forte presença das entidades do chamado “Sistema S” em programas de edu-
cação profissional de nível básico. Com a reforma da educação profissional em curso,
as escolas técnicas públicas e privadas também estão implantando e incrementando
programas de educação profissional de nível básico paralelamente à oferta de cursos
de educação profissional de nível técnico.
Os Estados, com sua atuação agora focalizada no ensino médio, estão tendendo a
reduzir sua presença nesta área. Mesmo assim algumas secretarias mantiveram suas
equipes até mesmo para repassar a experiência adquirida para os Municípios.
Os Municípios, ora com mais e maiores encargos no âmbito da educação básica, não
possuem uma realidade homogênea nem quanto ao seu tamanho, nem quanto à sua
inserção em diferentes regiões e contextos. Assim, é preciso reconhecer que muitos,
seja por falta de tradição na área, seja por carência de recursos, não estão tendo ca-
pacidade e condições de assumir os encargos que lhes foram atribuídos. Ao mesmo
tempo muitas administrações municipais vêm buscando assumir esse compromisso
com propostas curriculares, formação docente e produção de material didático. Donde
a importância da existência de uma fonte permanente de recursos a fim de viabilizar o
caráter includente desse direito.
Assim, como direito de cidadania, a EJA deve ser um compromisso de institucionali-
zação como política pública própria de uma modalidade dos ensinos fundamental e
médio e consequente ao direito público subjetivo. E é muito importante que esta políti-
ca pública seja articulada entre todas as esferas de governo e com a sociedade civil a
fim de que a EJA seja assumida, nas suas três funções, como obrigação peremptória,
regular, contínua e articulada dos sistemas de ensino dos Municípios, envolvendo os
Estados e a União sob a égide da colaboração recíproca. (BRASIL, 2000, p. 53).

A partir de uma perspectiva de regime de colaboração entre os entes fede-


rados o Parecer destaca a importância de ações integradas e políticas diferen-
ciadas para a erradicação do analfabetismo, a considerar os altos índices de
analfabetismo.

55 • capítulo 2
De acordo com o MEC/INEP/SEEC, em 1999, o número de alunos matriculados
em cursos presenciais da EJA em salas de alfabetização era de 161.791; em ensino
fundamental, 2.109.992; em ensino médio, 656.572 e em cursos profissionalizantes,
141.329. O número de estabelecimentos que oferecem a EJA, de acordo com os
dados de 1999, no Brasil, é de 17.234. Desse total, os Estados oferecem a EJA em
6.973 estabelecimentos, os Municípios em 8.171, a União em 15 e a rede privada em
2.075 estabelecimentos. O número de matrículas vem crescendo no âmbito municipal.
Se em 1997 eram de 683.078 matrículas, em 1999 eram de 821.321. Já para os
mesmos anos, o número de matrículas nos entes federativos passou de 1.808.161
para 1.871.620.
N ã o s e p o d e i g n o r a r q u e h á a l u n o s a t e n d i d o s p e l a i n i c i a t i v a p r i v a-
da e por múltiplas organizações não-governamentais. (BRASIL, 2000,
p. 55).

A formação docente é discutida no Parecer e chama a atenção para o exercí-


cio do dialogo na relação aluno-professor, assim:

[...] pode-se dizer que o preparo de um docente voltado para a EJA deve incluir, além
das exigências formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas à comple-
xidade diferencial desta modalidade de ensino. Assim esse profissional do magistério
deve estar preparado para interagir empaticamente com esta parcela de estudantes e
de estabelecer o exercício do diálogo. (BRASIL, 2000, p.56)

O professor deve considerar os saberes trazidos por esses alunos,

[...] os docentes deverão se preparar e se qualificar para a constituição de projetos


pedagógicos que considerem modelos apropriados a essas características e expec-
tativas. Quando a atuação profissional merecer uma capacitação em serviço, a fim de
atender às peculiaridades dessa modalidade de educação [...] (BRASIL, 2000, p. 57).

56 • capítulo 2
Quanto aos conteúdos e métodos, os mesmos devem ser (re)significados para
esta modalidade de ensino, “não se pode infantilizar a Educação de Jovens e
Adultos no que se refere métodos, conteúdos e processos” (BRASIL, 2000, p.57)
As Diretrizes Curriculares do Ensino Fundamental e Médio valem para a Edu-
cação de Jovens e Adultos, porém “não significa uma reprodução descontextuali-
zada face ao caráter específico da Educação de Jovens e Adultos”, mas adoção dos
“princípios da contextualização e do reconhecimento de identidades pessoais e
das diversidades coletivas constituem-se em diretrizes nacionais dos conteúdos
curriculares.” (BRASIL, 2000, p.61).
O Parecer também destaca o tema do Trabalho quando diz que:

O trabalho, seja pela experiência, seja pela necessidade imediata de inserção profis-
sional merece especial destaque. A busca da alfabetização ou da complementação de
estudos participa de um projeto mais amplo de cidadania que propicie inserção pro-
fissional e busca da melhoria das condições de existência. Portanto, o tratamento dos
conteúdos curriculares não pode se ausentar desta premissa fundamental, prévia e
concomitante à presença em bancos escolares: a vivência do trabalho e a expectativa
de melhoria de vida. Esta premissa é o contexto no qual se deve pensar e repensar o
liame entre qualificação para o trabalho, educação escolar e os diferentes componen-
tes curriculares. (BRASIL, 2000, p. 61).

Assim, para o Parecer o Projeto Político Pedagógico e a formação docente


devem considerar

[...] o trabalho e seus processos e produtos desde a mais simples mercadoria até os
seus significados na construção da vida coletiva. Mesmo na perspectiva da transver-
salidade temática tal como proposta nos Parâmetro Nacionais do Ensino Fundamental
vale a pena lembrar que cabe aos projetos pedagógicos a redefinição dos temas trans-
versais aí incluindo o trabalho ou outros temas de especial significado. As múltiplas
referências ao trabalho constantes na LDB têm um significado peculiar para quem já é
trabalhador. (BRASIL, 2000, p. 62)

O Parecer “CEB nº 15/98 para o ensino médio em geral ganha mais força para
os estudantes da EJA porque em sua maioria já trabalhadores.” (BRASIL, 2000,
p. 62). Assim, o trabalho

57 • capítulo 2
é o contexto mais importante da experiência curricular (...) O significado desse des-
taque deve ser devidamente considerado: na medida em que o ensino médio é parte
integrante da educação básica e que o trabalho é princípio organizador do currículo,
muda inteiramente a noção tradicional da educação geral acadêmica ou, melhor dito,
academicista. O trabalho já não é mais limitado ao ensino profissionalizante. Muito ao
contrário, a lei reconhece que, nas sociedades contemporâneas, todos, independente-
mente de sua origem ou destino profissional, devem ser educados na perspectiva do
trabalho (BRASIl, 2000, p.63)

Além do tema do Trabalho o Projeto Político Pedagógico da Educação de Jo-


vens e Adultos deve contemplar o Temas Transversais, e na Educação de Jovens
e Adultos o tema do Trabalho deve ser tratado de maneira especial e significati-
va. O Parecer define então as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação de
Jovens e Adultos quanto ao Ensino Fundamental e Médio:

Portanto, as diretrizes curriculares nacionais da educação de jovens e adultos, quanto


ao ensino fundamental, contêm a Base Nacional Comum e sua Parte Diversificada que
deverão integrar-se em torno do paradigma curricular que visa estabelecer a relação
entre a Educação Fundamental com a Vida cidadã, com as Áreas de Conhecimento,
segundo o Parecer CEB nº 04/98 e Res. CEB nº 02/98. Quanto ao Ensino Médio, a
EJA deverá atender aos Saberes das Áreas Curriculares de Linguagens e Códigos,
de Ciências da Natureza e Matemática, das Ciências Humanas e suas respectivas
Tecnologias, segundo o Parecer CEB nº 15/98 e Res. CEB nº 03/98. (BRASIL, 2000,
p. 65-66).

O Parecer reconhece que a Educação de Jovens e Adultos ainda tem um ca-


minho a percorrer para que se efetive “uma educação permanente a serviço do
pleno desenvolvimento do educando.” (BRASIL, 2000, p. 66). Assim, até que se
universalize o acesso e a permanência a Educação Básica em idade adequada
como um direito de todos, a Educação de Jovens e Adultos funciona como uma
“chave de abertura para o mundo contemporâneo em seus desafios e exigên-
cias mais urgentes e um dos meios de reconhecimento de si como sujeito e do
outro como igual.” (BRASIL, 2000, p.67).

58 • capítulo 2
ATIVIDADE
Após a leitura do fragmento de texto responda:

Que a escola dos jovens e adultos seja um espaço do encontro, onde possam
falar de si, de suas experiências; trocá-las; trocar afetos e afinidades; sentimen-
tos. Onde sejam reconhecidos e valorizados como pessoas, como trabalhado-
res com uma função social digna. Que as suas falas sejam levadas em conta,
como a de seus professores. Que sejam considerados como interlocutores que
podem ser escutados, pelo muito que têm a dizer. (PAIVA, 1997, p. 5)

a) A discussão apresentada pela autora está contemplada no Parecer CNE/


CEB 11/2000? De que forma?

b) Qual a importância da escola de jovens e adultos valorizar os saberes trazi-


dos por esses alunos?

c) O Parecer destaca três funções da Educação de Jovens e Adultos, explique


cada uma delas.

REFLEXÃO
A partir da leitura do texto abaixo, vamos refletir sobre a questão do analfabetismo funcional.
É considerada alfabetizada funcional a pessoa capaz de utilizar a leitura e a escrita para
fazer frente às demandas de seu contexto social e usá-las para continuar aprendendo e se
desenvolvendo ao longo da vida. Com a ampliação do acesso à escolarização, para além
da alfabetização, voltaram-se as atenções para a qualidade do processo de escolarização
oferecido a todos. A questão que se coloca não é simplesmente se as pessoas sabem ler e
escrever, mas também o que elas são capazes ou não de fazer com essas habilidades. Isso
quer dizer que, além da preocupação com o analfabetismo, problema social que ainda persis-
te no Brasil, emerge a preocupação com o analfabetismo funcional, ou seja, com a falta de
capacidades para fazer uso efetivo da leitura e da escrita nas diferentes esferas da vida social,
após alguns anos de escolarização. Pelo critério adotado nas pesquisas censitárias, são anal-
fabetas funcionais as pessoas com menos de quatro anos de estudo.

59 • capítulo 2
UNESCO. Alfabetização de jovens e adultos no Brasil: lições da prática. Brasília: Represen-
tação da Unesco no Brasil, 2008.
<http://unesdoc.unesco.org/images/0016/001626/162640por.pdf>.

LEITURA
UNESCO, Construção coletiva: contribuições à educação de jovens e adultos. Brasília:
UNESCO, MEC, RAAAB, 2005.

Este livro é uma coletânea de artigos, relatos de experiências e de praticas, direcionada


a Educação de Jovens e Adultos que foram publicados na Revista Alfabetização e Cidadania.
Os textos foram agrupados em oito blocos são eles: Legislação e Políticas Públicas; Con-
ceitos de Alfabetização; O Mundo do Trabalho; EJA Indígenas, para o Movimento Negro e
o MST; Formação de Professores; Currículo; Experiências da Oralidade a Escrita; EJA e o
ensino de Matemática.

UNESCO. Alfabetização de jovens e adultos no Brasil: lições da prática. Brasília: Represen-


tação da Unesco no Brasil, 2008.

Este livro reúne experiências brasileiras significativas sobre a Educação de Jovens e


Adultos. No primeiro capitulo será abordada a legislação e a política educacional brasileira
referente à Educação de Jovens e Adultos. No segundo capitulo será analisada as mudanças
no conceito de Alfabetização. No terceiro capitulo são apresentadas iniciativas de Alfabetiza-
ção de Jovens e Adultos que estão em andamentos assim como seus desafios no contexto
educacional brasileiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes nacionais para a educação de jovens e adultos. Brasília.
2000.
______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outu-
bro de 1988. Contém as emendas constitucionais posteriores. Brasília, DF: Senado, 1988.
_______. Ministério da Educação. Plano Nacional de Educação. Brasília. 2001.
_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9394/96. Brasília, 20 dez. 1996.

60 • capítulo 2
______. Parecer CEB/CNE 11/2000. Diretrizes curriculares nacionais para a educação de jovens e
adultos, 2000.
FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 9. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2001.
LIBÂNEO, J.C.; OLIVEIRA, J.F.de; TOSCHI, M.S. Educação escolar: políticas, estruturas e organização.
São Paulo:Cortez, 2012.
PAIVA, M.J.; MACHADO, M.; IRELAND, T. Educação de jovens e adultos: uma memória contemporânea,
1996-2004. Brasília: Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da
Educação: Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, 2007.
VIEIRA, Maria Clarisse. As CONFITEAS e as políticas de educação de jovens e adultos no Brasil: o lugar
da sustentabilidade. In: Revista do programa alfabetização solidária: a educação de jovens e adultos em
discussão. São Paulo, vol. 7, n. 7, p. 11-26, 2007.

CONEXÃO
No capítulo 3 será abordada a trajetória de Paulo Freire, apresentando sua biografia, suas
obras e suas contribuições para a Educação Brasileira.

61 • capítulo 2
62 • capítulo 2
3
O Pensamento
Político-Pedagógico
Freireano e a
Educação Popular
Apresentação

Neste capítulo, tomaremos contato com a trajetória de Paulo Freire, abor-


dando sua biografia, suas obras e suas contribuições à educação. É importante
mencionar sua vasta experiência com educação popular, pois se destacou nos
estudos e práticas no campo de alfabetização de jovens e adultos. A partir da
concepção de educação problematizadora proposta por Paulo Freire, orienta-
remos nossas reflexões acerca dos conceitos de autonomia, conscientização e
libertação e das práticas educativas que respeitem o educando. Daremos desta-
que à educação de jovens e adultos – EJA e à educação popular numa perspec-
tiva freireana que fundamenta a chamada educação libertadora ou educação
problematizadora.

OBJETIVOS
•  Conhecer a importância de Paulo Freire para a educação em âmbito mundial e sua vasta
contribuição para a educação popular e para a alfabetização de jovens e adultos, a partir de
sua vida e suas obras.
•  Entender as ideias que fundamentam a educação problematizadora.

Você se lembra?
Nos capítulos anteriores, apresentamos um breve histórico acerca da alfa-
betização de jovens e adultos no Brasil, bem como a legislação da educação de
jovens e adultos. Agora vamos adentrar então no pensamento político-pedagó-
gico de Paulo Freire.
Muitas vezes, mesmo sendo alunos do curso, pouco estudamos de fato as
contribuições de Freire para a educação. Contudo, seus estudos e ações no
campo da educação popular são inegáveis, o que exige que conheçamos suas
ideias e proposições.

64 • capítulo 3
3.1  Trajetória intelectual de Paulo Freire: vida e obra.

Paulo Reglus Neves Freire nasceu no dia 19 de setembro de 1921, no Recife.


Era de uma família de classe média. A crise financeira de 1929 teve uma reper-
cussão muito forte na vida de Freire. Durante esse período, vivenciou situações
de pobreza e fome, fatos que o levaram a se preocupar com os pobres e o ajuda-
ram a construir sua metodologia de ensino.
Destacou-se por trabalhar na área da educação popular e um de seus objeti-
vos centrais era a formação da consciência crítica. É considerado um dos edu-
cadores mais notáveis na história da pedagogia mundial, tendo influenciado o
movimento chamado pedagogia crítica.
Freire cursou Direito na Universidade de Recife, mas não exerceu a profis-
são. Dedicou-se mais aos estudos de filosofia da linguagem e, posteriormente,
preferiu trabalhar como professor numa escola do então segundo grau ensi-
nando língua portuguesa. Nessa escola, conheceu a professora Elza Maria Cos-
ta de Oliveira, com quem se casou em 1944 e teve cinco filhos.

CONEXÃO
Produzido pela MultiRio, empresa municipal de multimeios do Rio de Janeiro, um dos pro-
gramas “Nós da Escola”, dirigido por Tomil Gonçalves, entrevista o professor José Nelson da
Costa. Por ocasião do aniversário de Freire, em setembro de 2005, esse apaixonado pela
história de Freire conta-nos um pouco de seu percurso. A apresentação do programa fica
por conta de Licurgo. Vale a pena conferir! Acesse: <http://www.youtube.com/watch?-
v=fnJMCbugUg8>.

Em 1946, Freire é indicado para assumir o cargo de diretor do Departamen-


to de Educação e Cultura do Serviço Social em Pernambuco. Trabalhou inicial-
mente com analfabetos pobres e lutou para que eles soubessem ler e escrever e
pudessem ter o direito de votar nas eleições presidenciais.
De acordo com Vera Barreto (2004), em 1958, o então presidente do Bra-
sil, Juscelino Kubitschek, convoca Freire para participar de um Congresso de
Educação de Adultos. Nesse congresso, Freire afirma que o analfabeto não é o
problema, o analfabetismo não é o problema e alfabetizar, consequentemente,
não é a solução. O problema é a miséria da população.

65 • capítulo 3
Em 1960, cria-se em Recife o MCP – Movimento de Cultura Popular –, e é no
âmbito desse movimento que Freire desenvolve a sua metodologia de alfabeti-
zação de adultos.
Em 1961, foi indicado para diretor do Departamento de Extensões Culturais
da Universidade do Recife.
Em 1962, Freire e alguns universitários instruídos por ele realizaram uma
experiência notável de alfabetização de adultos em Angicos, uma pequena cida-
de do sertão do Rio Grande do Norte. Em apenas quarenta horas, trezentos tra-
balhadores rurais foram alfabetizados. Do sucesso dessa experiência resultou
o convite de Paulo de Tarso Santos, ministro da Educação de João Goulart, para
que Freire implantasse um Programa Nacional de Alfabetização de Adultos.
Esse programa objetivava a alfabetização de cinco milhões de pessoas em
um ano, preparando-as para as eleições de 1964. O programa iniciou-se nos úl-
timos meses de 1963. Freire tinha total liderança do processo de alfabetização.
A alfabetização de jovens e adultos, na década de 1960, foi composta de vá-
rios movimentos que visavam à educação e à cultura popular. Além do MCP –
Movimento de Cultura Popular que já mencionamos, podemos destacar:

•  MEB – Movimento de Educação de Base – surgiu em 1961 como uma iniciativa da


Igreja Católica, visando à alfabetização de adultos por meio da utilização de emissoras
católicas.
•  CPC – Centro de Cultura Popular, fundado em 1961 pela UNE – União Nacional dos
Estudantes, artistas e intelectuais da época. O objetivo era levar a cultura às classes
mais desfavorecidas da sociedade. Em 1963, foi criado o Departamento de Alfabeti-
zação de Adultos, onde seriam utilizados materiais como livros e literatura no ensino.
•  CEPLAL – Campanha de Educação Popular, que teve origem na Paraíba em 1961.
Foi criada pelo governo estadual. A conscientização das pessoas era um dos objetivos
principais da campanha.

No entanto, após o golpe militar de 31 de março de 1964, vários desses pro-


jetos foram extintos, sendo que alguns tiveram seus membros perseguidos, exi-
lados e acusados de comunistas.
Freire foi preso como traidor por setenta dias. Em seguida foi exilado na
Bolívia. Trabalhou no Chile por cinco anos no Icira – Instituto de Capacitação e

66 • capítulo 3
Investigação em Reforma Agrária e realizou trabalhos muito interessantes, se-
guindo uma linha cultural de reflexão, sobretudo de conhecimento do universo
mental do camponês.
No Brasil, em 1967, durante o regime militar surge o Mobral – Movimento
Brasileiro de Alfabetização. Os militares tinham todo o controle do que seria
ensinado. Dizia-se que o objetivo era erradicar o analfabetismo no Brasil num
curto espaço de tempo, com forte influência do método de Paulo Freire, pois se
utilizava a “palavra geradora”.
Contudo, há uma diferença marcante entre o método de Paulo Freire e o
método utilizado pelo Mobral. O método de Paulo Freire utilizava palavras ti-
radas do cotidiano dos alunos, e, no Mobral, as palavras eram definidas por
tecnocratas que as escolhiam a partir de alguns estudos. Paulo Freire sempre
afirmou que o Mobral havia sido criado para negar o seu método e para silen-
ciar o seu discurso.
Em 1967, Freire publicou o livro Educação como prática de liberdade. A
obra foi bem recebida e Freire foi convidado para ser professor visitante da
Universidade de Harvard em 1969. No ano anterior, ele escrevera Pedagogia do
oprimido, seu livro mais famoso, o qual foi publicado em várias línguas: inglês,
espanhol (1970) e até em hebraico (1981). Aqui no Brasil, o livro só pôde ser
publicado em 1974.

COMENTÁRIO
De acordo com a 42ª edição de Pedagogia do oprimido, publicado no Brasil pela editora Paz
e Terra, o livro foi traduzido para 17 línguas e revelou-se sucesso editorial em todos os países
devido à perenidade e relevância das questões que aborda.

Em 1970, Freire mudou-se para Genebra, na Suíça, para trabalhar no Con-


selho Mundial de Igrejas como consultor educacional. Durante esse tempo,
atuou como um consultor em reforma educacional em colônias portuguesas
na África.
Em 1980, com a anistia, voltou para o Brasil e filiou-se ao PT (Partido dos
Trabalhadores), e trabalhou como supervisor do programa do partido para a
alfabetização de adultos de 1980 a 1986.
Em 1988, o PT foi bem sucedido nas eleições municipais e Freire foi indica-

67 • capítulo 3
do Secretário da Educação de São Paulo. Exerceu esse cargo durante a adminis-
tração de Luiza Erundina (1989 a 1993).
Com o intuito de dar continuidade e reinventar o legado de Freire, em 1991
foi criado o Instituto Paulo Freire.
Em 2 de maio de 1997, Freire morreu de um ataque cardíaco, seguido de
complicações na operação de desobstrução de artérias e infarto no Hospital Al-
bert Einstein, em São Paulo.

CONEXÃO
O Instituto Paulo Freire, o IPF, é uma associação civil, sem fins lucrativos, criada em 1991 e
fundada oficialmente em 1 de setembro de 1992. Atualmente, considerando-se Cátedras,
Institutos Paulo Freire pelo mundo e o Conselho Internacional de Assessores, o IPF se cons-
titui numa rede internacional que integra pessoas e instituições distribuídas em mais de 90
países em todos os continentes, com o objetivo principal de dar continuidade e reinventar o
legado de Paulo Freire. Para conhecer a riqueza e a extensão do trabalho desenvolvido pelo
IPF, acesse: <http://www.paulofreire.org>.

No mesmo ano da morte de Freire, surgiu o PAS – Programa Alfabetização


Solidária. Os principais objetivos do PAS eram a inserção das pessoas não alfa-
betizadas na Educação de Jovens e Adultos e a continuidade dos estudos. Du-
rante o segundo semestre de 2002, o PAS passou a se chamar Alfasol e cons-
tituir-se como uma Organização Não Governamental (ONG), que continua
atuando na alfabetização de jovens e adultos.
Freire era um intelectual que amava as pessoas e o mundo. E, por isso, luta-
va para que a justiça social fosse implantada antes da caridade. A grande preo-
cupação de Freire sempre foi uma educação para a mudança, para a tomada de
decisão, para a responsabilidade social e política.

68 • capítulo 3
3.2  Conceitos freireanos de autonomia, conscientização e
libertação.

3.2.1  A concepção problematizadora da educação e de libertação.

A concepção problematizadora da educação tem sido classificada como


uma tendência progressista devido a seu caráter de crítica às chamadas peda-
gogias tradicionais. Tal concepção encontra-se engendrada nas ideias da peda-
gogia libertadora, que, por sua vez, guarda relações diretas e fundamentais com
os estudos e propostas de Paulo Freire.
As análises de Freire (2005) na educação consideram que as relações edu-
cador-educandos na escola apresentam como característica predominante as
narrativas e dissertações. Com isso, ele quer dizer que o que ocorre nas escolas
é narração de conteúdos, que, exatamente por isso, desprovidos de sentindo,
tendem a se cristalizar. Nesse sentido, teríamos o sujeito – o narrador, e os ob-
jetos – os educandos, no papel de ouvintes pacienciosos.
Tal situação coloca o educador como agente central e único sujeito, cuja tare-
fa é narrar seus conteúdos de modo a “encher” as cabeças dos educandos. Para

69 • capítulo 3
Freire, essa narração de conteúdos desconectados da totalidade é desprovida de
significação. Alerta-nos para o fato de que, nesta prática, os educandos são con-
duzidos à memorização mecânica. E complementa “a narração os transforma
em ‘vasilhas’, em recipientes a serem ‘enchidos’ pelo educador. Quanto mais
vá enchendo os recipientes com seus ‘depósitos’, tanto melhor educador será.
Quanto mais se deixem docilmente ‘encher’, tanto melhores educandos serão”
(FREIRE, 2005, p. 66).
Dentro dessa perspectiva de narrativas, o educador faz “comunicados” ao
invés de comunicar-se! Essa é a denúncia de Freire à concepção “bancária” de
educação. Os educandos têm o papel de receber os depósitos e arquivá-los. Po-
rém, Freire nos alerta que nessa concepção de educação os grandes arquivados
são os homens, pois estão alijados da busca, da práxis, e sem isto “os homens
não podem ser”. Ambos, educador e educando, arquivam-se nesse processo
equivocado de educação isento de criatividade e de potencial transformador.
Nessa concepção que estamos a criticar

[...] o ‘saber’ é uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doa-
ção que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão –
absolutização da ignorância, que constitui o que chamamos de alienação da ignorância,
segundo a qual esta se encontra sempre no outro. (FREIRE, 2005, p. 67)

O educador, portanto, é sempre aquele que sabe, mantendo-se em posições


invariáveis; já o educando, é sempre o que não sabe. A educação enquanto pro-
cesso de busca é negada frente a essas rígidas posições. Para Freire, a educação
deve implicar na superação da contradição educador-educandos, fazendo de
ambos, simultaneamente, educadores e educandos. Essa superação inicial é a
razão de ser da educação libertadora (FREIRE, 2005).
Porém, nessa concepção bancária não podemos verificar tal superação,
uma vez que ela reflete a sociedade opressora, mantendo e estimulando a con-
tradição. Os homens são vistos como seres da adaptação, bem ajustados. Isso
significa dizer que quanto mais “se exercitem os educandos no arquivamento
dos depósitos que lhe são feitos, tanto menos desenvolverão em si a consciên-
cia crítica de que resultaria a sua inserção no mundo, como transformadores
dele. Como sujeitos” (FREIRE, 2005, 68).

70 • capítulo 3
A “educação bancária” jamais servirá à conscientização dos educandos,
uma vez que propor a eles o desvelamento do mundo, o pensar autêntico, seria
perigoso e colocaria em risco a “domesticação” dos mesmos.
Em contrapartida, a concepção problematizadora e libertadora da edu-
cação parte do pressuposto de que, se os homens são seres da busca e se
sua vocação ontológica é humanizar-se, hora ou outra podem perceber a
contradição em que a “educação bancária” pretende mantê-los e envolver-
-se na busca por sua libertação. Para tanto, é necessário que o educador seja
companheiro dos educandos.

CONEXÃO
A resenha da obra de Paulo Freire Educação como prática da liberdade, escrita por Marco
Gomes e publicada na Revista HISTEDBR On-line em dezembro de 2005, contribuirá com o
enriquecimento da compreensão acerca dos pressupostos da concepção problematizadora
da educação. A revista é uma publicação on-line da Faculdade de Educação da Universidade
Estadual de Campinas – Unicamp e veicula artigos de pesquisa e reflexão acadêmica, estu-
dos analíticos, resenhas, resumos de teses e dissertações e documentos que abordam temas
da história da educação. Leia a resenha em:< http://www.histedbr.fae.unicamp.br/
revista/edicoes/20/res6_20.pdf>.

3.2.2  Conscientização: Consciência crítica e consciência ingênua

Segundo Paulo Freire (1994, p.113):

A consciência crítica é a representação das coisas e dos fatos como se dão na exis-
tência empírica. Nas suas correlações causais e circunstanciais. A consciência ingênua
(pelo contrário) se crê superior aos fatos, dominando-os de fora e, por isso, se julga
livre para entendê-los conforme melhor lhe agradar.

A conscientização é mais do que saber o que se passa ao seu redor, é acima


de tudo um processo histórico e, nesse sentido, coloca Paulo Freire (1980): no
ato mesmo de responder aos desafios que lhe apresenta seu contexto de vida,

71 • capítulo 3
o homem se cria, se realiza como sujeito, porque esta resposta exige dele refle-
xão, crítica, invenção, eleição, decisão, organização, ação. Todas essas coisas
pelas quais se cria a pessoa e que fazem dela um ser não somente adaptado
à realidade e aos outros, mas integrado. É isso que o autor entende por cons-
cientização. É o homem se descobrindo. É a luta para se descobrir a si próprio,
interrogando-se e buscando respostas aos seus desejos e observações.
De acordo com Paulo Freire (1998), algumas características da consciência
ingênua são: simplicidade na interpretação de problemas, tendência a aceitar
formas massificadoras de comportamento, satisfazer-se com as experiências,
afirmar que a realidade é estática e é propensa a cair no fanatismo.

Contudo, o autor também destaca algumas características da consciência


crítica: não se satisfaz com as aparências, há profundidade na análise dos pro-
blemas, reconhece que a realidade é mutável, é indagadora, ama o diálogo e
nutre-se dele.

CONEXÃO
Interessou-se em conhecer mais sobre o conceito de conscientização, em Paulo Freire? Você
pode ler a obra: FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução
ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez & Moraes, 1979. A obra completa está
disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/paulofreire/paulo_
freire_conscientizacao.pdf>.

72 • capítulo 3
3.2.3 Autonomia

Autonomia é uma palavra de origem grega – auto “de si mesmo” + nomia,


“lei” –, assim combinados são entendidos como “aquele que estabelece suas
próprias leis”. É a capacidade que alguém adquire de governar a si mesmo;
aquele que é autônomo, independente, ou seja que toma suas próprias deci-
sões “sem interferências exteriores”.
A reflexão e discussão da autonomia se faz importante para compreender o
objetivo freireano no processo educativo. Paulo Freire busca considerar a auto-
nomia como um ponto de equilíbrio que estabelece a legitimidade da autorida-
de e liberdade. Assim a autonomia se apresenta como um processo dialético de
construção da subjetividade do indivíduo, que, por sua vez, depende das rela-
ções interpessoais desenvolvidas no seu espaço de vivência.
Para Freire, o fim da opressão do ser humano e a sua libertação e o respei-
to à dimensão humana do educando passam pela construção da autonomia
dele, que deve “estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da
responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberdade” (FREI-
RE, 1997, p. 121). As experiências respeitosas permitem o desenvolvimento da
subjetividade autônoma, elemento importante para a constituição das relações
entre liberdade e autoridade.
A reflexão de Freire, acerca da autonomia, está presente na prática educativa
que se processa a respeito de “saberes necessários à prática educativa”, confor-
me reflexão apresentada em várias obras, dentre elas a Pedagogia da autono-
mia (1997). Assim, Freire não se prende ao desenvolvimento de um conceito de
autonomia desvinculado de uma experiência que leve à reflexão.
A autonomia realiza-se no processo histórico, no reconhecer-se limitado
ou inacabado mas com esperança de que possa assumir a sua história pois,
conforme Freire, “Nós somos seres indiscutivelmente programados mas, de
modo nenhum, determinados. Somos programados sobretudo para aprender.
” (FREIRE, 1997, p. 126). E ainda, “Não apenas temos sido inacabados, mas nos
tornamos capazes de nos saber inacabados”. É quando “se abre para nós a pos-
sibilidade de inserção numa busca permanente. [...] Minha esperança parte de
minha natureza enquanto projeto. Por isso sou esperançoso, e não por pura
teimosia” (FREIRE, 1995, p. 75).
Freire afirma que é essa consciência de inacabados...

73 • capítulo 3
[...] que nos faz seres éticos. O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um
imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros. [...]
O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua
inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o pro-
fessor que ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que ‘ele se ponha no seu lugar’
ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se exime do
cumprimento de seu dever de propor limites à liberdade do aluno, que se furta ao dever
de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando,
transgride princípios fundamentalmente éticos de nossa existência. É nesse sentido
que o professor autoritário, que por isso afoga a liberdade do educando, amesquinhan-
do o seu direito de estar sendo curioso e inquieto, tanto quanto o professor licencioso
rompe com a radicalidade do ser humano – a de sua inconclusão assumida em que se
enraíza a eticidade (FREIRE, 1997, p. 66-7).

A partir da afirmação apresentada, é possível destacar em Freire a reflexão


sobre “Ensinar exige respeito à autonomia do ser educando” (1997, p. 65), des-
tacando a coerência exigida daquele que busca e defende a autonomia do ou-
tro, ou seja, do educando. “Saber que devo respeito à autonomia, à dignidade
e à identidade do educando e, na prática, procurar a coerência com esse saber,
me leva inapelavelmente à criação de algumas virtudes ou qualidades sem as
quais aquele saber vira inautêntico, palavreado vazio e vontade arrogante do
mestre” (1997, p. 69).
Para Freire não há como separar a reflexão sobre autonomia, identidade e
dignidade do educando. Refletir sobre esses aspectos em conjunto exige um
grande esforço do educador para diminuir, cada vez mais, a distância, que pa-
rece existir, entre o que é dito e o que é feito.

CONEXÃO
Interessou-se em conhecer mais sobre o conceito de autonomia, em Paulo Freire? Você
pode ler a obra: Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Paulo
Freire. A obra completa está disponível em: <http://forumeja.org.br/files/Autonomia.
pdf>.

74 • capítulo 3
3.3  A EJA e a Educação Popular numa perspectiva freireana.

3.3.1  Breve histórico do processo de alfabetização de jovens e adultos no Brasil

Para estudarmos o processo de alfabetização de jovens e adultos no Brasil,


é imprescindível que recorramos ao pensamento de Paulo Freire, pois o educa-
dor consolida um novo paradigma pedagógico com referencial teórico próprio.

CONEXÃO
Conforme nos explica Moacir Gadotti em uma de suas falas na produção audiovisual dirigida
por Toni Venturi, “Paulo Freire Contemporâneo”, Paulo Freire não cria apenas um método de
alfabetização, mas uma teoria do conhecimento.
A leitura do mundo é um princípio essencial à teoria de conhecimento de Paulo Freire. A
segunda ideia fundamentadora de tal teoria é a tematização, que é feita a partir das palavras
geradoras, e isto implica em descobrir o que significa aquilo que o povo conhece. O terceiro
momento é marcado pela problematização, que é o momento culminante do método freirea-
no, pois está ligado à sua teoria do conhecimento e antropologia.
“Paulo Freire Contemporâneo” está disponível no Portal Domínio Público. Visite o endereço
eletrônico da Biblioteca Digital desenvolvida em software livre: <http://www.dominiopu-
blico.gov.br>.

A história das ideias em torno da alfabetização de jovens e adultos no Brasil


acompanha a história da educação, que, por sua vez, acompanha a história dos
modelos políticos e econômicos.
A partir da década de 1930, a educação básica de jovens e adultos começou
a delimitar seu lugar na história da educação. Foi um período de grandes mu-
danças, associadas ao processo de industrialização.
No entanto, a educação de jovens e adultos ganhou maior destaque após a
ditadura militar de Getúlio Vargas em 1945, em que o país vivenciava a eferves-
cência política da redemocratização. Era urgente a necessidade de aumentar os
eleitores para o fortalecimento do governo central. Além disso, a ONU – Orga-
nização das Nações Unidas – alertava para a necessidade de integração entre os
povos visando a paz e a democracia.
Em 1947, é lançada a Campanha de Educação de Adultos. O objetivo era que

75 • capítulo 3
numa primeira etapa houvesse uma ação extensiva prevendo a alfabetização
em três meses, e mais a condensação do curso primário em dois períodos de
sete meses. Depois, seguiria uma etapa de “ação em profundidade”, voltada à
capacitação profissional e ao desenvolvimento comunitário.
Entretanto, durante essa campanha, existia a concepção de que o analfabe-
tismo era a causa e não o efeito da situação econômica, social e cultural do país.
Essa concepção tornava legítima a visão do adulto analfabeto como incapaz e
marginal.
Tal visão foi sendo modificada paulatinamente. Contudo, antes do fi-
nal da década de 1950, a campanha se extinguiu. As críticas dirigiam-
-se tanto às deficiências administrativas e financeiras, quanto à orientação pe-
dagógica da Campanha da Educação de Adultos. Essas críticas trouxeram uma
nova visão sobre o problema do analfabetismo e alavancaram a implantação
de um novo paradigma pedagógico para a educação de adultos, cuja referência
principal foi Paulo Freire. Sua pedagogia inspirou os principais programas de
Alfabetização e Educação Popular no início dos anos de 1960.

3.2.2  Paulo Freire e o sentido da alfabetização

Para Paulo Freire (apud VERA BARRETO, 2004), a alfabetização é um ato de


criação de que fazem parte o alfabetizando e o educador. O educador é funda-
mental. Ele tem mesmo que ensinar desde que jamais anule o esforço criador
do educando.
Vera Barreto (2004 p.77-78) destaca alguns pontos importantes da forma
como Paulo Freire compreende a alfabetização:

•  O ato de aprender a ler e escrever começa a partir de uma compreensão


abrangente do ato de ler o mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de
ler a palavra.
•  Seria impossível escrever se antes não tivesse havido a fala. Não é possível ler
sem falar, do ponto de vista de uma compreensão filosófica, global do ato de ler.
•  A leitura da palavra foi precedida de um passado sem palavra oral e um pas-
sado depois da oralidade.
•  A leitura da palavra escrita implica a fala, implica a oralidade. A capacidade
de falar, por sua vez, demandou antes o transformar a realidade. Isso é escrever

76 • capítulo 3
o mundo.
•  Ninguém é analfabeto porque quer, mas como consequência das condições
onde vive. Há casos, onde o “analfabeto é o homem ou mulher que não necessi-
ta ler e escrever”, em outros é a mulher ou o homem a quem foi negado o direito
de ler e escrever.
•  Enquanto ato de conhecimento e ato criador, o processo da alfabetização
tem, no alfabetizando, o seu sujeito.

É importante destacar, porém, que não podemos falar de analfabetismo em


culturas que desconhecem o alfabeto, as letras. Numa cultura iletrada não há
analfabetos.
Vera Barreto (2004) afirma que Paulo Freire marcou definitivamente o pen-
samento relativo à alfabetização e introduziu ideias extremamente importan-
tes, tais como:

•  É necessário tomar a alfabetização como consequência de uma ordem social


injusta. O problema do domínio da escrita é tomado num contexto mais amplo,
no qual a escrita aparece como um bem social desigualmente distribuído.
•  Compreender que o aprendizado da leitura e da escrita não pode ser feito
como algo paralelo à realidade concreta dos alfabetizandos. A linguagem está
absolutamente conectada à realidade. Há um ir e vir constante da leitura do
mundo à da palavra e da leitura da palavra à releitura do mundo.
•  O processo de alfabetização é um ato com o qual se reconhece que o povo já
possui conhecimentos. Assim, é preciso propor um texto, um pensamento liga-
do ao contexto social e histórico como objeto da curiosidade e do conhecimen-
to do alfabetizando e, na apreensão desta totalidade, apreender a parcialidade
que é a escrita da palavra.
•  Conceber a alfabetização como um ato criador. A relação alfabetizador-alfa-
betizando é uma relação em que o que conhece a escrita provoca, estimula o
outro para que, através da prática de ler e escrever chegue a esse conhecimento.

Uma pergunta, entre tantas outras que instigava Paulo Freire era a seguinte:
Como ajudá-lo a criar, se analfabeto, sua montagem de sinais gráficos?
E a resposta, de acordo com o próprio Paulo Freire (1994, p. 114), parecia estar:

77 • capítulo 3
A) num método ativo, dialogal, crítico e criticizador;

B) na modificação do conteúdo programático da educação;

C) no uso de técnicas como a da redução e da decodificação.

Vera Barreto (2004) nos aponta que algumas novidades no campo da alfabe-
tização foram introduzidas por Paulo Freire:

•  As carteiras ficavam em círculos ao invés de enfileiradas.


•  O diálogo entre educador, educando e objeto do conhecimento era muito im-
portante.
•  O que era conhecido dos educandos se transformava em palavras geradoras,
que possibilitavam a participação de todos.
•  Apresentação de imagens relacionadas com os temas estudados eram recur-
sos facilitadores para o diálogo.
•  O educador tem o papel de problematizar a situação, estimulando a relação
dialógica.

Paulo Freire (1994, p.110), em sua obra intitulada Educação como prática de
liberdade, afirma que:

Experimentáramos métodos, técnicas, processos de comunicação. Superamos proce-


dimentos. Nunca, porém, abandonamos a convicção que sempre tivemos, de que só
nas bases populares e com elas, poderíamos realizar algo de sério e autêntico para
elas. Daí, jamais admitirmos que a democratização da cultura fosse a sua vulgarização,
ou por outro lado, a doação do povo, do que formulássemos nós mesmos, em nossa
biblioteca e que a eles entregássemos como prescrições a serem seguidas.

78 • capítulo 3
3.3.3  Educador e compromisso social

Segundo Paulo Freire (1998), o compromisso envolve uma decisão lúcida e


profunda de quem o assume e se dá no plano concreto. Para que alguém possa
assumir um ato comprometido, precisa ser capaz de agir e refletir. Refletir sobre
si mesmo e a partir daí, agir no mundo. Só poderá assumir um compromisso real,
a pessoa que for capaz de distanciar-se da sua realidade, admirá-la e transformá
-la. Só pode existir reflexão e ação dentro da relação homem-realidade.
O compromisso autêntico advém da percepção da realidade total e em per-
manente interação. Dessa forma, não é possível que alguém que se coloque na
posição de “detentor do saber” seja verdadeiramente comprometido com a
educação para a diversidade.
Paulo Freire (1979, p. 52) afirma que “(...) reconhecer-se como o ‘agente de
mudança’ atribui a si a exclusividade da ação transformadora que, sem dúvida,
numa concepção humanista, cabe também aos demais homens realizar. Se sua
opção é pela humanização, não pode então aceitar que seja o ‘agente da mu-
dança’, mas um de seus agentes. ”
Esse compromisso se constrói gradativamente, na medida em que necessi-
tamos enfrentar os desafios de nossa profissão ao lidarmos com as diferenças,
com o pluralismo de ideias e ações, a capacidade de assumir os preconceitos
que existem em nós. Como algo que se desenvolve ao longo de nossa prática, o
compromisso ajudará na fundamentação de uma escola e sociedade mais de-
mocráticas.
Dessa forma, algumas questões são fundamentais: Que tipo de homem de-
sejamos formar? Que tipo de formação temos? O que fazer mediante os proble-
mas que enfrentamos no cotidiano escolar?
Todas as questões levantadas são fundamentais e ao mesmo tempo comple-
xas. Contudo, servem para nossa reflexão quanto à melhoria da qualidade do
ensino nas escolas. Sem dúvida, a reflexão aqui proposta, passa pela construção
coletiva de um projeto articulado na escola e que funcione de modo eficaz, com
sentimento de solidariedade e respeito entre os professores e toda equipe téc-
nica e pedagógica da escola e entre professores e alunos.
Paulo Freire (1979, p.21) evidencia que: “Não é possível um compromisso
verdadeiro com a realidade, e com os homens concretos que nela e com ela es-
tão, se desta realidade e desses homens se tem uma consciência ingênua. Não
é possível um compromisso autêntico se, àquele que se julga comprometido, a

79 • capítulo 3
realidade se apresenta como algo dado, estático e imutável”. O autor concebe a
educação como um processo permanente, no qual estamos nos educando con-
tinuamente.
De acordo com Freire (1979), o compromisso deve estar carregado de huma-
nismo e esse só será consequente com fundamentação científica. O profissio-
nal que almeja esse compromisso precisa de aperfeiçoamento constante. Ao
ampliar seus conhecimentos, o profissional comprometido substitui a visão
ingênua pela visão crítica do mundo. O autor também afirma que tentar a cons-
cientização dos indivíduos com quem se trabalha e, ao mesmo tempo, cons-
cientizar-se é o papel do trabalhador social que optou pela mudança.

ATIVIDADE
01. Leia e comente a seguinte afirmação de Paulo Freire (A importância do ato
de ler) sobre a função do professor.
A questão da coerência entre a opção proclamada e a prática é uma das exigên-
cias que educadores críticos se fazem a si mesmos. É que sabem muito bem que não
é o discurso que ajuíza a prática, mas a prática que ajuíza o discurso. Nem sempre,
infelizmente, muitos de nós, educadoras e educadores que proclamamos uma opção
democrática, temos uma prática em coerência com nosso discurso avançado. Daí
que o nosso discurso, incoerente com a prática, vire puro palavreado.

02. O pensamento pedagógico de Paulo Freire parte de alguns princípios que


marcam, de forma clara e objetiva, o seu modo de entender o ato educativo.
Considerando as características do pensamento desse autor, sobre a conscien-
tização, analise a afirmação que se segue:
Trata-se de aprender a ler a realidade (conhecê-la) para em seguida poder rees-
crever essa realidade (transformá-la), Paulo Freire.

REFLEXÃO
As maiores contribuições de Freire foram no campo da educação popular para a alfabeti-
zação e conscientização política de jovens e adultos. Sua obra perpassa amplos espaços
e acaba atingindo toda a educação. Segundo sua visão, nenhuma educação é neutra. Toda

80 • capítulo 3
educação é, em si, política. E mais, toda neutralidade afirmada é uma opção escondida.
Paulo Freire inverteu a lógica das décadas anteriores ao trabalhar com a concepção de que
o adulto analfabeto não era a causa do subdesenvolvimento do país, mas era a sua conse-
quência. Dessa forma, inverte também a visão do analfabeto como um sujeito sem cultura.
A metodologia utilizada por Freire consistia em trazer a discussão do que é cultura e fazer
com que as pessoas se reconhecessem como produtoras de cultura a partir de suas próprias
situações cotidianas, nas quais a alfabetização e a concepção problematizadora de educação
são utilizadas como instrumentos para a leitura do mundo em que se vive.

LEITURA
Gostou de conhecer um pouco sobre o educador brasileiro Paulo Freire? Você pode se apro-
fundar sobre a concepção de educação presente no pensamento dele e também conhecer
mais sobre sua vida e obra por meio da leitura dos seguintes livros:
DAMKE, Ilda Righi. O processo do conhecimento na pedagogia da libertação: as ideias de
Freire, Fiori e Dussel. Petrópolis: Vozes, 1995.
Nesta, obra a autora estabelece entre alguns autores um diálogo profundo a partir de sua
experiência como educadora numa perspectiva da educação libertadora, tanto na escola
quanto em movimentos populares.
FREIRE, Ana Maria Araújo. Paulo Freire: uma história de vida. Indaiatuba: Villa das Letras,
2006.
A obra, escrita por Ana Maria Araújo Freire, a segunda esposa de Paulo Freire, é uma biografia
sobre a vida e a obra de Paulo Freire. Nesta obra, extensa, mas riquíssima em documentos, a
autora apresenta diferentes momentos de sua vida enquanto criança, estudante, professor e
escritor.
GADOTTI, Moacir (org.). Paulo Freire: uma biobibliografia. São Paulo: Cortez, 1996.
A obra vem preencher uma lacuna importante, na história das ideias pedagógicas no Brasil,
pois apresenta um inventário atualizado dos escritos de e sobre Paulo Freire, facilitando o
acesso à bibliografia sobre a concepção libertadora da educação e seu impacto nas ciências
da Educação.
FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia: o cotidiano do professor. 7. ed. Rio de Janeiro:
Paz e Terra. 1997.
A obra apresenta um diálogo entre Freire e Shor, em que debatem sobre como é o cotidiano
do professor, entre outros assuntos relacionados à educação. Eles acreditam que, por não
permitir que os discentes busquem o conhecimento, a escola não motiva seus alunos.

81 • capítulo 3
MULTIMÍDIA
<http://www.youtube.com/watch?v=WJryIAcbRRE> – O vídeo retrata o cenário em
que surge a concepção freireana para a educação popular, as experiências de seu método
de alfabetização no Brasil e no mundo, desde a cidade Angicos/RN, onde se dá a primeira
grande experiência que projetou Freire no Brasil e no mundo
<http://www.youtube.com/watch?v=zeFogTRJiOs> – O vídeo apresenta um trecho
do vídeo do Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (Prof.ª.), do MEC, no
qual especialistas como Emília Ferreiro, José Eustáquio Romão, Vera Barreto e Vera Masa-
gão comentam como o trabalho de Paulo Freire contribuiu para o desenvolvimento da teoria
e da prática da Alfabetização de Jovens e Adultos.
<http://www.paulofreire.org/Crpf/CrpfAcervo000141> – O vídeo, com duração de
cinco minutos, apresenta o professor Moacir Gadotti explicando os três momentos do que
muitos chamam de Método Paulo Freire: leitura do mundo, compartilhamento do mundo lido
e reconstrução do mundo lido. Trata-se de um trecho da Coleção Grandes Educadores de-
dicada à Paulo Freire.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARRETO, Vera. Paulo Freire para educadores. São Paulo: Arte & Ciência, 2004.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1989.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e
Terra, 1997.
______. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.
______. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
______. Pedagogia do oprimido. 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
______. À sombra desta mangueira. São Paulo: Olho D’água, 1995.
______. 1994. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 3. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra. 1979.
GADOTTI, Moacir (org). Paulo Freire: uma biobibliografia. São Paulo: Cortez, 1996.
GOHN, Maria da Glória. Educação não formal, participação da sociedade civil e estruturas colegiadas
nas escolas. Ensaio: avaliação e políticas públicas em educação. Rio de Janeiro, v.14, n. 50, p. 27-38,
jan./mar. 2006.
ROMAO, José Eustáquio. Educação de jovens e adultos: o desafio do final do século. São Paulo,

82 • capítulo 3
IPF,1999. Série CADERNOS DE EJA, n. 5.
ZITKOSKI, Jaime José. Horizontes da refundamentação em educação popular. Frederico Westphalen:
Ed. URI, 2000.

CONEXÃO
Estudaremos as especificidades e as características da Educação de Jovens e Adultos no
Brasil. Os estudos serão baseados em pesquisas e estudos que que nos apresentam o perfil
dos alunos da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, bem como entender as necessida-
des específicas dos alunos e das alunas dessa modalidade de ensino. Refletiremos, a partir
desses estudos e pesquisas, sobre a maneira de organizar a aprendizagem que proporcione
novos desafios para os alunos e alunas da educação de jovens e adultos.

83 • capítulo 3
84 • capítulo 3
4
Princípios
Pedagógicos e
Especificidades da
EJA
Apresentação

Neste capítulo, você poderá dialogar com importantes especificidades e ca-


racterísticas da Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Conheceremos, a partir
de pesquisas e estudos, qual o perfil dos alunos que frequentam a EJA nas es-
colas brasileiras buscando compreender as necessidades específicas para esse
segmento educacional, refletindo sobre as melhores maneiras de organizar no-
vas aprendizagens e propor novos desafios aos estudantes que precisam conci-
liar o mundo do trabalho com o universo escolar.

OBJETIVOS
Compreender os desafios enfrentados pela EJA atualmente, refletindo acerca das dificulda-
des e entraves que cerceiam tal modalidade em todo país, vislumbrando possíveis caminhos
e soluções para melhorias nesse segmento escolar.

Você se lembra?
Durante sua trajetória escolar você deve ter conhecido pessoas que frequen-
taram a EJA ou que estiveram nas escolas em modalidades supletivas para fina-
lizar os estudos conciliando com as responsabilidades do trabalho e da família.
Vamos pensar um pouco sobre as especificidades desses casos, lembrando al-
gumas características específicas de exemplos que vocês possuem?

4.1  As características dos alunos da EJA: mundo do trabalho e


identidades juvenis.

Para pensarmos especificamente sobre o perfil dos alunos da Educação de


Jovens e Adultos/ EJA vale pontuar que a identidade da maior parte das pessoas
que frequentam a EJA na rede pública são na maioria trabalhadores proletaria-
dos ou momentaneamente desempregados, idosos, donas de casa e também
jovens, com suas diferenças culturais, etnias, religião e crenças.
Para grande parte desses alunos, a escola se apresenta como um espaço de

86 • capítulo 4
sociabilidade e possibilidades, sendo encarada como um importante caminho
para a transformação social e a construção de conhecimentos. Tal visão se am-
para na perspectiva de que é possível aprender e construir conhecimentos e sa-
beres diversos que tenham significado nas práticas cotidianas, visto que muitas
vezes esses alunos vão até a escola após um dia intenso de trabalho e possuem
compromissos familiares.
Para o aluno que frequenta a EJA uma preocupação permanente é se o con-
teúdo ministrado em sala de aula pode ser útil no dia a dia. Levando em conta a
experiência de vida dos alunos o professor deve preparar as aulas indo além do
conteúdo, auxiliando a busca dos alunos jovens e adultos a novas descobertas.
Pode-se afirmar que o perfil dos alunos que frequentam a EJA em geral não
varia, muitos são em suma jovens e adultos que não puderam, por motivos di-
versos, dar continuidade nos estudos no período comum e retornam a escola
para junto à vida de trabalho concluir etapas escolares importantes. O que se
pode perceber é que os alunos que frequentam a EJA têm necessidades especí-
ficas e, portanto para garantir frequência e empenho de tais alunos nos proces-
sos de aprendizagem é necessário que os professores tragam para a sala de aula
assuntos sobre os quais eles se interessam e que estejam relacionados com o
seu universo.
Diante de uma realidade complexa, em que muitos adolescentes entram no
mercado de trabalho com certa precocidade, é comum a busca pela escolari-
zação, ou mesmo a continuidade nos estudos, após um período afastados do
ambiente escolar. Tal situação se justifica por uma inserção no mundo do tra-
balho e a busca por uma identidade e independência financeira, desse modo,
os motivos que fazem com que adolescentes estudem na Educação de Jovens e
Adultos são muitos.
Segundo pesquisas do IBGE, a presença de adolescentes na Educação de
Jovens e Adultos (EJA) no Ensino Fundamental é preocupante: quase 20% dos
matriculados têm de 15 a 17 anos.
A quantidade de alunos dessa faixa etária na modalidade da EJA não tem so-
frido grandes variações nos últimos anos, mesmo com uma significativa queda
no total de matrículas (28,6%). Tal panorama tem atraído a atenção dos especia-
listas da área que questionam os motivos de esses adolescentes estarem frequen-
tando a modalidade da EJA, ao em vez de estarem na Educação Básica regular.
Dentre esses motivos nota-se que grande parte são questões que extrapolam
os muros da escola, e outros têm a ver diretamente com a qualidade da Educa-

87 • capítulo 4
ção, envolvendo de forma mais ampla toda a organização do sistema de ensino
que vem constantemente enfrentando certo descaso dos órgãos responsáveis
maiores: Ministério da Educação (MEC), Secretarias Municipais e Estaduais,
gestores e também os professores que lecionam na modalidade. Desse modo,
muitos adolescentes deixam o Ensino Médio regular para poderem entrar no
mundo do trabalho e tem preferência, quando retornam aos estudos, pela mo-
dalidade da EJA devido aos horários de aula (geralmente noturnos) que favore-
cem a continuidade no trabalho.
Outro importante foco está na adesão de idosos à modalidade da EJA. Ao reto-
mar os estudos, eles se socializam, aprendem conteúdo e ganham independên-
cia, o que em geral têm sido fatores fundamentais que justificam o interesse no
retorno aos estudos por parte da terceira idade. Nota-se que a influência da esco-
laridade de filhos e netos é outro fator que impulsiona os mais velhos a estudar,
pois o desejo de auxiliar nas tarefas de casa das crianças e também de participar
mais ativamente da Educação delas.
Em geral a procura pela escola está relacionada à realização de uma vontade
antiga e reprimida de aprender os conteúdos escolares. Saber ler e escrever e
aprender conteúdos de Língua Portuguesa e Matemática é interpretado e asso-
ciado a uma possibilidade de avanços e condição de vida melhor.
De acordo com pesquisas realizadas pelo Censo Escolar (2012), os idosos da
Educação de Jovens e Adultos (EJA) representam cerca de 3% das matrículas do
segmento no país e fazem parte de uma parcela da população que não teve opor-
tunidade de frequentar a sala de aula na idade certa.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 10
milhões de brasileiros nessa faixa etária não sabem ler ou escrever. Esses índi-
ces apontam que o analfabetismo funcional atinge 49% das pessoas acima de
60 anos, entre elas, 18% não tiveram Educação formal e 89% não concluíram o
Ensino Fundamental.
O que se percebe é que na vida adulta, a obrigação com a família é uma das
razões para adiar o retorno às aulas, portanto a adesão da terceira idade nesse
retorno aos estudos está no fato de que nesse período de vida as responsabili-
dades diminuem, já que os filhos estão criados e a disponibilidade de tempo é
maior, em função da aposentadoria.
Partindo disso, podemos afirmar que os ganhos que os adultos e idosos de-
monstram ter com os estudos reforçam a ideia de que o papel da escola não é
apenas conduzir ao mercado de trabalho e possibilitar ascensão social. Nota-

88 • capítulo 4
se que tal concepção minimiza as buscas por melhorias na educação voltada a
esse público, e tem desconsiderado a terceira idade na formulação de políticas
públicas e de leis relacionadas à Educação. Garantir aos adultos, assim como as
outras faixas etárias, uma Educação de qualidade é fundamental. Precisamos
lutar por ações governamentais para essa parcela da população, que cresceu
muito nos últimos anos e buscar espaços de convivência e socialização, como a
escola, indo além de um oferecimento de aulas sem sentido ou descontextuali-
zadas de suas necessidades e vivências.

4.2  Desafios da EJA

Diante das características sociais e educacionais atuais, especificamente no


que se refere à modalidade de ensino que trabalha com adultos, pode-se dizer
que preparar alunos para um mundo em transformação tem sido o maior desa-
fio a ser enfrentado.
O preparo desses alunos para as necessidades atuais da sociedade está dire-
tamente relacionado à inserção de jovens e a permanência de adultos no mer-
cado de trabalho.
De acordo com pesquisas realizadas pelo MEC, nos últimos anos vem ocor-
rendo uma integração entre a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e segmen-
tos da Educação Profissional - PROEJA (Programa Nacional de Integração da
Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de
Jovens e Adultos), em todo o país, aplicado nas instâncias federal, estadual e
municipal.
De acordo com tais pesquisas o número de alunos matriculados no progra-
ma PROEJA ainda está muito baixo a meta prevista:

89 • capítulo 4
PORCENTAGEM DE MATRÍCULAS DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
NO ENSINO FUNDAMENTAL, INTEGRADAS À EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

Atual (2012)
0,7 %
Meta (2023)
25 %

PORCENTAGEM DE MATRÍCULAS DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS


NO ENSINO MÉDIO, INTEGRADAS À EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

Atual (2012)
2,7 %
Meta (2023)
25 %

MEC/Inep/Deed/Sinopse Estatística da Educação Básica


Elaboração: Todos Pela Educação

Para esse cálculo apresentado acima foram consideradas as matrículas do


Ensino Médio na Educação de Jovens e Adultos integradas à Educação Profis-
sional, nas modalidades semipresencial e presencial como proporção do total
de matrículas de Ensino Médio na Educação de Jovens e Adultos.
Segundo tais dados, em uma análise contextual pode-se afirmar que mesmo
com o advento do FUNDEB, que ampliou a possibilidade de financiamento de
programas de Educação de Jovens e Adultos, as matrículas nessa modalidade
de ensino vêm caindo nos últimos anos. Experiências de programas mais liga-
dos à formação profissional tem obtido algum sucesso e precisam ser acom-
panhados de perto. Deste modo, se faz necessária a adoção de projetos peda-
gógicos diferenciados e específicos, que sejam capazes de atender à enorme
diversidade do público que demanda por essa modalidade de ensino.
A partir desses números podemos inferir que além da baixa procura por par-
te dos alunos pela EJA em nível profissionalizante, há também uma enorme

90 • capítulo 4
lacuna nos dados referentes a matrículas nos níveis de Ensino Fundamental da
EJA bem como no que se refere a permanência desses alunos nos cursos.
Desse modo, a EJA ainda conta com importantes dados que revelam os altos
índices de evasão dos alunos como um problema grave na Educação de Jovens
e Adultos em todo o país.

CONEXÃO
Para maiores informações e dados sobre o programa PROEJA acesse o link: <http://www.
observatoriodopne.org.br>.
O observatório do PNE é uma plataforma on-line que tem como objetivo monitorar os indi-
cadores referentes a cada uma das 20 metas do Plano Nacional de Educação (PNE) e de
suas respectivas estratégias, e oferecer análises sobre as políticas públicas educacionais
já existentes e que serão implementadas ao longo dos dez anos de vigência do Plano. A
ideia é que a ferramenta possa apoiar gestores públicos, educadores e pesquisadores, mas
especialmente ser um instrumento à disposição da sociedade para que qualquer cidadão
brasileiro possa acompanhar o cumprimento das metas estabelecidas.

A realidade brasileira possui experiências distintas em estados e municí-


pios diferentes, no entanto é praticamente permanente em artigos publicados
sobre o assunto, exemplos de casos de classes de EJA que começam o ano letivo
com um número significativo de alunos e, já no final do primeiro semestre, es-
tão com metade das carteiras vazias. Não se pode descontextualizar tais dados,
são diversas as situações e motivos que levam alunos da EJA a desistirem, visto
que os fatores que levam os alunos a abandonarem os estudos estão muitas
vezes fora do controle de gestores e professores, porém existem vários aspectos
em que é possível atuar para auxiliar na motivação e permanência dos estudan-
tes na escola.
Para que os números da evasão dessa modalidade sejam reconsiderados e
as taxas de permanência sejam significativas é necessário em primeiro lugar,
empenho por parte de todos os envolvidos nas políticas públicas e governa-
mentais, bem como gestores e professores, para que a escola possa se fazer um
ambiente interessante para a construção de experiências significativas.
Desta forma, a organização da escola tem papel fundamental na permanên-
cia dos alunos, visto que problemas estruturais ou de cunho organizacional
como a pouca assiduidade dos professores ou planejamento falho, desmoti-
vam ainda mais alunos que em geral já estão com dificuldades para frequentar

91 • capítulo 4
a escola. Sendo assim, garantir o bom funcionamento da escola representa um
trabalho que também ajuda na criação de um vínculo afetivo com a escola, que
deve representar um lugar onde se tem acesso ao conhecimento, bem como um
espaço a que os alunos se apeguem e considerem importante para suas vidas.
Além do desafio apresentado acima, ainda é apontado por muitos estudos
outro desafio de grande proporção, que está relacionado a transgressão da per-
cepção de que a educação de jovens e adultos se dá apenas em cunho de alfabe-
tização. Sobre isso estudaremos no próximo item deste capítulo.

4.3  Currículo e Práticas Curriculares de alfabetização na Educação


de Jovens e Adultos.

Segundo estudos realizados nos últimos anos, como o estudo apresentado


pelo autor inglês Ireland (2012), a EJA atualmente tem tido importantes avan-
ços curriculares, possuindo agora objetivos maiores do que a simples alfabe-
tização de jovens e adultos. Para o especialista inglês, na atualidade o maior
desafio da modalidade de ensino é o de preparar jovens e adultos para um mer-
cado de trabalho concorrente em um mundo em constante transformação.
Mesmo com muitos paradigmas alterados, a Educação de Jovens e Adultos
(EJA) ainda é vista por muitas pessoas como uma forma de alfabetizar quem
não teve oportunidades de estudos na infância ou mesmo aqueles que por al-
gum motivo tiveram de abandonar a escola.
Atualmente o conceito de ensino e aprendizagem para a EJA vem se transfor-
mando e, dentre os grandes desafios dessa modalidade, agora temos também a
questão que envolve a preparação dos alunos para o mercado de trabalho.
A cada dia, sabemos do valor da aprendizagem como parte de um processo con-
tínuo, por todas as fases da vida, indo além do período da infância e da juventude.
Segundo Ireland (2013), que foi diretor do Departamento de EJA do Ministé-
rio da Educação (MEC) de 2004 a 2007, a alfabetização é uma parte fundamen-
tal quando se fala em EJA, mas não é a única e mais importante. Sabemos que
tal questão associa-se ao fato de que no Brasil, a EJA tem sido, em geral, associa-
da à escolaridade compensatória para pessoas que não conseguiram ir para a
escola quando crianças, no entanto, tal perspectiva não se coloca coerente com
o que se preconiza nas metas e princípios educacionais atuais.
Não há como negar que existe uma força política muito forte para reduzir as

92 • capítulo 4
estatísticas de analfabetismo, visto que tal índice está relacionado a busca de
um crescimento econômico e social. No entanto é essencial lembrar que esse
é um dos indicadores usados para calcular o Índice de Desenvolvimento Hu-
mano (IDH), além do fato de que a alfabetização representa o alicerce do pro-
cesso de Educação, o portal pelo qual é necessário passar para poder continuar
aprendendo.
Vale lembrar que uma aprendizagem adequada deve considerar o proces-
so educacional em três dimensões: a individual, a profissional e a social. Além
dessas, há outra dimensão de aprendizagem muito pertinente nesse momento:
a relação das pessoas com o meio ambiente, na prática de novos paradigmas de
sustentabilidade e novos hábitos de consumo, que, deve ser alvo de trabalho
também na modalidade da EJA.
Sabe-se que nosso país tem apontado esforços recentemente, com investi-
mentos nessa modalidade educacional. Um deles está no fato de a EJA ter sido
incluída no Fundeb (Fundo de manutenção e desenvolvimento da educação básica
e de valorização dos profissionais da educação) que foi fundamental para garantir
uma fonte estável de recursos para investimentos na modalidade. No entanto
ainda existem graves problemas referentes aos investimentos que muitas vezes
não são distribuídos devidamente nas modalidades educacionais.
Sendo assim, no que se refere aos investimentos financeiros e incentivos
para políticas públicas, há muitas ações que precisam ser promovidas, no en-
tanto, podemos ressaltar que o MEC tem um papel importante nesse processo
ao coordenar políticas que busquem a interface com outros setores, como as
áreas de comunicação e saúde.

93 • capítulo 4
LEITURA

O desafio da EJA nos dias atuais


Ligia Sanchez

A necessidade de erradicar o analfabetismo no Brasil é consenso em todo discur-


so que atrela educação e desenvolvimento nacional, em qualquer esfera da sociedade.
Está presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Projeto de Lei
do novo Plano Nacional de Educação. Na prática, continua uma ferida aberta, principal-
mente quando se pensa pela ótica da gestão pública da educação.
Variadas fontes apontam os poucos progressos obtidos no Brasil nos últimos
anos em termos de cobertura e atendimento à demanda por escolarização a adultos
e jovens excluídos do mundo letrado. Em 2009 ainda existiam 14,1 milhões de anal-
fabetos com 15 anos ou mais no país, o que correspondia a 9,7% da população nesta
faixa etária, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad). Os dados
mostraram que a taxa de analfabetismo caiu 1,8 ponto percentual entre 2004 e 2009.
A Pnad 2009 estimou a taxa de analfabetismo funcional (pessoas de 15 anos
ou mais de idade com menos de quatro anos de estudos) em 20,3% da população. O
índice é 4,1 pontos percentuais menor que o de 2004. As matrículas na Educação de
Jovens e Adultos, em contrapartida, totalizaram 4 milhões naquele ano, considerando
ensino fundamental e médio, de acordo com o Censo Escolar do MEC/Inep.
Os índices de cobertura da Educação de Jovens e Adultos são “irrisórios”, de
acordo com Maria Clara Di Pierro, pesquisadora da Faculdade de Educação da Uni-
versidade de São Paulo cujo doutorado versou sobre as políticas para a modalidade.
“A matrícula em EJA nunca chegou a 10% da demanda potencial. Dados censitários
apontam que a população sem ensino fundamental completo (oito anos de estudos) é
da ordem de 65 milhões de brasileiros acima de 15 anos. A oferta está muito aquém
das necessidades”, analisa a especialista.

94 • capítulo 4
Em meio a essa profusão de indicadores, uma primeira depuração se faz neces-
sária: o quanto desse contingente de analfabetos e pessoas com baixa escolaridade
concorre, na prática, aos bancos escolares. É o que explica Maria Clara. “Nem toda
demanda potencial se converte em demanda efetiva, porque depende das aspirações
que as pessoas têm, das perspectivas de mudança de vida e da própria dinâmica em
que estão inseridas”, afirma.
Esse fator está relacionado aos diferentes perfis dos analfabetos, também indica-
dos pelas pesquisas populacionais. Em 2009, a taxa de analfabetismo no Nordesse
estava em 18,7% segundo a Pnad, quase o dobro da média nacional. “Existem diferen-
ças de indicadores entre as zonas rural e urbana, entre afrodescendentes e brancos,
por faixa etária. Então, a demanda potencial é a da população mais pobre, que vive
na zona rural, predominantemente negra, além dos mais idosos”, detalha Maria Clara.
Segundo ela, a oferta de EJA, por outro lado, está fortemente concentrada nas áreas
metropolitanas, na região Sudesse.
Além de o atendimento não chegar aonde é mais necessário, a situação desta mo-
dalidade de ensino no país se agrava com a queda no número de matrículas. Em 2009,
foram registrados 2,8 milhões de alunos de EJA no ensino fundamental e 1,2 milhão
no ensino médio. A taxa de matrícula vem diminuindo progressivamente em relação a
2006, quando havia 3,5 milhões de matrículas no ensino fundamental e 1,3 milhão no
ensino médio. Os dados são do Censo Escolar MEC/Inep.
“Ultimamente nossa pergunta é: por que a matrícula em EJA está caindo? Será
que a demanda não está se expressando? E por quais razões?”, indaga a especialista
da Feusp.
– Desafios: A resposta para a queda nas matrículas em EJA suscita um leque de
hipóteses relacionadas de forma mais ampla aos desafios para sua plena implemen-
tação no Brasil. “Existe uma multiplicidade de respostas para a questão, baseadas em
fatores que atuam em conjunto: o formato ainda muito convencional da escola, poucos
esforços e falta de estímulos a estados e municípios para investir em EJA, além da
escassez de políticas intersetoriais das áreas de saúde, transporte, assistência social”,
lista Roberto Catelli, que coordena o programa de EJA na Ação Educativa - organiza-
ção voltada a promover os direitos educativos e da juventude.

95 • capítulo 4
Para a pesquisadora Francisca Izabel Pereira Maciel - do Centro de Alfabetização,
Leitura e Escrita (Ceale), órgão da Faculdade de Educação da Universidade Federal de
Minas Gerais -, a motivação para os alunos de EJA está relacionada à sua inserção em
uma sociedade que tem forte demanda de uso da escrita e leitura. “Ler e escrever não
é aprendizagem fácil. Muito mais do que uma técnica, envolve letramento, fazer uso
social dessa tecnologia. Quem não utiliza não aprimora, pode acabar desaprendendo”,
explica.
Segundo Francisca, o desafio para coordenadores de projetos e professores de
EJA está em propiciar a articulação do ensinar a ler e escrever com suas funções e
usos na sociedade. A começar por uma diferenciação da alfabetização para jovens e
adultos em relação à que é destinada e formatada para crianças.
– Condições de acesso e permanência: “A mobilização para matrículas em EJA
depende de uma aproximação dos gestores das redes de ensino com a população,
para identificar dados - que se encontram muito desagregados em diferentes áreas da
administração - reveladores de necessidades próprias por bairros e municípios”, afirma
Leila Loureiro, assessora técnico-pedagógica da Secretaria de Educação de Olinda
(PE). A leitura destas informações encontrará pessoas em situações que escapam à
esfera da pasta educacional. Aí entra a defesa, por parte dos especialistas, da adoção
de políticas intersetoriais para implantação de EJA.
Trata-se de criar condições para o aluno simplesmente ter acesso à escola. “Em
EJA, lidamos com baixa renda, desemprego, pessoas que têm filhos. Temos de pensar
em como fazer para atendê-las, oferecendo, por exemplo, assistência em saúde, cre-
che para os filhos”, complementa Catelli, da Ação Educativa.
Responsabilidade de quem? Outro ponto é evitar o abandono. “A permanência
dos alunos em EJA, com sucesso, está relacionada à adequação do programa, o que
se consegue com as políticas de intersetorialidade. Já acompanhei casos de alunos
que têm dificuldade em assistir às aulas à noite porque não enxergam direito e não
possuem óculos, ou que faltam e se sentem desestimulados por problemas de saúde
como pressão alta”, relata Leila.

96 • capítulo 4
Considerando as particularidades regionais do Brasil, Maria Clara Di Pierro sugere
políticas intersetoriais que contemplem distribuição de renda, acesso à terra, geração
de trabalho, qualificação profissional, além de saúde, alimentação e transporte, para
propiciar o acesso e a frequência. “Se a iniciativa está no campo, tratar com assistência
rural, saúde, meio ambiente. O ideal são medidas mais focalizadas, ajustadas aos con-
textos e conectadas com outras estratégias.”
As políticas educacionais levadas à prática nos últimos anos apontam que a Edu-
cação de Jovens e Adultos tem recebido importância secundária frente a outras mo-
dalidades de ensino e grupos de idade, argumenta Maria Clara Di Pierro, em artigo que
analisa a EJA no Plano Nacional de Educação 2001-2010, na publicação Educação
& Sociedade.
Vontade política e o envolvimento dos entes municipais e estaduais são fundamen-
tais para o avanço da modalidade, defende Roberto Catelli, da Ação Educativa. Na con-
figuração do atual sistema educacional brasileiro, EJA continua buscando seu espaço.
Maria Clara Di Pierro identifica uma série de iniciativas nas políticas do governo
federal nos últimos anos. “O Programa Brasil Alfabetizado, coordenado pela Secretaria
de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad / MEC); o Programa
Nacional de Inclusão de Jovens - Projovem, gerido pela Secretaria Nacional de Juven-
tude; o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação
Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja), mantido pela Secre-
taria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC; o Programa Nacional de Educa-
ção na Reforma Agrária, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário; e o
Exame Nacional de Certificação de Competências, realizado pelo Inep”, lista.
Em sua avaliação, tais iniciativas encontram-se “precariamente articuladas entre
si”. Roberto Catelli, da Ação Educativa, questiona o curto alcance do Proeja, por exem-
plo, dado o potencial da proposta. Os resultados de tais programas são pouco men-
surados ou divulgados. O Ministério da Educação não atendeu à solicitação da revista
para fornecer informações sobre o tema.
Por parte das redes estaduais e municipais, um dos entraves ao desenvolvimento
da educação de jovens e adultos pode estar relacionado ao financiamento. Quando
o Fundeb entrou em vigor, em 2007, estabeleceu fator de ponderação 0,8 para esta
modalidade de ensino. O fator de ponderação é um índice atrelado a um valor de refe-
rência, no caso a remuneração por aluno que o fundo dá à primeira

97 • capítulo 4
etapa do ensino fundamental, que é 1. No caso de EJA, a remuneração é de 80%
do valor por aluno pago no fundamental 1.
Se por um lado foi um avanço em comparação à situação anterior, em que o pre-
cedente Fundef sequer contemplava a EJA, por outro lado, as matrículas caíram. “Uma
hipótese é a de que os gestores estariam configurando os alunos jovens e adultos
como inscritos em educação regular, declarando-os como estudantes com defasagem
idade-série, classes de aceleração ou algo do tipo”, afirma Maria Clara. A manobra visa-
ria receber o valor do Fundeb referente ao fator de ponderação mais alto.
Outra possibilidade, segundo ela, é a pressão social sobre a administração pública,
voltada para a educação de crianças. “A cultura do direito à educação na infância e a
necessidade de as mulheres trabalharem influenciam as decisões políticas”, diz. Já a
cultura da educação de adultos ainda está por se construir, a demanda social é tênue e
desorganizada. Para esta população, a resposta do gestor acontece em forma de pro-
gramas simples, seguindo o modelo tradicional da escolarização, que acaba gerando
evasão e resultados insatisfatórios.
Novo paradigma: Em um cenário de grandes desafios e problemas estruturais, a
educação de jovens e adultos no Brasil não deixa de apresentar avanços, seja na pers-
pectiva macro, seja para aqueles que se apropriam da leitura e escrita para ganhar uma
condição social menos opressiva em sua história de exclusão.
Maria Clara Di Pierro avalia que houve um incremento na colaboração da União
com os estados e municípios, por meio da institucionalização da EJA no sistema de
ensino básico (pelo Fundeb e pela Lei nº 11.497/2009, que regulamentou a inclusão
no Programa Dinheiro Direto na Escola). Além disso, a modalidade passou a ser incluí-
da nos programas de assistência aos estudantes que proveem alimentação, transporte
escolar e livro didático. “Essas medidas, durante o governo Lula, colocaram a educação
de adultos no terreno da disputa da Educação Básica, o que é importante”.
Em um aspecto mais amplo, está a retórica da educação ao longo da vida, que
lança as bases para a atual configuração da Educação de Jovens e Adultos, não como
uma recuperação do passado perdido, mas como direito do sujeito ao exercício da
cidadania.
O desafio: Educação de Jovens e Adultos precisa ampliar a oferta, chegar aos lu-
gares certos e encontrar maneiras de ensinar seu público respeitando sua experiência
de vida.

98 • capítulo 4
Evolução das matrículas em EJA por etapa (2001-2009)

ANO ENSINO ENSINO MÉDIO


FUDAMENTAL
2001 2.636.888 987.376

2002 2.788.113 874.001

2003 3.315.887 980.743

2004 3.419.675 1.157.593

2005 3.395.550 1.223.859

2006 3.516.225 1.345.165

2007 3.084.718 1.278.690

2008 3.001.834 1.276.241

2009 2.810.738 1.239.804

Revista Escola Pública Uol

99 • capítulo 4
ATIVIDADES
Após assistir ao vídeo “Os desafios da Educação de Jovens e Adultos” indica-
do anteriormente, acesse o link: <http://youtu.be/vOyWBZuMHBQ>, responda as
seguintes questões:

01. Enumere os principais desafios desta modalidade de ensino levando em


consideração o público a qual se destina tal modalidade.

02. Pensando nos grupos que são atendidos na modalidade de ensino da EJA,
comente as razões que os levaram a tal escolha.

REFLEXÃO
Vamos refletir um pouco sobre os desafios atuais da EJA?
Diante das discussões e reflexões apresentadas, pode-se afirmar que não é possível de-
senvolver programas de qualidade em nenhuma modalidade de ensino sem que os recursos
sejam disponibilizados e garantidos. Na realidade brasileira, sabe-se que muitas escolas são
improvisadas, não possuindo locais próprios, nem mesmo materiais e educadores devida-
mente formados.
Para resolver isso, a profissionalização do corpo docente e o enriquecimento dos ambien-
tes de aprendizagem são ações fundamentais. Pensando em termos de gestão, é fundamen-
tal a implementação de políticas públicas efetivas, transparentes, eficazes e responsáveis,
que envolvam na decisão pessoas que representem os diversos segmentos da sociedade
civil, como exemplo, participantes da EJA.

MULTIMÍDIA
Assista ao vídeo Os desafios da Educação de Jovens e Adultos. Disponível em: <http://
youtu.be/vOyWBZuMHBQ>
Esse vídeo nos traz uma Roda de Conversa que foi ao ar no dia 29/03/2014 veiculado pela
Rede Minas. A discussão trouxe ao centro os desafios da Educação de Jovens e Adultos
(EJA). A formação dos profissionais que trabalham na área, o respeito às especificidades

100 • capítulo 4
da modalidade de ensino, as políticas específicas vigentes para a EJA e ainda e contexto
social e cultural dos alunos estão entre os temas que permearam o debate com especialistas.
Participaram do debate Geraldo Leôncio Soares, professor da Faculdade de Educação da
Universidade Federal de Minas Gerais, Jane Paiva, professora da Faculdade de Educação da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Maria Clara di Pierro, professora da Universidade
de São Paulo e especialista em Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Assista ao vídeo Hora Atividade: As Dimensões Teórico-metodológicas da EJA. Disponí-


vel em: < http://youtu.be/2DnJhFKLwGk>
Esse vídeo aborda as Concepções Teórico-metodológicas das Áreas de Conhecimento da
Educação de Jovens e Adultos, tendo como convidados a Técnica-Pedagógica da EJA/
SEED a Professoras Jane Cleide Alves, e do município de Fazenda Rio Grande a Coordena-
dora Municipal da EJA Andréia Velter Sellma e a Educadora da EJA Fase I Vanessa Gomes.
TV Paulo Freire. 2009.

LEITURA
GADOTTI, M. & ROMÃO, J. Educação de Jovens e Adultos: teoria, prática e proposta. São
Paulo: Cortez, 2001.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CIAVATTA, M. Trabalho como princípio educativo na sociedade contemporânea. Disponível em: <http://
www.tvbrasil.org>.
ESSEBAN, M. T. Educação popular: desafio à democratização da escola pública. Cad. CEDES [online].
2007, v.27, n.71, p. 9-17. ISSN 0101-3262.
IRELAND, T. Uma prática educativa com operários em construção. In: Construção Coletiva: Contribui-
ções para a educação de Jovens e adultos. Brasília: UNESCO, MEC, RAAAB, 2005.

101 • capítulo 4
CONEXÃO
Estudaremos sobre a formação do educador diante das particularidades e especificidades da
EJA. Refletindo sobre quais são as prioridades desse segmento educacional que devem
orientar não apenas o trabalho professor como também sua formação específica para atuar
nesse campo. Além disso também vamos refletir sobre algumas possíveis ações que podem
ser desenvolvidas na EJA, relatando experiências curriculares e sugerindo materiais didáti-
cos que contribuam com as aulas para a modalidade educacional para jovens e adultos.

102 • capítulo 4
103 • capítulo 4
5
Formação do
Educador Frente as
Particularidades na
EJA
Apresentação

Neste capítulo, será possível refletir sobre os principais pontos que caracteri-
zam a identidade do professor que trabalha com a Educação de Jovens e Adul-
tos no Brasil. Partindo de uma discussão acerca das necessidades dos alunos
que frequentam a EJA, poderemos compreender como os professores dessa
modalidade educacional devem pensar e organizar sua prática pedagógica e
sua postura no cotidiano escolar.

OBJETIVOS
Refletir sobre as necessidades dos alunos que frequentam a EJA e pensar sobre as melho-
res maneiras de organizar novas aprendizagens e propor aos alunos da EJA atividades que
sejam contextualizadas com suas experiências e vivências, bem como com os interesses e
necessidades dos educandos.

Você se lembra?
Vamos pensar a respeito da formação docente? Em outros momentos do
curso de Pedagogia, foi possível discutir e refletir acerca dessa importante te-
mática. Nesta disciplina, falando especificamente sobre EJA, podemos perce-
ber que a formação continuada geral do Pedagogo remete à necessidade de
considerar sempre as especificidades do trabalho, sendo coerente com a mo-
dalidade e/ou ciclo específico a que estamos trabalhando. Pensando assim, é
possível ser Pedagogo e atuar com diferentes públicos sem buscar continuada-
mente uma formação condizente com nossos alunos?

5.1  Especificidades do professor da EJA

Sabemos que a modalidade da EJA tem as suas especificidades no que se


refere ao público-alvo, ou seja, aos alunos. Tal característica nos proporciona
a compreensão da importante necessidade de um trabalho direcionado, que
considere tais questões como prioridade.

104 • capítulo 5
Desse modo, é essencial considerar que os profissionais que atuam na Edu-
cação de Jovens e Adultos devem atuar em consonância com esta prerrogati-
va, podendo desta maneira representar um importante avanço nas políticas de
acesso e permanência das pessoas nessa modalidade de ensino.
Entende-se que a permanência dos alunos pode representar um elo entre
as políticas públicas e uma possível efetivação destas na prática pedagógica do
professor. Assim, podemos dizer que os profissionais comprometidos com a
pluralidade e com o respeito à diversidade das culturas apresentadas pelos jo-
vens e adultos precisam participar de uma formação continuada permanente,
para poder ir ao encontro das especificidades de cada educando na EJA.
Para que possamos garantir a devida formação para os educadores que
trabalham ou irão trabalhar com a EJA, faz-se necessário que os profissionais
que formam continuadamente educadores saibam como esta modalidade de
ensino se configura historicamente e atualmente em nosso país. Como citado
por Arroyo (2006), “se esse perfil de educação de jovens e adultos não for bem
conhecido, dificilmente estaremos formando um educador desses jovens e
adultos” (p. 22).
Da mesma maneira, o professor da EJA deve buscar por si próprio traçar seu
perfil na busca de ampliar suas habilidades e competências específicas para
desenvolver uma boa prática pedagógica em seu trabalho, garantindo sua for-
mação contínua também por meio de uma busca pessoal e particular.
A formação acadêmica inicial é, além de uma ferramenta técnica, um ins-
trumento que compõe a competência que o professor deve ter para iniciar seu
caminho reflexivo e formativo. No entanto, sabemos que é preciso buscar a for-
mação continuada como um complemento para aprender a conduzir os sabe-
res que serão construídos dentro da complexidade dessa sociedade de conheci-
mento que envolve a EJA.

É necessário estabelecer uma formação inicial que proporcione um conhecimento


válido e gere uma atitude interativa e dialética que conduza a valorizar a necessidade
de uma atualização que se produzem; a criar estratégias e métodos de intervenção, co-
operação, análise, reflexão; a construir um estilo rigoroso e investigativo (IMBERNÓN,
2009, p. 66).

105 • capítulo 5
Sendo assim, pode-se afirmar que a formação continuada se faz essencial ao
longo da prática com as especificidades que a EJA envolve, sugerindo o cotidia-
no e as formações in locus (na própria escola, por meio de reuniões pedagógi-
cas e estudos direcionados) como um importante ponto de partida para a busca
do atendimento das necessidades que os alunos têm.
Cabe ao educador da modalidade da EJA a busca permanente por qualifi-
cação para desenvolver ações pedagógicas que atendam às necessidades dos
educandos jovens e adultos e suas experiências socioculturais, visto que o pro-
fessor precisa estabelecer suas ferramentas de trabalho com base na realidade
do educando e no aprendizado que se quer garantir. Portanto, para uma experi-
ência bem-sucedida, é preciso saber quem são esses alunos, onde e como vivem
e quais os seus históricos de vida. Concordando com Nóvoa (2002), entende-se
que o aprender contínuo é essencial e se concentra em dois pilares: a própria
pessoa como agente e a escola como lugar de crescimento profissional perma-
nente (p.23).
Algumas características peculiares à EJA, relacionadas às vivências dos alu-
nos e outras questões de ordem emocional, interferem diretamente na postura
e na ação pedagógica do professor de adultos e jovens. A concepção de mundo
de uma pessoa que regressa aos estudos na idade adulta, após longos anos afas-
tada da escola, ou mesmo daquele adulto que está começando sua trajetória
escolar, é bem peculiar e característica. Tais questões são ponto de partida para
pensar na atuação em sala de aula.
Vale lembrar que esses alunos são pessoas que já têm uma visão de mundo
baseada nas experiências vividas e têm suas crenças e valores já constituídos e
formados. São alunos jovens e adultos com origens, idades, vivências profissio-
nais, históricos escolares, ritmos e estruturas de aprendizagem diferenciadas,
e eles atuam no mundo adulto do trabalho, buscando aprimorar ou mesmo se
preparar para encarar melhor algumas ações cotidianas.
Esses alunos são sujeitos de direito que têm responsabilidades sociais e fa-
miliares e têm já formados seus valores éticos e morais através de experiências
e da realidade cultural em que estão inseridos.
É a partir desse contexto que se acredita que o professor da EJA tem espe-
cificidades pontuais e deve estar preparado para lidar e conviver com diversas
experiências trazidas pelos educandos, usando-as a seu favor e a favor de um
aprendizado contextual e significativo para adultos e jovens que buscam no
processo de ensino-aprendizagem enriquecimento para a prática e a reflexão

106 • capítulo 5
cotidianas.
E ainda, como sugere Freire (1996),

Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos, por isso mesmo pensar certo colo-
ca ao professor ou, mais amplamente à escola, o dever de não só respeitar os saberes
com que os educandos, sobretudo os das classes populares, chegam a ela saberes
socialmente construídos na prática comunitária – mas também, como há mais de trinta
anos venho sugerindo, discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses saberes
em relação com o ensino dos conteúdos. (...) Por que não estabelecer uma “intimidade”
entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles
têm como indivíduos? (p. 30).

Outro ponto fundamental para compor a identidade do professor que tra-


balha com EJA se refere ao fato de lidar com questões pessoais dos educandos,
que por vezes ocasiona em um novo abandono dos estudos. É imprescindível
que o professor, juntamente com a equipe gestora, possa organizar as aulas e
as ações na escola sempre ao encontro das necessidades e dos interesses do
educando, buscando garantir sua permanência na escola.
No entanto, o porquê das evasões muitas vezes também está relacionado
com questões subjetivas e pessoais e, assim, para que o professor possa auxiliar
o aluno em sua permanência e continuidade nos estudos, é necessário organi-
zar ações que facilitem a comunicação com o aluno. Muitas respostas podem
ser encontradas por meio de uma autoavaliação feita pelo educador em relação
às práticas desenvolvidas em sala de aula, assim o professor poderá potenciali-
zar sua organização e planejamento dos conteúdos, visando à toda a complexi-
dade do processo educacional.
Portanto, vale pontuar que o professor deve priorizar o desenvolvimento de
algumas habilidades essenciais para sua prática pedagógica, como a boa comu-
nicação e o aprimoramento do relacionamento interpessoal, pois isso possibi-
lita o desenvolvimento de um fazer pedagógico coerente com as necessidades
dos educandos.
Dentre as habilidades e outras atribuições que compõem o perfil do profes-
sor de jovens e adultos está o compromisso em mostrar que a EJA é uma edu-
cação possível e capaz de mudar significativamente a vida das pessoas, permi-
tindo que estas possam reescrever sua história, motivando, portanto, o aluno a

107 • capítulo 5
buscar o seu crescimento pessoal e profissional.
Como nos mostram algumas pesquisas atuais, a EJA vem passando por re-
configurações, estando em uma fase de transição, na qual se nota um progressi-
vo abandono por parte da União nas atividades dedicadas à educação de jovens
e adultos analfabetos. Segundo Haddad (2007), o movimento em torno da EJA
resgata nesse momento sua importância, inscrevendo-a nas pautas das políti-
cas públicas, o que sugere que esse período tem permitido avanços na maneira
de pensar e de fazer, o que evidencia sinais de uma nova forma de fazer EJA.
Nesse momento se faz necessário pensar, pesquisar e refletir so-
bre as propostas de formação desses educadores; afinal, para con-
tinuarmos avançando numa nova concepção de EJA, precisamos
reconhecer o direito a uma escolarização para todas as pessoas, indepen-
dentemente de sua idade. Isso significa reconhecer que não é permitido pri-
var parte da população dos conteúdos e bens simbólicos acumulados his-
toricamente e que são transmitidos pelos processos escolares. Significa
reconhecer que a garantia do direito humano à educação passa pela elevação
da escolaridade média de toda a população e pela eliminação do analfabetismo
(HADDAD, 2007, p. 15).
Partindo disso, a construção de uma proposta de trabalho que reconheça as es-
pecificidades do público da EJA perpassa diversos aspectos, como, por exemplo:

•  A diversidade de educandos com características de vida específicas;


•  A preocupação com a organização geral escolar que acolha a realidade desse público;
•  Propostas curriculares que vão ao encontro das necessidades e interesses dos alunos,
•  A disponibilidade de recursos didáticos que atendam e desenvolvam as potencialida-
des desses sujeitos;
•  Iniciativas de formação inicial e continuada aos educadores que trabalham com a EJA
especificamente;
•  Implementação de políticas compensatórias de alimentação e transporte que favore-
çam a permanência dos educandos.

Complementando tais colocações, Giovanetti (2005) diz que o que caracte-


riza a EJA é justamente a presença de jovens e adultos de origem popular, que
foram marcados por processos de exclusão social, marginalização cultural e ex-
ploração econômica, sugerindo, assim, que as propostas educacionais façam

108 • capítulo 5
referência a essa característica. De acordo com Fávero (2009), a EJA não deve
ser vista como

[...] apenas uma segunda oportunidade de escolarização, em termos do que se crítica


como uma “educação pobre para os pobres”, mas outras formas de educação que
venham a instrumentalizar indivíduos e grupos para, dizendo novamente: entender e
criticar a realidade em que vivem e, em consequência, propor alternativas para sua
transformação. Não mais meras e repetitivas campanhas de alfabetização, nem ofertas
facilitadas do ensino copiado do sistema regular, mas ações educativas que preparem
para a vida, para uma nova vida, ao longo de toda a vida (p. 91).

A partir de tais apontamentos, podemos afirmar que, entre os desafios a se-


rem enfrentados na formulação de políticas públicas para a educação em geral,
e especificamente para a EJA, encontra-se a profissionalização dos educadores,
pois a ausência de professores especializados nessa modalidade contribui para a
reprodução de um amadorismo e improviso no enfrentamento de suas questões.

5.2  Diferentes ações desenvolvidas na EJA: experiências


curriculares e sugestões de atividades

Ao pensarmos na organização e na composição de um currículo para a Edu-


cação de Jovens e Adultos, é necessário estabelecer uma relação direta com as
especificidades que compõem toda essa modalidade, ou seja, paradigmas que
relacionam o saber da experiência e vivências dos alunos e o mundo do trabalho.
Desse modo, o currículo da EJA precisa estar organizado de maneira coeren-
te com os objetivos para esta modalidade, pensando, portanto, em conteúdos
disciplinares não fragmentados ou mesmo baseados na programação já esta-
belecida na modalidade de ensino para crianças e adolescentes. É preciso que
o mundo adulto, isto é, o mundo do trabalho, seja levado em conta na organiza-
ção de projetos e atividades coerentes com os educandos.
Com isso, faz-se necessário combater uma tendência visível em algumas
propostas curriculares recentes de organização curricular por áreas do conhe-
cimento que aglutinem as disciplinas sem integração curricular. Temas trans-

109 • capítulo 5
versais e interdisciplinaridade devem ser ponto de partida das propostas curri-
culares para EJA.
Para pensarmos em práticas e ações coerentes com a realidade de jovens e
adultos que frequentam as salas de aula da EJA, é fundamental a organização
de materiais, atividades e projetos que tenham como proposta trabalhar conte-
údos correlacionados com as vivências do cotidiano dos alunos.
Dessa maneira, traremos aqui de sugestões de atividades que contemplem
as definições do currículo e que sejam coerentes com a proposta política e pe-
dagógica das instituições escolares.

Sugestão de atividade sequenciada:


(Adaptação da sequência publicada pelo Programa Escola que Vale, uma
parceira entre a Comunidade Educativa CEDAC e a Fundação Vale)

Literatura e leitura na EJA: leitura para os filhos ou netos na hora de dormir


Conteúdo: Leitura em voz alta de textos literários.
Descrição da atividade: Nessa sequência de atividades, pretende-se traba-
lhar com os alunos da EJA a importância do hábito da leitura, demonstrando
que esse hábito pode ser desenvolvido a partir de práticas cotidianas, como ler
histórias para as crianças na hora de dormir. Além disso, esta atividade propõe
apontar a relevância da leitura em voz alta tanto para quem lê como para quem
ouve, de forma subjetiva e também compartilhada.
Como se dá a escolha das histórias a serem lidas: Muitas pessoas têm dúvi-
das sobre quais os melhores tipos de textos e ou contos para trabalhar com os
alunos jovens e adultos. Esta questão é simples. Os textos adequados são aque-
les de qualidade, sendo aqueles que os aproximam da linguagem que se usa
para escrever, mas com vocabulário enriquecido, literário, e não aqueles que
tentam aproximar a escrita da fala com vocabulários restritos, simplificados ou
empobrecidos.
Vale lembrar que ler em voz alta é uma prática que exige várias habilidades.
É preciso ser capaz de decodificar as marcas gráficas do texto e construir para
elas um significado. Além disso, para que esse ato de leitura cumpra a função
de comunicar o texto a algum ouvinte, é preciso que o leitor seja também capaz
de oralizar o texto de maneira a envolver esse ouvinte e captar a sua atenção: é
necessário observar tanto características do texto que será lido quanto caracte-
rísticas da própria leitura.

110 • capítulo 5
Para o momento de escolha do texto a ser lido, é importante realizar uma se-
leção daqueles que correspondam às possibilidades do ouvinte, considerando
o tempo de duração da leitura, a linguagem utilizada no texto que tornará mais
rica a relação do ouvinte com o conteúdo do texto. A seleção cuidadosa do texto
a ser lido é fundamental, e aprender a fazer tal escolha, levando em conta os cri-
térios que favoreçam a interação do ouvinte com o texto, faz parte dos objetivos
didáticos que esta sequência permite construir.
Como uma condição didática, faz-se necessário que o professor em sala
de aula estabeleça uma leitura habitual para os alunos, ou seja, realize leitu-
ras diariamente, utilizando gêneros diversificados. A realização da leitura de
narrativas literárias pelo professor é condição didática necessária para que esta
sequência ocorra de maneira adequada. Normalmente, essa leitura tem como
objetivo colocar os alunos em contato com diversas histórias, permitindo-lhes
uma experiência comum do grupo, que assim poderá compartilhar impressões,
discutir significados e interpretações, em suma, aprender a apreciar literatura.
Além disso, com a leitura diária, os alunos podem compartilhar procedimen-
tos e comportamentos leitores do professor, por exemplo: ouvir o professor co-
mentar a justificativa de sua escolha, comentar partes do texto que mais apre-
ciou, emocionou-se com o que lê, emitir opiniões etc.
Objetivos

•  Oferecer aos alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) a possibilidade de se-


rem leitores de narrativas literárias para crianças;
•  Desenvolver diversos comportamentos leitores: compartilhar com o ouvinte os efeitos
que os textos produzem; confrontar interpretações e pontos de vista; relacionar o texto
com outros conhecidos; observar a beleza de certas expressões ou fragmentos de um
texto; localizar o lugar em que a leitura foi interrompida; recordar os últimos aconte-
cimentos narrados, podendo inclusive reler alguns parágrafos se achar conveniente;
antecipar o que segue no texto e controlar as antecipações de acordo com o desenrolar
da narrativa; adequar a modalidade de leitura aos propósitos que se perseguem; voltar
atrás para recuperar aspectos relevantes do relato para compreender melhor uma situ-
ação ou ao descobrir que não se prestou atenção a uma informação importante; com-
parar com outros personagens, outras versões, outros textos do gênero, outros autores
etc.; reconhecer certos recursos linguísticos próprios de um autor ou de uma versão;
identificar recursos linguísticos adequados a determinadas situações comunicativas.

111 • capítulo 5
Desenvolvimento

1a etapa: Reflexão sobre a importância da leitura

•  Momento em que o professor deve auxiliar os alunos a compreenderem a importância


da leitura realizada pelos alunos jovens e adultos para as crianças (seus filhos, irmãos
menores ou outra criança próxima), explicitando pelo menos dois motivos: quem lê tem
a oportunidade de construir estratégias específicas próprias da prática de leitura em
voz alta; e quem ouve passa a ter situações em que a escrita deixa de ser somente
marcas gráficas e passa a ter sentido, e isso ocorre por meio de um leitor que traz, além
de tudo, a magia e a afetividade da relação de cumplicidade proporcionada pela leitura
em conjunto.

2a etapa: Apresentação da proposta aos alunos

•  Organizar uma roda de conversa, que antecede o momento da leitura habitual, e sus-
citar uma discussão sobre o prazer de ouvir histórias, comentando experiências pesso-
ais sobre a leitura que ouviu quando criança, ou já adulto, expressando sentimentos,
falando das passagens que mais gostava ou desgostava, das que davam medo e faziam
sentir calafrios, de ter chorado e rido com as situações, da beleza dos cenários que se
apresentavam em sua mente, das boas lembranças e dos momentos passados com
alguém querido que havia, com tanto carinho, lhe preparado e lido uma história.
•  Deixe que os alunos também falem sobre suas experiências. Na maioria das vezes, os
jovens e adultos da EJA têm poucas lembranças de alguém lendo histórias, mas com
certeza têm recordações de pessoas conhecidas que contavam histórias.

112 • capítulo 5
3a etapa: Em contato com a leitura (e leitores) em voz alta

•  Para que os alunos tenham oportunidade de refletir sobre o que garante uma boa
leitura em voz alta, é importante que participem de situações em que observem pes-
soas experientes realizando essa prática. Isso pode acontecer de várias maneiras, e é
importante que essas oportunidades sejam numerosas e realizadas em situações inter-
caladas às situações de suas leituras, pois contribui para que os alunos tenham mais
elementos para autorregular sua própria leitura.
•  Leitura realizada pelo professor: Numa das situações em que o professor realiza a
leitura diária, ele pode pedir a seus alunos que prestem atenção não somente à história
contada, mas também ao modo como lê, àquilo que lê, pois isso ajuda a tornar aquela
leitura mais envolvente. Dessa maneira, o olhar dos alunos se voltará para aquilo que
é preciso cuidar, enquanto se lê, para favorecer a atenção dos ouvintes. Ao terminar o
texto, o professor discute o que os alunos analisaram e pode também lançar as seguin-
tes questões: a leitura permitiu que a história fosse apreciada? A leitura permitiu que
os alunos, de fato, se interessassem pela história? Em caso afirmativo, o que contribuiu
para esse interesse?

Enquanto os alunos expõem suas opiniões, é interessante que o professor


anote as conclusões (por exemplo: os alunos podem dizer que o professor pro-
curou ler numa altura que fizesse sua voz audível, sem precisar gritar; podem
perceber que, em alguns momentos, o professor leu mais rápido ou mais pau-
sadamente, e que isso estava relacionado àquilo que acontecia naquele mo-
mento da história; podem comentar sobre a preocupação com o ambiente e
a organização da classe de modo que todos pudessem ver as ilustrações etc.).
Outras ações que envolvem a leitura em voz alta: Ouvir contos/histórias em
CD; Receber um convidado que irá realizar uma leitura em voz alta.

4a etapa: Escolha e preparação dos textos a serem lidos pelos alunos em voz alta

Para a escolha do conto a ser lido, o professor deverá deixar disponíveis aos
alunos diversos títulos de livros que sejam coerentes com a capacidade leitora
do grupo. Para esta atividade, o professor deve providenciar certa quantidade

113 • capítulo 5
de exemplares, de modo a disponibilizar um livro para cada três ou quatro alu-
nos. Assim que os grupos estiverem organizados, o professor pode sugerir a lei-
tura dos seguintes contos:

•  Contos de Perrault: Cinderela; As fadas


•  Contos de Grimm: Rapunzel; Branca de Neve

Em seguida, solicite que escolham qual eles gostariam de ler para as crian-
ças, orientando-os. Feita a escolha, peça que eles realizem uma leitura silencio-
sa e depois combinem que um aluno de cada grupo faça a leitura em voz alta,
que será preparada com o auxílio do professor e dos outros colegas. Cada aluno
lê para seu grupo, e seus parceiros analisam e dão sugestões de como aprimo-
rar a leitura, a partir da lista de dicas já elaborada. Após a análise dos pequenos
grupos, o professor pode questionar se alguém gostaria de ler seu conto para
toda a classe.

5a etapa: Leitura e Comentários

Após essa preparação, os alunos lerão para as crianças, na hora de dormir,


o conto que escolheram, mas ao mesmo tempo deverão ficar atentos a alguns
pontos que poderão ser discutidos e analisados no retorno à sala, como:

•  Como foi a recepção do ouvinte?


•  A criança pôde manipular o livro?
•  Ela se encantou com as ilustrações?
•  Ela gostou ou não da história?
•  Que justificativas podem ser levantadas para isso?

Depois de os alunos terem feito a leitura em casa, proponha uma situação


em que relatem como foi essa atividade.

114 • capítulo 5
6a etapa: Fechamento e continuidade

Esta sequência poderá ser realizada durante várias semanas, com a repeti-
ção da escolha do texto a ser lido, a preparação, a análise da leitura em sala, a
análise de modelos de leitores, a leitura em casa, os comentários sobre a leitura
e novamente a escolha, e assim por diante.
O ideal e esperado é que a atividade de leitura do aluno jovem ou adulto para
as crianças na hora de dormir se torne um hábito. Para isso, sugerimos que você
realize semanalmente (em uma aula) uma atividade habitual que chamamos de
“Roda de Histórias para Hora de Dormir”, em que os alunos compartilham com
o grupo as impressões e experiências vividas nas situações em que leem para
as crianças em casa, isto é, que compartilhem experiências como leitores de
histórias em voz alta.
Adaptação da sequência publicada pelo Programa Escola que Vale, uma parceira entre a
Comunidade Educativa CEDAC e a Fundação Vale.

ATIVIDADES
A partir das leituras e reflexões, responda às questões abaixo:

01. Como professores têm lidado com a questão do saber do aluno trabalhador?
Até que ponto as experiências de vida têm influenciado a seleção e o tratamento
de conteúdos escolares?

02. Como enfrentar a visão hegemônica de escolarização como preparação para


o trabalho nos moldes da acumulação flexível?

03. Ao mesmo tempo, de que forma fazer da escola de EJA um espaço de reflexão
acerca do mundo do trabalho e suas transformações sem abandonar totalmen-
te a possibilidade de ações de geração de emprego e renda?

115 • capítulo 5
REFLEXÃO
A temática que envolve as especificidades na educação de jovens e adultos é muito ampla
e nos possibilita uma extensa reflexão sobre o assunto. É possível pensar a EJA sob vários
aspectos, como: organização curricular, reflexão teórica e prática, organização do tempo e
dos espaços, diversidade de sujeitos, material didático e formação de educadores. Assim,
buscando compreender quais as especificidades do educador que trabalha com a EJA, foi
possível perceber que é fundamental, na prática pedagógica, preservar as particularidades
que envolvem a EJA, destacando as relações dialógicas entre educador e educando e to-
mando como ponto de partida para a ação pedagógica o respeito pelo conhecimento prévio
e pelas vivências do educando.

LEITURA
MOURA, T. A formação de professores(as) para a educação de jovens e adultos em questão.
São Paulo: Edufa, 2007.

Dicas de vídeos:
Assista ao vídeo O discurso do educador com os alunos da EJA. Acesse o link: <http://
youtu.be/4FpzrfFwRrM>.
Nesse vídeo, Sandra Medrano, coordenadora pedagógica do Centro de Educação e Do-
cumentação para Ação Comunitária (Cedac), explica qual deve ser a postura do educador da
EJA diante dos alunos resistentes às novas práticas de ensino.

Assista ao vídeo O computador pode ser um grande aliado na alfabetização de adul-


tos. Acesse o link: <http://youtu.be/5nKv1mcRqQE>.
Esse vídeo traz um trecho do vídeo do Programa de Formação de Professores Alfabe-
tizadores (Prof.ª), do MEC. Emilia Ferreiro fala sobre o uso do computador na alfabetização
de adultos, demonstrando o exemplo de uma aula em que os alunos adultos escrevem no
computador um texto que sabem de memória.

116 • capítulo 5
Leituras Recomendadas

Texto 1: Oralidade: a fala que se ensina


Lorena Verli e Rodrigo Ratier
Oralidade não se aprende por intuição: gêneros mais formais, como o seminário, devem
ser trabalhados com as crianças desde as séries iniciais.
Por alguns instantes, volte ao passado: algum professor ajudou você a saber como falar?
Salto para o presente: na sua prática em sala, você se preocupa em abordar conteúdos da
oralidade? É possível que a resposta às duas perguntas seja a mesma: um sonoro “não”.
Uma apresentação de sucesso:

Roteiro preciso
Uma cola com tópicos pode ajudar a encaminhar a apresentação. Não vale ler os carta-
zes nem decorar o trabalho.

Discurso seguro
As falas devem ser claras, coerentes e concisas: é preciso passar todo o conhecimento
no tempo combinado.

Apoio certeiro
Recursos visuais devem trazer informações simples e diretas para facilitar a compreen-
são do tema geral da apresentação
A razão é compreensível. Existe a ideia corrente de que não é papel da escola ensinar
o aluno a falar – afinal, isso é algo que a criança aprende muito antes, principalmente com
a família. Meia verdade. Há nessa concepção um erro grave de reduzir a oralidade à fala
cotidiana, informal, representada pelos bate-papos e pelas conversas do dia a dia. O fato
é que, sob a denominação genérica de “linguagem oral”, encontram-se diversos gêneros:
entrevistas, debates, exposições, diálogos com autoridades e dramatizações. Em relação a
todos eles, o professor tem um papel importante.
“Cabe à escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral nas diversas situações comu-
nicativas, especialmente nas mais formais”, afirmou o psicólogo suíço Bernard Schneuwly
em entrevista à NOVA ESCOLA em 2002. Considerado um dos maiores estudiosos sobre o
Desenvolvimento da oralidade, ele defende a ideia de que os gêneros da fala têm aplicação
direta em vários campos da vida social – o do trabalho, o das relações interpessoais e o da
política, por exemplo.

117 • capítulo 5
Esforço contínuo
Uma primeira medida para resgatar a importância do tema é investir na abordagem sis-
temática. A estratégia que deve permear todas as fases da escolarização é iniciar o traba-
lho pelas situações comunicativas praticadas naturalmente em sala de aula. Partindo dessa
perspectiva, o Centro Educacional São Camilo, em Cachoeiro de Itapemirim, a 130 quilôme-
tros de Vitória, decidiu trabalhar o seminário como uma atividade permanente desde o início
do Ensino Fundamental (veja a foto à esquerda). E não apenas nas aulas de Língua Portu-
guesa: pesquisas e trabalhos de campo de História, Geografia e Ciências, antes restritos à
entrega em papel, são apresentados para toda a turma na forma de exposição oral. “Com a
experiência constante, os estudantes avançam em todas as etapas do trabalho: passam a
fazer pesquisas mais profundas, descobrem o que pode ser utilizado na apresentação e mos-
tram mais desenvoltura na hora de expor o assunto”, diz a coordenadora pedagógica Edna
Valory (leia no quadro acima os conteúdos desse tipo de atividade).
No seminário, como em qualquer outro gênero, o fundamental é conseguir que ele faça
sentido aos alunos. Para isso, o professor deve debater com a turma o propósito da atividade:
por que estamos fazendo essa pesquisa? Quais os critérios para selecionar o que aprende-
mos e merece ser apresentado? De que forma ele pode interessar ao público? “O seminário
tem de ter uma finalidade maior do que ser apenas uma apresentação. Caso contrário, o
trabalho corre o risco de se tornar desmotivante”, explica Roxane Rojo, professora do Depar-
tamento de Linguística Aplicada da Universidade de Campinas. Depois, é partir para o de-
talhamento dos procedimentos que sustentam a apresentação oral (leia sequência didática
com etapas da atividade ao lado).
A melhor forma de conseguir bons resultados é acompanhar o aluno em todos os pro-
cessos. No Colégio Sete de Setembro, em Fortaleza, a orientação dos seminários vai desde
a discussão sobre o tema até a avaliação da apresentação. “No momento em que o aluno
vai pesquisar, por exemplo, não adianta ele reunir um monte de indicações bibliográficas ou
simplesmente copiar trechos de sites da internet. É tarefa do professor auxiliar na seleção
de informações e na articulação das diversas fontes”, explica a coordenadora pedagógica
Rachel Ângela Rodrigues.
Ainda que a exposição oral seja mais comum nas séries finais do Ensino Fundamental,
ela pode ter lugar desde os primeiros anos. A recomendação dos Parâmetros Curriculares
Nacionais é que as expectativas de aprendizagem acompanhem a evolução dos alunos. A
partir do 3º ano, é possível exigir mais formalidade no uso da linguagem, preparação prévia
e manutenção de um ponto de vista na apresentação. A avaliação deve contemplar esses
aspectos – desde, claro, que o professor os tenha ensinado.

118 • capítulo 5
O que ensinar nos seminários
Quem disse que uma apresentação se aprende espontaneamente? Um seminário possui
uma série de procedimentos formais que devem ser abordados em sala. Primeiro, é preciso
estudar a fundo o assunto a ser apresentado por meio de pesquisas e leituras. Em seguida,
é necessário triar as informações e preparar a exposição, estruturando-a para que ela seja
assimilada pelos colegas. Só então chega o momento de partir para a apresentação propria-
mente dita. Nessas etapas, há quatro aspectos que não podem ser esquecidos:

Planejamento do texto: além de cuidar do conteúdo (uma preocupação comum a todas


a situações comunicativas), um seminário exige a preocupação com a forma como as infor-
mações são passadas, que não pode ser a mesma usada com os colegas no dia a dia. Por
isso, é necessário trabalhar as diferenças entre a língua formal e a informal.

Estrutura da exposição: o conteúdo precisa ser apresentado de forma clara e coerente


– o objetivo é facilitar a compreensão de seu sentido geral. Para que isso ocorra, o texto oral
deve ter uma sequência organizada: fase de abertura, introdução ao tema, desenvolvimento,
conclusão e encerramento.

Características da fala: o tom e a intensidade da voz do expositor devem criar um clima


propício para a interação com a plateia.

Postura corporal: olhares, gestos, expressões faciais e movimentos corporais são im-
portantes para complementar as informações transmitidas pela fala. Esses recursos auxiliam
a mobilizar a escuta atenta.
Disponìvel em: <http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/
pratica-pedagogica/fala-se-ensina-423559.shtml>.

Bibliografia

Gêneros orais e escritos na escola, Bernard Schneuwly, Joaquim Dolz e outros, 278
págs., Ed. Mercado de Letras.

Texto 2: Trabalhar a linguagem oral com os alunos da EJA


Revista Nova Escola

119 • capítulo 5
Como professor de Ciências da EJA, uma das primeiras coisas que percebi foi a neces-
sidade de valorizar o que os alunos falam. Desde o início, ficou claro que alguns estudantes
eram mal avaliados em minha disciplina porque não conseguiam escrever sobre os conteú-
dos específicos, embora tivessem aprendido os conceitos. Nas conversas com esses alunos,
ouvi frequentemente: “Eu sei, professor. Só não consigo escrever o que sei.”
Em nossas avaliações, cobramos muitos textos escritos, mas não consideramos o que
costuma ser dito pelos alunos. É natural que haja essa ênfase, uma vez que um dos objetivos
centrais do Ensino Fundamental é a alfabetização e aquisição de autonomia na leitura e na
escrita. Muitos deles, inclusive, afirmam estar na escola primordialmente para “aprender a ler
e escrever”.
Contudo, especialmente na EJA, a fala deveria ocupar um lugar privilegiado. Primeira-
mente, porque é preciso distinguir o aluno que não aprendeu determinado conteúdo daquele
que sabe, mas não consegue demonstrar isso por escrito. Esses dois tipos têm necessida-
des distintas e requerem intervenções diferentes do professor.
Em segundo lugar porque, embora todos sejamos falantes proficientes da nossa língua
materna, sabemos que há pessoas que encontram dificuldades para organizar a fala e se
expressar de maneira formal em certas situações. Não se trata de negar os regionalismos,
nem de preconceito linguístico. Trata-se de auxiliar esses jovens e adultos a aprenderem a
se expressar melhor no trabalho; a não se intimidar em situações mais formais e a adequar
sua fala ao meio onde está (mais formal, menos formal).
Já ouvi alunos contarem de suas dificuldades para falar com o caixa do banco, solicitar
algo ao patrão ou explicar seus sintomas a um médico, entre outros exemplos. Todos nós,
professores, conhecemos estudantes que não têm coragem de fazer perguntas quando es-
tão em grupo. Portanto, desenvolver a oralidade na sala de aula pode ajudá-los a enfrentar
muitas situações cotidianas, além de contribuir para seu aprendizado.
Com isso em mente, costumo propor à turma que apresente seminários sobre as pes-
quisas que fazemos. Acho que essa é uma forma interessante de aprender a se preparar
para dizer algo em público: é preciso selecionar partes da pesquisa, hierarquizar os assuntos,
explicar cada tópico, aprender a pronunciar palavras que ainda não se conhece (isso é muito
comum em Ciências!), adequar-se ao tempo que foi determinado, além de, claro, promover
uma aproximação com um assunto específico da área.
Alguns dos critérios que utilizo para avaliar os seminários:
–– Posicionamento e desenvoltura durante a apresentação;
–– Incorporação de dados da pesquisa na fala de cada participante;
–– Autoria da fala (por exemplo: se as palavras usadas foram pensadas pelo aluno ou
se ele simplesmente decorou um texto retirado da internet).

120 • capítulo 5
E você, concorda que é importante propor atividades para desenvolver a oralidade em
alunos da EJA? Que tipo de atividade costuma realizar? Quais critérios você usa para avaliar?
Disponìvel em: <http://revistaescola.abril.com.br/blogs/eja/2014/04/16/
trabalhar-a-linguagem-oral-com-os-alunos-da-eja/>

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARROYO, M. G. Formar educadoras e educadores de jovens e adultos. In: Seminário Nacional Sobre
Formação do Educador de Jovens e Adultos. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.
FÁVERO, O. Educação de jovens e adultos: passado de histórias, presente de promessas. In: Educação
de Jovens e Adultos na América Latina. São Paulo: Moderna (2008).
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
1996.
HADDAD, S. Por uma nova cultura de educação de jovens e adultos, um balanço de experiências de
poder local. Novos caminhos em Educação de Jovens e Adultos - EJA. São Paulo: Global, 2007.
IMBERNÓN, F. Formação docente e profissional: Formar-se para a mudança e a incerteza. São Paulo:
Cortez, 2009.
KLEIMAN, A. (Org.) O ensino e a formação do professor: alfabetização de jovens e adultos. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2000.
NÓVOA, A. (org.). Os professores e sua formação. Lisboa-Portugal: Dom Quixote, 2002.

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